BMA REVIEW54 PORT 23AGO - BMA Advogados - Barbosa ......Justo título ou quaisquer outros...
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Noventa e cinco por cento. Esse foi o aumento verificado até maio de 2016 nos pedidos de falência e recuperação judicial em comparação com o mesmo período do ano passado. Resultado da crise que assola o Brasil desde 2014.
Reza a lei que, decretada a falência ou deferida a recuperação judicial, instaura-se o juízo universal na Justiça Comum e lá devem ser concentrados os atos executó-rios contra o devedor. As ações trabalhistas só prosseguem na Justiça do Trabalho até se chegar ao valor devido ao empregado; depois o processo é suspenso e o crédito exequendo é direcionado ao juízo universal.
Tal regra foi endossada em 2012 pela Corregedo-ria-Geral da Justiça do Trabalho (CSJT), por meio do Provimento no 01/2012, que impõe ao juiz do trabalho, uma vez apurado o montante devido ao empregado, expedir certidão para habilitação do crédito perante o juízo universal.
Mas, a despeito disso, ainda hoje se multiplicam na Justiça do Trabalho decisões que determinam o prosseguimento da execução, após a definição do valor do crédito do empregado. Em vez de deter-minarem a remessa ao juízo universal, os magistrados desconsideram a persona-lidade jurídica da empresa, direcionando a execução contra os sócios, os admi-nistradores e, ainda, contra empresas solventes do gru-po econômico.
Segundo essas decisões, a fraude ou má gestão da empresa decorreriam do simples fato de ela estar insolvente, pois não honrar o crédito alimentar do trabalhador representaria “fal-ta de cuidado” na condução dos negócios. Pior: desconsi-dera-se a personalidade jurídica de forma automática, sem respeito ao contraditório e muitas vezes sem pedido por parte do credor. Isso mesmo após o TST ter se pronunciado pela compatibilidade entre o processo do trabalho e o inci-dente de desconsideração da personalidade jurídica pre-sente no Novo CPC.
Essas decisões, em regra, são proferidas por juízes de primeira instância e passíveis de recurso. Todavia, dificilmente se consegue levar a discussão ao TST, diante do óbice imposto pelo art. 896, §2º da CLT, que só admite recurso nesses casos se houver afronta direta à Constituição.
Ficam as empresas, assim, à mercê da “sensibilidade” dos Tribunais Regionais, os quais, infelizmente, costumam se comover com a hipossuficiência do empregado, quando confrontada com as regras da Lei de Falências e da CSJT.
Esse cenário impõe às empresas dois encargos: manter um constante monitora-mento do seu passivo trabalhista, de modo a antecipar possíveis decisões tenden-tes à desconsideração; e buscar meios judiciais para reverter essas decisões, quando proferidas. Tarefa desafiadora, mas necessária para se resguardar a or-dem e o patrimônio.
JULHO | SETEMBRO 2016
b m a r e v i e w
índicE
A Lei nº 13.303/2016 e os contratos com empresas estatais
08
STJ decide sobre validade de cláusulas compromissórias
06
O usucapião extrajudicial no Novo Código de Processo Civil
05
Critérios para a submissão ao CADE de operações envolvendo contratos associativos
04
Planos de opção de compra de ações e a jurisprudência do CARF
03
Acordos bilaterais na recuperação judicial
07
Justiça do Trabalho, desconsideração da personalidade jurídica eprocesso falimentar
01
54
Cibelle Linero, sócia da
área Trabalhista
Luiz marcelo Góis, sócio da
área Trabalhista
JUSTiça dO TRaBaLHO, dEScOnSidERaçãO da PERSOnaLidadE JURídica E PROcESSO FaLiMEnTaR
LUiZ MaRcELO GÓ[email protected]
ciBELLE [email protected]
vivian Casanova, sócia da área
de Direito Tributário
EXPEdiEnTE
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FeChamento: setembro de 2016
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ComérCio internaCionaL
ContenCioso e arbitraGem
direito ambientaL
direito ConCorrenCiaL
direito imobiLiário
direito soCietário e m&a
direito trabaLhista
direito tributário
esPorte e entretenimento
étiCa CorPorativa e ComPLianCe
inFraestrutura, reGuLação
e assuntos Governamentais
merCados FinanCeiro e de CaPitais
ProPriedade inteLeCtuaL
reestruturação e reCuPeração
de emPresas
PrinciPais áreas de atuação do BMa - BaRBOSa MüSSnicH aRaGãO
3JULHO | SETEMBRO 2016 | bma review n. 54
Com o retorno das sessões de julgamento do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), após a Ope-
ração Zelotes, um dos temas de destaque que voltou a
ser debatido pelas turmas julgadoras refere-se às autua-
ções fiscais relacionadas aos stock option plans (SOP).
