SALVADOR: cultura, turismo e desenvolvimento econômico
Victor Marcelo Oliveira Mendes
SALVADOR: cultura, turismo e desenvolvimento econômico
Dissertação apresentada ao Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR-UFRJ) como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de mestre em Planejamento Urbano e Regional.
Orientadora: Dra. Ana Clara Torres Ribeiro
Rio de Janeiro 2001
Victor Marcelo Oliveira Mendes
SALVADOR: Cultura, turismo e desenvolvimento econômico
Rio de Janeiro, 30 de julho de 2001.
Professora Dra. Ana Clara Torres Ribeiro (orientadora). Doutora em Ciências
Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Professor Dr. Mauro Kleiman, Doutor em Planejamento Urbano, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Professor Dra. Sônia Maria Tadde Ferraz, Doutora em Arquitetura, Universidade Federal Fluminense.
Professora Dra. Tamara Tania Cohen Egler, Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Dedico esta dissertação ao meu pai, Antônio Carlos,
e à minha mãe, Maria Augusta.
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer aos meus professores pelo estímulo e orientações, em
especial à Ana Clara, minha querida orientadora, não apenas pela precisa
orientação, mas principalmente pela atenção e carinho.
Quero, também, agradecer a meus pais, avós e irmãos pelo apoio dado.
Agradeço, ainda, à Universidade Católica do Salvador pelo apoio e
incentivo dado para a conclusão do curso.
RESUMO
A Cidade de Salvador é apresentada num contexto de marketing city, com grande estímulo ao cluster cultura, entretenimento e turismo. Com isto, observam-se ações governamentais, como a duplicação do Aeroporto Internacional, restauração do Pelourinho e ações de marketing comunicando a cidade como destino turístico. Assim, tem-se uma expectativa que este cluster ajude a reverter os problemas econômicos e sociais da cidade. Porém, foi verificado que, em função da estrutura social desigual, com uma série de dificuldades, como o elevado desemprego e baixa escolaridade da população, a estratégia de desenvolvimento econômico perde eficiência e as oportunidades de negócio nem sempre são capturadas pela população e empresariado local.
ABSTRACT
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADRO 1 – Calendário Oficial de Festas de Salvador – 2000 24
QUADRO 2 – Produtos, Consumidores e Segmentação 71
MAPA 1 – Distribuição de Renda em Salvador (2000) 103
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Festa do Senhor do Bonfim 25
FIGURA 2 – Festa de N. S. da Conceição 25
FIGURA 3 – Baianas Preparam Comida Típica 25
FIGURA 4 – Igreja do Senhor do Bonfim 26
FIGURA 5 – Parque de Pituaçu 26
FIGURA 6 – Vista Aérea da Ribeira 26
FIGURA 7 – Praia de Stela Mares 26
FIGURA 8 – Praia da Barra Iluminada 39
FIGURA 9 – Elevador Lacerda 39
FIGURA 10 – Modelo do Cluster Cultura, Lazer e Turismo em Salvador 50
FIGURA 11 – Banda Timbalada Durante o Carnaval 58
FIGURA 12 – Cadeia de Valor da Produção Cultural em Salvador 67
FIGURA 13 – Capoeiristas no Farol da Barra 75
FIGURA 14 – Cortejo do Senhor do Bonfim 75
FIGURA 15 – Vista Aérea do Pelourinho 79
FIGURA 16 – Pelourinho Após Reforma 79
FIGURA 17 – Vista Panorâmica do Pelourinho 81
FIGURA 18 – Os Casarões do Pelourinho 81
FIGURA 19 – Vista Panorâmica da Praça Castro Alves no Carnaval 87
FIGURA 20 – Desfile do “Bloco Camaleão” no Campo Grande 88
FIGURA 21 – Desfile do “Filhos de Gandy” 88
FIGURA 22 – Sistema Retroalimentador de Variáveis Sócio-Econômicas 106
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Esperança de Vida ao Nascer - Salvador - 1960-1991 32
GRÁFICO 2 – Investimentos em Infra-Estrutura de Turismo - 1991-2005 em US$
Milhões 54
GRÁFICO 3 – Investimentos em Infra-Estrutura de Turismo - 1991-2005 em % 55
GRÁFICO 4 – Estabelecimentos Comerciais no Pelourinho - Distribuição Percentual 82
LISTAS DE TABELAS
TABELA 1 – Produto Interno Bruto Total e Per Capita Índices e Taxas de Crescimento – Bahia 1985-1999 27
TABELA 2 – Estrutura Setorial do PIB Bahia – 1998 28
TABELA 3 – População de 1996 e População Projetada – Região Metropolitana e Município do Salvador / 1996 –2020 30
TABELA 4 – Número Médio de Habitantes por Domicílio Salvador - 1980/1991/1996 31
TABELA 5 – População por Sexo - Salvador 2000 31
TABELA 6 – População por Faixas Etárias - Salvador 2000 31
TABELA 7 – Distribuição da População Ocupada de 15 anos e Mais por Setor de atividade nas seis maiores Regiões Metropolitanas - setembro
1999 33
TABELA 8 – Taxas de Desemprego - Salvador e Região Metropolitana – (Julho/2000) 34
TABELA 9 – Cidades Mais Visitadas - Brasil 2000 41
TABELA 10 – Geração de Diárias nos Hotéis Classificados em Salvador - Janeiro - maio - 1999-2000 41
TABELA 11 – Estabelecimentos do Setor Hoteleiro - Salvador - 1980-1998 42
TABELA 12 – Movimento de Vôos no Aeroporto Internacional de Salvador/ Salvador - 1992/1999 45
TABELA 13 – Movimento de Passageiros Transportados em Vôos Charters, no Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães, Salvador - 1991-98 46
TABELA 14 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA – 1997 77
TABELA 15 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA – 1998 77
TABELA 16 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA – 1999 77
TABELA 17 – Ano de Fundação dos Blocos Carnavalescos 94
TABELA 18 – Equivalência entre Classe e Rendimento 101
TABELA 19 – Sub-Distrito, Renda Familiar Média e Classes 102
TABELA 20 – População por Classe em Salvador 105
TABELA 21 – População por Classe em Salvador em Agrupamentos 105
TABELA 22 – Anos de Escolaridade na Faixa de 20 a 24 Anos em Salvador (1996) 111
TABELA 23 – Anos de Escolaridade na Faixa de 25 a 29 Anos em Salvador (1996) 111
TABELA 24 – Número de Estabelecimentos Culturais e de Lazer, por Região Administrativa - Salvador – 1999 113
LISTA DE SIGLAS
ABA Associação Brasileira de Anunciantes
ABIPEME Associação Brasileira de Institutos de Pesquisa de Mercado
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 15 2 A CIDADE DO SALVADOR: DOS ASPECTOS HISTÓRICOS, SÓCIO-ECONÔMICOS E DEMOGRÁFICOS AO CITY MARKETING 20
2.1 BREVE HISTÓRICO: SALVADOR 452 ANOS 20
2.2 SALVADOR NO TERCEIRO MILÊNIO 26
2.3 SALVADOR: CARACTERIZAÇÃO DEMOGRÁFICA 30
2.4 SALVADOR, TRABALHO, EMPREGO, E SAZONALIDADE 33
2.5 SALVADOR E SEUS VETORES DE CRESCIMENTO 35
2.6 SALVADOR: CITY MARKETING 37
2.6.1 Duplicação do Aeroporto Internacional de Salvador 45
2.7 SALVADOR: O DESENVOLVIMENTO DO CLUSTER DO TURISMO, CULTURA
E ENTRETENIMENTO 46
2.8 SALVADOR: DEVE-SE OPTAR PELO PLANO ESTRATÉGICO? 52
2.9 O TURISMO EM SALVADOR: A VISÃO DOS GOVERNOS ESTADUAL E MUNICIPAL SOBRE CULTURA E TURISMO 53 3 A ECLOSÃO DA CULTURA: SALVADOR – PRODUTO 58
3.1 A MERCANTILIZAÇÃO DA CULTURA 58
3.2 PÓLOS DE LUCRO DA PRODUÇÃO CULTURAL EM SALVADOR 71
3.3 O QUE É CULTURA E INDÚSTRIA CULTURAL 72
3.4 E, AFINAL, O QUE É A CULTURA SOTEROPOLITANA? 74
3.5 O ESTADO E A CULTURA 76
3.6 PELOURINHO: O ESPAÇO DA HISTÓRIA, CULTURA E TURISMO 79
3.7 A DISPUTA PELO MARKET-SHARE CULTURAL EM SALVADOR 83
3.8 O CARNAVAL DE SALVADOR, SUA EVOLUÇÃO E VERTICALIZAÇÃO 86
3.9 OS BLOCOS DE CARNAVAL: ORIGENS, PRÁTICAS, USOS DA CIDADE, GESTÃO, MERCADO E A CULTURA NUMA PERSPECTIVA ECONÔMICA 91
3.10 AS ORIGENS DOS BLOCOS 93
3.11 O CARNAVAL DE BAIRRO: FOCO NA CLASSE BAIXA OU NA VITRINE? 95 4 ESTRUTURA DE CLASSES E PROMOÇÃO DA CULTURA: QUEM GANHA COM ESSA CIDADE? 97
4.1 AS CLASSES E SALVADOR 97
4.2 SALVADOR: DISTRIBUIÇÃO DAS FAMÍLIAS POR CLASSE DE RENDA 100
4.3 ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO X ESTRUTURA SÓCIO-ECONÔMICA 106
4.4 A ESTRUTURA DE CLASSES E O MERCADO CONSUMIDOR NUMA PERSPECTIVA EMPRESARIAL 108
4.5 EDUCAÇÃO, CLASSES E MÃO-DE-OBRA QUALIFICADA 109
4.6 A CULTURA, O ENTRETENIMENTO, O TURISMO, AS CLASSES E SEUS ESPAÇOS 112 5 CONCLUSÃO 116 REFERÊNCIAS 121
1 INTRODUÇÃO
Esta dissertação tem como objetivo o estudo das relações de produção
e consumo dos produtos ligados à cultura de Salvador, numa perspectiva de
desenvolvimento econômico.
Assim, pode-se notar que o objeto da dissertação expressa três recortes:
a) espacial: a cidade de Salvador;
b) temporal: período recente;
c) sócio- econômico: classe média.
A escolha do tratamento do tema da dissertação na cidade de Salvador
decorreu das seguintes considerações:
a) esta cidade apresenta um grande déficit de emprego e simultaneamente
um quadro de intensa desigualdade sócio- econômica;
b) o marketing turístico de Salvador tem explorado a sua condição de
centro produtor e exportador de cultura.
O recorte temporal do estudo foi definido considerando:
a) em 1985, Salvador foi tombada como patrimônio histórico;
b) no ano de 1985, houve um boom da música baiana, através do
denominado movimento Axé Music;
c) o carnaval de Salvador, nas décadas de 80 e 90, passou por um
processo de profissionalização, sendo estimulada a criação de pequenas
empresas e a geração de empregos;
d) durante a década de 90, o governo do estado intensificou os
investimentos vinculados à atividade turística, tendo como um dos seus
pilares a cultura de Salvador. Como exemplo, podemos citar a
restauração do Pelourinho – centro histórico e cultural da cidade - e
elevados investimentos no Carnaval, considerado o ponto alto da
expressão da cultura na cidade.
A classe média foi escolhida por considerarmos:
a) o processo de dualização dos grandes centros econômicos que tem, em
parte considerável, excluído as camadas populares do consumo em
geral e do consumo de bens culturais em particular;
b) a classe média como um “termômetro” das transformações sociais e
econômicas.
O estudo da cultura, como opção econômica para Salvador, despertou
nosso interesse ainda no curso de graduação. Naquela época, observava que
o carnaval, a música, o folclore e a história local mantinham uma relação muito
intensa com a vida cotidiana da cidade. Evidentemente, essa relação se repete
em muitas cidades, mas em Salvador constata-se uma exacerbação da cultura.
Este é um fenômeno que se multiplica e cria um ambiente propício à “inovação
cultural” e, assim, a centralidade da cultura na dinâmica da economia urbana.
A forma de pensar e de agir dos soteropolitanos sempre foi descrita
como peculiar. A índole do povo, o carinho com o visitante e a adesão à
identidade de baiano aparecem como traços positivos do contexto analisado.
Ser baiano aparece, freqüentemente, como algo mágico. Ser baiano é ser
único. Surge, então, a expressão baianidade, que contempla o, assim
considerado, modo baiano de viver.
Esta positividade identitária, porém, manifesta-se num contexto de
grandes problemas sociais e econômicos. Acreditamos, nesta direção, que a
cultura soteropolitana possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida da
população, desde que seus vínculos com a economia não reproduzam os
mecanismos responsáveis pela desigualdade e pela exclusão.
Observamos, atualmente, uma forte relação entre cultura, turismo e
estratégia de desenvolvimento econômico. Reconhecer como esses elementos
se combinam e qual é o seu impacto para a sociedade soteropolitana
constituem o exercício analítico que orienta a dissertação.
Por um lado, o senso comum apresenta o turismo como alternativa
econômica para as cidades, pois trata-se de uma indústria intensiva em mão de
obra, que propicia qualificação e gera renda. Por outro lado, a prostituição e a
mercantilização da cultura espontânea apresentam-se como custos sociais do
turismo. Assim, não existe consenso sobre os impactos econômicos e sócio-
econômicos do turismo.
Desta maneira, esta dissertação procura refletir as conseqüências da
indústria cultural em Salvador, associada ao turismo, para os soteropolitanos.
Queremos compreender a quem interessa o negócio da cultura em Salvador.
Mais que isto: queremos saber se a indústria cultural está sendo tratada como
um negócio sustentável a longo prazo, de forma realmente estratégica, ou não.
Desta forma, dividimos este trabalho em três capítulos. No primeiro
capítulo fazemos uma apresentação da cidade de Salvador, destacando
aspectos sociais, econômicos e demográficos; traçando, assim, um
panorama da estrutura urbana, da atividade econômica e dos problemas
sociais.
No segundo capítulo, apresentamos o processo de eclosão da cultura de
Salvador. Procuramos conceituar cultura, identificar agentes e sujeitos do
processo de formação da cultura, discutir o papel da mídia e identificar os
produtos da indústria cultural. Ainda neste capítulo, apresentamos e discutimos
aspectos do turismo, relacionando a cultura local com a atividade turística:
estratégia de captação de turistas, marketing da cidade e papel do carnaval
como alavanca do produto Salvador.
Ainda no segundo capítulo, discutimos os benefícios e os malefícios do
turismo em Salvador, apontando para a apropriação de espaços e serviços
pelo turismo em detrimento da população.
No terceiro capítulo, analisamos a situação da classe média nos
seguintes processos: consumo de cultura, empresariamento e exclusão. Temos
assim, neste capítulo, um conjunto de referências que nos permite refletir até
que ponto os esforços governamentais de estímulo ao turismo e ao consumo
da cultura têm favorecido a classe média.
Por fim, chegamos às conclusões. Nelas, valorizamos, a partir do quadro
atual, a reflexão de tendências para o futuro, abrindo possibilidades para novos
trabalhos e análises.
2 A CIDADE DO SALVADOR: DOS ASPECTOS HISTÓRICOS, SÓCIO-ECONÔMICOS E DEMOGRÁFICOS AO CITY MARKETING
2.1 BREVE HISTÓRICO: SALVADOR 452 ANOS
Remetimentos da memória profunda continuam vivos nas ruas e nas
festas de Salvador. Quais são os caminhos percorridos nos vínculos passado -
presente? Quais os fatos lembrados e quais os fatos esquecidos?
O breve relato da história de Salvador, que aqui realizamos, contém a
mescla de múltiplas influências institucionais mas, também, contém elementos
de uma verdade sentida e transmitida em múltiplas manifestações culturais
espontâneas.
Fundada em 1549 para ser a capital do Brasil, a Cidade do Salvador
serviu de palco dos acontecimentos mais marcantes dos primeiros três séculos
de nossa história colonial. Principal porto atlântico das naus da "volta do mar",
da rota das especiarias com destino ao Oriente, prosperou inicialmente com a
exportação do açúcar produzido nos engenhos do Recôncavo Baiano (área
geográfica do entorno da Baía de Todos os Santos) e depois como ponto de
apoio do comércio entre a Colônia e Portugal.
Tudo começou em 1501, quando a primeira expedição de
reconhecimento da terra descoberta por Pedro Álvares Cabral deparou-se com
uma grande e bela baía, batizada de Baía de Todos os Santos pelo navegador
Américo Vespúcio, por ter sido descoberta no dia 1º de novembro, data em que
a Igreja Católica festeja Todos os Santos. A baía tornou-se, então, uma
referência para os navegadores, sendo um dos portos mais movimentados do
continente americano.
Alguns registros históricos da época relatam fatos relevantes para a
história da Cidade, como a saga do náufrago português Diogo Álvares que, em
1509, foi acolhido pela tribo Tupinambá que vivia no litoral das terras que
futuramente pertenceriam a Salvador. Chamado de Caramuru, Diogo Álvares
casou-se com a filha do cacique Taparica, a índia Paraguaçu, batizada em
1528 na França com o nome de Catarina Alvares. Caramuru desempenhou
importante papel na construção da cidade mandada fazer pelo Rei de Portugal,
D. João III, que nomeou o capitão Thomé de Souza para ser o governador-
geral do Brasil. A armada, capitaneada pela nau Conceição, trazia mais de mil
pessoas em seis embarcações: as naus Conceição, Salvador e Ajuda, duas
caravelas e um bergantim. Depois de cinqüenta e seis dias de viagem, a
esquadra foi recebida com festa por Caramuru e os Tupinambá. Thomé de
Souza ficou no cargo até julho de 1553 e voltou a Lisboa, sendo substituído
pelo governador-geral D. Duarte da Costa. Com a chegada dos escravos
africanos, no final do século XVI, a cidade prosperou, em decorrência das
atividades portuárias e da produção de açúcar no Recôncavo.
Em 1583, Salvador tinha duas praças, três ruas e cerca de mil e
seiscentos habitantes. A riqueza da Capital atraiu a atenção de estrangeiros,
que promoveram expedições para conquistá-la. Saques e bombardeios de
corsários ao porto de Salvador eram freqüentes entre o final do século XVI e o
início do século XVII. Com a união das coroas portuguesa e espanhola em
1580, os interesses do comércio marítimo estrangeiro foram contrariados e, ao
expirar o tratado de paz entre a Espanha e os Países Baixos, a Companhia das
Índias Ocidentais atacou Salvador em maio de 1624, onde permaneceu até
abril de 1625, quando seus soldados foram expulsos pela armada de quarenta
navios mandada pela Espanha.
