Post on 24-Jul-2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências - Campus Bauru
Licenciatura em Pedagogia
Trabalho de Conclusão de Curso
MIRIAN SANCHES
A IMPORTÂNCIA DO JOGO SIMBÓLICO NA
INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA COMO FORMA
DE ENRIQUECIMENTO NO PROCESSO DE
ENSINO-APRENDIZAGEM
BAURU
2007
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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências - Campus Bauru
Licenciatura em Pedagogia
MIRIAN SANCHES
A IMPORTÂNCIA DO JOGO SIMBÓLICO NA
INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA COMO FORMA
DE ENRIQUECIMENTO NO PROCESSO DE
ENSINO-APRENDIZAGEM
Pesquisa apresentada como requisito para a Conclusão do Curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências - UNESP Campus Bauru - sob a orientação da Profª. Ms. Karla Paulino Tonus.
BAURU
2007
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Agradecimentos
Primeiramente a Deus, meu Tudo, minha Vida, meu Pai e íntimo Amigo que a todo o
momento me ajudou a ultrapassar os obstáculos, perseverar e acreditar, iluminando-
me para que fosse possível a realização e a conclusão deste trabalho.
A minha estimada Família, que com afeto, carinho e muita paciência compreenderam
os quatro anos de minha ausência, ajudando-me intensamente com dedicação e amor
no percurso da minha trajetória acadêmica, pessoas que faço menção, como forma de
prestigiá-las com um pedacinho singelo da minha profunda gratidão:
cunhado Sérgio Ricardo da Cruz Quinezi, casado com minha irmã Vanessa Sanches
Cruz Quinezi; cunhada Renata Cristina da Costa Silveira Sanches, casada com meu
irmão Ricardo da Silveira Sanches, em que não posso deixar de mencionar a imensa
alegria que minha cunhada e meu irmão preencheram em meu coração presenteando-
nos com a vinda do meu grande tesouro, meu amor, minha princesa, razão do meu
viver, Yasmin Maria da Costa Silveira Sanches(hoje com 3 anos e 8 meses);
a minha amada mãe, Telma Teresinha da Silveira Sanches, por sua abnegação,
incentivo e apoio, atitudes infinitamente especiais e inesquecíveis e como também, não
fazer referência ao meu pai, Ariomar Luiz Sanches, que mesmo com seu jeito reservado
e austero, muito contribuiu para que eu chegasse até o fim!
Além dos meus preciosos padrinhos, Carlos Alberto Balarin e Jussara Aparecida da
Silveira Balarin, bem como, minha prima-irmã Jacqueline da Silveira Balarin;
principalmente aos meus saudosos, admirados e muito amados avós maternos, Joaquim
Antonio da Silveira Lazaro e Almira Gonçalves da Silveira, que apesar de não ter dado
tempo de em vida me verem concluir a Faculdade que tanto queriam participar, do
céu, deram-me forças para eu não desistir do meu sonho!!
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Dedicatória
A minha querida amiga e companheira de pesquisa, Solange Aparecida da Silva, que
comigo compartilhou seus saberes, idéias, pensamentos e informações fundamentais à
concretização de meu trabalho.
A todas as pessoas envolvidas e preocupadas com a qualidade da Educação
Infantil em nosso país e no mundo.
Aos meus alunos da Turma do Infantil III B, que tiveram participação
fundamental à realização da pesquisa deste trabalho.
E a todos que contribuíram direta ou indiretamente em minha trajetória
acadêmica.
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Como em uma roseira: os botões se abrem em
momentos diferentes. A capacidade de florescer
depende da maturação, dos estímulos dados pelo
ambiente e também dos olhos humanos, capazes de
presenciar sua beleza.
Vygotsky
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RESUMO
A infância é o período no qual a criança se apropria gradativa e lentamente do mundo, sendo neste momento, não só aprendiz dos signos e significados que seus olhos interpretam, mas também aprendiz das regras e valores determinados pelos cuidados da família e instituição escolar a que pertence. Dessa forma, é necessário ressaltar, que este período também é caracterizado pelo brincar e não apenas pelo cuidar, sendo nas brincadeiras, que a criança contempla a sua identidade, passando a entender a si mesma e ao universo cultural em que está inserida. Diante disso, o presente estudo tem como principal objetivo apresentar o jogo simbólico enquanto recurso pedagógico, através de uma forma de intervenção educativa sobre este. Com isto, visamos contribuir na formação de uma nova postura de pais e educadores em relação ao brincar. Nesse sentido, verificamos que todo educador deve ter em sua práxis pedagógica, uma finalidade educacional, entrelaçada por uma intervenção coerente com o caráter educativo para que o processo de ensino e aprendizagem proporcione não só o aprimoramento do conhecimento já alcançado, mas a superação do modo de compreensão da realidade a partir dos conhecimentos novos adquiridos, ampliando sua visão de mundo para a transformação efetiva da realidade até então tida como a certa.
Palavras-chave: Brincar, Educação Infantil, Infância, Intervenção Pedagógica, Jogo de Papéis.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
1. UMA BREVE EXPLANAÇÃO SOBRE A REPRESENTATIVIDADE DA
EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO HISTÓRICO DO BRASIL
14
2. EDUCAR E CUIDAR, DOIS ASPECTOS DA MESMA AÇÃO: ENFATIZANDO
O BRINCAR ENQUANTO MEIO DE EFETIVAÇÃO DA AÇÃO PEDAGÓGICA
21
3. CONHECENDO AS CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS DE VIGOTSKI E PIAGET
SOBRE DESENVOLVIMENTO, APRENDIZAGEM E O JOGO SIMBÓLICO
30
3.1 Piaget 31
3.2 Vigotski 35
3.3 O brincar nas teorias de Piaget e Vigotski 40 4. METODOLOGIA DA PESQUISA 54
4.1 Etapas da pesquisa 54
4.2 Local 54
4.3 Participantes 55
4.4 Recursos pedagógicos 56
4.5 Indicadores para avaliação 57
4.6 Coleta de dados 57 5. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS 59
5.1 Observações iniciais 59
5.2 A intervenção 62
5.2.1 Delineamento da ação interventiva 63
6. ANÁLISE DOS RESULTADOS 72 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 75
REFERÊNCIAS ANEXOS
8
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa pretende tecer algumas considerações a respeito da
importância do jogo simbólico na intervenção pedagógica, como forma de
enriquecimento no processo de ensino-aprendizagem.
Nessa perspectiva, defronta-se o seguinte questionamento: Como o professor
pode intervir na brincadeira simbólica, de modo a torná-la um recurso educativo?
Este questionamento será o elo de ligação entre nossas investigações teóricas e a
intervenção junto aos alunos, a qual se deu na instigante descoberta pedagógica que este
mundo mágico do faz de conta proporciona ao educador para chegar o mais próximo
possível do mundo imaginário da criança.
Para atingir a meta de apropriar do jogo de papéis das crianças para a realização
de intervenção pedagógica, tomamos como ponto de partida nossas indagações
decorrentes da docência durante cinco anos na Educação Infantil, observando no
decurso dessa trajetória o quanto o brincar e a brincadeira são mal compreendidos pela
sociedade, tanto pelos pais, bem como por muitos professores.
Neste sentido, concordamos com Pereira (2002, p.9), quando diz que: “O
brincar, nesses espaços educativos, precisa estar num constante quadro de inquietações
e reflexões dos educadores que os compõem”.
Isto nos leva à compreensão de que todo educador de educação infantil deva
ampliar o que entende por ensinar, considerando as diferentes faixas etárias das crianças
para que haja verdadeiramente a promoção do desenvolvimento, garantindo a
apropriação do conhecimento novo.
Comprometidos pelo aprofundamento desta reflexão pedagógica e analisando os
estudos já realizados, podemos verificar que este assunto tem sido foco de interesse
também de muitos pesquisadores, seja na psicologia, na biologia, na sociologia, na arte,
na antropologia, na música e em outras áreas do saber humano, no entanto, cada área
aprofundando-se de acordo com o seu universo científico. Atestando isto, Pereira
(2002, p.8) aponta que: “A antropologia e a sociologia observam os conteúdos presentes
numa brincadeira que mostram uma organização de uma cultura. Ali estão expostos os
mitos, os ritos, as relações de autoridade, dentre outros muitos aspectos”.
Mas como estamos vislumbrando o brincar na perspectiva educacional,
constatamos que as brincadeiras tem sido alvo de muitos estudos, principalmente como
instrumentos pedagógicos, como nos esclarece Wajskop (2004, p. 9):
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Conhecer como e por quê as crianças brincam é caminho seguro para uma prática educativa que respeita o seu fazer lúdico. A observação atenta das brincadeiras e o respaldo teórico colaboram para que as intervenções dos educadores sejam apropriadas.
Desta maneira, é necessária uma visão mais apurada sobre qual deva ser o
procedimento adequado do educador para que sua prática auxilie verdadeiramente no
fazer lúdico da criança, pois sabemos que a brincadeira envolve muitos saberes,
conforme nos esclarece Vigotski (1998) em sua posição frente às relações entre o ensino
e o desenvolvimento da criança. Estas relações ocorrem na zona de desenvolvimento
real e proximal, tais conceitos são definidos como a diferença entre o desenvolvimento
atual da criança (zona de desenvolvimento real) e o nível que ela atinge quando resolve
problemas com auxílio (zona de desenvolvimento proximal1). Isso quer dizer, que a
zona de desenvolvimento real classifica-se pelas capacidades já compreendidas e
desenvolvidas pela criança - um exemplo desta capacidade apropriada é quando a
criança, ao perder o foco de uma bola, por esta ter tornado-se oculta por um obstáculo,
consegue sem dificuldade, deslocar-se até o local em que o objeto ficou escondido,
localizar a bola e continuar a brincadeira, sem demonstrar nenhuma frustração.
Por outro lado, na zona de desenvolvimento proximal a criança não seria capaz
de ir à procura da bola, pois, em seu entendimento esta, teria deixado de existir, criando
um sentimento de perda muito grande, cabendo ao adulto ajudar-lhe a descobrir a bola
novamente. Assim sendo, verifica-se que aqui a criança encontra-se numa relação de
aprendiz, na qual emergem capacidades que deseja alcançar.
Na instituição escolar, através da intervenção do professor durante o ato de
brincadeira da criança, esta amplia seus conhecimentos, em um processo de superação
do seu nível real de desenvolvimento, pois, segundo Paulo Freire2, não se anula o velho,
por ser velho, como também não se admite o novo, porque é novo, mas se admite o
velho e o novo na medida em que estes possibilitem respostas.
No entanto, faz-se necessário ressaltar, que se a criança durante o processo de
conhecimento apenas brincar espontaneamente, onde o professor fica somente
observando de longe, esta criança não avançará qualitativamente em seus
1 Para Vigotski existem apenas dois níveis de desenvolvimento: o real e o proximal; este último também pode ser classificado como potencial. Nossa escolha foi pelo termo proximal. 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. Caderno pedagógico - V Semana de Estudos Pedagógicos. Bauru: Gráfica Líder, 2004.
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conhecimentos, ou seja, ela estará apenas realizando ações de capacidades já
internalizadas, permanecendo na zona de desenvolvimento real.
É necessário, portanto, uma superação do modo de compreensão da realidade
pela qual se encontra e é nesse momento em que surge a figura do professor. Este
deverá estar em constante observação, mas junto e muito próximo de seus alunos.
Por meio de brincadeiras planejadas, o professor saberá em que momento
realizará a intervenção na brincadeira, sem tolher os conhecimentos já adquiridos pelos
alunos, mas orientando-os para que, partindo de sua realidade, conheçam outras,
possibilitando assim que adquiram conhecimentos novos e ampliem sua visão de
mundo.
Tais enfoques constatamos em nossa ação interventiva no trabalho realizado
com as crianças em instituição de ensino, compreendidas na faixa etária de 3 anos
(2006) e 4 anos (2007), em que utilizamos suas brincadeiras espontâneas como ponto de
partida para efetivar uma atitude pedagógica coerente com o caráter educativo.
Para tanto, contemplamos três aspectos necessários, que abordamos em capítulos
distintos, para que, ao trilharmos a abordagem teórica, fosse possível analisar e observar
na Educação Infantil a relevância do jogo simbólico no processo de ensino-
aprendizagem.
O primeiro destes aspetos, que será abordado no primeiro capítulo, refere-se ao
contexto histórico da criança no Brasil durante os períodos Colônia e Império, para que
possamos entender como se processava a vivência da infância nessa época, levando em
consideração o contraste das classes sociais compreendidas pela elite e pela classe de
escravos, bem como as demais categorias sociais de baixa renda.
Ainda neste primeiro capítulo, identificamos também, as questões pertinentes à
Legislação no que se refere à educação infantil (LDB), mostrando como esta passou a
ser um direito garantido pela União, principalmente a partir dos movimentos sociais e
de suas reivindicações, os quais foram fundamentais para favorecer a incorporação desta
educação inicial na Lei.
O segundo capítulo, onde abordaremos o segundo aspecto anunciado, traz como
enfoque central a relação entre educar e cuidar, bem como as orientações do RCN para a
educação infantil sobre a importância do brincar e da brincadeira para o
desenvolvimento da criança, que serão analisadas a partir da consideração de que a
educação deva favorecer a superação das objetivações em-si (conhecimentos prévios da
criança referentes a sua experiência vivenciada no cotidiano) para as objetivações para-
11
si (conhecimentos novos, adquiridos pela ciência aprendida na instituição de ensino
através dos conteúdos escolares).
Finalmente, dos três aspectos que iremos contemplar, no terceiro capítulo,
analisaremos os pressupostos teóricos de Vigotski e Piaget, salientando inicialmente que
para o primeiro, o jogo deriva das relações sociais e o momento histórico cultural no
qual a criança está inserida, enquanto para Piaget, o jogo deriva da estrutura do
pensamento da criança. No entanto, apesar das diferentes concepções, ambos
compreendem o valor estrutural e dimensional que a brincadeira propicia para o
desenvolvimento e a aprendizagem da criança, estabelecendo nesse percurso, a relação
entre o jogo simbólico, mais especificamente, o “jogo de papéis” e a práxis pedagógica.
Nesta abordagem, Vigotski (1998, p. 135) ressalta ainda que:
A brincadeira fornece, pois, ampla estrutura básica para mudanças da necessidade e da consciência, criando um novo tipo de atitude em relação ao real. Nela aparecem a ação na esfera imaginativa numa situação de faz-de-conta, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e das motivações volitivas, constituindo-se, assim, no mais alto nível de desenvolvimento pré-escolar.
Partindo desta consideração, salientamos a necessidade de diferenciar o conceito
de atividade dentro do processo das objetivações em-si e das objetivações para-si, com o
intuito de elucidar a intenção principal da educação, qual seja, a busca pela conquista de
um universo que contemple a produção e a elaboração do saber científico pelos
educandos, pois a escola é o espaço para existir e colocar em prática a reflexão e a
criticidade e não apenas a espontaneidade presente na vida cotidiana, que pode e deve
ser um ponto de partida para a apropriação do conhecimento.
A apropriação permite à criança, ser sujeito construtor desse conhecimento, pela
mediação cultural, possibilitando a superação do senso-comum - sophia (espontâneo e
não intencional - mediações em-si), para a episteme (não espontâneo e intencional -
mediações para-si). Tomemos como exemplo, o saber de uma criança que trabalha na
feira e realiza contas matemáticas rotineiras, esta é uma atividade cotidiana pragmática
imediatista, pois realiza as quatro operações aritméticas automaticamente, sem ter a
compreensão do mecanismo que as envolve. Por meio de uma educação intencional e
sistematizada, esta criança compreenderia o processo das operações aritméticas,
superando, por incorporação, as objetivações do cotidiano em que está inserida, saindo
12
do empirismo para a concretude da existência social. Ao se referir às objetivações para-
si, Giardinetto (1999, p. 29) afirma que:
Tais formas de agir e de pensar obrigam o indivíduo a se colocar em uma posição em que enxerga sua realidade sob um prisma que lhe permite compreender nuances até então escamoteadas pelas manifestações imediatas de sua realidade. È essa a postura da análise científica.
Nesta perspectiva sobre a atividade escolar elaborada e contextualizada pela
criança, Leontiev (1978, p. 287) também confirma a importância do jogo na atividade
de brincar:
[...] A idade pré-escolar é o período de vida que se abre, pouco a pouco, à criança o mundo da atividade humana que a rodeia. Pela sua atividade e sobretudo pelos seus jogos, que ultrapassam o quadro estreito da manipulação dos objetos circundantes e da comunicação com os pais, a criança penetra no mundo mais vasto de que se apropria de forma ativa. Toma posse do mundo concreto enquanto mundo de objetos humanos com o qual reproduz ações humanas.
Nesse sentido, torna-se crucial descaracterizar da educação infantil o caráter
assistencialista, e enfatizar uma perspectiva pedagógica, crítica e reflexiva, de forma a
proporcionar a formação do cidadão desde a tenra idade, mediada pela intervenção do
professor na relação ativa entre professor e aluno, assegurando-lhe no processo de
educar a apropriação da experiência social historicamente acumulada e culturalmente
organizada.
Sobretudo, faz-se necessário, reverter o olhar sobre o brincar, associado durante
muito tempo à necessidade da criança extravasar energias contidas em sala de aula ou
um descansar do trabalho pedagógico; pois a brincadeira é um comportamento
socialmente construído, que ajuda a criança a entender a si mesma e ao universo cultural
em que está inserida.
Assim sendo, entendemos que seja relevante, dentro da finalidade educacional
do professor, utilizar o jogo simbólico como instrumento pedagógico eficiente para
atingir a aprendizagem e compreender como os alunos lidam com os acontecimentos do
seu dia-a-dia, refletidos nas brincadeiras de faz-de-conta mediadas pelo jogo de papéis
que desempenham.
13
Neste sentido, Wajskop (2004, p. 10) acrescenta que:
A educação tem-se utilizado de um recurso pedagógico bastante rico, por meio do qual as crianças podem apropriar-se do mundo não diretamente, mas ativamente através da representação. Esse recurso pedagógico caracteriza-se como o jogo de faz-de-conta que recria, através da representação, situações as mais variadas da vida e da cultura humana, com as quais as crianças podem defrontar-se, confrontar-se e, ao vivenciá-las, construir e reconstruir hipóteses a respeito do funcionamento dos fenômenos sociais, culturais, físicos, biológicos e afetivos.
Partindo dessa premissa, acreditamos que esta pesquisa de campo qualitativa
contribuirá para uma nova postura, não só dos pais, como também de educadores,
desvelando, por sua vez, um novo olhar sobre a ação do brincar na educação infantil.
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1. UMA BREVE EXPLANAÇÃO SOBRE A REPRESENTATIVIDADE DA
EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO HISTÓRICO DO BRASIL.
O Capítulo I traz uma abordagem histórica da infância das crianças no Brasil,
como também enfatiza a questão da Educação Infantil no que se refere ao fato de ter
sido contemplada na nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9.394/96 (apud SOUZA e
SILVA, 2002), pois no passado, além de se ter uma concepção assistencialista, a criança
era vista somente como um adulto em miniatura, tolhida de identidade, autonomia e
vontades próprias.
