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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização do autor, do orientador e da universidade.
Yana dos Santos Moysés
Graduada em Oceanografia pela Faculdade de Oceanografia da UERJ. Atualmente mestranda em Geografia da PUC- Rio, Linha de Pesquisa: Espaço e Sustentabilidades. Integrante do Grupo de Pesquisa Gestão Territorial no Estado do Rio de Janeiro. Atuando, principalmente, nos temas: desenvolvimento socioespacial, sustentabilidade, planejamento e gestão do território.
Ficha Catalográfica
CDD: 910
Moysés, Yana dos Santos A instalação do COMPERJ e a des-re-territorialização da Comunidade de Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro): desenvolvimentos e sustentabilidades / Yana dos Santos Moysés ; orientador: Augusto Cesar Pinheiro da Silva. – 2010. 135 f. : il.(color.) ; 30 cm Dissertação (Mestrado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Geografia, 2010. Inclui bibliografia 1. Geografia – Teses. 2. Comunidade de Itambi. 3. COMPERJ. 4. APA de Guapimirim. 4. Desenvolvimento(s). 5. Sustentabilidade(s). I. Silva, Augusto Cesar Pinheiro da II. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Geografia. III. Título.
Às mulheres e aos homens da Comunidade de Itambi.
Agradecimentos
Essa dissertação contou com a contribuição e participação de várias pessoas e instituições, sem as quais, certamente, essa pesquisa não seria possível.
Antes de tudo, agradeço ao meu orientador Augusto César Pinheiro da Silva, pelas suas críticas, sugestões, pelos seus “puxões de orelha” e, principalmente, pela sua efetiva presença do início ao fim na realização dessa pesquisa.
Ao Departamento de Geografia da PUC-Rio, seus professores e funcionários, em especial, ao professor Rogério de Oliveira, sempre disposto a ajudar, e à Márcia, pela atenção, disponibilidade e por apresentar uma competência inigualável.
E à CAPES pelo importante auxílio financeiro concebido.
Agradeço à professora Denise Fonseca, tanto pela sua participação e contribuições nas bancas de qualificação e defesa, quanto pelas valiosas discussões em sala de aula.
À professora Gisela Aquino Pires do Rio, pelas importantes contribuições na banca de qualificação que certamente me fizeram amadurecer academicamente e novamente pela sua atenção e disponibilidade para participação na banca de defesa.
Ao professor Rogério Haesbaert, pela gentileza, atenção e disponibilidade para participação na banca de defesa e pelas ricas discussões em sala de aula que contribuíram significativamente na elaboração desse trabalho.
Ao professor e amigo Gian Mario Giuliani, pela sua participação na banca de qualificação e pela sua constante disposição mesmo distante fisicamente.
Aos colegas que também realizam pesquisas na região, em especial, a Bárbara e David do IFCS-UFRJ, ao Guilherme e Graziella da UFF, pelas discussões, saídas de campo e suas importantes contribuições na construção desse trabalho.
Aos colegas do GeTERJ, em especial ao Marcelo e a professora Rejane, pelas discussões semanais, contribuindo tanto para o enriquecimento desse trabalho quanto para o meu amadurecimento acadêmico.
Agradeço aos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e aos chefes da APA de Guapimirim e da ESEC da Guanabara, em especial ao Breno Herrera, pela atenção, gentileza e disponibilidade, contribuindo significativamente na elaboração dessa pesquisa.
Sobretudo, um justo agradecimento à Comunidade de Itambi pela confiança e disponibilidade, sem a qual, obviamente, esse trabalho seria impossível.
Por fim, um agradecimento especial à minha família, minha mãe Cristina, meu pai Zich e meus irmãos Thiago e Raphael pelo apoio físico e emocional e por ser o meu eterno porto seguro.
À minha tia Angélica, sempre presente e disposta a ajudar, sendo várias pessoas em uma só.
Ao meu avô Manoel pela torcida, apoio e amor.
À minha querida comadre - irmã Letícia pela imensa contribuição nesse trabalho, pela sua leitura, sugestões, paciência... e, principalmente, pela sua amizade.
Ao meu querido Daniel por ter participado efetivamente de todas as etapas dessa dissertação, saídas de campo, leituras, sugestões e, principalmente, pela sua paciência, seu carinho e amor.
Resumo
Moysés, Yana dos Santos; Silva, Augusto Cesar Pinheiro da. A instalação do COMPERJ e a des-re-territorialização da Comunidade de Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro: Desenvolvimentos e Sustentabilidades. Rio de Janeiro, 2010, 135p. Dissertação de Mestrado. Departamento de Geografia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
A Comunidade de Itambi, localizada no Município de Itaboraí, na Região
Metropolitana do Rio de Janeiro, será des-re-territorializada dos mangues da
APA de Guapimirim para um Conjunto Habitacional, ao mesmo tempo em que o
Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro se instala no município. As
contradições entre o modelo de desenvolvimento socioespacial via COMPERJ
com as potencialidades locais são nítidas, divergindo das concepções de
desenvolvimento(s) e sustentabilidade(s) defendidas nessa pesquisa, as quais são
entendidas de acordo com as perspectivas particulares dos territórios, que emanam
cultura e história específicas e, portanto, outras racionalidades ligadas a ideia de
qualidade de vida. Os gestores envolvidos nessa política de desenvolvimento
baseiam-se em uma concepção parcial da produtividade, entendida como
capacidade dos investimentos de aumentar a renda financeira em curto prazo,
mesmo que diminuam a produtividade de energia, capital natural e desmantelem
as diversidades culturais. Defende-se dessa forma que as potencialidades
específicas locais devam ser potencializadas com a participação da Comunidade
de Itambi nos processos decisórios nos projetos de desenvolvimento do território
em que esses estão inseridos. Procura-se fortalecer então a luta da Comunidade de
Itambi e de outras populações do Brasil por mais direitos e liberdades. Esse
trabalho tenta contribuir dessa forma com a luta pela efetiva justiça social, para a
diminuição das desigualdades, e para o reconhecimento da diversidade territorial.
Palavras-chave Comunidade de Itambi, COMPERJ, APA de Guapimirim,
desenvolvimento(s), sustentabilidade(s).
Abstract
Moysés, Yana dos Santos; Silva, Augusto Cesar Pinheiro da (Advisor). The installation of COMPERJ and the de-re-territorialization of Community of Itambi (Itaboraí, Rio de Janeiro): Developments end Sustainabilities. Rio de Janeiro, 2010, 135p. MSc. Dissertation - Departamento de Geografia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
The Community of Itambi, located in the municipality of Itaboraí,
Metropolitan Region of Rio de Janeiro, will be de-re-territorialized the
mangroves of the Environmental Protection Area of Guapimirim for a Housing,
while the Petrochemical Complex of Rio de Janeiro (COMPERJ) is installed in
the municipality. The contradictions between the model of social and spatial
development via COMPERJ with local potential are sharp, diverging from the
conceptions of development (s) and sustainability (s) defended in this research,
which are construed in accordance with the particular perspectives of the
territories that emanate history and culture specific and, therefore, other rationales
linked the idea of quality of life. The managers involved in policy development
based on a concept of partial productivity, understood as the ability of investments
to increase the financial income in the short term, even if they reduce the
productivity of energy, natural capital and dismantle the cultural diversities. It is
argued that how the specific potential sites to be leveraged with the involvement
of the Community of Itambi in decision making in development projects in the
territory in which they are inserted. It seeks to strengthen the fight then the
Community of Itambi and other peoples in Brazil for more rights and freedoms.
This paper attempts to contribute so effectively to the fight for social justice, to
reduce inequalities, and the recognition of territorial diversity.
Keywords
Community of Itambi; COMPERJ; Environmental Protection Area of Guapimirim ; development(s); sustainability(s).
Sumário
1. Introdução 13
2. Territorialidades, Desenvolvimentos e Sustentabilidades: algumas reflexões acerca de suas funcionalidades como ferramentas políticas 19
2.1. A busca da(s) territorialidade(s) para desenvolvimento(s) com maior autonomia 21
2.2. Do desenvolvimento uno aos desenvolvimentos múltiplos 29 2.3. Do desenvolvimento sustentável para a(s) sustentabilidade(s) 36 2.4. Desenvolvimentos e sustentabilidades democraticamente mais justos 41
3. O COMPERJ: modelo de desenvolvimento hegemônico e contradições no espaço local 46
3.1. Os gestores e seus discursos no Estado do Rio de Janeiro 47 3.2. Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ): visão da empresa 51 3.3. Projetos de modernização: uma análise crítica do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro 53 3.4. As contradições do modelo de desenvolvimento via COMPERJ 71
4. A Comunidade de Itambi: potencialidades e perspectivas de um território em transmutação 75
4.1. A Comunidade de Itambi 77 4.2. A saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim:
algumas considerações 82 4.3. As múltiplas dimensões do processo de saída vivenciado pela Comunidade de Itambi 94 4.4. As expectativas da reterritorialização da Comunidade de Itambi no conjunto habitacional 104 4.5. Resistências, alternativas e a busca por outras racionalidades 109
5. Considerações finais 115 6. Referências bibliográficas 120 Anexos 129
Lista de figuras
Figura 1 – Localização do COMPERJ e sua proximidade da APA de Guapimirim 51 Figura 2 – O COMPERJ e o Arco Metropolitano no contexto da integração regional 52 Figura 3 – Área de Proteção Ambiental de Guapimirim (área verde) – Reserva de Manguezal 59 Figura 4 – Vista aérea da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim 60 Figura 5 – Representação esquemática do distrito de Itambi e da área do Manguezal de Itambi 77 Figura 6 – Rua de terra na entrada da vila (à direita, as casas e ao fundo, um campo de futebol) 78 Figura 7 – Foto realizada durante a entrevista com A. O. Casa do A.O. localizada à direita. À esquerda, o barco utilizado para a coleta atracado 79 Figura 8 – Estabelecimento comercial (no fundo da figura) e alguns moradores sentados em sua frente debaixo de uma grande mangueira 80 Figura 9 – Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 83 Figura 10 – Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de esgoto e drenagem (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 84 Figura 11 – Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro 85 Figura 12 – Imagem de satélite na qual se visualiza o local onde será realizada a recuperação ambiental e que está sendo construído o centro comunitário (área da Bacia, Município de Itaboraí, Rio de Janeiro) 85 Figura 13 – Maquete do Conjunto Habitacional Nova Itambi 86 Figura 14 – Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro 87 Figura 15 – Crianças brincando no campo de futebol de Itambi 96 Figura 16 – Varais de roupa na comunidade 96 Figura 17 – Rua transversal a entrada da rua da comunidade, na qual já pode ser observado canos da CEDAE e a direita da foto as obras já iniciadas do Centro Comunitário 97 Figura 18 – Creche do Conjunto Habitacional já finalizada 97 Figura 19 – Posto de saúde do Conjunto Habitacional já finalizado 98
Figura 20 – BR-493: uma via do Arco Metropolitano 98 Figura 21 – Quintal da moradora J.B. À direita, a construção do Centro Comunitário e parte do abacateiro cortado 99
Renascer da própria força, própria luz e fé, memória
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós, história Somos a semente, ato, mente e voz, magia
Não tenha medo, meu menino povo, memória Tudo principia na própria pessoa, beleza
(Gonzaguinha, Redescobrir)
1. Introdução
Iniciei o trabalho com a Comunidade de Itambi1 no início de 2007 para a
elaboração do projeto final do curso de graduação em Oceanografia da UERJ.
Naquela época, já me angustiavam as distâncias existentes entre as ciências
naturais e as ciências sociais e, da mesma forma, entre os conhecimentos
científico-acadêmicos e os conhecimentos ditos tradicionais. Dessa maneira,
finalizei, no começo de 2008, a monografia intitulada A importância da
articulação dos conhecimentos científicos e tradicionais para a conservação dos
manguezais da APA de Guapimirim2.
Desde o começo dessa pesquisa, a instalação do Complexo Petroquímico do
Estado do Rio de Janeiro (COMPERJ) já era foco de discussão tanto em Itaboraí
como em outros municípios do estado do Rio de Janeiro. Os caranguejeiros de
Itambi, em alguns dos seus relatos, se preocupavam com a entrada dos
investimentos do complexo na região; entretanto, apenas no final do ano de 2007
escutei rumores sobre o desmonte da comunidade “em prol do desenvolvimento”.
Vale ressaltar que naquele momento os moradores por mim entrevistados na
localidade evitavam falar a respeito dessa provável mudança, e a comunidade,
nitidamente, silenciava sobre o assunto. No mesmo período, tive o conhecimento
de um parecer técnico (a ser avaliado mais adiante) que informava que, de fato, a
Comunidade de Itambi seria retirada do seu território atual.
Naquela mesma época, o COMPERJ já era associado (através da divulgação
no site da Petrobrás, em folhetins, pelo Estado, mídia e, inclusive, por ONGs que
atuam no local) às concepções de desenvolvimento e sustentabilidade. A soma
dessas questões que se verificavam no território em questão tornou inevitável o
1 Reconhece-se a existência de uma literatura vasta sobre o conceito de comunidade (ANDERSON, 2008 (1991); CASTELLS, 2000; BAUMAN, 2003;). Entretanto, esse trabalho não discutirá esse termo conceitualmente. A opção pela utilização da denominação Comunidade de Itambi se deu, devido a essa população de caranguejeiros de Itambi já ser assim referenciada em outros trabalhos (ALBUQUERQUE, A.L., 2002; BOTELHO, 2003; MOYSÉS, 2008; PANDEFF, 2009; HERRERA, no prelo), pelo filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, por documentos (PLANO DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001; GIULIANI et al., 2005), em grupos de pesquisa (“Biodiversidade, Áreas Protegidas e Inclusão Social”-LATTES, CNPq, UFRJ; GeTERJ- PUC-RJ) e comumente reconhecida entre os membros dos conselhos gestores do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense (MMACF) e da APA de Guapimirim e ESEC da Guanabara (CONAPAGUAPI), dentro dos quais possuem representantes da comunidade. 2 Monografia do curso de Oceanografia da Faculdade de Oceanografia da UERJ. Defendida em janeiro de 2008 e orientada pelo sociólogo Dr. Gian Mario Giuliani IFCS/UFRJ.
14
prosseguimento da pesquisa e o despertar do meu interesse em realizar esta
dissertação.
A necessidade de uma visão integradora (cultural, política, econômica,
ambiental) e não-dicotômica na relação cultura-natureza foi fundamental para que
essa dissertação fosse realizada no campo da Geografia por sua tendência atual de
integração holística da análise espacial. E em especial, a opção pelo Programa de
Pós-Graduação de Geografia da PUC-Rio pela sua proposta pautada na
interdisciplinaridade no tratamento dos processos ecológicos, sociais e culturais
que ocorrem no espaço, tornou possível a realização desse trabalho.
Dessa maneira, a dissertação analisa o atual processo de instalação do
COMPERJ e a des-re-territorialização (a ser discutida nesse trabalho a partir de
Haesbaert (2004)) da Comunidade de Itambi, localizada no município de Itaboraí,
região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro. Esta comunidade pertence à
Área Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim, o que já mostra a contradição
dos projetos de gestão dos territórios na localidade.
A realidade aqui estudada vem passando por rápidas transformações e
durante a pesquisa observou-se significativas mudanças nas relações comunitárias
de Itambi, o que influenciou em grande medida a metodologia desse trabalho.
A dissertação foi organizada em três capítulos. O primeiro aborda os
principais referenciais teórico-conceituais utilizados nessa pesquisa. O segundo
discute as contradições do modelo de desenvolvimento via COMPERJ, enfatizado
o momento geohistórico vivenciado com a instalação desse pólo petroquímico. E
no terceiro capítulo, busca-se um olhar especificamente na Comunidade de
Itambi, compreendendo como essa vem sendo afetada pelas políticas públicas do
município de Itaboraí. Apesar dessa divisão, a prática e a teoria foram realizadas
conjuntamente no desenvolvimento dessa pesquisa, e os trabalhos de campo,
entrevistas, o levantamento e leitura de documentos, foram realizados em
momentos intercalados com o levantamento e a leitura teórico-conceitual. O olhar
sobre o real e suas visíveis transformações durante a pesquisa fez necessária a
busca freqüente por referenciais teórico-conceituais que servissem não apenas de
instrumentos para a compreensão dessa realidade, mas que participassem e
interviessem nesse real.
15
Houve dificuldades, nos primeiros contatos, no estabelecimento de laços de
confiança com a comunidade, devido a experiências anteriores com outros
pesquisadores, principalmente as desenvolvidas por ONGs. Segundo os próprios
moradores, certas informações da comunidade foram obtidas sem o devido
reconhecimento das pessoas entrevistadas e retorno de benefícios aos moradores.
Contudo, ao iniciarmos a presente pesquisa o contato e a familiarização com a
comunidade já estavam consolidados.
Durante toda a pesquisa, foram realizadas visitas a comunidade, de modo
que o sentimento de confiança foi mantido. As observações diretas e a
continuidade do contato a partir de conversas informais foram privilegiadas na
realização desse trabalho. Desta forma, percebeu-se uma maior abertura dos
moradores, facilitando a compreensão da comunidade como todo.
A partir da compreensão das observações e conversas, foram realizadas
algumas entrevistas gravadas semi-estruturadas (ANEXO 1). As perguntas foram
curtas, pois se privilegiou a fala dos próprios moradores. A escolha pelas pessoas
deveu-se, obviamente, pelos moradores que se disponibilizaram a participar.
Também se tentou entrevistar diferentes faixas etárias, buscando uma
uniformidade numérica entre homens e mulheres. Por último, procurou-se
entrevistar tanto pessoas mais ligadas às lideranças comunitárias quanto aquelas
mais distantes delas. É importante ressaltar, contudo, que por ser uma comunidade
pequena houve a percepção da baixa discrepância entre as posições dos
moradores, que foram muito semelhantes em suas opiniões e interpretações e
falas. Em quase todas as entrevistas gravadas, outros comunitários também
participavam conjuntamente, entretanto foram apenas transcritos os trechos das
pessoas que haviam sido informadas sobre a gravação e me autorizado quanto a
isso. Porém, mesmo estando autorizada a utilizar tais entrevistas, busquei
preservar o máximo possível as identidades dessas pessoas. O último contato com
a comunidade para a realização desse trabalho se deu em fevereiro do corrente ano
(2010).
No segundo semestre de 2009, foram realizadas entrevistas também com
alguns agentes de gestão envolvidos nas políticas públicas do município de
Itaboraí que afetam diretamente a Comunidade de Itambi. Também foram
realizadas entrevistas semi-estruturadas com poucas perguntas curtas, de maneira
16
que também se privilegiou a fala desses gestores e o direcionamento para outras
questões (ANEXO 2). Durante o processo de investigação houve ainda a
participação em uma reunião dos membros do Conselho Gestor da APA de
Guapimirim e da Estação Ecológica (ESEC) da Guanabara - CONAPAGUAPI.
Foram utilizadas ainda algumas respostas do chefe da APA Guapimirim via
e-mail. Também a partir de poucas questões (ANEXO 3), o gestor me enviou suas
respostas em forma de texto. Além disso, tanto o arquiteto e urbanista do
Conjunto Habitacional do PAC como o chefe da APA de Guapimirim me
enviaram diversos documentos via e-mail referentes ao projeto do PAC, o que
inclui dados sobre o Conjunto Habitacional.
Nessa pesquisa também foram utilizados diversos documentos oficiais: o
RIMA do COMPERJ; o Parecer Técnico 53/2007; a Ação Civil Pública do MPF
n°1.30.003.000055/2006-07; a Manifestação técnica sobre os impactos ambientais
potenciais decorrentes da implantação do COMPERJ nas unidades de conservação
federais da região do IBAMA e ICMBio; as atas das audiências públicas do
Empreendimento Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro e da BR 493, entre
outros.
Houve também o levantamento e a leitura de diversos trabalhos realizados
na área de estudo, além do contato permanente com outros pesquisadores que
também realizam trabalhos na região, principalmente do IFCS-UFRJ, PosGeo –
UFF e das Ciências Ambientais – UFF, e a participação no Seminário
Internacional Direito à Cidade nos Municípios do CONLESTE e os objetivos de
Desenvolvimento do Milênio, realizado pela ONU-HABITAT, Petrobras, UFF e
COLESTE que contribuíram para o enriquecimento dos dados e compreensões
acerca desta dissertação.
Como dito anteriormente, o COMPERJ insere-se no território da
comunidade em questão trazendo consigo concepções de desenvolvimento e
sustentabilidade no seu discurso. Nessas concepções, as contradições entre as
potencialidades locais e o discurso modernizante do complexo são nítidas e
devem ser analisadas para que projetos de desenvolvimento não continuem a ser
implementados de maneira aleatória em relação às transformações socioespaciais
dos grupos territorializados nos espaços. Um olhar atento sobre a realidade da
17
Comunidade de Itambi torna-se necessário para que as populações de diversas
localidades possam ser compreendidas como parte inerente desse
desenvolvimento sob uma perspectiva da “diferença e singularidade” que projetos
modernizadores devem considerar para que transformem as realidades locais de
acordo com os interesses de quem vive, trabalha e concebe os territórios (SILVA,
2007).
Busca-se assim compreender a realidade estudada à luz do conceito de
território, na medida em que esse conceito servirá tanto como instrumento para
interpretação dessa realidade quanto como instrumento de uso, transformando o
real que ele mesmo reconhece (HAESBAERT, 2008).
No capítulo 1 será realizada uma análise teórico-conceitual fundamentada
na leitura crítico-reflexiva da bibliografia referente aos conceitos/noções de
território, territorialidade, desenvolvimento e sustentabilidade. As discussões
passarão ainda pelas reflexões acerca das concepções de identidade territorial e
autonomia.
Buscar-se-á, nesse capítulo, identificar os diferentes caminhos e visões
acerca dos conceitos / noções de desenvolvimento e sustentabilidade, suas
representações e discursos hegemônicos especificando quais deles são
privilegiados no âmbito da intelectualidade brasileira recente. Entende-se assim o
caráter reflexivo da concepção de sustentabilidades para os desenvolvimentos de
acordo com as perspectivas particulares dos territórios, que emanam cultura e
história específicas e, portanto, outras racionalidades ligadas à ideia de qualidade
de vida.
No capítulo 2, o COMPERJ será apresentado do ponto de vista da empresa,
a partir de fontes dadas pela própria estrutura gestora do complexo, como o
Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), o site, folhetins e documentos oficiais
da Petrobras, as ONGs locais e a mídia. Em seguida, averiguar-se-ão as
concepções de desenvolvimento e sustentabilidade que os gestores do COMPERJ
se baseiam, na medida em que se compreenderão as ações e discursos voltados
para a instalação do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro no
território em questão. Dessa maneira, será feita uma análise crítico-reflexiva em
18
relação ao pólo, em que se abordarão as contradições existentes do projeto de
desenvolvimento via COMPERJ com as realidades de gestão local.
Por fim, no capítulo 3 será realizada uma caracterização da comunidade e
sua relação com o seu lugar. As potencialidades e perspectivas serão identificadas
e analisadas frente ao possível deslocamento do grupo social para outra realidade
e à entrada do COMPERJ no município de Itaboraí. Serão abordados os motivos
dessa mudança, a opinião dos moradores de como vem sendo o processo (a saída
deles dos mangues e a entrada do COMPERJ no município, a des-re-
territorialização de uma maneira geral) e a transparência das políticas públicas do
município que os envolvem diretamente. Procura-se assim alertar para as
contradições e riscos embutidos nas políticas feitas por outros grupos que não
sejam os diretamente envolvidos nestas políticas, e se essas de fato contribuirão
para uma melhor qualidade de vida e mais justiça social para essa população.
A preocupação central é então conceber, a partir das experiências desses
sujeitos, outras racionalidades para projetos de gestão na localidade, a partir de
estratégias que visem à justiça social e qualidade de vida, concepção que também
deve ser entendida pela vivência, ideais e especificidade da própria comunidade.
2. Territorialidades, Desenvolvimentos e Sustentabilidades: algumas reflexões acerca de suas funcionalidades como ferramentas políticas
A comunidade de caranguejeiros, localizada em Itambi, distrito do
município de Itaboraí, na região metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ), na
parte leste da Baía de Guanabara, e sob jurisdição da Área de Proteção Ambiental
de Guapimirim, será des-re-territorializada3 devido à entrada do maior
empreendimento da Petrobras4 na RMRJ, o Complexo Petroquímico do Estado do
Rio de Janeiro (COMPERJ).
A população residente atualmente em Itambi ocupa casas nos mangues da
APA de Guapimirim e será transferida de seu lugar de vida, sobrevivência e
convivência para prédios de um conjunto habitacional que está sendo construído
na rodovia BR-493, no estado, que será um dos segmentos do futuro Arco
Metropolitano do Rio de Janeiro.
Ao mesmo tempo, o complexo traz consigo, pelo seu Relatório de Impactos
Ambientais (RIMA), concepções acerca de desenvolvimento, modernização e
sustentabilidade que são difundidas pelo site da Petrobras, em seus folhetins
informativos, Estado, mídia e por Organizações Não-Governamentais (ONGs) que
atuam no local. São visíveis, perante uma análise cuidadosa destes meios de
informação, as contradições entre as potencialidades locais e o discurso do
COMPERJ, de modo que se torna necessária uma reflexão crítica sobre tal
condição a fim de que projetos de desenvolvimento passem a considerar de fato as
possíveis transformações socioespaciais das populações territorializadas nos
espaços visados pela atividade econômica em questão.
O território estudado abarca múltiplas dimensões (cultural, política,
econômica e as da natureza), o que torna necessária uma visão integradora e não-
3 Esse trabalho utiliza des-re-territorialização hifenizado baseado em Rogério Haesbaert, já que a partir do autor, entende-se que toda desterritorialização está acompanhada de reterritorialização(ões). 4 A Petrobras (corporação majoritária no consórcio empresarial criado para viabilizar o empreendimento) apresenta a obra em seu site, em diversos meios de comunicação e pelo próprio RIMA do COMPERJ como o maior investimento individual de sua história, cerca de oito bilhões de dólares (Disponível em < http://www.comperj.com.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010).
20
dicotômica que evite a separação entre cultura-natureza e material-imaterial. A
busca pela compreensão da realidade estudada à luz do conceito de território
significa que o conceito não apenas servirá de instrumento para interpretação e
significação de uma realidade “em devir”, como o próprio é componente dessa
realidade. Esse é também instrumento de uso, já que intervém nessa realidade “em
processo”, participando e modificando, ou seja, transformando o “real”, que ele
mesmo “re-conhece” (HAESBAERT, 2008).
Nesse sentido, compreende-se aqui o território como o lugar de luta,
resistência e busca por melhores condições de vida, estas entendidas como
qualidade de vida, justiça social e desenvolvimento(s)5. Entende-se que a
territorialidade (a ser discutida mais adiante) possa ser potencializada como
estratégica política na busca desse(s) desenvolvimento(s) com mais autonomia
dos sujeitos envolvidos.
Acredita-se que o olhar sobre a territorialidade da Comunidade de Itambi
seja necessário para que outras populações do Brasil também possam ser
entendidas como singulares, ou seja, com culturas, interesses, necessidades e
desejos diferentes e particulares, mesmo estando inseridas, em maior ou menor
grau, em um contexto nacional e global. Dessa maneira, espera-se contribuir para
que os projetos de desenvolvimento transformem as realidades locais de acordo
com os interesses das populações diretamente envolvidas.
Ainda neste capítulo trabalharemos também com a compreensão das
representações e discursos hegemônicos dos conceitos/noções de
desenvolvimento e sustentabilidade. A partir dela, pode-se expor as bases das
concepções de desenvolvimento e sustentabilidade sobre as quais os gestores do
COMPERJ se apóiam e suas contradições com o território, o que será mais
amplamente discutido no capítulo 2.
Como um contraponto, serão analisadas reflexões acadêmicas que prezam
pela necessidade de pensarmos as sustentabilidades para os desenvolvimentos
pautadas nas particularidades do território, ou seja, em outras racionalidades não-
hegemônicas que são correntemente ignoradas.
5 Explicar-se-á mais detalhadamente o que esse trabalho entende pelo conceito/noção de desenvolvimento no decorrer deste capítulo.
21
Neste sentido, as discussões centrais do presente capítulo passarão pelas
reflexões acerca dos conceitos/noções de território/territorialidade, identidade
territorial, autonomia, desenvolvimento local e sustentabilidade(s), todos eles
entendidos como instrumentos de intervenção no real através da organização e
luta pela cidadania e participação na gestão do diferente e do desigual (SAQUET,
2008).
2.1. A Busca da(s) territorialidade(s) para desenvolvimento(s) com maior autonomia
A abordagem territorial aqui proposta enfatiza as relações de poder que
constituem o território. Estas, baseando-se em Haesbaert (no prelo, p.09-10),
abrangem desde a natureza estatal-administrativa e político-econômica até a mais
simbólica, o que inclui a própria identidade territorial da Comunidade de Itambi
entendida aqui também como instrumento de poder.
Entende-se assim que o território não envolve unicamente o tradicional
poder político. O mesmo autor (2007) compreende que o território diz respeito
tanto ao poder na dimensão mais explícita, de dominação, até a mais implícita, de
apropriação e, baseado em Lefèbvre6, entende que os processos de dominação
estão vinculados a dinâmicas mais concretas, “funcionais”, de valor de troca,
enquanto que os de apropriação seriam os relacionados aos processos mais
simbólicos, do “vivido”, ao valor de uso. O território, dessa maneira, estaria
sempre dentro de um continuum, entre a dimensão de dominância “funcional”, em
um extremo, e de dominância simbólica, em outro extremo, dois pólos que, por
sua vez, não necessariamente se opõem.
Entretanto, como se observa no caso da Comunidade de Itambi, o “território
funcional e simbólico” de interesses de certos grupos ao imporem a des-re-
territorialização dessa comunidade, invade “as funções” da comunidade,
refazendo e interferindo, dessa maneira, na própria re-configuração das
construções identitárias desse grupo, ou seja, interfere no “vivido” dessa
comunidade.
6 Haesbaert (2007, p.21) afirma que embora Lefèbvre se refira sempre a espaço e não a território, ele não trata o espaço de maneira genérica e abstrata, e sim como um espaço-processo. Assim, o espaço, enquanto concebido, percebido e vivido, é sempre um espaço socialmente construído.
22
Seguindo esse raciocínio, Rua (2007) também baseado em Lefèbvre,
compreende então que o espaço (feito território), ao mesmo tempo em que traz
simbolismos do cotidiano, do vivido, do particular, pode também transmitir
mensagens de poder e de dominação hegemônica, “expressões do geral, do
concebido que, muitas vezes, são aceitas/impostas como única alternativa”
(p.162). Nesse sentido, o COMPERJ traz consigo esse discurso, visto como uma
“possibilidade única”, até então “nunca conquistada”, e “desejada por todos”, de
“desenvolvimento”, “progresso”, “modernização” na região metropolitana do Rio
de Janeiro, em especial no município de Itaboraí. Tal ideário passa a ser divulgado
pelo Estado e pelos interesses de alguns grupos em seus diversos meios de
comunicação, e a força com que esse discurso é imposto e circulado sem
questionamentos e alternativas faz com que grande parte da população local, do
estado do Rio de Janeiro e do Brasil o aceitem e contribuam para a sua
proliferação.
Então, como Saquet (2007) evidencia, os mediadores da reprodução do
poder e do controle do/no espaço desses grupos hegemônicos, são “a formação de
redes de circulação e comunicação que ligam o singular ao universal e vice-versa,
interferindo dessa forma diretamente nas territorialidades dos diferentes
indivíduos e classes sociais” (p.129). Isto pode levar mesmo ao “fim” de certos
grupos e territorialidades e à perda dos seus principais referências simbólicos,
impossibilitando a própria sobrevivência dos indivíduos.
Em alguns relatos, não apenas dos moradores da Comunidade de Itambi,
como também dos gestores das unidades de conservação envolvidos no projeto de
modernização, Itambi está fadada a desaparecer. A perda do território significa
assim o fim do próprio grupo com a desvinculação direta da funcionalidade com a
identidade.
