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CONHECIMENTO DA SUPERESTRUTURA ARGUMENTATIVA E COMPREENSÃO LEITORA DE UNIVERSITÁRIOS
Jussara Pedroso Lisboa
ULBRA
Introdução
A preocupação da autora desta pesquisa surgiu após a observação de
alunos matriculados no primeiro semestre de estudos de uma instituição
privada de ensino superior. Estes apresentavam inúmeras dificuldades em
relação a análise, interpretação e produção de textos argumentativos. Embora
formado por alunos de diferentes cursos (Pedagogia, Letras, Administração,
Educação Física e Licenciaturas), o grupo demonstrava dificuldades maiores
relacionadas à compreensão textual. Assim, a preocupação com o
aprimoramento da compreensão leitora dos estudantes originou o presente
estudo.
Pesquisas já demonstram que a leitura de textos argumentativos pode
tornar-se uma tarefa difícil para muitos alunos por envolver a compreensão não
somente de informações explícitas no texto, mas também de elementos
implícitos, como as pressuposições de caráter sócio-cultural do material
analisado, feitas pelo autor. Assim, trabalhar textos com essa tipologia requer
uma preparação contínua e metodológica.
Sem dúvida, a dissertação argumentativa, por uma série de razões, é
atualmente a forma escrita que merece a maior atenção na academia. Primeiro,
porque se traduz na forma mais solicitada às pessoas envolvidas com a
produção de trabalhos universitários, textos de produção e divulgação
científicas e textos técnico-administrativos. Segundo, porque da compreensão
leitora dos sujeitos em relação a este tipo de texto, predominantemente
solicitado, depende o sucesso de sua aprendizagem.
Uma vez que a leitura oferece ao estudante oportunidades de integração
entre sua vivência e suas experiências acadêmicas, faz-se necessário que o
mesmo receba uma orientação sobre como trabalhar esta atividade. É neste
recorte que se insere a presente pesquisa.
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Com o objetivo de contribuir para o melhoramento das atividades de
compreensão leitora de universitários, pesquisou-se, tendo como sujeitos
estudantes universitários do primeiro semestre de uma universidade particular,
em que medida o conhecimento da superestrutura textual argumentativa se
correlacionava com o nível de compreensão leitora desses sujeitos.
Com esse objetivo, buscou-se o apoio em estudos sobre: argumentação
em Jean Michel Adam (1992); compreensão leitora baseados, principalmente,
em Poersch (1993), Stotsky (1983) e Goodman (1983); configuração neuronial
na compreensão leitora em Poersch (2002); papel da leitura na aprendizagem
em Smith (1983); processo transacional na perspectiva de Goodman (1991),
com sua Teoria Unificada da leitura; predições feitas pelo leitor movidas pelo
conhecimento prévio e trabalhada por Kleiman (1993); competência de leitura
apresentada por NEIS (1982); habilidades de raciocínio relacionadas por Scott
(1993) e operações mentais envolvidas nos processos de compreensão de
textos descritas por Kintsch e Van Dijk (1978).
Cumpre esclarecer que a opção pelo texto argumentativo se deve ao fato
de sua presença nas aulas do terceiro grau. No entanto, a argumentação não é
objeto deste estudo, embora seja de grande relevância para o mesmo. A
presente investigação limitou-se ao estudo e à análise da correlação entre o
conhecimento da superestrutura textual argumentativa e a compreensão leitora
de universitários.
Tendo em vista o objetivo deste trabalho, realizou-se uma revisão da
literatura, a qual fundamenta as hipóteses levantadas e a análise de dados. Os
tópicos abordados são os seguintes: leitura e interação entre pensamento e
linguagem; operações mentais envolvidas na compreensão leitora;
intencionalidade e argumentação; avaliação da pesquisa; proposta para uma
análise da compreensão leitora e proposta para uma análise do conhecimento
da superestrutura argumentativa.
Após definidos os objetivos, as hipóteses e as variáveis do trabalho,
descreve-se a metodologia usada: tipo de pesquisa, população e amostragem,
procedimento de coleta de dados e descrição dos instrumentos. Finalmente,
avaliam-se as hipóteses e discutem-se os resultados com base na análise
realizada.
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Fundamentação teórica
Read not to contradict and confute, nor to believe
and take for granted, nor to find talk and discourse, but to
weigh and consider.
(Leia, não para contradizer e refutar, nem para
crer e pressupor, nem para achar assunto e conversa,
mas para pensar e considerar).
Francis Bacon, of Studies
O acompanhamento dos estudos na área da Lingüística Aplicada tem
possibilitado, à grande maioria dos educadores, aperfeiçoar e renovar o
processo de ensino-aprendizagem da língua materna. Isso porque a leitura
vem recebendo maior atenção por parte dos pesquisadores, principalmente
com o desenvolvimento da Psicolingüística.
De maneira especial, alguns estudos lingüísticos contribuíram
significativamente para uma mudança da concepção clássica de leitura.
LEITURA: INTERAÇÃO ENTRE PENSAMENTO E LINGUAGEM
A partir dos estudos de Goodman (1976, 1991) e Smith (1983), a leitura
passa a ser vista como um modelo psicolingüístico. Ou seja, deixa de ser
considerada como processo passivo, em que o leitor apenas decodifica a
mensagem escrita e começa a ser vista como processo ativo, no qual o leitor
também participa fazendo predições.
Goodman deu início a essa mudança ao considerar falsa e refutar a
concepção de que “a leitura é um processo preciso que envolve percepção e
identificação seqüenciais exatas e detalhadas de letras, palavras, padrões de
ortografia e unidades lingüísticas maiores” (1976, p.497).
Em lugar dessa concepção, Goodman apresenta a de que
(...) a leitura é um jogo psicolingüístico de adivinhação. Envolve uma interação entre pensamento e linguagem. A leitura eficiente não resulta da percepção precisa e da identificação exata de todos os elementos, mas da habilidade em selecionar o menor número de “pistas” produtivas necessário à elaboração
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de “adivinhações” que estarão certas desde o início. A habilidade de antecipar aquilo que não foi visto é vital para a leitura, assim como a habilidade de antecipar o que ainda não foi ouvido é vital para a compreensão oral.(1976, p.498).
Um pouco mais tarde, objetivando encontrar uma unidade entre as
pesquisas do passado e do presente sobre leitura, Goodman apresenta um
esboço de uma teoria unificada da leitura. E afirma que tal unidade “será
construída a partir de uma visão transacional” (1991, p.10).Nas palavras de
Goodman,
(...) numa visão transacional, o escritor constrói um texto pelas transações com o texto em desenvolvimento e o significado sendo expresso. O texto é transformado no processo assim como os esquemas do escritor (modos de organização do conhecimento). O leitor também constrói um texto durante a leitura através das transações com o texto publicado, e os esquemas do leitor também são transformados no processo pela assimilação e acomodação, descritas por Piaget (1991, p.11).
Em outras palavras, Goodman (1991), nessa visão transacional, vê a
leitura como linguagem escrita receptiva integrante dos quatro processos
lingüísticos das sociedades alfabetizadas.
O autor divide os processos lingüísticos em dois grupos. O primeiro
deles é o dos processos gerativos produtivos e inclui a fala e a escrita. Nesses
processos, o texto é construído para representar significados. O segundo grupo
é o dos processos receptivos, em que estão a compreensão oral e a leitura.
Nesses processos, o significado é construído através de transações com o
texto e indiretamente através do texto com o escritor. Assim, Goodman (1991)
conclui que “tanto os processos gerativos como os receptivos são construtivos,
ativos e transacionais” (p.11).
Conforme Goodman (1991), as transações lingüísticas envolvidas na
leitura podem ser abordadas de três pontos de observação diferentes: 1) o
processo pelo qual o escritor produz o texto; 2) as características dos textos; e
3) o processo pelo qual o leitor constrói o significado.
Em seu trabalho, o autor reconhece que os processos de língua escrita
são unitários, uma vez que representam uma visão da realidade através da
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linguagem. E tal unidade se deve, conforme Goodman (1991), “às limitações do
cérebro, à realidade que está sendo representada, aos esquemas do falante ou
escritor, à sintaxe, ao léxico da língua e ao contexto social e situacional, que
modelam este processo” (p.12).
Tal citação se faz pertinente nesta pesquisa, como forma de justificar
que, ao averiguar se existe correlação entre o conhecimento da superestrutura
textual argumentativa e a compreensão leitora de sujeitos, não se ignora o
caráter unitário da compreensão leitora (a forma com que cada leitor realiza
este processo). Apenas averiguar-se-á se é possível estabelecer uma ligação
entre o segundo e o terceiro ponto de observação citados por Goodman (1991),
ou seja, se uma característica específica do texto argumentativo (a
superestrutura) pode influenciar na construção de significado pelo leitor.
Ao longo de seu trabalho, Goodman (1991) desenvolve cada um dos
três pontos de observação citados anteriormente. A esta pesquisa interessa,
primeiramente, as informações referentes às características do texto. Quanto a
esse aspecto, o autor afirma que:
O texto deve ser suficientemente bem formado para que a comunicação possa ocorrer sem qualquer contato direto entre o leitor e o autor. Esta limitação interage com as limitações físicas do texto escrito que resultam de suas características como um meio bidimensional mais ou menos permanente que deve ser visualmente perceptível (GOODMAN, 1991, p.16).
Portanto, nossa utilização da superestrutura, como “pista” ao leitor,
estará relacionada às limitações físicas mencionadas acima.
Goodman (1991) afirma que parte das convenções de estruturação que
regulam os textos são intrínsecas à sua função e ao seu conteúdo, embora
algumas convenções sociais sejam arbitrárias. Segundo o autor, as
convenções textuais podem ser aplicáveis a todos os tipos de textos ou a um
único tipo.
Nesta pesquisa, opta-se pela escolha das convenções impostas ao texto
dissertativo pelo fato de que, apesar de inúmeras investigações terem
evidenciado que as diferentes formas de organização global de um texto e a
familiaridade do leitor com as mesmas sejam fatores determinantes no seu
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processamento, poucos estudos têm-se ocupado com a estrutura da
argumentação.
Grande parte dessas pesquisas foram realizadas com textos narrativos
(Pearson & Camperell, 1984) e expositivos (Armbruster et al., 1987; Carrell,
1990; Kletzien, 1991; Meyer & Freedle, 1984; Meyer & Rice, 1984; Pinto, 1991;
Richgels, 1987; Spring & Prager, 1992). Não obstante, quando abordam textos
dissertativos, normalmente, relacionam leitura, compreensão leitora e
capacidade de resumir (Brown e Day,1983); Johnson (1978) e McClusky &
Dolch (1924) e Vigner (1991) entre outros.
Também a tese de Smith (1983) de que através da leitura aprendem-se
os mistérios da língua, de que o educando precisa ler de maneira especial,
para adquirir conhecimentos leva-nos a relacionar compreensão leitora e
estrutura textual. O autor ainda afirma que através da observação de textos
específicos, de seus estilos e procedimentos aprende-se a compreendê-los e
escrevê-los. Por tal razão os textos já existentes, as criações de outras
pessoas servem de fonte de conhecimentos para o leitor.
Nesse sentido, Kleiman (1993) afirma que é no conhecimento prévio que
estão apoiadas as escolhas e predições que o leitor proficiente faz quanto ao
conteúdo da leitura realizada. Conforme a autora, cada indivíduo vai
armazenando os conhecimentos na memória a partir de experiências pessoais
e, apesar de não partilharem exatamente o mesmo conhecimento de mundo de
outros indivíduos, para poder exercer plenamente a compreensão leitora, é
preciso que produtor e receptor de um texto possuam uma boa parcela de
conhecimentos comuns.
