Post on 25-Jun-2015
Universidade de Lisboa
O PROCESSO DE
REALOJAMENTO DO BAIRRO DO
CASAL VENTOSO
POLÍTICAS DE HABITAÇÃO
Curso: Serviço Social (Pós-Laboral)
Docente:
Prof. Aux. Albino Cunha
Discentes:
Ana Francisca Lopes Regêncio (211901)
Célia Maria Costa Rodrigues (211773)
Jorge Manuel Carapinha Maurício Fava (211786)
Maio 2014 | 2º Semestre | 3º Ano | Ano lectivo 2013 / 2014
«Famílias inteiras privadas das refeições diárias
Das condições sanitárias
Em habitações precárias
Sem habilitações literárias
Para poder fugir às áreas
Onde a droga e a pobreza fazem execuções sumárias
Das minorias que representam as maiorias das classes mais operárias
Devido ao feudalismo, racismo e atrocidades várias
Medidas sociais são necessárias»
Chullage, «À Pala de Quem Não Come»
in Rapresálias – Sangue, Lágrimas, Suor, 2001.
RESUMO
A ocupação do Casal Ventoso para finalidades de habitação deu-se nos finais do séc. XIX num
contexto de grande debilidade económica a par da inexistência de políticas públicas de
habitação o que contribui para a fixação da população em áreas do espaço urbano que a sua
situação financeira pôde suportar. Era “habitado por classes populares […] e […] marcado
pela degradação habitacional e ambiental, pelo uso de materiais provisórios na habitação e
por défices, quer infra-estruturais, quer de redes de abastecimento” (Chaves 2013: 31-32) . As
pessoas encaravam a sua passagem pelo Bairro como uma situação transitória. Com a
proliferação deste tipo de mercados habitacionais (submercados de habitação) começou a
surgir a preocupação em implementar políticas que tivessem em conta as carências
habitacionais e o planeamento urbano. Surge em, …, com o objectivo de realojar as pessoas do
Casal Ventoso. Esse processo ocorreu em… Como o Estado sempre adoptou uma postura
reactiva no que toca à questão habitacional, o realojamento tem impactos positivos e
negativos nas vidas das pessoas.
ÍNDICE GERAL
Introdução----------------------------------------------------------------------------------------5
Capítulo I – Enquadramento teórico--------------------------------------------------6
1.1 – O conceito de Bairro------------------------------------------------------------------6
1.2 – Evolução da habitação social em Portugal-------------------------------------6
1.3 – O direito à habitação condigna----------------------------------------------------8
1.4 – O realojamento-------------------------------------------------------------------------9
1.5 – O Plano Especial de Realojamento (PER)-------------------------------------10
Capítulo II – Contextualização do Bairro do Casal Ventoso--------------11
2.1 - Evolução histórica do Bairro do Casal Ventoso-------------------------------1
2.2 - Características do Bairro do Casal Ventoso e da sua população--------1
2.3 - A exclusão social-----------------------------------------------------------------------1
2.4 - O desmoronar do Bairro--------------------------------------------------------------1
Capítulo III – O realojamento na Quinta do Cabrinha------------------------1
3.1 – O Processo de realojamento-----------------------------------1
3.2 - A (Re)Construção de uma nova identidade e o apoio social no
processo de inclusão----------------------------------------------------------------------1
Capítulo IV – Metodologia e Apresentação de resultados-----------------1
4.1 - Objectivos e questões da investigação------------------------------------------1
4.2 - Seleção da amostra--------------------------------------------------------------------1
4.3 - Procedimentos de recolha da amostra------------------------------------------1
Capítulo VI – Conclusões-------------------------------------------------------------------1
Referências bibliográficas-----------------------------------------------------------------1
Anexos----------------------------------------------------------------------------------------------1
INTRODUÇÃO
O tema para o nosso trabalho de grupo surgiu de imediato e de forma consensual. No
âmbito da disciplina de Políticas de Habitação incitou-nos interesse perceber de que
forma foi elaborado e conduzido o processo de realojamento do bairro do Casal
Ventoso, situado numa das encostas do Vale de Alcântara na freguesia de Campo de
Ourique, em Lisboa, muito conhecido essencialmente pela sua envolvência no tráfico e
consumo de drogas.
A Câmara Municipal de Lisboa através do “Plano Integrado de Reconversão”,
financiado pelo Programa URBAN da União Europeia, criou condições para que os
habitantes desta zona da cidade fossem realojados em novas habitações construídas
de raíz para o efeito, na Quinta do Cabrinha, Quinta do Loureiro e Ceuta Sul, junto à
Avenida de Ceuta.
Pretendemos de forma introdutória e num enquadramento teórico, contextualizar
historicamente o bairro do Casal Ventoso, nomeadamente a sua origem e
crescimento, bem como caracterizar a população nele existente quanto à sua cultura,
etnias, tradições, hábitos existentes e práticas quotidianas.
A metodologia a que recorreremos basear-se-á numa pesquisa e análise documental,
referente ao bairro do Casal Ventoso e ao Vale de Alcântara, com recurso à GEBALIS
e ao Projecto AlKantara, entre outras fontes, elaborando desta forma a fase inicial do
nosso trabalho.
Posteriormente, é nosso propósito empregar um método de carácter qualitativo
(inquérito ou entrevista), objetivando aferir dois aspetos que consideramos
fundamentais num processo como este. Ou seja, numa vertente humana pretendemos
saber se foram tidos em conta os interesses das pessoas, as culturas, e etnias, as
redes de vizinhança e hábitos de vida existentes nesta comunidade e as suas
perspetivas de comodidade. Numa vertente urbana e social, que tendo em conta a
nossa área de formação, nos desperta grande interesse, é nosso intuito conhecer o
que de bom e menos bom estes realojamentos trouxeram a esta pessoas.
Pretendemos saber o que sentem e como se sentem nos novos bairros; que
alterações surgiram no seu quotidiano; que mudanças estruturais aconteceram nas
suas vidas, sejam de idosos, crianças ou pessoas em idade ativa que, com a mudança
de casa foram obrigados também a mudar os seus hábitos de vida devido à quebra de
relações familiares e de vizinhança de vários anos; de que forma foi alterada ou não a
imagem que tinham de si próprios, estereotipada socialmente durante tantos anos; etc.
