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Afetividade na relação professor aluno para o desenvolvimento da aprendizagem
Development of learning and the role of affectivity in the teacher-student relationship
Cleusa Piovezan Almeida1
Tania Stoltz2 RESUMO
A construção das relações afetivas no espaço escolar tem sido um desafio para os educadores, pois exercem forte influência sobre as crianças e os adolescentes. É importante lembrar que a escola é um ambiente onde as crianças permanecem durante uma importante fase de seu desenvolvimento e, por isso, precisam estar envolvidas de carinho, afeto e atenção. Levando em consideração esses aspectos, o presente artigo tem por finalidade discutir a influência da afetividade no processo de ensino e aprendizagem com base nos estudos de Vygotsky (1991, 1993, 1998, 2001), mais especificamente em sua discussão sobre a influência da interação social no aprendizado, e a teoria de Wallon (1978, 2007), que sinteticamente afirma que a dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista da construção da pessoa quanto do conhecimento. A conclusão deste estudo aponta que tanto Wallon como Vygotsky apresentam pontos em comum no que diz respeito à questão da afetividade que, ao lado da inteligência, é fundamental para o desenvolvimento humano. Palavras-chave: Afetividade. Criança. Desenvolvimento. Aprendizagem. Educação. ABSTRACT Building relationships of affectivity in the school environment has been a challenge for educators, given that they exert a strong influence over children and teenagers. It is important to recall that the school is a place where children spend remain during an important phase of their development. For this reason they need to be surrounded with care, affection and attention. Taking these aspects into consideration, the purpose of this article is to discuss the influence of affectivity on the teaching and learning process. This discussion is based on the studies of Vygotsky (1991, 1993, 1998, 2001), more specifically on his discussion of the influence of social interaction on learning, as well as on the theory of Wallon (1978, 2007) which, in short, states that affectivity plays a key role, both in people's development and in building knowledge. The conclusion of this study indicates that both Wallon and Vygotsky present points in common with regard to the question of affectiveness which, along with intelligence, is fundamental for human development . Keywords: Affectivity. Child. Development. Learning. Education.
1 Pedagoga da Rede Estadual de Educação do Paraná, participante do Programa de
Desenvolvimento Educacional, turma 2010. 2 Professora orientadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPR.
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INTRODUÇÃO
Há muito tempo a afetividade vem sendo tema de discussão. Muitos autores
defendem que a escola deve aliar o ensino a uma relação de afetiva que auxilie o
aluno no seu desenvolvimento cognitivo.
A construção das relações afetivas dentro do espaço escolar é um desafio
aos educadores, já que exercem forte influência sobre crianças e adolescentes. O
educador deve levar em conta a personalidade dos alunos, suas características e
suas atitudes, de forma que a sua influência seja a mais positiva possível.
A criança e o adolescente desejam e necessitam ser amados, aceitos,
acolhidos, e ouvidos para que possam despertar para a vida quanto à curiosidade e
ao aprendizado, e é o professor que despertará a busca do interesse de seus
alunos. A postura profissional se manifesta na sensibilidade ao interesse do aluno,
entendendo-o a partir de sua maneira de agir e pensar, respeitando a opinião
individual que cada um tem, seu pensamento e seu modo de sentir o mundo.
Considerando que o educador é modelo significativo, é preciso que
compreenda que a aprendizagem se efetiva por meio das interações que estabelece
com seus alunos. Neste sentido, o objetivo deste artigo é o de pesquisar a influência
da afetividade no processo de ensino-aprendizagem com base nos estudos de
Vygotsky (1991, 1993, 1998, 2001) e Wallon (1978, 2007).
AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM
Vallejo-Nágera (1997) entende a afetividade como o modo através do qual o
nosso ser interior é afetado por tudo aquilo que ocorre à nossa volta, o que provoca
sensações que oscilam entre dois pólos opostos: amor-desamor, alegria-tristeza,
recusa-aceitação.
Goleman (1997), ao desenvolver o conceito de inteligência emocional,
salienta que aprendemos sempre melhor quando se trata de assuntos que nos
interessam e nos quais temos prazer.
A afetividade exerce um papel fundamental nas correlações psicossomáticas
básicas, além de influenciar decisivamente a percepção, a memória, o pensamento,
a vontade e as ações, e ser, assim, um componente essencial da harmonia e do
equilíbrio da personalidade humana.
