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Estudo
sobre a estratégia de vinculação do
Comércio Justo e do turismo sustentável com a
Copa do Mundo na África do Sul
Relatório
Janeiro a março 2011
Responsável técnico:
Johann Wolfgang Schneider
2
Índice
Metodologia .............................................................................................. 4
Lista de entrevistados............................................................................... 5
Sumário executivo .................................................................................... 6
1. Comércio Justo na África do Sul ....................................................... 9
1.1. Contexto geral e histórico ............................................................................................ 9
1.2. A entidade nacional de marketing Fairtrade ............................................................. 11
2. Comércio Justo no turismo ............................................................ 12
3. Comércio Justo no turismo na África do Sul ................................... 15
4. A Copa do Mundo de futebol de 2010 na África do Sul ................... 17
5. Comércio Justo na Copa do Mundo de futebol de 2010 .................. 18
Sip for South Africa ................................................................................................................. 20
Rainbowcollection .................................................................................................................. 21
Cape Crafts & Design Institute ............................................................................................... 23
6. Comércio Justo no turismo durante a Copa do Mundo ................... 27
7. As Olimpíadas da sustentabilidade de Londres 2012 ..................... 28
8. Conclusões gerais .......................................................................... 30
9. Anexos ........................................................................................... 31
3
Índice de figuras
Figura 1 - Mapa África do Sul ........................................................................................................ 9
Figura 2 – Logomarca da entidade de certificação e marketing da África do Sul ....................... 11
Figura 3 - Tourism concern .......................................................................................................... 13
Figura 4 - Ethical Travel Guide da tourism concern .................................................................... 14
Figura 5 - Fair Trade in Tourism - África do Sul ........................................................................... 15
Figura 6 - Logomarca do Fair Trade Travel South Africa ............................................................. 16
Figura 7 - Mapa interativo de empresas credenciadas no sistema de turismo de comércio justo
da África do Sul............................................................................................................................ 16
Figura 8 - Material promocional da KUONI ................................................................................. 17
Figura 9 - Campanha "Sip for South Africa" ................................................................................ 20
Figura 10 - Peças da campanha "Sip for South Africa" na Inglaterra .......................................... 20
Figura 11 – Imagem do website da Rainbowcollection .............................................................. 21
Figura 12 - Artesãs da Africa Ignite ............................................................................................. 22
Figura 13 - Logomarca da ONG Africa Ignite ............................................................................... 22
Figura 14 - Torcida da laranja mecânica...................................................................................... 22
Figura 15 - Logomarca do Instituto de Artesanato e Design do Cabo ........................................ 23
Figura 16 - Mapa do Fan Park ..................................................................................................... 24
Figura 17 - O mapa do estádio identificando a zona de exclusão definida pela FIFA ................. 25
Figura 18 – Capa do código de fornecimento sustentável do comitê organizador das Olimpíadas
de Londres ................................................................................................................................... 28
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Metodologia
A pesquisa foi uma combinação entre um estudo secundário, analisando documentos
publicamente disponíveis e informações nos websites das entidades relevantes ligados ao
tema em pauta e entrevistas a distância com pessoas-chave destas entidades, visando a
complementação e o aprofundamento das informações obtidos através da análise
documental.
Como as informações disponíveis sobre o tema específico de Comércio Justo na Copa do
Mundo foram bastante limitadas, a meta mínima de cinco entrevistas foi superada, elevando
o total para sete entrevistas localizados na África do Sul, Holanda e Reino Unido.
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Lista de entrevistados
1. Entrevistada: Kate Lewis Cargo: Business Development Manager - Responsável pela campanha
promocional do vinho da África do Sul no Reino Unido Organização: Fairtrade Foundation, Iniciativa Nacional de Certificação do Reino
Unido País: Reino Unido
2. Entrevistado: Arianna Baldo Cargo: Marketing e promoções – responsável pela campanha durante a copa Organização: Fairtrade Label South Africa - FLSA País: África do Sul
3. Entrevistado: Jennifer Seif Cargo: Diretora executiva Organização: Fairtrade Tourism South Africa País: África do Sul
4. Entrevistado: Pieter van der Manden Cargo: Gerente de projeto Organização: Bhold, Rainbowcolletion – ONG de apoio a artesãos na África do Sul País: Holanda
5. Entrevistado: Samantha Dormer Cargo: Gerente de produto – cacau e responsável pelo acompanhamento da
campanha Fairtrade nas olimpíadas de Londres 2012 Organização: Fairtrade Foundation, Iniciativa Nacional de Certificação do Reino
Unido País: Reino Unido
6. Entrevistado: Patricia Barnett Cargo: Diretora executiva Organização: Tourism concern País: Reino Unido
7. Entrevistado: Erica Elk Cargo: Diretora executiva, responsável pelo projeto da Copa do Mundo 2010 Organização: CCDI - Cape Craft & Design Institute
País: África do Sul
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Sumário executivo
A experiência sul-africana mostra que há oportunidades para quem se prepara com a devida
antecedência e com um plano de marketing consistente e direcionado adequadamente para o
público alvo certo. No entanto, vale ressaltar que as expectativas precisam ser realistas diante
das restrições que existem para empresas que não fazem parte dos patrocinadores oficiais do
evento. Aliás, todos os entrevistados concordaram em uma conclusão: o único ganhador
garantido numa Copa do Mundo é a FIFA. É sabido desde as últimas realizações que para o país
realizador os investimentos bilhionários não têm retorno econômico mensurável. Os ganhos
reconhecidos são principalmente de imagem que, por sua vez, pode atrair e/ou facilitar
negócios no futuro. O evento também oferece o ensejo para os governos investirem em áreas
que, de outra forma, talvez não receberiam a mesma atenção, tal como transporte, segurança
pública, limpeza urbana, educação e cultura além das áreas de infraestrutura como
saneamento básico nas áreas impactadas.
No aspecto prático empresarial, por outro lado, as restrições de acesso a outras marcas que
não os patrocinadores oficiais limitaram muito as oportunidades para PMEs de chegar perto
dos torcedores. Além disso, a força de atração do mega-evento desviou a atenção e vendas
dos outros negócios.
O público alvo, no caso o típico torcedor de futebol também precisa analisado com atenção
para identificar as oportunidades. Na África do Sul ele mostrou não ter um poder aquisitivo
compatível com o turista tradicional de viagens de longa distância, procurando economizar
bastante e tendo um foco bastante concentrado nos jogos enquanto a busca por outros
destinos ou negócios ficaram baixo das expectativas.
