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ECCOM, v. 9, n. 18, jul./dez. 2018
Ações inovadoras de comunicação organizacional no
terceiro setor
Arquimedes Pessoni Jornalista, mestre e doutor em Comunicação Social. Universidade Municipal de São Caetano do Sul
Adilson Roberto Costa Mestre em comunicação pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul
Resumo A proposta deste artigo é a de identificar modelos e práticas inovadoras de comunicação
organizacional em geral e comunicação interna em particular em organizações de interesse
humanitário coletivo, as chamadas ONGs e OSCIPs. Os conceitos de inovação foram baseados na
classificação de Rossetti (2013) e colocados como referência de análise a ONG Viva e Deixe Viver –
Contadores de Histórias. A metodologia utilizou pesquisa documental acrescida de entrevistas com os
responsáveis pela instituição e o estudo apontou para ações inovadoras na comunicação interna da
instituição.
Palavras-chave Comunicação Organizacional; Comunicação Interna; Inovação; ONG; Terceiro setor.
Abstract The purpose of this article is to identify innovative models and practices of organizational
communication in general and internal communication in particular in organizations of collective
humanitarian interest, so-called NGOs and OSCIPs. The concepts of innovation were based on the
classification of Rossetti (2013) and placed as reference of analysis the NGO Viva e Deixe Viver –
Contadores de Histórias. The methodology used documentary research plus interviews with those
responsible for the institution and the study suggested innovative actions in the internal
communication of the institution.
Key words Organizational Communication; Internal Communication; Innovation; NGOs; Third sector.
Introdução
A economia dos países não é feita somente de organizações industriais ou comerciais,
pois, na esteira dos problemas que este tipo de organização trouxe para as sociedades a partir
da Revolução Industrial, surgem novas organizações e movimentos ao fim da segunda guerra
mundial com características de atuação voltadas para defesa e difusão de temas de apego
humanitário-coletivo, como a proteção ambiental por exemplo. Essas entidades floresceram
inicialmente nos países desenvolvidos (ou industrializados), mas também se tornaram globais
com ramificações em países emergentes de alguma pujança industrial e com os mesmos
potenciais problemas de degradação ambiental.
Nesse contexto, as chamadas Organizações Não Governamentais (ONGs) ganham
força por denunciarem agressões ao meio ambiente provocadas por negligência ou
oportunismo econômico-tecnológico de empresas e governos. Elas procuram respaldo na
mídia para obtenção de apoio social e ganham prestígio com a aprovação de leis que
regulamentam a atuação de promotores da destruição do ciclo ambiental e da qualidade de
vida da coletividade.
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Essas entidades formarão, junto com outras do mesmo tipo, uma nova equação na
atividade empresarial cujo escopo é diferente daquele das tradicionais, ou seja, o resultado
econômico (lucro) não é sua razão de existir, por isso pertencem a um tipo de organização
denominada sem fins lucrativos. Esse conjunto irá formatar o que é conhecido como
organizações do terceiro setor – “espaço de participação e experimentação de novos modos de
pensar e agir sobre a realidade social” (CARDOSO, 2005, p. 8) – e seu crescimento mundial
trará novas oportunidades profissionais para o mercado de trabalho.
No Brasil, país base desta pesquisa, essas organizações ganham força a partir da
década de 1990 com o impulso da globalização de entidades internacionais, pois antes se
limitavam a movimentos de defesa da democracia face ao regime militar vigente. Já a partir
do século XXI se institucionaliza no país outro tipo de organização do terceiro setor, as
chamadas Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), que, além de
atuarem em movimentos humanitários e de defesa ambiental, passam também a ganhar espaço
em projetos e atividades complementares e em parceria com o serviço público.
O setor de atendimento à saúde pública é um dos segmentos onde mais se consolida a
presença dessas organizações, mas o espaço se amplia para outras áreas, como as de pesquisa
de indicadores sociais, de transparência de órgãos públicos, de defesa da cidadania, de
eventos públicos de massa (vacinação preventiva, por exemplo), de defesa de animais
domésticos, de famílias e comunidades carentes, de moradores de rua, de dependentes
químicos, de fomento ao esporte, entre outros segmentos.
Devido à ineficiência de órgãos públicos, à falta de profissionais, ao sucateamento de
instalações e equipamentos, essas organizações inundam o mercado brasileiro. Elas são
formatadas organizadamente e adotam princípios da administração nas suas operações, como,
por exemplo, Gestão de Pessoas, pois, como uma empresa, contam com grande contingente de
trabalhadores, processos administrativos e operacionais, objetivos, metas e planos. Assim, não
só novas oportunidades de trabalho e de profissionalização surgem com essas organizações,
como também cursos de formação técnica e de nível superior como engenharia e gestão
ambiental, técnicos e agentes de saúde pública, entre outras. Personalidades artísticas,
intelectuais, políticos, esportistas, jornalistas incorporam-se a ações de marketing específicas
e dão prestígio a esses movimentos.
As mudanças do perfil social trazido ao país pela tecnologia e pela comunicação nos
anos finais do século XX vão incorporar ainda outros movimentos e organizações que trarão
impacto econômico à sociedade mundial e especialmente à brasileira. Esses movimentos são
cruciais para o entendimento deste projeto de pesquisa.
