Post on 09-Dec-2018
SFI 5800 Espectroscopia Física
Espectroscopia eletrônica: semicondutores,
cristais iônicos e bronzes
Prof. Dr. José Pedro Donoso
Universidade de São Paulo
Instituto de Física de São Carlos - IFSC
Espectroscopia Eletrônica
Espectros eletrônicos em cristais iônicos: bandas
Centros de cor: espectros de absorção de centros F. Lei de Mollwo – Ivey.
Semicondutores : espectros de absorção em semicondutores dopados
Bronzes : espectros eletrônicos de óxidos metálicos. Transição isolante -metal
Espectros eletrônicos em
cristais iônicos puros
A figura mostra o espectro de absorção medido a 80 K do NaCl. Este sistema é um
isolante típico onde o inicio da curva de absorção se da em torno dos 7.5 eV, na
região ultravioleta distânte. Este espectro resulta da excitação de um eletron da
banda de valência (cheia) para a banda de condução (vazia), estando ambas
separadas por um gap de energia relativamente grande. O espectro mostra
também uma estrutura de exciton, caraterizado por uma energia de ligação da
ordem de 1 eV. O tratamento da estrutura de bandas de cristais iônicos isolantes
pode ser encontrada nos textos de física do estado sólido de Ch. Kittel, F. Seitz,
Ashcroft & Mermin, A.J. Dekker e de Wert & Thomson.
A formação do NaCl a partir de seus elementos envolve a transferência de um elétron do
sódio (ficando Na+ no cristal) para o cloro (ficando como Cl-). O primeiro passo para
calcular a banda de energia proibida (gap) consiste em determinar o trabalho necessário
para formar os íons.
a) Para remover o eletron de valência de um átomo de sódio é necessária uma energia de
5.14 eV, que é a energia de ionização I do Na. Se esse eletron for transferido ao átomo de
cloro para formar o íon Cl-, haverá um ganho de energia de 3.75 eV, que corresponde a
afinidade eletrônica A do cloro. A energia (em eV) necessária para realizar o processo:
Na+ + Cl- = Na + Cl será:
4.1)14.5()75.3( −=−=−= IAEg
b) Consideremos o potencial coulombiano experimentado pelos íons carregados no sólido.
Como o íon Na+ na estrutura tem seis íons negativos de primeiros vizinhos, doze íons
positivos de segundos vizinhos, e assim por diante, o potêncial no íon positivo será:
+−−= K
3
8
2
126
4
2
ooa
eV
πε
⊗ : íon Na+ na estrutura
Esta soma foi realizada por Madelung em 1918, que introduziú a constante αM. Para o
NaCl, αM = 1.748. Considerando uma distância internuclear de 2.814 Å, esta expressào
fornece um valor V = 8.86 eV. Este potêncial de Madelung é positivo (atrativo para o
eletron) no lugar do anion. A energia de ligação de um eletron do Cl- no nivel de valência
3p é : EB = A + eV. O mesmo termo contribui como uma energia de repulsão no sítio do
cation, EB = e V – I. A banda proibida (em eV), incluindo o potencial de Madelung será:
M
oooo a
e
a
eV α
πεπε 43
8
2
126
4
22
−=
+−−= K
4.16)16.8(2)14.5()75.3(2 =+−=+−= eVIAEg
Este resultado, 16.4 eV, ainda esta longe do valor medido experimentalmente (8.5 eV)
mais pelo menos o sinal agora está correto.
c) Efeito da polarização eletrostática. Quando um eletron é excitado de um Cl- para um
remoto íon Na+, devemos substrair da energia de ligação a energia da polarização do
cristal. Desta forma, a energia de ligação será diminuida de 1.5 eV quando um eletron
é removido do orbital 3p do Cl.
Da mesma forma, a polarização do
cristal provoca uma diminuiçào na
energia quando um eletron é colocado
no orbital 3s do Na.
d) Por último devemos considerar o
efeito da sobreposição dos orbitais entre
íons vizinhos, formando bandas. A
banda de valência do NaCl é estreita,
com largura menor que 2 eV. A banda
de condução, formada do nível 3s do
sódio é bastante mais larga, 5 eV. A
figura (d) mostra o efeito na banda
proibida destas larguras de linha
resultante da sobreposição dos orbitais.
