Post on 07-Sep-2015
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MQUINAS DE RITMO /////////////////////////////////////
PEOMAS, de
RENATO MUSSUMO,
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
suprasSUMO DO SUCO
DA LARANJA ESPRIMIDA
EM CONTRIBUIO ABSOLUTAMENTE DECISIVA
PARA O NECESSRIO,
LENTO E GRADUAL
DESMONTE CIVILIZACIONAL
2014
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
PARTE AURAL- DIANOIA -
TEM QUE LER EM VOZ ALTA (SE NO LER EM VOZ ALTA NO VALE)
A morte & seus mortinhos
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
1.
Os mortos voltaram de Osasco, de van,
onde no encontraram
aquilo de que se precisa
(desodorante, tabasco, fitas adesiva
e do Djavan)
2.
o cncer
come quieto,
por de dentro
uma parte sua
que se alheia,
esquece como se morre
massa em-
barrigada que
se alastra
se c arranca
o naco
do neoplasma
desembestado
ele volta, puto, rindo,
te toma tecido, sistema,
organismo,
tudo que te tem
(eeu ser mortal, hein?
entimema ousilogismo?)
2.
e morre sempre um mundo
quando morre algum,
alis
(morrem os pases todos,
celebridades, a cor lils, cachorros, baleias, refres, os doze grandes, programas de auditrio, cotoveladas;
tudo que o caso,
a diferena entre tangerina e laranja, suspensrios, meles, dios destilados, a Polnia)
alm das
colnias, ecossistemas,
das usinas dentro da gente,
(mundo persistente pra
tanto bicho)
tem ainda
os morfemas
de cada um,
toda qualia que no se quina
direito,
o nicho,
mortalha
individuada
de tudo quanto h
praquele espcime
se apresentar
o filme que sai
daqueles poros, circuns-
-crito naquele domo,
trilha em estreo
dentre
dois ouvidos
encerrrada,
de timbre, partitura
e andamento
dodos
mesmo que mal
fingido, mal produzido,
distrado, trreo,
todo implodido, num instante,
mortos todos figurantes
3.
ento
tambm se morre
em quem se ama,
quando eles se vo
uma verso nossa,
um jeito da gente se dar,
avatar,
voz que j
se sabia
como conjurar,
que tambm engolida
pelas dobras frias
indo,
voltando
em queda
continuada
(pedras de sono, todas as mais feras
cadeias de carbono enganchadas)
4.
e falta nenhuma dessas
preenchida,
(no de verdade, nunca)
te seguem como tua nuca,
os teus mortos, bafejando
quente (no cangote, mesmo,
s vezes), gritando, soltos
teus avatares antigos, dodos,
acumulados feito
nota de rodap
em livro que ningum
vai ler de novo
no so sutis,
nem dormem,
so muitos, andam por a
em bondes, dividem txis,
se atiram ao oceano,
enchem estdios,
s pra melhor te acompanhar
por todo canto, pra melhor
te encher o saco
dizem, sempre,
as mesmas coisas:
"seu mundo feito
dos seus mortos, viu"
"os limites do seu mundo
so os limites dos seus mortos, hein"
etc
e, de fato,
querendo ou no,
sempre eles, os fela,
acenando do fundo, aos montes, tortos,
em qualquer foto, espelho, tela,
vitrine de rua, gua empoada;
mesmo esguelho,
domingo, p de cachimbo,
os mortos organizam uma gincana,
enchem uma bacia
que j quase entorna,
(a expresso sacana,vazia,
ttrica)
p em gua morna, cai a tardinha,
o mundo caminha pra morte trmica
Cultura
//////////////////////////////////////////////
este o ritmo da noite
(soa solene e tudo,
mas na verdade Corona,
banda eletrnica
com cantora
brasileira
dos anos
noventa)
a gente mquina
de diferena
e repetio
(umas coisas funcionam,
outras no)
desde criana
que me levam
pros cantos de carro,
e estes tinham rdios
que reproduziam, em sua maioria
o que se despejava,
de continers
das grandes naes industriais
eu uma criana incomumemente alegre
(sorrindo em todas as fotos
at os sete)
cabea de cera, de massinha
dctil, plasmvel ainda
sendo impressa com qualquer merda
que desse na telha
d'algum cheirado californiano,
aceito com jab por outr'alma
(to pouco escrupulosa quanto)
derramada
numa cascata tcnica
do tamanho, pelo menos,
de alguns continentes
tem quem diga
que tudo que a gente
vai ser na vida
se deriva, na real,
das modificaes que fizemos
at os dez, onze anos
tumba familiar
sempre rebentando
dos mesmos fantasmas,
toda primavera
todo o resto recombinando,
vera,
umas mesmas faltas
(e preenchimentos)
j furadas na folha
este o ritmo da noite,
ento, aprende-se,
seus cantos, bolhas;
foda-se, sigamos
a gente mquina
de diferena
e repetio
(umas coisas funcionam,
outras tambm)
vinte um anos depois,
eu nem tinha bebido muito,
a msica da festa tarra muito ruim,
indiezinho lixo que no se dana
nem fora,
eu no aguardo que algum mude,
vejo chegar uma bicha ferssima
espalhafatosa reclamando (fantasiada de imperador galctico,
ou coisa que o valha), meio rude
do que eu espero que seja a mesma situao, sendo
guiada por algum que v graa,
vai at o computador, no cho,
e ao que vai se agachando,
morre a anterior, eu ouo
mude j essa atrocidade
antes que eu te aoite, v
(*)
cacete, adoro essa msica
jesus humilha satans,
j foi-se, j
esse o ritmo da noite
Boi
feito por cima de um poema comprido do Octavio Paz
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
a noite vai baixando suas pestanas
em So Paulo,
desce ruas, prdios,
pernas de relgios, persianas
caminha como um rio, uma rvore
(eu hoje tou facinha, viu), me fala
como se fosse um rio, rvore,
desses deuses marrons e tmidos
(linhas como pintos moles,
cocs, a prosa tardia do
Henry James , aquela tia,
trgida como uma tarde,
e absolutamente clara,
espacializada, espada
sem lmina, quente,
s corte,
tempo no qual
no passa nada,
exceto
seu transcorrer ditoso,
prprio, mugido
imenso, auto-envolvido,
proceloso arco dodo
na sua curta viagem
at a morte,
