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02 a 05 setembro 2013
Faculdade de Letras UFRJRio de Janeiro - Brasil
SIMPÓSIO - Contato e mudança linguística
DP como fase e a marcação de posse via adjunção: um caso de reestruturação parcial no PB. Elaine Alves Santos Melo
A ordem dos constituintes oracionais em situações de contato linguístico na região do Envira: o caso do Kaxinawa e do Shanenawa (Pano) Gláucia Vieira Cândido
A influência fonético-fonológica da língua de imigração em situação de contato linguístico nas zonas rurais do Espírito Santo Edenize Ponzo Peres
INDÍCE DE TRABALHOS(em ordem alfabética)
A adaptação de empréstimos recentes no papiamentu: aspectos da grafia Manuele Bandeira, Shirley Freitas e Gabriel Antunes de Araújo
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A variação fonológica das plosivas bilabiais no contato linguístico: PB-HunsrückischClaudia Camila Lara
Expressão do plural e quantificadores no Português Huni-KuinBeatriz Christino Glides e Estrutura Silábica em PrincipenseAna Lívia Agostinho
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De múltiplos eventos a múltiplas entidades: mudança induzida por contato nos numerais em NheengatuAline da Cruz Página 11
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A sintaxe dos clíticos no Português de Luanda Eliana Pitombo Teixeira e Norma Lucia Fernandes de Almeida Página 07
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Casos de nasalização na oralidade dos quilombolas gurutubanos norte de Minas Gerais Diocles Igor Castro Pires Alves e Ana Cristina Santos Peixoto
Página 14Empréstimos na Língua de Sinais Brasileira: Línguas em contato Cristiane Batista do Nascimento
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Interferências fonético-fonológicas do Mawé no Nheengatu do Rio Andirá (Médio Rio Amazonas) Raynice Geraldine Pereira da Silva e Michéli Carolíni de Deus Lima Schwade
LIBRAS: Variação e mudanças lingüísticas Clarissa Luna Borges Fonseca Guerretta
O “portunhol” falado na região fronteiriça de Guayaramerin/BO e Guajará-Mirim/BR Marci Fileti Martins
O sujeito indeterminado no português afro-brasileiro Dante Lucchesi
Situação de contato linguístico dos Xerente-Akwe: usos e atitudes sociolinguísticas Julia Izabelle da Silva
Uma reflexão sobre aspectos fonológicos do Português Terena Rogério Vicente Ferreira e Caroline Pereira de Oliveira
O contato linguístico entre as línguas africanas e o português brasileiro na visão de Mendonça (1933) e Raimundo (1933) – uma análise historiográficaPatrícia de Souza Borges
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A grafia oficial do papiamentu falado em Curaçao é relativamente recente, tendo se estabelecido
apenas na segunda metade do século XX. Contudo, o papiamentu é escrito desde o final do século
XVIII, porém os sistemas de representação variam de autor para autor, tendendo ora a demonstrar
influências hispanicizantes, ora neerlandecizantes, sem deixar de recorrer a soluções ad hoc. O termo
hispanização é utilizado para se referir à tendência de alguns autores do papiamentu de se aproximar
da grafia espanhola, apesar de os dois sistemas gráficos não serem totalmente convergentes. Já
a neerlandecização remete à tendência a se inspirar na grafia do holandês. Dentro dessa temática,
analisamos como os falantes do papiamentu adaptam empréstimos recentes do ponto de vista da
grafia, buscando observar exemplos das supostas hispanização e neerlandecização. A justificativa
para a análise repousa no fato de que, a partir dos resultados obtidos, será possível entender melhor
como se dá a adaptação de empréstimos no papiamentu no âmbito da grafia, permitindo um maior
conhecimento dos aspectos gráficos do papiamentu como um todo. Os dados do estudo provêm de
Bandeira (2013), cujo corpus é formado por palavras que entraram no papiamentu na segunda metade
do século XX em diante e pertencem aos campos lexicais do Esporte, Política, Economia, Tecnologia
e Desenvolvimento. Analisando os dados, observou-se que o papiamentu, em muitos casos, tem uma
grafia que se aproxima àquela do espanhol, como se vê em bateadó ‘batedor’ (bateador em espanhol)
e futbòl ‘futebol’ (fútbol em espanhol). Nem sempre, contudo, as grafias irão coincidir, visto que,
em alguns casos, ocorrerão algumas alterações gráficas por conta das regras do papiamentu. Como
exemplos, temos as palavras do espanhol que apresentam os grafemas <g> e <j>, ambas se referindo
ao fone [h], representado no papiamentu pelo grafema <h>: hungá ‘jogar’ (jugar no espanhol) e halòp
‘galope’ (galope no espanhol). No caso das palavras provenientes do holandês, de um total de 140, 39
aparecem sem nenhuma alteração gráfica: aanloopkosten ‘gasto inicial’ (do holandês aanloopkosten)
e liquiditeit ‘liquidez’ (do holandês liquiditeit). As outras 101 sofrem poucas alterações (como
a passagem de vogais longas para breves, uso de acento, troca de letra) a fim de atender as regras
gráficas do papiamentu: snòrkel ‘respirador (de mergulhador)’ (do holandês snorkel), pilot ‘piloto’
(do holandês piloot), dèk ‘cobrir outro jogador (termo do esporte) (do holandês dec). Assim sendo,
nesta apresentação, demonstramos que, embora haja o tema da hispanização e da neerlandecização, o
papiamentu moderno seguiu um caminhodiferente com um sistema próprio, sendo a sua grafia aquela
que rege os processos de adaptação de empréstimos independentemente do seu étimo.
A ADApTAçãO DE EmpRéSTImOS RECENTES NO pApIAmENTu: ASpECTOS DA gRAfIA
Manuele Bandeira, Shirley Freitas e Gabriel Antunes de Araújo
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O estado do Espírito Santo, durante o século XIX, recebeu milhares de imigrantes, sobretudo europeus.
Desse contingente de pessoas, cerca de 32.900 eram italianos do norte do país, especialmente do
Vêneto. (APHEES, 2007). Fugindo das guerras, da fome e da falta de perspectiva de um futuro
melhor, esses imigrantes e suas famílias deixaram a terra natal e se estabeleceram em um local
longínquo e desconhecido. Passados mais de cem anos desde a chegada dos primeiros imigrantes,
a colonização italiana trouxe inúmeros benefícios ao Espírito Santo. Atualmente, os descendentes
desses imigrantes ocupam postos de destaque na economia, na política e na vida social do estado.
