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Universidade Federal de Mato Grosso
Instituto de Saúde Coletiva
A regulação assistencial no Sistema Único de Saúde:
o caso da Central de Regulação de Cuiabá/MT.
Alexandre Giraux Cavalcanti
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Saúde Coletiva, como parte dos
requisitos necessários para obtenção do título
de Mestre em Saúde Coletiva.
Área de Concentração: Saúde Coletiva
Orientadora: Profª Dra Maria Angélica dos
Santos Spinelli
Cuiabá/MT
2011
A regulação assistencial no Sistema Único de Saúde:
o caso da Central de Regulação de Cuiabá/MT.
Alexandre Giraux Cavalcanti
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em Saúde Coletiva do Instituto de
Saúde Coletiva da Universidade Federal de
Mato Grosso, como parte dos requisitos
necessários para obtenção do título de Mestre
em Saúde Coletiva.
Área de Concentração: Saúde Coletiva
Orientadora: Profª Dra Maria Angélica dos
Santos Spinelli
Cuiabá/MT
2011
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte
C376r Cavalcanti, Alexandre Giraux.
A regulação assistencial no Sistema Único de Saúde : o caso da
Central de Regulação de Cuiabá/MT / Alexandre Giraux Cavalcanti. --
2011.
99 f. : il. color. ; 30 cm.
Orientadora: Maria Angélica dos Santos Spinelli.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Mato Grosso,
Instituto de Saúde Coletiva, Programa de Pós-Graduação em Saúde
Coletiva, Cuiabá, 2011.
Inclui bibliografia.
1. Sistema Único de Saúde. 2. Regulação - SUS - Cuiabá. 3. Central
de Regulação - Cuiabá. 4. Cirurgias – Regulação de vagas. I. Título.
CDU 614.39(817.2)
Ficha Catalográfica elaborada pelo Bibliotecário Jordan Antonio de Souza - CRB1/2099
Permitida a reprodução parcial ou total desde que citada a fonte
Dedicatória
A minha esposa Iluska, que sempre me incentivou
a prosseguir nesta caminhada, grande amor da
minha juventude, da idade adulta e, certamente,
da minha velhice, se assim Deus permitir.
Aos meus queridos filhos Raquel e Davi, presente
maior que pudemos receber de nosso Pai.
AGRADECIMENTOS
A Deus pela saúde e oportunidade de realizar esse trabalho e aos meus pais pelo
incentivo que sempre me deram nos estudos.
Ao Tribunal de Contas da União pelo investimento que fez em mim, ao permitir a
redução de carga horária durante o curso de mestrado e ao conceder-me licença para
capacitação, período fundamental para redação desse trabalho.
Ao amigo e Secretário de Controle Externo no Estado de Mato Grosso, Carlos
Augusto de Melo Ferraz, pelo grande incentivo e sincero apoio durante todo o curso
de mestrado.
À minha orientadora, Profª Dra Maria Angélica dos Santos Spinelli, pela paciência e
dedicação que sempre dispensou a mim ao longo de todo o processo de construção
desse trabalho.
Ao Prof. Dr João Henrique Gurtler Scatena por ter contribuído, em todas as etapas
deste trabalho, de forma preciosa e construtiva para a conclusão desta dissertação de
mestrado.
Ao Prof Dr Luiz Odorico Monteiro de Andrade por prestigiar o Programa de
Mestrado em Saúde Coletiva do ISC/UFMT com sua presença na Banca
Examinadora.
À Diretoria de Regulação, Controle e Avaliação / SMS Cuiabá pela receptividade e
disponibilidade durante a execução dos trabalhos.
Aos colegas de curso, docentes e funcionários do ISC pelo convívio amistoso e
saudável durante esses dois anos de caminhada.
CAVALCANTI AG. A regulação assistencial no Sistema Único de Saúde: o caso da
Central de Regulação de Cuiabá/MT. [dissertação de mestrado]. Cuiabá: Instituto de
Saúde Coletiva da UFMT; 2011.
RESUMO
Introdução - A Política Nacional de Regulação, implantada pelo Ministério da
Saúde em 2008, pretendeu consolidar a utilização de Complexos Reguladores, com
suas respectivas Centrais de Regulação, para organizar o fluxo de atendimento
assistencial no Sistema Único de Saúde. Essa ferramenta de gestão, além de
retroalimentar a Programação Pactuada e Integrada entre diferentes unidades
federativas, deve processar, mediante emprego de diferentes critérios, toda demanda
por procedimentos de média e alta complexidade, de tal forma que o usuário seja
encaminhado para a melhor alternativa de atenção à saúde, de acordo com as
características de cada caso e com a disponibilidade de serviços. Objetivo – Analisar
o mecanismo de regulação no que tange ao processamento da demanda por cirurgias
eletivas por parte da Central de Regulação de Cuiabá-MT. Métodos – Trata-se de um
estudo de caso, com predominância de investigação qualitativa, no qual foram
coletados dados que compõem uma triangulação de informações geradas por
entrevistas, observação participante e documentos. A pesquisa foi realizada nas
instalações da Central de Regulação de Cuiabá/MT. Ela teve como universo empírico
pessoas envolvidas no fluxo interno do processo de regulação dos pedidos de
cirurgias eletivas. Os dados foram analisados seguindo e adaptando a análise
temática de conteúdo. Resultados – Os erros no preenchimento dos pedidos
prejudicam a eficiência do mecanismo regulatório, o que causa atraso no
atendimento do usuário do SUS; a oferta é menor que a demanda por cirurgias
eletivas, fato que dificulta o acesso dos pacientes às vagas; não há um protocolo
oficial para que o médico regulador possa analisar os pedidos; o direcionamento dos
pacientes para as unidades prestadoras consideram as referências para a realização do
procedimento solicitado e a existência de vagas com data mais próxima do
agendamento; as informações gerenciais provenientes do mecanismo regulatório não
são devidamente aproveitadas pela gestão no planejamento das ações e serviços em
saúde; existem vários mecanismos de fuga ao fluxo regulatório; e os problemas que
acometem o sistema de saúde também repercutem no trabalho da Central de
Regulação de Cuiabá.
Descritores: Regulação; Acesso; Sistema Único de Saúde.
CAVALCANTI AG. Regulating care within the Unified Health System: the case of
the Central Regulation of Cuiabá/MT. [Master's thesis]. Cuiabá: Institute of Public
Health of UFMT; 2011.
ABSTRACT
Introduction - The National Regulation Policy, implemented by the Ministry of
Health in 2008, intended to consolidate the use of Regulator Complexes with their
respective Regulation Centers, to organize the flow of assistance services in the
Unified Healthcare System (UHS). This management tool, in addition to retrofeed
the Integrated and Contracted Program among different Federal Bodies, must process
all requests of medium and high complexity procedures through the use of different
criteria, in a way that the end users will be routed to the best health care option based
on the characteristics of each case and service availability. Objective - To analyze
the regulatory mechanism of the Cuiabá Regulation Center (MT), concerning the
process demand of elective surgeries. Methodology - This is a predominantly
qualitative case study, which used data generated by interviews, participative
observation and documents. The survey was conducted on the premises of the Cuiabá
Regulation Center (MT) and sampled people involved in requests of elective
surgeries. Data were analyzed by following and adapting the thematic content
analysis. Results - Errors in application fulfillment affects the efficiency of the
regulatory mechanism, which delays end-user services at the UHS; availability does
not cope with demand of elective surgeries, an issue that hinders end-users' access to
health care; doctors have no official protocol to evaluate applications for surgeries;
routing of patients takes into consideration not only the nature of requested
procedure but also the earliest date of availability; managerial information of the
regulatory mechanism is not fully utilized to plan actions and services; there are
various possibilities to bypass the regulatory mechanism, and system-wide problems
of the Unified Healthcare Systems also affects the performance of the Cuiabá
Regulation Center (MT).
Keywords: Regulation; Access, Unified Healthcare System
ÍNDICE
1. INTRODUÇÃO 12
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA REGULAÇÃO NO SUS 14
2. OBJETIVOS 24
3. MÉTODOS 25
3.1 COLETA E ANÁLISE DE DADOS 27
3.1.1 Questões Éticas 31
3.1.2 Limitações da Pesquisa 31
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 32
4.1 COMPLEXO REGULADOR EM MATO GROSSO 32
4.2 A CENTRAL DE REGULAÇÃO DE CUIABÁ 37
4.3 PROCESSOS E FLUXOS REGULATÓRIOS 46
4.3.1 Conceitos de Regulação 46
4.3.2 Descrição do Fluxo Regulatório 48
4.3.3 Mecanismos de Fuga ao Fluxo Regulatório 58
4.4 DISPONIBILIDADE E ACESSO ÀS VAGAS
ADMINISTRADAS PELA GERÊNCIA DE CIRURGIAS
ELETIVAS
63
4.4.1 Disponibilidade de Serviços 63
4.4.2 Critérios Utilizados para Escolha dos Prestadores de Serviços 66
4.4.3 Critérios Utilizados para Priorizar o Acesso 69
4.4.4 Acessibilidade aos Serviços 72
4.5 RETROALIMENTAÇÃO DAS INFORMAÇÕES GERADAS
PELA CENTRAL DE REGULAÇÃO
80
5. CONCLUSÕES 85
REFERÊNCIAS 89
APÊNDICES 94
APÊNDICE 1 – Termo de Concentimento 94
APÊNDICE 2 – Roteiro de entrevista 95
ANEXOS 97
ANEXO 1 – Escriórios Regionais de Saúde 97
ANEXO 2 – Fotografias da Central de Regulação 98
Lista de Tabelas
Tabela 1 Leitos cirúrgicos do SUS, segundo hospital e tipo de prestador
– Cuiabá 2010.
63
Tabela 2 Demanda por cirurgias à Central de Regulação – Cuiabá (ano
de 2010).
64
Tabela 3 Distribuição de leitos cirúrgicos específicos disponíveis e de
cirurgias ortopédicas realizadas no período de janeiro de 2008
a julho de 2010, demandas à Central de Regulação nos anos
de 2008 e 2009.
65
Tabela 4 Distribuição percentual das solicitações de cirurgias
ortopédicas à Central de Regulação de Cuiabá, segundo sua
situação.
73
Tabela 5 Distribuição percentual das solicitações de cirurgias
ortopédicas à Central de Regulação de Cuiabá que estão na
fila, segundo grau de prioridade.
74
Tabela 6 Distribuição percentual dos pacientes que receberam alta após
cirurgia ortopédica, segundo “grau de prioridade” – Central de
Regulação de Cuiabá.
75
Tabela 7 Distribuição percentual das cirurgias ortopédicas realizadas,
segundo a oportunidade das solicitações à Central de
Regulação de Cuiabá.
77
Tabela 8 Distribuição percentual das solicitações de cirurgias
ortopédicas posteriores à data de alta, segundo “grau de
prioridade”.
78
Lista de Quadros
Quadro 1 Dimensões e categorias analíticas do estudo. 26
Quadro 2 Instrumentos de coleta de dados primários. 28
Quadro 3 Instrumentos de coleta de dados secundários. 29
Quadro 4 Perfil dos Dirigentes e Técnicos entrevistados. Central de
Regulação de Cuiabá – 2010
42
Lista de Figuras
Figura 1 Organograma funcional da Diretoria de Regulação, Avaliação
e Controle da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá.
40
Figura 2 Mapa de Processamento dos pedidos de cirurgias eletivas por
parte da Central de Regulação de Cuiabá.
49
12
1. INTRODUÇÃO
Atuo, desde o início de 2008, na área de controle externo dos recursos
federais em Mato Grosso. Minhas atividades sempre estiveram ligadas a processos
relacionados com a função saúde. Nesse mesmo ano, em virtude de minha atuação
nesse ramo, tomei conhecimento de distorções existentes no mecanismo regulatório
no país, as quais ameaçavam a legitimidade das Centrais de Regulação, ao processar
o pedido encaminhado pelas unidades solicitantes direcionando pacientes para um
determinado estabelecimento de saúde em detrimento de outro, sem observação do
princípio da equidade ou de qualquer outro critério objetivo.
Tal fato despertou o meu interesse sobre esse assunto. Qual deveria ser o
papel de uma Central de Regulação ao receber as demandas das unidades de saúde
solicitantes? Como deveria ser esse processamento para que ele fosse adequado aos
princípios que norteiam o Sistema Único de Saúde – SUS?
Pouco tempo depois, participei de um levantamento, em Brasília, para
avaliar quais seriam as áreas mais relevantes para realização de auditorias na área de
saúde. Ficou constatado, nesse trabalho, que os Complexos Reguladores
gerenciavam, nas grandes capitais, o acesso dos usuários do SUS aos procedimentos
de média e alta complexidade, os quais representavam um importante volume de
despesa no que concerne à função orçamentária em tela, além do gasto envolvido
com a implantação desses complexos.
Em decorrência disso, foi realizado, no ano de 2009, um trabalho de
auditoria de natureza operacional relacionado à Política Nacional de Regulação
envolvendo nove estados, entre eles Mato Grosso. Neste estado da federação, tive a
oportunidade de compor a equipe de auditoria. O Relatório de Fiscalização que
consolidou as informações coletadas em todo país resultou no Acórdão nº 1189/2010
prolatado pelo Plenário do Tribunal de Contas da União – TCU. Já as informações
coletadas no Estado de Mato Grosso foram tratadas por esta Corte de Contas no
Acórdão TCU nº 635/2010 – Plenário.
13
Esse tipo de fiscalização realizada pelo TCU busca examinar, de forma
independente e objetiva, os aspectos relacionados à economicidade, eficiência,
eficácia e efetividade de organizações, programas e atividades governamentais, com
a finalidade de promover o aperfeiçoamento da gestão pública (TCU, 2010a).
Nessas fiscalizações, o escopo dos trabalhos esteve relacionado à regulação
da assistência à saúde, que, segundo o Ministério da Saúde, tem por finalidade a
organização, o gerenciamento e a priorização do acesso e dos fluxos assistenciais no
SUS (MS, 2008). Contudo, alguns aspectos ligados à regulação da atenção à saúde
foram discutidos nesses trabalhos de auditoria, tais como a análise da contratação de
serviços de saúde, entre outros aspectos.
Depois dessa experiência, surgiu de minha parte uma inquietação a respeito
de como se processa a regulação assistencial de acordo com a visão dos sujeitos que
labutam diariamente com essa questão. Então, quais seriam os critérios utilizados
para priorizar as demandas de um paciente em detrimento dos outros? Da mesma
forma, como são selecionados os prestadores de serviços que deverão receber uma
demanda específica? Nesse procedimento, consideram-se os pactos estabelecidos
entre os entes federativos para referenciar a demanda por procedimentos de média e
alta complexidade no estado, tal como está consubstanciado na Programação
Pactuada e Integrada?
Aumenta a relevância e também o desafio deste trabalho o fato de existirem
poucos estudos na literatura a respeito do assunto, uma vez que a Política Nacional
de Regulação foi implantada no ano de 2008, apesar de, na prática, as ações nessa
área existirem desde 2002.
Nesta pesquisa, pretendi descrever o mecanismo de regulação sob o ponto
de vista de dirigentes e técnicos de uma Central de Regulação e analisá-lo com base
nas normas delineadas pelo Ministério da Saúde e nos princípios constitucionais do
Sistema Único de Saúde.
Optei por desenvolver um estudo de caso sobre a Central de Regulação de
Cuiabá/MT. A escolha justificou-se pela sua estrutura ser responsável pela regulação
da maior parte de toda capacidade de atendimento de média e alta complexidade do
Estado de Mato Grosso, uma vez que se trata da principal Central de Regulação de
todo complexo estadual.
14
Decidi operacionalizar o estudo contemplando a Gerência de Cirurgias
Eletivas, devido à experiência obtida na auditoria operacional. Nesse trabalho, pude
verificar que esse setor, sob a égide da Coordenadoria de Regulação da Diretoria de
Regulação, Controle e Avaliação – DRAC da Secretaria Municipal de Saúde de
Cuiabá, recebe demandas da capital e do interior do estado para o atendimento de
especialidades, cujas vagas são limitadas quando comparadas à demanda. Portanto,
diante dessas circunstâncias, o mecanismo regulatório praticado pela equipe dessa
Gerência é importante para qualificar o acesso da população de Mato Grosso aos
procedimentos de média e alta complexidade que exigem internações eletivas.
Sob a responsabilidade dessa Gerência, existem procedimentos em que a
oferta é menor que a demanda, como é o caso de Ortopedia. Assim, a descrição
quantitativa dos resultados da regulação feita nessa especialidade pode ser um bom
exemplo para contribuir com a análise da eficácia do mecanismo regulatório efetuado
por esse órgão.
Esses dados, associados às informações geradas pelas entrevistas com a
equipe da Gerência de Cirurgias Eletivas e com os dirigentes desse órgão, à
observação participante sobre as atividades diárias de regulação e aos documentos
produzidos pela Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá que tratam sobre o órgão
estudado caracterizam o estudo de caso da Central de Regulação de Cuiabá/MT e
foram objeto de análise na presente pesquisa.
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA REGULAÇÃO NO SUS
A Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988) instituiu
o Sistema Único de Saúde – SUS, mediante o artigo 198, o qual expressa, que as
ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada
e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
15
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.
O caráter universal e igualitário do acesso às ações e serviços de saúde para
sua promoção, proteção e recuperação foi destacado no artigo 196 da Carta Magna,
apresentando ainda que o direito à saúde deva ser garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos.
Dessa forma, entende-se que há um grande desafio para a gestão alcançar
todos os objetivos traçados pelo texto constitucional. No entanto, políticas de saúde
têm sido formuladas e implantadas nesse sentido, buscando ainda a equidade na
distribuição dos recursos, bens e serviços disponíveis (EVANGELISTA et al., 2008).
A integralidade na assistência à saúde é um dos princípios constitucionais
do SUS – assim como a universalidade e equidade – e, portanto deve, também, ser
contemplada na elaboração das políticas de saúde brasileiras. Contudo, a definição a
respeito deste princípio apresenta diversas vertentes. PINHEIRO e MATTOS (2001)
destacaram que a integralidade sempre foi uma das “bandeiras de luta” dos que
defendem um sistema público de saúde. Eles afirmam que, independentemente do
sentido que seja dado a esse princípio, o termo implica recusa ao reducionismo, à
objetivação dos sujeitos e uma abertura para o diálogo entre as partes atuantes no
SUS. HORTALE (2004) ressaltou o emprego do termo integralidade como
articulação entre níveis de prestação de serviços de saúde, como integração entre os
setores público e privado, como uma importante diretriz na gestão dos serviços e
como proposta de modelo de atenção.
Para implementar esse modelo de atenção integral, várias estratégias
políticas e de gestão foram propostas por várias entidades e personalidades
importantes do movimento sanitário de todo país. No âmbito jurídico, foram
promulgadas as Leis Orgânicas da Saúde – nº. 8.080/90 (BRASIL, 1990a) e nº
8.142/90 (BRASIL, 1990b) – e, no âmbito do Ministério da Saúde, as Normas
Operacionais (NOB e NOAS). As Leis Orgânicas regulamentaram o SUS, agregando
todos os serviços estatais – federais, estaduais e municipais – e os serviços privados.
As normas operacionais têm regido o processo de descentralização da gestão do
sistema de saúde e definido as relações entre as três esferas de governo.
16
Diversos municípios brasileiros não têm estrutura adequada para gerenciar a
saúde de sua população. Apesar de todas essas dificuldades, a descentralização tem
transferido responsabilidades de gestão dos serviços, prerrogativas e recursos para os
governos municipais (TEIXEIRA e SOLLA, 2005). Vários esforços foram
despendidos para aperfeiçoar esse processo de descentralização do SUS, que
culminaram com a aprovação da Norma Operacional de Assistência à Saúde - NOAS
01/2002 (MS, 2002). Esse documento, a despeito de suas limitações, apresentou
alguns resultados positivos, tais como o fortalecimento das ações de regulação,
controle e avaliação da regionalização na pauta prioritária dos gestores do SUS nas
três esferas de governo e a ampliação do emprego da Programação Pactuada e
Integrada – PPI (SOLLA, 2006).
Segundo a Portaria GM/MS nº 399, de 22/02/2006, a PPI:
resulta de um processo que visa definir a programação das ações de saúde em
cada território e nortear a alocação dos recursos financeiros para saúde a partir de
critérios e parâmetros pactuados entre os gestores, obedecendo às diretrizes
estabelecidas do Plano Diretor de Regionalização (PDR). Sua mudança ocorre a
cada gestão estadual, sem prejuízo das atualizações necessárias. A PPI deve
explicitar os pactos de referencia entre municípios, gerando a parcela de recursos
destinados à própria população e à população referenciada (MS, 2006a).
A PPI foi criada pela Portaria que instituiu a NOB - 96 (MS, 1996) para que
a organização das redes e o planejamento das ações não ocorressem de forma
fragmentada e, assim, pudesse facilitar e organizar o acesso da população aos
serviços de saúde, propiciando, ainda, um melhor aproveitamento dos recursos
baseados na concepção de regiões de saúde.
Com base na Portaria MS/GM n. 373/2002, que regulamentou a NOAS
01/2002, GUIMARÃES (2005) definiu região de saúde da seguinte maneira:
base territorial de planejamento da atenção à saúde, não necessariamente
coincidente com a divisão administrativa do estado, a ser definida pela Secretaria
Estadual de Saúde, de acordo com as especificidades e estratégias de
regionalização da saúde em cada estado, considerando-se as características
demográficas, sócio-econômicas, geográficas, sanitárias, epidemiológicas, oferta
de serviços, relações entre municípios, entre outras [...] Por sua vez, a menor
base territorial de planejamento regionalizado, seja uma região ou uma
microrregião de saúde, pode compreender um ou mais módulos assistenciais",
definido, segundo a mesma portaria, como um "conjunto de municípios, entre os
quais há um município-sede (GUIMARÃES, 2005; p. 1018).