o sentido do passado
esterco repisado
at virar estrada,
(Yama em seu touro
que caga e anda),
bunda de javali
respingada de lama;
uma caamba,
barro com vidro
quebrado, grama,
os caralhos quietos,
curvados, guardados em pijama,
assim como suas contrapartes
negativas
(que j os contm em potncia
expressiva, sendo,
portanto, formas superiores)
tambm silenciosas, folhas dobradas,
maiores e menores,
os silncios respectivos
do juiz, do criador de empregos, do ncora,
assim como das verses fmeas
do mesmo chiaroscuro escroto,
de todos homens de terno,
seus apndices rotos, engastados,
(pra quem tambm chegam as noites, sempre),
sociedade civil desativada,
cemitrio vivo de toda
figura retrica engessada
posta em braso, maiscula,
leo ou gesso, mrmore, escrotismo etnocntrico,
camisa com numero, logo da Lacoste et caterva
fins e comeos esticados
na barbrie cromada
to bem ps-produzida
dos seus sonhos
medocres, cancrescentes
(batcaverna e casa da barbie, mesmo;
quase sempre;
os avs do imprio tramando
tudo sculos atrs, num transatlntico, bbados)
do outro lado
o fumo que sai das boas intenes
de todas gentes, pndegos,
bem fraseadas, chiques,
aparato crtico fumoso
dependurado em cima
como cumulus nimbus,
as slabas arrastadas
dum mesmo senhor tsico
durando dcadas, preenchendo
pra sempre
auditrios mofados
do interior de vastos gigantes
subdesenvolvidos (mofados nas juntas, com infeco urinria)
c nem me venha
com coisa nenhuma,
nem diz nada,
tudo bem, calma,
eu sei, nem cheirar cheira, tampouco,
s gera um acmulo gorduroso,
quando muito,
na grelha da ventilao, com os anos,
mas as cidades se compem,
de fato, dos monumentos todos,
atos de fala
mal enrijecidos
em jeito de corpo,
memria depositada
em rua e escada, praa
o musgo da vida alheia, traa
que no se investiga;
as reverberaes
de atos nossos
cumpridos nos outros, atravs dos outros,
por meio dos corpos dos outros,
redes extensas de aes
em teias de linhas entrameadas
irradiadas a partir de tantos centros,
dendritos que se puxam sem
que se entenda quem puxou quem,
ou por qu, direito; s vezes
(boa parte do tempo)
vizinhanas inteiras acendem,
cristalizam por tempo demais,
a morte,
po de todo mundo,
se reparte, sim,
mas tem quem
morra bem mais
que outros,
e tem quem puxe mais cordas
da mquina-moinho
do mundo,
com mais fora, no mnimo,
digamos (estou
dedando, olha s,
tenho at listas, se
quiserem, .ppts)
mas tudo se comunica,
nos dois (ou trs)
sentidos, de quem
fala oi, de vasos
interligados, na frase
ouvem-se
as fontes debaixo da terra, por exemplo)
razes abraam terra
desesperadamente, sempre,
os ps quietos, presos
de todos escravos energticos
em suas cadeias infindas
de produo, e ainda
a gua contnua
de pronome
que s'entrelaa
at que some
persistindo s
a cadeia extensa,
organismo de organismo,
teia densa, inteira
que a coisa toda,
o meio, tempo,
o quarto lado
onde se assenta tudo,
manancial que
dissolve rosto,
lineamento, encurva pedra,
relgio, continente
faz seu caimento
mono nas costas
qu'insiste at s restarem
as bordas lisas, redondas,
d'ua massa mamfera,
de ossos moles, quebradios,
nariz afundado na cara
cheia d'gua, gordura,
poros,
ventos, braos,
gnglios, colnias
de seres l dentro,
fantasma, espelho & alapo,
(pelo menos);
culpa nenhuma, no
(nasceu,
em teus meios to
teus fins, viu,
teu,
levanta essa bunda,
escova os marfins)
o meu boi morreu,
que ser de mim
vamo buscar outro, maninha,
l no Piau
Rebote
////////////////////////////////
isso,
aparato que atua
reiterando a si mesmo
(e ainda assim, ainda assim
fora de toda fora,
a dentro)
fort da, jogo
de desaparecimento,
repetio e controle,
(da morte?
da morte)
o isso, a parte no-viva, toda ela,
voltada pra frente, pra fora
agora
"vai"
eu disse (acho que pra lua,
mesmo), isso
num aparato que atua
reiterando a si mesmo
pseudomonarchia daemonorum
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
*presto
nessa
giganto-
maquia
corporativa
da qual
somos
todos sindoque
no tem
anarquia,
preza
de cannabis sativa
que salve, sempre,
a f no que
se d de ver,
agigantado,
mal feito o teatro
de sombra
com mo alheias, em vultos,
bichos, feias
agregaes
pentagonais,
mema-lombra
mal compartilhada,
demonhos so comerciais, bisso,
os que agem atravs dos sonhos,
diz Giordano Bruno
c me falou, uma vez, rino
to l em cada nicho,
telha
(teto, pano
pra se costurar misria, esticar em surdo,
credirio mudo),
concreto que preenche a grelha
de carrinho de supermercado
cada vo preenchido por espuma branca-
cinzenta
que cai sobre si mesma, endurece,
esfria,
punho j'erguido
previsto na summa
gestual pr-comentada, por sua vez
contida numa
gosma rosa, mecanicamente
recuperada, gelatinosa e frita,
pantomima (que-tudo-imita) geral
passada pelo rolo-compressor,
arquibigorna carimbada
ACME no pobre pulha
coiote-coi que se narra,
a marra tantriteando
toda rima j feita, certa,
assim como toda quebra
de linha ou expectativa,
jeans pr-rasgado,
pblico cativo, trao,
gatilho travado dum
efeito de superfcie
num demogrfico dos vrios
nada que ameace
os boneco esturricado de gesso
que to que gritam
que so
o fim e o comeo
tem tanto tempo
o volume no talo, o santinho,
que a gente
chega vai acredita,
grita um coro que no tem outra forma eficiente
de tcnica de crena coletiva, ao que parece,
prum lugar to grande, vasto,
amplamente peitado
alm
desses bales a mesmo,
que mal se arrastam, presena
esvaziada, sim-e-no, tios
quebrando de sono, silncio,
ningum senta no trono,
mas ningum caga nele,
tambm?