Dentre as muitas consequências da imigração italiana no Espírito Santo, está o contato entre o dialeto
vêneto e o português, o que gerou um modo de falar, por parte dos habitantes das regiões serranas,
bastante diferente dos demais capixabas. Dessa forma, os objetivos deste trabalho são:
a) auxiliar na compreensão das consequências do contato entre uma língua majoritária e uma
língua de imigração;
b) analisar a importância dos fatores extralinguísticos para a manutenção/substituição de uma língua
minoritária;
c) descrever, no nível fonético-fonológico, a linguagem da primeira e da segunda geração de imigrantes
italianos numa situação de contato.
A fim de alcançar os objetivos acima, analisaram-se os dados de fala de 16 informantes idosos –
08 homens e 08 mulheres, todos descendentes diretos de italianos e com baixa escolaridade – de
diversas localidades do Espírito Santo, notadamente de zonas rurais, em que o relativo isolamento
facilita a preservação dos traços da língua de imigração. Os dados fo ram codificados e analisados
quantitativa e qualitativamente com base nos pressupostos da Sociolinguística,especialmente do
Contato Linguístico (WEINREICH, 1953; FISHMAN, 1972; CHAMBERS e
TRUDGILL, 1980; APPEL e MUYSKEN, 1996; FASOLD, 1996; COULMAS, 2005; etc.).
Os resultados evidenciam os caminhos percorridos por uma língua em contato com outra:
a) a clara influência fonético - fonológica da língua de imigração, principalmente nos traços em que os
dois sistemas diferem, ou seja, os ditongos nasais, a produção dos fonemas /r/, /l/, /t/ e /d/, o ritmo etc.;
b) o uso de expressões da língua dos ancestrais;
c) a língua majoritária mal aprendida. Por fim, as entrevistas também revelam a importância do
sentimento de identidade e de lealdade para a manutenção/substituição das línguas minoritárias em
situação de contato.
A INfLuêNCIA fONéTICO-fONOLógICA DA LÍNguA DE ImIgRAçãO Em SITuAçãO DE CONTATO LINguÍSTICO NAS zONAS RuRAIS
DO ESpÍRITO SANTOEdenize Ponzo Peres
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A família Pano possui uma grande homogeneidade territorial, linguística e cultural distribuída em
três países da América do Sul: Bolívia, Brasil e Peru. As 26 línguas Pano mencionadas na literatura e
que ainda contam com falantes estão assim distribuídas territorialmente: duas na Bolívia (Chácobo e
Pakawara); 12 no Brasil (Arara, Katukina, Kaxarari, Korubo, Kulina, Marubo, Matis, Nawa, Nukini,
Poyanáwa, Shanenawa e Yawanawa) e nove no Peru (Amawaka, Iskonawa, Kapanawa, Kashibo -
kakataibo, Mastanawa, Shipibo-Konibo, Sharanawa, Xitonawa, Yoranawa,). Outras duas línguas, o
Kaxinawa e o Matsés, são faladas tanto no Brasil como no Peru, e uma última, o Yaminawa, é falada
concomitantemente nos três países.
Neste contexto, interessante se torna um trabalho de descrição e análise de algumas situações de
contato linguístico entre os falantes das línguas Pano e as línguas majoritárias da tríplice
fronteira (Brasil, Bolívia e Peru) e/ou o contato resultante de interações entre os grupos majoritários
(falantes de Castelhano ou Português) e os minoritários (línguas Pano). Nesta linha de raciocínio,
propõe-se, nesta comunicação, apresentar os resultados de uma pesquisa sobre situações de contato
linguístico envolvendo dois grupos Pano, os Shanenawa e os Kaxinawa, habitantes das margens do rio
Envira, nos municípios de Feijó e Tarauacá, no Acre, haja vista a proximidade territorial entre esses
dois grupos e, ainda, o fato de os falantes de ambas as etnias estarem em contato constante com as
línguas majoritárias.
Por ora, focalizar-se-á apenas um aspecto gramatical: a ordem dos elementos sintáticos funcionais
na sentença, haja vista o fato de a ordem básica tradicional dos constituintes oracionais das
línguas da família Pano ser SOV em contraste com o que se vê tanto no C a s t e l h a n o
como no Português, línguas caracterizadas pela ordem SVO. A ideia é verificar se o contato das
duas línguas Pano com as línguas majoritárias (especialmente, o Português) causou algum processo
de reestruturação da ordem básica verificada nas línguas da família Pano e, caso isso tenha ocorrido,
observar se devido à proximidade entre os falantes do Kaxinawa e do Shanenawa, haveria algum
outro tipo de mudança nos domínios morfossintático dessas línguas. Para tanto, serão analisados
dados já documentados na literatura, além de arquivos pessoais recuperados de linguistas e etnógrafos
interessados nas línguas em questão.
A ORDEm DOS CONSTITuINTES ORACIONAIS Em SITuAçõES DE CONTATO LINguÍSTICO NA REgIãO DO ENvIRA:
O CASO DO KAxINAwA E DO SHANENAwA
Gláucia Vieira Cândido
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Estudos comparativos recentes (AVELAR, CYRINO & GALVES 2008, NEGRÃO&VIOTTI 2008;
H0LM 2009; PETTER 2008a,entre outros) têm demonstrado haver semelhanças morfossintáticas entre
o português brasileiro e o português de países africanos. Os dois primeiros creditam tais semelhanças
ao contato do português com línguas africanas, a partir da transferência de estruturas dessas línguas
por falantes do português como segunda língua, cujo modelo teria servido de input para as novas
gerações no processo de nativização. Luchessi ao estudar o português afro-brasileiro, isto é, a língua
falada em comunidades isoladas e remanescentes de quilombos, também atribui ao contato a maior
parte das inovações promovidas pelos aloglotase nativizadas pelos seus descentes.
O autor propõe que tais inovações são resultantes do que ele chama de ‘transmissão linguística
irregular’, ou seja, uma aquisição imperfeita motivada pelo acesso limitado à língua dos colonizadores
e pela ausência de instrução formal da grande massa de escravos da população escrava trazida para
o Brasil em consequência do empreendimento colonial português, o que se traduz, principalmente,
na corrosão da morfologia. De fato, o contato parece ser o motor das mudanças linguísticas, haja
vista a origem e a formação das línguas românicas. O locus desse estudo é Luanda, capital de Angola.
