Post on 21-Jun-2015
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Adefensorapública esta-dual de São Paulo AnaíArantes Rodrigues, queacompanhaprocessosderemoções e desapropria-ções na capital paulista,
avalia que a lei que tratado tema deveria ter sidoatualizada há tempos.“Nossa legislação tem
que ser urgentemente re-formulada e modernizadapara,principalmente, reco-nhecer a posse em caso dedesapropriação. Isso já re-solveria boa parte dos pro-blemas, porque as famíliasreceberiam uma indeniza-
ção mais justa”, avalia.Para ela, é preciso um
pacto nacional. “É neces-sário um marco legal na-cional que determine re-quisitos e premissas des-sasdesapropriaçõesdeco-munidades.Como funcio-na, o que o Estado temque garantir às famíliasem caso de deslocamentoforçado”, diz. l
Legislaçãoprecisamudar no país
Educação para escanteio
BrunoMoreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
Enquanto se questionaqual será o legado dosmegaeventos no Bra-sil, em especial o da Co-pa doMundo, o direitoà educação de milha-res de crianças e ado-lescentes foi colocadopara escanteio e estásendo lesado.Desde2010, en-
tre 57,3 mil e76,5 mil pes-soas residen-tes em vilase f a ve l a s ,com idadeentre 0 e 19ano s , f o r amafetadas direta-mente e tiveram quemudar de escola ou cre-che em função das de-sapropriações ou remo-ções para as obras dosmegaeventos.O cálculo é feito com
base no número de pes-soas afetadas, aplican-do-se o percentual demoradores dessa faixa
etária que residem emvi-las e favelas no Brasil(38%), segundo o Censode 2010, do IBGE.Não há informações
oficiais, apenas estimati-vas de quantas pessoasteriam sido desapropria-das ou removidas. Umadas mais confiáveis é ado Observatório dasMe-trópoles, núcleo nacio-nal de pesquisadoresdas cidades.De acordo como coorde-
nador da pesquisa“Metropolizaçãoe Megaeventos:impactos daCopa do Mun-do de 2014 eOlimpíadas de2016 sobre as
metrópoles brasi-leiras”, Orlando Al-
ves dos Santos Jr, é possí-vel estimar entre 150mil e200 mil o número de pes-soas (de todas as faixasetárias) que tiveram quedeixar suas casas em fun-ção dessas obras. Foramutilizados dados de gover-nos edosComitêsdosAtin-gidos pelaCopa de cada ci-dade.
MIGRAÇÃOOprocessomigratório pe-loqual oBrasil passounosúltimos cinco anos foi umdos maiores da história,se não o maior, em movi-mentação intraurbana –dentro da própria cidade.Geralmente, as famíliasforam para mais longe daárea central.A ação, promovida pe-
lo poder público, tevepouco ou nenhum supor-te para que houvesse acontinuidade da vida es-colar das crianças e ado-lescentes afetados. Foi oque constatou o Hojeem Dia em visita a setedas 12 cidades-sede daCopa doMundo, onde seconcentraram maior nú-mero de remoções.A série de reportagens
que começa hoje mostra-rá casos de jovens quenão se adaptaram à novarealidade ou não conse-guiram vagas em escolase largaram os estudos.Há situações em que a
ajuda de conhecidos e asorte foram determinan-tes para que os jovens pu-dessem continuar a estu-dar, outras em que esco-las comunitárias estãoameaçadas de fechar oujá pararam de funcionar.Foram mais de 10 mil
quilômetros percorri-dos, centenas de telefo-nemas e e-mails nos últi-mos três meses em buscadessas pessoas nas capi-ta i s Be lo Hor izonte ,Cuiabá, Fortaleza, PortoAlegre, Recife, Rio de Ja-neiro e São Paulo. l
MT
MINASGERAIS
RS
RJ
CE
PE
Cuiabá
Porto Alegre*
SãoPaulo** Rio de Janeiro*
SP
BH
Recife
Fortaleza*
1.421 km
1.361 km498 km
1.373 km
1.132 km
338 km
1.881 km
752 km
1.644 km
2.285
R$ 119,7 milhões
459
R$ 102,5 milhões
700
R$ 128,2 milhões
708
R$ 234 milhões
10.000
R$ 300 milhões
161
R$ 40,8 milhões
3.270
R$ 99,6 milhões
Desapropriações/remoções/reassentamentos
Valor gasto
* Dados oficias não repassados de forma completa** O Metrô SP se recusou a responder à demanda. Os dados foram retirados do Ministério do Esporte e do site do Metrô SP, e podem estar desatualizados
Fontes: Governos locais, Ministério do Esporte, Observatório das Metrópoles, Defensoria Pública do Estado de Pernambuco e Comitês dos Atingidos pela Copa
PESSOAS DESAPROPRIADAS
Em função dos megaeventos:entre 150 mil e 200 mil
Em idade escolar (0 a 19 anos):entre 57,3 mil e 67,5 mil
ROTEIRO DA REPORTAGEM
Situação nas cidades visitadasl> Obras para oMundial de futebol eOlimpíadasdeixarammilhares de jovens semaula no país
Oprojetoquedeuorigemaestareportagemfoi vencedordaCategoria ImpressodoVIIConcursoTimLopesdeJornalismo Investigativo,realizadopelaAndi, ChildhoodBrasil e oUnicef, comoapoiodaOIT, daFenaj edaAbraji.
