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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
GERSON MOURA DUARTE
Cumbica, Guarulhos, So Paulo, Brasil: um aeroporto contemporneo?
So Paulo
2011
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GERSON MOURA DUARTE
Cumbica, Guarulhos, So Paulo, Brasil: um aeroporto contemporneo?
Tese de Doutorado apresentada Universidade
Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial
para a obteno do ttulo de Doutor em Arquitetura
e Urbanismo.
Orientadora: Dra. Nadia Somekh
So Paulo
2011
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D812c Duarte, Gerson Moura Cumbica, Guarulhos, So Paulo, Brasil: um aeroporto
contemporneo ? / Gerson Moura Duarte 2012. 246 f. : il. ; 30cm.
Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, So Paulo, 2012. Bibliografia: f. 235-246.
1. Aeroporto. 2. Planejamento urbano. 3. Planejamento aeroporturio. I. Ttulo.
CDD 725.39
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AGRADECIMENTOS
A Deus e Santa Rita de Cssia, pela fora e sabedoria concedida nesta jornada.
Professora Dra. Nadia Somekh, minha gratido, por sua orientao rigorosa,
que me fez enxergar novas possibilidades e principalmente concluir esta tese.
Professora Dra. Rita Moura Fortes, da Escola de Engenharia Mackenzie, e
Professora Dra. Sueli Ramos Schiffer, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
USP, membros da banca de qualificao, pelas contribuies decisivas.
Aos professores do Programa de Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, pelas reflexes constantes.
Ao Fundo Mackenzie de Pesquisa, pela concesso de bolsa parcial desde o
incio desta pesquisa, que me possibilitou continu-la sem interrupo, ao longo de trs
anos.
Ao Matheus de Souza Pompeu Gomes da Costa, que desde o princpio acreditou
em mim e suportou junto comigo o peso dessa responsabilidade.
Aos meus pais Floro Flix Duarte e Maria Jos Manuel Duarte, e a minha irm
Katia Duarte, que sempre me ouviram nos momentos de grandes dificuldades, porm,
com serenidade me incentivaram a continuar.
Aos meus colegas professores e alunos do Curso de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Nove de Julho, por me fazerem acreditar no ofcio da docncia.
Aos meus ex-companheiros da INFRAERO, empresa onde atuei como arquiteto
por doze anos, por serem to generosos comigo.
Aos meus demais familiares e amigos, que compreenderam a razo do meu
afastamento.
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RESUMO
O aeroporto contemporneo na era da globalizao estratgico, pois, conecta
um pas ao mundo global. Este trabalho trata da relao entre o Aeroporto Internacional
de So Paulo e a Cidade de Guarulhos que o acolheu, e os seus desdobramentos na
Regio Metropolitana de So Paulo.
A partir do estudo dos Planos Diretores e das Leis de Uso e Ocupao do Solo
de Guarulhos constatamos que, entre 1980 e 1990, os instrumentos de planejamento
urbano dessa cidade foram permissivos em relao s ocupaes urbanas residenciais
clandestinas e irregulares no entorno do aeroporto, e que mesmo aps terem se
tornado mais restritivos em relao a esse uso, a partir de 1990, o poder pblico
municipal no impediu, ou no teve condies de impedir, o adensamento populacional
em zonas de usos imprprias para ocupaes urbanas residenciais e incompatveis
com a operao aeroporturia do principal aeroporto internacional brasileiro.
O Plano Diretor Aeroporturio, elaborado em 1981; foi realizado pelo Governo
Federal atravs da Comisso Coordenadora do Projeto Sistema Aeroporturio
COPASP; e o Plano de Desenvolvimento Aeroporturio, concludo em 2004, pela
INFRAERO, no considerou o reassentamento de aproximadamente 5.000 famlias que
residem nas reas de aproximao das cabeceiras da futura terceira pista de pouso e
decolagem comprometendo a continuidade da implementao desse aerdromo como
fora planejado.
Entendemos que o aeroporto contemporneo deve ser considerado estratgico
para a cidade, a regio e o pas onde est inserido e, portanto, deve ser implementado
de forma compartilhada ao territrio que o acolhe.
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ABSTRACT
In the globalized era the contemporary airport is strategic since it connects one
country to the global world. This study deals with the relationship between the So
Paulo International Airport and the town of Guarulhos, where it is located, and the
outcomes in the So Paulo metropolitan region.
Studying the City Master Plan and the laws concerning land usage and
occupation in the town of Guarulhos we found out that, between 1980 and 1990, the
urban planning instruments were permissive to clandestine and irregular urban
residential occupation in the surroundings of the airport. And that, even after it became
more restrictive concerning this kind of land usage since 1990 the municipal authority
did not impede, or did not have the conditions to impede, the growth in population
density in zones improper for urban residential occupation and incompatible with the
airport operation of the main Brazilian international airport.
The Airport Master Plan, delivered in 1981, was devised by the Federal
Government through the Coordinating Comission of the Airport System Project
COPASP; and the Airport Development Plan, ended up in 2004, by INFRAERO, did not
consider the resettlement of about 5 thousand families that lived nearby the future third
landing-strip, jeopardizing the continuity of the airport implementation as designed.
We understand that the contemporary airport should be considered strategic to
the city, the region and the country where it is located and therefore its implementation
should be shared with the territory that encompasses it.
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SUMRIO
Introduo 9
1. O Aeroporto Internacional de So Paulo e o seu planejamento
desarticulado 15
1.1. As origens: a expanso da atividade e da infra-estrutura
aeroviria brasileira 16
1.2. A escolha de Guarulhos para abrigar o Aeroporto Internacional
de So Paulo (1969 1979) 33
1.3. O Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de
So Paulo (1981) 39
1.4. O Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto
Internacional de So Paulo (2004) 64
1.5. Concluses parciais 82
2. A Cidade de Guarulhos e o seu planejamento desarticulado 85
2.1. As origens: o desenvolvimento urbano da Cidade de
Guarulhos 86
2.2. A cidade legal: as Leis de Uso e Ocupao do Solo do
Municpio de Guarulhos (1980, 1990, 1996 e 2007) 101
2.3. A cidade real: o adensamento urbano irregular em Zonas de
Usos Aeroporturio 131
2.4. A Macrometrpole de So Paulo e os Planos Diretores da
Cidade de Guarulhos (1971 e 2004) 148
8
2.5. Concluses parciais 170
3. O planejamento dos aeroportos no mundo e no Brasil, e o Aeroporto
Internacional de Viracopos / Campinas como alternativa
175
3.1. Como os Estados Unidos da Amrica planejam os seus
aeroportos 176
3.2. Como a Unio Europia planeja os seus aeroportos 182
3.3. Como a INFRAERO e o DAESP planejam os seus aeroportos 187
3.4. A rea de Controle Terminal So Paulo: as funes do
Aeroporto Internacional de Viracopos / Campinas, a principal
alternativa Guarulhos.
200
3.5. Concluses parciais 222
Concluso 226
Referncias Bibliogrficas 235
9
INTRODUO
Este trabalho tem como objetivos, compreender o impacto e o papel da infra-
estrutura aeroporturia na cidade contempornea, rever a relao entre o Municpio de
Guarulhos e o Aeroporto Internacional de So Paulo, e os seus desdobramentos na
Regio Metropolitana de So Paulo e na macrometrpole paulista, e finalmente
contribuir para a adequao urbana desse aeroporto em Guarulhos, em So Paulo e no
Brasil.
O tema deste trabalho surgiu no momento em que ns reconhecemos a
relevncia do mesmo para a sociedade brasileira, e aps doze anos de atuao
profissional como arquiteto, na rea de planejamento aeroporturio da Gerncia de
Engenharia da Superintendncia Regional do Sudeste da INFRAERO.
Esta inquietao emergiu a partir da observao do cenrio em que o
planejamento de expanso previsto para este aeroporto foi paralisado por no ser
possvel implement-lo, em razo da problemtica decorrente da remoo e do
reassentamento de milhares de famlias que residem em ocupaes urbanas
clandestinas e irregulares localizadas em reas limtrofes ao stio aeroporturio, bem
como do desenvolvimento econmico do pas e de sua crescente necessidade de
ampliao da sua infra-estrutura aeroporturia.
A partir do estudo dos Planos Diretores e das Leis de Uso e Ocupao do Solo
de Guarulhos constatamos que, entre 1980 e 1990, os instrumentos de planejamento
urbano dessa cidade foram permissivos em relao s ocupaes urbanas residenciais
clandestinas e irregulares no entorno do Aeroporto Internacional de So Paulo, e que
mesmo aps terem se tornado mais restritivos em relao a esse uso, a partir de 1990,
10
o poder pblico municipal no impediu o adensamento populacional em zonas de usos
imprprias para ocupaes urbanas residenciais e incompatveis com a operao
aeroporturia do principal aeroporto internacional brasileiro.
Ao estudarmos o Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So
Paulo, elaborado em 1981, que estabeleceu uma capacidade mxima em seu ltimo
horizonte de planejamento da ordem de 28,5 milhes de passageiros / ano, notamos
que o foco do planejamento previsto para esse aeroporto foi desviado. Pois, desde
1969, esse aerdromo j havia sido idealizado para atender apenas o trfego
domstico e internacional do Cone Sul, porm, aps a sua inaugurao, em 1985, e
com o decorrer da implementao de sua infra-estrutura aeroporturia, esse aeroporto
passou a atender alm da demanda de trfego areo domstico e internacional do
Cone Sul, tambm o trfego areo internacional intercontinental, caracterizando-o, em
pouco tempo, como o principal aeroporto brasileiro em volume de passageiros e de
carga area.
O Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So
Paulo concludo, em 2004, readequou as diretrizes desse aeroporto e elevou a sua
capacidade mxima em seu ltimo horizonte de planejamento para 41 milhes de
passageiros / ano. Porm, a terceira pista de pouso e decolagem no ser construda,
pois, conforme declarao feita ao Jornal O Estado de So Paulo, em 21 de janeiro de
2008, pelo ento Ministro da Defesa Nelson Jobim, todos os estudos mostraram que a
construo da terceira pista seria uma obra antieconmica por causa do grande
impacto de ordem social, financeira e ambiental. Jobim nessa ocasio tambm
anunciou medidas para ampliar a capacidade do Aeroporto Internacional de So Paulo,
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como o terceiro terminal de passageiros, e a construo de um terceiro aeroporto na
regio. Porm, o terceiro terminal de passageiros, necessrio para ampliar a
capacidade anual do aeroporto, teve trs projetos bsicos desenvolvidos, ao longo dos
ltimos 15 anos, e at hoje, a sua construo ainda no foi iniciada.