Perceber também se o realojamento facilitou ou contribuiu de alguma forma para
favorecer a criação/ manutenção de redes sociais e a inserção profissional da
população ativa e se foi ou não assegurado um equilíbrio na sua envolvente,
nomeadamente na criação de condições que potenciem a integração e coesão social,
nomeadamente a existência de redes de vizinhança e serviços de proximidade
(escolas, centro de saúde, empregos, transportes, serviços para a ocupação dos
tempos livres dos jovens e dos idosos; etc).
Depois de analisados os resultados obtidos apresentaremos as nossas conclusões,
perspetivas e reflexões sobre este processo.
Capítulo I – Enquadramento teórico
1.1 – O conceito de Bairro
Primeiramente, parece-nos oportuno definirmos o que se entende por Bairro. Pela
dificuldade em encontrar uma definição universal, citamos algumas fontes. Lefebvre,
citado por Bezerra (2011: 22) define-o como “…uma unidade natural da vida social
devido à ideologia comunitária inserida na sua base”. Ainda segundo o autor, o
conceito é identificado como “…uma simples divisão territorial de uma cidade”.
Tal como referido por Bezerra (2004: 23), no vocabulário organizado por Corona e
Lemos (1972) Bairro é analisado “…como uma das partes principais em que se
localiza a população de uma cidade ou mesmo uma porção do território de uma
povoação, mais ou menos separada e a semelhança com um arrabalde ou subúrbio”.
Para Ferreira (2004: 252), referido também por Bezerra, Bairro significa “…cada uma
das partes em que se costuma dividir uma cidade ou vila, para mais precisa orientação
das pessoas e mais fácil controle administrativo dos serviços públicos”.
Vemos nestas definições, unicamente a delimitação de um espaço físico por questões
administrativas, mas importa referir também que outros aspetos são importantes na
sua definição, como seja o aspeto cultural e de identidade dos indivíduos a uma
unidade espacial, conforme abordado no decorrer deste capítulo.
1.2 – Evolução da habitação social em Portugal
Para o desenvolvimento do presente trabalho, sentimos necessidade de recuar alguns
anos para perceber, muito sucintamente, como evoluiu a habitação social em Portugal
e o que origina o realojamento.
Os movimentos migratórios da população do interior para as grandes cidades,
sobretudo Lisboa, em busca de melhores condições de vida, resultaram na fixação
destas populações em bairros de barracas nos anos 60, 70 e 80, contribuindo assim
para a formação de habitações degradadas e com poucas condições de
habitabilidade, normalmente em locais com terrenos acidentados e de difícil acesso,
como é o caso do Bairro do Casal Ventoso. Eram locais onde não se pagava renda,
pese embora a falta de condições mínimas de habitabilidade e conforto. Esta transição
demográfica, fruto dos movimentos migratórios no nosso país, levou a um aumento
populacional nas grandes cidades e veio gerar alguns problemas sociais e um deles
foi precisamente a questão do alojamento. Neste contexto surgem nas grandes
cidades os primeiros bairros habitados pelas classes sociais mais desfavorecidas e de
baixos recursos económicos, que deram origem mais tarde aos ditos bairros sociais. A
periferia das cidades foi-se destacando por aglomerados habitacionais
desorganizados, na grande maioria clandestina (Bracons 2012).
Ainda durante o Estado Novo, a Política Social passou a ser provida diretamente pelo
Estado, nomeadamente pela publicação em 1933, do Decreto-Lei nº 23052, de 23 de
Setembro de 1933, sobre o Programa das Casas Económicas que surge da
instauração da noção de família, entendida como célula essencial do Estado Social e
Corporativo. E é o Estado em parceria com as Autarquias, que vai promover e
financiar a construção das referidas Casas Económicas, embora em dificuldades
financeiras e produtivas em que se encontrava. Este programa foi questão central da
política de habitação do Estado Novo, embora dele beneficiassem também populações
de estratos sociais com capacidade para adquirir habitações alternativas no mercado.
Desta forma quem mais beneficiou não foram os mais necessitados, mas sim quem
vivia acima da média nacional, deixando aos mais pobres, apenas o acesso a
programas marginais de realojamento ou deixados por conta de instituições de
caridade, pois eram vistos como elementos externos ao próprio sistema, com
necessidades de reeducação social e só depois então é que estariam aptos a usufruir
das conquistas do Estado Novo, nomeadamente das Casas Económicas (Bracons
2012).
Entretanto após o 25 de Abril de 1974, é criado o SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório
Local), que veio desenvolver projetos de habitação social e a sua construção para os
residentes em barracas nas zonas de Lisboa, Setubal e Porto. Mas foi já durante os
anos 80, que surge um dos mais importantes programas de realojamento, o PIMP
(Projeto de Intervenção a Medio Prazo), possibilitando à Câmara de Lisboa realizar
operações de realojamento. Durante a 2ª metade da década de 80, forma-se o
IGAPHE (Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado), com
competência para com as autarquias estabelecerem acordos com a finalidade de se
construirem respostas sociais de habitação condigna em regime de arrendamento,
para os residentes em barracas. (Em 2002 este Instituto foi fundido no INH (Instituto
Nacional de Habitação)). E é também durante esse período da década de 80 que em
Portugal, sob influência da adesão à CEE, que nas políticas sociais e de realojamento
se sente a influência de programas europeus de luta contra a pobreza com a
promoção da cidadania ativa, envolvendo as populações nos programas em curso.
Esta prática acentuou-se com os (PNAI’s) Planos Nacionais de Acção para a Inclusão
(Rodrigues 2012).
Em 1993, devido à insuficiência do PIMP, foi criado o PER (Programa Especial de
Realojamento, de que falaremos mais à frente, como medida para erradicar as
barracas e realojar os seus ocupantes em habitações condignas em regime de
arrendamento (Bracons 2012).
1.3 – O direito à habitação condigna
A questão da habitação social tem vindo a representar um aspeto fulcral da
providência do Estado. “O direito à habitação, constante da maior parte das
Constituições nacionais, força o Estado a uma intervenção em nome dos cidadãos
menos favorecidos em termos habitacionais, tentando deste modo reduzir a sua
situação de exclusão…” (Augusto 2000), reforçando o exercício de cidadania, a
inserção dos menos desfavorecidos e potenciando os laços sociais (Augusto 2000).
