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Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 1
Caderno de Teoria do Direito
Luiza Silva Rodrigues
(Aulas da Prof.ª Jeanine Nicolazzi Philippi - UFSC)
O que é de direito?
Como resolver problemas juridicamente, à luz da constituição pública.
O que é o Direito?
- O direito pode ser um agente de transformação social (resolver distorções sociais: educação, saúde, segurança); é algo que garante ao ser humano uma vida digna.
- Compreender o direito é compreender a nossa própria condição humana; é saber porque nós obedecemos, mandamos, nos indignamos e em função de alguns ideais conservamos certas estruturas.
- O direito oprime e retira a liberdade (todo aquele que atenta contra a liberdade de outro precisa sofrer uma pena de mesma intensidade)
- Estudar direito é, portanto, estudar limites e possibilidades da sociabilidade humana.
- O direito pode ser uma prática virtuosa, mas também pode ser usado de forma distorcida. Pode servir para privilegiar algumas poucas famílias (lucros abusivos, condutas que vão de encontro aos princípios do direito).
Direito: Origem e Significado
Definição Nominal: A palavra direito vem da palavra do baixo latim directum ou rectum, que quer dizer aquilo que é certo, aquilo que é correto.
- Jus vem do particípio do verbo jussum – associam a palavra a mandar, ordenar, subjugar (conceitos que podem ser associados ao direito).
- Jus vem do particípio passado do verbo justum – a palavra direito deriva daquilo que é justo, daquilo que está conforme com a justiça (YÓS: o que é bom, o que é santo).
Definição Real: A palavra direito é o nome de três realidades distintas: - Direito é norma (direito objetivo: conjunto de normas com as quais operamos) - Faculdade ou permissão (direito subjetivo: sujeito; é o direito que o sujeito tem de fazer valer o direito objetivo; a faculdade de agir) - Direito é uma qualidade e a qualidade do direito é a justiça.
O que é Justiça?
- Igualdade, no sentido de buscar que todos tenham os mesmos tratamentos, é o
conceito de justiça mais remoto da tradição Ocidental.
- Pode haver concessões dadas pela lei desde que estes que a recebem sirvam a todos
(justiça como algo objetivo e não meramente subjetivo). Como exemplo, temos os
médicos que possuem privilégios, mas ficam de plantão zelando pela saúde das
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pessoas; podemos citar também os militares que cuidam das fronteiras nacionais e,
em caso de guerra, garantem a continuidade da vida das outras pessoas – portanto é
justo que estes tenham privilégios.
Subjetivo: vem de sujeito; é o ponto de vista de um sujeito. Por exemplo, os nossos
gostos, opiniões pessoais, visões de mundo.
Objetivo: o que pode ser comum a todos.
- A vida, a liberdade, são bens que precisam ser preservados – assim como a dignidade.
- O direito fundamental é o direito à vida, porque a morte é certa (deixar que o ciclo
vital de cada um se cumpra). Mas o indivíduo pode escolher quando quer interromper
a vida.
Conceitos de Justiça
- Os gregos identificavam a justiça como igualdade (Ética a Nicômaco,
Aristóteles).
- Hobbes diz que justiça é sinônimo de segurança, a possibilidade de ter uma
vida boa.
- Kant associa justiça à liberdade
- A justiça é sempre um conceito objetivo e não é, necessariamente, sinônimo de
direito; é um ideal do direito (muitas vezes na prática o direito se distancia da justiça).
Teoria do Direito
Associada à possibilidade de fazer do direito uma ciência.
- Século XIX: a partida – acreditamos que o direito poderia ser uma ciência cujo objeto
seriam as normas jurídicas.
* Crítica feita pela filosofia do direito
* Todo o direito passou a ser positivo
* Revolução Francesa, Revolução Industrial – cada vez mais o direito passou a
ser de poucos (grandes massas marginalizadas).
- Direito: instrumento de libertação e/ou alienação social.
* Filosofia do direito: questionar as funções do direito (as distorções de
conduta), estabelecendo quais são os fundamentos do direito
- Não basta dominar a técnica jurídica; é preciso aprender a questionar este
instrumento com o qual lidamos. A filosofia busca aprimorar o pensamento crítico;
adotar uma postura crítica no mundo jurídico.
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O Direito e as Demais Normas Jurídicas
1) O que é Normalidade?
Normalidade Designa, sobretudo, a qualidade daquilo que está de acordo com
a regra. Normal também é a qualidade daquilo que incide sobre muitos; aquilo
que não é o excepcional (que está de acordo com a regra, com o costume); o
que está de acordo com a norma, o que é próprio de muitos.
Normalidade: estado normal ou procedimento normal. São modos de ser ou
atuar de acordo com os padrões estabelecidos e modelos consolidados.
1.1) No Mundo Ético:
O mundo ético é o mundo do comportamento humano. Nele, um
procedimento é dito normal quando está de acordo com o sistema de
concepções dominantes (certo, errado, proibido, permitido) – sistema
axiológico de referência: conjunto de valores dominantes de um
determinado tempo em um determinado local (as normas estão
acopladas a esses sistema). Então, no mundo ético as normas são
construções humanas (normas morais, jurídicas). No mundo ético a lei
prescreve aquilo que deve ser.
1.2) No Mundo Físico:
No mundo físico, o estado é tido normal quando acontece
necessariamente, isto é, se o procedimento não puder deixar de ser o
que é (lei da gravidade, por exemplo). O instinto humano não é
unânime como as leis naturais (não agimos por instinto; podemos
controlá-los). Cada pessoa tem suas particularidades para as quais não
há uma explicação racional padrão. No mundo físico, a lei descreve
uma regularidade ou um estado (todo ser vivo morre).
- Quando se diz que o homem não possui instinto, quer dizer que
ele é livre.
1.3) Anormal:
O anormal, portanto, é aquilo que não se conforma com a regra, que
não está de acordo com a norma, que colide com certas certezas
científicas. No entanto, quando trabalhamos com o mundo ético não
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pode ser considerado normalidades a anormalidades absolutas (podem
ser contextualmente, momentaneamente), por exemplo, o divórcio,
demonstrações de afeto entre casais em público. O normal e anormal
está relacionado a um sistema de convicções dominantes.
2) Normalidade e Anormalidade
Normalidade é o estado do corpo e da mente de uma célula ou de um
organismo, de um grupo social ou de um Estado em que os procedimentos não
contrariam as concepções dominantes sobre como as coisas devem ser ou
podem ser ou, ainda, como as coisas são, necessariamente (mundo físico).
Anormalidade é o nome dado ao procedimento que fere a normalidade. É o
procedimento incompatível com as concepções e convicções dominantes.
2.1) No Mundo Físico:
Essas anormalidades no mundo físico podem surgir em objetos feitos
pelo homem ou pela natureza em que essas deformidades não são
deliberadas pelos seres humanos. Para os pesquisadores a
anormalidade no mundo físico é apenas aparente; porque quando
entendemos aquele acontecimento, estabelecemos certa regularidade
(o poder dos alimentos no tratamento, no desenvolvimento de certas
doenças, por exemplo) e a partir daí aquilo passa a ser normal. Também
é considerada aparente as errôneas convicções da ciência (o que hoje é
verdade científica amanhã pode não ser mais – por exemplo as medidas
protecionistas adotadas por aqueles que pregaram um extremo
liberalismo).
2.2) No Mundo Ético:
Ao contrário do mundo físico as anormalidades no mundo ético não são
aparentes, não estão de acordo com o sistema de convicções
dominantes.
3) Norma e Ordenação Normativa
A norma é aquilo que estabelece um padrão, que dita um determinado
procedimento, que descreve uma regularidade. No mundo físico é aquilo que
descreve uma regularidade. Já no mundo ético o conceito é mais complexo:
normas são expressões mentais, juízos ou proposições de como procedimentos
ou comportamentos podem ou não podem ser, devem ou não devem ser.
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Como toda a norma é um princípio de normalidade, ela está incluída em um
sistema de convicções dominantes. Esse sistema, também chamado sistema
axiológico de referência, é o que podemos chamar de ordenação normativa.
- Ordenação Normativa: é o conjunto articulado de disposições para a
orientação do comportamento segundo o que é tido em uma comunidade
como bom e mau, conveniente e inconveniente, útil e prejudicial, belo e feio. É,
em síntese, o conjunto de valores que ordena o comportamento humano em
determinado tempo e lugar. No mundo físico não há ordenação normativa.
- As normas brotam das nossas relações e daquilo que nós acreditamos.
- Se nós não conseguimos alterar nossa forma de relação com o mundo, não há
ordenação normativa, por mais severa que seja, que possa resolver os problemas. Por
exemplo: não adianta pedir que aumente o tempo da pessoa na cadeia se não
mudarmos a forma de relacionamento.
- Exemplos de ordenação normativa:
10 mandamentos, códigos morais, constituições, legislações de estados,
regulamento dos jogos, preceitos da moda, preceitos de boas maneiras e boa
educação (etiqueta).
A etiqueta é uma pequena ética; por isso ela é própria a todo ser humano. Nos
portamos de forma adequada em respeito ao outro, em respeito a si mesmo.
Possibilidade de lapidação da pessoa, humanização.
Não há norma que não esteja relacionada à ordenação normativa!
Sistema Axiológico de Referência
Normas
Ordenação Normativa (conjunto de normas)
Norma
Constitucional
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4) Ser e Dever Ser
As normas do mundo ético são normas do dever ser: elas prescrevem
comportamentos considerados corretos. Todas as normas do mundo ético têm
um caráter imperativo, adquirem a natureza de um mandamento.
- Mandamento é uma ordem de fazer ou não fazer (assim como toda norma).
- Toda norma está ligada a um sistema axiológico de referência (axiologia é o
estudo dos valores). O mandamento é avulso.
No mundo físico as normas não são mandamentos, não prescrevem nada;
descrevem regularidades: são normas do ser
No mundo físico: se A é, B é (dada a causa, precipita o
fenômeno)
No mundo ético: se A é, B deve ser (não necessariamente
acontece)
Estrutura da norma jurídica: se A é, B deve ser; e não for B
deverá ser S (sanção). Por exemplo num contrato de compra e
venda: se eu paguei pela mercadoria, eu devo recebê-la; caso
não receba, aquele que não cumpriu estará sujeito a uma
sanção.
- Nem toda norma precisa ter sanção! Por exemplo: ‘Não pise na grama’ é uma norma.
- Os 10 mandamentos da Igreja Católica
Norma para os fiéis
Mandamento para os não católicos
- Aquilo que é mandamento hoje pode ser norma amanhã.
Toda norma repousa em três elementos interligados:
1º) O fato
2º) Sistema axiológico de referência (ponto de partida)
3º) Juízo
- Toda norma está associada a fatos reais que a fizeram surgir (por exemplo, a idéia de
manipulação genética)
- Juízo é um ato pelo qual nós afirmamos ou rejeitamos uma idéia a partir de outra;
emissão de uma opinião.
Toda norma é um mandamento; mas nem todo mandamento é uma norma.
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* A norma é um juízo: analisa um fato à luz do sistema axiológico de referência.
- Até o século XVIII essa discussão animou os debates jurídicos: a lei é arte ou
natureza?
5) Estrutura das Normas
6) Diferença entre Norma e Mandamento
7) Divisão dos Mandamentos
8) Natureza Condicional das Normas
9) Juízo ou Julgamento
Direito Natural
Quando nós falamos de direito natural, vamos pensar sempre num direito erga
omnes, um direito para todos. E, sendo para todos, o direito natural tem que ser
universal. Também é imutável: não varia no tempo nem no espaço.
Desde a Grécia Antiga, com os pré-socráticos (os filósofos da natureza) o direito
natural estava atrelado ao conceito de natureza – e à medida que este ia mudando o
direito também mudava.
Heráclito: o primeiro conceito de natureza
- Dizia que a justiça – a lei, portanto – está fundada num conceito de igualdade:
dizia que nós, seres humanos, somos habitantes do mesmo cosmos, mesmo universo.
- Nós também somos igualmente portadores do Logus, a razão, e é este que
nos conecta com o cosmos (mas nem todos fazem deste o mesmo uso; por isso as
desigualdades).
- Nomos, em grego, é a lei. E essa lei, necessariamente, é a igualdade (faríamos
da Terra o espelho do céu). A lei conecta o logus com o nomus.
Juízo
Fato
Sistema Axiológico de Referência
Norma
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Pensar a existência de uma cidade onde todos fossem iguais: a polis
grega democrática.
* Os iguais eram apenas os homens livres (tinham voz na
Assembléia)
* Com o passar do tempo e com a operação dessa polis
democrática ela passou a ser antagônica: certos interesses
prevaleciam sobre os demais (as leis favoreciam segmentos
específicos).
Sofistas: justificar as desigualdades da polis
- Diziam que é um equívoco pensar a natureza como o cosmos. Ela é esse
mundo físico (sensível: afeta e pode ser afetado pelos meus sentidos), o qual é o nosso
mundo comum.
- Se nós observarmos a natureza veremos que nela sobrevive o mais forte;
portanto, se é este o nosso mundo, essa é a lei.
- Defendiam, ainda, que as normas não meros artifícios dos débeis para retirar
o poder daqueles que são fortes.
- Os sofistas eram considerados como os advogados na Grécia; eles ensinavam
às pessoas a arte da retórica (a arte de seduzir pela fala, independentemente de seu
conteúdo) em troca de dinheiro.
- A lei inspirada nessa natureza não é mais igualdade.
Sócrates: se opunha aos sofistas
- Dizia que nós seres humanos não podemos ser comparados a outros seres
vivos. Não somos animais políticos (vivemos na polis, e não na selva) e, portanto, não
nos vale a lei da selva – porque na selva não sobreviveríamos.
- A nossa natureza é a psique, a alma (razão ou órgão de sentido)
- Para bem compreendermos alei, temos que conhecer quem é o homem.
Dependemos fundamentalmente do outro (seres comuns –
comunidade)
A lei como responsabilidade do homem
Lei: habilidade de resposta que o homem dá para os impasses da
vida em comum
Responsabilidade: habilidade para responder
- A lei, para Sócrates, tinha esse fundamento na justiça
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- Quando a natureza é humana, a lei tem o nome de responsabilidade
Platão: discípulo de Sócrates
- Extremamente antidemocrático: essa assembléia de ignorantes (que
condenou seu mestre) não pode ser a marca da lei
- Da idéia do bem nós viemos e para ela voltaremos (apenas após a morte)
- A vida humana é um processo contínuo de aperfeiçoamento (nunca
atingiremos a perfeição na Terra)
- Para Platão há dois mundos: o mundo inteligível (construído empensamento,
com imaginação) e o mundo sensível
- Se a natureza é a idéia do bem, a lei é pedagógica (aquela que deve mostrar
ao homem o caminho de sua perfeição)
- Repúblicas devem ser governadas por filósofos porque só eles conhecem a
idéia do bem e assim, seriam os mais aptos a formular as leis para guiar os homens.
