Post on 29-Jan-2021
O CONTO LITERÁRIO: UMA FORMA DE APROXIMAR OS ALUNOS DA LITERATURA CLÁSSICA
Autora: Cristiani Schneider
Orientadora: Professora Dra. Anna Beatriz da Silveira Paula
Resumo
Este artigo descreve a aplicação da Unidade Didática O conto literário como
meio de aproximar os alunos e a literatura clássica. No desenvolvimento desse
material, realizaram-se rodas de leitura utilizando estratégias de leitura baseadas
nos pressupostos da Estética da Recepção e em sugestões das autoras Maria da
Glória Bordini e Vera Teixeira de Aguiar. Colocou-se como tema maior de reflexão a
concepção de Literatura como uma forma de arte que leva os indivíduos a pensarem
sobre a condição humana. Na aplicação do projeto foram envolvidos alunos do 9º
ano (8ª série) do Ensino Fundamental e buscou-se desenvolver sua capacidade de
compreender e interpretar materiais de leitura. Optou-se pelo conto literário como
ponto de partida para esse trabalho devido sua brevidade, o que pode ser um
elemento aproximador entre os alunos e a literatura clássica. Os autores escolhidos
foram Luiz Vilela, Carlos Drummond de Andrade e Anton P. Tchekhov.
Palavras-chave: Literatura; leitura; conto literário
Abstract
This article describes the implementation of Curriculum Unit The literary tale
as a means of bringing students and classical literature. In developing this material,
held reading groups using reading strategies based on the assumptions of the
Reception Aesthetics and suggestions of the authors Maria da Gloria Bordini and
Vera Teixeira de Aguiar. Put as major theme of reflection designing Literature as an
art form that leads individuals to think about the human condition. In the
implementation of the project involved students were in 9th grade (8th grade)
elementary school and sought to develop their ability to understand and interpret
reading materials. We chose the literary tale as a starting point for this work because
of its brevity, which can be an approximator among students and classical literature.
The authors were chosen Luiz Vilela, Carlos Drummond de Andrade and Anton P.
Chekhov.
Keywords: Literature, reading, literary tale
1 Introdução
Faz parte das funções da escola habilitar os alunos na leitura da palavra, de
imagens, das mídias atuais e do mundo que os cerca. O ensino da leitura da palavra
tem se mostrado um grande desafio não só no que se refere à simples decodificação
e compreensão das palavras, como também em conseguir com que a leitura faça
parte da vida das pessoas não apenas como uma tarefa escolar, mas como uma
forma de prazer. Como observa Alberto Manguel, é sabido que a leitura traz
qualidade para a vida pessoas, mas ainda não encontramos a fórmula exata para
transformar nossos alunos em leitores. “Ler em voz alta, ler em silêncio, ser capaz
de carregar na mente bibliotecas inteiras de palavras lembradas são aptidões
espantosas que adquirimos por meios incertos.” (MANGUEL, 1997, p. 86).
Ainda sobre o aprendizado da leitura, em outro momento, o autor reitera:
Ainda estamos longe de uma resposta. Misteriosamente, continuamos a ler sem uma definição satisfatória do que estamos fazendo. Sabemos que a leitura não é um processo que possa ser explicado por meio de um modelo mecânico; sabemos que ocorre em certas áreas do cérebro, mas sabemos também que essas áreas não são as únicas a participar; sabemos que o processo de ler, tal como o de pensar, depende de nossa capacidade de decifrar e fazer uso da linguagem, do estofo de palavras que compõem texto e pensamento. (MANGUEL, 1997. p. 54 – 5)
Quando elaboramos nosso Plano de Trabalho Docente e refletimos sobre os
porquês do ensino da Literatura, um objetivo se mostra essencial: fazer com que a
leitura se torne uma atividade prazerosa para os alunos. Gostaríamos de formar
leitores. No entanto, temos constatado que muitos alunos que concluem o Ensino
Médio não gostam de ler. Entre aqueles que afirmam gostar de ler fica clara a
preferência pela “literatura da moda”, ou seja, livros de auto-ajuda e aqueles que
seguem uma receita de sucesso de venda: linguagem simples e enredo instigante.
