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História da América portuguesaSebastião da Rocha Pita
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América Latina: a pátria grandeDarcy Ribeiro
Prefácio: Eric Nepomuceno
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História da América portuguesaSebastião da Rocha Pita
Prefácio: João Carlos Escosteguy Filho
América Latina: a pátria grandeDarcy Ribeiro
Prefácio: Eric Nepomuceno
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Os Correios, reconhecidos por prestar serviços postais com
qualidade e excelência aos brasileiros, também investem em
açõesquetenhamaculturacomoinstrumentodeinclusãosocial,
pormeiodaconcessãodepatrocínios.Aatuaçãodaempresavisa,
cadavezmais,contribuirparaavalorizaçãodamemóriacultu-
ralbrasileira,ademocratizaçãodoacessoàculturaeofortaleci-
mentodacidadania.
ÉnessesentidoqueosCorreios,presentesemtodooterritório
nacional, apoiam, com grande satisfação, projetos da natureza
desta Biblioteca Básica Brasileira e ratificam seu compromisso
emaproximarosbrasileirosdasdiversas linguagensartísticase
experiênciasculturaisquenascemnasmaisdiferentesregiões
dopaís.
A empresa incentiva o hábito de ler, que é de fundamental
importância para a formação do ser humano. A leitura possibi-
litaenriquecerovocabulário,obterconhecimento,dinamizaro
raciocínioeainterpretação.Assim,osCorreiosseorgulhamem
disponibilizaràsociedadeoacessoalivrosindispensáveisparao
conhecimentodoBrasil.
Correios
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Os Correios, reconhecidos por prestar serviços postais com
qualidade e excelência aos brasileiros, também investem em
açõesquetenhamaculturacomoinstrumentodeinclusãosocial,
pormeiodaconcessãodepatrocínios.Aatuaçãodaempresavisa,
cadavezmais,contribuirparaavalorizaçãodamemóriacultu-
ralbrasileira,ademocratizaçãodoacessoàculturaeofortaleci-
mentodacidadania.
ÉnessesentidoqueosCorreios,presentesemtodooterritório
nacional, apoiam, com grande satisfação, projetos da natureza
desta Biblioteca Básica Brasileira e ratificam seu compromisso
emaproximarosbrasileirosdasdiversas linguagensartísticase
experiênciasculturaisquenascemnasmaisdiferentesregiões
dopaís.
A empresa incentiva o hábito de ler, que é de fundamental
importância para a formação do ser humano. A leitura possibi-
litaenriquecerovocabulário,obterconhecimento,dinamizaro
raciocínioeainterpretação.Assim,osCorreiosseorgulhamem
disponibilizaràsociedadeoacessoalivrosindispensáveisparao
conhecimentodoBrasil.
Correios
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O livro, essa tecnologia conquistada, já demonstrou ter a
maiorlongevidadeentreosprodutosculturais.Noentanto,mais
queossuportesfísicos,asideiasjádemonstraramsobreviverain-
damelhoraosanos.EsseéocasodaBibliotecaBásicaBrasileira.
EsseprojetoculturalepedagógicoidealizadoporDarcyRibeiro
tevesuassementeslançadasem1963,quandoforampublicados
osprimeirosdezvolumesdeumacoleçãoessencialparaoconhe-
cimentodopaís.SãotítuloscomoRaízes do Brasil,Casa-grande
& senzala,A formação econômica do Brasil,Os sertõeseMemórias de
um sargento de milícias.
Esse ideal foi retomado com a viabilização da primeira fase
dacoleçãocom50títulos.Aotodo,360milexemplaresserãodis-
tribuídos entre as unidades do Sistema Nacional de Bibliotecas
Públicas,contribuindoparaaformaçãodeacervoeparaoacesso
públicoegratuitoemcercade6.000bibliotecas.Trata-sedeuma
iniciativaousadaàqualaPetrobrasvemjuntarsuasforças,cola-
borandoparaacompreensãodaformaçãodopaís,deseuimagi-
nário e de seus ideais, especialmente num momento de grande
otimismoeprojeçãointernacional.
Petrobras - Petróleo Brasileiro S. A.
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O livro, essa tecnologia conquistada, já demonstrou ter a
maiorlongevidadeentreosprodutosculturais.Noentanto,mais
queossuportesfísicos,asideiasjádemonstraramsobreviverain-
damelhoraosanos.EsseéocasodaBibliotecaBásicaBrasileira.
EsseprojetoculturalepedagógicoidealizadoporDarcyRibeiro
tevesuassementeslançadasem1963,quandoforampublicados
osprimeirosdezvolumesdeumacoleçãoessencialparaoconhe-
cimentodopaís.SãotítuloscomoRaízes do Brasil,Casa-grande
& senzala,A formação econômica do Brasil,Os sertõeseMemórias de
um sargento de milícias.
Esse ideal foi retomado com a viabilização da primeira fase
dacoleçãocom50títulos.Aotodo,360milexemplaresserãodis-
tribuídos entre as unidades do Sistema Nacional de Bibliotecas
Públicas,contribuindoparaaformaçãodeacervoeparaoacesso
públicoegratuitoemcercade6.000bibliotecas.Trata-sedeuma
iniciativaousadaàqualaPetrobrasvemjuntarsuasforças,cola-
borandoparaacompreensãodaformaçãodopaís,deseuimagi-
nário e de seus ideais, especialmente num momento de grande
otimismoeprojeçãointernacional.
Petrobras - Petróleo Brasileiro S. A.
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta ix
sumário
Apresentação xi
Prefácio–JoãoCarlosEscosteguyFilho xiii
Prefáciodoautor 3
Prólogo 5
Advertência 7
Licenças 9
Livroprimeiro 21
Livrosegundo 65
Livroterceiro 118
Livroquarto 162
Livroquinto 214
Livrosexto 264
Livrosétimo 308
Livrooitavo 343
Livronono 393
Livrodécimoeúltimo 445
Apêndice Protestação 491
Pessoas,quenestetemposeachamcomo
governodasoutrasprovíncias,epraças
doBrasil 492
PessoasnaturaisdoBrasil,queexerceram
dignidades,egovernoseclesiásticos,
esecularesnapátria,eforadela 493
I 496
II 498
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a m é r i c a l at i � a – a pát r i a g r a � d e | d a r c � r i b e i r o xi
apresentação
AFundaçãoDarcyRibeirorealiza,depoisde50anos,osonho
sonhado pelo professor Darcy Ribeiro, de publicar a Coleção
BibliotecaBásicaBrasileira–aBBB.
A BBB foi formulada em 1962, quando Darcy tornou-se o
primeiroreitordaUniversidadedeBrasília–UnB.Foiconcebida
comoobjetivodeproporcionaraosbrasileirosumconhecimento
maisprofundodesuahistóriaecultura.
Darcy reuniu um brilhante grupo de intelectuais e profes-
sorespara, juntos,criaremoqueseriaauniversidadedofuturo.
Eraosonhodeumageraçãoqueconfiavaemsi,quereivindicava
–comoDarcyfezaolongodavida–odireitodetomarodestino
emsuasmãos.DessaentregagenerosanasceuaUniversidadede
Brasíliae,comela,muitosoutrossonhoseprojetos,comoaBBB.
Em1963,quandoministrodaEducação,DarcyRibeiroviabili-
zouapublicaçãodosprimeiros10volumesdaBBB,comtiragem
de15.000coleções,ouseja,150millivros.
A proposta previa a publicação de 9 outras edições com 10
volumescada,poisaBibliotecaBásicaBrasileiraseriacomposta
por100títulos.AcontinuidadedoprogramadeediçõespelaUnB
foiinviabilizadadevidoàtruculênciapolíticadoregimemilitar.
Comamissãodemantervivosopensamentoeaobradeseu
instituidore,sobretudo,comprometidaemdarprosseguimento
àssuaslutas,aFundaçãoDarcyRibeiroretomouapropostaea
atualizou,configurando,assim,umanovaBBB.
Aliada aos parceiros Fundação Biblioteca Nacional e Editora
UnB, a Fundação Darcy Ribeiro constituiu um comitê editorial
que redesenhou o projeto. Com a inclusão de 50 novos títulos,
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xia m é r i c a l at i � a – a pát r i a g r a � d e | d a r c � r i b e i r o xi
apresentação
AFundaçãoDarcyRibeirorealiza,depoisde50anos,osonho
sonhado pelo professor Darcy Ribeiro, de publicar a Coleção
BibliotecaBásicaBrasileira–aBBB.
A BBB foi formulada em 1962, quando Darcy tornou-se o
primeiroreitordaUniversidadedeBrasília–UnB.Foiconcebida
comoobjetivodeproporcionaraosbrasileirosumconhecimento
maisprofundodesuahistóriaecultura.
Darcy reuniu um brilhante grupo de intelectuais e profes-
sorespara, juntos,criaremoqueseriaauniversidadedofuturo.
Eraosonhodeumageraçãoqueconfiavaemsi,quereivindicava
–comoDarcyfezaolongodavida–odireitodetomarodestino
emsuasmãos.DessaentregagenerosanasceuaUniversidadede
Brasíliae,comela,muitosoutrossonhoseprojetos,comoaBBB.
Em1963,quandoministrodaEducação,DarcyRibeiroviabili-
zouapublicaçãodosprimeiros10volumesdaBBB,comtiragem
de15.000coleções,ouseja,150millivros.
A proposta previa a publicação de 9 outras edições com 10
volumescada,poisaBibliotecaBásicaBrasileiraseriacomposta
por100títulos.AcontinuidadedoprogramadeediçõespelaUnB
foiinviabilizadadevidoàtruculênciapolíticadoregimemilitar.
Comamissãodemantervivosopensamentoeaobradeseu
instituidore,sobretudo,comprometidaemdarprosseguimento
àssuaslutas,aFundaçãoDarcyRibeiroretomouapropostaea
atualizou,configurando,assim,umanovaBBB.
Aliada aos parceiros Fundação Biblioteca Nacional e Editora
UnB, a Fundação Darcy Ribeiro constituiu um comitê editorial
que redesenhou o projeto. Com a inclusão de 50 novos títulos,
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b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxii b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxii
a Coleção atualmente apresenta 150 obras, totalizando 18 mil
coleções, o que perfaz um total de 2.700.000 exemplares, cuja
distribuiçãoserágratuitaparatodasasbibliotecasqueintegram
oSistemaNacionaldeBibliotecasPúblicas,eocorreráaolongo
detrêsanos.
A BBB tem como base os temas gerais definidos por Darcy
Ribeiro: O Brasil e os brasileiros; Os cronistas da edificação;
Culturapopulareculturaerudita;EstudosbrasileiroseCriação
literária.
Impulsionados pelas utopias do professor Darcy, apresenta-
mos ao Brasil e aos brasileiros, com o apoio dos Correios e da
Petrobras, no âmbito da Lei Rouanet, um valioso trabalho de
pesquisa,comodesejodequenosreconheçamoscomoaNova
Roma, porém melhor, porque lavada em sangue negro, sangue
índio, tropical.ANaçãoMestiçaqueserevelaaomundocomo
uma civilização vocacionada para a alegria, a tolerância e a
solidariedade.