17
A estrutura econômico-social no país é bastante heterogênea, gerando
desequilíbrio na oferta de serviços e de profissionais de saúde, imputando grandes
obstáculos para universalidade no acesso entre diferentes regiões (SOLLA, 2006). A
fragilidade da capacidade de gerar assistência integral por parte dos municípios,
quando isolados, fortaleceu a concepção de regiões de saúde como estratégia de
atenção no SUS.
A Norma Operacional da Assistência à Saúde – NOAS-SUS 01/2001 (MS,
2001) regulamentou as diretrizes gerais para a organização regionalizada da
assistência à saúde no Brasil. Com base em sua segunda edição, NOAS/SUS 01/2002
(MS, 2002), os ajustes entre o Ministério da Saúde e os demais níveis de governo
consideraram as prioridades assistenciais de cada estado, considerando também as
regiões e microrregiões definidas no Plano Diretor de Regionalização da Saúde
(PDR).
Plano Diretor de Regionalização: instrumento de ordenamento do processo de
regionalização da assistência em cada estado e no Distrito Federal, baseado nos
objetivos de definição de prioridades de intervenção coerentes com as
necessidades de saúde da população e garantia de acesso dos cidadãos a todos os
níveis de atenção (MS, 2002).
Segundo GUIMARÃES (2005), as regiões de saúde devem ser organizadas
tendo como referência os municípios-sede capazes de ofertar um conjunto de ações
de média complexidade para a sua própria população e para a população dos
municípios a ele adscritos.
A regionalização solidária da assistência à saúde foi estabelecida como eixo
da descentralização no “Pacto pela Saúde”, proposto pelas portarias GM nº 399/06
(MS, 2006a) e nº 699/06 (MS, 2006b). Segundo SOLLA (2006), a proposta
estabelecida nesses instrumentos normativos não conseguiu ir além do já definido
pela NOAS, porquanto somente criou um mecanismo de gestão regional, com
participação dos gestores municipais e do gestor estadual.
Apesar do esforço institucional de buscar soluções para gerar integralidade
na assistência à saúde da população, ao criar regiões de saúde para um melhor
aproveitamento da oferta de serviços, a demanda cresceu e, com ela, os desafios para
18
proporcionar equidade no acesso. Esse contexto favoreceu o argumento a favor da
utilização de ferramentas de gestão, tais como as Centrais de Regulação
(EVANGELISTA, 2008), instrumento já previsto na NOAS 01/2001 (MS, 2001) e
retomado pelo Pacto pela Saúde, em 2006 (MS, 2006a).
Conforme citado anteriormente, o planejamento da rede regionalizada de
saúde utiliza como uma de suas ferramentas a PPI. Esse instrumento ajuda a
organizar a rede, conferindo-lhe visibilidade e formalizando os fluxos de referência
estabelecidos entre os gestores municipais e o gestor estadual, além de ser a base
para distribuição, entre os municípios, dos recursos federais transferidos para os
estados. Assim, a PPI da assistência à saúde deveria fornecer subsídios para o
processo de regulação do acesso aos serviços de saúde.
Por outro lado, os complexos regulatórios de acesso configuram-se como
uma das ferramentas de excelência para o monitoramento dos pactos firmados, que
consiste no conjunto de atividades que buscam acompanhar rotineiramente a
execução física e financeira das ações e dos fluxos pactuados naquele instrumento de
gestão (MS, 2006c). Esse mecanismo de retroalimentação, proporcionado pelos
dados gerados pelo processo de regulação da assistência, poderia viabilizar o ajuste
da programação pactuada de tal forma que o planejamento da distribuição dos
recursos e da conformação dos fluxos assistenciais não ficassem distantes da
realidade.
Nesse contexto, na perspectiva de fortalecer o processo de regionalização,
hierarquização e integração das ações e serviços de saúde, estabelecido por normas
operacionais, foi instituída a Política Nacional de Regulação do Sistema Único de
Saúde pela Portaria GM/MS nº 1.559/08 (MS, 2008). A relevância das ações de
regulação está expressa no objetivo dessa política, que busca orientar uma produção
eficiente, eficaz e efetiva de ações de saúde, de forma a contribuir para a melhoria do
acesso, integralidade, resolutibilidade e humanização dessas ações e proporcionar ao
usuário do SUS uma melhor oferta das ações públicas voltadas à saúde.
Segundo o inciso III do artigo 2º da referida Portaria, a regulação do acesso
à assistência tem, dentre seus objetos, a priorização do acesso e dos fluxos
assistenciais no âmbito do SUS, baseado em protocolos, classificação de risco e
demais critérios de priorização.
19
Regulação do Acesso à Assistência: também denominada regulação do acesso ou
regulação assistencial, tem como objetos a organização, o controle, o
gerenciamento e a priorização do acesso e dos fluxos assistenciais no âmbito do
SUS, e como sujeitos seus respectivos gestores públicos, sendo estabelecida pelo
complexo regulador e suas unidades operacionais e esta dimensão abrange a
regulação médica, exercendo autoridade sanitária para a garantia do acesso
baseada em protocolos, classificação de risco e demais critérios de priorização
(MS, 2008).
As atividades diárias praticadas pelas Centrais de Regulação – unidades
operacionais do Complexo Regulador –, quais sejam as ações de regulação, são
definidas pelo processamento da demanda da solicitação de procedimentos. Para o
acesso aos serviços disponibilizados pelas Centrais, deveriam ser consideradas, além
de questões clínicas, o cumprimento de protocolos estabelecidos para oferecer a
alternativa assistencial mais adequada a cada caso. Os protocolos clínicos tratam da
forma de intervenção por patologia, para subsidiar as decisões terapêuticas. Enquanto
que os protocolos operacionais pretendem ordenar o fluxo de pacientes entre os
níveis de complexidade, definindo os limites resolutivos de cada um deles (MS,
2006d).
O acesso à assistência de saúde é um conceito que varia entre autores com
relação ao enfoque adotado (TRAVASSOS e MARTINS, 2004). Para
PENCHANSKY e THOMAS (1981), o acesso a serviços de saúde representa um
conjunto de dimensões específicas que descrevem a relação entre clientes e o sistema
de cuidados de saúde. Nesta pesquisa, foram utilizadas, na análise dos dados, as
dimensões que tratam sobre a disponibilidade de serviços, bem como sua
acessibilidade para o usuário do SUS.
Disponibilidade – relação entre o volume e o tipo de serviços (e recursos)
existentes e o volume e tipo de necessidade dos clientes;
Acessibilidade – relação entre a localização do serviço e a localização dos
clientes, considerando-se os recursos necessários ao transporte dos clientes,
tempo de viagem, distância e custo (PENCHANSKY e THOMAS, 1981).
Ao pesquisar na literatura a respeito de trabalhos que tratam da atuação das
Centrais de Regulação no SUS, percebeu-se a existência de poucas referências sobre
esse assunto. Apesar disso, pode-se citar, além de um estudo de caso sobre a Central
de Marcação de Consutas da Grande Florianópolis (LOCKS, 2002), estudos recentes
20
que também tiveram como foco algumas Centrais de Regulação no país
(FERREIRA, 2007, TORRES, 2007, EVANGELISTA et al., 2008, e SILVA, 2008).
LOCKS (2002) buscou a identificação das causas do “estrangulamento” das
consultas especializadas na Central de Marcação de Consultas da Grande
Florianópolis, no período de 1998 a 2000. Ao analisar a oferta dessas consultas
perante a demanda, a autora verificou que, em pelo menos metade das
especialidades, há um déficit, sendo as prováveis causas a falta de profissionais ou
sua baixa produção. A autora destacou que a Central deveria ser utilizada pelos
gestores estaduais como fonte de informação a respeito da real necessidade dos
usuários. Dessa maneira, esses parâmetros assistenciais funcionariam como uma
espécie de instrumento de regulação para ajustar as deficiências do sistema de saúde.
FERREIRA (2007) avaliou a repercussão da implantação do Complexo
Regulador do Sistema Público Municipal de Serviços de Saúde para a rede de
atenção de Ribeirão Preto-SP. A autora analisou a gestão e o nível operacional do
Complexo Regulador, mostrando que o Complexo Regulador provocou alterações
positivas na acessibilidade e na equidade da rede de atenção em saúde local.
Destacou-se o potencial da regulação como ferramenta estratégica para a avaliação e
a gestão do sistema de saúde. No entanto, para que haja uma maior contribuição por
parte do Complexo Regulador ao SUS seria necessário maior investimento na
divulgação de suas práticas e no aperfeiçoamento de suas atividades.
TORRES (2007) realizou estudo de caso descritivo com abordagem
qualitativa, com o objetivo de compreender o funcionamento da regulação dos leitos
hospitalares no Sistema Único de Saúde na cidade do Salvador-BA, de acordo com a
percepção dos funcionários da Central Estadual de Regulação. O estudo pretendeu,
ainda, identificar as dificuldades enfrentadas pelos profissionais dessa Central ao
viabilizar o serviço de acordo com as necessidades dos usuários Os resultados
obtidos evidenciaram que os gestores dessa Central de Regulação passam por
dificuldades relacionadas à sua organização e funcionamento. Dentre eles, o
quantitativo insuficiente de leitos hospitalares e as deficiências de especialidades
prejudicam o grau de disponibilidade de serviços de saúde para o usuário do sistema.
A autora concluiu que, apesar de os seus profissionais conviverem com limitada
autonomia e com escassez de recursos, a Central Estadual de Regulação tenta
21
facilitar o acesso dos pacientes aos serviços de saúde, na tentativa de consolidar a
proposta do SUS de assegurar os princípios de universalidade, integralidade e
equidade na assistência à saúde.
EVANGELISTA et al. (2008) estudaram as características de acesso às
internações por doenças isquêmicas do coração realizadas pelo Sistema Único de
Saúde, em 2002, mediante atuação da Central de Internações de Belo Horizonte-MG.
Os autores verificaram que a maioria das internações (75,1%) ocorreu diretamente
nos hospitais, sem intermediação da Central de Internação. O estudo mostrou
diferenças nas características das internações realizadas pelas duas vias de acesso. A
via direta foi mais utilizada por pacientes com idade maior ou igual a 70 anos,
internados por insuficiência coronariana aguda, na clínica cirúrgica e no fim de
semana. Já as internações viabilizadas pela Central de Internação foram mais
acessadas por residentes em outros municípios, em hospitais não públicos e com
utilização de UTI. O número de dias de internação também foi diferente entre as
vias.
SILVA (2008) avaliou a Central de Regulação da Segunda Microrregional
de Saúde do Estado do Ceará no atendimento à demanda do cidadão nos atributos de
eficiência, eficácia, integralidade e hierarquização dos serviços, sob a perspectiva da
Política Nacional de Regulação. Ao analisar as atividades de regulação dessa
microrregional, observou que os gestores locais não planejam suas ações e
desconhecem os parâmetros de necessidades dos usuários; não há avaliação dos
procedimentos programados diante dos que foram efetivamente produzidos; os
gestores desconhecem a capacidadede de oferta de serviços da rede assistencial; e em
algumas Secretarias de Saúde não há ações de controle, avaliação e auditoria para
subsidiar o setor de regulação. Concluiu que a regulação não viabiliza a otimização
dos serviços de referência disponíveis para os usuários de acordo com suas
necessidades.
No que concerne ao Estado de Mato Grosso, ressalta-se estudo de caso
sobre as práticas regulatórias no SUS, sob a perspectiva do usuário. SANTOS (2008)
analisou o itinerário percorrido por um morador da cidade de São José do Rio
Claro/MT para buscar cuidados diante de uma emergência cardiocirculatória. Pode-se
captar a influência que as redes de contato informais do usuário exerceram sobre o
22
itinerário terapêutico, pois, mesmo diante do insucesso no encaminhamento oficial do
paciente por parte da unidade de saúde de seu município, o usuário foi transportado
para o Hospital Pronto-Socorro de Cuiabá. Em que pese o paciente ter dado entrada
nessa unidade, teoricamente considerada como porta de entrada para o sistema
regulatório, a sua inserção no mecanismo regulador não se concretizou. Procedimento
que, certamente, sobrecarrega a capital, além de comprometer a estratégia de
regionalização da saúde, uma vez que, pelo fluxo, o usuário do sistema deveria ser
encaminhado para a Regional de Diamantino. Não obstante as limitações do estudo de
um caso foi evidenciada a discrepância entre o que está formalmente estruturado e o
que acontece na prática. Percebeu-se que, frente à falta de eficiência do sistema
regulatório, o paciente busca alternativas para ser atendido. A distância a ser
percorrida pelo usuário e a demora no procedimento regulatório significam riscos para
o estado de saúde do paciente que poderiam ser diminuídos se houvesse uma perfeita
integração entre os diferentes níveis de atenção. A autora constatou ações
fragmentadas, medicamente centradas e pontuais, o que vai de encontro a qualquer
princípio de integralidade que se possa conceber. A pesquisadora chamou a atenção
para a importância de os formuladores de política compreenderem a lógica do usuário
para ajustar o modelo de atenção à sua realidade.
OLIVEIRA (2006) buscou descrever e analisar o funcionamento da Central
de Regulação da região Sul de Mato Grosso. A autora concluiu que esse tipo de órgão
é um novo instrumento de gestão, cujo objetivo é fortalecer o sistema de saúde
público. Contudo, ela percebeu que a Central de Regulação estudada apresentou
algumas fragilidades na sua interação com os serviços de saúde e com os gestores.
No que tange ao conceito sobre regulação, SANTOS e MERHY (2006)
definiram o termo como a capacidade de intervir nos processos de prestação de
serviços, alterando ou orientando a sua execução. Pode ser feita por intermédio de
mecanismos indutores, normalizadores, regulamentadores ou restritores. A
intervenção entre a demanda e a prestação direta dos serviços, nos seus diversos
aspectos, pode ser caracterizada como mecanismo de regulação, o qual pode se dar
tanto do ponto de vista do acesso cotidiano das pessoas – microrregulação, quanto no
aspecto das definições das políticas mais gerais das instituições – macrorregulação.
Esta última consiste nos mecanismos mais estratégicos de gestão, quais sejam:
23
planejamento das ações, controle, orçamento, relações com outras políticas sociais e
estabelecimento de regras para as relações com o setor privado na saúde.
A microrregulação ou regulação assistencial se materializa no cotidiano da
operação do sistema, com base nas regras gerais estabelecidas na macrorregulação.
Consiste em articular e conjugar as respostas potenciais do sistema, para o conjunto
dinâmico das demandas das populações, operacionalizando o acesso aos serviços.
Implica, também, avaliar o que foi planejado e, assim, dotar a gestão de uma
inteligência face à quantidade de informações geradas nesse mecanismo (SANTOS e
MERHY, 2006).
No presente estudo, o foco foi a microrregulação. Assim, buscou-se o
entendimento da concepção prática da ação regulatória, cuja definição teórica é o
processo de operacionalização, monitoramento e avaliação da solicitação de
procedimentos, realizada por um profissional de saúde, sendo observados, além das
questões clínicas, o cumprimento de protocolos de regulação estabelecidos para
disponibilizar a alternativa assistencial mais adequada a cada caso (MS, 2006d).
Pretendeu-se analisar o mecanismo de regulação, enfatizando as práticas dos
atores envolvidos no processo de regulação. Vários aspectos foram abordados, entre
os quais se destaca o entendimento sobre os critérios de priorização para
encaminhamento dos pacientes, bem como para a escolha dos prestadores de
serviços, no âmbito do processamento regulatório da demanda.
Foi realizada, também, a análise do acesso aos serviços disponíveis de
cirurgias eletivas na especialidade de ortopedia, a título de exemplo, em
contraposição às demandas por essas internações, por parte dos municípios do
interior e da capital, e as respostas a esses pedidos dadas pela Central de Regulação
de Cuiabá-MT, desde janeiro de 2008 até julho de 2010.
Buscou-se, ainda, o entendimento de como os dados da PPI estavam
inseridos no processamento da demanda por serviços de saúde, bem como a
apreensão da existência de um mecanismo de retroalimentação dessa ferramenta de
pactuação pela Central de Regulação de Cuiabá/MT. Assim, esperou-se agregar à
análise a verificação da sintonia entre o planejamento e a execução das ações de
saúde no estado.
24
2. OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Analisar o mecanismo de regulação, o seu fluxo e o processamento da
demanda por procedimentos eletivos realizados pela Central de Regulação de
Cuiabá-MT.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Contextualizar a Central de Regulação de Cuiabá no Complexo Regulador
de Mato Grosso;
Caracterizar os critérios adotados pela Central de Regulação de Cuiabá para
priorização de encaminhamento dos pacientes e seleção da instituição provedora do
serviço, bem como os fluxos de acesso e atendimento dos usuários.
Caracterizar as demandas por cirurgias eletivas na especialidade de
ortopedia e as respostas dadas pela Central de Regulação de Cuiabá-MT desde
janeiro de 2008.
Verificar se as informações geradas pela Programação Pactuada e Integrada
são consideradas no processamento dos pedidos, por parte da Central de Regulação
de Cuiabá-MT.
Comparar os critérios e procedimentos praticados pela Central de Regulação
de Cuiabá frente às normas delineadas pelo Ministério da Saúde e aos princípios
constitucionais do Sistema Único de Saúde.
25
3. MÉTODOS
Segundo DESLANDES e GOMES (2004), quando a organização interna
dos grupos e as lógicas que sustentam suas práticas é o objeto de pesquisa, o foco do
trabalho se constitui na apreensão dos costumes, ritos, suas normas e hierarquias, as
interações de seus membros, dentre outros aspectos.
Nesse contexto, o presente estudo tem como predominância a abordagem
qualitativa, uma vez que a mais relevante fonte de dados foi a perspectiva dos
dirigentes e técnicos da Central de Regulação sobre o processamento da demanda por
procedimentos eletivos. De acordo com DESLANDES e ASSIS (2002), apesar de
haver grande diversidade nesse tipo de investigação, existe o propósito comum em
analisar o significado atribuído pelos sujeitos aos fatos, às relações e às práticas,
avaliando tanto as interpretações, quanto as práticas dos sujeitos.
Considerando os diferentes desenhos metodológicos desse tipo de
investigação, destaca-se o estudo de caso por permitir a exploração das
peculiaridades dessa Central de Regulação, sem que haja preocupação com
generalizações para outras instituições similares no país. Cabe ressaltar, como
limitação, que cada estudo é, em última instância, uma aproximação da realidade do
caso (DESLANDES e GOMES, 2004). O estudo de caso possibilita análise com
profundidade sobre alguns aspectos do objeto de investigação (YIN, 2005).
Além disso, buscaram-se dados quantitativos para caracterizar os serviços
disponíveis de cirurgias eletivas na especialidade de ortopedia, a título de exemplo,
bem como as demandas por esses serviços por parte dos municípios do interior e pela
capital e as respostas dadas pela Central de Regulação de Cuiabá-MT, desde janeiro
de 2008 até julho de 2010. Todavia, não foram realizadas análises das variáveis
quanto a sua tendência central ou dispersão. Esses dados compuseram uma
triangulação de informações com o intuito de dar maior subsídio à análise e maior
consistência aos achados da pesquisa.
26
Portanto, o presente estudo consistiu em uma investigação qualitativa a
respeito do mecanismo de regulação adotado pela Central de Regulação de Cuiabá-
MT. As dimensões e as categorias analíticas do estudo estão expostas no quadro 1.
Quadro 1: Dimensões e categorias analíticas do estudo.
Dimensões Categorias analíticas (preliminares)
Concepções de regulação
Critérios de priorização e risco ligados à demanda dos pacientes.
Critérios de encaminhamento para os prestadores de serviços.
Utilização dos dados gerados pelo mecanismo de regulação no
planejamento do SUS no estado.
Acessibilidade
Caracterização das demandas.
Identificação do atendimento das demandas.
Disponibilidade Caracterização dos serviços disponíveis.
Uma das principais características dos métodos qualitativos é
compreender a visão do grupo pesquisado. Trabalhou-se com elevado número de
questões, dirigidas a um grupo pequeno de pessoas, o qual foi escolhido de acordo
com critérios previamente definidos conforme os objetivos do estudo. Para que seja
feita a escolha, é necessário um conhecimento prévio do contexto a ser investigado
(VICTORA et al., 2000).
A pesquisa foi realizada nas instalações da Central de Regulação de
Cuiabá e seu universo empírico contou, principalmente, com pessoas envolvidas no
fluxo interno do processo de regulação dos pedidos de cirurgias eletivas. Esse setor
foi escolhido devido à oferta de serviços ser inferior à correspondente demanda, fato
que exige um mecanismo qualificado de regulação. Entrevistaram-se todos os
profissionais previamente definidos. Os relatos promovidos pelos informantes, com
base nos conteúdos previstos nas entrevistas semi estruturadas (quadro 2), foram
destacados em todo o texto desta dissertação e referenciados de acordo com a função
27
dos entrevistados na Central de Regulação (dirigente – D; técnico de regulação – T; e
médico regulador – M).
Buscou-se apreender as diferentes percepções dos entrevistados sobre as
práticas e atividades, no âmbito da Central de Regulação, pertinentes às categorias e
dimensões definidas na pesquisa, conforme sugerido por VICTORA et al. (2000) e
DESLANDES e GOMES (2004). Os dados foram coletados nos meses de junho a
agosto de 2010.
