Apresentação ii sifedoc

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II

SEMINÁRIO REGIONAL DE EDUCAÇÃO DO CAMPO: PROJETOS POLÍTICO-PEDAGÓGICOS DE ESCOLAS

DO CAMPO NO RS

Trabalho-Educação do Campo no Campo: disputa pela terra entre trabalho e capital sob a mediação do

EstadoMarlene Ribeiro – PPGedu/UFRGS

1. Introdução

1. 1 -Tema: trabalho-educação no/do campo

Uma formação humana omnilateral é indissociável do trabalho, integrando o corpo, a razão e a sensibilidade.

Portanto a terra – meio de produção que não resulta do trabalho humano – é a base do trabalho agrícola que sustenta a educação do campo, no campo.

1. 2 – Objetivo: abordar as contradições do discurso da legislação que ampara a educação do campo, articulando o trabalho agrícola à educação escolar, ao mesmo tempo em que se negam as condições de permanência no campo, dificultando ou inviabilizando esta educação.

1. 3. Justificativa

a) Necessidade de eliminar as ilusões de que a conquista da educação do campo, assegurada em lei, corresponda à garantia de condições objetivas e subjetivas para a sua efetivação.

b) A reflexão aqui proposta poderá subsidiar a luta dos movimentos sociais populares pela educação do campo - Via Campesina e Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) – na unidade do Movimento Camponês.

2. Antecedentes

Estudos destacam, como base da formação humana integral, o trabalho industrial efetivado no mundo urbano, tomado como desenvolvido e civilizado, de onde se deduz o conceito de educação, associado, no senso comum, aos processos de escolarização.

A civilização e o desenvolvimento são remetidos à cidade, com acesso a alguns direitos básicos como: água, luz, saúde, diversões...

Na estruturação das formas de viver, de gerar saberes, culturas e conhecimentos, remetidos às cidades, estão imbricadas as formas de organização e expressão dos processos de trabalho industrial, comercial e na área de serviços.

O trabalho do camponês não é considerado.

Por isso, a educação do campo constrói-se em um longo processo de lutas:

a) Contra a falta de escola para os filhos, com base na estrutura de ocupação da terra pelo latifúndio, que expulsa pequenos agricultores, indígenas e quilombolas;

b) Contra o preconceito em relação ao trabalho agrícola visto como arcaico, o agricultor como ignorante e a ideologia como uma justificativa de levar a civilização e o progresso aos trabalhadores rurais;

c) Pela superação da educação rural promovida pelo Estado que nega o agricultor enquanto sujeito de conhecimentos, cultura, saberes.

Os professores que trabalham nas escolas rurais geralmente não têm a formação que é exigida para atuar nas escolas urbanas;

E professores são designados como castigo às escolas rurais municipais por discordarem do partido do Prefeito;

Ou ainda, quando realizam uma licenciatura buscam trabalhar nas escolas urbanas.

3. Identificação das experiências de trabalho-educação do/no campo

3. 1 – É uma construção dos movimentos sociais populares articulados na Via Campesina: MPA, MST, MAB, MMC, CPT, PJR e FEAB.

Seus métodos pedagógicos são inspirados em experiências efetuadas na Rússia, por Pistrak, Makarenko, Krupskaya.

3. 2 – Inclui as CFR e EFA, vinculadas ao Movimento Sindical dos trabalhadores rurais organizados na CONTAG, ou às ONGs e Associações Comunitárias.

No método pedagógico das CFR e das EFA a relação trabalho-educação inspira-se em experiências efetuadas na França e na Itália.

3. 3 – Como educação do campo tem-se, ainda:

a) A educação indígena, associando a educação à demarcação das áreas historicamente ocupadas pelos povos indígenas (BRASIL/MEC. Parecer CNE/CEB n° 13/2012).

b) A educação quilombola, projetada pelos movimentos populares vinculados ao Movimento Negro, que lutam pela regulamentação da posse das terras ocupadas há mais de um século (BRASIL/MEC.CNE/CEB, Resolução nº 8, de 20/11/2012).

4. Características da educação do campo

A educação do campo consiste na articulação entre o trabalho produtivo na agricultura, na pesca e na pecuária com a aprendizagem de conhecimentos sistematizados, feita na escola.

Por isso, se alternam atividades de trabalho e escola, com tempos/espaços realizados no centro pedagógico, em regime de internato, e outros tempos/espaços de aplicação dos conhecimentos nas comunidades de origem.

Assim, o vínculo entre a educação escolar e o trabalho agrícola exige a garantia da terra de trabalho sem a qual não existe a educação do campo.

Há uma busca de superação da escola rural, portadora de diretrizes, currículos, conteúdos e metodologias que valorizam o trabalho, a cultura e a vida urbanos.

E, com a educação do campo, há o reconhecimento dos camponeses como sujeitos de educação, portadores de culturas, produtores de alimentos, saberes e conhecimentos.