Paulo de F. RibeiroPresidente
FundaçãoDarcyRibeiro
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xiii
prefácio – joão carlos escosteguy filho
SebastiãodaRochaPita.Épossívelqueonomedoautor,nas-
cidonolongínquoanode1660,nãodiganadaaoleitordehoje.
Masotítulodesuaobramaisfamosa,objetodesteprefácio,tem
umsignificadoaindapresenteparaqualquerbrasileiro.AHistória
da América Portuguesa,publicadapelaprimeiravezem1730, foi,
durantemuitotempo,consideradaaprimeiraHistóriadoBrasil
dignadessenome.Istoé,oprimeirorelatosobreamaiorparteda
entãocolôniaportuguesadesdeachegadadoslusitanos,em1500,
atéasvésperasdesuapublicação,em1724.Aindaqueo“título”
delivroprimeirodenossahistóriatenhasido,hoje,perdido(uma
outra obra, a História do Brazil, de Frei Vicente do Salvador, foi
escritaem1627,emboratenhasidopublicadaapenasnoséculo
XIX), o trabalho de Rocha Pita continua como uma das princi-
paiselaboraçõessobreosprimórdiosdapresençaportuguesana
América.Trata-sedeumdocumentoessencialparaacompreen-
sãodaformacomonós,brasileiros,aindahojeenxergamosnossa
existênciacomonação.
Nascido em Salvador, filho de um português com uma per-
nambucana, Rocha Pita estudou no colégio da Companhia de
JesusdaBahiae,segundoalgunsbiógrafos,teriacontinuadoseus
estudosnaUniversidadedeCoimbra,comoeracostumeentreos
filhosdaelitecolonial.CasotenhadefatofrequentadoCoimbra
não chegou, porém, a se formar em Direito, retornando para o
Brasileocupandocargos importantesemsuaterranatal,como
vereadordoSenadodaCâmaraeCoroneldeOrdenanças(nome
dadoàsforçasmilitaresauxiliaresportuguesas).
b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxii
a Coleção atualmente apresenta 150 obras, totalizando 18 mil
coleções, o que perfaz um total de 2.700.000 exemplares, cuja
distribuiçãoserágratuitaparatodasasbibliotecasqueintegram
oSistemaNacionaldeBibliotecasPúblicas,eocorreráaolongo
detrêsanos.
A BBB tem como base os temas gerais definidos por Darcy
Ribeiro: O Brasil e os brasileiros; Os cronistas da edificação;
Culturapopulareculturaerudita;EstudosbrasileiroseCriação
literária.
Impulsionados pelas utopias do professor Darcy, apresenta-
mos ao Brasil e aos brasileiros, com o apoio dos Correios e da
Petrobras, no âmbito da Lei Rouanet, um valioso trabalho de
pesquisa,comodesejodequenosreconheçamoscomoaNova
Roma, porém melhor, porque lavada em sangue negro, sangue
índio, tropical.ANaçãoMestiçaqueserevelaaomundocomo
uma civilização vocacionada para a alegria, a tolerância e a
solidariedade.
Paulo de F. RibeiroPresidente
FundaçãoDarcyRibeiro
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b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxiv
AocupaçãodessescargospermiteainserçãodeRochaPitana
chamada“nobrezadaterra”,ouseja,comopartedaelitelocalque
nãoapenassedestacavapelonascimento,mas,também,interfe-
rianapolíticacotidianaapartirdesuasocupações.Ashomena-
gensquerecebeuaolongodavida,comoohábitodaOrdemde
Cristo(1679)eamercêdeFidalgodaCasaReal(em1701e1703),
mostramquetinhaprestígiojuntoàCoroaportuguesa.Essestítu-
los,símbolosdehonraedistinçãosocialnasociedadeportuguesa,
podiamserbastantedisputadosentreosmembrosdosgruposdo-
minantescoloniais.
Porfim,anomeaçãodeRochaPitaparaacadêmicosupranu-
merário(istoé,parteexcedentedogrupooriginalmenteestabele-
cido)daAcademiaRealdeHistóriadePortugal,em1721,mostra
queseuprestígionãoeraapenassocialoupolítico,mas,também,
ligadoàsuaatuaçãocomohomemdeletras(ou“letrado”),con-
formesediziaàépoca.Defato,RochaPitanãoapenasdedicou-
-se à escrita da História da América Portuguesa, mas igualmente
produziu cânticos, sonetos, hinos etc. Também foi membro da
AcademiaBrasílicadosEsquecidos,em1724,dataemquejáfina-
lizavaaescritadeseulivro(queseriapublicado,porém,apenas
seisanosmaistarde,emPortugal).
RochaPitamorreuem1738,massuafamaperdurou.Maisde
cemanosdepoissuaobraseriaretomada,jánoBrasilindependen-
te,comosímbolodanaçãoquesepretendiaconstruir.Seunome
figuraria nas listas de “brasileiros ilustres” que historiadores do
séculoXIX,noImpério,formulariam.Sehojeoautorsoadistante,
poderemosperceberqueostemassobreosquaisescreveufazem
partedenossosensocomumsobreopaís.
Contudo,antesdefalarespecificamentedeseulivro,precisa-
mossituarsujeitoeobjeto,autoreobra,nocontextodesuaépo-
ca.Apenasassimpoderemoscompreenderosignificadodeuma
História da América PortuguesaparaoBrasildoséculoXXI.
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xv
O contexto
ComorepetidamenteensinadonasaulasdeHistória,oBrasil,
no século XVIII, não era ainda um país independente. Pelo
contrário: era parte integrante do chamado “Império Colonial
Português”,cujaformaçãosehaviainiciadonaépocadaexpan-
são ultramarina (as “Grandes Navegações”). Sendo parte desse
Império,aquiloque,hoje,chamamosde“Brasil”era,naverdade,
umconjuntoderegiõessemmuita ligaçãoentresi.Nãoexistia
umsentimentonacionalde“brasilidade”:aprincipalreferência,
em termos de identidade, era a Coroa Portuguesa. Por isso não
devemos pensar a obra de Rocha Pita como um testemunho de
nossa formação como nação. Não podemos imaginar que, em
1730,oBrasildoséculoXXIjáexistissedeformaembrionária.Não
havia uma “inevitabilidade” no destino histórico do Brasil Ou
seja,em1730, ninguémpoderiapreverqueumséculodepoisnas-
ceriaumpaísindependentechamadoBrasil.AHistória da América
Portuguesa,portanto,éumlivrosobrepartedoImpérioportuguês,
enãosobreafuturanaçãobrasileiraemconstrução.
Mas como o livro de Rocha Pita se insere nas ambições do
ImpérioPortuguêsemrelaçãoàHistória?Podemosdizerqueessa
ligaçãofazpartedeumconjuntomaiordeacontecimentosqueco-
meçavaatransformarasformasdeorganizaçãodoconhecimento
naEuropa,aosubstituir,poucoapouco,apredominânciadafi-
guradoinvestigadorsolitáriopelosaberproduzidoporreuniões
conjuntas de letrados (um termo da época para caracterizar o
intelectual).Reuniõesestasqueaconteciamemespaçosfundados
especialmenteparaessefim:eramaschamadasAcademias,parte
inseparáveldomovimentochamadoIluminismo(ouIlustração,
comoseusavamaiscorrentementeàépoca).
As Academias funcionavam como centros que reuniam as
mais diversas temáticas, indo desde as ciências naturais até
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b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxvi
as humanidades e, especialmente no caso da História, a escrita
vinha sempre acompanhada de preocupações artísticas e retó-
ricas. Em outras palavras, as academias misturavam áreas de
conhecimentoque,hojeemdia,ficamseparadasnasuniversida-
desenoscentrosdepesquisa.Paraentenderessa“mistura”,não
podemospensarem“confusão”.Precisamoslembrarqueaciên-
ciatalqualconhecemos,divididaemdepartamentosdistintos,é
umainvençãoqueganhouforçaapenasnoséculoXIX.Cemanos
antes, o ideal intelectual ainda estava mais próximo do perfil
renascentista.
EnquantoempaísescomoaFrançaasacademiastinhamum
carátermaisuniversal,semfocomuitoparticularnumounoutro
ramodosaber, emPortugal ocaminho foi umpoucodiferente.
Nessereinohouveapreocupaçãoemcriarumaacademiaespe-
cificamente voltada para a pesquisa sobre o passado lusitano.
Porisso,em1720,oReiDomJoãoVfundouaAcademiaRealde
História,emLisboa.EssaAcademiateriacomoprincipalfunção
escreverumaHistóriaEclesiásticaPortuguesa,comaintençãode
cantarasglóriasdoreinoetorná-lomaisconhecidoeadmirado
pelomundo.
Qual o sentido de escrever uma História para tornar o rei-
no mais conhecido? E, além disso, o que significa a expressão
“HistóriaEclesiástica”?Ambasasquestõesestãorelacionadas.Em
primeirolugar,nãopodemosesquecerque,atéhoje,aHistóriaé
uma poderosa ferramenta de construção de identidade. Todos
nósnosconsideramospartedeumamesmanaçãoporque,den-
treoutras razões, temosumaHistóriaemcomumquenosune.
Compartilhar o mesmo passado reforça nossos laços de união.
Se isso é uma realidade em pleno século XXI, no passado era
uma certeza mais forte ainda. Com uma diferença: na Europa
Ocidental,escreveraHistóriadeumreino,atéoséculoXVIII,não
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xvii
eraescreverahistóriadeseupovo,desuacultura,deseusindiví-
duos“comuns”etc.Era,emvezdisso,escreverprincipalmentea
história dos reis,das famílias reais,das casasaristocráticase do
cristianismo,semprecomapreocupaçãodenarrartaishistórias
deumpontodevistadaProvidênciaDivina.Emoutraspalavras,
ointeressemaiordaspesquisashistóricas,atéoséculoXVIII,es-
pecialmente nas Academias, era reunir bastante material sobre
acontecimentos passados que envolvessem o rei ou, de forma
maisgeral,aquelesnobresconsiderados“notáveis”.Eessesacon-
tecimentos,nessasnarrativas,estavamsempreguiadospelamão
divina,comoseDeusabençoasseos feitos passados e presentes
desses sujeitos históricos destacados, conferindo sempre uma
auradeglóriaevitóriaàHistóriadoReino.
Sendoessaa regrageralatéoséculoXVIII,algumasnecessi-
dades mais imediatas dessa época impunham aos letrados sete-
centistasumaoutratendênciaquesemisturariaàsintençõesde
louvarosfeitosreaisdopassado.Essanecessidadeeradepolítica
colonial: escrever História significava, também, conhecer me-
lhor as possessões do Império, e por isso, no caso português, a
Academia Real de História não serviria apenas para glorificar o
reinonafiguradeseusoberano,mas,também,parareunirinfor-
maçõessobreasregiõesdominadaspelosportuguesesaoredordo
mundo.Essaeraamaneiraencontradadereforçaropodermetro-
politanosobreessasregiões,aumentandooconhecimentosobre
asáreaseaspopulações.Nãoàtoa,umadasprimeirasmedidas
tomadaspelaAcademiaRealfoisolicitaroenviodedocumentos
administrativosdascolôniasparaPortugal,tarefaque,pordiver-
sasrazões,nãofoitotalmentecumpridapelosgovernanteslocais.
