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7/23/2019 Legibilidade e Controle
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Legibilidade e Controle: Temas na Obra
de James C. Scott
Nota do Tradutor – Eis como o autor define ‘rent’, palavra que prefiro manter eminglês: ‘Mais ou menos o que os economistas significam por “quase-renda”: o
excedente do produtor, ou receita mais elevada do que a que seria necessária como
incentivo para trazer um bem ao mercado (isto é, um preço consistentemente mais
elevado do que o custo marginal de produção). Chama-se ‘rent’ por analogia, a partir
da lei da renda/aluguel (rents) da terra de Ricardo.’
Opacidade e Legibilidade.
Em Vendo Como um Estado, Scott desenvolve o tema central de “legibilidade,” que
estará envolvido na maior parte de nossas linhas de análise abaixo. Refere-se atentativa de um estado de tornar a sociedade legível, de organizar a população de tal
maneira que fiquem simplificadas as funções clássicas do estado de tributação,
conscrição e prevenção de rebelião. Havendo começado a pensar nesses termos,
comecei a ver a legibilidade como um problema central do estadismo. O estado
premoderno era, sob muitos aspectos cruciais, parcialmente cego; sabia muito pouco
acerca de seus súditos, sua riqueza, propriedade de terras e produção, sua
localização, sua própria identidade. Não dispunha de qualquer coisa parecida com
um “mapa” minudente de seu território e de seu povo. Carecia, de maneira geral, deuma forma de mensurar, uma métrica, que lhe permitisse “traduzir” o que sabia num
padrão comum necessário para uma visão sinóptica. Em decorrência, suas
intervenções eram amiúde cruas e autodestrutivas.
…. Como fez o estado para gradualmente obter claro entendimento de seus súditos
e do ambiente deles? Subitamente processos tão díspares quanto a criação de
sobrenomes permanentes, a estandardização de pesos e medidas, o
estabelecimento de levantamento cadastral de bens de raiz e de registros de
população, a invenção da posse real da terra, a estandardização da linguagem e dodiscurso jurídico, o projeto de cidades, e a organização do transporte pareceram
inteligíveis como tentativas de legibilidade e simplificação. Em cada um dos casos
citados, as autoridades tomaram práticas sociais excepcionalmente complexas,
ilegíveis e locais, tais como costumes de posse da terra ou de atribuição de nomes,
e criaram uma grade padronizada por meio da qual elas poderiam ser registradas e
monitoradas centralizadamente…. [1]
Como fizeram os agentes do estado para começar a mensurar e a codificar, ao longo
de cada região de um reino inteiro, sua população, suas propriedades de terra, suascolheitas, sua riqueza, o volume do comércio, e assim por diante? …
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Cada empreendimento… exemplificava um padrão de relações entre, de um lado, o
conhecimento e as práticas locais e, de outro, rotinas administrativas do estado….
Em cada caso as práticas locais de mensuração e propriedade da terra eram
“ilegíveis” para o estado em sua forma bruta. Exibiam diversidade e complexidade
que refletiam grande variedade de interesses puramente locais, não do estado. Valedizer, não poderiam ser assimiladas numa grade administrativa sem ser ou
transformadas ou reduzidas a uma forma taquigráfica conveniente, ainda que
parcialmente ficcional. A lógica por trás da taquigrafia requerida era fornecida…
pelas prementes exigências materiais dos governantes: recebimentos fiscais,
pessoal para as forças armadas, e segurança do estado. Por sua vez, essa
taquigrafia não funcionava… como apenas uma descrição, por mais inadequada.
Escorada por poder estatal por meio de registros, tribunais e, em última análise,
coerção, essas ficções do estado transformavam a realidade que presumidamenteobservavam, embora nunca de modo completo a ponto de fechar a grade de modo
preciso. [2]
Não fica claro em que medida o conceito de Scott de legibilidade está diretamente
influenciado pela análise de Michel Foucault em Disciplina e Punição. Parece,
contudo, provável significativa influência. Scott cita aquele livro diversas vezes em
Vendo Como um Estado, inclusive uma vez de maneira que sugere relação direta
com seu próprio tratamento da legibilidade:
O que é novo no alto modernismo, acredito eu, não é tanto a aspiração deplanejamento abrangente. Muitos estados imperiais e absolutistas tiveram
aspiraçõies similares. Novos são, isso sim, a tecnologia administrativa e o
conhecimento social que tornam plausível imaginar organizar uma sociedade inteira
como antes só haviam sido organizados a caserna ou o mosteiro. No tocante a isso,
a argumentação de Michel Foucault emDisciplina e Punição… é persuasiva. [3]
De qualquer forma, a análise de Foucault,, em algumas passagens, antecipa-se a
Scott quase palavra por palavra, a ponto até de usar a palavra “legibilidade”
essencialmente no mesmo sentido.O Panopticon de Bentham, como descrito por Foucault, é apenas um exemplo de
uma instituição arquiteturalmente projetada para tornar seus reclusos tão legíveis
quanto possível para os em posições de autoridade. Foucault aplica o mesmo
princípio panóptico de legibilidade a mosteiros, formações e acampamentos
militares, hospitais, asilos, escolas e fábricas. Em todos os casos o princípio básico é
a compartimentação, para ser eliminada ambiguidade e ser organizada a instituição
— ou sociedade — na base de “Cada indivíduo tem seu próprio lugar; e cada lugar
seu indivíduo.”
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Evitar distribuições em grupos; desintegrar inclinações coletivas; analisar
pluralidades confusas, maciças ou transientes. O espaço disciplinar tende a ser
dividido em tantas secções quanto corpos ou elementos a serem distribuídos. É
preciso eliminar os efeitos de distribuições imprecisas, o desaparecimento
descontrolado de indivíduos, sua circulação difusa, seu ajuntamento não usável eperigoso; era uma tática de antideserção, antinomadismo, anticoncentração. Seu
objetivo era deixar claras presenças e ausências, saber onde e como localizar
indivíduos, estabelecer comunicações úteis, interromper outras, ser capaz de, em
cada momento, supervisar a conduta de cada indivíduo, avaliá-la, julgá-la, para
calcular suas qualidades ou méritos. [4]
Na fábrica, isso significava “distribuir os indivíduos num espaço no qual fosse
possível isolá-los e mapeá-los…” [5] O leiaute da fábrica de Oberkampf em Jouy, tal
como projetado por Toussaint Barre em 1791, por exemplo, era tal que tornavapossível efetuar supervisão ao mesmo tempo geral e individual: detectar a presença
e a aplicação do trabalhador e a qualidade de seu trabalho; comparar os
trabalhadores uns com os outros, classificá-los conforme habilidade e velocidade;
acompanhar os estágios sucessivos do processo de produção. Todas essas
serializações formavam uma grade permanente: a confusão ficava eliminada: vale
dizer, a produção era subdividida e o processo de trabalho tornava-se articulado, de
um lado, de acordo com seus estágios ou operações elementares e, do outro, de
acordo com os indivíduos, os corpos específicos, que os realizavam: cada variaveldesse grupo — força, prontidão, habilidade, constância — seria observado, e
portanto categorizado, avaliado, computado e relacionado com o indivíduo que era
seu agente específico. Assim, pois, distribuída de maneira perfeitamente legível por
toda a série de corpos individuais, a força de trabalho pode ser analisada em
unidades individuais. Quando do surgimento da indústria de larga escala descobre-
se, por baixo do processo de divisão da produção, a fragmentação individualizadora
do poder de trabalho; as distribuições do espaço disciplinar amiúde asseguravam
ambos. [6]A instituição era, sempre, um “observatório” no qual poder e disciplina resultavam da
capacidade de ver:
O exercício da disciplina pressupõe um mecanismo que exerce coerção por meio da
observação; um aparato no qual as técnicas que tornam possível ver induzem efeitos
de poder e no qual, inversamente, os meios de coerção tornam aqueles nos quais
são aplicados claramente visíveis. [7]
A arquitetura era projetada de forma a “tornar as pessoas dóceis e cognoscíveis,” a
“permitir controle interno, articulado e detalhado—”
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para tornar visíveis os que estejam dentro dela; em termos mais gerais, uma
arquitetura a operar para transformar os indivíduos: atuar sobre os que abriga,
exercer poder sobre sua conduta, levar os efeitos do poder até eles, tornar possível
conhecê-los, alterá-los. [8]
“O perfeito aparato disciplinar,” em suma, “tornaria possível a um simples olhar a fito
ver tudo constantemente.” [9] Esse era, essencialmente, o propósito do Panopticon
de Bentham: “induzir no recluso um estado de visibilidade cônscia e permanente que
assegura o funcionamento automático do poder.” [10]
Esse princípio aplicava-se acima de tudo ao relacionamento entre o estado e os
cidadãos da sociedade em geral. O jornal fourieristaLa Phalange, com deliberada
ironia, descreveu a filosofia implícita por trás das observações de um juiz a um
andarilho processado em seu tribunal:
Havia necessidade de haver um lugar, uma localização, uma inserção compulsória:
‘A pessoa dorme em casa, disse o juiz, porque, na verdade, para ele, tudo tem de ter
uma casa, algum lugar para morar, esplêndido ou modesto; a tarefa dela não é
proporcionar moradia, e sim forçar todo indivíduo a viver numa residência.’ Mais que
isso, uma pessoa tem de ter uma posição na vida, uma identidade reconhecível,
uma individualidade fixada vez por todas: qual é sua posição? Essa pergunta é a
expressão mais simples da ordem estabelecida na sociedade; tal nomadismo é
repugnante para ele, perturba-o; uma pessoa precisa ter uma posição estável,
contínua, de longo prazo, pensamentos acerca do futuro, um futuro seguro, paraficar a salvo de todos esses ataques.’ Em suma, uma pessoa deve ter um senhor,
ser apanhada por e situada dentro de uma hierarquia; a pessoa só existe quando
inserida em relações definidas de dominação…. [11]
Outra obra cuja análise superpõe-se consideravelmente à de Scott é a de E.P.
Thompson “Tempo, Disciplina de Trabalho e Capitalismo Industrial.” O tratamento de
Scott da legibilidade do processo de trabalho, como auxílio do controle gerencial,
pode ser proveitosamente comparado com o tratamento de Thompson dos sistemas
objetivos e legíveis de Scott de marcação de tempo — como o relógio e o ritmo domaquinário — como meio de imprimir ao trabalho o padrão de ritmo da gerência de
preferência ao padrão tradicional de alternar estirões de trabalho intenso e de
ociosidade, da “Santa Segunda-Feria,” do calendário de dias santos etc., preferido
pelo trabalho dos trabalhadores que se autoempregam. [12]
O surgimento de um sistema objetivo e legível de marcação de tempo, como descrito
por Thompson, é análogo aos sistemas legíveis de título da terra, pesos e medidas,
dinheiro, sobrenomes etc., impostos pelos estados. E o propósito era exatamente o
mesmo —aumentar a quantidade de trabalho apropriável. No caso de sistemaslegíveis de marcação do tempo, isso significou acabar com “os antigos hábitos de
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trabalho das pessoas,” [13] nos quais os trabalhadores, normalmente, trabalhavam
apenas o suficiente para comprar o necessário — apenas três ou quatro dias por
semana. À medida que as classes trabalhadoras foram sendo privadas de seu antigo
acesso independente aos meios de subsistência e de produção por expedientes tais
como os Cercados [Enclosures], e o sistema de fábricas substituiu o autoemprego,“[a]s classes que gozavam de lazer começaram a perceber o problema… do lazer
das massas.” As classes de donos de propriedades e de empregadores ficaram
horrorizadas com o fato de tantos trabalhadores manuais, depois de findarem seu
dia de trabalho, ainda terem “diversas horas do dia para gastar praticamente como
quisessem.” [14]
Como exemplo dos novos sistemas de marcação legível do tempo impostos,
Thompson citou o Livro Legal da Fundição de Ferro de Crowley, o qual determina
(Ordem 103): “Para o fito de indolência e vilania serem identificadas e os justos ediligentes serem recompensados, concebi criar uma conta de tempo por meio de um
Monitor….” O Monitor deveria manter uma folha de controle de tempo para cada
empregado. [15]
De todos esses modos — pela divisão do trabalho; a supervisão do trabalho; multas;
campainhas e relógios; incentivos em dinheiro; doutrinação e instrução; a supressão
de feiras e esportes — novos hábitos de trabalho foram formados, e uma nova
disciplina referente ao tempo foi imposta. [16]
Scott e Hayek:Mētise Conhecimento Oculto.
O conceito de Scott de “mētis” (Μ τις), emῆ Vendo Como um Estado é a culminância
de longa linha de pensamento anterior.Mētis é “conhecimento prático,” ou
“conhecimento embutido em experiência local,” por oposição a techne(corpo
sistemático de conhecimento formal, geral e abstrato dedutível de princípios
fundamentais). [17] “Representa largo séquito de habilidades práticas e inteligência
adquirida na resposta a ambiente natural e humano em constante mudança.” [18]
Qualquer praticante de uma habilidade ou ofício desenvolverá vasto repertório de
manobras, juízos visuais, sentido de tato ou gestalt discriminadora para avaliar otrabalho, bem como um espectro de intuições precisas, nascidas da experiência,
difíceis de serem comunicados à parte da prática. [19]
Mētisé adquirido por meio — e é aplicável a —“situações similares no geral mas
nunca exatamente idênticas que requerem rápida e experiente adaptação que se
torna quase segunda natureza do praticante.” “Resiste a simplificação a princípios
dedutivos que possam ser transmitidos bem-sucedidamente por aprendizado
livresco…” [20]
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O exemplo clássico demētisé a amplamente tida por veraz história de Squanto (ou
pela variante Massasoit) oferecendo aos colonos ingleses conhecimento local de
clima e tempo, solo e ciclos de crescimento de plantas nativas, desse modo
impedindo que ocorresse inanição em massa. [21]
Isso deverá soar familiar a qualquer estudioso de Friedrich Hayek. Em seu clássico
ensaio “O Uso do Conhecimento na Sociedade,” Hayek escreveu acerca de
“conhecimento distribuído”:
Se possuirmos toda informação relevante,se pudermos começar a partir de dado
sistema de preferências, esedispusermos de conhecimento completo dos meios
disponíveis, o problema remanescente será puramente de lógica. Isto é, a resposta à
pergunta de qual é o melhor uso dos meios disponíveis estará implícita em nossas
assunções. As condições que a solução desse problema colocado nos termos mais
favoráveis tem de satisfazer já foram completamente equacionadas e melhorpoderão ser enunciadas em forma matemática: dito do modo mais sucinto, são que
as taxas marginais de substituição entre duas mercadorias ou fatores têm de ser as
mesmas em todos os seus diferentes usos. [O que bem resume o ponto de vista
neoclássico da firma como “caixa preta” guiada por uma função de produção que é
um dado.—K.C.]
Esse, entretanto,não é, enfaticamente, o problema econômico com o qual a
sociedade se defronta….
O caráter peculiar do problema de uma ordem econômica racional é determinadoprecisamente pelo fato de que o conhecimento das circunstâncias das quais temos
de fazer uso nunca existe em forma concentrada ou integrada, e sim tão-somente
como os fragmentos dispersos de conhecimento incompleto e amiúde contraditório
que todos os indivíduos separadamente possuem. O problema econômico da
sociedade não é pois meramente um problema de como alocar recursos “dados” —
se “dados” for entendido como uma mente única que deliberadamente resolve o
problema colocado por esses “dados.” É, antes, o problema de como assegurar o
melhor uso de recursos conhecidos por qualquer dos membros da sociedade, parafins cuja importância relativa só esses indivíduos conhecem. Ou, para dizer de
maneira resumida, é um problema da utilização de conhecimento não dado a
ninguém em sua totalidade. [22]
Hoje em dia é quase heresia sugerir que o conhecimento científico não constitua a
soma de todo conhecimento. Mesmo pouca reflexão, entretanto, mostrará haver,
sem sombra de dúvida, um corpo de conhecimento muito importante mas não
organizado ao qual não há como chamar de científico no sentido de conhecimento
de regras gerais: o conhecimento das circunstâncias específicas de tempo e lugar. Éno tocante a isso que praticamente todo indivíduo tem vantagem sobre todos os
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demais, por possuir informação exclusiva de qual o uso benéfico que poderia ser
feito, mas cujo uso só poderá ser feito se as decisões respectivas forem deixadas
para aquele indivíduo tomar, ou forem tomadas com sua cooperação ativa. Só
precisamos lembrar do quanto temos de aprender em qualquer ocupação depois de
termos completado nosso treinamento teórico, de quanto é grande a extensão denossa vida de trabalho gasta no aprendizado de atividades específicas, e do quanto
constitui ativo valioso em toda profissão o conhecimento das pessoas, das condições
locais, e de circunstâncias especiais. [23]
Se pudermos concordar com que o problema econômico da sociedade diz respeito,
principalmente, a rápida adaptação a mudanças nas circunstâncias específicas de
tempo e lugar, poderíamos dizer parecer seguir-se que as decisões últimas tenham
de ser deixadas para as pessoas familiarizadas com as circunstâncias, com
conhecimento direto das mudanças relevantes e dos recursos imediatamentedisponíveis para lidar com elas. Não podemos esperar que esse problema seja
resolvido mediante primeiro a comunicação de todo esse conhecimento a uma
diretoria centralizada que, depois de integrar todo o conhecimento, emita suas
ordens. [24]
Mētissuperpõe-se em medida considerável ao que Michael Polanyi chama de
“conhecimento tácito”: habilidades adquiridas por meio de memória de habilidades
motoras ou também de prática, que só com dificuldade (ou nunca) pode ser reduzida
a uma fórmula verbal e transmitida em forma de instrução falada ou escrita.25 Scottdá o exemplo de “tentar escrever instruções explícitas acerca de como andar de
bicicleta….” [26] Assim, pois, “a maior parte das artes e ofícios que requeiram
sensibilidade em relação a implementos e materiais têm sido, tradicionalmente,
ensinada mediante longos períodos de aprendizado oriundo de mestres artífices.”