Finalmente, os resultados de seminários na área da Lingüística Aplicada
demonstram que o processo da compreensão leitora envolve fatores relativos
ao processamento da informação, fatores cognitivos e sociais, devendo a
Língüística investigar quais desses fatores podem ser, cientificamente,
considerados como auxiliares na compreensão de textos.
Como o objetivo desta pesquisa é investigar em que medida o
conhecimento da superestrutura textual argumentativa proposta por Jean
Michel Adam (1987) se correlaciona com o nível de compreensão leitora de
alunos universitários, ou seja, como a habilidade de identificação de idéias
principais em relação ao texto argumentativo pode estar relacionada com o
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conhecimento da sua organização estrutural (superestrutura argumentativa),
faz-se necessário aprofundar alguns aspectos teóricos que servem de base
para a elaboração desta proposta.
Aspecto Cognitivo da Leitura
A leitura, ao estabelecer relação entre um sujeito autor e um sujeito leitor
por intermédio de um texto, constitui uma atividade comunicativa. Como afirma
Poersch (1992), é “uma atividade cognitiva em sua essência e uma atividade
social em sua práxis” (p.116).
Goodman (1991) afirma que o texto em si não tem significado, pois o
mesmo está na mente do autor que o representa em um texto e na mente do
leitor quando o reconstrói, o que caracteriza a natureza cognitiva da leitura.
Nessa reconstrução, a leitura envolve processos que atuam
simultaneamente e que se influenciam: ativar e aplicar conhecimentos
armazenados, processar e integrar diversos tipos de informações (ortográficas,
sintáticas, semânticas, pragmáticas). Ou seja, apresenta-se como um processo
interativo, na medida em que a construção do sentido se dá através da
percepção de diversos níveis de informação que se inter-relacionam durante a
leitura.
Do ponto de vista cognitivo, pode-se, então, definir a leitura, de acordo
com Poersch e Amaral (1989), como sendo:
um processo ativo de comunicação que leva o leitor a construir,
intencionalmente, em sua própria mente, a partir da percepção de
signos gráficos e da ajuda de dados não visuais, uma substância de
conteúdo equivalente àquela que o autor quis expressar, através de
uma mensagem verbal escrita (p.78).
Retomando as idéias de Goodman (1991), tanto a mente do leitor quanto
o texto sofrem transformações durante o processo de construção de sentido. A
transformação por que passa o leitor ocorre à medida que ele assimila e
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acomoda o conhecimento novo, tendo, assim, tanto os seus esquemas
conceituais quanto os seus valores alterados através da compreensão.
Quanto à transformação do texto, Goodman (1991) afirma ser
decorrente do fato de o leitor, no processo de leitura, ir construindo em sua
mente um texto paralelo àquele que está lendo. Esse outro texto, embora
esteja relacionado com o primeiro, resulta dos esquemas, do conhecimento do
leitor, da sua capacidade de fazer inferências e de estabelecer referências e
co-referências.
Desenvolvimento da Competência Comunicativa
Partindo do fato de que a leitura e a emissão de uma mensagem são
práticas sociais, é imprescindível reconhecer que envolvem o domínio de
convenções e regras sociais.
Dessa forma, a manutenção da compreensão humana depende do
pressuposto de que haja, no ato comunicativo, um acordo de cooperação.
Caso contrário, nenhuma negociação será possível.
Em Grice (1982), temos o Princípio Cooperativo que consiste em
máximas conversacionais, segundo as quais deve-se ser informativo na
medida certa (máxima da quantidade), ser sincero (máxima da qualidade), ser
relevante (máxima da relação) e ser claro (máxima do modo).
Nesse sentido, Kleiman (1989) afirma que o estabelecimento da
comunicação na leitura depende da cooperação mútua entre leitor e autor, pois
ambos têm a zelar para que os pontos de contato sejam mantidos. Devendo o
leitor considerar, ainda, as condições em que o texto foi produzido e as
circunstâncias de sua veiculação, a fim de compreendê-lo do modo mais
próximo possível do pretendido pelo autor.
A habilidade de um sujeito em construir o sentido de um texto faz parte
de sua competência comunicativa. Este conceito, proposto inicialmente pela
sociolingüística (NEIS, 1982), engloba o conhecimento das regras psicológicas,
culturais e sociais que regem a utilização da linguagem por indivíduos inseridos
no grupo social.
O termo competência comunicativa passa a ser usado nos estudos
relativos à produção e recepção textual, já que os mesmos envolvem, não só
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elementos estritamente lingüísticos, mas também os elementos lógico-
cognitivos e pragmáticos.
Em relação às atividades comunicativas, Coste (1988) distingue várias
habilidades que necessitam ser desenvolvidas:
a) lingüística: habilidades referentes aos constituintes e ao
funcionamento da língua;
b) textual: habilidades relativas às mensagens lingüísticas enquanto
seqüências organizadas de enunciados;
c) referencial: habilidades relacionadas às experiências e aos
conhecimentos que o indivíduo possui;
d) de relação: habilidades relativas às estratégias e normas envolvidas
nas relações interpessoais, considerando os papéis e intenções dos
participantes;
e) situacional: habilidades relativas aos fatores externos (sociais,
culturais e circunstanciais) que podem afetar a comunicação.
A competência de leitura pode ainda ser considerada, segundo Neis
(1982), em sentido amplo e estrito.
Em sentido amplo, Neis (1982) denomina de competência de leitura o
conhecimento e a experiência no uso da língua e do sistema pragmático de
usos e convenções ligados à comunicação lingüística, assim como os
conhecimentos referentes ao tema do texto.
Em sentido estrito, para Neis (1992), a competência de leitura envolve a
capacidade de identificar o(s) tema(s) de um texto, através de dados textuais e
extratextuais; perceber as macroestruturas, as relações entre as seqüências do
texto; reconhecer as relações estruturais entre as orações, captando
corretamente as informações isoladas e o modo como foram organizadas;
saber diferenciar os tipos e as categorias textuais.
Neis (1982) afirma ainda que “perceber a intenção que o autor teve ao
redigir um texto parece ser essencial para sua compreensão”.
Nesta pesquisa, é dado um destaque especial ao sentido estrito de
competência de leitura apresentado por Neis (1982), procurando relacioná-lo
ao conhecimento da superestrutura textual do texto argumentativo (sua parte
formal).
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Raciocínio e Leitura Scott (1993) reforça a idéia de que o leitor competente não lê
literalmente, antes busca significado para o que lê no texto. Geralmente, há
concordância entre os leitores, indicando que esse processo não é
completamente arbitrário ou idiossincrático e que há um significado potencial
em comum a ser criado.
Nesse sentido, o autor aponta três fatores como sendo os principais
envolvidos no desenvolvimento da habilidade de ler um texto:
compreensão do co-texto e das ligações internas (coesão);
conhecimento prévio;
habilidades de raciocínio.
O autor ainda relaciona cada uma das ações que precisam ser
desenvolvidas para que o leitor adquira a habilidade de raciocínio. São elas:
percepção de semelhanças e diferenças;
percepção de relações de causa efeito;
flexibilidade de arranjo mental;
percepção de ironia, diálogo autor-leitor e ideologia;
habilidade de distanciamento do texto;
percepção de funções não-explícitas;
fornecimento de informações não dadas.
Scott (1993) acredita que algumas das habilidades de raciocínio devem ser ensinadas mais amplamente do que o são atualmente. Nesse sentido, cita o filósofo Grice com suas máximas que — acredita-se — sejam seguidas pelo autor ou falante (ou que deveriam ser seguidas) quando os mesmos se comunicam. Embora já tenha sido feita, anteriormente, uma breve menção ao Princípio Cooperativo de Grice, julgamos esclarecedor apresentar a citação na íntegra:
(1) Máxima da quantidade: faça sua contribuição tão informativa quanto necessário; (2) Máxima da qualidade: tente fazer com que sua contribuição seja verdadeira. Isto é, não diga nada que você acredita ser falso, ou para o que não tenha evidências adequadas. (3) Máxima de relação: faça com que sua contribuição seja relevante aos objetivos da conversa em andamento; (4) Máxima do modo: seja claro. Tente evitar obscuridade, ambigüidade, prolixidade, desordem em seu uso da língua (SCOTT, 116).
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Pensando na dificuldade que alguns leitores enfrentam ao tentar ler nas
entrelinhas e quando ocorre a não familiaridade da língua, Scott (1993) propõe
um conjunto de regras “a la Grice” para auxiliar no processo da leitura:
A. Pressuponha que o discurso é corente (isto é, os itens se organizam como unidades em seqüência, a não ser que esteja explicitado o contrário). B. Onde parecer faltar informação (falha no “fio”) pressuponha que ela não é surpreendente, conflitante ou inconsistente; C. Onde a informação parece sem sentido, irrelevante, conflitante ou surpreendente, (1) procure dicas no co-texto para a seqüência da informação, e, se isso não restaurar a coerência, (2) procure uma função interpessoal para suplementar a função do conteúdo ideacional; D. Se a máxima falhar momentaneamente (isto é, em apenas um dos itens), pressuponha que lhe falta informação prévia necessária. Decida sobre os custos e benefícios de ignorá-la ou procurá-la em outras fontes; E. Se falhar permanentemente no discurso (isto é, os itens seguintes estão coerentes entre si, mas não com os itens que você está focalizando) pressuponha que você chegou ao fim daquela unidade do discurso; F. Mesmo que o discurso pareça coerente, pressuponha que há em jogo funções interpessoais de linguagem inexplícitas, ou pelo menos um ponto de vista, assim como a função ideacional; procure-as perguntando-se no que o autor pode querer levar você a acreditar. Procure as pressuposições do autor. Teste para verificar se não há falhas nas máximas de Grice (SCOTT, p.117).
Scott (1993) propõe ainda uma prática sistemática para desenvolver
habilidades de raciocínio. Primeiramente sugere a discussão da natureza do
processo de leitura com os alunos e o que a leitura das entrelinhas envolve. A
seguir, sugere a formulação de questões apropriadas sobre os textos.
Aconselha que haja um distanciamento da informação citada explicitamente no
mesmo.
Ou seja, afirma que se devem elaborar questões que necessitem do uso
das habilidades de raciocínio, tais como o fornecimento de informações não
dadas, a percepção de semelhanças e diferenças, a percepção de causa e
efeito, a flexibilidade do arranjo mental, a percepção de comentário, ironia,
“diálogo autor-leitor” e ideologia e a habilidade de se distanciar do texto.
Finalmente, Scott (1993) sugere a construção de exercícios para
conscientização das palavras emotivas ou asserções, para corrigir
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generalizações semiverdadeiras, para identificar as pressuposições. Trata da
importância de exercícios envolvendo a lógica e exercícios que auxiliem na
busca da coerência, entre outros. O autor é categórico ao afirmar que todos os
exercícios devem ser contextualizados, acompanhados do texto a que se
referem.
Ao mostrar ao educador que ler nas entrelinhas é um problema que
merece atenção, Scott (1993) alerta para o fato de os alunos apresentarem
dificuldade em extrair as informações implícitas do texto. Acredita que isso
ocorre porque os educadores em geral têm trabalhado muito pouco com o
aspecto do raciocínio, intrínseco à leitura.
Segundo Scott (1993), é comum os leitores conhecerem cada palavra do
texto, mas não conseguirem imprimir-lhe sentido, ler nas entrelinhas ou
descobrir “onde o autor está querendo chegar” e enxergar suas implicações
subjacentes.
OPERAÇÕES MENTAIS E COMPREENSÃO LEITORA
Dependendo do modo como concebemos o texto e a leitura, teremos
diferentes definições para a compreensão.