No entanto, quem planeja e age com a devida antecedência pode criar oportunidades efetivas
para pequenos produtores. O Instituto de Artesanato e Design do Cabo (provincia do Cabo
Ocidental), entidade de promoção e desenvolvimento dos artesãos da região, se preparou com
dois anos de antecedência, encomendando um estudo para comprender como melhor
explorar as oportunidades e conseguiu montar um espaço dentro das região central reservada
aos fans, no Fan Park e na Fan Mile, com 20 estandes e uma loja coletiva, gerando uma venda
total de 5.482 itens, no valor global equivalente a cerca de R$100.000,00 no período dos oito
jogos que aconteceram na Cidade do Cabo.
A principal história de sucesso no segmento do Comércio Justo foi de uma campanha com
acessórios direcionados para a torcida holandesa. Acessórios para as torcidas certamente é um
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dos segmentos de mercado de maior potencial. Porém, é necessário desenvolver produtos
direcionados a este mercado específico e encontrar os canais e locais apropriados para acessar
este público. Neste contexto, a customização para uma torcida específica, no caso o da
Holanda, se mostrou a mais bem sucedida, superando a meta de 100.000 unidades pulseiras
em 40%. Para completar, uma estratégia de preço facilmente acessível e as promoções
facilitaram a compra por impulso.
Torcidas de países onde o Fairtrade é mais conhecido parecem mais inclinados a comprar
produtos e serviços Fairtrade também no destino. Mas é fundamental comunicar
adequadamente a oferta de produtos e serviços junto ao público alvo de turistas para gerar
um fluxo interessante nos locais de venda. Por outro lado, o pouco conhecimento do conceito
e da selo de Fairtrade por parte da população local limitou o impacto das ações promocionais
realizadas no varejo.
Na área de turismo a experiência do Comércio Justo certificado a África do Sul é pioneira no
desenvolvimento de um sistema de certificação. No entanto, esta iniciativa está apenas
começando, tendo sido lançados os primeiros pacotes após a Copa, em final de 2010 e início
de 2011. O Turismo comunitário não foi explorado pelas organizações sul-africanas durante a
Copa do Mundo.
O impacto da Copa do Mundo no segmento de turismo, que não estava diretamente ligado aos
locais do evento, na verdade foi negativo. De acordo com a diretora executiva da entidade de
promoção do turismo Fairtrade, a força de atração do evento foi tão grande que desviou até os
negócios tradicionais de outras regiões no período da Copa.
Ora, para analisar a experiência sul-africana corretamente no sentido de extrair o aprendizado
válido para o Brasil, se faz necessário levar em consideração a situação muito especial do país.
Saído do regime de apartheid em 1994, sofre ainda de altas taxas de desemprego e uma
população negra com pouca educação e um flagelo de contaminação com HIV (5,5 milhões) e
uma expectativa de vida de somente 51,5 anos. 10% da população ganha 58% da riqueza do
país e 85% da terra agrícola está nas mãos de fazendeiros brancos.
Uma experiência muito rica de aprendizado para o Brasil, que surgiu durante as entrevistas
com os especialistas em Londres, é a dos preparativos das Olimpíadas de Londres 2012. O
comitê organizador local incluiu o tema da sustentabilidade desde o princípio na pauta da
proposta e, segundo a coordenadora da implementação da agenda de sustentabilidade do
evento da Fairtrade Foundation do Reino Unido, este fato teria ajudado consideravelmente a
vencer a concorrência. Com este pano de fundo global presente na pauta dos organizadores,
está sendo muito mais fácil introduzir produtos e serviços com qualidade de sustentabilidade
8
social, ambiental e de ética empresarial comprovada (certificada). Evidentemente ainda há as
restrições típicas destes mega-eventos para garantir a exclusividade aos patrocinadores
oficiais, mas com a devida insistência e a credibilidade da experiência internacional e a
sensibilidade do público a Fairtrade Foundation está conseguindo inserir o fornecimento de
vários produtos nas áreas restritas, além de práticas comerciais e de prestação de serviços
mais éticas.
9
1. Comércio Justo na África do Sul
1.1. Contexto geral e histórico
Na era pós-apartheid da África do Sul, desde a
transição para uma democracia constitucional, em
1994, o país registrou um constante crescimento
econômico. Investimentos do Governo têm
contribuído para um notável crescimento social,
como a construção de habitações de baixa renda e
melhora ao acesso a educação, eletricidade, água,
saneamento e subvenções de serviço social. Essas iniciativas tiveram um impacto positivo na
diminuição da pobreza. Porém, a posição da África do Sul como um país de “renda media”, com
um PIB de US$277 bi (classificada em 32º, num ranking de 190 países em relação ao Produto
Interno Bruto (PIB)) mascara os desafios significativos de desenvolvimento humano enraizados
no legado da história do apartheid sul-africano, o que significa que milhões de pessoas pobres
ainda têm acesso limitado a oportunidades econômicas e lutam para manter uma vida estável.
Os desafios do desenvolvimento social incluem:
� Altas taxas de desemprego de 23.6%;
� Falta de acesso generalizado a serviços sociais básicos, como educação e saúde;
� O maior número de pessoas contaminadas com o HIV/AIDS (5.5 milhões) e 24% da
incidência global de tuberculose relacionada ao HIV;
� Expectativa de vida de 51.5 anos, em 2008, está abaixo da de outros países africanos
como Malawi (52.4) e Uganda (51.9);
Persistentes desigualdades de renda e riqueza entre raça, sexo e localização existente (com
10% da população sendo rica e ganhando 58% da renda total nacional) e pobreza nas cidades e
fazendas levaram a uma generalização do abuso de álcool e drogas e à violência.
O Comércio Justo vem operando na África do sul desde 2003. Há, no total, 97 produtores
certificados pelo Comércio Justo vendendo 5 categorias de produtos dentro do mercado
Figura 1 - Mapa África do Sul
10
mundial de Comércio Justo (veja a tabela 1). Esses grupos representam 15,000 trabalhadores e
327 pequenos agricultores.1-2
Operadores de Fairtrade certificado - FLO
Produto Produtores Traders Produto Produtores Traders
Café - 3 Sucos de Fruta 4 3
Frutas secas Uva passa 1 1 Maçã 4 2
Frutas frescas/ Vegetais 62 36 Laranja - 1
Limões 9 5 Pimentas e ervas - 5
Soft Citrus 8 4 Não especificado - 1
Grapefruit 5 2 Baunilha - 1
Laranja 12 4 Gengibre - 1
Pêras 4 4 Pimenta Preta - 1
Ameixas 5 2 Pimenta Branca - 1
Maçãs 4 5 Chá 8 7
Nectarinas 2 - Não especificado 1 1
Pêssego 1 - Rooibos 7 5
Mirtilo 1 1 Camellia - 1
Mangas 1 2 Uvas para vinho 22 21
Uvas 6 4 Total 97 76
Ervilhas - 1
Fonte: FLO-cert - janeiro 2011 Abacates 3 1
Lichias 1 1
Historicamente, a África do Sul tem fortes ligações com o Reino Unido e a Holanda, que hoje
são respectivamente o país de maior dinamismo no crescimento do Comércio Justo e o país
onde todo o movimento se originou. Por esta razão o principal mercado de destino da África
do Sul é o Reino Unido.
