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SIMULAÇÃO NUMÉRICA DE UM FORNO DE REVENIDO
Jerónimo Monteiro Barreira Duarte
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia Mecânica
Júri
Presidente: Doutor Mário Manuel Gonçalves da Costa
Orientador: Doutor Viriato Sérgio de Almeida Semião
Vogal: Doutor Pedro Jorge Martins Coelho
Junho de 2013
i
Resumo
Neste trabalho efetuou-se o estudo numérico do comportamento de um forno de revenido, projetado
para revenir discos de aço de alfaias agrícolas, através da utilização de um código computacional
comercial (FLUENT 6.3.26) para prever o escoamento, a combustão, a transmissão de calor e os
perfis de temperatura existentes no seu interior. Foi escolhido o gás natural como combustível, tendo-
se utilizado uma mistura com características idênticas à do fornecido pela rede de distribuição.
Para a simulação da complexa geometria do forno foram concebidas duas malhas computacionais
num programa específico compatível com o FLUENT (GAMBIT 2.4.6). A malha menos refinada,
denominada malha mais grosseira, tem 790800 elementos, e a malha mais refinada possui 1960200
elementos.
Nas simulações foram usados o modelo de turbulência RNG, o modelo de difusão para a
combustão, e o modelo das ordenadas discretas para a radiação. Foram feitos ensaios numéricos em
regime estacionário e em regime transiente com três valores distintos de potência térmica: 80, 100 e
130 kW.
Os resultados obtidos, embora façam uma quantificação detalhada das características do forno e das
suas propriedades e variáveis em regime estacionário, e em regime transiente com as pilhas dos
discos a revenir estáticas no seu interior, não traduzem o comportamento do forno real em que os
discos estão sujeitos ao movimento periódico galopante. Não obstante, os resultados são de extrema
utilidade para o projeto deste tipo de fornos na medida em que fornecem informação clara sobre as
tendências do seu comportamento.
Palavras-chave:
Mecânica dos fluídos computacional; combustão; radiação; tratamento térmico; forno de revenir.
iii
Abstract
The aim of this work is to simulate numerically a tempering furnace, designed to temper discs of
agricultural equipment, through the use of a commercial CFD code (FLUENT 6.3.26), that predicts the
fluid flow, combustion, heat transfer and temperature distribution in its interior. Natural gas similar to
that supplied in the gas networks was chosen as fuel for the furnace.
Two computational meshes were generated by the GAMBIT 2.4.6 software, a grid generator code
compatible with FLUENT, to mimic numerically the complex furnace geometry. The coarsest mesh
has got 790800 cells, and the finest one has got 1960200 cells.
In the simulations the RNG turbulence model, the non-premixed combustion model, and the
discrete ordinates model for radiation were used. Numerical simulations were run in steady-state and
transient regime, with three different power inputs: 80, 100 and 130 kW.
Although the results obtained quantify in detail the relevant variables and properties inside the furnace
in steady state, and in transient regime with the disc packs to be tempered remaining static inside the
furnace, they do not yield the actual furnace dynamic behavior with the disc packs advancing
periodically inside it. Even though, those results are most useful for the design of this kind of furnace
as they provide accurate information on the furnace behavior trends.
Key-words:
Computational fluid dynamics; combustion; radiation; heat treatment; tempering furnace.
v
Agradecimentos
O trabalho aqui mostrado não podia ter sido realizado sem a ajuda de várias pessoas envolvidas.
Como tal, gostava de mostrar o meu agradecimento a todos, e em especial aqueles que me
acompanharam de perto.
Em primeiro lugar quero agradecer ao Prof. Viriato Semião pela disponibilidade para a orientação da
dissertação e por todos os esclarecimentos prestados às minhas dúvidas, que conduziram à
resolução de partes importantes deste trabalho.
Ao Comendador João Justino da Galucho pela excelente receção prestada durante o estágio que
efetuei naquela empresa, e pela sugestão do tema do qual surgiu este trabalho.
Ao Eng. Nunes Rodrigues e ao Eng. Eduardo Nunes pela ajuda e pelos dados fornecidos para a
conceção de um forno de revenido que correspondesse aos requisitos da Galucho.
Ao meu amigo Jorge da Câmara por toda a ajuda e disponibilidade mostrada ao longo deste trabalho,
que sem ele não era possível ter aprendido de forma tão rápida a trabalhar com o GAMBIT e com o
FLUENT.
Ao Pedro Costa pela disponibilidade mostrada para ajudar na elaboração de uma UDF (User Defined
Function).
Ao Ricardo Oliveira pelas várias dúvidas tiradas e pela sempre pronta disponibilidade em ajudar.
A todos os meus colegas e amigos por tudo.
E por último aos meus pais e toda a minha família, por todo o apoio prestado, pois sem eles nada
disto teria sido possível.
vii
Índice geral
Resumo ................................................................................................................................................... i
Abstract ................................................................................................................................................. iii
Agradecimentos ..................................................................................................................................... v
Índice de figuras .................................................................................................................................... xi
Índice de tabelas .................................................................................................................................. xv
Nomenclatura ..................................................................................................................................... xvii
Acrónimos ....................................................................................................................................... xvii
Operadores matemáticos ................................................................................................................ xvii
Símbolos alfanuméricos.................................................................................................................. xvii
Letras gregas ................................................................................................................................... xix
Símbolos subscritos ......................................................................................................................... xix
1. Introdução ....................................................................................................................................... 1
1.1. Âmbito do trabalho e objetivos ............................................................................................... 1
1.2. Revisão de Literatura .............................................................................................................. 3
1.2.1. Queimadores de escoamento com rotação (swirl) .......................................................... 3
1.2.2. Modelo de turbulência RNG .................................................................................. 4
1.2.3. Modelo de radiação de ordenadas discretas .................................................................. 6
1.3. Contribuições da presente tese .............................................................................................. 7
1.4. Estrutura da dissertação ......................................................................................................... 8
2. Geometria do forno de revenir e malha computacional ................................................................... 9
2.1. Geometria do forno e condições de fronteira .......................................................................... 9
2.1.1. Geometria do forno ......................................................................................................... 9
2.1.2. Condições de fronteira .................................................................................................. 12
viii
2.2. Malha computacional para o forno........................................................................................ 16
2.2.1. Malha mais grosseira .................................................................................................... 18
2.2.2. Malha refinada .............................................................................................................. 21
3. Modelo físico e numérico .............................................................................................................. 24
3.1. Equações da continuidade e da quantidade de movimento ................................................. 24
3.2. Modelo da turbulência .......................................................................................................... 25
3.2.1. Médias de Reynolds ..................................................................................................... 25
3.2.2. Modelo de turbulência RNG ................................................................................ 27
3.2.3. Modelação da viscosidade efectiva .............................................................................. 28
3.2.4. Modelo RNG modificado para escoamentos com swirl ....................................... 28
3.2.5. Cálculo do inverso dos Números de Prandtl Efectivos ................................................. 29
3.2.6. Equação de energia ...................................................................................................... 29
3.3. Modelo da combustão .......................................................................................................... 30
3.3.1. Definição da fração de mistura .................................................................................. 31
3.3.2. Equações de transporte para a fração de mistura e sua variância ...................... 31
3.3.3. Interação da turbulência com a cinética química .......................................................... 32
3.3.4. Determinação dos valores médios dos escalares dependentes de ........................... 33
3.3.5. A forma da PDF ............................................................................................................ 33
3.4. Modelo da Radiação ............................................................................................................. 34
3.4.1. Discretização Angular ................................................................................................... 36
3.5. Método numérico .................................................................................................................. 37
3.5.1. Equação geral de transporte de escalares ................................................................... 38
3.5.2. Solução do sistema de equações lineares.................................................................... 40
3.5.3. Discretização espacial .................................................................................................. 40
ix
3.5.4. Discretização temporal ................................................................................................. 42
3.5.5. Avaliação de gradientes e derivadas ............................................................................ 43
3.5.6. Pressure-Based Solver ................................................................................................. 44
3.5.7. Ligação da pressão com a velocidade .......................................................................... 46
3.5.8. Sub-relaxação das equações ....................................................................................... 47
3.5.9. Algoritmo de regime transiente ..................................................................................... 47
3.5.10. Algoritmo iterativo de avanço no tempo ........................................................................ 48
4. Resultados numéricos ................................................................................................................... 49
4.1. Malha mais grosseira ............................................................................................................ 49
4.1.1. Regime estacionário ..................................................................................................... 49
4.1.2. Regime transiente ......................................................................................................... 61
4.2. Malha refinada ...................................................................................................................... 66
4.2.1. Regime estacionário ..................................................................................................... 66
5. Conclusões ................................................................................................................................... 77
5.1. Síntese conclusiva ................................................................................................................ 77
5.2. Trabalho futuro ..................................................................................................................... 78
Referências Bibliográficas .................................................................................................................... 79
xi
Índice de figuras
Figura 1.1 – Uma alfaia agrícola representativa de uma grade de discos típica .................................... 2
Figura 2.1 - Pilha de discos típica da fábrica Galucho ........................................................................... 9
Figura 2.2 - Vista de planta do forno de revenido em estudo (medidas em mm). 1 – Queimador; 2 –
Pilha de discos; 3 – Conduta central de queima do combustível; 4 – Saída para a chaminé............... 11
Figura 2.3 - Vista frontal do forno de revenido em estudo (medidas em mm). 1 – Queimador; 2 –
Pilhas de discos; 3 – Conduta central de queima do combustível. ....................................................... 11
Figura 2.4 - Vista em planta da representação da região do forno onde estão os discos, dividida por
diferentes secções ............................................................................................................................... 17
Figura 2.5 - Representação da malha mais grosseira num plano de secção transversal da conduta de
queima.................................................................................................................................................. 18
Figura 2.6 - Pormenor da malha do queimador para a entrada de ar e de gás natural ........................ 18
Figura 2.7 – Disposição dos elementos num plano vertical perpendicular à conduta de queima e a
uma pilha de discos, na malha mais grosseira ..................................................................................... 19
Figura 2.8 – Vista de planta da distribuição dos elementos na zona dos discos e na conduta, na malha
mais grosseira ...................................................................................................................................... 20
Figura 2.9 - Pormenor construtivo no centro dos discos, na malha mais grosseira ............................. 20
Figura 2.10 - Pormenor construtivo do centro dos discos, na malha refinada ...................................... 21
Figura 2.11 - Vista em planta da distribuição dos elementos na zona dos discos e na conduta de
queima, da malha refinada ................................................................................................................... 21
Figura 2.12 - Disposição dos elementos num plano vertical perpendicular à conduta e a uma pilha de
discos, na malha refinada..................................................................................................................... 22
Figura 3.1 - Representação gráfica da função densidade de probabilidade de , ....................... 32
Figura 3.2 - Representação visual de uma Tabela Look-Up para o escalar como uma função de e
e de ganhos/perdas de calor normalizados .................................................................................... 35
Figura 3.3 – Esquema de transferência de calor por radiação ............................................................. 36
Figura 3.4 - Sistema de coordenadas angulares .................................................................................. 37
xii
Figura 3.5 – Esquema do método de resolução numérica ................................................................... 38
Figura 3.6 – Volumes finitos com centros e usados para ilustrar a discretização de uma
equação de transporte de escalares .................................................................................................... 39
Figura 3.7 – Variação de entre = 0 e (Equação 3.35) ......................................................... 42
Figura 3.8 – Ilustração do algoritmo de cálculo iterativo para problemas transientes .......................... 48
Figura 4.1 - Distribuição da temperatura nos discos no ensaio de 80 kW – vista I .............................. 52
Figura 4.2- Distribuição da temperatura nos discos no ensaio de 80 kW – vista II .............................. 52
Figura 4.3 - Distribuição de temperatura nas paredes da conduta de queima no ensaio de 80 kW..... 53
Figura 4.4 - Previsão da fração de mistura no plano de simetria do forno no ensaio de 80 kW ........... 53
Figura 4.5 - Vista ampliada dos contornos da fração de mistura no plano de simetria ........................ 54
Figura 4.6 - Distribuição da temperatura no plano do simetria do forno para uma potência de 80 kW 54
Figura 4.7 - Distribuição de temperatura em planos verticais, passantes pelo centro das várias pilhas
de discos para o ensaio de 100 kW ..................................................................................................... 55
Figura 4.8 - Distribuição de temperatura no plano horizontal Z = 700 mm para o ensaio de 100 kW .. 55
Figura 4.9 - Distribuição de temperatura no plano horizontal Z = 850 mm para o ensaio de 100 kW .. 56
Figura 4.10 - Distribuição de temperatura na saida de escape para o ensaio de 100 kW ................... 56
Figura 4.11 - Distribuição de temperatura da pilha 1 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 57
Figura 4.12 - Distribuição de temperatura da pilha 2 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 57
Figura 4.13 - Distribuição de temperatura da pilha 3 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 57
Figura 4.14 - Distribuição de temperatura da pilha 4 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 58
Figura 4.15 - Distribuição de temperatura da pilha 5 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 58
Figura 4.16 - Distribuição de temperatura da pilha 6 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW..... 58
Figura 4.17 - Distribuição vectorial do escoamento no plano de simetria no ensaio de 130 kW .......... 59
Figura 4.18 - Distribuição vectorial do escoamento no plano de simetria, próximo à saída de escape
no ensaio de 130 kW ............................................................................................................................ 60
xiii
Figura 4.19 - Distribuição vectorial do escoamento no plano horizontal, passante pelo centro do
queimador e da conduta, Z = 250 mm no ensaio de 130 kW ............................................................... 60
Figura 4.20 - Distribuição vectorial do escoamento no plano horizontal Z = 700 mm no ensaio de 130
kW ........................................................................................................................................................ 61
Figura 4.21 - Distribuição vectorial do escoamento no plano Z = 850 mm no ensaio de 130 kW ........ 61
Figura 4.22 - Evolução temporal da temperatura mínima dos discos da pilha 1, para 130 kW de
potência ................................................................................................................................................ 63
Figura 4.23 - Distribuição de temperatura nos discos vista de baixo, para 130 kW de potência em
regime transiente .................................................................................................................................. 64
Figura 4.24 - Distribuição de temperatura no plano Y = 700 mm, passante pelo centro das pilhas de
discos, para 130 kW de potência em regime transiente ....................................................................... 64
Figura 4.25 - Evolução temporal da temperatura mínima dos discos da pilha 1, para 100 kW de
potência ................................................................................................................................................ 65
Figura 4.26 - Distribuição de temperatura nos discos visto de cima, para 100 kW de potência em
regime transiente .................................................................................................................................. 65
Figura 4.27 - Distribuição da temperatura do interior do forno para o ensaio de 100 kW, visto de baixo
e através do plano de simetria ............................................................................................................. 66
Figura 4.28 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário,
na malha refinada, visto do canto do forno de inversão de escoamento .............................................. 67
Figura 4.29 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário,
na malha refinada, visto da zona da saída de escape ......................................................................... 68
Figura 4.30 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário,
na malha refinada, visto ligeiramente de baixo .................................................................................... 68
Figura 4.31 - Distribuição de temperatura do forno para o ensaio de 80 kW em regime estacionário,
na malha refinada, visto através do plano de simetria ......................................................................... 69
Figura 4.32 - Distribuição de temperatura em diferentes planos com coordenada X constante, para o
ensaio de 100 kW na malha refinada ................................................................................................... 69
Figura 4.33 - Distribuição de temperatura no plano Y = 700 mm, para o ensaio de 100 kW na malha
refinada ................................................................................................................................................ 70
xiv
Figura 4.34 - Distribuição de temperatura no plano Z = 250 mm, para o ensaio de 100 kW na malha
refinada ................................................................................................................................................ 70
Figura 4.35 - Distribuição de temperatura da pilha 1 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 71
Figura 4.36 - Distribuição de temperatura da pilha 2 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 71
Figura 4.37 - Distribuição de temperatura da pilha 3 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 71
Figura 4.38 - Distribuição de temperatura da pilha 4 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 72
Figura 4.39 - Distribuição de temperatura da pilha 5 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 72
Figura 4.40 - Distribuição de temperatura da pilha 6 ao longo do eixo Z, para a malha refinada......... 72
Figura 4.41 - Distribuição de temperatura nas faces exteriores do forno, para a malha refinada ........ 73
Figura 4.42 - Distribuição de temperatura na conduta para o ensaio de 130 kW na malha refinada ... 74
Figura 4.43 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano de simetria no ensaio de 130 kW na
malha refinada ...................................................................................................................................... 75
Figura 4.44 - Pormenor da distribuição dos vetores de velocidade no plano de simetria, próximo à
saida de escape, no ensaio de 130 kW na malha refinada .................................................................. 75
Figura 4.45 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 250 mm, no ensaio de
130 kW na malha refinada.................................................................................................................... 75
Figura 4.46 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 700 mm, no ensaio de
130 kW na malha refinada.................................................................................................................... 76
Figura 4.47 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 850 mm, no ensaio de
130 kW na malha refinada.................................................................................................................... 76
xv
Índice de tabelas
Tabela 2.1 - Condição de fronteira para a entrada de ar ...................................................................... 13
Tabela 2.2 - Condição de fronteira para a entrada de gás natural ....................................................... 14
Tabela 2.3 - Condição de fronteira da saída para a chaminé ............................................................... 14
Tabela 2.4 - Condição de fronteira das paredes do forno .................................................................... 14
Tabela 2.5 - Propriedades dos materiais usados nas simulações numéricas realizadas ..................... 15
Tabela 2.6 - Constituição considerada para a composição do gás natural .......................................... 16
Tabela 2.7 - Propriedade do gás natural considerado .......................................................................... 16
Tabela 4.1 - Características do computador usado para a realização deste trabalho .......................... 49
Tabela 4.2 - Valores dos residuos adimensionais obtidos nos ensaios feitos em regime estacionário,
para a malha mais grosseira ................................................................................................................ 50
Tabela 4.3 - Balanço de massa efectuado ao forno, em kg/s............................................................... 50
Tabela 4.4 - Balanço de energia efectuado ao forno, em W ................................................................ 51
Tabela 4.5 - Valores dos residuos adimensionais obtidos nos ensaios feitos em regime estacionário,
para a malha refinada........................................................................................................................... 67
xvii
Nomenclatura
Acrónimos
2D – duas dimensões, bidimensional
3D – três dimensões, tridimensional
AGM – Algebraic MultiGrid
CFD – Computational Fluid Dynamics
DO – Discrete Ordinates
ETR – Equação de Transferência de calor por Radiação
LES – Large Eddy Simulation
NOx – Óxidos de Azoto
PCI – Poder Calorífico Inferior
PDF – Probability Density Function
PRESTO! - PREssure STaggering Option
RNG – ReNormalization Group
SA – Sociedade Anónima
SIMPLE – Semi-Implicit Method for Pressure Linked Equations
SIMPLEC – SIMPLE-Corrected
SOU – Second Order Upwind
UDF – User Defined Function
Operadores matemáticos
Flutuação de
Operador de divergencência
Operador de rotacional
Derivada em ordem à posição
Derivada em ordem ao tempo
Operador exponencial
Operador logaritmico
Operador somatório
Símbolos alfanuméricos
Elemento de área
Constante
xviii
Calor específico, a pressão constante (J/kg∙K)
Entalpia (J/kg)
Fração de mistura, função descritiva
Variância da fração de mistura
Aceleração da gravidade (9.81 m/s2)
Entalpia de formação da espécie à temperatura de referência (J/kg)
Entalpia total (J/kg)
Intensidade de transferência de calor por radiação (W/m2∙sr)
Matriz identidade
Vetores direção das coordenadas cartesianas
Fluxo mássico (kg/s)
Energia cinética turbulenta (m
2/s
2), coeficiente de absorção radiativa, fator emissivo,
coeficiente de condutibilidade térmica (W/m∙K)
Fluxo axial de quantidade de movimento angular (m5/s
2)
Fluxo axial de quantidade de movimento axial (m4/s
2)
Número de divisões existentes na coordenada e
Raio exterior do anel circular (m)
Raio interior do anel circular (m)
Pressão estática (Pa), função densidade de probabilidade
Número de Peclet
Variável integradora do raio
Taxa de deformação
Trajetória do feixe emissivo
Termo fonte, tensor médio de deformação
Temperatura (K)
Velocidade axial do escoamento (m/s)
Velocidade do escoamento (m/s)
Elemento de volume
Velocidade tangencial do escoamento (m/s)
Componente cartesiana da posição
Componente cartesiana da posição
Fração mássica da espécie
Fração mássica do elemento
xix
Letras gregas
Inverso do número de Prandtl efetivo
Constante
Constante, nome da PDF
Coeficiente de difusão
Delta de Kronecker
Duração do passo temporal
Taxa de dissipação de energia cinética turbulenta (m2/s
3)
Constante de Stefan-Boltzmann (5.67e-8 W/m2K
4)
Ângulo polar
Comprimento de onda (m)
Viscosidade absoluta (Pa∙s)
Massa volúmica
Tensor das tensões
Escalar transportado, ângulo azimutal
Ω Ângulo sólido (rad)
Símbolos subscritos
Referente ao momento inicial, à distância
Variável espectral de um corpo negro
Células e
Número de pixels por divisão de
Referente a
Valor efetivo
Referente à interface
Referente ao combustível
Variável integradora, posição cartesiana
Referente a
Referente à distância
Variável espectral
Variável espectral referente ao scattering
Referente ao máximo
Referente ao mínimo
xx
Referente à componente normal, referente ao instante
Número da célula vizinha
Referente ao valor anterior
Referente ao comburente
Referente à posição
Referente à transferência de calor por radiação
Referente à posição a oeste
Referente ao escalar
Número de pixels por divisão de
1
1. Introdução
1.1. Âmbito do trabalho e objetivos
A construção de fornos industriais e câmaras com atmosfera controlada têm sido alvo de uma
evolução considerável em termos de projeto e controlo de temperatura, ao longo dos últimos anos,
muito graças à conceção de modelos físicos e numéricos que permitem simular computacionalmente,
de forma mais ou menos precisa, o seu desempenho em determinados regimes de funcionamento.