A visão de leitura como atividade comunicativa conduz a conceber o
texto não somente como um elemento possibilitador de contato interpessoal,
mas também como um meio de atuar sobre o outro. Disso decorre que o texto
passa a servir a um determinado propósito de seu autor e, conseqüentemente,
a exercer uma determinada função na comunidade.
No que diz respeito à compreensão leitora, opta-se, nesta pesquisa, pela
adoção conceitual das idéias de dois autores de extrema importância na área
da Psicolingüística: Kintsch e Van Dijk (1978).
Em seu artigo “Towards a model of text comprehension and production”,
os autores descrevem as operações mentais envolvidas nos processos de
compreensão e elaboração de textos e apresentam um modelo de
processamento psicológico, baseado na estrutura semântica do texto e
delineado em três conjuntos de operações:
a) um conjunto referente ao texto global;
b) um conjunto de operações que condensam o significado
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total do texto;
c) um conjunto de ações que objetivam a geração de um
novo texto a partir dos dados da memória e dos processos de
compreensão.
Kintsch e Van Dijk (1978) apresentam uma distinção entre micro e
macroestrutura do texto.
A microestrutura (fio condutor do texto) diz respeito à coesão de
elementos e segmentos entre as proposições. Ou seja, a microestrutura é
formada pelas distintas idéias, uma a uma, que o conformam e também pelas
relações lineares que se estabelecem entre elas, cada proposição com a
antecedente e a conseqüente. As proposições (distintas idéias), por sua vez,
contêm como elementos o predicado e os argumentos.
Já a macroestrutura de um texto é o conjunto de proposições
(macroproposições) que serve para dar sentido, unidade e coerência global ao
texto.
Portanto, para passarmos da micro para a macroestrutura é necessário
que as idéias particulares (proposições) sejam entendidas como componentes
ou partes de um todo mais complexo, como exemplos de um conceito mais
geral ou, finalmente, como mais relevantes ou globalizadoras que os restantes.
Para os autores, a forma de fazer esta transposição (da micro para a
macroestrutura) é a atividade de resumo e, para compreender um texto,
devemos encontrar as proposições globais em torno das quais cada um dos
significados particulares encontram um sentido, conectando estas proposições.
A seguir, devemos construir, em nossa mente, uma representação hierárquica
em que umas idéias apóiam outras mais globais; e estas, outras igualmente
globais e assim sucessivamente (quadro 1).
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MP O Brasil é um país do Terceiro Mundo.
O Brasil é um país com
um péssimo nível
educacional.
(macroproposição)
O Brasil conta com um
desenvolvimento industrial
mediano. (macroproposição)
O Brasil é um país pouco
democrático.
(macroproposição)
P P P P P P P P P P P P P P P
MICROESTRUTURA
(cada uma das distintas idéias e as relações lineares entre elas)
QUADRO 1 – Representação hierárquica de macro e microestrutura do texto (adaptação de Sanchez (2002) feita pela autora)
Kintsch e Van Dijk (1978) também distinguem os níveis de compreensão
textual. Segundo os autores, as noções de compreensão superficial e de
compreensão profunda tem correspondência com a distinção, mais técnica,
entre texto-base (compreensão superficial) e modelo da situação
(compreensão profunda).
Para alcançar a compreensão superficial, Kintsch e Van Dijk (1978)
afirmam ser necessário criar em nossa mente uma base textual (texto base),
conectando as distintas idéias entre si, linear e globalmente. Dessa forma,
podemos parafrasear o texto que lemos, resumi-lo, lembrá-lo e responder a
questões literais.
Em contrapartida, os autores afirmam que um nível profundo de
compreensão supõe fundir a informação extraída do texto com o que já
sabemos. Nesse momento reteríamos uma representação do mundo e /ou da
situação, não mais do texto em si.
Logo, para Kintsch e Van Dijk (1978), um modelo da situação permite
resolver tarefas ou problemas novos que requerem um uso criativo da
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informação do texto. No entanto, para criar uma representação situacional, é
necessário um contato permanente entre o que o texto oferece e o que já
sabemos.
Assim, é provável que o leitor primeiro procure formar uma
representação coerente entre as idéias do texto, formando uma base textual.
Somente depois será criado o modelo da situação, após a reflexão sobre o que
leu, a revisão dos conteúdos, etc.
Kintsch e Van Dijk (1978) mencionam diferentes níveis de compreensão
no processo de leitura.
Num primeiro nível, os significados extraídos do texto formam um todo
coerente e cada idéia deve guardar uma relação precisa (local e global) com o
resto. É o que os autores denominam como texto-base (base textual). Neste
primeiro nível, diferenciamos três níveis estruturais do texto: a microestrutura
(identificação das proposições e conexão entre elas); a macroestrutura (idéia
global que dota o texto de coerência e sentido) e a superestrutura (diferentes
formas de organizar o texto).
Embora os demais níveis sejam apresentados a seguir, é importante
destacar que, na avaliação do conhecimento da superestrutura argumentativa a
ser realizada junto aos sujeitos desta pesquisa, é utilizada a especificação
deste primeiro nível numa inter-relação com a proposta de Adam (1992). Tal
inter-relação é detalhadamente explicada no capítulo de proposta para análise
da superestrutura argumentativa.
O segundo nível de compreensão, mais profundo, segundo Kintsch e
Van Dijk (1978), supõe a integração das informações do texto com o resto de
nossos conhecimentos até fundirem-se. Nesse caso, o que retemos em nossa
mente não é o texto, mas o mundo ou situação que se refere nele. Esse
segundo nível é denominado de modelo de situação. A elaboração de um
modelo da situação nos permite usar criativamente a informação, respondendo
a perguntas cujas respostas não estão literalmente no texto.
Finalmente o terceiro nível é a natureza auto-regulatória da leitura. Relaciona-se com as estratégias metacognitivas: estabelecimento da meta;
elaboração do plano; supervisão da compreensão e avaliação da compreensão
da leitura em relação à meta estabelecida.
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Ao apresentar as ações envolvidas na compreensão - as
metaestratégias – Kintsch e Van Dijk (1978) nos levam a imaginar um leitor
frente ao texto a ser trabalhado. Estando sozinho nesta tarefa, ele não tem
ninguém para indicar o caminho a seguir; ninguém para supervisioná-lo durante
a leitura nem para saber se está conectando adequadamente os conteúdos
com seus conhecimentos prévios e ninguém para avaliá-lo. Já não é possível
interpelar o autor do texto para esclarecer seu significado, assim o próprio leitor
deve efetuar os esclarecimentos, detectar as dúvidas e buscar modelos para
resolvê-las. Estas ações os autores denominam de supervisão.
Os autores alertam para o fato de que um texto pode ser lido com
distintos objetivos, portanto cabe ao leitor selecionar uma meta que possibilite a
aproximação com o texto. Depois, é necessário prever e ordenar as ações que
permitirão compreender a leitura, etapa denominada de planejamento. Para Kintsch e Van Dijk (1978), quando o leitor analisa se o grau de
compreensão alcançado é aceitável ou não, relacionando a compreensão com
a meta estabelecida, está realizando a avaliação.
É exatamente a essas três estratégias: supervisionar, planejar e avaliar
que os autores denominam metaestratégias, por operarem sobre outras
atividades ou estratégias (estratégias operando sobre outras estratégias) e não
sobre a informação do texto.
Assim, ao supervisionar (que é uma ação), operamos sobre outras
ações (construir proposições, detectar sinais de organização, etc.). Enquanto
uma parte de nós reconhece palavras ou constrói proposições, outra parte se
ocupa em avaliar a marcha do processo (nos interrogamos sobre se ficou clara
determinada idéia, se realmente encaixa o significado de uma palavra).
Quando planejamos, criando uma meta e um plano, operamos certas
estratégias que se dispõem numa ordem determinada para alcançar a meta
prevista (primeiro uma leitura global, depois adotando um critério para
compreensão (leitura de parágrafos, capítulos, etc.). Finalmente, ao avaliar,
nos comprometemos em atividades mediante as quais pomos à prova o
resultado final obtido. O quadro 2 apresenta, esquematicamente, os níveis de
compreensão.
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NÍVEIS DE COMPREENSÃO DE UM TEXTO
PRIMEIRO NÍVEL: Base Textual ou Texto-Base
Neste nível identificamos três níveis estruturais:
• Microestrutura
(identificação das proposições e conexão entre elas)
• Macroestrutura
(Identificação da idéia global, do sentido, da coerência do texto)
• Superestrutura
(Forma, modo de organização do texto)
SEGUNDO NÍVEL: Modelo de Situação
O que retemos não é o texto, mas a situação de mundo a que ele remete. É o nível em que se dá a
integração das informações do texto com os conhecimentos do leitor.
TERCEIRO NÍVEL: Metacognição
Natureza auto-reguladora da leitura.
Utilização de metaestratégias (estabelecer/realizar): meta, plano, supervisão e avaliação.
Quadro 2 – Representação dos níveis de compreensão de um texto-esquema elaborado pela autora.
Kintsch e Van Dijk (1978) chamam a atenção sobre a importância
das inferências na compreensão leitora. Os autores referem-se às
inferências como sendo as ligações estabelecidas entre as informações
implícitas oferecidas pelo escritor e as relações com o conhecimento
prévio do leitor. Apontam as mesmas como responsáveis pela
compreensão extratextual, ou seja, pela interpretação de pressuposições
e idéias subentendidas.
Objetivando auxiliar os leitores em sua passagem da micro para a
macroestrutura textual, Kintsch e Van Dijk (1978) procuraram identificar e
descrever as macrorregras que reduzem e organizam as informações mais
detalhadas na microestrutura do texto.
Segundo os autores, a natureza geral das macrorregras é baseada na
relação de acarretamento semântico (conceito relacional) e deve ser realizado
1 8
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na estrutura superficial com verbos, adjetivos, advérbios, etc., e os argumentos
representam diferentes funções semânticas, tais como agente, objeto e meta.
Na primeira macrorregra, denominada integração, uma seqüência de
proposições é substituída por outra totalmente nova, entendendo que essa
seqüência constitui as partes de um conceito mais amplo, os elementos do
texto são parte de uma idéia mais complexa.
A segunda macrorregra é a generalização. Mediante ela, dada uma
seqüência de proposições, substituímos os conceitos incluídos nessa
seqüência por um conceito supra-ordenado (uma generalização o menor
possível para os elementos substituídos). Os elementos substituídos são
entendidos como exemplos do conceito que vem substituí-los (brigar, rasgar,
gritar são concebidos como exemplos de mau comportamento).
O Quadro 3 apresenta um esquema do exemplo citado. Exemplo: Pedro chegou tarde à escola. Brigou com o porteiro. Rasgou o
uniforme do colega. Gritou com a professora.
Quadro 3- Representação da macrorregra de generalização-adaptação de
Sanchez (2002)
A terceira macrorregra é a de seleção (supressão ou omissão). Dada
uma seqüência de proposições, se constrói a macroestrutura, selecionando
aquela(s) que é (são) uma condição necessária para poder interpretar o
restante do que é relevante. Ou, em termos negativos, se constrói suprimindo
Macroestrutura
P P P P
Pedro chegou tarde à escola. Brigou com o
porteiro.
Rasgou o uniforme do colega. Gritou
com a professora
Microestrutura (cada proposição) )
MP Pedro apresentou um mau comportamento hoje.
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1 9
aquelas proposições que resultam triviais ou redundantes. Esta atividade
mental se assemelha com a atividade física de sublinhar.