Recentemente, em 5 de dezembro de 2011, o Governador do Estado de So
Paulo Geraldo Alckmin, declarou a Jovem Pan On Line que, a construo de um
terceiro aeroporto em So Paulo um projeto de mdio prazo, e que j autorizou um
estudo sobre a viabilidade da participao da iniciativa privada. No entanto, a
aprovao depende do aval da INFRAERO. E ainda, conforme afirmao de Alckmin
[...] H a necessidade de um terceiro aeroporto, especialmente, voltado
a jatos executivos. O modelo de transporte que mais cresce aerovia.
Mas, depende do governo federal. rea sempre tem, ns temos vrias
alternativas. Como est fazendo a PPP (Parceria Pblico-Privada) de
Viracopos e de Cumbica, acho que o governo no quer discutir isso
nesse momento.
Nessa mesma entrevista, o Governador Geraldo Alckmin tambm ressaltou que
o mais urgente agora no Estado de So Paulo a construo do terceiro terminal do
Aeroporto Internacional de So Paulo, em Guarulhos.
A partir da descrio dos problemas apontados, entendemos que o aeroporto
contemporneo na era da globalizao estratgico, pois, conecta um pas ao mundo
global. E defendemos a tese de que, tanto os Planos Diretores do Aeroporto
Internacional de So Paulo como os Planos Diretores da Cidade de Guarulhos foram
implementados de formas independentes, porque no foram articulados entre si, o que
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tornou esse aeroporto num enclave regional quase autnomo dentro do Municpio de
Guarulhos, e por outro lado, em razo dos milhares de empregos gerados pela sua
atividade aeroporturia, o mesmo contribuiu com o adensamento populacional de
regies limtrofes a sua rea patrimonial imprprias para a ocupao urbana residencial.
A estrutura desenvolvida para este trabalho composta de trs captulos, e os
quais se subdividem, cada um deles, em cinco sub-captulos. No captulo 1, no sentido
de comprovarmos o planejamento desarticulado do Aeroporto Internacional de So
Paulo, abordaremos as origens da atividade aeroviria nacional; descreveremos o
processo de escolha da Cidade de Guarulhos para abrigar o Aeroporto Internacional de
So Paulo; e analisaremos o Plano Diretor Aeroporturio (1981) e o Plano de
Desenvolvimento Aeroporturio (2004), ambos elaborados para esse aeroporto.
No captulo 2, no sentido de comprovarmos o planejamento desarticulado do
Municpio de Guarulhos, abordaremos as origens e as principais fases do
desenvolvimento urbano dessa cidade; descreveremos as Leis de Uso e Ocupao do
Solo desse municpio aprovadas em 1980, 1990, 1996 e 2007; e analisaremos o
adensamento urbano irregular em reas situadas ao redor do Aeroporto Internacional
de So Paulo imprprias para o uso residencial, e incompatveis com a intensa
atividade aeroporturia; e discutiremos a Macrometrpole de So Paulo e os Planos
Diretores da Cidade de Guarulhos aprovados em 1971 e 2004, e suas interfaces com o
Aeroporto Internacional de So Paulo.
No captulo 3, descreveremos como os Estados Unidos da Amrica e a Unio
Europia planejam os seus aeroportos; analisaremos como a INFRAERO e o DAESP
planejam as suas redes aeroporturias; e discutiremos o papel do Aeroporto
13
Internacional de Viracopos / Campinas na rea de Controle Terminal So Paulo, sendo
ele uma alternativa ao saturado Aeroporto Internacional de So Paulo.
Observamos ainda que, alguns conceitos tericos de autores renomados nos
auxiliaram no entendimento da problemtica estudada e na construo da comprovao
de nossa tese, tais como, Franois Ascher (2001) que define a modernizao como
um processo de transformao da sociedade, e observa que o capitalismo cognitivo
baseado na produo, apropriao, venda e uso de conhecimentos, informaes e
procedimentos; Saskia Sassen (2010) que entende a cidade global como um espao
centrado no lugar, no sentido de que est enraizado em locais especficos e
estratgicos, e transterritorial, no sentido de que conecta locais que no so
geograficamente prximos, mas que so intensamente conectados entre si; Sandra
Lencioni (2008) que afirma que, dois conceitos intrnsecos da dinmica urbana prpria
da metrpole contempornea so a concentrao e centralizao do capital, e que a
metrpole contempornea devido a sua disperso espacial e a conurbao de cidades
ao seu redor, apresenta uma densidade populacional menor que a metrpole coesa do
passado, em razo de seus limites territoriais serem difusos, e dado o alto grau de
disperso de sua populao, de suas atividades de consumo, de sua rea construda e
de suas atividades produtivas; Rem Koolhaas (1997) que aponta que algumas grandes
cidades contemporneas so cidades genricas que ao se despojarem de suas
identidades tornam-se iguais umas as outras, a partir da constatao de alguns
aspectos comuns que caracterizam este fenmeno; Mathis Gller e Michael Gller
(2002) que descrevem que a cidade aeroporto est relacionada com o
desenvolvimento regional, e que no se mantm isolada nos limites do aeroporto, mas
forma parte de uma estratgia regional mais ampla, que se orienta em realizar a funo
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que exerce o aeroporto nas redes de trfego terrestres e pretende se beneficiar das
atividades derivadas do aeroporto; e Marc Aug (1992) que entende um aeroporto
contemporneo como um no lugar, pois, no se trata de um lugar antropolgico,
justamente porque um local de passagem, ou seja, os lugares antropolgicos tm
pelo menos trs caractersticas comuns, eles se pretendem (pretendem-nos)
identitrios, relacionais e histricos.
15
1. O Aeroporto Internacional de So Paulo e o seu planejamento
desarticulado
Entendemos que o aeroporto contemporneo na era da globalizao
estratgico, pois, conecta um pas ao mundo global. Na era da globalizao, segundo
Ascher (2001, p.32) essa conexo possibilitada pelos avanos tecnolgicos dos meios
de comunicao e de transportes (em especial o setor aerovirio), e que por sua vez
permitiram uma autonomia crescente ante os limites espaciais e temporais. Ascher
(2001, p.32) tambm admite que essa atual fase de modernizao, tambm
denominada por ele de baixa modernidade, um reflexo das rpidas transformaes
que ocorreram ao longo das ltimas trs dcadas do sculo XX e atravessaram a
primeira dcada do sculo XXI.
Koolhaas (1997, p.40) outro autor que tambm reconhece a importncia
estratgica do aeroporto na era da globalizao, e defende que "o mesmo se torna
cada vez mais autnomo em relao cidade que o abriga. Esse entendimento
compartilhado por Gller (2002, p.11) que afirma que os aeroportos, como indiscutveis
pontos de encontro regionais e globais, esto se transformando em centros de
atividades em si mesmos, dizer que, em novos plos de desenvolvimento regional, ou
simplesmente em cidades-aeroportos.
No sentido de comprovarmos o planejamento desarticulado do Aeroporto
Internacional de So Paulo, estruturamos este captulo em cinco partes. No sub-
captulo 1.1 abordaremos as origens da atividade aeroviria nacional, apontando os
fatos marcantes que contriburam para o desenvolvimento deste importante setor de
transporte; no sub-captulo 1.2 descreveremos o processo de escolha da Cidade de
16
Guarulhos para abrigar um grande aeroporto, atravs da compreenso do Estudo de
viabilidade tcnico econmico do principal aeroporto internacional do Brasil, elaborado
em 1969; no sub-captulo 1.3 analisaremos o Plano Diretor Aeroporturio realizado pelo
Governo Federal atravs da COPASP, em 1981, e o qual estabeleceu para o seu ltimo
horizonte de planejamento uma capacidade anual mxima de 28,5 milhes de
passageiros, e tambm que esse aeroporto iria operar apenas vos domsticos e
internacionais oriundos dos pases do Cone Sul; no sub-captulo 1.4, descreveremos o
Plano de Desenvolvimento Aeroporturio concludo pela INFRAERO, em 2004, e o qual
reviu as premissas originais de planejamento desse aeroporto, elevando a sua
capacidade mxima anual para 40 milhes de passageiros no seu ltimo horizonte de
planejamento, e admitiu a operao de vos domsticos, internacionais oriundos do
Cone Sul, e internacionais intercontinentais. No sub-captulo 1.5 apresentaremos as
nossas concluses parciais.
1.1. As origens: a expanso da atividade e da infra-estrutura aeroviria
brasileira
Iniciamos este trabalho atravs da apresentao de um breve panorama histrico
do desenvolvimento da atividade e da infra-estrutura aeroviria nacional, no sentido de
compreendermos a evoluo desse importante setor de transporte no Brasil. Para
Branco (2009, p.28), o Brasil sempre teve especial destaque na aviao internacional.
Essa afirmao da autora corroborada por aes pioneiras como as do aviador e
inventor brasileiro Santos Dumont, criador da aeronave 14 Bis, com a qual, em 23 de
17
outubro de 1906, decolou, voou e pousou por meios prprios no Parc Bagatelle em
Paris.
Ainda segundo Branco (2009, p.28) alega-se que a aviao no Brasil foi
inaugurada com um vo registrado de Edmund Plauchut, ocorrido em 22 de outubro de
1911, no Rio de Janeiro. O aviador, que foi mecnico de Santos Dumont, decolou da
Praa Mau, voou sobre a Avenida Central e caiu no mar, de uma altura de 80 metros,
ao chegar a Ilha do Governador.
Em 17 de junho de 1922, os portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral
chegaram ao Brasil, concluindo vo pioneiro, da Europa para a Amrica do Sul, e em
1927, Joo Ribeiro de Barros e Newton Braga, no avio Jah (figura 1) executaram o
vo de volta, chegando Europa tendo partido do Brasil. (BRANCO. 2009, p. 28)
Figura 1: Foto da aeronave Jah, com Joo Ribeiro de Barros e sua tripulao, na Cidade do Recife, 1927.
Fonte: , acessado em maio de 2010.
Branco (2009, p.28) tambm observa que, em 1927, foi constituda e passou a
operar a primeira empresa area brasileira, chamada Condor Syndikat, que fazia seus
18
primeiros vos com sua aeronave hidroavio batizada de Atlntico, que operava no
Brasil ainda com matrcula alem D-1012.