Apesar do intercâmbio cultural importante, principalmente entre os brancos das classes
socioeconomicamente mais favorecidas, que têm a oportunidade de viajar para a Europa e
podem experimentar o fenômeno do Faitrade nos mercados consumidores, a consciência dos
consumidores em relação ao conceito, de acordo com a representante entrevistada da
entidade nacional, não passa de 2%-3% e o reconhecimento da marca é praticamente zero. No
primeiro momento, portanto, o intercâmbio, principalmente entre estudantes e ONG’s,
facilitou o surgimento da iniciativa local com algum suporte técnico da Fairtrade Foundation
do Reino Unido, a partir do engajamento de voluntários e patrocinadores.
1 Dados da FLO-cert e do relatório “Impacts of Fairtrade in South Africa” de junho 2010
2 Veja a lista de operadores certificados pela FLO no anexo
11
1.2. A entidade nacional de marketing Fairtrade
Em 2009 foi criada a entidade de marketing, chamada de
“Fairtrade Label South Africa - FLSA”, com o objetivo de
promover seus produtos certificados entre o mercado
consumidor do próprio país.
A FLSA se apresenta como segue:3
NOSSA MISSÃO
Aliviar a pobreza rural e capacitar pequenos produtores, bem como trabalhadores
desfavorecidos, principalmente na África, criando oportunidades de marketing para aumentar
as vendas de produtos classificados como de Comércio Justo na África do Sul.
NOSSOS OBJETIVOS
1. Aumentar a consciência sobre o Comércio Justo na África do Sul e estimular a criação
de consumidores críticos;
2. Aumentar a gama de produtos de Comércio Justo, desenvolvendo novas cadeias de
suprimentos de produtos com foco especial nas estruturas comerciais totalmente
africanas;
3. Aumentar a disponibilidade de produtos do Comércio Justo nas lojas da África do Sul.
COMO IREMOS FAZER?
Nós estamos envolvidos em várias atividades que visam aumentar a consciência sobre o
Comércio Justo entre as partes interessadas e na criação de acessos a mercados para os
produtos do Comércio Justo na África do Sul. Alguns exemplos:
Trabalho promocional: nós organizamos eventos e atividades para promover os produtos do
Comércio Justo e explicar os benefícios do Comércio Justo para os consumidores;
Desenvolvimento de mercado: nós facilitamos o processo de licenciamento e acompanhamos
o registro localmente. Temos contatos com empresas locais e varejistas, a fim de estimular o
desenvolvimento das cadeias de abastecimento do Comércio Justo, buscando, assim,
3 Fonte: www.fairtradelabel.org.za
Figura 2 – Logomarca da entidade de certificação e marketing da África do Sul
12
proporcionar aos consumidores locais uma maior variedade de produtos registrados de
Comércio Justo;
Proteção de registro e monitoramento: nós monitoramos o uso de etiquetas do Comércio
Justo localmente e asseguramos que não esta sendo usado de uma forma abusiva.
A FLSA é a segunda entidade no mundo com o objetivo de promover seus produtos em seu
próprio país, depois do México, com a diferença que a entidade da África do Sul incorpora
integralmente a sistemática da FLO sem se preocupar em desenvolver um sistema próprio de
certificação baseado na cultura e nas condições locais, como foi o caso do México e como é o
caso também do Brasil.
Outra diferença importante a observar é que grande parte dos produtores são de médias e
grandes fazendas, que se enquadram na categoria de trabalhadores contratados (“hired
labour”), o que se deve ainda ao legado da antiga política de “apartheid”, de segregação racial,
que terminou somente em 1994. Como consequência 85% da terra agrícola ficou nas mãos de
fazendeiros brancos enquanto que a maior parte da população negra e desfavorecida ficou
limitada aos “townships”, as favelas nos arredores das grandes cidades, sem acesso a terras
produtivas. Uma iniciativa de melhorar esta taxa de propriedade de terra pela população, cujo
objetivo é de chegar a 30% em 2014, incluindo a devolução de terra e a reforma agrária, não
está conseguindo os resultados desejados devido ao aumento de preços da terra nos últimos
anos que se deve, por sua vez, ao crescimento econômico e o consequente aumento de
demanda pelos produtos agrícolas. Neste contexto, somente os fazendeiros ricos têm
condições de adquirir as terras e expandir seus negócios.
Este fenômeno da distribuição limitada da terra certamente contribuiu para o não-surgimento
de um movimento mais forte de pequenos produtores a favor de um sistema próprio de
certificação, como nos casos do México e do Brasil.
2. Comércio Justo no turismo
Em 1988 criou-se no Reino Unido a rede de organizações de turismo preocupada em evitar a
exploração das comunidades pobres nos destinos turísticos, numa época em que a palavra
“impacto” ainda nem existia no contexto de avaliação de projetos de desenvolvimento.
Evoluindo ao longo dos anos, em 1999, graças a um financiamento da Comissão Européia, a
"Tourism Concern" virou ONG com o objetivo de desenvolver o Comércio Justo no Turismo,
13
como um projeto a ser desenvolvido, inicialmente em 3 anos. Através da rede, que inclui hoje
mais de 150 organizações, tais como empresas turísticas, ONG´s, universidades, etc., têm sido
analisados os negócios da indústria turística em comunidades dos países em desenvolvimento
em busca de soluções para diminuir impactos negativos e da sustentabilidade.
Figura 3 - Tourism concern
São pressupostos da rede4:
O Comércio Justo no Turismo é um aspecto chave do turismo sustentável. Seus objetivos são:
� Maximizar os lucros provenientes do turismo para os envolvidos nos locais de destino,
através de benefícios mútuos e parcerias de igualdade entre as organizações nacionais
e internacionais nos destinos turísticos;
� Apoiar os direitos das comunidades locais, envolvidas ou não no turismo, no que diz
respeito à participação em condições de igualdade nas parcerias, tornando-as
beneficiárias do processo de desenvolvimento turístico.
Beneficiários:
São priorizados os grupos e partes da comunidade receptiva dos países de destino que estejam:
� Socialmente e/ou economicamente em desvantagem ou são/foram discriminadas,
particularmente no que se refere ao desenvolvimento já existente ou em fase de
planejamento;
� Envolvidas em iniciativas emergentes de turismo;
� Aptas a trabalharem com o mercado nacional e internacional, carecendo de apoio
técnico e organizacional;
� Empregados em sectores formais e/ou informais do turismo que não tenham tido voz
nas decisões prévias do processo de implantação do turismo;
4 Fonte: www.tourismconcern.org.uk
14
O comércio justo no turismo pode ser concebido como:
� Um processo de desenvolvimento integrado no local de destino, considerando-se a
construção das parcerias dos sectores público, privado e sociedade civil;
� Código corporativo de conduta ética;
� Um produto de Comércio Justo, controlado e certificado.