Haesbaert (2007, p.23), baseado em Milton Santos (2000) e Jean Gottman,
diferencia o território para os “atores hegemônicos” do território para os “atores
hegemonizados”. Nessa distinção, o primeiro trata o território como recurso,
como acumulação e lucro em nosso sistema de produção, ou seja, “um meio para
obter um fim”, estando esses atores, muitas vezes, desvinculados com o território.
Já o segundo compreende o território como abrigo, proteção, ou seja, “um fim em
23
si mesmo”. Enquanto o primeiro pode abstrair-se da identificação com o território,
para o segundo, a perda do território pode significar “desaparecer”.
Contudo, o chefe da APA de Guapimirim e o chefe da Estação Ecológica da
Guanabara vão mais além: eles acreditam que com a instalação do COMPERJ no
local, mesmo que as pessoas permaneçam em seu território de vida de até então, a
comunidade “desapareceria” da mesma forma, já que seus membros perderiam
seus referenciais simbólicos, seus recursos materiais de sobrevivência e a
afetividade com o território. Ou seja, a Comunidade de Itambi seria forçada, de
qualquer maneira, a se deslocar em um futuro próximo.
Observa-se assim, a partir das interpretações tanto da própria comunidade
como dos gestores das Unidades de Conservação (UCs), que a Comunidade de
Itambi estaria vivenciando uma precarização territorial tanto no sentido simbólico-
cultural como no político-econômico. Isso nos leva diretamente à discussão de
Haesbaert (2004) quando o geógrafo relaciona desterritorialização à exclusão
social. A partir das interpretações dos parágrafos anteriores compreende-se que os
territórios sejam também recursos inerentes à reprodução social e, dessa maneira,
a exclusão social e a efetiva pobreza equivaleriam à exclusão territorial. A partir
daí, a desterritorialização deve ser vista no seu sentido mais forte e mais estrito:
(...) a desterritorialização como exclusão, privação e/ou precarização do território enquanto “recurso” ou “apropriação” (material e simbólica) indispensável à nossa participação efetiva como membros de uma sociedade (HAESBAERT, 2004, p.315).
Dessa maneira, segundo o autor, a desterritorialização em seu aspecto social,
tão pouco enfatizada na discussão de desterritorialização, é a que poderia carregar
melhor essa noção, ou seja, é quando os grupos, de fato, perdem o seu referencial
simbólico, seu lugar de abrigo, proteção e sobrevivência.
Entretanto, sendo justos ao autor, essa desterritorialização nunca é absoluta,
sendo sempre acompanhada de reterritorialização(ões)7. Nesse sentido, a
Comunidade de Itambi vive efetivamente um processo de des-re-territorialização,
7 Discussão central em seu livro de 2004, O Mito da Desterritorialização, no qual o autor afirma que não estaríamos vivendo uma desterritorialização, como muitos defendiam/defendem, como Virilo e Badie, e sim vivenciando uma multiterritorialidade. A interconexão de territórios-zona, mais tradicionais, com territórios-rede, mais envolvidos pela fluidez e a mobilidade, nos leva, dessa maneira, a expressão da multiterritorialidade vivenciada por diferentes sujeitos, porém mantendo a sua singularidade nos diferentes lugares, assim como afetando diferentemente e desigualmente os diferentes lugares e grupos sociais.
24
sendo a análise deste processo necessária para detectar sua precarização territorial,
tanto no sentido da dimensão político-econômica do território quanto da dimensão
simbólico-cultural.
Busca-se nesse trabalho, a partir, principalmente, das falas dos moradores da
comunidade em estudo, compreender o processo de desterritorialização dos
mangues da APA de Guapimirim, analisando tanto conseqüências que já podem
ser visualizadas como o próprio imaginário dessa população no que diz respeito
ao futuro do grupo. Ou seja, busca-se entender esse processo desde o sentimento
da perda gradual já concretamente efetivada de certos referenciais simbólicos (o
abrigo, convivência e afetividade com outros moradores) até a do controle do
território. No capítulo 3, um olhar nas múltiplas dimensões dos processos
econômico-político e simbólico-cultural será realizado mais detalhadamente.
Pode-se assim compreender o medo da desterritorialização como exclusão
social. Entretanto, seguindo com o raciocínio de Haesbaert (2004), é importante
atentar para a compreensão da noção de exclusão. Nas palavras do autor, esta:
(...) deve ser sempre qualificada, adjetivada (...) jamais deve ser vista na perspectiva conservadora que faz uso do termo para legitimar medidas paliativas de “reinserção” social, sem questionar as condições de (in)justiça social, (in)quidade econômica, (falta de) autonomia política e reconhecimento cultural dos grupos sociais nela envolvidos (p.319)
Essa racionalidade sobre a exclusão pode servir de base para discursos e
estratégias de determinados grupos que agem de acordo com interesses próprios
alegando estarem a serviço do “bem comum” de muitos, sem que estes sejam
consultados ou participem das decisões sobre a sua própria existência. A própria
re-territorialização da Comunidade de Itambi dos mangues para um conjunto
habitacional é justificada em alguns documentos de gestores envolvidos na obra
do Programa de Aceleração do Crescimento8 (PAC) e de outros das UCs
envolvidas na política de “bem comum” da comunidade. Entretanto, esse “bem”
para comunidade é questionado nas próprias falas dos moradores da Comunidade 8 Segundo o site do Governo Federal, o PAC além de ser um programa de expansão do crescimento, é considerado um novo conceito de investimento em infra-estrutura, já que aliado a medidas econômicas tem o objetivo de estimular os setores produtivos e, ao mesmo tempo, levar benefícios sociais para todas as regiões do país (Disponível em: <https://www.pac.gov.br/>, Acesso em 15 de abril de 2009). Ver os investimentos do PAC no Estado do Rio de Janeiro: http://www.brasil.gov.br/pac/.arquivos/relatorioRJ_090409.pdf.
25
de Itambi que alegam não terem sido consultados, mas apenas comunicados de
sua futura remoção. Alguns moradores argumentam que eles deveriam ter sido
perguntados sobre o que eles pensam sobre o que é o “bem” deles9. Este ponto
será aqui retornado e trabalhado nos capítulos seguintes.
A partir disso, torna-se agora necessário levantar a questão da identidade
territorial, baseando-se na reflexão de Haesbaert (2007a). Para este autor, essa
identidade é uma estratégia de luta e/ou resistência, o que deve ser ampliado pela
visão de Saquet (2007) para quem deve ser destacado o caráter político da
identidade como possibilidade de transformação social.
Como Haesbaert (2007a) nos lembra, a questão não é a discussão da
veracidade ou falsidade de uma construção identitária, mas sim de sua eficácia
política. A identidade é ligada diretamente a ações de natureza política e
paralelamente também se constitui em um recurso por um mínimo de
reconhecimento, “tendo em vista romper com a indiferença e o ‘desconhecimento’
que a massificação (em especial, mas não unicamente, da pobreza) promove”
(HAESBAERT, no prelo, p.4). Seria, dessa maneira, o reconhecimento da
diferença.
Encontrou-se nas falas dos moradores da Comunidade de Itambi a afirmação
e reivindicação de sua identidade, as quais podem aqui ser interpretadas como
estratégias de luta, que incluem a luta pelo próprio território em sua dimensão
material. Haesbaert (2007a), baseado em Lévi-Strauss (1977), afirma que de
algum modo a luta pela afirmação das diferentes identidades tem suas causas e
consequências materiais, ou seja, “é entre aqueles que estão mais destituídos de
seus recursos materiais que aparecem formas as mais rigorosas de apego a
identidades territoriais ou ‘territorialismos’” (HAESBAERT, 2007, p.23).
O mesmo grupo e/ou comunidade pode abrir-se ou fechar-se em diferentes
tempos históricos. A busca pela legitimação de uma identidade mais fechada, ou
mais aberta, é consequência de sua estratégia de luta e resistência, e é aí que a
territorialidade pode ser potencializada na busca por desenvolvimento(s).
9 Ressalta-se aqui que esse é apenas um dos argumentos para a saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim para o conjunto habitacional. Serão discutidos, mais detalhadamente, os motivos e as justificativas da mudança da comunidade no capítulo 3 dessa dissertação.
26
Pode-se perceber também nos relatos dos moradores da Comunidade de
Itambi uma sobrevalorização de recursos simbólico-identitários. Os
caranguejeiros falam sobre a perda da “referência do caranguejo”, sobre o fato de
já estarem acostumados a morar no local (em casas nos mangues), se queixam que
perderão sua tranquilidade, questionam onde plantarão suas árvores, ficarão seus
barcos (que ficam hoje atracados atrás de suas casas), colocarão suas galinhas,
abordam a perda da sombra e do espaço conquistados, alegam que terão que
conviver com pessoas que não estão acostumados, preocupando-se até com o
campeonato de futebol que é realizado uma vez por ano na comunidade. A busca
pela valorização de referenciais simbólicos pela afirmação de certas diferenças
pode constituir de fato a luta pela sua própria sobrevivência, assunto também a ser
tratado no capítulo 3. Da mesma forma, a territorialidade da Comunidade de
Itambi, se potencializada, pode servir de instrumento político para a
transformação social. Tal afirmação se coaduna com a afirmação de Haesbaert
(2007a) para quem a territorialidade tanto pode buscar constituir laços puramente
simbólicos “como levar a ações efetivas na construção ou na defesa e/ou
manutenção material de espaços de identidade” (p.44).
Mesmo que a relevância da identidade se dê pela sua eficácia política e não
propriamente pela sua verdade, no caso da Comunidade de Itambi, a referência a
recortes espaciais reais pode auxiliar, e muito, a eficácia dos discursos identitários
(HAESBAERT, 2007a, p.44).
A territorialidade da Comunidade de Itambi, ou seja, as suas relações sociais
(econômicas, políticas e culturais), atividades diárias e relações com a natureza,
pode ser valorada e utilizada por esse grupo como estratégia político-cultural
(SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009, p.8). Nesse sentido, Dematteis (2008)
distingue territorialidade passiva e ‘negativa’ de territorialidade ativa e ‘positiva’,
a partir das diferentes abordagens dessa concepção por Sack (1986) e Raffestin
(1981, 2007). O primeiro autor a entende como “a tentativa, por um indivíduo ou
grupo, de atingir/afetar, influenciar ou controlar as pessoas, fenômenos e
relacionamentos, pela delimitação e afirmação do controle sobre uma área
geográfica. Esta área será chamada território (...)” (SACK, 1986, p.19). O
segundo, juntamente com outros autores, entende-a como:
27
Conjunto de relações que nasce em um sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo, com vistas à maior conquista possível de autonomia, compatível com os recursos de um sistema (...) conjunto de relações que uma sociedade, e por isso os indivíduos, têm com a exterioridade e com a alteridade para satisfazer os próprios desejos com a ajuda de mediadores, na perspectiva de obter a maior autonomia possível, tendo em conta os recursos de um sistema (DEMATTEIS, 2008, p.34).
Nesse sentido, a primeira partiria de estratégias de controle e normas
associadas, excluindo sujeitos e recursos, e a segunda visaria estabelecer a
construção de estratégias de inclusão a partir “de ações coletivas territorializadas e
territorializantes dos sujeitos locais” (p.35). O autor, porém, ressalta que nem
sempre os objetivos da territorialidade passiva são negativos, já que antes de tudo
é “com a finalidade do bem” que se exerce o controle. Entretanto, com a
transferência da Comunidade de Itambi dos mangues para um conjunto
habitacional, este ‘bem’ é delegado a partir de interesses de determinados grupos,
e não a partir da autonomia e dos interesses das populações locais “com a
finalidade do bem”.
Souza (2001), baseado em Castoriadis (1983), define autonomia,
contrapondo-a a heteronomia. Segundo ele, a autonomia apresenta duas faces:
...a individual (capacidade psicológica e possibilidade material e institucional efetiva de o indivíduo estabelecer fins para a sua existência e persegui-los de modo lúcido, em igualdade de oportunidades com os outros indivíduos da mesma sociedade) e a coletiva (presença de instituições sociais que garantam igualdade efetiva - e não apenas formal - de oportunidades aos indivíduos para a satisfação de suas necessidades e, muito especialmente, para a participação em processos decisórios relevantes na regulação da vida cotidiana) (SOUZA, 2001, p.159).
Assim sendo, a autonomia de cada comunidade pode ser a construção de
outras racionalidades “de baixo para cima”, ou seja, a partir da participação social
inerente aos seus valores culturais e seus interesses, e não como normalmente é,
“de cima para baixo”, com o domínio do mercado e do Estado sobre os povos,
ditando as leis e normas às sociedades (heteronomia). Contudo, como nos lembra
o geógrafo brasileiro, devemos ter em mente que a conquista da autonomia é um
processo e que o diálogo uma vez buscado entre culturas distintas não deve ser
rejeitado. (SOUZA, 2001).
Seguindo esse raciocínio, Souza (2001, p.163-164) acredita que a
territorialidade autônoma seja então a gestão radicalmente democrática do
28
território e a capacidade da defesa do mesmo, incluindo seus simbolismos, em
face de ameaças externas. Assim como o autor, não se defende aqui uma auto-
suficiência da Comunidade de Itambi sob um velho anarquismo, mas sim a
conquista crescente de mais direitos e liberdades para o maior número de pessoas
possíveis. Nesse sentido, compreende-se aqui que a territorialidade seja a
mediação, relação social, prática e cognição em que se acrescenta a necessidade
da qualidade de vida, o que inclui qualidade ambiental, na geração de relações
autônomas (SAQUET, 2007). Dessa maneira, a territorialidade de Itambi inclui
também as concepções de qualidade de vida do grupo que a constitui e as suas
relações com a natureza exterior, as quais também obviamente terão um caráter
singular.
Dessa maneira, a abordagem territorial desse trabalho procura reconhecer o
movimento, contradições, natureza, relações de poder e identidade territorial, os
quais certamente necessitam de organização política, na busca pela autonomia,
para o(s) desenvolvimento(s).
Cada indivíduo, cada família, cada instituição pública ou privada, cada unidade produtiva e de consumo, de vida produzem relações históricas e multiescalares, de poder, territoriais, territorialidades que podem ser potencializadas para um desenvolvimento 10com mais autonomia, que incorpore a distribuição de terras, de capital, as diferenças culturais, a vida em sociedade e em natureza, sem medo, vícios, armadilhas (SAQUET, 2007, p.176).
Nesta citação do autor, o vocábulo ‘desenvolvimento’ foi sublinhado para
que se comece a caracterizar o desenvolvimento desejado neste trabalho.
Acredita-se, como Saquet (2007), que esse processo deva ser identificado
localmente, de acordo com as necessidades dos indivíduos e a autonomia de cada
lugar, sem rejeitar ou desconhecer o outro. O desenvolvimento deve ser sempre
territorial, construído com a participação dos diferentes sujeitos, interesses e
necessidades. A territorialidade da Comunidade de Itambi assim pode ser
potencializada como estratégia de organização e luta na busca pelo seu próprio
desenvolvimento territorial.
Acredita-se que mesmo com as diversas críticas nas últimas três décadas ao
chamado “mito do desenvolvimento”, onde a idéia de desenvolvimento foi
rejeitada como se referisse, unicamente, à hegemonia do crescimento econômico 10 Grifo nosso.
29
somada à modernização tecnológica11, é possível re-contextualizarmos o termo
sob uma forma alternativa, a de desenvolvimento socioespacial12, conforme
concebe Souza (2003).
Sob esta reflexão, o COMPERJ insere-se no território da comunidade em
questão trazendo consigo concepções de desenvolvimento e sustentabilidade no
seu discurso. Entretanto, contradições entre as realidades locais e as propostas do
complexo industrial são percebidas, o que torna necessária uma revisitação das
noções de desenvolvimento socioespacial e sustentabilidade.
Nesse momento, analisar-se-á o conceito/noção desenvolvimento e em
seguida o de sustentabilidade, compreendendo o papel de suas representações e
discursos, defendendo-se a busca por modelos de desenvolvimentos e
sustentabilidades diferentes e singulares, alternativos aos impostos até então, nos
diferentes lugares.
2.2. Do desenvolvimento uno ao(s) desenvolvimento(s) múltiplo(s)
Nesse momento merecem destaque as reflexões de Celso Furtado, que
durante toda a sua trajetória de vida intelectual, acadêmica e de gestão preocupou-
se em pensar e “construir” o Brasil em consonância com as diferentes épocas de
sua formação. A busca do/pelo desenvolvimento, salientando-se a plena
participação dos indivíduos nos processos decisórios, sempre esteve presente em
seus escritos, nos quais da mesma maneira sempre afirmava as diversidades e
singularidades existentes nos diferentes lugares do Brasil, os seus “diferentes
Brasis”. Seria injusto então se a discussão aqui proposta não começasse a partir
das concepções do célebre economista brasileiro, já que a pesquisa em curso foi
pensada, desde seu início, a partir das leituras de sua obra. Além disso, acredita-se
e reforça-se a importância do legado do economista para a construção de um
Brasil democraticamente mais justo.
11 Um dos autores que nega a própria idéia de desenvolvimento, é Porto-Gonçalves (2006), entendendo-a unicamente como nome-síntese da idéia de dominação da natureza e trabalhando com a ideia des-envolver, o que tira o envolvimento (a autonomia de cada povo e cultura). 12 Souza (2003) discute no livro ABC do desenvolvimento urbano o conceito/noção de desenvolvimento de maneira introdutória e didática. O autor afirma que o espaço social foi com freqüência, totalmente ou quase totalmente, esquecido pelos teóricos do desenvolvimento e defende que o desenvolvimento que leve em conta os interesses legítimos de toda uma sociedade, devendo ser socioespacial.
30
Furtado (1978) nos lembrava das ambigüidades inerentes à idéia de
desenvolvimento, em que o mesmo conceito / noção é utilizado para processos
históricos diferentes, salientando ainda que o processo de desenvolvimento não
possa existir sem que haja a liberação criadora de um povo. O autor supracitado
acredita que a “modernização” afastou-se das necessidades mais elementares da
população. Dessa maneira, os obstáculos à passagem da simples modernização ao
desenvolvimento cimentam-se na esfera social (FURTADO, 1984).
Em 1962, Furtado nos afirmava que “acima de tudo devemos ter um plano
de desenvolvimento econômico e social à altura de nossas possibilidades e em
consonância com os anseios de nosso povo” (p.32). Naquele momento, o autor já
nos alertava sobre a utilização de modelos de desenvolvimento fechados e pré-
fabricados em outras realidades para as soluções dos nossos problemas.
Acreditava que deveríamos buscar, em nossa realidade, uma política que
orientasse o desenvolvimento do país.
O economista, em 1978, já defendia que, em muitos lugares, o que incluía o
Brasil, o processo de modernização significava ocidentalização, ou seja, o
perecimento dos valores das culturas locais. Na continuidade dessa ideia, Rua
(2007) compreende, a partir de Latouche (1994), que o trinômio modernização-
progresso-desenvolvimento é sinônimo de Ocidentalização, sendo o Ocidente
muito mais uma noção ideológica do que uma noção meramente geográfica. Da
mesma maneira, Celso Furtado acreditava que a civilização industrial poderia ser
lida como “uma crônica do avanço da técnica”, ou seja, todas as formas criativas
seriam subordinadas à racionalidade instrumental (1978, p.78).
O projeto civilizatório do Ocidente, de acordo com Rua (2007), formado
pelo tripé modernização-progresso-desenvolvimento, ao se tornar hegemônico foi
imposto a todos os cantos do globo. “O desenvolvimento passou assim a fazer
parte do próprio imaginário social e os seus discursos pareciam ‘colonizar’ a
realidade” (p.145).
Rua (2007), baseado em Escobar (1995), acredita que o colonialismo e o
desenvolvimento introduziram uma violência moderna engendrada por meio de
representações, tornando ela mesma uma fonte de identidade. E mesmo com as
diversas críticas, a partir dos anos 1980, a essas representações que se tornam
31
dominantes e “colonizam a realidade”, o discurso do mercado e do neoliberalismo
reafirmam a visão do desenvolvimento como modernização (p.145-146). Segundo
Rua (2007), a modernização seria a base concreta da modernidade, tendo como
conceito-gêmeo o progresso13. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a ambos
foi acrescentado o conceito síntese desenvolvimento. Nas palavras do autor:
Evolucionista, como os anteriores, de caráter sempre positivo, como os dois conceitos que o têm acompanhado (progresso e modernização), o desenvolvimento tem se mostrado ainda mais forte ideologicamente. Além do caráter positivo e evolucionista, sintetiza, também, um projeto civilizatório ocidental que coloca como instrumento operativo de um paradigma a ser seguido por todos (RUA, 2007, p.149).
Muitos pós-colonialistas14 trazem a cultura para o centro nos estudos de
desenvolvimento e como Rua (2007) ressalta essa abordagem é importante para
enfatizar outras dimensões além da econômica; a partir dessa racionalidade, essa
pesquisa ao analisar o projeto de desenvolvimento via COMPERJ na RMRJ,
verifica outras dimensões, o que inclui assim os próprios valores da Comunidade
de Itambi, seus recursos simbólicos-identitários e sua relação com a natureza
exterior. Entretanto, não podemos cair no culturalismo e deixarmos o econômico
de lado, vendo a cultura como uma dimensão autônoma, a-histórica.
A partir de uma análise crítica da ocidentalização imposta ao mundo em suas
territorialidades dominantes, percebem-se as histórias de alguns, impostas a todos.
Nessa concepção, ocorre não apenas a repressão do espacial como da
possibilidade de outras temporalidades, de outras trajetórias que sejam diferentes
13 Segundo Furtado (2000), “as raízes da idéia de progresso podem ser detectadas em três correntes do pensamento europeu que assumem uma visão otimista da história a partir do século XVIII. A primeira delas filia ao Iluminismo, que concebe a história como uma marcha progressiva para o racional. A segunda brota da idéia de acumulação de riqueza, na qual está implícita a opção de um futuro que encerra uma promessa de melhor bem-estar. A terceira, enfim, surge com a concepção de que a expansão geográfica da influência européia significa para os demais povos da Terra, implicitamente considerados ‘retardados’, o acesso a uma forma superior de civilização (p.9). 14 A partir de Sousa Santos (2004), entende-se por pós-colonialismo um conjunto de correntes teóricas e analíticas, com forte implantação nos estudos culturais, presentes hoje em todas as ciências sociais, que dão primazia teórica e política às relações desiguais constituídas historicamente no colonialismo entre os países do Norte e do Sul para explicação e/ou compreensão do mundo contemporâneo. Essa corrente de pensamento acredita que mesmo com o fim do colonialismo enquanto relação política há ainda colonialismo enquanto relação social, enquanto mentalidade e forma de sociabilidade autoritária e discriminatória. Hall (2003) afirma que uma das principais críticas aos pós-colonialistas seria a ausência em seus textos do relacionamento do pós-colonialismo com o capitalismo global. Como exemplo de autores pós-coloniais, destacamos o historiador e crítico literário palestino Edward Said e seu livro O Orientalismo (1978).
32
do modelo ocidental europeu. A importância dada à dimensão cultural está
justamente nesse ponto:
(...) colocando-a no plano da econômica, política, simbólica ou ecológica, pretendemos lembrar a importância dessa dimensão para análise do desenvolvimento como um processo imposto a partir de um autodenominado centro mundial (Ocidente/capitalismo) (RUA, 2007, p.183).
Portanto, a busca do/pelo desenvolvimento no território estudado deve assim
levar em conta as características e os modos de vida locais. Dessa maneira, nos
perguntamos: os gestores do COMPERJ consideraram ou estão considerando os
valores das populações que lidam e vivem dos/nos mangues da região?
Entende-se assim, a partir de Souza (1996), que só teria sentido falar em
“desenvolvimento” se esse se distanciasse da conotação teológica, etnocêntrica e
capitalística, assim como da sua idéia-irmã de “progresso”. Desenvolvimento
implica, segundo o autor, uma idéia de valor, um objetivo ou objetivos a serem
alcançados, entretanto, esses fins não significam um “estágio final” ou que exista
um certo paradigma e uma certa trajetória “evolutiva” (p.10).
Não existe, dessa maneira, uma “nova teoria” para o desenvolvimento
territorial da Comunidade de Itambi. Os objetivos almejados por esse grupo
deveriam assim ser buscados a partir do juízo de valor dado pela própria
comunidade, ou seja, a partir dos interesses e das necessidades dessa população
nos seus diferentes tempos históricos. Dessa maneira, só terá sentido falar em
qualidade de vida e justiça social para a Comunidade de Itambi, se essas
concepções também forem construídas de “baixo para cima”, em outras palavras,
se também forem concebidas a partir da própria comunidade. Obviamente, assim,
os próprios moradores da Comunidade de Itambi devem ter voz ativa nas decisões
que afetam e interferem “suas funções” e seu “vivido”.
Dessa forma, não existem outras soluções homogeneizadoras para a
diversidade e complexidade do “real”. O projeto de civilização ocidental
(modernização / desenvolvimento) não pode ser simplesmente substituído por
outras generalizações. Souza Santos (2004), trabalhando com a concepção de
emancipação social15, defende que esta deva ser reinventada, “indo mais além da
teoria crítica produzida no Norte e na práxis social e política que ela subscrevera” 15 Concepção ocidental, como nos alerta Rua (2007).
33
(p.6). O autor critica o universalismo e historicismo, enfatizando a possibilidade
de modernidades alternativas. Entretanto ele afirma, tal como Rua (2007), que não
devemos buscar uma teoria geral para emancipação social, ou seja, devemos
pensá-la em sua pluralidade, em emancipações construídas a partir da participação
dos diferentes povos. Assim sendo, a emancipação social da Comunidade de
Itambi só terá sentido se for pensada e buscada a partir da participação dos
próprios moradores da comunidade.
Defende-se, então, tal como Rua (2007), o desenvolvimento local como uma
ação possível, apesar de se reconhecer algumas restrições explicativas /
instrumentais na diversidade e complexidade das realidades locais. É importante
ressaltar aqui que não negligenciamos nenhuma escala, o papel do Estado (o qual
consideramos fundamental em qualquer política, seja local, regional ou nacional)
e as questões de classe social. A intenção não é supervalorizar a escala local que,
por si só, é vazia, mas acreditamos que o ponto de partida deva ser as
compreensões das vivências das pessoas, do cotidiano, do local (embutido de
valores e caracteres globais). Portanto, explicar-se-á melhor o quê esse trabalho
compreende por local.
O local surge de dentro do global como Hall (2003) nos lembra, mas não é
apenas um simulacro deste. Ou seja, a mistura das relações sociais globais com
locais interage e afeta de maneira diferentemente e desigualmente nos/os
diferentes lugares. A referência pode assim ser construída em um lugar em
movimento, mantendo um elemento que é o da singularidade que tem um caráter
único. É a combinação das coisas de uma forma específica em um determinado
lugar, “que interagem com a história acumulada de um lugar e ganham um
elemento a mais na especificidade dessa história” (MASSEY, 2002 [1994],
p.185). A Comunidade de Itambi, então, mesmo não estando desconectada de um
contexto global, nacional, possui singularidades e particularidades em seus modos
de vida, círculo de convivência e relações com a natureza que são facilmente
percebidas e ressaltadas nas falas dos moradores, que sempre enfatizaram “que
suas vidas e seus cotidianos são muito diferentes do que eu, os cariocas e as
pessoas que eu conheço estão acostumados” 16.
16 Desde o primeiro contato com a Comunidade de Itambi, no início de 2007, os moradores da Comunidade de Itambi sempre fizeram questão de destacar que o ritmo de vida deles era muito
34
Rua (2007), seguindo o mesmo raciocínio de Massey (2002):
(...) defende a abordagem multiescalar/transescalar17 lembrando que ela se realiza não apenas na relação global x local, local x global, mas na relação particularidade (global x local = total x particular) com a singularidade, isto é, o “jogo” desenvolvido no local que identifica (e o torna único em alguns aspectos) (RUA, 2007, p.176).
Outro ponto que esse trabalho procura se atentar quando se refere a
desenvolvimento local é identificar os seus agentes, já que, muitas vezes,
diferentes deles também podem fazer uso desse discurso para reproduzir um
“desenvolvimento hegemônico” que vigora em amplo global. Em outras palavras,
a pesquisa procura assim também identificar quais são os agentes que logram o
“desenvolvimento” no território em que o COMPERJ está sendo instalado e a
partir de quais interesses. De forma que, observam-se contradições nos discursos
proferidos entre os gestores envolvidos no COMPERJ e a Comunidade de Itambi,
bem como os gestores das unidades de conservação envolvidas.
Defende-se, assim como Saquet (2007), que “há uma relação de
complementaridade entre o local e o global sem anular o território” (p.114). As
sociedades produzem território(s) e territorialidades(s) de acordo com suas
normas, regras, crenças, valores, ritos e mitos, com suas atividades cotidianas
(SAQUET, 2007). Dessa maneira, afirma-se novamente que a Comunidade de
Itambi, ao possuir parâmetros diferentes e específicos de desenvolvimento,
consequentemente, deveria também participar na construção do seu próprio
desenvolvimento.
O conceito/noção de desenvolvimento precisa assim acentuar a ideia de cada
povo, cada grupo social, os quais devem possuir autonomia suficiente para defini-
lo de acordo com suas necessidades e com suas características culturais (SOUZA,
1996, p.10).
diferente dos cariocas e que a relação que eles tinham com a natureza seria muito próxima. O próprio horário de acordar e dormir é definido pelas marés, já que as marés baixas e cheias definem o horário da cata do caranguejo, principal atividade econômica realizada pela comunidade para a sobrevivência. As singularidades e particularidades da Comunidade de Itambi serão amplamente discutidas no capítulo 3. 17 Rua (2007a) entende que as múltiplas territorialidades são vividas em diferentes escalas. “A multiescalaridade estaria relacionada à capacidade de vivenciar várias escalas sincrônica ou diacronicamente. Já a transescalaridade poderia relacionar-se à capacidade de ‘transitar” indiferenciadamente pelas diversas escalas. O primeiro termo poderia estar mais ligado aos indivíduos, socialmente diferenciados, o segundo as empresas (p.276).
35
O COMPERJ, desde o início de sua instalação, sempre carregou consigo o
semblante de “desenvolvimento”. Entretanto, as des-re-territorializações das
comunidades que estão na sua área de implantação, como é o caso da Comunidade
de Itambi, assim como a sua proximidade do Mosaico da Mata Atlântica Central
Fluminense (MMACF), principalmente com a APA de Guapimirim, divergem da
concepção de desenvolvimento que defendemos no parágrafo anterior. A
instalação do COMPERJ parece um exemplo das contradições entre os modelos
de desenvolvimento socioespacial. No capítulo seguinte, aprofundar-se-á a análise
da contradição existente entre as realidades locais e o discurso do COMPERJ,
para que possamos compreender as diversas faces desse processo.
Concorda-se então novamente com Rua (2007) que afirma que se deve
deixar que os indivíduos de diferentes lugares decidam as formas de vivenciar as
suas territorialidades e assim o seu(s) desenvolvimento(s), ou seja, seus
parâmetros de justiça social e qualidade de vida, nos quais as relações com a
natureza também seriam especificas. Neste momento, fala-se aqui então de
sustentabilidade(s), termo que vem sendo muito utilizado nas Ciências Sociais da
atualidade e que não deixa de ser criticado por ser considerado por muitos como
apenas mais um qualitativo adicionado à noção hegemônica de desenvolvimento.
Igualmente, a partir de Rua (2007), acredita-se que a sustentabilidade aparece
como a evidência de uma ação possível assim como as múltiplas vivências
correspondem a modelos particulares de desenvolvimentos; essas correspondem,
da mesma forma, a modelos particulares de sustentabilidades.
Entretanto, o discurso ambiental pode também ser apropriado para evocar
um ambiente único e, dessa maneira, todos juntos deveriam defendê-lo em uma
só política. Certamente, contudo, a política a ser validada seria referente a
interesses de um grupo impostos como ‘a melhor para todos’. Novamente, o
pensamento único, agora de um ambiente único, na prática, mais uma vez, nos
leva ao ambiente dos negócios (ACSELRAD, 2009).
