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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
CURSO DE DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO
ALMERINDA TEREZA BIANCA BEZ BATTI DIAS
ESTRATÉGIA COMO PRÁTICA SOCIAL: UM ESTUDO DE PRÁTICAS
DISCURSIVAS E QUESTÕES DE GÊNERO DAS(OS) PRATICANTES NO
PROCESSO ESTRATÉGICO DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR
COMUNITÁRIA
BIGUAÇU
2015
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
D541e Dias, Almerinda Tereza Bianca Bez Batti.
Estratégia como prática social: um estudo de práticas
discursivas e questões de gênero das(os) praticantes no processo
estratégico de uma instituição de ensino superior comunitária /
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias; orientador: Carlos
Ricardo Rossetto, coorientador Sidnei Marinho. – Biguaçu, SC,
Ed. do Autor, 2015.
262 p : il. ; 21 cm.
Tese (Doutorado) - Universidade do Vale do Itajaí, Programa
de Pós-Graduação em Administração, Biguaçu, SC, 2015.
1. Estratégia organizacional. 2. Estratégia como prática social.
3. Prática social. 4. Práticas discursivas. 5. Divisão sexual no
trabalho. 6. Gênero nas organizações. I. Título.
CDD. 22ª ed. 658.4012
Bibliotecária Rosângela Westrupp – CRB 14º/364
Biblioteca Central Prof. Eurico Back - UNESC
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
ALMERINDA TEREZA BIANCA BEZ BATTI DIAS
ESTRATÉGIA COMO PRÁTICA SOCIAL: UM ESTUDO DE PRÁTICAS
DISCURSIVAS E QUESTÕES DE GÊNERO DAS(OS) PRATICANTES NO
PROCESSO ESTRATÉGICO DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR
COMUNITÁRIA
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Administração, Universidade do Vale do
Itajaí –UNIVALI, como requisito parcial para a
obtenção do grau de Doutora em Administração.
Orientador: Prof. Carlos Ricardo Rossetto, Dr.
Coorientador: Prof. Sidnei Marinho, Dr.
BIGUAÇU
2015
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Dedico este trabalho:
a minha querida mãe, Maria Almerinda, que, já no final de sua vida, aceitou a minha
ausência junto a ela para que eu pudesse realizar esse sonho – momentos esses
irrecuperáveis.
as minhas amadas filhas e filhos: Verônica, Victor, Hamilton e Marina que são
definitivamente os bens maiores da minha vida – o meu amor incondicional.
ao meu amor, Hamilton, que sempre me incentivou e apoiou a seguir estudando. e,
também, por fazer parte da minha história de vida.
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
AGRADECIMENTOS
O final da caminhada para chegar a este trabalho se deu, porque, no percurso para
alcançá-lo, eu tive o privilégio de receber amparo de diversas pessoas. Por isso gostaria
de externalizarlizar alguns agradecimentos:
Ao professor Carlos Ricardo Rossetto, meu orientador nesta tese de doutorado, por me
receber como orientanda, pelas sugestões, orientações e encaminhamentos e, também,
por ter acatado o meu tema de tese integralmente.
Ao professor Sidnei Vieira Marinho, meu coorientador neste trabalho e membro da
banca, pelo apoio, confiança, compreensão e apontamentos muito pertinentes.
Ao professor Miguel Angel Verdinelli, membro da banca, pela paciência, apoio e
sabedoria e, também, pelas sugestões quando da banca de qualificação da tese.
À professora Giovana Ilka Jacinto Salvaro, membro da banca, por me ter desvelado o
que são os estudos de gênero, pelo convite para participar dos encontros de leituras
orientadas, pelas suas contribuições, essenciais para que o trabalho fosse, de fato, sobre
gênero. E, junto à professora Giovana, a professora Giane Rabello, por me receberem
tão bem na disciplina sobre Gênero, no Programa de Pós-Gradução em
Desenvolvimento Socioeconômico.
Ao professor Cristiano de Oliveira Maciel, membro da banca, pelo aceite e, também,
pelas importantes contribuições durante a qualificação da tese.
À professora Christiane Kleinunbing Godoi que esteve comigo durante a elaboração do
projeto da tese, pela sua amizade e ensinamentos.
Às(os) professoras(es) do PPGA que auxiliaram para sedimentar a construção desta tese
por meio do aprendizado que obtive em suas disciplinas e grupos de pesquisa.
Às meninas da secretaria do PPG – Cristina Heusi Leal, Caroline de Aquino Rosa
Torres, Maria de Lurdes Rodrigues dos Santos– que sempre tão eficaz e prontamente
me atenderam.
Às(os) amigas(os), doutourandas(os) e mestrandas(os) do PPGA, pela amizade, estudos
e companheirismos, em especial à(ao): Sabrina do Nascimento, Daiane Melo Heinzen,
Ronaldo Telles, Alessandra Cassol, Nathalia Werlang e Graciele Tonial.
À Unesc, nas pessoas: do Reitor, professor Gildo Volpato, pelo incentivo e apoio para o
desenvolvimento da pesquisa; da Pró-reitora de Ensino de Graduação, professora
Robinalva Ferreira, e da Pró-reitora de Administração e Finanças, professora Katia
Aurora Dalla Libera Sorato, com as quais convivi diretamente nos quatro anos desta
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tese, pelo apoio e amizade. E, também à Unesc, pelo afastamento parcial que me
possibilitou realizar o curso, além da autorização para aplicar a pesquisa na Instituição.
Às(os) gestoras(es) da Universidade objeto do estudo que aceitaram participar da
pesquisa.
A minha amiga, afilhada e colega de docência, Nara Cristine Thomé Palácios Cechella,
pela amizade íntegra e pela revisão linguística desta tese.
A minha amada família – meu bem inestimável – pelo amor incondicional, apoio,
confiança e paciência.
Agradeço imensamente a todas(os), inclusive às pessoas não nominadas, mas que, de
alguma forma, contribuíram para eu realizar esta tese.
Deixo, então, o meu muito obrigada.
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
EPÍGRAFE
Não se nasce mulher, torna-se mulher.
Simone de Beauvoir, 1949, em O Segundo Sexo
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
RESUMO
DIAS, Almerinda Tereza Bianca Bez Batti. Estratégia como prática social: um
estudo de práticas discursivas e questões de gênero das(os) praticantes no processo
estratégico de uma instituição de ensino superior comunitária. 2015; 262f. Tese
(doutorado em administração) – Programa de Pós-Graduação em Administração da
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Biguaçu, 2015.
Este trabalho foi realizado na interface de dois campos teóricos de estudo, a saber: a
abordagem contemporânea da Estratégia como Prática Social – EPS (WHITTINGTON,
1996) com destaque para as práticas discursivas da estratégia integrada com as questões
de gênero, cujo foco se deu na divisão sexual do trabalho, especificamente nos
princípios da separação e da hierarquia. Whittington (2006) apresentou em seu desenho
teórico a tríade: práticas, práxis e praticantes em que as primeiras são os métodos de
decisão estratégica, ferramentas, normas e procedimentos que orientam as atividades
estratégicas; práxis – são as atividades envolvidas no processo estratégico, são aquelas
que possibilitam a criação e a realização da estratégia. Refere-se à atividade realizada
pelas(os) estrategistas; e praticante – referem-se às(os) executoras(es) das práticas,
qualquer pessoa envolvida no processo estratégico. Vaara e Whittington (2012)
sugeriram que, dentre outras temáticas a serem investigadas, os estudos da EPS devem
pesquisar as práticas discursivas, as quais estão dentro do conjunto de práticas da
abordagem da Estratégia como Prática Social articuladas às questões de gênero, a fim de
compreendermos como ocorrem o discurso das(os) estrategistas e se há influência de
gênero no processo estratégico. Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo geral:
compreender como as práticas discursivas e questões de gênero – princípios da
separação e da hierarquização – contribuem na práxis estratégica de uma Instituição de
Ensino Superior comunitária. Acerca do design metodológico do trabalho, a literatura
apontou que pesquisas em EPS devem utilizar a abordagem qualitativa, perspectiva esta
adotada no trabalho. Como método, optamos pelo estudo de caso em uma instituição de
ensino superior comunitária pelo fato de que, além de ser recomendado na literatura,
também se refere a uma instituição em que há mulheres em todos os níveis hierárquicos
da gestão. Para coleta dos dados, utilizamos a observação sistemática em cinco reuniões
do planejamento estratégico; entrevista qualitativa com gestoras(es) dos cinco níveis
hierárquicos da IES e, também, a análise documental dos Relatório CPA (Comissão
Própria de Avaliação), livro Unesc: a trajetória de uma universidade comunitária,
Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), relatório Planejamento Estratégico,
materiais utilizados em reuniões do PE 2014, relatórios de funcionários (formação e
titulação acadêmica) e das(os) gestoras(es) da Instituição com suas funções. Para a
análise dos dados, apresentamos e utilizamos a análise semiótica para a qual
estabelecemos uma sistematização do método articulando as tricotomias de Peirce
(2000) com contribuições de Knights e Morgan (1991), de Vaara e Tienari (2008) Vaara
(2010). Dessa análise semiótica, verificamos que, por meio das práticas discursivas, foi
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
possível identificar o que impactou no processo estratégico, a saber: o processo
decisório, as vozes e os fatores organizacionais. Quanto às questões de gênero, a
contribuição foi de verificar que o cenário da IES é o mesmo de outras organizações, ou
seja, embora a Instituição tenha um percentual relevante de mulheres na gestão, o
cenário apontado na literatura se reproduz na Universidade.
Palavras-chave: Estratégia como Prática Social. Práticas Discursivas. Gênero. Divisão
Sexual do Trabalho. Análise Semiótica.
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
ABSTRACT
This study was conducted at the interface of two theoretical fields of study: the
contemporary approach of Strategy as Social Practice - SSP (WHITTINGTON, 1996)
highlighting the discursive practices of the integrated strategy with gender issues,
focusing on the sexual division of labor, and in particular, the principles of separation
and hierarchy. Whittington (2006) showed, in his theoretical design, the triad: practices,
praxis and practitioners, whereby the first are the methods of strategic decision, tools,
standards and procedures that guide the strategic activities; praxis refers to the activities
involved in the strategic process, those who enable the creation and implementation of
the strategy. The author refers to the activity carried out by the strategists; and
practitioner – these are the once who execute the practice, i.e. anyone involved in the
strategic process. Vaara and Whittington (2012) suggest that among other issues to be
researched, studies in SSP need to investigate the discursive practices, which are part of
a set of approaches of Strategy as Social Practice, articulated with gender issues, so that
we can understand the discourse of the strategists and determine whether gender
influences the strategic process. In this context, the overall aim of this study was to
understand how the discursive practices and gender issues - principles of separation and
hierarchy - contribute to the strategic practice of a community higher education
institution. In terms of methodological design, a qualitative approach was used in this
study, as this is advocated in the literature for research in SSP. We chose a case study in
a community higher education institution as the method, since this method is
recommended in the literature, and because it was an institution, where there are women
at all levels of management. For the data collection, we used systematic observation of
strategic planning meetings; qualitative interviews with managers of the five levels of
the HEI, and document analysis of the CPA (committee for assessment) report, Unesc
book: history of a community college, Institutional Development Plan (IDP), Report
Planning Strategic, materials used in the PE 2014 meetings, reports of employees
(training and academic titles) and the managers of the institution, with their job
functions. For the data analysis, we present and use semiotic analysis, for which we
established a systematic method for articulating the trichotomies of Peirce (2000) with
contributions from Knights and Morgan (1991), Vaara and Tienari (2008) and Vaara
(2010). Based on this semiotic analysis, we found that through the discursive practices,
it was possible to identify the factors that impact on the strategic process, namely: the
decision-making process, the voices and the organizational factors. In terms of gender
issues, the contribution of this study was the finding that the scenario of the IES studied
is the same as that of other organizations, i.e. although the institution has a significant
percentage of women in management, the scenario pointed out in the literature is
reproduced at the University.
Keywords: Strategy as Social Practice. Discursive Practices. Gender. Sexual Division
of Labor. Semiotics Analysis.
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Síntese dos Aspectos de Relevância da Pesquisa ........................................... 26
Figura 2: Mediação da EPS e Gênero pelas Práticas Discursivas .................................. 29
Figura 3: Tricotomias Perceanas e Respectivas Etapas de Análise ................................ 33
Figura 4: Organização da Tese ....................................................................................... 34
Figura 5: Poder Soberano versus Poder Disciplinar ....................................................... 45
Figura 6: Poder Disciplinar versus Biopoder ................................................................. 46
Figura 7: Fragilidades Abordagem Clássica ................................................................... 55
Figura 8: Fragilidades Abordagem Processual ............................................................... 57
Figura 9: Campo Organizacional de Estratégia: produtores e consumidores de estratégia
discurso............................................................................................................................63
Figura 10: Compreensão Sociológica para as Implicações Práticas Gerencialistas ....... 65
Figura 11: Integração entre Práticas, Práxis e Praticantes .............................................. 66
Figura 12: Práxis, Práticas e Praticantes ......................................................................... 68
Figura 13: Abordagens de Estudo da História da Mulher .............................................. 76
Figura 14: Epistemologias e Correntes de Estudos Feministas ...................................... 84
Figura 15: Histórico das Categorias: Mulher, Mulheres e Gênero ................................. 86
Figura 16: Fatores que Incidem no Processo de Reprodução das Desigualdades de
Gênero e suas Características ....................................................................................... 101
Figura 17: Delineamento da Pesquisa .......................................................................... 122
Figura 18: Síntese das Técnicas de Coleta e Análise dos Dados ................................. 125
Figura 19: Roteiro Observação Sistemática ................................................................. 128
Figura 20: Organograma Unesc .................................................................................... 131
Figura 21: Distribuição Amostra para Entrevista ......................................................... 132
Figura 22: Tópicos da Entrevista Qualitativa ............................................................... 133
Figura 23: Objetivos das Técnicas de Coleta de Dados ............................................... 134
Figura 24: Interdependências, interações e inter-relações ............................................ 136
Figura 25: Etapas de Análise Semiótica das Práticas Discursivas ............................... 138
Figura 26: Representação da Análise Semiótica .......................................................... 141
Figura 27: Legenda Dados ............................................................................................ 142
Figura 28: Linha do Tempo .......................................................................................... 142
Figura 29: Primeira Sede Administrativa Fucri ............................................................ 147
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 30: Registro das Comemorações ....................................................................... 149
Figura 31: Logomarca Institucional ............................................................................. 151
Figura 32: Registro das Ações Comunitárias ............................................................... 151
Figura 33: Síntese das Edições do Processo Estratégico Institucional ......................... 159
Figura 34: Convites para Participar da Pesquisa .......................................................... 165
Figura 35: Vozes Presentes nas Práticas Discursivas ................................................... 168
Figura 36: E-mail Agradecendo a Participação na Pesquisa ........................................ 183
Figura 37: Fluxo da Formação da Estratégia na Percepção das(os)
Entrevistadas(os)...........................................................................................................187
Figura 38: Comparação das Abordagens de Estratégia e a IES Pesquisada ................. 188
Figura 39: Mapa Conceitual dos Fatores que Impactaram no Fazer Estratégia .......... 199
Figura 40: Distribuição das(os) Praticantes por Nível Hierárquico ............................. 203
Figura 41: Mapa Conceitual Divisão Sexual do Trabalho na IES ................................ 222
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Gerenciamento dos Setores .......................................................................... 207
Tabela 2: Número de Mulheres e Homens na IES por Área de Atuação ..................... 209
Tabela 3: Gestoras(es)-Docentes por Área Acadêmica ................................................ 212
Tabela 4: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNACET ........................................... 217
Tabela 5: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNACSA ........................................... 218
Tabela 6: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNAHCE ........................................... 218
Tabela 7: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNASAU ........................................... 219
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ADITT – Agência de Desenvolvimento, Inovação e Transferência de Tecnologia
ANPAD – Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração
ANT – Actor-Network Theory
ANTD – Agenda Nacional de Trabalho Docente
CEDAW – Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Contra a Mulher
CGUT – Comitê Técnico de Estudos de Gênero e Uso do Tempo
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CONSU – Conselho Universitário
CPA – Comissão Própria de Avaliação
CSA – Conselho Superior de Administração
DRP – Diretoria de Política Regulatória
EAD – Educação a Distância
EPS – Estratégia como Prática Social
ESEDE – Escola Superior de Educação Física e Desportos
ESCCA – Escola Superior de Ciências Contábeis e Administração
ESTEC – Escola Superior de Tecnologia
EUA – Estados Unidos da América
FACIECRI – Faculdade de Ciências e Educação de Criciúma
FCS – Fatores Críticos de Sucesso
GLNRS – Coordenação-Geral de Legislação e Normas da Regulação e Supervisão da
Educação Superior
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IES – Instituição de Ensino Superior
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IPARQUE – Parque Científico e Tecnológico da Unesc
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
OEA – Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos
OIT – Organização Internacional do Trabalho
ONU – Organização das Nações Unidas
ONU Mulheres – Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o
Empoderamento das Mulheres
PDI – Plano de Desenvolvimento Institucional
PDTI – Plano Diretor de Tecnologia da Informação
PEI – Planejamento Estratégico Institucional
PI – Plano de Infraestrutura
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNPM – Plano Nacional de Políticas para as Mulheres
PROAF – Pró-reitoria de Administração e Finanças
PROGRAD – Pró-reitoria de Ensino de Graduação
PROPEX – Pró-reitoria de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão
SAE – Secretaria de Políticas do Trabalho e Autonomia Econômica das Mulheres
SAIAT – Secretaria de Articulação Institucional e Ações Temáticas
SERES – Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior
SEV – Secretaria de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres
SPM – Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República
TAC – Teoria da Ação Comunicativa
TRS – Teoria das Representações Sociais
UCLA – Centro Médico para o Estudo de Intersexuais e Transexuais, na Universidade
da Califórnia, em Los Angeles
UNA – Unidade Acadêmica
UNIFACRI – União das Faculdades de Criciúma
UNIFEM – Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher
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SUMÁRIO
CAPITULO 1 ................................................................................................................ 18
APRESENTAÇÃO DO TRABALHO ........................................................................ 18
1.2 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA .............................................. 20
1.3OBJETIVOS DA PESQUISA ................................................................................... 24
1.3.1 Objetivo Geral ..................................................................................................... 24
1.3.2 Objetivos Específicos ........................................................................................... 24
1.4 CONJECTURAS ...................................................................................................... 25
1.5 RELEVÂNCIAS TEÓRICA, EMPÍRICA E METODOLÓGICA .......................... 26
1.5.1 Relevância Teórica .............................................................................................. 27
1.5.2 Relevância Empírica............................................................................................ 30
1.5.3 Relevância Metodológica .................................................................................... 32
1.6 ORGANIZAÇÃO DA TESE ................................................................................... 33
CAPÍTULO 2 ................................................................................................................ 37
CONTRIBUIÇÕES DE FOUCAULT PARA O ESTUDO DA ESTRATÉGIA
COMO PRÁTICA SOCIAL E DO GÊNERO NO TRABALHO ............................ 37
CAPÍTULO 3 ................................................................................................................ 50
TRAJETÓRIA EPISTEMOLÓGICO-TEÓRICA DOS ESTUDOS ...................... 50
SOBRE ESTRATÉGIA ............................................................................................... 50
3.1 ESTRATÉGIA: DO MODERNISMO AO APÓS MODERNISMO ....................... 51
3.2 A ABORDAGEM DA ESTRATÉGIA COMO PRÁTICA SOCIAL – EPS .......... 59
CAPÍTULO 4 ................................................................................................................ 73
ESTUDOS SOBRE GÊNERO ..................................................................................... 73
4.1 DOIS OU TRÊS MOMENTOS DOS ESTUDOS DE GÊNERO? CONCEPÇÕES
EPISTEMOLÓGICAS ................................................................................................... 74
4.2 GÊNERO: CONCEITOS CONTEMPORÂNEOS .................................................. 90
4.3 ESTUDOS SOBRE GÊNERO EM ORGANIZAÇÕES DE TRABALHO ............. 93
4.4 INICIATIVAS INSTITUCIONAIS SOBRE GÊNERO ........................................ 107
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CAPÍTULO 5 .............................................................................................................. 119
POSICIONAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA ................................. 119
5.1 LOCUS E PARTICIPANTES DA PESQUISA ..................................................... 120
5.2 DELINEAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA .................................... 122
5.2.1 Abordagem da Pesquisa .................................................................................... 123
5.2.2 Método da Pesquisa ........................................................................................... 124
5.2.3 Investigação das Práticas Discursivas: técnicas de coleta de dados .............. 125
5.2.3.1 Observação Sistemática e Diário de Campo .................................................... 126
5.2.3.2 Entrevista Qualitativa ....................................................................................... 129
5.2.3.3 Análise Documental ......................................................................................... 133
5.3 ANÁLISE SEMIÓTICA DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS ................................ 135
CAPÍTULO 6 .............................................................................................................. 143
ESTUDO DE CASO – UNESC ................................................................................ 143
6.1 CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL E PRÁTICA ESTRATÉGICA DA
INSTITUIÇÃO ESTUDADA ...................................................................................... 145
6.2 PRÁTICAS DISCURSIVAS NO FAZER ESTRATÉGIA ...................................... 160
6.2.1 As Vozes Presentes nas Práticas Discursivas .................................................. 161
6.2.2 Processos Decisórios na Formação da Estratégia ........................................... 171
6.3 FATORES QUE IMPACTARAM NO FAZER ESTRATÉGIA .............................. 189
6.3.1 Poder: Cultura Organizacional ........................................................................ 190
6.3.2 Poder: Política Institucional ............................................................................. 194
6.4 QUESTÕES DE GÊNERO: DISCRIMINAÇÃO OU SEGMENTAÇÃO NO
AMBIENTE DE TRABALHO .................................................................................... 200
6.4.1 Divisão Sexual do Trabalho: Funções Ocupadas – Níveis Hierárquicos ...... 201
6.4.2 Divisão Sexual do Trabalho: Áreas de Atuação – Acadêmica e Meio .......... 206
6.4.3 Divisão Sexual do Trabalho: Áreas do Conhecimento ................................... 212
6.4.4 Divisão Sexual do Trabalho: Hierarquia – Titulação ................................... 216
6.5 CONTRIBUIÇÕES DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS E QUESTÕES DE
GÊNERO ...................................................................................................................... 223
6.5.1 Contribuições das Práticas Discursivas ........................................................... 224
6.5.2 Contribuições das Questões de Gênero ........................................................... 226
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 7 .............................................................................................................. 230
REFLEXÕES FINAIS ............................................................................................... 230
7.1 REFLEXÕES FINAIS ............................................................................................ 231
7.2 LIMITAÇÕES DA PESQUISA ............................................................................. 237
7.3 SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS .................................................... 238
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 238
APÊNDICE A– DESIGN DA PESQUISA ............................................................... 264
18
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPITULO 1
APRESENTAÇÃO DO TRABALHO
“Todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a
apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo.”
(FOUCAULT, 1996, p. 45)
19
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
1.1 PRIMEIRAS PALAVRAS
Antes de entrarmos no trabalho acadêmico-científico a que se propõe este
texto, gostaria de explicitar algumas considerações acerca da produção textual a fim de
orientar o leitor de forma a não lhe causar nenhum estranhamento durante a sua leitura.
Optei por utilizar a primeira pessoa do plural ao longo do texto por entender
que o produto final de minha caminhada de doutorado não é fruto exclusivamente meu.
Portanto, junto com a minha voz, estão implícitas as vozes das(os) autoras(es), cuja
literatura recorri, das(os) professoras(es) orientadoras(es), avaliadoras(es) e das
disciplinas que cursei no programa, das(os) minhas(meus) colegas-amigas(os) que,
também, contribuíram durante a construção deste trabalho. Uso, na revisão da literatura,
os verbos conjugados no passado quando se referem às contribuições das(os)
autoras(es), porque entendo haver mais coerência nessa prática uma vez que as suas
publicações já se realizaram.
Outra questão que também foi minha opção, evidentemente influenciada por
professoras(es) e leituras realizadas, é o uso das notas de rodapé para explicações,
contextualizações e, até mesmo, considerações acerca de determinada abordagem. Sei
que essa utilização não é tão comum na área da Administração. Mas, como estamos
diante de uma tese de doutorado interdisciplinar, que recorreu à abordagem qualitativa,
e as teorias abordadas são contemporâneas, senti-me encorajada a utilizá-las, inclusive,
de forma farta. Também devido a essa interdisciplinaridade, apresentei fragmentos de
dados oriundos da análise documental, observação e entrevistas em itálico, sem recuo de
margem e com espaçamento simples com o objetivo de que fosse dado destaque a eles,
mas sem confundi-los com as citações diretas.
A fim de contextualizar este trabalho acadêmico-científico com o meu lugar
de autora, esclareço que a tese se realizou na interface de dois campos teóricos de
estudo, a saber: a abordagem contemporânea da Estratégia como Prática Social – EPS –
(WHITTINGTON, 1996; 2006) com destaque para as práticas discursivas, traçando
dessa maneira um caminho interdisciplinar com a Linguística, e as questões de gênero,
com foco na divisão sexual do trabalho. Destaco que o meu interesse pela integração
dessas perspectivas teóricas se deu naturalmente em razão das minhas graduações em
20
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Letras e Administração Pública, mestrado em Ciências da Linguagem e pela experiência
profissional como docente na área de Linguística e temas relacionados à gestão, mas
também por desempenhar funções de gestão, inclusive relacionadas ao planejamento
estratégico. Desse modo, nasceu o desejo de poder realizar um estudo em que fosse
possível articular essas áreas do saber e cresceu a vontade de estudar as práticas
discursivas relacionadas ainda com as questões de gênero, temática esta emergente nas
organizações e porque não dizer no mundo.
Já o meu interesse pelas questões de gênero nas organizações emergiu,
posso dizer de forma não tão natural no sentido de que, até então essa temática não
havia despertado a minha curiosidade em meu percurso acadêmico. Mas, ao ser
estimulada por professoras de disciplinas e colegas de docência na Instituição em que
leciono e, também, à medida que as leituras foram realizadas, essa lacuna era apontada
pelas(os) estudiosas(os) da EPS, reconheci, então, a relevância do tema também no
meio acadêmico. Portanto, colocando-me em um lugar de fala de alguém que conclama
essa importância, eu não poderia construir este texto sem priorizar por marcas
linguísticas que valorizassem a mulher, o feminino. Logo não estranhem que sempre
que houver explicitadas(os) as(os) praticantes, autoras(es), dentre outras, haverá a
marcação do feminino antes do masculino, contrariando a prescrição da norma padrão
do português. Diante dessa explanação, passamos a apresentar os itens introdutórios
desta tese.
1.2 DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA
A fim de contextualizar esse estudo no campo da estratégia, na linha do
tempo desses estudos, são três as perspectivas que estudam a estratégia: na primeira,
chamada de tradicional ou clássica, o fazer estratégia é realizado pela alta
administração e os especialistas no assunto com o propósito de planejar o futuro, pois se
consideram capazes de perceber oportunidades e ameaças. Volberda (2004) ratificou
que o foco da estratégia, na perspectiva clássica, está na vantagem competitiva.
Na segunda, conhecida como processual ou estratégia como processo, o
fazer estratégia agrega questões sociais e políticas enfatizando práticas cotidianas na
empresa, agregando outras(os)personagens, as(os) quais podem interferir na estratégia
21
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
organizacional, é vista como processo de aprendizagem em que as etapas de formulação
e implantação são um único processo, contrapondo, dessa maneira, com a abordagem
anterior. Além disso, nesta perspectiva, os planos traçados previamente são
flexibilizados, enfatizando os fluxos de processos; por fim desta proposta nasce a
abordagem da Estratégia como Prática Social – EPS, focalizando as micros atividades
das(os) participantes no cotidiano.
A terceira perspectiva, intitulada como Estratégia como Prática Social
(EPS), movimento europeu da década de 1990 – deriva da teoria social da década de 80,
trazendo, portanto, um viés sociológico para a estratégia, ao ampliar os demais atores
envolvidos na estratégia da organização. Essa proposta valoriza a pesquisa qualitativa,
com pluralidade de métodos a fim de aproximar mais os estudiosos de seu objeto de
estudo: os estrategistas. Para essa concepção teórica, a estratégia é uma Prática Social,
em que o relevante é compreender como as(os) praticantes interagem e agem no
processo de fazer estratégia utilizada nas organizações.
Whittington (1996; 2001) justificou que o campo dos estudos da estratégia
está, cada vez mais, tornando-se interessante, bem como suas ferramentas e seus
trabalhadores. O autor defendeu ainda que atualmente há tanto um interesse no
desenvolvimento de micro estratégia – atividades das(os) praticantes dentro das
organizações, como também o interesse mais macro na ascensão e queda de
determinadas práticas e estratégias de gestão. Mas, por fim, alegou que a articulação do
contexto macro e micro1 em estratégia é o problema central em aprender a criar
estratégias. “[...] aceitar a estratégia como uma prática social envolve a recusa em
privilegiar a performance da firma, em benefício da performance do campo como um
todo ou das(os) praticantes da estratégia individualmente” (WHITTINGTON, 2004, p.
48).
Ao focalizar a EPS – uma das teorias que norteia este estudo, Whittington
(2006), em sua proposta teórica sobre a chamada virada estratégica, apresentou a tríade
estratégica, a qual é composta por: práticas – são os métodos de decisão estratégica,
ferramentas, normas, discursos e procedimentos que trabalham a estratégia, em outras
1Balogun, Huff e Johnson (2003) expuseram que vários indicadores apontam para a necessidade de
compreender como o comportamento diário em organizações cria escolhas estratégicas e suas
consequências. Alegaram também que é uma antítese o fato de que, ao mesmo tempo, há a necessidade de
os pesquisadores compreenderem detalhadamente o contexto, ficando próximos ao fenômeno estudado,
mas também estudá-lo de forma ampla na organização.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
palavras: tudo o que orienta as atividades do dia a dia; práxis – são as atividades
envolvidas no fazer estratégia, são aquelas que possibilitam a criação da estratégia, ou
seja: como o trabalho da estratégia se realiza, materializa-se na organização. Trata-se da
atividade em si realizada pela(o) praticante, é o modo com as práticas são realizadas; e
praticante – refere-se à(o)executora(r) das práticas, à pessoa que está envolvida no fazer
estratégia.
Portanto, para Vaara e Whittington (2012), há necessidade de ir mais longe
na análise das práticas sociais a fim de ampliar o potencial da perspectiva da EPS, haja
vista que as práticas organizacionais afetam significativamente o processo e o resultado
das estratégias. Dessa maneira, os autores sugeriram direções para as pesquisas futuras.
Dentre essas sugestões, abordaram que a gestão estratégica envolve as práticas
discursivas – linguagem em seu uso – easpectos de gênero, que promovem valores
masculinos no discurso estratégico e que seria interessante compreender os papéis e
identidades que mulheres e homens desempenham na estratégia, entender se e como
eles dependem dos contextos organizacionais. Entendemos, portanto, que temos uma
lacuna a ser estudada dentro da perspectiva da EPS, que é a ampliação dos estudos
buscando envolver as práticas discursivas2 articuladas à temática de gênero.
Remetemo-nos, então, aos estudos de gênero, o trabalho que foi marco na
dicotomia entre sexo e gênero como categoria de análise foi o artigo de Scott – primeira
publicação em 1988 e posteriormente em 1989. Nele a autora permitiu que a questão do
gênero fosse então pensada como uma categoria de análise distinta de sexo. Além disso,
trouxe um histórico acerca dos estudos descritivos do gênero. Para a pesquisadora, sexo
é biológico e natural, e gênero é culturalmente construído. Scott (1983) esclareceu que
estudar gênero significa examinar homens e mulheres em relação um a outro, de
questionar quais definições ou leis que se aplicam a um seguramente implica com o
outro, quais atividades de homens e mulheres revelam sobre cada um, quais
2 Acerca da expressão práticas discursivas na EPS, ela foi mencionada por Vaara, Kleymann e Seritö
(2004) em seu estudo sobre estratégia como construções discursivas. Nele, examinaram os elementos
discursivos a fim de compreender os micros processos e práticas que compõem a estratégia. Os autores
afirmaram que as pesquisas acerca da estratégia têm dado pouca atenção aos processos discursivos
envolvidos na elaboração das estratégias.
Nesse mesmo sentido, Vaara, Sorsa e Pälli (2010) afirmaram a necessidade de pesquisa que investiguem
o discurso estratégico. Também Vaara e Whittington (2012) defenderam como agenda de pesquisa
investigações que estudem os valores incorporados no discurso estratégico que podem influenciar o
comportamento dos atores envolvidos no fazer estratégia.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
representações da diferença sexual sugerem sobre a estrutura de autoridades social,
econômica e política.
Ao estudar gênero nas organizações, Abramo (2004) expôs que, desde a
década de 1990, as mulheres conseguiram algumas conquistas como uma melhor
participação no mercado de trabalho tradicionalmente masculino e, também, passaram a
ocupar mais oportunidades de empregos, inclusive os formais, embora esse percentual
ainda seja inferior ao dos homens, dessa maneira as mulheres ocupavam maior parte dos
trabalhos informais. Também a autora colocou que, apesar de as mulheres terem
aumentado o seu acesso à educação formal e, consequentemente, aumentaram o seu
grau de escolaridade, isso não as coloca em condições de igualdade com os homens no
ambiente profissional: ou seja, as mulheres precisam ter uma escolaridade maior que os
homens para conseguirem a mesma oportunidade de trabalho, havendo dessa maneira
uma divisão sexual do trabalho. Nesse mesmo sentido, Cappelle et al. (2007)
defenderam que, embora tenham havido transformações nos papéis desempenhados
pelas mulheres no âmbito familiar (reprodutivo) e profissional (produtivo), permanecem
ainda desequilíbrios em vários aspectos. Essas diferenças tanto ocorrem porque há
trabalhos que são considerados especificamente para mulheres e outros para homens
(princípio da separação), como também há trabalhos de homens que são mais
valorizados do que aqueles que são para mulheres (princípio da hierarquização)
defenderam Hirata e Kergoat (2007) e Kergoat (2009).
A fim de nos fundamentar teoricamente articulando as duas áreas do saber:
EPS e gênero, realizamos uma busca pelos termos strategy as practice, strategy-as-
practice e strategy practice relacionados à gender nas bases Ebsco, Capes, Scielo e, no
âmbito nacional, Estratégia como Prática Social3 e gênero nas mesmas bases, eventos e
periódicos nacionais disponíveis no site da Associação Nacionalde Pós-graduação e
3 Bispo, Soares e Cavalcante (2014) realizaram estudo bibliométrico a fim de mapear a publicação, por
meio do sistema de indexação SPELL – Scientific Periodicals Electronic Library, acerca dos estudos
realizados em abordagens sobre práticas, no período de 2002 a 2014. Dos trabalhos analisados, 42%
estavam centrados na área da estratégia. “É importante perceber que o tema estratégia como prática vem
crescendo e se desenvolvendo, é possível perceber isso quando observamos que o periódico que concentra
o maior número de publicações é o REABRE, e que o principal tema de pesquisa e as palavras- chave
mais citadas são ‘estratégia como prática’ 20 vezes, ‘estratégia’ 10 vezes, ‘estratégia como prática social’
3 vezes e ‘strategizing’ 3 vezes” (BISPO; SOARES; CAVALCANTE, 2014, p. 11). Os autores
evidenciaram que a produção brasileira ainda é incipiente desde o início dos anos 2000 e está concentrada
em dois temas independentes, a saber: aprendizagem e conhecimento e Estratégia como Prática as quais
foram destaques no movimento da virada das práticas.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Pesquisa em Administração. Dessa busca, localizamos dois trabalhos articulando gênero
com a abordagem da EPS: um teórico e um empírico das mesmas autoras – Silva e
Lavarda (2010; 2011) – em que estudaram como as mulheres participaram na EPS e
como está caracterizado o praticante feminino que participa na Estratégia como Prática
Social. As autoras também ratificaram a necessidade de associar questões de gênero à
abordagem da EPS.
Com o propósito de promover a integração teórica e empírica entre a
perspectiva da Estratégia como Prática Social e a temática gênero, buscamos responder
à seguinte pergunta norteadora da pesquisa: Como as práticas discursivas e questões
de gênero – princípios da separação e da hierarquização – das(os) estrategistas
contribuiram no fazer estratégia de uma Instituição de Ensino Superior
comunitária?
1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA
1.3.1 Objetivo Geral
Compreender como as práticas discursivas e questões de gênero – princípios
da separação e da hierarquização – contribuíram no processo estratégico4 – fazer
estratégia – de uma Instituição de Ensino Superior comunitária.
1.3.2 Objetivos Específicos
A fim de alcançar o objetivo geral e responder à pergunta de pesquisa,
norteados pelos elementos da Estratégia como Prática Social e gênero, temos como
objetivos intermediários:
4 A expressão processo estratégico usada neste trabalho não remete a abordagem processual da estratégia,
o que poderia denotar, de certa forma, contradição à proposta da EPS, mas refere-se ao evento realizado
pela Instituição para formação da estratégia. Whittington (2007) expôs que a relação entre EPS e a
abordagem processual da estratégia podem gerar certa confusão em razão de, embora tenham diferenças
relevantes, a relação ser tênue. O autor colocou como principal questão para essa ambiguidade a
dicotomia teórica em que a EPS estaria focada no conteúdo, no tipo da estratégia enquanto a Processual
com a formulação e implantação da estratégia.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Resgatar o contexto histórico-social da IES até 2014 e de sua prática estratégica
do período em que está formalizada.
Analisar, por meio das práticas discursivas, as vozes e processo decisório
utilizados pelas(os)praticantes na formação da estratégia na Instituição.
Verificar os fatores que impactaram na formação da estratégia na Universidade.
Identificar as questões de gênero com foco na divisão sexual do trabalho, por
meio dos princípios da separação e da hierarquia nas práticas discursivas da
estratégia.
1.4 CONJECTURAS
A literatura expõe e justifica a necessidade de investigar empiricamente as
práticas do dia a dia nas instituições a fim de entendermos como se dá a formação da
estratégia tanto na dimensão macro, mas principalmente na micro (JOHNSON; MELIN;
WHITTINGTON, 2003). Dentre as práticas cotidianas que impactam o fazer estratégia,
os autores sugeriram que as práticas discursivas merecem destaque, haja vista ser por
meio delas que a estratégia é formulada e as questões de gênero se materializam.
Chies (2010) argumentou que a discriminação de gênero no mercado de
trabalho ainda permanece, embora tenham ocorrido transformações e avanços sociais
nos últimos tempos com relação ao acesso das mulheres na esfera pública. No entanto
os lugares ocupados por elas são ainda aqueles considerados secundários nas
organizações e, portanto, com remuneração e reconhecimento aquém àqueles alocados
para os homens, permanecendo, dessa maneira, a desigualdade de gênero também no
ambiente de trabalho.
Além disso, Whittington, Cailluert e Yakis-Douglas (2011) e Vaara e
Whittington (2012) expuseram que as pesquisas na perspectiva da EPS devem também
ser articuladas com a temática gênero, uma vez que pode impactar também na formação
das estratégias nas organizações. Isso posto, está explícito na literatura da EPS o
interesse em investigar tanto as práticas discursivas como as questões de gênero no
fazer estratégia, por consequência asconjecturas deste trabalho são:
As práticas discursivas explicitam vozes e fatores que impactam
relevantemente no fazer estratégia da Universidade.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Apesar dos avanços acerca das questões de gênero e de a Instituição ser
uma universidade, ou seja: área da educação, nela se reproduz o cenário
de feminização de organizações de outras áreas de atuação.
1.5 RELEVÂNCIAS TEÓRICA, EMPÍRICA E METODOLÓGICA
Além de a proposta da Estratégia como Prática Social ser uma abordagem
recente no continente europeu e no Brasil, a articulação dela com a temática gênero não
tem sido muito estudada, embora venha sendo apontada como agenda de pesquisa por
estudiosos, tais como: Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007), Silva e Lavarda (2010),
Whittington, Cailluert e Yakis-Douglas (2011) e Vaara e Whittington (2012). Dessa
maneira a relevância deste trabalho está ancorada na integração da EPS com foco nas
práticas discursivas com as questões de gênero com ênfase nos princípios da separação
(há atividades que são para homens e outras que são para mulheres) e da hierarquização
(os trabalhos dos homens são mais valorizados que os das mulheres). Bem como pelo
fato de o estudo de caso ser aplicado em uma Instituição de Ensino Superior
comunitária brasileira, a qual foi escolhida em função do relevante percentual de
mulheres na gestão da Universidade. Também trazemos a técnica de análise semiótica
dos dados a qual está ancorada na semiótica de Peirce (2000).
Dessa maneira, o estudo – à luz da EPS – busca ompreender como as
práticas discursivas e questões de gênero – princípios da separação e da hierarquização
– contribuem no fazer estratégia de uma Instituição de Ensino Superior comunitária
torna-se relevante, porque trará, no mínimo, três contribuições, conforme ilustra a
Figura 1.
Figura 1: Síntese dos Aspectos de Relevância da Pesquisa Relevância Síntese
Teórica Associação entre uma abordagem contemporânea da estratégia, com foco nas
práticas discursivas das(os) praticantes com os estudos de gênero – um dos temas de
maior relevância social no campo científico atualmente.
Empírica Aplicação da abordagem da EPS no campo da Gestão de uma instituição de
ensino superior comunitária. Presença de mulheres na gestão da IES.
Metodológica
Sistematização e utilização da análise semiótica no campo dos estudos das
organizações: estratégia.
Valorização de práticas de coleta discursivas que exigem a imersão do
pesquisador no campo.
Fonte: Elaborada pela Autora
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Nas seções seguintes, detalhamos as três relevâncias apontadas acima.
Inicialmente justificamos, com base na literatura, a lacuna do estudo e, na sequência,
discorremos sobre sua relevância e ineditismo.
1.5.1 Relevância Teórica
A temática Estratégia como Prática Social teve seu início há pouco menos
de duas décadas na Europa, mais precisamente na Inglaterra, com a publicação de
Whittington (1996). No Brasil, ainda incipiente, segundo Walter, Bachl e Barbosa
(2012), o primeiro artigo nacional foi publicado por Silva (2005), em que o autor
apresentou crítica à lógica dominante (abordagem clássica da estratégia), buscando
explicitar novos elementos conceituais que permitissem construir um novo caminho que
altere de maneira evolutiva de tal proposta – responsável pelas causas de fracasso da
estratégia. Jarzabkowski (2004) pontuou que as transformações ocorridas no campo da
estratégia se dão em função de duas motivações, a saber: primeiro – a frustração com os
modelos prescritivos que simplificam a complexidade no fazer estratégia; segundo –
ênfase dos atores e suas ações no processo da organização. Volberda (2004) argumentou
no mesmo sentido ao dizer que as prescrições estratégicas tradicionais não têm sido
suficientes para estudar o fenômeno da estratégica.
Em razão deste desapontamento, a proposta da EPS surgiu para
complementar a abordagem anterior no sentido em que insere diversas(os) praticantes
no movimento do fazer estratégia, bem como olhar para as práticas utilizadas por
suas(seus) praticantes, em outras palavras: as(os) praticantes de estratégia e as micro
atividades cotidianas passam a ter destaque na construção da EPS, esclareceram
Jarzabkowski e Spee (2009). A fim de complementar, Vaara (2010) defendeu que,
mesmo havendo significativa publicação acerca da virada linguística na EPS, ainda há o
que ser estudado no que se refere a uma perspectiva discursiva para entender como se
dá o fazer estratégia.
No que tange à temática dos estudos sobre gênero – outra vertente desta
pesquisa – Saffioti (2009) alegou que, em 1992, quando levantou o estado da arte sobre
gênero, a publicação já era extensa e que na última década e meia vem aumentando
extraordinariamente, mas que não há consenso entre os estudiosos sobre o conceito de
28
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
gênero, mas percebeu uma conversão dos estudos quantitativos por qualitativos. Acerca
de estudos sobre gênero no trabalho, Abramo (2007) ratificou que ainda atualmente são
percebidos obstáculos à inserção e à permanência em igualdade de condições das
mulheres no mercado de trabalho, tanto com relação aos rendimentos, quando ao
desemprego. Essas barreiras acabam por ratificar a divisão sexual do trabalho. Para
Chies (2010, p. 526):
Apesar de todas as transformações sociais ocorridas nos últimos anos, os
polos principais de tensão ainda se manifestam na discriminação dirigida à
mulher. [...] E algumas das contradições e paradoxos pertinentes a esse
campo de tensão referem-se ao fato que, mesmo frente à evidente inserção
das mulheres no mercado de trabalho, ao acesso à escolaridade e à
capacitação profissional, ainda o que pesa nas relações é a questão de gênero.
Embora não tenham focalizado a abordagem da EPS em seus trabalhos,
trazemos aqui alguns autores que trabalharam a estratégia com a temática gênero para,
também, justificar a articulação dessa perspectiva teórica com o tema gênero. Gomes et
al. (2009, p. 79) relataram: “[...] no que diz respeito, especificamente, ao
comportamento estratégico feminino, quase não há registro do assunto na literatura
especializada.” Em sua pesquisa, os autores buscaram conhecer o comportamento
estratégico de mulheres empreendedoras na cidade de Vitória da Conquista, região
sudoeste da Bahia. Já Callado et al. (2013) estudaramas práticas gerenciais inerentes à
gestão estratégica associadas aos gêneros dos gestores, em treze organizações
agroindustriais comercializadoras de frutas na CEASA/PE, considerando as
características dos gestores e das organizações.
Silva e Lavarda (2010), cuja pesquisa articulou Estratégia como Prática
Social e gênero, sugeriram que futuras investigações devem, empiricamente, estudar a
relação entre EPS e o papel do gênero no processo de elaboração e implantação da
estratégia, por meio de estudos longitudinais. Embora estudar questões relacionadas ao
gênero na prática estratégica tenha muita relevância nos estudos de estratégia
organizacional, elas têm sido pouco exploradas até o momento, complementaram as
autoras.
Além da interface EPS – focalizamos as práticas discursivas – e gênero,
articulamos a contribuição de Foucault com relação aos conceitos de práticas e de poder
necessários para analisar os resultados da pesquisa, promovendo, dessa maneira, um
diálogo entre as(os) autoras(es). Para Foucault (2008), o poder é flexível e está implícito
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
nas práticas cotidianas, no caso estudado, nas práticas discursivas. E, em tais práticas, as
relações de poder se manifestam. As práticas discursivas, portanto, possibilitam
materializar as relações que se dão por meio do discurso, respeitando determinadas
regras anônimas, contextualizadas historicamente. Nessas práticas estão ancoradas as
relações de poder e saber para Foucault. Dessa maneira as práticas discursivas são o
ponto convergente entre as abordagens da EPS e de gênero as quais são analisadas por
meio da semiótica, conforme ilustra a Figura 2. Vaara e Whittington (2012)
esclareceram que termo práticas é amplo e é o elo entre estudos em estratégia e outras
áreas do conhecimento.
Figura 2: Mediação da EPS e Gênero pelas Práticas Discursivas
Fonte: Elaborada pela Autora
Acreditamos ser apropriado o uso do conceito de poder de Foucault, uma
vez que as relações entre homens e mulheres são materializadas pelas práticas
discursivas e, naquelas, ainda permanecem relações desiguais de poder, muitas vezes
inseridas no plano micro das organizações, ou seja: nas ações cotidianas. O estudo
nesse viés está em conformidade com a abordagem da EPS que valoriza sobretudo o
estudo da estratégia na dimensão micro. Estudar as relações de poder de acordo com
Foucault significa direcioná-lo às práticas sociais, considerando aspectos históricos e
sociais que possam limitar e determinar as atividades das(os) atores sociais envolvidos
no fazer estratégia. Dessa maneira entendemos haver coerência entre as abordagens
teóricas da EPS e gênero com as contribuições de Foucault aos propósitos deste
trabalho.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Além disso, Vaara e Whittington (2012) propuseram cinco lacunas
fundamentais para avançar na pesquisa da Estratégia como Prática Social, das quais
focalizamos as duas últimas neste estudo:
1. Estudos dos artefatos materiais, tanto gerenciais como tecnológicos,
utilizados pelas(os) praticantes da estratégia.
2. Explorar a natureza macro-institucional ou social das práticas de
estratégia como “campos” de Bourdieu – ou “sistemas” sociais de Giddens.
3. Explorar as estratégias emergentes – aquelas que surgem no cotidiano
das organizações, as quais foram, de certa forma, negligenciadas nos
estudos da EPS.
4. Evidenciar a diversidade de práticas organizacionais que não são
reconhecidas como estratégia, como: as várias vozes e a multiplicidade
discursiva relacionada com a decisão estratégica.
5. Verificar como ocorre a participação, a inclusão, a (des)igualdade de
gênero e a capacitação dos indivíduos na estratégia.
Esta pesquisa buscou, portanto, estudar as lacunas teóricas apontadas por
Vaara e Whittington (2012). Logo pretende contribuir para a literatura especializada em
estratégia – prática discursiva – e gênero no trabalho, já que a EPS é um tema
emergente que recentemente iniciou sua caminhada teórica no Brasil, sobretudo com
trabalhos empíricos conforme demonstrado anteriormente. Portanto tem relevância
teórica, mas também ineditismo por trazer a abordagem EPS – ainda incipiente de
pesquisas empíricas no contexto brasileiro – articulada à temática gênero, haja vista ser
este um assunto em desenvolvimento. E que, embora este tema seja debatido desde a
década de 1970 e foram diversos os ganhos, permanece ainda a desigualdade entre
homens e mulheres no ambiente de trabalho. Logo tem sua relevância contemporânea
mundial e ineditismo de estudos que associem gênero com o fazer estratégia, sobretudo
abordando sob a lógica da Prática Social por meio das práticas discursivas.
1.5.2 Relevância Empírica
O método estudo de caso eleito para este trabalho que associa a EPS e
gênero se deu em razão de que a organização objeto de estudo ser uma Instituição de
Ensino Superior (IES) comunitária, em outras palavras: sem fins lucrativos. A escolha
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
da IES se justifica pelo argumento de Vaara e Whittington (2012), os quais defenderam
que as investigações na perspectiva da EPS trazem, dentre outros benefícios, o de poder
estudar outras instituições, para além do retorno econômico, como as organizações sem
fins lucrativos, dentre elas, as universidades, prefeituras, hospitais, etc.
Acerca do método escolhido, Albino et al. (2010) argumentaram que
estudos na perspectiva da EPS devem recorrer a metodologias qualitativas sobretudo os
estudos de caso. Portanto, para realizar trabalhos empíricos na abordagem da EPS, é
necessária a aproximação do pesquisador com os pesquisados, bem como estudar as
atividades do dia a dia. Essa aproximação é possibilitada pelo fato de a pesquisadora ser
funcionária e estar em função de gestão na Instituição. Whittington (1996; 2001; 2003;
2006) defendeu a valorização das experiências cotidianas dentro das organizações nos
estudos da EPS.
Também, para justificar a escolha do objeto de estudo, a Universidade
esteve durante o ano de 2014 e início de 2015, em plena revisão de suas estrategias, a
qual foi composta, segundo dados da análise documental, por: análise do ambiente de
negócios, posicionamento estratégico, definição das diretrizes estratégicas, elaboração:
do mapa estratégico, dos indicadores e metas e dos projetos estratégicos, desdobramento
da estratégia e construção do modelo de governança da estratégia.
Além da relevância da escolha do caso pelo método e pela aplicação da
abordagem da EPS articulada à temática gênero, a Instituição estudada tem em seu
grupo gestor mulheres e homens em todos os níveis hierárquicos. Dos cento e onze
estrategistas da Instituição que compõem o grupo do planejamento institucional, 54%
são gestoras e 46% gestores nos cinco níveis hierárquicos que constam no organograma
da Universidade. Também no cômputo geral 67% dos cargos são ocupados por
mulheres. A literatura mostra que essa não é a realidade predominante no mercado de
trabalho brasileiro. Bruschini (2007) apresentou que a participação das mulheres ainda é
inferior à participação masculina – 70%. Segundo IBGE (2012), em 2011, 45,40% das
mulheres estão ocupando funções no mercado de trabalho, e 54,50% são de homens.
Cappellin (2008) argumentou que há áreas de atuação que as mulheres têm sido mais
bem aceitas no campo profissional, a saber: administração, educação, saúde e
organismos internacionais. Dessa maneira, além da importância de estudar uma
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
instituição sem fins lucrativos, a Universidade se torna um estudo de caso singular pela
composição de sua gestão em termos de gênero.
1.5.3 Relevância Metodológica
Nas pesquisas que adotam a abordagem da EPS, há a busca pela pluralidade
de métodos de pesquisa para que se promova maior integração do pesquisador com os
pesquisados, tornando a relação mais próxima entre eles, bem como a valorização da
performance das(os) praticantes do processo estratégico e de suas práticas cotidianas,
enfatizando, portanto, as micros atividades. Balogun, Huff e Johnson (2003)
defenderam que os trabalhos devem trazer novas possibilidades metodológicas para as
pesquisas. Como esclareceu Whittington (2004), são as pesquisas sobre estratégia mais
direcionadas às práticas, buscando modelos para além da economia em direção à
Sociologia. Chia e Mackay (2007) complementaram que a perspectiva da EPS reorienta
as pesquisas em estratégia para o trabalho, conversas, atividades e competências
individuais das(os) gestoras(es) como estrategistas.
Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007), dentre a agenda de pesquisa
apresentada, sugeriram a necessidade de proposta metodológica inovadora para os
estudos em EPS. No mesmo sentido, Vaara e Whittington (2012) ratificaram que as
pesquisas nessa perspectiva trazem novos vieses ampliando os contextos empíricos de
pesquisa em estratégia, propiciando novas metodologias. Estes autores defenderam que
a pesquisa, utilizando a abordagem EPS, permite a análise de uma práxis mais
complexa, flexível e polivalente do que os relatos tradicionais ou documentos das
investigações convencionais de estratégia, e que, além de ação social humana, ainda há
muito o que pesquisar sobre gênero e práticas discursivas no fazer estratégia.
Este trabalho utiliza a abordagem de pesquisa qualitativa e para a coleta dos
dados a: observação sistemática com registro em diário de campo, entrevista qualitativa
e análise documental. Essa proposta está em consonância com a argumentação de
Jaccound e Mayer (2008) e Deslauriers e kerisit (2008) os quais esclareceram que a
pesquisa qualitativa pode utilizar a combinação de observação, entrevista e o uso de
dados documentais.
33
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
A relevância e a inovação metodológica deste trabalho no campo da
administração residem na proposição de uma análise semiótica das práticas discursivas
e das questões de gênero. Trazemos, portanto, no capítulo delineamento metodológico,
em específico na análise dos dados, na seção 5.3, a proposta metodológica de análise
semiótica das práticas discursivas, com base na Semiótica peirceana, em suas
tricotomias: Primeiridade – trata-se da primeira impressão ao ter o contato com o objeto
de estudo; Secundidade – é reação da consciência em relação aos fatos; Terceridade – é
a junção das duas primeiras categorias, trata-se da interpretação do mundo. Agregando a
esse método de análise, incluímos as contribuições de Knights e Morgan (1991) acerca
do contexto histórico, de Vaara e Tienari (2008) sobre os elementos textuais e, por fim
de Vaara (2010) com relação às questões de gêneros. Na Figura a seguir apresentamos
as tricotomias perceanas e as etapas da análise semiótica propostas para este trabalho, as
quais serão detalhadas em seção específica mencionada anteriormente.
Figura 3: Tricotomias Perceanas e Respectivas Etapas de Análise
Fonte: Elaborada pela Autora
1.6 ORGANIZAÇÃO DA TESE
Este trabalho está organizado, para fins didáticos, em sete capítulos, nos
quais segmentamos a introdução, os pressupostos teóricos, as escolhas metodológicas,
os resultados e respectivas discussões e, por fim, as reflexões finais, conforme detalhado
na Figura a seguir.
34
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 4: Organização da Tese C
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Primeiras palavras
Delimitação do problema de pesquisa
Objetivos da pesquisa Objetivo geral
Objetivos específicos
Conjecturas
Relevância
Teórica
Empírica
Metodológica
Organização da tese
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Contribuições de Foucault
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Trajetória
epistemológico-
teórica dos estudos
sobre estratégia
Estratégia: do modernismo ao após modernismo
A abordagem da Estratégia como Prática Social – EPS
CA
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Estudos sobre gênero
Dois ou três momentos dos estudos de gênero: concepções
epistemológicas
Gênero: conceitos contemporâneos
Estudos sobre gênero em organizações de trabalho
Iniciativas institucionais sobre gênero
CA
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UL
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5
Mét
od
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Posicionamento
metodológico da
pesquisa
Locus e participantes da pesquisa
Delineamento
metodológico da
pesquisa
Abordagem da Pesquisa
Método da Pesquisa
Investigação das
Práticas
Discursivas
Observação Sistemática
e Diário de Campo
Entrevista Qualitativa
Análise Documental
Análise semiótica das práticas discursivas
CA
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6
Res
ult
ad
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Estudo de caso –
UNESC
Contexto histórico-social e prática estratégica
Práticas
discursivas dos
sujeitos
As vozes presentes nas práticas discursivas
Processos decisórios no processo estratégico
Fatores que
impactaram no
processo estratégico
Poder: cultura organizacional
Poder: política institucional
Questões de
gênero:
discriminação ou
segmentação no
ambiente de
trabalho
Funções ocupadas: níveis hierárquicos
Áreas de atuação: acadêmica e meio
Áreas do Conhecimento
Hierarquia – Titulação
Contribuições Contribuições das Práticas Discursivas
Contribuições das Questões de Gênero
CA
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Co
ncl
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Reflexões finais
Reflexões acerca dos Objetivos
Limitações da Pesquisa
Sugestões para Futuras Pesquisas
Fonte: Elaborada pela Autora
35
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Neste primeiro capítulo, apresentamos os primeiros registros acerca das
propostas norteadoras da pesquisa teórica, bem como a pergunta que orienta a
investigação e aonde desejamos chegar a termos de objetivos e contribuições teórica,
empírica e metodológica.
Os pressupostos teóricos que fundamentam este trabalho estão organizados
em três capítulos, a saber: o segundo capítulo da tese e também primeiro da revisão da
literatura traz as contribuições de Foucault ao estudo: conceito de práticas e de poder. O
terceiro capítulo da tese trata dos estudos sobre a estratégia. Nele optamos por retomar
as abordagens de estudo da estratégia, indo do modernismo ao após modernismo a fim
de inserir, em tal contexto, a perspectiva que conduz este trabalho: Estratégia como
Prática Social. Em seção específica, focalizamos a proposta de Whittington – principal
abordagem deste trabalho.
No quarto capítulo da tese, destacamos os estudos sobre gênero. Na primeira
seção, apresentamos que os estudos do gênero se deram em dois momentos,
primeiramente focalizando a questão biológica e, no segundo momento, gênero passa a
ser uma construção social, abordando a epistemologia desses momentos. Dada essa
distinção, revisamos também os conceitos contemporâneos de gênero apresentados na
literatura. Como o propósito desta pesquisa é enfatizar questões de gênero no trabalho,
acreditamos ser pertinente abordar, em seções específicas, concisa revisão sobre divisão
sexual do trabalho e gênero no trabalho, bem como as iniciativas institucionais
brasileiras sobre gênero no trabalho.
Relatamos, no quinto capítulo, o posicionamento metodológico da pesquisa.
Nele apresentamos o delineamento metodológico do trabalho, ou seja: o desenho da
pesquisa, o locus e participantes da pesquisa. Em seções específicas, apresentamos a
abordagem qualitativa eleita para este trabalho, bem como o método estudo de caso e as
práticas de investigação com o objetivo de coletar os dados, as quais foram: observação
sistemática e a ferramenta diário de campo; entrevista qualitativa; e análise documental.
Por fim, na última seção, temos a proposta metodológica de análise dos dados: análise
semiótica das práticas discursivas na formação da estratégia.
No sexto capítulo, trazemos os resultados obtidos por meio da análise
documental, da observação sistemática e das entrevistas. Iniciamos com a parte
descritiva da tese sobre o contexto histórico-social e prática estratégica da Instituição
36
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
estudada. Nas seções seguintes, já com os dados primários da pesquisa, apresentamos as
práticas discursivas no fazer estratégia, ressaltando as três vozes que mais se
destacaram no processo estratégico; bem como o processo decisório que o envolveu;
fatores que influenciaram a fomação da estratégia e, por fim, as questões de gênero
segmentadas em: funções ocupadas: níveis hierárquicos; áreas de atuação: acadêmica e
meio; áreas do conhecimento; e hierarquia – titulação a fim de responder aos objetivos
específicos deste trabalho.
As reflexões finais estão no sétimo e último capítulo da tese, no qual
retomamos os principais resultados da pesquisa, tanto do ponto de vista teórico,
empírico e metodológico e encerramos com as referências utilizadas no trabalho.
37
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 2
CONTRIBUIÇÕES DE FOUCAULT PARA O ESTUDO DA
ESTRATÉGIA COMO PRÁTICA SOCIAL E DO GÊNERO NO
TRABALHO
“[...] O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de
dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos
queremosapoderar”
(FOUCAULT, 1996, p. 10)
38
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Cabe, também, antes de apresentarmos as abordagens da Estratégia como
Prática Social propriamente dita e de gênero com foco no trabalho, trazermos as
contribuições de Foucault para este estudo acerca dos conceitos de prática e de poder.
Mas antes disso, relatamos a reflexão realizada por Whittington (2001, p. 8) acerca dos
termos prática e práticas5. Nas palavras do autor: “A termo prática pode parecer para
referir-se tanto aos modos regularizados de funcionamento quanto à forma em que esses
modos de funcionamento são promulgados em determinadas circunstâncias.”
Acerca da prática transformada em gestão estratégica, este autor resumiu em
duas vertentes principais da virada da prática da estratégia: a primeira perspectiva – que
focaliza o estudo macro organizacional tem sido crescente dentro dos estudos
organizacionais, mas também – a segunda perspectiva – na estratégia em particular, na
difusão de determinados conceitos e técnicas do discurso gerencial, facilitando sua
implantação. Whittington (2001) esclareceu que falta ainda, nestes estudos, uma
proposta de um conjunto mais amplo de práticas de estratégia. Alegou, também, que a
prática depende fortemente dos conceitos compartilhados e tecnologias.
Colla (2012, p. 41), ao trazer para o contexto organizacional
especificamente, expôs que a prática “[...] é reconhecida como um locus central dos
resultados organizacionais [...]. Desse modo, a preocupação está relacionada ao
entendimento da realidade organizacional [...] e a perspectiva prática desloca a atenção
para o caráter de rotina ao vivo do mundo todos os dias.”
Whittington e Vaara (2012) ratificaram que as origens da perspectiva prática
podem ser atribuídas a Wittgenstein (1951) ou a Heidegger (1962), e, nas últimas
décadas, nas ciências sociais em geral, os autores que a estudam são: Reckwitz (2002)6,
5
Bispo (2013, p. 19) relatou que “O estudo da vida social a partir das práticas não é algo,
necessariamente, novo [...]. Na década de 1950, Garfinkel já iniciava suas reflexões e pesquisas acerca de
como uma coletividade se constituía e perpetuava a partir das suas práticas. Os Estudos Baseados em
Prática foram muito influenciados pela etnometodologia, fenomenologia e pelo legado de Wittgenstein,
além de alguns elementos marxistas e outros pensamentos mais contemporâneos como os desenvolvidos
por Pierre Bourdieu e Anthony Giddens [...].” Mas o autor esclareceu que, no campo da administração,
foi no final da década de 1990 que os estudos passaram a utilizar as práticas como forma de compreender
a aprendizagem, o conhecimento e asorganizações.