De acordo com o artigo “O Direito à Habitação”, apresentado no site (Associates,
2014), todos os cidadãos têm direito a um nível de vida condigno e neste sentido, a
habitação é fundamental para alcançar e suprir algumas das necessidades de caráter
físico, como o direito a um abrigo, a um espaço pessoal e privado e a um espaço
comum para uma família, “… que representa a unidade base da sociedade…”. Este é
um direito que assiste a todos em sociedade e está reconhecido como um direito
humano na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), no artigo 25º,
conforme se transcreve:
Artigo 25.º (DUDH)1. “Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à
sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade.”
Em termos de habitabilidade e conforme o mesmo site, “…uma habitação condigna
deve ser habitável em termos de proporcionar aos seus ocupantes, espaço adequado,
segurança, prover do frio, da humidade, do calor, da chuva, do vento e outros perigos
para a saúde, dos riscos devido a problemas estruturais e vetores de doença.”
Mas, seguindo as ideias apresentadas nesse mesmo site, em todo o mundo continuam
a existir indivíduos sem-abrigo e pessoas a viver em habitações indignas e esta
situação espelha claramente a enorme dificuldade dos Estados garantirem este tão
importante direito de qualquer ser humano e leva-nos a questionar até que ponto são
os governos os únicos responsáveis em atribuir a todos de igual modo “… terra, quatro
paredes e um telhado” (Associates 2014). Sobre este aspeto, a questão essencial é
precisamente o que é que o Estado deverá fazer para que sejam os próprios
indivíduos a exercerem os seus direitos e dessa forma obterem a sua habitação,
nomeadamente, aumentar o acesso à educação e ao mercado de trabalho, pois estes
são fatores que geralmente facilitam e potenciam o acesso à habitação. Claro está que
devem ser consideradas as exceções como incapacidades físicas, emocionais,
sociais, etc e nestes casos, o acesso à habitação deve ser provido pelo Estado de
forma a que todos os cidadãos sem distinção possam atingir a plena satisfação dos
seus direitos.
1.4 – O realojamentoIniciando este ponto pela definição do conceito de realojamento e procurando
novamente no Dicionário Priberam da língua portuguesa, percebemos que este
vocábulo não existe. Existe o termo realojar que significa voltar a alojar ou a alojar-se
noutro local. Tanto quanto entendemos, trata-se obviamente de um processo e nas
palavras de Cardoso, 1993, citadas por Carapinha, 2010, “apresenta-se como um
processo de reestruturação da vida quotidiana e de um conjunto de práticas ligadas ao
meio de residência dos indivíduos, […] às quais está subjacente a passagem para um
novo quadro de vida e uma adaptação a esse novo quadro.” O realojamento é um
processo de “urbanização à força”, conforme mencionado (Bairro do Cabrinha/ Casal
Ventoso – processo de Realojamento)
A vivência de um processo como este, leva muitas vezes à rotura de vínculos dos
indivíduos, com todo o seu ambiente físico e social, provocando um desequilíbrio
emocional que importa não descurar requerendo algum cuidado no processo de
transição e readaptação destas pessoas. Essa readaptação só poderá ser bem
sucedida e eficaz, se forem contempladas todas as identidades socioculturais de cada
um, as redes de relações anteriormente construídas, os laços sociais criados assim
como os projetos e estratégias de vida pessoais (Rodrigues 1989 citado por Cardoso
& Perista 1994 mencionado por Carapinha 2010).
Um processo de realojamento tem como principal objetivo, resolver os problemas
relacionados com habitações degradadas e de indigna habitabilidade, mas tem sido
um processo ineficiente no que diz respeito ao combate à pobreza e exclusão social,
acentuando até, as desigualdades sociais, referido por Carapinha, 2010.
Na construção de bairros para realojamento, os modelos urbanísticos de habitação,
têm sido alvo de muitas críticas, conforme expõe Carapinha, 2010, (citando Ferreira
1994 citado por Freitas 1995), nomeadamente pela
“…aridez e uniformidade da arquitetura; uso de materiais desvalorizados;
escassez ou ausência de espaços públicos e de equipamentos; ausência de
arranjo dos espaços exteriores; ocupação sem conclusão das infra-estruturas;
ausência ou deficiências de transportes públicos; localização em zonas
periféricas, estigmatizadas e segregadas do restante tecido urbano.”
Na nossa opinião e fundamentados pelas palavras de Carapinha, 2010, referindo
Guerra, 1994, os programas de realojamento que têm vindo a ser realizados, não têm
tido o sucesso que se desejaria, não só mas também por via de se ter em conta
apenas os aspetos financeiros e urbanísticos, descorando o papel ativo das
comunidades, das suas histórias e vivências anteriores, como se as pessoas fossem
objetos que se transportam de um lado e se depositam noutro.
1.5 – O Plano Especial de Realojamento (PER)De acordo com o Portal da habitação, o Programa PER, foi criado pelo Decreto-Lei nº
163/93, de 7 de Maio (última alteração através do Decreto-Lei nº 271/2003, de 28 de
Outubro, com o objetivo de proporcionar às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto,
condições para que estes dessem início à erradicação das barracas (que proliferaram
com os movimentos migratórios em Portugal), nos seus concelhos e realojassem estas
comunidades em habitações de custos controlados. Desta forma, eram concedidos
apoios financeiros para que se construíssem, adquirissem ou arrendassem fogos
destinados a realojar os agregados familiares, vindos de bairros de barracas.