[27]
Alex Pouget sugere um motivo pelo qual tanto conhecimento situacional resiste
redução a fórmula verbal. Alguns neurologistas acreditam que as funções do cérebro
funcionam como um dispositivo de cálculo bayesiano, “tomando diversos fragmentosde informação, sopesando seu valor relativo, e chegando rapidamente a uma boa
conclusão”:
…[S]e desejarmos fazer algo, tal como pular por sobre um regato, precisamos extrair
dados não inerentemente parte daquela informação. Precisamos processar todas as
variáveis que vemos, inclusive a largura aparente do regato, quais poderiam ser as
consequências de cair dentro dele, e quão longe sabemos poder saltar. Cada
neurônio responde a uma variável específica e o cérebro decidirá da conclusão
acerca do conjunto total de variáveis, usando inferência bayesiana.
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Ao a pessoa chegar a decisão, haverá muito transtorno para colocar em palavras a
maioria das variáveis que o cérebro acabou de processar para a pessoa.
Analogamente, a intuição bem poderá consistir menos numa explosão de percepção
do que em um consenso tosco entre os neurônios. [28]
Uma observação interessante de Scott é mētis não ser, em absoluto,
necessariamente questão de conhecimento puramente tradicional, nem ser
conservador. Em verdade, ele evita expressões tais como “conhecimento tradicional.”
[29] Antes, mētis frequentemente reflete muito engenho e invenção em alto grau. As
inovações e expedientes produzidos por meio de mētis são amiúde uma resposta a
uma situação apresentada mais racional e eficaz do que aquelas mediadas por uma
hierarquia gerencial.
Como destaca Scott, “os pobres e marginalizados estão amiúde na vanguarda de
inovações que não requeiram muito capital. Isso não é, em absoluto, surpreendenteao se considerar que, para os pobres, uma aposta arriscada frequentemente faz
sentido quando as práticas atuais deles estão fracassando.” [30] Ele aponta para o
exemplo hipotético de dois pescadores,
ambos os quais dependem de um rio para ganhar a vida. Um dos pescadores vive à
beira de um rio onde a captura é estável e abundante. O outro mora ao lado de um
rio onde o apanho é variável e esparso, proporcionando apenas magra e precária
subsistência. O mais pobre dos dois claramente terá interesse imediato, de vida ou
morte, em conceber novas técnicas de pescar, observando intimamente os hábitosdos peixes, situando cuidadosamente armadilhas e redes retentoras de peixes,
registrando épocas e sinais de migrações sazonais de diferentes espécies, e assim
por diante. [31]
Isso vai de par com minha própria linha de análise alhures. São as classes
privilegiadas, com suas grandes propriedades, e as grandes corporações, com seus
insumos fortemente subsidiados, que têm condições de expandir a produção
mediante acréscimo extensivo de insumos e de ser relativamente ineficientes em
termos de produção por unidade de insumo. Os produtores de pequena escala, poroutro lado, sem acesso a grandes montantes de capital, têm de, necessariamente,
ser extremamente criativos em encontrar meios de fazer uso mais intensivo de
insumos limitados. Assim vem a ocorrer que a contraeconomia, ou economia
informal e caseira, seja a fonte de muita inovação em tecnologias de baixo overhead
e baixo custo. EmTeoria da Organização: Uma Perspectiva Libertária, escrevi:
…[A]s classes proprietárias usam formas menos eficientes de produção
precisamente por o estado dar-lhes acesso preferencial a grandes tratos de terra e
subsidiar os custos de ineficiência da produção em larga escala. As pessoasengajadas na economia alternativa, por outro lado, farão o uso mais intensivo e
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eficiente dos limitados terra e capital disponíveis para elas. Assim, o equilíbrio de
forças entre a economia alternativa e a capitalista não estará nem perto de ser tão
desigual quanto a distribuição de propriedade poderia sugerir.
Se toda pessoa capaz de beneficiar-se da economia alternativa participar dela, e
fizer uso pleno e eficiente dos recursos já disponíveis, no final teremos uma
sociedade onde a maior parte do que a pessoa média consome será produzido
numa rede de produção de autoempregados ou de propriedade de trabalhadores, e
as classes proprietárias serão deixadas com grandes tratos de terra e fábricas com
falta de funcionários quase inúteis para elas por tornar-se extremamente caro
empregar trabalho, exceto pagando preço não lucrativo. A essa altura a correlação
de forças terá mudado até que capitalistas e proprietários de terras se tornem ilhas
num mar cooperativo — e suas terras e fábricas se tornem a última coisa a cair, do
mesmo modo que a Embaixada Estadunidense em Saigon. [32]Esse é o mesmo princípio geral que John Robb, recorrendo à terminologia da
engenharia, chama de “compressão STEMI,” que Bucky Fuller chamou de
“efemerização,” que Mamading Ceesay chama de “economia da agilidade,” e Nathan
Cravens chama de “recursão produtiva.” Todas essas expressões equivalem, em
termos práticos, a extração mais eficiente de produção a partir dos insumos. [33]
O relato oficial, a versão tida por verdadeira/correta, oriunda de autoridades como
Schumpeter e Galbraith, diz-nos que a grande organização, altamente capitalizada,
gerencial, é fundamental para o progresso tecnológico; a ideologia altomodernistadas classes gerenciais inclui um “reflexo” de “desdém pela história e pelo
conhecimento do passado.” [34] Como escreveu Schumpeter:
…[H]á vantagens que, embora não estritamente inatingíveis no nível competitivo da
empresa, são, na prática, asseguradas apenas por exemplo no nível de monopólio,
porque monopolizar pode aumentar a esfera de influência dos melhores cérebros e
diminuir a esfera de influência dos cérebros inferiores, ou pelo fato de o monopólio
gozar de condição financeira desproporcionalmente mais elevada….
Não pode haver qualquer dúvida razoável de que, nas condições de nossa época, talsuperioridade é, na prática, a característica preeminente da unidade de controle de
larga escala. [35]
E Galbraith, desenvolvendo o mesmo tema, atribuiu a “uma benigna Providência” a
ascensão da “moderna indústria de umas poucas grandes firmas” como “excelente
instrumentalidade para induzir mudança técnica.”
…. O desenvolvimento técnico tornou-se há longo tempo domínio do cientista e do
engenheiro. A maioria das invenções baratas e simples já foram… feitas. Não
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apenas o desenvolvimento é mais sofisticado e dispendioso mas tem de ter escala
suficiente para sucessos e fracassos não destoarem muito entre si.
Pelo fato de o desenvolvimento ser dispendioso, segue-se só poder ser levado a
efeito por uma firma que disponha dos recursos vinculados a tamanho considerável.
Ademais, a menos de a firma dispor de substancial fatia do mercado, não terá
grande incentivo para empreender grandes gastos de desenvolvimento….
…[N]a moderna indústria compartilhada por umas poucas grandes firmas, porte e as
recompensas que se acrescem ao poder de mercado compõem-se para assegurar
que os recursos para pesquisa e desenvolvimento técnico fiquem disponíveis. O
poder que habilita a firma a ter alguma influência sobre os preços assegura que os
ganhos resultantes não sejam passados para o público por imitadores… antes de o
desembolso relativo ao desenvolvimento poder ser reembolsado….
O substantivo de tudo isso é ter de haver algum elemento de monopólio numa
indústria, para que ela possa ser progressista. [36]
Entretanto, quase sempre a verdade é o oposto. Como Hayek sugeriu (ver abaixo na
secção “Vendo Como Chefe e A Arte de Não Ser Gerido”), e como confirmado por
evidência empírica apresentada por escritores tais como Harvey Leibenstein e Barry
Stein, [37] adaptações e mudanças na configuração de maquinário existente, e
organização mais eficiente da produção de fábrica e equipamento já existentes —
coisas que custam pouco em termos de investimento novo, e que os trabalhadores
usualmente são quem tem melhores condições de determinar — podem resultar emmaiores aumentos de produtividade do que a introdução de uma nova geração de
maquinário. Grande parcela de inovação técnica consiste em mesclas criativas de
tecnologias já existentes e à venda, usadas como blocos de construção. E fatia
desproporcional dessa inovação provém de grupos trabalhando de maneira não
convencional que procuram reproduzir a pequena oficina dentro de uma burocracia
corporativa.
Tão amiúde quanto não (ou mais amiúde do que não), são as grandes corporações
oligopolistas capital-intensivas quem suprime ativamente a competição detecnologias de menor escala, menor custo e mais eficientes.
E é precisamente por causa de seu acesso privilegiado — e subsidiado — a grande
quantidade de terra, capital e outros recursos que os produtores em larga escala
podem dar-se ao luxo de ser ineficientes. Ao longo da maior parte do século 20, a
indústria estadunidense aumentou principalmente por meio de acréscimo extensivo
de insumos em vez de por extração intensiva de mais produção por unidade de
insumo. As práticas de cultivo intensivo do camponês do Terceiro Mundo ou do
pequeno agricultor estadunidense normalmente produzem várias vezes mais poracre do que a grande hacienda que mantém 80% de sua terra sem cultivo, ou do
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que a grande operação de agronegócio que ganha mais dinheiro mantendo terra
ociosa como investimento imobiliário apoiado pelo Departamento de Agricultura dos
Estados Unidos – USDA do que efetivamente cultivando-a. A despeito da retórica de
“nós alimentamos o mundo” do complexo USDA-agronegócios, o uso mais produtivo
da terra é o sistema biointensivo de John Jeavons de agricultura de canteiros maiselevados que o solo em volta, que pode alimentar uma pessoa com apenas um
décimo de acre.
Na verdade, contrariamente a Galbraith, é amiúde o poder de mercado da grande
organização que permite a ela suprimir inovação. Os produtores grandes e
ineficientes, havendo cartelizado um setor industrial entre eles próprios mediante
erguerem barreiras à entrada contra técnicas mais eficientes, desse modo se
isolaram dos maus efeitos da ineficiência competitiva. Com a indústria dividida entre
um punhado de grandes produtores com as mesmas técnicas ineficientes e asmesmas culturas organizacionais patológicas, não há penalidade competitiva para a
ineficiência porque todo mundo é igualmente ineficiente. As firmas dominantes
podem concordar em postergar a adoção de nova tecnologia até que suas fábricas e
equipamentos existentes se exauram — uma situação na qual, nas palavras de Paul
Goodman, “[t]rês ou quatro fabricantes controlam o mercado de automóveis,
competindo com preços fixados independentemente dos custos reais de produção, e
de aperfeiçoamentos dosadamente procedidos.” [38]
De acordo com Walter Adams e James Brock, a consolidação de númerorelativamente grande de firmas de tamanho médio nas Três Grandes – Big Three
depois da Segunda Guerra Mundial levou diretamente a significativa desaceleração
do ritmo de inovação. Elas atrasaram inovações tais como a tração dianteira, freios
de disco, injeção de combustível e coisas da espécie, durante anos. [39] Para tomar
um exemplo, os maiores fabricantes de automóveis entraram num acordo no final
dos anos 1950 segundo o qual nenhuma companhia anunciaria ou instalaria
qualquer inovação em dispositivos exaustores antipoluição sem a concordância das
outras; elas trocaram patentes e concordaram quanto a uma fórmula paracompartilhar os custos de patentes adquiridas de terceiros. [40]
A maior parte do código regulamentador consiste de medidas para todos os intentos
e propósitos escritas por grandes firmas das próprias indústrias regulamentadas,
para criminalizar a introdução de técnicas novas e mais eficientes.
Scott e R. A. Wilson: Poder e Comunicação.
Dominação e a Arte da Resistência [41], de Scott, é um estudo acerca de como a
comunicação é distorcida pelas relações de poder. Os pobres e subordinados, como
ele diz no Prefácio, dizem uma coisa na presença dos ricos ou de seus superiores eoutra entre eles próprios. O foco do livro é principalmente nesse fenômeno tal como
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ocorre nas relações de classe da sociedade como um todo e em relacionamentos de
produção agrária quase-feudais tais como escravidão, servidão e meeiros — não em
hierarquias burocráticas como as do órgão do governo ou da grande corporação. E o
caráter da comunicação ele próprio que é distorcido envolve precipuamente a
legitimidade da ordem de classes em vez de as informações necessárias paraprojeto ótimo de políticas ou organização de tarefas. O princípio geral que ele
descreve, contudo, é certamente aplicável a nossa presente área de interesse. Não
é preciso levar muito adiante a linha de análise dele para chegar-se ao dito de R. A.
Wilson de que ninguém diz a verdade a um homem com uma arma de fogo. Como
argumentou Wilson em “Treze Corais para o Divino Marquês,”
Uma civilização baseada em autoridade e submissão é uma civilização sem meios
de autocorreção. A comunicaçãoeficazflui apenas de um modo: do grupo dos
senhores para o grupo dos servos. Qualquer ciberneticista sabe que tal canal de umúnico sentido de comunicação carece de feedback e não tem como comportar-se
“inteligentemente.”
O epítome da autoridade-e-submissão é o Exército, e a rede de controle e
comunicação do Exército tem todos os defeitos que um pesadelo de ciberneticista
poderia conjurar. Seus padrões típicos de comportamento estão imortalizados no
folclore como SNTF (situação normal: todos fornicados), FAQE (fornicados além de
qualquer esperança) e ACERF (as coisas estão realmente fornicadas). Em forma
menos extrema, mas igualmente nosológica, estão as condições típicas de qualquergrupo autoritário, seja ele uma corporação, uma nação, uma família, ou toda uma
civilização. [42]
A comunicação de sentido único cria opacidade a partir de cima; a comunicação de
sentido duplo cria legibilidade horizontal. Para citar Michel Bauwens:
A capacidade de cooperar é verificada no próprio processo de cooperação. Portanto,
os projetos estão abertos a todos os chegantes, desde que tenham as habilidades
necessárias para contribuir para o projeto. Essas habilidades são verificadas, e
comunalmente validadas, no próprio processo de produção. Isso fica claro emprojetos abertos de publicação tais como o jornalismo participativo: qualquer pessoa
pode afixar os, e qualquer pessoa pode verificar a veracidade dos, artigos. São
usados sistemas de reputação para validação comunal. A filtragem dá-se a
posteriori, não a priori. O anticredencialismo contrasta pois com a revisão tradicional
por iguais, onde as credenciais são pré-requisito essencial para participar.
Os projetos P2P são caracterizados por holoptismo. O holoptismo envolve a
capacidade implícita e o projeto de processos entre iguais, permitindo aos
participantes livre acesso a todas as informações acerca dos outros participantes;não em termos de privacidade, mas em termos da existência e das contribuições
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deles (isto é, informações horizontais) e acesso aos objetivos, à métrica e à
documentação do projeto como um todo (isto é, informações verticais). Isso pode ser
contrastado com o panoptismo, característico dos projetos hierárquicos: os
processos são projetados para reservar o conhecimento ‘total’ para uma elite,
enquanto os participantes só têm acesso àquilo que é ‘indispensável saber’.Entretanto, nos projetos P2P, a comunicação não é de cima para baixo e baseada
em regras de relato estritamente definidas, e sim o feedback é sistêmico, integrado
no protocolo do sistema cooperativo. [43]
Wilson (com Robert Shea) desenvolveu o mesmo tema emO Illuminatus! Trilogia.
“….[E]m uma hierarquia rígida, ninguém questiona ordens que parecem vir de cima,
e aqueles bem no cimo estão de tal modo isolados da situação real de trabalho que
nunca vêem o que está acontecendo abaixo.” [44]
Um homem com arma de fogo só fica sabendo do que as pessoas consideram não oprovocará a puxar o gatilho. Visto que toda autoridade e governo estão baseados na
força, a classe senhorial, com sua carga de onisciência, vê a classe servil, com seu
fardo de necedade, precisamente como um assaltante de estrada vê sua vítima. A
comunicação só é possível entre iguais. A classe senhorial nunca obtém da classe
servil informação suficiente para saber o que realmente está acontecendo no mundo
onde a produtividade real da sociedade acontece…. O resultado só pode ser
deterioração progressiva entre os que mandam. [45]
Como veremos adiante na secção “Vendo Como Chefe e a Arte de Não Ser Gerido,”essa incapacidade da classe senhorial de abstrair informação suficiente, e essa
percepção da gerência pelos trabalhadores como “um assaltante de estrada,” resulta
no amealhamento de informação por aqueles que estão por baixo e o uso dessa
informação como fonte de rents.
O teórico da organização radical Kenneth Boulding, em veia similar, escreveu do
valor da “análise da maneira pela qual a estrutura organizacional afeta o fluxo de
informação,”
portanto afeta o insumo da informação para o tomador de decisão…. Há muitaevidência de que todas as estruturas organizacionais tendem a produzir falsas
imagens no tomador de decisões, e de que quanto maior e mais autoritária a
organização maior será a probabilidade de que seus tomadores de decisão de alto
escalão estejam operando em mundos puramente imaginários. [46]
Ou na incisiva frase de Bertram Gross: “Uma pessoa com grande poder não obtém
informação válida em absoluto.” [47]
Em sua discussão domētis, Scott traça uma conexão entre ele e a mutualidade
—“enquanto oposta a coordenação imperativa e hierárquica”—e reconhece sua
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dívida para com pensadores anarquistas como Kropotkin e Proudhon por essa
percepção. [48]Mētissó floresce num ambiente de comunicação nos dois sentidos
entre iguais, onde a pessoa em contato com a situação — a pessoa que realmente
faz o trabalho — está em situação de igualdade.
Interessantemente, R.A. Wilson havia anteriormente notado a mesma conexão entre
mutualidade — comunicação bilateral entre iguais — e informação precisa — em
“Treze Corais.” E incluiu sua própria alusão a Proudhon, não menos:
Proudhon era grande analista da comunicação, nascido 100 anos cedo demais para
ser compreendido. Seu sistema de associação voluntária (anarquia) está baseado
nos princípios simples de comunicação de que um sistema autoritário significa
comunicação num só sentido, ou estupidez, e um sistema libertário significa
comunicação em dois sentidos, ou racionalidade.
A essência da autoridade, como ele via, era a Lei — isto é, faça-se — isto é,
comunicação eficaz num sentido apenas. A essência de um sistema libertário, como
ele também via, era Contrato — isto é, acordo mútuo — isto é, comunicação eficaz
em ambos os sentidos. (“Redundância de controle” é a expressão técnica
cibernética.)
Em seu livro A Realidade de Quem Conta? Colocação do Primeiro em Último,
Robert Chambers descreve como as relações de autoridade distorcem o fluxo de
informação na elaboração da política de desenvolvimento do Terceiro Mundo.