Até meados do século passado, o desenvolvimento e a evolução de fornos eram baseados em
métodos empíricos, obrigando os engenheiros a executar projetos com um certo nível de risco e com
uma evolução contida. A simulação de escoamentos reativos com transferência de calor através de
métodos numéricos, que teve um grande avanço no séc. XX, permitiu caracterizar com maior detalhe
as propriedades físicas desses escoamentos, assim como reduzir o custo e o tempo do projeto.
Num ambiente industrial, a eficácia da produção é um parâmetro característico. Contudo, devido à
crescente preocupação com o meio ambiente e ao constante aumento do custo de acesso à energia,
torna-se cada vez mais necessário procurar soluções que visem o aumento de eficiência de utilização
da energia, de forma a assegurar a sustentabilidade e a competitividade das empresas no mercado.
A otimização de processos energeticamente intensivos assume um papel importante nas indústrias
do aço, visando introduzir formas de produção mais limpas e eficientes. Os fornos industriais são
geralmente equipamentos críticos nas linhas de produção industriais pelas seguintes razões:
consomem uma grande quantidade de energia (combustível ou energia elétrica); têm um papel
importante na qualidade final do produto; contribuem com uma grande proporção do tempo de
produção; e têm um impacto crucial na poluição emitida pela fábrica (Jaklic et al., 2005).
A conceção de fornos para efetuar tratamentos térmicos dispõe de uma ampla variedade de soluções
possíveis, consoante o material a tratar, as características finais pretendidas, a cadência objetivo e a
fonte de energia a usar. O aço é, possivelmente, o material que mundialmente é mais sujeito a
rigorosos tratamentos térmicos, necessitando quase sempre de mais do que um processo de
tratamento para se conseguir obter o máximo proveito das suas propriedades mecânicas. Para este
material podem-se destacar, de entre os vários tratamentos existentes, a austenização, a têmpera, o
revenido e a cementação.
A austenização consiste num tratamento essencialmente de alivio de tensões internas, provocado por
processos prévios de forjamento, por exemplo, em que o aço é levado acima da temperatura de
austenização, mantido assim por um determinado tempo, e arrefecido lentamente. A têmpera é o
processo que permite que o aço ganhe dureza, e consiste em levar o aço a uma temperatura entre os
600 e 900 ºC, e arrefecido em água ou em óleo, consoante a percentagem de carbono existente no
aço e o requisito pretendido dessa peça. O revenido é definido mais à frente. A cementação é um
tratamento termoquímico de endurecimento superficial do aço, que é feito, tipicamente, levando o aço
2
a um banho de sais, mantidos a aproximadamente 900 ºC. Este tratamento provoca uma migração de
carbono da superfície da peça para o interior que será tanto maior quanto maior o tempo de
exposição ao banho de sais. Este processo é mais usado para rodas dentadas e outros elementos
mecânicos que necessitem de elevada dureza superficial.
O forno que é alvo de estudo nesta tese é destinado ao processo de revenido de discos de aço, que
são parte constituinte de uma grade de discos convencional (alfaia agrícola que tem por objetivo
lavrar a terra, que pode ser vista na figura 1.1). A produção desta grade pode ser feita pela Galucho,
Industrias Metalomecânicas S.A., empresa que se dedica à produção e comercialização de
equipamentos agrícolas e material circulante industrial. Os discos são uma parte fundamental da
alfaia, pois são eles que rasgam a terra e, como tal, estão sujeitos a esforços mecânicos intensos e
variados, necessitando por isso de um bom compromisso entre dureza, para ter bom poder de
penetração nos diversos terrenos, e tenacidade, para conseguir absorver impactos diversos sem
partir. Os discos são também um elemento de desgaste, sendo portanto uma das peças mais
fabricadas pela empresa, onde há, inclusivamente, produção para stock.
O revenido efetua-se após a têmpera, e consiste num aquecimento a uma temperatura inferior à
temperatura de austenitização, estágio a essa temperatura, e posterior arrefecimento lento,
geralmente ao ar. O processo é moroso, uma vez que requer um tempo de estágio entre 1 a 3h. As
temperaturas necessárias não são muito elevadas (entre os 100 a 450 ºC), sendo essa a razão pela
qual a maior parte dos fornos de menores dimensões são aquecidos através de resistências elétricas,
por simplicidade de construção, reduzida manutenção e segurança de operação.
Figura 1.1 – Uma alfaia agrícola representativa de uma grade de discos típica
É no âmbito desta temática, o revenido de discos para grades de alfaias agrícolas, que a presente
tese se insere. Com este trabalho espera-se dar um contributo acrescentado para a conceção e
análise de fornos de revenido através de métodos numéricos, uma vez que é um tipo de fornos que
não possui uma análise técnico-científica tão aprofundada quanto outros fornos de tratamentos
térmicos realizados a temperaturas superiores, ou mesmo de outro tipo de processos industriais
efetuados em fornos, como a fundição de aço ou vidro.
3
1.2. Revisão de Literatura
De forma a sustentar algumas das escolhas feitas no presente trabalho, tanto na modelação física e
numérica como na geométrica, foi necessária a revisão de alguns trabalhos diversificados. De entre a
bibliografia pesquisada apenas ficaram por encontrar (porque inexistentes) trabalhos referentes a
fornos de revenido, que seria certamente o conteúdo mais importante para se poder aprofundar o
conhecimento.
Assim, a aprendizagem efetuada nos trabalhos referentes a outros processos térmicos foi contida, e
as escolhas feitas foram baseadas no processo de revenido existente na Galucho.
A revisão da literatura efetuada ao longo deste trabalho focou-se pois na aplicação de vários modelos
computacionais, e nas configurações de escoamentos semelhantes ao do forno em estudo.
Convém desde já salientar que a simulação computacional do forno em estudo foi feita com recurso
ao código de CFD (computational fluid dynamics) comercial FLUENT 6.3.26, que tem associado o
software de geração de malhas GAMBIT 2.4.6. O FLUENT é um software comercial de resolução de
equações algébricas, que são o resultado de discretização pelo método dos volumes finitos das
equações diferenciais de transporte (continuidade, quantidade de movimento, entalpia e outros
escalares). Para tal, é necessário discretizar todo o domínio físico de cálculo em volumes finitos, o
que é feito através de uma malha computacional gerada pelo software GAMBIT referenciado.
1.2.1. Queimadores de escoamento com rotação (swirl)
Os queimadores de chama de difusão com escoamento com rotação (swirl) são amplamente
utilizados em sistemas de queima industriais como turbinas a gás, caldeiras e fornos, devido a razões
de segurança e estabilidade. O swirl aumenta a taxa de mistura do combustível com o ar,
assegurando a estabilização de chama, e tem uma forte influência nas características da chama e
das emissões de poluentes. Contudo, é sabido que, independentemente da tecnologia de combustão
utilizada, qualquer melhoria no desempenho da combustão relativamente à formação de poluentes,
estabilidade e eficiência geral requer um estudo pormenorizado do mecanismo de mistura e
arrastamento para escoamentos turbulentos reativos.
Em diversos equipamentos de combustão ambos os reagentes estão na fase gasosa e, por razões
tecnológicas, a geometria coaxial é comummente utilizada para injetar os reagentes na câmara de
combustão e promover a mistura dos dois escoamentos; o movimento de swirl do escoamento
principal (Coghe e Solero, 1999) (escoamento de ar) é usado para assegurar a estabilização de
chama e melhorar o processo de mistura entre o comburente e o combustível.
Bastantes estudos experimentais e numéricos têm sido efetuados em torno de escoamentos
laminares e turbulentos, com transferência de calor e sem o efeito de swirl em anéis concêntricos.
Num estudo experimental recente, a transferência de calor pode ser aumentada num anel usando
4
injeção de escoamento tangencial pelo tubo exterior. Os autores constataram que a transmissão de
calor aumenta até 85% para números de Reynolds constantes e até 39% para uma potência de
bombagem constante. O movimento de swirl promove uma maior transferência de calor para as
paredes da câmara, para um mesmo número de Reynolds. Este aumento de transferência de calor é
significativo junto à entrada da câmara, e vai decaindo à medida que o escoamento prossegue para
jusante, até atingir assintoticamente um valor constante quando o efeito swirl já não se faz sentir.
Este aumento de transferência de calor é devido ao maior nível de turbulência causado pelo
movimento em swirl e ao aumento do comprimento de contacto entre os elementos do fluido e a
superfície a aquecer (Shabana et al., 1999).
A aplicação de escoamento com rotação swirl no presente forno foi decidida ser aplicada ao
escoamento anular, que neste caso é o escoamento de ar, como forma de tentar obter as vantagens
previamente mencionadas.
1.2.2. Modelo de turbulência RNG
As características térmicas e dinâmicas de escoamentos em câmaras de combustão são fatores
determinantes na sua eficiência. Neste âmbito, a mecânica de fluidos computacional tem prestado um
papel de grande importância na avaliação e projeto de inúmeros sistemas de combustão. Uma das
áreas onde a comunidade científica que estuda esta matéria se tem focado é na otimização e estudo
dos modelos de turbulência.
Os escoamentos em câmaras de combustão são variáveis, com regiões do escoamento
completamente turbulento, regiões de transição laminar-turbulento, e regiões de escoamento laminar.
Simultaneamente, estes escoamentos não isotérmicos apresentam características associadas a
diferentes tipos de forças motrizes, como a convecção forçada, a convecção natural e/ou uma
combinação de ambas. Por isso, estes escoamentos são complexos, exibindo zonas de separação e
recirculação, vórtices, regiões de predomínio de impulsão térmica, etc., o que torna algo complexo a
sua modelação computacional.
Existem, atualmente, três tipos de abordagens no tratamento da turbulência: simulação numérica
direta (DNS – direct numerical simulation), simulação das grandes escalas da turbulência (LES –
large eddy simulation) e simulação das médias de Reynolds das equações de Navier-Stokes (RANS –
Reynolds averaged Navier-Stokes) – ver, p.e., Smagorinsky (1963) e Deardorff (1970).
A DNS resolve diretamente as equações de Navier-Stokes. Este método resolve integralmente todo o
espetro espacial e temporal da turbulência, desde as menores escalas mais dissipativas (escalas de
Kolmogorov), às escalas integrais ou grandes escalas de turbulência. Como resultado, a DNS
necessita de refinamentos de malha muito acentuados, de forma a capturar as menores escalas de
turbulência em presença no escoamento, o que a torna incomportável para cálculos de câmaras de
combustão. Smagorinsky (1963) e Deardorff (1970) desenvolveram o método LES partindo da
hipótese que o movimento turbulento pode ser dividido em duas partes distintas, as grandes e as
5
pequenas escalas. As grandes escalas de turbulência, tendo em conta a capacidade computacional
atual, são simuláveis diretamente. As pequenas escalas são modeladas, o que elimina a necessidade
computacional incomportável acima referida. Esta abordagem baseia-se no pressuposto das grandes
escalas de turbulência serem responsáveis pelo transporte da quantidade de movimento e da
energia. Ainda assim, o modelo LES é ainda considerado pesado do ponto de vista computacional,
especialmente em problemas de engenharia com geometrias complexas, como é o caso de fornos
industriais.
Nos estudos de engenharia, nomeadamente em projeto, otimização e incrementação da eficiência
energética de câmaras de combustão, os parâmetros médios (média temporal) do escoamento têm-
se revelado de maior utilidade que os seus valores instantâneos. Por esta razão, tem-se assistido a
uma maior atenção da comunidade científica ao desenvolvimento e otimização dos modelos
baseados nas médias de Reynolds (RANS), que conseguem prever rapidamente e com precisão
bastante aceitável, ao nível de engenharia, os escoamentos médios no seu interior. Estes modelos
assumem que as grandezas que caracterizam os escoamentos podem ser separadas em duas
componentes, a média temporal e a flutuação em relação à média. A aplicação desta abordagem
gera termos associados à turbulência nas equações que governam o escoamento que requerem
modelação.
De entre os modelos de turbulência baseados nas médias de Reynolds, o mais popular e utilizado é o
modelo de turbulência a duas equações, denominado (p.e. Semião, 1986; Coelho, 1987;
Zhang e Chen, 2006). O modelo é semi-empírico e válido apenas para escoamentos
completamente turbulentos (elevado número de Reynolds).
No entanto, certas características dos escoamentos em fornos industriais, como sejam as zonas de
baixa velocidade, e por tal, com baixo valor do número de Reynolds, requerem a utilização de
modelos mais adequados, como o modelo de turbulência RNG (renormalization group). Este
modelo é obtido através do tratamento matemático das equações de Navier-Stokes instantâneas,
utilizando a técnica grupo de renormalização (Yakhot e Orszag, 1986), que recorre à teoria das largas
escalas turbulentas e aos seus efeitos nas pequenas escalas, e que se materializa pela introdução de
coeficientes modificados nas equações de transporte da energia cinética turbulenta ( ) e na da taxa
de dissipação da energia cinética turbulenta ( ) (Stamou e Katsiris, 2006).
O modelo de turbulência padrão (Launder e Spalding, 1974) continua a ser profusamente
utilizado na modelação de escoamentos no interior de fornos industriais, ilustrando resultados
aceitáveis (especialmente na simulação das características globais de escoamento) exibindo como
principal vantagem a eficiência computacional. Apresenta, no entanto, algumas limitações na previsão
de situações especiais, nomeadamente em regiões de baixo número de Reynolds.
6
O modelo RNG, embora sendo ligeiramente mais demorado computacionalmente do que o
padrão, proporciona resultados que, nalguns casos, podem ser bastante mais precisos, tendo
sido, por isso, largamente utilizado.
Os valores máximos previstos para a energia cinética turbulenta e para a sua taxa de dissipação são
mais precisos quando usado o modelo RNG, pois este permite capturar melhor as
características do escoamento de corte desenvolvido. Relativamente ao RNG, o modelo
padrão comporta-se de forma medíocre junto à região em que as linhas de corrente do escoamento
apresentem elevada curvatura, enquanto que o modelo RNG permite capturar a tensão média
deste tipo de escoamento (Keramida et al., 1999).
1.2.3. Modelo de radiação de ordenadas discretas
A equação da transferência de calor por radiação (ETR) para um meio em equilíbrio termodinâmico
local pode escrever-se do seguinte modo (Lockwood e Shah, 1981):
(1.1)
em que representa a intensidade radiativa espectral, representa a intensidade ratiativa
espectral de um corpo negro, o coeficiente de scattering espectral do meio, é o coeficiente de
absorção espectral.
Se se considerar o meio como um gás cinzento e sem partículas em suspensão, , a equação
1.1, após integrada no espectro radiativo, simplifica-se para (Coelho e Carvalho, 1997):
(1.2)
onde é a constante de Stefan-Boltzmann.
A discretização da equação (1.2) através de ordenadas discretas é obtida, como o nome sugere,
discretizando por completo o ângulo sólido (Ω = 4 ), usando um número finito de direções ordenadas
e respetivos fatores de ponderação. A ETR é escrita para cada ordenada e os termos integrais são
substituídos por equações discretizadas sobre cada ordenada (Viskanta e Meng ç, 1987).
Ao longo da última década, o método das ordenadas discretas (DO) tem sido a técnica mais
amplamente utilizada para obter soluções numéricas para a equação de transferência radiativa. O
método das DO tem bastantes vantagens que evidenciam a sua popularidade: à parte a óbvia
facilidade com que é incorporado em cálculos da dinâmica dos fluídos computacional (CFD), devido à
sua compatibilidade com as soluções das equações diferenciais para escoamentos turbulentos,
7
reativos e com radiação, é computacionalmente eficiente e relativamente fácil de programar (Kayakol
et al., 1999).
Nos dias de hoje, o modelo DO é um dos modelos de radiação mais usados, pois garante um bom
compromisso entre a precisão da solução e os requisitos computacionais para muitos problemas
práticos. No caso de um problema completo de transferência radiativa, i.e., quando o fluxo de calor ao
longo de toda a fronteira ou a divergência do vetor de fluxo de calor radiativo são necessários, impõe-
se a escolha de modelos de radiação económicos. Neste caso, as duas melhores abordagens serão
provavelmente o modelo de Monte Carlo e o modelo DO. Os requisitos computacionais são elevados
sempre que é usado o método de Monte Carlo. Posto isto, o modelo DO poderá ser uma melhor
opção em vários problemas, uma vez que a precisão é frequentemente afetada apenas
marginalmente e os requisitos computacionais são menores (Coelho, 2007).
1.3. Contribuições da presente tese
Atualmente, na Galucho, os discos são revenidos por um forno elétrico que permite tratar um conjunto
de discos empilhados de cada vez. Sendo o processo de revenido um tratamento demorado, em
média leva cerca de uma hora e meia para ser concluído, a taxa de produção permitida pelo forno em
questão torna-se num fator limitativo da eficácia produtiva. O objetivo deste trabalho é fornecer à
empresa um anteprojeto de um forno que permita obter uma maior cadência de produção a um custo
menor, preservando as características de qualidade que são exigidas aos discos.
O forno em estudo está projetado para proceder ao revenido de seis pilhas de discos ao mesmo
tempo, melhorando consequentemente a cadência produtiva em seis vezes. O aquecimento deste
forno poderá ser feito por um queimador a gás natural, pois considerou-se que este permitiria reduzir
significativamente os custos para fornos de grandes dimensões, é menos agressivo para o ambiente
e tem um índice de PCI/Nm³ melhor que os outros combustíveis fosseis.