Defrontados com uma guerra civil pouco tempo depois da Independência de Portugal, muitos
provincianos migraram para a capital, uma zona neutra em que, mesmo duramente, ainda se podia
sobreviver. Essa parcela da população, mais afastada do centro administrativo e, portanto, do contato
com a língua portuguesa, iria fortalecer e acelerar a difusão de um português aprendido emergencial
e imperfeitamente visto a necessidade imperiosa de sobrevivência na cidade.Se pensarmos que Angola
livrou-se do jugo português há aproximadamente quarenta anos, inferimos que o português angolano
ainda está em formação. Portanto, podemos compará-lo ao Brasil do século XIX.
Luanda é, pois, uma cidade rica e estimulante para qualquer pesquisador interessado nos estudos de
línguas em contato. Nesse trabalho, abordamos empiricamente a posição dos cliticos no português
falado em Luanda em uma amostra constituída de falantes nativos de linguas nacionais, com nulo
e baixo nível de escolaridade, de estudantes do nível fundamental e universitários falantes nativos
do português. Além desse fator social, buscamos verificar se os chamados atratores de próclise
funcionam ou não nessa variedade linguistica, haja vista os resultados de trabalhos recentes sobre o PB
mostrarem que nem sempre tais atratoresbloqueam a ênclise, adquirida pelo contato com a escrita (cf.
KATO, 1999) e, portanto, assumida como uma forma prestigiada no imaginário de estudantesde nível
A SINTAxE DOS CLÍTICOS NO pORTuguêS DE LuANDA
Eliana Pitombo Teixeira e Norma Lucia Fernandes de Almeida
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mais avançado de escolaridade. Os resultados mostramuma acentuada polarização entre o primeiro
e o terceiro grupo de falantes, de modo que, na variedade popular, observa-se uma aproximação ao
português brasileiro enquanto que, na variedade culta ou semi-culta, a preferência pela ênclise e o
fenômeno da ‘subida’ de clítico remetem ao português europeu.
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Estudos no espaço brasileiro de contatos linguísticos envolvendo grupos majoritários e minoritários
têm motivado a pesquisa do contato linguístico entre o português brasileiro (PB) e a língua de
imigração,Hunsrückisch.De acordo com Altenhofen e Margotti (2011), no nível fonético-fonológico
o traço característico do português de contato com o adstrato alemão mais evidenciado é a
dessonorização de consoantes sonoras. O presente trabalho tem por objetivo verificar a frequência
da variação da plosiva bilabial vozeada em lugar de desvozeada, e vice-versa, exemplos dessa variação
na fala são:bairro~pairro e pode~bode. Para a realização da pesquisa foi analisada a fala de vinte e
quatro informantes da zona rural do município de Estrela/RS. O município de Estrela, localizado no
Vale do Taquari, região Sul do Brasil, recebeu a partir de 1855 os primeiros imigrantes alemães que se
estabeleceram nas picadas para trabalhar.
A partir das entrevistas sociolinguísticas em que foi realizada a gravação espontânea de fala com
o entrevistador levantaram-se os dados submetidos ao pacote computacional VARBRUL, versão
GoldVarb X, para verificar os fatores linguísticos e extralinguísticos que condicionam a realização
das plosivas.Segundo Berruto (2010) os falantes de qualquer língua, ao se comunicarem entre si e
em sua comunidade de fala, se utilizam de sons variados, vocábulos e estruturas que podem ser
realizadas de diferentes formas.Para Labov (2008 [1972]), os membros de uma comunidade de fala ao
compartilharem normas de uso, configuram padrões e realizam variação de forma estratificada na
fala.Portanto, uma variedade linguística é concebível como um conjunto de variantes que coocorrem
em uma dada língua.Como resultado deste estudo, Lara (2012) ressalta que é baixa a frequência da
troca das plosivas bilabiais (/p, b/) porque ocorre com os informantes mais velhos que permanecem
na comunidade. Os jovens deslocam-se para trabalhar em centros urbanos, onde a frequência da
aplicação da regra é ainda mais baixa.
A vARIAçãO fONOLógICA DAS pLOSIvAS BILABIAIS NO CONTATO LINguÍSTICO: pB-HuNSRüCKISCH
Claudia Camila Lara
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O presente trabalho propõe investigar o comportamento dos fonemas vocálicos nasais oralidade dos
quilombolas do território gurutubano – Norte de Minas Gerais. A pesquisa baseia-se no comportamento
dos fonemas vocálicos nasais de pronúncia uniforme no Português do Brasil e de pronúncia variável,
com segmento consonantal nasal e segmento vocálico nasal na cadeia sonora e sem segmento nasal na
cadeia sonora. O objetivo é descrever o comportamento linguístico destes segmentosem itens lexicais
do Português do Brasilfalado na comunidade quilombola Gurutubanae identificar as informações
linguísticas e não linguísticas dos casos de vogais nasais usadas em itens lexicais pelos falantes da
comunidade em investigação.
Em conformidade com o modelo teórico que selecionado para ancorar essa investigação, a
Sociolinguística Variacionista,problematizamos que há diferenças entre vogais nasais (pronúncia
uniforme) e vogais nasalizadas (pronúncia variável) que aqui adotamos, e que cada caso de vogais
nasalizadas envolve informações linguísticas e não linguísticas (situação comunicativa, redes sociais,
idade, sexo etc.) a ele peculiares. O modelo demonstra que a estrutura da língua deve ser construída
através do uso linguístico (substância), será baseado em dados reais de fala, cuja coleta já foi realizada e
é constituída de uma amostra controlada de informantes naturais que sempre viveram na comunidade
quilombola, considerando-se fatores linguísticos e não lingüísticos.
A Sociolinguística insiste na relação entre língua e sociedade e entende a língua como um sistema de
regras variáveis, em que a atualização dessas regras dependerá das circunstâncias linguísticas e não
linguísticas em que o falante de uma comunidade estiver inserido.Os dados foram coletados por meio
de gravação de entrevistas: algumas informais e espontâneas sem qualquer delimitação de tema ou
assunto e outras relacionadas a festas religiosas, costumes e antepassados.
