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Flos sanctorum

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FLOS

SANCTORUM

O HISTORIA DAS VIDAS

DE

CHRISTO E SUA SANTSSIMA ME

E DOS SANTOS l SUAS FSSTAS

PELO PADRE

DIOGO DO ROSARIO

I HO va BDIXo AUCtMEKTADA oom os santos modebhos B otbos OMUTIDOB

vas Adies antbbiobbs

PELO PADRE

JOS ANTONIO DA CONCEIO VIEIRA

VOLUME I

HISTORIA DA VIDA DE NOSSA SENHORA

B DOS

SANTOS DO MEZ DE JANEIRO

s LISBOA

TYPOGRAPHIA UNIVERSAL

D& THOMAS QUINTINO antunns

Rua dos Calafates, 110

1869

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Je_

1-3-

INTRODUCCO

As Sagradas Escripturas so inquestionavelmente o Grande Livro.

E o livro dos livros.

Nada to antigo, to sublime, to santo.

E a palavra de Deus, quer directa, quer por intermdio dos seus santos filhos.

A par das revelaes sublimes, que justificam a existncia do homem n'este valle de lagrimas, em um centro de existncia, que no aquelle que est em harmonia com as ambies, que n'elle se revelam, o que se traduz nos seus gemidos e lagrimas, encerra a mais pura, a mais santa moral ; a nica que, limitando as ambies, e forando o homem a viver na sua pequena esphera de liberdade, e a respeitar a dos outros, capaz de fazer a felicidade das sociedades.

IVINTRODUCO

A Bblia, todavia, j pelas apparentes contradic-es, j pelos pensamentos de elevado e difficillimo alcance, o que tem dado aso s encontradas interpretaes no seio dos povos no catholicos, no , s por si, o mais seguro dos guias nas mos dos que se no acham preparados para penetrar-lhes o verdadeiro sentido, que s um deve ser.

Assim que a santa Egreja para prover de remdio, tem procedido e instado com os diversos prelados, para que em suas dioceses procedam publicao de folhetos, que resumida e substancialmente involvam os conhecimentos theologicos, moraes e disciplinares, necessrios salvao, e por uma forma accessivel a todas as intelligencias * os Catecismos da doutrina ; assim que para a' unidade litrgica se publicam desde os missaes e brevirios at s novenas locaes; e em relao parte histrica se tem publicado sob a epigraphe Historia Sagradaos factos concernentes ao povo de Deus.

D'est'arte9 a Biblia lida sem perigo para a in-telligencia, sem causar damno unidade da f, que s uma deve ser; pois tudo, alm da legitima deseendencia das Sagradas Escripturas, , a mais, reforado com as tradies apostlicas, decises dos Conclios, e autoridade dos santos padres.

Ha porm um livro de elevada importncia em relao salvao, e que, como filho das Sagradas Escripturas, deve andar junto com os que acabei de referir. -

este o Fios Sanctorum.

N'aquelles aprendemos a theoria, n'este a pratica da religio.

Todo o portuguez conhece que a probidade, honradez, valor, e amor da ptria, so qualidades que assentam bem em todos os filhos d'est paiz, e de todos os paizes; mas, estas theorias puras e santas, podiam sensibilisar-nos, como o sentimos, quando lemos nas paginas da nossa historia os admirveis exemplos, que nos legaram Egas Moniz, Martim de Freitas, Alvares Pereira, Albuquerque, Joo de Castro, e outros?

Assim a Biblia ou o Catecismo, por um lado, e o Fios Sanctorum, por outro.

N'aquelles conhecemos as verdades, as causas; n'este apalpamos os fructos, os effeitos.

VIINTRODCO

E na verdade: se empregarmos as nossas atten-es n'esses magniicos jardins celestes, e ahi estudarmos as flores, cujas biographias se acham consignadas no dito Fios Sanctorum, encontraremos, quer no grupo dos santos patriarchas, quer no dos prophetas, quer no dos apstolos, no dos confessores, doutores, instituidores das ordens religiosas, anachoretas, solitrios, virgens e viuvas martyres e no martyres, que, desprendidos do mundo, tudo sacrificam pela gloria do Senhor, e salvao de suas almas e das dos seus prximos, exemplos da mais admirvel abnegao, do mais acrisolado amor que se pde conceber.

