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UFRJ
Danielle Martins de Andrade Sales
CONTRIBUIÇÕES DO TRABALHO EM DUPLA PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO NAS AULAS DE INGLÊS
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar de Lingüística Aplicada, Faculdade de Letras, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do Título de Mestre em Lingüística Aplicada.
Orientadora: Professora Doutora Myriam Brito Corrêa Nunes
Rio de Janeiro Julho de 2007
Sales, Danielle Martins de Andrade. Contribuições do trabalho em dupla para a construção do conhecimento nas aulas de inglês. UFRJ/CLA, 2007 113f; 30cm. Orientador (a): Myriam Brito Corrêa Nunes Dissertação (mestrado) – UFRJ/ CLA/ Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar de Lingüística Aplicada, 2007. Referências bibliográficas: f.108-110 1. Visão de conhecimento e educação. 2. O modelo sócio-interacional 3. Visão de linguagem 4. Teoria e prática na minha sala de aula. I. Nunes, Myriam Brito Corrêa. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar de Lingüística Aplicada. III. Título
AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus que me sustentou ao longo desta caminhada
acadêmica dando-me saúde, paz e sabedoria para que não esmorecesse em meio às
dificuldades, receios e desafios inerentes a esta jornada.
Aos meus pais, Sebastião e Ana Maria, que sempre me apoiaram ao longo da minha
formação pessoal e profissional primando o meu sucesso, pois todas as vezes em que estava
estudando ambos colaboraram com silêncio, compreensão e palavras amigas nos momentos
de desânimo.
À minha irmã, Munique, que sempre me incentivou e também compreendeu os
momentos que precisava fazer uso do computador nas horas impróprias, mas mesmo assim
nunca reclamou da luz acesa e do barulho da impressora.
Ao meu marido André, que, mais do que marido, é um amigo sempre presente.
Agradeço por compreender os momentos que tive de me dedicar exclusivamente à redação de
minha dissertação e não pude lhe dar muita atenção. Sou grata a Deus por ter colocado
pessoas como André em minha vida, que compartilham as minhas lutas sempre com
companheirismo e muito amor.
À Professora Adriana Graciano, diretora acadêmica do curso de idiomas onde realizei
a pesquisa, por ter permitido a minha investigação na instituição.
À minha orientadora, Professora Doutora Myriam Brito Corrêa Nunes, que
incansavelmente ajudou-me de uma forma magnífica. Sem a sua dedicação e experiência seria
impossível a realização deste estudo. Sinto-me agraciada por ter tido a oportunidade de
conhecê-la, pois a Myriam foi de fundamental contribuição para o meu crescimento
acadêmico e pessoal.
A todos meus amigos e familiares que torcem pelo meu sucesso, muito obrigada.
RESUMO
CONTRIBUIÇÕES DO TRABALHO EM DUPLA PARA A CONSTRUÇÃO DE
CONHECIMENTO DOS ALUNOS NAS AULAS DE INGLÊS
Daniellle Martins de Andrade Orientadora: Professora Doutora Myriam Brito Corrêa Nunes
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar de Lingüística aplicada, Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Lingüística aplicada.
Tenho como objetivo analisar as contribuições dos trabalhos em dupla, propostos nas minhas aulas de inglês, para a construção de conhecimento dos meus alunos. Assim sendo, defendo as visões de conhecimento, educação e linguagem baseadas em Freire(1996), Bakhtin(1997/20001), Vygotsky(1998/2001), Bruner(1996/1997/2001) entre outros teóricos. Proponho, também, aprofundar tais discussões tendo como base a minha prática em sala de aula através do reconhecimento da linguagem como mediadora das práticas sociais e da visão sócio-interacional de ensino-aprendizagem (VYGOTSKY, 1998/2001). Para a realização do estudo, optei pela pesquisa interpretativista de cunho etnográfico (HOLMES, 1992/ ERICKSON, 1984/ HORNBERGER, 1994/ MC DONOUGH & MC DONOUGH, 1997). Os dados analisados foram gerados num curso livre de idiomas onde lecionava e constam de gravações em áudio das aulas, das entrevistas além das notas de campo por mim confeccionadas. A análise aponta que as contribuições dos trabalhos em dupla nas aulas de inglês não se limitam à prática do idioma em sala de aula, tais atividades também colaboram para a construção do conhecimento através de um processo de mediação e partilha com o outro. Palavras-chave: Trabalho em dupla, sócio-interacionismo, par mais competente, meios de mediação.
ABSTRACT
PAIR WORK CONTRIBUTIONS TO STUDENTS’ BUILDING OF KNOWLEDGE IN ENGLISH CLASSES
Danielle Martins de Andrade
Orientadora: Myriam Brito Corrêa Nunes
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar de Lingüística aplicada, Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Lingüística aplicada. In this study, I intend to analyze some pair work contributions, proposed in my classrooms, in relation to my students’ building of knowledge, education and development of proficiency in language based on Freire(1996), Bakhtin(1997/2004), Vygotsky(19998/2001), Bruner(1996/1997/2001) and so on. I also intend to discuss my practice in the classroom through the acknowledgement of language as a mediator of social practice and also through the social interactional view of teaching. In order to develop my study I carried out an ethnographic interpretative research (HOLMES, 1992/ ERICKSON, 1984/ HORNBERGER, 1994/ MC DONOUGH & MC DONOUGH, 1997). The data were generated at an English course where I taught and they consist of audio-taped classes, audio-taped interviews and field notes written by me. The analysis points out that pair work contributions in English classes are not restricted to the practice of foreign language; such activities also collaborate to the building of knowledge as a process of social mediation with a partner. Key words: pair work, social interaction, more capable peer, means of mediation.
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS .............................................................................................................15
RESUMO .................................................................................................................................16 ABSTRACT .............................................................................................................................17 PREFÁCIO...............................................................................................................................21 INTRODUÇÃO........................................................................................................................13 1 VISÃO DE CONHECIMENTO E EDUCAÇÃO.................................................................17 2 ABORDAGEM SÓCIO-INTERACIONAL .........................................................................27 2.1 O ser humano na perspectiva vigotskiana ..........................................................................30
2.1.1 O conceito de ZDP ..................................................................................................32
2.1.2 O papel do professor................................................................................................33
2.1.3 O papel do aluno......................................................................................................37 3 VISÃO DE LINGUAGEM ...................................................................................................40
3.1 O dialogismo bakhtiniano...............................................................................................44
3.1.1 Enunciado e heteroglossia .......................................................................................45 4 TEORIA E PRÁTICA NA MINHA SALA DE AULA........................................................50
4.1 A sócio-interação na prática ...........................................................................................53
4.1.1 Discutindo a minha prática ......................................................................................55 5 PLANEJAMENTO DA PESQUISA.....................................................................................59
5.1 Pesquisa interpretativista de cunho etnográfico .............................................................61
5.2 Contexto de pesquisa......................................................................................................64
5.2.1 Local de pesquisa.....................................................................................................64
5.2.2 Sujeitos colaboradores da pesquisa .........................................................................65
5.3 Geração de dados............................................................................................................66
5.3.1 Observação participante ..........................................................................................66 5.3.2 Notas de campo .......................................................................................................67
5.3.3 Questionário de sondagem ......................................................................................68
5.3.4 Entrevistas ...............................................................................................................68
5.3.5 Gravação..................................................................................................................69
5.4 Critérios para a análise de dados ....................................................................................70
6 RESPOSTAS ÀS QUESTÕES INVESTIGADAS ...............................................................72
6.1 As relações entre os alunos e o trabalho em dupla .........................................................73
6.1.1 Como os meus alunos entendem e participam do trabalho em dupla?....................74
6.1.2 Como os meus alunos interagem entre si? ..............................................................82
6.2 Como o meu papel auxilia na construção de conhecimento dos meus alunos? .............88
6.2.1 Como preparo os meus alunos para as atividades em dupla?..................................88
6.2.2 Como ajo durante as interações? .............................................................................91
6.2.3 Como ajo após o trabalho em dupla?.......................................................................93
6.3 Respondendo a macro-pergunta de pesquisa..................................................................94 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................106
ANEXOS................................................................................................................................111
A.1 Questionário de sondagem...........................................................................................112
A.2 Planos de aula ..............................................................................................................113 LISTA DE QUADROS Quadro 1 -Modelos de mente .................................................................................................24 Quadro2- Domínios de discurso..............................................................................................52 Quadro3-Como os meus alunos entendem os trabalhos em dupla?.........................................79 Quadro4-Meios de mediação...................................................................................................82 Quadro5-Assimetria no diálogo da seqüência 1......................................................................83 Quadro6-Assimetria no diálogo da seqüência 3......................................................................84 Quadro 7- O papel de professora-pesquisadora.......................................................................91 Quadro 8- Como os trabalhos em dupla contribuem para a construção do conhecimento dos meus alunos?............................................................................................................................98
Ser um docente não é uma tarefa fácil nos dias de hoje. O jovem que escolhe ser um
professor tem de lidar com as dificuldades inerentes à profissão e com a falta de prestígio de
sua carreira. Entretanto, ao decidir ser professora nunca hesitei apesar da falta de incentivo
por parte de alguns amigos, familiares e até da própria sociedade. Nasci para ser educadora e
não há adversidades que possam abalar a minha convicção.
Comecei a lecionar aos vinte anos de idade uma das disciplinas que mais me encanta:
a língua inglesa. A partir deste momento, trabalhei em vários cursos livres de idiomas
submetendo-me a diversas metodologias e ao uso de variados materiais didáticos. Ao terminar
minha graduação, logo ingressei na especialização em língua inglesa e vi-me interessada em
aprofundar os meus estudos cursando o mestrado.
Quando pesquisei sobre o local em que iria prosseguir meus estudos, decidi pelo curso
de Lingüística Aplicada da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Então, deparei-me com o
desafio de preparar um projeto como uma das etapas da seleção para o ingresso ao curso. Já
que desejava aprimorar minha prática, optei por pesquisar a minha própria sala de aula a fim
de compreender os processos envolvidos nas atividades aí realizadas e na construção de
conhecimento de meus alunos.
Desde que comecei a trabalhar num determinado curso livre de idiomas (o nome não
será mencionado por uma questão de ética), sempre fui orientada a propor trabalhos em dupla
todas as aulas. A princípio estranhava tal prática e até duvidava da eficácia da mesma. Este
fato se impôs como um tema que realmente me interessasse, ou seja, algo que me
impulsionasse a estudar. Dessa forma, escolhi investigar as contribuições dos trabalhos em
dupla para a construção do conhecimento dos alunos pautando-me em teóricos como
Bakhtin(1997/2004), Vygotsky(1998/2001), Bruner(1996/1997/2001) e outros.
Ciente da minha condição de docente participante do processo de ensino-
aprendizagem, vi-me impulsionada a transformar-me numa investigadora desse processo por
mim proposto, com a intenção de melhor compreendê-lo, visando a reflexão sobre a minha
prática de professora- pesquisadora atuante em sala de aula e a relação desta atuação para com
o desenvolvimento intelectual dos meus alunos.
Decidi redigir este prefácio a fim de situar o meu leitor em relação às razões pelas
quais me levaram a começar este estudo. Passo para a próxima seção que contém a introdução
do relato da investigação na qual me envolvi.
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O educador lida constantemente com seres humanos que têm como fator decisivo do
seu comportamento o convívio social. Segundo Vygotsky (2001:44), a experiência do homem
não é mero comportamento do animal que assumiu posição vertical, é uma função complexa
decorrente de toda a experiência social da humanidade e de seus grupos particulares.
Tendo em mente tal postulado vigotskiano, senti-me atraída por investigar como o
convívio social obtido através dos trabalhos em dupla poderia contribuir para a construção de
conhecimento dos meus alunos considerando a possibilidade do par mais competente na
interação não ser o professor, mas outro aluno. Essa inquietação me impulsionou a procurar
respostas para algumas considerações no meu cotidiano, bem como para a minha atuação
profissional como professora de inglês num determinado curso livre de idiomas, com o
propósito de melhor compreender o processo de construção de conhecimento de meus alunos,
especialmente na realização de atividades em dupla. Segundo Tudge (1996), a maior parte do
interesse por pesquisas, que enfocam a colaboração de pares mais competentes na ajuda ao
aprender, tem se centrado no papel que os adultos assumem no incentivo e reforço do
desenvolvimento das crianças. Já meu trabalho visa investigar o papel de adolescentes
atuando na construção de conhecimento do outro através de um processo colaborativo.
Apesar de inserida num contexto de curso de inglês onde os professores recebem
pacotes prontos para serem usados como material e se vêem limitados, todavia consegui
investigar a minha própria prática e sanar uma inquietação de saber se os trabalhos em dupla
poderiam contribuir para a construção de conhecimento dos meus alunos iniciantes.
Esta investigação baseia-se na visão sócio-interacional de ensino-aprendizagem e
linguagem a serem discutidas nos capítulos I, II e III. Para realizá-la, lancei mão da
metodologia interpretativista de cunho etnográfico, que me possibilitou observar e analisar
dados gerados por meio de notas de campo, gravações em áudio e entrevistas, com o intuito
de tecer reflexões sobre o processo de sócio-interação de meus alunos entre si bem como com
15
a professora a fim de construírem conhecimento durante as atividades em dupla. Assim,
organizei a apresentação dos resultados desta pesquisa do seguinte modo:
No capítulo I, defino a visão de conhecimento e educação pautados nos pressupostos
teóricos de Bakhtin (1997/2004) e Vygotsky (1998/2001) alinhada aos ideais de Paulo Freire
(1996) e outros teóricos. No capítulo II, apresento o modelo sócio-interacional defendido na
investigação que desdobra-se em subseções nas quais discuto o ser humano na perspectiva
vigotskiana, o conceito de ZDP, o papel do professor e do aluno.
O capítulo III dedica-se à visão de linguagem presente na pesquisa tendo em vista a
importância da mesma para o desenvolvimento do ser humano conforme os pressupostos
vigotskianos e também ao fato do estudo pertencer à Lingüística Aplicada e se realizar num
contexto de língua estrangeira.
No capítulo IV, apresento a forma pela qual coloco em prática na sala de aula os
pressupostos sócio-interacionais através da descrição das atividades em estudo. Exponho no
capítulo V a metodologia de pesquisa que norteou esta investigação a partir da descrição do
problema que gerou o estudo. Também teço comentários acerca da abordagem
interpretativista de cunho etnográfico e da forma pela qual os dados foram registrados com
base em Hryniewiewcz, 1996; Holmes,1992; Erickson, 1984; Hornoberger, 1994; Mc
Donough & Mc Donough, 1997 e outros.
Mencionei a macro-pergunta de pesquisa (Como o trabalho em dupla pode contribuir para
o processo de construção de conhecimento de meus alunos?) que foi desdobrada em outras,
entre as quais:
� Como os alunos entendem e participam do trabalho em dupla?
� Como o meu papel de professora-pesquisadora pode auxiliar no processo de construção
de conhecimento com ênfase no trabalho em dupla na aula de inglês?
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Ainda neste capítulo apresento o contexto de minha pesquisa e os sujeitos colaboradores
(professora-pesquisadora e alunos pertencentes ao terceiro nível de um curso destinado a
adolescentes). Em seguida, explico como os dados foram gerados ressaltando o uso de
triangulação dos mesmos para obter subsídios que me permitissem responder aos meus
questionamentos e inquietações para que minhas asserções tivessem coerência ou
credibilidade segundo Hubbard & Power (1993). Por fim, na última seção do capítulo
apresento os critérios usados para a análise do corpus.
No último capítulo deste trabalho, intitulado respostas às questões, busco responder às
perguntas de pesquisa que me levaram a conduzir esta investigação, ancorando-me nos
aportes teóricos de estudiosos apresentados nos capítulos anteriores. Na primeira subdivisão
enfoco a seguinte pergunta: Como os meus alunos entendem e participam do trabalho em
dupla?
Na segunda parte, procuro investigar o meu papel na participação e construção de
conhecimento de meus alunos. Finalmente, retomo o que foi discutido em resposta às duas
subperguntas de pesquisa para responder a macro-pergunta: Como o trabalho em dupla pode
contribuir para o processo de construção de conhecimento de meus alunos?
Na parte final deste trabalho, que optei por chamar de encaminhamentos, teço
considerações em relação às atividades em pares a partir desta investigação, mas este fato não
significa que irei parar de indagar-me sobre a minha prática, pois o final desta redação me
trouxe algumas respostas que geraram outras questões para serem investigadas futuramente.
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1 VISÃO DE CONHECIMENTO E EDUCAÇÃO
“Educar significa, antes de mais nada, estabelecer novas reações, elaborar novas formas de comportamento.”
(Vygotsky)
18
(...) quem forma se forma e re-forma ao formar; e quem é formado forma-se e forma ao ser formado (FREIRE, 1996: 25).
A citação acima se refere a uma visão de conhecimento e educação que entende o
processo de ensino-aprendizagem como uma via de mão dupla (grifo meu), isto é, em que
tanto o educador quanto o educando está em processo de formação contínua, pois ambos
ensinam e aprendem reciprocamente. Como educadora de alunos de diferentes faixas etárias,
em cada aula tenho a oportunidade de interagir com os jovens e assim trocar experiências com
os mesmos, embora alguns anos de vivência se interponham entre nós. Isto ocorre porque
entendo que ensinar não é uma mera transferência de conteúdos, mas criar meios em minha
sala de aula para a construção do conhecimento através do diálogo - perguntas, respostas,
argumentação etc. - entre o professor e os alunos e dos alunos entre si.
Isto posto, proponho-me a defender neste capítulo os pressupostos com que procuro
construir a visão de conhecimento e educação pautada em Vygotsky e Bakhtin alinhada aos
ideais de Paulo Freire e outros teóricos. Antes, porém, discutirei, em linhas gerais, diferentes
conceitos relativos ao processo de educação, ensino-aprendizagem, transmissão e construção
de conhecimento.
Sabe-se que existem diversas teorias de desenvolvimento que se apóiam em diferentes
concepções de homem e visões de conhecimento. A visão de desenvolvimento que privilegia
a apropriação pelo homem da experiência histórico-social é relativamente recente (DAVIS
1993). Dessa forma, durante vários anos a interação entre os fatores endógenos e exógenos
como propulsora do desenvolvimento humano não era destacada. Assim, ora os cientistas e
filósofos enfatizavam os fatores endógenos ora os exógenos. Com isso, foram criadas teorias e
abordagens denominadas inatistas ou maturacionais (que privilegiavam os fatores endógenos)
e ambientalistas ou behavioristas (que privilegiavam os fatores exógenos)(DAVIS, 1993).
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A concepção inatista pressupõe que os eventos ocorridos após o nascimento do
indivíduo não são relevantes para o seu desenvolvimento. Características humanas tais como
personalidade, valores, hábitos, crenças, reações emocionais e formas de pensar se
encontrariam prontas ou em potencialidade desde o nascimento. O desenvolvimento seria algo
espontâneo do ser humano, sendo assim o ambiente pouco interferiria no processo de
desenvolvimento (CASTORINA, 1995).
Entendo a concepção inatista como uma teoria que coloca o papel da escola e da
educação em uma posição acessória, ou seja, se o ser humano já se encontra “pronto” (grifo
meu) desde o seu nascimento, pouco a escola faria. Felizmente, sabe-se que não há bases
atualmente que sirvam de apoio para a visão inatista no âmbito da psicologia (DAVIS, 1993).
Caso contrário, não importaria a qualidade da educação que o indivíduo acessou ao longo de
sua vida nem menos valeria investir na formação de profissionais especializados na área
educacional, já que em conformidade com esta concepção o indivíduo é visto como um ser
pré-definido “acabado” (grifo meu) e pouco os professores deveriam fazer para conduzir o
educando ao conhecimento.