CASOS DE NASALIzAçãO NA ORALIDADE DOS quILOmBOLAS guRuTuBANOS NORTE DE mINAS gERAIS
Diocles Igor Castro Pires Alves e Ana Cristina Santos Peixoto
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O Nheengatu é a variedade moderna da língua geral amazônica, que teria se desenvolvido a partir do
Tupinambá, língua da família Tupi-Guarani do subconjunto III. No processo de colonização da região
amazônica, a língua geral teria sido utilizada como meio de comunicação interétnica (ver Rodrigues
(1996) e Bessa Freire (2004)). Ao se espalhar pela região amazônica e, em muitas circunstâncias,
substituir outras línguas indígenas, a língua geral passou por mudanças estruturais, particularmente
na sintaxe e na fonologia. Atualmente, a lingua geral, conhecida como Nheengatu,é falada por povos
Aruak do Alto do Rio Negro.
Este trabalho investiga as mudanças ocorridas nas classes lexicais, focalizando o caso do campo
semântico dos “numerais”. Descrições de línguas da família Tupi-Guarai têm mostrado que nessas
línguas, numerais possuem propriedades sintáticas e morfológicas de expressões adverbiais. Trata-
se de um padrão conservativo também encontrado em línguas Tupi (ver, por exemplo, os estudos
sobre o Karitiana, família Arikén, desenvolvidos por Muller e Sanchez (2008)). A classificação dos
numerais como expressões adverbiais em línguas Tupi-Guarani estaria relacionada às propriedades
sintáticas, morfológicas e semânticas desses termos. Comparando as propriedades de distribuição e
comportamento sintático dos numerais em Nheengatu e em numerais cognatos em outras línguas da
família Tupi-Guarani, observa-se que no Nheengatu os termos do campo semântico dos numerais
sofreram uma mudança estrutural profunda: suas propriedades sintáticas e morfológicas permitem
classificá-los não mais como expressões adverbiais, mas como membros da classe dos ‘nomes’. Para
demonstrar essa recategorização dos termos do campo semântico numeral em Nheengatu, essa
pesquisa analisa (a) aspectos sintáticos como a constituência em relação ao sintagma nominal; (b)
aspectos morfológicos como a perda da possibilidade de combinar com morfemas nominalizadores,
causativos, entre outros; (c) aspectos semânticos, como a relação entre multiplicidade de eventos
e multiplicidade de entidades. As mudanças ocorridas no Nheengatu apontam no sentido de um
distanciamento do padrão das línguas Tupi-Guarani em que numerais têm propriedades adverbiais e
uma aproximação ao padrão das línguas indoeuropeias, em que numerais têm propriedades adjetivais.
DE múLTIpLOS EvENTOS A múLTIpLAS ENTIDADES: muDANçA INDuzIDA pOR CONTATO NOS NumERAIS Em NHEENgATu
Aline da Cruz
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Pesquisas têm investigado o efeito do contato do Português Brasileiro (doravante PB) com as línguas
africanas, especialmente as da família Bantu (AVELAR e GALVES, 2011; MUNHOZ, 2011; MUNHOZ
e NAVES, 2012). Nessa linha de pesquisa, analisarei construções, inacusativas, em que, em principio,
o argumento é um DP modificado por PP, (1a). Em (1a’), observamos que há o alçamento do sintagma
genitivo para [Spec-T] e a ausência da preposição que denota posse e checa Caso genitivo.
(1) a. Acabou a bateria do celular.
a’. O celular acabou a bateria
O objetivo desse trabalho é investigar a manutenção da noção de posse mesmo com a ausência da
preposição “de”. A hipótese é de que houve uma reestruturação parcial do PB (MUFAWENNE, 2000)
resultante do contato com as línguas Bantu (doravante LB) que admitiriam a checagem desse traço
sem a presença de um item lexical específico. Entretanto, o exemplo (2) evidencia que “ka” checa os
traços de genitivo e é realizado nos mesmos contextos que a preposição “de” no PB. Portanto, esta
construção não foi o “gatilho” para a reestruturação da marcação de posse.
(2) Cokwe: kasumbikatata
chicken POSS Poss; 1 SG.father
PB: galinha do meu pai (Martins 1990:50)
Outro tipo de sentença – com duplo objeto - apresenta itens aglutinados ao verbo, como “el”,
em (3), que checam caso. Observemos que é gerada, no PB, uma construção agramatical com dois
argumentos internos não preposicionados, o primeiro checa acusativo e o segundo, dativo.
(3) Mudjondzi a-yiv-el-ile Tino mabuku.
estudante 3a Pes-rouba-a-passado Tino livros
Nessas sentenças, os dois argumentos internos podem ter sido reanalisados como possuidor e possuído,
gerando uma estrutura em que o traço de posse é checado via adjunção. A evidência pode estar nos
resultados diacrônicos acerca da marcação de posse, no PB: no século XIX, havia o dativo de posse em
contextos como (3), como notamos em (4).
Dp COmO fASE E A mARCAçãO DE pOSSE vIA ADjuNçãO: um CASO DE REESTRuTuRAçãO pARCIAL NO pB.
Elaine Alves Santos Melo
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(4) Sumiu um livro a João (BARROS, 2006:169)
Segundo Barros (2006), houve uma mudança em que o traço de posse deixou de ser expresso por
dativos, passando a ser checado pela preposição genitiva “de”. A hipótese é de que a marcação de
posse via adjunção é resultado do contato entre o substrato das LBs, em que havia a construção de
duplo objeto, e o português, que admitia as construções com dativo de posse. Ou seja, o falante não
“enxergava” o item “el”, de (3), como “checador” de dativo e, assim, reestruturou a construção.
Formalmente, a derivação pressupõe que DP seja uma fase (SVENONIUS, 2004) e por isso, possui
traços na margem que permitem o movimento do sintagma para uma posição mais alta na sentença:
[Spec-T]. Assim, o sintagma genitivo é alçado, checa os traços de EPP e exerce a função de sujeito.
Este estudo Minimalista (CHOMSKY, 1998 e 2000) é descritivo, constitui uma abordagem preliminar,
comparativa entre as estruturas de marcação de posse no PB, via adjunção, e as de duplo objeto das
LBs. Assim, colabora para uma descrição das mudanças na sintaxe do PB, considerando o contato
linguístico como força propulsora.
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A Língua de Sinais Brasileira – LSB – ou, popularmente como é chamada, Libras é uma língua natural
que surgiu e tem sido desenvolvida em uma situação de contato de língua, no caso, com a língua
portuguesa – LP. Apesar da LSB ser uma língua de modalidade, espacial e visual, diferente da LP,
oral auditiva, esta língua oral tem motivado a criação de sinais da LSB. Este fenômeno não é uma
singularidade da LSB, Sutton-Spencee Woll (1999) também identificaram empréstimos da língua
inglesa na Língua de Sinais Britânica – BSL. A situação ideal para o indivíduo surdo brasileiro é
o bilinguismo já que a língua de sinais não pode substituir a língua portuguesa por escrito como
mencionado na Lei 10.436/02.