Aristóteles: o primeiro que estabeleceu diferença entre direito natural e positivo
- Não concordava que a nossa essência é inteligível
Nem tudo é idéia; o grande motor do mundo é a physis (natureza) e ela
ditava a lei
- Parte da justiça é legal e parte é natural
- Temos que compreender os humanos a partir de suas ações indispensáveis e
indiferentes
Indispensáveis: aquelas que devem ser sempre as mesmas para a
manutenção da harmonia do mundo (por exemplo. Cultuar um Deus –
lei da natureza). JUSTIÇA NATURAL
Indiferentes: a forma com que os homens cultuam os deuses (lei da
assembléia, varia no tempo e no espaço). JUSTIÇA LEGAL
- Essa natureza determina para cada homem o seu lugar no mundo e esse lugar
é essencial à manutenção do movimento harmônico do mundo
- Por uma lei da natureza uns nascem para mandar (homens livres) e outros,
para obedecer (os escravos). Caso isso não ocorra, a engrenagem pára.
Os escravos são um direito natural e por isso ao podem ser revogados
na Assembléia.
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Império Romano:
- Não havia propriamente distinguida a questão do direito natal e do direito
positivo.
- Visava à expansão e manutenção do império tendo o direito como
instrumento
Direito Romano: do cidadão romano, propriamente dito
Direito Comum: estendido a todos os povos dominados (produzido
pelos romanos) – uns dizem que este é o germe do direito internacional;
outros, que é uma espécie de direito natural.
Idade Média:
- Caracterizada pelo pluralismo político e jurídico (pluralidade das sedes de
poder e das fontes do direito).
- O eixo do mundo é a Igreja (Deus); e a natureza, à época, foi a ele identificada
(natureza é Deus).
Direito Natural: aquilo que sai dos laboratórios da igreja, dos textos
sagrados (destaque a Santo Agostinho – A Cidade de Deus – e Tomás de
Aquino – Suma Teológica)
Santo Agostinho:
- Acompanha toda a derrocada do Império e acredita que ela se deu pela
adoção de deuses que não eram deuses (demônios) – não sabiam o caminho traçado
pelo pai
- A lei é a vontade de Deus escrita no coração dos homens e podemos conhecê-
la através da razão ou da revelação
- Trabalha a divisão do mundo com a metáfora das duas cidades: dos homens e
de Deus (cristianiza o pensamento de Platão, o príncipe dos filósofos).
- A lei do homem é iníqua e pode ser injusta, mas nem por isso podemos deixar
de obedecê-las.
- Todo o sofrimento é necessário: tudo o que o corpo padece purifica a alma –
encontro com o pai após a morte
- Cria a moral da dor (acética). Sua versão laica é a teoria do progresso.
- Somos sacrificados em nome dos privilégios do paraíso (para atingi-los)
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Tomás de Aquino: século XIII
- Não fez a leitura de Platão; cristianizou Aristóteles
- Retoma a dicotomia da justiça legal e natural restituindo o valor à lei do
homem
- Estabelece uma hierarquia da lei em quatro planos:
1) Lei Divina: só santos e anjos conhecem (inacessível)
2) Lei Natural: tradução para os homens da vontade de Deus (podemos
conhecê-la através da razão).
3) Lei Humana: finalidade de tentar aproximar para que a terra seja cada
vez mais próxima do céu. Tornar esse mundo bom e justo; adequar o
homem à natureza divina
4) Lei Religiosa (da Igreja): a igreja está sob a lei do Estado – e não ao
contrário. Restitui todo o valor da lei humana.
O Estado Moderno:
- O eixo do mundo muda na Idade Moderna: é o homem. Então vamos ter que
pensar numa lei feita por e para esses homens. Essa lei só pode ter por fundamento a
razão – racionalismo moderno.
- A natureza é sinônimo da ordem racional do universo
- O poder político é sinônimo de monopólio da força + monopólio da legislação.
E esse é o poder do Estado:
Uma lei para todos os habitantes de um mesmo território
Ao final do século XVIII, essa dicotomia perdeu sua razão de existir
- Todo o direito é construção do homem; todo direito é arte.
- Passamos a ver a história como aquilo que é feito pelo homem
- A natureza passa a ser entendida como uma ordem racional do universo (o
homem a explica através da razão)
- Como justificar o Estado e seu poder?
Na modernidade, a primeira corrente da filosofia foi o Contratualismo,
na qual se destacam Hobbes, Locke, Rousseau e Kant. Eles procuram
justificar o Estado e seu poder a partir de três elementos:
1) O Estado de natureza
2) O contrato
3) A sociedade civil ou Estado
- Para que possamos entender o que é uma sociedade de homens organizada
pela lei, temos que entender primeiro a natureza
- A compreensão da hipótese dos seres humanos onde não há lei e poder
comuns, do estado de natureza, no qual o homem está entregue a si mesmo. O estado
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de natureza não é um estado de guerra; mas que pode levar à guerra, justamente por
não existir uma lei comum.
- Como podemos continuar juntos em paz?
Através de um contrato. Contrato é uma relação que implica
reciprocidade de direitos e obrigações
Sociedade civil ou Estado é uma sociedade juridicamente organizada
(organizada pelo direito).
Texto 1: Hobbes
- Liberdade: é a capacidade de o homem agir de acordo com seu julgamento e sua
razão; é a ausência de determinação; não há nenhuma vontade divina, nem tanto uma
vontade natural, à qual estamos submetidos.
Determinação e liberdade são antônimos: se há determinação não há liberdade
Somos livres, portanto, porque somos indeterminados (o que não é bom, nem
mau)
- Razão: é apenas um instrumento do sujeito para que possa atingir seus objetivos.
Não é algo moral; é mero instrumento, do qual todos somos dotados.
Somos dotados de razão porque temos habilidade para cálculo da escolha dos
meios e dos fins.
- Igualdade: a terceira característica do homem. Somos iguais porque somos seres
igualmente livres e racionais.
- Como vivem esses homens livres e iguais?
O homem está no mundo procurando objetos satisfatórios aos seus desejos (ao
contrário das necessidades). Não há um objeto específico para saciá-lo.
Os desejos podem mudar e são diferentes para cada pessoa
Aquele que encontra no mundo tal objeto é um homem feliz
O homem é um ser que pode tudo: primeiro porque é livre; segundo porque tem
um instrumento para calcular os meios necessários para atingir seus fins.
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Mas como o desejo não tem um objeto fixo, toda vez que encontra um
objeto satisfatório, o desejo é estimulado (a partir de uma conquista, o
desejo se relança)
Quem consegue conservar consigo esses objetos, tem poder
O desejo é o motor do homem; são bons encontros que a vida nos proporciona.
Uma pessoa emocionalmente saudável é aquela que ama e trabalha
- Nunca alguém encontra a felicidade porque ela não é um estado, é um movimento.
Se conseguir manter viva essa capacidade desejante, está bem no mundo; uma
abertura de espírito.
- E uma vez que os desejos e objetos satisfatórios são distintos entre as pessoas, um
conceito de felicidade universal só pode ser totalitário.
- Contudo, esse estado de natureza não é tão simples, porque, como não há lei ditando
os limites para a busca de seu objeto satisfatório, eu posso matar, escravizar o outro. E
quando duas pessoas disputam o mesmo objeto, pode haver uma GUERRA.
A condição de guerra, para Hobbes, é a pior condição do ser humano; além
disso, pode se transformar numa guerra de todos contra todos.
Temos possibilidade de escolhas (de um outro modo de vida) e
percepção (da miséria dessa condição).
- É possível resolver a guerra através de um CONTRATO, um acordo de vontades, onde
cada um enuncia ao seu direito sobre todas as coisas para que cada um tenha direito
às suas coisas (deve ser comum a todos para que ninguém corra risco de
expropriação).
É um pacto de não armação onde, ao renunciar ao direito, constitui-se um
poder soberano que estabelecerá o meu direito sobre as minhas coisas
Esse poder será dotado do monopólio da força e estabelecerá para
todos, de forma igual, a lei – de todos que são racionais.
- O direito fundamental em Hobbes é a vida: queremos preservá-la de uma morte
violenta, em primeiro lugar.
Além disso, o Estado também deve garantir uma sociabilidade segura
Segurança é uma vida boa (fundamento racional para explicar nossa
obediência às leis e ao Estado).
- Contrato: relação que implica reciprocidade de direitos e deveres
Os súditos têm dever de obediência incondicional ao soberano, cujo dever é
preservar os direitos dos súditos: preservar a vida de uma morte violenta e
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garantir uma sociabilidade segura, uma vida boa. Ou seja, nós não obedecemos
simplesmente pelo gosto da servidão.
- O poder soberano é absoluto! Surge esse Estado com monopólio da força e da
legislação ao qual devemos obediência.
- O estado não promete a felicidade; apenas fornece condições para buscá-la.
- A liberdade só pode ser exercida sob a lei.
- Hobbes diz que são três as causas da discórdia entre os homens:
1) A competição (leva à desconfiança)
2) A desconfiança (necessária para a proteção do homem; no entanto, quando ela
se generaliza, nenhum laço mais é possível)
3) A glória (sempre buscamos que o outro reconheça nossa reputação)
- Tais aspectos levaram os homens à GUERRA e esta se transforma numa guerra de
todos contra todos. A guerra é o tempo mais miserável para a vida humana; nela não
há faculdade para a mente inventiva porque estaremos estritamente preocupados
com a nossa sobrevivência.
O homem torna-se solitário, pobre (tanto no âmbito material quanto no
espiritual), embrutecido e a vida se torna curta.
- Mas, da mesma forma que temos paixões que nos levam à guerra, temos as paixões
que nos levam à paz:
1) O temor de uma morte violenta
2) Desejo pelas coisas que dão conforto ao ser humano e a esperança de obtê-las
através do trabalho
- O Estado, então, é prevenção e não apenas repressão.
- O direito é uma forma de manter os homens em paz, sem ameaças
- A razão, para Hobbes, também nos sugere adequadas normas de paz que podem ser
alcançadas por um contrato mútuo.
As normas da paz se igualam às leis da natureza.
Leis da natureza são normas da paz (lex naturalles) sugeridas pela razão
e realizadas através de um contrato; é uma regra geral da razão que
proíbe o ser humano a destruir a sua vida ou privá-la dos meios
necessários à sua preservação.
- Se nós temos tais leis, não podemos confundi-las com o direito da natureza (são
diferentes)
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Direito da natureza é a liberdade total de cada ser humano para utilizar sua
razão como quiser no sentido de garantir a sobrevivência e a vida boa.
- Hobbes diz que, a despeito da confusão entre direito e leis, nós não podemos
confundi-los:
O direito é a faculdade de agir ou omitir e a lei é a obrigação de agir ou omitir.
O direito natural é a liberdade (por seu faculdade).
- Se nós podemos definir um direito também (o da natureza é o direito que cada um
tem sobre todas as coisas sem estabelecer propriedades), então não pode haver
segurança, uma vez que o homem não pode se defender de todos ao mesmo tempo
no estado de natureza.
- A natureza nos sugere leis fundamentais para escapar à guerra:
1) Procurar a paz e segui-la (dela deriva a segunda lei)
2) A paz deve ser alcançada através do acordo mútuo (contrato) entre os homens
– a partir dele renunciamos nosso direito sobre todas as coisas com a condição
de que todos também o façam.
Assim podemos ter o direito sobre as nossas coisas (estabelece-se o que
é meu e o que é teu).
- Renunciar ao direito, para Hobbes, significa privar-se da liberdade de negar a outro
homem o benefício de seu próprio direito à mesma coisa.
Quando um homem renuncia ao direito ele age levando em consideração o
direito que lhe foi concedido.
No entanto, há um conjunto de direito que não podem ser renunciados e
transferidos: o direito de defender nossa vida, nossa integridade física e nossa
liberdade.
- Quando falamos sobre transferência mutua dos direitos estamos falando em contrato
Transferência: tudo isso será transferido, após o contrato, ao soberano (com a
esperança de receber benefícios – reciprocidade)
- Fazer um pacto é um ato de vontade, de deliberação.
- No contrato, renúncia e transferência são tidos como sinônimos.
3) Nós devemos respeitar os contratos (caso isso não aconteça, voltamos à
condição de guerra – à mais profunda condição de injustiça).
- A justiça é o cumprimento dos pactos. E tudo que não é justo é injusto.
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A definição comum de justiça é ‘dar a cada um o que é seu’; mas enquanto não
existe um poder e uma lei que defina propriedades, não pode haver justiça.
Portanto, é um conceito equivocado.
Onde não há estado, não há propriedade; sem propriedade, não há justiça.
Há necessidade de um poder civil para obrigar o cumprimento dos pactos.
- O Estado é aquele que institui e garante a propriedade privada; no entanto, sua
função primordial é garantir a vida (e uma vida boa).
- Hobbes estabelece a divisão da justiça:
Comutativa: é aquela própria dos pactos; aquela que implica a renúncia
recíproca do direito sobre todas as coisas.
Distributiva: é aquela que surge depois do contrato e estabelece, a partir das
leis do soberano, o que é meu e o que é teu; aquela que vem de um árbitro, de
alguém que estabelece o que é justo (o soberano – ele legisla, executa e julga).
Eqüidade seria o nome mais adequado para esta justiça.
- Hobbes estabelece mais 14 leis da natureza (17 ao todo) e todas elas podem ser
resumidas nesta frase:
- Essas leis da natureza têm uma definição imprópria porque não são leis; são apenas
mandamentos da razão.
Eu me obrigo porque assim a minha consciência determina (assim agimos de
forma certa – LEI INTERNA) – não é só pela sanção que obedecemos.
Se nós não nos acostumamos com essa obrigação, não há lei que valha
- Por que Hobbes diz que essa lei da natureza é um mandamento moral?
A lei, propriamente dita
FALTA PÁGINA 118
- Quem tem o poder de mandar sobre os demais? O soberano.
“Faz aos outros o que gostarias que te fizessem”
A lei do estado me obriga em FÓRUM EXTERNO
A lei moral me obriga em CONSCIÊNCIA, o que é de fundamental importância: a nossa vida é
viável, entre outras coisas, porque temos a internalização da lei.
Caráter pedagógico e função civilizadora da lei
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O soberano é alguém que pode se expressar através de uma pessoa ou
assembléia
- Pessoa é o ser cujas palavras e ações são consideradas como suas próprias. Essa é a
pessoa natural para Hobbes. Mas há a pessoa fictícia, artificial: é aquela que
representa as palavras e/ou ações de um outro homem ou de uma multidão.
A pessoa natural é o autor de seus atos, de suas palavras; a pessoa artificial é o
ator, aquele que representa as palavras e ações de outros.
Nós, os súditos, somos os verdadeiros autores do poder do soberano; este, por
sua vez, é o ator (só representa)
- O poder soberano é o poder de todos porque nós somos os autores desse poder –
idealmente.
