Crises Epilépticas e Epilepsias · Definição Conceitual de Epilepsia • Epilepsia é uma...

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Crises Epilépticas e Epilepsias

Dr. Veriano Alexandre Jr

Departamento de Neurociências

Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto - USP

Origem do termo e aspectos históricos

• A palavra epilepsia, utilizada pela primeira vez por Avicena (980-1037), é originada do verbo grego epilambanein, que significa ser tomado, atacado ou dominado.

• Egípcios e Sumérios (1700 a. C.): epilepsia era vinculada a fenômenos sobrenaturais, magia e maldições.

Origem do termo e aspectos históricos

• Hipócrates (400 a. C.): a causa da epilepsia não estava em espíritos malignos, e sim no cérebro (tentando desfazer mitos sobrenaturais).

• Medicina Chinesa (770-221 a. C.).

• Relatos Bíblicos (Marcos, cap. IX, vv. 13 a 28).

• Antiguidade (sec. II d. C.): Galeno.

• Renascença: René Descartes.

• Idade Média.

• Sec. XVIII: John Hughlings Jackson: descarga anormal das células nervosas.

Personalidades da História

Crises epilépticas

• Crises epilépticas são eventos clínicos que refletem disfunção temporária de um conjunto de neurônios de parte do cérebro (crises focais) ou de área mais extensa envolvendo os dois hemisférios cerebrais (crises generalizadas).

• Os sinais e/ou sintomas de uma crise dependem das partes do cérebro envolvidas na disfunção.

O que gera as crises epilépticas • A crise é causada por uma descarga elétrica anormal, excessiva e

transitória das células nervosas, decorrente de correntes elétricas que são fruto da movimentação iônica através da membrana celular.

Crises em condições clínicas agudas Crises epilépticas são sintomas comuns de doenças neurológicas agudas: • Meningoencefalites. • Trauma craniano (fase aguda). • Acidente cerebral vascular (fase aguda). ou doenças clínicas: • Hipoxia. • Febre. • Hipoglicemia. • Insuficiência renal e hepática. • Distúrbios hidroeletrolíticos. • Abstinência de álcool e drogas. • Processos tóxicos, infecciosos, metabólicos.

Nestas circunstâncias agudas (provocadas), entretanto, não se caracteriza

como epilepsia.

Definição Conceitual de Epilepsia

• Epilepsia é uma doença cerebral caracterizada por uma predisposição permanente em gerar crises epilépticas.

• Com consequências neurobiológica, cognitiva, psicológica e social.

• A definição de epilepsia requer a ocorrência de pelo menos uma crise epiléptica.

Epidemiologia

• Incidência: 1 caso para cada 2000 pessoas por ano (0,5 casos/1000 pessoas/ano).

• Prevalência: 1% da população mundial. No Brasil, estima-se uma prevalência de 1,8%.

• A incidência é maior nos extremos da idade (crianças e idosos).

O evento descrito é realmente uma crise epiléptica?

• Síncope (síncope convulsiva): origem cardíaca, ortostática e reflexa.

• Síndrome de Hiperventilação: ansiedade, pânico.

• Crises psicogênicas: transtorno dissociativo, conversivo, somatização.

Crise psicogênica

As crises podem ser parciais (ou focais)

• Crises parciais são aquelas nas quais as primeiras manifestações clínicas e eletroencefalográficas indicam uma ativação de uma região limitada a uma parte de um hemisfério cerebral.

– Simples (consciência preservada): autonômica, motora focal, sensitiva, psíquica.

– Complexas ou Discognitivas (consciência/cognição comprometidas).

– Secundariamente generalizadas (convulsivas).

Crise motora focal Crise parcial simples (aura) com evolução para crise discognitiva

Crises generalizadas desde o início

• Crises generalizadas primárias são aquelas nas quais as primeiras manifestações clínicas e eletroencefalográficas indicam um envolvimento de ambos os hemisférios cerebrais.

• Podem ser do tipo: Ausência; Tônica; Clônica; Atônica; Mioclônica; Tônico-clônica.

Não convulsiva (Ausência) Convulsiva (Tônico-clônica)

Diagnóstico

• Anamnese.

• Exames físico e neurológico.

• Exames complementares.

• Diagnóstico diferencial.