FIMDEHISTÓRIA–
NoRiodeJaneiro,meninaobserva
operáriosderruba-
remacasaonde
morava,naVila
Autódro-mo,ao ladodoParqueOlímpico
SAIBAMAIS
OHoje emDiapercorreu 10milquilômetros
em setecidades-sede daCopa doMundo
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COPA SEM ESCOLACOPA SEM ESCOLA
PRIMEIRADEUMA SÉRIE
FOTOS SAMUEL COSTA
22BeloHorizonte,segunda-feira,12.5.2014
HOJEEMDIA
hojeemdia.com.brMinas
Emcontraposição às di-ficuldades que enfren-tou com a remoção emfunção da duplicaçãoda avenida Pedro I, naregião de Venda Nova,emBeloHorizonte, a fa-mília da salgadeiraAlédia Aparecida OttoPereira,de37anos, con-tou com a sorte e a soli-dariedade de pessoasquenemconhecia. Prin-cipalmente para conse-guir vaga na escola pa-ra os quatro filhos.A família foi desapro-
priada em setembro doano passado e, como ti-nha pouco tempo parasair, escolheu uma casa
em um bairro de SantaLuzia, na Grande BH. Aintenção era ficar o maisperto possível dos paren-tes, já que alguns perma-neceram próximo à anti-ga residência.Na mudança, Alédia e
família perceberam queo local era muito perigo-so. Três dias depois, ochefe do marido dela oviudesesperadono traba-lho e ajudou a conseguiruma casa para alugar nomunicípio de Confins.Assim, em menos de
uma semana eles fize-ramduasmudanças. De-pois de arrumar o tetoparamorar, faltava a es-
cola das crianças. Assim,com ajuda atémesmo doprefeito da cidade, con-seguiram vaga para to-dos os filhos. “Não tive
ajuda lá em Belo Hori-zonte, mas aqui me rece-beram mui to bem emeus filhos não ficaramfora da escola. Foi sorte,
solidariedade e Deus”,aponta a salgadeira.
FAMÍLIAComo a casa em SantaLuzia está para venderoualugar, eles não conse-guiram ainda utilizar osrecursos da indenizaçãopara comprar outro imó-vel, e estão arcando como aluguel, o que nuncahavia feito parte dos gas-tos da família.Apesar disso, estão to-
dos satisfeitos. “Aqui eles(os filhos) têmmuita ami-zade.As pessoas nos rece-beram muito bem, temosumavista linda.Masapar-te ruimé que ficamos lon-ge da nossa família. Ago-ra está cada um em umlugar”, lamenta Alédia. l
Morar relativamenteperto do Centro de BeloHorizonte, em frente àUniversidade Federald e M i n a s G e r a i s(UFMG),naavenidaAn-tônio Carlos, na Pampu-lha, era um sonho paraaestudanteRejianeSan-tos Rodrigues, de 18anos. Filha de um casalde ex-moradores derua, que ocuparam aárea há pouco mais deuma década, ela viu suafamília ser desapropria-daparaumaobradaCo-pa doMundo, em 2011.A casa que foi possível
ser comprada com o di-nheiro da indeniza-ção,nobairroAl-to Boa Vista,v iz inho aoCitrolândia,em Betim,na GrandeBH, f ica aaproximada-mente40quilô-metros de onde afamília morava.O casal, quando deci-
diu sair das ruas e mon-tar uma família, pensouem dar tudo o que fossepossível para a filha queviria. E foi com isso emmente que, assimque semudaram para Betim,os pais procuraramumaescola para que Rejianepudesse continuar os es-tudos. Entretanto, de-morou para conseguirescola.“No começo foi difícil.
