Post on 18-Apr-2015
LINGUAGEM DISCURSIVA:
RESSIGNIFICAÇÃO DA ESCRITA DE ALUNOS
SURDOS
Sandra Eli Sartoreto de Oliveira MartinsDepartamento de Educação Especial – UNESP/ Marília
UNESP - 2010
MÉTODOS DE ENSINO LEITURA E MÉTODOS DE ENSINO LEITURA E ESCRITAESCRITA
Adaptações dos métodos de ouvintes
POLÊMICA
EDUCADORES
Atividade Inicial: análise de Atividade Inicial: análise de textotexto
Texto 1 Texto 2O cavalo come aguaO cavalo caiuO cavalo vi ele pega cavalo é pequenoO cavalo tá bravo.O cabalo vi A cavala é bonita.O cavalo não come água.O cavalo vi mae comeu café !O cavalo é novoO cavalo vi homem pega leiteO cavalo não gossto de dele.
9 anos - 1a série
O casa domingo foi namorado G. e
D. à taarde abraça. Muito gosta você
amor Bonita ou Beijão foi casa. FIM.
Semana
10 anos – 3a série
Aprendizagem da escritaAprendizagem da escrita
Criança ouvinte Escola/ vocabulário próprio, conhecimento
de mundo e uso das formas gramaticais (aprendizado da escrita)
Criança surda Pais/ alguma forma de comunicação Sistematização precária da língua falada
Importância da LibrasCondições para o seu aprendizado
Abordagens EducacionaisAbordagens Educacionais
MONOLÍNGUE BILÍNGUE
Problematizando...Problematizando...
Historicamente, estudos dão maior ênfase na sintaxe
. estudos descritivos: desde a década de 40 (Sec. XX) relação
desempenho/acentuado atraso quando comparado com ouvinte
. estudos explanatórios: desde a década de 70 (Sec. XX) tomam
por base os princípios da “Gramática Gerativo-Transformacional,
de Chomsky, p/ “explicar” as dificuldades no uso da língua por
alunos surdos: técnicas de remediação p/ adequação às regras
gramaticais
(PEREIRA, 2003)
Concepções acerca da escritaConcepções acerca da escrita
COMPREENSÃO DA LÍNGUA COMO CÓDIGO
COMPREENSÃO DE LÍNGUA COMO ATIVIDADE
DISCURSIVA
Língua como códigoLíngua como código
- estudos cuja ênfase recai sobre a percepção auditiva e a fala: . ordem de complexidade determina desenvolvimento da função auditiva . sequencia de vogais isoladas até frases no trabalho com a fala . compreensão de que a fala é determinante p/ a apropriação da escrita . exercícios mecânicos: treinamento auditivo, propriocepção dos pontos de
articulação, treinamento da produção fonoarticulatória
- estudos de natureza inatista . exposição à língua de acordo com hierarquia de complexidade sintática . recursos internos p/ organização das regras gramaticais dispensam o mediador - estudos desenvolvimentistas: . etapas e níveis de “aquisição” . baseiam-se em comparações com a linguagem de ouvintes . desenvolvimento linguístico subordinado ao desenvolvimento cognitivo
GUARINELLO (2007)
Escrita como representação da oralidadeEscrita como representação da oralidade
- língua: sistema de representação formal e universal
. língua “ensinada” como pré-requisito para a apropriação da escrita
. padrão a ser alcançado . não há espaço para as idiossincrasias/singularidades
- alfabetização . baseia-se na oralidade . carece de atividades significativas
GUARINELLO (2006)
Língua como atividade discursivaLíngua como atividade discursiva
Estudos em que a atividade discursiva se define pela
ação do sujeito sobre e com a língua: . negam a linearidade e caráter universal da língua . enfatizam os determinantes histórico-sociais e
político-ideológicos
. “problemas” apresentado pelo aluno surdo não derivam da condição física, mas do modo como esse surdo é inserido no universo da linguagem
GUARINELLO (2006, 2007)
Escrita como modalidade discursivaEscrita como modalidade discursiva