Instituições de cunho religioso, como as igrejas evangélicas chamadas
neopentecostais, que defendem um slogan de prosperidade coletiva, também passam a
organizar-se de maneira sistêmica, com gestão administrativa, estrutura organizacional
hierárquica, missão, visão, princípios e valores, etc., bem como estruturam um mercado que
conta com shows musicais, eventos em praça pública, produção, publicação e vendas de
livros, jornais e revistas, objetos religiosos, lojas franqueadas, turismo religioso, programas
televisivos, produção e uso de equipamentos e tecnologia de mídia social e doações que
movimentam cifras espetaculares e sustentam novas classes econômicas e um novo modelo de
produção, distribuindo renda e riqueza pela sociedade em geral.
A comunicação organizacional e interna nesse segmento é importante instrumento de
avaliação da satisfação dos colaboradores das organizações. Ela pode desempenhar papel
estratégico na medida em que alcança o alinhamento de objetivos organizacionais com
objetivos profissionais e pessoais do seu público interno.
Identificar ou explorar uma estratégia de comunicação interna num mercado
empresarial com características e estruturas organizacionais diferentes do tradicional e de
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alcance econômico relativamente recente pode identificar novos paradigmas ou
procedimentos no processo de comunicação interna, bem como pode trazer resultados
significativos para os profissionais e estudiosos da comunicação, especialmente na tarefa de
monitorar e alavancar a satisfação dos colaboradores e parceiros.
Pode, também, agregar valor aos profissionais da comunicação das empresas e mesmo
aos indicadores de produtividade e qualidade dos colaboradores na medida em que a pesquisa
revele métodos e estratégias de comunicação interna que estimulem a gestão de um clima
interno favorável ao alinhamento dos objetivos individuais e coletivos com os objetivos e
metas organizacionais e com a gestão de recursos humanos.
Cardoso (2006) nos ensina que no âmbito interno das organizações empresariais, as
relações com empregados, os diferentes estilos administrativos, assim como as ações
humanas, demandam novos rumos na gestão que superem os modelos lineares, verticais e
impositivos e alcancem novas formas de ação administrativa que envolva e valorize o trabalho
em equipe baseado na maior participação e autonomia dos envolvidos. “As relações
empresariais demandam propostas inovadoras e especial atenção para as questões culturais,
éticas e sociais que envolvam as ações organizacionais” (CARDOSO, 2006, p.1132).
A produção teórica sobre a comunicação organizacional no terceiro setor, no Brasil,
apresenta quatro tendências principais. A primeira, predominante, discute a importância e as
vantagens da comunicação nesse segmento (KUNSCH, 2003; TORQUATO, 2004), além de
tecer recomendações para a sua implementação, em geral, colocando a comunicação,
particularmente as Relações Públicas, como “arma” para formar ou melhorar a visibilidade
das organizações na sociedade e intensificar a conquista de aliados. No caso da comunicação
das empresas com o terceiro setor, na perspectiva da responsabilidade social, os argumentos
giram em torno das vantagens para as mesmas, por causa do valor que agregam à identidade
corporativa, além da necessidade de se posicionarem de maneira diferente do passado, devido
às novas exigências sociais.
Em segundo lugar, estão estudos que enfatizam o subaproveitamento desse
instrumental pelas ONGs e movimentos sociais. A terceira tendência preocupa-se em discutir
a aplicabilidade da comunicação organizacional às instituições sem fins lucrativos e
movimentos sociais e, ao mesmo tempo, orientar o como fazer, com base nas particularidades
do segmento.
Para Peruzzo (2013, p. 103), “há, também, uma quarta perspectiva, que procura
compreender a comunicação efetivada pelas próprias organizações e movimentos sociais, em
suas especificidades, e no contexto mais amplo de seu significado mobilizador e político”.
A autora conclui que dadas as especificidades evidenciadas, os fundamentos teóricos
da comunicação organizacional e de outras áreas da comunicação social – desenvolvidos para
empresas e poderes públicos –, não podem ser simplesmente transferidos e reproduzidos no
âmbito do terceiro setor, especialmente nos movimentos e organizações sem fins lucrativos de
base popular e mobilizadora. A comunicação que, em última instância, poderia ser
identificada como comunitária, se liga a organizações e movimentos sociais, cuja razão de
existir é diferente daquela que rege o mercado. “A finalidade, na realidade brasileira, é
ampliar e democratizar a cidadania e favorecer o desenvolvimento comunitário e da pessoa
humana, integralmente” (PERUZZO, 2013, p. 104).
Autores brasileiros, como Torquato, Kunsch e outros, referenciados neste artigo,
também abordam a necessidade de transformar a comunicação em elemento estratégico para
as ONGs, um caráter estratégico no que se refere à sua capacidade de dar visibilidade às suas
ações e construir sua reputação, incorporar certas temáticas na agenda pública, posicionar-se
como parceiro social, construir redes com outras organizações e dar conta à sociedade de suas
ações de forma transparente. No entanto, apesar dessa estratégica, a comunicação das
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associações sem fins lucrativos no domínio da saúde ainda é um campo praticamente
inexplorado de pesquisa.