Sendo um forno de revenido, este trabalho conseguiu ser um início do que poderá vir a ser uma
tendência de utilização sistemática de modelação numérica de fornos industriais para aplicações de
baixa temperatura (aproximadamente 300 ºC) usando processos de queima de gás natural para
aquecimento, uma vez que quase todos os trabalhos numéricos realizados para a indústria se
concentram em fornos para aplicações de elevada temperatura (900 ºC ou mais).
Uma vez que o forno estudado é um protótipo, o seu projeto permitiu fomentar o sentido crítico
relativamente à própria conceção de fornos de revenido, pois a esmagadora maioria destes fornos
são aquecidos por resistências elétricas. Assim, a utilização de queimadores de gás natural para o
seu aquecimento pode apresentar uma ampla diversidade de formas de aplicação, sendo a estudada
apenas uma das mais simples de concretizar, se for pretendido utilizar-se um queimador único.
8
1.4. Estrutura da dissertação
A presente dissertação encontra-se dividida em 5 capítulos, conforme se descreve sinteticamente de
seguida.
O capítulo 1 introduz o tema, fazendo o enquadramento da conceção de fornos industriais utilizando
métodos numéricos, e abordando a necessidade atual de elaborar estudos nesta área de
conhecimento. Descrevem-se os objetivos e apresenta-se o resumo de cada um dos capítulos da
dissertação.
No capítulo 2 é apresentado o forno projetado nesta tese, tanto na sua vertente geométrica, como no
que se refere à sua adaptação a um modelo numérico computacional. Serão ainda descritas as
condições de fronteira impostas durante os diferentes ensaios numéricos realizados, assim como a
descrição das propriedades dos materiais considerados.
No capítulo 3 são descritos, de forma genérica, os modelos físico-matemáticos e numérico utilizados
nas simulações. São apresentadas as formas básicas das equações de transporte, assim como os
modelos escolhidos para a combustão, turbulência e radiação. O processo de cálculo iterativo é
descrito de forma simplificada, tanto para cálculos em regime estacionário como em regime
transiente.
No capítulo 4 são apresentados os resultados obtidos dos ensaios numéricos estacionários e
transientes realizados para as diferentes configurações de escoamento testado. É discutido o
potencial do modelo global utilizado para representar a fornalha considerada, assim como a utilidade
dos resultados obtidos.
No capítulo 5 apresentam-se as conclusões resultantes da realização deste trabalho, bem como
sugestões para o trabalho futuro a realizar nesta área.
Esta tese contém ainda os Anexos, onde se encontram imagens referentes a ensaios e parâmetros
de modelação que foram consideradas como secundárias para o corpo principal da dissertação, mas
que servem de complemento ao trabalho feito.
9
2. Geometria do forno de revenir e malha computacional
O forno que se vai estudar nesta tese é um protótipo com qual se espera colmatar as necessidades
atualmente existentes. O objetivo principal será conceber um forno de revenido que permita aumentar
a cadência de produção e, simultaneamente, preservar a qualidade de revenido obtida no forno atual
existente na Galucho. Uma vez que o processo do tratamento térmico não pode ser encurtado
temporalmente, a única solução será aumentar o número de discos a revenir em simultâneo. Para tal
será necessário projetar um forno com dimensões bastante superiores que permita alojar um maior
número de discos.
A forma mais razoável de aglomerar vários discos em simultâneo no forno será colocá-los em pilhas
verticais, uma vez que esta é a forma que permite juntar o maior número de discos num menor
volume contido, além de que dispõe de uma simplicidade construtiva da sua estrutura e proporciona
uma grande facilidade em arrumar os discos na pilha por parte do operário ou da máquina. Isto torna-
se possível pois quase todos os discos possuem um furo central para entrarem no eixo da grade de
discos. Esta é a forma como é feita a arrumação dos discos na fábrica, mostrando a figura 2.1 uma
pilha típica da fábrica Galucho pronta para ir para o forno de revenido.
Figura 2.1 - Pilha de discos típica da fábrica Galucho
2.1. Geometria do forno e condições de fronteira
2.1.1. Geometria do forno
A conceção do forno que aqui se pretende fazer tem como principal força propulsora o aumento da
cadência de produção. Como tal, algumas soluções e opções foram adotadas com o intuito de
promover essa especificação. A meta da empresa Galucho seria ter a capacidade de produzir um
10
milhão de discos por ano, e esse foi o número inicial a partir do qual foram definidas as
características do forno.
Se o forno trabalhar durante dois turnos (16h) por dia, serão necessários aproximadamente 240
discos por hora por forma a satisfazer a meta proposta. Uma vez que o processo de revenido
demora, em média, uma hora e meia, isto significa que o forno deve alojar 360 discos no seu interior.
Sendo os discos de dimensão e massa bastante variável (desde 458 mm de diâmetro com 7kg cada,
a 762 mm, com 36kg), foi estabelecida uma pilha padrão como sendo constituída por trinta discos de
762 mm, e 10 mm de espessura. Esta pilha padrão terá uma massa de aproximadamente uma
tonelada, correspondendo a um peso que foi considerado adequado para ser manobrado em
segurança pelos operadores com as gruas de bandeira e com o empilhador. Quando forem revenidos
discos mais pequenos (e menos espessos), será possível aumentar o número de discos por pilha
numa determinada proporção por forma uma manter a carga térmica aproximadamente constante.
De forma a assegurar uma boa eficácia do forno, será importante criar uma linha de seguimento das
pilhas de discos que garanta um movimento dessas pilhas numa só direção e num único sentido.
Nesse sentido, foi pensado que a melhor configuração é a de um forno em linha, em que as pilhas
entram por um lado do forno e saem pelo lado oposto. Contudo, para evitar o projeto de um forno
demasiado comprido ou desproporcionado, essa linha deverá ser dividida em duas linhas paralelas.
Esta abordagem assegura uma maior facilidade do forno ser alojado na fábrica, facilita a escolha da
forma de aquecimento e resulta num forno teoricamente mais eficiente, uma vez que a razão
superfície/volume será minimizada.
O avanço das pilhas de discos dentro do forno será conseguido através da utilização de um sistema
hidráulico que fornece um avanço galopante de cada pilha de uma dada posição para a posição
seguinte. Este sistema é o existente nos fornos principais da fábrica Galucho, e provou ser, não só
eficaz, como também bastante robusto.
Nas figuras 2.2 e 2.3 podem ser vistas representações a duas dimensões do forno que foi projetado,
em planta e em vista frontal, respetivamente. Trata-se de um forno paralelepipédico que engloba
duas fileiras de seis pilhas de discos (identificadas pelo número 2) que se deslocam paralelamente ao
longo do seu comprimento. O forno possui uma conduta central para queima do combustível (número
3) que guia os produtos de combustão para jusante, seguindo-se uma inversão do escoamento
desses gases até à zona de entrada das pilhas, dirigindo-se então para a saída da chaminé (número
4) localizada por cima do queimador (número 1), encostada à parede. A função da conduta é fazer de
escudo radiativo da chama, e promover o escoamento em U dos gases quentes, por forma a
transferir o máximo de energia térmica possível dentro do forno. Essa conduta foi considerada como
sendo feita de chapa de aço com 5 mm de espessura.
A fonte de energia térmica para aquecimento dos discos foi definida como sendo o gás natural, cuja
combustão é efetuada por meio de um queimador, localizado na parede de saída dos discos, e no
centro do tubo central de queima – ver figuras 2.2 e 2.3. Este queimador fornece um escoamento
11
coaxial de gás natural no centro e ar na periferia (zona anular). O diâmetro escolhido para o tubo de
gás natural foi de 38,1 mm, pois é uma medida normalizada para tubos interiores (3/4’’), e o diâmetro
exterior da secção anular onde se dá o escoamento de ar é de 120 mm. Ambos os diâmetros foram
escolhidos para que nenhum dos escoamentos pudesse ter uma velocidade superior a 10 m/s.
Figura 2.2 - Vista de planta do forno de revenido em estudo (medidas em mm). 1 – Queimador; 2 – Pilha de discos; 3 – Conduta central de queima do combustível; 4 – Saída para a chaminé.
Figura 2.3 - Vista frontal do forno de revenido em estudo (medidas em mm). 1 – Queimador; 2 – Pilhas de discos; 3 – Conduta central de queima do combustível.
12
Para promover uma combustão mais limpa, eficaz e estável, foi adicionado um movimento angular ao
ar de forma a dar um efeito de rotação (swirl) ao escoamento. O swirl permite aumentar a taxa de
mistura entre reagentes e produtos, levando a uma chama mais curta, e ligeiramente mais ampla,
devido ao efeito de forças centrífugas.
Uma vez que as temperaturas pretendidas para os produtos de combustão na região de aquecimento
dos discos se situam próximo dos 300 ºC, será de esperar que o calor transferido para os discos
tenha uma parcela convectiva predominantemente, devido também ao facto de os discos se taparem
quase por completo uns aos outros.
Para isolamento térmico do forno foi escolhida a fibra cerâmica, uma vez que, para aplicações
industriais, é o material que tem melhores propriedades isolantes e apresenta uma boa resistência ao
desgaste. Este material é usado também no isolamento de alguns fornos da Galucho. A parte exterior
do forno será naturalmente revestida a chapa de aço, com espessura a definir, mas irrelevante em
termos deste trabalho, pois a sua componente de resistência térmica é desprezável
comparativamente à do isolamento.
Para projeto computacional, a parte inferior do forno foi tida como igual a toda a restante envolvente,
ou seja, estanque e isolada termicamente. O forno real não seria estanque na sua superfície
horizontal inferior nem perfeitamente isolado, uma vez que esta teria que conter o sistema galopante.
A estrutura mecânica do sistema galopante tem, por vezes, de ser arrefecida por líquido em fornos de
elevada temperatura, e isto pode acarretar uma perda térmica não desprezável. No caso do projeto
computacional do forno em estudo, e uma vez que a temperatura objetivo é relativamente baixa,
considera-se que a aproximação efetuada seja bastante razoável.
2.1.2. Condições de fronteira
Neste projeto computacional do forno não foi efetuada a simulação do funcionamento real do forno,
uma vez que para tal seria necessária a construção e implementação de uma função específica no
código FLUENT utilizado (UDF – User Defined Function) que permitisse simular a mudança de
posição das pilhas de discos, e que não foi possível de executar.
Os ensaios numéricos realizados, consideraram que tanto em regime estacionário como em regime
transiente as pilhas permaneciam imóveis dentro do forno. No regime estacionário não foi imposto
qualquer tipo de condição inicial, ou seja, foi considerado que os discos faziam parte do interior do
forno. No regime transiente foram inicializadas as temperaturas das pilhas com o valor de 293 K, e foi
observada a sua evolução temporal. Neste caso, os discos vão acumular energia térmica, até
entrarem em equilíbrio com a envolvente, ou seja, até se atingir o regime estacionário.
Posto isto, verifica-se que em regime estacionário não existe qualquer carga térmica dinâmica
imposta ao forno, e, por conseguinte, os valores obtidos para as temperaturas no seu interior não
corresponderão aos pretendidos para um funcionamento real. O objetivo das simulações efetuadas é
13
analisar as tendências do comportamento do forno e estudar formas de melhorar a sua configuração
ou disposição.
Assim, foram usados três valores de potência térmica (80-130 kW), qualquer deles correspondente a
uma potência seguramente inferior ao usado num possível funcionamento real, visando-se com esta
abordagem a obtenção de temperaturas não muito elevadas e próximas das que existem no interior
de um forno real.
Para qualquer dos três valores de potência testados foi definido um caudal mássico de ar tal que
permitisse obter condições de queima com 30% de excesso de ar. Este valor é favorável para a
obtenção de uma combustão completa e temperatura máxima de chama um pouco inferior à
estequiométrica.
Na tabelas 2.1 e 2.2 estão descritas as condições de fronteira impostas, respetivamente, para o ar
comburente e o gás natural, tanto em regime estacionário, como transiente. As potências
consideradas foram baseadas no poder calorífico inferior (PCI) do gás natural, que pode ser visto
mais adiante.
Tabela 2.1 - Condição de fronteira para a entrada de ar
Potência (kW) 80 100 130
Velocidade axial (m/s)
3.42 4.28 5.57
Velocidade angular (rad/s)
30.0 30.0 30.0
Número de Swirl 1.16 0.93 0.71
Caudal mássico (kg/s)
2.043e-2 2.557e-2 3.328e-2
Diâmetro hidráulico (mm)
81.9 81.9 81.9
Temperatura (K) 293 293 293
Emissividade 1 1 1
As condições de fronteira da saída para a chaminé são mostradas na tabela 2.3. Esta define,
maioritariamente, condições de um eventual escoamento de retorno para dentro do forno através da
saída dos gases quentes.
A tabela 2.4 descreve a condição de fronteira imposta às paredes do forno. Esta condição de
fronteira, em termos térmicos, foi considerada como sendo mista, ou seja, sujeita a trocas térmicas
com o exterior tanto por convecção como por radiação.
Foi apenas simulada metade do forno, para economia de recursos computacionais, sendo a simetria
uma condição de fronteira para todas as variáveis, exceto para a velocidade (devido ao swirl).
14
Tabela 2.2 - Condição de fronteira para a entrada de gás natural
Potência (kW) 80 100 130
Velocidade axial (m/s)
1.85 2.31 3.00
Caudal mássico (kg/s)
7.625e-4 9.521e-4 1.236e-3
Diâmetro hidráulico (mm)
38.1 38.1 38.1
Temperatura (K) 293 293 293
Emissividade 1 1 1
Tabela 2.3 - Condição de fronteira da saída para a chaminé
Diâmetro hidráulico
(mm)
Pressão de escoamento de
retorno (Pa)
Temperatura de escoamento de
retorno (K) Emissividade
218.2 0 293 1
Tabela 2.4 - Condição de fronteira das paredes do forno
Coeficiente de convecção
exterior ( ) 10
Temperatura exterior de convecção (K)
293
Emissividade interior 0.75
Emissividade exterior 0.5
Temperatura exterior de radiação (K)
293
Espessura (mm) 100
Condutividade térmica ( )
0.10
Material fibra cerâmica
Condição de não escorregamento (u, v, w = 0 m/s)
Os discos e a conduta de queima do combustível constituem as restantes condições de fronteira a
definir pelo utilizador. Para ambas, foi considerado que eram meios participantes na radiação, e sem
geração de energia interna. Nas suas superfícies foi definida a condição de não escorregamento, que
garante velocidade nula em todas as direções.
Um valor usual para proceder à caracterização de fornos é o calor libertado por unidade de volume,
que consiste no quociente entre a potência libertada pela combustão e o volume interior do forno.
Com base nos valores testados, o valor do calor libertado por unidade de volume varia entre 6.4 e
10.5 kW/ . Foram analisados diversos fornos distintos, e os valores encontrados para este
quociente variavam entre 39 e 1803 kW/ , sendo o mais baixo o valor referente a um forno de
15
dimensões elevadas destinado ao reaquecimento de lingotes de aço. Sendo este forno bastante mais
pequeno, e com temperaturas bastante inferiores, será de esperar que tenha um valor de calor
volumétrico libertado inferior a 39 kW/ , em condições de funcionamento real.
Como já foi referido anteriormente, o ar é injetado com uma dada quantidade de movimento angular,
de forma a promover o efeito de swirl e obter assim melhores condições de queima. Na tabela 2.1 é
referido o número de swirl associado ao escoamento de ar. Este número é definido por Chigier e Beér
(1964), e simplificado por Sheen et al. (1996) como:
(2.1)
em que:
taxa axial de quantidade de movimento angular (m5/s
2)
taxa axial de quantidade de movimento axial (m4/s
2)
raio exterior do anel circular (m)
raio interior do anel circular (m)
velocidade tangencial do escoamento (m/s)
velocidade axial do escoamento (m/s)
variável integradora do raio
Em termos de materiais sólidos, apenas foram usados o aço e a fibra cerâmica. O aço foi usado para
definir os discos, a conduta central de queima de combustível e o revestimento exterior do forno. A
fibra cerâmica foi usada como revestimento isolante de todo o forno, incluindo a parte inferior da
conduta, e com uma espessura uniforme de 100 mm. Este valor poderá ser ligeiramente excessivo
em algumas zonas do forno numa aplicação real, mas para um estudo inicial foi considerado como
razoável, uma vez que permite identificar melhor as zonas mais quentes e frias do forno, em que
posteriormente se poderia ajustar a quantidade de isolamento às necessidades.
A tabela 2.5 indica as propriedades definidas para os materiais considerados para as diferentes
simulações.
Tabela 2.5 - Propriedades dos materiais usados nas simulações numéricas realizadas
Material Massa volúmica
( )
Condutividade
térmica ( )
Calor específico
( ) Emissividade
Aço 7850 51.17 577.9 0.5
Fibra cerâmica 290 0.170 1130 0.75
O gás natural é um combustível constituído por vários compostos gasosos, com composição bastante
variável, dependendo da localização geográfica em que tenha sido extraído. Como tal, sempre que
este combustível é usado, será importante definir a sua composição média.
16
Na fábrica da Galucho, o gás natural é fornecido pela rede de canalização, e a sua composição
apresenta algumas variações ao longo do ano. Neste trabalho foram usados os valores
correspondentes à composição média fornecida durante o mês de Junho de 2012, que são exibidos
na tabela 2.6.
A tabela 2.7 mostra as propriedades físicas mais relevantes do gás natural considerado.
Tabela 2.6 - Constituição considerada para a composição do gás natural
Elemento Fração molar
0,9030
0,0680
0,0126
0,0027
0,0059
0,0078
Tabela 2.7 - Propriedade do gás natural considerado
Massa volúmica ( ) PCI ( ) PCI ( )
0.79 38.0 48.1
2.2. Malha computacional para o forno
Como já foi referido, o forno em estudo foi simulado com recurso ao software FLUENT, que resolve
as equações de transporte discretizadas, o que requer a criação de uma malha computacional
adequada. Dos modelos disponibilizados pelo software foi efetuada uma escolha criteriosa de quais
utilizar, o que conduziu, em termos gerais, aos modelos de turbulência, combustão e radiação
descritos no capítulo 3.
A resolução das equações diferenciais sob a forma discretizada em equações algébricas foi efetuada
com a adaptação do modelo físico à representação da geometria em causa por duas malhas
tridimensionais, maioritariamente constituídas por elementos hexaédricos e poliédricos, criadas no
software GAMBIT. Uma vez que a geometria que se pretende representar foi tida como complexa,
considerou-se que os elementos tetraédricos não seriam tão apropriados quanto os hexaédricos.
Uma vez que a geometria do forno apresenta um plano de simetria, que consiste num plano vertical
passante pelo centro da conduta de queima, procedeu-se apenas à modelação de metade do forno,
permitindo assim racionalizar os meios de cálculo computacional sem comprometer a precisão dos
resultados.
Na zona da conduta de queima foram usadas coordenadas tais que verifiquem dois planos de
simetria perpendiculares entre si, e que permitam dividir a conduta em quatro quadrantes iguais. Um
17
desses planos é o plano principal de simetria acima referido, em que o forno é dividido ao meio; e o
outro plano de simetria é perpendicular àquele e passa pelo eixo do queimador. Esta configuração foi
conseguida, uma vez que a conduta tem a forma de um paralelepípedo, e as saídas de ar e gás
natural são circulares e circunscritas no centro da base desse prisma, que está inserida numa parede
lateral do forno.
A motivação desta hipótese simplificativa foi criar uma malha estruturada em que as células se
encontrem orientadas tanto quanto possível com o escoamento principal, que conduz a uma maior
estabilidade e rapidez de cálculo para a zona onde há maior intensidade na ocorrência de vários
fenómenos físicos, como a combustão, a radiação e a turbulência.
