UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - SCHLA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS - DECISO
GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO
A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA
CURITIBA
2013
GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO
A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA
Monografia apresentada ao Departamento
de Ciências Sociais da Universidade
Federal do Paraná, como requisito parcial
para a obtenção de grau de Bacharel e
Licenciado em Ciências Sociais.
Orientador: Prof. Dr. Márcio de Oliveira
CURITIBA
2013
GABRIEL PORTUGAL SORRENTINO
A COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA
Monografia aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel e
Licenciado no Curso de Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da
Universidade Federal do Paraná, pela seguinte Banca Examinadora:
Orientador: Prof. Dr. Márcio de Oliveira
Departamento de Ciências Sociais, UFPR
Prof. Dr. Lorenzo Macagno
Departamento de Ciências Sociais, UFPR
Prof. Dr. Alexsandro Eugênio Pereira
Departamento de Ciências Sociais, UFPR
Curitiba, de dezembro de 2013
AGRADECIMENTOS
Antes de tudo, aos meus pais, Simone e Marcos, que me colocaram no mundo
e me ensinaram a vivê-lo, minha gratidão e admiração eterna.
À família, agradeço por compartilharmos as dores e alegrias da vida, ante as
quais estivemos sempre unidos.
Aos meus avós e ao meu tio, cujas lembranças continuarão presentes, sou grato
por tê-los conhecido e pelo tempo que vivemos juntos.
Às amigas e amigos, posso apenas expressar minha alegria pelos nossos
caminhos terem se encontrado e agradecer por me ajudarem a ser o que sou.
Aos professores e professoras, aos quais me juntarei um dia, agradeço pelos
ensinamentos, pela dedicação e por acreditarem na Educação.
A todxs funcionárixs da Universidade Federal do Paraná, por me propiciarem
condições para desenvolver meus estudos, e especialmente àqueles que trabalharam no
Restaurante Universitário, agradeço.
Enfim, sou grato à natureza e à existência, por viver aqui e agora.
RESUMO
A presente pesquisa monográfica tem como principal objeto a imigração chinesa e a
formação de uma comunidade sino-brasileira na cidade de Curitiba, e visa conhecer e
compreender as características de tal comunidade e seus integrantes, a partir de
preceitos e métodos da Sociologia. Para tanto, retoma o longo processo das diásporas
chinesas, intimamente ligado à história da China, passando pela imigração desse grupo
para as Américas e o Brasil, atendo-se ao caso específico da capital paranaense, na qual
foi realizada pesquisa empírica junto aos imigrantes chineses. Apresenta também um
panorama atual dos movimentos migratórios internacionais e foca-se na história da
imigração chinesa para o Brasil, a partir do século XIX, que suscita uma série de
debates acerca da identidade nacional e do futuro do país. A monografia reúne os
resultados de três linhas técnicas diferentes de pesquisa, a saber: 1) levantamento
bibliográfico sobre o tema da diáspora chinesa pelo mundo, sobre a imigração chinesa
para a América Latina e mais especificamente para o Brasil; 2) coleta de dados
estatísticos secundários e informações sobre o tema, nos mais variados órgãos, institutos
e associações; 3) pesquisa qualiquanti, por meio da aplicação de questionários e de
conversas e interações com imigrantes e pessoas relacionadas ao tema. Estima-se que
existam 42 milhões de chineses vivendo fora da China (chineses overseas), sendo que
no Brasil vivem aproximadamente 200 mil e entre três e cinco mil na cidade de
Curitiba, vindos principalmente a partir de meados do século XX em busca de melhores
condições de vida e trabalho.
Palavras-chave: China. Chineses Overseas. Imigração. Curitiba. Sociologia
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADRO 1 - COLETA DE DADOS ...................................................................... 14
QUADRO 2 - POPULAÇÃO CHINESA NO EXTERIOR (CHINESES
OVERSEAS) - 2012 ................................................................................................. 29
QUADRO 3 - CHINESES NA AMÉRICA, POR PAÍS DE RESIDÊNCIA -
CENSOS ................................................................................................................... 38
QUADRO 4 - POPULAÇÃO CHINESA NA AMÉRICA - 2012 ........................... 38
QUADRO 5 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - BRASIL -
2013 .......................................................................................................................... 53
QUADRO 6 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - PARANÁ -
2013 .......................................................................................................................... 53
QUADRO 7 - MIGRAÇÕES - ESTRANGEIROS E NATURALIZADOS NO
CENSOS ................................................................................................................... 55
QUADRO 8 - FLUXO E SALDO MIGRATÓRIA CHINA - BRASIL .................. 57
QUADRO 9 - AUTORIZAÇÕES DE TRABALHO CONCEDIDAS A
CHINESES - 1993 A 2012 ....................................................................................... 57
QUADRO 10 - ANISTIAS CONCEDIDAS A CHINESES - 1998/2009 ............... 59
QUADRO 11 - POPULAÇÃO RESIDENTE POR NACIONALIDADE -
PARANÁ .................................................................................................................. 60
QUADRO 12 - CONVERSAS REALIZADAS ....................................................... 68
FIGURA 1 - MAPA POLÍTICO DA CHINA .......................................................... 17
FIGURA 2 - A DIÁSPORA CHINESA ................................................................... 32
FIGURA 3 - COMÉRCIOS NA REGIÃO CENTRAL DE CURITIBA ................. 74
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - POPULAÇÃO DE CHINESES QUE RESIDEM NO BRASIL,
PARANÁ E CURITIBA - 2010 ............................................................................... 56
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11
1 AS DIÁSPORAS CHINESAS E AS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS .... 16
1.1 CHINA - SITUAÇÃO ATUAL ......................................................................... 16
1.2 PANORAMA DAS MGRAÇÕES INTERNAICOAIS ..................................... 20
1.3 A DIÁSPORA CHINESA .................................................................................. 23
1.4 DOIS MIL ANOS DE EMIGRAÇÕES ............................................................. 24