Podemos,então,afirmarqueaAcademiaRealdeHistória,bem
como as principais obras históricas escritas em Portugal nessa
época,tinhamessaduplapreocupaçãoemmente:criarnarrativas
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b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxviii
elogiosasdosreisenotáveisportuguesesdopassadoeaumentara
coleçãodeinformaçõessobreaspossessõesultramarinas.Aobra
deRochaPita,comonãopoderiadeixardeser,seencaixanesse
conjunto.
Enquanto essa onda tomava os principais centros europeus,
letradosdoBrasilcolonial,apesardaslimitaçõesquesuacondi-
ção impunha (como a ausência de universidades ou restrições
maisfortesàpublicaçãodelivros),tambémseconectarampar-
cialmente ao “movimento academicista”. As principais cidades
daépoca,Salvador(entãocapital)eRiodeJaneiro,assistiramà
fundaçãodealgumasAcademiasaolongodosetecentos.Dentre
as chamadas “Academias Brasílicas”, duas, em especial, dedi-
caram-se fundamentalmente à escrita da história da América
Portuguesa: a Academia Brasílica dos Esquecidos (1724) e a
AcademiaBrasílicadosRenascidos(1759).Aprimeira,emespe-
cial, fora fundada com o objetivo declarado de contribuir, pela
produçãointelectual,paraasoberanialusitananaAmérica,sen-
doseunome–“Esquecidos”–umaindicaçãodequeosletrados
nascidosnoBrasildesejavamservistoscomoparteintegranteda
“eliteletrada”portuguesa,fugindoaoostracismoqueacondição
coloniallhespoderiaimpor.
Acurtaduraçãodainstituiçãobaiana,porém,impediuareali-
zaçãodeseuprojetomaior:aescritadememóriashistóricassobre
a colonização portuguesa na América. Dentre seus membros,
apenasumdeles,exatamenteRochaPita,conseguiriarealizar,de
formacoerenteecompleta,essatarefa.
Surgindo,assim,numcontextodepreocupaçãodoreinopor-
tuguêscomaescritadahistóriadeseuImpério,olivrodeRocha
Pita seria uma primeira realização concreta desse empreendi-
mento.Éhoradeverificarmosaobramaisdeperto,embuscadas
razõesparasuapermanênciacomosímbolodoiníciodaescrita
daHistóriadoBrasil.
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xix
A obra
Divididaem10partes(chamadas“livros”),aobradeRochaPita
éfrutodepesquisasemarquivosdosconventosdasOrdensdeSão
Francisco,CarmoeSãoBento,alémdenosarquivosjesuíticose,
inclusive,deLisboa.Trata-sedeumrelatodapresençaportuguesa
noterritórioamericanodesdesuachegada,em1500,até1724.O
autor,seguindocostumedaépoca,dedicaaobraaomonarcapor-
tuguêsDomJoãoV,emnomedequemseescreviaesemantinha
ocontrolelusitanosobreacolônia.
AHistória da América Portuguesaapresentaalgumassurpresas
paraoleitordoséculoXXI.Emprimeirolugar,devemoslembrar
que,quandofalamosem“História”,precisamoscontextualizaro
significadoqueessapalavratinhanoséculoXVIII.Ouseja,não
era,ainda,umconhecimento“autônomo”,separado,comohoje
nos acostumamos a ver (desde os cursos universitários até as
disciplinas escolares). Essa forma “científica” da História iria se
fortalecerapenasnoséculoXIX.Cemanosantes,umhistoriador
era, antes de tudo, como já vimos, um “letrado” que atuava em
váriosramosdosaber.RochaPitanãoeradiferente.
Poeta,RochaPitaescrevianumestiloquepoderiaserchama-
do,hoje,derebuscado,floreado,muitopreocupadocomaretóri-
ca.NumatradiçãoqueremontavaàAntiguidade,a formadese
escrevertinhatantaimportânciaquantooconhecimentoemsi
quesepretendiatransmitir.Podecausarestranhamentoque,em
suadescriçãodaAméricaPortuguesa,logonosegundoparágrafo
dolivroprimeiro,RochaPitatenhaescritocoisascomo:
Emnenhumaoutraregiãosemostraocéumaissereno,
nem madruga mais bela aurora; o sol em nenhum outro
hemisfériotemosraiostãodourados,nemosreflexosno-
turnostãobrilhantes;asestrelassãoasmaisbenignas,ese
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mostramsemprealegres;oshorizontes,ounasçaosol,ou
sesepulte,estãosempreclaros;aságuas,ousetomemnas
fontespeloscampos,oudentrodaspovoaçõesnosaquedu-
tos,sãoasmaispuras:éenfimoBrasilterrealparaísodesco-
berto,ondetemnascimentoecursoosmaioresrios(...)
Essas palavras, que hoje dificilmente veríamos em um livro
dedicadoàpesquisahistórica,eramcomunsemobrasdaépoca.
Faziampartedeumestilodeescritaquemarcariaasinterpreta-
ções sobre o Brasil, influenciando fortemente, inclusive, nossos
autoresdoRomantismonoséculoXIX,sempreassociandoafor-
mação nacional brasileira a sua magnífica natureza. A ideia de
queoBrasilnasceuabençoadopeloscéustemlongatradiçãoem
nossopensamentohistoriográfico,earecuperaçãodeRochaPita,
atualmente,podenosajudarasituaressatradiçãoemseudevido
lugar:comomitofundadordenossanacionalidade.
Ao longo de suas páginas, a História da América Portuguesa
abordadiversosoutrosassuntosparaalémdoelogiodanatureza
oudescriçãoterritorial.Abordafatospolíticos,sociaiseeconômi-
cos.Insere-se,assim,numconjuntodeobrasquebuscavamnão
sónarrarosfeitosportugueses,mas,também,organizarinforma-
ções sobre as regiões coloniais como auxílio, à Coroa, para um
maiorconhecimentodeseusdomínios.
Algunstemasaindaatuaisestãopresentesnolivro.Podemos
mencionarcomoexemploaperenequestãoacercadodescobri-
mentoporPedroÁlvaresCabral.Teriasidointencional?Ouacaso?
RochaPita,emseulivroprimeiro,junta-seàquelesquedefendem
achegadaacidental,frutodeumdesviodarotaportempestade.
Noslivrosseguintes,descriçõesdepovoaçõesefundaçõesdevi-
las,cidadeseprovínciassãoabordadas,bemcomoaatuaçãodos
governadores-gerais.
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h i s t ó r i a d a a m é r i c a p o r t u g u e s a | s e b a s t i ã o d a r o c h a p i ta xxi
Masissonãoétudo.Maisdoqueapenasumadescriçãoeuma
interpretaçãodasorigensdapresençaportuguesanaAmérica,o
autorcontribuiu,naescolhadosassuntos,paraumaverdadeira
seleção de conteúdos que até hoje pauta nossas aulas escolares
sobreopassadobrasileiro.Emoutraspalavras,aleituradeRocha
Pitapodenosfazerpensarsobreossistemasdelembrançaeesque-
cimentoaquetodoconhecimentosobreaHistóriaestásujeito.
Alguns temas tratados por Rocha Pita ainda estão universal-
mente presentes nos livros didáticos sobre História do Brasil,
como a presença holandesa no Nordeste e o período da União
Ibérica.Emboraosignificadodessestemastenhamudadocons-
tantemente de 1730 para cá, sua presença quase “obrigatória”
aindacomomatériadeestudo,aindaqueo alunomuitasvezes
nãoentendaasrelaçõesentreseumundoeessesacontecimentos
passados,mostramopesoqueautoresdopassadoaindapodem
ter sobre nossas vidas. A continuidade que muitos estudos de
História realçam entre a cultura portuguesa e a brasileira pode
ignorar,nãoraro,influênciasdeoutrasvertentes,comoindígenas
eafricanas.PensaroquantoaHistóriadePortugalénossaprópria
História e o quanto temos nós de diferentes exige uma crítica
constanteaoshistoriadoresdopassado,eRochaPita,nessesenti-
do,podenosoferecermuitomaterialparareflexão.
Outros pormenores considerados relevantes por Rocha Pita,
como a epidemia que assolou Pernambuco em 1686, constante
nolivro7,forampraticamenteesquecidosdosbancosescolares.
Aopercebermosessesacontecimentosrestritoscomorelevantes
obastanteparaapareceremnumaobrade1730,porém“pequenos
demais” para que surjam com força nos livros atuais, podemos
refletirsobrecomooconhecimentosobreopassadopodemudar
detemposemtempos.Fatosconsideradosessenciaisatualmente
podemtersuaimportânciadiminuídapeloshistoriadoresdofu-
turo.Éassimqueoconhecimentohistóricosedesenvolve:cada
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b i b l i o t e c a b á s i c a b r a s i l e i r a – c u lt i v e u m l i v r oxxii
épocaselecionadoseventospassadosaquelesqueconsideramais
significativosparaseupresente.Eessaseleçãoésempredisputa
entrehistoriadores,grupos,classes,instituiçõesetc.Ahistóriaé,
também,aindaquenãoapenas,umadisputapolíticasobreoque
cadagruposocialdecidelembrareoquecadaumprefereesque-
cer.MaisumareflexãoparaaqualtextoscomoodeRochaPita
podemcontribuir.
Esse movimento de lembrança-esquecimento pode ser sinte-
tizado,parafecharmosesteprefácio,numoutrotemaabordado
por Rocha Pita: Zumbi de Palmares. Ao longo do livro 8, Rocha
Pitafaladofamosoquilomboedeseulíderedo“poderdosnegros
[quecrescia]comestessocorrosdosfugitivosqueselhesiamjun-
tando”.Palmaresétratadocomopartedahistóriadogovernode
CaetanodeMellodeCastro,governadordePernambucoàépoca,
mas, ainda que inserida na história política mais geral, ganhou
umdestaquenãovistoemmuitoslivrosetextossobreHistória
doBrasilnosséculosXIXeXX.Sementrarnaquestãodosigni-
ficadodePalmaresoudeZumbi(talvezumdostemascoloniais
maisdebatidosdenossaatualidade),podemospercebercomoa
História, em cada momento, é marcada por essas lembranças e
esquecimentos.ZumbiePalmaresforampraticamenteignorados
emmuitasobrasdoséculoXIXeXXpoisaescravidãoaindaera
presente e constituía uma questão nacional difícil de resolver
pelasclassesdirigentes.NoiníciodoséculoXX,ahistoriografia
sobreafricanosficavaemsegundoplano.Emmeadosdoséculo,
Zumbiressurgiucomolíderguerreiroabolicionista,imagematé
hojeemgrandepartepreservada.Atualmente,osestudoshisto-
riográficos,queseconvencem,cadavezmais,dacrucial impor-
tânciadaHistóriadaÁfricaparaoBrasil,tentamentenderZumbi
nocontextodesuaépoca.