Neste trabalho realizamos uma pesquisa teórica com base em Couto (2005), Ecologia Fundamental
das Línguas, Sebbas (2007), as consequências do contato de língua, Lucas e Valli (2000) tratam
dos possíveis resultados do contato entre duas línguas de sinais e os resultados de uma língua de
sinais e uma língua oral e por último, Faria-Nascimento (2009) que classifica e apresenta uma
terminologia específica para os empréstimos LP para a LSB. Com base na terminologia proposta por
Faria-Nascimento, apresentamos exemplos dos cinco tipos de empréstimos classificados por ela, os
empréstimos transliterados, empréstimos da configuração visual dos lábios, empréstimos semânticos
(decalques), empréstimos estereotipados e empréstimos cruzados.
O contato de línguas tão diferentes como o português e a LSB tem produzido um fenômeno interessante,
os itens lexicais dessa língua de sinais têm sido motivados, na maioria das vezes, pela escrita da língua
portuguesa e é um mecanismo para inovação lexical. O recurso mais usado para transmissão de
material fônico tem sido o alfabeto manual das LSB que representa manualmente as letras do alfabeto
da LP. Muitos dos empréstimos tornam-se quase imperceptíveis, pois adaptam-se tão plenamente a
língua receptora que o falante nem percebe que o item lexical é decorrente do contato entre línguas.
EmpRéSTImOS NA LÍNguA DE SINAIS BRASILEIRA: LÍNguAS Em CONTATOCristiane Batista do Nascimento
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As variedades de Português empregadas como segunda língua pelas diversas comunidades
indígenas brasileiras não apenas servem de veículo de comunicação com a sociedade nacional, mas
ainda desempenham o papel de línguas francas na interação entre indígenas de distintas origens e
constituem elemento de identidade étnica (v. Maher 1996, 1998). Muitas pesquisas vêm apontando
as especificidades dos chamados ‘Português-Indígena’ e, com isso, trazendo dados valiosos para as
reflexões envolvendo as relações entre contato linguístico, processos de reestruturação e mudança
linguística (a exemplo de Matos e Silva (1988), Costa (1993), Lucchesi e Macedo (1997) e Christino e
Lima e Silva (2012)).
Este trabalho integra um projeto de pesquisa voltado para a identificação e caracterização das
particularidades morfossintáticas do Português Huni-Kuin. Nosso objeto de estudo, portanto,
corresponde à variedade específica de Português usada pelos autodenominados Huni-Kuin (ou
“homens autênticos”), cuja língua materna pertence à família Pano. Também conhecidos como
Kaxinawá, habitam os dois lados da fronteira Brasil-Peru e são em número superior a 5.000. No Brasil,
vivem em 11 terras indígenas ao longo dos rios Tarauacá, Jordão, Breu, Muru, Envira, Humaitá e
Purus (região do Alto Juruá, AC).
Refinando e aprofundando nossa investigação preliminar da concordância de número no sintagma
nominal em Português Huni-kuin (v. Abreu Sant’Anna e Christino 2012), a presente análise leva em
consideração a expressão de plural em SNs de diversas estruturas, paralelamente ao exame de SNs
em que ocorrem quantificadores. Vale lembrar que, como as demais línguas Pano, o hantxakuin(ou
“língua autêntica”) não apresenta obrigatoriedade de indicação de número e não conta com nenhum
mecanismo de concordância, seja no domínio do SN ou na relação verbo-sujeito.
Ainda que estes não representem a maioria das ocorrências no corpus, nossa atenção se volta
especialmente para os processos em que há estruturas agramaticais para os falantes nativos do PB,
como a marcação de plural exclusivamente no último elemento do sintagma -- reconhecível em
(1) “espaço tradicionais faz a gente respirar o fundo espirituais” (postado no Facebook por M.S. em
06/11/12) e (2) “O que pode melhorámais no quintais?” (em gravação cedida pela Comissão Pró-Índio
do Acre, doravante CPI-AC). Contextos assim se revelam um material privilegiado para a observação
de processos de reestruturação empreendidos por falantes de segunda língua e atuantes nas situações
de contato linguístico.
ExpRESSãO DO pLuRAL E quANTIfICADORES NO pORTuguêSHuNI-KuIN
Beatriz Christino e Clarissa de Abreu Sant’Anna
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No tocante aos sintagmas com quantificadores, pudemos encontrar na oralidade e na escrita a forma
tudos, neutra quanto ao gênero e detentora de marcação morfológica de plural, como se pode notar em
(3) “divougatudos os trabalho importante” (postado no Facebook por I.S. em 08/02/13) e em (4) “Tudos
área que eles identificaram” (CPI-AC). Especificidades foram constatadas, igualmente, na utilização do
quantificador cada. O corpus continha tanto ocorrências com marcação morfológica de plural nesse
elemento -- (5) “aí cadas vez ele abrindo vontade mesmo” (no material fornecido por Amilton Matos,
autor do documentário O Espírito da Floresta) – quanto sintagmas em que o nome quantificado vinha
com plural expresso, caso de (6) “plantas de... de frutífera, né, que estão em cada quintais” (CPI – AC).
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Neste trabalho discutiremos o status dos glides e a estrutura silábica do Principense, um crioulo de
base portuguesa falado na Ilha do Príncipe em São Tomé e Príncipe. Primeiramente, apresentaremos
a fonotática dos glides, para em seguida examinar as mudanças diacrônicas dos onsets, codas e glides
do Português para o Principense . Argumentaremos, então, que os onglides estão no onset enquanto
os offglides fazem parte da coda. Finalmente, vamos propor uma estrutura silábica para o Principense.
Os onglides podem aparecer após qualquer consoante com exceção das oclusivas laterais, palatais e
labio-velares.No quadro a seguir, observamos que os onglides podem aparecer antes de qualquer vogal
oral, com exceção de /wu/ e /ji/, restrição comum nas línguas do mundo (Ohala& Kawasaki: 1984).