O foco central de seu livro é o que ele chama de erros “enrustidos” (por oposição a
“aceitos”). Aceito é um erro o qual, na presença de mecanismo saudável de
feedback, é reconhecido e usado como ferramenta de aprendizado para corrigir
futuras tentativas de elaboração de políticas. Erros enrustidos, por outro lado,
“tendem a espalhar-se, a se autoperpetuar, e a se entranhar.” Fazem isso porque “se
adaptam ao que as pessoas poderosas querem acreditar,” [49] e pelo fato de as
pessoas poderosas estarem insuladas em relação a feedback eficaz.
Não apenas os erros enrustidos se adaptam ao que as pessoas poderosas querem
acreditar, mas os poderosos têm interesse velado na perpetuação de tais erros namedida em que eles reforçam o poder e os recursos disponíveis para eles. A
perpetuação do erro depende, em parte, de “quem ganha materialmente com aquilo
que as pessoas acreditam.”
Quanto o mito dá apoio a políticas, projetos e programas, muitos ficam em posição
de ganhar. Tanto indivíduos quanto organizações: burocratas, políticos, empreiteiros,
consultores, cientistas, pesquisadores e aqueles que financiam pesquisa; e suas
organizações — burocracias nacionais e internacionais, sistemas políticos,
companhias, firmas ou consultores, institutos de pesquisa e órgãos de financiamento
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de pesquisa. Qualquer um, ou diversos, ou todos esses podem beneficiar-se com a
aceitação de ideias, projetos ou políticas errados. [50]
Na presença de relações de poder hierárquicas, o fluxo de informação é distorcido —
além dos interesses velados — por diversos fatores que de algum modo se
imbricam. Primeiro o profissionalismo, no qual “crenças errôneas [ficam] embutidas
nos conceitos, valores, métodos e comportamento normalmente dominantes em
disciplinas e profissões.” Os erros enrustidos refletem “valores e crenças dominantes
atuais” reforçados pela cultura profissional e por contato entre pares profissionais.
[51]
Segundo, a “distância,” no sentido de aqueles no poder estarem “física,
organizacional, social e cognitivamente distantes das pessoas e condições em
relação às quais [estejam] analisando, planejando e prescrevendo, e acerca das
quais estejam fazendo previsões.” As pessoas no poder estão amiúde fisicamentedistantes, “situadas centralmente, em sedes, em escritórios, em laboratórios e em
postos de pesquisa,” muito longe das realidades com as quais suas políticas são
formuladas para lidar. [52]
Terceiro, o poder. Um cargo de poder — estar em posição superior de autoridade,
tendo controle do financiamento ou das perspectivas de carreira daqueles de quem
recebem relatórios etc. — tende a condicionar as percepções daqueles no cimo,
impedindo que aprendam. [53]
Para o aprendizado, o poder é uma deficiência. Parte da explicação do erropersistente reside nas relações interpessoais de poder. Profissionais poderosos
podem impor suas realidades…. O aprendizado dos que estão em cima é tolhido por
domínio pessoal, distância, negação, e responsabilização da vítima. De sua parte,
os que estão em baixo defendem-se por meio do que selecionam para mostrar e
contar, da diplomacia, e da tapeação. Autoengano e engano mútuo sustentam os
mitos. Pesquisas por questionário tendem a confirmar as realidades dos que estão
em posição superior, impondo seus constructos e refletindo suas realidades… Todo
poder tapeia, e poder excepctional tapeia excepcionalmente….….Todos os que são poderosos são por definição pessoas que estão no alto, por
vezes muitas vezes no alto. As outras pessoas relacionam-se com eles na condição
de pessoas que estão por baixo. Em suas vidas diárias muitos dos que estão no alto
ficam vulneráveis a aquiescência, deferência, lisonja e aplacamento. Não são
facilmente contraditos ou corrigidos. ‘A palavra deles prevalece’. Torna-se fácil e
tentador para eles… impor suas realidades e negar as dos outros. Torna-se difícil
para eles aprender. [54]
Vendo Como Chefe, e A Arte de Não Ser Gerido: Opacidade eMētis naHierarquia Corporativa.
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Hayek, em “O Uso do Conhecimento na Sociedade,” tratou o mercado como o
mecanismo principal para agregar conhecimento disperso ou oculto. O problema é
que os atores dominantes do mercado — grandes corporações — são ilhas de
planejamento centralizado num mar de mercado. E em grande parte da economia
são ilhas muito grandes, com o domínio do mecanismo de preços do mercadorelegado a estreitos canais entre elas.
Ora, como argumentou Ronald Coase, num livre mercado as fronteiras entre
planejamento centralizado e relações de preços no mercado seriam traçadas no
ponto onde o aumento de benefícios decorrentes de controle administrativo
cessasse de anular as ineficiências resultantes da perda do mecanismo de mercado.
Mas o que existe não é um livre mercado. É uma economia corporatista na qual o
estado subsidia os custos operacionais do grande porte e protege enormes
corporações ineficientes da pressão competitiva, de tal maneira que as ilhas deplanejamento central ficam muitas vezes maiores — e mais ineficientes — do que
provavelmente seriam num livre mercado.
Uma hierarquia corporativa interfere nas avaliações do que Hayek chamou de “as
pessoas no lugar,” e na coleta de conhecimento disperso de circunstâncias,
exatamente da mesma maneira que o estado faz.
A maioria das atividades de produção envolve considerável quantidade demētis, e
depende da iniciativa de trabalhadores para improvisar, aplicar habilidades de novas
maneiras, diante de eventos ou totalmente imprevisíveis ou não totalmenteprevisíveis. [55] Hierarquias rígidas e regras rígidas de trabalho funcionam num
ambiente previsível. Quando o ambiente é imprevisível, a chave do sucesso reside
na posse de poder e de autonomia por aqueles em contato direto com a situação.
As organizações hierárquicas são — para tomar de empréstimo uma frase luzente
de Martha Feldman e James March—sistematicamente estúpidas. [56] Por todas as
mesmas razões hayekianas que tornam uma economia planificada
insustentável,nenhumindivíduo é “genial” o suficiente para administrar uma grande
organização hierárquica.Ninguém — nem Einstein, nem John Galt — possui asqualidades para fazer uma hierarquia burocrática funcionar racionalmente. Ninguém
é genial a esse ponto, do mesmo modo que ninguém é genial o bastante para
administrar eficientemente o Gosplan — essa é toda a questão. Como disse Matt
Yglesias,
Creio ser digno de nota que a classe empresarial, como conjunto, tem uma visão
curiosa e de certo modo incoerente do capitalismo e de por que ele é uma coisa boa.
Na verdade, é, sob a maioria dos aspectos, uma visão retrógrada que contrasta
fortemente com a abordagem da ciência econômica ou política acerca de por que osmercados funcionam.
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A visão básica dos empresários está muito concentrada no papel fundamental
doexecutivo. Firmas boas, lucrativas, em crescimento são administradas por
executivos brilhantes. E a capacidade da firma de crescer e ser lucrativa é evidência
do brilho de seus executivos. Esse é parte do motivo pelo qual os salários dos
Executivos Principais – CEO precisam estar sempre subindo — recrutar o melhor éessencial para o sucesso. Os líderes de grandes firmas tornam-se figuras
reverenciadas…. Seu sucesso decorre de genialidade total….
O problema disso é que, se isso fosse geralmente verdade — se os CEOs da lista
das 500 da Fortune fossem brilhantes videntes econômicos — então faria muito
sentido implantar-se o socialismo. Socialismo real. Nada de tributação progressiva
para financiar um levemente redistributivo estado assistencialista. E sim “vamos
deixar Vikram Pandit e Jeff Immelt planejarem centralizadamente a economia —
afinal de contas, eles realmente são brilhantes!”No mundo real, porém, a questão dos mercados não é que os executivos sejam
espertos e os burocratas sejam broncos. A questão é queninguém é tão brilhante
assim. [57]
Não importa o quanto sejam esclarecidos e capazes, não importa o quanto
competentes, como seres humanos na lide com a realidade efetiva, ainda assim, por
sua própria natureza, as hierarquias insulam aqueles que estão no cume da
realidade do que está acontecendo abaixo, eforça-osa funcionar em mundos
imaginários onde toda a sua inteligência se torna inútil. Não importa o quanto osgerentes sejam inteligentes enquantoindivíduos, uma hierarquia burocrática torna a
inteligência deles menosusável. A única solução é dar discricionariedade àqueles
em contato direto com a situação. Como escreve Bruce Schneier no tocante a
segurança contra ataque:
A boa segurança tem como encarregadas pessoas. As pessoas são resilientes. As
pessoas conseguem improvisar. As pessoas conseguem ser criativas. As pessoas
conseguem desenvolver soluções adaptadas ao local específico…. As pessoas são
o ponto mais forte num processo de segurança. Quando um sistema de segurança ébem-sucedido perante ataque novo ou coordenado ou devastador, isso geralmente
se deve aos esforços das pessoas. [58]
O problema das relações de autoridade numa hierarquia é que, dado o conflito de
interesses criado pela presença do poder, aqueles com autoridade não
podem permitir-sedar discricionariedade àqueles em contato direto com a situação.
Resulta estupidez sistemática, inevitavelmente, de uma situação na qual uma
hierarquia burocrática tem de desenvolver alguma métrica para avaliar as
habilidades ou a qualidade do trabalho de uma força de trabalho acerca de cujotrabalho real ela nada sabe, e cujos interesses materiais militam contra sanar a
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ignorância da gerência. Quando a gerência não sabe (nas palavras de Paul
Goodman) “o que significa um bom trabalho,” é forçada a confiar em métrica
arbitrária.
A maior parte do constantemente crescente fardo de papelada existe para dar a
ilusão de transparência e controle a uma burocracia que está fora de contato com o
real processo de produção. A maioria da nova papelada é acrescentada para
compensar o fato de a papelada já existente refletir métrica pobremente concebida
que transmite pobremente a informação que supostamente mensura. “Se tão-
somente conseguirmos conceber o formulário perfeito, saberemos finalmente o que
está acontecendo.”
Numa hierarquia, os gerentes são forçados a ver “por espelho, em enigma” um
processo necessariamente opaco para eles porque eles não estão diretamente
envolvidos nele. Eles são forçados a realizar a tarefa impossível de desenvolvermétrica precisa para avaliar o comportamento dos subordinados, com base em
autorrelato de pessoas em relação às quais eles têm conflito fundamental de
interesses. Toda a carga de papelada que a gerência impõe aos trabalhadores
reflete tentativa de tornar legível um conjunto de relações sociais que, por sua
natureza, tem de ser opaco e vedado a ela, porque ela está fora dele. Cada novo
formulário visa a melhorar o até agora imperfeito autorrelato dos subordinados. A
necessidade de nova papelada está baseada na premissa de que o cumprimento
precisa ser verificado porque as pessoas que estão sendo monitoradas têm conflitofundamental de interesses com aqueles que elaboram as políticas, e portanto não se
pode confiar nelas; ao mesmo tempo, porém, a papelada depende do autorrelato
como principal fonte de informação. Toda vez que nova evidência é apresentada
mostrando que esta ou aquela tarefa não está sendo desempenhada de modo
satisfatório para a gerência, ou que tal política não está sendo observada, a despeito
das já existentes resmas de papelada, a reação da gerência é conceber mais outro
— e igualmente inútil — formulário.
Regras weberianas de trabalho resultam como consequência inevitável quandométricas de desempenho e qualidade não estão ligadas a feedback direto oriundo do
próprio processo de trabalho. Representam uma métricadetrabalho para alguém
que não é nem criador/fornecedor nem usuário final. E são necessárias — repetindo
— porque aqueles no cume da pirâmide não podem permitir-se deixar aqueles no
sopé terem liberdade para usar seu próprio bom senso. Uma burocracia não pode
permitir-se conceder a seus subordinados tal autonomia, porque alguém com
discricionariedade para fazer as coisas mais eficientemente também terá
discricionariedadel para fazer algo mau. E como o subordinado tem conflitofundamental de interesses com o superior, e não internaliza os benefícios de aplicar
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sua inteligência, não se torna confiável quanto a usar sua inteligência para benefício
da organização. Em tal relacionamento de soma zero, qualquer discricionariedade
pode levar a abuso.
Daí o pesadelo burocrático— como algo diretamente saído deBrazil— que Paul
Goodman descreveu no sistema de escolas públicas de Nova Iorque.
Quando os meios sociais ficam vinculados a organizações assim complicadas, torna-
se extraordinariamente difícil e por vezes impossível fazer uma coisa simples
diretamente, embora fazê-lo seja questão de bom senso e vá contar com aprovação
geral, como quando nem o filho, nem o progenitor, nem o bedel, nem o diretor da
escola podem retirar a trava de porta que está atrapalhando. [59]
Enquanto isso, “[u]m tipo antiquado de ferragem está especificado para todos os
novos edifícios, mantido em produção apenas para o sistema de escolas de Nova
Iorque.” [60] Você tem um Formulário 27-B?
Por outro lado, os subordinados não podem permitir-se contribuir com o
conhecimento necessário para projeto de um processo eficiente de trabalho. É boa a
analogia do “ladrão de estrada” de R.A. Wilson acima citada. Os trabalhadores veem
os gerentes como assaltantes que usarão contra eles qualquer informação que
obtenham. Gary Miller, emDilemas Gerenciais, argumentou que a confiança era a
característica mais distinta das empresas que faziam uso mais produtivo do capital
humano. Citou obras de economistas comportamentais e de teóricos de jogos
mostrando que as relações de confiança são construídas ao longo de interaçõesrepetidas, quando as partes sabem que lidarão uma com a outra no futuro. Ele usou
a remuneração por peça como ilustração. No curto prazo, a gerência poderia ter
incentivo racional para obter maior esforço mediante pagamento por peça fabricada,
cortando, mais tarde, esse tipo de remuneração. No longo prazo, porém, só será
possível extrair maior esforço se os trabalhadores confiarem em que a gerência não
mudará as regras do jogo, prejudicando-os; caso contrário, a estratégia racional
será, no caso dos trabalhadores, fugir das obrigações e evitar produzir acima da
média. A gerência poderá extrair maior esforço por meio de medidas prolongadas deconstrução de confiança demonstrando não ter a intenção de expropriar os ganhos
de produtividade decorrentes de maiores esforços. A gerência só conseguirá extrair
investimento de esforço e de habilidade dos trabalhadores em favor da produtividade
da empresa se lhes der direitos de propriedade de longo prazo na parcela deles dos
ganhos de produtividade, com garantias fidedignas contra expropriação. E os
relacionamentos de confiança sobre os quais repousa a disposição do trabalhador
para investir em esforço e habilidade, para revelar seus conhecimentos ocultos, são
todos extremamente frágeis e passíveis de fácil rompimento se a gerência trair essaconfiança. [61] Relacionamentos de confiança penosamente construídos ao longo do
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tempo podem ser destruídos do dia para a noite pelo idiota típico com mestrado em
administração de empresas que acha poder aumentar sua remuneração em opções
de ações mediante demitir metade da força de trabalho.
Sob esse aspecto, a prática japonesa (pelo menos até recentemente) de oferecer
garantias vitalícias de trabalho, e a segurança no emprego relativamente forte no
Capitalismo de Consenso Estadunidense, não foram propriamente o estofo da
“cultura de direitos assegurados” e de ineficiência que a direita sugere. Foram quase
ideais para a gerência de capital humano como investimento de longo prazo, e para
extrair os esforços, as habilidades e o conhecimento oculto da força de trabalho.
Como Waddell e Bodek destacam, as pessoas “não trabalharão mais arduamente se
a gerência tiver definido como meta final uma fábrica completamente automatizada,
enquanto incursiona pela fábrica caçando empregos a eliminar e pessoas a demitir.
As pessoas… não trabalharão mais arduamente para alguém que as tenha definidocomo custo variável.” [62] Quando os trabalhadores são definidos como custo
variável, “criam segurança no emprego mediante darem um jeito de o trabalho nunca
ser completado.” [63] Para mencionar apenas um exemplo, antes de uma fábrica da
Range Rover no Reino Unido fazer promessa de emprego vitalício, no início dos
anos 90, apenas 11% dos empregados entravam na competição anual de sugestões
de empregados, por medo de o aumento de eficiência levar a demissões. Depois da
garantia, a cifra subiu para 84%. E só uma dessas sugestões valeu para a empresa,
em economia, um milhão de libras. [64]Sanford Grossman e Oliver Hart oferecem base teórica para isso, argumentando que
a atribuição de direitos de propriedade pela firma afeta a produtividade porque a
atribuição de condição de requerente residual a uma parte reduz o incentivo da outra
para investir na firma. A parte requerente residual “usará [seu] controle dos direitos
residuais para obter fatia maior do excedente após excluídas as incertezas,” o que
levará a parte sem direito residual a subinvestir. Portanto, os direitos residuais devem
ser distribuídos de acordo com contribuições para a produtividade. [65] Dado que as
ações, numa corporação típica, valem diversas vezes o valor contábil dos haveresfísicos, e dada a enorme contribuição do capital humano para a produtividade, a
implicação fica clara.
De acordo com Gary Miller, remuneração adequada serve não apenas como salário
acima da média para reduzir rotatividade de capital humano como, também, extrai
conhecimento oculto que de outra maneira poderia ser explorada sob forma de rents
de informação. O problema é o relacionamento de soma zero entre gerência e
trabalhadores:
Visto que os salários de subordinados são custos para o dono dos lucros residuais, amaximização do lucro pelo centro é um obstáculo à resolução eficiente do problema
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tanto da informação oculta quanto da ação oculta. O desejo dos donos de maximizar
receitas deduzidos os pagamentos de salários para os membros da equipe
continuamente os induz os a optar por esquemas de incentivo que estimulam
fornecimento capcioso de informações estratégicas e métodos de produção
ineficientes por parte dos subordinados….
O dilema central numa hierarquia é pois como restringir o interesse próprio daqueles
com algo a ganhar ou perder no inevitável resíduo gerado por um sistema de
incentivos eficiente…. Haverá disponível, para o dono, um conjunto de alternativas
gerenciais que fará decrescer o tamanho total do bolo, aumentando contudo a fatia
do dono nesse bolo….