Aquelas obras que ficaram conhecidas como “clássicos da literatura” não
aparecem nas preferências desses leitores, talvez por exigirem mais esforço
intelectual, persistência e concentração, mas são livros que não “envelhecem” nem
saem de moda porque apresentam temas de interesse universal e atemporal. Ítalo
Calvino define o clássico como aqueles livros que nunca terminam o que têm a
dizer, provocando contínuas alterações em quem os lê. Eles proporcionam uma
espécie de transmissão de tradições e saberes, já que se mantêm universais no
tempo. Esses conhecimentos supõem a formação de padrões de pensamento e
comportamento, os quais o leitor pode aceitar ou rejeitar. (CALVINO, 1991)
A leitura do texto literário clássico não promete prazer ou uma utilidade
imediatos. Ao falar sobre a literatura como uma forma de arte, Haquira Osakabe
comenta “... ela, a arte, tem sim uma particularidade nem sempre acessível à
percepção estereotipada que nunca se dispõe à tarefa de despojar-se dos lugares
comuns e enfrentar a nem sempre óbvia fruição da arte.” (OSAKABE, 2005, p. 41).
Não existe nada de condenável na leitura da chamada literatura de consumo,
mas essa não precisa ser “ensinada”, não precisa da intervenção do professor para
que o aluno a entenda, ele já tem habilidades de leitura suficientes para perceber
tudo o que o texto oferece, já que linguagem e os temas são atuais. Maria da Glória
Bordini e Vera Teixeira de Aguiar (1988, p. 84) afirmam que “Diante de um texto que
se distancia de seu horizonte de expectativas, o leitor, (...) precisa adotar uma
postura de disponibilidade, permitindo à obra que atue sobre seu esquema de
expectativas...”. O texto, quanto mais se distancia do que o leitor espera dele por
hábito, mais altera os limites dos seus horizontes de expectativas e os amplia. Onde
mais, se não for na escola, o leitor poderá enriquecer suas leituras e exercer seu
direito ao consumo de textos clássicos?
Com o intuito de contribuir para a melhoria da competência leitora dos alunos
do 9º ano D do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Macedo Soares, foram
organizadas rodas de leitura semanais, de acordo com as indicações das autoras
Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira de Aguiar. Optou-se pelo conto literário como
ponto de partida para esse trabalho, pois sua brevidade pode ser um elemento
aproximador entre os alunos e a literatura clássica. Então, a partir de uma proposta
de leitura de contos de Luis Vilela, Carlos Drummond de Andrade e Anton P.
Tchekhov, foram aplicadas estratégias de leitura literária que tinham como objetivo
levar os estudantes envolvidos a ampliar sua capacidade de compreender e
interpretar materiais de leitura e a descobrir a beleza da literatura, passar a vê-la
como uma forma de arte que os fizesse refletir sobre a condição humana.
2 Desenvolvimento
2.1 A Estética da Recepção
As Diretrizes Curriculares do Paraná, fundamentadas nas ideias de Hans
Robert Jauss, apontam a literatura como parte importante na formação dos alunos e
direcionam seu ensino a partir dos pressupostos teóricos da Estética da Recepção,
a qual se fundamenta na relação entre obra, autor e leitor. A obra traz a
representação de mundo do autor que se contrapõe a representação de mundo do
leitor. No livro A formação do leitor: alternativas metodológicas, essa relação é assim
apresentada:
... o processo de concretização como interação do leitor com o texto, em que este atua como pauta e tudo o que não diz ou silencia cria vazios que forçam aquele a interferir criadoramente no texto, a dialogar com ele, de igual para igual, num ato de comunicação legítimo. (BORDINI e AGUIAR, 1988, p. 82)
O método recepcional no ensino da literatura propõe a evolução do aluno
como leitor e enfatiza justamente as chamadas “obras difíceis” porque elas se
afastam daquilo que é conhecido e esperado e, por isso, têm poder transformador.