Tudo so perfumes, que, suavisando as nossas almas, nol-s elevam at Deus; excitando em ns toda a ordem de generosos sentimentos, que mais nos aproximam dos Anjos, que dos homens, propriamente taes.

Cum sanctis sanctus eriscom os santos sers santo.

E um livro precioso: e entre ns fazia-se sentir a falta de uma publicao, accessivel a todas as intel-ligencias, e ao alcance da maior parte das fortunas.

iHraoDucovn

Essa publicao a presente, a que do entrada as linhas que vou escrevendo.

ccordmos em escolher, como base, o Fios San-ctorum, que, a instancias do nosso Fr. Bartholomeu dos Martyres, publicara o P.e Fr. Diogo do Rosario.

Escolhemos este de preferencia, por ser o mais acceito pelo paiz, em geral, e reconhecido como o melhor pelos homens mais notveis, que (Testas obras teem conhecimento.

As lacunas, que alli se manifestam em alguns dias do anno, iro preenchidas pelos santos que as occu-pam no Fios Sanctorum do P.e Sarmento, e nas mais recentes e auctorisadas publicaes; sendo a Historia Ecclesiastica quem me deva fornecer os que me faltem para que, em todos os dias, nas supraditas lacunas, se possa ler a biographia d'alguns dos santos de quem, em tal dia, trate o Martyrologio Romano.

Um indice geral, no s dos Santos d'esta publicao, mas dos nomes de todos os Santos do Martyrologio Romano, terminar esta edio; que, praza ao Senhor Deus de Misericrdias, seja de utilidade e edificao a todos, que a leiam.

P. Jos ANTONIO DA CONCEIO VlEIRA.

HISTORIA DA VIDA

VIRGEM MARIA

NOSSA SENHOBA

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INTRODUCAO

Q

uerendo Deus formar o primeiro homem, conta a Sagrada Escriptura no Gnesis, qoe disse: Faamos o homem d nossa imagem e similhana. Falia n'este logar, como diz Santo Agostinho, o Padre Eterno desta maneira, porque a obra da fabrica do homem era maravilhosa, sendo o fim e remate de todas as creaturas. E assim foi conveniente para denotar a sua grandeza, que como de accordo conviessem, e concorressem todas as trs divinas Pessoas da Santssima Trindade em sua formatura. Prosegue a Es criptura, dizendo : Creou Deus ao homem sua ima-gem e similhana ; e accres-1 centa logo : sua imagem creou Deus ao homem. S. Basilio reparou em estar de menos n'este logar a similhana, porque s diz, que Deus crera o homem sua imagem e similhana ; e dizer (pondera este Santo), que se emendou, ou retractou em um logar do que tinha dito em outro, e que est de mais aquella partcula similhana, blasphe-mia, porque quem disser, que na Escriptura Sagrada ha palavra alguma demasiada ou suprflua, diz o mes- . mo Santo, que blasphemo. Pois de que procede, que em, um logar se diga do homem, que o formou Deus sua imagem-e similhana, e em outro se calle similhana, e somente se diga ima-

' gem ? Procede (diz o mesmo Santo), de que a imagem denota no homem o natural : como a alma espirito, e tem tres potencias, Memoria, Entendimento e Vontade, similbana de Deus, que espirito; e sendo uma a essncia, so tres Pessoas, Padre, Filho, Espirito Santo : e similhana accrescen-ta, que essa alma est adornada de virtudes, e de obras santas, em que se exercita mediante o seu livre alvedrio.

De maneira que, formou Deus o homem sua imagem, porque lhe deu o que era da sua parte, e assim elle da sua fizesse por onde se conservasse na similhana. E isto quiz o Filho de Deus dar a entender quando, fallando com os seus sagrados Apstolos e discpulos, disse: Sede misericordiosos, como vosso Pae celestial o . E vem a ser: Se vos parecerdes na misericrdia com o vosso Pae celestial, que faz nascer o sol, e chover,. sobre bons e maus, no s permanecer em vs outros a sua imagem, mas tambm tereis a sua similhana, pois na misericrdia sereis similhan-tes a elle. Peccou o homem, e pelo peccado, o que dantes era similhante a Deus, ficou sendo similhante aos brutos, ficou com a imagem riscada: no ficou sem vontade e livre alvedrio, nem sem o natural, que diz n'elle imagem, mas ficou-lhe tudo isso disformado. Pela qual raso convinha que provesse Deus de outra imagem sua, viva e exemplar, donde os mais homens tomassem molde, ou frma, e guia, com que podessem caminhar seguros para conseguir a bemav.enturana, que foi o fim de sua crea-o.