A concepção ambientalista, por outro lado, defende a influência do ambiente externo
no desenvolvimento humano. Esta concepção tem como origem a corrente filosófica
denominada empirismo que enfatiza a experiência sensorial como fonte de conhecimento
(CASTORINA, 1995). Um dos grandes defensores da concepção ambientalista, também
conhecida como behaviorista, é o norte-americano chamado B.F. Skinner. Em sua teoria,
Skinner preocupa-se em explicar os comportamentos observáveis do sujeito e renega em sua
análise fatores pertinentes à conduta humana como raciocínio, os seus desejos, fantasias e
sentimentos (DAVIS, 1993). Nesta concepção, o ambiente é muito mais importante do que a
maturação biológica do sujeito, já que são os estímulos presentes em dada situação os
responsáveis pelo aparecimento de determinado comportamento. A aprendizagem se dá
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através de associações entre um estímulo e uma resposta e entre uma resposta e um
reforçador. Sendo assim, quando os comportamentos modelos são reforçados, há a tendência
de imitá-los. Todavia, quando os mesmos são punidos tende-se a evitá-los. Segundo a visão
ambientalista, o ato de observar um colega fazer um gol, possivelmente fará com que as
crianças imitem a forma de chutar para obter o mesmo resultado (DAVIS, 1993).
Finalmente há uma terceira concepção denominada interacionista, esta se contrapõe
tanto à visão inatista quanto à visão ambientalista. Primeiramente critica a visão inatista
porque esta despreza o papel do ambiente e a visão ambientalista por ignorar os fatores
maturacionais. Em contrapartida, os interacionistas postulam a idéia de que o organismo e o
meio sofrem e exercem influências recíprocas e que o desenvolvimento e o processo de
construção de conhecimento perduram ao longo da vida do indivíduo. Identifico nesta
concepção de conhecimento duas correntes teóricas: a elaborada por Piaget e a defendida por
Vygotsky (CASTORINA, 1995).
A corrente teórica elaborada por Piaget acredita que o desenvolvimento cognitivo do
indivíduo ocorre através de constantes desequilíbrios e equilibrações. A equilibração é o
processo pelo qual o organismo procura manter um estado de igualdade com o seu meio a fim
de superar as perturbações existentes. Para atingir o equilíbrio, é necessário que se acione dois
mecanismos internos: a assimilação e a acomodação. O primeiro é responsável pela atribuição
de significados aos elementos do ambiente, já o segundo tenta restabelecer o equilíbrio
superior com o ambiente. Ambos auxiliam o indivíduo no ajuste às modificações e
transformações inerentes às demandas existentes no ambiente (DAVIS,1993). Em suma, o
desenvolvimento cognitivo ocorre através da interação entre o sujeito e o objeto cognoscível.
Para Vygotsky, a interação social e os instrumentos lingüísticos são extremamente
relevantes para a compreensão do desenvolvimento cognitivo (CASTORINA, 1995). A teoria
vigotskiana, defendida no presente estudo, por sua vez, é de fundamentação histórico - social:
21
propõe uma visão da formação das funções psíquicas superiores como internalização
mediada da cultura e, portanto, postula um sujeito social que não é apenas ativo mas
sobretudo interativo(CASTORINA, 1995:12). Segundo Vygotsky (1998), o aprendizado do
indivíduo começa antes de seu ingresso na escola, pois qualquer evento com o qual a criança
se depara na fase escolar pode ter uma história prévia.
Vygotsky coaduna com a ótica de Bakhtin (filósofo da linguagem), pois ambos
defendem a natureza social da educação, da construção do sentido e, portanto, do saber
através da linguagem e da interação com o outro. Dessa forma, o trabalho desenvolvido
dentro da escola pelo professor, por exemplo, deve relacionar-se à experiência pessoal do
aluno. Em outras palavras, o indivíduo somente aprende o que for relevante e aplicável ao seu
cotidiano:
Vimos que o único educador capaz de formar novas reação no organismo é a sua própria experiência. Só aquela relação que ele adquiriu na experiência pessoal permanece efetiva para ele. É por isso que a experiência pessoal do educando se torna base principal do trabalho pedagógico (VYGOTSKY, 2001: 63).
Através das palavras de Vygotsky (2001), percebe-se que o processo educacional
precisa basear-se na atividade pessoal do aluno. Mas, não dele sozinho, pois o papel do
educador consistiria em orientar e mediar as atividades propostas. Tais ideais opõem-se à
velha pedagogia que entendia o aluno como uma esponja absorvedora de um tipo de
conhecimento que não teria nenhuma relação com a sua identidade.
Adquire-se conhecimento através da interação com os indivíduos que nos cercam.
Desde o momento em que as crianças começam a formular suas primeiras perguntas, designar
nomes aos objetos que as rodeiam e interagir com os seus familiares e amigos; e neste
processo com o outro através do diálogo e da linguagem já estão adquirindo conhecimento: O
aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do
qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam (VYGOTSKY,
22
1998:115). Esta citação nos permite fazer a asserção de que o processo pelo qual o indivíduo
adquire conhecimento não se restringe apenas à maturação biológica, mas também demanda
de uso de signos, instrumentos de interação e a presença de outros indivíduos. Com base nos
pressupostos vigotskianos, sabe-se que o desenvolvimento das funções superiores ocorre
quando há incorporação e internalização de padrões e formas de relação experienciados com
outros (FREITAS, 1997).
Por sua vez, em reforço ao que vem sendo discutido, Bakhtin postulava que todo o
sujeito é híbrido e constituído socialmente, pois cada indivíduo é formado por discursos
sociais e coletivos (SOUZA, 1995). Estes construtos me levam a ressaltar que a educação
deve ser vista como um processo heterogêneo; assim sendo, perante uma situação conflitante,
o educador precisa refletir sobre uma forma de resolvê-la tendo em mente que o processo de
ensino-aprendizagem deve ser significativo para a construção da identidade pessoal de cada
educando.
Com base em Bakhtin, entendo a minha sala de aula como um fenômeno social que se
assemelha a uma arena de conflito de vozes (SOUZA,1995), nela circulam várias vozes e
valores concorrentes; Bakhtin intitula tal disputa de valores, encontro e desencontros de
vozes como heteroglossia. Corroboram para a presença da hetereglossia, todos os elementos
constituintes da sala de aula como o professor, os alunos, a metodologia e os conteúdos
programáticos.
Volto-me agora para os argumentos apresentados por um psicólogo vigotskiano para
quem as concepções de construção do conhecimento (inatista, ambientalista e interacionista)
mencionadas ao longo desta seção são válidas, porém cada uma gera um tipo de
conhecimento diferente que nasce num processo distinto. A partir desta proposição, Bruner
(1996, 2001) defende a existência de quatro modelos dominantes de mente que se mantêm
válidas até os dias de hoje na pedagogia popular, mas que produzem conhecimento segundo
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concepções diferentes que se originaram, portanto, por caminhos distintos. Segundo o
psicólogo, tais modelos não são meras concepções de mentes que determinam como
ensinamos, mas concepções sobre as relações entre mentes e culturas. Os modelos de mentes
são nomeados da seguinte forma por Nunes(2000): imitação, instrução, descoberta e
colaboração.
A imitação baseia-se em pressupostos que se assemelham aos do behaviorismo, pois o
conhecimento se origina através da imitação e do ensaio repetido. Cabe ao aluno imitar o
professor sem que haja reflexão e criatividade.
O modelo denominado instrução alinha-se à educação tradicional baseada na
exposição didática em que o aluno é apenas um receptáculo e que concebe a mente
especialmente como sendo capaz de memorizar. Através deste modelo, o aluno aprende a
partir da exposição didática conhecendo fatos, regras, princípios e teorias.
Por sua vez, a descoberta é o modelo de mente pautado no interacionismo piagetiano,
já que se baseia no princípio de que o conhecimento tem sua origem na experiência individual
do aluno e no controle de seus processos cognitivos. O aluno é visto como um pensador que
controla os processos cognitivos através de sua experiência individual.
Por fim, o modelo chamado colaboração coaduna com a ótica vigotskiana que tem
como base a construção do conhecimento através da colaboração e participação no diálogo. O
aluno é um pensador colaborativo capaz de administrar o conhecimento obtido através da
colaboração, reflexão e participação do diálogo.
Utilizarei um quadro de Nunes(2000) com base nas proposições de Bruner (1996) que
propicia um sumário dos modelos de pedagogia popular acima mencionados :
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Modelos de mente
Imitação Instrução Descoberta Colaboração
Visão de conhecimento
Prático, ritual, procedimental.
De princípio, proposicional, de conceito.
Subjetivo Construção, desenvolvimento.
Origem do conhecimento
Imitação, ensaio repetido.
Exposição didática.
Experiência individual, controle dos processos cognitivos.
Colaboração, reflexão, participação no diálogo.
Visão da mente Não criativa, capaz de imitar.
Receptáculo, capaz de memorizar.
Capaz de descobrir, capaz de pensar.
Capaz de administrar conhecimento objetivo.
Perfil do aluno Imitador de ações
Conhecedor de fatos, regras, princípios e teorias.
Pensador, epistemologista.
Pensador colaborativo
Perfil do professor
Modelo Instrutor. Facilitador Mediador /colaborador
Processo de ensinar
Ação, experiência.
Exposição didática.
Propiciar experimentação, oposto de aprender.
Colaborar, mediar, partilhar saber.
Processo de aprender
Replicar, repetir. Memorizar, conhecer fatos regras, princípios e teorias.
Fazer experiência individual, descobrir.
Construir verdades novas.
Quadro 1- modelos de mente
Em minha concepção pedagógica acredito e, portanto, procuro seguir o quarto modelo
de mente exposto no quadro acima porque propõe uma forma colaborativa de construção de
conhecimento que leva o aluno a refletir sobre o que está sendo aprendido e aceito como
verdade. Sei que o conhecimento não é resultado apenas de um ato proveniente de uma
pessoa, mas fruto de um processo sócio-cultural colaborativo. Todavia, conforme discutirei na
seção 4.1.1 deste estudo, o material didático adotado pelo curso onde a investigação foi
realizada lança mão dos quatro modelos de pedagogia popular citados por Bruner (1996). É,
portanto, eclético em sua visão de mente e não apresenta clareza quanto à fundamentação
teórica que orienta a visão dos processos de ensinar e aprender. Em conseqüência disto,
esperava que o professor às vezes desempenhasse o papel de modelo e instrutor. Quanto ao
aluno, pelas atividades propostas que serão discutidas na seção 4.1.1, às vezes seu perfil é
25
semelhante ao de um imitador de ações dos outros, pressupõe-se que ele memorize regras e
fatos (cf.A.2).
As atividades em par tornaram-se, contudo, o momento propício para eu estudar meu
perfil, o papel dos alunos e o tipo de conhecimento que se pretende construir segundo o
modelo de colaboração apresentado no quadro 1.
Na seção denominada presentation, lançava mão da instrução, pois apresentava ao
aluno fatos, regras princípios e teorias. Na seção listening practice, o aluno trabalhava
sozinho a fim de identificar o conteúdo ouvido sendo capaz de descobrir e pensar através de
sua experiência individual. Na seção listen and repeat , utilizei a imitação como modelo de
pedagogia, pois os alunos reproduziam o conteúdo como um ensaio repetido. Por fim, na
seção speaking practice, os alunos deveriam interagir em par através de um processo de
colaboração.
Tipos Retomando o título da seção, após uma breve menção das distintas teorias de
desenvolvimento existentes no campo educacional, defendo uma visão de conhecimento e
educação sócio-interacionista colaborativa, visto que esta entende o processo de ensino-
aprendizagem como algo co-construído; em outras palavras, considero que ensinar não é
repassar informações, mas criar situações que aprimorem o patrimônio pessoal do aluno e o
levem à produção de verdades novas. m
A partir do momento em que o educador se conscientiza que ensinar é formar, ou seja,
é mobilizar as forças internas existentes no educando para que este exerça o seu potencial;
concebe-se, desta forma, o ensino como ferramenta para transformação e não como um meio
de transmissão de verdades inquestionáveis. Para isso, o conteúdo ensinado deve estar
intimamente interligado à realidade do aluno devido à concepção vigotskiana discutida ao
longo do presente capítulo de que só aprendemos o que nos apresenta algum significado.
Portanto, educar não é apenas ensinar conteúdos ou inserir o aprendiz no mercado de trabalho;
26
educar é formar cidadãos que possuam uma consciência reflexiva da sociedade na qual estão
inseridos independentemente da disciplina a qual lecionamos e também do papel que nela os
alunos possam vir a desempenhar.
Retorno no próximo capítulo à teoria desenvolvida por Vygotsky, também conhecida
como sócio-interacionismo, de forma mais detalhada a fim de justificar os motivos pelos
quais a defendo no presente trabalho.
27
2 ABORDAGEM SÓCIO-INTERACIONAL
“ A educação deve ser organizada de tal forma que não se eduque o aluno mas o próprio aluno se eduque”. (Vygotsky)
28
No capítulo anterior, procurei discutir brevemente distintas visões de conhecimento e
educação; neste, proponho-me a enfocar as principais contribuições do modelo sócio-
interacional, para meu estudo, tendo em vista que os pressupostos teóricos da presente
investigação fundamentam-se no mesmo.
Sendo assim, começarei a discorrer sobre a natureza da abordagem sócio- interacional
defendida por Vygotsky. Na seção 3.1 discutirei as características do ser humano a partir dos
pressupostos vigotskianos. Tal seção desdobra-se em três subseções nas quais enfoco o
conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), para então discutir o papel do
professor e o papel do aluno no sócio-interacionismo.
Na abordagem sócio-interacional, o desenvolvimento se baseia na concepção de que o
indivíduo é um organismo interativo, consciente e capaz de desenvolver-se e transformar-se
cujo pensamento constrói-se num ambiente sócio- histórico. Conforme faz notar Davis
(1993) e Gallimore & Tharp (1996), Vygotsky postula a idéia que a interação entre as
mutáveis condições sociais e a base biológica do comportamento humano gera novas e mais
complexas funções mentais. Segundo Davis (1993), estas funções mentais superiores (como a
capacidade de solucionar problemas, o armazenamento e o uso adequado da memória, a
formação de novos conceitos e o desenvolvimento da vontade) surgem diferentemente das
funções inferiores (caracterizadas por serem preponderantemente biológicas, espontâneas e
rudimentares). Aquelas partem inicialmente no plano social da interação do indivíduo com
outras pessoas para, então, em seguida surgirem no plano psicológico, ou seja, no próprio
indivíduo. Com base nestes argumentos, conclui-se que para Vygotsky a internalização da
interação interpsicológica é o principal mecanismo que explica o desenvolvimento
psicológico humano, tendo sido originalmente examinada no contexto da emergência das
funções psicológicas guiadas pelas sugestões de outros (CASTORINA,1995:29).
29
Depreende-se que o desenvolvimento humano, conforme os postulados vigotskianos,
dá-se através de uma atividade interpessoal que se converte em intrapessoal. O progresso
cognitivo é produzido, portanto, por um processo que ocorre num primeiro estágio de fora
para dentro, com isso as formas culturais internalizam-se ao longo do desenvolvimento dos
indivíduos e constituem-se no material simbólico que medeia sua relação com os objetos de
conhecimento (CASTORINA,1995:36).
Importa ressaltar que o desenvolvimento pleno do ser humano depende do
aprendizado realizado em determinado grupo cultural com base na interação entre os
indivíduos da sua espécie (REGO, 1995). Em outras palavras, um indivíduo sem problemas
físicos em seu aparelho fonador criado no meio de animais de outras espécies, que não falam,
provavelmente não aprenderá a falar de forma que outros seres humanos o entendam.
Consoante tal premissa que postula a estreita relação entre o comportamento do homem e o
meio social no qual está inserido, percebe-se a importância do último para o desenvolvimento
humano. Trago as palavras do próprio Vygotsky (2001:6) para enfatizar estes conceitos:
O comportamento do homem se processa nos complexos limites do meio social. O homem não entra em convívio com a natureza senão através do meio, e em função disso o meio se torna o fator mais importante, que determina e estabelece o comportamento do homem.
No que concerne ao processo de formação do pensamento, Davis (1993) faz notar que
Vygotsky o entende como um processo despertado e acentuado pela vida social e pela
constante comunicação entre indivíduos da mesma espécie; o que ocasiona a assimilação de
experiências alheias. A partir do momento em que o indivíduo tem a oportunidade de interagir
com outros, o mesmo aprende e desenvolve-se, já que a aprendizagem e o desenvolvimento
são fenômenos distintos e interdependentes, pois cada um torna o outro possível (DAVIS,
1993:53).
Outro aspecto do sócio-interacionismo a ser apresentado baseado nos postulados
vigotskianos é o de que há dois níveis de desenvolvimento: o real (refere-se a ações que o
30
indivíduo consegue realizar sem ajuda de terceiros) e o proximal (refere-se àquilo que o
indivíduo consegue fazer somente mediante a ajuda alheia) (REGO, 1995). Eis mais um
argumento para que se defenda que o aprendizado através da interação e da linguagem é o
fator preponderante no desenvolvimento do aluno e na construção do conhecimento. No
momento em que o indivíduo interage com outros sujeitos, o mesmo ativa vários processos
que, sem ajuda externa, seriam impossíveis de ocorrer. Tais processos são internalizados e
passam a fazer parte do desenvolvimento individual do sujeito.
Retomando o título deste capítulo, destaco a relevância do meio social, das atividades
interpessoais e, portanto, das atividades em pares, para o desenvolvimento sócio-histórico do
ser humano. Na próxima seção, enfocarei a visão de ser humano na perspectiva vigotskiana, a
partir da qual procurarei discutir o conceito de ZDP para conseqüentemente elucidar como
entendo o papel do professor e do meu do aluno sob a ótica sócio-interacional.
2.1 O ser humano na perspectiva vigotskiana
Os pressupostos teóricos vigotskianos caracterizam o homem como um ser interativo,
transformador, cultural e capaz de pensar. Um ser que se difere dos outros animais porque
possui um pensamento complexo, dialético e transcendente: um ser histórico e produto de
relações sociais (FREITAS, 2002:318).
Com base em Freitas (2002), entende-se que o desenvolvimento psicológico do ser
humano, discutido acima, está atrelado aos modos de ordenar o real construído culturalmente.
Pressupõe-se o homem como um ser sócio-histórico porque o fundamento de seu
funcionamento psicológico é cultural:
Os elementos mediadores na relação entre o homem e o mundo - instrumentos, signos, e todos os elementos do ambientes humanos carregados de significado cultural – são construídos nas relações entre homens (OLIVEIRA, 2005:8).
31
Segundo esta visão, o sujeito não é formado somente por fatores biológicos e por sua
experiência individual, mas também por fatores sociais que medeiam o contexto no qual está
inserido. Conforme apontado na seção anterior, seu comportamento também se pauta na
experiência histórica de seu contexto social, daí a afirmação de Oliveira (2005:12) de que: O
ser humano é o único animal que utiliza a experiência duplicada, isto é, vivida mentalmente e
concretamente, o que lhe permite uma adaptação ativa ao meio, inexistente nas outras
espécies.
Estas concepções se baseiam em Vygotsky (2001) para quem o homem se diferencia
dos animais devido aos seguintes fatores: o indivíduo tem herança social (experiências
acumuladas por gerações anteriores); vínculos condicionados que se estabeleceram através da
experiência social de outros homens - o homem pode imaginar como é uma cidade sem nunca
visitá-la somente através do relato de outros - o sujeito adapta seu corpo à natureza ativamente
para que esta possa ser sua ferramenta, e aí se situa sua capacidade de se expressar e usar a
linguagem.
Finalmente, tendo em vista sua herança social, o ser humano é capaz de produzir suas
ferramentas porque executa seu trabalho de forma categórica devido a sua capacidade de
pensar e planejar suas tarefas antes de executá-las, ou seja, ele possui funções psicológicas
superiores. O fator decisivo do comportamento humano não é só biológico, mas também
social, como já discutido, que traz consigo momentos inteiramente novos para o seu
comportamento. A experiência humana não é mero comportamento de um animal que
assumiu posição vertical; é uma função complexa decorrente de toda experiência social da
humanidade e de seus grupos particulares (VYGOTSKY, 2001:44).
A partir das asserções feitas ao longo desta seção, considero o homem um ser que já
nasceu social, já que interage com os seus grupos particulares desde o momento de seu
nascimento. Voltando-me para a situação de sala de aula posso afirmar que, no instante em
32
que os alunos têm oportunidade de interagir com seus colegas em sala de aula, há a
possibilidade de atuação na ZDP( zona de desenvolvimento proximal) do outro colega.
Devido ao conceito de ZDP, um aluno pode fazer uma atividade com a ajuda do outro e
segundo o qual podemos melhor entender sua possibilidade de se desenvolverem como seres
sócio-historicamente construídos.