Se o livro escolhido por alguém está muito próximo do sistema de valores desse
leitor, seu horizonte de expectativas permanece o mesmo e sua posição psicológica
é confortável e ele, muito provavelmente, classificará a leitura como boa e
recomendável. Por outro lado, as obras que desafiam a compreensão e geram
conflito por não refletirem as mesmas concepções de mundo do leitor ou por se
distanciarem muito no tempo e espaço não têm muita aceitação. Os objetivos a
serem alcançados e que garantem o sucesso do método recepcional são os
seguintes:
(1) Efetuar leituras compreensivas e críticas; (2) ser receptivo a novos textos e a leituras de outrem; (3) questionar as leituras efetuadas em relação a seu próprio horizonte cultural e (4) transformar os próprios horizontes de expectativas bem como os do professor, da escola, da comunidade familiar e social. (BORDINI e AGUIAR, 1988, p. 86)
Para a aplicação de atividades de literatura a partir desse método, há cinco
etapas a serem seguidas (BORDINI e AGUIAR, 1988, p. 88 – 90). A primeira delas é
a determinação do horizonte de expectativas, ou seja, um diagnóstico da turma em
relação aos seus gostos de leitura, seus valores, preconceitos, preferências de lazer
e crenças. Essas informações podem ser levantadas através de conversas com os
alunos, discussões, observação do comportamento da turma, questionários ou
dinâmicas. Neste projeto optei por verificar na biblioteca da escola quais foram os
livros mais procurados pelos alunos no ano de 2010.
Conhecidos os interesses do grupo, passa-se ao atendimento dos horizontes
de expectativas. Este estágio do projeto consiste em levar para a classe texto que
satisfaçam aos gostos observados. Esses textos podem ser literários ou pertencer a
outros meios de expressão como histórias em quadrinhos, charges entre outros.
Escolhi para primeira leitura o conto As formigas, de Luiz Vilela, por atender ao
gosto dos alunos e por ser uma narrativa simples – ainda que guarde conteúdos
profundos – com linguagem de fácil compreensão.
A terceira etapa é chamada de ruptura do horizonte de expectativas. É o
momento em que são ofertados aos alunos textos que os levem ao questionamento
de suas concepções de mundo, suas certezas. Entretanto, é necessário que esses
textos se assemelhem aos anteriores em um aspecto, seja a temática, a estrutura ou
a linguagem para manter um vínculo com a etapa anterior. Os demais elementos,
porém, devem ser completamente diferentes para que os alunos se deem conta de
que estão sendo apresentados a algo novo.
A seguir ocorrerá a etapa do questionamento do horizonte de expectativas.
Aqui a turma deverá fazer uma comparação entre as etapas anteriores, decidindo
quais textos lhes exigiram maior grau de reflexão, maior descoberta de sentidos e,
por consequência, maior grau de satisfação. Espera-se que o grupo faça um debate
sobre seu comportamento em relação às leituras realizadas, que juntos visualizem o
processo de superação dos obstáculos na compreensão do material de leitura. Além
disso, é preciso, nesse momento, levar os alunos a perceberem que conhecimentos
por eles adquiridos anteriormente lhes proporcionaram condições para entender
muitas situações descritas nos textos, resultando numa reflexão sobre as relações
entre a leitura e a vida.
Parte-se então para a ampliação do horizonte de expectativas, última etapa
do processo. Como resultado da reflexão anterior, os leitores tomam consciência
das mudanças de sua visão de mundo a partir das experiências que tiveram com a
literatura. Conscientes do que a literatura oferece para seu crescimento, a partir
dessa etapa, espera-se que o aluno dê continuidade ao processo, numa busca
constante de leituras mais desafiadoras e enriquecedoras.
A avaliação dos alunos acontece a cada etapa do processo. No decorrer dos
trabalhos, eles devem ser capazes de comparar todas as leituras realizadas e de
revisar criticamente seu próprio comportamento, o que resultará na ruptura do
horizonte de expectativas e, consequentemente, sua ampliação. O professor deve
ser capaz de provocar a participação dos alunos nesse processo e de criar situações
que propiciem as discussões do grupo.