Na zona dos discos (ver figuras 2.2 e 2.3) a situação é diferente, uma vez que o seu eixo de
revolução é vertical e o escoamento será, maioritariamente, horizontal, contornando-os. Neste caso
foi privilegiada a construção de uma malha que melhor se adapta ao perfil dos discos, pois estes são
a componente mais importante de todo o processo. Assim, foram criadas seis malhas com dois
planos de simetria verticais e perpendiculares entre si, uma vez que as zonas que aglomeram as seis
pilhas de discos existentes no interior do forno correspondem também a paralelepípedos
quadrangulares regulares retos, como pode ser deixado antever pela figura 2.4.
Figura 2.4 - Vista em planta da representação da região do forno onde estão os discos, dividida por diferentes secções
Cada paralelepípedo que alberga uma pilha de discos apresenta 900 mm de lado da base quadrada e
1000 mm de altura. Esta dimensão permite deixar um espaço de 69 mm entre as extremidades dos
discos maiores (762mm) e a parede, que foi considerada suficiente para a passagem segura das
pilhas dentro do forno. Quanto maior for o forno, mais desproporcionado se torna para os discos mais
pequenos (18 polegadas, ou 458 mm), e menor será o seu rendimento.
Além das dificuldades inerentes à utilização de coordenadas que permitam adaptar a malha à
geometria do equipamento, é necessário reticular o domínio de cálculo com um número de células
que garantam a independência dos resultados obtidos relativamente à grelha construída. Este
objetivo deve ser também compatibilizado com os recursos computacionais disponíveis, pois muitas
vezes a malha computacional necessária para garantir resultados fidedignos obriga a um dispêndio
computacional acima do permitido pela máquina existente, e/ou tempos de cálculo inadmissíveis. A
utilização de um grande número de células é, normalmente, a estratégia seguida quando se
pretendem realizar poucas simulações.
18
Neste trabalho, tendo como objetivo testar uma variedade significativa de condições de
funcionamento do forno, a utilização de malhas muito reticuladas tornaria o cálculo bastante
demorado. Foi, por essa razão, tomada a opção de construir primeiro uma malha mais grosseira (com
cerca de elementos) que respeitasse as implicações mencionadas no parágrafo anterior, e
que exigisse um tempo de cálculo moderado; depois, foi construída outra malha mais refinada (com
cerca de elementos) e organizada para testar a coerência de resultados.
2.2.1. Malha mais grosseira
A primeira malha a ser criada e testada foi tal que permitisse verificar uma distribuição de elementos
relativamente equilibrada, e com um número total de elementos abaixo de um milhão.
Na figura 2.5 pode ser vista a configuração escolhida para a conduta de queima, em que o esquema
de malha desenhado para a saída do queimador foi construído de forma distinta do restante espaço
da conduta.
Figura 2.5 - Representação da malha mais grosseira num plano de secção
transversal da conduta de queima
Figura 2.6 - Pormenor da malha do queimador para a entrada de ar e de gás natural
A figura 2.6 mostra de forma mais pormenorizada a malha do queimador através do qual se efetua a
entrada dos reagentes. Pode ser visto nessa figura que essa condição de fronteira correspondente às
entradas de ar (zona entre os dois anéis vermelhos) e de gás natural (circulo vermelho interior) foi
simulada com divisões radiais e tangenciais. Por outro lado, na restante zona da conduta foi usada
uma disposição mais próxima da forma retangular. Isto foi necessário para conseguir assegurar a
19
existência de um número razoável de células necessárias na fronteira com o espaço para os discos,
que será visto adiante. A configuração da conduta à saída do queimador foi expandida em planos
iguais e paralelos até à outra parede do forno, de forma a privilegiar a homogeneidade de malha. Se
tal não fosse verificado, existiriam pilhas de discos com discretizações diferentes.
Como pode ser rapidamente deduzido, cada hipótese considerada para uma zona do forno tem de
respeitar constrangimentos impostos pelas zonas vizinhas de forma a ter uma malha o mais
homogéneo e harmonioso possível, e ainda assegurar um tempo de cálculo admissível. O primeiro
compromisso a respeitar foi o número de células a utilizar no espaço da altura entre discos na zona
dos discos. Sendo tanto a espessura dos discos como a distância entre estes de 10 mm, foi
considerado que esta medida seria uma dimensão razoável para a divisão da malha até ao disco do
topo da pilha. Entre o disco de baixo e o chão do forno foi deixado um espaço de 20 mm,
correspondente ao espaço ocupado pela estrutura de suporte dos discos, que foi dividido
verticalmente por dois elementos de volume. Este espaçamento de 10 mm por elemento de volume
na vertical foi também respeitado na conduta.
Para garantir a simetria da conduta em dois planos, foi necessário respeitar o espaçamento de 10
mm também na metade superior da conduta. No espaço do forno por cima da conduta, que tem a
mesma altura de 500 mm, foi usado um espaçamento maior por forma a reduzir o número de volumes
finitos, usando-se uma divisão vertical por 30 elementos. Toda esta descrição pode ser vista de forma
gráfica através da figura 2.7.
Figura 2.7 – Disposição dos elementos num plano vertical perpendicular à conduta de queima e a uma pilha de discos, na malha mais grosseira
Uma característica que torna a estrutura da malha não regular na zona dos discos é o facto de estes
serem côncavos. Na figura 2.8 pode ser vista uma representação plana do esquema que se repete
20
verticalmente ao longo do eixo dos discos, com a organização prevista de acordo com o plano vertical
representado na figura 2.7.
A figura 2.8 mostra ainda a distribuição pouco habitual dos elementos pelo disco, mais uma vez
influenciada pelo compromisso de corresponder a um número de elementos razoável tanto para a
conduta como para o furo existente ao centro dos discos. Idealmente, os discos poderiam ter uma
distribuição de elementos da malha radial e tangencial, como foi feito para o queimador representado
na figura 2.6. Contudo, se tivesse sido adotada essa abordagem, existiria um refinamento demasiado
grande no centro dos discos, obrigando o computador a suportar um número de elementos muito
maior sem necessidade. Em vez disso, foi escolhida uma configuração que permite ter 80 elementos
distribuídos pela periferia exterior do disco, e 40 na periferia interior (10 elementos por cada aresta do
furo quadrado). Cada disco é assim representado por 680 elementos – ver figura 2.9.
No espaço central vazio dos discos sobra uma pequena área discretizada por 100 elementos, que é
um refinamento ainda bastante considerável tendo em conta a pouca importância da zona em causa.
As distribuições dos elementos nesse espaço central do disco e no contorno interior do disco podem
ser vistas pela figura 2.9.
Figura 2.8 – Vista de planta da distribuição dos elementos na zona dos discos e na conduta, na malha mais grosseira
Figura 2.9 - Pormenor construtivo no centro dos discos, na malha
mais grosseira
A disposição parcial da zona dos discos e da conduta, prevista pela figura 2.8, repete-se mais cinco
vezes para a direita, de forma a completar a totalidade do forno. A disposição verificada na figura 2.7
apenas se verifica nos planos que forem paralelos ao plano YZ que passam pelo centro dos discos, e,
como no caso anterior, também se repete mais cinco vezes ao longo do forno.
A saída para a chaminé também pode ser vista na figura 2.8, com o contorno a vermelho. Para esta
foi definida uma área retangular disposta por 100 elementos (20 na direção do eixo Y por 5 na direção
21
do eixo X). De relembrar que apenas está representada metade da chaminé, uma vez que o plano XZ
que delimita o contorno inferior da figura 2.8 é plano de simetria.
Os elementos volumétricos, na sua maioria, foram obtidos a partir de elementos quadrangulares,
havendo apenas alguns elementos originados a partir de elementos triangulares (que resulta num
elemento tridimensional com forma de um prisma triangular). Muito poucos são os elementos que
apresentam um grau de distorção (skewness) maior que 90%, existindo apenas alguns nos discos e
outros no conjunto de elementos interiores do queimador, que são todos elementos triangulares que
convergem num ponto, como se de pequenas fatias se tratassem.
No conjunto final, o forno ficou com 790800 elementos. Este número mostrou-se aceitável para ser
corrido pelo computador usado (referido no Capítulo 4).
2.2.2. Malha refinada
A malha mais refinada teve como principal objetivo testar a sensibilidade dos resultados ao seu
refinamento e obter uma melhor distribuição dos elementos nos discos e uma maior concentração de
elementos na conduta de queima ao longo do seu comprimento (eixo X de figura 2.2). Tal não só foi
conseguido, como ainda permitiu obter uma diminuição do número de elementos no centro dos
discos, que na malha anterior tinha uma concentração de elementos desajustada às necessidades
nestas zonas. Esta constatação pode ser verificada na figura 2.10.
Figura 2.10 - Pormenor construtivo do centro dos discos, na malha refinada
Figura 2.11 - Vista em planta da distribuição dos elementos na zona dos discos e na conduta de queima, da malha refinada
Através da figura 2.11, que mostra a vista em planta da distribuição dos elementos da malha na zona
dos discos e conduta de queima, verifica-se que os elementos na zona dos discos apresentam
dimensões e formas de volume mais homogéneas, comparativamente à malha mais grosseira. No
entanto, para se conseguir tal característica apenas usando elementos hexaédricos, é necessário
22
efetuar uma reorganização dos elementos na zona média dos discos. Ou seja, no centro existe uma
configuração retangular, que contorna e define o furo quadrado central, e na periferia do disco existe
uma disposição cilíndrica dos elementos, que define o contorno circular dos discos. Para se proceder
à união de uma zona à outra escolheu-se um octaedro regular, que foi tido como uma aproximação
razoável de um círculo (contorno externo do disco) a um quadrado (contorno interno do disco), tendo
em conta o caso em estudo. Esta escolha dá prioridade à organização dos elementos na periferia, em
vez da zona central, uma vez que o aquecimento dos discos será feito, na sua maioria, por condução
de calor radial da energia recebida por convecção pela periferia dos discos. Se fosse escolhido uma
forma quadrada para definir a metade interior do disco, esta promoveria uma melhor aproximação da
zona central, mas pecando na zona exterior. Se, por outro lado, fosse escolhida uma figura com
dezasseis lados, dar-se-ia o oposto.
O refinamento da malha nos discos foi feito apenas ao nível do plano onde estão contidos, mantendo
um elemento por dimensão de espessura, como no caso anterior. Isto permitiu com que os discos
fossem modelados através de um número de elementos 2,5 vezes superior ao conseguido na malha
mais grosseira. Foi apenas feito um refinamento ao longo do eixo Z a partir do último disco, de forma
a obter uma disposição dos elementos mais ortogonal e manter a homogeneidade da malha, como
pode ser visto na figura 2.12. Este acréscimo de elementos na parte superior do forno permite obter,
teoricamente, um cálculo dos fluxos de radiação e das outras variáveis, e por conseguinte da
temperatura, mais precisa relativamente à malha anterior. A malha da zona por cima da conduta de
queima também ficou mais refinada, uma vez que foi aumentado o número de elementos
constituintes tanto ao longo do eixo Z, como do eixo X.
Figura 2.12 - Disposição dos elementos num plano vertical perpendicular à conduta e a uma pilha de discos, na malha refinada
23
Na conduta de queima manteve-se a disposição de elementos num plano de corte transversal, como
definido e mostrado na figura 2.5. A alternativa a esta solução seria aumentar o refinamento para o
dobro, uma vez que o tamanho dos elementos tem de ser divisível por 10 mm, que é tanto o valor da
espessura dos discos como da distância entre estes. Se isso tivesse sido feito, o número final de
elementos teria sido demasiado grande, incomportável para a máquina usada. Como tal, apenas foi
feito um refinamento ao longo do seu comprimento, resultante do refinamento pretendido para a zona
dos discos.
Por baixo dos discos inferiores mantiveram-se dois elementos por altura, de forma a manter a sua
distribuição na conduta de queima inalterável ao longo das suas altura e largura, uma vez que estas
duas zonas são contíguas. Uma vez que existem menos elementos a definir o furo dos discos, esta
condição permite que esses elementos interiores sejam menos esbeltos e mais proporcionais. No
final, não só estes elementos, mas todos da malha, sofreram uma diminuição benéfica do fator de
skewness, que é resultado de uma malha mais homogénea e regular.
Resumindo, pode-se concluir que a malha refinada é consideravelmente diferente da malha mais
grosseira, particularmente no que se refere à discretização dos discos. Esta malha refinada contém
1960200 elementos, número esse que se revelou comportável para o computador disponível mas,
contudo, bastante penoso em termos de tempo de CPU para cálculo da solução final.
24
3. Modelo físico e numérico
O FLUENT proporciona capacidades de modelação bastante abrangentes para uma grande gama de
problemas de escoamentos incompressíveis e compressíveis, laminares e turbulentos, isotérmicos e
não-isotérmicos, com e sem reação química. Análises em regime estacionário ou transiente podem
ser executadas. No FLUENT, um vasto leque de modelos físicos para fenómenos de transporte (com
transferência de calor ou combustão) é conjugada com a boa capacidade de modelar geometrias
complexas.
Modelos de turbulência precisos e robustos são uma componente vital do conjunto de modelos do
FLUENT. Os modelos de turbulência fornecidos têm uma grande gama de aplicabilidade sem
necessitarem de afinações específicas para uma aplicação particular, e incluem os efeitos das
flutuações turbulentas e da compressibilidade. Foi dada particular atenção a problemas como a
precisão junto das paredes, através da utilização, adicional, de funções parietais.
É possível modelar os diversos modos da transferência de calor, incluindo a convecção natural,
forçada ou mista, com ou sem complexidades adicionais, tais como meios porosos. O conjunto de
modelos de radiação, e submodelos relacionados, para modelar meios participativos, são gerais e
levam em consideração as complexidades de um problema de combustão.
Uma particularidade deste código é a sua capacidade de modelar fenómenos de combustão através
de modelos de dissipação turbulenta ou de modelos de funções de densidade de probabilidade
(PDF). Ainda dentro da combustão, é possível analisar outro tipo de problemas relacionados com
esta, como a combustão de uma partícula ou de uma gota, reações superficiais e formação de
poluentes.
3.1. Equações da continuidade e da quantidade de movimento
Para todos os escoamentos, o FLUENT resolve as equações de transporte para a continuidade e a
quantidade de movimento. Para escoamentos envolvendo transferência de calor ou
compressibilidade, a equação da energia é resolvida adicionalmente. Para escoamentos que
envolvam mistura de espécies ou reações, a equação de transporte das espécies é resolvida, ou, se
for usado o modelo de combustão non-premixed combustion, as equações de transporte da fração de
mistura e da sua variância são resolvidas. Equações adicionais de transporte podem ser resolvidas
quando existe turbulência.
Nesta secção são apresentadas as equações regentes do escoamento num forno, conforme descritas
no manual do FLUENT.
25
Equação da continuidade
A equação da continuidade em sistemas de combustão como o que aqui se estuda pode ser escrita
da seguinte forma:
(3.1)
Na equação (3.1) é a massa volúmica do fluido e é a componente da velocidade do escoamento
na direção .
Equações de transporte de quantidade de movimento
As equações de transporte de quantidade de movimento, num referencial inercial (não acelerado),
são dadas por:
(3.2)
em que é a pressão estática, é o tensor das tensões e é a força gravitacional.
O tensor das tensões, , é dado por:
(3.3)
em que é a viscosidade efetiva, definido adiante e o segundo termo do lado direito é o efeito da
dilatação do volume.
3.2. Modelo da turbulência
Os escoamentos turbulentos são caracterizados por exibirem campos de velocidade com flutuações
que promovem uma melhor mistura das quantidades transportadas, tais como quantidade de
movimento, a energia e a concentração de espécies, originando também flutuações dessas
quantidades transportadas. As equações exatas que regem o escoamento turbulento podem ser
aproximadas por médias temporais ou manipuladas para remover as menores escalas, resultando
num conjunto modificado de equações que têm uma resolução menos penosa em termos
computacionais. Contudo, as equações modificadas contêm variáveis desconhecidas adicionais,
sendo necessário haver modelos de turbulência para quantificar essas variáveis em ordem a
quantidades conhecidas.
3.2.1. Médias de Reynolds
A maioria dos modelos de turbulência baseia-se nas equações de transporte das médias de Reynolds
das variáveis, em que todas as variáveis utilizadas nas equações originais são decompostas numa
componente média (temporal) e numa flutuação em torno dessa média:
26
(3.4)
(3.5)
Nas equações anteriores, e representam respetivamente a componente média e flutuação da
velocidade, representa qualquer escalar (pressão, entalpia, concentração de espécies, etc.),
sendo o valor médio e a flutuação.
Substituindo estas expressões pelas variáveis de escoamento nas equações instantâneas da
continuidade e da quantidade de movimento, e tomando uma média temporal (suprimindo o traço por
cima do valor da velocidade média, , por facilidade de escrita), obtém-se as equações (3.6) e (3.7),
que são as equações médias da quantidade de movimento que o FLUENT utiliza para resolver
escoamentos turbulentos.
(3.6)
(3.7)
As equações (3.6) e (3.7) são denominadas médias de Reynolds das equações de Navier-Stokes
(RANS – Reynolds-Averaged Navier-Stokes), e têm uma forma semelhante às equações
instantâneas, com as velocidades e as restantes variáveis a representarem, agora, valores médios.
Os termos adicionais que aparecem são devidos aos efeitos de turbulência, e representam as
tensões de Reynolds,
. Estas tensões necessitam de ser modeladas para se poder
proceder ao fecho das eqs. (3.7).
Para escoamentos com massa volúmica variável, as equações (3.6) e (3.7) podem ser interpretadas
como as médias de Favre das equações de Navier-Stokes, com as velocidades a representarem os
valores médios mássicos.
Não é apropriado estudar escoamentos com rotação (swirl) usando os modelos tradicionais RANS
devido à existência de estruturas coerentes instáveis e efeitos de curvatura do escoamento médio.
Para escoamentos emergentes de queimadores circulares, existe uma camada limite circular da
velocidade junto à saída do queimador onde a instabilidade do escoamento pode desenvolver-se com
vorticidade e turbulência a jusante. Por seu lado, um queimador anular possui duas camadas limites
adjacentes, que podem aumentar o nível de turbulência, promovendo uma maior taxa de mistura e de
combustão e reduzir as emissões poluentes. A superfície do queimador do escoamento anular do
combustível também se comporta como agente de estabilização de corpo sólido (Jiang et al., 2010).
O modelo do FLUENT escolhido para calcular as tensões de Reynolds foi o modelo RNG.
27
3.2.2. Modelo de turbulência RNG
Ao contrário do modelo padrão, que se baseia na solução de equações com médias de
Reynolds, o modelo RNG deriva das equações instantâneas de Navier-Stokes, utilizando uma
rigorosa técnica matemática denominada “Método de Grupos Renormalizados”. A derivação analítica
resulta num modelo com constantes diferentes das do modelo padrão, para além de termos e
funções adicionais nas equações de transporte. Por exemplo, a equação de transporte de inclui um
termo de taxa de deformação que é importante para o tratamento de efeitos de não-equilíbrio e de
escoamentos na camada limite (e.g., escoamentos com separação ou com pontos de estagnação).
Assim, o modelo RNG permite obter previsões melhoradas de escoamentos de camada limite,
com elevada curvatura e com rotação, baixo número de Reynolds ou de transição, bem como
escoamentos com transferência de calor e massa nas paredes.
O modelo RNG difere do modelo padrão e das suas variantes nos seguintes aspectos
importantes: i) as constantes e funções utilizadas no modelo RNG são determinadas através de
desenvolvimentos teóricos e não empiricamente; ii) os efeitos da existência de baixos valores de
números de Reynolds em certas zonas do domínio de cálculo estão incluídos na teoria do RNG,
permitindo a previsão de escoamentos mistos ou quase laminares; iii) o aparecimento de novos
termos na equação de transporte de , incluindo o termo de taxa de deformação, é importante para o
tratamento dos efeitos de não-equilibrio e escoamentos com zonas de estagnação; iv) as equações
de transporte turbulento foram expandidas de modo a permitir prever escoamentos de elevada
rotação (elevado swirl).