6Reckwitz (2002) argumentou que se podem encontrar elementos de uma teoria das práticas sociais no
trabalho de um grande número de teóricos sociais no último terço do século XX, que são de origens
teóricas diversificadas: Pierre Bourdieu explicitamente perseguia o projeto de uma praxeologia desde
Esboço de uma Teoria da Prática (1972) até suas últimas Meditações Cartesianas (1997), um projeto o
qual, pelo menos, no início foi ainda influenciado até um grau considerável estruturalismo objetivista.
Bordieu (2002) definiu objetivista como aquele que constrói relações objetivas econômicas ou
39
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Rouse (2007) e Schatzki et al. (2001), incluindo contribuições do filósofo Foucault
(1980), sociólogos Certeau (1984), Giddens (1984), antropólogo Bourdieu (1990),
etnometodologista Garfinkel (1967), teóricos da atividade Engeström, Miettinen e
Punamäki (1999) e Vygotsky (1978) e o estudioso do discurso Fairclough (2003) (apud
WHITTINGTON; VAARA, 2012).
Portanto a abordagem da ESP possibilita a interface com a pluralidade de
teorias sociais contemporâneas7 de diversos autores, uma vez que promove novas
reflexões acerca da prática estratégica considerando teorias sociais. Zwick, Silva e Brito
(2014, p. 385) argumentaram que:
linguísticas as quais estruturam as práticas. Dito pelo autor de outra maneira, o conhecimento objetivista
estabelece as estruturas objetivas do mundo social. Da Antropologia de Claude Lévi-Strauss (1950; 1989)
a influência foi do estruturalismo subjetivista. Michel Foucault, em suas obras da década de 1960 e 1970,
tentou uma série de diferentes opções teóricas entre o estruturalismo, pós-estruturalismo e uma teoria
nietzschiana do corpo chegaram às suas últimas obras em ética antiga em um quadro de análise das
relações entre corpos, a agência, o conhecimento e a compreensão de que pode também ser entendido
como Praxeológica. As teorias influenciadas pela fenomenologia e pela hermenêutica foram as de Harold
Garfinkel (1967), Alfred Schütz e Niklas Luhmann. Anthony Giddens (1979, 1984) desenvolveu a sua
versão da teoria da prática no âmbito de uma teoria da estruturação, fortemente influenciado por
Wittgenstein. Também os estudos de gênero de Judith Butler (1990), dentre outros (RECKWITZ, 2002).
Os efeitos da teoria da prática é, de um lado, proporcionar um vocabulário socioteórico para pesquisas
empíricas nas Ciências Sociais, de outro: uma forma de ver e analisar fenômenos sociais, e possibilita,
também, de certa maneira de definir a posição como ser humano em um mundo social. No entanto
Reckwitz (2002) colocou que ela tem um sistema teórico limitado diante de outras teorias já, de certa
forma, consolidadas. A teoria prática promove, no dizer do autor, a inserção e análise das atividades
mentais, a compreensão da interligação de rotinas corporais de comportamento, rotinas mentais de
compreensão, bem como a forma como os estudos organizacionais lidam com o discurso em suas diversas
esferas, a comunicação ou ação comunicativa, como práticas discursivas rotineiras. 7A fim de ampliar essa reflexão, trazemos Reckwitz (2002) o qual defendeu que há boas razões para
argumentar que há algo novo no vocabulário socioteórico da prática, já que sob o termo prática há uma
família de teorias que estão ligadas a um interesse do cotidiano (Certeau (1994) argumentou que o
homem ordinário inventa o cotidiano por meio das artes de fazer (ou práticas) cotidianas, que são
flexíveis, logo se alteram, apropriando-se de novos lugares, papéis e produtos em conformidade com cada
um. Dessa maneira, o indivíduo é determinado pela relação social em suas práticas sociais. O autor
exemplificou práticas cotidianas como falar, ler, circular, habitar, fazer compras ou preparar as refeições)
e que se diferem das propostas clássicas da teoria social, apresentando, dessa maneira, uma nova imagem
social e de atividade humana. O autor esclareceu que, desde seu surgimento com a filosofia moral
escocesa no final do século XVIII, a teoria de práticas sociais modernas (ou teorias práticas – intitulada
pelo autor de teorias culturais) desenvolveu três formas fundamentalmente distintas para explicar a ação e
a ordem social, das quais as duas primeiras são opostas conceitualmente: a primeira, chamada de
utilitarista escocesa, contempla a teoria da escolha racional contemporânea cuja orientação é para a ação;
a segunda, apresentada como a perspectiva sociológica, é orientada por normas de ação; a terceira, que
surgiu como resultado das revoluções culturalistas no século XX, chamada filosofia social, a qual está
enraizada em: estruturalismo e semiótica, fenomenologia e hermenêutica, e na filosofia da linguagem de
Wittgenstein.
40
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Isto porque o entendimento da estratégia como prática está atrelado a uma
análise sociológica e filosófica da prática. É justamente essa concepção que
altera o foco da estratégia que, antes vista de modo estrito como uma
ferramenta de gestão, passa a ser revisitada no contexto dos fenômenos mais
amplos que a envolvem; ou seja, passa-se a levar em conta o contexto
macrossocial.
Para desenvolver este estudo, optamos por articular as contribuições teóricas
de Foucault – no que tange às relações de poder – com as perspectivas da Estratégia
como Prática Social e de Gênero. Acreditamos haver coerência teórica nessa articulação
uma vez que estamos direcionando a pesquisa para as relações de poder, nas quais há,
também, questões acerca da divisão sexual do trabalho naturalizadas e que se
materializam por intermédio das práticas discursivas nos diversos níveis hierárquicos da
Instituição, em outras palavras: pelas(os) envolvidas(os) no evento da formação da
estratégia.
Além disso, também a fim de justificar a contribuição de Foucault neste
trabalho, ressaltamos que outros autores já realizaram estudos com a abordagem da EPS
orientada pela proposta foucautiana, a saber: Vaara, Kleymann e Seristö (2004)
estudaram as construções discursivas da estratégia em companhias áreas; a atividade de
fazer estratégia foiestudada como um exemplo de organização concebida como a prática
discursiva por Ezzamel e Willmott (2008); Mantere e Vaara (2008) adotaram uma
perspectiva discursiva para analisar os processos de estratégia e quais os papéis dos
membros da organização nesse processo. Silva, Carrieri e Souza (2012), em artigo
teórico, apresentaram a articulação acerca da dinâmica social de Foucault, Certeau e
Moscovici e a Estratégia como Prática Social.
Mesmo ciente da árdua tarefa que é escrever sobre os pressupostos de
Foucault, aqui não temos a pretensão de trazer a sua trajetória de seus estudos, porque
acreditamos que podemos nos atrever dizer que o autor foi um estudioso denso e
eclético no sentido de que, durante a sua trajetória acadêmica, o filósofo foi
modificando os seus interesses e teorizando sobre vários temas. Seu trabalho, de modo
geral, a literatura divide em três fases, as quais não são estanques, são eles: arqueologia,
genealogia – relaçõesde poder e a genealogia da ética.
Na primeira fase – denominada arqueologia: refere-se à produção do sujeito
pelo discurso, é a dualidade entre linguagem e discurso para a produção do
conhecimento – epistemologia, e a análise da discursividade é o foco central nos
41
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
trabalhos do autor. O filósofo teve sua inspiração nos estudos kantianos e seu ciclo é
composto desde a História da loucura, de 1961, tese de doutorado de Foucault;
Onascimento da clínica, de 1963; As palavras e as coisas, de 1966; até a obra A
arqueologia do saber, de 1969 expôs Thiry-Cherques (2010). “Uma arqueologia é um
estudo das condições filosóficas, técnicas, institucionais, sociais, econômicas, políticas
etc. de emergência dos discursos do saber em geral e da articulação entre eles em uma
época”, este é o conceito de Foucault parafraseado por Thiry-Cherques (2010, p. 221).
Silva, Carrieri e Souza (2012) completaram ao afirmar que o filósofo analisou o
discurso como um sistema autônomo.
Na segunda fase – conhecida como genealogia, a qual é descendente de
Nietzsche no que se refere à articulação da nossa condição com a nossa história. Para
Thiry-Cherques (2010, p. 223), “A genealogia é a tática que, a partir da discursividade
local descrita, ativa os saberes libertos da sujeição que emergem desta discursividade.”
Trata-se do indivíduo nas relações de poder e as práticas discursivas, isto é: a
articulação entre os tipos de discurso e o contexto econômico, político, histórico, etc.
Dito de outra maneira: as relações de poder são materializadas por meio das práticas
cotidianas de seus atores sociais. Allard-Poesi (2010) esclareceu que o poder, para
Foucault, permite compreender porque os estrategistas agem de maneira não
formalizada no processo estratégico das organizações. Permite também perceber a
estratégia como práticas discursivas que reproduzem práticas sociais.
Silva, Carrieri e Souza (2012) afirmaram que, para Foucault, o poder é
flexível e o que o torna uma prática social é o fato de ele permear as práticas cotidianas
as quais estão em constante movimento e mudança produzindo conhecimento. No
terceiro período – genealogia da ética: relações dos sujeitos os quais são produzidos por
diversos saberes, relações de poder e do sujeito com ele mesmo.
Para este trabalho, focalizaremos, nos conceitos importantes para a análise
da EPS e gênero que são as relações de poder que se materializam por meio das práticas
discursivas. Zwick, Silva e Brito (2014, p. 390) afirmaram que “os escritos de Michel
Foucault também fornecem contribuições para a estratégia como prática. Tais
contribuições estão relacionadas com a discussão sobre a formação dos saberes e dos
discursos de verdade nas relações de poder.”
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Para tanto, é preciso trazer os conceitos de prática por Foucault, e torna-se
necessário, em razão de estarem vinculados, apresentar também os de relações
discursivas, discurso, enunciado e enunciação, os quais não necessariamente
precisariam ser na ordem apresentada, já que não há relação hierárquica entre eles.
As relações discursivas, para Foucault, não são nem internas nem externas
ao discurso, são ou estão na fronteira do discurso, em outras palavras: seria um feixe –
como o filósofo chamou – de relações por meio das quais o discurso pode falar, nomear,
analisar classificar, explicar, etc. os objetos. “Essas relações caracterizam não a língua
que o discurso utiliza, não as circunstâncias era que ele se desenvolve, mas o próprio
discurso enquanto prática” (FOUCAULT, 2008, p. 51-52).
O discurso, na arqueologia, busca delimitar os próprios discursos como
práticas esclareceu o autor. Foucault (2008, p. 157) conceituou que: “A arqueologia
busca definir não os pensamentos, as representações, as imagens, os temas, as obsessões
que se ocultam ou se manifestam nos discursos, mas os próprios discursos, enquanto
práticas que obedecem a regras.”
Para Foucault (2008), o discurso é muito mais que conjuntos de signos os
quais designam conteúdos ou representações ligando as palavras às coisas, mas discurso
como práticas carregadas historicamente no sentido de interpretar a sociedade e não
somente descrevê-la, é ir além do que está posto linguisticamente. Essa concepção de
discurso para além do que está posto afasta-se do estruturalismo. “[...] os discursos [...]
como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam. Certamente os
discursos são feitos de signos; mas o que fazem é mais que utilizar esses signos para
designar coisas” (FOUCAULT, 2008, p. 55).
Nessa perspectiva, o discurso é muito mais do que o dito e tem nele um
poder implícito que vai atravessando e construindo modelos que se vão naturalizando no
cotidiano. Além disso, para Foucault (1996), o foco do discurso não está no significado
que tem, mas sim no significante, dito de outra forma: é mais relevante como o outro
recebe tal discurso. Por meio do discurso, materializa-se o poder que desejamos expor, o
qual é disseminado e validado na sociedade, tornando-o natural.
O autor apresentou diversas definições para discurso. Dentre elas, Foucault
(2008, p.133) escreveu que é: “[...] um conjunto de enunciados, na medida em que se
apoiem na mesma formação discursiva.” Por ser enunciado, o autor explicitou que
43
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
precisa cumprir algumas funções, como referência a alguma coisa conhecida, haver um
sujeito, estar relacionado a outros enunciados em um discurso, ser um fato em dado
momento e lugar. Logo um enunciado é marcado local e temporalmente e que, ao ser
proferido por um sujeito, esse ato torna-se a enunciação.
Retomando a questão da prática articulada com o poder, para Foucault, as
relações de poder e saber estão imersas em práticas sociais. Dentre as práticas sociais, as
práticas discursivas especificamente neste trabalho são os meios pelos quais o
conhecimento e o poder se desenvolvem. Dito de outra forma, para Foucault, as práticas
sociais se efetivam discursivamente. Ficher (2001, p. 200) afirmou que: “Na verdade,
tudo é prática em Foucault. E tudo está imerso em relações de poder e saber, que se
implicam mutuamente, ou seja, enunciados e visibilidades, textos e instituições, falar e
ver constituem práticas sociais por definição permanentemente presas, amarradas às
relações de poder, que as supõem e as atualizam.”
Foucault (2008, p. 133) conceituou prática discursiva como um conjunto de
regras definidas em contextos específicos e complementou com:
Finalmente, o que se chama ‘prática discursiva’ pode ser agora precisado.
Não podemos confundi-la com a operação expressiva pela qual um indivíduo
formula uma ideia, um desejo, uma imagem; nem com a atividade racional
que pode ser acionada em um sistema de inferência; nem com a
‘competência’ de um sujeito falante, quando constrói frases gramaticais; é
um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e
no espaço, que definiram, em uma dada época e para uma determinada área
social, econômica, geográfica ou linguística, as condições de exercício da
função enunciativa.
A prática discursiva, para Foucault, portanto, significa materializar as
relações que se dão por meio do discurso, respeitando determinadas regras anônimas e
contextualizadas historicamente. Nessa prática estão ancoradas as relações de poder e
saber para Foucault.
Para tanto, apresentamos o conceito de poder defendido por Foucault.
Atrevemo-nos, por uma questão didática neste trabalho, sistematizar o trabalho de
Foucault acerca da atuação do poder em três dimensões, são elas: I – poder soberano; II
– poder disciplinador ou a Figura da disciplina; III – biopoder.
O poder soberano – ou poder da soberania – refere-se ao poder da força e da
violência no campo social como o poder de um governante diante de seus
44
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
súditos/subordinados. “[...] o poder soberano está associado ao poder de matar
(simbolismo da potência de morte). Não por outro motivo à lei. Também ao simbólico
da soberania, estaria associada à Figura do sangue e não a Figura da sexualidade, que –
como veremos – traduz um outro formato de exercício de poder” (SOUZA, 2011,
p.112). Foucault atrela o poder soberano à Figura do Estado, como entidade coletiva,
que cobra, apodera-se dos bens e riquezas daqueles que lhe são subordinados.
Já o poder disciplinar é um efeito que desencadeia com o propósito de
domar os indivíduos por meio de instituições e instrumentos disciplinares. Na obra
Vigiar e Punir, Foucault (1999b) trouxe instituições disciplinares como escolas,
hospitais, hospícios, fábricas, dentre outras que utilizam o poder disciplinar. Dessa
maneira, este poder controla o corpo e suas necessidades biológicas por meio dessas
instituições. Também a organização do espaço e o comando do tempo tornam-se
mecanismos de materialização do poder disciplinar, em razão de os momentos político e
social exigirem novas maneiras de disciplina, isto é: o corpo individual é vigiado e
punido. Trata-se de um controle do espaço e do corpo, estabelecendo relações de poder,
com o objetivo de buscar a eficácia da disciplina estabelecida ao corpo. Foucault
(1999b) esclareceu que esses mecanismos de controle visam produzir indivíduos
subservientes. Foucault (1999b, p. 18) afirmou que:
O poder sobre o corpo, por outro lado, tampouco deixou de existir totalmente
até meados do século XIX. Sem dúvida, a pena não mais se centralizava no
suplício como técnica de sofrimento; tomou como objeto a perda de um bem
ou de um direito. Porém castigos como trabalhos forçados ou prisão -
privação pura e simples da liberdade - nunca funcionaram sem certos
complementos punitivos referentes ao corpo: redução alimentar, privação
sexual, expiação física, masmorra.
O filósofo falou de uma tecnologia do poder que se refere a um conjunto de
instrumentos, técnicas e procedimentos queo faz crescer e multiplicar. Como
instrumento do poder, a vigilância é o mais relevante dispositivo de que o disciplinador
sustenta em uma relação de poder independente de quem o pratica. Pogrebinschi (2004,
p.191) ratificou que no “poder disciplinar, não há um centro único de poder e nem
mesmo uma Figura única que o encarna: o poder encontra-se nas periferias, distribuído
e multiplicado em toda parte ao mesmo tempo, materializado que está nos corpos dos
indivíduos a ele sujeitados.” Na Figura a seguir, são apresentadas as oposições entre os
poderes soberano e disciplinar.
45
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura5: Poder Soberano versus Poder Disciplinar Poder Soberano Poder Disciplinar
Indivíduo-sociedade Indivíduo-corpo
Terra e seus produtos Corpo
Apropriação e expiação de riquezas Anatomia do corpo político humano
Existência física do soberano Disciplina
Tributação Vigilância
Produção de bens e riquezas Maximização da força
Monarquia Sociedade disciplinar
Lei Norma
Codificação Normalização
Estado Instituições, escolas, oficina,
hospitais, etc.
Direito Ciências Humanas
Continuidade Descontinuidade
Contrato Disciplina
Visibilidade do soberano e
invisibilidade dos súditos
Visibilidade da disciplina e
invisibilidade dos sujeitos
Fonte: Pogrebinschi (2004, p. 195)
Mais tarde, Foucault agregou o conceito de biopoder – ao analisar as formas
de poder da metade século XVIII – como uma maneira de conseguir ir além do poder
disciplinador e individual, mas para o controle da população – corpo-espécie,
comandando a vida (nascimento) e a morte dos indivíduos, com o propósito de punir
tanto o corpo individual como o coletivo, por meio de intervenções e controles com o
objetivo de regular. Não houve uma superação do poder disciplinar em detrimento do
biopoder, na realidade há uma coexistência de ambos na sociedade. Acerca disso,
esclareceu Foucault (1999a, p. 131):
[...] esse poder sobre a vida desenvolveu-se a partir do século XVII, em duas
formas principais [...]. Um dos polos, o primeiro a ser formado, ao que
parece, centrou-se no corpo como máquina: no seu adestramento, na
ampliação de suas aptidões, na extorsão de suas forças, no crescimento
paralelo de sua utilidade e docilidade, na sua integração em sistemas de
controle eficazes e econômicos – tudo isso assegurado por procedimentos de
poder que caracterizam as disciplinas: anátomo-política do corpo humano. O
segundo, que se formou um pouco mais tarde, por volta da metade do século
XVIII, centrou-se no corpo espécie, no corpo transpassado pela mecânica do
ser vivo e como suporte dos processos biológicos: a proliferação, os
nascimentos e a mortalidade, o nível de saúde, a duração da vida, a
longevidade, com todas as condições que podem fazê-los variar; tais
46
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
processos são assumidos mediante toda uma série de intervenções e controles
reguladores: uma biopolítica da população.
O autor exemplificou que, quando as pessoas pensam em poder, o que lhes
vem à mente são poderes instituídos como polícia, exército, justiça. No entanto o autor
diz que as relações de poder estão em diversas esferas da sociedade, como entre homens
e mulheres, entre os que sabem e os que não sabem, entre pais e crianças.
Complementou que a sua maneira de apresentar o poder é diferente de outras
abordagens que estudaram esse fenômeno antes dele, uma vez que busca: “ver como, na
vida cotidiana, nas relações entre os sexos8, nas famílias, entre os doentes mentais e as
pessoas sensatas, entre doentes e médicos, enfim, em tudo isso, há inflação de poder”
(FOUCAULT, 2003, p. 233). Figura 6, são apresentadas as características que
diferenciam (ou não) o poder disciplinar e o biopoder.
Figura 6: Poder Disciplinar versus Biopoder Poder Disciplinador Biopoder
Indivíduo-corpo População
Corpo Vida
Anatomia política do corpo humano Biopolítica da espécie humana
Individualização Massificação
Disciplina Regulamentação
Vigilância Regulação
Maximização da força Regulação
Sociedade disciplinar Sociedade de normalização
Norma Norma
Normalização Normalização
Organo-disciplina da instituição Bio-regulamentação pelo Estado
Instituições, escolas, oficinas,
hospitais, etc
Mecanismos reguladores estatais
Treinamento individual Equilíbrio global
Ciências Humanas Ciências Exatas e Biológicas
Fonte: Pogrebinschi (2004, p. 198)
8 Cabe esclarecer que o filósofo não trataou em seus estudos especificamente sobre questões de gênero.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Conforme apresentado na Figura 6, enquanto o foco do poder disciplinador
está no plano individual, o biopoder está na dimensão coletiva, na população, exceto
com relação à norma, a qual pode intervir tanto a um corpo quanto a uma população.
Foucault argumentou que a sociedade é a soma das normas disciplinares e de
regulamentação.
Na obra Microfísica do Poder, edição de 2015, para Foucault (2015, p. 369),
“o poder não existe” no sentido de que ele não está alocado em um lugar ou ponto
específico, porque ele circula, é flexível e está nas relações. O autor apresentou o poder
como um feixe aberto de relações sociais relativamente organizado, piramidalizado e
coordenado, não havendo um estado inicial, ou ponto de partida, nem tampouco uma
entidade estável para o poder. Além disso, o autor abordou que as relações de poder (ou
práticas de poder) são expressas por meio de micropoderes, os quais estão nas
atividades cotidianas realizadas pelos indivíduos ou entre grupos em sua prática social,
edificada historicamente, nas instituições, ou seja: em toda a sociedade. Dessa maneira,
o poder está nas mãos de muitos em vez de alguns ou de um como o Estado, por
exemplo. “O exercício do poder não é simplesmente uma relação entre ‘parceiros’
individuais ou coletivos; é um modo de ação de uns sobre outros. [...] o poder só existe
em ato, mesmo que, é claro, se inscreva em um campo de possibilidade esparso que se
apoia em estruturas permanentes” (FOUCAULT, 2010, p. 287).
Foucault (2015, p. 371-372) defendeu ainda que a realização das relações de
poder pode também se materializar não somente de cima para baixo. Afirmou, portanto,
que o poder circula, movimenta-se. Esclareceu que:
[...] é preciso ver como as grandes estratégias de poder se incrustam,
encontram suas condições de exercício em microrrelações de poder. Mas
sempre há também movimentos de retorno, que fazem com que estratégias
que coordenam as relações de poder produzam efeitos novos e avancem
sobre domínios que, até o momento, não estavam concernidos.
Ratificou, ainda, que o poder só pode ser praticado sobre sujeitos livres, ou
seja, para Foucault (2010), livres são aqueles – tanto individuais como coletivos – que
possuem diversas possibilidades de condutas e decisões. Em que a liberdade de alguns
está articulada à autoridade de outros, aumentando, dessa maneira, o compromisso
social e respeito entre as pessoas.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Na proposta de Foucault (2015), o poder está deslocado espacialmente do
centro, ou seja: está nas extremidades. Exemplificando com uma instituição de ensino
superior, o poder não estaria somente na Reitoria que representa o centro dessa
comunidade, mas também em seus órgãos de apoio que representam os seus limites.
Para analisá-lo, o filósofo expôs que precisamos avaliar as práticas sociais tais como:
gestos, atitudes, comportamentos, discursos, dentre outras. Desse modo, Foucault
(2015) abandonou o conceito dito tradicional de poder, que tem localidade certa, é
estático eemerge de cima para baixo na pirâmide. Para o autor, o real poder não é algo
negativo, mas positivo e que é possível, por meio dele, construir e educar.
Como não há uma teoria do poder9 e tampouco método e ferramentas de
estudo para as relações de poder esclareceu Foucault (2010), o autor recomendou a
necessidade de ter princípios de análise para realizar o exame analítico das relações de
poder a fim de possibilitar a compreensão de como o poder opera no cotidiano
(FOUCAULT, 2015). Para ele, temos uma falsa ideia acerca do que é o poder e que, em
função disso, em vez de analisarmos a essência do poder de fato, estamos é reforçando a
visão deturpada de poder. Foucault (2010) sugeriu que devemos refletir acerca do que
legitima o poder e ainda os modos de pensar o poder conforme determinado modelo
institucional. Foucault (2015, p. 267-268) defendeu o argumento de que – pormeio de
discursos e práticas – legitimamos, normatizamos e sustentamos tais relações de poder.
Chamemos provisoriamente genealogia o acoplamento do conhecimento com
as memórias locais, que permite a constituição de um saber histórico das
lutas e a utilização deste saber nas táticas atuais. Nesta atividade, que se pode
chamar genealógica, não se trata, de modo algum, de opor a unidade abstrata
da teoria à multiplicidade concreta dos fatos e de desclassificar o
especulativo para lhe opor, em forma de cientificismo, o rigor de um
conhecimento sistemático. Não é um empirismo nem um positivismo, no
sentido habitual do termo, que permeiam o projeto genealógico. Trata-se de
ativar saberes locais, descontínuos, desqualificados, não legitimados, contra a
instância teórica unitária que pretenderia depurá-los, hierarquizá-los, ordená-
los em nome de um conhecimento verdadeiro, em nome dos direitos de uma
ciência detida por alguns.
Epistemologicamente Foucault transitou pelo estruturalismo, passando pelo
pós-estruturalismo e pós-modernismo. Mesmo o autor não se tendo autointitulado em
9 “Seria, certamente, excessivo falar em teoria do poder tratando-se de Foucault. Ele rejeitava a ideia de
Teoria com T maiúsculo, à qual atribuía uma função de poder muito mais do que de instrumento de
conhecimento. Quando trata de maneira mais sistemática do poder, Foucault prefere falar em ‘precauções
metodológicas’, ‘regras’, etc., e nunca em teoria” (ALBUQUERQUE, 1995, p. 105).
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
nenhum dessas epistemologias, é possível, ao ler as suas obras, enxergar marcas desses
movimentos. Acercado do primeiro, Foucault (2013) não se assumiu como
estruturalista, o autor alegou que os autores do movimento estruturalista – exceto os
estudiosos da linguística e da mitologia comparada – que se assumiam como tal não
conheciam de fato o que se tratava essa abordagem. Ele situou o fenômeno estruturalista
como uma nova modalidade do pensamento formalista europeu da pré-guerra
renascendo. Afirmou também que, se fosse estruturalista, teria um método posto de
análise do poder.
Além disso, Foucault não aceitava tais molduras epistemológicas, ele
preferia colocar-se como um crítico da modernidade. "Nunca fui freudiano, nunca fui
marxista e jamais fui estruturalista" (FOUCAULT, 2013, p. 327). Hoffmann (2010, p.
11) informou que Foucault foi “um dos principais expoentes do estruturalismo francês,
deu as diretivas da nascente teoria pós-estruturalista e influenciou em muitos aspectos a
teoria feminista das últimas três ou quatro décadas.”
Há autores que, conforme a obra do filósofo, colocaram-no, a despeito do
próprio julgamento do autor, entre os estruturalistas, ou entre os pós-estruturalista ou
inclusive entre os pós-modernos, uma vez que as linhas divisórias desses movimentos,
por vezes, são tênues. Vieira e Caldas (2007) ratificaram que sob o movimento pós-
modernista há uma pluralidade de submovimentos que não contemplam características
pós-modernas. Dessa maneira, acreditamos não haver incoerência epistemológica ao
utilizarmos os conceitos de práticas e poder, juntamente com as abordagens da EPS e
gênero. Foucault (2015), ao ser questionado sobre os movimentos de libertação,
esclareceu que o movimento das mulheres não requer a especificidade da sexualidade e
seus respectivos direitos, ou seja: elas não restringem tudo ao sexo, elas vão muito além
disso, porque têm objetivos econômicos, políticos, dentre outros.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 3
TRAJETÓRIA EPISTEMOLÓGICO-TEÓRICA DOS ESTUDOS
SOBRE ESTRATÉGIA
“Considerar a estratégia como uma prática social, como algo que as pessoas fazem, tem
um efeito descentralizador sobre as proposições tradicionais da finalidade da
estratégia.”
(WHITTINGTON, 2004, p. 47)
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Neste capítulo, apresentamos a revisão da literatura acerca da estratégia10
.
Optamos por iniciar pela contextualização desde a perspectiva tradicional – modernismo
–atéa proposta da Estratégia como Prática – o após o modernismo de Whittington
(2004). Na abordagem da EPS, em seção específica, dedicamos mais tempo, haja vista
ser a concepção teórica que norteia este trabalho. Ao final de cada seção, brevemente
orientamos o leitor acerca do posicionamento adotado neste trabalho.
3.1 ESTRATÉGIA: DO MODERNISMO AO APÓS MODERNISMO
Optamos por apresentar uma reflexão acerca de questões epistemológicas e
teóricas sobre pesquisa em estratégia em ordem cronológica por entendermos que se
torna mais didática embora haja autores que afirmaram nem sempre ser possível a
divisão desses movimentos. Vieira e Caldas (2007) expuseram que a era pós-moderna –
final do século XX e início do século XXI – para uma gama de estudiosos significa a
ruptura com o modernismo e seus objetivos, no entanto, para outros investigadores, o
movimento pós-modernismo é uma continuação, um estágio mais avançado do
modernismo ou ainda uma modernidade tardia, ou ainda modernidade líquida11
, logo
não há ruptura. Além disso, Vieira e Caldas (2007, p. 299) esclareceram que, no guarda-
chuva do pós-modernismo, “[...] há múltiplas facetas e subcorrentes [...]”, as quais não
se reconhecem como pós-modernas.
Portanto iniciamos pela abordagem tradicional – clássica, cuja
epistemologia se encontra no modernismo, seguindo pelas perspectivas processuais pós-
modernistas que caminham para a abordagem da EPS no chamado, por Whittington
(2004), de após o modernismo.
De maneira geral, a literatura divide em três concepções12
o estudo da
estratégia13
. A primeira, chamada de visão clássica – com foco econômico e sob a
10
“[...] a estratégia tem uma árvore genealógica antiga: se Descartes criou suas raízes, os esforços de
conceituação da guerra foram o solo em que foi cultivada. A estratégia, desde seus princípios mais
remotos, sempre esteve relacionada à guerra” (CLEGG; CARTER; KORNBERGER, 2004, p. 28).
11
Expressão usada pelo sociólogo contemporâneo Zygmunt Bauman.
12
Whittington (2002) apresentou quatro perspectivas genéricas acerca de estratégia: clássica,
evolucionária, processual e sistêmica. As quatro perspectivas de estratégia apresentadas por Whittington
(2002) iniciam a linha do tempo com a abordagem Clássica, na década de 1960, cuja estratégia é
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
influência do racionalismo cartesiano14
– busca o planejamento de metas e objetivos
previamente determinados pela alta gestão; trata-se, em linha horizontal, do extremo do
objetivismo. Volberda (2004) ratificou que o foco da estratégia, nesta perspectiva, está
na vantagem competitiva e fundamentada nas teorias: de sistemas, cibernética, da
contingência e das organizações industriais, valorizando os métodos estatísticos. Nesta
abordagem, a estratégia é elaborada pelos executivos da alta administração, no
planejamento do futuro, separadamente daqueles que a executam, logo é a segmentação
elaborada formalmente de forma consciente e controlada, com foco na maximização do lucro e teve
influência da economia e do militarismo. Os autores dessa proposta defendem que o domínio dos
ambientes interno e externo exige planejamento racional de longo prazo, elaborado pela alta
administração e explicitam apego à análise racional.
Na década de 1970, tem-se a proposta processual, focalizando a política e cognições humanas, também
com ênfase no ambiente interno e influenciada pela Psicologia. Os autores desta perspectiva afirmam que
o planejamento de longo prazo não é eficaz, rejeitam o princípio do homem racional e da perfeição dos
mercados competitivos. Argumentam que a estratégia emerge de um processo de aprendizado e
comprometimento e que visa ao ajuste e ao cultivo paulatinamente de competências essenciais.
Defendem, também, que o sucesso da organização está pautado em sua capacidade de explorar e renovar
seus recursos internos.
Surgiu o evolucionismo na década de 1980, cuja proposta priorizou a sobrevivência da organização e
voltou-se para o ambiente externo – mercado – e sofreu a influência da economia e da Biologia. Fazendo
uma analogia com a evolução biológica, trazendo para o contexto organizacional, trata-se dos processos
competitivos – mercado – os quais selecionam as empresas que vão sobreviver, logo somente as melhores
sobreviverão, por isso propõem que haja diversidade de iniciativas inovadoras para o ambiente selecionar.
Seus autores defendem que as estratégias bem sucedidas emergem quando o processo de seleção natural
permitir, e que as organizações possuem capacidades limitadas para preverem e reagirem frente às
mudanças no ambiente.
Por último, nos anos 1990, a perspectiva sistêmica, voltada para o ambiente externo, especificamente para
a sociedade, foi influenciada pela Sociologia. Nela as estratégias são determinadas em contexto
sociológicos, orientadas pelos limites cognitivos da psique humana como também pelos aspectos culturais
do ambiente em que a estratégia foi formulada e podem mudar conforme as exigências do mercado. Logo
suas metas e processos estratégicos refletem os sistemas sociais em que a estratégia está sendo elaborada.
Seus autores defendem que as organizações diferem em consonância com seus sistemas sociais e
econômicos. Em estudos desta perspectiva, incluem-se questões de controle: classe e profissão, nações e
estados, e família e gênero.
13
Paroutis, Heracleous e Angwin (2013) esclareceram que o campo da gestão estratégica teve influência
de duas escolas as quais fundamentaram muitos debates na academia e nas organizações: Escola
Estratégica – baseada em Chadler – 1962 – considera o planejamento racional como resultado das
atividades da análise estratégica; Escola Emergente, liderada por Henry Mintzberg – 1973, a qual percebe
a estratégia como um resultado pretendido pelos membros da organização. Com base nessas duas escolas,
surgem diversas propostas de modelos de análise estratégica.
14
Knights e Morgan (1991) afirmaram que Pettigrew; Mintzberg; Mintzberg e Waters; Mintzberg e
McHugh desafiaram a ortodoxia da abordagem tradicional, questionando até que ponto a estratégia
realmenteincorpora processos racionais. Estes autores passaram a dar atenção para o que é socialmente
construído.
53
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
de quem pensa e planeja de quem faz a ação. Os principais autores desta abordagem
são: Chandler (1962)15
, Andrews (1971), Porter (1989; 1999) e Ansoff, Declerck e
Hayes (1981).
Whipp (2004)16
relatou que o crescimento dos estudos sobre estratégia, em
suas diferentes abordagens, segue somada à abordagem da década de 1960. Surgem,
portanto, novas abordagens que permanecem juntas com a dos anos 60. A perspectiva
tradicional dos estudos sobre estratégia, nas palavras do autor, foi racional e
abertamente ligada ao determinismo econômico, cujos objetivos eram avaliar o
ambiente organizacional, prever o futuro e adequar as estruturas e os recursos internos a
esse planejamento.
A estratégia, nesta perspectiva, esteve vinculada aos pressupostos
epistemológicos modernistas17
, cuja origem se deu na década de 1960, como: “[...] a
15
Whittington (2008) resgatou três contribuições particularmente importantes de Chandler para a
evolução da gestão estratégica. A primeira é sobre o controverso conjunto de definições fundamentais
para estratégia. Chandler tem sido um dos autores mais citados pelo fato de haver criado definições
claras, mesmo diante da complexidade de seus quatro principais casos (DuPont, General Motors, Sears e
Standard Oil) acerca de: estratégia – determinação de metas e objetivos de longo prazo para uma
empresa, e a adoção de planos de ação e a alocação de recursos necessários para a realização das ações;
estrutura – definida como a concepção de organização por meio da qual a empresa é gerida; formulação
de estratégia – decisão da estratégia, a qual é de responsabilidade da alta administração; implementação
de estratégia – realização de estratégia pelos executivos de nível mais baixo.
Embora tais definições ainda sejam citadas nos trabalhos, estão cada vez mais controversas pelo fato da
prescrição das estratégias e da segmentação entre a sua elaboração e implantação, bem como o
distanciamento dos gestores de nível hierárquico médio na organização na tarefa de elaboração das
estratégias, haja vista serem eles os que, de fato, têm contato com a operacionalização da estratégia.
Na segunda, a celebre frase a estrutura segue a estratégia, Whittington (2008) esclareceu que, embora
tenha sido amplamente influente, essa concepção é contestada, principalmente, porque, na prática, muitas
vezes a estratégia que segue a estrutura. E a terceira contribuição foi à preocupação com os recursos
organizacionais e às capacidades que têm alimentado a corrente teórica chamada de Visão Baseada em
Recursos – RBV – da empresa, a qual defende que a organização deve ter estratégias que visem à
produção de produtos/serviços raros, difíceis de imitar e de serem substituídos. Na sequência, Chandler
antecipou a linguagem da segunda geração da RBV chamada de Capacidades Dinâmicas, quando afirmou
que as capacidades organizacionais se referiam às habilidades gerenciais e às capacidades de planejar,
distribuir, coordenar e monitorar os investimentos necessários na produção e distribuição.
É justo esclarecer que Chandler desenvolveu a maior parte de sua proposta no início de um vácuo teórico
e que a sua intenção era principalmente para fornecer clareza de análise para histórias complexas, em vez
de oferecer prescrições gerenciais, e que ele propôs foi um elo teórico entre estratégia e organização,
abrangendo, além da questão da estratégia, outros campos adjacentes de teoria da contingência, portanto é
um grande legado o de Chandler, declarou Whittington (2008).
16Whipp (2004) relatou as abordagens de estudo sobre estratégia com riqueza de detalhamento,
explicitando a sequência de acontecimentos que resultaram nos estudos acerca da estratégia.
54
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imparcialidade científica superior ao engajamento prático, o geral superior ao
contextual, e o quantitativo superior ao qualitativo”, distanciando, dessa forma, o
pesquisador de seu objeto de investigação, criticou Whittington (2004, p. 44).
Tureta, Rosa e Santos (2006) argumentaram que os estudos acerca da
estratégia seguem pressupostos ontológicos e epistemológicos modernistas18
,
focalizando, em suas análises, a dimensão econômica e nível macro organizacional,
privilegiando as abordagens estruturais19
. Dessa maneira, os autores esclareceram que
essa dimensão epistemológica deixou uma lacuna devido ao fato de não buscar entender
como os indivíduos envolvidos na elaboração e implantação da estratégia o fazem. Mas
atualmente este modelo é questionado em função de sua incapacidade de lidar com as
inter-relações entre as pessoas e suas atividades cotidianas na empresa. Na Figura7,
apresentamos a síntese das principais fragilidades desta abordagem teórica apontadas na
literatura.
17
“O debate está polarizado entre duas posições epistemológicas claramente em conflito, a saber: o
modernismo, com sua crença na capacidade essencial da humanidade de buscar sua perfeição pelo poder
de seu pensamento racional; e o pós-modernismo, com seu questionamento crítico e muitas vezes total
rejeição do racionalismo etnocêntrico propugnado pelo modernismo”, esclareceram Cooper e Burrell
(2007, p. 313).
18
Pires (2008, p. 46) explicou que “As ciências sociais são produto do mundo moderno” e buscam, desde
o século XVI, desenvolver, de forma dicotômica entre o que é ciência e o que outros saberes, um
conhecimento objetivo da realidade. Segundo o autor, as ciências sociais nasceram do que se chamava de
filosofia ou letras, distinguindo-se dos saberes filosófico e religioso. No século XVIII, emergiu uma
exigência metodológica em que os dados necessitavam ser verificados, refutados ou discutidos. Ao
desmembrar da filosofia e das letras, as ciências sociais, para Pires, passaram a buscar validade empírica
para os conhecimentos produzidos, de maneira que não fossem promovidas distorções tanto na coleta
quanto na interpretação dos dados. Essa forma de legitimidade empírica promoveu discussões em dois
planos: epistemológico e metodológico. A primeira referia-se à atitude do pesquisador e, na segunda, a
reflexão se deu na natureza dos dados. Duas visões acerca dos dados emergiram: uma quantitativa – em
que só o conhecimento matemático poderia dar validade cientifica aos dados; outra qualitativa que
privilegiava a pesquisa histórica, enfatizando os dados primários.
19Clegg, Carter e Kornberger (2004, p. 23) expuseram que a teoria da estrutura produziu um planejamento
estratégico que conduz, domina e determina a estrutura organizacional. “Posto de forma mais simples, as
mudanças ambientais criam a necessidade de novas estratégias, tema incessantemente repetido pela teoria
da contingência; em consequência, essas novas estratégias exigem nova estrutura organizacional (observe
a linguagem funcionalista sobre necessidades). Em ambos os passos, a organização reage passivamente:
primeiro, ela é uma vítima passiva das mudanças ambientais, às quais responde desenvolvendo novas
estratégias. A estratégia é uma reação à qual a estrutura também reage. A estrutura segue a estratégia, e a
estratégia é conduzida por mudanças ambientais. A rede de causas e efeitos é linear, simples e trivial, e
absolutamente decisiva.”
55
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Figura7: Fragilidades Abordagem Clássica
Fonte: Elaborada pela Autora
Esta concepção de estratégia, portanto, gera insatisfação com suas
explicações, e surge, na contrapartida, a segunda concepção, conhecida por estratégia
como processo – década de 1970 – a qual rejeitou a visão de que a estratégia é somente
um processo deliberado20
e passa a ser vista como processo de aprendizagem em que as
etapas de formulação e implantação são um único processo e que nem sempre são
definidos a priori. Nesta perspectiva, outros atores, além da alta gestão e dos
especialistas em estratégia, participam da construção e implantação da estratégia,
enfatizando as práticas sociais do cotidiano. São autores desta abordagem: Lindblom
(1959), Pettigrew21
(1987) Mintzberg (1995; 2004) e Quinn (1978).
Whittington (2004) esclareceu que o movimento pós-modernismo22
questiona as generalizações quantitativas e imparciais do modernismo, tal reflexão
20
Estratégia deliberada – tem foco no controle, é planejada, já que os acontecimentos são previstos com
antecedência. Mintzberg e Walters (1985) definiram que, para ser perfeitamente deliberada, a estratégia
deve atender a três condições: I – deve haver intenções precisas na organização, detalhadas de modo a
não haver dúvidas sobre o que é desejado antes de as ações serem concretizadas; II – a estratégia deve ser
aceita pelos líderes; III – as intenções coletivas devem ser realizadas exatamente como pretendidas, sem
interferência de nenhuma força externa (mercado, tecnologia, políticas, entre outros), ou seja: o ambiente
tem que ser previsível e sob controle total da empresa.
21
Pettigrew (1987), a fim de fornecer uma estrutura metodológica, apresentou que a mudança estratégica
se realiza por meio da integração de três dimensões, a saber: conteúdo – refere-se ao conteúdo que
envolve a transformação em estudo; processo – trata-se de como a mudança ocorre; contexto – refere-se
ao porquê da mudança considerando o contexto interno – aspectos internos que promovem e ou inibem as
mudanças estratégicas; e externo – forças ambientais.
22
O termo pós-modernismo, para Alvesson e Deetz (1999), refere-se a um período de tempo em que
ocorrem mudanças sociais e organizacionais. Os autores defenderam que os pós-modernistas
questionaram o posicionamento do Iluminismo, suas ações que acabavam por destruir o ambiente e as
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
inicia, então, o declínio do monopólio modernista e busca a recuperação da razão
prática, levando as pesquisas ao após o modernismo. Tureta, Rosa e Santos (2006)
expuseram que a filosofia e a sociologia têm contribuído como perspectivas alternativas
para as mudanças realizadas nas décadas de 1960 e 1970, no plano da estratégia, nas
organizações. Dessa maneira, Whittington (2004) defendeu que essa modificação
amplia o contexto de prática racional, tornando-a mais inclusiva e pragmática, em que
passa haver maior proximidade do pesquisador com seu objeto de estudo. Em específico
com relação à estratégia, significa aproximar-se da prática, por meio da pluralidade de
métodos.
Desde a década de 1970, embora com limitações, as pesquisas sobre
estratégia na abordagem processual23
trouxeram, no mínimo, três contribuições
relevantes para a área de estratégia, esclareceram Johnson, Melin e Whittington (2003),
a saber: I – reconhecimento da estratégia como um fenômeno organizacional; II –
humanizando o campo da estratégia, pois possibilitou o contato com os atores
envolvidos no processo estratégico; III – e a legitimação de estudos aprofundados com
pequenas amostras, permitindo desenvolver e compreender o contexto holístico da
estratégia.
No entanto Johnson, Melin e Whittington (2003) apresentaram seis
limitações das pesquisas na abordagem processual24
: I – boa parte das pesquisas se
baseia em relatos dados pelos altos executivos, fixando-se no plano organizacional
macro, deixando em segundo plano as práticas, os processos de tomada de decisão e as
mudanças organizacionais realizadas pelas pessoas que a executam, ou seja: o plano
micro. II – não exploram os estrategistas de fato e como as forças macro sociais que
podem restringir as ações das(os)estrategistas. III – um terceiro desafio é a extensão das pessoas. “O Iluminismo prometeu um sujeito autônomo progressivamente emancipado pelo conhecimento
adquirido por meio dos métodos científicos” (ALVESSON; DEETZ, 1999, p. 231). 23
Chia e Mackay (2007) esclareceram que pesquisadores sobre estratégia estão cada vez mais
interessados em entrar nas minúcias do processo da estratégia, e que tal interesse muda o foco de pesquisa
em estratégia uma vez que prioriza os micros processos e práticas. Afirmou ainda que, indiscutivelmente,
Pettigrew (1985) e Johnson (1987) iniciaram esse novo paradigma com seus trabalhos na década de 1980.
24
Chia e Mackay (2007) chamaram o paradigma que emergiu depois da abordagem processual de pós-
processual. Esclareceu que uma postura pós-processual significa: primazia ontológica sobre as práticas
em vez dos atores; filosoficamente privilegia práticas complexas em vez de atores e coisas como o
locusde análise; e enfatiza a explicação do campo das práticas em vez das intenções de indivíduos e
organizações.
57
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
implicações práticas das pesquisas na abordagem processual, em outras palavras: não
chegam a dar orientações práticas para as atividades diárias do fazer estratégia. IV – o
fato de segregarem questões de conteúdo como: separação entre diversificação e
estrutura. V – em muitas pesquisas, embora tenha exceção, o processo de pesquisa não
tem ligações explícitas com os resultados da estratégia. VI – as pesquisas têm resultado
em descrições densas, mas com poucas análises rigorosas e sistemáticas em torno de
teorias.
Jarzabkowski (2005) ratificou que, embora a pesquisa sobre estratégia como
processo tenha alcançado avanços significativos com relação à humanização da
estratégia e à geração de teorias mais dinâmicas, seus resultados ficaram de certa forma
limitados em função de duas razões: a primeira pela razão de que, como processo,
problematizou somente o papel da alta gestão no fazer estratégico, e a segunda devido
ao fato de estar preocupada em explicar o fenômeno no nível de análise da organização
apenas. Na Figura 8, sintetizamos as principais fragilidades da abordagem processual.
Figura 8: Fragilidades Abordagem Processual
Fonte: Elaborada pela Autora
Percebemos que a segunda concepção foi uma espécie de elo entre a
abordagem moderna e a perspectiva do fazer estratégia– Estratégica como Prática
Social. Dito de outra forma: ela tem sido uma fase preparatória para a concepção
seguinte – EPS – que, na verdade, ampliou a segunda. Então, a terceira concepção,
58
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
intitulada Estratégia como Prática Social25
– movimento europeu da década de 1990 –
derivada da teoria social da década de 80, trouxe, portanto, um viés sociológico26
para a
estratégia, ao ampliar os atores envolvidos na estratégia da organização. Esta proposta
valoriza a pesquisa qualitativa – em detrimento da abordagem clássica que focalizava a
pesquisa quantitativa – como propósito de aproximar os pesquisadores com os diversos
atores envolvidos no processo estratégico: os estrategistas.
Para esta perspectiva teórica, a estratégia é uma prática social no sentido
dado por Foucault que são: gestos, atitudes, comportamentos, discursos, dentre outras
práticas. Portanto o relevante é compreender como todas as pessoas (praticantes)
interagem e agem no processo de fazer estratégia nas organizações.
Para Whittington (2004), no após o modernismo, não há a rejeição do pós-
modernismo ao modernismo. Trata-se de uma visão inclusiva que busca a ampliação,
inclusive no que se refere aos métodos de pesquisa, ou seja: não se trata de abandonar a
abordagem quantitativa em detrimento da qualitativa. O autor afirmou que o ceticismo
pós-moderno questionou tais posicionamentos epistemológicos, promovendo reflexão
acerca disso e, também, estabeleceu uma ponte para o após o modernismo. Portanto,
para entender os estudos da EPS, requer métodos diversificados que possibilitem o
envolvimento profundo do pesquisador com os pesquisados, como a etnografia,
pesquisa ação, entre outros.
Dessa maneira, a EPS busca preencher a lacuna da perspectiva clássica, para
a qual somente os estrategistas de alto nível hierárquico interessavam no processo
estratégico e o resultado econômico da organização. Na perspectiva do após o
modernismo, o pesquisador, por meio da pesquisa qualitativa, pode relacionar-se de
forma mais próxima com seu objeto de estudo, a estratégia passa a ser vista como uma
25
Colla (2012, p. 36) complementou: “A abordagem da Strategy-as-Practice não rompe com os conceitos
– conteúdo e processo – estabelecidos no campo da estratégia, mas integra-os, pois, em seu pressuposto,
faz a junção conceitual de formulação e de implantação. Desse modo, procura elucidar novas questões nas
quais a teoria tradicional (aquela baseada nos princípios do planejamento formal, política organizacional e
processo estratégico) não obteve êxito. A estratégia como prática procura relacionar os níveis
organizacionais como criador e influenciador da estratégia, mas tende a limitar-se a âmbitos mais micros,
encontrando dificuldade em integrá-los a níveis mais amplos. Isso permite perceber que essas duas
perspectivas estão buscando estender seu enfoque de forma que uma possa auxiliar na complementação
da outra.”
26Spee e Jarzabkowski (2009) argumentaram que o rótulo Estratégia como Prática carrega um duplo
sentido: o termo prática sinaliza uma tentativa de ser perto com o mundo de praticantes e um
compromisso com as teorias sociológicas da prática.
59
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
prática social das pessoas e não somente da organização, e o método quantitativo passa
a ser apenas mais uma forma de fazer pesquisa em estratégia. Isso não significa que a
questão econômica não seja importante, mas trata-se, na realidade, da valorização das
pessoas envolvidas no fazer estratégia em todos os níveis hierárquicos, logo, nesta
abordagem os praticantes executores do movimento estratégico são ouvidos também.
Já a perspectiva da Estratégia como Prática Social, proposta por
Whittington, epistemologicamente se insere no chamando pelo autor de após o
modernismo. Cabe ressaltar que Whittington (2004) esclareceu que o após o
modernismo não rompe com os movimentos anteriores, pois se trata de estender o
modernismo e o pós-modernismo. Além disso, não há um divisor estanque entre tais
paradigmas. A EPS será mais detalhada na seção seguinte, já que é a abordagem teórica
sobre estratégia que fundamenta este trabalho.
3.2 A ABORDAGEM DA ESTRATÉGIA COMO PRÁTICA SOCIAL – EPS
Remetendo-nos, agora, à proposta de Estratégia como Prática27– EPS, cujo
precursor foi Whittington (1996; 2001; 2003; 2004). Trata-se, além dos conhecimentos
formais, da valorização das experiências cotidianas nas organizações, por vezes
negligenciadas na perspectiva clássica. A obra de 1996 foi a primeira publicação do
autor a buscar um espaço para uma abordagem emergente cujo foco foi tratar a
estratégia como um bem social, preocupando-se como as(os) atores fazem a estratégia.
Não temos a pretensão de apresentar todos os trabalhos localizados, por isso
elegemos os autores ou Whittingtonou Jarzabkowski28
por serem os seminais da
proposta e, também, os mais citados29
nos artigos sobre a temática.
27
Biselli e Tonelli (2006) esclareceram que a preocupação de uma abordagem mais prática da estratégia
iniciou, em 1985, com Smircich e Stubbart, que já indicavam a dificuldade de o estrategista entender o
ambiente organizacional. David Knights e Glenn Morgan, em 1991, questionaram o discurso da
estratégia, uma vez que as organizações sempre existiram independentemente da estratégia. Gioia e
Chittipeddi, em 1991, avaliaram o processo de mudança em uma universidade. David Barry e Michael
Elmes, 1997, contribuíram ao apresentar a visão da estratégia como narrativa ou estória, que poderia ser
contada tanto dentro e quanto fora da organização. Informaram também que foi Whittington o expoente
contemporâneo dessa proposta.
28Walter, Bachl e Barbosa (2012) pesquisaram os trabalhos que abordaram a perspectiva da Estratégia
como Prática no Brasil (64 artigos) e no exterior (143 textos) no período entre 1996 e 2011. Os periódicos
internacionais pesquisados foram: Organization Studies, Journal of Management Studies, Long Range
Planning, Strategic Organization, Human Relations, European Management Review, Management
60
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Whittington (1996), em seu artigo seminal sobre EPS, buscou reivindicar
um espaço para uma abordagem alternativa da estratégia, estacomo uma prática
social30
em que o importante é entender como os praticantes agem e interagem ao fazer
estratégia. O autor, neste artigo, focou na explicação da diferença entre a abordagem da
EPS e a perspectiva processual, esta, para ele, focaliza a organização como um todo,
enquanto a EPS daria ênfase as práticas realizadas pelas(os) praticantes.
Em outras palavras: na perspectiva da EPS, estudamos a forma como as(os)
praticantes desenvolvem as estratégias, como eles agem e interagem com a estratégia. O
autor explicou que há implicações quando se aborda a estratégia na perspectiva da EPS
tanto para os profissionais, para professores e para pesquisadores, são elas: implicações
Decision, Organization, Competitiveness Review, Journal of Family Business Strategy, Journal of
Management Inquiry, Accounting, Organizations and Society, The Journal of Applied Behavioral
Science, Research Policy e Journal of Economic Geography. Também localizaram artigos nos eventos:
European Group for Organization Studies (EGOS Colloquium), Academy of Management Proceedings
(AOM), Conference at the University of Warwick (Warwick Conference) e Advanced Institute of
Management (AIM Research).
29Ferreira, Bubach e Silva Junior (2014) realizaram pesquisa bibliométrica no período de 2003 a 2013,
utilizando o método ProKnow-C a fim de levantar a produção acadêmica sobre a abordagem EPS. Foram
localizados, pelos autores, nas bases Esmerald 125, Science Direct 940, Web of Science 304 e Sage 38,
107 artigos, cujo título estava alinhado ao tema EPS. Deste Levantamento, os pesquisadores com mais de
cem citações foram: Jarzabkowski (2004), Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007), Jarzabkowski e Spee
(2009), Regner (2003), Whittington (2004), Whittington (2007), Carter, Clegg e Komberger (2008),
Whittington et al. (2003 e Jarzabkowski e Seidl (2008). Também Ferreira, Bubach e Silva Junior (2014, p.
11) concluíram que “[...] pode-se confirmar o caráter pluralístico do campo da estratégia como prática,
com a utilização de diferentes abordagens e perspectivas teóricas.”
30Rouleau, Allard-Poesi e Warnier (2007) afirmaram que as raízes do movimento Estratégia como Prática
Social é europeia, incluindo pesquisadores britânicos, franceses, escandinavos e alemães. Declararam que
houve três núcleos importantes de estudo dessa perspectiva que seguiram a proposta de Richard
Whittington, no artigo Long Range Planning, datado de 1996. O primeiro na Inglaterra onde aconteceram
diversos eventos discutindo essa perspectiva, também a edição especial do Journal of Management
Estudos publicado em 2003. Na segunda geração de autores dessa abordagem, surgem as publicações de
Paula Jarzabkowski, Julia Balogun e David Seidl e a produção, em 2007, de um número especial sobre o
tema em Relações Humanas. Relataram ainda que movimento semelhante acontecia na França. Por fim a
perspectiva de Estratégia como Prática se renova com uma nova geração de pesquisadores e estudantes de
doutorado. São livros, artigos, conferências – como International Management (Academia of
Management, International Association Gestão Estratégica, europeu Grupo de Estudos Organização,
Estratégico Sociedade de Gestão), edições especiais dos jornais (Jornal de Estudos de Gestão, europeu
Gestão Journal, Relações Humanas, Planejamento de Longo Alcance) e, também, um site dedicado ao
temaEstratégia como Prática (www.strategy-como-practice.org) com mais de 2.000 membros.
Chia e MacKay (2007) esclareceram que uma diversidade no vocabulário utilizado para teorizar
Estratégia como Prática, o autor citou: visão baseada em atividades, núcleo micro-estratégias, micro-
atividades,micro-comportamentos, micro-contextos, micro-nível processual, micro-práticas, micro-
perspectivas, micro-sociológicas, abordagem prática, atividades estratégicas, práticas estratégicas, mas o
que se percebe é que, no geral, as práticas são essencialmente micro-processos, realizados por atores no
contexto organizacional.
61
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
práticas – ênfase na competência prática; implicações no ensino – no sentido de que o
professor não pode ser somente um estudioso que aconselha e treina, mas alguém que
experimente o processo da EPS; implicações na pesquisa – novas abordagens teóricas
necessitam de novos tipos de investigação.
Incitado pelo fato de ensinar estratégia na academia há aproximadamente
quinze anos e ser questionado como se faz estratégia, Whittington (2001; 2003)
produziu duas obras buscando esclarecer questões acerca do fazer estratégia na prática.
Essa pergunta o motivou a produzir artigos aproximando o ensino da aprendizagem31
,
com foco nas questões mais básicas sobre o processo de elaboração de estratégia. O
primeiro texto, publicado em 2001, explicou o que ele chamou de virada prática da
estratégia, a qual está centrada em dois principais eixos: prática – refere-se à
regularização dos modos de funcionamento e às atividades específicas dos atores em
busca de uma meta; e práticas – são relativas aos modos socialmente definidos de
operar, são as regras, normas, linguagem, costumes para realizar as atividades afirmou
Whittington (2001).
Whittington (2001) apresentou os resultados parciais de um estudo piloto de
um projeto de pesquisa mais amplo sobre como os diretores de empresa aprenderam a
criar estratégias. Foram quatro entrevistas semiestruturadas com os gestores, com
aproximadamente 60 a 90 minutos de gravação em cada uma delas e um painel de
discussão com outros quatro gestores. Dos oito participantes, cinco eram presidentes ou
31
Com relação ao ensino de estratégia, Jarzabkowski e Whittington (2008a; 2008b) defenderam que, em
vez de separar a teoria acadêmica da prática de gestão, a pesquisa, a gestão e o ensino podem estar
ligados, uma vez que as pesquisas realizadas na academia podem auxiliar no desenvolvimento de
materiais de ensino voltados a profissionais, ou seja: por meio do ensino, a produção acadêmica pode ser
relevante para a prática.
Jarzabkowski e Whittington (2008b) esclareceram que o ensino da estratégia na Harvard Business School
era focado no desenvolvimento de um profissional competente que traria valores para o processo
estratégico além da maximização dos lucros. Dessa maneira, segundo os autores, os estudiosos da
Estratégia como Prática examinam de perto o fazer real da estratégia: os artefatos materiais em mão, a
linguagem utilizada, o posicionamento físico em episódios de estratégia, o riso, a frustração, a raiva, a
excitação, a antecipação, o tédio, a repetição, e as manobras políticas que estão juntas no fazer estratégia.
Também buscam explicações acerca das atividades e suas consequências, trata-se da reflexão da prática
real. Os autores argumentaram que o comportamento dos alunos hoje em sala de aula é diferente em
função de eles terem mais experiência no setor e, logo, não acatam modelos simplistas e histórias heroicas
de gestores e que esse novo contexto nos leva a um ensino mais complexo e realista que necessita utilizar
a experiência do aluno no processo de aprendizagem.
62
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
diretores. Os resultados parciais indicaram certo desconforto para as comunidades de
tradição prática, sugeriram ainda que a estratégia pode ser praticada nessas organizações
de forma mais sutil sobre as quais os pesquisados não conseguiram externalizar.
No segundo artigo, Whittington (2003) tinha como objetivo apresentar seis
questões de pesquisa e enquadrá-las dentro de uma abordagem prática a fim de
promover uma identidade comum às pesquisas dessa proposta. A motivação do autor
para refletir acerca de como fazer estratégia é pelo constrangimento de ele, em
aproximadamente 15 anos ensinando sobre estratégia, saber muito pouco sobre como
fazer estratégias. Ele afirmou que precisamos saber mais sobre questões básicas do fazer
estratégia, também como usar consultores, ferramentas, como fazer os planos, enfim
uma perspectiva prática pode auxiliar em questões básicas que merecem investigação
científica.
As seis questões de pesquisa acerca do processo de fazer estratégia são: I –
onde e como é o trabalho de elaboração e organização das estratégias; II – quem e como
fazem as estratégias e a organização do trabalho; III – quais são as habilidades
necessárias para este trabalho e como tais habilidades são adquiridas; IV – como é
organizado o trabalho de elaboração de estratégias; V – quais as ferramentas e técnicas
de elaboração de estratégias na organização; VI – como são comunicadas as estratégias
para os envolvidos no fazer estratégia.
Com o intuito de contribuir com a identificação das(os) possíveis praticantes
do fazer estratégia, Whittington et al. (2003) apresentaram um mapa preliminar de
estratégia com oito conjunto de atores dentro do campo da estratégia, são eles: gurus,
escolas de negócios, empresas de consultoria, instituições financeiras, equipes de
gestão, meios de comunicação de negócios, instituições do Estado e grupos de pressão,
conforme ilustra a Figura 9.
63
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura9: Campo Organizacional de Estratégia: produtores e consumidores
de estratégia discurso
Fonte: Whittington et al. (2003, p. 398)
No eixo horizontal da Figura, à esquerda estão os que produzem novas
ideias, conceitos e representações estratégicas, e indo para a direita estão os que
divulgam tais ideias. Na extrema direita, estão os chamados consumidores passivos do
discurso estratégico. No eixo vertical – de dependência financeira – estão posicionados
os oito conjuntos de atores, de acordo com o seu grau de dependência em relação às
corporações, indo do mais dependente (parte superior do eixo) ao independente (parte
inferior do eixo).
Whittington (2004) apresentou duas perspectivas para aceitar a Estratégia
como Prática Social, a primeira que se desloca para cima, e a segunda que se desloca
para um nível abaixo da organização32
, a saber: I – sociológica: considera a estratégia
32
“[...] a partir de uma abordagem sociológica, passa-se a discutir a Estratégia como um amplo campo de
atividade social, cujas práticas são importantes para a sociedade como um todo, já que envolve o
direcionamento de poderosas instituições públicas e privadas; exige atores capacitados e de alto custo,
além dos efeitos das inovações e dos investimentos estratégicos poderem afetar toda a sociedade. Já no
segundo caso, a partir de uma perspectiva gerencial, a análise desloca-se um nível abaixo para tratar de
forma mais explícita os processos estratégicos gerais da firma e das atividades daqueles que “fazem
Estratégia.” Questões do tipo onde e como a atividade de criação e administração de estratégias realmente
é feita; quem as realiza; quais as competências necessárias a esta atividade e como elas são adquiridas;
quais são as técnicas e ferramentas utilizadas e como a atividade de ‘fazer Estratégia’ é organizada
passam a ser consideradas importantes na pauta de pesquisas no campo da Estratégia” (ALBINO et al.,
2010, p. 5).