O governo é o reflexo do povo, da sociedade
- Hobbes pergunta: o pacto obriga o autor ou o ator?
O autor (nós nos obrigamos)
Todavia, nem todos são autores. Esse ser cujas palavras e ações são
consideradas próprias é um ser responsável; uma pessoa capaz. Aqueles que
não fazem uso da razão não podem ser considerados pessoas e não podem ser
autores do pacto (são coisas)
Ao escravo se estende o status de coisa (mas no tempo do contrato não há
escravidão – escravidão e contrato são antônimos)
- Quando uma multidão se converte em uma só pessoa?
Quando ela passa a ser representada no poder do soberano (concede a
unidade de todos)
Essa união de indivíduos sob o mesmo poder e a mesma lei representa a voz da
maioria.
- Por que a submissão consentida?
Eles dão essa autorização porque têm preocupação com a preservação das suas
vidas e porque querem uma vida feliz (não queremos sobreviver apenas como
um animal biológico)
Essa preservação consiste na gestão das nossas necessidades (plano de
satisfação das nossas necessidades sem a qual colocamos em risco a nossa
própria sobrevivência)
Mas nós não somos animais que vivem apenas em função de suas
necessidades; somos os únicos capazes de criar o nosso mundo
Isso não é política; é economia
Quando se fala em formas de vida é plano político
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 18
Quando o mundo é voltado para a economia, perdemos a
capacidade de questionar sobre nossa forma de vida (política)
- Sem a espada os pactos não oferecem a menor garantia a ninguém
- O temor de uma morte violenta nos leva ao pacto
- Por que os homens necessitam dos pactos e depois da espada para viverem juntos?
Por que não vivem em harmonia como os outros animais?
A humanidade não se reúne da mesma forma que as outras criaturas vivas
A sociabilidade do homem não é normal
O homem não tem uma lei natural que impõe as regras para a sociabilidade
- Por quê?
1) Os homens se envolvem em competições pela honra e dignidade
2) Porque os demais animais não fazem distinção entre bem comum e individual
3) Porque essas criaturas, ao contrário dos homens, não fazem uso da razão (não
percebem nem julgam os outros) – os homens sempre se julgam mais sábios
que os outros.
4) Essas criaturas (os demais animais) não possuem o dom da palavra
5) Basta que essas criaturas se sintam satisfeitas para que não se sintam
ofendidas com seus semelhantes. Já o homem, quanto mais satisfeito ele se
sente, mais tentado ele fica a exibir sua sabedoria e controlar os demais
6) Enquanto o acordo vigente entre essas criaturas é natural, os homens
conseguem isso apenas artificialmente (através do pacto)
Por isso nós precisamos de algo além das palavras para garantir seu
cumprimento: a espada
- Por isso, o único caminho que leva o homem a instituir um poder comum é conferir
toda a força a uma Assembléia ou a um homem (uma só vontade capaz de defender
todas as injúrias que possam lhe acontecer)
Esse caminho só pode ser trilhado a partir do consentimento
- O pacto, por ser artificial, é deliberado de vontade (ele não se põe pela força, mas é
cumprido por ela)
- Assim forma-se o Estado: a multidão reunida em uma só pessoa
- Geramos, assim, um grande monstro, um super poder; o maior de todos (pode,
inclusive, engolir um homem, mas é a única forma de salvá-lo).
Este poder pode ser adquirido por uma força natural ou através de um acordo
entre os homens
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 19
- Os súditos não podem, contudo, destituí-lo (o poder do soberano) porque isso levaria
ao rompimento do pacto e à pior de todas as injustiças
Também não podem rejeitar o soberano e nem, tampouco, puni-lo (porque
sendo cada súdito autor dos atos do soberano, quando o súdito o pune, ele
está punindo a si mesmo)
- Esse super poder não detém apenas toda a força; detém também um monopólio da
elaboração das regras para todos.
Hobbes chama a essas regras do comportamento humano regras da
propriedade (são confeccionadas pelo soberano)
Essas regras de propriedade também são descritas como aquelas que
distinguem o bem e o mal, o legítimo e o ilegítimo. São, portanto, todas
as leis civis do Estado.
Propriedade, aquilo que é próprio, também é o seu direito sobre aquilo
que é seu.
- A autoridade atribuída ao soberano é indivisível e, sob esse poder absoluto, a
condição de súdito é miserável. FALSO
A afirmação não procede porque a condição mais miserável do homem é a
guerra.
- Se o poder do soberano exige de nós uma submissão incondicional, como fica então
nossa liberdade no estado?
Um homem livre no estado adéqua sua conduta àquilo que estabelecem as leis
civis.
Somos livres para fazermos tudo aquilo que a lei determina e para agir
no espaço onde não há leis
O súdito não tem a liberdade de desobedecer e também não pode
resistir à força do estado.
- A obrigação vai até o espaço onde o soberano delimitou com suas regras. Para além
dele, o homem pode agir conforme sua deliberação.
Todos os homens, por natureza, estão dotados de grandes lentes de aumento (ou
seja, as Paixões e o Amor-próprio), através das quais a mínima contribuição surge
como um imenso fardo; por outro lado, eles são destituídos daquelas lentes
prospectivas (Moral e Ciência Civil) que permitem ver de longe as misérias que os
ameaçam e que não podem ser evitadas sem essas contribuições.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 20
- Obedecemos e consentimos nessa obediência porque queremos a nossa proteção
Quando o homem vê a proteção na sua espada ou na espada do outro, esse
pacto já está dissolvido por incompetência, por omissão do soberano (pode
dissolver seu próprio poder, remetendo os homens à guerra)
- Na intenção daqueles que a criaram, a soberania é imortal, mas também está sujeita
à morte violenta em função da guerra exterior
Os estados estão sempre na condição de natureza; entre eles não há lei, mas
força, porque não há possibilidade de estabelecer um soberano para todos os
soberanos,
- A soberania também está sujeita à morte violenta em virtude de causas internas: a
ignorância e as paixões humanas que levam à discórdia
- Hobbes nos coloca bem numa face da modernidade:
É o primeiro jus naturalista moderno
Mas também é o primeiro jus positivista (no estado não vigoram as leis
naturais)
Direito, para Hobbes, é exclusivamente o conjunto das leis civis.
Defende a monarquia (vive em um contexto de guerras religiosas e necessidade
de consolidação de um poder forte)
Texto 2: Locke
- No estado de natureza, para Locke, o homem vive também em perfeita liberdade
(como diria Hobbes)
O estado de natureza também é caracterizado como um estado de igualdade,
porque ninguém está subordinado a outro.
Não podemos confundir com um estado de licenciosidade: os homens
são livres no estado de natureza porque estão sujeitos apenas às leis
A vida infeliz sob a espada do soberano ainda é melhor que a guerra.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 21
da natureza (e não licenciosidade onde ninguém está sujeito a nada –
como diz Hobbes)
- Liberdade: para Locke, é sinônimo de submissão à lei
- Cabe ao homem velar pelo respeito da lei natural. Ao fazer isso, o homem passa a ser
aquele que pode punir qualquer transgressor dessa lei natural.
Podemos fazer isso porque, ao transgredir a lei da natureza o infrator declara
estar vivendo sob outra regra que não aquela da razão. Quem desvia-se da
correta razão torna-se um degenerado (rompimento com os princípios da
natureza humana – inapto para as regras do convívio humano)
- A razão, para Locke, tem um conteúdo moral
- Então, todos, no estado de natureza, somos executores de sua lei (cada um tem o
direito de punir o comportamento desviante)
Isso gera problemas aos executores da lei da natureza, acarretando grandes
malefícios, porque os homens acabam punindo com severidade aqueles que
não os agradam e não são benécis com aqueles que lhe são queridos.
O rigor da lei para o outro; o benécis para mim.
- Aquilo que era punição transforma-se em vingança (e isso traz discórdia, leva à
guerra)
- Qual o remédio para conter a imparcialidade dos homens? O governo civil.
Sair do estado de natureza e formar uma sociedade juridicamente organizada
Nem todo governo é preferível ao estado de natureza; se for um governo
absoluto, é preferível um estado de natureza (sendo cada um executor da lei,
há como cada um fazer valer seu direito)
Em um governo absoluto, perdemos o recurso a qualquer lei, porque
tudo é imposto.
O que distingue o estado de natureza para Hobbes e para Locke?
Em Hobbes, é licenciosidade (nenhum tipo de lei)
Em Locke, os homens estão sujeitos apenas à lei da natureza – que obriga a todos e que
determina que ninguém deve desrespeitar o outro
Locke defende que o poder do Estado não está acima
(inclusive o soberano está sob a lei)
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 22
- Origem do estado de direito: é aquele no qual o poder político está submetido à lei
A produção de normas também é estabelecida pela lei
- Aqueles que não cumprem a lei rompem com o estado de igualdade (que gera
confusão e discórdia)
- Quando, então, os homens estão em estado de natureza?
Todos os que se encontram num estado em que obedecem às leis da
natureza, estão em estado de natureza (como os estados e os soberanos, por
exemplo).
- A instituição de um magistrado comum extingue a discórdia e a desordem.
- Quando passam a usar a força sem o direito, colocam os homens em GUERRA
E esse uso da força também é driblar a lei.
- Quando declara-se guerra o agente pode ser punido e destruído (adesão de Locke à
pena de morte), pela mesma razão que são caçados lobos e leões.
- Degenerado é aquele que abdica da sua própria humanidade por adotar princípios
que violam a lei da razão = ENTRA EM GUERRA
- A razão para que se unam em sociedade é, também, evitar essa condição de guerra
Em guerra, não podemos conservar nossa propriedade (o que, para Locke, é o
direito fundamental)
- Cada homem tem uma propriedade em sua pessoa
Pessoa: proprietário das suas palavras e ações
Propriedade, então, quer dizer ser dono da sua vida, da saúde, do trabalho (é
através dele que se adquire aquilo que proporciona uma vida boa), da
liberdade e de tudo aquilo que ele pode adquirir com o trabalho de seu corpo e
a obra de suas mãos.
- A terra oferece, para todos, condições de uma vida boa
Mas aquilo que é propriedade comum se torna propriedade privada quando eu,
com meu trabalho, retiro esses frutos da natureza – mesmo no estado de
natureza.
- Cada um deveria ter apenas aquilo que fosse suficiente para lhe conceder uma vida
boa
Estado de natureza, para Locke, é aquele em que os homens vivem em paz,
respeitando e sendo os executores da lei da natureza.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 23
O dinheiro se tornou um instrumento durável
- Para que nós possamos preservar nossa propriedade nós consentimos e esse
consentimento é um pacto que nos leva à sociedade política.
- Onde, então, existe o estado de natureza e a sociedade política?
Quando o homem, tendo nascido sob uma liberdade perfeita e o gozo de
exercer todos os direitos concedidos
A sociedade política existe apenas quando cada um renuncia ao direito
natural, através do pacto, de ser executor da lei natural, colocando esse poder
nas mãos de um corpo político que distribui a lei da natureza
Assim, é muito fácil distinguir quem está ou não em uma sociedade
política
- O Estado, para Locke, é o mesmo soberano
- O homem que cede esse direito de executar a lei da natureza também concede ao
corpo político o direito de usar essa força para poder fazer a lei para todos
O poder político, para Locke, também é detentor da força
- E sempre que os homens estiverem sob esse poder comum, tendo renunciado ao
poder natural de executores da lei da natureza, estão numa sociedade civil
Um povo, portanto, é aquele conjunto de homens que está sob um poder civil
(assim como em Hobbes)
E só assim podemos pensar na paz na Terra (estabelecendo um juiz)
- A monarquia absoluta é compatível com a sociedade civil?
Não, porque aquele que coloca a lei também se coloca acima da lei. Ficamos
sem uma pessoa para a qual possamos apelar.
Sempre que os homens não têm a quem apelar pela injustiça, eles estão
em estado de natureza e estão em condição pior do que a guerra.
Governo ilimitado, para Locke, é pior que a guerra.
- Os homens resolvem contratar justamente porque querem evitar as inconveniências
do estado de natureza quanto à execução da lei
- Contratamos para garantir a propriedade, para que nós possamos instituir um
magistrado comum que possa aplicar equitativamente essa lei para todos.
- Os homens, para Locke, só podem se submeter ao poder de outro através de seu
próprio consentimento
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 24
Para viver de forma pacífica, confortável
- Qualquer número de pessoas que consentem desse modo forma um corpo político
Assume a obrigação de se submeter à determinação da maioria e acatá-la.
Se isso não ocorresse o pacto não teria nenhum sentido porque cada
um continuaria livre como no estado de natureza
O pacto surge da concordância em unir-se em sociedade.
- Todo aquele que usufrui dos benefícios trazidos por essa sociedade política
concordaram tacitamente (acordo tácito) e se tornaram membros da sociedade
- O direito é um patrimônio de todos que legamos de geração em geração
- Todo aquele que vive em uma comunidade está sujeito às leis da sociedade e
também por ela está protegido (troca de gentilezas).
- Embora nós tenhamos total liberdade em nosso estado de natureza, é difícil que
consigamos exercê-la de forma adequada, porque dependemos dos outros
Os homens querem se libertar dessa condição de incerteza e violação
constante dos pactos
O estado de natureza é repleto de perigos constantes (que atentam contra a
vida, contra a liberdade, contra os bens e que rondam a propriedade de cada
um)
Unem-se porque pretendem a conservação da propriedade
- O que falta no estado de natureza para que a propriedade seja garantida?
1. No estado de natureza não temos uma lei estabelecida, fixa e conhecida
(embora a lei da natureza seja clara e inteligível os homens são influenciados
por interesses próprios e paixões)
2. Não há um magistrado comum e parcial para controlar as controvérsias de
forma equitativa (de acordo com as leis da natureza)
3. Não há um poder capaz de garantir essa autoridade que irá aplicar de forma
imparcial a lei
- Os homens têm poderes no estado natural:
1. Fazer tudo aquilo que a lei da natureza prescreve para a conservação de cada
um
2. Poder de executar a lei da natureza e punir todo aquele que a transgride
É preferível estar sujeito apenas à lei da razão que à vontade arbitrária de um príncipe.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 25
- O homem procede a um equilíbrio nas suas disposições
Ele não muda para uma condição pior da que ele está
Nós não consentimos em um poder (poder absoluto) porque se submeter à
vontade exercida sem o respaldo da lei por um princípio nos tira o direito para
recorrermos
O soberano não está acima da lei
- Dissolve-se o poder soberano:
A forma mais comum é a invasão estrangeira
Por causas internas
Os cidadãos podem e devem destituir o soberano quando, por exemplo,
o legislativo, que é a alma do poder, é alterado
- O poder soberano é dissolvido quando:
1. A pessoa ou príncipe coloca sua vontade acima das leis que expressam a
vontade de todos
2. Impede que o legislativo se reúna para os fins para os quais o legislativo foi
constituído
3. Os direitos eleitorais são alterados sem o consentimento dos cidadãos
4. Entrega os cidadãos ao poder estrangeiro
5. Já não cumpre mais e não coloca em execução as leis
Onde as leis não são executadas é como se não houvesse leis; e um
governo sem leis é um mistério político inconcebível para a capacidade
humana e incompatível com a vida em comum
- Qual é o primeiro e fundamental ato da sociedade?