Observa-se claramente a necessidade de desenvolver uma linha de pesquisa para
estudar a comunicação em ONGs no domínio da saúde, no contexto de instrumentos teóricos
e práticos desenvolvidos para a gestão profissional da comunicação nessas organizações.
A profissionalização crescente dos departamentos de comunicação de ONGs no
campo da saúde certamente levou a uma melhoria na gestão, mas sente-se ainda a ausência de
um modelo de análise de referência para a gestão de comunicação. Isso poderia ser uma causa
(ou consequência) da prevalência da visão tática sobre o estratégico vista em muitas
organizações.
Da mesma forma, observou-se que a investigação está praticamente ausente do
processo de comunicação, limitando-se à coleta de informações sobre impactos na mídia de
massa e à análise de forma incipiente e assistemática da interação em redes sociais. Portanto,
os processos de comunicação dessas organizações podem ser classificados como parcialmente
metódicos e metodologicamente assistemáticos.
Essas organizações não têm planos anuais de comunicação, prevalecendo o
planejamento tático focado no desenvolvimento de produtos e ações com uma visão de curto
prazo. “Por isso, um dos desafios para essas organizações é desenvolver processos para
gerenciar a comunicação estratégica, com base em uma visão de médio e longo prazo” (DIAZ
e CAMBRA, 2014, p. 216) (tradução nossa).
Delimitação do estudo
Na elaboração dos trabalhos de campo para a pesquisa geradora deste artigo adotamos
a pesquisa exploratória qualitativa, com desenho metodológico apontando para a utilização de
pesquisa documental, com fundamentação em depoimento pessoal com o dirigente fundador
da ONG VIVA E DEIXE VIVER1 e outros colaboradores profissionais da instituição, análise
e pesquisa institucional em site e blog para confronto de informações e caracterização do
desenho comunicacional da entidade junto aos seus públicos de interesse.
A pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A
diferença essencial entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a
pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos
diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se
de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda
podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa (GIL, 1995, p.
51).
A escolha da instituição se deu a partir de visita à Aberje (Associação Brasileira de
Comunicação Empresarial), onde o presidente da ONG VIVA E DEIXE VIVER ministrou
palestra aos membros do Grupo de Estudos de Novas Narrativas – GENN – uma vez que a
ONG aparentava utilizar conceitos inovadores de comunicação junto aos seus diversos
públicos. Como estratégia da pesquisa, formatou-se e aplicou-se um questionário apropriado à
pesquisa exploratória, através de depoimento pessoal local com o dirigente presidente da
1 Perfil da instituição pode ser conhecido no link: http://www.vivaedeixeviver.org.br/. Acesso em 17/04/2017.
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ONG VIVA E DEIXE VIVER, com conteúdo que explorou questões próprias sobre aplicação
prática de métodos e técnicas comunicativas estruturadas ou informais, direcionadas para
impulsionar um clima interno favorável à organização bem como a satisfação no trabalho de
funcionários e colaboradores.
Como medida adicional, foi realizada nova visita à entidade, onde pudemos detalhar e
identificar em documentação e depoimentos, as informações sobre estratégias e práticas de
comunicação interna prestadas pelo entrevistado Valdir Cimino e por meio de encontro
pessoal com outros colaboradores da ONG VIVA, Sras. Andrea Coltelli e Nathalie Bizzochi,
respectivamente coordenadoras das células Desenvolvimento Humano e Comunicação e
Marketing.
Na sequência, realizamos pesquisa documental no site e blog oficial da organização
para esclarecer e avaliar a coerência dos discursos, coleta de links, vídeos institucionais,
textos e material de comunicação alinhados com práticas pretensamente inovadoras de
comunicação interna, gestão da satisfação no trabalho e clima organizacional dirigida ao seu
público interno.
Identificação de ações inovadoras
É recorrente no mercado empresarial o apelo e o desafio pela competitividade que se
traduz cotidianamente na busca sistemática da eficiência e eficácia dos negócios. A
globalização e a infidelidade do cliente ameaçam a sobrevivência das organizações que
buscam avidamente instalar novos modelos, equipamentos, processos e tecnologias para
produzir novas soluções para mercado. Já não bastam belos discursos, retóricas ou quadros
bonitos nas paredes da empresa. É necessário formar uma consciência de inovação em todos
os momentos operacionais e administrativos da organização. O foco essencial dessa
conscientização é o conhecimento das pessoas e são justamente elas que levarão a empresa
aos objetivos desejados, qual seja, os stakeholders que gravitam em torno da organização.
A formação de uma consciência organizacional, passa pela formação de uma “cultura”
de inovação, já que, como abordado em outros momentos desse trabalho, a organização
empresarial se caracteriza como um conjunto de pessoas atuando profissionalmente sob um
manto cultural que lhe dá sentido e orientação para o desenvolvimento de esforços coletivos
que levem ao alcance de resultados.
A comunicação organizacional tem importante papel a desempenhar para a construção
de um coletivo cultural que abarque todas as equipes e departamentos funcionais, seja na
tomada de decisão, na dinâmica de processos de trabalho ou nas relações interpessoais que
são responsáveis em formatar a imagem da empresa junto aos seus públicos de interesse, bem
como a missão, visão e valores do negócio. Mas como estabelecer parâmetros para uma
comunicação que fomente a conscientização e a cultura para a inovação? O que é inovação
em comunicação?
