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2014O BandeirantePublicação mensal da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - Regional S.Paulo
A guerrilheira“De repente, o que se ouve de sua voz não é um hino
revolucionário, como, a princípio, se esperava, mas, sim, um
cântico de exaltação da natureza, uma esperança silvestre
resgatando o amor desgarrado, quase perdido, quase sequestrado,
compondo um coro de ternura, à primeira vista incompatível com o
matraquear cracracante e seco da luta armada, por uma liberdade
apenas divisada, ceifando cabeças e membros ao redor e a esmo.
Um cântico de entrega e desprendimento que transforma em causa
a justiça social, muito além da própria morte”
Leia a crônica de SÉRGIO PERAZZO na p. 3
“- Sou médico aposentado, já com os pés na eternidade. Por
força da minha profissão, fiz da minha vida um rosário, um
cordão de contas, alegrias e sofrimentos mesclados, sem
explicação. Enquanto isso, ela, a morte, sempre à espreita... Você
entende bem isso: é coveiro. Afinal, por que está desempregado?”
O conto de RODOLPHO CIVILE na p. 4
O papai noel ladrão
Naufrágio“O povo yorubá era protegido e abençoado, Xangô era o único
que tinha todos os poderes para protegê-los e às crianças que
cresceriam fortes e guerreiras como ele. Só ele tinha trânsito livre
pelos dois mundos que faziam a terra e que separavam-se entre
mortos e vivos.”
O conto de ROBERTO ANTONIO ANICHE está na p. 5
Visite nosso BLOG: http://sobramespaulista.blogspot.com.br
CAFÉHildette Rangel
Enger
5
DIA DE SOLAnienne Nascimento
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DIVAGAÇÃOJosef Tock
6
2 O Bandeirante - Março 2014
Jornal O Bandeirante
ANO XXIII - nº. 256Março 2014
Publicação mensal da Sociedade
Brasileira de Médicos Escritores -
Regional do Estado de São Paulo SOBRAMES-SP. Sede:
Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 278 - 7º. Andar - Sala 1 (Prédio
da Associação Paulista de Medicin a) - São Paulo - SP
Editores: Josyanne Rita de Arruda Franco e Marcos Gimenes
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Jornalista Responsável e Revisora: Ligia Terezinha Pezzuto(MTb 17.671-SP).
Redação e Correspondência: Rua Francisco Pereira
Coutinho, 290, ap. 121 A – V. Municipal – CEP 13201-100 –
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Colaboradores desta edição: (Textos literários): Anienne
Nascimento, Hildette Rangel Enger, Josef Tock, Roberto
Antonio Aniche, Rodolpho Civile e Sérgio Perazzo. (Fatos &Olhares): Márcia Etelli Coelho.
Tiragem desta edição: 300 exemplares (papel) e mais de
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Impressão e Acabamento: Expressão e Arte Gráfica
Editora - São Paulo
Josyanne Rita de Arruda Franco
Médica Pediatra Presidente da Sobrames-SP
Diretoria recebe anuidades 2014
As Pizzas Literárias da SOBRAMES-SP acontecemna terceira quinta-feira de cada mês, a partir
das 19h00 na PIZZARIA BONDE PAULISTARua Oscar Freire, 1.597 - Pinheiros - S.Paulo
É de R$ 330,00 o valor da anuidade para 2014, que poderá ser pago emduas parcelas de R$ 165,00, com cheques para março e abril. Para ospagamentos efetuados a partir de maio, o valor será de R$ 360,00. Adiretoria espera e agradece a contribuição de todos, pois esta é a únicafonte de recursos para manter as atividades da SOBRAMES-SP. O pagamentoem dia também garante a publicação de seus textos literários. Contatoscom a tesouraria: aidapdsb@terra.com.br
Adesões para Coletânea 2014As regras e condições para mais uma edição da tradicionalcoletânea bianual da SOBRAMES-SP, “A Pizza Literária -décima terceira fornada”, já estão disponíveis. Elas forampublicadas num BLOG exclusivo, que foi ao ar no final dejaneiro e que poderá ser acompanhado no endereço abaixo.Foram enviados e-mails a nossos autores e logo mais estarásendo enviada também por correio convencional. Noencerramento desta edição, oito autores já haviam feitosua inscrição.