1.5 CHINESES OVERSEAS - CHINESES ULTRAMARINOS .............................. 27
2 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA AS AMÉRICAS E O BRASIL ............... 33
2.1 A IMIGRAÇÃO FEZ A AMÉRICA .................................................................. 33
2.2 O COMÉRCIO DE COOLIES ........................................................................... 35
2.3 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA BRASIL .................................................... 40
2.4 A QUESTÃO CHINESA ................................................................................... 43
3 A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL NA SEGUNDA METADE
DO SÉCULO XX .................................................................................................... 48
3.1 CHINESES NO BRASIL DE HOJE .................................................................. 49
3.2 MARCOS JURÍDICO E INSTITUCIONAL ..................................................... 50
3.3 DADOS ESTATÍSTICOS SECUNDÁRIOS ..................................................... 52
3.3.1 Polícia Federal ............................................................................................... 52
3.3.2 IBGE ............................................................................................................... 54
3.3.3 Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ................................................ 57
3.4 - ANISTIAS ........................................................................................................ 58
3.5 CHINESES NO PARANÁ ................................................................................. 59
4 CHINESES EM CURITIBA .............................................................................. 62
4.1 LEVANTAMETO BIBLIOGRÁFICO .............................................................. 62
4.2 TRABALHO DE CAMPO - NOTAS INTRODUTÓRIAS ............................... 65
4.3 RESULTADOS .................................................................................................. 68
4.3.1 Origens e anos de imigração ......................................................................... 69
4.3.2 Fatores de expulsão ....................................................................................... 70
4.3.3 Fatores de atração ......................................................................................... 71
4.3.4 Educação ........................................................................................................ 72
4.3.5 Localização geográfica e atuação profissional ............................................ 73
4.3.6 Língua ............................................................................................................. 76
4.3.7 Desejo de retornar à China ........................................................................... 78
4.4 SINO-MOÇAMBICANOS ................................................................................ 79
4.5 TRAJETÓRIAS DA IMIGRAÇÃO ................................................................... 81
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 83
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 86
APÊNDICES ........................................................................................................... 92
11
INTRODUÇÃO
Os textos introdutórios às Ciências Sociais, que costumam ser lidos no início
da graduação, apontam a importância para um cientista social de estar atento àqueles
temas e objetos de estudo que passam despercebidos ou são deixados de lado pelo
mainstream acadêmico, e que podem ser enquadrados dentro do "senso comum", o par
oposto do conhecimento científico. Além disso, tais textos também falam sobre o
familiar e o exótico1, sobre os movimentos entre ambas estas esferas que são tão caros
ao fazer antropológico.
O empreendimento que se segue busca retirar do escopo do senso comum um
fato recorrente nas grandes metrópoles brasileiras, que é a existência de chineses e seus
descendentes, e trazê-lo para o campo das Ciências Sociais, a partir da análise do
processo de imigração e das comunidades chinesas estabelecidas no Brasil, mais
especificamente na cidade de Curitiba, a partir do ano de 1949, ano da revolução
comunista na China e divisor de águas de sua história moderna e de seu longo processo
migratório.
Em outras palavras, transformar o familiar em exótico, uma vez que nós
(habitantes de grandes cidades) já estamos habituados à sua "existência"; e o exótico em
familiar, pois a China, os chineses e sua cultura talvez representem o nosso "outro"
ideal, no sentido de uma alteridade total.
Este trabalho de conclusão de curso, sob a forma de monografia, teve seus
primeiros delineamentos a partir da realização de uma matéria intitulada "Sociologia da
Imigração", durante o 2º semestre letivo de 2012 e ministrada pelo professor Márcio de
Oliveira.
O trabalho final dessa disciplina consistiu em abordar um fato atual pertinente
ao tema à luz das teorias ali estudadas ao longo do semestre. Na ocasião, optei por fazer
1 DA MATTA, Roberto. O ofício do etnólogo ou como ter anthropological blues. IN: NUNES, Edson O.
(org.) A aventura sociológica: objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de
Janeiro: Zahar, 1978.
VELHO, Gilberto. Observando o Familiar. IN: NUNES, Edson O. (org.) A aventura sociológica:
objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
12
um breve estudo sobre a imigração chinesa em Curitiba, inicialmente motivado pelo
questionamento sobre qual a relação que havia, se é que de fato havia, entre os
imigrantes chineses e o ofício a que muitos se dedicavam: o comércio de alimentos, seja
em pastelarias, restaurantes, bares ou armazéns.
A percepção de que havia cada vez mais estabelecimentos comerciais desse
gênero sob o comando de chineses levou-me a buscar entender, por meio de uma
pesquisa sociológica, essa relação entre grupo étnico, nacionalidade e ofício, juntamente
à questão da imigração em si.
O resultado não foi muito animador: além da escassez de informações e
estudos sobre a imigração chinesa para Curitiba,em que apenas duas obras abordavam o
tema (um artigo sobre os sino-moçambicanos2
e um livro sobre a história e a
comunidade chinesa3) a maioria dos chineses contatados
4 mostrou-se relutante em
estabelecer diálogo e, mais ainda, em responder a um breve questionário.
Entretanto, os poucos5 que foram mais receptivos e que não se importaram em
conversar sobre suas vidas me permitiram, além de fazer o trabalho, ter uma breve ideia
dos desafios e possibilidades de um estudo mais aprofundado sobre este tema.