Conforme Priore (2006, p. 8):
[...] a história sobre a criança feita no Brasil, assim como no resto do mundo, vem mostrando que existe uma enorme distância entre o mundo descrito pelas organizações internacionais, pelas não-governamentais ou pelas autoridades, e aquele no qual a criança encontra-se cotidianamente imersa. O mundo do qual a “criança deveria ser” ou “ter” é diferente daquele onde ela vive, ou no mais das vezes sobrevive. O primeiro é feito de expressões como “a criança precisa”, “ela deve”, “seria oportuno que”, “vamos nos engajar em que” etc. até o irônico “vamos torcer para”. No segundo, as crianças são enfaticamente orientadas para o trabalho, o ensino, o adestramento físico e moral, sobrando-lhes pouco tempo para a imagem que normalmente se lhe está associada: do riso e da brincadeira.
Mediante a colaboração de Priore (2006), para melhor compreensão entre o real
e o ideal no mundo infantil, tomemos como ponto de partida a contextualização do
cotidiano da criança livre no Brasil, durante o período Colônia e o Império, época em
que a infância, na mentalidade coletiva, era tempo sem maior personalidade, sendo
apenas um momento de transição, classificada como uma esperança.
Dessa forma, o olhar sobre a criança e sua valorização na sociedade brasileira
processou-se de acordo com a organização de cada sociedade e estruturas econômicas e
sociais em vigor.
Exemplo disso é verificado pelo contraste das classes sociais compreendidas
pela elite e demais categorias sociais da época, no qual havia a presença de crianças
pequenas, brancas ou negras, filhos de senhores e escravos, que podiam compartilhar os
mesmos espaços privados, como a sala e as camarinhas, enquanto pequeninos. A partir
dos sete anos, os primeiros iam estudar e os segundos trabalhar, construindo neste
momento, a muralha eterna entre as duas realidades.
15
Enquanto a educação das crianças de elite era voltada para aulas de “inglês,
francês, alemão, religião, física, botânica, grego, piano, literatura, latim e mais tarde
fotografia” (PRIORE, 2006, p. 167); aos meúdos (categorias sociais distintas, das quais
faziam parte, os livres e os escravos), além do trabalho, “convinha uma formação
comum, quer dizer, cristã, e as circunstâncias socioeconômicas convidavam-lhes a
amoldar-se a diferentes tradições culturais e costumes sociais educativos”. (PRIORE,
2006, p.167 e 104-105).
Vale elucidar também, que na família imperial, em relação à instrução, havia
uma rotina especial, porém com dura disciplina de estudos estabelecida por Dom Pedro
II para a educação de suas filhas, Princesas Isabel e Leopoldina, a qual tinha início às
sete horas da manhã, estendendo-se até às nove da noite.
Nesta abordagem, D. Francisca, irmã de Dom Pedro II e princesa de Joinville,
percebendo que o tempo era regulamentado em demasia, com lazer e passeios tão
limitados, não exitou em informar esse desconforto a seu irmão, escrevendo-lhe as
seguintes palavras: “Toma bem sentido de não as cansar muito e que lhes não falte
recreação no meio do trabalho [...]. Isto é muito importante para a sua saúde, que sem
ela nada é possível fazer-se de verdadeiro trabalho intelectual”. (Apud PRIORE, 2006,
p. 167).
Este enfoque foi garantido também pela preceptora da princesa Isabel, a qual
permitia-lhe algum divertimento em Petrópolis, nas férias de verão, por compreender a
necessidade e importância de momentos de descontração, os quais foram registrados no
diário pela princesa, descrevendo em memória os banhos refrescantes de cachoeira e os
rodopios das danças dos salões, revelados por um pequeno trecho particular de seu
próprio mundo. (PRIORE, 2006, p.167).
Seguindo essa trajetória histórica da vivência das crianças de elite e as dos filhos
de escravos, percebemos que Dom Pedro II foi como um precursor da sistematização
(precária) da Educação Infantil, assinando de próprio punho o “Regulamento”,
documento que determinava um conjunto de regras para educação de suas filhas,
composto por 36 artigos, no qual eram abordados desde os cuidados de higiene pessoal
até os valores morais e ensinamentos sistematizados, que deveriam ser aplicados às
princesas, conforme registra Priore (2006, p.164):
Art. 7º - governanta [...], dar-lhe-á bons conselhos e exemplos, explicar-lhe-á a razão porque lhe nega certas coisas, ou lhes a proíbe, não consentirá, que se lhe meta medos com coisa alguma só sim infundirá temor de Deus, respeito,
16
e amor a seu pai, e mãe, e humanidade para com seu próximo, não lhe deixando fazer mal, mesmo a animal algum, para que o seu coração não se endureça, ensina-lhe-ha a rezar, a ouvir a missa, cozer, a bordar e a tudo mais que constitua uma senhora ordinaria bem prendada, pois que muito convem que saiba tudo [...] Art. 14º - Não consentirão que as Meninas conversem com pretos, ou pretas, nem que brinquem com molequinhos e cuidarão muito especialmente, que as Meninas não os vejam nús [...] Art. 15º - Quando as Meninas se vestirem, terão todo o cuidado, que ellas se não descomponhão fazendo-lhes ceonhecer, que ellas não só devem ter pudor de si, mas vergonha de suas próprias criadas.
Nesse sentido, é visível como a criança desde cedo, era castrada no sentido
moral e físico, como também tolhida de oportunidade para dedicar-se ao lazer, sendo
tão somente cobrada com responsabilidades, ora para intensos estudos (no caso da elite),
ora para o trabalho exaustivo (no caso dos escravos).
Assim sendo, podemos observar que no Brasil, desde o seu “nascimento”
histórico-cultural, não se tinha uma legislação em que vigorasse o direito da infância
pela busca de ações integradas que incorporadas a atividades educativas,
contemplassem os cuidados essenciais das crianças e suas brincadeiras.
Dessa forma, posteriormente a tanta barbárie no universo infantil ocorridos
durante esses quinhentos e sete anos é que, conforme Fonseca (1998, p. 200), gradativa
e lentamente por meio de análises conscientes do processo histórico, foram-se aos
poucos superando as “concepções ingênuas, simplistas, dogmáticas, rotuladoras,
preconceituosas e autoritárias”. O autor (idem) pontua que:
Dramas ou tragédias como o trabalho infantil, os meninos e as meninas de rua, os maus tratos domésticos, o abuso sexual e a prostituição infantil, entre outros, mostraram a necessidade de o Estado e a sociedade empreenderem enorme esforço para a conquista da cidadania por esse significativo contingente populacional (p.200).
Com o crescimento desta nova consciência, de que a situação da infância parte
de um todo e que é crucial interferir sobre os condicionantes desta realidade para
favorecer verdadeiramente sua transformação, estabeleceu-se um consenso a respeito da
urgência de uma política social integrada, redistributiva e preventiva; porém, sabemos
que esses esforços ainda são insuficientes para modificar o quadro da infância das
crianças de baixa renda.
Decorrente deste amadurecimento, razões de ordem social, econômica, política e
cultural motivaram a mudança de postura em relação à Educação Infantil, a qual adquire
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importância crescente nos debates a respeito da política educacional brasileira, passando
a ser direito institucionado pela Lei maior do país.
Entretanto, mesmo com a elaboração do documento contemplando uma gestão
educacional vigente, a luta continuou, para que a Educação Infantil com essa pseudo
valorização de sua dimensão, fosse realmente estruturada de acordo com a sua
categoria, conforme atesta Lanter (1999, p. 154): “[...] é importante ressaltar que, em
décadas passadas, as políticas públicas para a educação infantil se caracterizaram por
projetos assistencialistas, distantes de ações que valorizassem a educação e a ampliação
do magistério nessa área”.
Assim, podemos observar na Lei, que a educação de 0 a 6 anos em nosso país,
anterior à Constituição de 1988 e também ao Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), elaborado em 1990, não era incluída como prioridade do ensino.
Com esta linha de percurso, mais uma vez, houve a necessidade, em meio a
movimentos da sociedade civil e medidas tomadas por órgãos públicos, de se construir
uma nova mentalidade em relação ao significado da infância, da educação infantil e,
sobretudo, do educador da criança pequena, que de acordo com Fonseca (1998, p. 198):
“Além dos meios acadêmicos, também os meios sociais, principalmente os ligados aos
direitos das crianças e das mulheres vêm reivindicando a criação e expansão de
instituições educativas e assistenciais para atendimento à infância”.
Convencidos da importância e da urgência de uma atenção maior do governo e
da sociedade para a criança pequena, como também a consciência da necessidade de
uma política para a educação infantil, integrada e articulada nas três esferas do governo:
união, estados e municípios, Lanter (1999, p. 154) nos faz compreender que: “A
educação infantil passa ser entendida não mais como assistência e caridade para as
crianças pobres, mas, sim, como um espaço educacional e de formação para a
cidadania”.
A partir deste marco histórico na legislação, as políticas públicas de educação
infantil, foram tomando caminhos menos nebulosos e mais definidos, conforme destaca
Lanter (1999, p. 136):
Atualmente, reconhecida na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/96), a educação infantil é pela primeira vez incluída como parte integrante da educação básica. Enfatiza-se a necessidade de que educadores, comunidade e pesquisadores envolvidos na problemática da educação infantil, estejam atentos para as definições e diretrizes das políticas públicas dirigidas à população de 0 a 6 anos e de que atuem, também, para
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provocar constantes intervenções, de modo a fortalecer o caráter educativo e formativo do atendimento à infância no país.
Vejamos então, como a educação infantil está definida nesta nova Lei 9.394/96
(LDB - art.29):
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até 6 anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando, a ação da família e da comunidade (apud SOUZA E SILVA, 2002, p. 51).
A Educação Infantil deve ser oferecida em dois níveis, nas seguintes instituições
(LDB - art.30):
I - em creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II - em pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade (apud SOUZA E SILVA, 2002, p. 51).
No entanto, cabe ressaltar ainda diante destas definições da Lei 9.394/96, (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB) entre o atendimento e a educação às
crianças de 0 a 6 anos de idade, como também o que contempla a Constituição Federal
Brasileira de 05.10.88, referindo-se à competência legislativa nas três instâncias da
administração pública, mais especificamente aos municípios, o parágrafo 2º, do artigo
211 qual determina que: “... os municípios atuarão prioritariamente no ensino
fundamental e pré-escolar” (FONSECA, 1998, p. 203).
Através das alterações realizadas no referido documento, a Emenda
Constitucional nº. 14, entre outras modificações introduzidas na Constituição, deu nova
redação ao parágrafo, alterando a menção “pré-escolar” para “educação infantil”, a
saber: “Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação
infantil”. (FONSECA, 1998, p. 204).
Portanto, verificamos nesta última abordagem, que a nova Emenda
Constitucional, consagra a educação infantil compreendendo as faixas etárias de 0 a 6
anos, e não mais de 4 a 6 anos, como na Lei anterior.
Neste sentido, evidencia-se que tanto a Constituição Federal de 1988, quanto a
Lei de Diretrizes e Bases de 1996, pronunciam uma organização autônoma do
19
município em consonância com o sistema da União e do Estado, atribuindo assim, a
responsabilidade da educação infantil ao poder municipal (objetivo da nova gestão
política pública, consagrada no processo de descentralização pela municipalização das
políticas públicas - saúde, educação e meio-ambiente).
A partir deste processo histórico, político e cultural concernente entre o Brasil
legal, o Brasil ideal e o Brasil real, o Ministério da Educação e do Desporto, elaborou o
RCN (Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil), documento oficial
composto por três volumes, no qual, segundo Guimarães (2003, p. 28):
[...] apresenta características e funções bem definidas e traz um elenco de princípios norteadores de sua filosofia. Desse modo, propõe-se a ser um conjunto de referências e orientações pedagógicas, visando o exercício da cidadania. Sua intenção deliberada é fomentar as práticas e programas de educação infantil, ampliando o mais possível seu universo de atuação, socializando informações, propiciando discussões, incentivando a pesquisa, oferecendo subsídios ao trabalho educativo de técnicos, educadores e demais componentes do sistema de ensino, direcionado à educação infantil.
O referido documento se propõe ainda a:
[...] servir como um guia de reflexão de cunho educacional sobre objetivos, conteúdos e orientações didáticas para os profissionais que atuam diretamente com crianças de zero a seis anos, respeitando seus estilos pedagógicos e a diversidade cultural brasileira (BRASIL, 1998, v. 1, p. 5).
A partir da finalidade da educação infantil, conforme expressam os documentos
oficiais, que é propiciar o pleno desenvolvimento da criança pertencente às faixas
etárias mencionadas e considerando ainda, as especificidades afetivas, emocionais,
sociais e cognitivas, conheçamos também os princípios que norteiam as ações em
educação infantil para o exercício da cidadania, segundo o RCN (Referencial Curricular
Nacional para a educação infantil):
O respeito à dignidade e aos direitos das crianças, consideradas nas suas diferenças individuais, sociais, econômicas, culturais, étnicas, religiosas, etc.; O direito das crianças a brincar, como forma particular de expressão, pensamento, interação e comunicação infantil; O acesso das crianças aos bens socioculturais disponíveis, ampliando o desenvolvimento das capacidades relativas à expressão, à comunicação, à interação social, ao pensamento, à ética e à estética;
20
A socialização das crianças por meio de sua participação e inserção nas mais diversificadas práticas sociais, sem discriminação de espécie alguma; O atendimento aos cuidados essenciais associados à sobrevivência e ao desenvolvimento de sua identidade (BRASIL, 1998, v. 1, p. 13).
Feita essa breve explanação sobre a representatividade da criança no contexto
histórico do Brasil, aliada a contemplação das políticas públicas frente aos direitos da
criança em uma significativa oportunidade de educação, objetivada em seu pleno
desenvolvimento físico, mental, emocional e social desde a tenra idade, dentro de um
espaço educacional e de formação para a cidadania. Vejamos a seguir, no segundo
capítulo, mais um pouco sobre o enfoque dado a educação infantil pelo RCN, como
também, a questão do educar e cuidar e o brincar, ações que merecem atenção e uma
verdadeira compreensão do que venham a ser verdadeiramente essas manifestações.
21
2. EDUCAR E CUIDAR, DOIS ASPECTOS DA MESMA AÇÃO:
ENFATIZANDO O BRINCAR ENQUANTO MEIO DE EFETIVAÇÃO
DA AÇÃO PEDAGÓGICA.
O Capítulo II tem como primeiro enfoque, a questão do educar e cuidar da
criança pequena, para posteriormente, elucidar de maneira clara e objetiva o direito e o
ato do brincar, condição transformadora e significativa da consciência infantil.
Para tanto, antes de adentrarmos nesta categoria do ato do brincar, vejamos
primeiro a definição do binômio educar e cuidar, tão mal interpretado na educação
infantil, conforme esclarece o documento do RCN:
Nas últimas décadas, os debates em nível nacional e internacional apontam para a necessidade de que as instituições de educação infantil incorporem de maneira integrada as funções de educar e cuidar, não mais diferenciando nem hierarquizando os profissionais e instituições que atuam com as crianças pequenas e/ou aqueles que trabalham com as maiores. (BRASIL, 1998, v. 1, p. 23).
Desta forma, entendemos que as ações cuidar e educar não ocorrem
separadamente, mas de forma integradas, como aponta Guimarães (2003, p.38):
A criança, no processo de conhecer outra pessoa, precisa desenvolver o auto-conhecimento. Os sentimentos, emoções, idéias, capacidades, limitações, desejos e objetivos que temos na relação com o outro e no processo de cuidar / educar dele são de suma importância. Requer também que se aprenda como ser, responder e agir com cada criança, que emoções ela nos suscita e vice versa durante o processo de cuidar / educar.
Tomemos por base o esclarecimento a seguir: “A base do cuidado humano é
compreender como ajuda o outro a se desenvolver como ser humano. Cuidar significa
valorizar e ajudar desenvolver capacidades.” (BRASIL, 1998, v. 1, p. 24).
No mesmo sentido: Segundo o filósofo Milton Mayeroff (1990), cuidar de outra pessoa, no sentido mais significativo, é ajudá-la a crescer e realizar-se. É uma forma de relação com o outro que envolve uma atitude de preocupação com o crescimento e desenvolvimento da pessoa humana em toda a sua complexidade. Esta atitude se desdobra em procedimentos que requerem conhecimentos (GUIMARÃES, 2003, p. 38).
22
Nesta perspectiva, comprova-se como é de suma importância compreender que
não há dicotomia entre tais ações, como confirma Guimarães (2003, p. 42):
A saúde é um estado que não depende apenas de nossa biologia, da natureza, mas também de como nos relacionamos, de como lidamos com nossas emoções e de como os seres humanos organizam a sua vida em grupo. Ela é tanto física quanto mental porque “corpo” e “mente” estão integrados, assim como, nas sociedades humanas, a natureza e a cultura.
Verificamos então a necessidade de conhecimento e embasamento por parte do
educador sobre tais aspectos ao trilhar sua trajetória acadêmica e profissional, pois não
basta o conhecimento básico elementar, ministrado nos cursos de formação de
educadores infantis, é necessário construir o conhecimento sobre as formas de cuidar no
contexto educativo, fundamentadas pelas objetivações para-si, construídas nos diversos
campos do saber. Lembramos que manter-se atualizado faz parte do processo, uma vez
que o conhecimento científico está em constante transformação.
Neste sentido, Lanter (1999, p. 154) afirma:
[...] Logo, o educador infantil - que anteriormente não necessitava de formação e sim de ter “boa vontade” e “gostar de crianças” - hoje demanda escolarização e formação na área, rompendo com o esteriótipo do profissional leigo e desinformado.
Tomemos esta reflexão para a nossa prática, e repensemos sobre o processo de
educar conforme a visão de Guimarães (2003, p. 37): “O processo de educar demanda
conhecimentos por parte do educador sobre o processo de aprendizagem em cada faixa
etária, assim como sobre a didática adequada a cada conceito, atitude e procedimento
que se deseja ensinar”.
Mediante esse novo olhar, é plausível citar o significado que se busca para um
verdadeiro projeto político pedagógico, que de acordo com Guimarães (2003, p. 37):
O projeto político pedagógico de cada centro de educação infantil deve contemplar estes aspectos (devem estar implícitas as dimensões do conhecimento: conceitual, procedimental e atitudinal). Ele deve expressar concepções que revelam a visão de mundo e compreensão dos educadores sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças e sobre os conhecimentos que cada grupo etário precisa desenvolver na creche e na pré-escola. (parênteses nossos)
23
Após estas considerações, compreendemos que tanto as instituições quanto o
educador infantil, necessitam remodelar suas concepções, ou seja, o conhecimento
técnico científico deve articular-se com o conhecimento da região onde a unidade de
educação está inserida, sobre as famílias e crianças atendidas, suas características,
desejos e necessidades, assim sendo, afirma Guimarães (2003, p. 47):
O importante é evitar rótulos e articular informações advindas da entrevista inicial, da observação e das interações posteriores, sempre buscando caminhos para que a criança tenha suas necessidades atendidas e aprenda gradativamente a cuidar-se sozinha, adquirindo hábitos saudáveis.
Desta maneira, podemos determinar com solicitude que não há contraste entre as
ações cuidar / educar, mas sim uma relação dialética, na qual uma complementa a outra
na arte do processo de ensino e aprendizagem.
Neste sentido Guimarães (2003, p. 39) é conclusivo em afirmar que:
[...] os cuidados que visam à promoção do crescimento e desenvolvimento orgânico (promoção da saúde) não são separados das atitudes e procedimentos que ajudam a criança a construir conhecimento sobre a vida sócio-cultural. “Cuidar” e “educar” são faces da mesma moeda e, simultaneamente, mantém a vida, promovem a saúde e ampliam o conhecimento humano.