As adesões vão até 31 de março e poderão ser inscritostextos em prosa e verso sobre qualquer tema. Cada autorpoderá contratar um mínimo de 5 (cinco páginas) da obra,não havendo limite máximo de participação. Para cadapágina contratada, o autor receberá 5 (cinco) volumes dolivro. O custo por página contratada é de R$ 70,00 (setentareais) e o total da quota do autor poderá ser parcelado ematé 7 (sete) vezes. Não perca mais tempo: prepare seusmelhores textos e inscreva-se hoje mesmo!
http://coletanea2014.blogspot.com.br/
21/03 – Helio Begliomini21/03 – Maria da Glória Civile
A Sobrames-SP tem se destacado com seus talentosos escritores em diversasagremiações e entidades literárias, variadas mídias e nas especiais eacolhedoras noites de festivos saraus que são as Pizzas Literárias. Osvisitantes encantam-se com o convívio alegre e fraterno reinante, onde têmoportunidade de ouvir a voz do próprio autor na apresentação do seu trabalhoe conhecer bem de perto autores premiados e profissionais destacados emseus ofícios. Uma experiência intimista única que remete aos tempos de umacidade um pouco mais silenciosa, um pouco menos movimentada, massempre pujante e com vocação para se tornar grandiosa, sem perder seuencanto no acolhimento de todos os estilos, todas as vertentes, todas aspropostas. Um jeito São Paulo de ser! Um jeito regional paulista de receber!Sejam bem-vindos.
O Bandeirante - Março 2014 3
Sérgio Perazzo
A guerrilheira
Os ossos não são mais os mesmos. Gemem opassar dos anos. Tempos de rastejar colinas. Desbravaro mato. Comer gafanhotos. Pensar ferimentos das longasmarchas. Secar frieiras. Digitais em passaportes falsos,como em filmes de espionagem passados na peneira desuspeitas de oficiais das SS ou de sentinelas imberbesde bochechas rosadas da Europa Central no auge daGuerra Fria.
Tempo clandestino. Tempo de fuga. Tempo dasredes de informações que cobriam o mapa das fronteirasda Guatemala e que se estendiam pelas estradas de terrade El Salvador, Nicarágua e Costa Rica.
No descanso da varanda sombreada detrepadeiras, algo desfiadas, no ângulo certo, num rápidomomento, quase imperceptível, o sorriso de pedra delábios cerrados, como que reconhecendo a reprise domundo em sua monótona sucessão de atrocidades jamaissuperadas, em mais uma passeata de protesto e palavrasde ordem massacrada pelo implacável poder constituído,algum dia destituído pelo apodrecimento dos anos.
No mais, o sorriso sempre se suaviza, sempre éadoçado pela página do reverso da mesma história quetransforma tragédia em anedota. Tempos heroicos.Tempos esquecidos. Tempos de alguma forma revividos.
Por isso mesmo, é capaz de ser deixada só naperiferia de um subúrbio qualquer de uma cidade
desconhecida sem se perder, apesar da falta de bússola,guia, sextante ou GPS. Sempre encontra, sem medo esem pânico, o caminho de volta. Sem senha. Semcodinome. Sem facão de mato abrindo picadas. Sembandana prendendo o cabelo e contendo o suor da testa.Sem fieira de munição de metralhadora cruzando o peitoà sombra de bananeiras.
Ninguém diria, sentindo a luz que emana do seurosto, que apagar qualquer brilho era o segredo desobrevivência da sombra clandestina. Ninguém diria quea palma rude esculpida de calosidades rompendo ascordas de alpinista, fosse capaz do calor das chacras,da suavidade reparadora e da brisa etérea que emanade seus dedos de lavadeira.
De repente, o que se ouve de sua voz não é umhino revolucionário, como, a princípio, se esperava, mas,sim, um cântico de exaltação da natureza, uma esperançasilvestre resgatando o amor desgarrado, quase perdido,quase sequestrado, compondo um coro de ternura, àprimeira vista incompatível com o matraquear cracracantee seco da luta armada, por uma liberdade apenasdivisada, ceifando cabeças e membros ao redor e a esmo.Um cântico de entrega e desprendimento que transformaem causa a justiça social, muito além da própria morte.O impulso muito perto da loucura. Tal entrega muito pertoda divindade. O ideal muito perto da determinação, daescolha e do acaso, juntando os retalhos de vida pessoal,de caminhos outros que a pudessem situar, por exemplo,numa faixa de areia à beira do mar ou num pico de neveno alto de uma montanha mais europeia que asiática ou,quem sabe, na folha de uma tamareira na miragem deum deserto.