Centros de Cor
Os cristais halogenetos alcalinos são transparentes na região visível do espectro. Estes
cristais podem ficar coloridos pela introdução de impurezas (íons metálicos) ou pelo
bombardeio de raios-X, raios γ, neutrons ou eletrons.
O centro de cor mais simples é o centro F (Farbe, cor em alemã). Ele corresponde
a vacância de um íon negativo que é substituido por um elétron ligado na vacância.
A função de onda do eletron aprisionado é compartilhada pelos seis íons alcalinos
adjacentes ao sítio vazio da rede.
O centro F pode ser produzido pelo
aquecimento do cristal num excesso de
vapor alcalino ou por irradiação de raios-X.
O centro pode ser identificado por
Ressonância Paramagnética Eletrônica
(RPE) como um eletron ligado na vacância
de um íon negativo.
O processo de formação de um centro F envolve duas etapas. O metal alcalino (por
ex. KCl) ioniza num íon mais um eletron: K → K+ + e-
Este íon e o íon halogeneto formado no interior do cristal forma mais cristais na
superfície: K+ + Cl- → KCl
O excesso de eletrons resultante do primeiro processo fica aprisionado na vacância
formando o centro F.
A figura mostra as bandas de absorção central (bandas F) associadas com os centros F
em diversos cristais halogenetos alcalinos
Se observa que a posição da banda se
desloca para baixas energias de acordo
com o tamanho do cristal. A absorção da
banda F é caraterística do cristal e não do
metal alcalino usado no vapor. O papel do
vapor é apenas produzir um centro F no
cristal hospedeiro. Kittel, Introdução à Física do Estado Sólido
Centros F
Em 1931, E. Mollwo observou a relação entre a posição da banda F (EF) e a distância
entre os primeiros vizinhos (a) . Em 1947, H.F. Ivey ajustou os dados experimentais e
obteve a relação conhecida como lei de Mollwo - Ivey:
84.1
7.17
aEF =
(EF em eV e a, parâmetroda rede, em Å)
Existem numerosos modelos para explicar a absorção de centros F, como o modelo do
contínuo, o modelo de orbitais moleculares e o modelo de íons pontuais. Este último,
introduzido por Gourary & Adrian em 1957, admite que o cristal é constituido de cargas
pontuais localizadas, desprezando efeitos de polarização. O potencial em forma de poço
desta aproximação, além do fato das funções de onda dos centros F estarem bastante
localizadas na região interna do poço, sugerem o conhecido modelo quantico da
“partícula na caixa” para descrever o centro F. A equação de Schrödinger é:
02
2
2 =+∇ ψψh
mE2
222
2ma
nEn
hπ=⇒⇒⇒⇒
Éste modelo prediz: 2
1a
EF
∝
Onde o parâmetro a está relacionado com as distâncias entre os primeiros vizinhos na
rede ou, equivalentemente, com o parâmetro da rede do cristal.
Shulman & Compton, Color Centers in Solids
A figura mostra a correlaçào entre a posição da banda do centro F e o parâmetro
de rede para diversos halogenetos alcalinos. Não deixa de ser surprendente que
um modelo tão simples como o do poço de potencial quadrado consiga descrever
razoavelmente bem os espectros de absorção dos centros F
Espectros de absorção em semicondutores: efeito de impurezas
Consideremos um diamante, que é um semicondutor com um gap de energia de 5.4 eV.
Se adicionamos pequenas quantidades de impurezas de nitrogênio, estes substituiram
átomos de carbono na rede cristalina.
Nassau, The Physics and Chemistry of color
Configuração do N5+ : 1s2 2s2 2p3
Configuração do C4+ : 1s2 2s2 2p2
Para cada átomo de nitrogênio
adicionado haverá um eletron extra.