Para melhor compreensão do que aqui proponho, enfoco na próxima seção o conceito
de ZDP a partir da qual procurarei discutir como entendo o meu papel de professora-
pesquisadora e, conseqüentemente, como entendo o papel dos meus alunos nas seções
subseqüentes.
2.1.1 O conceito de ZDP
Segundo Vygotsky (1998), para que haja desenvolvimento a partir da interação entre
os indivíduos, é necessário que um par mais competente atue na ZDP do outro. Por isso, nesta
seção proponho-me a discutir este conceito que se refere ao conjunto de atividades que a
criança não conseguiria fazer sozinha, mas com a ajuda de outros consegue realizá-las. Aquilo
que uma criança pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha amanhã
(VYGOTSKY, 1998:113).
Este conceito é de grande valia para a compreensão do desenvolvimento intelectual
do aluno na concepção vigotskiana de ensino-aprendizagem, pois a ZDP define as funções
que ainda não amadureceram. As ações realizadas independentemente pertencem ao nível de
desenvolvimento real, ou seja, aquelas que já são maduras e já estão internalizadas, pois
passaram do nível inter para intra-pessoal. Em contrapartida, aquelas em que a criança ainda
necessita de auxílio permanecem na ZDP. Vygotsky (1998) chama tais ações de brotos ou
flores do desenvolvimento. A ZDP propicia aos psicólogos e educadores um instrumento que
proporciona estudar e compreender o caminho condutor ao desenvolvimento. Usando esse
33
conceito podemos dar conta não somente dos ciclos e processos de desenvolvimento que já
foram completos, como também daqueles processos que estão em estado de formação, ou
seja, aqueles que estão começando a amadurecer (VYGOTSKY,1998:113).
Através da ZDP, os adultos, ou os outros sujeitos, podem intervir, colaborar ou mediar
no desenvolvimento das crianças desde que estas tenham oportunidades de participar de
processos colaborativos. Assim sendo, no momento em que as crianças participam de
atividades em colaboração com outros indivíduos, estas aprendem significados,
comportamentos e tecnologias adultas (TUDGE, 1996).
Os estudos realizados por Vygotsky (1998) sobre o conceito de ZDP trouxeram
contribuições significativas para as questões que investigo na presente pesquisa. Com base em
seus conceitos, percebo que os trabalhos em pares propostos nas aulas de inglês podem afetar
diretamente ou indiretamente ao desenvolvimento dos alunos. À medida que os discentes
interagem com colegas que atuam como pares mais competentes, estes têm a oportunidade de
se desenvolver porque podem aprender novos significados, comportamentos, criar e usar
ferramentas. Tal interação ajuda a amadurecer os processos que ainda estavam em formação
(na ZDP), ou seja, pode levar a amadurecer os brotos do desenvolvimento. É com base nestes
pressupostos que investigo neste estudo as contribuições dos trabalhos em dupla nas aulas de
inglês para a construção do conhecimento dos alunos.
Tendo em vista a importância de um mediador no processo de ensino-aprendizagem,
passarei a seguir a discutir também o papel do professor no modelo sócio-interacional.
2.1.2 O papel do professor O professor no modelo sócio-interacional possui extrema relevância, visto que
Vygotsky (2001) entende o mestre como organizador do meio educativo, o regulador e
34
controlador da sua interação com o educando; isto é, o professor é o mediador do processo
educacional.
Para que haja tal mediação, pressupõe-se que o processo de educação seja baseado na
atividade pessoal do aluno e que este se insira num processo interativo com outros pares.
Depreende-se que o discente precise entender a relação entre o conteúdo visto em sala de aula
e seus interesses pessoais. Dessa forma coaduno com Davis (1993:52) que nota o seguinte: as
formas comportamentais usadas pelo professor na situação de aprendizagem vão sendo
apropriadas pelos alunos que podem passar a usá-las de modo independente ao tentar
compreender novos aspectos do ambiente.
Ancorando-me aos ideais de Vygotsky (2001), entendo que o mestre exerce influência
imediata sobre os alunos através do meio social que funciona como uma alavanca no processo
educacional e cabe ao professor direcionar esta alavanca.
Faço uso da metáfora feita por Vygotsky (2001) para tornar mais clara a função do
professor para o meu leitor. Como um jardineiro seria insano se quisesse influenciar o
crescimento das plantas, puxando-as diretamente do solo com as mãos, o pedagogo entraria
em contradição com a natureza da educação se forçasse influência direta sobre a criança. Mas
o jardineiro influencia o crescimento da flor aumentando a temperatura, regulando a umidade
etc. Assim faz o educador, que ao mudar o meio, educa a criança e também se educa.
Retomando o título desta seção, entendo que cabe ao professor um papel ativo no
processo educacional. Para isso, o fazer docente consiste em cortar, talhar e esculpir os
elementos do meio, combiná-los pelos mais variados modos para que eles realizem a tarefa
de que ele, o mestre necessita (VYGOTSKY 2001:73). Dessa forma, recai sobre professor
que crê na construção sócio-interacional um papel relevante: tornar-se co-construtor e
mediador do meio social no qual irá também interagir através da linguagem com seu aluno.
35
Para ser um organizador do meio social (VYGOTSKY, 2001), o mestre precisa ter em
mente meios que façam com que os alunos se interessem por um dado assunto ministrado em
sala de aula. A inspiração do docente deve atingir aos alunos e coincidir com os interesses
pessoais dos mesmos. Com isso, a aprendizagem contribuirá para o desenvolvimento e
apropriação de instrumentos de apropriação cultural: A aprendizagem organizada converte-se
em desenvolvimento mental e coloca em funcionamento uma série de processos evolutivos
que nunca poderiam ocorrer à margem do aprendizado (CASTORINA, 1995:22).
É válido destacar que o papel do professor no presente relato não se restringe em ser
apenas mediador e organizador do meio social. Conforme Richards (1986), o mestre também
desempenha outros papéis que os auxiliam a organizar, construir e mediar conhecimento:
• Analista de necessidades – O professor é responsável por corresponder às
necessidades do aluno. Esta análise pode ser feita informalmente através de conversas
individuais nas quais o professor observa o estilo de aprendizagem do aluno e seus
objetivos.
• Gerente das atividades em grupos- As aulas não são centralizadas no professor. A
responsabilidade do educador é organizar a sala de aula como um cenário para
comunicação e atividades comunicativas. Durante a atividade o professor monitora,
incentiva, auxilia os grupos na discussão de auto-correção e contém a vontade de
suprir os espaços em branco em relação ao léxico e a gramática. Todavia, anota tais
espaços em branco para um futuro comentário e uma prática comunicativa.
• Conselheiro - O professor é um comunicador efetivo que maximiza a relação entre a
intenção do falante e a interpretação do ouvinte, através do uso de paráfrase,
confirmação e retorno.
Com base nos pressupostos vigotskianos, Gallimore & Tharp (1996) nos fornecem seis
meios com os quais o professor pode mediar o processo de ensino-aprendizagem:
36
modelagem, gerenciamento de contingências, realimentação (feedback), instrução,
questionamento e estruturação cognitiva.
Modelagem é o processo pelo qual propicia comportamentos a serem imitados. Tais
modelos encontram-se engendrados no nicho ecológico e cultural da família (trabalho no
campo, cuidado com as crianças etc.). Descrevem o gerenciamento de contingências como
sendo recompensas e punições oferecidas conforme um dado comportamento. São os reforços
sociais de elogio e encorajamento, reforços materiais de bens de consumo ou privilégios,
troféus e recompensas simbólicas (GALLIMORE & THARP, 1996:175).
A realimentação (feedback) dá-se através de resultados obtidos em testes, respostas
imediatas do professor à conversação dos alunos e aplicação de formulários de verificação.
Este processo está tão arraigado à vida normal que passa despercebido. Para estes autores, um
outro meio de assistência muito freqüente em nosso cotidiano é a instrução. Através deste
meio, os professores se responsabilizam em acompanhar seus alunos em vez de esperar que os
estudantes aprendam os conteúdos sozinhos.
Para Gallimore & Tharp, o questionamento se torna um meio de desenvolvimento
quando as perguntas formuladas auxiliam o desempenho de uma forma camuflada. A
pergunta exige explicitamente uma resposta cognitiva e lingüística ativa que estimula o aluno
a produzir criações próprias (GALLIMORE & THARP, 1996:177). Finalmente, propõem a
estruturação cognitiva que se refere à organização de conteúdos e funções, pois o professor
pode auxiliar o aluno na organização de dados brutos da experiência encontrados nos textos e
experimentos dados em sala de aula relacionando tais dados com outros similares
(GALLIMORE & THARP, 1996).
A partir destes seis meios de assistência descritos anteriormente, analisarei no capítulo VI
do presente estudo a minha prática e as atividades em par por mim propostas a fim de saber
37
quais meios se fazem presentes em minha sala de aula e são utilizados por mim e meus alunos
nos trabalhos em pares propostas em minha sala de aula.
Embasada na discussão da presente seção, parece-me que cabe ao professor fazer com
todos os alunos se envolvam na aula que está sendo ministrada para que os estes se sintam
motivados de forma que percebam a relevância de sua participação no processo de ensino-
aprendizagem.
À medida que, como professora, tenho a consciência de meu papel como mediadora no
processo de ensino-aprendizagem e das necessidades dos aprendizes como fatores primordiais
para o planejamento das aulas, desperto meus interesses por melhor conhecer como se
realizam as atividades em dupla e questiono se são executadas de maneira que contribuam
para a construção de conhecimento, pois creio que devo proporcionar o máximo de
oportunidades para a participação dos alunos e paralelamente desenvolver a responsabilidade
dos aprendizes promovendo atividades possíveis em que interajam entre si.
Estas afirmações e questionamentos fazem com que passe a enfocar na próxima seção a
questão do papel do aluno no modelo sócio-interacional, já que concebo o processo de ensinar
e aprender como de mão dupla em que professor e alunos são interativos e participantes.
2.1.3 O papel do aluno Se o professor tiver em mente o seu papel no modelo sócio-interacional como já
discutido na seção anterior, conseqüentemente seus alunos também terão a consciência de
seus respectivos papéis no processo educativo. Conforme enfocado anteriormente, não
somente o mestre é o par mais competente, os outros colegas presentes em sala de aula podem
contribuir para o desenvolvimento através da interação, já que um pode atuar na ZDP do outro
(vide seção 2.1.1). Inerente a isto, numa visão sócio-interacional de construção do
38
conhecimento, os próprios alunos devem desprender-se da concepção de que o professor é o
único responsável por tudo em sala de aula:
Por isso a passividade do aluno como subestimação da sua experiência pessoal é o maior pecado do ponto de vista científico, uma vez que toma como falso preceito de que o mestre é tudo, e o aluno nada. Ao contrário, o ponto de vista psicológico exige reconhecer que, no processo educacional, a experiência pessoal do aluno é tudo(grifo meu). A educação deve ser organizada de forma que não se eduque o aluno, mas o próprio aluno se eduque (VYGOTSKY, 2001:64).
Tendo em vista o que destaquei ao citar as palavras de Vygotsky, deduz-se que o fator
que contribui para o processo de desenvolvimento do aluno é a apropriação ativa do
conhecimento disponível na sociedade na qual está inserido e que possa ter aplicabilidade no
seu dia-a-dia. Tal apropriação, conforme já abordado, ocorre através da interação do sujeito
com pares mais competentes em diferentes ambientes sociais (incluindo o doméstico, o
escolar, o de trabalho etc.). Desta forma, Davis alerta para o fato de ser:
(...) preciso que a criança aprenda e integre em sua maneira de pensar o conhecimento da sua cultura. O funcionamento mais complexo desenvolve-se graças à regulações realizadas por outras pessoas que, gradualmente, são substituídos por auto- regulações. Em especial, a fala é apresentada, repetida e refinada, acabando por ser internalizada, permitindo à criança processar informações de uma forma mais elaborada (1993:54).
Partindo destes pressupostos, investigo como o aluno em sala de aula pode atuar como
um sujeito ativo tanto no seu processo educativo quanto no processo educativo de seus
colegas por meio do diálogo e da sócio- interação. O que importa no processo e em uma
situação de ensino-aprendizagem é que o aluno se desenvolva, ou seja, que o discente seja
capaz de aplicar o conteúdo ou o conceito construído em sala de aula em outro contexto e não
apenas aprenda um conceito para repeti-lo. Percebe-se que ambos o papel do professor e dos
alunos são inter-dependentes assim como ensinar e aprender é um único processo na teoria
sócio- interacional.
Passo a seguir a discussão sobre a visão de linguagem em que se fundamenta a minha
investigação e prática pedagógica, tendo em mente que a linguagem é construtora por
excelência da ação do pensamento e instrumento para o processo de ensino-aprendizagem e
39
para a execução de diferentes formas de comportamento no domínio da interação social
(LEVINA,1981).
40
3 VISÃO DE LINGUAGEM
“ O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma com a inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento na História”. (Paulo Freire)
41
Tendo em vista não só a importância da linguagem para o desenvolvimento humano
conforme os pressupostos vigotskianos, mas o fato de meu estudo pertencer à Lingüística
Aplicada (área interdisciplinar que investiga problemas sociais e práticos relacionados à
linguagem que ocorrem dentro ou fora da sala de aula), o presente capítulo tem como
finalidade discutir algumas tendências que orientam a concepção de linguagem e esclarecer
aquela em que a presente investigação se baseia.
A Lingüística Aplicada tem como uma de suas características a natureza
interdisciplinar, uma vertente que se detém ao ensino de língua estrangeira e outra que está
atrelada ao construtivismo. Portanto, a minha pesquisa se insere no campo de Lingüística
Aplicada, já que utilizo o conhecimento teórico advindo de disciplinas como psicologia e
educação. Além disso, a sala de aula é vista como um objeto de investigação em que atuo
como professora e investigadora, pois o foco da pesquisa em sala de aula está na construção
da aprendizagem a partir da sócio-interação. Segundo Cavalcanti e Moita Lopes (1991) a
relevância deste foco é de extrema importância para a Lingüística Aplicada na área de ensino-
aprendizagem de línguas, pois o que se deseja é a compreensão do modo em que o professor
opera e como o aluno executa a tarefa de aprender.
Através da pesquisa na área do ensino da língua estrangeira, a LA ( Lingüística Aplicada)
pôde descobrir algumas características de como um indivíduo aprende uma outra língua de
forma que os professores possam preparar aulas que realmente promovam a aprendizagem.
Como professora de língua estrangeira, preocupo-me em proporcionar aos meus alunos
aulas em que a aprendizagem seja construída e ao mesmo tempo procuro conscientizá-los de
que saber inglês é algo necessário para que eles entendam o que se passa no mundo e possam
também se colocar quando necessário for:
(...) Essa aprendizagem não pode ser vista, também no contexto da comunicação internacional. Entenda-se aqui, não apenas a absorção de ensinos provenientes do exterior, mas também a necessidade de se colocar a contribuição brasileira nas áreas da ciência, da tecnologia e dos negócios acessíveis ao resto do mundo (CELANI, 2000:23).
42
Observa-se que a LA sempre contribui bastante no que se refere ao ensino-aprendizagem
de língua estrangeira. Sendo assim, há uma experiência acumulada com o passar dos anos e
esta experiência pôde trazer vários subsídios para o desenvolvimento da minha pesquisa.
Além disso, o estudo que desenvolvi está voltado para a reflexão sobre minha atuação como
professora e a maneira em que os alunos se vêem quando executam atividades por mim
propostas. Conforme Celani (2000), cada vez mais a LA está relacionada às questões de
desenvolvimento de uma consciência crítica no que se refere ao ensino-aprendizagem de
língua estrangeira.
Já que meu estudo pertence à Lingüística Aplicada, identifico nos preceitos advindos
da filosofia da linguagem (BAKHTIN, 1997), três tendências que orientam a concepção de
linguagem através de diferentes estudos e épocas: o subjetivismo idealista, o objetivismo
abstrato e o pensamento bakhitiniano.
O subjetivismo idealista reduz o fenômeno lingüístico a um ato significativo de
criação individual. Os pressupostos teóricos desta visão são alvo das seguintes críticas ou
restrições (BAKHTIN, 1997): a materialização da língua se dá através de atos individuais de
fala, as leis da criação lingüística pertencem às leis da psicologia individual, a criação
lingüística compara-se à criação individual e a língua é vista enquanto produto acabado ou
sistematizado (léxico, gramática e fonética), pois apresenta-se como depósito inerte
construída pelos lingüistas de forma abstrata.
Já em relação ao objetivismo abstrato aplicam-se os seguintes comentários: parte da
premissa de que a língua possui traços idênticos para todas as enunciações (traços fonéticos,
gramaticais e lexicais). Além disso, pressupõe que a língua seja considerada um sistema
estável com formas imutáveis pertinentes a um sistema fechado que nada tem a ver com
valores ideológicos. Por isso, os atos individuais de fala são vistos como simples refrações,
43
variações ou deformações da língua não se estabelecendo assim qualquer vínculo ou
afinidades entre o sistema da língua e a sua história (BAKHTIN, 1997).
Ferdinand Saussure é um dos mais notórios representantes desta segunda vertente.
Este considera a linguagem como um sistema estável e imutável reproduzido pelo indivíduo
falante - parole. Em sua visão, os elementos lingüísticos são puramente objetivos e sua
lingüística é eminentemente frasal, pois desconsidera a complexidade da linguagem do ponto
de vista social e histórico.
Em oposição aos dois posicionamentos acima enfocados, Bakhtin e seus seguidores
postulam a linguagem como um fenômeno social: a unidade básica de análise lingüística,
para Bakhtin, é o enunciado, ou seja, elementos lingüísticos produzidos em contextos sociais
reais e concretos como participantes de uma dinâmica comunicativa (BAKHTIN, 1995:21).
Os ideais de Bakhtin postulam a função comunicativa da linguagem, já que este
pensador vê a língua como um meio de interação verbal entre os indivíduos que pertencem a
uma comunidade claramente organizada (BAKHTIN, 1997). Fundamenta-se no pressuposto
que a linguagem é co-construída por indivíduos que estejam integrados em uma determinada
situação social, visto que dois organismos biológicos não são capazes de produzir um ato de
fala se estiverem sozinhos em um meio natural. Em sua visão é de extrema relevância que o
locutor e o ouvinte sejam pertencentes à mesma comunidade lingüística para que possam se
comunicar, pois: a estrutura da enunciação é puramente social e como tal só se torna efetiva
entre falantes. (BAKHTIN, 1997:127).
Uma vez discutida a visão de linguagem em três perspectivas distintas, na próxima
seção discutirei de forma mais detalhada a visão bakhtiniana defendida no presente estudo,
pois complementa a visão de ensino-aprendizagem sob a qual analisarei a minha prática
pedagógica.
44
3.1 O dialogismo bakhtiniano
A visão de linguagem, que discutirei neste trabalho, baseia-se nos princípios
postulados por Bakhtin (1997; 2001). Para este filósofo, o valor do signo se encontra no
mundo exterior (social), conforme anunciei na seção anterior, pois o autor privilegia as
relações sociais entre os sujeitos. Bakhtin se preocupa com a construção e instauração de
sentidos, pois a língua não é falada no vazio. Desta forma, o significado da palavra está ligado
ao mundo em que o falante está inserido, sendo a linguagem vista como enunciação e
interação. Para este autor, a enunciação está atrelada às condições de comunicação que
sempre estão ligadas às estruturas sociais. Com vista a discutir tais conceitos, trago as
considerações de Faraco quando ele afirma que não há limites para o contexto dialógico:
(...) As vozes sociais estão numa intrincada cadeia de responsividade: os enunciados , ao mesmo tempo que respondem ao já dito (“não há palavra uma palavra que seja primeira ou a última”), provocam continuamente as mais diversas respostas (adesões , recusas , aplausos incondicionais, críticas, ironias, concordâncias e dissonâncias , revalorizações etc.- “não há limites para o contexto dialógico”) O universo da cultura é intrinsecamente responsivo como se fosse um diálogo(2003:57).