Esse movimento da memória, entre lembranças e esqueci-
mentos,édifícildeperceber.Normalmentesentimosapenasseus
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efeitos:algunstemasquenosparecemessenciaisemcertasépo-
cassomemdadiscussãonosanosseguintes.Sentimosaausência,
masnãorefletimosmuitossobresuascausas.Emumpaíscomo
oBrasil,ondeaideiadequeaspessoastêmmemóriacurtaétão
difundida,apublicaçãodeobrasdopassadosobreaformaçãoter-
ritorial do país podem contribuir para pensarmos o significado
de nossa própria História, bem como para pensarmos sobre os
mecanismosquetornamalgunsassuntostãorelevanteseoutros
tãoignorados.
SebastiãodaRochaPita:essenome,umtantoesquecido,pode
termuitoadizersobrenóspróprios.
João Carlos EsCostEguy Filho é Professor de História da faetec-rJ – fundação de aPoio à escola técnica do estado do rio de Janeiro e Professor substituto da uerJ – universidade do estado do rio de Janeiro. Mestre eM História social Pela uff – universidade federal fluMinense.
Referências bibliográficas
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JESUS, Roger Lee Pessoa de. A História da América Portugueza (1730) deSebastião da Rocha Pita: o contexto, o autor, a obra. Revista de História da Sociedade e da Cultura, 11, 2011,p. 141-164.
KANTOR,Iris. Esquecidos e Renascidos:historiografiaacadêmicaluso-brasileira(1724-1759). São Paulo: HUCITEC; Salvador: Centro de Estudos Baianos/UFBA, 2004.
KARVAT, Erivan Cassiano. Histórias na “História da América Portuguesa”:concepçõesdehistóriaemtornodaobradeRochaPita(1730). Anais do XXIII Simpósio Nacional de História.Anpuh:Londrina, 2005.
TAVARES,TherezinhadeJesusMariliaAlmeida.Ensinocrítico–historiográficodolivro“HistóriadaAméricaPortuguesa”deSebastiãodaRochaPita.Cadernos de Pesquisa.Número4(2),SãoLuís,1988,p.54-64.
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História da América portuguesaSebastião da Rocha Pita
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Senhor.A América portuguesa,emtoscos,masbrevesrasgos,buscaos
soberanospésdeVossaMajestade,porqueaobrigaçãoeamora
encaminhamaoMonarcaSupremo,dequemreconheceodomí-
nioerecebeasLeiseaquemcomamaiorhumildadeconsagraos
votos,implorandoarealproteçãodeVossaMajestade,porqueao
príncipequelheregeoImpériopertencepatrocinar-lheaHistória.
DelaveráVossaMajestadeemgrosseiroriscodelineadaapartedo
NovoMundo,queentretantasdoorbeantigo,quecompreendeo
círculodasuaCoroa,éamaiordasuamonarquia.Nãooferecea
VossaMajestadegrandezasdeoutrasRegiões,emquedominao
seupoderosocetro,tendotantasquelhetributarnadoBrasil.Seo
quadroparecerpequenoparaideiatãogrande,emcurtoscírculos
sefiguramasimensasZonas,eEsferascelestes,emestreitomapa
seexpõemasdilatadasporçõesdaterra:umasópartebastapara
representaragrandezadeumcorpo;umsósimulacroparasimbo-
lizarasmonarquiasdoMundo:faltar-lhe-áopinceldeTimantes,
paraemumdedomostrarumgigante;ainteligênciadeDaniel,
paraemumaestátuaexplicarmuitosImpérios;massobra-lhea
grandezadeVossaMajestade,emcujaamplíssimasuperioresfera
seestãoassuasprovínciascontemplandocomoestrelas:sócom
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ela pode desempenhar-se o livro; prenderá as folhas, se Vossa
Majestadesoltaros raios,queelesalumiaram(comreaisvanta-
gens) mais âmbitos dos que pretende ilustrar a pena, existindo
estesborrõessónaforma,emqueàsluzespodemservirastrevas.
Porém,Senhor,comodescrevoumadasmaioresregiõesdater-
ra,permita-meVossaMajestadequedosresplendoresdessapró-
priaEsferaRégiatireumaluzparailuminarassombrasdosmeus
escritos,seráodelitodePrometeu,emroubarumraioaoSol,para
animarobarrodasuaestátua;tantosedevepediraumpríncipe,
em tal extremo generoso; e tudo pode conceder um Monarca,
comoVossaMajestade,portodososatributosgrande,etãodigno
deImpério,quenosanospelaidademenosrobustos,emtempo
quevacilanteoorbeiacaindo,lhepuseramanatureza,eafortuna
aosombros,nãosóopesodeumreinoflorente,masamáquinade
ummundoarruinado.FoiVossaMajestadeoverdadeiroAtlante,
eafortíssimacoluna,quesustentando-ocomasforças,ecomas
disposições, lheevitouosestragos;equeaindahojeoassegura,
nãosóaosseusnaturaisdomínios,masatodososestranhos,sen-
doarefulgentecoroadeVossaMajestadeEscudodePalasparaa
defensa,eoseuveneradoCetroraiodeJúpiterparaorespeito.A
RealPessoadeVossaMajestadeguardeDeusmuitosanos.
Sebastião da Rocha Pita
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prólogo
As grandezas, e excelências, ó leitor discreto, da regiãodoBrasil, tãocélebredepoisdedescoberta,comoani-quilada enquanto oculta, exponho ao público juízo, e atenção
doMundo,ondeassuasriquezastêmchegadomaisqueassuas
notícias,postoquealgumasandemporváriosautoresintroduzi-
dasemdiversosassuntos,diferentesdomeu,quenãotemoutro
objeto.Ocostumesemprenotadonosportuguesesdeconquista-
remImpérios,enãoosencarecerem,écausadequetendocriado
oBrasiltalentosporeminênciagrandes,nenhumcompusessea
históriadestaregião,commaiorglóriadaPátria,edaquepode
lograr nos meus escritos, tomando eu com inferiores forças o
peso,querequeriamaisagigantadosombros;porémorespeitado
caráter,emqueporsuagrandezaenãopormerecimentomeu,me
constituiuaRealAcademia,honrando-mecomoprecaríssimolu-
gardeseuacadêmico,medaráalentosdeHérculesparasustentar
pesosdeAtlante.
Comestaexpressãoofereçoestevolume:seentenderes,queo
compusemaplausosereverênciadoclimaemquenasci,podes
crer, que são seguras, e fiéis as notícias, que escrevo, porque os
obséquios não fizeram divórcio com as verdades. Se em alguns
termosoestiloteparecerencarecido,ouemalgumasmatériasde-
masiadooornato,reconhece,queemmapadilatadoavariedade
dasfigurascarecedavivezadascores,edasvalentiasdopincel;e
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queomeuaindaestáhumildenasimagens,queaquipinto,assim
porfaltadeengenho,comopornãotervistotodososoriginais,fa-
zendoamaiorpartedascópiasporinformações,dasquaismenão
poderesultaroacertodeApelesnoretratodeHelenapelosversos
deHomero;massetenãoconciliaragradopelastintasapintu-
ra,nãodeixemdemerecer-tetãomelindrosa,quenãobastema
contentá-locomlheapartaresosolhos,atiteescusasoenfado,e
amimacensura.
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advertência
Adverteoautor,quedariquíssimaAmérica(tãodilatada,queseestendeporquasequatromilléguasdecompri-mento,estandoaindaporsaberasquetemdelargo,ejazdebaixo
detrêsdiversaszonas,dividindo-seemSetentrional,eMeridional)
daparteSetentrionalnãofala,esótratanaMeridionaldagrandís-
sima porção, que compreende o Estado do Brasil, assunto desta
História da América Portuguesa.
Que não põem nela o cômputo dos tempos em número su-
cessivodeanos,porquedesdeodemilequinhentos,emquefoi
descobertaaAméricaPortuguesa,porlargocurso,atéodemile
quinhentosetrintaecinco,emquesedoarãoalgumasprovíncias,
eseprincipiouafundaçãodelas,nãoacontecerãooutrosprogres-
sos mais que a vinda do cosmógrafo Américo Vespúcio, por or-
demd’El-ReiD.Manuel,ademarcarestaRegião,eassuascostas;e
depoisadeoutrosgeógrafos,ecapitãesenviadospelomesmorei,
eporseufilho,esucessorEl-ReiD.JoãoIII,atomarposse,meter
marcos,observarocursodosmares,sondarosportos,exploraro
país,elevardelemaisdistintasnotícias.
Que estas operações se fizeram com intervalos de tempos; e
desdeoanodemilequinhentosequarentaenove,emqueveio
oprimeiroGovernadordoEstado,levaacontadelespelasuces-
sãodosgovernos,eordemdosfatos,mediandoaindaalgunslar-
gos espaços sem ações para a escritura; falta, que precisamente
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interrompeasériedosanos,masnãoalteraaverdadedaHistória,
nemasnotíciasdoBrasil,queéofimparaqueoautoraescreve,
etodaaalma,esubstânciadosescritos;poisomaissãoacidentes.
Queasmatérias,enotícias,quenelatrata,sãocolhidasdere-
laçõesfidedignas,conferidascomosautores,queestasmatérias
tocarão,ecomparticularesinformaçõesmodernas(queelesnão
tiveram) feitas por pessoas, que cursarão as maiores partes dos
continentesdoBrasil,easdepuseramfielmentecomotestemu-
nhasdefato,comaciênciadequeoautorasinquiriaparacompor
estaHistória,cujoessencialinstitutoéaverdade.
Quecomonosdoisprimeiroslivrosdescreveocorponatural,
ematerialdestaregião,asmaravilhosasobras,quenelafezanatu-
reza,asadmiráveisproduçõesemváriosgêneros,eespécies,eas
suntuosasfábricas,queparaotratocivil,epolítico,dassuaspo-
voaçõesfoicompondoaarte,noretratodetantaformosura,pre-
cisadaaserpincelapena,nãotemesairdospreceitosdahistória,
quandoalteraapurezadassuasleiscomasideiasdapintura,que
requermaisvalentesfantasias, tendoporexemplarportentos,e
queamaiselevadafrasepoéticaéverdadeaindamal-encarecida.
Que nos outros livros, que contêm matérias políticas, leva o
estilohistóricocomestudocastigado,enãopõenasmargensos
numerososrios,easváriasespéciesdasproduçõesdoBrasil,por-
que,sendotantodoinstitutodestaobra,entendequedevemirno
corpodela.
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licenças
Aprovação de ANTONIO RODRIGUES DA COSTA, do Conselho de Sua Majestade, e do seu Tribunal de Ultramar, Acadêmico da Academia Real da História.
Excelentíssimos Senhores.
Em execução da ordem de Vossas Excelências vi o livro, in-
titulado História da América Portuguesa, composta pelo coronel
Sebastião da Rocha Pita; e ainda que me parece mais elogio ou
panegírico, que História, não entendo, que desmerece o Autor,
queVossaExcelêncialheconcedamafaculdade,quepededepo-
dercondecoraroseunomenaedição,quefizerdestaobra,como
título,quegozadeAcadêmicoProvincialdestaAcademiaRealda
HistóriaPortuguesa.VossasExcelênciasordenarãooqueformais
justo e acertado. Deus guarde as pessoas de Vossas Excelências.