Rosseti (2013) apresenta as características de uma comunicação inovadora ao
descrever as categorias de inovação com base no pensamento filosófico.
Mas o que é inovação e o que se entende por este conceito? Como muitos
outros conceitos, este não apresenta uma definição unívoca, pois muitos são
os entendimentos possíveis acerca da inovação e, maior ainda, o número de
termos correlatos. É preciso, portanto, classificar essas acepções de inovação
e fundamentá-las em autores de referência. Para esta explicitação dos
diversos conceitos de inovação, a Filosofia pode contribuir muito[...]
(ROSSETTI, 2013, p. 64)
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A pesquisadora explica que a inovação não se configura somente em novidades
tecnológicas, mas perpassa todas as relações socioeconômicas, sejam as de caráter
governamental, empresarial, humanitárias e mesmo familiar. A formação de uma cultura para
a inovação desafia todos os atores sociais, inclusive a academia, no desenvolvimento de novas
proposições científicas das ciências sociais, como a Comunicação.
No campo da Comunicação, a inovação é mais evidente nas interfaces
tecnológicas e nas novas mídias. Todavia, a inovação está presente também no
impacto social das novas tecnologias de comunicação e informação, no novo
receptor, agora produtor e interativo, nos processos cognitivos, nas linguagens,
na estética e até mesmo em novas abordagens metodológicas e teóricas de
comunicação. Isso, porque a inovação é um fenômeno social, simbólico e
tecnológico, presente em toda sociedade contemporânea midiatizada e pode
perpassar todo o campo da Comunicação (ROSSETTI, 2013, p. 64).
Também outros autores da administração abordam o tema da inovação numa
perspectiva mais ampliada como Drucker, Shumpeter, Simantob, Porter, entre outros. O
conceito de inovação é bastante utilizado no contexto empresarial, ambiental e mesmo
econômico. Neste sentido o ato de inovar significa a necessidade de criar novos caminhos ou
estratégias diferentes aos habituais meios para atingir determinado objetivo. Inovar é inventar,
seja, ideias, processos, ferramentas ou serviços. A ideia de inovação, no entanto, não deve
ficar fadada apenas à invenção de novos produtos, serviços ou tecnologias, mas também ao
valor ou conceito de determinada coisa, como o modo de organizar uma empresa, por
exemplo.
O tipo de estratégia da empresa, seu desenho organizacional, sua visão, missão e
valores e, principalmente suas ações concretas vai influenciar a forma como a inovação é
realizada na empresa. Um ambiente empresarial que permite a colaboração dos seus
colaboradores nos processos de decisão, que incentiva a partilha de informação e a
proatividade e com o uso eficiente de meios tecnológicos vai permitir incubação de
conhecimento, a transmissão de conhecimento, e logo a propensão para a inovação.
Tal cenário envolve o objeto deste trabalho que é exatamente verificar como e se a
ONG VIVA e DEIXE VIVER pratica ações inovadoras em comunicação visando obter o
compromisso dos colaboradores e voluntários para um clima favorável ao alcance de
objetivos e a satisfação no trabalho. Para tal verificação adotamos a análise de Rossetti que
tem um foco voltado mais para a inovação em Comunicação e que, portanto, estava mais
alinhada com as propostas desta pesquisa.
O artigo de Rossetti permite a formatação de um quadro de categorias em que os
vários sentidos da inovação estão classificados. O quadro é construído a partir do conceito de
mudança, pois toda mudança traz o novo, reforçando o debate da temática tão cara às
organizações atuais.
A construção deste quadro de categorias de inovação é feita a partir das
categorias aristotélicas de substância, qualidade, quantidade, relação, lugar,
tempo, ação e paixão, em que são organizados os seguintes termos relativos
ao conceito de inovação: novo, novidade e mudança; criação, invenção,
alteração, modificação, transformação, multiplicação, diferenciação,
diversificação, salto, transposição, tradução, mudança, evolução, ruptura;
mutação, variação, incremento, adaptação, apropriação, experimentação;
renovação, recriação, transubstanciação, transmutação, deformação,
reformulação, transfiguração, metamorfose, transmudação, transverter;
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legítimo, genuíno, singular, diferenciado, diferente, diverso, novidade,
incomum, primeiro, primordial, matricial, inédito, original; sujeito inovador
e objeto inovado (ROSSETTI, 2013, p. 64).
A partir das categorias identificadas, o trabalho da autora parte para interpretação da
inovação na antiguidade com base nas formulações de Aristóteles.
Categorias são instrumentos conceituais de investigação das coisas e de
expressão linguística. Aristóteles privilegia o ponto de vista linguístico: as
categorias são os modos em que o ser se predica das coisas nas proposições,
portanto, categorias são os predicados fundamentais das coisas (ROSSETTI,
2013, p. 66).