A razão pela qual os homens vivem em sociedade é a preservação da
propriedade. E o fim que elegem para estarem juntos é a formação das leis que
protejam a propriedade.
- Então, o poder do povo pode destituir o soberano quando este transgredir a lei
fundamental da sociedade: a preservação da propriedade
É o poder do povo e não do indivíduo, particularmente. O poder que cada
indivíduo deu à sociedade, jamais retorna a ele de forma degenerada. Em
conjunto, tornam-se juízes e podem transferir o poder a outro soberano
- Por quê?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 26
Porque o fim do poder é o bem da humanidade e todo aquele que usa a força
sem o direito, sem o respaldo na lei perde o direito de exercer a soberania,
porque se coloca cima da lei (é visto como um degenerado)
Texto 3: Rousseau
- Critica Hobbes afirmando que a estrutura de uma sociedade civil onde um manda e
outros obedecem torna-se propriedade de quem está no poder
- Nós temos que rever os termos do contrato que prevê poderes ilimitados para
um/poucos e obediência incondicional a muitos
- Para Rousseau, o desenvolvimento histórico da humanidade se dá em três tempos:
- O momento negativo (em Hobbes, o estado natural; e em Locke, estado de guerra),
para Rousseau é a sociedade civil, que deve ser superada por um contrato para que os
homens vivam em paz na república.
- Como é, para Rousseau, o estado de natureza?
É pacífico e feliz porque nele o homem, não possuindo necessidades além
daquelas que a natureza oferece, ele na precisa se aliar aos seus inimigos
O homem vive isolado se satisfeito com o que a natureza oferece
- Os homens não estabelecem entre si nenhum tipo de relação moral (então não são
nem bons, nem maus); portanto, é indeterminado
Como esse homem não está em relação com o outro, ele é despido de virtudes
(a virtude humana é lapidada com a relação com o outro)
- Nesse estado, muito embora os homens sejam considerados felizes, não podem ser
considerados livres porque não obedecem à lei da razão e seguem apenas seus
caprichos, apetites e paixões
Liberdade é apenas aquela sob a lei
A licença não nos concede liberdade alguma
Seguir apenas seus caprichos, apetites e paixões é não ter a compreensão da
lei da natureza – e quem não a tem é um IDIOTA (ainda que isso seja sinônimo
de liberdade hoje em dia)
República Sociedade Civil Estado Natural
CONTRATO
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 27
Se isso fosse instinto, teríamos todos os mesmos caprichos, apetites e
paixões
- Nos tornamos escravos de nós mesmos com dificuldade de estarmos no mundo, de
criarmos laços com o outro
E isso na nos coloca entre os outros: ao contrário, nos isola (mundo
individualista)
- Todavia, cedo surgem as dificuldades próprias desta condição inicial do ser humano,
as quais o homem deve sobrepujar fazendo alianças com seus semelhantes. No
entanto, fica complicado porque, não seguindo uma lei da razão e tendo os mesmos
desejos, há o CONFLITO, o choque, a GUERRA.
- A igualdade que era natural desaparece. A propriedade é introduzida e o trabalho
torna-se obrigatório e, muitas vezes, escravo.
- Na sociedade civil os homens se reúnem, mas não há uma lei comum, não há o
reconhecimento da lei da razão
- Como continuar sendo felizes e resgatar a igualdade natural estando entre outros?
Só através de um CONTRATO: idéia reguladora da razão que funda o pacto
político
Para Hobbes e para Locke, o contrato é o consentimento em uma
renúncia
- Através do contrato o indivíduo transforma-se em cidadão e essa metamorfose é
justamente a possibilidade de uma vida racional
Através do contrato cada um coloca toda a sua pessoa e sua autoridade sob o
imperativo supremo de uma vontade geral (lei de todos, idéia reguladora)
- O contrato é um pré-requisito da República
- A renúncia, em Rousseau, quando se dá o contrato é em relação a meus caprichos,
apetites e paixões
Não podemos viver juntos sem renúncia e algumas coisas
- Para Rousseau, a razão é também moral
- A sociedade civil é condição totalmente miserável
- Reconhecer o outro como o outro e não como uma coisa que está a serviço dos meus
desejos
O homem que causou mais estragos para toda a espécie foi aquele que pela primeira vez fincou
uma estaca no solo e disse: Isso é meu!
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 28
- O contrato não é renúncia à liberdade; muito pelo contrário: é a única forma de
conquista da liberdade
- E assim os indivíduos constituem um corpo moral, dotado de vida e vontades ao qual
chama de República
Os associados coletivamente = povo
Os associados individualmente = cidadãos
- Para que os homens possam viver juntos preservando a igualdade, realizando a
liberdade, uma lei de organização faz-se necessária
Essa lei é a vontade geral: a única capaz de dirigir as forças para o bem
comum
- Vontade geral é aquela que é de todos (podemos reconhecer à medida que somos
seres racionais). Leva à realização do bem comum, ao contrário da vontade da maioria
– que é a união das vontades particulares
A vontade geral é qualificada, é a lei da razão; a única que pode conduzir ao
bem comum
Ainda que a vontade geral seja utópica, ela é necessária para que possamos
almejar mudanças
- A República é o espaço da liberdade e da igualdade pois o pacto social destrói a
desigualdade gerada artificialmente pelo desconhecimento da lei
Igualdade moral estabelecida através da lei (formaliza a igualdade de todos
perante a lei)
- A satisfação irrestrita dos apetites leva o homem à escravidão enquanto a
obediência à lei prescrita pela razão conduz à liberdade (não existe se não for sob a
lei)
- O homem se transforma de um animal estúpido e limitado em um ser inteligível
(em um home, propriamente dito)
O direito tem, portanto, um papel civilizacional (impossível a vida sem lei)
- Idiota é aquele que não sabe reconhecer o outro
- A grande obra da lei é forçar o homem a ser, ao mesmo tempo, livre e justo (justo
porque através do reconhecimento da lei reconhece o outro)
A lei que regulamenta a sociedade compete exclusivamente aos associados (ao
povo reunido sob a vontade geral); o povo faz a lei, então ninguém pode estar
acima da lei na República
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 29
- Rousseau coloca o germe do estado democrático de direito em que o povo faz a lei
- Ninguém pode estar acima do que a lei prescreve numa República (nem mesmo o
soberano)
- As leis não são injustas porque ninguém é injusto consigo mesmo (afinal, o povo é
que faz as leis)
A lei deve partir da totalidade para a eles retornar (e nada deve interferir nessa
unidade – por isso que a vontade geral é unânime e não da maioria)
- A república deve receber, por parte do indivíduo, uma submissão total
Ele não possui direitos inalienáveis, os quais possa invocar
Direito inalienável é a expressão da vontade geral (inquestionável – não
há nenhum recurso a não ser ela mesma)
- A lei obriga o homem a ser livre
Restituir a felicidade que tínhamos no estado de natureza e a igualdade e
permitir que os homens vivam livres é a função da lei
Através da lei adquirimos a liberdade e a igualdade
A razão, para Rousseau, tem o aspecto de uma lei
- Para Rousseau, só há liberdade quando se está sob a lei da razão; fazer o que cada
um bem entende é escravidão
- Quando a lei é soberana, eu não tenho dono na Terra (porque esta também é minha
lei)
- Ao compreender os homens eu compreendo a lei adequada para regê-los
- Estado livre é aquele cujo soberano é a vontade geral
Portanto, é impossível viver sem lei
- Para Rousseau, não há possibilidade de voltar ao estado de natureza
- Liberdade natural é sinônimo de escravidão (a licenciosidade coloca os homens
como escravos de si mesmos)
- A anarquia é o regime próprio da sociedade civil
- O que, fundamentalmente, leva ao contrato social?
Legisladora e soberana é a vontade geral (que é a lei)
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 30
A licenciosidade, a desigualdade dos homens que ficam à mercê de uma lei
comum
Texto 4: Kant
- Obra: “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”
1ª Parte: Doutrina do Direito
2ª Parte: Doutrina Moral
- Dimensão do direito como um agente civilizador necessário e indispensável para um
progresso ético
- Quando os homens estiverem pacificados os soberanos devem fazer um acordo entre
si
- Os soberanos não estão abaixo de qualquer lei o que não quer dizer que não tenham
que fazer um acordo mútuo para a paz (só assim teremos um progresso ético)
- Antropologia é a física dos costumes
- O homem é um animal indeterminado, e em função disso não podemos compreender
e tampouco pensar uma lei a partir da simples observação
Propõe a física dos costumes: observando, escrever alguma regularidade do
comportamento humano
Precisamos de uma meta e vamos organizar não através da simples
observação, mas interpretando a situação. É tirada de uma
compreensão racional do agir humano.
A lei: orientação para o agir humano
A observação, a empiria, não leva a lugar algum
Como ser racional, tenho o dever de refletir sobre minha ação (a razão leva a
compreender).
- Transcendental, para Kant, é sinônimo de racional
- Kant distingue três planos:
Imanência: ver, observar; aquilo que conhecemos através dos sentidos, o que é
empiricamente observado
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 31
Plano do Transcendental: o que não necessariamente acontece no mundo,
mas o que eu, enquanto racional, posso compreender, realizar (não podemos
observar, mas podemos compreender porque somos racionais)
Transcendente: aquele que eu não tenho acesso algum – por exemplo, Deus:
está além das nossas possibilidades cognitivas e capacidades racionais; fiéis que
se resignam aos desejos de Deus.
- A humanidade não deve se desenvolver apenas tecnicamente, mas também
eticamente
Não é porque agem dessa forma que estão condenados eternamente a agir
assim
- Moral: é aquela que impõe ao homem agir de acordo com os costumes
estabelecidos, costumes sociais. O agir moral é agir de acordo com tais costumes.
- Ética: quando saímos do plano de meramente agir (plano moral) para o de refletir
(plano ético), passamos para o plano da ética
Refletir a partir de princípios universais
Anular sua vida pelos outros não é ética
- A exploração não pode ser uma regra para os seres racionais
- Título nada mais é que justificativa dos princípios a priori que podem conduzir a
conduta humana.
- Direito como parte indispensável de todo e qualquer processo civilizatório
- Até um povo de demônios pode viver em paz se respeitar a lei do estado
É o primeiro passo para a desbestialização do ser humano
- Para isso é necessário que reconheçamos uma lei e um poder capaz de fazê-la para
todos
Mas não basta os homens estarem pacificados num estado nacional; também
temos que entender necessidade de pacificação dos soberanos, porque
enquanto houver guerra, a humanidade não pode pensar em desenvolvimento
moral/progresso ético.
Direito público/do estado: direito do estado, da república, conjunto das leis
civis. Regula as relações dos homens em um estado. É aquele que exige a
promulgação de todos.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 32
Direito das gentes: acordo entre os soberanos visando um projeto de paz
eterna. Os estados fazem um pacto mútuo de não-agressão, já que não existe
um soberano dos soberanos.
Direito cosmopolítico: não é o público e tampouco o direito das gentes; é o
direito que regula as relações dos homens dos diferentes estados do mundo.
Todos nós habitamos a mesma casa, a Terra; então deveríamos poder circular
livremente pela Terra e tal circulação seria regulada por este direito. Aquele
que chega deve oferecer a sua sociabilidade; aquele que recebe deve oferecer
a sua hospitalidade.
- Só assim podemos ter adequado desenvolvimento moral (no sentido de ética)
- A diferença que divide o agir humano da natureza é a liberdade, condição inseparável
do agir humano
- A razão descobriu enfim que os homens agem sem determinação externa; descobriu
que é possível a vontade querer (esse é o grande conceito da liberdade do homem)
Eu não estou condenado a ser o que sou nem viver como vivo. A minha
vontade é livre e ela, para Kant, tem a força da lei.
Quem guia é a razão; e quem limita é a lei.
- Todos nós somos esclarecidos pela razão
- Natureza humana é aquela própria do agir racional, o que não significa que a razão já
nasça com o homem de modo pronto e acabado; temos que exercitar racionalmente a
ponto de não nos desenvolvermos como seres racionais (se não ficamos aquém de
toda e qualquer possibilidade humana)
- A razão não pode ser compreendida nesse seu âmbito elementar. Faz-se necessário
que o homem seja também moral; não apenas racional.
- A razão possui três âmbitos
1. Habilidade: é o âmbito mais elementar, mais básico da razão. É ele que nos
implica com os nossos aprendizados. A cultura os oferece tanto os meios
quanto os fins. Escolher os meios adequados para atingir os objetivos. Quem
quer os fins, quer os meios. O mundo estaria resolvido se tudo fosse assim tão
simples.
Há um fim comum entre os homens para os quais a razão não pode
mapear todos os meios para atingi-lo. Esse fim é a felicidade (muito
embora todos queiram, se perguntarmos para cada um, teremos
conceitos diferentes de felicidade que não é algo universal)
2. Sagacidade: toda vez que tentamos fazer valer um conceito universal nos
impomos de forma totalitária sobre os outros. Com inteligência, escolher os
meios para atingir nossa felicidade, que é nosso fim. Temos que ser prudentes
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 33
e inteligentes para escolhermos, sem bússola, aquilo que pode nos trazer
felicidade.
A felicidade não é apenas um direito, mas um dever. Porque se não
pudermos prover o bem a nós mesmos, como provê-lo aos outros?
Como organizar um movimento desses homens que no mundo
procuram a felicidade?
3. Moralidade: é justamente a possibilidade de organizar no mundo esse
movimento à procura da felicidade. Como fazer para que, ao procurar a
felicidade, eu não impeça que o outro encontre a sua?
Moralidade é o campo da eticidade; é o reino dos fins: cada ser humano é um
fim em si mesmo e nunca o instrumento para que o outro possa atingir seu fim
(como viver, trabalhar, ter amigos sem instrumentalizar o outro).
A felicidade é um dever porque eu não posso instrumentalizar e nem
me fazer instrumento do outro para que atinja seus fins.
- Nós temos uma vontade que tem força de lei
Vontade: conceito de lei da razão; romper no indivíduo um mau hábito – e toda
vez que isso acontece, não está apenas crescendo, mas mostrando à
comunidade que pode fazer diferente; que é possível a vontade querer
- O fundamento de toda a moralidade é a liberdade. Se não fôssemos livres não
poderíamos discutir a possibilidade de fazer diferente
A liberdade é que permite ao ser humano usar a sua vontade como força de lei
Livre é aquele que se submete à lei da razão. E este é um ser autônomo.