Cis juram?
o capital literal, alis, nem precisa
de nada disso,
no,
seu imprio sendo
procedimental,
exatamente igual
sua extenso)
quase se esquece
(neguinho)
que ns somos aquilo que os mortos sabem
- nume, estandarte, canto, esses bau -
e que os mortos
(essa parte eu garanto)
sabem de tudo
cha-blau
MADAME PSICOSE
para o AUGUSTO, entre outros
////////////////////////////////////////////
I
at onde eu entendo
do budismo e da metempsicose
(dos quais eu no entendo
nem o budismo
e nem a
metempsicose)
que formas se repetem,
e forma (com
o que eu digo matria)
tudo o que tem,
(alm dos vazios
aos quais correspondem;
o quadro que, depois de visto,
aparece fora dele,
todos
os teus entres)
palavras so
coisas pedaudas,
tem algo como vida prpria
e so o que elas so,
sem nada dentro
isto,
vcuo e vento,
como dois mais dois
outra maneira
de dizer
a diferena
entre trs e sete
(o infinito pela metade,
de p;
um beque, uma rede -
a ttrade)
II
se a gente
mais falta
que presena,
mais o ar dentro do balo
do que o seu contorno
expressivo,
ento os movimentos
que a gente faz,
e os que a gente leva consigo
tudo furaco que assovia vento,
faltas dirigidas, carregadas
em peidos,
ondas,
(o mundo se despedaa em fatos!, grita um morto),
o alcance do teu corpo,
lombra,
todo
encaixe eventual de tu mesmo
com os teus contextos,
(quase sempre
alheios,
quando rolam)
so tudo o que
a gente consegue ser;
o que d, ou anda dando,
de significar
(cabendo a, claro, pelo menos,
mundos)
e isto tudo pra dizer
que voc j parece ter sido
um cachorro
(o que eu digo, claro,
como um elogio,
cachorros das melhores
agremiaes possveis
de matria)
isso pela disposio
a que seu corpo
se apresenta
(ou que das disposies
s quais seu corpo se apresenta,
este conjunto de efeitos,
esquema
tende a se afirmar mais que outros)
a sucesso
o que existe,
e seus sons,
os deuses
que se lhes decorrem
todos (sem exceo)
tem gente
que repete jabutis,
mesas de mogno, bestirios medievais
inteiros, cotovelos quando enrugados,
cotovelos quando pontiagudos, comentarista de portal,
algum dos menudos,
itens vo se acumulando
como avatares num pico
de trs mil pginas e contando,
sem soluo, dialtica
(muda at a fonte,
de arial pra helvetica;
jibias que comem pythons)
o romrio, nia,
arthur bispo do rosrio,
pinheiros, ftons
Gozando com * *** dos outros
/////////////////////////
um ou outro
desde cedo
que te botam
num corpo
mostram o que
cada um
dos bonecos faz,
e o que no faz,
(pra trs,
onde a cmera no pega,
formam-se desenhos coletivos
com os corpos todos, enormes,
esticados, em duas, trs, quatro
dimenses,
de bichos, formas geomtricas,
cores, bales)
mas modelos novos,
ou seminovos
anunciados no rdio,
na televiso,
abrem
varrendo,
como um leque, radar,
toda a gama d'opo
testculo de madeira,
mama
de algodo
veculo
de sexo (de gozo)
no para quieto
nunca
o excesso fumoso
que solta,
o tamanho
pegajoso
dos vultos,
sua fundura
a gente termina nos
dedos, t certo,
criatura,
mas o meio t sempre em volta,
perto, entrando
como quem
no quer nada;
pelos olhos, nariz, poros
todos, raiz
pivotando,
pele permevel,
voragem
que desata
casa, corredor
mulher desdobrvel, n,
(oxe, eu tambm
sou)
De Prima Olhando pra Poesia do Martinho
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
a diferenca expressiva
que tem
entre o silncio da tia Vite,
quase de santa, hein,
e daquele miltlufer, vixe,
pezo metido no cho
de Holderlin, as cara,
dedos chafurdando
a prpria merda da terra
desnecessariamente
gordos, covardes,
cheios-de-Si *cof* Ser,
tantos,
o mundo mundar
at alitera,
mas t longe de ser soluo,
dolores-pra-morte
mundo mundo vasto, norte
(fausto
ao vivo e a cores!)
bem mais vasta a concreo
Deus **** natura
/////////////////////
a pica de deus enorme
maior que uma perna, que a crsega
nem faz ccegas nela
palito de picol
tragado,
devolvido pela mar
a pica de deus, ereta,
descomunal
entra nela como
numa catedral
rio engolido na dobra,
nos cnions encurralados
por suas montanhas-coxa
ino,
hoje conversa tanto com a tua fenda
que chega di a membra-
ninha, o freio da lngua,
falha a voz
mas ela responde,
treme, foz que quebra em cheio,
onde
s'abrem as perna,
jorra
ino,
voltando
na cara, toda
terra
ora
rede,
tudo relao entre:
o que te acreditava
antes;
o que te acredita
agora
******
Cachet
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
fica tudo aqui
ainda,
gravado.
consenso manufaturado
em giz e pinga
esterco, catarro detrs
do nariz
penso,
adenide
filtro de barro
essas onda de tipo
paranide,
tem que saber
domar
(diria surfar
no fosse
comdia demais)
cai pra trs,
cata o fundamento
cada um tem suas rdea,
religa
um medo com medo
dentro;
espiga, gua,
E todo mundo agora
//////////////////////////////
deixa de meninage,
nada vai te ajudar
aqui, agora
esquece esses teu livro tudo,
as ambage,
o lodo azul, di-mo,
logo, ento
se a culpa sua - nossa -
ou do fonofa-
-logo-
-centrismo?