Fiquei dois meses paraconseguir vaga. Eu emi-nha mãe ficávamos ten-tando. Quando conse-
gui, era no turno da noitee ficava com um poucodemedo ao voltar pra ca-sa. Hoje já me acostu-mei”, lembra a garota.
VILAUFMGSegundo a Prefeiturad e B e l o Ho r i z o n t e(PBH), na Vila RecantoUFMG, 130 famílias fo-ram remov idas , em2011, para a constru-ção de um viaduto dea c e s s o à a v e n i d aAbrahão Caram. Outrasobras na capital foramfeitas em função da Co-pa do Mundo e deman-daram remoções, comoa duplicação da aveni-da Pedro I e a Via 210(no bairro Betânia). Nototal, na capital minei-ra, foram 708 famíliasremovidas, de acordocom a PBH.Rejiane é uma das cer-
ca de 900 crianças e ado-lescentes em idade esco-lar em Belo Horizonteque foram afetadas dire-tamente pelas obras daCopa do Mundo.
PREFERÊNCIAHoje, passados três anosda mudança, ela estáacostumada com a vizi-nhança e gosta de ondemora. “Não queria ir paraumapartamento por cau-sa dos cachorros”, conta.Mas, ao mesmo tempo,
lamenta estar longe daUFMG, já que ela deve seformar neste ano no ensi-no médio. “Quero cursarpsicologia. Se ainda mo-rasse em frente à UFMG,seria ótimo”, afirma. l
Solidariedade para superar as dificuldades
l> Família sai de BeloHorizonte para Betim e peregrinação embusca de vaga emescola foi sofrida
Recomeço a 40quilômetrosde distância do antigo lar “Oqueéo
devido
atendimen-
to,nonosso
entender?A
pessoatem
quesairda
situaçãoem
quese
encontraeir
parauma
outraigual
oumelhor.
Elanunca
podepiorar
aqualidade
devidaem
razãodessa
intervenção
pública”
Anaí
Arantes
Rodrigues,
defensora
pública
estadualem
SãoPaulo
“Nósfomos
muitobem
recebidos
aqui(na
cidadede
Confins)e
estamos
gostando.
Contamos
comaajuda
demuita
gente.Mas
sentimos
faltada
nossa
família,que
ficou
separada”
Alédia
Pereira,
salgadeira,
desapropriada
nasobras
daavenida
PedroI
DESAPROPRIADA–Rejianedemoroudoismesesparaencontrarumavaganaescolapróximaàsuanovacasa,distante40quilômetrosdeondemorava
“No começo foidifícil. Eu eminhamãeficávamos
tentando vaga”,diz Rejiane
DIFÍCILADAPTA-ÇÃO–A
famíliadeAlédianãoconseguiu
vivernacasa
compradacomo
dinheirodaindenizaçãoefoiprecisoajudapara
serestabele-
ceremConfins,naGrandeBH
hojeemdia.com.br 23BeloHorizonte,segunda-feira,12.5.2014
HOJEEMDIAMinas
MinasEditor:AmilcarBrumano-abrumano@hojeemdia.com.br
CUIABÁ – A capital doMato Grosso teve mui-tasdesapropriações rela-cionadasàCopadoMun-do em imóveis comer-ciais para a implantaçãodo Veículo Leve sobreTrilhos (VLT). Entretan-to,porpressãoda comu-nidade do bairro Caste-lo Branco, a prefeituradesistiu do projeto deabertura da avenida docórrego do Barbado, on-de 400 famílias estavamameaçadas de remoção.Apenas 33 que mora-
vam emárea de risco deinundação, na beira deum curso d’água, foramrealocadas para a cons-truçãode uma rotatória.A obra não faz parte daMatriz da Copa, mas in-diretamente está ligadaao Mundial.Para muitos morado-
res, a mudança de ende-reçonãoévistacomone-
gativa. Mas o que os afligeé para onde foram leva-dos: um imenso conjuntohabitacional do programaMinha CasaMinha Vida, oAltos do Parque, distante14 quilômetros, onde nãohá escola para as criançasdas mais de mil famílias.Segundo a presidente
da Associação deMorado-resdoBairroCasteloBran-co, Deumaci Freitas Afon-
so, algumas famílias fo-ram para o conjunto habi-tacional “divididas”.“Comonãohávagas pa-
ra todo mundo nas esco-las próx imas , houvequem deixasse os filhoscom parentes aqui perto,para que continuem a es-tudar.Mas nem todos pu-deram fazer isso. Então,muitas crianças ficaramfora da escola”.A Secretaria da Copa do
Mato Grosso (Secopa)não semanifestou sobre ocasoatéo fechamentodes-taedição.SegundoaSeco-pa,houvecercade700de-sapropriações na capitalmato-grossense. l
Crianças realocadas emconjunto habitacionalsemescola emCuiabá
BrunoMoreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
SÃOPAULO –Desde pe-quena, Raquel*, de 14anos, sonha ser atriz. Háquatro anos, ela conse-guiuumabolsanoThea-tro Municipal de SãoPaulo para estudar balé,um importante passo nafutura carreira. Mas, em2013, quase na metadedo curso, abandonou osalãoespelhado,as sapa-tilhas e o tutu. Antigamoradora do BuracoQuente, comunidade aolado do aeroporto deCongonhas, a família dagarota foi uma das desa-propriadas em funçãoda obra do monotrilhoLinha 17 – Ouro.Raquel deixou o balé
por falta de tempo. Co-mo não conseguiu vagaem escola perto da novamoradia, gasta quase 5horasnotrânsitoparaes-tudar: sai de casa às10h30evoltaàs20h.Porisso,acarreiraartística fi-cou em segundo plano.O irmãomais velho de
Raquel, Fábio*, de 17anos, tambémfoi impac-tado pela mudança. Em2013, sóencontrou vagaem uma escola distantede casa. Faltava dinhei-ro para ir à aula, e eleperdeu o ano. Em 2014,disse àmãe, a cabeleirei-ra Regina Almeida, de35 anos, que não iriamais estudar.A indenização recebi-
dadevidoàdesapropria-ção permitiu à famíliacomprar um lote na zo-na Sul de São Paulo,mas não erguer a casa.Hoje, Regina, o maridoeos filhosmoramdealu-guel no Jardim Selma, a12quilômetrosdoBura-co Quente.Raquel e Fábio fazem
parte do grupo de 57,3mil a 76,5 mil brasilei-ros de zero a 19 anosquevivemnascidades-se-dedoMundialde futebole foram impactados pelaCopa. Obrigados a mu-dar de casa, enfrentamdificuldades para conti-nuar estudando, comomostra o Hoje em Diadesde ontem. Não há le-vantamento de quantosestão nessa situação.De aco rdo com o
MetrôSP, a Linha 17 –Ouro não tem relação
com o Mundial de fute-bol. Entretanto, orçadaem R$ 1,8 bilhão, a obraesteve na Matriz de Res-ponsabilidade da Copaaté 2012, dois anos apóso anúncio de que o está-dio do torneio na cidadeseria o Itaquerão, e nãomais o Morumbi. O últi-mo será atendido pela Li-nha 17 – Ouro.A assessoria doMetrôSP
afirmaqueas desapropria-ções “respeitam os trâmi-tes judiciais”, mas não in-forma o valor da interven-ção ou quantas pessoas fo-ram removidas. No entan-to, no site da companhiaconstaque161 famílias se-riam desapropriadas. Já oComitê dos Atingidos pelaCopaemSãoPauloapontamais de 430.Para a defensora pública
de São Paulo, Anaí Aran-tesRodrigues,éprecisoob-servarqueodireitoàmora-dia inclui outros. “Quandoa pessoa vai parar em umlugar tão distante, ondenão há como manter o fi-lho na escola, o direito de-la à moradia digna e a to-dos os outros direitos, semdúvida, ficam prejudica-dos”, avalia. l(*Os nomes são fictícios)
l> EmSão Paulo, obra domonotrilho que passa junto ao estádio doMorumbi afetou 161 famílias
LINHA17–Comoomonotrilhopaulista foiexcluídodaMatrizdaCopaem2012,aMetrôSPnegarelaçãocomoMundial
Novoendereço faz garotadesistirde sonhoe irmão largar estudo
SEGUNDADEUMASÉRIE
LONGE–ParaacabeleireiraRegina, remoção foi ruim:
clientes sumiramefilhos têmdificuldadeparaestudar
ALTOSDOPARQUE–Porenquanto,
salasdeaulaestãoapenasnoprojeto
COPA SEM ESCOLACOPA SEM ESCOLA
FOTOS SAMUEL COSTA
hojeemdia.com.br 29BeloHorizonte,terça-feira,13.5.2014
HOJEEMDIA
PORTO ALEGRE –Quando começou a de-sapropriação dosmora-dores da vila Dique, lo-calizada atrás do aero-porto Salgado Filho, nacapita l gaúcha, em2009, a prefeitura ofe-receu transporte paraque os filhos em idadeescolar continuassem aestudar nos colégiospróximos às suas anti-gas casas. A mudançafoi para o Porto Novo,um conjunto habitacio-nal distante cerca de no-
ve quilômetros. Mas,pouco tempo depois, es-sa ajuda acabou.“Eles tiveramque pegar
ônibus e não tinham di-nheiro para passagem.Muitos chegaram a per-deroano”, lamentaAlme-rinda Argenta Gambin,de47anos, conhecida co-mo Miranda, líder comu-nitária emembro da dire-toria do Clube de Mães.Naquele momento, as