Ressonância Magnética com sinais de esclerose hipocampal esquerda

Classificação das Etiologias

• Idiopáticas (genéticas): idade-relacionada, com características clínicas e eletrográficas típicas, predisposição hereditária. Por exemplo, epilepsia de ausência infantil e juvenil, epilepsia mioclônica juvenil, epilepsia da infância com paroxismos rolândicos, entre outras.

• Sintomáticas (estruturais ou metabólicas): quando uma lesão é presumida ou identificada como a causa da epilepsia, por exemplo, esclerose hipocampal, displasias corticais, neoplasias, lesões sequelares ou metabólicas, síndromes neurocutâneas, malformações arteriovenosas. por exemplo, doenças mitocondriais, entre outras.

• Criptogênicas ou de causa desconhecida: presumidamente sintomáticas, mas cuja causa ainda não é conhecida.

Exemplos de Lesões Estruturais (Etiologia Sintomática)

Classificação das Síndromes Epilépticas

A classificação das síndromes epilépticas é baseada no tipo clínico e na etiologia das crises.

1) De acordo com o tipo de crises:

• Epilepsias e síndromes focais ou localizadas: quando crises parciais.

• Epilepsias e síndromes generalizadas: quando crises generalizadas.

2) De acordo com a etiologia:

• Epilepsias idiopáticas: transmitidas geneticamente e idade relacionadas.

• Epilepsias sintomáticas: etiologias identificadas (lesões estruturais).

• Epilepsias criptogênicas: lesões estruturais presumíveis, mas não demonstradas, sem etiologia definida.

Classificação das Síndromes Epilépticas

• Epilepsias e síndromes generalizadas.

• Epilepsias e síndromes parciais ou topograficamente localizadas.

Classificação das Síndromes Epilépticas

• Epilepsias e síndromes não definidas se parciais ou generalizadas.

• Epilepsias e síndromes relacionadas à circunstâncias:

– Quadros infecciosos agudos

– Convulsão febril

– Abuso de substâncias

– Hipoglicemia

– Hipóxia

Classificação das Síndromes Epilépticas

Tratamento medicamentoso

• Considerado sintomático, ou seja, para o controle das crises. Porém, não existe evidência que as drogas antiepilépticas (DAE) possam agir no processo de desenvolvimento da epilepsia, ou seja, na epileptogênese.

• Possibilita o controle das crises em 70% dos pacientes. Os outros 30% de pacientes são considerados farmacorresistentes.

Relacionadas à DAE Relacionadas ao paciente Relacionadas à realidade local

Tipos de crises ou síndromes Efeitos adversos Reações idiossincrásicas Toxicidades crônicas Teratogenicidade Carcinogenicidade Farmacocinéticas Potenciais interações Formulações

Base genética Gênero Idade Comedicações Comorbidades Seguro-saúde Poder aquisitivo Capacidade de engolir medicação

Disponibilidade da DAE Custo da DAE

Receptores NMDA Receptores AMPA/ Kainato

Ca2+

Na+

Na+

(Ca2+

)

Canal sódio voltagem-dependente Na+

Despolarização

Liberação vesicular

Neurônio pós-sináptico

Terminal pré-sináptico excitatório

Potencial de ação

Canal de cálcio α2δ

Glutamato K

+ K

+

Gabapentina Pregabalina

Levetiracetam

Topiramato Felbamato

Fenitoína, carbamazepina, valproato, felbamato, lamotrigina, topiramato, zonisamida, oxcarbazepina, lacosamida

Modificado de Rho e Sankar, Epilepsia 1999

Terminal pré-sináptico inibitório

Neurônio pós-sináptico

Glutamato

GAD

GABA

Transportador GABA

GABA-T

Semi-aldeido succínico

Receptores GABA-A

GABA Topiramato, felbamato Barbitúricos, benzodiazepínicos

Tiagabina

Vigabatrina

Cl- Modificado de Rho e Sankar, Epilepsia 1999

Primeira Geração Segunda Geração Terceira Geração

Fenobarbital (PB) Felbamato Eslicarbazepina

Fenitoína (PHT) Lamotrigina (LTG) Brivaracetam

Valproato de sódio (VPA) Gabapentina (GBP) Fluorofelbamato

Benzodiazepínicos Levetiracetam

Carbamazepina (CBZ) Oxcarbazepina (OXC)