64
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
como uma atividade social cujas práticas são importantes para toda a sociedade; II –
gerencialista: trata-se dos processos estratégicos gerais da firma e das atividades atuais
daqueles que praticam a estratégia, importando o modo como os estrategistas
desempenham seus papéis. Ambas privilegiam a performance do campo como um todo
(contexto social mais amplo) ou das(os) praticantes (individualmente) da estratégias.
Jarzabkowski (2002; 2004) complementou ao expor que o foco está em
como se dá a interação entre os atores, bem como a interação deles com os recursos
físicos e sociais envolvidos na construção, implantação e controle da estratégia
focalizando os níveis: macro – externo à organização, ambiente de atividade; meso –
organizacional; e micro – praticantes e ações cotidianas. Whittington (2004) sintetizou
ao escrever que Estratégia como Prática busca compreender os processos
organizacionais no nível micro, mas também entender as práticas em um contexto social
mais amplo.
Retomando a perspectiva sociológica, “[...] a estratégia passa a ser um
amplo campo de atividade social” (ALBINO et al., 2010, p. 5). Whittington (2004)
esclareceu que, nesta abordagem, a estratégia é considerada como prática em si mesma,
e o nível de análise é deslocado para uma instância acima, pois considera a estratégia
como amplo campo de atividade social. Já na Gerencialista, a compreensão da prática é
transformada em vantagens gerenciais e o nível de análise é deslocado para uma
instância abaixo, porque interessa é a performance – modo – das(os) estrategistas
diante de seus papéis. O autor apresentou elementos de agenda dupla – perspectivas
sociológica e gerencialista33
– para os estudos em estratégia após o modernismo,
conforme ilustra a Figura 10.
33
Colla (2012, p. 52) verificou, em sua pesquisa sobre a publicação brasileira, que “[...] o predomínio da
agenda de teorização ou sociológica ocorreu nos estudos das Práticas, seguido dos estudos da Práxis e,
por fim, dos Praticantes. Assim, é possível inferir que os artigos que estudam a Prática tendem a
contribuir para a agenda de teorização ou sociológica. Os estudos que compõem a agenda da ação ou
gerencialista ocorreram com maior intensidade nos estudos do elemento Práxis, seguidos da Prática e, por
fim, dos Praticantes, ou seja, os pesquisadores que estudam a Práxis tendem a contribuir para a agenda de
ação.”
65
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura10: Compreensão Sociológica para as Implicações Práticas Gerencialistas Perspectiva Sociológica Perspectiva Gerencialista
A sociologia das elites busca compreender
que tipos de pessoas alcançam o poder,
como elas se articulam e influenciam a
sociedade. Em termos práticos, seriam
estudadas a formação educacional e a
carreira dos gestores e profissionais da área,
mas também dos indivíduos considerados
gurus e dos acadêmicos, fontes de influência
externa da organização.
A sociologia das elites promoveria o
entendimento de, nas palavras de
Whittington (2004): “como alguém se
torna estrategista.” Seria a investigação da
formação educacional e da trajetória
profissional do envolvido, bem como uma
estrutura que possibilitasse o
desenvolvimento pessoal do individuo
como estrategista.
A sociologia do trabalho busca explicar a
organização, a divisão das tarefas e as
implicações do trabalho, bem como as
habilidades dos participantes envolvidos no
fazer estratégia.
Uma sociologia do trabalho em estratégia
promove o estudo das habilidades
necessárias para os estrategistas, bem
como elas podem ser adquiridas.
Whittington (2004) coloca que é preciso
compreender a composição na prática das
habilidades apontadas por Mintzberg
(1994): planejar e pensar estrategicamente.
A sociologia da ciência e da tecnologia
auxilia a análise da criação, do uso e dos
efeitos das ferramentas estratégicas a fim de
entender como elas são utilizadas na prática.
Quanto à sociológica das tecnologias da
estratégia, poder-se-ia compreender como
tais ferramentas estratégicas são usadas na
prática gerencial. Ou outra oportunidade
de pesquisa seria entender como desenhar
e divulgar novas tecnologias em
estratégias para suas(seus) praticantes.
Fonte: Elaborada com base em Whittington (2004)
Whittington (2006) propôs uma estrutura conceitual com três elementos de
uma teoria da EPS, os quais podem ser isolados em: I – práxis34
de estratégia – trata-se
das atividades das(os) envolvidas(os) no trabalho de fazer estratégia. Para o autor:
refere-se à atividade real, que as pessoas fazem na prática; II – práticas de estratégia – é
o fazer dos atores, suas rotinas, discursos, conceitos, normas e tecnologias por meio dos
quais a atividade estratégica se realiza. Nas palavras do autor, práticas vão referir-se às
rotinas comuns de comportamento, incluindo tradições, normas e procedimentos para
34
Cunha (2001) informou que o termo práxis deriva do latim praxis e do grego práxis. Mora (1998, p.
577), em seu dicionário de Filosofia, expôs que “Os gregos chamavam πράξις (práxis) uma tarefa,
transação ou negócio, ou seja, à ação de levar a cabo algo, πράξις (infinito). O termo πράξις também foi
usado para designar a ação moral.
66
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
pensar, agir e usar coisas. III – Praticantes de estratégia – são as(os) atores envolvidos
no fazer a estratégia, são os estrategistas que realizam suas práticas.
Estudos orientados para a prática não precisam, necessariamente, combinar
os três elementos: práxis, práticas e praticantes ao mesmo tempo, esclareceu
Whittington (2006), no entanto a proposta da teoria prática faz supor interconectividade
entre eles. O autor apresentou a Figura 8, a fim de explicitar a integração da práxis,
práticas e praticantes. Nela as(os) praticantes são vistos como atores reflexivos que
podem modificar os elementos de sua práxis e, consequentemente, alterar as práticas
existentes. Logo eles são a conexão crítica entre a práxis e as práticas intra e extra-
organizacional.
Na Figura 11, no conjunto de praticantes estratégicos, estão as(os) atores da
alta e média gestão e seus conselheiros (A, B e C), bem como ator externo (D) –
participante do extracampo, participando da organização (paralelogramo inferior). As
setas verticais indicam a utilização e retroalimentação das práticas, as quais, quando
legítimas, são incluídas no interior da parte superior do paralelogramo (1 a 4). A prática
explicitada pelo número 4 representa as práticas que são do domínio
extraorganizacional. Há cinco (i-v) pontos de convergência em episódios de práxis de
estratégia intraorganizacionais, que podem ser reuniões formais do conselho, conversas
informais, entre outras práxis.
Figura11: Integração entre Práticas, Práxis e Praticantes
Fonte: Whittington (2006, p. 622)
67
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Whittington (2006) abordou sobre quatro implicações acerca da integração
para a prática de estratégia: I – refere-se ao fato de as setas indicarem para baixo, dessa
forma explicitam o peso potencial de práticas sobre a práxis, alertando sobre o
conservadorismo, mas também apontam para a possibilidade de mudança nas práticas
estratégicas. II – as práticas são transmitidas por setas para cima que indicam que elas
são tipicamente emergentes de práxis. III – as pessoas são o centro na reprodução,
transferência e práticas inovadoras de estratégia. IV – a práxis efetiva depende muito da
capacidade de os profissionais acessarem e implantarem as práticas estratégicas.
Ao traçar uma analogia da EPS com as fragilidades identificadas nas
abordagens clássica e processual, percebemos que perspectiva da Estratégia como
Prática Social visa ao preenchimento de tais lacunas, a partir do fato de que o
protagonista do processo estratégico são as pessoas, nas palavras de Whittigton, as(os)
praticantes ou estrategistas, incluindo tanto aqueles que planejam como também os que
executam as estratégias no cotidiano das organizações.
Dessa maneira, a EPS tem a necessidade de aproximar-se dessas(es) atores
privilegiando, portanto, os métodos qualitativos para coleta e análise dos dados. A EPS
também possibilita a análise no nível micro, bem como as práticas e processo decisório
tanto dos gestores do alto escalão, como dos praticantes que executam as ações do dia a
dia. Esta abordagem faculta o entendimento do fenômeno da estratégia, não se limitando
a sua descrição.
Retomando Whittington (2006) acerca dos conceitos de práxis, prática e
praticantes, Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007) apresentaram o conceito de práxis,
práticas e praticantes, a fim de que os pesquisadores da abordagem Estratégica como
Prática Social pudessem explicar os desafios de pesquisa desta perspectiva, bem como
eles podem ser examinados empiricamente. Práxis refere-se às ações (trabalho) de
diferentes praticantes nos níveis micro e macro das organizações. Práticas estão
relacionadas ao fazer, trata-se, portanto, do comportamento, recursos físicos,
discursivos, processos, normas institucionalizadas por meio dos quais as(os)
estrategistas interagem e realizam as atividades coletivamente. Praticantes são
aquelas(es) que se tornam estrategistas, são as(os) estrategistas que inter-relacionam à
práxis e à prática. Na articulação dos três elementos acontece o strategizing, em outras
palavras: o fazer estratégia, conforme ilustra a Figura 12.
68
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura12: Práxis, Práticas e Praticantes
Fonte: Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007, p. 8)
Vaara e Whittington (2012) realizaram revisão de trabalhos empíricos
publicados desde 2003, acerca de Estratégia como Prática. Os autores tiveram dois
objetivos, a saber: fornecer uma visão geral da pesquisa fundamental no campo da
estratégia como prática, distinguindo-a das pesquisas em estratégia tradicional; e sugerir
caminhos para uma compreensão mais completa do papel central da organização e das
práticas sociais mais amplas na decisão estratégia. Estes autores argumentaram que a
EPS enriquece a pesquisa em estratégia tradicional, devido a quatro características
distintivas.
A primeira, porque a investigação se baseia principalmente nas teorias
sociológicas sobre a prática, em vez de teorias econômicas. Segunda, a abordagem
prática amplia o alcance da pesquisa em estratégia, já que se preocupa com diversos
resultados como a política, consequências de determinados episódios na elaboração de
estratégias ou os efeitos de ferramentas de estratégia, ou ainda acerca do envolvimento
de determinados tipos de praticantes. Terceira, amplia também os tipos de organizações
estudadas, não ficando restrita a empresas privadas com fins lucrativos. Quarta, alcança
mudança metodológica substancial, não se limitando aos estudos estatísticos
tradicionais, privilegiando os métodos qualitativos.
Ao revisarem as publicações de 2003 em diante, Vaara e Whittington (2012)
organizaram as publicações focalizando práticas, práxis e profissionais, embora sejam
Práxis
Fluxo de atividades socialmente realizadas que estrategicamente
impactam na direção e na sobrevivência do grupo e da
organização ou indústria.
Praticantes Atores que dão formato à
construção da prática, por meio de quem são,
como agem e quais recursos utilizam.
Práticas
Práticas cognitivas, comportamentais,
discursivas, motivacionais e físicas que são combinadas,
coordenadas e adaptadas para construir a prática
Strategizing
B C
B B
A
69
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
temas interligados e, por uma questão didática, apresentaram os resultados
separadamente. Os autores afirmaram que o termo práticas é amplo, e é o elo entre a
pesquisa em estratégia e tradições teóricas e empíricas de outras áreas do conhecimento.
Os autores definiram ferramentas, normas e procedimentos que trabalham a estratégia.
Vaara e Whittington (2012) ratificaram que práxis são as atividades
envolvidas no processo estratégico, em outras palavras: aquelas que possibilitam a
criação da estratégia. Citaram como um dos aspectos positivos desses estudos é o fato
de possibilitarem o aprofundamento sobre o que realmente acontece no processo
estratégico. Os autores trataram dos resultados acerca dos papéis e identidades das(os)
profissionais específicos em estratégia e informaram que as pesquisas têm caminhado
em duas direções: primeira – preocupação em recuperar, por meio de pesquisas, os
especialistas em estratégia, como facilitadores envolvidos na organização; segunda –
focaliza as(os) gestoras(es) de nível médio na organização devido ao seu potencial
envolvimento como criadores, intérpretes e comunicadores da estratégia na organização.
Por fim propuseram cinco direções fundamentais para avançar na pesquisa da EPS, são
elas:
1. Atividade como uma rede de práticas – os autores argumentaram a
necessidade de ampliar a análise das atividades na elaboração da estratégia, já que a
gestão estratégica tradicional potencializa a capacidade de praticantes individuais na
orientação das organizações. Especificamente a perspectiva prática permite ir além do
individualismo metodológico, focalizando as pessoas e suas ações ou comportamentos.
Alertaram que há práticas organizacionais que nem sempre são reconhecidas como
estratégia, e que precisam ser estudadas também.
O objetivo de Vaara e Whittington (2012) foi enfatizar a diversidade dessas
práticas e as várias vozes que produzem ou estão em torno da estratégia. Sugeriram,
então, que uma via interessante para futuras pesquisas seria elucidar a variedade
discursiva de práticas relacionadas com a atividade estratégica, ou como as(os) atores
aprendem a fazer uso da prática discursiva em suas ações, ou qual é a contribuição de
outras(os) praticantes organizacionais – vendedores, especialistas tecnológicos, ou
trabalhadores do chão de fábrica – os quais contribuem para a atividade estratégica.
2. Explorar a natureza macroinstitucional ou social das práticas de
estratégia em contextos mais amplos, como campos – Bourdieu – ou sistemas sociais –
70
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Giddens, articulando os gestores da alta administração, consultores, instituições
financeiras, agências estatais, os meios de comunicação, escolas de negócios na
produção e consumo do discurso estratégico. Conceituar estratégia como um campo é
também torná-la social e historicamente contextualizada. Os pesquisadores da EPS têm
demonstrado interesse em investigar, por meio de estudos mais detalhados, a influência
de práticas organizacionais sobre a práxis estratégica. “A pesquisa em estratégia após o
modernismo procura modelos para além da economia e em direção à sociologia. Esta
permaneceu menos restrita pelo modernismo e mais aberta à prática”
(WHITTINGTON, 2004, p. 51). Essas pesquisas buscariam explicações em estudos que
envolvessem um campo da sociedade, estado ou propriedade privada que lidam com o
processo estratégico.
3. Explorar as estratégias emergentes, as quais, embora importantes, foram
de certa forma negligenciadas nos estudos da estratégia, já que o foco até então era na
estratégia formal. Nas palavras de Vaara e Whittington (2012), realizar pesquisas
acerca da estratégia emergente é uma oportunidade significativa para o avanço da
investigação em EPS. É concentrar-se nas práticas que formam a base do sucesso ou da
sobrevivência organizacional a fim de melhor entender como apenas algumas práticas
são vistas como estratégicas. Nessa visão, a estratégia pode estar implícita nas práticas e
ações cotidianas.
4. As sugestões anteriores focalizavam as(os) praticantes envolvidos no
fazer estratégia, neste item, os autores sugeriram investigações sobre os objetos
materiais – artefatos35
– como documentos, tecnologias, reuniões, etc. Trata-se dos
35
Spee e Jarzabkowski (2009) propuseram o conceito de objetos de fronteira como uma estrutura para
explicar como ferramentas estratégicas são usadas no processo de estratégia. Os autores esclareceram que,
nem todo artefato é objeto de fronteira, é que para serem objetos de fronteira seriam os artefatos que
permitem e limitam a socialização do conhecimento por meio de três fronteiras do conhecimento que são:
I – limites sintáticos: são os mais simples e assumem que o conhecimento pode ser transferido entre os
atores propiciando uma sintaxe comum. No âmbito organizacional, seriam os acordos de contratação
entre setores internos. II – limites semânticos: é mais complexo porque os significados comuns precisam
ser desenvolvidos, exemplificaram com o departamento de marketing e um setor de vendas que
precisariam interpretar o que os outros exigem a fim de poderem comercializar seus produtos. III – limites
pragmáticos: são mais social e politicamente complexos, pois precisam desenvolver e transformar o
conhecimento. Exemplificando, seriam, em períodos de incerteza, os atores estratégicos em diferentes
setores terem interesses políticos diferentes sobre o curso adequado da ação estratégica. Para Spee e
Jarzabkowski (2009), os objetos de fronteira permitem a interação entre os atores, mas também revelam
às fronteiras dentro das organizações, particularmente aquelas que são mais complexas do que as
fronteiras sintáticas.
71
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
artefatos materiais – tanto gerenciais como tecnológicos – usados pelas(os) praticantes
da estratégia. Tais recursos devem ser objetos de estudo uma vez que eles tanto
promovem quanto dão transparência a formação da estratégia quanto podem impedir a
participação das pessoas.
Para exemplificar com resultados empíricos, relatamos a pesquisa de
Jarzabkowski e Seidl (2008) que estudaram um conjunto de dados de cinquenta e uma
observações de reuniões estratégicas em três universidades do Reino Unido, durante um
período de sete anos. Examinaram como as reuniões estavam envolvidas nas orientações
estratégicas existentes ou propondo variações que gerassem cumulativamente mudanças
nessas orientações. As reuniões observadas foram identificadas como estratégicas pelos
gestores da alta administração em razão de nelas tratarem de questões que envolviam as
instituições como um todo, particularmente em termos da sua reputação e prestígio,
crescimento e viabilidade financeira, logo, de sua sobrevivência no setor universitário.
5. A última proposição é uma análise crítica da estratégia, ou seja: realizar a
análise crítica das práticas tomadas como certas, naturalizadas. Logo é não se limitar a
analisar somente os padrões das atividades dos estrategistas, mas também problematizar
tais práticas. As pesquisas, com base na prática, podem investigar o que é invisível nas
práticas estratégicas. É necessário entender como práticas de planejamento
convencional podem legitimar e naturalizar lucros a curto prazo. Também estudar a
forma como as pessoas são tratadas, por vezes como recursos, ou ainda como as pessoas
lidam com as práticas que lhes são impostas. A questão de gênero precisa de atenção,
porque a gestão estratégica parece promover valores masculinos por meio das práticas
que passam despercebidas.
Os autores sugeriram que seriam interessantes pesquisas que possibilitassem
a compreensão dos papéis e identidades dos homens e mulheres no fazer estratégia.
Argumentaram que tais papéis e identidades podem ser diferentes, mas que variam
conforme os contextos organizacionais e institucionais. Sugeriram investigações para
verificar como os valores masculinos incorporados no discurso estratégico influenciam
no comportamento das pessoas. Também dentro dessa visão crítica, parece importante
estudar as formas pelas quais os modismos estão inseridos nas organizações, bem como
suas implicações no cotidiano. Acrescentaram ainda como sugestão, estudar as formas
72
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
de ensino da estratégia, como ele divulga, legitima e naturaliza as práticas de gestão
estratégica, em outras palavras: se o ensino auxilia na promoção da inclusão e da
igualdade.
Este trabalho se insere nas lacunas apresentadas por Vaara e Whittington
(2012) acerca das práticas discursivas, buscando identificar as diversas vozes que
influenciam no fazer estratégia a fim de verificar a contribuição das(os) estrategistas
nas atividades estratégicas, mas também realizar uma análise crítica das práticas de
gênero tomadas como certas e, portanto, naturalizadas na formação da estratégia acerca
da divisão sexual do trabalho.
73
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 4
ESTUDOS SOBRE GÊNERO
“Tudo muda, nada muda.”
(HIRATA; KERGOAT, 2007, p. 597)
74
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Parece-nos pertinente, antes de apresentarmos conceito e os estudos sobre o
gênero – estes com foco no trabalho –, relatarmos acerca dos dois ou três momentos dos
estudos de gêneros, mais conhecidos com as ondas do movimento feminista e suas
concepções epistemológicas. Na próxima seção, portanto, apresentamos os conceitos
contemporâneos de gênero: de forma implícita e sem a utilização do termo. A temática
foi abordada implicitamente na obra de Simone de Beauvoir, na década de 40; Stoller,
no final dos anos sessenta, utilizou o termo pela primeira vez; com Gayle Rubin, na
segunda metade da década de 1970, o termo foi difundido em seus estudos; e Scott, em
1986, trouxe o gênero como categoria analítica.
Na sequência, trazemos estudos sobre gênero em organizações de trabalho
– cujo foco foi a questão da divisão sexual do trabalho conceitual e empiricamente – e,
por fim, uma seção em que apresentamos as iniciativas institucionais brasileiras acerca
do gênero.
Cabe orientar a leitura esclarecendo que optamos por contextualizar os
estudos de gênero e, ao final das seções deste capítulo, apresentamos a reflexão acerca
dos posicionamentos que fundamentam este trabalho.
4.1 DOIS OU TRÊS MOMENTOS DOS ESTUDOS DE GÊNERO – CONCEPÇÕES
EPISTEMOLÓGICAS
O objetivo nesta seção é apresentar os momentos dos estudos36
e respectivas
categorias de análise: mulher, mulheres e gênero. Concomitantemente, apresentamos as
concepções epistemológicas de cada categoria. Iniciamos com a retomada, sobretudo de
Scott, com o propósito de contextualizar as duas ondas do movimento feminista. Cabe
ressaltar que há autores que tratam de três37
ou quatro ondas, como Pedro (2011), como
36
Para ver dossiê sobre o feminismo no Brasil, ver:
RAGO, Margareth. Adeus ao feminismo? Feminismo e (pós)modernidade no Brasil. Cadernos AEL:
mulher, história e feminismo. Campinas, IFCH, n. 3/4, p. 37-38, 1996. Disponível em:
CORRÊA, Mariza. Do feminismo aos estudos de gênero no Brasil: um exemplo pessoal, Cadernos Pagu
(16), p.13-30, 2001.
SARTI. Cynthia Andersen. O feminismo brasileiro desde os anos 1970: revisitando uma trajetória,
Estudos Feministas, Florianópolis, 12(2): 264, maio-agosto/2004.
37
“O feminismo tem sido delimitado por suas etapas históricas, três grandes fases são comumente
referidas: a fase universalista, humanista ou das lutas igualitárias pela aquisição de direitos civis, políticos
e sociais; a fase diferencialista e/ou essencialista, das lutas pela afirmação das diferenças e da identidade;
75
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
também não se tratam de movimentos estanques e de superação. Nós adotamos aqui
para apresentar dois momentos por ser o mais recorrente na literatura, mesmo sabendo
que não sobrelevação entre eles.
Para contextualizar esses momentos, relatamos o apanhado realizado por
Scott (1983) acerca das produções sobre a mulher nos Estados Unidos. A autora relatou
o fato inegável de que historiadoras(es), inspiradas(os) pela agenda política do
movimento feminista, documentaram a vida das mulheres, bem como as mudanças nas
posições econômica, educacional e política delas.
Scott (1983) argumentou que a produção de materiais – livros, revistas,
conferências, entre outros – possui diversidade de tema, método e interpretação. Ela
colocou que, de fato, seria incoerente a tentativa de estudar a mulher como tema único,
haja vista o reconhecimento das diversas formas de evidência. No entanto argumentou
que a pluralidade de abordagens também gera certa confusão, tanto na compreensão da
história de mulheres, como também para uma avaliação crítica. Em seu texto, a autora
discorreu acerca das abordagens utilizadas nos estudos realizados nos Estados Unidos,
os quais, por questão didática, sintetizamos na Figura 13.
e uma terceira fase, denominada de pós-moderna, derivada do desconstrucionismo, que deu apoio às
teorias dos sujeitos múltiplos e/ou nômades” (SCAVONE, 2008, 177).
76
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 13: Abordagens de Estudo da História da Mulher Abordagem Contextualização Objetivo
História das
mulheres
como "la-
história"
Uma narrativa da experiência das
mulheres ou ao lado ou totalmente
fora dos marcos históricos
tradicionais.
Foco exclusivo na atuação do sexo
feminino, no papel desempenhado
por elas na história.
Não pretende reescrever a história
das mulheres, mas levantar questões
que exigem respostas, além de
oferecer documentação sobre as
atividades públicas e privadas das
mulheres que aconteceram, mas não
foram incluídas nas histórias
convencionais.
A mulher é substituída pelo homem
como sujeito histórico.
As categorias sexo e gênero precisam
ser conceituadas historicamente.
Estudos buscavam:
dar valor à história de uma
experiência que tem sido ignorada
e, assim, desvalorizada e insistir na
construção da história feminina.
descobrir a participação das
mulheres em grandes
acontecimentos políticos para
escrever sua história.
apresentar as estruturas de vida das
mulheres normais, bem como das
mulheres notáveis.
descobrir a natureza do feminismo
ou da consciência feminina que
motivaram seu comportamento.
Histórias das
mulheres
associadas à
história social
Promove importante suporte para a história
das mulheres de várias maneiras:
fornece metodologias na
quantificação e na utilização dos
detalhes da vida quotidiana e
empréstimos interdisciplinares de
sociologia, demografia e etnografia.
interpreta as histórias como um
fenômeno histórico de relações
familiares, fertilidade e sexualidade.
desafia a narrativa da história política
(líderes masculinos).
legitima o foco em grupos
costumeiramente excluídos da
história política.
avaliar o impacto do capitalismo e
ou compreender a sua operação na
relação mulher e trabalho.
descobrir a gama de papéis sexuais
e simbolismo sexual em diferentes
sociedades e épocas, para descobrir
os seus significados, bem como seu
funcionamento.
Fonte: Elaborada com base em Scott (1983)
Scott (1995) comentou que as(os) historiadoras(es) feministas tinham duas
razões para buscar teorias que embasassem seus estudos: I – necessidade de explicar as
desigualdades38
persistentes e das experiências sociais diferentes; II – devido à
38
Scott (1995) proporcionou uma reflexão acerca dos conceitos de igualdade e diferença e das
identidades individuais e de grupo. A autora defendeu que tais conceitos não são opostos, mas
interdependentes e abordou a dificuldade de conceituar o termo igualdade do ponto de vista social.
Afirmou também que tal conceito, ao longo do tempo, tem-se transformado e, em razão disso, as questões
de (des)igualdade também vêm modificando-se: inicialmente havia a proibição do voto, atualmente são
questões de acesso à educação, ao trabalho, entre outros.
Para Abramo (2007, p. 6): “[...] interessa para a análise sociológica descobrir as relações sociais que
configuram e reconfiguram os lugares de homens e mulheres no mercado de trabalho, e as
77
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
marginalidade dos estudos acerca da história das mulheres, causada pela falta de
questionamento com relação aos conceitos dominantes acerca do gênero.
Nas palavras de Scott (1995), embora tenha sido provado que as mulheres
tiveram uma história, bem como a sua participação nas principais mudanças políticas da
civilização ocidental, as(os) historiadoras(es) não feministas demonstraram pouco
interesse pela história das mulheres e as segregaram da história dos homens. Além
disso, as teorias utilizadas pelas(os) historiadoras(es) limitaram os resultados, haja vista
generalizarem de maneira redutora ou simples demais o fenômeno estudado. As
abordagens mais utilizadas por elas(es) foram duas: a primeira, essencialmente
descritiva – a qual visava à descrição do fenômeno; a segunda, causal, em que buscava
o porquê dos fenômenos e das realidades (SCOTT, 1995).
Destacamos, então, os dois momentos dos estudos de gênero em
consonância com a literatura que, de forma geral, reconhece duas ondas do movimento
feminista, embora tais ondas não se tratem de movimentos de superação entre elas.
Focalizando o primeiro momento – conhecido como a primeira onda dos estudos, ele se
desenvolveu do final do século XVIII até o final do século XIX e teve diversas
influências teóricas durante o movimento, a saber: liberal39
, radical40
, psicanalítica41
,
marxista42
, socialista43
. Nesta onda, as feministas buscavam a igualdade com relação aos
correspondentes relações de desigualdade, hierarquia ou subordinação que os caracterizam, é fundamental
desvendar e descobrir os mecanismos que reproduzem essas diferenciações e desigualdades [...].”
39
Inicialmente retomaram o pensamento de que as mulheres são pessoas de Mary Wollstonecraft – 1792,
John Stuart Mill – 1869, Harriet Taylor Mill – 1851. Houve três ondas liberais: I – até a década de 1960 –
buscavam reivindicar acesso da mulher a todos os ambientes da vida; II – década de 1960 – defendiam a
igualdade de acesso e representação no ambiente público; III – década de 1980 – focalizaram a diferença,
evidenciando a diferença entre sexo e gênero (CALÁS; SMIRCICH, 1999).
40
Desde seu surgimento – década de 1960 – questionou a subordinação da mulher à dominação
masculina. Buscou uma ordem social separatista em que não haja subordinação da mulher ao homem.
Valorizou qualidades ditas como femininas, como a sensibilidade e capacidade de expressar emoções
expuseram Calás e Smircich (1999).
41
Criticou a visão da estrutura psicológica feminina e rejeitou o determinismo biológico acerca do gênero
e da sexualidade. Defendeu que práticas educativas na infância favorecem um modo masculino de estar
no mundo, construído cultural e historicamente que desfavorece as mulheres, explicaram Calás e
Smircich (1999).
42 Defende que a vida econômica condiciona a vida social, política e intelectual defenderam os estudiosos
dessa abordagem. O capitalismo de produção e a luta social entre capital e trabalho são os temas
enfatizados nesta perspectiva. Critica o feminismo liberal devido: a sua concepção errônea da natureza
78
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
direitos políticos, sociais e econômicos44
dados aos homens. As feministas sociais
reivindicavam o direito de as mulheres votarem, serem eleitas, condições de trabalho,
educação, controle de propriedade e herança.
Nesta perspectiva, as mulheres eram subordinadas aos homens socialmente,
logo as feministas questionavam essa subordinação e reivindicavam direitos iguais aos
homens. No século XIX, esse movimento ficou conhecido como igualitárias em razão
de elas buscarem o mesmo espaço que os homens tinham na esfera pública (pública45
contrapondo com a esfera privada – doméstica). Calás e Smircich (1999, p. 280)
afirmaram que o objetivo era “[...] a igualdade de acesso e representação na vida
pública; qualquer ênfase em diferenças de sexo e/ou seu reconhecimento era vista como
reacionária e perigosa para a ‘causa’.” Pinsky e Pedro (2003, p. 287)46
esclareceram que
o posicionamento era “baseado no reconhecimento da igualdade entre os seres humanos,
homens e mulheres.” Nesta perspectiva, a mulher é apresentada masculinizada, porque
busca a igualdade com ele, gerando, por isso, contestações47
.
humana, ao entendimento equivocado do processo de trabalho, à cegueira ao patriarcado. Para esta
perspectiva, a mulher sofre dupla opressão: de gênero e de classe (CALÁS; SMIRCICH, 1999).
43
Contestou as teorias: marxista – devido ao fato de darem maior importância à opressão dos
trabalhadores do que das mulheres; radical – em razão de sua ingenuidade por entender que há uma
cultura feminina sob o patriarcado e o capitalismo; psicanalítica – devido as suas tendências
generalizantes, mas, ao mesmo tempo em que criticou tais perspectivas, assumiu questões que as
englobam, bem como buscou ultrapassar as limitações delas. Buscou explicar a separação e opressão de
gênero por meio da integração da estrutura social e da ação humana, esclareceram Calás e Smircich
(1999).
44 Nesse contexto, Scott (2002) debateu a questão do individualismo para que fosse possível a igualdade
política, social e econômica entre homens e mulheres. A autora apresentou diversos conceitos para a
palavra indivíduo, já que há vários usos desse termo. Segundo esta pesquisadora, as diferenças que
distinguem os indivíduos é que os tornam únicos, esse fato, nessa relação de diferenças, é que se institui a
individualidade, que é o que as pessoas têm em comum. 45
Esferas pública versus privada: a primeira refere-se aos espaços ditos masculinos, remunerados e,
portanto, produtivos no sentido que, na visão capitalista, gera lucro diretamente; a segunda é o espaço
doméstico, ocupado pelas mulheres, reprodutivo (biológica e social), logo, sem remuneração formal. “Em
nossa sociedade, é convencionalmente atribuída às mulheres a dedicação ao universo privado, enquanto
que aos homens é reservada a participação na vida pública. De acordo com essas representações
tradicionais, tudo o que não se refere ao universo doméstico, à casa e aos cuidados dos filhos tem sido,
ainda que imprecisamente, considerado participação pública reservada aos homens”, esclareceu Vianna
(2013, p. 173).
46
Esta obra traz detalhadamente o movimento em diversos países. 47
Saffioti (2009, p. 20) expôs que “[..] diferente faz par com idêntico. Já igualdade faz par com
desigualdade, que são conceitos políticos. Assim, as práticas sociais de mulheres podem ser diferentes das
79
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Várias foram as conquistas em termos de direitos políticos, sociais, sexuais
e reprodutivos, mas muito ainda havia para buscar pelo movimento das mulheres e
feministas. Pinsky e Pedro (2003, p. 293) argumentaram que “O século XX já foi
chamado de ‘século das mulheres’, momento em que o movimento de mulheres e no
interior deste, o movimento feminista [...].”
Em contraponto a esse movimento feminista e das mulheres48
, as
diferencialistas buscam a diferença das mulheres em relação aos homens, ou seja:
homens como uma categoria universal e, logo, excludente, dando primazia às
reivindicações acerca do corpo, do prazer das mulheres. As diferencialistas defendem a
separação das mulheres, a fim de construir uma identidade e cultura feminina. Pedro
(2005) esclareceu que esses estudos se deram após a Segunda Guerra Mundial e
passaram a ter ênfase da década de sessenta em diante, quando emergiu a categoria
gênero, embora coexistam dentro do feminismo.
Sintetizando, nesse contexto, foram duas perspectivas dos estudos
feministas: igualitaristas e diferencialistas as quais, embora tivessem em comum
focalizar as mulheres, tinham enfoques distintos dentro do movimento. Isso lhes rendeu
questionamentos mútuos, inclusive: as primeiras criticavam o posicionamento das
segundas em razão de entenderem que havia uma defesa ao essencialismo, dito de outra
forma: a defesa de que o sexo genital era o materializador da diferença entre mulheres e
homens, além de buscarem a transformação qualitativa das profissões com o acesso das
mulheres, fenômeno conhecido como feminização49
do mundo, esclareceu Pedro
de homens da mesma maneira que, biologicamente, elas são diferentes deles. Isto não significa que os
dois tipos de diferenças pertençam à mesma instância. A experiência histórica das mulheres tem sido
muito diferente da dos homens exatamente porque, não apenas do ponto de vista quantitativo, mas
também em termos de qualidade, a participação de uma é distinta da de outros. Costuma-se atribuir tais
diferenças de história de vida às desigualdades, e estas desempenham importante papel nesta questão.”
48
Expressão usada por Pedro (2005).
49
Abercrombie, Hill e Turner (1994), em seu dicionário de Sociologia, definiram feminização quando as
mulheres ocupam significativamente as profissões. Afirmaram, ainda, que o grau de feminização é
mensurado pela proporção de mulheres dentre os funcionários e relacionada ao empobrecimento do
referido trabalho. Especificamente nos estudos de gênero, feminização é o termo que se refere às
transformações que ocorrem nas profissões com a adesão das mulheres. Trata-se de uma análise
qualitativa desses processos.
Yannoulas (2011) trouxe um questionamento de que, dentro do fenômeno da feminização, há dois
significados um quantitativo e outro qualitativo, para os quais a autora nomeou como feminilização e
feminização respectivamente. O primeiro abarca a ocupação e composição, estaticamente, das mulheres
em determinada profissão, e o segundo busca entender e explicar os processos de transformação ocorridos
em determinada época, bem como seu valor social acerca de determinadas profissões, em outras palavras:
80
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
(2005); as segundas argumentavam que as igualitaristas primavam pela masculinização
das mulheres para alcançarem os mesmos direitos dados a eles.
De fato, o que ocorreu também, nesse cenário, é que as mulheres não se
sentiam reconhecidas pela categoria mulher, em razão da diversidade das necessidades
e, consequentemente, reivindicações do movimento feminista, uma vez que não havia
um modelo universal que pudesse representar todas as mulheres. Então, para expressar
essa heterogeneidade requerida por elas, a categoria mulheres passou a ser utilizada.
“[...] a identidade de sexo não era suficiente para juntar as mulheres em torno de uma
mesma luta. Isto fez com que a categoria ‘Mulher’ passasse a ser substituída, em várias
reivindicações, pela categoria ‘mulheres’”, esclareceu Pedro (2005, p. 82). No entanto,
esta categoria também sofre seus questionamentos, uma vez que ainda há grupos que
não se sentem representadas por ela.
Logo, no interior da categoria mulheres e ao final da segunda onda, emerge
a categoria gênero, a qual vai construindo-se na interface com os movimentos
feministas. O texto destaque acerca da categoria gênero foi o de Scott, publicado em
inglês, em 1986, com duas traduções para o português: 1989 e 1995. Ao utilizar gênero
como substituto de mulheres, a autora evidencia que o mundo das mulheres está contido
no mundo dos homens. Nas palavras de Scott (1995): não é possível separar as
dimensões dos homens e das mulheres.
Esse argumento foi reforçado pelo fato de que o termo designa relações
sociais que ocorrem entre ambos os sexos. Na década de 1980, os estudiosos buscaram
a legitimidade acadêmica50
ao usar o termo gênero em vez de mulheres e deram, assim,
um caráter mais científico, objetivo e neutro, já que ele não traz consigo questões de
poder ou de desigualdade. Trata-se de um termo mais amigável no dizer de Scott
(1995).
seriam os processos de entrada, permanência, ascensão das mulheres nas funções/profissões no mundo do
trabalho, esclareceu a autora.
50
Para Matos (2008, p. 336) “[...] as mulheres feministas no campo acadêmico visaram ampliar, nas
ciências humanas e sociais, o escopo das reflexões para adotar uma nova proposta teórico-conceitual: os
estudos de gênero. É certo e já estabelecido que gênero, como um conceito, surgiu em meados dos anos
703 e disseminou-se instantaneamente nas ciências a partir dos anos 80. Tal reformulação surgiu com o
intuito de distinguir e separar o sexo – categoria analítica marcada pela biologia e por uma abordagem
essencializante da natureza ancorada no biológico – do gênero, dimensão esta que enfatiza traços de
construção histórica, social e sobretudo política que implicaria análise relacional.”
81
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Para sintetizar, da categoria universal mulher a qual não representava todas
as mulheres e, por isso, necessitou ser ampliada para mulheres a fim de elas – brancas,
negras, de diversos níveis socioeconômicos – pudessem se ver na categoria. Mas,
mesmo assim, ainda ficava a dicotomia biológica e, dessa maneira, não abarcava as
relações sociais, portanto careceu de um termo que fosse imparcial emergindo, assim, a
categoria gênero. Tais categorias coexistem e provocam estudos em diferentes áreas do
saber.
Logo como permanecia em algumas(uns) historiadoras(es) a inquietação de
explicar o conceito de gênero, bem como sua mudança histórica, emergiu da pluralidade
de abordagens51
nas análises de gênero, declarou Scott (1995), as quais foram
sistematizadas em três pressupostos teóricos pela pesquisadora, a saber: patriarcado,
marxista e psicanalítica.
O patriarcado52
focaliza a subordinação da mulher pelo homem. Uma
justificativa dessa condição de submissão da mulher seria pelo fato de ela ser a
responsável pela reprodução da espécie. Saffioti (2004) acatou que o conceito de gênero
é mais amplo que o de patriarcado, porque aquele acompanha a humanidade desde sua
existência, enquanto este é um fenômeno datado do capitalismo. Esta autora, mesmo
51
Matos (2008) esclareceu que o construto gênero, em razão de sua pluralidade de conhecimento, foi
apropriado de diversas formas e por várias áreas do conhecimento. Afirmou também que o conceito de
gênero propiciou contestar as categorias de homem e de masculino e não somente de mulher e de
feminino.
Saffioti (2009) contribuiu ao esclarecer que há um impasse acerca da teoria de gênero, em razão do
paradoxo entre homens e estudiosos feministas, porque os primeiros admitem a existência do patriarcado,
os segundos o dispensam e consideram-no em extinção.
52 Rubin (1986, p. 104 - tradução nossa) esclareceu que “Foi introduzido o termo ‘patriarcado’ para
distinguir as forças que mantêm o sexismo de outras forças sociais, como o capitalismo. Mas o uso de
‘patriarcado’ esconde outras distinções.”
Hernández (2008) esclareceu que, embora os estudos feministas tenham relevância no que se refere à
opressão das mulheres, eles também têm limitações como realizar estudos de mulheres, como
investigações de gênero com foco exclusivamente na exploração das mulheres “[...] concentrando seus
estudos apenas nos efeitos devastadores do patriarcado sobre eles, observou um foco claro sobre
vitimização: as mulheres vítimas do patriarcado, a escravidão sexual, obrigadas a dar à luz, cuidado e
reprodução; com os trabalhadores de baixa renda e oportunidades de desenvolvimento profissional;
sexualmente, vítimas de prostituição, desemprego, seus maridos, seus pais e do sistema” (HERNÁNDEZ,
2008, p. 26 tradução nossa). Além disso, o autor pontuou a falta de estudos que visassem conhecer os
homens, a natureza masculina, bem como acerca dos efeitos do machismo sobre os próprios homens.
Argumentou que estudos destas naturezas auxiliariam também as mulheres frente ao patriarcado, como
também para entender as relações de poder existentes entre mulheres e homens.
82
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
reconhecendo a categoria gênero, faz uma crítica ao seu conceito dado como
pretensamente neutro, colocando que ele deve significar uma postura e, portanto, um
referencial teórico – a autora intitulou o capítulo de seu livro resgatando Lenin: “Não há
revolução sem teoria.”
Saffioti (2004) defendeu também que o gênero alimenta a exploração-
dominação que são questões primárias do patriarcado, encobrindo, assim, a postura
desigual entre homens e mulheres. Argumentou que a categoria gênero deve, para o
muito além de constatar, explicar, analiticamente, o que as demais categorias não
conseguiram com relação às desigualdades, uma vez que estas permanecem. Portanto, é
necessário desnaturalizar a ideia de superioridade do homem. Matos (2009), nesse
mesmo sentido, justificou que historicamente ainda vivemos em uma sociedade
patriarcal, porque as práticas sociais ainda demonstram a hierarquia do masculino sobre
o feminino, materializando-a em prestígio, privilégios e poder para os homens e
subordinação para as mulheres.
O segundo pressuposto – de tradição marxista53
– teve compromisso com as
críticas feministas e visou à explicação material para eliminar as diferenças físicas e
naturais. Scott (1995) esclareceu que essa corrente buscou pela explicação materialista
para o gênero e, de certa forma, restringiu o desenvolvimento de novos caminhos de
análise. A autora criticou o marxismo pelo fato de que as questões relacionadas ao
gênero não foram abordadas, tratando-as como secundárias, pois, para a autora, não foi
objeto de estudo dos marxistas.
As feministas – chamadas Feministas Marxistas – que adotaram os
pressupostos dessa corrente buscavam demonstrar que a luta feminista também era
possível dentro do contexto marxista, e dessa forma dar legitimidade social e
politicamente ao movimento feminista. A Teoria Feminina Marxista acabou por debater
a rejeição ao essencialismo e que a subordinação das mulheres é anterior ao capitalismo.
Contestou o capitalismo e criticou o liberalismo político argumentando que sua
concepção acerca da natureza humana é errônea e pela sua cegueira ao patriarcado, as
quais reproduzem a desigualdade de gênero/sexo. Para esta perspectiva, gênero e classe
53
Rubin, em sua entrevista, declarou que: “Há um imenso legado marxista no feminismo, e o pensamento
feminista tem uma grande dívida com marxismo. Em certo sentido, o marxismo permitiu que as pessoas
levantassem toda uma série de questões que o próprio marxismo não podia responder satisfatoriamente”
(RUBIN; BUTLER, 2003, p. 2).
83
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
são categorias sociais que promovem a opressão das mulheres. Calás e Smircich (1999,
p. 295) afirmaram que “o feminismo marxista analisa a dinâmica produtiva e
reprodutiva das dinâmicas de gênero na organização capitalista e patriarcal da economia
e da sociedade [...].”
E o terceiro pressuposto apresentado por Scott – inspirado nas escolas de
psicanálise (a Escola Anglo-Americana) – trabalhou com os termos de teorias de
relações de objeto, focalizando a influência da experiência concreta. Nos Estados
Unidos, cujos expoentes foram Nancy Chodorow e Carol Gilligan, este se inspirou no
trabalho de Chodorow, para o qual a compreensão é consciente. A escola Francesa
baseou-se nas leituras de Freud; no contexto das teorias da linguagem – Jacques Lacan –
cujo papel central da linguagem está na comunicação, interpretação e representação de
gênero, ou seja: o inconsciente é imprescindível na construção do sujeito.
No geral, esta perspectiva rejeitou o determinismo biológico acerca de
gênero e sexualidade e defendeu a mudança dos arranjos estruturais sociais a fim de
promover a igualdade de gênero. Também responsabilizou, pela desigualdade, os
arranjos sociais que promovem as diferenças no desenvolvimento psicológico da mulher
e do homem. Temas trabalhados na perspectiva feminina psicanalítica têm valorizado:
as diferenças das mulheres; formas de conhecimento e liderança femininas; estruturação
organizacional em círculos e redes em vez de pirâmides ou cadeias; relacionamentos e
conflitos organizacionais.
A crítica de Scott (1995) a esta perspectiva se deu pelo fato de o conceito de
gênero estar muito focado na família, porque não é só ambiente familiar responsável
pelo processo de construção do sujeito. A terceira vertente estava, portanto, dividida
entre o pós-estruturalismo francês e as teorias anglo-americanas das relações de objeto
as quais têm como objetivo “explicar a produção e a reprodução da identidade de gênero
do sujeito” (SCOTT, 1995, p. 9).
Parece-nos pertinente apresentar a revisão realizada por Calás e Smircich
(1999) sobre as teorias feministas e suas concepções epistemológicas pós-estruturalistas
– ratificando o texto acima, e pós-modernas e respectivas correntes de estudos com o
objetivo de apresentar o panorama dos estudos de gênero as quais estão sintetizadas na
Figura 14. Cabe ressaltar que a classificação apresentada a seguir é uma possibilidade
de classificação apresentada por Calás e Smircich.
84
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura14: Epistemologias e Correntes de Estudos Feministas Epistemologia Corrente Características Objetivos Representantes
Pós-
estr
utu
rali
smo
Fem
inis
mo
Fra
ncê
s
Os autores que articulam seus
estudos com o pós-estruturalista:
* Jacques Lacan – 1977, que
reinterpreta as teorias freudianas
sobre os estágios pré-edipiano e
edipiano;
*Jacques Derrida – 1976, que
descontrói54
as noções logocêntricas
sobre o conhecimento, e com
psicanalistas freudianos.
Questiona as
posições
ontológicas e
epistemológicas
das teorias
modernas.
Julia Kristeva – 1980,
Luce Irigaray – 1985,
Hélene Cixou e
Catherine Clément –
1986
Teo
ria
An
glo
-am
eric
an
a
Desenvolveu-se a partir da
argumentação de Michel Foucault
acerca do poder e conhecimento, a
qual é constituída por meio de
discursos e práticas.
Weedon – 1987,
Diamond e Quinby –
1988,
Rosemary Pringle –
1988,
J. Martin – 1990,
Sawicki – 1991,
R. Jacques – 1992,
Mumby e Outnam -
1992,
Nkomo – 1992,
Calás e Smircich –
1991, 1992, 1993 e
Calás – 1993,
Cullen – 1994,
Gray – 1994,
Holvino – 1994.
Pós-
mod
ern
o
F
emin
ism
o p
ós-
mo
der
no
Feminismo pós-moderno traduz
pluralidade de fontes, no entanto
mantém a preocupação com as
metanarrativas.
Enfatiza as
relações sociais,
requerendo mais
que gênero
como uma
categoria para a
crítica efetiva.
Lyotard – 1984,
Alcoff – 1988,
Nicholson – 1990,
Butler e Scott – 1992,
Ferguson – 1993.
Fonte: Elaborada com base em Calás e Smircich (1999)
A fim de complementar epistemologicamente as características dos estudos
feministas apresentados na Figura15, com base em Calás e Smircich (1999), trazemos
54
“Termo proposto pelo filósofo francês Jacques Derrida, nos anos sessenta, para um processo de análise
crítico-filosófica que tem como objetivo imediato a crítica da metafísica ocidental e da sua tendência para
o logocentrismo, incluindo a crítica de certos conceitos (o significado e o significante; o sensível e o
inteligível; a origem do ser; a presença do centro; etc.) que tal tradição havia imposto como estáveis. [...]
A desconstrução foi enquadrada no chamado pós-estruturalismo, primeiro movimento de auto-crítica e
depois movimento de ruptura com o estruturalismo, e divulgou-se de forma mais insistente nos meios
universitários norte-americanos, onde conheceu amplos debates nas décadas de setenta e oitenta,
sobretudo” (CEIA, s/d, s/p) CEIA, Carlos.Dicionário de termos literários. Disponível em
http://www.edtl.com.pt/business-directory/6719/desconstrucao/. Acesso em: 01 de nov. 2014.
85
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Ely (1999), a qual apresentou algumas considerações acerca das perspectivas feministas
pós-modernas. Nas palavras da pesquisadora, a crítica pós-moderna era sobre o foco que
os estudos até então tinham sobre as narrativas centradas no poder do homem sobre as
mulheres. No pós-modernismo, portanto, as narrativas são as próprias críticas às quais
valorizam a igualdade de gênero. Trata-se de uma política significativa, conceitual e
teórica cujo objetivo é mudar a forma como o trabalho feminino era visto. Na
concepção pós-moderna, é defendida como equívoco as visões racionalistas e anti-
racionalistas, pois são apoiadas em oposições: razão versus emoção, mente versus
corpo, privado versus público, porque os primeiros termos são associados a
masculinidade enquanto os segundo, à feminilidade, dessa maneira perpetuam à
dominação do homem e a fragilidade da mulher.
Complementou Ely (1999), ao afirmar que a perspectiva racionalista é
duvidosa porque, ao tentar negar a diferença sexual, já pressupõe o gênero masculino, já
que trabalha com a oposição ao feminino. Na perspectiva anti-racionalista, também
considerada problemática, em função da dificuldade em reconhecer o feminino em si e
dentro de uma estrutura social de dominação masculina, além disso, com esse
posicionamento de não criticar o feminino, a perspectiva assume que as mulheres não
são prejudicas em sua história, então, se não há tais estruturas de opressão, acaba por
manter a subordinação da mulher. Esclareceu que a dicotomia dos traços de gênero
apresentados nas duas perspectivas valoriza uma relação desigual e preserva a
dominação masculina. Dito de outra forma, a autora ratificou que o debate entre as
perspectivas feministas modernas e as pós-modernas têm limitado a compreensão de
gênero, poder e comportamento organizacional.
Para ilustrar a caminhada percorrida pelas categorias mulher, mulheres e
gênero e suas respectivas ondas de estudo e epistemologias, bem como finalizar a
revisão apresentada nesta seção, elaboramos breve histórico do desenvolvimento e uso
dessas categorias, apresentado na Figura 15, o qual foi fundamentado nas divisões
relatas pelos autores, havendo, portanto, outras categorizações por outros estudiosos.
86
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura15: Histórico das Categorias: Mulher, Mulheres e Gênero
Período
Ondas do
feminismo e
autoras
Epistemologia Definição do termo
gênero
Categoria predominante
Até
a d
éca
da
de
196
0
Primeira
ESTRUTURALISMO
Estudos sincrônicos.
Adoção de certos determinismos
sociais e à eliminação da
percepção consciente do sujeito.
Identificação de estruturas
(categorias) universais comuns.
A reivindicação era
igualdade nos direitos
políticos, sociais e
econômicos.
Mulher
Déc
ad
as
de
19
60
a 1
97
0
Segunda
Betty Friedan
(1963)
Gayle Robin
(1975)
Joan Scott
(1986)
PÓS-ESTRUTURALISMO
Procura romper com o
Estruturalismo, embora mantenha
pontos em comum com ele.
Reavaliação do lugar social do
sujeito e da prática social.
Tentativa de resgatar o histórico.
Criticou: sujeito social universal;
as noções de identidades
essenciais, ou seja: essencialismo;
e o binarismo.
Desenvolve métodos de análise
como arqueologia, genealogia e a
desconstrução.
Questionam as grandes narrativas.
Questionam os padrões de
masculinidade e feminilidade.
Superação do
essencialismo e
absorve as identidades
associadas à diferença
sexual, sexualidade e
raça.
A reivindicação era a
igualdade entre homens
e mulheres. Iniciou nos
Estados Unidos e,
posteriormente, na
França.
Simone de Beauvoir
tornou-se referência do
movimento feminista.
O modelo de família
modifica-se à medida
que a mulher entra
massivamente no
mercado do trabalho.
Mulheres e
gênero
Déc
ad
a d
e 1
98
0
Segunda,
autores que
assumem
como terceira
Butler (1990)
PÓS-MODERNISMO
Junto com o pós-estruturalismo,
criticam caráter abstrato e a-
histórico do estruturalismo.
Metodologias desconstrutivas, de
análise de discursos e narrativas e
de inspiração pós-estruturalistas.
A ideia de uma racionalidade
central e de um pensamento único
entra em declínio e adota-se a
valorização de todos os discursos.
Problematizou a
categoria mulheres
como sujeito do
feminismo.
Para Butler, sexo é
construído socialmente.
Gênero
Fonte: Elaborada a partir de Calás e Smircich (1999), Negreiros e Bernardes (2008), Matos (2009), Pedro
(2011) e Costa e Vergara (2012)
87
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Cabe ressaltar que os autores divergem com relação aos representantes de
cada movimento epistemológico, portanto os limites entre o estruturalismo e pós-
estruturalismo, bem como deste com o pós-modernismo são, muitas vezes, tênues,
esclareceram Costa e Vergara (2012). Nesse contexto, Pedro (2011) argumentou que o
pós-estruturalismo supera o essencialismo e incorpora as identidades associadas à
diferença sexual, sexualidade e raça. Como resultado da crítica das feministas negras e
do terceiro mundo à categoria colocada mulher, emerge a categoria mulheres que
enfatiza as diferenças entre os homens e mulheres. Mas as dificuldades não estão
resolvidas por meio da crítica pós-estruturalista pelo fato de evidenciarem tais
diferenças, mas deixarem marginalizadas(os) àquelas(es) que não se encaixam no
binarismo mulher x homem, Surgiu, ao final da década, a categoria gênero, resultado da
virada linguística e, portanto, ligada ao pós-estruturalismo e, por fim, à própria crítica a
essa categoria, encabeçada por Judith Butler no pós-modernismo.
Butler (2003) – primeira edição publicada em 1990, a obra ficou conhecida
como a virada pós-moderna do feminismo – questionou a categoria mulheres como
uma categoria universal pelo fato de ela não inclui todos que participavam no
movimento feministas, excluindo dessa maneira quem não fosse branca e de classes
média-alta. A autora colocou que o sexo na realidade é ditado por questões sociais, por
meio de normas e regras, que definem o que é masculino e o que é feminino,
suprimindo outros sexos como os transexuais.
Butler (2003) problematizou o fato de as teorias feministas estarem pautadas
na dicotomia de que o sexo é natural, biológico e que gênero é construído socialmente.
Para a autora, ambos são construídos externamente e, portanto, socialmente, logo sexo
também é discursivo55
e cultural como gênero. Também criticou a categoria mulheres
porque, segundo Butler, essa classificação busca uma identidade comum normativa, ou
seja: uma categoria universal para as mulheres, que acaba por segregar e tornar
invisíveis aquelas(es) que não são representadas(os) por tal identidade discursiva, além
de não permitir que os conflitos aflorem. A autora aproxima-se de Foucault quando
55
Butler (2003) trouxe da teoria dos Atos de Fala de Austin aspectos ativos dos discursos chamados por
ela de performatividade do gênero, em analogia aos atos performativos da proposta de Austin, os quais
traduzem uma proclamação e fazem acontecer à ação.
88
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
defende que o sujeito do feminismo é construído discursivamente dentro do próprio
feminismo.
Butler (2003) questionou o uso de classificações tanto quando no sentido
universal quanto as fragmentadas, uma vez que nenhuma delas dá conta do todo. A
filósofa contestou quem é o sujeito do feminismo. A autora interpelou as mulheres
como sujeitos dos movimentos feministas56
, porque, além de excluírem outras mulheres
no movimento como as negras, também não se trata de uma categoria estável: “o
próprio sujeito das mulheres não é mais compreendido em termos estáveis ou
permanentes” (BUTLER, 2003, p. 18). A autora trouxe que a construção binária
opositiva: homem versus mulher deve ser descontruída, porque essa estrutura posta só
reforça e mantém a dicotomia feminino versus masculino. Também argumentou que
esse binarismo necessita ser rompido, desfazendo o gênero, dessa maneira, rompendo
com a criação de normas restritivas que estabelecem o que é masculinidade e
feminilidade ou homem/mulher. Butler (2003) renovou a temática feminista quando
transferiu, sem desprezá-la, a questão de gênero das diferenças sexuais para o da
heterossexualidade normativa.
Acreditamos que não podemos tratar do movimento feminista como único e
homogêneo, porque são diversas as abordagens teóricas assumidas nos estudos,
resultando, dessa maneira, em uma pluralidade conceitual para as teorias feministas e,
consequentemente, aos estudos de gênero. Portanto necessitamos delimitar, neste texto,
os diálogos pretendidos com algumas das abordagens mesmo sabendo não ser
conveniente explicitar limites teóricos e, portanto, epistemológicos.
A fim de justificar essa tentativa, citamos outros estudos de gênero que já
realizaram diálogos semelhantes, a saber: Rubin (1986 – primeira edição em 1975)
articulou um diálogo crítico com a teoria antropológica de Lévy-Strauss, com a
psicanálise freudiana e com o marxismo; Scott (1995), ao invocar a categoria classe.
Butler (2003) buscou o conceito de presente histórico de Marx para discutir as
categorias de identidade que as estruturas jurídicas formam e naturalizam. Saffioti
56
Uma crítica aos estudos feministas é a questão do ofuscamento da heterogeneidade entre as mulheres.
Hernárdez (2008, p. 27) defendeu que: “[...] e hasta la lhegada de nuevas propuestas de activistas negras,
lesbianas y de identidades fronterizas: transexuales; cuando asuntos como raza, etnia, orientación sexual,
classe, religión, edad, ideologia política y cuerpo comienzan a ser abordados para formular nueva
dicotomia: unidad versus diversidad, em sustitución de la palavra ‘mujer’ por mujeres’.”
89
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
(2004), no texto sobre gênero, patriarcado e violência, trouxe as abordagens utilizadas
por autores nos estudos feministas, dentre eles, Mitchell – Psicanálise e feminismo:
Freud, Reich, Laing e mulheres – que fez interlocução com a psicanálise e diversas
correntes do marxismo. Também Heidi Harmann, na obra The Unhappy Marriage of
Marxism and Feminism: Towards a More progressive Union, Capital and Class,
utilizou conceitos marxistas para reflexão teórica.
Trazendo para o contexto do marxismo de forma específica, embora, como a
própria Scott (1995) colocou, o feminismo não tenha sido objeto de defesa da proposta
Marxista57
nem tampouco elaborou um conceito político de gênero. Isso resultou em
uma crítica a esta perspectiva teórica, mas os estudos de gênero e o marxismo são
alinhados no sentido de que ambos buscam combater as desigualdades no mundo do
trabalho, investigando o porquê da manutenção das relações de opressões, no caso dos
estudos feministas, entre os homens e as mulheres.
Haraway (2004, p. 211) esclareceu que “o conceito feminista moderno de
gênero não se encontra nos escritos de Marx e Engels, embora seus escritos e outras
práticas, e as de outros da tradição marxista, tenham oferecido instrumentos
importantes, assim como barreiras, para as teorizações posteriores sobre gênero.”
No marxismo, portanto está materializada a disputa desigual entre os
burgueses e proletariado, bem como a não aceitação destes como dominados. A
abordagem teórica trouxe a forma como os interesses de grupos sociais prestigiados
foram encaminhados de maneira a servir os objetivos dos grupos dominantes. De
semelhante forma as chamadas minorias, dentre elas as mulheres, também por não
aceitarem a submissão ao homem, as desigualdades social, econômica e política,
passaram a reivindicam seus diretos, por meio da igualdade de condição, a
desnaturalização da categoria universal homem, já que não se sentiam representadas por
ela. Dito de outra forma: visa sair da ênfase essencialista da dominação do homem sobre
a mulher.
Calás e Smircich (1999) ratificaram que a proposta marxista defendeu o
materialismo histórico como influenciador da natureza humana, portanto é em sua
existência social que o homem se torna consciente. Nessa perspectiva, embora essa
57
Para ler uma análise do Marxismo na perspectiva do feminismo, ver: NICHOLSON, L. Feminismo e
Marx: Integrando o parentesco com o econômico. In: BENHAABIB, S.; CORNELL, D. (coord.)
Feminismo como crítica da modernidade. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos Ltda, 1987. p. 23-37.
90
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
abordagem considere, além das definições históricas, também as estruturais e materiais
para conceber gênero, o que não se adota em sua totalidade neste trabalho, gênero
também é defendido como uma categoria social, “construída por meio de práticas
sociais como o trabalho, observando que poder e sexualidade estão entrelaçadas nas
relações de trabalho” (CALÁS; SMIRCICH, 1999, p. 295).
E, ainda, pelas relações de desigualdade e poder é possível analisar o
contexto produtivo e reprodutivo que promovem as desigualdades de gênero nas
organizações, o que nesse sentido aproxima-se ao objetivo deste trabalho. Por fim, ao
focalizar o feminismo marxista americano – o qual teve inspiração em Foucault –
defendeu, segundo Scott (1995, p. 79): “[...] que a sexualidade é produzida em
contextos históricos [...]”, dessa maneira, busca resgatar o histórico das relações.
4.2 GÊNERO: CONCEITOS CONTEMPORÂNEOS
Matos (2009, p. 63) esclareceu que, na literatura, há ampla diversidade de
conceitos de gênero, “[...] gestada nos espaços acadêmicos, nas ONGs feministas e não
feministas, por entidades internacionais e no aparelho do Estado.” Nesta seção,
apresentamos um conciso histórico, em ordem cronológica, do conceito de gênero sem a
preocupação com as características ou epistemologias assumidas ou implícitas pela(os)
autoras(es), nem com diversidade da produção na área, já que o objetivo é apresentar as
concepções, no nosso entendimento e com base na revisão teórica, dos autores que
consideramos mainstreams.
Iniciaremos o breve histórico, com duas autoras que, embora não tenham
apresentado conceito acerca de gênero, trabalharam implicitamente essa temática e
foram marco para os estudos de gênero.
Simone de Beauvoir, com sua celebre frase Ninguém nasce mulher, torna-se
mulher, no final da década de 1940 – 1949, publicada na obra O Segundo Sexo, tornou-
se, para Saffioti (1999b apud SAFFIOTI, 2004), a pioneira conceituando implicitamente
gênero ao não aceitar o que está posto pelo biológico. Ou seja: embora Beauvoir (1970)
não tenha conceituado nem utilizado o termo gênero, ela trouxe subentendida a sua
problematização quando argumentou que ser mulher não é algo natural e que a cultura e
91
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
o meio influenciam nessa construção. Essa questão foi retomada mais tarde pelas
historiadoras feministas da segunda onda do movimento.
Na obra Mística Feminina (The Feminine Mystique), primeira edição
publicada em 1963, Betty Friedan (1971) trouxe a realidade da vida das mulheres na
esfera doméstica e a imagem produzida por elas (a qual Friedan chamou de mística
feminina), bem como efeito dessa imagem sobre as mulheres. O livro trata de uma
espécie de denúncia no sentido de que elas se sentiam frustradas com sua condição de
vida, sendo inclusive diagnosticada como problemas mentais, dentre outros – como a
autora mesma chamou o problema sem nome: título bastante instigante do primeiro
capítulo do livro.