Traçada esta harmonia entre o educar e o cuidar, é importante ainda considerar
que a educação em seu mais amplo sentido e significado têm por finalidade o
“desenvolvimento social, intelectual, moral, físico e afetivo da criança e jovem”
(Queiroz, 2003, p. 96), assegurando-lhes a transmissão da cultura de uma geração para
outra.
Partindo desta consideração, detemo-nos para uma análise mais profunda do que
venha a ser então, o ato de educar na educação infantil, levando em conta todo o estudo
até agora realizado, onde de acordo com RCN:
Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integradas e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir para formação de crianças felizes e saudáveis (BRASIL, 1998, v. 1, p. 23).
24
Neste sentido, dentre as práticas acima mencionadas, o ato de educar na
educação infantil, deve proporcionar às crianças situações de brincadeiras de forma
integrada com os conhecimentos escolares advindos pela realidade social, histórico e
cultural.
No entanto, vimos que historicamente, as crianças eram podadas deste direito
por terem de dedicar-se intensamente aos estudos, no caso da elite e ao trabalho, no caso
dos escravos e demais categorias econômicas de baixa renda.
Mas, vimos também, que a partir deste descaso, a sociedade brasileira ao longo
da caminhada rumo à ordem e progresso através de movimentos sociais, reivindicou um
atendimento educativo e assistencial para a criança, tendo a União que acatar e legalizar
este direito.
Hoje, depois de muitas lutas e reivindicações a educação infantil está quase
atingindo o cume almejado, mas ainda há muito para se alcançar, principalmente em
relação ao conhecimento e à compreensão do que seja o brincar e a brincadeira.
A partir disto, redigiremos qual a visão da sociedade e por meio das teorias de
Vigotski e Piaget contidas no capítulo 3, direcionaremos nossa contribuição no
desvelamento de um novo olhar sobre o ato de brincar, como afirma Pereira (2002, p.
8):
[...] Em todo o brinquedo existe um campo, no tempo e no espaço, para ele acontecer, que é diferente do tempo e espaço em que vivemos normalmente, porém brincar não é algo fora da vida, é algo nela também. Nesses lugares, habitam a alegria, a tristeza, a calma, a tensão e todos os sentimentos que envolvem cada um de nós.
Porém, durante muito tempo, tanto para os pais, quanto para muitos educadores,
a brincadeira esteve associada à necessidade de a criança extravasar energias contidas
nas salas de aula ou o descansar do trabalho pedagógico, o que ao mesmo tempo nos
causa preocupação e consternação, assim sendo Pereira (2002, p. 9) acrescenta que:
[...] Brincar, então, é uma ação em que a pessoa torna-se “dona” daquilo que está envolvida, num tempo e espaço “de mentirinha”, transformando aquilo que era um mero instrumento de aprendizagem numa busca de perguntas e soluções.
25
Desta forma, a criança apesar de viver em constante estado lúdico, segundo
Pereira (2002, p. 8): “[...] a criança não está brincando o tempo todo, ela sabe, e muito
bem, se o que está fazendo é uma brincadeira ou não. O espaço / tempo é algo bem
sabido por ela”.
Nesta perspectiva, “brincar funciona como um cenário no qual as crianças
tornam-se capazes não só de imitar a vida, como também transformá-la” (BRASIL,
1998, v.1, p. 27) , pois a criança desde sempre, está imersa na cultura, e através do jogo,
exercita ações de entendimento sobre as relações inter-individuais, culturais, que
observa e vivencia.
Antes de continuarmos, é necessário um esclarecimento importante: as palavras
brincar, brincadeira e jogo não podem ser entendidas isoladamente, elas são
intrinsecamente ligadas, pois mediante Camargo (s/d, p. 6):
O brincar e a brincadeira na literatura pedagógica atual aparecem diferenciadas, muitas vezes, de jogo, em vista de preservar, no primeiro, o sentido lúdico das atividades infantis, diferenciadas então da utilização indiscriminada da palavra jogo.
Com relação à íntima ligação que ocorre entre as palavras brincar, brincadeira e
jogo, Guimarães (2003, p. 79), também faz uma importante consideração:
Se trocarmos os substantivos jogo e brinquedo pelos verbos correspondentes jogar e brincar, percebemos, facilmente, que estamos diante de ações. Isto é, saímos de situações estáticas para outras de caráter dinâmico. Jogar e brincar são necessariamente atividades que exigem movimento. A brincadeira corresponde ao ato de brincar, de jogar. Caracteriza-se como ato no sentido de atitude assumida com determinada intenção. Daí torna-se ação. Conseqüentemente, podemos concluir que na realização da brincadeira temos uma atuação. De maneira geral, as palavras jogos, brinquedos e brincadeiras são tratadas como sinônimos em relação aos seus significados. Apenas o brinquedo, enquanto objeto, foge a esta relação. Porém, tão somente enquanto objeto (forma estática). Quando a palavra brinquedo é usada no sentido de ação, denota não mais o objeto e, sim, a relação dinâmica, a ação lúdica. Passa a ter o mesmo significado de jogo ou brincadeira. (grifos do autor)
Diante dos esclarecimentos de Camargo (s/d) e Guimarães (2003), elencamos
abaixo nossa compreensão sobre o significado dos elementos que compõem o fazer
lúdico da criança:
26
Brincar: termo que serve para designar o conjunto de atividades e
ações que se assemelham entre si por seu caráter lúdico, envolvendo
idéias, sentimentos, pessoas, situações, objetos;
Brincadeira: é uma necessidade da criança, em que ela se diverte, faz-
de-conta, desenvolve sua imaginação e criatividade e se socializa.
Brinquedo: é um suporte ativo da brincadeira, ou seja, o brinquedo,
verdadeiro objeto de prazer e satisfação para a criança, proporciona
oportunidades para o aprendizado, a criatividade, a comunicação e
expressão da criança;
Jogo: é uma possibilidade de brincadeira, haja vista ser organizado
muitas vezes, por uma composição própria com regras, objetivos,
papéis e posições demarcadas, podendo também evoluir.
Mediadas pelas informações sobre o ato de brincar, atividade sobre a realidade,
na qual a criança experimenta outra forma de ser e pensar, desenvolvendo sua
imaginação e criatividade, tomemos como complemento, o que diz o RCN:
Ao brincar, as crianças podem reconstruir elementos do mundo que as cerca com novos significados imediatamente perceptíveis e materiais para atribuir-lhes novas significações, imprimir-lhes suas idéias e os conhecimentos que têm sobre si mesma, sobre as outras pessoas, sobre o mundo adulto, sobre lugares distantes e/ou conhecidos (BRASIL, 1998, v. 3, p. 171).
Assim podemos notar de antemão como esta ação é mais rica e intensa do que
pensamos ter conhecimento e amplitude. Nesse sentido o RCN aponta que:
Nas brincadeiras, as crianças transformam os conhecimentos que já possuíam anteriormente em conceitos gerais com os quais brinca. [...] É no ato de brincar que a criança estabelece os diferentes vínculos entre as características do papel assumido, suas competências, e as relações que possuem com outros papéis, tomando consciência disto e generalizando para outras situações (BRASIL, 1998, v. 1, p. 27-28).
Desta forma, compreendemos que “brincar é uma das atividades fundamentais
para o desenvolvimento da identidade e da autonomia” (BRASIL, 1998, v. 2, p. 22),
pois a criança desvela não só como enxerga sua corporeidade, mas também sua vivência
cotidiana e interpretação de mundo representados nos papéis que desempenha nos jogos
de faz-de-conta, assim o RCN enfatiza que:
27
A diferenciação de papéis se faz presente, sobretudo no faz-de-conta, quando as crianças brincam como se fossem o pai, a mãe, o filhinho, o médico, o paciente, heróis e vilões etc., imitando e recriando personagens observados ou imaginados nas suas vivências. A fantasia e a imaginação são elementos fundamentais para que a criança aprenda mais sobre a relação entre as pessoas, sobre o eu e sobre o outro (BRASIL, 1998, v. 2, p. 22).
Entendida a ação do brincar e amadurecida a falsa concepção, até pouco tempo
tomada, de ação para apenas extravasar energias, podemos nos conscientizar de que “na
brincadeira as crianças recriam e estabilizam aquilo que sabem sobre as mais diversas
esferas do conhecimento, em uma atividade espontânea e imaginativa” (BRASIL, 1998,
v. 1. p. 29), elaborando de forma pessoal e independente suas emoções, sentimentos,
conhecimentos e regras sociais.
Assim, podemos concluir por meio da contribuição de Camargo (s/d, p. 8) sobre
a ação lúdica do brincar que:
A brincadeira é o espaço da interação e do confronto. É também através dela que a criança e o grupo constroem a sua compreensão sobre o mundo e as ações humanas. Não é atividade espontânea, antes se constrói através das experiências constituídas no contato social, primeiro na família, depois nos grupos informais e depois na escola, ou simultaneamente. Representa o elo de ligação entre a criança e a cultura na qual ela está imersa. Produz e responde a indagações e abre espaço para experiências impossíveis em outros contextos de vida, o que promove comportamentos que vão além das possibilidades atuais da criança, apontando para sua área potencial de desenvolvimento.
Pautadas pela influente importância do brincar e da brincadeira para o
desenvolvimento da criança, consideremos então, qual venha ser o papel da educação
para favorecer a superação das objetivações em-si rumo as para-si, permeada pelas
instituições de ensino através do trabalho educativo dos profissionais da educação, em
que, segundo Giardinetto (1999, p. 43) se constitui:
[...] em uma atividade mediadora, na formação do indivíduo, das objetivações em-si para o acesso às objetivações para-si, uma atividade mediadora na formação do indivíduo entre o cotidiano e o não-cotidiano. [...] O trabalho educativo é o espaço inequívoco em que se realiza o processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos pertencentes às objetivações para-si.
Nesta perspectiva, verificamos que são nos espaços educativos, que as crianças
encontram instrumentos de aprendizagem eficientes para avançar em sua zona de
28
desenvolvimento real, visto que, é “tarefa precípua do trabalho escolar garantir a
apropriação do saber sistematizado, do saber mais elaborado” (GIARDINETTO, 1999,
p. 47) pelo indivíduo. A este respeito, Giardinetto (1999, p. 48-49) ainda completa:
Dado que a escola objetiva a socialização do saber sistematizado, a atividade escolar tem que assegurar igualmente a transmissão de instrumentos que garantam o acesso a essa forma de saber. Tais instrumentos se apresentam segundo um processo que só pode ser deliberado, sistemático e intencional. É importante ressaltar a intencionalidade presente no processo educativo escolar. Se, ao longo das diversas práticas sociais, o indivíduo produz um saber assistemático e espontâneo (não-intencional), na escola, a atividade aí implícita está na expressão elaborada do saber que surge na prática social. Daí, a necessidade dos instrumentos que viabilizam essa elaboração e sistematização segundo um processo que só pode ser metódico, seqüenciado e intencional. Cada conceito escolar trabalhado é um instrumento para elaboração de conceitos que virão posteriormente. [...] dada essas especificidades, os conceitos escolares apresentam uma organicidade própria regida por essa lógica da sistematização. Essa lógica é o instrumento que viabiliza a apropriação desses conceitos. [...] o conhecimento escolar possibilita alcançar níveis de desenvolvimento conceitual cada vez mais elaborados.
Dessa forma, entendemos que o professor é o principal colaborador para mediar
à ação lúdica da criança em uma significativa situação de aprendizagem, na qual a
relação da criança com a brincadeira espontânea realizada, seja apenas o eixo norteador
para o seu trabalho pedagógico.
Portanto, é propósito da escola, assim como dos professores, garantir que a
criança não se concentre apenas nos seus conhecimentos prévios sustentados pela vida
cotidiana, mas avance qualitativamente nas objetivações de em-si ao para-si, na
superação da realidade em que se vê imersa, através de uma atenta e planejada
intervenção pedagógica centrada na zona de desenvolvimento proximal, ou seja, que a
criança estará próxima a conseguir alcançar, o conhecimento próximo àquele já
consolidado. Atestando isso, Giardinetto (1999, p. 46-47) confere que:
[...] Os conceitos escolares, além de promoverem a apropriação dos conceitos científicos, promovem também o desenvolvimento da sensibilidade artística, da postura filosófica, da análise política, de comportamentos morais, etc. A educação escolar promove um agir e pensar distinto daquelas formas de pensar inerentes ao pragmatismo [...] da vida cotidiana. [...] não se trata de cada indivíduo singular construir todo o saber mas ter o direito ao acesso a esse saber constituído.
29
Tendo consolidado o conciso estudo sobre as questões do educar e cuidar
compreendidas em ações indicotomizáveis que favorecem crescimento e
desenvolvimento da pessoa humana em toda a sua complexidade, assim como tendo
conceituado o ato do brincar como uma ação lúdica fundamental para o
desenvolvimento da identidade, corporeidade e autonomia da criança, no terceiro
capítulo faremos referência às teorias de Vigotski e Piaget, as quais enfatizam a
importância do jogo simbólico, mais especificamente o “jogo de papéis” na brincadeira
do faz de conta.
30
3. CONHECENDO AS CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS DE VIGOTSKI E
PIAGET SOBRE DESENVOLVIMENTO, APRENDIZAGEM E JOGO
SIMBÓLICO.
É necessário que todo educador conheça as teorias mais usualmente aceitas
sobre desenvolvimento e aprendizagem feitas por Vigotski e Piaget, através de leituras,
análise e reflexão, para que não diga conhecê-los pelo “achismo” do senso-comum, pois
de acordo com Oliveira (1995, p. 62-63):
[...] Se uma interpretação leviana das posições de Piaget levou, freqüentemente, a uma postura espontaneísta, que propõe que a criança deve ser deixada livre em sua interação com os estímulos do mundo físico para que possa amadurecer, “desabrochar”, em seu desenvolvimento natural, uma compreensão superficial de Vygotsky poderia levar ao oposto: uma postura diretiva, intervencionista, uma volta à “educação tradicional”.
Para Piaget o desenvolvimento e a aprendizagem ocorrem em uma relação
evolutiva entre a criança e seu meio, isto é, ela reconstrói suas ações e idéias em relação
às novas experiências ambientais, conforme salienta Pulaski (1983, p. 22):
[...] No decurso desse contínuo relacionamento com o meio, a criança exibe, em algumas idades, estruturas ou organizações de ação e pensamento características, que Piaget classificou de estágios [...] evolutivos do desenvolvimento intelectual [...]. Contudo, a contribuição maior de Piaget talvez seja a sua brilhante análise de como o conhecimento humano se desenvolve lentamente, para além de suas origens biológicas herdadas, através de um processo de auto-regulação baseado na resposta (feedback) do ambiente, que leva a uma reconstrução interna. A habilidade de adaptar-se a novas situações através da auto-regulação é o elo entre todos os seres vivos e a base da teoria biológica do conhecimento de Piaget.
Na concepção de Vigotski as relações entre desenvolvimento e aprendizagem,
segundo Oliveira (1995, p. 61): “[...] estabelece forte ligação entre o processo de
desenvolvimento e a relação do indivíduo com seu ambiente sócio-cultural.”
A autora complementa que:
[...] Embora Vygotsky enfatize o papel da intervenção do desenvolvimento, seu objetivo é trabalhar com a importância do meio cultural e das relações entre indivíduos na definição de um percurso de desenvolvimento da pessoa humana, e não propor uma pedagogia diretiva, autoritária. [...] trabalha, explícita e constantemente com a idéia de reconstrução, de reelaboração, por parte do
31
indivíduo dos significados que lhe são transmitidos pelo grupo cultural. [...] A constante recriação da cultura por parte de cada um dos seus membros é a base do processo histórico, sempre em transformação, das sociedades humanas. (OLIVEIRA, 1995, p. 63)
Evidenciada a importância das relações que a criança estabelece entre o meio
físico e social descritos por Piaget e Vigotski no decorrer do seu desenvolvimento, o
RCN (BRASIL, 1998, p. 181) vai ao encontro de tais convergências, na afirmativa de
que:
As crianças, desde que nascem, participam de diversas práticas sociais no seu cotidiano, dentro e fora da instituição de educação infantil. Dessa forma, adquirem conhecimentos sobre a vida social em seu entorno. A família, os parentes e os amigos, a instituição, a igreja, o posto de saúde, a venda, a rua entre outros, constituem espaços de construção de conhecimento social (BRASIL, 1998, v. 3, p.181).
3.1 Piaget
Torna-se fundamental fazer uma breve explanação do que venha a ser à base da
teoria biológica do conhecimento segundo Piaget.
Como dito anteriormente, para este psicólogo, o desenvolvimento e a
aprendizagem ocorrem em uma relação evolutiva entre a criança e seu meio, subsidiada
pela habilidade de adaptação frente às novas situações.
Entretanto, para que esta habilidade aconteça, é preciso haver uma reciprocidade
contínua entre duas tendências básicas e inerentes a todas as espécies, quais sejam: a
adaptação e a organização; isto é a “adaptação ocorre através da organização”. A autora
acrescenta que:
Para ele, [...] a adaptação é a essência do funcionamento intelectual, assim como a essência do funcionamento biológico. A outra é a organização, a habilidade de integrar as estruturas físicas e psicológicas em sistemas coerentes. [...] A tendência à organização está implícita em nossa herança biológica; é parte integrante da adaptação e não pode separar-se dela. (PULASKI, 1983, p.23)
Para exemplificar a relação intrínseca entre “adaptação e organização”,
discorreremos a seguir os dois processos através do comportamento humano, lembrando
32
que suas funcionalidades são simultâneas em todos os níveis biológicos e intelectuais,
possibilitando desta forma, o desenvolvimento tanto físico, quanto cognitivo. Assim
sendo:
O bebê que está aprendendo a comer seus primeiros alimentos sólidos usando uma colher precisa aprender a assimila-lo lambendo e mastigando, em lugar de seu método anterior de sucção. Ao mesmo tempo, precisa abrir sua boca e acomodar-se ao tamanho e posição da colher, em vez do mamilo a que está habituado. Assim, adapta-se a uma experiência. (PULASKI, 1983, p. 23)
Vejamos agora mais um exemplo, desta vez, relacionado a um brinquedo:
O mesmo se dá quando o bebê recebe seu primeiro chocalho. Tenta assimilá-lo a sua boca, enquanto a acomoda ao tamanho e formato do brinquedo. Essa experiência, no entanto, produz uma adaptação cognitiva, e não digestiva. O bebê aprende que se trata de um objeto que pode ser sugado, mas não engolido e, a partir daí, modifica sua compreensão dos objetos-de-levar-à-boca e passa a incluir suas subcategorias: (1) objetos comestíveis e (2) objetos não-comestíveis. Assim, enquanto funciona adaptativamente, o bebê se desenvolve também intelectualmente. (PULASKI, 1983, p. 23-24)
Os dois exemplos descritos sobre o ato do bebê com relação aos esquemas e / ou
categorias da experiência vivenciada, frente à natureza dual da adaptação destacada
pelos processos gêmeos de assimilação e acomodação, geram o eixo de ligação entre a
aliança da adaptação e organização.
Tomemos neste momento, a informação de Pulaski (1983, p. 23) sobre o
processo de assimilação:
[...] A assimilação é o processo de entrada, seja de sensações, alimento ou experiências. É o processo pelo qual as coisas, pessoas, idéias, costumes e preferências são incorporados à atividade de um indivíduo. Por exemplo, ouvindo as pessoas falarem ao seu redor, a criança aprende as inflexões, a construção das frases e o sentido da linguagem, muito antes de ser, ela própria capaz de falar. Está assimilando tudo o que ouve e gradualmente transformando-o um algo de seu.