Kintsch e Van Dijk (1978) deixam claro que, ao compreender, não nos
limitamos a colecionar ou amontoar os significados das palavras que vamos
lendo. Necessitamos estabelecer relações (agente, objeto, ação) entre esses
significados, que dão lugar a uma unidade mais ampla que tem um sentido
completo. Coloquialmente esta unidade costuma ser chamada de “idéia” e,
tecnicamente, de proposição. Trata-se da menor unidade de significado que
pode ser verdadeira ou falsa. Ao observar a seguinte frase: Os alunos arrastaram o móvel para o
centro da sala, pode-se afirmar que a expressão “arrastaram” tem significado,
mas não constitui uma proposição: não podemos estabelecer se “arrastaram” é
verdadeiro ou falso. O mesmo acontece se somarmos os significados de
alunos e móvel :juntos não constituem uma proposição.
Já o significado de “Os alunos arrastaram o móvel para o centro da sala”
nos permite estabelecer um julgamento de verdade e, por isso, podemos dizer
que constitui uma proposição.
Se agregássemos ao anterior um novo termo: “os alunos arrastaram o
móvel branco para o centro da sala”, teríamos duas proposições ou unidades
distintas: “os alunos arrastaram o móvel” e “o móvel era branco”.
Assim, o que retemos em nossa mente depois de ler são as relações
entre os significados das palavras e não as palavras em si. Por isso, a
paráfrase é uma forma de demonstrar nossa compreensão de um texto.
Kintsch e Van Dijk (1978) afirmam que a capacidade da memória de
trabalho determina a divisão da leitura e compreensão do texto em ciclos.
Um texto é processado seqüencialmente (input de audição, ordem
temporal). A limitação do número de proposições depende das características
do texto, enquanto que a limitação de seu próprio valor depende, além dos
aspectos relativos ao texto, das características do leitor.
Neste processo, estabelece-se uma rede de trabalho ou – gráficos de
coerência. Este tem uma coordenada (linha) referente às proposições e a outra
relacionada às referências. Ambas as coordenadas estão dispostas em níveis:
o primeiro nível diz respeito ao resultado, o segundo, às proposições
conectadas ao topo e o terceiro, às proposições que não se conectam.
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É justamente em relação à escolha das proposições mais importantes
que os autores citam a importância da memória duradoura. Ou seja, ela é a
responsável pela indicação das proposições mais importantes; as já
conectadas com outras informações. Logo, ela auxilia no processamento
textual. E a estratégia utilizada na escolha da proposição na passagem de um
ciclo para outro é a denominada seleção.
Essa estratégia, no entanto, não descarta as proposições anteriores,
uma vez que a compreensão da leitura inclui todas estas proposições, mesmo
as não armazenadas na memória de curto-termo, embora disponíveis na
memória duradoura e possíveis de serem recuperadas na releitura.
A estratégia também prevê a continuidade do processamento em caso
de a proposição selecionada ser bem-sucedida ou ainda, o reinício do processo
de inferência, com adição de dados para a base textual, caso o êxito não
aconteça.
Kintsch e Van Dijk (1978) mencionam um modelo de processamento
simplificado da compreensão leitora que funciona de acordo com três
parâmetros: o tamanho máximo de input por ciclo, a capacidade da memória de
curto-termo e a probabilidade de reprodução. Além disso, seu funcionamento
também depende de algumas variáveis, tais como: os diferentes leitores e suas
características (limitação de memória, conhecimentos prévios, etc.), dificuldade
do texto, recursos utilizados no processamento do texto (decodificação
perceptual, análise semântica-sintática, generalização de inferências e os
macro-operadores do discurso) que definirão as diferentes estratégias de
leitura a serem seguidas.
As predições do modelo são relevantes não apenas para a recordação,
mas também para a leiturabilidade. Textos que requerem operações que
exigem um número maior de recursos envolvem mais tempo para a leitura.
Além disso, um texto considerado fácil para um leitor não será
necessariamente fácil para outro. Devido a esta variação, a leiturabilidade não
pode ser considerada uma propriedade do texto, mas uma interação entre leitor
e texto.
Um destaque feito por Kintsch e Van Dijk (1978) sobre a importância dos
macro-operadores no processo de leitura interessa em especial para esta
pesquisa. Os autores afirmam que os referidos macro-operadores apagam da
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macroestrutura do texto as informações irrelevantes e redundantes mantendo
apenas o que é essencial. Com esta operação, propiciam a construção de
novas proposições. Portanto, os autores os consideram diretamente
responsáveis pela coerência textual. Ou seja, transformam as proposições da
base textual em proposições que representam o núcleo central do texto.
Assim, utilizaremos também este recorte de Kintsch e Van Dijk (1978)
para montar nossa proposta de análise da superestrutura.
Alguns exemplos de macro-operadores citados pelos autores:
Esse fenômeno tem uma fácil explicação....
Por um lado....
Um segundo fator....
Justifica-se a possível inter-relação deste aspecto com a proposta de
Adam (1992) pelo fato de que Kintsch e Van Dijk (1978) consideram
“esquemas” ou estruturas conceituais de alto nível formas convencionadas
para desenvolver uma determinada estrutura textual, o que significa que
relacionam o papel dos esquemas com a aplicação dos macro-operadores,
vendo-os como co-responsáveis pela organização das idéias globais num todo.
Apesar de os autores considerarem difícil criar uma taxionomia definitiva
do tipo de esquemas ou estruturas conceituais básicas, identificam as mais
comuns: a narração, a argumentação e a descrição.
Sendo assim, os esquemas são auxiliares dos macro-operadores, pois,
além de organizarem as categorias do texto (exemplo: introdução, método,
resultados e discussão), eles ainda selecionam as informações mais relevantes
para a macroestrutura e auxiliam nas pesquisas dos estudantes. Conforme as
metas dos leitores, representadas pelo esquema, será feita a utilização dos
macro-operadores. Se tais metas são vagas, os macro-operadores serão
impreditíveis.
Utilizando-se dos macro-operadores, anteriormente citados, os autores
estabelecem a relação com o esquema:
Macro-operadores: - Esse fenômeno tem uma fácil
explicação....
- Por um lado....
- Um segundo fator....
Esquema: -Texto argumentativo organizado pela
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apresentação de causas de um
determinado fenômeno.
Segundo os autores, podemos chamar a ordem ou organização mais ou
menos definidas dos textos como superestrutura (refere-se à forma do texto).
Ela constitui, também, uma segunda forma de coerência global. Já quando
falamos de macroestrutura, nos referimos ao conteúdo.
Para definir “a superestrutura” de um texto argumentativo utilizamos —
na análise realizada — o modelo de Adam (1987), embora saibamos da
existência de outros modelos.
Construção de Sentido, Configuração Neuronial e Compreensão Leitora
Poersch (2003) afirma que “Ler é compreender; compreender é recordar
e aprender”. Para o autor, a leitura consiste na configuração cerebral de um
conteúdo a partir de um texto (expressão). Numa visão conexionista, informa
que ler consiste em:
(...) transformar, para fins de comunicação, uma seqüência discreta (de letras, de palavras, de frases), apresentada serialmente — uma unidade após outra —, para uma realidade analógica, “fotografada” (pensamento). Essa realidade pode representar um contínuo (mapa, fotografia, desenho, esquema) de um conjunto de quadros, de fatos, de idéias ou de argumentos (p.4).
Portanto, Poersch (2003), assim como Goodman (1991), vê o processo
de compreensão inserido, fundamentalmente, na relação
pensamento/linguagem e leitura. A primeira parte, do texto ao pensamento. Já
a segunda (a escritura) parte, do pensamento (conteúdo) ao texto (expressão).
Para Poersch (2003) apreender como se dá a compreensão envolve,
inevitavelmente, a explicação de como passar do digital, do discreto (texto), ao
analógico, a uma unidade contínua (pensamento).
O autor afirma que essa passagem não pode ser explicada mediante um
processamento serial de símbolos abstratos e fixos armazenados na mente,
mas através de um processamento de distribuição em paralelo de dados
flexíveis engramados na redneuronial (cérebro), cabendo à mente representar
este funcionamento.
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Também Shanks (1993) refere-se à origem das funções mentais numa
visão conexionista como sendo o resultado da interligação e comunicação dos
neurônios no cérebro “O pensamento atual da neurofisiologia afirma que as
mudanças do cérebro, que correspondem à aprendizagem, ocorrem nas
sinapses que ligam neurônios”(p.2).
Para Poersch (2003), a construção do sentido apresenta o seguinte
processamento: O texto fornece dados que são percebidos, captados pelos olhos; o nervo ótico conduz essa percepção ao cérebro. É no cérebro que se inicia o processamento desses dados com aqueles previamente armazenados. Como conhecimento significa conexão sináptica, se determinado dado (input) encontrar caminho (conexão) para outro dado armazenado, esse dado é ativado. Houve recordação e, automaticamente, a sinapse será reforçada. Se essa ativação não for possível, não encontrar caminho previamente traçado, o dado de entrada deve ser integrado a algum dado já armazenado. Essa integração consiste em estabelecer uma nova conexão; isso significa aprender. Esse novo conhecimento passa a constituir conhecimento prévio para o processamento do resto do texto (p.4).
Poersch (2003) alerta para o fato de que cada etapa deste
processamento constitui a resposta de um sem número de estímulos que
atuam em paralelo. Não obstante, o referido processamento é serial, isto é,
ocorre à medida que o texto é lido.
Tal afirmação torna possível relacionar o conhecimento da
superestrutura argumentativa como sendo um reforço sináptico para o leitor.
Ou seja, se de fato tal conhecimento existir, durante a leitura será ativado
provocando a recordação mencionada por Poersch (2003) e
conseqüentemente facilitando a compreensão do texto.
Quando ocorre a compreensão, no final da leitura, segundo Poersch
(2003), o leitor tem “o conteúdo presente como se fosse a fotografia ‘ad hoc’ de
todas as conexões estabelecidas sendo que, na recordação, aparece em
primeiro lugar aquele conteúdo mais fortemente gravado” (p.4).
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Conhecimento e Sinapses Neuroniais
Poersch (2003) define conhecimento lingüístico como sendo todo
conhecimento acerca da linguagem. Assim, tal conhecimento se refere aos
diversos níveis de análise lingüística, aos aspectos que presidem a
manipulação da língua e às áreas limítrofes da lingüística com outras ciências.
A apropriação desse conhecimento realiza-se através de alterações na
força das sinapses neuroniais. Alterações essas que, segundo Poersch (2003):
(...) são motivadas pelo processamento de insumos externos – fornecidos pelas experiências com o mundo circundante e pela informação fornecida via linguagem – e de insumos internos – dados previamente engramados nas redes neuroniais. O aprendizado e o uso da leitura pressupõem a alteração de ligações sinápticas específicas. Se de um lado, tem-se a construção de correspondências entre dados gráficos e sua sonorização (recodificação), de outro lado, processa-se a correspondência entre as expressões sonoras e seu respectivo conteúdo (decodificação) (p.01).
Assim como Scott (1983), Poersch (2003) destaca a importância de se
trabalhar – na aprendizagem da leitura – com as pressuposições que devem
ser incluídas e as inferências que devem ser feitas. Essas devem corresponder
aos dados trazidos pelo texto e pelo conhecimento de mundo. Dessa forma, o
leitor configurará em seu cérebro uma substância de conteúdo semelhante
àquela existente no cérebro do escritor ao produzir o texto.
Segundo Seidenberg e MacDonald (1999), a apropriação do saber
lingüístico se realiza através de respostas fornecidas a três tipos de estímulos:
estímulos externos primários, estímulos externos secundários e estímulos
internos. Os estímulos externos primários correspondem aos dados que o leitor
coleta na comunidade lingüística na qual ele se insere. (...) Esses dados são oferecidos pelos falantes e engramados no cérebro (alterações de sinapses) segundo condicionamentos probabilísticos (Seidenberg & MacDonald, 1999) por um lado, e de outro, por constrangimentos motivacionais, afetivos, emocionais (SCHUMANN, 1994) (p.01).