Ainda em 22 de fevereiro de 1927, foi iniciada a primeira linha area regular,
chamada Linha da Lagoa que ligava a Cidade de Porto Alegre as Cidades de Pelotas
e Rio Grande, ambas localizadas no Estado do Rio Grande do Sul. E segundo Branco
(2009, p.28) em junho daquele mesmo ano era fundada a Viao Area Rio-
Grandense (VARIG), e em dezembro a Condor Syndikat fora nacionalizada passando a
chamar Sindicato Condor Limitada que na dcada de 1940 assumiu a nova identidade
Cruzeiro do Sul (absorvida pela VARIG nos anos 1980).
Em 1929, a New York Rio Buenos Aires Line (NYRBA) inicia os seus servios
areos e passou a ligar o Brasil a essas duas importantes cidades, tendo sido fundada
no Brasil a NYRBA S.A., com linha semanal entre Belm e Santos, e que mais tarde se
transformaria em PANAIR do Brasil (figura 2), extinta em 1965. (BRANCO. 2009, p.28)
Figura 2: Foto da aeronave Constellation L-049 da Panair do Brasil, estacionado no Aeroporto Santos Dumont, dcada de 1940.
Fonte: , acessado em maio de 2010.
19
Em novembro de 1933 foi fundada a Viao Area So Paulo (VASP), que
iniciou em 1936 a chamada Ponte Area Rio So Paulo. E o local onde, hoje, se
encontra o Aeroporto Internacional de Congonhas, conforme afirmao de Mello (2006,
p.24) foi utilizado publicamente, em carter experimental, pela primeira vez, em 12 de
abril de 1936, conforme convite publicado no jornal O Estado de So Paulo. E ainda
segundo essa autora esse aerdromo ficou conhecido por um breve perodo como
Campo da VASP.
Porm, Mello (2006, p.24) descreve que em 15 de setembro do mesmo ano, o
Governo do Estado de So Paulo adquiriu o terreno chamado de Campo da VASP e
passou a administr-lo por meio da Secretaria da Viao e Obras, batizando-o de
Aeroporto de So Paulo. Posteriormente, em 1948, o Departamento de Aviao Civil
DAC rebatizou o aeroporto paulistano como Aeroporto de Congonhas (figura 3), e
conforme Mello (2006, p.31) em homenagem ao Visconde de Congonhas, Lucas
Antnio Monteiro de Barros, primeiro governante da Provncia de So Paulo (1824-
1827).
Durante a dcada de 1940, segundo Silva (1991, p. 43):
Ocorreu uma consolidao da aviao civil brasileira, atravs da criao
do Ministrio da Aeronutica, em 20 de janeiro de 1941, da formao de
duas dezenas de empresas de transporte areo no decorrer desta
mesma dcada, da constituio de uma grande frota de aeronaves, a
criao de centenas de aeroclubes dedicados formao de pilotos, e a
construo, durante a II Guerra Mundial, de uma rede de aeroportos
com pistas de pouso e decolagem pavimentadas e com equipamentos
de auxlio navegao area.
20
Figura 3: Foto do ptio de aeronaves do Aeroporto de Congonhas, dcada de 1950.
Fonte: , acessado em maio de 2010.
J na dcada de 1950, a atividade aeroviria e a rede de infra-estrutura
aeroporturia nacional se tornaram pontos estratgicos para o projeto de
desenvolvimento do Brasil, e nesse sentido Branco (2009, p.29) descreve que:
O Brasil detinha a maior rede de servios areos comerciais do mundo
em volume de trfego depois dos Estados Unidos. Na dcada de 1950
chegaram a operar 16 diferentes companhias areas brasileiras e as
ligaes areas assumiam relevante papel no desenvolvimento nacional,
principalmente desde que o Presidente Juscelino Kubitscheck
popularizou o uso do avio, tornando pblico o fato de ter transformado
21
o avio numa ferramenta de trabalho imprescindvel para que seu
objetivo de modernizar o Brasil e inaugurar a nova capital, em Braslia,
se tornasse realidade.
Atravs de nossos estudos constatamos que, entre 1950 e 1960, o Brasil figurou
como um dos maiores mercados atendidos pela aviao regular no mundo, porque o
modelo de negcios da poca e as condies econmicas do perodo, associadas ao
objetivo das lideranas polticas daquele momento, fizeram com que o transporte areo
torna-se um instrumento elementar para interligar regies distantes de um pas com
dimenses continentais, que buscava se modernizar e se desenvolver. Esse
entendimento compartilhado por autores como Silva (1991), Mello (2006) e Branco
(2009).
Partindo do Aeroporto de So Paulo (Congonhas), naquela poca, era possvel
chegar de avio Sorocaba, Avar, Bauru, Poos de Caldas, So Jos dos Campos,
Taubat, Guaratinguet, guas de Lindia, Ubatuba ou Santos, alm de muitos outros
destinados que se ligavam uns aos outros atravs de uma extensa malha area. E
segundo Branco (2009, p.30) naturalmente isso no s ocorria porque as condies
das estradas e ferrovias no eram favorveis, mas porque de fato o Brasil, naquele
momento, via a aviao como uma alternativa mais do que factvel para ligar as capitais
ao interior, atravs de uma infra-estrutura aeroporturia compatvel e funcional.
Mas, com o acmulo de crises econmicas, a partir da dcada de 1970, elevao
do preo do petrleo e m gesto de todas as empresas areas nacionais, at 1980 o
nmero de empresas operando no Brasil se reduziu para apenas quatro, VARIG, VASP,
TRANSBRASIL e Cruzeiro (que pertencia a VARIG). Nessa dinmica, os destinos de
mdias e pequenas distncias foram excludos das malhas dessas companhias, que
22
mesmo passando por dificuldades econmicas modernizavam as suas frotas com
aeronaves maiores, e incompatveis com os aeroportos criados no perodo de 1940 a
1960. Branco (2009, p.30) conclui que:
No toa, todas essas empresas que lideravam o setor areo brasileiro
na dcada de 1980 foram extintas ou faliram, Um novo modelo
aeronutico se estabeleceu no Brasil desde as dcadas de 1990 e 2000,
e hoje, o Brasil vive um modelo praticamente de duoplio, com a disputa
de poucas rotas regulares (no mais de 200 destinos domsticos),
atendidas por duas companhias areas dominantes (TAM e GOL).
No final da dcada de 1950, com a entrada em operao das aeronaves
quadrimotores reao, especificamente das aeronaves Boeing 707 (figura 4), se
acentuou no mundo, o crescimento do transporte areo de passageiros e cargas. Essas
aeronaves obrigaram na poca, uma grande transformao da infra-estrutura
aeroporturia mundial, exigindo ampliaes das pistas, dos ptios de estacionamento
de aeronaves em rea e em capacidade de suporte e, das dimenses e eficincia dos
terminais de passageiros e cargas.
23
Figura 4: Foto da aeronave Boing 707 da antiga VARIG, estacionado no Aeroporto do Galeo, dcada de 1960.
Fonte: , acessado em maio de 2010.
Recentemente, as aeronaves de fuselagem larga ou wide-body (figura 5)
ampliaram ainda mais a capacidade do transporte areo, sem exigir novas e drsticas
adaptaes da estrutura aeroporturia, levando o transporte areo a atingir as
caractersticas de transporte de massa. Entretanto, diversos conflitos internacionais
tornaram obrigatrias severas e restritivas medidas de segurana, determinando a
implantao de novas rotinas e controles.
Conforme afirmao da INFRAERO e ENGEVIX (2004, p.11)1:
1 Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos,
elaborado pela Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroporturia INFRAERO e ENGEVIX Engenharia Ltda., em 2004.
24
Para que bem se compreenda a evoluo da infra-estrutura
aeroporturia brasileira, preciso esclarecer que todo o investimento at
1985 era feito, a fundo perdido, sob a exclusiva responsabilidade do
Governo Federal. A administrao da rede de aeroportos comerciais
brasileiros era realizada diretamente pelo Departamento de Aviao
Civil, do Ministrio da Aeronutica. As primeiras tentativas de
descentralizao da administrao aeroporturia ocorreram quando com
essa finalidade, foram criadas modestas estruturas no Galeo, Rio de
Janeiro (1968), em Braslia (1971) e, em Ponta Pelada, Manaus (1972).
At o final da dcada de 1970, os nicos aeroportos brasileiros com
caractersticas adequadas para receber as aeronaves de fuselagem larga ou wide-
body eram os do Rio de Janeiro e de Manaus. Este cenrio preocupante de falta de
infra-estrutura aeroporturia adequada num pas que estava em pleno desenvolvimento
econmico e que j consolidava uma importante produo industrial, levou o Governo
Federal a iniciar a organizao e modernizao da rede aeroviria nacional. Porm,
antes de descrevermos o processo de modernizao da infra-estrutura aeroporturia
brasileira, fomentada pelo Governo Federal a partir da dcada de 1970, precisamos
entender o significado do conceito de modernizao.
25
Figura 5: Foto da aeronave Air Bus A380 durante o Paris Air Show, em 2007. Ainda hoje, a maior aeronave wide-body de transporte de passageiros em operao no mundo, podendo transportar de 555 a 845 passageiros.
Fonte: , acessado em maio de 2010.
comum vermos as sociedades ocidentais contemporneas sendo
caracterizadas pelo qualificativo moderno no sentido de diferenci-las de um perodo
temporal longnquo e de outras sociedades com caractersticas diferentes. Porm,
conforme afirmao de Ascher (2001, p.21) essa noo de modernidade bastante
vaga, e de uso incmodo e ambguo. E ainda segundo esse autor, mais correto falar
de modernizao, pois, a modernidade no um estado, mas um processo de
transformao da sociedade. Pode-se dizer, inclusive, que o que diferencia as
sociedades modernas de outras o fato de a mudana ser o seu princpio essencial.
A modernizao um processo que emergiu bem antes dos tempos
que denominamos, usualmente, modernos. Ela resulta da interao de
trs dinmicas socioantropolgicas, cujos traos podemos reconhecer
26
em diversas sociedades, mas que ao entrar em ressonncia na Europa
durante a Idade Mdia, produziram as sociedades modernas: a
individualizao, a racionalizao e a diferenciao social. (ASCHER.
2001, p.21-22)
Ascher (2001, p.22) tambm define a individualizao como a representao do
mundo, no a partir do grupo ao qual pertence o indivduo, mas a partir da sua prpria
pessoa; o uso da linguagem do eu no lugar do ns e ainda a inveno da
perspectiva, bem como a substituio das lgicas coletivas pelas lgicas de
apropriao e domnio individuais.
A racionalizao consiste na substituio progressiva da tradio pela razo na
determinao dos atos. A repetio d lugar s escolhas, e essas, segundo Ascher
(2001, p.22), usam o conhecimento derivado da experincia, os saberes cientficos e
mobilizam as tcnicas.