A dúvida inicial acerca da relação entre etnia e ofício pode ser parcialmente
respondida: os chineses que optam por trabalhar em pastelarias e lanchonetes o fazem
devido a pouca necessidade de qualificação e comunicação, além do rápido retorno
financeiro que o comércio de alimentos oferece. Mas inúmeras outras surgiram e a
questão da imigração chinesa para Curitiba e o estabelecimento de uma comunidade
expressiva nessa cidade passou a ser o objeto de estudo que se segue.
Ao realizar esta pesquisa almejo mais a apresentação do "estado da arte" deste
tema, devido à escassez de informações e estudos, do que sua análise sociológica
completa e detalhada. Uma vez que os caminhos a se trilhar são quase que
2MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In: Andréa
Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012, (no prelo). Disponível em
<http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Comunicacoes/Seminario23Fevereiro2012.pdf>. Acesso em:
22/10/2013; 3 FONTOURA, Rubens Oliveira. Cultura e a longa marcha de chineses e chinesas até Curitiba.
Edição do autor, Curitiba, 2012; 4 Conforme ver-se-á adiante.
5 O processo de interação e contato com os chineses em Curitiba serão o tema do quarto capítulo.
13
desconhecidos, a apresentação do tema e a elaboração de perguntas torna-se mais
premente do que o fornecimento de respostas
As questões que dão origem e permeiam este estudo são: como explicar a
recente imigração chinesa para o Brasil e mais especificamente para Curitiba? É um
grupo com perfil social homogêneo ou compreende histórias díspares e sem conexões?
Quem e quantos são? Quais seus ofícios e onde se estabelecem? Como viviam na China
e como estão vivendo hoje? São as relações com os brasileiros boas ou permeadas por
pré-conceitos?
Para a realização desta monografia foram realizadas três linhas diferentes de
pesquisa, a saber: 1) levantamento bibliográfico sobre o tema da diáspora chinesa pelo
mundo, sobre a imigração chinesa para a América Latina e mais especificamente para o
Brasil (capítulos I e II, respectivamente); 2) coleta de dados estatísticos secundários e
informações sobre o tema, nos mais variados órgãos, institutos e associações que
porventura pudessem contribuir (capítulo III); 3) pesquisa quantitativa, por meio da
aplicação de questionários, e qualitativa, por meio de conversas e interações com
imigrantes e pessoas relacionadas ao tema (capítulo IV).
No primeiro capítulo me dedico à apresentação da atual situação dos
movimentos migratórios pelo mundo no século XXI e ao tema da diáspora chinesa
(chinese overseas), que é objeto de estudo recorrente em várias partes do mundo.
Entretanto, a maioria desses estudos está situada no exterior, o que dificulta o acesso à
grande parte da bibliografia, exceto aquela disponível em ambiente virtual.
No segundo capítulo busco apresentar a questão da imigração chinesa na
América Latina e no Brasil, apontando as comunidades chinesas mais expressivas. Não
posso deixar de mencionar também a América do Norte, que reúne aproximadamente
75% da população chinesa das Américas.6
O terceiro capítulo contém o resultado da coleta de dados estatísticos
secundários junto aos mais variados órgãos, associações e instituições, apresentados a
seguir. Realizarei também considerações sobre as fontes e as disparidades do dados e
6OVERSEAS CHINESE POPULATION DISTRIBUITON. IN: Overseas Community Affairs Council
(OCAC).Republic of China (Taiwan). 2012. Disponível em:
<http://www.ocac.gov.tw/english/public/public.asp?selno=8889&no=8889&level=B>. Acesso em:
06/11/2013
14
das formas de mensuração do fenômeno. Nem todos forneceram informações ou dados
relevantes, sendo que alguns sequer responderam aos meus e-mails. Ainda assim os
elenco a seguir:
QUADRO 1 - COLETA DE DADOS
INSTITUIÇÃO, ASSOCIAÇÃO, ÓRGÃO FORMA DE CONTATO
Embaixada da China Pessoalmente
Consulado da China em São Paulo e Rio de Janeiro E-mail
National Bureau of Statistics of China E-mail
Chinese Academy of Sciences; E-mail
Organização Internacional para Migração (IOM - ONU) E-mail
Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR -
ONU) E-mail
Conselho Nacional de Imigração (CNIg) Lei de Acesso à Informação
Ministério da Relações Exteriores (Itamaraty) Pessoalmente, E-mail e Lei de
Acesso à Informação
Ministério do Trabalho e Emprego Lei de Acesso à Informação
Ministério da Justiça Lei de Acesso à Informação
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Lei de Acesso à Informação
Polícia Federal Lei de Acesso à Informação
Comitê Estadual para Refugiados e Migrantes, do Departamento de
Direitos Humanos e Cidadania (DEDIHC) da Secretaria de Justiça do
Paraná
Pessoalmente
Instituto Confúcio em Brasília Pessoalmente e E-mail
Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) Telefone e E-mail
Associação Chinesa de São Paulo E-mail
Associação Cultural Chinesa do Paraná (ACCPAR) Telefone
FONTE: O autor
O quarto e último capítulo busca compreender o processo e os resultados do
trabalho de campo, realizado em Curitiba ao longo do ano de 2013. Junto a isso,
apresento e discuto os resultados do levantamento bibliográfico realizado para esta
pesquisa. A recente imigração chinesa para o Brasil ainda não recebeu a devida atenção
por parte das Ciências Sociais, visto que os estudos significativos sobre o tema podem
ser contados nos dedos, conforme também aponta DWYER (2011)7.