…. Uma empresa ficará melhor se puder garantir a seus subordinados seguro
“direito de propriedade” em dado plano de incentivos e o direito de controlar certos
aspectos de seu ambiente de trabalho e ritmo de trabalho…. A segurança dessesdireitos de propriedade pode dar aos empregados motivo para fazer investimentos
de tempo, energia e relacionamentos sociais que produzem crescimento econômico.
[66]
Isso quase nunca acontece porque, como argumenta Miller, a gerência percebe
como de seu interesse lançar-se à busca de interesses próprios mesmo a expensas
da produtividade total da firma. Portanto os trabalhadores, no modelo padrão do
capitalismo selvagem conduzido pelo mestre em administração de empresas, acaba
essencialmente refletindo as estratégias dos camponeses de Zomia (ver a secçãoabaixo “Espaços Estatais e Não Estatais”), tentando minimizar sua legibilidade em
relação à gerência e minimizar a probabilidade de aumento de produtividade
resultante de seu conhecimento oculto ser usado contra eles ou expropriado. O
conhecimento oculto — ouamealhado — dos trabalhadores é diretamente análogo
aos tubérculos dos camponeses zomianos escondidos no subsolo para impedir
confisco via incursões dos exércitos do estado.
Os rents que resultam de conhecimento privado detido por trabalhadores peritos,
dado o relacionamento de soma zero entre gerência e trabalhadores, são barreirainaceitável impeditiva de apropriação do produto do trabalho.
O aumento do controle do processo de trabalho pela gerência, e portanto a
apropriabilidade da produção — tornando a organização mais legível de maneira a
aumentar o produto líquido apropriável — é a real agenda no cerne das estratégias
de redução do nível de qualificação dos trabalhadores, como o taylorismo. Para
repetir a metáfora de Miller, quando tendo opção entre eficiência e controle — entre
um bolo maior e uma fatia maior de um bolo menor — a gerência usualmente prefere
maximizar o tamanho de sua fatia em vez de o tamanho do bolo. Como Scottargumenta, o controle leva a melhor sobre a eficiência:
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Como mostrou convincentemente a obra inicial de Stephen Marglin, o lucro
capitalista requer não apenas eficiência mas aconjugação de eficiência e controle.
As inovações cruciais da divisão do trabalho no nível de subproduto e a
concentração da produção na fábrica representam os passos decisivos para colocar
o processo de trabalho sob controle unitário. Eficiência e controle podem coincidir,como no caso da fiação e da tecelagem mecanizadas do algodão. Por vezes, porém,
podem não estar relacionados e até ser contraditórios. “A eficiência, na melhor das
hipóteses, cria um lucro potencial,” observa Marglin. “Sem controle o capitalista não
tem como materializar tal lucro. Assim, pois, formas organizacionais que aumentem
o controle capitalista poderão aumentar os lucros e ganhar o favor de capitalistas
mesmo se afetarem adversamente a produtividade e a eficiência. Inversamente,
maneiras mais eficientes de organizar a produção que reduzam o controle capitalista
poderão acabar reduzindo os lucros e sendo rejeitadas pelos capitalistas.”Quando a produção artesanal era mais eficiente, era “difícil para o capitalista
apropriar-se dos lucros de uma população dispersa de artífices.” [67]
Na agricultura, do mesmo modo, “a mera eficiência de uma forma de produção não é
suficiente para assegurar a apropriação de tributos ou lucros.”
A agricultura do pequeno proprietário independente poderá… ser o modo mais
eficiente de plantar. Contudo, tais formas de agricultura, embora possam apresentar
possibilidades para tributação e lucro quando seus produtos são juntados,
processados e vendidos, são relativamente ilegíveis e difíceis de controlar. Como nocaso de artesãos autônomos e lojistas pequeno-burgueses, monitorar os sucessos
comerciais de peixes pequenos é um pesadelo administrativo. As possibilidades de
evasão e resistência são numerosas, e o custo de conseguir dados precisos anuais
é alto, se não proibitivo. [68]
A produção dispersa via métodos artesanais quase sempre representou obstáculo
em relação a controle e apropriação. O objetivo do taylorismo era abolir o
conhecimento oculto e os rents que o acompanhavam. O taylorismo era um modo
pelo qual “o trabalho humano como sistema mecânico… podia ser decomposto emtransferências de energia, movimento, e física do trabalho.” Essa “simplificação do
trabalho em problemas isolados de eficiências mecânicas” facilitava “o controle
científico de todo o processo de trabalho.” E controle científico significava legibilidade
e expropriabilidade.
Para o gerente da fábrica ou o engenheiro, as novas linhas de montagem inventadas
tornavam possível o uso de trabalho não qualificado e de controle sobre não apenas
o ritmo de produção mas de todo o processo de trabalho. [69]
O gênio dos modernos métodos de produção em massa, Frederick Taylor, entendeucom grande clareza o problema de destruir mētis e de tornar uma população
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resistente, quase autônoma, de artesãos em unidades mais adequadas, ou
“empregados de chão de fábrica.” “Na gerência científica… os gerentes assumem…
o ônus de coletar todo o conhecimento tradicional que, no passado, era possuído
pelos artífices e, em seguida, de classificar, tabular e reduzir esse conhecimento a
regras, leis, fórmulas…. Assim, pois, todo o planejamento que, no antigo sistema,era feito pelos artífices precisa, inevitavelmente, ser feito pela gerência, em acordo
com as leis da ciência.” Na fábrica taylorizada apenas o gerente da fábrica tinha o
conhecimento e o comando do processo total, e o trabalhador era reduzido à
execução de uma pequena, amiúde minúscula, parte do processo total.
Isso poderia, por vezes, resultar em aumento de eficiência, disse Scott — mas
foisempre“um grande benefício para o controle e o lucro.” [70]
O taylorismo não apenas tirou poder dos trabalhadores; tão importante quanto isso,
deu poder aos gerentes e técnicos. Foi uma subespécie do que Scott chama de“ideologia altomodernista,” e mais especificamente de sua vertente estadunidense (o
movimento Progressista do início do século 20, precursor direto do liberalismo de
meados do século 20). O Progressismo e seu componente taylorista refletiam, e
serviam como instrumento de legitimação de, o desejo de poder das classes
gerenciais-profissionais de colarinho branco. A indústria deveria ser governada por
um conjunto de “melhores práticas,” regras weberianas de trabalho, melhor
conhecidas pelos especialistas no alto da hierarquia. E o regime de eficiência e
racionalidade — o que Scott chama de “autoritarismo de régua de cálculo —substituiria o conflito de classes pela “colaboração de classes” mediante crescentes
produção e racionalidade promovendo os interesses comuns de todos. [71]
Sob esse aspecto, o taylorismo dentro da corporação era um microcosmo da
ideologia altomodernista do Progressismo na sociedade em geral.
As ideologias altomodernistas incorporam preferência doutrinária por certas formas
de organização social… A maioria das preferências pode ser deduzida dos critérios
de legibilidade, apropriação e centralização de controle. Na medida em que os
arranjos institucionais possam ser facilmente monitorados e dirigidos a partir docentro e possam ser facilmente tributados (no mais amplo sentido de tributação),
provavelmente serão fomentados. [72]
Esse conjunto de preferências é tão verdadeiro da gerência corporativa quanto do
sistema político e social como um todo.
Se houve um apóstolo do modelo de meados do século 20 da organização industrial
— o modelo associado à organização política-econômica chamada ou de
“liberalismo corporativo” ou de “capitalismo de consenso” — foi Alfred Chandler.
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Onde a tecnologia subjacente de produção permitiu, o aumento da produção-por-
período-de-tempo [throughput] por meio de inovação tecnológica, o aperfeiçoamento
do projeto organizacional e o aperfeiçoamento das habilidades humanas levaram a
agudo decréscimo do número de trabalhadores necessários para produzir cada
unidade produzida. A proporção de capital em relação aos trabalhadores, demateriais em relação aos trabalhadores e de gerentes em relação aos trabalhadores,
para cada unidade produzida, tornou-se maior. Tais indústrias de alto volume logo se
tornaram intensivas em termos de capital, energia e gerência. [73]
Suspeito, porém, de que tais métodos de produção em massa intensivos em termos
de capital não eram tão eficientes em tantos casos quanto Scott imagina. Tais
métodos, como ressaltado por autores que escreveram sobre produção enxuta como
John Womack, ou William Waddell e Norman Bodek, tendem a ser mais eficientes
em cada estágio individual da produção — minimizando o custo unitário de cadamáquina específica e maximizando sua [?] — criando ao mesmo tempo aumento de
custo mais do que anulador daquela economia, oriundo de estoque, overhead e
marketing e distribuição em geral.
De qualquer forma,mētis e conhecimento disperso nunca podem ser completamente
taylorizados a partir do processo de produção. Tentativas daqueles em posição de
autoridade de minimizar a discricionariedade mediante redução das tarefas a rotinas
padronizadas e previsão de todas as contingências possíveis em regras só podem
redundar em séria degradação da eficiência, precisamente por ser impossível prevertodas as contingências ou conceber regras gerais que não requeiram exceções
diante de circunstâncias inesperadas.
O sonho utópico da taylorização — uma fábrica na qual todo par de mãos fosse mais
ou menos reduzido a movimentos automáticos, à moda de robôs programados —
era irrealizável. Não que isso não tenha sido tentado. David Noble descreveu a bem-
financiada tentativa de fabrico de máquinas operatrizes por meio de controles
numéricos porque isso prometia “emancipação em relação ao trabalhador humano.”
O fracasso final aconteceu precisamente porque o projeto do sistema havia excluídomētis — os ajustes práticos que um trabalhador experiente faria para compensar
pequenas mudanças em material, temperaturas, a fadiga ou irregularidades na
máquina, mau funcionamento mecânico, e assim por diante. Como disse um
operador, “Pretende-se que os controles numéricos sejam como mágica, mas tudo o
que se consegue produzindo automaticamente é sucata.” Essa conclusão poderia
ser generalizada. Numa brilhante etnografia das rotinas de trabalho de operadores
de máquina cujas tarefas pareciam ter sido completamente destituídas de
qualificação, Ken Kusterer mostrou como os trabalhadores, todavia, tiveram dedesenvolver habilidades individuais as quais eram absolutamente indispensáveis
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para produção bem-sucedida, mas que nunca poderiam ser reduzidas a fórmulas
que um novato pudesse usar imediatamente.
No incidente a que Scott aludiu, como descrito por Noble, “[o]s trabalhadores cada
vez mais recusaram-se a tomar qualquer iniciativa”
— para fazer manutenção simples (tal como tirar fiapos do leitor de fita), ajudar a
diagnosticar mau funcionamento, consertar ferramentas quebradas, e até evitar uma
colisão. A taxa de produção de refugo disparou… juntamente com tempo de
máquinas paradas, e baixo moral produziu as taxas mais altas de absenteísmo e
rotatividade de pessoal. Tornou-se comum empregados ausentarem-se do local de
trabalho e, sob constante assédio dos supervisores, os operadores desenvolveram
engenhosos métodos secretos de manter alguma medida de controle do próprio
trabalho, inclusive uso astuto de controles manuais interferentes no funcionamento
automático de máquinas.
….A parte da fábrica com o equipamento mais sofisticado tornara-se a parte da
fábrica com mais alta taxa de refugo, de rotatividade de pessoal, e de mais baixa
produtividade…. [74]
Na verdade, as organizações hierárquicas dependem, para continuação de
funcionamento, da disposição dos trabalhadores para tratar regras baseadas em
autoridade como uma forma de irracionalidade e passar ao largo delas. Scott dá o
exemplo da URSS, onde num congresso de especialistas em agricultura durante
a perestroikade Gorbachev
houve quase unanimidade dos participantes na exasperação acerca do que três
gerações haviam feito com as habilidades, a iniciativa e o conhecimento dos
kolkhozniki…. Subitamente uma mulher de Novosibirsk os repreendeu: “Como vocês
acham, para começo de conversa, que as pessoas do campo sobreviveram durante
sessenta anos de coletivização? Se elas não tivessem usado sua iniciativa e
sagacidade, não teriam chegado até aqui! [75]
Exatamente. Para nossos objetivos, a União Soviética pode ser tratada como um
caso em que uma única corporação era dona de uma economia nacional inteira, como Politburo como diretoria, a KGB como os sabotadores dos movimentos dos
trabalhadores e os ministérios industriais como divisões de produção dentro de uma
gigantesca estrutura de formato multidivisional. Pelo fato de a economia soviética
inteira ser de propriedade de um único conglomerado, com barreiras autárquicas à
competição vinda de fora, os únicos limites ao nível de ineficiência que ela podia
tolerar eram estabelecidos pela necessidade de impedir colapso econômico ou
político. Ou, para inverter a comparação, a grande corporação é um microcosmo da
economia planificada soviética, na qual os trabalhadores usam sua iniciativa paracontornar a irracionalidade burocrática imposta de cima.
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A grande corporação tacitamente depende dos trabalhadores que desenvolvem
meios de contornar e de desprezar regras irracionais para manterem a produção em
andamento a despeito da gerência, do mesmo modo que o Ministério de Serviços
Centrais, em Brazil, dependia de pessoas como Harry Tuttle. O desaparecimento do
mercado paralelo e da atividade nalevo teria tido o mesmo efeito na URSS que umagreve tipo operação padrão numa corporação.
Scott escreve ser impossível, devido à natureza das coisas, toda pessoa implicada
no processo de produção ser destilada, formalizada ou codificada em forma legível
pela gerência.
…[A] ordem formal codificada nos projetos de engenharia social inevitavelmente
deixa de fora elementos essenciais a seu funcionamento real. Se a fábrica [da
Alemanha Oriental] fosse forçada a funcionar apenas dentro da raia dos papéis e
funções especificados no projeto simplificado, rapidamente pararia. Economias decomando coletivizado praticamente em toda parte só conseguiram avançar mal e
mal graças à amiúde desesperada improvisação de uma economia informal
totalmente fora de sua representação diagramática.
Enunciado de forma um tanto diferente, todos os sistemas socialmente engendrados
de ordem formal são, na verdade, subsistemas de um sistema maior do qual são, em
última análise, dependentes, para não dizer parasitários. O subsistema depende de
uma gama de processos — frequentemente informais ou antecedentes — que
sozinho ele não consegue criar ou manter. Quanto mais esquemática, enxuta esimplificada a ordem formal, menos resiliente e mais vulnerável fica ela a
perturbações externas a seus estreitos parâmetros….
É, acredito, característico de grandes sistemas formais de coordenação serem
acompanhados de aparentes anomalias as quais, porém, quando inspecionadas
mais de perto, revelam-se parte integrante daquela ordem formal. Grande parte
disso poderia ser chamado de “mētis em operação de socorro….” Uma economia de
comando formal… depende de comércio miúdo, escambo e acordos normalmente
ilegais…. Em cada caso, a prática em desacordo com as normas é condiçãoindispensável para a ordem formal. [76]
… Em cada caso, o necessariamente delgado, esquemático modelo de organização
e produção social inspirador do planejamento era inadequado como conjunto de
instruções para criação de uma ordem social bem-sucedida. Por si próprias, as
regras simplificadas nunca conseguem gerar uma comunidade, cidade ou economia
que funcione. A ordem formal, para ser mais explícito, é sempre e em algum grau
considerável parasitária de processos informais, que o esquema formal não
reconhece, sem os quais não conseguiria existir, e que sozinho não consegue criarou manter. [77]
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O mesmo é verdade, naturalmente, na “economia de comando coletivizado” da
grande corporação ocidental. Bom exemplo é o conhecimento oculto de
trabalhadores de central telefônica de um serviço público privatizado.
À medida que surgiram sucessivos problemas nos sistemas, ficou claro para a
equipe que as pessoas que haviam projetado os sistemas tinham conhecimento
inadequado do conteúdo do trabalho dos funcionários, achando ser ele muito menos
complexo do que em realidade era. De certo modo ironicamente, a introdução de
sistemas visantes a simplificar e padronizar o trabalho dos funcionários em realidade
chamou a atenção dos funcionários para o fato de eles emprestarem à empresa
determinado tipo de competência técnica que não pode facilmente ser escrito dentro
de um programa de computador. Como observou um funcionário, “Cada secção
envolvia conhecimento que tem de ser obtido pela experiência, que não pode ser
embutido nos sistemas”…. Um funcionário de suprimento explicou:…. Não acredito termos entendido, antes, o quanto a gerência depende do que nós
conhecemos acerca do trabalho…. Ela supunha saber tudo o que nós fazíamos,
dizia “Sabemos os procedimentos, temo-los por escrito.” Acredito ter sido forte
choque para ela descobrir que não sabia, que o procedimento escrito não é
necessariamente como a gente faz o trabalho, as descrições de tarefas não têm
como abranger tudo.” [78]
E, desobediência formal à parte, a diferença entre o que Oliver Williamson chamou
de “cooperação consumada” e apenas “cooperação perfunctória — distinção quegira em torno da contribuição ativa, pelo trabalhador, de seu conhecimento disperso
ou mētis para o processo de produção, por oposição a fazer apenas o mínimo
necessário para evitar ser demitido — faz enorme diferença para o nível de
funcionamento de referido processo.
A cooperação consumada é uma atitude de trabalho afirmativa — de incluir o uso do
discernimento, preencher lacunas, e tomar iniciativa de maneira fundamental. A
cooperação perfunctória, em contraste, envolve desempenho de trabalho de tipo
minimamente aceitável…. O resultado é que os trabalhadores, ao passarem a adotarum modo de desempenho perfunctório, ganham condições de “destruir” ganhos
idiossincrásicos de eficiência. [79]
Como argumenta J. E. Meade, trata-se de simples comportamento de maximização
de utilidade: Empregado assalariado “terá de observar o padrão mínimo de trabalho
e esforço a fim de manter seu emprego; mas não terá motivo financeiro pessoal
imediato… para comportar-se de modo que promova a lucratividade da empresa….