Entendida a assimilação, nos atentemos sobre o processo da acomodação:
A assimilação é continuamente balanceada pela acomodação, o processo ajustador de saída, que consiste em dirigir-se para o meio. Acriança que ouve começa a balbuciar em resposta à conversa a seu redor e gradualmente
33
aproxima as palavras que está assimilando. “Papai” [...] sai como “papá” [...] e “flor” [...] pode ser “fô” [...], mas, à medida que a criança persiste em seus esforços, acomoda os sons que emite aos que ouve, e seu balbucio infantil se transforma em fala compreensível. Assim, ela se adapta aos requisitos de linguagem de seu ambiente. (PULASKI, 1983, p. 23)
Assim sendo, Piaget nos chama a atenção para o fato de que, para todas as
funções cognitivas em desenvolvimento, primeiramente a assimilação predomina, para
em seguida, a acomodação do funcionamento da própria função, ou seja, primeiramente
há um movimento funcional próprio (assimilação), que vai se especializando e
modificando através do contato com os objetos (acomodação).
Diante de tais afirmações e dos exemplos já analisados, percebemos que as
novas experiências realizadas pela criança se organizam de várias maneiras, seja
diferenciando, seja integrando ou ainda categorizando. Fica evidente também, que na
psicologia do desenvolvimento de Piaget, o indivíduo, mais especificamente, o bebê,
jamais é visto como um ser passivo, nem tampouco desamparado, ou seja:
[...] Ele é um organismo ativo e curioso, que se direciona, experimenta e busca meios de regular o equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, entre a sua realidade interior e a do mundo a seu redor. Assim como o corpo busca encontrar um estado fisiológico de equilíbrio entre o exercício e o repouso, ou entre a fome e a superalimentação, também a mente da criança busca o equilíbrio entre o que compreende e o que experimenta em seu ambiente. (PULASKI, 1983, p. 24)
Dessa forma, podemos perceber um terceiro componente auxiliador, ou melhor,
auto-regulador para a essência do funcionamento intelectual e biológico do mecanismo
de adaptação no indivíduo, denominado equilibração.
Segundo Piaget, a equilibração significa compreensão interna, isto é:
[...] o atingimento de um “estado (relativamente) constante” num sistema de equilíbrio e coordenação em permanente mudança entre o organismo e seu meio. [...] é um sistema aberto, no qual a resposta do ambiente contribui para um processo constante de reorganização interna auto-regulada. (PULASKI, 1983, p. 24)
Nesse sentido, Pulaski (1983, p. 25) completa e exemplifica que a função do
processo de equilibração: “[...] é produzir uma coordenação balanceada entre a
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assimilação e acomodação, assim como um termostato mantém um equilíbrio constante
entre o calor e o frio.”.
De fato, essa funcionalidade auto-reguladora dinâmica e contínua que Piaget
denominou equilibração, é a base central de sua teoria do desenvolvimento cognitivo da
criança, pois de acordo com Jeanette Gallagher (apud PULASKI, 1983, p. 25): “Esse
[...] é “o cerne da teoria piagetiana do desenvolvimento cognitivo”. 3”.
Finalizando o breve estudo feito sobre a teoria biológica do conhecimento
concebida por Piaget, utilizaremos suas palavras, destacando que: “[...] “o
desenvolvimento é uma equilibração progressiva a partir de um estado inferior até um
estado mais elevado de equilíbrio”. 4”. (PIAGET apud PULASKI, 1983, p. 25)
Portanto, podemos verificar que para Piaget ocorre primeiramente o
desenvolvimento antes da aprendizagem, ou seja, para que a criança aprenda é
necessário que os seus processos mentais estejam desenvolvidos para que ao relacionar-
se com o ambiente, consiga por meio do contato experimentar. De tal modo,
vivenciadas as diversas situações, sua cognição terá maturidade para apropriar-se de
novos conhecimentos, isto é, quanto mais desenvolvida estiver sua cognição, maior
capacidade terá para aprender.
Nesta perspectiva, constatamos que para o psicólogo suíço, a criança aprende
ativamente quando os seus diversos aspectos biológicos e intelectuais já estiverem
completados permitindo dessa forma, o desenvolvimento de novas habilidades
caracterizadas pelo aparecimento de novas qualidades de pensamentos, pois o
desenvolvimento de uma criança abrange: crescimento físico, mudanças psicológicas e
emocionais, bem como a adaptação social.
Recordemos então, por meio de auxílio do esquema abaixo, como ocorre à
relação evolutiva da criança com o seu meio segundo Piaget, para que as habilidades
frente às novas situações se efetivem:
3 Jeanette Gallagher, “Piaget’s Concept of Equilibration”, em Marilyn H. Appel e Lois S. Goldberg (org.), Equilibration: Theory, Research, and Application, vol. 1 de Topics in Cognitive Development (Nova York: Plenum Publishing Corp., 1977), p. 22. 4 Jean Piaget, Six Psychological Studies (Nova York: Random House, 1967), p. 3.
35
Fonte: Elaborado pela própria autora
3.2 Vigotski
ENTRADA
situação nova
2 (acomodação)
SAÍDA
ação
1 (assimilação)
3 (equilibração)
1 - ASSIMILAÇÃO Apropriação de conhecimento (entrada de
informação)
2 - ACOMODAÇÃO Comparação com conteúdos já existentes
(conhecimento prévio)
3 - EQUILIBRAÇÃO Aprendizagem do conhecimento novo (ação
refletida)
realizada as etapas, nessa seqüência, resulta a ação de novas habilidades
ou seja, mediação do resultado da construção entre a interação de fatores
internos com os externos.
36
Voltemos agora nosso olhar, para as relações de desenvolvimento e
aprendizagem segundo a concepção teórica de Vigotski.
É importante salientar que este autor busca “compreender a origem e o
desenvolvimento dos processos psicológicos ao longo da história da espécie humana e
da individual” (OLIVEIRA, 1995, p. 56).
Vigotski oferece-nos também reflexões e dados de pesquisa sobre os vários
aspectos do desenvolvimento, bem como, a importância do aprendizado sobre este.
Nesta abordagem, Oliveira (1995, p. 56) informa que:
[...] Para ele, desde o nascimento da criança, o aprendizado está relacionado ao desenvolvimento e é “um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas”. 5 Existe um percurso de desenvolvimento, em parte definido pelo processo de maturação do organismo individual, pertencente à espécie humana, mas é o aprendizado que possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento que, não fosse o contrário do indivíduo com certo ambiente cultural, não ocorreriam.
Neste sentido, podemos perceber que Vigotski compreende a aprendizagem pelo
processo em que o indivíduo:
[...] adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc., a partir de seu contato com a realidade, o meio ambiente, as outras pessoas. [...] justamente por sua ênfase nos processos sócio-históricos, a idéia de aprendizado inclui a interdependência dos indivíduos envolvidos no processo. (OLIVEIRA, 1995, p. 57)
Assim sendo, exemplifiquemos tais considerações a respeito das relações entre
desenvolvimento e aprendizado, a partir do fato destacado por Oliveira (1995, p. 56-57):
Podemos pensar, por exemplo, num indivíduo que vive num grupo cultural isolado que não dispõe de um sistema de escrita. Se continuar isolado nesse meio cultural que desconhece a escrita, esse indivíduo jamais será alfabetizado. Isto é, só o processo de aprendizado da leitura e da escrita (desencadeado num determinado ambiente sócio-cultural onde isso seja possível) é que poderia despertar os processos de desenvolvimento internos do indivíduo que permitiriam a aquisição da leitura e da escrita. Confirmando o mesmo fenômeno, podemos supor que se esse indivíduo, por alguma razão deixasse seu grupo de origem e passasse a viver num ambiente letrado, poderia ser submetido a um processo de alfabetização e seu desenvolvimento seria alterado.
5 Vygotsky. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984, p. 101.
37
Mediante tais reflexões podemos perceber que se não ocorrer interação entre o
indivíduo e o meio, seu desenvolvimento ficará impedido de acontecer, devido à falta de
situações propícias ao aprendizado, tal como confirma Oliveira (1995, p. 58):
Essa concepção de que é o aprendizado que possibilita o despertar de processos internos do indivíduo liga o desenvolvimento da pessoa a sua relação com o ambiente sócio-cultural em que vive e a sua situação de organismo que não se desenvolve plenamente sem o suporte de outros indivíduos de sua espécie.
A autora (idem) complementa tal enfoque afirmando que:
[...] essa importância que Vygotsky dá ao papel do outro social no desenvolvimento dos indivíduos cristaliza-se na formulação de um conceito específico dentro de sua teoria, essencial para a compreensão de suas idéias sobre as relações entre desenvolvimento e aprendizado: o conceito de zona de desenvolvimento proximal. (OLIVEIRA, 1995, p. 58)
Podemos definir zona de desenvolvimento proximal como um domínio
psicológico em constante transformação, determinada pela distância entre esta e o nível
de desenvolvimento real.
O nível de desenvolvimento real caracteriza-se pelas etapas já alcançadas, já
conquistadas pela criança, ou seja, aquelas capacidades ou funções que a criança já
domina completamente e exerce de forma autônoma, isto é, conhecimentos e ações já
internalizados, que promovem a resolução de um problema e /ou situação pela criança,
sem o auxílio de outra pessoa.
Já o nível de desenvolvimento proximal, caracteriza-se pela capacidade que a
criança tem de desempenhar tarefas com a ajuda de adultos ou pela colaboração de
outro companheiro mais capaz, ou seja, ações que ela ainda precisa de ajuda para
conseguir desempenha-las.
Vejamos alguns exemplos a partir do material onde se trabalha com a montagem
de torres com cubos de diversos tamanhos:
1. Nível de desenvolvimento real: a criança consegue montar as peças por si só,
seguindo a seqüência correta, a partir da co-relação que realiza (de maneira
independente) na observação que faz entre os vários tamanhos;
2. Nível de desenvolvimento proximal: a criança consegue montar as peças com
a ajuda feita pelas instruções de um adulto, do tipo: “Monte de uma maneira que
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a torre não caia”; “Você tem que colocar primeiro as peças maiores e depois as
menores” ou até mesmo se a criança realizar a montagem, observando uma
criança mais velha construindo a torre ao seu lado, é provável que consiga um
resultado positivo do que aquele que viesse a conseguir caso realizasse a tarefa
sozinha.
Porém, é imprescindível ressaltar que “não é qualquer indivíduo que pode, a
partir da ajuda do outro, realizar qualquer tarefa”. (OLIVEIRA, 1995, p. 59); é preciso
que a criança esteja em um determinado nível de desenvolvimento para ser capaz de
realizar uma tarefa proposta. Como no caso de uma criança que ainda não deu os
primeiros passos, só irá conseguir andar se um adulto a segurá-la pelas mãos e isso a
partir de um determinado nível de desenvolvimento; essa criança precisaria ter no
mínimo de 8 a 9 meses de idade. Em contrapartida, uma criança de 3 meses de idade,
não poderia e não seria capaz de andar nem mesmo com auxílio. O nível real determina
o proximal, que vai alterar o real e assim sucessivamente.
Dessa forma, a zona de desenvolvimento proximal se refere ao caminho que a
criança vai percorrer para desenvolver as funções que estão em processo de
amadurecimento e que irão se tornar funções consolidadas, estabelecidas no seu nível de
desenvolvimento real.
Neste sentido, constatamos que Vigotski atribui grande importância à interação
social enquanto mediadora do processo de construção do conhecimento.
Portanto, para este psicólogo russo, diferentemente de Piaget, ocorre
primeiramente a aprendizagem e conseqüentemente o desenvolvimento, ou seja, a
criança aprende através da socialização com as pessoas, a qual é responsável pela
mediação entre o conhecimento prévio (que a criança já têm, nível de desenvolvimento
real) e aquele que ela pela interferência de outrem, irá adquirir (conhecimento em
elaboração, nível de desenvolvimento proximal) e a partir dessa relação, ocorre a
promoção do desenvolvimento da atividade (ações) da criança através da aprendizagem.
Assim, a aprendizagem se efetiva na zona de desenvolvimento proximal.
Diante desta abordagem, verificamos então, que segundo Vigotski, o
desenvolvimento cognitivo resulta da interação entre a criança e as pessoas com quem
mantém contatos regulares. De tal modo, o adulto é o mediador entre a realidade
histórico-cultural e a criança, isto é, a apropriação do conhecimento pela criança é
mediada pelo adulto. Este é o condutor e organizador do conhecimento junto aos
39
Fonte: Elaborado pela própria autora
processos ativos (integração da realidade social nos aspectos: emocional, físico e
cognitivo) da criança.
Lembremos aqui também, por meio da observação do desenho abaixo, como se
dão as relações entre o ensino (aprendizado) e o desenvolvimento da criança de acordo
com o conceito de zona de desenvolvimento proximal, conceito fundamental na teoria
de Vigotski:
Concluindo o conciso estudo sobre a teoria das relações de desenvolvimento e
aprendizagem delineados por Vigotski, discorreremos a seguir, a importante
contribuição dada por Oliveira (1995, p. 60):
[...] aquilo que uma criança é capaz de fazer com a ajuda de alguém hoje, ela conseguirá fazer sozinha amanhã. É como se o processo de desenvolvimento progredisse mais lentamente que o processo de aprendizado; o aprendizado desperta processos de desenvolvimento que, aos poucos, vão tornar-se parte das funções psicológicas consolidadas do indivíduo. Interferindo constantemente na zona de desenvolvimento proximal das crianças, os adultos e as crianças mais experientes contribuem para movimentar os processos de desenvolvimento dos membros imaturos da cultura.
R P
Necessidade de orientação / intervenção
feitas pelo adulto / professor
NÍVEL DE DESENVOLVIMENTO
PROXIMAL
Capacidades próximas de
serem alcançadas pela criança
Capacidades já desenvolvidas
(ponto de partida)
NÍVEL DE DESENVOLVIMENTO
REAL
40
3.3 O brincar nas teorias de Piaget e Vigotski
Estabelecida a distinção entre as concepções teóricas de Piaget e Vigotski sobre
o desenvolvimento cognitivo e a aprendizagem, nos atentaremos a elucidar agora, suas
posições frente à atividade infantil do brincar nos espaços educativos.
Piaget, em seu estudo da evolução do jogo infantil, concluiu que existem três
categorias principais de jogo: os jogos práticos, os simbólicos e os que têm regras.
Entretanto, por considerar o simbolismo lúdico um passo necessário no caminho do
desenvolvimento da inteligência adaptada, a maior parte de seu interesse focaliza-se nos
jogos simbólicos, que implicam a representação de um objeto ausente, sendo a um
tempo, imitativos e imaginativos.
Nesse sentido, Pulaski (1983, p. 92), completa sobre o jogo simbólico: “[...] Na
medida em que simbolizam para a criança seus próprios sentimentos, interesses e
atividades, ajudam-na a expressar-se criativamente e a desenvolver uma vida fantasiosa
rica e satisfatória.”.
A fim de esclarecer com detalhes o que venha a ser a atividade da criança no
jogo simbólico, que ocorre na idade entre 2 a 4 anos, transcorreremos a seguir exemplos
sobre este simbolismo lúdico que Piaget observou nas atitudes de seus filhos, por meio
da projeção de seus esquemas simbólicos em novos objetos, atrelando imaginação e
realidade:
[...] Aos dois anos, Jacqueline movia os dedos sobre a mesa dizendo, “dedo anda... cavalo trotando”. Luciene era o carteiro, ou sua avó [...] [...] Aos 4; 3, L. , de pé ao meu lado e muito quieta, imitou o som de sinos. Pedi-lhe que parasse, mas ela continuou. Coloquei então minha mão sobre sua boca. Ela me empurrou, zangada, e disse, continuando a manter sua postura muito ereta: “não faz isso! Eu sou uma igreja”. 6 (PIAGET apud PULASKI, 1983, p. 93)
Podemos observar na seqüência dos exemplos descritos acima, que no primeiro
jogo, Jacqueline tenta usar livremente seus poderes individuais, reproduzindo ações pelo
prazer de ver-se desempenhá-las e exibi-las para outra pessoa. Em seguida, no segundo
jogo, Lucienne reproduz a aparência e / ou ações de outrem e por fim, no terceiro jogo,
novamente Lucienne, realiza a transposição de cenas inteiras, ao invés de fragmentos
isolados. 6 Piaget, Play, Dreams and Imitation in Childhood, p. 125
41
Mediante tais considerações, voltemos nossa atenção, para mais dois importantes
exemplos:
[...] Por volta de dois anos e meio, Jacqueline fingiu preparar um banho para Lucienne, usando uma caixa vazia como banheira e um pedaço de grama como termômetro. Mergulhou o termômetro na banheira e achando a água muito quente, esperou alguns instantes e testou-a novamente. “Agora está bom, ainda bem!”, disse, e fingiu despir Lucienne, peça por peça, sem realmente tocá-la. Cerca de um mês depois, Jacqueline fingiu estar caminhando com um bebê no colo para niná-lo, falando com ele enquanto o mantinha nos braços. Uma semana depois, ao reproduzir a mesma brincadeira, parava de falar à aproximação de qualquer pessoa. A uma distância conveniente, Piaget podia ouvi-la dizer coisa como, “Agora nós vamos passear”. O faz-de-conta de Jacqueline já se estava transformando em uma experiência interior secreta. (PULASKI, 1983, p. 93)
A partir desses exemplos, verificamos o quanto a criança por meio da
brincadeira do faz-de-conta e da observação do seu entorno, exploram o mundo através
do jogo de papéis, para não só entendê-lo melhor, mas também conhecer-se com mais
intimidade.
Temos também outro aspecto muito importante analisado por Piaget no jogo
simbólico:
[...] Ao chegar aos quatro anos, Jacqueline era dotada de uma imaginação bem desenvolvida e, sempre que sofria qualquer restrição, era capaz de elaborar uma história “compensatória”em que ficava clara a direção de seus desejos. [...]. Ao ser mandada para a cama para um cochilo, Jacqueline retrucou, “Marécage nunca dorme de tarde; ela brinca o tempo todo”. Evidentemente, a criança estava realizando no faz-de-conta o que lhe era proibido na realidade. (PULASKI, 1983, p. 94)
Podemos constatar que na brincadeira do faz-de-conta desempenhada por
Jacqueline (em seu jogo de papéis caracterizado por uma boneca), que através da
transposição simbólica, presente no jogo, a criança explicita e reduz parte do seu
desprazer com o objetivo de transformar as situações vivenciadas (nas quais a criança
está sujeita as exigências parentais), mais toleráveis para sua aceitação; aprendendo
dessa forma, a conviver com realidades desagradáveis que a vida oferece e venha a
oferecer.
Nesse sentido, Pulaski (1983, p. 95) contribui:
42
Nessas formas de jogo, como assinala Piaget, a criança amplia sua consciência através de novas experiências ou se vinga da realidade pelas que lhe são desagradáveis. Pode inclusive antever os resultados de suas ações e projetar, em sua imaginação, as conseqüências que adviriam se desobedecesse às instruções ou se envolvesse em problemas.
A autora coloca ainda qual venha a ser, então, a função do jogo simbólico:
“Assim, a função do jogo simbólico é claramente percebida no “faz-de-conta” das
crianças de dois a quatro anos. Ela consiste em “assimilar a realidade ao ego, ao mesmo
tempo em que o libera das exigências da acomodação”. 7”. (PULASKI, 1983, p. 95).
Entretanto, Piaget ao analisar as demais faixas etárias, de cinco anos em diante,
parece diminuir o significado que a brincadeira no jogo do faz-de-conta representa em
relação ao fazer lúdico das crianças de 2 a 4 anos.