famílias começaram abuscar vagas em escolasnos arredores, mas nãohavia para todos. Parapiorar, eles conviviamcom o preconceito de se-rem “diqueiros”, ou seja,da vila Dique, conhecidapor seruma regiãoviolen-ta da cidade.Agora, passados quase
cinco anos do início dasremoções, as pessoas jáestão mais adaptadas àmudança, mas aindanão há escolas para to-dos na região.A estudante Bianca da
Silva Ortiz, de 15, conti-nua a estudar no antigocolégio e gasta mais deuma hora no ônibus. Masconta com a solidarieda-de para arcar como custodo transporte. “Como es-tou fazendo o curso (deculinária) aqui no Clubede Mães, recebo vale-transporte”, relata.Para ela, a mudança foi
boa. “Tinha muita genteque morava em situaçãomuito precária”, lembra.Em Porto Alegre foram
maisde3.200 famíliasde-sapropriadas. l
Dificuldadedetransporteefaltadevagas
BrunoMoreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
RIODE JANEIRO – Per-to do meio-dia de umasexta-feirademarço, Lu-cas*, de 15 anos, acom-panha com o olhar osalunos que retornam daescola, na comunidadeNovo Lar, no Recreio,zonaOestedoRiode Ja-neiro.Enquanto isso, pe-neira a areia que seráutilizada para fazer oconcreto de um barra-co. Desde o ano passa-do, o garoto não pisaem uma sala de aula e otrabalho de ajudante depedreiro temsidoaprin-cipal ocupação.Ele é umdosmilhares
de crianças e adolescen-tes das cidades-sede daCopa do Mundo que ti-veramodireito à educa-ção lesado. A estimati-va é a de que entre 57,3mil e 76,5mil, com ida-de entre zero e 19 anos,tenham sido removidospor conta das obras re-lacionadas direta ou in-diretamente ao Mun-dial de futebol e àsOlimpíadas de 2016.Com isso, enfrentaramdificuldades para conti-nuar a vida escolar, co-mo mostra o Hoje emDia desde a última se-gunda-feira.No Rio de Janeiro não
há um número preciso,masoComitêdosAtingi-dospelaCopaeOlimpía-das estima em mais de10 mil famílias removi-das em função dessesmegaeventos.
RETORNO
AfamíliadeLucasmora-vana vilaRecreio II e foiremovida para a cons-truçãodoBRTTransoes-
te, em 2012. Como com-pensação, receberam oapartamento de um pro-grama habitacional emCampo Grande, no extre-mo oeste da capital flumi-nense. Entretanto, não seadaptaramànova realida-de. Por isso, no ano passa-do alugaramumaquitine-te (quarto, banheiro, cozi-nha e sala) na Novo Lar,comunidadea 300metrosda antiga vila Recreio II.A família, composta pe-
lamãe, padrasto e quatrofilhos, foi desmembrada.Dois dos irmãos não fo-ram para Campo Grandee decidirammorar com aavó. Outro irmão, Rodri-go*,de16, tambémtraba-lha ajudando o padrastona construção de casas.“A escola era boa aqui
perto. Lá (em CampoGrande), os alunos quemandam na escola, éumabagunça.Hoje passoo dia na lan house, ficosentado aqui no banco daárvore, ajudomeupadras-to”, diz Lucas.Ele afirmaque sente fal-
ta da escola,mas não ade
Campo Grande. Apesardisso, só pretende voltarem 2015. Assim, terá per-dido três anos de estudos,abandonados em 2012.“Quandovoltamos, fiz ins-crição pela internet, sóconsegui escola pro ladodeCampoGrande.Não ti-nha escola perto”, relata.Para a assessora de Di-
reitos Humanos na Anis-tia Internacional no Bra-sil, RenataNeder, as famí-lias não poderiam ter sidolevadas para áreas distan-tes. “O reassentamentodeve ser em área próximae em condições adequa-das. Nunca você pode le-var uma família para umasituaçãopior. Esseproces-so aprofunda as desigual-dades urbanas”, avalia.A Secretaria Municipal
de Habitação do Rio deJaneiro informou que naobra do BRT Transoesteforam desapropriadas666 famílias, e que elasforam acompanhadas porassistentes sociais até osmoradores alcançarem aautonomia. l*Nomesfictícios
l> Por ter sidoremovidodeondemorava,jovemde 15anosestá semestudardesde2012