Já os estímulos externos secundários correspondem a dados sobre a
língua obtidos a partir de fontes secundárias orais ou gráficas, sob a forma de
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metalinguagem (gramáticas, livros e apresentações orais ou escritas) sobre
línguas e linguagem. Esses estímulos distinguem-se dos anteriores por não se
referirem à língua como desempenho, mas à língua como objeto de análise
(metalinguagem).
Finalmente, os estímulos internos são provenientes do processamento
interneuronial e constituem as unidades intermediárias. Como respostas
internas a estímulos externos podem produzir respostas externas. A esses
dados tem-se acesso através de atividade introspectiva – tais como os
protocolos verbais e a análise da relação entre estímulos externos e respostas
externas.
Poersch (2003) sintetiza o funcionamento do cérebro como sendo
gerado a partir das respostas que se obtêm através das três fontes de
estímulos mencionadas anteriormente e que constituem nosso conhecimento
prévio enciclopédico (em caráter geral) e o nosso conhecimento lingüístico (em
particular). Tais conhecimentos são armazenados no cérebro e sofrem
constantes processamentos. Quando ativado por estímulos apropriados, o
conhecimento enciclopédico torna-se disponível, sendo recuperável.
Aquisição de Conhecimento e de Alguns Paradigmas
Existem três paradigmas que podem explicar a apropriação do
conhecimento, isto é, sua percepção, seu armazenamento e sua recuperação.
O conhecimento que se tem de certa realidade depende do ponto de vista de
sua análise.
Em relação à apropriação de “saberes” em geral, e de saber lingüístico,
em particular, Poersch (2003) aponta três paradigmas importantes: o primeiro
corresponde ao paradigma comportamentista; o segundo é o simbólico e o
terceiro paradigma é o conexionista.
O autor deixa claro que o mais importante não é rotular tais paradigmas
como certos ou errados, mas sim analisar a sua força explicativa.
Poersch (2003) relaciona os fundamentos dos paradigmas com a forma
com que concebem a aquisição do conhecimento.
O paradigma comportamentista (behaviorista) se fundamenta na
aquisição do conhecimento através da experiência. Corresponde à metáfora da
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“tabula rasa”, ou seja, todo ser, ao nascer, não possui nenhum conhecimento;
este é adquirido pela experiência, através dos sentidos.
Segundo o referido paradigma (behaviorista), o cérebro humano recebe
estímulos aos quais são dadas determinadas respostas. Todas as alterações
nos estímulos provocam alterações no cérebro. Para os behavioristas, tudo
acontece no cérebro, no orgânico; logo, negam a existência da mente. O
cérebro (constituído dos neurônios) serve de mediador entre um estímulo e
uma resposta, contudo o seu processamento não é importante. Resumindo:
para os behavioristas “aprender significa saber dar a devida resposta a
determinado estímulo”.
Em contrapartida, o paradigma simbolista pleiteia a existência da mente
como realidade distinta, embora não separada, do cérebro. A fala, em sua
realidade física, serve para expressar o pensamento, a realidade mental. Esse
paradigma pretende desvendar os processos cognitivos da linguagem: formula
hipóteses sobre o que acontece no espaço que separa o estímulo de sua
respectiva resposta.
A idéia básica dos simbolistas é a de que a cognição humana depende
centralmente da manipulação de representações simbólicas (signos, conceitos)
processados em série segundo regras fixas, os algoritmos. Exemplo
característico desse paradigma é o signo lingüístico de Saussure (1971) e a
teoria dos esquemas mentais de Schank (1993) e Minsky (1981). Grande parte
dos simbolistas defende o inatismo lingüístico (regras inatas). Numa visão
simbolista “aprender significa representar na mente a realidade existente”.
Finalmente, o paradigma conexionista tenta penetrar no cérebro através
dos achados da neurociência e das avarias cerebrais. Tal paradigma baseia-se
na estrutura eletroquímica das conexões estabelecidas entre os sem-número
de neurônios que captam o conhecimento, não em forma de símbolos prontos,
como um todo, mas de traços disseminados e engramados nesses neurônios,
tridimensionalmente conectados.
Segundo Poersch (2003), o conexionista procura explicar os processos
mentais com base em configurações desenhadas “ad hoc”, em forma
fotográfica, nas redes neuroniais e se contrapõe ao inatismo, apoiando o
culturalismo: todo saber é adquirido através da experiência.
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Este “saber” tem como sede o cérebro. Em contrapartida, a mente, que
não tem existência própria, nada mais é do que o seu funcionamento. Portanto,
para os conexionistas “aprender significa, essencialmente, alterar a força das
sinapses neuroniais”.
Neurônio: a Unidade Básica do Cérebro
Young & Concar (1992) e Poersch (2003) caracterizam o funcionamento
do cérebro humano por uma extrema plasticidade. Segundo Rumelhart &
McClelland (1986) tal funcionamento é de “uma ampla flexibilidade e uma
impressionante rapidez, além da capacidade de operar com vários estímulos
ao mesmo tempo – processamento de distribuição em paralelo (apud
POERSCH, 2003, p.3).
Haykin (1994), Concar (1992) e Poersch (2003) sintetizam a unidade
básica do cérebro como sendo constituída pelo neurônio. Este varia
substancialmente quanto a seu tamanho, sua forma, sua função e suas
relações. O que é comum entre os neurônios é sua estrutura triádica: corpo
celular (núcleo), axônio e dendritos. O axônio é o meio pelo qual um neurônio se comunica com outros. Os dendritos são ramificações do corpo celular que funcionam como receptores da informação provinda de outros neurônios através dos axônios. O ponto de encontro de um neurônio e um dendrito – onde ocorre a conexão interneuronial – é denominado sinapse (p.03).
Inúmeros estudos têm apresentado as alterações das sinapses no
cérebro como sendo responsáveis pela aquisição de conhecimento novo. Logo,
a aprendizagem, além de reforçar sinapses também provoca reajustes nas
redes neuroniais já existentes. Assim, os neurônios ajustam a força de suas
sinapses durante o processamento da informação. O que numa visão
conexionista permite afirmar que a aquisição de conhecimento está relacionado
a mudanças sutis nas conexões neuroniais (sinapses).
Nesta concepção, todo dado de entrada constitui um estímulo. Se esse
dado encontrar uma resposta – isto é, um caminho interneuronial previamente
marcado, dizemos que houve uma ativação, uma recordação. Essa recordação
não constitui a aprendizagem propriamente dita (ou seja, não constitui
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conhecimento novo). Contudo, quando não for encontrado um caminho
marcado, será necessário que o dado (novo) seja integrado a algum
conhecimento existente. Para isso, é preciso traçar um novo caminho,
estabelecer uma nova conexão interneuronial. É nesse momento que
adquirimos conhecimento, que aprendemos.
Poersch (2003), em seu artigo, apresenta a proposta de que o
conhecimento lingüístico consiste de três fatores fundamentais: o
conhecimento de um determinado idioma (competência e desempenho); o
conhecimento sobre a língua (descrição, metalinguagem) e o conhecimento de
aspectos de uso da língua (aquisição, ensino/aprendizagem, pragmática).
A importância das afirmações de Poersch (2003) para a presente
pesquisa se deve ao fato de o lingüista apontar a leitura como uma atividade de
recordação e de aprendizagem responsável pela apropriação do saber
lingüístico através da forma gráfica (código escrito).
Como já foi visto, ele defende a idéia de que “ler é compreender e que
compreender é recordar e aprender”. Logo, o conhecimento lingüístico está
armazenado na forma escrita que encontra-se disponível via leitura.
Finalmente, Poersch (2003) termina seu artigo afirmando que a leitura constitui
fonte de saber lingüístico, o que vai ao encontro das hipóteses desta pesquisa.
Assim se, no paradigma conexionista, aprender significa alterar a força
das sinapses neuroniais, ao se trabalhar com a compreensão leitora utilizando-
se o conhecimento da superestrutura como um dado de entrada, acredita-se
que o mesmo poderá representar o papel do estímulo, provocando a ativação,
a recordação (de um caminho interneuronial previamente marcado) que
auxiliará o leitor na compreensão do texto.
INTENCIONALIDADE E ARGUMENTAÇÃO
Para Anscombre e Ducrot (1994), a argumentação é uma estratégia
discursiva marcada pela intenção do locutor de fazer com que o interlocutor
admita um ponto de vista, ou simplesmente que o locutor defenda a pertinência
de seu próprio ponto de vista.
Os autores destacam a importância da estruturação da argumentação e
da interlocução, considerando-se que toda argumentação é dirigida a alguém.
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Adam (1987), teórico destacado na presente pesquisa, não fala em tipos
de textos, mas em tipos de seqüências textuais, a partir do pressuposto de que
um texto é constituído de seqüências, podendo conter diversas tipologias,
como narrativas, descritivas, argumentativas.
A proposta de Adam (1987) categoriza a superestrutura argumentativa
em tese anterior, premissas, cadeia de argumentos, conclusão e nova tese;
contudo, sem que haja necessidade de manter-se esta ordem no texto.
Normalmente, a tese diz respeito a um campo problemático, representando o
objeto da argumentação. Já as premissas são responsáveis pela armação do
raciocínio, tendo como características serem incontestáveis e estarem
relacionadas com as conclusões. Finalmente os argumentos são constituídos
de proposições utilizadas para apoiar a tese.
Tratando da interlocução, Charolles (1980) apresenta a conduta e a
situação de argumentação, descrevendo a interação entre argumentador (autor
da conduta) e argumentatário (sujeito visado pela conduta). O argumentador é
um agente que busca modificar ou reforçar o julgamento de um sujeito
argumentatário em relação a uma tese ou conclusão.
Ainda segundo Charolles (1980), toda conduta argumentativa tem lugar
em uma dada situação, engaja participantes, refere-se a um objeto ou campo
problemático, visa a um fim, que é a adesão de um argumentatário a uma tese,
e exige do argumentador meios ou instrumentos, que são os argumentos.
A superestrutura argumentativa exposta anteriormente é relevante para
este trabalho por servir de critério para a identificação das idéias principais do
texto que serviu para a elaboração do instrumento desta pesquisa e que forma
os critérios de avaliação dos referidos instrumentos. Contudo um
aprofundamento da proposta de Adam (1992) faz-se pertinente.
Heterogeneidade do Discurso
Uma vez que o recorte realizado nesta pesquisa objetiva destacar o
modelo de superestrutura argumentativa de Adam (1987), faz-se necessário
apresentar a proposta do autor quanto ao estudo do texto.
Embora o teórico refira-se aos problemas envolvendo os “tipos de
textos”, externiza que não considera coerente o uso de tal expressão. Afirma
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que cada texto é uma realidade muito heterogênea, daí a dificuldade de defini-
lo de maneira estrita. Em decorrência da heterogeneidade composicional dos
enunciados julga presunção falar de “tipologia textual”. Segundo o lingüista, é
mais adequado falar de diferentes “tipos de organização textual” e definir o
texto como uma estrutura composta de seqüências.
Em seus estudos, demonstra que as formas narrativas podem ser tão
variadas quanto as argumentativas. Também demonstra, em suas análises,
que quase não existe descrição pura e autônoma. Na verdade, freqüentemente
ela constitui um momento de um texto narrativo ou explicativo. Finalmente,
argumenta que “narrar” pode ser apenas um momento inicial da argumentação,
da explicação ou da conversação. Fechando o ciclo, mostra-nos que não existe
narração sem um mínimo de descrição.
Não obstante, Adam (1987) utiliza-se dos estudos de Baktine (1984)
sobre os Gêneros do Discurso para prevenir o leitor/escritor de que “o
enunciado, na sua singularidade, a despeito de sua individualidade e de sua
criatividade, não poderia ser considerado uma combinação absolutamente livre
das formas da língua”.