Roberto Stoller, em 1968, primeiro autor a utilizar o termo gênero de forma
explícita, na obra Sex and Gender, abordou a questão de que o sentir-se homem ou
mulher é mais relevante do que ser homem ou mulher na definição biológica em suas
pesquisas com transexuais. Haraway (2004, p. 216) esclareceu que:
O trabalho do psicanalista Robert Stoller discutia e generalizava as
descobertas do projeto da UCLA58
. Stoller apresentou o termo ‘identidade de
gênero’ ao Congresso Internacional de Psicanálise, em Estocolmo, em 1963.
Ele formulou o conceito de identidade de gênero no quadro da distinção
biologia/cultura, de tal modo que sexo estava vinculado à biologia
(hormônios, genes, sistema nervoso, morfologia) e gênero à cultura
(psicologia, sociologia). O produto do trabalho da cultura sobre a biologia era
o centro, a pessoa produzida pelo gênero – um homem ou uma mulher.
Mas, afirmou Saffioti (2009), foi somente a partir de 1975, com a
publicação The Traffic in Women: notes on the political economy (O tráfico nas
mulheres: notas sobre a economia política do sexo) da antropóloga Gayle Rubin59
, que
o termo foi difundido por meio de diversos estudos de gênero. Rubin (1986)60
,
58
Centro Médico para o Estudo de Intersexuais e Transexuais, na Universidade da Califórnia, em Los
Angeles (UCLA).
59
A obra foi escrita no início da segunda onda do feminismo, em que o contexto político padecia com a
nova esquerda (New Left), sobretudo com o movimento contra a guerra e a oposição ao imperialismo
militarizado dos EUA. O paradigma dominante desse contexto era o marxismo (RUBIN; BUTLER,
2003).
60
Título original: The Traffic in Women: notes on the ‘Political Economy’ of sex. Toward Anthropology
of Women, monthly Review Press, Nueva York, 1975.
92
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
defendendo gênero ser um termo neutro, chamou de sistema de sexo/gênero61
, em que o
último refere-se à parte da vida social que envolve a opressão das mulheres como algo
inevitável e produto das relações sociais, das minorias sexuais bem como de
determinados aspectos da personalidade humana; e sexo à questão biológica do corpo.
Dessa maneira, para a autora, são apenas o masculino e o feminino condicionados por
características biológicas imutáveis.
Scott (1995, p. 86), cuja publicação original do texto se deu em 1986,
definiu gênero como tendo: “[...] duas partes e diversos subconjuntos, que estão
interrelacionados, mas devem ser analiticamente diferenciados.” Ainda nas palavras da
autora, esse conceito repousa sobre duas assertivas que visam aclarar a análise das
relações sociais e institucionais de gênero, a saber:
(1) O gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas
diferenças percebidas entre os sexos.
Para essas relações sociais, implicam-se quatro possibilidades de análise que
são inter-relacionadas e não operam separada nem simultaneamente: I – símbolos
culturais disponíveis que nos fazem recordar representações simbólicas contraditórias e
dicotômicas. II – conceitos normativos que possibilitam alcançar o significado desses
símbolos, dando-nos parâmetros para as interpretações não literais. Essas normas
constroem, normalizam e regulam nossas vidas. III – inclusão da concepção de política,
referência de instituição e organização social, que significa analisar para além das
questões centradas no lar e na família como organização social, seria incluir também o
mercado de trabalho, a educação e o sistema político (em outras palavras: economia e
organização política), uma vez que a constituição do gênero não se dá exclusivamente
por meio do parentesco. IV – inclusão da identidade subjetiva de gênero, em que é
necessário analisar as formas como as identidades de gênero são construídas. Na
segunda assertiva apresentada pela autora:
(2) O gênero é uma forma primária de dar significado às relações de poder.
Scott (1995) abordou a teorização do gênero, dito de outra forma: é por
meio do gênero que o poder se pronuncia. Saffioti (2004) apresentou crítica a Scott de
61
Touraine (2010, p. 61) defendeu que sexo, gênero e sexualidade são diferentes, afirmou que a última
“se constrói a partir do sexo através da relação com o outro e a partir da relação consigo mesmo.”
Portanto, para o autor, a sexualidade não é um dado biológico nem uma construção social.
93
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
que esta valoriza o discurso sem sujeito e que os estudos descritivos sobre gênero não
dão conta de explicar a exploração-dominação das mulheres e defende que a abordagem
do patriarcado é uma possibilidade de estudo de gênero.
Até por volta da década de 1980, as teorias feministas acatavam o conceito
de gênero e sexo em que o primeiro era construído culturalmente, enquanto o segundo
era naturalmente adquirido, construído por meio de uma heterossexualidade normativa,
imposta por meio de uma cultura e politica predominantes62
. Em outras palavras: havia
mulheres que não se sentiam representadas, sentiam-se marginalizadas, excluídas dentro
do movimento feminista, uma vez que somente as mulheres brancas e elitizadas eram
ouvidas. Após esse período, tais conceitos, portanto, começaram a ser questionados.
Essa tensão iniciou com as mulheres negras e difundiu-se a outras.
Neste trabalho, o conceito de gênero adotado é o apresentado por Scott, para
a qual gênero é uma categoria analítica que possibilita a problematização e a
compreensão do conhecimento sociohistórico. Essa escolha se deu em razão de que a
(des)igualdade de gênero não é possível de ser problematizada e explicada considerando
o determinismo biológico. Logo a categoria gênero “[...] é um elemento constitutivo de
relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma
forma primeira de significar as relações de poder” (SCOTT, 1995, p.14).
4.3 ESTUDOS SOBRE GÊNERO EM ORGANIZAÇÕES DE TRABALHO
Consideramos imprescindível, antes de focalizarmos alguns trabalhos acerca
do gênero no trabalho, refletirmos aqui sobre o conceito de divisão sexual do trabalho63
categoria estudada nesta tese, independentemente do movimento epistemológico que o
acolheu. No verbete do dicionário sobre divisão de trabalho, Abercrombie, Hill e Turner
(1994, p. 22 – tradução nossa) trouxeram que há três dimensões de emprego dessa
62
Touraine (2010, p. 58) arguiu que “A fraqueza da ideia de gênero, mesmo que ela defina a mulher
como uma construção social, reside no fato de que ela não pontualiza aquilo que especifica essa
construção social do gênero, já que todas as condutas humanas e quase todas as relações sociais são
construções sociais.”
63A Expressão divisão social do trabalho teve origem nos trabalhos de Karl Marx para referir-se às
atividades produtivas desempenhadas pelos seres humanos. Nos estudos acerca de gênero, utiliza-se o
termo divisão sexual do trabalho para destacar as diferenças nos trabalhos dos homens e mulheres por
meio das relações sociais.
94
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
expressão: “I – no sentido da divisão técnica do trabalho que descreve o processo de
produção; II – como a divisão social do trabalho, refere-se à diferenciação na sociedade
como um todo; III – como divisão sexual do trabalho, que descreve as divisões sociais
entre homens e mulheres no ambiente de trabalho.” Com relação ao terceiro uso, os
autores esclareceram que alguns sociólogos modernos buscam ampliar o conceito de
divisão do trabalho incluindo a questão sexual, no sentido de que há papéis distintos
entre homens e mulheres, gerando, assim, um efeito de separação entre as dimensões
internas e externas (privada e pública) na sociedade capitalista.
Para essa reflexão acerca do conceito de divisão sexual do trabalho como
uma construção social, e não biológica, de poder dos homens sobre as mulheres –
entendendo estas não como um grupo homogêneo – elegemos as autoras Helena Hirata
e Daniele Kergoart para a apresentação dessa concepção. Kergoat (1996) esclareceu que
a divisão sexual do trabalho está baseada nas relações sociais de sexo, as quais são
construídas social e não biologicamente. Portanto trata-se de relações historicamente
edificadas em cada sociedade, por isso, são passíveis de modificações ou diferenciações,
conforme cada período histórico e cultural, podendo haver, dessa maneira, sentidos
diferentes. A autora defendeu que os conceitos de divisão sexual do trabalho e de
relações sociais de sexo são inseparáveis, haja vista haver relação social entre os
homens e mulheres, bem como diferença nas atividades realizadas por elas(es). Para a
autora, tratar da divisão sexual do trabalho é proporcionar uma reflexão acerca da
hierarquia dessas atividades.
Com o objetivo de contextualizar a temática, trazemos Kergoat (2009), a
qual relatou que a expressão divisão sexual do trabalho foi usada, primeiramente, pelos
etnólogos, a fim de indicar a segmentação, no sentido de complementaridade, das
atividades entre os homens e mulheres e, em outro momento, pela Sociologia e História.
A mudança de perspectiva da relação de poder dos homens sobre as
mulheres foi dada pelas antropólogas feministas. Foi na França, na década de 1970, que
o movimento feminista – consciente da opressão vivida pelas mulheres, externalizada
pelo trabalho invisível realizado gratuitamente por elas, em nome do amor e da
maternidade – iniciou os fundamentos teóricos do conceito de divisão sexual do
trabalho, esclareceram Hirata e Kergoat (2007) e Kergoat (2009).
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Hirata e Kergoat (2007) e Kergoat (2009) expuseram que a divisão social do
trabalho está fundamentada em dois princípios, a saber: o princípio de separação
(existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres) e o princípio de hierarquização
(um trabalho de homem tem mais valor do que um trabalho de mulher). Semelhante
dicotomia também é apresentada na literatura como segmentações horizontal e vertical.
Na primeira, as mulheres estão alocadas em poucas profissões/ocupações; na segunda,
poucas trabalhadoras ocupam os cargos hierarquicamente mais altos.
Tais princípios levam à legitimação e à naturalização de comportamentos ao
longo dos tempos com relação às mulheres e aos homens, perpetuando as desigualdades
de gênero também na esfera do trabalho, tanto aqueles considerados profissionais
quanto os domésticos. Hirata e Kergoat (2007) apresentaram que inicialmente os
estudos acerca da divisão sexual do trabalho buscavam investigar se havia
desigualdades no trabalho considerado da esfera pública, em que o trabalho doméstico
sempre esteve em um segundo plano nos estudos, por ser entendido como da dimensão
privada.
Mas o trabalho invisível das mulheres impulsionou, na França, os
investigadores a refletirem e repensarem o trabalho e suas categorias, já que os estudos
acerca dessa temática necessitavam ir além das descrições das desigualdades. Essa nova
forma de ver os estudos sobre a divisão sexual do trabalho fez com que o modelo
família tradicional – como instituição natural e biológica em que os papéis da família e
domésticos são assumidos pelas mulheres e, ao homem, cabe o de provedor – fosse
questionado e, dessa maneira, iniciou sua falência. Em consequência disso, a família
passa a ser um lugar de exercício de trabalho, o que leva a um questionamento da esfera
do trabalhado assalariado, reconhecido como produtivo e masculino.
Diante desse cenário e das novas configurações da divisão sexual do
trabalho, as quais são chamadas pelas autoras de nomadismos sexuados, geram
precarização do emprego tanto para as mulheres quanto aos homens. Para elas, porque
explodem as opções de trabalho em tempo parcial; para eles, porque há uma banalização
e aumento dos deslocamentos profissionais, uma trivialização do contrato de trabalho.
Também a flexibilização do emprego para as mulheres em profissões de Ensino
Superior acaba por reforçar formas estereotipadas das relações de sexo entre elas. Deste
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
contexto, tem-se o modelo em que é de responsabilidade da mulher conciliar a vida
familiar e a vida profissional – conhecido como o modelo conciliador.
Logo as mulheres que priorizam suas carreiras acabam por externalizar o
seu trabalho doméstico a mulheres em situação precária, gerando, segundo Hirata e
Kergoat (2007): I – relaçõesde classe, porque são mulheres empregando mulheres; II – e
relações de concorrência entre as mulheres em situação de trabalho incerta. Em
decorrência disso, surge como proposta de modelo para substituir ou sobrepor o modelo
de conciliação, que é o chamado modelo de delegação. Essa ocorrência gera um duplo
mascaramento, porque, ao mesmo tempo em que aumenta o número de mulheres em
profissões de nível superior, aumenta também o de mulheres em situação precária.
Hirata e Kergoat (2007), portanto, argumentaram que se torna necessário
aprofundar as reflexões sobre as formas as atividades são hierarquizadas e separadas
entre os sexos como relações de poder e de dominação erguidas socialmente. Isso
porque as mulheres – conscientes da opressão, da desigualdade da divisão do trabalho
doméstico – continuam a incumbir-se do trabalho doméstico. E, mesmo quando não o
fazem e delegam essa atribuição, ainda assim lhes cabem a gestão do conjunto do
trabalho delegado sempre como competência daquelas que o delegam.
Para finalizar essa reflexão, trazemos o conceito de divisão sexual do
trabalho na visão de Hirata e Kergoat (2007, p. 599), já discutido anteriormente:
A divisão sexual do trabalho é a forma de divisão do trabalho social
decorrente das relações sociais entre os sexos; mais do que isso, é um fator
prioritário para a sobrevivência da relação social entre os sexos. Essa forma é
modulada histórica e socialmente. Tem como características a designação
prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres à esfera reprodutiva
e, simultaneamente, a apropriação pelos homens das funções com maior valor
social adicionado (políticos, religiosos, militares etc.).
Passamos, então, sem a pretensão de esgotar a temática, a citação de alguns
estudos acerca do gênero evidenciando o ambiente de trabalho, haja vista ser esse o
objeto de estudo desta pesquisa e ser essa uma temática em desenvolvimento, o que nos
leva a crer a necessidade de trazermos alguns trabalhos empíricos para ilustrar e,
também, justificar a realização desta tese. Ely (1999) realizou uma revisão crítica de
pesquisas empíricas sobre gênero, publicadas de janeiro de 1986 a dezembro de 1995,
em quatro principais revistas acadêmicas: Academy of Management Journal,
Administrative Science Quarterly, Journal of Applied Psychology, and Organizational
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Behavior e Human Decision Processes. O universo de sua pesquisa se deu em cento e
dezoito estudos; desses, 94% abordaram as diferenças de sexo e/ou tratamento
diferencial com base no sexo.
Os resultados apontaram que dos cinquenta e sete artigos que abordaram
questões relacionadas com o tratamento diferenciado dos homens e mulheres nas
instituições, quase 70% apelaram explicitamente a atitudes e práticas sexistas na
organização. Esta autora identificou trabalhos que buscaram compreender o tratamento
diferenciado com relação à remuneração entre homens e mulheres, em função da
sensibilidade deles ao mercado competitivo. Outros trabalhos focalizavam suas
descobertas para intervenção organizacional no sentido de diminuir a desigualdade.
Trabalhos que enfatizaram que as mulheres devem ser tratadas diferentemente dos
homens, pois são de fato diferentes; neles, os pesquisadores sugeriram que elas
deveriam ser auxiliadas no sentido de resolver os problemas enfrentados por elas no
trabalho.
Pouco foi debatido nos trabalhos sobre o tratamento de atitudes sexista e
diferenças de sexo. Exceto nos estudos com orientação sociológica ou psicológica que
destacaram o comportamento das mulheres não é mais aceitável como explicação para
as diferenças em suas profissões. Acerca do conceito de gênero, Ely (1999) resgatou em
seu estudo que a maioria das pesquisas se baseia em uma noção como uma característica
pessoal em que os indivíduos, principalmente as mulheres, são socializados em funções,
de acordo com os estereótipos de sexo.
Contrariando os pressupostos tradicionais, Ely (1999) propôs uma agenda
de pesquisa que visa estudar o gênero como processos relacionais indissociáveis de
diferenciação e opressão de gênero e sustentados por meio de relações sociais e políticas
e práticas formais e informais formadas pelas organizações. A autora propôs duas
construções pós-modernas articulando a teoria do gênero: sexo como um aspecto da
identidade social, chamada identidade de gênero; e de gênero como um aspecto das
relações sociais, chamado de relações de gênero.
Na identidade de gênero, tem-se o conjunto de significados associados com
o ser homem ou mulher, substituindo noções unitárias de mulher e gênero feminino
identidade, ou homem e gênero masculino. Dessa maneira, a identidade de gênero é
diferente para cada pessoa, possui aspectos diferentes e não tem conteúdo determinado
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
fora das relações de gênero, as quais estão situadas e desenvolvem-se dentro das
condições sociais, culturais e históricas específicas. Ely (1999) afirmou também que
essas relações se manifestam nas práticas sociais concretas – interações sociais,
fenômenos interpessoais e de grupo. Estruturas organizacionais, normas, recompensas,
políticas, símbolos, dentre outras – que atuam para preservar ou desafiar a dominação
masculina. Sendo assim, as relações de gênero tanto podem ser opressivas como anti-
opressivas.
Na forma de opressão, as práticas sociais reificam sexo trazendo as
oposições: mente versus corpo, indivíduo versus comunidade, razão versus emoção,
público versus privado. Tais dicotomias mantêm os dois domínios, masculino (como
superior) e feminino (como inferior), separados e dentro das relações de gênero. Ely
(1999) reafirmou, portanto, que as diferenças não são especificadas, reconhecidas, são
os processos, dentro de circunstâncias sociais, culturais e históricas, que levam às
diferenciações relacionais. Na forma de antiopressão, as relações de gênero rejeitam as
oposições em favor de formas mais complexas de compreensão. Estas relações são
externalizadas por meio das práticas sociais que aumentam a consciência das
assimetrias de gênero e poder das pessoas e como tais desequilíbrios limitam a escolha e
possibilidade em suas vidas e de outras pessoas.
Todaro, Abramo e Godoy (1999), no artigo contido no projeto Inserción
laboral de las mujeres: el punto de vista empresarial, discutiram os resultados da
pesquisa realizada em 1998-1999, em que buscaram verificar a opinião dos empresários
de 203 empresas de várias regiões do Chile, mas também identificar os fatores como
setor produtivo, porte da organização, percentual de mulheres na empresa, cultura
organizacional, entre outros influenciavam no discurso empresarial. Os resultados da
pesquisa indicaram que o referido discurso é, por vezes, pouco claro e contraditório
sobre as mulheres trabalhadoras. Verificaram, também, que é difícil estabelecer uma
relação entre os fatores estudados – tamanho da organização, setor, percentual de
mulheres na empresa, etc – e o discurso empresarial, mas que o que pode explicar a
percepção dos empresários são as características das diferentes ocupações, porque, na
opinião deles, há funções masculinas e funções femininas.
Também foi identificado que, na produção, o empecilho para a contratação
de mulheres é a necessidade de trabalhar no turno noturno e funções que são
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
tradicionalmente masculinas. No entanto, Todaro, Abramo e Godoy (1999)
questionaram o porquê de nas empresas de comunicações ou no setor de saúde as
mulheres serem contratadas para ocupações – telefonistas e enfermeiras – cujo trabalho
acontece por turnos, incluindo o noturno.
Todaro, Abramo e Godoy (1999, p. 25 tradução nossa) entenderam que as
explicações para tal questionamento são culturais e históricas e não em razão das
competências técnicas: “As explicações para isso não estão na área de especialização,
mas por causa de ordem cultural e histórica, que continuam a reproduzir, apesar das
profundas mudanças nos últimos anos nas características técnicas dessas ocupações.”
Ainda como resultados de sua pesquisa, obtiveram que as mulheres têm seu
desempenho laboral melhor avaliado do que os homens; os custos do trabalho da mulher
são mais altos, embora esse resultado tenha sido, de certa forma, não uniforme, havendo
os empresários que não compartilham com tal afirmação.
Abramo (2004) relatou que, na América Latina, na década de 1990, houve
alguns ganhos das mulheres com relação ao trabalho, a saber: diminuiu a diferença na
participação entre mulheres e homens no mercado de trabalho; reduziu a disparidade da
participação entre as mulheres pobres e as demais; as mulheres ocuparam a maior parte
das oportunidades de empregos ofertadas; caiu um pouco o acesso à escolaridade,
principalmente de nível superior; diminuiu moderadamente a lacuna dos empregos
informais. No entanto, segundo a pesquisadora, também houve aspectos negativos para
o trabalho feminino: aumento de desemprego, sobretudo para as mais pobres; o
percentual dos empregos informais em relação ao total de trabalho feminino é superior
aos homens na mesma relação; as mulheres, em seus trabalhos, possuem menos
proteção social em comparação aos homens.
Esta pesquisadora argumentou que somente maior escolaridade das
mulheres não lhes garante inserção no mercado de trabalho em condições de igualdade
com os homens, e as trabalhadoras precisam ter formação significativamente superior a
eles para ter a mesma oportunidade laboral. “[...] em média quatro anos para receber o
mesmo salário e dois anos a mais para ter as mesmas oportunidades de acesso ao
emprego formal” (ABRAMO, 2004, p. 226 – tradução nossa).
Na pesquisa realizada com empresários no Chile, em 1998-1999, com o
objetivo de averiguar a percepção que os gestores tinham com relação ao desempenho
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
do homem bem como da mulher no trabalho, eles apontaram que, com relação à
remuneração, as mulheres que não são as provedoras principais de seus lares, não
negociam sua remuneração e aceitam tranquilamente a oferta feita. Além disso, também
reforçando a imagem das mulheres como força de trabalho secundário, afirmou Abramo
(2004), é o fato de elas terem restrições no trabalho, como: turno noturno, viagens,
realizar horas-extras, exceto em funções tradicionalmente femininas, no entanto a autora
argumentou que essa realidade vem mudando paulatinamente, ou seja: há mulheres em
funções que exigem trabalho noturno, etc. e que essas limitações acabam por passar a
imagem das mulheres como trabalhadoras problemáticas, pouco adequadas ou
diferentes.
Atualmente, ainda se percebem obstáculos à inserção e à permanência em
igualdade de condições das mulheres no mercado de trabalho, expôs Abramo (2004;
2007), tanto com relação aos rendimentos, quando ao desemprego. A pesquisadora
relatou que a imagem da mulher como força de trabalho secundária está presente no
imaginário: social, empresarial, sindical, das próprias mulheres e dos responsáveis pelas
políticas públicas, resistindo a muitas mudanças ao longo das décadas. A autora
esclareceu que não há como separar as dimensões familiares e da sociedade no
imaginário64
sobre os homens e mulheres.
Mas, além dessas dimensões, há também que se considerar o imaginário: I –
social em geral: senso comum que estabelecem o lugar, papel e função dos homens e
mulheres no trabalho, na família e na sociedade; II – empresarial: noções, percepções e
ideias compartilhadas entre os empresários que subsidiam suas decisões no ambiente de
trabalho; III – dos agentes políticos e dos formuladores de políticas públicas: noções,
percepções e ideias que afetam “as oportunidades e condições de vida e trabalho de
homens e mulheres” (ABRAMO, 2007, p. 12). Esta apresentou três fatores que
potencializam a reprodução da desigualdade de gênero apresentados na Figura 16.
64
Abramo (2007, p. 10) definiu imagens de gênero como: “[...] as representações sobre as identidades
masculina e feminina que são produzidas social e culturalmente, e que determinam, em grande medida, as
oportunidades e formas de inserção de homens e mulheres no trabalho.” A autora esclareceu que essas
imagens são frutos de dicotomias entre o privado e o público, entre os mundos familiar e produtivo.
Afirmou, também, que elas são fundamentais na reprodução das desigualdades atribuídas as mulheres
trabalhadoras.
101
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 16: Fatores que Incidem no Processo de Reprodução das
Desigualdades de Gênero e suas Características
Fonte: Elaborado a partir de Abramo (2004; 2007)
Bruschini (2007) colocou que, embora haja um importante aumento da
participação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro em 2005, o qual vem
crescendo gradativamente, os indicadores ainda permanecem longe das taxas
masculinas de atividade – superior a 70% ou até mesmo o percentual de homens
empregados no setor formal ou no informal. A autora relatou que esse aumento da
participação feminina no trabalho é devido ao fato de o Brasil ter sofrido
transformações nas dimensões: demográficas – em parte em razão da queda do número
de filhos, família menores, aumento da expectativa de vida e famílias cuja
responsabilidade de manutenção é das mulheres; culturais – acesso às universidades
gerou novas oportunidades de trabalho as mulheres; sociais – consequentemente se dá a
alteração do perfil da trabalhadora – agora mais velha, casada e com filhos, nas últimas
décadas do século passado.
Com base nos dados da Rais 2004, Bruschini (2007) apresentou que 31%
dos cargos de chefia eram ocupados por mulheres, no entanto, ao detalhar essa
informação, verificou que elas permaneceram nas áreas da administração pública,
educação, cultura, serviços de saúde e outras áreas sociais. Naquelas em que
historicamente prevaleceram os homens, como produção e operações, as trabalhadoras
femininas permanecem à margem. Verificou, também, que, em 2005, as mulheres
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
obtiveram algumas conquistas, a saber: o acesso à escolaridade65
pelas mulheres foi
maior que o dos homens, e passaram a ocupar funções de prestígio, apesar de 30% delas
ainda em ocupações precárias.
Para as mulheres trabalhadoras, ratificou Bruschini (2007), permaneceram
algumas condições desfavoráveis no que se refere à igualdade no trabalho: quase 40%
das mulheres trabalhadoras se distribuíram em três grandes áreas: I – educação, saúde e
serviços sociais; II – serviços domésticos; III – outros serviços coletivos, pessoais e
sociais, não conseguindo, portanto, adentrar significativamente às profissões tidas como
masculinas; desemprego elevado; desigualdade na remuneração; além de continuarem
responsáveis pelas atividades domésticas, ou seja: dupla jornada de trabalho. Quanto ao
perfil da mulher trabalhadora, nas palavras da autora, houve uma mudança: elas
passaram a ter mais idade, casadas e com filhos, conciliando, dessa maneira, as tarefas
domésticas, familiares e profissionais.
Em seu trabalho, Cappellin (2008) relatou sobre o legado da história do
trabalho feminino para entendermos a sua influência na questão da desigualdade de
gênero no trabalho extradoméstico. Ela esclareceu que, desde a década de 1980, os
autores acerca do mercado de trabalho feminino concentraram seus estudos na
dicotomia: lugares e condições não qualificados; e lugares e alta formação. A autora
argumentou que, em 1929, havia uma mulher formada para 3,3 homens; já, na década
de 1990, com base nos dados da Rais (2006), alegou que as mulheres eram em maior
número com diploma do terceiro grau – 60%, ocasionando mudança no contexto do
trabalho, e, em 2006, elas passaram a ocupar as vagas empregos com exigência de curso
superior – 164,9 mil contra 73,4 mil dos homens.
65
Beltrão e Alves (2009), na pesquisa que realizaram sobre o hiato de gênero na educação – diferenças na
escolaridade dos homens e das mulheres – verificaramque em boa parte do século XX, no Brasil, os
homens tinham maior escolaridade que as mulheres, no entanto, elas conseguirem reverter esse quadro.
Os autores esclareceram também que esse déficit educacional permaneceu por aproximadamente 450
anos, foi na década de 1960 que elas passaram a ter maiores chances de acesso ao Ensino Superior e
iniciaram, nos anos de 1970, a reverter tal hiato. Essa mudança no contexto educacional foi, sem dúvida,
uma vitória das mulheres.
Complementaram escrevendo que: “A educação brasileira ainda carece de uma expansão quantitativa e
qualitativa para atingir os padrões internacionais já alcançados por países com o mesmo nível de
desenvolvimento. Contudo, nas últimas décadas, o número de anos de estudo médio cresceu bastante para
ambos os sexos, e as mulheres ultrapassaram os homens em todos os níveis educacionais” (BELTRÃO;
ALVES, 2009, p. 135).
103
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
No entanto Cappellin (2008) esclareceu que esse movimento na geração de
empregos não repercutiu na remuneração, a qual correspondia a 56,5% da remuneração
obtida pelos homens nas mesmas condições de trabalho, mas o movimento das mulheres
em busca da formação acadêmica foi importante para entendermos a chegada das
mulheres no mercado de trabalho de alta qualificação, esclareceu Cappellin (2008,
p.101): “A entrada das mulheres no mercado reconfigura-se, assim, por uma dupla
mudança: obtenção de diplomas universitários e exercício profissional de alta
responsabilidade com pretensão de comando.”
Os estudos sobre a desigualdade de gênero no trabalho são realizados em
duas abordagens, Cappellin explicou-as: I – estudos baseados nos depoimentos de
mulheres executivas sobre os mecanismos que as afastam de altas funções hierárquicas
nas organizações; II – estudos que visam às rupturas das posições hierárquicas
ancoradas em fontes estatísticas. Em seu trabalho, a autora buscou dados secundários, a
fim de identificar os ambientes organizacionais que possivelmente foram objetos de
outros trabalhos científicos. Logo, com base em dados estatísticos que usou para
realizar análise comparativa, a pesquisadora chegou a algumas considerações acerca das
posições ocupadas pelas mulheres nas organizações entre 1990 a 2006, sendo uma delas
que as mulheres tinham aumentado sua formação acadêmica, possibilitou alterações no
mundo simbólico delas, e, dessa maneira, promoveu novos saberes e atividades
ocupacionais.
Essa formação abriu a possibilidade de elas se inserirem nos postos de
responsabilidade profissional, mas nem sempre isso possibilita um aumento de
ocupação por elas nas funções de decisão nas organizações, inclusive pouco é vista a
presença feminina em: diretorias gerais, finanças e atividades imobiliárias, além de sua
exclusão nas indústrias extrativa e de transformação, eletricidade, água, gás, construção
e transporte; por outro lado, as mulheres têm sido aceitas em áreas específicas, como:
administração, educação, saúde e organismos internacionais. Esses resultados, segundo
a autora, indicaram o forte uso de estratégias sexistas de seleção.
Cappellin (2008) sugeriu que as metáforas telhado de vidro66
, paredes de
vidro67
e céu de chumbo68
auxiliam a identificar as barreiras que promovem as
66
Sinônimo de Teto de Vidro – “A metáfora do telhado de vidro instiga a interpretar as diferenciações de
mobilidade entre quem alcança os postos de comando, quem não é considerado idôneo ou quem é
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
desigualdades de gênero no ambiente profissional. Nas palavras da pesquisadora:
interpretar a ausência da presença feminina em função de direção e porque elas estão em
função intermediária de gerência ou básica como funcionárias, ou ainda porque há uma
diferença tão grande de remuneração entre os homens e mulheres, principalmente
quando ocupam funções que exigem alta profissionalização.
Chies (2010) esclareceu que o advento do acesso das mulheres ao trabalho
assalariado em razão das transformações sociais leva-nos a duas reflexões: a primeira de
que forma são desenvolvidas profissões predominantemente femininas em um primeiro
momento não regulamentadas e depois como mão de obra industrial, mas em analogia
às atividades desenvolvidas no trabalho doméstico; a segunda é de que tanto homens
como mulheres ocuparam trabalhos antes essencialmente masculinos. No entanto,
mesmo com essa mudança no contexto do trabalho, ainda foram mantidas profissões
minimamente ocupadas por mulheres, Chies (2010, p. 508) exemplificou como:
Engenharia Civil, na Agronômica e nas Minas e Geologia, nas atividades a
céu aberto, a participação feminina gira entre 10 e 14%. Nas especialidades
da Mecânica e Metalurgia, menos de 5% dos postos de trabalho são ocupados
por mulheres. [...] nas especialidades (cirurgia, cardiologia, medicina
esportiva, ortopedia, medicina legal e urologia) de maior prestígio da área e
que possuem melhores remunerações é menor o percentual de
representatividade feminina, somente 30%.
Notadamente há uma segregação entre as profissões, algumas especialidades
são consideradas femininas, enquanto outras são consideradas essencialmente
masculinas. Pelo exposto, Chies (2010) propôs-se a discutir como são delimitadas as
identidades profissionais e como tais identidades de gêneros se apresentam no trabalho.
Ela iniciou sua argumentação dizendo que a mulher é subordinada de duas maneiras:
frequentemente preterido e fica estacionado em lugares profissionais na base da pirâmide” (CAPPELLIN,
2008, p. 118).
67 Paredes de Vidro – Refere-se à identificação de critérios de seletividade (procedimentos invisíveis e
artificiais) os quais ficam implícitos na estrutura do comando, que impedem as mulheres de ascender a
funções estratégicas nas grandes organizações esclareceu Cappellin (2008).
68 Céu de Chumbo – trata-se de uma nova metáfora que apresenta os mecanismos institucionais e
culturais que promovem a desigualdade sexual, tais como: premiações, citações, medalhas, entre outras
maneiras de discriminação, esclareceu Cappellin (2008).
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
uma pela falta de poder, em razão da estrutura social brasileira em que primeiro é
subordinada ao pai depois ao marido; e segundo, como trabalhadora assalariada que,
além de ter dupla jornada – doméstica e extradoméstica – ainda não tem a remuneração
obtida pelo homem na realização da mesma atividade. Somado a isso, as profissões
estereotipadas como femininas tendem a ser menos valorizadas àqueles que são
masculinas.
A identidade da mulher como dona de casa foi e é imposta como uma
construção social e ideológica no Brasil, que inferioriza e desvaloriza o trabalho
feminino. Além disso, o equívoco maior foi o fato de que tal estereótipo ser passado
como algo natural, porque as atividades domésticas são naturalmente de competência da
mulher, tidas como sexo frágil, emotivas e irracionais. Trata-se de uma deturpação da
realidade quando pensamos que tal identidade feminina é natural. Chies (2010, p. 515)
complementou dizendo que:
Essa situação diferencial de homens e mulheres na sociedade, e em particular
no campo do trabalho, parece ser justificada pela ideia de que o trabalho da
mulher é algo ‘secundário’ frente ao trabalho masculino. E não somente
existem profissões que historicamente foram concebidas como masculinas,
mas a própria menção ao trabalho era algo em essência pertencente ao mundo
masculino. Portanto, as mulheres tiveram que enfrentar um espaço na
sociedade que, à primeira vista, já se concebia como um mundo masculino, e
muitas profissões foram relutantes, e algumas são até hoje, à ideia de
mulheres atuando junto aos homens.
Trazendo o contexto do trabalho na política, Beltrão e Alves (2009)
informaram que foram eleitas, em 1978, duas deputadas federais; oito em 1982 e vinte e
seis em 1986, estas fundamentais para a conquista de direitos iguais entre os sexos.
Informaram ainda que, em 2002, foram eleitas 42 deputadas federais. Alves e
Cavenagui (2012) argumentaram que as eleições de 2010, no Brasil, historicamente
foram as com maior número de candidatas a deputadas estaduais e federais, bem como
duas candidatas à Presidência da República, no entanto, embora tenha sido uma eleição
fortemente marcada pela presença feminina, não houve por parte delas a discussão de
gênero como um dos assuntos principais em suas campanhas.
Costa (2013), presidente da Ordem Advogados do Brasil de São Paulo,
afirmou que 22 milhões de famílias no Brasil têm hoje como responsável pela sua
sustentação econômica as mulheres, mas esse fato não se reproduz em outros setores,
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
como na política, em que o Brasil ocupa a 107ª posição mundial sobre a participação
das mulheres no parlamento brasileiro: 45 deputadas federais versus 467 homens; 7
senadoras para 81 senadores. No Poder Judiciário, comentou o presidente da OAB, o
contexto é diferente, o advogado expôs que temos hoje, aproximadamente, 40 % de
ocupação por mulheres, resultado melhor ainda é no Tribunal Regional do Trabalho da
2ª região, no qual há somente desembargadoras.
Barbosa (2014), com o intuito de refletir sobre a evolução da participação da
mulher no mercado de trabalho brasileiro, bem como identificar os seus determinantes
associados às características individuais, de composição familiar e localização
geográfica, utilizou os microdados de Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (PNAD) de 1992 a 2012, cuja fonte é do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. Como resultados, a autora colocou como determinantes relevantes para a
oferta de trabalho o seguinte: nível educacional, o estado conjugal e a presença de filhos
e idosos. “Tais resultados, em especial os associados com a composição familiar,
sugerem a existência de barreiras que dificultam a escolha das mulheres em ingressar na
força de trabalho” (BARBOSA, 2014, p. 431-432).
Portanto a divisão sexual do trabalho está pautada sobre estereótipos
construídos e naturalizados discursivamente em que, para as mulheres, cabe a função
reprodutiva biológica e social em suas famílias, e, também, características como
fragilidade, irracionalidade, dependência, dentre outras, em que o espaço dito feminino
é tido como o privado. Em contrapartida, aos homens, a identidade construída e
naturalizada foi a de função produtiva e pública, cujas características são a força física,
a racionalidade, a independência, entre outras, gerando, dessa maneira, grupos
antagônicos produzidos socialmente.
Logo não é suficiente atualmente termos somente a mensuração quantitativa
e descritiva sobre a participação das mulheres no mercado de trabalho, é necessária a
contribuição da análise qualitativa desses resultados estatísticos, a fim de
compreendermos os caminhos realizados por elas, a cultura percebida, os obstáculos
encontrados em razão da maioria masculina em determinadas profissões historicamente
postas, enfim examinar o que pode estar influenciando positiva e ou negativamente a
feminização das profissões, rumo à (des)igualdade de gênero no âmbito profissional.
Trata-se de uma temática atual e latente, já que a permanência da atribuição do trabalho
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
doméstico às mulheres continua sendo um dos problemas mais importantes na análise
das relações sociais de sexo/gênero, afirmaram Hirata e Kergoat (2007).
4.4 INICIATIVAS INSTITUCIONAIS SOBRE GÊNERO
Inserimos essa revisão das iniciativas institucionais, no plano nacional,
como uma seção de capítulo teórico, em função da importância de apresentar ações
implantadas em termos de leis, órgãos de apoio, conferências e Plano Nacional de
Políticas para as Mulheres, práticas essas que, mesmo sendo incipientes, já indicam a
relevância da temática para a União. A apresentação dá-se em ordem cronológica dos
eventos.
Por meio do Decreto-Lei, nº 5.452, de 1º de maio de 1943, o então
Presidente da República, Getúlio Vargas, aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), a qual apresenta o capítulo III que trata da Proteção do Trabalho da Mulher.
Este capítulo está dividido em vinte e sete artigos em vigor, segmentados em seis
seções, a saber: i – da duração e condições do trabalho; ii – do trabalho noturno; iii –
dos períodos de descanso; iv – dos métodos e locais de trabalho; v – da proteção à
maternidade; vi – das penalidades, todos visando à proteção da mulher no trabalho.
O Estatuto da Mulher Casada (BRASIL, Lei 4.121/1962), embora não tenha
eliminado todos os privilégios apresentados até então pelo Código Civil de 1916, o qual
privilegiava inúmeros direitos aos homens, discriminando as mulheres, afirmaram Alves
e Corrêa (2009), avançou em relação ao patriarcado, mesmo mantendo algumas
questões de gênero pendentes. Os autores esclareceram que os avanços femininos
ficaram, de certa forma, congelados até 1975 – Ano Internacional da Mulher – quando
foram retomadas as conquistas das mulheres brasileiras. Exemplos desses avanços
foram a conquista ao divórcio – Brasil (1977), Lei n. 6.515 datada de 1977 – e a
Constituição de 198869
(BRASIL, 1988), em seu capítulo Dos Direitos e Deveres
69
“A Constituição de 1988 passou a ser uma das mais avançadas do mundo no que se refere à equidade
de gênero ao incorporar e consolidar conquistas nacionais e internacionais que marcam um século de luta
feminista. A nova Constituição estabeleceu a obrigatoriedade de concurso para o preenchimento de
cargos no serviço público. Essa medida favoreceu a entrada de mulheres com curso superior em diversas
profissões, como de advogados e economistas, que eram carreiras essencialmente masculinas”
(BELTRÃO; ALVES, 2009, p. 135).
108
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Individuais e Coletivos, no qual é assegurado que os “[...] homens e mulheres são iguais
em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”, além do § 8o do Art. 226, em
que explicita sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra as
mulheres, rompendo, dessa maneira, com o regime autoritário no Brasil.
Em função da nova Constituição Brasileira (1988), expuseram Alves e
Corrêa (2009), houve repercussão interna por meio da promulgação de vários
documentos e eventos. Relativos à igualdade de gênero, foram oportunizadas: a
Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948, na Assembleia Geral
da Organização das Nações Unidas (ONU), após dois anos de elaboração e contou com
a participação de mais de cinquenta países em sua redação, com o objetivo de combater
a descriminação por raça, cor, gênero, idioma, nacionalidade ou por qualquer outro
motivo; a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra
a Mulher (CEDAW), aprovada pela Organização dos Estados Unidos (ONU), em 1979
e ratificada pelo Brasil em 1984. Trata-se de importante instrumento internacional para
promover a igualdade de gênero, independentemente de a discriminação ser praticada
por Estados, indivíduos ou organizações.
O CEDAW (Committee on the elimition of discrimination against women)70
monitora a implantação da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de
discriminação contra a mulher. Esse comitê é constituído por vinte e três especialistas
de todo o mundo sobre os direitos das mulheres. Também a Convenção Interamericana
para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do
Pará e promulgada em 1994, adotada pela Assembleia Geral da Organização dos
Estados Americanos (OEA), visa combater a violência contra as mulheres; a IV
Conferência Mundial sobre a Mulher de Pequim, em 1995, que focalizou a igualdade e
desenvolvimento para todas as mulheres.
O Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher
(UNIFEM71
), presente no Brasil desde 1992, tem como objetivo promover a igualdade
70
UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS. Committee on the elimition of discrimination against women.
Disponível em: http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CEDAW/Pages/CEDAWIndex.aspx. Acesso em: 21
janeiro 2014.
71
FUNDO DE DESENVOLVIMENTO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A MULHER – UNIFEM.
UNIFEM – ONU Mulheres Brasil e Cone Sul. Disponível em:
http://www.eeas.europa.eu/delegations/brazil/press_corner/all_news/news/2011/20110113_01_pt.htm.
Acesso em: 25 janeiro 2014.
109
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
de gênero e os direitos humanos das mulheres na Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e
Uruguai. Vinculado à ONU Mulheres – Entidade das Nações Unidas para a Igualdade
de Gênero e o Empoderamento das Mulheres – busca acelerar o progresso e o
atendimento das demandas das mulheres e meninas em todo o mundo. Para isso, divulga
editais e chamadas mundiais de projetos da ONU Mulheres ou de fundos na área de
gênero, raça, etnia e direitos humanos com foco nas mulheres.
Outra conquista, em termos de Lei, foi a chamada Lei do Concubinato – Lei
n. 8.971 de 1994 (BRASIL, 1994), que regulou o direito da companheira comprovada
de um homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva
há mais de cinco anos ao direito a alimentos, bem como à sucessão. Também a Lei
9.100, datada de 1995 (BRASIL, 1995), trouxe outro avanço em favor das mulheres,
nela o Governo Federal estabeleceu a cota mínima de vinte por cento das vagas de cada
partido ou coligação para candidatadas mulheres.
Como resultados de sua pesquisa, Abramo (2007) indicou que houve
avanços por meio de ações institucionais, no Brasil, que visam à promoção da igualdade
de gênero, dando visibilidade a essa questão, a saber: Criação da Secretaria Especial de
Políticas para as Mulheres; I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres; e
Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), detalhados a seguir.
Foi criada, em 2003, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres,
vinculada à Presidência da República, cujo objetivo principal é promover a igualdade
entre homens e mulheres e combater todas as formas de preconceito e discriminação
herdadas de uma sociedade patriarcal e excludente72
. Em 1985, foi criado o Conselho
Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), vinculado ao Ministério da Justiça, com o
objetivo de promover políticas que “visassem eliminar a discriminação contra a mulher
e assegurar sua participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do país.”
Esse conselho, a partir de 2003, foi vinculado à Secretaria Especial de Políticas para as
UNIFEM. Quem responde às mulheres? Gênero e responsabilização. Progresso das mulheres do
mundo, UNIFEM, 2008/2009. Disponível em: http://www.unifem.org.br/sites/700/710/00000395.pdf.
Acesso em 25 janeiro 2014.
72
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) – disponível em: http://www.spm.gov.br/sobre. Acesso
em: 20 janeiro 2014.
110
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Mulheres. Alves e Corrêa (2009, p. 135) confirmaram que “[...] a criação do CNDM foi
recebida com grande apreço e muita visibilidade na Conferência Internacional sobre a
Mulher de Nairobi, pois tratava-se do primeiro país sul-americano a estabelecer um
mecanismo federal robusto de promoção da igualdade entre os gêneros [...].”
A realização da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em
2004, em que se reuniram aproximadamente 2.500 pessoas na cidade de Brasília, teve
como objetivo a elaboração das diretrizes para uma Política Nacional para as
Mulheres73
. A Política Nacional para as Mulheres orienta-se pelos seguintes pontos
fundamentais, de acordo com Brasil (2006, p. 7-8):
Igualdade e respeito à diversidade – homens são iguais em seus direitos. A
promoção da igualdade implica no respeito à diversidade cultural, étnica,
racial, inserção social, situação econômica e regional, assim como os
diferentes momentos da vida das mulheres;
Eqüidade – a todas as pessoas deve ser garantida a igualdade de
oportunidades, observando-se os direitos universais e as questões específicas
das mulheres;
Autonomia das mulheres – o poder de decisão sobre suas vidas e corpos deve
ser assegurado às mulheres, assim como as condições de influenciar os
acontecimentos em sua comunidade e seu país;
Laicidade do Estado – as políticas públicas voltadas para as mulheres devem
ser formuladas e implementadas independentemente de princípios religiosos,
de forma a assegurar os direitos consagrados na Constituição Federal e nos
instrumentos e acordos internacionais assinados pelo Brasil;
Universalidade das políticas – as políticas públicas devem garantir, em sua
implementação, o acesso aos direitos sociais, políticos, econômicos, culturais
e ambientais para todas as mulheres;
Justiça social – a redistribuição dos recursos e riquezas produzidas pela
sociedade e a busca de superação da desigualdade social, que atinge de
maneira significativa às mulheres devem ser assegurados;
Transparência dos atos públicos – o respeito aos princípios da administração
pública, tais como legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, com
transparência nos atos públicos e controle social, deve ser garantido;
Participação e controle social – o debate e a participação das mulheres na
formulação, implementação, avaliação e controle social das políticas públicas
devem ser garantidos e ratificados pelo Estado brasileiro, como medida de
proteção aos direitos humanos das mulheres e meninas.
A elaboração do I Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (BRASIL,
2005) foi composta por cento e noventa e nove ações distribuídas em vinte e seis
73
CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIA. I Conferência Nacional de Políticas para as
Mulheres. Disponível em:
http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=997:1-conferencia-
nacional-de-politicas-para-as-mulheres&catid=120:numero-136-agosto-de-2004&Itemid=129. Acesso em
20 janeiro 2014.
111
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
prioridades discutidas e estabelecidas na I Conferência Nacional de Políticas para as
Mulheres; Nela foram traçadas quatro linhas de atuação: autonomia, igualdade no
mundo do trabalho e cidadania; educação inclusiva e não sexista; saúde das mulheres,
direitos sexuais e direitos reprodutivos; e enfrentamento à violência contra as mulheres
(BRASIL, 2006).
No entanto Abramo (2007) ressaltou que tais ações foram realizadas para
atenderem às solicitações dos movimentos feministas e das mulheres e são para avançar
no mesmo sentido de ações realizadas nos países latino-americanos. Mas são ações,
mesmo que incipientes e, de certa forma, insuficientes ainda porque, entre outros
motivos, o número de programas é limitado, são relevantes já que colocam a temática na
agenda pública, além de trazerem para o governo federal a incumbência de estabelecer
políticas públicas para buscar a igualdade de gêneros.
Além dessas ações, em 2007, foi realizada a II Conferência Nacional de
Políticas para as Mulheres74
, quando foi avaliada a implantação do I Plano Nacional de
política para as Mulheres, além de discutirem a participação das mulheres brasileiras
nos espaços de poder. O evento contou com aproximadamente duzentas mil brasileiras
de todo o país e foram eleitas duas mil e setecentas delegadas. Dessa conferência, foi
construída a proposta do II PNPM (BRASIL, 2008), o qual foi orientado pelos
princípios aprovados nas duas Conferências nacionais, a saber: igualdade e respeito à
diversidade, equidade, autonomia das mulheres, laicidade do estado, universalidade das
políticas, justiça social, transparências dos atos públicos, participação e controle social.
O Plano está organizado em onze capítulos que expressam temas prioritários
e áreas de preocupação para as mulheres conferencistas, são eles: I – autonomia
econômica e igualdade no mundo do trabalho, com inclusão social; II – educação
inclusiva, não-sexista, não-racista, não-homofóbica e não-lesbofóbica; III – saúde das
mulheres, direitos sexuais e direitos reprodutivos; IV – enfrentamento de todas as
formas de violência contra as mulheres; V – participação das mulheres nos espaços de
poder e decisão; VI – desenvolvimento sustentável no meio rural, na cidade e na
floresta, com garantia de justiça ambiental, soberania e segurança alimentar; VII –
direito à terra, moradia digna e infraestrutura social nos meios rural e urbano,
74
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. II
Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres – Disponívelem http://spm.gov.br/pnpm/ii-
conferencia-nacional-de-politicas-para-as-mulheres. Acesso em: 20 janeiro 2014.
112
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
considerando as comunidades tradicionais; VIII – cultura, comunicação e mídia
igualitárias, democráticas e não discriminatórias; IX – enfrentamento do racismo,
sexismo e lesbofobia; X – enfrentamento das desigualdades geracionais que atingem as
mulheres, com especial atenção às jovens e idosas; XI – gestão e monitoramento do
plano (BRASIL, 2008).
Vinculadas à Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, foram
instituídas três secretarias, sendo elas: a Secretaria de Políticas do Trabalho e
Autonomia Econômica das Mulheres (SAE), a qual foi implantada com o objetivo de
“promover a autonomia econômica das mulheres, por meio do desenvolvimento de
políticas voltadas para a inserção e a permanência das mulheres no mundo do trabalho,
a ampliação dos seus direitos sociais e por mais igualdade entre mulheres e homens,
sejam elas das cidades, do campo ou da floresta.” Dentre seus principais programas e
sob a Coordenação Geral de Autonomia Econômica das Mulheres, está o de Pró-
equidade de Gênero e Raça, com foco em empresas de médio e grande porte, públicas e
privadas, para difundir novas concepções na gestão e na cultura organizacional, com o
objetivo de promover a igualdade entre homens e mulheres no contexto do trabalho75
.
Ainda, dentro desta secretaria, foi instituído o Comitê Técnico de Estudos
de Gênero e Uso do Tempo76
(CGUT), a fim de realizar pesquisas para identificação das
desigualdades de gênero no uso do tempo para dedicação à profissão, aos cuidados com
a família e à administração do lazer, além de estimular a incorporação da perspectiva de
gênero na produção e análise de informações estatísticas. Esse comitê foi instituído pelo
governo para atender à demanda apresentada na II Conferência Nacional de Políticas
para as Mulheres em 2007.
Há também, nesta secretaria: a Coordenação Geral de Direitos do Trabalho
das Mulheres, cujos principais programas e ações são: participar dos fóruns
relacionados à Agenda Nacional do Trabalho Decente, a fim de contribuir na
75
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Secretaria de Políticas do Trabalho e Autonomia Econômica das Mulheres – Disponível em:
http://www.spm.gov.br/secretaria-de-politicas-do-trabalho-e-autonomia-economica-das-mulheres. Acesso
em: 20 janeiro 2014.
76 SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Comitê Técnico de Estudos de Gênero e Uso do Tempo – Disponível em:
http://www.spm.gov.br/secretaria-de-politicas-do-trabalho-e-autonomia-economica-das-
mulheres/coordenacao-geral-de-estudos-e-pesquisas. Acesso em: 21 janeiro 2014.
113
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
formulação e implantação de políticas e cumprimento das convenções internacionais
acerca dos direitos das mulheres no ambiente de trabalho; interlocução com a bancada
feminina, comissões legislativas, parlamentares e poder judiciário, sempre defendendo
os direitos das mulheres no trabalho; promover o desenvolvimento de políticas de
esporte e lazer para mulheres de todas as idades, bem como a profissionalização das
mulheres no esporte sempre de maneira igualitária aos homens77
.
Na segunda Secretaria – a de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres
(SEV), estão alocadas as Coordenações Gerais de Fortalecimento da Rede de
Atendimento – que, dentre outras atribuições, deve “apoiar, monitorar e promover ações
relativas à implementação de políticas públicas voltadas para o atendimento
humanizado e qualificado às mulheres por meio da rede de atendimento à mulher em
situação de violência”78
; Coordenação da Central de Atendimento à Mulher – cujo foco
é coordenar, aprimorar e acompanhar o funcionamento da central de atendimento;
Coordenação de Ações Preventivas e Garantia de Direitos – cuja competência deve ser a
promoção e divulgação de ações com o objetivo de desconstruir os estereótipos e
representações de gênero, mitos e preconceitos com relação à mulher, bem como criar
condições de garantia dos direitos das mulheres79
.
A terceira Secretaria – de Articulação Institucional e Ações Temáticas
(SAIAT)80
– busca estrategicamente desenvolver a autonomia das mulheres, seja pelo
exercício e ampliação de seus direitos, bem como pela inclusão de questões
77
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Coordenação Geral de Direitos do Trabalho das Mulheres – Disponível em:
http://www.spm.gov.br/secretaria-de-politicas-do-trabalho-e-autonomia-economica-das-
mulheres/coordenacao-geral-de-direitos-do-trabalho-das-mulheres. Acesso em: 21 janeiro 2014.
78
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Secretaria de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as-mulheres/coordenacao-
geral-de-fortalecimento-da-rede-de-atendimento. Acesso em: 21 janeiro 2014.
79
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Coordenação Geral de Ações Preventivas e Garantia de Direitos. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-enfrentamento-a-violencia-contra-as-mulheres/coordenacao-
geral-de-acoes-preventivas-e-garantia-de-direitos. Acesso em: 21 janeiro 2014.
80
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Secretaria da Articulação Institucional e Ações Temáticas. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-articulacao-institucional-e-acoes-tematicas. Acesso em: 22
janeiro 2014.
114
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
relacionadas ao gênero em políticas públicas. Nesta Secretaria, estão alocadas as
Coordenações de: Relações de Poder e Participação Política – cujo objetivo é o
fortalecimento e ampliação das políticas públicas para as mulheres, bem como ampliar a
sua participação na esfera política nos planos municipais, Distrito Federal e Estaduais;
Programas e Ações de Educação e Cultura – que têm o propósito de estimular a
desconstrução e a agir na desconstrução das opressões das mulheres, como também
promover a produção científica e reflexão sobre as relações de gênero, mulheres e
feminismo no Brasil, além de incentivar o debate sobre gênero na esfera escolar e
promover e dar visibilidade às ações culturais femininas81
; Programas e Ações de
Saúde, os quais visam auxiliar na implantação da Política Nacional de Atenção Integral
à Saúde das Mulheres82
, por meio do Ministério da Saúde; Diversidade – cujo objetivo é
“fazer reconhecer a diversidade como uma das maiores riquezas da humanidade e a
existência de pessoas diferentes, com suas diferenças culturais, étnicas, de orientação
sexual e geracionais”83
.
Vinculada à Organização Internacional do Trabalho (OIT) – agência das
Nações Unidas, a OIT84
no Brasil, desde 1950, tem apresentado programas e atividades
que refletem os objetivos da Organização e busca promover a igualdade de
oportunidades e tratamento de gênero e raça no trabalho. Em 2003, o então Presidente
da República do Brasil assinou Memorando de Entendimento que previa o
estabelecimento de um programa especial de cooperação técnica para a promoção de
uma Agenda Nacional de Trabalho Decente (ANTD) no Brasil. Essa Agenda definiu
três prioridades: I – a geração de mais e melhores empregos, com igualdade de
81
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Coordenação Geral de Programas e Ações de Educação e Cultura. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-articulacao-institucional-e-acoes-tematicas/coordenacao-geral-
de-programas-e-acoes-de-educacao. Acesso em: 22 janeiro 2014.
82
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Coordenação Geral de Programas e Ações de Saúde. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-articulacao-institucional-e-acoes-tematicas/coordenacao-geral-
de-programas-e-acoes-de-saude. Acesso em: 22 janeiro 2014.
83
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.
Coordenação Geral da Diversidade. Disponível em: http://www.spm.gov.br/subsecretaria-de-articulacao-
institucional-e-acoes-tematicas/coordenacao-geral-da-diversidade. Acesso em: 22 janeiro 2014.
84
Organização Internacional do Trabalho (OIT). Disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/content/oit-
no-brasil. Acesso em 25 janeiro 2014.
115
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
oportunidades e de tratamento; II – a erradicação do trabalho escravo e eliminação do
trabalho infantil, em especial em suas piores formas; III – e o fortalecimento dos atores
tripartites e do diálogo social como um instrumento de governabilidade democrática.
Dentre os programas da OIT, está o de Igualdade de gênero e raça,
erradicação da pobreza e geração de emprego, cujo objetivo é promover a igualdade de
oportunidades e a eliminação de toda e qualquer tipo de discriminação, a fim de
melhorar a circunstâncias das mulheres e outros grupos discriminados da sociedade,
bem como possibilitar o acesso a condições de trabalho dignas que possibilitem uma
vida digna para si e para os seus.
O escritório da OIT no Brasil, em parceria com a Secretaria de Políticas
para as Mulheres da Presidência da República (SPM), publicou o livro Igualdade de
Gênero e Raça no Trabalho: avanços e desafios (OIT, 2010), com o propósito de
contribuir para a produção e difusão de conhecimentos gerados sobre gênero e raça no
mercado de trabalho. Abramo (2010, p.17), na introdução da obra, afirmou que o livro
apresenta “[...] um conjunto de estudos e reflexões que visam dar conta de avanços e
desafios em áreas chaves para a promoção da igualdade de gênero no Brasil.”
O prêmio Construindo a Igualdade de Gênero85
, instituído em 2005, é
resultado da parceria entre o Ministério da Educação e a Secretaria de Políticas para as
Mulheres (SPM), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) e a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o
Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres).
Trata-se de um concurso de redações, artigos científicos e projetos
pedagógicos com o objetivo de estimular a produção científica e a reflexão acerca das
relações de gênero, mulheres e feminismo e todas as formas de discriminação, raça e
orientação sexual, além de promover a participação das mulheres no campo das ciências
e das carreiras acadêmicas. O prêmio atualmente é contemplado em cinco categorias:
redações – para estudantes do Ensino Médio; artigos científicos – para estudantes de
Graduação; artigos científicos – para mestres e estudantes de Doutorado; projetos
pedagógicos – para escolas de Ensino Médio promotoras da igualdade.
85
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero. Disponível em:
http://www.igualdadedegenero.cnpq.br/igualdade.html. Acesso em: 25 janeiro 2014.
116
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Em termos de legislação, em sete de agosto de 2006, foi promulgada a Lei
nº 11.340, intitulada Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006), a qual visa coibir e prevenir
a violência contra a mulher e assegurar oportunidades e facilidades para viver sem
violência e com direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à
cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à
liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária a todas as
mulheres (BRASIL, 2006).
Também há o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), vinculado
à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o qual tem como
Missão Produzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas
públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro. O instituto
disponibiliza indicadores acerca das desigualdades de gênero, por meio do Retrato das
Desigualdades de Gênero e Raça86
. Este relatório se encontra em sua quarta edição,
com dados de 1995 a 2009 segmentados em doze blocos temáticos, a saber: população;
chefia de família; educação; saúde; previdência e assistência social; mercado de
trabalho; trabalho doméstico remunerado; habitação e saneamento; acesso a bens
duráveis e exclusão digital; pobreza, distribuição e desigualdade de renda; uso do tempo
e vitimização.
Apresentaremos alguns dos resultados contidos no último relatório do Ipea
que acreditamos serem importantes para a temática em estudo neste trabalho. Os dados
referem-se ao período de 1995 a 2009, e os resultados indicaram que as mulheres chefes
de família aumentaram de 22,9%, em 1995, para 35,2% em 2009, o que indica
mudanças no padrão de comportamento das famílias brasileiras, sobretudo nas cidades.
Ao analisar separadamente os dados, o aumento na área urbana foi maior que na rural –
13% e 5%, respectivamente. Com relação ao tipo de formação das famílias lideradas
pelas mulheres, os resultados apontaram que, em 1995, 68,8% delas estavam em
famílias monoparentais (mulher com filhos/as) e 2,8% em famílias formadas por casais
com ou sem filhos/as, e 49,4%, de famílias monoparentais e 26,1% as famílias eram
formadas por casais nos mesmos períodos, demonstrando um aumento no percentual de
famílias formadas por casais chefiadas por mulheres.
86
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça. Disponível
em: http://www.ipea.gov.br/retrato/apresentacao.html. Acesso em: 24 janeiro 2014.
117
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
No entanto, segundo o Ipea (2011), as famílias chefiadas por mulheres
negras ainda se encontram em situações de maior vulnerabilidade. Quanto à
remuneração, os resultados mostram que a renda domiciliar per capita média de uma
família cujo líder for um homem branco é de R$ 997,00, enquanto que em uma família
chefiada por uma mulher negra é de apenas de R$ 491,00.
Acerca da condição de atividade, 41% das mulheres chefes de família são
inativas87
, enquanto para os homens o valor é de 16%. Para o Ipea, este resultado sugere
que seja pelo fato de as mulheres também serem donas de casa e, portanto, precisam
dedicar-se ao trabalho doméstico em suas casas. A respeito dos filhos, nos casos de
famílias chefiadas por mulheres, 46% delas têm filhos com 15 anos ou mais, enquanto,
para os homens, a percentagem é de 38%.
Relativo à quantidade de pessoas disponíveis para o mercado de trabalho –
chamada de taxa de participação pelo Ipea – as mulheres maiores de 16 anos
totalizavam 58,9%, já a taxa relacionada aos homens, em 2009, era de 81,6%. Mas, o
Instituto adverte que o fato de haver disponibilidade não significa estar empregado, por
isso, faz-se necessário conhecer o indicador de desemprego, a fim de ter um
mapeamento real do contexto do trabalho para as mulheres, o qual, no período de 1995
a 2009, variou aproximadamente de 7% para 11% e, para os homens, de 5% para 6%.
As mulheres já são responsáveis, em média, por 45% da renda familiar. O Ipea (2011)
acredita que esse fato se dá em razão da maior participação delas no mercado de
trabalho (aumentou 10%), bem como devido ao novo perfil da família chefiada por
mulheres.
No relatório de 2011, consta que, desde os cinco anos de idade, sobretudo
após os 10 anos, as meninas e mulheres são encaminhadas para o trabalho doméstico.
Ratifica essa informação com os seguintes indicadores: em 2009, 14,5 % dos meninos,
com idade entre 5 e 9 anos, realizavam trabalho doméstico utilizando, em média, 5,2
horas, enquanto 24,3% das meninas tinham a mesma atribuição, usando 6,1 horas. À
medida que aumenta a idade da população – entre 10 e 15 anos –, os meninos
utilizavam 10,2 horas, e as meninas 25,1 horas; tais diferenças se mantêm ao longo da
87
“Pessoas inativas são as que não estavam ocupadas e não procuraram trabalho. Entre elas podemos citar
as/os donas/os de casa, as/os aposentadas/os e pensionistas, pessoas incapacitadas para o trabalho e
estudantes” (IPEA, 2011, p.19).
118
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
vida de homens e mulheres, inclusive, aumentando a proporção em famílias com maior
número de filhos.
