“ Palavras para o velho abacateiro”
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“Palavras
para
o velho abacateiro”
Ondjaki
Os da minha RuaIn:
Professora Elsa Oliveira
Antigamente as pessoas eram pessoas de chegar. Não sabíamos fazer despedidas.
Palavras da avó Catarina
“Quando chegámos da praia
o céu estava à espera que as
pessoas todas se
recolhessem para poder
ordenar às nuvens que
começassem a largar uma
grande chuva molhada, era
até raro em Luanda naquele
tempo fazer uma ventania
daquelas…”
Personificação
Pleonasmo
e pensar que ele se mexia para me dizer
certos segredos,
Personificação
“(…) e o abacateiro estremeceu…
Comparação
…como se fosse a última vez que eu ia olhar para ele…
não sei, há coisas que é preciso ir perguntar aos galhos de
um abacateiro velho (…)”
e pode ter sido nesse momento que no corpo de criança um
adulto começou a querer aparecer,
não soube mais entender
não sei o que o abacateiro me disse,
“… a bomba de água
disparou e assustei-me, o
vento estava a pôr-me
nervoso,…”
“…olhei a mangueira com mangas verdes, olhei os galhos
secos do abacateiro, reparei no encarnado vivo das romãs
bem madurinhas ali perto do mamoeiro, olhei as uvas na
videira, e enquanto olhava o céu escuro, ainda pensei que era
tão estranho aquelas uvas terem um sabor tão nítido a
manga…”
Enumeração
Sinestesia
“… Caiu a carga de água que o céu tinha
prometido pela cor e pelo vento soprado
(…)”
“… era tanta água que mesmo ver a casa do Jika estava
difícil, o mundo parecia um deserto molhado naquela
tarde…”
“… a chuva caía como um embrulho gigante de redes de pesca
que tivesse escorregado do armário de um pescador que estava
lá muito em cima, nas alturas, …”
personificação
comparação
sinestesia
Ndalu quando entrou na cozinha tinha o corpo a
pingar, a t-shirt estava encharcada e ele decidiu
voltar lá para fora para a pendurar na corda.
Quando voltou a entrar a mãe disse-lhe:
“…- o pai e eu estivemos a falar sobre aquele assunto –
o meu corpo estava todo molhado, pensei que a minha mãe
ia me ralhar de eu estar a trazer a chuva para dentro de
casa, espalhando as gotas do meu corpo pelo chão limpo da
cozinha, …”
“… a minha mãe tinha os olhos molhados também e um
grande silêncio invadiu a casa escolhendo esse espaço entre
nós para ficar, …”
Hipérbole
Personificação
“- Tu há tanto tempo que falavas
nisso, nós estivemos a falar…”
Pensou na sua irmã Tchi, no seu pai, na
restante família, vizinhos, amigos, animais,
árvores e plantas daquele lugar de África-
Luanda.
A cabeça de Ndalu “viajou” pelas memórias daquela casa e daquele espaço.
“… uma vontade de lágrimas me visitou (…), entrei no meu
quarto de tão poucos anos (…).
Metáfora/personificação
- Nós pensamos que, se é
realmente o que tu queres,
podes ir estudar para outro
país…”“…pensei que lá nesse país teria outro quarto, mas não este, o
antigo, o dos cheiros e das roupas e das músicas e dos livros e
das escritas tristes e secretas, da mala com os livros do
Astérix…” Enumeração
…onde é preciso enchermos cada pedaço de espaço
com o riso do presente e todas, todas as
aprendizagens do passado, que alguns também
chamam de antigamente…”
“-assim a pingar ainda te constipas - a minha mãe
disse com chuva nos olhos bem encarnados…”
“… eu sem saber como dizer – a ela e a mim- que
essa viagem, essa partida de ir embora, (…) me
chegava fora do tempo, num terreno que ia muito
além da dor e das lágrimas…”
“A avó Agnette (…) [dizia] que o futuro era (…) um lugar aberto, uma varanda, talvez uma canoa… Metáfora
Personificação
Metáfora
Metáfora
“Fiquei com os olhos postos nas gotas tombadas no chão,
sem poder saber, nunca mais, o que era gota o que era
lágrima…”“- Se tu queres ir para outro lugar, nós também
achamos que é o melhor.”
“(…) abri um pouco a janela (…) ouvi (…) os passos da avó
Agnette que se ia sentar na cadeira da varanda e apanhar
fresco…”“… Senti que despedir-me da minha casa
era despedir-me dos meus pais, das
minhas irmãs, da avó e era despedir-me
de todos os outros:
Enumeração
os da minha rua…”
a minha rua, (…) nesse dia ficou espremida
numa só palavra que quase me doía na boca
se eu falasse com palavras de dizer:
“…senti que a rua não era um conjunto de
casas, mas uma multidão de abraços,
infância.”
“A chuva parou. O mais difícil era saber parar as lágrimas.”
“O mundo tinha aquele cheiro da terra depois de chover e
também o terrível cheiro das despedidas… Metáfora
… Não gosto de despedidas porque elas têm esse cheiro de
amizades que se transformam em recordações molhadas com
bué de lágrimas.”
Metáfora
“Desci. Sentei-me perto, muito perto da avó Agnette…
Repetição
… Ficámos a olhar o verde do jardim, as gotas a
evaporarem, as lesmas a prepararem os corpos para
novas caminhadas. O recomeçar das coisas.”
Enumeração
“- Não sei onde é que as lesmas sempre vão, avó.- Vão pra casa, filho.
- Tantas vezes de um lado para o outro?
- Uma casa está em muitos lugares -
Ela respirou devagar, me abraçou. -
É uma coisa que se encontra.”FIM