Para o modelo RNG, as equações de transporte (energia cinética turbulenta) e de (taxa de
dissipação de energia cinética turbulenta) são expressas pelas eqs. (3.8) e (3.9), respectivamente.
(3.8)
(3.9)
As constantes introduzidas na equação de assumem os valores de 1.42 e 1.68. Os
termos e são, respectivamente, o inverso dos números de Prandtl efectivos para e para , e
o termo é a taxa de deformação, definida pela seguinte equação:
(3.10)
em que , 4.38 e 0.012.
O termo é o módulo do tensor médio de deformação, e é expresso por:
28
(3.11)
(3.12)
3.2.3. Modelação da viscosidade efectiva
A teoria RNG conduz a uma equação diferencial para a viscosidade turbulenta, dada por,
(3.13)
em que:
(3.14)
(3.15)
A equação (3.13) é integrada por forma a obter uma descrição precisa da variação do transporte
turbulento efetivo com o número de Reynolds, permitindo que o modelo preveja escoamentos de
baixo número de Reynolds e próximos de paredes.
No limite, para elevados números de Reynolds, a eq. (3.13) resultará na eq. (3.16),
(3.16)
sendo = 0.0845, derivado da teoria RNG.
Será interessante mencionar que este valor de é muito próximo de 0.09, que é o valor
determinado empiricamente e usado no modelo padrão.
3.2.4. Modelo RNG modificado para escoamentos com swirl
O modelo RNG da família fornece uma opção para prever os efeitos de swirl modificando a
viscosidade turbulenta adequadamente. A forma funcional dessa modificação é descrita pela seguinte
equação:
(3.17)
em que é o valor da viscosidade turbulenta calculada sem a modificação de swirl, é o número
de swirl característico calculado pelo FLUENT em função das caracteristicas geométricas do
queimador e das componentes de velocidade à entrada do forno, e é uma constante que assume
valores diferentes, consoante o grau de rotação do escoamento. A função é desconhecida pelo
utilizador do FLUENT, uma vez que esta não é especificada no manual. A modificação de viscosidade
29
devida ao swirl é sempre tida em conta para escoamentos rotativos axissimétricos, e para
escoamentos 3D em que o modelo RNG seja selecionado.
O valor pré-definido pelo FLUENT para é de 0.07, podendo, no entanto, ser usado um valor
superior para escoamentos com grande efeito de swirl.
3.2.5. Cálculo do inverso dos Números de Prandtl Efectivos
O inverso dos números de Prandtl efetivos, e , são determinados usando a eq. (3.18), que foi
derivada analiticamente da teoria de RNG.
(3.18)
Na eq. (3.18), = 1.0. No limite, para elevados números de Reynolds, tem-se 1, o que
conduz a 1.393.
3.2.6. Equação de energia
No FLUENT, o transporte turbulento de energia é modelado usando uma analogia com o transporte
de quantidade de movimento turbulenta, o que conduz a:
(3.19)
Na equação anterior, representa a energia total, é a condutividade térmica efetiva, e é
o tensor desviador de tensões.
O termo que inclui representa a dissipação viscosa de energia, que não é calculado por
defeito, uma vez que apenas tem relevância em escoamentos de fluidos muito viscosos, mas pode
ser selecionada a opção de o calcular.
Para o modelo RNG, a condutividade térmica efetiva é dada por:
(3.20)
onde a variável é dada pela eq. (3.18), com .
O modelo RNG, tal como condificado no FLUENT, exibe muitas das características de um bom
modelo de turbulência para engenharia: versatilidade, economia e robustez. O seu domínio de
aplicação é consideravelmente mais alargado que o do modelo padrão e os recursos computacionais
necessários apenas são aumentados de forma marginal. Além disso, o seu uso não requer a
30
alteração dos valores das constantes do modelo, e os resultados melhorados dele provenientes foram
documentados para uma larga gama de escoamentos turbulentos, incluíndo escoamentos com
separação de camada-limite, escoamentos transientes, escoamentos com forças mássicas e
curvatura das linhas de corrente, escoamentos com efeitos devido a baixos valores de número de
Reynolds, escoamentos com transferência de calor e massa e escoamentos rotativos.
Quando o modelo de combustão de chama de difusão turbulenta (non-premixed combustion model) é
escolhido, o FLUENT resolve a seguinte equação da energia:
(3.21)
em que é a entalpia total, é a condutividade térmica turbulenta, definida pelo modelo de
turbulência, é o calor específico do fluido e é um termo fonte que inclui termos volumétricos,
devido à radiação e mudança de fase.
Considerando que o número de Lewis (quociente entre a difusividade térmica e a difusividade
mássica) é igual à unidade, os termos referentes à condução de calor e difusão de espécies
combinam de forma a obter o primeiro termo do lado direito da eq. (3.21), enquanto que a
contribuição das dissipações viscosas aparecem na forma não conservativa como no segundo termo.
A entalpia total é definida como:
(3.22)
em que é a fração mássica da espécie e é a entalpia dessa espécie definida como:
(3.23)
Na equação anterior é a entalpia de formação da espécie à temperatura de referência
, definida como 298,15 K.
Para corpos sólidos, a equação de energia é igual à eq. (3.21) sem o termo de transporte convectivo.
3.3. Modelo da combustão
A modelação do processo de combustão é, de uma forma geral, uma etapa crucial para a simulação
numérica de sistemas de queima industriais. Contudo, pode também ser dos processos mais
onerosos em termos computacionais, se for exigido um grande rigor na precisão dos valores das
concentrações das espécies e das temperaturas.
31
Para a simulação do forno de revenido em causa foi escolhido o modelo de combustão de chama de
difusão (non-premixed combustion model), que é um modelo que considera o transporte de apenas
dois escalares conservados, a fração de mistura e a variância da fração de mistura, e considera a
interação da turbulência com a cinética química com base numa distribuição assumida da função
densidade de probabilidade (PDF – probability density function) da fração de mistura.
A fração de mistura, denominada por , é a fração mássica local dos elementos do combustível,
queimados e inqueimados ( , , etc.), presente no seio de todas as espécies químicas (
, etc).
Este modelo foi visto como sendo bastante apropriado para simulação de chamas de difusão
turbulentas com cinética química muito rápida. Consegue também ser um modelo de combustão mais
eficiente e razoável em termos computacionais, comparativamente ao modelo de dissipação de
turbilhões (eddy-dissipation formulation), pois permite a previsão de espécies intermédias (radicais),
efeitos de dissociação e uma ligação precisa da turbulência com a cinética química, recorrendo
apenas ao transporte de um ou dois escalares, ao invés de resolver um grande número de equações
para o transporte das diferentes espécies químicas em jogo.
3.3.1. Definição da fração de mistura
A base do modelo de chama de difusão é que dentro de um determinado conjunto de hipóteses
simplificativas, o estado termoquímico instantâneo do fluido está relacionado com uma quantidade
escalar conservada conhecida como a fração de mistura, . A fração de mistura é definida em termos
das frações mássicas pela eq. (3.24),
(3.24)
em que é a fração mássica elementar do elemento , é a fração mássica elementar do
elemento à entrada do escoamento do comburente e é a fração mássica elementar do
elemento à entrada do escoamento do combustível.
3.3.2. Equações de transporte para a fração de mistura e sua variância
Considerando como iguais as difusividades mássicas, as equações de transporte das espécies
podem ser reduzidas a apenas uma equação de transporte da fração de mistura . Os termos fonte
de reação das espécies cancelam-se, e assim é uma quantidade conservada. Se a hipótese
simplificativa de iguais difusividades é problemática para escoamentos laminares, ela é geralmente
aceitável para escoamentos turbulentos onde a difusividade molecular tem pouca expressão
comparativamente à difusividade turbulenta.
32
A equação de transporte da fração de mistura é dada pela eq. (3.25).
(3.25)
Em adição à equação de transporte da fração de mistura, o modelo de combustão resolve também
uma equação de transporte de variância da fração de mistura, , dada pela seguinte forma:
(3.26)
em que = , = 0,85, = 2,86 e = 2,0.
3.3.3. Interação da turbulência com a cinética química
As relações entre a fração de mistura e a fração de espécies químicas, massa volúmica e
temperatura são conhecidas quando se assume equilíbrio químico. A previsão do FLUENT do
escoamento reativo turbulento está, contudo, mais focado nos valores médios destes escalares de
comportamento oscilatório. A forma como estes valores médios estão relacionados com os valores
instantâneos depende do modelo de interação da turbulência com a cinética química. O FLUENT
aplica a abordagem da forma assumida da função densidade de probabilidade de (PDF) como
modelo de fecho, quando o modelo de combustão de chama de difusão é utilizado.
A PDF, , pode ser vista como uma fração do tempo que o fluido passa na vizinhança do valor .
A figura 3.1 exibe a evolução da fração de mistura ao longo do tempo T num ponto do escoamento
(no lado direito) e a função densidade de probabilidade de (no lado esquerdo). O valor oscilatório
de ocupa uma fração de tempo no período T dada por , assumindo valores tais que,
dentro da área abaixo da curva na largura descrita, , é igual à fração de tempo que passa neste
domínio.
Figura 3.1 - Representação gráfica da função densidade de probabilidade de ,
33
3.3.4. Determinação dos valores médios dos escalares dependentes de
A função densidade de probabilidade descrevendo as flutuações de no escoamento
turbulento, pode ser usada para calcular os valores médios de outras variáveis escalares que
dependam de , , que podem ser obtidos (em sistemas adiabáticos) através da eq (3.27).
(3.27)
Nesta equação é a relação de dependência entre e , assumindo-se equilíbrio no presente
caso.
A massa volúmica obedece à equação de estado dos gases perfeitos.
3.3.5. A forma da PDF
A forma da PDF assumida, , é descrita no FLUENT pela função , que mais proximamente
representa PDFs observadas experimentalmente, e depende somente da fração média de mistura, ,
e da sua variância, .
A forma da PDF função é descrita pela eq. (3.28),
(3.28)
sendo:
(3.29)
(3.30)
Tendo as previsões de e em cada ponto do escoamento, eqs. (3.25) e (3.26), a forma da PDF
assumida permite usá-la como a função ponderadora para determinar os valores médios da fração
mássica de espécies e massa volúmica, usando a equação (3.27) e a temperatura.
Para todas as simulações feitas, o modelo de combustão foi usado considerando vinte espécies
existentes. As espécies consideradas foram as seguintes:
e .
34
Como o caso do forno analisado envolve transferência de calor pelas paredes e para os discos, o
sistema terá que ser considerado não adiabático. Em tais sistemas o estado local termoquímico não
pode ser função apenas de , mas também da entalpia, .
Em sistemas não adiabáticos, as flutuações turbulentas devem ser consideradas por meio da função
densidade de probabilidade conjunta, . A computação de , contudo, é demasiado
onerosa computacionalmente para a maior parte dos problemas de engenharia. O problema pode ser
simplificado significativamente se se assumir que as flutuações de entalpia são independentes do
nível local do valor da entalpia (isto é, as perdas de calor não afetam significativamente as flutuações
turbulentas da entalpia). Com esta consideração, e os escalares médios
são calculados através da equação 3.31. Na consideração anterior representa a função Delta de
Dirac, e a entalpia média total.
(3.31)
Em sistemas não adiabáticos, em que a entalpia não está linearmente relacionada com a fração de
mistura, mas depende também do calor transferido pelas paredes (i.e., de H), será necessária uma
tabela de consulta para cada valor de entalpia possível no sistema. Trata-se de uma tabela a três
dimensões, como esquematizado na figura 3.2, que consiste em camadas 2D, cada uma
correspondente a um ganho ou perca de calor normalizado. A primeira camada corresponde ao
máximo calor perdido pelo sistema, enquanto que a última camada corresponde ao máximo calor
ganho pelo sistema. A camada sem ganhos ou perdas corresponde à tabela adiabática. As camadas
interpoladas entre a camada adiabática e a camada máxima correspondem a ganhos de calor do
sistema, e aquelas interpoladas entre a camada adiabática e a mínima correspondem a perdas de
calor do sistema.
As tabelas referidas permitem ao FLUENT determinar o valor de cada fração mássica, massa
volúmica e temperatura com base nos valores calculados de , , e .
3.4. Modelo da Radiação
A equação de transferência de calor por radiação para um meio absorvedor, emissor e com
scattering, foi definida na secção 1.2.3 como sendo:
(1.1)
em que representa a intensidade radiativa espectral, representa a intensidade ratiativa
espectral de um corpo negro, o coeficiente de scattering espectral do meio, é o coeficiente de
absorção espectral.
35
Figura 3.2 - Representação visual de uma Tabela Look-Up para o escalar como uma função de e
e de ganhos/perdas de calor normalizados
A figura 3.3 ilustra o processo de transferência de calor por radiação.
O modelo de transferência de calor por radiação deve ser incluído na simulação quando o fluxo de
calor radiante,
, assume valores significativos em relação à transferência
de calor devido à condução e à convecção. Normalmente isto acontece a elevadas temperaturas, ou
em situações de baixa velocidade de escoamento, onde a dependência do quarto grau da
temperatura se faz sentir, podendo mesmo ser o fenómeno dominante de transferência de calor.
Relativamente à modelação da radiação propriamente dita, o FLUENT disponibiliza cinco modelos
que tornam possível a inclusão dos seus efeitos nas células, com ou sem meios participativos, nas
simulações de escoamento com transferência de calor. No entanto, para a simulação do
comportamento do forno em estudo, apenas foi utilizado o modelo de radiação das ordenadas
discretas (DO – Discrete Ordinates).
O modelo das ordenadas discretas é bastante versátil em termos de aplicação a diferentes
espessuras óticas, e permite resolver problemas diversificados que vão desde a radiação entre
superfícies, à radiação em meios participativos em problemas de combustão. O esforço
computacional é moderado para discretizações angulares típicas, e o custo de memória é modesto.
36
Figura 3.3 – Esquema de transferência de calor por radiação
Dos modelos de radiação disponibilizados pelo FLUENT, o modelo de ordenadas discretas é, em
geral, o que permite obter resultados com melhor precisão, qualquer que seja a gama de espessuras
óticas do sistema em estudo.
O presente modelo escolhido considera a radiação de gases cinzentos.
Este modelo resolve a equação da transferência de calor por radiação para um número finito de
ângulos sólidos discretos, cada um deles associado a um vetor direção definido no sistema global
Cartesiano ( ). O refinamento da discretização angular é controlado pelo utilizador. O modelo
DO transforma a eq. (1.1) numa equação de transporte para a intensidade de radiação, e resolve
tantas equações de transporte quantas as direções que existirem.
3.4.1. Discretização Angular
Cada octante do ângulo sólido total em cada localização espacial é discretizado em
ângulos sólidos de extensão , chamados ângulos de controlo. Os ângulos e são,
respetivamente, os ângulos polar e azimutal, e são medidos a partir do sistema global de
coordenadas Cartesiano ( ), como mostrado na figura 3.4. As grandezas e do ângulo de
controlo, e , são constantes. Em cálculos tridimensionais, são resolvidas um total de
direções. Neste caso foram usadas 4 divisões para e 8 divisões para .
37
Figura 3.4 - Sistema de coordenadas angulares
3.5. Método numérico
Para resolver o escoamento não-isotérmico com combustão no interior do forno, a abordagem
baseada na equação de correção da pressão foi escolhida. Neste método, o campo de pressões é
extraído ao usar uma equação da pressão ou equação de correção da pressão, que é obtido por
manipulação das equações da continuidade e de quantidade de movimento.
O FLUENT resolve as equações diferenciais parciais que governam a conservação de massa, de
quantidade de movimento, de energia e de transporte de escalares como a turbulência e espécies
químicas na forma integral. É utilizada uma técnica baseada nos volumes finitos, que consiste em:
Divisão do domínio em volumes finitos discretos, através da utilização de uma malha
computacional;
Integração das equações regentes nos volumes finitos, individualmente, para construir as
equações algébricas para as variáveis discretas dependentes (velocidades, pressão,
escalares conservados);
Linearização das equações discretas e resolução do sistema de equações lineares
resultantes para poder atualizar os valores das variáveis dependentes.
As equações fundamentais de um escoamento são resolvidas sequencialmente. Na medida em que
estas equações são interdependentes (i.e., existe uma interdependência entre as variáveis), são
necessárias várias iterações do ciclo de resolução do problema antes de se obter uma solução
convergente. Este ciclo de resolução consiste nos passos mostrados na figura 3.5 e descritos abaixo:
38
Figura 3.5 – Esquema do método de resolução numérica
1. São atualizadas as propriedades do fluido (massa volúmica, viscosidade, etc.) incluindo a
viscosidade turbulenta (difusividade), baseadas na solução atual (a da última iteração
disponível);
2. São resolvidas as equações de quantidade de movimento, sequencialmente, utilizando os
valores atuais de pressão e fluxos mássicos das interfaces dos volumes finitos;
3. Como as equações obtidas no ponto 2 podem não satisfazer a equação da continuidade a
nível local, é derivada uma equação de Poisson para a correção da pressão, a partir da
equação da continuidade e das equações de quantidade de movimento linearizadas. Esta
correção de pressão é, então, resolvida para obter as correções necessárias aos campos de
pressão e velocidade;
4. São corrigidas a pressão, o fluxo mássico nas interfaces dos volumes de controlo e o campo
de velocidades com base na correção de pressão obtida no passo 3;
5. Quaisquer equações auxiliares (p.e., energia, turbulência, radiação) são resolvidas utilizando
os valores já atualizados das outras variáveis;
6. São atualizados os termos de fonte derivados de interações entre diferentes variáveis;
7. É verificada a convergência.
Estes procedimentos são repetidos até se alcançar um erro de fecho dos balanços das variáveis
transportadas que verifiquem um critério de convergência definido (figura 3.5).
A introdução de fenómenos como a radiação obriga à alternância no cálculo dos balanços, ou seja, os
fluxos de energia radiante são recalculados e atualizados periodicamente após um certo número de
iterações do cálculo das equações de transporte.
3.5.1. Equação geral de transporte de escalares
O FLUENT usa a técnica baseada nos volumes finitos para converter uma equação diferencial de
transporte de uma variável numa equação algébrica que possa ser resolvida numericamente por
métodos matriciais. Esta técnica consiste em integrar a equação de transporte em cada volume de
controlo, fornecendo uma equação discretizada que expressa a conservação da variável no volume
finito em questão.
39
A discretização das equações regentes podem ser ilustradas de forma simplificada considerando a
equação transiente de transporte de uma grandeza escalar genérica . Isto é demonstrado pela
seguinte equação escrita na forma integral para um volume de controlo arbitrário , escrita como:
(3.32)
em que
massa volúmica
vetor velocidade ( em 3D)
vetor de área de superfície
coeficiente de difusão para
gradiente de ( em 3D)
termo de fonte de por unidade de volume
Na equação (3.32), o segundo termo do lado esquerdo e o primeiro termo do lado direito da equação
resultam da aplicação do teorema de Green-Gauss.
A eq. (3.32) é aplicada a cada volume finito, ou célula, no domínio computacional.
A célula triangular, a duas dimensões, representada na figura 3.6 é um exemplo de tal volume finito.
Figura 3.6 – Volumes finitos com centros e usados para ilustrar a discretização de uma equação de transporte de escalares
A discretização da equação (3.32) resulta em:
(3.33)
em que
40
número de faces envolvendo a superfície
valor de na interface do volume finito (ver figura 3.6)
fluxo mássico que passa através da face
área da face , em 3D
gradiente de na interface
volume da célula
O termo
é definido na seção 3.5.4.