Nas autuações fiscais que estão sendo analisadas pelo
CARF, as autoridades administrativas pretenderam a exi-
gência de contribuições previdenciárias sobre os supostos
ganhos decorrentes de tais planos, bem como a exigência
de multa isolada em decorrência da não retenção do im-
posto de renda na fonte (IRRF).
Como não há na legislação brasileira definição específica
sobre a natureza jurídica do SOP (se mercantil ou remu-
neratória) e acerca da tributação dos ganhos dele decor-
rentes, ao julgar esses casos, o CARF, na grande maioria
dos casos, tem firmado o entendimento de que o SOP
poderá ter natureza mercantil (não sujeita à tributação
das contribuições previdenciárias e do IRRF), a depender
de suas características, em especial: risco, onerosidade e
voluntariedade, como ocorreu nos casos Sadia (Ac. nº
2803-03.815) e Itaú Unibanco (Ac. nº 2401-003.888). Des-
ta forma, a natureza remuneratória, sujeita à tributação,
ou a natureza mercantil, não sujeita à tributação, vem
dependendo sempre da ava-
liação do caso concreto.
Nas sessões de julgamento
realizadas a partir de dezem-
bro de 2015, há uma tendên-
cia de as turmas continuarem
aplicando esse entendimen-
to. Contudo, vale destacar
que, dos julgamentos realiza-
dos nesta nova fase, não te-
mos notícia de qualquer SOP
que tenha sido reconhecido
como de natureza mercantil.
Por outro lado, alguns pontos
relacionados a fato gerador e
base de cálculo das contribui-
ções previdenciárias e do
IRRF têm sido definidos pelo
CARF, resultando, em alguns
casos, no cancelamento do
lançamento por vício material, em razão de erro da fisca-
lização na definição do momento de ocorrência do fato
gerador ou, ainda, da base de cálculo dos referidos tributos.
Esses cancelamentos estão relacionados ao fato de que
nem mesmo entre os auditores fiscais há um consenso
sobre a definição desses aspectos, sendo lavrados autos
de infração com utilização de critérios completamente dis-
tintos acerca do fato gerador e base de cálculo das con-
tribuições previdenciárias e IRRF.
Especificamente quanto à exigência das contribuições
previdenciárias, a tendência das turmas julgadoras do
CARF é de que o seu fato gerador ocorreria no momento
do exercício da opção pelo
beneficiário do SOP. A
base de cálculo tributável,
por sua vez, seria a diferen-
ça entre o preço pago pelo
beneficiário para aquisição
das ações e o preço das
ações no mercado, na data
do exercício.
Já sobre o IRRF, as turmas
julgadoras ainda vêm di-
vergindo sobre a definição
do momento de ocorrência
do seu fato gerador e base
de cálculo, sendo que, para
algumas turmas, estes se-
riam, assim como as contri-
buições previdenciárias,
definidos no momento do
exercício da opção de
compra de ações. Para ou-
tras turmas, contudo, o en-
tendimento é de que o fato
gerador do imposto ocorreria no momento em que o
beneficiário cumpre todas as condições do plano e a op-
ção de compra de ações torna-se exercível (ainda que
não exercida naquela data). A base de cálculo, por sua
vez, seria a diferença entre o preço de exercício definido
em contrato e o preço das ações no mercado, na data em
que cumpridas as condições para o exercício da opção.