2.2 Aplicação do material didático
A Unidade Didática elaborada propôs a realização de encontros para leitura
de contos de Luiz Vilela, Carlos Drummond de Andrade e de Anton P. Tchekhov e,
como estratégia, propôs a aplicação da teoria da Estética da Recepção. As
atividades de leitura foram direcionadas aos alunos da 8ª série (hoje 9º ano) E do
Ensino Fundamental do período noturno, do Colégio Estadual Macedo Soares, de
Campo Largo, região metropolitana de Curitiba. O colégio atende a
aproximadamente mil alunos, em três turnos. Está localizado na região central da
cidade e há uma grande diversidade entre seus alunos quanto a condições sociais e
culturais. A turma escolhida para a aplicação do Material Didático tinha 20 alunos
matriculados, sendo que apenas 12 frequentavam as aulas normalmente. Essa
situação é muito comum no ensino noturno, já que muitos alunos são trabalhadores
e acabam não conseguindo conciliar o trabalho com os estudos.
Foram dezoito encontros de leitura, nos quais se desenvolveram atividades
antes e depois da leitura de cada um dos três contos selecionados e, a partir deles,
foram aplicados exercícios de recepção e compreensão. De Luiz Vilela optou-se por
As formigas; de Carlos D. de Andrade, A incapacidade de ser verdadeiro e de
Tchekhov, Gricha. Em todos eles, os autores descreveram o mundo sob os olhos da
infância.
O trabalho foi desenvolvido de acordo com as indicações de Maria da Glória
Bordini e Vera Teixeira de Aguiar, no livro A formação do leitor: alternativas
metodológicas. Segundo as autoras, o processo de recepção deve se iniciar antes
do contato do leitor com o texto, portanto, os contos não foram apresentados de
imediato aos alunos. Mas antes foi feita a determinação do horizonte de expectativas
do grupo. Nesse momento, buscou-se conhecer as preferências de leitura e opiniões
em relação aos temas que aparecem nos textos selecionados. Para a elaboração
deste material fez-se uma pesquisa na biblioteca da escola sobre os livros mais
procurados pelos alunos. Entre as obras mais lidas do ano de 2010 encontramos o
livro Contos da infância e da adolescência, de Luiz Vilela, do qual escolhemos o
conto As formigas cuja linguagem é atual e a temática da infância se repete nos
contos de Drummond e Tchekhov, trabalhados nas etapas seguintes.
1º ENCONTRO: Para haver diálogo entre leitor e texto é preciso motivação e
envolvimento, por isso, foi escolhida a dinâmica conhecida como “Jogo dos Rótulos”.
Essa dinâmica é um exercício de sensibilização que procura motivar os participantes
a partilharem sentimentos e impressões com o grupo. Por se tratar de uma atividade
diferente, cujo desenrolar era imprevisível, houve um pouco de relutância por parte
dos alunos em se apresentarem como voluntários para que lhes fosse colocado nas
costas um rótulo. Mas assim que o primeiro aluno se propôs a participar, outros
também quiseram e foi possível desenvolver todas as etapas da dinâmica.
2º ENCONTRO: A intenção nesse encontro era conversar com os alunos
sobre o universo infantil - necessidades, linguagem e interação com os adultos –
com o objetivo de aproximá-los do tema dos contos que seriam lidos. Não se falou
muito sobre a infância de forma generalizada, pois os participantes acabaram
direcionando a conversa para relatos sobre a sua infância, principalmente de
situações em se sentiram incompreendidos pelos pais. Considero essa discussão
muito importante, pois, através dela, foi alcançado o objetivo de aproximar e
preparar os alunos para a leitura dos contos que viria em seguida.
3º ENCONTRO: Como continuidade da atividade do encontro anterior, foi
solicitada aos participantes uma produção de texto na qual relatassem a sensação
ou lembrança infantil mais remota que guardam na lembrança. Seguem trechos de
relatos dos alunos:
“Quando minha casa pegou fogo eu e meu pai estávamos perto do fogão e
minha mãe estava sentada na cama. Meu pai gritou para ela tirar meus irmãos lá de
dentro. Saímos correndo e os vizinhos chamaram os bombeiros para eles apagarem
o fogo...”