Depreende da interpretação de linguagem como prática discursiva instaurada por meio de processos dialógicos interdiscursivos e intradiscursivos, perpassados pelas condições de usos nos contextos histórico-sociais e ideológicos nos quais se constituem:
- processo não linear - espaço para as idiossincrasias - constituição de conhecimento do mundo - reflexão sobre o funcionamento da linguagem - recontextualização do escrito para a derivação de
sentidos: multiplicidade de sentidos
PEREIRA (2009), ABAURRE, MASSI ( 2001)
A escrita como prática pedagógica A escrita como prática pedagógica discursivadiscursiva
Processo: interação, interdiscursividade, condições de funcionamento da escrita;
Escrever: dizer ao outro ao invés de representar a linguagem graficamente; instaurar espaço para a multiplicidade de sentidos
Discurso escrito• Uma forma de ação, de
interação (pressupõe o outro/concreto ou virtual)
• Se insere num contexto (relação entre os interlocutores)
• Produzido por um sujeito• Regido por normas, sua
acessibilidade• Dada pela
interdiscursividade
Escrita como prática discursivaEscrita como prática discursiva
A escrita como prática pedagógica A escrita como prática pedagógica discursivadiscursiva
• Ter o que dizer
• Ter porque dizer
• Ter para quem dizer
• Estar comprometido
com o dizer
• Encontrar estratégias
para dizer
Ato de ensinar e o ato de construir - juntos
Sujeito constrõe conhecimento, age sobre o mundo,
transforma-o, exerce sua plena cidadania
Prontidão e imaturidade: deixam de ter sentido
Estimulação dos aspectos motores, cognitivos e
afetivos: isolados não tem sentido
Diferenças individuais são entendidas como
singularidades inerentes ao processo de apropriação
da escrita
Aprendizagem da escrita pelo surdoAprendizagem da escrita pelo surdo
Estratégias e recursosEstratégias e recursos
Propiciar diferentes situações em que as crianças possam
utilizar a escrita
Favorecer o contato com diferentes materiais lingüísticos
Possibilitar que a criança reflita sobre as diferentes
funções e usos da língua
Criar situações que possibilitem a compreensão quanto a
organização do sistema lingüístico
Promover atividades de re-escritura/retextualização
Momentos em que a criança possa refletir sobre o seu
modo de escrever
APROPRIAÇÃO DA ESCRITA
APROPRIAÇÃO DA ESCRITA
APROPRIAÇÃO DA ESCRITA
APROPRIAÇÃO DA ESCRITA
APROPRIAÇÃO DA ESCRITA
Aspectos do texto: formais e Aspectos do texto: formais e discursivosdiscursivos
Aspectos formais da escrita
referem-se às características de representação gráfica da linguagem
Aspectos discursivos da escrita referem-se às características da linguagem em uso
- coesão textual: diz respeito ao conjunto de recursos linguísticos por meio dos quais as sentenças se interligam formando seqüências de sentidos: adjetivos, verbos, proposições, pronomes, advérbios, conjunções (operadores argumentativos);
- coerência textual: modo como os elementos expressos na
superfície do texto e os que se encontram implicados permitem a construção do sentido
(BRASIL, 1997)
Aspectos do texto: formaisAspectos do texto: formais
Aspectos formais
- momento inicial: apreende o sistema alfabético/tendência à representação dos sons da fala na escrita
- no transcorrer do processo de construção da escrita: percepção de que a escrita é mais complexa do que a simples transcrição da oralidade
- nesse processo a criança propõe sua própria ortografia
- apropriação do sistema convencional de escrita: forma de inclusão = forma de inclusão educacional/social
O que se questiona não é a necessidade do domínio do “padrão oficial” da escrita, mas a forma como tal
domínio é conduzido!!!