e ainda (questo-bnus)
se o tempo
a morte
passando pela gente, fria,
gradiente de entropia,
ou se ns
somos ele,
seu plano,
corte contnuo
em pano quente,
mquina-me do ritmo,
PARTE VISUAL NOESIS - NO PRA LER EM VOZ ALTA
CULTURA (II)
o paimatamos com nossos irmos,
muito tempo atrs, fazendo do seu corpo
espalhado uma cidade, esticando
sua pele de borracha;
da sua cabea uma cabaa
serve de coroa despreenchida,
que fica em pde si mesma
(ficando at bonita)
se tnhamos uma me (ningum aqui lembra)
certo que j matamos tambm,
apodrecenodentro do seu ventre
cada vez mais quente, e mido
primata pelado, em p, suado
que se bota em tudo, se espalha
quer comer todas as coisas, s-las,
met-las pra dentro, por dentro
e disso fazendo essa teia
(quase toda involuntria)
espasmdica, afetiva, juntura
do tempo e de tudo
na qual a besta soberana cresce
comendo seu prprio rabo;
enormes os seus braos
abrindo como leque
por de trs,
(um deus hindu desses
incalculavemente
membrosos,
de pelo menos quatro rostos,
que a gente veja)
apaga o beque,
caem panos como
numa cachoeira
luz faldada em si mesma
empoando
num baque surdo,
estrondo
l fora,
a natureza ruge seu tronco
metlico, o nosso,
de besta
Memes
p g tarde, brodislaw manilowski, entre outros
I
Ela passa, ela passa
A dor quebrante na coxa
A lcera da pele
A grande dor negra
do abdmen
Elas passam, passam
sim
por voc
II
"as orelhas
bebem o ar por outros corpos
percutido"
gato por cima das telhas,
a nossa dor de olvido
e
o discurso mais
campanudo,
as solues mais elegantes,
engenhosas
(velcro, zper, veludo)
as formas mais pregnantes
(ou violentas,
ciumentas, mesmo, vai saber)
vo ficando,
tomam corpo,
estantes, criam bolha de ar
por dentro, mucosas,
preenchem as coxas
laboriosas, de legging,
de gostosas de academia,
chacoalham suas extenses,
fileiras de lemmings,
sua lataria
se pensa adiante
como gente
a coalhadura engasgada
das ideia-elas-mesma,
c chamava
gastam o que tem pra gastar
suas figuras
se preenchem (como um queijo,
um livro de visitas), bales
de fala que esquecem
como se morre, palavra-alma-penada,
fitas
k7 cancrescentes, que se arrastam, lentos xotes
tristes, chuva em lona,
senis pacientes
(Locke, Hobbes, Roma)
na sala de espera,
tendo seus nomes chamados
quatro, cinco,
seis vezes
III
toma conta
do som,
diz
que o sentido
toma conta
de si mesmo
"o verbo
um nome
que agrega o tempo
ao que ele
significa"
a ao
age, apesar
da palavra
parada
se alguma coisa
existe ou no existe,
e como
(conforme os intervalos
do tempo
na pgina)
querendo
ou no
o som
sucede
IV
eu vi a dobra do tempo,
e ela curva pra fora
e pra dentro
de si mesma, junto,
como
uma roscea,
hemcia agrupindo
que corra e carregue
o ar em rede
o pulsar do nada
latejando lindo
nele mesmo,
nidificando,
torresmo frio,
nikiti city
cerveja quente,
a vida desembestada dos mortos,
sentindo tanta saudade da gente
tica
para bentinho spinoza e bebeto da-cabea-branca
1.
O retorcimento cabuloso das figuras,
acmulos
que se do de ver
estourados
na superfcie,
(rebentados,
como bolhas ou cnions)
irrompidos
de uma massa maior
inteiria
(que sempre
a prolongao
dum'outra massa
ainda maior
inteiria;
da qual se desprende, continuamente,
se estica)
as rachaduras abrindo como galhos,
costas,
ramificando fatos em
fractais
(alma,
como toda atualidade,
forma que se realiza -
cumpre
a si mesma)
do mar que se engole e se vomita todo,
(modo, auto-gerado
e carcomido
nas juntas
da sucesso dentada
dos dias*
*que (pra vrios efeitos)
giram
como
moeda
num
ralo
metlico
quicando
pro
centro,
rpido;
2.
Deus, essa
concreo, processo,
autoconhecimento
prtico, extenso
do nosso
corpreo evento,
(verbo ditico
que se projeta, deita
sobre seu prprio ritmo)
que de todos seus muitos
membros,
so ainda todos
retorcimentos
particulares da nossa figura,
e suas extenses prprias
(ou analogias), ns
desdobrados, junta, bacia,
cotovelo
(assim como
comporta, turbina,
nuvem, ao, penico)
Deuses, como fatos,
tem l o Vico,
so feitos
Um macaco enorme se espreguia, molemente.
Sua cauda espirala em concha,
Uma lontra que d a mo, boiando,
outra
lombra
3.
Barbarice loqui, 'sa porra.
Todas as vozes
desautorizadas j, aqui,
C escolhe com que unidade
lidar (eu no, fi),
individuado a partir da parturio,
entrameado em que a mo
se confunde
com os fio,
Se c termina no carro, na mo, no umbigo,
comeca no p, na gnada, no batismo,
eu no sei, eu no tava l, esse tempo todo, olha
que absurdo; tudo que te tem
entretecido
clula, tecido,
rgo, organismo)
Qual mnada c tem
pra chamar de sua, e
alavanc-la
como puder, pra beleza
algum manejo
( do teu corpo
com os outros)
que seja , pelo menos,
minimamente
ofensivo,
minimamente
suportvel
Album de Famlias
///////////////////////////////
Descem (pelo menos)
Brahma, deva, dio, Zeu, Diana,
todos bbados
tudo at agora
fatia ou farelo
da torta
proto-indo-europeia,
cada umbigo
uma porta
que d noutra, que d noutra,
(fio amarelo puxado que descasca
tinta, arranca grama,
leva tudo consigo)
e assim vai, secretada a uria
das esttuas todas,
por suas vezes
hoje desinfetadas (no soto,
as escrota)
e sotopostos
os plainos undosos
de anandamide,
no h nada que no
se elucide,
em seu tempo
deixando
d'Edilusis o templo
e seus mistrios
iniciticos,
limpa a cara,
a boca na manga,
o nariz,
suco gstrico num copo,
mundo sem fim
Tem algo d'errado comigo
Trao que o virtual
deixou no extensivo?