Podem ainda, ao abrigo deste programa, ser concedidos apoios financeiros para a
reabilitação, ou aquisição de fogos ou prédios devolutos e pagamento dos custos com
obras de recuperação, desde que estes edifícios se destinem ao mesmo fim
anteriormente referido, ou seja, o realojamento de famílias recenseadas no PER. Este
programa tem incidência especificamente nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto,
embora possam também os restantes municípios do país, proceder a ações de
realojamento em habitações sociais construídas ou adquiridas com o apoio da
Administração Central e instituições bancárias, com financiamentos bonificados. No
âmbito do PER, têm acesso a financiamento “…os municípios aderentes e as
respetivas empresas municipais, as Instituições Particulares de Solidariedade Social,
as pessoas coletivas de utilidade pública administrativa que prossigam fins
assistenciais, as cooperativas de habitação e construção, e os agregados familiares
registados no levantamento efetuado pelos Municípios”. Também as famílias
abrangidas pelo Programa PER e com vista a acelerar o processo de erradicação das
barracas, podem beneficiar do Programa PER-FAMÍLIAS, que lhes permite comprar
casa para habitação permanente, segundo a dimensão do seu agregado familiar, em
local à sua escolha, assim como efetuar obras de reabilitação destinada à sua
habitação permanente. Também e desde que se destinem ao realojamento, as
instituições Particulares de Solidariedade Social, podem aderir ao PER, sendo que as
demolições das barracas em questão fiquem a encargo destes. As Instituições
Particulares de Solidariedade Social têm igualmente acesso aos meios de
financiamento previstos da mesmas forma que os Municípios. Complementarmente os
municípios ou as Instituições Particulares de Solidariedade Social podem celebrar
acordos ao PER, no âmbito do Programa Nacional da Luta contra a Pobreza. São
acordos que visam a inserção social dos agregados familiares a realojar, em que os
todos os encargos são comparticipados até um máximo de 80% a fundo perdido, pelo
Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (Portal da Habitação).
Conforme referido por Carapinha, 2010, segundo Cachaço, 2009 este plano visava
fundamentalmente, a erradicação das barracas, a envolvência vincada dos municípios
nos processos e potenciar uma mudança no estilo de vida característico dos bairros
degradados.
Capítulo II – Contextualização do Bairro do Casal Ventoso
2.1 – O Casal Ventoso
O Bairro do Casal Ventoso correspondia a uma área residencial do concelho de Lisboa
que se estendia “ao longo da zona mais baixa e íngreme” de “uma das encostas do
Vale de Alcântara, ocupando cerca de 10 ha” e inseria-se na freguesia do Santo
Condestável (criada em 7 de Fevereiro de 1959). Era “habitado por classes populares
[…] e […] marcado pela degradação habitacional e ambiental, pelo uso de materiais
provisórios na habitação e por défices, quer infra-estruturais, quer de redes de
abastecimento” (Chaves 2013: 31-32).
Inicialmente era designado por Castelo Ventoso (referência de 1837 num mapa de
Lisboa). “A existirem [vestígios de habitações] não passariam, porventura, de barracas
onde se armazenavam alguns utensílios e produtos agrícolas sem finalidades de
alojamento.” (Chaves 2013: 44).
Chaves refere que as edificações do Bairro eram de baixo custo tecnológico,
transformadas gradualmente de barracas em casas e, em alguns casos, estavam
sobrepostas e interligadas. O universo habitacional constituía-se fechado e
autocontido. Segundo o autor, a estimativa mais credível relativamente ao universo
populacional indicava 3653 habitantes em alojamentos (Chaves 2013: 34).
O Bairro não consistia “num lugar de trânsito, nem para peões, nem para automóveis”
não sendo habitual a entrada de forasteiros existindo “no seu interior, escassas,
degradadas e imbrincadas vias pedonais” (Chaves 2013: 33).
2.3 – A fixação no Casal Ventoso e as suas características habitacionais
Chaves (2013: 45) refere que as alterações no quadro ecológico do Vale de Alcântara
e das áreas circundantes (por exemplo a linha do comboio e as alterações nas redes
de acesso), registadas a partir da década de 1880, tiveram impacto no tecido
habitacional do Bairro do Casal Ventoso que se torna “atractivo” pelos acessos viários
que circundam a sua localização geográfica dando-se começo a “um processo
imparável de reconstrução dos solos”.
A população que se fixa no Bairro oriunda dos movimentos migratórios de finais do
século XIX com o objectivo primeiro de fugir à “miséria dos campos”, apresenta “uma
grande dispersão dos locais de proveniência geográfica” que para além de outras
áreas de Lisboa são “os distritos de Viseu, Castelo Branco e Guarda os principais
responsáveis por estes surtos” (Chaves 2013: 39, 54).
Os primeiros anos do século XX corresponderam à fase inicial de construção do
Bairro (Chaves 2013: 46). A instalação no Bairro não constitui um processo linear,
tendo sido antecedida por “outras tentativas para se obter alojamento no espaço
urbano” sendo que o alojamento no Casal Ventoso significava “descer ao mais baixo
patamar da hierarquia residencial”. O “contexto de grande debilidade económica [tanto
para os arrendatários como para os construtores-senhorios-p.49] com repercussões
legíveis na própria forma de habitar” é a característica comum aos diferentes
processos de fixação no Bairro. Pela dificuldade em conseguirem por si próprias
suportar o valor da renda da habitação, ainda que mais baixa comparativamente a
outras zonas da cidade, “as famílias envolviam-se, muitas vezes, em processos de
coabitação, de coaluguer ou de sublocação”. Segundo Chaves, algumas famílias
alojaram-se no Bairro devido a processos de despromoção social que se traduziam
assim em percursos de despromoção espacial (Chaves 2013: 54-56).
Para além da impossibilidade financeira de habitar noutras zonas da cidade, a
proximidade dos locais de trabalho pela reduzida mobilidade espacial da altura era
também motivo de fixação no Bairro. Assim, a permanência no Bairro passava por
uma questão de sobrevivência “numa situação extrema de privação, próxima, em
alguns casos, dos limites da subsistência física”. As condições habitacionais daqueles
indivíduos “favoreciam o incremento de surtos epidémicos” (Chaves 2013: 57).
Chaves refere que foram “responsáveis pela densificação da área residencial e por
uma maior resistência do tecido habitacional contra as intempéries” a prática de
estratégias de melhoria da condições habitacionais como o alargamento das casas e a
transformação das barracas em casas “através do emprego de materiais mais sólidos”
(Chaves 2013: 56).
É, aproximadamente, por volta de 1910 que se estabelece o “limiar da construção do
Casal Ventoso enquanto «processo legal». A partir desse momento, a situação
começará a ser caracterizada, maioritariamente ou totalmente, pela clandestinidade”
(Chaves 2013: 47).