Em 1638, mais uma tentativa de invasão, desta vez comandada por
Maurício de Nassau, não obteve êxito. Salvador permaneceu na condição de
Capital da América Portuguesa até 1763, quando a sede do Vice-Reino foi
transferida para a cidade do Rio de Janeiro. Porém, como capital da Província
da Bahia, a cidade manteve sua importância política e econômica e, em 1808,
recebeu a família real portuguesa que fugia das tropas napoleônicas. Na
ocasião, o príncipe regente D. João VI abriu os portos às nações amigas e
fundou a Escola Médico-Cirúrgica da Bahia, no Terreiro de Jesus, que viria a
ser a primeira faculdade de medicina do Brasil.
A consciência libertária da população de Salvador deu origem a vários
movimentos de contestação, com destaque para a Conjuração dos Alfaiates,
em que um grupo de revoltosos, inconformados com o domínio português,
tentou fundar a República Bahiense. Em 1823, mesmo depois da proclamação
da Independência do Brasil, a Bahia continuou ocupada pelas tropas
portuguesas do brigadeiro Madeira de Mello. No dia 2 de julho do mesmo ano,
as milícias patrióticas entraram na Cidade pela Estrada das Boiadas, atual
Avenida Lima e Silva, no bairro da Liberdade. A data passou
a ser referência cívica dos baianos, comemorada anualmente com intensa
participação popular.1
Refletir sobre as origens do povo baiano, sua tradição na luta por ideais
e preservação da cultura é de grande relevância para o estudo do atual quadro
sócio – econômico da cidade de Salvador. Sem dúvida, podemos afirmar que a
história deste povo explica e o credencia a preservar e propagar seus
costumes e hábitos, já que estes correspondem a uma construção identitária
profunda e, em grande parte, única.
A forte expressão popular observada na cidade reflete, em boa parte,
esses costumes e hábitos, o que pode ser constatado no seu calendário de
festas.
1 Texto extraído e adaptado a partir de referências históricas do site da Emtursa (setembro de 2000).
Data Evento Local Categoria
01 de janeiro Festa da Boa Viagem Boa Viagem Data Fixa 05 e 06 de janeiro Festa de Reis Magos Largo da Lapinha Data Fixa 13 de janeiro Lavagem do Bonfim Conceição / Bonfim Data Móvel 17 de janeiro Festa da Ribeira Ribeira Data Móvel 02 de fevereiro Festa de Yemanjá Rio Vermelho Data Fixa 17 de fevereiro Lavagem de Itapuã Itapuã Data Móvel 28 de fevereiro Festa de São Lázaro S. Lázaro / Federação Data Móvel 02 a 07 de março Carnaval Salvador Data Móvel 08 de março Presente de Yemanjá de Humaitá Humaitá / Monte Serrat Data Fixa 29 de março Fundação da Cidade Salvador Data Fixa 16 de abril Procissão de Ramos Centro Histórico Data Móvel 21 de abril Paixão – Procissão do Senhor Morto Centro Histórico Data Móvel 22 de abril Queima de Judas (Sábado de Aleluia) Bairros da Cidade Data Móvel 10 de maio Procissão de S. Francisco Xavier
Centro Histórico
Data Fixa
11 de junho Festa do Divino Espírito Santo Largo de Santo Antônio Data Móvel 13 de junho Festa de Santo Antônio Bairros Data Fixa 24 de junho Festa de São João Todo o Estado da Bahia Data Fixa 29 de junho Festa de São Pedro Todo o Estado da Bahia Data Fixa 02 de julho Festa da Independência da Bahia Centro da Cidade Data Fixa 16 de agosto Festa de São Roque São Lázaro Data Fixa 27 de setembro Festa de Cosme e Damião Liberdade / 7 Portas Data Fixa 12 de outubro Nossa Senhora Aparecida Nacional Data Fixa 25 de novembro Dia da Baiana Pelourinho Data Fixa 02 a 05 de dezembro Festa dos Pescadores Boca do Rio Data Fixa 02 de dezembro Dia do Samba Centro Histórico Data Fixa 04 de dezembro Festa de Santa Bárbara Centro Histórico Data Fixa 08 de dezembro Festa de N. S. Conceição Conceição Data Fixa 13 de dezembro Festa Santa Luzia Pilar Data Fixa
QUADRO 1 – Calendário Oficial de Festas de Salvador – 2000
Fonte: Prefeitura Municipal de Salvador / Emtursa (2000).
Como podemos perceber, com base neste calendário, uma série de
festas de expressão popular ocorrem em Salvador durante todo o ano. Desta
forma, são freqüentes as referências ao espírito festeiro, e até certo ponto
espetacular do soteropolitano. Por exemplo: “baiano não nasce, estréia” ou “o
carnaval de Salvador não começa porque não acaba”.
Estas festas populares apresentam, como características marcantes,
uma mescla intensa entre o profano e o religioso, além de um nítido
sincretismo. O sincretismo religioso surge como uma das formas de resistência
da cultura negra, desenvolvida a partir do momento em que escravos eram
obrigados a assistir às missas dos portais das igrejas.
O sincretismo ocorre pelo paralelismo construído entre os santos
católicos e os deuses afros. Podemos citar, como exemplos, as festas
católicas, também comemoradas pelos negros, de Santa Bárbara - que
corresponde a Iansã, e a do Senhor do Bonfim, que é Oxalá.
FIGURA 1 – Festa do Senhor
do Bonfim FIGURA 2 – Festa de N. S. da
Conceição FIGURA 3 – Baianas preparam
comida típica
Desta maneira, podemos compreender que o denso calendário de festas
de Salvador constitui uma legítima expressão da cultura popular, da própria
história do povo soteropolitano.
Porém, resta uma questão: transformar essa cultura em negócio
realmente favorece aos soteropolitanos? Ou, ainda, que grupos sociais se
aproveitam efetivamente, deste negócio?
2.2 SALVADOR NO TERCEIRO MILÊNIO
A cidade do Salvador e o estado da Bahia entraram no terceiro milênio
apresentando um quadro de agudas desigualdades sociais2. O crescimento do
PIB estadual entre os anos de 1985 e 1999 parece não ter sido suficiente para
garantir mais qualidade de vida aos habitantes da capital baiana.
FIGURA 4 – Igreja do Senhor do Bonfim FIGURA 5 – Parque de Pituaçu
FIGURA 6 – Vista aérea da Ribeira FIGURA 7 – Praia de Stela Mares
Verificamos com dados oficiais que o PIB do Estado cresceu nos últimos
anos da década de 90 a uma taxa per capita de cerca de 0,5% (0,4% em 1998
e 0,5% em 1999). Podemos reconhecer, também, que existe uma grande 2 No Capítulo III pode-se verificar tabelas referentes à distribuição de renda em Salvador
variação nas taxas de crescimento do PIB na última década. Estes dados nos
levam a concluir que a economia baiana, em decorrência das políticas
econômicas nacionais ou por fatores internos, não conseguiu se desenvolver
com vigor nos últimos quinze anos.
TABELA 1 – Produto Interno Bruto (Total e Per Capita), Índices e Taxas de Crescimento – Bahia 1985-1999
Anos Unidade
monetária PIB total (valores
correntes)
Índice do PIB
real
Taxa de crescimento
População em 1.000
hab.
PIB per capita
(valores correntes)
Índice do PIB per
capita real
Taxa do PIB per capita
1985 Cr$ Bilhão 69.437,00 100,0 ... 10.551 6.581,3 100,0 ... 1986 Cz$ Milhão 175.045,69 107,9 7,9 10.775 16.245,2 105,8 5,8 1987 Cz$ Milhão 515.009,42 103,0 -4,6 10.997 46.833,5 98,8 -6,6 1988 Cz$ Milhão 4.002.085,83 109,1 5,8 11.213 356.901,2 102,7 3,9 1989 NCz$ Milhão 57.061,55 109,0 0,0 11.425 4.994,6 100,7 -1,9 1990 Cr$ Milhão 1.427.202,77 108,7 -0,3 11.631 122.709,4 98,5 -2,1 1991 Cr$ Milhão 7.294.188,74 107,0 -1,5 11.832 616.492,0 95,3 -3,2 1992 Cr$ Milhão 77.313.805,89 108,9 1,8 11.990 6.448.128,8 95,8 0,4 1993 CR$Milhão 1.680.577,57 112,3 3,1 12.138 138.457,6 97,6 1,9 1994 R$Milhão 14.972,46 116,3 3,5 12.283 1.219,0 99,9 2,3 1995 R$Milhão 26.769,07 117,5 1,0 12.426 2.154,3 99,7 -0,1 1996 R$Milhão 32.989,50 120,6 2,7 12.568 2.624,8 101,2 1,5 1997 R$Milhão 36.735,27 128,5 6,6 12.710 2.890,3 106,7 5,4 1998* R$Milhão 39.365,02 130,5 1,6 12.853 3.062,7 107,2 0,4 1999* R$Milhão 43.194,45 132,5 1,6 12.998 3.323,2 107,7 0,5 Fonte: SEI / IBGE (2000).
No que se refere à estrutura setorial do PIB baiano, observamos
acentuada concentração da atividade econômica no setor terciário (51,3%),
seguido pelo setor secundário (38,4%). Esses dados demonstram a força do
segmento de serviços no estado.
TABELA 2 – Estrutura Setorial do PIB Bahia – 1998
Setores
(%)
Primário 10,3 Secundário 38,4
Terciário 51,3 Total 100,0
Fonte: SEI / IBGE (1998).
O setor terciário inclui as atividades vinculadas ao turismo, lazer e
cultura. Portanto, os dados disponíveis indicam ainda, apenas numa primeira
aproximação, uma significativa presença destes segmentos na economia
baiana. Dados da Secretaria da Cultura e Turismo apontam que o turismo,
incluindo os negócios ligados à cultura representam cerca de 4,4% do PIB
estadual.
De qualquer forma, a real avaliação do PIB ligado à cultura,
entretenimento e turismo torna-se complexa em função do impacto agregado
destas atividades na economia (como transportes, comércio e educação).
Neste momento, importa assinalar que se, por um lado, a economia
cresceu, o mesmo ocorre no quadro de desigualdades sociais. Novos
investimentos, como a ampliação da rede hoteleira em Salvador (a exemplo do
projeto que vem sendo desenvolvido no bairro do Rio Vermelho) e o Complexo
Ford em Camaçari3 geram, na sociedade local, uma forte expectativa de
desenvolvimento econômico e social. Talvez essa expectativa seja alimentada,
3 O acordo firmado entre o governo estadual e a Ford para a instalação do parque automotivo prevê uma
série de concessões, inclusive fiscais. Esses incentivos foram classificados pelo governo paulista como uma ação que alimenta a “guerra fiscal” entre os estados, tendo como contra-argumento central do governo baiano a necessidade de reverter o quadro de desigualdades, no próprio estado e entre os estados da Federação.
sobretudo pelo déficit social existente e pela compreensão de que será
necessário um grande esforço para revertê-lo.
O desemprego, o analfabetismo, o déficit de leitos hospitalares, o
aumento da criminalidade e a concentração da renda aparecem com muito
destaque no cotidiano soteropolitano4.
4 A seguir procuraremos demonstrar a manifestação destas carências na cidade de Salvador.
2.3 SALVADOR: CARACTERIZAÇÃO DEMOGRÁFICA
A cidade de Salvador detém a terceira maior população entre os
municípios brasileiros, depois de São Paulo e Rio de Janeiro e à frente de
grandes cidades, como
Belo Horizonte, Fortaleza e Recife.
De acordo com o Censo Demográfico 2000 (IBGE), o município de
Salvador tem 2.427.745 habitantes, o que corresponde a cerca de 18% do
contingente populacional do estado da Bahia.
A população soteropolitana cresceu 22,3 %, no período 1991-2000. Ou
seja, a população cresceu a uma taxa média anual de 2,26%. Para efeitos de
comparação, o crescimento anual da população brasileira foi de 1,6% e o da
Região Nordeste 1,3%. Mantendo-se esta tendência, a cidade terá 3.060.540
habitantes em 2020.
TABELA 3 – População de 1996 e População Projetada – Região Metropolitana e
Município do Salvador / 1996 -2020
1996(1) 2000 2005 2010 2015 2020
RMS 2.709.084 3.067.748 3.355.220 3.622.045 3.846.870 4.027.968
Salvador 2.211.539 2.427.745 2.589.705 2.759.744 2.926.458 3.060.540
Fonte: Planejamento, Pesquisa, Consultoria e Assessoria Ltda / SEPLAM (2001).
A cidade demanda cada vez mais unidades habitacionais, pois, além do
crescimento da população, observa-se a redução do número médio de
habitantes por domicílio. Desta forma, a pressão por moradia tende a crescer
nos próximos anos, agravando uma série de problemas urbanos, hoje
observados, tais como saneamento básico, transporte e segurança.
TABELA 4 – Número Médio de Habitantes por Domicílio Salvador - 1980/1991/1996
Ano Habitantes/Domicílio
1980 5,0
1991 4,3
1996 4,0
Fonte: IBGE - Censos Demográficos, 1980/1991 e Contagem da População, 1996. Elaboração: PMS-SEPLAM-FMLF-GERIN-SISE, 1998.
A população de Salvador apresenta as seguintes características
demográficas básicas:
TABELA 5 – População por Sexo - Salvador 2000
Sexo Habitantes % Homens 1.147.498 47,0 Mulheres 1.293.395 53,0
Fonte: IBGE (2000).
TABELA 6 – População por Faixas Etárias - Salvador 2000
Idades Habitantes % Até 4 anos 243.771 10,0 5 a 9 anos 214.362 8,8
10 a 14 anos 271.764 11,1 15 a 19 anos 290.033 11,9 20 a 29 anos 473.024 19,4 30 a 39 anos 391.506 16,0 40 a 49 anos 260.213 10,7 50 a 59 anos 142.972 5,9
60 anos e mais 153.245 6,3 Fonte: IBGE (2000).
Salvador apresenta, portanto, uma pirâmide etária com perfil bastante
jovem, com 61,2% da população com idade até 29 anos inclusive. Na verdade,
este perfil jovem é também, em boa parte, resultado da desigualdade social
estrutural que caracteriza a cidade.
Como aspecto positivo, observa-se o aumento da esperança de vida.
Este fenômeno pode ser percebido claramente desde a década de 60,
conforme gráfico apresentado a seguir:
GRÁFICO 1 – Esperança de Vida ao Nascer – Salvador – 1960/1991 Fonte: Planejamento, Pesquisa, Consultoria e Assessoria Ltda / SEPLAM (2000).
Portanto, uma das conclusões parciais deste trabalho diz respeito à
própria estrutura social da cidade, cujo efeitos sobre a dinâmica social e
econômica não podem ser desconhecidos.
Esta estrutura vem apresentando melhorias graduais em alguns
aspectos – a exemplo da expectativa de vida – e perdas crescentes noutros –
como no nível de emprego.
Esperança de Vida ao Nascer Salvador - 1960/1991
62,48
71,19
47,57
53,6257,63
54,28
67,8460,52
40
50
60
70
80
1960 1970 1980 1991
Masculino Feminino
2.4 SALVADOR, TRABALHO, EMPREGO E SAZONALIDADE
O mercado de trabalho de Salvador caracteriza-se por elevado grau de
informalidade, além de forte concentração nos setores de serviço e comércio.
Em contrapartida, o segmento da população ocupado na indústria é o
menor dentre as seis maiores regiões metropolitanas do Brasil, conforme pode
ser observado na tabela apresentada a seguir:
TABELA 7 – Distribuição da População Ocupada de 15 Anos e Mais por Setor de
Atividade nas Seis Maiores Regiões Metropolitanas (Setembro/ 1999)
Setor de Atividade Belo Horizonte Porto Alegre Recife Rio de Janeiro Salvador São Paulo
Indústria 16,1 20,9 10,6 10,5 8,8 20,8
Construção Civil 9,6 6,5 6,3 6,8 7,4 6,6
Comércio 13,6 14,9 17,3 14,1 15,1 15,1
Serviços 54,0 48,7 54,5 58,4 57,8 53,4
Outras Atividades 6,6 9,1 11,3 10,2 10,9 4,2
Fonte: IBGE / SEPLAM (2001).
A estrutura ocupacional não permite afirmar, quando observada
isoladamente, a existência de obstáculos ao desenvolvimento da cidade. O fato
de Salvador apresentar uma estrutura ocupacional particularmente concentrada
no comércio e nos serviços apenas indica a direção historicamente assumida
pela economia da cidade.
Entretanto, a associação do índice de desemprego à estrutura
ocupacional permite reconhecer a grave situação social da cidade. Dados
oficiais apontam para um índice de desemprego aberto de 14,8% (julho de
2000) e oculto de 11,1%, totalizando 25,9%.
TABELA 8 – Taxas de Desemprego - Salvador e Região Metropolitana (Julho/2000)
Taxas RMS
Salvador Demais municípios
Desemprego total 27,3 25,9 33,1 Desemprego aberto 15,4 14,8 17,9 Desemprego oculto 11,9 11,1 15,2
Participação (PEA/PIA) 61,6 62,4 58,5 Fonte: PED RMS - SEI/SETRAS/UFBA/DIEESE/SEADE.
Assim, com estas informações, tem-se uma forte indicação do elevado
nível de informalidade do mercado de trabalho em Salvador (desemprego
oculto - 11,1%). Este fato, de certa forma, encontra-se associado à
sazonalidade da indústria cultural.
Inicialmente, podemos apresentar duas questões, visando a uma melhor
compreensão da situação apresentada:
a) a primeira aponta para uma relação de casualidade do negócio da
cultura com a informalidade na relação de trabalho. Assim, propomos
que o empresariamento da cultura, do lazer e do turismo implica em forte
sazonalidade o que é prejudicial à dinâmica social, dada a tendência ao
desemprego estrutural;
b) a segunda aponta para a necessidade de mais investimento no negócio
da cultura, tendo em vista a redução da sazonalidade e da
informalidade. Ou seja, ao se enfatizar este negócio – cultura, lazer e
turismo – deve-se pensar, simultaneamente, nos investimentos para que
este se torne sustentável e no controle dos efeitos negativos da
sazonalidade sobre as empresas e a população.
Nesta linha de raciocínio, poderia ser estimulada a utilização, na baixa
estação, de bens ligados à cultura e lazer, sendo assim aproveitada a
capacidade instalada, como teatros, shows e exposições.