Implementação
O Comércio Justo no turismo deve atuar em 5 áreas onde as mudanças são necessárias, no
sentido da construção da equidade, a saber:
1 - Acordos de comércio Internacional;
2 - Indústria Turística (corporações transnacionais e investidores independentes);
3 - Investidores nas comunidades de destino;
4 - Comportamento do consumidor;
5 - Políticas dos governos dos locais de destino.
Devido à diversidade de circunstâncias e à complexidade do sistema de turismo dos locais de
destino, não deve haver um modelo único de implantação. Uma linha geral pode ser criada
para, adaptada às exigências do local, servir de orientação aos diferentes segmentos da
indústria turística.
Sofrendo de certa limitação de recursos, a diretora executiva
Patricia Barnett, lamenta ainda não ter conseguido desenvolver um
sistema de certificação e de uma marca que pudesse identificar
empresas e organizações que atendem aos critérios da
sustentabilidade e do comércio justo no turismo.
Enquanto isso, eles produzem um guia de viagens éticas, ou
“ethical travel guide”, muito procurado, com uma lista de
operadores que fazem parte de sua rede e/ou obedecem à filosofia
e aos princípios defendidos por eles.
Na ausência de uma marca, neste momento, o Comércio Justo no
Turismo deve ser considerado como um processo multifacetado, em direção a uma mudança
Figura 4 - Ethical Travel
Guide da tourism concern
15
global, em favor de uma política de comércio turístico mais equitativa. Normalmente as
empresas que participam da rede se identificam pela marca da WFTO.
De acordo com o relatório de consumo ético de 20105 referente a dados até 2008, o turismo
responsável, que considera o faturamento com produtos e serviços que se preocupam com
este impacto no meio ambiente e social, bem como boicotes contra empresas que agem
contra estes princípios, teria movimentado £931 milhões em 2008, tendo sofrido quedas
seguidas desde 2005, quando estava em £1.229 milhões. Ainda assim, em torno de 90% do
público do Reino Unido acredita que operadoras turísticas devem assumir uma
responsabilidade para preservar o meio ambiente local e beneficiar as comunidades locais, e
80% afirmam que eles estariam mais inclinados a comprar uma viagem com uma companhia
que observa estes princípios.
3. Comércio Justo no turismo na África do Sul
Figura 5 - Fair Trade in Tourism - África do Sul
Enquanto a Tourism Concern não conseguia desenvolver seu sistema de certificação, a
África do Sul foi em frente e, após vários anos de experiências e testes foi pioneira ao
lançar oficialmente, em junho de 2002, o selo “Fairtrade in Tourism South Africa - FTTSA”
(Comércio Justo em Turismo África do Sul). Foi a primeira vez na história do movimento de
Comércio Justo que um selo de certificação foi criado para o setor de turismo tinha. Em
outubro de 2003, os primeiros licenciados (estabelecimentos de receptivo, hotelaria, entre
outros) foram aprovados.
A FTTSA se apresenta como segue:
5 “ethical consumerism report”
16
O Que Fazemos:
A FTTSA encoraja e divulga a prática de negócio justo e responsável por estabelecimentos
de turismo da África do Sul.
Fazemos isto através do selo registrado FTTSA, um símbolo independente de justiça na
indústria de turismo. O selo registrado é concedido a estabelecimentos de turismo que
observam critérios rigorosos:
� Salários e condições de trabalho justos, operações justas, compra e distribuição de
benefícios.
� Prática empresarial ética
� Respeito pelos direitos humanos, cultura e o ambiente
O selo registrado do “ Fair Trade Travel South Africa - FTTSA”
Candidatos ao selo registrado FTTSA recebem a certificação,
por exemplo, empregando e comprando localmente,
treinando seus funcionários em questões de saúde e
consciência de HIV/Aids; provendo educação ambiental e
apoio às comunidades.
Estabelecimentos de turismo passam por um processo de auto-avaliação primeiro, seguido
por uma avaliação
independente. Após uma
revisão especializada, os
candidatos bem sucedidos
são certificados com o selo
registrado. Uso do selo
registrado é monitorado
rigorosamente por FTTSA
para manter o alto padrão e
maximizar sua efetividade
como uma ferramenta de
marketing.
Figura 6 - Logomarca do Fair Trade Travel South Africa
Figura 7 - Mapa interativo de empresas credenciadas no sistema de turismo de comércio justo da África do Sul
17
As empresas associadas ao sistema podem ser encontradas num mapa interativo no site
da entidade. Através deste sistema o consumidor pode optar por qualquer combinação de
serviços ao longo da cadeia de comercialização e prestação de serviços, comprando desde
um pacote completo com uma operadora em sua origem até a hospedagem ou o receptivo
diretamente no destino final da localidade.
Os manuais do sistema de certificação, envolvendo 14 áreas de avaliação, incluindo toda a
cadeia de prestação de serviço e
comercialização são públicos e
podem ser acessados
gratuitamente no site da
entidade6.
Em 2010 foram lançados os
primeiros dois pacotes turísticos
certificados, com a operadora
suíça KUONI. A Suíça sendo o país
de maior consumo per capita de
produtos de Fairtrade e de
reconhecimento da marca FLO
entre os consumidores, ela
também tem muitas empresas
com programas de
Responsabilidade Social Corporativa. É o caso da KUONI que, com base no seu programa
de RSC, foi o parceiro ideal para desenvolver esta experiência, junto com ONGs e a
embaixada sul-africana na Suíça.
Um terceiro pacote foi lançado recentemente na feira de turismo ITB 2011 em Berlim,
Alemanha.
4. A Copa do Mundo de futebol de 2010 na África do Sul
O mega evento consumiu um investimento de US$4,28 bi por parte do governo sul-
africano em infraestrutura e equipamentos esportivos. O retorno sobre o investimento
6 http://www.fairtourismsa.org.za/onlinemanual/index.html
Figura 8 - Material promocional da KUONI
18
em termos macro-econômicos se revela claramente negativo, o que, aliás, já é sabido
desde as experiências anteriores. O impacto foi considerado pela maioria dos
entrevistados como uma bolha, por deixar muito pouco impacto socio-econômico
duradouro no país além do impacto econômico imediato. O grande benefício
estratégico de longo prazo de um mega evento deste tipo é, reconhecidamente, a
imagem projetada globalmente. O governo espera reverter o investimento através de
impactos positivos indiretos de longo prazo no turismo e no comércio em geral, sendo
esta uma conta incerta. Até o fechamento do presente estudo ainda não tinham sido
publicados estudos sobre o impacto macro-econômico do evento.