3.1 COLETA E ANÁLISE DE DADOS
A aceitação do pesquisador por parte dos sujeitos investigados é
fundamental para a qualidade do dado obtido. Por isso, é importante que o
pesquisador planeje a sua entrada no local da pesquisa de forma cuidadosa
(VICTORA et al., 2000). Inicialmente, houve uma exposição dos objetivos e fases da
pesquisa aos dirigentes da Diretoria de Regulação, Controle e Avaliação – DRAC.
Em seguida, procurou-se compreender, da maneira mais abrangente
possível, a forma de organização da Central de Regulação de Cuiabá. Assim,
utilizou-se dois tipos de dados: os primários, advindos das entrevistas e observações,
e os secundários, documentos produzidos pela Secretaria Municipal de Saúde de
Cuiabá, pela própria Central de Regulação, pelo Tribunal de Contas da União, entre
outros, apresentados nos quadros 2 e 3.
Cabe destacar que os documentos fornecidos pela Secretaria Municipal de
Saúde de Cuiabá não proporcionaram muitas informações sobre a Central de
Regulação. Além disso, observou-se que certos dados solicitados à DRAC não foram
apresentados, pois não estavam normatizados por essa Diretoria, tais como os
protocolos de regulação.
No âmbito da pesquisa social, quando o estudo de caso é feito sobre uma
organização, esse objeto é geralmente estudado a partir de observação participante e
entrevistas (DESLANDES e GOMES, 2004).
28
Quadro 2: Instrumentos de coleta de dados primários.
DADOS PRIMÁRIOS
Procedimentos Instrumentos Conteúdo Fonte dos
dados
Entrevista
estruturada
Formulário com
perguntas
fechadas
Dados demográficos e ocupacionais
Dirigentes do
órgão, técnicos
e médicos
reguladores
Entrevista semi
estruturada
Roteiro
temático
- Concepções sobre microrregulação.
- Descrição do procedimento de regulação:
Fluxos internos (ênfase nos técnicos);
Critérios de priorização do atendimento dos
pacientes (ênfase nos médicos reguladores); e
Critérios utilizados para seleção dos
prestadores de serviço (ênfase nos médicos
reguladores).
- Formas de organização e do processo de decisão da
Central de Regulação.
- Acompanhamento dos resultados e avaliação dos
dados produzidos pelo mecanismo regulatório (ênfase
nos dirigentes).
- Utilização pela Central de Regulação dos dados da
PPI no processamento do pedido (ênfase nos médicos
reguladores);
- Identificação dos aspectos facilitadores e dos
obstáculos no âmbito do mecanismo regulatório.
- Pontos fortes e fracos do processo de regulação.
- Mecanismos de interação com outras instâncias
políticas e institucionais (ênfase nos dirigentes).
Dirigentes do
órgão, técnicos
e médicos
reguladores
Observações e
anotações de
campo
Diário de campo
Registro de conversas informais, observações e
reflexões que permitam:
- identificar fatores que facilitam ou dificultam o
fluxo da informação nesse processo;
- perceber como é feito o processamento das
demandas; e
- fotografias do local de trabalho.
Observação dos
elementos ou
situações no
contexto
29
Quadro 3: Instrumentos de coleta de dados secundários.
DADOS SECUNDÁRIOS
Procedimentos Instrumentos Conteúdos Fonte dos
dados
Coleta de documentos Solicitação
formal
- Organograma e Fluxograma da Central de
Regulação;
- Regimento Interno da Secretaria Municipal de
Saúde de Cuiabá-MT;
- Plano de Trabalho Anual da Secretaria Municipal
de Saúde de Cuiabá-MT;
- Relatório de Gestão da Secretaria Municipal de
Saúde de Cuiabá-MT; e
- Acórdão TCU nº 1189/2010-P e 635/2010-P.
DRAC,
SMS
Cuiabá e
TCU.
Coleta de informações
produzidas por acesso
ao banco de dados da
Central de Regulação
Solicitação
formal
- Dados a respeito das demandas, nos anos de 2008
e 2009, por cirurgias eletivas na especialidade de
ortopedia, a título de exemplo, provenientes dos
municípios do interior e da capital e as respostas
dadas pela Central de Regulação até julho de 2010.
Banco de
dados do
sistema
AGHOS
(DRAC).
Quanto ao primeiro instrumento, pretendeu-se acompanhar e observar, por
um certo período, as atividades da Central de Regulação, especialmente as práticas
da Gerência de Cirurgias Eletivas. Buscou-se, com isso, descrever e compreender o
processo de regulação dos pedidos de cirurgias eletivas nas instalações da Central de
Regulação de Cuiabá-MT.
Já no que tange às entrevistas, foram solicitadas informações sobre como
funcionam os diferentes setores, as atividades desenvolvidas, os processos decisórios
e as responsabilidades profissionais dos segmentos estudados (Apêndice 2). Elas
foram conduzidas em uma sala disponibilizada pela Direção do órgão para permitir
um melhor registro das conversas e para proporcionar um ambiente reservado para o
entrevistado.
Em relação à analise documental, foram buscados documentos que tratavam
sobre a organização e o funcionamento da Central, bem como relatórios de auditoria
sobre o desempenho operacional desse órgão, que poderiam ajudar a entender o
contexto no qual se insere a Central de Regulação de Cuiabá.
30
Com base no acompanhamento do fluxo de regulação e entrevistas foi
construído um Mapa de Processo. Essa metodologia, empregada em auditorias de
natureza operacional (TCU, 2010a), permitiu a visualização diagramática das etapas
de um determinado processo de trabalho e facilitou a análise de possíveis pontos de
entrave na obtenção do resultado final, no caso o acesso do paciente à vaga
necessária.
Além disso, dados provenientes do processamento da demanda por cirurgias
ortopédicas permitiram exemplificar a disponibilidade de serviços, bem como a
acessibilidade às vagas para os usuários do SUS em Mato Grosso. Foram trabalhadas
informações do banco de dados fornecidas pelo sistema informatizado de regulação
(AGHOS) da Central de Regulação de Cuiabá. As informações referem-se aos
pedidos, por esse tipo de cirurgia, efetuados nos anos de 2008 e 2009, bem como o
seu respectivo atendimento, no período de janeiro de 2008 a julho de 2010.
As entrevistas semi-estruturadas foram gravadas e posteriormente
transcritas. Os registros de conversas informais, observações e reflexões foram feitos
no diário de campo eletrônico. Além disso, os dados básicos de cada sujeito
envolvido na pesquisa foram inseridos nesse arquivo. Algumas fotografias também
fazem parte desse banco de dados, como sugerido por VICTORA et al. (2000). Os
documentos colhidos foram organizados em pastas apropriadas e replicados
eletronicamente para compor o diário de campo eletrônico.
À medida que os dados foram coletados, realizou-se uma primeira
sistematização das informações. Tratava-se de uma composição das informações de
diferentes origens, consistindo uma parte intermediária entre a coleta e a análise final
dos achados.
Os dados das entrevistas foram trabalhados consoante adaptação da análise
temática de conteúdo. Essa análise baseia-se no conteúdo mediante condições
empíricas do texto, estabelecendo categorias para sua interpretação (CAREGNATO
e MUTTI, 2006). Assim, procurou-se descobrir os núcleos de sentido que compõem
uma comunicação, cuja presença ou frequência signifiquem alguma coisa para o
objeto visado (MINAYO, 1992).
A utilização de todos esses dados tem respaldo na proposta de triangulação
das informações, com o intuito de dar maior consistência à análise do objeto dessa
31
pesquisa, de acordo com VICTORA et al. (2000) e MERCADO-MARTÍNEZ e
BOSI (2004).
3.1.1 Questões Éticas
As pessoas que participaram do estudo foram abordadas a respeito de suas
atividades no mecanismo de regulação delimitado neste trabalho. As informações
pessoais obtidas nas entrevistas são sigilosas. Foram solicitados consentimentos para
participação no estudo, os quais estão registrados em Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (Apêndice 1), que contém informações sobre os objetivos deste
trabalho e os procedimentos desenvolvidos, de acordo com as normas de pesquisas
com seres humanos da Resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde (CNS, 1996).
O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética do Hospital
Universitário Júlio Müller-UFMT, credenciado pela Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa do Ministério da Saúde, em abril de 2010, mediante o protocolo número
784/CEP-HUJM/10. O referido projeto recebeu aprovação final por esse pleno em
14/4/2010.
3.1.2 Limitações da Pesquisa
Além das limitações atinentes a um estudo de caso, das quais se pode
destacar a impossibilidade de generalizar as conclusões para outras Centrais de
Regulação, ressalta-se que a pesquisa ampara-se na experiência de dirigentes e
técnicos da instituição estudada sobre o mecanismo regulatório.
Não houve, nesse estudo, a intenção de buscar a percepção dos dirigentes e
médicos vinculados ao setor conveniado ao SUS, nem dos usuários do sistema, sobre
os diferentes fatos apresentados sobre a Central de Regulação de Cuiabá.
32
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
4.1 COMPLEXO REGULADOR EM MATO GROSSO
A Política Nacional de Regulação do Sistema Único de Saúde (MS, 2008),
instituída pelo Ministério da Saúde em 2008, estabeleceu que todas as unidades da
federação devam implantar tal política como instrumento que possibilite a plenitude
das responsabilidades sanitárias assumidas pelas esferas de governo.
Entretanto, o Estado de Mato Grosso, desde 1998, já havia iniciado a
organização de suas Centrais de Regulação. O Sistema Estadual de Referência e
Contra-Referência para Atenção à Saúde em Mato Grosso foi criado mediante
Resolução CIB Nº 21, de 05/06/98. A consolidação das Centrais de Regulação,
subprojeto desse sistema, pretendia obedecer à lógica da regionalização do Sistema
de Saúde, tanto que a regulação deveria estar fortemente articulada e integrada à
Programação Pactuada e Integrada – PPI (SCHRADER, 2002).
Segundo SCHRADER (2002), o complexo regulador do Estado de Mato
Grosso deveria responder de forma sistemática às demandas de saúde em seus
diferentes níveis e etapas do processo de assistência, facilitando o acesso do usuário
aos serviços do SUS, centralizando os encaminhamentos para o atendimento,
evitando duplicidade e paralelismos de ações. Nesse sentido, entendeu-se que uma
Central de Regulação, sob a égide do interesse social e coletivo, deveria ordenar,
regular e definir o acesso à atenção à saúde, devendo fazê-lo de forma rápida,
qualificada e integrada.
Especificamente, as Centrais de Regulação em Mato Grosso deveriam
atingir os seguintes objetivos:
Promover a regulação dos serviços do SUS, de forma a integrar a atenção, a
promoção, a prevenção, o tratamento, a reabilitação e a hierarquização dos níveis
de complexidade no atendimento ao usuário, ou seja, ter a porta de entrada do
33
sistema organizada pela atenção básica, via modelo de saúde da família e pela
urgência e emergência;
Estruturar o fluxo entre os três níveis de assistência hospitalar e ambulatorial de
complexidade e de referência e contra-referência, com base na proposta da PPI,
entendendo-se como nível primário, a atenção básica, como nível secundário, as
especialidades e serviços de apoio e diagnóstico de média complexidade e o
nível terciário, como a rede hospitalar e os serviços de alta complexidade;
Garantir também a contra-referência, com fluxos e encaminhamentos orientados
ao usuário e ao seu domicílio, na atenção básica;
Propor e acompanhar os contratos e convênios, em conjunto com os serviços de
controle e avaliação e gerenciar a oferta de serviços, quantitativa e
qualitativamente, no processo de PPI;
Estimular a participação do usuário, no sentido de torná-lo um parceiro
informado dos seus direitos e deveres, ativo e influente na melhoria do
atendimento que recebe;
Humanizar o atendimento nas Centrais, treinando e acompanhando,
permanentemente, os funcionários que trabalham diretamente com o usuário
(SCHRADER, 2002).
Antes da formalização do complexo regulador estadual, em abril de 1993,
foi criada a Central de Vagas no Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá –
HPSM. Nesse período, as normas e o fluxo para efetuação das internações
hospitalares de urgência e emergência foram estabelecidos. Ela deveria servir de
centro de orientação de referências aos diversos municípios do estado. A partir de
1996, a Central de Vagas se instalou no prédio do Centro de Especialidades Médicas
(CEM), onde funcionou até 2001, quando ocorreu a mudança para a nova sede da
Central de Regulação Estadual de Cuiabá (CALLEJAS, 2008).
O complexo regulador da assistência à saúde foi instituído mediante a
Portaria SES/MT nº 183, de 27/12/2002, definindo como instrumentos gerenciais e
operacionais o Plano Diretor de Regionalização – PDR; a Programação Pactuada e
Integrada – PPI; o Cadastro de Estabelecimentos de Saúde; o Sistema de
Informações Ambulatoriais – SIA e Sistema de Informações Hospitalares – SIH; os
convênios e contratos de prestação de serviços estabelecidos entre os municípios e o
Estado de Mato Grosso, dependendo do nível de habilitação de cada um, e o
Cadastro Nacional de Usuários do SUS (CALLEJAS, 2008).
O Complexo Regulador de Mato Grosso, formado em 2002 pela Central
Estadual de Regulação do SUS (CER/SUS) de Cuiabá, Centrais Regionais e Centrais
Municipais, foi concebido e implementado pela SES/MT, em parceria com os
municípios, com a missão de facilitar o fluxo do usuário em todo o estado.
34
Em 2010, existiam em Mato Grosso mais de cem Centrais de Regulação,
instaladas nas Secretarias Municipais de Saúde, as quais encaminham pacientes para
as cidades de maior porte, de acordo com os ajustes estabelecidos nas Regiões de
Saúde. Esse denso número de Centrais Municipais de Regulação está em sintonia
com a política apoiada pela Coordenação Geral de Regulação e Avaliação do
Ministério da Saúde, que consiste na existência de Centrais nos municípios que
possuam serviços especializados. Em decorrência disso, a região Centro-Oeste é a
que possui o maior número de Centrais de Regulação no país (TCU, 2010c).
O gerenciamento das Centrais Regionais é de responsabilidade da SES/MT,
em parceria com o órgão local, podendo ser o Consórcio Intermunicipal de Saúde de
Municípios ou a Secretaria Municipal local. Desde 2003, há uma pressão dos órgãos
de controle sobre a SES/MT a fim de minimizar os problemas gerenciais enfrentados
pelos municípios do interior do estado na área da saúde. A partir dessa época, o
Estado de Mato Grosso procurou desenvolver a descentralização da regulação dos
serviços de saúde (SANTOS, 2008).
Atualmente, existem dezesseis Centrais Regionais, uma ligada a cada
Escritório Regional de Saúde (Anexo 1).
As Centrais Regionais regulam as demandas oriundas dos municípios sob sua
jurisdição, sendo de sua responsabilidade: a) o recebimento dos pedidos de
exames e procedimentos de alta complexidade; b) a regulação daquilo que é
possível executar dentro da região jurisdicionada; c) o encaminhamento daquilo
que não é possível ser feito nesse local à Central Municipal de Regulação de
Cuiabá, que fará a regulação; e d) realização de uma espécie de filtro inicial das
urgências e emergências. Se for possível o atendimento em hospitais da região,
essas centrais impedem o deslocamento dos usuários para a capital (TCU,
2010b).
No caso de Cuiabá, a administração e o gerenciamento conjunto da
CER/SUS entre a SES/MT e a SMS de Cuiabá, por meio da Portaria SES/MT nº 4 de
2002, foi considerado um modelo inovador de gestão. Sua atuação, em 2002,
abrangia a regulação das seguintes áreas: sistemas de transplantes; serviços de apoio
diagnóstico-terapêutico de média e alta complexidade; leitos hospitalares ou vagas;
consultas especializadas; urgência e emergência; retaguarda ambulatorial e
tratamento fora do domicílio; e apoio e informação ao usuário (SCHRADER, 2002).
Assim, a co-gestão da Central Estadual de Regulação de Cuiabá entre o
35
Estado de Mato Grosso e a capital provocou melhora no monitoramento e no
controle dos contratos com os prestadores de serviços privados. Além disso, a gestão
estadual preconizava, nessa época, uma política de consolidação do Programa Saúde
da Família na atenção básica e o fomento à regionalização e interiorização do
cuidado especializado à saúde mediante apoio aos consórcios intermunicipais e aos
hospitais regionais, o que poderia proporcionar um contexto favorável para o bom
funcionamento do complexo regulador estadual (SPINELLI et al., 2008).
Contudo, a partir de 2003, iniciou-se um processo de desarticulação e de
ruptura com a política que vinha sendo implantada anteriormente pelo setor, com alta
rotatividade de secretários de estado de saúde e marcada centralização das decisões
na SES. Outro fato relevante foi a priorização do investimento na atenção
especializada em detrimento ao estímulo à atenção básica (SPINELLI et al., 2008).
Em 2007, o cenário era de crise no SUS Cuiabá: rotatividade dos gestores,
racionalização da oferta de serviços especializados, desarticulação entre a direção da
Secretarias de Saúde e suas equipes técnicas e precariedade dos vínculos
empregatícios da maioria dos funcionários da saúde municipal (SPINELLI et al.,
2008).
O contexto de turbulência política contribuiu para que, em 2009, houvesse a
saída da Secretaria de Estado de Saúde da gestão da Central de Regulação de Cuiabá.
O estado passou a assumir, separadamente, a responsabilidade pela gerência das
Casas de Apoio, da regulação dos transplantes e dos Tratamentos Fora de Domicílio
– TFD. Estas duas últimas atividades passaram a ser exercidas no âmbito de uma
nova Central Estadual de Regulação.
No momento, a Central de Regulação da capital está sob a gestão da
Diretoria de Regulação Controle e Avaliação, subordinada à Secretaria de Saúde
Municipal de Cuiabá, e sua atividade abrange o controle das vagas de cirurgias
eletivas, tratamento oncológico, exames e procedimentos de média e alta
complexidade, consultas especializadas, além de urgências e emergências (D2).
Atualmente, a Central Estadual de Regulação, administrada pela SES/MT,
tem papel importante na regulação dos casos de urgência e emergência provenientes
do interior do estado. Ela recebe a demanda para esse tipo de assistência,
principalmente das Centrais Regionais, quando não é possível acolher o paciente na
36
região de saúde em que o paciente procura por atendimento. Nessas situações, a
Central Estadual de Regulação avalia a necessidade de remoção desse paciente para
Cuiabá ou para outras regiões de saúde mais próximas do usuário. Caso seja
confirmada a necessidade de transferência desse paciente, essa Central busca a vaga
e coordena o transporte desse paciente para unidade executante da assistência (TCU,
2010b).
Existe um esforço por parte da SES/MT no sentido de desenvolver o
mecanismo regulatório sob responsabilidade das Centrais Regionais. Há um
investimento financeiro, principalmente por parte do Ministério da Saúde, com o
objetivo de modernizar a estrutura dessas Centrais. Está em fase inicial de
implantação um plano para informatizar boa parte da rede de assistência no interior
do estado e para instalação do SISREG III em todo complexo regulador mato-
grossense (TCU 2010b). Caso, esse projeto de modernização das Centrais Regionais
seja concretizado e haja um maior investimento na assistência de média e alta
complexidade nos principais pólos regionais do estado, será dado um importante
passo para a efetivação da regionalização da saúde em Mato Grosso, bem como será
amenizado o excesso de demanda por serviços de saúde na capital.
Existem problemas na comunicação entre a atual Central Estadual de
Regulação e a Central de Regulação de Cuiabá. Os gestores da SES/MT responsáveis
pela regulação estadual, bem como as Centrais Regionais, não têm livre acesso aos
dados do mecanismo regulatório disponíveis no sistema AGHOS, instalado na
Central da capital. Dessa forma, há um prejuízo na integração e agilidade das
informações no complexo regulador (TCU, 2010b).
37
4.2 A CENTRAL DE REGULAÇÃO DE CUIABÁ
A Política Nacional de Regulação do Sistema Único de Saúde, normatizada
pela Portaria GM/MS 1559/08, deve ser implantada em todas as unidades federadas,
respeitadas as competências das três esferas de gestão, como instrumento que
possibilite a estruturação das ações de regulação, controle e avaliação e o
fortalecimento dos instrumentos de gestão do SUS, que garantem a organização das
redes e fluxos assistenciais, provendo acesso equânime, integral e qualificado aos
serviços de saúde (MS, 2008).
As ações de que trata tal política estão organizadas em três dimensões de
atuação, necessariamente integradas entre si:
I - Regulação de Sistemas de Saúde: tem como objeto os sistemas municipais,
estaduais e nacional de saúde, e como sujeitos seus respectivos gestores públicos,
definindo a partir dos princípios e diretrizes do SUS, macrodiretrizes para a
Regulação da Atenção à Saúde e executando ações de monitoramento, controle,
avaliação, auditoria e vigilância desses sistemas;
II - Regulação da Atenção à Saúde: exercida pelas Secretarias Estaduais e
Municipais de Saúde, conforme pactuação estabelecida no Termo de
Compromisso de Gestão do Pacto pela Saúde; tem como objetivo garantir a
adequada prestação de serviços à população e seu objeto é a produção das ações
diretas e finais de atenção à saúde, estando, portanto, dirigida aos prestadores
públicos e privados, e como sujeitos seus respectivos gestores públicos,
definindo estratégias e macrodiretrizes para a Regulação do Acesso à Assistência
e Controle da Atenção à Saúde, também denominada de Regulação Assistencial
e controle da oferta de serviços executando ações de monitoramento, controle,
avaliação, auditoria e vigilância da atenção e da assistência à saúde no âmbito do
SUS; e
III - Regulação do Acesso à Assistência: também denominada regulação do
acesso ou regulação assistencial, tem como objetos a organização, o controle, o
gerenciamento e a priorização do acesso e dos fluxos assistenciais no âmbito do
SUS, e como sujeitos seus respectivos gestores públicos, sendo estabelecida pelo
complexo regulador e suas unidades operacionais e esta dimensão abrange a
regulação médica, exercendo autoridade sanitária para a garantia do acesso
baseada em protocolos, classificação de risco e demais critérios de priorização
(MS, 2008).