O fato de ter sido afirmado que não há limites para o contexto dialógico levanta a
questão do dialogismo, ou seja, o permanente diálogo promovido através da linguagem. O
dialogismo está atrelado à interação através do diálogo que nem sempre é simétrico e
harmonioso, este existe entre diferentes discursos que formam uma comunidade, uma cultura,
uma sociedade. Pode-se dizer que o dialogismo é o elemento que instaura a natureza
interdiscursiva da linguagem. De acordo com os ideais bakhtinianos, a própria vida é
dialógica(BRAIT,1997). Por isso, o sujeito se constitui a partir da assimilação das palavras e
dos discursos do outro. Bakhtin chama este princípio de dialogismo; segundo o qual cada
enunciado ou palavra nasce como resposta a um enunciado anterior: a categoria básica da
concepção de linguagem de Bakhtin constitui-se na realidade dialógica. Para ele, toda
enunciação é um diálogo, mesmo as produções escritas num processo ininterrupto
(FREITAS, 1995:135). Tal visão complementa os argumentos já apresentados para que haja a
45
proposta de atividades em pares ou grupos em sala de aula, pois estas atividades fazem com
que os discentes tenham a oportunidade de dialogar com os seus colegas assim como a
possibilidade de contextualizar o conteúdo aprendido no momento em que expressam suas
idéias, atitudes e opiniões através do uso da linguagem de acordo com o contexto no qual
estão inseridos. Cabe ainda ressaltar que o diálogo face -a- face é apenas um dos muitos
eventos em que se manifestam as relações dialógicas considerando o todo da interação verbal
(FARACO, 2003), o dialogismo é um conceito amplo que não se limita ao momento que o
aluno está dialogando com o outro. Este fenômeno é constante porque sempre estamos
dialogando com idéias e conceitos já vistos, mesmo que calados.
Atividades colaborativas em dupla em sala de aula oportunizam o desenvolvimento da
interdiscursividade entre os aprendizes tendo em vista que o diálogo não é simétrico devido
aos diferentes discursos existentes numa comunidade. Por isso, o dialogismo é visto como um
elemento que desenvolve a natureza interdiscursiva da linguagem (BRAIT, 1997).
A visão bakhtiniana de linguagem trouxe contribuições significativas para as questões
que investigo. Posso concluir, que por meio do diálogo que se realiza através da interação
com outros sujeitos em sala de aula, o meu aluno pode promover a construção de
conhecimento pela confrontação de vários discursos. Além do dialogismo, depreende-se ainda
do pensamento bakhtiniano conceitos relevantes a minha investigação como o de enunciado e
heteroglossia que serão discutidos na próxima seção.
3.1.1 Enunciado e heteroglossia
A definição bakhtiniana de enunciado como real unidade da comunicação
discursiva faz com que a língua não seja vista como um mecanismo previsível, cada
enunciação dependerá da intenção discursiva do falante:
46
O falante termina seu enunciado para passar a palavra ao outro, ou dar lugar à sua compreensão ativamente responsiva. O enunciado não é uma unidade convencional, mas uma unidade real, precisamente delimitada da alternância dos sujeitos do discurso (..) (BAKHTIN, 2003:275) .
Todo enunciado também pressupõe e é limitado pela atitude responsiva por parte de
um dos interlocutores, pois o falante espera uma compreensão ativa de seu discurso. De
acordo com os construtos teóricos de Bakhtin, o objetivo real da comunicação discursiva está
pautado na relação entre o falante e uma ativa posição responsiva do ouvinte:
( ... ) O ouvinte, ao perceber e compreender o significado (lingüístico) do discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente) completa-o, aplica-o, prepara-se para usá-lo etc.(...) ( BAKHTIN, 2003:271).
Sabe-se que o enunciado é caracterizado por seu aspecto expressivo, por isso é muito
relevante que se proponham atividades relacionadas à realidade dos alunos a fim de que estes
possam construir significado e expressar as suas opiniões:
A relação valorativa do falante com o objeto do seu discurso (seja qual for esse objeto) também determina a escolha dos recursos lexicais, gramaticais e composicionais do enunciado. O estilo individual do enunciado é determinado principalmente pelo seu aspecto expressivo (BAKHTIN, 2003:289).
Quando o professor de língua estrangeira propõe atividades em que os alunos
interajam entre si, o mesmo pode colaborar com a construção de sentido em sua sala de aula.
No momento em que os aprendizes têm a oportunidade de trabalhar em pares, há uma
expectativa por parte dos alunos de uma atitude responsiva do colega. Eis porque se espera
que as atividades sócio-interacionais em sala de aula permitam a alternância dos falantes, com
isso os alunos venham se sentir mais estimulados a praticar o idioma em estudo porque estão
fazendo o uso da linguagem de forma mais próxima ao contexto no qual estão inseridos.
Depreende-se a partir de discussões presentes nesta seção que o enunciado é pleno de
totalidades dialógicas. Sendo assim, a partir do momento que os aprendizes têm a
47
oportunidade de expressar a língua em estudo através de atividades em pares ou em grupos, a
experiência discursiva destes alunos pode se desenvolver.
Tendo em vista a interdiscursividade da linguagem discutida ao longo da seção 3.1,
pressupõe-se que ensinar uma língua não significa transmitir o conhecimento contido em
dicionários e gramáticas, mas relacionar o processo de ensino-aprendizagem às enunciações
concretas: aprender a falar significa aprender a construir enunciados não por orações
isoladas e, evidentemente, não por palavras isoladas (BAKHTIN, 2003:283).
Assim pode-se esperar que cada falante vá se expressar de acordo com a sua visão de
mundo e suas particularidades, todavia os enunciados não podem ser vistos isoladamente, já
que são compostos por variadas atitudes responsivas a outros enunciados:
Eis por que a experiência discursiva individual de qualquer pessoa se forma e se desenvolve em uma interação constante e contínua com os enunciados individuais dos outros. Em certo sentido, essa experiência pode ser caracterizada como processo de assimilação (...). Nosso discurso, isto é, todos os nossos enunciados (inclusive as obras criadas) é pleno de palavras dos outros(...). Essas palavras dos outros trazem consigo a sua expressão, o seu tom valorativo que assimilamos, reelaboramos, e reacentuamos (BAKHTIN, 2003:295).
Tendo em vista que os nossos enunciados são plenos de palavras dos outros
(BAKHTIN, 2001), coaduno com o pressuposto bakhtiniano de que cada sujeito é híbrido
devido a uma arena de conflito e confrontação dos vários discursos que o formam, este
fenômeno é denominado pelo filósofo como polifonia ou heteroglossia:
Segundo esses conceitos (polifonia ou heteroglossia), cada língua, como cada indivíduo, é formado por variantes conflitantes - sociais, geográficas, temporais, profissionais , etc. - todas sujeitas à questão do poder, sendo que, em determinado momento de sua história, cada língua configura-se em termos de uma estratificação verticalizada e hierárquica específica dessas variantes que a constituem (BRAIT,1995: 23).
A heteroglossia também é um outro fator de realce na concepção bakhtiniana de
linguagem. Para o pensador, o sujeito é formado através da confrontação de vários discursos e
a linguagem tem um papel múltiplo: a idéia de que a linguagem funciona diferentemente para
48
diferentes grupos, na medida em que diferentes materiais ideológicos, configurados
discursivamente, participam do julgamento de uma dada situação(BRAIT,1997: 99).
Tais questões levam à percepção da relevância dos conceitos baktinianos para o
processo de ensino-aprendizagem de língua estrangeira. A partir das asserções de Bakhtin,
podemos entender a sala de aula como uma área conflitante de valores mutáveis e
concorrentes. Por conta desta heteroglossia, cabe ao professor negociar a melhor forma para
que o conteúdo visto em sala de aula atenda aos diversos interesses presentes, pois este possui
o papel dominante neste contexto.
Faz necessário destacar que o princípio da heteroglossia encontra-se vigente tanto no
discurso dos alunos quanto nos professores, visto que cada sujeito que constitui uma
comunidade é híbrido e formado por discursos conflitantes. Os conflitos advindos da
interação entre alunos, professores, contexto e comunidade, contudo, podem ser minimizados
por mecanismo de negociação:
Tendo em vista que, na própria linguagem, o significado é atribuído ao signo de forma conflitante, dependendo de quem seja o atribuidor e de qual seja o contexto da atribuição, qualquer tentativa de eliminar conflitos substituindo-os com a harmonia, acaba apenas adiando o momento do conflito da mesma forma em que as metodologias tradicionais adiavam o conflito (...) (BRAIT,199:24).
Se os professores adotarem no momento do planejamento de suas aulas os princípios
de bakhtinianos até aqui mencionados, a sala de aula se tornaria um local de diálogo,
participação e conflito, mas também de construção, negociação, reconstrução de significados,
local de ouvir e de ser ouvido pelo outro e não o local de repetição de modelos de
memorização de fórmulas prontas. Talvez o processo de ensino-aprendizagem seria mais
aprazível tanto para os aprendizes quanto para os docentes e todos passariam a respeitar o
tempo e o ritmo de aprendizagem alheios. Será que tais construtos são levados em
consideração em minha sala de aula?
49
No próximo capítulo descreverei a minha prática pedagógica a partir dos pressupostos
teóricos discutidos ao longo do presente estudo. Para depois buscar em meus dados resposta
para esta questão e outras que investigo.
50
4 TEORIA E PRÁTICA NA MINHA SALA DE AULA
“ O meio social é a verdadeira alavanca do processo educacional, e todo o papel do mestre consiste em
direcionar esta alavanca”. (Vygotsky)
51
Os trabalhos que enfoco neste estudo são atividades em dupla propostas nas aulas de
inglês num determinado curso de idiomas descrito a seguir na seção 5.2 do capítulo V. É
pertinente lembrar que os tipos de atividades propostas nas aulas não se restringiram a
trabalhos em dupla, houve também atividades em grupos de três ou mais componentes. Por
uma questão de foco na investigação, optei por pesquisar as contribuições das referidas
atividades em dupla para problematizar a construção de conhecimento dos meus alunos.
As atividades em estudo foram propostas de acordo com o tema das aulas. Foram
gravadas cinco aulas consecutivas do terceiro nível do curso destinado a adolescentes que
contemplaram assuntos como meios de transporte, esportes, passatempos, objetos
colecionados e tipos de filmes preferidos. Tais assuntos foram pré-determinados pelo livro
didático adotado pelo curso de inglês para todos os alunos deste nível.
Os alunos trabalhavam em duplas escolhidas de forma aleatória, ou seja, ora a
professora escolhia as duplas sem considerar nenhum critério ora os próprios alunos decidiam
com quem iriam trabalhar.
Para haver interação é preciso que os indivíduos se relacionem entre si e um dos
instrumentos que facilita esta interação é a cultura. Segundo Bruner (1997), a cultura tem um
papel constitutivo, ou seja, é um fator importante para dar forma às mentes daqueles que
vivem sob sua influência.
As culturas caracteristicamente criam dispositivos protéticos que nos permitem transcender os limites biológicos brutos, por exemplo, os limites da capacidade da memória ou os limites da nossa acurácia auditiva (...) é a cultura, e não a biologia , que molda a mente e vida humanas, que dá significação à ação (...) Ela faz isso impondo os padrões inerentes aos sistemas simbólicos da cultura , sua linguagem e modos de discurso, as formas de explicação lógica e narrativa e os padrões da dependência mútua da vida comum (BRUNER, 1997:40)
Através dos relatos de Bruner (1997) em relação à relevância da cultura, fui buscar a
interferência da mesma no desenvolvimento psicológico dos indivíduos participantes da
pesquisa, já que os indivíduos são expressões de suas próprias culturas.
52
De acordo com as idéias deste autor (1997), a cultura é um instrumento que
proporciona interação entre os indivíduos e esta interação é muito favorável ao
desenvolvimento humano. A criança entra na vida de seu grupo como participante de um
processo no qual os significados são negociados, ou seja, os significados são compartilhados
por procedimentos públicos de interpretação e negociação. Como foi mencionado
anteriormente, portanto, as atividades que proporcionam interação entre os alunos podem
facilitar o processo de ensino-aprendizagem em sala de aula, visto que haverá interpretação e
negociação de significados:
Em virtude da participação na cultura, o significado é tornado público e compartilhado. Nosso meio de vida culturalmente adaptado depende da partilha de significados e conceitos. (...) A criança não entra na vida do seu grupo como num esporte autista, privada de processos primários, mas como participante em um processo mais amplo no qual os significados públicos são negociados (BRUNER, 1997:23) .
No momento em que o aluno troca informações e dialoga com o seu colega a fim de
desempenhar uma tarefa proposta por seu professor, este pratica a língua inglesa, troca
experiências culturais e pode se desenvolver.
Retomando o título desta seção, destaco a relevância da sócio-interação em sala de
aula, pois a interação propiciada por um trabalho em par, com efeito, colabora para o
desenvolvimento do aluno: as interações entre a criança e as pessoas no seu ambiente
desenvolvem a fala interior e o pensamento reflexivo, essas interações propiciam o
desenvolvimento do comportamento voluntário da criança (VYGOTSKY,1998:117).
Como já foi comentado na seção em que tratei do modelo sócio-interacional de uma
forma geral, procurarei esboçar a seguir a relação entre os trabalhos em dupla por mim
propostos nesta pesquisa e a sócio- interação tendo em vista o contexto em que a língua está
sendo praticada visto que a mesma é considerada uma prática social.
53
4.1 A sócio-interação na prática Entende-se, no presente estudo, a linguagem como uma prática social determinada por
estruturas sociais conforme já discutido ao longo do capítulo III. O real discurso é
determinado por ordens discursivas socialmente constituídas associadas às instituições
sociais (FAIRCLOUGH, 2001:17). Assim sendo, é relevante propor em sala de aula
atividades em que os alunos possam praticar a língua em estudo associando-a às práticas de
instituições sociais a eles familiares.
Sabe-se que o diálogo é uma construção dinâmica em que sempre ocorre a
reconstrução de significados. Com este processo, o diálogo expressa, reflete e determina as
relações sócio- culturais pertinentes aos interlocutores (LINNEL, 1990): os participantes de
um diálogo são atores sociais dependentes de percepções e interpretações de ações alheias,
isto é, os atos comunicativos e as contribuições advindas de uma conversa estão sempre
dependentes do contexto(LINNEL 1990:149). Com isso, apesar dos alunos estarem na sala de
aula, a professora procurava contextualizar as atividades fazendo associações a situações que
poderiam ser vividas por eles como, por exemplo, perguntar o tipo o meio de transporte
utilizado para chegar até o curso e o tempo gasto no percurso; o que eles fazem no seu tempo
livre; o que eles gostam de colecionar; qual era o tipo de filme favorito etc. Este fato só é
possível devido à herança social do ser humano que o permite imaginar, pensar e planejar
situações devido as suas funções psicológicas superiores ( cf. seção 2.1).
Segundo Linnel & Luckman (1990:7), a assimetria refere-se aos vários tipos de
diferenças presentes no diálogo. Um diálogo prospera através das explorações das assimetrias
e ao retorno do estado de equilíbrio, pois a assimetria é uma característica intrínseca ao
mesmo. A assimetria está relacionada ao poder, em outras palavras, este termo refere-se a um
processo em que um dos interlocutores assume o controle do diálogo enquanto o outro está
sendo controlado. Assim, tanto o falante quanto o ouvinte são inter-dependentes no diálogo ,
54
pois a elocução do falante dependerá do contexto social e do seu ouvinte assim como o
ouvinte precisa de um falante.
Dessa forma, Linnel & Luckmann (1990:8) afirmam que mesmo quando um diálogo
apresenta direitos iguais para os interlocutores tomarem os turnos de fala, manter os tópicos e
distribuir a participação do discurso simetricamente, contudo haverá vários tipos de
assimetrias envolvidas no diálogo. Por isso, as assimetrias são multifacetadas e heterogêneas
podendo o interlocutor apresentar quatro formas de dominação do discurso (LINNEL, 1990):
Domínio quantitativo →
Medido pelo número de palavras ditas pelos interlocutores.
Domínio Interacional →
Relaciona-se à distribuição de iniciativas e respostas presentes no diálogo.
Domínio semântico →
O interlocutor é caracterizado como dominante se determinar os tópicos do diálogo e sustentá-los em seu discurso
Domínio estratégico →
Ocorre quando o interlocutor contribui com intervenções mais importantes estrategicamente.
Quadro 2- Domínios de discurso segundo Linnel & Luckman(1990)
Os diálogos são produzidos por indivíduos em sócio-interação, por isso a assimetria é
gerada através de um relacionamento social. É importante ressaltar que qualquer tipo de
simetria ou assimetria encontrada, não é meramente expressão de intenções individuais. Os
referidos termos são estruturas sociais e tradições faladas por atores: as assimetrias em
discurso são contextualizadas; dependentes e co-constitutivas de condições endógenas e
exógenas (LINNEL &LUCKMAN, 1990:10).
Percebe-se que a assimetria é uma característica inerente ao diálogo que deriva entre
momentos de assimetria e tentativas de retorno a momentos de equilíbrio. Subjaz a este
conceito a importância de se propor atividades orais em dupla nas aulas de inglês, pois estes
tipos de atividades propiciam ao aluno várias possibilidades de assumir o controle da
interação. No momento em que o aluno somente tem a oportunidade de ter o professor como
seu único interlocutor, surge o discurso institucionalizado caracterizado por um rígido
55
controle das estruturas de participação por parte do professor que cria obstáculos à
comunicação em vez de implementá-la, tal fator gera interlocutores tensos e pouco
espontâneos (FABRÍCIO, 1996). No momento em que incentivo os meus alunos a
participarem de trabalhos em pares nas aulas de inglês, há uma redução da assimetria devido à
baixa tensão típica da relação aluno-aluno. Com isso, os estudantes têm mais oportunidades
de praticar a língua do que em contextos institucionais em que predomina a fala do professor.
Estas são as questões que me levam a investigar minha prática.
Voltando, pois, à questão da minha sala de aula, na medida em que as atividades em
dupla são organizadas, espera-se que venha a ocorrer a assimetria típica de um diálogo, os
interlocutores compartilham de igual posição social (pois ambos são alunos), mas os direitos
de participação mudam de acordo com o contexto da atividade proposta. O controle do
diálogo sai das mãos de professor e vai para os alunos que organizam o sistema de trocas de
turnos e selecionam quem vai falar e quando. Dessa forma, a sala de aula deixa de ser um
local onde ocorrem fatos previsíveis controlados por um professor, pois abre-se espaço para
que os alunos interajam entre si de maneira que adquiram as estruturas necessárias para
transpor as paredes da sala de aula para agirem como numa conversa do dia-a-dia quando
necessário. Na próxima seção descreverei o material didático utilizado e a forma pela qual
planejava as aulas.
4.1.1 Discutindo a minha prática
Cada aula ministrada em inglês tinha uma hora de duração e era dada duas vezes por
semana (terças e quintas). O material era composto pelo livro do aluno utilizado em sala de
aula, um livro de atividades para serem feitas em casa e o CD de áudio para o uso do
professor. As lições tinham seções como: presentation, vocabulary, practice, listen and
repeat, speaking practice e writing practice (vide anexo A.2). Havia um calendário a cumprir,
56
por isso tinha de ministrar uma lição por dia não tendo flexibilidade para propor outras
atividades que não fossem as do livro. Não me eram oferecidas muitas oportunidades para
propor várias atividades de caráter colaborativo, por isso aproveitei os momentos em que o
próprio livro as propunha para enfocar a minha pesquisa e hoje porque entendo que, mesmo
limitados, tais momentos podem contribuir consideravelmente para a co-construção e
mediação do conhecimento em sala de aula.
A seção presentation destinava-se à apresentação do vocabulário novo da lição.
Fazendo um paralelo entre os modelos de pedagogia popular citados por Bruner (1996) (cf.
capítulo I) e minha ação pedagógica, nesta ocasião como professora lançava mão da instrução,
pois expunha o conteúdo novo apresentando ao aluno os fatos, regras, princípios e teorias
relacionados ao vocabulário introduzido(cf.A.2).
Na seção vocabulary practice, os alunos deveriam praticar o vocabulário apresentado
através de um exercício em que tinham de correlacionar as palavras com as figuras para em
seguida checar as respostas com os colegas por meio de uma atividade em par. Refletindo
sobre a ação pedagógica, nesta fase se espera que os alunos lancem mão do meio de mediação
citado por Gallimore & Tharp(1996) chamado de estruturação cognitiva(cf. seção 2.1.2), pois
espera-se que os alunos ao associarem figuras conhecidas como meios de transporte, objetos
colecionáveis e cenas de filmes com o vocabulário novo em inglês construam, assim, novas
estruturas de conhecimento(cf.A.2).
