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ACR 8431 PB APELAÇÃO CRIMINAL Nº 8431 PB (2005.82.00.009033-1) APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL APDO : DESTILARIA MIRIRI S/A APDO : GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHO APDO : EMANUEL PINHEIRO DE MELO ADV/PROC : CARLOS ROGERIO MARINHO DIAS E OUTRO ORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DA PARAíBA - PB RELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma RELATÓRIO O JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI (Relator): O MINISTéRIO PúBLICO FEDERAL MPF ofereceu denúncia (fls. 129/132) contra DESTILARIA JACUíPE S/A (sucedida pela DESTILARIA MIRIRI S/A), GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHO e EMANUEL PINHEIRO DE MELO, pela prática dos tipos penais descritos nos arts. 40, 55 e 60 c/c o art. 15, II, a, c, d, ee q, todos da Lei nº 9.605/98, na forma do art. 69 do Código Penal CP, além do tipo descrito no art. 2º da Lei nº 8.176/91, em concurso formal com o já referido art. 55 da Lei nº 9.605/98 (fls. 02/11). Narrou a peça acusatória que a DESTILARIA JACUíPE S/A, por decisão dos outros dois denunciados, no interesse e benefício dessa entidade, construiu, instalou e fez funcionar projeto de carcinicultura numa área de mangue de 63,8 ha localizada em estuário do Rio Mamanguape, interior de Área de Preservação Ambiental da Barra do Rio Mamanguape/PB. Destacou que a obra, potencialmente poluidora, não tem licença ou autorização do órgão ambiental competente, contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes, bem como causando dano direito à unidade de Conservação Ambiental Federal, além de executar extração de recursos minerais sem a competente licença. Arrolou quatro testemunhas. A denúncia foi recebida em 25/05/2005 (fls. 538/539). Seguindo o rito do Código de Processo Penal CPP vigente à época, o acusado GILVAN CELSO foi interrogado às fls. 567/576. Em seguida (fls. 578/579), a DESTILARIA JACUíPE S/A e GILVAN CELSO apresentaram defesa prévia. Arrolaram cinco testemunhas. O acusado EMANUEL foi interrogado às fls. 616/621 e apresentou sua defesa às fls. 623/624, arrolando cinco testemunhas. As quatro testemunhas de acusação arroladas foram ouvidas (José Santana Alves fls. 635/636; José Pereira da Silva fls. 637; Ivan Coutinho Ramos fls. 638/639; Edberto Farias de Novaes fls. 640/641). Empós, o magistrado do 1º grau PODER JUDICIáRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO GABINETE DO JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI 1

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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 8431 PB (2005.82.00.009033-1)APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALAPDO : DESTILARIA MIRIRI S/AAPDO : GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHOAPDO : EMANUEL PINHEIRO DE MELOADV/PROC : CARLOS ROGERIO MARINHO DIAS E OUTROORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DA PARAíBA - PBRELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma

RELATÓRIO

O JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI (Relator):

O MINISTéRIO PúBLICO FEDERAL – MPF ofereceu denúncia (fls. 129/132)contra DESTILARIA JACUíPE S/A (sucedida pela DESTILARIA MIRIRI S/A), GILVAN CELSO

CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHO e EMANUEL PINHEIRO DE MELO, pela prática dos tipospenais descritos nos arts. 40, 55 e 60 c/c o art. 15, II, “a”, “c”, “d”, “e” e “q”, todos daLei nº 9.605/98, na forma do art. 69 do Código Penal – CP, além do tipo descrito no art.2º da Lei nº 8.176/91, em concurso formal com o já referido art. 55 da Lei nº 9.605/98(fls. 02/11).

Narrou a peça acusatória que a DESTILARIA JACUíPE S/A, por decisão dosoutros dois denunciados, no interesse e benefício dessa entidade, construiu, instalou e fezfuncionar projeto de carcinicultura numa área de mangue de 63,8 ha localizada emestuário do Rio Mamanguape, interior de Área de Preservação Ambiental da Barra doRio Mamanguape/PB. Destacou que a obra, potencialmente poluidora, não tem licençaou autorização do órgão ambiental competente, contrariando as normas legais eregulamentares pertinentes, bem como causando dano direito à unidade de ConservaçãoAmbiental Federal, além de executar extração de recursos minerais sem a competentelicença. Arrolou quatro testemunhas.

A denúncia foi recebida em 25/05/2005 (fls. 538/539).

Seguindo o rito do Código de Processo Penal – CPP vigente à época, oacusado GILVAN CELSO foi interrogado às fls. 567/576. Em seguida (fls. 578/579), aDESTILARIA JACUíPE S/A e GILVAN CELSO apresentaram defesa prévia. Arrolaram cincotestemunhas.

O acusado EMANUEL foi interrogado às fls. 616/621 e apresentou suadefesa às fls. 623/624, arrolando cinco testemunhas.

As quatro testemunhas de acusação arroladas foram ouvidas (JoséSantana Alves – fls. 635/636; José Pereira da Silva – fls. 637; Ivan Coutinho Ramos –fls. 638/639; Edberto Farias de Novaes – fls. 640/641). Empós, o magistrado do 1º grau

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deferiu o pedido do MPF para oitiva de mais uma testemunha. Às fls. 692/693,depoimento da testemunha de acusação Edval Batista da Silva Filho.

Oito das dez testemunhas arroladas pela defesa foram ouvidas (VirgílioGadelha Pinto – fls. 739/741; Givanildo Pereira da Silva – fls. 742/743; Thales Ramon deQueiroz Bezerra – fl. 792; Assis Lins de Lacerda Filho – fls. 793/794; Sérgio Tavares –fl. 795; José Severino da Silva – fl. 854; Severino Gomes da Silva – fls. 913/914; AmaroJosé da Silva – fls. 963/964). As outras duas foram dispensadas (fls. 791 e 964).

Na fase do antigo art. 499 do CPP, o MPF nada requereu (fl. 970).GILVAN CELSO, por seu turno, pugnou pela realização de Perícia ambiental (fls. 974/976),pedido indeferido pelo Juízo a quo (fls. 1.702/1.706).

À fl. 1.717, a DESTILARIA MIRIRI S/A informou que, em 16/11/2006,sucedeu a ré DESTILARIA JACUíPE S/A por incorporação.

Nas alegações finais (antigo art. 500 do CPP), o MPF sustentou que asprovas acostadas aos autos confirmam o petitório exordial. Pediu, pois, a condenaçãodos réus nos termos da denúncia (fls. 1.728/1.730).

Na mesma oportunidade, a defesa postulou a reconsideração do despachode fls. 1.702/1.706 que havia indeferido a perícia ambiental. No mérito, pugnou pelaimprocedência da denúncia, ao reconhecimento de: a) existir circunstância que exclui ocrime ou isenta o réu de pena relativamente à acusação do art. 60 da Lei nº 9.605/98; b)quanto ao supostos delitos do art. 55 da Lei nº 9.605/98 e do art. 2º da Lei nº 8.176/91,o fato não constituir infração penal; c) estar provada a inexistência do fato, alusivamenteao suposto dano ambiental previsto no art. 40 da Lei nº 9.605/98, referente à imagináriacontaminação do Rio Mamanguape; d) não haver prova da existência do fato, ou,quando menos seja, não existir prova suficiente para a condenação, no que diz respeitoao pretenso dano ambiental respeitante ao imaginário assoreamento do manguezal (fls.1.736/1.764).

Às fls. 1.803/1.810, em observância aos princípios do contraditório e daampla defesa, foi deferida a realização da perícia ambiental suscitada pela defesa.

Cópia do Laudo pericial apresentado na Ação Civil Pública nº2005.82.00.004315-8 juntada às fls. 1.854/2.381.

O MPF opinou pela não realização de nova prova pericial e trouxe aosautos pareceres dos seus assistentes técnicos (fls. 2.383/2.407).

A defesa pronunciou-se também manifestando desinteresse na realizaçãode nova perícia e requerendo, ainda, a juntada da Análise do laudo pericial firmada pelosseus assistentes técnicos (fl. 2.411/2.545).

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Instado a se manifestar, o Parquet requereu o reconhecimento da extinçãoda punibilidade em relação aos crimes previstos nos arts. 55 e 60 da Lei nº 9.605/98, pelaocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal. No mais, defendeu que restouevidenciada a prática da conduta descrita no art. 40 da Lei nº 9.605/98, bem como noart. 2º da Lei nº 8.176/91 (fls. 2.563/2.566).

A defesa, por sua vez, argumentou a inexistência de prova firme, apta esegura de efetivo dano ambiental, muito menos de exploração desautorizada de matériaprima pertencente à União (fls. 2.570/2.584).

A sentença julgou a demanda nos seguintes termos:a) decretou a extinção da punibilidade em face da prescrição relativamente aos delitosdos arts. 55 e 60 da Lei nº 9.605/98;b) julgou improcedente a denúncia e absolveu os réus da imputação referente ao delitodo art. 40 da Lei nº 9.605/98, nos termos do art. 386, VII, do CPP.

Apesar de não constar no dispositivo na sentença o entendimento dojulgador acerca da imputação pelo crime do art. 2º da Lei nº 8.176/91, o magistrado, nafundamentação de sua decisão, afastou a incidência desse tipo penal pela atipicidade daconduta, porquanto entendeu que a atividade de exploração de camarões não constituiatividade mineral que se contemple no art. 2º da Lei nº 8.176/91.

Os embargos de declaração opostos pelos réus (fls. 2.645/2.647) foramimprovidos (fls. 2.651/2.653)

O MPF apelou. Nas suas razões recursais (fls. 2.658/2.663), destacou apossibilidade de a extração irregular de areia ensejar a incidência concomitante do tipopenal previsto no art. 2º da Lei nº 8.176/91 e no art. 55 da Lei nº 9.605/98, uma vez queos institutos tutelam bens jurídicos diferentes, quais sejam, o patrimônio público federal ea qualidade ambiental, respectivamente. No que refere ao crime previsto no art. 40 daLei nº 9.605/98, defendeu a ocorrência do dano ambiental decorrente das atividades doempreendimento promovido pelos acusados. Argumentou que “o maior equívoco deambos os julgadores em referência (presente ação penal e da ação civil pública correlata)é justamente limitar a apreciação do dano ambiental em tela apenas à questão daqualidade da água lançada no estuário próximo”. Sustentaram que os réus causaramdano à Área de Proteção Ambiental – APA, da Barra do Rio Mamanguape, criada peloDecreto Federal nº 924/1993. Ao final, pugnaram pela reforma da sentença, paracondenar, em concurso material, a DESTILARIA MIRIRI S/A, GILVAN CELSO CAVALCANTI DE

MORAIS SOBRINHO e EMANUEL PINHEIRO DE MELO, nas penas cominadas no art. 2º da Lei nº8.176/91 e nas penas do art. 40 da Lei nº 9.605/98 (sendo aplicadas à primeira ré aspenalidades previstas no art. 21 da referida lei), com a incidência das circunstânciasagravantes previstas no art. 15, II, “a”, “c”, “d”, “q” e “r”, da mesma lei ambiental.

