Post on 28-Jul-2020
MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA
Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral
Serviço Geológico do Brasil – CPRM
Departamento de Gestão Territorial – DEGET
Levantamento de Feições de Instabilidade do Terreno e
Edificações, da Rua Mato da Lagoa e Entorno, Bairro Jóquei Clube,
Curvelo - MG
Relatório de Visita
Outubro de 2019
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS .................................................................................................. 1
2. METODOLOGIA ......................................................................................................................... 2
3. RESULTADOS ............................................................................................................................ 2
4. CONCLUSÕES E SUGESTÕES ................................................................................................. 8
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1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS
Em resposta ao ofício enviado pela Prefeitura Municipal de Curvelo, uma equipe do Serviço
Geológico do Brasil (SGB-CPRM), constituída pelos geólogos Júlio César Lana e Heródoto Goes, da
Superintendência Regional de Belo Horizonte, realizou no dia 08 de outubro de 2019 um
reconhecimento de campo à Rua Mato da Lagoa e entorno, no bairro Jóquei Clube, na cidade de
Curvelo, em Minas Gerais.
A equipe do SGB-CPRM foi acompanhada por Agenor de Lima Fernandes - Secretário
Municipal de Obras, Henrique de Freitas Galvão – Engenheiro da Prefeitura Municipal, Tenente
Alencar - 42º BPM de Curvelo, Tenente Santos - 3º Pel. BM de Curvelo e Helvécio de Souza Lopes
Filho - Agente de Saneamento - COPASA.
Neste local, na madrugada do dia 26 de setembro, ocorreu um evento, possivelmente de
origem geológico-geotécnica que gerou trincas e rachaduras no solo, no pavimento da rua, em pisos,
paredes e muros de residências, além de trechos com abatimentos localizados no terreno. Segundo
informações dos moradores, repassadas pelos membros da prefeitura que acompanharam e guiaram
essa visita, houve um ruído forte, como uma grande vibração ou estrondo, semelhante a um trovão,
quando o solo, as paredes e pisos das casas trincaram e racharam. Além disso, relataram que algumas
paredes continuaram a estalar e a trincar por várias horas. Ainda segundo os membros da prefeitura,
poucos dias antes do evento, um poço do local teve um rebaixamento rápido de cerca de 9 m do nível
d`água, o que gerou a necessidade de reposicionar a tomada d`água da bomba. Também nos foi
informado que no subsolo, no eixo da Rua Mato da Lagoa, passam três adutoras, paralelas, de
abastecimento de água da COPASA. Sete imóveis residenciais da área foram interditados e os
moradores evacuados preventivamente.
De posse dessas informações a equipe fez um reconhecimento do local objetivando avaliar a
dimensão da área afetada, os tipos de feições que foram geradas, bem como colher o máximo de
informações de moradores e membros da prefeitura para descrever e tentar caracterizar o evento.
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2. METODOLOGIA
A fim de identificar a abrangência da área afetada pelo evento ocorrido no dia 26/09/2019, foi
realizado caminhamento pela região atingida e também pelas áreas limítrofes, nas quais não há
evidências do evento. Observou-se em detalhe a disposição, persistência e dimensões das
trincas/rachaduras no terreno, pisos e no pavimento asfáltico de duas ruas. Também se caracterizou a
abertura e persistência das fissuras, trincas, rachaduras e brechas nas paredes das edificações
danificadas. Foi anotada a posição dos poços de água que estão dentro ou muito próximos da área de
atuação do evento.
Os registros foram feitos por tomada de pontos de GPS, fotografias e anotações em caderneta
de campo.
3. RESULTADOS
A área caracterizada em campo pode ser visualizada na figura 1.
Figura 1. Principais feições identificadas em campo. Imagem: Google Earth.