“[…] O Bairro enquanto edificação sustentada sobre princípios de ilegalidade”
apresenta dois períodos diferentes. Um que vai desde a ascensão das primeiras
edificações clandestinas até à década de 30, no qual o Estado ainda não tinha
desenvolvido mecanismos para dar respostas a uma problemática recente. Neste
período, “esbate-se o problema da ilegalidade da ocupação [pela existência de
processos iniciais de loteamento], ficando por resolver a questão da ilegalidade da
construção”. No segundo período, desde a década de 30 até 1945, “a tolerância
relativa que o Estado demonstrara para com a construção clandestina diminui”. Estes
dois períodos distinguem-se pelo “controlo exercido sobre a clandestino”. A construção
clandestina distingue-se assim por duas valências: (1) “a construção […] antecedida
pela aquisição dos respectivos lotes não urbanizados” e (2) a “apropriação ensaiada
directamente sobre terrenos abandonados, onde a construção parecia impossível”
(Chaves 2013: 49-50).
O período entre 1919 e 1945 “é sobretudo caracterizado pela autoconstrução” que
resultou de duas formas distintas: (1) o “alargamento das construções já existentes,
promovida pelos locatários e pelos senhorios” e (2) a “construção clandestina,
concebida de raiz pelo morador” (Chaves 2013: 49).
Embora o Bairro fosse inatractivo para investimentos habitacionais, as “formas
embrionárias de construção clandestina traduziam as potencialidades económicas e
as próprias aspirações à habitação deste tipo de populações” numa altura “em que se
verificava uma ausência de programas de habitação social” (Chaves 2013: 50).
No final da década de 40, o Casal Ventoso apresentava-se próximo da sua forma
final constituído por três “Casais”: Casal Ventoso de Cima, Casa Ventoso de Baixo e
Viúva Teles (Chaves 2013: 51).
Desde a edificação do Bairro até ao princípio da década de 50, “[…] não existiam,
de forma generalizada […] ocupações ilegais, mas sim algumas práticas ilegais” como
furto de produtos alimentares (Chaves 2013: 61, 63).
Na segunda metade da década de 50, “a construção em altura, a construção de
anexos e o prolongamento das casas foram, fundamentalmente, orientados para o
alojamento de descendentes” e verificou-se a “redução das zonas onde a edificação
era ainda possível” devido às profundas alterações no Vale de Alcântara (construção
da ponte 25 de Abril e da Avenida de Ceuta) que provocou o desmantelamento de
algumas barracas. Assim, verificaram-se “processos de realojamento que foram
dirigidos essencialmente para as zonas de Musgueira e Chelas” (Chaves 2013: 64).
Por esta altura, a “transformação das redes viárias decorreu em paralelo com […] o
declínio industrial do Vale de Alcântara” que gerou despedimentos e o “aumento da
dificuldade de obtenção de emprego nessa área” afectando assim a população do
Bairro que se traduziu num número significativo de desempregados de longa duração.
Nesta época, “a qualificação e a especialização laboral converteram-se em elementos
bastante mais decisivos para a obtenção de trabalho” (Chaves 2013: 64-65).
Neste período (segunda metade da década de 50 a inícios da década de 70) ,
associa-se a prostituição e o proxenetismo às práticas ilegais que parte das pessoas
desenvolviam “em simultâneo com ocupações legais” que lhes facultava “rendimentos
indispensáveis à sobrevivência fisiológica”. Chaves refere que se constituía “uma
espécie de triângulo da sobrevivência cujos vértices correspondiam às várias
possibilidades de obtenção de rendimentos num contexto de marginalidade
económica: trabalho legalmente reconhecido; actividades ilegais; penhora,
mendicidade e fiado” (Chaves 2013: 67).
Desde o início da década de 70 ao início da década de 80, verificou-se “uma
melhoria na generalidade da área edificada que correspondeu à construção de vários
anexos. Esse facto conduziu, em simultâneo com o fornecimento de electricidade,
serviço de esgotos e água canalizada, a um melhoramento das condições
habitacionais de muitos habitantes, o que não significa, contudo, que uma parte
significativa dos alojamentos não tivesse prosseguido um processo de degradação
acelerado” (Chaves 2013: 71).
Se“De facto, se, no início do processo de edificação, o Casal Ventoso foi
temporariamente encarado pela edibilidade camarária como uma solução urbanística
para o alojamento de um determinado tipo de populações migrantes particularmente
desprovidas de recursos económicos, algum tempo depois ele emergia já como o
exemplo extremado de um «bairro difícil», depreendendo-se isso mesmo dos diversos
planos de melhoramento ou dos planos para a construção de um bairro novo de que
temos notícia: em finais da década de 40, finais da década de 60 e ainda
imediatamente a seguir ao 25 de Abril de 1974. Ao procurar intervir neste tipo de
bairros enquanto localidades onde diversos «problemas» da sociedade global
adquirem uma expressão espacial”, o Estado apresentou alternativas como o
alojamento da população noutras zonas da cidade ou a melhoria das condições de
habitabilidade (Chaves 2013: 76-77).
Apesar das propostas apresentadas, a intervenção do Estado é praticamente
inexistente no Casal Ventoso desde a sua génese até ao início da década de 80. As
transformações ocorridas no Bairro como a construção de infra-estuturas viárias
decorrem das modificações da zona de Alcântara na década de 50 e acentuam-se no
pós-25 de Abril com a criação de um balneário público e o abastecimento de água, luz
e serviço de esgotos à maior parte da população (Chaves 2013: 78-79).
2.4 – A exclusão social
Chaves recorre ao “conceito de estigma para caracterizar as representações
largamente maioritárias que a sociedade global produz acerca de uma dada região do
espaço urbano” (2013: 71). Relativamente ao Casal Ventoso o autor realça três
aspectos (2013: 71-72):
a) “dizer que uma região é estigmatizada é o mesmo que afirmar que, para todo o
observador exterior […] a diversidade e a complexidade internas dessa região são
reduzidas […] a uma única característica [socialmente construída e concebida como
problema social] valorizada de forma negativa”;
b) “a região que transporta esse estigma não é apenas portadora do problema, mas
é também concebida enquanto símbolo desse problema”;
c) cada indivíduo associado ao Bairro transporta o estigma individualmente, ou seja,
“o seu portador possui virtualmente o «problema» que se atribui à região por
inteiro”.