Contrarrazões pelo não provimento da apelação (fls. 2.678/2.709).

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Em parecer (fls. 2.714/2.729), a Procuradoria Regional da República da5ª Região opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Ao eminente revisor.

JUIZ FRANCISCO CAVALCANTIRelator

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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 8431 PB (2005.82.00.009033-1)APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALAPDO : DESTILARIA MIRIRI S/AAPDO : GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHOAPDO : EMANUEL PINHEIRO DE MELOADV/PROC : CARLOS ROGERIO MARINHO DIAS E OUTROORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DA PARAíBA - PBRELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma

EMENTA: CRIME DOLOSO CONTRA O MEIO AMBIENTE.PROVA INCONTESTE. CONDENAÇÃO DOS DIRIGENTESRESPONSÁVEIS E DA PESSOA JURÍDICA, NOS TERMOS DALEI AMBIENTAL.1. Prova inconteste da prática de crime ambiental consistente naimplantação e exploração de projeto de carcinicultura, com expressa econsciente violação da legislação de regência;2. Responsabilidade comprovada, pelo exame da prova dos autos, doSócio controlador, do diretor superintendente e da pessoa jurídica.3. Inexistência de prova de exploração clandestina de jazida mineral.Ponto em que sucumbe a denúncia.4. Provimento, apenas parcial do apelo, nos termos das provascolhidas.

VOTO

O JUIZ FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI (Relator): Discute-se nospresentes autos a prática de crimes contra o meio ambiente. No caso, tipos que afetam,sobretudo, o equilíbrio ecológico em área de extrema importância que são osmanguezais.

Relevante precisar-se o que seria Área de mangue. Como tal pode se definir:

ManguezalO manguezal é um ecossistema especial que se desenvolve em zonas

litorâneas tropicais, associado a terrenos baixos, planos e regiões estuarinas, àsmargens de lagunas ou ao longo de rios e canais naturais, em áreas encharcadas,salobras e calmas, com influência das marés; porém, não atingidos pela açãodireta das ondas. Nesses locais, a força das marés é branda e a velocidade dascorrentes é baixa, favorecendo intensa deposição de sedimentos finos e matériaorgânica (IPT, 1988).

Torna-se o elo de ligação entre os ambientes marinho, terrestre e de águadoce, caracterizando-se por uma constante conquista de novas áreas pelo acúmulode grandes massas de sedimentos e detritos trazidos pelos rios e pelo mar. Osubstrato assim originado tem consistência pastosa; é pouco compactado,alagadiço, rico em matéria orgânica, pouco oxigenado e sujeito a períodos

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alternados de inundação e drenagem, conforme variação das marés (IPT, 1988).Lamberti (1969).

Conceito:Entende por mangal ou manguezal um grupo de plantas que se desenvolvem

na zona litorânea, em substrato plano, lodoso, contornando por estuários,enseadas, lagoas,baías etc.,que, segundo Veloso & Góes Filho (1982) são áreaspedologicamente instáveis e dinâmicas, seja pela constante deposição de areias domar, seja pelo rejuvenescimento do solo ribeirinho, com deposições aluviais elacustres.

Os termos antes citados denominam a vegetação, o solo e tudo o que nele seencontre. Esses autores salientam que, no Brasil, tal ecossistema tem sidoestudado mais do ponto de vista de sua composição florística do que por seusaspectos ecológicos ou fisiológicos.

1. Características gerais dos manguezais: Os manguezais são predominantemente tropicais e crescem em zonascosteiras protegidas, planícies inundáveis, praias lodosas, e desembocaduras derios. Pertencem a uma variedade de família de plantas, sendo as que mais sedestacam as Combretaceae, Rhizophoraceae e Avicenniaceae, apresentandoconforme suas características morfológicas e fisiológicas distribuição por seisregiões geográficas do planeta. Para o pleno desenvolvimento dos manguezais,algumas características físico-químicas e geográficas são necessárias, tais como:– Climas tropicais: · Existência de substrato mole constituído por sedimentos finos de silte e argila,rico em matéria orgânica, geralmente de origem fluvial; · Áreas abrigadas da forte ação das ondas e marés violentas; · Existência de água salobra ou salgada; · Amplitude de marés.

– Flora: No geral, é reduzido o número de espécies vegetais que compõem osnossos manguezais, se comparados a outras regiões tropicais do globo terrestre. Entre as espécies dominantes de porte arbóreo temos:Rhizophora mangle (mangue vermelho), Laguncularia racemosa (mangue branco)e Avicennia schaueriana (mangue siriúba). Conforme a origem do manguezal ainda podem ocorrer o Hibiscus tiliaceus(porte arbóreo); Acrostichum aureum (uma samambaia); Spartina sp. (porteherbáceo), além de diversas espécies da família Bromeliaceae. Podem ainda podeocorrer várias associações vegetais, influenciados pelo grande acúmulo dematéria orgânica superficial ou intersticial.

– Fauna: Merece também destaque a fauna dos manguezais composta por umcomplexo conjunto de animais que podem ser residentes, semi-residentes ouvisitantes. Destaca-se ainda a presença de caranguejos, peixes e camarões e umnúmero enorme na vegetação periférica de mamíferos, répteis e avifaunacaracterística de estuários marinhos.

Numa avaliação sistêmica os manguezais são ecossistemas de grandeprodutividade, promovendo a troca de gases entre as várias partes da planta e aatmosfera e a produção de biomassa aérea (raízes, caules, folhas e frutos) eterrestre (raízes). Colabora ainda na manutenção das bacias flúvio - marinhas,permitindo a absorção pelo lençol freático.

A produção de biomassa em manguezais implantados é maior que nasformações originais, devido às ações de manejo florestal desenvolvidas, em face as

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florestas nativas apresentarem muito cedo um estágio clímax, diminuindo asatividades físico-biológicas da população, e consequentemente diminuindo suaprodução de biomassa.

2. Ecologia dos manguezais: Por conceito o manguezal é um ecossistema aberto quanto a energia ematéria. Os nutrientes carreados pelos rios, marés, chuvas e pelo run-off(escoamento superficial) da zona circunvizinha, são distribuídos sobre o solo domanguezal e daí retirados por processos físicos, químicos e biológicos,incorporando-se aos sedimentos e/ou sendo absorvido pelo metabolismo vegetalou animal. Esses nutrientes produzidos são reciclados pela complexa rede da vida nomangue. Em estudos experimentais, Heald (1971 apud Fonseca 2002) e Odum(1988), calcularam para os manguezais uma produção de material seco (folhas) daordem de 800g/m²/ano, sendo que desse total, menos de 5% foram consumidosdiretamente e menos de 2% foram armazenados como turfa (argila orgânica). Dos93% restantes, metade foi consumida por fungos, bactérias e outros. A outrametade foi carreada para as águas do litoral.

É importante observar que a reciclagem nos manguezais é iniciada ainda nasárvores, pelos fungos, bactérias e protozoários, sendo então incorporados aosubstrato realimentando a diversificada teia alimentar continuamente.

2.1 Dendrologias (ramo da botânica que estuda as plantas lenhosas,principalmente árvores e arbustos, e as suas madeiras) dos manguezais:

Conforme já descrito anteriormente, existe uma riqueza de biodiversidadenos manguezais mesmo com os fatores adversos como insolação, inundações,salinidade, etc., porém para efeito de estudo do projeto em curso recairá sobre astrês espécies mais utilizadas para a recuperação dos manguezais, a saber:· Rhizophora sp: também chamado mangue vermelho, famíliaRhizophoriaceae, coloniza lugares onde os níveis de marés são mais elevados,permanecendo por mais tempo alagados. Por possuírem propágulos (função depropagar a espécie, estruturas adaptadas para garantir o sucesso na disperção)relativamente pesados e grandes, que afundam após um certo período deflutuação, retornando a superfície, permitindo boiar e se fixar após a baixa damaré. Permite ainda a dispersão dos propágulos a longa distância.

Possuem raízes aéreas (recentemente constataram que são caules aéreos),formando verdadeiras escoras (caules-escoras), apresentando grande quantidadesde lenticelas (são pequenas estruturas que aparecem como bolinhasesbranquiçadas para captar oxigênio do ar) na sua superfície e possuindo no seuinterior a substância tanino que impede que as raízes submersas se deteriorem.Apresenta a facilidade da reprodução por "viviparidade", analogamente, uma vezque da planta já se obtém o propágulo preparado para o plantio.· Laguncularia sp: também chamado mangue branco, família Combretaceae,esta espécie ocupa preferencialmente as áreas mais afastadas da influência daoscilação das marés, necessitando de um período maior dessas amplitudes, parapromover o enraizamento e consequentemente sua fixação ao substrato. Ospropágulos são pequenos, não exibindo a mesma característica de flutuação, queapós afundarem não retornam a superfície. Apresenta um sistema radicular(raízes)pouco profundo(ainda não há estudos que comprovam se as raízes são maisprofundas ou não) disposto de forma radial com os pneumatóforos (raízes quecrescem para cima, na superfície, para troca gasosa). Possuem glândulasexcretoras de excesso de sal na base da lâmina foliar. Sua reprodução ocorreatravés de sementes.· Avicennia sp: também chamado mangue siriúba, família Avicenniaceae, estaespécie tem ocorrência restrita às áreas mais afastadas da influência das marés

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e consequentemente com menor frequência de inundação. Os seus propágulostambém são pequenos e sempre flutuam, necessitando para efetuar sua fixação aosubstrato de um período maior livre da influência das oscilações de marés,conforme a espécie anterior, com grande poder de resistência. Apresentamtambém em suas raízes as estruturas de pneumatóforos e folhas brilhosas comglândulas que expelem sal.

3. Manguezais e os centros de origem de espécies:A superior diversidade nos trópicos é bem conhecida: aproximadamente 3/4

das espécies mundiais encontram-se confinadas nos trópicos. No ambientemarinho, fatos históricos indicam que a maioria dos grupos animais se originouem regiões tropicais, em áreas adjacentes ou zonas de transição demanguezais. No ambiente terrestre, uma alta diversidade também é encontrada nostrópicos. Existem, contudo, certas áreas dos trópicos nas quais a diversidade deespécies atingiu níveis mais altos do que o normal. Tais áreas funcionam,aparentemente, como "centros de origem evolucionária". Este fato enfatiza aimportância de se destinar esforços para conter a taxa de extinção de espéciesencontradas nos trópicos e a conservação dos diferentes sistemas tropicais,incluindo os manguezais.

O conceito de "centro de origem" é reforçado pela descoberta de taxa maisnovos nas regiões tropicais, com aumento da idade em direção as altas latitudes.Sugere-se que tais gradientes representam uma adaptação em longo prazo, alatitudes mais frias por grupos antes tropicais (Briggs, 1984 apud Fonseca 2001).Embora os trópicos marinhos possuam uma biota rica, existem variaçõeslongitudinais consideráveis. A riqueza da fauna da região Ocidental Indo -Pacífica é 2,5 vezes maior que da região do Atlântico Ocidental, 3,5 vezes maiorque a do Pacífico Oriental e 7,3 vezes maior que a do Atlântico Oriental (Briggs,1985 apud Fonseca 2001).