Observam-se, entretanto, diferentes usos e apropriações do conceito de
sustentabilidade. Ao se discutir criticamente o discurso de sustentabilidade que o
COMPERJ possui, torna-se necessário, nesse momento do trabalho, compreender,
mesmo que brevemente, a história, agentes e atores envolvidos na formulação do
conceito/noção de sustentabilidade. Tal abordagem é concebida, prioritariamente,
36
sob o viés da lógica mercantil e empresarial dado o que se observa do debate
ambiental a partir dos anos de 1990 (PORTO-GONÇALVES, 2006). A partir
desse debate pode-se apontar para outras racionalidades e estratégicas que visem,
principalmente, a justiça social e a qualidade de vida que também deverão ser
específicas nos diferentes povos e culturas, questões que vêm sendo esquecidas e
substituídas pelo avassalador poder da busca da eficiência econômica.
2.3. Do desenvolvimento sustentável para a(s) sustentabilidade(s)
Para a compreensão de um conceito de sustentabilidade(s) que abrigue uma
agenda política democraticamente mais justa, a partir de outros valores (éticos,
culturais e ambientais) e outras racionalidades que fogem a eficiência econômica
puramente, entende-se antes de qualquer coisa, a partir da visão de Ascerald
(2009), que o conceito/noção sustentabilidade ainda está relacionado,
exclusivamente, à lógica das práticas, “articulando-se a efeitos desejados, a
funções e práticas que o discurso pretende tornar realidade objetiva” (p.45).
A apropriação do termo é um processo de legitimação/ deslegitimação. De
acordo com Acselrad (1999; 2009), são diversos discursos em disputa, distintas
representações e valores associados à noção de sustentabilidade na busca de sua
expressão mais legítima. Essa suposta indefinição em torno da concepção de
sustentabilidade sugere que ainda não haja uma hegemonia estabelecida entre os
diferentes discursos. Contudo, é evidente que o discurso econômico até o presente
momento foi o que melhor se apropriou da noção de sustentabilidade
(ASCELRAD, 1999). A questão ideológica deve estar dessa maneira no cerne da
discussão de sustentabilidade, já que se percebe claramente que sustentabilidade
(ou desenvolvimento sustentável) constitui uma poderosa ferramenta política nos
dias de hoje, perceptivelmente, utilizado por diversas empresas atualmente,
constituindo-se em um importante slogan da Petrobras e um dos principais
discursos inseridos na implementação do COMPERJ. São perceptíveis os
impactos sócio-ambientais do COMPERJ no território de sua instalação, contudo
o semblante de desenvolvimento sustentável está presente nos documentos
oficiais do empreendimento, em seu site e em seus diversos meios de divulgação,
37
ancorado principalmente por um Corredor Ecológico a ser criado em Itaboraí18 e
pela Agenda 21 COMPERJ19. Contudo pela opinião de Afonso Sobrinho
(representante da Associação de Pescadores da Praia de São Gabriel em Itaoca,
São Gonçalo) “a Agenda 21 do COMPERJ é uma forma que a empresa Petrobrás
encontrou de legitimar o seu empreendimento” (BANDEIRA DE MENEZES,
2009, p.27).
Em 1992, Furtado afirmava que a civilização criada pela Revolução
Industrial, na qual uma minoria dispõe dos recursos não-renováveis sem se
preocupar com as gerações futuras, levaria a grandes calamidades. A principal
tarefa para o novo século que se aproximava seria o estabelecimento de novas
prioridades para uma ação política que apontasse para uma nova concepção de
desenvolvimento, este posto ao alcance de todos os povos e capaz de preservar o
18 De acordo com o site do COMPERJ o Corredor Ecológico tem como objetivo “recuperar a flora nativa para conectar o manguezal à Mata Atlântica da região do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. Para isso, serão plantados quatro milhões de mudas de árvores, além de ser criado um berçário florestal na Fazenda Viveiros, localizada em Itaboraí, com capacidade de produção anual de 300 mil mudas de espécies da Mata Atlântica. Esse viveiro estará disponível para visitas técnicas das escolas da região. A Petrobras conta com vários parceiros nessa empreitada: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por intermédio da Fundação Johanna Döbereiner, desenhou o projeto conceitual do Corredor. A OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Innatus capacitou cerca de 400 pessoas da comunidade em cursos semestrais de práticas de silvicultura, além de artesanato. Já a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) vai elaborar projetos para a recuperação das áreas degradadas” (Disponível em: <http://www.comperj.com.br/CorredorEcologico.aspx.>, Acesso em 2 de fevereiro de 2010). 19 Novamente pelo site do COMPERJ: “A Agenda 21 é um plano de ação resultante da Conferência Rio 92. Criada consensualmente com a contribuição de governos e sociedade civil de 179 países, pode ser adotada de forma global, nacional e local em todas as áreas nas quais a ação humana representa algum tipo de impacto ao meio ambiente. É seguindo os princípios desse planejamento que a Petrobras se relaciona com a sociedade dos 15 municípios da área de influência do Complexo Petroquímico, construindo conjuntamente com ela planos locais de desenvolvimento sustentável. A Agenda 21 estimula o exercício da cidadania, a mobilização social e a formação de parcerias entre os diversos setores da sociedade para o alcance da sustentabilidade social, ambiental e econômica” (Disponível em: <http://www.comperj.com.br/Agenda_21.aspx>, Acesso em 2 de fevereiro de 2010). Entretanto, segundo Bandeira de Menezes (2009) “o sistema de Agenda 21 apresenta uma clara disputa de interesses, a começar pela divisão dos debates por setores. No 1º setor estão os membros de órgãos públicos, o 2º setor engloba empresários, industriais e comerciantes, no 3º setor participam representantes de ONGs, sindicatos, associações de classe e fundações, enquanto o 4º setor é o da representação dos movimentos sociais, de membros da sociedade civil organizada e de associações de moradores. Através de licitações o poder público selecionou ONGs executoras dos Fóruns de Agenda 21 para cada setor. Foram vencedoras o Instituto Ipanema (1º. setor); o ISER (2º setor); a Roda Viva (3º setor) e a ASA (4º setor). O sistema de Agenda 21 prevê Fóruns Municipais de caráter deliberativo para elaborar planos de desenvolvimento locais. Nestes são eleitos quatro delegados (um de cada setor) que representarão os municípios no Fórum Regional da Agenda 21. Desta maneira se forja a representatividade da sociedade civil no âmbito das decisões da agenda. O problema vai além da pseudoparidade, pois também passa pelo próprio entendimento da categoria “comunidade” como um todo homogêneo”(p.26-27).
38
equilíbrio ecológico. De acordo com autor, o principal desafio que se colocava
então no século XXI era:
(...) nada menos que mudar o curso da civilização, deslocar o seu eixo da lógica dos meios a serviço da acumulação, num certo horizonte de tempo, para uma lógica dos fins em função do bem-estar social, do exercício da liberdade e da cooperação entre os povos (FURTADO, 1992, p.75-76).
Em outras palavras, Celso Furtado já nos alertava que a grande utopia, o
devir, o projeto do nosso século, seria então a busca pela sustentabilidade. O
economista, em 1992 ligava claramente a concepção de desenvolvimento à de
sustentabilidade, pensado a partir da nossa realidade, satisfazendo as necessidades
de nosso povo e, dessa forma, pela ação criativa dos homens e mulheres de nosso
país, afirmando que deveríamos reconhecer/buscar/assumir a nossa própria
identidade (FURTADO, 1992).
Entretanto, os rumos no processo de conceituação de sustentabilidade ou
desenvolvimento sustentável, principalmente nas duas últimas duas décadas, não
parecem seguir exatamente a utopia desejada por Furtado. Desde a Conferência
das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em
1972, a questão da sustentabilidade vem sendo pautada em diferentes conteúdos
(FONSECA, 2005). A partir dos anos 1980, a discussão em torno do tema de
sustentabilidade vem se tornando cada vez mais presente. Em 1987, a Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento gera como documento final o
Relatório Brundtland, o qual define desenvolvimento sustentável como o
“desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a
capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” 20.
A questão ambiental tornou-se pauta internacional de discussão nos anos
1990. A queda do muro de Berlim (1989) e o colapso da URSS contribuíram para
o enfraquecimento do Estado, o alavanque das organizações não-governamentais21
20 WWF BRASIL (online). Disponível em: < http://www.wwf.org.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010. 21 Chamo atenção para a precisão neoliberal da expressão não-governamental que Porto-Gonçalves (2006) discute. Primeiramente, a expansão da expressão ONGs se deu em um momento em que se tentava relacionar tudo que era vinculado ao Estado como negativo. Somado ainda a um discurso de que os países (pobres) não possuem dinheiro suficiente para se desenvolverem e cuidarem do meio ambiente, e de que seus governos são por si só corruptos. Dessa maneira, o Banco Mundial e outras instituições multilaterais financiam e estimulam as organizações não-governamentais a “substituírem” e fazerem o papel do Estado (PORTO-GONÇALVES, 2006).
39
e, principalmente, para o fortalecimento da ideologia liberal (PORTO-
GONÇALVES, 2006).
Nesse contexto ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), na qual o princípio de sustentabilidade
começa ser concebido como um discurso científico e político (GUIMARÃES,
1997; MARQUARDT, 2006; PORTO-GONÇALVES, 2006) internacionalmente,
ganhando a sua expressão mais legitima de desenvolvimento sustentável, que
começou a aparecer nos documentos preparatórios e a ser inserida nas agendas
políticas de diversos países.
Segundo Guimarães (1997), desde a Conferência do Rio (1992) a percepção
predominante é de que os problemas do meio ambiente estão vinculados aos
problemas do desenvolvimento. Entretanto, os principais atores promotores do
desenvolvimento sustentável são basicamente os que constituem a base social do
modelo dominante atual. Dessa maneira, a lógica pouco se modificou e,
consequentemente, tampouco os fundamentos econômicos do processo produtivo:
capital, trabalho e recursos naturais. Dessa maneira, não é de se estranhar que o
Banco Mundial tem sido o principal gestor financeiro de estratégia de
desenvolvimento sustentável e o financiador da Agenda 21 (GUIMARÃES,
1997).
Como Acselrad (1999) nos lembra, se as mesmas forças hegemônicas no
projeto desenvolvimentista (Estado e empresariado) incorporam a crítica
à insustentabilidade do modelo de desenvolvimento constituinte, certamente seus
discursos estarão presentes na própria ideia/noção/conceito de sustentabilidade.
Segundo Fonseca (2005), naquele período, definia-se o conceito de
desenvolvimento sustentável:
(...) o termo desenvolvimento significava a capacidade dos países de produzir mais, o que equivale dizer, que a sua primeira parte estava ligada ao campo da economia. A palavra sustentável, naquele momento, se referia às idéias de preservação, conservação e proteção ambiental. Desta maneira o termo funcionava como um adjetivo do substantivo de desenvolvimento (FONSECA, 2005, p.4) 22.
Instalou-se dessa maneira a primeira grande contradição do conceito de
desenvolvimento sustentável. A autora supracitada compreende que os valores da
22 Grifos da autora Fonseca (2005).
40
economia e natureza são por si só incompatíveis e antagônicos, uma tensão
essencial, dessa maneira, se estabeleceria desde então (FONSECA, 2005).
Segundo Porto-Gonçalves (2006), essa contradição é vista de forma ainda mais
cristalina quando relacionada ao conceito de território. O meio ambiente
não é apenas um objeto de troca, não é apenas o lugar da produção, mas também
o lugar da vivência, da convivência e da solidariedade. Esse é o mesmo lugar
onde, no processo de produção, ficam os rejeitos (fumaça, poluição, lixo...)
(PORTO-GONÇALVES, 2006, p.301).
Dessa maneira, a proximidade do COMPERJ com o Mosaico da Mata
Atlântica Central Fluminense, principalmente com a APA de Guapimirim, a des-
re-territorialização das comunidades locais, como é o caso da Comunidade de
Itambi, e as possíveis conseqüências ambientais do empreendimento que podem
tornar inviáveis as atividades de subsistência das populações locais (pesca, cata de
caranguejo, siri...) se contradizem com o discurso de desenvolvimento sustentável
envolvido na implementação do complexo.
Furtado (1984) nos lembra, criticamente, que o pensamento baseado em uma
racionalidade econômica (técnico-produtiva) não leva em conta os custos sociais e
ambientais, gerando a repartição desigual de ônus e bônus entre as classes e
grupos sociais (inclusive dentro do mesmo território), gerando, como
conseqüência, a desertificação cultural e humana.
Analogicamente ao pensamento do autor supracitado, já podemos perceber
os primeiros reflexos da instalação do COMPERJ na transformação do território
em questão no que diz respeito à repartição desses custos. Em um olhar inicial,
dentre as primeiras vítimas desse “desenvolvimento” inclui-se a Comunidade de
Itambi, perceptivelmente destinada a compartilhar os custos sociais e ambientais,
ou seja, os ônus, podendo até perder as bases de sua principal fonte de renda,
referência e de segurança e com perspectiva reduzida de inserção nessa nova
lógica territorial. Em vários depoimentos os catadores ressaltam a importância da
permanência da possibilidade da cata do caranguejo para seus filhos, eles
argumentam que mesmo se seus filhos optarem por outra profissão, se eles
precisarem poderão ter a opção da cata para a sobrevivência. Na fala de um dos
caranguejeiros: “(...) poder deixar isso para eles (...) porque isso eles sabem se
precisarem, deixar uma segurança”
41
Fonseca (2005) acredita que para que o desenvolvimento sustentável seja
uma relação de congruência devemos buscar outros valores para desenvolvimento,
sustentabilidade e cultura, re-conceituando, dessa maneira, a discussão sobre
desenvolvimento sustentável a partir do resgate dos valores éticos e culturais.
Certamente esse trabalho possui anseios e objetivos comuns com os da autora na
busca por outras racionalidades e por um agir ético, e acredita-se que a economia
deva estar a serviço (um meio e não um fim) da integridade ambiental e equidade
social. Conforme os ideais propostos até aqui, as realidades são múltiplas e dessa
forma a ferramenta política da sustentabilidade deve assim ser pensada em sua
multiplicidade23. Nesse sentido, busca-se aqui um esforço para pensarmos
sustentabilidade(s) no plural (RUA, 2007) fugindo, dessa maneira, das armadilhas
ideológicas do pensamento único.
2.4. Desenvolvimentos e sustentabilidades democraticamente mais justos
Guimarães (1997) entende que os problemas ocasionados pela desigualdade
social e degradação ambiental não podem ser definidos como problemas
individuais, já que constituem, de fato, problemas sociais. O autor acredita ser
impossível adquirirmos signos de sustentabilidade sem que seja resolvida a
imensa desigualdade no acesso e distribuição dos recursos naturais, econômicos e
políticos, intra e entre nações. A partir disso, o autor enumera algumas dimensões
de sustentabilidades que devem ser aqui destacadas: planetária, ecológica,
ambiental, demográfica, cultural, social, política e institucional (GUIMARÃES,
1997).
Da mesma forma, Saquet (2007), baseado em Magnaghi (2000) compreende
que a sustentabilidade deve ser pensada para além da proteção da natureza, em
que o território, a sustentabilidade política, econômica, cultural e ambiental
devem também ser incorporados no seu raciocínio. “Degradar o território significa
degradar o ambiente e ‘vice-versa’, sendo que esse ‘vice-versa’ é que tem
centralidade” (p.116).
23 Nesse ponto, divergimos de Fonseca (2005), apesar de possuímos ideais comuns, utilizamos ferramentas conceituais diferentes, já que a autora defende a utilização do conceito de desenvolvimento sustentável, entendido nesse trabalho como um conceito já impregnado de ideologia neoliberal.
42
Leff (2001) trabalha com o princípio de incomensurabilidade para nos dizer
da impossibilidade da redução dos processos ambientais a valores do mercado, ou
seja, de se atribuir preços às externalidades ambientais, e acrescenta que “as
influências culturais, sociais e institucionais na valorização das externalidades não
coincidem com nenhum balanço contábil de custo-benefício, nem é possível
atribuir taxas de desconto para atualizar preferências e valorizações futuras”
(LEFF, 2001, p.70). Ainda segundo este autor, o processo fundado na
racionalidade econômica e no direito privado não só ignora as forças ecológicas
de sustentabilidade e de vida do planeta, que é o suporte de todo sistema
produtivo, como também transforma e destrói os valores humanos, culturais e
sociais (ibidem, 2001).
Pelos argumentos expostos até então, não estaria o COMPERJ fundado
ainda numa racionalidade econômica ignorando forças ecológicas de
sustentabilidade, tais como áreas de preservação permanente, e destruindo valores
culturais e sociais? No capítulo seguinte será discutido mais detalhadamente essa
questão.
Ainda Leff nos remete aos movimentos de resistência existentes que se
colocam em oposição à apropriação capitalista da natureza e da cultura,
levantando a questão da justiça ambiental ao acreditar que não existem normas
nem da economia nem da ecologia para equacioná-la. Dessa maneira, esse autor
compartilha ideias como as de Acselrad e Leroy (1999), que indicam que novos
atores sociais devem fazer parte da condução de ações políticas, participando
assim da tomada de decisões para a construção de outras racionalidades24 e de
sustentabilidades democraticamente mais justas.
Para isso, os autores mencionados anteriormente, baseados nos princípios da
equidade social e diversidade cultural, corroboram com a ideia de que devem ser
construídos desenvolvimentos alternativos com mais justiça social e qualidade de
vida. Contudo, a própria ideia de qualidade de vida não pode ser vista como única
aos diferentes povos e culturas. Observa-se nesse trabalho, nas diferentes falas dos
24 Enrique Leff trabalha com a ideia de racionalidade ambiental. Segundo o autor, a partir da perspectiva dessa nova racionalidade, “os objetivos de equidade e sustentabilidade implicam abolir o domínio do mercado e do Estado sobre a autonomia dos povos”. Dessa maneira, criaria condições para a “apropriação dos potenciais ecológicos” de cada uma das regiões de acordo com os valores culturais e interesses de cada comunidade (LEFF, 2001, p.77).
43
diferentes grupos sociais (gestores do PAC, gestores das UCs envolvidas,
moradores da Comunidade de Itambi), nos diversos documentos analisados e na
mídia, diferentes opiniões e concepções de qualidade de vida. Entretanto, percebe-
se, em entrevistas e outros materiais analisados na pesquisa, que algumas dessas
concepções são impostas como se fossem inquestionáveis, ou seja, concebíveis,
aceitas e almejadas da mesma maneira por todos os sujeitos. No capítulo 3
analisar-se-á o que a Comunidade de Itambi compreende por qualidade de vida,
suas reivindicações e, consequentemente, contradições com as políticas que são
implementadas para o benefício dessa comunidade.
Mesmo que até o presente momento, as resistências e a busca por
territorialidades alternativas que vão contra as des-re-territorializações impostas
pelos grupos dominantes, tenham sido quase sempre silenciadas pela força, elas
apresentam momentos de viva atividade:
(...) Há sempre uma relação dialética entre os processos globais de reestruturação do capitalismo com as resistências de nível local que, quase sempre derrotadas até o presente momento, têm antagonizado os modelos ocidentais de desenvolvimento. Essas resistências se dão nas nesgas do vivido das práticas espaciais cotidianas em oposição ao processo brutal e transescalar das transformações (desenvolvimento) criadoras de renovadas representações (RUA, 2007, p.162).
Dessa maneira, busca-se, tal como Siqueira (2007), encontrar, através de
valores éticos, a construção de conceito de sustentabilidade(s) que valorize a
diversidade e a pluralidade. O ethos cultural global baseado em uma racionalidade
econômico-política global reprodutor de um conceito teórico de sustentabilidade
desenraizado e desubstancializado não pode servir de inspiração nesse processo de
re-conceitualização.
Esse trabalho então buscará os valores éticos da Comunidade de Itambi no
ethos local, na esfera da sustentabilidade local, envolvendo dessa maneira seus
valores culturais, ambientais e religiosos, construídos na escala local do território
e que eticamente deixaram suas raízes identitárias (SIQUEIRA, 2007).
Acredita-se assim, tal como Furtado (2007), que o fator político é a esfera
mais nobre das atividades criativas e que devemos tomar gosto pelo exercício da
imaginação para assim darmos continuidade à construção do Brasil. Assim sendo,
pensamos como Rua (2002) para quem o lugar é o ponto de partida para modelos
de desenvolvimento menos desiguais e excludentes e, dessa maneira, a partir dele
44
é que se devem buscar as sustentabilidades, valorizando as tradições das
populações locais ao invés de supervalorizar os interesses internacionais e
nacionais (SILVA, 2006). Como salienta Siqueira (2007), “a força do ethos local
é, sem dúvida, um paradigma de sustentabilidade para a formação do ethos
global” (SIQUEIRA, 2007, p.20).
A construção de um espaço multidimensional, feito território, percebido
como político e pleno de relações de poder/saber dentro de um continuum de
apropriação e/ou dominação e socialmente mais justo necessita, assim, de
desenvolvimentos autênticos com sustentabilidades específicas, autônomas,
“portanto participativas inequívocas das transformações sociais” (RUA, 2007,
p.172).
Concorda-se, então, com Acselrad (2009) para quem o caráter de uma
política de desenvolvimento e sustentabilidade se trata, de fato, de escolhas.
Saquet e Briskievicz (2009) ratificam que dependendo do caráter do projeto de
desenvolvimento, se preservará ou não os traços identitários e simbólicos de cada
território. Portanto, defende-se a busca de escolhas éticas e políticas que
confrontam essa visão do pensamento único, ambiente único em que devemos
economizar recursos. Segue-se então com alguns questionamentos de Acselrad
(2009):
(...) com a realização de um grande investimento infraestrutural, quais riscos devem ser priorizados? O risco de descontinuar os planos de um modelo de integração com os capitais internacionais ou o risco de desestruturar as bases materiais de existência das populações locais (p.34)?
Analogicamente, identificamos essas questões com a realidade estudada.
Que escolhas vêm sendo priorizadas com a entrada do COMPERJ no território
estudado? Quais são os discursos? Quais são os interesses privilegiados? De quem
e para quem? Quais são as contradições? O que está sendo desmantelado e o que
está sendo construído? Quais são os sujeitos envolvidos? Questões que
serão retomadas, analisadas e discutidas nos capítulos seguintes, para que assim
possamos compreender também as resistências, as alternativas, as estratégias de
luta e sobrevivência a partir de outras racionalidades.
Ainda neste trabalho serão observadas outras racionalidades, o que inclui a
própria ideia de qualidade de vida a partir da própria Comunidade de Itambi, ou
45
seja, a partir de seus referenciais simbólicos, interesses e relação com a natureza,
salientando assim a importância desses indivíduos nos processos decisórios na
transformação do território em que eles estão inseridos, procurando fortalecer a
luta dessa comunidade por mais direitos e liberdades.
Contudo, antes de qualquer coisa, é necessário compreender o contexto
histórico-geográfico da realidade estudada, quais são as forças e os interesses
envolvidos, para que possamos compreendê-la em suas diversas faces. Mais
importante do que qualquer caracterização do território, muitas vezes genérica e
dicotômica, é perceber a sua historicidade, ou seja, o seu contexto histórico-
geográfico, já que os objetivos dos processos de territorialização tanto de
dominação quanto o de apropriação, variam no tempo e no espaço, o que nos
possibilita compreender a multiplicidade de poderes, os múltiplos sujeitos
envolvidos e as múltiplas territorialidades em que estamos mergulhados
(HAESBAERT, 2007).
Compreender assim o processo de des-re-territorialização vivenciado pela
Comunidade de Itambi é entender o contexto multiescalar em que está inserida, o
que envolve forças e interesses específicos. Territorialidades e interesses podem
ser tanto econômicos e/ou políticos e/ou culturais e esses dão/darão as formas e
determinados conteúdos ao território e aos territórios. Essas mesmas forças
determinarão a desterritorialização e reterritorialização da Comunidade de Itambi,
e a possível constituição de novas territorialidades nos mesmos ou diferentes
lugares e períodos históricos (SAQUET, 2007, p.128).
No capítulo seguinte verificar-se-á o contexto histórico-geográfico em que a
Comunidade de Itambi se insere, analisando-se as estratégias de desenvolvimento
privilegiadas entre os gestores do território fluminense, na medida em que se
compreenderão as ações e discursos voltados para a instalação do Complexo
Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro no território em questão. Assim sendo,
se verificarão os diversos atores, agentes, sujeitos e interesses, disputas,
resistências e contradições que também se estabelecem no território. Somente
assim poder-se-á compreender a dinâmica por qual passa hoje a Comunidade de
Itambi e suas estratégias de luta por mais direitos e liberdades.
3 O COMPERJ: modelo de desenvolvimento hegemônico e contradições no espaço local
No capítulo anterior, observou-se que parte da Academia já se encontra, em
grande medida, posicionada criticamente contra a redução do conceito de
desenvolvimento às concepções de crescimento econômico e modernização
tecnológica, simplificações típicas das chamadas teorias da modernização e do
crescimento que tiveram seus apogeus na década de 1960. Essas críticas não vêm
somente de intelectuais identificados com as chamadas teorias da dependência e
do imperialismo como Celso Furtado, mas tornaram-se também cada vez mais
aceitas entre setores não necessariamente identificados de maneira ideológica com
“a esquerda”25.
Exemplos disso são as ideias de que a erradicação da pobreza não depende
apenas das altas taxas de crescimento econômico e do progresso da técnica, e que
o principal objetivo de uma política de desenvolvimento seria de fato a satisfação
das necessidades básicas (SOUZA, 1996).
Dessa maneira, questionou-se, no capítulo anterior, o modelo de
desenvolvimento eurocêntrico imposto a todos os cantos do globo e que
recentemente ganhou o adjetivo, mundialmente conhecido, “sustentável”.
Defendeu-se, porém, modelos de desenvolvimentos e sustentabilidades
alternativos e singulares nos diferentes lugares, conquistados no(s) território(s) a
partir da autonomia dos diferentes sujeitos.
Entretanto, como Souza (1996) ressalta, mesmo com essas diversas críticas
ao modelo de desenvolvimento “tradicional”, o qual preconiza que é apenas uma
questão de tempo para que os efeitos positivos comecem aparecer a partir dos
processos de crescimento e de modernização, esse modelo ainda é observado no
campo prático das estratégias e políticas públicas no Brasil.
Como já referendado no capítulo anterior, Ascelrad (2009) afirma que a
busca por um projeto ou outro de desenvolvimento, por uma prática ou outra de
sustentabilidade em um determinado território, seja uma questão de fato de
25 Souza (1996) cita dois exemplos: o enfoque “redistribuição com crescimento” do Banco Mundial e a vertente que enfatiza “a satisfação de necessidades básicas” (p.7).
47
escolhas. Partiremos, neste momento da análise, da escolha da instalação do maior
empreendimento da Petrobras (maior obra do PAC no estado do Rio de Janeiro - o
Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro) pelo município de Itaboraí,
analisando, da mesma maneira, as outras conseqüentes escolhas que vêm sendo
atribuídas a partir da instalação do complexo.
Observa-se que o COMPERJ é propagado pelo discurso de desenvolvimento
e sustentabilidade em seus diversos meios de divulgação. A partir das discussões
do que entendemos por esses conceitos/noções no capítulo anterior, averiguar-se-
ão sob quais concepções os gestores do COMPERJ se baseiam e que contradições
existem entre as potencialidades locais e as propostas do complexo industrial.
Iniciaremos compreendendo brevemente as ações privilegiadas entre os
gestores do território fluminense que dizem respeito ao tema em questão e, dessa
maneira, as representações do COMPERJ para a gestão atual do estado do Rio de
Janeiro. Assim, analisaremos criticamente a escolha pelo município de Itaboraí, o
licenciamento ambiental, os discursos dos gestores do COMPERJ, dos órgãos
ambientais locais, da mídia e dos diferentes moradores, suas contradições,
resistências... A partir daí far-se-á uma análise crítico-reflexiva em relação ao pólo
petroquímico, em que se abordarão as possíveis contradições existentes entre o
projeto de desenvolvimento via COMPERJ e as realidades de gestão local,
notadamente a partir da legislação das Unidades de Conservação (UCs)26.
3.1. Os gestores e seus discursos no Estado do Rio de Janeiro
No capítulo 1 discutimos o modelo hegemônico de desenvolvimento que foi
sendo implantado por diferentes lugares do mundo, inclusive no Brasil.
Destacaram-se as reflexões de Celso Furtado que, já na década de 1980, entendia
26 Unidade de Conservação é o nome dado no Brasil às áreas protegidas fazendo parte do sistema brasileiro de proteção ao meio ambiente, e são controladas pelo órgão federal ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Em 2000, o Brasil institui um Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)- Lei Federal 9.985, atendendo ao oitavo artigo da Convenção sobre Diversidade Biológica As unidades de conservação integrantes do SNUC dividem-se em duas categorias:UC de proteção integral (parques nacionais, estações ecológicas, etc.) de caráter mais preservacionista e restritivo quanto ao uso dos recursos naturais; e UCs de uso sustentável (áreas de proteção ambiental, reservas extrativistas, etc.) mais flexíveis quanto às possibilidades de uso humano de seus recursos (SNUC, 2000).
48
que o desenvolvimento deveria ser fundado na preservação da identidade cultural
de cada uma das regiões que formam o país e em função de prioridades definidas
pela própria coletividade. O autor salientava a importância do planejamento que,
segundo ele, seria o único meio que permitiria a introdução da dimensão espacial
(e, portanto, geográfica) no cálculo econômico. Dessa maneira, os custos
ecológicos e sociais da aglomeração espacial das atividades produtivas, ignorados
pelas empresas privadas e públicas, poderiam ser corrigidos (1984).
Entretanto, apesar de toda reflexão teórico-acadêmica do renomado
economista, e, como dissemos anteriormente, também de variados intelectuais e
estudiosos do desenvolvimento, verifica-se, ainda na atualidade, que os discursos
e ações voltados para a modernização do território do Estado do Rio Janeiro pelos
seus gestores públicos, como nos lembra Silva (2007), se apóiam na idéia
“tradicional de desenvolvimento”, ou seja, que a modernização da base técnico-
produtiva, por si só, trará o bem estar. Como tradicional, deve-se destacar a visão
etapista de desenvolvimento de W. W. Rostow (1953)27 ainda prevalecente nas
perspectivas de gestão pública, em que os espaços rurais, por exemplo, são
entendidos como atrasados. Dessa maneira, este tipo de organização societária
deveria ser extinta para que a modernidade fosse atingida, ou seja, como caminho
condicional para uma sociedade industrial. Tal percepção ainda atinge os povos
tradicionais como os das florestas, pescadores, caranguejeiros... que desenvolvem
atividades artesanais e de subsistência.
A partir de uma perspectiva etapista, algumas atividades industriais são
privilegiadas no território fluminense, tais como o padrão petrolífero de Macaé e o
nuclear de Angra do Reis. Verificam-se, de acordo com Silva (2006), articulações
com grandes corporações e empresas de alta tecnologia e, com isso, mudanças nas
características pré-estabelecidas dos locais a partir de processos técnico-
científicos que remontam e re-significam os lugares (SILVA, 2006). Em outras
palavras, desvalorizam as tradições locais e regionais em busca da
“modernização” (SILVA, 2007).
27 Ver: ROSTOW, W.W. Chapter 2, "The Five Stages of Growth-A Summary. In: The Stages of Economic Growth: A Non-Communist Manifesto. Cambridge: Cambridge University Press, 1960. Disponível em: < http://www.mtholyoke.edu/acad/intrel/ipe/rostow.htm>. Acesso em 26 de abril de 2009.
49
Nessa perspectiva, não há uma racionalidade para a discussão dos custos
sociais, ambientais e políticos em longo prazo. Preconiza-se o pensamento em
curto-prazo e, da mesma forma, interesses globais/ nacionais se sobrepõem aos
interesses locais (FURTADO, 2007).
Ainda em 1984, Furtado criticava o centralismo político e defendia a
autonomia regional. Com a Constituição de 1988 e a descentralização do poder, a
escala subnacional foi valorizada, conquistando maior autonomia administrativa e
financeira.