(nem
boto f, no, mas
tem quem bote,
sempre, n)
sentido um negcio
que se faz,
c me diz,
mais molemente
os metais
respirantes fundem,
sacando
dos mrmores vultos vivos,
que correm pro ptio,
mergulham no chafariz
s deus sabe
cad o Urheimat,visse,
(que no existe)
a primeira galerosidade a espedaar
a planta que mataram, me-Tiamat
de quem se divide o corpo, Iemanj
de onde saem as coisas que se arrastam
todas,
(do pai,se eu bem me lembro,carregam
at hoje a cabea,
resmungona e meio racista)
e seus membros, que mal se bastam,
votivos morte, entregues
a afroasitica no canto dela, Thoth
no seu barco, atribulado, cuidando
dos seus Bau,
Bereshitando
*cof cof*
as gandharvas se formam,
cabea de cavalo, tronco
de gente,
pernas e braos
que moem, parvos, suas
extenses
as lnguas latinas todas na sombra
desse fogo plido que Roma
que no quma mais
mas que tamm no vai embora
alguns galhos se abraam
em cima, nos lados,
com o vento, se engancham, quebram,
fazem uns bosques sinistros, outros
tem rvore
isolada, no seu prprio canto (a basca ali,
dxa ela)
Prototupi, macro-j, vai o coro
quede vocs
se acheguem-se, pliz
Tem pro norte
toda uma floresta enorme, preta
de troncos quase todos calcinados,
que dizem que guardada
o tempo quase todo
por um monstro trifauce
de nome
marques-frodo-nite,
o trimurti, a trindade,
kritik,
os trs poderes
pra guardar os modernos,
seus
alecto, megera, tisfone
mneme, musa, fia, precisa de ti
agora mais do que nunca,
loco,
(tambm tem usque,
red bull, ps asados,
fusili)
Milto, mane, as carruage, cad, Milto
e fria
s vira eumnide
s com muito parto,
s
tudo tudo tudo tudo tudo
dentro
le modificazioni della nostra medesima mente umana,
o trapo-trapo da caixa pela ensima vez,
a guitarra baiana
II
mas o mundo pra mim
s acontece
(assim
de acontecer mesmo)
quando em portugus
(ou melhor,
na minha lngua)
as outras lnguas so lindas,
tambm
(at mais lindas, quem sabe)
mas deslizam, espumam,
recobrem coisas, se abrem,
tem tripas, buracos,
cadafalsos,
quinas
o portugus (o portugus no,
a minha lngua)
a nica coisa
pedauda, tijolo que se joga,
apanha, substncia omnmoda
do Spinoza,
todo encaixe, curva gostosa,
fruta pesando, manga
suculenta, quase j podre,
gua escura
que corre, acumula, lenta,
empoa, ganha vida, cai
do galho e sai correndo,
se diz e se diz num mesmo sentido
em tudo que se diz,
todo som voluminoso
enche quartos, subsiste
como cheiro ou musgo,
endakkorde
eines quartets
eito desembestando
a esmo,
e ainda assim encaixando
num ritmo qualquer,
assentado de trs,
quatro, quase sempre,
sincopado
a ttrade
toda nossa,
umas palavras preenchidas, gordas
de repente
sem vo, em p de si
prprias, sem poros
todo rio corre a si mesmo,
em volta cabra, canavial)
(me deixa, srio, rapido)
petra autrem erat cabral
RESPONDENDO A UMA PERGUNTA RETRICA DE GERTRUDE ELIZABETH ANSCOMBE
Sim
Fenomenologia d'o Esprito
(lbum de famlias pt.II)
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
1.
foi numa noite enluarada
que eu vi Ogun cavalgar
poas de gua
parada
nas falhas, nas reentrncias
da massa bulbosa
que a cidade,
(maresia, nsias
de corpora cavernosa
esvaziadas, preenchidas)
esparramada
e quente
arfando feito ventre
de cachorro
sobem e descem o morro,
de terno, feios,
apressados,
deuses emprestados
hoje obsoletos
tardios os quartetos
sempre,
madrugada,
"toma", gangorra
infinita, "um chicabon"
srio,
apartamento quieto,
toca fita, o leblon,
rabada,
o vio,
redoma e modorra
boneco falsificado
de um super-heri,
casa de papelo
do deus que destri
e nem pra preservar preserva,
sardinhas em conserva,
(a ona que come a cria,
ducha de gua fria)
o espao negativo da palavra,
seu alapo escondido abrindo
um criador tsico, laricado,
tossindo,
cansado, limpa os culos
todo nome prprio
menos o seu
ritmo
2.
omo-esmeralda verdejando
atravs
do verdejar de esmeraldas
(i.e.,
tautologicamente)
jorge (se) salva,
senta praa,
nossa, sente nos ps
o drama todo,
a lmina, tbua,
trama de vime encorpada
como um queijo
que se preenche, pele,
computador analgico
de si mesmo,
plipo
que conclama, redime,
estrutura, recupera,
compila, amassa
e quebra,
(j quase terminando o episdio, o cachorro
resolve a situao, todos gargalham, tomam sorvete; pousa uma cambaxirra no seu ombro,
chega a hora da moral, ele olha pra cmera, canta)
cultura produo convincente
de localidade, primavera
que no termina, continua
saindo mole, dura
e quente,
fazer do prprio corpo
meio, ambiente,
cidade, instrumento;
(um arco reteso pelo vento
uma rede com peso sorrindo,
a lua com sede)
senhor
tu tens tido feito
o nosso refgio
u
u
u
u
u
u
3.
corre no sulco a agulha
como o sangue nas veias arborescentes,
suco de gente,
as rvores somos ns
fotografados, msica
grossa, lenta,
bossa velha surda
em auto-concorrente
fuga
*
razes so ps quietos,
(Isis remontando seu marido
todo santo final de episdio
enquanto a plateia
se desgancha de rir),
a colmeia,
algum que aquilo que faz,
produz sua presena, a zica,
canta junto, zs e zs,
como quem pede bena
por cima da msica, os
cabelos feito antenas, o
vento de cuja cadncia
se desenrolavam cenas
a cabea que no pra no tempo
nozes capacetadas num
sobe & desce de escadas
(que do,
pasmo,
em nada),
Joo de Patmos tem um tremelique
enrodilha-se, o moleque,
como um cachorro magro,
ciclonado, que no se esconde,
se levantando como deve serf,
Whitman manda um salve involuntrio, geral,,
esperto
(alguma verso do pastoral, decerto
Burke, MC), hameleque
politropo snico, esguio, exige forquilha
punho erguido, boneco falsificado
maior que si mesmo quando
manipulado pelo
prprio guri,
alma nenhuma termina,
abre-se
a infinitamente longa braguilha,
sucuri
como baob embarrigada, chove
em toda espraiada
compossvel,
sinto
deus na plurifalda, verde-
grossa, cavernosa, doida
dobra das coisas
dando f5
Uma srie de mitos para a inveno do automvel
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
Um. Todos os homens tinham que sair correndo pra todo lugar, at que um homem muito sabicho juntou diversas partes de lata e fez um automvel, que carregava a gente por todo canto em troca de coca-cola. Por isso, todos tinham que carregar consigo por toda parte latas e garrafas de coca-cola para despejar nos buracos dos automveis normais e de luxo a quem se pediam caronas pelas cidades das grandes naes industriais.