Em 2013, com dez anos de existência da Secretaria de Políticas para as
Mulheres, é publicado o chamado III Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, com
validade para o período de 2013 a 2015, revisado e revisitado, por meio das
Conferências de Mulheres municipais, estaduais e nacional, com a participação da
sociedade civil, movimento de mulheres rurais e urbanas, feministas e organismos
estaduais e municipais de políticas para as mulheres. O plano é composto por dez
capítulos com seus respectivos objetivos gerais e específicos, metas, linhas de ação e
ações.
119
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 5
POSICIONAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA
“[...] pouco trabalho empírico realizado na perspectiva de estratégia como prática
desenvolveu inovadora e específica metodologia à perspectiva [...].”
“[…] little empirical work conducted in the strategy-as-practice perspective has developed
innovative methodology specific to the perspective [...].”
(JARZABKOWSKI; BALOGUN; SEIDL, 2007, p. 21)
120
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
O objetivo, neste capítulo, é explicitar como se deu a integração da
abordagem da Estratégia como Prática Social – com foco nas práticas discursivas da
estratégia88
– coma temática Gênero, correlacionando, dessa maneira, os estudos
organizacionais transpassados também pela Linguística, por meio da Semiótica. Para
EPS, a estratégia é uma atividade social, cujas práticas são importantes para toda a
sociedade. Samra-Fredericks (2003), dentre outros objetivos acerca da EPS, propôs
começar uma conversa entre as áreas – Sociologia, Linguística e Antropologia –, a fim
de desenvolver o conhecimento sobre a EPS. Seu desejo foi de que outras áreas se
juntem à reflexão para que futuras pesquisas em estratégia possam efetivamente moldar
novas tecnologias, alianças, fusões e assim por diante. “Surgem, desse modo,
possibilidades de buscas de métodos e técnicas de outras áreas, em especial a
Antropologia e a Sociologia, que trabalham com o fenômeno social em constante
modificação”, ratificou Colla (2012, p. 55).
Por uma questão didática, optamos por, em cada etapa, discorrer
justificando teoricamente acerca de cada posicionamento metodológico e, ao final da
seção, apresentar o detalhamento adotado neste trabalho. Organizamos o capítulo
iniciando pela escolha do local e da amostra da pesquisa. Na seção seguinte, abordamos
o delineamento metodológico da pesquisa, no qual estão inseridas as nossas escolhas, a
saber: abordagem, método, técnicas de coleta de dados – observação sistemática,
entrevista qualitativa e análise documental –, finalizando com a análise semiótica das
práticas discursivas.
5.1 LOCUS E PARTICIPANTES DA PESQUISA
Alves-Mazzotti e Gewanddsznajer (1999) confirmaram que as definições de
onde e quem participa da pesquisa é proposital e que essa escolha do investigador se
realiza em razão da temática do trabalho, bem como pelas condições de acesso. Vaara e
Whittington (2012) esclareceram que os estudos, à luz da EPS, possibilitam a inclusão
88
Laine e Vaara (2007) esclareceram que há três tipos de estudos discursivos na área da estratégia: I –
análises teóricas diversas para examinar a estratégia como um corpo de conhecimento; II – perspectiva
narrativa sobre a elaboração de estratégias ou o papel da narração na mudança organizacional; III –
exame das práticas discursivas envolvidas na elaboração de estratégias.
121
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
de instituições sem fins lucrativos, como universidades, prefeituras, hospitais, dentre
outras. A escolha da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC – como
objeto de análise se deu por um conjunto de motivos, a saber: pelo fato de pesquisadora,
além de ser docente da IES, também participar do grupo gestor da Universidade, o que
possibilita a realização da observação; pelo fato de se tratar de uma Instituição
comunitária; também o fato de a Universidade, durante o ano de 2014, ter realizado a
revisão do seu planejamento estratégico, cujo foco se deu na formação da estratégia; e,
além do exposto, pelo fato de a Instituição ser gerida por gestoras(es) mulheres e
homens em todos os seus níveis hierárquicos.
Acerca das(os) participantes da pesquisa, Wilson e Jarzabkowski (2004)
justificaram que o pesquisador, na abordagem da EPS, precisa definir o polo no nível
micro, em conformidade com o objeto de estudo e a partir da definição do contexto
macro. No plano micro, a investigação se pauta nas(os) praticantes e em suas ações
cotidianas. Whittington (2004) sintetizou ao escrever que EPS compreende os processos
organizacionais no nível micro, mas também entender as práticas em um contexto social
mais amplo. Desalauriers e Kérisit (2008, p. 138) esclareceram que a amostra da
pesquisa qualitativa “[...] não se constitui ao acaso, mas sim em função de
características precisas, que o pesquisador pretende analisar.” Vaara e Whittington
(2012) citaram que, dentre os aspectos positivos dos estudos que abordam a perspectiva
micro, está o fato de possibilitarem o aprofundamento sobre o que realmente acontece
no processo estratégico é o mais significativo.
O universo desta pesquisa foi composto pelo grupo de gestoras(es) definido
pela Instituição para participarem da revisão da estragégia, durante o ano de 2014, o
qual foi constituído por cento e onze pessoas que participaram da coleta des dados por
meio da observação participantes. A escolha desse universo se deu pelo fato de que:
primeiramente terem sido as(os) praticantes que compuseram o grupo do planejamento
institucional da Universidade; segundo pelo fato de nele haver representantes dos cinco
níveis hierárquicos da Universidade e dos diversos setores da IES.
Desse universo, para a realização das entrevistas, foi utilizada uma amostra
composta por representantes do grupo gestor da revisão 2014, segmentados por nível
hierárquico e sexo, detalhada na Figura 21 da seção 5.2.3.2.
122
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
5.2 DELINEAMENTO METODOLÓGICO DA PESQUISA
Externalizados, nos capítulos anteriores, os posicionamentos teóricos e
epistemológicos desta pesquisa, apresentamos, conforme ilustra a Figura 17, os
delineamentos metodológicos. Para Desalauriers e Kérisit (2008), delineamento da
pesquisa inclui aspectos metodológicos eleitos para a investigação.
Figura17: Delineamento da Pesquisa
Fonte: Elaborada pela Autora
Como pressuposto teórico que fundamenta este trabalho, adotamos a
perspectiva da Estratégia como Prática Social de Whittington (1996; 2006) – com
ênfase nas práticas discursivas – articulada à temática gênero – com foco na divisão
sexual do trabalho, as quais foram apontadas por Vaara e Whittington (2012) como
lacuna de pesquisa na EPS.
O posicionamento metodológico – abordagem, métodos e técnicas de coleta
e análise dos dados – neste trabalho, está em consonância com os argumentos
apresentados por autoras(es) de que os trabalhos na abordagem da EPS podem utilizar
de pluralidade de métodos e técnicas, inclusive trazendo as experiências metodológicas
de outras áreas do saber. As práticas de coleta de dados devem ser ampliadas para
123
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
atender a um mundo em mudança, no entanto, isso não significa sacrificar o rigor, mas
sim, acatar novas possibilidades inclusive metodológicas, defenderam Balogun, Huff e
Johnson (2003). O posicionamento metodológico é detalhado nas próximas seções,
primeiramente apresentamos o embasamento teórico e, ao final de cada escolha, a
situação aplicada nesta tese.
5.2.1 Abordagem da Pesquisa
Alves-Mazzotti e Gewanddsznajer (1999) argumentaram que as pesquisas
qualitativas possuem regras flexíveis em razão de sua diversidade de aplicação e que
buscam, geralmente, preencher lacunas no conhecimento. Os autores relataram que a
pesquisa qualitativa, portanto, enfatiza e valoriza os aspectos humanos, as interpretações
do saber sobre o mundo social, bem como a interpretação e compreensão do próprio
pesquisador e das pessoas acerca do fenômeno estudado. Corroboraram, também, que a
pesquisa qualitativa está articulada com diferentes crenças sobre o que há para saber
sobre o mundo social. Pires (2008) expôs que a pesquisa qualitativa é flexível, seus
objetos vão descobrindo-se e construindo-se à medida que a investigação avança, além
de possuir muitas e diversificadas formas.
A pesquisa qualitativa é classificada em descritivas e exploratórias por
Desalauriers e Kérisit (2008). A primeira visa à descrição do fenômeno em evidência,
podendo fornecer informações para outras etapas da pesquisa. Busca descrever as
caraterísticas de uma população ou fenômeno, em que o pesquisador já parte de um
problema de pesquisa.
A segunda tem como propósito a familiarização com os envolvidos na
pesquisa, utilizando pequenas amostras. Busca esclarecer e compreender a natureza de
um problema. Como, em geral, não pretende fornecer evidências conclusivas, a etapa
exploratória é seguida por outra pesquisa – descritiva e ou explicativa – com tal fim.
Para Alves-Mazzotti e Gewanddsznajer (1999, p. 161), o objetivo desta etapa
exploratória “[...] é proporcionar, através da imersão do pesquisador no contexto, uma
visão geral do problema considerado, contribuindo para a focalização das questões e a
identificação de informantes e outras fontes de dados.”
124
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Percebemos, com relação à abordagem metodológica utilizada nas pesquisas
empíricas revisadas para este trabalho, que os autores têm preferido à pesquisa
qualitativa, isso se justifica pelo fato de a proposta teórica da EPS buscar a proximidade
com os envolvidos no fazer estratégia. Albino et al. (2010, p. 10) esclareceram que
“Pesquisas dentro da abordagem da ‘Estratégia como Prática’ têm como um dos seus
focos a descoberta e análise de diferentes tipos de práxis, inter-relacionando-as com
suas(seus) praticantes e com práticas extra e intraorganizacionais, utilizando-se, para
tanto, de metodologias qualitativas, principalmente o estudo de caso [...].”
A abordagem de pesquisa utilizada foi a qualitativa, em razão de ela
oportunizar a aproximação do pesquisador com o objeto de estudo, o que está em
consonância com a literatura da EPS. No caso desta pesquisa com as(os) praticantes
envolvidas(os) na revisão 2014 da estratégia, bem como realçar os significados que
emergem no processo de fazer estratégia. A pesquisa qualitativa focaliza o
entendimento da natureza dos fenômenos e seus significados, por meio do contato direto
entre o pesquisador e pesquisados, também em amostras de tamanho reduzido (GODOI;
BALSINI, 2006).
5.2.2 Método da Pesquisa
Alves-Mazzotti (2006) esclareceu que, sobretudo nas pesquisas classificadas
como estudos de caso, o pesquisador deve propiciar seu trabalho à discussão acadêmica
mais ampla, a fim de possibilitar a aplicação de suas considerações em outros trabalhos,
contribuindo, dessa maneira, para o conhecimento científico.
Santos, Sette e Tureta (2006) informaram que os trabalhos empíricos na
abordagem EPS têm utilizado como estratégia de pesquisa estudo de caso único ou
casos múltiplos, longitudinais, com fontes documentais, entrevista e observação.
Também Walter e Augusto (2012), em sua pesquisa com estudos empíricos nacionais e
estrangeiros sobre a perspectiva EPS, ratificaram que, acerca do delineamento da
pesquisa, predominam estudos de caso, os quais, em sua maioria, aplicados a um único
caso, seguido por mais de um caso: múltiplo ou comparativo.
O método utilizado neste trabalho foi o estudo de caso qualitativo, o qual
possibilitou a verticalização na Instituição objeto da pesquisa e um compromisso do
125
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
pesquisador com a compreensão aprofundada de um objeto, neste caso, de uma
Instituição de Ensino Superior comunitária, localizada em Santa Catarina.
5.2.3 Investigação das Práticas Discursivas: técnicas de coleta de dados
Valles (1997) defendeu que são três os ingredientes da pesquisa qualitativa:
documentação, observação e conversação. Para Alves-Mazzotti e Gewanddsznajer
(1999, p. 163), as pesquisas qualitativas são multimetodológicas, e as práticas mais
utilizadas são observação participante ou não, entrevista em profundidade e análise de
documentos. Para Godoy (2006), as técnicas de coleta de dados, observação e entrevista
são utilizadas frequentemente na mesma pesquisa.
Walter, Augusto e Fonseca (2011) e Walter e Augusto (2012) identificaram
como mais frequente as entrevistas, observação e análise de documentos. Foram
utilizadas, neste trabalho, as seguintes práticas de investigação: observação sistemática,
na qual foi utilizado o diário de campo para registro da observação, entrevista
qualitativa, além da análise documental. Godoy (2006), Jaccound e Mayer (2008) e
Deslauriers e Kerisit (2008) explicaram que a coleta de dados, na pesquisa qualitativa,
pode ser combinada com a observação e a entrevista. Esse argumento foi ratificado por
Desalauriers e Kérisit (2008, p. 140): “Geralmente, [...] recorre à observação
participante e à entrevista. Estas técnicas básicas se completam com o questionário, a
fotografia, os documentos audiovisuais (filme, vídeo), a observação dos lugares
públicos, a história de vida, a análise de conteúdo.” Na Figura 18, apresentamos a
síntese das técnicas utilizadas neste trabalho. Nas subseções seguintes detalhamos cada
uma delas.
Figura 18: Síntese das Técnicas de Coleta e Análise dos Dados
Técnicas de Coleta
de Dados Corpus
Técnica de
Análise dos
Dados
1. Observação
Sistemática Reuniões do processo estratégico.
Análise
Semiótica das
Práticas
Discursivas
2. Entrevista
qualitativa Gestoras(es) dos cinco níveis hierárquicos da IES.
3. Análise
Documental
Relatório CPA (Comissão Própria de Avaliação), Plano de
Desenvolvimento Institucional (PDI), Relatório de
Atividades de 2014, livro Unesc: a trajetória de uma
universidade comunitária, Relatórios Planejamento
126
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Técnicas de Coleta
de Dados Corpus
Técnica de
Análise dos
Dados
Estratégico, material utilizado nas reuniões do PE 2014.
Relatório de funcionários, com respectiva formação e
titulação acadêmica e relatório das(os) gestoras(es) da
Instituição com suas funções na Universidade.
Fonte: Elaborada pela Autora
5.2.3.1 Observação Sistemática e Diário de Campo
Serva e Jaime Junior (1995) esclareceram que devemos à Antropologia a
inserção do pesquisador no contexto natural do pesquisado. Pires (2008) expôs que essa
técnica de coleta de dados foi utilizada para observar a vida social em seu próprio
contexto. Ratificando esse argumento, García e Casado (2008) esclareceram que se trata
de uma das técnicas que o pesquisador utiliza para estudar como na vida social os
sentidos e práticas se entrelaçam. Estes autores colocaram que o investigador precisa ter
uma sólida formação teórica e habilidades comportamentais para desempenhar o papel
de observador, a saber: princípios éticos, sinceridade com os observados, paciência e
respeito pelo observado, além de humildade, saber ouvir e, quando a observação for de
grupo, ser legitimado pelos membros dele.
Todas as formas de pesquisa observacional, para Angrosino e Pérez (2000),
envolvem três procedimentos: I – observação descritiva, em que o observador descreve
todos os detalhes, trata-se de um procedimento que produz uma grande quantidade de
dados, alguns que poderão ser irrelevantes na análise; II – foco de observação, nela, o
pesquisador olha apenas para o material que é pertinente ao assunto em estudo; III –
observação seletiva – foco em uma forma específica de uma categoria mais geral.
Jaccoud e Mayer (2008) expuseram alguns princípios metodológicos para a
prática da observação. Primeiramente, acerca da seleção do local (como o contexto em
que fenômenos são produzidos) e, sobre o acesso aos dados, eles defenderam que
dependem de considerações teóricas, sociais e práticas. Com base em Angers, Jaccoud e
Mayer (2008), destacaram cinco questões norteadoras e flexíveis para a pesquisa
observação: 1. Onde estamos. 2. Quem são os participantes? 3. Por que os participantes
estão aí? 4. O que se passa? 5. A que se refere e desde quando?
127
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Estes autores expuseram que a técnica de observação não possui princípios
absolutos para a pesquisa, mas há alguns critérios que podem dar maior cientificidade e,
consequentemente, confiabilidade aos dados coletados, a saber: proximidade das fontes
– trata-se de uma observação de perto, de primeira mão no dizer dos autores; inter e
intra-subjetividade – refere-se a uma situação descrita por vários observadores da
mesma maneira, nos mesmos termos; saturação dos dados – quando os dados começam
a ser redundantes, a repetirem-se; exaustividade – a teoria elaborada explica todos os
fatos observados.
Complementou San Martín e Fernando (2010), indicando que o observador
deve, primeiramente, ser aceito pelo grupo de pessoas observado, avaliando como deve
fazer seu acesso ao grupo, bem como vai conduzir a relação com os atores do grupo,
consolidando-a paulatinamente, sem forçar o seu aceite. Para o autor, o observador deve
utilizar para registro o diário de campo, filmagem e fotografias. Deve registrar em seu
diário de campo primeiramente se houve resistência do grupo ao observador, e também
anotar detalhadamente tudo o que foi observado.
A premissa maior da observação sistemática – também conhecida como
controlada – é o planejamento, em outras palavras: essa observação deve realizar-se em
condições controladas, a fim de que os objetivos propostos antecipadamente possam ser
respondidos. Nela, o pesquisador busca compreender determinado fenômeno, atividade,
observando o processo e artefatos utilizados.
A pesquisa sistemática necessita de uma estrutura pré-estabelecida, em
razão de que o pesquisador já sai para o campo sabendo o que observar, exigindo,
portanto, deste um conhecimento prévio acerca da temática. Esse método de coleta de
dados permite ao investigador o registro de todos os fatos e suas frequências. Santos e
Tureta (2010, p. 4) defenderam que o pesquisador da abordagem da Estratégia como
Prática Social precisa se tornar parte do laboratório.
Nesta pesquisa, a observação sistemática foi realizada pela pesquisadora nos
cinco workshops realizados sobre o planejamento institucional da IES, os quais
aconteceram entre os meses de maio e março de 2015. Nesses encontros, participaram
todas(os) as(os) cento e onze gestoras(es) do grupo do planejamento institucional da
IES, a saber: 07/05/2014 – 1º Workshop de Planejamento; 04/09/2014 – Demandas
Estratégicas; 20/11 – Apresentação dos Projetos Estratégicos Institucionais; 16-12 –
128
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Validação do Modelo de Governança da Unesc; e em 25/03/2015 – Apresentação dos
Programas Estratégicos, os quais se realizaram em um miniauditório na Instituição.
Dois desses encontros foram divididos em duas etapas: na primeira com os
cento e onze participantes juntos e, no segundo, com tarefas a serem executadas em
grupos menores. Nos cinco encontros, como a pesquisadora fazia parte do grupo gestor,
não foi informado as(os) pesquisadas(os) acerca da observação, logo entendemos que,
devido a esses fatos, não houve nenhum tipo de constrangimento sobre a presença da
pesquisadora. As reuniões ocorreram de maneira habitual, e a observação aconteceu
com a pesquisadora participando da primeira etapa com todo o grupo e, no momento em
que a atividade se dava em pequenos grupos, a pesquisadora circulou em vários grupos.
Além desses eventos, foi realizada observação de três reuniões com grupos
específicos nos quais também foi utilizado roteiro de observação. Como se trataram de
reuniões de grupo em que a pesquisadora não fazia parte como gestora, foi, então,
informado ao grupo sobre o motivo de sua presença. A pesquisadora colocou-se
fisicamente em uma mesa ao canto da sala ficando atrás de boa parte dos participantes e
não interagiu com eles. A condução desses encontros sempre iniciava com a fala do
Reitor da IES e, na sequência, era orientada pelo consultor externo, mas também eram
orientadores dos processos em pequenos grupos um membro da consultoria e os
membros da equipe do Planejamento Institucional. Na observação sistemática para esta
pesquisa, foi utilizado o roteiro apresentado na Figura 19.
Figura 19: Roteiro Observação Sistemática
Fonte: Elaborada pela Autora
Acerca do diário de campo, para Balogun, Huff e Johnson (2003), trata-se
de um meio de coleta de dados com experiência comprovada de registro, no entanto,
1. Local e participantes
2. Condução da reunião
3. Organização do ambiente: condições físicas
4. Material utilizado: condições técnicas e materiais
5. Quais as vozes que mais influenciam no processo estratégico neste
momento
6. Como ocorreu o processo decisório
7. Valores específicos que influenciaram o processo estratégico
8. Barreiras que inibem as(os) praticantes do fazer estratégica
9. Outros registros
129
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
não há muita orientação sobre como usá-los. Como o ato do registro escrito é demorado,
uma alternativa seria a gravação a qual incentiva mais a abertura, a franqueza e a
autoexpressão e, talvez, permita observações mais emotivas do que os registros escritos.
Mas também podem materializar-se por anotações escritas e ou gravadas, quando o
pesquisador registra suas impressões, sentimentos, interpretações, em outras palavras: o
que o investigador julgar relevante para a sua pesquisa.
Do ponto de vista do pesquisador, a principal vantagem de diários reside em
sua capacidade de coletar grandes quantidades de informações em tempo real, a partir
de um vasto grupo de respondentes ao longo do tempo. García e Casado (2008)
sugeriram que o registro deve ser feito no momento da observação, descrevendo o
cenário estudado e anotando o que o observador considera significativo para a pesquisa
a fim de que, em outro momento, possa fundamentar as considerações defendidas pelo
pesquisador. García e Casado (2008) complementaram ao dizer que é preciso tornar o
registro o menos complicado e abstrato possível. Também esclareceram que, no diário,
devemos assumir por escrito o que estamos vendo, de forma detalhada.
Os dados coletados da observação sistemática deste trabalho foram
registrados no diário de campo eletrônico no momento da própria coleta e, também,
seguindo o roteiro da observação, registrando quais foram os participantes e mediadores
da reunião, bem como registros acerca da organização física, de materiais,
comportamentos, além de outros registros julgados pertinentes no momento da
observação.
5.2.3.2 Entrevista Qualitativa
A entrevista qualitativa é também chamada de entrevista aberta ou em
profundidade. Para Alonso (1998), é uma conversa entre o entrevistador e o
entrevistado, que busca identificar o saber individual, bem como a construção do
sentido social do comportamento individual que é referência do entrevistado. O autor
colocou que há quatro campos básicos para uso da entrevista: reconstrução de ações
passadas; estudo das representações sociais individuais; investigação da interação de
construções psicológicas e condutas sociais; e prospecção de campos semânticos,
vocabulário e discursos de grupo. Não há regra fixa para realizar a entrevista, essa
130
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
prática é um processo interlocutório e seus resultados não são generalizáveis, esclareceu
o autor.
Sierra (2000) contribuiu ao defender que a entrevista qualitativa está entre
uma conversa do dia a dia e a entrevista formal. Este autor explicou que sua
proximidade de uma conversa do cotidiano se dá pelo fato de o entrevistador deixar o
entrevistado narrar sua experiência ou fato acontecido, e, considerando essa narrativa, o
pesquisador fará suas reflexões acerca do fenômeno estudado.
A entrevista, para Gaskell (2002), possibilita mapear a percepção dos
entrevistados, fornecendo dados para a compreensão das relações (crenças, atitudes,
valores e motivações) entre os atores sociais, no contexto em que estão inseridos.
Também argumentou que a entrevista pode ser utilizada juntamente com outras técnicas
de coleta de dados. Samra-Fredericks (2003) ratificou que estudos acerca das(os)
praticantes da estratégia que utilizam a técnica de entrevistas são importantes para a
compreensão de como eles desenvolvem a gestão estratégica.
Por meio da entrevista, portanto, o pesquisador instiga o relato das
experiências pessoais dos entrevistados, bem como a sua reflexão acerca delas, com o
objetivo de compreender os processos sociais implícitos contribuíram Finkel, Parra e
Baer (2008). Estes autores esclareceram também que é pertinente ter, antes da
realização das entrevistas, um roteiro com os principais temas da pesquisa, a fim de
facilitar a interação com o entrevistado. No entanto esse esquema não deve impor o seu
seguimento inflexível, ou seja: ele deve ser uma orientação somente para o ato da
entrevista.
O uso de entrevista, nesta tese, justifica-se também pelos seguintes
argumentos apresentados por Poupart (2008): de ordem epistemológica – ele afirma que
entrevista do tipo qualitativa é indispensável para que a investigação aconteça em
profundidade na perspectiva de seus atores sociais. Na ordem ético-política, a técnica
possibilita explorar, conhecer e compreender as condições de vida de seus atores para
denunciar os preconceitos sociais, discriminação, iniquidades de grupos considerados
vulneráveis. “O uso dos métodos qualitativos e da entrevista, em particular, foi e ainda
hoje é tido como um meio de dar conta do ponto de vista dos atores sociais e de
considerá-lo para compreender e interpretar as suas realidades” (POUPART, 2008, p.
216).
131
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Nesta pesquisa, entrevistamos, por meio de entrevista qualitativa, quatorze
gestoras(es), segmentadas(os) por nível hierárquico apresentado no organograma da IES
e sexo até que os dados foram saturados, ou seja: repetiram-se.
Figura 20: Organograma Unesc
Fonte: Dados da Pesquisa
A escolha das(os) entrevistadas(os) dentro do grupo de trabalho na IES foi,
primeiramente, com o objetivo de ter representantes em todos os níveis hierárquicos e
por sexo, a fim de que tivéssemos relato de experiência que possibilitasse apresentar o
132
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
processo estratégico. No entanto, em razão da saturação dos dados, a amostra por sexo
não foi cumprida. Na Figura 21, apresentamos a referida distribuição.
Figura 21: Distribuição Amostra para Entrevista Nível Hierárquico Feminino Masculino Total
1º Nível – Reitor, Pró-reitoras, Chefe de Gabinetes e
Assessores 1 2 3
2º Nível – Diretores e Coordenadores de UNA 1 1
3º Nível – Coordenadores de curso/setor/PPG e
gerêntes de departamento
4 2 6
4º Nível – Coordenadores de curso Lato sensu e de
setores
2 2
5º Nível – Supervisores de setores, cursos, clínicas e
laboratórios
2 2
Total 10 4 14
Fonte: Dados da Pesquisa
As entrevistas foram agendadas conforme a disponibilidade das(os)
entrevistadas(os) e aconteceram entre os meses de dezembro de 2014 a julho de 2015,
no próprio local de trabalho dos participantes. Nelas, as(os) participantes foram,
inicialmente, convidadas(os) a relatar a sua participação na revisão 2014 do fazer
estratégia da IES, porque o nosso objetivo não era realizar uma entrevista com
perguntas e respostas, mas fazer com que a(o) praticante da estratégia nos contasse, em
forma de uma narrativa, como se deu sua participação e da(os) demais estrategistas
nesse movimento. Acreditamos que, dessa maneira, ao mesmo tempo em que já
fazíamos uma espécie de filtro acerca do tema da entrevista, também propiciamos à(ao)
entrevistada(o), a reflexão sobre o assunto e, dessa forma, extraímos do relato o discurso
acerca da estratégia. Além disso, como as(os) entrevistadas(os) narraram sua
participação, acreditamos que a pesquisadora, dessa maneira, pode, de certa forma,
distanciar-se como participante do grupo gestor da IES e estar, naquele momento de
coleta dos dados personificada como pesquisadora.
Os relatos foram gravados com autorização das(os) entrevistadas(os) e
transcritos, literalmente, pela pesquisadora. A entrevista foi orientada no sentido de
133
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
levar as(os) praticantes a relatarem informações sobre os macro tópicos apresentados na
Figura 22, os quais orientaram a pesquisadora na condução da entrevista.
Figura 22: Tópicos da Entrevista Qualitativa
Fonte: Elaborada pela Autora
5.2.3.3 Análise Documental
Nas palavras de Valles (1997), a investigação documental se encontra nas
pesquisas, as quais tiveram suporte em documentos de diversos tipos que não
necessariamente foram produzidos para fins de pesquisa social. O autor incluiu, com
base em MacDonald e Tipton, além dos documentos escritos oficiais da administração
pública, tais como informes e estatísticas oficiais, periódicos da imprensa e documentos
internos das organizações, os documentos visuais, a saber: fotografias, pinturas,
esculturas e arquitetura. Para Godoy (2006), essa prática metodológica deve incluir todo
tipo de material escrito, desde textos da esfera jornalística, como registros internos da
organização como memorandos, relatórios, dentre outros.
Cellard (2008) defendeu que a análise documental tem aspectos positivos e
negativos. Como positivo, o fato de ela eliminar, pelo menos de forma parcial, as
influências do pesquisador; em contrapartida, nos documentos circulam informações em
sentido único, porque deles o pesquisador não poderá buscar informações
complementares, eles são estanques no sentido de que é necessário aceitá-los como são.
O autor apresentou detalhamento da seleção documental, o qual deve: iniciar pela
seleção de documentos pertinentes ao objeto de pesquisa; segundo, avaliar a
credibilidade desses documentos: o contexto global em que eles foram produzidos,
seu(a) autor(es), a autenticidade e credibilidade dos registros, bem como a natureza
deles, ou seja: a esfera em que ele está inserido.
Relato sobre o movimento estratégico na IES.
As vozes que influenciam no processo estratégico.
Processo decisório.
Percepção sobre valores específicos que possam influenciar a formação da estratégia.
Percepção sobre barreiras que possam inibir as(os) praticantes do fazer estratégia.
Relato sobre o movimento estratégico no setor.
134
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Para Rodríguez (2010), a pesquisa que envolve documentos deve seguir
quatro etapas: definir o marco teórico que norteará a pesquisa empírica; determinar a
operacionalidade da pesquisa, ou seja: trata-se da tradução dos conceitos teóricos em
indicadores empíricos; avaliar e selecionar os documentos a serem analisados; analisar e
interpretar os resultados.
O surgimento e a produção da prática discursiva, buscando o seu histórico e
contexto em que foi realizado está em consonância com uma das etapas da proposta
seminal de Knights e Morgan (1991), os quais esclareceram que é preciso perceber as
relações sociais, o contexto institucional, em outras palavras, as circunstâncias em que
as práticas discursivas são materializadas, a fim de compreendermos sua história.
Nesta pesquisa, analisamos os materiais utilizados nas reuniões do processo
de construção da estratégia, tanto os entregues impressos às(aos) praticantes nos
encontros, quanto os utilizados nas apresentações nas reuniões; o relatório da Comissão
Própria de Avaliação (CPA), livro Unesc: a trajetória de uma universidade
comunitária, relatório de atividades de 2014, os relatórios dos Planejamentos
Estratégicos anteriores com o objetivo de realizar a descrição do contexto histórico da
IES, bem como a sua prática estratégica atendendo, dessa maneira, ao objetivo
específico: resgatar o contexto histórico da IES com relação a sua prática estratégica.
Além dos relatórios de funcionários com respectiva formação e titulação acadêmica e
relatório das(os) gestoras(es) da Instituição com suas funções na Universidade, foi
utilizado o relatório do Unesc em números de 2014.
A fim de sintetizar as técnicas de coleta de dados, apresentamos na Figura
23, o propósito de cada técnica utilizada para buscar os dados da pesquisa.
Figura 23: Objetivos das Técnicas de Coleta de Dados
Técnicas de Coleta de
Dados
Propósitos
1. Observação Sistemática Dados para analisar as práticas discursivas e as questões de
gênero das(os) praticantes envolvidas(os) no fazer estratégia. 2. Entrevista qualitativa
3. Análise Documental Dados para descrever o contexto histórico da IES, bem como
o histórico do movimento do Planejamento Estratégico
Institucional.
Fonte: Elaborada pela Autora
135
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
5.3 ANÁLISE SEMIÓTICA DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS
Explicitado como se deu a coleta dos dados, passamos a detalhar como foi a
análise qualitativa deles. Vaara e Whittington (2012) enfatizaram que as pesquisas em
Estratégia como Prática Social têm trazido para os estudos da estratégia vieses de outras
áreas do saber, ampliando os contextos empíricos de pesquisa em estratégia,
promovendo, dessa maneira, novas metodologias. Considerando essa argumentação,
trazemos, portanto, a Semiótica peirceana – Peirce (2000) – como técnica de análise de
dados para a presente pesquisa, acrescida das contribuições de Knights e Morgan
(1991), de Vaara e Tienari (2008), de Vaara (2010).
Acreditamos, portanto, que cabe neste trabalho revisarmos, de forma
concisa, a Semiótica moderna, a qual teve base em duas propostas teóricas: I – linguista
Saussure, na Europa, que batizou sua ciência de Semiologia, a qual tinha por base
conceitos dicotomizados, com foco na linguagem verbal; II – filósofo Charles Peirce, na
América do Norte, que fundou a ciência de todos os signos, pautada nas três categorias
universais: Primeiridade, Secundidade e Terceridade e suas relações tríadicas,
focalizando as linguagens verbal e não-verbal.
Peirce empregou o termo phaneroscopia (fenomenologia) por volta de
1902, embora ele já aparecesse em seus estudos desde 1867, quando o autor apresentou
originalmente a sua teoria das categorias, a qual ficou completa em 1897. Em 1902,
deram-se, então, as chamadas categorias fenomenológicas, que passaram a ser a base
geral para a teoria lógica de Peirce (BRAGA, 1999; QUEIROZ, 2007; SANTAELLA,
1989; 2006). Peirce buscou elaborar sua doutrina de categorias fenomenológicas
universais, a qual possibilitaria estudar os fenômenos por meio de concepções simples e
universais, que, de tão simples e completas, pudessem ser aplicadas a qualquer assunto.
As categorias aristotélicas focalizavam mais a linguística, os estágios hegelianos eram
mais particulares e materiais, mas, ainda que a proposta do autor apresente certas
similaridades com os estágios de Hegel, Peirce, no entender de Santaella (1989; 2000),
dizia que seu estudo fora construído por meio das categorias Kantianas. O autor
entendia que Kant havia sido o primeiro a observar a existência das distinções
tripartidas (ou tricotômicas).
136
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Não há a pretensão de esgotar o assunto acerca das tricotomias, portanto,
focalizaremos, aqui, as três dimensões mais exploradas por Peirce, as quais embasaram
a técnica de análise semiótica utilizada neste trabalho: I – é o signo em si mesmo, uma
mera qualidade, algo concreto ou lei geral; II – é a relação existencial do signo com o
objeto, trata-se do caráter representativo do signo, como ele representa seu objeto; III –
interpretativo, representação do interpretante com o signo, efeito que signo produzirá na
mente do interpretante. Na Figura 24, apresentamos as relações entre os nove tipos de
signos.
Figura 24: Interdependências, Interações e Inter-relações
Categorias/
Tricotomias
Relação do signo com ele
mesmo – constituição do
signo.
Relação do signo com seu
objeto
Relação do signo
com seu
interpretante
Primeiridade quali-signo (uma qualidade) –
um sentimento anterior à
consciência, impressão,
sensação sem qualquer
referência a outra coisa.
ícone – representação do
signo com objeto pela
semelhança.
rema – signo de
possibilidade
qualitativa.
Secundidade sin-signo (um existente) –
inicia a consciência, as inter-
relações: um signo particular.
índice – o signo refere-se ao
seu objeto por meio de
alguma conexão natural,
existencial.
dicente – signo de
existência real.
Terceiridade legi-signo (uma lei) – signo
padrão de convenção.
símbolo – a relação se dá de
acordo com uma convenção
(regra, lei).
argumento – signo
interpretado como
um signo de lei.
Fonte: Elaborada a partir Santaella (2002), Queiroz (2007) e Merrell (2012)
Na Primeiridade, trata-se de perceber a consciência tal como ela é em
determinado momento, é a consciência imediata, corresponde ao acaso, à variação
espontânea, é o sentir puro. Trata-se das possibilidades e qualidades. Na Secundidade, é
a consciência reagindo em relação a uma realidade cotidiana, é a ação e reação a fatos
concretos, conflito, surpresa, dúvida, é a materialização da qualidade. É a percepção da
realidade em que interagimos.
Terceridade é a camada da inteligibilidade, por meio da qual interpretamos
o mundo, aproximação ou junção das duas primeiras categorias em uma síntese
intelectual. Trata-se do pensamento em signos, do crescimento contínuo, da mediação
ou processo. Queiroz (2007) complementou: primeiridade – apresentação do signo;
137
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
secundidade – representação do signo; e terceridade – poder interpretativo do signo.
Merrell (2012) sintetizou: primeiridade é qualidade, possibilidade; secundidade é efeito,
é atualidadade; terceridade é processo, é potencialidade ou necessidade.
Na relação do signo com ele mesmo, o quali-signo refere-se à pura realidade
sem representar nenhum objeto; sin-signo – Walther-Bense (2000) compreendeu que
significa o signo singular, individual, único – é qualquer coisa material, fato; o legi-
signo é todo tipo a natureza das leis, regras ou hábitos, convenções. No entender de
Morris (1976), Pignatari (2004) e Simões (2004), a Semiótica permite que a linguagem
seja geral e aplicável a qualquer signo e, por isso, aplicável à linguagem da ciência e aos
signos específicos que são usados na ciência, já que ela possibilita a pesquisa por meio
da leitura do mundo verbal e não-verbal.
Cabe ressaltar que a Semiótica é também utilizada como instrumento e
como método de investigação científica de outras ciências, uma vez que nada pode ser
investigado sem signos afirmaram Morris (1976), Carontini e Peraya (1979), Fidalgo
(1999), Santaella (1989, 2000, 2006). No dizer de Simões (2004), por meio da
Semiótica, a análise linguística ganha espaços interdisciplinares.
A partir de Semiótica peirceana, sistematizamos uma proposta de análise
semiótica a qual foi aplicada aos dados secundários e primários desta tese. Incluímos o
resgate do contexto histórico de Knights e Morgan (1991), das estratégias textuais de
Vaara e Tienari (2008), questões de gêneros, apontadas por Vaara (2010) e das análises
das funções sociais de uso das práticas discursivas, apontados por Vaara e Whittington
(2012), com o propósito de investigar o discurso89
das(os) praticantes, focalizando as
práticas discursivas e as questões de gênero. Apresentamos, na Figura 25, as etapas de
análise semiótica das práticas discursivas que foram utilizadas neste trabalho.
89
Adotamos o conceito de discurso de Foucault (2008). Para ele, os discursos, além de serem realizados
por meio de signos, são principalmente práticas imbuídas implicitamente por questões sociais, políticas e
históricas.
138
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 25: Etapas de Análise Semiótica das Práticas Discursivas
Categorias
peirceana
Etapas de
Análise Objetivos Características
Primeiridade Aproximação
fenomenológica
- Registrar a primeira
impressão acerca do
texto escrito ou oral,
bem como do
comportamento dos
atores.
Trata-se do primeiro contato com o
texto escrito ou oral e do
comportamento das(os) praticantes
sem realizar nenhum vínculo. É o
registro da primeira impressão,
trata-se de uma abstração.
Secundidade
Contexto
histórico
- Verificar o surgimento
e a produção da prática
discursiva.
Refere-se à contextualização do
momento de produção da prática
discursiva.
Análise
Linguística
- Mapear os micros
elementos textuais que
possam auxiliar na
construção do discurso
da estratégia.
É reação do pesquisador frente aos
significados possíveis em razão da
análise linguística.
Terceiridade Análise
discursiva
- Compreender como se
dá a prática discursiva
da estratégia
É a compreensão das práticas
discursivas individuais e sua
influência na organização.
Fonte: Elaborado pela Autora
Chamamos aqui de Aproximação Fenomenológica a etapa que está em
consonância com a Primeiridade da tríade peirceana, em que se tem o primeiro contato
com o texto verbal e/ou não-verbal. A primeira percepção da(o) interpretante, no caso
desta pesquisa, a pesquisadora, com relação ao signo, sem fazer nenhum vínculo dele –
interpretante – com seu objeto.
No segundo momento, intitulado de Contexto histórico, verificamos o
surgimento e a produção da prática discursiva, buscando o seu histórico e contexto em
que foi realizada. Esta etapa está em consonância com uma das etapas da proposta de
Knights e Morgan (1991)90
, os quais esclareceram que é preciso perceber as relações
90
Ao abordar especificamente o discurso da estratégia, Knights e Morgan (1991) defenderam que ele tem
o seu próprio histórico, incorpora modos particulares de ver as organizações, os indivíduos e as
sociedades. O discurso passa, então, a ser incorporado em determinados conjuntos de relações sociais,
com determinados efeitos de verdade. Os autores relataram que é preciso olhar especificamente para o
contexto institucional em que o discurso da estratégia se tornou identificável para entendermos sua
história.
Nas palavras deles, na época do estudo, o impulso para a articulação, expansão e utilização da estratégia
corporativa vieram dos Estados Unidos da América (EUA) e dois aspectos necessitam ser considerados:
primeiro – o surgimento de discurso de gestão em geral: os EUA tinham sido a fonte da maior parte do
pensamento inovador sobre a natureza do papel da gestão e das organizações desde Weber. Desde o final
do século XIX, houve uma simbiose de aprendizagem teórica e experimental sobre gestão e organizações
que haviam sido incorporados na emergente cultura escolar de negócio em universidades norte-
139
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
sociais, o contexto institucional, em outras palavras, as circunstâncias em que as
práticas discursivas são materializadas, a fim de compreendermos seu contexto
histórico.
Na análise linguística, mapeamos os micro elementos textuais que
pudessem auxiliar na construção das práticas discursivas da estratégia, tais como:
ambiguidades, vozes, pressupostos, implícitos e operadores argumentativos. Vaara e
Tienari (2008), em seu estudo, enfatizaram e confirmaram as estratégias textuais, por
meio dos micro elementos textuais, as quais possibilitam ver como os sentidos da
legitimidade são criados e manipulados na prática discursiva. Nesse sentido, Vaara
(2010)91
afirmou que, embora se tenha muita produção acerca da estratégia focalizando
a virada linguística, ainda há muito a ser estudado para termos uma abordagem
americanas. Ao contrário da Europa, onde as universidades foram distintamente separadas da indústria e
do mundo do trabalho.
Segundo – a mudança da natureza das corporações nos EUA no período pós-1945: o taylorismo foi
ramificando-se em toda a esfera da gestão da produção e planejamento da força de trabalho,
estabelecendo uma sequência entre políticos, gestores e acadêmicos nos EUA. Dessa maneira, ao final da
década de 1930, já havia nos EUA um poderoso discurso de gestão incorporado em um grande número de
práticas, materiais e grupos profissionais, preocupado com o controle da produção, o que era praticamente
inexistente no contexto europeu. No entanto, esse discurso desenvolvido nos EUA ainda não tinha gerado
um espaço livre para o discurso da estratégia corporativa.
91
Vaara (2010) utilizou uma visão multifacetada de discurso da estratégia por meio de três níveis de
análise em que, no metanível, examina-se a complexidade da estratégia como um corpo de conhecimento.
Neste nível, o autor defendeu que é importante concentrar a atenção nas lutas sobre as diferentes
concepções de estratégia, conceitos, práticas e métodos. No nível mesoeconômico ou organizacional, há a
possibilidade de alargar a nossa compreensão das narrativas de organização estratégica para melhor
entender:
Essas formações discursivas podem ser múltiplas, dependendo do contexto sociocultural e organizacional
em que estão inseridas. O plano micro possibilita refletir sobre as habilidades retóricas e táticas que são
usadas em conversas – formais e informais – sobre estratégia para promover ou resistir a pontos de vista
específicos.
O pesquisador sugeriu que, para melhor compreender a interconectividade dos diferentes níveis de
análise, é necessário estudar: I – produção do discurso estratégia: examinar como os textos de estratégia
são construídos, as ideias e conceitos vigentes na estrutura de criação, autoria, além de como as visões
conflitantes são materializadas no texto; II – textos de estratégia como gênero textual: saber sobre a
natureza dos textos de estratégia como um gênero específico da esfera empresarial, bem como seu poder
na elaboração e difusão da estratégia; III – recontextualização do discurso da estratégia: nela discursos
específicos são traduzidos, dando-lhes significados concretos e, também, criando novos. Trata-se de um
processo que possibilita compreender como as concepções institucionalizadas de estratégia atuam sobre a
difusão do discurso estratégico; IV – micro elementos linguísticos: analisar o uso dos pronomes como
expressões de consenso e conflito (nós ou eles), verbos (as formas ativas ou passivas na construção de
autoridade e ou para assumir a responsabilidade), modalidades ou o uso de expressões idiomáticas
específicas (como expressões militares, masculinas, dentre outras); V – as funções sociais de uso do
discurso estratégico: ampliar a compreensão das várias maneiras em que o discurso estratégico pode ser
usado em organizações ou da sociedade.
140
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
discursiva que possa auxiliar a nossa compreensão sobre estratégia. O autor propôs
cinco níveis de análise crítica das práticas discursivas da estratégia, o último deles
refere-se ao estudo das funções sociais de uso do discurso estratégico, incluindo
questões de gênero.
Para ratificar a junção, na análise das práticas discursivas, das temáticas
EPS e gênero, trazemos Vaara e Whittington (2012) que propuseram realizar a análise
crítica das práticas tomadas como certas, problematizando-as. Nesse contexto, a
temática acerca de gênero precisa de atenção, conforme pontuaram os autores, porque a
gestão estratégica parece promover valores masculinos por meio das práticas que
passam despercebidas, logo é relevante verificar como tais valores são incorporados no
discurso estratégico, influenciando o comportamento dos demais atores. Esse argumento
também foi defendido por Whittington, Cailluert e Yakis-Douglas (2011), os quais
justificaram que o gênero influencia as mudanças dentro das organizações e, por isso, as
pesquisas devem abordar praticantes e práxis.
Portanto, no contexto histórico e análise linguística, estão incluídos na
Secundidade apontada por Peirce, porque é a reação entre o que é visto e o consciente
da(o) interpretante reagindo ao que está posto. Nas palavras do autor: trata-se da relação
marcada pela reação/conflito diante do que a consciência imediata reconhece da
materialização da qualidade.
Dentro da análise da prática discursiva, com o objetivo de buscar
compreender as questões de gênero das(os) praticantes na práxis, há a junção da
primeridade com a secundidade, o que resulta na terceridade proposta por Pierce e
materializada no Capítulo 6 desta tese. Nela, a nossa consciência supõe o que é algo
existente, trata-se do signo e seu objeto e do signo com sua(eu) interpretante, refere-se
ao processo de mediação interpretativa.
Ao focalizar as práticas discursivas verbal e não-verbal oriundas das três
técnicas de coleta de dados, a saber: observação sistemática, entrevistas e dados
secundários, primeiramente a pesquisadora realizou o registro da primeira impressão
sem nenhuma relação ainda contextual, ou seja: foi a anotação do primeiro contato com
o texto, do que a pesquisadora viu emergir dele – relaciona-se à primeiridade, bem
como acerca do comportamento das(os) praticantes envolvidas(os) no fazer estratégico.
141
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Dito de outra forma: nesta etapa a pesquisadora não fez nenhuma coneção dos dados
com as possíveis relações.
Quanto à secundidade, verificamos a influência do contexto histórico e dos
micro elementos textuais na prática discursiva apresentada. Registramos o contexto da
IES, com base na pesquisa documental, e depois verificamos o que havia de relação
desse contexto com os dados primários. Ainda na secundidade, destacamos nos dados
ambiguidades, pressupostos e relações argumentativas – análise linguística – que
destacaram algum efeito na reação do interpretante – pesquisadora – com o dado. Cabe
justificar que não verificamos os implícitos, ficando no plano do pressuposto para não
sai do escopo apresentado nos dados.
Da somatória dessas duas análises, sucedeu a terceridade, em que
agregamos a interpretação do texto propriamente dita. É o produto final da consciência
da pesquisadora – interpretante – com relação à reação a sua primeira impressão.
Refere-se à mediação interpretativa. Pelo exposto, na análise semiótica realizada neste
trabalho, no próximo capítulo, apresentamos os resultados relativos à terceridade. A
Figura 26 ilustra como foi organizada a análise semiótica das práticas discursivas, seja
ele verbal ou não-verbal.
Figura 26: Representação da Análise Semiótica
Fonte: Elaborada pela Autora
A análise semiótica explanada acima foi realizada com os dados resultantes
das observações dos encontros estratégicos, das entrevistas e, também, da análise
documental. Os resultados obtidos são ratificados, no capítulo seguinte, com fragmentos
dos dados obtidos por meio das técnicas de coleta utilizadas. A fim de indentificá-los,
apresentamos a legenda após cada parte apresentada, a saber: na primeira casa,
142
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
identificamos o número que equivale à(ao) participante ou do documento analisado; na
segunda casa, as letras representam a origem da(o) praticante: área acadêmica, área
meio, consultoria ou se é texto; por fim, na terceira casa da legenda, indicamos qual foi
a técnica de coleta dos dados: entrevista, observação ou análise documental, conforme
detalhado na Figura 27.
Figura 27: Legenda Dados Localização Símbolo Representação
Primeira casa Números Naturais Praticantes
Segunda casa
A Área Acadêmica
P Área Meio
C Consultoria
T Texto
Terceira casa
E Entrevista
O Observação
AD Análise Documental
Fonte: Elaborada pela Autora
Cabe ressaltar que, quando for possível, por meio da informação da primeira
casa identificar a(o) entrevistada(o) – praticante do processo estratégico, utilizaremos “-
--” nos fragmentos, com o objetivo de não tornar pública a autoria do discurso.
143
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 6
ESTUDO DE CASO – UNESC
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – homens e
mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.”
(CONSTITUIÇÃO FEDERAL – 1988, Art. 5º)
144
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Sistematizamos este capítulo em quatro grandes segmentos, os quais estão
em consonância com o delineamento da pesquisa – apêndice. O primeiro, por meio da
análise documental, com o propósito de responder ao objetivo de resgatar o contexto
histórico-social da IES e de sua prática estratégica. Dessa maneira, o leitor desta tese
poderá conhecer os fatos históricos e sociais da Instituição estudada relacionados ao
fazer estratégia.
Nos segmentos seguintes, apresentamos a análise semiótica dos resultados,
os quais são oriundos dos dados coletados por meio das entrevistas qualitativas,
observação sistemática e, também, dos dados secundários dos registros da IES. O
segundo bloco, por meio do qual buscamos identificar e analisar as práticas discursivas
na formação da estratégia da Instituição, está dividido em duas etapas: na primeira,
trouxemos as vozes que emergiriam nas práticas discursivas que impactaram no fazer
estratégia; na segunda, os processos decisórios realizados pelas(os) estrategistas na
construção da estratégia na perspectiva das(os) praticantes. No terceiro segmento,
visamos responder ao objetivo de verificar quais fatores – à luz da EPS, com a
contribuição de Foucault, acerca do conceito de poder – influenciaram a formação da
estratégia na Universidade, os quais intitulamos como poder: cultura organizacional; e
poder: política institucional.
No início da tese – primeiro capítulo, apresentamos o que chamamos de
conjecturas – que seriam uma espécie de inferência, baseadas na literatura sobre o tema,
as quais nortearam a pesquisadora ao longo da pesquisa a fim de serem validadas ou não
com os resultados obtidos. Essas conjecturas, no Design da Pesquisa – apêndice, estão
articuladas aos objetivos específicos, construtos teóricos e categorias inicialmente
pensadas para a pesquisa. Para os três primeiros segmentos, portanto, tínhamos como
conjectura inicial que: As práticas discursivas explicitam vozes e fatores que impactam
relevantemente no fazer estratégia da Universidade.
No quarto e último segmento deste capítulo, tratamos das questões de
gênero, com foco na divisão sexual do trabalho, por meio da análise, em seções
específicas, das funções ocupadas e níveis hierárquicos das(os) estrategistas, as quais
são áreas de; atuação das(os) gestoras(es): atuação na Instituição: acadêmica e meio;
conhecimento – utilizamos a divisão adotada pela Instituição em quatro áreas do saber;
e a questão da hierarquia, no caso aqui estudado, a titulação das(os) estrategistas, por ser
145
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
uma Universidade, cuja regulamentação salarial das(os) gestoras(es) docentes é pela
titulação.
Neste Bloco, o objetivo foi de interpretar as questões de gênero
materializadas por meio da divisão sexual do trabalho, considerando os princípios da
separação (há trabalhos que são masculinos e outros femininos) e da hierarquia
(trabalho masculino é mais valorizado que o feminino) nas práticas discursivas no fazer
estratégia. A relação entre gênero e divisão sexual do trabalho se dá pelo fato de que o
primeiro se realiza nas relações sociais (des)iguais de poder entre as mulheres e homens,
em que para as primeiras cabe o trabalho reprodutivo, o cuidado dos filhos, o trabalho
doméstico não ou sub remunerado. Esse cenário do gênero da dimensão privada se
apresenta de maneira semelhante quando as mulheres acessam à esfera produtiva,
produzindo assim, a divisão sexual do trabalho.
Para tanto, acerca das questões de gênero pontuadas, temos como conjectura
que: apesar dos avanços acerca das questões de gênero e de a Instituição ser uma
universidade, ou seja: área da educação, nela se reproduz o cenário de feminização de
organizações de outras áreas de atuação.
Portanto, nas seções seguintes deste capítulo, apresentamos a análise dos
tópicos expostos acima, conforme o detalhamento acerca da análise semiótica
apresentado na seção 5.3.
6.1 CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL E PRÁTICA ESTRATÉGICA DA
INSTITUIÇÃO ESTUDADA
O propósito, nesta seção, é, por meio da análise documental, primeiramente
resgatar o histórico92
da IES com o objetivo de descrever brevemente o seu contexto
histórico. Concomitantemente, contextualizamos a Instituição acerca de seu processo
estratégico, a partir do momento identificado como um processo formal, que foi o ano
de 1999 até 2014 – ano corte desta pesquisa. Knights e Morgan (1991) relataram que é
preciso olhar especificamente para o contexto institucional em que o discurso da
92
O livro Unesc: a trajetória de uma universidade comunitária, escrito por João Batista Biterncourt,
contextualiza o período que antecedeu a criação da Fucri até a sua transformação para Universidade e a
década de 1990. Relata o contexto histórico e político da época.
146
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
estratégia se tornou identificável para entendermos sua história. Na Figura 28,
apresentamos a síntese da linha do tempo da IES. Na parte superior estão expressos, do
ponto de vista estratégico, os maiores momentos histórico-sociais vividos na Instiuição.
Na parte inferior a respectiva missão institucional que cada período estava ancorado.
Essa linha do tempo é detalhada nos parágrafos seguintes.
Figura 28: Linha do Tempo
Fonte: Dados da Pesquisa
Por quase um século, a cidade de Criciúma foi o centro da economia sul-
catarinense, em razão da extração do carvão mineral, que chegou a gerar quase 11 mil
empregos diretos na década de 1980. Nesse contexto, a Fundação Educacional de
Criciúma (FUCRI)93
foi instituída pelo Poder Público Municipal, concretizando um
desejo que nasceu da participação comunitária na busca coletiva pelo atendimento às
necessidades regionais. Segundo Volpato (2011, p. 9), no prefácio da obra Unesc: a
trajetória de uma universidade comunitária, a Fucri foi criada “[...] como resultado de
um movimento da sociedade civil organizada para satisfazer uma necessidade regional:
oportunizar Ensino Superior a centenas de jovens da região que ou buscavam a capital
93
Texto parcial extraído do Relatório CPA 2014.
147
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
dos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul para estudar [...].” A Figura 29
apresenta a primeira sede administrativa da então Fucri, no centro de Criciúma.
Figura 29: Primeira Sede Administrativa Fucri
Fonte: Bitencourt (2011, p. 59)
A primeira escola de Ensino Superior, criada em 1970, foi a Faculdade de
Ciências e Educação de Criciúma (Faciecri), com os cursos de Matemática, Desenho,
Ciências e Pedagogia; e, nos anos seguintes, criaram-se: a Escola Superior de Educação
Física e Desportos (Esede), em 1974, com o curso de Educação Física; Escola Superior
de Tecnologia (Estec), com o curso de Engenharia de Agrimensura; Escola Superior de
Ciências Contábeis e Administração (Escca), em 1975, com os cursos de Ciências
Contábeis e Administração empresarial e hospitalar. Mas, a Instituição continuava a
expandir seus cursos visando criar outras escolas. Bitencourt (2011, p. 68) relatou que
“[...] ainda no ano de 1973, entrou com o processo [...] requerendo a autorização para o
funcionamento dos cursos de Letras e Estudos Sociais [...].” Em 1978, os cursos de
Letras com habilitação em Português e Inglês, Estudos Sociais com habilitação em
Moral e Cívica passaram a ser oferecidos pela Faciecri.
Quanto a sua gestão, até o ano de 1986, a então Fucri tinha seus dirigentes
de maior nível hierárquico indicados pelo Poder Público Municipal. Em 1987, obteve a
aprovação de mudanças em sua estrutura organizacional, garantindo a autonomia na
148
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
escolha de seus gestores. Bitencourt (2011, p. 125) expôs que os alunos reivindicaram
por meio de manifestações, em 1983, eleições diretas para o principal gestor da
Instituição. Após isso, foram várias as ações dos prefeitos daqueles anos, no sentido de
tentar organizar e regulamentar tal assunto.
O jogo de disputa pelo comando da Fucri revela as imbricadas relações
políticas em torno dela. Mesmo com inúmeros problemas, era ela uma vitrine
política e controlá-la era uma demonstração de poder que gerava prestígio,
alimentando e sustentando poderes. As disputas pelo Judiciário, com
liminares, mandados de segurança e ações de reintegração transcorriam a
passos lentos.
Em 19 de abril de 1991, foi assinado, por dezenove prefeitos municipais do
Sul do estado, o protocolo de intenções de transformar as unidades de Ensino Superior
em Unesc. Bitencourt (2011, p. 136) esclareceu que “[...] o evento é bastante ilustrativo
da realidade vivenciada pela instituição e da renovação por ela pretendida naquele início
de década. Por outro lado, a assinatura do protocolo respondia à cobrança social e, mais
especificamente, da comunidade acadêmica, quanto à transformação em universidade.”
A conquista da União das Faculdades de Criciúma (Unifacri) – cuja
mantenedora era a Fucri e englobou Faciecri, Estec, Escca e Esede, com regimento
aprovado pelo Parecer n. 256, de 24/09/91, do Conselho Estadual de Educação de Santa
Catarina – CEE/SC – foi, portanto, marco fundamental para a Instituição e a região Sul
catarinense. A partir disso, iniciou o processo de discussões internas, durante três anos,
sobre formas de agrupar os cursos então existentes, de modo a criar uma estrutura pré-
universitária. Essa nova estrutura permitiu que a Instituição ampliasse sua visão quanto
a sua função no Ensino Superior e, sobretudo, acerca de sua inserção no contexto
regional.
Seguindo ao encontro dos objetivos a que se propôs, a Instituição, por meio
de seu então diretor-presidente, na sequência, em Brasília, protocolou a carta-consulta
no Conselho Federal de Educação. Dessa maneira, tiveram-se, nas palavras de
Bitencourt, passos concretos em direção à Unesc. Em 1993, quando o Conselho
Estadual da Educação de Santa Catarina (CEE/SC) aprovou o processo de Carta-
Consulta para a transformação da Unifracri em Universidade, por meio do
reconhecimento – o que tornava essa transformação inicialmente provisória –, delegou
149
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
competência ao Conselho Estadual de Educação, que, pela Portaria 04/93, constituiu a
Comissão Especial de Acompanhamento da transformação para universidade.
Foram anos de muito trabalho e avaliação constante, a fim de atender aos
requisitos para a transformação. Esse processo de avaliação e acompanhamento foi
concluído em 17 de junho de 1997, em sessão plenária do CEE/SC, que aprovou por
unanimidade as conclusões apresentadas pelo conselheiro relator e acompanhadas pela
Comissão de Ensino Superior.
Por meio da Resolução n. 35/97/CEE-SC, datada de 16 de outubro de 1997
e publicada no Diário Oficial de SC, n. 13.795, de 04/11/97, a Universidade do Extremo
Sul Catarinense (Unesc) foi reconhecida com o campus de Criciúma, tendo como
finalidade a produção, preservação e disseminação do conhecimento, por meio de ações
voltadas ao ensino, à pesquisa e à extensão. A caravana que foi à plenária no CEE foi
recebida em Criciúma com festa pela conquista da transformação da então Fucri em
universidade, conforme ilustram as fotos abaixo.
Figura 30: Registro das Comemorações
Fonte: Bitencourt (2011, p. 148-149)
A missão da Instituição, embora concebida há mais de uma década, foi
somente divulgada amplamente após a transformação para Universidade. A sua
elaboração resultou de um processo interativo, entre diretores, coordenadores,
professores e acadêmicos de diversas áreas, que resultou em: Promover o
desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida. O fato de a
Unesc estar inserida em uma região altamente degradada, em razão da extração
desenfreada do carvão, sem a preocupação com a preservação ambiental da região teve
impacto na definição de sua Missão na época. Dessa maneira, a Instituição direcionou
150
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
suas ações para esse fim, com o propósito de contribuir para transformar a realidade em
que estava inserida.
Reconhecida de fato como Universidade Comunitária, a Unesc não possui
finalidade lucrativa e reinveste todos os resultados na própria atividade educacional.
Trata-se de instituição de Ensino Superior criada e mantida pela sociedade civil. A
Universidade passou a ter a condição de comunitária reconhecida de direito a partir da
publicação, em novembro de 2013, da Lei 12.881 – Presidência da República,
conhecida como Lei das Comunitárias.
Ao analisarmos o contexto histórico-social da Instituição, percebemos que
ela vem demonstrando a preocupação com o processo democrático, bem como com a
dimensão ambiental. Acreditamos que esses fatores se dão em razão, respectivamente,
de ser uma Instituição comunitária, sem fins lucrativos, cujo dono é a sociedade por
meio do Poder Público Municipal, e, por isso, suas decisões são pautadas no processo
democrático e participativo.
Cabe salientar também que, estrategicamente, a Instituição explicitou seu
desejo de contribuir regionalmente, ou seja: já se colocou não como uma organização da
cidade de Criciúma, mas sim, para atender à grande região de Criciúma, ficando claro
esse seu compromisso em sua missão: Promover o desenvolvimento regional para
melhorar a qualidade do ambiente de vida, certamente por meio do fator de sucesso:
formação humana e profissional de qualidade. Percebemos, portanto, ser uma
Universidade que já nasceu com o compromisso de formar profissionais, mas também
cidadãos que vão ter um olhar diferenciado para as questões ambientais.
A questão ambiental está materializada também em sua logomarca, por
meio da utilização dos dois tons de verde. Também o tripé: ensino, pesquisa e extensão
é materializado na logomarca adotada, na qual, segundo memorial descritivo94
, o círculo
representa a totalidade e traz a verdade em sua inteireza, como manifestação de todas as
áreas do conhecimento humano. O vermelho representa a vida em sua totalidade. As
três pontas constituem o tripé: ensino, pesquisa e extensão. Os dois tons de verde
indicam que as ações dessa trilogia estão voltadas para as questões ambientais,
conforme ilustra a Figura 31.
94
Memorial descritivo escrito por João Batanolli. Disponível em:
http://www.unesc.net/portal/capa/index/91/5086/. Acesso em 21 de julho de 2015.
151
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 31: Logomarca Institucional
Fonte: Dados da Pesquisa
A Unesc foi, desde o final da década de 1990, expandindo sua atuação e
suas ações com novos cursos de Graduação e Pós-graduação Lato sensu e Stricto sensu,
nas diferentes modalidades e áreas, articulados com a pesquisa e a extensão, os quais
compõem o tripé universitário. Além disso, direcionou seus esforços para empreender e
disseminar outras ações, programas e projetos que concretizassem sua finalidade, seus
objetivos e sua Missão como Universidade comunitária, ilustrados na Figura 32.