[Q]ualquer lucro extra devido a seu esforço extra será creditado, em princípio, ao
empresário….” [80]
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E conhecimento oculto significa, escreve Williamson, ser impossível “descobrir se os
trabalhadores põem sua energia e inventividade no trabalho de maneira que
possibilite ser plenamente materializada economia de custos específica de
tarefas….” [81] Nas palavras de Paul Milgrom e John Roberts, “apenas o agente tem
conhecimento da ação que praticou na persecução de seus próprios objetivos oudos do chefe, ou apenas o agente tem acesso ao conhecimento específico no qual
sua ação está baseada.” [82]
Os conceitos de Williamson de cooperação consumada e perfunctória estão
implícitos nesta passagem de Hayek:
Conhecer e colocar em uso uma máquina não completamente empregada, ou a
habilidade de alguém que poderia ser melhor utilizada, ou estar consciente de um
excedente de estoque ao qual se possa recorrer durante uma interrupção do
suprimento, é socialmente tão útil quanto o conhecimento de técnicas alternativasmelhores. [83]
…. Será verdade que, uma vez tendo sido construída uma fábrica, o resto é mais ou
menos mecânico, determinado pelo caráter da fábrica, ficando pouco por ser
mudado na adaptação às sempre cambiantes circunstâncias do momento?
…. Numa indústria competitiva, de qualquer forma… a tarefa de impedir que os
custos subam requer luta constante, absorvendo grande parte da energia do
gerente. O quanto é fácil para um gerente eficiente dissipar os diferenciais sobre os
quais repousa a lucratividade e o ser possível, com as mesmas facilidades técnicas,produzir com grande variedade de custos contam-se entre os lugares-comuns da
experiência de negócios que não parecem ser igualmente encontradiços no estudo
do economista. [84]
E Oliver Williamson escreveu, na mesma tecla, que “[q]uase todo trabalho envolve
algumas habilidades específicas.”
Mesmo os mais simples trabalhos de guarda/manutenção são facilitados pela
familiaridade com o ambiente físico específico do local de trabalho nos quais estejam
sendo realizados. O funcionamento aparentemente rotineiro de máquinaspadronizadas pode ser auxiliado, de modo importante, pela familiaridade com o
equipamento operacional específico…. Em alguns casos os trabalhadores são
capazes de prever o problema e diagnosticar sua origem graças a sutis mudanças
no som ou cheiro do equipamento. Ademais, o desempenho em alguns empregos de
produção ou de gerência envolve um elemento de equipe, e constitui habilidade
crítica a capacidade de trabalhar eficazmente com os membros existentes da
equipe…. [85]
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A disposição da força de trabalho de cooperar consumadamente em vez de
perfunctoriamente, de contribuir com seu conhecimento disperso, é possivelmente o
principal fator determinante na amplitude potencial de custos de determinado
conjunto de recursos técnicos. E o capital humano da empresa — conhecimento e
repertório ocultos de habilidades específicas de tarefa dos quais a gerênciararamente sequer tem conhecimento pelo fato de não haver como comunicá-los por
meio de hierarquia, a rede de relacionamentos pessoais da qual a produção
depende — é a fonte de grande parte do patrimônio de uma firma, e responde pela
lacuna entre seu valor patrimonial e seu valor escriturado nos livros (isto é, o valor de
mercado de seus haveres físicos). Nada obstante, como veremos adiante, a
gerência, dentro das convenções da contabilidade sloanista, trata o trabalhador e
suas habilidades como custo direto, em vez de haver de capital que custa dinheiro
para substituir, e faz tudo o que pode para periodicamente dizimar seu capitalhumano.
Quando resolvem parar de escorar o sistema mediante desconsiderar suas regras
irracionais os trabalhadors podem, com efeito, por meio de sua própria obediência,
ficar imóveis e permitir que ele se destrua por meio de sua própria irracionalidade. Já
vimos a descrição de David Noble de os trabalhadores retirarem sua cooperação
consumada no caso de maquinário numericamente controlado. Mais geralmente,
Scott destaca a greve tipo operação padrão como aplicação prática, do ponto de
vista do trabalhador, da dependência da organização formal do sistema mais amplode processos informais:
Numa ação de operação padrão… os empregados começam a executar suas
atividades mediante observarem meticulosamente cada uma das regras e
regulamentações, cumprindo apenas as obrigações enunciadas nas descrições de
suas tarefas. O resultado, plenamente deliberado nesse caso, é que o trabalho para,
ou pelo menos anda a passos lentos…. Na longa operação padrão contra a
Caterpillar, a grande fabricante de equipamentos, por exemplo, os trabalhadores
reverteram à observância dos ineficientes procedimentos especificados pelosengenheiros, sabendo que eles custariam à empresa valiosos tempo e qualidade,
em vez de continuarem a usar as práticas mais rápidas e eficazes que havia longo
tempo tinham concebido para as atividades. Basearam-se na assunção testada de
que trabalhar estritamente de acordo com as normas é necessariamente menos
produtivo do que trabalhar com iniciativa. [86]
Infelizmente, trabalhadores que tentam degradar a eficiência da produção mediante
trabalhar de acordo com as regras poderão descobrir que não conseguem competir
com a gerência. A prática de redução corporativa de pessoal para reduzir custos[downsizing] em anos recentes tem equivalido a destruição sistemática — pela
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gerência! — do conjunto de processos informais do qual a produtividade da
organização depende.
David Jenkins, em 1973, argumentou que os “[a]dmiráveis resultados de curto prazo”
conseguidos pelo downsizing geralmente acontecem ao preço de “uma catástrofe no
longo prazo.”
Tal conduta, diz [Rensis] Likert, é estimulada por sistemas empresariais de
recompensa que “permitem a um gerente que seja um ‘artista da pressão’ obter altos
ganhos em poucos anos, enquanto destrói lealdades, atitudes favoráveis,
motivações cooperativas etc. entre os membros supervisores e não supervisores da
organização.”….
O que acontece nesses casos, com efeito, é recursos valiosos estarem sendo
descartados, e estar sendo dado impulso artificial de curto prazo aos ganhos.
Nenhuma gerência concordaria com tratamento assim desdenhoso em relação a
haveres físicos…. Como os recursos humanos não aparecem na folha de balanço,
podem ser destroçados à vontade por gerentes voltados para “os finalmente” …para
efeito de uma injeção espúria nos ganhos. [87]
Duas décadas depois, durante a onda de downsizing dos anos 1990, Kim Cameron
arrolou os problemas que normalmente resultavam do downsizing:
…(1) perda de relacionamentos pessoais entre empregados e clientes; (2)
destruição de confiança e lealdade entre empregados e clientes; (3) ruptura de
rotinas tranquilas e previsíveis na firma; (4) aumento de formalização (dependência
de regras), estandardização, e rigidez; (5) perda de conhecimento interunidades e
interníveis que advém de longevidade e interações ao longo do tempo; (6) perda de
conhecimento acerca de como reagir a aberrações fora da rotina enfrentadas pela
firma; (7) decréscimo de documentação e portanto menos compartilhamento de
informação acerca de mudanças; (8) perda de produtividade do empregado; e (9)
perda de cultura organizacional comum. [88]
Alex Markels cita consultor de gerência dizendo que, em ocorrendo downsizing,
“uma empresa tem gravemente afetado seu progresso por causa de perda de‘conhecimento e capacidade de tomada de decisões acertadas adquiridos ao longo
dos anos.’” [89]
Bom exemplo é a prática de contratação na área de varejo. Há quarenta anos o
pessoal de vendas em lojas de roupas e sapatos era geralmente formado de
empregados de carreira que ganhavam salário suficiente para viver, e que
conheciam os gostos dos clientes e as linhas de produtos por dentro e por fora.
Daquela época em diante, os donos de lojas substituíram aqueles empregados de
carreira por trabalhadores de salário mínimo egressos do curso médio.
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Esse foi essencialmente o desempenho de Bob Nardelli, do Home Depot – HD, pelo
qual ganhou $210 milhões de dólares na rescisão de contrato. De acordo com Tom
Blumer, do BizzyBlog, o meio pelo qual Nardelli aumentou os ganhos de curto prazo
envolveu o seguinte:
A consolidação que ele fez da função de compras e de muitas outras funções em
Atlanta, a partir de diversas regiões, levou compradores a perderem contato com as
pessoas que vendiam para eles….
A demissão de pessoas com conhecimento e experiência em favor de novatos
desinformados e empregados em tempo parcial reduziu grandemente os custos de
folha de pagamento e de benefícios, mas no final fez a empresa perder clientes, e
deu à empresa reputação altamente merecida de desempenho medíocre. [90]
Nardelli e seus subordinados manipularam toda contabilidade, aquisição e
esquemas de meia-sola que puderam para manter os números parecendo bons,
enquanto deixavam os negócios deteriorarem-se. [91]
Desde então fiquei sabendo que Nardelli, nos últimos meses antes de ir-se, tirou a
função de compras inteiramente para fora de Atlanta e a transferiu para… a Índia —
dentre todas as possibilidades de terceirização estrangeira.
Dizem-me que “sem contato” nem começa a descrever o quanto as coisas estão
ruins agora entre as lojas do HD e Compras, e entre Compras do HD e os
fornecedores.
Não apenas há uma barreira de dialeto linguístico como, também, as pessoas que
trabalham em compras na Índia não conhecem a “língua” dos equipamentos
estadunidenses — e nem sabem sequer como é a metade dos produtos que lojas e
fornecedores descrevem.
Dizem-me que incrível quantidade de tempo, dinheiro e energia está sendo gasta —
tudo em nome do que era, de toda verossimilhança, meta alimentada por
recompensas para corte de pessoal e para fazer as despesas gerais e
administrativas parecerem baixas (“parecerem” baixas porque as despesas foram
empurradas para baixo para as lojas e fornecedores). [92]
Essa prática foi parodiada em Rei da Colina na pessoa do adolescente com cara
coberta de espinhas e vestindo guarda-pó azul do “Megalo-Mart,” que não se fazia a
menor ideia de onde Hank poderia encontrar um martelo. Infelizmente, não se tratou,
em realidade, de uma paródia. Já vi isso com meus próprios olhos no departamento
de jardinagem da Lowe’s. A resposa invariável do pessoal a pedido de qualquer
ajuda para achar um produto é algo como “Não sei. Acho que se o senhor não está
vendo, é porque não tem.”
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Esse tipo de diminuição deliberada da competência dos trabalhadores de serviços a
expensas da qualidade, para transferir recursos para cima, tirando-os da equipe de
apoio ao cliente em favor dos salários e bônus do Executivo Principal, só pode
ocorrer numa área na qual a competição em qualidade de serviços ao cliente tenha
sido suprimida pela cartelização. Quando o mercado é controlado por um punhadode firmas oligopolistas gigantescas com a mesma cultura disfuncional, as firmas
podem permitir-se serviço reles e de meia-tigela.
Como mencionado anteriormente, tudo isso reflete a métrica sloanista pela qual a
gerência corporativa superior mensura custo e eficiência, em termos aproximados
comparável à métrica pela qual os integrantes do Gosplan tentavam gerir a
economia soviética.
Ludwig von Mises argumentou, em Burocracia, que a hierarquia corporativa
enquanto tal não era uma burocracia em sentido estrito. A burocracia,necessariamente, era uma gerência baseada em regras, com processos definidos ao
longo de linhas weberianas, em vez de gerência baseada no lucro, por não produzir
nenhum produto comercializável e por sua produção não ter preço de mercado. A
grande empresa comercial, por outro lado, era — graças ao milagre da escrituração
por partidas dobradas — uma extensão da vontade do empresário. O empresário
podia rastrear os lucros e prejuízos de cada subdivisão e atuar de acordo com os
dados para transferir o investimento de uma divisão para outra e disciplinar ou
substituir gerentes. [93] Isso equivalia a um reflexo da abordagem neoclássica detratar a firma como ator unitário no mercado e seu funcionamento interno como caixa
preta.
A ênfase de Mises quanto à natureza empresarial da corporação negligencia
diversos fatos. Primeiro, o preço de transferência interno da corporação equivale ao
proposto pelo socialista de mercado Oskar Lange, que Mises desqualificou como
“dando uma de capitalista.” Pelo fato da maioria dos bens intermediários produzidos
por uma firma — componentes de produto e coisas que tais — serem específicos de
produto, não há mercado externo para eles. Portanto, os preços de transferênciainternos têm de ser estimados indiretamente, em base de acréscimo sobre o custo,
muito longe de quaisquer preços reais de mercado — exatamente do mesmo modo
que os planejadores econômicos soviéticos dependiam indiretamente de
informações de preços de mercado das economias ocidentais para estabelecer seus
próprios preços. [94]
Segundo, a gerência das grandes corporações típicas não é formada, de facto, por
servos contratados do empreendedor ou investidor. No mundo real, lutas entre
representantes/procuradores quase sempre fracassam, tomadas hostis tornaram-seraras desde que a gerência desenvolveu contramedidas nos anos 1980, e a maior
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parte do investimento novo — em contraste com fusões e aquisições — é financiada
internamente por meio de ganhos retidos. Em realidade, o acionista é apenas outra
classe de requerente contratual com direito a que dividendo a gerência considerar
adequado emitir (se considerar) e a participar do ritual vazio da reunião de
acionistas. O real requerente residual, pelo menos em grandes “corporaçõesconsumadas” de propriedade do público onde a propriedade das ações é difusa, é a
gerência superior. Na prática, a gerência de tais corporações é uma oligarquia que
se autoperpetua, em controle de massa livremente flutante de capital sem dono —
de modo muito parecido com a gerência burocrática da antiga URSS. Assim, a
gerência superior, como os gerentes da fábrica socialista de Lange, está “dando uma
de empresária” — fazendo jogos de azar com capital para o qual não contribui a
partir de seus próprios esforços do passado, e não correndo o risco de prejuízos
pessoais, tendo por outro lado a possibilidade de ganhar muito dinheiro se a apostader certo.
Terceiro, não existe métrica politicmente neutra ou imaculada, seja a “escrituração
por partidas dobradas” ou o que mais seja. As funções de processamento de
informação de uma hierarquia amiúde tolhem a agregação de conhecimento
disperso — na corporação, tanto quanto no estado. A métrica de eficiência, lucro e
prejuízo numa grande corporação reforça os interesses da gerência. No modelo
dominante de contabilidade gerencial sloanista, como descrito por William Waddell e
Norman Bodek, o trabalho é praticamente o único custo direto variável que agerência tenta minimizar. Custos administrativos como salários da gerência,
overhead geral, custos de armazenamento de estoque etc., são tratados como
custos diretos fixos. Maximizar o retorno sobre o investimento – ROI de cada estágio
da produção, mediante maximizar o fluxo e minimizar as horas diretas de trabalho é
praticamente a única medida de corte de custos considerada. Salários da gerência e
outros custos administrativos, desembolsos desperdiçadores ou irracionais de capital
etc. não contam porque, como overhead, são incorporados (pelo milagre da
“absorção de overhead”) aos preços de transferência de bens acabados que são“vendidos” ao estoque. E, na contabilidade sloanista, o estoque é um haver líquido
que se acresce ao valor escriturado da empresa — mesmo que não haja
encomendas dele e ele acabe tendo o preço baixado e sendo vendido com prejuízo,
ou até baixado como de venda impossível. Essa prática equivale a “aumentar os
números mediante varrer o overhead para baixo do tapete e para dentro do estoque.”
[95]
Assim, a despeito do fato de os salários e benefícios dos trabalhadores de produção
representarem normalmente dez por cento ou menos do custo unitário total,
sistematicamente vemos mestres em administração de empresas – MBA
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obsessivamente manejando a peneira para eliminar todo segundo livre de trabalho
direto — enquanto deixam passar batido overhead oriundo de custos administrativos
e buracos de ratazanas de gastos de capital em quantidade oceânica. [96] Os custos
administrativos da corporação e a organização de estilo Rube Goldberg tipicamente
parecem-se com aqueles do Ministério de Serviços Centrais de Brazil, e a alocaçãode investimentos em fábricas e equipamentos físicos tipicamente assemelham-se ao
desenvolvimento irregular de uma economia centralizadamente planificada.
Os investimentos irracionais de capital na grande corporação guardam semelhança
com as predições de Mises relativas ao planejamento sob o socialismo de estado —
isto é, “envolveriam operações o mérito das quais não poderia nem ser previsto
antecipadamente nem ser aferido depois de terem ocorrido.” [97] Como Richard
Ericson disse dos regimes comunistas, a corporação tem como realizar grandes
feitos de engenharia sem considerar o custo.Quando o sistema persegue um poucos objetivos prioritários, independentemente
dos sacrifícios ou prejuízos em áreas de menor prioridade, os responsáveis últimos
não têm como saber se alcançar o sucesso valeu a pena. [98]
Vejo regularmente exemplos disso no hospital onde trabalho. O dinheiro é despejado
em expansões multimilionárias da Sala de Emergência, e em reformas de andares
inteiros que alteram radicalmente os leiautes — limitadas apenas pela presença de
paredes mestras — de maneiras que os tornam menos funcionais. A gerência
adquire maquinário enormemente dispendioso como o robô cirúrgico Da Vinci, eexpande seu leque de procedimentos dispendiosos de alta tecnologia tais como
cateterismo cardíaco — tudo em busca de valor de prestígio público — enquanto faz
cortes na equipe de enfermagem e transforma as alas de cuidados aos pacientes em
pocilgas infectas e com falta de pessoal de atendimento, levando os custos
decorrentes de quedas e de estafilococos áureos resistentes à meticilina para as
alturas.
Em suma, a alocação interna de capital na grande corporação segue um padrão
muito parecido com a descrição de Hayek da economia planificada do socialismo deestado:
Não há motivo para esperar que a produção pare, ou que as autoridades tenham
dificuldade em usar os recursos disponíveis de alguma forma, ou mesmo que a
produção seja permanentemente menor do que era antes do início da planificação….
[Devemos esperar] é o desenvolvimento excessivo de algumas linhas de produção a
expensas de outras e o uso de métodos inadequados consideradas as
circunstâncias. Devemos esperar encontrar superdesenvolvimento de algumas
indústrias a um custo não justificável pela importânica do aumento de sua produçãoe ver incontida a ambição do engenheiro de aplicar os mais recentes progressos
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alhures, sem considerar se economicamente adequados face à situação. Em muitos
casos o uso dos métodos mais recentes de produção, que não poderiam ter sido
aplicados sem planejamento centralizado, seria então sintoma de mau uso do
recursos em vez de prova de sucesso.