Trata-se, portanto, mais de uma estratégia de marketing de nações do que de uma
conta de investimento versus retorno econômico-financeiro. E, evidentemente, é
neste nível que são realizadas as negociações. O único ganhador financeiro garantido,
de acordo os entrevistados, que também citam economistas reconhecidos e bastante
críticos em relação ao retorno do evento, é a FIFA.
5. Comércio Justo na Copa do Mundo de futebol de 2010
A entidade sul-africana reponsável por promover os produtos do Fairtrade no país, a
FLSA, como já foi esboçado em capítulo anterior, teve apenas poucos meses para se
preparar para o evento. Ela somente começou a operar na prática no início de 2010,
poucos meses antes da copa, ainda com recursos financeiros e humanos muito
limitados. Ao mesmo tempo ainda só tinha dois produtos de Fairtrade certificados no
mercado local: vinho e café, limitando ainda mais as possibilidades de promoção junto
aos consumidores. Os preparativos para a Copa só puderam ser iniciados em maio, um
mês antes do evento.
Ainda assim, em junho e durante o período do evento eles conseguiram organizar
ações de promoção com uma grande rede de lojas de bebidas para os vinhos. De
acordo com Arianna Baldo, da FLSA, responsável pela campanha durante a copa,
foram um total de sete eventos de degustação em cinco grandes cidades. Os eventos
foram programados precisamente nos dias de grandes partidas da copa,
principalmente visando fans dos países que tinham uma maior familiaridade com o
Fairtrade em suas origens, tais como a Inglaterra e a Holanda. Estes eventos foram
realizados por voluntários num total de 30 lojas de uma rede de varejo de bebidas.
19
No entanto, o retorno das ações foi considerado fraco e muito aquém das
expectativas. Além do pouco tempo de preparo e dos recursos limitados, o que resulta
em ações também limitadas e de pouco impacto junto ao consumidor, o
conhecimento deste sobre Fairtrade é ainda insignificante, entre 2% a 3%, sendo que
estes são principalmente os brancos que tiveram oportunidade de viajar para a Europa
onde puderam conhecer o conceito e os produtos nas prateleiras. Pior ainda, o
reconhecimento do selo Fairtrade da FLO é praticamente zero.
As tentativas de realizar ações perto dos estádios resultaram infrutíferas devido às
limitações de acesso de outros produtos e meios de comunicação senão dos
patrocinadores oficiais.
Outras idéias que não conseguiram implementar por falta de tempo e/ou recursos
foram:
� Fairtrade World Cup: organizer uma copa de futebol de times de produtores,
disputando uma copa do mundo Fairtrade;
� Cartões postais com temas da copa desenhados por um famoso cartunista local,
que já é engajado em outras ações de marketing do Fairtrade;
Como a FLSA trabalha somente com os produtos certificados pela FLO, não foi
realizada nenhuma ação com artesanato por eles. A possibilidade de realizar ações,
combinando produtos alimentícios certificados pela FLO e objetos de artesanato é
reconhecida como válida, no entanto, sua implementação é considerada como além
da capacidade operacional da entidade, neste momento.
As principais lições aprendidas da equipe foram:
� Para se ter impacto, ações de promoção neste tipo de evento, ou melhor, por
ocasião deste tipo de evento, precisam de muito mais tempo de antecedência
para preparação.
� O envolvimento de patrocinadores também ainda é um grande desafio, visto
que o consumidor ainda nem conhece o segmento. As empresas só se
interessam no segmento a partir do momento em que há uma massa crítica de
consumidores potenciais.
20
� A Fifa não permite qualquer promoção de produtos ao redor dos estádios que
não sejam dos patrocinadores oficiais, que, neste caso, foram McDonald’s e
Budweiser.
Sip for South Africa
Na Inglaterra, a Fairtrade Foundation, ou FTF, a entidade nacional de certificação e
promoção do Comércio Justo certificado pela FLO, promoveu a campanha “Sip for
South Africa” – bebericar /tomar um gole pela África do Sul. O vinho, um produto
facilmente identificado pelo consumidor inglês
com a África do Sul, foi o produto escolhido para
receber um esforço promocional através desta
campanha que foi realizada exclusimente “on-
trade”, ou seja, em bares e restaurantes.
A campanha não foi tão bem sucedida quanto
eles esperaram devido a vários fatores. O
principal problema foi resultado do fato de ter
sido a primeira campanha deles no on-trade, levando-os a subestimaram o tempo
necessário para sensibilizar os estabelecimentos e ativar as cadeias de fornecimento
para disponibilizar vinho de Fairtrade em bares e restaurantes que não costumavam
trabalhar com este produto específico de Fairtrade. Um dos desafios identificado logo
no início da campanha foi o fato de os torcedores típicos de futebol da Inglaterra não
serem grandes
consumidores de
vinho e sim de
cerveja.
Uma das estratégias
alternativas usadas
então durante a
campanha foi
direcionada às
“world cup widows”,
as “viúvas” da copa.
Trata-se das
Fairtrade Wine
Figura 9 - Campanha "Sip for South Africa"
Point of Sale Materials Available
Figura 10 - Peças da campanha "Sip for South Africa" na Inglaterra
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mulheres que foram deixadas para trás pelos fans que foram se encontrar com seus
amigos para assistir aos jogos da copa. Estas constumam reunir-se por sua vez em
outras estabelecimentos, sendo mais receptivas a este tipo de bebida.
Um dos grandes públicos tradicionais de comidas e bebidas de Fairtrade são
estudantes. Porém, não é permitido vender bebidas alcoólicas nos campi.
Não houve acompanhamento ou monitoramento de resultados ou impacto da
campanha por parte da FTF, porque os pedidos dos estabelecimentos foram
encaminhados diretamente para os ditribuidores licenciados. Mas a gerente de
desenvolvimento de negócios e coordenadora da campanha, Katie Lewis, deixou
transparecer que eles ficaram não ficaram animados com o retorno e que ficaram com
o sentimento de que poderiam ter feito melhor.
As principais lições aprendidas foram:
� Permitir prazos bem maiores (“lead time”) para preparar os canais de distribuição;
� Envolver desde o início os distribuidores para acessar apropriadamente o on-trade;
� O público consumidor de vinho não é congruente com o típico torcedor de futebol;
Rainbowcollection
Independente da promoção de produtos de Fairtrade
certificados pela FLO, foi identificada, no setor de
artesanato, a ONG holandesa Bhold7, cuja iniciativa
rainbowcollection8 conseguiu contabilizar um bom
resultado com a copa de 2010. A organização
holandesa de Fairtrade se especializa em realizar
ações ou campanhas promocionais, ligadas a mega
eventos ou temas que possam despertar o interesse
geral da população e dos departamentos de
Responsabilidade Social Corporativa das empresas. A
estratégia é desenvolver produtos de pequeno valor, a exemplo de acessórios, que
possam facilmente ser associados a campanhas que mobilizam grande quantidade de
7 www.behold.nl
8 www.rainbowcollection.nl
Figura 11 – Imagem do website da Rainbowcollection
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pessoas nos mercados consumidores da Europa. Desta forma conseguem viabilizar a
comercialização de dezenas, ver centenas de milhares de unidades e atingir um
público considerável.