7 DWYER, Tom. A China e o Brasil: mudanças e desafios para a Sociologia brasileira. Conferência
proferida durante o XV Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado em Curitiba, 2011. Disponível em:
<http://www.gr.unicamp.br/ceav/content/pdf/pdf_seminario_china_tpdwyer.pdf> Acesso em: 22/10/2013.
Além disso, pode também ser encontrado em <http://www.youtube.com/watch?v=uTphy-HKCV8>.
Acesso em: 22/10/2013. Nesta conferência, traça um panorama das relações entre os dois países,
apresenta em linhas gerais a sociologia chinesa e a lacuna de interesse por temas afins na academia
15
Ciente da grande relutância de meus interlocutores em estabelecer diálogo e da
dificuldade em explicar minhas motivações, entrei em contato com uma professora do
Centro de Línguas (CELIN) da UFPR e pedi que traduzisse uma carta de apresentação8
por mim escrita para o mandarim, na qual explico os objetivos de minha pesquisa,
solicito um breve diálogo e se possível a resposta a um questionário9.
Ainda que tal carta tenha facilitado meu trabalho, pois agora conseguia ao
menos dizer porque estava ali, a relutância ao diálogo continuou, principalmente entre
os chineses de bares e pastelarias, sob a principal desculpa de que não dispunham de
tempo e não sabiam falar português. Apenas quatro pessoas se dispuseram a responder o
questionário, e três delas foram contatadas via internet por meio de amizades em
comum, tendo elas mesmas lido e respondido.
Dessa forma, devido ao pouco sucesso na aplicação de tal questionário e à falta
de representatividade que sua utilização poderia adquirir, optei por deixar de lado a seu
uso como instrumento de pesquisa. A parte empírica desta monografia se baseia em
conversas informais realizadas com as mais diversas pessoas, o que será melhor
detalhado no último capítulo.
brasileira. Aponta o trabalho de Daniel VERAS (20008) e Rosana PINHEIRO-MACHADO (2009) como
"únicas contribuições de maior fôlego". 8 Apêndice A.
9 Apêndice B.
16
CAPÍTULO 1 – A DIÁSPORA CHINESA E AS MIGRAÇÕES
INTERNACIONAIS
1.1 - CHINA - SITUAÇÃO ATUAL
A República Popular da China (RPC) está localizada no oeste da Ásia,
ocupando um território de 9.572.900 (aprox. 9.6 milhões) km², (7% do solo terrestre e
quase o tamanho da Europa). É composta por 33 unidades administrativas, sendo 22
províncias, cinco regiões autônomas, quatro municípios e duas regiões administrativas
especiais (SAR, na sigla em inglês: Hong-Kong e Macau).10
Sua população é estimada em 1.349.911.000 (1,35 bilhão) de pessoas no ano de
2012, um quinto da população da Terra, sendo que 51,3% da população vive em áreas
urbanas. É composta por 56 etnias diferentes, mas 92% pertencem à etnia Han. A língua
oficial é o mandarim, embora existam mais de 1000 dialetos falados dentro de seu
território, como cantonês, min e vu. Não há uma religião oficial, e 40% da população se
declara não religiosa ou atéia, ainda que crenças tradicionais como o Confucionismo e o
Taoísmo estejam na base de toda a cultura chinesa.11
10 CHINA. IN: Encyclopædia Britannica. Encyclopædia Britannica Online, 2013. Disponível em:
<http://www.britannica.com/EBchecked/topic/111803/China>. Acesso em: 02/11/2013. 11
Ibidem
17
FIGURA 1 - MAPA POLÍTICO DA CHINA
FONTE: Wikipedia
12
A civilização chinesa é a mais longa que já existiu e tem seu início entre 3000 e
1500 anos a.C.. Entretanto, o início da sua história imperial data do ano de 221 a.C. sob
a dinastia Qin, que unificou a China ao impor determinada forma de escrita e assumir as
ideias confucionistas, que desempenharam grande influencia por toda sua história.
Desde então, foi governada por diversas dinastias, sendo as principais: Qin
(221 a.C. - 206 a.C.); Yuan (1279 - 1368); Ming (1368 - 1644); Qing (1644 - 1911).13
Um episódio central à compreensão da história contemporânea da China são as
Guerras do Ópio (1839-1842 e 1856-1860), conflitos armados entre o Império Qing e as
principais potências européias, principalmente o Império Britânico. A China exportava
grandes quantidades de chá, porcelana e seda para a Europa, e em troca aceitava apenas
12 Disponível em: en.wikipedia.org/wiki/China. Acesso 30/11/2013.
13 Para uma história da China Imperial mais detalhada e completa, cf. Encyclopædia Britannica op. cit.
18
ouro e prata (que eram extraídas nas colônias européias), pois não demonstrava
interesse em nenhuma mercadoria oferecida pelos mercadores europeus.
O grande déficit comercial fez o Império Britânico começar a vender ópio
produzido na Índia, sua colônia, aos chineses. Tal medida alcançou grande êxito, pois a
droga tinha alta aceitação e grande poder de vício. Dessa forma, a venda de ópio cresce
exponencialmente e equilibra a balança comercial entre os dois impérios. Isso faz com
que o governo chinês proíba o seu uso e comércio, desencadeando o conflito armado.