Guerrilhas passam. Outras guerrilhas se fundam ese organizam. Planos de batalha são traçados na mesamapeada de comandos, bandeirinhas coloridasespetando as posições do inimigo.
Um dia vem que, pelo gemido dos ossos, o sorrisose suaviza com a reunião dos filhos deixados para trás enovamente recolhidos, aposentando a guerrilheira que,num vislumbre da claridade, reaparece entre as sombrasda varanda. Entre as flores das trepadeiras, numa cirandasazonal fertilizada pela chuva benfazeja do tempo e dahistória. Cochilar diante da violência recorrente doshomens? Nunca. Recostar-se entre tréguas do fogo dasbatalhas sem delas se tornar refém? Talvez. Deixar-semorrer? Jamais.
Para as guerrilheiras
da América Central,
sempre e para sempre
guerrilheiras
VENCED
OR
Prêmio
FLER
TS NEB
Ó
2013
4 O Bandeirante - Março 2014
O papai noel ladrãoRodolpho Civile
Na calada da noite, um vulto, sorrateiramente, pisa narelva ressequida da imponente mansão do Morro dos Ingleses,no Bexiga. Em seguida, o som agudo do estilhaçar de umajanela. A luz bruxuleante de uma lanterna de mão, percorrendoo ambiente. Até que... O encontro com uma cadeira de rodas.Nela, um velhinho de cabelos brancos como a neve.
- Opa! O que o senhor está fazendo aqui?- Eu é que pergunto, afinal a casa é minha! Qual o motivo
da sua presença, vestido de Papai Noel, quebrando a vidraçae interrompendo o meu sono? Ainda faltam cinco dias para oNatal!
- Peço desculpas! Não é minha intenção...- Então, qual é? Entrar na casa dos outros é crime!
- O senhor tem razão, mas, eu não sou ladrão. Estouprocurando...
- Procurando o que?- Uma boneca que vira os olhos e fala “papai e mamãe”
e também um trenzinho elétrico para dar aos meus filhos.- Então, por que não foi procurar numa loja de
brinquedos?- Aí é que está o problema... Não tenho dinheiro, estou
desempregado.- Qual é a sua profissão?- Coveiro.- Puxa que bela profissão!- A minha mulher quer que eu mude... Por falar nela, eu
gostaria de presenteá-la com um relógio de pulso, mas, é tudotão caro... O senhor pode me ajudar, mesmo que seja umempréstimo? Um dia, eu prometo pagar.
- Que piada! Como posso acreditar em você? Entra emminha casa, quebra uma vidraça, vestido de Papai Noel... Afinal,por que escolheu esta casa?
- Nesta região, só dá gente muito rica. Escolhi a suacasa por ser muito bonita!
- Demonstra bom gosto!- Que adianta ter bom gosto sem dinheiro?
Desempregado como estou... Não encontro outro emprego...- Isto é verdade... O grande escritor italiano Giovanni
Papini disse que “o dinheiro é o estrume do diabo”. Ninguémvive sem ele...
- Por favor, o que quer dizer estrume? Eu só tenho oprimário.
- Ah! Estrume significa bosta, merda.- Agora, sim entendi! O senhor fala muito difícil...- Bem...Vamos pular esta parte. Qual é o seu nome?- Dimas.- Que coincidência! O mesmo nome do bom ladrão que
foi crucificado com Jesus Cristo, de acordo com os evangelhos.- Ele deve estar no Paraíso! Enquanto eu estou na Terra,
ou melhor, no Bexiga, tentando conseguir uns brinquedos...
- De qualquer maneira, é melhor do que ser crucificado.Mudando de assunto: você está com fome?
- Muita!- Então vamos até a cozinha. Apague a sua lanterna.
Na cozinha.- Olhando o seu rosto ...Você é jovem. Precisa fazer a
barba!- Mas, Papai Noel tem barba branca e comprida!- Onde conseguiu esta roupa?- Num brechó. O senhor está sozinho?- A minha filha e o meu genro foram a um baile. São moços.
Devem aproveitar a vida, enquanto ela sorri.- Isto é verdade... Velho só fala em doenças, remédios e
morte. Não sei se é o seu caso...- Sou médico aposentado, já com os pés na eternidade.