Em relao diferenciao social, Ascher (2001, p.22) entende que se trata de
um processo de diversificao das funes de grupos e indivduos no interior de uma
mesma sociedade. Ela amplamente reforada pelo desenvolvimento da diviso
tcnica e social do trabalho, e resultante da dinmica da economia de mercado. O
autor ainda observa que a diferenciao social produz diversidade e desigualdade entre
os grupos que formam uma sociedade, e a partir desse entendimento a sociedade se
torna cada vez mais complexa.
Ascher (2001, p.23) distingue a modernizao da sociedade em trs fases,
sendo a primeira delas denominada de alta modernidade, e a qual se inicia no final da
Idade Mdia e termina no comeo da revoluo industrial, perodo em que ocorre a
transformao do pensamento e do lugar da religio na sociedade, da emancipao da
27
poltica e a emergncia do Estado-nao, o desenvolvimento das cincias e a expanso
progressiva do capitalismo mercantil e, logo a seguir, do industrial.
A segunda fase de modernizao da sociedade, denominada de mdia
modernidade, a da revoluo industrial, momento da histria humana em que ocorre
produo de bens e servios, subordinada, em grande medida, s lgicas
capitalistas; o pensamento tcnico ocupando um lugar central na sociedade e
constituio do Estado do bem-estar.
A terceira fase da modernizao, tambm denominada de baixa modernidade,
reflexo das rpidas transformaes que ocorreram ao longo das ltimas trs dcadas
do sculo XX e atravessaram a primeira dcada do sculo XXI, caracterizada,
segundo Ascher (2001, p.32), por uma sociedade mais racional, mais individualista, e
mais diferenciada. Essa transformao nas relaes da sociedade contempornea tirou
partido dos resultados obtidos com os avanos tecnolgicos dos meios de comunicao
e de transportes, que por sua vez permitiu uma autonomia crescente ante os limites
espaciais e temporais.
O aumento das possibilidades de ao e interao em uma distncia
espacial e temporal tal que os indivduos podem ter a impresso de
poder estar em muitos lugares e tempos simultneos. Um sentimento de
ubiqidade e multitemporalidade acompanha assim um duplo processo
de deslocao e de desinstantaneamento. (ASHER. 2001, p.38)
A problemtica que envolve o fenmeno de compresso do espao-tempo na
sociedade contempornea fomentado pelo processo de globalizao econmica, e as
suas conseqncias na reconfigurao e ocupao do territrio urbano da cidade
contempornea, que o torna desigual na medida em que a diferenciao social
28
crescente e cada vez mais complexa nesse cenrio, foi igualmente objeto de reflexo
por parte de autores como Sassen (2010), Lencioni (2004 e 2008), e Koolhaas (1997).
Em 1973, o Governo Federal deu incio a um processo de modernizao da infra-
estrutura aeroporturia brasileira, criando a primeira empresa estatal de administrao
aeroporturia, ARSA (Aeroportos do Rio de Janeiro SA), originada da Comisso de
Construo do Principal Aeroporto Internacional, CCPAI. Essa empresa estatal tornou-
se responsvel pela concluso da construo do aeroporto do Galeo e, aps seu
trmino, por sua administrao e operao at 1987.
Ainda em maio de 1973, foi criada pelo Governo Federal a Empresa Brasileira de
Infra-Estrutura Aeroporturia INFRAERO, destinada a planejar, implantar, administrar,
operar e explorar comercialmente e industrialmente, a infra-estrutura aeroporturia que
lhe fosse atribuda. Em novembro de 1973 a INFRAERO passa a administrar os
Aeroportos de Braslia e de Ponta Pelada, Manaus. A partir de 1974 os aeroportos
comerciais brasileiros vo sendo gradativamente absorvidos pela INFRAERO que
cresce e se estrutura.
Alguns marcos importantes do desenvolvimento da INFRAERO so a absoro
dos aeroportos Eduardo Gomes (Manaus) em 1976, Congonhas (So Paulo) e
Viracopos (Campinas) em 1984, Guarulhos (So Paulo) em 1985 e finalmente, com a
extino da ARSA em 1987, os aeroportos Santos Dumont e Galeo (Rio de Janeiro).
Silva (1991, p.156) afirma que:
O nvel de servio melhorou em funo da organizao de quadros
especializados, atingindo grau de profissionalizao compatvel com as
exigncias dos usurios. A empresa pode alargar suas atribuies
29
absorvendo novos aeroportos, graas aos supervits obtidos pelos
aeroportos de trfego intenso.
O fato da maior relevncia para infra-estrutura aeroporturia brasileira foi
deciso do Governo Federal, a partir de 1985, de no mais participar dos investimentos
para sua implementao. A INFRAERO assumiu a responsabilidade integral da
manuteno e de todos os investimentos necessrios para a expanso e
aprimoramento da rede dos aeroportos comerciais brasileiros. A fonte dos recursos teve
de se restringir exclusivamente s receitas provenientes da explorao industrial e
comercial da rede aeroporturia existente.
Segundo Silva (1991, p. 156):
Antes da criao da INFRAERO, a administrao aeroporturia era
assegurada pelo Departamento de Aviao Civil DAC e pelos
comandos territoriais da Fora Area Brasileira. No existia um plano de
investimento bem definido e a administrao inseria-se num quadro
onde o trfego se desenvolvia rapidamente, apresentando a taxa
histrica de 8% ao ano para passageiros, e de 12 % ao ano para carga,
sem que o correspondente aumento de capacidade fosse tratado
adequadamente.
Segundo a INFRAERO e ENGEVIX (2004, p.11) no Brasil, a limitada
disponibilidade de recursos pblicos, levou a utilizao compartilhada da infra-estrutura
aeroporturia pela aviao civil e militar. E por essa razo, importantes aeroportos
brasileiros como, o Internacional do Rio de Janeiro (Galeo), Internacional de Salvador,
Internacional de Recife, Internacional de Fortaleza, Internacional de Braslia e
Internacional de So Paulo, que atendem a aviao comercial nacional e internacional,
30
neles tambm operam a aviao militar das Bases Areas da Aeronutica localizadas
na rea patrimonial desses aeroportos, porm, ao contrrio da rea civil que
administrada nesses casos pela INFRAERO, as bases areas so reas militares
administradas pela Aeronutica.
O projeto e a construo do Aeroporto Internacional de So Paulo em Guarulhos,
iniciado em 1979, ainda foi da responsabilidade do Governo Federal, atravs da
Comisso Coordenadora do Projeto e Construo dos Aeroportos da rea Terminal de
So Paulo, COPASP2.
As providncias para implantao do Aeroporto Internacional de So Paulo em
Guarulhos tiveram incio em maio de 1979 com a criao da COPASP pelo Ministrio
da Aeronutica. O objetivo dessa Comisso era estudar, projetar e construir um sistema
aeroporturio que pudesse servir a toda a rea Terminal de So Paulo.
Foram estudados os aeroportos de Congonhas, Viracopos, Campo de Marte,
Santos e, especialmente, Guarulhos. O ponto de partida foi o estudo de demanda por
transporte areo para a Grande So Paulo e a partio do trfego pelos diversos
aeroportos da rea Terminal de So Paulo. Em seguida, foram consideradas as
sensveis questes de desapropriao das reas necessrias implantao dos
aeroportos.
A partir de 1985, com a entrada em operao do Aeroporto Internacional de So
Paulo / Guarulhos, modificou-se rapidamente o panorama aeroporturio brasileiro. Em
apenas dois anos de operao o Aeroporto de Guarulhos tornou-se o principal centro
2 A Comisso Coordenadora do Projeto do Sistema Aeroporturio da rea Terminal So Paulo foi criada
atravs de um Convnio firmado entre o Governo do Estado de So Paulo e o Ministrio da Aeronutica, em 23/05/1979.
31
de operaes de vos comerciais (hub) da Amrica do Sul, superando em movimento
e receitas o Aeroporto do Galeo no Rio de Janeiro.
No contexto do planejamento do Aeroporto Internacional de So Paulo
importante revermos como ao longo da sua histria, foram fixados os parmetros para
sua implantao. Segundo o planejamento previsto pelo Plano Diretor, elaborado pela
COPASP/IESA3 em 1981, e aprovado em 1983, o Aeroporto Internacional de So Paulo
foi concebido para atender, na rea da Grande So Paulo, demanda de vos
domsticos que utilizavam o Aeroporto de Congonhas e de vos internacionais com
origem e destino ao Cone Sul e servindo tambm como alternativa ao Aeroporto
Internacional de Viracopos / Campinas. Adiante, nos prximos trs sub-captulos,
iremos aprofundar nosso estudo sobre o planejamento do Aeroporto Internacional de
So Paulo.
Hoje, segundo dados da Agncia Nacional de Aviao Civil ANAC4, no Brasil
existem 745 aerdromos pblicos e 2.152 aerdromos privados, implantados em todas
as regies do pas, sendo que 34 deles so considerados internacionais, e os demais
se dividem entre aerdromos5 e aeroportos6 domsticos. De acordo com o Cdigo
Brasileiro de Aeronutica (Lei n 7.565, de 19 de dezembro de 1986), aerdromo toda
rea destinada a pouso, decolagem e movimentao de aeronaves.
3 Em agosto de 1980, a Internacional Engenharia S.A. IESA foi contratada pela Comisso
Coordenadora do Projeto do Sistema Aeroporturio da rea Terminal So Paulo COPASP, para o desenvolvimento do Plano Diretor do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos. 4 Dados sobre os aerdromos pblicos atualizados pela Agncia Nacional de Aviao Civil em seu site,
em 17/05/2010, e os dados referentes aos aerdromos privados atualizados pela ANAC em seu site, em 10/05/2010. 5 Segundo o Cdigo Brasileiro de Aeronutica (Lei n 7.565, de 19 de dezembro de 1986, aerdromo
toda rea destinada a pouso, decolagem e movimentao de aeronaves. 6 Ainda, de acordo com o Cdigo Brasileiro de Aeronutica (Lei n 7.565, de 19 de dezembro de 1986),
aeroportos so os aerdromos pblicos dotados de instalaes e facilidades para apoio de operaes de aeronaves e de embarque e desembarque de pessoas e cargas.
http://www.anac.gov.br/biblioteca/leis/cba.pdfhttp://www.anac.gov.br/biblioteca/leis/cba.pdfhttp://www.anac.gov.br/biblioteca/leis/cba.pdfhttp://www.anac.gov.br/biblioteca/leis/cba.pdf
32
O Cdigo Brasileiro de Aeronutica classifica os aerdromos em civis (quando
destinados ao uso de aeronaves civis) e militares (quando destinados ao uso de
aeronaves militares). Os aerdromos civis podem ser subdivididos em duas categorias:
Aerdromos pblicos, que se constituem em universidades e patrimnios
autnomos, enquanto mantidas sua destinao especfica pela Unio. Assim, s podem
ser fechados mediante ato administrativo da Autoridade de Aviao Civil (no caso, a
ANAC). Propriedades vizinhas aos aerdromos pblicos esto sujeitas a restries
especiais, em relao ao plano bsico de zona de proteo de aerdromos e ao plano
de zoneamento de rudos. So abertos ao trfego atravs de processo de
homologao. E aerdromos privados, que s podem ser utilizados com a permisso de
seu proprietrio, sendo vedada sua explorao comercial - o proprietrio no pode
sujeitar os usurios de seu aerdromo ao pagamento de tarifas. Os aerdromos
privados no tm zona de proteo garantida, podendo estar sujeitos a restries
operacionais motivadas por novas instalaes ou construes no seu entorno. So
abertos ao trfego atravs de processo de registro e podem ser fechados a qualquer
tempo pelo proprietrio ou pela Autoridade de Aviao Civil.