Casa10deAgostode1726.
Antônio Rodrigues da Costa
Aprovação de D. ANTONIO CAETANO DE SOUSA, Clérigo
Regular, Qualificador do Santo Ofício, Consultor da Bula da Santa
Cruzada, e Acadêmico da Academia Real da História.
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Excelentíssimos Senhores.
Li a História da América Portuguesa, escrita por Sebastião da
RochaPita,FidalgodaCasadeSuaMajestade,CavaleiroProfesso
da Ordem de Cristo, Coronel do Regimento de Infantaria da
Ordenança da Cidade da Bahia, e dos Privilegiados dela, e
AcadêmicoProvincialdoEstadodoBrasil.
EstaHistória,ExcelentíssimosSenhores,éaúnica,quetemos
seguida e completa dos dilatados, e riquíssimos domínios, que
El-ReinossosenhortemnestagrandepartedoMundo;peloque
émuitodeagradeceracuriosaaplicaçãocomqueseuAutorse
empregouemescreverestaHistória,que,sendoprincipalmente
política,temmuitodanatural,peloquesefazmaisagradável,não
sópelanotíciadosseuspreciososminerais,maspeladeinumerá-
veisanimaisterrestres,quadrúpedes,répteis,evoláteis,monstros
horríveis,aindaaquáticos,porqueaquelesmaresproduzemcoi-
sasdegrandeadmiração,comotambémosãoasvegetáveis,com
tãoextraordináriasproduçõesdanatureza,quefazemfertilíssima
aquelagrandeporçãodeterra,compreendidadebaixododomí-
niodonossoAugustoProtetor.
ÉSebastiãodaRochaPitanascidonaBahia;enãoémuito,que
oamordapátriaoobrigueaengrandecer,eornarcomespeciosas
vozesaquelascausas,queanóssenosfazemmaisestranhas,ou
porseremrarasvezesvistas,ousomentecridaspelasinformações
comqueassabemos.Ésemdúvidaqueaquelapartedomundo
contémprodígios,que,excedendoàshipérboles,nãoofendema
verdade,leimaisessencialparaaHistória,doqueosoutrosmais
rigorosospreceitos,comqueelasedevecompor.Esteautorofaz
emestilotãoelegante,quetemmuitodepoético,emquelheacho
companheirodetãograndenota,comoalgumdeeminentíssimo
caráter,eesteseráomotivo,porqueconcilienamaiorpartedos
leitoresaplauso,e louvor;porqueentendo,quenãoserámenos
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estimadaestahistória,doqueoutras,quevemosdesemelhante
estilonanossalíngua,enadosnossosvizinhos,aondetembas-
tantereputação.Pordiferentesmeiosconciliamosautoresaaura
popularcomqueosseuslivrossãoestimados.Osexemplaresda
HistóriaRomana,cujaliçãoétãorecomendávelaumhistoriador,
vemosquãopoucosconseguemoimitá-los,eporissosãotãopou-
cososquelogramocabalnomedehistoriadores.Quantasvezes
ouvimoscriticaraquelesmestresdaHistória,dequemosoutros,
que se seguirão, beberão não só o método, mas ainda o mesmo
estilo? Nesta parte são bem diversos os gostos, porque também
algunsenfastiadosdaeloquênciapretendemsejaaHistóriauma
narraçãotãonuadevozes,comodereflexões,desorte,queaque-
remantesinsulsaquecomalgumadorno:porémestesdiscursos
são tidos de uns paradoxos, e de outros por afetos da melanco-
lia,queosdomina,demodoqueonãochegamaexecutarnesta
parteaindaosmaisausteroscensores.Estelivromeparecemui
dignodalicença,queseuautorpede,paraoornarcomonome
de Acadêmico da nossa Real Academia; e assim devem Vossas
Excelênciasmandar-lheagradecerozelocomqueestácooperan-
doparaonossoInstituto,nãosócomosseusestudos,maisainda
comasuaprópriadespesanaimpressãodestelivro.Esteéomeu
parecer.VossasExcelênciasresolverãooqueformaisconvenien-
teàhonradanossaAcademia.LisboaOcidental,naCasadeNossa
SenhoradaDivinaProvidência,24deNovembrode1726.
D. Antônio Caetano de Souza,ClérigoRegular
DiretoreCensoresdaAcademiaRealdaHistóriaPortuguesa
dãolicençaaoCoronelSebastiãodaRochaPita,parausardotí-
tulo de Acadêmico Supranumerário no livro intitulado História
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da América Portuguesa,vistasasaprovaçõesdosdoisAcadêmicos,
aquesecometeuoseuexame.LisboaOcidental,6deDezembro
de1726.
Marquês de Alegrete
D. Manuel Caetano de Sousa
Marquês de Fronteira
Marquês Manuel Telles da Silva
DO SANTO OFÍCIO
Aprovação do R. P. M. Fr. MANUEL GUILHERME, Qualificador do
Santo Ofício, Examinador das três Ordens Militares
Eminentíssimo Senhor.
LiolivrointituladoHistória da América Portuguesa,composto
porSebastiãodaRochaPita;enabrevidadededezdiasemqueoli,
mostroadmireiafraseverdadeiramenteportuguesa,desafetada,
pura,concisa,econceituosa.Quer-meparecerqueoautordesem-
penhatodasas leisdaHistória,queouçodizersãomuitas,ede
difícilobservância.Pelaprincipalrazãodenãotercoisacontraa
Fé,oubonscostumes,mepareceémerecedoraestaobradalicen-
ça,quepretende.VossaEminênciamandaráoqueforservido.São
DomingosdeLisboaOcidental,20deDezembrode1726.
Fr. Manuel Guilherme
Aprovação do R. P. M. Fr. BOAVENTURA DE SÃO GIÃO,
Qualificador do Santo Ofício.
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Eminentíssimo Senhor.
SEMPRE o gênio português foi avaro em narrar por escrito
suasheroicasações,eostentarnopreloassuasproezas;nãoas-
pirando chegar com a pena, onde se arrojou a sua espada, nem
voar com o discurso onde se remontou o seu valor; por senão
disporareduziraescritura,oqueemtodooUniversopublicou
afama;comoexceção;porémdestaregraseanimouSebastiãoda
RochaPitaapresentaraosolhosdomundo,eatençãodasgentes
a História da América Portuguesa, que compôs e ordenou em be-
nefíciodaPátria,ecréditodanação;onderessuscitadeentreas
cinzas,emquehátantosanosjaziaenvoltatãoadmirávelestátua,
antigamentelavrada,eprimorosamenteesculpidacomoferro,e
armaslusitanas,retratando-anobrevemapadestepapel,ondese
darábemaconhecerpelacópiaooriginal.
É a ideia do escritor igualmente elevada, que o assunto e a
sua pena proporcionada a tão sublime emprego, pois desempe-
nhanestaobraoquepremeditouoseuconceito,eajuizouoseu
pensamento,ecomgrandebradoreputaránoteatrodomundo
asproezas,efaçanhasdobraçoportuguês,nodescobrimentode
novasterras,tãodilatadas,comoincógnitas.Descreveabondade
doclima,fertilidadedaterrasemprefecundanassuasproduções:
fazpresenteopassado;epõeànossavistaoqueestátãolongedos
nossosolhos.
Pontualmente cumpre os preceitos da narração, e as leis da
História; porque determina ações, ajusta anos, observa tempos,
distinguelugares,demarcaterras,individuasucessos,reduzindo
aabreviadosperíodosoquepoderásermatériadecopiosostrata-
dos.Edenominando-seestapartedoorbeNovoMundo,paranós
éagoraMundonovo,pelanotícia,queoautornoscomunicado
queé,edoquecontémtãodilatadopaís,expondoànossacom-
preensãooqueatéaquiseocultouaonossoconhecimento.
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Poucoimportadescobrirotesouro,sesenãoconheceasuapre-
ciosidade:porqueachá-loéfortuna,conhecê-lo,descrição,emais
olograquemosabeavaliarquequemopossuisemoconhecer.O
valordodiamantedependedaestimaçãodolapidário,ovalordo
ourodoexamedocontraste,porqueumlhesondaofundo,outro
lheexaminaosquilates.
EstoucertosehádelerapresenteHistóriacomgosto,esem
fastiopelaboaordem,eadmiráveldisposiçãocomqueestácom-
posta, novidades, que refere, particulares, que relata elegância
comqueseadorna;porqueoestiloégrave,especioso,eagradável,
naturalsemartifício,ecultosemafetação,etãosingular,quenão
temregraociosa,oraçãosupérflua;nãotemperíodoquenãoseja
próprio,palavra,quenãoestejaemseulugar:nãohátermoquese
nãopercebacomclareza,objeto,quesenãovejacomdistinção;
igualmenteconvidaacuriosidade,edesafiaaemulação;porque
historiardestasorteéfelicidadedepoucos,einvejademuitos.
TemoBrasilaventuradeacharnaeloquênciadeumfilhoo
melhor instrumento da sua glória, e o maior manifesto do seu
luzimento,poispublicacomestepregãoassuasexcelências,edá
aconhecerassuassingularidades;animandodenovoasproezas
antigas,eossucessospassados,queporcaducosestavamamorte-
cidos,eporesquecidoseramcadáveres;etornaverdesaspalmas,
que a dilação do tempo tinha murchas, não sendo menos úteis
aosimpériososempregosdapena,queasvitóriasdaespada;por-
quenasimagensdosescritos,comonosmármores,seconservaa
memória,eseeternizaafamadostriunfosdasarmas.
Époisbeneméritodamaioratençãoestepreciosolivro,edig-
no de todo o crédito o que nele se exprime, pela autoridade do
escritor,ecoerênciadasnotícias,semomínimoescrúpulo,deque
oafetodenatural,eamordaPátriaviciasseaHistória,ouadulte-
rasseaverdade.Eporqueemtudoseconformacomapurezade
nossaSantaFéCatólica,ebonscostumes,selhedevedejustiça
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a licença, que pede por favor para a estampa, sendo merecedor
doprimeirolugarnoprelo.Esteomeuparecer.VossaEminência
mandará o que for servido, Lisboa Ocidental, no Hospício do
Duque,10defevereirode1727.
Fr. Boaventura de São Gião
• • •
VISTASasinformações,pode-seimprimiraHistória da América
Portuguesa,compostaporSebastiãodaRochaPita,edepoisdeim-
pressatornaráparaseconferir,edarlicençaquecorra,semaqual
nãocorrerá.LisboaOcidental,11deFevereirode1727.
Fr. R. Alencasstre – Cunha. – Teixeira. – Silva. – Cabedo
DO ORDINÁRIO
Aprovação do M. R. Padre D. JOSÉ BARBOSA, Clérigo Regular,
Acadêmico Real da História Portuguesa, Cronista da Sereníssima Casa
de Bragança, e Examinador das Três Ordens Militares.
Ilustríssimo Senhor.