Ao longo desta dissertação procuraremos avançar mais nesta discussão,
mesmo não sendo nosso objetivo tentar esgotar este tema.
2.5 SALVADOR E SEUS VETORES DE CRESCIMENTO
A cidade de Salvador possui uma geografia peculiar. As ladeiras e os
terrenos acidentados interferiram de forma direta no processo de urbanização.
As particularidades do sítio interferiram na concepção da cidade, dividida em
duas partes; a alta, onde hoje estão localizadas a Praça Municipal e a Praça
Castro Alves, e a baixa, onde se encontram o Mercado Modelo, o Porto e o
Comércio.
De início, a cidade apresentou, como boa parte das cidades litorâneas
do Brasil, um crescimento próximo ao mar5. Assim, a consolidação da
urbanização da cidade deu-se na faixa voltada para a Baía de Todos os
Santos. Posteriormente, o crescimento acontece em direção ao norte da
cidade, acompanhando a faixa litorânea banhada pelo Oceano Atlântico.
5 A exemplo do Rio de janeiro, Santos, Aracaju e Maceió.
Segundo conclusões de estudos realizados pela Mendes – Informação e
Marketing6, a cidade de Salvador apresenta três vetores de crescimento
distintos, que determinarão a direção da expansão da cidade e o perfil das
áreas por eles abrangidos. São eles:
a) Vetor 1 – ao longo da Orla de Salvador. Vetor de crescimento
econômico qualitativo, caracterizado por condomínios residenciais de
alto luxo, predominantemente condomínios fechados;
b) Vetor 2 – ao longo da Av. Paralela, seguindo pela Estrada do Coco e em
direção ao Litoral Norte, apresentando derivações importantes como o
Miolo de Salvador7, Itinga e Villas do Atlântico – já em Lauro de Freitas –
e se estendendo até os povoados de Camaçari ao longo da Estrada do
Coco.
Os estudos realizados apontam para a tendência de que a Av. Paralela
abrigue futuras incorporações comerciais da cidade, incluindo concessionárias
de carros, shoppings centers e universidades8. Em função do grande
adensamento da Av. Tancredo Neves9, este vetor torna-se a opção natural
para o surgimento de novos edifícios de escritórios. Por outro lado, as regiões
no Miolo de Salvador, tenderão a apresentar crescimento residencial de
famílias de renda média/ baixa10.
6 Esses estudos foram realizados em 2000 e 2001, visando identificar o potencial de consumo de cada
Região Administrativa e os vetores de crescimento de Salvador. A metodologia utilizada nesses estudos utiliza dados do IBGE, da SUCOM e da CONDER.
7 O Miolo de Salvador é a área existente entre a Av. Paralela e a BR 324. 8 A exemplo do novo campus da Universidade Católica do Salvador e da Faculdade Diplomata, bem
como a nova sede da Odebrecht. 9 Estudo realizado pela Mendes – Análise de Mercado em maio de 2001 indica a existência de cerca de
7.000 salas de negócios entre as avenidas Tancredo Neves e Antônio Carlos Magalhães. 10Já se pode verificar a existência de grandes conjuntos habitacionais nesta área, destinados,
principalmente, à classe média baixa.
c) Vetor 3 – ao longo da BR-324, que se estende até Simões Filho e deriva
também para o Miolo de Salvador e o subúrbio ferroviário. Área de
impacto industrial que é impulsionada pelo crescimento do Pólo
Petroquímico de Camaçari e pelo Pólo Automotivo da Ford.
Portanto, o que podemos notar é um processo de conurbação entre as
cidades de Salvador e Lauro de Freitas – já de forma mais clara – mas também
envolvendo Simões Filho e Camaçari.
Podemos, também, compreender estes vetores de crescimento como
um processo de segmentação do espaço urbano. Assim, as classes média-alta
e alta tendem a ocupar os espaços do vetor 1, ficando o vetor 2 destinado à
classe média-baixa. Já a classe baixa continua a conviver em condições
adversas, em especial no subúrbio ferroviário.
2.6 SALVADOR: CITY MARKETING
Segundo Porter (1990), os lugares devem competir para obter vantagens
competitivas11, conquistando uma posição diferenciada no mercado de
localização de atividades produtivas.
Algumas estratégicas são apresentadas para que os lugares possam
melhorar suas posições nesta competição. Segundo Kotler (1994), existem seis
estratégias genéricas que podem ser utilizadas:
11 A competitividade nas cidades americanas tem origem nos anos 30, tendo como centro analítico a
indústria da localização.
a) Atrair turistas e visitantes a negócios;
b) Atrair negócios de outros lugares;
c) Manter e expandir os negócios já existentes;
d) Promover pequenos negócios e apoiar a criação de novos;
e) Aumentar as exportações e os investimentos estrangeiros;
f) Aumentar a população ou mudar a combinação de moradores.
A partir de 1991, com a volta do grupo carlista12 ao governo do estado,
foi desenvolvida uma estratégia de desenvolvimento da atividade turística para
a Bahia13 e especialmente para a capital. Esta estratégia baseou-se na
construção de uma “vocação” da cidade, vinculada às atividades ligadas ao
turismo e expressiva da compreensão da cidade como organização
competitiva. Esta vocação era fundamentada nas belezas naturais e riquezas
ecológicas, no patrimônio histórico e na diversidade cultural do estado.
Com um grupo bastante alinhado com seu líder, a máquina pública
passou a desenvolver uma série de ações que visavam ao estímulo do turismo.
Estas ações podem ser divididas em investimentos em infra-estrutura e em
promoção.
12 Waldir Pires (PMDB) assume o governo em 1987,deixando-o em 1989, para se candidatar a vice-
presidente na chapa de Ulisses Guimarães, assumindo, então, o vice_ Nilo Coelho. Em 1991, assume, pela terceira vez o governo do estado, Antônio Carlos Magalhães (PFL). Posteriormente, Paulo Souto (1995) e César Borges (1999), ambos ligados a ACM, assumem a gestão estadual.
13 Podemos notar, já no final da década de 60, esforços do governo, em direção ao desenvolvimento do
turismo no estado, inclusive com metas de interiorização da atividade. Assim, o estado, numa postura empreendedora, construiu e administrou hotéis no interior, como em Lençóis e Itaparica. Como o grupo carlista esteve à frente do governo estadual na maior parte do tempo entre 1968 e 2001, percebemos uma clara intenção, quase que continuada, de desenvolvimento do turismo.
Por infra-estrutura, compreende-se, da ótica do grupo responsável, a
melhora do produto ou, ao menos, seu embelezamento. Foram realizados
investimentos nesta direção, nos municípios, com apoio do estado e
financiamento internacional. Em Salvador, foi iniciado o projeto de revitalização
do Pelourinho, com a recuperação dos antigos casarões e o redirecionamento
das atividades econômicas.
Foram concebidos, ainda, outros projetos, como o BahiaAzul14, a
iluminação da orla da Barra, a revitalização do Dique do Tororó e o reforço da
segurança pública – em especial na orla e pontos turísticos - para a melhoria
do produto Salvador.
FIGURA 8 – Praia da Barra Iluminada FIGURA 9 – Elevador Lacerda
Em paralelo a essas atividades, a Bahiatursa passou a desenvolver uma
forte estratégia de reposicionamento da imagem da cidade, com investimentos
em comunicação e na promoção de eventos.
Nesta direção, o prefeito de Salvador, Antônio Imbassahy, em entrevista
concedida em 1997, afirmou que a Bahiatursa cuidaria da promoção e a
14 Este projeto tem como meta elevar para mais de 90% o saneamento básico na cidade, o que
possibilitará uma redução significativa na poluição da orla marítima.
prefeitura do produto15. Nesta parceria, cada órgão envolvido teria atribuições
claramente definidas e complementares. Esta afirmação coaduna-se com a
orientação do City Marketing.
Segundo Kotler (1994), uma cidade deve preocupar-se com a
Administração Estratégica da Imagem (AEI). Portanto, devem estar claramente
definidos os segmentos- alvo dos usuários potenciais e como atingi-los. Mais
que isto, é indispensável monitorar a imagem construída do lugar.
Neste sentido, pode-se afirmar que os interesses representados no
governo da Bahia e da cidade de Salvador seguem as orientações do City
Marketing, atuando de forma incisiva na promoção de seu produto. A elevada
conta publicitária na divulgação da cidade exemplifica o acionamento desta
estratégia16.
Na estratégia implementada, encontra-se incluída a disputa com outras
cidades brasileiras como lugar destino dos fluxos turísticos. Assim, observando
os dados do turismo nacional, verificamos que Salvador é a quarta cidade mais
visitada do Brasil. À sua frente estão São Paulo, Rio de Janeiro e Florianópolis.
TABELA 9 – Cidades Mais Visitadas - Brasil 2000
15 Sem dúvida, este é um claro pensamento mercadológico, orientado pelos 4P’s (promoção, produto, praça e preço) 16O jornal A Tarde durante o segundo semestre de 2000 publicou uma série de reportagens alertando para
os elevados valores relacionados à publicidade do governo do estado.
Cidade % Rio de Janeiro 32,54 Florianópolis 17,69 São Paulo 13,74 Salvador 12,67 Foz do Iguaçu 11,78
Fonte: Embratur (2000). Publicado no site da Embratur.
O acionamento do City Marketing tem gerado resultados positivos para
alguns segmentos da economia soteropolitana. Um dos segmentos com maior
retorno tem sido o de hotelaria, que apresentou forte crescimento nos últimos
dois anos, conforme pode ser observado nas tabelas apresentadas a seguir:
TABELA 10 – Geração de Diárias nos Hotéis Classificados em Salvador (Janeiro - Maio/ 1999-2000)
Diárias Geradas Mês 1999 2000 2000 / 1999 (%)
Janeiro 158.660 195.608 23,29 Fevereiro 121.758 150.412 23,53 Março 122.216 168.301 37,71 Abril 96.476 148.213 53,63 Maio 100.228 106.556 6,31 Jan – Maio 599.338 769.090 28,32
Fonte: BAHIATURSA, FNRH's / BOH's Elaboração: BAHIATURSA e SEI(1) Inclusas Itaparica e Praia do Forte.
Como reflexo do aumento da demanda, tem crescido, também, o
número de estabelecimentos do setor hoteleiro. A tabela apresentada a seguir
demonstra isto, em especial no que se refere a pensões, casas de
hospedagem e hotéis não classificados. Estes estabelecimentos, normalmente,
são geridos por pequenos empresários, oriundos da classe média da cidade ou
ex-turistas que adotaram a cidade como moradia17.
TABELA 11 – Estabelecimentos do Setor Hoteleiro – Salvador – 1980 – 1998
17 Este perfil foi estabelecido com base em observação de campo e entrevistas informais com profissionais do setor.
ESTABELECIMENTOS
Ano Hotéis classificados Pensões, casas de hospedagem e hotéis não classificados 1980 37 109 1981 38 120 1982 36 113 1983 36 105 1984 36 130 1985 41 148 1986 42 167 1987 44 168 1988 46 141 1989 47 141 1990 47 141 1991 46 141 1992 43 141 1993 42 165 1994 44 177 1995 42 189 1996 42 194 1997 41 201 1998 38 207
Fonte: BAHIATURSA (1999).
Também têm sido observadas a construção e a reforma de grandes
hotéis, como o Complexo de Sauípe. Distante cerca de 70 km de Salvador, foi
inaugurado em 1999 com seis hotéis cinco estrelas, tendo como principal
acionista o Fundo de Pensão do Banco do Brasil (92%). Este Complexo
disponibiliza serviços especiais como o super inclusive18, além de apresentar
novos procedimentos operacionais de atendimento e gestão. Já o Hotel Quatro
Rodas passou por reforma significativa em 2000 e, no bairro do Rio Vermelho,
está em fase de construção um grande centro hoteleiro. Também o Hotel
Fiesta desenvolveu seu sistema de qualidade com base nas normas ISO 9000.
Enfim, tem-se um cenário de empreendedorismo muito forte,
caracterizado pela busca de padrões de atendimento de ponta, destinado a
segmentos de turistas de alta renda. Observa-se, assim, uma segmentação
18 Sistema apresentado pelo Super Clubs, um dos hotéis do Complexo de Sauípe.
empresarial que corresponde a um movimento de especialização no
atendimento de segmentos do público-alvo.
Porém a qualificação da mão-de-obra aparece como uma das questões-
chave deste processo de desenvolvimento do turismo. Os processos de
padronização de procedimentos e implementação de programas de qualidade
encontram, muitas vezes, o obstáculo da baixa qualificação da mão-de-obra
local.
Como reflexo deste obstáculo, observa-se, por exemplo, no Complexo
de Sauípe a vinda de mão- de- obra qualificada do Centro-Sul do país, em
especial de São Paulo, o que implica na manutenção dos mecanismos de
segregação social que caracterizam a dinâmica social da cidade.
Assim, percebemos que uma mudança estrutural no próprio modo de
compreender os investimentos sociais – e aqui nos referimos especialmente à
educação – poderia ter um forte impacto na apropriação das oportunidades
econômicas geradas pelo turismo tão fortemente estimulado por sucessivos
governos.
Isto significa dizer que existe um forte descompasso entre os
investimentos em infra-estrutura e o padrão de vida da população local,
trazendo, como resultado, o seu afastamento sistemático das oportunidades
criadas. Esta é uma forma de violência a qual não é citada nem refletida.19.
19 Processo semelhante já pode ser notado na implantação da Ford em Camaçari. Lá percebe-se um
“esforço de última hora” para qualificar a população local, sendo que os ocupantes dos principais
Em decorrência dos limites da dissertação, não levantaremos questões
relativas ao papel do Estado. Assim, não apresentaremos uma visão crítica
detalhada da necessidade de mais investimentos em educação, mas, pelo
menos, devemos citar duas concepções relacionadas à qualificação da mão –
de - obra local:
a) o Estado deve garantir a qualificação da população (escolas, faculdades,
cursos de línguas, cursos de computação);
b) o mercado por si só se regula. A questão se resume a uma lógica de
demanda e oferta. Assim, a oferta de qualificação interage de forma
harmônica com a demanda (conduzida pelo poder de compra).
O que se verifica é que nenhuma das duas concepções é efetivada. Nem
existe investimento governamental capaz de reverter obstáculos relacionados à
qualificação, nem a população possui poder aquisitivo para obter a qualificação
necessária à sua inclusão na estratégia de desenvolvimento escolhido para a
cidade.
2.6.1 Duplicação do Aeroporto Internacional de Salvador
De forma coerente com a política de City Marketing, observa-se ainda
uma preocupação do governo do estado com a infra-estrutura de apoio do
cargos, a exemplo de engenheiros, serão selecionados fora do estado. Em parte, o mesmo fenômeno se repete na Coelba e na Telebahia Celular após seus respectivos processos de privatização.
turismo. Um dos principais exemplos desta preocupação é a duplicação do
Aeroporto Internacional de Salvador, iniciada em 1998.
Em parte, este investimento reflete a crescente demanda observada nos
últimos anos, porém o investimento realizado também transmite à indústria do
turismo o compromisso do governo com o setor.
TABELA 12 – Movimento de Vôos no Aeroporto Internacional de Salvador (Salvador - 1992/1999)
Anos Domésticos Internacionais Total 1992 42.478 3.396 45.874 1993 44.684 3.432 48.116 1994 49.590 3.358 49.590 1995 51.599 2.782 54.381 1996 52.932 2.504 55.436 1997 58.194 3.377 61.571 1998 68.395 4.074 72.469
1999(1) 61.374 3.331 64.705 Fonte: INFRAERO. (1) Dados relativos de Janeiro a Outubro de 1999.
Paralelo a esse aumento de vôos, houve uma redução dos vôos
charters. De certa forma, isto significa que vôos especiais têm perdido a
demanda, o que pode ser explicado pelo aumento do número de vôos
regulares, em especial os internacionais.
TABELA13 – Movimento de Passageiros Transportados em Vôos Charters, no Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães (Salvador - 1991/ 1998)
Ano Passageiros embarcados
Passageiros desembarcados
Total Número de vôos (pouso / decolagem)
1991 9.711 9.430 19.141 88 1992 20.205 17.692 37.897 101 1993 21.445 21.007 42.452 220 1994 31.088 29.708 60.796 600 1995 31.237 30.409 61.646 716
1996 18.753 18.315 37.068 368 1997 8.292 7.850 16.142 156 1998 10.643 11.538 22.181 236
Fonte: INFRAERO.
Observa-se, com base nas informações apresentadas, a gradual
configuração de condicionantes materiais (grandes objetos e empresas) do
futuro de Salvador, o que exige o desvendamento de estratégias que
possibilitam a integração social nos rumos da modernização econômica.
2.7 SALVADOR: O DESENVOLVIMENTO DO CLUSTER DO TURISMO, CULTURA
E ENTRETENIMENTO
A observação das ações dos governos estadual (a partir de 1991) e
municipal (a partir de 1995) que visam à transformação da cidade de Salvador
num pólo turístico sugere a adoção de cluster na reflexão da economia local.
Porter define clusters como concentrações geográficas de empresas
interligadas entre si, que atuam em um mesmo setor com fornecedores
especializados, provedores de serviços e instituições associadas.
Um aglomerado é um agrupamento geograficamente concentrado de empresas interrelacionadas e instituições correlatas numa determinada
área, vinculadas por elementos comuns e complementares. O escopo
geográfico varia de uma única cidade ou estado para todo um país ou
mesmo uma rede de países vizinhos. Os aglomerados assumem diversas
formas, dependendo de sua profundidade e sofisticação, mas a maioria
inclui empresas de produtos ou serviços finais, fornecedores de insumos especializados, componentes, equipamentos e serviços, instituições
financeiras e empresas em setores correlatos. Os aglomerados geralmente
também incluem empresas em setores a jusante (ou seja, distribuidores ou
clientes), fabricantes de produtos complementares, fornecedores de infra-
estrutura especializada, instituições governamentais e outras, dedicadas ao
treinamento especializado, educação, informação, pesquisa e suporte técnico (como universidades, centros de altos estudos e prestadores de
serviços de treinamento vocacional), e agências de normatização. Os
órgãos governamentais com influência significativa sobre os aglomerados
incluem associações comerciais e outras entidades associativas do setor
privado , que apoiam seus participantes. (PORTER, 1999, p. 211-212 ).