A despeito de o CARF já ter julgado, antes e depois do
retorno de suas atividades, um número considerável de
autuações fiscais relacionadas aos planos de stock options,
a nosso ver ainda não é possível dizer que há entendimen-
to consolidado sobre a matéria, seja porque o retorno das
sessões de julgamento do CARF, com a nova composição
das turmas, ainda é recente e muitos conselheiros ainda
estão definindo seu posicionamento, seja porque a Câmara
Superior de Recursos Fiscais, órgão de última instância do
processo administrativo tributário federal, que tem por fun-
ção uniformizar o entendimento das turmas julgadoras do
CARF, ainda não se pronunciou sobre o tema. Acreditamos,
assim, que ainda há muito espaço para que as empresas
continuem discutindo autuações fiscais desta natureza.
Por fim, importante mencionar que nenhuma das autua-
ções fiscais analisadas pelo CARF refere-se a fatos gera-
dores ocorridos após a edição da Lei nº 12.973/2014, não
sendo possível prever o entendimento que será adotado
com base em tal legislação.
alguns pontos relacionados a fato gerador e base de cálculo das contribuições previdenciárias e do iRRF têm sido definidos pelo caRF, resultando, em alguns casos, no cancelamento do lançamento por vício material.
PLanOS dE OPçãO dE cOMPRa dE açõES E a JURiSPRUdência dO caRF
ViVian [email protected]
naTáLia caVaLcanTi [email protected]
O Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15), que
entrou em vigor em 16/03/16, traz um importante ins-
trumento para regularização fundiária, especialmente
para os casos em que há consenso entre as partes, que
é o usucapião extrajudicial.
Seguindo uma tendência de desjudicialização de diver-
sos atos jurídicos em que seja possível a disponibilização
do direito das partes, como no caso de separação e di-
vórcio extrajudiciais, inventário extrajudicial, retificação
administrativa, entre outros, o legislador pátrio transfe-
re aos tabeliães e notários públicos o reconhecimento
da propriedade de determinado imóvel, através do usu-
capião, desde que haja o consentimento do proprietário
do imóvel usucapiendo.
Nesta linha, o artigo 1.071
do Novo Código de Proces-
so Civil insere o art. 216-A
na Lei de Registros Públi-
cos (Lei nº 6.015/73) e pre-
vê que, sem prejuízo do
direito de pleito em juízo, é
admitido o pedido de reco-
nhecimento extrajudicial de
usucapião, perante o com-
petente Oficial do Registro
de Imóveis, devendo o inte-
ressado, representado por
um advogado, instruir o seu
pedido com:
Ata notarial lavrada por
um tabelião do Ofício de
Notas, atestando o tempo
de posse do requerente e seus antecessores, com os
efeitos do art. 384 do Novo Código de Processo Civil;
Planta e memorial descritivo do imóvel, assinados pelos
titulares de direitos reais e de outros direitos registrados
ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e dos
imóveis confinantes;
Certidões negativas dos distribuidores de ações na co-
marca de situação do imóvel usucapiendo e do domicí-
lio do requerente, a fim de comprovar que não há qual-
quer demanda judicial questionando a sua posse; e
Justo título ou quaisquer outros documentos que de-
monstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tem-
po da posse, tais como o pagamento dos impostos e das
taxas que incidirem sobre o imóvel.
Vale ressaltar que os documentos acima previstos não
afastam a necessidade de se preencher os requisitos
exigidos por lei para a aquisição do direito de proprie-
dade via usucapião (conforme as hipóteses previstas nos
arts. 1.238 e seguintes do Códi-
go Civil bem como em outras
legislações específicas), mas
apenas evidenciam e compro-
vam a posse prolongada do
imóvel usucapiendo pelo reque-
rente, de forma mansa, pacífica
e incontestada.
Caso a planta não contenha a
assinatura de qualquer titular
de direitos reais e de ouros di-
reitos registrados ou averbados
tanto na matrícula do imóvel
usucapiendo quanto dos imó-
veis confinantes, este deverá
ser notificado pelo registrador,
pessoalmente ou via correio
com aviso de recebimento,
para que manifeste seu consentimento em 15 (quinze) dias,
interpretado o seu silêncio como discordância.
O Oficial do Registro de Imóveis também dará ciência
pessoalmente à União, ao estado, ao Distrito Federal e
ao município, conforme o caso, bem como promoverá a
publicação de edital, em jornal de grande circulação,
para a ciência de terceiros interessados, para manifes-
tação em 15 (quinze) dias.