E para isto mandou Deus a seu Filho Unignito ao mundo, e veiu vestido de carne, para que o homem o visse, porque sem esta libr era impossvel vel-o; conforme o que diz s. Joo: Ningum viu a Deus; e quer dizer: No podem os olhos corporaes ver o que puro espirito; para que o vejam, tome libr, faa-se homem, e assim o ver o homem, e ser-lhe-ha exemplar, de que tire copia, e imagem, que imite; que assim o quer S. Paulo, dizeu-do: Aos que Deus predestinou, quiz, que fossem conformes d imagem de seu Filho. Quiz, que o imitassem, e seguissem suas pizadas, ainda que foi o seu passo tio acelerado, e caminhou tanto, que a muitos lhes parece, ou se lhes faz impossvel o seguil-o. Do que temos a prova n'aquelle rico, que com desejo de salvar-se perguntou a Jesu Ghristo: Que farei para conseguir a vida eterna ? E respondeu-lhe o Senhor : Que guardasse 09 Mandamentos; e que, se quizesse ser perfeito, desse a pobres a sua fazenda, e o seguisse. Ouvindo isto o rico, entristeceu-se.

Na tristeza, diz Santo Tho-maz, que se encerra temor. Temeu este, que por ir carregado de muitas riquezas, que tinha, e ver a Christo, que se adiantava tanto, pa-recendo-lhe no o poder alcanar, desmaiou, e foi-se para casa. Por isso deu o Filho- de Deus outra traa, e foi que, quem se no atrevesse a seguil-o e imital-o, pozesse os olhos em alguns dos seus servos, a quem imitasse e seguisse, S. Paulo isto sente, quando diz : Sede, irmos, imitadores meus, caminhae por onde eu caminho; e se vos parece, que no podereis seguir a Ghristo, porque ainda que homem, tambm juntamente Deus, segui-me a mim, que sou homem e de carne, como todos, os demais ; e seguindo me a mim, que sigo a Jesu Christo, todos iremas ao Ceo.

Pois entre todos quaijtos servos e amigos de Deus temos, a quem podemos, e devemos imitar, tem o primeiro logar a Virgem Sacratssima Maria Me de Deus, porque mais que outro algum o seguiu e imitou. D'esta prodigiosa Senhora,'dizem os sagrados Doutores, que teve todas as graas, todas as virtudes, todas as prerogativas e ex-cellencis que teve IJesu Christo verdadeiro Deus, e homem (no sendo a etla repugnantes), ainda que de diffrente maneira, porque Christo as teve de si mesmo, e a Virgem sua Me participadas d'elle. Era esta Senhora mui parecida a Deus ; e costuma succder, que muitos dos filhos saem parecidos a suas mes. De um dizemos que roubou os olhos a sua me, outro a boca, outro as feies do rosto, e outro a condio, por se lhe assimilharem muito n'estas coisas. Na Virgem Maria no dizemos, que seu Santssimo Filho se parece com ella, seno que ella se parece com elle; porque assim como o engaste se parece, ou se assimilha pedra; se redonda, o engaste de necessidade ha de ser redondo ; e se quadrada, quadros ha cie ter o engaste: assim aquella Pedra divina, que desceu do alto do monte do seio do Eterno Padre, sem ser tocada de mos de homens, e sem que obra d varo se intromettessea engastal-a, introduziu-se nas entranhas da Virgem, e engasto-se, vestindo-se n'ellas de carne : o engaste se accommodou pedra, e se fez ao seu talhe, da maneira, que formou a sua traa. E assim tem a Virgem todas as virtudes e graas, que dizem, e se ajustam com ella, simi-lhana de seu soberano Filho.

E se o Filho nos d vozes, e chama, que o sigamos e imitemos; a Virgem tambm convida a que sigamos por sua imitao a Christo. S. Joo diz no Apo-calypse, que o Espirito e a Esposa, por quem se entende a divindade e humanidade de Chrislo, clamam, dizendo: Vinde. E que o que ouve, por quem se entende a Virgem, a qual como mais immediata a Christo ouve primeiro a sua voz, tambm diz: Vinde; e se offerece a acompanhar a quem fr em seguimento de Christo, e o affirma nos Cantares por estas palavras: Correremos para o cheiro de vossos perfumes: eu correrei, e acompanharei aos que quizerem correr em vosso seguimento, e imitao. De sorte que nos pe Jesu Christo a Virgem Sacratssima sua Me por molde, ou original, de que devemos tirar copia, e conformar nossas obras quanto nos fr possivel com as suas; e para melhor o executar bem que vejamos qual foi a sua vida, e quaes foram suas obras.