Esses dados foram obtidos através de trabalho de comparação de diversidadede espécies nessas quatro áreas tropicais, comprovando a existência de variaçõeslongitudinais. Em menor escala, a diversidade de espécies pode variarconsideravelmente segundo fatores tais como: heterogeneidade do substrato,proximidade da costa e distúrbios físicos.

O eixo longitudinal do Indo - Pacífico Ocidental percorre quase 2/3 do globoterrestre, o que o torna um caso especial. Na maioria dos trabalhos realizados naregião foi encontrado um pico de diversidade na área que se estende das Filipinasà península Malay até a Nova Guiné (Briggs, 1992 apud Fonseca 2001). Estetriângulo tem sido considerado um centro de radiação evolucionária, uma vez queo número de espécies tende a cair em todas as direções. No seu interiorencontram-se extensas áreas de manguezais, citando, então, o autor trabalhos queevidenciam a maior diversidade de espécies nas regiões tropicais.

4.Diversidade e conservação:As atividades conservacionistas mais utilizadas consistem em cercar

pequenas áreas com o objetivo de afugentar espécies ameaçadas, ou preservarespécies nativas. A maioria dos parques e refúgios selvagens contém apenaspequenas frações do habitat nativo pré-existente. Desta forma fica-se restrito aslimitações da relação espécie-área, que estima que um habitat reduzido em umdécimo de seu tamanho original perderá metade de suas espécies. Assim coloca-sea questão da preservação de espécies ou habitats.

A falta de uma estratégia preservacionista, cientificamente aceita, aliada aofato das grandes concentrações urbanas, próximas a manguezais e aos centros deorigem evolucionária adjacentes, continuam a priorizar a preservação dasespécies raras ou incomuns. Muitas dessas espécies em vias de extinção sãoendêmicas, ou seja, extinguindo-se seus habitats, não terão futuro filético (Relativo

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ao filo: ramo filético). Ao focar a atenção para os centros de origem, pode-setentar preservar áreas de alta diversidade; essas áreas têm grande importânciaevolucionária histórica e futura.

Para muitas pessoas, destaca o ecólogo Robert Ricklefs, a extinção deespécies coloca uma questão moral. Algumas tomam essa posição porque, se aespécie humana atinge com o seu desenvolvimento toda a natureza, é dela aresponsabilidade moral de proteger a natureza afetada. Se a moralidade origina-se de uma lei natural, onde todos tem direito a vida, pode-se presumir que osdireitos dos indivíduos e espécies não-humanos são também legítimos, tantoquanto os de nossa espécie e seus ambientes. Não se garante o direito a existênciaperpétua, assim como ao homem não é dada a imortalidade, mas a extinção deespécies através da caça, poluição e destruição de habitats, assim como adisseminação de doenças, pode ser análoga ao assassinato, à carnificina, aogenocídio e outras infrações aos direitos humanos que buscamos preservar.

Às vezes, destaca ainda Ricklefs (1996), pode-se questionar a conservação deum tipo de habitat, como os manguezais, através da comparação do valoreconômico das espécies nativas que lá ocorrem com o valor advindo da alteraçãoou outro manejo do habitat. Contudo, por exemplo, o ganho a curto prazo deconverter florestas em agricultura, ou de um recurso marinho excessivamenteexplorado ou cultivado intensivamente graças a degradação de manguezais, éassumido sobrepujar qualquer valor de longo prazo de conservar o sistema naturalpara uma receita sustentável.

O valor de espécies e habitats conservados torna-se evidente, quando oscustos de longo prazo da sobre-exploração ou conversão dos manguezais sãoapropriadamente levados em conta, uma prática que não é encorajada pelopragmatismo do desespero da fome, nem pela notória visão curta e ignorante dasatuais gerações.

5. A dimensão social dos manguezais:Os manguezais se constituem num dos mais produtivos ecossistemas do

planeta, sendo responsáveis pela manutenção de uma teia biológica, que éiniciada na degradação das folhas por microrganismos decompositores, passandopor diversos nós, culminando nos peixes e mamíferos até o homem. Devido a suaestrutura complexa, os manguezais arvorecem à criação de numerosos nichos paradiferentes espécies de peixes, crustáceos, moluscos, aves, que passam toda a vidaou parte dela no ecossistema. Atuam também como filtro biológico de sedimentosque evitam o assoreamento das regiões estuarinas, através da retenção mecânicadas raízes, da floculação e da vegetação rasteira que se desenvolve nas áreasperiféricas, fixando paisagens e o perfil geomorfológico das áreas costeiras,protegendo as habitações e as comunidades residentes em seu entorno.

A dimensão humana do manguezal tem relação também com os povostradicionais que ocupam as regiões estuarinas que utilizam os produtos do manguepara sua alimentação e o excedente para a sua comercialização, contribuindopara a manutenção de sua família. Observa-se ainda que existe uma relação deequilíbrio entre os povos tradicionais que ocupam as bordas dos manguezais e onível de produção de matéria e energia do ecossistema.

Quando se inicia a influência antrópica externa e nociva, os níveis deequilíbrio são alterados, gerando conflitos de ordem sócio-econômica, com adiminuição dos produtos naturais provenientes de seus bosques, bem como ocomprometimento da qualidade das águas circundantes.

5. A importância da recuperação dos ecossistemas manguezais:Apesar da proteção integral pelos dispositivos legais vigentes, manguezais,

restingas e brejos vêm sofrendo um intenso e constante processo de degradação,que muitas vezes compromete os importantes serviços ambientais e econômicos

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desses e, por consequência, os estudos relacionados a sua valoração, influindo nojuízo de valor dos entrevistados sobre aqueles, em função de seu maior ou menorgrau da degradação.

Os ecossistemas denominados manguezais são formações paisagísticascaracterísticas das zonas costeiras abrigadas nos trópicos e sub-trópicos e suaimportância até algumas décadas passadas desconhecida, sentenciou sua sub-utilização e destruição. Apesar de sua clara ligação com a produtividadepesqueira tanto comercial como artesanal e dos diversos dispositivos legais quelhe conferem a proteção integral, em diversos países os manguezais vêm sendodestruídos em taxas alarmantes, destacando-se como um dos ecossistemascosteiros mais ameaçados e estimando-se a perda anual de 1.000.000 ha de emtodo o planeta (Fonseca, 2001).

Os processos de degradação se agravam à medida que é na zona costeira doscontinentes que a ocupação humana se dá com maior intensidade, submetendoconsequentemente não só os manguezais como os demais ecossistemas litorâneos apressões que muitas vezes destroem por completo o equilíbrio de extensas áreas.

Em diversas partes do mundo de uma forma cada vez mais presente,paralelamente ao processo de degradação, vem sendo desenvolvidas formas derestaurar os ambientes impactados e até mesmo propiciar as condiçõesnecessárias para a criação de novas áreas. Mais do que uma recente linha depesquisa e de atuação dos profissionais ligados com a área ambiental, asatividades de restauração/criação de manguezais apresentam em sua proposta acrescente preocupação e conscientização da sociedade quanto a importânciadestes ecossistemas não só como provedores e mantenedores da biodiversidade,bem como diretamente relacionados com a sustentação de inúmeras e importantesatividades econômicas humanas, que variam desde a pesca artesanal a atividadesturísticas, industriais, a qualidade de vida das populações litorâneas residentes noentorno desses ecossistemas, podendo constituírem-se, também, em grandesdepósitos para o sequestro de carbono da atmosfera, contribuindo para a mitigar oefeito estufa no planeta .

Por que efetuar trabalhos de restauração e criação de manguezais, é outraquestão que necessita tornar-se clara em estudos de valoração dos bens e serviçosdesses ecossistemas, como alternativa à reversão das áreas degradadas, aosequestro do carbono atmosférico e a fixação do perfil geomorfológico costeiro. Ainexistência de uma instituição supranacional e a inópia das medidas voltadas àeficiência econômica, face as grandes disparidades no atual padrão dedistribuição da renda nos países de ambos os hemisférios, são entraves para umacordo sobre a emissão dos greenhouse gases (GHG) (gases na atmosfera queemitem e absorvem radiação na faixa do infravermelho), realçando a importânciadas pesquisas sobre a recomposição de manguezais como alternativa ao sequestrodo carbono atmosférico (Fonseca, 2002)

No fundo, a discussão existente nos presentes autos envolve a proteção aomanguezal e a lesão que a ele teria sido causada pelos denunciados. O MD Juiz de 1º.Grau, ao julgar o processo julgou improcedente a denúncia (em sede de embargos dedeclaração, confirmou o julgado), e assim se pronunciou:

PROCESSO Nº 2005.82.9033-1 - CLASSE 31 - AÇÃO CRIMINALAUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADOR DA REPÚBLICA: JOSÉ GUILHERME FERRAZ DA COSTARÉUS: DESTILARIA JACUÍPE S/A, SUCEDIDA POR INCORPORAÇÃO PELADESTILARIA MIRIRI S/A, GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAISSOBRINHO E EMANUEL PINHEIRO DE MELO

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ADVOGADOS: IVON PIRES FILHO, BRÁULIO LACERDA, BRUNO LACERDA ECARLOS ROGÉRIO MARINHO DIAS

S E N T E N Ç A

Cuida-se de Embargos de Declaração (fls. 2645/2647) opostos por DestilariaMiriri S/A, Gilvan Celso Cavalcanti de Morais Sobrinho e Emanuel Pinheiro deMelo à sentença que proferi às fls. 2586/2641.

Os Embargantes afirmam que o dispositivo da sentença é omisso quanto àabsolvição do delito do artigo 2º da Lei nº 8.176/1991.

É o relatório. Decido.

De forma esquemática:

Embargos de DeclaraçãoSentença"Esse eminente Magistrado Federal afastou, judiciosamente, na fundamentação dodecisório, a imputação alusiva ao art. 2° da Lei n° 8.176/9 1, ao reconhecimentoda vedação - fora da hipótese de concurso de crimes - de dupla tipicidade penalpelo mesmo fato, além de excluir a incidência de dispositivo relativo à exploraçãomineral em caso versando sobre questões eminentemente ambientais, nos seguintestermos, in verbis:A autuação deu-se perante o ordenamento ambiental. Já a denuncia alarga aspossíveis hipóteses legais que, por argumentar, trazem tais tipos para as hipótesestáticas.Entendo que para uma mesma conduta não pode haver duas tipicidades, porque,inclusive não se trata de concurso.Em nenhum momento cuida-se de extratividade mineral stricto sensu, regulada porlegislação específica, ainda que pudesse causar dano ambiental.A atividade de exploração de camarões vanamei não constitui atividade mineralque se contemple no artigo 2° da Lei n° 8.17611991.O órgão ambiental enquadrou, com acerto, no plano apenas da tipicidade doartigo 55 da Lei n° 9.605/1998.Em princípio, não há que considerar a atividade de criação de camarões na esferade usurpação, produção oq exploração de matéria prima pertencente à União,com ou sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelotítulo autorizativo.Em momento algum à empresa e seus diretores pode ser atribuída a atividademineradora. Não há menção ou qualquer referência à atividade de mineração areclamar o exame do tipo legal descrito no artigo 2° da Lei n°8176/1991.A alegação de extração de recursos minerais não se compadece com a hipótesefática. A construção de tanques de viveiros a ensejar eventuais danos ambientaise/ou assoreamento atinam com o ordenamento jurídico ambiental e não com ateleologia do ordenamento mineral.Assim, afasto a incidência da tipicidade do artigo 2° da Lei no 8.176/1991.Contudo, na parte final da sentença, à fl. 2639, circunscreveu-se o decisório aosseguintes termos:1) Decreto a extinção da punibilidade em face da prescrição (artigo 107, inciso IV,do Código Penal) relativamente aos delitos dos artigos 55 e 60 da Lei n°9.605/1998.