Transcorridos todos os prazos
de manifestação de terceiros, e
de eventuais diligências, achan-
do-se em ordem toda a docu-
mentação e havendo a concor-
dância expressa dos titulares de
direitos reais e de outros direi-
tos registrados ou averbados na
matrícula do imóvel usucapien-
do e na dos imóveis confinan-
tes, o Oficial do Registro de
Imóveis registrará a aquisição
da propriedade em nome do
requerente. Do contrário, o ofi-
cial rejeitará o pedido, o que
não impede o ajuizamento de
ação de usucapião.
Espera-se, assim, uma maior celeridade em procedi-
mentos de usucapião de menor complexidade, em que
haja a expressa concordância daquele que perde a pro-
priedade pelo usucapião. Caberá a cada Corregedoria
Estadual regular os procedimentos que os Oficiais de
Registros de Imóveis deverão
seguir para este fim.
Em 2012, quando a atual lei de defesa da concorrência (Lei nº 12.529/2011) entrou em vigor, o contrato associativo celebrado entre empresas passou a ser considerado ato de concentração econômica. Na época, pouca atenção foi dada a esse tema. Porém, à medida que operações envolvendo contratos dessa natureza chegaram ao conhecimento do CADE, o órgão anti-truste foi consolidando o seu entendimento sobre a matéria.
Em 2013, operações envolvendo o licenciamento não exclusivo de uso de tecnologias de propriedade da Monsanto foram sub-metidas à análise do CADE e o próprio órgão divergiu quanto à necessidade de notificação desses contratos. Muitas dúvidas surgiram desde então, sendo que a obrigatoriedade de submis-são de contratos associativos ao CADE permaneceu como uma nuvem difícil de dissipar.
A lei não determina com clareza a abrangência do conceito de contratos associativos. Diante dessa lacuna, entrou em vigor em 2014 a Resolução nº 10 do CADE que considera “associati-vos” quaisquer contratos com duração superior a dois anos em que houver cooperação horizontal ou vertical, ou compartilha-mento de risco que acarrete relação de interdependência entre as partes contratantes.
Nesse contexto, a Resolução nº 10 prevê que há cooperação ho-rizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que acarrete relação de interdependência em duas hipóteses: a primeira, nos contratos em que as partes estiverem horizontalmente relaciona-
das no objeto do contrato, sempre que a soma de suas participações no mercado relevante afetado pelo con-trato for igual ou superior a 20%; a segunda, nos con-tratos em que as partes contratantes estiverem ver-ticalmente relacionadas no objeto do contrato, sempre que pelo menos uma delas detiver 30% ou mais dos mercados relevantes afeta-dos pelo contrato. Na hipó-tese de verticalização, uma das seguintes condições deve ser igualmente preen-chida: ou que o contrato estabeleça o compartilha-mento de receitas ou preju-ízos entre as partes; ou que do contrato decorra rela-ção de exclusividade.
Ainda que a Resolução nº 10 tenha buscado esclarecer os critérios, muitas dúvidas per-maneceram, e, portanto, tem sido fundamental para as empre-sas acompanhar os julgados do CADE. Em junho de 2015, a ex-conselheira Ana Frazão proferiu o seu voto no AC 08700.000137/2015-73, esclarecendo que o que distingue os contratos associativos dos demais contratos não é a existência ou não de cooperação, mas sim o seu grau e tipo. Nos contratos
associativos, a cooperação corresponde à própria prestação ou aos deveres principais assumidos pelas partes, cujas necessida-des devem ser as mesmas (ou muito próximas) e em torno de um fim comum, justificando o comportamento paralelo.
Em maio de 2016, o CADE lançou a Consulta Pública nº 2, que poderá revogar ou alterar a Resolução nº 10. Para as empresas e profissionais da área, essa iniciativa veio em boa hora, ainda que a minuta proposta continue com parâmetros que levariam à necessidade de notificação de um volume grande de contra-tos, usualmente não analisados pelo regime de análise prévia em outras jurisdições.
