Post on 08-Jan-2017
Portugal no contexto europeu Entre tradição e modernidade
Anália Cardoso Torres
Professora Catedrática do ISCSP, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas
Universidade Técnica de Lisboa Presidente da Associação Europeia de Sociologia, ESA (2009-2011)
Ciclo de Conferências em Sociologia Pensar a sociedade no século XXI Universidade dos Açores 27 de Outubro de 2011
1. Sociedades contemporâneas. A modernidade e a modernidade avançada.
2. Portugal no contexto Europeu.
3. Algumas notas sobre a Crise Actual.
O que distingue as sociedades modernas das tradicionais ?
Dos papéis pré-fixados, à autonomização e à individualização. Do constrangimento e da protecção, à maior margem de manobra individual mas também ao risco, à incerteza, à insegurança e ao medo.
Dos saberes e dos poderes tradicionais herdados, às lógicas meritocráticas e aos saberes abstractos e periciais.
Da lógica do estatuto à lógica das competências.
Sociedades que se pensam a si próprias: auto-reflexividade institucional.
Recomposição Social e mudança no século XX, particularmente nos últimos 50 anos (a partir dos anos 60, de 1973 e dos anos 80). Modernidade tardia, avançada ou pós-modernidade?
Como se caracterizam estes processos da modernidade avançada? E em Portugal?
Desruralização, terciarização, urbanização. Os trinta gloriosos (45-75). Ascensão do Estado de bem-estar Social. Especificidades do caso português (e também a guerra colonial).
Mais claramente a partir dos anos 80: desindustrialização, feminização da força de trabalho; desemprego; aumento da longevidade; lógicas neo-liberais; início dos problemas com o estado de bem-estar social e a sustentabilidade do sistema. O contra-exemplo da Finlândia e dos países escandinavos. Capitalismo “controlado” ou “regulado” pela social-democracia?
Crescimento das classes médias (grande heterogeneidade interna).
Globalização efeitos no plano económico, político e financeiro. aumento das desigualdades (sobretudo depois dos anos 70), novas e velhas exclusões.
Novas formas de conhecimento e circulação dos saberes. A sociedade da informação/conhecimento (?) Novas possibilidades e limites.
Acessos diferenciados aos recursos, aos saberes, aos poderes. Promessas e frustrações.
Portugal modernidade inacabada, combinações específicas de moderno e tradicional.
Vejamos alguns resultados de investigação ESS (2002 a 2008)e outras fontes.
Anos de escolaridade completos (população) (médias)
Fonte: European Social Survey, round 4 (2008)
Anos de escolaridade completos (população) (médias)
Fonte: European Social Survey, round 4 (2008)
Anos de escolaridade completos (> 59 anos) (médias)
Fonte: European Social Survey, round 4 (2008)
Anos de escolaridade completos (30 -‐ 59 anos) (médias)
Fonte: European Social Survey, round 4 (2008)
Anos de escolaridade completos (Até 29 anos) (médias)
Fonte: European Social Survey, round 4 (2008)
Uma simples comparação e verificação dos dados...(análise de frequências, quantos são...)
Que nos faz pensar. Então por que há desemprego de licenciados? Porque a nossa estrutura produtiva não absorve os que temos...
Que diz duas coisas em simultâneo (nada de raciocínios lineares). Avançámos espectacularmente, somos o país europeu em que mais se elevou o nível de escolaridade das gerações mais jovens para as mais velhas (de uma média de 2 anos nos outros países em Portugal essa diferença é de 6 anos); mas estamos muito aquém, partimos de patamar muito baixos;
Caso para dizer os investimentos na educação deram frutos...
A distribuição 40/40/20 (UE); 80/10/10 (PT)
Não têm acesso à internet
Confiança social e confiança política
Satisfação com o Governo, a Economia, os Serviços de Saúde, a Educação e a Democracia
Portugal
Pouca formação escolar, exclusão de largos sectores da chamada sociedade do conhecimento. Mas subida espectacular nas gerações mais jovens.
Pouca confiança nos outros (não funcionamento transparente das instituições, pouco sentido do bem público), pouca confiança política, pouca satisfação política, menos bem-estar subjectivo.
Intervenção do Governo na esfera económica por escalão etário
Premeiam-se certas preocupações sociais, defende-se a igualdade de oportunidades e sustenta-se a necessidade de acção defensiva;
Contra as ideias correntes (ou que se querem fazer correntes...) que dizem que cada vez os jovens se preocupam menos com os outros, que o estado não deve intervir na economia, que os sindicatos já não interessam às pessoas…
Qual a importância de cada um destes aspectos na sua vida?