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2) Julgo improcedente a denúncia e absolvo os Réus da imputação referente aodelito do artigo 40 da Lei n° 9.60511998, nos termos do artigo 386, inciso VII, doCódigo de Processo Penal.Não se visualiza, portanto, na parte final do decisum embargado, remissão aopreceptivo processual penal no qual se assentou a sentença para o efeitoespecífico de absolver os embargantes da imputação relativa ao delito do art. 2°da Lei n° 8.176/91 - malgrado fundamentadamente afastada no corpo do julgado.Ante as considerações alinhadas, suplicam dessa Ilustre Autoridade JudiciáriaFederal que, reconhecendo-a, declare a sentença para suprir a omissão apontada,como medida essencial de Direito.Postulam, pois, sejam os embargos ora manifestados conhecidos e providos poresse reto Sentenciante, para o efeito suso declinado.""Da imputação alusiva ao delito do artigo 2º da Lei nº 8.176/1991O Auto de Infração nº 29737 lavrado pelo IBAMA em 17.05.2002 (fls. 33) contéma descrição da conduta: "Executar extração mineral, sem LO (licença deoperação) área degradada 0,5 ha." A descrição legal contida no Auto: infração aoartigo 55 da Lei nº 9.605/1998.A denúncia enquadra a conduta em dois tipos legais: artigo 55 da Lei nº9.605/1998 e artigo 2º da Lei nº 8.176/1991.Com relação ao artigo 55 da Lei nº 9.605/1998, ocorreu a prescrição da pretensãopunitiva, como visto.A autuação deu-se perante o ordenamento ambiental. Já a denúncia alarga aspossíveis hipóteses legais que, por argumentar, trazem tais tipos para as hipótesesfáticas.Entendo que para uma mesma conduta não pode haver duas tipicidades, porque,inclusive não se trata de concurso.Em nenhum momento cuida-se de extratividade mineral stricto sensu, regulada porlegislação específica, ainda que pudesse causar dano ambiental.A atividade de exploração de camarões vanamei não constitui atividade mineralque se contemple no artigo 2º da Lei nº 8.176/1991.O órgão ambiental enquadrou, com acerto, no plano apenas da tipicidade doartigo 55 da Lei nº 9.605/1998.Em princípio, não há que considerar a atividade de criação de camarões na esferade usurpação, produção ou exploração de matéria prima pertencente à União,com ou sem autorização legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelotítulo autorizativo.Em momento algum à empresa e seus diretores pode ser atribuída a atividademineradora. Não há menção ou qualquer referência à atividade de mineração areclamar o exame do tipo legal descrito no artigo 2º da Lei nº 8.176/1991.A alegação de extração de recursos minerais não se compadece com a hipótesefática. A construção de tanques de viveiros a ensejar eventuais danos ambientaise/ou assoreamento atinam com o ordenamento jurídico ambiental e não com ateleologia do ordenamento mineral.Assim, afasto a incidência da tipicidade do artigo 2º da Lei nº 8.176/1991.(....)ISTO POSTO:1) Decreto a extinção da punibilidade em face da prescrição (artigo 107, inciso IV,do Código Penal) relativamente aos delitos dos artigos 55 e 60 da Lei nº9.605/1998.2) Julgo improcedente a denúncia e absolvo os Réus da imputação referente aodelito do artigo 40 da Lei nº 9.605/1998, nos termos do artigo 386, inciso VII, doCódigo de Processo Penal."

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Conforme assinalei no julgado, o princípio da especialidade afasta a incidênciade tipo penal (artigo 2º da Lei nº 8.176/1991) que trata de atividade mineral.

ISTO POSTO, conheço dos Embargos de Declaração e nego-lhes provimento,à míngua de omissão.

Publique-se em mãos do Diretor da Secretaria (artigo 389 do Código deProcesso Penal, e artigo 41, inciso III, da Lei nº 5.010/1966), adequando-se aoregistro no sistema informatizado, nos termos do Provimento nº 01/2009, daCorregedoria-Geral do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Intimem-se as partes.

Após o trânsito em julgado, envie-se cópia desta sentença aos JuízesDistribuidores da Justiça Estadual e Justiça Eleitoral em João Pessoa (artigo 3ºda 11.971/2009).

João Pessoa,16 de fevereiro de 2011

ALEXANDRE COSTA DE LUNA FREIRE Juiz Federal

Em função da citada sentença, o MD Procurador da República ao recorrerpretendeu a reforma da sentença por entender incidente o tipo do art. 2º da Lei nº8.176/91 que não estaria absorvido, como pretendido pela sentença, invocandoprecedentes do STJ entendendo inaceitável a tese do remanejamento porempréstimo de material argiloso. Defendeu, ainda a existência de crime de dano aunidade de conservação federal. Defendeu que a simples instalação do empreendimento àrevelia de qualquer licenciamento ambiental, caracterizaria o ilícito. Destacou oassoreamento em algumas partes do manguezal que existe no entorno do projeto.Pretendeu demonstrar ter havido equivoco do magistrado... ao afirmar que o fatodano à unidade de conservação pela supressão de vegetação não fora imputado nadenúncia, destacando que tal constaria explicitamente daquela peça.RESSALTOU, TAMBÉM, OS DANOS QUE TERIAM SIDO CAUSADOS ÀAPA, da barra do rio Mamanguape. Requereu, ao final o provimento do recursona forma indicada às fls. 663. Já o Representante Regional do MPF posicionou-secontrariamente à tese do Parquet de 1º grau, fundando-se nos termos da sentençaproferida na ação civil pública nº 20058200004315-8, que entendeu ter havido danoapenas em relação à existência de dano em relação à supressão de vegetação demanguezal.

Observo que A PRESENTE QUESTÃO ESTÁ VINCULADA À MATÉRIAOBJETO DA AC nº 520224/PB, recentemente julgada na 2ª Turma desta Corte, emAcórdão, por maioria, que deu provimento parcial à apelação, para reconhecer aimpossibilidade de concessão de licença pela SUDEMA e condenar a DESTILARIAMIRIRI S/A (antiga DESTILARIA JACUÍPE S/A) a:

Apresentar e executar projeto de recuperação ambiental daárea atingida, devidamente subscrito por profissionalhabilitado e sob a supervisão do IBAMA ...incluir a retirada

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total do empreendimento da região analisada pela perícia,JÁ QUE ACIMA CONSTATADO QUE NÃO PODE HAVERLICENCIAMENTO DE PROJETO DE CARCINICULTURANA MESMA; CONDENAR A RÉ DESTILARIA MIRIRI S/A (antiga destilaria Jacuípe S/A) a pagar, a título decompensação por danos morais coletivos, o valor de R$500.000,00 (quinhentos mil reais0 a serem revertidos aofundo de reconstituição de bens lesados de que trata oartigo 13 da lei 7347/85.

Mister se faz, pois, um exame mais apurado das questões suscitadas, nãopodendo se acolher a tese do MD Procurador Regional da República do reflexo daimprocedência em primeiro grau da ação .

Relevante, de logo, definir o que seria a APA da foz do rio Mamanguape. Foi elacriada há cerca de 20 anos, como se vê do texto abaixo:

Decreto 924/93 | Decreto no 924, de 10 de setembro de 1993Cria a Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Maman guape no Estado daParaíba e dá outras providências.O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos arts. 8º, da Lei nº 6.902,de 27 de abril de 1981, 4º, inciso II, e 9º, inciso VI da Lei nº 6.938, de 31 deagosto de 1981, e no Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, DECRETA:Destruição, destino final, descarte de produtos e resíduos industriais.Art. 1º Fica criada a Área de Proteção Ambiental (APA) da Barra do RioMamanguape, localizada nos Municípios de Rio Tinto e Lucena, no Estado daParaíba, envolvendo águas marítimas e a porção territorial descrita no art. 2ºdeste decreto, com o objetivo de:I - garantir a conservação do habitat do Peixe-Boi Marinho (Trichechus manatus);II - garantir a conservação de expressivos remanescentes de manguezal, mataatlântica e dos recursos hídricos ali existentes;III - proteger o Peixe-Boi Marinho (Trichechus Manatus) e outras espécies,ameaçadas de extinção no âmbito regional);IV - melhorar a qualidade de vida das populações residentes, mediante orientaçãoe disciplina das atividades econômicas locais;V - fomentar o turismo ecológico e a educação ambiental.Art. 2.º A APA da Barra do Rio Mamanguape apresenta delimitação baseada nascartas topográficas SB.25-Y-A-VI-3-NO, SB.25-Y-A-V-4-NE, SB.25-Y-A-VI-1-SO,SB.25-Y-A-VI-3-SO, em escalas 1:25.000 da Superintendência do Desenvolvimentodo Nordeste-SUDENE, conforme a seguinte descrição: Partindo do Ponto 00, decoordenadas geográficas 6º 47'06"latitude Sul e 35º 04'48" longitude Oeste; dessePonto, segue com azimute 80º e distância (77 mm) de 1.920m, rumo ao Ponto 01,de coordenadas geográficas de 6º 46'56"latitude Sul e 35º 03'47" longitude Oeste;desse Ponto, segue com azimute 147º e distância (69 mm) de 1.725m, rumo aoPonto 02, de coordenadas geográficas 6º 47'42"latitude Sul e 35º 03'16" longitudeOeste; desse Ponto, segue com azimute 75º e distância (211 mm) de 5.275m rumoao Ponto 03, de coordenadas geográficas de 6º 46'57"latitude Sul e 35º 00'31"longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute 99º 30' e distância (39 mm) de975m, rumo ao Ponto 04, de coordenadas geográficas 6º 47'01"latitude Sul e 35º00'00" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute 19º e distância (22 mm)de 550 m, rumo ao Ponto 05, de coordenadas geográficas de 6º 46'44"latitude Sule 35º 59'53" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute 91º e distância (53