ORDENA-MEVossaIlustríssimaquevejaaHistória da América
Portuguesa,queescreveuoCoronelSebastiãodaRochaPita.Esta
grandeporçãodomundo,descobertonoanodemilequinhen-
tos,esteveatéagoracomoincógnitaporfaltadehistoriadorque
desseaconhecercomexaçãoasportentosasmaravilhasdequea
dotouanatureza.EscreveudestaRegiãoumbrevíssimotratado,
comotítulodeHistória da Província de Santa Cruz,PedroGandaio
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de Magalhães, e nele, nem a brevidade, nem o estilo podiam
fazeragradávelasuarelação.Emmaiorvolume,massemexce-
derdecronistanaturaldaquelasdilatadíssimasterras,escreveo
PadreSimãodeVasconcelos,daCompanhiadeJesus,doislivros
de notícias curiosas, que depois foram incorporadas na crônica
da mesma religião daquele Estado. Em alguns livros se acham
poucas memórias da América, que pertençam juntamente aos
sucessos políticos, e militares, porque suposto que temos o va-
lorosoLucidenodeFr.ManuelCallado,oCastriota LusitanodeFr.
Rafael de Jesus, as Memórias Diárias da guerra de Pernambuco de
DuartedeAlbuquerqueCoelho,aNova LusitâniadeFranciscode
BritoFreire,eaGuerra do Brasil na língua italianadeFr.JoãoJosé
deSantaThereza,nenhumdestesautoresécronistageraldetoda
aAméricaPortuguesa,porqueamaiorpartedestaspenasseocu-
paramcomahistóriadasguerras,queintroduziramnaCapitania
de Pernambuco as armas holandesas; e tendo algumas delas
historiadoasnossasdesgraças,semprelhesfaltouotempopara
daremnotíciadasnossasvitórias.Masaindaquenesteslivrosse
vejaobriomilitardosAmericanosPortugueses,tudooqueneles
se escreve é uma pequena parte a respeito de tão grande todo.
Sabíamosovalor,comquepoucossoldadosmal-armadosepior
disciplinados,animando-osozelodaFé,eoamordaliberdadedas
suasPátrias,souberamvencer,etriunfardeumagentetãovaloro-
sa,comoaholandesa,emqueéfácildeexaminar,qualsejanela
maior,seoesforço,seaindústriamilitar.Sabíamosemcomumos
nomesdosGovernadoresdemuitascapitaniasemquesedividiu
oagigantadocorpodaquelaconquista,masnãolhessabíamosa
continuaçãoatéosnossostempos,porqueestasnotíciasatéagora
eramfilhasdoacaso.Sabíamos,queemalgunsdaquelesBispados
floresceramPreladosSantíssimos,quecomgenerosoeapostólico
trabalhoacrescentarãoorebanhodeCristo,masasuasérieera
ignoradapelosescritores.Sabíamososmilagres,quepeloespaço
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detantosséculosescondeuanaturezaatodoorestodomundo;
e sabíamos que aqueles sertões mais eram povoados de ouro, e
de pedraria, que de homens; mas tudo isto sabíamos com tanta
confusão,quenãoseriagrandeerrooafirmar,queeraomesmo,
queseoignorássemos,porqueestacostumaserapenadoquese
sabeemconfusão.Paraque tudosesoubessecomdistinção,es-
creveoCoronelSebastiãodaRochaPitaestaHistória da América
Portuguesa,quecompreendeduzentosevintequatroanosdetem-
po,emquesepraticarãotodosaquelesacontecimentos,emque
mostra a fortuna a firme variedade da sua inconstância. Com a
devida proporção verão os leitores nesta História todos aqueles
casosquefizeramfamosasamuitasmonarquias,porqueaquise
verãopovosmalcontentes,elogosatisfeitos,ver-se-ãopromessas
de tesouros, umas vezes mal cumpridas, e outras descobertas,
achar-seoouroemtantaabundância, comose fora terra; e uns
Governadoresdescuidadosdahumanidadeporculpadadistân-
cia,eoutrossempreosmesmos,aindaquetãodistantesdaCorte,
porqueoshomensverdadeiramentecristãosadoramemtodapar-
teapresençadeDeus;desorteque,atendendoaoqueesteautor
escreveu,entendoquejustamenteselhedevedarotítulodenovo
Colon,porquecomoseutrabalho,ecomoseuestudonossoube
descobriroutromundonovonomesmomundodescoberto.Esta
Históriaestáescritacomtantaelegância,quesótemodefeitode
nãosermaisdilatada,paraqueos leitoressepudessemdivertir
commaiortorrentedeeloquência.Todosossucessosestãoescri-
tos com tão artificiosa brevidade que se percebem sem defeito
dasnotíciasnecessárias,porquedeoutrasorteocupariammuitos
volumes os negócios políticos, e as ações militares de tão gran-
denúmerodenações,comosãoasquehabitamodilatadíssimo
sertão da nossa América. Parece-me que Vossa Ilustríssima lhe
devedaralicençaquepede,paraseimprimirestaHistória,nãosó
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porquenãoofendeaFé,oubonscostumes,senãotambémpara
quevejaEuropa,quelhenãocedeoBrasilnaqualidadedosescri-
tores.VossaIlustríssimaordenaráoqueforservido.NestaCasade
NossaSenhoradaDivinaProvidencia,28deMarçode1727.
D. José Barbosa
Clérigo Regular
VISTAainformação,pode-seimprimirolivrodequesetrata,
edepoisdeimpressotornaráparaseconferir,edarlicençaque
corra,semaqualnãocorrerá.LisboaOcidental,30deMarçode
1727.
D. F. Arcebispo da Lacedemônia
DO DESEMBARGO DO PAÇO
Aprovação de MARTINHO DE MENDONÇA DE PINA E DE
PROENÇA, Acadêmico da Academia Real da História Portuguesa.
Senhor.
LENDOaHistória da América Portuguesa,quecompôsSebastião
da Rocha Pita, não achei nela coisa, por que se deva negar a li-
cençadeseimprimir;antesmeparecequenãosomenteédigno
delouvor,porémaindadeprêmioozelocomqueseuautorquis
aumentaraglóriadaPátria.Delesevê,queasoberanaproteção,
que Vossa Majestade concede às artes, e ciências, inspirando os
maioresescritoresdaEuropa,animatambémosdasmaisdistan-
tes partes do mundo; pois as remotas e dilatadas províncias da
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Américalhetributammaispreciosostesouros,queosdesuasmi-
nasnestelivro,oqualseadornacomossucessoshistóricos,que
refere e brilha com vários ornatos poéticos de largos episódios,
frequentesfiguras,ediscretospanegíricos,quecontém.
Algumreparosepoderáfazernamiudezacomqueemhistória
tãosucintarelataalgunssucessosmaisdignosdehorror,esilên-
cio,quedêmemória,masnãofazerdelesmenção,seriadiminuir
a glória dos leais, encobrindo a infâmia dos traidores contra as
severasleisdaHistória;Nihil veri non audeat.Esteéomeuparecer.
VossaMajestademandaráoqueformaisconvenienteaoseureal
serviço.LisboaOcidental,25deJulhode1727.
Martinho de Mendonça de Pina e de Proença
QUE se possa imprimir, vistas as licenças do Santo Ofício, e
Ordinário,edepoisdeimpressotornaráàMesaparaseconferir,
etaxar,quesemissonãocorrerá.LisboaOcidental,1ºdeAgosto
de1727.
Marquês P. – Pereira. – Oliveira. – Teixeira. – Bonicho
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livro primeiro
Introdução. – Do Novo Mundo, tantos séculos escondido, ede tantos sábios caluniado, onde não chegarão Hannoncom as suas navegações, Hércules Líbico com as suas colunas,
nemHérculesTebanocomassuasempresas,éamelhorporção
o Brasil; vastíssima região, felicíssimo terreno, em cuja superfí-
cie tudo são frutos, em cujo centro tudo são tesouros, em cujas
montanhas,ecostastudosãoaromas;tributandoosseuscampos
omaisútilalimento,assuasminasomaisfinoouro,osseustron-
cosomaissuavebálsamo,eosseusmaresoâmbarmaisseleto:
admirávelpaís,atodasasluzesrico,ondeprodigamenteprofusa
anatureza,sedesentranhanasférteisproduções,queemopulên-
ciadamonarquia,ebenefíciodomundoapuraaarte,brotando
assuascanasespremidonéctar,edandoassuasfrutassazonada
ambrosia,dequeforammantidasombraolicor,evianda,queaos
seusfalsosDeusesatribuoacultagentilidade.
Emnenhumaoutraregiãosemostraocéumaissereno,nem
madrugamaisbelaaaurora:osolemnenhumoutrohemisfério
temosraiostãodourados,nemosreflexosnoturnostãobrilhan-
tes:asestrelassãoasmaisbenignas,esemostramsemprealegres:
oshorizontes,ounasçaosol,ousesepulte,estãosempreclaros:
aságuas,ousetomemnasfontespeloscampos,oudentrodaspo-
voaçõesnosaquedutos,sãoasmaispuras:éenfimoBrasilTerreal
paraísodescoberto,ondetêmnascimento,ecursoosmaioresrios;
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domina salutífero clima; influem benignos astros, e respiram
aurassuavíssimas,queofazemfértil,epovoadodeinumeráveis
habitadores,postoqueporficardebaixodatórridazona,odesa-
creditassem,edessemporinabitávelAristóteles,PlínioeCícero,
ecomgentiososPadresdaIgrejaSantoAgostinho,eBeda,quea
teremexperiênciadestefelizorbe,seriafamosoassuntodassuas
elevadaspenas,aondeaminhareceiavoar,postoqueoamorda
Pátriamedêasasas,easuagrandezamedilateaesfera.
Estado em que se achava a monarquia. – Florescia o Império
LusitanomuitosséculosdepoisdeserfundadoporTubal,amplia-
doporLuso,eporLísias,edeteremosseusnaturaisgloriosamen-
tenaPátriaobradoaçõesheroicas,econcorridoforadelaparaas
maiores empresas, já nos socorros, que deram aos cartagineses
conduzidosporSafo,paradomaraMauritânia;jánosqueacom-
panharamaAníbal,paraconquistaraItália;jáconcorrendocom
Mitridates contra Pompeu, e com Pompeu, e seus filhos contra
César;edehaveremnadefensadapróprialiberdadefeitoadmi-
ráveis provas de valor com os seus capitães Viriato, e Sertório
contraosRomanos;efinalmentedepoisquelivresdasujeiçãodos
Suevos,dosAlanos,dosGodos,edosSarracenos,tendojálogrado
noseuprimeiroreiportuguêso invictoD.AfonsoHenriques,e
nasuarealproleosuavedomíniodetrezesucessivosmonarcas
naturais,seachavanaobediênciadofelicíssimoReiD.Manuel.
Mantinha com a Tiara Romana a antiga união, firme com a
nossaobediência,ereligião;comCastelaestavaempazassegura-
dapelasnossasvitórias;tinhaamizadecomaCoroaImperial,com
as de França, Inglaterra, Escócia, Suécia, Polônia, e Dinamarca;
com as Repúblicas, e Nações Setentrionais, e Italianas, pelos in-
teresses recíprocos, e comuns das Monarquias; fazia guerra aos
Mauritanos,aosEtíopes,eaosAsiáticos,paralhesintroduziraFé
Católica,achava-sedilatadacomosdescobrimentosdasIlhasdo
PortoSanto,daMadeira,edosAçoresnoOceano;epordiferentes
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mares,commuitaspraças,eprovínciasemÁfrica;comgrandes
povoações,econquistasnaEtiópia;ecomeçavaamostrar-lheos
seusmaioresdomíniosdaÁsia,quandooNovoMundolheabriu
asportasdasuamaisvastaregião.