Comprovando isso, discorreremos a seguir, algumas análises das quais
discordamos de Piaget.
De acordo com o teórico, Pulaski (1983, p. 95 - 99) informa:
[...] (2-4) Essa é a idade em que o jogo fantasioso infantil é mais exagerado e mais distorcida a sua visão da realidade. [...] Piaget observa que, após os quatro anos, os jogos simbólicos se tornam muito mais ordenados, em contraste com a incoerência dos jogos iniciais. Verificamos como, no período intuitivo, o uso do jogo simbólico decresce em favor da imitação das atividades da vida real. Isso se dá porque a criança está atingindo um melhor equilíbrio entre a assimilação e a acomodação interessando-se mais pelo mundo real do que por suas fantasias particulares. [...] O pensamento adaptado se amplia, à medida que decresce o jogo simbólico. [...] Os jogos simbólicos diminuem à medida que progride a socialização [...]. [...] Enquanto se acomoda melhor ao mundo externo, a criança encontra menos oportunidade de assimilar a realidade e suas necessidades pessoais internas, vindo assim a distorcê-la. Quanto à questão de as crianças acreditarem em seu jogo simbólico, Piaget crê que isso dependa da idade da criança. Embora façam muito cedo a distinção entre o fictício e o real, afirma Piaget, as crianças se recusam a permitir que o mundo dos adultos ou a realidade corriqueira interfiram no deleite de sua realidade privada. [...] “A criança de dois a quatro anos não se detém na questão de seus símbolos lúdicos serem ou não reais. Ela sabe, em certo sentido, que não o são para outrem e não se empenha seriamente em persuadir o adulto dessa realidade. Para ela, porém, essa é uma questão que não se coloca, porque o jogo simbólico é uma satisfação direta do ego e tem seu próprio tipo de crença, que é uma realidade subjetiva”. 8 (parênteses nossos)
7 Piaget, Play, Dreams and Imitation in Childhood, p. 134. 8 Piaget, Play, Dreams and Imitation in Childhood, p. 168.
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Se recordarmos os exemplos descritos por Piaget, relatados anteriormente, em
observação da brincadeira espontânea de seus filhos, nos jogos do faz-de-conta,
poderemos verificar claramente, que nesta fase da criança, cuja faixa etária se faz entre
dois a quatro anos, como o símbolo lúdico, desempenhado pelo jogo de papéis, tem
coerência entre o que a criança vivencia e experimenta na sua realidade e projeta a partir
da sua interpretação, mesmo que subjetiva, porém, incisiva em detalhes, o quanto ela, a
partir da incorporação de papéis, elucida o repertório cultural da qual faz parte.
Portanto, é no seu fazer lúdico, que a criança passa a explorar o mundo para
entendê-lo melhor. Sua maneira de poder realizar esta exploração far-se-á pelo faz-de-
conta, presente no jogo simbólico, o qual permite que ela dê enfoque nas diversas
experiências que costuma vivenciar no seu dia-a-dia, bem como, nas demais advindas
de sua imaginação, por meio da fantasia; visto que, a fantasia é uma aptidão totalmente
criativa e construtiva, associada pelo alto controle de referendar seus desejos ou
preocupações mais íntimas.
Por meios dessas representações simbólicas, inicialmente simples, darão lugar a
um faz-de-conta mais elaborado, que ajudarão a criança a compreender situações
conflitantes, como as dos papéis sociais estabelecidos, por exemplo, professor, guarda,
pai, mãe, filho, etc.
Outro fator também muito importante e que merece destaque, é que através desta
imitação representativa a criança aprende a lidar com regras e normas sociais,
desenvolvendo a capacidade de interação e aprendendo a ter e lidar com os limites.
O jogo simbólico, do qual a brincadeira com bonecas é um exemplo típico,
oferece à criança não só oportunidade de atualizar seus “instintos maternais” ou de
aprender normas culturais de desempenho de papéis femininos, mas também, e
principalmente, oferecer oportunidade de organizar os conflitos cotidianos vivenciados,
bem como seus desejos insatisfeitos. Pois, à medida que desempenha o papel de mãe,
poderá trabalhar mentalmente as angústias, alegrias, etc., que experenciou no contato
com sua mãe.
Outro exemplo bem característico é o nascer de um irmãozinho, quando é bem
possível que a criança manifeste com suas bonecas sentimentos e atos agressivos que
gostaria de dirigir, na realidade, ao bebê. Ou ainda, é freqüente observarmos em uma
criança que sofre agressões constantes dos pais, brincar de bater com ira na boneca.
Com a representação e/ou repetição da situação vivida no jogo simbólico, a criança se
44
fortalece em termos de estruturação de personalidade, estando aí presentes tanto
elementos cognitivos como afetivos.
Dessa forma, podemos nos atentar sobre a significativa importância que o jogo
simbólico perfaz para a aprendizagem da criança; este é a codificação do pensamento
traduzido em formas, ou seja, a representação corporal do imaginário no qual se
predomina a fantasia.
Isso quer dizer que na sua imaginação a criança pode modificar sua vontade,
usando o faz-de-conta proporcionado pelo jogo de papéis à projeção de estado de
consciência prazerosas ou penosas, neste último, não para conservá-los na qualidade de
dolorosos, mas torná-los suportáveis e quase agradáveis.
Nesse sentido, o jogo de papéis é uma forma de expressão e comunicação de si
mesma partilhada ou não com os outros, com os objetos e com o meio, em que a criança
atua no mundo imaginativo, pois não consegue expressar em palavras o que pensa da
sua relação entre a realidade e a simbolização desta realidade.
Logo, por meio da prática do jogo de papéis, é possibilitada a criança recriar,
simbolizar e representar situações do cotidiano, por uma forma de expressão imaginária
e veraz, que mais se aproxima da vida real.
Contudo, apesar de Piaget decrescer a nível qualitativo, a significativa
representatividade que a brincadeira possui no jogo simbólico entre as idades de 2 a 4
anos, acredita na relevância da atividade lúdica para as crianças nos anos pré-escolares.
Tal concepção implica em que, se a criança for bem trabalhada, instigada e estimulada
pelo professor (assim como fez Piaget em suas pesquisas com seus filhos e demais
crianças), refletirá no desenvolvimento de capacidades para o aprimoramento das
habilidades (aptidões) desejáveis como a originalidade, a flexibilidade e a imaginação
criativa.
Adentremos agora à posição de Vigotski frente ao papel do brinquedo para a
aprendizagem e para o desenvolvimento da criança.
Vigotski estabelece uma relação estreita entre o jogo e a aprendizagem,
atribuindo-lhe grande importância, por ser o brinquedo e a brincadeira domínios da
atividade infantil.
Não é apenas o caráter de espontaneidade do jogo que o torna uma atividade
importante para a aprendizagem e o desenvolvimento da criança, mas sim a prática no
plano da imaginação da capacidade e/ou habilidade de planejar, imaginar situações
45
diversas, representar papéis e situações do cotidiano, bem como, o caráter social das
situações lúdicas, os seus conteúdos e as regras inerentes a cada situação.
Isso quer dizer que ao desenvolver um jogo simbólico, a criança ensaia
comportamentos e papéis, projeta-se em atividades dos adultos, ensaia atitudes, valores,
hábitos e situações diversas.
Dessa forma, Vigotski têm como principal enfoque o jogo do faz-de-conta,
conforme atesta Oliveira (1995, p. 66):
Quando Vygotsky discute o papel do brinquedo, refere-se especificamente à brincadeira de “faz-de-conta”, como brincar de casinha, brincar de escolinha, brincar com um cabo de vassoura como se fosse um cavalo. Faz referência a outros tipos de brinquedo, mas a brincadeira de “faz-de-conta” é privilegiada em sua discussão sobre o papel do brinquedo no desenvolvimento.
Vigotski valoriza e atribui grande importância à brincadeira do faz-de-conta, por
esta trabalhar o papel da imaginação que coloca em estreita relação com a atividade
criadora da criança, pois no jogo, ela representa e produz com desenvoltura aquilo que
viu, ou que lhe contaram. Ou seja:
Numa situação imaginária como a da brincadeira de “faz-de-conta”, [...] a criança é levada a agir num mundo imaginário [...], onde a situação é definida pelo significado estabelecido pela brincadeira [...] e não pelos elementos reais concretamente presentes (OLIVEIRA, 1995, p. 66).
Vejamos o exemplo descrito abaixo para uma melhor compreensão do que seja
objeto e significado para a criança:
Ao brincar com um tijolinho de madeira como se fosse um carrinho, por exemplo, ela se relaciona com o significado em questão (a idéia de “carro”) e não com o objeto concreto que tem nas mãos. O tijolinho de madeira serve como uma representação de uma realidade ausente e ajuda a criança a separar objeto e significado. [...] O brinquedo provê, assim, uma situação de transição entre a ação da criança com objetos concretos e suas ações com significados (grifo da autora - OLIVEIRA, 1995, p. 66).
Na verdade Vigotski esclarece que o brinquedo fornece um estágio de transição
na direção em que um objeto torna-se o pivô da separação do pensamento entre o
significado do objeto real convertido em objeto imaginário utilizado pela criança no
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jogo do “faz-de-conta”, enriquecendo ainda o processo pelo qual a criança utiliza esse
objeto para desempenhar com precisão o papel que lhe chamou a atenção vivenciada no
seu cotidiano, uma vez que: “O comportamento das crianças pequenas é fortemente
determinado pelas características das situações concretas em que elas se encontram”.
(OLIVEIRA, 1995, p. 66).
Além desta facilidade criadora em transformar objetos em brinquedos
imaginários para sua atuação na brincadeira do faz-de-conta, é importante destacar
também, que ao brincar a criança tenta ser o que ela pensa que no papel que está
desempenhando deveria ser, pois na vida real, a criança não se preocupa com a postura
intrínseca a sua condição, como salienta Oliveira (1995, p. 67): “[...] O que na vida real
é natural e passa despercebido, na brincadeira torna-se regra e contribui para que a
criança entenda o universo particular dos diversos papéis que desempenha.”.
Podemos constatar falta de consciência da criança perante sua realidade, no que
tange ao seu papel particular, isto é, natural, ao observar uma criança brincando de ser
irmã, sendo que na vida real ela já exerce este papel:
[...] duas irmãs, [...] disseram uma para a outra: “Vamos brincar de irmãs?” Elas estavam encenando a realidade. [...] ao brincar, a criança tenta ser o que ela pensa que uma irmã deveria ser. Na vida, a criança comporta-se sem pensar que ela é a irmã de sua irmã. Entretanto, no jogo em que as irmãs brincam de “irmãs”, ambas estão preocupadas em exibir seu comportamento de irmã; o fato de as duas irmãs terem decidido brincar de irmãs induziu-as a adquirir regras de comportamento (VIGOTSKI, 1998, p. 124).
Verificamos dessa forma, que além de ser e oferecer uma situação imaginária, o
brinquedo também é uma atividade conduzida por regras. Mesmo no universo do faz-
de-conta, existem regras que precisam ser respeitadas e seguidas, conforme evidencia
Vigotski (1998, p. 125):
[...] Sempre que há uma situação imaginária no brinquedo, há regras - não as regras previamente formuladas e que mudam durante o jogo, mas aquelas que têm sua origem na própria situação imaginária. [...] a noção de que uma criança pode se comportar em uma situação imaginária sem regras é simplesmente incorreta. Se a criança está representando o papel de mãe, então ela obedece as regras de comportamento maternal. O papel que a criança representa e a relação dela com um objeto (se o objeto tem seu significado modificado) originar-se-ão sempre das regras.
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Mediante tais abordagens, percebe-se que na brincadeira ocorrem situações
imaginárias em que dado momento, resulta o papel lúdico, isto é, a reprodução da ação
pela criança. No papel que desempenha no brinquedo, a criança assume diferentes
funções sociais generalizadas do adulto, sendo muitas vezes uma função profissional
(um médico que vacina, por exemplo), conduzindo-se assim, de acordo com as regras de
ação subentendidas a essa função social.
Neste sentido, Leontiev (2001, p.133) completa:
[...] a criança que brinca atribui-se uma função social, humana, a qual ela desempenha em suas ações. Uma criança brinca de ser motorista ou professora de escola maternal etc., construindo uma situação apropriada e o enredo do jogo. Este é o conteúdo objetivo expresso do jogo que diretamente nos chama a atenção, mas em um jogo subjetivo há também, necessariamente, um outro elemento constitutivo. Esta é a regra da ação latente em qualquer papel do enredo. Quando uma criança assume um papel em uma brincadeira, por exemplo, o de professora da escola maternal, ela se conduz de acordo com as regras de ação latentes a essa função social; ela organiza o comportamento das crianças à mesa, manda-as fazer suas sestas, e assim por diante. A unidade do papel do enredo e da regra do jogo expressa a unidade do conteúdo físico e social do brinquedo.
Assim sendo, podemos compreender que na brincadeira, a ação da criança torna-
se uma regra de comportamento no brinquedo, advinda da sua experiência diária que
muitas vezes acaba por passar-se despercebida.
Entretanto, é essencial esclarecer que o jogo de faz-de-conta da criança, não é
apenas uma recordação singela do vivido, ou uma simples imitação, mas a
transformação criadora das impressões para a formação de uma nova realidade que
responda às exigências da própria criança.
Nesse sentido, Oliveira (1995, p. 63) contribui:
Ligado aos procedimentos escolares; mas não restrito à situação escolar, está o mecanismo de imitação, destacado por Vygotsky. Imitação, para ele, não é mera cópia de um modelo, mas reconstrução individual daquilo que é observado nos outros. [...] Vygotsky não toma a atividade imitativa, portanto, como um processo mecânico, mas sim como uma oportunidade de a criança realizar ações que estão além de suas próprias capacidades, o que contribui para seu desenvolvimento. Ao imitar a escrita do adulto, por exemplo, a criança está promovendo o amadurecimento de processos de desenvolvimento que a levarão ao aprendizado da escrita.
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Nesta perspectiva sobre a brincadeira da criança não ser apenas uma imitação
sem conteúdo e objetivo, Leontiev (2001, p.120) acrescenta:
[...] a brincadeira da criança não é instintiva, mas precisamente humana, atividade objetiva, que, por constituir a base da percepção que a criança tem do mundo dos objetos humanos, determina o conteúdo de suas brincadeiras. [...] Uma criança que domina o mundo que a cerca é a criança que se esforça para agir neste mundo.
Mediante tais considerações, Vigotski (1998, p.135) ainda destaca que:
[...] o brinquedo contém todas as tendências do desenvolvimento sob forma condensada, sendo, ele mesmo, uma grande fonte de desenvolvimento. [...] o brinquedo é muito mais a lembrança de alguma coisa que realmente aconteceu do que imaginação. É mais a memória em ação do que uma situação imaginária nova. [...] É incorreto conceber o brinquedo como uma atividade sem propósito. [...] o propósito decide o jogo e justifica a atividade. O propósito, como objetivo final, determina a atitude afetiva da criança no brinquedo.
Diante destas conjecturas sobre o mérito que a brincadeira no jogo do faz-de-
conta perfaz para a aprendizagem e desenvolvimento infantil, podemos atribuir à escola,
o grande desafio para que tal prática aconteça de maneira significativa e verdadeira.
Assim, a expectativa da concepção teórica de Vigotski para o ensino escolar,
torna-se imediata, conforme esclarece Oliveira (1995, p.61- 62):
[...] Se o aprendizado impulsiona o desenvolvimento, então a escola tem um papel essencial na construção do ser psicológico adulto dos indivíduos que vivem em sociedades escolarizadas. Mas o desempenho desse papel só se dará adequadamente quando, conhecendo o nível de desenvolvimento dos alunos, a escola dirigir o ensino não para etapas intelectuais já alcançadas, mas sim para estágios de desenvolvimento ainda não incorporados pelos alunos, funcionando realmente como um motor de novas conquistas psicológicas. Para a criança que freqüenta e escola, o aprendizado escolar é elemento central no seu desenvolvimento.
Nesta perspectiva Leontiev (2001, p. 130) contribui:
Nos brinquedos do período pré-escolar, as operações e ações da criança são, [...] sempre reais e sociais, e nelas a criança assimila a realidade humana. O brinquedo [...] é realmente “o caminho pelo qual as crianças compreendem o mundo em que vivem e que serão chamadas a mudar”.
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Entretanto, para que o brinquedo torne-se de fato um instrumento pedagógico
eficaz nos espaços educativos de modo a ajudar o professor a ensinar a criança a ser um
agente transformador na construção de um mundo melhor, é preciso que a escola esteja
estruturada e explicitamente comprometida com a promoção de processos de
aprendizado e desenvolvimento.
Nesse sentido, Vigotskii (2001, p. 111, 113 - 116) enfatiza:
É uma comprovação empírica, freqüentemente verificada e indiscutível, que a aprendizagem deve ser coerente com o nível de desenvolvimento da criança. [...] A criança atrasada, abandonada a si mesma, não pode atingir nenhuma forma evolucionada [...] e, precisamente por isso, a tarefa concreta da escola consiste em fazer todos os esforços para encaminhar a criança nessa direção, para desenvolver o que lhe falta. [...] o único bom ensino é o que se adianta ao desenvolvimento. [...] assim, todo o processo de aprendizagem é uma fonte de desenvolvimento que ativa numerosos processos, que não poderiam desenvolver-se por si mesmos sem a aprendizagem. [...] Esses processos estão todos ligados ao desenvolvimento do sistema nervosos central. A aprendizagem escolar orienta e estimula processos internos de desenvolvimento. A tarefa real de uma análise do processo educativo consiste em descobrir o aparecimento e o desaparecimento dessas linhas internas de desenvolvimento no momento em que se verificam, durante a aprendizagem escolar. [...] aprendizagem e desenvolvimento da criança, ainda que diretamente ligados, nunca se produzem de modo simétrico e paralelo. O desenvolvimento da criança não acompanha nunca a aprendizagem escolar, como uma sombra acompanha o objeto que a projeta.
Em conformidade com Vigotski, frente a aprendizagem e o desenvolvimento da
criança nos espaços educativos, Oliveira (1995, p.62) completa: O processo de ensino-aprendizado na escola deve ser construído, então, tomando como ponto de partida o nível de desenvolvimento real da criança [...] e como ponto de chegada os objetivos estabelecidos pela escola, supostamente adequados à faixa etária e ao nível de conhecimentos e habilidades de cada grupo de crianças. O percurso a ser seguido nesse processo estará balizado também pelas possibilidades das crianças, isto é, pelo seu nível de desenvolvimento potencial. [...] a escola tem o papel de fazer a criança avançar em sua compreensão do mundo a partir do seu desenvolvimento já consolidado e tendo como meta etapas posteriores, ainda não alcançadas.
Nesse sentido, é preciso que o professor tenha clareza e conhecimento sobre as
características e particularidades das diferentes faixas etárias, ampliando o que entenda
por ensinar, reconhecendo ainda, que a motivação (inerente a cada indivíduo, motivos e
50
interesses internos), juntamente com a maturação das necessidades, desempenha caráter
especial no desenvolvimento da criança, em relação à singularidade do brinquedo.
Diante deste contexto, sobre a relação harmônica e singular do brinquedo
Vigotski (1998, p. 134-135) afirma que: [...] o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário, no brinquedo é como se ela fosse maior do que é na realidade. Como no foco de uma lente de aumento, o brinquedo contém todas as tendências do desenvolvimento sob forma condensada, sendo, ele mesmo uma grande fonte de desenvolvimento.