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A afetividade é situada como um conceito mais amplo, envolvendo vivências e
formas de expressão humanas mais complexas, desenvolvendo-se com a
apropriação dos sistemas simbólicos culturais pelo indivíduo, que irão possibilitar
sua representação, mas tendo como origem as emoções. É um conceito que, “além
de envolver um componente orgânico, corporal, motor e plástico, que é a emoção,
apresenta também um componente cognitivo, representacional, que são os
sentimentos e as paixões” (DER, 2004, p. 61). Assim, a afetividade envolve as
vivências e as formas de expressão humanas, apresentando um salto qualitativo a
partir da aquisição dos sistemas simbólicos, em especial a fala, e isso possibilita a
transformação da emoção em sentimentos e sua representação no plano interno,
passando a interferir na atividade cognitiva e possibilitando seu avanço.
A dimensão afetiva nunca foi negada nos processos de constituição humana,
mas também não tem sido considerada quando se trata do desenvolvimento
humano. Segundo Leite (2006), pode-se compreender os motivos através de uma
análise histórica que nos explica a herança que recebemos de uma concepção
dualista do ser humano, cujas raízes estão na tradicional separação cartesiana do
ser humano, onde o homem é visto separado entre razão e emoção.
Além desse dualismo razão/emoção, durante séculos o pensamento
dominante sempre caracterizou a razão como a dimensão mais importante, sendo a
emoção, em vários momentos históricos, responsável pelas reações inadequadas do
ser humano, é possível reconhecer que até o século XX predominou a interpretação
de que razão deve dominar e controlar a emoção, o que seria possível pelo
processo de desenvolvimento, no qual os mecanismos institucionais educacionais,
com destaque para a família e a escola, teriam um papel fundamental (VYGOTSKY
apud ARANTES, 2003).
Assim, compreende-se que essas representações tiveram papel crucial na
escola, em especial nos currículos e programas educacionais, pois contribuíram em
considerar apenas as dimensões racionais e cognitivas no trabalho pedagógico.
A pedagogia baseada em concepções dualistas e racionalistas, caracterizava
a aprendizagem como produto exclusivo da inteligência formal, desconsiderando os
aspectos afetivos. Tal crença faz com que o pensamento seja considerado
calculista, frio e desprovido de sentimentos (VASCONCELOS, 2004).
Com o surgimento de novas concepções teóricas centradas nos
determinantes culturais, históricos e sociais do ser humano criou-se condições para
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uma nova visão sobre o papel da dimensão afetiva no desenvolvimento humano,
bem como das relações entre razão e emoção. A partir da ampliação dos
conhecimentos sobre a emoção e seus complexos processos de constituição, o
conceito de homem centrado somente na dimensão racional, vem sendo revisto.
Atualmente, pode-se identificar esta questão em alguns autores como
Damásio (2001), que colocam a emoção como base do processo de
desenvolvimento humano. Assim também os teóricos da abordagem histórico-
cultural afirmam que as primeiras reações do recém nascido são de natureza
emocional, Wallon (2007) por exemplo, afirma que no estágio impulsivo – emocional
(0 a 1 ano) a criança expressa sua afetividade por meio de movimentos
desordenados, em resposta a sensibilidades corporais dos músculos, das vísceras e
do mundo externo, para satisfazer suas necessidades básicas. Nesta prespectiva,
tal dimensão seria a base de todo o processo de desenvolvimento humano.
Para defender a idéia de que as dimensões afetivas influenciam no
desenvolvimento e na aprendizagem do indivíduo, tem-se que levar em conta a
questão da relação sujeito-objeto. Essa relação é central no processo de construção
do conhecimento e do desenvolvimento humano, segundo Leite (2006).
Assim, as relações estabelecidas entre pais e filhos, alunos e professores é
que determinarão em grande parte a qualidade das relações futuras que se
estabelecerão entre o jovem e os diversos objetos culturais, já que essas relações
são marcadamente afetivas e os pais e professores são os principais mediadores
entre a criança e os diversos objetos culturais.
Pino, citado por Leite (2006, p. 130-131), analisando as experiências afetivas,
defende que cada indivíduo é afetado por acontecimentos da vida, ou seja, pelo
modo como cada um dá significado e sentido às experiências pelas quais passa no
decorrer de sua existência. Para o autor, “são as relações sociais, com efeito, as que
marcam a vida humana, conferindo ao conjunto da realidade que forma seu contexto
(coisas, lugares, situações, etc.) um sentido afetivo”.