Figura 32: Registro das Ações Comunitárias
Fonte: Bitencourt (2011)
As imagens acima ilustram a participação da Instituição na comunidade. A
primeira delas (preto e branco) refere-se à solenidade de abertura do Hospital Regional
de Araranguá, sob a gestão da Fucri, em 1995. A segunda trata da inauguração do
Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas, em seis de maio de 1999. A última
foto é da primeira turma de formandos na Universidade Alternativa, final de 1995. Este
projeto tinha como objetivo demonstrar que não há limite de idade para a aprendizagem,
segundo Bitencourt (2011).
O processo estratégico formal da Unesc localizado neste trabalho indica que
ele iniciou em 1999, com a constituição de um grupo de planejamento composto por
profissionais de várias áreas da Instituição. Buscou, principalmente, adaptar a
Universidade ao novo contexto do ensino, da pesquisa e da extensão, exigido pela sua
mudança de status de faculdade para universidade em 17 de junho de 1997.
152
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
A primeira edição do processo estratégico focalizou a promoção do
desenvolvimento regional e na melhoria da qualidade do ambiente de vida, inserindo o
tripé: ensino, pesquisa e extensão. Cada etapa de trabalho foi inicialmente discutida
entre os integrantes do grupo e, posteriormente, validada em assembleia, a qual foi
composta por diversos professores e funcionários da Instituição, além de um facilitador
que conduziu o processo estratégico. Foram definidos o Negócio, a Missão, objetivos e
metas até 2002, e os seguintes Fatores-chave de Sucesso:
Formação humana e profissional de qualidade
Qualidade no ambiente de vida
Gestão participativa
Sustentabilidade econômico-financeira
Excelência em marketing institucional
Ao realizar a análise semiótica do breve contexto histórico-social da
Instituição e de seu processo estratégico, ficou explícito que a Instituição, ao ampliar
seu portifólio de cursos em razão da migração para universidade, sentiu a necessidade
de planejar formalmente o seu futuro, por meio da adoção da metodologia do
planejamento estratégico. Desde o formato da construção do planejamento estratégico, o
qual privilegiou ser participativo, já que houve a discussão entre os pares e socialização
em assembleia, a fim de estar em consonância com seus princípios, também foi
materializado como fator de sucesso (trata-se dos fatores que proporcionam diferenciais
no nicho de mercado em que a instituição estiver inserida), a gestão participativa, a fim
de atender a sua essência comunitária e democrática.
No sentido de atender à transformação de faculdade para universidade,
havia a necessidade de consolidar o tripé: ensino, pesquisa e extensão, fazendo com que
incluísse isto claramente em sua missão institucional: Promover, por meio do ensino, da
pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do
ambiente de vida. Mantendo, ainda, o cenário regional como seu foco de atuação e
reconhecimento.
O segundo momento formal do processo estratégico, revisão de 2002,
iniciou nos dias 5 e 6 de novembro e 12 e 13 de dezembro de 2002, quando se reuniram
Reitor, Pró-reitoras(es) com suas(eus) dirigentes de áreas para identificar as principais
realizações e limitações da Unesc, com o objetivo de planejar a Instituição para o
153
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
período 2003/2006, partindo da análise dos ambientes. Também participaram desta
revisão as(os) coordenadoras(es) de curso em seis de fevereiro de 2003.
A próxima revisão iniciou no final de 2005, com a aplicação de pesquisa a
quatro grupos, a saber: 1 – vinte e seis gestoras(es); II – vinte e um docentes; III – vinte
e um discentes; e IV – quinze funcionárias(os). Com base nos resultados desta pesquisa;
em março de 2006, a Lobo e Associados apresentou a Matriz SWOT, construída
priorizando os 10 itens em cada uma das forças, fraquezas, oportunidades e ameaças
pelos participantes do planejamento.
Logo, com o objetivo de aperfeiçoar ainda mais suas atividades em favor de
maiores conquistas na concretização de sua Missão e finalidades, em 2006 foi elaborada
e implantada, em 2007, uma nova estrutura administrativa na Unesc, operacionalizando
uma proposta que foi discutida coletivamente e alicerçada em dois princípios
fundamentais:
1) Excelência nas atividades de ensino, pesquisa e extensão: entendida
como qualidade superior, devendo ser priorizada a partir dos objetivos e metas
estabelecidas no Projeto Pedagógico Institucional, Planejamento Estratégico, entre
outros.
2) Gestão compartilhada, participativa e descentralizada, permitindo que a
comunidade acadêmica esteja mais envolvida nas decisões institucionais, e que as várias
instâncias executivas ou acadêmicas possam ter uma maior autonomia dentro dos
limites de sua competência.
Além desses dois eixos do programa de gestão, entendeu-se que deveriam
ficar garantidos, na forma e na concepção estrutural, alguns princípios básicos em
relação às decisões acadêmicas e administrativas, ao equilíbrio entre ensino, pesquisa e
extensão e à prevalência do Acadêmico sobre o Administrativo de forma sustentável.
Dentro desses princípios, sua Missão foi rediscutida e reformulada de
maneira a incluir o tripé: ensino, pesquisa e extensão, a fim de materializar seu
comprometimento de ser universidade: Educar, por meio do ensino, pesquisa e
extensão, para promover a qualidade e a sustentabilidade do ambiente de vida.
Essas reavaliação e reformulação se estenderam, por consequência, ao
Estatuto (Resolução 01/2006/CSA95
) e Regimento Institucionais (Resolução
95
Página da Secretaria dos Conselhos. Disponível em: http://www.unesc.net/portal/capa/index/94/3376/
154
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
01/2007/CSA3). Nesse sentido, e conforme o Art. 7º do Estatuto, a Unesc deve
desenvolver suas atividades universitárias, visando atingir às seguintes metas:
Promover a educação integral, a profissionalização e a formação do
cidadão.
Desenvolver Ciência, Arte, Cultura, Tecnologia e Inovação em benefício
da sociedade.
Promover a preservação do meio ambiente e a valorização de relações
humanas que visem ao desenvolvimento sustentável da sociedade.
Socializar os conhecimentos gerados na Universidade, por meio de
programas e projetos comunitários, cursos e serviços.
Criar, promover e disseminar, inclusive por meio de televisão,
radiodifusão, e outros meios de comunicação, a cultura, em suas diferentes
modalidades, disponibilizando-a a toda sociedade, respeitando e valorizando as
características regionais.
Exercer a criticidade em relação a si própria e ao contexto onde está
inserida, participando da formação e orientação da opinião pública.
Buscar a excelência nos serviços prestados.
Ao comparar a formulação de 1999, as revisões parciais realizadas em 2002
e 2005, e com a reforma administrativa de 2007, constatamos uma mudança estratégica
na missão institucional que declina do desenvolvimento regional deixando em aberto
essa delimitação, bem como o foco passa a ser cumprir a sua atividade fim, o seu
objetivo maior que é a educação, no caso, por meio do ensino, pesquisa e extensão.
Também passa a ter um dimensionamento muito maior uma vez que não visa mais
melhorar, mas sim, promover a qualidade, e esta articulada com a sustentabilidade, ou
seja: não adianta ter qualidade se não for sustentável. A missão claramente amplia o
propósito da Instituição, além do que não delimita mais a sua participação geográfica
que, até então, era regional.
Além disso, verificamos que a Instituição não perdeu sua essência com o
compromisso com a formação profissional e humana de seus acadêmicos, sua
inquietação com relação à questão ambiental e internamente com a gestão participativa,
embora estejam explicitadas de forma diferentes, agora por meio de metas ou princípios.
No entanto chamou a atenção a tensão materializada pela necessidade de estar posto que
155
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
a gestão deve ter como princípio básico no processo decisório a prevalência do
Acadêmico sobre o Administrativo de forma sustentável. Remete-nos a uma disputa de
poder entre as duas áreas de atuação na Instituição.
Portanto, em 2007, a Universidade passou a ter uma nova estrutura de
gestão, segmentando os cursos em quatro áreas do conhecimento: Unidade Acadêmica
Ciências, Engenharias e Tecnologias (UNACET), Unidade Acadêmica Ciências Sociais
Aplicadas (UNACSA), Unidade Acadêmica Humanidades, Ciências e Educação
(UNAHCE) e Unidade Acadêmica Ciências da Saúde (UNASAU). Dentre outras
mudanças, foi implantada a Coordenadoria de Planejamento e Desenvolvimento
Institucional (CPDI). Entre suas atribuições, estava a condução do planejamento
estratégico da Instituição.
Foi aprovado pela Reitoria, em dezembro de 2007, o cronograma de
atividades para a revisão do Planejamento Estratégico 2008, com as seguintes etapas: 1
– Avaliação da Missão, princípios e valores da Unesc; 2 – Discussão da Visão do
Futuro da Unesc; 3 – Avaliação das competências essenciais da Unesc; 4 – Fatores
críticos de sucesso da Unesc (FCS); 5 – Análise SWOT96
(Estratégias Institucionais); 6
– Análise e definição das ações; 7 – Apresentação dos planos de ação; 8 – Reuniões
mensais de acompanhamento.
O grande grupo do Planejamento Estratégico Institucional foi composto por
cinquenta integrantes de diversas áreas da Universidade privilegiando a gestão
participativa e democrática. A revisão do planejamento estratégico institucional esteve
ancorada, em todas as suas etapas, nos seguintes eixos propostos pela Câmara de
Administração e Finanças (Parecer 03/2007):
Qualidade da Educação (Pesquisa, Ensino e Extensão) e dos demais
serviços prestados pela Instituição;
Sustentabilidade Financeira da Instituição;
Desenvolvimento Humano;
Melhoria da Gestão Institucional.
A Missão da Unesc, estabelecida em seu Estatuto, conforme Resolução Nº
01/2006/CSA, Seção I, é: Educar, por meio do ensino, pesquisa e extensão, para
96
A sigla SWOT significa: Forças (Strengths), Fraquezas (Weaknesses), Oportunidades (Opportunities) e
Ameaças (Threats). No Brasil, também é chamada de FOFA.
156
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
promover a qualidade e a sustentabilidade do ambiente de vida. Essa missão foi
reavaliada, no entanto, o grupo entendeu que ela deveria ser mantida, pois ainda
permanecia a mesma ênfase na Instituição. Quanto aos seus Princípios, eles foram
reavaliados e o grupo aprovou, em reunião específica no dia 28 de março, no
miniauditório do Bloco P, na Unesc, a seguinte redação para os Princípios e Valores
Institucionais.
Na gestão universitária, buscamos:
Gestão democrática, participativa, transparente e descentralizada.
Qualidade, coerência e eficácia nos processos e nas ações.
Racionalidade na utilização dos recursos.
Valorização e capacitação dos profissionais.
Justiça, equidade, harmonia e disciplina nas relações de trabalho.
Compromisso sócio-ambiental.
Respeito à biodiversidade, à diversidade étnico-ideológico-cultural e aos
valores humanos.
Nas atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão, primamos por:
Excelência na formação integral do cidadão.
Universalidade de campos de conhecimento.
Flexibilidade de métodos e concepções pedagógicas.
Equilíbrio nas dimensões acadêmicas.
Inserção na comunidade.
Como profissionais, devemos:
Ser comprometidos com a missão, princípios, valores e objetivos da Instituição.
Tratar as pessoas com atenção, respeito, empatia e compreensão.
Desempenhar as funções com ética, competência e responsabilidade.
Fortalecer o trabalho em equipe.
Ser comprometidos com a própria formação. (6 T AD)
Também foram aprovadas, nesta reunião: a Visão de Futuro da Unesc: Ser
reconhecida como uma Universidade Comunitária, de excelência na formação
profissional e ética do cidadão, na produção de conhecimentos científicos e
tecnológicos, com compromisso socioambiental e a Competência Essencial da
Universidade: Universidade Comunitária, comprometida com a sociedade, com gestão
democrática e participativa, que busca formar com qualidade, profissionais e cidadãos.
Verificamos que os princípios foram abertos em três dimensões: na gestão;
no ensino, pesquisa e extensão e, como profissionais, no entanto, o que percebemos é
que as questões essenciais permaneceram as mesmas, mas são ratificadas por outros
157
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
princípios e valores com o propósito, possivelmente, de fortalecê-los diante das
comunidades interna e externa. Nas diretrizes institucionais, por meio da Visão de
Futuro e da Competência Essencial, passa a ser explicitada a condição de universidade
comunitária, o que até então se apresentava de forma implícita por meio dos princípios e
metas apresentadas em outras edições do planejamento. Essa concretização sugere que a
Instituição deseja mostrar-se mais como comunitária, possivelmente como um
diferencial, e que deveria ser reconhecida pelas suas ações como uma Universidade
Comunitária – esse posicionamento sugere uma mudança de direcionamento estratégico
por parte da Unesc.
Também no Estatuto da Unesc, assim como em seu Projeto Pedagógico
Institucional (PPI)97
e Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI)98
, fica evidenciado
como os objetivos da Universidade se refletem de forma articulada com a sua missão e
princípios e valores, os quais se concretizam na prática pela articulação do ensino,
pesquisa, extensão e a prestação de serviços.
A revisão 2010 partiu da análise dos ambientes, mantendo as definições
organizacionais validadas na revisão de 2008. Teve, portanto, como objetivo, realizar
diagnóstico participativo avaliando os ambientes interno – pontos fortes e pontos fracos;
e externo – oportunidades e ameaças, a fim de traçar os objetivos estratégicos e suas
respectivas ações para o ano de 2010, revisando, assim, parcialmente o Planejamento
Estratégico Institucional (PEI). O grupo do planejamento foi composto por setenta e
nove gestoras(es) dos diversos órgãos de apoio, bem como as(os) coordenadoras(es) de
curso da Instituição. Os trabalhos iniciaram com a análise do cenário atual, informações
sobre os ambientes externo e interno para subsidiar o trabalho em grupo, com o objetivo
de que os participantes reavaliassem o novo ambiente, por meio dos pontos fortes,
pontos fracos, oportunidades e ameaças utilizando o método brainstorming.
Por meio do Edital n. 1, datado de 14 de agosto de 2012, publicado pela
Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres), a Unesc protocolou
processo para migração do Sistema Estadual de Educação para o Sistema Federal de
Ensino. As exigências do MEC foram atendidas em duas etapas: os documentados
apresentados foram analisados no primeiro ano e, ao final do ano de 2013, foram
97Aprova o PPI da UNESC. Disponível em www.unesc.net/portal/resources/documentosoficiais/7722.pdf 98
Aprova PDI da Unesc. Disponível em
www.unesc.net/portal/resources/documentosoficiais/4501.pdf?1285963734
158
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
solicitadas outras informações e registros da Instituição. Foi, em oito de agosto de 2014,
emitido parecer favorável pelo Ministério da Educação, Secretaria de Regulação e
Supervisão da Educação Superior, Diretoria de Política Regulatória (DPR) e
Coordenação-Geral de Legislação e Normas da Regulação e Supervisão da Educação
Superior (GLNRS) para o processo de migração e, na sequência, solicitação de abertura
do processo de recredenciamento da Universidade pelo Sistema Federal.
A Unesc, em 2014, ofertou cinquenta e seis cursos alocados em quatro
Unidades Acadêmicas: de Humanidades, Ciências e Educação; Engenharias e
Tecnologias; Saúde; e Ciências Sociais Aplicadas. São cinco mestrados: Ciência e
Engenharia de Materiais, Ciências Ambientais, Ciências da Saúde, Desenvolvimento
Socioeconômico e em Educação; e dois doutorados: Ciências Ambientais e Ciências da
Saúde. A Instituição tinha um total de 12.594 alunos, dos quais 10.797 acadêmicos
matriculados na Graduação, 950 em cursos de Especialização, 195 em Mestrado, 78 em
cursos de Doutorado, 327 no Colégio Unesc e 247 no Pronatec; 639 docentes e 616
técnicos-administrativos, conforme dados do Unesc em números 2014/2. O grupo gestor
da IES atualmente é composto por cento e onze colaboradores, dos quais 54% são
mulheres.
Diante do nosso cenário de regulação e de demanda, a Universidade, para a
revisão do seu planejamento estratégico 2014, além da equipe interna composta por três
pessoas, contratou uma consultoria externa para auxiliar nesse processo, a qual
apresentou, após o briefing, a proposta de metodologia de trabalho à Reitoria para
validação. O processo de revisão iniciou em março com a contratação da consultoria e,
inicialmente, estava previsto para terminar em setembro de 2014. No entanto, durante o
processo em algumas etapas, foi necessário dispender mais tempo para reflexão e
discussão das temáticas. Quanto às definições organizacionais, as quais ainda
demandam por aprovação nos colegiados superiores, foram reavaliadas e as sugestões
validadas pelo grupo do planejamento institucional, a saber: Missão – Contribuir para a
formação de melhores profissionais e seres humanos, por meio da excelência em
ensino, pesquisa e extensão, promovendo o desenvolvimento regional sustentável.
Ao realizar a análise semiótica da proposta de missão – edição 2014, houve
uma delimitação na proposta de missão, porque explicita a questão profissional e
cidadã, as quais não estão contempladas na missão atual, embora estivesse em diversas
159
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
definições institucionais da Universidade. Além de retomar o limite do desenvolvimento
regional que estava presente na missão anterior da IES. Essa demarcação da proposição
de missão parece reduzir o compromisso da Instituição em termos de ensino-
aprendizagem em razão do uso do verbo contribuir o qual nos remete a auxiliar,
cooperar e não propriamente a realizar como é o verbo utilizado na missão atual:
educar.
Nas seções seguintes, apresentamos esta revisão das estratégias, na
percepção das(os) entrevistadas(os). A Figura 33 sintetiza as edições formais do
planejamento da Universidade, com base na pesquisa documental, a fim de fecharmos a
descrição realizada. Para fins didáticos, adotamos a expressão revisão completa quando
houve em determinada edição do planejamento a reflexão acerca das definições
institucionais como Missão, Visão de Futuro, Princípios e Valores e competência
essencial. O termo parcial, utilizamos para as edições em que foi realizada revisão a
partir da atualização dos ambientes e reformulação das estratégias.
Figura 33: Síntese das Edições do Processo Estratégico Institucional Ano Edição Foco
1999 Primeira elaboração formal
do PEI
Promoção do desenvolvimento regional e na melhoria da
qualidade do ambiente de vida.
2002 Revisão parcial Replanejar a Instituição para o período 2003/2006.
2005/2006 Revisão parcial Análise dos cenários, ajustes de objetivos e dos planos
de ação.
2008
Revisão completa Qualidade da Educação (Pesquisa, Ensino e Extensão) e
dos demais serviços prestados pela Instituição;
Sustentabilidade Financeira da Instituição;
Desenvolvimento Humano;
Melhoria da Gestão Institucional.
2010 Revisão parcial Análise dos cenários, ajustes de objetivos e ações.
2014 Revisão completa Adoção do BSC – balanced scorecard – como modelo
de gestão.
Fonte: Dados da Pesquisa
Da síntese acima, compreendemos que a Instituição teve cinco momentos
estratégicos, com ênfase na formação das estratégias. No entanto desses cinco, três com
PE formal, somado a um informal, totalizam quatro de posicionamento estratégico. O
primeiro deles, embora não houvesse registro de um planejamento formal, mas pelo
histórico da Instituição, deu-se no final da década de 1980 e no início de 1990, quando
160
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
houve um claro posicionamento estratégico, em razão do movimento para criar uma
pré-estrutura universitária para anteceder a transformação para universidade. Essa
configuração sugere que foi motivada já pelo desejo visionário de haver uma instituição
de Ensino Superior para atender à região de Criciúma.
O segundo foi que, para se constituir como universidade, a então Unesc
passa a ter o tripé: ensino, pesquisa e extensão e a expansão dos cursos de Graduação.
Diante desse cenário, tem o primeiro registro do processo estratégico formal em que a
Instituição se posiciona estrategicamente como regional e ratifica a sua preocupação
com o ambiente de vida do contexto em que está inserida.
O terceiro, sem registro de vínculo direto com o processo estratégico
formalizado, foi a reforma administrativa que se realizou em 2007. No entanto, diante
da nova estrutura, acreditamos que a gestão se viu motivada a realizar uma revisão de
suas estratégias a fim de contemplar a nova estrutura da Universidade, o que resultou na
revisão completa de 2008. Outro marco que se destacou desta revisão foi a ênfase no
fato de a Instituição ser comunitária. Esse fato teve tamanha valorização que foi
explicitada tanto na Visão de Futuro quanto na Competência Essencial da Universidade.
E o último, possivelmente em razão também da migração para o sistema federal,
a Instituição promoveu uma revisão completa, inclusive com a contratação de uma
consultoria. Esse momento da edição do planejamento estratégico – ano de 2014 – por
ser o objeto de estudo desta tese, será melhor detalhado nas seções seguintes, à luz da
EPS e à divisão sexual do trabalho – questões de gênero.
6.2 PRÁTICAS DISCURSIVAS NO FAZER ESTRATÉGIA
Nossa finalidade, nesta seção, é apresentar a análise semiótica das práticas
discursivas presentes no fazer estratégia da Instituição durante o ano de 2014, quando
da formação das estratégias. Elegemos, em razão do tema deste trabalho, como universo
desta pesquisa, as pessoas que compõem o grupo do planejamento institucional, o qual
foi composto por cento e onze praticantes, distribuídas(os) em cinco níveis hierárquicos,
conforme organograma apresentado na Figura 20. No primeiro nível, estão os
componentes da Reitoria: reitor, chefe de gabinete, três pró-reitoras e cinco
assessoras(es). No segundo nível, estão as(os) diretoras(es) das Unidades Acadêmicas e
161
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
do Iparque e Coordenadoras(es) de Ensino, de Pós-Graduação e Pesquisa e de Extensão
das quatro Unidades Acadêmicas. Nos terceiro e quarto níveis, estão alocados as(os)
gestoras(es) nas funções de coordenadoras(es) das coordenadorias e setores, gerentes de
departamentos e coordenadoras(es) de curso de Graduação e Pós-graduação. No quinto
nível, supervisoras(es) de setores, de curso de Pós-graduação, das clínicas e de
laboratórios.
Utilizamos no trabalho a mesma segmentação dada pelo planejamento
institucional, a saber: área acadêmica – referem-se às(aos) gestoras(es) que envolvem o
ensino, como pró-reitorias de ensino e de pós-graduação, pesquisa e extensão e
suas(eus) assessoras(es), as(os) dirigentes das Unidades Acadêmicas e
coordenadoras(es) de curso, Programas Stricto Sensu; área meio – relativas às(aos)
gestoras (es) dos órgãos de apoio ao ensino, a saber: Departamentos de: Tecnologia da
Informação, Desenvolvimento Humano, Finanças e Contabilidade, Projetos e
Infraestrutura, Administrativa da Editora, Patrimônio e Suprimentos; Coordenadorias
de: Políticas de Atenção ao Estudante, Relações Internacionais; Setores de: Avaliação
Institucional, Educação a Distância, Arte e Cultura, Estágio e Empregabilidade,
Comunicação Integrada, Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu e Extensão, Centro
Especializado em Reabilitação, Museu da Infância, Colégio Unesc, Editora
Universitária, Planejamento Institucional; I-Parque; Ouvidora; Clínicas Integradas e
Procuradoria Jurídica.
Cabe ressaltar que, em alguns momentos e em grupos específicos de
trabalho, foram chamadas(os) funcionárias(os) de área meio, em razão das temáticas
discutidas. Dessa forma, o número foi maior em algumas análises. Mas, tomamos aqui
como referência, o recorte das(os) gestoras(es) que foram convidadas(os) a participarem
do planejamento estratégico institucional, revisão 2014, nos workshops institucionais.
Cabe relatar que, a fim de verticalizar determinadas análises, trazemos também dados de
toda a Instituição com relação as(aos) suas(eus) profissionais.
Iniciamos a apresentação trazendo as vozes das(os) estrategistas
envolvidas(os) que, de alguma forma, impactaram no fazer estratégia.
6.2.1 As Vozes Presentes nas Práticas Discursivas
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Temos como propósito descrever, nesta seção, e apresentar a análise
semiótica das vozes que emergiriam nas práticas discursivas no fazer estratégia, as
quais se destacaram de maneira a influenciar as(os) demais praticantes durante o evento
do planejamento estratégico, a saber: reitor, diretoras(es) e consultor. Cabe dizer que,
quando da coleta de dados, as vozes relatadas a seguir afloraram nas entrevistas e
observações, pois acreditávamos que haveria enunciadores99
presentes na fala das(os)
estrategistas, no entanto, não tínhamos antecipadamente as subcategorias dessas vozes.
Foi na ida ao campo que elas – vozes – se revelaram.
Vaara (2010), em sua pesquisa no nível mesoeconômico ou organizacional,
defendeu que precisamos ampliar a nossa compreensão das narrativas de organização
estratégica para melhor entender a polifonia100
e dialogicidade101
presentes nas práticas
discursivas organizacionais. Essas formações discursivas podem ser múltiplas,
dependendo do contexto sociocultural e organizacional em que estão inseridas. A
análise do plano micro possibilita, portanto, refletir sobre as habilidades retóricas e
táticas que são usadas em conversas – formais e informais – sobre estratégia para
promover ou resistir a pontos de vista específicos. Vaara e Whittington (2012)
99
Usamos enunciadores, neste contexto, como sinônimos de vozes, ou seja, podemos ter em um único
locutor (estrategista) várias vozes (ou enunciadores). 100
“A noção de polifonia, elaborada por Oswald Ducrot [...] pode ser definida como a incorporação que o
locutor faz ao seu discurso de asserções atribuídas a outros enunciadores ou personagens discursivos –
ao(s) interlocutor(es), a terceiros ou à opinião pública em geral. O termo, emprestado a Bakhtin (2003),
quando caracteriza como polifônico o romance de Dostoiewski, passa a designar, assim, o coro de vozes
que se manifesta normalmente no discurso, visto ser o pensamento do outro constitutivo do nosso, não
sendo possível separá-los radicalmente” esclareceu KOCH (2004, p. 140). 101
Em Bakhtin, a noção de dialógico ou de dialogicidade10
aparece por meio de diversas vertentes,
esclareceram Scorsolini-Comin e Santos (2010, p. 749), as quais são:
“(a) Dialogismo interno da palavra: no discurso, o objeto está mergulhado em valores, crenças,
descrições e definições, o que faz com que o falante se depare com múltiplos caminhos e vozes, que se
tecem ao redor desse objeto – a dialética do objeto está ligada ao diálogo social que o engloba;
(b) Dialogicidade nos enunciados: mesmo antes da concretização de um determinado enunciado – e
também posteriormente, há outros enunciados, que emanam dos outros, aos quais o próprio enunciado
está vinculado por algum tipo de relação. [...]
(c) Dialogismo construído pela emergência de várias vozes relacionadas a um tema específico, dadas pela
antecipação da resposta dos outros e das possíveis respostas imaginadas por ele, em função do
interlocutor e do contexto.
(d) Dialogização das linguagens: uma língua nacional é plural, pois abriga um compósito de linguagens:
oriundas das reuniões sociais, familiar, cotidiana, sociopolítica; linguagem dos jargões profissionais
(advogado, médico, empresário, político, professor...), linguagem de geração e de idade, linguagem de
autoridade, linguagens ordinárias do dia; linguagem oratória, publicitária, científica, jornalística,
literária..., com múltiplas vozes que estabelecem uma variedade de conexões e inter-relacionamentos.”
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
ratificaram acerca da importância de os estudos identificarem como as vozes dos
estrategistas influenciam, por meio de suas práticas discursivas, no fazer estratégia.
Passemos, então, às vozes. Verificamos que a fala Reitor é muito forte, e
que nela há dois enunciadores presentes: o líder e o gestor. Principalmente, a voz de
líder que motiva as(os) diversas(os) praticantes a participarem e comprometerem-se
com as etapas do PEI. Essa voz valoriza as(os) estrategistas no fazer estratégia, as(os)
quais se sentem compromissados com o Reitor.
E a própria vontade da reitoria, porque o PE precisa dessas lideranças, puxando o
processo, acompanhando, e depois controlando a efetividade dele. E me pareceu que,
no final, tinha esse compromisso firmado entre os participantes de que a reitoria faria a
função de ser o cabeça de todo o projeto, ser os motivadores que vão acompanhar. (7 A
E)
Também na observação realizada no workshop de maio, o qual foi o
primeiro evento com todo o grupo gestor, além da introdução motivacional para as(os)
gestoras(es), observamos que o Reitor se dirige às(os) gestoras(es) como um grande
líder, que reconhece a importância das(os) estrategistas no fazer estratégia. O Reitor
também fez uma explanação sintética acerca do evento do planejamento, demonstrando
conhecimento e comprometimento com o movimento, dessa maneira sobressai a voz de
gestor da IES. Explicou que não se trata de um plano de gestão, já que o mandado dele
encerra bem antes do final do planejamento e a sua preocupação é com a Instituição.
Também apresentou o grupo de trabalho do PE, tanto interno quanto os membros da
consultoria. Neste momento, era o gestor maior da Universidade que falava às(aos)
praticantes.
Percebemos, tanto nos workshps de maio quanto de setembro, que o Reitor
deseja mostrar que está comprometido com o fazer estratégia, que acredita em seu
sucesso, tanto quanto líder, mas também como gestor, deseja materializar sua
consciência de que, para isso, depende do apoio e participação de todas(os) da
Instituição. Mais uma vez demonstra sua inquietação com o futuro da Universidade e
não com o seu mandato.
[...] acho uma primeira reunião [...] eu lembro de uma fala do Reitor, vindo, passando
nos grupos, ele chegou no nosso grupo, “a hora de falar agora, é a hora”, eu acho que
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eu fiquei com aquilo na cabeça, “aproveita para colocar tudo”, então sei lá, acho que
eu fiquei um pouco com isso na cabeça. (4 A E)
Vejamos, conforme corrobora o fragmento acima, que essa motivação do
Reitor tem repercussão nas(os) praticantes da formação da estratégia, as(os) quais se
sentem incentivadas(os) a participarem das atividades, contribuírem como líderes das
ações que estavam por vir. Brito (2013), em sua tese de doutorado, estudou o processo
de construção sociodiscursiva (aspectos sociais, políticos, ideológicos e econômicos)
das estratégias em uma Cooperativa de Produtores Familiares de Poço Fundo, concluiu
que as estratégias são constituídas discursivamente, marcadas pela relação entre a
estrutura social e a ação coletiva e são produto e produtora do discurso e que reproduz
elementos políticos (relações de poder) e ideológicos.
Desde o convite – por meio de um vídeo, e pelo e-mail que informava o
encerramento do prazo da pesquisa, os quais foram encaminhados para a comunidade
participar, o objetivo era de levantar dados para o fazer estratégia e, também, integrar a
comunidade acadêmica e representantes da sociedade, colocava o Reitor como um líder
que busca a parceria com as(os) pesquisadas(os). Essa interpretação se dá pelo fato de
que o Reitor, ao falar, buscou aproximar a(o) ouvinte, colocá-la(o) como peça-chave no
planejamento estratégico: “Você é quem responde.”, como se ele dissesse, o que você
nos disseer é importante, é fundamental para identificarmos o que você, que é com
quem nos importamos, deseja para podermos atender. No e-mail, apresentado na Figura
35, enviado quando estava próximo do fechamento da pesquisa, por meio da frase
“Receba o convite do Reitor Gildo Volpato”, o objetivo é tornar o convite algo pessoal,
aproximando novamente o Reitor – figura maior da Universidade – tanto com os
membros da comunidade acadêmica, quanto da sociedade. Essa opção pela figura do
Reitor, em vez do nome da Instituição, leva-nos a crer que o Reitor, além de ser o cargo
máximo da Instituição, é materializado por intermédio da imagem do professor Gildo
Volpato, que explicita uma liderança tanto interna quanto externamente à IES e,
consequentemente, motiva as pessoas a responderem a pesquisa.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 34: Convites para Participar da Pesquisa
Fonte: Dados da Pesquisa
Também no convite do Reitor, encaminhado às(os) gestoras(es) para o
encontro de maio, já se buscava contextualizar a(o) gestora(o) acerca do fazer estratégia
que iniciaria na Instituição – fica implícita, aqui, a voz de gestor que busca
contextualizar o momento vivido na Instituição e o que as(os) praticantes farão em
conjunto. Nele, as(os) praticantes estratégicos foram tratados como líderes. Nesse
convite, o Reitor não se inclui no grupo, ele não se coloca junto às lideranças e às(aos)
representantes da comunidade acadêmica, aqui está presente a voz do gestor que
determina o que deve feito por seus pares.
Em 7 de maio, será realizado o primeiro evento do novo ciclo de planejamento
estratégico da Unesc.
Além do lançamento oficial do planejamento, esta ocasião também será a primeira de
uma série de reuniões em que lideranças da instituição e representantes da
comunidade acadêmica estarão trabalhando juntos para construir as bases do futuro
da Unesc.
Nesta primeira reunião, o foco do trabalho recairá sobre a análise dos ambientes
interno (relativo a questões internas à instituição) e externo (relativo a fatores e
tendências nos âmbitos político, econômico, sociocultural, etc), definindo
direcionadores que orientem a instituição a atuar nesse contexto.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Em breve, você receberá mais informações do projeto, que deverão ser repassadas por
você a sua equipe. (2 R AD)
Entendemos que esse encaminhamento foi realizado dessa maneira para,
além de convidá-las(os) a participar da reunião, situá-las(os) acerca do que aconteceria
no evento estratégico, especificamente naquele encontro e a importância de participação
de cada uma delas(es) e mostrar que quem fará o fazer estratégia são as(os) praticantes
e não a alta gestão. O uso do termo juntos dá uma conotação de unidade, de processo
democrático e de que a Instituição precisa das(os) gestoras(es), no entanto a figura do
Reitor fica fora deste momento. Acreditamos que o objetivo era motivá-las(os) a
aderirem, de fato, ao planejamento, envolvendo-se e liderando suas equipes. Também
constatamos que, no início do movimento, houve uma preocupação de que as(os)
gestoras(es)-líderes socializassem com sua equipe o que está acontecendo no
planejamento da IES. Dessa maneira, por meio da fala do Reitor, localizamos duas
vozes: do Reitor como um líder que motivou sua equipe e, também, do Reitor como
gestor que explicitou o que deve ser realizado pelas(os) diversas(os) praticantes do
processo estratégico.
Outra voz expressiva no processo estratégico, tanto nos workshops como
nas reuniões com grupos menores, foi a do consultor externo. Whittington et al.
(2003), dentre os oito conjuntos de atores da estratégia, apresentaram as empresas de
consultoria como uma possibilidade de praticante da estratégia.
No primeiro encontro com todas(os) as(os) gestoras(es), em maio de 2014, a
fala do consultor foi democrática, explicativa e, sobretudo, o discurso de um especialista
no assunto, mas sem usar metalinguagem102
. Este estrategista procurou incluir-se como
integrante do grupo, buscou aproximar-se das pessoas ali presentes, nominalizando-as,
falando dos setores, dando exemplos da própria Universidade, dando a noção de que
conhece a infraestrutura de pessoal, física e tecnológica da Instituição, a fim de obter
credibilidade das(os) ouvintes, bem como dando informações do que a consultoria
pretende fornecer de subsídios para a gestão da IES.
Sintetizando, a primeira fala do praticante externo foi no sentido de
aproximar-se das(os) participantes, colocando-se próximo fisicamente inclusive, ou
102
Metalinguagem – nesse contexto, significa usar a linguagem técnica do processo estratégico para
explicar o planejamento.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
seja: falou mais perto das(os) gestoras(es), usou os corredores do auditório para
caminhar e ficar mais próximo das(os) praticantes. Na sequência, detalhou as etapas de
trabalho que a consultoria iria implantar. Interessante, porque ele não usou terminologia
da área da estratégia, apenas uma vez, mais ao final da exposição, utilizou o termo
governança. Entendemos que isso tenha sido proposital para não melindrar as(os)
gestoras(es) que não detêm domínio desses termos técnicos, então articulou sua fala de
uma forma que, independentemente da área de conhecimento, todas(os) pudessem
entender o que ele desejava passar. Dessa maneira, passou a ter credibilidade e
confiança das(os) gestoras(es), ao valer-se da voz de alguém que conhece o processo
estratégico, mas que se colocou como uma(um) das(os) praticantes.
Depois desse momento, quanto o consultor apresentou especificamente as
quatro etapas do fazer estratégia, ele passou a usar a primeira pessoa; como se as(os)
gestoras(es) tivessem que prestar contas a ele, como se o compromisso também fosse
com a consultoria, além da gestão maior da Universidade. Acreditamos que essa voz
tinha como objetivo aumentar o comprometimento das(os) estrategistas, uma vez que o
acompanhamento e controle seria também por parte de um ator externo.
O que eu quero é que o grupo [...]. (9 C O)
Eu estou aqui, estarei aqui até setembro para dar algumas agulhadas em vocês. (9 C O)
No segundo workshop, em quatro de setembro, percebemos, por meio da
observação, que o consultor se colocou como alguém que é especialista em
planejamento e, por várias vezes, apresentou o que seria necessário para que o processo
desse certo. Vaara, Sorsa e Pälli (2010, p. 20) esclareceram que o uso de terminologia
especial-técnica por parte de um estrategista reforça a “reprodução dos ideais e
ideologias da estratégia empresarial. Implicações sobre as relações de poder dos atores
sociais dependendo do seu conhecimento e capacidade de usar conceitos e vocabulário
da estratégia.”
Além disso, em certo momento, ele fez uma colocação de que uma
instituição de excelência é formada por uma equipe de excelência, portanto, não haveria
lugar para quem não tivesse esse perfil na IES, utilizando uma voz de um gestor da IES
que tem condições de cobrar algo das(os) praticantes. Acreditamos que esse fato se
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
tenha dado em razão da percepção do consultor de alguma possível barreira encontrada
para que o desenvolvimento do planejamento tivesse sucesso, e ele desejou
conscientizar as(os) praticantes de seu compromisso com a IES e não com o poder de
um grupo ou individual. Tratou-se, a nosso ver, então, de uma comunicação e não
necessariamente uma relação de poder que, no dizer de Foucault (1982, p. 786):
É necessário distinguir também as relações de poder das relações de
comunicação que transmitem uma informação através de uma língua, de um
sistema de signos ou de qualquer outro meio simbólico. Sem dúvida,
comunicar é sempre uma certa forma de agir sobre o outro ou os outros.
Porém, a produção e a circulação de elementos significantes podem
perfeitamente ter por objetivo ou por consequências efeitos de poder, que não
são simplesmente um aspecto destas. Passando ou não por sistemas de
comunicação, as relações de poder têm sua especificidade. (tradução nossa)
Da análise das vozes apresentadas acima, podemos categorizá-las em três
vozes expressas por meio das práticas estratégias discursivas, as quais emergiram dos
dados, são elas: I – liderança: por meio da fala do Reitor que incentivava a participação
das(os) estrategistas na formação da estratégia, mostrando que somente em um trabalho
conjunto o fazer estratégia teria sucesso; II – gerenciamento: expressa por meio das
práticas discursivas informativas, trazendo novas informações, as quais tinham como
objetivo colocar as(os) praticantes a par das atividades relativas à revisão do processo
estratégico, como também pudessem expressar seus pontos de vista; III – terminologia
específica: envolve a voz do consultor que busca traduzir a complexidade das
definições da área, bem como conduzir as(os) praticantes a cada atividade a ser
realizada, sem fazer delas(es) uma(um) especialista no assunto, mas sim, uma(um)
usuária(o) da técnica. Essas vozes presentes nas práticas discursivas detalhadas
anteriormente estão sintetizadas na Figura 35.
Figura 35: Vozes Presentes nas Práticas Discursivas Vozes Condições de Produção Possíveis Praticantes Resultado de
Poder
Liderança Desejo de motivar as(os)
estrategistas a participarem,
efetivamente, na formação
da estratégia.
Estrategista que detém
liderança democrática.
As(os) praticantes sentem-
se comprometidas(os) com
o processo. Dessa maneira,
passam a se responsabilizar
pelo fazer estratégia.
Gerenciamento Busca pela socialização das
informações pertinentes ao
planejamento estratégico.
Estrategista que está à
frente da administração
da organização.
As(os) estrategistas
sentem-se a par das
atividades a serem
realizadas.
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Vozes Condições de Produção Possíveis Praticantes Resultado de
Poder
Terminologia
específica
Traduz os termos específicos
da área da estratégia por
terminologia acessível a
praticantes de diversas áreas
do saber. Refere-se ao não
uso da metalinguagem.
Estrategista especialista
em processo
estratégico, cuja função
é mediar sua condução.
As(os) participantes
cumprem as atividades do
fazer estratégia sem
necessariamente dominar
essa área do conhecimento.
Fonte: Dados da Pesquisa
Para ratificar esse estudo, trouxemos o trabalho seminal de Knights e
Morgan (1991), em que os autores desenvolveram um quadro para a análise crítica da
estratégia coorporativa, focalizando o surgimento, desenvolvimento e a reprodução do
discurso da estratégia, refletindo sobre as condições em que o discurso estratégico
torna-se pensável e prático. Primeiramente, os autores discutiram o conceito de
discurso, com base em Foucault, com o objetivo de esclarecer a sua contribuição para a
compreensão das relações sociais. Os autores definiram discurso como um conjunto de
ideias e práticas que condicionam nossas maneiras de relacionarmo-nos e agirmos sobre
determinados fenômenos, porque o discurso está sempre embutido na prática social.
Ao abordar especificamente o discurso da estratégia, Knights e Morgan
(1991) defenderam que ele tem o seu próprio histórico, incorpora modos particulares de
ver as organizações, os indivíduos e as sociedades. O discurso passa, então, a ser
incorporado em determinados conjuntos de relações sociais, com determinados efeitos
de verdade. No caso da IES pesquisada, as vozes implícitas nas práticas discursivas
externalizaram esses modos específicos, particulares das(os) praticantes seja por meio
da liderança, do gerenciamento ou mesmo do discurso específico da estratégia com o
propósito de envolver as(os) demais estrategistas.
Laine e Vaara (2007) examinaram a subjetividade contida no discurso da
estratégia, considerando que há uma batalha dialética pelo poder de influenciar os
indivíduos, a fim de proteger ou melhorar seu posicionamento diante das(os) demais
estrategistas. Neste contexto, os autores mostraram três maneiras específicas de as(os)
praticantes mobilizarem os discursos: lançamento e apropriação do discurso da
estratégia pela alta administração para tentar obter controle sobre a organização;
discurso de gerentes de nível médio resiste à hegemonia da alta gestão, dessa maneira
tinham um discurso que visava criar um espaço de persuasão em situações controversas;
discurso dos gerentes de unidades específicas que procuravam distanciamento do
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
discurso da estratégia. Os resultados são diferentes dos obtidos nesta tese, no entanto,
faz sentido utilizá-los, porque, mesmo sendo outros discursos, o objetivo é o mesmo que
é persuadir as(os) praticantes envolvidas(os) no fazer estratégia.
Vaara, Sorsa e Pälli (2010) obtiveram como resultado de sua investigação
empírica, em que estudaram o plano estratégico formal da cidade de Lahti, na Finlândia,
a identificação de cinco categorias discursivas centrais, a saber: Auto-autorização,
Terminologia especial, Inovação discursiva, Consenso forçado e Deonticity. Dessas
cinco, duas ratificam os resultados obtidos nesta tese, a saber: autoautorização: o
processo estratégico em outubro de 2004, quando o novo grupo composto pelo prefeito
e seu executivo juntamente com dois consultores de gestão pública, reuniu-se para
negociar a forma como o processo de estratégia de 2005 seria realizado. O texto da nova
estratégia foi particularmente autoritário, em que a estratégia foi comunicada de sua
importância; terminologia especial: trata-se do léxico específico conhecido por
especialistas de estratégia. Esse vocabulário específico tanto facilita as discussões, a
escritura das estratégias, como também interpretar o documento estratégico, no entanto,
essa linguagem pode afetar as posições de poder dos diversos gestores, porque alguns
dominavam melhor esse discurso melhor do que outros, em função de sua formação,
educação ou vivência na gestão estratégica, as quais se referem às vozes de
gerenciamento e de terminologia específica.
Vaara e Whittington (2012) defenderam a importância de revelar as diversas
vozes, muitas vezes em um único locutor, as quais impactam, no sentido de serem mais
ou menos ouvidas durante o fazer estratégia e, dessa maneira, influenciando o processo
decisório. Essas vozes, na perspectiva de Foucault (2003), é uma forma de expor o
poder o qual está implícito nas práticas discursivas, nas relações entre as(os) praticantes,
enfim, em tudo na organização.
Kwon, Clarke e Wodak (2014) analisaram dados de quarenta e cinco horas
de entrevistas individuais e cem horas de reuniões de diretoria com a equipe estratégica
em uma multinacional, entre novembro de 2006 a abril de 2007, para demonstrar
algumas das manobras linguísticas mais utilizadas pelos participantes. Os dados foram
analisados usando a Abordagem Histórica do Discurso (DHA) e a Análise Crítica do
Discurso (ACD). Dessa análise, foram reveladas cinco estratégias discursivas –
igualização; re/definição; simplificação; legitimação; conciliação – realizadas de forma
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
dinâmica por meio de estratagemas linguísticos, utilizadas pelas equipes quando
buscavam desenvolver visões compartilhadas em torno de questões estratégicas.
Das cinco, duas ratificam os achados desta tese, são elas: igualização a qual
envolve atores incentivando à participação, flexibilizando protocolos e estruturas de
poder, a fim de fornecer espaço para que as(os) estrategistas pudessem expressar pontos
de vista; simplificação – referem-se aos membros da equipe que tentam reduzir a
complexidade das definições concorrentes em razão da baixa compreensão. Entendemos
que, embora com outros termos nomeando-as, refere-se à voz da liderança que busca
envolver as(os) praticantes no processo, bem como a voz do consultor que buscou
tornar os procedimentos de elaboração das estratégias acessíveis a todas(os) os
envolvidos.
6.2.2 Processos Decisórios na Formação da Estratégia
Nesta seção, o objetivo é relatarmos e apreciarmos os resultados referentes à
definição da metodologia utilizada na formação da estratégia, alocação dos membros
nos grupos de trabalho, bem como foi realizado o processo de avaliação e a construção
da Missão, Visão e Valores, os objetivos estratégicos, projetos, indicadores e, por fim, a
priorização dos projetos, enfim, as etapas do planejamento estratégico, edicação 2014,
na perspectiva, principalmente, das(os) entrevistadas(os).
Dito de outra maneira, nosso desejo não é descrever as etapas puramente do
fazer estratégia, para o qual bastaria realizar a análise documental dos relatórios, mas
sim, compreender como as(os) participantes se enxergaram como atores do processo e,
também, como perceberam o movimento da formação da estratégia. Por isso, a
descrição não segue a lógica apresentada no relatório do planejamento institucional,
mas uma sequência que foi revelada nas entrevistas, ou seja: é a maneira como elas(es),
ao serem solicitadas(os) para relatarem sua participação no evento estratégico,
contaram para a pesquisadora. Nisso é que entendemos estar o maior valor desta seção,
pois houve uma aproximação da pesquisadora com o objeto de estudo, e as(os)
praticantes puderam externalizar seus sentimentos com relação ao processo vivenciado.
Whittington (1996; 2006) defendeu que o fazer estratégia deve ser realizado e estudado
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
em todos os níveis da Instituição, a fim de que, o pesquisador ao aproximar-se dos
atores envolvidos, possa compreender como se dá a formação da estratégia.
Figura 37: Fluxo da Formação da Estratégia na Percepção dos Entrevistados
Fonte: Dados da Pesquisa
Inicialmente, a empresa contratada para dar assessoria nesse movimento na
Universidade apresentou uma proposta de metodologia de trabalho – a qual foi
avaliada pelos membros da Reitoria, feitas as adaptações necessárias para atender ao
perfil de gestão da Instituição, segundo dados das entrevistas: democrático e
participativo – foi colocada em prática.
Então eles (consultoria) vinham para e diziam o que eles tinham que fazer, a
consultoria mostrava o que eles tinham que fazer, aí eles vinham para decidir conosco
qual o nível de participação que a gente queria. Aí nós escolhemos o máximo de
participação nesse primeiro diagnóstico. As decisões finais que foram com grupos mais
fechados. Mas a participação tinha que ser sempre maior possível. (5 A E)
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Acerca da composição dos seis grandes grupos de trabalho, a saber: quatro
Unidades Acadêmicas, Iparque e Colégio Unesc, a definição foi realizada em reunião
com o Reitor e Pró-reitoras de Ensino, de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão e de
Administração e Finanças em conjunto com a consultoria.
A gente dividiu em seis grupos, núcleos assim: as quatro unidades acadêmicas, o
Iparque e o Colégio Unesc porque a gente percebeu que cada um deles, embora
estejam na mesma Universidade, têm as suas especificidades e eles deveriam ser
tratados de forma separados para identificar as questões que são específicas. (5 A E)
O propósito dessas seis frentes de trabalho, na visão das(os)
entrevistadas(os), foi de identificar os objetivos e projetos institucionais, ou seja: as
definições macro da Universidade, para em um momento seguinte levar para as(os)
gestoras(es) dos setores meios contribuírem.
Primeiro na verdade tivemos a identificação dos projetos institucionais, primeiro
discutimos com todos esses protagonistas da Instituição, dai saíram onze grandes
projetos institucionais, desses seis lugares, seis setores: Unidades Acadêmicas, o
Iparque e o Colégio Unesc. E depois acabamos trabalhando com os setores de apoio
para vermos como alcançarmos e realizarmos aqueles projetos que estrutura
precisamos ter, qual é a condição dessas atividades meio precisamos melhorar e
definimos. (5 A E)
Whittington (2006) defendeu a importância de, no fazer estratégia à luz da
EPS, haver integração entre o conservadorismo e as possibilidades de mudança nas
práticas estratégicas – tipicamente práticas emergentes de práxis, por meio das pessoas
que são o centro na reprodução, transferência e práticas inovadoras de estratégia.
Portanto, neste caso, pareceu-nos que o fato de o processo decisório ser realizado por
pessoas da alta hierarquia da Universidade, segmentados em seis grupos, pode sugerir
algum comprometimento na elaboração e, com maior probabilidade, na implantação do
processo estratégico, haja vista talvez as(os) praticantes não se sentirem totalmente
comprometidas(os) com o fazer estratégia.
Cabe ressaltar que há praticantes do planejamento que consideraram que a
metodologia trouxe algumas limitações em termos de participação, devido não somente
à composição dos grupos, mas também em razão da definição do tempo de cada etapa
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
que já era delimitada pelo grupo do planejamento o qual buscou manter, de início, o
roteiro projetado para o processo. Segue depoimento coletado em entrevista:
[...] como existe um grupo a frente definindo o roteiro exercido pelo PE, algumas
situações só se tomava ciência na hora e o tempo como era muito curto, necessitava de
uma discussão maior sobre cada tempo a fim de abrir os parâmetros, possibilidade que
poderia ocorrer [...]. (1 A E)
Também nos foi colocado de que a metodologia usada foi apresentada no
primeiro workshop, em torno de 15 minutos, não foi suficiente para que as(os)
praticantes, de modo geral, entendessem o movimento no todo. Relataram que sentiram
falta de uma espécie de formação ou contextualização para quem não domina o
processo estratégico, sobre o que elas (eles) fariam e com qual objetivo, a fim de que
elas (eles) pudessem contribuir de forma mais efetiva. Nesse workshop, conforme
dados secundários, o objetivo foi realizar as análises dos ambientes interno e externo,
com base na pesquisa realizada com a comunidade acadêmica e a sociedade, bem como
com dados da avaliação institucional.
[...] no meu ponto de vista, eu achei que a gente tinha que saber mais o que era o
planejamento antes de começar a planejar. Dai tinha que vir com uma introdução, com
uma capacitação, porque a gente já chegou lá tendo que produzir sem saber o porquê.
Eu fui entender bem o planejamento nas etapas finais. (6 P E)
Foi dito por gestoras(es) da área meio que, embora tenham entendido e
gostado ao final do planejamento estratégico, durante o mesmo a metodologia não
permitiu que as(os) praticantes, generalizando aqui, entendessem a atividade no todo, o
que, de certa forma, prejudicou as contribuições na primeira etapa.
Primeiro para ter uma ideia do que seria, contribui com alguma coisa a respeito do
onde estávamos e aonde queríamos chegar, naquela metodologia de grupos que não
dava uma ideia do todo, dava uma ideia de partes aqui nos traz a questão da
organização do planejamento estratégico em que o esclarecimento da metodologia não
foi bem compartilhado. E depois um outro workshop mais ou menos nessa mesma
direção. (3 P E)
Na proposta da EPS, as(os) protagonistas do fazer estratégia são as pessoas.
Para Whittigton (1996, 2006), as(os) praticantes ou estrategistas – ressaltamos que são
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
aqueles que planejam como também as(os) que executam as estratégias no cotidiano das
organizações – são as(os) responsáveis pelo sucesso da formação da estratégia,
necessitando que elas(eles), portanto, sintam-se participantes e valorizadas(os) em todas
as etapas.
Verificamos que houve ações, por parte do grupo organizador do
planejamento estratégico, no sentido de colocar as(os) praticantes a par das etapas do
PEI. Também no primeiro workshop, em que foram apresentadas as equipes e as quatro
etapas, essas instruções foram dadas, no entanto tais ações pareceram, em alguns
momentos, insuficientes pelas(os) gestoras(es).
O consultor explicou rapidamente as quatro dinâmicas com temas transversais em onze
grupos, sintetizadas a seguir:
Dinâmica 1 – dados da pesquisa realizada com a comunidade para construção de
cenários (futuros possíveis) explicou o que significa cenários – classificar na percepção
dos participantes o impacto do material disponível. Tivemos algumas questões para
avaliar o impacto e o grau de incerteza.
Dinâmica 2 – construção de cenários – quatro cenários.
Dinâmica 3 – análise da matriz SWOT.
Dinâmica 4 – elaboração de respostas estratégicas – elaboramos quatro respostas
estratégicas para quatro cenários/ou cruzamento dos pontos internos e externos. (10 C
O)
Também nos convites para participarem dos workshops, percebemos que
havia essa preocupação em contextualizar em que momento o movimento se
encontrava, o que aconteceu até então – observemos o primeiro parágrafo – e apresentar
– nos demais parágrafos do convite – o que seria realizado no referido encontro para o
qual a(o) gestora(r) estava sendo convidada(o) a comparecer.
O Planejamento Estratégico Unesc 2025 está concluindo a fase que trata da concepção
da estratégia da instituição. Ou seja, nesta fase foram definidos a direção e o foco das
atividades da Unesc no longo prazo.
A partir dessa estratégia formulada, e que em breve você conhecerá, serão mapeadas
as demandas estratégicas. As demandas são “conectores” da estratégia com a
operação, apontando os fatores críticos para o alcance dos objetivos do mapa em
termos de Processos, Tecnologia e Infraestrutura e Organização.
Assim, ao mapear essas demandas, será possível identificar as lacunas existentes entre
a operação atual e a estratégia estabelecida, favorecendo a identificação de projetos
prioritários. Além disso, as demandas criam as bases necessárias para desdobrar a
estratégia para as áreas de apoio.
176
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Para mapear essas demandas, contamos com sua participação no Workshop de
Demandas Estratégicas que será realizado no dia 4 de setembro, cujas informações
seguem abaixo: (4 T AD)
No final do texto, especificamente no último parágrafo, é dado o comando
para as(os) estrategistas: Para mapear essas demandas [...], logo no texto houve uma
espécie de nivelamento – primeiro parágrafo – em que dá informação de em qual parte o
processo estava naquele momento, seguindo por uma explicação da próxima tarefa e,
em seguida, o comando do que deve ser feito pelas(os) estrategistas. Kwon, Clarke e
Wodak (2014) demonstraram, em seu estudo, o uso dos recursos linguísticos no
processo estratégico pelas equipes quando buscavam desenvolver visões compartilhadas
em torno de questões estratégicas. Dentre elas, os autores apresentaram:
simplificação: envolve os membros da equipe que tentam reduzir a complexidade das
definições concorrentes em razão da baixa compreensão.
Neste caso, os e-mails realizaram também esse papel de informativo e
motivador. Percebemos que houve essa preocupação na IES estudada, tanto nos dados
secundários quanto na observação e entrevistas por parte daquelas(es) que estavam à
frente do processo de tornar a linguagem utilizada acessível às(aos) participantes, uma
vez que as(os) estrategistas são de diversas áreas do saber, e muitas(os) delas(es) não
dominavam a terminologia técnica do planejamento estratégico.
No entanto, este mesmo texto ratifica que, embora a coleta de dados tenha
sido por meio de pesquisa com toda a comunidade interna, a estratégia propriamente
dita não foi elaborada coletivamente, e sim, por um grupo restrito e, provavelmente, não
será dada a oportunidade de contribuições pelas(os) estrategistas, uma vez que em breve
a(o) estrategista conhecerá, conforme ilustra o fragmento abaixo.
[...] O Planejamento Estratégico Unesc 2025 está concluindo a fase que trata da
concepção da estratégia da instituição. Ou seja, nesta fase foram definidos a direção e
o foco das atividades da Unesc no longo prazo.
A partir dessa estratégia formulada, e que em breve você conhecerá, serão mapeadas
as demandas estratégicas. [...]. (4 T AD)
Além do convite que contextualizou, na tentativa de simplificar o processo,
o conteúdo a ser trabalhado pelas(os) estrategistas, o grupo do planejamento estratégico
encaminhou um texto explicativo, intitulado Alinhamento entre estratégia e operação.
177
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Vaara, Sorsa e Pälli (2010) relataram que as frases são, em princípio, puramente
orientativas para uma ação futura, mas, ao considerar a finalidade do texto, elas se
transformam em imperativas, tornando-as obrigações para as(os) gestoras(es).
No texto encaminhado, a consultoria utilizou linguagem metafórica,
buscando assegurar o entendimento do conteúdo específico da área do planejamento
porque as pessoas poderiam acabar seguindo em uma direção inversa à pretendida pela
estratégia em razão das demandas cotidianas, conforme podemos verificar no destaque
do fragmento a seguir.
A grande maioria das organizações que busca implementar sua estratégia encontra
lacunas entre as rotinas de trabalho e seus objetivos de longo prazo. A impressão é que
o dia-a-dia representa a correnteza de um rio levando as pessoas em uma direção que
nem sempre é aquela estabelecida pela estratégia. Se o mundo das operações não
estiver alinhado à estratégia, o foco das equipes não se voltará para o longo prazo e,
dificilmente, a visão de futuro será implementada. (5 T AD)
A explicação visa estabelecer a relevância de a(o) praticante da estratégia
identificar o que pode impedir ou garantir, no operacional, a implantação da estratégia
no cotidiano da Instituição, mostrando que, caso não haja tal alinhamento, nada adianta
ter uma excelente estratégia, porque ela possivelmente não terá sucesso. Ainda no
referido texto, há as perguntas que, na ótica dos consultores, provavelmente são as mais
recorrentes entre as(os) participantes do evento, com o objetivo de subsidiá-las(os) com
informações acerca do procedimento a ser trabalhado.
Acreditamos que, apesar dos esforços em contextualizar e conscientizar
as(os) estrategistas acerca das etapas do fazer a estratégia, o fato de as(os) gestoras(es),
sobretudo das áreas meio, não terem entendido as etapas anteriores do processo
estratégico, acabaram por, provavelmente, apresentarem dificuldades para a etapa
seguinte. Também há que se considerar que havia reuniões com grupos menores
acontecendo concomitantemente aos workshops, das quais somente parte das(os)
gestoras(es) participava, e, mesmo as(os) que participaram como convidadas(os),
também não conseguiram ver o movimento no todo. Parte delas(es) somente entendeu o
processo quando se tornaram líderes de projeto, logo, grande parte não conseguiu
visualizar o todo da revisão do planejamento. Neste momento, na verdade, o diagnóstico
já havia sido realizado, bem como a construção das estratégias.
178
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
[...] também não participamos do diagnóstico, mais efetivamente sim dos projetos em
diante, teve os dois workshopping com todos os gestores. Aqueles foram os dois únicos
momentos que a gente participou. Foi um diagnóstico, no meu entendimento, de uma
tarde que não tinha noção exata. Claro eles apresentaram, mas em 10 – 15 min, o todo,
então, para quem já estava trabalhando naquilo, era diferente, mas para nós que
estávamos ali vendo pela primeira vez, pensar no diagnóstico, eu por exemplo
participei de um item, de um objetivo, depois então eu participei de um segundo
workshopping com algumas pessoas da área meio. (3 P E)
Havia, explicitamente, uma expectativa por parte de algumas(ns)
gestoras(es) das áreas meio que haviam participado de outras revisões do planejamento
quanto ao seu grau de participação na edição 2014. O termo mesmo nos remete a uma
informação implícita de que as(os) gestoras(es) dessas áreas sabem de seu papel e grau
de importância dentro da Instituição, reconhecem, portanto, que seu setor não é o
negócio fim da IES e, talvez por isso, tenham tido, na visão delas(es), papel secundário
no processo.
No primeiro momento como nós estávamos acostumados nos planejamentos anteriores
a participar mesmo sendo área meio, sendo gerentes, essa era a nossa impressão, de
que participaríamos também, claro que as definições estratégias, macro seriam feitas
pela Reitoria, mas, a partir dai, os desdobramentos nós participaríamos, foi uma
metodologia um pouco diferente disso, [...] eu participei umas três vezes, acho que dois
ou três workshop. (3 P E)
De fato, os dados das entrevistas nos remetem de que há uma divisão
hierárquica implícita entre as(os) gestoras(es) que são da área acadêmica e as(os) das
áreas meio, em que há uma maior participação no processo decisório da formação das
estratégias por parte das(os) estrategistas da área intitulada acadêmica.
No primeiro convite para o encontro coletivo, endereçado às(aos)
estrategistas para consultarem os resultados da pesquisa aplicada à comunidade interna
e externa da Instituição, o vocativo utilizado remete a essa dicotomia por parte das(os)
gestoras(es) que estão à frente do planejamento estratégico, uma vez que está explícita a
divisão entre elas(es).
Gestor e Coordenador, para que você comecea se preparar para o primeiro whokshop
do Planejamento Estratégico que ocorrerá amanhã, dia 7, disponibilizamos o resultado
179
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
consolidado das pesquisas aplicadas junto a alunos e pais, funcionários, docentes e
sociedade em geral. [...]. (3 T AD)
Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007) argumentaram que a abordagem
prática deve promover a participação, além das(os) gestoras(es) da alta administração,
os demais atores – como gerentes de nível médio e demais funcionários – envolvidos no
fazer estratégia, bem como conhecimentos de várias áreas do saber, logo tanto
estrategistas da área acadêmica quanto da área meio. Nas palavras dos autores: embora
as ações dessas(es) praticantes possam influenciar na estratégia de maneira não
intencional, elas(es) são importantes para a sobrevivência e até mesmo para a vantagem
competitiva da instituição. Por isso, a relevância de participarem praticantes de todos os
níveis dentro da organização. E, no caso da Instituição estudada, das duas áreas
segmentadas no planejamento estratégico da IES: acadêmica e meio.
Além disso, como propôs Foucault, o poder não está centralizado em uma
pessoa/entidade como um lugar determinado, no caso da IES estudada: em uma área. Na
verdade, para o autor, o poder está implícito em uma rede de relações estratégicas entre
indivíduos ou grupos, dessa maneira se torna relevante para o sucesso do processo
estratégico envolver as(os) estrategistas das duas áreas.
Outra questão levantada acerca da metodologia foi sobre os prazos e as
solicitações de informações. Os prazos eram sempre muito curtos e que elas(es) já
tinham muitas atribuições em seus setores, o que fez que houvesse uma sobrecarga de
trabalho. Logo, era necessário que as(os) estrategistas elegessem prioridades e o
planejamento, por vezes, foi relegado ao segundo plano. Também foi dito que boa parte
das informações solitadas estava disponível nos sistemas da Instituição e que o próprio
pessoal que estava à frente do planejamento poderia providenciar, dessa forma, tais
gestoras(es) teriam mais tempo para focalizar no que realmente era de sua competência.