De acordo com as diretrizes do Ministério da Saúde, a área técnica da
regulação do acesso deve ser estabelecida por unidades operacionais denominadas
Centrais de Regulação, as quais, em cojunto, formam o Complexo Regulador.
38
Conforme sua organização e estruturação, as atribuições da regulação do acesso
podem ser definidas da seguinte forma:
I - garantir o acesso aos serviços de saúde de forma adequada;
II - garantir os princípios da eqüidade e da integralidade;
III - fomentar o uso e a qualificação das informações dos cadastros de usuários,
estabelecimentos e profissionais de saúde;
IV - elaborar, disseminar e implantar protocolos de regulação;
V - diagnosticar, adequar e orientar os fluxos da assistência;
VI - construir e viabilizar as grades de referência e contra-referência;
VII - capacitar de forma permanente as equipes que atuarão nas unidades de
saúde;
VIII - subsidiar as ações de planejamento, controle, avaliação e auditoria em
saúde;
IX - subsidiar o processamento das informações de produção; e
X - subsidiar a programação pactuada e integrada (MS, 2008).
Uma Central de Regulação Municipal, em geral sob gestão e gerência da
Secretaria Municipal de Saúde, regula o acesso da população própria às unidades de
saúde sob gestão municipal, no âmbito do município, e garante o acesso da
população referenciada, conforme a Programação Pactuada e Integrada – PPI (MS,
2008).
O município de Cuiabá é a principal referência do Estado de Mato Grosso
para prestação de serviços de saúde de média e alta complexidade do SUS. Assim, a
Central de Regulação de Cuiabá-MT tem papel importante no complexo regulador
deste estado, uma vez que gerencia o acesso às vagas disponíveis para prestação de
serviços de saúde na capital mato-grossense.
A Central de Regulação de Cuiabá está inserida na estrutura da Diretoria de
Regulação, Avaliação e Controle – DRAC, a qual está subordinada à Secretaria-
Adjunta de Assistência da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá-MT. A DRAC
possui duas Coordenadorias sob sua gestão: a Coordenadoria de Controle e
Avaliação – CCA e a Coordenadoria de Regulação – CREG (Figura 1).
A CREG é a responsável pela regulação do acesso às vagas administradas
pela Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá. Ela é composta pela Gerência de
Urgência e Emergência e pela Gerência Integrada de Regulação, de acordo com o
39
tipo de serviço de saúde necessário ao usuário do SUS (Figura 1). Este último setor,
na verdade, é composto por quatro Gerências que tratam especificamente da
regulação do acesso às consultas especializadas, às cirurgias eletivas, aos exames
especializados, ao tratamento oncológico e terapia renal. Existe uma instância
específica para gerenciamento das demandas do interior, responsável pelo
recebimento e triagem dos pedidos para os demais setores da Gerência Integrada de
Regulação (D2). As demandas são processadas por toda equipe da CREG que, para
isso, conta com o suporte do sistema informatizado AGHOS, para organizar as
informações pertinentes a atividade regulatória (D3).
A Central de Regulação de Cuiabá-MT recebe e gerencia os pedidos de
urgência e emergência, já triados pela Central Estadual de Regulação, originários do
interior do estado, bem como a própria demanda da capital, para esse tipo de
atendimento, encaminhada pelos serviços de saúde locais. No que concerne aos
pedidos de exames e procedimentos de média e alta complexidade eletivos, a Central
de Cuiabá recebe as solicitações do interior do estado, via malote, encaminhadas
pelas dezesseis Centrais de Regulação Regionais, além de sua própria demanda local,
pela mesma via de comunicação. No que tange às consultas de especialidades, o
gerenciamento é feito mediante uma central telefônica. O setor responsável organiza
a demanda por meio do cadastramento de funcionários das unidades solicitantes de
todo o estado e define os horários para o atendimento telefônico das pessoas
cadastradas (TCU, 2010b).
A partir do momento em que o paciente é atendido pelo prestador de
serviço, a Coordenação de Controle e Avaliação inicia os trabalhos pertinentes à
supervisão médica e administrativa dos procedimentos realizados. Essa Coordenação
é composta pelos setores de Contratualização e Habilitação dos Serviços
Ambulatoriais e Hospitalares; setores de Supervisão Ambulatorial e Hospitalar; Setor
de Supervisão Médica e Administrativa; e Setor de Pré Autorização. Atualmente,
existe um entendimento de que o controle financeiro da prestação de serviço é bem
desenvolvido por essa coordenação. No entanto, é preciso desenvolver as atividades
pertinentes à avaliação da qualidade dos atendimentos aos pacientes contemplados
com as vagas reguladas (D4).
40
Figura 1: Organograma funcional da Diretoria de Regulação, Avaliação e Controle da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá.
Fonte: Documento fornecido pela DRAC – julho de 2010
Diretoria de Regulação, Avaliação e Controle
Supervisão
Hospitalar
Coordenadoria
de Regulação
Auditoria Coordenadoria de
Controle e Avaliação
Coordenadoria
Geral
Logístico Gerência da
Informação
Gerência de
RH
Supervisão
ambulatorial
SIA Consolidação
do
Faturamento
SIH Consolidação
do
faturamento
Pré
autorização
Supervisão
médica e
Administrativa
Contratualização
e habilitação SIA
/ SIH
Gerência Integrada de
Regulação:
Consultas;
Cirurgias;
Exames;
Oncologia e terapia renal; e
Interior.
Gerência de Urgência
e Emergência
Manutenção,
limpeza e
segurança
CNES
Habilitação
41
As duas coordenações são gerenciadas por um Diretor de Regulação,
Avaliação e Controle, assessorado por um Coordenador Geral. Periodicamente, são
realizadas reuniões internas com toda a chefia da DRAC para tratar dos assuntos
pertinentes à regulação, controle e avaliação. O processo decisório é pautado pela
hierarquia entre as gerências e suas coordenações, as quais são norteadas pelas
diretrizes estabelecidas pela direção da DRAC. As Portarias do Ministério da Saúde
têm influência importante no trabalho regulador, na medida em que normatizam a
aplicação de boa parte dos recursos destinados à prestação dos serviços de saúde
(D2).
Não há uma gestão integrada entre a DRAC e setores administrativos da
Secretaria Municipal de Saúde. Isso repercute negativamente no entrosamento entre
as atividades de regulação e a de gestão do sistema de saúde em Cuiabá. Os dados
gerados pelo mecanismo regulador na DRAC não realimentam o planejamento do
SUS nem a redefinição das prioridades da assistência em Cuiabá. A Secretaria de
Estado de Saúde ao deixar a gestão da Central de Regulação também não redefiniu
novos mecanismos de gestão.
A Central de Regulação de Cuiabá funciona em uma edificação que ocupa
parte de um quarteirão (foto 1 – Anexo 2). O espaço disponível para as atividades do
órgão é amplo (foto 2 – Anexo 2). Na parte principal do prédio, funciona boa parte
dos setores ligados à Coordenadoria de Regulação. Esse espaço é organizado por
divisórias que delimitam os setores responsáveis por cada Gerência de Regulação.
Na parte anexa do prédio, funciona a Coordenadoria de Controle e Avaliação. Nesse
espaço, também estão situados o gabinete da Diretoria de Regulação, Controle e
Avaliação e a Gerência de Urgência e Emergência.
Conforme já comentado anteriormente, para apreender as práticas cotidianas
de regulação do acesso executada pela Central, foram entrevistados dirigentes e
técnicos do ligados à Gerência de Cirurgias Eletivas, mais especificamente quatro
dirigentes da Central de Regulação; três técnicos envolvidos com o processamento
interno do fluxo dos pedidos de acesso às cirurgias eletivas e três médicos
reguladores.
A composição atual da Gerência de Cirurgias conta com seguinte efetivo:
dez médicos reguladores (quatro deles são específicos para análise de cirurgias
42
oncológicas) e onze técnicos de regulação (D2). O perfil dos entrevistados está
descrito no Quadro 4. Observa-se que todos possuem curso superior completo.
Dentre eles há uma heterogeneidade no tempo de vínculo, entre 3 e 36 anos, com o
serviço público e no tipo de formação profissional. Cabe destacar, também, que
houve predominância de servidores estatutários no grupo pesquisado.
Quadro 4: Perfil dos Dirigentes e Técnicos entrevistados. Central de Regulação de
Cuiabá – 2010.
Entrevistados Nível de escolaridade Formação profissional Tempo de vínculo com o
serviço público
Tipo de vínculo com
a instituição:
Dirigentes
Superior completo Medicina 3 anos Contrato
Superior completo Enfermagem 26 anos Estatutário
Superior completo Psicopedagogia 11 anos Contrato
Superior completo Ciências contábeis 11 anos Contrato
Técnicos de
regulação
Superior completo Assistente Social 5 anos Estatutário
Superior completo Assistente Social 8 anos Estatutário
Superior completo Assistente Social 25 anos Estatutário
Médicos
reguladores
Superior completo Medicina 20 anos Estatutário
Superior completo Medicina 36 anos Estatutário
Superior completo Medicina 28 anos Estatutário
Segundo dirigentes e médicos reguladores, a Central de Regulação possui
boa estrutura física. Apesar disso, reconheceu-se a necessidade de maiores
investimentos em sua manutenção.
Na época em que a Central era gerenciada em conjunto pelo município de
Cuiabá e pelo estado de MT, a estrutura era mais bem conservada e administrada
(D3).
“Eu acho que a estrutura física é boa, é excelente. (...) o que precisa é dar
manutenção, porque se deixou de dar manutenção, porque ali era uma boa
gestão, uma boa gestão entre o estado e o município, e funcionou bem, cada um
com as suas responsabilidades. Então, você naquela época, você não via ter
problema com computador, você não via ter problema de estrutura física, porque
as atribuições estavam bem definidas, você entendeu? Cada um fazia o seu papel,
né?” (D3)
Essa opinião é compartilhada por um dos técnicos de regulação, ao
reconhecer que a estrutura já foi melhor, principalmente na época da co-gestão (T2).
43
Quanto à infra-estrutura de trabalho, as deficiências são apontadas de forma
mais veemente pelos dirigentes e técnicos de regulação. Para eles existem problemas
ligados à falta e inadequação de mobiliário, equipamentos e climatização, conforme
pode ser visto na opinião desse técnico de regulação:
“Precária (...) questão de espaço físico mesmo, armários, arquivo, coisas assim...
Cadeiras, maior espaço, mesas... Ar-condicionado, nós ficamos numa sala que
não tem ar-condicionado...” (T3)
Os médicos reguladores não têm queixas com relação às suas condições de
trabalho. Interessante notar que, não raramente, esses profissionais não quiseram
opinar sobre outros setores, que não aquele em que eles atuam.
“o que nós precisamos a direção da central nos atende, agora os outros setores eu
não posso te informar.” (M3)
Com relação à rede informatizada e ao sistema operacional utilizado
(AGHOS), os dirigentes e técnicos destacaram o seu bom funcionamento e a boa
visão da situação dos pedidos que ele proporciona. No entanto, há possibilidade de o
sistema informatizado de regulação ser mais bem aproveitado, considerando suas
potencialidades (D3). Os médicos reguladores comentaram que, com certa
frequência, o sistema apresenta lentidão, devido à sobrecarga causada pelo grande
volume de dados manipulados.
As Centrais de Regulação que compõem o Complexo Regulador Estadual
não têm acesso aos dados gerenciados pelo sistema AGHOS. Esse assunto foi alvo
de recomendação específica do TCU, a fim de aumentar a transparência e controle do
que é efetivamente regulado pela Central de Regulação de Cuiabá para os
prestadores de serviços gerenciados pela SMS Cuiabá.
“9.3. determinar à Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá/MT que: (...)
9.3.13. disponibilize as informações geradas pelo sistema de informação adotado
pela central de regulação, inclusive mediante acesso via internet, para os
municípios do interior do Estado, a fim de que seja viabilizado e facilitado o
controle, por parte desses entes, daquilo que foi solicitado e executado por
Cuiabá, confrontando ainda com o pactuado na PPI, com fundamento na Portaria
GM/MS 399, de 22/2/2006 e no art. 6º, da Portaria GM/MS 1.559/2008;
9.3.14. disponibilize acesso ao sistema de informação adotado pela sua Central
de Regulação ao Estado de Mato Grosso, a fim de que esse ente possa monitorar
o cumprimento pelo Município das programações físico-financeira definidas na
44
PPI, inclusive no que tange aos atendimentos efetuados aos municípios do
interior, com base na Portaria GM/MS 399, de 22/2/2006, e no art. 6º da Portaria
GM/MS 1.559/2008” (TCU, 2010b).
No que tange à estrutura de pessoal, os dirigentes reconhecem que há
necessidade de um maior investimento na capacitação dos seus funcionários. Os
baixos salários e os frequentes pedidos de demissão acabam sobrecarregando alguns
setores (D2). Em que pesem as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores, foi
destacado seu elevado grau de comprometimento com a missão da instituição (D4).
Quanto à suficiência do efetivo de funcionários, apesar de existirem setores
que precisariam de maior número de trabalhadores, um dirigente destacou a
necessidade de remanejamento de funções e readequação de papéis. Como exemplo,
referiu-se ao grande numero de médicos reguladores atuando na análise dos pedidos.
Na visão da direção, a DRAC deveria priorizar as atividades de controle e avaliação
do acesso aos serviços de saúde. Portanto, esses médicos poderiam ser deslocados de
sua função reguladora e, contribuir com a avaliação da qualidade do atendimento
prestado pelos hospitais vinculados ao SUS Cuiabá (D4).
As interferências políticas e a rotatividade no cargo de Secretario Municipal
de Saúde têm repercutido negativamente na Central de Regulação, pois provocam
constantes mudanças na direção e em toda equipe de coordenação, o que prejudica a
continuidade do trabalho do setor (M2).
“Tem o problema político que é um negócio muito desagradável, que cada vez
que muda o secretário, mudam todos os coordenadores, mudam todos os
funcionários, então, às vezes o trabalho fica meio confuso e quando anda,
finalmente, aí para, porque aquela pessoa tem uma outra visão de fazer as coisas,
e não... Esse problema político interfere muito nessas mudanças que tem de
secretário, aí muda a coordenação, aí vai, efeito dominó, acho que isso é o que
mais atrapalha o fluxo do funcionamento da central. Não fosse isso, as coisas
seguiriam, que aí um vem implanta uma coisa, o outro vem depois já não quer
aquilo mais. Não tem continuidade, se perde esse trabalho. O problema político é
no SUS inteiro.” (M2)
Para se ter uma noção da repercussão que isso provoca na Central de
Regulação, o TCU registrou, no período 2009-2010, três alterações da equipe de
Diretoria, bem como seu respectivo Coordenador de Regulação. Sem contar as
alterações em outras funções como, por exemplo, as gerências de regulação.
45
A Central de Regulação de Cuiabá sofre com a falta de uma carreira que
profissionalize o trabalho regulador. Até mesmo para remanejar pessoal dentro da
estrutura da DRAC, há resistência devido ao arrimo político da indicação dos cargos.
Isso certamente impede que haja um desenvolvimento contínuo das atividades da
Central e, como consequência, a ocorrência de retrocessos na gestão do órgão é
frequente. Assim, retarda-se o processo de amadurecimento do mecanismo de
regulação garantidor da atenção integral e de um SUS mais equânime. Torna-se
premente ampliar a discussão sobre a introdução, na administração pública, de
modelos profissionais de gestão que contraponham ao clientelismo, como no
exemplo citado sobre a indicação política para a ocupação de cargos e de
trabalhadores na saúde (JUNQUEIRA et al., 2010).
46
4.3 PROCESSOS e FLUXOS REGULATÓRIOS
Nessa Seção, buscou-se compreender o conceito atribuído ao termo
“regulação” por parte dos dirigentes e técnicos da Central de Regulação de Cuiabá,
bem como seus entendimentos e críticas a respeito do fluxo processual de regulação
dos pedidos de procedimentos eletivos. Além disso, foram abordados os diferentes
meios de fuga à regulação do acesso às vagas.
4.3.1 Conceitos de Regulação
As concepções de regulação, segundo os entrevistados, situam-se entre as
mais pragmáticas e aquelas de caráter mais amplo que priorizam os princípios do
SUS. No que se refere ao primeiro grupo, as citações mais frequentes conceberam
regulação como o mecanismo de dar acesso aos serviços de saúde, considerando-se o
respeito à prioridade (D1, T3, M2 e M3) e ao grau de necessidade do paciente (T1 e
M2) atribuídos pelo médico regulador, de acordo com a avaliação da patologia com
base nas informações constantes da guia de internação (M3), a cronologia de entrada
do paciente (D1, T1 e T3) e a limitação do atendimento para toda a demanda (M2),
procurando equacioná-la dentro dos limites financeiros (T3).
Percebe-se que essa definição é bem adaptada à atual realidade da Central
de Regulação de Cuiabá, na medida em que cita as restrições ligadas à amplitude da
demanda em contraposição aos limites financeiros. Outro aspecto interessante é a
consciência da limitação da decisão do médico regulador, a qual se baseia nas
informações escritas repassadas por outro profissional que atendeu o paciente na
unidade de origem.
47
No que tange ao segundo grupo, as definições caminhavam na mesma
direção que a anterior, no entanto apresentaram trechos mais subjetivos para elaborar
o conceito com propósito mais centrado no usuário e nas diretrizes do SUS. Com
base nesses relatos, pode-se destacar as seguintes idéias sobre regulação:
maneira de democratizar o acesso, mediante a qualificação do usuário em
sua demanda (D4);
instrumento de gestão para gerar igualdade no acesso (D3); e
uso do princípio da equidade entre os usuários (T1).
Alguns entrevistados complementaram suas opiniões com questões práticas
que contextualizam o tema regulação. Isso pode ser constatado, por exemplo, no
comentário feito a respeito da necessidade de se evitar, nesse processo, que os
prestadores priorizem suas demandas ao escolherem apenas os pacientes que lhe são
mais interessantes, invertendo a finalidade da Central de Regulação na definição das
prioridades do atendimento nas cirurgias eletivas (D4).
O uso das informações geradas pelo mecanismo regulatório no
replanejamento da gestão, defendida por SANTOS e MERHY (2006), também
esteve presente em uma definição sobre o tema:
“instrumento de gestão que tanto vai subsidiar o gestor pra fazer a programação
do que necessita, do que o paciente, do que a comunidade necessita de acesso,
quais os serviços necessários. A regulação fornece também indicadores (...) que
grupo tá tendo mais acesso a determinado exame, por quê? O ideal seria isso,
pegar essas informações e retroalimentar quem tá na ponta, pro gestor fazer uma
análise, pra ele poder fazer uma programação mais voltada pra realidade e até
acompanhar a qualidade da assistência.” (D3)
Pode-se dizer que o conceito de regulação está atrelado ao de economia,
cuja definição é pautada no estudo da escassez e da escolha. O que varia é o nível de
escassez dos recursos e quão difíceis são as escolhas (CONASS, 2007). O
mecanismo de regulação em saúde se configura também nesse tipo de administração,
já que se baseia na intervenção entre a demanda e a prestação direta dos serviços, nos
seus diversos aspectos (SANTOS e MERHY, 2006).
O papel exercido pelas Centrais de Regulação, ao processar os pedidos, é
apenas uma face desse desafio de gerenciar a escassez de vagas perante a demanda
por serviços de saúde. Contudo, além de ter potencial para promover equidade no
48
acesso às vagas ofertadas, caso as escolhas sejam qualificadas por critérios
meticulosamente trabalhados, as centrais são instrumentos capazes de fornecer
informações valiosas para a macrorregulação e, assim, viabilizar ajustes mais
vinculados à realidade do sistema de saúde. Essa possibilidade pode ser retratada, por
exemplo, na identificação de falhas ou aspectos a serem trabalhados na Atenção
Básica do sistema.
4.3.2 Descrição do Fluxo Regulatório
Com base no processamento dos pedidos de cirurgias eletivas pela equipe da
Gerência responsável por esse setor da Central de Regulação de Cuiabá, provenientes
das unidades solicitantes, pôde-se construir um Mapa de Processo – Figura 2.
A etapa inicial do processo se caracteriza pelo encaminhamento à Central de
Regulação de Cuiabá-MT, principalmente via malote, dos laudos médicos que
contêm os pedidos de cirurgias eletivas, oriundos das unidades solicitantes da capital
e das cidades do interior de Mato Grosso. Estes demandantes são os estabelecimentos
de saúde responsáveis pela atenção básica, como, por exemplo, as unidades do
Programa de Saúde da Família – PSF, os serviços de atenção secundária, como as
Policlínicas, e, também os hospitais credenciados ao SUS.