O estigma associado ao Casal Ventoso é praticamente tão antigo quanto o próprio
Bairro não incidindo sempre nas mesmas construções sociais. “O Casal Ventoso
transportou vários estigmas, ou seja, foi símbolo de vários problemas que se
sucederam no tempo” (Chaves 2013: 73). “De um estigma baseado na «miséria»
transita-se progressivamente para um estigma baseado na «delinquência».” (Chaves
2013: 75). “À semelhança da estigmatização produzida pelos lisboetas, o Estado
central e a autarquia passam progressivamente a conceber o Bairro como um grave
«problema urbano e urbanístico».” (Chaves 2013: 76).
A “conjuntura de crise do sistema produtivo da primeira metade da década de 80”
gerou “um agravamento das taxas de desemprego a nível nacional” e o aumento da
precariedade laboral que penalizaram a população do Bairro pelos baixos níveis de
qualificação e especialização. Devido a estes processos, registou-se “uma maior
desvinculação relativamente a mercado de trabalho legal” sendo que, “a partir da
década de 90, quer aqueles que ficaram desempregados, quer aqueles que pura e
simplesmente prescindiram da sua inserção no mercado legal, encontraram fontes de
rendimento numa nova actividade ilegal disponível”, o tráfico de drogas que permite “a
obtenção de rendimentos muito superiores aos que se podem auferir das ocupações
legais disponíveis” (Chaves 2013: 93-95).
O Bairro do Casal Ventoso “constitui até à década de 80 um paradigma de uma área
com um «panorama de problemas multifacetado», a partir da década de 90 este foi
enriquecido com mais um: o do narcotráfico. A sobreposição de «problemas» numa
mesma área […] elevaram-no [o Bairro], nas representações colectivas, a uma espécie
de fonte endémica geradora de problemas para a cidade” deixando de “consistir um
mero exemplo para se converter progressivamente num símbolo do «problema da
droga», ou mesmo numa grande parte do «problema em si»” (Chaves 2013: 101-102).
Assim, “um processo de estigmatização que incida sobre o espaço do Bairro incide
também sobre cada um dos seus moradores individualmente a não ser que cada um
deles oculte, quando tal se afigura possível, a sua zona de residência” (Chaves 2013:
105).
Nas palavras de Augusto (2000):
“Os bairros sociais acabam por reconstruir espaços de aglomerados de
pobreza urbana, concentrando no seu interior os principais grupos de risco e
contribuindo para uma interiorização da exclusão, com consequências
previsíveis, inclusivamente, na socialização para o desvio. Não estranha,
portanto, a associação que mecanicamente as populações urbanas
estabelecerem entre bairro social e desvio, criminalidade ou delinquência.”
2.3 – O desmoronar do bairro
Pela convergência de diferentes problemáticas que tornaram a realidade do Bairro
“num emblema de degradação física e humana, […] a sua reabilitação e o
realojamento dos seus residentes” tornaram-se prioridade (Sampaio citado por Soares
2010: 16). “A construção da Avenida de Ceuta levou à maior exposição de toda a
encosta onde se localizava o bairro, pondo em evidência os seus problemas
urbanísticos e sociais que faziam […] com que esta zona fosse fortemente
estigmatizada e excluída da cidade.” O Bairro foi então demolido, sendo os seus
habitantes realojados entre 1999 a 2002 no âmbito do Programa Especial de
Realojamnento (PER) financiado pelo Programa de Iniciativa Comunitária (PIC)
URBAN I (1994-2001) (Soares 2010: 16).
Capítulo III – O realojamento na Quinta do Cabrinha
3.1 – O Processo de Realojamento
No Quadro Comunitário de Apoio II (QCA II) caracterizava no Plano Estratégico de
Lisboa (PEL) da Câmara Municipal de Lisboa (CML), a zona do Bairro do Casal
Ventoso como “uma zona de intervenção prioritária devido à degradação física das
habitações e do espaço urbano envolvente, acompanhada de uma forte degradação
social.”
Ainda de acordo com a caracterização inicial da zona de intervenção do QCA II a CML
realizou um levantamento das infraestruturas básicas e condições de habitabilidade
em 1992 tendo detetado “cerca de 39% das habitações das habitações não
dispunham de água canalizada, 27% não estavam ligadas à rede de saneamento
básico e 9% não dispunham de luz eléctrica. E cerca de 42% não estavam equipadas
com cozinha, e só cerca de 48% dispunham de casas de banhos.” Houve necessidade
de realizar um inquérito local específico, entre 1992/93 que veio a confirmar a
estabilidade da população residente dos dados de 1982. Cerca de 4300 pessoas.
A CML apresentou então uma candidatura ao Programa de Intervenção Comunitária
(PIC) URBAN II, programa comunitário que tinha como objetivos:
“1) promover a melhoria da qualidade de vida das populações de centros urbanos ou
de subúrbios em crise das grandes cidades, pela formulação e a aplicação de
estratégias inovadoras de revitalização sócio-económica sustentável;
2) fomentar o desenvolvimento e o intercâmbio de conhecimentos sobre a
revitalização e o desenvolvimento urbano sustentável.”
Além desta candidatura apresentou também uma candidatura no âmbito do Plano
Especial de Realojamento (P.E.R.). O Programa Especial de Realojamento visava
proporcionar aos municípios condições para proceder à erradicação das barracas
existentes e ao, consequente, realojamento dos seus ocupantes em habitações de
custos controlados. O PER para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto foi criado
pelo Decreto-Lei nº.163/93 de 7 de Maio, tendo a sua última alteração através do
Decreto-Lei n.º 271/2003, de 28 de Outubro, e visava proporcionar, aos municípios
daquelas áreas, condições para proceder à erradicação das barracas existentes,
concedendo apoios financeiros para a construção, aquisição, ou arrendamento de
fogos destinados ao realojamento de agregados familiares residentes nessas barracas
e habitantes similares.
Devido à ligação destes projetos de reconversão e realojamento do bairro do casal
ventoso e de vários apoios, foi necessário criar o “Gabinete de Reconversão do Casal
Ventoso”. Este foi criado através do decreto-lei nº 262/95 de 4 de outubro (Anexo I)
com o intuito de realizar o enquadramento institucional do projecto e fazer a ligação
entre Estado e C.M.L.