Ainda que antes de pr mo nisto, confesso de mim, que temo, que me succeda o que aconteceu ao atrevido sacerdote Oza, querendo suster com suas mos a Arca do Senhor, pelo que o castigou com pena de morte. Zelo mostrou ter Oza em querer seguir a Arca do Testamento, para que no casse em terra; e parece, que por este zelo, que foi publico, se lhe podra dissimular o delido occulto; que commetteu tfaquella obra, pois supposto, que certo tel-o havido, ainda se no tem declarado de todo o que fosse; e comtudo isso pagou pelo seu atrevimento. Pois quanto com maior razo merecerei eu ser castigado, por me atrever a pr a mo, Do na Arca do Testamento, que era de madeira, seno na vida da que recebeu e guardou a Deus em suas entranhas, onde esteve como em arca encerrado por espao de nove mezes? Ao que se accrescenta, que se em Oza houve algum delicio e peccado (como houve), no se acaba de conhecer, e em mim reconheo eu muitos defeitos, pelos quaes justamente posso e devo temer, que venha sobre mim outro similhante castigo, se no desisto do intento. !

Por outra parte vejo que diz Ecclesiastico: Os que se occupam em escrever e declarar os meus divinos mysteris, conseguiro a vi-da eterna. Ouo tambm a Isaias, que diz: Ai de mim, por que calleit to digna de ser louvada^ a Virgem Santssima Maria Me de Deus, que incorrer em grande culpa quem, podendo, no emprega toda sua vida em a louvar. Vejo, que os sagrados Doutores mostrando-se muito devotos d'esta excellentissima Senhora, todos ficam curtos e muito limitados neste particular; porque alguns foram "seus grandes devotos, como um Sv Jeronymo, um Santo Ildefonso, um S. Bernardo, o qual tratou do principio da vida d'esta im-maculada Senhora, e do mysterio da Annunciao: Santo Ildefonso tratou de sua virgindade e limpeza; e S. Jeronymo escreveu de sua morte, e Assumpo. E assim nem estes tres nomeados, nem algum outro de todos os mais escreveu inteiramente sua vida.

E posto que alguns pro-mettam de fazer isto, como Simeo Metafrasle, com tanta brevidade, e dizem to pouco, que mais despertam o appetite para de* sejar o todo, do que o deixam satisfeito com to pequena parte. Pelo que, ainda que reconheo em mim muito pouco talento para negocio tao preexcelso e elevado, e juntamente o no ser santo, seno grande peccador, me podia servir de impedimento para o intentar; comtudo o grande desejo que tenho, e sempre tive, de servir a Virgem Maria, assim pelo seu grande valor e merecimento, que sem egual, como pelas incomparveis mercs, que d'ella tenho recebido, e espero me ha de continuar, me estimula e anima a tomar a penna e escrever em seu obsequio, confiando no favor que o seu preciosssimo Filho me dar, do qual espero que, saindo bem com isto, usar commigo o que acontece a um bom escrivo, que com mal aparada penna faz melhor letra, do que outro que no escreve to bem, com outra finamente aparada. E o que ao caador, que sae com diversidade de libros caa, que levanta o veado, e o segue o ligeiro galgo; e depois de o ter canado e vencido, o deixa por algum particular accidente, que lhe succede, e. vem a morrer nas garras de oulro libro, de que se no esperava tanto : assim eu, ainda que seja penna mal aparada, e de meus eccos ou latidos se no deva fazer caso, sendo favorecido de Deus, ser possvel, que comece, e d fim em escrever a vida da Sacratssima Virgem Maria sua Me, de sorte que agrade aos seus devotos, e a todos os fieis Christos, e os incite a seus louvores. A qual, colligindo-a do que d'esta Senhora escreveram os sagrados Evangelistas e muitos santos Doutores, na forma seguinte.

CAPITULO I

Em que se referem os antecessores da Sagrada Virgem Maria Me de Deus, desde Ado at Jacob Patriarcha.