Professores identificados com esta educação e que pretendam permanecer no campo recebem uma formação específica, através de licenciaturas em educação do campo – e são chamados educadores.

A educação do campo abrange desde a Educação Infantil, o Ensino Fundamental, Médio e Técnico, até licenciaturas em educação, em agronomia e direito e, em alguns casos, a pós-graduação.

4. (Im)Possibilidades de trabalho/educação do/no campo

Nucleação de escolas ou definição de uma escola urbana como escola-polo, para onde se dirigem as crianças e jovens provenientes das áreas rurais.

Em menos de 10 anos, segundo um Censo Escolar do INEP, o número de escolas do campo, que eram 107.432, foi reduzido para 83.036. Ou seja, cerca de 24 mil escolas tiveram suas portas fechadas.

E, apesar de reconhecer a educação do campo, o MEC, através da SECADI, aplica o Programa Escola Ativa, com recursos do Banco Mundial, de 1997-2007, prosseguindo, em 2008, com recursos do MEC.

O Pronera, vinculado ao INCRA, e, desde 2002, integrado MDA, garante recursos aos cursos de licenciatura, mas sofre intensa pressão dos senhores do latifúndio.

5. Movimento do capital na disputa pela terra

Empresas carimbadas como ecologicamente corretas burlam as leis, promovem a exploração predatória das florestas e provocam entupimento de córregos e rios.

Com isso, tais empresas dificultam quando não inviabilizam a permanência de camponeses na terra e dos seus filhos na escola do campo.

O agronegócio é o setor que mais recruta pessoas para trabalhar em regime semelhante ao de escravidão; é o que mais produz desmatamento para expansão da fronteira agrícola, especialmente na Amazônia.

A falta de apoio da legislação, a carência de instrumentos legais ou quando estes não são aplicados, se constituem em ameaça constante à permanência dos camponeses na terra.

Isso pode ser constatado pelos assassinatos de lideranças do/no campo e de religiosos/as que denunciam a apropriação indevida da terra, incluindo a de posseiros e indígenas.

Assim, um grave problema a ser enfrentado, que atinge a educação do campo, é a garantia do direito de os camponeses permanecerem na terra em que vivem e trabalham.

Sem trabalho com a, na, da terra não há educação do campo!

Políticas educacionais situam a educação rural ainda existente, as escolas oferecidas às populações camponesas, e os seus professores, dentro da estrutura fundiária predominante, baseada no latifúndio.

Esta estrutura fundiária se caracteriza:

a) pela concentração de terras em mãos de poucos proprietários;

b) pelo aumento da expropriação da terra dos pequenos agricultores;

c) pela exploração da mão-de-obra assalariada rural.

Esta estrutura fundiária é também ocupada por monocultivos, como: a soja e a cana de açúcar para a produção do etanol, e o eucalipto para a produção da celulose, entre outros cultivos e produtos...

Esta ocupação, com o uso de sementes transgênicas e agrotóxicos, é uma forma “pacífica” de expulsar camponeses que teimam em ficar e trabalhar a sua terra.

Ocorre a apropriação indevida de terras públicas ao mesmo tempo em que não se concretiza uma reforma agrária, anulando a função social da terra prevista na Constituição Federal de 1988.

Mas por que não se faz a reforma agrária?

E se estamos falando da educação do campo há que considerar a necessidade de debater, nas escolas, o trabalho relacionado ao uso de agrotóxicos e de sementes transgênicas.

A política voltada à aceleração do crescimento na ótica do capitalismo brasileiro está associada à ampliação dos espaços físicos para construir hidrelétricas e extrair minérios para a exportação.

E para onde serão varridos os camponeses que precisam da terra para trabalhar e os seus filhos que precisam da escola do campo para estudar?

Isso significa a destruição de florestas e da fauna além da apropriação de áreas habitadas por indígenas, quilombolas e por agricultores, cobrando a cada dia mais espaços para produzir commodities agropecuárias.

6. Como relacionar trabalho-educação no/do campo nestas condições?

Com as crianças tendo aulas nas sedes dos municípios e recebendo uma educação rural ou o Programa Escola Ativa, que reproduz a visão urbana de mundo?

Frequentando escolas urbanas com uma cultura diferente das suas vivências, crianças e jovens perdem os aprendizados adquiridos no trabalho com os pais e abandonam o campo e a cultura do campo.

E ao abandono da escola segue-se o abandono do campo, ou o inverso...

7. E concluindo:

Pode-se afirmar que é de suma importância a conquista da educação do campo/no campo e de algumas condições oferecidas pelo Estado, como é o caso do Pronera, para que ela se realize.

Mas só isso não basta porque são gigantescos os desafios a serem enfrentados pelos camponeses para manter-se na terra.

E a quem vamos apoiar nesta luta?

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