3.5.2. Solução do sistema de equações lineares
A equação de transporte discretizada, equação 3.33, contém como incógnita a variável escalar no
centro da célula, , assim como os valores desconhecidos nos centros das células vizinhas, .
Esta equação é, regra geral, não linear no que diz respeito a estas variáveis. A forma linearizada da
equação 3.33 pode ser escrita como:
(3.34)
em que a referência se refere às células vizinhas, e e são os coeficientes linearizados
para e para .
O número de células vizinhas para cada célula depende da topologia da malha, mas é tipicamente
igual ao número de faces envolventes da célula (sendo as células fronteira a exceção).
Equações semelhantes são escritas para cada célula da malha. Isto resulta num conjunto de
equações algébricas que constituem uma matriz de coeficientes. Para equações escalares, o
FLUENT resolve este sistema linear usando o método de Gauss-Seidel em conjunto com um método
algébrico de multimalha (AMG - algebraic multigrid).
3.5.3. Discretização espacial
Por defeito, o FLUENT armazena os valores discretos do escalar no centro das células ( e na
Figura 3.6). Contudo, os valores nas interfaces são necessários para os termos convectivos da
equação (3.34) e devem ser interpolados a partir dos valores do centro das células. Isto é conseguido
usando, por exemplo, o algoritmo upwind.
No algoritmo upwind o valor na interface é derivado dos valores na célula a montante, relativa à
direção da velocidade normal na equação (3.33).
41
Os algoritmos usados no decorrer dos cálculos do forno efetuados nesta tese foram o power law e
second order upwind.
Os termos difusivos da equação (3.33) são resolvidos por diferenças centrais de segunda ordem de
precisão.
O algoritmo de discretização power-law interpola os valores de uma variável usando a solução
exata para a equação convectiva-difusiva a uma dimensão dada por:
(3.35)
em que e são constantes dentro do intervalo . A equação (3.35) pode ser integrada para
obter a seguinte solução descrevendo como varia com :
(3.36)
em que = , =
e é o número de Peclet definido por
.
A variação de entre = 0 e é retratada na figura 3.7 para uma gama de valores do
número de Peclet. A figura 3.7 mostra que para um elevado , o valor de em é
aproximadamente igual ao valor a montante. Isto significa que quando o escoamento é dominado
pela convecção, o esquema dá uma solução próxima da do esquema upwind.
A figura 3.7 permite ver também que quando 0 (sem escoamento, difusão pura), pode ser
interpolado usando uma média linear simples entre os valores em = 0 e .
Quando o número de Peclet tem um valor intermédio, o valor interpolado de em deve ser
derivado por aplicação da equação 3.36.
42
Figura 3.7 – Variação de entre = 0 e (Equação 3.35)
Quando é requerida uma precisão de segunda ordem, as quantidades nas interfaces das células são
calculadas usando uma abordagem de reconstrução multidimensional linear. Com esta abordagem, é
conseguida uma precisão de ordem superior nas interfaces das células através de uma expansão de
séries de Taylor da solução no centroide da célula. Assim, quando o algoritmo upwind de segunda
ordem é escolhido, o valor da face é calculado usando a seguinte equação:
(3.37)
em que e representam, respetivamente, os valores ao centro da célula e o seu gradiente a
montante, e é o vetor deslocamento do centro da célula a montante para o centroide da interface. A
sigla define as iniciais de Second Order Upwind. Esta formulação requer a determinação do
gradiente em cada célula, como mostrado adiante na secção 3.5.6.
3.5.4. Discretização temporal
Para simulações transientes, as equações governantes devem ser discretizadas tanto no espaço
como no tempo. A discretização espacial para as equações dependentes do tempo é idêntica ao caso
de regime estacionário. A discretização temporal envolve a integração de todos os termos nas
equações diferenciais ao longo de um passo temporal .
Uma forma genérica para a evolução temporal da variável é dada por,
43
(3.38)
em que a função incorpora quaisquer discretizações espaciais.
Se a derivada temporal é discretizada usando diferenças regressivas, o resultado tem uma precisão
de primeira ordem e é dado pela eq. (3.39).
(3.39)
A discretização de segunda ordem é dada por
(3.40)
em que
uma quantidade escalar
valor no instante seguinte,
valor no instante atual,
valor no instante anterior,
Uma vez discretizada a derivada temporal, apenas ficam por definir as posições temporais de a
usar para calcular . Esta ação dependerá se a integração temporal for feita de forma implícita ou
explícita. No caso em estudo, apenas foram usadas integrações implícitas de segunda ordem
(equação 3.40).
A vantagem do método totalmente implícito é que este é incondicionavelmente estável para qualquer
valor de período temporal escolhido.
3.5.5. Avaliação de gradientes e derivadas
Os gradientes são necessários não só para construir valores de um escalar nas interfaces das
células, mas também para calcular termos difusivos e derivadas da velocidade. O gradiente de
uma determinada variável é usado para discretizar os termos convectivos e difusivos nas equações
de conservação regentes do escoamento.
Para calcular os gradientes foi usado o método de Green-Gauss Cell-Based.
Quando o teorema de Green-Gauss é usado para calcular o gradiente de um escalar no centro da
célula , a sua forma discretizada é escrita como,
(3.41)
44
em que é o valor de no centroide da interface da célula, calculado como é demonstrado na
secção mais abaixo. O somatório é referente a todas as faces envolvendo a célula.
Por omissão, o valor da face, , na equação (3.41) é obtido da média aritmética dos valores nos
centros das células vizinhas como descrito na equação (3.42).
(3.42)
3.5.6. Pressure-Based Solver
Para a discretização das equações da continuidade e da quantidade de movimento e suas soluções
através do algoritmo baseado na equação de correção à pressão, será vantajoso começar por
considerar estas equações em regime estacionário na sua forma integral como:
(3.43)
(3.44)
em que representa a matriz identidade, é o tensor das tensões, e é o vetor de forças mássicas.
Como descrito acima, as equações da quantidade de movimento e da continuidade são resolvidas
sequencialmente. Contudo, a pressão não é uma grandeza explícita em escoamentos
incompressíveis, visto que a massa volúmica não está diretamente relacionada com a pressão.
Para discretizar as equações da quantidade de movimento é também usado um esquema de
discretização idêntico ao definido na equação (3.34). Por exemplo, a equação da quantidade de
movimento na direção pode ser obtida estabelecendo :
(3.45)
Como o campo de pressão não é conhecido a priori, tem de ser obtido como parte da solução.
O FLUENT usa um esquema colocado, em que a pressão e a velocidade são ambas calculadas no
centro das células. Contudo, a equação (3.45) requer o valor da pressão na face entre as células
e , mostradas na figura 3.6. Portanto, será necessário um esquema interpolador para calcular os
valores da pressão nas interfaces a partir dos valores nos centros das células.
O esquema pré-definido que o FLUENT usa interpola os valores da pressão nas interfaces usando os
coeficientes da equação do movimento linear (Rhie e Chow, 1983):
45
(3.46)
Escoamentos com elevado efeito swirl, ou com elevado número de Rayleigh, são situações em que o
esquema estandarizado de interpolação da pressão poderá encontrar algumas dificuldades. Nesses
casos, será necessário refinar a malha em regiões de elevado gradiente para resolver a variação de
pressão de forma correta.
Nas situações em que o esquema convencional de interpolação da pressão não é válido, o FLUENT
dispõe de vários métodos alternativos para resolver o problema. O esquema usado nestes casos foi o
PRESTO!
O esquema PRESTO! (PREssure STaggering Option) utiliza o balanço discretizado da continuidade
para um volume de controlo desfasado em relação à interface onde se pretende calcular a pressão.
De notar que para malhas triangulares, tetraédricas, híbridas e poliédricas, valores de precisão
semelhantes são obtidos usando este algoritmo. O esquema PRESTO! encontra-se disponível para
todo o tipo de malhas.
A equação da continuidade pode ser integrada no volume de controlo para chegar à equação (3.47).
(3.47)
Na equação (3.47), representa o fluxo mássico que passa através da interface , .
É necessário relacionar os valores da velocidade nas interfaces, , com os valores armazenados da
velocidade no centro das células, podendo usar-se uma interpolação linear para tal. Em alternativa,
pode usar-se uma média ponderada, recorrendo a fatores ponderadores baseados no coeficiente
da equação (3.45). Através deste procedimento, o fluxo mássico na superfície, , pode ser rescrito
como mostra a equação (3.48).
(3.48)
Na equação (3.48), , e , representam as pressões e velocidades normais,
respetivamente, entre duas células em ambos os lados, e contém a influência das velocidades
nestas células. O termo é uma função de , que é a média dos coeficientes da equação da
quantidade de movimento linear para as células em ambos os lados da face .
46
3.5.7. Ligação da pressão com a velocidade
A ligação entre a pressão e a velocidade é conseguida usando a equação (3.48) para derivar uma
condição adicional para a pressão por reformulação da equação da continuidade (eq. (3.48)). Os
esquemas usados para resolver o problema do escoamento foram o SIMPLE e o PISO, que são
apresentados de seguida.
Algoritmo SIMPLE
A família de algoritmos SIMPLE (Semi-Implicit Method for Pressure-Linked Equations) é utilizada para
deduzir a equação de correção à pressão. Esta família de algoritmos utiliza uma relação entre a
correção da pressão e da velocidade para manter a conservação de massa e para obter o campo de
pressão. Neste caso, o fluxo em qualquer interface pode ser escrito como:
(3.49)
em que é o termo que contém a influência das velocidades vizinhas e , e o termo pode
ser escrito como
(3.50)
Na equação (3.50), o termo é a média dos valores de para as células que contêm os nós P e
E.
Se a equação da quantidade de movimento é resolvida estimando o campo de pressão , o fluxo
resultante , calculado através da equação (3.51),
(3.51)
não satisfaz a equação da continuidade. Consequentemente, a correção é adicionada ao fluxo
para que o caudal corrigido ,
, satisfaça a equação da continuidade. O algoritmo
SIMPLE postula que pode ser escrito como
(3.52)
onde é a correção da pressão.
Algoritmo PISO
Outro método usado para ligar a pressão com a velocidade é o algoritmo PISO (Pressure-Implicit with
Splitting Operators), que é baseado numa maior precisão entre as correções para a pressão e
velocidade (usa também a abordagem de preditor-corretor). Uma limitação do algoritmo SIMPLE é
47
que novas velocidades e seus fluxos correspondentes não satisfazem os balanços de quantidade de
movimento após a equação de correção da pressão ser resolvida. Como resultado, o cálculo tem de
ser repetido até o balanço ser satisfeito. Para melhorar a eficiência deste cálculo, o PISO resolve
duas correções adicionais: a correção de vizinhança e a correção de enviesamento.
Correção de vizinhança: A ideia principal do algoritmo PISO é mover os cálculos repetidos
requeridos pelo SIMPLE (e pelo SIMPLEC) dentro de um estágio de soluções da equação de
correção da pressão. Depois de um ou mais loops adicionais, as velocidades corrigidas satisfarão as
equações da continuidade e da quantidade de movimento com maior precisão. O processo iterativo é
chamado correção de vizinhança (neighbor correction). O PISO requer um pouco mais de tempo
computacional por iteração para ser resolvido, mas pode reduzir drasticamente o número de iterações
necessárias para convergir, especialmente em simulações transientes.
Correção de enviesamento: Para malhas com algum grau de enviesamento, a relação aproximada
entre a correção do fluxo mássico na interface da célula e a diferença das correções da pressão nas
células adjacentes são bastante desiguais. Sendo as componentes do gradiente da correção de
pressão ao longo das interfaces das células desconhecidas a priori, um processo iterativo semelhante
ao da correção de vizinhança torna-se desejável. Após a solução inicial da equação de correção da
pressão, o gradiente de correção da pressão é recalculado e usado para atualizar as correções de
fluxo mássico. Este processo, chamado correção de enviesamento (skewness correction), reduz
significativamente as dificuldades associadas com malhas enviesadas, permitindo obter uma solução
num número aproximado de iterações aquelas necessárias numa malha mais ortogonal.
3.5.8. Sub-relaxação das equações
A sub-relaxação das equações, também conhecida como relaxação implícita, é usada para estabilizar
a convergência das iterações exteriores, particularmente nos casos de equações não-lineares, ao
introduzir variações controladas das quantidades no sistema de equações discretizadas.
Sendo o coeficiente de sub-relaxação, , a equação discretizada toma a forma:
(3.53)
3.5.9. Algoritmo de regime transiente
Para problemas dependentes do tempo, a forma discretizada da equação genérica de transporte é
dada pela equação (3.32), definida anteriormente.
O algoritmo do FLUENT utilizado neste trabalho usa uma discretização implícita da equação de
transporte (eq. (3.32)). Por defeito, todos os termos convectivos, difusivos e de fonte são avaliados a
48
partir dos cálculos já realizados para o momento atual . Esta abordagem é descrita pela
equação (3.54).
(3.54)
Na equação anterior, o primeiro termo do lado esquerdo é o que contém a influência de (no
instante anterior).
O erro de discretização no tempo é determinado quer pela escolha de discretização temporal (e.g.,
primeira ordem, segunda ordem), quer pela maneira de como as soluções são introduzidas no passo
temporal seguinte. A discretização temporal introduz o erro de truncatura correspondente, ,
, para a primeira e segunda ordem, respetivamente.
3.5.10. Algoritmo iterativo de avanço no tempo
No algoritmo iterativo, todas as equações são resolvidas iterativamente, para um dado passo
temporal, até que os critérios de convergência sejam verificados. Porém, avançar as soluções num
passo temporal requer normalmente um número de iterações externas, como mostrado na figura 3.8.
Com este algoritmo iterativo, a não linearidade das equações individuais e a ligação interna das
equações são tidas em conta.
Figura 3.8 – Ilustração do algoritmo de cálculo iterativo para problemas transientes
49
4. Resultados numéricos
Este capítulo apresenta os resultados computacionais mais relevantes obtidos durante a realização
do trabalho. As condições em que o forno foi testado foram apresentadas atrás no capítulo 2.
Para resolver as simulações foi utilizado um computador adquirido propositadamente para a
realização deste trabalho, uma vez que o computador na posse do autor deste trabalho não
suportava os requisitos computacionais impostos por qualquer malha computacional e pelos modelos
escolhidos. As características técnicas do computador usado estão descritas na tabela 4.1.
Tabela 4.1 - Características do computador usado para a realização deste trabalho
Processador AMD FX (tm) – 4100 Quad-Core 3,60 GHz
Memória RAM 8,00 GB
Disco rígido 465 GB
Placa-mãe ASUS M5A78L Series
Sistema operativo Windows 7
Tipo de sistema 64 bits
Os ensaios computacionais feitos para prever o comportamento do forno foram realizados com as
duas malhas em regime estacionário e apenas com a malha mais grosseira em regime transiente,
devido ao tempo envolvido nos cálculos. As condições fronteira impostas na entrada de ar e de gás
natural foram descritas, respetivamente, nas tabelas 2.1 e 2.2 do capítulo 2.
4.1. Malha mais grosseira
4.1.1. Regime estacionário
Os ensaios em regime estacionário foram os mais fáceis de simular com sucesso, e com um tempo
de cálculo na gama de 4 a 7 dias. Em todos os ensaios feitos em regime estacionário foi usado o
algoritmo power law, uma vez que era o que permitia obter valores de resíduos de cálculo
significativamente mais baixos, e com relativa rapidez de cálculo, face ao second order upwind.
Foram consultados vários trabalhos de fornos de reaquecimento de lingotes de aço (Kim e Huh, 2000;
Kim et al., 2000; Hsieh, et al., 2008; Han et al., 2010), em que também são usados bastantes
elementos, assim como os mesmos modelos de combustão e radiação, e também se usou o
algoritmo power law como esquema de interpolação. No entanto, este algoritmo tem uma precisão de
primeira ordem.
50
Os valores dos resíduos adimensionais obtidos pelos cálculos interativos feitos em regime
estacionário da malha mais grosseira estão descritos na tabela 4.2. Os resíduos apresentam um valor
razoavelmente baixo.
Tabela 4.2 - Valores dos residuos adimensionais obtidos nos ensaios feitos em regime estacionário, para a malha mais grosseira
Escalares transportados 80 kW 100 kW 130 kW
Continuidade 3.46e-5 3.27e-5 4.78e-6
Velocidade x 5.53e-6 4.46e-6 9.34e-7
Velocidade y 4.48e-5 2.99e-5 2.91e-6
Velocidade z 4.47e-5 2.25e-5 5.15e-6
Entalpia 3.26e-5 8.59e-5 1.50e-5
2.17e-6 2.97e-6 3.47e-7
7.01e-7 4.35e-7 3.32e-7
Intensidade DO 3.27e-3 1.31e-2 2.35e-2
Fração de mistura média 9.46e-6 2.25e-6 2.87e-6
Variância da fração de mistura 1.48e-7 1.81e-7 1.97e-7
Os resíduos iterativos, apesar de darem uma boa previsão da convergência dos soluções, não dizem
diretamente o erro de conservação do escalar transportado. Como tal, resolveu-se fazer os balanços
da continuidade e da energia, mostrados na tabela 4.3 e 4.4, respetivamente. Os caudais mássicos
das fronteiras abertas do forno foram obtidos diretamente do FLUENT, assim como o fluxo de calor
que é transferido pelas paredes do forno. Os fluxos de calor transportados pelas fronteiras com
escoamento foram calculados com base nas propriedades dos fluidos por aí passantes.
De referir que o resultado do resíduo dado entre parênteses, em ambos os casos, corresponde ao
valor adimensinalizado pela quantidade de massa ou energia que entra no sistema.
Tabela 4.3 - Balanço de massa efectuado ao forno, em kg/s
Condição fronteira 80 kW 100 kW 130 kW
Entrada de ar 2.043e-2 2.557e-2 3.328e-2
Entrada de gás natural 7.625e-4 9.521e-4 1.236e-3
Escape -2.120e-2 -2.652e-2 -3.452e-2
Diferencial 2.000e-11
(9.44e-8 %) 1.12e-9
(4.22e-6 %) 4.000e-10
(1.15e-6 %)
51
Tabela 4.4 - Balanço de energia efectuado ao forno, em W
Condição fronteira 80 kW 100 kW 130 kW
Entrada de ar -24.8 -31.0 -40.4
Entrada de gás natural 36711.4 45839.8 59510.9
Escape -16076.7 -20557.1 -27160.9
Paredes do forno -18519.9 -18309.0 -19380.6
Diferencial* 2090.0
(5.69 %) 6942.7
(15.1 %) 12929.6
(21.7 %)
* - Inclui calor transferido para os discos
Após breve comparação com a tabela 4.2, que apresenta o resultado dos resíduos numéricos,
observa-se que a massa conserva-se com melhor rigor que o que os resíduos iterativos deixariam
antever. Quanto ao balanço energético, o mesmo não se conseguiu verificar. Acredita-se que o valor
retirado para a energia térmica transferida pelas paredes do forno não seja rigoroso, uma vez que é
anunciado um valor de perdas pelas paredes superior no caso 80 kW, em relação à simulação de 100
kW. A incerteza na previsão do valor de perdas energéticas para a envolvente do forno leva à
necessidade de se efetuar uma análise energética diferente da efetuada, calculando igualmente a
transferência de calor pelas paredes. Por outro lado, por dificuldade e morosidade de cálculo, incluiu-
se o calor transferido para os discos no diferencial do balanço de energia.
Na tabela 4.4 pode ainda ser verificado um valor negativo de energia fornecida pela entrada de ar,
que corresponde ao calor sensível contido no ar (injetado a 293 K), em relação à temperatura de
referência (298.15 K). O valor fornecido pelo gás natural corresponde a praticamente metade do
previsto pela potência objetivo do ensaio, uma vez que só é simulado metade do forno. Esta potência
foi baseada no poder calorífico inferior do combustível, uma vez que foi o único parâmetro possível de
ser calculado através das entalpias de formação disponibilizadas pelo modelo de combustão usado.