A minuta de resolução propõe definir contratos associativos como sendo aque-les estabelecidos em regime de coopera-ção, com compartilhamento de riscos e resultados, com duração igual ou superior a dois anos e cujo objeto possa ser reali-zado por empresa privada com propósito de lucro, ainda que não tenha finalidade lucrativa. Seguindo a mesma regra ante-rior, contratos com duração inferior a dois anos ou por prazo indeterminado devem ser notificados quando o prazo de dois anos for atingido ou ultrapassado, evitan-do-se, assim, as renovações automáticas.
O critério objetivo de market share nos mercados afetados pelo negócio continua sendo um parâmetro de referência para a notificação de contratos associativos entre empresas horizontal ou verticalmente re-lacionadas. No entanto, esse critério ainda é frágil, pois, depen-dendo de como o mercado relevante é definido, pode levar a conclusões distintas.
O conceito de contrato associativo proposto, portanto, conti-nua amplo e pode envolver diversos tipos de parceria. Contra-tos que tenham por objeto a distribuição, licença de uso de marca ou de tecnologia, patentes, P&D ou assistência técnica, por exemplo, podem depender de autorização do CADE para serem celebrados, e essa autorização pode levar até 330 dias para ser concedida.
Caso a Consulta Pública venha a se tornar uma Resolução, essas novas regras passarão a valer em breve, sendo fundamental que as empresas e seus advogados façam uma análise cuidadosa dos contratos que pretendem firmar. Uma vez identificado o contrato como associativo, a notificação ao CADE será obriga-tória e a celebração ou consumação do contrato antes de apro-vado poderá resultar em multas salgadas para as empresas, além de uma possível anulação dos atos praticados. Seria uma pena, no entanto, se na publicação dessa nova Resolução o CADE não aproveitasse a oportunidade para refinar e esclarecer os critérios de notificação de acordos associativos – e, quem sabe, limitar à hipótese de notificação con-tratos nos quais passe a existir efetivamen-te um acordo associativo que pressuponha um empreendimento comum.
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cRiTéRiOS PaRa a SUBMiSSãO aO cadE dE OPERaçõES EnVOLVEndO cOnTRaTOS aSSOciaTiVOS
PaTRícia [email protected]
GaBRiELa [email protected]
caso a consulta
Pública venha
a se tornar uma
Resolução, essas
novas regras passarão
a valer em breve,
sendo fundamental
que as empresas
e seus advogados
façam uma análise
cuidadosa dos
contratos que
pretendem firmar.
Patrícia avigni, advogada da
área de Direito Concorrencial
JULHO | SETEMBRO 2016 | bma review n. 54
cRiSTiana [email protected]
GUiLHERME [email protected]
O legislador pátrio transfere
aos tabeliães e notários públicos o
reconhecimento da propriedade de determinado imóvel, através do usucapião,
desde que haja o consentimento
do proprietário do imóvel
usucapiendo.
O USUcaPiãO EXTRaJUdiciaL nO nOVO cÓdiGO dE PROcESSO ciViL
Cristiana moreira,
sócia da área de Direito
Imobiliário
Guilherme ayala,
advogado da área de Direito
Imobiliário
O principal objetivo da Lei de Re-
cuperação e Falências brasileira
(LRF) é promover a superação
da crise econômico-financeira de
sociedades empresárias e empre-
sários criando um ambiente para
que devedores, credores e demais
partes interessadas possam alinhar
os rumos do devedor e dos seus
respectivos ativos.
No âmbito do procedimento de
recuperação pela via judicial, em
linhas gerais, a ideia é que, após o
protocolo e deferimento do pedido
de processamento, haja uma fase
de verificação de créditos e, parale-
lamente, o devedor inicie múltiplas
rodadas de negociação com seus
credores, a fim de que haja um
amplo consenso com relação à es-
trutura do plano de recuperação a
ser submetido e votado em assem-
bleia geral. Tudo isso devidamente
supervisionado pelo administrador
judicial e pelo juízo competente.
Antes e durante o curso desses procedimentos judiciais,
a maioria das negociações relevantes ocorre longe dos
holofotes do Poder Judiciário, por meio da formação de
uma teia de acordos bilaterais que vinculam devedor e
seus principais credores. Com esses Restructuring Sup-
port Agreements (RSAs) – como são chamados pelos
tribunais norte-americanos – os devedores pretendem
limitar o grau de incerteza do curso da sua recuperação,
definir os termos do plano de recuperação com antece-
dência, bem como acelerar a saída desse estado via uma
efetiva aprovação do plano.