Na rua dos pases em desenvolvimento em toda parte encontrava-se moleques carregando engradados de coca-cola quente, muitos deles adulterados (o lquido mais clarinho e meio avermelhado, meio mate). De ingresso num nibus cobrava-se no mnimo um copinho de caf de coca-cola, despejado num lato do lado do cobrador de copinhos descartveis carregados no bolso ou na bolsa ou, s vezes, cuspidos da bochecha (geralmente no interior).
Dois. Todas as gentes viviam em florestas, campos ou desertos, at que dois irmos gmeos um dia viram como funcionava um formigueiro por de dentro, depois de derrub-lo para retribuir o favor antigo de um tamandu-bandeira sem braos. Achando muito engenhosa a sociedade das formigas, toda metida em canais onde coisas e materiais passavam de forma pressurosa e organizada, os gmeos ento decidem fazer grandes antas betuminosas a partir de fuligem, cuspe, liguinhas de borracha, areia e fogo. As antas carregam gente em suas entranhas expostas, cospem na frente de escolas, hospitais, restaurantes, fbricas. As bestas carregam leite, galinhas e outras antas betuminosas-beb pelo interior do pas. A facilidade prtica advinda da inveno contribui com a criao e o desenvolvimento ao longo de meses de diversos tipos de biscoito, equipamento cirrgico, travesseiros. Tudo parece timo. As antas betuminosas s conseguem caminhar pelas colmeias humanas, ou entre os fios que ligam as colmeias humanas, no conseguindo trafegar fora desses sulcos (feitos, s vezes de cascalho mastigado pelas prprias antas, s vezes de coca-cola carbonizada). Elas logo constroem cidades enormes onde podem circular livremente, escravizando o povo para que continuem sua expanso indefinida e um dia possam circular por toda a terra. Os gmeos se encontram com um conselho emergencial interespecfico clandestino, de madrugada, numa clareira, todos de robe escuro (menos o Jabuti, que j se veste a si mesmo). Todos criticam as Antas Betuminosas e o seu proceder, e os gmeos se arrependem de sua criao, fazem cara de constrangidos. Viajam para So Paulo de carona para encontrar a Rainha das Antas Betuminosas, que um caminho descomunal que no carrega nada e corre initerruptamente numa esteira do tamanho de um campo de futsal, dentro de um prdio de cimento, janelas vermelhas e vrios andares. Os gmeos conversam com a Rainha das Antas Betuminosas, que diz que o seu povo tem tanto direito de trafegar livremente quanto qualquer outro. Os gmeos concordam, propem uma nica estrada que d a volta no mundo, concedendo a todas as Antas Betuminosas correrem o mundo enquanto o resto das criaturas possam viver dividido pela estrada. H um acordo, todos tiram fotografias sorrindo, comem um bolo. Nos meses seguintes, os gmeos coordenam com a ajuda de um conglomerado de dezoito empresas de seis pases diferentes a construo de uma estrada que vai de Roma, na Itlia, at Roma, na Itlia, atravessando a sia e a Europa e a Amrica e passando por dois tneis intercontinentais. A rapidez prometida da construo era tanta e o tamanho da estrada to extraordinrio que dezesseis meses depois do incio das obras j se prometia que era possvel comear a realizar o trajeto que as obras seriam concludas antes da sua concluso (isso contando, claro, o engarrafamento natural de alguns meses). Mal sabiam as Antas Betuminosas, no entanto, que o primeiro dos tneis intercontinentais, na verdade, leva s profundezas do Hades, onde as Antas Betuminosas sero escravizadas em troca da redeno de uma srie de antepassados de diversas espcies selecionados especialmente pelos gmeos. Estes espritos de antepassados notveis, agora ressurtos, e contendo , naturalmente, cincias extraordinrias sobre a morte, o mundo das almas e o futuro, garantem o estabelecimento e a manuteno expressiva de uma nova sociedade, mais plstica e interanimada, justa, livre e prspera, que dura quase quatorze anos.
Trs. No tinham como ir de uma cidade pra outra. Os ancies ento se reuniram para inventar o carro. Demoraram meses para formar o comit que decidiria a forma de melhor inventar o carro. Trecho selecionado de ata de uma reunio dos primeiros meses do comit:
-Coisa j se fez assim, como que no. Pegando e pronto.
-No tem como. Vrias mquinas. Pistes.
-Pe umas roda ali e vamo nessa.
-No assim que funciona, meu senhor.
Decidiu-se, enfim, depois de trs meses,por um carro que se movia com o vento. No deu certo. Morrem mais de oitenta mil pessoas e so extintas pelo menos trezentas espcies da fauna e flora ao longo dos sessenta anos em que se empreende a busca por materiais e por um povoado que possa produzir o automvel. As carcaas carbonizadas do primeiro prottipo (resultante do incndio da fbrica promovido durante a terceira rebelio operria) so decoradas pelos locais depois de alguns anos como se fossem um antigo cemitrio de uma espcie antiga de superanimais alados. Um cineasta francs e seu produtor belga fazem um documentrio medocre sobre o cemitrio, que mesmo medocre abocanha uns prmios e acaba vindo a ter boa rodagem em dois sites de streaming por assinatura, tamanho o interesse plstico (e a esquitice, mesmo) das carcaas decoradas e seus decoradores orgulhosos em volta explicando os detalhes.
Ou (quatro) que o carro j tinha sido inventado, muitos anos atrs, mas ningum mais usava. Todos andavam a p, ou de trem, ou de bicicleta, ou em balsas, ou em bondes. Uma empresa alem de carros teve a grande ideia de veicul-los durante eventos esportivos.