Autonomia é seguir apenas a sua lei (que é a lei da razão e não dos seus
caprichos, apetites e paixões – porque isso não é lei)
Auto = próprio; nomos = lei
- O contrário de autonomia é heteronomia: em vez de seguir a sua, segue a lei do
outro/outra lei que me escraviza da mesma forma que meus caprichos, apetites e
paixões.
Torno-me ou escravo do outro (vontade arbitrária) ou escravo de mim mesmo
Assim como quando desconheço a lei da razão seguindo apenas meus
caprichos, apetites e paixões, torno-me escravo de mim mesmo.
- Autonomia está associada à dignidade: quando eu sigo apenas a lei da razão, além de
autonomia eu sou digno porque não me submeto nem à minha própria lei, nem à lei
do outro. Sigo a lei comum dos homens racionais
A reciprocidade implica em encontrar um fim em si mesmo
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 34
- A dignidade é a faculdade de estar apenas sujeito a uma lei da razão
Dignidade ligada à autonomia, à liberdade e ao cumprimento da lei da razão
O princípio supremo da moral consiste na junção da felicidade com a dignidade
de ser feliz
- Para sermos éticos não precisamos abdicar de uma vida boa; temos que contemplar
tudo isso e cuidar para que os outros não sejam prejudicados
Doutrina do Direito
- Plano da heteronomia, para Kant, é o mundo físico
- Autonomia é aquele conceito próprio ao mundo ético ao qual Kant chama de reino da
liberdade.
Esse mundo é o mundo da ação humana (que não está condicionada nem pela
vontade da natureza nem pelas autoridades transcendentes)
- Além desse conjunto de normas que obrigam o homem em fórum interno, temos a
legislação jurídica
Legislação interna: é a lei moral
Legislação externa: é o direito que não obriga o sujeito em consciência, mas
com o peso da espada, a força do soberano
- A norma jurídica tem como causa as inclinações dos seres humanos (caprichos,
apetites e paixões) e sobretudo das aversões dos seres humanos
Justifica o caráter coercitivo do direito: a sanção que o direito aplica àqueles
que não obedecem às normas jurídicas
É necessário porque o homem é indeterminado; ele é dotado de uma liberdade
total. E essa ausência de limites força os homens a submeterem a sua liberdade
não apenas à lei da razão, às leis que obrigam os homens em consciência, mas
também a uma legislação exterior cuja finalidade é justamente viabilizar o
convívio humano.
- Liberdade Selvagem é aquela que necessariamente é coibida pela lei do estado
(licenciosidade)
- Apenas onde a liberdade é limitada o homem é livre
- O estado de natureza é uma idéia a priori (eu não preciso ter vivido a guerra, que não
é algo próprio para os seres humanos, para compreender o que seria a vida nessas
condições)
A superação dessa condição de vida fora da lei é um dever moral
Viver bem é um direito fundamental
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 35
- O contrato, para Kant, é um dever moral fundamentado num princípio da razão que
diz: É preciso sair do estado de natureza e contratar com os demais cujas relações
são inevitáveis (é preciso entrar em um estado civil), superar a condição inicial de
existência onde cada um segue seus caprichos
A renúncia é aos caprichos, apetites e paixões
O contrato não decorre de uma necessidade, mas de uma exigência moral,
afinal, quando não há leis nós estamos à mercê da maldade do outro
- A sociedade civil exprime um dever ser além do ser
Não é apenas aquilo que nós vivemos, mas uma normatização para a nossa vida
A indeterminação que marca a nossa condição faz com que possamos agir a
qualquer momento de qualquer maneira
Esse estado não é adequado para ter uma vida digna
- O direito é um agente de transformação social
- Essa necessidade do dever ser além do ser é o que expressa o valor do direito que
ultrapassa os acontecimentos históricos e os interesses individuais e é o direito que
permite a individualidade e a liberdade dos homens
- O bem público a ser prioritariamente preservado é a constituição, porque ela que
garante:
1. A liberdade – o único direito natural do indivíduo
2. A igualdade – a impossibilidade moral de um indivíduo ser obrigado pelos
demais além daquilo que constrange a todos; a qualidade do homem ser dono
de si mesmo
- A Liberdade, para Kant, também é aquela sob a lei (apenas onde a liberdade for
limitada o homem pode ser livre); é não estar submisso à vontade de outrem
- Igualdade perante a lei jurídica/formal: só isso que possibilita efetivamente a
liberdade
- Quando eu respeito uma lei que é de todos não estou sujeito à vontade arbitrária de
ninguém
- Esse direito divide-se em direito natural e direito positivo
Direito Natural é aquele fundado nos princípios a priori da razão e corresponde
àquilo que cada um tem por natureza (a liberdade) independentemente de
qualquer ato jurídico
Direito Positivo é aquele conjunto de leis que exige a promulgação de todos e é
produzido em um estado juridicamente organizado. É o conjunto de normas
postas pelo povo para a constituição de um estado
- É através do direito que nós criamos o estado. Esse estado será também o produtor
do direito (sob limites: limites para legislar e executar sua força; não se força aleatória)
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 36
- A vontade de todos não pode ser confundida com a vontade geral, nem da maioria de
Rousseau, porque para Rousseau nem todos os homens podem participar
efetivamente da formação da lei: apenas os independentes podem fazer a lei
(proprietários, profissionais liberais e funcionários do estado); porque se eu sou
empregado de alguém, minha vida depende do outro e minha vontade pode não ser
livre, mas condicionada por essa pessoa da qual eu dependo para sobreviver.
Apenas os independentes, cuja conservação não depende de outro, participam
ativamente da formação da lei
Essa dependência não fere nem o princípio da liberdade nem da igualdade
porque os indivíduos que legislam fazem para todos a mesma lei (para os
independentes e os dependentes) e isso mantém a igualdade.
Nenhuma legislação pode atentar contra o direito de um cidadão
dependente poder se tornar, pelo trabalho, um independente (direito
com função de ajustador social)
- Princípio universal do direito
É justa toda ação que por si ou sua máxima não constitui um obstáculo à
conformidade da liberdade de todos com a liberdade de cada um segundo leis
universais
Para Kant, justiça também é liberdade
- O bem maior a ser preservado pelo direito: a liberdade
1º Lugar: pacificados pela lei comum num estado civil, o que não é suficiente
porque estaremos sempre com a liberdade ameaçada.
- O direito: força capaz de neutralizar o uso da liberdade que se opõe à liberdade de
todos (uma obrigação de ser livre)
Revisão
Hobbes: é um estado de plena liberdade (ausência de determinação: o sujeito pode fazer tudo tendo como guia apenas sua razão)
Locke: é um estado de liberdade, mas não de licenciosidade. No estado de natureza os homens estão sob a lei da natureza – que é a lei da razão. Licenciosidade é aquele no qual não vigora nenhuma lei
Rousseau: é um estado de felicidade, mas não de liberdade porque os homens são escravos de seus caprichos, apetites e paixões. Nesse estado de natureza os
O que é o estado de natureza?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 37
homens estão satisfeitos de forma a suprir suas necessidades com aquilo que a natureza oferece.
Kant: não é um estado de injustiça, mas ao menos um estado de justiça negativa no qual, em caso de conflitos, não haveria um juiz competente para ditar uma sentença legítima em virtude da qual cada um pudesse obrigar o outro a sair desse estado de guerra e fazê-lo entrar em um estado jurídico.
Hobbes: no estado de natureza, não há lei comum que estabeleça o que é meu e o que é teu (não há um poder suficientemente forte para estabelecer limites na busca de objetos satisfatórios)
Locke: porque no estado de natureza há ausência de um magistrado comum que distribua equitativamente a lei da natureza para todos (a aplicação da lei fica também desequilibrada); e a utilização da força sem o direito coloca os homens em guerra.
Rousseau: quando os homens que não conhecem a lei da razão tem que conviver para suplantar as dificuldades inerentes à condição inicial de suas existências.
Kant: porque não há um juiz competente para ditar uma sentença legítima em casos de conflitos
Hobbes consiste no consentimento
Locke
Rousseau
Kant
Hobbes: renúncia ao direito sobre todas as coisas
Locke: renúncia ao poder natural de ser executor das leis da natureza
Rousseau: renúncia ao costume de seguir exclusivamente seus caprichos, apetites e paixões
Kant: renúncia à liberdade selvagem que lhe permitia seguir seus caprichos, apetites e paixões
Por que o estado de natureza leva à guerra?
consiste na idéia reguladora da razão
consiste na idéia reguladora da razão
Qual o remédio para sair da condição miserável? O contrato.
é um dever moral fundamentado num princípio da razão que diz: É preciso sair do estado de natureza e contratar com os demais cujas relações são inevitáveis (é preciso entrar em um estado civil), superar a condição inicial de existência onde cada um segue seus caprichos
O contrato sempre consiste em uma renúncia:
Qual é o fundamento/a finalidade do Estado/República?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 38
Hobbes: para ter uma vida preservada de uma morte violenta e ter uma sociabilidade segura (dever do Estado – prover uma vida boa)
Locke: para assegurar a conservação da propriedade (vida, saúde, liberdade, trabalho e os bens através dele adquiridos)
Rousseau: para reconduzir o homem ao caminho da felicidade e da igualdade (que lhe eram próprios no estado de natureza) e viabilizar a liberdade.
Kant:
Hobbes: direito da natureza é a faculdade de agir ou omitir, é a liberdade; já a lei da natureza é a obrigação de agir ou omitir, no sentido de preservar a vida. A lei civil é a palavra daquele que, por direito, tem poder de mando sobre os demais (a lei civil são as regras da propriedade que estabelecem para o homem a vida, a liberdade, aquilo que é seu). A lei também estabelece o justo e o injusto, o legítimo e o ilegítimo.
Locke: é a lei da natureza (a lei da razão), que vale tanto no estado de natureza quanto na sociedade civil. Ela limita tanto os cidadãos quanto o soberano.
Rousseau: é a vontade geral (lei organizadora da razão que constitui um povo que, reunido, forma a República). É também a lei da razão que só conhecemos após o contrato (não existe no estado de natureza nem na sociedade civil).
Kant: há duas legislações: a interna (que é a lei moral) e a externa (que é o direito que não obriga o sujeito em consciência, mas com o peso da espada, a força do soberano; a lei é a vontade de todos)
Hobbes: o poder soberano não pode ser limitado pela lei (a lei não limita o poder de quem a elabora)
Locke: a lei limita o poder soberano
Rousseau: não porque soberana é a vontade geral (que não pode ser limitada)
Kant: sim porque quem a elabora, o faz para todos, de modo que também estão sob a lei.
- O que importa é o exercício do poder político que a lei limita ou não; e não o regime
político
Hobbes sinônimo de Estado
Locke
Rousseau: é um estado de guerra (sem um poder e sem uma lei comum nós vamos à guerra)
O que é a lei?
A lei impõe limites ao soberano?
O que é a sociedade civil?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 39
Kant: é o estado de relação mútua dos particulares reunidos num povo. Estabelece um dever ser além do ser, uma normatização para a nossa vida
- É o único que divide em três tempos; além disso, ele não estabelece
passagem com contrato do estado de natureza para a sociedade civil.
Hobbes: no estado de natureza é a ausência de determinação e na sociedade civil é fazer aquilo que a lei permite.
Locke: é estar sob a lei da natureza (da razão), que é a mesma no estado de natureza e na sociedade civil.
Rousseau: é respeitar a lei da razão. Só existe liberdade na república porque só lá os homens seguem, efetivamente, a lei da razão.
Kant: também é aquela sob a lei (apenas onde a liberdade for limitada o homem pode ser livre); é não estar submisso à vontade de outrem
Hobbes: é o cumprimento do contrato
Locke: é o respeito à lei da razão; é fazer valer a lei de forma igual para todos
Rousseau: é poder viver de forma livre e feliz entre outros sob, portanto, a mesma lei (ela que concede liberdade e restitui a igualdade)
Kant: É justa toda ação que por si ou sua máxima não constitui um obstáculo à
conformidade da liberdade de todos com a liberdade de cada um segundo leis
universais
Hobbes: a vida
Locke: a propriedade
Rousseau: a igualdade
Kant: liberdade
O que é liberdade?
O que é justiça?
Qual é o direito fundamental?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 40
O Positivismo Jurídico – Norberto Bobbio
- Até o final do século XVIII, o direito era definido a partir do direito natural e do direito
positivo. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) é um
marco de positivação daquilo que no século XVII e XVIII foram tidos como direito
natural.
O apogeu do direito natural também é marca da sua derrocada, decadência,
porque o direito não é obra de nenhuma natureza, nem mesmo a racional;
direito á arte, é construção histórica.
- O Estado é um aparato que garante a efetivação desses direitos. Se não houver o
Estado, o direito não passa, como já dizia Hobbes, de palavras vazias que se perdem no
vento.
- O positivismo jurídico nasce quando o direito natural e o direito positivo já não são
mais considerados direito no mesmo sentido
Há uma redução de todo o direito no direito positivo
O direito natural é excluído da categoria direito
- O acréscimo do adjetivo positivo ao direito torna-se, então, um pleonasmo (porque
não se pode falar em direito que não seja positivo). As outras ordens recebem outros
nomes.
- A origem do positivismo jurídico corresponde à origem do Estado Moderno, aquele
que conjuga monopólio da força e da legislação.
- A sociedade medieval é pluralista, ou seja, não havia um estado detentor do
monopólio
- O estado moderno tem estrutura monista: concentra em si todos os poderes,
inclusive aqueles de produção do direito (monopólio do direito pelo estado)
- Origens mais remotas ainda, o gérmen de um direito positivo, podemos encontrar
toda vez que nós tivermos notícia de uma sociedade que tem um corpo normativo
aceito e reconhecido por ela, como normas que regulam a vida em comum, e quando
há uma controvérsia, ela não é resolvida pela vingança entre as partes, mas pela
O positivismo jurídico é a doutrina segundo a qual não existe outro direito senão o positivo.
A partir do século XIX, o direito natural não é mais considerado direito; direito é, exclusivamente, um conjunto de
normas posto por uma autoridade competente no âmbito do estado (ou seja, é direito positivo)
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 41
intervenção de um árbitro ou magistrado que decide o caso em questão aplicando
sanção àquele que violou a norma.
Então essa sociedade vive sob o direito. As demais vivem sob usos e costumes
(por exemplo, o tráfico de drogas no Brasil).
- O que é viver sob o direito?
Hoje, no mundo Ocidental, há dois grandes sistemas de direito que nos fazem
entender como esse direito é produzido nos estados.
1. Common Law: direito anglo-saxão (Inglaterra, EUA com exceção do
estado Louisiana, Canadá com exceção do Quebec, e todas as ex
colônias inglesas)
2. Direito Estatutário/ Tradição Romano-Germânica: demais locais do
mundo
Common Law
1ª Fase: é o direito que surge diretamente das relações sociais; é direito costumeiro.