Aspectos do texto: formaisAspectos do texto: formais
A representação direta da oralidade na escrita: não é
suficiente para a apropriação da escrita
Situações em que não há correspondência letra-som
uma mesma letra pode ser articulada com base em sons
distintos (sapato e casa)
um mesmo som pode ser grafado por diferentes letras
(fonema [g] por g e j; [x] em próximo e exame)
letras que não têm som nenhum na fala, mas que estão
presentes na escrita (h em hoje
Aspectos do texto: formaisAspectos do texto: formais
Situações em que não há correspondência letra-som
possibilidades de muitas palavras serem pronunciadas
de maneiras distintas em função das variedades lingüísticas (pastel, leite)
as letras podem apresentar um valor silábico (apto, afta)
utilização de duas letras para representar um som (guerra, queijo)
Aspectos do texto: formaisAspectos do texto: formais
Exemplos de ocorrências que divergem do sistema convencional
- “trocas” na escrita: compreendidas como decorrentes de
dificuldades com a correspondência grafema-fonema
- instabilidade quanto ao domínio das diferentes possibilidades
de representar, graficamente, um determinado som
representações múltiplas (“xeio”, “maxa”, “xega”, “civocê”
demonstram confusão com o uso de x, ch e s)
- confusão com o uso de m e n: “tanbe”, “não ven”
- confusão com uso de r: “matan”, “acumula”
Aspectos do texto: formais Aspectos do texto: formais
- assistematicidade do uso de marcação de nasalidade: “maxa”, “lipa”, “dengue”, “tanbe”
- assistematicidade quanto à compreensão sobre a quantidade de elementos que podem compor uma sílaba: “bancas”, “barcas”, “brica”
- instabilidade no uso de critérios de utilização de espaços em branco na escrita: segmentação na escrita
. Hipossegmentações: “civocê”, “nãoven”, “nosvasos”, “tesasas”, “propipa”, “denguepodemata”
. Hipersegmentações: “e le”, “ a reia”
Soluções propostas pela criança = erros ou sintomas de construção da escrita?
Qualidade textualQualidade textual
Garantem a organização estrutural e constituição dos sentidos: coesão, coerência (informatividade, situacionalidade, interxtualidade , intencionalidade e aceitabilidade)
(BEAUGRAD E DRESSLER, apud KOCH, 1990)
Aspectos do texto: discursivos Aspectos do texto: discursivos
COESÃO E COERENCIA
- A coerência interna se apóia em elementos coesivos (responsáveis pela articulação dos marcadores lógicos do texto, pela não contradição, pela organização seqüencial do pensamento)
- Coerência é o texto: não há texto se não há coerência. Porém há texto em que a coesão não se realiza necessariamente
Estratégias de processamento textualEstratégias de processamento textual
Textuais
De organização da informação: superfície do texto; o modo como a informação é dada(conhecida) e a nova (que está sendo apresentada)
De formulação: recursos de natureza cognitiva e interacional que tem entre os objetivos, esclarecer , exemplificar, ilustrar, atenuar, etc
De referenciação: ligadas entre elementos que fazem parte da superfície do texto, de modo que sejam recuperados por outros, formando o que chamado de cadeia coesivas;
De balanceamento entre o explicito e o implícito: está expresso claramente no texto e os subentendidos recuperáveis através de marcas ou pistas
Gêneros textuais – aspectos Gêneros textuais – aspectos composicionaiscomposicionais
São fenômenos históricos, ligados a vida cultural e social; produto coletivo dos diversos usos da linguagem, que não se apresentam em forma rigorosamente definida, mas realizam diferentes modos, de acordo com as necessidades comunciativas (BRANDÃO, 2000; MARCHSCHI, 2002);
Práticas sociais de linguagem;
Novas práticas sociais surgem: e-mails, chats, debates, cheques, cartões (natal, postal, aniversário, etc)
Gêneros lingüistas conhecidos cartas, receitas, bulas de remédio, receitas culinárias, verbetes de dicionário e enciclopédia, charges, propagandas, publicidades, quadrinhos, musicas, poemas, resumos, resenhas, ensaios científicos, contos, livros em geral, etc.