Com bases nesses princípios conceituais, a autora formata uma tabela “Categorias de
Inovação” com as diversas formas de se interpretar a inovação em comunicação e sua
correspondente ação ou resultado prático. A tabela é dividida nos itens: Categorias
Aristotélicas; Atos de Inovação; Efeitos da Inovação; Categorias de Inovação. A partir deste
quadro e da interpretação linguística da análise identificamos oito ações de comunicação
relatadas pelos entrevistados da ONG VIVA e comprovadas com a pesquisa documental que
foram classificadas como inovadoras, segundo as categorias de inovação de Rossetti (2013):
Ações inovadoras identificadas:
Diário digital;
Plataforma VIVA HUMANIZAÇÃO;
Contrato de adesão ao serviço voluntário;
Pesquisa de satisfação com a VIVA;
Número de voluntários atuantes (crescimento) e horas produzidas;
Ação comunicativa em rede e online;
Satisfação pela causa e pelas transformações sociais;
Curso de líderes (cabeças de chave).
Quadro 1 – Classificação das ações de comunicação nas categorias de inovação
Ação de Comunicação
Respostas da entrevista
Categorias de
Inovação (ROSSETTI, 2013)
Manifestação da
Inovação
Questão 2: [...] “Para você ver, o
voluntário depois de formado,
consequentemente atuando, nós
criamos um mecanismo num diário
digital...[...]. Nós criamos um
mecanismo onde ele vê e vivencia o
trabalho dele. É comunicação total”.
SUBSTANCIAL:
É uma ação decorrente da
criação e da invenção, pois estes
dois procedimentos fazem surgir
o novo, remetendo à natureza
das coisas.
Criação; Invenção, que
resultam no ORIGINAL
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Ação de Comunicação
Respostas da entrevista
Categorias de
Inovação (ROSSETTI, 2013)
Manifestação da
Inovação
Questão 13: [...] “Estamos criando
uma plataforma da VIVA
HUMANIZAÇÃO, com mais de 50
vídeos atemporais para falar de
humanização na saúde”.
Questão 10: [...] “Eu conto para ele o
que você está produzindo para a
ONG. Nós invertemos o discurso.
Você assina o contrato, vai me doar
horas qualificadas e o resultado são
transformações”.
QUALITATIVA:
Atos que trazem movimento,
mutação, transmutação,
transmudação, reformulação,
deformação, metamorfose ou
transfiguração podem causar
mudança na forma
(transformação), mudança no
modo (modificação) ou
alteração na ação de
comunicação.
Resultados que trazem
TRANSFORMAÇÃO,
MODIFICAÇÃO,
NOVIDADE.
Questão 4: “A cada contrato que
assinamos com o hospital, tem uma
cláusula que afirma que se houver
mudança comportamental, podemos
avaliar esta relação. É bom para os
funcionários e para a equipe[...] No
meu caso, cuidamos de 1200
voluntários e agimos em rede”.
QUANTITATIVA:
Diz respeito à multiplicabilidade
das ações de comunicação.
Ações que trazem:
MULTIPLICAÇÃO,
VARIAÇÃO,
Questão 8: [...] “E também a gente se
disponibiliza para ser benchmarking
para outras ONGs. São 8 anos que
somos considerados ‘Ponto de
Cultura’ e o MEC nos solicita que
sejamos incubadora”.
Refere-se à variabilidade, à
multiplicação e
RENOVAÇÃO E
Questão 10: “O ano passado o VIVA
conseguiu captar 5 milhões de horas
voluntárias”
à massificação dos atos
comunicativos
AMPLIAÇÃO
Questão 6: “Aqui as pessoas têm
amor à causa. Até ficam um pouco
mais ou tentam ficar. Há glumas
variações: temos pessoas CLT,
pessoas contratadas, estagiários e
naturalmente quando acaba o
contrato vão embora. As que ficam,
temos uma longevidade interessante
e não é por causa do salário”.
RELAÇÃO:
Abrange situações em que
houve diversificação ou
diferenciação nos produtos
comunicacionais.
Atos ou ações
INCOMUNS e que
exprimem:
DESEMELHANÇA,
ALTERIDADE,
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Ação de Comunicação
Respostas da entrevista
Categorias de
Inovação (ROSSETTI, 2013)
Manifestação da
Inovação
Questões 11 e 12: “Exercer gestão de
pessoas ainda é um marco a ser
trabalhado. Aí é ‘x’ da questão. As
pessoas incluídas têm que conseguir
‘fechar a conta’. O benefício maior
é o retorno humanitário [...]. É
muito difícil porque é uma
associação. [...] E você percebe que
não é a grana. E você percebe que
não é a grana. O fato é que aquilo vai
trazer também uma satisfação
pessoal [...]”.
Nesta análise, há que se
observarem sinais que
exprimam ato ou evento
“diverso, diferenciado,
diferente, dessemelhante,
incomum ou de alteridade” na
comunicação.
DIVERSIFICAÇÃO
Questão 13: [...] “Eu falo com os
voluntários a partir do diário digital
do que eles estão produzindo dentro
dos hospitais. Eu falo em reuniões
mensais da diretoria que são
transmitidas via Skype para quem
quiser entrar no Brasil e ouvir o
que a gente está falando” [...].
São DIFERENTES em
relação ao tradicional.
Questão 13: “Estamos criando uma
plataforma do VIVA
HUMANIZAÇÃO com mais de 50
vídeos atemporais [...]. Os trabalhos
que são elaborados e apresentados
por pôsteres pelo Brasil, são
imputados dentro dele. Então nós
estamos criando uma plataforma para
de fato sermos pioneiros no tema e
na produção da humanização”.