Para viabilizar tais acordos, os principais credores são
logo contatados para discutir as condições de apoio à
decisão da sociedade de ajuizar seu procedimento re-
cuperacional e de anuência ao plano de reestruturação.
Esse processo de negociação pode envolver injeção de
capital novo na sociedade com eventual inclusão de no-
vas garantias, manutenção do fornecimento dos insumos
para a sociedade, necessidade de aval do credor para
determinadas decisões empresariais durante a recupera-
ção, contratação de um CRO (Chief Restructuring Office)
que traga mais confiança em termos de governança cor-
porativa; enfim, tudo para que os interesses de ambos os
lados fiquem alinhados e proporcionem um soft landing
do procedimento recuperacional.
Justamente pela capacidade de impactar decisivamente
o curso do procedimento recuperacional é que, ao redi-
gir-se um RSA, ao menos dois pontos devem ser objeto
de maior atenção. O primeiro é o efetivo poder transfe-
rido contratualmente a um credor sobre o devedor. Isso
pode ocorrer quando aquele passa a ter (e exercer) de
fato o controle sobre a administração da sociedade e o
teor do plano a ser apresentado limitar a amplitude de
negociação com outros credores, ou ainda pela imposi-
ção da contratação de CRO.
O segundo refere-se ao fluxo de informações entre todos
os envolvidos no procedimento de recuperação, pois ao
mesmo tempo que o RSA pode favorecer o soerguimen-
to da recuperanda por meio de uma atuação coordenada
entre credores e devedor, também tem o condão de
afastar da mesa de negociação credores cujos créditos
não afetam a sorte do plano de recuperação.
Nos EUA, onde esse fenômeno foi recentemente quali-
ficado como bankruptcy’s quiet revolution, discute-se a
conveniência de se regular tais acordos, mesmo já exis-
tindo regras como a do 11 USC §1125(b), responsável
pela proibição da prospecção de votos após o protoco-
lo do pedido de recuperação judicial, enquanto não for
apresentada uma versão do plano e da aprovação das
notas explicativas pelo juiz
competente. Nem nas cor-
tes norte-americanas está
suficientemente claro qual
o escopo e forma indicados
para um RSA. No conheci-
do caso In re Innkeepers
USA Trust, o tribunal de
Nova York anulou um RSA
ao considerar, entre ou-
tros, que o acordo limitava
o alcance de ulteriores ne-
gociações da recuperanda
com os seus credores.
Sob a ótica da nossa LRF, o
devedor não possui seme-
lhante restrição ou mesmo
obrigação de exibir aos
demais credores, às partes
interessadas e ao juiz que conduz o seu caso, o teor de
acordos com credores específicos, embora o adminis-
trador judicial e o comitê de credores, em tese, possam
instar o devedor a fazê-lo.
É por isso que, pelas possíveis consequências advindas
de seus termos, o amadurecimento dessa matéria pela
doutrina e tribunais pátrios pode afigurar-se vantajoso
para todas as partes envolvidas, porquanto capaz de
evitar que o devedor tenha suas expectativas quebradas
por ulteriores decisões judiciais acerca da validade do
acordo, bem como mitigar eventual assimetria de infor-
mação em relação aos demais
titulares de créditos.
Recentemente, por maioria de votos, a 3ª Turma do STJ
decidiu questão muito controvertida, acerca dos elemen-
tos determinantes ao reconhecimento da validade de
cláusulas compromissórias.
O acórdão foi proferido no julgamento do Recurso Espe-
cial nº 1.569.422-RJ e teve como pano de fundo um acor-
do de unificação de duas companhias, o qual previa uma
opção de compra de ações em determinadas situações.
O acordo remetia a uma carta anexa, na qual as partes
estabeleceram a forma de aquisição das ações e que, ha-
vendo divergência quanto ao seu valor de mercado, cada
parte poderia indicar um avaliador. Se necessário fosse,
os avaliadores indicados apontariam um terceiro avalia-
dor. A decisão dos avaliadores seria final, definitiva e vin-
culante para as partes.