Discurso do homem da agncia de publicidade no dia da apresentao da campanha:
Sem querer ficar tcnico demais, mas at bvio, gente, que a fora organizada desses homens disputando de forma organizada como um s corpo vai remeter imediatamente vontade de tambm expressar sua fora de forma fantasticamente controlada! - Centenas de cavalos! O que se far contgua com os nossos vdeos todos protagonizando homens seguros (s vezes sozinhos, com barba por fazer, s vezes com uma mulher e famlia) e atraentes dirigindo carros que sugerem no apenas uma possncia confortvel, segura e estilosa, mas tambm, graas, aqui no primeiro caso, narrativa noir estilosa e exagerada de um jeito que foi deliberadamente pensado pela nossa querida genial Mnica pra agradar tanto uma fatia da classe C e D diretamente e uma outra fatia da classe A e talvez B ironicamente - numa tentativa ao meu ver brilhante de fazer justamente o gesto que se entendeu estrategicamente que deveramos estar fazendo nesse semestre, no mesmo - e no segundo caso graas poderosa narrativa do Guto e do Tlio onde o nosso carro a nica forma de organizar uma milcia resistente contra o Imprio dos robs e das corporaes malvadas num distante futuro ps-apocalptico, todo mundo sabia do risco de fazer um comercial de carro onde metade do tempo ele aparecsse velho e sujo, mas funcionou, e como funcionou, a mensagem de confiabilidade e durabilidade japonesas somada com a poderosa narrativa e a figura simplesmente formidvel da menina Eva, encarnada pela ainda mais formidvel Elisngela, que t aqui com a gente, hoje, essa noite maravilhosa, fizeram realmente a diferena, deixando por meses o nosso como o viral mais bem-sucedido da indstria automobilstica do ano, uma salva de palmas aqui, gente
Eles patrocinaram o time local, que veio a ganhar a Copa da Alemenha e ter um resultado decente no Campeonato Alemo (quinto). Dessa forma, a indstria automobilstica foi salva at a prxima crise cclica, que tava pro ms que vem. Bnus pra todo mundo.
Enfim, vocs entenderam. Fantasias principalmente masculinas de agncia e fora etc bem infantil mesmo. Da utopia rodoviria Romana e depois Europeia tivemo a cria da utopia rodoviria americana, conjugada com a casa suburbana como topos de consumo e constituio-de-si-mesmo da unidade nuclear da famlia. Todo um tro. Fizeram em cima disso, entre outras coisas, por exemplo: Braslia.
Cinco
Tlio odiava o trnsito de Belo Horizonte mais do que ele odiava quase qualquer outra coisa. E Tlio odiava muitas coisas (barulho, cebola, poodles, sertanejo tradicional e universitrio, prdios novos azul-espelhados, hamburguerias gourmet, condomnios fechados, futebol, tanto a copa do mundo quanto a maior parte das manifestaes de animosidade politizada contra ela). Quase todo o tempo em que ele se encontrava preso no trnsito era gasto se maravilhando continuamente com o absurdo daquele estado to insustentvel, e com o fato de tanta gente aparentemente ir empurrando aquela situao com a barriga como se ela no fosse, afinal, to absurda e insustentvel. Rabo de cavalo jungido em liguinha, pochete, os braos juntos. Tantos carros prateados sujos feios juntos disputando espao e reclamando uns com os outros, ligados sem nem se mexer direito, arfando, urgindo mpetos desesperados a cada centmetro concedido, soltando suas fumaas como quem tosse, chacoalhando seus traseiros e tentando avanar territrio como destacamentos militares. T certo que de certa forma ele tambm estava empurrando a situao com a barriga com sua mera presena ali, de certa forma contribuindo com manuteno daquela bosta, mas que opo ele tinha? At pensava de vez em quando (sonhava talvez seja a palavra mais adequada) em comear a gritar, puxar os prprios cabelos, tirar a camisa, pintar a bochecha com tinta guache ou canetinha e subir em cima de um carro gritando por algum tipo de revoluo vagamente urgida contra o domnio dos carros e do trnsito sobre as pobres encurraladas e encaixotadas pessoas. No que no achasse a imagem ridcula (achava, e muito). Ela geralmente no ia muito alm dessa cena, ele l em cima com uma cara fantica gritando contra as grandes montadoras e a reduo do IPI, dedo em riste, clamando por alguma forma de irmandade mamfera contras as mquinas, algumas pessoas aos poucos concordando e fazendo que sim com as caras, batendo palma, outras fingindo que nem tavam vendo (as duas ramificaes narrativas subsequentes tradicionais, quando ocorriam, eram bem bestas da menina mais bonita presentemente disponvel no nibus achando ele heroico e subindo junto no teto do carro, tambm tirando sua camisa e revelando lindos baloiantes seios, ou da multido decidir queimar um carro aleatrio, por falta do que mais fazer, no sem antes educadamente retirar seu ocupante coxinha e resmungo, invariavelmente de terno e cara de babaca, resmungando de forma tambm babaca sobre ter de chegar no seu trabalho insuportavelmente coxinha que Tlio nem quer imaginar pra no se irritar mais do que o adequado para a composio estofada da cena). Ele pelo menos estava num nibus. Pelo menos ele no colaborava de forma to direta, ele pensava, com aquela coisa escrota, dirigindo um carro s pra ele mesmo (como a irm fazia, embora verdade que o trabalho dela fosse bem pior de se chegar de nibus). Ele retirava alguma satisfao disso, tambm continuamente, e tambm todo dia, mas uma satisfao pequena, no muito maior do que aquela extrada com o nico jogo que ele tinha no celular, e que ele geralmente jogava uma meia hora por dia no trnsito (um jogo onde padres geomtricos coloridos se formavam com o deslizamento dos seus dedos e que ele jogava de forma bastante distrada e pouco estratgica). Hoje era sexta, e ele no sabia se o engarrafamento nesse dia de fato era pior que nos outros ou se assim lhe parecia pelo fato de chegar em casa na sexta ser to mais desejvel do que nos outros dias. O fato que parecia que ele estava ali tinha um tempo interminvel, dava pra jurar que h pelo menos vinte minutos eles no avanavam nada. O nibus fazia seus movimentos e rudos como se avanasse, mas era como se estivesse subindo uma esteira rolante na direo contrria, ele podia ver h um tempo enorme o mesmo boteco com um tiozinho barrigudo e cara de displicente em p, meio que rindo sabe-se l do qu (talvez de no