Ainda conforme conceituao do Cdigo Brasileiro de Aeronutica, os aeroportos
so os aerdromos pblicos dotados de instalaes e facilidades para apoio de
operaes de aeronaves e de embarque e desembarque de pessoas e cargas.
Helipontos so os aerdromos destinados exclusivamente a helicpteros. Heliportos
so os helipontos pblicos dotados de instalaes e facilidades para apoio de
operaes a helicpteros e de embarque e desembarque de pessoas e cargas.
33
1.2. A escolha de Guarulhos para abrigar o Aeroporto Internacional de So
Paulo (1969 1979)
Antes da escolha definitiva de Guarulhos como a cidade que deveria abrigar o
Aeroporto Internacional de So Paulo, outras localidades tambm foram estudadas no
sentido de se verificar a viabilidade de implantao de um aeroporto de grande porte.
Em 1969, o Consrcio Hidroservice, Acres & Parkin7 a pedido do Ministrio da
Aeronutica, desenvolveu um estudo que partiu da anlise de um conjunto de 31
localidades situadas nos Estados do Rio de Janeiro e So Paulo, e aps uma primeira
anlise comparativa, este grupo foi reduzido para 9 localidades, das quais 4 pertenciam
a metrpole paulistana, sendo elas, Santo ngelo (Mogi das Cruzes), Cumbica
(Guarulhos), Ermelino Matarazzo e Cangaba (ambos em So Paulo).
Os critrios considerados neste estudo para a seleo dos stios aeropoturios
foram: rea disponvel, meteorologia, condies de teto e visibilidade, direo dos
ventos, topografia, existncia de obstculos, distncia com relao aos centros das
cidades do Rio de Janeiro e So Paulo, acessibilidade e, por fim, desenvolvimento
urbano da localidade. Na tabela 1, podemos ver a comparao das vantagens e
desvantagens das 4 localidades situadas na metrpole paulistana e que foram
escolhidas pelo estudo desenvolvido pelo Consrcio Hidroservice, Acres e Parkin, em
1969.
Em seu estudo o Consrcio Hidroservice, Acres e Parkin aps elaborar uma
anlise comparativa das quatro localidades, refinou-a considerando os aspectos
7 HIDROSERVICE, ACRES & PARKIN, estudo de viabilidade tcnico econmico do principal aeroporto
internacional do Brasil Vol.1 Estudos de localizao. So Paulo, Ministrio da Aeronutica, 1969.
34
tcnicos de operao aeronutica em cada stio, e finalmente, o estudo de viabilidade
econmica orientou a escolha da melhor alternativa. E ainda segundo a anlise desse
consrcio, a expanso urbana que j se encontrava em curso s margens da Rodovia
Presidente Dutra caracterizava-se pelo uso predominantemente industrial, que poderia
compatibilizar com a atividade aeronutica. Portanto, o estudo do Consrcio
Hidroservice, Acres e Parkin, no considerou que atividade industrial atrairia com ela o
uso residencial, j em curso naquela poca, conforme iremos abordar no captulo 2,
baseados nos estudos de Wilheim (1969), Langenbuch (1971), Romo e Noronha
(1980), Meyer et al (2004), Santos (2006) e Lasalvia (2006).
O estudo do Consrcio Hidroservice, Acres e Parkin conclui que nos stios do
Galeo (Rio de Janeiro) e no de Cumbica (Guarulhos) deveriam ser construdos os dois
principais aeroportos do Brasil. O do Galeo seria destinado a ser o principal aeroporto
internacional do pas, e o de Cumbica seria destinado aos vos domsticos e
internacionais do chamado Cone Sul.
Segundo Santos (1980, p.85) as obras do Aeroporto Internacional do Rio de
Janeiro (Galeo) foram iniciadas aps a finalizao, em 1969, do estudo do consrcio
citado, e concludas em 1977, j em relao ao stio de Cumbica que fora definido com
uma rea de 30 km na qual estava contida a Base Area de So Paulo, apesar das
suas vantagens, o Ministrio da Aeronutica tomou a deciso de envolver o Governo do
Estado de So Paulo na escolha do local mais apropriado para a implantao do novo
Aeroporto Internacional de So Paulo, aps ter encontrado divergncias polticas e
insatisfao da populao local que naquela poca j residia no entorno da Base Area
35
de So Paulo e rejeitava a hiptese de serem desapropriadas em razo da construo
do novo aeroporto.
Tabela 1: Anlise comparativa entre os stios estudados Consrcio HIDROSERVICE, ACRES & PARKIN, em 1969
Localidade Vantagens Desvantagens
Santo ngelo:
Situado em regio equidistante entre Cumbica e Mogi das Cruzes
- rea suficiente para expanses
- inexistncia de obstculos no horizonte
- os terrenos elevados possuam bom solo e boa drenagem
- conexo ferroviria com SP e previso de conexo rodoviria]desenvolvimento industrial permite integrao com o aeroporto
- distante 40km do centro de SP
- deve ser construda via de acesso
- requer grande movimento de terra
- requer desapropriao da Vila de Jundiapeba
Cumbica:
Situado no municpio de Guarulhos, em rea de 30 km, incluindo a Base Area
- solo relativamente estvel, sem grande movimentao de terra
- remoo de obstculos com pequena movimentao de terra
- nica rea vaga prxima SP
- melhor acessibilidade apresentada
- rudo no muito crtico se for desapropriado terreno suficiente
- campo de aviao muito utilizado
- custo de desapropriao menor que Ermelino Matarazzo e maior que Santo ngelo
- grande movimento de terra para retirada da camada de turfa
- drenagem custosa
- o setor norte apresenta obstculos elevados
- deveria ser feita a transfer~encia da Base Area
Ermelino Matarazzo:
Situado entre a Estrada de Cumbica e o Vale do Rio Jac (entre a Dutra e a Estrada de Ferro)
rea de 23 km
-rea plana e aterrada
-possui bom clearence
-prxima a SP com acesso pela estrada de ferro
- pouco vivel devido ao seu desenvolvimento industrial
- preo dos terrenos e benfeitorias alto
- condies do solo pouco favorveis
- alto custo de drenagem
- a rea disponvel no conteria as curvas de rudo, o que seria um problema devido a urbanizao vizinha
Cangaba:
Situada na vrzea do Rio Tiet, entre a Av. Guarulhos e Ermelino Matarazzo
rea de 16 km
-rea plana
-clearence excelente
-prxima SP e timo acesso
- antiga rea de explorao de areia, com inmeros buracos, o que torna pouco vivel
- rea inundvel
Necessria a prvia retificao do Rio Tiet
- rea insuficiente para conter o rudo com possibilidade de rpida urbanizao do entorno
Fonte / Autoria: LASALVIA, Liliana de Souza. A cidade de Guarulhos e o aeroporto. 2006. p. 90.
36
Em 4 de maio de 1976, o Ministrio da Aeronutica firmou um convnio com o
Governo do Estado de So Paulo, no qual delegou ao governo estadual a escolha do
local do novo aeroporto, enquanto o ministrio ficou encarregado de aprovar a escolha,
os conceitos de funcionalidade dos terminais de passageiros e carga area, dos
projetos pr-construtivos e a prpria homologao desse aeroporto. Nesse perodo o
Departamento Aerovirio do Estado de So Paulo DAESP, elaborou um relatrio
preliminar denominado Aeroporto Metropolitano de So Paulo, onde comparou trs
stios para a implantao do novo aeroporto, sendo eles, Caucaia do Alto (primeira
opo), Ibina (segunda opo) e Viracopos (terceira opo).
A premissa inicial do DAESP foi de que o stio no novo aeroporto deveria ter uma
rea de 60 km, ou seja, o dobro que o Consrcio Hidroservice, Acres & Parkin havia
indicado para Cumbica, em 1969. Essa rea atenderia uma demanda estimada muito
maior do que a que fora calculada pelo consrcio, e era o resultado de uma projeo de
trfego areo para o horizonte de planejamento de 1995, da ordem de 43.700.000
passageiros / ano. Cabe observar que, em 2010, passaram por Guarulhos 28.849.185
de passageiros.
Entre as trs opes estudadas, o stio de Caucaia do Alto foi considerado a
melhor opo, por estar localizado a 35 km da Cidade de So Paulo, onde a maior
parte de sua rea se situava em uma reserva florestal e o restante deveria ser
desapropriado, alm disso, esse local poderia ser acessado pela Rodovia Raposo
Tavares, conforme indicado na figura 6. Mas apesar das vantagens identificadas pelo
DAESP, fatores como topografia acidentada que demandaria grande movimentao de
37
terra gerando um alto custo de investimento, e insero em uma rea de reserva
florestal que mobilizou proprietrios de terras e ecologistas a protestarem, inviabilizaram
a implantao do novo aeroporto nesse stio.
Segundo Santos (1985, p.95), entre 1975 e 1979, a questo da localizao do
stio aeroporturio ficou sem resoluo, pois as disputas que envolviam os proprietrios
dos terrenos que eram alvo de estudo, representantes das comunidades que seriam
desapropriadas e ecologistas no permitiam a tomada de deciso. Sobre a demora na
tomada de uma deciso por parte do DAESP, Lasalvia (2006, p.98) afirma que, esta
situao teria motivado o Ministrio da Aeronutica a tomar a frente do processo de
escolha e definitivamente conduzi-lo a partir de ento.