Reconhecer e sublinhar as palavras;
Tentar entender cada parte do texto (expressões, frases, períodos, parágrafos, versos, estrofes)
Identificar fragmentos significativos relacionando-o a outros;
Utilizar o dicionário (dúvida);
Substituir itens lexicais por outros familiares;
Observar a lógica das relações morfológicas e sintáticas
Detectar erros no processo de decodificação e interpretação
Recuperar idéias geral e resumida
Procedimentos sugeridos: Procedimentos sugeridos: MicroestruturaisMicroestruturais
Analisar e compreender todas as pistas que acompanhem o texto escrito: figuras, desenhos, pinturas, ilustrações;
Identificar o nome do autor, lugares, referencias temporais e espaciais;
Situar o texto sempre que possível, temporal e espacialmente;
Observar relacionado com o texto o título e subtítulo;
Explorar capa do livro, personagens, antes da leitura;
Elaborar uma sinopse antes da leitura;
Reconhecer elementos paratextuais: parágrafo, negritos, sublinhados, travessões,etc;
Estabelecer relações com outras leituras;
Construir paráfrases em LIBRAS ou LP;
Identificar o gênero textual (carta, bilhete, jornal);
Identificar tipologia textual (prescritivo, enumerativo, entretenimento);
Observar a importância socio-cultural e discursiva (pragmática);
Ativar conhecimentos prévios.
Procedimentos sugeridos: Procedimentos sugeridos: MacroestruturaisMacroestruturais
O que a criança surda precisa saber O que a criança surda precisa saber para ler e escrever? para ler e escrever?
Ter acesso a diferentes portadores de texto escrito
Conhecer diversos gêneros (narração, diálogo, argumentação)
Conhecer e discutir sobre variados graus de formalidade relacionados à situação da interlocução
Ter acesso a textos de estilos e temas variados, que sejam significativos e se articulem com outros textos
Que características devem ter os Que características devem ter os textos?textos?
Ser adequado ao nível de compreensão das criançasApresentar um certo grau de estrutura e complexidadeSer coerente
Como devem ser trabalhados os textos?Como devem ser trabalhados os textos?
Sempre em torno de eixos temáticos ou como uma tarefa prática com função definidas (recreação, informação, estudo)
Resgatando o processo de interlocução aproveitando a visão de mundo e as experiências prévias da criança
Considerações finais...Considerações finais...
[...]Quem domina uma língua compreende e joga o jogo de
referenciar sentido, apreende temas e sabe construí-los a partir
de operações discursivas. Quem não domina uma língua copia,
repete, esquece palavras, fica estático diante do lápis e do
papel, lê palavras – até identifica seu significado de dicionário –
mas não é capaz de engendrá-las, artesanalmente, na trama de
um texto e muito menos de puxar seus fios e com eles tecer
sempre o mesmo mas já um outro tecido. Um pouco mais
adiante: Quem não joga o jogo da linguagem apenas produz
textos simples, padronizados, réplica de textos escolares, sem
sentido, sem função, sem significado (SOUZA, 1996, p. 145).
ReferênciasReferências
ABAURRE, M. B. M. ; FIAD, R. S. ; MAYRINK-SABINSON, M. L. T. Cenas de aquisição da escrita: o sujeito e o trabalho com o texto. São Paulo: Mercado das letras, 2001.
GUARINELLO, A. C. Letramento e linguagem nas práticas escritas com sujeitos surdos. In: (Orgs.) BERBERIAN. A. P.; MORI-DE-ANGELS, C. C. Letramento: referenciais em saúde e educação. São Paulo: Plexus, 2006, p. 348-67.
__________________. O papel do outro na escrita de sujeitos surdos. São Paulo: Plexus Editora, 2007.
LACERDA, C. .B. F. Os processos dialógicos entre aluno surdo e educador ouvinte: examinando a construção de conhecimentos. Tese de Doutorado, Universidade Estadual de Campinas, 1996.
__________________. Atividades simbólicas e o desenvolvimento inicial da escrita da criança surda bilíngüe. In: BERBERIAN, A.P., MORI-DE ANGELIS, C.C., MASSI, G. Letramento: referências em saúde e educação. São Paulo: Plexus, 2006, p. 221-243
BERBERIAN, A. P.; MASSI, G. A.; GUARINELLO A. C. Linguagem escrita: referenciais para a cliníca fonoaudiológica. São Paulo: PLEXUS, 2003.
BERBERIAN, A. P.; ANGELIS, C. C. M. de ; MASSI, G. Letramento: referências em educação e saúde. São Paulo: Plexus Editora, 2006.
PEREIRA, M. C. C. Discutindo o uso da sintaxe por estudantes surdos. In: (Orgs.) Linguagem escrita: referenciais para a clínica fonoaudiológica. São Paulo: Plexus, 2003, p. 111-24.