Os conselhos municipais, ou seja, canais institucionais que possibilitam
maior controle sobre as atribuições das prefeituras e ampliam a participação
popular, foram assim também definidos em 1988 e institucionalizados e
difundidos na década de 90 (CASTRO, 2005, p.207). Entretanto, segundo Rua
(2002), no Brasil a descentralização tributária e o fortalecimento dos municípios
podem tanto representar a participação popular na gestão dos recursos como
privilegiar as oligarquias locais que serão fortalecidas com a entrada de recursos,
podendo anular ou manipular a participação das comunidades locais. Exemplo
disto são os diversos conselhos locais que existem formalmente para cumprirem
as leis e garantirem a entrada dos recursos (RUA, 2002).
Os gestores envolvidos na implementação do Complexo Petroquímico do
Rio de Janeiro (COMPERJ) vinculam o complexo diretamente às concepções de
modernização, desenvolvimento e sustentabilidade que vêm sendo justificadas
como fundantes da decisão de alocação do pólo na região metropolitana do Rio de
Janeiro. A partir disso, então, começaremos a compreender as racionalidades
predominantes nas quais se apóiam os gestores do território fluminense
envolvidos na instalação do COMPERJ no Município de Itaboraí.
Numa perspectiva histórica, percebemos que o Rio de Janeiro passou nas
últimas décadas por diversos episódios que afetaram a auto-estima da sua
população: a transferência da capital do país para Brasília, a fusão autoritária dos
Estados da Guanabara e o do Rio de Janeiro, a perda gradual da gestão sobre o
capital privado para São Paulo, entre outros.
O estado do Rio de Janeiro (o que inclui a sua capital), como nos lembra
Souza (2000), é marcado por uma mediocridade administrativa e um contexto
50
subregional economicamente problemático, o que subtrai possibilidades de
emergência dessa unidade da federação no contexto político nacional. Assim
sendo, o COMPERJ é interpretado como uma oportunidade de crescimento
econômico, de “desenvolvimento” e de “modernidade” que interfere no
sentimento da população, principalmente dos cariocas que assistem, de longe, as
possíveis benfeitorias do complexo, mas não vivenciam diretamente as
conseqüências socioespaciais (atuais e futuras) na região. E é dessa maneira que o
Relatório de Impactos Ambientais (RIMA) o descreve:
O estado do Rio de Janeiro tem hoje a possibilidade de reverter um processo de esvaziamento econômico que começou com a mudança da capital federal para Brasília, acentuou-se na fusão com a Guanabara e aprofundou-se com a fuga de investimentos, aumento da criminalidade e perdas ambientais no interior. Este empreendimento pode dar oportunidade de crescimento econômico de forma positiva para o estado (RIMA-COMPERJ, 2007, p.7)
Entretanto, a des-re-territorialização das comunidades que estão na área do
COMPERJ, assim como a proximidade do complexo com o Mosaico da Mata
Atlântica Central Fluminense (MMACF)28, principalmente com a Área de
Proteção Ambiental de Guapimirim (figura 1), leva a questionamentos de diversas
entidades da sociedade civil tais como os Conselhos Gestores29 das respectivas
áreas, de comunidades locais, da Academia, entre outros30, em relação à
localização do pólo petroquímico. Dessa maneira, primeiramente torna-se
necessário apresentar o COMPERJ do ponto de vista da empresa para
28 De acordo com o SNUC, em seu artigo 26, mosaicos de unidades de conservação: “quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional”. O Ministério do Meio Ambiente reconhece cinco mosaicos, entre eles o Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense, criado em 2006, através da Portaria n°350 do MMA, dentro do Corredor da Serra do Mar (IBAMA-INSTITUTO CHICO MENDES, 2008). O MMACF foi criado pela Portaria do Ministério do Meio Ambiente em dezembro de 2006 e reúne 22 Unidades de Conservação: 2 Reservas Biológicas, 3 Estações Ecológicas, 1 Monumento Natural, 4 Parques, 8 Áreas de Proteção Ambiental, 4 Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Destas UCs, 5 são Federais, 7 Estaduais, 6 Municipais e 4 Privadas. Ocupando uma área de 233.710 hectares em 13 municípios (GIULIANI, 2007). 29 De acordo com o SNUC, todas as UCs e mosaicos devem dispor de conselhos gestores: colegiados que participam da gestão da unidade, consultiva ou deliberativamente dependendo da categoria da UC, compostos por representantes dos órgãos ambientais e da sociedade civil, como associações de moradores locais, colônias de pesca etc. 30 GIULIANI, Gian Mario. As áreas naturais protegidas e a responsabilidade social e ambiental das empresas: o caso do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense e do Comperj. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 16, p. 21-37, jul./dez. 2007. Editora UFPR.
51
posteriormente ser feita uma análise crítica do empreendimento, compreendendo
assim as contradições das potencialidades locais com o discurso proferido pelos
gestores do complexo.
Figura 1: Localização do COMPERJ e sua proximidade da APA de Guapimirim
Fonte: ULTRA, BNDES e PETROBRÁS (agosto de 2007).
3.2. Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ): Visão da empresa
O Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ) é o maior
empreendimento individual da história da Petrobras, com um investimento de R$
15 bilhões e está previsto para entrar em operação em 2012. Além disso, constitui-
se em uma das partes importantes do Programa de Aceleração do Crescimento -
PAC - lançado no inicio de 2006 pelo Governo Federal (RIMA-COMPERJ,
2007).
O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do COMPERJ também prevê
que o pólo irá gerar cerca de 200 mil empregos diretos, indiretos e efeito de renda
em âmbito nacional. Além disso, o texto evidencia que a produção do complexo
52
irá estimular a instalação de outras indústrias de bens de consumo na região de
influência do pólo. Estudos da Fundação Getúlio Vargas estimam que 720
empresas serão instaladas na região até 2015 para produzir plásticos (copos e
sacos plásticos, embalagens de alimentos e de cosméticos brinquedos, fibras para
a indústria têxtil e garrafas de refrigerantes e de água, assim como componentes
para as indústrias montadoras de automóveis, eletrodomésticos), a partir da
transformação dos produtos petroquímicos do COMPERJ.
Atualmente, o Brasil exporta óleo cru pesado e importa uma significativa
quantidade de óleo leve. O pólo refinará 150 mil barris diários de petróleo pesado
cru do campo de Marlim, Bacia de Campos. O projeto apresenta uma nova
tecnologia que será utilizada pela primeira vez no Brasil e, consequentemente,
poderá ser uma alternativa competitiva para promover o crescimento da indústria
petroquímica no país (Ibidem).
O RIMA acrescenta que a escolha da localização do pólo se deu devido á
(ao): disponibilidade e facilidades da região, o que inclui o futuro Arco
Metropolitano viabilizado pelo COMPERJ, ligando Itaboraí ao Porto de Itaguaí;
melhor aproveitamento da logística existente; maior competitividade para cadeia
produtiva; maior inclusão social para região (2007) (figura 2).
Figura 2: O COMPERJ e o Arco Metropolitano no contexto da integração regional
Fonte: RIMA-COMPERJ (2007).
O Relatório sustenta ainda que o complexo não só proporcionará uma
renovação econômica como ambiental, e que já deu início a um Corredor
53
Ecológico que prevê o plantio de quatro milhões de mudas, acrescentando que a
ideia é garantir que a implantação do empreendimento no local atenda aos
princípios do desenvolvimento sustentável e da responsabilidade social (p.8).
Percebemos, conforme já afirmamos, que o COMPERJ traz consigo, pelo
RIMA, as ideias de desenvolvimento, modernização, desenvolvimento sustentável
e responsabilidade social difundidas pelo site da Petrobras, seus folhetins, Estado,
mídia e por ONGs que atuam no local. Entretanto, essas concepções também vêm
sofrendo diversas críticas. Cabe, portanto, aprofundar a analise para que possamos
compreender as diversas faces desse processo.
3.3. Projetos de modernização: uma análise crítica do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro
De acordo com o depoimento do biólogo Breno Herrera, chefe da APA de
Guapimirim31, há cerca de seis anos iniciou-se uma campanha no Rio de Janeiro
para que a refinaria anunciada pela Petrobras fosse instalada no estado. O governo
estadual, na época sob a gestão de Rosângela Matheus Garotinho, opositora ao
governo federal e com forte base eleitoral em Campos, no norte fluminense (como
na gestão anterior de Anthony Garotinho), já divulgava em diversos meios de
comunicação o logotipo: “A refinaria é nossa”. Após a definição de que o Rio de
Janeiro sediaria a refinaria, as discussões voltaram-se para a escolha do espaço
físico no território, Campos e Itaguaí eram as duas cidades mais cotadas.
Entretanto, quando o governo federal anunciou definitivamente a locação do pólo,
o município de Itaboraí foi o escolhido. Segundo o biólogo, IBAMA e ICMBio
(esses dois últimos se expressando através do documento Manifestação técnica
sobre os impactos ambientais potenciais decorrentes da implantação do
COMPERJ nas unidades de conservação federais da região, elaborado em 6 de
março de 2008 por um grupo de trabalho), a escolha foi indesejável do ponto de
vista ambiental. Neste documento, os representantes do IBAMA e do ICMBio
afirmam que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) fez uma análise muito
superficial, dada a magnitude do empreendimento, em apenas quatro páginas, dos
31 Resposta via e-mail dia 04/11/2009.
54
possíveis locais de implantação do COMPERJ e que a melhor alternativa
apontada pelo EIA, a área de Itaboraí, seria de fato a pior.
As justificativas para a escolha do município de Itaboraí, apontadas pelo
EIA, são então questionadas por esse grupo de trabalho, tais como os quesitos da
proximidade com a matéria-prima e da dinamização da economia, os quais, de
acordo como o EIA, favoreceram Itaboraí. Segundo a manifestação técnica do
IBAMA- ICMBio (2008), esses critérios deveriam favorecer a alternativa de
Campos-Travessão, dada a proximidade com a Bacia de Campos, e de acordo com
o mesmo documento, pela região norte fluminense ser mais pobre do que a região
metropolitana do Rio de Janeiro. O mesmo trabalho ainda questiona o EIA
quando se refere às “restrições geotécnicas” nas áreas de Itaguaí e Campos, não
especificando quais seriam essas restrições e características mecânicas do solo,
apontando soluções técnicas para estruturas e intervenções no solo da região de
Itaboraí. Estas, por sua vez, não são muito diferentes das duas outras opções
locais. Além disso, também observa que Itaguaí já possui outras indústrias de
porte semelhante.
O biólogo Breno Herrera também acredita que a escolha mais viável para a
implantação seria a do município de Campos dos Goytacazes. O EIA levanta
“dificuldades e custos de implantação de um terminal portuário” (IBAMA-
ICMBIO, 2008, p.3), sem levar em conta, segundo o mesmo documento, a
implantação do Porto do Açu no Norte Fluminense, nem a possibilidade de se
construir um terminal portuário próprio, o que está previsto para Itaboraí com
consequências diretas no manguezal da APA de Guapimirim e da ESEC da
Guanabara. Outra justificativa do EIA pelo descarte da implantação do
COMPERJ no Norte Fluminense seria a proximidade com cultivos de cana de
açúcar32, sendo que essa priorização se dá em detrimento da vegetação de
preservação permanente, o que é criticado tanto pelo chefe da APA de
Guapimirim como pelo documento supracitado.
32 Vale lembrar o processo de antropização, degradação e empobrecimento do solo desta região, em conseqüência de muitos ciclos de cultivo desde os tempos coloniais (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.3)
55
Dessa maneira, sob o ponto de vista de áreas preservadas e unidades de
conservação, observa-se uma grande diferença entre as três alternativas
locacionais apresentadas pelo EIA (ANEXOS 4,5 e 6).
A partir dos mapas selecionados, observa-se que a localidade Campos do
Goytacazes-Travessão possui apenas uma unidade de conservação no raio de
20km (a Estação Ecológica Estadual de Guaxindiba a 18 km) do local que seria
previsto para implantação do COMPERJ. Já em Itaguaí haveria uma UC de uso
sustentável no raio de 10 km (a APA Estadual de Mangaratiba, a cerca de 5 km) e
quatro UCs no raio de 20 km (a APA estadual do Gericinó-Mendanha a 15 km; a
Floresta Nacional Mário Xavier a 16 km; o Parque Estadual da Pedra Branca a 17
km; e a Reserva Biológica e Arqueológica Estadual de Guaratiba a 18 km)
(IBAMA- ICMBIO, 2008, p.3)
Na localidade de Itaboraí, observam-se duas unidades de conservação em
um raio de 10 km (a APA Estadual da Bacia do Rio Macacu, na qual está
proposto o empreendimento e a APA Federal de Guapimirim a 6 km) e seis UCs
no raio de 20 km (Estação Ecológica Federal da Guanabara a 11 km; a Estação
Ecológica Estadual do Paraíso a 13 km; a APA de Petrópolis a 14 km; a APA
Federal da Bacia do Rio São João a 14 km; o Parque Estadual dos Três Picos a 17
km; o Parque Nacional da Serra dos Órgãos a 19 km).
Os mapas mostram apenas as unidades de conservação federais e estaduais,
entretanto é importante ressaltar que na localidade de Itaboraí ainda se encontra a
APA Municipal de Guapi-guapiaçu, sob administração da Prefeitura de
Guapimirim. Todas essas UCs citadas compõem o Mosaico de Unidades de
Conservação da Mata Atlântica Central Fluminense (ibidem, p.3). A opção de
Itaboraí, do ponto de vista ambiental, dessa maneira, seria a mais imprópria.
Contudo é importante observar a partir de Irving, Giuliani e Loureiro (2008)
que a regulamentação do SNUC- política que institui as UCs- fortalecida pelo
Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP)33 institui também a
33 Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006 (Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5758.htm, Acesso em 28 de março de 2010). Segundo Irving, Giuliani e Loureiro (2008) diversos princípios e diretrizes estabelecidos pelo PNAP reforçam a perspectiva de integração sociedade-natureza no âmbito de implementação de políticas públicas, dentre os quais: “valorização dos aspectos éticos, culturais, estéticos e simbólicos da conservação da natureza (Princípio II); valorização do patrimônio cultural e do bem difuso, garantindo os direitos das gerações atuais e futuras (Princípio IV);
56
obrigatoriedade da gestão participativa das UCs, envolvendo Estado e sociedade,
procurando ir além do viés ambiental. Alguns dos objetivos do SNUC são: a
promoção do desenvolvimento sustentável, a partir dos recursos naturais
(Objetivo IV); promoção da utilização dos princípios e práticas de conservação da
natureza no processo de desenvolvimento (Objetivo V); importância da
valorização econômica e social da diversidade biológica (Objetivo XI). Observa-
se entre os objetivos do SNUC, portanto, sob a ótica de planejamento, articulações
entre as políticas de proteção da natureza e aquelas vinculadas à promoção do
desenvolvimento econômico e social (p.14). Além disso, enfatiza em algumas de
suas diretrizes34 a questão da participação social “como garantia da efetividade da
própria política de proteção da natureza” (p.15)
Mesmo, então, que no momento da criação de uma UC ainda prevaleça à
defesa da unidade de conservação da ameaça da ação humana, em sua gestão o
compromisso da participação social caminha para uma nova percepção:
(...) a de que o êxito dessa política de proteção da natureza depende do efetivo engajamento das populações locais no processo de gestão, a partir da internalização da natureza como patrimônio coletivo e da percepção de integração da área protegida com a dinâmica sócio-econômica do entorno (IRVING, GIULIANI e LOUREIRO, 2008, p.15)
reconhecimento das áreas protegidas como um dos instrumentos eficazes para a diversidade biológica e sócio-cultural (Princípio VII); repartição justa e equitativa dos custos e benefícios advindos da conservação da natureza, contribuindo para a melhoria de qualidade de vida, erradicação da pobreza e redução das desigualdades regionais (Princípio XII); desenvolvimento de potencialidades de uso sustentável das áreas protegidas (Princípio XIII); reconhecimento e fomento às diferentes formas de conhecimento e práticas de manejo sustentável dos recursos naturais (Princípio XIV); harmonização com as políticas públicas de ordenamento territorial e desenvolvimento regional sustentável (Princípio XVII); pactuação e articulação das ações de estabelecimento e gestão das áreas protegidas com os diferentes segmentos da sociedade (Princípio XVIII); promoção da participação, da inclusão social e do exercício de cidadania na gestão das áreas protegidas, buscando permanentemente o desenvolvimento social, especialmente para as populações no interior e do entorno das áreas protegidas (Princípio XX); consideração do equilíbrio de gênero, geração, cultura e etnia na gestão das áreas protegidas (Princípio XXI); garantia de ampla divulgação e acesso público às informações relacionadas às áreas protegidas (Princípio XXIV)” (p.15-16). 34 “Mecanismos e procedimentos devem ser assegurados para o envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da Política Nacional de Unidades de Conservação (Diretriz II); A participação efetiva das populações locais deve ser assegurada na criação, implantação e gestão de Unidades de Conservação (Diretriz III); As necessidades das populações locais devem ser consideradas no desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável de recursos naturais, independentemente das diferentes categorias de manejo previstas (Uso Sustentável ou Proteção Integral) (Diretriz XIX)” (IRVING, GIULIANI e LOUREIRO, 2008, p.15).
57
Segundo o estudo “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio35:
perspectivas na América Latina e Caribe” (CEPAL, 2005) o objetivo da garantia a
sustentabilidade ambiental era um dos que apresentava maior desafio para a
região. Acrescentando que na década de 90 a área coberta por florestas no Brasil
diminuiu de 66,3% para 63,6% (p.2). Uma das estratégias governamentais para
minimizar o cenário histórico de degradação da Mata Atlântica é a criação de
áreas especialmente protegidas como unidades de conservação, mosaicos e
corredores ecológicos. Dentre dezoito pontos críticos identificados no planeta, a
costa do Brasil é caracterizada como uma das principais áreas remanescentes de
alta biodiversidade e grande parte da Mata Atlântica é considerada Reserva da
Biosfera pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO)36, indicando a prioridade para a conservação e o
desenvolvimento sustentável. No conjunto de ecossistemas que compõem a Mata
Atlântica, a UNESCO considera determinadas regiões como prioritárias para
conservação, tanto pela sua relevância ambiental, como pela sua importância
social e no conhecimento cientifico e tradicional. Dentre essas regiões, encontra-
se o Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar37 (PROGRAMA MOSAICOS
DA MATA ATLÂNTICA – RBMA – PROJETO DE APOIO AO
35 “Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) foram adotados em 2000 pelos governos de 189 países — incluindo o Brasil — como um compromisso para diminuir a desigualdade e melhorar o desenvolvimento humano no mundo. Ele prevê oito grandes objetivos, a serem cumpridos, em sua maioria, até 2015: erradicar a extrema pobreza e a fome; atingir o ensino básico universal; promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento” (CEPAL, 2005, p.1). 36 Em uma reunião realizada no dia 29 de outubro de 2009 com os conselheiros da APA de Guapimirim, foi feito um abaixo-assinado pra que APA de Guapimirim fosse reconhecida ainda como posto avançado da Mata Atlântica pela UNESCO. Para uma UC ser reconhecida como Posto Avançado é necessário que a instituição desenvolva pelo menos duas das dessas três funções básicas: proteção da biodiversidade, do desenvolvimento sustentável e do conhecimento científico e tradicional sobre a Mata Atlântica, as quais a APA de Guapimirim já desenvolve. 37 O Corredor da Serra do Mar abrange grande parte do Rio de Janeiro, além do litoral de São Paulo, o sul de Minas Gerais e o extremo norte do Paraná. Este fato está associado às boas condições de conservação de diversas áreas dessa região, que se reflete em um alto grau de diversidade biológica, na existência de endemismos e na ocorrência de espécies raras e ameaçadas de extinção nos ecossistemas regionais. Está associado também à interação intensa desses recursos com a ação humana, já que o Corredor da Serra do Mar engloba algumas das áreas mais densamente populosas do Brasil. Neste Corredor concentram-se importantes fragmentos florestais, além de uma vasta diversidade sociocultural em interação com estes fragmentos. A conservação destes fragmentos é fundamental para a conservação da biodiversidade da Mata Atlântica (PROGRAMA MOSAICOS DA MATA ATLÂNTICA – RBMA – PROJETO DE APOIO AO RECONHECIMENTO DE MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO CORREDOR DA SERRA DO MAR., 2007, p.53-54).
58
RECONHECIMENTO DE MOSAICOS DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
DO CORREDOR DA SERRA DO MAR, 2007, p.53-54).
Determinadas porções do Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar são
consideradas ainda como áreas de prioridade extrema para conservação, dentre
elas se encontra a região do Mosaico de Unidades de Conservação da Mata
Atlântica Central Fluminense, que abrange a Serra dos Órgãos e se estende do
Maciço do Tinguá até Macaé de Cima, incluindo a parte leste da Baía de
Guanabara. O documento do Ministério do Meio Ambiente, que subsidiou a
elaboração do Mapa de Áreas Prioritárias para Conservação no Brasil, intitulado
“Avaliação e identificação de áreas e ações prioritárias para conservação,
utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira”
considera esta região como de Prioridade de Conservação e Uso Sustentável –
Extremamente Alta. Devido à importância ambiental, social e econômica desses
manguezais para toda a baía, eles ainda são protegidos pelo Código Florestal. A
situação prioritária para conservação dos mangues da Baía de Guanabara levou ao
estabelecimento de ações importantes de um grande programa de conservação dos
mangues, o GEF38 Mangue, cujo objetivo é promover a conservação e uso
sustentável de ecossistemas manguezais no Brasil (ibidem, p. 54-55).
As unidades de conservação APA Guapimirim e Estação Ecológica da
Guanabara localizam-se na região da foz de diversos rios de outras UCs do
Mosaico. Há deposição de sedimentos finos que possibilitam a tomada das
margens por vegetação de manguezal. A partir desses rios, os manguezais são
cortados por canais que se entrecruzam, formando uma rede de irrigação. Esses
rios são oriundos do alto das serras que compõem a bacia da Baía de Guanabara,
sendo os principais elos de ligação das regiões de baixada com as demais áreas do
mosaico. A gestão da APA Guapimirim e da ESEC Guanabara39, portanto,
depende diretamente da gestão das demais UCs do mosaico, que têm parte de suas
áreas drenando para ela (ibidem, p.56).
38 Fundo Global para o Meio Ambiente, na sigla em inglês. 39 De acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade- ICMBio, pelo regimento interno dessas unidades de conservação, oficialmente a APA de Guapimirim e a ESEC da Guanabara constituem uma unidade integrada. Dessa maneira, possuem gestão integrada e as duas unidades de conservação possuem assim o mesmo espaço consultivo formalmente, o conselho da APA Guapimirim – CONAPAGUAPI. Disponível em: http://www.icmbio.gov.br/apaguapimirim/?id_menu=52, Acesso 05 de fevereiro de 2010.
59
Figura 3: Área de Proteção Ambiental de Guapimirim (área verde) - Reserva de Manguezal
Fonte: Instituto Baia de Guanabara (2007).
Hoje, os manguezais da Baía de Guanabara estão restritos a uma área total
de 81,50 Km2 concentrada, principalmente, na APA de Guapimirim, que
corresponde a uma área de 68,75 Km2, com cerca de 14.000 hectares e abrange os
municípios de Magé, Guapimirim, Itaboraí e São Gonçalo (AMADOR, 2001)
(figuras 3 e 4).
Esta APA40 foi criada em 1984, pelo Decreto Federal nº 90.225 (PLANO
DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001), em resposta à primeira ação
comunitária em defesa da Baía de Guanabara, que obrigou a DNOS (responsável
pelas maiores transformações das bacias fluviais da baía) a desistir do projeto que
criaria terrenos para as indústrias saneando a área compreendida pelos Rios
Macacu-Guapi, Guaraí, Guaximdindiba, com seus canais de marés e manguezais
40 De acordo com a Lei Federal n.º 9.985/00, SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, em seu artigo 15, a APA (Área de Proteção Ambiental) é definida: “... como uma área em geral extensa; com certo grau de ocupação humana; dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e que tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais; constituída por terras públicas ou privadas (§1º); onde podem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização da propriedade privada (§ 2º), condições para a realização de pesquisa científica e visitação pública, pelo seu órgão gestor, nas áreas públicas (§ 3º), e pelo seu proprietário, nas privadas (§ 4º); dispondo de um Conselho, presidido pelo órgão administrador e constituído por representantes dos órgãos públicos, de ONG (Organização Não Governamental) e da população residente (§ 5º)” (SNUC, 2003).
60
associados (AMADOR, 1992, p.207). A APA de Guapimirim funciona como um
berçário para milhares de espécies marinhas e é considerada, popularmente, como
o “pulmão” da Baía de Guanabara já que:
...assegura a manutenção de condições naturais de trechos da baía, viabilizando a sua recuperação como ecossistema e garantindo a vida na baía, representada pela cadeia biológica constituída por microorganismos, crustáceos, moluscos, camarões, peixes e mamíferos (como os botos) (AMADOR, 2001, p. 137).
Dessa maneira, a vida marinha existente em toda baía é dependente desses
manguezais, assim como eles são vitais para a manutenção dos estoques
pesqueiros (KAMEL et al., 2004). A APA é assim fundamental para a produção
de pescado em toda a da Baía de Guanabara, o que evidencia uma grande
importância econômica e social, principalmente no que diz respeito à quantidade
de pessoas envolvidas nessas atividades produtivas41.
Figura 4: Vista aérea da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim
Fonte: PREFEITURA DE ITABORAÍ (2006).
Com o intuito de proteger os manguezais da APA, e assim toda Baía de
Guanabara, uma Estação Ecológica foi implantada dentro da APA de Guapimirim
por iniciativa do IBAMA. Pelo Decreto s/n de 15 de fevereiro de 2006, a Estação
41 Em um trabalho realizado por JABLONSKI et al. (2006) a produção de pescado na Baía de Guanabara registrada, entre abril de 2001 e março de 2002, foi, aproximadamente, de 19.000 ton., correspondente a um valor de 4,8 milhões de dólares. E a quantidade de pescadores envolvidos foi de, aproximadamente, 3700 pescadores.
61
Ecológica da Guanabara42 foi implementada, mesmo não tendo sido consenso nas
comunidades interessadas, sobretudo a dos pescadores e caranguejeiros43
(GIULIANI, 2007). Esta é considerada a área mais preservada da Baía de
Guanabara abrangendo os municípios de Itaboraí e Guapimirim (IBAMA, 2006).
Dessa maneira, a instalação do COMPERJ com uma área de 4.529,8 ha,
mais de duas vezes e meia maior que a área da ESEC Guanabara e localizando-se
cerca de 6 km à montante da APA de Guapimirim, certamente afetará o regime
hidrológico que sustenta os manguezais44 (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.10).
Soares (2007)45 acrescenta outros pontos que também deveriam ser levados
em conta quanto à localização do pólo petroquímico no município de Itaboraí: a
escassez de água da região e a fragilidade do ecossistema da Baía de Guanabara.
Esses pontos, que segundo a manifestação técnica do IBAMA e ICMBio (2008)
causam preocupação devido à falta de planejamento integrado em relação ao
fornecimento de água e destinação dos efluentes, possuem licenciamentos
separados. 42 De acordo com SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - em seu artigo 9: A Estação Ecológica tem com objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas; A Estação Ecológica é de posse e domínios públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei (§1º); é proibida a visitação pública, exceto quando o objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico (§2º); A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento (§3º); Na Estação Ecológica só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de: I- medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados, II- manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica, III- coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas; IV- pesquisas científicas cujo o impacto sobre o meio ambiente seja maior do que aquele causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de um mil e quinhentos hectares (§4º) (SNUC, 2003). 43 Por motivos óbvios a Comunidade de Itambi era contrária a implementação de uma Estação Ecológica, já que a ESEC se enquadra na categoria de UC de Proteção Integral, restringindo assim a cata de caranguejo e a pesca. A defesa dos caranguejeiros se baseava que não adiantaria fechar uma área se não atacasse diretamente os focos de poluição. Em trabalho anterior Moysés (2008) mostrou o conflito existente entre os gestores das UCs com as populações que residem nestas, defendendo que a Comunidade de Itambi na realidade contribuía para a conservação e preservação dos mangues da APA de Guapimirim. Atualmente, os membros do Conselho Gestor da APA de Guapimirim estão entrando em acordo, que mesmo pelo SNUC seja proibida qualquer atividade extrativista na ESEC, os caranguejeiros e os pescadores cadastrados da região poderão realizar suas atividades, assunto a ser retomado no capítulo seguinte. 44 É importante destacar aqui que segundo a manifestação técnica do IBAMA - ICMBio (2008) a metodologia empregada no EIA onde se considera o ponto central da área do COMPERJ na definição dos raios das áreas diretamente afetadas (ADA) e de influência direta (AID), está equivocada, dada a magnitude da área do empreendimento (4.529,8 ha) (p.14). 45 Mário Luiz Gomes Soares é oceanógrafo, professor da Faculdade de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e membro do Conselho Gestor da APA Guapimirim e do Conselho Consultivo do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense.
62
No RIMA, são apontadas as seguintes alternativas para captação de água: os
Rios Paraíba do Sul e Guandu, a construção de barragem no Rio Guapiaçu e de
captação de água no reservatório de Juturnaíba. Entretanto, segundo a
manifestação técnica, são opções de difícil implantação, já que o Rio Paraíba do
Sul demandaria um bombeamento extraordinário para transpor a Serra dos
Órgãos; o Guandu por abastecer a RMRJ já se encontra saturado; a construção da
barragem no Rio Guapiaçu afetaria sensivelmente as unidades de conservação à
jusante, sendo assim considerada de grande risco ambiental; e a opção de captação
de água no reservatório de Juturnaíba46 demandaria estudos do hidrograma
ecológico da bacia do rio São João, já que hoje ainda não existem dados que
permitam a autorização da captação daquele reservatório (p.6).
Seguindo o mesmo documento, ainda se afirma que a vazão média de
efluentes líquidos irá atingir 13,7 m3/s47 já que este deverá ter a contribuição da
drenagem de águas pluviais contaminadas, questionando-se a adoção da Refinaria
do Paraná (REPAR) e não a de Duque de Caxias (REDUC) como referência para
se estimar as características dos efluentes. O estudo ainda acrescenta que
deveriam ser incluídas as substâncias que serão empregadas nos processos
petroquímicos, já que o COMPERJ também realizará essa atividade, além do
refino, esclarecendo se o petróleo pesado de Marlim não terá um potencial maior
de impacto ambiental, com compostos mais complexos e persistentes, já que
demanda maior tratamento e por ser um processo pioneiro de refino. Portanto, é
possível haver subprodutos e resíduos com riscos potenciais não previstos nos
efluentes descartados (p.7).
Dessa maneira, Soares (2007) nos alerta que o COMPERJ e sua forte
demanda por água, além do possível risco de contaminação por resíduos
industriais, somar-se-ão às outras indústrias que se instalarão no local e aos novos
46 Não apenas o reservatório, mas como todos os rios contribuintes estão sofrendo problemas de assoreamento e o reservatório vem perdendo sua capacidade de armazenamento de água, esse problema se agrava pelo fato do reservatório de Juturnaíba ser responsável pelo abastecimento de uma população de mais de 500 mil pessoas da Região dos Lagos, que chega a quadriplicar no verão (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.6). 47 Como comparação, a maior Estação de Tratamento de Esgotos do PDBG, ETE Alegria, que atende uma população de 1.500.000 habitantes e na época de sua inauguração era maior do Brasil, tem a capacidade de tratar 5,0m3/s, embora não opere a plena carga (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.7).
63
assentamentos urbanos, o que certamente comprometerá o futuro das bacias de
drenagem da região.
Nos últimos anos ocorreram alguns acidentes envolvendo petróleo e
derivados que atingiram os manguezais do recôncavo da Baía de Guanabara48.
Tais eventos devem ser considerados como prioritários em termos de gestão. Nas
entrevistas realizadas nessa pesquisa, os catadores de caranguejo em algumas de
suas falas remetem aos episódicos acidentes como momentos de dificuldades,
principalmente quando se referem ao acidente mais recente e mais próximo da
área em que vivem atualmente49. Durantes esses eventos, a cata de caranguejo e a
pesca foram gravemente atingidas, sendo proibidas pelo IBAMA de ocorrer
durante algum tempo, afetando assim o principal meio de sobrevivência dessa
população.