Figura 6: Mapa, sem escala, com a indicao do Stio Aeroporturio sugerido pelo DAESP em Caucaia do Auto, em 1977. Base original editada para permitir o entendimento do desenho.
Fonte: Departamento Aerovirio do Estado de So Paulo DAESP. Aeroporto Metropolitano de So Paulo Relatrio Preliminar. 2 edio, 1977
38
Ainda segundo Santos (1985, p.95), em maro de 1979, o Brigadeiro Dlio
Jardim de Mattos assumiu o Ministrio da Aeronutica, e ao tomar posse, considerou de
absoluta prioridade a construo do Aeroporto Internacional de So Paulo. Em maio de
1979, o Ministrio da Aeronutica criou a Comisso Coordenadora do Projeto Sistema
Aeroporturio da rea Terminal de So Paulo COPASP, com a finalidade de
organizar o planejamento do novo Aeroporto Internacional de So Paulo e concretizar
sua construo. Esta comisso, tambm, tinha o objetivo de estudar, projetar e construir
um sistema aeroporturio que envolvesse toda a rea Terminal de So Paulo,
conforme j ocorria em outras metrpoles com intenso trfego areo, como Nova
Iorque, Paris e Londres. O sistema seria constitudo pelos aeroportos de Campo de
Marte, Congonhas, Guarulhos, Santos e Viracopos. Com a criao da COPASP, Santos
(1985, p.95) afirma que, o Ministro da Aeronutica manifestou claramente o seu ponto
de vista de que deveriam ser construdos dois grandes aeroportos, um em Guarulhos
(Cumbica) e outro em Campinas (Viracopos) [...]. Lasalvia (2006, p.68) tambm
observa que, obviamente, a manifestao, do ponto de vista do Ministro, teve carter
decisrio e no apenas sugestivo, considerando que o cenrio poltico da poca ainda
encontrava-se sob domnio militar, denotando, portanto a feio autoritria tpica deste
perodo.
Mas apesar da deciso arbitraria do Ministrio da Aeronutica sobre a
construo do Aeroporto Internacional de So Paulo na Cidade de Guarulhos,
observamos que desde a concluso, em 1969, do estudo de viabilidade tcnico
econmico do principal aeroporto internacional do Brasil, elaborado pelo Consrcio
Hidroservise, Acres e Parkins, e o qual definiu a rea localizada em Cumbica como a
melhor alternativa para a implantao do novo aeroporto internacional, decorreram dez
39
anos at a tomada da deciso definitiva sobre Guarulhos. Ao longo dessa dcada,
como j descrevemos, o Ministrio da Aeronutica envolveu o Governo do Estado de
So Paulo no sentido localizar a melhor rea para construo do aeroporto, e o qual
delegou essa responsabilidade ao DAESP, que definiu a melhor alternativa como sendo
Caucaia do Alto, mas essa indicao encontrou uma forte rejeio dos ambientalistas e
proprietrios de reas rurais dessa localidade. Em meio a essa morosidade na tomada
de uma deciso definitiva sobre o local de construo do novo aeroporto, teve incio na
regio localizada no entorno da Base Area em Cumbica, um aumento da ocupao
urbana predominantemente formada por loteamentos clandestinos e irregulares.
1.3. O Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So
Paulo (1981)
A maior parte do local aonde atualmente se encontra o Aeroporto Internacional
de So Paulo / Guarulhos, anteriormente era ocupado pela Base Area de So Paulo, a
qual foi construda pelo Governo Federal, durante a dcada de 1940, no perodo da
Segunda Guerra Mundial. Esta Base Area foi implantada na antiga Fazenda Cumbica,
localizada no Municpio de Guarulhos, e para esse mesmo local, aproximadamente
quarenta anos depois, a Comisso Coordenadora do Projeto Sistema Aeroporturio da
rea Terminal de So Paulo COPASP, desenvolveu o planejamento e implantao do
Aeroporto Internacional de So Paulo.
40
Conforme consta no Plano Diretor Aeroporturio8 original, a escolha da Cidade
de Guarulhos para abrigar o Aeroporto Internacional de So Paulo se deu em razo da
sua relativa proximidade do centro da Cidade de So Paulo, apenas 28 km pela
Rodovia Presidente Dutra (BR-116), por sua topografia regular, e constncia da direo
dos ventos no local, apesar de reconhecer que a regio no apresentava condies
meteorolgicas favorveis. A existncia da Base Area de So Paulo com
aproximadamente 10 km tambm foi outro fator determinante para a escolha desse
local para a implantao do novo aeroporto internacional. Pois, os custos com as
desapropriaes, realizadas atravs de um Decreto Estadual, seriam concentrados nas
indenizaes para a incorporao de apenas 4 km de rea urbanizada ao stio da Base
Area.
Hoje, a acessibilidade rodoviria do complexo aeroporturio, conta com a
Rodovia Hlio Smidt (SP-19 / BR-610), a qual faz a ligao entre o Aeroporto
Internacional de So Paulo e a Rodovia Ayrton Senna (SP-070: antigas Via Leste e
Rodovia dos Trabalhadores), tendo uma interseo com a Rodovia Presidente Dutra
(BR-116). Na figura 7 podemos observar a insero desse aeroporto em relao aos
demais modais de transportes localizados em seu entorno, como as rodovias, as
ferrovias, e o metr (antiga Linha Norte Sul: atual Linha 1 Azul).
O projeto do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos (GRU)
desenvolvido pela COPASP, entre 1980 e 1981, atendia uma demanda prevista de 28,5
milhes de passageiros / ano, at o horizonte de 1998, e abragia tanto o trfego
domstico (exceto ponte area) quanto o internacional relacionado com o Cone Sul,
8 O Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos foi desenvolvido
41
que naquela poca eram operados no Aeroporto Internacional de Congonhas / So
Paulo (SAO).
Figura 7: Mapa de localizao, sem escala, do Aeroporto Internacional de So Paulo.
Fonte: Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos, elaborado pela COPASP / IESA, entre 1980-1981.
entre 1980 e 1981, pela Empresa Internacional Engenharia S.A., sob a coordenao da COPASP.
42
A configurao geral final do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos
(GRU), o resultado de vrias alternativas de implantao estudadas pelos tcnicos da
COPASP. E conforme aponta o Plano Diretor Aeroporturio original, Para atender a
capacidade prevista para 1998, o aeroporto precisaria ter apenas duas pistas de pouso
e decolagem paralelas e independentes, e com uma separao mnima entre os eixos
das mesmas de 1.310 m. E a posio lgica dos terminais seria entre essas pistas. O
Plano Diretor Aeroporturio tambm reconhece que essa seria a soluo ideal para o
novo aeroporto, contudo, indica a sua impossibilidade devido s limitaes da forma da
rea disponvel e a incovenincia do aumento da rea a desapropriar em zona
densamente povoada.
O Plano Diretor Aeroporturio original, elaborado pela COPASP, entre 1980 e
1981, menciona os estudo das seguintes alternativas para a configurao do stio
aeroporturio:
Duas pistas independentes e paralelas (separao de 1.500 m), uma de 3.500 m
e outra de 2.100 m. Vantagens: atendimento a capacidade e possibilidade de posicionar
os terminais de passageiros entre as pistas. Desvantegens: a) o aeronaves operando
em pista curta teriam limitao de carga para vos mais longos; b) dificuldade no
controle para selecionar as aeronaves que utilizariam a pista curta; c) o ALS
(equipamento de auxlio a navegao area) teria que ficar fora da rea do aeroporto;
d) em caso de interdio da pista longa, o trfego teria que ser desviado para o
Aeroporto Internacional de Viracopos / Campinas (VCP); e) o rudo gerado sobre a
Base Area de So Paulo (BASP) seria maximizado.
43
Duas pistas paralelas, longas e dependentes com espaamento de 375 m.
Vantagens: a) no haveria prejuzo na operao da Base Area de So Paulo (BASP);
b) no haveria nenhuma das desvantagens da soluo anterior. Desvantagens: a) no
atenderia capacidade total prevista; b) os terminais de passageiros no poderiam ficar
entre as pistas de pouso e decolagem.
Duas pistas convergentes em V sem interseo. Vantagens: a) teminais de
passageiros entre as pistas de pouso e decolagem, mas com restrio devido
exigidade de espao. Desvantagens: a) capacidade insuficiente para atender
demanda aps 1988; b) excesso de obstrues na aproximao e na decolagem devido
topografia da regio.
Combinao das duas duas primeiras alternativas: duas pistas de pouso e
decolagem paralelas e dependentes (separao de 375 m), uma de 3.000 m e outra de
3.500 m, e uma 3 pista de 2.025 m ao norte dos terminais de passageiros afastada
1.375 m da pista de pouso e decolagem mais prxima.
Essa ltima alternativa foi eleita por somar quase todas as vantagens das duas
alternativas combinadas. Esta configuarao tambm permitia exaurir a capacidade de
utilizao da rea disponvel, sem qualquer interferncia na operao da Base Area de
So Paulo (BASP).
Em relao aos terminais de passageiros, o Plano Diretor Aeroporturio original
descreve que, a configurao dos mesmos foi definida a partir das seguintes premissas
da COPASP: a) interdependncia espacial e funcional entre o ptio de aeronaves, os
edifcios dos terminais de passageiros e o estacionamento de veculos; b) minimizao
44
dos investimentos, decorrente principalmente da reduo das reas de ptios de
estacionamento de aeronaves, das reas edificadas, e do emprego de equipamentos
sofisticados e/ou importados; c) otimizao da relao entre o custo e o conjunto de
comodidades e facilidades posto disposio dos usurios; d) facilidade de
implantao, possibilitando o crescimento modulado por etapas de obra; e) flexibilidade
de operao para s companhias areas, com menores custos operacionais.
E a partir das premissas da COPASP descritas acima, foram estudadas as
seguintes alternativas de posio das aeronaves em relao aos edifcios dos terminais
de passageiros: 1) De frente para o edifcio (linear). Vantagem: reduo do percurso
feito a p pelos passageiros, tanto no embarque quanto no desembarque. Desvatagem:
o comprimeto do terminal de passageiros resulta da soma das envergaduras das
aeronaves e do espaamento entre elas, implicando em reas excessivas de edificao
e ptios de estacionamento de aeronaves; 2) em crculo, em torno dos portes de
embarque (satellite). Vantagem: adequao fsica operao de aeronaves de grande
porte, com reduo das reas edificadas. Desvantagem: resulta em ptios de
aeronaves muito extenso; 3) em posies afastadas dos terminais de passageiros
(remote positions). Vantagem: minimizao dos investimentos em obras civis.