Com a vitória européia, a China é forçada a assinar tratados que abrem suas
portas ao domínio estrangeiro e seus portos aos navios europeus, além do pagamento de
multas e da cessão de territórios, como a ilha de Hong Kong. Estes tratados dão início a
um "século humilhação", devido à intervenção do imperialismo estrangeiro.14
Até 1911 a China vivia sob um regime imperial, que se encerra com a tomada
do poder pela Aliança Revolucionária, cujo principal líder era Sun Yixian. Funda no
ano seguinte o Kuomitang, Partido Nacional do Povo. Nos primeiros anos de república,
o poder foi exercido pelo general Yuan Shikai, que se revelou um ditador e pretendeu
restabelecer a monarquia.
Com sua morte em 1916, o país se fragmenta politicamente, devido a falta de
uma autoridade central, e passa a ser governado por chefes militares, inaugurando a Era
dos Senhores da Guerra, que dura até 1928.
A República da China (1911-1945) foi um período conturbado da história
chinesa, pois o país foi alvo de frequentes invasões estrangeiras e estava dividido
internamente entre nacionalistas, liderados por Chiang Kai-Shek, e comunistas,
liderados por Mao Tsé-Tung.
Os nacionalistas do Kuomitang eram acusados de favorecer países estrangeiros
e as elites econômicas e feudais da China, dando continuidade ao establishment que
vinha desde o Império e privilegiava pequenas parcelas da população, cuja maioria se
encontrava na miséria.
14 Sobre as Guerras do Ópios, cf. PINEHIRO-MACHADO (2009) e SAHLINS (2004).
19
Os comunistas propunham a reforma agrária, a emancipação dos pobres e o
anticolonialismo, fundando em 1931 a República Soviética da China, na cidade de Jui-
chin. O governo nacionalista os reprime e tem início a Longa Marcha do Exército
Vermelho, que percorre o interior do país e recebe a simpatia do povo.
Em 1937 os dois partidos, o comunista e o nacionalista, se unem para expulsar
os japoneses, que haviam invadido o território chinês em 1931. Permanecem unidos até
o final da Segunda Guerra, período em que o partido comunista se fortalece e expulsa os
nacionalistas, criando a República Popular da China (RPC) em 1949. Durante os
primeiros trinta anos do regime comunista, alguns episódios merecem destaque:
- o primeiro Plano Quinquenal (1953-1958), que implantou a reforma agrária, a
formação de cooperativas e a obrigatoriedade da educação;
- o Desabrochar das Cem Flores (1956-1957), no qual foi incentivado o debate
e a crítica ao regime como forma de aperfeiçoá-lo;
- o Grande Salto Adiante (1958-1961), que pretendia a coletivização do campo
e a industrialização urbana em tempo recorde;
- a Grande Fome (1958-1961), que como consequência das políticas anteriores
e de condições climáticas adversas levou à morte mais de 30 milhões de pessoas;
- a Revolução Cultural (1966-1976), uma campanha lançada por Mao contra
artistas, intelectuais, burocratas e qualquer crítico do regime, levando-os à prisões,
exílio, trabalhos forçados e inclusive à morte. É dessa época o famoso Livro Vermelho
de Mao, principal símbolo do movimento revolucionário.
Com a morte de Mao em 1976, a liderança da RPC passa para Deng Xiaoping,
que começa o período de reformas e abertura econômica e política (embora esta em
menor grau) da China. Dentro de uma corrente pragmatista e que pretendia criar um
"socialismo com características chinesas", cria as Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) e
o programa das quatro modernizações, que envolvia indústria, agricultura, ciência e
tecnologia e forças armadas.
Atualmente é a segunda maior economia do mundo, possui um sistema político
unipartidário e o Partido Comunista Chinês (PCC) governa o país. Sua autoridade
política máxima é o presidente Xi Jinping. A história da China, que já dura
20
aproximadamente cinco mil anos, viu-se intimamente conectada à história dos seus
fluxos migratórios.
1.2 - PANORAMA DAS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS
De acordo com o World Migration Report (2010)15
, da IOM, existem
atualmente cerca de 214 milhões de migrantes internacionais ao redor do mundo, 740
milhões de migrantes internos, 26 milhões de pessoas deslocadas internamente (IDP,
internally displaced persons) e 15,2 milhões de refugiados em 2008. Caso o ritmo de
crescimento das migrações internacionais continue igual, estima-se que ela atinja a
marca de 405 milhões de pessoas em 2050.
Dois fatores podem ser apontados como responsáveis por parte significativa
dos motivos de emigração no presente século: a questão do trabalho e a das mudanças
climáticas. O primeiro apóia-se sobre as disparidades entre países mais e menos
desenvolvidos, principalmente no que tange ao crescimento da força de trabalho:
enquanto nos mais desenvolvidos ela deve permanecer estável, por volta de 600
milhões, nos menos deve atingir 3 bilhões em 2020 e 3,6 bilhões em 2040 (IOM, 2010,
p. 4). Tal diferença criará uma grande demanda por mão-de-obra qualificada e por
estudantes nos países desenvolvidos aliado ao seu excesso nos outros países.
Já as mudanças climáticas tendem a causar deslocamentos populacionais cada
vez maiores, ainda que suas reais consequências sejam imprevisíveis. Tais mudanças
devem contribuir mais para migrações internas do que internacionais, e catástrofes
devem ser menos impactantes do que mudanças graduais e de longo prazo. Para se ter
uma ideia, desastres causados por eventos naturais deslocaram 36 milhões de pessoas
em 2008, e nos últimos 30 anos o número de pessoas deslocadas pelas secas foi o dobro
das deslocadas por tempestades (IOM, 2010, p. 121).
15IOM (International Organization for Migration).World Migration Report 2010: The future of
migration: building capacities for change. 2010. Disponível
em:<http://publications.iom.int/bookstore/free/WMR_2010_ENGLISH.pdf>. Acesso em: 02/11/2013.