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mm) de 1.325m, rumo ao Ponto 06, de coordenadas geográficas de 6º46'45"latitude Sul e 34º 59'09" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute30º e distância (39 mm) de 975m, rumo ao Ponto 07, de coordenadas geográficasde 6º 46'18"latitude Sul e 34º 58'54" longitude Oeste; desse Ponto, segue comazimute 46º e distância (129 mm) de 3.225m, rumo ao Ponto 08, de coordenadasgeográficas 6º 45'06"latitude Sul e 34º 57'37" longitude Oeste; desse Ponto, seguecom azimute 64º 30' e distância (56 mm) de 1.400m, rumo ao Ponto 09, decoordenadas geográficas de 6º 44'44"latitude Sul e 34º 56'56" longitude Oeste;desse Ponto, segue com azimute 23º 30' e distância (68 mm) de 1.700m, rumo aoPonto 10, de coordenadas geográficas 6º 43'28"latitude Sul e 34º 56'35" longitudeOeste; desse Ponto, segue com azimute 2º 30' e distância (30 mm) de 750m, rumoao Ponto 11, de coordenadas geográficas 6º 43'30"latitude Sul e 34º 56'33"longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute de 358º e distância de (52 mm)de 1.300m, rumo ao Ponto 12, localizado à margem direita da Rodovia Estadual41, que interliga a comunidade de Marcação à Baia da Traição, de coordenadasgeográficas 6º 42'47"latitude Sul e 34º 56'34" longitude Oeste; desse Ponto, seguecom azimute 80º 30' e distância (121 mm) de 1.012m terrestres adentrando emárea marítima 1.080 milhas náuticas, rumo ao Ponto 13, de coordenadasgeográficas 6º 42'30"latitude Sul e 34º 54'57" longitude Oeste; desse Ponto seguecom azimute 169º 30' e distância (680 mm) de 9.179,3 milhas náuticas, rumo aoPonto 14, de coordenadas geográficas 6º 51'38"latitude Sul e 34º 53'20" longitudeOeste; desse Ponto, segue com azimute 245º 30' e distância (68 mm) de 823,4milhas náuticas e 20m terrestres, rumo ao Ponto 15, de coordenadas geográficas6º 52'01"latitude Sul e 34º 54'01" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute233º 30' e distância (141 mm) de 3.525m, rumo ao Ponto 16, de coordenadasgeográficas 6º 53'09"latitude Sul e 34º 55'42" longitude Oeste; desse Ponto, seguecom azimute 310º 30, e distância (53 mm) de 1.325m, rumo ao Ponto 17, decoordenadas geográficas 6º 52'41"latitude Sul e 34º 56'15" longitude Oeste; dessePonto, segue com azimute 53º 30' e distância (129 mm) de 3.225m, rumo ao Ponto18, de coordenadas geográficas 6º 51'39"latitude Sul e 34º 54'50" longitude Oeste;desse Ponto, segue com azimute 343º e distância (163 mm) de 4.705m, rumo aoPonto 19, de coordenadas geográficas 6º 49'31"latitude Sul e 34º 55'26" longitudeOeste; desse Ponto, segue com azimute 319º 30' e distância (104 mm) de 2.600m,rumo ao Ponto 20, de coordenadas geográficas 6º 48'27"latitude Sul e 34º 56'22"longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute de 256º e distância (157 mm) de3.925m, rumo ao Ponto 21, de coordenadas geográficas 6º 49'01"latitude Sul e 34º58'21" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute 261º 30' e distância (474mm) de 6.850m, rumo ao Ponto 22, de coordenadas geográficas 6º 49'30"latitudeSul e 35º 02'06" longitude Oeste; desse Ponto, segue com azimute 243º e distância(118 mm) de 2.950, rumo ao Ponto 23, de coordenadas geográficas 6º50'12"latitude Sul e 35º 03'32" longitude Oeste; desse Ponto segue com azimute263º 30' e distância (99 mm) de 2.475m, rumo ao Ponto 24, de coordenadasgeográficas 6º 50'22"latitude Sul e 35º 04'52" longitude Oeste; desse Ponto, seguecom azimute 347º 30' e distância (121 mm) de 3.025m, rumo ao Ponto 25, decoordenadas geográficas 6º 48'44"latitude Sul e 35º 05'14" longitude Oeste; dessePonto, segue com azimute 26º 30' e distância (38 mm) de 950m, rumo ao Ponto 26,de coordenadas geográficas 6º 48'16"latitude Sul e 35º 05'00" longitude Oeste;desse Ponto segue com azimute 10º e distância (88 mm) de 2.200m, rumo ao Ponto00, ponto inicial desta descrição, fechando um perímetro aproximado de 79.965me uma área aproximada de 14.640 hectares, cujas coordenadas geográficas,distâncias de terreno e ângulos de azimute são aproximados das cartastopográficas. Citado por 1Art. 2º A APA da Barra do Rio Mamanguape foi delimitada com base nas cartastopográficas SB. 25-Y-A-VI-3-NO, SB. 25-Y-A-V-4-NE, SB. 25-Y-A-VI-1-SO e SB.25-Y-A-VI-3-SO de escala de 1.25.000, da Superintendência do Desenvolvimento

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ACR 8431 PB

do Nordeste-SUDENE, conforme a seguinte descrição: inicia no ponto 00, decoordenadas geográficas 6º 46'55,814"de latitude sul e 35º 03'46,732" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 80º 26'31"e distância de1.898,630 m, rumo ao ponto 01, de coordenadas geográficas 6º 47'41,814" delatitude sul e 35º 03'15,733"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de145º 47'27" e distância de 1.704,217 m, rumo ao ponto 02, de coordenadasgeográficas 6º 46'56,814 "de latitude sul e 35º 00'30,739" de longitude oeste;desse ponto, segue com azimute de 74'29'56"e distância de 5.253,001 m, rumo aoponto 03, de coordenadas geográficas 6º 47'00,814" de latitude sul e 34º59'59,740"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 97º 07'08" edistância de 960,020 m, rumo ao ponto 04, de coordenadas geográficas 6º46'43,815 "de latitude sul e 34º 59'52,741" de longitude oeste; desse ponto, seguecom azimute de 22º 08'10"e distância de 564,854 m, rumo ao ponto 05, decoordenadas geográficas 6º 46'44,814" de latitude sul e 34º 59'08,742"delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 91º 04'01" e distância de1.351.746 m, rumo ao ponto 06, de coordenadas geográficas 6º 46'17,815 "delatitude sul e 34º 58'53,743" de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de28º 48'41"e distância de 948,925 m, rumo ao ponto 07, de coordenadasgeográficas 6º 45'05,815" de latitude sul e 34º 57'36,745"de longitude oeste; desseponto, segue com azimute de 46º 40'47" e distância de 3.238,383 m, rumo ao ponto08, de coordenadas geográficas 6º 44'43,816 "de latitude sul e 34º 56'55,747" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 61º 32'43"e distância de1.429,250 m rumo ao ponto 09, de coordenadas geográficas 6º 43'27,816" delatitude sul e 34º 56'34,748"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de15º 12'50" e distância de 2.422,530 m, rumo ao ponto 10, de coordenadasgeográficas 6º 43'29,816 "de latitude sul e 34º 56'32,748" de longitude oeste;desse ponto, segue com azimute de 134º 46'43"e distância de 86,886 m, rumo aoponto 11, de coordenadas geográficas 6º 42'46,816" de latitude sul e 34º56'33,748"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 358º 26'27" edistância de 1.321,519 m, rumo ao ponto 12, localizado à margem direita daRodovia Estadual 41, que interliga a comunidade de Marcação à Baía da Traição,de coordenadas geográficas 6º 42'29,816 "de latitude sul e 34º 54'56,751" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 79º 49'54"e distância de1.023,46 m, até a praia do Coqueirinho e, daí, adentrando em área marítima de1,08 (um vírgula zero oito) milhas náuticas (2001,5 m), rumo ao ponto 13, decoordenadas geográficas 6º 51'37,812" de latitude sul e 34º 53'19,755"delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 169º 44'29" e distância de 9,23(nove vírgula vinte e três) milhas náuticas (17 098,276 m), rumo ao ponto 14, decoordenadas geográficas 6º 52'00,812 "de latitude sul e 34º 54'00,753" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 240º 28'05"e distância de0,671 (zero vírgula seiscentos e setenta e uma) milhas náuticas (1.243,524 m), atéa praia de Lucena e, daí, mais 200,206 m terrestres rumo ao ponto 15, decoordenadas geográficas 6º 53'08,811" de latitude sul e 34º 55'41,749"delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 235º 48'14" e distância de3.739,388 m, rumo ao ponto 16, de coordenadas geográficas 6º 52'40,812 "delatitude sul e 34º 56'14,748" de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de310º 05'58"e distância de 1.329,233 m, rumo ao ponto 17, de coordenadasgeográficas 6º 51'38,812" de latitude sul e 34º 54'49,751"de longitude oeste; desseponto, segue com azimute de 58'38'47" e distância de 3.231,275 m, rumo ao ponto18, de coordenadas geográficas 6º 49'30,813 "de latitude sul e 34º 55'25,750" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 344º 04'14"e distância de4.085,149 m, rumo ao ponto 19, de coordenadas geográficas 6º 48'26,814" delatitude sul e 34º 56'21,748"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de318º 35'53" e distância de 2.612,318 m, rumo ao ponto 20, de coordenadasgeográficas 6º 49'00,813 "de latitude sul e 34º 58'20,744" de longitude oeste;

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desse ponto, segue com azimute de 253º 48'57"e distância de 3.800,959 m, rumoao ponto 21, de coordenadas geográficas 6º 49'29,813" de latitude sul e 35º02'05,736"de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 262º 24'51" edistância de 6.967,220 m, rumo ao ponto 22, de coordenadas geográficas 6º50'11,813 "de latitude sul e 35º 03'31,733" de longitude oeste; desse ponto, seguecom azimute de 243º 42'56"e distância de 2.939,600 m, rumo ao ponto 23, decoordenadas geográficas 6º 50'21,813" de latitude sul e 35º 04'51,730"delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 262º 37'30" e distância de2.476,043 m, rumo ao ponto 24, de coordenadas geográficas 6º 48'43,813 "delatitude sul e 35º 05'13,729" de longitude oeste; desse ponto, segue com azimute de347º 06'21"e distância de 3.086,163 m, rumo ao ponto 25, de coordenadasgeográficas 6º 48'15,814" de latitude sul e 35'04'59,729"de longitude oeste; desseponto, segue com azimute de 26º 18'27" e distância de 961,828 m, rumo ao ponto26, de coordenadas geográficas 6º 47'05,814 "de latitude sul e 35º 04'47,730" delongitude oeste; desse ponto, segue com azimute de 09º 28'38"e distância de2.182,265 m, rumo ao ponto 00, início desta descrição, totalizando uma áreaaproximada de 14.640 ha e um perímetro de 80.158,368 m. (Redação dada peloDecreto de 7 de abril de 1998). Citado por 1Art. 3º A APA da Barra do Rio Mamanguape será implantada, supervisionada,administrada e fiscalizada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dosRecursos Naturais Renováveis (IBAMA), em articulação com a Superintendênciade Defesa do Meio Ambiente (SUDEMA) e com o Batalhão de Polícia Florestal, doEstado da Paraíba, as Prefeituras dos Municípios de Rio Tinto e de Lucena e seusrespectivos órgãos de meio ambiente, e organizações não-governamentaisinteressadas.Art. 4º O IBAMA poderá firmar convênios e acordos com órgãos e entidadespúblicas ou privadas sem prejuízo de sua competência de supervisão efiscalização, visando atingir os objetivos previstos para a APA da Barra do RioMamanguape.Art. 5º A implantação e administração da APA de que trata este decreto terá oassessoramento técnico-científico do Centro Nacional de Conservação e Manejode Sirênios (Projeto Peixe-Boi Marinho), do IBAMA.Art. 6º Na implantação e gestão da APA da Barra do Rio Mamanguape serãoadotadas, entre outras, as seguintes medidas:I - as atividades a serem permitidas ou incentivadas em cada zona, definidas pelozoneamento ambiental desta APA, e outras que deverão ser restringidas ouproibidas, inclusive rotas marítimas, serão regulamentadas por InstruçãoNormativa do Ibama, ouvido, no que couber, o Ministério da Marinha;II - a utilização de instrumentos legais e incentivos financeiros governamentaispara assegurar a proteção da biota, o uso racional do solo e do subsolo;III - mecanismos destinados a impedir ou evitar a captura, a apanha, os maus-tratos, a mutilação ou a morte do Peixe-Boi Marinho ou o exercício de atividadesque ameacem a integridade dos indivíduos desta espécie, ficando o contato diretorestrito aos pesquisadores credenciados pelo IBAMA;IV - a divulgação deste Decreto, objetivando o esclarecimento de sua finalidade ea orientação da comunidade envolvida;V - a promoção de programas específicos de educação ambiental, extensão rural esaneamento básico.Art. 7º Fica estabelecida na APA da Barra do Rio Mamanguape uma Zona de VidaSilvestre, a ser delimitada pelo IBAMA quando da sua implantação, objetivandoproteger locais de maior ocorrência do Peixe-Boi Marinho, manguezais, lagoas,falésias, formações de barreiras e matas representativas, onde não serãopermitidas:I - na porção marítima: o uso de embarcações motorizadas, exceto as destinadas àrealização de pesquisas, ao controle ambiental, à guarda costeira e à fiscalização,

