Post on 11-Dec-2015
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ANTROPOLOGIA CULTURAL
ACADÊMICA: MAYRA FERNANDES
MÓDULO:
A Globalização e Interculturalidade: Mais acesso a todos ou o acesso
é restrito e ilusório?
O que é a tal da Globalização? Um maior acesso as informações e diferentes
culturas do mundo, atingir e entender a dimensão humana, econômica, tecnológica,
cultural e simbólica de cada sociedade? No conceito, sim. Então todos temos maior
fluxo de informações, de movimentos humanos, comercialização de produtos e mais
atividades nas relações humanas. Chega a ser poética tal definição. Todos temos
acesso igualmente e a tudo.
Hoje através de um simples “click” podemos acessar mais sobre uma
determinada Cultura, até então, por nós desconhecida. Mas o quanto essa informação é
realmente pra todo mundo? Até onde e de que forma essas histórias e essas culturas não
chegam apenas como uma história única, e é assim, é essa a realidade que querem que
saibamos. Exemplifico: Chimamanda Ngozi Adichie é uma escritora Nigeriana, passou
parte de sua vida na cidade de Enugu, estudou desde muito cedo, a família tem boas
condições financeiras e sempre fez questão do investimento nos saberes educacionais e
humanos, aos dezenove anos deixou a Nigéria e foi estudar nos EUA. Ao chegar na
universidade sua colega de quarto, americana, a recebeu como uma pobre coitada,
miserável, pensando que teria inclusive dificuldades de comunicação com Chimamanda,
julgando que ali estava um ser “menos civilizado” que ela. Quando a nigeriana
falou fluentemente inglês, a colega surpreendeu-se em saber que ela falava sua língua,
mal sabia ela que inglês é o idioma oficial da Nigéria. E todo o convívio entre as duas
foi cheio de surpresas, coitada da americana, sim coitada! Pois ela foi uma pessoa que
através da informatização teve acesso a uma história única, na verdade o que chegou a
americana é que eles são mais “civilizados”, superiores e que todos os nigerianos,
africanos, são famintos, miseráveis e falam em dialetos, os colocam, em geral, como
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não pertencentes e talvez até mesmo incapazes de fazerem parte na mesma cultura que a
nossa.
E esse click nas informações são exatamente reais e totais ou apenas recortes de
histórias e culturas? Novamente retomo, a questão da “história única” , através do que
nos é contado entendemos que somos mais, que podemos mais e que sabemos mais
sobre todos os povos, porque temos maior “acesso as informações”.
Zigmund Bauman apresenta em seus estudos um pessimismo nessa relação
humana versus a globalização. Essa desfrontalização de territórios, são encaradas como
um processo de degradação nas relações humanas, na qual deter o poder é o foco.
Exemplo disso, é a exploração da mão de obra barata em países, que é feita em prol de
sustentar a economia de outros mais poderosos. Grandes empresas, utilizam de mão de
obra barata, pensando no próprio lucro e geralmente não visam ou pensam num
desenvolvimento local.
Nesse sentido podemos ver a Globalização como um processo de desordem
social e econômica. O “eu” poderoso, passa a denominar em outros territórios que não
o seu, as ordens sociais e as histórias de cada povo, como uma história única, são
na verdade a história que é conveniente. Assim deixamos os pobres condicionados a
um único caminho, o de ser pobre, esquecidos e miseráveis. Essa é a verdade
transmitida, essa é a verdade que em geral a sociedade acredita e segue como única. E
assim na linha de estudos de Bauman, a globalização é responsável por muitos dos
males da sociedade, mas mesmo assim todos a vislumbram e para ele esse processo da
globalização é sem cura e sem volta. A globalização é imposta de forma totalitária e
indissolúvel, ele crê que será inevitável um colapso entre nações e empresas. Fala sobre
a pobreza e a degradação social, negando ao ser humano condições minimas de
sobrevida, tornando grande parte da população como miseráveis.
Em partes creio nisso, pois as relações humanas não devem ser reduzidas ou
amplificadas da forma que uns se sobrepõe a outros. E essas relações se dão por
necessidades de poderes humanos e principalmente econômicos, não creio em histórias
únicas e sim em histórias com facetas e fases, necessidades humanas individuais fazem
parte da sociedade e do processo de uma cultura.
A Globalização parece um resultado da internet e dos acessos as informações
por meio das redes sociais e sites, mas esse processo é apenas uma intensificação de
algo que já ocorria a muito tempo.O termo surge nas décadas de 70 e 80, mas para
alguns autores esse processo da globalização inicia juntamente com a expansão
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marítimo-comercial europeia, no final do século XV e início do século XVI, na qual
expandi-se também o sistema capitalista pelo mundo. Então a globalização aconteceu
para atender um sistema, de venda, consumo, exploração de terras não conhecidas,
novas matérias primas e consequentemente novos produtos que poderiam ser
interessantes ou não, mas testar produzir e consumir, esse era e é o principal viés na
nossa sociedade.