Ainda nos anos 1980, cabe também referir o Plano de Intervenção a Médio Prazo
(pimp), que projetava o realojamento de famílias residentes em habitações precárias.
Legislado em 1987 (Decreto-Lei n.º 226/87 de 06-06-1987), deu origem à construção
de 9698 fogos até 1993 (Farina, 2001, p. 57)
O Programa PIMP - Plano de Intervenção a Médio Prazo
O Enquadramento legal do PIMP remete para os Decreto-Lei 110/85 de 17 de Abril,
366/85 de 11 de Setembro e 226/87 de 6 de Junho. O Programa surge no âmbito de
um quadro de investimentos sujeitos ao regime de coordenação e cooperação entre
Estado e Autarquias, definindo as linhas de colaboração em matéria de investimento e
promoção de habitação social. A promoção de habitação social para erradicação de
barracas implicava o realojamento das famílias mediante um planeamento a médio
prazo e baseava-se no levantamento prévio exaustivo das situações existentes de real
carência habitacional. Previa a comparticipação de 50% a fundo perdido pelo IGAPHE
e o recurso ao financiamento do INH para os restantes 50%. Foi o primeiro dos
Programas de Realojamento do Município de Lisboa que visava de forma planeada e
sustentada a erradicação das cerca de 20.000 barracas da cidade de Lisboa.
A CML no seu Relatório Final do programa de Realojamento do PER e PIMP define os
critérios de realojamento (ANEXO II) e o mapa de recenseamento inicial do PER onde
constavam 338 famílias (ANEXO III) em condições de serem realojadas.
Entre 1998 e 2002 foram construídas no âmbito do programa URBAN e PER 972
fogos, tendo a construção da Quinta do Cabrinha com 248 fogos ficado concluída em
1998.
No seu “Relatório Final dos Programas de Realojamento do PER e PIMP” o Pelouro
da Habitação da CML descreve o processo da seguinte forma:
“O realojamento de 248 famílias na Quinta do Cabrinha foi o primeiro do
processo de reconversão do Casal Ventoso.”
“PROGRAMA DE CONSTRUÇÃO – 1.ª Fase: Programa Especial de Realojamento
(PER) para construção de 10 edifícios (248 fogos) na Quinta do Cabrinha, concluída
em 1998; 2.ª Fase: PER para construção de 8 edifícios (205 fogos) na Av. de Ceuta
Sul, concluída em 2001; 3.ª Fase: PER para construção de 18 edifícios (395 fogos) na
Av. de Ceuta Norte, concluída em 2002, 4 edifícios (64 fogos) na Rua Maria Pia,
concluída em de 2002; 6 edifícios (100 fogos) no Casal Evaristo (só foram concluídos
3 edifícios – 60 fogos) em 2002. O realojamento do Casal Ventoso foi ainda efectuado
no âmbito no Programa URBAN II.
REALOJAMENTO – 1.ª Fase: Famílias realojadas em 1999, oriundas do Casal
Ventoso de Baixo; 2.ª Fase: famílias realojadas em 2001, oriundas do Casal Ventoso
de Cima e de Vilas existentes na zona da Maria Pia e da Meia-Laranja; 3.ª Fase:
realojamento local, em 2002, de famílias maioritariamente residentes no Casal
Ventoso de Cima.
INÍCIO GESTÃO DA GEBALIS – De 1 de Julho de 2002 a 30 Dezembro de 2003, em
gestão mista com a CML; gestão global desde 1 de Janeiro de 2004
Nº DE HABITANTES – 3.916
Nº DE LOTES – 71
Nº DE FOGOS EXISTENTES – 1.152
Nº DE FOGOS GERIDOS GEBALIS – 1.022
EQUIPAMENTOS LÚDICOS/DESPORTIVOS – Piscinas Municipais e Ringue; Parque
Infantil”.
3.2 – A (Re)Construção de uma nova identidade e o apoio social no processo de
inclusão.
Para Amartya Sen pobreza é “a habilitação, que permite o acesso de que os
indivíduos podem dispor, e a capacidade para que estes possam funcionar e tentar
encontrar as condições ideais que desejam.” Sen, (1999) citado em Perista, (2010).
De uma forma mais simples podemos concluir que pobreza como a carência de
recursos.
Carmo (1996) refere-se à pobreza como “nível mínimo de subsistência, isto é, estimar
o montante mínimo de rendimento que o indivíduo necessita para ter acesso às coisas
essenciais à vida.”
Pobreza e exclusão social não são a mesma coisa, sendo que a pobreza é uma forma
de exclusão social.
Como exclusão social podemos definir como “um fenómeno que provoca
desigualdades no que refere ao acesso ao mercado de trabalho, a uma pensão de
reforma, que permita a subsistência de quem a aufere, a um rendimento suficiente
para cobrir todas as despesas essenciais, a uma habitação condigna e com o mínimo
considerável de condições.” Carmo (1996).
A Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social é uma das iniciativas
emblemáticas da estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável
e inclusivo. in http://ec.europa.eu/social/main.jsp?catId=961&langId=pt
Segundo o site do Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu (IGFSE) “a inclusão
social visa a integração social e profissional dos mais vulneráveis, na sociedade e no
mercado de trabalho, através de respostas sociais adequadas que conduzam ao
apetrechamento destas pessoas em maior risco de exclusão, com as competências
necessárias ao exercício de uma cidadania ativa (isto é, através da aquisição de
aptidões sociais e profissionais relevantes que facilitem a plena integração dos mais
desfavorecidos) ”.
A partir da visão do que é a exclusão social podemos indicar cinco fatores de
exclusão: Habitação, Família, Educação, Saúde, Emprego e Desemprego.
Habitação - Poderemos considerar que as condições de habitabilidade das pessoas
são muitas vezes fatores de exclusão social. Como vimos anteriormente a carência de
recursos leva a que as pessoas sem condições financeiras para arrendar ou comprar
uma casa escolhessem (por exclusão de partes) viver em casas ou barracas sem
aquilo que se considera ser o mínimo adequado à vida humana.