21
A intensidade e frequência dos desastres naturais (cuja relação com as
mudanças climáticas é difícil de ser avaliado) vêm crescendo e se torna cada vez mais
visível na Ásia. O terremoto na província de Sichuan, na China, deslocou 15 milhões de
pessoas, 40% do total de pessoas deslocadas por desastres naturais nesse ano de 2008.
Além disso, 31 milhões (86%) desse total de pessoas moravam na Ásia e 17 dos 20
eventos que mais deslocaram pessoas ocorreram nesse continente (IOM, 2010, p.168).
Ainda que se reconheçam as dificuldades e insuficiências dos métodos de
mensuração dos fluxos e estoques de migrantes, principalmente devido à fragmentação
dos dados, é consenso que tais números vêm crescendo e se tornando mais complexo.
Para tal mensuração o relatório aponta como principais métodos os censos, os dados da
administração pública e os programas de regularização de imigrantes irregulares levados
a cabo em alguns países.
Especial atenção merece ser dada à questão das migrações irregulares, que
pode ser definida como referente àquelas pessoas que entraram em outros países
ilegalmente (sem inspeção), ou com documentos falsos, ou, ainda, que permaneceram
em determinado país por período superior àquele permitido pelo seu visto. Há quem
atue como facilitador nesse processo, em troca de dinheiro: os chamados coiotes
(smugglers) e traficantes (traffickers). A principal diferença entre eles reside no fato de
que os coiotes auxiliam apenas no ato de cruzar fronteiras ilegalmente, enquanto
traficantes, além da travessia, pretendem explorar o trabalho dos migrantes ilegais no
país de destino. (SKELDON, 2000, p.7 - 8)16
Estima-se que tais atividades geraram entre cinco e sete bilhões de dólares em
1995 e que um barco com migrantes chineses para os EUA dê um lucro próximo a seis
milhões de dólares, ou em outros termos, o tráfico de oito migrantes irregulares equivale
ao de 1kg de heroína, embora o perigo e as penas do tráfico humano sejam irrisórios se
comparados aos do tráfico de drogas. (SKELDON, 200, p.21)
Dos 214 milhões de migrantes internacionais em 2010, estima-se que entre 10
e 15% sejam irregulares, ou seja, aproximadamente 30 milhões de pessoas (IOM, 2010,
p.29). Embora os Estados Unidos e a Europa Ocidental sejam os principais destinos,
16 SKELDON, Ronald. Myths and Realities of Chinese Irregular Migration.IOM Migration Research
Series, Suiça, n. 1, 2000.Disponível em: <http://publications.iom.int/bookstore/free/mrs_1_2000.pdf>.
Acesso em 02/11/2013.
22
não são os únicos. O fluxo migratório, regular ou não, entre países do hemisfério sul e
na região oeste da Ásia também é significante.
Os movimentos migratórios se inserem em um complexo contexto mundial de
globalização, no qual diversos fatores permeiam sua existência, como as melhorias nos
sistemas de comunicação e transporte; os direitos humanos e as desigualdades sociais
intra e internacionais; a configuração política de Estados-Nações e sua fronteiras; e o
principal fator, a demanda por trabalho.
Tal demanda apresenta-se nos países mais desenvolvidos sob uma dupla
característica: as taxas de natalidade são baixas, muitas vezes registrando índices de
crescimento populacional negativos, e há cada vez menos disponibilidade de mão-de-
obra "nativa", ainda mais para trabalhos físicos intensos, perigosos e subvalorizados,
contribuindo para isso o alto nível educacional da população, menos disposta a aceitar
tais serviços. (SKELDON, 2000, p. 11)
Assim, a insuficiente oferta de força de trabalho local e a continua demanda
por ela, independente de sua origem, favorece e pode ser considerada o principal pilar
da migração ilegal, podendo até se afirmar que sua ilegalidade é apenas virtual, uma vez
que é uma condição desejada por países desenvolvidos para os trabalhadores de baixa
qualificação, pois estes não teriam acesso à direitos providos pelo Estado e formariam
aquilo que Marx chamou de exército de reserva.
A migração irregular chinesa talvez seja a que mais se destaca nesse cenário,
por meio de redes criminosas bem organizadas e estruturadas, que envolvem pessoas
tanto no país de origem quanto no de destino. Entretanto, SKELDON (2000) aponta que
tal destaque se deve a fatores diferentes de sua real dimensão, principalmente devido ao
medo, por parte dos países de destino, do potencial migratório de um país com 1,3
bilhão de pessoas em que as principais regiões de emigração representam apenas 12%
da população do país.
A província de Fujian, região costeira e próspera da China, é o lugar de origem
da maioria dos migrantes irregulares, e as cidades de Fuzhou e Changle merecem
destaque, não por sua pobreza, mas pela percepção de que há mais oportunidades em
outros lugares. Enquanto o salário médio na China era de U$ 100 dólares, nos EUA
23
girava em torno de U$ 1.359 dólares para os imigrantes ilegais (CHIN, 1999, p.14 apud.
SKELDON, 2000, p.17).
Segundo HOOD (1998, p. 3 apud. SKELDON, 2000, p. 18), deixaram a
província de Fujian entre 1979 e 1995 entre 300 e 400 mil pessoas, a maioria
irregularmente, uma média entre 19 e 25 mil pessoas por ano.
1.3 - A DIÁSPORA CHINESA
O termo "diáspora" está historicamente associado aos judeus, mas ultimamente
tem sido usado em referência aos armênios, africanos e também chineses. Ele carrega
consigo algumas características importantes, conforme aponta VERAS (2008)17
baseado
em autores como HALL (2003), COHEN (1996), TÖLÖLYAN (2004), SAYAD (2000)
e SAFRAN (1991): uma consciência étnica; a ideia de retorno; a dispersão por dois ou
mais locais; uma certa idealização da terra natal e o constante contato com os que ali
ficaram.