Tabela 1: Glide + Vogal
A seguir, constatamos que offglides não ocorrem em todos os contextos:
Tabela 2: Vogal + Glide
Para tanto, utilizaremos dados do Principense gravados in loco pela autora em 2009, 2010 e 2011
e dados do Fa d’Ambô, também gravados in loco pela autora em 2012. Todos os dados obtidos de outra
fonte serão identificados como tal.
gLIDES E ESTRuTuRA SILáBICA Em pRINCIpENSE
Ana Lívia Agostinho
18
No entanto, as consoantes labio-velares são raras e não-produtivas na língua (Maurer: 2009: 10). As
outras consoantes que não aparecem seguidas de glides são
Maurer: 2009.
De acordo com as tabelas acima, podemos observar que a sequência GV ocorre mais do que VG.
Argumentaremos que isso está vinculado a processos diacrônicos que ocorreram durante a formação
do Principense.
Na tabela a seguir, apresentamos os tipos de sílaba possíveis em Principense, tal como proposto
porKlein (2004), mas acrescentado também sílabas longas:
Tabela 3: Sílabas possíveis em Principense
Por se tratar de uma língua crioula pouca estudada e por trazer dados empíricos, bem comodescrições e
análises fonológicas dessa língua, este trabalho pretende trazer contribuições para o campo de línguas
em contato e línguas crioulas, encaixando-se, assim, no simpósio intitulado “Contato e mudança
linguística”.
Bibliografia citada:
Klein, Thomas B. 2004 “Diversity and complexity in the typology of syllables in Creole languages ”.
Ms. Georgia Souther University.
Maurer, Philippe. 2009. Principense – Grammar, texts, and vocabulary of the Afro- Portuguese creole
of the island of Príncipe. London: Battlebridge Publications.
Ohala J. & H. Kawasaki. 1984. “Prosodic phonology and phonetics”. PhonologyYearbook1. 113-127.
19
Na região do médio rio Amazonas localiza-se a terra indígena Andirá-Marau do povo Sateré-Mawé,
com uma população aproximada de 8.000 pessoas. A área de estudo em questão é a do rio Andirá
(Médio Rio Amazonas), onde há falantes do Mawé (língua predominante) e do Nheengatu (língua
com poucos falantes e todos com mais de quarenta anos). Neste trabalho objetivamos apresentar um
estudo preliminar sobre as interferências fonético-fonológicas da língua Mawé no Nheengatu falado
na região do rio Andirá. A história de contato dessas línguas na região é de mais de trezentos anos,
estudos já realizados por Rodrigues (1984/85), Rodrigues & Dietrich (1997), Franceschini (1999),
Suzuki (1997), Silva (2005) e (2010) sobre o Mawé tratam da questão dos empréstimos linguísticos
entre elas tanto no nível fonético-fonológico, quanto no nível lexical.
As interferências fonéticas são observadas pela presença do vogal central alta [ i ] com ocorrência em
variação livre tanto com a anterior alta [ i ] quanto com a posterior alta [ u ] na pronuncia de palavras
em Nheengatu. Observa-se, ainda que preliminarmente, o emprego da oclusiva glotal[ ? ] em juntura
de palavras. Neste estudo pretende-se fazer algumas considerações sobre os empréstimos entre duas
línguas indígenas (Mawé e Nheengatu) na região do médio rio Amazonas/AM. Dessa forma, este
trabalho se enquadra no Simpósio intitulado Contato e mudança linguística que tem como objetivo
descrever e analisar situações de contato linguístico em áreas de fronteira e/ ou envolvendo interações
entre grupos majoritários e minoritários buscando uma melhor compreensão dos mecanismos
de mudanças e reestruturação linguística induzida pelo contato entre línguas. Esse estudo trará
contribuições relevantes quanto à análise de empréstimos linguísticos ocorridos a partir do contato
dessas duas línguas que se encontram no mesmo tronco linguístico, o Tupi.
INTERfERêNCIAS fONéTICO-fONOLógICAS DO mAwé NO NHEENgATu DO RIO ANDIRá (méDIO RIO AmAzONAS)
Raynice Geraldine Pereira da Silva e Michéli Carolíni de Deus Lima Schwade
20
As pesquisas linguísticas iniciaram principalmente nos Estados Unidos, através de Stokoe (1965), que
editou o primeiro dicionário organizado sobre a língua de sinais americana (ASL). Esse trabalho foi
importante por que demonstrou, pela primeira vez, a organização interna da língua, sua estrutura
gramatical, combinações possíveis desta estrutura. Enfim, legitimou seu status de língua. No Brasil,
a língua de sinais brasileira (LSB), mais comumente chamada de Libras, foi regulamentada a lei nº
10.436, 24 de abril de 2002. Com o seu reconhecimento linguistico, muitas pessoas pensavam que a
língua de sinais é universal, mas não é, cada país tem a sua própria língua de sinais, como exemplo
alguns países lusófonos, vemos que utilizam diferentes línguas de sinais: no Brasil existe a Língua
Brasileira de Sinais (LIBRAS), em Portugal existe a Língua Gestual Portuguesa (LGP), em Angola
existe a Língua Angolana de Sinais (LAS), em Moçambique existe a Língua Moçambicana de Sinais
(LMS). Além disso, da mesma forma que acontece nas línguas faladas oralmente, existem variações
linguísticas dentro da própria língua de sinais, isto é, regionalismos e ou sotaques.Todas as línguas
humanas sofrem mudanças ao longo do tempo. O estudo das mudanças fonológicas e lexicais da Língua
Brasileira de Sinais - LIBRAS denotam um importante movimento sociolinguístico da comunidade
surda brasileira.Segundo Diniz (2010), os seis principais tipos de tendência de mudança identificados
nas Línguas de Sinais também são encontrados na Língua Brasileira de Sinais: simetria de duas mãos;
deslocamento locativo; conteúdo lexical para as mãos; a assimilação; deletação de uma mão de sinais
de duas mãos; e, deletação de uma parte do sinal composto.Este trabalho tem como objetivo apresentar
a criação de um novo sinal em Libras, a partir das restrições impostas pelos parâmetros fonológicos da
estrutura gramatical da Língua Brasileira de Sinais. E, em seguida, provisória mudanças de três sinais
hoje existentes, considerando as possíveis motivações destas mudanças daqui a uma década.