Família – A transmissão de valores de pobreza é uma forma continuada deste
fenómeno. A forma como as famílias vivem o estado de pobreza, determina muitas
vezes o futuro das crianças nascidas no seio destas famílias, quer através da ausência
de recursos disponíveis, quer através de aspectos sociais e culturais que determinam
os modos de vida em situação de pobreza.
Educação – No seio da população pobre é possivel encontrar fracos níveis de
escolaridade, o que constitui uma enorme para a integração no mercado de trabalho.
Existe uma relação entre educação e pobreza que pode ser vista de uma forma de
certo modo como se de um ciclo vicioso se tratasse. As pessoas são pobres porque
não investiram em si próprias na sua educação. Por outro lado os pobres possuem
escassez de recursos que possam aplicar na sua formação. Assim, podemos afirmar
que os baixos níveis de escolaridade intensificam a vulnerabilidade da pessoa face à
pobreza e à exclusão social.
Saúde – Sendo pobres e existindo uma escassez de recursos, este leva a uma
alimentação deficiente e a uma quase ausência cuidados de saúde primária que os
pobres geralmente apresentam. É consensual que os pobres estão mais expostos à
doença porque apresentam uma maior exposição e vulnerabilidade face ao risco de
contraírem doenças. Verificamos então que o estado de saúde influencia directamente
o nível de rendimento das pessoas e das famílias através da apresentação de uma
fraca produtividade e de um aumento de gastos efectuados com os cuidados médicos.
Emprego e Desemprego – Nem sempre podemos considerar que uma pessoa por ter
um emprego não se pode encontrar em risco de exclusão social. Os empregos
precários com baixos salários e más condições, aliados à baixa escolaridade e levam
consequentemente ao barramento de profissões onde poderiam auferir de mais
rendimentos. Observa-se que entre os pobres ganhar um salário não chega muitas
vezes para cobrir as despesas para que possam ter uma vida condigna. Da mesma
forma o desemprego tem que ser visto como uma forma de exclusão social pela
ausência de recursos. Por entre este tipo de população o desemprego de longa
duração tende a ser maior que a média.
Quando falamos de construção ou reconstrução de uma nova identidade no
realojamento dos habitantes do Bairro do Casal Ventoso para a Quinta do Cabrinha
queremos referenciar que tanto pessoas como as famílias do Casal Ventoso deverão
passar a ter outro tipo de condições além duma nova habitação. É por isso uma
oportunidade de realizarem mudanças positivas nas suas vidas. A reabilitação urbana
sem reabilitação social não faz sentido.
Desta forma o programa PIC-URBAN II prevê mais alguns eixos de intervenção que
promovam a inclusão social: “a)Promover a reconversão gradual do bairro de origem
espontânea pertencente à 1ª geração de bairros clandestinos surgidos em Lisboa, em
simultâneo com a sua integração no tecido urbano envolvente revitalizando o carácter
urbano da zona - esta prioridade inclui um conjunto de operações de renovação
urbana de espaços públicos, destinados a elevar a qualidade do espaço público na
zona. b) Reforçar os equipamentos colectivos através da promoção de actividades
sociais, culturais e desportivas. Sendo que os projectos neste âmbito centram-se na
criação de condições básicas para que os agentes locais actuem como promotores
sociais da cidadania, da integração social e da solidariedade entre os grupos menos
favorecidos. c) Combater a exclusão social e as causas de marginalização e
insegurança do bairro através da erradicação do tráfico, do consumo de droga e
desenvolvimento de programas para a criação de emprego, formação profissional e
apoio às instituições que levem à integração social e qualificação profissional - as
medidas neste âmbito visam a elevação das qualificações profissionais da população
local, a promoção do trabalho por conta própria, a constituição de microempresas e a
prevenção e o tratamento de casos de toxicodependência na população local.”
Relatório Final de Execução - PIC URBAN II. (2009).
A estruturação do espaço público, a criação de infraestruturas e de um novo ambiente
urbano, a criação de espaços para novas actividades económicas, o apoio ao auto-
emprego e empreendedorismo e a criação de estruturas lúdicas como Piscinas
Municipais e Ringue e Parque Infantil levam a que se encontrem criadas condições na
Quinta do Cabrinha que promovam a inclusão social.
A C.M.L. através da GEBALIS (gestora dos bairros sociais) promove a ocupação por
parte de entidades e parceiros sociais que desenvolvam projetos de apoio social
através da cedência a rendas muito baixas das lojas dos edifícios tal como o “projeto
Alkantara”; Gabinete de Inserção Profissional ‐ Delegação Regional de Lisboa e Vale
do Tejo; Crescer na Maior - Associação de Intervenção Comunitária; Associação de
Lares Familiares p/ Crianças e Jovens “Novo Futuro”; A ARIA - Associação de
Reabilitação e Integração Ajuda; Banco de Bens Doados; Entreajuda; Associação
Desportiva “Aguias Recreativo Clube”; Programa BIP-ZIP (CML)
Capítulo IV – Análise Empírica
4.1 – Objectivos e questões da investigação
4.2 – Seleção da amostra
4.3 – Procedimentos de recolha da amostra
Capítulo VI – Conclusões
6.1 – aaa
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Carmo, H. (1996), “Exclusão Social – Rotas de Intervenção”, Instituto Superior de Ciências
Sociais e Politicas. I.S.C.S.P.
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consultado no dia 14 Maio 2014. URL : http://sociologico.revues.org/165 ; DOI :
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Relatório Final de Execução - PIC URBAN II. 2009 em http://www.ccdr-lvt.pt/uploader/index.php?action=download&field=http://www.ccdr-lvt.pt/files/a6e7c1e83795b6f91a887d56dfbf603d.pdf&fileDesc=Relatorio_Execucao_Final_PIC_URBANII-2009, acedido em 24 de abril de 2014
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ANEXOS
ANEXO I
ANEXO II
ANEXO III
ANEXO IV
Gráfico 1 Gráfico 2
Gráfico 3 Gráfico 4
Gráfico 5 Gráfico 6
Gráfico 7 Gráfico 8
Gráfico 9 Gráfico 10 10100001
Gráfico 11Gráfico 12
Gráfico 13 Gráfico 14
Gráfico 15 Gráfico 16
Gráfico 17
Gráfico 18
Gráfico 19
Gráfico 20 Gráfico 21
Gráfico 22 Gráfico 23