A migração, entendida como processo essencialmente coletivo, apresenta
unidade e coerência entre os eventos do ciclo de vida e os significados
percebidos e atribuídos ao longo de sua experiência (de indivíduos e grupos
sociais). Tal coerência interna do processo empírico deve-se àquilo que
Sayad (2000: 11) chamou de retorno, o elemento constitutivo da condição do
imigrante. De fato, um paradoxo inerente à constituição do fenômeno
migratório que o define e unifica, pois a noção de retorno "está
intrinsecamente circunscrita à denominação e ideia de emigração e
imigração. Não existe imigração em um lugar sem que tenha havido
emigração a partir de outro lugar; não existe presença em qualquer lugar que
não tenha a contrapartida de uma ausência alhures". (FAZITO, 2008, p.
152).18
17 VERAS, Daniel Bicudo. As diásporas chinesas e o Brasil: a comunidade sino-brasileira em São
Paulo. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), PUC-SP, 2008 18
FAZITO, Dimitri. Situação da migrações internacionais no Brasil contemporâneo. IN: Populações e
políticas sociais no Brasil: os desafios da transição demográfica e das migrações internacionais.
Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2008. p. 150-172. Disponível em:
<http://www.cgee.org.br/publicacoes/demografica.php>. Acesso em 06/11/2013.
24
Tratar a diáspora chinesa como homogênea e única é uma opção delicada, uma
vez que ela é a mais longa e expressiva diáspora humana que se tem notícia. Melhor do
que isso talvez seja abordá-la no plural, enquanto diásporas, ou então diáspora
fragmentada, como o faz WEI-MING (1994)19
.
José de Souza Martins (2003)20
nos adverte sobre a redução que o termo
imigrante contém, na qual diluem-se as diferenças em favor de uma categoria
homogênea, genérica. Essa redução ocorre tanto no que tange às origens étnicas e/ou
nacionais, agrupando toda uma variedade de personagens sob o nome de chinês, como
se o fato de alguém ser oriental seja suficiente para classificá-lo como tal. Ainda assim,
tentarei esboçar uma breve história desse processo migratório.
1.4 - 2000 MIL ANOS DE EMIGRAÇÕES
Segundo GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002)21
a diáspora chinesa
pode ser dividida em quatro períodos: o primeiro, que se inicia no século III a.C. e vai
até a metade do XVI, é caracterizado pelos mercadores (homens, em sua maioria) que
viajavam por países próximos, como Filipinas, Malásia e Indonésia, buscando novas
mercadorias e eventualmente estabelecendo-se nestes países, criando culturas híbridas
por meio do casamento inter-étnico. Esse período é caracterizado como padrão
Huashang (chinês comerciante).
A emigração foi proibida na China durante a dinastia Qing, a última dinastia
imperial, entre 1644 e 1911. Entretanto, essa situação muda após as guerras do ópio,
quando a Europa subjuga o império chinês e faz com que sua demanda por mão-de-obra
para a agricultura, principalmente nas Américas, seja atendida. Este segundo período,
Huagong (chinês coolie), vai de 1840 até 1920, é composto majoritariamente por
19 WEI-MING, 1994, apud.VERAS, 2008, p .62
20 MARTINS, José de Souza. O imaginário da Imigração Italiana. São Caetano do Sul: Fundação Pró-
Memória. 2003 p . 85 21
LEW, A.A. and WONG, A. Tourism and the Chinese Diaspora.In: C.M. Hall & A.M. Williams (orgs.).
Tourism and Migration: New Relationships Between Production and Consumption. Kluwer
Academic, Dordrecht, The Netherlands, 2002, (no prelo). Disponível em:
<http://www.geog.nau.edu/publications/Lew_Wong-Chinese-Diaspora.pdf>. Acesso em: 28/10/2013
25
homens de origem rural e é o primeiro fluxo migratório chinês significante para fora da
Ásia.
O terceiro período, entre 1911 e 1949, é caracterizado pelos migrantes Huaqiao
(chinês de estadia temporária), com maior tempo de estudo e mais bem qualificados,
além de forte sentimento nacionalista e com objetivos de divulgar a cultura chinesa para
além-mar, na Europa e sudeste da Ásia.
A emigração durante estes três períodos foi originada predominantemente do
sul e sudeste da China, principalmente das províncias de Fujian e Guangdong
(Cantão). Voltarei a essa questão em outro momento.
SKELDON (2000, p. 15) aponta a importância das migrações chinesas do final
do século XIX e início do XX no estabelecimento de redes mundiais entre as
comunidades chinesas que favoreceram as migrações recentes do final do século, após a
sua interrupção durante os 30 primeiros anos do regime comunista.
Enfim, nos final dos anos 1970, após certa abertura do regime comunista para o
mundo e a permissão de emigrar, ocorre uma nova onda de migração. Ainda que
continue a predominar o aspecto econômico, agora se têm chineses originados das mais
diversas regiões da China e cujos principais destinos são a América do Norte e a
Austrália. GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002) caracteriza esse período
como uma forma moderna de migrantes Huashang (comerciantes) e Huagong
(trabalhadores), além dos Huayi (descendentes), que reemigram para outros países.