Esses costumes e esse direito era aquele acolhido pelos juízes quando discutiam/
decidiam os casos levados à apreciação dos tribunais. Hoje, esse direito não é mais
assim produzido.
2ª Fase: Torna-se um direito de elaboração judiciária, ou seja, é constituído pela norma
que equivale à decisão dos juízes prolatada após a discussão de casos concretos. Tal
decisão torna-se solução obrigatória para todos os casos análogos ou semelhantes.
É um direito jurisprudencial
É direito positivo porque há um funcionário do estado com autoridade para
produção de normas jurídicas válidas.
Os parlamentos legislam a estrutura da ordem jurídica. A legislação periférica é
produzida judicialmente.
Direito Estatutário
Produção legislativa do direito; os parlamentares produzem prioritariamente, o
direito e os juízes aplicam aos casos concretos (juiz não pode decidir de forma
contrária ao que diz a lei).
- Elementos essenciais do positivismo jurídico:
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 42
1. O Formalismo: o positivismo jurídico se ocupa não com o conteúdo, mas com a
forma do direito.
Forma é o conjunto dos procedimentos adequados para a produção de
uma norma jurídica.
Se foi produzida por uma autoridade competente nomeada pelo Estado,
é direito, independentemente daquilo que estabelece o certo/ errado, o
justo/ injusto.
2. O Imperativismo: obrigação de fazer ou não fazer a despeito do conteúdo; e é
essa obrigação que dá à norma um caráter imperativo.
- Características do Positivismo Jurídico:
1. Modo de abordar o Direito: aborda o direito como um fato e não como valor (o
direito é o que é e não o que deveria ser)
2. Definição do Direito: é definido levando em consideração o elemento de
coação, ou seja, para os positivistas, o direito é o conjunto de normas que se
fazem valer por meio da força
3. Compreensão das Fontes do Direito: local de origem do direito; como nasce o
direito numa sociedade. Para os jus positivistas, a lei é a fonte do direito; ela
que produz (e a origem da lei é o Estado).
4. Teoria da Norma Jurídica: A norma é um comando e isso nos leva à
compreensão do caráter imperativo do direito (ordem de fazer ou não fazer).
5. Teoria do Ordenamento Jurídico: para Bobbio, temos que compreender o
direito além da norma jurídica. A norma jurídica por si só não esclarece o que é
direito, não esclarece sua juridicidade; temos que conhecer o ordenamento
jurídico do qual ela faz parte.
- Ela tem que integrar essa ordem jurídica válida sob pena de não ser considerada uma
norma válida.
- A constituição serve como nosso sistema de referência
Precisamos de reformas constitucionais para instituir novas normas/ acolher
pela nossa ordem jurídica em vigor.
O direito é definido como um conjunto de normas com as quais o soberano ordena ou proíbe
comportamentos aos súditos ou cidadãos. O direito é visto como um comando, uma ordem de
fazer ou não fazer.
1. É colocada pela força
2. É colocada por uma autoridade jurídica competente
3. É um comando, ordem de fazer ou não fazer
Norma
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 43
6. Método da Ciência Jurídica: o positivismo jurídico sustenta a teoria da
interpretação mecanicista do direito que na atividade do jurista faz prevalecer
o elemento declarativo sobre o elemento produtivo/ criativo do direito.
Nós trabalhamos com o direito positivo a partir de um silogismo simples
A partir da subsunção do caso concreto, a norma.
- Aquilo que já estava estabelecido na norma é declarado em relação ao caso concreto.
- A produção da norma num estado democrático de direito pode ter apoio/ reprovação
da população. O povo pode reivindicar/ apoiar certas proposituras de norma.
Já os juízes estão imunes de qualquer pressão social; então, podem decidir de
acordo com a sua cabeça e essa norma incide sobre nós sem qualquer
participação popular. O juiz diz o que é, desconsiderando o conteúdo
normativo, o que põe por terra o caráter do estado democrático de direito.
Legalização do jeitinho brasileiro
7. Teoria da Obediência: muito embora não possamos generalizar, podemos dizer
que prepondera no âmbito dessa teoria posições que levam a considerar a
teoria da obediência absoluta da lei enquanto tal.
Avaloratividade do Direito Positivo
- Nasce do esforço de tornar o direito uma verdadeira ciência adequada aos métodos
das demais ciências.
Ciência se caracteriza pela sua avaloratividade; faz distinção significativa entre
juízo de fato e juízo de valor, excluindo-o
- Juízo de Fato: é a tomada de conhecimento de uma realidade com o intuito de
informar o interlocutor acerca dela; descrição da realidade; dizer o que é.
Direito Ciência: estabelece o que é direito - TEORIA DO DIREITO
Premissa Maior: A NORMA Premissa Menor: O CASO CONCRETO Conclusão: A DECISÃO
O direito é uma ciência porque ele tem um objeto que é a norma.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 44
- Juízo de Valor: ao contrário do juízo de fato, representa uma tomada de posição
frente à realidade, com o intuito de influenciar o interlocutor a fim de que tome
determinadas escolhas ou siga determinadas prescrições.
Estabelece o que o direito deveria ser – FILOSOFIA DO DIREITO
- Validade do direito/ da norma: é aferida a partir de dois requisitos formais
1) O fato de a norma ter sido colocada por uma autoridade competente
2) O fato de a norma pertencer a um ordenamento jurídico real ou válido
- Não basta, portanto, apenas ter sido colocada por autoridade competente, porque
uma norma pode ferir os princípios constitucionais (tanto os formais que dizem como
ela deveria ser formulada, quanto os princípios materiais).
Por isso nós temos institutos de ação direta contra a institucionalidade = ADINs
PEC: Projeto de Emenda Constitucional – alterar em tudo ou em parte um
princípio constitucional para incluir outras coisas na constituição em vigor
- O positivismo jurídico trabalha com a validade da norma, e não com o valor da
norma.
O valor indica qualidade dessa norma pela qual ela está de acordo com aquilo
que entendemos ser um direito ideal. É uma síntese dos valores fundamentais
no qual o direito deve ser inspirado
A CIÊNCIA DO DIREITO trabalha com a validade
A FILOSOFIA DO DIREITO trabalha com o valor além da validade
- Bobbio distingue-as: distinções entre definições
Juízos de fato e de valor no campo do direito, tem função de delimitar as
fronteiras entre o que é ciência e filosofia do direito
Ciência do direito estuda o direito prescindindo do seu valor
Filosofia do direito não se contenta em conhecer a realidade jurídica tal
como ela é; investiga o fundamento, a justificativa do direito e a partir
desse problema que nós encontramos a discussão sobre o valor do
direito. É o estudo do direito a partir do ponto de vista de um
determinado valor que podemos julgar passado/ presente/ futuro.
- Então, há duas categorias de definições do direito:
1) Científicas: são factuais ou avalorativas; essas definições são ainda chamadas
de ontológicas porque definem o direito tal qual ele é (ontologia: estudo do
ser, aquilo que é)
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 45
2) Filosóficas: são, ao contrário, consideradas valorativas ou deontológicas
porque definem o direito que deve/ deveria ser (deontologia: estudo do dever
ser)
- Essas definições valorativas caracterizam-se pelo fato de possuírem estruturas
teleológicas (teeologia: aquilo que me serve para chegar a algum lugar – telos; para
que eu consiga realizar um valor). Já as definições avalorativas são estritamente
factuais.
- Para Bobbio, o direito é uma técnica social que consiste em obter a desejada conduta
dos homens mediante a ameaça de uma coerção a ser aplicada em caso de conduta
contrária.
É uma definição apurada de todo e qualquer elemento valorativo. O direito é
definido como simples técnica que pode servir para a realização de qualquer
propósito ou fim
No entanto, não se pode desconsiderar que a filosofia do direito é
imprescindível para o estudo do direito para que ele não se transforme nessa
mera técnica; tenta abrir essa ordem para o questionamento.
- No Brasil temos uma precária formação jurídica porque não há um equilíbrio entre
filosofia e ciência. Trabalhamos num âmbito restrito porque é a forma mais fácil.
- A interpretação da norma em nosso país também é oficial; só estudamos
doutrinadores reconhecidos pelos nossos tribunais. Ou seja, a doutrina e a norma
perdem força para a jurisprudência.
Positivismo e Realismo jurídico
- Definição do direito como norma válida e eficaz
- O positivismo normativista é aquele que vai trabalhar a norma a partir do elemento
exclusivo da validade excluindo do estudo das normas os fatos sociais e a possibilidade
dessa norma ser ou não aplicada. Trabalha o direito não dando importância à eficácia.
O positivismo jurídico no direito estatutário trabalha essencialmente com a
validade da norma
- O realismo jurídico não dá ênfase à validade exclusiva da norma, mas à sua eficácia.
Paradigma
positivista
normativista
Paradigma flexível onde a
norma passa a ser sinônimo
de decisão
Passamos para
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 46
No entanto, não devemos entender que a validade é positivista e a
eficácia é realista, porque Kelsen diz que o mínimo de eficácia é preciso
quando temos uma norma.
- ESCOLA REALISTA DO DIREITO: o direito é um conjunto de regras que são
efetivamente seguidas numa sociedade. Direito não é produzido por uma autoridade
competente, mas uma produção social; e tais normas que devem ser aplicadas e
reconhecidas como direito no âmbito mesmo de um estado nacional.
- Se nós temos dois elementos que caracterizam a validade da norma, também temos
dois que caracterizam a eficácia dela:
1) O fato de ela ser reconhecida pelos destinatários
2) O fato de ela ser efetivamente aplicada pelos tribunais
- A eficácia da norma é conhecida prioritariamente por esse segundo requisito; com
ele, a norma pertence ao ordenamento jurídico válido.
- O estado e o direito por ele produzido são originalmente maculados com
autoritarismo e que a sociedade é portadora da verdade; por isso o verdadeiro direito
é aquele socialmente produzido. SERÁ???
Quem pensa nisso não deixa de ser um utópico, uma pessoa que faz uma
prescrição e não uma descrição da realidade
As normas sociais podem e devem, muitas vezes, ser corrigidas pelos aparato
estatal
Não podemos dizer que o direito transforma nem que conserva a sociedade;
ele pode fazer os dois.
- Entre essas duas definições podemos encontrar elementos em comum:
São definições avalorativas porque não fazem menção ao fim nem aos
propósitos do direito
São definições formais e positivistas – são aquelas que procuram dizer o que o
direito é, prescindindo do seu conteúdo.
- Por que o positivismo jurídico se ocupa especialmente com a forma?
Toda tentativa de definir o direito a partir do seu conteúdo é destinada ao
fracasso porque a variedade do conteúdo do direito é imensa e não existe
matéria que o direito não tenha regulado ou que pretenda regular. Então, o
que dá certeza da ciência jurídica é o trato com a forma do direito. Por isso que
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 47
o positivismo jurídico considera como direito somente como é produzido e não
o que ele estabelece
- A verdade no direito está associada à sua justiça (justiça está associada à forma de
vida que pretendemos). É um conceito assim como o de justiça: varia no tempo e no
espaço; então é sempre semi-verdade.
Hans Kelsen
- Burguesia se prevaleceu do direito natural para chegar ao poder e precisa de um
instrumento de manutenção deste poder e vai se fazer da lei para isso, radicada dentro
das premissas do positivismo jurídico.
- O positivismo defende que o que não pode ser provado racionalmente, não pode ser
conhecido.
- Kelsen não é sinônimo de positivismo, porque o positivismo foi trabalho por muitos
autores.
Biografia
Estudou com Weber e sofreu fortes influências de Kant
1920: ajudou na confecção da constituição da Áustria
Pertenceu ao Círculo de Viena, junto com Freud. Posteriormente esse círculo se
dissolveu, em 1936, com a ascensão do nazismo.
Em 1933 publica “Teoria Pura do Direito”
Positivismo Normativista
- Ser e dever ser são as categorias pólos desta teoria do positivismo normativista.
SER (sein) realidade
DEVER SER (sollen) direito
Leis metafísicas;
contrato de Deus com
os homens Revolução Industrial
Positivismo Jurídico Paradigma do
Direito Natural Medievo
- Revolução Francesa
- Ideais burgueses já
consolidados
A Lei como Principal
Lei = Fruto da Razão
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 48
- Princípio da Causalidade: está atrelado às ciências naturais; existe uma causa e o
efeito dela decorrente. Por exemplo, a lei da gravidade.
- Princípio da Imputação: uma causa não está necessariamente atrelada a um efeito.
Por exemplo, o crime e a pena: caso cometa um crime, deve ser punido, mas não é
certo que isso ocorrerá.
O direito, DEVER SER, está relacionado ao princípio da imputação
- Kelsen empreende o fundamento da teoria jurídica
- O direito não tem a ver com o fato, com a conduta efetiva dos homens; ocupa-se do
que está prescrito juridicamente.
Norma Jurídica e Proposição Jurídica
- Norma Jurídica é a letra da lei
“As normas jurídicas, por seu lado, não são juízos, isto é, enunciados sobre um objeto
de conhecimento. Elas são antes, de acordo com o seu sentido, mandamentos e, como
tais, comando, imperativos. Mas não apenas comandos, pois também são permissões
e atribuições de poder ou competência. Em todo o caso, não são – como, por vezes
identificando o direito com a ciência jurídica, se afirma – instruções [ensinamentos]. O
direito prescreve, permite, confere poder ou competência – não ‘ensina’.
Por exemplo, o art. 121, CP matar alguém: reclusão de 6 a 20 anos
Ela é classificada como válida quando está dentro do ordenamento jurídico; e
como inválida quando não o está.
É o ato de quem põe a norma
É um ato de vontade, um ato que vai prescrever a norma jurídica, da
autoridade judiciária (pode ser o legislador, o juiz)
É prescritiva
- Proposição Jurídica é tudo o que se fala a respeito da norma; é o que a doutrina, a
jurisprudência fazem; é o que se desdobra, o que decorre da norma; é a interpretação
da norma.
“São juízos hipotéticos que enunciam ou traduzem que, de conformidade com o
sentido de uma norma jurídica – nacional ou internacional – dada ao conhecimento
jurídico, sob certas condições, os pressupostos fixados por esse ordenamento devem
intervir certas conseqüências pelo mesmo ordenamento determináveis”.
Da circunstância de algo ser não se segue que algo deva ser, assim como da circunstância de
que algo deve ser não se segue que algo seja.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 49
Por exemplo: o homicídio deve ser punido com reclusão de 6 a 20 anos
Ela é classificada como verdadeira quando está vinculada à norma jurídica
válida; e como falsa quando não o está.