Os pedidos originados nos municípios do interior do estado de Mato Grosso
sofrem uma primeira triagem, em sua respectiva Região de Saúde. SANTOS (2008)
descreveu esse processo da seguinte forma:
“A partir do primeiro atendimento nas unidades básicas de saúde, se o usuário
precisa de avaliação, o médico do PSF o encaminha para o serviço de regulação
municipal, com um relatório de encaminhamento (escrito) para avaliação de
especialista ou para realização de exames complementares. A microregulação ou
regulação local através de telefone/fax, e conforme a disposição dos serviços
especializados disponíveis no município, autoriza e agenda o atendimento
solicitado. Caso o serviço solicitado não exista no município, é acionado o
serviço de autorização de procedimento e agendamento do Consórcio Regional,
ou DIRES, a que ele pertence”. (SANTOS, 2008)
49
Figura 2: Mapa de Processamento dos pedidos de cirurgias eletivas por parte da Central de Regulação de Cuiabá.
Fonte: autor desta pesquisa com base nas informações disponibilizadas pela Gerência de Cirurgias Eletivas da Central de Regulação de Cuiabá – julho 2010.
Receber laudos
com pedidos das
unidades
solicitantes
Inserir
informações
contidas nos
laudos no sistema
informatizado
“DOC”.
Médico Regulador:
conferir todas as
informações e verificar
se existem
inconsistências ou falta
de informações no laudo.
Decidir: laudos
estão corretos e
completos?
Não
Sim
Devolver laudo para
unidade solicitante.
Recomeçar
processo
Decidir: Qual
é a prioridade
do caso?
Decidir:
1. segue para
atendimento?
2. vai para fila?
Fila Atendido
Enviar laudo para o
hospital de referência.
Receber AIH após alta para
conferência e pagamento.
Aguardar vaga.
Pedido
atendido
A informatização do
pedido poderia aumentar
a eficiência do processo.
50
Essa atividade é realizada em cada uma das dezesseis Centrais Regionais de
Regulação do Estado de Mato Grosso (Anexo 1), que verificam a pertinência do
pedido e se a demanda pode ser atendida na região.
Se não existirem referências para o atendimento necessário ao paciente nos
municípios sede adjacentes e a capital disponibilizar o procedimento necessário, a
solicitação é enviada para Central de Regulação de Cuiabá (TCU, 2010b).
Ao receberem os pedidos das unidades solicitantes, os técnicos de regulação
inserem os dados da solicitação e do laudo médico no sistema informatizado de
regulação. Via sistema, as demandas são encaminhadas aos médicos reguladores.
Estes avaliam a pertinência do pedido de acordo com a descrição do quadro clínico
do paciente constante no laudo preenchido pelo médico da unidade sanitária de
origem e verificam se existem inconsistências ou falta de dados nessa documentação.
Os laudos levam, em média, três dias para serem avaliados pelos médicos
reguladores – Figura 2 (D2).
Até recentemente, os pedidos e laudos eram totalmente conferidos pelos
técnicos de regulação. A partir do momento em que os técnicos contaram com a
participação dos médicos reguladores para conferência dos dados clínicos, a crítica
ao preenchimento incorreto dos laudos ganhou mais legitimidade por parte da
Central (D2).
“antigamente eram só funcionários leigos que faziam a devolução desses laudos.
Sabe lá se esses laudos não estavam corretos e o funcionário que não entendeu?
Ele como médico conhece a função de outro médico. Se ele falar que realmente
esse laudo está errado, ele vai assinar, ele vai colocar a assinatura dele ali e vai
devolver para o outro médico profissional para ele reconhecer que ele realmente
estava errado.” (D2)
Se houver erro na documentação e o médico regulador der parecer favorável
à necessidade de sua correção, o laudo médico é devolvido, via malote, para a
unidade solicitante. Sanadas as incorreções, a solicitação dará nova entrada na
Central de Regulação para o seu processamento. Caso o pedido esteja apto, os
médicos reguladores o classificam de acordo com a gravidade de cada caso nos
seguintes grupos: Eletivo 1, 2 ou 3.
51
Considerando-se a prioridade do pedido e a disponibilidade de vagas para a
especialidade de cirurgia solicitada, o paciente poderá ter acesso direto à execução do
procedimento ou aguardará em fila para futuro atendimento (Figura 2).
Na primeira possibilidade, o laudo autorizado é encaminhado ao prestador
de serviço para que a cirurgia seja agendada e posteriormente realizada. Na segunda
hipótese, quando o caso não requerer urgência, ou devido à falta de oferta do serviço
naquele momento, o paciente aguarda em fila a oportunidade de realizar o
procedimento.
Todas as unidades executantes têm acesso ao sistema informatizado de
regulação. Assim, após a alta do paciente, os hospitais devem alimentar o sistema
com as informações sobre o caso atendido e enviar a Autorização de Internação
Hospitalar – AIH para a Coordenadoria de Controle e Avaliação para conferência e
pagamento. A equipe de supervisão dessa coordenação confere no prontuário do
paciente a documentação que comprova a realização do procedimento.
Em julho de 2010, encontrava-se em processo de implantação um novo
sistema que permitiria a permanência do laudo na Central de Regulação, uma vez
que tornaria possível a visualização da autorização do médico regulador, por parte
das unidades executoras. Tal procedimento permite que, ao liberar uma vaga, o
hospital obtenha a informação em tempo real e contate o paciente para realizar a
cirurgia, dando mais agilidade ao processo (T1).
As críticas a esse mecanismo referem-se à velocidade da etapa inicial do
fluxo interno do processamento dos pedidos, desde a entrada da solicitação na
Central de Regulação até a análise pelos médicos reguladores. Esse processo vem
ganhando agilidade nos últimos anos. Entretanto, sua eficiência é prejudicada pelos
erros existentes no preenchimento dos laudos, que provocam a devolução de pedidos
às unidades de origem (D2). A falta de informações administrativas está presente em
cerca de 30% dos pedidos. Isso pode gerar desperdício dos horários marcados com os
profissionais, pois diminui a probabilidade de um contato oportuno com o usuário
contemplado com a vaga (D4). Assim, há um esforço para que conste do cadastro os
telefones e outros dados do paciente.
Os dirigentes pretendem que, até julho de 2011, os consultórios da rede
assistencial da capital estejam munidos de computadores interligados em rede com a
52
Central de Regulação de Cuiabá (M2 e D4). Nesse sentido, está sendo realizado um
teste piloto com o Hospital Geral Universitário e o Hospital Universitário Júlio
Müller. No entanto, os erros no preenchimento dos pedidos continuam acontecendo
com certa frequência (D2).
“Acontece muitas vezes, na solicitação dentro do sistema, muitos erros (...) nós
estamos com o Hospital Geral e o Hospital Júlio Müller fazendo essa solicitação
(via sistema). Daqui a uns dias, teremos várias unidades fazendo essa solicitação,
e essa solicitação vai vir de forma errada. O fluxo dela vai talvez diminuir, mas
vão descrever os laudos no sistema errado, entendeu, então vai ocasionar esse
problema.” (D2)
Pode-se afirmar que a informatização das unidades solicitantes e sua
interligação com a rede utilizada pela Central de Regulação de Cuiabá poderiam
gerar ganhos na eficiência do processo, uma vez que a velocidade na comunicação
das informações constante dos pedidos seria bem maior que a atual. Os casos de
incorreções nas solicitações poderiam ser mais rapidamente solucionados e os
pacientes seriam menos prejudicados por questões formais.
Registra-se, mais uma vez, a falta de integração, via sistema AGHOS
(sistema informatizado adquirido pela SMS Cuiabá), entre a Central de Regulação de
Cuiabá e as outras Centrais que compõem o Complexo Regulador de Mato Grosso, o
que gera morosidade nas trocas de informação sobre as solicitações de atendimento
ao usuário do SUS (TCU, 2010b).
Cuiabá/MT não disponibiliza acesso ao seu sistema de informação às demais
centrais de regulação existentes no estado, que somente conseguem as
informações via telefone e pela troca de ofícios entre as Secretarias de Saúde. As
informações são encaminhas esporadicamente aos municípios do interior do
estado. Em decorrência da falta de integração, os sistemas tornam-se “ilhas”,
cujas informações restringem-se à utilização pela própria secretaria de saúde
(TCU, 2010b).
O Ministério da Saúde vem desenvolvendo, desde 1999, o Sistema de
Regulação – SISREG. Trata-se de um sistema on line para gerenciamento de todo
complexo regulador. Possui módulos que podem ser utilizados pelas unidades
solicitantes dos serviços de saúde, pelos reguladores e pelas unidades executantes
(MS, 2007). Esse instrumento promete tornar possível a integração das informações
sobre a regulação do acesso com aquelas utilizadas pelos demais subsistemas do
53
Sistema Nacional de Informação em Saúde. Eles teriam os mesmos padrões de
informação, tabelas, cadastros, entrada de dados, identificações comuns, que
possibilitassem cruzamentos, extração de indicadores e constituísse, de fato, um
instrumento para as ações da regulação e avaliação da assistência (SANTOS e
MERHI, 2006). Mesmo com a disponibilidade desse sistema, fornecido
gratuitamente pelo Ministério da Saúde às unidades federadas interessadas, Cuiabá
continua optando por adquirir o sistema AGHOS. Cabe esclarecer que a utilização do
SISREG não é obrigatória aos entes federados. Todavia, é importante que, dentro do
complexo regulador, os sistemas sejam compatíveis e possam trocar informações de
forma ágil.
No que concerne às falhas na precisão e clareza da demanda originária de
toda rede assistencial, um dirigente afirmou que apesar de a Central de Regulação ser
um ponto chave para o acesso aos serviços de saúde, outras questões, como a
qualidade da Atenção Básica e os atributos referentes à formação dos profissionais
da saúde, comprometem também o fluxo regulado (D4).
“A central de regulação, ela não é responsável por todos os problemas que nós
temos, ela é um ponto chave no acesso, mas nós temos problemas gravíssimos na
básica, nós temos problemas de formação médica, nós temos problemas de
orientação dos agentes de saúde, nós temos problemas de infra-estrutura
operacional dos postos de saúde, o modo como eles atuam.” (D4)
Sobre essa questão, a DRAC depende de uma atuação da SMS Cuiabá e da
SES/MT, no sentido de qualificar as equipes médicas atreladas à atenção básica para
que a demanda seja encaminhada de uma forma mais técnica para as Centrais de
Regulação. Esses profissionais precisariam receber mais investimentos em
capacitação para compreender melhor o seu papel no sistema de saúde. Em 2010, foi
feita orientação a esses órgãos para que incluíssem em seu planejamento anual
atividades especialmente voltadas para divulgação da política de regulação do
Estado, perante os usuários e os profissionais de saúde, entre outros atores
envolvidos, a fim de evitar dificuldades de acesso a serviços de saúde ocasionados
por desorientação (TCU, 2010b).
54
Existe consenso entre os grupos entrevistados de que, após a análise e
aprovação do pedido pelo médico regulador, o processo, não raramente, é lento
devido à oferta insuficiente de vagas comparada à demanda.
A oferta é definida nos contratos e credenciamentos dos prestadores de
serviços, os quais são estabelecidos pelos limites financeiros da Secretaria de Saúde
de Cuiabá. Além disso, nesses ajustes, consideram-se a capacidade física e técnica de
atendimento de cada serviço de saúde, em cada uma de suas especialidades. A
Coordenadoria de Controle e Avaliação é a responsável por ajustar esses limites
financeiros aos contratos com os prestadores e a Coordenadoria de Regulação
gerencia o acesso às vagas com base nos tetos fixados (D1 e D2).
Um dos motivos apontados como causa da oferta limitada de serviço é a
defasagem da tabela de repasse por procedimento adotada pelo Ministério da Saúde
(D1 e M2). Isso causa impacto negativo no volume de recursos transferidos da União
para o município de Cuiabá. Esse fator foi apontado como obstáculo para o bom
funcionamento da Central de Regulação, uma vez que cria dificuldades para o gestor
contratar prestadores que tenham interesse em dispor seus serviços para o usuário do
SUS (D1, T2 e D4).
Esse discurso se alinha ao utilizado pelos prestadores privados de serviços
de saúde, na medida em que os preços médios de consultas e internações praticados
pelas empresas de planos e seguros de saúde são três a seis vezes superiores aos das
instituições públicas. Parte considerável dos compromissos das entidades médicas
tem sido ocupada com a negociação de valores de procedimentos. A Frente
Parlamentar da Saúde, criada em 1993, consolidou uma agenda reunindo interesses
públicos e privados, sendo um dos principais pontos tratados os valores de
remuneração dos procedimentos médico-hospitalares das tabelas do Ministério da
Saúde e daquela elaborada pela Associação Médica Brasileira, que serve como
referência para as empresas de planos e seguros de saúde. Dessa forma, a busca pelo
aumento de recursos para o financiamento das instituições privadas de saúde atrai
tanto os pleitos por aumento de recursos para o SUS, quanto os relativos à ampliação
das isenções fiscais, créditos e anistias de dívidas para estabelecimentos e
prestadores privados e produtores de insumos para os serviços de saúde (BAHIA,
2009).
55
Outro posicionamento referiu-se ao insuficiente investimento em hospitais
públicos como uma das causas para limitação das vagas oferecidas para internações.
Tal fato faz com que o SUS fique dependente da oferta privada de serviços de saúde
(M3). Em Cuiabá, segundo CNES, apenas 38% dos leitos a disposição do SUS em
Cuiabá eram providos por instituições públicas de saúde em 2010.
Cabe destacar que, tanto o excesso de demanda provocada, por exemplo,
pela falta de uma atuação mais eficaz da atenção básica frente aos problemas mais
elementares de saúde da população (SANTOS, 2008 e TORRES, 2007), quanto a
restrição orçamentária à oferta de serviços de média e alta complexidade, são
ameaças importantes para a concretização de dois princípios constitucionais do SUS,
quais sejam, a universalidade do acesso e a atenção integral à saúde.
A limitação econômica para investimento nos serviços de saúde de média e
alta complexidade também sofre interferência do modo como a instância estadual
administra a prevenção e a promoção da saúde no seu território. Deve-se impedir que
os recursos sejam totalmente consumidos pelos cuidados curativos (TORRES, 2007).
Outro fator que interfere na eficiência do processo após a aprovação do
pedido por parte dos médicos reguladores, diz respeito à seleção dos “laudos
teoricamente mais atraentes”, por parte de prestadores de serviços, em detrimento de
outros casos já contemplados com a vaga, cujos laudos ficam em poder dos hospitais
cadastrados pelo SUS. Tal fato tem causado prejuízos à fila organizada pela Central
de Regulação e provocado a negativa de atendimento para alguns usuários do SUS
(D2, D3 e D4).
A Central deixa de exercer sua função reguladora, que é assumida, nesse
caso, pelos setores conveniados. Isso é um reflexo do que se observa no setor saúde
no Brasil. Pode-se notar a consolidação de mercados privados em saúde dinâmicos e
fortes, sob incentivo do Estado, com a persistência de iniquidades que colidem com a
noção da saúde como direito de cidadania (VIANA e MACHADO, 2008).
“Nós temos dificuldades de acesso muito maior por conta do prestador, que
seleciona o paciente, que não quer determinadas patologias, eles fazem seleção,
eles fazem cadastro de reserva.” (D3)
56
O fato de haver pacientes preteridos em relação a outros, sem qualquer
justificativa embasada em critérios objetivos, por parte dos estabelecimentos de
saúde, fere o princípio da igualdade de acesso aos serviços de saúde expresso no
artigo 196 da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
A Central de Regulação tem buscado soluções para esse problema.
Recentemente, houve uma modificação processual para tentar impedir os hospitais de
acumularem laudos já autorizados pelos médicos reguladores. O novo fluxo tem
como premissa o encaminhamento de um novo paciente para o prestador somente
quando ele já atendeu a última solicitação da Central de Regulação (D2).
“nós vamos controlar, o máximo que a gente pode, em obrigar os hospitais a
realizarem as cirurgias conforme a fila (...) como eu falei pra você, eu mando um
laudo de ortopedia pro hospital, enquanto o hospital não realizar aquele paciente,
não vai outro.” (D2)
A medida já vem surtindo algum efeito benéfico quanto ao atendimento
integral das autorizações encaminhadas pela Central de Regulação aos prestadores.
Dessa forma, a fila, pelo menos teoricamente, tem mais chances de ser respeitada. No
entanto, houve diminuição na velocidade do fluxo de encaminhamento de laudos
para os estabelecimentos de saúde executantes (D2). Essa é uma solução paliativa
para o problema. A causa está relacionada com a falta de controle da Central de
Regulação sobre os prestadores cadastrados, uma vez que os contratos não estão
formalizados ou estão com vigência expirada. As cláusulas que poderiam dar
legitimidade à SMS Cuiabá para sancionar as unidades de saúde privadas ao não se
submeterem adequadamente ao mecanismo de regulação não estão formalizadas
(TCU 2010b).
Dirigentes e técnicos de regulação informaram que, posteriormente ao
atendimento do usuário, a unidade de saúde que executou o procedimento é
responsável pela alimentação do sistema informatizado de regulação com os dados
sobre a alta do paciente. Dessa forma, o controle e a organização da fila, gerenciados
pela Central de Regulação, dependem da qualidade dessa informação.
Os prestadores não realizam essa atividade de forma oportuna e regular ou
até mesmo deixam de fazê-la, situação que requer dos funcionários da Central a
57
confirmação, via telefone, da realização da cirurgia. Essa situação também foi
relatada por TORRES (2007) em Salvador-BA. Assim, não raramente, a alimentação
desse sistema é, na prática, efetuada pelos próprios trabalhadores da Central de
Regulação (D2).
“No Sistema automaticamente a Unidade Executora alimenta o sistema
colocando que aquele paciente foi internado (...) Depois que esse paciente realiza
esse procedimento o próprio hospital dá alta para esse paciente, ai a alta se muda
de internação para alta. Ai a gente sabe que o procedimento foi realizado no
paciente. (...) Na verdade, eles tinham que estar alimentando isso em tempo real.
Eles não fazem essa alimentação no tempo real. Eles deixam pra dias depois, ou
nem mesmo alimentam o sistema. Ai, como que a gente sabe? Ligando no
hospital. Na nossa concepção, a gente acredita que o hospital fez o procedimento
no paciente, mas pelo sistema não tem como saber, porque eles não fazem a
alimentação (...) A gente mesmo que coloca a informação, a gente vai lá e dá
baixa, a gente pede aqui pro médico fazer isso... eles é que deviam fazer isso,
mas eles não fazem, entendeu?” (D2)
Finalmente, o processo de monitoramento, acompanhamento e avaliação do
atendimento da demanda processada pela Central de Regulação e do seu grau de
resolutibilidade é falho, impedindo que os chamados “nós críticos” sejam
identificados (D3 e D4). Perde-se, muitas vezes, a oportunidade de a regulação
retroalimentar a gestão com informações sobre as distorções do processo (D3).
Portanto, ao analisar todo fluxo regulatório, percebe-se um esforço da
Central de Regulação de Cuiabá para tornar mais ágil o trâmite interno das
informações. Por outro lado, nota-se certa resignação para soluções de problemas
externos à Central. Questiona-se, assim, a ausência de ação gerencial da Secretaria
Municipal de Saúde que poderia considerar a função da Central de Regulação no
suporte ao bom funcionamento do Sistema de Saúde. Não há sinais de bom
entrosamento entre a DRAC e a administração da Secretaria.
Quanto ao relacionamento com a SES/MT, a partir do momento em que
deixou a co-gestão da Central de Regulação de Cuiabá percebe-se que o
distanciamento político entre os governos do estado e da capital também se reflete na
esfera administrativa das instâncias regulatórias desses entes. A Programação
Pactuada e Integrada - PPI, coordenada pela SES, até o momento, ainda é um mero
instrumento de rateio dos recursos provenientes do governo federal entre os
municípios de Mato Grosso. Como será exposto com mais detalhes na Seção 4.5, a
58
PPI poderia ser um efetivo meio de planejamento das ações de saúde compartilhadas
pelos municípios do estado, regidos pela coordenação da SES.
4.3.3 Mecanismos de Fuga ao Fluxo Regulatório
Certos descaminhos utilizados por usuários do sistema, gestores, prestadores
de serviços e políticos tem potencial para descaracterizar a função regulatória da
Central. Trata-se de situações em que cada indivíduo busca a satisfação dos seus
interesses ocasionando graus distintos de prejuízo ao mecanismo regulador, na
medida em que enfraquece a concepção de sistema voltado para saúde dos usuários.
Nesse contexto, as liminares concedidas pelo poder judiciário são uma das
principais vias, mencionadas pelos entrevistados, para obter acesso às vagas de
cirurgias eletivas sem ter que se submeter à Central de Regulação (D1, D2, T1, T2,
T3, D3 e D4). O poder judiciário tem prolatado decisões liminares que interferem no
mecanismo regulatório, ao fazer com que determinados pacientes sejam atendidos de
forma imediata, desconsiderando-se a fila organizada pela Central de Regulação (D1,
D2 e D3). Existem algumas especialidades que só têm vagas contempladas por
liminares (D2).
Nesse contexto, destaca-se a atuação do Ministério Público que é procurado
por aqueles pacientes que se julgam prejudicados pela falta de acesso aos serviços de
saúde do SUS (D1 e D3). Houve críticas à atuação do Ministério Público por atuar
nesse setor sem entender de forma profunda o mecanismo regulatório. Algumas
interferências desse órgão parecem não ter observado o princípio da igualdade, ao
contemplar pacientes que a Central julga como não tendo prioridade em relação aos
outros casos (D3). Apesar disso, reconheceu-se que em alguns casos, principalmente
quando certos hospitais têm resistência para atender pacientes específicos, a atuação
do Ministério Público trouxe benefícios ao sistema (D3).