LIBRAS: vARIAçãO E muDANçAS LINguÍSTICAS
Clarissa Luna Borges Fonseca Guerretta
21
Duas obras são consideradas como fundadoras da tradição que, no Brasil, se dedicou a investigar
a questão do contato entre as línguas africanas e o português brasileiro: A influência africana no
Português do Brasil (1933) de Renato Firmino Maia de Mendonça [1912 - 1990] e O elemento
afro-negro na Língua Portuguesa (1933) de Jacques Raimundo (cf., p. ex., BONVINI, 2009;
CASTRO, 2012[1933] apud MENDONÇA 2012[1933]). Ao construir um panorama histórico da
produção brasileira que tratou desta questão, Bonvini (2009) classifica Mendonça e Raimundo
como representantes da vertente que sustenta a hipótese da “influência” das línguas africanas no
português brasileiro, principalmente no domínio do léxico.
Segundo ele, ambas as obras foram produzidas no contexto que buscava defender as especificidades
do PB frente às características do português europeu. Nesta apresentação, no intuito de ir além
de “rótulos” consolidados ou classificações feitas em conformidade com a história social (por
exemplo, em décadas e períodos políticos), analisaremos, por um lado, as obras sob uma perspectiva
historiográfica que privilegie os aspectos internos, i.e, os que dizem respeito à natureza dessas
descrições linguísticas, principalmente com relação às fontes e à metodologia empregada, e, por outro
lado, os aspectos externos, que tratam da história dos agentes, do espaço e tempo envolvidos na
produção do conhecimento linguístico. A análise se fará por meio do conceito de “programa de
investigação” proposto por Swiggers (1981).
Nosso objetivo é analisar o tratamento dado à questão do contato, a partir dos parâmetros de
análise que distinguem um “programa de investigação”: visão (visão de linguagem adotada, tipos
de materiais de destaque e modos de conceber as relações entre linguagem e sociedade, linguagem e
cultura, etc.), técnica (conjunto de princípios e métodos adotados) e incidência (formas linguísticas
de análise privilegiadas e à natureza e função preferencialmente atribuídas a essas formas). Trata-
se de uma análise parcial de dados de nosso projeto de mestrado, que tem como objetivo mapear e
analisar a produção que se dedicou a investigar as relações entre o português brasileiro e as línguas
africanas no Brasil e propor uma periodização entrelaçada (interrelação entre aspectos internos
e externos) para a história dessa produção, a partir da análise da metodologia e das fontes que
fundamentaram as descrições. (Apoio: CNPq)
O CONTATO LINguÍSTICO ENTRE AS LÍNguAS AfRICANAS E O pORTuguêS BRASILEIRO NA vISãO DE mENDONçA (1933) E RAImuNDO (1933) –
umA ANáLISE HISTORIOgRáfICA
Patrícia de Souza Borges
22
Esta comunicação faz parte das discussões e das proposições do projeto Observatório da Educação na
Fronteira – OBEDF, que tem por objetivo construir um panorama qualificado da situação linguística
em escolas brasileiras da fronteira de i) Ponta-Porã (MS/BR)/Pedro Juan Caballero (PRA), ii) Guajará-
Mirim (RO/BR)/Guayaramerin (BO) e iii) Epitaciolândia (AC/BR)/Cobija (BO) observando seu reflexo
sobre os processos de ensino e aprendizagem da língua portuguesa, para alunos de séries iniciais,
nessas três regiões fronteiriças.
Interessa, notadamente, nesse contexto, as variedades lingüísticas faladas ao longo da fronteira brasileira
com esses países de expressão hispânica, variedades estas comumente denominadas “portunhol”.
O que se tem observado é que esse contexto linguístico/cultural da fronteira brasileiraque resulta,
dentre outras coisas, em uma “língua de contato” não é homogêneo. De fato, a região fronteiriça de
Guayaramerin (Departamento do Beni, na Bolívia) e Guajará-Mirim (Estado de Rondônia, no Brasil),
por exemplo, destaca-se por sua grande diversidade lingüística e cultural: além do português e do
espanhol, são faladas muitas outras línguas indígenas.
Dito isso, nessa apresentação, pretendo discutir por um lado, a própria designação do que se considera
“portunhol” mostrando que essa língua de contato, nas diferentes fronteiras brasileiras, pode ter
constituição diferenciada. Isso será feito através da comparação da região de Guayaramerin (BO)/
Guajará-Mirim (BR) com outra área fronteiriça: a região de Rivera (Departamento de Rivera, no
Uruguai) e Santana do Livramento (Estado do Rio Grande do Sul, no Brasil).
Por outro lado, interessa analisar também, a atitude lingüística do aluno boliviano estudante das escolas
brasileiras na região fronteiriça de Guayaramerin (BO) e de Guajará-Mirim (BR), frente à(s) língua(s)
que fala que, como propõe Kempf e Barbery (2001) é determinada por um contexto sociolingüístico
no qual competem duas estratégias linguísticas: i) a identitária marcando seu pertencimento a um
grupo e ii) a ilocutória ligada, portanto, às necessidades de comunicação.
O “pORTuNHOL” fALADO NA REgIãO fRONTEIRIçA DE guAyARAmERIN/BO E guAjARá-mIRIm/BR
Marci Fileti Martins
23
De acordo com a visão sistematizada em Lucchesi, Baxter e Ribeiro (2009), o contato entre línguas
afetou a formação histórica das variedades populares do português brasileiro, não por meio de um
processo prévio de crioulização, mas através de um processo de transmissão linguística irregular de
tipo leve (TLIL). A crioulização arquetípica caracteriza-se pela drástica eliminação de mecanismos
gramaticais sem valor informacional e pela reconstrução original dos mecanismos gramaticais
essenciais ao funcionamento da língua, além da transferência de certos mecanismos gramaticais das
línguas do substrato, em circunstâncias favoráveis. Já, na TLIL, a reestruturação original da gramática
e as transferênciasdo substrato seriam raras ou mesmo ausentes, sendo o resultado mais notável
desse processo a erosão dos mecanismos gramaticais sem valor informacional (como as regras de
concordância), sem, contudo, ocorrer sua eliminação total, como costuma ocorrer na crioulização.
O mecanismo gramatical para expressar a indeterminação do sujeito pode ilustrar bem essa diferença.
Em crioulos portugueses arquetípicos, como os crioulos do Golfo da Guiné, o pronome a da língua edô,
do substrato africano, foi incorporado à gramática dessas línguas para expressar a indeterminação do
sujeito, como se pode ver no exemplo abaixo, do lunguié, crioulo falado na Ilha do Príncipe:
(1) A sakunfya na myefa. (Lunguié)
IND ASP confiar NEG mulher nNEG
‘Não se deve confiar nas mulheres.’