[...] muitas coisas que eles deram para a gente fazer, eles poderiam ter feito o
levantamento, até facilitaria não na questão a gente não quer fazer, mas no nosso dia a
dia a gente deixou de fazer melhor alguma situação, alguma solicitação deles, porque
eles dão uma semana para a gente dar uma devolutiva e a gente faz no último dia do
prazo, porque a gente acabou não priorizando né. Às vezes algumas coisas eles
mesmos poderiam ter levantado, a gente tem o sistema acadêmico, a gente tem o
sistema de orçamento, tem a ouvidoria, para eles trazerem as situações para a gente
trabalhar em cima. (6 P E)
180
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Além disso, quando as(os) gestoras(es) das áreas meio foram
convidadas(os) a participar do planejamento estratégico, os mapas estratégicos já
estavam prontos segundo relataram, então era mais para contribuir com o que já estava
posto, pois a fase de coleta e análise dos fatores já havia sido realizada, e elas(es) não
haviam entendido muito bem. Ficou evidente o desejo delas(es) em contribuir em todas
as etapas do PEI. Esse comprometimento com a Universidade é uma aspecto
extremamente positivo, de acordo com as prescrições da abordagem da Estratégia como
Pratica Social, para ao sucesso do fazer estratégia, é necessário que todas(os)
envolvidas(os) estejam motivadas(os), sintam-se valorizadas(os), dessa maneira, além
de haver esforço para implantação das ações, também outras estratégias poderão
emergir durante a execução dos procedimentos.
Claro se a gente conhecesse o todo, mais do início, pelo menos na nossa concepção,
isso seria melhor que nós iriamos acompanhando e poderíamos até nos antecipar em
alguma coisa. [...] é claro que nós poderíamos contribuir muito mais se a gente tivesse
um entendimento do todo, de uma forma mais geral e aprofundada, nós tínhamos uma
visão geral daquele momento. (3 P E)
Kwon, Clarke e Wodak (2014) abordaram que a legitimação envolve os
componentes do grupo que estabelecem o controle, justificando os pressupostos
subjacentes e construindo a credibilidade de determinados pontos de vista. Com relação
às(aos) gestoras(es) da área acadêmica, os dados sugerem ter havido uma participação
maior, bem como uma contextualização acerca do planejamento estratégico, além da
apresentação de cenários internos e externos, a fim de que tivessem mais subsídios no
planejamento. A seguir, apresentamos o relato coletado em entrevista:
[...] nós fomos convidados no início, para que nós soubéssemos que ia acontecer o
planejamento estratégico e fosse apresentada a consultoria. [...] então as nossas
reuniões se deram mais na instância da Unidade Acadêmica. Fizemos as discussões,
entendemos o que o planejamento estratégico estava prevendo, quais eram as etapas.
Nós estávamos participando daquela primeira fase que se tratava do posicionamento
da Instituição: missão, visão e valores e dentro da Unidade Acadêmica também. Nesse
processo a gente avaliou alguns cenários da Unidade Acadêmica e também dos cursos.
(7 A E)
Os dados indicaram que, principalmente os estrategistas que ficaram como
líderes de projeto, como se envolveram mais e tinham a incumbência de detalhar o
181
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
projeto, entenderam mais a proposta do planejamento no todo. No entanto, temos que
considerar que líderes de projetos são em número reduzido, segundo dados da análise
documental.
O uso do aplicativo disponibilizado pela consultoria para que as(os) líderes
pudessem inserir os projetos foi bem visto por elas(eles). Colocaram que essa novidade
da metodologia possibilitou uma organização e aprendizado. Mais uma vez,
demonstraram estarem comprometidas(os) e valorizando a nova experiência.
[...] achei esse interessante também, pelo modo como eles conduziram e pelo aplicativo
mesmo, porque é um programa mesmo, que vai te ajudando a colocar, a organizar, a
definir as etapas, então já aparecem algumas questões que você tem que colocar, então
isso foi bom. (7 A E)
Há uma ansiedade, talvez por falta de conhecimento acerca da próxima
etapa, de como serão encaminhadas a priorização, a execução e o acompanhamento do
planejamento da Instituição. Talvez, pelo fato de que a priorização dos objetivos não
tenha sido feita coletivamente, nem tampouco socializada entre as(os) praticantes do
processo estratégico, segundo relataram algumas(ns) estrategistas. Essa nossa
percepção se deu pelo fato de que as(os) gestoras(es) ainda não conheciam os objetivos
estratégicos prioritários para a Instituição.
A meu ver ainda está indefinido os principais objetivos da Universidade, um deles com
certeza deve ser o seu crescimento nos próximos dez anos, como é que vai conseguir
manter esse crescimento dentro do cenário que nos encontramos, e outro: quais são as
politicas que vão ser desenvolvidas com relação a cursos e as modalidades de cursos.
(1 A E)
O conteúdo desse relato torna-se relevante, porque a abordagem da EPS
prega que deve haver um maior número de participantes em todos os níveis hierárquicos
envolvidas(os) no processo estratégico e, também, que a organização tenha uma
estratégia de divulgação e envolvimento daquelas(es) que não foram convidados a
participar do processo, mas que vão auxiliar na execução dele. O que observamos, com
base nas entrevistas, é que havia estrategistas que participaram das etapas, mas não
conheciam os objetivos estratégicos.
Ao perguntarmos sobre como seria a socialização dos resultados do
planejamento com as(os) funcionárias(os) que não participariam do processo, mas que
182
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
certamente teriam que se envolver em sua execução, não havia ainda o conhecimento de
como isso acontecerica na Instituição.
A socialização para com eles. Creio que quem vai puxar a frente do planejamento,
porque a consultoria vai embora, mas quem fica é o gestor do PE juntamente com
aquele que é o líder do projeto, mas talvez não vai ter um envolvimento muito grande
porque não fizeram parte do processo. (2 A E)
O único indício localizado, na análise documental, dessa socialização foi no
primeiro convite emitido às(aos) estrategistas, citado anteriormente, cujo fragmento
reapresentamos a seguir.
Em breve, você receberá mais informações do projeto, que deverão ser repassadas por
você a sua equipe. (2 R AD)
O processo de avaliação e construção da Missão, Visão e Valores
Institucionais iniciou com a pesquisa aplicada antes mesmo de o planejamento iniciar
com toda a comunidade acadêmica e sociedade local. A Instituição disponibilizou, em
seu portal e, também, internamente, encaminhou, às(aos) funcionárias(os), pesquisa
acerca das expectativas que as comunidades interna e externa tinham sobre o futuro da
Unesc, ou seja: como viam à Universidade nos próximos dez anos. No e-mail – Figura
36 – foi encaminhado agradecimento às(aos) que participaram da pesquisa.
183
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 36: E-mail Agradecendo a Participação na Pesquisa
Fonte: Dados da Pesquisa
Realizando a análise semiótica da Figura 37, relacionamos a ideia de futuro
com a imagem da criança. Além disso, há uma frase slogan utilizada Construindo juntos
a Unesc de 2015. O verbo no gerúndio remete-nos à ideia de que é algo que está em
andamento, já iniciou, mas permanece em realização. Esse sentido, somado ao termo
juntos, materializou que a Instituição não deseja fazer seu planejamento desassociado da
necessidade da comunidade acadêmica e externa à IES. Essa frase remete, a(o)
leitora(r), o desejo de inseri-la(o) no fazer estratégia, dito de outra maneira, seria como
se fosse dito: você também faz parte da Unesc, a Unesc somos todas(os) nós.
No entanto, ao mesmo tempo em que possibilita a participação de outras
pessoas para o planejamento estratégico, as quais não estão contempladas no grupo do
Planejamento Institucional, fica evidente que não há uma preocupação com gênero, em
específico com as mulheres. Vejamos os convites apresentados nas Figuras 30 e 32. Na
primeira, a frase de agradecimento que finaliza o e-mail: Desde já agradecemos a
todos!, e, na seguinte, a frase: Construindo juntos a Unesc de 2015, em que os termos
todos e juntos incluem, do ponto de vista dos estudos de gênero, somente os
representantes masculinos. Scott (1995, p. 72) esclareceu que “[...] o uso gramatical
envolve regras formais que resultam da atribuição do masculino ou do feminino.”
Com o propósito de contribuir com a literatura acerca da legitimação em
empresas multinacionais na perspectiva discursiva, Vaara e Tienari (2008)
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
concentraram a atenção nas estratégias textuais, adotando a abordagem da análise
discursiva crítica (a qual atua em três níveis textuais: texto – nível micro elementos
textuais; prática discursiva – produção e interpretação de textos; prática social –
contextos situacional e institucional).
O fato é que os documentos que registram a estratégia são textos poderosos
por meio dos quais objetivos, valores e ideologias são promovidos e legitimados, e
alguns de seus efeitos são explícitos, outros passam facilmente despercebidos,
explicaram Rouleau e Balogun (2011). No texto em análise, acreditamos que, em razão
da prescrição da norma padrão do português, essa desigualdade fica despercebida ao
leitor, tornando as mulheres invisíveis no processo estratégico.
Sabemos que a gramática da Língua Portuguesa prescreve a concordância
com o masculino, porém, se o desejo é incluir a diversidade de representações, porque
não explicitar a questão de gênero e enfatizar a vontade de que o convite é também para
o público feminino? Possivelmente, a resposta para isso é o fato de que já está
naturalizado, e ratificado pelas normas da gramática normativa do Português, que a
mulher atua como pano de fundo nas organizações. E cabe, cada vez que for explicitado
em texto, a supremacia masculina.
Retomando as etapas do fazer estratégia, com base nos dados da pesquisa
aplicada, a consultoria apresentou uma proposta de Missão, Visão de Futuro e Valores,
a qual foi discutida, primeiramente, com os membros da reitoria e diretoras(es). Essa
proposta foi levada aos seis grupos de trabalho para apreciação com seus pares e
elaboração de proposta de alteração, se fosse o caso. Então, essa revisão, nos dois
primeiros momentos, foi realizada por parte do grupo gestor, uma vez que a proposta
primeira foi elaborada pela consultoria, seguiu para a Reitoria e para os grupos da área
acadêmica, Iparque e Colégio Unesc. Quando questionada(o), a(o) entrevistada(o)
afirmou ter participado da elaboração da Missão, Visão e Valores da Instituição.
Participei, de todos eles, por meio da UNA, reunião de coordenadores que não era a
UNA, mas a Reitoria que estava convocando. (1 A E)
Depois de avaliada pelos seis grupos, retornou à Reitoria e foi apresentada,
em workshop, no dia nove de setembro, ao grande grupo de estrategistas para ajustes e
validação. Neste encontro, participaram gestoras(es) tanto da área acadêmica, quanto da
185
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
área meio. A reunião foi dividida em dois momentos: no primeiro, foram apresentadas
uma breve retrospectiva da caminhada do processo estratégico até aquele momento; a
proposta da nova Missão, Visão de Futuro e Valores e o mapa estratégico. Ficou aberto
um canal de comunicação para quem desejasse encaminhar sugestões de alteração,
dentre outras. No segundo momento, as(os) praticantes foram segmentados em grupos
para que, em equipe, listassem as proposições. Vaara, Sorsa e Pälli (2010, p. 20)
chamaram de consenso forçado, quando há a necessidade de o grupo estratégico chegar
a um grau unanimidade e alinhamento com o trabalho da estratégia subsequente à
discussão.
Cabe ressaltar que ainda é necessário passar pela aprovação nas instâncias
do Conselho Universitário (CONSU) e do Conselho Superior de Administração (CSA)
as propostas de Missão, Visão de Futuro e Valores Institucionais, cabendo ainda
alterações.
Desses seis grupos em conjunto com as(os) gestoras(es) da Instituição e
partindo dos resultados da pesquisa mencionada acima, emergiram os objetivos
estratégicos e nove projetos institucionais, os quais foram discutidos nos seis grupos do
PEI e, paulatinamente, construídos de forma colaborativa e democrática. De acordo com
os dados secundários, são eles: Estruturação do modelo e infraestrutura para EAD;
Melhoria de eficiência operacional; Fortalecimento do ensino; Plano Diretor de
Tecnologia da Informação (PDTI); Plano de Infraestrutura (PI); Programa de
comunicação e relacionamento; Fortalecimento das políticas de permanência;
Redesenho da ADITT; Internacionalização.
Cabe salientar que, por decisão da Reitoria, os grupos que iniciaram os
trabalhos são os quatro da área acadêmica, do Colégio Unesc e do Iparque, ou seja:
verificamos que não há da área meio (administrativo), inicialmente.
Foi uma decisão nossa, porque a gente entendeu que precisava da participação de
diferentes segmentos, precisava ter o olhar de pessoas diferentes, porque são projetos
da Instituição, então não dava para ter um só segmento olhando. Teria que ter o olhar
de todos os lugares. Por isso a gente pediu para diversificar, o máximo diversificado os
grupos para que pudesse ter o olhar de todo mundo. Lógico que sempre tinham pessoas
que puxavam, porque tinha essa responsabilidade, porque tinha o conhecimento da
área, mas sempre com componentes de outras áreas na discussão para complementar.
(5 A E)
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
As(os) gestoras(es) das áreas meio participaram dos workshops em conjunto
com as(os) demais estrategistas da área acadêmica e, em outros momentos, quando foi
necessário saber quais infraestruturas física, tecnológica ou de pessoal seriam
necessárias para realizar os objetivos e projetos delimitados.
Há uma satisfação acerca dos projetos. Em outras palavras: as(os)
gestoras(es), independentemente se da área acadêmica ou da área meio, demonstraram
satisfação em participar da elaboração dos projetos, mesmo que seus escopos já tenham
vindo delimitados. Elas(es) alegaram que foi uma oportunidade para entender e
inserirem-se no processo do planejamento, como também de aprenderem sobre o
assunto. No caso de área meio, houve mais um ganho que, ao levantarem as
necessidades e propostas de melhorias para seus setores, foi possível realizar o
planejamento de seu setor.
O negócio assim de botar no programa, diz isso ai tem uma linguagem técnica, que a
gente não domina muito, a gente tem que aprender, uma técnica, uma tipologia para
fazer o negócio [...]. (4 A E)
[...] a gente também teve liberdade para propor, para sugerir, claro sem sair do escopo
do projeto, mas dentro do escopo do projeto pudemos trabalhar e adequar para atender
de uma forma melhor os objetivos [...]. (3 P E)
Acerca dos indicadores, primeiramente, foram levantadas as métricas já
existentes na Instituição e, na sequência, as(os) gestoras(es) foram convidadas(os) a
estabelecer, com o apoio da equipe do planejamento, as demandas as quais resultariam
nos indicadores e prazos para monitorar o desempenho estratégico da Universidade. Em
conjunto com os membros da reitoria e as(os) diretoras(es), foram definidas as formas
de mensuração para cada um dos objetivos constantes no mapa estratégico.
A mesa da reitoria apenas validava depois das discussões terem acontecido em vários
locais, principalmente os mais desenvolvidos, tanto que a própria consultoria disse que
agora no final na definição de prazo e tal, eles nunca viram uma Instituição que
deixaram tanto para decisão dos setores. Tanto que houve pequenas interferências
nossas no sentido de eles verem que tinham coisas que ou precisam de um tempo maior
porque não iam conseguir resolver naquele tempo, e outras que precisavam encurtar o
tempo, coisas que sabíamos que dava para fazer em seis meses, mas a gente não sabe
se as pessoas não entenderam direito e colocaram 30 meses, casos que precisavam de
ajustes por falta de entendimento do que eles precisavam fazer. (5 A E)
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Sobre a priorização dos projetos, essa definição coube à Reitoria,
considerando diversos fatores internos. Essa definição realizada pela Reitoria e diretores
foi socializada com as(os) demais praticantes do fazer estratégia.
Os resultados desses relatos sugeriram que a revisão do planejamento
estratégico 2014, de certa forma, não promoveu a participação das(os) estrategistas das
duas áreas de forma igualitária, tampouco se estendeu aos níveis hierárquicos de menor
poder de decisão. A Figura 37 ilustra o processo na percepção das(os) entrevistadas(os).
Figura 37: Fluxo da Formação da Estratégia na Percepção das(os) Entrevistadas(os)
Fonte: Dados da Pesquisa
Ao analisar a Figura acima, percebemos que em todas as etapas, as(os)
entrevistadas(os) mencionaram que houve validação das definições e, além disso, antes
das aprovações, por meio da pesquisa realizada e da análise da matriz SWOT –
momento em que os membros do grupo do planejamento institucional puderam dar suas
opiniões, sugestões, enfim contribuir efetivamente. No entanto, os relatos sugeriram que
o processo decisório propriamente dito ficou ao encargo de poucas pessoas, as quais
compõem a alta gestão da Instituição, ou, em alguns momentos de deliberação, também
por intermédio dos membros dos seis grupos estratégicos. Dessa maneira, entendemos
188
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
que a totalidade do grupo do planejamento institucional não teve oportunidade de
participar de etapas relevantes do processo estratégico.
Whittington (2001) defendeu que, atualmente, há um interesse no
desenvolvimento de micro estratégia – atividades das(os) atores dentro das
organizações. Dessa maneira, caberia à IES estudada promover a socialização e
envolvimento das(os) praticantes das duas áreas de atuação – acadêmica e meio – e dos
cinco níveis hierárquicos, garantindo, assim, a participação, mesmo que indireta, das(os)
demais estrategistas no processo de elaboração, a fim de haver mais sucesso na etapa de
implantação das estratégias.
Articulando os resultados da pesquisa com a proposta de Whittington
(2006), elaboramos a Figura 38.
Figura 38: Comparação das Abordagens de Estratégia e a IES Pesquisada
Fonte: Dados da Pesquisa
No extremo esquerdo, apresentamos a abordagem tradicional, a qual
prioriza as questões econômicas, a competitividade da organização. A estratégia é
deliberada pela alta gestão. Como intermediária entre a tradicional e a EPS, temos a
processual, para a qual a estratégia é vista como processo, afirmou Whittington (2004).
Inclui questões sociais e políticas, além das econômicas e praticantes de outros níveis
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
hierárquicos. No outro lado, no extremo direito, a EPS busca resolver as lacunas das
duas primeiras abordagens: aproximando o pesquisador do objeto estudado por meio da
pesquisa qualitativa, valoriza as práticas cotidianas de suas(seus) praticantes, pois visa
entender como estes fazem a estratégia e também as estratégias emergentes. Dessa
maneira, a estratégia passa a ser uma prática social dentro da organização.
Verificamos que o desejo, expresso pelas(os) gestoras(es), era que o
processo fosse o mais participativo possível. No entanto, conforme os relatos das(os)
entrevistadas(os), ele se caracterizou, com relação ao seu processo decisório, entre as
abordagens tradicional e processual. Porque, embora as decisões tivessem sido
validadas em conjunto com o grupo do planejamento institucional, elas(eles) já
chegaram orientadas(os), direcionadas(os), conforme reflexões realizadas antes com os
grupos da Reitoria e diretoras(es) ou, em outros momentos, com os membros dos seis
grupos estratégicos. Dessa maneira, o envolvimento das(os) gestoras(es) também se
fragilizou, se analisarmos à luz da EPS. No entanto, percebemos que no que se refere às
práticas cotidianas, foi dada a oportunidade de as(os) praticantes exporem suas ideias e
necessidades. Ratificando o exposto, para Whittington (1996; 2001; 2003; 2004; 2006),
é necessário durante o fazer estratégia, além dos conhecimentos formais e específicos
dessa área de saber, valorizar as experiências cotidianas das(os) diversas(os)
estrategistas, porque é desse reconhecimento que as estratégias vão, em muitos casos,
emergir nas organizações.
6.3 FATORES QUE IMPACTARAM NO FAZER ESTRATÉGIA
Nesta seção, é apresentada a análise semiótica dos fatores que, na percepção
das(os) entrevistadas(os) e na observação realizada pela pesquisadora, impactaram –
positiva ou negativamente – no fazer estratégia. Para Foucault (2008), por intermédio
das práticas discursivas, podemos interpretar o discurso historicamente, a fim de
compreendermos o que está implícito nelas. Significa ir além do que está posto no
enunciado. Cabe aqui a análise desses fatores, uma vez que, segundo Foucault (2015, p.
284), as relações de poder também se explicitam de baixo para cima nas organizações,
por meio das microrrelações de poder em movimentos contínuos de idas e vindas:
190
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
O poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que
só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas
mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou um bem. O poder
funciona e se exerceem rede. Nas suas malhas os indivíduos não só circulam,
mas estão sempre em posição de exercereste poder e de sofrer sua ação;
nunca são o alvo inerte ou consentido do poder, são sempre centros de
transmissão. Em outros termos, o poder não se aplica aos indivíduos, passa
por eles.
Dessa maneira, o poder indica ser materializado no fazer estratégia da IES
estudada por intermédio dos seguintes fatores, os quais foram percebidos nas práticas
discursivas, como fonte de poder: cultura organizacional – a visão individual em vez
de coletiva, temas historicamente rejeitados na IES e o conhecimento técnico e da
Instituição por parte das(os) praticantes; e política institucional – o contexto político
eleitoral; a hierarquia de cargos; representação de curso ou setor que têm
representatividade econômica. Cabe ressaltar que esses fatores, em conformidade com a
proposta da EPS e da pesquisa qualitativa, emergiram durante a análise dos dados.
6.3.1 Poder: Cultura Organizacional
Passemos, então, à apresentação dos fatores considerados aqui como partes
da cultura organizacional: os chamados feudos pelos estrategistas, ou seja: visão
individual em vez de coletiva, temas historicamente rejeitados na Instituição estudada e
o conhecimento técnico e da Instituição por parte das(os) estrategistas. Foucault (1982)
sugeriu que olhemos as diferenças linguísticas e culturais dos indivíduos, bem como
suas intenções, a fim de compreendermos o poder que dali emerge.
Johnson, Scholes e Whittington (2007) expuseram que a cultura
organizacional é composta por quatro camadas, a saber: valores – os quais geralmente
são materializados por meio da missão, objetivos ou estratégias institucionais; crenças –
são conficções que as(os) praticantes defendem dentro das organizações;
comportamento – refere-se a maneira como a instituição opera no seu dia a dia, suas
rotinas e estruturas; suposições dadas como certas – trata-se do núcleo da cultura
organizacional, já que são as barreiras difíceis de serem transportas.
191
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Com o objetivo de contextualizar nossas escolhas, ressaltamos que
entendemos cultural organizacional como um paradigma de crenças e valores definido e
executado por um grupo específico. Tavares (1996, p. 2) esclareceu que:
A cultura organizacional é composta de vários elementos, entre os quais se
destacam pela importância que assumem, os valores, as crenças, os ritos, os
tabus, os mitos, as normas, a comunicação formal e informal. Todos esses
elementos condicionam e direcionam o desempenho das pessoas, que, por sua
vez, irá condicionar e direcionar o desempenho das organizações.
Trata-se de práticas de poder, na visão de Foucault (2015), de micropoder
colocadas nas atividades diárias das(os) gestoras(es). Neste sentido, há estrategistas na
Universidade que, segundo os dados coletados, parecem não pensar prioritariamente na
IES. Sugere haver uma prática institucionalizada que é resolver as questões relativas ao
seu setor e às atividades emergenciais, o que impede muitas vezes de refletir no
coletivo, na Universidade de forma abrangente e pensando a médio e longo prazos. Em
outras palavras, constatamos que algumas(ns) praticantes pensam muito no imediato, no
curto prazo e nas demandas cotidianas. Essa percepção foi sentida tanto por estrategistas
do primeiro nível quanto do terceiro plano hierárquico.
[...] eu ainda percebo um foco, chamo aqui de feudos, essa é a minha percepção que eu
tenho, ai se esquecem da situação maior da Universidade e como desenvolver um
estudo para a Universidade e não para o seu núcleo, para o seu feudo. (1 A E)
Eu penso que as pessoas se baseiam muito ainda nos problemas que elas têm, nas
angustias, nos calos que elas têm no dia a dia, então é muito na resolução desses
problemas do que na visão de futuro de jogar para frente, então muito tivemos que
trabalhar nesse sentido de provocar, com a consultoria, de futuro mesmo, de ver para
onde estamos indo, para onde queremos crescer. [...] então eu vejo que essa questão
dos problemas do dia a dia, as pessoas estão muito ligadas ai e às vezes elas ficam um
pouco receosas de pensar no futuro, eu vejo que a gente precisou provocar muitas vezes
para as pessoas terem que se desprender do concreto, da dificuldade real para que
pudessem pensar na perspectiva de prospecção do futuro. (5 A E)
Trata-se da preocupação de resolver as questões imediatas, concretas, os
problemas do dia a dia. Outro exemplo de cultura organizacional, é o fato de haver
temas na Instituição que sofrem resistências por parte de algumas(ns) estrategistas.
Alguns deles já são relutâncias históricas dentro da Universidade segundo as(os)
192
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
entrevistadas(os), a Educação a Distância é um exemplo deles. Então, temáticas assim
tiveram dificuldades para serem discutidas em alguns grupos e, consequentemente,
elaboradas estratégias específicas. São temas que não avançaram tanto na discussão
como seria preciso na visão de algumas(ns) praticantes do processo estratégico.
Têm várias questões que a gente precisa avançar e a gente tem dificuldade, porque as
pessoas são muito conservadoras, eu acho que, apesar de ser uma Universidade que
tem o conhecimento historicamente produzido, mas que também tem que pensar na
inovação, na mudança, na transformação, ainda a Universidade é um lugar de muito
conservador. (5 A E)
Portanto, os dados apontaram que há participantes do planejamento que não
se desprendem do conservadorismo para contribuir com o processo estratégico e pensar
a Universidade focalizando o futuro coletivo. São, no dizer de Foucault (2015), o poder
expresso em micropoderes que vão, neste caso, interferindo no fazer estratégia de
forma localizada, no caso, com relação a determinados temas, levando a algumas
situações em que contrapõem com o poder maior da Instituição.
Além desses fatores, ao realizar a análise das entrevistas, identificamos que
o conhecimento, seja o técnico acerca do planejamento estratégico ou da história da
própria Instituição fez com que algumas pessoas fossem mais expressivas no processo.
No dizer de uma(m) entrevistada(o), a ausência de conhecimento sobre o que
planejamento estratégico pode ter prejudicado a participação de praticantes em alguns
grupos, uma vez que não se sentiam à vontade para contribuir, porque não conseguiam
acompanhar a condução das atividades. Entendemos, então, que tanto gestoras(es) da
área acadêmica quanto meio que conheciam os procedimentos ou que já haviam
participado de outras revisões, sentiram-se mais confiantes para expressar suas opiniões.
[...] eu acredito que carecia de conteúdo e conhecimento do que se tratava um PE,
reorganizar determinadas informações no sentido de que certa forma fazer o
planejamento estratégico. (1 A E)
[...] acho que, no meu caso, falta de conhecimento especifico da área [...]. (4 A E)
No entanto, do ponto de vista de outras(os) estrategistas, a falta desse
conhecimento específico não inibiu a participação das(os) praticantes na elaboração da
193
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
estratégia, em razão de que a equipe que conduzia o processo orientava e estava à
disposição para tirar as dúvidas e auxiliar as(os) estrategistas.
A gente teve o apoio das pessoas que estavam à frente do processo, teve as pessoas do
setor que estavam sempre dando apoio, então eles, sempre que a gente solicitava eles
vinham. Também sem solicitar, eu penso que eles passaram em todos os grupos sempre
foi contemplado com a presença deles, ou explanando alguma coisa ou dando
orientação. Então nós fomos atendidos e assistidos durante o processo. (11 P E)
Dessa maneira, os depoimentos acerca da questão do conhecimento
específico sobre o planejamento estratégico sugerem que pode ter inibido algumas(ns)
estrategistas, mas não impediu a participação plena delas(es), uma vez que houve
assessoramento técnico àquelas(es) que necessitaram.
Também ocorreram praticantes que ou por terem mais tempo de Instituição
ou por dominarem procedimentos internos da IES, espontânea e positivamente,
envolveram-se mais no processo estratégico. Logo o conhecimento acerca da Instituição
– conhecer as rotinas, legislações, dentre outras informações sobre a Universidade – fez
com que tais praticantes influenciassem positivamente a elaboração da estratégia. Suas
contribuições exalavam poder oriundo do saber revelado afirmaram as(os) participantes
nas entrevistas.
[...] mesmo outro momento quem não tinha muita experiência de gestão, mas tempo de
casa, também faz com, que seja uma pessoa numa dinâmica como essa, que se
destaque. Que ajude bastante, que acaba exercendo uma liderança. (4 A E)
Acho que sempre tem um ou outro que se destaca, com uma articulação maior de
oralidade, conhecimento de contexto da casa, como por exemplo, um coordenador que
trabalha há bastante tempo aqui, que teve vários cargos de gestão, lembrei bem agora
de um. Destacou-se no grupo. (4 A E)
Analisando pelo viés do conceito de poder de Foucault (1996), há uma
articulação entre o conhecimento e o poder no sentido de as práticas discursivas
daqueles que detêm o conhecimento moldarem o indivíduo, ou seja: são por meio dos
discursos que o poder se materializa e naturaliza práticas. No caso da IES estudada, é
por meio do poder que as(os) estrategistas exercem em seus setores, ou em seus grupos
que aderem ou não a determinadas temáticas de interesse institucional, ou ainda em
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
razão de individualmente possuírem conhecimento técnico sobre o planejamento
estratégico ou também por estarem há mais tempo na Universidade e, devido a isso
terem mais conhecimento histórico dela. Dessa maneira, as(os) praticantes acabam
apropriando-se dessas questões como uma forma de poder para se fazerem ouvidas(os)
ou ainda com o objetivo de fazer valer sua opinião pessoal ou de pequeno grupo diante
da vontade coletiva de maneira a ser validada por um grupo. Com essa validação tais
questões tendem a tornarem-se natural de tal forma que a vontade de grupo
inibe/impede a vontade considerada coletiva.
São esses indivíduos ou grupos que acabam por produzir um discurso como
coletivo, em outras palavras e no caso da IES estudada: a comunidade acadêmica
gestora. Portanto, é necessário, no dizer de Foucault, que os demais sujeitos tenham
consciência de que se trata da construção de um discurso que busca moldar e naturalizar
comportamentos e que, tão logo, as(os) demais praticantes tenham esse discernimento,
poderão questionar tais práticas, se for o caso.
6.3.2 Poder: Política Institucional
O contexto do poder, por meio da política institucional, foi materializo
durante a revisão do processo estratégico, por meio de algumas formas particulares, a
saber: o contexto político eleitoral; a hierarquia de cargos; representação de curso ou
setor que têm representatividade econômica. Adotamos o conceito de poder de Foucault
apresentado no Capítulo 2 desta tese, para o qual o poder, na verdade, são relações de
poder as quais são flexíveis, pois estão em constante movimento e estão contidas nas
práticas sociais do dia a dia das(os) estrategistas. Na visão de Foucault (1999b), as
relações de poder – estratégias – manifestam-se nas práticas cotidianas, afetando a vida
das(os) atores sociais. Em outras palavras: a estratégia é vista como um discurso, ou um
conjunto de práticas que regulam possibilidades de agir sobre um determinado
fenômeno.
No Estatuto da IES estudada, Seção IV, que trata da eleição da Diretoria
Executiva, está explícito o sistema de eleição para Reitor e Vice-reitor (equivalem a
Diretor Presidente e Vice-Diretor Presidente), bem como a respeito do voto direto e
secreto (Resolução 02/2007/CSA). Diante dessa normativa, a cada quatro anos, a
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Instituição passa pelo processo eleitoral envolvendo toda a comunidade acadêmica. O
Reitor reeleito tem mandato até trinta de junho de 2017, conforme Art. 55, Capítulo VII,
Resolução 03/2009/CSA103
. Portanto, a revisão do processo estratégico foi realizada em
um período em que já é percebido na Universidade o movimento político das próximas
eleições para o qual deverá haver um candidato não natural, ou seja: o atual dirigente já
foi reeleito e não pode mais se candidatar, e a IES se encontra sem vice-reitor, já que o
eleito pediu demissão da Universidade, dessa maneira, não há candidatos considerados
genuínos.
Este contexto eleitoral apresentou o fator política institucional, a qual foi
percebida no discurso das(os) entrevistadas(os), porque, nos relatos, surgiram falas de
que há praticantes que, em vez de planejar e priorizar estratégias institucionais,
buscavam viabilizar ações em interesse próprio, visando alcançar benefícios que
trouxessem vantagens políticas, uma vez que na Instituição, Reitor, Vice-reitor e
coordenadores de curso são eleitos pelo voto direto, e os cargos de gestão dos demais
níveis hierárquicos são indicação da Reitoria. Dessa maneira, a questão política torna-se
muito forte dentro da Universidade no dizer das(os) entrevistadas(os). Foucault (2013)
colocou que o exercício do poder, desde sua existência, é objeto de uma luta política.
Esse fator é sentido e externalizado por praticantes, conforme explicitado no fragmento
a seguir.
Principalmente e aí pode ser que não seja nem culpa delas (das pessoas), porque por
sermos uma Universidade comunitária, temos uma inserção política muito forte, e essa
inserção política acaba interagindo e dificultando ações estratégicas mais pontuais e
de longo prazo. (1 A E)
Trata-se de uma Instituição Comunitária, cujos dirigentes são eleitos ou
indicados. Esse cenário também fez com que houvesse uma relação de poder mais
explícita, já que não foi possível traçar estratégias desejadas por praticantes, porque
pessoas/grupos não abriram mão de manter determinadas estruturas e temáticas para não
diluir seu poder diante de uma parcela da comunidade acadêmica. Foucault (1982)
103
UNESC, Res. 03/2009/CSA, datada de 03 de março de 2009. Disponível em:
http://www.unesc.net/portal/resources/documentosoficiais/2792.pdf?1255714337. Acesso em 07 de julho
de 2015.
196
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defendeu que devemos analisar o poder nas relações entre as pessoas, uma vez que são
nelas em suas ações cotidianas que o poder se materializa.
Nós tivemos que fazer alguns recuos de algumas coisas que a gente achava que deveria
ser feito para virar uma tensão maior que pudesse inviabilizar o próprio PE, nós
tivemos que conservar algumas coisas, pelo menos duas (questões-coisas) no conjunto
da Universidade, pelo menos neste momento, para não criar uma outra resistência que
pudesse inviabilizar o planejamento todo. (5 A E)
Conforme a defesa de Foucault (2010), no cenário da Instituição estudada,
formou-se uma rede de micropoderes, ou seja: com poderes locais, estabelecendo
relações de poder entre as(os) participantes, articuladas nos diversos espaços da
Universidade, com o objetivo de manter tais poderes, a fim de que essas relações de
poder, além de se manterem, ficassem fortalecidas. Em princípio, esse cenário pode não
parecer negativo, no entanto, ao reprimir objetivos estratégicos que poderiam expandir
positivamente a Instituição, tornou-se negativo.
Nesse cenário poder/política, outro fator encontrado foi a questão do plano
hierárquico, em que apresença de um gestor de nível hierárquico nos grupos de trabalho
fez com que algumas(ns) praticantes da área acadêmica, na visão de coordenador de
curso, não desejassem expressar sua opinião em respeito à autoridade da função
ocupada.
Às vezes na colocação das falas, as pessoas se colocam nessa posição, por uma questão
hierárquica eles não enfrentam as outras ideias. Apesar de que nesse momento de
brainstorming onde todo mundo teria que contribuir de alguma forma mais
informações nesse brainstorming, mas algumas pessoas ficam mais resistentes em fazer
esse pronunciamento em função da hierarquia. Isso nos grupos grandes nos workshops.
(1 A E)
Na observação da reunião do dia cinco de julho, da qual participaram os
dois primeiros níveis da Instituição, e esse encontro era muito mais para socializar o
andamento das atividades realizadas nos grupos menores, percebemos que, quando se
tratava da(o) gestora(r) do Colégio, havia um certo melindre da(o) praticante fazer suas
em colocações acerca do Colégio. Acreditamos que isso se deu pelo fato de o colégio,
embora estivesse sendo tratado como uma dimensão independente na estrutura dada no
planejamento, de direito e de fato, até então, é subordinado a uma Unidade Acadêmica.
197
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Acreditamos que essa hierarquia possa ter inibido a participação efetiva em alguns
momentos por parte da(o) gestora(r) do órgão. No entanto, percebemos que havia
polidez, como uma preocupação, um respeito na fala da diretora da UNA para tratar do
assunto do Colégio, como se não quisesse ofender, tampouco restringir a fala da(o)
gestora(r).
Em contrapartida, nas reuniões do grupo do primeiro e segundo níveis
hierárquicos da Universidade, em que participaram o Reitor, chefe de gabinete, pró-
reitoras e diretoras(es), ficou explícito que as(os) praticantes do processo estratégico
tinham as mesmas condições de contribuir, dito de outra forma: todas(os) faziam suas
colocações independentemente de suas funções, não havendo diferenciação hierárquica
entre elas(es) no que se refere às contribuições. Pelo exposto, constatamos que as
contribuições das(os) diretoras(es) tinham repercussão no fazer estratégia com relação,
inclusive, a atores hierarquicamente superiores.
[...] em alguns momentos tinham diretores que o que eles colocavam prevalecia, mas
dependia de qual era ao assunto, dependia de qual era o interesse [...]. (2 A E)
Ainda dentro desse contexto político institucional, outra influência na
formação da estratégia deu-se por meio de pessoas que se sobressaíram em razão de
representarem um curso ou setor que têm representatividade expressiva dentro da
Instituição, o que, de certa forma, dava-lhes mais poder de inserção no evento, fazendo
com que suas opiniões fossem, talvez, mais enfáticas.
[...] mas entre técnicos e professores a gente percebe que umas (pessoas) se
sobressaem ou pelo tamanho do curso ou do departamento e a sua representatividade
dentro do contexto da Universidade. (1 A E)
Essa representatividade ancorada em um setor ou curso, cuja notabilidade
econômica é importante para a Instituição gerou um poder individual (ou a um grupo
específico de pessoas), fazendo com que tivesse mais autoridade para apresentar suas
opiniões. Para Foucault, o poder não é exercido somente por questões de direito, mas
sim, porque emerge das relações silenciosas de poder entre os indivíduos na sociedade,
no caso em estudo, na Instituição. Foucault (2015, p. 282) afirmou que:
198
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
[...] não se trata de analisar as formas regulamentares e legítimas do poder em
seu centro, no que possam ser seus mecanismos gerais e seus efeitos
constantes. Trata-se, ao contrário, de captar o poder em suas extremidades,
em suas últimas ramificações, lá onde ele se torna capilar; captar o poder nas
suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto
em que, ultrapassando as regras de direito que o organizam e delimitam, ele
se prolonga, penetra em instituições, corporifica-se em técnicas e se mune de
instrumentos de intervenção material, eventualmente violento.
A literatura apontou que as instituições, geralmente em seu fazer estratégia,
sofrem influência tanto de fatores tais como: econômicos – juros, financiamentos,
política cambial, inflação, tributação, distribuição de renda, dentre outros; políticos –
acordos internacionais, restrições ao desenvolvimento do negócio, entre outros;
tecnológicos – novos materiais, tecnologia na comercialização ou no mercado,
qualidade no ensino superior, outros; socioculturais – moda, crescimento populacional,
cultura; demográficos – densidade populacional, índices de natalidade e ou mortalidade,
crescimento demográfico-vegetativo; legais – legislações tributária, trabalhista,
comercial; liderança – poder –, entre outros. Tais fatores podem causar influências
positivas e/ou negativas na formação da estratégia.
Johnson, Scholes e Whittington (2007) esclareceram que são várias as
fontes de poder nas organizações, e que ele pode emergir tanto por meio de indivíduos
quanto de grupos. Citam como exemplos de poder: o poder formal por meio da
hierarquia; influência por intermédio de uma liderança carismática; controle de recursos
estratégicos, posse de conhecimentos e ou habilidades específicas; habilidade de
negociação e envolvimento no fazer estratégia.
Na Universidade estudada, foi possível compreender que o planejamento
estratégico foi moldado por fatores que interferiram no fazer estratégia. Esses fatores
sublevaram-se, por meio da análise semiótica, das práticas discursivas, sintetizados na
Figura 39.
199
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 39: Mapa Conceitual dos Fatores que Impactaram no Fazer Estratégia
Fonte: Dados da Pesquisa
Buscando experiências obtidas em outras instituições de Ensino Superior
brasileiras, trazemos Santos et al. (2009) que, na Universidade Federal de Alagoas,
dentre seus achados, verificaram que a falta de conhecimento dos processos
organizacionais; interferências de questões políticas; falta de visão sistêmica da
organização pelos funcionários; resistências culturais (cultura avessa a mudanças); falta
do hábito de planejar; falta de clareza da realização dos processos prejudicaram a
implantação do processo estratégico. Esses fatores ratificam os resultados apontados
neste trabalho.
No mesmo sentido, Kich e Pereira (2011) verificaram que os fatores
organizacionais, estrutura, liderança, cultura e comunicação influenciaram no processo
de implantação do Planejamento Estratégico. Albano e Garcia (2013), em seu estudo em
uma universidade federal, na qual pesquisou sobre os fatores organizacionais, obtiveram
como resultado que o fator conhecimento/experiência sobre um processo estratégico
para 81,2% das(os) estrategistas não foi um fator impeditivo para participar do
planejamento.
Os fatores identificados na IES pesquisada estão em consonância com a
proposta da EPS de Whittington (1996; 2006), uma vez que enfatizamos as práticas
sociais cotidianas durante a formação das estratégias. Para o autor, refere-se ao fazer
200
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
das(os) atores envolvidas(os) no fazer estratégia é o que, de fato, acontece nas
atividades, procedimentos e comportamentos do dia a dia das(os) praticantes. Tais
fatores foram frequentemente citados pelas(os) gestoras(es) participantes da pesquisa
como motivos de obstáculos e/ou maior acesso ao fazer estratégia.
Também estão em conformidade com Foucault (1996; 1999b; 2008; 2010;
2015), já que, em tais práticas, consideramos os aspetos sociais e históricos das(os)
estrategistas investigadas(os). Portanto, para compreendermos os fatores que chamamos
de cultura organizacional e política institucional na IES, consideramos o momento
social e histórico em que a Universidade se encontrava.
6.4 QUESTÕES DE GÊNERO: DISCRIMINAÇÃO OU SEGMENTAÇÃO NO
AMBIENTE DE TRABALHO
Nesta seção, desejamos apresentar a reflexão acerca da divisão sexual do
trabalho, evidenciando as questões de gênero com foco nos princípios da hierarquia – a
qual remete ao fato de haver trabalhos de homens que valem mais do que os
desempenhados por mulheres; e da separação por meio da qual há trabalhos que são
considerados masculinos enquanto outros são femininos.
Primeiramente, gostaríamos de definir o conceito de gênero adotado, neste
trabalho, como uma questão cultural, social e histórica que visa ampliar as reflexões
para além da dicotomia biológica como propôs Scott (1995). Significa abordar gênero
como uma construção social que propicia a explicação das relações de poder que
naturalizam a divisão sexual do trabalho impedindo a ponderação e o acesso às
mulheres na esfera pública – reprodutiva, por meio de cargos hierarquicamente mais
altos e ou de funções consideradas masculinas e mais valorizadas.
Essas questões são abordadas aqui já que, embora muito tenha sido
produzido na literatura a seu respeito, a desigualdade ainda permanece. Hirata e Kergoat
(2007, p. 597) argumentaram que “[...] sempre que tenta fazer um balanço da divisão
sexual do trabalho em nossas sociedades, se chega à mesma constatação em forma de
paradoxo: nessa matéria, tudo muda, mas nada muda.” E essa constatação não deve ser
somente em termos de quantificar, mensurar estatisticamente a participação das
mulheres em determinada profissão ou área do saber, chamada por Yannoulas (2011;
201
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
2013) de feminilização. É urgente, portanto, que os estudiosos se preocupem em
compreender as mudanças que ocorrem em uma profissão ou ocupação específica. Em
outras palavras, trata-se de estudar as justificativas dos motivos e consequências que
levam as mulheres a ocuparem determinadas funções/profissões – intitulado de
feminização por Yannoulas (2011; 2013). “As especialistas constataram que existe uma
intensa relação entre o acesso massivo de mulheres em uma determinada profissão ou
ocupação (feminilização, contabilidade de pessoas de sexo feminino ou fêmeas)”
(YANNOULAS, 2013, p. 39).
Portanto, aqui, procuramos compreender as questões de divisão sexual do
trabalho na Instituição estudada, considerando o momento histórico específico do ano
de 2014. Além disso, para esta análise, utilizamos as contribuições de Foucault acerca
do poder. O autor esclareceu que, metodologicamente, “[...] o importante não é fazer
uma espécie de dedução do poder que, partindo do centro, procuraria ver até onde se
prolonga para baixo, em que medida se reproduz, até chegar aos elementos moleculares
da sociedade” (FOUCAULT, 2015, p. 285). Mas, realizarmos uma análise precedente
dos dispositivos de poder: “mecanismos infinitesimais que têm uma história, um
caminho, técnicas e táticas e depois examinar como estes mecanismos de poder foram e
ainda são investidos, colonizados, utilizados, subjugados, transformados, deslocados,
desdobrados, etc. [...].” Em consonância com a proposta do autor, buscamos, em fontes
secundárias, dados oriundos da análise documental que pudessem, de certa forma,
justificar a divisão sexual do trabalho, detalhadas nas seções seguintes, uma vez essa
questão não emergiu nos dados primários.
6.4.1 Divisão Sexual do Trabalho: Funções Ocupadas – Níveis Hierárquicos
A Figura 40, a seguir, foi elaborada considerando o organograma da
Instituição (Figura 20). No nível 1, foram incluídas(os) as(os) assessoras(es) das pró-
reitorias (três homens e três mulheres) e o chefe de gabinete. Neste nível, como
principais gestoras(es), estão o Reitor e as três pró-reitoras, a saber: de Ensino de
Graduação (Prograd); de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão (Propex) e de
Administração e Finanças (Proaf).
202
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Ao analisar a composição do grupo distribuído nos cinco níveis
hierárquicos, observamos que a equipe gestora da Instituição é composta ligeiramente
por mais praticantes mulheres 54%, embora a função de Reitor – primeiro nível – seja
ocupada por um homem, mantendo, desse modo, no nível maior do executivo da
Instituição, a figura masculina. Historicamente, a Universidade teve em seu quadro de
reitoria, mulheres nas pró-reitorias, mas na função de Reitor foram sempre homens,
preservando o que Cappellin (2008, p. 90) afirmou: “predominância hierárquica dos
homens nos postos mais altos e mais bem remunerados das organizações.” A autora
sugeriu, portanto, que se trata de uma função de homem.
Se olharmos esse fato pela perspectiva da divisão sexual do trabalho – com
foco no princípio da hierarquia, essa preponderância masculina no maior cargo da
Universidade pode ter como significado o fato de que o trabalho das mulheres não é
valorizado da mesma maneira que dos homens para tal função. Esse reconhecimento
pode se dar pela própria trajetória histórica de exclusão das mulheres para determinadas
funções/ocupações na esfera privada, sobretudo para os cargos hierarquicamente mais
altos. Talvez, também, pelo fato de que elas, embora tenham no contexto da educação a
feminilização da profissão, mantêm a sua responsabilidade com as tarefas da outra
jornada de trabalho, da esfera privada, com sua família, do cuidado da casa, dos filhos,
condicionando as docentes sem conquistarem a função de Reitor.
Neste sentido, Bruschini e Lombardi (2000, p. 70) esclareceram que “em
nossa sociedade, os afazeres domésticos são tidos como responsabilidade da mulher,
qualquer que seja sua situação social, sua posição na família e trabalhe ela ou não fora
do lar.” Além disso, Yannoulas (2008, p. 3) – em sua pesquisa na Universidade
Nacional de Entre Ríos, na Argentina – verificou que as entrevistas colocaram que “[...]
preferiram atrasar suas aspirações a cargos hierárquicos até o momento em que seus
filhos e filhas tivessem alcançado relativa autonomia.”
Ou seja: esse contexto histórico que naturaliza a exclusão no espaço
público, e a retém na dimensão privada, faz com que as mulheres não ocupem
determinadas funções na sociedade. Cappelle, Melo e Souza (2013, p. 173)
esclareceram que: “olhar o mercado de trabalho na ótica das mulheres implica observar
diversas outras atividades, uma vez que, além de fazer parte dos espaços produtivos de
203
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
caráter público, à mulher compete outras atribuições impostas pela sociedade voltadas
para a manutenção da família.”
Logo esse contexto indica que se trata de uma tarefa culturalmente de
tradição masculina, cujo compromisso é com a esfera pública, já que não cabe aos
homens, os compromissos domésticos – considerados da esfera privada e, portanto, para
as mulheres. Além disso, há o estereótipo equivocado de que o homem é racional, forte,
possui autoridade, dinamismo e audácia, e que pode, ainda, dedicar-se mais à função,
mantendo o mito de inferioridade da mulher para assumir o cargo maior da organização.
Como chamou Abramo (2004), trata-se de um território masculino. Nessa mesma linha
de pensamento, Cappellin (2008, p. 96) colocou que: “Fala-se de antigas e tradicionais
formas de sexismo; de isolamento das mulheres executivas frente a importantes redes
informais de poder; da circulação de atitudes sexistas que colocam as mulheres em
desvantagem no ambiente das tomadas de decisão.”
Além disso, esse cenário da função de reitor sugere que as normas de gênero
constroem e naturalizam determinada incapacidade de as mulheres assumirem cargos
de gestão hierarquicamente altos na pirâmide organizacional.
Na Figura 40, apresentamos a distribuição das(os) estrategistas nos cinco
níveis hierárquicos, as(os) quais foram convidadas(os) a constituir o grupo do processo
estratégico 2014.
Figura 40: Distribuição das(os) Praticantes por Nível Hierárquico
Fonte: Dados da Pesquisa
204
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Diferentemente das organizações em que, de um modo geral, a segregação
de gênero impõe limitação à participação das mulheres a determinadas funções/cargos,
sobretudo os mais altos na pirâmide hierárquica, a Instituição estudada demonstra certa
predominância na distribuição feminina nos dois primeiros níveis. No plano da Reitoria,
atualmente são três mulheres nas três pró-reitorias e, historicamente, tem sido
majoritária a presença feminina nesta função. Também na função de direção das quatro
Unidades Acadêmicas, são hoje três diretoras e um diretor, além do diretor do Iparque.
No entanto, observamos que, em se tratando da diretoria do Parque
Científico e Tecnológico (Iparque), desde sua criação, essa função tem sido ocupada por
um homem. O referido Instituto é composto por: uma incubadora (I.TEC.IN –
Incubadora Tecnológica de Ideias e Negócios) e cinco institutos (I.ALI – Instituto de
Alimentos, I.DT – Instituto de Engenharia e Tecnologia, I.PESE – Instituto de Pesquisa
Socioeconômica Aplicada, I.PETE – Instituto de Pesquisa em Tecnologia Educacional,
e I.PAT – Instituto de Pesquisas Ambientais e Tecnológicas).
No Instituto, os professores e acadêmicos têm diversas possibilidades de
atuação, no entanto, o foco não é o processo de ensino-aprendizagem, mas sim, a
prestação de serviços para as empresas em áreas consideradas mais masculinas na
literatura. Além disso, há a própria tradição masculina nos cursos da área tecnológica,
que acaba por colocar uma barreira na ascensão feminina a essa função. Talvez, por
esses motivos, a função de maior nível hierárquico no Instituto esteja a cargo de um
homem em concordância com o que tem apresentado a literatura acerca de gênero.
Lombardi (2008, p. 401), em sua pesquisa sobre a função de comando – gerência nas
engenharias, concluiu que:
O fato é que o comando feminino de maneira geral, e na área tecnológica em
particular, é fato bastante recente nas organizações. Até o momento, ele
requer, de um lado, a aceitação dos padrões masculinos de carreira esperados
pelas empresas por parte das mulheres que desejem desempenhá-lo, e de
outro, a aceitação e a legitimação da autoridade técnica feminina por parte
dos homens.
Então, exceto na função maior que é de Reitor e vice-reitor, as quais têm
sido desempenhadas por homens, e na direção do Iparque, há a predominância de
mulheres nos cargos de gestão da Instituição.
205
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
No entanto, há que se observar que as questões de gênero se comportam de
maneiras distintas em razão do local em que ocorrem, uma vez que sofrem influência
das regras socioculturais de cada espaço, afirmou Cappelle et al. (2007). Então,
acreditamos que o fato de haver mulheres nos dois primeiros níveis da IES – exceção na
função de Reitor e diretor do Iparque, dar-se-á por ser uma instituição de ensino e,
conforme a literatura, a área da Educação é um gueto feminino. Bruschini (2007, p.
549), em seu trabalho acerca da participação das mulheres no mercado de trabalho
brasileiro, no qual utilizou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, do
Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério da Educação sobre as áreas de
ocupação por elas, a autora trouxe que, na formação no Ensino Superior, as mulheres
aumentaram significativamente sua participação, mas que “as escolhas das mulheres
continuam a recair preferencialmente sobre áreas do conhecimento tradicionalmente
‘femininas’, como educação (81% de mulheres), saúde e bem-estar social (74%),
humanidades e artes (65%), que preparam as mulheres para os chamados ‘guetos’
ocupacionais femininos”, transferindo, dessa maneira, essa segmentação para o contexto
do trabalho.
Analisamos os níveis três e quatro juntos, porque na Instituição,
culturalmente, parece haver o mesmo status entre gerência de departamentos e
coordenação de setores, a ordenação colocada, no entanto, é pela área, ou seja: se é da
área acadêmica ou da área meio, conforme apresentado na seção 6.4.2 a seguir. Logo, se
somarmos os dois níveis (três e quatro), há praticamente um empate, ainda assim, em
favor delas: 41 mulheres e 38 homens na gestão e, por fim, no nível cinco duas
mulheres e dois homens. Esse fato se torna interessante porque a literatura tem apontado
que a educação é uma área de atuação que valoriza a figura feminina, o que, de certa
forma, em tais níveis acontece de forma tímida. Bruschini (2007) também afirmou que a
educação é uma das áreas que a ocupação feminina em cargos de chefia é mais
encontrada. No mesmo sentido, para Beltrão e Alves (2009), embora a educação
brasileira ainda esteja aquém dos níveis internacionais, ela tem crescido e as mulheres já
são maioria em todos os níveis educacionais.
Com o propósito de compreender a participação das mulheres na gestão da
Instituição, retomamos o histórico da Universidade quando da sua formação.
Verificamos que os primeiros cursos foram voltados à própria educação com a
206
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Faculdade de Ciências e Educação de Criciúma (Faciecri) – cursos de Matemática,
Desenho, Ciências e Pedagogia; na sequência veio o curso de Educação Física (Escola
Superior de Educação Física e Desportos), o qual, embora mais masculinizado, ainda
era voltado ao ensino. Na sequência, foram os cursos de Ciências Contábeis e
Administração Empresarial e Hospitalar e a exceção foi o de Engenharia de
Agrimensura, este até os dias de hoje é a preferência masculina. Nos anos seguintes,
forma abertos os cursos de Letras e Estudos Sociais. Vejamos que à exceção de
Agrimensura, o qual é um rincão dos homens, e Ciências Contábeis e Administração
Empresarial e Hospitalar, que estão em processo de feminização, os dados indicam que
a Instituição, em sua concepção, parece ter promovido implicitamente o acesso de
profissionais mulheres, uma vez que os cursos eram voltados à formação do professor
da Educação Básica.
Para finalizar esta seção, o que percebemos é que, embora as mulheres
estejam presentes na gestão, inclusive de forma levemente majoritária (54%), no cargo
maior da Instituição, o qual as mulheres não conseguem assumir, haja vista ser essa uma
ocupação masculina, construída histórica e socialmente na Universidade provavelmente
em função de hierarquicamente ser o mais alto cargo da gestão. Aquele resultado
contraria o alcançado por Gauche, Verdinelli e Silveira (2013), em sua pesquisa sobre a
composição das equipes de gestão do primeiro nível hierárquico, em que somente 32%
do universo são gestoras. Hirata e Kergoat (2007) esclareceram que essa divisão sexual
do trabalho se dá em razão das relações sociais entre os sexos, as quais privilegiam o
homem por representar a esfera produtiva, apropriando-se das ocupações de maior valor
social em detrimento da mulher que exerce a esfera reprodutiva e, consequentemente, de
menor valor. O resultado obtido por Gauche, Verdinelli e Silveira (2013), na função de
Reitor, ratifica o desta pesquisa, porque 79,4% dos ocupantes da função de Reitor são
homens nas universidades públicas brasileiras.
6.4.2 Divisão Sexual do Trabalho: Áreas de Atuação – Acadêmica e Meio
Buscando compreender melhor esse contexto da Instituição sob a
perspectiva de gênero – divisão sexual do trabalho, segmentamos o grupo gestor da
Universidade, composto por cento e onze profissionais, em: I – gerenciamento dos
207
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
setores; e II – profissão. Acerca do primeiro: das(os) trinta estrategistas da área meio,
são vinte e uma mulheres e nove homens; dos oitenta e um da área acadêmica, trinta e
nove são mulheres e quarenta e dois homens, ou seja: 54% das(os) estrategistas dos
cinco níveis hierárquicos são mulheres, independentemente se da área acadêmica ou
meio, conforme ilustra a Tabela 1.
Tabela 1: Gerenciamento dos Setores
Área /sexo Feminino Masculino Total
Qde % Qde % Qde
Meio 21 70,00 9 30,65 30
Acadêmica 39 48,14 42 51,86 81
Total 60 54,00 51 46,00 111
Fonte: Dados da Pesquisa
Com relação à profissão: das(os) trinta gestoras(es) de áreas meio, quatorze
setores são coordenados por docentes. Dessa composição, percebemos que noventa e
cinco gestoras(es) dos cento e onze são docentes, as(os) quais mantêm atividades em
sala de aula e na gestão institucional. Logo, percebemos que a Instituição é gerida em
sua maioria por docentes. Esses resultados sugerem que o foco das(os) gestoras(es)
(85,58%) é a docência (educação) e não a gestão diretamente. Elas(es) foram assumindo
funções na gestão em razão da necessidade da Instituição e, muitas vezes, sem preparo
para tal. Portanto, o processo seletivo, a remuneração, incentivos para formação
continuada realizam-se com ênfase na docência.
[...] me tornei coordenador há quatro anos, como eu me tornei coordenador? Com a
maioria se torna, na paulada do dia a dia, nunca estudei sobre, não estudei nada de
administração, uma leitura ou outra. (4 A E)
De modo geral, segundo as(os) entrevistadas(os), as vozes de gestoras(es)
da área acadêmica foram mais enfáticas, valorizadas na tomada de decisão. Logo, a área
de atuação: acadêmica ou meio pareceu ser uma barreira, em que as(os) estrategistas da
área meio, além de não participarem efetivamente dos seis grupos de trabalho
instituídos, somente integravam a equipe quando chamados. Dessa maneira, no
entendimento delas(es), poderiam ter contribuído mais na elaboração das estratégicas da
área acadêmica. Parece-nos que, aqui também, há um jogo político de poder implícito
208
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
no fazer estratégia da Instituição, no qual a área acadêmica foi privilegiada, acreditamos
que, por ser o ensino o negócio da IES.
[...] dadas às dificuldades que eles tinham e as fraquezas que apresentavam. Não
tinham voz ativa, porque na definição de como encaminhar a Universidade para o
futuro eu não percebi naquele momento como eles podiam fazer. (1 A E)
Outra questão de não ser ouvido, na minha avaliação, o PE foi conduzido de maneira a
ouvir mais as Unidades Acadêmicas, do que os setores meios. Na minha avaliação, os
setores meios deveriam ter uma participação muito maior no PE. (2 A E)
Essa divisão das áreas foi materializada nos registros acerca da reforma da
estrutura administrativa realizada em 2007, a qual teve como base dois princípios que
enfatizavam: a Excelência nas atividades de ensino, pesquisa e extensão e Gestão
compartilhada, participativa e descentralizada. Além desses, na época ficaram
garantidos princípios básicos acerca de decisões acadêmicas e administrativas, a saber:
o equilíbrio entre ensino, pesquisa e extensão e à prevalência do Acadêmico sobre o
Administrativo de forma sustentável. Fica evidente que formalmente essa dicotomia
entre as duas áreas na Instituição se dá historicamente.
Analisando esse cenário pelo viés da divisão sexual do trabalho, talvez as
mulheres venham tendo maior sucesso no acesso à gestão da Universidade, por ser da
área profissional da educação, ou seja: educar já é uma tarefa delas na esfera privada.
Dito de outra forma, para as mulheres coube e cabe à responsabilidade do cuidado, de
educar os filhos, ensiná-los, passar os princípios e valores, enfim, prepará-los para a
vida. Esse estereótipo está tão internalizado na sociedade que já é considerado natural,
muitas vezes, inclusive que elas abdiquem de sua profissão ou determinado trabalho em
detrimento de suas responsabilidades no âmbito privado. Os dados analisados por
Bruschini (2007) revelaram que aproximadamente 31% dos cargos de diretores nas
organizações estudadas eram ocupados por mulheres, focalizando os ramos de
atividades, a autora verificou que elas estavam alocadas nas áreas da “[...] administração
pública, educação – mais de 50% – e em outras áreas sociais, como saúde e serviços
sociais, com 46% dos cargos de diretoria ocupados por mulheres” (BRUSCHINI, 2007,
p. 553).
209
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
A fim de verificarmos se os resultados anteriores se equivalem quando
analisados independentemente do nível hierárquico – função, mas segmentados pela
área de atuação – acadêmica ou meio, instituídas pelo processo estratégico na
Instituição, trazemos os dados na Figura 2. Nesses resultados, consideramos todo o
quadro de pessoal (incluindo docentes e técnico-administrativos) da Universidade,
observando que, para estar em consonância com a literatura, a maior parte das mulheres
deveria estar na área acadêmica.
Tabela 2: Número de Mulheres e Homens na IES por Área de Atuação
Área /sexo Feminino Masculino Total
Qde % Qde % Qde
Meio 441 67,64 211 32,36 652
Acadêmica 286 43,40 373 56,60 659
Total 727 55,45 584 44,55 1311
Fonte: Dados da Pesquisa
Comparando aos resultados do grupo gestor – Tabela 1 – com a totalidade
de funcionários da Universidade, percebemos que, considerando as duas grandes áreas
segmentadas no processo estratégico pela IES, a saber: acadêmica e meio, as mulheres
são maioria na Instituição (55,45%). Mas é necessário verificar que ter a maior
representatividade não significa que a distribuição seja igualitária entre os grupos. Por
isso, é oportuno compreender como se dá essa distribuição. Conforme os resultados da
Tabela 2, as mulheres estão mais atuantes nos setores das áreas meio (67,64%). Esse
resultado, em princípio, contraria a literatura que indica que as mulheres são mais
presentes na área da educação, inclusive em cargos de chefia.