Soares (2007) salienta ainda que a localização do pólo petroquímico
contraria o próprio Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da
Baia da Guanabara (PDRH-BG), que recomenda:
(...) impedir que áreas inundáveis ainda não ocupadas venham a ser urbanizadas, evitando assim futuros problemas. Recomenda-se delimitar estas áreas e criar legislação nos respectivos municípios tornando-as não urbanizáveis.50
O mesmo plano, em relação à bacia do Rio Guapimirim, diz: “os resultados
indicam que é aconselhável que se proceda a preservação destas águas,
impedindo-se a localização de indústrias poluidoras na sua área de influências...”
(IBAMA- ICMBIO, 2008, p.9).
Também, segundo o PDRH-BG, os municípios de Itaboraí e Guapimirim
são os piores em termos de disponibilidade de rede de esgoto, água pluvial e
48 Como exemplo, devem ser destacados o acidente da Refinaria Duque de Caxias, em janeiro de 2000, com mais de 1 milhão de litros de óleo combustível na Baía de Guanabara (SOARES, 2002) e o acidente da Ferrovia Centro Atlântica, em abril de 2005, quando cerca de 60.000 litros de óleo diesel atingiram o Rio Caceribu (VIANA, 2009, p.34). 49 O filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, retrata as conseqüências para a Comunidade de Itambi, quando o trem descarrila e derrama óleo diesel nas margens do rio Caceribu. Mostra o dia em que cada família, alguns com mais de 10 filhos, ganha uma lata de sardinha como ajuda para seu sustento enquanto a pesca e a cata de caranguejo não retornassem ao normal. O filme ainda retrata algumas das discussões referentes à implantação da Estação Ecológica da Guanabara, nas quais a Comunidade de Itambi nitidamente se posiciona contrária. 50 SOARES GOMES, Mario L. Responsabilidade socioambiental: a difícil transposição do “abismo“ que separa a retórica da prática. Considerações sobre a proposta de localização do Comperj. Palestra - Desafios e conflitos na conservação e gestão de manguezais. UERJ, Rio de Janeiro. 2007.
64
coleta e deposição final do lixo (SOARES, 2007). A manifestação técnica do
IBAMA e do ICMBio (2008) afirma que devam ser muito bem definidas e
exigidas as responsabilidades pelo saneamento, planejamento e ordenamento
urbano da região. Segundo o próprio RIMA do COMPERJ a construção do pólo
aumentará a pressão nas áreas urbanas e urbanizáveis devido à atração de grupos
populacionais em busca de trabalho51. Entretanto, o RIMA delega a
responsabilidade dos impactos aos órgãos públicos e organizações da sociedade
civil local (GIULIANI, 2007). Segundo o documento:
(...) este impacto sobre o uso do solo e a infraestrutura disponível, acontecerá se não houver medidas governamentais adequadas para absorver mão de obra, ampliar a infraestrutura e controlar o uso do solo (...). A chegada de mão de obra para a fase de construção, vinda de outros municípios, poderá aumentar a ocupação irregular das áreas vazias em volta do COMPERJ, na ausência de controle do uso do solo pelo poder municipal (RIMA-COMPERJ, p.103).
Os municípios da região atraídos pela perspectiva de recursos de royalties se
associaram em um consórcio - Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento do
Leste Fluminense (CONLESTE)52. Com isso, os próprios municípios assumiram
essas responsabilidades e ainda estão sendo cobrados pelos gestores envolvidos na
implantação do COMPERJ53.
51 A manifestação técnica nos dá como exemplo o Município de Duque de Caxias que tem o segundo maior potencial poluidor do estado em diversos parâmetros físico-químicos e toxicológicos, em conseqüências da implantação da REDUC que atraiu outras indústrias do ramo e químicas relacionadas (IBAMA- ICMBIO, 2008, p.7). 52 De acordo com o site Fórum COMPERJ, a decisão da implantação do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro - COMPERJ, em Itaboraí, município na Região Metropolitana Leste, “pelo nível de investimentos, geração de empregos e arrecadação de impostos, trará nítidos benefícios e transformará, significativamente, o perfil sócio-econômico de todo o entorno do Complexo. Nesta perspectiva, os municípios que compõem esta área de influência criaram o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento do Leste Fluminense – CONLESTE, com o objetivo de definir estratégia e atuação conjuntas diante dos possíveis impactos sociais decorrentes da implantação do megaprojeto de investimento do Complexo. O CONLESTE, além de Itaboraí, reúne os municípios de Niterói, São Gonçalo, Cachoeiras de Macacu, Casimiro de Abreu, Guapimirim, Magé, Maricá, Rio Bonito, Silva Jardim e Tanguá (http://www.forumcomperj.com.br/, Acesso em 03 de fevereiro de 2010). 53 Portanto, não se generaliza aqui que todos os gestores dos municípios assumiram todas as responsabilidades e não cobrem essas da Petrobras. Na ata da Audiência Pública do Empreendimento do COMPERJ, no dia 09 de junho de 2009, que se discutiu o empreendimento denominado Estrada de Acesso Principal ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ), o Coronel Samuel Dionísio, da Secretaria do Transporte do Município de Itaboraí, traz a questão : “ Como vai conviver a população de Manilha e de Itambi com o aumento de tráfego gerado por essa nova rodovia?” mesmo corroborando que seja “fundamental a instalação do COMPERJ para o município, que vai ganhar na mega sena o maior prêmio de todos os tempos, é como se amanhã estivesse ganhando 64 milhões na mega sena e ficasse espantado com esse processo de crescimento”. Ele argumenta que “ há de se ter tecnicamente uma situação, uma condição de que a Petrobrás participe junto com o município e não entube goela abaixo do
65
No seminário internacional Direito à cidade nos municípios do CONLESTE
e os objetivos de desenvolvimento do milênio, realizado nos dias 5 e 6 de outubro
de 2009, pela ONU-HABITAT em parceria com a Petrobras, Universidade
Federal Fluminense (UFF) e CONLESTE, em Niterói, um Diretor de Créditos e
Inclusão Social do BNDES, na época, cobrou dos municípios avanços na
infraestutura das cidades.
O diretor observou que os “Indicadores do Milênio” 54 dos municípios do
CONLESTE tendem a piorar com a chegada de outras empresas e grupos
populacionais atraídos pelo COMPERJ. Dessa maneira, ele alerta os gestores dos
municípios que eles podem “não darem conta”, se não começarem já os seus
planos municipais de esgoto, planejamento e ordenamento urbano, “sozinhos ou
com a ajuda do BNDES”55. Apoiando a sua fala com a ideia de que os benefícios
(impostos, royalties) aos municípios só chegarão daqui a 5 anos e a declaração de
que “nós todos queremos”, o diretor ressaltou que todos devem “rachar a conta”,
dividir o ônus e as responsabilidades, porque a Petrobras não irá pagar tudo
sozinha.
Retornando ao depoimento do biólogo Breno Herrera, este aponta as
contradições no licenciamento ambiental realizado. Segundo ele, o licenciamento
do COMPERJ praticamente desconsiderou a legislação ambiental quanto à
necessidade de apresentação de alternativas locacionais para empreendimentos
poluidores56, já que das cerca de 10.000 páginas do EIA, menos de 10 são
município as situações em que as pessoas que moram em Itaboraí estão envolvidas, ou seja, a preocupação do transporte e do trânsito da prefeitura de Itaboraí é exatamente fazer com que a Petrobrás cuide das pessoas e não só das vias e não só dos animais. Essa é a situação, essa é a nossa preocupação e hoje nós estamos perguntando a Petrobrás: Quais vão ser as medidas tomadas na convivência das pessoas com os trechos do impacto da nova rodovia?” (p.20). (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audiencia_estrada_COMPERJ.pdf.>, Acesso 4 de fevereiro de 2010). Como a Comunidade de Itambi será transferida para um Conjunto Habitacional na rodovia BR-493 sofrerá os impactos diretos dessa nova rodovia, dessa maneira, esse assunto será melhor retomado no próximo capítulo. 54 Esses indicadores (no total de 58) foram definidos pelas equipes da ONU-HABITAT e da Universidade Federal Fluminense, com a participação de gestores locais do CONLESTE, em consonância com os 9 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e com os princípios do Pacto Global da ONU. Os objetivos são: acabar com a fome e a miséria; educação básica de qualidade para todos; igualdade entre sexos e valorização da mulher; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde das gestantes; combater a AIDS, a malária e outras doenças; qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento; e de equidade social no CONLESTE. 55 Grifo nosso. Esse gestor dá destaque em sua fala à palavra “ajuda”, ressaltando que a responsabilidade desses planos não é da Petrobras, e sim dos municípios. 56 Resolução CONAMA 01/06.
66
dedicadas à análise locacional, sendo os argumentos apresentados para a exclusão
da alternativa Campos dos Goytacazes de difícil aceitação pelos especialistas. O
chefe da APA de Guapimirim acrescenta ainda que o abastecimento hídrico no
município do norte fluminense seria resolvido com a utilização das águas
próximas à foz do Rio Paraíba do Sul, o mais caudoloso do estado, e sob
quaisquer aspectos ambientais seria a alternativa mais viável, já que não haveria
nenhuma UC dentro de um raio de 20 km do empreendimento.
Ainda o biólogo acrescenta que, a Federação das Indústrias do Rio de
Janeiro (FIRJAN) contratou e pagou os salários da maior parte do corpo técnico
responsável pelo licenciamento no estado: a FEEMA, criando assim profundas
implicações éticas sobre a independência necessária entre o licenciador ambiental
e o os agentes do capital industrial.
Dentre outras irregularidades apontadas pela Ação Civil Pública
1.30.003.000055/2006-07, apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF)
contra FEEMA, Petrobras e IBAMA, evidencia-se um alinhamento entre o órgão
ambiental e a Petrobras. Essa ação também se embasa na manifestação técnica do
IBAMA e ICMBio (2008) aqui utilizada, observando-se que a elaboração da
manifestação se deveu ao fato de que apesar de o MPF ter sido avisado de que o
órgão ambiental federal participaria de forma integrada no processo de
licenciamento, a presença de apenas dois técnicos do IBAMA nesse grupo de
trabalho não permitiu que eles tivessem a mesma voz ativa nas conclusões sobre o
EIA/RIMA. Dessa maneira, os peritos federais deixaram o colegiado, e a
autarquia ambiental passou a analisar os estudos apresentados pelo empreendedor,
oferecendo essa manifestação técnica separadamente (p.3). A ação civil, então,
destaca a conclusão dos 14 analistas que subscreveram a manifestação técnica:
Portanto, concluímos pelas razões acima expostas e pelo princípio de precaução, norteador da gestão e do direito ambiental pela impossibilidade da emissão de anuências pelas unidades de conservação federais à implantação do empreendimento na localidade proposta, enquanto não sejam apresentados estudos complementares, referentes aos impactos sobre as unidades de conservação (p.5).
Da mesma forma, o somatório de elementos apresentados anteriormente,
que sugerem uma inadequação do COMPERJ em relação à sua área de instalação,
fez com que os Conselhos Gestores da APA de Guapimirim e do Mosaico das
Unidades de Conservação da Mata Atlântica Central Fluminense se
67
manifestassem contrários ao empreendimento. Entretanto, essa posição foi
derrotada com a emissão da licença prévia pelo órgão ambiental estadual.
Segundo a ação civil, em que pese o teor da manifestação técnica, em 25 de
março de 2008, o então Superintendente do IBAMA no estado do Rio de Janeiro,
Rogério Rocco, emitiu a autorização ao FEEMA57 para que desse prosseguimento
ao licenciamento sob as condicionantes da autorização. No dia seguinte, 26 de
março de 2008, foi expedida pela FEEMA a licença prévia do COMPERJ com as
condicionantes, dentre elas a obrigatoriedade da apresentação de diversos projetos
e documentos pela Petrobras. Apenas dois dias após, no dia 28 de março de 2008,
foram produzidos o Parecer Técnico de Análise de Risco e o Parecer Técnico de
Licença de Instalação n° 1.651/2008, “na mesma data que exarados os
documentos” (p.5). Dessa maneira, a ação civil escreve:
Não se pretende aqui afirmar que seria impossível à Petrobrás vislumbrar - em razão da experiência por ela acumulada- projetos e documentos que poderiam eventualmente ser exigidos para concessão LI em comento. Causa estranheza, no entanto, que tenha ela entregue exatamente todos os projetos e documentos elencados como condição de Licença de Instalação (...), antes mesmo de o próprio parecer técnico que lastreou a concessão da Licença da Prévia. É dizer: ainda não havia a FEEMA se manifestado sobre as condicionantes da LI (ou havia?), mas já tinha a PETROBRÁS conhecimento das mesmas (p.47)58.
A ação civil ainda registra que a FEEMA informou ter o empreendedor
apresentado, antes do pedido de licença de instalação em 20/02/2008 e atualizado
em 07/03/2008, planos e programas integrantes do Plano Ambiental Básico (PBA)
e, em 27/02/2008, o Projeto Executivo (PEX) referente à implantação da
infraestrutura do COMPERJ, “a fim que se fosse precedida analise prévia dos
mesmos, objetivando verificar a necessidade de serem realizados eventuais
ajustes” (p.47).
57 Lembramos aqui que isso ocorreu antes da criação do INEA. O Governo do Estado do Rio de Janeiro criou através da Lei nº 5.101, de 04 de outubro de 2007, o Instituto Estadual do Ambiente (INEA) com a missão de proteger, conservar e recuperar o meio ambiente para promover o desenvolvimento sustentável. O novo instituto, instalado em 12 de janeiro de 2009, unifica e amplia a ação dos três órgãos ambientais vinculados à Secretaria de Estado do Ambiente (SEA): a Fundação Estadual de Engenharia e Meio Ambiente (FEEMA), a Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA) e o Instituto Estadual de Florestas (IEF). Em sua inauguração o governador do estado, Sérgio Cabral, afirmou: "Teremos um órgão fortalecido, que permitirá simplificar e agilizar a concessão de licenciamentos ambientais. O órgão nasce, trazendo quadro de pessoal renovado com 214 novos servidores, selecionados em concurso público realizado pela primeira vez na história ambiental do Rio. É um ganho de qualidade extraordinário” (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/>., Acesso em 29 de janeiro de 2010). 58 Grifo da Ação Civil Pública 1.30.003.000055/2006-07.
68
A ação civil levanta ainda outras irregularidades, tais como a não inclusão
do sistema de adução de água caracterizando partição do licenciamento do
empreendimento, uma vez que a implantação de um depende do outro. Dessa
maneira, o EIA não considera a Lei Estadual 3111 de 18 de novembro de 199859,
que estabelece:
Quando houver mais de um EIA para a mesma bacia hidrográfica a FEEMA deverá realizar a análise conjunta dos empreendimentos, para definir a capacidade de suporte do ecossistema, a diluição dos poluentes e os riscos civis, sem prejuízo das analises individuais (p.7)
Além disso, na região da implantação do COMPERJ há vários outros
projetos de grande magnitude, licenciados ou em processos de licenciamento, que
se enquadram também nessa consideração: terminais de gás natural liquefeito-
GNL e gás liquefeito de petróleo na Baía de Guanabara, Arco Rodoviário do Rio
de Janeiro, o gasoduto REDUC-Cabiúnas e ampliação da REDUC, além do
terminal aquaviário da Ilha Comprida e a linha 3 do metrô.
O licenciamento de parte (principal) do Complexo petroquímico, anterior e isoladamente, além de ocultar a lesividade do conjunto, e obstar a intervenção e análise do órgão protetor das unidades de conservação federais em todo o processo, terá, inevitavelmente o efeito nefasto de induzir a concessão de licença para as demais obras (...) uma vez implantadas as principais instalações do COMPERJ, e não sendo estas suficientes à operação do empreendimento concebido pela Petrobrás, tornar-se-á absolutamente necessária a aprovação das obras complementares. Estará o órgão licenciador, assim, refém das circunstâncias então criadas (AÇÃO CIVIL PÚBLICA - MPF n°1.30.003.000055/2006-07, p.41).60
Deve-se destacar também a inclusão, no capítulo do meio ambiente da
Constituição do Estado do Rio de Janeiro, das emendas referentes à Baía de
59 Como Breno Herrera nos lembra, essa lei é de autoria do Sr. Carlos Minc, na época deputado estadual e presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa. Em 2008, como secretário estadual do meio ambiente, Minc licenciou o COMPERJ, contrariando, dessa maneira, a lei de sua própria autoria. 60 Esse desmantelamento do conjunto é visto, por exemplo, na Ata da Audiência Pública do Empreendimento do COMPERJ, no dia 09 de junho de 2009, quando se discutiu o empreendimento denominado Estrada de Acesso Principal ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ). Mesmo com o próprio nome da ata se referindo ao COMPERJ, foram comuns as repostas como a de Sergio Tolipan, da consultora CONCREMAT, responsável pela elaboração do estudo de impacto ambiental e do relatório do impacto ambiental: “Pelo que estou entendendo, esta pergunta diz respeito ao COMPERJ, não à estrada. Seria uma pergunta sobre o gerenciamento dos resíduos químicos do COMPERJ. O processo dos efluentes do COMPERJ vai ser outro processo de licenciamento que não diz respeito à estrada. Eu não saberia responder” (p.23-24) (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br>, Acesso em 04 de fevereiro de 2010). Dificulta-se assim as compreensões do processo em todo seu conjunto.
69
Guanabara: Área de Preservação Permanente61 e Área de Relevante Interesse
Ecológico62 (AMADOR, 1992). O relatório PROBIO63 2000 e sua revisão em
2006, do Ministério do Meio Ambiente, qualificam essa baía como área de alta
importância biológica (SOARES, 2007). Além disso, visando a melhoria da sua
qualidade ambiental, o Programa de Despoluição de Baía da Guanabara64 já
consumiu bilhões de reais, o qual tem como premissa a redução das descargas de
esgotos domésticos e industriais para esse ambiente (GIULIANI, 2007).
Por último, mas não menos importante, lembra-se aqui a importância da
APA de Guapimirim para as comunidades que vivem em seus arredores.
A política que tende a instituir Unidades de Conservação de Uso
Sustentável65 permite que se possa conservar os sistemas naturais mantendo certas
atividades econômicas ligadas à extração de seus recursos. Nesse sentido, as
políticas de proteção de área estariam também tentando amenizar as condições
socialmente desfavoráveis das populações ditas tradicionais. 61 De acordo com Código Florestal brasileiro (Lei 4.771 de 15/09/1965), incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001, Área de Preservação Permanente: área protegida nos termos dos artigos 2o e 3o desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. (Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4771.htm>, Acesso em 30 de março de 2009). 62 De acordo com o SNUC (lei n° 9.985, de 18 de Julho de 2000, no art.16), Área de Relevante Interesse Ecológico é uma área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e tem como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local, e regular o seu uso admissível, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza (SNUC, 2003). 63 Entre 1997 e 2000, o Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira - PROBIO, componente executivo do Programa Nacional da Diversidade Biológica- PRONABIO, apoiou a realização de um estudo mediante ampla consulta para a definição de áreas prioritárias para conservação nos biomas brasileiros. Essas áreas foram reconhecidas pelo Decreto no. 5092, de 21 de maio de 2004 e instituídas pela Portaria no 126 de 27 de maio de 2004 do Ministério do Meio Ambiente. A portaria prevê a revisão periódica pela Comissão Nacional de Biodiversidade (CONABIO), em prazo não superior a dez anos, devido à dinâmica do avanço do conhecimento e das condições ambientais (Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/zoneamento-ambiental/areas_prioritarias/>, Acesso em 30 de março de 2009). 64 O Programa de Despoluição da Baia da Guanabara (PDBG) foi iniciado em 09 de março de 1994. Desenvolvido pelo governo do Estado do Rio de Janeiro em conjunto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o governo japonês, é constituído por um conjunto de ações multidisciplinares que compreendem obras, bens e serviços relativos a intervenções nas áreas de esgotamento sanitário, abastecimento de água, coleta e destinação final de resíduos sólidos, drenagem de águas pluviais, dragagem de rios e lagoas, controle ambiental e mapeamento digital. Tais ações visam à redução dos níveis de poluição da Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara (Disponível em: http://www.cedae.rj.gov.br, Acesso em 30 de março de 2009). 65 Unidades de Uso Sustentável têm como objetivo tanto a proteção do meio ambiente natural, como as próprias atividades das populações residentes. Entre estas unidades, destacam-se: as Reservas Extrativistas (RESEX) e as Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e as Áreas de Proteção Ambiental (APAs). Ver: Mercadante (2001); Sant’Anna (2003).
70
Este foi, então, um dos mecanismos que a sociedade teria encontrado para
regular aquele processo que, através da devastação da natureza, levaria à
decomposição de grupos sociais inteiros que lidam diretamente com ela e retiram
da mesma seus principais recursos econômicos.
A Comunidade de Itambi66, além de tirar sua subsistência do manguezal
seja pela cata de caranguejo, siri e pela pesca de robalo ou outros peixes, também
possuí os seus modos de vida adaptados à região, assunto que se verifica no
próprio RIMA-COMPERJ. Este afirma que os manguezais da APA (...)
“fornecem o sustento para diversas comunidades que recolhem animais” (RIMA-
COMPERJ, 2007, p.67-68.).
Contudo, com a entrada do COMPERJ na região, a Comunidade de Itambi
será des-re-territorizada de seu lugar de vida para blocos de prédio distantes dos
manguezais. A população de caranguejeiros, entretanto, desde o início da pesquisa
sempre careceu de informações sobre tal mudança e, a partir de relatos dos
próprios moradores da comunidade, tal situação foi apenas comunicada, não tendo
havido nenhuma consulta prévia.
Parece-nos assim que, como recorrente no território fluminense, as
audiências públicas novamente servem estritamente para comunicar as decisões e
a aparente abertura da participação da sociedade civil e da população diretamente
envolvida em projetos de modernização é basicamente formal, ainda muito
distante de projetos de gestão participativa67.
66 A Comunidade de Itambi estaria então vivenciando dois conflitos contraditórios momentaneamente. O conflito com os gestores da APA de Guapimirim, na busca de uma “proteção da natureza”, e o conflito com uma territorialização ecologicamente degradante - o COMPERJ ,que dada as intrepetações dos entrevistados e documentos dessa pesquisa, impedirá a habitação e a sobrevivência, expulsando, as populações de seus territórios de vida e obrigando-as a se deslocarem. Contudo, com a entrada do COMPERJ na região podemos ver também uma maior aproximação das populações residentes na APA de Guapimirim com seus gestores. 67 Entende-se aqui, a partir de Souza e Rodrigues (2004), que o desejável na prática do planejamento e da gestão, do ponto de vista político, seja que os próprios cidadãos tenham a oportunidade de decidir sobre os destinos de seus espaços e de suas cidades, situação em que o papel dos técnicos e estudiosos seja “de consultores do conjunto dos cidadãos organizados, e não de conselheiros e funcionários a serviço de estruturas de poder nebulosas e autoritárias” (p.35).
71
3.4. As Contradições do Modelo de Desenvolvimento via COMPERJ
A instalação do COMPERJ é um exemplo claro do domínio de uma
concepção de desenvolvimento socioespacial a partir dos pressupostos de certos
grupos sociais sobre outros grupos. Tal domínio expressa contradições muito
evidentes nas políticas públicas atuais que afetam o espaço fluminense: as
necessidades da realidade local periferizadas por outras definidas pelo COMPERJ
em relação ao desenvolvimento socioespacial.
Uma gerente do COMPERJ, em palestra no já referido seminário
internacional realizado pela ONU-HABITAT, UFF e COLESTE, afirmou que a
chegada da Petrobras na região foi ancorada no “princípio da transparência”, e que
o diálogo com as populações locais foi sempre permanente. Em sua apresentação,
ela também acrescentou que o COMPERJ segue alguns princípios, na seguinte
ordem: busca por viabilidade econômica, discurso ecologicamente correto e
socialmente justo. Em referência ao ecologicamente correto, o COMPERJ se
apóia no corredor ecológico e se baseia na valorização da cultura local, em ações
de responsabilidades sociais e projetos de Educação Ambiental.
Tal discurso institucional mostra as contradições da fala da gerente do
COMPERJ como as realidades locais. Observa-se ainda que o COMPERJ
privilegia alguns requisitos comuns entre os gestores do Estado: visão em curto
prazo e interesses globais sobrepondo-se aos interesses locais, racionalidade
estritamente técnico-científica, assim como outros anteriormente já descritos.
O COMPERJ, a partir dessa análise se enquadra perfeitamente nos
discursos de desenvolvimento dos gestores do estado do Rio de Janeiro e se
distancia das concepções de desenvolvimento e sustentabilidade que acreditamos
serem os caminhos de possíveis gestões democráticas e participativas no
território, defendidas anteriormente.
Apesar das claras contradições entre o ponto de vista ambiental e as
previsíveis conseqüências do empreendimento industrial no território de sua
instalação, a Petrobras e o governo do estado, com promessas de melhoria
econômica (genericamente) e oferta de empregos, conseguem o apoio de grande
parte da população local e, principalmente, do poder público das prefeituras
72
locais. A implantação do COMPERJ é assim divulgada pela prefeitura, pela
Petrobras, pela mídia e pelas ONGs locais como o único meio para o
desenvolvimento (econômico) local e seus impactos negativos são camuflados
pelo discurso de desenvolvimento sustentável.
O chefe da APA de Guapimirim interpreta que a Petrobras e o governo se
utilizam de mecanismos de “chantagem ambiental”, as quais podem ser vistas
principalmente no âmbito das compensações ambientais68. A lógica da criação das
UCs se subverte, “já que entes públicos dispõem de parte de seu território para
implantação de empresas poluidoras, sacrificando sua qualidade ambiental em
troca de benefícios pecuniários diretos.” 69 Um exemplo claro na região seria a
criação da APA Municipal de Suruí, em Magé, motivada, de acordo com Breno
Herrera, pela Secretaria do Meio Ambiente Municipal para recolher benefícios de
compensação do COMPERJ.
Segundo o pescador Afonso Sobrinho (representante da Associação de
Pescadores da Praia de São Gabriel em Itaoca, São Gonçalo):
(...) a Petrobras fez de que iria ter um empreendimento de oito bilhões de dólares aqui na região. Portanto, a partir desse anúncio, todas as pessoas passaram a entender, o grosso da população passou a achar, que teria um emprego, que seus filhos teriam um emprego, que conseguiriam um espaço dentro do COMPERJ e isso não é verdade (BANDEIRA DE MENEZES, 2009, p. 27).
Entende-se assim que, conforme sinalizamos anteriormente, o processo da
instalação do COMPERJ ainda se baseia na redução do conceito/noção
desenvolvimento ao crescimento econômico e a modernização tecnológica e não
leva em conta os custos sociais e ambientais, e a repartição desigual dos ônus e
bônus entre as classes e grupos sociais. Ressalta-se, a partir da visão de Souza
(2000), que as vítimas da segregação socioespacial certamente serão as que mais
sofrerão com “a vingança das forças da natureza” (p.120).
Da mesma forma, observou-se que os gestores envolvidos na política de
desenvolvimento para o território em questão, baseando-se na visão de Dematteis
(2008, p.44), em vez de adaptarem aos ambientes locais o conhecimento e as
68 Segundo o SNUC (2003), em seu artigo 36, “nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental (...) o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação (...)”. 69 Resposta via e-mail dia 04/11/2009
73
técnicas disponíveis, estão adaptando o lugar à técnica, nivelando-as às
tecnologias que atualmente são rotuladas como as mais produtivas. Entretanto, se
trata de uma concepção parcial da produtividade, entendida como capacidade dos
investimentos de aumentar a renda financeira em curto prazo, mesmo que
diminuam a produtividade de energia, capital natural e desmantelem as
diversidades culturais.
Em outras palavras, as potencialidades específicas locais que poderiam ser
utilizadas como vantagens competitivas são desvalorizadas em detrimento de
interesses globais/nacionais, e com isso se perde a reprodução de saberes
contextuais ambientais no que se refere às formas produtivas locais, se aumentam
as desigualdades e os efeitos ecológicos, e diminui a diversidade territorial
(DEMATTEIS, 2008).
O chefe da APA de Guapimirim afirma: “se nem mesmo a oposição do
Mosaico seja suficiente para evitar os impactos ambientais negativos do
COMPERJ, este não será um movimento em vão se estabelecer-se como um dos
elos de uma rede de resistência maior”70. O biólogo acredita que a organização da
resistência ambiental deve então, além de reforçar os movimentos de resistência
local, construir estratégias de ampliação da escala de atuação. Ele afirma que a
articulação das UCs no Mosaico Central Fluminense já segue esse princípio e
devem ir além, associando-se a casos similares de resistência como os da usina
hidrelétrica do Rio Madeira e a abertura do banco de Abrolhos à exploração
petrolífera, ensejando assim movimentos integrados de resistência ambiental.
Por outro lado, como visto a partir das discussões acima e somadas às
entrevistas com os moradores da Comunidade de Itambi e gestores das UCs
envolvidas, percebe-se também que não só as referências simbólicas, os laços de
convivência e solidariedade da Comunidade de Itambi estão “fadados a
desaparecer”; mas também a própria fonte de sobrevivência desse grupo também
está ameaçada, assim como de outras populações locais que dependem
diretamente dos recursos das unidades de conservação que serão afetadas pelo o
COMPERJ.
70 Resposta via e-mail dia 04/11/2009.
74
Dessa maneira, torna-se importante nesse momento averiguar o processo que
a população vivencia para pensar a partir das experiências dos sujeitos envolvidos
outras racionalidades para projetos de gestão na localidade. Tal observância pode
contribuir para que outros projetos de desenvolvimento no Brasil considerem as
realidades locais, as suas diferentes culturas, interesses, necessidades e assim
transformem o território levando em conta as potencialidades locais com a
participação efetiva dos diferentes grupos em seus diferentes projetos de
desenvolvimento e sustentabilidade. Acredita-se que assim se diminuiriam as
desigualdades e se aumentariam os direitos e liberdades para o maior número de
pessoas possível contribuindo para a construção de um Brasil democraticamente
mais justo.
4. A Comunidade de Itambi: potencialidades e perspectivas de um território em transmutação
A comunidade de caranguejeiros de Itambi, localizada nos mangues da APA
de Guapimirim, será transferida para um conjunto habitacional, o qual está
inserido em um projeto do PAC do município de Itaboraí, às margens da BR- 493,
futura via do Arco Metropolitano.
Ao mesmo tempo, a instalação de um pólo petroquímico na região, o
COMPERJ, certamente ocasionará futuros danos nos mangues da APA de
Guapimirim, a partir das interpretações dos documentos e de entrevistas de/com
gestores do IBAMA e ICMBio analisados no capítulo anterior, que possivelmente
interferirão nos modos de vida e sobrevivência dessa comunidade. A comunidade
passa assim por um processo de perda de seu lugar de vida, afetividade,
convivência e sobrevivência.
Como já se afirmou nesse trabalho, a partir da Constituição de 1988, a escala
local da política nacional ganhou novas atribuições e a partir de exigências da
sociedade em busca de direitos da cidadania, essa escala pode ganhar maior
visibilidade. Contudo, como se observou no capítulo anterior, o processo de
organização do território, o projeto de desenvolvimento via COMPERJ, assim
como outras políticas que estão sendo implementadas hoje no município de
Itaboraí em virtude e/ou em conseqüência da entrada do pólo petroquímico, são
escolhas que revelam muito mais interesses nacionais do que condizem com as
potencialidades locais (CASTRO, 2005).
Acredita-se assim, baseando-se em Castro (2005), que seja ainda necessária
a inversão de certos valores e que se acrescentem outros no debate sobre
município, já que atualmente, preferencialmente tem-se o “recorte espacial da
informação estatística (...) útil para as análises setorializadas da atividade
econômica, das finanças e da sociedade”. Contudo, ineficaz para revelar sobre o
próprio município como objeto de conhecimento e as condições diferenciadas
tanto nacionais, como até mesmo locais (p.136).