Nesta abordagem, Vigotski (1998, p. 135) ressalta ainda que: A brincadeira fornece, pois, ampla estrutura básica para mudanças das necessidades e da consciência, criando um novo tipo de atitude em relação ao real. Nela aparecem a ação na esfera imaginativa num situação de faz-de-conta, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e das motivações volitivas, constituindo-se, assim, no mais alto nível de desenvolvimento pré-escolar.
Mediante tais considerações sobre a importante relação que a criança (também
em idade escolar) faz com o brinquedo no jogo de faz-de-conta e a desafiadora
responsabilidade que a escola possui em seu processo educativo frente a essa
necessidade lúdica infantil, permeada pela atitude da criança em relação à realidade,
Oliveira (1995, p. 62) completa: Como na escola o aprendizado é um resultado desejável, é o próprio objetivo do processo escolar, a intervenção é um processo pedagógico privilegiado. O professor tem o papel explícito de interferir na zona de desenvolvimento proximal dos alunos, provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente. O único bom ensino afirma Vygotsky, é aquele que se adianta ao desenvolvimento. Os procedimentos regulares que ocorrem na escola - demonstração, assistência, fornecimento de pistas, instruções - são fundamentais na promoção do “bom ensino”. Isto é, a criança não tem condições de percorrer, sozinha, o caminho do aprendizado. A intervenção de outras pessoas - que, no caso específico da escola, são o professor e as demais crianças - é fundamental para promoção do desenvolvimento do indivíduo.
Tal posição expressa a concepção de Vigotski, sobre o grande valor da
intervenção do professor - e de outras crianças - em assistência ao desenvolvimento de
51
cada indivíduo, no tocante à dimensão do conhecimento procedimental envolvido na
situação escolar, procedimento este que: [...] sugere uma recolocação da questão de quais são as modalidades de interação que podem ser consideradas legítimas promotoras de aprendizado na escola. Se o professor dá uma tarefa individual aos alunos em sala de aula, por exemplo, a troca de informações e de estratégias entre as crianças não deve ser considerada como procedimento errado, pois pode tornar a tarefa um projeto coletivo extremamente produtivo para cada criança. Do mesmo modo, quando um aluno recorre ao professor (ou aos pais, em casa) como fonte de informação para ajuda-lo a resolver algum tipo de problema escolar, não está burlando as regras do aprendizado mas, ao contrário, utilizando-se de recursos legítimos para promover seu próprio desenvolvimento. [...] Qualquer modalidade de interação social, quando integrada num contexto realmente voltado para promoção do aprendizado e do desenvolvimento, poderia ser utilizada, portanto, de forma produtiva na situação escolar. (OLIVEIRA, 1995, p. 64).
Desta maneira, é necessária, portanto, uma visão mais apurada sobre qual deva
ser o procedimento adequado do educador na instituição escolar, para que sua prática
auxilie verdadeiramente no fazer lúdico da criança.
Por meio de brincadeiras planejadas, isto é, com finalidade educacional o
professor saberá em que momento realizará a intervenção na brincadeira que será
mediada pela relação ativa entre professor e aluno.
Nesta abordagem, propõe o documento dos Referenciais Curriculares Nacionais:
A intervenção intencional baseada na observação das brincadeiras das crianças, oferecendo-lhes material adequado, assim como um espaço estruturado para brincar permite o enriquecimento das competências imaginativas, criativas e organizacionais infantis. Cabe ao professor organizar situações para que as brincadeira ocorram de maneira diversificada para propiciar às crianças a possibilidade de escolherem os temas, papéis, objetos e companheiros com quem brincar ou jogos de regras e de construção, e assim elaborarem de forma pessoal e independente suas emoções, sentimentos, conhecimentos e regras sociais. (BRASIL, 1998, v. 1, p. 29).
Nesse sentido, justifica-se nossa escolha pelo referencial teórico de Vigotski,
pois acreditamos em uma educação em que a transformação no indivíduo, desde a tenra
idade, só se efetivará permeada na construção real de suas capacidades integradas em
sua relação com o meio, advinda pela apropriação da experiência social historicamente
acumulada e culturalmente organizada.
52
Assim sendo, verificamos ao término do estudo sobre o brincar, segundo as
contribuições teóricas de Piaget e Vigotski, que suas concepções quanto o papel do jogo
simbólico, na brincadeira do faz-de-conta, apresentam-se de maneira dicotômica, pois
enquanto para Piaget no jogo prepondera a assimilação, em que a criança assimila no
jogo o que percebe da realidade às estruturas que já construiu e dessa forma o jogo não
se faz determinante nas modificações das estruturas; para Vigotski, ao contrário, o jogo
proporciona direta e significativa alteração das estruturas. Além de que, enquanto Piaget
enfatiza a interação com o meio físico, Vigotski dá ênfase sobre a interação com o meio
sócio-cultural.
Outro aspecto divergente entre os teóricos é a idéia de transformação criadora. É
correto afirmar que para ambos se fala em uma transformação do real por exigência das
necessidades da criança; mas enquanto que para Piaget a imaginação da criança não é
mais do que atividade deformante da realidade, para Vigotski a criança cria, a partir do
que conhece, das oportunidades do meio e em função das suas necessidades e
preferências.
Logo, de acordo com as concepções de Vigotski, uma prática pedagógica
adequada perpassa não somente por deixar as crianças brincarem, mas,
fundamentalmente por ajudá-las a brincar, por brincar com elas e principalmente por
ensiná-las através do brincar.
Ao invés dos professores de educação infantil apenas atuarem como
observadores neutros e passivos do sujeito na atividade lúdica da criança precisam agir
como elementos ativos numa situação de interação social, utilizando a intervenção como
forma de estabelecer um trabalho coerente, enfatizando uma perspectiva pedagógica,
crítica e reflexiva, assegurando desta forma, a construção de aprendizagens
significativas para seus alunos.
Contudo, esta prática consciente e atuante do professor só será possível, se a
escola também tiver uma postura comprometida com a promoção do processo de ensino
e aprendizagem, pois uma reforma educacional coerente envolve conteúdos conceituais,
procedimentais e atitudinais, os quais afetam diretamente no sucesso ou no fracasso do
aluno, pois os primeiros anos de escolaridade são essenciais na vida de toda criança.
Partindo dessas considerações, a escola e o professor permitirão através do jogo
simbólico, não só o aprimoramento do conhecimento já alcançado pela criança (nível de
desenvolvimento real - objetivações em-si), mas a superação do modo de compreensão
da realidade, avançando de forma qualitativa no nível de desenvolvimento proximal,
53
possibilitando ainda, adquirir conhecimentos novos (objetivações para-si) e ampliar sua
visão de mundo.
Portanto, por meio de uma intervenção coerente com o caráter educativo, o
educador promoverá uma real transformação da realidade até então conhecida e
considerada certa pela criança, perfazendo a dialogicidade entre a teoria e a prática
educativa.
54
4. METODOLOGIA DA PESQUISA
Neste capítulo apresentamos o trabalho interventivo, através do qual buscamos
mostrar uma forma de atuação do professor na brincadeira, com vistas à promoção do
desenvolvimento do aluno.
4.1 Etapas da pesquisa:
A princípio foi realizado um levantamento teórico que investigou o significado
da brincadeira simbólica, mais especificamente o jogo de papéis na brincadeira do faz
de conta, para a prática pedagógica e a importância a ela dada por Piaget e Vigotski,
cujas teorias são apropriadas pela educação.
4.2 Local:
Esta pesquisa foi realizada em uma escola particular, situada no centro urbano
comercial da cidade de Bauru que atende famílias da classe média alta. Os pais, na
grande maioria são empresários, autônomos, médicos, dentistas, vereadores, juízes,
advogados, policiais, entre outros funcionários públicos que atendem a vários setores do
município.
Quanto à estrutura física e organizacional, a escola possui o curso de Educação
Infantil, atendendo crianças de 02 a 05 anos de idade e dando continuidade à proposta
da Educação Infantil, o curso do Ensino Fundamental de 1º ao 9º Ano, atendendo alunos
de 06 a 14 anos.
A ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, é decorrente da Lei 11.
2749, responsável pela alteração da redação dos artigos 29, 30, 32 e 87 da Lei nº 9. 394,
de 20 de dezembro de 1996, a qual estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, determinando a duração de nove anos para o ensino fundamental, com
matrícula obrigatória a partir dos seis anos de idade.
A escola possui 1028 alunos matriculados, categorizados na Educação Infantil
por:
9 De acordo com a Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, Art. 5° Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal terão prazo até 2010 para implementar a obrigatoriedade para o Ensino Fundamental disposto no art. 3° desta Lei e a abrangência da pré-escola de que trata o art. 2° desta Lei.
55
3 Turmas de Infantil I - 2 anos;
3 Turmas de Infantil II - 3 anos;
3 Turmas de Infantil III - 4 anos;
3 Turmas de Infantil IV - 5 anos;
Já no Ensino Fundamental, dividem-se em:
3 Turmas de 1° Ano - 6 anos;
4 Turmas de 2º Ano - 7 anos;
4 Turmas de 3º Ano - 8 anos;
4 Turmas de 4º Ano - 9 anos;
4 Turmas de 5º Ano - 10 anos;
5 Turmas de 6º Ano - 11 anos;
3 Turmas de 7º Ano - 12 anos;
4 Turmas de 8º Ano - 13 anos;
3 Turmas de 9º Ano - 14 anos.
Os períodos educativos da escola discorrem entre manhã e tarde, cujos horários
compreendem matutino, das 7h10 às 11h30 e vespertino, das 13h10 às 17h30.
Em relação à estrutura física, a escola possui salas de aulas amplas e arejadas,
com ar-condicionado central, laboratórios de Informática, laboratório de Ciências, sala
de vídeo, parque infantil com brinquedos diversificados, cantinho do aquário e viveiro,
pátios amplos, cantinas, quadras poliesportivas, sendo uma coberta, salas ambientes
para o ensino fundamental e uma biblioteca, com sistema de informática que além dos
livros, conta também com 28 assinaturas correntes de periódicos.
4.3 Participantes:
A ação interventiva foi realizada pela graduanda pesquisadora, junto aos alunos
do Maternal I A em 2006, hoje Infantil III B composto por 20 crianças (11 meninos e 9
meninas), pela colaboração de uma estagiária de Pedagogia, que auxilia nos trabalhos de
sala de aula, na qual a pesquisadora é docente desde o princípio do ano letivo de 2006.
Participou também, uma graduanda de Pedagogia que acompanhou todo o trabalho de
maneira ativa e integrada, auxiliando na elaboração das estratégias e metodologias
56
pedagógicas, bem como na aplicação de todas as etapas, tanto nas atividades em sala de
aula, quanto nas atividades lúdicas interventivas.
4.4 Recursos Pedagógicos:
Para a realização da pesquisa científica e atividade interventiva, foram utilizados
diferentes recursos pedagógicos como estratégias para a realização das mesmas:
Coleção: As Aventuras dos Carros
Autores: AMORIM, Patrícia; SCHEIDEMANTEL, M. Ramon.
Editora: Vale das Letras;
CD: “A Aventura dos Carros” - Vale das Letras
3 Estojos de carrinhos de corrida - “Motorwheels” - com 4 unidades.
Ursinho Leco Visita o Médico e o Dentista
Autora: SILVEIRA, Susan Helena de Souza
Editora: Todolivro;
Ursinha Pipa
Autora: GOULART, Yedda
Editora: Todolivro;
Painéis Ilustrativos
Autora: SILVA, Solange Ap. da
Músicas: “Meu amigo médico”, autoras SANCHES, Mirian; SILVA,
Solange Ap. da e “Gratidão ao amigo médico”, autoria SANCHES, Mirian.
5 Kit’s de Enfermagem: Medical Set (Brinquedos Pica-Pau Ltda)
Conteúdo do Kit: 1 seringa, 1 termômetro e 1 estetoscópio.
Os recursos foram utilizados em atividades co-relacionadas: o contar histórias e
a brincadeira espontânea do faz de conta, na sala de Maternal I em 2006, hoje Infantil
III, da referida instituição escolar da cidade de Bauru.
57
4.5 Indicadores para Avaliação:
A comparação entre as atividades livres anteriormente observadas e registradas e
a atividade interventiva, foram utilizadas como indicadores do esperado enriquecimento
por parte dos alunos, na compreensão dos conteúdos trabalhados, na busca da superação
da realidade até então conhecida.
Nesse sentido, após toda a atividade realizada com as crianças em sala,
direcionamos a brincadeira com brinquedos e objetos referentes aos conteúdos
trabalhados em sala de aula, em que se buscou averiguar demonstrações de “avanço
qualitativo” na aprendizagem dos alunos, qual seja, a superação das objetivações em-si
para as objetivações para-si (GIARDINETTO, 1999, p.29), mediante a execução das
etapas planejadas e sistematizadas descritas abaixo:
1 No que tange à brincadeira espontânea dos alunos, o que mais chamou a
atenção do (a) professor (a)?
2 A brincadeira realizada pelos alunos, mantém um padrão de gênero?
Meninos brincam somente com meninos, e meninas somente com meninas?
3 Sobre o jogo de papéis, quais pessoas e/ou personagens emergem no
decorrer da brincadeira?
4 Existe permanência ou ocorre troca de papéis, durante o momento da
brincadeira?
5 Após a ministração em sala de aula, e ao serem observados no local habitual,
as crianças mudaram o padrão da brincadeira?
6 No decorrer da ação interventiva, quais reações foram consideradas
relevantes?
4.6 Coleta de Dados:
Os dados coletados a partir das práticas interventivas, foram registrados em
forma de relatórios e anotações, os quais foram obtidos por observação, no momento em
que se efetivavam as atividades planejadas. Os registros foram realizados em cada aula
ministrada, pelas pesquisadoras, para posterior análise dos resultados.
Através das observações das aulas, realizamos as observações de brincadeira
espontânea, ao longo do segundo semestre de 2006 e primeiro semestre de 2007 (por
meio da análise dos resultados da atividade prática interventiva, conforme Anexos 1 e
58
2), com a turma de Maternal I, atualmente cursando a turma do Infantil III, composto
por 20 crianças, sendo 11 meninos e 9 meninas. Por meio de tais observações,
evidencia-se o fantástico mundo que a criança constrói em sua imaginação, no momento
em que internaliza o papel com que se identifica, mediante a personagem que
representa, se compenetrando naquilo, tanto quanto nós, em nossas pesquisas.
Assim sendo, atentemos a seguir para o delineamento mensal da coleta de dados
frente ao criativo mundo mágico das crianças em suas brincadeiras espontâneas, as
quais estarão contemplando os conteúdos emergentes na brincadeira do faz-de-conta
escolhidas de maneira autônoma pelos dois grupos que se destacaram na preferência
pelos jogos de papéis ludicizadas pelas representações da brincadeira de médico (com
predileção das meninas em sua maioria e poucos meninos) e a brincadeira de carros de
corrida (sobressaindo os meninos).
59
5. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
5.1 Observações iniciais:
Foram registradas em diário as observações, organizadas e listadas
mensalmente, por meio de descrição das crianças em momento de brincadeira livre com
os colegas, buscando prestar atenção aos conteúdos que emergiam dessa ação lúdica.
Frente à brincadeira espontânea dos alunos, com destaque de escolha entre duas
preferências: brincadeira de carros e brincadeira de médico foi interessante observar a
criatividade emergente na atuação do jogo de papéis, em que no primeiro grupo, o
índice de interesse foram meninos e no segundo, sendo a maioria composto por
meninas, o atraente e convidativo mundo mágico que acontece na brincadeira do faz-de-
conta.
Agosto
Na volta às aulas, no decorrer do mês de agosto, enquanto os alunos
brincavam livremente no parque, observamos que dois grupos se
distinguiram nas preferências entre as escolhas das brincadeiras:
Um grupo destacou-se na predileção pela brincadeira de médico, sendo em
sua maioria meninas, as quais brincavam na Casa de Boneca do parque, onde
posteriormente foi observado que a brincadeira se repetia sempre no mesmo
local;
O outro grupo mostrou-se intensamente dedicado a brincadeira de carros,
realizando fortes ruídos de motores e explorando todo o espaço físico do
parque para a realização da ação lúdica escolhida.
Setembro
Já no mês de setembro, tais preferências se intensificaram principalmente às
sextas-feiras, que é o “Dia do Brinquedo”, no qual os alunos levam o
brinquedo predileto para brincarem na escola junto com os amigos:
O grupo da brincadeira de médico levava sempre variedades de bonecas com
algum tipo de acessório, como bolsa, celular, batom, óculos de sol, entre
outros;
60
O grupo da brincadeira de carros levava grandes variedades de carros, da
coleção do Filme “Os Carros”, como também da coleção do Filme
“Hotwheels”, entre outras.
Outubro
No mês de outubro, houve manifestações desta ação lúdica, dentro da sala de
aula também, em momentos em que os alunos, ao término da atividade
proposta, se reuniam nos respectivos grupos, em um cantinho da sala e
davam início ao jogo de papéis, ainda, que não tivessem em mãos nenhum
instrumento:
O grupo da brincadeira de médico organizava toda uma estratégia, em que
havia a representação da doutora, da mamãe, das filhinhas e raramente do
papai; porém, as meninas não apresentavam resistência quando um amigo se
aproximava, permitindo que este participasse da brincadeira, caso quisesse;
O grupo da brincadeira de carros realizava movimentos com as mãos, que
caracterizavam seus carrinhos, e com a boca, o intenso barulho do “ronco”
do motor, sempre de maneira a demonstrar sentido de corrida em alta
velocidade.
Novembro
Já no mês de novembro, percebeu-se que ocorreu um aumento no interesse
de algumas meninas pela brincadeira de carros e também, alguns meninos já
participavam da brincadeira de médico com mais entusiasmo e naturalidade,
ocorrendo desta maneira, uma socialização entre as distintas predileções de
ambos os grupos:
O grupo da brincadeira de médico realizava os papéis com grande satisfação,
podendo haver modificações entre as personagens no decurso da brincadeira,
ou seja, ocorria uma transição nos papéis desenvolvidos, a doutora tornava-
se a mamãe, a filhinha tornava-se a doutora e a mamãe tornava-se a filhinha;
este rodízio permanecia até que todas contemplassem os três papéis;
No grupo da brincadeira de carros, já ocorria uma dificuldade maior de
aceitação para a troca de personagens, uma vez que incorporavam as
máquinas como sendo eles, ou seja, o vermelho, não aceitava ser o carro
61
laranja, o azul não queria ser o verde e assim sucessivamente, principalmente
quando os carrinhos eram os personagens do desenho “Os Carros”.
Dezembro
Em dezembro, firmou-se uma motivação muito grande entre os grupos, os
quais já queriam brincar não somente nas brincadeiras de suas preferências,
mas ao término da sua, dirigiam-se ao outro grupo com intenso interesse e
fascinação:
O grupo da brincadeira de médico estabeleceu uma aproximação afetiva e
verdadeira com a professora, colocando-a no rodízio de papéis entre mamãe,
filhinha e doutora; a presença e participação da professora, sempre que
convidada, criava grande prazer e alegria aos alunos. É importante salientar
que, ao atuar na brincadeira de faz-de-conta, a criança não enxerga o adulto
como um adulto, ao contrário, atua no jogo como se este fizesse parte da sua
faixa etária, não demonstrando cautela alguma em seus atos por ter a
presença de alguém mais velho na brincadeira. Ocorreu que em uma das
saídas da escola para casa, uma aluna ao despedir-se da professora, falou:
“Tchau bebê”. A avó, olhando para a neta, demonstrando-se horrorizada e
envergonhada ao mesmo tempo, repreendeu sua atitude imediatamente,
alegando falta de respeito. Sua ação foi impulsiva, sem ter a preocupação e o
cuidado de perguntar antes para a neta, o porquê falara com a professora
assim, dando-a oportunidade de se expressar. A professora então, com
respeito, explicou a avó, que a atitude da neta, estava apenas reportando a
brincadeira que a pouco tinha realizado com os amigos, tendo também sua
participação, a qual era a filhinha e a neta era a sua mamãe. Novamente
envergonhada, a avó sorriu e desculpou-se; momento em que a neta,
observando atitude positiva da avó, sem olhares ou fala punitivas, expressou-
se dizendo: “Vovó, a tia hoje foi o meu bebê”.