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AFETIVIDADE NA RELAÇÃO PROFESSOR ALUNO
Pode-se afirmar, embasados nos teóricos citados anteriormente, que a
afetividade se constitui um fator importante e determinante da natureza das
relações que se estabelecem entre os sujeitos. No espaço escolar essas relações
ficam ainda mais estreitas à medida que o professor e o aluno se relacionam no dia
a dia, por isso a qualidade desta relação deve ser objeto de reflexão de cada
educador na sua prática diária.
Leite (2006) chama a atenção, porém, para a necessidade de a palavra
“afeto” não ser mal interpretada. Ele faz questão de afirmar que professor afetuoso
não é o mesmo que professor “bonzinho”. Do ponto de vista das práticas
pedagógicas, a dimensão afetiva, segundo ele, transparece na organização da aula,
na metodologia adotada e no planejamento das atividades. “Isso tem um efeito
enorme na auto-estima porque o aluno percebe que o professor está interessado no
seu sucesso”. Já as aulas mal planejadas, afirma, levam o aluno ao fracasso e, por
consequência, à baixa auto-estima (p. 33).
Promover relações harmoniosas e afetivas em sala de aula não significa que
o professor tenha que se destituir da sua autoridade hierárquica, pois esta faz parte
do seu papel, e muito menos aceitar tudo que é feito pelo aluno, sem interferir. Não
deve haver incompatibilidade entre estes aspectos e o vínculo afetivo. Tanto o
professor como o aluno devem identificar seu papel na dinâmica de sala de aula,
respeitando uns aos outros.
Para Furlani (1995), as características afetivas, culturais e de personalidade
do professor se problematizam, originando modelos através dos quais ele se situa
em relação ao aluno:
Modelos autoritários
Ausência total de diálogo. O professor é aquele que sabe, que ensina, que
fala, que informa, que transmite os conhecimentos para o aluno, que, por sua vez, é
passivo, um mero recebedor de conteúdos.
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Modelos permissivos
Total liberdade de expressão. Os alunos são ouvidos e observados, mas não
há imposição de limites, um direcionamento dado pelo professor, uma vez que
faltam objetivos educacionais mínimos estipulados em planejamento para serem
atingidos.
Modelos democráticos
O meio-termo entre os modelos permissivos e os autoritários. Aqui há a
existência do diálogo, o conhecimento é desenvolvido, elaborado e reelaborado a
partir da interação entre o professor e o aluno, tendo por base suas experiências.
Para Furlani (1995), o modelo democrático ainda é uma utopia, ainda
encontra obstáculos para ser implantado nas escolas, pois a própria sociedade
brasileira é cheia de modelos permissivos e autoritários que influenciam a vivência
dos alunos.
A realidade é que o mundo e a educação do tempo de nossos pais e avós
não são mais possíveis de serem revividos. Os valores do amor, da amizade, do
idealismo, da coragem, da esperança, do trabalho, da humildade, da sabedoria, do
respeito e da solidariedade precisam ser resgatados, ensinados, apropriados por
todos que gostariam de, um dia, voltar aos tempos de infância.
Rego (2001) nos mostra que os postulados de Vygotsky parecem apontar
para a necessidade de criação de uma escola bem diferente da que conhecemos.
Uma escola em que as pessoas possam dialogar, duvidar, discutir, questionar e
compartilhar saberes. Escola onde exista espaço para transformações, para as
diferenças, para o erro, para as contradições, para a colaboração mútua e para a
criatividade. Uma escola em que os professores e alunos tenham autonomia,
possam pensar, refletir sobre seu próprio processo de construção de conhecimento
e assim, ter acesso a novas informações. Uma escola em que o conhecimento já
sistematizado não seja tratado de forma dogmática e esvaziado de significado.
Deste modo, deve estar centrada na relação professor-aluno, o aluno aprende a
aprender e o professor precisa aprender a reaprender sempre.
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AFETIVIDADE SEGUNDO VYGOTSKY
Para Vygotsky (2001, p. 146):
O aspecto emocional do indivíduo não tem menos importância do que os outros aspectos, e é objeto de preocupação da educação nas mesmas proporções em que o são a inteligência e a vontade. O amor pode vir a ser um talento tanto quanto a genialidade, quanto a descoberta do cálculo diferencial.
Vygotsky (1991) destaca em sua teoria a importância das relações sociais no
desenvolvimento da criança e refere-se à mediação e à internalização como
aspectos fundamentais para a aprendizagem, defende a ideia de que a construção
do conhecimento se dá a partir de um intenso processo de interação entre as
pessoas. Portanto, a cultura em que a criança está inserida e as pessoas que estão
a sua volta são fundamentais para o seu desenvolvimento.