É descritiva
É um ato de conhecimento
Interpretação Jurídica
- Há duas formas de interpretar:
Autêntica: pelo aplicador do direito (para Kelsen, ela define) – NORMA
Não autêntica: é aquela realizada pela ciência do direito [polemiza] –
PROPOSIÇÃO
Direito e Ciência do Direito
- Kelsen esclareceu, repetidamente, que a sua teoria é uma teoria pura do direito
positivo e não uma teoria do direito puro (direito puro é aquele direito desconectado
da realidade); não se trata, portanto, de dizer que Kelsen afirmava a pureza do direito
em si. A pureza é atributo da ciência que ele quis constituir. Em outras palavras, a
teoria pura, ou seja, a ciência do direito, para Kelsen, possui um objeto: as normas
de direito positivo.
- Qual o princípio metodológico principal dessa ciência?
A pureza do direito.
- Na ciência do direito é que ele busca esse princípio da pureza
A ciência do direito e a norma jurídica fazem parte do DEVER SER
- A ciência do direito é o molde, a forma que pode ser preenchida com qualquer
conteúdo.
Kelsen não compactuou com o sistema nazista; escreveu obra sobre justiça e
democracia. Mas a teoria do direito é uma esponja que também recebe esses
princípios nazistas.
Validade
Tripé de Importância para Kelsen: norma fundamental, validade e sistema hierarquizado
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 50
- A validade não submete a norma ao juízo do certo e do errado, mas apenas ao juízo
jurídico propriamente dito, ou seja, ao juízo de existência ou não diante de um
determinado ordenamento.
C
- A Norma Fundamental é o pressuposto de validade da constituição. Ela dá validade a
todo ordenamento jurídico (está no ápice das pirâmides), ela não é posta, é um
postulado que não é deduzido, não deriva de um ato de vontade e sim de um ato de
pensamento (idéia da razão – por isso é neokantiano).
É uma espécie de poder constituinte originário (poder originário é um conjunto
de forças que, em determinado momento, tornou-se hegemônico – assembléia
constituinte, congresso constituinte, golpe, revolução). NÃO É KELSEN.
A assembléia inclui todos os cidadãos, mesmo sem filiação política –
quando a constituição está pronta, dissolve-se a assembléia.
O congresso segue as regras de uma eleição e o eleito exerce as funções
de legislador ordinários e também de constituinte.
O golpe é quando uma parcela do poder político se rebela em relação
ao todo e se torna hegemônico – já a revolução parte da sociedade.
Uma hipótese que pode estar ligada a um acontecimento, mas que funda um
sistema.
Ela não existe, é uma abstração
Não é uma norma constitucional; trata-se de uma ficção de pensamento na
busca de determinar logicamente um começo e um fim.
Constituição Código Civil
Contrato
Decretos, regulamentos,
sentenças, portarias
Leis Ordinárias
Leis Complementares
Norma Fundamental
Constituição
Norma Fundamental
- Todo pressuposto de validade de
uma norma é sempre outra norma
superior. Norma superior é pré-
requisito para as demais normas.
Ato Executivo/
Sentenças
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 51
Ela tem a função de autorizar o poder originário a estabelecer uma
constituição, ela é força.
Porém a força não é sinônimo de violência. Para Kelsen o direito regula
a produção e o uso da força (força no sentido de poder).
- O sistema jurídico é unitário, orgânico, fechado, completo e auto-suficiente.
- Inexistente à norma fundamental devem-se aceitar pressupostos metafísicos para
fundamentação da ordem jurídica (por exemplo Deus, contrato social, direito natural)
– hipóteses para que os homens consigam elaborar uma lei.
- A constituição dá as bases para a produção do código civil; o código civil dá as bases
para a produção do contrato; o contrato dá as bases para o ato executivo, as
sentenças.
- O contrato é executado pelo ato executivo; o código civil é executado pelo contrato;
a constituição é executada pelo código civil.
Validade diz respeito à existência de uma norma
Eficácia é a produção de efeitos da norma
Vigência diz respeito ao tempo de validade da norma, do momento em que
entra em vigor até o momento em que é revogado.
Norma Jurídica
- A Norma Fundamental de uma ordem jurídica é aquela que dá fundamento último
dessa ordem. É uma norma pressuposta e não positivada.
1. Conceito: Com o termo norma se quer significar que algo deva ser ou
acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada
maneira.
2. Estrutura: Estrutura de uma norma jurídica se baseia em uma proposição
hipotética que atribui uma conseqüência a uma hipótese de fato. A norma
qualifica o fato que, se ocorrer, acarretará uma conseqüência (princípio da
imputação)
3. O Ato e Seu Significado Jurídico: A norma transforma um fato num ato jurídico
(lícito ou ilícito); não é a sua facticidade [o ser, o fato em si], não é o seu ser
natural, isto é, o seu ser tal como determinado pela lei da causalidade e
encerrado no sistema da natureza, mas o sentido objetivo que está ligado a
esse ato, a significação que ele possui. O sentido jurídico específico, a sua
particular significação jurídica, é recebido pelo fato em questão por intermédio
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 52
de uma norma que a ele se refere com o seu conteúdo, que lhe empresta a
significação jurídica, de forma que o ato pode ser interpretado segundo esta
norma.
Atos jurídicos: sentença, contrato, indenização
4. A Norma Jurídica como Sistema de Interpretação: A norma jurídica é o sentido
objetivo de um ato de vontade, pois ela dá à conduta uma significação jurídica;
descreve relações entre os fatos e as significações jurídicas. Ela é o filtro de
juridicidade.
Fatos (ser, realidade)
Norma (filtro)
Atos jurídicos
5. Norma e Produção Normativa: A norma jurídica serve como sistema de
interpretação, mas também sua significação jurídica provém de outra norma.
O direito regula a própria produção de normas. Ele é um sistema de
normas que regula o comportamento humano, uma ordem normativa
da conduta humana. É um dever ser e toda a legislação é a autorizada
pela constituição.
6. Regulamentação Positiva e Negativa:
Regulamentação Positiva: o ordenamento expressa a obrigação ou a
proibição de uma conduta.
Regulamentação Negativa: tudo que não é proibido por lei é permitido
7. Norma e Valor: O valor de uma conduta é julgado como bom ou mau de acordo
com a norma; deve ser observada sua correspondência com o ordenamento
jurídico porque Kelsen não incluía o ordenamento de valor.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 53
Da Norma ao Ordenamento Jurídico
Norberto Bobbio
- Uma teoria do direito deve, antes de tudo, conceituar o seu objeto.
- Ordem é um sistema de normas = Ordenamento
- Para Bobbio, não é possível uma definição adequada do direito do ponto exclusivo da
norma jurídica. Essa definição adequada só é possível a partir da composição do
ordenamento jurídico (do sistema de normas).
- O que se entende por norma jurídica? Essa definição é resolvida quando ampliamos o
campo de pesquisa para o que entendemos por ordenamento jurídico.
Teoria Tradicional do Ordenamento: o ordenamento é composto por normas jurídicas.
Teoria de Bobbio: compreensão diferente, na medida em que diz que não existem
ordenamentos porque há normas, mas sim que só existem normas porque há o
ordenamento jurídico.
O direito indica muito mais um sistema normativo que um tipo específico ou
particular de normas.
- Se nós sabemos que o ordenamento jurídico é um sistema de normas, como todo
sistema, um ordenamento jurídico é um conjunto de normas.
Essa definição geral de ordenamento jurídico pressupõe uma única condição:
na constituição de um ordenamento jurídico concorre mais de uma norma,
pelo menos duas.
- Em todo ordenamento jurídico, encontramos dois tipos de normas.
1. Norma de Conduta: é aquela que regula o comportamento humano. Por
exemplo, ‘é proibido matar’.
2. Norma de Estrutura: é aquela que regula a produção das normas jurídicas. Por
exemplo, indicando quem tem autoridade para dizer que é proibido matar.
- Considerando a pluralidade das normas jurídicas, podemos conceber um
ordenamento jurídico formado por apenas uma norma de conduta?
NÃO podemos entender o comportamento humano com apenas uma norma.
Ela, por si só, não daria conta da complexidade desse comportamento.
- Pode existir um ordenamento com várias normas de conduta e uma única de
estrutura?
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 54
SIM. O ordenamento de uma monarquia absoluta segue esse padrão: é
obrigatório tudo aquilo que o soberano determina. Nesse ordenamento, as
normas de conduta serão tantas quantas forem as ordens do soberano.
- Como um ordenamento jurídico é composto por mais de uma norma, essa
pluralidade produz os principais produtos relacionados à existência de um
ordenamento jurídico. Os problemas do ordenamento jurídico provêm dos problemas
das relações entre as normas. Eis tais problemas:
1. Problemas da Unidade
2. Problema da Coerência
3. Problema da Completude
Em primeiro lugar, deve-se observar se forma uma unidade. O problema
fundamental é o problema da hierarquia das normas.
Em segundo lugar, deve-se saber se, além da unidade, constitui um sistema. O
problema fundamental a ser colocado é aquele das antinomias (antinomia é a
presença de normas contraditórias em um mesmo ordenamento jurídico).
Em terceiro lugar, além de ser unitário e sistemático, pode ser também
completo. O problema fundamental é o das lacunas do direito.
1. Unidade
- Em cada ordenamento o ponto último de referência de todas as normas é aquilo que
chamamos de poder originário ou poder constituinte – além dele não há outro capaz
de justificar o ordenamento jurídico e é ele que funda também a ordem jurídica.
Esse poder originário é chamado de fonte de todas as fontes.
- Poder Originário é aquele que funda uma ordem jurídica. Nada mais é que o
conjunto de forças que em um determinado momento histórico se torna hegemônico
e passa a exercer o poder político. Manifesta-se de quatro formas:
a) Revolução: é quando a sociedade depõe toda a ordem em vigor e esse grupo
forte que ascende ao poder detém, então, o poder originário (nela o poder
originário é da sociedade, que consegue ascender/ tomar para si o exercício do
poder político)
b) Golpe: não tem base social; é dado entre aqueles que já detêm o poder. Uma
parcela passa a exercer o poder político se sobrepondo aos demais.
Implicam na destruição
da ordem em vigor
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 55
- Tanto a assembléia quanto o congresso constituintes são formas legais ou
constitucionais da transmissão desse poder originário mediante a manutenção dessa
ordem vigente. Há uma possibilidade de reformulação através da sociedade.
c) Assembléia Constituinte: é formada por cidadãos. Qualquer cidadão brasileiro,
em pleno exercício de seus poderes políticos pode concorrer a funcionário da
assembléia sem filiação partidária e sem acumular função de legislador
ordinário – não são políticos de carreira. Tem o fim exclusivo de produzir uma
constituição que, quando entra em vigor, dissolve a assembléia.
d) Congresso Constituinte: os componentes são vinculados a partidos políticos e
são eleitos como constituintes e legisladores ordinários que continuam
exercendo essa função mesmo após a constituição entrar em vigor.
- Se todas as normas derivassem do poder originário nos encontraríamos diante de um
ordenamento simples (ele colocaria todas as ordens). Mas não é assim que acontece.
- A necessidade de normas de conduta é tão grande que não é possível ...
Os ordenamentos jurídicos são complexos cujas normas derivam de outras
fontes além do poder originário. Essa complexidade depende de duas razões
principais:
Nenhum ordenamento jurídico nasce num deserto; sempre sobram
restos normativos que são reconhecidos por essa nova ordem jurídica.
O novo ordenamento nunca elimina completamente as outras
estratificações normativas.
O fato de o poder originário criar, ele mesmo, outras centrais de
produção normativa para dar conta da necessidade de produzir as
normas. Ele atribui aos órgãos executivos o poder de estabelecer
normas subordinadas àquelas por ele estabelecidas.
- Fontes do direito são as origens primárias do direito, de onde ele surge. Assim, temos
basicamente dois tipos:
a) Fontes Reconhecidas: quando um ordenamento novo reconhece expressa ou
tacitamente normas preexistentes a ele (de outros ordenamentos que caíram,
dos costumes sociais)
b) Fontes Delegadas: quando o poder originário delega a outros órgãos a
competência para a produção de normas válidas.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 56
- O que interessa não é tanto saber quais as fontes, mas compreender que o
ordenamento jurídico regula não apenas o comportamento humano, mas também o
modo pelo qual as normas jurídicas devem ser produzidas.
- Em um ordenamento estatal moderno, em cada grau vamos encontrar normas de
conduta ao lado de normas de estrutura. Por exemplo, na nossa constituição.
Artigo 5º, inciso 4: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato” Regra de conduta
Existem também outras normas que regulam o processo através do qual o
congresso pode funcionar. Artigo 61: “A iniciativa das leis complementares e
ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do
Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da
República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta constituição”
_______________________________________________________________________
Excedendo a teoria de Bobbio, há outros tipos de fontes do direito que também são
definidas ou especificadas como fontes formais e materiais.
1. Fontes Materiais/ Reais
- São os fatos sociais, históricos, relevantes, naturais, o desenvolvimento científico do
conhecimento, que afetam a sociedade e, como tal, afetam também o direito.
- São elementos e valores que emergem da realidade social e inspiram o ordenamento
jurídico (por exemplo, a técnica de manipulação do genoma humano).
- Há uma pluralidade das fontes reais ou materiais do direito, pois se ele existe na
sociedade, tudo aquilo que a afeta, afeta também o direito.
2. Fontes Formais
- São os processos mediante os quais as normas se positivam como força obrigatória.
2.1 Estatais: a legislação (leis, decretos, regulamentos) e as jurisprudências
(súmulas, sentenças)
2.1.1 Legislação: conjunto de normas em vigor num estado em
determinado momento histórico.
2.1.2 Jurisprudência: conjunto das decisões uniformes e constantes dos
tribunais resultantes da aplicação das normas aos casos concretos
constituindo uma norma aplicável a todos os casos similares ou
idênticos. É uma norma de aplicação.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 57
2.2 Não-Estatais: costumes, a doutrina e as convenções (poder de negociação)
2.2.1 Costume: é uma norma social e a fonte material é fonte social; por
que é considerado uma fonte formal não-estatal? Porque nem todo
costume pode ser considerado fonte do direito. Só aquele que não
for contrário aos princípios que regem a ordem jurídica entra em
vigor.
2.2.2 Doutrina: é a produção teórica dos especialistas/ jurisconsultos
sobre o direito e o conteúdo das normas. Auxilia a aplicação do
direito e pode antecipar uma decisão.
2.2.3 Convenções/ Contratos/ Poder de Negociação: há liberdade de
negociação garantida pela ordem jurídica – salvo se tratar com a
incapacidade do sujeito ou com a ilicitude do objeto. É fonte do
direito porque com base nesses casos se discutem algumas questões
juridicamente; e em caso de quebras de contrato, por exemplo, está
sujeito a sanção.
_____________________________________________________________________
- A complexidade de um ordenamento jurídico não exclui, no entanto, a sua unidade.
Não podemos falar de ordenamento jurídico sem falarmos em sentido unitário.
- Bobbio aceita a teoria da construção escalonada de Kelsen segundo a qual as normas
não estão situadas no mesmo plano em um ordenamento jurídico: há normas
inferiores e normas superiores.
- A norma superior produz a inferior; e a norma inferior executa a superior.