Esse capítulo analisará então as políticas públicas que atualmente impactam
o território de vida da Comunidade Itambi – a saída da comunidade dos mangues
76
e a entrada do COMPERJ do município. Em outras palavras, analisaremos a des-
re-territorialização71 da Comunidade de Itambi, que ultrapassa a perda do
território em sua dimensão material, buscando-se considerar outras racionalidades
a partir das perspectivas, desejos e necessidades da população comunitária, grupo
diretamente atingido pelas políticas públicas de desenvolvimento em andamento
no município de Itaboraí. Tais políticas estão focadas, ao mesmo tempo, como
estratégias de proteção ambiental e como possibilidade de “desenvolvimento”
associada à transformação da base técnico-produtiva da indústria moderna.
Diferentes motivos são apontados para a saída da Comunidade de Itambi dos
mangues tanto pelos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e das Unidades
de Conservação envolvidas, como pelos próprios moradores da comunidade.
Verifica-se a ideia de qualidade de vida nos diferentes discursos, mas buscar-se-á
compreender tal concepção a partir dos valores da própria comunidade ao mesmo
tempo em que se verificarão as contradições dessa concepção nos demais
discursos.
A partir de Souza (2000a), dessa maneira, entende-se a defesa da autonomia
como um princípio básico72. Dessa forma, compreende-se que o caminho
democraticamente mais legítimo na busca de mais justiça social e de melhor
qualidade de vida seja quando os próprios indivíduos e grupos sociais envolvidos
definem seus conteúdos concretos e estabelecem prioridades referentes a estes
(p.79).
Seguindo o raciocínio do autor supracitado, esse capítulo não visa então,
fazer um receituário ou um esquema pretensamente universal, já que somente o
debate sobre a realidade entre os caranguejeiros de Itambi tem a capacidade e
responsabilidade de orientar na intervenção sobre o real (p.85). Procura-se aqui
propor e alertar para as contradições e riscos embutidos nas políticas feitas por
outros grupos que não sejam os diretamente envolvidos nestas, assim como
perceber a transparência dessas políticas públicas que envolvem os moradores da
Comunidade de Itambi e se essas contribuirão para uma melhor qualidade de vida
e mais justiça social para essa população.
71 Entende des-re-territorialização a partir de Haesbaert (2004), abordada no capítulo 1 desta dissertação. 72 Grifos do autor Souza (2004).
77
Primeiramente, torna-se necessário apresentar a Comunidade de Itambi e sua
relação com o território em que ainda se localiza. Posteriormente, verificar-se-á o
local para onde a comunidade será re-territorializada, os motivos dessa mudança,
a opinião dos moradores de como vem sendo o processo (a des-re-
territorialização de uma maneira geral), para então buscarmos as resistências,
alternativas, estratégias de luta e sobrevivência, partindo de uma outra
racionalidade: a da comunidade em questão.
4.1. A Comunidade de Itambi
A comunidade de caranguejeiros está localizada em Itambi, distrito do
município de Itaboraí, situado na região metropolitana do Rio de Janeiro, na parte
leste da Baía de Guanabara. Itambi é a única área do município que tem ligação
com a baía, localizando-se no chamado “Recôncavo da Guanabara” (figura 5).
Figura 5: Representação esquemática do distrito de Itambi e da área do Manguezal de Itambi
Fonte: Adaptado PREFEITURA DE SÃO GONÇALO / PREFEITURA DE ITABORAÍ (2007).
78
Uma importante característica do distrito é a presença de manguezais,
ecossistemas que representam uma área de transição entre o ambiente marinho e
terrestre. O manguezal de Itambi localiza-se na Área de Proteção Ambiental de
Guapimirim. A comunidade extrai recursos do manguezal para sua subsistência e
tem seus modos de vida relacionados com esse ambiente.
Os habitantes da Comunidade de Itambi, localizados especificamente na
chamada Bacia, são, predominantemente, catadores de caranguejo, e vivem em
casas próprias, muito simples, em ruas não asfaltadas (figura 6), de onde são
vistos os barcos normalmente parados à beira do rio, por detrás das casas (figura
7). O local se caracteriza por um ambiente familiar, em que todos se conhecem e
vários possuem algum parentesco, de modo que eles ajudam uns aos outros. Os
poucos que têm barco a motor saem com os que não possuem, normalmente em
quatro pessoas e “(..) eles mesmos que são os mecânicos do motor também, são
todos unidos” (Moradora J., 11/02/2010). Os catadores de Itambi saem para a
catação entre as 6 e 7 horas da manhã e retornam por volta das 5 horas da tarde,
realizando a captura dos caranguejos em horários da baixa-mar (Caranguejeiro
A.O, 20/12/2007).
Figura 6: Rua de terra na entrada da vila (à direita, as casas e ao fundo, um
campo de futebol)
Fonte: Arquivo Pessoal (27/07/2007)
79
Figura 7: Foto realizada durante a entrevista com A. O. Casa do A.O.
localizada à direita. À esquerda, o barco utilizado para a coleta atracado
Fonte: Arquivo Pessoal (20/12/2007).
A maioria dos catadores são homens e as mulheres realizam os afazeres
domésticos. No local há uma deficiente infraestrutura; todavia, os entrevistados
caracterizam a região como calma e tranqüila, “aqui nós temos paz”
(Caranguejeiro S., 27/07/2007). A tranqüilidade e a segurança local são sempre
ressaltadas nas falas dos moradores:
(...) aqui a gente fica até tarde, todo mundo conversando, (...) a gente tem segurança, aqui é praticamente é uma família, um toma conta da casa do outro assim, não tem caso aqui de ninguém for assaltado aqui dentro, não teve roubo na casa de ninguém (Morador J., 16/09/2009).
Os caranguejeiros também não saem de suas casas para a venda do
caranguejo ou do pescado, sendo a comercialização realizada na própria Bacia.
(...) pessoal entra aqui dentro, o pessoal vende caranguejo aqui dentro, vem gente de tudo que é lugar pra comprar caranguejo aqui dentro, larga o carro aqui, entra lá pra dentro, vai comprar caranguejo, volta, o carro tá aberto do mesmo jeito que deixou, não acontece nada (...) ninguém sai daqui para lugar nenhum pra vender um caranguejo, vendo o caranguejo aqui, ali na frente, ali na pracinha, não vai pra Niterói, não vai pra São Gonçalo, vende aqui, o pessoal de São Gonçalo, de Niterói, do Rio, de Magé, vem tudo pra cá comprar caranguejo, porque o nosso caranguejo é o melhor que tem, é o maior e o melhor, vem todo mundo aqui
80
comprar, esse menino da casa de caranguejos lá das Charitas, Floriano, vem aqui comprar caranguejo do nosso mangue pra levar para casa deles comer, a gente não sai daqui pra poder vender, os garotos não saem daqui pra vender peixe, pra poder caranguejo, eles vendem dentro de casa, ninguém sai daqui pra vender nada (Moradora J., 11/02/2010).
No fim da rua, há um estabelecimento comercial. Observa-se, em frente a
esse estabelecimento, a partir das observações nas diversas visitas realizadas
durante essa pesquisa e pela fala dos próprios moradores, um local de encontro
tanto dos moradores como de pessoas de outras localidades que vão para a Bacia
comprar caranguejo. As pessoas ficam debaixo de uma grande mangueira
comendo caranguejo e consumindo bebidas do estabelecimento comercial.
(...) você senta aqui oh, adora essa árvore, todo mundo que vem aqui fica apaixonado, come caranguejo aqui de baixo, bebe, vai , fala que vai voltar mais vezes e volta, nada, melhor lugar que tem é aqui, tem até um colega da gente que mora lá em Visconde que fala ‘é aqui que o pobre vive, debaixo dessa mangueira, bebendo uma cerveja, comendo um caranguejo’ (Moradora J.A., 11/02/2010).
Além da mangueira (figura 8) verificam-se nos quintais dos moradores
plantações de abacate, laranja, goiaba, manga, banana, milho e aipim, assim como
criações de pato, galinha e porco.
Figura 8: Estabelecimento comercial (no fundo da figura) e alguns moradores sentados em sua frente debaixo de uma grande mangueira.
Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008)
81
Em seus horários de lazer, os moradores da comunidade se encontram
frequentemente na rua, onde as mulheres normalmente ficam em frente de suas
casas conversando uma com as outras e cuidando dos seus filhos e dos filhos de
outras moradoras que não estão presentes. As crianças normalmente estão
brincando, principalmente no campo de futebol. Outro ponto também destacado
nas falas dos moradores, principalmente pelas mulheres, é o campeonato de
futebol que ocorre uma vez por ano no local e que, segundo elas, é freqüentado
por pessoas de toda a região para participar e assistir.
Em outro trabalho73, em 2008, verificou-se o sentimento de apropriação e
identificação com os mangues nas falas de alguns habitantes da comunidade.
Percebeu-se que os caranguejeiros de Itambi possuem um vasto conhecimento da
biologia dos caranguejos, identificam os principais problemas dos manguezais e
entendem profundamente as modificações e transformações do ambiente ao longo
dos anos, já que o trabalho dos caranguejeiros, além de ser diário, é herança de
gerações anteriores, o que faz com que eles recebam, assim, conhecimento do
ambiente passado (MOYSÉS, 2008).
Além disso, os catadores relacionam diretamente a preservação desse
ecossistema com a conservação de suas atividades e acreditam contribuir para a
manutenção desse sistema. Compreende-se assim que a manutenção dos
habitantes da Comunidade de Itambi nos mangues é de fundamental importância
para a conservação desse ambiente, bem como o fato de a sobrevivência dessa
comunidade de catadores depender da conservação dos manguezais (ibidem).
Entretanto, além da instalação do COMPERJ e os seus previsíveis impactos
negativos nos manguezais, já abordados nessa dissertação, essa comunidade sairá
do território que vive atualmente para um conjunto habitacional juntamente com
73 Trabalho de monografia da Faculdade de Oceanografia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), orientada pelo sociólogo Gian Mario Giuliani do IFCS- UFRJ. A distância existente entre os conhecimentos científicos e os conhecimentos populares foi a preocupação que norteou o trabalho. A partir dos conhecimentos dessa população, discutiu-se o ciclo de vida do caranguejo e as influências naturais e antrópicas que interferem nesse animal e, conseqüentemente, nas condições de vida desses caranguejeiros. Com isso, ao entender a importância da participação da Comunidade de Itambi nos planos de manejo local e em estudos, tais como a época mais apropriada para o Defeso e instrumentos utilizados na captura mais adequados para preservação desse ambiente, percebeu-se a peculiaridade dos conhecimentos culturais dessa população para a conservação desse ecossistema, assim como o fato de a preservação desse ambiente ser fundamental para a manutenção dessa comunidade (MOYSÉS, 2008).
82
outras famílias residentes na rua Levi Barroso e Vila do Campo, afastando-a dos
mangues e dos rios pela Rodovia BR-493 RJ.
4.2. A saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de Guapimirim: algumas considerações
A des-re-teritorialização (HAESBAERT, 2004) da Comunidade de Itambi é
interpretada de maneira distinta entre os diferentes agentes envolvidos nesse
processo, assim como são apontados diferentes motivos referentes à saída da
comunidade do território ocupado atualmente.
Nesse momento da pesquisa, apresentar-se-á então o projeto do PAC, no
qual está incluído o conjunto habitacional para onde os habitantes da comunidade
serão deslocados, e as opiniões tanto dos gestores do PAC envolvidos nesse
projeto, dos gestores das Unidades de Conservação envolvidas (APA de
Guapimirim e ESEC da Guanabara), assim como a interpretação da própria
Comunidade de Itambi.
Na figura 9, pode-se observar a área em que ocupam as três comunidades
(Bacia, Rua Levi Barroso e Vila do Campo)74 que serão deslocadas. Também
podem ser visualizadas as margens da Rodovia BR 493 RJ, que será duplicada, e
um segmento do Arco Rodoviário. A Vila do Campo, como destacam os gestores
do PAC e os habitantes da Comunidade de Itambi, é marcada pelo tráfico de
drogas.
74 É importante ressaltar aqui, para evitar confusões, que a quem o trabalho se refere como Comunidade de Itambi, o projeto que inclui o Conjunto Habitacional do PAC do Município de Itaboraí, se refere a essa comunidade, como Comunidade da Bacia (como o local é reconhecido dentro de Itambi e área que está inserida dentro da APA de Guapimirim), já que a rua Levi Barroso e a Vila do Campo também se encontram dentro do distrito de Itambi. Esse trabalho optou pela denominação de Comunidade de Itambi, devido a comunidade de caranguejeiros de Itambi já ser assim referenciada em outros trabalhos (ALBUQUERQUE, A.L., 2002; BOTELHO, 2003; MOYSÉS, 2008; PANDEFF, 2009; HERRERA, no prelo), pelo filme Guapimirim, de Telêmaco Montenegro, por documentos (PLANO DE MANEJO DA APA DE GUAPIMIRIM, 2001; GIULIANI et al., 2005), em grupos de pesquisa (“Biodiversidade, Áreas Protegidas e Inclusão Social”-LATTES, CNPq, UFRJ; GeTERJ- PUC-RJ) e comumente reconhecida entre os membros dos conselhos gestores do Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense (MMACF) e da APA de Guapimirim e ESEC da Guanabara (CONAPAGUAPI), dentro dos quais possuem representantes da comunidade.
83
Figura 9: Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)
INTERVENÇÕES
Rua Levi BarrosoBacia
Vila do Campo
REASSENTAMENTO
Conjunto Habitacional
Centro Antigode Itambi
BR 493
Fonte: Apresentação do PAC [2008?]
Segundo uma apresentação do PAC do município de Itaboraí75, o projeto
conta com a remoção de 256 famílias de “áreas insalubres e/ou perigosas” e o
reassentamento delas em um conjunto habitacional dotado de infraestrutura, posto
de saúde e creche. Além disso, no local em que ainda habitam e no novo local
haverá abastecimento de água, drenagem e rede de esgotamento sanitário, estação
de tratamento de esgoto, centro comunitário, pavimentação, ciclovia e áreas de
lazer (figuras 10, 11, 12).
Esse projeto é mais detalhadamente explicado no Memorial Descritivo de
Intervenções - PAC76, o qual, como o próprio nome diz, tem como objetivo
descrever as intervenções urbanas:
1) Infraestrutura Urbana com implantação de sistema de esgotamento sanitário, drenagem, pavimentação e recuperação ambiental no Centro Velho de Itambi, com retirada de famílias nas favelas existentes as margens do Canal Tambicu (Bacia)/
75 Em formato de Power Point, que me foi enviada pelo o arquiteto e urbanista do Conjunto Habitacional do PAC. 76 Esse memorial, por sua vez, me foi entregue pelo chefe da APA de Guapimirim.
84
Córrego dos Padres e Rua Levi Barroso, bem como famílias adensadas inapropriadamente na favela da Vila do Campo.
2) Reassentamento em Jardim Itambi, das famílias retiradas das áreas mencionadas acima, próximo também ao Centro Velho de Itambi, onde será implantado Conjunto Residencial para 256 famílias e também haverá uma readequação da infra-estrutura urbana com a implantação de sistema de esgotamento sanitário, drenagem e sistema de abastecimento de água. Sendo que estas intervenções também atenderão a população instalada no entorno.
3) Com a instalação de equipamentos comunitários como posto de saúde e creche, não só as áreas acima mencionadas serão beneficiadas como também todas as comunidades do entorno, algo entre 1.800 a 2.000 famílias. Será implantado ainda um centro comunitário que ajudará na qualificação e geração de renda para os pescadores e catadores de caranguejo.
4) As intervenções acima visam à requalificação espacial e reestruturação urbana (exceto abastecimento de água, uma vez que a área já é atendida pela CEDAE) do Centro Velho de Itambi. Após a retirada das famílias da Bacia e Rua Levi Barroso será realizada uma recuperação ambiental, não permitindo que estas ou quaisquer outras famílias ocupem tal área
Figura 10: Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de esgoto e drenagem (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)
INTERVENÇÕES
Rua Levi BarrosoBacia
Vila do Campo
INFRA-ESTRUTURA
Centro Antigode Itambi
Esgoto/ Drenagem
ETE
Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]
85
Figura 11: Imagem de satélite com as intervenções previstas pelo projeto do PAC de pavimentação (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)
INTERVENÇÕES
Rua Levi BarrosoBacia
Vila do Campo
INFRA-ESTRUTURA
Centro Antigode Itambi
Pavimentação
Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]
Figura 12: Imagem de satélite na qual se visualiza o local onde será realizada a recuperação ambiental e que está sendo construído o centro comunitário (área da Bacia, Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)
INTERVENÇÕES
INFRA-ESTRUTURA
Recuperação AmbientalPlantio de Espécies Nativas
Centro Comunitário
ETE
Fonte: Apresentação do PAC do Município de Itaboraí [2008?]
. Segundo o Arquiteto e Urbanista do PAC, as famílias que serão
reassentadas nesse conjunto habitacional receberão um documento de Seção de
86
Uso para fins de moradia, o qual substitui a escritura, mas não permite que essas
pessoas vendam seus imóveis. Na figura 13, podemos visualizar a maquete do
conjunto habitacional. Os apartamentos ficam de frente para a BR 493 e por detrás
se observa, no centro, a creche; à esquerda se localiza o posto de saúde e à direita
uma área de lazer que inclui um campo de futebol.
Figura 13: Maquete do Conjunto Habitacional Nova Itambi
Fonte: Parecer Técnico 53/207 Apa-Guapimirim, 13 de dezembro de 2007.
O primeiro documento oficial registrado nessa pesquisa que constatou a
saída dessa comunidade dos mangues para o conjunto habitacional foi o parecer
técnico 52/2007 APA-Guapimirim (13 de dezembro de 2007) o qual dizia que a
transferência estava associada à construção de uma estrada principal de acesso e
de outros acessos secundários que serão construídos e/ou recuperados para
viabilizar o transporte de equipamentos e matéria prima até o COMPERJ. O
parecer apresentava também as figuras 13 e a 14 deste trabalho. Por esse
documento, o espaço onde, atualmente, os caranguejeiros vivem (contorno
amarelo da figura 4.10), serviria, em parte, para as obras do Arco Rodoviário do
Rio de Janeiro (GIULIANI, 2007). As mesmas figuras constam na apresentação
do PAC do município de Itaboraí e me foram enviadas pelo chefe da APA de
Guapimirim.
87
Figura 14: Imagem de satélite da área em estudo (trecho do Município de Itaboraí, Rio de Janeiro)
Fonte: Parecer Técnico 53/207 Apa-Guapimirim, 13 de dezembro de 2007.
A comunidade irá residir em apartamentos e não em casas como moram
atualmente. No parecer técnico destacamos que:
(...) segundo a presidente da Associação de moradores da Bacia, a maioria das pessoas está satisfeita com a implantação do projeto, pois trará uma boa qualidade de vida para todos, haverá uma recuperação ambiental (como cita o projeto) (...). Fomos informados de que apenas uma minoria de moradores está insatisfeita, isto é, são contrários a residir em apartamentos como prevê o projeto. (p.2)
Em uma entrevista realizada com o chefe da APA de Guapimirim no dia 03
de novembro de 2009, ele afirma que teria visitado a comunidade no fim de 2007
e que eles na época teriam se posicionado a favor. Entretanto, segundo os relatos,
os moradores da Bacia de Itambi alegam que não foram consultados
anteriormente e que foram apenas comunicados que seriam transferidos do local,
não tido acesso às informações, mesmo tendo representações junto ao PAC77.
Além disso, os gestores do conjunto habitacional do PAC afirmam, em
entrevista direta, que nenhuma obra do COMPERJ passará pela área da Bacia,
assim como o chefe da ESEC da Guanabara que afirma que a Petrobras teria lhes
enviado uma planilha com todas as suas intervenções e que nessa não constaria 77 De acordo com A. O. , ele e mais dois moradores representam a comunidade nas reuniões do PAC (13/10/2008).
88
nenhuma intervenção de infraestrutura na Bacia. A assistente social e o pedagogo
do conjunto habitacional do PAC afirmam ainda nem saberem da existência desse
parecer.
Já o chefe da APA de Guapimirim, também em entrevista direta, afirma que
esse parecer teve “valor mínimo” e que a saída da comunidade se deve a um
projeto antigo da Prefeitura de Itaboraí, mas que, com certeza, a chegada do
COMPERJ na região teria acelerado a execução desse projeto, já que segundo ele,
“qualquer obra que ocorre hoje na região está diretamente ou indiretamente
relacionada com o pólo petroquímico” (entrevista realizada em 03/11/2009).
Indiretamente é óbvio que o COMPERJ tem a ver; todos os empreendimentos que ocorrem na região, todo PAC da região, a âncora econômica, que tá orbitando em volta é o COMPERJ, o COMPERJ é o peso, que tá descendo e vai todo mundo acompanhando aquilo (Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009)
Como afirma Souza (2000), então, não é apenas o Estado (resposta óbvia
em principio) que planeja e gere as relações sociais, mas certos agentes
modeladores do espaço (como o grande capital industrial, no caso o
COMPERJ78), a partir de geoestratégias, não raro, sofisticadas (p.86).
Os gestores da APA e da ESEC ressaltam, então, que esse projeto do PAC
(que inclui o conjunto habitacional) é da prefeitura e não do IBAMA ou do
ICMBio. Segundo os próprios, o projeto se deve a um aspecto burocrático e
também pelo fato de que o local em que hoje está alocada a Comunidade de
Itambi “tecnicamente não ser uma área de moradia preferencial”. Dessa maneira,
eles, os gestores, teriam dado apenas a anuência ambiental para o projeto.
Contudo também enfatizam que o aspecto formal deles naquele local é
prioritariamente ambiental e não social e, dessa maneira, mesmo que a
comunidade se posicionasse contra, o órgão ambiental deveria se posicionar a
favor, já que seu foco deve ser o ambiental. Para os gestores,
(...) por fins da legislação é clandestina essa ocupação, como é que se regulariza essa ocupação clandestina? (...) o mecanismo que a Prefeitura procurou adotar é esse, realocá-los em uma área próxima onde pudesse ser oferecido equipamentos urbanos mais favoráveis, aliado com uma auto-declaração dessas populações, dizendo que as condições de habitação são precárias, é isso que a nossa análise foi feita (...) Se os moradores tivessem dito não quero sai daqui, se a Prefeitura dissesse ‘socialmente não vai ser bom’, mesmo assim (...) não caberia o Ibama na
78 O qual não deixa de ser também o Estado.
89
época ou ICMbio agora poder negar um empreendimento dessa ordem (...) nosso aspecto ali formalmente é um aspecto ambiental ( Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009).
(...) E deixar claro quem é o empreendedor da obra, não somos nós (...) é a Prefeitura (...)a quem cabe a responsabilidade sobre a execução da atividade aí no caso foi a Prefeitura, a Prefeitura que recebeu a nossa anuência (...) anuência ambiental (Chefe da ESEC da Guanabara, 03/11/2009).
No decorrer dessa pesquisa, até setembro de 2009, os moradores da
Comunidade de Itambi informavam que consultores os visitavam falando a
respeito de indenizações para a mudança do local. A última empresa que teria
entrado em contato com eles, segundo os próprios moradores e os gestores do
Conjunto Habitacional do PAC, seria a empresa PLANAVE79.
A assistente social do conjunto habitacional em uma conversa informal
realizada no dia 16 de setembro de 2009, afirmou que até onde ela saiba o
COMPERJ não tem nada a ver com a saída da comunidade, e que estaria
envolvida em uma obra do PAC do município de Itaboraí. Acrescentou ainda que
não sabia que o COMPERJ também se constitui em uma das obras do PAC e nem
que o Arco Metropolitano estaria sendo viabilizado pelo COMPERJ, não
entendendo porque uma empresa terceirizada do COMPERJ estava na época da
entrevista fazendo uma pesquisa com a comunidade com “pranchetas na mão” e
que com isso “rolou um boato” que iriam indenizá-los. Por fim, então,
questionava: “por que indenizá-los se já há um projeto do PAC há dois anos
fazendo um conjunto habitacional para eles?”. Afirmou ainda que tentou contato
com as agentes sociais do COMPERJ, mas até aquele momento ninguém havia
retornado suas solicitações.
Já em outra entrevista com o arquiteto e urbanista responsável pelo PAC,
realizada no dia 28 de setembro de 2009, ele afirmava já ter orientado aos
consultores da PLANAVE para não falarem mais sobre indenizações, já que este
seria um “assunto extremamente delicado”; contudo, afirmou também que o Arco
Metropolitano se resumiria à duplicação da via e que não haveria nenhum corte
entrando em comunidades. O profissional acrescentou que:
79 Segundo o próprio site da empresa, a PLANAVE foi fundada em 1969, está localizada na cidade do Rio de Janeiro e é especializada na prestação de serviços de Consultoria e Engenharia. (Disponível em: <http://www.planave.com/index.htm.>, Acesso em 20 de março de 2010).
90
(...) o que existe hoje, nós fomos procurados pela Petrobras, é um estudo da Petrobras, a construção de uma via especial, de uma via de transporte pesado, estão estudando esse entorno, que vai desde São Gonçalo nas margens da Baía de Guanabara (...) Guaxindiba, Itambi, aí vai subindo até Guapimirim, estão fazendo um estudo onde seria o melhor local para implantação desse fluxo de veículos pesados, que não poderiam passar veículos de transporte comum, para não atrapalhar o fluxo certamente do Arco Metropolitano (Arquiteto e Urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).
Dessa maneira, os gestores do PAC não associam em suas falas a saída da
comunidade com o COMPERJ, atribuindo a diversos outros motivos que vão
desde a proteção ambiental até as questões assistencialistas. Segundo esses
gestores, a comunidade abriga um lugar impróprio, de risco e sem infraestrutura e,
dessa maneira, a mudança desta para o conjunto habitacional é visto de maneira
positiva. A assistente social afirma que “lá eles vivem em uma miséria, e em uma
pobreza, lá eles não tem nada, aqui eles terão tudo” (16 de setembro de 2009).
Os gestores alegam ainda outros fatores para importância desse projeto do
PAC em seu todo. Segundo o arquiteto e urbanista, esse projeto também tem a
“vertente do trabalho do social tiração de trabalho e renda”:
(...) então a gente trabalha com essas pessoas assim, elas (...) têm baixo grau de escolaridade e qualificação quase zero, qualificação mínima, então eles pegam os serviços mais simples, semente joga, as mulheres ficam ociosas a maior parte de tempo, dessa maneira, com experiências no município que deram certo, artesanato com reciclagem, então nós contratamos essa pessoa, que faz um trabalho muito grande com a Petrobras, Vale, com essas empresas maiores que normalmente patrocinam esses eventos, então nos contratamos essa professora que veio aqui ensinou algumas técnicas de confecção de bolsa e já está dando retorno para algumas pessoas, já estão tirando do artesanato não o sustento, mas a contribuição de renda (...) trouxemos uma nutricionista para ensiná-los a reaproveitar os alimentos, eles desperdiçam muito(...) (Arquiteto e urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).
O mesmo gestor afirma ainda que além de arquiteto e urbanista é
engenheiro de segurança do trabalho e dessa maneira, o projeto procurou
aglomerar os serviços, de forma que evitasse que as pessoas saíssem do conjunto
habitacional e tivessem que atravessar a estrada BR, futura via do Arco
Metropolitano. Estariam assim também prestando um serviço de proteção:
(...) aqui a gente tem a creche, saindo dessa creche vai direto para escola e posto de saúde, tem tudo no Conjunto Habitacional (...) então na verdade estamos prestando um serviço de prevenção, até porque ele não tem que sair daqui (Arquiteto e Urbanista do Conjunto Habitacional do PAC, 28/09/2009).
91
Por fim, acrescentam a criação de uma ciclovia para impedir que outros
moradores se instalem no local em que a Comunidade de Itambi reside
atualmente. Dessa maneira, acreditam que esse projeto, além de aumentar a
qualidade de vida das comunidades que morarão no conjunto habitacional,
também aumentará a qualidade de vida dos moradores que vivem no entorno.
Pelas falas desses gestores, a cata de caranguejo e a pesca continuarão a ser
realizadas com a entrada do COMPERJ na região. Dessa maneira, os catadores de
caranguejo manterão seu principal meio de sobrevivência, ressaltando ainda a
construção do Centro Comunitário, que já está em obras. Segundo o arquiteto, “o
Centro Comunitário vai regularizar a venda do pescado e do caranguejo, porque
eles são informais” 80.
Os chefes da APA de Guapimirim e da ESEC da Guanabara ainda
relacionam a saída da comunidade com o COMPERJ, porém de uma maneira um
pouco diferente. Eles afirmam que o Conselho da APA de Guapimirim foi
expressamente contrário ao COMPERJ. O conselho foi “uma das poucas
instituições que se manifestaram expressamente contrárias ao COMPERJ; fomos
derrotados junto com o Ministério Público, que foi outra instituição que também
se manifestou contra”. O gestor da APA de Guapimirim continua assim sua
reflexão:
(...) dentro desse conjunto do COMPERJ que a gente tá tendo que corrigir e trabalhar por algo que não acreditamos e achamos que tá errado, então a estratégia é, vamos reduzir o mal, é um mal inevitável, a gente vê que tem poucas coisas positivas, pouquíssimas (...) a gente vê como positiva a realocação daquela comunidade pela auto-declaração que foi manifestada para nós (Chefe da APA de Guapimirim, 03/11/2009).
A partir dessa visão, os gestores suspeitam que “seria pior se eles
permanecessem onde estão”. Afirmam ainda que, por uma “perspectiva histórica e
por outras histórias”, certamente a chegada do COMPERJ diminuirá a qualidade
80 O Centro Comunitário já era uma reivindicação antiga da comunidade como destacaremos mais adiante nesse capítulo. Contudo é importante destacar aqui que vários caranguejeiros de Itambi já são cadastrados, recebendo inclusive o DEFESO implementado em 2001, a partir de uma parceria entre a OSCIP IDM-Instituto de Desenvolvimento Municipal e a Prefeitura Municipal de Itaboraí, através da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente. O projeto tem como objetivo proteger os manguezais e promover programas voltados à sustentabilidade das populações de catadores de caranguejos. Além da proteção e preservação através da fiscalização, o Defeso tem como premissa a remuneração dos catadores de caranguejo nos períodos em que a captura é suspensa (MOYSÉS, 2008).
92
de vida daquela região e, dessa maneira, não acreditam que aquele estilo de vida
tradicional poderá continuar. Seguindo esse raciocínio, a saída da Comunidade de
Itambi dos mangues onde se instalou seria uma tentativa de minimizar os
impactos na APA de Guapimirim, já previstos. Em outras palavras, como essa
comunidade está fadada a “desaparecer” (aqui caberia o termo
desterritorialização), pois já é um “fato concreto” a entrada do COMPERJ na
região, acabaria se forçando, da mesma forma, a comunidade a se deslocar em um
futuro próximo, já que essa certamente perderá os seus referenciais simbólicos e
seus recursos materiais de sobrevivência.
A saída da comunidade da APA de Guapimirim seria uma medida para
tentar impedir ou dificultar de certa forma que outras populações se instalem
nesse local, sendo assim uma medida para minimizar as futuras consequências
ambientais, ou seja, no fundo sua preocupação central ainda estaria na proteção da
natureza. Apesar disso, o chefe da ESEC da Guanabara ainda relaciona que a
saída deles do mangue irá aumentar a qualidade de vida desse grupo, já que,
segundo esse gestor, certos parâmetros referentes à concepção de qualidade de
vida são essenciais e inquestionáveis:
Do outro lado da história, são pessoas falando que aquela área lá não é uma área que as pessoas podem morar, né, aquela área lá é uma área insalubre também, né, que a expectativa dessas pessoas diminui por morar em uma área com saneamento deficiente, com certeza. Como é que chega a água pra eles lá? Como eles obtêm água potável? A solução seria urbanizar aquela área (...) água potável e saneamento básico (...) se você me falar aqui para mim que isso não influencia na expectativa de vida das pessoas, digo pra você, você precisa conhecer um pouco mais sobre a história do desenvolvimento da civilização, né, aí eu vou te provar por ‘ a’ mais ‘b’ que hoje nossa expectativa de vida subiu porque temos água potável e nossos dejetos são destinados corretamente, tá, isso é uma parte da história (Chefe da ESEC da Guanabara, 03/11/2009).