Por força da minha profissão, fiz da minha vida um rosário, umcordão de contas, alegrias e sofrimentos mesclados, semexplicação. Enquanto isso, ela, a morte, sempre à espreita... Vocêentende bem isso: é coveiro. Afinal, porque está desempregado?
- Sorte sua que é médico! É duro suportar um coveirochefe, briguento, implicante e mandão. Um chato! Tão chato,que até os mortos perdem a vontade de serem enterrados!
- Nossa! Gostei de sua explicação. Bem original! Dequalquer forma, cada Ser tem neste mundo um destino...
- É verdade! O meu é de ser um Papai Noel de saco vazio.- O extraordinário, meu amigo, é saber que num saco
pequeno e vazio podem morar os sonhos, as ilusões, a felicidade...- Principalmente para os meus filhos! Por este motivo,
não posso decepcioná-los e estou aqui, conversando com odoutor.
- Não é necessário o título, só o nome: Jorge. A partir dehoje, somos amigos. Você conseguiu afastar de mim a minhainimiga, a solidão. Velho só vive assoprando as cinzas do passado.E elas só trazem sofrimento.
- Mas isto não leva a nada... Tudo acaba na terra... Nistotenho bastante experiência.
- Você tem medo da morte?- Não! Ela me ajuda a ganhar o pão.- Bem, visto deste ângulo, você tem razão! Você é um
verdadeiro sábio!- Que exagero! Eu sou um simples coveiro, atualmente
desempregado, com o firme propósito de levar sonhos,naturalmente, dependendo de sua colaboração! Não vai lhe fazerfalta alguns brinquedos...
- Um dia, no futuro bem distante, sem pressa, quando eubater os “borzeguins” e, por acaso, você for o coveiro...
- Ah, eu o enterrarei, com muito prazer! Considerando anossa amizade...
- Gostei da sua franqueza e solidariedade! Estouprofundamente impressionado!
- E disposto a me ajudar?- Sim! O que lhe falta, eu tenho aqui encaixotado, sem
uso, mofando.- Então, eu vou lhe fazer um favor...- Exatamente! Que faça proveito! E, para completar, darei
um relógio de pulso que pertenceu à minha falecida esposa.Estará melhor no pulso de sua amada. Por favor saia pela portada frente, para não quebrar outra vidraça. Apareça sempre! Sónão quero vê-lo no cemitério!
Lá fora, uma intensa neblina cobria o Morro dos Ingleses.O passo cadenciado do guarda da rua... Ao vê-lo
- Boa noite, Papai Noel!- Boa noite! Feliz Natal para você sua família!
Com um ligeiro aceno, Papai Noel sumiu na densa bruma.
Menção
Honr
osa
Prêmio
FLERT
S NEBÓ
2013
O Bandeirante - Março 2014 5
NaufrágioRoberto Antonio Aniche
As crianças corriam nuaspelas matas, pelas praias e riosespalhando o riso alegre comoborboletas voando entre plantas.Cada criança, cada par de mãoseram como uma nova esperança dealegria, fartura e progresso paratodo o reino de Oyo (hoje Nigéria).
Xangô, grande guerreiro setornava bondoso e não conseguiaimpedir um sorriso largo que sederramava em cada criança, paravaos trovões, descansava seumachado, tornava-se no coraçãoirmão daquelas crianças que corriam, brincavam. O olhar deXangô era o sol escaldante, mas a pele negra já era íntima docalor extremo, e mesmo assim, era a luz protetora daquelascrianças que se multiplicavam como pássaros para tornar anação cada vez mais forte.
A pele era o orgulho, resistia ao sol e se banhava naágua morna dos rios embaixo da proteção do seu olhar. Somenteelas conseguiam dominar a valentia e a violência de que Xangôera detentor, o destemido governante que se enternecia com oriso e as brincadeiras dos filhos de sua nação.
O povo yorubá era protegido e abençoado, Xangô erao único que tinha todos os poderes para protegê-los e àscrianças que cresceriam fortes e guerreiras como ele. Só eletinha trânsito livre pelos dois mundos que faziam a terra e queseparavam-se entre mortos e vivos.
Numa tarde quente, Xangô foi traído. A nação foi pegadesprevenida, seus guerreiros foram emboscados, mortos,capturados, mutilados. As mulheres, amarradas às crianças,violentadas, agredidas. Capturados como animais. Tratados
Menção
Honr
osa
Prêmio
FLERT
S NEBÓ
2013
como animais. Presos, colocadosaos montes em porões de navios.Crianças chorando, mulheresgemendo. Os mutilados foramdeixados para trás, muitos sejogaram ao mar preferindo morrera viver em cativeiro.