Um exemplo que ele cita — “a excelência, do ponto de vista tecnológico, de algumas
partes do equipamento industrial russo, que amiúde impressiona o observador
superficial e é comumente vista como evidência de sucesso” — é diretamente
comparável ao acima mencionado robô Da Vinci. [99]
O problema que Hayek descreve é complicado pelo fato de a própria “produção” ser
uma métrica sem sentido nessas circunstâncias. Na “absorção de overhead”
sloanista, do mesmo modo que no planejamento centralizado soviético, o sistema de
preços de transferência internos baseado no consumo de insumos, e o repasse de
custos para o consumidor via margem acrescida ao custo, significa que qualquerconsumo de insumos que possa ser incorporado ao “preço” dos bens acabados —
na acepção da palavra — é produção.
Os atores dominantes de um mercado oligopolizado podem ficar impunes em
relação a todas essas formas de irracionalidade — a supressão de tecnologias mais
novas e eficientes, a desqualificação da força de trabalho e a substituição de mētis
por techne porque os grandões compartilham da mesma cultura organizacional.
A Arte de Não Ser Governado: Espaços Estatais e Não Estatais.
O que Scott chama de “espaços estatais e espaços não estatais” é o tema central de
A Arte de Não Ser Governado. Os espaços estatais, escreveu Scott em Vendo Como
um Estado, são regiões geográficas com população de alta densidade e agricultura
de grãos de alta densidade, “produzindo um excedente de grãos… e de trabalho de
apropriação relativamente fácil pelo estado.” As condições dos espaços não estatais
eram exatamente o inverso, “daí limitando severamente as possibilidade de
apropriação fidedigna pelo estado.” [100]
Essa poderia ter servido como a sentença resumidora de seu livro seguinte, A Arte
de Não Ser Governado. Na verdade, de acordo com Scott, [101] Vendo Como umEstado foi em realidade uma ramificação da pesquisa que por fim levou a A Arte de
Não Ser Governado. A linha original de investigação dele era “compreender por que
o estado sempre pareceu ser inimigo das ‘pessoas que se locomovem’….” Em seus
estudo das “perenes tensões entre, de um lado, povos móveis das colinas, de
agricultura de corte e queimada, de um lado, e reinos dos vales encharcados
produtores de arroz, de outro,” juntamente com diferentes tipos de nômades e de
escravos foragidos, Scott foi desviado para um estudo da legibilidade como motivo
das políticas estatais de sedentarização. Havendo desenvolvido esse tópico, voltou aseu foco original em A Arte de Não Ser Governado.
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Nesse livro posterior, Scott vistoria as populações de “Zomia,” as áreas altas que se
estendem pelos países do Sudeste Asiático, as quais se situam, em grande parte,
fora do alcance dos governos da região. Ele sugere pontos em comum entre os
zomianos e pessoas em áreas não estatais em todo o mundo, povos de terras altas
e de fronteira como os cossacos, habitantes das terras altas escocesas e “caipiras”estadunidenses, povos nômades tais como ciganos e itinerantes
escoceses/irlandeses, e comunidades de escravos foragidos em regiões pantanosas
inacessíveis do sul dos Estados Unidos.
Os estados tentam maximizar a apropriabilidade de colheitas e de trabalho
delimitando o espaço estatal de maneira a “garantir, para o governante, excedente
substancial e fidedigno de mão de obra e de grãos a custo o mais baixo possível…”
Isso é conseguido por meio de concentração geográfica da população e uso de
formas concentradas, de alto valor, de cultivo, a fim de serem minimizados o custode governar a área e bem assim os custos de transação de apropriação de trabalho
e de produtos da terra. [102] Os espaços estatais tendem a abranger grandes
“áreas-cernes” de grande produção concentrada de grãos “a poucos dias de marcha
a partir do centro da corte,” não necessariamente contíguas ao centro mas pelo
menos “relativamente acessíveis a autoridades e soldados oriundos do centro via
estradas ou águas navegáveis.” [103] As áreas governáveis são principalmente
áreas de produção agrícola de alta densidade ligadas ou por terreno plano ou por
cursos de água. [104]O espaço não estatal é inversão direta do espaço estatal: “repele o estado,” isto é,
“representa um cenário agroecológico singularmente desfavorável às estratégias
amealhadoras de mão de obra e de grãos dos estados. Os estados “hesitarão em
incorporar tais áreas, visto que o retorno, em mão de obra e grãos, provavelmente
será menor do que os custos administrativos e militares de apropriação.” [105]
Quanto maior a dispersão das plantações, mais difícil é coletar sua produção, do
mesmo modo que uma população dispersa é mais difícil de sequestrar. Na medida
em que tais plantações sejam parte do portfólio de um produtor usuário da técnicade corte e queimada, nesse grau revelar-se-ão fiscalmente estéreis para estados e
predadores e julgadas “não pagar a pena” ou, em outras palavras, constituirão
espaço não estatal. [106]
Os espaços não estatais beneficiam-se de diversas formas de “fricção/atrito” que
aumentam os custos de transação de apropriação do trabalho e da produção, e da
extensão do alcance do braço impositor do estado até tais regiões. Essas formas de
fricção incluem a fricção da distância107 (equivalente a um tributo incidente sobre a
distância para o controle centralizado), a fricção do terreno ou da altitude, e a fricçãodo tempo sazonal.108 No tocante a essa última, por exemplo, a população local
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poderá “esperar pelas chuvas, quando as linhas de suprimento se rompem (ou são
mais fáceis de ser rompidas) e a guarnição terá de optar entre morrer de fome ou
retirar-se.” [109]
Em Zomia, como Scott descreve:
Praticamente tudo concernente ao meio de vida, organização social e ideologias
dessas pessoas …pode ser visto como posicionamentos estratégicos projetados
para manter o estado à distância. A dispersão física delas em terreno acidentado, a
mobilidade delas, suas práticas agrícolas, sua estrutura de relacionamento familiar,
suas identidades étnicas maleáveis e sua devoção a líderes proféticos, de índole
milenária, servem, com efeito, para impedir a incorporação em estados e para
impedir que estados se lancem sobre elas. [110]
Para evitar tributos, trabalho recrutado e conscrição, praticavam a “agricultura de
escape: formas de cultivo concebidas para impedir apropriação pelo estado.”
Analogamente, sua estrutura social “estava projetada para facilitar dispersão e
autonomia e para proteger contra subordinação política.” [111]
Sugiro que os conceitos de “espaço estatal” e “espaço não estatal,” se removidos do
contexto espacial imediato de Scott e aplicados, por analogia, a esferas da vida
social e econômica mais ou menos dúcteis para efeito de controle estatal, podem ser
úteis para nós nos tipos de sociedades ocidentais onde, de toda aparência, não
existem espaços geográficos situados além do controle do estado.
Os espaços estatais em nossa economia são setores estreitamente aliados do e
legíveis pelo estado. Os espaços não estatais são aqueles difíceis de monitorar e
onde as regulamentações são difíceis de ser feitas cumprir. Os espaços estatais,
especificamente, estão associados a formas legíveis de produção. Nas economias
ocidentais, os setores econômicos mais legíveis pelo e mais estreitamente aliados
do estado são aqueles dominados pelas largas corporações nos mercados
oligopolizados.
De modo geral o estado guarda forte afinidade com formas de produção organizadas
centralizadamente. No caso da agricultura, escreve Scott:
Na agricultura, como na indústria, a mera eficiência de uma forma de produção não
é suficiente para assegurar a apropriação de tributos e lucros. A agricultura do
pequeno proprietário independente pode, como já observamos, ser a forma mais
eficiente de cultivar muitas lavouras. Tais formas de agricultura, porém, embora
possam apresentar possibilidades de tributação e lucro quando seus produtos são
ajuntados, processados e vendidos, são relativamente ilegíveis e difíceis de
controlar. Como no caso de artífices autônomos e lojistas pequeno-burgueses, o
monitoramento das fortunas comerciais de pequenas propriedades rurais é um
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pesadelo administrativo. As possibilidades para evasão e resistência são numerosas,
e o custo de obtenção de dados anuais precisos é alto, se não proibitivo.
Um estado preocupado principalmente com apropriação e controle considerará a
agricultura sedentária preferível ao pastorialismo ou à agricultura itinerante. Pelos
mesmos motivos, tal estado geralmente preferirá a grande propriedade à pequena e,
por seu turno, a plantação maciça ou a agricultura coletiva a ambas aquelas….
Embora a coletivização e a agricultura de plantio maciço raramente sejam muito
eficientes, representam… as mais legíveis e pois apropriáveis formas de agricultura.
[112]
O estado guarda afinidade similar com a grande forma corporativa em geral, e não
apenas em agricultura, de acordo com Benjamin Darrington. Se a grande corporação
depender, para sua sobrevivência, do estado, este — mesmo à parte o fato de ser
ele próprio em grande parte composto de representantes da classe corporativadominante — tem interesse racional em promover a grande corporação como forma
econômica dominante.
Grandes firmas centralizadamente organizadas facilitam a tarefa do governo de
manter sua posição hegemônica na sociedade. A capacidade do governo de
regulamentar eficazmente a economia depende da existência de instituições
econômicas com estruturas organizacionais que possam ser facilmente monitoradas
e controladas. A regulamentação de grande número de pequenas empresas requer
maior duplicação de esforços para fiscalizar registros financeiros, assegurarobediência às normas, e coletar tributos. É mais difícil punir pequenas organizações
por não cooperarem com a lei porque elas têm menos valor total para ser confiscado
e os proprietários mais provavelmente combaterão o governo visto ser deles o
dinheiro e a empresa diretamente em jogo, para não mencionar o fato de as
pequenas empresas gozarem de maior estima junto à população do que
corporações aparentemente sem face e distantes. O equipamento usado pelas
pequenas empresas não se presta facilmente a certificação, regulamentação e
testes de segurança, e o trabalho empregado não favorece fiscalização/repressãoeficaz no tocante a leis concernentes a coisas tais como negociações trabalhistas,
salário mínimo, licenciamento profissional, quotas raciais e sexuais, exigências de
cidadania, horas máximas de trabalho etc. Relações informais e econômicas de
pequena escala situam-se quase além do âmbito dos esforços do governo para fazer
cumprir seus éditos e para coletar tributos. Mediante tornar a empresa agente de
política o estado também cria útil bode expiatório para desviar a ira do público
voltada para a iniquidade e exploração das relações econômicas existentes e cria
condições para o estado atuar como “cavaleiro do bem” protetor do público evingador das perversidades e excessos da “empresa privada.” [113]
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Os mesmos efeitos conseguidos por meio de distância e isolamento espaciais e os
altos custos do transporte físico na Zomia de Scott podem ser logrados em nossa
economia, sem toda a inconveniência, por meio de expedientes tais como
criptografia e uso de darknets. Recentes progressos tecnológicos expandiram
drasticamente o potencial para versões não espaciais, não territorialmente sediadasdos espaços não estatais que Scott descreve. As pessoas podem retirar-se do
espaço estatal por meio da adoção de tecnologias e métodos de organização que as
tornam ilegíveis para o estado, sem qualquer movimento real no espaço.
Tais tecnologias e métodos de organização incluem moedas eletrônicas tais como
Ripple e Bitcoin como meio de trocas em economias darknet, os “phyles” de Daniel
de Ugarte (sociedades civis distribuídas que oferecem plataformas redeadas para
apoio a empresas de negócios, mecanismos de certificação e reputacionais,
serviços de arbitramento e adjudicação, serviços de seguros e jurídicos etc.), e a“Economia como Serviço de Software” de John Robb. [114]
No domínio da produção física, novas tecnologias de microfabricação oferecem
potencial sem precedentes para escape da imposição dle patentes industriais e
outras barreiras estatais similares à entrada no mercado. No caso da indústria
tradicional de produção em massa, os custos de transação de fiscalizar/reprimir no
tocante a patentes foram diminuídos por um estado de coisas no qual um punhado
de fabricantes oligopolistas de uma área cartelizada havia passado a produzir leque
limitado de produtos competidores (amiúde restringindo ainda mais a competiçãoentre os produtos mediante consórcio ou troca de patentes entre eles próprios),
comercializando suas linhas limitadas de produtos por meio de um punhado de
varejistas com cadeias nacionais. Quando o equivalente a $10.000 dólares de
ferramentas de controle numérico por computador – CNC numa fábrica de garagem
consegue produção comparável à de uma fábrica de um milhão de dólares, em
pequenos lotes distribuídos por meio de mercados de bairro, os custos de transação
de suprimir cópias piratas disparam — exatamente no mesmo momento em que a
economia de abundância destrói a base tributária do estado usada paraimposição/exação.
Outras tecnologias acessíveis a produção caseira de pequena escala, juntas com
trocas informais via rede de escambo, oferecem novo potencial para microempresas
sediadas em casa, de baixo overhead — por exemplo micropadarias caseiras
usando forno comum de cozinha, serviços de táxi usando carro da família etc. —
para evasão do zoneamento, licenciamento, códigos de “saúde” e de “segurança”
locais.
Os custos de transação de superar a opacidade e a ilegibilidade, e de imporobediência numa atmosfera de não obediência, funcionam como um tributo,
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tornando alguns “espaços” (isto é, setores ou áreas da vida) mais dispendiosos de
governar do que valem. Scott argumenta que, para um governante, a métrica
relevante não é o PIB, e sim o “Produto Acessível pelo Estado” (PAE). Quanto maior
a distância de uma área em relação ao centro, maior terá de ser a concentração de
valor ou a relação valor monetário/peso de uma unidade de produção para que aapropriação e o transporte para a capital valham a pena. Quanto mais longe do
centro estiver uma área, maior será a parcela de sua economia que custará mais do
que vale a pena explorar.115 É algo de certa forma análogo ao conceito de EROEI
[energia retornada em relação a energia investida] na área de energia; se a intenção
do estado é extrair um excedente em benefício de uma classe privilegiada, o “tributo
de governança” reduz o montante do excedente extraído por insumo de esforço para
fiscalizar/reprimir.
Qualquer coisa que reduza a “EROEI” do sistema, o tamanho do excedente líquidoque o estado consegue extrair, levá-lo-á a encolher-se para uma escala de equilíbrio
de atividade menor. Quanto maior for o custo de fiscalizar/reprimir e menor a receita
que o estado (e seus aliados corporativos, como no caso de fazer cumprir a lei de
copyright digital ou reprimir a pirataria chinesa) possa obter por unidade de esforço
de fiscalizar/reprimir, mais vazio tornar-se-á o sistema capitalista de estado ou
corporatista e de mais áreas da vida ele se retirará, considerando-as não valerem o
custo de governar.
Nossa estratégia, ao atacarmos a capacidade de fiscalizar/reprimir do estado comoponto fraco do capitalismo de estado, deve ser criar espaços não estatais
metafóricos tais como as darknets, bem como formas de produção física de escala
pequena demais e demasiado dispersas para valerem custos de fiscalização e
repressão sérios, desse modo alterando a correlação de forças entre “espaços” não
estatais e estatais.
De nosso ponto de vista, as tecnologias de libertação reduzem o custo e a
inconveniência da evasão. Na obra de Scott, para as pessoas que vivem em
espaços estatais, quanto mais trabalho elas tiverem enterrado em seus campos aolongo de gerações, mais relutantes estarão em sair a fim de escapar da tributação
do estado.116 Em Zomia, “não ser governado” frequentemente envolvia adotar
“estratégias de subsistência voltadas para escapar de detecção e maximizar a
mobilidade física para o caso de ser forçado a fugir de novo de um momento para o
outro.” Isso podia envolver real sacrifício em qualidade de vida, em termos das
categorias de bens que não poderiam ser produzidos, das categorias de alimentos
que se tornariam indisponíveis, etc.117 Historicamente, quando não ser governado
requeria distância espacial e inacessibilidade, criar um espaço não estatal significavauma escolha de tecnologias de vida baseada na necessidade de ser menos legível.
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Em muitos casos isso se traduzia em “abandonar cultivo fixo para adotar agricultura
itinerante e cata de comida,” a escolha deliberada de estilo de vida mais “primitivo”
para efeito de autonomia, e a escolha consciente de métodos de cultivo menos
produtivos e de excedente menor. [118]
Para dizê-lo em termos ocidentais, as tecnologias libertadoras agora oferecem o
potencial para eliminação da necessidade desse compromisso entre autonomia e
padrão de vida. Desejamos tornar-nos tão ingovernáveis quanto o povo de Zomia,
sem a inconveniência de viver nas montanhas e charcos ou de viver em grande
parte comendo raízes. Quanto mais áreas da vida econômica forem tornadas
ilegíveis para o estado por meio de tecnologia de libertação, menor o diferencial de
padrão de vida entre áreas estatais e não estatais.
Scott nomeia a mobilidade como seu “segundo princípio de evasão.” Mobilidade, “a
capacidade de mudar de localização,” torna uma sociedade inacessível por meio doexpediente de “mudar para local mais remoto e vantajoso.” É “uma capacidade
relativamente não atritiva de mudar de lugar….” [119] Em termos de nossos
análogos “espaços não estatais” não espaciais nas sociedades ocidentais, isso se
reflete na agilidade, resiliência e flexibilidade das redes.
Diferentemente da corporação e do estado, que requerem laborioso processamento
de informação e de propostas através de uma hierarquia burocrática, a organização
em rede facilita a adoção quase instantânea de novas informações e técnicas onde
for útil. As redes eliminam os custos administrativos e outros custos de transaçãoenvolvidos em levar ideias àqueles que possam beneficiar-se delas.
Muitos pensadores do código aberto, remontando a Eric Raymond em A Catedral e o
Bazar, já assinalaram a natureza dos métodos de código aberto e de organização
em rede como multiplicadores de força. [120] As comunidades de projeto de código
aberto tomam as inovações dos membros individuais e rapidamente as distribuem
para onde forem necessárias, com o máximo de economia. Essa é uma
característica da organização stigmérgica que consideramos anteriormente.
Esse princípio está em ação no movimento do compartilhamento de arquivos, comodescrito por Cory Doctorow. Inovações individuais tornam-se imediatamente parte do
repositório comum de inteligência, universalmente disponíveis para todos.