Assim, as empresas têm em comum o fato de estarem localizadas numa mesma área e de
contribuírem para um sistema que desenvolve produtos característicos da região. Há, portanto, uma forte
sinergia entre empresas, garantindo maior eficiência da economia local, e possibilitando crescimento
auto-sustentável. Desta forma, um cluster é mais que um simples aglomerado de empresas, é um caminho
seguido por determinada economia.
Para que os clusters operem de forma eficiente, é necessário o alcance
de: cooperação, complementaridade, senso de comunidade e competição.
Assim, ainda segundo Porter, num cluster toda produção é o resultado
da grande cooperação entre os diferentes agentes da cadeia produtiva, desde
fornecedores de matéria-prima até vendedores, passando por produtores,
desenhistas e pesquisadores. Esses players se complementariam ao
trabalharem em busca de um mesmo objetivo.
Entretanto, é justamente a competição entre as empresas das várias
etapas da cadeia produtiva que possibilita maior dinamismo à economia. A
competição contínua faz com que o cluster tenha uma produção mais eficaz,
com produtos de qualidade cada vez maior e com mais inovação. Além desta
interação entre os agentes da cadeia produtiva, existiria, também, um intenso
relacionamento com a sociedade local.
Nesta concepção da dinâmica econômica, há grande preocupação com
o desenvolvimento da região e o bem estar de sua população. Assim, o cluster
somente terá sucesso caso a região se desenvolva e sua população tenha um
bom nível de qualidade de vida. Com isto, o desenvolvimento econômico não
pode excluir o desenvolvimento social.
Em tese, um cluster é portador dos seguintes benefícios potenciais:
a) redução de custos pela especialização e/ou aumento de escala nos
setores da cadeia de negócios;
b) redução de riscos pela especialização e/ou divisão dos investimentos;
c) redução dos lead times pela melhoria da cadeia de negócios através da
integração entre as empresas;
d) aumento da qualidade por meio da competição, inovação e ações
conjuntas;
e) maior qualidade e flexibilidade da mão-de-obra pelo aumento e melhoria
da oferta de oportunidades profissionais e treinamento integrado;
f) aumento do dinamismo empresarial pela criação e atração de novas
empresas/líderes;
g) ganho de reconhecimento público.
A importância da compreensão do conceito de cluster e da sua aplicação
nas cidades – e, neste caso, em Salvador – reside no fato de que sua busca,
de forma sistemática, pelos governos e associações empresarias pode garantir
maior eficiência à economia local.
Em boa parte a adoção do conceito de cluster pode ser observada no
Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro (1996), ao se tentar coordenar o
desenvolvimento do turismo na cidade.
Também podemos identificar elementos do cluster no Plano Estratégico da
Cidade de Santos, onde a preocupação de coordenar ações que levassem a
cidade a um patamar de maior eficiência em transportes e telecomunicação
pode ser percebida de forma clara neste Plano20.
Em Salvador, existem indicações da aplicação do conceito de cluster.
Porém, Salvador não possui um Plano Estratégico.
20 A primeira fase do plano contava com três Programas de Desenvolvimento Municipal: Programa de
Modernização Administrativa da Prefeitura (SETI); Programa de Integração Porto – Cidade (Integra Centro) e Programa de Desenvolvimento de Infra-estrutura de Telecomunicações. Cada Programa era subdivido em Projetos Estruturais Específicos desenvolvidos de forma tripartite: Prefeitura, Empresariado e Sociedade Civil Organizada.
CLUSTER CULTURA,CLUSTER CULTURA, LAZER E TURISMO LAZER E TURISMO
Investidores
Transporte marítimo
Meios de hospedagem
Educação
Mídia / Cinema / TV / Revista / Gravadoras
Infra-estrutura de acesso
Eventos esportivos
Igrejas / manifestações religiosas
Exposição de arte Espetáculos
Restaurantes
Compras / Shopping de lazer /
Blocos e bandas
Operadores e agentes
Transporte rodoviário
Companhias aéreas
MODELO DO CLUSTER CULTURA, LAZER E TURISMO EM SALVADORMODELO DO CLUSTER CULTURA, LAZER E TURISMO EM SALVADOR
Agências de coord. pública (Entursa, Bahiatursa, SCT)
Agências de coord. privada (ABIH, ABT)
ONG’s ligadas ao meio cultural
FIGURA 10 – Modelo do Cluster Cultura, Lazer e Turismo em Salvador Fonte: este modelo foi adaptado a partir do Sumário Executivo do projeto “Criando o Cluster de
Entretenimento do Estado da Bahia” apresentado pela Monitor Company Group em maio de 2001 ao Governo da Bahia, através da Secretaria da Cultura e Turismo.
Nesta forma de compreender a lógica econômica, percebemos a
interação entre cultura, lazer e turismo na cidade de Salvador.
Neste modelo que busca a sinergia empresarial encontram-se incluídos
empresas aéreas, eventos esportivos, hotéis, teatros, infra-estrutura de apoio,
shopping de lazer, dentre outras organizações e iniciativas.
Observamos que, do ponto de vista econômico, existe forte indução
deste cluster pelo governo, em especial o estadual.
Assim, verificamos a contratação de empresas de consultoria que
apoiem o desenvolvimento do cluster cultura, lazer e turismo21.
Porém, deve ficar claro que a existência de um cluster, com essas
características ocorreu sem que houvesse qualquer trabalho de consultoria. Ou
melhor, o cluster cultura, lazer e turismo em Salvador antecede a contratação
de empresas de consultoria.
Podemos compreender, portanto, o modus operantes do cluster, em
desenvolvimento em Salvador com auxílio de consultores, como uma
21 A Monitor, empresa ligada a Michel Porter, estrategista e professor da Harvard University, vem
desenvolvendo uma consultoria ao governo do estado.
ferramenta gerencial, mas nunca como o caminho de emergência do próprio
cluster, que já existia, mesmo que com uma série de dificuldades de
coordenação e cooperação entre empresas e atividades. Por outro lado, o
envolvimento da sociedade local, um dos pressupostos do cluster enquanto
estratégia de desenvolvimento, enfrenta os limites da desigualdade social e da
origem dos interesses econômicos envolvidos em sua dinâmica.
Entre as principais dificuldades encontradas no desenvolvimento deste
cluster encontra-se a secundarização do empresariado local, em especial das
pequenas organizações. A falta de preparo reflete-se de forma clara em uma
baixa eficiência operacional e, ainda, numa baixa qualidade na prestação dos
serviços. Mais que isto, percebe-se que muitas organizações, como pequenos
blocos carnavalescos e restaurantes, não conseguem desenvolver o
planejamento de ações de longo prazo, tornando ainda mais nociva a
intensificação da sazonalidade das atividades econômicas em Salvador.
2.8 SALVADOR: DEVE-SE OPTAR PELO PLANO ESTRATÉGICO?
Apesar de Salvador não dispor de um Plano Estratégico – como Rio de
Janeiro ou Santos – a lógica do plano está absolutamente presente na
concepção do cluster cultura, lazer e turismo. Com isto, aspectos positivos e
negativos22 de um Plano Estratégico de Cidade estão presentes nas
estratégias de desenvolvimento empresarial do turismo e da cultura, sem que
ocorra qualquer tipo de negociação mais ampla com a sociedade local. 22 Ver Vainer (2000)
Como conclusão, então, temos que Salvador possui um Plano
Estratégico, sem que este surja como Plano Estratégico de Cidade. Talvez uma
das principais razões para este fato resida na forte aliança entre governos
estadual e municipal, o que tornaria “desnecessário” um plano para a cidade.
Os interesses contemplados, provavelmente, não encontram apoio num “pacto”
com base na cidade, mas sim com base no estado, sendo a cidade um locus
especialmente concentrado de manifestação / concretização destes interesses.
2.9 O TURISMO EM SALVADOR: A VISÃO DOS GOVERNOS ESTADUAL E MUNICIPAL SOBRE CULTURA E TURISMO
Como observado anteriormente, a partir de 1991, o governo estadual23
tem estimulado a indústria do turismo de forma nítida. Para tanto, o estado foi
dividido em sete áreas de investimento –Costa dos Coqueiros, Baía de Todos
os Santos, Costa do Dendê, Costa do Cacau, Costa do Descobrimento, Costa
das Baleias e Chapada. A divisão do estado em áreas de investimento
propiciou uma maior eficiência na gestão dos recursos.
O Programa de Desenvolvimento Turístico da Bahia – Prodetur Bahia -
condensa os investimentos dirigidos à implementação e ao de fortalecimento
do turismo no estado. Segundo dados da Secretaria de Cultura e Turismo, os
investimentos programados pelo governo estadual em infra-estrutura em
23 Atualmente as ações são coordenadas pela Secretaria de Cultura e Turismo.
turismo apontam para uma alocação de US$2,1 bilhões no período de 1991 -
2005.
Estes investimentos tiveram, na sua origem, o Tesouro Estadual como
fonte financiadora. Posteriormente, ocorre o envolvimento das seguintes fontes:
Banco Mundial – BIRD, Kreditanstalt für Wiederaufbau – KFW, Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDS, Fundo Geral de Turismo –
FUNGETUR e Programa de Financiamento ao Turismo do Nordeste –
PRODETUE24.
A distribuição destes investimentos encontram-se da seguinte forma:
GRÁFICO 2 – Investimentos em Infra-Estrutura de Turismo 1991-2005 em US$ Milhões Fonte: A Estratégia Turística da Bahia – 1991-2005. Secretaria de Cultura e Turismo – 2000.
24 Com a coordenação do Banco do Nordeste e recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento –
BID. Por fim, foi adotada a sigla BID – PRODETUR.
Investimentos em Infra-estrutura de turismo 1991-2005
em US$ milhões
147
515
891
172
158272
energia elétrica
transporte
saneamento
sistema aeroportuários
recuperação do patrimôniohistóricooutros
Ao observarmos os valores investidos em saneamento básico – e,
principalmente, a definição deste investimento como “infra-estrutura de turismo”
- percebemos a articulação, estabelecida pela estratégia dominante, entre os
recursos de cunho social e a política de desenvolvimento econômico.
GRÁFICO 3 – Investimentos em Infra-Estrutura de Turismo 1991-2005 em %
Ou seja, o investimento em saneamento básico surge como investimento
expressivo de estratégia econômica. Se, por um lado, é socialmente
inadequado que investimentos em melhoria da qualidade de vida da população
sejam justificados por fins econômicos, por outro lado, percebe-se que o
negócio do turismo só é plenamente viável se o for socialmente.
Neste sentido, podemos recorrer a uma expressão comumente utilizada
pelo trade turístico: “se a cidade não for boa para a população, não será para o
visitante”.
Investimentos em Infra-estrutura de turismo
(1991-2005)
7%
24%
42%
8%
7%12%
energia elétrica
transporte
saneamento
sistema aeroportuários
recuperação do patrimônio histórico
outros
Porém, os fortes processos de segregação social – e a seletividade por
eles estimulada – geram uma complexidade que pode permitir que o lucro
aconteça mesmo face à desigualdade e à exclusão.
Afinal, trata-se de uma nova economia de fluxos e estes podem ser
direcionados de forma estudada e planejada.
Dentre as obras já realizadas, podemos destacar as do Aeroporto de
Salvador, que possibilitaram o aumento da capacidade de atendimento de
passageiros de dois milhões / ano para cinco milhões / ano. Para tanto, o
terminal de passageiros mais que duplicou sua área, passando de 28 mil para
60 mil metros quadrados.
Ao final das obras, o aeroporto terá capacidade para atender
simultaneamente vinte e seis operações (quinze em posição remota e onze em
finger). Será também ampliado o estacionamento – de 550 vagas para 1.500 -
e a pista de taxiamento, de 1.500 metros, para 3.000.
De certa forma, podemos associar boa parte dos investimentos
realizados e previstos – iluminação da orla, polícia turística, Teatro Castro
Alves – a um processo de recuperação seletiva da cidade, ou seja, trata-se de
promover a melhoria daqueles segmentos da cidade que permitem retorno
econômico imediato – onde há apelo turístico.
Entretanto, como já observamos, existe grande risco nesta seleção. Se,
por um lado, é compreensível a necessidade de concentrar investimentos onde
existam perspectivas de retorno – onde o investimento pode ter um impacto
agregado elevado – por outro, reconhecemos que a comunidade – entendida
como empresas locais e sociedade – terá grande dificuldade na apropriação
das oportunidades decorrentes destes investimentos.
Mais uma vez, corre-se o risco – como nos exemplos do Complexo
Sauípe e da Ford – de que projetos de grande visibilidade não gerem
conseqüências sociais positivas. As oportunidades aparecem, mas não se
realizam plenamente. Tendem, ao contrário, a reproduzir a parcialidade que
caracterizou, historicamente, as sucessivas modernizações da cidade de
Salvador.
3 A ECLOSÃO DA CULTURA: SALVADOR – PRODUTO
3.1 A MERCANTILIZAÇÃO DA CULTURA
Podemos observar, nas últimas décadas, um forte processo de
mercantilização da cultura popular em Salvador. Neste processo, a cultura é
transformada e apresentada como um produto. Na visão de Kotler (1994, p.
26), um produto é “algo que pode ser oferecido para satisfazer a uma
necessidade ou desejo.” Este autor associa, ainda, produto e serviço:
De fato, serviços são também oferecidos por outros veículos como pessoas, lugares, atividades, organizações e idéias. Se estamos aborrecidos, podemos assistir a uma comédia (pessoas); viajar para uma estação de férias nas Bermudas (lugar); engajar-nos em algum exercício físico (atividade); associar-nos a um clube de pessoas solitárias (organização); ou adotar uma filosofia de vida diferente (idéia).
FIGURA 11 – Banda Timbalada Durante o Carnaval
O que fica bastante claro em Kotler é o fato de que o produto é pensado
de forma ampla, ou seja, existe uma busca pela transformação de práticas
sociais e objetos em produto.
Segundo Davis & Meyer (1999), existem aspectos tangíveis e intangíveis
nos produtos (incluindo os serviços), porém os intangíveis crescem mais
rapidamente. Neste sentido, parece ser razoável associar a cultura – ou,
melhor dizendo, os produtos ligados à cultura, ao turismo e ao entretenimento –
a esta tendência da economia contemporânea.
A questão central da produção cultural de objetos e práticas sociais seria
a possibilidade (ou não) da cultura ser transformada em produto. Mais que isto:
quais são as conseqüências sociais da transformação da cultura em produto?
Convém recordar, neste sentido, que contribuiu intensamente para a
exposição da cultura baiana uma série de novelas televisivas e filmes, a
exemplo de Tieta, Gabriela e o Pagador de Promessas. Contribuiu, também,
número expressivo de escritores, artistas e intelectuais com destaque nacional
e internacional. Podem ser citados, no período mais recente, Jorge Amado,
João Ubaldo Ribeiro, Dorival Caymi, Glauber Rocha, Caetano Veloso, Cid
Teixeira e Orlando Gomes. Mas, talvez, o maior destaque no mercado da
indústria cultural seja o produto carnaval.
Neste capítulo, analisamos o comportamento da indústria cultural,
associada ao turismo e ao lazer. Como premissa para o desenvolvimento desta
análise, afirmamos a existência de uma visão estratégica mais aguçada, por
parte do empresariado soteropolitano, quanto à cadeia de valor (Porter, 1990)
do negócio cultura , entretenimento e turismo em Salvador.
Assim, estudamos como o produto cultura de Salvador é construído,
distribuído e consumido. A pesquisa do fluxo de produção, circulação e
consumo deste produto busca permitir uma compreensão global deste
fenômeno na cidade.
Neste sentido, julgamos que observar atentamente a lógica empresarial
– que orienta o planejamento estratégico de cidades – constitui um caminho
interessante para a observação e a análise de processos mais amplos.
Desta forma, foi utilizado o modelo de Abell e Hammond (1979) para
identificar novas fontes de vantagens competitivas para empresas e
profissionais que atuam com a cultura local. Abell e Hammond (1979) indicam
que a definição de um negócio é o primeiro passo no planejamento estratégico
de mercado, porque a definição do negócio precede todas as demais reflexões
sobre a estratégia a ser desenvolvida. Alguns planos específicos, que
atenderão às necessidades dos clientes, só poderão ser formulados depois que
a organização tiver considerado questões relativas ao escopo, segmentação e
diferenciação de seu negócio.
Isto significa que devemos ter uma exata noção daquilo que chamamos
de indústria cultural, ou melhor, do negócio da indústria cultural de Salvador.
Segundo Abell e Hammond (1979), um negócio pode ser definido tanto
pelo lado da oferta – que segmento de mercado será atendido pela empresa–
quanto pelo lado da demanda – que produtos ou serviços serão oferecidos.
Sob qualquer destes pontos de vista, as descrições, seja do produto ou do
mercado a ser atendido, possuem três dimensões de análise. São elas:
a) QUEM está sendo atendido. Esta é a dimensão do grupo de
consumidores. Aqui, os clientes poderão ser classificados com base em
dimensões geográficas, demográficas e culturais (hábitos de compra e
estilos de vida, entre outras);
b) QUE necessidade está sendo atendida. Esta é a dimensão do produto,
da função que o produto ou serviço tem para o consumidor. Algumas
vezes, os produtos podem ser multifuncionais, atendendo a um conjunto
de necessidades relacionadas. Em outros casos, um negócio é capaz de
atender múltiplas necessidades dos clientes com a oferta de diferentes
produtos;
c) COMO as necessidades dos clientes estão sendo atendidas. Esta é a
dimensão da tecnologia. Em geral, existem diversas possibilidades
técnicas para satisfação de uma mesma necessidade.
Devemos salientar que, para os autores, nenhuma das três dimensões
isoladamente fornece a definição completa de um negócio. Assim, as três
dimensões são consideradas importantes na determinação do escopo,
segmentação e diferenciação do produto e, portanto, da atuação da firma.
Utilizando o modelo de Abell e Hammond (op. cit.), verificamos a
amplitude do negócio da indústria cultural em Salvador, sendo possível
demonstrar, inclusive, que a cultura tem uma forte relação com o turismo e
com o entretenimento. Desta maneira, refletiremos, a seguir, o negócio “cultura,
turismo e entretenimento de Salvador”.
Ao aplicarmos os conceitos oferecidos pelos autores citados à realidade
de Salvador, identificamos a articulação do carnaval de Salvador - fenômeno
típico da cultura da cidade - ao turismo e ao lazer. O pico de ocupação da rede
hoteleira no período do carnaval, a participação de turistas nos blocos de
carnaval e o recall de mídia da cidade mostram a sinergia entre cultura, turismo
e lazer.