“Lembro de um dia que minha mãe foi me visitar. Ela levou um brinquedo
para mim,uma tartaruga com rodinhas, aquelas que você coloca uma cordinha e sai
puxando ... mas um dia eu acordei de manhã e vi minha tartaruga queimada e
jogada lá fora...”
4° ENCONTRO: Cada aluno leu sua produção do encontro anterior. Todas as
leituras foram acompanhadas com bastante interesse pelos colegas, que fizeram
comentários e contaram situações semelhantes por eles vividas.
5° ENCONTRO: as carteiras foram distribuídas em círculo para a leitura do
conto As formigas, de Luis Vilela, do qual cada um recebeu uma cópia. Trata-se de
uma narrativa curta, que tem como personagem principal um menino que se diverte
conversando com as formigas que saem da rachadura da parede de seu quarto.
Esse mundo de fantasias é desfeito pelo pai que conserta a rachadura na parede e
provoca no filho uma grande revolta e frustração.
Após a leitura, solicitou-se aos alunos que falassem sobre as impressões que
tiveram sobre a personagem principal do conto e os motivos de sua revolta contra o
pai. Alguns temas comentados no segundo encontro foram relembrados pelos
alunos e associados à situação vivida pela personagem.
6° ENCONTRO: A atividade para esse dia era produzir uma história em
quadrinhos ou uma notícia de jornal adaptando o enredo do conto As formigas. O
trabalho foi realizado em duplas, depois ficou exposto por alguns dias na sala de
aula e, depois, recolhido. No texto abaixo, os alunos optaram por fazer uma
paráfrase do texto original.
“Na tarde do último sábado, 10, um pai rebelde acabou com a alegria do filho.
O menino adorava umas formiguinhas que moravam em uma rachadura da
parede do quarto. As formigas conversavam com ele e eram suas amigas. Mas o pai
não entendeu isso e vendo a rachadura a tapou com cimento.
Então o menino entrou no quarto e viu a mancha de cimento na parede, ficou
muito triste e o pai muito nervoso, mas a mãe pediu calma e tudo se resolveu.”
7° ENCONTRO: Cada aluno recebeu uma cópia do conto A incapacidade de
ser verdadeiro, de Carlos Drummond de Andrade. Paulo – personagem do conto – é
um menino conhecido pelas histórias incríveis que inventava e que, por causa disso,
era castigado com frequência. Certo dia, “... o menino voltou falando que todas as
borboletas da terra passaram pela chácara de Siá Elpídia e queriam formar um
tapete voador para transportá-lo ao sétimo céu, a mãe decidiu levá-lo ao médico”
(ANDRADE, 2009, p. 31). Após examiná-lo, o doutor conclui que o garoto seria um
caso de poesia.
Fiz uma leitura do conto para a turma e, percebendo um pouco de dificuldade
por parte de alguns alunos para entender o conto que, na opinião deles, estava
incompleto, não tinha sentido, falei sobre a importância de Carlos Drummond de
Andrade para a literatura brasileira e sobre o significado da frase proferida pelo
médico no final do conto.
8° ENCONTRO: Foi proposto aos alunos o seguinte tema para discussão:
Paulo era realmente um menino mentiroso? A turma foi dividida em dois grupos, um
para defender que Paulo mentia com intenção de enganar e outro para defender a
ideia de que ele não mentia, mas acreditava nas histórias que contava. A intenção
era de que, ainda naquele encontro, acontecessem as discussões entre os
componentes dos grupos, no entanto o tempo da aula se esgotou ainda durante as
explicações de como funcionaria a atividade, devido a dificuldade da turma em
elaborar respostas e argumentos sem materiais de apoio ou da interferência ou
opiniões do professor. Esgotado o tempo da aula, estabeleceu-se que a atividade
seria realizada no próximo encontro.
9º ENCONTRO: Retomou-se o assunto do encontro anterior e os grupos
reuniram-se para organizar seus argumentos e escolheram um dos componentes da
equipe para fazer a exposição. Os alunos sentiram muita dificuldade para elaborar
uma linha de raciocínio coerente e houve a necessidade de várias interferências.