Como foi mencionado no capítulo 2, os ensaios em regime estacionário são realizados sem carga
térmica dinâmica e, portanto, as distribuições de temperatura a serem verificadas não corresponderão
aquelas obtidas em funcionamento real do forno. De seguida, apresentar-se-ão os resultados mais
relevantes para caracterizar o comportamento do forno nas diferentes potências testadas.
Uma vez que os resultados mais relevantes para caracterizar o comportamento do forno serão
apresentados através de figuras, e uma vez que a diferença de grandezas entre os diferentes ensaios
numéricos não é muito acentuada, far-se-á uma análise preferencialmente qualitativa, que será
dividida entre os três valores de potência testadas. Os resultados que descrevem o forno de uma
forma quantitativa não são tão relevantes, uma vez que o forno foi projetado para valores de
temperatura bastante inferiores às obtidas, servindo estes resultados apenas para fornecer ao
utilizador uma tendência do comportamento esperado do forno em vazio (sem carga térmica
aplicada).
52
Será importante relembrar que todas as figuras mostradas na demonstração de resultados
correspondem a metade do forno apenas, tendo este sido dividido pelo plano de simetria, um plano
vertical passante pelo centro da conduta longitudinalmente.
80 kW
O valor de potência mais baixa testada foi de 80 kW, que corresponde a aproximadamente metade da
carga térmica imposta pelos discos num funcionamento real esperado.
Nas figuras 4.1 e 4.2 são apresentadas duas vistas diferentes das distribuições de temperatura nos
discos para 80 kW de potência. A orientação do plano de vista nas diferentes figuras apresentadas é
dada pelo conjunto de eixos representado no canto inferior esquerdo das imagens. Esta orientação é
concordante com a orientação prevista pelas figuras 2.2 e 2.3.
A figura 4.1 mostra o lado dos discos que está virado para a parede do forno, bem como o disco
superior das pilhas, estando a pilha de discos do canto superior esquerdo localizada junto à entrada
dos discos no forno, que é o local mais próximo da saída dos gases quentes da conduta de queima. A
mancha cor de laranja nessa pilha deixa antever a recirculação dos gases pelo canto superior do
forno, permitindo assim antever que essa seja a zona mais quente do forno (tanto de um lado, como
do outro não representado no modelo computacional). Assim sendo, a zona dos discos mais próxima
desse canto será a zona mais quente dessa pilha de discos.
Figura 4.1 - Distribuição da temperatura nos discos no ensaio de 80 kW – vista I
Figura 4.2- Distribuição da temperatura nos discos no ensaio de 80 kW – vista II
53
Na figura 4.2 está representada uma vista que mostre a distribuição de temperatura dos discos no
lado virado para dentro do forno, ou seja, virado para a conduta, assim como o disco inferior das
pilhas de discos. As duas pilhas mais próximas da saída dos discos apresentam uma zona
ligeiramente mais quente a sensivelmente meia altura das pilhas. Isto é devido ao facto de estarem
próximas da zona mais quente da conduta de queima, que é descrita na figura 4.3.
Através da figura 4.2 é ainda possível verificar que existe uma diferença de temperatura de
aproximadamente 30 K entre o disco inferior das pilhas junto à entrada e saída do forno. O disco
inferior da pilha junto à saída da conduta é o mais frio, uma vez que está situado numa zona de
recirculação dos gases mais frios do forno, pois os gases quentes que saem da conduta deslocam-se
rapidamente para a zona superior do forno, deixando assim lugar para os gases menos quentes na
parte inferior do forno.
A distribuição de temperaturas da chapa da conduta de queima, descrita na figura 4.3, é concordante
com a previsão do contorno de chama, deixado antever pela figura 4.4. Nesta figura estão
representados os contornos da fração de mistura, sendo a chama definida em termos médios pelo
contorno que define o valor fração de mistura na estequiometria. No caso do gás natural, esse valor
corresponderá a aproximadamente 0.055, que está representado pelo contorno a verde. Esse
contorno pode ser mais percetível numa vista ampliada, representada na figura 4.5.
Figura 4.3 - Distribuição de temperatura nas paredes da conduta de queima no ensaio de 80 kW
Figura 4.4 - Previsão da fração de mistura no plano de simetria do forno no ensaio de 80 kW
54
Figura 4.5 - Vista ampliada dos contornos da fração de mistura no plano de simetria
O valor da fração de mistura para os produtos de combustão cifra-se em 0.036, revelando a figura 4.4
que a combustão se dá como completa no primeiro terço do forno, que é onde se encontram as duas
pilhas de discos que apresentam um ligeiro aquecimento local, devido à radiação recebida pela
conduta.
A figura 4.6 mostra as temperaturas existentes no plano de simetria do forno, mostrando a
temperatura máxima atingida na combustão estudada. Esta distribuição de temperaturas permite
também antever a tendência do escoamento principal, delimitado pelos contornos das linhas mais
quentes.
Através da figura 4.6 ainda é possível observar a temperatura máxima de chama, que se cifra num
valor próximo dos 1800 K. Este está dentro do esperado, para uma combustão não adiabática de gás
natural, com 30% de excesso de ar.
Figura 4.6 - Distribuição da temperatura no plano do simetria do forno para uma potência de 80 kW
100 kW
O valor de potência de 100 kW fornecerá valores intermédios entre os 80 e os 130 kW, e portanto
dará informação qualitativa sobre a tendência do comportamento do forno com aumento de potência
55
térmica. Esse efeito será descritivo de forma qualitativa através da análise da distribuição de
temperatura em diferentes planos.
A figura 4.7 revela a distribuição de temperatura em planos verticais, com coordenada X constante,
passantes pelo centro das seis pilhas existentes no interior do forno. Nesta imagem pode ser visto
que os discos apresentam um gradiente de temperatura crescente, desde o disco de baixo ao disco
de cima, com uma tendência para serem ligeiramente mais quentes na parte virada para o interior do
forno, ou seja, virada para a conduta.
A figura 4.8 mostra a distribuição de temperaturas no plano horizontal Z = 700 mm, situado
imediatamente acima das pilhas de discos. O padrão é algo heterogéneo, sendo possível que seja
devido à presença dos discos imediatamente abaixo. No entanto, existe claramente uma zona mais
quente no canto de inversão do escoamento, e uma zona mais fria no canto oposto, do lado da pilha
1 e próximo da saída de escape.
Figura 4.7 - Distribuição de temperatura em planos verticais, passantes pelo centro das várias pilhas de discos para o ensaio de 100 kW
Figura 4.8 - Distribuição de temperatura no plano horizontal Z = 700 mm para o ensaio de 100 kW
Na figura 4.9, referente ao plano Z = 850 mm, verifica-se uma distribuição de temperaturas mais
homogénea, sendo devido à maior distância em relação às pilhas e maior proximidade ao teto do
forno. A zona por cima das pilhas 1 e 2 são as mais frias, e as zonas das pilhas 5 e 6 são as mais
quentes, com uma diferença de temperaturas de aproximadamente 70 K entre essas duas zonas.
56
Figura 4.9 - Distribuição de temperatura no plano horizontal Z = 850 mm para o ensaio de 100 kW
Figura 4.10 - Distribuição de temperatura na saida de escape para o ensaio de 100 kW
A figura 4.10 mostra a distribuição de temperatura na saída de escape. Os gases quentes são
expelidos do forno a uma média de 1000 K, observando-se um ligeiro gradiente térmico até à periferia
do escape. Este efeito é mais notório, pois a saída dos gases de escape não engloba uma possível
chaminé, o que faz os gases e a periferia do escape arrefecerem mais intensamente.
As figuras 4.11 até à 4.16 mostram distribuições de temperatura para diferentes pilhas de discos ao
longo da coordenada Z, para os discos da pilha 1 à pilha 6, respetivamente. Verifica-se que existe
uma diferença máxima de aproximadamente 50 K para a mesma cota de Z nos discos inferiores da
pilha 1, e que essa diferença de temperatura tende a ser reduzida à medida que se vai subindo na
cota Z. De referir que a pilha 1 é a que se encontra mais próxima do queimador e do escape, ou seja,
é a ultima posição antes de sair do forno.
Desde a pilha 1 à pilha 4 a distribuição de temperatura é semelhante, verificando-se apenas uma
diminuição dos gradientes de temperatura para todas as posições fixas de Z. Neste conjunto de
pilhas verifica-se também uma diminuição regular da temperatura máxima e da mínima, ou seja, uma
homogeneização de temperatura na pilha de discos.
A figura 4.15 revela a pilha a partir da qual a distribuição de temperaturas muda de padrão. Aqui pode
ser visto um estreitar da banda de temperaturas por unidade de altura, mas uma subida abrupta de
57
temperatura máxima a partir dos 400 mm. A pilha 6 tem um comportamento idêntico, mas com um
aumento repentino de temperatura máxima a ser dado aos 260 mm. Estes comportamentos podiam
ser facilmente antecipados, se for feita uma nova inspeção às figuras 4.1 e 4.2. Mesmo mostrando
valores para uma potência testada inferior, a tendência será a mesma.
Figura 4.11 - Distribuição de temperatura da pilha 1 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
Figura 4.12 - Distribuição de temperatura da pilha 2 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
Figura 4.13 - Distribuição de temperatura da pilha 3 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
58
Figura 4.14 - Distribuição de temperatura da pilha 4 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
Figura 4.15 - Distribuição de temperatura da pilha 5 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
Figura 4.16 - Distribuição de temperatura da pilha 6 ao longo do eixo Z para o ensaio de 100 kW
Como deixaria antever a figura 4.2, a temperatura mínima dos discos vai sempre diminuindo desde a
pilha 1 à pilha 6, comprovado agora pela análise das figuras 4.11 à 4.16.
59
130 kW
Nesta análise deste valor de potência (130 kW) tentar-se-á descrever o comportamento da dinâmica
de fluidos existente no interior do forno com base em figuras ilustrativas da orientação e intensidade
dos vetores de escoamento. Considerou-se que seria oportuna a análise de escoamento no valor da
maior potência testada, uma vez que é o caso onde existirão, no geral, maiores velocidades de
escoamento. De referir que a direção específica de cada vetor corresponde à orientação do
escoamento do ponto referente à origem do vetor, e o módulo da velocidade é definido pela sua cor.
Na figura 4.17 é mostrado o escoamento no plano de simetria. Esta figura revela algumas
características interessantes, tais como a região de recirculação junto à saída do queimador (abaixo
deste) e a vorticidade presente em frente à saída da conduta. Na zona de queima não existem
vetores pois a velocidade existente nessa zona é superior ao limite máximo de análise (4.00 m/s).
Verifica-se também que o escoamento dos gases quentes ao sair da conduta é diretamente
direcionado para a aresta superior do forno, criando ali uma região de mudança de direção do
escoamento. Isto fará com os gases quentes percam quase toda a sua energia cinética de uma forma
algo abrupta.
Figura 4.17 - Distribuição vectorial do escoamento no plano de simetria no ensaio de 130 kW
Na figura 4.18 apresenta-se o aspeto do escoamento próximo da saída de escape, ainda no plano de
simetria, que revela um escoamento maioritariamente organizado por baixo do teto do forno e com
um sentido de escoamento oposto por cima da conduta de queima. Verifica-se que aparenta existir
um ponto de inflexão, onde os vetores aparentam estar a divergir todos do mesmo ponto, e também a
existência de um escoamento com muito baixas velocidades no canto entre a conduta e a parede
lateral.
A figura 4.19 mostra o escoamento no plano horizontal Z = 250 mm. Foi escolhido este plano pois é o
plano que passa pelo centro da conduta e, portanto, pelo centro do queimador também. Esta altura
corresponde a pouco mais de um terço da altura das pilhas, sendo de esperar que exista alguma
60
complexidade do escoamento nesse plano. Verifica-se uma tendência do escoamento na zona das
pilhas ser de retorno, ou seja, no sentido contrário ao do escape, e verifica-se que dentro da conduta
existe apenas uma ligeira recirculação dos gases próximo da saída do queimador. A baixa densidade
de vetores na zona dos discos deve-se ao facto de o plano passar por um ou dois discos por pilha,
zona essa onde só existe material sólido.
Figura 4.18 - Distribuição vectorial do escoamento no plano de simetria, próximo à saída de escape no ensaio de 130 kW
Figura 4.19 - Distribuição vectorial do escoamento no plano horizontal, passante pelo centro do queimador e da conduta, Z = 250 mm no ensaio de 130 kW
Na figura 4.20 é mostrado o escoamento no plano Z = 700 mm, que corresponde a um plano
imediatamente acima das pilhas de discos. Em termos globais é possível observar uma maior
tendência do escoamento na zona das pilhas em se dirigir para a saída de escape. Verifica-se
também um escoamento com velocidade longitudinal positiva na zona da saída da conduta, sendo a
metade dessa zona mais próxima da parede a que corresponde ao escoamento convectado pelos
produtos de combustão expelidos pela conduta, e a metade a montante a que corresponde ao
escoamento de gases arrastados por diferenças de pressão e viscosidade, causados pelo
escoamento mencionado anteriormente.
61
A figura 4.21 é referente ao mesmo tipo de plano, mas para Z = 850 mm. Este é o plano intermédio
entre o da figura 4.20 e o teto do forno. Aqui verifica-se um escoamento bem definido e orientado,
maioritariamente com uma velocidade relativa ao eixo X negativa. É possível verificar a existência de
um vórtice mesmo por cima da pilha 6, que corresponde à mudança de direção do escoamento
devido às paredes do forno. Este vórtice evidencia o escoamento pretendido inicialmente com a
configuração do forno, que é um escoamento em ferradura, se apenas for considerado metade do
forno, ou um escoamento em W, se for tido em conta o forno inteiro. Isto significa que o escoamento
inicialmente é feito todo numa direção, até ao momento que encontra a parede do fundo do forno e é
obrigado a inverter o seu sentido em 180º.
O escoamento contido entre o plano Z = 850 mm e o teto do forno não sofre grandes alterações face
ao que foi descrito no parágrafo anterior, referente à figura 4.21.
Figura 4.20 - Distribuição vectorial do escoamento no plano horizontal Z = 700 mm no ensaio de 130 kW
Figura 4.21 - Distribuição vectorial do escoamento no plano Z = 850 mm no ensaio de 130 kW
4.1.2. Regime transiente
Nos ensaios em regime transiente foram feitas simulações para analisar a evolução temporal de
temperatura do forno e dos discos, partindo de 293 K até se verificar a condição de temperatura
mínima nos discos de 600 K, e sujeito às mesmas condições de fronteira do regime estacionário.
62
Este tipo de ensaio computacional distingue-se do anterior, em regime estacionário, pelo facto das
equações de transporte apresentarem um termo adicional. Este termo é o termo transiente, que
traduz a variação da respetiva variável em ordem ao tempo. Como tal, o esforço computacional será
superior ao do regime estacionário.
A simulação transiente em si requer o estabelecimento de um passo temporal (time step) pré-
definido, e de um número de iterações realizadas por passo temporal. Este passo temporal pode ser
constante ou variável, tendo sido feitas simulações apenas com valores constantes de passo
temporal.
A definição de um valor razoável para o passo temporal é de grande importância. Se for escolhido um
valor elevado, poder-se-ia obter uma solução com menos passos, mas com o risco da solução
divergir nos passos iniciais, que são onde se verificam os maiores gradientes. Por outro lado, com um
passo temporal mais pequeno consegue-se acompanhar com melhor precisão e segurança a
evolução das variáveis, sob pena de um consumo de tempo computacional mais elevado. O número
de iterações a realizar por passo temporal deve ser tal que verifique uma tendência de convergência
antes de passar para o passo temporal seguinte. Como na definição do passo temporal, o número de
iterações também acaba por ser um compromisso entre tempo disponível e precisão dos resultados.
Na resolução de equações transientes, a inicialização dos valores das variáveis para valores
próximos da sua tendência poderá ser uma vantagem para diminuir tanto o tempo de cálculo, como
as possibilidades de divergência. No entanto, nos ensaios realizados, isto não poderia ser feito para
todas as variáveis, uma vez que o objetivo será analisar a evolução temporal da temperatura. Assim
sendo, apenas foram inicializados os valores das velocidades e temperatura de escoamento nas
condições fronteira da entrada e saída, como forma de facilitar os cálculos. A inicialização da
temperatura das pilhas de discos a 293 K foi um requisito que tornou os cálculos morosos, pois é um
valor muito distante do verificado em qualquer um dos casos de regime estacionário.
Para as simulações de regime transiente foi usado o algoritmo second order upwind, em vez do
power law, devido ao facto de este último não ter apresentado valores dos resíduos de cálculo
satisfatórios, e a evolução temporal da temperatura dos discos não parecer realista. Com esta
mudança, o cálculo tornou-se mais moroso, mas permitiu obter resultados mais razoáveis, e a
precisão passou a ser, em princípio, de segunda ordem.
Neste tipo de ensaios apenas foram analisados dois valores de potência, devido ao elevado tempo
requerido. No entanto, através dos dois casos analisados, será possível compreender o
comportamento do forno, com base em valores diferentes de condições de fronteira e parâmetros de
simulação.
63
130 kW
No primeiro ensaio numérico feito em regime transiente, de 130 kW, foi feita uma simulação sem
pausas, até que se verificasse que a temperatura mínima nos discos da pilha 1 chegasse aos 600 K.
Apenas se vigiou a evolução da temperatura dos discos da pilha 1 (que é o mais próximo da saída de
escape), uma vez que este é descritivo do comportamento das várias pilhas dentro do forno.
Foram definidas 500 iterações a serem efetuadas por passo temporal, e uma duração deste de 20
segundos. Esta acabou por ser uma combinação razoável, demorando cerca 9 dias de cálculo até se
alcançar a temperatura mínima pretendida. Neste espaço de tempo foram realizadas 24610 iterações,
que simularam um tempo de funcionamento do forno correspondente a 500 segundos (8 minutos e 20
segundos). Este valor encontra-se dentro do esperado para o tipo de forno e dimensão dos discos em
estudo.
A figura 4.13 mostra o perfil da evolução da temperatura mínima das seis pilhas de discos existentes
dentro do forno. Verifica-se que os perfis são praticamente iguais, o que prova a boa capacidade do
forno de proporcionar uma entrega de energia térmica bastante idêntica às diferentes pilhas a revenir.
Os perfis têm todos um comportamento semelhante por estarem a descrever a evolução da
temperatura mínima, que se verificará no disco inferior de cada pilha. Uma vez que o forno arranca à
temperatura de 293 K, e como o disco inferior está muito próximo da superfície inferior do forno, será
de esperar que demore bastante tempo a aquecer, e que exista um comportamento semelhante em
todas as pilhas.
Figura 4.22 - Evolução temporal da temperatura mínima dos discos da pilha 1, para 130 kW de potência
A figura 4.23 mostra a distribuição de temperatura nos discos, numa perspetiva vista de baixo, e
desde o canto inferior próximo da saída dos gases quentes da conduta de queima do combustível.
Verifica-se existir uma tendência de uma transmissão de calor por condução por parte dos discos,
desde o lado virado para a conduta de queima para a zona mais fria, que fica virada para a parede
64
lateral. Pode ser visto ainda que a pilha 6 tem uma zona mais quente nos discos superiores, e na
zona virada para a parede do fundo, onde é feita a inversão de sentido de escoamento dos gases.
A figura 4.24 mostra uma distribuição de temperatura dos discos no plano Y = 700 mm, que é o plano
vertical passante pelo centro de todos os discos. Verifica-se existir uma diferença de
aproximadamente 160 K entre a temperatura do disco inferior e superior.