59
Diante desse contexto, acredita-se que a Secretaria Municipal de Saúde de
Cuiabá deveria se aproximar do Ministério Público para que eles possam
compreender melhor o contexto no qual trabalha a Central de Regulação, o
mecanismo regulatório, o relacionamento com os prestadores, entre outras questões
(D1 e D3). Nesse sentido, pretende-se disponibilizar acesso ao sistema informatizado
de regulação para o Ministério Público (D1).
“O que nós recebemos muito são liminares. (...) toda a liminar que chega aqui
pra gente nós atendemos rapidamente. Isso já foge a fila de espera. É o paciente
que tá na fila que acaba recebendo o acesso mais rápido devido à liminar. Mais
isso não é o correto. O que nós precisamos fazer é trazer o Ministério Público pra
junto da Secretaria de Saúde. Pra quê? Para o Ministério Público tenha a visão da
forma que está sendo feito o contrato com o hospital e ajude a Secretaria a cobrar
aquele contrato. (...) que tenha a liminar, mas que tenha substanciado porquê o
motivo daquela liminar(...) estamos voltando com o sistema novamente lá, pra o
Ministério Público ter a visão conforme a fila de espera, tá?” (D1)
Outra medida tomada foi a criação de uma Câmara Técnica no âmbito da
Central de Regulação com o objetivo de, eventualmente, assessorar o poder
judiciário nas suas decisões a respeito dos pedidos dos pacientes que porventura se
sintam prejudicados em relação ao acesso aos serviços de saúde (D4).
O mecanismo regulador também é distorcido quando os médicos solicitantes
concedem ao candidato à vaga um status de urgência, apesar de sua condição de
saúde não indicar esse tipo de priorização. Nesse caso, esse profissional pode
distorcer as informações para tornar o caso mais grave, com intenção de tornar o
processo mais ágil; no entanto, deixa para trás outras pessoas que estão na fila, cujas
condições clínicas seriam similares a desse indivíduo hipotético (D3).
Essa questão está interligada com o tratamento dado aos protocolos de
regulação, uma vez que há necessidade de analisar cada caso pautado em um
parâmetro objetivo. Os protocolos precisam ser implantados e divulgados, no âmbito
da regulação e das unidades solicitantes. Ao identificar as distorções nos pedidos, os
setores de controle e avaliação e de auditoria deveriam atuar (D3).
Nos casos de urgência, cabe à Central de Regulação e ao Controle e
Avaliação supervisionar se realmente aquele caso mereceria esse tipo de prioridade.
Não tendo essa supervisão, os pacientes classificados como eletivos acabam sendo
60
penalizados, pois aguardam sua vez de acordo com a prioridade dada ao seu caso e
uma urgência simulada, não. (D1)
Conforme será apresentado adiante, em julho de 2010 observou-se que,
dentre o universo de pacientes que tiveram acesso às cirurgias ortopédicas solicitadas
em 2008 e 2009 à Central de Regulação, 48,16% foram classificados como
“urgência”. Por outro lado, apenas 30,84% foram provenientes do grupo de
“eletivos”.
Esse fato pode ter relação com o aumento do acesso pela chamada “porta de
entrada” dos hospitais, que são referentes às demandas de urgência e emergência de
cada prestador de serviço. Atualmente, esse tipo de acesso ocupa cerca de 80% das
vagas de cirurgias, sendo o restante para a Gerência de Cirurgias Eletivas.
Antigamente, as cirurgias eletivas ocupavam a maioria das vagas hospitalares (D2).
“a porta de entrada está dificultando muito o processo de cirurgias eletivas por
que a porta de entrada de alguns hospitais ficaram acima da quantidade do teto
financeiro que pode ser liberado (...) para que esse teto não atinja, eu tenho que
mandar quantidade de menos paciente eletivos (...) hoje na verdade a urgência e
emergência praticamente tomou o lugar da eletiva e a eletiva ficou com a
urgência e emergência (...) os hospitais alegam que os contratos são muito
antigos e que têm que fazer os atendimentos, que nunca foi estipulado realmente
essa porta de entrada, é coisa muito antiga, então nessa contratualização seria
determinado realmente qual seria a quantidade exata que a urgência e
emergência poderá ocupar nos hospitais e quanto a eletiva vai ocupar também.”
(D2)
O acesso pela chamada “porta de entrada” dos hospitais deveria ser bem
definido por contrato, resultante de uma definição do modelo assistencial e da rede
de assistência por parte da Secretaria Municipal de Saúde, que definiria as regras
para esse tipo de acesso. Assim, com base nessas informações, o setor de Controle e
Avaliação faria a supervisão nos hospitais (D3).
Foi destacada, também, a interferência dos hospitais na efetividade do
atendimento de pacientes encaminhados pela Central de Regulação. Conforme
relatado anteriormente, os dirigentes informaram que hospitais credenciados pelo
SUS em Cuiabá têm selecionado os melhores casos para operar, deixando pacientes
que já foram autorizados pela Central de Regulação sem efetuarem suas cirurgias,
algumas vezes contribuindo para o óbito dessas pessoas (D2 e D3). Foi ressaltado
61
que esse fato é agravado pela falta de acompanhamento da Central de Regulação dos
pacientes contemplados com as vagas (D3).
Outra questão levantada tratou de pedidos políticos para favorecimento de
alguns pacientes que necessitam de atendimento na rede SUS. Apesar de ser
ressaltado que há respeito à fila por parte da equipe da Central de Regulação, os
pedidos são analisados pelos dirigentes e pelo corpo técnico, sendo algumas vezes
acatados pela Central de Regulação (D1 e D2). Alguns políticos não entendem o
processo regulatório. Eles acabam interferindo no trabalho da Central de Regulação e
buscam utilizá-la com objetivos eleitorais, ao tentar facilitar o acesso de seus
apadrinhados (D3 e D4).
“Questões políticas, isso é o que mais interfere na regulação. É político que
também não entende o processo. Tem uma idéia equivocada, distorcida e não
ajuda (...) o político, ele sendo a pessoa que deveria elaborar propostas pra
melhorar o sistema, ele piora, porque ele usa da regulação em favor próprio. Usa
a regulação pra objetivos eleitorais (...) acaba facilitando o acesso. Eu dou acesso
aquela, a determinada pessoa porque foi o político tal que pediu, é parente, e não
é... o papel da regulação não é esse.” (D3)
Para impedir que haja esse tipo de burla ao mecanismo regulatório, existe
orientação para que os gerentes supervisionem suas equipes, para que sejam
selecionados alguns casos específicos para investigação e, além disso, tem sido
restringido o acesso ao sistema de regulação fora do horário de expediente (D4).
No âmbito dos médicos reguladores, relatou-se que não há interferências
políticas diretas (M1, M2 e M3). No entanto, reconhece-se que as constantes
mudanças na direção da Secretaria Municipal de Saúde têm interferência nos outros
setores da Central e que, principalmente em épocas de eleição, os políticos exercem
pressão sobre a Central de Regulação (M2).
“É importante ter em perspectiva que os interesses e as disputas colocados entre
os atores sociais se fazem dentro de dado contexto histórico e político. Portanto,
a regulação adquire características conforme a base política que a sustenta e sua
orientação origina-se nas premissas e lutas dessas bases (SANTOS, 2008).
Outra estratégia utilizada para o não enfrentamento da burocracia do
mecanismo regulatório se consubstancia no frequente encaminhamento dos pacientes
do interior direto para Cuiabá, sem passar pela regulação. Isso provoca a
62
superlotação do Pronto Socorro de Cuiabá, que não tem estrutura suficiente para
receber esse volume de demanda (M3). Essa unidade é uma importante via de acesso
às vagas administradas pela Central de Regulação para os pacientes que vêm do
interior sem estabelecer um contato prévio com esse órgão (M3).
Dessa forma, a acessibilidade às vagas torna-se crítica para esse usuário do
SUS. Ao utilizar a via informal em busca de cuidados, além da dificuldade para
conseguir os recursos necessários para o transporte para a capital e do desgaste
provocado pelo tempo de viagem, esse usuário também não tem garantias de acesso
às vagas disponíveis, na medida em que ele não foi encaminhado via complexo
regulador.
Segundo pesquisa realizada pelo TCU, 33% das SMS responderam que os
pacientes são encaminhados diretamente de ambulância para o município de
referência mais próximo, sem passar pelo departamento de regulação, por
considerar que dessa forma se asseguraria a rapidez e a eficiência do
atendimento. Outros 31% responderam que encaminham pacientes para o
município mais desenvolvido, independentemente das pactuações realizadas, já
que o mais importante seria a saúde do paciente, além do fato de o SUS garantir
a universalidade do atendimento. Já para 41%, encaminham-se os pacientes na
maioria das vezes para a capital do estado, já que os serviços pactuados com os
municípios mais próximos não oferecem o melhor atendimento (TCU, 2010c).
Em meio às ações fragmentadas e burocráticas da assistência à saúde, o
usuário, diante da aflição causada pela sua morbidade, não deseja esperar que o
sistema se organize para acolhê-lo. O paciente reúne todos os seus contatos, formais
ou não, para conseguir acesso aos serviços dos quais necessita para sobreviver.
Portanto, há uma distância entre o que é legítimo para os gestores da regulação e para
o cidadão que precisa de atendimento.
63
4.4 DISPONIBILIDADE E ACESSO ÀS VAGAS ADMINISTRADAS
PELA GERÊNCIA DE CIRURGIAS ELETIVAS
Nessa Seção, pretende-se apresentar a distribuição de vagas administradas
pela Central de Regulação de Cuiabá que estão disponíveis para os usuários do SUS
em Mato Grosso que necessitam de cirurgias, bem como o perfil de acessibilidade a
essas vagas. Para esse fim, também será utilizada como exemplo a demanda por
cirurgias ortopédicas processadas por essa Central.
4.4.1 Disponibilidade de Serviços
Atualmente, a Central de Regulação de Cuiabá utiliza a base de dados do
CNES para controlar a disponibilidade de vagas para a demanda por serviços (T2).
Conforme a Tabela 1, existem 315 leitos vinculados ao SUS em Cuiabá para
execução dos mais variados tipos de cirurgia.
Tabela 1 – Leitos cirúrgicos do SUS, segundo hospital e tipo de prestador – Cuiabá
2010.
Hospital
Público Privado /
filantrópico Total
N % N % N %
AMECOR 7 3,21 7 2,22
Femina Hospital Infantil e Maternidade 2 0,92 2 0,63
Hospital do Câncer de Mato Grosso 48 22,02 48 15,24
Hospital Geral Universitário 36 16,51 36 11,43
Hospital e Maternidade Bom Jesus 17 7,80 17 5,40
Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá 71 73,2 71 22,54
Hospital Militar 4 1,83 4 1,27
Hospital Santa Helena 20 9,17 20 6,35
Hospital Universitário Júlio Müller 26 26,8 26 8,25
Santa Casa de Misericórdia de Cuiabá 74 33,94 74 23,49
Sotrauma Hospital 10 4,59 10 3,17
TOTAL: 97 30,79 218 69,21 315 100
Fonte: CNES, 2011.
64
Sobressaem-se a Santa Casa de Misericórdia de Cuiabá e o Hospital e Pronto
Socorro Municipal de Cuiabá, que juntos concentram quase 50% da oferta de leitos
cirúrgicos. Pode-se observar, também, que apenas cerca de 30% do total de leitos
cirúrgicos são estatais. Tal fato denota a dependência da Secretaria Municipal de
Saúde de Cuiabá dos serviços privados.
Em várias especialidades, a demanda por cirurgias supera a capacidade de
oferta administrada pela Central de Regulação de Cuiabá, o que gera o incremento de
filas de espera pelo atendimento. De acordo com a Tabela 2, em apenas um ano
houve 11.946 pedidos de cirurgias.
Tabela 2 – Demanda por cirurgias à Central de Regulação – Cuiabá (ano de 2010).
TIPO DE CIRURGIA QTD
Cardiovascular e linfática 1.176
Endocrinológica 216
Gastroenterológica 62
Gastroenterológica e órgãos anexos 2.878
Geral 604
Ginecológica 1.122
Múltipla 384
Obstétrica - parto e outros procedimentos cirúrgicos 108
Odontológica 106
Oftalmológica 221
Ortopédica e traumatológica 1.767
Otorrinolaringológica 626
Pelvi-gloso-mandibulectomia 10
Plástica 1.203
Torácica 400
Urológica 1.063
TOTAL: 11.946 Fonte: Central de Regulação de Cuiabá – Sistema AGHOS, 23/2/2011.
A título de exemplo, verificou-se a distribuição das cirurgias ortopédicas
realizadas entre as unidades executantes (Tabela 3). Pode-se notar que a Central de
Regulação dispõe, principalmente, de seis referências para execução de cirurgias
ortopédicas. Apesar disso, o rol de estabelecimentos que realizaram esses
procedimentos conta com mais três hospitais, os quais, juntos, contabilizaram cerca
de três por cento do total de cirurgias executadas. Ao todo, existem 77 leitos
65
disponíveis para realização de cirurgias ortopédicas no SUS Cuiabá. No período de
janeiro de 2008 a julho de 2010, foram registradas 5237 cirurgias ortopédicas
realizadas nesses hospitais de referência.
Tabela 3 – Distribuição de leitos cirúrgicos específicos disponíveis e de cirurgias
ortopédicas realizadas no período de janeiro de 2008 a julho de 2010, demandas à
Central de Regulação nos anos de 2008 e 2009.
Unidade Executante Leitos cirúrgicos
disponíveis N (%)
Hospital Bom Jesus* 13 506 9,66
Hospital do Câncer de Mato Grosso* 7 72 1,37
Hosp. e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá 17 1896 36,20
Hospital Geral Universitário 5 511 9,76
Hospital Militar* 2 9 0,17
Hospital Ortopédico Ltda ** _ 30 0,57
Hospital Santa Helena 3 310 5,92
Hospital Júlio Müller 12 41 0,78
Sta Casa de Misericórdia de Cuiabá 8 836 15,96
Sotrauma Hospital de Acidentados Traumatologia 10 1026 19,59
Total 77 5237 100
* Foram computados os leitos cirúrgicos disponíveis para Cirurgia Geral, uma vez que não há nesses hospitais leitos
específicos para ortopedia e traumatologia. **O Hospital Ortopédico realizou apenas 30 cirurgias nesse período, pois esse prestador foi desvinculado do SUS em 2008.
Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
O TCU verificou que no país, inclusive em Cuiabá, há insuficiência de
atuação dos gestores do SUS em otimizar a capacidade instalada da rede vinculada
ao SUS, devido à baixa qualidade no planejamento da contratação dos prestadores de
serviços, à grande parte dos contratos não estar formalizado por instrumentos
jurídicos, à discrepância significativa entre os dados constantes do CNES e os
previstos nos contratos e, ainda, à ausência de acompanhamento e fiscalização dos
contratos com os prestadores privados (TCU, 2010c).
O fato de a SMS Cuiabá não ter contrato formalizado com boa parte dos
prestadores de serviços a ela vinculados ou apresentar acordos fora de vigência,
deixa a DRAC sem instrumentos coercitivos para fazer valer os termos do ajuste com
66
essas unidades executantes. Isso leva a gestão, em diversas situações, a ser submissa
aos interesses desses últimos (T3). Cabe destacar que, após a Constituição Federal de
1988, na qual foi definido o SUS e o caráter complementar do setor privado regido
pelo direito público, impôs-se a necessidade da formal contratação seguida de regular
procedimento licitatório (SANTOS, 2008).
Dos nove prestadores de serviço para realização de cirurgias ortopédicas em
Cuiabá, apenas dois são públicos. Portanto, há um modelo de estímulo e expansão do
setor privado no SUS Cuiabá, conforme conduzido à época dos IAPs, INPS e
INAMPS, na segunda metade do século passado, em detrimento de um modelo
pautado pela égide do público, conforme preconizado pela Reforma Sanitária e a
legislação que a institucionalizou (SANTOS e MERHI, 2006).
4.4.2 Critérios Utilizados para Escolha dos Prestadores de Serviços
As unidades públicas de saúde estão vinculadas ao SUS, portanto estão
aptas a receberem os encaminhamentos provenientes da Central de Regulação.
Segundo registro no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde – CNES, em
2010, do total de serviços de saúde cadastrados em Cuiabá (pertencentes ou não ao
SUS), aproximadamente 89% estão sob gestão do setor privado e 11%, do sistema
público de saúde. Apesar de os serviços estatais responderem por cerca de 66% de
toda a produção ambulatorial nesse ano de referência, apenas 38% dos leitos a
disposição do SUS em Cuiabá eram providos por instituições públicas de saúde.
No que concerne ao setor privado, para que um determinado
estabelecimento possa receber um paciente encaminhado pela Central de Regulação
é necessário que ele esteja cadastrado no SUS e que, teoricamente, tenha contrato
firmado com a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá. Assim, considerando o
interesse, a capacidade de atendimento, as especialidades que possui e os
profissionais vinculados a sua estrutura, as unidades executoras privadas conveniadas
67
oferecem os serviços ao município, o qual os adquire conforme os limites financeiros
e o planejamento de sua demanda.
Expostos os requisitos para receberem os pacientes, passa-se a descrever o
mecanismo de escolha do prestador. O setor administrativo, no qual atuam os
técnicos de regulação, é o responsável pelo encaminhamento dos pacientes após a
autorização do médico regulador (D4). Considerando a classificação atribuída pelos
médicos reguladores, os técnicos alocam os pedidos mais urgentes nas unidades
hospitalares de referência para execução da cirurgia que dispõem de vagas mais
imediatas (D2).
“Se for um paciente eletiva 1, a gente sabe muitas vezes que hospital realiza mais
cirurgia que outro, então a gente vai direcionar para aquele onde a fila anda mais
rápido e aquele paciente que pode aguardar a gente encaminha para o outro
hospital.” (D2)
Dessa forma, um dos principais critérios baseia-se na existência de vagas
com data mais próxima a do agendamento (tempestividade do atendimento),
principalmente quando existe mais de um hospital apto para atender o usuário (D2,
T1 e D4). Consideram-se as características do estabelecimento hospitalar, a
qualificação dos profissionais para dada intervenção (M1) e por último, mas não
menos importante, a preferência do usuário, no caso de haver mais de uma referência
disponível (D3).
Outro critério, citado pelos três grupos entrevistados, está pautado na
continuidade da atenção ao paciente. Aos pacientes que já iniciaram tratamento em
um estabelecimento, a Central de Regulação procura viabilizar o acompanhamento
da atenção no hospital de origem (D2, T3, M3 e D4).
A Central de Regulação pretende inserir um dispositivo contratual que
assegure aos hospitais o direito de preencherem 20% de suas vagas SUS, atualmente
administradas pela Central de Regulação, com aqueles pacientes que já iniciaram o
tratamento no âmbito de suas instalações. Acredita-se que isso diminuiria o trabalho
da Central e acabaria com eventuais problemas de descontinuidade no
acompanhamento de alguns pacientes (D4).
68
Além dos critérios já descritos, é considerada a preferência do profissional
para operar em determinado hospital (D2) e para atuar em certos tipos de cirurgia,
apesar de isso não estar formalizado (D4).
“Muitas vezes o que acontece é que o profissional atende em vários
estabelecimentos, aí ele que determina onde ele vai operar.” (D2)
“Não está definido, por exemplo, tal profissional faz só esse tipo de cirurgia, isso
não tá definido. Isso é subliminar, né? De um conhecimento que as pessoas têm.”
(D4)
Assim, de acordo com médicos reguladores, para a escolha do prestador
considera-se principalmente o pedido do médico que solicitou a cirurgia (M1 e M3).
O Ministério da Saúde entende que as Centrais de Regulação são
instrumentos de gestão capazes de realizar o processamento do pedido de tal forma
que o estado possa oferecer ao usuário do sistema a alternativa assistencial mais
adequada a cada caso (MS, 2006d).
A Central de Regulação não deveria ser uma simples central de marcação de
consultas. A escolha do estabelecimento de saúde, que antes era livremente feita por
parte do usuário, foi substituída pelo gestor uma vez que ele deveria ter informações
suficientes para dizer para cada usuário qual é a melhor opção e a mais adequada
para o seu caso. Trata-se de um processamento do pedido.
O Manual de Implantação de Complexos Reguladores do Ministério da
Saúde expõe que regulação assistencial deve estar “voltada para a disponibilização
da alternativa assistencial mais adequada à necessidade do cidadão, de forma
equânime, ordenada, oportuna e qualificada” (MS, 2006d).
Dessa forma, entende-se que os critérios descritos pelos entrevistados não
traduzem o que o Ministério da Saúde preconizou para as Centrais de Regulação.
Não há uma padronização para estabelecer o destino do paciente de forma ordenada.
Os interesses dos profissionais e dos estabelecimentos de saúde que solicitam o
procedimento são os fatores mais relevantes no mecanismo de escolha. Portanto, essa
atividade se aproxima de um simples agendamento, distante de uma análise
qualificada para alocação mais adequada do paciente.
69
4.4.3 Critérios Utilizados para Priorizar o Acesso
A condição clínica do paciente é o principal critério utilizado para priorizar
o atendimento de um pedido em detrimento de outros. Conforme já mencionado
nessa pesquisa, existem limitações na avaliação dos médicos reguladores, na medida
em que esses profissionais não examinam diretamente o paciente. Eles recebem
informações escritas e documentais sobre o usuário, enviadas pelo médico que o
atendeu na unidade de origem.