Não havia mais a luz doolhar de Xangô para iluminar suasexistências reduzidas a simplesdestroços humanos amontoados,misturados a fezes e excrementos,a cadáveres que jamais seriamenterrados.
Xangô encontrou a Naçãoqueimada, filhos e irmãos mortos,
e gritou. Gritou muito com a força do trovão que ecoou pelaterra e pelo mar. Chorou com as lágrimas furiosas da tempestade.Toda a sua valentia converteu-se em ódio vingativo. Xangônunca suportou a traição e foi buscar a justiça para quemtraiçoeiramente desafiara sua força.
A tempestade fustigava o navio negreiro com uma fúriasem igual. O capitão e os marinheiros jamais haviam vistosituação tão violenta, um mar tão revolto que balançava o barcocomo um brinquedo na lagoa. O medo se apossara de todos.
Xangô se aproximou e com seu machado rompeu o navioao meio, enquanto todos imploravam pela proteção divina. Oterror se estampava em cada tripulante com a certeza da mortecerta. A carga do porão, apinhada, amontoada, ferida de morteem sua alma sorriu com a presença de Xangô, que de um sógolpe libertou todos os seus filhos e irmãos, enquanto Yemanjárecolhia a todos embaixo de seu manto de luz e bondade.
Estavam todos novamente livres para correr pelas matasdo outro mundo...
O cheiro de caféPelas manhãsMe leva a viajarPelos caminhosDa infância... Caboré de barro,Coador de panoFogão de lenha,abano de palha E o pai abanando rápidopro fogo ficar mais forteE ferver depressa a água do café...
Barulho de panelas
a mãe sonolenta fazendo cuscuz
Eu acordando contenteCom sons e cheiros da cozinha
Anunciando um novo diaPara descobertas.
Agora basta apertar um botão
Para o cheiro aparecer...Silenciosamente...
Não mais o pai
Nem a mãe na labutaNão mais alegrias
Ao amanhecer
Restaram lembrançasQue saltitantes chegam
Para me salvar...De entristecer
CaféHildette Rangel Enger
6 O Bandeirante - Março 2014
Lindo domingo de sol. Chove torrencialmente
em mim. O dia está brilhante e vivo. Os relâmpagos
e trovões de minh’alma parecem querer acordar a
mulher morta.
Abro a janela do quarto e o intenso azul do
céu me deixa tonta. Por dentro noite e ventos fortes.
Um céu sem nuvens entremeado pelo colorido das
pipas a sorrir para mim, a zombar de mim?
O que fazer? Minha casa fica a poucos
metros da praia, por que não sair para olhar o mar?
Olhar para fora de mim. Quem olhar através das
janelas de meus olhos chamuscados de chuva verá
escuridão e medo, desolação e choro.
Visto o maiô, o vestido de praia, coloco os
óculos escuros, as sandálias e o chapéu de palha. Aventania interna continua intensa. Vou caminhando
e olho ao redor. A chuva de granizo começa a cair e
machucar o espírito. Caras sorridentes passam por
mim. Turbulência na mente. Cangas esvoaçantes
parecem andar sozinhas. Desequilíbrio no peito.
Ao chegar à praia aprecio a paisagem,
minha velha conhecida. O mar de um belo azul
esverdeado tira meu fôlego. O fôlego escasso pela
desordem que me habita.
Na praia de areias brancas e finas, baldinhos
com cores vibrantes falam por si. Perturbação me
domina. Crianças brincando. Instabilidade do eu.
Famílias felizes.
Dirijo-me ao mar. De perto a água é tão clara
que é transparente. Peixes pequeninos vêm beijar
meus pés . A tempestade devastadora arranca
árvores sem deixar raízes, mas destruição em mim. Aminha pele sente a carícia dos peixinhos tingidos
Eu queria ter quatro braços,para poder te abraçar.Eu queria ter duas bocaspara poder te beijar.
Tua alma artista,gostaria de pintarnum quadro bem grande,para com quatro mãos segurar.
Tua bondade infinitagostaria de proclamar,
e teria duas bocaspara mais poder falar.
O meu amor infinitogostaria de perpetuar
e queria ter dois coraçõespara um poder te doar.