Entre as obras de grancle nome e fac&a, que Salomo fez para mostrar a grandeza do seu estado e auctorida-de de sua pessoa, foi uma, de que faz particular meno do terceiro livro dos Reis, de um throno, o qual era de marfim, mui grande e formoso : era xoberto de oiro, e tinha seis degraus : era pela parte detrs redondo, estava no alto d'elle uma cadeira cingida de dois braos com suas mos, e a sustentavam dois lees, e cada um debaixo de sua mo. Estavam mais, doze lees, repartidos dois em cada degrau. A obra era tal (diz a Sagrada Escriptura), que no foi feita outra si-milhanle em reino algum. Este throno. diz a.Glossa, que figura da Sagrada Virgem Maria, em cujas entranhas Deus se reclinou, e esteve nove mezes assentado, e depois havendo nascido, e estando nos braos d'esta Senhora como assentado em throno, recebeu a adorao e offertas de trs reis, reconhecendo-lhe vas-sallagem. Era o throno de marfim, e denota a grande pureza e limpeza da Virgem: era grande, porque a grandeza da Me de Deus tanta, que s o mesmo

Deus se lhe avantaja. Estava coberto de oiro, e denota n'esta Senhora sua fer-ventissima caridade : os seis degraus que o throno tinha at chegar cadeira, significam na Sagrada Virgem seis reis famosos entre outros muitos, que houve em sua illustrissima ascendncia, que foram: David, Salomo, As, Josaphat, Ezequias e Josias. Os braos e mos, que estavam nas ilhargas da cadeira, do a entender as obras de vida activa e contemplativa da Me de Deus, e que se acharam n'ella em gro de ex-cellencia : os lees significam a fortaleza, que mostrou em accommetter coisas rduas, e em soffrer coisas adversas, ou, como diz S. Pedro Damio, que S. Gabriel e o Evangelista S. Joo foram custdios, um de seu corpo, outro de sua alma. Os doze leesinhos, que a cercam, so doze fructos do .Espirito Santo, de que faz meno S. Paulo, e so chamados Caridade, Gozo, Paz, Pacincia, Grandeza de animo, Bondade, Benignidade, Mansido, F, Modstia, Continncia e Castidade.

* f Tal obra como a do throno > de Salomo, no foi feita em reino algum, e tal obra como a fabrica da Virgem no se viu no Ceo, nem na terra, em outra alguma pura creatura. Esmerou-se Deus com razo m fabrial-a; e sendo, como , muito amigo de sua honra, foivpreciso, que se esmerasse na fabrica da Virgem, #ois no tempo que elle conversou com os homens na terra, estando n'ella esta Senhora, ainda que os milagres, que elle fazia, eram to maravilhosos, sua doutrina to alta, sua vida to admirvel, e que tudo isto exaltava summamente, e pedia que os homens justamente o tivessem por coisa divina e celestial, como o era, nunca desprezou ter por Me a Virgem, sempre a troxe comsigo, e se presa va he ser tido por seu Filho, e de tal maneira, que se o nascer em um prespio lhe pde causar affronta, e o morrer na Cruz entre dois ladres ignominia, tendo junto comsigo em sua morte, e em seu nascimento a Virgem, de quem verdadeiro Filho, a honra que resulta de sel-o, sendo ella tal, suppre com vantagem (se com recta vista se olha) similhante affronta e ignominia ; e o mesmo faz agora no Ceo: e sendo ali i conhecido por Filho do Padre Eterno, e sendo verdadeiro Deus, no somente no se affronta com a companhia de tal Me, seno que se preza e honra de ser seu Filho, mostrando-a a todos os cidados d'aquella soberana corte, e dizendo: Vedes aqui a pea donde cortei o panno de minha humanidade, n'esta tenda me vesti de tal libr, esta a Me que me pariu, honrae-a todos, pois eu a honro como a minha verdadeira Me.