estar preso no trnsito). T certo que um troo grande e trambolhoso daquele no devia nem ser capaz de subir uma ladeira to ngreme. A televiso logo acima da sua cabea avisava que Capricrnio devia se ocupar dos negcios e esquecer do amor naquela semana. a terceira vez que ele lia essa informao, e a terceira em que lhe vinha mente uma ex-namorada que era Capricrnio e fazia questo de lembr-lo desse elemento incontornvel do seu carter pelo menos umas cinco vezes por dia (sendo que ele tambm odiava tanto astrologia quanto ex-namoradas; essa, a Alexandra, com particular veemncia). A ateno escapou para a sada de emergncia no teto do nibus, e na considerao duvidosa, tambm repetida quase diariamente, de sua efetiva funcionalidade num momento de desespero. Ele imaginou o nibus tombado e ele saindo de forma triunfante por ali, sem camisa, de mos dadas sua companheira revolucionria de seios baloiantes, fazendo viseira com uma das mos pro horizonte de carros parados nas vias entupidas da cidade e falando pausadamente de forma confiante e proftica como seria o futuro da cidade dali em diante, de produtos orgnicos locais crescidos no asfalto, festivais de fertilidade semanalmente encenados pela comunidade, com alguns automveis alegoricamente desmontados sob urros guturais da populao, outros pancados por praticantes amadores de MMA (como nas fases bnus do Street Fighter) vegetao j comearia a crescer quase imediamente em volta dos carros, at dentro deles, brotando dos estofados mais embolorados, razes irrompendo das fissuras j existentes no cimento, copas frondosas de Sequias, Pau-ferros e Guapuruvus subindo com a rapidez de nuvens de poeira numa demolio. De olhos fechados, pega uma goiaba pendente de uma das rvores, julga sua maturidade apertando a pele. A televiso agora avisava que Nicole tenta roubar o beb de Nico mas pega no flagra. tambm a terceira vez que ele v essa informao, mas ele precisa de novo (como todo dia) rebater um segundo de incredulidade irritada do absurdo de noticiarem um evento de novela como algo de interesse imediato geral, nomes prprios que ele desconhecia alardeados naturalmente com a urgncia de estadistas. Ele tambm odiava novelas (e, j que foram mencionados, quase todos estadistas disponveis para serem odiados). Uma possibilidade distantemente aventada seria de conseguir trabalhar perto de onde mora, ou morar perto de onde trabalha, e ir a p pro trabalho, como a sua me fez por anos, antes de mudar pra um condomnio l no cu do caralho (como ele carinhosamente costuma chamar). Ele odeia um pouco as pessoas que tem esse luxo, mas sem se deter muito, por achar que dio baseado em inveja no dos dios mais nobres (Tlio se orgulha pelo menos um pouquinho da retido da maior parte dos seus dios). Tenta reajeitar sua cabea da mo onde estava apoiada, e que est ficando dormente, para apoi-la na janela, mas ela treme demais, vai acabar dando dor de cabea. Antes de concluir que odeia dor de cabea (de todos os itens destacveis da realidade a coisa que ele mais odeia no mundo, o troo que mais diretamente torna sua vida quase inteiramente invivel) ele precisa fechar os dois punhos com muita fora e pensar em todo o seu dio se comprazendo em si mesmo, sua totalidade espraiada como a dos vrios diversos quilmetros de lentido viria empacotada da grande rea metropolitana de Belo Horizonte, como formigas canalizando pedaos de terra pra dentro de tneis eles mesmos j feitos de terra, entremetidas, pressurosas, formando uma s inteligncia, um s organismo, bem mais bonito, bem mais competente, do que aquele do qual ele infelizmente acontecia de fazer parte, ou (e essa imagem se apresenta com fora mesmo sem fazer imediato sentido) um enorme mar de leite, interminvel, de dio branco e cremoso que aos poucos sairia dos seus poros e das suas tmporas latejantes ali naquele banco, jorrando pelo corredor do nibus, e preencheria todas as ruas, subiria todas as ladeiras, entraria em todos os carros, molharia todas as meias, preencheria os primeiros e os segundos e os terceiros andares de todos os prdios do centro, alcanaria aos poucos todos os documentos guardados em porta-luvas, fundiria todos os motores, engasgaria todos os atores de novela no Rio de Janeiro, e alhures, empaparia todos os assentos recm-instalados dos estdios da copa, preencheria as conchas das orelhas de todos os cantores de sertanejo universitrio, coalhando aos poucos at que no houvesse nada que no fosse a massa gorda e dobrada em si mesma do seu dio coalhado e redentor, que tudo alcana, estrutura, compila, amassa, quebra, tudo recupera.
Seis (ltimo, prometo, um fistaile utpico-recreativo-comdico pra acabar), num futuro no to distante assim (2065, digamos), a cidade de So Paulo, depois de alguns anos de insatisfao com seu sistema principalmente hidrulico de transporte pblico, vem a considerar a reinveno do carro (que havia to tragicamente contribudo para as revoltas populares de 2046, com a destruio quase total de Higienpolis). Solicitam, para tanto, a consultoria criativa de Milton Nascimento e Gilberto Gil (que, inexplicavelmente, nunca morreram, sendo respectivamente o homem mais velho e o segundo homem mais velho do mundo). Eles inventam um carro conceitual, apresentado num especial de fim de ano, que consiste apenas de gritinhos harmonizados entre os dois. Ningum entende o que eles querem dizer com aquilo, mas todos aplaudem mesmo assim (eles tendo um tanto mais do que cem anos, afinal de contas, quase qualquer coisa a essa altura do campeonato impressiona). O sistema hidrulico de transporte pblico continua sendo usado de forma mais ou menos satisfatria at a destruio parcial dos tubos da cidade por uma nuvem de nano-gafanhotos (ou chineses ou norte-americanos, no se tem certeza), que s tem seu percurso destruidor impedido pelos gritinhos harmonizados de Gil e Milton, transmitidos pelo rdio, a populao virando seus aparelhos de som para os ralos e pias de suas cozinhas e banheiros para melhor reverberar as notas misticamente ungidas dos dois. Miramo no que vimo, acertamo no que no vimo, explica Gil, para os rob-reprteres. Os dois apoiados um no outro, suas roupas multicoloridas se confundindo. Exato, diz Milton, parecendo Gaia. De dentro das bolhas, longe do sol, todos se regozijam.