Site da instituição: A ação
comunicativa dos contadores de
histórias através de registros em
livros, cartilhas e revistas,
acompanhadas de gestos e
interpretação pessoal das
mensagens, bem como a atuação de
personagens incorporados nas
histórias.
ESPACIAL OU LUGAR:
A tradução ou interpretação de
um fato escrito para uma
narrativa oral instaura o novo,
sendo a interpretação ou
tradução sempre nova em
relação ao original. A alteração
na colocação ou ordem de
determinados termos e/ou
sentidos, na questão da
comunicação, é elemento de
inovação, pois haverá uma
passagem de um gênero a outro,
de um sentido a outro.
Fundamenta-se em
processos em que houve
SALTO, TRADUÇÃO e
TRANSPOSIÇÃO nos
produtos gerados pela
comunicação.
Estes passam a ter as
características de ser
PRIMEIRO,
PRIMORDIAL,
MATRICIAL.
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Ação de Comunicação
Respostas da entrevista
Categorias de
Inovação (ROSSETTI, 2013)
Manifestação da
Inovação
Questão 9: “O VIVA tem que mostrar
a sua postura junto à sociedade.
Nosso posicionamento é a leitura
(promover a leitura). Quem tem
leitura vai ter uma educação melhor.
O contador de histórias tem este
poder. Por isso é que nasce o ‘Inácio
Bonifácio’ que é um personagem que
vai defender a leitura e
principalmente a leitura dentro da
saúde. Então a gente tem que
desenvolver comunicação para
falar com os diversos públicos”.
Ação de Comunicação
SUJEITO INOVADOR:
Tem vínculo com o agente
inovador e a ação das pessoas
enquanto propulsores da
inovação. É chamada de
categoria da inovação ativa, na
qual o sujeito é inovador, em
que há ação de inovação. No
campo da Comunicação, este
sujeito inovador diz respeito aos
agentes envolvidos no processo
de comunicação (como o
emissor e o receptor) e diz
respeito também às novas visões
teóricas da comunicação.
Inovação ATIVA.
Manifestação da
Inovação.
Questão 3: [...] “Que seja motivado
(o colaborador) em forma de
comemorações de relacionamento
com o grupo. Este voluntário sai
daqui e vai para o hospital. Quando
ele chega lá, tem um líder que fala
com a equipe. Tanto é que nós
criamos aqui um curso de líderes”.
OBJETO INOVADO:
É a categoria em que o objeto
inovado é a referência de
análise. Neste critério, há a
paixão, no sentido daquele que
se submete, aquele que sofre a
ação que gerou nele a inovação.
É o efeito da inovação que gera
um produto inovado. A inovação
está no objeto como seu fim. É o
novo que surge como resultado
do processo de inovação. Desta
forma, em Comunicação, um
produto comunicacional pode se
configurar como um objeto
inovado.
Inovação PASSIVA.
Fonte: Adaptado de Rossetti (2013)
Considerações Finais
Jean-Marc Le Gall, em seu livro Gestão de Recursos Humanos (2008), aborda
aspectos da comunicação interna numa perspectiva das relações humanas no trabalho. O autor
destaca que, sob muitos pontos de vista, uma organização só cresce porque se comunica com
seus clientes e com seu pessoal. As informações trocadas são dados que orientam suas
decisões e sua atividade, determinando a qualidade do funcionamento da empresa diante dos
problemas. “A comunicação deve ser anterior a qualquer política da empresa nesse campo,
pois é inerente à vida coletiva” (LE GALL, 2008, p. 125).
Na entrevista com o dirigente Valdir Cimino da ONG VIVA, observa-se também a
premissa do autor quando este explica que a comunicação interna se potencializa no cotidiano
da entidade, nos debates internos sobre os resultados, na avaliação do alcance da causa
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ECCOM, v. 9, n. 18, jul./dez. 2018
incorporada, na distribuição e na dinâmica dos trabalhos.
Em sintonia com o pensamento de Cogo e Nassar (2015), a ONG VIVA propõe uma
comunicação horizontal entre equipes de voluntários, funcionários efetivos e estagiários que,
segundo seu dirigente entrevistado, permite o escoamento contínuo da informação e
estabelece relações funcionais difusoras em rede intermitente, incluindo seus parceiros
investidores e gestores líderes em Conselhos Internos.
Se, na interpretação da comunicação com colaboradores na ONG VIVA pelo
entrevistado, o discurso se cristaliza no boca a boca e no cotidiano do trabalho, então a forma
falada de comunicação passa a ter importância crucial, representada pelos discursos e
retóricas sobre o os destinos do “movimento” social que a entidade abraça. Disso acentua-se a
pertinência das reflexões dos autores.
Em função da distância e da dinâmica em que seus colaboradores (contadores de
história) atuam, a entidade faz uso sistemático dos meios eletrônicos para situar e sintonizar
os conteúdos e a performance esperada, na busca incessante da coerência de atitudes e
posturas no exercício das suas atividades, especialmente quando este se encontra na “casa”
dos parceiros da organização (hospitais e casas de saúde). Tal proposta pode ser embarcada na
análise de Carvalho (2012), quando aborda a estratégia de uso das redes sociais conectadas na
comunicação interna.