10º ENCONTRO: O objetivo era realizar um exercício de oralidade em que um
representante apresentaria os argumentos que o grupo elaborara e, em seguida, os
demais componentes poderiam intervir. Apesar das dificuldades iniciais, a
apresentação ocorreu satisfatoriamente.
11º ENCONTRO: O conto A incapacidade de ser verdadeiro termina com a
frase “- Não há nada a fazer, Dona Coló. Esse menino é mesmo caso de poesia.” A
partir desse trecho, os alunos responderam individualmente à questão: O poeta é
aquele que mente? Na sequência, vários participantes leram suas respostas e
alguns comentaram as falas de colegas.
12º ENCONTRO: Fui com o grupo até a biblioteca da escola. Previamente,
havia selecionado um grande número de livros de poesia, os quais estavam
espalhados sobre as mesas. Os alunos puderam manusear os livros e ler o que lhes
agradasse. Cada um deles levou emprestado um livro de poesia e, como tarefa,
deveria selecionar o poema de que gostara e que comprasse a resposta à questão
proposta no 11° encontro.
13° ENCONTRO: Cada aluno leu e comentou seu poema.
14° ENCONTRO: Todos receberam uma cópia do conto Gricha, de Anton P.
Tchekhov. Fizeram a leitura do texto individualmente e em silêncio. Depois, li o conto
para os alunos e, por se tratar de um texto longo e repleto de palavras e expressões
pouco comuns para a turma, esclareci dúvidas sobre seu significado. O domínio do
léxico é fundamental para a compreensão do texto. Muitas vezes o aluno “não gosta”
do livro simplesmente porque não domina o significado de grande parte das
palavras.
15° ENCONTRO: Conversa sobre o enredo do conto que, assim como o
vocabulário, retrata situações incomuns em nossa cultura. Também apresenta uma
estrutura composicional mais complexa do que os textos anteriores. O narrador, por
exemplo, “fala” sob a perspectiva do menino Gricha, de dois anos de idade. Esses
aspectos não foram percebidos pela maioria dos alunos.
No mundo chamado quarto de criança, há uma porta que dá para um
espaço, onde as pessoas jantam e tomam chá. Ali, ficam a cadeirinha alta de Gricha e o relógio de parede, que existe unicamente para balançar o pêndulo e soar de vez em quando. Da sala de jantar, pode-se passar para um quarto com poltronas vermelhas. Ali, sobre o tapete, aparece uma grande mancha, por causa da qual se costuma, até hoje, ameaçar Gricha com o dedo. Além desse quarto, há um outro, onde não deixam entrar e onde aparece papai, uma personagem extremamente misteriosa! A babá e mamãe são compreensíveis: elas vestem Gricha,servem-lhe comida e deitam-no para dormir, mas para que existe o papai, não se sabe. Existe ainda outra personagem misteriosa: a tia que presenteou Gricha com o tambor. Ora aparece, ora desaparece. Para onde é que ela vai? Mais de uma vez, Gricha espiou embaixo da cama, atrás do baú e debaixo do divã, mas ela não estava lá... (TCHEKHOV, 1999, p. 144 – 5)
16° ENCONTRO: compreendidas todas as nuances do conto, alguns
quiseram repetir a leitura da história. Leu-se o conto pela terceira vez e, sanadas as
dificuldades iniciais, o enredo agradou bastante a todos.
17° ENCONTRO: A partir da atividade do terceiro encontro, os alunos
produziram um conto, empregando também seus conhecimentos, adquiridos
previamente, sobre os elementos que compõem uma narrativa.
18° ENCONTRO: Concluída a produção, todos os alunos leram seu texto que
foram recolhidos. Fragmentos de uma das narrativas estão transcritos abaixo:
“ ...estava engatinhando, observava minha mãe limpando a casa, ela lavando
a louça ... atrás da porta avistei um saco com bolinhas coloridas. Quando minha
mãe se deu conta, eu estava sentadinha comendo as bolinhas, na hora só vi o
desespero dela, eu havia comido veneno para adubar plantações ... Fiquei internada
seis meses, me alimentando por sonda, entre a vida e a morte...”