Logo, segundo o lingüista, a organização da nossa fala se dá da mesma
maneira como se organizam as formas gramaticais (sintáticas). Ou seja,
aprende-se a falar aprendendo-se a estruturar enunciados e não proposições e
palavras isoladas.
Adam (1987) afirma que a Lingüística Textual deve abandonar toda idéia
de tipologia de textos e aponta o fenômeno da heterogeneidade do discurso
(texto) como o responsável pela necessidade de se “teorizar”, estudar,
pesquisar tal fenômeno. Segundo ele, a Lingüística Textual deve apoiar-se
sobre as noções de inserção de seqüências e de dominante seqüencial.
Dessa forma, Adam (1987), ao contrário de muitos estudiosos, trata a
“sintaxe das grandes massas verbais”, não no nível do texto, mas no da
seqüência.
Planos de Organização da Textualidade
Adam (1987) define o texto como produto do reconhecimento da
textualização, que encontra-se sob a dependência de duas representações
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complementares, as relativas à dimensão seqüencial (envolvendo a categoria
textual) e as relativas à dimensão configuracional (ou sentido-em-situação,
relativa à situação de interlocução-interação).
As duas dimensões são inseparáveis na prática: as inferências
sustentam-se tanto sobre a dimensão configuracional (pragmático-semântica)
como sobre a dimensão seqüencial (textual), mas podem ser distinguidas num
nível teórico e descritivo.
Esquematicamente, tais dimensões são ilustradas no Quadro 4.
O autor afirma que a competência lingüística dos sujeitos é regulada por
um feixe de restrições: discursivas, textuais e locais.
a. Restrições discursivas (as dos gêneros): ligadas a práticas
discursivas historicamente e socialmente determinadas.
b. Restrições textuais: ligadas à heterogeneidade da
composição.
c. Restrições locais de uma dada língua, nos planos fônico e
(orto) gráfico, lexical, gramatical, semântico-lógico.
Adam (1987) acredita que os planos de organização da textualidade são
responsáveis pelo caráter heterogêneo de um objeto irredutível a um único tipo
de organização, complexo e, ao mesmo tempo, coerente.
É importante deixar claro que o objetivo desta pesquisa não é o de
avaliar a proposta de Adam (1992) quanto a sua estrutura ou aplicabilidade. Na
verdade, opta-se pelo seu modelo de superestrutura argumentativa devido a
sua abrangência e flexibilidade. Também porque tal superestrutura parece ser
a mais adequada à organização e desenvolvimento da maior parte dos textos
argumentativos que circulam pelos bancos acadêmicos.
Portanto, não se está desprezando a Dimensão Configuracional de
Adam (1992) para a compreensão do texto, apenas far-se-á um “recorte”
valorizando o aspecto das restrições textuais (item b), buscando avaliar se de
fato influenciam na competência lingüística do leitor.
Até porque o próprio Adam (1992) (...) vê o efeito de texto como o resultado da passagem da seqüência à configuração, ou seja da linearidade do enunciado à “figura” (Ricoeur); da seqüência textual como seqüência linear de unidades lingüísticas (conexidade) à reconstrução (cognitiva) desta seqüência como um todo significante coesivo (coesão e Progressão) (p.58).
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Ou seja, primeiro o leitor trabalharia com a Dimensão Textual e só
depois com a Configuracional. Adam (1992) aponta a complexidade e a
heterogeneidade como responsáveis pela não pertinência das tipologias
textuais englobantes. Segundo o autor, é justamente o impacto do
Configuracional (Pragmático) sobre o Seqüencial que provoca o fenômeno da
heterogeneidade.
Adam (1992) acredita que
(...) se regularidades são observáveis - esta é, pelo menos, minha hipótese no plano seqüencial - a dimensão configuracional da textualidade é o lugar da originalidade e da especificidade do funcionamento do texto (como objeto semiológico produzido com fins de obter interação).(p.58)
Portanto, nossa ênfase recai sobre as regularidades propostas pelo
autor no plano seqüencial.
Seqüência: Unidade Constituinte e Constituída
Adam (1987) fala na seqüência como uma unidade constituída e uma
unidade constituinte.
Como unidade constituinte, a seqüência é um componente de T (texto);
como unidade constituída, a seqüência é composta de proposições
(macroproposições diferentes) segundo os tipos de seqüencialidades e
compostas elas mesmas de N microproposições. Nesse sentido Adam (1987)
retoma o que é apresentado por Kinstsch e Van Dijk (1978) e exemplificado
neste trabalho anteriormente.
Em seu livro “Les textes: types et prototypes” (1992), Adam orienta o
leitor que considere apenas cinco tipos de estruturas seqüenciais de base:
narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa e dialogal.
A Superestrutura Argumentativa
Adam (1987) inicia sua referência ao texto argumentativo com uma
citação retirada das “Escalas argumentativas” de Ducrot (1973):
3 3
3 3
Um grande número de textos literários, sobretudo nos séculos XVII e XVIII, se apresentam como raciocínios. Seu objeto é tanto o de demonstrar como o de refutar uma tese. Para isso, eles partem de premissas, não sempre explícitas, a1iás reconhecidas como incontestáveis, e eles tentam mostrar que não se poderia admitir essas premissas sem admitir também tal ou qual conclusão - a conclusão sendo tanto a tese a demonstrar como a negação da tese de seus adversários, ou ainda a negação de certos argumentos de seus adversários. E, para passar das premissas às conclusões, eles utilizam diversos procedimentos argumentativos, dos quais pensam que nenhum homem sensato pode recusar-se a cumprir (DUCROT, 1973, p.81).
Adam (1987) interpreta tais palavras como sendo representantes da
superestrutura dos textos argumentativos, conforme Quadro 4:
Tese Anterior
PREMISSAS
ARGUMENTOS
CONCLUSÃO
Nova Tese
É importante observar que essa ordem não
é fixa: a nova tese pode ser apresentada
logo de início e a tese anterior, as
premissas e até mesmo a conclusão
podem ser subentendidas. (p.69)
Quadro 4 - Representação da superestrutura dos textos argumentativos – Adam (1987)
É, no entanto, em Adam (1992) que encontramos o conceito de discurso
argumentativo que serve de critério na escolha do texto a ser utilizado nesta
pesquisa:
Um discurso argumentativo visa a intervir sobre as opiniões, atitudes
ou comportamentos de um interlocutor ou de um auditório, tornando
crível ou aceitável um enunciado (conclusão) apoiado, segundo
modalidades diversas, sobre um outro (argumento/dado/razão). Por
definição, o dado-argumento visa a sustentar ou a refutar uma
proposição (p.104).
O esquema da seqüência argumentativa prototípica apresentada por
Adam (1992, p.118) encontra-se no Quadro 5:
3 4
3 4
Quadro 5 - Representação da seqüência Argumentativa prototípica - Adam (1992)
Contudo, faz-se pertinente apresentar, também, a primeira
superestrutura proposta por Adam (1987). Isso porque, embora possam
parecer iguais, a versão apresentada abaixo tem um caráter mais geral pelo
fato de não apresentar explicitamente a refutação da tese inicial, o que nem
sempre ocorre nos textos argumentativos.
Superestrutura Argumentativa
P.arg.1 P.arg.2 P.arg.3 P.arg.4 P.arg.5 Tese
anterior
Premissas Cadeia de
argumentos
Conclusão Nova tese
(Arg.1 + Arg.2 + ...)
Quadro 6 - Representação arbórea da superestrutura argumentativa - Adam (1987)
Conforme Adam (1992), o esquema mostrado no Quadro 5 parte de três
macroproposições (P.arg.1, P.arg.2 e P.arg.3) e toma explicitamente apoio
sobre a P.arg.0 (tese anterior) no caso de refutação. Já no esquema do Quadro
6, isso não ocorre. O autor alerta para o fato de que a ordem linear do
esquema argumentativo não é imutável: a nova tese pode ser formulada no
início e retomada ou não por uma conclusão que a reproduz no fim da
seqüência, e a tese anterior (P.arg.0) pode estar subentendida.
No presente trabalho, considera-se a identificação, a síntese e a
organização formal e linear das proposições apresentadas no instrumento de
pesquisa por parte dos sujeitos como indícios de seu conhecimento da
superestrutura argumentativa. Inclusive os esquemas formais servem para
Seqüência Argumentativa
Tese Anterior + Dados - Sustentação das Inferências - então - CONCLUSÃO
(premissas) (arg.1, arg.2...) Provavelmente Nova tese
P.arg.0 P.arg.1 P.arg.2 P.arg.4 A menos que P.arg.3
RESTRIÇÃO
3 5
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testagem de tal conhecimento, conforme é discriminado na metodologia para
análise.
PROPOSTA PARA UMA ANÁLISE DA COMPREENSÃO LEITORA
A exposição dos referenciais teóricos que norteiam a proposta de
análise da compreensão leitora são apresentados ao longo deste trabalho.
Esses referenciais determinam o eixo básico de análise desenvolvida.
Em Goodman (1976, 1991) encontra-se a importância de reconstrução
do sentido do texto pelo leitor, o que é avaliado através do Teste de
Compreensão Leitora “cloze” (TCL) (o qual mostra-se ser capaz de confirmar a
“visão transacional” da leitura proposta por este autor).
No mesmo sentido, através do TCL,procura-se constatar a capacidade
dos sujeitos desta pesquisa em “ler nas entrelinhas”, conforme as palavras de
Scott (1993).
Quanto às macrorregras de Kintsch e Van Dijk (1978), elas servem de
explicação para os processos envolvidos no preenchimento correto de lacunas
quando o mesmo dá sentido ao discurso.
PROPOSTA PARA UMA ANÁLISE DO CONHECIMENTO DA SUPERESTRUTURA ARGUMENTATIVA
Também a fundamentação desta proposta é apresentada com noções
gerais ao longo do trabalho.
Smith (1983) sustenta a idéia de que através da observação de textos
específicos, seus estilos e procedimentos, aprende-se a compreendê-los.
Portanto, investiga-se se o conhecimento da superestrutura argumentativa
correlaciona-se com os índices da compreensão leitora dos sujeitos.
Neis (1982), ao tratar da competência de leitura restrita1, nos indica os
dados textuais e extratextuais importantes na identificação dos tipos de textos e
suas estruturas.
3 6
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Kintsch e Van Dijk (1978),de uma forma minuciosa, procuram dar conta
da apreensão do sentido global do discurso, o que, de certo modo, se inter-
relaciona com a proposta de superestrutura argumentativa de Adam (1987,
1992). Ou seja, ao propor determinadas macrorregras para derivar a
macroestrutura do texto, Kintsch e Van Dijk (1978), assim como Adam (1987),
procuram sintetizar, resumir as informações principais do discurso.
Partindo das concepções sobre a influência do conhecimento prévio do
leitor na compreensão leitora e identificação da estrutura textual Kleiman
(1993), Goodman (1991), Smith (1983), Neis (1982), Scott (1993) e Poersch
(2003) concordam que as macrorregras não são empregadas pelos
interpretantes de forma regular. Isso porque, conforme é mencionado neste
trabalho, a seleção das informações importantes depende tanto dos saberes
enciclopédicos de cada um, como das situações e de sua aplicação entre
outros fatores.
Sendo assim, para superar essa irregularidade, utiliza-se a tipologia
proposta por Adam (1987) através do seu modelo de superestrutura
argumentativa: identificação da tese inicial, das premissas, cadeias de
argumentos, conclusão e tese final.
Nossa meta é avaliar se o leitor apreende as macroproposições (idéias
principais) de cada seqüência argumentativa, se identifica as proposições que
apresentam os dados sobre a tese defendida, se consegue distinguir as
premissas, os argumentos e a nova tese do texto.