COPA SEM ESCOLACOPA SEM ESCOLA
TERCEIRADEUMASÉRIE
RIODEJANEIRO–Adolescentequeparoudeestudarem2012ajudaopadrastoemserviçosdepedreiro
Da sala deaula parao canteirode obra
PORTONOVO–Conjuntoabriga famílias removidasparaobrasnacapitalgaúcha
FOTOSSAMUELCOSTA
hojeemdia.com.br 31BeloHorizonte,quarta-feira,14.5.2014
HOJEEMDIAMinas
FORTALEZA – Hámais de 20 anos, a pro-fessora Nete Gomes,de 43 anos, trabalhana escola Irmã Iolan-da Brasil, na capitalcearense. Construídona beira da antiga li-nha de trem, no bair-ro Aldeota, o imóvel éum dos 2.185 que se-rão desapropriadospara a implantação do
Veículo Leve sobre Tri-lhos (VLT) de Fortale-za. Mas, até o momen-to, Nete não sabe paraonde vai a instituição.A escola comunitáriaatende 70 crianças e jáhavia sido desapropria-da anos atrás. Agora, te-rá que mudar mais umavez de endereço.“A maior preocupa-
ção deles (dos pais) é
com a escola dos filhos.Muitos já assinaram(acordo para serem de-sapropriados) e o di-nheiro não caiu na con-ta. Os moradores estãoficando sem opção e ospreços das casas estãoaumentando. Eles es-tão indo para bairrosmuito distantes e mui-to perigosos”, lamentaa professora.Nete encara seu traba-
lho como uma missão, ecritica a postura de go-vernantes com relaçãoao que foi prometido pa-ra o Mundial de fute-bol. “Eles colocaram co-mo se a Copa do Mundofosse deixar pra genteum grande legado. O le-gado que a gente estávendo é de famílias queestão perdendo as mo-radias, escolas perden-
do alunos”, argumenta.Enquanto se divide en-
tre o ensino e a adminis-tração da escola, ela per-de as noites de sono,sem saber qual será odestino dos alunos. “Ho-je o futuro delas (dascrianças) é a incerteza.Se daqui a quatro meses
elas vão ter a escolinha,não sei. A gente está ven-do que vai ficar sem es-cola. Porque a gentenão tem condições de ar-rumar um espaço deuma hora pra outra. Anossa grande preocupa-ção é essa. É um danosocial que o governo es-
tá provocando, que sóse preocupa em cons-truir estádio”, avalia.O governo do estado
do Ceará informou queestá garantindo moradiaa todos os reassentadospelo projeto do VLT, ofe-recendo imóveis e pagan-do aluguel social. l
BrunoMoreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
RECIFE – Desde o iníciodo ano, as tardes emuma rua do bairro SãoFrancisco, na cidade deCamaragibe, na Região
Metropolitana de Recife,não são mais as mesmaspara a pequena Luíza*, de7 anos. As brincadeiras narua, agora, ganharamuma atividade a mais: fa-zer o dever de casa.Regularmente, ela sai
de casa com livro a tiraco-lo e se senta em frente à
sua antiga escola, o Edu-candário Bom Jesus. Namureta da calçada folheiaa edição, no aguardo daantiga professora,Marcio-neFerreiradaCruz,de51,conhecida como Cione.Aluna e professora não
foram desapropriadas porcausa das obras do Mun-
dial de futebol. Entretan-to, sãovizinhasdeumade-sapropriação para a cons-trução doRamal da Copa,uma via que ligará Recifeà Arena Pernambuco,construídaemSãoLouren-ço da Mata. Além disso,há o projeto de aumentaro Terminal Integrado de
Passageiros (TIP), que fi-ca próximo à escola.Por isso, um boato e a
incertezadoque iria acon-tecer com a escola foramsuficientesparaquea insti-tuição de ensino fechasseas portas. Luíza e Cionemoram próximas ao está-dio e no entorno do que
seria a Cidade da Copa,um megaempreendimen-to imobiliário que teria aarenacomopontodeparti-dapara a aberturade umanova fronteira de urbani-zação na Grande Recife.“Um rapazmedisse que
se for sair daqui não temnada a ver com a Copa.Vai ser para2016. Sobre afalta de informação, nãoposso acusar ninguém.Fui atrás, mas não conse-gui.Opovo se encarregoude falar. Não posso culparo povo, porque ele temmedo. Não podia segurara turma (os alunos). Oqueeudisse éminhapala-vra: não vai sair”, lembraa professora.