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cujo monitoramento deverá ser executado em estreita articulação com o Ministérioda Marinha;II - na porção territorial: a construção de estradas, desmatamentos de qualquernatureza e edificações, exceto as destinadas à realização de pesquisa e ao controleambiental.Art. 8º Na APA da Barra do Rio Mamanguape ficam proibidos:I - a implantação de atividades industriais poluidoras capazes de afetar o meioambiente;II - o exercício de atividades capazes de provocar erosão ou assoreamento dascoleções hídricas;III - o despejo nos cursos d'água de qualquer efluentes, resíduos ou detritos, emdesacordo com as normas técnicas oficiais;IV - o exercício de atividades que ameacem as espécies da biota, as manchas devegetação primitiva, as nascentes e os cursos d'água existentes na região;V - o uso de biocidas e fertilizantes, quando em desacordo com as normas ourecomendações técnicas oficiais.Art. 9º Na área da APA objeto deste Decreto, a abertura de estradas e de canaispara construção de barragens em cursos d'água, a implantação de projetos deurbanização, de atividade minerária, de atividade industrial e agrícola, quecausem alterações ambientais, dependerão de licenciamento do IBAMA.Art. 10. Serão aplicadas pelo IBAMA aos transgressores das disposições desteDecreto as penalidades previstas nas Leis nºs 6.902, de 27 de abril de 1981, e6.938, de 31 de agosto de 1981, alteradas pela Lei nº 7.804, de 18 de julho de1989, na Resolução nº 10 do Conselho Nacional do Meio Ambiente CONAMA, de6 de dezembro de 1990, e no Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990.Parágrafo único. Além das penalidades previstas no caput deste artigo, serãoainda aplicadas as constantes das Leis nºs 5.197, de 3 de janeiro de 1967, e 7.653,de 12 de fevereiro de 1988.Art. 11. Os investimentos e a concessão de financiamentos da AdministraçãoPública, direta ou indireta, destinados à região compreendida pela APA, serãopreviamente compatibilizados com as diretrizes estabelecidas neste Decreto.Art. 12. O IBAMA expedirá os atos normativos complementares que se fizeremnecessários ao cumprimento deste Decreto.Art. 13. Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.Brasília, 10 de setembro de 1993; 172º da Independência e 105º da República.ITAMAR FRANCO

De acordo com o que dos autos consta, a Empresa ré (destilaria Jacuípe e, porsucessão Destilaria Miriri S/A) teria iniciado, dentro da APA, a implantação de umprojeto de carcinicultura, conforme se verifica do documento de fls. 62 a 66, que é adefesa apresentada pelo acusado Gilvan Celso Cavalcanti de Moraes Sobrinho emnome da Destilaria Jacuípe S/A, sucedida pela Destilaria Miriri S/A.

Naquela petição, cuja cópia acha-se aqui entranhada, alegou-se:

(textual)...” durante todo o processo a requerente sempre cumpriu com todas asrecomendações efetuadas pelo IBAMA PB , executando o seu projeto dentro doque houvera protocolado junto àquele órgão para aprovação de seu projeto,solicitando a regularização de sua licença de implantação e, como não poderiadeixar de ser, a sua licença de operação... (destaque-se, a própria empresareconhecia que não aguardara a concessão da licença, mas estava a agir deacordo com o projeto cujo esboço protocolara junto à seccional do IBAMA-PB)...

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“como houvera dado entrada no pedido da sua licença de operação, entendeu apromovente que poderia realizar alguns testes em seus equipamentos, haja vistao seu processo já estivesse concluído e até mesmo remetido a Brasília a fim deque pudesse ser analisado e submetido à emissão da LO, uma vez que já haviacumprido todas as recomendações do IBAMA PB” ...(ou seja a empresa antes deobter a licença de operação estava funcionando, embora denominasse tal fase detestes operacionais)... “restando apenas o parecer final do órgão em Brasília,responsável pela emissão de tais licenças.”

Tal peça é relevante, pois firmada pelo principal acusado, que declara ter iniciadoo empreendimento antes da licença necessária. O simples protocolar de um hipotéticoprojeto foi entendido como correspondente à aprovação de um empreendimento.

Os danos ao ecossistema por essa espécie de empreendimento são bastantegraves. Observe-se, a título de ilustração, o texto de Jane Evangelista sobre a matéria:

Cultivo de camarões em manguezais ameaça fauna e floraNa Bahia, a carcinicultura tem causado sérios problemas ambientais em áreas demangue, além de impactos sociais às populações que vivem em seu entornoO rico ecossistema do manguezal se configura como um berçário para inúmerasespécies da fauna e da flora aquática. Os peixes, moluscos e crustáceos, quehabitam e se reproduzem neste ambiente, são importantes fonte de renda e dealimento para as famílias que vivem na região costeira. Por estas razões, desde1965, os manguezais foram reconhecidos pelo governo Brasileiro como Áreas deProteção Permanente (APPs).A resolução nº 369 do Conselho Ambiental do Meio Ambiente (Conama)estabelece que as áreas de mangue não devam sofrer qualquer tipo de intervençãoem sua vegetação, a não ser em caso de utilidade pública. Porém, isto não é o queobservamos no litoral brasileiro. Com cerca de 20 mil Km², a faixa de manguebrasileira, maior do mundo, tem sido devastada, muitas vezes com o aval dosgovernos municipais e estaduais.Na região nordeste, particularmente na Bahia, os manguezais têm sido ameaçadospela construção de tanques para a criação de camarões em suas dependências. Acarcinicultura, como é conhecida este tipo de criação, tem causado sériosproblemas ambientais nas áreas de mangue, além de gerar infortúnios àspopulações que vivem nas proximidades dos manguezais e que deles tiram osrecursos necessários para a sobrevivência.O impacto social causado pela implantação da carcinicultura nos manguezais é opior problema que este tipo de cultivo pode gerar. Para Miguel Accioly, professordo Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), “Uma criaçãodeste tamanho ou menor (aponta para uma fotografia tirada por satélite de umimenso tanque que corta um manguezal), como aquelas que eu te mostrei,dificultam o acesso do pescador ao caminho que ele tinha naturalmente para ir aomangue e aos locais de pesca. Por exemplo, toda essa região era, principalmente,um local de pesca de sururu. Tem um povoadozinho, aqui, que vive há séculos e oprincipal produto lá, é o sururu. Resultado, depois da criação disso aqui (tanque)o banco de sururu acabou e o pessoal agora está desempregado, porque eles nãose empregaram aqui (no criadouro), simplesmente, eles deixaram de pescar osururu.”Além desse problema, os pescadores sofrem com a ameaça dos vigilantes quetrabalham para as empresas de cultivo de camarões. Os locais para pesca dosmoradores se restringem ao entorno dos tanques, logo, são vigiados e muitas vezes

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confundidos com ladrões. Segundo o professor, um pescador já foi morto emValença.Manguezal X Carcinicultura – O manguezal produz muito, mas pouco éconsumido pelos seres que vivem nele. Toda a produção excedente alimenta oestuário, que funciona basicamente como um berçário tanto para os seres quevivem no mar quanto para os que vivem nos rios. É um lugar abrigado que nãopossui fortes ondas ou correnteza e onde há poucos predadores, por isso osanimais vão para se reproduzir. Com a ocupação dos mangues, o fornecimento dealimento para o estuário é reduzido, e algumas espécies podem ser extintas daregião.Desta forma, o cultivo de camarões nas áreas de mangue não teria motivo paraexistir, porém a carcinicultura é uma área muito rentável da aquicultura, segundodados da Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), divulgados em2002, esta atividade moveu sozinha cerca de US$ 6,1 bilhões no mundo. No Brasil,particularmente no nordeste, não é diferente, a produção de camarões em viveiros,seja em tanques no mangue ou em terra firme, tem crescido a cada ano. E, estadeve ser a justificativa para a criação dos crustáceos em áreas de APP: o lucro,não das pessoas que vivem as cercanias dos manguezais, mas das indústrias que seinstalam com licença nestas áreas, infligindo o que preconiza a resolução nº 369do Conama.É necessário ressaltar, ainda, que a produção dentro dos tanques é menor, porémconcentrada, já a produção no manguezal é maior, no entanto dispersa, dando aimpressão de que não há ganhos ou benefícios, mas as marisqueiras e ospescadores da região vivem dos peixes e moluscos do mangue. Segundo Accioly,“com a construção do tanque no mangue, você tira 1000 desempregados quevivem nesta área e bota 20 carteiras assinadas. Para o governo isto está ótimo, aestatística melhorou muito, passou a ter 20 carteiras assinadas quando se tinha1000 desempregados. Só que na verdade estes 1000 que estão aqui, eles perderama fonte de alimentação, vão ter que ir para outro lugar, mas não tem outro lugar, eeles não eram desempregados, eles produziam alimentos, eles não passavamfome…”Fiscalização, irregularidades e danos ao ambienteO processo de fiscalização das fazendas de camarões, instaladas nos manguezais,desenvolvido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) consiste emesclarecer e apurar denúncias e ocorrências, aplicar sanções de multa e embargo,mantê-las e fazer o relato ao Ministério Público. Por sua vez, o Ministério Públicofaz a denúncia à justiça, que conta com informações técnicas atualizadas,fornecidas pelo Ibama sobre as irregularidades encontradas no cultivo, e, caso osujeito acusado seja condenado, responderá pelo passivo ambiental, assumindosua responsabilidade nas áreas administrativa, civil e penal. Culpado, odegradador terá, ainda, que fazer a reparação do dano causado, elaborando umplano de recuperação ambiental que terá sua eficiência julgada pelo Ibama.O monitoramento dos fiscais dos órgãos ambientais deveria ser contínuo, porémisso nem sempre ocorre, pois o contingente de fiscais não é suficiente para cobriro litoral baiano. Desta forma, algumas criações, mesmo embargadas, permanecemfuncionando irregularmente.Uma questão importante surge quando nos deparamos com uma APP sendodegradada para promover benefícios particulares: Como fiscalizar algo que emsua essência já é irregular, como os criadouros de camarões nos manguezais?Segundo o agente ambiental federal e instrutor de ações fiscalizatórias do Ibama,Alberto Gonçalves, “quando um órgão seja federal, estadual ou municipal licenciaestes cultivos obviamente deve conhecer os padrões, os parâmetros de tolerânciados impactos para aquele ambiente. Então, o licenciamento traz comocondicionantes todas as providências para que aquilo não afete o ambiente maisdo que o necessário… Como o mangue é APP, não poderia instalar os tanques, por