Desvantagem: alm do desconforto para o usurio, implica em intensa circulao de
veculos no ptio de estacionamento de aeronaves, com alto custo operacional e
dificuldades de trnsito; 4) de frente para extenses dos terminais de passageiros
(finger pier). Vantagem: reduo das reas de ptio. Desvantagem: aumento dos
percursos feito a p pelos usurios dentro dos terminais de passageiros.
45
Essa ltima alternativa em finger pier9 foi selecionada como a melhor. E
segundo o Plano Diretor Aeroporturio original, em razo de atender as premissas da
COPASP, e por ter as seguintes vantagens adicionais: a) maior nmero de aeronaves
posicionadas simultaneamente; b) o porte dos terminais de passageiros no seria
prejudicado por essa situao; c) facilidade de operao com portes independentes
para cada aeronave; d) disposio dos equipamentos de ptios em local abrigado junto
s aeronaves; e) comodidade decorrente da coincidnciade nveis entre os portes de
embarque e as portas das aeronaves; f) facilidade de embarque para os passageiros
sem bagagem que podem ser despachados diretamente nos portes; g) fluidez das
operaes de ptio, no ocorrendo cruzamento de aeronaves com veculos.
A rea terminal de passageiros foi projetada para conter quatro terminais de
passageiros, e todos com a mesma configuarao do tipo finger pier. E segundo o
Plano Diretor Aeroporturio original, cada um desses terminais teria uma rea
aproximada de 75.000 m, e uma capacidade individual de 7,5 milhes de passageiros /
ano. Dessa forma, a capacidade total do complexo terminal de passageiros de GRU
seria de 30 milhes de passageiros / ano.
Em 20 de janeiro de 1985, a primeira fase de implantao do Aeroporto
Internacional de So Paulo foi inaugurada, em acordo com o planejamento previsto pelo
Plano Diretor Aeroporturio desenvolvido pela COPASP / IESA.
9 Existem cinco tipos caractersticos de configuraes para projetos de terminais de passageiros, finger
per, linear, transporter, satellite e compact module / unit terminal. Para maiores informaes consulte: Internatinal Air Transport Association (IATA): The Airport Development Reference Manual.
46
Figura 8: Desenho, sem escala, representando as etapas de implantao do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos, onde a cor laranja representa a 1 fase de implantao e a cor azul a segunda fase de implantao.
Fonte: Plano Diretor Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos, elaborado pela COPASP / IESA, entre 1980-1981. Desenho anexo: GUA/GRL/905.002.
Em 1989, ocorreu uma invaso no stio patrimonial do Aeroporto Internacional de
So Paulo, prximo da rea reservada para a implantao da futura terceira pista de
pouso e decolagem. Esta invaso originou o assentamento clandestino denominado de
Malvinas.
Em 1990, em consonncia com a legislao federal que dispunha sobre a zona
de proteo do aerdromo e zoneamento de rudo, foi aprovada a Lei n 3.733/90 que
47
regulamentava o Uso e Ocupao do Solo no Municpio de Guarulhos, e estabelecia a
rea de influncia aeroporturia, onde a ocupao residencial deveria ser controlada, e
em algumas regies proibida, assunto que iremos abordar com profundidade no
captulo 2.
Segundo o Plano Diretor Aeroporturio original, a demanda de trfego areo em
1998 era estimada em 28.500.000 de passageiros / ano, sendo 23.100.000 domsticos
e 5.400.000 internacionais para um movimento anual de 313.100 aeronaves.
A composio da frota resultante estimada pode ser observada na tabela a
seguir:
Tabela 2: Composio da Frota (Plano Diretor 1981)
N. de Aeronaves na Hora-pico
Tipo 1983 1988 1998
BEM 3 6 8
B737 12 12 12
B727 15 20 31
B707 5 2 -
DC10/A300B 4 9 23
B747 - 1 2
Total 39 50 76
Fonte: Plano Diretor do Aeroporto Internacional de So Paulo, elaborado pela IESA / COPASP,
1981. Volume I, pgina 6.
Considerando a previso do aumento do tamanho mdio das aeronaves e a
evoluo dos sistemas de controle de aproximao de preciso, as duas pistas de
pouso e decolagem prximas dependentes, segundo o Plano Diretor, atenderiam a
demanda at 1998. A 3 pista ficaria como opo para atender demanda aps 1998.
48
Estimou-se o custo adicional da implantao da 3 pista em, no mximo 7% do
investimento total, O ganho de capacidade decorrente da implantao da 3 pista seria
de aproximadamente 30% em relao ao sistema com apenas duas pistas prximas. A
implantao da terceira pista seria necessria quando o movimento na hora-pico se
aproximasse do limite de capacidade conjunta das duas pistas paralelas dependentes,
provavelmente aps 1998. Essa pista permitiria elevar a capacidade horria do sistema
para 96 e 135 movimentos em condies IFR (operaes de pouso e decolagem
realizadas por instrumentos eletrnicos) e VFR (operaes de pouso e decolagem
realizadas de forma visual) respectivamente. Como pista secundria, sua funo seria
atender, em operao VFR, os pousos das aeronaves da aviao geral e regional e os
pousos de aeronaves comerciais com peso mximo de 100 toneladas. Situada ao norte
do TPS, com comprimento previsto de 2.025 m e 45 m de largura, devendo ser
implantada, na pior das hipteses, na cota 740. Conceitualmente pela sua geometria,
atenderia somente operaes de pouso.
Foi ainda estudada e prevista a possibilidade de utilizao da 3 pista para
operaes IFR no preciso, com o apoio de VOR/DME (equipamentos eletrnicos de
auxlio navegao area), ou IFR preciso se disponveis, equipamentos eletrnicos
de auxlio navegao area MLS/DME.
Comparando-se a previso do Plano Diretor (28,5 milhes de passageiros/ano e
313.100 movimentos) com o ocorrido em 1998 (14 milhes de passageiros/ano e
190.000 movimentos), percebe-se que o nmero total de passageiros chegou a pouco
menos da metade previsto e o movimento de aeronaves a pouco mais da metade do
previsto. A evoluo do trfego de passageiros e aeronaves ocorrido em Guarulhos, no
perodo de 1985 a 2000, apresentada na figura a seguir.
49
Figura 9: Grfico do Movimento x Demanda Passageiros, de 1985 a 2000.
0
5.00
0.00
0
10.0
00.0
00
15.0
00.0
00
20.0
00.0
00
25.0
00.0
00
30.0
00.0
00
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Ano
Pa
ssa
ge
iro
s
Passageiros Dom. Passageiros Int. Previso Pax
Fonte: INFRAERO. Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo, elaborado em 2004 (pgina 14).
Quanto ao movimento de passageiros internacionais, a previso, sob o aspecto
quantitativo, est muito prxima dos nmeros atuais. No entanto, estes passageiros no
so originados ou destinados exclusivamente ao Cone Sul, premissa considerada no
Plano Diretor. O movimento de passageiros domsticos, entre seis e sete milhes, est
muito abaixo do previsto no Plano Diretor.
Desde a sua inaugurao, o Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos
apresentou um movimento crescente, tornando-se o principal aeroporto do pas. Ocupa
50
o primeiro lugar no movimento de passageiros e o segundo em movimento de
aeronaves atrs apenas do Aeroporto de Congonhas. Em relao carga area
tambm tem posio de destaque no cenrio nacional, ocupando o primeiro lugar em
movimentao de carga internacional e apenas o volume de carga importada menor
do que a do Aeroporto Internacional de Viracopos / Campinas. Ainda apresenta o maior
volume em termos de carga de poro (que transportada por aeronaves de
passageiros em seus compartimentos de carga).
A movimentao de carga area por aeronaves cargueiras puras que ocorreu no
incio da operao do Aeroporto Internacional de So Paulo / Guarulhos, foi sendo
transferida para Campinas pela falta de capacidade em Guarulhos e, por outro lado,
pela disponibilidade em Viracopos.
Essa medida, tomada pelo Ministrio da Aeronutica (atual Comando da
Aeronutica), visou otimizar a utilizao da infra-estrutura aeroporturia da rea de
Controle Terminal So Paulo TMA / SP, garantindo uma sobrevida para o Aeroporto
Internacional de So Paulo (em especial para os Terminais de Carga), utilizando a
estrutura disponvel em Viracopos. Com o intenso crescimento da movimentao de
carga area no incio da dcada de 1990, foi necessria a ampliao dessa infra-
estrutura, em Guarulhos e em Viracopos / Campinas.
A movimentao de aeronaves no Aeroporto Internacional de So Paulo, no
perodo de 1985 a 2000, pode ser observada na figura a seguir:
51
Figura 10: Grfico do Movimento x Demanda Aeronaves, de 1985 a 2000.
0
50.0
00
100.
000
150.
000
200.
000
250.
000
300.
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350.
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1985
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1988
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1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Ano
Ae
ron
ave
s
Domstico Internacional Previso Acft
Fonte: INFRAERO. Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo, elaborado em 2004 (pgina 15).
Aps a inaugurao do Aeroporto Internacional de So Paulo, do ponto de vista
da infra-estrutura aeroporturia, as principais obras realizadas nos terminais de
passageiros existentes foram: a) construo do conector entre os Terminais 1 e 2, cuja
funo conectar as reas restritas de embarque e desembarque de ambos os
terminais no sentido de facilitar as conexes domsticas e internacionais; b) reforma e
adequao do desembarque e embarque remoto, e ampliao das extremidades dos
fingers dos Terminais 1 e 2; c) construo do Armazm de cargas Perigosas,
implantao do Centro de manuteno e Almoxarifado e execuo do heliponto e
hangar no Ptio Vip.
52
Com a ampliao dos Terminais de Passageiros 1 e 2, iniciada em 2001 e
concluda em 2004, esses terminais passaram a ter 91.939,50 m cada um deles, o que
elevou a capacidade anual individual dos mesmos em 8,5 milhes de passageiros /
ano. Essas reformas foram necessrias para ampliar o horizonte de saturao da
capacidade desses terminais at a concluso da construo do Terminal de
Passageiros 3, o qual teria uma rea construda de 165.000 m e uma capacidade de
12 milhes de passageiros / ano. Na figura a seguir podemos observar a infra-estrutura
existente no Aeroporto Internacional de So Paulo em 2004.
Figura 11: Desenho, sem escala, da infra-estrutura existente no Aeroporto Internacional de So Paulo em 2004.
Fonte: INFRAERO. Plano de Desenvolvimento Aeroporturio do Aeroporto Internacional de So Paulo, elaborado em 2004 (pgina 81).