Levante sua mão se você estiver pensando em algo como, “Mas a gestão de direitos
digitais – GDD não tem de ser prova contra atacantes geniais, só contra indivíduos
médios!…”
… Não tenho de ser um cracker para vazar sua GDD. Só preciso saber como
pesquisar no Google, ou Kazaa, ou qualquer outra máquina de pesquisa de
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livro de Eric Raymond “A Catedral e o Bazar” oferecem um ponto de partida para
análise ulterior. Eis aqui alguns fatores que se aplicam (da perspectiva dos
guerrilheiros):
* Libere logo e frequentemente. Tente novas formas de ataque contra diferentes tipos
de alvos logo e frequentemente. Não espere até conseguir um plano perfeito.
* Dado um grupo suficientemente grande de codesenvolvedores, qualquer problema
difícil será visto como óbvio por alguém. No final algum participante do bazar
descobrirá um jeito de subverter algum alvo particularmente difícil. Tudo o que você
precisará fazer será copiar o processo que ele usou.
* Seus codesenvolvedores (testadores beta) são seu recurso mais valioso. As outras
redes de guerrilheiros do bazar são seus aliados mais valiosos. Eles acrescentarão
inovações a seus planos, pulularão em volta dos pontos fracos que você identificar e
protegerão você criando ruído de sistema. [124]
A rápida inovação em Dispositivos Explosivos Improvisados (IED) conseguida por
redes de guerra de código aberto no Iraque e no Afeganistão é um caso ilustrativo.
[125] Qualquer inovação desenvolvida por uma célula específica da Al Qaeda do
Iraque, se bem-sucedida, é rapidamente adotada pela rede inteira.
No movimento de compartilhamento de arquivos, não é bastante que a gestão de
direitos digitais – DDD seja suficientemente difícil de burlar para dissuadir o usuário
médio. As fendas [cracks] desenvolvidas por aficcionados em computador [geeks]
para burlar a GDD tornam-se rapidamente parte do repositório comum de recursos.
CDs e DVDs craqueados por um geek hoje ficam disponíveis de graça num site
torrent para download amanhã por qualquer usuário médio que saiba como usar o
Google.
Considerem este exemplo prático da agilidade e responsividade do Bazar em
funcionamento, de Thomas Knapp:
Durante a reunião de cúpula do G-20 na área de Pittsburgh, na semana passada, a
polícia deteve dois ativistas. Esses ativistas, especificamente, não estavam
quebrando vitrines. Não estavam incendiando carros. Não estavam sequer
desfilando balançando bonecos gigantes e entoando slogans anticapitalistas.
Na verdade, estavam num num quarto de hotel em Kennedy, Pennsylvania, a milhas
de distância dos protestos “não sancionados” em Lawrenceville … ouvindo rádio e
aproveitando-se da conexão sem fio Wi-Fi do hotel. Agora estão sendo acusados de
“dificultar detenção de outras pessoas, uso criminoso de recurso de comunicação e
posse de instrumentos de crime.”
A rádio que eles estavam ouvindo era (alegadamente) um escaneador da polícia.
Estavam (alegadamente) usando seu acesso à Internet para divulgar boletins acerca
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dos movimentos da polícia em Lawrenceville para ativistas que participavam dos
protestos, usando o Twitter….
O governo, tal como o conhecemos, está engajado numa batalha por sua própria
sobrevivência, e essa batalha, como já mencionei, parece-se muito, em aspectos
fundamentais, com a luta da Associação da Indústria de Gravação dos Estados
Unidos – RIAA contra as redes ponto-a-ponto [entre pares, par-a-par] de
“compartilhamento de arquivos”. A RIAA pode exercer — e está exercendo — a
repressão mais dura de que é capaz, de todas as maneiras que consegue conceber,
mas está perdendo a luta e simplesmente não há cenário plausível no qual possa
esperar terminar vitoriosa. A indústria da gravação, como a conhecemos, ou mudará
seu modelo de negócios ou será extinta.
Os Dois de Pittsburgh são esplendidamente análogos ao pessoal da P2P. A
detenção deles acaba equivalendo, para todos os intentos e propósitos, a umasessão pública de depuração de programa. Os Dois de Pittsburgh 2.0 montarão suas
estações de monitoramento mais longe do local da ação (atravessando linhas
jurisdicionais), usarão um sistema de relés para trazer a informação a tais estações
de maneira tempestiva, e depois retransmitirão essa informação usando servidores
proxies [‘procuradores’] estrangeiros anonimizadores. Os policiais não chegarão
sequer a 50 milhas dos Dois de Pittsburgh 2.0, e o que fizerem para contrapor-se à
eficácia deles será por sua vez anulado em versões seguintes. [126]
Dois outros exemplos relativamente recentes são o uso do Twitter no Condado deMaricopa para alertar a comunidade latina de incursões do Xerife Joe Arpaio e para
alertar motoristas acerca de barreiras montadas para controle do cumprimento da lei
seca. [127]
Robb usa a expressão “superatribuição individual de poder” para descrever a
mudança radical no equilíbrio de recursos entre um e [ou] alguns indivíduos[, de um
lado,] e as grandes organizações hierárquicas tradicionais[, do outro]. A revolução do
desktop teve enorme efeito em toldar a distinção em qualidade entre trabalho feito
dentro de grandes organizações e o feito por indivíduos em casa. O indivíduo temacesso a amplo espectro de infraestruturas antes só disponível por meio de grandes
organizações. Como escreve Felix Stalder:
Há vasta quantidade de infraestrutura — transporte, comunicação, financiamento,
produção — abertamente disponível que, até recentemente, só era acessível a
organizações muito grandes. Agora são precisas relativamente poucas pessoas —
umas poucas pessoas dedicadas e com conhecimento — para conectar essas
partes numa poderosa plataforma a partir da qual agir. [128]
O resultado, nas palavras de Robb: “a capacidade de um só indivíduo de fazer aquiloque só podia ser feito, há poucas décadas, por uma grande empresa ou órgão do
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governo…” [129] A guerra de código aberto “capacita indivíduos e grupos a enfrentar
inimigos de porte muito maior,” visto
o poder dos indivíduos e pequenos grupos ser ampliado via acesso a redes abertas
(que aumentam de valor de acordo com a lei de Metcalfe = Crescimento da Internet
+ redes sociais correndo em paralelo) e tecnologia posta à venda normalmente (que
aumenta rapidamente de poder devido ao paroxismo do cumprimento da lei de
Moore e à implacável produtização do mercado). [130]
As economias de agilidade são análogas ao princípio do âmbito militar — nas
palavras de Saxe — de que a vitória tem a ver com pernas, mais do que com
braços/armas [trocadilho em inglês: arms significa tanto ‘braços’ quanto ‘armas’]. As
insurgências de código aberto de Robb são uma forma de guerra assimétrica — e há
motivo para esta ser chamada de “assimétrica.” Um lado é muito maior do que o
outro, e muito mais forte pela métrica convencional de força militar. Quando Goliassupera numericamente Davi em dez para um, e Davi combate usando as táticas
convencionais de Golias, Golias geralmente vence cerca de sete vezes em dez.
Quando Davi adota técnicas não convencionais que exploram os pontos fracos de
Golias, Davi vence seis vezes em dez. E o Bazar é local incomparável para facilitar o
rápido e disseminado compartilhamento de conhecimentos acerca dos pontos fracos
de Golias e a adoção das táticas mais eficazes para visar tais fraquezas. [131]
A organização em rede e o projeto de código aberto conseguem resiliência a partir
de redundância e de modularidade. O projeto modular é uma forma de extrair maisbenefício de cada dólar em pesquisa e desenvolvimento – R&D mediante a
maximização do uso de dada inovação ao longo da ecologia de um produto inteiro,
construindo ao mesmo tempo redundância no sistema por meio de peças
intercambiáveis. [132]
Como se costuma dizer, a Internet trata a censura como prejuízo, e passa ao largo
dela. Redes muitos-para-muitos conseguem contornar qualquer nodo específico que
seja fechado. Quando o Napster foi fechado, seus sucessores reagiram mediante
eliminar sua dependência de servidores centrais. O sequestro dos nomes dedomínio do Wikileaks resultou na proliferação global de sites-espelhos e provocadora
linkagem direta com seus endereços numerados IP.
Já discutimos a extração mais eficiente de produção a partir de insumos na
economia alternativa, como matéria de pura necessidade. Isso, juntamente com
maiores velocidade e agilidade, é um tremendo multiplicador de forças.
A economia alternativa geralmente faz uso melhor e mais eficiente das tecnologias
que a economia capitalista de estado desenvolveu para seus próprios propósitos.
[Fazendo uso de projeto modular] Incrível quantidade de inovação resulta de
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mesclas de tecnologias baratas à venda que podem ser modularizadas e misturadas
e combinadas para qualquer objetivo. De acordo com Cory Doctorow,
Não é que toda invenção já tenha sido inventada, mas seguramente temos muitas
peças básicas por aí, só esperando para ser configuradas. Pegue um semicondutor
programável FPGA de $200 dólares e você poderá gravar seus próprios microchips.
Arraste e solte alguns códigos-objetos em torno de você e poderá gerar algum
software para executar naqueles. [133]
Murray Bookchin, em Anarquismo Pós-Escassez, previu o mesmo princípio há quase
quarenta anos:
Suponhamos que, há cinquenta anos, alguém tivesse proposto um dispositivo capaz
de fazer um automóvel seguir uma linha branca no meio da estrada,
automaticamente e mesmo que o motorista pegasse no sono…. Teriam rido dele, e
sua ideia teria sido chamada de descabida…. Suponhamos, porém, que alguém hoje
dissesse precisar desse dispositivo, e estar disposto a pagar para tê-lo, deixando de
lado a questão de se ele teria qualquer uso genuíno que fosse. Certo número de
empresas se disporia a receber a encomenda e atendê-la. Não seria necessária
qualquer invenção real. Há milhares de jovens do sexo masculino no país para os
quais o projeto de tal dispositivo seria um prazer. Eles simplesmente comprariam
algumas fotocélulas, tubos termiônicos, servomecanismos, relés e, se instados,
fabricariam o que chamam de um modelo placa de ensaio, e funcionaria. A questão
é que a presença de uma porção de engenhocas versáteis, fidedignas e baratas, e apresença de homens que conhecem todos os modos baratos de usá-las tornaram a
fabricação de dispositivos automáticos quase direta e rotineira. Não mais se trata de
se é possível fabricá-las, é questão de se vale a pena fabricá-las. [134]
Scott contra o Mercado.
Na Introdução de Vendo Como um Estado, Scott expressa alguma preocupação com
seu livro vir a ser visto, à luz do colapso do bloco soviético e o desaparecimento do
socialismo de estado e do planejamento de estado como ideologia viável, como, em
grande parte, irrelevante. Ele destaca que “o capitalismo de larga escala é umagente de homogeneização, uniformidade, enquadramento e simplificação heroica
tanto quanto o estado,” e implicitamente iguala a “politicamente desimpedida
coordenação do mercado” de Hayek a “capitalismo de larga escala e padronização
impulsionada pelo mercado.” [135]
Scott boamente admite que alguma destruição de mētis é desejável, resultando do
progresso tecnológico. Fora antiquários com interesse puramente histórico, ninguém
lamenta o desaparecimento do recurso consistente em lavagem de roupa mediante
uso de pedras ou de tábua de lavar roupa, depois de as máquinas de lavar terem-setornado disponíveis — especialmente aqueles que tinham de lavar roupa à moda
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antiga. Scott porém nega que toda destruição de mētis seja desse tipo. “A destruição
de mētis e sua substituição por fórmulas padronizadas só legíveis a partir do centro
está praticamente insculpida nas atividades tanto do estado quanto no capitalismo
burocrático de larga escala.” [136] E, como sugerido anteriormente, em seu uso da
obra de Marglin acerca da desqualificação de empregados, a destruição de mētis éimpelida pela necessidade de tornar a corporação internamente mais legível e
controlável, e portanto para tornar o produto do trabalho mais apropriável.
O problema é que Scott faz pouca distinção entre o “capitalismo burocrático de larga
escala,” de um lado, e o mercado enquanto tal.
Ele comenta de modo direcionado acerca da “curiosamente retumbante unanimidade
a respeito deste ponto [isto é, problemas de cálculo no planejamento centralizado
socialista], e não a respeito de outros, entre críticos direitistas da economia de
comando como Friedrich Hayek e críticos esquerdistas do autoritatismo comunistacomo o Príncipe Peter Kropotkin” (ênfase minha). [137] O “não a respeito de outros,”
presumivelmente, é uma estocada na cegueira de Hayek para o fato de fracasso
semelhante de planejamento explicar a incerteza e a complexidade dentro do
“capitalismo burocrático de estado.” Mesmo quando a crítica de Hayek do
planejamento centralizado do estado coincide com a do próprio Scott, o
reconhecimento deste de que Hayek estava correto — até o ponto em que o fez — é
de má vontade. Havendo descrito, com aparente — embora resmungadora —
aprovação a percepção da “economia política liberal” de que “a economia eracomplexa demais para algum dia chegar a ser gerida em detalhe por uma
administração hierárquica,” [138] ele comenta sarcasticamente numa nota de rodapé
que Hayek era “o queridinho dos que se opunham ao planejamento pós-guerra e ao
estado assistencialista.” [139]
Interessante que Brad DeLong, num exame de Vendo Como um Estado, estrutura as
alternativas quase da mesma forma que Scott (isto é, “processos impulsionados pelo
mercado são tão nocivos à liberdade humana quanto o alto modernismo liderado
pelo estado”). Apenas que, para DeLong, “processos impulsionados pelo mercado,”embora essencialmente equivalentes a capitalismo corporativo, são uma boa coisa.
Como pode a padronização impulsionada pelo mercado ter as mesmas
consequências dos comandos de arquitetos que nunca residiram nas cidades que
projetam, ou que a coletivização da agricultura soviética, ou que a “vilaização”
forçada dos camponeses tanzanianos?
Isso não é claro.
“…[Q]uando olhamos para o capitalismo burocrático moderno de larga escala,”
continua ele, “vemos em toda parte aquilo que Scott chama de ‘metis’.”. [140]
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O notável aqui é que DeLong concorda com Scott em que os “tomates de
borracha(*)” são um exemplo de “padronização impulsionada pelo mercado,” e em
que o que Scott chama de “capitalismo burocrático de larga escala” ser
essencialmente o mercado. A diferença é que DeLong trata-os como exemplo
positivo da ordem espontânea do mercado e vê tal capitalismo burocrático de largaescala como amigável em relação a mētis. As pessoas compram tomates de
borracha, diz ele, porque eles são mais baratos — requerem menos trabalho para
ser cultivados. (* A expressão me era desconhecida. Depois de muita pesquisa,
entendo ser referência aos tomates da agricultura industrial/estandardizada, capazes
de sofrer quedas da carreta que os transporta na estrada sem se estragarem, mas
também sem nutrientes e sem sabor. Algumas das referências que
encontrei:http://www.grist.org/industrial-agriculture/2011-06-20-the-indignity-of-
industrial-tomatoes-florida http://www.cato-unbound.org/2010/09/24/tim-lee/of-hayek-and-rubber-tomatoes/ http://delong.typepad.com/delong_economics_only/2007/10/ru
bber-tomato-b.html )
Nunca ocorre a nenhum dos dois que o “capitalismo burocrático de larga escala” e
as patologias que cria — tal como o tomate de borracha — têm mais ou menos tanto
a ver com mercados genuínos quanto tinha o estado altomodernista de Lênin. O que
quer que pensemos de maciços subsídios para estradas que reduzem o custo
relativo de embarcar hortifrutigranjeiros por meio de grandes carretas, ou do acesso
de larga escala a água de irrigação subsidiada, é difícil discordar de eles mudarem oequilíbrio da agricultura local apoiada pela comunidade e da fazenda de produção de
verduras para o mercado em favor do agronegócio de larga escala. E esse não é
exatamente um fenômeno de “livre mercado”.
E Scott em particular negligencia o potencial de aplicação de análise do livre
mercado a uma crítica do capitalismo corporativo — isto é, “usar as ferramentas do
senhor para demolir a casa do senhor” — e a real existência de uma cepa diversa de
versões socialistas ou anticapitalistas de análise do livre mercado. Conceitos de livre
mercado genuíno oferecem enorme potencial de reutilização como armas contra oneoliberalismo e a dominação corporativa. Há importante conjunto de obras, no
amplo espectro que inclui a ala amigável em relação ao mercado do socialismo
clássico e a ala esquerda do liberalismo clássico, que trata escassez artificial,
direitos artificiais de propriedade e privilégio como sendo a causa fundamental da
exploração econômica. Tais pensadores incluem Thomas Hodgskin, que é
convencionalmente inserido entre os socialistas ricardianos mas foi figura influente
no liberalismo clássico precoce;141 Henry George, com suas teorias do rent da
terra; o inicial, esquerdista, Herbert Spencer (cujos mentores incluem Hodgskin);
anarquistas de Boston como Benjamin Tucker (o dos Quatro Monopólios);142 o
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georgista Franz Oppenheimer (responsável pela distinção entre “meios econômicos”
e “meios políticos” para a riqueza);143 pensadores como Albert Jay Nock e Ralph
Borsodi,144 que desenvolveram as ideias econômicas de George e de Oppenheimer
no contexto do capitalismo industrial estadunidense; e o anarquista individualista
R.A. Wilson, que viu o privilégio como o fator distintivo entre capitalismo e mercadosverdadeiramente livres.
Conclusão.
Vimos como os principais conceitos de Scott — legibilidade e opacidade, mētis,
espaços estatais e não estatais — samblam-se e relacionam-se um com o outro.
Todos eles refletem um tema subjacente comum: os conflitos de interesse e as
contradições sociais criados pela autoridade.
O poder, ou a autoridade, cria um conflito de interesses fundamental. Do mesmo
modo que o problema do conhecimento oculto e da ação oculta — os problemas de
informação e de ação de uma hierarquia corporativa — resulta do conflito de
interesses criados pelo poder, a autoridade do estado cria um conflito de interesses
no qual os cidadãos têm interesse em tornarem-se tão opacos quanto possível. O
poder, seja numa hierarquia corporativa ou numa sociedade governada por um
estado, é uma forma de externalizar custos para os outros e apropriar-se das
vantagens para si próprio.