Como a banda de valência esta
cheia, este eletron acaba formando
um nível de energia separado
(donor level na figura)
A banda do donor-level no diamante é bastante larga (4 eV). Luz com energia superior a
2.2 eV pode excitar o eletron extra na banda de condução (figura) resultando na
absorção da luz azul e violeta do espectro visível e dando a cor amarelada ao diamante
dopado com uma concentração de 1 átomo de nitrogênio por 100.000 de carbono, e
uma cor esverdeada aos dopados com maiores concentrações (1 : 1000). Para
concentrações maiores, a banda do donor level se alarga mais ainda.
Configuração do B3+ : 1s2 2s2 2p
Configuração do C4+ : 1s2 2s2 2p2
Diamante dopado com pequenas
quantidades de boro
Neste caso a adição do átomo de boro
provoca a deficiência de um eletron. A figura
mostra o nível de energia resultante, onde o
eletron perdido, ou buraco, é indicado por (○).
Este nível é chamado acceptor level e sua
energia é Eg = 0.4 eV, medida desde o topo da
banda de valência.
Concentrações de alguns átomos de boro por
milhões de átomos de carbono produzem a
cor azul dos diamantes mais cotizados, como
o diamante Hope do Smithsonian Institute de
Washington, de 2.5 cm e 45.52 carat. Estes
diamantes são também condutores
extrínsecos.
Nassau, The Physics and
Chemistry of color
Nassau, The Physics
and Chemistry of color
Espectros eletrônicos em óxidos
de metais de transição: bronzes
Sólidos de composição MxAO3, onde A é um metal
de transição, como tugstênio ou molibdeno, e M é
um metal alcalino ou hidrogênio, são chamados
bronzes. Nestes sistemas, o cation dopante (M2+ ou
M3+) doa seus eletrons externos para a banda de
condução do oxido.
Os bronzes de tugstênio MxWO3, são os mais
estudados. Para x = 0 o material é isolante (WO3).
Para valores pequenos de x, os bronzes são
semicondutores de estruturas ortorrombicas ou
tetragonais. Para valores intermediários de x, os
brozes são metálicos, com estrutura hexagonal ou
tetragonal. O grande interesse por estes materiais se
deve a transição isolante – metal.
As cores dos bronzes dependem da concentração x do metal alcalino.
No caso dos bronzes NaxWO3 as cores são as seguintes
(a) WO3, isolante com gap de energia de 3.5 eV. A transição eletrônica vai da banda de
valência a banda de 5d do W6+. A absorção no UV e V dá a cor amarelada do composto.
(b) Para x < 0.3 o eletron 5d fica localizado no W5+, dando uma absorção no infravermelho
O eletron constitui um estado doador. Bronze se comporta como um semicondutor tipo n.
(c) Para x > 0.3 a concentração de estados doadores supera a condição para uma
transição de Mott do estado semicondutor ao metálico. Os orbitais 5d formam uma banda
parcialmente cheia, responsável pela conduçào metálica do composto.
Bronze de tugstênio hidrogênio HxWO3
Espectro de absorção do bronze HxWO3 ( x ≈ 0.15). A intensa banda de absorção
centrada nos 10.000 cm-1, região infravermelha, é responsável da cor azul deste
Composto. Esta banda tem sido identificada com a transferência do eletron 5d do
W5+ a banda de condução. Como esta última banda é formada basicamente pelos
Orbitais do W6+, a transição é do tipo transferência de carga.
Duffy, Bonding, energy
levels and bands in
inorganic solids
A mudança das cores dos bronzes com a concentração é a base para aplicações
tecnológicas como dispositivos eletrocrômicos. A figura mostra um dispositivo
baseado num bronze de tugstênio como eletrodo de intercalação.
West, Solid State Chemistry
Bibliografia
West, Solid State Chemistry
Duffy, Bonding, energy levels and bands in inorganic solids
Wold & Dwight, Solid State Chemistry
Nassau, The Physics and Chemistry of color
Kittel, Introdução à Física do Estado Sólido
Shulman & Compton, Color Centers in Solids
Huheey, Keiter & Keiter, Inorganic Chemistry
Dekker, Solid State Physics
Wert & Thomson, Physics of Solids
Hinderbergue da Frota, Dissertação Mestrado (IFQSC, USP, 1981)