53
A deciso sobre as ampliaes dos terminais de passageiros resultou das
necessidades apontadas pelos Estudos de Demanda, Capacidade, Acessibilidade e
Auditoria Ambiental dos Aeroportos de Congonhas, Guarulhos e Viracopos, elaborados
pelo Laboratrio de Planejamento e Operao de Transportes do Departamento de
Engenharia de Transportes da Escola Politcnica da Universidade de So Paulo
LPT/EPUSP.
Os estudos do LPT/EPUSP apontaram um aumento significativo na demanda por
transporte areo nos aeroportos de Guarulhos, Campinas e Congonhas. E por essa
razo, em 2002, o Governo do Estado de So Paulo, decretou como sendo de utilidade
pblica para fins de desapropriao, uma rea densamente habitada com 1,3 km2
localizada ao norte do Aeroporto Internacional de So Paulo, necessria para
ampliao do stio patrimonial do aeroporto e possibilitar a implantao e operao da
terceira pista de pouso e decolagem. Porm, nesse mesmo ano, moradores da regio
atingida pela desapropriao, fundam o Movimento Contra a Terceira Pista, que inicia
uma forte oposio expanso do aeroporto junto mdia local e nas audincias
pblicas promovidas pela INFRAERO e Prefeitura de Guarulhos.
Observamos que a projeo de demanda futura por transporte areo calculada
pelo LPT/EPUSP, j era uma realidade constatada pela INFRAERO no final da dcada
de 1990, e que levou essa empresa estatal a investir na ampliao, modernizao e
readequao da infra-estrutura aeroporturia existente em seus principais aeroportos. E
naquela ocasio alguns projetos internacionais em construo como os novos terminais
de passageiros do Aeroporto Internacional de Londres (Heatrow) e o Aeroporto
Internacional de Madri (Barajas), ambos projetados pelo renomado arquiteto Richard
54
Rogers, serviram de modelo para a empresa estatal brasileira, assim como o conceito
de cidade aeroporto que j comeava a ser difundido no hemisfrio norte.
Mas sendo um grande aerdromo como o Aeroporto Internacional de So Paulo
vital para uma grande cidade contempornea como Guarulhos, at que ponto essa
infra-estrutura autnoma em relao cidade que o abriga? As diversas atividades
econmicas realizadas em suas dependncias e o volume de recursos financeiros
gerados por essas atividades so fatores que tambm contribuem para essa
autonomia? Quais atividades so executadas dentro de seus limites que o tornam uma
infra-estrutura especial em relao s outras? Para tentar responder essas questes
nos apropriamos do conceito de cidade aeroporto desenvolvido pelos arquitetos
holandeses Mathis e Michael Gller que o apresentaram na obra Del aeropuerto a la
ciudad aeropuerto, publicada em 2002, e a qual foi aceita e amplamente empregada
por vrios tcnicos envolvidos no planejamento de aeroportos no Brasil e no exterior.
Segundo Gller (2002, p.11), os aeroportos, como indiscutveis pontos de
encontro regionais e globais, esto se transformando em centros de atividades em si
mesmos, dizer que, em novos plos de desenvolvimento regional, ou simplesmente
em cidades-aeroportos.
O conceito de cidade-aeroporto proposto por Gller (2002) se aplica ao
aeroporto contemporneo, que alm de gerar riqueza ao seu administrador atravs do
recolhimento das tarifas aeroporturias advindas do transporte de passageiros e carga
area, tambm tem um alto faturamento com a locao de espaos internos e externos
de sua rea patrimonial para concesses comerciais e de servios, e para publicidade
diversa, atraindo investimentos pblicos e privados e, portanto, tornando-o um plo de
desenvolvimento econmico relevante na regio onde o mesmo est inserido.
55
Ainda segundo Gller (2002, p. 70):
O conceito de cidade aeroporto tambm est relacionado com o
desenvolvimento regional. Uma cidade aeroporto no se mantm isolada
nos limites do aeroporto, mas forma parte de uma estratgia regional
mais ampla, que se orienta em realizar a funo que exerce o aeroporto
nas redes de trfego terrestres e pretende se beneficiar das atividades
derivadas do aeroporto.
Em 2001, a INFRAERO seguindo uma tendncia internacional, iniciou a
implantao nos terminais de passageiros dos principais aeroportos administrados por
ela, do conceito denominado pela diretoria comercial dessa empresa de
aeroshopping, o que aumentou significativamente a sua receita comercial em pouco
tempo. Por exemplo, antes da grande reforma e adequao dos espaos comerciais e
operacionais internos dos terminais de passageiros 1 e 2 do Aeroporto Internacional de
So Paulo, iniciada em 2000, e executada pela Empresa Construes e Comrcio
Camargo Corra S.A., as reas comerciais e operacionais desses terminais eram
relativamente pequenas para atender o movimento crescente de passageiros j previsto
em estudos10 realizados naquela poca, e aps essa reforma e adequao concluda
em 2004, a rea destinada atividade comercial se tornou mais ampla e sofisticada,
com uma caracterstica de shopping center, contendo lojas de brinquedos, vesturio,
acessrios de moda, joalherias, livrarias, perfumarias, produtos eletrnicos e etc, alm
de praas de alimentao com redes de restaurantes fast food comuns nos grandes
centros comerciais existentes nas principais cidades brasileiras.
10 Estudos de Demanda, Capacidade, Acessibilidade e Auditoria Ambiental dos Aeroportos de Congonhas, Guarulhos e Viracopos, elaborados a pedido da INFRAERO, pelo Laboratrio de
56
Segundo Koolhaas (2000):
Depois de desenvolver durante sculos seus prprios modelos como o
mercado, os grandes armazns e as galerias comerciais, a atividade
comercial tem comeado a expandir-se nas ltimas duas dcadas sobre
qualquer programa imaginvel; aeroportos, estaes de trem, museus,
bases militares, cassinos, parques temticos, bibliotecas, escolas,
universidades, hospitais, etc. cada vez mais difcil de distinguir os
aeroportos dos shopping centers.
Esse grande investimento da INFRAERO em ampliar e modernizar as reas
comerciais dos terminais de passageiros de seus aeroportos com o conceito
aeroshopping teve incio em 2001, e hoje, alm do Aeroporto Internacional de So
Paulo (GRU), outros 16 importantes aeroportos tambm contam com reas comerciais
baseadas no conceito desenvolvido e implementado por essa empresa. So eles,
Aeroporto Internacional de Viracopos / Campinas (VCP), Aeroporto Internacional de
Braslia (BSB), Aeroporto de Palmas (PMW), Aeroporto Internacional de Porto Alegre
(POA), Aeroporto Internacional de Belm (BEL), Aeroporto de Londrina (LDB),
Aeroporto de Joinville (JOI), Aeroporto Internacional de Navegantes (NVT), Aeroporto
Internacional de Porto Velho (PVH), Aeroporto Internacional de Salvador (SSA),
Aeroporto Internacional de Manaus (MAO), Aeroporto de Campina Grande (CPV),
Aeroporto Internacional de Macei (MCZ), Aeroporto Internacional de Recife (REC),
Aeroporto Internacional de Petrolina (PNZ), e Aeroporto de Uberlndia (UDI).
No entendimento de Gller (2002, p. 61):
Planejamento e Operao de Transportes do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politcnica da Universidade de So Paulo LPT/EPUSP, em 2000.
57
Os aeroportos sempre sofreram profundas transformaes. Tm sido
constantemente redesenhados, se lhes foram acrescentados pistas de
pouso e decolagem ou se foram ampliados os terminais para
proporcionar mais portes de embarque. Na ltima dcada, o
extraordinrio crescimento do trfego areo tem gerado uma nova onda
de remodelaes aeroporturias por todo o mundo, porm, desta vez de
uma forma mais radical que as anteriores. [...]
Essa remodelao aeroporturia mundial apontada por Gller (2002), tambm
pode ser observada na estratgia comercial da INFRAERO, ao longo da primeira
dcada deste sculo, nas reformas de ampliao e adequao dos seus principais
aeroportos, conforme descrevemos anteriormente. Gller (2002, p.61) ainda afirma que:
No obstante, projetos de ampliao mais recentes no s foram
motivados pela necessidade de acrescentar asfalto ou portes de
embarque, mas tambm se ocuparam do traado do lado terra do
aeroporto, ao menos na mesma forma que nas instalaes do lado ar.
Junto com as novas estratgias comerciais do gestor, tem surgido o
desejo de proporcionar espaos prximos ao centro do aeroporto
destinados a atividades que no esto diretamente relacionadas com a
aviao, porm, geram recursos adicionais que se tornam
imprescindveis para a gesto de um aeroporto contemporneo.
Mas, no decorrer da implementao dos aeroshoppings pela INFRAERO, e
aps o denominado apago areo11 que se evidenciou logo aps o acidente com uma
aeronave da Empresa Gol Transportes Areos, ocorrido em setembro de 2006, que
11
O Termo apago areo foi utilizado por Alexandre Brando, em 2007, na obra Apago areo: para conhecer um pouco mais do caos nos aeroportos brasileiros, da Editora Alley, para denominar a problemtica da insuficincia de infra-estrutura nos aeroportos brasileiros evidenciada em 2006.
58
vitimou 154 pessoas, e depois do desastre com uma aeronave da TAM Linhas Areas
S.A., ocorrido em julho de 2007, no Aeroporto Internacional de Congonhas que matou
199 pessoas, o Sindicato Nacional dos Aerovirios, e muitos tcnicos especializados
em aeroportos, como Alexandre Brando (2007), acusaram a INFRAERO de privilegiar
o investimento na ampliao de reas comerciais, transformando os terminais de
passageiros em verdadeiros shopping centers, em detrimento da ampliao
necessria da infra-estrutura operacional, tais como, pistas de pouso e decolagem e
equipamentos de auxlio navegao area, o que comprometeu a segurana
operacional dos principais aeroportos do pas, e em especial Congonhas. Aps o
acidente muitas reportagens foram publicadas nos principais jornais e revistas do pas
questionando a segurana das pistas de pouso e decolagem de Congonhas e a
qualidade do procedimento de suas manutenes.
O fato que, independente da crtica ao conceito do aeroshopping que foi
defendido e implementado pela INFRAERO em seus principais aeroportos no incio
deste sculo, podemos constatar que o Aeroporto Internacional de So Paulo possui
uma complexidade de atividades econmicas dentro de suas dependncias que o
aproxima de alguns aspectos de uma cidade aeroporto, conforme o entendimento de
Gller (2002), pois, produz riqueza e gera milhares de empregos diretos e indiretos,
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