Outra constatação do entrevistado é que as equipes se automotivam no trabalho por
meio de relatos de vida e de suas experiências anteriores em empresas tradicionais. Veem-se
importantes e valorizados, pois podem colocar sua vivência profissional a serviço de uma
utilidade pública e humanitária que dá sentido e prazer ao trabalho realizado. Então essa troca
de conteúdos e narrativas individuais faz renovar-se um ambiente interno favorável à
consecução de objetivos e consequente satisfação no trabalho.
Outro destaque da narrativa do Diretor Presidente da entidade é a importância do uso
da tecnologia na comunicação interna com colaboradores da instituição. Ele observa ser
crucial este formato para que se possam difundir os objetivos de cada projeto social no qual a
ONG atua, quais suas diretrizes, objetivos e andamento cotidiano. Também recebe
informações e feedback de parceiros (hospitais), onde são preferencialmente realizadas as
ações dos “contadores de histórias”. Para ele, isto é essencial no processo de comunicação
interna, pois, além da agilidade e instantaneidade, as tecnologias reduzem os custos do fluxo
de informação e decisão relativos ao trabalho cotidiano da ONG. Dado que o colaborador
voluntário trabalha quase sempre em polos distantes, as comunicações em geral são
estratégicas para a consecução dos objetivos e também para o aperfeiçoamento profissional de
todos, narrativa que reforça a proposta de Margarida Kunsch (2003). Cimino destaca, todavia,
as dificuldades encontradas nas relações comunicativas internas, especialmente com o
colaborador voluntário de idade mais avançada e que demonstra certo desconforto com o uso
das modernas tecnologias de comunicação on line.
Regra geral, segundo depoimento de Valdir Cimino, o colaborador já vem ao VIVA E
DEIXE VIVER com uma vivência anterior em comunicação estruturada em empresas do
primeiro e do segundo setor. Isto facilita para a construção de narrativas da ONG, já que o
colaborador consegue entender a essência da comunicação organizacional para alcance dos
objetivos. Todavia, é necessário adaptar sua experiência à realidade de uma organização que
tem necessidades diferentes de empresas tradicionais. Neste caso, ele explica, os líderes
precisam trabalhar o treinamento constante nos colaboradores e voluntários no sentido de um
entendimento da missão e valores da ONG VIVA E DEIXE VIVER e do formato informal de
configurar os canais e mensagens apropriados para uma organização desse tipo. A ONG VIVA
E DEIXE VIVER não detém os recursos profissionais e financeiros que o mercado possui,
então a aprendizagem e a prática cotidiana passam a ter importância fundamental.
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Há um entendimento de que a globalização integra fronteiras, e a comunicação, os
universos de conhecimento. Nesse intuito, a ONG VIVA E DEIXE VIVER e seu dirigente
máximo demonstram a nova postura de evolução individual que se reflete nas organizações
sem fins lucrativos e evidencia que a gestão do conhecimento se inicia no indivíduo e se
concretiza na empresa por meio da comunicação, agregando, com isso, diferencial estratégico.
Torquato (2015) também discorre sobre o tema, agora num viés mais metodológico de um
desenho estratégico de comunicação de que podem valer-se as Organizações Não
Governamentais e especialmente a ONG VIVA E DEIXE VIVER, objeto deste estudo, e que
podem trazer soluções senão no todo, mas em parte, para solucionar eventuais problemas de
comunicação descritos pelo entrevistado.
Outro aspecto da retórica do dirigente da ONG VIVA E DEIXE VIVER junto a seus
colaboradores trata do fato de que a instituição é um espaço importante de aprendizagem para
estagiários, funcionários administrativos, líderes, dirigentes e voluntários. Ele enfatiza essa
condição, mas alerta que, às vezes, as pessoas não se apropriam desse poder da ONG.
E como a comunicação organizacional pode atuar para alinhar atitudes e posturas
profissionais que incorporem naturalmente esses temas? Como o aprendizado organizacional
pode propor tal debate considerando as turbulências éticas que vivemos no Brasil nos dias
atuais?
A comunicação terá como responsabilidade a entrega da transparência, como uma
premissa extremamente relevante para todos os públicos de interesse. O entrevistado dirigente
elege este ponto como fundamental no processo comunicacional da ONG VIVA E DEIXE
VIVER, tanto quanto aos colaboradores, parceiros (hospitais) e líderes de Conselhos
Consultivos Internos. Ele assinala relatórios de resultados, pesquisa de satisfação com
colaboradores e voluntários, publicações internas e no site da instituição.
A comunicação não é um fim em si, mas uma contribuição ao progresso de
relações de trabalho abertas e eficazes. Apostando na curiosidade, na
inteligência e no envolvimento dos funcionários, ela deve respeitar as
convicções e registrar as opiniões dos trabalhadores. Ao tornar conhecidas as
regras do jogo e os fatos significativos, ela faz emergir uma linguagem
profissional mais homogênea no interior da organização. O interesse comum
da empresa e de seus funcionários é reconhecer e desenvolver a
“comunicabilidade”, ou seja, a aptidão e o direito de se comunicar (LE
GALL, 2008, p. 130).