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Na Rua Mato da Lagoa, nas proximidades da casa número 20, foram observadas fissuras e
trincas persistentes, de aberturas inferiores a 1 cm, de direção N60W (quase perpendiculares à
direção da rua), com manifestação no pavimento asfáltico, continuidade no meio fio e nos terrenos
adjacentes, notadamente em direção ao local onde está instalada a indústria Gerplant Sementes
(Figura 2). Nesse local foram observadas as mais expressivas feições de deformação do terreno, tanto
em quantidade quanto em dimensão (Figura 1). As evidências são representadas por trincas e
rachaduras de grande persistência, algumas com degraus de abatimento com rejeitos superiores a 15
cm (Figuras 3 a 5) e curso ligeiramente arqueado, com centro de curvatura apontando em direção à
Rua Mato da Lagoa (Figuras 3 e 4). Ainda neste local foram identificadas várias algumas feições de
abatimento circulares, sob a forma de cavidades com diâmetro inferior a 1 metro (Figura 6). No
entanto, a avaliação realizada não forneceu subsídios suficientes para afirmar se a gênese de tais
feições está correlacionada ao evento ocorrido no dia 26/09/2019.
Figura 2. Trinca no pavimento asfáltico quase
perpendicular à direção da rua.
Figura 3. Trincas e rachaduras no terreno a jusante
da empresa de sementes.
Figura 4. Grupo de pelo menos três rachaduras no
terreno, arqueadas, com mais de 10 cm de abertura
em alguns pontos e persistência superior a 100 m.
Notar arqueamento com centro de curvatura situado
em direção à Rua Mato da Lagoa, à esquerda da foto.
Figura 5. Detalhe da dimensão do rejeito no degrau de
abatimento observado no terreno a jusante da
empresa de sementes.
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Figura 6. Grupo de feições de abatimento circulares
com diâmetro submétrico.
Ao lado da empresa de sementes há uma casa desocupada, interditada pela Prefeitura e que
está sendo usada como um ponto de monitoramento para a evolução das trincas. As feições
observadas no terreno atravessam essa casa e se manifestam nos pisos e paredes, produzindo danos
severos (Figuras 7 e 8). Foi observado que muitas das trincas atualmente presentes nesse imóvel se
manifestaram sobre rachaduras previamente existentes e cobertas com argamassa.
Figura 7. Rachadura no piso e parede da casa
situada nas proximidades da empresa de sementes.
Figura 8. Continuidade das trincas/rachaduras após a
casa da foto anterior.
Nas adjacências da Gerplant Sementes foi observado que as feições se tornam menos
evidentes, possivelmente marcando o limite de abrangência do fenômeno. Há fissuras e poucas
trincas, visíveis nas paredes, muros e nos pisos, como as que foram observadas em um dos galpões da
empresa e em casas da Rua Monte Alegre, final da Rua Mato da Lagoa e na área da COPASA
(Figuras 9 a 11).
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Figura 9. Fissura recente na parede de uma casa
situada à Rua Monte Alegre.
Figura 10 Trinca no muro que separa as instalações da
COPASA da última casa da Rua Mato da Lagoa.
Figura 11. Trincas verticais e a 45° observadas na
parede da última instalação da empresa de sementes.
Ao longo da Rua Mato da Lagoa as feições mais evidentes estão nas estruturas mais próximas
da rua, como calçadas, muros e paredes frontais dos imóveis (Figuras 12 e 13). Na feição da figura
12, aparentemente há um soerguimento ou uma feição de movimento brusco ascendente, com
deformação das telhas de acabamento da porção superior do muro.
Nos pisos e nos fundos das casas as trincas são observadas, mas de forma não tão evidente.
Nas seis casas desse local as trincas nos pisos têm aberturas subcentimétricas, apresentam orientação
diagonal em relação aos terrenos (NW-SE) e não são mais perceptíveis nos terrenos dos quintais, nos
fundos das casas (Figura 14).
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Figura 12. Desplacamento na cinta superior e trincas
no painel do muro de casa da Rua Mato da Lagoa.
Notar arqueamento para cima do telhadinho sobre a
área desplacada.
Figura 13. Rachadura a 45° no muro frontal de casa
da Rua Mato da Lagoa.
Figura 14. Trinca que se propaga principalmente de
forma diagonal ao terreno. Fundos de casa da Rua
Mato da Lagoa.
Figura 15. Feição linear, aparentemente de
soerguimento, no eixo central do pavimento asfáltico
da Rua Mato da Lagoa.
Há uma feição linear, de contorno irregular, aparentemente soerguida, no eixo longitudinal da
Rua Mato da Lagoa (Figura 15). Essa feição coincide com a posição das três adutoras da COPASA
que passam sob o leito da rua e podem indicar alguma relação de causa/efeito entre elas.
Constatou-se a presença de dois poços de água na área de influência do fenômeno observado.