MEDODEFECHARNeste ano, coma saída demuitos moradores do en-torno, nenhuma mãe searriscou a matricular o fi-lho no educandário, comreceio de que, nomeio doano letivo, a escola fossedesapropriada. Luiza foipara umaescola do bairrovizinho, e, agora, vai detransporte escolar.“Euqueria terumacerte-
za, se fossem derrubar ounão. Para mim foi muitotriste. Eu não esperavaque, realmente, parasse aescola. Eu gostava de tra-balhar, de estar com ascrianças. Eu paro ali nacalçada e os meninos fa-lam assim: Tia Cione, vo-cê me ensina a tarefa? Aescola foi pra rua. Eobomé que eu gosto”, conta,com lágrimas nos olhos.De acordo com a Procu-
radoria Geral do Estadode Pernambuco, no Reci-fe, emCamaragibeeOlin-da foram desapropriados459 imóveis, ao custo deR$ 102,5 milhões. l*Nomefictício
Escola desapropriada pela segundavez não tempara onde ir
ObradoMundial afasta alunoseeducandário é fechadol> EmRecife, estudantes que não foram removidos ficaram semaula perto de casa
COPA SEM ESCOLACOPA SEM ESCOLA
QUARTADEUMASÉRIE
SAUDADE–
Meninade7anos
tevequemudarde
escolaeagorase
encontracom
antigaprofessora
todososdias
FIMDE
LINHA–
Alunosda
escola Irmã
Iolanda
Brasilnão
têmdestino
definidona
capital
cearense
FOTOS SAMUEL COSTA
hojeemdia.com.br 31BeloHorizonte,quinta-feira,15.5.2014
HOJEEMDIAMinas
O fim da 4ª Conferên-cia Municipal de Políti-cas Urbanas foi adia-do para depois da Co-pa do Mundo. Com is-so, a revisão do PlanoDiretor de Belo Hori-zonte, que fixa as nor-mas para uso e ocupa-ção do solo, será con-cluída em 2 de agosto.No calendário ante-rior, os trabalhos se-riam encerrados em31 de maio.Nem todos os envol-
vidos no processo fica-ram satisfeitos com oadiamento. O setorempresarial, principal-mente o da constru-ção civil, defende asuspensão dos traba-lhos enquanto estudosde viabilidade finan-ceira são concluídos.O secretário-adjunto
de Planejamento Urba-no, Leonardo Castro,afirma porémque todosos estudos necessáriosestão disponíveis.
MAISTEMPOO novo cronogramafoi aprovado ontem,em reunião extraordi-nária do Conselho Mu-nicipal de Políticas Ur-banas. Com a mudan-ça, as plenárias finaisserão em 19 e 26 dejulho e 2 de agosto.Amanhã não haverá
a atividade anterior-mente programada e,
para o dia 24, está pre-vista uma integração téc-nica das propostas. Nodia 31, quando seria en-cerrada a conferência,ainda haverá a apresen-tação de proposições.Umadasprincipaisquei-
xas é em relação à Outor-ga Onerosa do Direito deConstruir (ODC). A pro-posta da Prefeitura de Be-loHorizonteéadequeemtoda a cidade seja aplica-do o coeficiente básico1,0, ou seja, será possívelerguerumaobra comáreaequivalente à do terreno.Seoempreendedor quisermais, terá que pagar.
DEBATEPara o secretário-adjun-to, o ideal é que a am-pliação da conferêncialeve ao aprimoramentodas proposições.“É um tempo amais pa-
ra melhorarmos as pro-postase construirmos jun-to com a equipe técnicada prefeitura uma formade viabilizar a transiçãoda legislação de modoquesejaadequadapara to-do mundo”.Já o presidente da Câ-
mara da Indústria daConstrução da Fiemg,Teodomiro Diniz Ca-margos, esperava outroencaminhamento.“Queríamos marcar
com número as etapas,mas sem colocar data,até termos condição defazer estudos profun-dos sobre o impacto eco-nômico que a propostada prefeitura impõe à ci-dade”, afirmou. l
LeonardoCastro
“Amudançanocronogramanosdáumtempoamaisparamelhorarmosaspropostas”.