Figura 4.23 - Distribuição de temperatura nos discos vista de baixo, para 130 kW de potência em regime transiente
Figura 4.24 - Distribuição de temperatura no plano Y = 700 mm, passante pelo centro das pilhas de discos, para 130 kW de potência em regime transiente
100 kW
No ensaio numérico de regime transiente de 100 kW os resultados foram em muitos aspetos idênticos
aos obtidos para 130 kW, até chegar aos 500 segundos (tempo simulado pela análise anterior), mas
com uma grande diferença respeitante ao tempo demorado a atingir os 600 K de temperatura mínima,
como pode ser visto na figura 4.25. Neste ensaio, essa temperatura foi atingida ao fim de 4000
segundos (aproximadamente 67 minutos), que corresponde a um valor oito vezes superior ao
demorado para 130 kW.
Esta foi a simulação mais morosa em termos de tempo de cálculo consumido, que demorou 14 dias.
65
A figura 4.26 mostra a distribuição de temperatura dos discos, numa perspetiva vista de cima e desde
a parede do fundo de inversão de sentido de escoamento. Esta distribuição de temperatura é muito
idêntica à verificada para o caso de 130 kW, como seria de prever. Continua a existir a zona quente
na parte superior da pilha 6 voltada para a parede do fundo, e uma temperatura ligeiramente superior
na parte dos discos voltada para a conduta, verificada essencialmente nas pilhas 1, 2 e 3.
Figura 4.25 - Evolução temporal da temperatura mínima dos discos da pilha 1, para 100 kW de potência
A figura 4.27 mostra a distribuição de temperatura no interior do forno, numa perspetiva vista
ligeiramente de baixo e do lado do queimador, através do plano de simetria. Existe um contorno
notório dos discos na parte inferior do forno, reflexo de uma grande proximidade entre estes dois, e
de uma má condutividade térmica por parte do isolante que reveste o forno (0.170 ).
O canto superior da parede de inversão do sentido de escoamento dos produtos de combustão é a
zona mais quente do forno, como já foi demonstrado em análises anteriores. A descrição qualitativa é
em tudo idêntica ao verificado em regime estacionário, sendo a maior diferença verificada apenas nas
temperaturas existentes.
Figura 4.26 - Distribuição de temperatura nos discos visto de cima, para 100 kW de potência em regime transiente
66
Figura 4.27 - Distribuição da temperatura do interior do forno para o ensaio de 100 kW, visto de baixo e através do plano de simetria
A análise de regime transiente efetuada serviu para perceber a resposta que o forno poderia ter num
arranque a frio. Verifica-se existir claramente um comportamento não linear na evolução temporal de
temperatura dos discos dentro do forno. Também se verifica que a diferença no tempo demorado a
atingir os 600 K não é linear com a mudança de potência calorífica injetada. Contudo, uma terceira
análise seria vantajosa para se confirmar esta tendência, usando uma potência distinta das
consideradas.
4.2. Malha refinada
4.2.1. Regime estacionário
Na análise feita com a malha refinada apenas foram realizadas simulações em regime estacionário,
devido ao incomportável tempo que a solução transiente exigiria.
A malha refinada revelou-se demasiado exigente para o computador usado neste trabalho, uma vez
que tanto os cálculos como o manuseamento do ficheiro no programa (abrir e gravar o ficheiro, leitura
de valores, mudança de parâmetros, etc.) demoravam bastante tempo a ser efetuados.
No entanto, o tempo total de cálculo por simulação não aumentou significativamente relativamente à
malha mais grosseira. Isto ocorreu porque para chegar aos valores obtidos foram precisas muito
menos iterações. Se na malha mais grosseira foram precisas mais de 20000 iterações para chegar ao
valor final, nesta malha refinada não foram necessárias 1000 iterações sequer.
Uma outra diferença relativamente à malha mais grosseira, e mais uma causa para tornar os cálculos
mais onerosos, é o facto de ter sido usado o algoritmo second order upwind em vez do power law.
Considerou-se que este algoritmo seria mais adequado para esta malha, uma vez que ela está mais
organizada e regular.
67
A tabela 4.5 mostra os valores obtidos para os resíduos nas diferentes simulações (diferentes
potências) feitas na malha refinada. O valor dos resíduos foram todos maiores, comparativamente
aos da malha mais grosseira. Através da afinação dos valores de sub-relaxação dos vários escalares
não foi possível obter melhores resultados que estes. Poder-se-iam ter obtidos valores mais baixos
dos resíduos se as soluções tivessem corrido durante mais dias, mas seria pouco significativo para o
nível de precisão aqui pretendido.
Tabela 4.5 - Valores dos residuos adimensionais obtidos nos ensaios feitos em regime estacionário, para a malha refinada
Escalares transportados 80 kW 100 kW 130 kW
Continuidade 2.78e-3 3.82e-3 2.65e-3
Velocidade x 5.59e-4 6.84e-4 5.78e-4
Velocidade y 3.53e-4 3.95e-4 3.15e-4
Velocidade z 4.88e-4 5.01e-4 3.82e-4
Entalpia 8.44e-7 1.44e-6 1.19e-6
4.72e-4 9.23e-4 6.47e-4
8.79e-4 1.52e-4 6.17e-4
Intensidade DO 2.67e-4 1.54e-4 1.17e-4
Fração de mistura média 2.86e-5 3.88e-5 3.82e-5
Variância da fração de mistura 8.36e-4 9.12e-4 6.48e-4
80 kW
Nas figuras 4.28, 4.29 e 4.30 são reveladas diferentes perspetivas da distribuição de temperatura nos
discos. Aqui é possível verificar, no geral, uma temperatura mais homogénea nos discos, apenas com
uma zona mais quente na pilha 1, do lado que está voltado para a conduta. Isto é devido ao facto da
zona por cima do queimador estar bastante quente, como mostrado a seguir.
Comparando com os resultados obtidos para a malha mais grosseira, representados na figura 4.1 e
4.2, verifica-se que a temperatura na malha refinada é mais homogénea e apresenta uma diferença
de temperatura menor entre o disco superior e o inferior. Continua a verificar-se que o lado dos discos
virado para a conduta é ligeiramente mais quente que o lado voltado para a parede lateral do forno, o
que é congruente com o verificado até agora.
Figura 4.28 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário, na malha refinada, visto do canto do forno de inversão de escoamento
68
Figura 4.29 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário, na malha refinada, visto da zona da saída de escape
Figura 4.30 - Distribuição de temperatura dos discos para o ensaio de 80 kW em regime estacionário, na malha refinada, visto ligeiramente de baixo
A figura 4.20 mostra a distribuição de temperatura nas paredes interiores do forno. Aqui pode ser
vista uma temperatura bastante homogénea ao longo do comprimento do forno, apenas com um
ligeiro gradiente ao longo da sua altura, como seria esperado.
Verifica-se também a existência uma zona quente na interseção da parte superior da conduta de
queima com a parede lateral, resultante do facto de a conduta estar a uma temperatura superior e ser
aquele o ponto de condução de energia térmica da conduta para as paredes. Este é o ensaio em que
este efeito se verifica com maior proeminência, daí ter sido mostrado para este valor de potência.
Na parte inferior do forno é possível verificar o contorno do disco inferior como sendo o que exibe
zonas mais frias. Sendo naturalmente uma parte protegida de trocas de calor por radiação, não existe
a capacidade de homogeneização de temperaturas com a mesma capacidade que o resto do forno.
69
Figura 4.31 - Distribuição de temperatura do forno para o ensaio de 80 kW em regime estacionário, na malha refinada, visto através do plano de simetria
100 kW
Nas figuras 4.32, 4.33 e 4.34 são mostrados perfis que permitam perceber a distribuição de
temperatura dos discos a comparar com a existente no interior do forno. Como já tinha sido
observado com a malha mais grosseira, os discos estão todos a uma temperatura inferior à
temperatura média do forno, e a uma temperatura superior em relação ao espaço existente por baixo
do primeiro disco de cada pilha. Esta situação pode ser bem observada nas figuras 4.32 e 4.33.
A figura 4.34 mostra a distribuição de temperaturas do forno e dos discos no plano Z = 250 mm. Aqui
verifica-se a existência do gradiente de temperaturas ao longo do eixo Y, mas de menor intensidade
que o previsto pela malha mais grosseira.
Ao contrário do que se passa com a zona próxima do teto do forno, na parte inferior do forno a zona
próxima da pilha 1 é ligeiramente mais quente que a da pilha 6, uma vez que existe uma recirculação
dos gases com sentido contrário ao que existe na parte superior do forno, ou seja, no sentido
contrário ao do escape. Esta situação também tinha sido verificada na malha mais grosseira.
Figura 4.32 - Distribuição de temperatura em diferentes planos com coordenada X constante, para o ensaio de 100 kW na malha refinada
70
Figura 4.33 - Distribuição de temperatura no plano Y = 700 mm, para o ensaio de 100 kW na malha refinada
Figura 4.34 - Distribuição de temperatura no plano Z = 250 mm, para o ensaio de 100 kW na malha refinada
Desde a figura 4.35 à 4.40 são mostrados, respetivamente, os perfis de temperatura da pilha 1 à pilha
6, ao longo do eixo Z. Estas figuras mostram que existe sempre um gradiente de temperatura entre
os discos inferiores e os superiores da pilha. Comparando estes perfis com os obtidos na malha mais
grosseira (figuras 4.11 à 4.16), verifica-se que existe uma ligeira diferença na forma, mas existe uma
diferença considerável no valor do gradiente de temperatura. Se na malha mais grosseira a diferença
máxima de temperatura por pilha varia de 60 a 100 K, nestes resultados da malha refinada pode ser
visto que as diferença máxima varia de 20 a 35 K apenas. Este resultado já tinha sido deixado
antever através da análise das figuras mencionadas anteriormente.
A maior homogeneidade de temperaturas verificada em toda a malha refinada pode ser em parte
devido ao aumento do número de volumes finitos em 2,5 vezes, como também devido à mudança do
algoritmo de discretização dos escalares do power law para o second order upwind.
71
Figura 4.35 - Distribuição de temperatura da pilha 1 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
Figura 4.36 - Distribuição de temperatura da pilha 2 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
Figura 4.37 - Distribuição de temperatura da pilha 3 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
72
Figura 4.38 - Distribuição de temperatura da pilha 4 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
Figura 4.39 - Distribuição de temperatura da pilha 5 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
Figura 4.40 - Distribuição de temperatura da pilha 6 ao longo do eixo Z, para a malha refinada
73
130 kW
A figura 4.41 mostra a distribuição de temperatura existente no exterior do forno, numa perspetiva
vista ligeiramente de cima, e do lado do queimador e da saída para a chaminé. Pode ser visto que a
distribuição é bastante homogénea, à exceção das linhas que definem o contorno da conduta de
queima em que se verifica uma temperatura superior.
Figura 4.41 - Distribuição de temperatura nas faces exteriores do forno, para a malha refinada
A temperatura média das faces exteriores do forno é de 370 K, sensivelmente, uma temperatura
demasiado elevada para um funcionamento eficiente numa utilização industrial. Este forno foi
projetado para trabalhar a temperaturas abaixo dos 700 K, pelo que este tipo de comportamento não
foi conseguido de simular em nenhum dos ensaios realizados. O valor elevado da temperatura
exterior deve-se muito à temperatura bastante superior no interior do forno, pelo que o isolamento
torna-se insuficiente para o tipo de funcionamento que foi simulado numericamente. Acredita-se,
porém, que para um funcionamento real o valor da temperatura das paredes exteriores do forno
venha a ser razoavelmente inferior.
A figura 4.42 mostra a distribuição de temperatura existente na chapa que define a conduta de
queima do combustível. Este perfil de temperaturas é idêntico ao verificado na malha mais grosseira,
demonstrado na figura 4.3, em que se verifica uma zona quente entre as pilhas 1 e 2, e um gradiente
de temperaturas relativamente pequeno no resto da conduta. Neste ensaio de 130 kW é onde o efeito
da recirculação é menos notório, resultando apenas numa temperatura um pouco mais alta na parte
superior da conduta e próximo da saída do queimador.
A temperatura média da conduta é também superior, face ao verificado na malha mais grosseira, em
aproximadamente 120 K, o que é natural devido ao facto de a potência calorífica simulada ser
superior na malha refinada.
74
Figura 4.42 - Distribuição de temperatura na conduta para o ensaio de 130 kW na malha refinada
Nas figuras 4.43 à 4.48 são mostrados os vetores velocidade dos escoamentos existentes em
diferentes planos do forno. Comparando com os resultados mostrados na secção 4.1.1. verifica-se
que existe uma grande semelhança nos perfis mostrados, à exceção de alguns pontos onde existem
criação de vórtices e pontos de dispersão de escoamento.
Na figura 4.43 verifica-se existir um ponto a partir do qual emergem vetores divergentes entre as
pilhas 5 e 6. Comparando com a figura 4.17 observa-se que este comportamento ocorre entre as
pilhas 4 e 5. Na proximidade desse ponto de mudança de direção é onde existem maiores diferenças
em termos de escoamento. Esta é a situação em que se verifica um comportamento menos idêntico
entre as duas malhas estudadas.
A figura 4.45 mostra um escoamento bastante complexo para o plano horizontal Z = 250 mm. Este
comportamento era previsível e é bastante idêntico ao verificado na figura 4.19.
Na figura 4.46 pode ser visto o escoamento para o plano Z = 700 mm. Este plano apresenta um perfil
já bastante idêntico ao observado num plano superior, revelado na figura 4.47, onde se destaca a
existência de um vórtice por cima da pilha 6, que define a inversão do escoamento dos gases
quentes. Quando comparado com a figura 4.20, as semelhanças são nítidas, existindo apenas uma
ligeira diferença na definição do ponto de dispersão existente no final da conduta de queima do
combustível, em parte, possivelmente, devido à diferente definição de concentração de vetores.
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Figura 4.43 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano de simetria no ensaio de 130 kW na malha refinada
Figura 4.44 - Pormenor da distribuição dos vetores de velocidade no plano de simetria, próximo à saida de escape, no ensaio de 130 kW na malha refinada
Figura 4.45 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 250 mm, no ensaio de 130 kW na malha refinada
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Figura 4.46 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 700 mm, no ensaio de 130 kW na malha refinada
Figura 4.47 - Distribuição dos vetores de velocidade no plano horizontal Z = 850 mm, no ensaio de 130 kW na malha refinada
77
5. Conclusões
5.1. Síntese conclusiva
Neste trabalho foi feito um estudo numérico do protótipo de um forno de revenido para proceder ao
tratamento térmico de discos de aço, através do programa comercial de CFD, FLUENT. Foi
construído um modelo geométrico, tendo sido de seguida adaptado a duas malhas computacionais
distintas, para poder ser analisado através de métodos numéricos. A primeira malha concebida,
denominada malha mais grosseira, tem 790800 elementos, e a segunda, denominada malha refinada,
possui 1960200 elementos. Tanto a construção do modelo geométrico como das malhas
computacionais foram feitas no programa GAMBIT.
Para simular o forno foram usadas as equações diferenciais de continuidade e do balanço de
quantidade de movimento; foi usada a equação de transporte da entalpia total para a energia, o
modelo RNG para a turbulência, o modelo de chama de difusão (non-premixed combustion
model) para a combustão (que efetua o cálculo de e de , usando uma distribuição PDF para
obter a fração de cada espécie presente), e o modelo DO (ordenadas discretas) para o transporte da
intensidade radiativa. Foram feitas simulações em regime estacionário e transiente, com potências
nominais de 80, 100 e 130 kW, em ordem a poder caracterizar o seu comportamento.
Os ensaios em regime estacionário deram origem a uma importante informação qualitativa do
comportamento do forno, como, por exemplo, avaliar zonas mais quentes e mais frias, conhecer o
escoamento, analisar a distribuição de temperaturas nas várias pilhas de discos e estudar o
comportamento da combustão dentro da conduta de queima do combustível.
Nas simulações feitas em regime transiente, foi possível avaliar a evolução de temperatura dos
discos, e a homogeneidade da sua distribuição. Os dois ensaios de potência resultaram em perfis
idênticos até aos 500 segundos, mas com tempos totais de aquecimento bastante distintos, o que
mostra a não linearidade do processo. Para que a temperatura mínima dos discos chegasse aos 600
K foram necessários 500 segundos de estágio para a análise de 130 kW, e 4000 segundos para 100
kW. A distribuição de temperatura resultou numa disposição quase igual nos dois casos, e muito
idêntica, em termos qualitativos, à verificada no regime estacionário.
A malha refinada foi também testada, mas apenas em regime estacionário. Neste caso foi usado o
algoritmo second order upwind. Verificou-se existir um número significativo de semelhanças em
termos qualitativos. As maiores diferenças observadas foram no perfil de escoamento por cima da
conduta de queima e nos valores das várias distribuições de temperaturas existentes no interior do
forno. Uma vez que os algoritmos usados não foram iguais entre as duas malhas, e como se
observaram diferenças quantitativas não desprezáveis, a independência de malha não ficou
assegurada. Contudo, a tendência do comportamento do forno com o aumento da potência é
semelhante nas duas simulações
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5.2. Trabalho futuro
Para desenvolvimentos futuros, existem vários aspetos que podiam enriquecer e completar este
trabalho. Alguns deles foram pensados desde início, no entanto, por razões diversas, não foi possível
executá-los para este trabalho.
Um aspeto importante a desenvolver no futuro refere-se à construção de uma função personalizada
(UDF – User Defined Function) que permita fazer a simulação virtual do comportamento real dos
discos dentro do forno. Será desejável ter uma função que permita copiar os campos de temperatura
de uma pilha de discos para a pilha seguinte, e inicializar a temperatura dos discos próximos da
entrada à temperatura ambiente, ao fim de um determinado tempo percorrido, para, assim, simular o
avanço de posição dos discos dentro do forno. Ao fazer isto, o forno fica sujeito a uma carga térmica
cíclica (dinâmica) e de período constante, que corresponde ao que iria acontecer no funcionamento
real. Com esta atualização, já seria possível prever não só a evolução temporal e o campo de
temperaturas dos discos, como também o caudal de gás natural necessário para manter o forno nas
condições pretendidas. Esta medida ainda ocupou bastante tempo por parte do autor deste trabalho,
mas não foi conseguida a sua concretização.
Sendo o presente trabalho uma ideia de uma possível solução para um forno de revenido que
cumprisse os objetivos propostos, ficaram por experimentar outras possíveis configurações do forno
para se tentar obter um aquecimento mais homogéneo e eficiente dos discos. A homogeneidade do
aquecimento e o controlo de temperatura são fatores cruciais para a garantia de qualidade do produto
final. Para uma melhor homogeneização da temperatura dos discos dentro do forno, seria necessário
existir algum tipo de recirculação forçada dos produtos de combustão, de forma a eliminar as zonas
quentes e zonas frias, que naturalmente existem neste forno, onde apenas existem dois escoamentos
impostos, de ar e gás natural à saída do queimador.
A conceção e experimentação de mais uma malha alternativa, com maior refinamento, assim como a
adoção de uma estrutura diferente, são ações que dariam ao trabalho uma maior consistência, assim
como poderia permitir a obtenção de resultados mais precisos. No entanto, para uma malha mais
reticulada em todas as direções poderão ser necessários recursos computacionais superiores às
disponíveis.
A validação deste modelo numérico requeria uma montagem experimental feita à escala para verificar
possíveis incongruências entre as simulações numéricas e os ensaios experimentais. Este tipo de
abordagem requereria, eventualmente, um investimento considerável, sendo que para o âmbito deste
trabalho não foi considerado como sendo razoável de ser executado. A decisão da construção do
forno teria que ser previamente discutida e aprovada pelas equipas do planeamento, da qualidade e
da manutenção da Galucho, assim como pelo proprietário da empresa em causa, assunto esse que
não chegou a ser discutido.
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