O poço representado pela figura 16 está nos fundos de uma das casas afetadas. Segundo informações
da equipe da prefeitura, que acompanhou essa visita, o poço apresentou importante variação de nível
poucos dias antes do evento, com necessidade de rebaixamento da tomada de água em 9 m. Além
disso, segundo os mesmos, expulsava muito ar nos dias seguintes ao evento.
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Figura 16. Um dos poços de água localizados na área.
Esse poço apresentou rápido rebaixamento do nível
pouco antes do evento, segundo informações
repassadas pelos representantes municipais.
Figura 17. Poço da COPASA situado próximo da área
afetada. Esse poço apresenta algumas singularidades
como muitas rachaduras e adernamento da estrutura
cimentada e inclinação (para a esquerda da foto) da
haste com a carretilha.
O poço da COPASA, que explota aproximadamente 18.000 litros de água por hora, apresenta
a base de alvenaria muito degradada e adernada e também mostra a haste metálica inclinada no
mesmo sentido do adernamento (Figura 17).
De acordo com a Rede Sismográfica Brasileira (RSB), os últimos episódios sísmicos na
região datam dos meses de fevereiro e julho de 2019. Dessa forma, salvo abalos de baixíssima
magnitude não captados pela RSB, provavelmente as trincas, rachaduras e fissuras não foram
causadas por evento sísmico.
Figura 18. Eventos sísmicos mais recentes registrados pela Rede Sismográfica Brasileira na região de
Curvelo/MG.
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4. CONCLUSÕES E SUGESTÕES
Por meio dos levantamentos de campo realizados constatou-se grande número de feições de
deformação, representadas principalmente por fissuras, trincas, rachaduras e degraus de abatimento
desenvolvidos no pavimento de ruas, pisos, paredes e muros das casas. Ficou claro que o pátio da
Gerplant Sementes foi o local de maior intensidade do evento ocorrido no dia 26/09/2019, onde
foram observadas as feições de maior persistência e abertura.
A área atingida pelo processo causador das deformações parece estar delimitada pelas
instalações da empresa de sementes, pela rodovia, pelo início da baixada localizada nos fundos das
residências da Rua Mato da Lagoa e pelos fundos das casas da Rua Monte Alegre. Também se
observou que a disposição das feições de deformação forma, de maneira geral, uma figura elíptica,
com eixo mais alongado aproximadamente no sentido N-S (Figura 1).
Não foi possível nessa visita estabelecer as causas do evento ocorrido na madrugada do dia 26
de setembro de 2019, e tampouco se o processo de deformação continua ativo. Dessa forma, fica
clara a necessidade da continuidade e detalhamento dos estudos, por meio do emprego de métodos de
investigação e monitoramento diversos, com o objetivo de investigar as causas do processo que
causou as deformações da área em questão.
Portanto, a título de sugestão, acredita-se ser prudente e necessário:
1. Realizar estudos geofísicos com objetivo de investigar algumas características do terreno e das
descontinuidades em subsuperfície, tais como: a persistência e direção das trincas, a variação
estratigráfica e eventual presença de vazios;
2. Realizar monitoramento e construir banco de dados do registro da evolução das trincas existentes
na região;
3. Ampliar a área de monitoramento de modo que envolva as instalações da Gerplant Sementes, as
casas da Rua Monte Alegre, as instalações da COPASA, a rodovia e a baixada nos fundos das
casas afetadas da Rua Mato da Lagoa;
4. Pesquisar, reunir e organizar informações de subsuperfície como, perfis e boletins de
monitoramento de poços d’água e descrições de sondagens realizadas na região;
5. Realizar uma ação fiscal visando localizar e cadastrar todos os poços de água ativos e inativos na
região;
6. Realizar estudos hidrogeológicos para entender a dinâmica da água subterrânea no local,
investigar eventual superexplotação do aquífero e sua relação com possível evento de
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7. Realizar uma coleta de dados referentes à operação e possíveis problemas detectados pela
COPASA no bombeamento e nas adutoras.
8. Manter as casas da área desocupadas e sob monitoramento até que se tenha os resultados dos
estudos aqui sugeridos.
Belo Horizonte, 14 de outubro de 2019
Heródoto Goes – Geólogo / Pesquisador em Geociências – SGB-CPRM
Júlio Cesar Lana – Geólogo / Pesquisador em Geociências – SGB-CPRM