DivagaçãoJosef Tock
Dia de sol, dia de tempestadeAnienne Nascimento
Experimente ler este texto
assim: primeiro leia-o
completo; depois leia apenas
as frases em negrito;
finalmente, leia apenas as
frases em itálico.
de cor e brilho colossais. Sinto os carros revirados,
as casas derrubadas, as barreiras desabadas...
Retiro o vestido. Deixo os óculos, as sandálias
e o chapéu na areia. Mereço um mergulho. E esse
mar de possibilidades? Infinito mar... Infinitas
possibilidades...
Braçadas enérgicas na vastidão da água me
levam em direção ao horizonte. Tornados e tufões
agitam minha essência e a natação transforma meus
sentimentos em atos vigorosos. Repentinamente o
temporal torna-se longínquo, distante, fantasioso, como
numa tela pintada a óleo. A água salgada lambe meu
corpo. As trevas me invadem bruscamente. O oceano
me envolve e me abraça. Eu estou em trevas. Um
abraço morno e aconchegante no corpo inteiro. Eu
sou trevas e incompetência para suportar a borrasca
em seu clímax. O organismo canta com um desmedido
prazer. Sou trevas e incompetência para sentir a
tormenta em seu auge. Meu corpo sente o júbilo e o
bem-estar de “estar”. Trevas e incompetência de “ser”
um sofrer infinito. Mulher em gozo e o clamor por
misericórdia.
Paro cansada e me ponho a flutuar. Corpo em
regozijo. Nasce em mim a luz dourada da aurora.
Permito-me ficar assim por alguns minutos. Deságua
em mim calmaria. Longos e infinitos minutos a boiar.
Interior em ruínas. Volto a nadar em completa
devastação. Olhos no céu sem nuvens. Sou escombros.
Estou de volta à beira do mar com o olhar no horizonte
e o amanhecer renasce com um arco-íris de sonhos em
mim.
O mundo continua igual. Eu, em
(re)construção.
O Bandeirante - Março 2014 7Livros em destaque
ANIENNE NASCIMENTO“Memórias de uma cortesã”Edição da autora - ALRomance que conta as aventuras edesventuras de uma prostitutafrancesa que viveu no período detransição do século XIX para o séculoXX. Com maestria, a autora conduzsua personagem pelos meandros daBele Èpoque, numa narrativa plena deerotismo que mantém a atenção doleitor desde a primeira página. Saibamais sobre a obra e a autora napágina do facebook https://www.facebook.com/MemoriasDeUmaCortesa.Aquisições e contatos:
anienne.petrus@gmail.com
SÉRGIO PERAZZO“Psicodrama - o forro e o avesso”Editora Ágora - SPCom ideias originais e inovadoras,Perazzo subverte os conceitos jáconsagrados do psicodrama e osrenova. O resultado dessa "costura"de teoria e prática é um ricomosaico do psicodrama brasileirocontemporâneo. A leitura permiteque o psicodramatista se atualize,sistematize sua prática e entre emcontato com um novo olhar sobre opensamento moreniano e pós-moreniano. Maiores informaçõescom o autor: serzzo@uol.com.br.Aquisições:www.livrariasaraiva.com.br
“...Era mesmo muito hábil
essa menina. Como, aliás,
toda menina estuprada. E
tinha plena consciência de
que a manipulação era a
semente da desonestidade e
da falta de ética...”
O trecho abaixo é parte de uma poesia de um dos autores daSOBRAMES-SP, já publicado anteriormente numa de nossas
COLETÂNEAS. Você consegue identificar o autor?Resposta na próxima edição.
Esta agenda está sujeita aalterações em decorrência defatores não previstos quando
de sua elaboração
Endereços e horários
Pizzas Literárias:Pizzaria Bonde Paulista. Rua OscarFreire, 1.597 - a partir de 19h00.