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isso se luta para desinstalá-los ou para que os já historicamente instalados seadéquem as normas”.O Conama e demais órgãos ambientais, a partir de estudos, elaboram os padrõestécnicos que os cacinicultores devem seguir. E, estes devem elaborar e fornecerperiodicamente relatórios sobre a qualidade ambiental de seus empreendimentos,documentos que deverão ser verificados pelos órgãos ambientais.Os criadouros licenciados de camarões nos mangues são antigos, já os irregularessão mais recentes. Isso porque, o mangue não é tecnicamente adequado para ocultivo de camarão em tanques, as condições de drenagem para limpeza e controlesanitário, por exemplo, não podem ser feitas de forma adequada. Quando se tratados viveiros instalados em terra firme, as condições são completamente diferentes,o tanque pode ser totalmente drenado, seco ao sol e ter fundo queimado com cal,sendo, desta forma, esterilizado e desinfetado. Há um controle sanitário que nãopode ser feito no mangue. No ambiente aquático do manguezal, não há comosecar totalmente o viveiro, o fundo é constituído de lama, acumulando resíduostóxicos, bactérias e microrganismos no fundo do viveiro. Desta forma, os viveirosconstruídos em manguezais têm durabilidade máxima de 10 anos, pois os resíduossaturam e matam o mangue, tornando-o inviável para o cultivo. Por isso, pelainviabilidade técnica, os criadouros mais recentes em manguezais são ilegais oupertencem a empresários predadores, que pensam única e exclusivamente no lucromomentâneo, pulando de mangue em mangue, deixando um terrível rastro dedanos ambientais.A criação irregular de camarões em manguezal não exige muitos investimentos,mas gera lucro rapidamente. Para Accioly, “geralmente há uma grande empresade criação de camarão por traz dele (criador irregular), fornecendo ração,fornecendo o pós larva, que são os filhotes de camarão, e fornecendo algumainformação técnica. Então, ele entra sem custo nenhum, praticamente… depois eleentrega os camarões cultivados irregularmente para aquele empresário que paga aele. O empresário pega o camarão que foi criado de forma ilegal mistura ao dele,criado de forma legal, e, a partir dali, o camarão tá todo com nota fiscal”.Os danos causados pela carcinicultura aos manguezais são agravados pelamorosidade dos processos ambientais, alguns tramitam há cerca de seis anos.Enquanto os processos estão tramitando os tanques não são removidos dos locais eos prejuízos ambientais são ampliados. Os tanques só são retirados após o términodos processos, que indicarão como o empreendedor sanará o problema causado.(capturado em www.cienciaecultura.ufpb, em 18/11/2012).

Essa matéria é, também, muito bem exposta por Karen Figueiredo Oliveira, nadissertação depuração do efluente proveniente da carcinicultura, utilizando a ostra-do-mangue crassotrea rizhophorae, defendida perante a Universidade de Santa Cruz(UESC), Ilhéus, em 2011, sobretudo fls. 08/12.

Seguiu a Destilaria em sua defesa (fls. 64) afirmando que a autuação dafiscalização do IBAMA, naquele momento, se dera em função:

De alegação de assoreamento do rio Mamanguape;1.Do despejo de águas drenadas de criação de larvas de camarão2.vananmei no meio ambiente.

Sobre essa espécie de camarão, não é demais lembrar, repetindo a pesquisadoraSara Nani:

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A alta produtividade do camarão vannamei é o principal atrativo para o seucultivo. "O rendimento das espécies nativas é bastante inferior", justifica o criadorde Cananéia. O melhor exemplo está no Nordeste, onde, nos últimos anos, osempresários da pesca têm investido pesado na carcinicultura. A produção anualcresceu a uma taxa de 50% e, no ano passado, foram exportadas aproximadamente60 mil toneladas, um acréscimo de quase 70% sobre o volume de 2002, segundo aAssociação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), totalizando US$ 240milhões.PESQUISAS Se as vantagens parecem tentadoras aos investidores, pesquisadesenvolvida pelo Laboratório de Biotecnologia de Manguezais (Bioma), doInstituto Oceanográfico da USP, identifica diversos fatores ligados ao cultivo dovannamei no estuário que podem causar impacto ao manguezal. Em seu estudosobre o tema, o pesquisador Clemente Coelho Júnior aponta a contaminação daságuas pelos efluentes dos tanques, que podem apresentar hormônios, compostosquímicos, resíduos alimentares e fertilizantes. Outro risco é a transmissão dedoenças. Segundo o pesquisador, já foram descritas aproximadamente 35enfermidades para o vannamei, entre vírus, bactérias, fungos e protozoários, quepodem afetar as diferentes fases da vida do crustáceo.

Continuou em sua defesa, a Destilaria, (fls. 64) afirmando:

... “justiça seja feita, o assoreamento encontrado pelos técnicos em05.09.2002 nos entornos do projeto já estão sendo mitigados, conforme sevislumbra do relatório de acompanhamento das medidas de controle erecuperação ambiental”... (reconhece-se, pois, o assoreamento e não poderiaser diferente, pois, como poderiam ser construídos os viveiros sem aconstrução de barreiras, que, naturalmente levam a assoreamento).

Quanto ao despejo de águas drenadas da criação de larvas, afirmou que :

“Em nenhum momento havia existido recomendação para que seconstruísse tal bacia de sedimentação. Isto porque a recomendação feitapelo IBAMA na vistoria que aprovou o projeto e sua autorização a suaimplantação era a construção de caixas de sedimentação”...

Ora, seria de indagar-se, a que aprovação se refere o acusado se reconhece que oprojeto ainda se achava pendente de aprovação pelo órgão responsável em Brasília?

Em verdade, o que se constata é que a empresa e seus dirigentes resolveram,moto próprio implantar o projeto, sem esperar pela prévia licença. Violaramflagrantemente a legislação ambiental.

Destaque-se, para adequado entendimento dos fatos, o teor do PARECER11/2003 – IBAMA/DILIQ/CGLIC/COAIR, cuja copia acha-se às fls. 107/112 dos autos,cujas conclusões são:

“APÓS ANÁLISE PCA/PRAD DO PROJETO DECARCINICULTURA NO MUNICIPIO DE RIO TINTO/PB,ENCAMINHADO PELA DESTILARIA JACUÍPE,CONCLUÍMOS PELA INVIABILIDADE AMBIENTAL DOMESMO, RECOMENDANDO QUE OS TANQUES EINSTALAÇÕES PRESENTES SEJAM RETIRADAS, E QUE A

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ÁREA IMPACTADA SEJA RECUPERADA INTEGRALMENTE.”(fls. 112)

Tivesse, pois, a destilaria e seus responsáveis a conclusão da análise do projeto,observariam o inequívoco descumprimento voluntário e doloso, das normas ambientaisde regência.

Em 01.11.2004, viria o Sr. Gilvan Celso Cavalcanti de Morais Sobrinho arequerer à SUDEMA, em nome da Destilaria Jacuípe S/A, licença prévia de instalação eoperação do empreendimento, ou seja, cerca de dois anos após a autuação do IBAMA,obtendo o referido licenciamento em poucos dias. (vide 2º vol dos autos).

Outro documento relevante é o RELATÓRIO DE VISTORIA que se acha às fls.419/435 e seguintes dos autos, inclusive, instruído com fotografias, onde se constatouque dos onze reservatórios, dez estavam em uso, inclusive com camarões, sem o tanquede decantação.

Outro elemento de prova relevante é o depoimento do Acusado GILVANCELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHO, perante o MM Juiz da 2ª VaraFederal da Paraíba (fls. 567 e segs.) onde reconhece a utilização dos tanques, emboramantendo a tese que estaria apenas fazendo testes.

Destaque-se, ainda, o depoimento de Emanuel Pinheiro de Melo, em seuinterrogatório, perante o MM Juiz da 2ª. Vara da secional da Paraíba que afirmou:

... “antes do empreendimento tinha sido solicitado um PCA... depois que deramentrada na documentação; que o PCA previa que precisavam de um material deacabamento dos taludes; que o PCA previa que precisavam de um material deempréstimo que seria tirado da própria fazenda para dar acabamento nos taludese para facilitar trafego de caminhão, retirada de material”...

... “que o material de empréstimo foi argila, piçarra para fazer o acabamento nostaludes, para torna-los trafegáveis, tendo sido pego de uma área da fazenda,distante um quilometro de onde estavam sendo feitos os viveiros de camarão; quehouve apenas o deslocamento dessa área para os taludes, que não houvecomercialização de argila tendo sido deslocada argila dessa área para ostaludes.”(p. 620/621)

Bastante expressivo é o depoimento do engenheiro de pesca Ivan CoutinhoRamos (fls. 638):

... “Com relação a área de extração de minérios, ainda se encontra lá; que sãoonze viveiros que ocupavam uma área já desmatada, usada para cultivo de gado eagricultura de subsistência; que quando chegou aqui em 2002, o projeto já estavainstalado. Que era uma espécie de ilha, tendo sido retirada a parte central eficada a área de mangue; que todos os diques eram recobertos com argila epiçarra e no momento em que esteve lá estava havendo uma erosão da parteexterna dos diques para a área de vegetação; que houve uma recomendaçãotécnica para que fosse limpada aquela área; ... que pediram para que retirasse a

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argila e deixasse a área como era antes... ... que foi tentada a autorização mas oIBAMA sempre contra o licenciamento desse sistema de produção , e elesocuparam a área total com viveiros e as águas liberadas são muito ricas emmateriais orgânicos”...

E ainda o depoimento do engenheiro florestal Edberto Farias de Novaes (fls.648):

... “a participação do depoente foi em dois momentos; que a primeira foi emsetembro de 2002, sendo a segunda após três anos; que o que mais chamou aatenção da equipe foi a falta da bacia de sedimentação, havendo outros fatos; queos dois empreendimentos eram a extração de argila e a criação de camarão eoutro fato consistia no cumprimento do embargo feito pelo IBAMA e esse embargonão estava sendo cumprido.”