Na seção listening practice, era proposto que os alunos trabalhassem sozinhos a fim de
identificar o conteúdo que ouviram. Estabelecendo, novamente, uma relação entre este tipo de
atividade e os modelos de Bruner(1996, cf.capítulo I), creio que subjaz a esta atividade o
modelo de pedagogia denominado “descoberta”. Pressupõe-se que através destas atividades, o
discente é capaz de descobrir e pensar através de sua experiência individual(cf.A.2).
57
A seção listen and repeat, fundamenta-se, contudo, no modelo de pedagogia de
imitação (BRUNER, 1996), pois os alunos repetiam o conteúdo ouvido no CD imitando as
ações como um ensaio repetido. Algumas lições tinham uma seção denominada writing
practice em que os alunos escreviam frases conforme o conteúdo das lições para em seguida
compará-las com as de um colega. Neste momento, há um misto de descoberta (BRUNER,
1996) com colaboração (BRUNER, 1996), já que os alunos são capazes de descobrir novos
sentidos no momento da formulação das frases e de dialogar um com outro no momento da
comparação das respostas com seus colegas (cf. A.2).
Na seção speaking practice, os alunos deveriam interagir em par através de um
processo de colaboração (BRUNER, 1996). Apesar dos exercícios serem similares a drills
(exercícios de repetição), os alunos ficam mais livres para fazer escolhas respondendo as
perguntas conforme as suas preferências e o seu conhecimento. A minha investigação enfoca
este momento da lição, já que a minha principal inquietação era saber se este tipo de interação
era relevante para a construção de conhecimento dos meus alunos visto que eram adolescentes
iniciantes e tinham muitas restrições em relação ao vocabulário, mas mesmo assim, conforme
confirmam meus dados (cf. capítulo VI), há colaboração, reflexão e participação dos alunos
nos diálogos (cf. A.2).
Os meus planos de aula eram manuscritos (cf. A.2) e continham anotações sobre como
ministrar as lições seguindo a ordem das atividades do livro. Toda aula era iniciada por um
aquecimento (warm up) que consistia numa atividade comunicativa como a realização de
jogos tais como forca em grupo, jogo da velha com palavras, telefone sem fio etc.
As perspectivas bakhtinianas e vigotskianas nas quais acredito (cf. capítulos I, II e III),
em minha sala de aula eram restritas. O conceito de colaboração somente se manteve presente
no momento das atividades em dupla denominado pelo livro como speaking practice (razão
pela qual baseei a presente pesquisa em tal momento). Entretanto, segundo Bruner (1996), nos
58
outros momentos da lição também houve construção de conhecimento conforme discutido
anteriormente.
A discussão, até aqui apresentada nos capítulos I, II, III e IV, e a inquietação sobre
minha prática me levaram a investigar e utilizar métodos de planejamento de pesquisa e
análise que discuto no capítulo a seguir.
59
5 PLANEJAMENTO DA PESQUISA
“Dentro da tendência de pesquisa etnográfica na sala de aula de línguas, tem preponderado uma preocupação com a natureza da interação na sala de aula como espaço de aprendizagem”. (Moita Lopes)
60
Devido ao interesse em pesquisar e analisar as contribuições do trabalho em dupla
para a construção de conhecimento na minha aula de inglês, optei seguir o caminho
metodológico da pesquisa interpretativista de cunho etnográfico, visto que me volto para o
estudo dos processos sócio-interacionais como geradores da construção de conhecimento; isto
é, o principal objetivo da pesquisa é investigar as contribuições dos trabalhos em dupla para a
construção de um conhecimento que não se restrinja apenas ao ensino-aprendizagem de
língua inglesa, mas que esteja associado ao desenvolvimento dos alunos como seres sócio-
historicamente construídos. Os estudos de cunho etnográfico na sala de aula, devido às suas
próprias naturezas, parecem ser essenciais para a compreensão da interação (MOITA LOPES,
1996).
A questão, que gerou o anseio por iniciar a pesquisa, surgiu a partir do momento em
que percebi a relevância das atividades em dupla através de estudos teóricos. Quando
atividades em dupla são planejadas, as minhas aulas de inglês tornam-se mais interativas e
percebo que os alunos podem se desenvolver, os estudantes passam a respeitar atitudes,
opiniões, conhecimentos e ritmos diferenciados de aprendizagem.
Logo que comecei a trabalhar na instituição na qual este estudo foi desenvolvido,
deparei-me com o fato de ter de promover atividades em que os alunos teriam de interagir em
pares (os chamados “pair work”). No início da minha carreira, por não ter embasamento
teórico, tinha dúvidas sobre a eficácia de tais atividades no desenvolvimento do processo de
ensino-aprendizagem dos alunos. Com o passar do tempo, estudei mais sobre o sócio-
interacionismo e com a minha formação na faculdade de educação entendi a relevância de tais
atividades. A partir deste momento, resolvi aprofundar os meus conhecimentos acadêmicos a
fim de constatar as contribuições dessas atividades para o desenvolvimento dos alunos na
prática.
61
Tal problema mencionado anteriormente deu origem à seguinte macro-pergunta de
pesquisa:
Como o trabalho em dupla pode contribuir para o processo de construção de
conhecimento dos meus alunos?
Tendo como foco de investigação tanto o papel de professora - pesquisadora quanto a
forma em que os alunos se vêem quando executam as tarefas propostas, subdividi esta macro-
pergunta em duas sub-perguntas:
Como os alunos entendem e participam do trabalho em dupla?
Enquanto professora-pesquisadora, como participo no processo de construção de
conhecimento com ênfase no trabalho em dupla na aula de língua inglesa?
Abordarei na próxima seção o caminho que optei nesta investigação para a
sistematização das informações obtidas.
5.1 Pesquisa interpretativista de cunho etnográfico
O fator mais importante que diferencia o conhecimento científico do senso comum é a
sistematização das informações obtidas na pesquisa. Sabe-se que a necessidade de descrever
os fenômenos que ocorrem na nossa sociedade não parte apenas da ciência. O senso comum,
que é um conhecimento superficial transmitindo pelas gerações, faz com que a necessidade de
estudar certos fenômenos seja despertada nos cientistas. Muitas vezes, ocorre o caminho
contrário, o senso comum incorpora as informações obtidas pela ciência e as usa de forma
incompleta ou errada (HRYNIEWIEWICZ, 1996). Neste meu trabalho, contudo, tenho como
objetivo principal produzir conhecimento e descrever os fenômenos de uma forma
62
sistematizada e empírica. Por isso, denomino meu trabalho como científico, além de ser
interpretativista de cunho etnográfico.
Por ser uma pesquisa interpretativista, trato os dados segundo uma abordagem
qualitativa, ou seja, esta não se preocupa em quantificar, mas em descrever o processo em que
as informações são obtidas. O principal objetivo deste tipo de pesquisa é descrever os
fenômenos, compreendê-los ou interpretá-los (HOLMES, 1992). Na posição interpretativista,
a visão dos participantes também é considerada, levando em conta que esta é determinada
pelo mundo social que os cerca como já foi discutido na seção 2.1 deste estudo. O fato é
acessado através de vários significados, pois é o fator qualitativo que interessa. O foco se situa
nos processos que ocorrem no mundo social (MOITA LOPES, 1994).
Segundo Erickson (1984:52), etnografia significa literalmente “escrever sobre as
nações”. Considero a minha pesquisa como de cunho etnográfico, já que é um estudo que leva
em conta o mundo em que os participantes estão inseridos. Com isso, como pesquisadora,
não me limitei em apenas observar e descrever dos fatos, mas procurei entender e questionar
os significados construídos pelos participantes da pesquisa a fim de interpretá-los. Além
disso, os participantes e o observador participante têm a oportunidade de expressar sua visão
em relação aos fatos e relacioná-los ao contexto sócio-histórico.
Optei por delinear o perfil da pesquisa como de cunho etnográfico e não como um
estudo de caso; pois segundo Mc Donough & Mc Donough(1997:203), um estudo de caso não
é em si um método de pesquisa nem o seu equivalente: implica métodos e técnicas na
investigação de um objeto de interesse.
Embora pesquisando minha sala de aula, não situo meu trabalho como pesquisa-ação,
uma vez que o mesmo não é um trabalho em espiral (NUNAN, 1992), pois meu objetivo era
compreender o que ocorria em um momento específico da minha prática. Apesar de ter
surgido a partir de um questionamento em sala de aula; e como professora, eu mesma gerei os
63
dados, todavia não pude intervir no contexto em que atuava. Por uma questão da metodologia
utilizada pelo curso que não possibilitava intervenção ou mudança e também por ter me
desligado da instituição por questões pessoais assim que terminei a pesquisa ( fevereiro de
2007), o meu trabalho não teve o formato de espiral que caracteriza a pesquisa-ação citado
por Nunan (1992) e Nunes (2000). Portanto, prefiro dizer que a minha investigação é de
cunho etnográfico pelos instrumentos que utilizei, por meu interesse em seguir um caminho
que me permitisse melhor compreensão sobre uma situação que me causava inquietação em
um contexto social definido.
Enfatizo que o valor da pesquisa de cunho etnográfico encontra-se tanto na visão
êmica quanto na visão holística. A visão holística considera todos os componentes do
contexto cultural em que a pesquisa está sendo desenvolvida, ou seja, todos os fatores e
eventos são considerados, já que estes revelam a interdependência de todos os componentes
culturais. Por outro lado, a visão êmica se refere à tentativa do pesquisador de descrever como
os membros entendem e participam das suas culturas. O valor desta visão está no potencial
para o novo, inesperado e imprevisível que pode ocorrer num contexto social específico
(HORNBERGER, 1994).
A curiosidade de saber como os meus alunos constroem seu conhecimento, e como
eles se vêem e me vêem no momento desta construção, fez com que surgisse o anseio pela
pesquisa na minha própria sala de aula conforme faz notar MC DONOUGH & MC
DONOUGH(1997:43):
Sugere-se, por isso, que as atividades de ensino e aprendizagem na sala de aula de língua contenha um tipo de desafio para nosso entendimento e para as nossas tentativas de apresentar mudanças e inovações que possam ser determinados pela pesquisa sobre aquelas atividades usando métodos que são apropriados para os objetivos e o problema de pesquisa em estudo.
Para dar conta da visão holística (visão macro que se volta para o contexto como um
todo) e êmica (visão que se volta para a análise das interações na minha sala de aula),
64
descreverei a seguir primeiramente o contexto macro de pesquisa em que o estudo foi
desenvolvido( o curso de idiomas como um todo) mostrando o contexto de limitação em que
atuava uma vez que recebia um pacote pronto para ministrar as minhas aulas e não tinha muita
flexibilidade para modificar o material didático. Em seguida, descreverei os participantes, antes
de analisar suas interações, e também enfocarei os instrumentos de geração de dados.
5.2 Contexto de pesquisa
Tendo em vista que o presente relato é uma investigação interpretativista de cunho
etnográfico, sabemos da importância da descrição do contexto de pesquisa tanto na visão
micro quanto macro. Por isso, nas seções subseqüentes descreverei o contexto de pesquisa
assim como os seus sujeitos colaboradores.
5.2.1 Local de pesquisa
O local em que pretendo desenvolver a pesquisa é um curso livre de idiomas que se situa
na zona oeste do Rio de Janeiro e que tem como metodologia a Abordagem Comunicativa.
Este curso é considerado um dos maiores do bairro, visto que a população predominante deste
local provém de classe média baixa ou até mesmo de classe baixa. O curso possui em média
mil alunos e o espaço físico é bem confortável, pois todas as salas possuem ar condicionado e
aparelho de som. Recentemente, foi inaugurado um Cyber Café que fica lotado de alunos
navegando na Internet. Também há uma sala de vídeo espaçosa que pode ser utilizada pelos
professores a fim de diversificar as aulas.
O prédio possui três andares com doze salas de aula sendo que uma sala é específica para
o trabalho com crianças, logo possui mobília, decoração e brinquedos apropriados para alunos
de faixa etária mais baixa.
65
O local é muito aprazível, visto que a concorrência entre os cursos livres de idiomas nesta
área é muito acirrada. Com isso, a direção e os funcionários fazem o possível para que os
alunos se sintam motivados a aprender inglês aprimorando a infra-estrutura da escola. Por
uma questão ética, o seu nome não será mencionado bem como o nome dos alunos envolvidos
na pesquisa.
Passo a seguir a descrição do contexto micro desta pesquisa a fim de dar conta da visão
êmica presente neste estudo como mencionado na seção 5.1.
5.2.2 Sujeitos colaboradores da pesquisa
Esta investigação tem como sujeitos colaboradores a professora-pesquisadora e os
alunos (adolescentes entre dez e treze anos de idade que cursavam o terceiro nível do curso
destinado especialmente para adolescentes).
Atuei como professora neste local de agosto de 2001 a fevereiro de 2007, pois quando
comecei a trabalhar ainda estava cursando a Faculdade de Letras da UFRJ e foi neste curso
que me desenvolvi como profissional. Devido à observação do desenvolvimento do meu
trabalho, surgiu o interesse em pesquisar e refletir sobre a minha atuação como professora.
Desde quando comecei a trabalhar nesta instituição, tinha de propor atividades em dupla em
todas as aulas independentemente do nível de desenvolvimento dos alunos. Inquietava-me
saber se alunos sem fluência em língua inglesa poderiam construir conhecimento entre si sem
o auxílio da professora.
Como professora, tinha uma relação amistosa com os alunos. Procurava tornar o ambiente
da sala de aula o mais agradável a fim de motivá-los a aprender inglês. Sou uma professora
jovem (27 anos) que gosta muito do magistério. Na pesquisa, observei o comportamento dos
meus alunos e a minha atuação a fim de entender e interpretar as contribuições inerentes aos
trabalhos em dupla por mim propostos para a construção de conhecimento dos meus alunos.
66
A partir de um questionário de sondagem, obtive informações gerais sobre os meus alunos
(cf. seção A.1). Pode-se dizer que os estudantes observados compreendem um grupo de
adolescentes que varia entre dez e treze anos de idade. Compunha-se esta turma por onze
alunos que moram no mesmo bairro da escola de idiomas ou nas proximidades. Por
conseguinte, alguns estudavam nas escolas particulares da redondeza ou até mesmo em
escolas públicas. As aulas eram dadas às terças e quintas de duas e meia da tarde até às três e
meia.
Com base em uma conversa informal no início do semestre, alguns alunos relataram que
estudavam inglês devido aos responsáveis que os incentivam e outros confessaram que vão
para o curso forçados, pois não gostam de inglês. Muitos estudantes alegaram que estudavam
inglês porque no futuro precisariam da língua para obter êxito na carreira profissional.
5.3 Geração de dados
No presente estudo, lancei mão de distintos instrumentos de geração de dados a fim de
obter triangulação. Entendo que em um estudo etnográfico, a triangulação de dados somente
se dá através do uso de múltiplas fontes. Dessa forma, as conclusões obtidas em uma pesquisa
qualitativa são justificadas através da comparação constante de dados gerados por
instrumentos distintos (HUBBARD & POWER, 1993).
5.3.1 Observação participante
Como professora/investigadora, pude observar e participar dos momentos em que
meus alunos tinham de interagir em pares, já que dava as instruções para as atividades e
observava como os alunos as executavam. Muitas vezes, eu mesma tive de escolher os pares
para trabalhar juntos, outras vezes deixava os próprios alunos escolherem os pares de sua
preferência.
67
Estava presente e busquei observar as reações dos alunos no momento em que havia
sócio-interação, ou seja, levantava asserções sobre como eles construíam conhecimento
juntos a fim de executar as tarefas propostas, tais asserções foram registradas e compõe as
notas de campo que trato na próxima seção. Todas as minhas primeiras impressões e
observações de como as atividades em dupla contribuem para a construção do conhecimento
foram extremamente importantes para a condução da pesquisa.
5.3.2 Notas de campo
Conforme Spradley (1979:64), a maior parte de qualquer estudo etnográfico consiste
em notas de campo. No momento em que você começa escrever o que vê e ouve, você
automaticamente codifica os acontecimentos em linguagem. Em algumas notas de campo,
que foram escritas durante os momentos em que os alunos trabalhavam em pares, há trechos
em que procurei reproduzir a linguagem dos alunos- verbatim- a fim de interpretar
posteriormente os possíveis sentimentos daqueles estudantes quando executavam
determinadas tarefas, mas também há trechos em que utilizo a minha linguagem ou a minha
visão dos fatos. Durante a redação das notas de campo, utilizei três princípios mencionados
por Spradley (1979:65) para a obtenção do registro etnográfico:
• O da identificação da linguagem (identifico cada falante através de métodos da transcrição como aspas, colchetes e parênteses ).
• O do verbabim ( registro exatamente o que dito pelo informante). • O concreto (descrevo os acontecimentos através de uma linguagem
concreta).
Os incidentes mais triviais também foram descritos em notas de campo, pois revelam
características que se repetem regularmente e que são de extrema importância para o trabalho
desenvolvido. Entretanto, há informações mais específicas que só podem ser obtidas através
de um questionário. Sendo assim, a seção seguinte tratará do papel deste instrumento na
presente pesquisa.
68
5.3.3 Questionário de sondagem
A fim de obter informações mais específicas sobre o grupo de alunos em que a
pesquisa se realizou, utilizei um questionário de sondagem. Através deste questionário, os
alunos puderam revelar informações referentes à suas idades, a instituição de ensino em que
estudam e o bairro onde moram (vide anexo A.1).
Com o objetivo de obter informações mais amplas sobre a visão dos alunos em relação
às atividades em dupla por mim propostas, discuto a seguir a importância das entrevistas
como instrumento de geração neste estudo.
5.3.4 Entrevistas
De acordo com Spradley (1979:78) uma entrevista etnográfica envolve dois processos
distintos, mas complementares: desenvolvimento de rapport (bom relacionamento entre
professor e aluno) e obtenção de informação. Sendo assim, procurei realizar as entrevistas
com alunos que tinham, a meu ver, alguma identificação comigo. Por isso, as entrevistas só
começaram a ser feitas cerca de um mês após o início das aulas. O rapport que tinha com estes
alunos fez com que eles se sentissem mais cômodos para responder as perguntas sem nenhum
tipo de receio.
As perguntas descritivas incentivaram os informantes a falarem de como se viam no
momento em que executavam atividades sócio-interacionais e como estas contribuíam para o
processo de aprendizagem de língua inglesa e a construção de seu conhecimento em geral de
acordo com a percepção dos próprios alunos envolvidos no processo.
O principal objetivo da realização das entrevistas era a obtenção de respostas para as
perguntas de pesquisa do presente estudo. Então, perguntas descritivas foram feitas de forma
69
que os informantes se mantinham falando e eu, professora/ investigadora, mostrava-me
interessada enquanto ouvia e registrava os relatos. O que me interessava era descobrir a
cultura do informante na linguagem do informante (SPRADLEY, 1979:83).
A maioria das entrevistas foram individuais e gravadas em áudio logo após o término
das aulas. Apenas alguns alunos foram entrevistados, já outros se recusaram ser entrevistados
por motivos pessoais.
Este instrumento ajudou-me a triangular as notas de campo para atender o princípio
concreto (cf. seção 5.3.2) de descrição dos acontecimentos numa linguagem concreta.
5.3.5 Gravação
A gravação em áudio foi o instrumento de geração de dados que possibilitou o registro
das aulas em que os alunos executavam atividades em pares, respondendo ao princípio do
verbatim citado na seção 5.3.2, com isso detalhes do comportamento interativo dos alunos no
momento das tarefas foram registrados e alguns trechos mais relevantes transcritos para
posterior análise. Cabe dizer que todas as gravações foram feitas mediante o consentimento
dos alunos e dos responsáveis pelos mesmos. No início do semestre, conversei com a diretora
pedagógica da instituição para dar início às gravações; logo que a mesma me autorizou, redigi
uma circular em que pedia a autorização dos responsáveis para que seus filhos participassem
da investigação e assim que obtive a permissão de todos a comecei. Para que os alunos se
sentissem mais confortáveis, somente comecei a gravar as aulas após um mês do início das
aulas.