Observa-se assim, novamente baseando-se em Souza (2004), que esses
“sustentabilistas”, com o auxílio de categorias vagas, examinam a pobreza e os
conflitos sociais, “devendo-se a preocupação com a pobreza parcialmente à sua
usual característica de ser um fator de degradação ambiental”. Nesse pensamento,
o “desenvolvimento sustentável” equivaleria à modernização combinada com
proteção ambiental. Não se avança assim para além de aspectos morais, apostando
ainda em um “Estado tipo keynesiano, que seja capaz de regular a expansão
urbana e investir na preservação do meio ambiente” (p.70).
93
Contudo, ainda segundo o autor, ressalta-se aqui, que estratégicas de âmbito
municipal, não podem perder de vista que mesmo atividades econômicas “pouco
importantes” ou mesmo residuais, podem ter importância social assaz significativa
(p.78).
Por outro lado, então, os moradores da Comunidade de Itambi também
interpretam de formas diversas os motivos que levaram/levarão à saída de seu
território de vida, convivência e sobrevivência. Observam que isso se deve tanto a
uma questão ambiental, de proteção da APA de Guapimirim, como por questões
assistencialistas, por alegarem que estão em uma área de risco, sem
infraestrutura... Eles relacionam, ainda, em diversas falas, a saída deles com o
COMPERJ. A moradora J., em uma entrevista realizada dia 11/02/2010, afirmava
que eles terão que sair de seu território atual, “porque eles têm interesse aqui, né”,
segundo a moradora, todos lá têm conhecimento que irão sair, “porque o ônibus
da Petrobras vai passar por aqui”.
Entretanto, todos os motivos acima interpretados pela comunidade
referentes à sua saída dos mangues para o conjunto habitacional são questionados
nas falas dos próprios moradores. Da mesma forma, a comunidade compreende
que a entrada do COMPERJ na região afetará negativamente os mangues e,
consequentemente, tanto suas atividades de sobrevivência, círculo de convivência
e solidariedade, como suas áreas de lazer.
Pelos depoimentos dos gestores do PAC envolvidos na construção do
conjunto habitacional, assim como dos gestores das UCs envolvidas, observaram-
se vários juízos de valores colocados como universais.
Entende-se, entretanto, que os agentes sociais que elaboram estratégias de
ação e intervenção do território devem desafiar e buscar ultrapassar o senso
comum ao interrogar o não interrogado, duvidando de certezas não-questionadas.
Ao mesmo tempo, também não se pode simplesmente ignorar os saberes locais
dos homens e mulheres concretos, como se as aspirações e necessidades destes
devessem ser definidas por outros que não eles mesmos (SOUZA, 2000a, p.87).
A partir disso, então, torna-se importante averiguar nesse momento entre os
moradores da comunidade o processo que essa população vivencia em suas
múltiplas dimensões, econômico-política e simbólico-cultural. Busca-se
94
compreender esse processo então desde o sentimento de perda de seus referenciais
simbólicos até do próprio controle do território e de seus meios de sobrevivência
para pensar, a partir das experiências dos sujeitos envolvidos, outras
racionalidades para projetos de gestão na localidade.
Essa pesquisa, portanto, não pretende estabelecer prioridades e definir as
metas e objetivos em nome da Comunidade de Itambi. A partir de Souza (2004),
baseado em Paulo Freire (1986), essa pesquisa busca, sob um ângulo dialógico,
então chamar atenção daqueles cuja autonomia deve ser respeitada e estimulada
(p.179-180).
Analisar-se-á a seguir a evolução da situação identificada desde meados do
primeiro documento oficial referente à saída da Comunidade de Itambi, de
novembro de 2007 a fevereiro de 2010.
4.3. As múltiplas dimensões do processo de saída vivenciado pela Comunidade de Itambi
O chefe da APA de Guapimirim acredita que houve uma “variação temporal
da perspectiva” da Comunidade de Itambi, já que, como relatado anteriormente,
ele diz ter escutado dos próprios moradores, ao visitar a comunidade, que eles
estariam satisfeitos com a mudança para o conjunto habitacional; contudo, ressalta
que teria conversado com apenas um grupo de moradores.
No primeiro momento em que os moradores se manifestaram sobre a
possível saída da comunidade da Bacia, no fim de novembro de 2007, a maioria
dos catadores manifestou o seu medo. Ao falar sobre esse assunto, muitos deles
diziam não saber nada direito sobre o assunto, entretanto vários já se queixavam.
O caranguejeiro F.I., o único que falava naquele momento um pouco mais
abertamente sobre o assunto, em uma entrevista realizada em 04/12/2007,
afirmava que se “a Prefeitura e a Petrobras querem que a gente saia, o que você
acha? Se não fizer um acordo você pode sair prejudicado; é praticamente
obrigatório, mas também não vou aceitar qualquer coisa”.
No segundo semestre de 2008, toda a comunidade já falava mais
abertamente sobre esse assunto. Os moradores afirmavam que foram apenas
95
comunicados de sua saída, não tendo nenhuma participação na decisão desse
projeto. As queixas dos moradores eram diversas e em todos os depoimentos
observaram-se insatisfações, receios e medo. O caranguejeiro C. acrescentava,
naquele período, que as opiniões estariam sendo diversas, e que ele tinha medo
“de abrir a boca e se queimar sozinho” (13/10/2008). As mulheres perguntavam
onde colocariam suas galinhas, lavariam suas roupas... Dona M. acreditava ainda
que o campeonato de futebol realizado uma vez por ano iria acabar e acrescentava
que gostava de morar lá, já estava acostumada e não queria sair (a figura 15
mostra o campo de futebol da comunidade e a figura 16 mostra os varais nas
casas). Além disso, afirmava que já haviam sido informados pelos gestores do
conjunto habitacional do PAC (pedagogo, assistente social e arquiteto e urbanista)
que eles já estavam proibidos de fazer novas construções. Como exemplo, me
citava seu filho que acabara de casar e não tinha onde morar com a mulher, me
mostrando os materiais de construção que o filho já havia comprado para levantar
uma casa ao lado da sua.
C. reclamava das novas moradias (mudar para prédios) e achava que os
moradores deveriam receber uma indenização para que cada um morasse onde
quisesse. Ele me mostrava a casa “espaçosa” que já havia conquistado o quintal
com as árvores, a sombra conquistada81, não acreditando que iria encontrar isso
no prédio e que, além do mais, ele ainda teria que conviver com estranhos.
O caranguejeiro A.O., um dos representantes do PAC, alegava que a
comunidade deveria ficar nas proximidades, de preferência em casas, “mas
alegaram falta de terra” (13/10/2008). Acrescentava que naquele momento os
pescadores ainda não cadastrados, estariam sendo cadastrados e que alguns
comunitários ainda relutavam em se cadastrar. Porém, o caranguejeiro afirmava
que naquele momento, tentava convencê-los, esclarecendo as dúvidas legais e a
importância desse cadastro para que assim pudessem ter força para atuarem na
busca de certos direitos que eles achassem necessário reivindicar futuramente.
Pelas interpretações do caranguejeiro, as políticas públicas que estavam em
andamento no município de Itaboraí, especificamente o projeto do PAC do
município de Itaboraí que conta com a saída dessa população dos mangues e a
entrada do COMPERJ no município, certamente afetarão suas atividades 81 Grafado no texto, porque o Caranguejeiro destaca essa conquista em sua entrevista.
96
econômicas (cata de caranguejo, siri, pesca), salientando assim a importância do
cadastro.
Figura 15: Crianças brincando no campo de futebol de Itambi
Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008).
Figura 16: Varais de roupa na comunidade
Fonte: Arquivo Pessoal (13/10/2008).
Já no segundo semestre de 2009, as obras do PAC já eram visíveis em
Itambi, principalmente na Bacia. Os ônibus já não entravam mais na vila,
passando apenas na BR-493. A obra do Centro Comunitário já havia começado e
97
a creche e o posto de saúde do conjunto habitacional já estavam prontos em
outubro daquele ano (figuras 17 a 20).
Figura 17: Rua transversal a entrada da rua da comunidade, na qual já pode ser observado canos da CEDAE e a direita da foto as obras já iniciadas do Centro Comunitário
Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)
Figura 18: Creche do Conjunto Habitacional já finalizada
Fonte: Arquivo Pessoal (28/09/2009)
98
Figura 19: Posto de saúde do Conjunto Habitacional já finalizado
Fonte: Arquivo Pessoal (28/09/2009)
Figura 20: BR-493: uma via do Arco Metropolitano
Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)
Contudo, os moradores continuavam a se queixar e estão ainda mais
receosos com a perda de se seus referenciais simbólicos, do lugar de abrigo,
proteção e sobrevivência. O morador J. destaca que com o início das obras no
local, ele estaria mais inseguro, afirmando que duas colegas suas já haviam sido
assaltadas no caminho entre a BR e a comunidade, o que não era comum no local.
99
Além disso, vários moradores me alertavam não visitá-los em dias de chuva, já
que lá nesses dias estaria ficando “pura lama”.
Com o início das obras do Centro Comunitário, algumas casas da
comunidade já tinham sido afetadas, como a casa da moradora J. B. que mostrava
que parte do seu quintal, juntamente com o seu abacateiro, já havia sido tomada
(figura 21).
Figura 21: Quintal da moradora J.B. À direita, a construção do Centro Comunitário e parte do abacateiro cortado
Fonte: Arquivo Pessoal (16/09/2009)
Um morador da Comunidade de Itambi que trabalha nas obras do Centro
Comunitário se diz receoso em dar entrevistas em dias de obra, pedindo para que
eu voltasse no final de semana. Além disso, pediu ainda para que não se tirasse
fotos dentro das obras do Centro Comunitário, acreditando que se o responsável
da obra chegasse, ele poderia se prejudicar. Entretanto, os outros moradores da
Comunidade de Itambi não estão trabalhando nas obras, já que segundo eles, os
moradores que possuem o cadastro de pescador não poderão receber a
100
aposentadoria de pescador82 se trabalharem com carteira assinada em outros
serviços.
De outubro de 2009 até fevereiro de 2010, última parte do trabalho de
campo dessa pesquisa, os moradores continuavam a questionar a saída deles do
local e os motivos dessa mudança para o conjunto habitacional. Algumas
mulheres afirmavam que não iriam sair, mas segundo elas mesmas, as casas delas
seriam derrubadas “mesmo com elas dentro”.
Eu só tenho uma coisa a dizer: eu não tô querendo sair da minha casa para ir para lá não, mas acho que a gente vai ter que obrigado a sair, né, se não sair eles derrubam a casa com a gente dentro, falaram (Moradora J.B, 16/10/2009).
Os moradores ainda se queixam das taxas que terão que pagar inclusive a do
condomínio do conjunto habitacional. Além disso, a mudança de casa para
apartamento, assim como o tamanho dos apartamentos do conjunto, é criticado
por todos os moradores entrevistados durante esse período. Os moradores
afirmavam que terão que se desfazer de vários móveis, porque eles não caberão no
apartamento, lembrando que as novas habitações serão por família, e que existem
algumas que são formadas por 5, 6 filhos. C. define os apartamentos como
“casinhas de pombo”, acrescentando: “a gente vai criar porco, galinha tudo dentro
de caixa” (16/09/2009).
Dona J. B. acredita que não terá de onde tirar dinheiro quando se mudar para
o conjunto habitacional. A moradora afirmava que sempre mexeu com caranguejo
e que hoje ela cozinha em seu fogão de lenha os caranguejos, vendendo-os no
local; lembra ainda do pé de abacate e de laranja que possui em seu quintal e que
perderá. Dessa maneira, observa que a transferência e o tamanho do apartamento a
ser habitado são problemas para continuar suas atividades de geração de renda.
Eu não to gostando não, não tô querendo sair da minha casa para ir pra lá não, porque aqui eu moro bem, tenho o meu ganha pão, que eu cozinho meu siri ali no fogão de lenha, cozinho meu caranguejo, descarno, entrego o moço, o moço me paga, agora vou cozinhar isso aonde lá? Dentro do apartamento não tem como, né? (Moradora J.B., 16/10/2009).
82 Nessa pesquisa, identifiquei dois senhores que moram na Bacia que recebem aposentadoria de pescador.
101
Diversos moradores criticam o fato de não terem opinado sobre esse projeto,
já que eles são os principais afetados. A moradora J.B, neste sentido, questiona os
motivos assistencialistas vistos anteriormente e não entende as justificativas para a
transferência deles para o conjunto habitacional: “Se eles tão pensando que é pra
melhorar a gente, tá pior, tá saindo do que é nosso... esse tal de condomínio não
vai adiantar de nada, pra mim não tá me dizendo nada” (16/10/2009).
As medidas implementadas com “a finalidade do bem” por outros atores
sociais para a comunidade (DEMATTEIS, 2008), assim interpretadas pelos
gestores do Conjunto Habitacional do PAC no município de Itaboraí e das UCs
envolvidas, são assim criticadas pela própria comunidade:
As pessoas que não vivem aqui dentro, que não convivem aqui dentro, têm uma visão totalmente diferente, eu acho que eles lá de fora que fizeram esse projeto tem uma visão de miséria pra gente aqui e não é isso, é uma coisa totalmente diferente, todo mundo aqui tem suas casas, todo mundo aqui tem a sua vida, né, todo mundo tem o seu trabalho, ninguém aqui passa fome igual, tem lugares que é muito pior, tem pessoas que precisam muito mais, eu não tô falando que nós não precisamos, até o fato assim, se eles limpassem o rio, fizessem uma pavimentação aqui nesse lado, sei lá, ajudasse a gente a melhorar a fachada da casa, que seja, eu acharia que seria muito mais vantagem do que sair a gente daqui para lá, entendeu? (Morador J., 16/10/2009).
A moradora J. ressalta que os moradores deveriam ter participado da
elaboração do projeto, não acreditando que estejam saindo de lá por qualquer
motivo assistencialista. Afirma que o principal motivo ainda seja por aquele local
interessar a Petrobras.
O que deveria que ser feito, eles primeiro tinham que perguntar pra gente se a gente queria casa ou apartamento, tinham que perguntar, não é chegar com um projeto tudo pronto e falar assim ‘o projeto tá aqui, vocês vão sair pronto e acabou’, eles deviam saber nossa opinião, mas eles não quis saber nossa opinião, falaram que a gente mora em área de risco, que área de risco que a gente mora? Que dá chuva, dá tempestade e o rio da gente não alaga, não morre ninguém, cadê a área de risco que a gente mora? O rio da gente nunca encheu, a gente não mora em área de risco não, as crianças brincam aí direto até meia noite, onze horas da noite, a única coisa de risco que tem aqui é o maruim, mas não mata criança alguma, que é o mosquito, as crianças tá tudo aí, cresce, tá tudo aí, não tem área de risco nenhuma, só porque a gente mora na beira de um rio é área de risco? Área de risco é lá em São Paulo que já tem lá dois meses lá que o Rio Tietê tá cheio lá, mora no centro da cidade, a gente não, a gente mora aqui na roça, mas o rio da gente não enche, nunca teve uma enchente desde que eu moro aqui, a mais de vinte anos, que área de risco? Vai tirar a gente da área de risco, quero saber aonde ta área de risco, qual foi o dia que eles viram sair no jornal que aqui alagou e que morreu alguém afogado, ou inundado, ou aterrado, tem área de risco nenhuma, é porque eles tão querendo
102
mesmo tirar a gente daqui por causa desse negócio da Petrobras que vão passar por aqui, o interesse mesmo é tirar a gente (Moradora J., 11/02/2009).
Da mesma maneira, os moradores criticam o fato de terem que sair do local
para a proteção da APA de Guapimirim. Em todas as visitas realizadas na
comunidade, eles afirmam não serem os responsáveis pela poluição e
desmatamento dos manguezais, lembrando que a subsistência deles está
diretamente relacionada aos mangues e que eles ainda colaboram para a sua
conservação, ponto verificado também em trabalho anterior (MOYSÉS, 2008)83.
A comunidade, ao questionar o motivo da saída para a proteção da APA de
Guapimirim, relaciona-o diretamente com a entrada do COMPERJ na região,
identificando assim contradições nesse argumento ao observar que o COMPERJ
trará significativos impactos para os mangues:
O COMPERJ vai acabar com o mangue, como é que teve aí o derramamento de óleo aí que teve aí, o trem descarrilou aí, acabou com o mangue, os garotos que ninguém deu uma assistência nenhuma, não recebeu uma indenização nenhuma, foi só 300 reais que eles deram para poder calar a boca dos outros, e acabou, os freguês sumiram tudo porque falaram que os caranguejos da gente tava tudo contaminado, passamos um perrengue e ninguém veio ajudar a gente, ninguém veio ajudar a gente e isso que aconteceu, e eles vão fazer o quê? Acabar de estragar o mangue, depois diz o quê? Que é o caranguejeiro que estraga o mangue, o pescador, como é que vai estragar se é dali que ele arranca o sustento? Ele? A gente vive muito bem, não tem caranguejo, os garotos catam pet dentro do mangue pra poder vender, traz, o caminhão pega tudo, de garrafa pet pra poder vender, eles ainda tão ajudando, fazendo um favor ainda, o pessoal tá revoltado mesmo de ter que sair daqui, ninguém quer sair (Moradora J.A., 11/02/2010).
A população de caranguejeiros, dessa maneira, em suas falas, não acredita
que eles sentirão os benefícios divulgados pela Prefeitura de Itaboraí e Petrobras
do desenvolvimento via COMPERJ. Ao contrário disso, a comunidade teme pelas
futuras consequências desse empreendimento nos mangues que afetarão
diretamente suas atividades produtivas, sua relação com a natureza exterior, e pela
possível perda de seus referenciais simbólicos. Além disso, os moradores também
acreditam que a entrada do COMPERJ no município afetará suas relações de
vizinhança e diminuirá a segurança local.
83 Foram verificadas em trabalho anterior (MOYSÉS, 2008) atividades dos caranguejeiros que contribuem com a conservação dos mangues da APA de Guapimirim: catam garrafas pet, evitam cortar galhos de mudas e novas ramagens, plantam a vegetação de mangue por conta própria, não catam fêmeas e em período de desova, entre outros.
103
O morador J. ainda diverge da opinião dos gestores de que a saída deles do
local seria uma medida mitigadora dos futuros danos do COMPERJ:
O COMPERJ vai ser uma coisa para Itaboraí crescer (...) empreendimentos, emprego, vai ser um pouco difícil porque é como todo mundo fala, marginalidade, enfim várias coisas, com certeza vai ter crescimento de população irregular, em todo lugar tem, eles não vão conseguir controlar, então tirando a gente daqui não adianta nada, vão se formar em outros lugares, outras pessoas virão e vão fazer casa, por exemplo, tem um barreiro ali, aí vem um, vem mais um,daqui pouco tá povoado aquilo ali, vira uma favela, o que eles vão fazer ali? Vão fazer igual tão fazendo do rio, pegam a casa das pessoas, deixam elas sem casas e destrói tudo? (...) A meu ver eu acho que não teria necessidade da gente sair daqui, no meu entendimento, eu penso assim, agora eles pensam diferente, quem somos nós para julgar, né? (Morador J., 16/10/2009).
Apesar de discordar da saída da comunidade por motivos relacionados à
preservação da APA de Guapimirim, o morador sugere que mesmo que a opinião
da Prefeitura ou dos gestores da APA de Guapimirim e da ESEC fosse essa, eles
ainda teriam alternativas como as de “fazer uma educação ambiental com todos nós”.
Muitos moradores assim ainda acreditam que a entrada do COMPERJ seja
de fato o principal responsável pela saída dessa população de seu território de vida
e se mostram receosos com a saída do seu lugar de vida, convivência e
sobrevivência juntamente com os já previsíveis impactos do COMPERJ.
Os moradores da Comunidade de Itambi então muitas vezes interpretam que
a saída deles dos mangues juntamente com a entrada do COMPERJ no município
pode resultar no “desaparecimento” dessa comunidade. Em outras palavras, pela
conjuntura maior do processo vivenciado no município (o COMPERJ), a
comunidade teme que a perda do território signifique o “fim da comunidade”
(HAESBAERT, 2007). Percebe-se que nesse momento entre os moradores da
comunidade uma afirmação e uma reivindicação pela identidade territorial
(HAESBAERT, 2007a).
Observa-se também que os fins das políticas públicas que os afetam
diretamente não estão claros para a população de caranguejeiros de Itambi.
Defende-se, contudo, baseando-se em Souza (2004), consoante o enfoque
autonomista, que os agentes sociais que elaboram estratégicas de intervenção e
ação no território, não podem simplesmente reivindicar, sentir e pensar em nome
da população que será afetada por essas políticas de intervenção, “presumindo a
104
racionalidade e a universalidade de suas próprias inclinações, de seus próprios
gostos e suas próprias necessidades” (p.179).
Segundo o mesmo autor, o usuário de um produto e não o expert que o
concebeu ou produziu é o legítimo juiz de suas qualidades, certamente, “esse juiz
não é infalível, mas é seu direito correr o risco de falhar em liberdade84” (SOUZA,
2000a, p.87).
4.4. As expectativas da reterritorialização da Comunidade de Itambi no conjunto habitacional
Nesse momento se verificará qual a opinião dos moradores da Comunidade
de Itambi sobre o projeto do PAC (em seu todo) em que eles estão incluídos.
Compreender-se-ão os juízos de valor da própria comunidade, ou seja, qual a
concepção de qualidade de vida dessa população e até que ponto esse projeto
aumentará ou diminuirá a qualidade de vida dos mesmos.
A perda de seu território é compreendida como um sentimento de incerteza
quanto ao futuro dos habitantes. Entretanto, essa incerteza está baseada, muitas
vezes, em algumas certezas dos moradores quanto à saída da comunidade dos
mangues para um conjunto habitacional, que fica às margens da BR-493, futura
via do Arco Metropolitano. Da mesma maneira, esse sentimento de perda traz a
indignação da comunidade de que o projeto lhes foi imposto sem ser questionado
e como lhes está sendo atribuídas culpas que sabem não serem deles. Os
moradores identificam ainda algumas contradições entre algumas das
justificativas referentes à saída deles dos manguezais e o processo maior que está
ocorrendo na região. Ou seja, ao mesmo tempo em que se explica que a saída
deles ocorrerá para a proteção da APA de Guapimirim, está havendo a entrada do
COMPERJ no município de Itaboraí.
Os habitantes da Comunidade de Itambi identificam, contudo, alguns pontos
positivos das intervenções desse projeto. O próprio Centro Comunitário já era
uma reivindicação antiga da comunidade. Desde meu primeiro contato com a
comunidade, no início de 2007, os caranguejeiros já diziam lutar a algum tempo 84 Grifos do autor Souza (2000a).
105
para a construção no local de um lugar onde eles pudessem armazenar e vender os
caranguejos e o pescado de maneira geral, assim como guardar diversos materiais
realizados na coleta, que são propostas do Centro Comunitário, além da venda de
artesanato. Ainda não parece definido se a gestão do centro será entregue para a
Associação dos Moradores da Comunidade de Itambi ou para Associação dos
Pescadores de Itambi- Itapesca. Entretanto, sua construção, apesar de alguns
receios por parte de alguns moradores, de uma maneira geral, é destacada como
ponto positivo do projeto. Outros pontos destacados são a construção do colégio
(creche)85 e do posto de saúde, que serão ocupados, como postos de trabalho,
preferencialmente, pelos moradores do conjunto habitacional.
A moradora J.A. afirma já estar trabalhando como merendeira no colégio e
uma amiga sua, também da Comunidade de Itambi, como professora. Observa
ainda que a AMPLA86 e Petrobras também afirmaram que dariam preferência aos
moradores do conjunto em outros serviços para complementação da renda e que
os moradores que trabalham no colégio ou no posto de saúde têm que,
necessariamente, voltar a estudar. A moradora entrevistada, mesmo afirmando não
gostar de estudar, vê essa obrigação “de forma positiva”, já que acredita que isso
seja um incentivo para poderem terminar os estudos.
Eles dão preferência pra gente, que nem agora o colégio tá funcionando, aí o pessoal do PAC veio aqui pediu pra gente lá colocar currículo que eles iam dá preferência pro pessoal que vai morar lá, pra poder trabalhar lá, poder trabalhar na creche, porque lá tem a creche, tem o colégio e tem o posto de saúde, então eles tão dando preferência pro pessoal da localidade que vai morar lá, a gente bota o currículo, aí eles vê lá o nome do pessoal que vai morar, aí eles tiram o pessoal que vai morar pra poder trabalhar, o pessoal da AMPLA também, eles falaram que era pra gente poder pegar o currículo e levar lá em cima que eles iam dá preferência pro pessoal que tá morando na comunidade, eles querem dá um serviço pro pessoal que é da comunidade, pra poder não ficar só vivendo da renda do caranguejo, o pessoal da Petrobras falou pra gente ‘todos os serviços que vir todos os benefícios que vir, primeiro lugar vai pro pessoal que vai morar lá em cima, a gente quer que o pessoal que vai morar lá em cima, o pessoal que vai sair da comunidade, a gente quer dar preferência pra vocês’, inclusive eu estou trabalhando no colégio, como merendeira (....) só que eu não to gostando muito porque eles colocaram para eu voltar a estudar, tive que lá fazer a matrícula pra voltar a estudar, também tão
85 De acordo com os gestores do Conjunto Habitacional do PAC, o colégio irá até o primário, mas existem projetos com o intuito de incluir o Ensino Fundamental e posteriormente o Ensino Médio. 86 De acordo com o site da própria empresa, a Ampla Energia e Serviços S.A distribui energia para 66 municípios do Estado do Rio de Janeiro (73% do território estadual). A Região Metropolitana de Niterói e São Gonçalo e os municípios de Itaboraí e Magé somam a maior concentração de clientes da distribuidora (Disponível em: <http://www.ampla.com/>, Acesso em 18 de março de 2010).
106
botando todo mundo pra voltar a estudar, também é até um incentivo de botar o pessoal de poder terminar, voltar ao estudo, terminar, né (...) é até uma coisa boa, mas eu não sei se vou agüentar a terminar não (Moradora J.A., 11/02/2010).
Entretanto, a mesma moradora acredita que o projeto, de uma maneira geral,
é negativo, principalmente devido à saída deles de seu território de vida atual para
os novos apartamentos. Ela entende ainda que esta complementação de renda é
mais do que necessária, porque no conjunto eles terão muito mais gastos do que
nas casas. Dessa maneira, não apenas a moradora J.A., mas os outros moradores
têm muitas queixas em relação à saída deles. Entre essas queixas, eles identificam
as contradições nas falas dos gestores do Conjunto Habitacional do PAC e das
UCs. Para eles, a ideia de qualidade de vida para esses gestores, ou seja, do que
realmente a comunidade entende que seja o melhor para eles, é muito diferente do
que os moradores realmente almejam.
Pontos essenciais e “verdades absolutas” encontrados nas agendas sociais
desses gestores como sendo ideais comuns e almejados por todos divergem de
alguns valores, interesses e necessidades, ressaltados pelos habitantes da
Comunidade de Itambi. A segurança, a convivência, a solidariedade, a sua relação
com a natureza exterior, assim como outros referenciais simbólicos os fazem
acreditar, nesse momento, que a Bacia seja um dos melhores lugares de se morar
na região. Contudo, a comunidade acredita que certas mudanças são necessárias,
mas que os moradores deveriam participar dos processos decisórios dos projetos
que intervêm na realidade dos mesmos.
Tá certo que a gente não tem um saneamento básico, não tem uma água encanada, mas isso daí a gente se vira, dá o nosso jeito, o melhor lugar que tem de se morar dentro de Itambi é aqui na Bacia (Moradora J.A, 11/02/2010).
O morador J. relaciona o que estão vivenciando com outro caso que teria
assistido na televisão e já aponta certas mudanças na região com a entrada do
PAC, acreditando que quando mudarem para o conjunto habitacional tenderá a se
agravar:
107
(...) esses dias eu estava vendo uma área lá na Amazônia e as pessoas chorando porque vai vir uma hidrelétrica enorme para aquele lugar (...) pessoas chorando com história de vida, pescadores, enfim, pessoas assim que nunca pensaram, quem aqui de nós falar ‘já pensava que isso ia acontecer’, é mentira, porque eu, se eles me chamassem para mim, J., para eu aprovar um projeto desses eu não ia aprovar, eu seria contra, nessas condições eu seria contra com certeza,quem assinou esse projeto (...), eu acharia que eles deviam conversar com a população daqui, que mora aqui, da Bacia, ‘o que vocês acham?’. Agora eles tem a casa deles, tem a mansão deles, tem um bairro bom, tudo asfaltado, acham que é melhor, ao meu ver eu acho que não é melhor não (...) a obra do PAC parou aqui dentro, os ônibus não passam aqui dentro, as pessoas estão sendo assaltadas nessas duas entradas, lá em cima e aqui, porque tem que saltar aqui para vir para cá (...)algumas pessoas se aproveitam, alguns marginais se aproveitam dessas condições (Morador J., 16/09/2009).
O morador J. acredita que irão perder muitas das coisas que já estão
acostumados, dentre as quais a segurança. Ressalta os laços de convivência e
solidariedade existentes na comunidade e suas possíveis perdas, assim como a
perda de suas referências; “eles deveriam pensar melhor o que estão fazendo
conosco, a referência do caranguejo é a Bacia” (16/09/2009).
As mulheres observam que irão morar na beira da auto-estrada frente ao alto
índice de acidentes que todos sabem possuir aquela região87 e se mostram
preocupadas com as crianças que estão acostumadas a brincar sozinhas. Ressaltam
ainda as diversas plantações existentes nos seus quintais, além da criação de
87 Na ata da audiência pública da BR 493, realizada 11 de fevereiro de 2009 a insegurança da estrada é destacada nas falas de todos os participantes da audiência. Um dos gestores responsáveis pelo EIA da duplicação da estrada afirma que em 2001 todo o tráfego de caminhões foi desviado para a BR 493, devido à limitação de tráfego de veículos pesados na ponte Rio- Niterói, sendo assim o único acesso ao norte do estado. Além disso, afirma que a rodovia atualmente conta com muitos problemas estruturais. Acrescentando outros motivos que levam a insegurança da rodovia: “Ela tem sete metros de largura, tem trechos de acostamento pavimentados, outros não pavimentados, muitos deles tomados por vegetação, cruzando as áreas urbanas de Magé e Itambi (...) toda circulação de pessoas, o tráfego local, travessia de ônibus, carros, tudo é feito pela rodovia que piora muito suas condições de tráfego, de segurança e a sua velocidade média, que está entorno de 50 km/h. A gente vê como o tráfego é misturado, você vê uma carroça passando bem na área urbana num ponto onde o limite de velocidade é de 50 por hora. Tem trânsito pesado de caminhões, a quantidade de caminhões que trafega pela rodovia é muito grande” (p.6). O mesmo gestor, contudo, afirma que com a duplicação da via dentre os impactos negativos, encontra-se o aumento do risco de acidentes, “na verdade aumento da fatalidade desse acidente é porque a velocidade vai ser maior, e a indução de processos erosivos também” (p.11). O engenheiro civil e sanitarista do Instituto Estadual do Ambiente, o INEA, também ressalta o risco de acidentes na rodovia e o aumento desses acidentes com a duplicação da via, acrescentando: “A BR 493 apresenta um tráfego de veículos pesados como já foi apresentado nos levantamentos e que transportam cargas perigosas. Quando será intensificado ainda com a instalação do COMPERJ em Itaboraí” (p.16) (Disponível em: <http://www.inea.rj.gov.br/downloads/ata_audit_public_br493.pdf>, Acesso em 20 de março de 2010).
108
certos animais, acrescentando que quando forem desalojados terão que comprar
todos os produtos de consumo básico, principalmente os alimentares.