Já o que se observa no português popular do Brasil é apenas uma simplificação morfológica, com a
utilização da forma “nua” da 3ª pessoa do singular para expressar a indeterminação do sujeito, sem
o recurso a partícula de indeterminação se, prevista na norma padrão, como se pode ver no exemplo
abaixo:
(2) Planta muita mandioca aqui. (português popular)
Planta-se muita mandioca aqui. (Padrão)
A distinção entre a referência arbitrária e a referência específica é feita, portanto, no plano pragmático
e discursivo. Nesta comunicação, serão apresentados os resultados de uma análise variacionista das
formas de indeterminação do sujeito, feita com base em amostras de fala vernácula de comunidades
rurais afro-brasileiras isoladas do interior do Estado da Bahia (algumas delas oriundas de antigos
quilombos). Os resultados quantitativos constituem a base empírica de uma interpretação segundo a
qual a simplificação morfológica que leva ao uso da forma nua da 3ª pessoa do singular para expressar
O SujEITO INDETERmINADO NO pORTuguêS AfRO-BRASILEIRO
Dante Lucchesi
24
a indeterminação do sujeito é o resultado do processo de TLIL presente na formação histórica dessas
comunidades de fala. Porém, esse processo está sendo revertido atualmente, pela influência da mídia
e da escola, entre outros fatores que promovem um processo de nivelamento linguístico no país
(LUCCHESI, 2006 e 2001); observando-se a utilização crescente de novos elementos gramaticais para
expressar a indeterminação do sujeito, como o uso dos pronomes a gente e você com essa função.
LUCCHESI, Dante; BAXTER, Alan; RIBEIRO, Ilza. O Português Afro-Brasileiro. Salvador: Edufba,
2009.
LUCCHESI, Dante.Parâmetros sociolingüísticos do português brasileiro, Revista da ABRALIN, vol.
V, nº 1 e 2, 2006, p. 83-112.
LUCCHESI, Dante.As duas grandes vertentes da história sociolingüística do Brasil, D.E.L.T.A., São
Paulo, 17: 1, 2001, pp. 97-132.
25
Para a ocasião do presente simpósio, pretendemos apresentar algumas discussões concernentes
à temática das línguas e grupos em situação de contato linguístico e de diglossia. Especificamente,
teremos como foco de discussão a situação de contato dos Xerente-Akwẽ com a população não-
índigena da região envolvente, tendo em vista os usos e as atitudes sociolinguísticas do grupo
indígena com relação à língua xerente e ao português. Os Akwẽ, conforme se autodenominam,
estão localizados nas reservas indígenas Xerente e Funil, dentro do município de Tocantínia (TO), à
margem direita do rio Tocantins. A relação que o grupo mantém com a população não-indígena local
tem sido classificada por Braggio (1997; 2002; 2003; 2009) como uma situação de tensão e conflito
político e sociocultural, a qual tem repercussões na configuração sociolinguística do grupo. Segundo
Weinreich (1951; 1953; 2011), o estudo acerca dos usos que falantes em situação de contato linguístico
fazem das línguas nos diferentes domínios sociais da comunidade bilíngue, assim como as avaliações
e as atitudes que mantêm com relação a cada uma dessas línguas, representa uma alternativa
importante para o entendimento não somente do comportamento linguístico individual do falante
bilingue, como também da mudança linguística e possível deslocamento da língua minoritária. De
acordo com Hamel (1983; 1987; 1988), a relação assimétrica mantida entre língua dominante e língua
dominadaé constituída não apenas pelas práticas discursivas do grupo, como pelo conjunto de valores
e representações existentes acerca das línguas e de seus falantes. Nesse sentido, uma descrição dos
padrões de uso e atitudes sociolinguísticas dos xerente relaciona-se com a temática do simpósio na
medida em que permite a discussão do fenômeno de línguas em contato em suas diversas dimensões
– linguística, sociológica, psicológica e política (WEINREICH, 2011). A compreensão da situação de
contato desse grupo indígena com a sociedade envolvente, embora represente uma realidade singular,
com aspectos políticos e socioculturais específicos do povo Xerente-Akwẽ, pode contribuir com o
tema de grupos e línguas minoritárias em situação de contato, de maneira geral e, especialmente, com
os estudos direcionados à dimensão socio-política do fenômeno.
SITuAçãO DE CONTATO LINguÍSTICO DOS xERENTE-AKwE: uSOS E ATITuDES SOCIOLINguÍSTICAS
Julia Izabelle da Silva
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O objetivo deste estudo é uma reflexão sobre a aquisição de aspectos fonológico como segunda língua
do português falado pelos Terena. O presente trabalho não pretende dar conta de todos os processos
fonológicos, mas, ainda assim, abordar algumas questões sobre interferência fonológica, pretende-se
que tais apontamentos dirija-se ao encontro das discussões sobre línguas de contato, principalmente
quando se trata de línguas minoritárias. Com isso, ampliar os estudos sobre o essa variação do
português falado por esses falantes. Braggio (1999), aponta que o código da língua indígena influencia
o do português, já que é o primeiro a ser adquiridos pela maioria das crianças e jovens. Assim, no
processo de interferência dos fonemas da L1 sobre a L2.
Os Terena formam o único subgrupo remanescente da nação Guaná no Brasil. Esse povo, através de
sucessivas levas migratórias, que se intensificaram em meados do século XVIII, cruzou o Rio Paraguai
em direção ao atual Estado de Mato Grosso do Sul, provenientes do Chaco Paraguaio/Boliviano,
região mítica, que na história oral Terena é chamada de Ênxiva. De um modo geral, podemos definir
os Terena como um povo estritamente bilíngue - entendendo por isso uma realidade social em que a
distinção entre uma língua materna(por suposto, indígena) e uma língua “de contato” ou “de adoção”
(o português, no caso) não tem sentido sociológico (ISA, 2012). Essa língua faz parte da família
linguística Arawak, conforme Aikhenvald (1999), contém o maior número de línguas na América do
Sul, espalhadas por 8 (oito) diferentes países – Bolívia, Guiana, Guiana Francesa, Suriname, Venezuela,
Colômbia, Peru e Brasil. Dentre estas línguas, cerca de 40 (quarenta) ainda estão vivas, apesar da
crescente ameaça que sofrem com o uso e invasão linguísticas das línguas espanhola e portuguesa.
É diante desse cenário que se faz necessário estudos do português de contato destes grupos minoritários.
umA REfLExãO SOBRE ASpECTOS fONOLógICOS DO pORTuguêS TERENA
Rogério Vicente Ferreira