Muitas organizações soteropolitanas alicerçadas neste tripé têm obtido
resultados econômicos satisfatórios, a exemplo do Aeroclube Plaza25.
Ao refletirmos a cultura como negócio para numerosos agentes
econômicos devemos acionar a categoria estratégia. Aqui discutiremos
estratégia no negócio cultura e tentaremos associar a cultura ao turismo e ao
entretenimento.
De fato, ao falarmos em estratégia estamos nos referindo a uma opção.
Um caminho estratégico exclui pelo menos um outro (menos estratégico).
Porter (1996) frisa a distinção entre eficácia operacional e estratégia,
destacando que o caminho estratégico produz resultados que são sustentados
25 Maior shopping de entretenimento do Brasil, inaugurado em 1999 com 10 salas de cinema, 30
restaurantes e 40 lojas, está localizado em uma área de 28 mil metros quadrados, em frente ao mar. O Consórcio Parques Urbanos - pool formado pelas empresas Nacional Iguatemi, Virrat Participações e Ciacorp Participações – investiu, neste empreendimento, o equivalente a R$ 50 milhões. O Aeroclube Plaza reúne em sua área de influência 70% da renda total da cidade e 44% da capacidade hoteleira de Salvador, segundo dados do próprio empreendimento.
ao longo do tempo, enquanto a eficácia operacional de uma empresa pode ter
o seu modelo rapidamente copiado pelos concorrentes.
Evidentemente, num primeiro momento novas técnicas que aumentem a
produtividade permitem que melhores resultados operacionais sejam
alcançados. Porém, ainda de acordo com Porter, muitas empresas não
conseguem traduzir em lucro os incrementos operacionais acionados.
Então, a eficácia operacional significa realizar melhor atividades
semelhantes às dos seus concorrentes. Já o posicionamento estratégico
significa realizar atividades diferentes ou atividades semelhantes de um modo
diferente.
A fronteira de produtividade é o locus de todas as best practices
existentes em um dado momento. Quando uma empresa melhora sua eficácia
operacional se move em direção a esta fronteira, que se desloca para fora
sempre que novas tecnologias ou enfoques gerenciais são desenvolvidos e
novos insumos tornam-se disponíveis.
Uma melhoria contínua na eficácia operacional é necessária para que se
atinja níveis mais elevados de lucratividade, contudo não é suficiente, já que
ocorre a rápida difusão das best practices, ou seja, competidores podem imitar
as melhorias alcançadas. Outra explicação para esta insuficiência seria a
convergência competitiva - quanto mais as empresas fazem benchmarking,
mais parecidas se tornam.
Por outro lado, estratégia competitiva significa escolher um conjunto
diferente de atividades, que proporcionem ações e produtos de valor único.
Quando as empresas se encontram na fronteira de produtividade, isto é,
quando atingem as best practices correntes, existe um trade-off entre custo e
diferenciação. A essência da estratégia é escolher o que não fazer. Sem trade-
offs não haveria necessidade de escolhas e nem de estratégia. Qualquer boa
idéia poderia ser (e seria) imitada. E, aí sim, a performance dependeria
exclusivamente da eficácia operacional.
Ao refletirmos o desempenho da indústria cultural, identificamos
claramente a relevância da denominada eficácia operacional. Assim, os
costumes, a música, a literatura, a cultura do povo pode ser transformada em
produto comercializável.
Mas só a eficácia operacional não é suficiente, pois isto significaria que
qualquer organização sem laços profundos com um determinado povo poderia
“empacotar” a cultura e vendê-la. Porém, também, é necessária uma boa dose
de diferenciação de produtos e de conhecimento das práticas e valores
culturais.
Entretanto, muitas organizações locais podem se considerar auto-
suficientes, por deterem fatores de diferenciação na produção, e enfrentar
sérias dificuldades26 na distribuição e marketing de produtos culturais. Ou, de
forma oposta, acreditar que não possuem competências essenciais para 26 Ver Prahalad e Hamel (1990).
realizar contratos e alianças com grandes organizações, visando ao consumo
de cultura e, em última análise, o fortalecimento da distribuição e do marketing
para aumento de seu market-share.
As mudanças ambientais, em especial as associadas à difusão das novas
Tecnologia da Informação27 têm revolucionado os serviços e, de forma
especial, o entretenimento.
A distribuição e o consumo da música sofreram grande impacto decorrente
do advento do MP3 – efeito típico do desenvolvimento da Tecnologia da
Informação. A produção cada vez mais se aproxima do consumo, tornando o
mercado mais dinâmico e aumentando a necessidade de estratégias e de
vantagens competitivas sustentáveis a longo prazo. Sem dúvida, o papel da
indústria fonográfica tem se alterado rapidamente, bem como o dos produtores
musicais e culturais.
Segundo Porter (1990), para que seja possível efetuar uma análise
consistente das fontes de vantagem competitiva existentes em uma indústria, é
preciso examinar todas as atividades da empresa e suas inter-relações. A
cadeia de valor é o instrumento para esta análise.
A cadeia de valor subdivide-se em atividades primárias - aquelas envolvidas
na criação do produto - na venda e transferência para o cliente e nos serviços
de pós-venda e, ainda, em atividades de apoio, que são as que sustentam as
27 ver Shapiro e Varian (1999).
atividades primárias e a si mesmas, fornecendo, por exemplo, tecnologia e
recursos humanos.
A cadeia de valor se articula a uma corrente maior de atividades, que
Porter denomina de sistema de valores. É preciso compreender de que modo
uma determinada empresa se enquadra neste sistema geral de valores.
Se assumimos que a indústria cultural pode ser expressa como um
negócio, devemos analisar as etapas de geração de valor deste negócio.
Assim, usaremos, como recurso de método, a cadeia de valor concebida por
Porter na reflexão da indústria cultural.
Muitas organizações acreditam que se o negócio como um todo é
lucrativo, suas atividades consequentemente o serão. Porém erram ao pensar
desta forma, pois todo negócio tem pólos de lucro.
Segundo Gadiesh & Gilbert (1998), existem diversas fontes de lucro em
qualquer negócio e a organização que as reconhecem antes – os pólos de
lucro que podem ser criados ou explorados – estará melhor preparada para
capturar uma fatia desproporcional do lucro de determinada indústria.
Os mapas de pólos de lucro revelam a localização e tamanho das
concentrações de lucratividade de uma indústria e indicam como estas
concentrações devem se alterar. O foco da análise do pólo de lucro é a
atividade inserida na cadeia de valores. Saber a distribuição do lucro ao longo
da cadeia de valores oferece uma visão mais ampla sobre as tendências de
lucros de uma indústria. Esta visão é fundamental para identificar mudanças
estruturais que podem afetar a lucratividade de uma organização e a de seus
concorrentes no futuro.
Estes conceitos permitem uma apreensão do negócio cultura, turismo,
entretenimento em Salvador. Esses conceitos foram testados na cidade
estudada, podendo ser observada, a seguir, a interrelação dos conceitos
cadeia de valor, profit pool e definição de negócio e estratégia na indústria
cultural.
Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Etapa 4
FIGURA 12 – Cadeia de Valor da Produção Cultural em Salvador
Ao analisarmos a cadeia de valor do negócio cultura
em Salvador, percebemos uma série de aspectos
relevantes desde a produção até o consumo.
Para facilitar o entendimento do fluxo da produção cultural, utilizamos o conceito de cadeia de
valor, dividindo-a em quatro etapas. Conforme indicado no gráfico acima, a ETAPA 1 relaciona-se à
produção, criação e inovação, ETAPA 2 ao “empacotamento”, ETAPA 3 à distribuição e marketing e a
ETAPA 4 ao consumo.
Produção, criação, inovação
“Empacotamento” Distribuição, marketing
Consumo
Cada etapa possui especificidades e oferece subsídios para uma análise
sócio-econômica e espacial mais consistente da indústria cultural.
Na primeira etapa, identificamos claramente a presença de uma vasta
gama de artistas, músicos e compositores. Aqui podemos observar um número
expressivo de “desconhecidos”. Mas esta etapa assume papel de extrema
importância no que tange à diferenciação da produção cultural. A sintonia com
as diversas culturas que compõem a cultura soteropolitana, a sua
miscigenação, garante a face eclética e continuamente inovadora da produção
cultural da cidade.
Sem dúvida, a diversidade cultural propicia maior facilidade no
desenvolvimento eficiente das etapas seguintes, pois aumenta a
competitividade na produção. Ou seja, a diversidade cultural é uma forte
vantagem competitiva desta indústria em Salvador.
Ainda é uma característica marcante desta etapa, a atuação isolada dos
players, o que reduz seu poder de barganha em relação aos players da etapa
2.
Recentemente, tem sido observada a articulação de alguns
compositores em torno de uma organização. Sem dúvida, esta é uma busca
por aumento de poder de barganha, face aos agentes das demais etapas da
cadeia de valor da indústria cultural.
Já na segunda etapa, podemos reconhecer, por exemplo, o papel dos
blocos de carnaval, com a produção de bandas e artistas. O Grupo Eva realiza
a produção das bandas Eva e Chica Fé, além de artistas como Cátia Guimman;
o Grupo Cheiro de Amor tem em seu cast as bandas Cheiro de Amor, Pimenta
N’Ativa e Harmonia do Samba; enquanto o grupo O Bicho da Cara Preta
empresaria O Tchan e outras bandas do gênero. De fato, estes grupos se
apropriam da cultura soteropolitana (etapa 1), “empacotando-a” e
transformando-a em produtos. Mais que isto: estes blocos desenvolvem cada
vez mais parcerias comerciais, a exemplo da “Central do Carnaval28”, o que
aumenta ainda mais a sua força dentro da cadeia de valor.
Se, por um lado, os artistas populares perdem poder de barganha junto
ao mercado consumidor pela presença destes grupos, ganham poder relativo
face os players da etapa 3. Assim, podemos notar a existência de um forte filtro
mercadológico na etapa 2.
De certa forma, podemos afirmar que a etapa 1 tem sido responsável
pela evolução da cultura ao longo do tempo e a etapa 2 pelo direcionamento de
produtos no curto prazo, isto é, por disputas imediatas do mercado.
Ao observarmos a terceira etapa, identificamos a presença da indústria
fonográfica, da mídia e dos órgãos governamentais – principalmente do nível
estadual - ligados ao turismo e cultura. Encontramos, ainda, empresas que
28 A Central do Carnaval é uma associação comercial que reúne cerca de dez grandes blocos, a exemplo
do Camaleão e Beijo, compartilhando a mesma estrutura de promoção e vendas.
procuram vincular suas marcas à cultura local, como os shoppings da cidade,
empresas de telefonia e bancos.
É nesta etapa que a cultura é efetivamente promovida – no sentido de
promoção ou estímulo à demanda – e disponibilizada ao público.
A apropriação da cultura, na terceira etapa, ocorre por sua
transformação em símbolos, imagens e produtos tangíveis. Assim, os players
desta etapa disponibilizam, entre outros, bens culturais transformados em
produtos: CDs, livros, novelas, culinária, conceitos, música e festas.
Característica marcante desta etapa é a forte competitividade que
atravessa diferentes âmbitos organizados da atividade econômica: turismo
nacional e internacional, mídia e formas de organização do mercado.
Por fim, a quarta etapa refere-se ao consumo dos produtos da indústria
cultural. Nesta etapa, procuramos identificar, como consumidores, a população
de Salvador em geral e os turistas nacionais e estrangeiros.
Como pode ser observado nas informações apresentadas a seguir, o
consumo da cultura, em Salvador, ocorre através de uma série de formas
alternativas de acesso. Para muitos produtos, o mercado consumidor é
conformado por turistas e residentes em Salvador, o que mostra que a
condição econômica não é o único fator relevante na determinação do
consumo. Existem, em verdade, outros condicionantes, tais como: formação do
gosto e pertencimento a redes sociais.
Porém, nos limites deste trabalho, a segmentação do consumo pode ser
reconhecida apenas de forma ad-hoc. Ou seja, para cada produto, existe um
tipo de segmentação observável. A tabela apresentada a seguir ilustra este
fenômeno.
Produto Consumidores
principais
Consumidores
secundários
Tipo de Segmentação
CD, K-7, DVD População em geral XXXXXX Interesses
Shows em Salvador com
grandes atrações
Classe média Turistas Sócio-demográfica (renda e
idade)
Grandes blocos de trio
(Domingo a Terça)
Turistas Classe média
alta
Sócio-demográfica (renda e
idade)
Blocos alternativos
(Quinta a Sexta)
Classes média e alta Turistas Sócio-cultural (classe social)
e Demográfica (idade)
Camarotes Turistas Classe média
alta
Demográfica (renda)
Carnaval (excluindo
camarotes e blocos)
População em geral Turistas Sócio-demográfica (renda e
idade)
Dança (academias de
ginástica)
Classe média XXXXX Sócio-cultural (classe social)
Serviços de hotelaria Turistas nacionais Turistas
estrangeiros
Freqüência, origem
Shopping de lazer
(Aeroclube)
Classes média e alta Turistas Sócio-cultural (classe social)
Passagens áreas
(origem- Salvador –
origem)
Turistas nacionais Turistas
estrangeiros
Frequência, origem
Pelourinho População em geral Turistas Interesses
Culinária População em geral Turistas Sócio-cultural (classe social)
QUADRO 2 – Produtos, Consumidores e Segmentação Fonte: pesquisa realizada para a dissertação pelo autor (2001)
3.2 PÓLOS DE LUCRO DA PRODUÇÃO CULTURAL EM SALVADOR
Como antes referido, uma análise dos pólos de lucro permitiria identificar
claramente classes e grupos que ganham com o empresariamento dos
vínculos entre Cultura, lazer e turismo. Entretanto, uma análise deste teor fica
bastante comprometida pela escassez e pela precariedade das fontes de
informação, já que organizações e pessoas envolvidas no negócio da cultura
frequentemente não declaram seus ganhos reais.
Existe, portanto, a necessidade de estudos futuros que procurem,
através de metodologia específica, identificar com segurança os pólos de lucro
da indústria cultural em Salvador. Identificar a fatia de receita e lucro em cada
uma das etapas acima apresentadas será de grande valia para uma melhor
compreensão dos vínculos empresariais entre cultura / lazer / turismo.
3.3 O QUE É CULTURA E INDÚSTRIA CULTURAL
A indústria cultural, juntamente com os meios de comunicação de massa
e a cultura de massa, surgem “como fenômeno da industrialização” (COELHO,
1980). Muitas das características da economia capitalista - seja a divisão social
do trabalho, seja o uso crescente da técnica - influenciam as formas de
organização e de transmissão da cultura.
Sempre que a cultura é comercializada – independente de qualquer
análise valorativa deste fato – podemos reconhecer a presença potencial da
indústria cultural. A produção de programas de TV e rádio, livros e revistas,
discos e teatro se enquadram no conjunto das atividades desta indústria.
Coelho (1980) chama a atenção para duas conseqüências do
nascimento da indústria cultural :
a) reificação ou coisificação da cultura; e
b) alienação.
Esta indústria transforma a cultura em mercadoria – coisifica práticas e
atos – e ainda estabelece uma série de limites/filtros sociais entre a cultura e o
seu consumo. Como vimos anteriormente, a organização da indústria cultural
pressupõe a especialização – empresariamento de várias etapas desde a
criação até o consumo, porém estas etapas não são dominadas inteiramente
pelos “produtores, criadores e inovadores”, o que produz e reforça a alienação.
O músico tecno mantém o sistema de sua música vivo, lá acima e além dele: ele mesmo é objeto dela, jamais seu criador. (TALES, 2001, p. 14).
Deste modo, como vimos anteriormente, a lógica empresarial e do
marketing alimentam, efetivamente, a dinâmica da indústria cultural. São ainda
criadas diferentes funções que obrigam a articulação dos diversos atores
sociais envolvidos nesta dinâmica. Segundo Coelho, a indústria cultural
apresenta aspectos negativos e positivos.
[...]com seus produtos a indústria cultural pratica o reforço das normas sociais, repetidas até a exaustão sem discussão. Em consequência, uma outra função: a de promover o conformismo
social. E a esses aspectos centrais do funcionamento da indústria cultural viriam somar-se outros, consequência ou sub-produtos dos primeiros: a indústria cultural fabrica produtos cuja finalidade é a de serem trocados por moedas; promove a deturpação e a degradação do gosto popular; simplifica ao máximo seus produtos, de modo a obter uma atitude sempre passiva do consumidor; assume uma atitude paternalista, dirigindo o consumidor ao invés de colocar-se à sua disposição. (COELHO, 1980, p. 28).
Este autor ainda afirma que a indústria cultural também produz
resultados favoráveis na sociedade, a exemplo do domínio precoce da
linguagem pela influência da televisão e a promoção de alterações positivas no
comportamento moral e ético.
Seja como for, a indústria cultural apresenta múltiplas faces, mais ou
menos positivas, que se inscrevem de forma complexa em cada contexto
social. Até que ponto, de fato, a indústria cultural desempenha funções
educacionais? Ou, até que ponto deturpa o gosto popular? Essas são questões
que devem estar presentes, sem dúvida, numa análise aprofundada da
indústria cultural.
3.4 E, AFINAL, O QUE É A CULTURA SOTEROPOLITANA?
A cultura de Salvador se confunde com a da Bahia. Salvador enquanto
capital é ainda confundida com o estado. Muitos ainda falam “vou para a
Bahia”, quando de fato se dirigem a Salvador.
Essa cultura se manifesta, de forma muito clara, através da música, seja
no Axé Music ou na Tropicália; em eventos, como o carnaval e, ainda, nas
famosas “lavagens”, que misturam o profano e o religioso; no teatro, na
literatura de Jorge Amado e João Ubaldo e no cinema de Glauber Rocha .
Há quem reconheça a cultura nas 365 igrejas de Salvador e nas
manifestações religiosas que acompanham os grandes jogos de futebol e a
política. Enfim, a cultura na Bahia e em Salvador é efetivamente plural.
FIGURA 13 – Capoeristas no Farol da Barra FIGURA 14 – Cortejo do Senhor do Bonfim
Existe uma pluralidade que é fruto da formação do povo. A miscigenação
encontra-se, provavelmente, na origem desta pluralidade. A cultura local é, na
verdade, decorrente de articulação historicamente possível entre elementos da
cultura africana, portuguesa, espanhola, holandesa e jamaicana. Trata-se da
cultura nordestina e brasileira em sua plenitude.