Conforme a conta dos Padres Bussieres, e Saliano. – Tinhajádadoo
SolcincomilequinhentasecinquentaeduasvoltasaoZodíaco,
pelamaisapuradacronologiadosanos,quandonodemilequi-
nhentos da nossa redenção (oito depois que a Cristóvão Colon
levouaespeculaçãoademandarasÍndias)trouxeatempestadea
PedroÁlvaresCabraladescobriroBrasil.Háesteilustre,efamoso
Capitão(oprimeiro,quedepoisdeD.VascodaGama,passavado
TejoaoIndoeGanges)governandoumaformosaArmadadetreze
poderosasnaus,comquepartiuaosnovedeMarço,navegandoao
princípiocomprósperaviagem,experimentouaosdozediastão
contráriafortuna,quearribandoumdosbaixeisaLisboa,osou-
troscorrendotormenta,perdidososrumosdanavegação,econ-
duzidosdaaltíssimaprovidência,maisquedosporfiadosventos,
naalturadopoloAntártico,dezesseisgrausemeiodapartedo
Sul,aosvinteequatrodeAbril,avistouignoradaterra,ejámais
surcadacosta.
Descobrimento do Brasil. Nomes, que lhe foram impostos. – Nela
surgindo as naus, pagou o General àquela ribeira a segurança,
queacharadepoisdetãoevidentesperigos,comlhechamarPorto
Seguro,eàterraSantaCruz,peloestandartedanossaFé,quenela
arvoroucomosmaisexemplaresjúbilos,eaosomdetodososins-
trumentos,eartilhariadaArmada;fazendocomamesmamilitar
ostentação,epiedadecelebraroSantoSacrifíciodaMissasobre
umaAra,quelevantouentreaqueleincultoarvoredo,quelheser-
viudedossel,edeTemplo,acujascatólicascerimôniasestiveram
admirados,masreverentes,todosaquelesbárbaros,econformes
comoexemplodosfiéis,premissasdoafeto,comquedepoisabra-
çaramanossaReligião.Estefoioprimeirodescobrimento,esteo
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primeironomedestaRegião,quedepoisesquecidadetítulotãosuperior, se chamou América, por Américo Vespúcio, e ultima-menteBrasil,pelopauvermelho,oucordebrasasqueproduz.
A sua situação, e o seu corpo natural. – Jaz o opulento Impériodo Brasil no Hemisfério Antártico, debaixo da zona temperadaMeridional grandíssimo espaço. É de forma a parte Austral aoTrópico de Capricórnio, de donde entra na Zona temperadaMeridionalgrandíssimoespaço.Édeformatriangular;principiapelabandadoNortenoimensoriodasAmazonas,eterminapeladoSul,nodilatadíssimoriodaPrata;paraolevanteobanhamaságuasdoOceanoAtlântico;paraoOcidentelheficamosReinosdeCongo,eAngola,etemporAntípodasoshabitadoresdaÁureaChersoneso,ondeestáoReinodeMálaca.Nasualongitudegran-díssimacontamoscosmógrafosmilecinquentaeseisléguasdecosta, a mais formosa, que cursam os navegantes, pois em todaela,eemqualquertempoestãoassuaselevadasmontanhas,eal-tosarvoredoscobertos,evestidosderoupas,etapeçariasverdes,porondecorreminumeráveiscaudalososrios,queemcopiosas,ediáfanascorrentesprecipitamcristaisnassuasribeiras,oulevamtributo aos seus mares, em que há grandes enseadas, muitos, econtinuadosportoscapacíssimosdosmaioresbaixéisedasmaisnumerosasArmadas.
O seu terrestre continente.–Asualatitudepelointeriordaterraélarguíssima:maisdequatrocentasléguasseachamjácultivadascomasnossaspovoações,sendomuitasasqueestãopordescobrir.Este famoso Continente é tão digno das suspensões humanas,pelas distâncias, que compreende, e pelas riquezas que contém,como pelas perspectivas, que mostra; porque até em algumaspartes, em que por áspero parece impenetrável, aquela mesmarudeza,queorepresentahorrível,ofazadmirável.Aformosava-riedadedassuasformasnadesconcertadaproporçãodosmontes,naharmoniadeobjetos,quenãosabemosolhosaondemelhorpossamempregaravista.
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Com inventos notáveis saiu a natureza na composição do
Brasil; já em altas continuadas serranias, já em sucessivos dila-
tados vales; as maiores porções dele fez fertilíssimas, algumas
inúteis;umasdearvoredosnuas,expôsàsluzesdoSol,outrasco-
bertasdeespessasmatas,ocultouaosseusraios;umascrioucom
disposições,emqueas influênciasdosastrosachamqualidades
proporcionadas à composição dos mistos, outras deixou menos
capazesdobenefíciodasestrelas.Formoudilatadíssimoscampos;
unspartidosbrandamenteporarroiospequenos,outrosutilmen-
tetiranizadosporcaudalososrios.Fezportentosaslagoas,umas
doces, e outras salgadas, navegáveis de embarcações, e abun-
dantesdepeixes;estupendasgrutas,ásperosdomicíliosdeferas;
densosbosques,confusascongregaçõesdecaças,sendotambém
destegêneroabundantíssimoesteterreno;noqualanaturezapor
váriaspartesdepositouosseusmaiorestesourosdefinosmetais,
epedraspreciosas,edeixouemtodoeleoretratomaisvivo,eo
mais constante testemunho daquela estupenda, e agradável va-
riedade,queafazmaisbela.
Montes pela parte do norte. – Os montes famosos desta região,
postoquesejammuitos,ecompitamemgrandeza,sódosmaiscé-
lebrespelaaltura,pelaextensão,eporoutrascircunstânciasme-
moráveis, faremosmenção.AoNorteomonteJericoacoara,que
estandoassentadonocontinentedaterradoCeará,émarco,que
muitasléguasaolongedescobremasembarcações,quandonave-
gamparaascapitaniasdoNorte.NodistritodeJaguaribeafamosa
serra,cujocumeserematacomaformadeSetePãesdeAçúcarda
Borborema,sitanoPortodosTourosentreoCunhaúeaParaíba,
quecorrendocomomesmonomeatéaribeiradoPinhancó,dali
atéaIguapava(emquemaiselevadafenece,escondendo-seentre
asnuvens)sechamaSerradoAraripe.AmontanhadoArarobá,
quenascenocontinentedaterradoPortodoCalvo,evaicoma
mesma grande altura cortando por muitas léguas o interior do
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sertão. O monte das Tabocas em Pernambuco, nove léguas da
ViladoRecife.AsmontanhasdosGuararapes,queprincipiando
menoselevadasquatroléguasdamesmaVila,vãocontinuando
paraosertãocomgrandiosíssimaaltura,eacabamemserranias,
quepenetramosares;estasmontanhas,eaquelemonte,célebres
pelastrêsfamosasvitórias,quenelesalcançamosdosholandeses
emtrêssanguinolentasbatalhascampais.
Montes pela parte do sul.–ParaoSulacordilheirademontes,
que começando na Capitania dos Ilhéus com o nome de Serras
dos Aimorés, e atravessando as do Porto Seguro, e do Espírito
Santo,vãoporcentoequarentaetrêsléguasdecursoacabarna
enseadadoRiodeJaneiro,ondelheschamamMontesdosÓrgãos.
NocaminhodaquelacidadeparaasMinasGeraisaaltíssimaSerra
daItatiaia.NosvastosdistritosdasMinasdoOuro,asinacessíveis
serranias,decujasvertentes(dizemosseusdescobridores)nasce
ograndíssimoriodeSãoFrancisco.NasprópriasMinasdoSulo
opulento Serro Frio, que tem mais partes de ouro, que o Potosí
tevedeprata.AestupendaSerradeParanapiacaba,quetendoas-
sentonocontinentevizinhoàsVilasdeSantos,eSãoVicente,vai
inconstantementesubindoemvoltas,umassobreomar,outras
paraointeriordaterra,edandoporalgumaspartesentradame-
nosdifícil,poroutrasestreito,efragosotrânsitoparaacidadede
SãoPaulo,quelheficapeloSertãoseteléguasdistante.
Apartadoquaseduasdaditacidade,océlebremonteJaraguaí,
dosprimeiroscorposterrenos,quenaquelaregiãosoltaramveias
de ouro. Junto à Vila de Sorocaba, o monte Marocoiaba, tão ro-
busto,quetemdeferroasentranhas.NaViladeTaubaté,agran-
demontanhadeItajubá.OaltomonteAiapi,fronteiroàVilade
Parnaíba.Entreela,eadeUtu,aSerradeAputerihibu.Nocaminho
dasnovasMinasdoCuiabá,acordilheiradosmontesdeIboticatu;
e mais ao Sul a do Cochipone. Finalmente, das elevadíssimas
montanhasdanossaPortuguesaAmérica,umasparecemteraos
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ombrosocéu,outraspenetrá-locomacabeça.Nãosejactemsó
África,eGréciadosseusdoissagradosmontes,porquetambém
(amenosostentaçãodecultos)temAtlanteseOlimposoBrasil.
As suas portentosas campanhas e vales.–Todaamaiorporçãodo
seuterrenosedilataemgrandíssimascampanhasrasas,tãoesten-
didas, que caminhando-se muitas léguas sucessivas sempre pa-
recequevãoterminarnoshorizontes.Valestãodesmedidos,que
emlarguíssimosdiâmetros,émenosdifícilabrir-lhesoscentros,
que compreender-lhes as distâncias no comprimento, e largura
dassuasplanícies.Nestedilatadíssimoteatro,emqueanatureza
comtantas,etãováriascenasrepresentaamaiorextensãodasua
grandeza, e apura todos os alentos dos seus primores, regando
com portentosos rios amplíssimas províncias, e posto que lhes
não possamos seguir as correntes, é preciso lhes declaremos os
nomes,primeiroaosmaiscélebres,edepoisaoutrostambémfa-
mosos,quandoaelesforchegandoaHistória.
Rios mais famosos desta Região.–OriodasAmazonas,ouGrão-
-Pará,quepuderaserpaide todosos rios;comooOceanoépai
detodososmarestendoprincípiolonguíssimonomaisinterior
seiodoreinodoPeru,comocorpodeestupendovulto,notrân-
sitode inumeráveis léguasporumabocadeoitentade largose
desentranha no mar tão impetuoso, que transformando-lhe as
ondassalgadasemáguasdoces,asbebemosnavegantes,setenta
léguasantesdechegaremàfoz.Aesterio,comograndíssimoin-
tervalodecentoesessentaléguasdecosta,porondedesembocam
outros (postos que inferiores, também generosos rios) se segue
o Maranhão, que com imenso comprimento, e largo corpo, por
dezesseteléguasdecapacidadedeboca,vomitaassuaságuasno
Oceano.DorioMaranhão,emdistânciadecentoetrintaequa-
troléguasdecosta,correoJaguaribe,tambémcaudaloso.Delese
contamquarentaléguasaorioGrande,quelevacopiosotributo
aomar.DorioGrande,correndoacostaporcentoevinteesete
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léguasdedistância,quecompreendeosCabosdeSãoRoqueede
SantoAgostinho,nostrezeriosdegrossoscabedais,sendoentre
elesomaisricoedemaisestiradonascimentooParaíbanestapro-
víncia,eoBeberibenadePernambuco.