Pois para Deus honrar a Sacratssima Virgem desde o principio do mundo, foi escolhendo ascendencias e pessoas as de mais nome e fama que n'elle se acharam, assim en virtudes, como em particulares excellencias; e para isto dos filhos de Ado escolheu a Seth, o qual de edade de cento e cinco an-nos gerou a Ens, este de nojenta annos gerou a Cai-no, este de setenta annos gerou a Malaleel, o qual de sessenta e cinco gerou a Jared, este de cento e sessenta e dois gerou a Henoch, que foi varo muito escolhido e amigo de Deus. e de sessenta e cinco annos gerou a Matusalem, o qual de cento e oitenta e sete gerou a La-mec, este de cento oitenta e dois gerou No, o qual sendo de quinhentos teve tres filhos, Sem, Cho, e Japhet, aos seiscentos annos de sua vida veiu o diluvio, no qual se renovou o mundo, morrendo quantos n'elle havia, seno No com seus tres fi* lhos, e as mulheres de todos quatro. De Sem, filho de No, que foi sacerdote, nasceu Arphaxad, de Arphaxad ty Sal.J. Lucas pe entre Arphaxad e Sal a Caino, e diz Nicolau de Lyra, que foi pae de Sal adoptivo; e por isso o nomeia S. Lucas, e o nomearam os setenta e dois interpretes: de Sal nasceu Heber, de Heber Phaleg, e de Pfialeg Reu (chamado por S. Lucas Ragau). de Refi Sarug, de Sarug Nachor, de Nachor Tar, que foi pae de Abraho, de quem o Evangelista S. Matheus comea a escrever a gerao de Jesu Christo, segundo a carne; e por conseguinte da Virgem.

Introduziu-se no mundo em tempo de Abraho a idolatria, tirando os idolatras a adorao, que se devia ao verdadeiro Deus, dando-a a deuses falsos. Pelo que si-gnalou sua Magestade uma gerao e descendncia qu foi a de Abraho, para se fazer homem, e redemir com sua morte o gnero humano ; e porque fossem signalados, du-lhe por preceito a Cir-cumciso, os quaes circum-cidando-se ao dia oitavo de seu nascimento, professavam por meio de tal sacramento a f de um medianeiro, que havia de nascer d'aquella gerao. E mediante isto, eram limpos do peccado original, em que foram concebidos e nascidos ; e por este particular favor, que Deus concedeu a Abraho, e por ser pessoa signa-lada no mundo, comeou o Evangelista S. Matheus a escrever d'elle a gerao de Jesu Christo,'segundo a hu* manidade, e da Sagrada Virgem sua Me: ainda que S. Lucas, que tambm poz nisto a mo, comeando do mesmo Jesu Christo, subiu no s at Abraho, d'onde S. Matheus comeou, mas chegou at Ado o primeiro homem ; e porque jvse nomearam os que foram antes de Abraho, por-se-ho agora os que foram depois d'elle, eguindo ambos os Evangelistas. Abrahogerou a Isaac, e Isaac a Jacob. Santo Anselmo, e com elle a Glossa dizem, que por Abraho se denota a F, por Isaac a Esperana, e por Jacob a Caridade.

CAPITULO II

Em que se referem os antecessores da Virgem Maria desde Jacob Patriarcha at S. Jos sen esposo.

De Jaob Patriarcha, que teve doze filhos, diz a Sagrada Escriptura, que escolheu Deus"no ao maior d'elles, que foi Ruben, seno a Judas, que teve o quarto lo-gar, o qual foi fllbo no de Rachel a formosa, seno de Lia a feia : Judas gerou de Thamar a Phares e Zaro. S. Jeronymo adverte, que se nomeiam algumas mulheres nagenealogia deChristo, e em todas ellas bouve que reprehender. Esta Thamar se fingiu m mulher, e se poz onde entendeu, que Judas a havia de ver e desejar com culpa e peccado de ambos, como succedeu ; ainda que ella o fez com desejo somente de ter filhos, visto que de outra maneira licita lhe no eram concedidos. Phares descendo o Egypto com seu pae Judas, e com seu av Jacob, gerou a Esron, e Esron a Aro, este a Aminadab, e Ami-nadab a Naason. Nicolau de Lyra diz, que este Naason saiu do Egypto com seu pae/ Aminadab, o qual foi principe e capito da triby de Jud, e deixou a seu filho esta dignidade e tribu, primazia e coroa do reino entre as outras tribus. Naason gerou a Salmon, e Salmon a Booz, e como diz Nicolau -de Lyra, foram trs d'est mesmo nome, pae, filho, e neto; e islo conforma cora o que diz S. Matheus, que houve quatorze geraes desde Abraho a David. Booz gerou a Obed, este a Jess, o qual foi pae de David rei, eoprimeirodaillus-trissima gerao de Christo, e por quem a tribu de Jud tomou posse do reino dos hebreos. David gerou a Salomo na mulher que foi primeiro delirias, chamadaBethsab. Salomao gerou a Roboo, em cujo tempo as doze iribus se dividiram, e com Roboo ficaram em Jerusalm a de Jud, e a de Benjamim. Roboo gerou a Abias, Abias a Asa. Asa a Josapbat, e Jo* saphat a Joro. Aqui diz gjgf eronymo, que passou em silencio S. Matheus tres reis, que foram Ochozias filho de Joro, e Joas filho de Ochozias, e Amasias filho de Joas. A razo diz que foi, porque Joro casou com Athalia filha de Jesabel, que foi mpia e cruelissima mulher, e por isto se excluiu at a terceira gerao da genealogia de*Christo, e^omo diz Lyra, sem estes tres se cumpre o numero de outras quatorze geraes at transmigrao de Babylonia. Pois o ultimo d'estes tres reis encobertos, chamado Amasias, foi pae de Ozias, e Ozias de Joatho, Joatho de Achaz, Acbaz de Ezechias, que foi bom rei, o qual gerou a Manasses, o que primeiro deu em ser vicioso e mau, e depois foi bom; este gerou a Amon, o qual pare-j cendo-lhe, que poderia imi-