Relativamente à gestão das relações humanas no trabalho, ele reconhece algumas
dificuldades. O papel moral das atividades de comunicação organizacional com pressuposto
ético é fundamental para que se efetive um contexto social moralmente mais adequado ao
desenvolvimento e ao aprendizado dos seres humanos, bem como para construir um clima
interno satisfatório e favorável para a efetividade dos objetivos organizacionais e
humanitários defendidos.
Ao analisar detalhes da entrevista, observamos que Cimino narra problemas pontuais
dos relacionamentos interpessoais da ONG VIVA E DEIXE VIVER que se assemelham com a
problemática vivenciada ao longo da minha carreira em empresas tradicionais e que se
refletem na abordagem introdutória deste trabalho, qual seja: Por que as pessoas reclamam
constantemente de que um dos problemas que afetam o ambiente interno nas empresas é a
comunicação?
Ele narra conflitos que surgem no cotidiano dos trabalhos da ONG VIVA E DEIXE
VIVER entre colaboradores funcionários, voluntários, estagiários e liderança. Ele sabe de
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comentários nos bastidores da organização de que o Presidente é um “chato”, pois cobra
demais e, às vezes, não atua com justiça no encaminhamento dos conflitos internos.
Reconhece essa realidade, mas justifica dizendo que as pessoas, às vezes, perdem o sentido da
atuação de uma instituição voltada ao interesse público humanitário e acabam por deixar-se
envolver por interesses individuais que colidem com a essência da organização. Ele mesmo
acaba por ser protagonista em mediar esses conflitos, dada sua experiência como profissional
da comunicação, mas que podem gerar insatisfações e comprometer, momentaneamente, o
equilíbrio do clima interno.
A Associação VIVA e DEIXE VIVER – “Contadores de Histórias” pratica ações de
comunicação interna que demonstram uma face inovadora na gestão da comunicação e das
relações humanas no trabalho com impacto na satisfação e no clima interno, especialmente
por ser uma organização que prestigia mais o esforço coletivo, confirmando a hipótese e
respondendo afirmativamente a pergunta-problema levantada neste estudo. Essa confirmação
se dá, entre outras coisas, pelos depoimentos e documentos analisados e pelo quadro de
classificação das ações comunicativas praticadas pela ONG VIVA nas categorias de inovação
de ROSSETTI (2013).
Quadro 2- Classificação das ações de comunicação nas categorias de inovação
Ações Categorias de
inovação
Manifestação da inovação
Diário digital Substancial Criação e invenção que resulta no
original
Plataforma VIVA
HUMANIZAÇÃO
Substancial Criação e invenção que resulta no
original
Contrato de adesão ao
serviço voluntário
Qualitativa Transformação, modificação,
novidade
Pesquisa de satisfação
com a VIVA
Qualitativa Transformação, modificação,
novidade
Número de voluntários
atuantes (crescimento) e
horas produzidas
Quantitativa Multiplicação, variação,
renovação, ampliação
Ação comunicativa em
rede e online
Quantitativa Multiplicação, variação,
renovação, ampliação
Satisfação pela causa e
pelas transformações
sociais
Relação Ações incomuns que exprimem:
dessemelhança, alteridade,
diversificação
Curso de líderes (cabeças
de chave)
Objeto inovado Inovação passiva
Fonte: do Autor
A satisfação pela causa coletiva na ONG VIVA é tão ou mais importante que a
satisfação econômica dos colaboradores, demonstrando um avanço importante da
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preocupação das pessoas em defesa de destinos comuns e reforçando o papel social da ONG
como indutora de estímulos para o trabalho em equipe, as trocas de informações cotidianas, o
aperfeiçoamento profissional, o compromisso com objetivo, missão, visão e valores, enfim
com a satisfação no trabalho.
As ONGs, na atualidade, representam um novo espaço para o mercado de trabalho,
especialmente para gestores de pessoas e profissionais da comunicação, que pode tornar-se
ainda mais significativo para o avanço e a melhoria nas relações de trabalho e dos
instrumentos de comunicação tradicionais.
Pelo estudo e trabalhos pesquisados, tanto de autores nacionais quanto de outros
países, pode-se afirmar que há uma relação objetiva entre a comunicação e a satisfação no
trabalho, com forte presença em atividades e entidades de atendimento à saúde.
A gestão de recursos humanos na organização VIVA E DEIXE VIVER carece de
maior desenvolvimento. O dirigente reforça ainda o surgimento de conflitos pontuais quando
o colaborador e as lideranças ainda não desenvolveram uma visão coletiva e humanitária e
buscam saltos econômicos de curto prazo.
Há um esforço de Valdir Cimino e outras lideranças intermediárias em reforçar que os
colaboradores da ONG VIVA E DEIXE VIVER são profissionais produtores de resultados
para a sociedade e não simplesmente beneméritos sem vínculo com a realidade, demonstrando
um sentido de gestão profissional nesse tipo de organização.
Claro que este estudo não vai esgotar os debates sobre o tema nem cristalizar conceitos
definitivos sobre comunicação e satisfação no trabalho, já que se trata de estudo sobre uma
entidade única, mas, se juntar-se a outros desenvolvidos pode, sim, disponibilizar elementos
ainda mais contundentes para os caminhos da academia e da inovação em comunicação
organizacional.
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integrada. São Paulo: Summus, 2003
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comunicação organizacional no terceiro setor: perspectiva alternativa. Revista FAMECOS,
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