Adota-se, inclusive, a mesma estrutura arbórea para a organização e
apreensão do sentido geral do texto proposto por Adam (1987, 1992) para
avaliar o conhecimento da superestrutura argumentativa dos sujeitos, o que é
detalhado nos procedimentos metodológicos.
Análise Pré-Pedagógica de texto
Com base nas exposições teóricas que constituem os capítulos
anteriores desta dissertação, propõe-se a análise de um texto argumentativo.
A fundamentação da proposta está nos postulados da Lingüística
Textual, sintetizados nos Planos de Organização da Textualidade formulados
por Adam (1987). O autor concebe a textualização como um fato dependente
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de dupla representação: a da Dimensão Configuracional e a da Seqüencial.
Sabe-se que ambas são inseparáveis, mas, na presente tarefa de análise,
procura-se, o quanto possível, torná-las distintas, descrevendo a Dimensão
Seqüencial com suas unidades lingüísticas, sem, contudo, ignorar totalmente a
situação de interlocução, tão necessária para desvelar o sentido textual.
Assim sendo, estuda-se o nível de representação dos planos de textos,
também chamados de superestruturas. Apresenta-se, num primeiro momento,
as etapas da análise realizada, para depois explicar e justificar cada uma delas.
Etapas da Análise
1) Seleção do “corpus”.
2) Análise da organização argumentativa do texto, com o objetivo
de fazer as divisões das seqüências argumentativas: tese anterior, premissas
(dados), cadeia de argumentos (inferências, sustentação), refutação e
conclusão (nova tese).
3) Análise das seqüências de textos como unidades constituintes
e constituídas (Kinstsch e Van Dijk (1978) utilizam os termos macro e
microproposições).
4) Identificação, em função do plano de texto e da
superestrutura, do tipo de organização seqüencial de base.
5) Organização formal e linear das seqüências (ou proposições).
Seleção do “Corpus”
Para a montagem dos instrumentos que integram esta pesquisa, é
selecionado um texto opinativo, publicado no jornal porto-alegrense Zero Hora.
Evitando que o conteúdo influencie na apreensão da superestrutura do
texto, escolhe-se um tema conhecido e debatido há muito tempo nos bancos
escolares: a antiga polêmica da influência da televisão na educação das
crianças.
Em relação ao público leitor, leva-se em conta que textos opinativos são
lidos pelo público adulto, de nível de instrução médio ou superior, sendo que o
próprio tema faz parte do dia-a-dia desse tipo de leitor.
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Estabelecidos esses requisitos, seleciona-se o texto:
ZH Volume: 033 Edição: 11.248 Quarta:
05/06/96
Página: 19
Editoria: Segundo Caderno
A babá eletrônica
FERNANDO ERNESTO CORRÊA
Análise da Organização Argumentativa do Texto
Com vistas à análise realizada, divide-se o texto em cinco recortes
principais e dois recortes internos, procurando respeitar as etapas da
argumentação.
Isso posto, o primeiro parágrafo sofre um recorte que apresenta a
proposição a ser desenvolvida. Esta divide-se em duas partes: tese e
colocação do problema. A tese (inicial) apontada é a polêmica em relação à
idéia de que a televisão influencia na educação das crianças. O problema
refere-se à sociedade: essa idéia ainda parece não ter sido compreendida e
assimilada, cumprindo ao autor, portanto, esclarecê-la.
A partir do segundo parágrafo até o sétimo, segue-se o
desenvolvimento. Nele ocorre a apresentação das diferentes teses defendidas
pela sociedade (vide dissertação na íntegra).
OBJETIVOS DA PESQUISA OBJETIVO GERAL Avaliar em que medidas estão correlacionados o conhecimento da
superestrutura textual argumentativa e a compreensão leitora de universitários.
OBJETIVO ESPECÍFICO Verificar se há correlação significativa entre os escores de conhecimento da
superestrutura textual argumentativa e os escores de compreensão leitora de
universitários.
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HIPÓTESES E VARIÁVEIS HIPÓTESE GERAL O conhecimento da superestrutura argumentativa por estudantes do terceiro
grau está correlacionado com sua compreensão leitora.
HIPÓTESE ESPECÍFICA Há correlação significativa entre os escores de conhecimento da superestrutura
textual argumentativa e os escores de compreensão leitora na avaliação de
testes de universitários matriculados no primeiro semestre de estudos de uma
instituição superior privada.
VARIÁVEIS
Grau de compreensão de leitura mensurável através dos
escores do teste “cloze” (TCL).
Grau de conhecimento da superestrutura argumentativa
mensurável através de teste específico (TSEA).
METODOLOGIA TIPO DE PESQUISA
A pesquisa caracteriza-se como um estudo de correlação de variáveis -
o conhecimento da superestrutura textual argumentativa e a compreensão
leitora de textos argumentativos. Caracteriza-se, também, como um estudo de
campo, na medida em que os dados são obtidos através de um grupo de
sujeitos – alunos universitários.
POPULAÇÃO E AMOSTRAGEM A população da pesquisa abrange alunos do curso de Administração e
de Pedagogia de uma Instituição de Ensino Superior.
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A amostra é constituída por 51 alunos (26 mulheres e 28 homens) que
cursam a disciplina de Português Instrumental no primeiro semestre de
estudos.
Os critérios para a inclusão dos sujeitos no grupo são:
a) estar matriculado na disciplina de Português Instrumental,
b) ter ingressado na universidade no ano de 2003 (ser calouro),
c) ter disponibilidade para realizar os testes em horários extra-
classe.
Convém ressaltar que, para constituir o grupo de amostra, não são
levados em consideração idade, sexo ou nível de conhecimento sobre
esquemas argumentativos dos sujeitos. Isso porque o item da disponibilidade
de horário é o fator que determina a participação dos mesmos.
COLETA DE DADOS Descrição dos Instrumentos
A coleta de dados para a presente pesquisa é feita através dos
seguintes instrumentos organizados a partir do texto “A babá eletrônica”.
• Teste de Compreensão Leitora medido por meio do
procedimento Cloze- TCL1 e TCL2 . A aplicação desse procedimento consiste
na omissão, através de intervalos, da oitava palavra do texto. Ainda, atendendo
à sugestão de uma especialista na área da argumentação, na elaboração do
instrumento para aplicação definitiva (TCL2) evita-se o apagamento de
determinadas classes gramaticais consideradas de difícil recolocação idêntica:
verbos, adjetivos e advérbios, sendo que o primeiro e os últimos parágrafos
são preservados integralmente.
• Teste de Conhecimento da Superestrutura Argumentativa
(TSEA5).É pertinente registrar que o TSEA5 decorre de inúmeras
reelaborações (TSEA1, TSEA2, TSEA3 e TSEA4) devido à preocupação da
pesquisadora em construir um instrumento que corresponda ao referencial
teórico apresentado, tornando esta tarefa, sem dúvida, no maior desafio para a
presente pesquisa.
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APLICAÇÃO PILOTO DOS INSTRUMENTOS
São realizadas duas aplicações pilotos dos instrumentos.
A primeira é composta por um grupo de vinte alunos (11 mulheres
e 9 homens) dos cursos de Pedagogia e Administração. Os testes de
Compreensão Leitora (TCL1) e de Conhecimento da Superestrutura
Argumentativa (TSEA2) são aplicados individualmente, pela pesquisadora, no
dia 13 de maio de 2003. Os universitários dispõem de quatro horas aulas
(cerca de três horas e meia) para a realização dos dois testes. Primeiramente
resolvem o TCL1 e depois o TSEA2 .
A segunda aplicação é realizada em duas etapas. A primeira no
dia 21 de maio de 2003 e a segunda no dia 28 de maio de 2003. A amostra é
composta por um grupo de dez alunos (6 mulheres e 4 homens) dos cursos de
Pedagogia e Administração.
Os resultados dos mesmos podem ser verificados na dissertação
completa.
APLICAÇÃO DEFINITIVA DOS INSTRUMENTOS Descrição da Aplicação
Esta aplicação, ao contrário das anteriores, é realizada em uma
única etapa no dia 11 de setembro de 2003. A amostra é composta por um
grupo de vinte e um alunos (09 mulheres e 12 homens) dos cursos de
Pedagogia e Administração.
Os testes de Compreensão Leitora (TCL2) e de Conhecimento da
Superestrutura Argumentativa (TSEA5), com algumas alterações para corrigir
os equívocos percebidos após as aplicações-piloto, são aplicados pela própria
pesquisadora no dia 11 de setembro de 2003. Os universitários realizam os
dois testes: primeiro o TCL2 e depois o TSEA5 dentro do período de aula
(aproximadamente três horas e meia).
Resultados e Tratamento Estatístico
Para levantamento dos dados do teste Cloze são numeradas
todas as lacunas do teste. O número de lacunas é de 55 (cinqüenta e cinco).
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Realizada a identificação e a classificação das lacunas, faz-se o
levantamento dos dados, registrando-os em quadros, um para cada item
lacunado. Tal quadro apresenta as seguintes características: identificação do
teste e do número da lacuna com a respectiva palavra do texto que deveria
preenchê-la; listagem dos sujeitos; registro da palavra com que cada um
preencheu a lacuna; classificação da resposta em “exata”, “adequada” ou
“inadequada” e indicação da aceitação ou não dessa resposta. Foram aceitas
as palavras que correspondiam exatamente à palavra constante no texto –
resposta “exata”, sem considerar erros de acentuação ou concordância de
gênero. Esse critério se deve ao fato de a pesquisa estar direcionada para a
simples constatação da existência ou não de correlação entre os testes TCL2 e
TSEA5.
Mediante uma análise dos dados obtidos, pode-se constatar que
mais de 50% dos alunos atinge um desempenho satisfatório no teste Cloze.
As respostas do Teste TSEA5 são corrigidas com base no critério
“certo ou errado”. Como explicitado anteriormente, a intenção do teste é avaliar
se o aluno consegue distinguir as partes constitutivas da superestrutura
argumentativa. Logo, são consideradas corretas as respostas que apresentam
categorias e frases resumitivas correspondentes, mesmo que ocorra alguma
inversão na ordem das macroproposições .
Embora a análise dos escores deste teste também apontem para
a constatação de que mais de 50% dos alunos atingem um bom resultado na
avaliação, é possível perceber uma grande dificuldade por parte dos mesmos
em realizá-lo. A apreensão e dificuldade em organizar as macroestruturas é
visível durante a sua resolução.
Os dados finais apurados e apresentados são submetidos ao
cálculo de correlação, com base na fórmula de Pearson e permitem apurar r=
0,78725 e p= 0,000. Isto permite afirmar que:
I) a correlação encontrada é fortemente significativa, pois o p-
valor até 3 decimais é zero, o que significa que temos uma quase certeza da
existência da relação nos escores dos testes;
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4 3
II) r= + 0,787 a relação entre os escores do teste de
conhecimento da superestrutura textual argumentativa (TSEA5) e os escores
do teste de Compreensão Leitora (TCL2) é DIRETA. Isto significa que quando
os escores do teste de conhecimento da superestrutura textual argumentativa
(TSEA5) variam num sentido, os escores do teste de Compreensão Leitora
(TCL2), predominantemente, variam no mesmo sentido;
III) a classificação para o valor desta correlação é razoavelmente
forte;
IV) o coeficiente de determinação entre os escores do teste de
conhecimento da superestrutura textual argumentativa (TSEA5) e os escores
do teste de Compreensão Leitora (TCL1) é r2=0,787. Isto permite afirmar que
79% das variações dos Teste de Conhecimento da Superestrutura Textual
Argumentativa (TSEA5) são explicados pelas simultâneas variações dos
escores do teste de Compreensão Leitora (TCL1).