Sendo assim, Vygotsky (1991) destaca a importância do outro na construção
do conhecimento e também na constituição do próprio sujeito e de suas formas de
agir. Assume a posição de que o homem nasce como um ser biológico e é
continuamente influenciado pelo meio em que está inserido, ou seja, pela cultura
que o rodeia e através desta influência, constitui-se em ser sócio-histórico. Esses
mecanismos pelos quais o “homem biológico” mescla-se com os processos culturais
produzem, para o autor, o que ele chama de funções psicológicas superiores
(LEITE, 2008, p. 22).
As idéias centrais que podem ser consideradas como pilares básicos do
pensamento de Vygotsky são resumidas por Oliveira (1993):
a) as funções psicológicas superiores têm suporte biológico, pois são
produtos da atividade cerebral: o cérebro, assumido como a base
biológica do funcionamento psicológico, é entendido como “um sistema
aberto e de grande plasticidade, cuja estrutura e modos de
funcionamento são moldados ao longo da história da espécie e do
desenvolvimento individual” (p. 24); essa plasticidade do cérebro abre
uma série de possibilidades e realizações humana e caracteriza a
enorme capacidade de adaptação cultural do homem;
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b) o funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações sociais entre o
indivíduo e o mundo exterior, as quais desenvolvem-se num processo
histórico: ou seja, o homem transforma-se de sujeito biológico em sujeito
sócio-histórico mediante sua inserção na cultura, sendo ela, pois,
essencial para a constituição das funções superiores, características do
desenvolvimento humano;
c) a relação homem-mundo é uma relação mediada por sistemas
simbólicos: o que coloca o conceito de mediação como central na
abordagem histórico-cultural; destaca-se o papel da fala, como o sistema
simbólico considerado fundamental para a constituição das diversas
funções superiores e, portanto, para a constituição do sujeito.
Portanto, Vygotsky (1993) assume que as origens das funções superiores do
comportamento devem ser buscadas nas relações que o homem mantém com sua
cultura, ou seja, com o grupo social que fornece aos indivíduos um ambiente
estruturado, pleno de significados socialmente compartilhados, o que inclui aspectos
afetivos.
Vygotsky (1998) entende que estados emocionais diferentes provocam
reações orgânicas muito semelhantes. Para ele faltava uma perspectiva de
desenvolvimento para a explicação das emoções. Segundo ele, os adultos têm uma
vida emocional mais refinada do que as crianças. Ele assume uma perspectiva de
desenvolvimento para as emoções e defende que as emoções não deixam de
existir, mas evoluem para o universo do simbólico, entrelaçando-se com os
processos cognitivos.
Com relação à afetividade, Vygotsky (1993, p. 6) critica a divisão histórica entre
afeto e cognição:
A separação desses dois aspectos enquanto objetos de estudo, é uma das principais deficiências da psicologia tradicional, uma vez que esta apresenta o processo de pensamento como fluxo autônomo de „pensamentos que pensam a si próprios‟, dissociados da plenitude da vida, das necessidades e dos interesses pessoais, das inclinações e dos impulsos daquele que pensa.
Para Vygotsky (2001), o papel da afetividade na configuração da consciência
só pode ser examinado por meio da conexão dialética estabelecida com as demais
funções. Nessa conexão, o repertório cultural, as inúmeras experiências e interações
com outras pessoas representam fatores imprescindíveis para a compreensão dos
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processos envolvidos. Por esse prisma, o sujeito (de acordo com a psicologia
histórico-cultural) é produto do desenvolvimento de processos físicos e mentais,
cognitivos e afetivos, internos (história anterior do indivíduo) e externos (situações
sociais). Para ele, a afetividade atua na construção das relações do ser humano
dentro de uma perspectiva social e cultural.
A teoria de Vygotsky considera que, no decorrer do desenvolvimento, as
emoções vão se transformando, isto é, vão se afastando da origem biológica e se
constituindo como fenômeno histórico-cultural. Essas mudanças qualitativas que
ocorrem com as emoções ao longo do desenvolvimento dizem respeito ao aumento
de controle do homem sobre si mesmo. A razão, o intelecto (desenvolvido graças ao
crescente domínio de instrumentos culturais), tem a capacidade de controlar os
impulsos e as emoções mais primitivas (auto-regulação do comportamento). No
entanto, não se trata de uma razão opressora, mas sim de uma razão a serviço da
vida afetiva, constituindo-se como um instrumento de elaboração e refinamento dos
sentimentos (Oliveira e Rego, 2003).