Importante, ainda, destacar o depoimento prestado em Juízo, perante o MD Juizde Direito da Comarca de Rio Tinto-PB (fls. 913/914), pelo motorista da Uniagro,empresa do grupo da Destilaria Ré. Destacou o Sr. Severino Gomes da Silva:

... “é motorista da Uniagro, pertencente ao grupo a que pertence também aDestilaria Jacuípe; que tem conhecimento que na verdade a Jacuípe fez osviveiros de camarão tratados na denuncia, mas não sabe se para tanto teveautorização legal; que no local onde os viveiros foram feitos não existe nada queinforme que se cuida de APA – Área de proteção ambiental; que não sabe informarse os viveiros de camarão causam poluição ao meio ambiente”... (destaquesinexistentes no original)

Outro não é o depoimento de Amaro José de Araújo ( fls. 963) quando afirma:

... “que os tanques foram construídos e as atividades de carcinicultura foraminiciadas”...

A prova, pois, do exercício, não autorizado de atividades de carcinicultura,causadora de danos ambientais é inconteste.

De se destacar, ainda, parte das conclusões da perícia, de fls.1863:

... “Portanto, de acordo com os objetivos de criação de uma APA a presença deempreendimentos de carcinicultura fere desde a pegislação ambiental, os acordosinternacionais de proteção à bidiversidade e os direitos das comunidadestradicionais. Visto que o empreendimento da destilaria Miriri encontra-se inseridono manguezal.”...

Destaque-se, de logo, o reconhecimento da prescrição em relação aos crimes dosartigos 55 e 60 da Lei nº 9.605/1998, fato este inconteste.

Resta a discussão acerca da Lei nº 9605/98 em relação a dois dispositivos:

Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e àsáreas de que trata o art. 27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990,independentemente de sua localização:

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Pena - reclusão, de um a cinco anos.§ 1o Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral asEstações Ecológicas, as Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, osMonumentos Naturais e os Refúgios de Vida Silvestre. (Redação dada pelaLei nº 9.985, de 18.7.2000)§ 2o A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção nointerior das Unidades de Conservação de Proteção Integral seráconsiderada circunstância agravante para a fixação da pena. (Redaçãodada pela Lei nº 9.985, de 18.7.2000)§ 3º Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.... ...Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem acompetente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordocom a obtida:Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar aárea pesquisada ou explorada, nos termos da autorização, permissão,licença, concessão ou determinação do órgão competente.

Em relação a esse último dispositivo, objeto da denúncia, não foi objeto dopedido na apelação de fls. 663, o que se explica pelo fato de não haver demonstração deexploração e pesquisa de lavra, nos termos do código de mineração. Entender-se que aauto utilização teria esse perfil seria um equívoco, que não foi perseguido pelo MDRepresentante do Parquet em sede recursal. Resta o exame da outra tipificação, bemcomo da Lei nº 8.176/91:

Art. 2° Constitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpação, produzirbens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ouem desacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.Pena: detenção, de um a cinco anos e multa.§ 1° Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização legal, adquirir,transportar, industrializar, tiver consigo, consumir ou comercializar produtos oumatéria-prima, obtidos na forma prevista no caput deste artigo.§ 2° No crime definido neste artigo, a pena de multa será fixada entre dez etrezentos e sessenta dias-multa, conforme seja necessário e suficiente para areprovação e a prevenção do crime.§ 3° O dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior a quatorze nemsuperior a duzentos Bônus do Tesouro Nacional (BTN).

Sobre essa matéria já apreciou o TRF da 1ª Região:

PROCESSO PENAL. PENAL. LEI 8.176, DE 1991, ART. 2º (EXPLORAR AMATÉRIA PRIMA). LEI 9.605, DE 1998, ART. 55 (EXTRAÇÃO RECURSOSMINERAIS). DERROGAÇÃO.1. Quando o agente extrai recursos minerais, sem a competente autorização legal,altera o mundo naturalístico uma só vez, havendo, no caso, um conflito aparentede normas. É de atentar-se que o art. 2º da Lei 8.176, de 1991, estabelece queconstitui crime contra o patrimônio, na modalidade de usurpação, (...) explorarmatéria-prima pertencentes à União, sem a devida autorização legal (...), e o art.55 da Lei 9.605, de 1998, define como crime o executar (...) extração de recursosminerais sem a competente autorização. A conduta, nos dois crimes, é a mesma,razão por que muitos entendem que esta última norma, por ser posterior, derrogouo art. 2º da Lei 8.176, de 1991, modificando a pena, reduzindo-a.

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2. Confirmação pelo Ministério Público Federal da transação firmada pelo autordo fato, que assumiu a obrigação de reparar o dano ambiental, perante juizabsolutamente incompetente, o que leva ao não recebimento da denúncia.

Quanto a este último tipo, não resta nos autos provado que os acusados tenhampraticado qualquer dos verbos que caracterizam as condutas criminosas:

1. Produzir bens; ou,2. Explorar matéria-prima pertencente à União, sem autorização legal ou emdesacordo com as obrigações impostas pelo título autorizativo.

A destilaria não explorou jazida de argila, ou de qualquer outro recursomineral da União Federal, como definido nos arts. 20 e 176 da CF/88. Não se podeconfundir com produção a utilização de argila existente na propriedade para construirbarreiras de contenção e taludes, mesmo para atividades ilícitas. Não se pode, na mesmalinha de pensamento, entender esse agir como “exploração de matéria-primapertencente à União”.

Já o tipo do art.40 da Lei nº 9605/98 está devidamente preenchido.

Como bem define Luiz Régis Prado, causar dano “significa originar, produzir,ocasionar, dar lugar a prejuízos, deteriorações, de qualquer ordem, contra a floraou fauna locais, de forma direta ou indireta”.1 O dolo é “simples, comum, material,de forma livre e plurisubsistente.”2 Indaga-se: No caso, a construção e utilização de onzetanques de grande porte, barreiros, ou baldes, transformando ilhas na foz do rio, no meiode manguezais, sem autorização possível, com deslocamento de material estranho comoargila e piçarra, com construção de ‘estradas” para acesso de caminhos, sem elementopara evitar o “ despejo” dos dejetos, resíduos, dos camarões nas áreas de mangue,caracteriza o tipo? A resposta não pode ser outra, senão a afirmativa.

O crime ocorreu, com dimensão bem razoável. Não se trata de um pequenoempreendimento artesanal, mas de obra empresarial de porte. No se pode esquecer, nocaso, o papel do direito penal ambiental. Como bem lembra Alex Fernando Santiago:

... “O direito penal de uma sociedade de risco quer evitar a ocorrência de danosde magnitude. Tanto é assim que modifica o momento da sanção penal da lesãopara aquele da exposição a perigo do bem jurídico.”3

O crime foi praticado. Deve-se observar a responsabilidade de cada um dosapelados.

No tocante a GILVAN CAVALCANTI DE MORAES SOBRINHO. Suaautoria é patente. Os depoimentos das testemunhas, sobretudo o seu próprio, em

1 PRADO, Luiz Régis. Crimes contra o meio ambiente. São Paulo: RT, 2ª.ed. 2001, p. 115.2 Idem, p.116.3 SANTIAGO, Alex Fernandes. Compreendendo o papel do direito penal na defesa do meio ambiente.

Revista de Direito ambiental, ano 16/61 jan.mar/2011. São Paulo: RT, P.102.

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juízo, as petições que apresentou ao IBAMA demonstram que, com o intuito claroe evidente de obter lucro fácil, pois, á época o mercado de camarões, sobretudopara exportação era bastante promissor, determinou a realização de obras quecausaram dano ao meio ambiente, dentro de uma APA.

Levando em conta os elementos do Código Penal:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, àpersonalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário esuficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº7.209, de 11.7.1984)I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de11.7.1984)II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dadapela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redaçãodada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie depena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Considerando a culpabilidade do agente, a sua conduta social, como empresáriode grande porte, responsável pela exploração de empreendimentos de grande porte, ascircunstancias, que envolvem, tipicamente o sacrifício de bem jurídico ambiental tãorelevante, com sobreposição de busca de ganho fácil, com consequências extremamentegravosas, deve a pena ser fixada em dois anos e seis meses de reclusão, em princípioem regime aberto, com substituição por duas penas restritivas de direito, adiantefixadas.

Em relação a EMANUEL PINHEIRO DE MELO, dirigente daDestilaria Jacuípe, depois Miriri (vide fls 681 e segs), tinha consciência da ilicitudedos atos praticados e teve, participação efetiva para suas ocorrências. No própriodepoimento demonstra, embora tentando encobrir a verdade, ter sido responsávelpela implantação do projeto ilicitamente implantado. Os elementos que levam àfixação da pena são semelhantes àqueles aplicados ao primeiro réu, razão pela qualentendo que deve ser aplicada a ele idêntica pena, com a mesma substituição.Ambos condenados em custas processuais.

As penas de prestação de serviços a que ficam condenados os réus, por dois anose seis meses, deverá corresponder a:

I - prestação de serviços à comunidade;II - prestação pecuniária, correspondente ao fornecimento de cinco cestas

básicas, por semana, a colônias de pescadores, na região de rio Tinto;

Quanto à Destilaria Miriri S/A, em função da sua autônomaresponsabilidade penal, fica condenada a multa de R$ 500.000,00 e restauração daárea de mangue objeto da implantação do projeto de carcinicultura com a

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proibição de realizar esse tipo de atividade por cinco anos. Condenada, ainda, aopagamento de custas processuais.

Dou, pois, parcial provimento à apelação, nestes termos.

É como voto.

JUIZ FRANCISCO CAVALCANTIRelator

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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 8431 PB (2005.82.00.009033-1)APTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALAPDO : DESTILARIA MIRIRI S/AAPDO : GILVAN CELSO CAVALCANTI DE MORAIS SOBRINHOAPDO : EMANUEL PINHEIRO DE MELOADV/PROC : CARLOS ROGERIO MARINHO DIAS E OUTROORIGEM : 2ª VARA FEDERAL DA PARAíBA - PBRELATOR : JUIZ FRANCISCO CAVALCANTI - Primeira Turma

EMENTA: CRIME DOLOSO CONTRA O MEIO AMBIENTE. PROVAINCONTESTE. CONDENAÇÃO DOS DIRIGENTES RESPONSÁVEIS EDA PESSOA JURÍDICA, NOS TERMOS DA LEI AMBIENTAL.1. Prova inconteste da prática de crime ambiental consistente na implantação eexploração de projeto de carcinicultura, com expressa e consciente violação dalegislação de regência;2. Responsabilidade comprovada, pelo exame da prova dos autos, do Sóciocontrolador, do diretor superintendente e da pessoa jurídica.3. Inexistência de prova de exploração clandestina de jazida mineral. Ponto emque sucumbe a denúncia.4. Provimento, apenas parcial do apelo, nos termos das provas colhidas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os presentes autos, DECIDE a Primeira Turma do TribunalRegional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termosdo relatório e voto anexos, que passam a integrar o presente julgamento.

Recife, 22 de novembro de 2012. (Data do julgamento)

JUIZ FRANCISCO CAVALCANTIRelator

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