Foram gravados cinco encontros consecutivos na íntegra e usado apenas um gravador
colocado em pontos estratégicos (perto da dupla que fazia a atividade). A cada atividade
distinta em que os alunos tinham de trabalhar em pares, eu posicionava o gravador perto de
uma dupla diferente para que houvesse maior variedade de dados.
70
5.4 Critérios para a análise de dados
Como já mencionado nas seções anteriores, nesta investigação lanço mão de
instrumentos diversos de geração de dados como observação participante, notas de campo,
questionário de sondagem, entrevistas e gravação. A fim de analisar os dados gerados a partir
de tais instrumentos utilizei critérios advindos da interpretação de análises semânticas
(SPRADLEY, 1980), métodos de comparação constante e de busca dos casos discrepantes
(ERICKSON, 1986), tipos recorrentes de interação verbal em sala de aula propostos por Van
Lier (1994), meios de mediação (GALLIMORE & THARP, 1996), os padrões de assimetria
propostos por Linell (1990) e ainda os construtos teóricos discutidos nos capítulos I, II, III e
IV.
A análise de dados é o processo pelo qual o investigador tem a oportunidade de rever
todos os dados gerados e categorizá-los de acordo com as perguntas de pesquisa e suas sub-
perguntas a fim de tentar respondê-las. Sendo assim, primeiramente, selecionei alguns dados
para responder as sub-perguntas. As informações obtidas durante as entrevistas com os
alunos, com as notas de campo e os pressupostos vigotskianos e bakhtinianos discutidos nos
capítulos I e II fizeram com que a sub- pergunta”Como os alunos entendem e participam do
trabalho em dupla ?” pudesse ser respondida.
Através da análise do diário reflexivo, das aulas gravadas e dos trabalhos dos alunos pude
alcançar uma posição reflexiva sobre a minha própria postura como professora e responder a
seguinte sub- pergunta : Enquanto professora-pesquisadora, como participo no processo
de construção de conhecimento com ênfase no trabalho em dupla na aula de língua
inglesa?
71
Por último, analisei as possíveis respostas obtidas para as sub-perguntas e triangulei os
dados a fim de responder a macro-pergunta de pesquisa: “Como o trabalho em dupla pode
contribuir para o processo de construção de conhecimento dos meus alunos ?”
É importante ressaltar que o uso de múltiplas fontes de dados é necessário para que
haja triangulação dos dados e assim justificar nossas interpretações (HUBBARD & POWER,
1993). Numa pesquisa de cunho etnográfico, quando os dados são categorizados e analisados
se deve levar em conta o óbvio, o comum, ou seja, todos os aspectos que são invisíveis para
aquele investigador que vive em determinada cultura. Quando todos os aspectos da instituição
são considerados, na análise final aquilo que parecia ser irrelevante se torna um dado
significativo (ERICKSON, 1984).
As considerações feitas no presente trabalho através do planejamento de pesquisa
descrito ao longo deste capítulo são apresentadas como possíveis e não certas. Por isso, este
estudo alcança credibilidade sem mistificação e com isso a investigação pode ser útil por
proporcionar novos pontos estratégicos para reflexão (ERICKSON, 1984).
72
6 RESPOSTAS ÀS QUESTÕES INVESTIGADAS
“É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”. (Paulo Freire)
73
Entendo a seleção dos dados para o momento da análise como uma das fases mais
críticas de uma investigação, já que tudo pode parecer relevante para a realização desta, o ato
de desconsiderar qualquer observação ocasionou certo desconforto por pensar que poderia
estar desprezando uma informação importante. Busquei, assim, transcrever neste relato os
momentos mais significativos que pudessem trazer à luz exemplos de objetos de reflexão,
interpretação e respostas às minhas perguntas de pesquisa pautando-me na visão sócio-
interacional de construção de conhecimento a partir das asserções de Vygotsky (1998/2001),
Bakhtin (1997/2001) e Bruner (1996/1997/2004) bem como outros teóricos mencionados nos
capítulos anteriores.
Nas seções subseqüentes, farei menção da relação entre as perguntas de pesquisa, os
dados gerados e o aporte teórico apontado nos capítulos I, II, III e IV.
6.1 As relações entre os alunos e o trabalho em dupla
A primeira sub-pergunta de pesquisa – como os alunos entendem e participam do
trabalho em dupla?- tem como objetivo me levar a observar e analisar as formas pelas quais
os aprendizes percebem e se posicionam em relação aos trabalhos em dupla freqüentemente
propostos nas aulas de inglês do curso que freqüentam (vide anexo A.2). Dessa forma,
lançarei mão da análise das relações semânticas (SPRADLEY, 1979) identificadas nos dados
gerados pela entrevista e minhas notas de campo a fim de me posicionar para poder responder
esta pergunta.
Para fins de discussão, divido o que mostra a análise de meus dados em duas
subseções. Na primeira enfoco as formas pelas quais os alunos dizem compreender os
trabalhos em dupla e na seguinte triangulo estas respostas com dados analisados de interações
em pares na tentativa de compreender como os aprendizes dialogam entre si e como fazem
74
uso de instrumentos de mediação citados por Gallimore & Tharp (1996) bem como enfoco a
questão da assimetria e dominância que me auxiliam a identificar e interpretar a atuação do
par mais competente ou dominante na interação (cf. capítulo 4).
Descreverei como eu e meus discentes participávamos dessas atividades a fim de
proporcionar uma melhor compreensão da análise feita. Primeiramente, eu apresentava o tema
de cada aula tendo como subsídio o livro didático (cf. seção A.2), em seguida praticava o
tópico ensinado com os alunos para finalmente dividi-los em pares muitas vezes de forma
aleatória para que pudessem interagir entre si (cf.seção A.2).
6.1.1 Como os meus alunos entendem e participam do trabalho em dupla?
A seqüência a seguir advém de uma lição em que os alunos aprenderam a fazer uso dos
advérbios de freqüência a fim de expressar a assiduidade em que realizam algumas ações
cotidianas(cf. A.2). O exercício transcrito abaixo consistia em um aluno perguntar para o
outro a freqüência em que realizava uma determinada ação fazendo uso das expressões how
often do you...? ou And you?:
Seqüência 1: Vai pergunta…and you?
1Igor: How often do you play computer games?
2Marta: I almost never play computer games.
3Igor: How often do you listen to music?
4Marta: I almost never listen to music.
5Igor: How often do you watch TV?
6Marta: Often. And you?
7Igor: What? Often?
8Marta: And You?
9Igor: I always watch TV.
10Marta: How often do you play computer games?
11Igor: I sometimes play video games. And you?
75
12Marta: Não entendi.
13Igor: Almost never?
14Marta: How often do you surf the Internet?
15Igor: I usually surf the Internet. And you? Não, esse aqui ( aponta para o livro)
16Marta: Sometimes.
17Igor: How often do you meet friends?
18Marta: Always ( a aluna erra a pronúncia).
19Igor: What? Always? ( com a intenção de corrigi-la). Vai pergunta : And you?
20Marta: And you?
21Igor: I almost never. How often do you go to a movie?
22Marta: Always.
23Igor: Vai, pergunta: And you?
24Marta: And you?
25Igor: I almost never go to a movie.
26Igor: Teacher, we finished.
Ao observar o diálogo acima, Igor diz What? Always? ( com a intenção de corrigi-la).
Vai pergunta: And you?/Marta: And you?( linhas 19 e 20), percebemos claramente a presença
de um par mais competente (Igor) que orienta a sua colega por meio da língua portuguesa, nos
momentos em que esta tem dificuldades, colaborando com o processo de ensino-
aprendizagem da colega. Marta não se mostra capaz de dar continuidade ao diálogo, mas
consegue ter uma atitude responsiva ao ouvir “Vai pergunta: And you?”(linha 19).
No trecho do diálogo que compreende as linhas 19 e 20 recém analisadas, há uma
participação na ZDP. Retomando o que já foi discutido na seção 2.1.1 deste trabalho, as ações
realizadas independentemente pertencem ao nível de desenvolvimento real, pois passaram do
nível inter para intrapessoal. Contudo, como se evidencia nas linhas 17 a 22 da seqüência
acima em que a aluna Marta erra a pronuncia da palavra always inicialmente e Igor a corrige e
numa seguinte elocução na linha 22 a aluna não comete o mesmo erro, aqui o conhecimento
foi construído pela interação com Igor ( par mais competente).
76
Os dados das linhas 17 a 22 também me remetem à asserção vigotskiana de que o
indivíduo quando interage com outros sujeitos ativa vários processos que sem a ajuda externa
seriam impossíveis de ocorrer. Tais processos são internalizados e passam a fazer parte do
desenvolvimento individual do sujeito, assim sendo, o par mais competente tende a atuar na
ZDP do outro de modo que o aluno passa a fazer sozinho aquilo que só fazia com a ajuda de
outro indivíduo.
Na medida em que os aprendizes interagem com pares mais competentes, estes têm a
oportunidade de se desenvolver porque podem aprender novos significados, comportamentos
e tecnologias conforme fiz registros nas notas de campo provenientes dos dias 30/08/2005 e
20/09/2005 que assinalam a ajuda do par mais competente quando aponta no livro onde o seu
parceiro deveria olhar; um aluno avisa para o outro o momento de falar e de parar quando o
colega está acelerado.
Em contrapartida, aquelas ações em que o indivíduo ainda necessita de ajuda
permanecem na ZDP como se evidencia no extrato a seguir em que a aluna ainda não
percebeu que durante a atividade deveria perguntar ao seu colega: And You? Com isso, Igor
buscava orientá-la seguindo o modelo apresentado pelo professor (ver discussão na seção
2.1):
19Igor: What? Always? ( com a intenção de corrigi-la). Vai pergunta : And you?
20Marta: And you?
21Igor: I almost never . How often do you go to a movie?
22Marta: Always.
23Igor: Vai, pergunta: And you?
24Marta: And you?
25Igor: I almost never go to a movie.
26Igor: Teacher, we finished.
A partir de extrato acima, podemos inferir que as atividades sócio- interacionais
ajudam a amadurecer os processos que ainda estão em formação na ZDP( cf. 2.1.1). Tal
77
processo está intimamente ligado ao desenvolvimento do aluno; pois segundo Vygotsky,
aprendizagem e desenvolvimento são fenômenos interdependentes (cf.capítulo II).
As asserções das linhas 14 a 16 da seqüência 1(Marta: How often do you surf the
Internet? /Igor: I usually surf the Internet. And you? Não, esse aqui( aponta para o
livro)/Marta: Sometimes.) mostram que neste tipo de atividade, além dos alunos se
relacionarem e descobrirem entre si formas colaborativas para sanar suas dúvidas com a ajuda
do par mais competente; os mesmos tendem a negociar significados através do uso da língua
materna contrariando as orientações da professora que os incentiva a falar somente em inglês
quando estão em sala de aula( confere ainda as linhas 10,11 e 12 do diálogo).
Nas notas de campo de 18/10/2005, também fiz registro da interferência da língua
materna, pois os alunos negociavam significados em português orientando o colega ao
apontar o certo quando o mesmo se confundia.
Um dos sujeitos participantes da pesquisa declarou, por meio de entrevista, a
preferência por trabalhar com um colega a trabalhar com a professora devido à liberdade para
usar o português como um dos aspectos da compreensão. Este fato identificado no diálogo me
permite interpretar que o os alunos entendem o uso do português como um aspecto positivo
dos trabalhos em dupla. A seqüência a seguir é parte de uma entrevista informal realizada
com uma aluna logo após a aula na qual como pesquisadora desejava registrar a visão dos
alunos em relação ao trabalho em par.
Seqüência 2: E se fosse só eu e vocês?
1Professora: Você acha que essas atividades ajudam a aprender inglês?
2Marta: Ajudam. Acho até melhor trabalhar com uma pessoa que saiba mais que você
por que 3ela te explica.
4Professora: E se fosse só eu e vocês no caso? Eu interagindo com vocês. Como é que
seria?
5Marta: Vocês dizem que não podem falar português, só podem falar em inglês.
6Às vezes os alunos te explicam em português, então é melhor ficar em par.
78
O extrato acima mostra que Marta vê com bons olhos as atividades (linha 2) e traz dois
argumentos para justificar seu ponto de vista: na linha 2 a aluna acha positivo um colega
poder explicar em português. A possibilidade de negociação em língua portuguesa traz
comodidade para os alunos no momento que a aluna afirma que é melhor trabalhar em dupla
devido ao uso da língua materna nas interações e vice-versa. Os dados até aqui discutidos
levam-me a inferir também que os aprendizes entendem as atividades em pares nas aulas de
inglês como um fator contribuinte para sua participação na construção de conhecimento.
Além disso, evidenciam que há oportunidade de dialogar mais, possibilitando a construção de
conhecimento pela confrontação de vários discursos e pela alternância de turno constante (cf.
seção 3.1).
À medida que as atividades orais embasadas na sócio-interação entre os alunos
mediada pelo professor são propostas, abre-se para os discentes a possibilidade dos alunos
deixarem de ser observadores externos e assumem a responsabilidade de juntos negociarem
significados (seqüência 1, linha 23: Vai, pergunta: And you?). Tal prática faz com que os
alunos percebam suas potencialidades e as de suas próprias participações. Além disso,
desenvolve dentro do aprendiz o poder de fazer escolhas responsáveis ou a menos desperta a
consciência das forças externas que afetam a sua própria capacidade de escolha (HALL,
1993). Este processo visa levar o aprendiz a entender a língua como uma prática social
relacionada ao seu uso e não algo aprendido isoladamente lançado no vácuo.
A seguir apresento outra seqüência também proveniente de interações em sala de aula
a fim de dar continuidade às minhas interpretações acerca das formas pelas quais os alunos
participam e entendem o trabalho em dupla nas aulas de inglês. O diálogo seguinte advém de
uma aula em que os tipos de filmes foram apresentados para os alunos em seguida
expressarem entre si as suas preferências (cf. A.2):
Seqüência 3: Yes, I love them (pergunta, vai)
79
1Jane: What kind of movies do you like?
2Marta: Almost all kinds but especially love stories.
3Jane; Yeah, I like them too. Do you like horror movies?
4Marta: No, I don’t. I hate them. Do you like horror movies?
5Jane: Yes, I love them ( pergunta, vai.)
6Marta: What kinds of movies do you like?
7Jane: Almost all kinds but especially comedies.
8Marta: Comedies, I love them.
As alunas Jane e Marta executaram rapidamente a atividade e não demonstraram
nenhum tipo de dificuldade, exceto na linha 5 quando Jane impacientemente orienta a aluna
Marta com relação ao momento de perguntar. O diálogo prosseguiu, mas parece-me que Jane
não gostou de ter de assumir o papel de maior poder. Na linha 5, a aluna desempenhou três
papéis simultaneamente a meu ver: convidou à participação, instruiu e insistiu. Numa
entrevista que ocorreu logo após uma aula, Jane declarou gostar de trabalhar em duplas
porque é uma forma de estar se relacionando com os colegas, entretanto prefere trabalhar com
alunos que já tenha um bom relacionamento interpessoal pré-estabelecido porque tem mais
afinidades e conversa melhor como mostra o extrato da entrevista com Jane a seguir:
Seqüência 4: Mas vale a pena tentar...
1Professora: Jane. Vou te fazer uma pergunta, como é que você se sente quando
trabalha em 2pares com os seus colegas em sala de aula ?
3Jane: Ah, eu me sinto bem porque é um modo de eu poder tá me relacionando
4com pessoas, conversando com elas, conhecendo mais e até ajudando elas e
5também sendo ajudada.
6Professora: E você prefere, eh.., trabalhar com pessoas que você conhece que você
7tem assim um relacionamento melhor ou você prefere trabalhar
8com outras?
9Jane: Pra mim tanto faz. Com uma pessoa que tenho bom relacionamento melhor, eu
10tenho mais afinidades já converso melhor. Com uma pessoa que eu não conheço às
11vezes posso me aborrecer por causa de qualquer coisa, mas vale a pena tentar.
80
Apesar da afirmação de Jane na linha 9 “ para mim tanto faz”, as linhas 3 e 4 do
extrato acima mostram que interagir com um colega na aula de inglês é uma forma de estar se
relacionando socialmente confirmando o postulado vigotskiano que o homem é um ser social
que interage com grupos particulares desde seu nascimento (cf. seção 2.1). Além disso, os
dados das linhas 9 e 10 do extrato acima evidenciam que o bom relacionamento interpessoal
pode fazer com que o par mais competente se sinta mais confortável para ajudar o seu
parceiro.Ressalto ainda que Jane vai além, mostrando que pode se aborrecer com quem não
conhece(linha 11). É de se destacar, contudo, que apesar de todas estas reflexões de Jane, ela
conclui com a afirmação que escolhi para identificar a seqüência:” mas vale a pena tentar”.
As reflexões críticas sobre os dados registrados em forma de notas de campo dos dias
19/10/2005 e 23/10/2005 levaram-me também a perceber que os alunos Pedro e Tiago no
momento de um exercício em dupla não se olhavam. Tais alunos só se voltavam para o papel
e estavam muito sérios usando um tom de voz baixo. No dia 23/10/2005, percebi que Igor e
Carlos estavam muito sérios, não havia contato visual e ambos também só dirigiam seu olhar
para o livro. Contudo, Kelly e Mauro interagiam sorridentes, sinalizando e apontando para o
outro o momento de falar, já que ambos eram amigos. Podemos observar que a última dupla
age de forma diversa em relação a Pedro e Tiago; Igor e Carlos, pois estes se mostram
desconfortáveis porque não têm um relacionamento interpessoal pré-estabelecido entre eles.
Numa entrevista, Kelly reforça com suas palavras o cuidado que o professor deve ter
ao formar grupos e sua preferência por trabalhar com pessoas que já tenha um bom
relacionamento interpessoal conforme faz notar o extrato a seguir:
Seqüência 5: Como funciona o trabalho em par?
1Professora: Se eu pedisse para você me descrever como funciona o trabalho
2em par. Como você faria para descrever isso?
3Kelly: Pô é legal, mas dependendo da pessoa que está do lado. O Tiago, eu
4não me dou muito com o Tiago. Eu falo com ele normalmente, mas não é a
81
5mesma coisa como o Mauro e o Anderson, eu ajudo também, mas fica aquela
6coisa assim retraída porque a gente não se fala muito.
Interpreto pelos dados acima analisados que o trabalho em dupla também pode ser
visto como uma oportunidade de aprender inglês e de estreitar relacionamentos em sala de
aula com as outras pessoas de uma forma descontraída ou retraída preparando-se para a vida
social e para o mercado de trabalho onde muito freqüentemente terão de interagir com outras
pessoas que não fazem parte de seu ciclo de amizade ou com quem se sintam confortáveis.
Para confirmar esta minha asserção, aponto alguns enunciados retirados de uma entrevista
com Leonardo, um dos participantes da pesquisa: numa empresa você vai ver várias pessoas
trabalhando com inglês, com o inglês que você já está aprendendo você já vai trabalhando
com várias pessoas desde cedo. Percebe-se que a oportunidade de trabalhar em dupla faz com
que os discentes dialoguem com seus colegas possibilitando a contextualização do conteúdo
aprendido no momento em que expressam as suas idéias, atitudes e opiniões através do uso da
linguagem (cf. seção 3.1).
Apesar de identificar um aspecto negativo em relação a como os alunos entendem o
trabalho em dupla, pelo que foi exposto a partir da análise feita ao longo da presente seção,
depreende-se que os alunos vêem os trabalhos em dupla propostos nas aulas de inglês como
algo positivo, confirmando; assim, o postulado vigotskiano de que o ser humano é um sujeito
social que não é apenas ativo, mas sobretudo interativo (cf. capítulo I). O quadro a seguir
sintetiza a análise feita na presente seção:
82
COMO OS ALUNOS ENTENDEM O TRABALHO EM DUPLA:
ASPECTOS POSITIVOS ASPECTO NEGATIVO
� Oportunidade de ajudar e ser ajudado (seqüências 1 e 2).
� Liberdade e comodidade para
negociar significados em língua portuguesa (seqüências 1 e 2).
� Abertura para trabalhar com
colegas que possuem mais afinidades (seqüências 4 e 5).
� Preparação para o mercado de
trabalho desde cedo através da interação em inglês (enunciados retirados da entrevista com Leonardo).
� Interagir com colegas que não tenham afinidades (seqüências 4 e 5).
Quadro3- Como os alunos entendem os trabalhos em dupla?