AFETIVIDADE SEGUNDO WALLON
Wallon (2007) apresenta uma teoria psicológica sobre o desenvolvimento
humano centrado na ideia da existência de quatro grandes núcleos funcionais
determinantes desse processo: a afetividade, o conhecimento, o ato motor e a
pessoa – sendo todo o desenvolvimento analisado e explicado pela contínua
interação das dimensões. Para ele, o desenvolvimento é um processo de construção
em que se sucedem fases de predominância alternadamente afetiva e cognitiva
(LEITE, 2006, p. 19).
Para esse teórico, existem quatro grandes núcleos funcionais determinantes
do processo de desenvolvimento humano. Afirma Wallon (2007, p. 117): “os
domínios funcionais entre os quais vai se distribuir o estudo das etapas que a
criança percorre serão, portanto,os da afetividade, do ato motor, do conhecimento e
da pessoa” – sendo todo o desenvolvimento analisado e explicado pela continua
interação dessas dimensões. Segundo o autor, o desenvolvimento é um processo de
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construção em que se sucedem fases de predominância alternadamente afetiva e
cognitiva.
Wallon (1978) entende que a criança acessa o mundo simbólico por meio das
manifestações afetivas que permeiam a mediação que se estabelece entre ela e os
adultos. Esse teórico entende as emoções numa perspectiva genética e de
desenvolvimento e à medida que o indivíduo se desenvolve, as emoções vão
encontrando formas de expressão mais complexas. Por isso, a afetividade e a
inteligência constituem um par inseparável na evolução psíquica e permitem à
criança atingir níveis de evolução cada vez mais elevados.
Segundo Galvão (1999), são cinco as etapas propostas por Wallon:
a) Estágio impulsivo emocional, marcado pelo domínio afetivo, no primeiro ano de
vida. A predominância da afetividade orienta o bebê quanto às suas ações
frente às pessoas, às quais intermediam sua relação com o mundo físico.
b) Estágio sensório motor e projetivo vai até os três anos de idade, é a fase onde a
criança aprende a manipular os objetos, predomínio das relações cognitivas
com o meio, é marcada pelo desenvolvimento da função simbólica e da
linguagem.
c) Estágio do personalismo, dos três anos aos seis anos, nesta fase a criança
desenvolve a consciência de si perante as interações sociais (formação da
personalidade) com predomínio das dimensões afetivas.
d) Estágio categorial, a partir dos seis anos, com importantes avanços no plano da
inteligência e consequente predomínio cognitivo. Esse progresso dirige a
criança para a aprendizagem do mundo que a cerca.
e) Estágio da adolescência, com a crise da puberdade, e com a nova definição dos
contornos da personalidade e domínio afetivo.
Para o autor, a emoção é o primeiro e mais forte vínculo que se estabelece
entre o bebê e as pessoas do ambiente, constituindo as primeiras manifestações de
estados subjetivos com componentes orgânicos. No início da vida as emoções têm a
função de garantir as necessidades básicas, mas vão se transformando em
movimentos expressivos em função das pessoas e do meio social. Assim, o outro
tem papel fundamental na construção das formas de expressão emocional, das
quais a criança vai se apropriando. Nesse processo, a emoção permite a passagem
da vida orgânica para a vida psíquica.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se observar que Wallon (2007) e Vygotsky (1991) apresentam pontos
em comum com relação à constituição humana, em especial, a questão da
afetividade, pois ambos os autores assumem que as manifestações são inicialmente
orgânicas e ganham complexidade à medida que o indivíduo desenvolve-se na
cultura, passando a atuar no universo simbólico, ampliando suas formas de
manifestação. Ambos assumem o caráter social da afetividade e também que a
relação entre afetividade e inteligência é fundamental para o processo de
desenvolvimento humano.
Diante disso, pode-se pressupor que as interações que ocorrem no ambiente
escolar também são marcadas pela afetividade em todos os aspectos. E da mesma
forma pode-se dizer que a afetividade constitui-se como um fator de grande
importância e que poderá determinar a natureza das relações que se estabelecem
entre os sujeitos (alunos) e os objetos de conhecimento (áreas e conteúdos
escolares). Com base no exposto, é possível afirmar que a afetividade está presente
em todos os momentos ou etapas do trabalho pedagógico desenvolvido pelo
professor e não apenas na relação direta que ele tem com o aluno.
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