Oliveira (1987) demonstra que a própria configuração da estrutura de
classes pode ser questionada em Salvador, em função da dificuldade de
“enxergar o outro, o inimigo”. A convivência no mesmo ambiente, muitas vezes
com empréstimo do nome, favorecia uma original sintonia entre as pessoas29, o
que oferece obstáculos à segmentação da cultura na Bahia. Não existiram,
29 Evitamos aqui falar em classes ou grupos.
historicamente, uma cultura do pobre e do rico ou do negro e do branco, mas,
sim, a de Salvador / Bahia.
É esta herança, decorrente de uma particular formação social, que sofre,
atualmente, os impactos do amadurecimento da indústria cultural e dos, cada
vez mais densos, entre cultura – lazer - turismo.
3.5 O ESTADO E A CULTURA
Técnicos do governo frisam a preocupação da gestão estadual ao definir
sua política de incentivo à cultura, de não alterar a produção cultural
espontânea. A preocupação seria de promover o que existe e não de interferir
em sua essência.
No âmago da política governamental de estímulo e incentivo à produção
cultural na Bahia foi criado o Programa Estadual de Incentivo à Cultura -
FAZCULTURA, instituído pela Lei 7.015, de dezembro de 1996. Esse programa
prevê abatimento de até 5% do ICMS a recolher sobre o limite de 80% do
projeto a ser patrocinado.
Buscando oferecer aos produtores culturais oportunidades de produção e de mercado, por entender que a cultura, além das suas especificidades intrínsecas, é também um fato econômico. (FAZCULTURA, 2001).
É bastante clara, portanto, a intenção do governo estadual de conceber
a cultura como uma alavanca econômica. Desta perspectiva, Estado,
empresariado e produtores culturais devem interagir de forma dinâmica e
cooperativa no sentido de potencializar o resultado deste esforço de valorizar a
cultura como atividade econômica.
Dados do próprio programa apontam para o apoio a 657 projetos em
todo o estado da Bahia (ou 65% dos 1.016 inscritos), entre janeiro de 1997 e
dezembro de 1998, com concentração nas áreas de tradição popular, música e
artes cênicas.
TABELA 14 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA - 1997
Área de Atuação Quantidade % Valor em R$ Artes Cênicas 8 23,54 526.009,50 Artes Plásticas 1 2,94 22.000,00 Bens Móveis e Imóveis 3 8,82 262.075,60 Cinema 1 2,94 25.000,00 Literatura 2 5,88 169.430,00 Museus 2 5,88 521.980,00 Música 17 50,00 1.394.029,95 Total 34 100,00 2.920.525,05
Fonte: SCT/FAZCULTURA
TABELA 15 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA – 1998
Área de Atuação Quantidade % Valor em R$ Artes Cênicas 19 15,70 1.244.577,42 Artes Plásticas 3 2,48 93.600,00 Bens Imóveis 1 0,83 1.004.000,00 Cinema 4 3,30 719.679,00 Literatura 13 10,74 565.041,60 Museus 30 24,80 3.054.655,98 Música 2 1,65 31.000,00 Tradições Populares 46 38,02 2.423.614,85 Vídeo 3 2,48 104.070,00 Total 121 100,00 9.240.238,85
Fonte: SCT/FAZCULTURA TABELA 16 – Projetos Patrocinados pelo FAZCULTURA - 1999 - Janeiro a Março
Área de Atuação Quantidade % Valor em R$ Artes Cênicas 23 23,47 709.618,69 Artes Plásticas 2 2,04 0,00 Bens Imóveis 2 2,04 0,00 Cinema 4 4,08 0,00 Literatura 13 13,27 407.915,00
Música 23 23,47 1.283.146,97 Tradições Populares 31 31,63 2.561.321,29 Total 98 100,00 4.962.001,95
Fonte: SCT/FAZCULTURA
Assim, o que se observa de fato é a implementação de uma política de
incentivo a cultura através de renúncia fiscal, o que favorece a sua
transformação em atividade empresarial, principalmente segmentos de maior
dificuldade de gestão30.
Pode, então, parecer contraditório que num mesmo período em que o
Estado tende a se ausentar31 da dinâmica da economia, este surja como ator
político relevante no estímulo à cultural.
Porém o que ocorre, de fato, é a grande falta de preparo dos
empresários ligados ao meio cultural, forçando o governo a desempenhar o
papel de estimulador desta atividade.
Assim, tem-se uma situação delicada visto que:
a) a cultura pode desempenhar um importante papel na economia;
b) o estado procura se afastar da condução direta da economia;
c) o negócio da cultura é muito dependente de incentivos estatais.
30 De forma oposta, grandes blocos carnavalescos melhoram cada vez mais suas gestões ,buscando
aumentar a lucratividade. Essas organizações não usufruem dos benefícios do FAZCLTURA. 31 Deve-se destacar que o estado da Bahia foi um dos pioneiros no processo desregulamentação da
economia, com privatização das estatais, a exemplo da venda do Baneb, paralelo a um processo de busca da eficiência na máquina pública.
Mais uma vez, a estrutura social e empresarial aparecem como
empecilhos para o desenvolvimento continuado de atividades associadas à
indústria cultural.
3.6 PELOURINHO: O ESPAÇO DA HISTÓRIA, CULTURA E TURISMO
Conjunto arquitetônico barroco com a quase totalidade de seus casarões
oriundos do período entre os séculos XVI e XIX, tombado em 1985 pela
UNESCO como patrimônio histórico da humanidade, o Pelourinho é por muitos
considerado como o centro histórico- cultural de Salvador (Dantas, 1993). Seus
quarteirões, sobrados e ruas representam a história e a diversidade étnica e
cultural da cidade.
FIGURA 15 – Vista Aérea do Pelourinho FIGURA 16 – Pelourinho Após a Reforma
Entretanto, o Pelourinho atravessou um longo período de degradação,
até que a partir de 199332 é iniciado um processo de revitalização que incluiu a
reforma dos casarões, policiamento ostensivo e remoção de famílias pobres – 32 Anteriormente havia sido tentada a implementação de projetos de revitalização, sem que nenhuma
tivesse obtido sucesso.
dando lugar a empreendimentos comerciais. Neste sentido, observa-se um
processo de revitalização da área, desenvolvido com a seguinte orientação:
[...] o objetivo de explorar todo o potencial turístico do patrimônio tombado e, neste sentido, a idéia central foi a de transformar um antigo bairro, degradado sócio-espacialmente, com uso maioritariamente residencial, ocupado por uma população bastante pobre (prostitutas, boêmios, artistas no ostracismo, ‘biscateiros’), e em certa medida ‘guetificado’, em um centro cultural e de comércio e serviços de lazer sob a forma do que se poderia chamar ‘shopping center’ ao ar livre. (FERNANDES, 1998, p. 85).
Evidentemente este processo gerou resistências sociais e divergências
entre lideranças comunitárias. Estas divergências colocavam em xeque o valor
da indenização atribuída aos antigos moradores – pois, em muitos casos, não
serviu ao seu principal fim que era a aquisição de nova moradia - e os critérios
adotados para a obtenção de ponto comercial na área.
Seja como for, o governo estadual manteve sua convicção na escolha
realizada e hoje o Pelourinho constitui um dos seus principais trunfos na
política traçada de desenvolvimento do turismo.
A recuperação e manutenção do patrimônio histórico tem no Pelourinho o exemplo mais significativo, considerando o forte apelo de marketing junto aos mercados emissores. A importância cultural como motivação de fluxos fez da recuperação do Pelourinho um instrumento motivador para a implantação de uma indústria cultural. (BAHIATURSA, 2000, p. 28).
Neste sentido, podemos compreender a intervenção no Pelourinho no
contexto macro de desenvolvimento da indústria do turismo na cidade, e não
como uma mera intervenção urbana dirigida à preservação de área
historicamente relevante. Assim, tem-se, no Pelourinho, a clara intenção de
favorecer estratégias empresariais.
O papel desempenhado pelo governo pode ser questionado em relação
a alguns aspectos:
a) qual é o impacto econômico efetivo destes investimentos?
b) qual é o retorno social– caso venha a existir- destes investimentos?
c) a iniciativa privada deve participar destes investimentos?
Segundo Fernandes (1998) o governo estadual atuou, e ainda atua, de
forma incisiva no Pelourinho, devido a sua importância.
Estratégias governamentais empresarialistas como no caso do Centro Histórico Pelourinho são essenciais e importantes em uma cidade como Salvador que possui mais de 50% de seu mercado de trabalho alocado no setor serviços. (FERNANDES, 1998, p. 89).
Ainda segundo o autor, a forma como foi conduzido o Programa de
Recuperação do Centro Histórico Pelourinho reduziu o papel da iniciativa
privada na revitalização desta área.
A ausência de um modelo de gerenciamento para o Centro Histórico Pelourinho, por parte do governo estadual que visasse dar um melhor ordenamento às atividades e ao funcionamento conjunto do lugar, definindo esferas de responsabilidade para as empresas e o Estado, levou ao não estabelecimento de uma parceria público-privado no lugar, elemento de fundamental importância no conceito de empresarialismo governamental. A gestão realizada de modo exclusivo pelo Governo do Estado, aliado à incipiente iniciativa autônoma do empresariado no Centro Histórico Pelourinho, acabou por gerar um processo de dependência do poder público na gestão do lugar. (FERNANDES, 1998, p. 92).
FIGURA 17 – Vista Panorâmica do Pelourinho FIGURA 18 – Os Casarões do Pelourinho
Atualmente o Pelourinho conta com o projeto Pelourinho Dia & Noite que
prevê a realização diária de apresentações artísticas. O objetivo deste projeto,
portanto, é transformar a área num centro de entretenimento, com bares,
restaurantes e locais de atração de turistas e soteropolitanos.
Dados de 1997, indicam o funcionamento de 318 estabelecimentos
comercias no Pelourinho, distribuídos da seguinte forma:
Estabelecimentos Comerciais no Pelourinhodistribuição percentual
24%
18%39%
4%11% 2%2%
Lazer e animação
Serviços diversos
Comércio de roupas e objetos
Lanches e afins
Artes e ofícios
Hotéis, albergues e pousadas
Instituições e escritórios
GRÁFICO 4 – Estabelecimentos Comerciais no Pelourinho – Distribuição Percentual
Neste sentido, podemos compreender a intervenção no Pelourinho como
uma ação que tinha como objetivo agregar mais valor ao produto Salvador.
Assim, não considerar, analiticamente, apenas o retorno econômico da
intervenção no próprio Pelourinho 33, mas, sim, considerar o seu impacto global
nas atividades econômicas de turismo, cultura e lazer em Salvador. O
Pelourinho é, desta perspectiva, mais um elemento do mix de atributos do
produto Salvador.
3.7 A DISPUTA PELO MARKET-SHARE CULTURAL EM SALVADOR
Quando analisamos a indústria cultural em Salvador, verificamos a
presença de um grande número de organizações. Estas organizações
competem por espaços na mídia, venda de produtos como shows (no caso das
bandas e casas de espetáculos), fantasias ou abadás (no caso dos blocos
carnavalescos) e, também, por visibilidade e popularidade.
Este ambiente competitivo faz da cidade um centro de referência da
cultura nacional. Porter (1999) demonstra que, na medida em que um país ou
cidade detém forte concentração de uma determinada indústria, seus agentes
33 Parte deste retorno é difícil de ser mensurado, devido ao grande número de variáveis que envolvem o
turismo. Assim, não conseguimos estabelecer uma relação causal entre investimentos no Pelourinho e aumento da atividade econômica na cidade. Entretanto, estudo realizado por Fernandes (1998) indica que não houve um impacto significativo desta intervenção no turismo da cidade. Fernandes considera tal ação com um forte cunho político e não econômico.
tendem a se fortalecer. A competitividade, neste sentido, é de extrema
importância, pois favorece a dinâmica do setor cultural em Salvador.
Como assinala este autor, a competitividade, ao longo do tempo, é
sustentada por um fluxo contínuo de inovação. Esta tendência manifesta-se
claramente em Salvador ao observarmos o contínuo lançamento de novos
artistas, ritmos e movimentos culturais na cidade estudada.
Novos grupos musicais, com diferentes origens, competem de forma
acirrada. Pop-rock, axé-music, pagode e salsa, dentre outros ritmos, disputam
o market-share cultural. Segundo Porter (1990) “a presença de um cartel em
um setor abafa a rivalidade e está associada à menor competitividade.” De fato,
em Salvador, não existe monopólio de nenhum gênero musical, de qualquer
origem cultural, mas, sim, a busca constante de novas formas de expressão da
cultura popular.
Assim, a diversidade cultural permite que a competição também
apresente uma face contraditória de cooperativa. O que se verifica, de fato, é
uma forte sinergia entre as diversas formas de manifestação da cultura.
O importante, neste processo, é que a disputa não se constitui num jogo
de soma zero. Quanto mais movimentos culturais lutarem por reconhecimento,
mais fortemente a cidade se posicionará como referência da indústria cultural
no Brasil.
Mas, qual é o papel do Estado nos seus três níveis e em especial, o
municipal? Aqueles de ideologia mais liberal podem propor que o
desenvolvimento do negócio da cultura seja completamente concebido pela
própria iniciativa privada. Porém deve-se ter claro o papel essencial do governo
no alcance de um ambiente adequado34 ao desenvolvimento de atividades
empresariais ligadas à cultura. Neste ambiente, que está associado ao turismo,
deveriam ser procurados patamares superiores de educação, saúde e
segurança.
Na medida em que setores mais amplos da população desfrutam de um
melhor padrão de vida e educacional, mais facilmente poderá ocorrer a
transformação de música, dança e costumes [...] em produtos. Ou, em outras
palavras, nestas condições, o empresariamento que envolve a iniciativa da
classe média pode, efetivamente, ser estimulado pelo poder público.
Porter (1990) afirma que “o governo, antes de mais nada, deve lutar para
criar um ambiente que apoie a crescente produtividade [...] garantindo acirrada
competição, e oferecendo educação e treinamento de alta qualidade.”
Parcerias entre a Prefeitura Municipal de Salvador, governo do estado e
entidades carnavalescas apontam para uma efetiva preocupação com a
qualificação de diversos tipos de profissionais. Assim, tem ocorrido o
treinamento de baianas de acarajé e seguranças dos blocos35.
34 Este ambiente pode ser descrito como frendly, de acordo com Porter (1990). 35 Uma série de outros cursos têm sido disponibilizados pelo Sebrae, Bahiatursa e SENAC, em especial
para garçons, cozinheiros, taxistas e guias de turismo.
Evidentemente, a carência é muito mais profunda, em especial no que
se refere ao nível de escolaridade. Não se trata, apenas, da necessidade de
que sejam desenvolvidas ações pontuais, como os treinamentos de algumas
horas, mas, sim, da necessidade de programas de longo prazo. Afinal, a
eficácia dos treinamentos é reduzida em decorrência do baixo nível de
escolaridade da população.
De qualquer sorte, verifica-se a preocupação da administração municipal
com as condições ambientais de iniciativa econômica, ainda que incipiente.
3.8 O CARNAVAL DE SALVADOR, SUA EVOLUÇÃO E VERTICALIZAÇÃO
Uma dos objetos centrais no nosso estudo é compreender a influência
do carnaval no negócio cultura, turismo e lazer de Salvador.
Podemos formular, como questão, se a cultura baiana é expressa no
carnaval ou se o carnaval altera as atividades culturais da cidade. Em outras
palavras, a cultura soteropolitana contém o carnaval ou o carnaval contém a
cultura?
FIGURA 19 – Vista Panorâmica da Praça Castro Alves no Carnaval
Ao assumirmos a segunda hipótese como verdadeira, estamos
considerando que as iniciativas culturais (ou as alterações na cultura) de maior
impacto sócio - econômico só ocorrem, ou ao menos se legitimam, se
estiverem presentes no carnaval.
Acreditamos, de fato, que a segunda hipótese é verdadeira: o carnaval
de Salvador possui, como característica relevante, a multiciplidade de gêneros
e estilos, permitindo que a cidade manifeste seu caráter miscigenado e
múltiplo.
Explicar esse fenômeno não é tarefa fácil. O Carnaval de Salvador é multifacetado, é a complexidade das complexidades. Combina cada vez mais o lúdico com o negócio, o essencialmente local ao potencialmente transnacional, o puramente anárquico à anarquia organizada, sob a égide de uma intensa dinâmica de transformação / mutação. (HEBER, 2000, p. 187).
É no carnaval que a cultura popular mostra-se de forma completa e
democrática. O espaço de fluxos (inclusive pela natureza dos shows que são
realizados, em sua maior parte, em trios-elétricos) é de difícil segregação.
Mesmo aqueles espaços sociais temporariamente separados (blocos com
cordas) perdem seu sentido inicial de segregação com o próprio movimento
dos trios.
FIGURA 20 – Desfile do “Bloco Camaleão” no Campo Grande
FIGURA 21 – Desfile do “Filhos de Gandy”
Quando observamos historicamente o carnaval de Salvador, verificamos
que, na década de 50, era assistido, sobretudo, pelas famílias de classes
média e alta da cidade. Bancos eram colocados nas calçadas para que toda a
família pudesse participar do evento. Enquanto as agremiações carnavalescas
desfilavam, os soteropolitanos de maior poder aquisitivo estreitavam laços
sociais. As classes populares não participavam do evento, de caráter
eminentemente elitista.
Nos anos 80, observa-se o início do crescimento dos grandes blocos
carnavalescos. Ainda sem estrutura empresarial, alguns blocos, como Os
Internacionais, desfilavam com mais de 1000 integrantes. Ainda nesta década,
a cidade passou a experimentar a intensificação do fluxo turístico no período do
carnaval.
Já na década de 90, com o apoio da indústria fonográfica e uma nítida
atuação dos órgãos governamentais de turismo, o carnaval passou a ser
estrategicamente utilizado como ferramenta de captação de turistas. Nesta
década, os blocos de carnaval - a exemplo do Cheiro de Amor, Eva e
Camaleão - passam a utilizar uma pesada estrutura empresarial, incluindo a
criação de sedes equipadas e ativas durante todo o ano, a contratação de
pesquisas mercadológicas e desenvolvimento de novos produtos.
Consolidam-se os blocos de trio, especialmente após a apropriação, por parte destes, do repertório estético criado pela “reafricanização” do carnaval, dando lugar à chamada axé music e à utilização do abadá como vestuário; organizaram-se como empresas, privilegiando a dimensão do mercado e fazendo do carnaval um produto com ciclo de realização que ultrapassa os limites da festa e da cidade e, no limite, estimularam as outras entidades carnavalescas, particulamente os blocos afro, a se jogarem em aventuras organizacionais, estendendo a sua afirmação também ao jogo do mercado, conforme assinalam LOYOLA e MIGUEZ. (HEBER, 2000, p. 188).