Até agora suas operações estavam limitadas à África do Sul, do lado dos produtores, e
à Holanda, do lado consumidor. No entanto, já para 2011 planejam expandir para
outros países da Europa e a copa do mundo do Brasil também já consta em sua agenda
para 2014.
No caso concreto da Copa do Mundo 2010 da África do
Sul, eles trabalharam com o grupo produtor “Africa
Ignite9”, que produz acessórios de miçangas, um tipo de
artesanato típico da África do Sul, como pode ser visto
na figura 11. Para a Copa criaram a campanha “orange
campaign”, que foi veiculada na Holanda, direcionada à
torcida da “laranja mecânica”, e foram desenhadas
pulseiras relativamente simples de miçangas. A
estratégia comercial direcionada à torcida geral foi
viabilizada através do canal dos “Wereldwinkel”, a
rede de lojas de Fairtrade da Holanda, sendo a
unidade vendida a €2,00. Ainda havia uma promoção
com a seguinte oferta: Compre 5 unidades para
presentear aos amigos e ganhe um para si! No
atacado, o produto era
vendido em caixas com
250 unidades à €200,00.
Paralelamente foram prospectadas empresas para
engajarem seus funcionários e clientes. A meta foi vender
100.000 unidades e, com isso, garantir trabalho de 400
mulheres durante um período de 3 meses. Foi esta
afirmação que foi inclusive usada na campanha de
9 http://www.africaignite.co.za/
Figura 14 - Torcida da laranja mecânica
Figura 13 - Logomarca da ONG Africa Ignite
Figura 12 - Artesãs da Africa Ignite
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divulgação, que contou com a participação de gente famosa, engajada na causa do
Fairtrade. A campanha foi um sucesso tão grande que a meta foi superada e mais de
140.000 unidades foram vendidas.
Na África do Sul a campanha foi realizada também em locais onde se podia acessar a
torcida holandesa, tais como a “Holland House”, um lugar de encontro dos torcedores
holandeses montado sempre nas cidades onde havia jogos do país, e nos campings
nestas mesmas cidades, já que os Holandeses são aficcionados desta forma turismo.
As principais lições aprendidas foram:
� Acessórios para a torcida são sempre bem vindos;
� Preços muito acessíveis praticamente eliminam a resistência, tornando o produto
fácil para a compra por impulso;
� O acessório permite a combinação entre um artesanato típico e a utilidade prática;
Cape Crafts & Design Institute
A provincia do Cabo Ocidental, com sua conhecida capital Capetown, a Cidade do Cabo,
mantém um instituto dedicado ao desenvolvimento e à
promoção do artesanato local, chamado “Cape Crafts and
Design Institute” – CCDI - Insituto do artesanato e design
do Cabo10. Este instituto encomendou em 2008 um
estudo para identificar as oportunidades para produtores
de artesanato na Copa do Mundo 2010 e orientá-los a
melhor aproveitá-las.
Os principais resultados deste estudo foram, entre outros:
� O torcedor de futebol enquanto consumidor está mais inclinado a comprar itens que
reforçam seus sentimentos de pertencimento ao grupo e de auto-estima, ou seja, itens
ligados ao time e ao evento, além de comida e bebida;
� A oportunidade deve levar ao desenvolvimento de produtos que possam ser
explorados além do mega evento;
10
www.ccdi.org.za/
Figura 15 - Logomarca do Instituto de Artesanato e Design do Cabo
24
� As expectativas dos artesãos são exageradas;
� A exploração da oportunidade depende do desenvolvimento customizado de produtos
que falem de um lugar e de uma experiência;
� A capacidade de produção dos artesãos é menor e, por isso, o preço mais alto. Por
isso, não têm como competir com memorabilia industrial, de massa. Precisa se
diferenciar.
O estudo incluiu também entrevistas e visitas aos artesãos, levando os coordenadores do
CCDI a desenharem um programa de capacitação e preparação dos produtores.
O relatório preliminar sobre os resultados destas ações e o impacto da Copa do Mundo,
revela que com a devida antecedência e dirigindo-se aos canais adequados é possível criar
oportunidades para pequenos produtores. Com a devida antecedência o instituto
conseguiu negociar com o Comitê Local de Organização um espaço no Fan Park, e durante
o Fan Fest, a área onde são transmitidas as imagens dos jogos. Neste espaço montaram
um Craft Village, um vilarejo de artesanato. No entanto, para que os produtores pudessem
ter acesso eles tinham que passar pelas capacitações e um processo rigoroso de seleção
organizado pelo próprio CCDI, preocupado em passar a melhor imagem. As capacitações
incluiam também orientações sobre o
que podia e não ser comercializado
neste espaço.
A partir de 2009 o CCDI começou a
organizar a participação de artesãos em
exposições em eventos culturais
menores.
A área no FanFest durante a Copa era
constituída de 20 estandes individuais e
uma loja coletiva, criando uma
oportunidade comercial para 133 produtores da provincia do Cabo Ocidental.
Um levantamento realizado junto a estes expositores revelou o seguinte:
� 51% realizaram nenhuma venda ou vendas muito pequenas;
� Outras 39% mal conseguiram cobrir seus custos;
� Somente 10% tiveram um resultado satisfatório;
Figura 16 - Mapa do Fan Park
25
� Por outro lado, 17% indicaram que receberam pedidos da ordem de R48,270;
� Outros 19% também receberam pedidos, sem revelar os valores;
� Razões dadas pelas poucas vendas incluíram:
o Pouco frequência de turistas - a maioria era de população local e jovens,
portanto, com recursos limitados;
o Entre os turistas, a maioria já tinha comprado itens em outros lugares.
� A loja coletiva vendeu mais, provavelmente graças a um merchandising a comunicação
melhor, além da decoração;
� Apesar das vendas fracas todos os participantes apreciaram a oportunidade e
gostariam de ter um evento similar anualmente;
� Todos se beneficiaram com um aumento de qualidade profissionalismo.
Ainda teve a participação de 17
produtores ao longo do Fan Walk, ou
Fan Mile, o caminho do estádio até o
Fan Park, onde vários produtos entre
alimentos e bebidas, memorabília,
acessórios para torcida, etc. são
oferecidos.
No total dos três locais foram vendidos
5.482 itens, no valor global de R629,097,
cerca de R$100.000,00 no período de
oito jogos que aconteceram na Cidade do Cabo.