Etossuximida (ESM) Pregabalina

Primidona Tiagabina

Lacosamida

Stiripentol

Topiramato (TPM)

Vigabatrina (VGB)

Rufinamida

Zonisamida

Retigabina/ Ezogabina

Tratamento medicamentoso

Tipo de crise ou síndrome epiléptica Estudos Classe I

Estudos Classe II

Estudos Classe III

Nível de evidência de eficácia e efetividade (em ordem alfabética)

Adultos com crises de início parcial 2 1 30 Nível A: CBZ, PHT Nível B: VPA Nível C: GBP, LTG, OXC, PB, TPM, VGB

Crianças com crises de início parcial 1 0 17 Nível A: OXC Nível B: nenhum Nível C: CBZ, PB, PHT, TPM, VPA

Idosos com crises de início parcial 1 1 2 Nível A: GBP, LTG Nível B: nenhum Nível C: CBZ

Adultos com crises tônico-clônicas generalizadas desde o início

0 0 23 Nível A: nenhum Nível B: nenhum Nível C: CBZ, LTG, OXC, PB, PHT, TPM, VPA

Crianças com crises tônico-clônicas generalizadas desde o início

0 0 14 Nível A: nenhum Nível B: nenhum Nível C: CBZ, PB, PHT, TPM, VPA

Crianças com crises de ausência 0 0 6 Nível A: nenhum Nível B: nenhum Nível C: ESM, LTG, VPA

EBI com pontas centro-temporais 0 0 2 Nível A: nenhum Nível B: nenhum Nível C: CBZ, VPA

Epilepsia Mioclônica Juvenil 0 0 0 Nível A: nenhum Nível B: nenhum Nível C: nenhum

Tratamento medicamentoso

Tratamento medicamentoso

Tratamento medicamentoso

Reação Alérgica

Avaliação pré-cirúrgica

Cirurgia de epilepsia (Lobo Temporal)

Cirurgia de epilepsia (Extra-Temporal)

Convulsão Febril

• Idade geralmente entre 3 meses e 5 anos.

• Incidência: 4%.

• Associada à febre. Pode ser recorrente.

• Afastada infecções do SNC (quando indicar punção liquórica?).

• História familiar.

• Pode ser:

Simples: crise generalizada, curta duração, sem recorrência em 24 horas, sem anormalidades neurológicas após a crise.

Complicada (complexa): crise focal, duração maior que 15 minutos ou recorrência dentro de 24 horas, anormalidade neurológica.

Convulsão Febril

• Risco de epilepsia posterior: 1 a 2%.

• Tratamento:

Orientação aos pais.

Tratamento medicamentoso se risco de recorrência (idade inferior 18 meses, HF positiva, febre baixa com duração inferior a uma hora antes da crise).

Profilaxia contínua: fenobarbital ou ácido valpróico.

Profilaxia intermitente: benzodiazepínicos.

Estado de mal epiléptico

• Emergência neurológica.

• Crise epiléptica com duração maior ou igual a 30 minutos (5, 10 ou 30 minutos), ou crises repetitivas sem recuperação da consciência entre as mesmas.

• Pode ser convulsivo ou não convulsivo (clínica e EEG).

• Tratamento:

Suporte de vida (unidade de terapia intensiva).

Investigação da etiologia (sistêmica ou SNC).

Medicamentos via endovenosa: fenitoína, fenobarbital, valproato, benzodiazepínicos (midazolam, diazepam).

EME refratário: induzir coma com barbitúricos, propofol, midazolam, anestésicos.

O que fazer e o que não fazer quando alguém tiver uma crise epiléptica

• Manter a calma.

• Proteger a pessoa de ferimentos (evitar traumas).

• Manter vias aéreas permeáveis.

• Decúbito lateral (evitar aspiração e sufocamento).

• Crises geralmente são autolimitadas e curtas.

• Aguardar recuperação da consciência e orientar a pessoa.

• Procurar auxílio médico se crise prolongada (mais que 5 minutos) ou recorrentes, em caso de ferimentos, condição clínica associada, se não tiver recuperação da consciência após a crise.

• Não introduzir objetos na boca da pessoa.

• Não há risco de engolir a língua.