Distantecinquentaléguasporcosta,numeradasdesdeoCabo
deSantoAgostinho,estáograndíssimoriodeSãoFrancisco,que
comoGrão-Pará,eodoPrata,podemfazerumTriunviratodas
águas,dominantesobretodososriosdoMundo.Sãoassuasmar-
gensmaispovoadasquetodasasdosoutrosdoBrasil,seguidasas
suasribeiraspelocontinente,maisdequatrocentasléguas;fecun-
díssimas,emedicinaisassuaságuas,navegáveisdeembarcações
medianas mais de quarenta léguas pelo sertão; por duas abre a
boca, querendo tragar o mar quando nele entra, e por muitas o
penetra,adoçando-lheasondas.Enganaram-sealgunsescritores
emdizerqueesterionomeiodoseucurso,porumsumidourose
metenaterra,edepoisdepenetrar-lheasentranhaspeladistância
dedozeléguastornaasaircomamesmacopiosacorrente;sen-
doocerto,queestreitando-seentreduascordilheirasdemontes
opostos,edilatadosemtodoaqueleespaço,parecequesesubter-
ra,enquantoporestacausaseesconde,afirmandoosgentiosque
daquelasmontanhasévistocorrerpelasruasraízesdescoberto.
Deste portentoso rio se contam até a barra da Bahia setenta
léguasdecosta,emcujograndeespaçocorremaomarvintefa-
mososrios,sendoentreelesdemaiorgrandezaosdeSergipe,Rio
Real,eItapicuru.DabarradaBahia,correndoaspraiassessenta
léguas,estáorioSantaCruznoPortoSeguro.Nesteintervalotri-
butamcopiosaságuasaoOceanotrintarios,avultandopormais
célebresoTaigpé,oCamamu,oJaguaribe,odasContas,eodeSão
Jorge.EmdistânciadoriodeSantaCruz,quarentaecincoléguas,
ficaorioDoce,recolhendoaságuasdeoutrosmuitos,comque
levagrossotributoaomar,sendoumdosfeudatáriosaesterioo
dasCaravelas,tambémnotável.
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NoespaçodeoitentaléguasquehádorioDoceaCaboFrio,corremvinteequatrorioscaudalosos.DezoitoléguasdistantedeCaboFrioficaaenseadadoRiodeJaneiro,emquedesembocamdezessete.Nointervalodequarentaeduasléguas,quesecontamdelaporcostaàbarradeSãoVicente,hátrintariosdepuríssimaságuas.TrintaléguasadianteestáorioCananeia,comgrandefoz,enavegávelatodoogênerodeembarcações.EmduzentasléguasdecostaquehádoriodaCananeiaaodaPrata, seachamvintegrandesrios,sendoosmaioresodeSãoFranciscodoSul,eodosPatos.
Ultimamente descoberto se segue o estupendo rio da Prata,maiorquetodos,esóinferioraoGrão-Pará,oudasAmazonas:trazoseunascimentodamesmamãe;epostoqueirmãomenor,temocursoquaseigualmentedilatadomaspordiferenterumo;cor-rendoodasAmazonasparaoNorte,eodaPrataparaoMeio-dia.EmlarguradecinquentaléguasdefozentrapeloOceano,eoutrastantas,antesdeoapartarem,vãoosnavegantesbebendodocesassuaságuas.OsescritoresimpropriamentelhechamamtambémParaguai,sendoesteonomedeoutrorio,que,recolhendomaisdoisnoseuregaço,vaicomelesaentranhar-senodaPrata,nãonoprincípiodoseunascimento,masjánoprogressodoseucurso.
Ilhas mais célebres desta costa.–Baixosdemaisnome.Nobojodeum,enabocadeoutrosevêmdoisarquipélagosdeIlhas,sendomenosasqueseachamnadistânciamarítima,quehádeumaoutro:ondeasmaiscélebressãoadeItamaracá,adeSantoAleixo,adeSãoSebastião,aIlhaGrande,eadeSantaCatarina;eporestacausa são os mares de toda esta costa tão limpos, e navegáveis,poisnãoachamosmareantesoutrosbaixoscélebres,edignosdeatençãoparaacauteladoperigo,maisqueodeSãoRoque,odeVasa-BarrisemSergipe,odeSantoAntônionabarradaBahiaeosAbrolhos.
Rumos da navegação pela costa da nossa América.–Osrumosda
navegaçãopelascostasdanossaAméricaPortuguesadeNortea
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Sul,eosventos,comquesefazemasviagensparaassuasalturas,
e para os seus portos, exporemos, declarando, que de um grau
Austral, saindo do Grão Pará para o Sul, nenhuma embarcação
redonda pode navegar as costas das seis Províncias, Maranhão,
Ceará,RioGrande,Paraíba,Itamaracá,ePernambuco,porcorre-
remviolentasaságuaspelacostaabaixoaoOeste,ecursarempor
elaimpetuosososventosSuestes,eLes-Suestes,causapelaqual
doGrão-ParásevãoosnaviosfazendonavoltadoNorteatéaaltu-
radedezoito,evintegrausdelatitudepeloSudoesteeOeste,para
dobraremoCabodeSantoAgostinho,eprosseguiremaviagem
paraasoutrasprovínciasdoBrasil;masdoreferidoCaboparao
Grão-Paráéperpétuaamonção,navegáveisosmares,eosventos
deservirsemprefavoráveis.
NoCabodeSantoAgostinho,queestáemoitograus,eumter-
ço,correacostapeloNoroeste.DeleaoriodeSãoFrancisco,que
fica em dez graus, e meio, corre a costa Nor-Nordeste Sudoeste.
DoriodeSãoFranciscoaoRioRealqueestáemonzegraus,eum
quarto,orumoNordesteSudoeste.DoRioRealàpontadeItapoá,
que está em treze graus, corre Nordeste Sudoeste. Da ponta de
ItapuãàdeSantoAntôniodabarradaBahia,queficanamesma
altura,correacostaLesteOeste.DapontadeSantoAntônioao
Morro, que fica em treze graus, e dois terços, corre a costa Nor-
NordesteSu-Sudoeste.DoMorroaosIlhéus,queestãoemquinze
grausescassos,correNorteSul.DosIlhéus,aoPortoSeguro,que
estáemdezesseisgrausemeio,correacostaomesmorumo.Do
PortoSeguroaosAbrolhos,queestãoemalturadedezoitograus,e
lançamaomarcinquentaecincoléguas,correacostaNorteeSul.
DosAbrolhosaoEspíritoSanto,queestáemalturadevintegraus,
correaoNortequartadeNordeste,aoSulquartadoSudoeste.
DoEspíritoSantoaoCaboFrio,queestáemvinteetrêsgraus,
vaicorrendoacostaatéapontadoCabodeSãoTomépeloSul
quarta do Sudoeste, e desta até o Cabo Frio pelo Sudoeste. Do
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CaboFrioatéoRiodeJaneiro,queficanamesmaalturadevinteetrêsgraus,correacostaLesteOeste.DoRiodeJaneiroaoPortodeSantos,queestáemvinteequatrograus,correacostaaOes--Sudoeste.DeSantosaoriodeSãoFranciscodoSul,queestáemalturadevinteeseisgraus,edoisterços,vaicorrendoacostapeloSudoestequartadoSul.DeleàIlhadeSantaCatarina,cujaalturasãovinteeoitograus,emeio,correaoSudoestequartadoSul.DaditaIlhaaoriodaLagoa,queestáemalturadetrintaedoisgraus,correacostapeloSudoesteguinandoparaoSul.DaliaoCabodeSantaMaria,queficaemalturadetrintaecincograus,corre-seacostaaoSudoeste.
Diversos movimentos do Oceano pelas mesmas Costas. Causa des-ta variedade. – Tem o Oceano nestas costas diverso movimento,ecursono círculodoano,porquedo Cabo de Santo AgostinhocorremaságuasparaoSuldesdevintedeOutubroatévintedeJaneiro;devintedeJaneiroatévintedeAbril,estãoindiferentesnocurso;devintedeAbrilatévintedeJulho,corremparaoNorte;edevintede JulhoatévintedeOutubro,semostramoutravezcomaindeclináveis:porémdoCabodeSantoAgostinhoatéoriodasAmazonas,temsempreumamesmaarrebatadacorrenteportodaaquelacostaparaLoesteatéoGrão-Pará.Arazãonaturaldes-tavariedadeé,porquecomooSolferecomperpendicularesraiososmaresdaTórridaZona,eoseucalorconsomegrandeporçãodaságuasdoOceanoAtlântico,eEtiópico,convertendoumasemnuvens,eatenuandooutrasemar,dispôsaprovidanaturezaqueoOceanoBorealtransformecomoseuúmidotemperamentoemsi o ar vizinho, e conceba um contínuo aumento de águas, quecorrendoparaoSul(comoasqueoOceanoAustralparticipadaZonaFrígida,corremparaoNorte)seconformemambosparaaconservaçãodotodo,suprindoumeoutroOceanocomassuaságuas,asquenaZonaTórridaseconsomem.
Vista já, posto que em sombras, a pintura do corpo natural
destaRegião,abenevolênciadoseuclima,aformosuradosseus
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Astros, a distância das suas costas, o curso da sua navegação, o
movimentodosseusmares,objetos,quemereciammaisvivos,e
dilatadosrascunhos;mostraremostambémembrutescobreve,as
suasproduções,frutos,plantas,lavouras,emanufaturas,comque
osPortuguesesforamfazendograndesosinteressesdoseucomér-
cio,easdelíciasdassuasPovoações,eoutrasárvores,flores,efru-
tasestrangeiras,quecomotempolhesintroduziram,recebendo-
-as a terra para as produzir tão copiosamente, que bem mostra,
quesódondenãoécultivada,deixadeserprofusa:exporemoso
mimodosseusmariscos,oregalodosseuspescadoseariqueza
dassuaspescarias;detudodaremosbreve,masdistintanotícia.
Planta da cana. Manufatura do açúcar.–Acana(plantacomum
atodaaAméricaPortuguesa)secultivaemsítiosprópriospara
a sua produção, que se chamam Massapes; uns em terra firme,
outrosemIlhas.Estendida,semetenaterra,edelavãobrotando
olhos,quecrescendoentreassuasfolhas,parecemàvistasearas
detrigo.Quandoestãosazonadas,epeloconhecimentodoslavra-
dores perfeitas, de dezoito meses nos continentes, e de um ano
nasIlhas,secortam,elevamparaosengenhos,ondeespremidas
eminstrumentos,quecham