Com base no conceito de que o desenvolvimento se dá através de uma atividade
interpessoal que se converte em intrapessoal, pois o desenvolvimento pleno do ser humano
depende do aprendizado realizado em determinado contexto social (cf. capítulo II), na seção
subseqüente abordarei os instrumentos de mediação para a construção do conhecimento no
processo de relação interpessoal utilizados pelos alunos no momento que interagem entre si.
6.1.2 Como os meus alunos interagem entre si?
Na presente seção, pretendo discutir a partir dos dados em análise os meios de mediação
utilizados pelos alunos no momento da interação discutidos na seção 2.1.2. Enfoco também a
questão da assimetria e dominância (cf. seção 4.1) que há entre os mesmos enquanto dialogam
buscando com isto descobrir o papel desempenhado pelos interlocutores nos diálogos.
Como evidenciado pelos depoimentos dos próprios alunos na seção 6.1.1, um dos fatores
contribuintes para a construção do conhecimento no momento da interação em par é a
83
possibilidade de ajudar e de ser ajudado por um colega, isto é, de negociar, dar, receber e
partilhar significados. A fim de clarificar a discussão, transcreverei a seqüência 1 novamente:
Seqüência 1: Não esse aqui.
1Igor: How often do you play computer games?
2Marta: I almost never play computer games.
3Igor: How often do you listen to music?
4Marta: I almost never listen to music.
5Igor: How often do you watch TV?
6Marta: Often. And you?
7Igor: What? Often?
8Marta: And You?
9Igor: I always watch TV.
10Marta: How often do you play computer games?
1Igor: I sometimes play video games. And you?
12Marta: Não entendi.
13Igor: Almost never?
14Marta: How often do you surf the Internet?
15Igor: I usually surf the Internet. And you? Não, esse aqui( aponta para o livro)
16Marta: Sometimes.
17Igor: How often do you meet friends?
18Marta:Always ( a aluna erra a pronúncia).
19Igor: What? Always? ( com a intenção de corrigi-la). Vai pergunta : And you?
20Marta: And you?
21Igor: I almost never . How often do you go to a movie?
22Marta: Always.
23Igor: Vai, pergunta: And you?
24Marta: And you?
25Igor: I almost never go to a movie.
26Igor: Teacher, we finished.
Ao observar Marta e Igor interagindo, verifica-se na linha 15 o uso do instrumento de
mediação denominado por Gallimore & Tharp(1996) de instrução ( cf. seção 2.1.2). Igor
84
instrui a sua colega ao dizer “Não, esse aqui” e ao apontar no livro a resposta correta, associa
um gesto a palavras. Já na linha 19, identifico que, ao enunciar “what”, Igor demonstra que
teve de lidar com algo imprevisível e frente a isto fez uso do gerenciamento de contingências,
já que ele controla, gerencia a situação demonstrando surpresa ao colega repetindo o
enunciado com a pronúncia correta conforme o quadro 4 a seguir, pois não poderia prever que
a sua colega iria pronunciar a palavra always incorretamente.
No final desta mesma linha (Vai pergunta : And you?), Igor faz novamente uso de
dois meios de mediação segundo Gallimore & Tharp(1996). Igor dá instrução a sua colega o
que resulta em Marta dizer na linha 20 “And you?” imitando o comportamento de Igor.
Identifica-se, portanto, que há aqui a mediação através da modelagem segundo Gallimore &
Tharp(1996), pois Igor foi o modelo imitado por Marta.
Na seqüência 3, que transcreverei abaixo, também identifico o uso de meios de
mediação utilizados pelos alunos em suas atividades em par:
1Jane: What kind of movies do you like?
2Marta: Almost all kinds but especially love stories.
3Jane; Yeah, I like them too. Do you like horror movies?
4Marta: No, I don’t. I hate them. Do you like horror movies?
5Jane: Yes, I love them ( pergunta, vai.)
6Marta: What kinds of movies do you like?
7Jane: Almost all kinds but especially comedies.
Quando Jane diz “pergunta, vai”, a aluna está instruindo sua colega em relação a hora
de falar. Igor na seqüência 2 e Jane na seqüência 3 agem como o par mais competente da
interação já que lançam mão dos meios de instrução com maior freqüência conforme
discutidos por Gallimore & Tharp(1996). O quadro abaixo resume a discussão desenvolvida
ao longo desta seção:
85
MEIO DE MEDIAÇÃO DESCRIÇÃO EXEMPLOS
Modelagem Comportamentos ou padrões para serem imitados e interiorizados.
� Igor:Vai pergunta: And you? (seqüência 1)
Gerenciamento de contingências
Lidar com o acaso e os imprevisíveis.
� Igor: What? Always? (com a intenção de corrigi-la)(seqüência 1).
Instrução Transmissão de conhecimento ou estratégias e procedimentos através da palavra.
� Igor: I usually surf the Internet. And you? Não, esse aqui (aponta para o livro)(seqüência1)
� Jane: Yes, I love them (pergunta, vai.)(seqüência3)
Adaptado de Gallimore & Tharp,1996- Quadro 4- Meios de mediação Neste momento, analisarei as seqüências 1 e 2 sob uma nova perspectiva a fim de
discutir a questão da assimetria e da dominância presentes nas interações. Conforme já
mencionado no capítulo IV do presente relato, a assimetria é característica intrínseca ao
diálogo.
No início da seqüência 1, ambos interlocutores apresentam direitos iguais para
tomarem os turnos de fala, manter os tópicos e distribuir a participação do discurso
simetricamente, contudo há no desenrolar do diálogo vários tipos de assimetria envolvidos.
A busca de um padrão assimétrico me permite identificar o cunho dialógico das
atividades realizadas em par, portanto, distanciando os alunos dos mecanismos de simples
repetição automática e padronizada (os chamados drills). Na linha 12 da seqüência 1 quando
Marta cede ao outro ao enunciar que não tinha entendido ( Marta: Não entendi.), verifica-se a
quebra da simetria, pois a aluna perdeu o controle do diálogo. Com isso, Igor na linha
13(Igor: Almost never?) passa a assumir o domínio do diálogo.
86
Dentre as quatro formas de dominação (domínio quantitativo, domínio interacional,
domínio semântico e domínio estratégico), predominam na seqüência 1 o domínio
quantitativo, o interacional e o estratégico conforme o quadro a seguir:
Domínio quantitativo →
Medido pelo número de palavras ditas pelos interlocutores.
Igor domina o diálogo quantitativamente (linhas13, 19, 23).
Domínio Interacional →
Relaciona-se à distribuição de iniciativas e respostas presentes no diálogo.
Igor toma as iniciativas no diálogo ao orientar a colega quanto ao momento de falar (linhas 19 e 23).
Domínio semântico →
O interlocutor é caracterizado como dominante se determinar os tópicos do diálogo e sustentá-los em seu discurso
Igor também tem domínio semântico na linha 12 quando Marta diz: Não entendi.
Domínio estratégico →
Ocorre quando o interlocutor contribui com intervenções mais importantes estrategicamente.
Igor quando diz “vai pergunta” lança mão de uma estratégia para orientar a sua colega e continuar a interação (linhas 19 e 23).
Quadro 5- Assimetria no diálogo da seqüência 1- Adaptado de Linnel,1990
É, portanto, Igor o par mais competente, pois ele domina o diálogo e ainda faz uso de
instrumentos de mediação na interação ou na relação interpessoal.
Ao analisar a dominância na seqüência 3, percebemos um equilíbrio quantitativo e
semântico maior nas interações, pois somente na linha 5 Jane demonstra assimetria no
domínio interacional do diálogo:
1Jane: What kind of movies do you like?
2Marta: Almost all kinds but especially love stories.
3Jane; Yeah, I like them too. Do you like horror movies?
4Marta: No, I don’t. I hate them. Do you like horror movies?
5Jane: Yes, I love them ( pergunta, vai.)
6Marta: What kinds of movies do you like?
7Jane: Almost all kinds but especially comedies.
8Marta: Comedies, I love them.
87
O quadro a seguir sumariza os domínios presentes na seqüência 3:
Domínio quantitativo →
Medido pelo número de palavras ditas pelos interlocutores.
Ambos interlocutores dominam quantitativamente (linhas 1-4).
Domínio Interacional →
Relaciona-se à distribuição de iniciativas e respostas presentes no diálogo.
Jane domina o diálogo na linha 5.É quem distribui as perguntas.
Domínio semântico →
O interlocutor é caracterizado como dominante se determinar os tópicos do diálogo e sustentá-los em seu discurso
Não há interlocutor dominante (linhas 1-4 e 6-8).
Domínio estratégico →
Ocorre quando o interlocutor contribui com intervenções mais importantes estrategicamente.
Estrategicamente, Jane faz uso da língua portuguesa na linha 5.
Quadro 6- Assimetria no diálogo da seqüência 3- Adaptado de Linnel,1990
Os dados provenientes das seqüências 1 e 3 mostram que nem sempre há simetria na
distribuição de papéis numa interação entre alunos. Fica evidente nos dados que os alunos
Igor e Jane respectivamente podem ser considerados pares mais competentes. O aluno Igor,
por exemplo, assumiu o controle e a responsabilidade sobre a tarefa conforme as linhas 15, 19
e 23 da seqüência 1 (15Igor: I usually surf the Internet. And you? Não, esse aqui( aponta
para o livro/19Igor: What? Always? ( com a intenção de corrigi-la). Vai pergunta : And
you?/23Igor: Vai, pergunta: And you?). Tais fatos levam-me a inferir que a interação em
dupla possui aspectos positivos, pois nela há a partilha de conhecimento e a ação cognitiva
pode ser regulada por outro. Bakhtin (2003) faz notar que o real objetivo da comunicação
está pautada na relação entre o falante e uma atitude responsiva do ouvinte tendo em vista que
os enunciados são plenos de palavras dos outros e cada sujeito é híbrido devido a uma arena
de conflitos e confrontação de vários discursos que o formam(cf. seção 3.1.1).
O trecho de uma entrevista com uma aluna participante da pesquisa após uma aula
com interações em dupla confirma a minha asserção:
88
Professora: Qual é a importância do trabalho em dupla para aprender inglês?
Kelly: Por que tem certas pessoas na sala, eu não sei dizer..., não sabem muito bem
pronunciar algumas palavras e tal tipo...se eu sei eu posso ajudar a pessoa também
com os trabalhos em grupo fica mais fácil para elas aprenderem.
Ao longo deste capítulo, podemos perceber que a sala de aula não é um local de
repetição de modelos e de memorização de fórmulas prontas, mas um local de construção,
negociação, reconstrução de significados e comunicação discursiva.
Na próxima seção, enfoco a relação entre o meu papel de professora-pesquisadora e o
processo de construção de conhecimento com ênfase no trabalho em dupla na minha aula de
língua inglesa.
6.2 Como o meu papel auxilia na construção de conhecimento dos meus alunos? A segunda subpergunta de pesquisa - Como o meu papel de professora- pesquisadora
pode auxiliar o processo de construção de conhecimento com ênfase no trabalho em dupla na
aula de língua inglesa?- tem como foco entender o papel que desempenho na prática tendo
em vista os pressupostos sócio-interacionais de co-construção de conhecimento defendidos ao
longo do presente estudo. Apresento, nesta seção, algumas reflexões a partir de dados que
mostram como participo na prática no momento em que meus alunos constroem
conhecimento ao trabalharem em dupla na minha aula de inglês, todavia primeiramente
discutirei como planejo as aulas para em seguida mostrar através dos dados como ajo
enquanto meus alunos trabalham entre si e finalmente analiso o meu papel após o processo
sócio-interacional.
6.2.1 Como preparo os meus alunos para as atividades em dupla?
89
O primeiro passo para a preparação das atividades em dupla é o plano de aula (vide
anexo A.2). A minha prática docente vê o professor como um mediador e não como o único
detentor do conhecimento, por isso privilegio em meu plano de aula atividades que propiciem
interação entre os alunos para que assim construam conhecimento através do diálogo
(cf.2.1.2). As seqüências a seguir apontam duas das formas pelas quais organizo o trabalho
em sala de aula. Sou como professora também uma gerente das atividades em dupla, pois
organizo o grupo para as atividades comunicativas. Este fato remete-me à metáfora feita por
Vygotsky (2001) de que a função do professor assemelha-se a de um jardineiro, pois o
jardineiro influencia o crescimento da flor aumentando a temperatura, regulando a umidade
assim como o educador que ao mudar o meio educa a criança (cf. A.2).
Primeiramente demonstro o tipo de atividade para que depois os alunos venham a
fazer sozinhos conforme os pressupostos vigotskianos (cf. seção 2.1.2) : 1Professora: One,
two, three, four,five. Who’s number one? Do you remember?/2Professora: Number one, sit
together, please.Number two, sit together, number three,/3number four and number five.
Neste caso, a professora numerava cada aluno aleatoriamente para que estes formassem pares
com aqueles que possuíssem o mesmo número:
Seqüência 6: Who’s number one?
1Professora: One, two, three, four,five. Who’s number one? Do you remember?
2Professora: Number one, sit together, please. Number two, sit together, number three,
3number four and number five.
4Professora: You’re going to speak like this:
5Pedro, you’re my partner, how do you go to school?
6Pedro: I go to school by bicycle.
7Professora: How long does it take you to get there?
8Pedro: It takes me ten minutes.
9Professsora: Ok.
10Pedro: How do you go to _____?(o nome da instituição foi omitido na transcrição
por uma questão de ética)
90
11Professora: I go to ____ by bus.
12Pedro: How long does it take you to get there?
13Professora: It takes me about thirty minutes, ok?
14Professora: Ok? So, now you speak together.
Os meus dados evidenciaram que também em minha prática faço uso de modelagem e
instrução - meios de mediação citados por Gallimore & Tharp(1996) previamente discutidos
na seção 2.1.2 do presente trabalho. No enunciado da linha 4 (you’re going to speak like this),
associei a instrução à modelagem como meio de mediação já que pretendia propiciar
comportamentos a serem imitados e internalizados pelos alunos ao trabalharem em com suas
respectivas duplas. As linhas 1, 2 e 3 apontam a professora como instrutora que orienta e
instrui como os alunos devem trabalhar.
Na seqüência a seguir, advinda de uma atividade em par em que os alunos tinham
fotos de vários filmes para classificá-los (cf. A.2), a professora inicialmente dá liberdade de
escolha para do par. Contudo, não dá aos aprendizes liberdade de escolher as perguntas a
serem formuladas:
Seqüência 7: You’re free to choose a different partner
1Professora: Let’s work in pair, now you’re free to choose a different partner.
2You need to ask your partner: What kind of movie is Godzila?
3Alunos: I think it’s a horror movie.
4Kelly: What kind of movie is “Pokemon 2 the movie”?
5Leonardo: I think it’s a cartoon.
6Leonardo:What kind of movie is “ There’s Something about Mary”?
7Kelly:It’s a comedy.
8Leonardo: What kind of movie is Godzila?
9Kelly: I think it’s a horror movie.What kind of movie is Mission Impossible ( a aluna
errou a pronúncia)?
10Leonardo: I think it’s an action movie.
91
Aparentemente as perguntas seguem o padrão de “drill”(exercícios em que os alunos
repetem a mesma estrutura várias vezes), contudo as escolhas das respostas se constroem
individualmente a partir da vivência dos discentes. Percebe-se, na seqüência acima, que a
professora lançou mão da estrutura cognitiva (GALLIMORE & THARP, 1996) como meio de
mediação, já que organizou os conteúdos novos de forma que os alunos os associassem com
situações conhecidas, isto é; naquela aula os alunos estavam lidando com uma estrutura
nova”What kind of movie is...?”, entretanto tinham de relacionar o tipo de filme à foto que
estava no livro utilizando seus conhecimentos pré-construídos no contexto sócio-cultural no
qual estão inseridos.
Passo a discutir na próxima seção como ajo durante as interações.
6.2.2 Como ajo durante as interações?
Como já mencionado na seção anterior, entendo que o professor além de ser mediador
é um gerente das atividades em dupla. Assim sendo, os dados apontam que o mesmo
monitora, incentiva e auxilia os grupos durante a interação. Devido às restrições de gravações
feitas por meio de um único gravador, não obtive dados de interações em que registrasse as
minhas intervenções, pois aproveitava para monitorar outras duplas enquanto uma interação
estava sendo registrada para que os alunos não se sentissem pressionados e intimidados por
minha presença. Contudo, obtive registros através de notas de campo e entrevistas sobre o
meu papel durante as atividades em dupla.
Uma ocasião, evidenciada em nota de campo do dia 20/09/2005, mostra quando dois
alunos não lembram de uma palavra ambos perguntam a mim, naquele momento lancei mão
de um meio de assistência muito freqüente em nosso cotidiano acadêmico denominado
instrução (GALLIMORE & THARP, 1996).
92
Os alunos ao terem uma dúvida pedem informação ao seu professor e este por sua vez
se responsabiliza em acompanhá-los em vez de esperar que os estudantes aprendam os
conteúdos sozinhos. Caso o aluno não possa ajudar o seu colega, sou vista como mediadora,
pois auxilio o processo de ensino-aprendizagem por ter um papel ativo no meio educacional
como se faz notar a seqüência a seguir advinda de uma entrevista:
Seqüência 8: Se ela não entender eu peço para ela pedir explicação para a senhora
1Professora: Você se incomoda de fazer atividade com uma pessoa que não saiba tanto
2quanto você?
3Marta: Não.
4Professora: O que você faz?
5Marta: Eu tento explicar se ela não entender eu peço para ela pedir explicação para
a senhora.
Em nota de campo (10/11/2005), há registros de um par que não lembrou uma palavra
e perguntou a mim. No dia 20/09/2005, Carla pergunta-me a pronúncia de uma palavra e não
ao colega talvez por não ter muita intimidade com ele.
Creio, todavia, que devido à assimetria existente na relação professor-aluno (cf.
capítulo IV), os aprendizes muitas vezes não se sentem à vontade para perguntar ao professor
e preferem pedir auxílio ao colega conforme evidenciam os dados.
Assim sendo, os estudantes vêem os colegas como pares mais competentes (cf. seção
6.1) e o professor deixa de ser o único que pode ensinar. Para confirmar esta minha asserção,
aponto a seqüência a seguir:
Seqüência 9: A gente às vezes se sente mal chegar para o professor e perguntar.
1Professora: Se fosse só eu interagindo com vocês como seria esta aula?
2Kelly: Seria chato porque a gente se sente melhor perguntando ao colega do que ao
professor.
3Professora: Por quê?
4Kelly: Não sei por que a gente às vezes se sente mal chegar para o professor e
perguntar.
93
Abordarei a seguir a forma pela qual ajo após a proposição de um trabalho em dupla.
6.2.3 Como ajo após o trabalho em dupla?
A minha ação após a proposição de um trabalho em dupla está atrelada ao tipo de
atividade que foi proposta bem como ao modo pelo qual os alunos interagiram entre si.
Quando uma atividade precisa de um feedback, após a interação checo as respostas com os
alunos conforme mostra o extrato da aula do dia 20/09/2005 a seguir:
Seqüência 10:
1Professora: In groups of three, you’re going to check your answers (…) two groups
of three 2and one of four. All right?
3Professora: You’re going to check your answers in groups and after this I’ll tell you,
come on!
Se durante o monitoramento das interações percebo que há algo discrepante, anoto
para ao final da aula tecer os comentários devidos. Quando percebo que o par mais
competente sanou as possíveis dúvidas do colega, não intervenho e continuo a execução de
meu plano de aula.
O quadro a seguir abarca uma síntese de como entendo o meu papel de professora no
processo de construção de conhecimento através do me mostrou a análise de dados:
94
O Papel de Professsora-Pesquisadora Antes Durante Depois
� Gerente de atividades em dupla (seqüência 6) .
� Propiciadora de modelos (seqüência 6).
� Propiciadora de instrução (seqüência 6).
� Propiciadora de retomada de situações similares - estrutura cognitiva (seqüência 7).
� Mediadora (seqüência 8).
� Monitora (seqüência 8).
� Auxiliadora (seqüência 8).
� Instrutora (nota de campo do dia 20/09/2005).
� Solucionadora de possíveis dúvidas (seqüência 10).