Os resultados de todo o programa, iniciado em 2009, ao longo dos dois anos incluíram:
� 33 workshops realizados;
� Artesãos participaram em 24 eventos, representando 1.083 oportunidades de
mercado;
� Vendas totais de R3 milhões (R$500.000), sendo 19,8% nos eventos da Copa do Mundo
de futebol;
� 262 novos produtos foram desenvolvidos por 90 artesãos, sendo 69% ligados ao tema
futebol, 27% ligados ao lugar e 4% customizados. Muitos deste produtos têm
longevidade além da Copa de 2010;
Figura 17 - O mapa do estádio identificando a zona de exclusão definida pela FIFA
26
De acordo com Erica Elk, a diretora executiva do CCDI, outros estudos evidenciaram que o
mês da Copa do Mundo foi o pior mês do ano para pequenos varejistas. A principal
explicação para este resultado seria o fato de a Copa atrair e concentrar toda a atenção,
inclusive geográficamente nos locais dos jogos ou aqueles próximos, como a Fan Mile e o
Fan Park.
A vinculação de artesanato com turismo em comunidades carentes, o chamado township11
tourism, apesar de ser reconhecido como oportunidade interessante, não foi explorada
com ênfase na ocasião da Copa pelo CCDI.
A certificação de Comércio Justo internacional não faz parte dos objetivos do CCDI, visto
que as exigências do Fairtrade são muito altas e o perfil dos produtores atendidos, em sua
grande maioria, ainda está no nível da busca da subsistência/sobrevivência.
As principais lições aprendidas foram:
� Com a devida antecedência e articulação é possível criar oportunidades para
pequenos produtores, mesmo no ambiente muito limitado pela FIFA;
� O público de torcedors estrangeiros não é um comprador automático de
artesanato. É preciso criar oportunidades de encontro e desenvolver produtos
específicos para a ocasião;
� O desenvolvimento de produtos e a preparação dos produtores deve visar um
horizonte de longo prazo, além do evento, a fim de gerar impacto duradouro;
� O desenvolvimento de produtos direcionados para o evento e os torcedores se
mostrou acertada;
� O impacto da Copa na economia de pequenos produtores não foi tão positivo
quanto esperado. Somente 10% dos artesãos que participaram na feira/loja no Fan
Park tiveram resultados satisfatórios. A diferença de resultados entre a feira/loja
no Fan Park e no Fan Walk não foram significativamente melhores dos outros
eventos. A maioria do pequeno comércio tradicional sentiu até impacto negativo
durante o período da Copa.
� No entanto, não tem conclusões fáceis quanto às causas deste resultado. Os
fatores que podem ter contribuídos incluem:
o A zona de exclusão e outras limitações impostas pela FIFA;
11
Township são os guetos dos negros, localizados fora dos centros, como cidades satélites.
27
o O perfil dos torcedores de futebol não é congruente com o perfil do
comprador tradicional de artesanato;
o A falta de merchandising e divulgação adequado junto ao público;
6. Comércio Justo no turismo durante a Copa do Mundo
A experiência da Copa, do ponto de vista do Fairtrade foi muito decepcionante devido
a vários fatores. De acordo com Jennifer Seif, diretora executiva da entidade sul-
africana de Fairtrade Tourism, FTTSA, o governo estava muito preocupado com as
grandes obras de infraestrutura para entregá-las à tempo para dar qualquer atenção a
temas como a sustentabilidade. As condições contratuais leoninas da FIFA não deram
muita abertura para PMEs e quanto mais o evento se aproximava, mais os negócios se
preocupavam em evitar prejuízos. Na verdade, muitos perderam dinheiro e como
consequência o desenvolvimento de PMEs não recebeu nenhuma atenção.
Jennifer Seif também foi muito enfático em sua afirmativa de que os fans de futebol
não gastam como se esperava para um destino de longa distância. Eles não têm um
poder aquisitivo tão alto e querem economizar para viabilizar sua viagem: “Não se
ganha dinheiro com eles!”. Portanto, eles não seriam um alvo adequado para um
turismo de qualidade e diferencial social. O lançamento dos primeiros pacotes
certificados de Comércio Justo no turismo foi propositadamente programado para
depois da Copa do Mundo para não ser abafado e poder ser valorizado corretamente
pelo mercado.
O setor de turismo em geral aproveitou o evento para direcionar sua atenção para
melhorar seus serviços que eram um grande problema. O principal projeto do setor
durante e ao redor da copa foi o lançamento do código de conduta em relação à
proteção à criança junto com a UNICEF e já existem contatos com a UNICEF no Brasil
para replicar esta experiência no país.
Como a FTTSA foi pioniera em desenvolver critérios e um modelo de certificação para
Turismo de Fairtade, conforme relatado anteriormente, já existem contatos com a
UNEP – programa de meio ambiente e sustentabilidade das Nações Unidas, no Brasil
para replicar a experiência e desenvolver "fair favela tourism" certificado, inclusive
para 2014.
28
Lições aprendidas:
� Muitos estabelecimentos certificados pelo sistema de Turismo de Fairtrade
não ganharam dinheiro. Na verdade, sua demanda habitual foi desviada;
� Os que ganharam dinheiro o fizeram apesar da copa;
7. As Olimpíadas da sustentabilidade de Londres 2012
Durante a Pesquisa sobre o mega-evento da Copa do Mundo na África do Sul junto à
Fairtrade Foundation da Inglaterra, surgiu o tema das Olimpíadas de Londres 2012.
Segundo Samantha Dormer, a responsável pelo acompanhamento da campanha
Fairtrade nas olimpíadas de Londres 2012 por parte da FTF, um dos principais motivos
para Londres ter ganho a concorrência teria sido a proposta de introduzir de forma
consequente e sistemática práticas efetivas de sustentabilidade durante a realização
do evento. Estas práticas são orientadas através de manuais que incluem critérios bem
precisas, abrangendo áreas como saúde, meio ambiente, sociais, envolvendo as
comunidades locais, e também de cadeias de fornecimento éticas e sustentáveis para
os produtos a serem servidos e/ou usados.
Estes documentos incluíram um código de fornecimento sustentável, que dá todas as
diretrizes para a seleção de fornecedores tanto de produtos quanto de serviços.
Figura 18 – Capa do código de fornecimento sustentável do comitê organizador das Olimpíadas de Londres
O código se baseia em quatro princípios ambiciosos:
1) Fornecimento responsável – garantir que produtos e serviços são fornecidos e
produzidos sob um conjunto de critérios ambientais, socais e éticos
internacionalmente aceitos.
29
2) Uso de materiais secundários – maximizar o uso de materiais com conteúdo
reutilizado e reciclado, minimizando embalagem e desenhando produtos podem
ser ou reutilizados ou reciclados.
3) Minimizar impactos embutidos – maximizar eficiência de fornecimento e energia
na produção e no processo de logística a fim de minimizar o impacto ambiental.
4) Materiais saudáveis – garantir que substâncias e materiais apropriados são usados
a fim de proteger a saúde humana e o meio ambiente.