Ao buscar acurar esse universo de funcionários para compreendermos esse
resultado obtido na área meio, identificamos que noventa e três mulheres (21,08%) e
treze homens (0,3%) desse contingente são responsáveis pela limpeza e organização da
infraestrutura física da Instituição, cuja escolaridade, em sua maioria é de primeiro grau
ou primeiro grau incompleto. Dessa maneira, a função desempenhada pelas noventa e
três mulheres configura-se como um trabalho doméstico, embora exercido na dimensão
pública, pelo fato de ser semelhante ao realizado na esfera privada, que é o cuidado e
organização da casa. Bruschini (2007, p. 561) alertou que “[...] o emprego doméstico
remunerado é o nicho ocupacional feminino por excelência, no qual mais de 90% dos
210
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
trabalhadores são mulheres.” Portanto, acreditamos que esse movimento das mulheres
nessas funções se dá por ser uma espécie de extensão da esfera privada, ou seja: cabe às
mulheres as tarefas de cuidar da casa, transferindo, assim, a sua atividade doméstica
para o trabalho público, logo, quando necessitam trabalhar e não possuem escolaridade
que lhes permitam concorrer para funções mais privilegiadas, elas transferem essa
competência privada – doméstica – para a esfera pública.
Entretanto, mesmo não considerando esse percentual de mulheres que estão
transferindo sua função do plano doméstico para a esfera pública, ainda prevalece o
percentual maior de mulheres na área meio. Ao continuar nessa análise, verificamos
que, no grau intermediário – entre as funções de auxiliares e o grupo gestor, estão os
assistentes e analistas (64% mulheres, maioria com ensino superior). Dessa maneira, o
que inicialmente parecia uma contradição com a literatura pelo fato de estarem em áreas
que não são guetos femininos, torna-se, em parte, uma ratificação dos resultados de
pesquisas realizadas em outros contextos profissionais em que as mulheres estão
adentrando em profissões nas áreas de: administração, procuradoria jurídica, finanças,
tecnologia da informação, apoio logístico, obras, dentre outras, porque estão
desempenhando funções em ocupações com menos destaque como analistas, assistentes
e, principalmente, auxiliares. Ou seja: as mulheres nessas áreas ocupam cargos menos
favorecidos hierarquicamente.
Retomando o resultado já apresentado anteriormente, na Tabela 1, sobre
as(os) gestoras(es) de setores da área meio que totalizaram trinta profissionais. Das(os)
trinta, quatorze são docentes e dezesseis não têm formação com foco na educação.
Destes dezesseis, dez são mulheres (62,50%) e seis são homens (37,50%). A literatura
trouxe que são áreas tradicionalmente ocupadas por homens como: Projetos e
Infraestrutura, Tecnologia da Informação, Patrimônio e Suprimentos, Finanças,
Contabilidade, Planejamento Institucional e Tesouraria. No entanto, Bruschini (2007)
afirmou que as mulheres – motivadas pela escolaridade – passaram em determinadas
organizações a ter um percentual maior do que dos homens e superam os homens na
ocupação de algumas funções tradicionalmente masculinas, como Direito, Arquitetura,
Medicina, dentre outras profissões.
Mas, é preciso verticalizar mais a análise, então, realizamos uma apreciação
mais aprofundada dos órgãos de apoio e percebemos que, embora sejam considerados
211
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
setores da área meio os quais são gerenciados por gestoras, algumas dessas instâncias
são apoios diretos à educação, a saber: Políticas de Atenção ao Estudante, Estágio e
Empregabilidade, Centro Especializado em Reabilitação, Museu da Infância, Relações
Internacionais, Secretaria Acadêmica. Acerca dos setores vinculados diretamente ao
ensino, somente um homem atualmente atua na gestão da coordenadoria de Relações
Internacionais, que se refere a um setor, cuja atribuição é a coordenação e
acompanhamento de ações, no âmbito internacional, acerca de cooperação
internacional, mobilidade acadêmica, processo seletivo estrangeiro, dentre outras, as
quais têm como foco o atendimento ao estudante estrangeiro, portanto, é diretamente
vinculado às atividades de educação. Historicamente, na Universidade, essa função já
foi ocupada por gestora. Nos demais órgãos de apoio, a gestão é atualmente realizada
por mulheres (83,33%).
Talvez seja essa a explicação para que na Universidade tenhamos um
resultado tão expressivo de mulheres em setores de áreas meio que tradicionalmente não
deveria ocorrer tal resultado, no entanto, ao detalhar os setores de atuação dentro da área
meio, verificamos que ocorre feminilização, pois se referem, a maior parte, a cuidados
e/ou à organização – atributos esses naturalizados como femininos. Bruschini (2007, p.
570-571) esclareceu que “a persistência de traços de segregação se revela também em
outras dimensões: na esfera ocupacional, em que as trabalhadoras permanecem, em
maior número, em setores, ocupações e áreas de trabalho tradicionalmente femininas.”
Portanto, dessa análise, verificamos que as mulheres, ratificando a literatura
acerca da divisão sexual do trabalho, com relação à gestão dos setores meio, elas estão
mais presentes em razão de serem órgãos de apoio ao ensino-educação, o que justifica
de certa forma a participação preponderante das mulheres na gestão. Nas funções
intermediárias como analistas, assistentes e auxiliares, elas são maioria, o que também
está em conformidade com a literatura.
Dessa maneira, o cenário visto em organizações de outras áreas de atuação
que não o ensino acaba por se reproduzir na Instituição estudada. Cappellin (2008, p.
97) trouxe que “Nas grandes organizações, quando as mulheres buscam ascender nas
áreas de mais alto poder, elas ficam restritas a âmbitos de menor posição estratégica,
como as direções de recursos humanos e de administração.” Morgato (2015), com base
nos dados do Sistema de Informações do Ensino Superior Particular do Semesp,
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
afirmou que as mulheres estão mais presentes em cargos técnicos ou administrativos –
em 2013, eram 214.225 mulheres e 180.191 homens atuando nessas áreas. No entanto,
quanto à função de gestoras, exceto para Reitor e diretor do Iparque, os dados desta
pesquisa contrariam os resultados apresentados por Morgato (2015, p. 37), a qual expôs
acerca do Ensino Superior particular que “Já na gestão das instituições de ensino
superior, incluindo cargos de reitoria, o predomínio também é masculino.”
6.4.3 Divisão Sexual do Trabalho: Áreas do Conhecimento
O intuito nessa seção é discutir as questões de gênero relacionadas à divisão
sexual do trabalho por área de conhecimento na composição do grupo estratégico da
Universidade – com foco nas(os) gestoras(es)-docentes das áreas acadêmica e meio.
Além disso, vamos trazer dados gerais da Instituição quando couber na apreciação. Para
tanto, segmentamos as quatro grandes áreas de conhecimento instituídas pela
Universidade, conforme dados oriundos da análise documental apresentados na Tabela
3, a saber: as Unidades Acadêmicas de: Ciências, Engenharias e Tecnologias
(UNACET), Ciências Sociais Aplicadas (UNACSA), Humanidades, Ciências e
Educação (UNAHCE) e Ciências da Saúde (UNASAU). Cabe ressaltar que
consideramos como amostra as(os) gestoras(es) da área acadêmica (81) e os da área
meio (14) que são docentes, porque não tivemos acesso aos dados da formação das(os)
gestoras(es) de setores técnico-administrativos. Verificamos distribuição assimétrica
relativa à participação menos acentuada de gestoras(es) na área das Engenharias e maior
na Saúde, as quais serão detalhadas a seguir. A apresentação desses resultados se dará
primeiramente pela área de conhecimento com maior percentual de feminização e,
assim, sucessivamente.
Tabela 3: Gestoras(es)-Docentes por Área Acadêmica
Área/sexo Feminino Masculino Total
Qde % Qde % Qde
UNASAU 12 66,67 6 33,33 18
UNACSA 12 57,14 9 42,86 21
UNAHCE 16 53,33 14 46,67 30
UNACET 10 38,46 16 61,54 26
Total 50 52,63 45 47,37 95
Fonte: Dados da Pesquisa
213
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Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Percebemos que a maior concentração de mulheres gestoras deu-se nos
cursos voltados à área da saúde (66,67%), talvez pelo fato de que profissões como
medicina têm-se tornado paulatinamente feminilizada, além de outras como
enfermagem, a qual tradicionalmente é uma atividade considerada feminina, porque
envolve a questão do cuidado. Bruschini (2007, p. 566) trouxe, com base no censo
2005, que “[...] os tradicionais guetos femininos, como a enfermagem (89% dos
enfermeiros, 84% dos técnicos de enfermagem e 82% do pessoal de enfermagem eram
do sexo feminino em 2002), a nutrição (93% dos nutricionistas eram mulheres), a
assistência social (91%), a psicologia (89% de mulheres) [...].”
Buscando compreender esse fenômeno, levantamos os cursos que compõem
a área da saúde na Instituição: Biomedicina, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia,
Gestão Hospitalar, Medicina, Nutrição, Odontologia e Psicologia. Ou seja: são
graduações, em sua maioria, que envolvem o cuidar do outro, são cursos que visam ao
atendimento assistencial em favor de alguém ou de um coletivo. Dessa maneira,
podemos articular com a prática das mulheres na esfera doméstica, na qual cabe a elas
cuidar, assistir o filho, o marido, a família; nesta, a mulher reproduz, é um trabalho
invisível, não gera remuneração dita direta. Essa naturalização das funções das mulheres
na esfera privada é levada à dimensão pública, vinculando as profissionais, de certa
maneira, às funções correlatas de cuidado, da educação, da assistência.
Além disso, Bruschini e Lombardi (2000, p. 92) esclareceram que “[...] a
presença feminina nessa área é reconhecida pelos homens e também aceita pelas
pacientes mulheres. O processo de avanço e consolidação da posição feminina na
Clínica Médica foi acontecendo no tempo [...].” Cappelle, Melo e Souza (2013, p. 170)
ratificaram que “Grande parte das atividades assistenciais privilegia o trabalho feminino
e pode ser considerada como verdadeiros guetos ocupacionais de mulheres.” Talvez
esse cenário da área da saúde se dê também pelo fato histórico-cultural da inserção das
mulheres nos cursos de Medicina. Barbosa e Lima (2013, p. 83) relataram que, a partir
de 1881, as mulheres puderam se matricular no Ensino Superior neste curso. Os autores
sugeriram também que a profissão médica é mais atrativa às mulheres. “[...] no campo
da saúde, mulheres sempre se fizeram presentes como enfermeiras, assistentes [...]. [...]
culturalmente mulheres são educadas para o cuidado e [...] a carreira médica representa
uma forma profissional de desenvolver estas habilidades socialmente adquiridas.”
214
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
De forma menos acentuada, mas também relevante, é o resultado da
Unidade de Ciências Sociais Aplicadas – 57,14%, na qual estão inseridos os cursos de
Direito, Economia, Administração, Ciências Contábeis, Tecnologia em Gestão, dentre
outros. Tais profissões têm, paulatinamente, sido feminilizadas – isto é: possibilitado o
acesso às mulheres. Dito de outra forma: as mulheres têm conseguido adentrar nessas
áreas de atuação. Bruschini (2007, p. 551) apresentou dados que corroboram o acesso
das mulheres, por exemplo, as profissões oriundas da área jurídica (a saber: advogados,
procuradores, juízes, promotores, dentre outras): “Em todas elas, o sexo feminino passa
a representar, em 2004, mais de 40% da categoria profissional. O caso da magistratura
também é exemplar, pois as juízas, que ocupavam 22,5% dos postos em 1993, chegaram
a mais de 34% na última data examinada.” A autora argumentou que essa mudança se
deu em razão de uma mudança cultural em que os movimentos sociais e políticos das
décadas de 60-70 impeliram as mulheres a adentrarem para as universidades que as
possibilitassem migrar da esfera privada para a pública.
O resultado da área da educação aponta que as mulheres têm mais acesso a
tal reduto profissional, ou seja: local em que o trabalho feminino é melhor aceito na
sociedade. Na IES estudada, elas estão também acima do percentual dos homens
(53,33% e 46,67% respectivamente), resultado esse que corrobora o cenário brasileiro,
embora o percentual seja superior, mas a diferença é bastante tímida – 6,66%.
Analisando na perspectiva da divisão sexual do trabalho, a área da educação
– embora a participação seja heterogênea nos níveis Fundamental, Médio e Superior – é
considerada uma área de atuação feminina, ou seja: um trabalho de mulher – princípio
da separação, apresentado por Hirata e Kergoat (2007) e Kergoat (2009), uma vez que
educar faz parte das atribuições da mulher que está na esfera privada – da reprodução. A
docência por consequência também passa a ser colocada na esfera reprodutiva do
trabalho (uma vez que não gera lucro diretamente). Essa dicotomia: trabalho de mulher
e trabalho de homem passa a ser meramente uma questão biológica e natural ao ser
humano. Os autores acima defenderam que os comportamentos são naturalizados e,
portanto, ao serem considerados naturais, perpetuam o argumento de que há trabalhos
que só podem ser executados por homens e outros por mulheres, mantendo, dessa
maneira, a desigualdade na dimensão do trabalho.
215
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Por outro lado, em outro extremo, temos as gestoras das áreas de exatas,
como as engenharias, com 38,46% que privilegiam o acesso aos homens. Cappelle,
Melo e Souza (2013, p. 169) obtiveram como resultados de sua pesquisa que “[...] uma
participação muito pequena de mulheres na Indústria e na Construção Civil, mantendo
níveis praticamente estáveis por mais de vinte anos (27,57% e 6,89% respectivamente
em 2004).” As autoras sugeriram que tais áreas de atuação são masculinizadas em razão
de seu tradicionalismo e pelo fato de exigirem força física na execução das atividades.
Lombardi (2013, p. 111) afirmou que “As estatísticas oficiais reafirmam a lenta
feminização da Engenharia no Brasil.” Em outras palavras, a transformação da
composição do universo das engenharias no Brasil, a fim de oportunizar o acesso das
mulheres a ele tem acontecido de maneira vagarosa. A autora apresentou dados quanto
ao emprego: em 2004 – 14%, em 2009 – 15,8% e, em 2011 – 17,4% dos empregos
formais de engenheiro eram ocupados por mulheres – dados da Relação Anual de
Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Emprego.
De modo geral, conforme discutimos acima, a participação das mulheres na
gestão de setores acadêmicos, ou seja: aqueles diretamente ligados ao ensino/educação
na Universidade são ligeiramente desproporcionais no sentido de desiguais. No entanto,
se considerarmos as(os) docentes que estão na função de gestoras(es) de setores da área
meio em razão de serem órgãos de apoio direto ao ensino – como os setores de
Educação a Distância, Avaliação Institucional, Sala Multifuncional de Atendimento,
dentre outros, o percentual se inverte, ficando com 52,63% para as mulheres e 47,37%
homens – Tabela 3.
Portanto, as áreas do saber vinculadas à saúde, às ciências sociais aplicadas
– sobretudo no campo do direito e da educação, as quais, com participações
diferenciadas no processo de feminilização, são áreas relacionadas ao cuidado e à
assistência do outro, que necessita de planejamento, jeito, organização, dedicação,
caraterística sociais, construídas e naturalizadas como próprias das mulheres, porque
cabe a elas a responsabilidade do cuidado da família, logo da reprodução da sociedade.
Yannoulas, Vallejos e Lenarduzzi (2000, p. 436) esclareceram que há “cursos que
estariam passando pelo processo de feminização (Medicina). Engenharia e Agronomia
se mantêm masculinizadas. Sem dúvida, as carreiras e especialidades que se
feminizaram mais cedo (como Educação) conservam este caráter.”
216
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Esse contexto leva, portanto, a ser natural essa convenção acerca do que é
incumbência do homem e do que é da mulher, porque, nas relações de gênero, ambos
acatam e reproduzem esses estereótipos. Estes acabam por evidenciar uma hierarquia
entre os homens e as mulheres em que o trabalho masculino, por ser da esfera produtiva,
tem mais valor perante a sociedade do que o feminino que é do plano reprodutivo – sem
valor direto, gerando desigualdade entre eles. Oliveira (2013, p. 140) afirmou que “Os
empregos e ocupações disponíveis no mercado de trabalho estão distribuídos
sexualmente.” Dito de outra forma, significa que há ocupações/profissões ocupadas por
homens, normalmente da esfera pública e, consequentemente, produtiva; e outras por
mulheres que, por vezes, reproduzem as atividades da esfera privada, portanto, essa
segmentação se dá em razão da divisão sexual do trabalho que impera e reproduz-se na
sociedade do trabalho.
6.4.4 Divisão Sexual do Trabalho: Hierarquia – Titulação
Além do princípio da separação, que naturaliza o fato de haver trabalhos
determinados para homens e outros específicos para mulheres, há também como fator
inibidor da ascensão da mulher no âmbito profissional a questão da hierarquia, por meio
da qual se evidencia a valorização, inclusive financeira, do trabalho masculino em
detrimento do trabalho feminino na dimensão pública.
Como a Universidade em estudo – assim como qualquer instituição de
Ensino Superior, regulamentada pelo Governo Federal – é regrada, em termos de
remuneração, principalmente, pela titulação de seu corpo docente. Portanto, as(os)
suas(eus) gestoras(es) docentes – tanto da área acadêmica, como aquelas(es) da área
meio que são professoras(es) – são remunerados(as) pelos critérios do mesmo plano de
carreira (titulação, produção acadêmico-cientifica, dentre outros). Exceto as funções de
diretor, pró-reitor e Reitor que recebem, além da titulação, uma gratificação durante o
exercício da referida função. Então, dessa maneira, a remuneração não pode ser uma
forma que diferencia o trabalho exercido por um homem ou por uma mulher na
Universidade no sentido de maior valor. Entretanto, entendemos que a área de saber
pode ser um fator que possa gerar a feminização de determinadas profissões e
ocupações na Instituição se estiver articulada com a titulação.
217
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Morgato (2015), com base nos dados da pesquisa Mestres 2012: estudos da
demografia da base técnico-científica brasileira, do centro de Gestão e Estudos
Estratégicos, afirmou que, desde 1998, as mulheres vêm ampliando a obtenção do título
de mestre no Brasil, com ênfase nas áreas das ciências da saúde, linguística, letras e
artes. Em contrapartida nas de engenharias e ciências exatas e da terra, as mestras
representam um terço dos títulos de mestrado. Quanto ao doutorado, Morgato (2015)
destacou que houve crescimento em todas as áreas do conhecimento desde 1996.
Para tanto, trouxemos para a análise os dados por área de saber articulada
com a titulação, primeiramente, com dados relativos ao grupo gestor; na sequência,
elegemos apresentar um recorte pela maior titulação – Doutorado/Pós-doutorado; e, por
fim, do corpo docente e ou do total de funcionárias(os) (docentes e técnico-
administrativos), a fim de verificarmos se os resultados se reproduzem em todas as
dimensões na Instituição. Na Tabela 4, apresentamos as(os) gestoras(es)
segmentadas(os) por titulação, sexo e Unidade Acadêmica. Cabe lembrar, mais uma
vez, que incluímos entre as(os) estrategistas as(os) da área meio que são docentes
também. Iniciamos a apresentação pela Unidade dos cursos das engenharias.
Tabela 4: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNACET UNA
Titulação Doutor Mestre Especialista Total
C E T
Feminino Qde 1 7 2 10
% 12,50 43,75 100,00
Masculino Qde 7 9 16
% 87,50 56,25
Total por UNA 8 16 2 26
Fonte: Dados da Pesquisa
Na Unidade Acadêmica das Engenharias (UNACET), na qual estão
alocados os cursos de Engenharias, Arquitetura e Ciência da Computação, verificamos
que o percentual de estrategistas com maior titulação é superior para os homens, tanto
com relação à titulação de Mestrado quanto ao Doutorado. Cabe esclarecer que dois
profissionais desta unidade estão na função de gestora(r) da área meio. Ao olharmos
somente para a titulação de Doutorado de toda a Unidade Acadêmica, agregando as
funções de gestão e de docente, também o percentual de homens é maior (87,50%).
Yannoulas, Vallejos e Lenarduzzi (2003, p. 12) argumentaram que “Engenharia e
218
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Agronomia se mantêm masculinizadas.” Dessa maneira, fica evidente que, na
Instituição estudada, o cenário brasileiro se reproduz, mantendo assim, o princípio da
hierarquia nessas profissões. Na sequência, apresentamos os dados da Unidade das
Ciências Sociais Aplicadas.
Tabela 5: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNACSA UNA
Titulação Doutor Mestre Especialista Total
C S A
Feminino Qde 1 9 2 12
% 50,00 75,00 28,57
Masculino Qde 1 3 5 9
% 50,00 25,00 71,43
Total por UNA 2 12 7 21
Fonte: Dados da Pesquisa
Na grande área das Ciências Sociais Aplicadas (UNACSA), as mulheres
gestoras, além de estarem mais presentes nas funções de gestão, apresentam um
percentual maior de titulação de mestrado (75%). No entanto, ao avaliar somente o
percentual de docentes e gestoras(es)/docentes na IES com título de Doutorado,
verificamos que os homens apresentam o mesmo percentual. Este resultado, de certa
forma, ratifica os achados de outras pesquisas apresentadas na literatura, que afirmaram
ser essas áreas, embora já com a inserção das mulheres crescendo timidamente, ainda
um rincão masculino. Bruschini (2007) apresentou, em sua pesquisa com dados de 1990
– 2004 da Rais (Ministério do Trabalho), que a participação feminina nessa categoria
profissional cresceu de 12% em 1993 para 14%, em 2004. Dessa maneira, podemos
inferir que, no futuro, o número de doutoras poderá aumentar haja vista ser, muitas
vezes, a próxima etapa de quem realiza o mestrado.
Tabela 6: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNAHCE UNA
Titulação Doutor Mestre Especialista Total
H C E
Feminino Qde 3 10 3 16
% 37,50 62,50 50,00
Masculino Qde 5 6 3 14
% 62,50 37,50 50,00
Total por UNA 8 16 6 30
Fonte: Dados da Pesquisa
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Na área de Humanidades – Educação (UNAHCE), ao reunirmos as(os)
docentes que estão na função de gestão dos setores da área meio, constatamos que o
cenário se modifica, ou seja: as mulheres passam a representar um percentual um pouco
acima dos homens no total (53,33%) e também os superam na titulação de mestre
(62,50%). No entanto, ao apreciarmos os dados referentes à titulação de doutor,
considerando todo o quadro docente desta área de saber, o percentual de homens é
maior com tal titulação. Esse resultado indica que, na IES, houve um movimento maior
por parte dos homens para buscarem titulação, contrariando o cenário colocado pela
literatura. Em pesquisas realizadas, é praticamente categórico de que as profissões
vinculadas à área da educação – com percentuais diferentes nos níveis educacionais –
iniciaram o acesso para as mulheres há mais tempo.
Ao olhar especificamente para a titulação de Doutorado dos homens,
verificamos que, dos 62.50%, 28% possui título na educação propriamente dito e 72%
em outras áreas como: letras, literatura, nutrição, ciências biológicas, botânica, história,
engenharia da produção, ciências do movimento e ciências da saúde. Já as mulheres, dos
37,50%, 40% possuem título na educação e as demais em áreas como: linguística,
ciências naturais, engenharia, ecologia e antropologia.
Esses resultados, todavia, não explicam porque o fenômeno da feminização
não aconteceu com as(os) docentes doutoras(es) da Instituição, contrariando, assim, o
cenário externo. Bruschini (2007), na mesma direção, argumentou que as mulheres em
ocupações e profissões da área da educação, no período de 1993-2005, tiveram
significativo avanço. Em contrapartida, podemos inferir que há um interesse implícito
por parte das mulheres na busca por titulação, uma vez que, com a titulação de mestre, o
resultado de 62,50%. Dito de outra forma, entendemos que o caminho natural para
quem buscou o mestrado é seguir na carreira acadêmica e realizar o doutorado. Na
Tabela 7, são apresentados os resultados da Unidade da Saúde.
Tabela 7: Gestoras(es)-docentes por Titulação UNASAU UNA
Titulação Doutor Mestre Especialista Total
S AU
Feminino Qde 4 6 2 12
% 57,14 66,67 100,00
Masculino Qde 3 3
6
% 42,86 33,33
Total por UNA 7
2 18
Fonte: Dados da Pesquisa
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Na área da Saúde, conforme Tabela 7, a titulação ratifica o resultado
anterior da participação das mulheres na gestão da Instituição. Também se avaliarmos a
participação de todos os docentes da referida Unidade Acadêmica acerca da titulação de
doutor, constatamos que os resultados se mantêm, porque 66,67% são docentes
doutoras. Portanto, os resultados que se apresentam na UNASAU, cujos cursos são da
grande área da saúde, apontam para o mesmo sentido do cenário brasileiro o qual
demonstra que profissões ligadas a tal área do saber vêm modificando-se com a inclusão
feminina. Esclareceram Yannoulas, Vallejos e Lenarduzzi (2003, p. 12) que há cursos
como medicina que “[...] estariam passando pelo processo de feminização.”
É interessante destacar nessa análise como a Instituição atribui funções de
gestão de setores da área meio para profissionais com formação em área diretamente
relacionada à educação. Acreditamos que esse panorama se dá em razão de ser uma
instituição vinculada à educação. Chies (2010) afirmou que há profissões em que a
representatividade feminina é menor como engenharia civil, agronomia, mecânica,
medicina esportiva, em detrimento de outras em que as mulheres são mais
representativas como a educação.
Cabe aqui refletir sobre o fato de que, em razão da sistemática de controle
do Ministério da Educação, a titulação torna-se, portanto, obrigatória tanto para os
homens quanto para as mulheres nas instituições de Ensino Superior, sobretudo para
universidades que são obrigadas a manterem o tripé: ensino, pesquisa e extensão. A
materialidade dessa obrigação se dá no instrumento de avaliação institucional, em que o
MEC (2014, p. 30), nos Requisitos Legais e Normativos, apresenta como critério de
avaliação da Instituição: “Titulação do Corpo Docente Universidades e Centros
Universitários: Percentual mínimo (33%) de docentes com pós-graduação stricto sensu,
conforme disposto no Art. 52 da Lei N° 9.394/96 e nas Resoluções Nº 1/2010 e Nº
3/2010.”
Esses dados – tanto a regulamentação do MEC, quanto ao fato de a
Universidade ter um plano de carreira vinculado à titulação e à produção acadêmico-
científica para as(os) docentes (RESOLUÇÃO n. 03/2008/CSA) – sugerem que a
remuneração não se torna uma barreira para ascender aos cargos na IES. Um exemplo
disso é que, atualmente, no primeiro nível, a Universidade tem quatro dirigentes (Reitor
e três pró-reitoras), metade com titulação de doutor e metade com mestrado; no segundo
221
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
nível são cinco diretoras(es): dois com título de doutorado e três mestres (duas mulheres
e dois homens).
Esse panorama, na Instituição estudada, permitiu apresentar algumas
considerações acerca da titulação como forma de remuneração: I – no total geral de
participação na IES, as mulheres são 55,45% (Tabela 2). Em primeira análise com o
grupo gestor dos três primeiros níveis, elas não são maioria na área acadêmica, ou seja,
nos setores voltados para a educação (48,14% – Tabela 1), no entanto, ao realizar uma
análise qualitativa das funções nas duas áreas, verificamos que as mulheres são mais
presentes na gestão, ratificando o cenário brasileiro com relação ao ensino. Segundo
Morgato (2015, p. 36), com base nos dados da pesquisa Mestres 2012: Estudos da
demografia da base técnico-científica brasileira, do Centro de Gestão e Estudos
Estratégicos, “[...] existe um claro predomínio das mulheres na obtenção de títulos de
mestrado no Brasil, a partir do ano de 1998.” No entanto, essa ascendência não se dá em
todas as áreas do saber, ficando mais expressiva nas ciências da saúde, linguística, artes
e letras. No outro extremo ficam as engenharias em geral.
Também nos setores diversos da administração da Universidade, para os
quais a formação, de regra geral, não é da área da educação, as mulheres se apresentam
com 67,64 %. Esses resultados indicam que elas são mais presentes que os homens na
função de gestão institucional, demonstrando, então, que a educação tem sido uma área
do saber que privilegia o acesso das mulheres a esse mercado de trabalho. Bruschini
(2007) contribuiu ao escrever que as mulheres com formação, além de atuarem em
funções relacionadas à educação, também têm adentrado em áreas que tradicionalmente
têm sido reduto masculino.
No mapa conceitual abaixo – Figura 41, sintetizamos como se dá a divisão
sexual do trabalho na Instituição estudada em que temos a divisão sexual do trabalho
sendo alimentada pelas categorias: função/nível hierárquico, titulação, áreas de
conhecimento e de atuação, para as quais emergiriam da pesquisa de campo as
subcategorias detalhadas no mapa.
222
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Figura 41: Mapa Conceitual Divisão Sexual do Trabalho na IES
Fonte: Dados da Pesquisa
Acreditamos que, paulatinamente e também em razão da formação, as
mulheres foram colocando-se nas diversas funções na Instituição. Mesmo em áreas
meio consideradas redutos femininos como a de Desenvolvimento Humano. Na
Universidade, havia anteriormente gestoras (na última década, foram três mulheres) e,
atualmente, é um homem como gestor. Na área financeira, a qual já foi chefiada por
mulher, passou para um homem e hoje é novamente uma mulher. Também na área meio
de Tecnologia e Informação, na última década passou pela coordenação de uma mulher,
por um homem e, atualmente, retornou a uma mulher. A primeira área é de domínio das
mulheres, enquanto as duas seguintes são masculinas. Em se tratando da área
acadêmica, na função de direção, há mulher na função tanto na Unidade sob a qual estão
alocados os cursos da área da saúde como das engenharias. Nas Ciências Sociais
Aplicadas, hoje nas mãos de um diretor, também já foi dirigida por uma gestora.
Acreditamos, portanto, não haver um combate explícito de gênero
internamente, no sentido de as mulheres terem que conquistar seus espaços na
Instituição ou de os homens cederem-nos às mulheres, uma vez que não aparenta haver
outros empecilhos para que elas atuem nem na Instituição e nem em assumir função de
gestão, exceto a área de formação. Mas, essa barreira, na verdade, não é da
Universidade, e sim, do contexto brasileiro que faz com que a presença da mulher nos
223
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
bancos escolares de determinadas profissões ainda, embora crescendo devagar, não
possibilite que seja majoritária em uma instituição de Ensino Superior.
Na literatura está descrito que a escolaridade não garante o acesso da mulher
às funções para as quais possui formação acadêmica. Podemos ratificar esse argumento
por meio do indicador taxa de escolarização, apresentado pelo Ipea (2011), o qual
indica a proporção de matriculados no nível de ensino adequado a sua faixa etária: em
2009, 16, 6% eram mulheres enquanto 12,2% de homens matriculados no Ensino
Superior. Também “[...] em grande parte dos indicadores educacionais, as mulheres se
sobressaem aos homens. No entanto, o tema de gênero não está resolvido nesta área,
sobretudo porque muitos são os desafios marcados pelo sexismo enfrentado pelas
mulheres nos bancos escolares e na carreira acadêmica, com atenção especial à situação
das mulheres negras” (IPEA, 2011, p. 21).
Barbosa e Lima (2013) esclareceram que, segundo o Censo da Educação
Superior de 2010, as mulheres são maioria em quinze de vinte carreiras com mais
alunos recém-formados, são maioria entre os estudantes do terceiro grau e são
aproximadamente 50% dos professores de instituições públicas, mas não estão em todas
as áreas. Nas exatas sua participação é pequena.
6.5 CONTRIBUIÇÕES DAS PRÁTICAS DISCURSIVAS E QUESTÕES DE
GÊNERO
Nesta seção, buscamos sintetizaras reflexões apresentadas nas seções ao
longo desta tese, a saber: compreender as contribuições das práticas discursivas e das
questões de gênero – com foco nos princípios da separação e da hierarquização –
das(os) praticantes no processo estratégico da Instituição estudada, isto é: durante o
processo de formação e priorização das estratégias. Como se trata de uma pesquisa
qualitativa, vale retomar que as subcategorias, apresentadas nas seções deste capítulo,
emergiram na ida ao campo da pesquisa quando da coleta dos dados. Por uma questão
de organização textual, apresentamos primeiramente as contribuições das práticas
discursivas e, na seção seguinte, com relação às questões de gênero.
224
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
6.5.1 Contribuições das Práticas Discursivas
Iniciamos a pesquisa com os seguintes objetivos específicos: resgatar o
contexto histórico-social da IES até 2014 e de sua prática estratégica do período em que
está formalizada; analisar as práticas discursivas no fazer estratégia da Instituição; e
verificar os fatores que impactaram na formação da estratégia na Universidade. Para
tanto, tínhamos como conjectura inicial para esses propósitos de que as práticas
discursivas trariam vozes e fatores que impactariam relevantemente no fazer estratégia
da Universidade.
Essa conjectura foi confirmada uma vez que as práticas discursivas
contribuíram significativamente para o fazer estratégia, uma vez que foi por meio delas
que identificamos como se deu o processo decisório e de formação das estratégias na
IES, verificamos as vozes e fatores que emergiram dessas práticas e que, de alguma
forma, impactaram nesse processo. Vaara e Tienari (2008) ratificaram a importância de
estudos com foco na linguagem, nos micro elementos textuais por meio dos quais o
locutor expressa suas ideias. Também Vaara (2010) argumentou que nas práticas
discursivas organizacionais são materializadas a polifonia – várias vozes – e a
dialogicidade e que, por meio destas, as questões socioculturais e organizacionais
podem ser evidenciadas. Com o objetivo de relatar tais contribuições, retomamo-nas
brevemente a seguir, articulando-as com os objetivos específicos.
O primeiro objetivo foi concretizado na análise documental, por meio da
qual foi possível identificar a história da Instituição, contata pelas(os) diversas(os)
autoras(es) dos textos institucionais, bem como por intermédio da autoria do livro sobre
a Unesc, mas também acerca dos seus momentos de planejamento formal e, sobretudo,
do resgate acerca dos quatro posicionamentos estratégicos desde a sua concepção como
Universidade.
Para os demais objetivos, além da pesquisa documental, contamos também
com dados das entrevistas qualitativas e das observações sistemáticas. Um dos
benefícios oriundos das práticas discursivas em favor do fazer estratégia foi o fato de
emergirem as vozes que tiveram destaque na formação da estratégia no sentido de
liderar e motivar os demais participantes para a elaboração participativa da estratégia.
Também a voz do gestor maior da IES, o qual colocava seus pares a par das
225
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
informações sobre a condução e resultados do processo, a fim de que eles pudessem
acompanhar e participar ativamente na elaboração das estratégias – vozes essas
materializadas na fala do Reitor da Instituição.
Além dessas, a voz do consultor como um especialista no assunto também
favoreceu o andamento do fazer estratégia na medida em que as(os) estrategistas
sentiram-se seguros tanto com relação às informações repassadas quanto sobre a
condução do processo de elaboração da estratégia. Dessa maneira, tais vozes implícitas
nas práticas discursivas foram importantes, porque buscavam envolver as(os)
estrategistas em uma produção colaborativa, tornando o processo participativo e
democrático e, portanto, contribuindo para a elaboração da formação da estratégia.
Outra contribuição foi de podermos construir o processo decisório, segundo
a percepção das(os) praticantes. Dessa forma, propiciou vermos o procedimento com o
olhar de quem o utiliza. Em tais práticas, foi percebido o desejo de praticantes de que
ele fosse mais participativo no sentido de que gostariam de contribuir em todas as
etapas do evento. Verificamos que foi dada oportunidade de todas(os) praticantes se
pronunciarem e validarem as decisões, mas as definições foram tomadas por um grupo
restrito, inclusive privilegiando as(os) gestoras(es) da área acadêmica em detrimento da
área meio.
Outra questão colocada foi quanto à metodologia, os dados coletados
indicaram que uma parcela das(os) praticantes não entenderam os procedimentos
adotados, embora tenha havido ações no sentido de colocá-las(os) a par. Até o momento
final da coleta de dados desta pesquisa, ainda havia um sentimento pelas(os)
entrevistadas(os) de não saberem o próximo passo com relação ao fazer estratégia.
Mais uma contribuição das práticas foi porque apresentaram os fatores que,
de alguma forma, impactaram na formação da estratégia. Afloraram dessas práticas: a
questão cultural, a qual se materializou por meio de uma visão de estrategistas que
privilegiavam os benefícios individuais ou de determinados grupos em detrimento do
coletivo – no caso da Instituição; pela rejeição a temas ainda emergentes no Ensino
Superior, mas que historicamente são rechaçados na Universidade como a Educação a
Distância. Também o fato de haver estrategistas que possuem saber técnico sobre o
processo estratégico ou ainda conhecimento sobre a IES, seu histórico e funcionamento.
Esses subfatores compuseram a cultura organizacional a qual impactou como forma de
226
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
poder na construção da estratégia entre as(os) praticantes. Para Foucault (2008), o poder
não está em uma pessoa, mas sim, nas relações entre as pessoas e em todo lugar,
implícito nas práticas discursivas e intervindo nos processos, nas ações e, portanto, na
formação das estratégias.
Além disso, surgiu nas práticas discursivas a questão da política
institucional em razão do contexto político eleitoral para as funções de Reitor e vice-
reitor que, embora as eleições aconteçam, ainda, somente em 2017, os dados indicam
que já teve início o jogo político na Instituição segundo as(os) entrevistadas(os).
Também a política se materializou nas hierarquias de cargos/funções e pela
representação de cursos ou setores que economicamente possuem notabilidade na
Universidade. Essa política institucional externalizou relações de poder em todos os
níveis hierárquicos, mas, principalmente, por meio da gestão dos órgãos de apoio
ligados à área acadêmica, ratificando o que Foucault colocou sobre o poder ser exercido
nas relações entre as pessoas.
Logo, percebemos que as práticas discursivas, por meio das
categorias/subcategorias acima apresentadas, foram para além do que estava posto
linguisticamente, uma vez que revelaram as relações de poder na Universidade, bem
como o poder implícito que transpassou e naturalizou modelos no cotidiano da gestão
da IES e, consequentemente, durante o fazer estratégia. Dessa forma, as pessoas que
recebem essas práticas discursivas tomam como verdades tais relações de poder e
conhecimento que, em muitos casos, seguem sendo validadas na comunidade acadêmica
e, talvez, na sociedade para além dos muros da Instituição. Essas práticas, portanto,
trazem contribuições que impactaram tanto positiva quanto negativamente, logo de
forma relevante, a práxis estratégica, muitas vezes determinando estratégias ou fazendo
com que houvesse recuos em relações a outras pretendidas, revelaram os dados
coletados.
6.5.2 Contribuições das Questões de Gênero
A fim de alcançarmos o objetivo de compreender as contribuições das
questões de gênero – especificamente o princípio da separação, para o qual há trabalhos
que são masculinos e outros que são femininos, e o princípio da hierarquia, em que os
227
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
trabalhos dos homens são mais valorizados que àqueles exercidos por mulheres –
realizados pelas(os) praticantes no fazer estratégia da Instituição estudada, definimos,
inicialmente, como conjectura que, apesar dos avanços acerca das questões de gênero e
de a Instituição ser uma universidade, ou seja: área da educação, nela se reproduz o
cenário de feminização de organizações de outras áreas de atuação, a qual foi ratificada
em razão dos resultados obtidos e destacados a seguir.
Bruschini (2007) obteve em sua pesquisa que algumas condições mantêm-se
desfavoráveis acerca da igualdade no trabalho para as mulheres, como a desigualdade
na remuneração, ascensão aos cargos de chefia, desemprego, e também a manutenção
de que elas devem permanecer em algumas áreas de atuação – educação, saúde e
serviços sociais – em razão de se aproximarem das atividades desempenhadas na esfera
privada.
Embora haja, de modo geral, a predominância feminina no grupo que
compõem o planejamento institucional, percebemos que as questões de gênero relativas
às funções ocupadas, em se tratando do cargo de Reitor e do diretor do Iparque,
indicaram haver uma tradição masculina nessas ocupações na IES. Essa divisão sexual
do trabalho possivelmente se dá em razão de ser o maior cargo hierárquico da
Universidade e, conforme a literatura, as mulheres têm tido dificuldades de ascender a
essas ocupações. Acerca da direção do Iparque, um Instituto Tecnológico – reduto
masculino – geralmente são profissionais da área das engenharias que assumem sua
direção. Nessa área do saber, a ocupação feminina ainda é bem restrita, sobretudo
quanto às funções de chefia.
Quanto à área de atuação, verificamos que a maioria são gestoras docentes
que conduzem a Instituição. Esse resultado provavelmente se revela em razão da área da
educação se aproximar historicamente as atividades da esfera privada pelas mulheres, as
quais são relacionadas ao cuidado, ao ensino, à organização da família.
Percebemos que essa dicotomia entre as duas áreas de atividade –
acadêmica e meio – apontou para um bloqueio em que a primeira aparenta ter privilégio
sobre a segunda, em razão possivelmente pelo negócio-fim da Instituição ser o ensino.
Quanto às áreas do conhecimento, o cenário de modo geral se configura de
forma semelhante ao apontado na literatura em que a feminilização está posta nos
cursos da área da saúde por simularem, de certa forma, a esfera privada, seguida pelas
228
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Ciências Sociais Aplicadas e da Educação. Na área das engenharias a ocupação dos
cargos de gestão por mulheres é bem menor que nas demais. Embora não haja
evidências nas entrevistas de divisão sexual do trabalho internamente, inferimos que
esse contexto de transferência das atribuições da esfera privada para a dimensão pública
acerca das ocupações femininas está naturalizado na sociedade e acaba por repercutir na
Universidade que, mesmo sendo um espaço da educação, o qual indica ser propício para
ascensão feminina, é reproduzido na Instituição.
Deduzimos que, acerca da divisão sexual do trabalho, em razão de ser uma
instituição de Ensino Superior, as mulheres foram assumindo funções diversas na IES
tanto em áreas consideradas redutos masculinos. Dessa maneira, os dados revelaram que
– exceto para a função de Reitor e diretor do Iparque – não há obstáculos para que elas
sejam gestoras. No entanto, os dados indicaram haver uma maior valorização das
funções da área acadêmica, por considerarem, possivelmente, ser esse o nicho do
negócio da Instituição.
Verificamos que a área de formação se mostrou um limitador para a
participação das mulheres, no entanto, essa barreira não é da Instituição, mas sim, do
cenário brasileiro que faz com que a presença da mulher nos bancos escolares de
determinadas profissões ainda, embora crescendo paulatinamente, não possibilite que
ainda seja majoritária em uma instituição de Ensino Superior. Portanto, apesar de todos
os progressos alcançados em favor do acesso das mulheres ao mercado de trabalho, na
Instituição, mesmo sendo da área da educação – área cuja feminização já ocorre, o
cenário nacional ali se reproduz.
Portanto, os dados coletados demonstraram que princípios da separação e da
hierarquia neste estudo apontaram para uma divisão sexual do trabalho no que se refere
à função de reitor e diretor do Iparque. Quanto à área de formação na comunidade
acadêmica – grupo gestor – reproduziu o cenário externo, isto é: a feminização tem seus
extremos com maior avanço na saúde e menor nas engenharias. Também a remuneração
em razão da regulamentação do MEC e do plano de carreiras para os docentes não se
torna um obstáculo para as mulheres terem acesso aos cargos na IES. Essas questões de
gênero não sugeriram impacto no processo estratégico. Já a supremacia da área
acadêmica em relação à área meio, na visão das(os) entrevistadas(os), indicou, pelo
229
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
exposto anteriormente, que pode ter sido negativa a sua contribuição na práxis
estratégica.
Cappellin (2008) esclareceu que, embora as mulheres estejam aumentando
sistematicamente sua formação acadêmica, promovendo novos conhecimentos e,
consequentemente, novas atividades ocupacionais, isso não garante a sua entrada em
funções de decisão nas organizações, isto é: ocupações hierarquicamente altas. Além
disso, a autora afirmou que as mulheres têm ascendido em áreas específicas, como:
administração, educação, saúde e organismos internacionais. Os resultados de Chies
(2010) indicam que as mulheres estão menos presentes em áreas como: engenharia civil,
agronômica, minas, geologia, mecânica e metalurgia.
230
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
CAPÍTULO 7
REFLEXÕES FINAIS
“O saber a gente aprende com os mestres e os livros.
A sabedoria se aprende é com a vida e com os humildes.”
(CORA CORALINA)
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
Neste capítulo, destacamos as reflexões que realizamos durante a execução
desta tese. Iniciamos apresentando as considerações finais retomando os objetivos
propostos no início do trabalho; na seção seguinte, expomos as limitações desta
pesquisa e, por fim, as proposições para futuros trabalhos.
7.1 REFLEXÕES FINAIS
O propósito desta tese foi compreender como as práticas discursivas e
questões de gênero – princípios da separação e da hierarquização – contribuíram no
fazer estratégia da Universidade estudada. Em razão de ser uma pesquisa qualitativa e,
para estar em consonância com a proposta da EPS, na caminhada da coleta de dados
tivemos que deixar emergir as subcategorias. Privilegiamos a percepção das(os)
praticantes, por meio de suas práticas discursivas, para inferir como eles estavam vendo
os procedimentos – processo decisório – adotados acerca do fazer estratégia uma vez
que a proposta da IES é de gestão participativa e democrática, bem como quais as
vozes, fatores e questões de gênero impactaram na práxis estratégica.
O nosso desafio, a partir dessas práticas discursivas e dados secundários, foi
inferir e entender tal contexto, utilizando a análise semiótica para a qual elaboramos as
etapas da análise – Figuras 25 e 26 –, incluindo dentro da tríade peirceana as categorias
de primeiridade, secundidade e terceridade. Etapas essas em consonância, além de
Peirce, com autores que desenvolveram estudos na abordagem da EPS com foco nas
práticas discursivas. Sendo assim, passamos a ter, além da análise, uma proposta
metodológica híbrida para análise de dados qualitativos.
Também a articulação entre a abordagem da EPS com gênero, apontada na
literatura como uma lacuna de pesquisa, foi um estímulo para o desenvolvimento desta
pesquisa, a qual se mostrou instigante haja vista que trabalhamos – referimo-nos aos
dados primários – com a observação e a entrevista qualitativa por meios das quais não
desejávamos inserir nenhuma pergunta previamente elaborada, ou algum
direcionamento para não haver incoerência metodológica com a proposta da EPS. Logo,
foi preciso esperar para que as práticas discursivas pudessem revelar as questões de
gênero, o que aconteceu de forma muito tímida e necessitamos, então, voltarmos para os
dados secundários buscando subsídios para entender as relações de gênero. Associado a
232
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
isso, teve o fato de na Instituição eleita para a pesquisa de campo ser uma universidade
comunitária que já traz em si características peculiares de gestão, além de que, em
princípio, a área da educação ser considerada um reduto para as mulheres. O que de fato
parecia ser em razão de haver em sua gestão um número expressivo de gestoras.
Por fim, entendemos que essas inquietações é que foram a riqueza e o
diferencial dessa tese, tanto em termos teóricos quando articulamos a abordagem da
Estratégia como Prática com a temática gênero – com foco na divisão sexual do
trabalho; como pela escolha da Instituição pesquisada e, também, pela sistematização da
proposta análise semiótica apresentada e testada com os dados qualitativos oriundos
desta investigação.
Com relação à Instituição, acreditamos que a Universidade, de posse dos
resultados desta pesquisa, poderá proporcionar uma reflexão acerca da condução da
revisão do planejamento realizada em 2014 e, se for o caso, ajustar outras edições, a fim
de garantir o processo à luz da EPS.
Retomando os objetivos específicos, especificamente com relação ao
contexto histórico-social da Instituição, verificamos que há uma cultura instituída de
que a gestão deve pautar-se no processo participativo e democrático em razão,
possivelmente, de ser uma instituição comunitária, cujo proprietário é o Poder Público
Municipal. No entanto, quando verificado especificamente acerca do planejamento
estratégico – edição 2014, percebemos que há uma barreira invisível instalada entre
as(os) gestoras(es) das áreas acadêmica e meio, em que a primeira emana mais
relevância internamente.
Percebemos, também, em suas definições institucionais, a preocupação com
a dimensão ambiental, devido provavelmente à região carbonífera em que está inserida.
Também ficou explícito seu compromisso com o desenvolvimento regional, com a
formação profissional e humana de suas(eus) estudantes.
Sobre o planejamento estratégico formal da Unesc, os dados indicaram que
ele iniciou em 1999 e passou por cinco revisões. Dessas, duas foram consideradas
completas, porque foram revistas desde as definições organizacionais até as ações
eleitas à época. A primeira Missão Institucional localizada foi: Promover o
desenvolvimento regional para melhorar a qualidade do ambiente de vida, os dados
sugerem que essa missão foi elaborada em 1987, porém não localizamos nenhum
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
documento formal que ratifique isso. Estrategicamente, verificamos que o planejamento
estratégico se realizou em momentos importantes para a Instituição: em 1999, a Unesc
recém tinha assumido sua condição de universidade e necessitava-se organizar e
planejar para cumprir o compromisso assumido com o ensino, pesquisa e extensão.
Havia uma série de exigências legais que precisavam ser executadas para que ela se
adequasse à nova condição.
A partir da sua transformação de faculdade para universidade – 1997, a
Instituição incluiu em suas diretrizes seu pacto com o tripé: ensino, pesquisa e extensão.
E, desde então, vem expandindo seu leque de atuação em termos de cursos de
Graduação, Pós-graduação Lato sensu e Stricto sensu, bem como ações de extensão
acadêmica e comunitária, a fim de materializar a sua Missão Institucional: Promover,
por meio do ensino, da pesquisa e extensão, o desenvolvimento regional para melhorar
a qualidade do ambiente de vida – validade de 1999 até 2006.
Em 2007, tem-se formalizada a nova Missão que perdura oficialmente até o
presente momento: Educar, por meio do ensino, pesquisa e extensão, para promover a
qualidade e a sustentabilidade do ambiente de vida. A Instituição teve novamente uma
modificação relevante em sua estrutura acadêmica e de gestão. Com o advento da
transformação para universidade, a Unesc acrescentou em seu portifólio novos cursos de
graduação, inseriu outras atividades como pesquisa e extensão, aumentou sua estrutura
física e tecnológica, enfim, a estrutura acadêmica e administrativa existente não era
mais compatível a sua nova realidade, e, em razão disso, em 2006 com implantação em
2007, a nova estrutura em que o ensino, a pesquisa e a extensão foram alocadas em
quatro áreas do saber: Humanidades, Engenharias, Sociais Aplicadas e Saúde.
Possivelmente, em virtude desse novo panorama acadêmico e administrativo, a
Instituição iniciou, em 2008, outra revisão – essa completa – do processo estratégico, já
que era uma nova maneira de segmentar o planejamento.
Percebemos que a Universidade mudou estrategicamente sua condição de
instituição de ensino no que se refere à forma de organização, mas manteve seu
compromisso com a formação profissional e humana de seus estudantes, expresso na
Missão, cujo foco passa a ser a educação. Conservou, ainda, a sua inquietação com
relação à questão ambiental e internamente com a gestão participativa. Passou a
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
focalizar, também, a questão comunitária até o presente momento, mas sem muito
destaque em termos de divulgação.
Em 2012, a Unesc, em razão de uma dívida financeira com o governo
federal a qual vinha sendo paga ao governo municipal, iniciou seu processo de migração
para o Sistema Federal de Ensino. Provavelmente em razão dessa mudança do sistema
estadual para o federal, a Universidade passou por uma reorganização interna, a fim de
atender às exigências do MEC e às novas necessidades financeiras. Esse processo durou
aproximadamente dois anos para encerrar a primeira etapa da migração. Acreditamos
que, em vista desse novo cenário, a Instituição iniciou uma nova revisão do
planejamento estratégico em 2014 – a qual foi o objeto de estudo desta tese.
Acerca das práticas discursivas, especificamente sobre as vozes que se
destacaram a modo de influenciar o fazer estratégia, verificamos que, na enunciação do
Reitor, estão presentes duas vozes que impactaram a estratégia: a voz do líder que
motivou e chamou as(os) estrategistas para o compromisso com o planejamento
estratégico, a fim de que as(os) praticantes fossem responsabilizados pelo processo. A
segunda voz é a de gestor da IES, quando o reitor explicou as etapas do planejamento e
a sua preocupação com a Universidade, com seu futuro para além do seu tempo de
mandato. Esta voz busca deixar as(os) envolvidas(os) a par das atividades. Por fim, a
terceira voz que produziu efeito sobre a estratégia foi a do consultor externo, em função
do seu domínio sobre o assunto. O objetivo foi conduzir as(os) estrategistas
independentemente do conhecimento prévio sobre o planejamento estratégico.
Esses resultados foram ao encontro da agenda apontada por Vaara e
Whittington (2012) de que os estudos deveriam evidenciar questões que impactam nas
estratégias, tais como as diversas vozes presentes nas práticas discursivas das(os)
estrategistas.
O processo decisório acerca da metodologia do planejamento estratégico
deu-se, inicialmente, pelos membros da Reitoria e diretoras(es), que, dentre outras
decisões, definiram seis grupos de trabalho: quatro Unidades Acadêmicas, Colégio
Unesc e Iparque. Essa composição trouxe, à luz da EPS, limitações uma vez que os
cento e onze estrategistas não participaram de todas as etapas do planejamento,
sobretudo as(os) da área meio. Whittington (2006) esclareceu que o sucesso do fazer
estratégia está em envolver as pessoas de diversos níveis hierárquicos, ou seja: é dar
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
voz a elas para que, além de contribuir na formação da estratégia, assumam a sua
implantação.
Embora tenhamos percebido a preocupação por parte da equipe do
planejamento em explicar as etapas do processo, tanto nas reuniões, quanto nos
convites/e-mails enviados, houve participantes que chegaram ao final da revisão sem as
entenderem. Talvez essa falta de entendimento tenha-se dado pelo fato de que as(os)
estrategistas em algumas etapas não participaram. Foram apresentados a elas(es) os
resultados para validarem. Isso pode ter confundido as(os) praticantes que não tinham
domínio da metodologia do planejamento ou das etapas que a Instituição adotou.
Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007) ratificaram que o fazer estratégia, de acordo com
a abordagem da EPS, deve privilegiar a participação das(os) praticantes
independentemente do nível hierárquico e ou área do saber/atuação.
Pareceu-nos que já havia na Instituição uma cultura em que os setores
relativos à acadêmica são mais valorizados do que os da área meio. Na análise
documental sobre a reforma administrativa de 2007, identificamos explicitamente essa
supremacia da área acadêmica por meio dos princípios básicos acerca das decisões
acadêmicas e administrativas, ao equilíbrio entre ensino, pesquisa e extensão e à
prevalência do Acadêmico sobre o Administrativo de forma sustentável. De acordo com
a Figura 38, as decisões acerca do posicionamento e objetivos estratégicos ficou nos
seis grupos de trabalhos e sobre a priorização dos projetos com os membros da Reitoria
e diretoras(es). Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007) esclareceram a abordagem da
EPS privilegia a participação das(os) praticantes de diversos níveis hierárquicos
envolvidas(os) no fazer estratégia com o objetivo também de que as estratégias tenham
maior probabilidade de sucesso.
Dessa maneira, a revisão do planejamento realizada na IES distanciou-se
parcialmente da proposta da EPS, porque, mesmo com o desejo interno de que o
processo fosse participativo e tenha havido momentos de validação, houve uma
segregação por área de atuação e por nível hierárquico nas decisões acerca do fazer a
estratégia. As decisões não foram elaboradas em conjunto, vinha uma proposição
discutida previamente por alguns pares, fragilizando, à luz da EPS, a formação da
estratégia. Whittington (1996; 2001; 2003; 2004; 2006) defendeu a importância da
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
valorização dos conhecimentos informais, das experiências do dia a dia das(os)
estrategistas, das suas participações no fazer estratégia.
Ao realizar a análise semiótica dos fatores que – na percepção das(os)
entrevistadas(os) e na observação realizadas – impactaram no fazer estratégia,
reconhecemos que o poder se materializou durante a revisão do planejamento
estratégico da IES estudada por meio dos seguintes fatores: cultura organizacional e
política institucional. Sob a cultura organizacional emergiram a visão individual em vez
de coletiva – os chamados feudos pelas(os) praticantes; temas historicamente rejeitados
na IES como a Educação a Distância; e o conhecimento técnico acerca do fazer
estratégia e ou conhecimento da Instituição devido às funções desempenhadas ou tempo
de caso. No guarda chuva, que chamamos de política institucional – o contexto político
eleitoral que a Universidade começou a vivenciar em função da proximidade das
eleições para Reitor e Vice-Reitor; a hierarquia de cargos; representação de curso ou
setor que têm representatividade econômica. Esses fatores afetaram positiva e ou
negativamente a formação da estratégia, havendo momento, segundo as(os)
entrevistadas(os), em que foi preciso recuar para não comprometer a edição em sua
totalidade. Tavares (1996) contribuiu ao esclarecer que exemplos de cultura organização
são os valores, crenças, ritos, normas, dentre outros, que influenciam o fazer estratégia.
Ao destacar as questões de gênero – divisão sexual do trabalho com foco no
princípio da separação, verificamos que, embora haja mulheres nos cargos dos cinco
níveis hierárquicos e sejam inclusive ligeiramente maioria – 54%, possivelmente nas
funções de Reitor e de diretor do Iparque, uma vez que historicamente não houve uma
mulher assumindo esses cargos na Universidade. Cappellin (2008, p. 90) esclareceu que
nos postos hierarquicamente mais altos ainda são mais ocupados por homens.
Acerca das áreas de atuação, a IES apresentou a divisão entre os setores que
compõem a área acadêmica e aqueles que constituem a área meio. Essa segmentação
administrativa foi percebida como uma forma de poder dentro da Instituição na
participação do fazer estratégia. Foucault (2015) afirmou que o poder é flexível e é
materializado nas relações sociais.
Ao olhar a divisão sexual do trabalho com foco nas áreas do conhecimento,
aquelas vinculadas à saúde, às ciências sociais aplicadas, sobretudo no campo do
direito, e à educação, elas são consideradas de cuidado e de assistência do outro, que
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
necessita de planejamento, jeito, organização, dedicação, caraterística sociais,
construídas e naturalizadas como femininas, porque, em analogia a esfera privada, cabe
a elas a responsabilidade do cuidado da família. Portanto, nessas áreas, na Universidade,
temos o processo de feminização instituído, ratificando a literatura acerca da divisão
sexual do trabalho, em que as mulheres têm dificuldades de acessar aos cargos de chefia
em áreas tradicionalmente masculinas, reproduzindo o cenário visto em outras
organizações.
Com foco no princípio da hierarquia, na IES estudada, refere-se à titulação,
observamos que no geral elas são maioria – 55,45% (Tabela 2). Ao verificar, nas duas
áreas de atuação, as funções diretamente relacionadas à educação, verificamos que as
mulheres são mais presentes na gestão. Esse resultado ratifica que a educação tem sido
uma área do saber que privilegia o acesso das mulheres a esse mercado de trabalho.
7.2 LIMITAÇÕES DA PESQUISA
As limitações teóricas desta pesquisa se deram no sentido de que foi
localizado somente um trabalho, no contexto nacional, relacionando a abordagem
Estratégia como Prática com as questões de gênero, ainda assim, não foi possível
utilizar os resultados da referida pesquisa com a desta investigação. Na literatura
internacional, foram diversos os autores – tais como: Whittington, Cailluert e Yakis-
Douglas (2011) e Vaara e Whittington (2012) – que defenderam como agenda de
pesquisa a lacuna entre a perspectiva da EPS com a temática gênero, porque esta pode
impactar no fazer estratégia nas instituições de forma relevante. No entanto, com os
achados desta pesquisa não localizamos pesquisas empíricas na literatura até 2014.
Acerca do design da pesquisa, a limitação que nos ocorreu foi o fato de a
observação sistemática ter sido realizada nos encontros que envolviam os cento e onze
gestoras(es) e, nas demais reuniões com grupos menores, não foi possível em razão da
coincidência de horários entre elas e, também, em razão dos horários de sala de aula da
pesquisadora. Talvez, se fossem realizadas mais observações, pudéssemos trazer mais
dados à pesquisa.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
7.3 SUGESTÕES PARA FUTURAS PESQUISAS
Acreditamos que a lacuna apontada na literatura em articular a EPS com
gênero está bastante incipiente, então a sugestão é de que outras investigações explorem
essa temática envolvendo a linguagem tanto em outras instituições de Ensino Superior,
como também em organizações em outras áreas do conhecimento, a fim de podermos
traçar um panorama de como a estratégia pode ser influenciada por essas questões.
Rouleau e Balogun (2011) defenderam a proposta de estudos que verifiquem, por meio
da linguagem, a formação das estratégias à luz da EPS, uma vez que as práticas
discursivas são condutoras de valores e ideologias que vão naturalizando-se nos
contextos institucionais e, por conseguinte, na sociedade.
Sobre a sistematização de análise semiótica proposta e utilizada neste
trabalho, sugerimos que outras pesquisas, na área da Administração, possam aplicá-la a
fim de testá-la em contextos semelhantes e ou incongêneres e, paulatinamente,
introduzi-la como técnica de análise de dados qualitativos nas Ciências Sociais
Aplicadas. Balogun, Huff e Johnson (2003) e Jarzabkowski, Balogun e Seidl (2007)
argumentaram a necessidade de novas possibilidades metodológicas para as pesquisas
em EPS. Simões (2004) esclareceu que a linguagem, por meio da Semiótica, extrapola
áreas do saber, torna-se interdisciplinar.
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Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
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261
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
APÊNDICEA– DESIGN DA PESQUISA (continua)
Design da Pesquisa
Pergunta de Pesquisa: Como as práticas discursivas e questões de gênero – princípios da separação e da hierarquização – contribuiram no fazer estratégia de uma
Instituição de Ensino Superior comunitária?
Objetivo Geral: Compreender como as práticas discursivas e questões de gênero – princípios da separação e da hierarquização – contribuiram no processo estratégico –
fazer estratégia – de uma Instituição de Ensino Superior comunitária.
Objetivos específicos Abordagem
Teórica
Categorias Subcategorias Conjecturas
Resgatar o contexto histórico-
social da IES até 2014 e de sua
prática estratégica do período
em que está formalizada.
EPS: práticas
discursivas
Elaboração do contexto - Histórico-social da IES
- Histórico da prática estratégica
As práticas discursivas
explicitam vozes e fatores
que impactam
relevantemente no fazer
estratégia da Universidade
Analisar, por meio das práticas
discursivas, as vozes e processo
decisório utilizados
pelas(os)praticantes na
formação da estratégia na
Instituição.
Identificação das vozes - Praticantes internos
- Praticantes externos
261
Almerinda Tereza Bianca Bez Batti Dias
Estratégia como Prática Social: práticas discursivas e questões de gênero
(conclusão)
Verificar os fatores que
impactaram na formação da
estratégia na Universidade.
Levantamento dos processos
decisórios na formação da
estratégia
- Definição da metodologia
- Organização dos cenários internos e externos
para reunião de maio
- Alocação dos membros nos Grupos de
trabalho
- Construção da Missão, Visão e Valores
- Elaboração dos Objetivos Estratégicos
- Elaboração dos Indicadores
- Priorização dos projetos
Identificação dos fatores que
impactaram no fazer
estratégia
-cultura organizacional
- poder/politica institucional
Identificar as questões de
gênero com foco na divisão
sexual do trabalho, por meio
dos princípios da separação e
da hierarquia nas práticas
discursivas da estratégia.
Gênero: divisão
sexual do trabalho
Identificação das questões de
gênero – divisão sexual do
trabalho – incorporadas na
IES que impactaram no fazer
estratégia.
- hierarquia: trabalho masculino é mais
valorizado que o feminino
- separação: há trabalhos que são masculinos e
outros femininos
Apesar dos avanços acerca
das questões de gênero e
de a Instituição ser uma
universidade, ou seja: área
da educação, nela se
reproduz o cenário de
feminização de
organizações de outras
áreas de atuação.