(médias)
Fonte: ESS1, 2002
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Família Amigos Tempos livres Política
Trabalho Religião Organizações de voluntariado Centro da escala
Nada importante
Extremamente importante
Qual a importância de cada um destes aspectos na sua vida? (médias)
Fonte: ESS1, 2002
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Família Homens Família Mulheres
Trabalho Homens Trabalho Mulheres
Religião Homens Religião Mulheres
Nada
importante
Extremamente importante
Centro da escala
Fortes sinais da sentimentalização, de valorização dos direitos individuais em simultâneo com a valorização da família e dos afectos, segundo moldes não tradicionais. Os afectos assumem papel central na vida dos Europeus.
Valorização, tanto pela parte dos homens como pela das mulheres, do trabalho profissional e valorização da simetria de contributos na família.
Mas persistência na prática de fortes assimetrias de género que penalizam as mulheres;
Europeus que declaram não ter religião (ESS, 2008)
43,8
68,8
41,0 40,4
53,4
39,5
52,7 56,3
31,0
58,1
38,8
7,4
77,5
44,4
27,7
12,3 8,8
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100
2008
Valores
Hierarquias que contrariam lugares comuns. Valorizações com “sentidos” diferentes mas largas
zonas de consenso ao nível europeu. Portugal ao lado dos mais conservadores e menos
abertos à mudança (mas tudo à volta do centro da escala...) e dos que mais apostam na auto-promoção e menos na auto-transcendência.
Secularização compatível com valores colectivos.
Conclusões
Mais confiança social, mais confiança política.
Mais Satisfação política (bom funcionamento das instituições), mais bem-estar subjectivo.
Baixas competências e qualificações dos portugueses (relação com confiança social, confiança política). Efeitos do e no Funcionamento das instituições.
Valores, preocupação com o colectivo e com os outros. Valorização da acção colectiva não é incompatível com a autonomia individual.
Contributos para explicar as especificidades do caso português
A estrutura produtiva não consegue absorver os pouco qualificados (metade da média europeia) que produz;
O Estado tem um filosofia “moderna” mas com fracos recursos;
Problemas estruturais da nossa economia mas também desenvolvimento a contra ciclo: o desperdício do período da guerra colonial; os efeitos da globalização e do desenvolvimento tecnológico e o surgimento de mercados de mão de obra mais barata (países emergentes) e mais qualificada (países de leste da UE).
Notas breves sobre a crise Esta não é uma crise como as outras (especificidade Europeia).
Causas complexas. Mas pode ser encarada como o culminar de um processo em curso desde os anos 80 e com o fim da regulação dos mercados.
O capital financeiro com a sua extraordinária mobilidade é hoje a força dominante que controla estados, nações, regiões do globo.
Especial pressão sobre a Europa. Há outras regiões do mundo com trabalho mais barato ao mesmo tempo que há dificuldade em absorver na Europa a mão-de-obra menos qualificada devido também às mudanças tecnológicas (Wolfang Streeck, 2001). Problemas mesmo para os mais qualificados.
Aumento da pobreza do desemprego (mais pressão sobre os estados de bem estar social).
Em 1999, na conferência sob o lema Will Europe Work? Kholi e Novack analisam a desprotecção social resultante dos anos anteriores de crise e desemprego e concluem que sem protecção social:
“Conflicts are likely to fundamentalize themselves under conditions of exclusion, economic deprivation and moral devaluation (Kholi and Novack, 2001: 10)”.
Dez anos depois foi exactamente isto que aconteceu – revoltas, explosões sociais sem objectivo preciso resultantes de raiva, ressentimento e perda de sentido.
Em 2007, na 8th Conference, Nicos Mouzelis falando das mudanças introduzidas pela extraordinária mobilidade do capital financeiro afirma:
“it explains the state’s incapacity to control capital movements and to redistribute the wealth produced” (Mouzelis, 2010: 27).
Finalmente, como Ulrich Beck escreveu em Fevereiro de 2011 num texto intitulado Cooperate or Fail! The way out to the Euro Crisis, os países europeus estão condenados a cooperar e que deviam mesmo fazer uma Declaração de Interdependência”. “Quem quiser estabilidade politica e segurança (social, financeira e ambiental) tem de praticar a solidariedade Europeia” (Beck, 2011).