Para implementar estes princípios o LOCOG – Comité dos Jogos Olímpicos de Londres,
precisava um braço executor com bastante experiência neste tema altamente
complexo de certificação e monitoria da sustentabilidade nos negócios. O Reino Unido
sendo um dos países de maior presença, reconhecimento e continuado dinamismo no
Fairtrade mundial, tendo acumulado larga experiência prática além de dispor de uma
ampla rede de organizações e indivíduos engajadas no tema, a Fairtrade Foundation é
este parcerio ideal para ajudá-los a implementar na prática a sustentabilidade do
fornecimento de produtos que detêm a certificação internacionalmente aceita, como a
FLO. Mesmo entrando em choque com os patrocinadores oficiais em vários
momentos, eles conseguiram introduzir os principais produtos na lista de
fornecimento, entre eles café, chá, açúcar, suco de laranja.
Para os fornecedores de comida foi desenvolvido um guia chamado de visão de
comida: “food vision” que orienta sobre a qualidade mínima exigida dos produtos,
incluindo também aspectos de sustentabilidade, saúde e higiene.
O plano global de sustentabilidade dos jogos olímpicos visa aspectos mais amplos
ainda, incluindo: mudanças climáticas, lixo, biodiversidade, inclusão social, econômica
e física da região de realização da maioria dos eventos, vida saudável.
As principais lições aprendidas foram:
� Vincular o tema da sustentabilidade às Olimpíadas é no interesse do COI, mas eles
precisam de especialistas que sabem implementar isso na prática;
� A sustentabilidade foi parte da proposta do LOCOG desde o início da proposta. Por
isso tinha de ser implementada e conflitos com partocinadores oficiais foram
administrados;
30
� Ainda assim os patrocinadores oficiais podem bloquear qualquer outro produto
em sua área, apesar dos produtos de Coca Cola, MacDonalds e Cadbury
(Chocolate), parceiros mundiais do evento, não serem exatamente saudáveis.
8. Conclusões gerais
� No Copa do Mundo o único ganhador financeiro garantido é a FIFA
� As restrições de acesso a outras marcas que não os patrocinadores oficiais limitam
muito as oportunidades para PMEs
� A força de atração do evento desvia atenção e vendas dos outros negócios e regiões,
no caso do turismo
� O típico torcedor de futebol tem um poder aquisitivo abaixo do tradicional turista de
viagens de longa distância, além de ter um foco bastante concentrado nos jogos,
enquanot a busca por outros destinos ou negócios fica abaixo do que esperado
� É preciso planejar e agir com muita antecedência para criar oportunidades efetivas
para pequenos produtores
� Quando a sustentabilidade como pano de fundo global já está presente na agenda dos
organizadores, introduzir produtos e serviços com qualidade comprovada (certificada)
é mais fácil
� Acessórios para as torcidas têm um mercado cativo
� Mas é necessário desenvolver produtos direcionados a este mercado específico
� A customização para alguma torcida específica tem maiores chances de sucesso
� Quanto mais acessível no preço, menor a resistência, facilitando a compra por impulso
� Torcidas de países onde o Fairtrade é mais conhecido parecem mais inclinados a
comprar produtos e serviços Fairtrade também no destino
� A comunicação adequada da oferta de produtos e serviços junto ao público alvo de
turistas é fundamental para gerar fluxo nos locais de venda
� A experiência do Comércio Justo certificado no turismo está apenas começando
� Turismo comunitário não foi explorado vinculado à Copa do Mundo
� A procura por outros serviços e destinos fora da Copa foi abaixo do esperado
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9. Anexos
� Coordenadas dos entrevistados
� Anexos eletrônicos:
o Documentos pesquisados
o Lista de Websites pesquisados
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Dados de contato dos entrevistados
Entrevistada: Kate Lewis
Cargo: Business Development Manager - Responsável pela campanha
promocional do vinho da África do Sul no Reino Unido
Organização: Fairtrade Foundation, Iniciativa Nacional de Certificação do Reino
Unido
Website: www.fairtrade.org.uk
Contato: The Fairtrade Foundation
3rd Floor, Ibex House
42-47 Minories
London, EC3N 1DY
Ramal direto: +44 (0)20 3301 5007
PABX: +44 (0)207 405 5942
Celular: +44 (0) 7748727075
Email: kate.lewis@fairtrade.org.uk
Entrevistado: Arianna Baldo
Cargo: Marketing e promoções – responsável pela campanha durante a copa
Organização: FAIRTRADE LABEL SOUTH AFRICA - FLSA
Website: www.fairtradelabel.org.za
Contato: Unit 20 Block E,
Collingwood Place,
Anson Str., Observatory,
Cape Town, 7925
Tel: +27.21 44 88 911
Mobile: +27. 79 9192997
Fax: +27.21 44 83 665
arianna@fairtrade.org.za
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Entrevistado: Jennifer Seif
Cargo: Diretora executiva
Organização: Fairtrade Tourism South Africa
Website: www.fairtourismsa.org.za
Contato: 34A Hatfield Corner
1270 Church Street
Colbyn - Pretoria
Africa do Sul
Tel: +27 (0)12 342 2945/3642
Fax: +27 (0)12 342 2946
e-Mail: jennifer@fairtourismsa.org.za
Entrevistado: Pieter van der Manden
Cargo: Gerente de projeto
Organização: Bhold, Rainbowcolletion
Website: www.behold.nl - www.rainbowcollection.nl
Contato: Social Venture House
Baarsjesweg 311
1058 AH / Amsterdam
Holanda
Tel: +31 626406131
Cel: +31 617880617
pieter.van.der.manden@behold.nl
Entrevistado: Samantha Dormer
Cargo: Gerente de produto – cacau e responsável pelo acompanhamento da
campanha Fairtrade nas olimpíadas de Londres 2012
Organização: Fairtrade Foundation, Iniciativa Nacional de Certificação do Reino
Unido
Website: www.fairtrade.org.uk
Contato: The Fairtrade Foundation
34
3rd Floor, Ibex House
42-47 Minories
London, EC3N 1DY
Main: +44 (0)20 7405 5942
Direct Tel: +44 (0)20 7440 8582
Fax: +44 (0)20 7405 5943
Mobile: +44 (0)782 799 6376
Entrevistado: Patricia Garnett
Cargo: Diretora executiva
Organização: Tourism Concern, Reino Unido
Website: www.tourismconcern.org.uk
Contato: Stapleton House
277-281 Holloway Road
London N7 8HN
Telephone : +44 (0) 20 7133 3800
info@tourismconcern.org.uk
Entrevistado: Erica Elk
Cargo: Diretora executiva
Organização: Cape Craft & Design Institute, Estado do Cabo Ocidental, África do Sul
Website: www.ccdi.gov.za
Contato: 75 Harrington Street
East City
Cape Town
PABX: 021 4611 488
Fax: 021 4611 228
info@ccdi.org.za