LIGAÇÕESPERIGOSASCombinar um chá de hipericão com ummedicamento para a tensão ginseng com insulinaou um sumo de laranja com quimioterapiapode ser fatal Muitos alimentos ingeridosem excesso cortam ou potenciam o efeitode medicamentos Porque nem tudoo que é natural é inócuo afinalveneno de cobra também é um

produto da naturezaPOR SARA SÁ

Não há nada melhor para a saúde do que umsumode laranja acabado de espremer o alho é

segredo da longevidade dos japoneses e faza tudo um chá de camomila acalma todos os malesCertoHá uma nova área da ciência que se dedica a estudar as

relações muitas vezes perigosas entre alimentos e medicamentos E osresultados são surpreendentes A laranja em excesso pode reduzir o efeitode medicamentos como os anti HIV os anticancerígenos ou até das estatinas E mesmo nas pessoas saudáveis acima dos mil mg por dia a vitamina Cuma laranja tem cerca de 100 mg pode provocar diarreia e cálculos renaiso alho pode aumentar o risco de hemorragias em pessoas que tomam anticoagulantes assim como a camomila E por aí vamosNa Universidade de Coimbra há um grupo de cientistas que envolve

farmacêuticos médicos e biólogos dedicado a procurar estas ligaçõesnum autêntico trabalho de detetive Àfrente do Observatório de InteraçõesPlanta Medicamento OIPM a farmacêutica Maria da Graça Campos elaprópria uma mulher surpreendente Com energia e vontade de cem mobiliza a equipa que inclui muito trabalho de voluntário para responder apedidos diretos de pessoas de todo o País Há uma página no Facebook umsite uma linha telefónica e um esforço de colaboração com as unidades de

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saúde Estamos sempre disponíveis» sublinha As dúvidas são respondidas a título individual numa abordagem casoacaso As vezes é

preciso ir a casa dos doentes ou até à prisão onde faz voluntariado «Nãoconheço nenhum outro grupo como o nosso» diz sem falsas modéstias«Procuramos informação em todo o mundo

O assédio

Apesar da lógica de grande abertura o trabalho do observatório e a questãodas interações entre as plantas e os medicamentos ainda é desconhecidomesmo entre os médicos «É uma área relativamente nova Estamos a daros primeiros passos» explica a diretora Apesar disso em três anos de atividade o OI PM já recolheu uma vasta gama de casos clínicos e uma base dedados disponível no site que distribui em folhetos em vários congressos eapresentações científicasMesmosem conhecero trabalhodoobservatório RicardoCasteloBranco

47 anos não está para combinar a quimioterapia a que tem de se submeterpara tratar um linfoma com outras soluções Há três anos quando começouos tratamentos sentiu se «assediado» por centenas de pessoas que queriam«vender lhe» uns desinteressadamente outros nem tanto remédios emezinhas ditas naturais com alegadas propriedades terapêuticas «Haviaquem me quisesse impingir duas anonas por refeição refere a título de

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exemplo «Um disparate Se não morresseda doença morria da cura » No fimdedezembro passado quando teve de regressaraos tratamentos publicou na sua páginado Facebook um aviso à navegação «Nãotentem impingir me nada Peço respeitoMesmo assim e apesar da linguagem diretahouve quem lhe fizesse mais uma ou outrasugestão «Há pessoas bem intencionadasoutras que só querem vender o seu peixeMas ou eu acredito no tratamento que estoua fazer ou então mais vale não fazer nada

De olho no Dr Oz

O OIPM nasceu precisamente por causa dosdoentes oncológicos «É aberrante a quantidade de produtos na sua maioria extratosde plantas que se impingem a estes doentes» alerta Maria da Graça Mas entretantofoi ampliando o seu raio de ação e hoje aceitatodas as queixas e dúvidas relacionadas comterapêuticasChegar a uma conclusão implica mui

ta investigação e atenção ao pormenorUm dos casos que a cientista gosta de darcomo exemplo é o de um senhor com umtumor no cérebro em que a quimioterapianão estava a fazer o efeito que se esperavacaso foi analisado uma e outra vez até que