O voto que prevaleceu no julgamento, do ministro Marco
Aurélio Bellizze, reconheceu que a previsão estabelecida
pelas partes tinha natureza
de cláusula compromissó-
ria, fixando em seguida os
elementos determinantes
para tal conclusão.
A 3ª Turma considerou que
o artigo 4º da Lei nº
9.307/96 exige apenas um
requisito para a validade da
cláusula compromissória:
que ela observe a forma es-
crita, podendo ser prevista
no próprio contrato ou em
documento apartado.
De acordo com o STJ, a
indispensável manifesta-
ção do consentimento das
partes pode se dar de inú-
meras formas, inclusive
mediante cartas/corres-
pondências, sendo desne-
cessária a assinatura no próprio contrato/negócio jurídi-
co. É neste sentido, aliás, a previsão do artigo II da
Convenção de Nova York, ratificada pelo Decreto nº
4.311/2002: “entender-se-á por ‘acordo escrito’ uma cláu-
sula arbitral inserida em contrato ou acordo de arbitragem,
firmado pelas partes ou contido em troca de cartas ou
telegramas”.
No caso, havia ainda a particularidade de que o acordo
de unificação, o qual fora assinado pelas partes, fazia ex-
pressa referência à carta – e apenas esta não havia sido
assinada. Quanto a este ponto, o STJ parece ter adotado
a teoria do incorporation by reference, segundo a qual as
partes estarão vinculadas à cláusula compromissória con-
tida em documento que não tenha sido por elas assinado
caso este documento tenha sido referido em outro docu-
mento que assinaram.
O acórdão também considerou outros elementos decor-
rentes da relação mantida como suficientes para concluir
pelo inequívoco consentimento quanto à cláusula com-
promissória e a opção pela via arbitral. Neste ponto, o STJ
parece ter se inspirado na teoria do implied consent, já
bem sedimentada na doutrina internacional.
Além disso, a 3ª Turma do STJ afirmou ser irrelevante a
terminologia utilizada pelas partes para designar o tercei-
ro responsável por resolver o conflito (avaliador, no caso
julgado). O fator determinante é a natureza conferida pe-
las partes à decisão do terceiro eleito: se for vinculante e
definitiva, estar-se-á diante de uma opção pela via arbitral,
na forma da Lei nº 9.307/96 (do contrário, estar-se-á dian-
te da figura de um arbitrador, e não de um árbitro).
Em resumo, o STJ decidiu que são os seguintes os requisitos
para que reste caracterizada a cláusula compromissória,
com a consequente ne-
cessária submissão das
partes à arbitragem pre-
vista na Lei nº 9.307/96:
as partes devem ter sub-
metido a decisão da
controvérsia a um tercei-
ro; a decisão deste ter-
ceiro deve ser definitiva,
irrevogável e vinculante;
as partes devem ter re-
gistrado tal convenção
em documento escrito,
ainda que não assinado;
e deve ter restado ine-
quívoca a manifestação
do consentimento das
partes, por qualquer
meio ou forma, quanto à
submissão da controvér-
sia à arbitragem.
Cumpre notar que o
mencionado acórdão
não transitou em julgado e a questão é ainda muito con-
trovertida, inclusive porque, naquela oportunidade, o STJ
não chegou a analisar outras questões relevantes, como,
por exemplo, se o mecanismo consagrado na decisão
atenderia ou não às exigências do devido processo legal.
Por isto, é preciso acompanhar a evolução jurisprudencial
do STJ sobre o tema para se verificar se o posicionamen-
to adotado no referido julgamento será consagrado tam-
bém em outros julgados, firman-
do-se no Tribunal.
acORdOS BiLaTERaiS na REcUPERaçãO JUdiciaL
a maioria das negociações relevantes ocorre longe dos holofotes do Poder Judiciário, por meio da formação de uma teia de acordos bilaterais que vinculam devedor e seus principais credores.