No final dos anos 90 e especialmente em 2000, o carnaval da cidade
passou a experimentar um processo muito claro de seletividade social, sendo
montados e comercializados camarotes em praticamente todo o circuito do
carnaval.
Este processo apresenta uma série de conseqüências nocivas para o
carnaval da cidade. Entre estas conseqüências, podemos destacar:
a) Salvador por ser uma cidade que “transpira” cultura tem como
peculiaridade a necessidade de ser sentida. Fazer do carnaval de
Salvador um evento para “ser visto”, como o do Rio de Janeiro,
desconstrói sua essência;
b) a organização vertical do carnaval facilita a sua padronização, no sentido
que o faz semelhante a qualquer evento que tenha trio-elétrico, a
exemplo do Carnatal (em Natal), Recifolia (em Recife) e Fortal (em
Fortaleza)36;
c) do ponto de vista estratégico, o produto cultura de Salvador tende a
perder seu diferencial competitivo frente ao oferecido por outras cidades.
O que diferenciava a cidade de Salvador das demais – a magia e o
sentir – tem perdido relevância nos últimos anos.
Na verdade, este processo deve ser analisado com cuidado pois, como
exposto anteriormente, as iniciativas culturais em Salvador são extremamente
dinâmicas. Ao mesmo tempo, a segregação impede que a produção,
distribuição e consumo da cultura permeie a cidade, vitalizando a vida urbana.
36 Estes eventos, muitas vezes, são organizados por empresários que não são de Salvador.
Outra processo expressivo da verticalização do carnaval de Salvador
surge da constatação de que os grandes blocos de carnaval da cidade são
oriundos da classe média soteropolitana, porém os camarotes pertencem a
cervejarias, outras grandes corporações e artistas do Sudeste, sem nenhum
vínculo com a cidade.
O processo de organização verticalizante do carnaval pode ser
apreendido em seus vínculos com o capital global, enquanto os outros
investimentos que permitem a sua reprodução encontram-se associados ao
capital multidoméstico.
Podemos, também, compreender este processo de verticalização como
uma oportunidade empresarial motivada pela captura de segmentos de turistas
de alta renda, que de fato não é criada e apropriada pelos empresários locais,
com poucas exceções. Assim, tem-se na verticalização do carnaval um risco de
transferência de renda para outras regiões do país.
3.9 OS BLOCOS DE CARNAVAL: ORIGENS, PRÁTICAS, USOS DA CIDADE,
GESTÃO, MERCADO E A CULTURA NUMA PERSPECTIVA ECONÔMICA
Os blocos de carnaval apresentam-se com grande força na estrutura do
negócio cultura, lazer e turismo. O impacto econômico é percebido pelo
elevado número de empresas que se relacionam com o evento.
Esses blocos representam a diversidade sócio-econômica da cidade. A
segmentação por status sócio-econômico-cultural é bastante evidente nos
desfiles. De certa forma, as pessoas “não se misturam”. No que se refere ao
público-alvo a distribuição social por bloco é definida com base nos preços, que
comunicam, de forma eficaz, a segmentação esperada, evitando dúvidas por
parte do público em geral37.
Neste sentido, os blocos com preços mais elevados não possuem, em
seus quadros de associados38, pessoas com baixo poder aquisitivo.
Considerando o perfil de concentração de renda da cidade, observa-se uma
divisão entre “brancos” de um lado (protegidos por negros - seguranças) e
“negros” de outro.
Assim, dentro de uma lógica econômica, uma grande parcela da
população não possui poder aquisitivo para se associar a estes blocos39. Por
outro lado, estes blocos focam seus esforços de marketing nos segmentos de
maior potencial de consumo (classes A e B e turistas).
Entendemos, ainda, que imaginar um racismo deliberado por parte
destas organizações é uma forma de encobrir o real problema da cidade que é
uma injusta estrutura social e onde apenas uma pequena população detém
poder de compra.
37 É comum parcerias entre blocos, Diretórios Acadêmicos e Grêmios Estudantis, com fornecimento de
banco de dados para ações de marketing direto. 38 Os clientes dos blocos carnavalescos são chamados de associados. 39 Os grandes blocos carnavalescos, a exemplo do Camaleão, Eva e Cheiro de Amor, cobram pelas
fantasias valores entre R$450 e R$700 por três dias de desfile.
Entretanto, ocorreu, nos últimos anos, uma série de ações judiciais
contra estes blocos carnavalescos, acusando-os de racismo. Como já
colocado, ao nosso ver, este quadro reflete a estrutura da sociedade, que
exclui os negros, e não a atuação isolada de um conjunto de organizações
empresariais, que procure, especificamente, fortalecer a segregação racial.
Este processo pode ser melhor compreendido quando, principalmente a
partir de 1998, organizações ligadas ao movimento negro lançaram campanhas
de combate ao “racismo” por parte destes blocos, com o apoio de jornais locais
e do próprio poder judiciário, mas não se alteraram, efetivamente, o perfil
destas agremiações, comprovando que a questão é social e não racial.
De qualquer forma, porém, o empresariamento da cultura, num contexto
de desigualdades sociais profundas, fortalece, tendencialmente, os
mecanismos sócio-econômicos responsáveis pela segregação e pela exclusão.
3.10 AS ORIGENS DOS BLOCOS
É bastante interessante observar que os principais blocos de trio foram
fundados antes do boom da axé-music. Este fato possibilita enfatizar que, na
sua origem, os blocos não tinham uma gestão profissionalizada. Em certo
sentido, o seu caráter eventualmente comercial estava relegado a um segundo
plano. Assim, podemos perceber que o processo de transformação da cultura –
e aqui, particularmente, do carnaval – em produto surge numa fase posterior.
TABELA 17 – Ano de Fundação dos Blocos Carnavalescos
Bloco Fundação
Internacionais 1962 Corujas 1963
Camaleão 1966 Papa-Léguas 1980
Eva 1980 Cheiro de Amor 1980
Pinel 1981 Mel 1983
Tiete Vip’s 1983 Beijo 1984
Fonte: ABT
A compreensão da competição entre estes blocos encontra forte apoio
no conceito de cluster. A integração dos blocos, fornecedores de fantasias,
bandas, rádios, TV, empresas de segurança [...] favorece o alcance de ganhos
de escala. Mais que um negócio gerido e fomentado pela iniciativa privada, o
poder público (estadual e municipal) desempenha um papel importante na
preservação e expansão dos blocos, como demostra o estudo de Guerra
(1999).
Quanto aos fatores infra-estruturais da competitividade, deve-se observar
que, sendo realizados em espaço público, mobilizando considerável parcela das cidades onde ocorrem e demandando diversos serviços públicos como
limpeza, transporte, segurança e iluminação, certos eventos culturais, a
exemplo do carnaval de Salvador, são, em grande medida, viabilizados pelo
poder público. Segundo relatório da EMTURSA sobre o carnaval 1999,
cerca de vinte e cinco mil pessoas foram mobilizadas para garantir os
diversos serviços públicos necessários à realização do evento. Em suma, é possível afirmar que, em Salvador, o poder público é um jogador
determinante para a organização desses eventos e, consequentemente, para
sua competitividade. (GUERRA, 1999, p. 46).
Portanto, enxergamos essas organizações – blocos – integrados em um
cluster e que, dentro de um conceito ampliado do negócio (cultura,
entretenimento e turismo) estão buscando e desenvolvendo cada vez mais
uma lógica cooperativa com o poder público.
3.11 O CARNAVAL DE BAIRRO: FOCO NA CLASSE BAIXA OU NA VITRINE?
Nos últimos cinco anos, a organização do carnaval soteropolitano
passou a investir no carnaval dos bairros40. Tal fato ocorreu pois o número de
foliões foi considerado excessivo nos circuitos Barra-Ondina (Circuito Dodô) e
Centro da Cidade (Circuito Osmar), pelos órgãos de segurança pública. Havia
grande preocupação, por parte dos organizadores com o crescimento da
violência. O “espaço do carnaval” foi, assim, planejadamente ampliado e
descentralizado.
Com esta iniciativa, por um lado, a população de baixa renda pôde
participar, com mais facilidade da maior festa da cidade - mesmo que sem a
estrutura e os atrativos dos circuitos principais. Por outro lado, turistas e
classes média e alta passaram a usufruir da sensação de maior segurança.
Num primeiro momento, esta estratégia parece ser adequada, visto o
elevado número de pessoas nos circuitos tradicionais. Por outro lado, o
40 Periperi e outros bairros populosos e pobres.
carnaval enquanto espaço democrático passa a ser manipulado de forma a
promover uma exclusão estratégica. Mais uma vez nos deparamos com
questões delicadas a serem tratadas de
forma objetiva: deve-se evitar um processo que pode levar à exclusão no
consumo?
Uma reflexão mais profunda indica uma tendência à dualização do
carnaval. Não é nossa intenção esgotar essa discussão aqui, mas estimular
debates futuros sobre as conseqüências sociais da implementação de
conceitos associados ao City Marketing41 no carnaval.
41 Desenvolvimento de uma imagem positiva frente aos segmentos-alvo, neste caso, turistas.
4 ESTRUTURA DE CLASSES E PROMOÇÃO DA CULTURA: QUEM GANHA COM ESTA CIDADE?
4.1 AS CLASSES E SALVADOR
Neste capítulo, procuramos demonstrar algumas relações existentes
entre o negócio cultura, entretenimento e o turismo – tanto na produção como
no consumo – com a dinâmica de classes em Salvador.
A importância da reflexão do empresariamento da cultura face à
dinâmica de classes decorre da própria natureza do fenômeno estudado.
Assim, com base em Hall, percebemos a amplitude e complexidade do debate
acadêmico sobre a categoria classe social:
Para alguns sociólogos, classe se refere a categorias de pessoas ocupando posições em comum dentro de uma mesma hierarquia de status (Warner,1949; Parson, 1970; Wiliams, 1960). Para outros, classes se definem grupos de conflito determinados por uma posição dentro de estruturas de autoridade ou poder (Dahrendon, 1959; Lenski, 1966). Os sociólogos no âmbito da tradição weberiana vêem classes como grupos de pessoas que compartilham “chances na vida” econômica (Weber, 1922; Giddens, 1973; Parkin, 1971) E os marxistas têm classes primordialmente em termos de posições estruturais compartilhadas dentro da organização da produção (Bukharin, 1921; Lenin, 1914). (HALL, 1989, p. 3-4).
De forma singela, podemos dizer que a reflexão das classes sociais
envolve duas dimensões básicas: a primeira, relacional, e a segunda, absoluta.
Do ângulo relacional, compreendemos que um determinado indivíduo é
pobre quando comparamos a sua situação social com a de outro que vivencia a
riqueza. Assim, pobreza e riqueza encobrem a problemática das desigualdades
sociais.
De outra forma, podemos refletir a pobreza de maneira absoluta,
considerando que há pobreza quando não existe acesso a uma série de bens e
serviços, como educação, saúde, alimentação, habitação e entretenimento.
As duas formas de reflexão da estratificação social apresentam
limitações e vantagens. Enquanto a absoluta secundariza as desigualdades
sociais – o importante é garantir o acesso aos serviços essenciais – a
relacional encontra-se comprometida com o alcance de uma certa
homogeneidade social, mesmo que na pobreza.42
Em nossa interpretação, estas duas abordagens da estratificação social
- relacional e absoluta - se completam no estudo de Salvador. Assim,
precisamos compreender o quanto as desigualdes sociais se acentuam – ou
não – e qual a parcela da sociedade excluída do processo de produção e
consumo de bens e serviços. Mais que isto: como os diferentes estratos e
camadas sociais participam do processo de produção e consumo dos bens
ligados ao turismo, cultura e entretenimento?
Em busca de resposta a esta pergunta, devemos, inicialmente,
considerar alguns efeitos na dinâmica da economia e na estratificação social 42 De certa forma, utilizamos possibilidades extremas para justificar nosso raciocínio.
decorrentes – mesmo que de forma parcial – da expansão do negócio turismo /
cultura / lazer. Estes efeitos encontram-se associados não apenas ao aumento
significativo dos investimentos neste negócio, mas, também e principalmente, à
abertura de novas oportunidades de negócio.
Em um certo sentido, a indústria cultural propagandeia a igualdade de
condições de acesso às oportunidades que cria. Ou seja, o fato de um
indivíduo pertencer a uma classe social inferior não o excluiria de ascender
socialmente através da cultura. Neste sentido, o importante não seria um
acumulo econômico prévio, mas a capacidade de expressar artística e
culturalmente as suas próprias potencialidades.
Esta idéia – da igualdade de oportunidades – tem sido fortemente
associada ao empreendedorismo. Ou seja, as oportunidades estão no mercado
e são facilmente transformadas em resultados se o indivíduo consegue mostrar
seu valor artístico cultural. Esta representação social do negócio da cultura
ajuda a legitimar as políticas de estímulo desenvolvidas pelos governos
estadual e municipal.
Chegamos então a um paradoxo: este argumento pode ser verdadeiro,
apesar de nulo. Isto porque individualmente é possível alcançar a ascensão
social, porém este fato não altera a estrutura de classes da cidade de Salvador.
Exemplos de pessoas que ascenderam socialmente fazem parte do
cotidiano da mídia, sejam dançarinas e cantores de pagode ou músicos de
forma geral. Porém, como estamos observando nesta dissertação, a estrutura
social permanece inalterada. Assim, temos um cenário que indica a
possibilidade de ascensão de um ou outro sujeito social, mas nunca de uma
alteração na estrutura sócio - econômica da cidade.
4.2 SALVADOR: DISTRIBUIÇÃO DAS FAMÍLIAS POR CLASSE DE RENDA
Ao estudarmos as classes sociais, buscamos estabelecer parâmetros
que nos balizem para uma análise adequada de nosso objeto. Assim,
utilizamos a renda familiar média - mesmo esta não refletindo de forma
completa o estudo das classes sociais – pois nos permite avançar em nossa
reflexão.
Com isto, observa-se em Salvador uma renda média familiar de
R$1.218,00 mensais, segundo dados do IBGE. Isto significa que a renda média
na cidade é 49,4% maior que a média nacional (R$815,10 mensais) e 118,8%
maior do que a média do Nordeste (R$556,89)43.
Duas considerações devem ser feitas sobre o calculo da renda média:
a) A renda tende a ser maior em regiões metropolitanas. Assim, é natural
que a renda média em Salvador seja mais elevada do que a nacional;
b) Renda média relativamente elevada pode significar a existência de um
acentuado quadro de desigualdades sócio - econômicas.
43 Período base: março de 2001.
Ao estabelecermos a relação entre rendimento mensal e classe sócio-
econômica utilizamos os critérios da Aba/Abipeme, indicados no seguinte
quadro:
TABELA 18 – Equivalência entre Classe e Rendimento
Classe sócio-econômica * Renda mensal (salários-mínimos) A 20 e mais B 10 a 20 C 5 a 10 D 2 a 5 E Até 2
*Critério ABA /ABIPEME
Para um estudo mais detalhado da concentração / distribuição de renda
na cidade, construímos a tabela abaixo, considerando a renda média familiar
nos sub-distritos de Salvador:
TABELA 19 – Sub-Distrito, Renda Familiar Média e Classes
DOMICÍLIOS (%) SUB-DISTRITO
RENDA MÉDIA FAMILIAR (R$) CLASSE A CLASSE B CLASSE C CLASSE D CLASSE E
Amaralina 2.448,18 15,7 26,9 23,6 18,4 15,3 Brotas 1.668,66 8,2 21,0 30,6 25,5 14,6 Conceição da Praia 401,94 0,0 8,2 0,0 38,8 53,1 Itapuã 1.644,30 9,6 18,6 21,6 25,4 24,8
Maré 182,70 0,4 2,5 7,7 25,5 64,0 Mares 974,40 3,6 17,4 30,2 30,6 18,3 Nazaré 1.254,54 7,2 23,0 35,7 25,3 8,8 Paripe 438,48 0,5 4,7 15,1 41,6 38,1 Passo 669,90 1,3 8,3 27,8 36,5 26,2 Penha 937,86 2,2 10,0 24,1 35,3 28,4 Periperi 548,10 0,7 5,8 21,7 40,2 31,6 Pilar 657,72 0,0 0,0 32,9 42,3 24,8 Pirajá 548,10 0,8 5,8 21,4 40,4 31,5 Plataforma 499,38 0,4 4,5 16,7 42,5 36,0 Santana 1.412,88 8,8 20,3 36,6 25,5 8,9 Santo Antônio 791,70 1,8 9,6 25,1 38,6 24,8 São Caetano 755,16 1,1 7,6 22,4 40,5 28,4 São Cristovão 633,36 1,8 8,5 22,4 38,6 28,7 São Pedro 1.693,02 6,9 21,2 39,6 26,2 6,1 Sé 475,02 0,6 5,5 17,2 32,6 43,9 Valéria 401,94 0,4 3,8 17,0 50,1 28,7 Vitória 2.496,90 17,1 25,7 26,5 18,8 11,8 SALVADOR 1.218,00 5,2 12,9 23,2 33,9 24,7
Fonte: Tabela elaborada para a dissertação com dados do IBGE
Ao analisarmos a distribuição apresentada acima, verificamos a forte
concentração de renda nos sub-distritos da Vitória e Amaralina. Em
contrapartida, áreas como Maré e Conceição da Praia apresentam elevada
concentração de pobreza44.
Percebemos, desta forma, que a cidade apresenta uma série de
contrastes no que se refere a renda média familiar. Optamos
metodologicamente por este critério - renda média familiar – para um
aprofundamento da análise sócio – econômica - espacial por julgarmos os
dados consistentes e confiáveis.
44 As famílias são consideramos neste estudo - de forma absoluta - na faixa da pobreza quando estão nas classes D e
E. Já de forma relacional, devemos considerar a diferenças existentes entre os diversos sub-distritos.
Mapa 1 – Distribuição de Renda em Salvador (2000). Fonte: IBGE.