Em geral, faltam detalhamento e clareza nas solicitações encaminhadas
pelas unidades de saúde. A insuficiência de informações dificulta o trabalho dos
médicos reguladores ao atribuir prioridade para cada caso (D4).
“(...) problema da ponta do atendimento, de toda a rede de atendimento, onde não
é explícito no laudo, os sintomas e os motivos dessa demanda (...) quem pega
não tem idéia de qual é a necessidade, não tem a mínima idéia, mas é assim que é
feito, quando o exame é classificado em grau um, dois e três, eletiva um, dois e
três.” (D4)
A avaliação do médico regulador é uma etapa importante para o destino do
pedido. Todavia, a avaliação inicial do médico que solicitou a cirurgia é que vai
direcionar para qual setor da Central de Regulação será encaminhada a demanda,
qual seja, se ela irá para a Gerência de Cirurgias Eletivas ou se irá para a Gerência de
Urgências e Emergências. Sobre o assunto, assim se posicionou um dos médicos
reguladores:
“De acordo com a solicitação do colega que fez aquele pedido, no próprio laudo
vem lá, urgência e eletivo. Se é caso de urgência, não passa nem por nós aqui,
vai direto pra urgência, que é um setor a parte que é de urgência. Agora, se é
eletiva, cai aqui pra nós, médicos reguladores, e nessa eletiva nós temos, eletiva
um, eletiva dois, eletiva três.” (M3)
Segundo os médicos reguladores, para atribuir uma prioridade ao pedido
que foi direcionado para a Gerência de Cirurgias Eletivas, considera-se, também, a
idade e as morbidades que acompanham a condição principal que provocou a
demanda pela cirurgia.
70
Interessante observar que as condições sociais do usuário não são
consideradas ao atribuir prioridade aos pedidos. Ao analisar o conceito de eqüidade,
verifica-se que o termo não é o mesmo que igualdade e que o conceito aplicado no
setor saúde considera a discriminação positiva, ou seja, dar mais a quem mais
necessita, tratar desigualmente os desiguais (CONASS, 2007). Portanto, sob esse
aspecto esse mecanismo carece de tratamento equânime entre os usuários do SUS em
Cuiabá.
Na opinião de um dirigente, para organizar o acesso aos serviços de saúde a
Central de Regulação deveria estabelecer certo equilíbrio no atendimento da
demanda entre as unidades de saúde. Segundo ele, cada unidade deveria ter uma
previsão da quantidade de pacientes que poderiam ser encaminhados por mês,
considerando um determinado parâmetro constantemente acompanhado e avaliado
pela Central de Regulação. No entanto, não existe esse critério, pois todos os
pacientes, seja qual for a origem, estão entrando numa fila única. (D3)
No que concerne à classificação, o pedido pode receber três tipos de
prioridades: “Eletiva 1”, que, teoricamente, teriam que ser atendidos em no máximo
trinta dias; “Eletiva 2”, a serem contemplados até o prazo de noventa dias; e “Eletiva
3”, atendidos em até cento e vinte dias (D2 e D4).
Ao estabelecer essa classificação, os médicos reguladores não utilizam
protocolos clínicos formalizados pela Central de Regulação. Até o final do ano de
2010, está prevista a implantação de alguns protocolos, como, por exemplo, para
exames de alto custo (D4). Acredita-se que eles poderiam organizar melhor o
mecanismo regulatório, por exemplo, diminuindo a realização de exames e cirurgias
consideradas desnecessárias.
Existe um receio a respeito da implantação imediata de protocolos, uma vez
que a rede não está preparada para essas novas regras, bem como os médicos não
estão treinados nesse sentido e, portanto, isso poderia dificultar ainda mais o acesso
para os usuários.
“Nós temos protocolos definidos já pra 50, 60% das nossas demandas, mas nós
não conseguimos implementar (...) quando você bloqueia, você cria um
problema pior pro paciente, porque ele tem que voltar com esse pedido pro
médico acrescentar coisas, solicitar esclarecimento (...) esse protocolo tem que
71
ser colocado lá na ponta, e quando a gente põe, a gente bloqueia mais ainda o
acesso, porque a rede não está organizada, o médico não tem o treinamento,
então falta isso. O protocolo, ele hoje, ele colocaria uma dificuldade muito
grande no acesso, mas de qualquer maneira, até o final do ano, deve colocar o
mínimo, por exemplo, mamografia, ressonância magnética, que tem um custo
alto, tomografia; ressonância de joelho, já pediu um ultrassom antes? Bloquear
isso no sistema é imediato, tá pronto, já temos o protocolo, só não ligamos,
entendeu?” (D4)
Os protocolos clínicos existiam, estavam encadernados e à disposição dos
médicos. Porém, atualmente, não estão mais acessíveis nem fisicamente, nem no
sistema (M2). No momento, são utilizados como referência os protocolos
organizados pelo SUS (M1).
Apesar de a Política Nacional de Regulação já ter normatizado que a
garantia do acesso deveria ser baseada em protocolos, classificação de risco e demais
critérios de priorização, foi constatado que dentre um universo de dezesseis estados
auditados, apenas três (Secretarias Municipais de Curitiba e de Belo Horizonte e a
Secretaria Estadual de Minas Gerais) possuíam esses instrumentos oficializados
(TCU, 2010c).
Os protocolos clínicos e operacionais são necessários para a padronização
dos procedimentos adotados na microrregulação. As Centrais de Regulação devem
adotar regras mínimas que orientem as decisões dos médicos reguladores e demais
operadores, a fim de minimizar a subjetividade do processo e as interferências de
caráter pessoal.
A Coordenação Geral de Regulação e Avaliação disponibiliza no sítio eletrônico
do Ministério da Saúde diversos protocolos operacionais e de regulação, já
adotados em algumas localidades do país, para consulta e referência a estados e
municípios. A padronização dos protocolos deve ser vista com cautela, pois
existe uma variabilidade aceitável em virtude, por exemplo, da capacidade
técnica instalada, da resolutividade das unidades de saúde e das referências
intermunicipais e interestaduais, que devem ser consideradas em cada estado ou
município. Ao invés de se falar em padronização, o gestor entende que o
Ministério da Saúde proponha um modelo de referência que seja flexível a
adequações locais (TCU, 2010c).
A Secretaria de Saúde de Cuiabá já foi alertada pelo TCU a respeito da
necessidade de se construir protocolos clínicos para orientar o mecanismo
regulatório. As regras estabelecidas têm que ser transparentes, de tal forma que todos
72
os interessados nesse processo – usuários, prestadores de serviços, unidades da rede e
profissionais de saúde, entre outros – possam conhecê-las (TCU, 2010b). Dessa
forma, a transparência no acesso aos serviços ganharia força, na medida em que os
critérios seriam mais claros. Não se trata de tarefa simples, pois o assunto envolve
diversos entraves, entre eles a limitação da liberdade do médico na sua função na
rede e na Central de Regulação. Assim, seria necessária uma ampla discussão a
respeito do teor desses protocolos para que ele ganhasse legitimidade suficiente para
ser aceito entre as partes envolvidas.
4.4.4 Acessibilidade aos Serviços
A partir do momento em que os médicos reguladores avaliam os pedidos, é
possível atribuir às solicitações, dentro do sistema informatizado de regulação, as
seguintes classificações:
solicitação rejeitada e/ou cancelada;
autorização clínica;
em atendimento; e
alta.
Se houver alguma inconsistência ou falta de dados, ou se a solicitação não
estiver em sintonia com a descrição do quadro clínico do paciente constante no laudo
preenchido pelo médico da unidade sanitária de origem, as solicitações são
devolvidas para correção, se for o caso. Nesse tipo de situação, o registro no sistema
recebe o rótulo de “solicitação rejeitada” ou “cancelado”.
Quando o pedido é aprovado pelo médico regulador, mas não há
disponibilidade de acesso imediato às vagas, ele receberá no sistema informatizado
de regulação o rótulo de “autorização clínica”.
A partir do momento em que o paciente é contemplado com a vaga, ele
poderá receber as seguintes chancelas no sistema: “solicitado”; “solicitação
autorizada”; ou “internado”. Finalmente, na oportunidade em que o usuário realizou
sua cirurgia e recebeu alta, o sistema registrará o status de “alta” para esse paciente.
73
Para se ter uma noção do resultado do processamento dos pedidos por parte
da Central de Regulação, será demonstrada a situação, em julho de 2010, das
solicitações realizadas nos anos de 2008 e 2009 na especialidade de Ortopedia,
reconhecida entre os profissionais entrevistados nesta pesquisa como uma das que
apresenta o maior desequilíbrio entre demanda e oferta de serviços.
Com base nos dados apresentados na Tabela 4, verifica-se que existe um
elevado percentual – cerca de 30% do total – de solicitações rejeitadas e canceladas
por parte da Central de Regulação. Esse quantitativo coincide com a informação de
um dirigente a respeito das devoluções dos pedidos às unidades de origem. Isso
indica a necessidade de um maior investimento na qualidade das informações da
demanda. A construção e divulgação de protocolos clínicos e operacionais em toda
rede assistencial pode ser um dos fatores capazes de diminuir esse percentual.
Observa-se que cerca de 58% dos pedidos foram atendidos e,
aproximadamente, 11% da demanda ainda aguardava na fila para ter acesso a
cirurgia prescrita. Considerando-se que a informação, obtida em julho de 2010,
refere-se aos pedidos efetuados em 2008 e 2009, calcula-se que esses pacientes
estavam aguardando no mínimo há seis meses por uma vaga. Portanto, a
disponibilidade de serviços de cirurgias ortopédicas reservadas à Gerência de
Cirurgias Eletivas é insuficiente, uma vez que o usuário passou por todas as etapas
do processo regulador e não obteve acesso às vagas no momento adequado à sua
situação.
Tabela 4 – Distribuição percentual das solicitações de cirurgias ortopédicas à Central
de Regulação de Cuiabá, segundo sua situação.
Estado da solicitação N (%)
Cancelado / Solicitação rejeitada 2805 31,06
Autorização clínica (fila) 978 10,83
Em atendimento 11 0,12
Alta 5237 57,99
Total 9031 100
Em atendimento = internado + solicitado + solicitação autorizada. Situação em julho de 2010 das cirurgias ortopédicas demandadas apenas nos anos de 2008 e 2009.
Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
74
De acordo com SANTOS (2008), a solicitação de encaminhamento pode
passar por até cinco níveis/serviços diferentes, dispostos como unidades de controle
entre a solicitação do serviço na unidade básica de saúde e o retorno de sua resposta
em forma de agendamento, a saber, na organização do transporte para viagem do
usuário, na reserva da casa de apoio para a estada dele e de seu acompanhante em
Cuiabá. Assim, existe excesso de burocracia da solicitação ao acesso à vaga e,
mesmo que o usuário enfrente todo o trâmite exigido pelo sistema, não há garantia de
um atendimento oportuno.
Dessa forma, verifica-se que, pelo menos no caso de Ortopedia, as metas
estabelecidas para o atendimento, conforme o grau de prioridade, estão
acentuadamente extrapoladas, já que, na pior das hipóteses (Eletiva 3), os pacientes
eletivos teriam que ser atendidos em até cento e vinte dias.
A Tabela 5 apresenta o perfil da fila para cirurgias ortopédicas de acordo
com a classificação de prioridades atribuída pelo médico regulador. Os dados
demonstram que 19,53% dos pacientes receberam o mais alto grau de prioridade para
os pacientes eletivos: “Eletiva 1”. A meta para o atendimento desses pacientes é de
no máximo 30 dias. Conforme já destacado, esses usuários estavam na fila há pelo
menos seis meses.
Percebe-se, nesses casos, que há problemas em relação ao modo como os
recursos da oferta são organizados para admitir os usuários do sistema. Dessa forma,
há desafios a serem vencidos pela Central de Regulação de Cuiabá para melhorar o
acesso desses pacientes às vagas para realização de cirurgias ortopédicas.
Tabela 5 – Distribuição percentual das solicitações de cirurgias ortopédicas à Central
de Regulação de Cuiabá que estão na fila, segundo grau de prioridade.
Grau de prioridade N (%)
Eletiva 12 1,23
Eletiva 1 191 19,53
Eletiva 2 770 78,73
Eletiva 3 5 0,51
Total 978 100
Situação em julho de 2010 das cirurgias ortopédicas demandadas apenas nos anos de 2008 e 2009. Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
75
Dentre o universo de pacientes que receberam alta, foi feita a comparação
entre aqueles classificados como urgências e emergências, e os usuários oriundos da
Gerência de Cirurgias Eletivas, conforme Tabela 6.
Registra-se que apenas cerca de trinta por cento dos pacientes contemplados
com vagas para cirurgias ortopédicas foram provenientes da Gerência de Cirurgias
Eletivas. Cabe destacar, também, que os pacientes considerados urgentes
conseguiram ter acesso a 48,16% das vagas oferecidas pela Central de Regulação e
os de emergência, a 21%.
Tabela 6 – Distribuição percentual dos pacientes que receberam alta após cirurgia
ortopédica, segundo “grau de prioridade” – Central de Regulação de Cuiabá.
Grau de prioridade N (%)
Eletiva 44 0,84
Eletiva 1 590 11,27
Eletiva 2 970 18,52
Eletiva 3 11 0,21
Urgência 2522 48,16
Emergência 1100 21,00
Total 5237 100
Situação em julho de 2010 das cirurgias ortopédicas demandadas apenas nos anos de 2008 e 2009. Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
Essa situação já havia sido alertada por um dos dirigentes, que expressou
sua preocupação com o fato de, ultimamente, haver uma inversão entre os limites
concedidos para a Gerência de Cirurgias Eletivas e o atribuído para os atendimentos
de urgência e emergência realizados mediante a chamada “porta de entrada” dos
hospitais conveniados (D2). No levantamento apresentado, os casos de urgência e
emergência tiveram acesso a quase 70% das vagas disponíveis para realização de
cirurgias ortopédicas.
No passado, o maior percentual seria destinado para os casos eletivos, no
entanto, hoje, essa situação é desfrutada pelas urgências e emergências.
Ao olhar para esses dados, resta uma dúvida: qual seria a diferença clínica
entre o paciente classificado como “Eletiva 1”, que teria que ser atendido em até
76
trinta dias, e um paciente rotulado de “Urgência”, encaminhado para a Gerência de
Urgência e Emergência? Não foram encontradas quaisquer normas internas da
DRAC que pudessem elucidar a distinção entre essas duas condições.
As definições dos termos “urgência” e “eletivo” para o Ministério da Saúde
deixam margem para interpretações subjetivas ao exame de um caso concreto.
Devido ao grande número de julgamentos e dúvidas que as definições de urgência e
emergência suscitam no meio médico e no sistema de saúde, o Ministério optou por
utilizar apenas o termo “urgência”, para todos os casos que necessitem de cuidados
agudos, tratando de definir o “grau de urgência”, a fim de classificá-las em níveis,
assim dispostos (MS, 2006f):
Nível 1 : Emergência ou Urgência de prioridade absoluta. Casos em que haja
risco imediato de vida e/ou a existência de risco de perda funcional grave,
imediato ou secundário;
Nível 2 : Urgência de prioridade moderada. Compreende os casos em que há
necessidade de atendimento médico, não necessariamente de imediato, mas
dentro de poucas horas.
Nível 3 : Urgência de prioridade baixa. Casos em que há necessidade de uma
avaliação médica, mas não há risco de vida ou de perda de funções, podendo
aguardar várias horas.
Nível 4 : Urgência de prioridade mínima. Compreendem as situações em que o
médico regulador pode proceder a conselhos por telefone, orientar sobre o uso de
medicamentos, cuidados gerais e outros encaminhamentos (MS, 2006f).
No que tange ao termo “eletivo”, existe apenas uma definição em uma
minuta1 do Ministério da Saúde que assim se posicionou: procedimento cirúrgico
eletivo é todo aquele procedimento cirúrgico terapêutico executável em ambiente
ambulatorial ou hospitalar, com diagnóstico estabelecido e com possibilidade de
agendamento prévio, sem caráter de urgência ou emergência.
Com base nesses conceitos, ao compararmos os níveis 3 e 4 de urgência,
pode-se entender que eles poderiam também serem enquadrados como eletivos.
No âmbito da Central de Regulação de Cuiabá, ao supor que hipotéticos
pacientes classificados como “Eletiva 1” e “Urgência” têm condições clínicas
semelhantes, um analista poderia chegar à conclusão de que o fato de um paciente ser
encaminhado para a Gerência de Cirurgias Eletivas o torna com menos chances de
conquistar a vaga a curto prazo do que um usuário que teve sua demanda
encaminhada para a Gerência de Urgência e Emergência.
77
Mesmo que essa suposição não seja verdadeira, o fato de os pacientes
eletivos ocuparem apenas 30 por cento do total de vagas contempladas, solicitadas
nos anos de 2008 e 2009, sugere um problema de equidade no acesso às cirurgias
ortopédicas.
Apesar disso, os médicos reguladores da Gerência de Urgência e
Emergência realizam uma triagem dos pacientes que dão entrada nesse setor. Eles
avaliam se o usuário realmente necessita de atenção urgente para a sua situação
clínica. Caso seja constatado que o caso não esteja enquadrado como urgência, a
solicitação é encaminhada internamente para a Gerência de Cirurgias Eletivas (D2).
Outra questão que chamou atenção ao analisar esses dados, diz respeito à
oportunidade do pedido efetuado em comparação com a data de alta do paciente.
Verificou-se que, dentro do universo de pacientes que obtiveram acesso, até julho de
2010, às cirurgias ortopédicas solicitadas em 2008 e 2009, certa quantidade teve o
pedido registrado no sistema informatizado após a data de alta do paciente (Tabela
7).
Tabela 7 – Distribuição percentual das cirurgias ortopédicas realizadas, segundo a
oportunidade das solicitações à Central de Regulação de Cuiabá.
Oportunidade da solicitação da vaga à Central de
Regulação N (%)
Posterior à internação do paciente 1447 27,63
Anterior à internação do paciente 3790 72,37
Total 5237 100
Situação em julho de 2010 das cirurgias ortopédicas demandadas apenas nos anos de 2008 e 2009. Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
Percebe-se que 27,63% desses pacientes tiveram seus pedidos registrados
após a alta efetuada pelo hospital. Esse procedimento é logicamente aceitável nos
casos de emergência, uma vez que as questões administrativas, nesses casos, são
postergadas. Contudo, se houver comparação com o percentual de emergências
atendidas, 21% do total (tabela 6), chega-se à conclusão de que pelo menos 6,63%
dos pacientes que realizaram cirurgias ortopédicas, inexplicavelmente, tiveram seus
1 http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/minuta_cirurgias_180610.pdf
78
pedidos atendidos antes de oficialmente demandados, mesmo não sendo casos de
emergência.
Com o intuito de averiguar qual o perfil de distribuição dos pedidos
realizados posteriormente à alta do paciente, conforme o grau de prioridade no
atendimento, foi elaborada a Tabela 8. Constata-se que a premissa de que todas as
emergências são solicitadas posteriormente à alta do paciente não é verdadeira. Além
disso, percebe-se que quase noventa por cento desse fenômeno está atrelado às
“urgências”.
Desses 1297 pacientes em urgência, verificou-se que 92% deles foram
provenientes do Hospital e Pronto Socorro de Cuiabá, que é uma das principais
portas de entrada para os pacientes oriundos do interior de Mato Grosso e até mesmo
da capital. Essa grande demanda provoca superlotação nesse hospital (M3), o que
certamente causa dificuldades administrativas para sua direção. Talvez esse seja um
fator que colabore para o atraso nos pedidos de autorização para a Central de
Regulação.
Interessante notar que existem também 21 casos de “eletivas 1 e 2” cuja
solicitação foi posterior ao atendimento do paciente. Apesar de esse dado ser pouco
expressivo se comparado ao volume total, ele pode ser considerado relevante, pois é
um indício de que há problemas na administração da fila de pacientes eletivos.
Tabela 8 – Distribuição percentual das solicitações de cirurgias ortopédicas
posteriores à data de alta, segundo “grau de prioridade”.
Grau de prioridade N (%)
Eletiva 1 11 0,76
Eletiva 2 10 0,69
Urgência 1297 89,63
Emergência 129 8,91
Total 1447 100 Situação em julho de 2010 das cirurgias ortopédicas demandadas apenas nos anos de 2008 e 2009. Fonte: Central de Regulação de Cuiabá, julho de 2010.
Diante desse contexto, a Diretoria de Regulação, Controle e Avaliação
deveria acionar sua equipe de auditoria para investigar os casos mais suspeitos de
solicitação posterior à alta do paciente. A transparência no procedimento de
79
regulação é um fator importante para a garantia da equidade no acesso, portanto além
de divulgar os resultados dessa investigação interna para o público interessado, a
DRAC deveria normatizar os casos lícitos em que são permitidas solicitações à
Central de Regulação posteriores à realização dos procedimentos.
80
4.5 RETROALIMENTAÇÃO DAS INFORMAÇÕES GERADAS PELA
CENTRAL DE REGULAÇÃO
Nesta seção, discute-se o papel da Central de Regulação no
acompanhamento e análise dos resultados dos procedimentos eletivos realizados pela
rede de assistência do SUS em Cuiabá. Além disso, foi levantado se os dados
produzidos e processados pela Central de Regulação retroalimentam a avaliação e
planejamento da gestão do sistema de saúde no Estado de Mato Grosso e na sua
capital.