Balada Literária:APM - Espaço Maracá - Av. Brigadei-ro Luís Antônio, 278 - 11º. andar -das 18h30 às 22h00
Reuniões de Diretoria:Sede da SOBRAMES-SP na APM -Av. Brigadeiro Luís Antônio, 278 -7º. andar - Sala 1 - às 19h00
PIZZAS LITERÁRIAS
JAN - 16FEV - 20MAR - 2OABR - 24*MAI - 15JUN - 26*
JUL - 17AGO - 21SET - 18OUT - 16NOV - 13*DEZ - 18
Realizadas na terceiraquinta-feira de cada mês
*ATENÇÃO Em virtude deferiados, as datas das reuniões
de Abril, Junho e Novembroforam modificadas
CONGRESSO NACIONAL
OUT - 08 a 12 Recife - PE
ELEIÇÕES
JUL - 17 - Prazo final para ainscrição de chapas concorrentes
SET - 18 - Eleição
BALADA LITERÁRIA
MAI - 30 NOV - 07
COLETÂNEA 2014
FEV Divulgação das regras einício das adesões de autores
NOV - 07 Lançamento
REUNIÕES DE DIRETORIA
Primeira quinta-feira do mês
O trecho da edição anterior pertence ao conto
“PERFUME DE ESTREBARIA”, de Carlos JoséBenatti, que foi publicado na página 49 da coletânea “APizza Literária – nona fornada”. Que tal reler esse contona íntegra, além de outros textos de Benatti e dostalentosos autores da SOBRAMES daquela edição?
Relendo
REALIZADO
...T...T...T...T...Tu eras a joia vivau eras a joia vivau eras a joia vivau eras a joia vivau eras a joia viva
Em corpo esguio engastada, Em corpo esguio engastada, Em corpo esguio engastada, Em corpo esguio engastada, Em corpo esguio engastada,
De imaginação ativa,De imaginação ativa,De imaginação ativa,De imaginação ativa,De imaginação ativa,
Bom companheirBom companheirBom companheirBom companheirBom companheiro de estrada,o de estrada,o de estrada,o de estrada,o de estrada,
Pura alma abençoada!...Pura alma abençoada!...Pura alma abençoada!...Pura alma abençoada!...Pura alma abençoada!...
PRÊMIO FLERTS NEBÓ 2013Uma antiga revolucionária, um navio negreiro eum Papai Noel diferente são temas dos textosque conquistaram o Prêmio Flerts Nebó entreguedurante a Pizza Literária de fevereiro. Valeconferir: Primeiro Lugar – “A Guerrilheira”(Sérgio Perazzo). Primeira Menção Honrosa –Naufrágio (Roberto Antonio Aniche). SegundaMenção Honrosa – “Papai Noel Ladrão”(Rodolpho Civile). Publicados nesta edição.Comissão julgadora: Gabriel Kwak, Fabiana deAlmeida, Nilva Mariani e Rosa Maria de BritoCosenza.
POSSESheila Regina Sarra tomou posse como
membro titular da Sobrames-SP na Pizza Literá-ria do dia 20 de fevereiro. Helio Begliomini fez
a apresentação da nova confreira, quelogo após prestou seu juramento.
Seja bem-vinda!
SUPERPIZZAA reunião literária de fevereiro teve uma expressiva
presença e foi muito festiva. Dentre as muitas atraçõesda noite, aconteceu a entrega do mimo pela Superpizza
em homenagem a Vinicius de Moraes, cuja vencedora foiJosyanne Rita de Arruda Franco. Em poucas palavras,ela manifesta o amor pelos filhos no embalo dos lindos
versos de “Garota de Ipanema”.O texto já foi postado no Blog:
sobramespaulista.blogspot.com.br
NOVOS ASSOCIADOS
CONGRESSOEstão abertas as inscrições para o XXV
Congresso Brasileiro de Médicos Escritores queacontecerá de 8 a 11 de outubro em Recife-PE,juntamente com o IX Congresso da UMEAL.
Informações no site da regional:sobrames-pe.webnode.com
SHEILA REGINA SARRAMedicina do Trabalho eArquiteturaReside na capital paulista.Nascida em 9 de novembrode 1958. Graduada pelaFaculdade de Medicina daUSP em 1981, vemdiversificando seus estudos ehoje cursa Arquitetura naFaculdade de Belas Artes.E-mail:sheila_sarra@hotmail.com
Às novas confreiras as boas-vindas, na certeza de que o talento literário de ambasvirá engrandecer e muito a nossa regional e a SOBRAMES de todo o Brasil.
ANIENNE BARBOSA GUSMÃODO NASCIMENTO
InfectologiaNatural de Rondonópolis-MT,
(18.05.1971) migrou com a famíliapara Maceió-AL, aos 3 anos, e láreside até hoje.Graduou-se pela
Universidade Federal de Alagoas -UFA, em 1995. Autora do romance
“Memórias de uma Cortesã”, étambém poeta e prosadora.
E-mail:
anienne.petrus@gmail.com