Quadro 7- O papel de professora -pesquisadora
A discussão feita ao longo deste capítulo leva-me a afirmar que o professor deve
possuir um papel ativo no processo educacional o que ratifica a asserção de Vygotsky
(2001:73): o fazer docente consiste em cortar, talhar e esculpir os elementos do meio,
combiná-los pelos mais variados modos para que realizem a tarefa de que ele, o mestre
necessita. Em suma, o professor deve ser organizador e mediador do meio social no qual irá
também interagir através da linguagem com os seus alunos.
Passo agora a apresentação de minhas reflexões críticas sobre os dados analisados a
fim de responder à macro-pergunta de pesquisa do presente estudo.
6.3 Respondendo a macro-pergunta de pesquisa
Retomo, nesta seção, o que foi discutido em resposta às duas sub-perguntas de
pesquisa, isto é, procuro repensar o que foi abordado nas seções 6.1 e 6.2 deste estudo com
ênfase no processo de construção de conhecimento para responder a seguinte questão:Como o
95
trabalho em dupla pode contribuir para o processo de construção de conhecimento dos meus
alunos?
Depreende-se da minha discussão ao longo da seção 6.1 que o conhecimento é
adquirido através da interação com indivíduos que nos cercam (cf. capítulo I), com base em
Vygotsky (1998:15) ao postular que o aprendizado humano pressupõe uma natureza social
específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles
que as rodeiam. As linhas 19 e 20 da seqüência 1, já transcritas e analisadas na seção 6.1 deste
trabalho, (19Igor: What? Always? ( com a intenção de corrigi-la). Vai pergunta : And
you?/20Marta: And you?)mostraram que Igor colabora para com o processo de construção de
conhecimento, atuando como o par mais competente e trazendo seu conhecimento para
negociar com seu par sua participação no diálogo como para sinalizá-lo colaborativamente.
Isto posto, percebemos que Marta ao interagir com Igor ativa processos que sem a ajuda do
colega poderiam ser mais difíceis de ocorrer. Faço lembrar que os dois alunos eram iniciantes
e tinham pouco domínio da língua inglesa, contudo, cada qual tinha seu grau de
desenvolvimento diferenciado: internalizam os conhecimentos de diversas formas, pois não
são seres pré-determinados biologicamente (cf. capítulo I).
Na seqüência a seguir advinda de uma interação em sala de aula em que um aluno
deveria perguntar para o outro os objetos que coleciona (cf. A.2), percebemos que Carlos
orienta Leonardo nas linhas 3, 7 e 11; pois Carlos respectivamente repete a pergunta,
direciona o colega falando em português e o repreende quando o mesmo repete uma pergunta
que já tinha sido feita. Este fato leva-me a considerar a seguinte asserção de Tudge
(1996:154): a interação com um par mais competente é muito eficiente para o
desenvolvimento cognitivo. Podemos inferir que Carlos é o par mais competente desta
interação por orientar o seu colega durante a atividade levando-o a um outro nível cognitivo.
Seqüência 11: Não é essa.
96
1Carlos: What do you collect?
2Leonardo: Não sei, não entendi.
3Carlos: What do you collect?
4Leonardo: I love collecting pins.
5Carlos: How many do you have?
6Leonardo: About thirty. And you? What do you collect? Do you have any postcards?
7Carlos: Não é essa.
8Leonardo: What do you collect?
9Carlos: I collect soccer cards.
10Leonardo: What do you collect?
11Carlos: Já perguntou isso.
A seqüência 1 analisada na seqüência 6.1.1, a aluna errou a pronúncia da palavra
always e na linha 22 não cometeu o mesmo erro. A orientação de Igor, ao apontar para o
livro e sinalizar o momento de perguntar “And you?” dizendo “ Vai, pergunta.”, foi útil para
a continuação da interação (linhas 15, 19 e 23) assim como as intervenções de Carlos na
seqüência 11 já discutidas anteriormente. Este fato nos remete à asserção vigotskiana de que o
sujeito social não é apenas ativo, mas sobretudo interativo(CASTORINA, 1995:12), pois
através da interação tem a oportunidade de se desenvolver porque pode aprender novos
significados e comportamentos.
Interpreto como um fator contribuinte à construção do conhecimento dos meus alunos
a liberdade e comodidade para negociar significados em língua portuguesa conforme já
discutido na seção 6.1 e evidenciado também na seqüência 11 especialmente quando os pares
desejam incluir no diálogo comentários e enunciados não previstos. Como os sujeitos
participantes da pesquisa encontravam-se no terceiro nível de um curso destinado a
adolescentes, os mesmos não tinham fluência em língua inglesa. Por isso, a língua portuguesa
(cf. seqüência1-linhas 12,15, 19 e 23; seqüência 3- linha 5; seqüência 11 – linhas 2, 7 e 11),
conforme Freitas(1997), foi utilizada como um instrumento para que houvesse incorporação e
97
internalização de padrões e formas de relação experienciados com outros ocasionando o
desenvolvimento das funções superiores.
O trabalho em dupla coaduna com a ótica vigotskiana que tem como base a construção
do conhecimento através da colaboração e participação no diálogo (cf. capítulo I). Todavia,
quando a aluna Kelly descreve o trabalho em dupla da seguinte forma: Pô é legal, mas
dependendo da pessoa que está do lado (seqüência 5, linha 3), a estudante sinaliza a
preferência por colegas que possuam mais afinidades. O mesmo está implícito nas reflexões
críticas sobre os dados registrados em forma de notas de campo dos dias 19/10/2005 e
23/10/2005 que me levaram também a perceber os alunos Pedro e Tiago no momento de um
exercício em dupla em que não se olhavam. Tais alunos só olhavam para o papel e estavam
muito sérios usando um tom de voz baixo. No dia 23/10/2005, percebi que Igor e Carlos
também estavam muito sérios, não havia contato visual e ambos só olhavam para o livro.
A seqüência a seguir proveniente de uma entrevista coletiva com os alunos em sala de
aula também ratifica o fato dos discentes preferirem trabalhar com colegas que tenham um
bom relacionamento (classifiquei os alunos por letras porque não pude identificá-los devido
as restrições da gravação, pois houve momentos em que todos falavam juntos) :
Seqüência 12-Entrevista coletiva com os alunos:
1Professora: Como seria se fosse somente o professor ajudando vocês?
2A: Seria chato.
3Professora: Você gosta de aprender com o colega?
4B: Não.
5Professora: Como você se sente?
6A: Bem.
7B: Não gosto porque não me dou bem com certas pessoas.
8C: Só gosto de trabalhar com quem falo direito.
9D: Fica estranho, fico meio tímido ao falar quando faço o trabalho com uma pessoa
10que eu não conheço muito bem.
11E: Gosto porque posso aprender com outras pessoas também.
98
12F: Gosto porque exercito mais o inglês.
13G: Não gosto porque me sinto burra quando falo com gente que saiba mais que eu;
14não sai quase nada.
Nas linhas 7,8,9 e 10 da seqüência acima, os alunos declaram preferir trabalhar com
determinados colegas. Este fato leva-me a considerar a motivação um fator altamente
relevante para que o trabalho em dupla contribua para a construção de conhecimento dos
alunos. Segundo Tudge (1996), para que a interação seja efetiva, as crianças devem trabalhar
no sentido de alcançar objetivos comuns a partir de significados compartilhados, pois o
aspecto mais importante da colaboração é a habilidade dos parceiros em engajar-se em um
processo de coordenação social.
Ao interagir em par, os alunos também lançam mão de instrumentos de mediação
como a modelagem, o gerenciamento de contingências e a instrução. Tal fato nos mostra que
em duplas um dos pares pode mediar o processo de ensino-aprendizagem e o professor não é
o único que pode deter o conhecimento que pode ser co-construído por meio de interações dos
alunos entre si (cf. quadro 4).
Destaco, porém, que no processo de co-construção do conhecimento através da
interação em dupla, nem sempre há simetria na distribuição de papéis conforme analisei na
seção 6.1.2. Durante a análise das seqüências 1 e 2, evidenciou-se que Igor e Jane poderiam
ser respectivamente considerados pares mais competentes por dominarem o discurso em
diversas formas. É bem verdade que um dos interlocutores pode ser silenciado ou dominado
pelo outro, contudo, tal fato leva-me a concluir que o domínio no diálogo é um meio de
contribuição para o processo de construção de conhecimento do outro; pois o par mais
competente precisa dominar o diálogo para intervir na ZDP do outro (cf. quadros 5 e 6).
Lembro ainda que para o trabalho em par colaborar para a construção de conhecimento
dos meus alunos, os meus dados me levam a afirmar ser preciso que o professor se
conscientize de seu papel na proposição do mesmo. Para tal, o docente deve ser visto como
99
um mediador nas interações e um gerente de atividades conforme já discutido na seção 6.2.2
do presente estudo.
O sucesso da proposição do trabalho em dupla está estritamente ligado à
conscientização do docente em relação aos vários processos que estão atrelados à execução
destas atividades, visto que o papel do professor como mediador é indispensável. É necessário
que o professor incentive a sócio-interação em sala de aula através do planejamento das aulas
não se negando também a auxiliar os alunos quando solicitado ajudando a sanar possíveis
dúvidas enquanto os alunos interagem entre si. Minha investigação aponta, portanto, que o
professor desempenha funções antes, durante e depois da proposição das atividades (cf.
quadro 7). Ele não é substituído ou excluído do processo de colaboração, mas também um
participante que cede, contudo, seu lugar aos interlocutores das duplas estando pronto a
reassumi-lo.
Na seqüência 7, percebemos através das palavras de Marta a importância da mediação
do professor caso os alunos não consigam sanar suas dúvidas. Tal fato ratifica que o
conhecimento não é resultado de uma pessoa, mas fruto de um processo sócio-cultural
colaborativo em que o ensino é uma ferramenta para a transformação e não um meio de
transmissão de verdades inquestionáveis:
Seqüência 7
1Professora: Você se incomoda de fazer atividade com uma pessoa que não saiba tanto
2quanto você?
3Marta: Não.
4Professora: O que você faz?
5Marta: Eu tento explicar se ela não entender eu peço para ela pedir explicação para
6a senhora.
Tendo em vista a interdiscursividade da linguagem discutida ao longo da seção 3.1,
pressupõe-se que ensinar uma língua não significa transmitir o conhecimento contido em
100
gramáticas e dicionários, mas relacionar o processo de ensino-aprendizagem às enunciações
concretas: Aprender a falar significa aprender a construir enunciados não por orações
isoladas e, evidentemente não por palavras isoladas (BAKHTIN, 2003:283).
O quadro a seguir abarca uma síntese de como os trabalhos em dupla, por mim
propostos, podem contribuir para o processo de construção de conhecimento dos meus alunos:
COMO OS TRABALHOS EM DUPLA CONTRIBUEM PARA A CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTODOS MEUS ALUNOS?
� Através da interação com um par mais competente que lança mão de instrumentos de mediação.
Quadros 3, 4 , 5 e 6.
� Através da liberdade e comodidade que os alunos têm para negociar significados entre si em língua portuguesa.
Quadros 3, 4, 5 e 6.
� Através da mediação do docente como auxiliador, instrutor, monitor e gerente de atividades.
Quadro 7.
Quadro 8- Como os trabalhos em dupla contribuem para a construção de conhecimento dos meus alunos?
Passo aos encaminhamentos na próxima seção da presente investigação.
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ENCAMINHAMENTOS
“ No processo de educação o mestre deve ser os trilhos por onde movimentam com liberdade e independência
os vagões, que recebem dele apenas a orientação do próprio movimento”. (Vygotsky)
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Um dos principais motivos que me levou a começar esta investigação foi a curiosidade
de saber a relevância dos trabalhos de diálogo em dupla, sempre propostos nas minhas aulas
de inglês, para com a construção de conhecimento dos meus alunos. A fim de realçar minha
decisão por escolher o tema desta pesquisa, optei por separar a apresentação deste trabalho em
duas seções: PREFÁCIO E INTRODUÇÃO.
Refletindo sobre esta investigação, espero ter contribuído para o conhecimento sobre a
relevância de se propor uma atividade de caráter colaborativo, como o trabalho em dupla nas
aulas de inglês independentemente do nível de desenvolvimento dos alunos. O fato de propor
atividades em dupla devido a uma orientação do método de ensino do curso não foi um fator
suficiente para que me convencesse sobre o seu valor pedagógico e não refletisse sobre a
minha prática. Hoje, após investigar o meu próprio trabalho sei que aquelas atividades em par
propostas em minhas aulas realmente contribuem para a construção de conhecimento dos
meus alunos.
Nas atividades realizadas por meus alunos, os mesmos não se restringiram a
reproduzir o modelo apresentado pela professora e pelo livro didático. Os discentes
procuraram inserir informações de sua experiência pessoal fazendo uso de assuntos propostos,
mas estabelecendo uma ponte com sua realidade (cf. capítulo VI). Por exemplo, no modelo
oferecido pelo material didático, os diálogos deveriam se desenvolver em relação a filmes, aos
meios de transportes e objetos utilizados no dia-a-dia (cf.A.2).Assim sendo, os interlocutores
buscaram em sua experiência formas de construir o diálogo a partir de sua experiência pessoal
não tendo uma postura de alunos que fazem usos de drills ( exercícios que enfatizam a mera
repetição de modelos).
Enquanto professora na instituição, tive a oportunidade de trabalhar com diversos
grupos desde os níveis iniciais até os mais avançados; todavia elegi um grupo de iniciantes
para pesquisar porque, a meu ver, as contribuições dos trabalhos em dupla em níveis mais
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avançados eram mais visíveis devido à fluência e ao conhecimento gramatical daqueles
alunos. A minha principal inquietação era saber se através da interação em dupla os alunos
poderiam aprender entre si, apesar das limitações de estudantes pertencentes ao terceiro nível
de um curso destinado a adolescentes; tal fato atualmente não me inquieta mais.
Ao longo desta pesquisa, pude perceber que a proposição de um trabalho em dupla vai
além da prática da língua inglesa em sala de aula. Tal atividade está também atrelada ao
desenvolvimento do aluno como ser humano, já que ao interagirem entre si os aprendizes têm
a oportunidade de ajudar e de serem ajudados participando de um processo de co-construção
do conhecimento e de conhecimento de suas potencialidades (cf. seção 6.1.1). Além disso,
pude perceber melhor e de forma consciente a importância do meu papel como professora
antes, durante e após a execução das atividades em dupla (cf. seção 6.2.3).
Embora a sala de aula bakhtiniana seja uma arena de conflitos de vozes onde vozes
diferentes de entrelaçam (cf. seção 3.1.1), muitas vezes os conflitos foram silenciados e não
foram por mim enfocados tendo em vista a proposta pedagógica do curso. Cada aula tinha
uma hora de duração, assim sendo tinha de dar uma lição por aula. Por isso, via-me limitada a
seguir a proposta pedagógica do curso e não tinha flexibilidade para propor atividades de
caráter colaborativo a não ser quando o próprio livro permitia . No momento da proposição de
atividades de caráter colaborativo, mesmo com as limitações inerentes a alunos iniciantes,
havia abertura para que conflitos de vozes ocorressem. Tais fenômenos se dão quando alunos
interagem entre si no diálogo e identificam que são seres diferentes e não têm afinidades com
os outros porque interpretam o mundo de formas diversas (cf.capítulo VI).
Retomando a minha macro-pergunta de pesquisa- Como o trabalho em dupla pode
contribuir para o processo de construção de conhecimento dos meus alunos?- tenho respaldo,
através dos dados gerados durante esta investigação, que a proposição do trabalho em dupla é
favorável à construção de conhecimento por uma série de motivos previamente discutidos ao
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longo do capítulo VI do presente estudo. Contudo, através deste trabalho - apesar de não ter
sido objeto específico de uma pergunta de pesquisa - considero que as atividades em pares
também podem ser uma oportunidade de sociabilização, já que os aprendizes têm de trabalhar
com pessoas independentemente do tipo de relacionamento interpessoal pré-estabelecido.
Apesar de alguns alunos verem como um aspecto negativo interagir com quem não
conhecem bem (cf. seção 6.1.1), acredito que este fato ajuda a sociabilizá-los e desenvolvê-los
como seres humanos, já que lhes abre a oportunidade de dialogar com quem não faz parte de
seu ciclo mais íntimo, apesar das limitações inerentes ao fato de terem um vocabulário restrito
em língua inglesa por pertencerem ao terceiro nível de um curso destinado a adolescentes.
Conforme faz notar Tudge (1996), o fator mais relevante para se propor uma tarefa de
caráter colaborativo é o próprio processo de interação em si e não os benefícios cognitivos de
associar uma criança a um parceiro mais competente, pois nasce dessa colaboração a
habilidade dos parceiros para o engajamento em um processo de coordenação e participação
social.
Percebi, através desta investigação, que não sou a única que pode auxiliar os meus
alunos no processo de construção de conhecimento como ratifica a seguinte asserção de
Tudge (1996:153): a colaboração com outra pessoa - um adulto ou um colega mais
competente - na zona de desenvolvimento proximal conduz então ao desenvolvimento de
formas culturalmente apropriadas.
Não pretendo enfatizar o caráter conclusivo deste estudo, pois o mesmo levou-me a
pensar e repensar sobre algumas respostas obtidas que podem apontar caminhos para
pesquisas futuras. Entre outras questões, gostaria também de pesquisar outros tipos de
trabalho em trio ou em grupos maiores com alunos de níveis avançados a fim de saber, por
exemplo, se a importância da língua materna é tão destacada quanto nos níveis elementares;
gostaria também de investigar a minha presença e como esta interfere diretamente no
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desempenho dos alunos ao trabalhar em grupo; e por fim, questiono o papel e o uso da língua
materna pelo professor tendo em vista, que a partir da opinião dos sujeitos colaboradores
desta pesquisa, o uso desta é algo importante. A meu ver, o docente deve ser os trilhos por
onde os vagões se movimentam e o uso somente da língua estrangeira em sala de aula seria
essencial para que o aluno se sinta estimulado a falar inglês.
Este trabalho só foi possível devido a uma curiosidade epistemológica sobre a minha
sala de aula, tal fato me remete a Freire (1996), para quem a prática docente deve ser reflexiva
a ponto de envolver um movimento dinâmico e construtivo; e o que era uma curiosidade
ingênua torna-se ponto de partida para um agir reflexivo. Com isso, adquiri um melhor
entendimento do que seja interagir por meio de uma atividade em dupla e alguns pontos que
via negativamente (como os alunos falarem em português durante as interações), este estudo
mostrou que podem ser fatores importantes para a construção de conhecimento dos alunos.
Por fim, entendo melhor a relevância das atividades em dupla e sinto-me mais experiente e
mais preparada para interagir com outros colegas em busca de soluções para problemas
relacionados à nossa prática em sala de aula.
Relembro os comentários de Tudge (1996:151) de que a maior parte do interesse por
pesquisas em pares mais competentes na ajuda ao aprender tem se centrado no papel que os
adultos assumem no incentivo e esforço do desenvolvimento das crianças. Destaco, contudo,
que meu trabalho traz uma contribuição, mesmo que humilde, aos estudos relacionados aos
pressupostos vigotskianos, já que investiga o papel de alunos adolescentes atuando em
colaboração sem competir, brincar e satirizar um ao outro (cf. capítulo VI).
Outra consideração a ser feita, diz respeito ao fato da pesquisa ter sido realizada no
contexto de um curso de inglês. Nele, como professores, nos vemos muitas vezes com nossas
opções limitadas, recebendo pacotes prontos para serem usados contendo material,
metodologia e pressupostos teóricos que não foram gerados pelos docentes. Todavia, meu
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estudo evidencia que, apesar de todos os obstáculos, a sala de aula pode ser um campo onde
conceitos são questionados, refletidos e reconstruídos.
As considerações obtidas através desta investigação não se limitam ao contexto em
que foram geradas, atualmente não atuo em cursos livres de idiomas. Entre outras funções,
também sou professora de literatura brasileira da Rede Estadual do Rio de Janeiro e trago para
minha prática o que aprendi através da minha pesquisa, pois incentivo os meus alunos a
trabalharem colaborativamente através da troca de idéias e negociação de significados. Hoje
entendo que não sou a única detentora do saber em sala de aula porque este pode ser co-
construído colaborativamente independentemente do contexto, basta apenas o professor ter
sua consciência crítica e reflexiva para incentivar os seus alunos à prática de tais atividades.
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