Pode-se dizer que há um mecanismo previsto para controlar a eficácia do
atendimento, pois após a liberação do paciente por parte da Central de Regulação, as
unidades executoras, ao darem alta, deveriam, em tempo real, alimentar o sistema
informatizado a respeito dos dados sobre esse procedimento. Isso não ocorre de
forma geral, o que obriga a Gerência de Cirurgias Eletivas a efetuar esse controle por
meio de ligações telefônicas (D2). Está prevista a inserção de cláusulas nos novos
contratos com os prestadores de serviços que os obriguem a alimentar, em tempo
real, as informações a respeito do agendamento e atendimento dos pacientes no
sistema informatizado de regulação (D2).
Assim, apesar de haver fragilidade nesse mecanismo de alimentação e das
consequências que isso pode acarretar na confiabilidade das informações inseridas no
sistema informatizado de regulação, alguns entrevistados afirmaram que é possível
emitir relatórios sobre o andamento do atendimento dos pacientes que já passaram
pela Central de Regulação com base nesse banco de dados (T1, T3 e M1).
Em que pese existirem informações sobre a realização do procedimento, não
é realizado um acompanhamento da qualidade dos serviços prestados (T3, D3 e D4).
De acordo com um dirigente da Central, existem protocolos preparados para avaliar a
qualidade dos atendimentos, cujos dados seriam inseridos no sistema de regulação.
No entanto, ainda não existe pessoal disponível para colher essas informações nos
hospitais que prestam os serviços. (D4)
81
“(...) têm ferramentas já prontas no sistema pra verificar a qualidade? Sim. Ah,
sim, aí temos um problema de pessoal, nós não temos pessoal pra fazer a
avaliação no momento, então, também cabe um rearranjo. (...) Mas temos
instrumentos e temos ferramentas no próprio sistema pra avaliação? Temos.
Então, nós temos um protocolo pronto que não ligamos, (...) Avaliação de
qualidade de assistência, do prestador, todos esses protocolos tão prontos: da
internação, do atendimento, da consulta, da rede própria, da rede prestadora, mas
não implantamos.” (D4)
Apesar de não haver um mecanismo sistematizado para aferir a qualidade da
atenção prestada pelos hospitais, existe a atuação de uma equipe de auditoria, ligada
ao Setor de Controle e Avaliação, que acompanha o serviço executado, basicamente
no que concerne a regularidade no faturamento dos procedimentos (D1, T2, D3 e
D4).
Existe desinformação a respeito de uma possível atuação da Central de
Regulação no que tange à contra-referência do paciente atendido. (M1)
Contra-referência diz respeito ao menor grau de complexidade, quando a
necessidade do usuário, em relação aos serviços de saúde, é mais simples, ou
seja, “o cidadão pode ser contra-referenciado, isto é conduzido para um
atendimento em nível mais primário”, devendo ser este a unidade de saúde mais
próxima de seu domicilio (FRATINI et al., 2008).
Dessa forma, não existe um protocolo definido pela Central de Regulação
de Cuiabá quanto ao encaminhamento do paciente para as unidades básicas de
origem do usuário após o atendimento cirúrgico eletivo. Sob esse aspecto, o sistema
se mostra fragmentado em detrimento à vocação do SUS de atenção integral ao
usuário. Um exemplo da visão contrária a esse princípio é a necessidade de o
paciente ter que voltar para fila após cada intervenção, no caso de indicação de uma
série de cirurgias relacionadas ao seu problema de saúde (T3).
A rede de atenção em Mato Grosso está longe de oferecer um continuidade de
cuidados, pois apresenta uma assistência fragmentada, medicamente centrada e
pontual em suas ações, que contraria qualquer princípio de integralidade e de
integração dos serviços que se possa conceber (SANTOS, 2008).
O Ministério da Saúde ressaltou que a qualificação do processo de
referência e contra-referência passa também pela informatização das Unidades de
Saúde, melhorando o fluxo de informação entre os diversos estabelecimentos de
saúde e seus respectivos gestores e centrais de regulação (TCU, 2010c).
82
De uma forma geral, não existe acompanhamento das informações geradas
pelo mecanismo de regulação e o seu aproveitamento por parte dos gestores para
identificar distorções, nós críticos, e a partir desse diagnóstico propor soluções para
as demais instâncias do sistema de saúde. A abundante fonte de informações também
não é repassada para as unidades solicitantes, seja em Cuiabá ou em todo o Estado de
Mato Grosso. (D3)
Apesar de os dados não serem plenamente utilizados para retroalimentar a
gestão, algumas utilizações pontuais foram relatadas: exposição da situação da fila
em algumas especialidades (D2); alguns dados foram encaminhados para o Setor de
Controle e Avaliação para orientar o processo de reformulação dos contratos com os
prestadores de serviços (D4); e primeiras tentativas para orientar o planejamento da
gestão, o que ocorreu no mês de abril de 2010 e de forma mais robusta proposta para
o planejamento de 2013 (D4).
Dessa forma, percebe-se que não há uma sintonia entre o planejamento,
execução e avaliação da política de atenção à saúde em Mato Grosso, especialmente
no que concerne à sua capital Cuiabá.
Uma evidência dessa situação é a falta de utilização dos dados da
Programação Pactuada e Integrada – PPI nas ações da Central de Regulação de
Cuiabá, ao contrário do que prescreve o Ministério da Saúde em Portaria específica:
Art. 3º Os objetivos gerais do processo de Programação Pactuada e Integrada da
Assistência em Saúde são: (...)
V - fornecer subsídios para os processos de regulação do acesso aos serviços de
saúde (MS, 2006c).
De acordo com os dirigentes da Central, a PPI ainda não é considerada no
mecanismo regulatório (D1, D2 e D4). No setor de internações eletivas a fila é
formada por todos os usuários do Estado de Mato Grosso que demandam o serviço,
independente da origem do paciente (D2). Apesar disso, verifica-se que o interior,
em virtude das pactuações, encaminha os pacientes para Cuiabá, fato que influencia
o mecanismo regulatório (T2).
O motivo mais forte apontado pelos dirigentes para a não-inclusão da PPI na
regulação foi a impossibilidade de identificar com eficácia a origem dos pacientes
(D1 e D4).
83
“Os mecanismos de controle são muito ruins. Nós não temos idéia de onde está
vindo o cidadão que recebe o atendimento (...) a gente vê ônibus de tal lugar,
ônibus de tal lugar lotado de gente que não, não tem endereço próprio aqui,
modifica seus endereços, né, então a pactuação é falha.” (D4)
Essa dificuldade é enfrentada em todo país. O Ministério da Saúde tentou
implantar o Cartão SUS com o objetivo de criar uma espécie de câmara automática
de compensação nacional, resolvendo grande parte dos problemas existentes com a
PPI e com o financiamento dos procedimentos dos municípios e estados com
recursos federais (TCU, 2010c).
Conquanto a confiabilidade dos dados do cadastro de usuários do Cartão
Nacional de Saúde (Cartão SUS) seja imprescindível para correta identificação
da origem dos pacientes e, por conseguinte, orientar o processo de regulação,
constatou-se problemas que afetam essa confiabilidade, como a multiplicidade de
cartões para um mesmo usuário, o que ainda é um entrave para a regulação
(TCU, 2010c).
Para tentar resolver esse problema, Cuiabá está tentando identificar os
pacientes por meio de cadastramento por digital (dados biométricos) para impedir
que um mesmo paciente seja registrado diversas vezes no sistema (problema ocorrido
com o cartão SUS). Existe a intenção de expandir esse procedimento para todo o
Estado de Mato Grosso, porém isso é um processo demorado e complexo. A partir do
momento que for possível identificar com precisão a origem de cada paciente, será
viável o ajuste financeiro entre os municípios e, assim, a “PPI viva”, revisada a cada
três meses na CIB, poderá se tornar uma realidade (D1 e D4).
No sistema informatizado de regulação existe uma ferramenta para
monitorar a PPI, no entanto, segundo dirigente da Central, em virtude do grande
volume de pacientes que adulteram o seu endereço para serem atendidos como se
fossem residentes em Cuiabá e do volume de pacientes do interior que vem para a
capital sem ser regulados, não faz sentido estabelecer ainda esse controle. Nessa
ferramenta, o sistema bloqueia o atendimento em caso de extrapolação do que foi
pactuado pelo município. (D4)
A auditoria do TCU já havia identificado essa situação. No texto do seu
relatório, a Corte de Contas afirmou que a PPI não estando alimentada no sistema de
regulação significa afirmar que o planejamento que ela contempla é inócuo,
84
tornando-se esse instrumento de pactuação um mero rateio dos recursos (TCU,
2010b).
Dos 16 casos estudados, constatou-se que apenas no Estado de Minas Gerais e
em sua capital, Belo Horizonte, a regulação estava operando de acordo com a
PPI no momento da auditoria (outubro de 2009), o que pode ser atribuído à
integração dos sistemas da PPI e da Regulação, assim como à importação dos
dados ser feita de forma automática (por carregamento de bases), também
constatada unicamente naquelas localidades (TCU, 2010c).
Ainda no que tange ao relacionamento entre a PPI e o mecanismo
regulatório, percebe-se que a Central de Regulação de Cuiabá é uma fonte rica de
dados e, portanto, deveria retroalimentar a programação, com vistas a reorientar o
planejamento das ações de saúde e melhor atender às demandas do cidadão,
conforme preveem as Diretrizes para a Programação Pactuada e Integrada da
Assistência em Saúde (MS, 2006e).
Em decorrência disso, ao longo do tempo a PPI vai se distanciando da
realidade. Esse distanciamento provoca a desvalorização do instrumento de
pactuação e a desobediência aos pactos firmados. Não há motivo que leve os gestores
a respeitarem um pacto que nada condiz com a realidade dos problemas da população
e dos serviços de saúde. Assim, a programação vem sendo utilizada de forma isolada,
com seu uso restrito à dimensão financeira, de repartição de recursos, sem que sejam
exploradas suas potencialidades de planejamento contínuo e desenvolvimento da
assistência.
85
5. CONCLUSÕES
O Complexo Regulador no Estado de Mato Grosso foi criado para responder
de forma sistemática às demandas de saúde em seus diferentes níveis e etapas do
processo de assistência, facilitando o acesso do usuário aos serviços do SUS.
Atualmente, há um esforço por parte da SES/MT no sentido de desenvolver o
mecanismo regulatório sob responsabilidade das Centrais Regionais, que fazem parte
desse complexo. Há um investimento financeiro, principalmente por parte do
Ministério da Saúde, com o objetivo de modernizar a estrutura dessas Centrais. Caso,
esse projeto de modernização das Centrais Regionais seja concretizado e haja um
maior investimento na assistência de média e alta complexidade nos principais polos
regionais do estado, será dado um importante passo para a efetivação da
regionalização da saúde em Mato Grosso, bem como será amenizado o excesso de
demanda por serviços de saúde na capital.
O município de Cuiabá é a principal referência do Estado de Mato Grosso
para prestação de serviços de saúde de média e alta complexidade do SUS. Assim, a
Central de Regulação de Cuiabá tem papel importante no complexo regulador deste
estado. O gerenciamento em conjunto entre a SES/MT e a SMS Cuiabá, desde 2002,
foi considerado um modelo inovador de gestão. Contudo, o contexto de turbulência
política, iniciado em 2003, culminou com a saída da SES/MT, em 2009, da gestão da
Central de Regulação de Cuiabá. Atualmente, existem problemas de comunicação
entre essa Central e o restante do complexo regulador que dificultam o trabalho de
coordenação do SUS por parte da SES-MT.
Considerando-se as informações colhidas nessa pesquisa, pode-se afirmar
que a Central de Regulação de Cuiabá apresenta problemas relacionados à falta de
um plano de carreira para os profissionais de regulação, o que gera rotatividade de
pessoal nos cargos e, assim acaba por refletir na continuidade das ações da Central de
Regulação. Há interferência política nas nomeações dos cargos.
Os profissionais entrevistados possuem diferentes concepções sobre o termo
regulação. Entretanto, destacou-se a visão prática ressaltada por boa parte dos
86
participantes, os quais conceberam o seguinte conceito: “mecanismo de dar acesso
aos serviços de saúde, considerando-se o respeito à prioridade e ao grau de
necessidade do paciente atribuídos pelo médico regulador, de acordo com a avaliação
da patologia com base nas informações constantes da guia de internação, a
cronologia de entrada do paciente e a limitação do atendimento para toda a demanda,
procurando equacioná-la dentro dos limites financeiros”.
Quanto ao processo de regulação da demanda por cirurgias eletivas, cabe
ressaltar que, desde a entrada do pedido na Central de Regulação até a avaliação dos
laudos de solicitação por parte dos médicos reguladores, o fluxo da informação é
ágil. Entretanto, existe um alto índice de solicitações com problemas no
preenchimento dos dados, fato que provoca a devolução de vários pedidos para a
unidade de saúde que solicitou o procedimento cirúrgico. Isso acarreta prejuízos ao
usuário do sistema de saúde, uma vez que há um atraso relevante no acesso aos
serviços de saúde requisitados. Cabe destacar, também, que o trânsito inicial do
pedido, entre a unidade solicitante e a Central de Regulação, poderia ser feito
virtualmente pelo sistema informatizado de regulação, pois isso aumentaria a
eficiência do mecanismo regulatório. Atualmente, isso é realizado por malote.
Percebe-se um esforço da Central de Regulação de Cuiabá para tornar mais
ágil o tramite interno das informações. Por outro lado, nota-se certa resignação para
soluções de problemas externos à Central. Questiona-se, assim, a atuação da
Secretaria Municipal de Saúde nas ações que poderiam dar suporte ao bom
funcionamento do Sistema de Saúde e, consequentemente da Central. Não há sinais
de bom entrosamento entre a DRAC, a administração da SMS e da SES. Essa última
não exerce com efetividade a coordenação do planejamento das ações em saúde do
estado, fato materializado em uma Programação Pactuada e Integrada que não se
reflete nas ações regulatórias das centrais em todo o estado.
No que concerne a possíveis mecanismos de fuga ao fluxo regulatório,
pôde-se destacar as frequentes liminares concedidas pelo poder judiciário,
desconsiderando-se a fila organizada pela Central de Regulação. Além disso, existem
diferentes formas para forjar uma situação de urgência ou emergência para casos em
que é possível aguardar dias ou semanas pelo procedimento requerido. Essa prática
prejudica os pacientes que efetuam sua demanda corretamente pela Gerência de
87
Cirurgias Eletivas. O fato de não existirem contratos formalizados entre a SMS
Cuiabá e grande parte dos prestadores de serviços agrava esse quadro de
irregularidades no acesso, na medida em que causa prejuízos ao poder coercitivo do
Estado em fazer valer as cláusulas ajustadas entre as partes envolvidas na prestação
dos serviços. Há, também, tentativas de interferências políticas para beneficiar certos
usuários em detrimento de outros.
Quanto aos critérios utilizados para a escolha do prestador de serviço,
avalia-se dentre as unidades de referência credenciadas, aquela que possui vaga mais
imediata para o usuário a ser operado. Considera-se também a continuidade da
atenção ao paciente, na medida em que tem preferência para realizar a cirurgia
aquela unidade que o encaminhou para Central de Regulação.
Os critérios de priorização do atendimento entre os casos eletivos
consideram, especialmente, os dados clínicos descritos nos laudos de solicitação.
Além disso, a idade e as morbidades que acompanham a condição principal que
provocou a demanda pela cirurgia apresentam alguma influência nessa classificação.
Não há protocolos de regulação oficialmente estabelecidos pela Central de
Regulação para avaliar os pedidos.
A partir do momento em que o médico regulador avalia e classifica o
pedido, conforme a prioridade atribuída ao caso, há um excessiva demora no
atendimento dos pacientes processados pela Gerência de Cirurgias Eletivas. As
possíveis causas dessa lentidão no acesso relacionam-se à pouca quantidade de oferta
em relação à demanda; e à pouca quantidade de vagas disponibilizadas para os casos
eletivos em relação à Gerência de Urgências e Emergências.
Verificou-se, também, que não há um aproveitamento efetivo do volume de
informações geradas pelo mecanismo regulatório para a gestão do SUS em Cuiabá e
no Estado de Mato Grosso. As informações da Programação Pactuada e Integrada
não são consideradas na prática de regulação, bem como não há uma
retroalimentação dos dados gerados pela administração do acesso às vagas para o
monitoramento e ajuste desse pacto.
A Coordenação de Controle e Avaliação tem intenção de avaliar a qualidade
dos serviços prestados aos usuários. No entanto, atualmente não há pessoal treinado e
disponível para esse fim. O foco atual de suas ações é a supervisão da execução
88
financeira dos serviços. Portanto, a própria Central reconhece o desafio de se tornar,
além de um instrumento de qualificação no acesso, uma instituição preocupada com
os resultados de suas ações para materializar o princípio de atenção integral à saúde.
89
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reorganização da assistência; cria mecanismos para o fortalecimento da capacidade
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do Anexo desta Portaria, a Norma Operacional da Assistência à Saúde – NOAS-SUS
01/2002, que amplia as responsabilidades dos municípios na Atenção Básica;
estabelece o processo de regionalização como estratégia de hierarquização dos
serviços de saúde e de busca de maior equidade; cria mecanismos para o
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94
APÊNDICE 1. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE SAÚDE COLETIVA
Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário, da pesquisa “a regulação
assistencial no Sistema Único de Saúde: o caso da Central de Regulação de Cuiabá/MT”.
Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do
estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias, uma delas é sua e a outra é do
pesquisador responsável.
Em caso de recusa você não terá nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com
a instituição que recebe assistência. Em caso de dúvida, você poderá procurar o Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Müller - UFMT- pelo telefone (65) 3615-8254.
O objetivo deste estudo é analisar o mecanismo de regulação no que tange ao processamento
da demanda por procedimentos eletivos, realizado pela Central de Regulação de Cuiabá-MT.
Sua participação nesta pesquisa consistirá em uma entrevista, que será gravada pelo
pesquisador, na qual serão feitas questões a respeito das atividades diárias do mecanismo de
regulação. Os benefícios para o participante da pesquisa são aqueles advindos da melhoria das práticas
referentes à regulação assistencial em Cuiabá/MT. Os riscos relacionados com sua participação na
pesquisa são mínimos, uma vez que os dados referentes a sua identificação serão confidenciais.
Você receberá uma cópia desse termo onde tem o nome, telefone e endereço do pesquisador
responsável, para que você possa localizá-lo a qualquer tempo. Seu nome é Alexandre Giraux
Cavalcanti, Mestrando em Saúde Coletiva / ISC / UFMT, telefone de contato é o 65 9973-9206 / 65
3642-6615 e e-mail agiraux@yahoo.com.br .
Considerando os dados acima, CONFIRMO estar sendo informado por escrito e
verbalmente dos objetivos desta pesquisa e em caso de divulgação por foto e/ou vídeo AUTORIZO a
publicação.
Eu__________________________________, idade:____, sexo:____, Naturalidade:______________,
portador(a) do documento RG Nº:______________, declaro que entendi os objetivos, riscos e
benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar.
Cuiabá-MT, ___ de ______________de 20___
___________________________________
Assinatura do participante
____________________________________
Alexandre Giraux Cavalcanti / Pesquisador
95
APÊNDICE 2. Roteiro de entrevista
Entrevista nº: Data:
Idade: Sexo:
Nível de escolaridade: Formação profissional:
Função na Instituição:
Tempo de vínculo na instituição:
Tipo de vínculo com a instituição:
Tempo de vínculo com o serviço público:
Teve alguma capacitação para atuar na instituição:
Área Temática Perguntas
Concepções sobre microrregulação
1. O que você entende por regulação?
Fluxos internos
2. Como o pedido pode dar entrada na CReg?
3. O que você tem a dizer sobre o fluxo interno dos pedidos?
4. Como a CReg busca a informação sobre as vagas
disponíveis? (buscar maior detalhamento na entrevista com
os técnicos)
Critérios de priorização do
atendimento dos pacientes
5. O que é considerado para priorizar o atendimento de um
pedido em detrimento de outros? (buscar maior detalhamento
na entrevista com os médicos reguladores)
Critérios utilizados para selecionar
os prestadores de serviços
6. O que é considerado para priorizar um estabelecimento de
saúde em detrimento do outro para atender ao pedido regulado?
(buscar maior detalhamento na entrevista com os médicos
reguladores)
Informações gerenciais
(buscar maior detalhamento na
entrevista com os dirigentes)
7. Como é a estrutura de organização da Central de Regulação?
8. Como funciona o processo de decisão a respeito das
diretrizes do mecanismo de regulação?
9. Como a Central de Regulação acompanha os resultados de
suas ações?
10. Existe algum tipo de avaliação sobre os dados gerados no
mecanismo regulatório para a gestão do SUS? Caso positivo, de
96
que forma é realizada?
Utilização dos dados da PPI no
processamento dos pedidos
11. De que forma as pactuações entre os municípios
influenciam o mecanismo de regulação?
Avaliação sobre o procedimento
regulatório
12. Na sua opinião, quais são os aspectos facilitadores e os
obstáculos no âmbito do mecanismo regulatório?
13. Na sua opinião, quais são os pontos fortes e fracos do
processo de regulação?
Mecanismos de integração com
outras instâncias políticas
14. Quais as instâncias políticas que interagem no processo
regulatório? De que forma interferem?
Considerações finais
15. Como a regulação pode contribuir para a melhora do SUS?
16. No que concerne ao processo de regulação, você tem algo a
acrescentar ao que foi falado na sua entrevista?
98
ANEXO 2. Fotografias da Central de Regulação de Cuiabá
Foto 1: Vista externa da Central de Regulação de Cuiabá.