STJ dEcidE SOBRE VaLidadE dE cLáUSULaS cOMPROMiSSÓRiaS
MaRiO [email protected]
iaRa [email protected]
76
JOãO caRLOS aREOSa [email protected]
mario Gelli, sócio da
área de Contencioso e Arbitragem
de acordo com o
STJ, a indispensável
manifestação do
consentimento
das partes pode
se dar de inúmeras
formas, inclusive
mediante cartas/
correspondências,
sendo desnecessária
a assinatura no
próprio contrato/
negócio jurídico.
JULHO | SETEMBRO 2016 | bma review n. 54
João Carlos areosa, advogado
das áreas de Contencioso e
Arbitragem e Reestruturação e
Recuperação de Empresas
A edição da Lei nº 13.303/2016, em 30 de
junho de 2016, veio preencher lacuna que
existia em nosso ordenamento jurídico
desde 1998, quando a Emenda Consti-
tucional nº 19, modificando a redação do
parágrafo 1º do artigo 173 da Constituição,
previu a edição de lei ordinária federal dis-
ciplinando o regime jurídico das empresas
públicas, sociedades de economia mista e
suas respectivas subsidiárias. Tal disciplina
inclui as regras aplicáveis às licitações e
aos contratos celebrados pelas empresas
estatais.
A novidade é importante para todos aque-
les que mantêm contratos com entidades
da administração pública indireta. Afinal,
até a edição desta lei muito se discutia
a respeito da aplicação, às estatais, das
normas da Lei nº 8.666/93 – que confere
prerrogativas extraordinárias aos entes
administrativos, colocando-os sempre em
posição juridicamente privilegiada em relação ao particular. Com isso, apesar de
serem as estatais pessoas jurídicas de direito privado, os contratos por elas ce-
lebrados caracterizavam-se por conter cláusulas típicas de direito público e por
demandarem o mesmo procedimento licitatório aplicável à administração direta.
O novo regime é aplicável a todas as empresas estatais, inclusive Petrobras e
Eletrobras, que possuíam autorização legal para criar seus próprios regulamen-
tos por meio de decreto. Tais dispositivos foram revogados, de maneira que
ambas passam a se submeter ao novo regime, que deve ser implementado no
prazo de 24 meses.
A exigência de licitação prévia à celebração dos contratos continua sendo a
regra, mas as exceções previstas na Lei são mais adequadas às atividades de
empresas privadas do que aquelas contidas na Lei nº 8.666/93. Prevê-se, por
exemplo, não haver necessidade de licitação quando se tratar da comerciali-
zação, prestação ou execução, de forma direta, de produtos, serviços ou obras
especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais (art. 28,
§ 3º, I) ou para a escolha de parceiro estratégico para o desenvolvimento de
oportunidades de negócio específicas (art. 28, § 3º, II). O desenvolvimento de
parcerias entre tais entidades e o setor privado poderá, assim, ser ampliado,
algo que sempre esbarrou em forte insegurança jurídica.
Além disso, foi criada uma modalidade licitatória específica para as estatais,
praticamente idêntica ao Regime Diferenciado de Contratação, criado pela Lei
nº 12.462/2011. Tal regime oferece ferramentas como a contratação integrada
(licitação sem projeto básico), inversão de fases, unicidade recursal e sigilo do
orçamento. Outra possibilidade, que deve ser a regra na aquisição de bens ou
serviços comuns, é a utilização do pregão, preferencialmente eletrônico.
A Lei nº 13.303/2016 expressamente prevê que os contratos celebrados pelas
estatais serão regidos pelo direito privado. Não se aplicam, portanto, diversas
cláusulas exorbitantes contidas na Lei nº 8.666/93, tais como a possibilidade de
modificação unilateral do contrato, a obrigação de manter o cumprimento das
obrigações mesmo diante do inadimplemento da administração ou a rescisão
unilateral por interesse público.
Diante dessa novidade legislativa, que certamente despertará diversas contro-
vérsias, é de se esperar que o ambiente para a celebração de contratos com
empresas estatais seja favorecido, com o incremento da segurança jurídica que
deve revolver tais pactos.
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José Guilherme berman, advogado da área de Infraestrutura
Regulação e Assuntos
Governamentais
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a LEi nº 13.303/2016 E OS cOnTRaTOS cOM EMPRESaS ESTaTaiS