A importância das árvores ultrapassa a necessidade material e também é
vista muitas vezes de maneira simbólica. O medo da perda da grande mangueira e
de sua representação para a comunidade é salientada em diversas falas: é o lugar
da sombra, do encontro, da conversa, onde se come o caranguejo, onde se bebe a
cerveja; para muitos, o melhor lugar da Bacia. Todos os entrevistados ressaltam o
fato de que no conjunto habitacional não haverá árvores e, mesmo com os
gestores do PAC afirmando que irão plantar, afirmam que “terão que ficar
trancados nos apartamentos até as árvores crescerem”.
Além das árvores, os moradores temem pela perda do campo de futebol e
áreas comuns de circulação. “Eles dizem que o campo vai continuar aí, né, eles
não vão tirar nem os campos nem as árvores, mas vão derrubar as casas, dragar o
rio, vamos ver né, pra ver se é isso mesmo que vai acontecer” (Moradora M.H.,
11/02/2010).
Claramente, observa-se que as justificativas relacionadas para melhoraria da
qualidade de vida desse grupo não estão de acordo com os desejos e as
necessidades da Comunidade de Itambi. Vários moradores levantam que se
deveria, de fato, criar condições e investir para que aquela área constitua-se em
uma Vila de Pescadores, já que o local, segundo eles, possui condições naturais
favoráveis, atividade comunitária, saberes contextuais ambientais úteis tanto às
formas produtivas locais, como para a conservação e manutenção dos mangues da
APA de Guapimirim. Além disso, já se constitui em um ponto de referência em
relação ao caranguejo e com a construção do Centro Comunitário no local
fortaleceria ainda mais suas atividades produtivas, sendo ainda um lugar para a
venda de artesanatos, já que parte da comunidade já possui práticas nessa
atividade.
Essa perspectiva, portanto, baseando-se em Dematteis (2008, p.44), não é
um contraste em relação à “evolução dos conhecimentos científicos”, ou seja, “tal
evolução” poderia ser combinada com os conhecimentos contextuais locais. A
partir da valorização de produções típicas locais se exigiria uma reprodução
inovativa das tecnologias que fossem apropriadas às condições e experiências dos
109
lugares. Dessa maneira, permitiria tanto a “evolução de tecnologias” como o
estabelecimento de gestões democraticamente mais justas e apropriadas nos
diferentes lugares.
Segundo o sítio oficial da Prefeitura de Itaboraí, existe um projeto da
prefeitura para transformar o manguezal em atração turística. No site o secretário
Ricardo Guimarães, da Secretaria de Indústria, Comércio e Turismo declara:
Sabemos que essa é uma área de grande potencial ecológico e que infelizmente está esquecido e sem conservação. Nosso objetivo é preparar o mangue para que sejam realizados passeios ecológicos com embarcações. O projeto prevê ainda, a capacitação dos próprios moradores para que possam atuar como guias turísticos do local e assim, aprender outra profissão (Disponível em:<http://prefeitura-itaborai.blogspot.com/2009/07/projeto-da-prefeitura-pretende.html>, Acesso em 20 de março de 2010).
Esse projeto reforçaria ainda mais a permanência dessa comunidade nos
mangues da APA de Guapimirim. Ressalta-se que não se defende aqui essa
política em nome da Comunidade de Itambi, mas coloca-se uma possibilidade de
proposta para o debate, já que, como defendido até aqui, os fins da ação ou
intervenção proposta, sob um ângulo autonomista, devem advir de um debate
lúcido e democrático com a Comunidade de Itambi (SOUZA, 2004, p.178).
Observou-se em outro momento dessa dissertação que o caráter de uma
política de desenvolvimento e sustentabilidade é de fato uma questão de escolhas
(ACSELRAD, 2009). O projeto do PAC para a Comunidade de Itambi, assim
como a instalação do COMPERJ no município de Itaboraí, pela opinião dos
mesmos, parecem não considerarem os traços identitários e simbólicos da
comunidade (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009) e a importância do saber local
(SOUZA, 2000a). Compreenderemos então quais são as alternativas, as
estratégias de luta e sobrevivência dessa comunidade para cunhar outras
racionalidades.
4.5. Resistências, alternativas e a busca por outras racionalidades
A luta pela conquista de mais direitos e liberdades da Comunidade de Itambi
é constante. A população comunitária afirma que pela Associação dos Moradores
conseguiram luz, coleta de lixo na Bacia e outros benefícios, tais como algumas
110
reivindicações contra a cerâmica existente ao lado da comunidade. Os moradores
afirmam que antigamente a cerâmica depositava os restos dos materiais no campo
de futebol, alegando que a área que a Comunidade de Itambi habita pertencia à
cerâmica. Segundo os próprios moradores, eles encaminharam vários documentos
à prefeitura reivindicando essa situação, afirmando ainda que algumas crianças já
haviam se ferido e uma gravemente, ficando internada durante três meses. Com
isso, conseguiram pela justiça que a cerâmica fosse proibida de depositar qualquer
material na área em que hoje a população de caranguejeiros ainda vive.
Depois do derramamento de óleo em 200088, o qual teria afetado os mangues
de onde a comunidade tira sua subsistência, a população teria se unido e
constituído a Associação de Pescadores de Itambi- Itapesca, para que assim
pudessem ter mais força política e para que futuros impactos semelhantes a esse
fossem contornados com mais rapidez e intensidade.
Em uma reunião do Conselho Gestor da APA de Guapimirim e da ESEC da
Guanabara (CONAPAGUAPI), realizada dia 29 de outubro de 2009, com a
participação de membros da Associação dos Moradores e da Associação de
Pescadores de Itambi, constatou-se que, a partir da reivindicação dessas
associações em reuniões anteriores, os membros do conselho estariam entrando
em acordo para que os caranguejeiros e pescadores cadastrados da região
pudessem realizar suas atividades (cata de caranguejo, siri, pesca...) dentro da
ESEC, mesmo que pelo SNUC essa UC seja considerada área de preservação
permanente, estando proibida a coleta de componentes dos ecossistemas para
quaisquer outros fins que não sejam científicos.
Os gestores do PAC, segundo os moradores entrevistados, teriam informado
que a primeira comunidade a se mudar para o conjunto habitacional seria a Bacia.
Contudo, os moradores se mostram receosos devido à inconstância das políticas
públicas federais. Para eles,
(...) o ônibus da Petrobras vai passar aqui, aí eles querem que a gente saia primeiro, aí tiram a gente, jogam a gente pra lá, Lula perde (a eleição de 2010), aí a gente fica lá largado, abandonado, naqueles prédios tudo inacabado, e só a comunidade da gente que sai (Moradora J., 11/02/2010).
88 O acidente da Refinaria Duque de Caxias, em janeiro de 2000, com mais de 1 milhão de litros de óleo combustível na Baía de Guanabara (SOARES, 2002).
111
Os entrevistados reafirmam, mais uma vez, que a Petrobras irá se utilizar daquela
área:
(...) o pessoal que tiveram aqui, o pessoal da PLANAVE, o pessoal da Petrobras teve aqui, aí falou que o pessoal da PLANAVE ia vir pra poder fazer a inscrição, para poder tirar o pessoal, aí ia vir de lá da entrada até aqui, essa casa aqui da minha sobrinha, (...) onde eles mediram que o ônibus vai passar, pegaram os documentos do pessoal pra poder receber uma indenização, mas aí depois eles já vieram com um outro papo falando que não ia mais passar por aqui que ia passar do lado de lá da linha de trem e ninguém ia receber nada, aí agora o pessoal do PAC já veio dizer pra gente que a primeira comunidade que vai sair é da gente, porque é da gente? Por que é a primeira que vai sair? Por que eles têm interesse aqui, né? Por isso que eles querem tirar a gente primeiro. Por que não tiram as três comunidades junto? (Moradora J., 11/02/2010).
Sob receio de serem a primeira comunidade a sair, os entrevistados avisam
que estão se organizando e que a Presidente da Associação dos Moradores já
haveria marcado uma reunião para discutir tal questão. O objetivo deles é criar
uma resistência afirmando que só sairão quando as outras duas comunidades (da
rua Levi Barroso e da Vila do Campo) saírem. Nesse sentido, os moradores já
acordaram que ninguém sairá de lá se a inauguração do conjunto habitacional não
for realizada com as três comunidades se mudando ao mesmo tempo e se as
condições dos apartamentos não estiverem iguais ao que consta na planta.
Observa-se assim que a comunidade tenta estabelecer resistências, entretanto,
segundo os mesmos, eles também precisam de ajuda externa, senão certamente,
pelo nível de forças envolvidas, ficarão largados à própria sorte.
Observou-se aqui contradições nas interpretações relacionadas às políticas
públicas que afetam diretamente a Comunidade de Itambi, o quê inclui a saída
dessa população dos mangues para o conjunto populacional, inserida em um
projeto do PAC apresentado nesse capítulo. Ao questionar aqui os motivos
referentes à mudança dessa população, demonstrando contradições e incertezas
nas falas dos gestores envolvidos e da comunidade, não se tem aqui o intuito
denunciativo, e sim de questionar a transparência nesse processo.
Evidencia-se a falta de clareza da Comunidade de Itambi em relação à sua
mudança, dos motivos, dos meios e dos fins, assim como dos trâmites legais dessa
política. Da mesma forma, evidencia a falta da participação da comunidade em
112
processos decisórios relevantes que interferem diretamente a vida desses
indivíduos.
Ainda nos depoimentos obtidos na Comunidade de Itambi, pode-se perceber
uma busca pela afirmação de suas diferenças, uma luta pela identidade territorial,
o que inclui a reivindicação pelo próprio território de vida em sua dimensão
material. Percebe-se também que a busca pela valorização de referenciais
simbólicos através da afirmação de certas diferenças é a luta pela própria
sobrevivência e o medo dessa comunidade “desaparecer” (HAESBAERT, 2007a).
A partir de Souza (2000a), compreende-se assim que os agentes sociais
envolvidos nas políticas de intervenção/ação do território da Comunidade de
Itambi, não consideram verdadeiramente a percepção e vivência da população
envolvida. Eles se utilizam de injeções políticas de “cima para baixo” com a
preocupação de atingir metas e objetivos impositivos e pretensamente racionais,
sendo impermeável a participação da comunidade ou reduzindo esta à
pseudoparticipação (apaziguamento, consulta e informação).
Identificam-se também algumas estratégias como ofertas de emprego que
podem atuar como medidas para desestabilizar e enfraquecer a ação política do
coletivo no que parece o principal objetivo da Comunidade de Itambi nesse
momento histórico, a permanência em seu território de vida, afetividade e
sobrevivência. Acredita-se, contudo, que a célula possível de pressão que se
verifica atualmente na comunidade possa ser fortalecida, frente às outras
conquistas políticas da comunidade pelas suas Associações de Moradores e
Pescadores. A comunidade parece, nesse momento, estar debatendo e se
organizando politicamente na busca de mecanismos para a defesa de seus direito
legítimos, a começar pelo direito de manterem sua identidade (SOUZA, 2004,
p.390).
A partir de Souza (2004), baseado em Habermas (1981; 1990), defende-se a
importância de um agir comunicativo, expandido o diálogo e “que o
autoritarismo, o qual costuma se aninhar mesmo nas relações entre companheiros
de causa e luta, seja coerentemente combatido e substituído por debates livres e
confrontos abertos de posições e argumentos” (p.337). Sem subestimar a
profundidade das contradições e o potencial dos conflitos, acredita-se que se deva
113
ter um compromisso prioritário com a não-violência e o diálogo como meios de
resolução de conflitos (p.390-391).
A comunidade, nesse momento, deve criar estratégicas a partir do confronto
racional de argumentos, demonstrando outras possibilidades de políticas públicas
que considerem e valorizem as potencialidades locais, tais como políticas que
visem à manutenção da qualidade de vida da Baía de Guanabara, assim como a
dos mangues da APA de Guapimirim, que fortaleçam as atividades produtivas
locais (a cata de caranguejo, de siri, a pesca), e até que desenvolvam o ecoturismo,
o que já se constitui em um projeto da Prefeitura de Itaboraí e a principal
possibilidade apontada pela Cooperativa de Manguezal Fluminense89
(HERRERA, FERREIRA e RODRIGUES, 2009). Dessa maneira, os moradores
poderiam buscar alianças em outras esferas de poder e organizações em rede com
outras comunidades de Itambi e do Brasil que passam por processos semelhantes
fortalecendo a luta por uma margem de manobra institucional que permita a sua
manutenção nos mangues e a constituição da área da Bacia em uma Vila de
Pescadores.
Políticas legítimas e dignas, além de reproduzirem o capital territorial local,
não destroem o capital local de outros sistemas ligados por interações materiais e
imateriais (DEMATTEIS, 2008, p.43). E pelo espírito de respeito às diferenças
legitimas pode, ademais, “servir para questionar a legitimidade das próprias regras
do jogo econômicas e políticas da sociedade atual” (SOUZA, 2004, p.390).
Acredita-se, nesta pesquisa, que um dos papéis da Academia seja a busca
por mudanças práticas na realidade. Em outras palavras, compreender outras
racionalidades a partir dos diferentes sujeitos, para que as mudanças se
concretizem quando os sujeitos forem mais participativos dos projetos de
desenvolvimento que os incluem.
Socializar o conhecimento sobre os problemas evidenciando outras
racionalidades, como nos alerta Souza (2000a), é essencial para incentivar mais
89 A formação da Cooperativa Manguezal Fluminense pautou-se em três fases: mobilização comunitária, cursos de capacitação profissional e discussão sobre o modelo de organização. O projeto foi desenvolvido entre março de 2006 e maio de 2009, com recursos do Programa PDA Mata Atlântica, do Ministério do Meio Ambiente. Foi executado pela OSCIP INNATUS (Instituto Nacional de Tecnologia e Uso Sustentável), em parceria com a APA Guapimirim (HERRERA, FERREIRA e RODRIGUES, 2009).
114
pessoas a se integrarem nos debates e processos decisórios como para prestar
contas aos atores já envolvidos, sobre os trâmites legais, as modificações e
implementações de propostas. O incentivo à mobilização e participação da
população deve ser compartilhado entre as organizações civis da sociedade e o
Estado. Devemos buscar mais dados sobre as realidades locais, e as estratégicas e
os planos devem estar disponíveis a uma população letrada, porém de baixa
escolaridade ou elementar. Ou seja, todas as propostas de intervenção/ação no
território devem ser totalmente claras aos principais envolvidos, o “requisito da
transparência é condição sine qua non para decisões com conhecimento de causa e
o exercício da autonomia”, sem a sonegação “de informações-chaves, seja quanto
aos fins, seja quanto aos meios” (p.96).
Ao mostrar a realidade da Comunidade de Itambi procura-se evidenciar aqui
a identidade territorial como possibilidade de transformação social, fortalecendo
lutas que não necessariamente buscam certos “ideais comuns”.
Retomando Castro (2005), afirma-se a necessidade da inversão de certos
valores e a soma de outros no debate sobre município. Dessa maneira, ao serem
mostradas as políticas públicas implementadas no Município de Itaboraí que
afetam diretamente a Comunidade de Itambi, percebe-se que a importância dessa
inversão está em:
Perceber (1) que as diferenças vão muito além do problema tamanho da população ou riqueza, mas encontram-se profundamente inscritas nos territórios das sociedades locais; (2) que a isonomia da lei obscurece diferenças entre o que é ser pequeno ou pobre nas regiões Norte e Nordeste ou no centro-sul do país; (3) o que significa ser exatamente eficiente e onde; (4) que a produção de injustiças começam nessa escala (CASTRO, 2005,p.137).
Dessa maneira, a escala local é a escala privilegiada para experimentos
político-pedagógicos, para a formação de uma consciência de direitos e para a
prática da participação política (SOUZA, 2000a), e assim acredita-se que as
potencialidades específicas locais deveriam ser potencializadas com a participação
dos sujeitos nos processos decisórios nos projetos de desenvolvimento do
território em que esses estão inseridos. Procura-se assim fortalecer a luta dessa e
de outras populações do Brasil por mais direitos e liberdades. Esse trabalho tenta
contribuir dessa forma com a luta pela efetiva justiça social, para a diminuição das
desigualdades e para o reconhecimento da diversidade territorial.
5. Considerações Finais
O COMPERJ, desde o início de sua instalação, carrega consigo a imagem
do “desenvolvimento” e “sustentabilidade”. Entretanto, as des-re-
territorializações das comunidades que estão na sua área de implantação, como é
o caso da Comunidade de Itambi, e sua proximidade com o Mosaico da Mata
Atlântica Central Fluminense (MMACF) divergem das concepções de
desenvolvimento e sustentabilidade defendidas nesta pesquisa. Entende-se, nesta
pesquisa, que se deve deixar que os indivíduos de diferentes lugares decidam as
formas de vivenciar as suas territorialidades e assim o(s) seu(s)
desenvolvimento(s) e sua(s) sustentabilidade(s), ou seja, seus parâmetros de
justiça social e qualidade de vida. A instalação do COMPERJ é, dessa maneira,
um exemplo das contradições entre os modelos de desenvolvimento socioespacial.
Observou-se que a política de desenvolvimento via COMPERJ ainda está
baseada na redução do conceito de desenvolvimento ao crescimento econômico e
modernização tecnológica, a partir de uma concepção de produtividade que é
parcial, pois que aumenta a renda financeira em curto prazo diminuindo a
produtividade de energia e capital natural local, desmantelando as diversidades
culturais. Da mesma forma, percebeu-se que a Comunidade de Itambi certamente
compartilhará dos custos sociais e ambientais, ou seja, dos ônus da política
pública em voga, em muitas instâncias do poder instituído.
Não se sabe ao certo se as infraestruturas relacionadas ao COMPERJ
afetarão concretamente o território atual da Comunidade de Itambi. Entretanto,
percebe-se que a saída dessa comunidade dos mangues está diretamente
relacionada com a entrada do COMPERJ naquele espaço, seja por uma política
ambiental que busca minimizar os futuros danos ambientais do pólo petroquímico
ou por uma política de cunho assistencialista como forma de fortalecer a entrada
do capital industrial no local.
Ainda se verifica, a partir dos depoimentos utilizados nessa dissertação, que
a chegada do COMPERJ no local (com suas previsíveis conseqüências sociais e
ambientais), levará a perda dos principais referenciais simbólicos, recursos
materiais de sobrevivência, ciclos de convivência e solidariedade e afetividade
116
com o território da Comunidade de Itambi. Dessa maneira, percebe-se que a
comunidade estaria vivenciando um processo de des-re-territorialização
(HAESBAERT, 2004).
Nessa pesquisa salientou-se que os lugares estão inseridos, em maior ou
menor grau, em um contexto nacional e global e ainda assim possuem
particularidades e singularidades que devem ser valorizadas e potencializadas.
Estas devem ser utilizadas como vantagens competitivas, reproduzindo assim
saberes contextuais ambientais no que se refere às formas produtivas locais,
diminuindo os efeitos ecológicos e as desigualdades e conservando a diversidade
territorial. Contudo observou-se justamente o contrário, em que as potencialidades
específicas locais são desvalorizadas em detrimento de interesses globais/
nacionais.
É importante então que direcionemos “um olhar menos viciado” sobre a
Comunidade de Itambi para que se possa perceber outras racionalidades e
desmantelar certas “verdades”. A partir das próprias concepções da comunidade
verificou-se que os moradores não estão satisfeitos com a mudança para o
Conjunto Habitacional, dizendo-se não terem sido consultados, mas apenas
comunicados sobre esse projeto do PAC. Os juízos de valor em relação à ideia de
qualidade de vida atribuídos pelos os gestores do Conjunto Habitacional do PAC e
das Unidades de Conservação divergem das concepções dos habitantes da
Comunidade de Itambi.
A Comunidade de Itambi luta por mais direitos e liberdades. Contudo,
verificou-se um pedido de “ajuda” nessa luta, observando as forças desiguais e o
medo de seu “desaparecimento”, em outras palavras de sua exclusão social.
A partir dos depoimentos da Comunidade de Itambi, poder-se-ia investir
para que a área se constituísse em uma Vila de Pescadores com a manutenção dos
mangues pela comunidade. Dessa maneira, outras políticas públicas que
considerem e valorizem as potencialidades locais poderiam ser privilegiadas, tais
como políticas que visem à manutenção da qualidade de vida da Baía de
Guanabara, assim como dos mangues da APA de Guapimirim, que fortaleçam as
atividades produtivas locais (a cata de caranguejo, de siri, a pesca) e até que
desenvolvam o ecoturismo.
117
A comunidade, nesse momento, procura se organizar na busca por mais
direitos. Acredita-se, que a célula possível de pressão atual na comunidade tenha
que ser fortalecida e pelas suas associações de moradores e pescadores devam
criar estratégicas a partir de um confronto racional de argumentos e tentando
buscar alianças que fortaleçam seus mecanismos de ação política. Com isso, não
apenas seria uma política do reconhecimento da diferença e consequentemente da
diminuição de desigualdades, como também da reprodução de saberes ambientais
que contribuiriam para a conservação daqueles manguezais, favorecendo a
qualidade ambiental local/regional. Seria, dessa maneira, uma visão em longo
prazo.
Salientamos ainda que o território é o lugar de luta, resistência, busca pelo
desenvolvimento(s) e sustentabilidade(s), entendidos de acordo com as
perspectivas particulares dos territórios, que emanam cultura, história, interesses,
necessidades e desejos específicos e, portanto, outras racionalidades.
Da mesma maneira, foram observadas as múltiplas dimensões do território
(cultural, política, econômica e da natureza), afirmando assim a necessidade de
uma visão integradora e não-dicotômica entre cultura e natureza em seu estudo.
Entretanto, podemos observar uma separação ainda muito clara do
social/ambiental entre os gestores públicos envolvidos.
Dessa maneira é fundamental a importância da Academia nesse processo e o
papel da Geografia na transformação social, ressaltando a temática da pluralidade,
das diferenças e a de separação das políticas públicas sociais das ambientais.
Assim sendo, devem ser buscadas outras escalas do fazer político.
Como alertava Furtado (2007), devemos tomar gosto pelo exercício da
imaginação para a construção de um Brasil democraticamente mais justo, ou seja,
aprender a fazer política e criar condições, estratégicas e ferramentas para que
diferentes populações participem dos processos decisórios de políticas de
desenvolvimentos dos territórios em que estão inseridas.
Concorda-se ainda com Souza (2000a), quando lembra que o controle
cidadão pleno exige muito mais que uma transformação política na escala local,
sendo necessária uma transformação social mais profunda, impossível de ser
alcançada apenas dentro do raio de ação político, cultural e econômico local.
118
Contudo, como o próprio autor afirma, a escala local continua sendo a
privilegiada para experimentos político-pedagógicos, para a formação de uma
consciência de direitos e para a prática da participação política. Dessa maneira,
baseando-se em Rua (2002), acreditamos que o ponto de partida ainda seja o
lugar, rumo à superação da heteronomia, com a criação de mecanismos e adoção
de medidas que permitam a redução da segregação socioespacial e ir além da
pseudoparticipação (SOUZA, 2000a).
Esse trabalho procura contribuir com essa luta ao olhar para a
territorialidade da Comunidade de Itambi e buscar outras racionalidades. Com
esse olhar, outros projetos de desenvolvimento no Brasil para transformarem as
realidades locais devem ser compreendidos em suas diferenças, procurando
valorizá-las para diminuir as desigualdades do nosso país; em outras palavras,
esperamos que este trabalho possa contribuir para que diferentes territorialidades
possam ser potencializadas como estratégica política na busca desse(s)
desenvolvimento(s) com mais autonomia dos sujeitos envolvidos.
A realidade aqui estudada está se modificando rapidamente e ainda nos
deixa diversas questões. O futuro da comunidade ainda é incerto e o porquê de
empresas terceirizadas do COMPERJ conversarem com a comunidade a respeito
de indenizações também não podem ser respondidos nessa pesquisa. Da mesma
forma, o futuro do município de Itaboraí, assim como de outros municípios que
também estão sendo afetados pela política de desenvolvimento via COMPERJ
ainda deixa muitas dúvidas. As conseqüências ambientais e sociais tanto nas
Unidades de Conservação como em toda a Baía de Guanabara com a
implementação do pólo petroquímico no local, ainda que previstas, não são certas.
Além disso, a atual discussão em torno da redistribuição dos royalties merece um
olhar especial, já que pode afetar diretamente a política de desenvolvimento na
região, seus mecanismos de ação, o CONLESTE, assim como a própria opinião
pública.
“Só durante a própria marcha será possível vislumbrar os novos desafios
que irão surgir – as limitações das táticas e estratégicas – e as maneiras de vencê-
los” (SOUZA, 2000a, p.85). Dessa maneira, a continuidade na análise das
múltiplas faces desse processo, das modificações e conseqüências, assim como
das resistências e lutas é importante não apenas para compreensão dessa realidade,
119
como para a criação de ferramentas, ou seja, de políticas capazes de intervirem
nessa realidade e fortalecerem tanto a luta dos sujeitos envolvidos nessa política
de desenvolvimento, como de outras populações do Brasil.
Outros projetos de desenvolvimento no Brasil devem transformar assim o
território levando em conta as potencialidades locais com a participação efetiva
dos diferentes grupos em seus diferentes projetos de desenvolvimento e
sustentabilidade. Acredita-se que assim se diminuiriam as desigualdades e se
aumentariam os direitos e liberdades para o maior número de pessoas possível,
contribuindo para a construção de um Brasil democraticamente mais justo, com
justiça social e reconhecimento da diversidade territorial dos lugares.
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______. Território do Outro, problemática do mesmo?O princípio da Autonomia e a superação da dicotomia Universalismo Ético versus Relativismo Cultural. In: ROSENDAHL, Zeny& CORRÊA, Roberto Lobato (orgs.). Religião, Identidade e Território. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2001, p.145-176.
______. “Desenvolvimento urbano” e impactos ambientais nas metrópoles brasileiras. In: SOUZA, Marcelo Lopes. O Desafio Metropolitano-um estudo sobre a problemática socioespacial nas metrópoles brasileiras. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000, p.118-125.
______. O Planejamento e a gestão das cidades em uma perspectiva autonomista. In: Revista Território, Rio de Janeiro, ano V, n°8, 2000a, p.67-100.
______.Urbanização e desenvolvimento no Brasil. Atual.Série Princípios, Editora Ática, 1996.
SOUZA, Marcelo Lopes de., RODRIGUES, Glauco Bruce. Planejamento urbano e ativismos sociais. São Paulo: UNESP, 2004. 136p.
VIANA, Viviane Japiassú. Riscos ambientais associados ao transporte de produtos perigosos na área de influência da ETA Guandu-RJ. Dissertação (Mestrado em Engenharia). Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2009.
WWF BRASIL. Disponível em: < http://www.wwf.org.br>, Acesso em 19 de janeiro de 2010.
127
Outras fontes:
Apresentação PAC do Município de Itaboraí (POWER- POINT), enviada via e-mail pelo Arquiteto e Urbanista em novembro de 2009.
Memorial Descritivo das Intervenções do PAC, enviado via e-mail pelo chefe da APA de Guapimirim em novembro de 2009.
ONU-HABITAT- PETROBRAS- UFF- COLESTE. Seminário Internacional Direito à Cidade nos Municípios do CONLESTE e os objetivos de Desenvolvimento do Milênio, Niterói, dias 5 e 6 de outubro de 2009.
REUNIÃO do CONAPAGUAPI, 29 de outubro de 2009.
SOARES GOMES, Mario L. Responsabilidade socioambiental: a difícil transposição do “abismo” que separa a retórica da prática. Considerações sobre a proposta de localização do Comperj. Palestra- Desafios e conflitos na conservação e gestão de manguezais. UERJ, Rio de Janeiro. 2007.
Entrevistas:
Gestores do Conjunto Habitacional do PAC:
Arquiteto e Urbanista, Entrevista realizada no dia 28/09/2009.
Assistente Social, Entrevista realizada no dia 16/09/2009.
Pedagogo, Entrevistas realizadas nos dias, 16/09/2009 e 28/09/2009.
Gestores das Unidades de Conservação:
Chefe da APA de Guapimirim, Entrevista realizada em 03/11/2009.
Chefe da ESEC da Guanabara, Entrevista realizada em 03/11/2009.
Chefe da APA de Guapimirim (Resposta em formato de texto enviada via e-mail dia 04/11/2009)
Comunidade de Itambi :
A., caranguejeiro, 33 anos, 2 filhos.Nasceu em São Gonçalo, mora a 25 anos em Itambi. Entrevista realizada em 25-11-2007. O pai era caranguejeiro.
A.O., caranguejeiro, 35 anos, 2 filhos. Nasceu em Itambi. Entrevistas realizadas em 20-12-2007 e 13-10-2008. O pai e a mãe eram caranguejeiros.
128
C., caranguejeiro, separado, 39 anos, 3 filhos.Nasceu em São Gonçalo, mora desde pequeno em Itambi. Entrevistas realizadas em 25-11-2007, 13-10-2008 e 16-09-2009. O pai era caranguejeiro.
F., caranguejeiro, casado, 72 anos, 5 filhos, nasceu em Itapiruna. Reside há 40 anos em Itambi. Entrevista realizada em 04-12-2007. Sempre foi caranguejeiro e o filho que mora com ele também é caranguejeiro.
J., casada. 30 anos. 1 filho. O marido é caranguejeiro e o pai é aposentado como pescador. Entrevista realizada em 11-02-2010.
J., 18 anos.Toda a sua família sempre trabalhou nos manguezais.Faz artesanatos.Entrevistas realizadas em 27-07-2007, 13-10-2008 e 16/09/2009.
J.A, casada. 31 anos. 2 filhos. O marido é caranguejeiro. Entrevista realizada em 11/02/2010.
J.B., 49 anos. 6 filhos, 5 netos. Mexe com caranguejo. Entrevista realizada 16/09/2009.
M., separada, 53 anos, 10 filhos gerados, seis filhos vivos. Nasceu em São Gonçalo. Mora a 40 anos em Itambi. Entrevistas realizadas em 27-07-2007, 13-10-2008 e 16/09/2009. O ex-marido é caranguejeiro e o filho que mora com ela também, durante toda a sua vida sua renda familiar veio dos manguezais.
M.H., casada, 50 anos. O marido é caranguejeiro. Mora com duas netas. Entrevista realizada em 11/02/2010.
P., caranguejeiro, 32 anos, 4 filhos. Nasceu em Niterói. Mora em Itambi desde os 3 anos de idade. Entrevista realizada em 01-12-2007. O pai era pescador, cata caranguejo desde os oito anos de idade.
S., casado, caranguejeiro, 63 anos, 10 filhos. Nasceu em São Gonçalo. Reside a 30 anos em Itambi. Entrevista realizada em 27-07-2007. Durante toda a vida trabalhou nos manguezais.
Saída de barco:
B., caranguejeiro, casado, nasceu em Itambi, sempre trabalhou nos manguezais. Saída: 07-10-2007
ANEXOS
130
ANEXO 1
Roteiro de Entrevistas (com a comunidade):
Nome:
Idade:
Quantos filhos:
Estado civil:
Atividade realizada:
1- Quando e como você ficou sabendo da mudança para o Conjunto Habitacional?
2- Quais são os motivos dessa mudança?
3- Qual a sua opinião sobre a mudança para o Conjunto Habitacional?
4- Qual a sua opinião sobre a entrada do COMPERJ no Município de Itaboraí?
131
ANEXO 2
Roteiro de Entrevistas (com os gestores): Atividade realizada:
1- Qual são os motivos da saída da Comunidade de Itambi dos mangues da APA de
Guapimirim para o Conjunto Habitacional?
2- Qual a sua opinião sobre a mudança da comunidade para o Conjunto
Habitacional?
3- Qual a sua opinião sobre a entrada do COMPERJ no Município de Itaboraí?
132
ANEXO 3
Questões enviadas via e-mail para o chefe da APA de
Guapimirim:
1- Contextualização do momento vivenciado na região de instalação do COMPERJ;
2- Impactos ambientais previstos do COMPERJ na região;
3- O processo de licenciamento ambiental do COMPERJ;
4- Perspectivas para a região.
133
ANEXO 4
Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)
134
ANEXO 5
Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)
135
ANEXO 6
Fonte: IBAMA- ICMBIO (2008)
Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )
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