Obs: as classes seguem o critério ABA / ABIPEME
Uma análise mais acurada do poder de compra da população nos sugere
que as classes D e E, ou seja, com renda familiar de até cinco salários
mínimos, estão excluídas – parcial ou totalmente – do consumo de uma série
de bens45, com conseqüências sócio – econômicas. Dentre elas, podemos
destacar:
a) para esta parcela da população (classes D e E), a exclusão social se
manifesta no acesso às condições básicas de moradia, saúde,
alimentação e educação;
b) a população pertencente às classes D e E não consegue a qualificação
necessária à entrada no mercado de trabalho formal;
c) o mercado consumidor – ou com poder de compra razoável – tende a se
concentrar nas classes A, B e C, principalmente nas duas primeiras,
reduzindo sensivelmente o potencial de consumo da cidade.
Temos, portanto, de uma população total de aproximadamente 2,427
milhões de habitantes, um mercado consumidor, inclusive de bens culturais, de
439 mil (classes A e B) ou 1,002 milhão (considerando as classes A, B e C).
Por outro lado, existe um contigente de excluídos de 1,423 milhões (classes D
e E) ou 1,986 milhões (considerando as classes C, D e E).
TABELA 20 – População por Classe em Salvador
Classe População (em milhares) %
A 126 5,2% B 313 12,9% C 563 23,2% D 823 33,9% E 600 24,7%
45 Seguimos estudos realizados pela Mendes – Informação e Marketing e pelo DIEESE.
Fonte: Tabela elaborada para a dissertação com dados do IBGE. Obs: Valores aproximados
TABELA 21 – População por Classe em Salvador em Agupamentos
Classes População (em milhares) % A e B 439 18,1%
A, B e C 1.002 41,3% C, D e E 1.986 81,8%
D e E 1.423 58,6% Fonte: Tabela elaborada para a dissertação com dados do IBGE Obs: Valores aproximados
Conforme indicação anterior, consideramos esta estrutura sócio-
econômica como o mais importante obstáculo a ser transposto para o
desenvolvimento econômico da cidade.
4.3 ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO X ESTRUTURA
SÓCIO-ECONÔMICA
Os caminhos percorridos pelo planejamento em Salvador indicam a
adoção de um modelo de desenvolvimento econômico que possui, como uma
de suas principais orientações estratégicas, a configuração do cluster cultura,
entretenimento e turismo. O sucesso deste cluster pode significar a melhoria da
situação sócio-econômica, por uma maior renda média da população e redução
da pobreza, pelo menos em sua forma absoluta46. O que acontece, porém, é
uma relação retroalimentadora da desigualdade, como ilustra o gráfico
apresentado a seguir:
FIGURA 22 – Sistema Retroalimentador de Variáveis Sócio-Econômicas
Como se observa, tem-se um viés: o esforço de desenvolvimento de
uma estrutura esbarra em sua própria estrutura e essa estrutura perversa
impede sua mudança.
46 Em tese, estamos reduzindo as variáveis sócio-econômicas, como educação, saúde e moradia à sua
renda. Esta redução pode ser considerada válida, se for aceita a tabela de ajuste da renda familiar à classe sócio-econômica (critério ABA / ABIPEME).
Estrutura sócio-econômica
SISTEMA RETROALIMENTADOR DE VARIÁVEIS SÓCIO-ECONÔMICASSISTEMA RETROALIMENTADOR DE VARIÁVEIS SÓCIO-ECONÔMICAS
Estratégia dedesenvolvimento econômico
Busca alterar a estrutura sócio- econômica
Reduz o efeito da estratégiaadotada
De acordo com Shapiro e Varian (1999), ao trabalharem o conceito de
nova economia47, variáveis de uma dada estrutura, quando se manifestam de
forma positiva, têm uma tendência de impactar positivamente sobre as demais.
O inverso - justamente o que se observa - também é verdadeiro. Podemos,
portanto, compreender esse sistema dentro de uma lógica de feedback
negativo.
Ou seja, a retroalimentação da estrutura sócio-econômica explica-se
pela preservação dos fatores estruturais.
Romper com este ciclo vicioso e entrar em um ciclo virtuoso onde a
estratégia de desenvolvimento econômico tenha sua eficiência aumentada por
uma estrutura sócio – econômica adequada nos parece o objetivo da cidade,
seja numa lógica de cidade empreendedora ou não.
47 Os autores consideram a nova economia como o conjunto de atividades ligadas à tecnologia da informação. Entretanto, consideramos um paralelo adequado à dinâmica econômica de Salvador.
4.4 A ESTRUTURA DE CLASSES E O MERCADO CONSUMIDOR NUMA PERSPECTIVA EMPRESARIAL
Como podemos verificar, temos um modelo estrutural que reduz a
eficiência da estratégia de desenvolvimento econômico de Salvador. A
apresentação deste modelo ganha consistência, quando, junto aos dados
apresentados durante este estudo, observamos trabalhos realizados para
organizações privadas48 dos segmentos de varejo (em especial shoppings
centers e lojas de conveniência), educação (escolas, faculdades, cursos de
computação, de línguas e esportes), saúde (hospitais, clínicas, laboratórios,
planos de saúde e urgência / emergência médica), lazer (blocos carnavalescos)
e imobiliário que mostram como resultados relevantes para nosso estudo:
a) as classes A e B estão razoavelmente bem atendidas pela oferta
existente, dificultando a expansão de negócios para essas classes;
b) as classes C, D e E – em especial as C e D – passam a se apresentar
como alternativas de expansão do mercado consumidor;
c) mesmo a classe C (que se constitui atualmente pelo seu tamanho em
um segmento - oportunidade) possui uma razoável dificuldade de figurar
como mercado consumidor para uma infinidade de bens – no caso
específico dos segmentos listados anteriormente – pelo seu reduzido
poder de compra;
d) De fato, o reduzido porte das classes A e B constituem um entrave ao
desenvolvimento de novos negócios, dado o baixo poder aquisitivo das
demais classes.
48 Esses estudos foram realizados pela Mendes – Informação e Marketing, dentre outras empresas de
análise de mercado.
Temos, então, um mercado que tende a estar saturado nas classes A e
B, restando como alternativa uma expansão para as demais classes, o que,
muitas vezes, não se concretiza por causa do baixo poder aquisitivo destas
demais classes.
Assim, concluímos que a estrutura de classes na cidade não se constitui
num mero problema social, mas também, e talvez principalmente, em um
problema econômico.
Apesar de haver uma série de oportunidades de negócio para as classes
C, D e E, elas estão limitadas a uma renda familiar baixa. Com isto, dentro de
um pensamento empresarial, torna-se importante a expansão da renda da
população, a fim de propiciar sustentabilidade a novos negócios.
4.5 EDUCAÇÃO, CLASSES E MÃO-DE-OBRA QUALIFICADA
Anteriormente, já havíamos alertado para as questões relativas à
qualificação da mão-de-obra, apontando para este aspecto como um ponto
negativo na estratégia de desenvolvimento econômico de Salvador. Isto nos
sugere um aprofundamento desta questão: a qualificação.
Entendida como o somatório de escolaridade, treinamentos específicos
e experiência na atividade ou atividades correlatas, a qualificação está de
forma direta e indireta associada à escolaridade. De forma direta por ser esse
um dos critérios de qualificação e de forma indireta pela tendência a uma maior
facilidade de qualificação nos outros dois critérios.
Coerente com uma estratégia agressiva de captação de investimentos,
ou mesmo de desenvolvimento endógeno, deve ser a preocupação com a
escolaridade da população.
Harvey (1996) aponta para a crescente demanda por mão-de-obra
qualificada, sendo este um fator que diferencia de forma bastante clara as
cidades numa perspectiva de competição. “A concorrência internacional
depende também da qualidade, da quantidade e dos custos de mão-de-obra
local.” (HARVEY, 1996, p. 32).
Este autor aponta ainda para a variável mão-de-obra como “um
poderoso fator de atração de um novo desenvolvimento econômico”.
Contudo, em Salvador, ao analisarmos, por exemplo, a faixa etária de 20
a 24 anos, ou seja, jovens que estão entrando no mercado de trabalho,
percebemos a baixa escolaridade que possuem.
TABELA 22 – Anos De Escolaridade na Faixa de 20 a 24 Anos em Salvador (1996)
Anos Percentual Acumulado Menos de 1 2,533% 2,533%
1 e 2 5,277% 7,810% 3 e 4 12,537% 20,346% 5 a 7 23,035% 43,381%
8 10,753% 54,135% 9 a 11 35,958% 90,092%
12 8,961% 99,053%
Ignorado 0,947% 100,000% Fonte: IBGE / Mendes – Informação e Marketing.
Ao se observar a tabela acima, percebe-se que 54,135% da população
na faixa etária de 20 a 24 anos tem, no máximo, oito anos de estudo e mais de
43% não atinge sequer este patamar.
O mesmo quadro é verificado se observarmos a faixa etária
compreendida entre 25 e 29 anos:
TABELA 23 – Anos de Escolaridade na Faixa de 25 a 29 Anos am Salvador (1996)
Anos Percentual Acumulado
Menos de 1 2,894% 2,894% 1 e 2 5,388% 8,282% 3 e 4 12,707% 20,989% 5 a 7 18,393% 39,382%
8 10,848% 50,230% 9 a 11 38,603% 88,833%
12 10,278% 99,111% Ignorado 0,889% 100,000%
Fonte: IBGE / Mendes – Informação e Marketing.
Enfim, observando esta estrutura, percebe-se ser uma tarefa difícil, no
processo de captação de investimentos, desenvolvimento endógeno ou
qualquer outra estratégia de desenvolvimento, um retorno positivo de
benefícios sustentáveis ao longo do tempo.
Sem dúvida, empresários e população de forma geral são os grandes
perdedores deste sistema sócio - econômico inadequado.
4.6 A CULTURA, O ENTRETENIMENTO, O TURISMO, AS CLASSES E SEUS
ESPAÇOS
Como verificamos anteriormente, existe forte segmentação espacial em
Salvador. A diferença de renda nas diversas áreas da cidade nos induz a
pensar em diferentes padrões de consumo. Consequentemente, pensamos na
necessidade de deslocamentos e fluxos para que possa haver o consumo de
uma série de produtos e serviços, como hospitais, shoppings centers e
estádios de futebol.
Podemos, então, compreender tais deslocamentos, também, como uma
necessidade para o consumo de bens ligados à cultura e lazer.
A seguir, utilizamos informações relativas à distribuição dos
equipamentos culturais, por Região Administrativa:
TABELA 24 – Número de Estabelecimentos Culturais e de Lazer, por Região Administrativa - Salvador – 1999
Região Administrativa Teatros Cinemas Museus
I – Centro 12 5 21
II – Itapagipe - - 1
V – Brotas 1 - -
VI – Barra 5 3 4
VII - Rio Vermelho 4 - 1
VIII – Pituba 3 17 -
IX - Boca do Rio 1 11 1
X – Itapuã 1 - -
XI – Cabula - - 1
XIII - Pau da Lima - 2 -
Total 27 38 29
Fonte: Bahiatursa / Emtursa / Jornal A Tarde. Elaboração: PMS / SEPLAM / FMLF / GERIN-SISE, 1999.
Com base nestas informações, podemos reconhecer a existência de
uma forte concentração destes equipamentos nas Regiões Administrativas de
maior renda média (Pituba, Boca do Rio49 e Barra).
Deste modo, o que podemos perceber é que se, por um lado, as classes
D e E conseguem consumir produtos ligados à cultura e lazer, o fazem por
conta de uma cultura que permeia a cidade e, em muitos casos, de forma
gratuita, a exemplo do carnaval e outras festas populares. Porém, quando
existe a necessidade de pagamento do produto ligado à cultura, a lógica que
prevalece na localização é a econômica.
Ou seja, o consumo da cultura não é excludente pela lógica da cultura,
mas o é pela lógica da estrutura sócio - econômica. Daí sim, os fluxos de
consumo se estabelecem de duas formas:
a) da dinâmica cultural;
b) da dinâmica econômica.
49 Em especial por conta do Aeroclube Plaza Show, shopping de entretenimento.
Podemos então concluir que a cultura, no sentido que mais se aproxima
da expressão popular, é bastante democrática. Já a cultura pensada
empresarialmente utiliza da lógica mercadológica na definição do local, público-
alvo e preço. São duas lógicas que, apesar de distintas, estão presentes no
estudo do consumo da cultura em Salvador.
Como havíamos verificado anteriormente, na cadeia de valor a ETAPA 1
(produção, criação e inovação) é observada em toda a cidade. À medida que
se aproxima do consumo, passa a existir uma preocupação com o público, com
uma conseqüente segmentação. Evidentemente que essa segmentação tem
um reflexo na questão do espaço da cultura, lazer e turismo.
As faculdades, teatros, casas de shows / boites e sedes dos blocos
carnavalescos concentram-se em áreas habitadas predominantemente pelas
classes A e B. Essas áreas, compreendem, também, espaços de circulação de
turistas (como exceção, devemos colocar o Pelourinho ). A localização dos
hotéis da cidade procura seguir a lógica econômica para a sua localização,
com uma forte concentração na orla.
Pensar até que ponto essas duas lógicas se contrapõe ou se
complementam constitui uma questão relevante para análise. Ou melhor, como
a lógica econômica pode interferir na da cultura?
5 CONCLUSÕES
Sem dúvida, percebemos, de forma clara, a emergência do cluster
cultura, lazer e turismo – ainda que sem uma perfeita cooperação e
coordenação de esforços – em Salvador. Este cluster, que resulta de um
cenário com muitas variáveis, onde se inclui a estratégia governamental de
estímulo, apresenta uma série de conseqüências sócio-econômicas, espaciais
e culturais. Ou seja, o cluster relaciona-se diretamente com a vida coletiva em
Salvador – economia, mercado de trabalho, distribuição de renda,
desenvolvimento e povo, gerando uma forte expectativa em relação a todos os
aspectos discutidos ao longo de nossa dissertação.
Assim, percebemos, na capital baiana, não apenas a existência de uma
forma deliberada de estímulo aos negócios ligados à cultura, entretenimento e
turismo, por parte dos governos estadual e municipal, mas, também, um certo
compromisso do setor empresarial para fortalecimento destes negócios.
Entretanto, verificamos que o empresariado local – ligado às atividades
econômicas estudadas - ainda mantém uma forte relação, inclusive de
dependência, com os governos estadual e municipal. Sabemos que, por um
lado, é o preço pago pelo poder público para alavancar a economia e melhorar
a estrutura social; por outro lado, sabemos que esta relação não garantirá
competitividade e sustentabilidade ao cluster e, consequentemente, este não
terá efeitos sociais positivos. Logo, numa visão de longo prazo, não
vislumbramos um desenvolvimento econômico e urbano da cidade calcado no
empresariamento estatal.
Efetivamente, o amadurecimento do negócio da cultura e a sua
conseqüente sustentabilidade dependem de uma estrutura econômica e social
que apresente o denominado Diamante Competitivo (Porter, 1990) de forma
absolutamente favorável à dinâmica econômica. Isto pressupõe:
a) mão de obra qualificada, em especial com aumento do nível de
escolaridade;
b) melhoria do modelo empresarial vigente, principalmente no que diz
respeito a novos padrões de serviços e compromissos das empresas
com a dinâmica do cluster;
c) atuação governamental limitada à estruturação e à coordenação do
negócio;
d) clara visão da necessidade de cooperação entre os diversos players,
garantindo ações mais eficientes, a exemplo da gestão do carnaval;
e) acima de tudo, uma clara percepção da necessidade de mudança na
estrutura sócio-econômica da cidade.
Portanto, precisamos considerar, de forma clara, a estrutura social da
cidade como elemento crucial do desenvolvimento de estratégias econômicas.
As dificuldades de desenvolvimento do cluster cultura, entretenimento e turismo
estão diretamente associadas à questão do baixo poder aquisitivo da
população – que reduz o mercado consumidor e dificulta uma melhor
administração da sazonalidade do negócio da cultura – e à questão do baixo
nível de qualificação da mão - de – obra o que dificulta o aproveitamento de
oportunidades de cooperação econômica e de interação social.
Logo, concluímos que o negócio da cultura, entretenimento e turismo
reflete distintas demandas:
a) empresários: maiores lucros;
b) governos estadual e municipal: desenvolvimento econômico e social e
manutenção da estrutura de poder;
c) população: emprego, renda e participação no consumo.
Por isso, não podemos compreender, de nenhuma forma, este negócio
como um encontro harmônico de interesses, mas sim como um somatório de
convergências e divergências. Por um lado, verificamos convergência com
relação à política governamental entre aqueles que conseguem ocupar um
papel de destaque na cadeia de valor, como verificado ao longo da dissertação.
Por outro lado, verificamos divergências por parte daqueles que não
conseguem um lugar adequado na cadeia de valor, ou no consumo, a exemplo
de amplos segmentos das camadas populares.
A cultura, o receber bem o visitante, a preocupação em servir com
carinho são vistas como uma característica positiva de Salvador, por quase a
totalidade da sociedade. Esta representação da cidade decorre das próprias
origens da cidade e de sua cultura. A baianidade, neste sentido, pode
simbolizar a Bahia e Salvador sem muitas contestações.
Já a visão empresarial e econômica – voltada ao lucro – não tem, para
muitos, raízes na essência do soteropolitano, não possuindo um vínculo direto
com a baianidade. Assim, cultura é uma coisa, negócio é outra. São dimensões
diferentes da vida social, não havendo consenso com relação à positividade do
empresariamento da cultura.
Então a cultura, como negócio – ou na dimensão da economia, está
sujeita a questionamentos e à pressão de expectativas não satisfeitas.
Assim, ainda nas conclusões, algumas questões centrais permanecem
em aberto:
a) esta cultura, a “ baianidade “, favorece o desenvolvimento econômico e
social, podendo ser portadora de uma melhor distribuição da renda?
b) na própria dimensão da cultura, esta resistirá, de forma dinâmica, ao
encontro com outras culturas, preservando a sua originalidade, ou
ocorrerá adaptação aos gostos do mercado? O que de fato tende a
acontecer em Salvador?
Acreditamos que a resposta a estas questões poderá ser positiva, porém
a preocupação com relação ao seu teor deve permanecer, para que esta visão
positiva não se transforme em utopia.
Um trabalho sobre tema tão fantástico não pode pretender ser definitivo.
Esperamos, apenas, ter contribuído para iluminar algumas questões
relevantes. Se não conseguimos esgotar o tema, temos a expectativa de que
janelas tenham sido abertas, para que outros estudos sejam realizados, a
exemplo de uma pesquisa mais profunda acerca da concentração de lucros no
negócio da cultura e, até mesmo, sobre o seu real potencial de geração de
renda. Sem dúvida, um estudo mais profundo do impacto econômico e sócio-
cultural do cluster cultura, entretenimento e turismo sobre a cidade de Salvador
é necessário.
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