No grupo da brincadeira de carros, a representação continuava no prazer em
realizar fortes ruídos de motores com a boca e projetar-se correndo para
demonstrar a corrida dos carros em alta velocidade; havendo também uma
suave melhora para a troca dos personagens, quando solicitada entre os
amigos. Não houve existência de regras na brincadeira, prevalecendo o jogo
de papéis entre os personagens do desenho “Os carros”.
62
Como já mencionado anteriormente, ao término de suas atividades lúdicas
preferidas, os grupos da brincadeira de médico e da brincadeira de carros se
misturavam para também participarem e atuarem daquelas não realizadas
com freqüência.
5.2 A intervenção:
Como atividade prática interventiva, foi realizado o plano de ação, apresentado
pelas etapas do trabalho a ser desenvolvido em sala de aula, com relação aos registros
coletados frente aos conteúdos evidenciados na brincadeira espontânea, conforme
planos de aula, do projeto de intervenção no anexo I.
Assim, a partir das atividades interventivas pontuadas abaixo, pudemos atestar
mudanças significativas nas atitudes dos alunos e entre os alunos, como também,
comprovar na prática, toda a teoria estudada.
Atividades realizadas:
Em sala de aula:
1. Hora do Conto: Conto de histórias das coleções planejadas (Anexo 1) pelas
professoras;
2. Hora da Conversa: Levantamento das partes principais das histórias com
perguntas lançadas ao grupo sala pelas professoras, bem como, os pontos
que os alunos mais gostaram; dentre outras indagações e curiosidades
ocorridas no momento da atividade (prática feita em seguida ao conto da
história);
3. Músicas: Prática feita com os alunos, ou antes, ou após a Hora do Conto
e/ou Hora da Conversa.
Fora da sala de aula:
1. Parque / Pátio / Sala de Vídeo: Realização da ação lúdica pelos grupos de
médico e de carros em local habitual em que às brincadeiras aconteciam,
como também, em outros locais diferentes; hora não disponibilizando
brinquedos (instrumentos), hora com o oferecimento dos mesmos.
63
5.2.1 Delineamento da ação interventiva:
A ação interventiva se deu durante o primeiro semestre de 2007, nos dias
especificados adiante, com os alunos do Infantil III. As atividades ministradas seguiram
um planejamento realizado após a observação das brincadeiras espontâneas dos alunos,
levando em consideração suas atitudes, como também o foco de interesse (conteúdos
emergentes) pela escolha das brincadeiras.
Apontaremos alguns dos registros das aulas trabalhadas no decorrer do semestre,
a fim de elucidar com exemplos, como aconteceu a prática a partir dos planos de aulas
tencionados (Anexo I):
Data: 07/05/2007 - Atividades em Sala de Aula:
Hora do Conto: Contamos a história do livro: “Tubo, o pequeno bombeiro”,
da coleção “A Aventura dos Carros”.
Antes de iniciar o conto, ao ver a ilustração da capa do livro, alguns alunos
do grupo de carros, começaram a emitir o som de arranco dos motores dos
carros.
Os alunos atentos observavam cada página do livro, como também, a nossa
expressão facial e tonalidade de voz.
Hora da Conversa: Ao término da história, os alunos foram indagados a
partilharem junto com os amigos, qual a parte que mais gostaram, tendo
como respostas em unanimidade: “O pai apagando o fogo” e “O filhinho
bombeiro”.
Posteriormente, levantamos alguns questionamentos, para verificarmos o
nível de compreensão da história:
Pesquisadoras: “Por que o bombeiro pai não queria que o filhinho o ajudasse
nos incêndios?”.
Alunos: “Porque senão ele podia se machucar”. “Porque ele podia se
queimar”. “Porque era perigoso”.
Pesquisadoras: “O filhinho obedeceu ao papai bombeiro ao pedir para ele
não se aproximar dos incêndios?”.
Alunos: “Obedeceu”. “Sim”. “É”.
64
Pesquisadoras: “E onde ele ficava quando o papai bombeiro estava apagando
o fogo?”.
Alunos: “Ele ficava de longe” (unânime).
Pesquisadoras: “Mas ficava de longe fazendo o quê?”.
Alunos: “Olhando para aprender”. “Olhando”.
Pesquisadoras: “O filhinho bombeiro precisou crescer para poder ajudar?”.
Alunos: “Não” (unânime).
Pesquisadoras: Então como ele ajudou?”.
Alunos: “Ele gritou”. (unânime)
Pesquisadoras: “E gritou o quê? O que ele falou?”.
Alunos: “Socorro” (resposta incorreta). “Cuidado” (perceberam o erro do
amigo e retrucaram).
Pesquisadoras: “É importante ouvir e obedecer os nossos pais?”.
Alunos: “Sim” (unânime).
Data: 25/05/2007 - Atividades em Sala de Aula:
Hora da Conversa: Em outra aula, subseqüente às demais em que foram
realizadas a mesma prática no decorrer da atividade da Hora do Conto,
utilizando os livros com diferentes histórias da Coleção; com o livro: “Tubo,
o pequeno bombeiro” nas mãos, recordamos os pontos mais relevantes da
história.
Música: Terminada a partilha, os alunos ouviram a música - faixa 9 - do Cd
da mesma coleção, que abordava a importância e a coragem dos bombeiros.
Ao acabar a música, pediram com satisfação para que fosse colocada
novamente.
Hora da Conversa: Finalizado o momento da música, foram feitas novas
perguntas:
Pesquisadoras: “De quem a música fala?”.
Alunos: “Bombeiro” (unânime).
Pesquisadoras: “E o que fala do bombeiro?”.
Alunos: “Ele é amigo”. “Ele apaga o fogo”.
Pesquisadoras: “Sim, está certo. Mas o que mais fala que ele é?”.
65
Alunos: “Tem coragem”. “Cuida das pessoas”.
Atividade fora da sala de aula:
Parque - Brincadeira do Grupo de Carros:
Concluída a reflexão sobre a música, o grupo de carros foi levado ao parque
da escola para que observássemos como ocorreria a ação lúdica após o
trabalho realizado em sala de aula.
Imediatamente, começaram a fazer o ronco forte de motores e partiram
correndo, ocupando todo o espaço físico do parque. O interessante foi
verificar, no decorrer da brincadeira, que alguns do grupo, começaram a
realizar o jogo de papéis não mais apenas do desenho “Os Carros”, mas
representar os personagens da história do livro recordado: “Eu sou o papai”,
“Eu sou o filhinho”, “Eu sou o amigo”, (na história também tinha a presença
deste personagem).
Data: 29/06/2007 - Atividade fora da sala de aula:
Parque - Brincadeira do Grupo de Carros:
Desta vez, iniciamos a aula já no parque da escola. A brincadeira ocorreu
com a mesma preferência, em que os alunos, cheios de alegria e satisfação,
corriam em alta velocidade pelo parque, realizando o jogo de papéis dos
carros.
Passado o tempo intencionalmente esperado, foram oferecidos aos alunos,
estojos de carrinhos de corrida, para que realizassem a brincadeira, agora,
instrumentalizados.
Continuaram a brincadeira, ocupando novamente todo o espaço físico do
parque; corriam de maneira rápida e com grande disposição. Entretanto,
ocorreram pequenos conflitos entre os alunos, por trombarem entre si, e
também, por apresentarem dificuldade em partilhar os carrinhos, devido as
diferentes cores que havia.
A brincadeira foi interrompida e fomos para a sala de aula.
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Atividade em Sala de Aula:
Hora da Conversa - com o Grupo de Carros:
Sentados em roda, fizemos uma tomada de consciência, exercício que
oportuniza a criança não só refletir, mas expressar oralmente seu modo de
pensar sobre as coisas e o mundo. Pedimos que escolhessem uma das
histórias da coleção dos carros, que haviam gostado mais e escolheram a do
bombeiro. Percebemos que a identificação dos alunos por esta história, se fez
devido à presença do personagem bombeirinho. Assim sendo, os indagamos
a pensarem sobre as seguintes perguntas:
Pesquisadoras: “Na história que vocês escolheram, o papai bombeiro e o
filhinho bombeiro brigavam?”.
Alunos: “Não”.
Pesquisadoras: “E o amigo do papai bombeiro brigou com ele na história?”.
Alunos: “Não”.
Pesquisadoras: “Por quê?”.
Alunos: “Porque era amigo dele”.
Pesquisadoras: “E vocês, são amigos?”.
Alunos: Balançaram a cabeça afirmando que sim.
Pesquisadoras: “Teve briga no parque?”.
Alunos: “Não”.
Pesquisadoras: “Quem brigou?”.
Alunos: “Eu não” (cada um respondeu).
Pesquisadoras: “Não!”. “Mas deu para ver amigos brigando?!”.
Alunos: Houve um silêncio tímido.
Pesquisadoras: “Será que podemos mentir?”
Alunos: “Não”. “Não, é muito feio”. “Não, o Pinóquio mentia e o nariz dele
crescia”.
Pesquisadoras: “Nós podemos mentir para as pessoas?”.
Alunos: “Não”.
Pesquisadoras: “Muito bem! Temos que falar só a verdade e quando fazemos
as coisas, precisamos contar. Então, vou confiar em vocês e perguntar mais
uma vez: quem brigou?”.
67
Alunos: Dois alunos levantaram as mãos. Mas teve outro que ainda se
omitiu.
Pesquisadoras: “Quando nós queremos alguma coisa emprestada, podemos
puxar da mão do amigo?”.
Alunos: “Não”.
Pesquisadoras: “Então, como devemos fazer?”.
Alunos: “Pedir por favor,”, um dos alunos respondeu.
Pesquisadoras: “Muito bem! Então ao invés de alguns amigos terem brigado
por causa dos carrinhos, puxando da mão do outro, o que deveriam ter falado
para o amigo?”.
Alunos: “Me empresta por favor”.
Pesquisadoras: “Muito bem! Agora que tivemos essa conversa muito
importante, vamos ver se vocês aprenderam como que a gente deve tratar os
amigos”.
Atividade fora da sala de aula:
Parque - Brincadeira do Grupo de Carros:
Voltando ao parque, foram oferecidos os carrinhos de brinquedo novamente
para comprovação da veracidade da conversa em sala de aula.
No mesmo instante, começaram a trocar os carrinhos, pedindo “por favor”,
evitando brigas, de forma a mostrarem que haviam entendido a importância
do respeito; observamos que contribuímos, neste momento, não só para ação
do respeito, mas também para o exercício da solidariedade, da amizade, entre
outros.
Data: 04/07/2007 - Atividade fora da sala de aula:
Pátio - Brincadeira do Grupo de Carros:
Para que atingíssemos a satisfação almejada com o grupo de carros, mesmo
que o enriquecimento da ação lúdica da pesquisa já tivesse sido comprovado
na representação de papéis, oportunizada pela brincadeira do faz-de-conta
com aquisição de novos conhecimentos, levamos os alunos ao pátio da
escola, sem recordar nenhuma história e sem mencionar os modos para se
68
conviver de uma maneira saudável com o próximo, pois o objetivo nesta
última aula, era verificar se ocorreria também um avanço qualitativo no
modo de comportamento entre eles, no momento da brincadeira.
Para a nossa satisfação, o retorno do resultado foi extremamente
compensatório, pois os alunos praticaram em ações, tudo aquilo que haviam
expressado em palavras nas atividades realizadas durante o semestre.
Data: 04/06/2007 - Atividades em Sala de Aula:
Hora do Conto: Por meio da coleção “Ursinhos Companheiros”, contamos a
história do livro: “Ursinha Pipa”.
Os alunos atentos observavam cada página do livro, bem como, a nossa
expressão facial e tonalidade de voz.
Hora da Conversa: Ao término da história, os alunos foram indagados a
partilharem junto com os amigos, qual a parte que mais gostaram, tendo
como respostas em unanimidade: “Da Pipa no médico”.
Posteriormente, levantamos alguns questionamentos, para verificarmos o
nível de compreensão da história:
Pesquisadoras: “O que aconteceu com a ursinha Pipa?”.
Alunos: “Ficou doente”, “Ficou com febre”, “Dor de garganta”, “Ficou com
tosse”.
Pesquisadoras: “Mas por que isso aconteceu?”.
Alunos: “Tomou chuva”, “Esqueceu a sombrinha”.
Pesquisadoras: “E aí, como ela fez para sarar?”.
Alunos: “Foi no médico” (unânime).
Pesquisadoras: “Ela teve coragem de ir sozinha?”.
Alunos: “Não”, “Foi com a mamãe”.
Pesquisadoras: “Qual era o nome do médico?”.
Alunos: De primeiro momento não lembraram, após alguns instantes, uma
aluna lembrou dizendo “Amoroso”.
Pesquisadoras: “O médico era bravo?”.
Alunos: “Não”, “Não, bonzinho”.
Pesquisadoras: “O médico deu alguma coisa para ela tomar?”.
69
Alunos: “Sim”, “Remédio”, “Injeção”.
Pesquisadoras: “A Pipa ficou boa de novo?”.
Alunos: “Sim”, “Ficou”.
Pesquisadoras: “O que ela mais gostava de fazer?”.
Alunos: “Brincar” (unânime).
Pesquisadoras: “Pode brincar na chuva?”
Alunos: “Não”, “Não fica doente”.
Pesquisadoras: “Quando ficamos doentes, aonde a mamãe leva?”.
Alunos: “Médico”, “No médico”.
Pesquisadoras: “Precisa ter medo de ir ao médico?”.
Alunos: “Não” (unânime).
Pesquisadoras: “Quem tem medo de médico?”.
Alunos: “Eu não”, “Eu não tenho medo”.
Pesquisadoras: “Os médicos são bravos, eles fazem mal para gente?”.
Alunos: “Não”, “Não, bonzinho”.
Data: 15/06/2007 - Atividades em Sala de Aula:
Hora da Conversa: Em outra aula, subseqüente às demais em que foram
realizadas a mesma prática no decorrer da atividade da Hora do Conto,
utilizando os livros com as histórias das Coleções “Amiguinhos Ursos” e
“Ursinhos Companheiros”; com painéis ilustrativos de algumas imagens da
história do livro: “Ursinha Pipa” nas mãos, recordamos os pontos mais
relevantes da história.
Música: Terminada a partilha, cantamos a música: “Gratidão ao amigo
médico” (Anexo 2), a qual encantou a todos os alunos e quiseram que
cantássemos várias vezes, sendo que alguns, até aprenderam a letra da
mesma.
70
Atividade fora da sala de aula:
Parque - Brincadeira do Grupo de Médico:
Concluída a aprendizagem da música, o grupo de médico foi levado ao
parque da escola para observação de como ocorreria à ação lúdica após o
trabalho realizado em sala de aula.
Correram até a casinha de bonecas e já começaram arrumar e se acomodar
no local. O interessante foi verificar também neste grupo, que durante a
brincadeira, as alunas realizaram o jogo de papéis não somente dos
personagens habituais, mas representar os personagens da história do livro
recordado: “Eu sou a Pipa”, “Eu sou a mamãe dela”, “Eu sou o médico
urso”, “Eu sou o dentista urso”, (na história também tinha a presença deste
personagem).
Data: 25/06/2007 - Atividade fora da sala de aula:
Sala de Vídeo - Brincadeira do Grupo de Médico:
Desta vez, iniciamos a aula em outro ambiente, na sala de vídeo. Queríamos
verificar se a mudança de ambiente provocaria alterações nas manifestações
dos papéis projetados na brincadeira de faz-de-conta.
Porém, não houve diferença, tanto na preferência de papéis, quanto no modo
de atuação, as quais desempenharam a ação lúdica, com bastante alegria e
grande satisfação.
Passado o tempo intencionalmente esperado, foram oferecidos as alunas,
kit’s de enfermagem, para que realizassem a brincadeira, agora,
instrumentalizadas.
Recomeçaram a brincadeira, ocupando todo o espaço físico da sala de vídeo,
ficando totalmente maravilhadas com os instrumentos que acabavam de
receber.
No entanto, foi necessária uma intervenção inicial, explicando que teriam
que ficar divididas em grupos menores, para que as componentes dos grupos
utilizassem os brinquedos de modo que nenhuma ficasse sem papel.
Após o auxílio na divisão dos grupos, a brincadeira do faz-de-conta
aconteceu de forma imensamente cativante, de modo que até nós pudemos
71
vivenciar juntamente com o grupo, o encantamento proporcionado pela
magia desta fantasia tão prazerosa.
Para o nosso grande contentamento, o retorno do resultado foi extremamente
satisfatório, pois não ocorreu nenhum desentendimento entre as
participantes, tiveram a mesma didática utilizando o rodízio de papéis no
decorrer da ação lúdica, pois todas do grupo queriam manusear todos os
acessórios, além de demonstrarem êxito na utilização de cada brinquedo,
comprovando mais uma vez, o enriquecimento que esta atividade do ato de
brincar oferece e oportuniza a criança na aprendizagem, principalmente
escolar, no desvelamento de uma nova maneira de compreender e agir sobre
a realidade até então conhecida.
Data: 06/07/2007 - Atividade fora da sala de aula:
Pátio - Brincadeira do Grupo de Médico em interação com a brincadeira do
Grupo de Carros:
Como fechamento da pesquisa e conclusão da atividade interventiva,
proporcionamos aos alunos brincarem utilizando o mesmo espaço físico,
pois das atividades ministradas em sala de aula, os dois grupos participaram.
Queríamos observar se haveria ou não avanço qualitativo quando brincavam
separadamente. Porém, no momento da brincadeira fora da sala, os grupos
não atuaram juntos.
Houve interesse entre os grupos, cada um procurou pelo outro, brincaram
juntos, partilharam os brinquedos e trocaram experiências por meio do jogo
simbólico, um eficiente instrumento de aprendizagem para os alunos sobre
conhecimentos novos adquiridos na instituição escolar, que se dá quando o
educador oferece aos seus alunos através da práxis pedagógica um trabalho
compromissado, organizado, planejado e responsável, visando a busca pela
conquista de um universo que contemple a produção e a elaboração do saber
científico, no desabrochar de um mundo melhor, mais justo e solidário.
72
6. ANÁLISE DOS RESULTADOS:
Este trabalho de pesquisa foi realizado por meio de observação e análise
referentes à contribuição do ato de brincar para a aprendizagem e o desenvolvimento
infantil, através do jogo simbólico, mais especificamente do jogo de papéis, na
brincadeira do faz-de-conta, a luz de uma rica e importante literatura, em que Vigotski,
psicólogo histórico-cultural, contribuiu não só por meio de sua vasta teoria, mas
principalmente pela sua meticulosa didática ao retratar com precisão a atividade do
universo infantil.