Maria da Graça se sentou com ele e lhe pediu uma descrição completa das 24 horasdo seu dia E às tantas Eureka O problemaestava no sumo feito com três laranjas quetomava todos os dias desde que a doença semanifestara «Quando consumida em elevadas quantidades a laranja pode induzir oaumento da metabolização de alguns medicamentos e assim reduzir o seu efeito»explica Era o que estava a acontecer com os

anticancerígenos É claro que tudo tem avercom a dose com o equilíbrio Os problemascomeçam quando se consomem os alimentos numa perspetiva de medicamento exagerando na quantidade e mantendo uma regularidade obsessiva «Desconfiem sempreque vos disserem que alguma coisa não temefeitos secundários Isso não existe» alertaDurante anos havia sempre um ele

mento da equipa atento ao que anunciavao médico americano Dr Oz no seu famoso programa de televisão suspenso neste momento por o médico estar acusadode promoção de produtos fraudulentos«Já sabíamos que íamos ter queixas relacionadas com o alimento ou extrato de alimen

to que ele andava a publicitarNem doentes nemmédicos estão habitua

dos ou treinados para pensar nas complicações que podem surgir pela sobreposiçãode efeitos Fernando Pinto cardiologistae presidente da Sociedade Portuguesa deHipertensão deteta na sua consulta algunscasos de interações com produtos que podem reduzir o efeito dos medicamentos

para a tensão Ginkgo ou chá de folha de oliveira podem diminuir em demasia a tensãopotenciando os efeitos dos medicamentospara a hipertensão enquanto beringelachá preto e verde ou ginseng podem provocar um aumento da pressão arterial contrariando o efeito dos medicamentos «Os

doentes não nos contam Mas admito quetemos de ser nós os clínicos a estar atentos e a introduzir estes conceitos na práticaclínica» admite o médico Chega a haverdoentes a abandonar a medicação por causados efeitos secundários que atribuem aosmedicamentos sem nunca pôr ahipótese de

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o problema ser do chá ou do extrato de umaplanta que também tomam «Nestas situações é muito difícil reintroduzir a terapêutica Há uma grande resistência por parte dodoente que julga que o produto dito naturalnão pode fazer mal algum

Às escondidas do médico«As pessoas não contam logo tudo aquiloque andam a tomar Háum certo sentimentode culpa e a noção de se estar a fazer algumacoisa de mal» relata Maria da Graça «Masnós não julgamos ninguém e até ajudamosquando a pessoa quer tomar alguma coisaalém da terapêutica passada pelo médico

Paula Ravasco médica e investigadora naárea da nutrição tem a mesma experiênciaDedicada aoestudodas relações entreos alimentos e os tratamentos oncológicas a cientista do Instituto deMedicinaMolecular emLisboa depara se commuitos casos complicados «No papel o aloé vera cura tudo Maso que sabemos é que pode reduzir o efeitoda quimioterapia em cerca de 40 por centoE há quem o consuma durante todo o ciclode tratamento sem nunca dizer que o fezO chá de hipericão e o chá de pau d arco sãoprodutos também na moda e que interagemcom praticamente todos os fármacos Para atensão diabetes dor de cabeça Mas sobretudo com os citotóxicos anticancerígenos«Está completamente desaconselhado» su

blinha Paula Ravasco que se mostra muitopreocupada com esta forte tendência paraprocurar soluções nas plantas sempre coma convicção nada científica de que «se é natural então não faz mal»Paula Ravasco percebe que um doente on

cológico «dispare em todas as direções» Mashá que divulgar mais a informação sobre asinterações porque é grande o risco de nãosó o que toma não fazer bem nenhum comodiminuir o efeito dos medicamentos «As

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pessoas fazem de tudo ervas comprimidosdietas radicais jejuns tomam diuréticos laxantes Tudo isto tem interações muito significativas »Àmemória vemlheimediatamente o caso de um jovem na casa dos vinteanos com um cancro muito avançado Além

de lidar com a doença o rapaz ainda estavaa cumprir uma dieta prescrita por um nutricionista que lhe recomendava entre outrascoisas bagas de gogi emjejum leite de amêndoas e menos de vinte gramas de proteínaspor dia Media 1 90 metros e pesava 55 quilos

«Até chorei quando olhei para o papel com adieta Não se faz isso a uma pessoa é imoralPara Luís Costa oncologista no Hospital

de Santa Maria em Lisboa a procura de outras soluções paralelamente à terapêuticastandard está relacionada com uma neces

sidade de acreditar na possibilidade de curae de participar nas escolhas «Isto é positivoMas é importante que se procure informação validada e um parceiro honesto Todasas hipóteses são legítimas mas têm de sertestadas primeiro » Noslaboratóriosfazem se milhares de experiências para quecada um de nós não tenha de as fazer com o

seu próprio corpo

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