Plano
das
Normas
Postas
Ato Executivo
Série de
Produção
Normativa Série de
Execução
Normativa
Contrato
Código
Civil
N.C.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 58
A produção implica PODERES
A execução implica DEVERES
- Kelsen diz que não há norma sem um poder capaz de colocá-la e ele está autorizado,
por sua vez, por outra norma.
Código civil possui as normas que regulam o contrato. Com base nessas
normas, nós temos um contrato, que é fonte de direito.
Ato executivo é a entrega da coisa mediante o pagamento conforme
contratado.
- Qual a norma que autoriza que tipo de poder para colocar a constituição?
A Norma Fundamental autoriza o poder originário/ constituinte para colocar a
constituição.
- O que é norma fundamental para Kelsen?
É uma ficção
É uma norma pressuposta; não é posta.
É um ato de pensamento; não de vontade – ou seja, nós, sem vê-la, podemos
conhecê-la
Ajuda a conhecer a unidade de um sistema escalonado de normas ao conferir o
último grau de validade de toda a ordem em vigor.
Autoriza o poder originário a colocar a constituição.
É formal e não material – ou seja, não possui nenhum conteúdo. A única coisa
que ela poderia dizer é que nós devemos obedecer à constituição.
- Para Bobbio, ainda que a norma fundamental seja pressuposta, formal, ela não é
mera ficção e podemos conhecer sua materialidade. Para que nós possamos
compreender essa materialidade da norma fundamental temos que conhecer/
entender o que é esse poder originário.
Poder Originário é o conjunto de forças que em determinado momento passa a
ser hegemônico e exercer o poder político.
- Isso nos leva a afirmar que para Bobbio a norma fundamental é a força. Então o
direito é força – o que não quer dizer que seja violência.
- Quem dá esse sentido à norma fundamental?
Nós. Depende de cada um a condução da sociedade, a expressão dessa norma.
Nenhum poder totalitário sustentou-se sem base popular.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 59
2. Coerência
- Esse segundo problema preocupa-se com a questão de o ordenamento jurídico ser
ou não uma unidade sistemática, se constitui um sistema
- O pensamento jurídico trabalha de forma equivocada com a palavra sistema. Embora
o uso seja recorrente, a definição é precária. Na história recente da teoria do direito,
podemos encontrar três sentidos para a palavra ‘sistema’:
a) Um determinado ordenamento é um sistema na medida em que todas as
normas jurídicas que o compõem são derivadas de alguns princípios gerais
(como a liberdade em Kant – nenhuma norma pode coibi-la). Essa concepção
diz respeito, exclusivamente, ao direito natural que é compreendido como um
sistema dedutivo, um princípio geral a partir do qual todas as demais normas
são deduzidas.
b) Outra definição pode ser encontrada na ciência do direito moderno. Nela a
palavra ‘sistema’ é utilizada para indicar um ordenamento da matéria
organizado a partir de um processo indutivo, a partir do conteúdo simples das
normas com a finalidade de construção de conceitos mais gerais e classificação
desses conceitos em matérias inteiras com o intuito de ordenar todo o material
jurídico.
Para Bobbio
- No entanto, esses dois conceitos são insuficientes.
c) Esse sentido é aquele que realmente importa para o pensamento jurídico.
‘Sistema’ equivale à validade do princípio que exclui a incompatibilidade das
normas.
- Norma Jurídica para ser assim considerada deve ser compatível com as demais
normas. Quando as normas não são compatíveis umas com as outras, estamos diante
de uma antinomia.
- Antinomia Jurídica se refere/ especifica a incompatibilidade de normas em um
mesmo ordenamento jurídico. Há duas condições para a existência de antinomias:
Que as normas pertençam ao mesmo ordenamento jurídico.
Quem se assusta com a redução do direito à força, não está preocupado com o direito que
é (força), mas com aquele que deveria ser.
E se o direito é força, tanto melhor se os mais fortes forem também os mais justos.
Direito Natural Sistema Dedutivo
Direito Positivo Sistema Indutivo
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 60
Que tenham o mesmo âmbito de validade.
- Há quatro planos de validade:
Temporal: é proibido fazer barulho no condomínio a partir das 10 da noite. Essa
norma não é incompatível com a norma que permite fazer barulho em outros
horários.
Espacial: é permitido fumar no corredor – não é incompatível com a norma que
proíbe fumar em sala de aula.
Pessoal: é proibido vender bebida alcoólica a menor de 18 anos – não é
incompatível com aquela que permite a venda de bebida alcoólica.
Material: a norma que proíbe fumar maconha não é incompatível com aquela
que permite fumar cigarro ou cachimbo (está regulando outra coisa).
- Quando duas normas são incompatíveis em um ordenamento jurídico, este não se
desfaz; preserva-se o sistema trabalhando com a possibilidade de resolução dessas
antinomias.
- Três critérios para a solução dessas antinomias:
a) Critério Hierárquico/ Lex Superior: aquele que diz: lei superior derroga lei
inferior (as normas em um ordenamento são colocadas em uma ordem
hierárquica). Esse critério é uma das conseqüências dessa estrutura.
b) Critério Cronológico/ Lex Posterior: entre suas normas incompatíveis prevalece
a norma posterior, o que é uma dedução lógica – se prevalecesse a anterior,
não haveria possibilidade de transformação da ordem.
c) Critério da Especialidade: lei especial derroga a lei geral. Então lei especial é
aquela que anula a lei geral porque subtrai uma parcela dessa norma e a
submete a uma regulamentação específica.
- No entanto, podem ocorrer antinomias entre duas normas com as mesmas
classificações. Entra-se numa dimensão de um conflito não apenas de normas, mas de
critérios. Estamos diante de uma antinomia de 2º grau.
- Há três conflitos que podem ocorrer entre critérios.
a) Conflito entre os Critérios Hierárquico e Cronológico: tem lugar quando a
norma anterior superior é antinômica a uma posterior inferior. Prevalece o
critério hierárquico. A solução é bastante óbvia para Bobbio porque, se fosse o
cronológico, o hierárquico se tornaria vão.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 61
b) Conflito entre os Critérios Cronológico e da Especialidade: tem lugar quando a
norma anterior especial é antinômica a uma posterior geral. Prevalece a
anterior especial. Essa regra deve ser tomada com certa cautela na medida em
que o critério da especialidade tem poder menos decisivo que o hierárquico.
Cronológico é considerado mais fraco em relação aos demais critérios.
c) Conflito entre os Critérios Hierárquico e da Especialidade: tem lugar quando a
norma superior geral é antinômica a uma inferior especial. Uma resposta
segura a esse conflito é impossível porque depende muito mais de instituições
políticas que jurídicas. Na regra, deveria prevalecer o critério hierárquico.
- Quando há conflito entre os critérios para resolução dos conflitos entre as normas, o
aplicador do direito pode ab-rogar uma, as duas normas ou preservar ambas. Essa
preservação se dá quando a antinomia é apenas aparente (o que pode ser concluído a
partir de uma análise mais profunda).
- A interpretação ab-rogante é um termo, embora utilizado, impróprio porque o
aplicador do direito não tem esse poder , mas apenas de suspender a eficácia dessa
norma (deixa de aplicá-la) cabendo o poder de ab-rogar (tirar) apenas ao legislador.
- O dever de coerência serve para preservar a certeza jurídica (diz respeito ao fato de
os cidadãos conhecerem a juridicidade dessa norma). Além disso, o dever de coerência
preserva também a segurança jurídica e a justiça.
Justiça, para Bobbio, é o tratamento igual de todos perante a lei.
3. Completude
- Preocupa-se com o problema das lacunas.
- Completude é a propriedade pela qual o ordenamento jurídico tem uma norma para
regular qualquer caso que for apresentado para a apreciação do poder judiciário. É a
ausência de lacunas.
- O nexo entre coerência (exclusão de toda situação na qual encontramos normas
contraditórias em um mesmo sistema) e a completude (exclusão de toda a situação na
qual não pertençam ao mesmo sistema normas que se contradizem) é que:
Deve-se eliminar as normas contraditórias
Mas também deve-se atentar para o fato das lacunas.
- No âmbito das práticas jurídicas valem duas regras:
O juiz é obrigado a julgar qualquer caso apresentado a ele
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 62
Além disso tem que julgar tais casos com base em uma norma que pertença ao
ordenamento jurídico.
- A origem histórica desse dogma da completude ...
No Estado Moderno (que detém o monopólio da força e da legislação) é
necessário, porque senão teríamos que admitir a concorrência do sistema
jurídico estatal com outros não estatais.
Desde a origem o direito nasce como algo completo capaz de oferecer solução
a todas as controvérsias apresentadas.
Século XIX: Escola da Exegese todo direito está contido na lei, no código. O
direito é colocado como sinônimo de lei e para estudá-lo temos que conhecer o
código.
Com o passar do tempo, ainda no século XIX, as sociedades sofreram o impacto
da revolução industrial que trouxe à tona uma realidade antes contida, exposta
a uma legislação que pregava a liberdade, a dignidade e a fraternidade dos
seres humanos.
Percebe-se aqui a distância entre a norma posta e a realidade social:
nem tudo o que é direito está normatizado.
- Nasce a Escola do Direito Livre: propõe uma crítica ao fetichismo da lei e à
completude do ordenamento jurídico nos estados.
- O Positivismo Jurídico, ligado ao fetichismo da lei e à completude, não se deixou
derrotar tão facilmente.
Em reposta à escola do direito livre, lançou a Teoria do Espaço Vazio: não há
como falar em lacunas na ordem jurídica vigente; tudo que é relevante o direito
normatiza (só não normatiza aquilo que não tem relevância jurídica).
- Quando a lei for omissa, o juiz decidirá através de costumes, analogias e princípios
gerais do direito. Ou seja, a própria ordem jurídica reconhece suas lacunas. As lacunas
podem ser de dois tipos:
a) Próprias: quando realmente constituem a ausência de uma norma num sistema
para regulamentar uma situação específica. Essas lacunas podem ser
eliminadas a partir da atividade do aplicador do direito – só elas importam ao
operador do direito.
b) Impróprias: quando deriva da compreensão de um sistema real com um
sistema ideal. Essas lacunas podem ser eliminadas só através da formulação de
novas normas/ da atividade do legislador.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 63
- Esse conceito de espaço jurídico vazio é muito frágil. Para continuar sustentando que
ao direito nada falta foi criada a Teoria da Norma Geral Exclusiva que diz que uma
norma quando proíbe determinado comportamento ela permite, por contraste, todas
as outras condutas.
Tudo o que não está expressamente proibido por lei, por lei é permitido.
- Essa teoria também é frágil porque conforme a sociedade evolui, práticas que não
podem ser consideradas lícitas surgem (por exemplo, a manipulação do genoma
humano).
- Por fim, a terceira teoria: Teoria da Norma Geral Inclusiva (por exemplo, o que
encontramos no artigo 4º da lei de introdução ao código civil: “quando a lei for omissa,
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do
de direito”)
- As lacunas próprias são eliminadas:
Método da Hetero integração: consiste na integração operada através do
recurso a ordenamentos diversos. Assume três formas:
1) Recurso ao Costume: pode ser considerado fonte do direito
desde que não seja incompatível com o ordenamento jurídico.
2) Recurso ao Direito Judiciário: método mais importante. Recurso
a fonte judiciária em caso de omissão da lei/ lacuna no
ordenamento jurídico; recurso ao poder criativo dos juízes
(possibilidade de um juiz emitir um juízo de equidade, que pode
ou não ser transformado em jurisprudência). Porém, há limites
para esse poder criativo dos juízes.
Método da Auto Integração: consiste na resolução da lacuna através do próprio
ordenamento jurídico, sem recorrência a outras fontes, apenas às normas.
Apóia-se especialmente em dois procedimentos:
Analogia: procedimento pelo qual atribuímos a um caso não
regulamentado a mesma disciplina de um caso semelhante já
regulamentado, se essa semelhança for relevante, muito próxima – é
preciso encontrar uma qualidade comum nos dois casos. Por exemplo, a
união homossexual, em caso de divórcio não consensual (partilha do
patrimônio entre os sócios).
o Efeito: criação de uma nova norma.
Interpretação Extensiva: é ampliar um conceito contido na norma para
que ela possa atingir casos não previstos em nenhuma norma
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 64
pertencente à ordem jurídica. Leva à redefinição de um termo da norma
para que ela possa alcançar um caso não previsto na legislação.
o Efeito: extensão de uma norma para casos ainda não previstos
por ela.
3. Recurso aos Princípios Gerais do Direito: a distinção entre princípios e regras é
imprópria. Princípios são normas/ regras generalíssimas das quais as outras são
deduzidas. Então, também é norma. Muitos desses princípios já estão em
normas.
“Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece”
Artigo 5º, sobre a igualdade de todos perante a lei em deveres e em
direitos.
- Outros exemplos de princípios que não estão nas normas
a) Ninguém pode transferir mais direito do que tem
b) A boa fé se presume e a má fé deve ser provada
c) Ninguém pode invocar sua própria malícia
d) Dano causado por dolo ou culpa deve ser reparado
e) Autonomia da vontade e a liberdade de contratar
f) Responde-se pelos próprios atos e não pelos atos de outros
g) Deve-se favorecer mais aquele que procura evitar um dano que aquele que
busca a realização de um ganho
h) Não se pode responsabilizar alguém mais de uma vez pelo mesmo fato.
_______________________________________________________________________
Revisão
- O que é direito?
Kelsen: Direito é aquele que regula em uma sociedade o uso da força.
Bobbio: É aquele que regula a sociedade através da força.
- Direito e Liberdade para Kelsen
Nós não somos livres porque somos indeterminados; mas porque nossa
conduta pode ser afetada por uma norma – podemos adequar nossa conduta
àquilo que a norma estabelece.
Somos condicionados, mas não determinados por uma norma.
- Kelsen: a norma é o sentido objetivo do ato de vontade. Já proposição jurídica é a
explicitação do conteúdo da norma colocando suas possibilidades de aplicação/
interpretação de uma norma.
Caderno de Teoria do Direito UFSC – Luiza Silva Rodrigues Página 65
- O ato de vontade tem dois sentidos:
Sentido subjetivo: é a intenção do agente
Sentido objetivo: é a significação jurídica dada por uma norma ao ato
- Princípio da Causalidade: trabalha a questão das ciências. É aquele que informa as
ciências naturais. Se A é, B é. Descreve uma regularidade, é do âmbito do SER
- Princípio da Imputação: informa outro tipo de ciência, as ciências sócias normativas: a
moral e o direito. Não é descritivo, mas prescritivo. Se A é, B deve ser. Atribui uma
conseqüência jurídica a certas condutas. É do âmbito do DEVER SER
Imputar = responsabilizar o sujeito pelo ato que tem conseqüências jurídicas.
- A norma jurídica atribui, para Bobbio, conseqüências a atos e fatos dando a eles
significação jurídica.