Desapropriar terras e povos, para fim exploratórios, para venda e lucro, assim
começou por exemplo a história do nossa país. No texto da Eliane Brum com um titulo
que já diz tudo, “Índios, os estrangeiros nativos”, fica claro que essa ideia exploratória
de desterritorialização e o pior de desculturilização, não foi só no descobrimento do
Brasil, no qual é sabido por todos o genocídio ocorrido em nossas terras. Ainda hoje
com as necessidades tecnológicas da maioria dominadora, os índios são tratados como
estrangeiros, dentro do seu próprio local natural, os nossos nativos sofrem hoje um
processo de xenofobia e eles são “os outros”, são ao olhar de muitos os que incomodam,
os que impedem o nosso desenvolvimento. Os indios são, nessa perspectiva um entrave
ao desenvolvimento social, ou melhor dizendo, um entrave ao desenvolvimento do
capitalismo. Com isso eles estão fora, são classificados e tratados como bichos,
incapazes de tomar decisões com coerência. Os índios que são o inicio da nossa cultura,
hoje são julgados um entrave ao desenvolvimento.
O texto "Culturas híbridas - estratégias para entrar e sair da modernidade “ do
argentino Néstor Garcia Canclini, aborda importantes questões sobre a problemática da
modernidade na América latina. Ele fala sobre as possibilidades de saída desse processo
de modernidade e julga necessário que isso ocorra. Refere-se a Hibridação Cultural
como um processo de mesclar diversas formas culturais.
Essa Hibridação Cultural, está ligada de alguma forma ao progresso, se nos
colocarmos num lugar diferente do da competição, ou seja do ser mais ou menos,
apenas diferentes com culturas e saberes diferentes, nessas diferenças possivelmente
encontraremos a evolução social e humana.
Ao invés da disputa pelo poder em sistema extremamente ditado por ele,
estabelecermos nas diversidades a busca pela evolução. Colocarmos a globalização e o
acesso a informação de maneira agregadora, que some fatores e não gere sempre
disputas. Não.Não somos mais ou menos civilizados e sim apenas, civilizações
diferentes.
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A Globalização para alguns autores, nesse sentido fica como um entrave para a
cultura, retomando a questão dos índios em nosso país, sendo “relocados” de seus
lugares para a construção de rodovias, ferrovias e hidroelétricas, com isso toda uma
cultura é destruída, eles são retirados de seus locais que são natos, pertencem a eles,
para a construção de recursos que favorecem o desenvolvimento e o progresso, por trás
disso tudo existem discursos políticos que pregam a violência e a xenofobia. Esses
discursos passam a ser verdade para muitos da sociedade, tendo em vista que quem
detém o poder de transmitir as informações de globaliza-las não são os índios e sim os
“poderosos”, os que estão em prol do desenvolvimento e do progresso da nossa
sociedade.
Os índios, para os poderosos e aos que cedem as informações sem filtro, a os
índios são apenas índios, hoje pra muitos, já sem cultura e sem identidade “ um bando
de vagabundos” que já não são mais nem brancos nem índios.
Ao decorrer desse texto transcrevo minha compreensão sobre essa
interculturalidade e o processo da globalização, inicio o mesmo com indagações sobre o
acesso as informações e se esse acesso é homogêneo a todos do nosso globo de
terrestre. Ao decorrer das leituras, pesquisas e das percepções que detive nesse período,
noto que sim o processo da globalização causa entraves humanos. Creio que a
interculturalidade ou a hibridação cultural se realizada de maneira total ela leva a
evolução humana e social. Aceitar e compreender as culturas que formam o nosso
mundo, trocar e somar seria de fato evolutivo, levaria a menos intolerância e ao
entendimento que não existe mais ou menos evoluído, apenas evoluções com
parâmetros culturais diferentes.
A globalização é maravilhosa, poder pegar um avião e estar do outro lado do
globo terrestre tomando um chá tipico da região é de uma magnitude fantástica. O que
não é fantástico é a bitolação ou manipulação das informações, fazendo com que as
mesmas cheguem de maneira superficial. Dessa forma assim como Bauman acho que a
globalização é responsável por muitos males da nossa sociedade.
O que nós precisamos de fato e desenvolver um meio de deter uma apropriação
crítica das nossas diferenças, já dizia Laura Segato, eu concordo e creio que é dessa
maneira que deve-se estabelecer a ordem social. Estamos num período de intensificação
de todos os processos e se não houver um senso critico, apurado e interpretativo das
informações elas serão negativas ao desenvolvimento humano.
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REFERENCIAS
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: As conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999.
BHABHA, Homi K. (2007) [1994] “ Como o novo entra no mundo: o espaço pós
moderno, os tempos pós coloniais e as provações da tradução cultural” (Cap. 11) in: O
local da cultura. Belo Horizonte, Editora UFMG, pp. 293-325.
BRUM, Eliane “Índios: os entrangeiros nativos”, Revista Época, 10/06/2013.
CANCLINI, Néstor García (1998) “ Culturas híbridas, poderes oblíquos” (Cap 7) in:
Culturas hibridas. São paulo, Edusp, pp. 283-350.
SEGATO, rita Laura (2012) [2010] “Gênero e colonialidade: embusca das chaves da
leitura e de um vocabulário estratégico descolonial”, e-cadernos CES, nr.187
(Epistemologias feministas: ao encontro da critica radical), Centro de Estudos Sociais
da Universidade de Coimbra, pp. 106-131.