O estado e a classe dominante que o controla têm interesse em maximizar sua
extração de rents e de tributos, mesmo ao custo de tornar a sociedade menosprodutiva em sentido absoluto, do mesmo modo que a gerência de uma corporação
tem interesse em maximizar seus salários e benefícios a expensas da produtividade
geral. Os que se encontram em posição de autoridade, em ambos os casos, tentam
estruturar a instituição ou sociedade como um todo de maneira a maximizarem a
legibilidade dela e o montante líquido absoluto de riqueza extraída — mesmo ao
custo de eficiência subótima. E o povo de uma sociedade governada pelo estado, do
mesmo modo que os trabalhadores de produção de uma corporação, fazem o
melhor que podem para tornarem-se opacos em relação a seus superiores ereduzirem sua vulnerabilidade à extração de riqueza — mesmo ao custo de usarem
técnicas menos produtivas.
Em todos os casos, o poder distorce o fluxo de informação e o incentivo para
produzir tão eficientemente quanto possível. A existência de pessoas em autoridade
que existem num relacionamento de soma zero economicamente com aqueles de
quem extraem rents, seja no estado ou na hierarquia que governa as instituições,
cria incentivo para os que estão abaixo minimizarem sua legibilidade (e portanto a
extratividade de rents) em relação aos que estão acima. Cria incentivo paraestruturarem sua atividade produtiva de maneira a minimizar a extratividade de rents,
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mesmo ao custo de produzir menos eficientemente. Num relacionamento de soma
zero, os produtores — tanto quanto os parasitas — têm incentivo para maximizar o
tamanho de sua fatia do bolo a expensas do tamanho do bolo como um todo.
Em suma a autoridade, longe de ser a solução para a guerra de todos contra todos,
é a causa dela. E, ao sê-lo, destrói racionalidade, conhecimento, e cooperação.
Estudo original publicado porKevin Carson em 26 de maio de 2011.
Traduzido do inglês porMurilo Otávio Rodrigues Paes Leme.
* * *
Notes:
[1] James Scott, Vendo Como um Estado (New Haven e Londres: Imprensa da
Universidade de Yale, 1998), p. 2.
[2] Ibid., p. 24.[3] Ibid., p. 378n11.
[4] Michel Foucault, Disciplina e Punição: O Nascimento da Prisão, Traduzido por
Alan Sheridan, 1977. Edição Second Vintage (Nova Iorque: Vintage Press, 1995), p.
143.
[5] Ibid., p. 144.
[6] Ibid., p. 145.
[7] Ibid., pp. 170-171.
[8] Ibid., p. 172.
[9] Ibid., p. 173.
[10] Ibid., p. 201.
[11] Ibid., p. 291.
[12] E. P. Thompson, “Tempo, Disciplina de Trabalho e Capitalismo Industrial,”
Passado e Presente 37 (1968): pp. 56-97.
[13] Ibid., p. 85.
[14] Ibid., p. 90.[15] Ibid., pp. 81-82.
[16] Ibid., p. 90.
[17] Scott, Vendo Como um Estado, pp. 311, 320.
[18] Ibid., p. 313.
[19] Ibid., p. 329.
[20] Ibid., pp. 315-316.
[21] Ibid., pp. 311-312.
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[22] Friedrich Hayek, “O Uso do Conhecimento na Sociedade,” Individualismo e
Ordem Econômica (Chicago: Imprensa da Universidade de Chicago,1948), pp. 77-
78.
[23] Ibid., p. 80.
[24] Ibid., pp. 83-84.
[25] Michael Polanyi. Conhecimento Pessoal: Rumo a uma Filosofia Pós-Crítica
(University of Chicago Press, 1958).
[26] Scott, Vendo Como um Estado, p. 313.
[27] Ibid., p. 314.
[28] Alex Pouget, “Misterioso ‘ruído neural’ em realidade prepara o cérebro para
desempenho máximo,” EurekAlert, 10 de novembro de
2006 <http://www.eurekalert.org/pub_releases/2006-11/uor-mn111006.php>.[29] Scott, Vendo Como um Estado, p. 331.
[30] Ibid., p. 429n65.
[31] Ibid., p. 324.
[32] Carson, Teoria da Organização: Uma Perspectiva Libertária (Booksurge, 2008),
p. 475.
[33] Todos esses conceitos são discutidos na primeira secção do Capítulo Sete em
meu livro A Revolução Industrial Gestada em Casa:Um Manifesto de Baixo
Overhead (CreateSpace, 2010).
[34] Scott, Vendo Como um Estado, p. 305.
[35] Joseph A. Schumpeter, Capitalismo, Socialismo, e Democraccia (Nova Iorque e
Londres: Publicadora Harper & Brothers, 1942), pp. 100-101.
[36] John Kenneth Galbraith, Capitalismo Estadunidense: O Conceito de Poder
Compensatório (Boston: Houghton Mifflin, 1962), pp. 86-88.
[37] Harvey Leibenstein, “Eficiência Alocativa versus Eficiência X,’” Revista
Econômica Estadunidense 56 (Junho 1966); Barry Stein, Porte, Eficiência e Empresa
Comunitária (Cambridge: Centro para Desenvolvimento Econômico Comunitário,
1974).
[38] Paul Goodman, Pessoas ou Pessoal, em Pessoas e Pessoal e Como uma
Província Conquistada (New York: Vintage Books, 1963,1965), p. 58.
[39] Walter Adams e James Brock, O Complexo de Tamanho: Indústria, Trabalho e
Governo na Economia Estadunidense. Segunda edição (Stanford: Imprensa da
Universidade de Stanford, 2004), pp. 48-49.
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[40] Mark J. Green, Beverly C. Moore, Jr., e Bruce Wasserstein, O Sistema de
Empresa Fechada: Estudo de Grupo de Ralph Nader acerca de Fazer Cumprir o
Antitruste (Nova Iorque: Publicadora Grossman, 1972), pp. 254-256.
[41] James C. Scott, Dominação e a Arte da Resistência: Transcrições Ocultas (New
Haven e Londres: Imprensa da Universidade de Yale, 1990).
[42] R. A. Wilson, “Treze Corais para o Divino Marquês,” de Coincidance – A Head
Test (1988) <http://www.deepleafproductions.com/wilsonlibrary/texts/raw-
marquis.html>.
[43] Michel Bauwens, “A Economia Política da Produção por Pares,” Ctheory.net, 1o.
de dezembro de 2005 <http://www.ctheory.net/articles.aspx?id=499>.
[44] Robert Shea e Robert Anton Wilson, O Illuminatus! Trilogia (New York: Dell
Publishing, 1975), p. 388.
[45] Ibid., p. 498.
[46] Kenneth Boulding, “A Economia do Conhecimento e o Conhecimento de
Economia,” Revista Econômica Estadunidense 56:1/2 (March 1966), p. 8.
[47] Citado em Hazel Henderson, “Para Lidar Com Choque Organizacional Futuro,”
Criação de Futuros Alternativos: O Fim da Economia (New York: G. P. Putnam’s
Sons, 1978), p. 225.
[48] Scott, Vendo Como um Estado, pp. 6-7.
[49] Robert Chambers, A Realidade de Quem Conta? Colocação do Primeiro emÚltimo Lugar (London: Intermediate Technology Publications, 1997), p. 15.
[50] Ibid., p. 30.
[51] Ibid., p. 31.
[52] Ibid., p. 31.
[53] Ibid., p. 32.
[54] Ibid., p. 76.
[55] Scott, Vendo Como um Estado, p. 314.
[56] Martha S. Feldman e James G. March, “Informação em Organizações como
Sinal e Símbolo,” Ciência Administrativa Trimestral 26 (abril 1981).
[57] Matthew Yglesias, “Duas Visões do Capitalismo,” Yglesias, 22 de novembro de
2008 <http://yglesias.thinkprogress.org/2008/11/two_views_of_capitalism/>.
[58] Bruce Schneier, Além do Medo: Pensamento Sensato Acerca de Segurança
num Mundo Incerto (New York: Copernicus Books, 2003), p. 133.
[59] Goodman, Pessoas ou Pessoal, p. 88.
[60] Ibid., p. 52.
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[61] Gary Miller, Dilemas Geranciais: A Economia Política da Hierarquia (Nova
Iorque: Imprensa da Universidade de Cambridge, 1992), pp. 201-202.
[62] William Waddell e Norman Bodek, O Renascimento da Indústria Estadunidense
(Vancouver: PCS Press, 2005), p. 158.
[63] Ibid., p. 169.
[64] John Micklethwait e Adrian Wooldridge, Os Médicos Feiticeiros: Como Entender
os Gurus da Administração (Nova Iorque: Livros Times, 1996), p. 209.
[65] Sanford J. Grossman e Oliver D. Hart, “Custos e Benefícios da Condição de
Proprietário: Uma Teoria da Integração Vertical e Lateral,” Jornal de Economia
Política 94:4 (1986), pp. 716-717.
[66] Miller, Dilemas Gerenciais, pp. 154-155, 157.
[67] Scott, Vendo Como um Estado, p. 336.[68] Ibid., pp. 337-338.
[69] Ibid., p. 98.
[70] Ibid., pp. 336-337.
[71] Ibid., p. 99.
[72] Ibid., p. 219.
[73] Alfred D. Chandler, Jr., A Mão Visível: A Revolução Gerencial na Empresa
Estadunidense (Cambridge e Londres: Imprensa Belknap da Imprensa da
Universidade de Harvard, 1977), p. 241.
[74] David F. Noble, Forças de Produção: História Social da Automação Industrial
(Nova Iorque: Alfred A. Knopf, 1984), p. 277.
[75] Scott, Vendo Como um Estado, p. 350.
[76] Ibid., pp. 351-352.
[77] Ibid., p. 310.
[78] Julia O’Connell Davidson, “As Fontes e Limites de Um Serviço Público
Privatizado,” em J. Jermier e D. Knight, eds., Resistência e Poder nas Organizações(Londres: Routledge, 1994), pp. 82-83.
[79] Oliver Williamson, Mercados e Hierarquias, Análise e Implicações Antitruste:
Estudo nas Economias de Organização Interna (Nova Iorque: Imprensa Livre, 1975),
p. 69.
[80] J.E. Meade, “A Teoria das Firmas Geridas por Trabalhadores e de
Compartilhamento de Lucros,” em Jaroslav Vanek, ed., Autogerência: Libertação
Econômica do Homem (Hammondsworth, Middlesex, Inglaterra: Penguin Education,
1975), p. 395.[81] Williamson, Mercados e Hierarquias, p. 69.
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[82] Paul Milgrom e John Roberts, “Uma Abordagem Econômica para Influenciar
Atividades nas Organizações,” Jornal de Sociologia Estadunidense, suplemento ao
vol. 94 (1988), p. S155.
[83] Hayek, “O Uso do Conhecimento na Sociedade,” p. 80.
[84] Ibid., p. 82.
[85] Williamson, Mercados e Hierarquias, pp. 62-63.
[86] Scott, Vendo como um Estado, pp. 310-311.
[87] David Jenkins, Poder do Emprego: Democracia de Colarinho Azul e Branco
(Garden City, Nova Iorque: Doubleday & Company, Inc., 1973), p. 237.
[88] Kim S. Cameron, “Downsizing, Qualidade e Desempenho,” em Robert E. Cole,
ed., A Morte e a Vida do Movimento de Qualidade Estadunidense (Nova Iorque:
Imprensa da Universidade de Oxford, 1995), p. 97.[89] Alex Markels e Matt Murray, “Chamem Isso de Estupidisizing: Por Que Algumas
Empresas Arrependem-se do Corte de Custos,” Wall Street Journal, 14 de maio de
1996 <http://www.markels.com/management.htm>.
[90] Tom Blumer, “Para Desarmar os Defensores de Nardelli Parte I,” BizzyBlog, 8 de
janeiro de 2007 <http://www.bizzyblog.com/2007/1/08/disarming-nardellis-defenders-
part-1/>.
[91] Blumer, “Para Desarmar os Defensores de Nardelli Parte 3,” BizzyBlog, 8 de
janeiro de 2007 <http://www.bizzyblog.com/2007/1/08/disarming-nardellis-defenders-part-3/>.
[92] Comentário de Blumer abaixo de Kevin Carson, “Cálculo Econômico na
Comunidade Corporativa, Parte II: Hayek vs. Mises acerca de Conhecimento
Distribuído (Excerto),” Blog Mutualista: Anticapitalismo de Livre Mercado, 16 de
março de 2007 <http://mutualist.blogspot.com/2007/03/economic-calculation-in-
corporate.html>.
[93] Ludwig von Mises, Burocracia. Editado e com Prefácio de Bettina Bien Greaves
(Imprensa da Universidade de Yale, 1944: renovado por Liberty Fund, 1972; EdiçõesEditoriais Liberty Fund, 2007).
[94] Ver Capítulo Sete (“Cálculo Econômico na Comunidade Corporativa: A
Corporação Enquanto Economia Planificada”)
[95] Ver Waddell e Bodek, pp. 135-140, 143.
[96] Voltando aos Noventa, David Noble disse que os custos do trabalho situavam-se
normalmente em torno de 10% do custo unitário total nas indústrias de metalurgia,
em comparação com 35% de overhead. Mas 75% do esforço de corte de custos pela
gerência dirigiam-se para cortar trabalho, em comparação com 10% para cortar
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http://slidepdf.com/reader/full/legibilidade-e-controle 55/57
overhead. Noble, Progresso Sem Pessoas: Nova Tecnologia, Desemprego e a
Mensagem de Resistência (Toronto: Entre as Linhas, 1995), p. 105.
[97] Ludwig von Mises, Socialismo: Análise Econômica e Sociológica. Traduzido por
J. Kahane. Nova edição, ampliada por um Epílogo (New Haven: Imprensa da
Universidade de Yale, 1951). [Procure o número da página.]
[98] Richard Ericson, “A Economia Clássica de Tipo Soviético: Natureza do Sistema
e Implicações para Reforma,” Jornal de Perspectivas Econômicas 5:4 (1991), p. 21.
[99] Friedrich Hayek, “Cálculo Socialista II: O Estado e o Debate (1935),” em Hayek,
Individualismo e Ordem Econômica (Chicago: Imprensa da Universidade de
Chicago, 1948), pp. 149-150.
[100] Scott, Vendo Como um Estado, p. 186.
[101] Ibid., pp. 1-2.[102] James C. Scott, A Arte de Não Ser Governado: História Anarquista das Terras
Altas do Sudeste Asiático (New Haven & Londres: Imprensa da Universidade de
Yale, 2009), pp. 40-41.
[103] Ibid., p. 53.
[104] Ibid., p. 58.
[105] Ibid., p. 178.
[106] Ibid., p. 196.
[107] Ibid., p. 51.
[108] Ibid., p. 61.
[109] Ibid., p. 63.
[110] Ibid., x.
[111] Ibid., p. 23.
[112] Scott, Vendo Como um Estado, p. 338.
[113] Benjamin Darrington, “Economias de Escala Criadas pelo Governo e
Especificidade de Capital” Paper apresentado na Conferência dos AcadêmicosEstudantes Austríacos, 2007 (Por favor veja o link no original deste artigo; se
inserido aqui, ele distorce a tabela.)
[114] Daniel de Ugarte, Phyles: Democracia Econômica no Século XXI
<http://deugarte.com/gomi/phyles.pdf>; “Phyles,” P2P Foundation Wiki
<http://p2pfoundation.net/Phyles>. John Robb, “EaaS (ECONOMIA como
SERVIÇO),” Guerrilheiros Globais, 7 de novembro de 2010
<http://globalguerrillas.typepad.com/globalguerrillas/2010/11/eaas-economy-as-
aservice.html>. Phyles e Economy como Serviço de Software são discutidos noCapítulo Dois de minha minut manuscrit online Governo de Código Aberto, sob a
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subsecção “Legibilidade, Mecanismos de Reputação e de Verificação”
<http://dl.dropbox.com/u/4116166/Open%20Source
%20Government/2.%20%20Open%20Source%20Regulatory%20State.pdf>.
[115] Scott, A Arte de Não Ser Governado, p. 73.
[116] Ibid., p. 65.
[117] Ibid., p. 181.
[118] Ibid., p. 188.
[119] Ibid., p. 184.
[120] Eric S. Raymond, A Catedral e o Bazar
<http://catb.org/~esr/writings/homesteading>.
[121] Doctorow, “Palestra de Pesquisa GDD Microsoft,” em Conteúdo: Ensaios
Seletos sobre Tecnologia, Criatividade, Copyright, e o Futuro do Futuro (SãoFrancisco: Publicações Táquion, 2008), pp. 7-8.
[122] Doctorow, “É a Economia da Informação, Estúpido,” em Ibid., p. 60.
[123] Schneier, Além do Medo, p. 95.
[124] John Robb, “A PLATAFORMA DE CÓDIGO ABERTO DO BAZAR,”
Guerrilheiros Globais, 24 de setembro de 2004 (Por favor veja o link no texto original;
por algum motivo, se inserido aqui, ele muda a largura da tabela.)
[125] Adam Higginbotham, “Instituição Militar dos Estados Unidos Aprende a
Combater as Armas Mais Letais,” Wired, 28 de julho de 2010 (Por favor veja o link notexto original)
[126] Thomas L. Knapp, “A Revolução Não Será Proclamada no Twitter,” Centro por
uma Sociedade Sem Estado, 5 de outubro de 2009 (Por favor veja o link no texto
original)
[127] Katherine Mangu-Ward, “Lá Vem o Xerife! Lá Vem o Xerife!” Razão Bata e
Corra, 6 de janeiro de 2010 (Por favor veja o link no texto original) Branan, “Polícia:
Twitter usado para evitar barreiras da lei seca,” Seattle Times, 28 de dezembro de
2009 (Por favor veja o link no texto original)
[128] Felix Stalder, “Vazamentos, Denunciantes e a Ecologia das Notícias
Redeadas,” n.n., 6 de novembro de 2010 (Por favor veja o link no texto original)
[129] John Robb, “Julian Assange,” Guerrilheiros Globais, 15 de agosto de 2010 (Por
favor veja o link no texto original)
[130] Robb, “Guerra Aberta e Replicação,” Guerrilheiros Globais, 20 de setembro de
2010 (Por favor veja o link no texto original)
[131] Malcolm Gladwell, “Como Davi Vence Golias,” O Novaiorquino, 11 de maio de
2009 (Por favor veja o link no texto original)
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