No decorrer das atividades foi sempre levado em consideração que a leitura
é um processo de interação entre leitor-texto-autor. De acordo com Angela Kleiman
“é mediante a interação de diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento
linguístico, o textual, o conhecimento de mundo, que o leitor consegue construir o
sentido do texto” (KLEIMAN, 2002, p. 13). Assim, a leitura é um processo ativo e
interativo.
3 Conclusão
Postos em prática todas as etapas previstas na Produção Didático Pedagógi-
ca e comparados os resultados aos objetivos pretendidos, pode-se dizer que estes
foram alcançados. Algumas vezes foi preciso reconhecer que atividades que pare-
ciam ideais no papel, na prática mostraram-se incompletas e, então, rever as estra-
tégias e conscientizar-se de que não existem modelos prontos. Em vários momentos
houve a necessidade de intervir, explicar, comentar e exemplificar, pois os alunos
não conseguiam entender o texto e ninguém gosta daquilo que não entende, como
confirmam as palavras de Angela Kleiman:
Ninguém gosta de fazer aquilo que é difícil demais, nem aquilo do qual não consegue extrair o sentido. Essa é uma boa caracterização da tarefa de ler em sala de aula: para uma grande maioria dos alunos ela é difícil demais, justamente porque não faz sentido. (KLEIMAN, 2002, p. 16)
Por se tratar de encontros dedicados exclusivamente à leitura, houve tempo
para auxiliar os alunos a compreenderem as relações, informações e significados
presentes no texto. Isso dificilmente ocorre na prática cotidiana das aulas de Língua
Portuguesa, já que os professores estão presos ao cumprimento de prazos de que
gerem notas. Além disso, a maioria dos professores ainda apresenta o texto literário
ao aluno e solicita que dele sejam retiradas informações, identificação de palavras e
da “mensagem” que o autor pretende passar.
Superados os contratempos, foi possível diminuir a distância entre os alunos
e a literatura. Eles conseguiram perceber que “... ao lermos um texto, qualquer texto,
colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que refle-
tem o grupo social em que se deu nossa socialização primária...” (KLEIMAN, 2002,
p. 10). Num primeiro momento, os leitores ficaram sensibilizados porque algumas si-
tuações vividas pelas crianças personagens dos contos lidos foram vivenciadas tam-
bém por eles na infância. Assim, pode-se confirmar que existe uma situação dialógi-
ca entre texto e leitores.
4 Referências
ANDRADE, Carlos Drummond. Contos Plausíveis. 9. ed. Rio de Janeiro: Best Seller,
2009.
BORDINI, Maria da Glória & AGUIAR, Vera Teixeira de. A formação do leitor:
alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988.
CALVINO, Ítalo. Porquê ler os clássicos? Lisboa: Teorema, 1991.
Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Portuguesa, Paraná, 2009.
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br
KLEIMAN, Angela. Oficina de leitura: teoria e prática. 9. ed. São Paulo: Pontes,
2002.
MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São Paulo: Companhia das Letras,
1997.
OSAKABE, Haquira. Poesia e indiferença. In: PAIVA, Aparecida (Org.). leituras
literárias: discursos transitivos. Belo Horizonte: Ceale, 2005.
Publicação da segunda edição da pesquisa Retratos da leitura no Brasil. Disponível
em: WWW.funarte.gov.br/literatura/publicacao-da-segunda-edicao-da-pesquisa-
retratos-da-leitura-no-brasil. Acesso em: 10/11/2010.
TCHEKHOV, Anton Pavlovitch. A dama do cachorrinho e outros contos. São Paulo:
1999.
VILELA, Luiz. Contos da infância e da adolescência. São Paulo: Ática, 2005.
http://WWW.funarte.gov.br/literatura/publicacao-da-segunda-edicao-da-pesquisa-retratos-da-leitura-no-brasilhttp://WWW.funarte.gov.br/literatura/publicacao-da-segunda-edicao-da-pesquisa-retratos-da-leitura-no-brasil
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