AVALIAÇÃO DAS HIPÓTESES
A hipótese de que “há correlação significativa entre os escores de
conhecimento da superestrutura textual argumentativa e os escores de
compreensão leitora na avaliação de testes de universitários no primeiro
semestre de estudos de uma instituição superior privada” é estimada com base
na comparação dos coeficientes de correlação entre os escores obtidos no
Teste Cloze (TCL2) e os escores obtidos no Teste de Conhecimento da
Superestrutura Argumentativa (TSEA5).
Com os dados apresentados nas tabelas é calculado o coeficiente
de correlação.
Os dados finais apurados e apresentados apontam para o índice
de correlação entre as variáveis (TCL1 e TSEA5) de r=0,787 e uma
significação estatística de 79%.Esse resultado confirma a hipótese de que
existe correlação entre as variáveis e que o resultado não pode ser
considerado simplesmente fruto do acaso.
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DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O presente estudo tem como objetivo principal confirmar a
hipótese de que o conhecimento da superestrutura textual argumentativa
influencia na compreensão em leitura. A existência dessa correlação nos leva a
considerar que o conhecimento estrutural do texto de fato influencia na
construção de significados pelo leitor.
Essa hipótese compreende um aspecto: o grau de compreensão
de leitura mensurável através dos escores do teste TCL1 e sua relação com o
grau de conhecimento da superestrutura argumentativa mensurável através
dos escores do TSEA5.
Uma das conclusões a que se pode chegar, a partir da
confirmação da hipótese, é que as características físicas do texto escrito,
realmente, atuam como “pistas” ao leitor durante as transações lingüísticas,
afirmação mencionada por Goodman (1991).
Também é possível relacionar a obtenção do índice significativo
de correlação com as afirmativas de Smith (1983) de que a observação de
textos específicos funciona como facilitador de sua compreensão. Logo, o
conhecimento da superestrutura argumentativa, nesta pesquisa seguindo o
modelo de Adam (1987), pode ser considerado um fator de influência na
compreensão leitora.
Considerando-se os resultados obtidos, é possível constatar que
a competência de leitura em sentido restrito, mencionada por Neis (1982),
envolve a capacidade de identificar não só o tema do texto através de dados
contextuais e extratextuais, mas também é facilitada pelo conhecimento e
percepção da macroestrutura textual, neste caso a argumentativa.
Os resultados da pesquisa destacam a importância do
conhecimento da superestrutura textual mencionada por Kintsch e Van Dijk
(1978) quando diferenciam os níveis de compreensão no processo da leitura.
Os autores, assim como Adam (1992), consideram as estruturas conceituais de
alto nível formas convencionadas para compreender e organizar as idéias
globais apresentadas no texto.
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4 5
Ainda deslocando a interpretação dos resultados para o âmbito da
aquisição de conhecimentos, e embora os testes realizados apresentem
algumas limitações, pode-se inferir que o conhecimento da superestrutura
argumentativa pode representar – numa visão conexionista (POERSCH, 2003)
– um dado de entrada capaz de provocar a ativação e recordação de estruturas
textuais anteriormente analisadas, auxiliando, assim, na organização das idéias
apresentadas e conseqüentemente servindo como um dado auxiliar na
compreensão do novo texto.
Procurando unir alguns pontos convergentes das referências
teóricas mencionadas, reafirmamos as palavras de Adam (1992) de que o leitor
pode valer-se do conhecimento da Dimensão Textual (referente a
superestrutura ou planos de textos) como “pista” para a forma de organização
das idéias apresentadas.
Embora o conhecimento da superestrutura textual argumentativa
não resulte necessariamente na apreensão exata das partes mencionadas por
Adam (1987): tese anterior, premissas, argumentos, conclusão e nova tese, os
resultados de correlação obtidos nos levam a afirmar que o desconhecimento
de uma estrutura textual básica pode dificultar a compreensão do material lido.
Desde logo é preciso reconhecer que os dados levantados
através da aplicação dos testes TCL2 e TSEA5, apesar de apresentarem um
índice significativo de correlação entre as variáveis, não caracterizam
definitivamente a relação entre o conhecimento da superestrutura textual
argumentativa e a compreensão leitora de sujeitos universitários. Certamente,
para proceder a um estudo mais rigoroso, necessário é operar com um grupo
maior de sujeitos e com um número maior de textos argumentativos. Ainda
assim, acredita-se ter alcançado algumas conclusões merecedoras de atenção.
Os índices de correlação obtidos nesta pesquisa, tomando-se por
base o texto trabalhado “A babá eletrônica”, tornam coerente a afirmação de
que o processo da compreensão leitora envolve fatores relativos ao
processamento da informação, fatores cognitivos e sociais.
Os fatores de processamento certamente destacam às idéias já
mencionadas de Goodman (1991) sobre a visão transacional da leitura. Ou
seja, o leitor, assim como o escritor, constrói o significado do texto através das
transações com o mesmo. Logo, a realidade representada, os esquemas do
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4 6
escritor, a sintaxe, o léxico e o contexto social e situacional modelam o
processo. Não obstante, quando o leitor conhece a superestrutura textual
argumentativa, conforme indicam os índices obtidos na pesquisa, essas
transações ocorrem de forma mais eficiente.
Outro fator fortemente influenciável na correlação obtida, é a
natureza cognitiva da leitura e do inter-relacionamento entre leitura,
pensamento e linguagem. Conforme visto em Poersch (2003), quando certos
conhecimentos lingüísticos são armazenados no cérebro, sofrem
processamentos. Assim, ao serem ativados por determinados estímulos (no
caso específico, um trabalho com texto dissertativo) fica disponível (em forma
da superestrutura) e é recuperável.
Finalmente o fator social pode ser reforçado com as afirmações
de Kleiman (1989) de que a comunicação em leitura leva o leitor a considerar
as condições em que o texto é produzido e as circunstâncias de sua
veiculação, a fim de compreendê-lo do modo mais próximo ao pretendido pelo
autor.
A partir dos resultados desta pesquisa, pode-se inferir a atuação
mútua do conhecimento estrutural de textos no processo de leitura. Em vista
disso, o trabalho integrado dessas duas tarefas da aula de língua,
possivelmente, produz resultados satisfatórios na ampliação da capacidade
leitora de indivíduos.
Mesmo que a confirmação da hipótese se restrinja a uma
pequena amostra, entende-se que os resultados justifiquem o desenvolvimento
deste trabalho. E, na medida em que pesquisas similares possam ser
desenvolvidas junto a alunos de diferentes níveis de escolaridade, poder-se-á
verificar se esta correlação se confirma, se ela cresce ou se diminui.
Diante disso, acredita-se que os instrumentos para medir a
compreensão leitora devem ser ampliados e melhor analisados. Somente com
novas pesquisas nesta área poder-se-á contribuir para o aperfeiçoamento e
tratamento didático-pedagógico dessa atividade tão necessária ao cidadão das
sociedades letradas: a leitura crítica e reflexiva de textos argumentativos.
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CONCLUSÃO
Pelas características deste estudo – que exige conclusões
parciais ao longo de seu desenvolvimento – esta retomada é sucinta tratando
de aspectos significativos dos resultados obtidos e avaliando a implicação dos
referenciais teóricos apresentados.
Smith (1983) e Goodman (1991) afirmam que a compreensão
leitora vai além do texto. Assim, envolve as limitações do cérebro (nesta
pesquisa descritas pelas configurações neuroniais mencionadas em Poersch
(2003)), à realidade que está sendo representada, aos esquemas do escritor, à
sintaxe, ao léxico e ao contexto social e situacional. Logo, segundo os teóricos
mencionados na pesquisa, ela ocorre na própria mente do leitor e através da
interação entre as informações textuais e seu conhecimento enciclopédico, sua
experiência de mundo. Sendo assim, procura-se esclarecer se o conhecimento
da superestrutura argumentativa influencia a compreensão em leitura.
Para isso, a Hipótese Geral levantada é a de que o conhecimento
da superestrutura argumentativa por estudantes do terceiro grau está
correlacionada com sua compreensão leitora.
A avaliação dessa hipótese é feita com base em duas variáveis: o
grau de compreensão de leitura mensurável através dos escores do teste cloze
(TCL2) e o grau de conhecimento da superestrutura argumentativa mensurável
através dos escores de teste específico (TSEA5). Através da comparação e
correlação dos escores obtidos busca-se um índice significativo entre as
variáveis para considerar o conhecimento da superestrutura textual
argumentativa um elemento influenciador da compreensão em leitura.
A análise dos dados coletados indica a existência dessa
correlação e os resultados obtidos nos levam a confirmar a hipótese
apresentada considerando que há uma correlação significativa entre os
escores de conhecimento da superestrutura argumentativa e os escores de
compreensão leitora na avaliação de testes de universitários matriculados no
primeiro semestre de estudos de uma instituição superior privada.
Como podemos verificar, a importância do conhecimento da
superestrutura textual argumentativa na compreensão leitora é considerada
aspecto importante neste estudo. Adam (1992) afirma que o reconhecimento
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da textualização encontra-se sob a dependência de duas representações
complementares: as relativas à dimensão seqüencial (envolvendo a categoria
textual) e as relativas à dimensão configuracional (ou sentido-em-situação,
relativa à situação de interlocução-interação).
Embora, na prática, as duas dimensões sejam inseparáveis
podem ser distinguidas num nível teórico e descritivo. Assim, é feito um
“recorte” valorizando o aspecto das restrições textuais, buscando avaliar se de
fato influenciam a compreensão leitora dos sujeitos.
Os resultados, conforme relatos anteriores, evidenciam uma
correlação significativa entre o conhecimento da superestrutura argumentativa
e a compreensão em leitura dos sujeitos sobre determinado assunto. Neste
sentido, a análise das seqüências de textos como unidades constituintes e
constituídas (Kinstsch e Van Dijk (1978), também denominadas macro e
microproposições, ajudam a compreender o processo de desvelamento do
sentido textual.
Através do teste de compreensão leitora, constata-se a
capacidade dos sujeitos em “ler nas entrelinhas”, conforme as palavras de
Scott (1993).
Finalmente, no que tange à construção de sentido relacionada
com a configuração neuronial e a compreensão leitora, acredita-se que a
afirmativa de Poersch (2003) de que “ler é compreender ; compreender é
recordar e aprender” torna válida a afirmativa de que o conhecimento prévio da
superestrutura argumentativa pelo leitor pode ser visto como um possível
reforço sináptico a ser ativado durante a leitura, provocando a recordação das
partes estruturais do texto e consequentemente facilitando a compreensão
leitora dos sujeitos.
Examinando o referencial teórico levantado para justificar a
escolha do tema e definir a metodologia a ser adotada na análise dos dados,
pode-se constatar que há fortes indicações para que a existência dessa
correlação se confirme. Tal constatação permite, inclusive, que se infira que
esta correlação, talvez, não exista apenas no grupo examinado, o que reforça
as sugestões de elaboração de novas pesquisas apresentadas na discussão
dos resultados.
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4 9
Face às constatações registradas acredita-se haver alcançado os
objetivos que norteiam o desenvolvimento da presente pesquisa. E embora
existam certas limitações, o presente estudo aponta para a importância da
abordagem integrada da leitura e de estratégias específicas para a apreensão
de sentidos do texto. Também demonstra que o estudo das superestruturas
textuais é um caminho promissor a ser explorado em nível didático-pedagógico,
quando o assunto é compreensão em leitura. Por fim, constitui-se em mais um
pequeno passo dado no aprofundamento das relações existentes entre
recepção do código escrito – sua forma estrutural - e a compreensão textual,
campo promissor para pesquisas mais detalhadas e mais aprofundadas.
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