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tar a seu pae, e serjnau na mocidade, e na velhice fazer penitencia e salvar-se, Deus lhe encurtou os passos, permittindo, que criados seus o matassem moo occupado em seus vicios, porque o outro com seu exemplo no se descuidasse no que tanto lhe importava. Amon gerou a Josias, santssimo varo, que desde menino se empregou em servir a Deus, e derribou todos os idolos de seu reino. Este gerou a Jechonias, e a seus irmos,

Um delles foi Sedecias, em cujo tempo succedeu a transmigrao, feita por Nabucodonosor, dos judeos, que viviam em Jerusalm e sua comarca, a Babylonia, levando com, elles a Sedecias seu rei, filho de Josias, a quem mandou tirar os olhos, porque se rebelou contra elle, havendo-lhje deixado o reino, tirando-o a Jechonias, neto "de Josias, ao qual havia levado captivo a Babylonia, e matara a seu pae, chamado do seu mesmo nome, tambm por rebelde: d'estes dois, pae e filho, que tiveram um mesmo nome, faz o Evangelista S. Matheus um s homem, como dizem S. Jeronyrao e Nicolau de Lyra, e se collige de Jeremias, e diz que gerou a Sa-lathiel, que perdeu o titulo de rei pela captividade de Babylonia, e Salathiel gerou a Zorobabel, que foi o que reduziu o povo do capliveiro a Jerusalm, sendo seu capito e guia. Zorobabel gerou a Abiud, ainda que tem outro nome no Paralipome-non. Abiud gerou a Eliacim, este a Azor, Azor a Sadoch, Sadoch a Achim, Achim a Eliud, Eliud a Eleazar, Eleazar a Mathan, Mathan a Jacob, e Jacob a Jos esposo da Virgem. S. Lucas, sem nomear a Jacob, chama pae de Jos a Heli. S. Je-ronymo, e Nicolau de Lyra dizem de Jos, que foi filho natural de Jacob, e legal de Heli. S. Lucas nomeou a esteie S. Matheus aquelFoutro: Jos foi esposo de Maria (diz S. Matheus), de quem nasceu Christo. Chegou com a genealogia at Jos (diz S. Jeronymo), porque no era costume nas geraes pr-se nomes de mulheres, e porque Jos, e a Virgem eram de uma tribu e gerao. E prova d'isto, que no era licito pela lei, que mulher alguma, a quem pertencia a herana do pae, como pertencia Virgem a de Joaquim, seu pae, casasse com outro que no fosse da sua tribu; e se Aaron sum-mo sacerdote, que era da tribu de Levi, casou com Isabel, filha de Aminadab, e irm de Naason, que era da tribu de Jud ; e David, sendo da mesma tribu de Jud, casou com Michol, filha de Saul, da tribu de Benjamim, foi porque a herana e morgado dos paes a nenhuma d'estas duas pertencia ; porque tinham outros irmos mais velhos, como consta da Escriptura; mas na Sagrada Virgem uao tinha isto logar, por ser filha primognita e nica de Joaquim e Anna, seus paes, a quem sua herana e morgado pertencia ; e assim fica provado, que eram parentes S. Jos, e a Virgem. O grau de parentesco declaram alguns Doutores referidos por S. Joo Lcido, seguindo o texto de S. Lucas n'esta maneira. Janne gerou a Mel-chi, Melchi gerou a Levi, Levi a Malhai, e Mathat geroo a Heli, que se chamou tambm Joaquim, que foi pae natural de Maria, e legal de S. Jos. /