Faltapolíticanacional paraminimizarimpacto social
BrunoMoreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
Assim como nos em-preendimentos com sig-nificativo dano ambien-tal, para os quais a legis-lação exige um estudode impacto no entorno,deveria ser obrigatórioo levantamentodopossí-vel prejuízo social causa-doporobrasquedeman-dam desapropriaçõesemáreas urbanas, comoas que estão em cursono Brasil em função demegaeventos. A opiniãoé do advogado Ariel deCastro Alves, membroda Comissão Especialda Criança e do Adoles-cente da Ordemdos Ad-v o g a d o s d o B r a s i l(OAB) em nível federal.“Nãotemosumalegis-
laçãodeprevisãodeim-pacto social. Deveria
existir para evitar a des-continuidade na presta-ção de políticas públi-cas, como a educação. Apartir desse estudo, osconselhos poderiam su-gerirmedidasparaplane-jar ações, como, porexemplo,asseguraroses-tudos de crianças e ado-lescentes”,diz.OEstatuto da Criança
edoAdolescente (ECA)apontaquenãopodeha-ver ruptura nos servi-çospúblicosemprogra-mas de atendimento,como as escolas. “Umain te r rupção ,mesmoque de alguns meses,ou um ano, tem um im-pacto imenso na vidadessas crianças”, argu-menta o advogado.Desdesegunda-feira,o
HojeemDiamostraqueobrasligadasdiretaouindi-retamente aosmegaeven-tos(CopadoMundoeOlim-píadas)têmprejudicadoa
vidaescolardejovensemváriascapitaisdopaís.
PORTARIA317Para a defensora públicaCleide Aparecida Nepo-muceno, a Portaria 317doMinistério das Cidadesjá indica um direciona-mento no sentido de seprevenir prejuízos sociais.Entretanto, a norma só seaplica às obras que têm
financiamento federal.Cleide relata que, em
Minas,nãorecebeuqual-quer denúncia em rela-çãoàdificuldadedeconti-nuidade dos estudos depessoas desapropriadas.Apesardisso,nememBe-
lo Horizonte nem nasseis cidades visitadaspe-loHojeemDia–Cuiabá,Fortaleza, Recife, Rio deJaneiro, Porto Alegre eSão Paulo – os morado-res removidos relatarama existência de estudosdeimpactosocial.
INEGOCIÁVELPara a socióloga Graça Ga-delha, a educação é um di-reito inegociável. “Pela edu-caçãosepreparaparaoexer-cício da cidadania. É funda-mental, também, para sequalificar, desenvolver parao mercado de trabalho”.Há ma i s d e 20 ano s
acompanhando as ques-tões ligadas ao ECA, elaapontaqueosmegaeven-tosestãocontradizendooestatutoeaConstituição.“Apesardetantosinves-
timentos,nunca, comoagora, tantos direitos fo-ramdescumpridos.NoECAháamençãodequeéobrigatório que o poderpúblico forneça acesso àescolagratuita epróximaàresidência.Oquevimos,nessasreportagens,équeisso não ocorreu emmui-toscasos”,lamenta.l
Mudançanasnormasparausoeocupaçãodo solodeBHdeverá ser concluídaem2deagosto
“Queríamosmarcarasetapas,massemdatas.Oidealseriatermosumestudocomofoi feitoparaaOperaçãoNovaBH”.
Pres.daCâmaradaIndústriadaConstruçãodaFiemg
TeodomiroDiniz
l> Membro da Comissão daCriança e doAdolescente daOAB sugere estudo preventivo
Conferência dePolíticaUrbana sótermina após a Copa
CONTRA
Secretário-adjuntodePlanejamentoUrbano
SOLIDARIEDADE–ForçadaasemudardaavenidaPedroI, emBH,adolescentecontoucomaajudadeamigose
atédeestranhosparaconseguir vagaemumaescolapúblicadeConfins,naregiãometropolitana
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DEBATE–Umadaspolêmicasestánacobrançapara
construçãodeobrasmaioresqueaáreado terreno
AFAVOR
ÚLTIMADASÉRIE
SAMUEL COSTA
ARQUIVO HOJE EM DIA
COPA SEM ESCOLACOPA SEM ESCOLA
O artigo 53 do ECAassegura à criança eao adolescente oacesso à escolapública e gratuitapróxima de casa,para seu plenodesenvolvimento,exercício dacidadania equalificação para otrabalho
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hojeemdia.com.br 31BeloHorizonte,sexta-feira,16.5.2014
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