Dessa forma, a partir da coleta de dados explicitados detalhadamente em
períodos mensais a cerca das brincadeiras conduzidas pelas crianças no deleite de seu
mundo mágico, foi possível não só verificar a veracidade do conhecimento científico
teorizado por Vigotski, mas principalmente, realizar o desvelamento do que realmente
significa esta atividade lúdica para a criança desde os seus primeiros passos.
Assim sendo, também foi possível fazer um exercício de profunda reflexão sobre
o ato de educar, visto que todo educador necessita compreender e ampliar o que entende
por ensinar, pois é na relação ativa entre professor e aluno, que se determinará a
qualidade do ensino na promoção do desenvolvimento da criança através da
aprendizagem.
Neste sentido, cabe recordar a pontuação de Wajskop (2004, p. 9) quanto à
necessidade de se ter o entrelace entre os pares dialéticos teoria e prática:
Conhecer como e por quê as crianças brincam é caminho seguro para uma prática educativa que respeita o seu fazer lúdico. A observação atenta das brincadeiras e o respaldo teórico colaboram para que as intervenções dos educadores sejam apropriadas.
Dentro desta perspectiva, torna-se enfático para o educador a necessidade de
ampliar o que se entenda por ensinar, e neste sentido, levar em consideração a questão
do “fazer lúdico” da criança, no qual, ela se projeta no imaginário, para não só
desenvolver a sua identidade, como também para construir sua personalidade,
possibilitando a expressividade do seu modo de ser em sua totalidade.
Logo, por meio de um processo de ensino e aprendizagem dinâmico e
estimulador, considerando as diferentes faixas etárias da criança, é que o professor,
conduzido por uma significativa metodologia, pautada por sólido e definido
73
planejamento, poderá realizar uma verdadeira avaliação, sustentadas por uma descrição
clara do que se pretendia alcançar e do resultado atingido pelos alunos.
Assim sendo, a ação educativa do professor precisa estabelecer aproximações
entre os conceitos, de forma que os conteúdos estejam sempre inseridos e integrados ao
cotidiano das crianças. Ou seja, nas atividades realizadas pelo professor deve haver
intencionalidade, tendo ainda que estar explícitas as ações conceitual, procedimental e
atitudinal, pois não basta a criança ficar só no nível do conceito, é necessário atingir
todas as dimensões do conhecimento de maneira integral.
Compromissadas com a promoção do desenvolvimento da criança, e
orientadas pela compreensão de que a apropriação do conhecimento por ela se dá pela
mediação do adulto ao incidir na zona de desenvolvimento proximal, defendemos que o
professor, ao partir do nível de desenvolvimento real em que a criança se encontra,
acolhe as capacidades já desenvolvidas (conceitos/aprendizagens consolidados) como
ponto de partida para aprofundar a compreensão desses conhecimentos. De tal modo, a
criança estará não mais como conhecedora do saber, mas como aprendiz do saber
destacado agora pelo nível de desenvolvimento proximal, quais sejam as capacidades
que se deseja alcançar.
Todavia, não basta apenas compreender teoricamente o que seja a ação do
brincar pela criança, é necessário esclarecer na prática como esta abordagem motivadora
e criadora se dá, o que verificamos após o nosso estudo e a nossa ação interventiva junto
aos alunos, contemplando a importância que o jogo de papéis na brincadeira do faz-de-
conta, perfaz sobre a prática do educador como um eficiente instrumento pedagógico
enriquecedor, motivador e facilitador no processo de ensino-aprendizagem.
Nesta perspectiva, delimitaremos a seguir, a nossa intervenção realizada com as
crianças no momento de suas brincadeiras, das mesmas.
Frente à brincadeira espontânea dos alunos, com destaque de escolha entre duas
preferências: brincadeira de carros e brincadeira de médico foi interessante observar a
criatividade emergente na atuação do jogo de papéis, em que no primeiro grupo, o
índice de interesse foram meninos e no segundo, sendo a maioria composto por
meninas, o atraente e convidativo mundo mágico que acontece na brincadeira do faz-de-
conta.
Finalizamos a pesquisa com uma realização muito forte, pois além de as crianças
demonstrarem grande interesse e acolhedora participação na realização de cada
74
atividade planejada, pudemos comprovar que a educação em que acreditamos existe, é
possível e faz a diferença.
Logo, a pesquisa atingiu o objetivo proposto, pois demonstrou ser o jogo
simbólico um recurso pedagógico para o professor e um instrumento de aprendizagem
para a criança, eficientes, no enriquecimento do processo de ensino e aprendizagem nos
espaços educativos.
ós a ação interventiva houve avanço qualitativo na ação lúdica das crianças,
processo este em que se contemplou a passagem do senso comum (objetivações em-si)
para a episteme (objetivações para-si), na superação do conhecimento da realidade até
então conhecida, para a prática de uma transformação significativa da realidade,
adquirida pela compreensão do novo conhecimento aprendido.
Concluímos então, que se faz necessário e fundamental, que o professor de
Educação Infantil, conheça o seu aluno, a sua sala de aula como um todo, para
compreender como ocorre a aprendizagem. Conhecer o aluno significa saber o que
costuma ocorrer no processo de desenvolvimento no sentido geral, isto é, de todos os
seres humanos e também em particular de cada aluno, para que professor e alunos
possam falar linguagens que façam sentido para ambos. Neste acerto de linguagens,
reside o cerne do ato pedagógico e a possibilidade de êxito do ato educativo.
75
7. Considerações Finais
Cabe ao educador conhecer a faixa etária com a qual trabalha, para possibilitar a
amplitude de conhecimento dos alunos, para que tenham a visão do todo e consigam
transformar e enriquecer as experiências de vida da criança, ou seja, este professor deve
garantir que a criança avance em relação à zona de desenvolvimento real, de forma a
promover a formação humana, nas três esferas fundamentais do processo de ensino e
aprendizagem, caracterizadas pela inter-relação entre as dimensões do conhecimento
conceitual, procedimental e atitudinal.
Nesse sentido, vale lembrar, que a brincadeira é uma atividade séria para a
criança, na qual descobre papéis sociais, limites, experimenta novas habilidades,
formando um novo conceito de si mesma, aprendendo a viver e avançar para novas
etapas de domínio do mundo que a cerca. Para tanto, ela precisa de tempo e espaço para
poder trabalhar a construção do real pelo exercício da fantasia, colocando toda a riqueza
de sua imaginação em ação, por meio de sua linguagem secreta, como propõe o
documento dos Referenciais Curriculares Nacionais: “Quando utilizam a linguagem do
faz-de-conta, as crianças enriquecem sua identidade, porque podem experimentar outras
formas de pensar, ampliando suas concepções sobre as coisas e pessoas ao desempenhar
vários papéis sociais ou personagens”. (BRASIL, 1998, v.2. p. 23).
Assim sendo, torna-se plausível o prestígio dado à brincadeira. É importante
brincar porque a criança, sem medo de errar, adquire conhecimento com prazer.
Desenvolve-se a sociabilidade, aprende-se a conviver com o próximo, aprendendo-se a
trabalhar em equipe, a aceitar as diferenças, bem como exercitar as potencialidades com
plenitude.
O que a criança realmente precisa é o reconhecimento do seu tempo livre, de
espaço, recursos adequados para que seus interesses possam ser desenvolvidos a partir
de significativas aprendizagens mediatizadas por verdadeiras situações de aprendizagem
escolar.
Vigotski em sua teoria histórico-cultural, tem posição clara sobre a importância
da intervenção do professor e das próprias crianças, subsidiadas por modalidades de
interação planejadas, consideradas legítimas promotoras de aprendizado na escola.
Desta forma, exprimi-se ao educador garantir espaço e tempo na rotina escolar
para que a brincadeira tenha seu lugar assegurado. Torna-se importante pensar em
materiais, estratégias e configurar espaço físico de acordo com a idade das crianças, o
76
que em certa medida define as suas possibilidades, para trazer ao cotidiano escolar os
conteúdos emergentes observados na brincadeira espontânea a fim de que possa nutrir o
imaginário das crianças, correlacionando aos componentes curriculares a importância e
relevância desta atividade.
Neste sentido, a observação atenta e intervenção refletida e planejada são
necessárias e preciosas não só pelo professor, mas também pelas instituições escolares,
que devem ser organizadas em torno do brincar infantil para poder cumprir efetivamente
suas funções pedagógicas, privilegiando ainda, uma educação para a criança através de
uma perspectiva criadora, voluntária e consciente.
Portanto, o papel do brincar na educação da criança é fundamental. A vivência
instantânea provocada pelo brincar dá a chance da criança exteriorizar seus sentimentos,
exercitar sua iniciativa, assumir a responsabilidade das suas ações. Por meio da
brincadeira, a criança internaliza conteúdos historicamente acumulados, bem como,
aprende a viver e trabalhar sua auto-estima.
Logo, cabe à escola criar condições de expressão e de comunicação para que a
criança através do brincar, tenha uma visão consciente do seu mundo. Tem também o
papel de auxiliar pais e mães na compreensão dos verdadeiros benefícios do brincar. A
parceria entre a escola e os pais é uma positiva garantia de crescimento e
desenvolvimento integral e pleno da criança.
Este trabalho foi possível, por acreditarmos que o processo educativo tem
repercussões sobre o desenvolvimento cognitivo da criança. Tal concepção é
influenciada pela teoria de Vigotski, no entanto, ainda que o educador não compartilhe
de tal teoria, é possível encontrar na brincadeira um momento no qual possa exercer seu
papel de ensinar.
Contudo, esperamos que esta pesquisa tenha contribuído para abrir algumas
possibilidades para estudar o processo de construção do conhecimento na escola,
almejando uma nova postura, não só de pais, mas principalmente de educadores, no
desvelamento de um novo olhar sobre a ação do brincar na educação infantil.
77
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFIA
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental.
Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.
v. 1 - 3.
CAMARGO, F. Considerações acerca do Jogo. Espaço Pedagógico. s/d.
FONSECA, J. P da. A educação infantil. In: MENESES, J. G. de C. et al. Estrutura e
funcionamento da educação básica: leituras. São Paulo: Pioneira, 1998.
GIARDINETTO, J. R. B. Matemática escolar e matemática da vida cotidiana.
Campinas, SP: Autores Associados, 1999.
GUIMARÃES, J. G. M. (Org.). Pedagogia cidadã - cadernos de formação: caderno de
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LANTER, A. P. S. L. A política de formação do profissional de educação infantil: os
anos 90 e as diretrizes do MEC diante da questão. In: KRAMER, S. (Org). Infância e
educação infantil. Campinas, SP: Papirus, 1999.
LEONTIEV, A. N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizonte, 1978.
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OLIVEIRA, M. K. de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo
sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1995.
PEREIRA, E. T. Brinquedos e infância. Presença pedagógica, São Paulo, nº 44, p. 7-9,
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PULASKI, M. A. S. Compreendendo Piaget: uma introdução ao desenvolvimento
cognitivo da criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.
PRIORE, M. D. (Org.). História das crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.
QUEIROZ, T. D. Dicionário prático de Pedagogia. São Paulo: Rideel, 2003.
SOUZA, P. N. P.de.; SILVA, E. B. da. Como entender e aplicar a nova LDB: lei
9.394/96. São Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2002.
VIGOTSKI, L S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2001.
78
WAJSKOP, G. Conhecendo a criança: O papel do jogo na educação das crianças.
Avisalá, São Paulo, nº 17, p. 9-15, jan, 2004.
79
ANEXO 1
Planos de Aula referentes ao Trabalho de Conclusão de Curso integrado ao
Projeto de Intervenção realizados no 1º Semestre de 2007
1. Plano de Aula 1.
Tema: Conhecendo uma boa maneira de aprender a ser e a conviver.
Conteúdo: Aprendendo a conviver, valorizando a auto-estima, perseverança e a
dedicação para consigo mesmo, como também ao próximo.
Público alvo: Infantil III B - faixa etária: 4 anos
Objetivos:
O aluno deve ser estimulado a:
Reconhecer a necessidade de ajudar o próximo, sabendo valorizar a ajuda recebida;
Perceber a importância de se conviver com as pessoas, reconhecendo que fazemos
parte de uma sociedade;
Aprender a cultivar e a praticar valores como amizade, afeto, respeito, solidariedade,
perseverança uns com os outros;
Reforçar a auto-estima, através de atitudes positivas, valorizando a beleza interior de
cada um;
Ampliar seus conhecimentos referentes aos conteúdos presentes na brincadeira.
Procedimentos Metodológicos:
Inicialmente cantaremos a música “Motorista” - (CD - Vai começar a
brincadeira - FTD), que enfoca os cuidados que o motorista deve ter ao dirigir.
Após o término da música, indagaremos os alunos sobre qual personagem a
canção se refere, de forma a introduzi-los no tema principal “Os Carros”.
Logo em seguida, prosseguiremos com a atividade “Hora do Conto”, em que
realizaremos a leitura dos livros infantis da coleção “Vale das Letras”, referente à
“Aventura dos Carros”, de autoria de Patrícia Amorim e Ramon M. Scheidemantel, cujo
fundo moral será trabalhado principalmente sobre valores que contemplam a auto-
80
estima, perseverança e dedicação, os quais serão potencializados com o CD da própria
coleção, faixas 6, 7 e 9, referentes às histórias contadas.
Em aulas subseqüentes, serão oferecidos aos alunos, carros de brinquedo, para
que possam através da brincadeira, demonstrar se houve um “avanço qualitativo” em
sua aprendizagem, por meio dos conteúdos ministrados em sala de aula, cujo objetivo é
a superação das objetivações em-si para as objetivações para-si (Giardinetto, 1999,
p.29).
Neste momento, as graduandas pesquisadoras, farão a observação sobre as
hipóteses propostas neste trabalho, confrontando-as com a ação interventiva, cujo
propósito é a observação sobre os conteúdos emergentes na brincadeira dos alunos no
jogo de papéis, envolvendo, portanto, uma pesquisa de campo qualitativa.
Recursos materiais:
CD “Vai começar a brincadeira” - FTD;
Coleção “A Aventura dos Carros” - Vale das Letras;
CD “A Aventura dos Carros” - Vale das Letras;
3 Estojos de carrinhos de corrida - “Motorwheels” - com 4 unidades.
Avaliação :
A avaliação se dará mediante a observação de atitudes e comportamento das
crianças, levando em consideração o desempenho de papéis assumidos,
companheirismo, ajuda mútua, e participação nas atividades.
Bibliografia:
LIBÂNEO, José C. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed,
1998.
ZÓBOLI, Graziella. Práticas de ensino: subsídios para a atividade docente. São
Paulo: Ática, 2002.
81
2. Plano de Aula 2.
Tema: Um jeito divertido para cuidar da saúde.
Conteúdo: Reforçar os bons hábitos de higiene, saúde e alimentação, de forma a
contribuir para uma boa qualidade de vida, valorizando o papel do médico como um
“amigo confiável”, que colabora na orientação e manutenção do nosso corpo.
Público alvo: Infantil III B - faixa etária: 4 anos
Objetivos:
O aluno deve ser estimulado a:
Adquirir noções de hábitos de higiene em relação ao seu próprio corpo;
Praticar e reforçar como exercício diário, noções básicas de higiene;
Compreender que os cuidados com a saúde, influenciam na corporeidade humana,
no sentido do equilíbrio físico e emocional, na dimensão ominilateral;
Desenvolver um enfrentamento positivo e agradável em relação às visitas ao
médico, procurando vê-lo como um “amigo”, pois a essência do seu trabalho é o de
cuidar e o de salvar vidas;
Ampliar seus conhecimentos referentes aos conteúdos presentes na brincadeira.
Procedimentos Metodológicos:
Inicialmente, ensinaremos a música “Meu amigo médico”, de autoria das
graduandas Mirian e Solange, cujo ritmo musical se assemelha ao da música “Atirei o
pau no gato”, que tem como enfoque o personagem da história, o “Ursinho Leco”, que
perde o medo em ir ao médico, enfatizando a postura do profissional da saúde, que pelo
carinho e atenção com que trata o ursinho, torna-se seu querido amigo.
O mesmo procedimento será realizado ao término do conto das histórias infantis,
no qual o fechamento da aula teórica se dará pelo ensinamento da música “Gratidão ao
amigo médico”, de autoria da graduanda Mirian Sanches e de mesma sonoridade
musical já mencionado. O enfoque é a simbolização de gratidão do ursinho Leco e da
ursinha Pipa em presentear o amigo médico com gestos e atitudes de carinho fraternal.
82
Após o término da música, indagaremos os alunos sobre quais personagens da
área da saúde a canção se refere, de forma a introduzí-los no tema principal “Um jeito
divertido para cuidar da saúde” enfatizando a figura do médico.
Logo em seguida, prosseguiremos com a atividade “Hora do Conto”, em que
realizaremos a leitura dos livros infantis das coleções “Amiguinhos Ursos” e “Ursinhos
Companheiros”, referente à visita do ursinho Leco e da ursinha Pipa ao médico e ao
dentista, de autoria de Susan Helena de Souza Silveira, e Yedda Goulart
respectivamente. Utilizaremos também, como recurso material, painéis ilustrativos com
os personagens desenhados, de autoria da graduanda Solange Aparecida da Silva, cujo
objetivo é aliar a observação, anteriormente realizada no momento de brincadeira
espontânea, referente à preferência pelo “papel do médico” pelos alunos, com o
embasamento teórico. A intenção é promover a superação do que já conheciam da
brincadeira, para outro nível qual seja, o avanço qualitativo mediante a
instrumentalização, através dos brinquedos que serão oferecidos, ultrapassando a zona
de desenvolvimento real para a zona de desenvolvimento proximal.
Desta forma, em aulas subseqüentes, serão oferecidos aos alunos, Kit´s de
enfermagem “Medical Set”, para que possamos observar, através da brincadeira, se
houve um “avanço qualitativo” em sua aprendizagem, após os conteúdos ministrados
em sala de aula.
Recursos materiais:
Livro: Ursinho Leco Visita o Médico e o Dentista
Autores: Susan Helena de Souza Silveira
Editora: Todolivro;
Livro: Ursinha Pipa
Autora: GOULART, Yedda
Editora: Todolivro;
Painéis Ilustrativos
Autora: Solange Aparecida da Silva
Músicas: “Meu amigo médico”, autoras Mirian Sanches e Solange Aparecida da
Silva e “Gratidão ao amigo médico”, autoria Mirian Sanches (letra das canções em
Anexo II).
83
5 Kit’s de Enfermagem: Medical Set (Brinquedos Pica-Pau Ltda)
Conteúdo do Kit: 1 seringa, 1 termômetro e 1 estetoscópio.
Avaliação :
A avaliação se dará mediante a observação de atitudes e comportamento das
crianças, levando em consideração o desempenho de papéis assumidos,
companheirismo, ajuda mútua, e participação nas atividades.
Bibliografia:
LIBÂNEO, José C. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed,
1998.
ZÓBOLI, Graziella. Práticas de ensino: subsídios para a atividade docente. São
Paulo: Ática, 2002.
84
ANEXO 2 - Letras das Músicas
Título: Meu amigo médico
Autoria: Mirian Sanches / Solange Aparecida da Silva
O Ursinho Leco - co
Muito fofinho - nho
Foi ao mé-di-co
Visitá-lo - lo
Com muito medo - do
Mas ao vê-lo
Foi bem cuidado
Perdeu o medo
E se alegrou - oh!!!
Título: Gratidão ao amigo médico
Autoria: Mirian Sanches
O Ursinho Leco - co
Com sua amiga - ga
Chamada Pipa - pa
Presentearam - ram
O bonzinho médico
Com um belo sorriso
Um gostoso abraço
E um beijo de tchau - tchaaaau!!!