Diz Cornlio JoSo Senio, e parece dizer o mesmo Santo Agostinho, que chamar-se Heli pae legal de S. Jos, no se ha de entender da maneira que outros tinham este nome, pela raso de que morrendo sem filhos, e casjndo o irmo do morto, ou parente chegado, com a viuva, o filho que lhe nascia, se chamava natural do pae que o gerava, e legal d'aquelle, em cujo nome nascia; porque, diz elle : Heli, ou Joaquim, que tudo um, era sogro de S. Jos, esposo da Virgem; e S. Lucas o chama pae seu, por ser costume chamarem os sogros aos genros, filhos, e os genros aos sogros, paes. Diz mais Joo Senio, que S. Lucas, no tempo que quiz escrever a gerao de Christo, segundo a humanidade, disse d'elle, que era lido por filho de Jos, dando n'isto a'entender a verdade, que s era pae seu putativo, ou em opinio, como antes o tinha es-cripto contando embaixada do Anjo S. Gabriel Virgem, e encarnao do Filho de Deus, feita no por obra de varo, seno do Espirito Santo ; e se nomeara o pae natural de S. Jos, que foi Jacob, podera-se-lhe dizer (diz este auctor) : Evangelista sagrado, se nos quereis contar a genealogia de Christo, e que descende de David, segundo a carne, em nomeando a Jos, esposo da Virgem, deixae sua gerao, e contae-nos a d'esta Senhora, que foi sua verdadeira me. E assim o fez, que em nomeando a S. Jos, e dizendo d'elle, que era tido por pae de Jesu, diz de Jos, que foi filho de Heli, isto , como temos dito, da maneira que chamado filho o genro do sogro ; e assim assenta Joo Senio, que Heli foi Joaquim, pae da Sacratssima yirgem Mariai Diz mais, que desde David, seguiu S. Matheus a gerao de Jos pla linha de Salomo, e S. Lucas, a da Virgem, pela de Natho, filhos ambos de David, e de Bethsab, como se diz no Paralipomenon ; e bem verosmil, que estas geraes por respeito das mulheres se misturaram diversas vezes, e se renovava o parentesco, como toca Santo Agostinho ; e assim os reis descendentes de David, e Salomo, nomeados por S. Matheus, pertenciam no somente gerao de Jos, mas tambm da Virgem : por onde esta Senhora, e seu esposo eram to chegados em parentesco, que conhecendo uma gerao, se conhecia a outra. E por isto ambos os Evangelistas pretendendo declarar que Jesu Christo era Filho de David, ainda que cada um seguiu seu caminho e vereda, procuraram ajuntar-se no mesmo David, nomeando ambos com seus progenitores. Jr

O bemaventurado S. Je-ronymo, traduziu de he-' braico em latim, um tratado, que se intitula do Nascimento da Virgem; e ainda que pe n'elle alguns escrpulos e dificuldades, est j to recebido, e com sua traduco to ap-provado, que podemos fiar-nos d'elle, e dizer aqui o que n'elle se acha, que toca a S/Joaquim e a Santa Anna, paes da Sagrada Virgem. Diz n'este tratado, que a beraaventurada e gloriosa sempre Virgem Maria, da real famlia de David, nasceu em Nazareth, seu pae se chamou Joaquim, e sua me Anna. Seu pae tinha casa e parentes em Nazareth, povo de Galila, e sua me em Belm: viviam ambos em Nazareth,-singela e justamente para com Deus, e sem reprehenso para com os homens, com os quaes eram piedosos* porque o que em sua fazenda ganhavam cada anno, faziam em tres partes: uma offereciam ao templo de Jerusalm para servio seu e de seus ministros, outra distribuam com pobres e peregrinos, e a outra gastavam em sua casa e famlia. Passaram d'esta maneira quasi vinte annos sem ter filhos, fizeram voto, se Deus lhe desse algum, de offerecer-lh'0 para servio do templo, o qual todos os annos visitavam nas festas principaes, e renovando sua promessa, pediam a Deus humildemente os consolasse em sua soledade. Succedeu que visitando S. Joaquim o templo na festa chamada Encenias, sendo summo sacerdote Isacar,

(a.