CHAN (1999, apud LEW & WONG, 2002, p. 5) aponta a grande diversidade
da população chinesa no exterior (chineses overseas), que compreende pessoas de
diferentes gerações, origens, destinos e classes sociais. Tal população se origina de uma
"série de pequenas diásporas geográficas", sendo que permanecem unidos apenas pela
sua "Chineseness".22
22 O termo diz respeito ao "caráter chinês" (VERAS, 2008, p. 113), algo como uma cultura idealizada ou
um tipo ideal, para utilizar uma categoria mais sociológica. Pode ser traduzido para o português como
"chinesidade", embora eu tenha optado por utilizar a palavra em língua inglesa.
26
DING (2010)23
usa o termo diáspora digital chinesa para se referir aos
emigrantes chineses que utilizam a internet para organizar suas comunidades
diaspóricas e manter fortes as conexões sentimentais e materiais com a China. Tais
redes aumentam o senso de identidade e solidariedade, fortalecendo os valores culturais
tradicionais (Chineseness) e permitindo uma maior participação em questões políticas
na China.
Esse fato redefine a identidade chinesa ao facilitar e expandir a comunicação, a
associação e o ativismo transnacional. Para o regime comunista, isso pode tanto
contribuir para a imagem e influência da China como também facilitar o acesso à
informação e aumentar as críticas ao governo, que pretende controlar as informações
disponíveis para seus cidadãos. (DING, 2010, p.6).
Para exemplificar sua tese, o autor relata que em 2008 mais de 80 mil chineses
receberam o visto de estadia permanente (green card) nos EUA, consequência da maior
qualificação tempo de estudo. Aliado a isso, cerca de 90% dos asiáticos americanos
utilizam a internet, sendo que os chineses são o grupo que a utilizam por mais tempo.
(DING, 2010, p.3)
Ainda que fatores de expulsão favoreçam as migrações, é importante
considerar que ela depende também de outros fatores, como contatos e redes pré-
estabelecidas. VERAS (2008) se propõem a analisar o fenômeno migratório em sua
dupla dimensão: individual, baseada em depoimentos e pesquisa junto aos imigrantes; e
coletiva, com base em dados estatísticos e bibliográficos.
Ele aponta como fatores de expulsão da China: instabilidade política e medo de
guerras; medo da perda de patrimônio por famílias mais abastadas, devido a Revolução
Comunista; falta de perspectiva econômica e perseguição política, sendo que a esta
última atribui maior peso, com base em depoimentos coletados direta e indiretamente.
(VERAS, 2008, p. 28).
A região sul da China (Fujian, Hong-Kong, Cantão), além de possuir redes e
conexões com outros lugares já estabelecidas, tinha a emigração facilitada por questões
23DING, Sheng.Sons of the Yellow Emperor Go Online: The State of the Chinese Digital Diaspora.
Global Migration and Transitional Politics Series, N. 13, Geroge Mason University, 2010.Disponível
em: <http://gmtp.gmu.edu/publications/gmtpwp/gmtp_wp_13.pdf>. Acesso em: 05/11/2013.
27
geográficas, uma vez que o terreno montanhoso dificultava a expansão territorial e o
acesso ao mar propiciava o deslocamento via navegação.
Junto a isso, o desenvolvimento industrial dos séculos XIX e XX acarretou no
êxodo rural de grandes contingentes da população do interior do país, que se dirigiram
para os centros urbanos da costa e produziu um excesso demográfico nessas áreas, o que
impulsionava a emigração.(VERAS, 2008, p. 40)
Além das províncias de Fujian e Guangdong, podemos citar as cidades
Wenzhou e Qingtian, ambas na província de Zhejiang, também costeira, como
principais origens de migrantes chineses, nesse caso principalmente para a Europa.
ARAÚJO (2009, p. 230) fala que entre 1980 e 1995 deixaram a China cerca de
2.429.000 chineses.24
1.5 - CHINESES OVERSEAS - CHINESES ULTRAMARINOS
A noção de chineses overseas (que pode ser traduzido por chinês ultramarino,
chinês no exterior, chinês expatriado; em mandarim, utiliza-se huaren ou huaqiao) é
criada no contexto das emigrações da segunda metade do século XX com o objetivo de
valorizar tais emigrantes, antes condenados, uma vez que eles eram fonte de grandes
contribuições financeiras para a terra natal.
O termo chineses overseas é usado para designar aqueles chineses que, mesmo
no exterior, nunca deixam de carregar sua identidade cultural e étnica, ainda que em
1980 a República Popular da China tenha proclamado uma lei que impedia a dupla
nacionalidade. Normalmente é aplicado aos chineses e seus descendentes (huayi),
mesmo que possuam passaporte e/ou outra nacionalidade.25
24ARAÚJO, Marcelo Silva. Chineses no Rio de Janeiro: notas sobre nação, território e identidade através
da prática comercial e religiosa. Cadernos do CEOM – ETNICIDADES. Ano 23, nº 32, p. 221-240,
jun. 2010.Disponível em: <http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/issue/view/77/showToc>.
Acesso em: 22/10/2013 25
Para uma discussão acerca da terminologia e suas implicações, cf. JIANLI, Huang. Conceptualizing
Chinese Migration and Chinese Overseas: The Contribuition of Wang Gungwu. IN: Journal of Chinese
Overseas. N°. 6, 2010, p. 1-21. Disponível em:
<http://www.academia.edu/380322/_Conceptualizing_Chinese_Migration_and_Chinese_Overseas_The_
28
De acordo com o World Migration Report (IOM, 2010, p. 167), no ano 2000
aproximadamente 24% dos emigrantes asiáticos estavam nas Américas, e no mesmo
ano, 5,8 milhões de pessoas haviam emigrado da China.
Sobre o número de chineses no exterior (chineses overseas), as fontes de dados
diferem bastante: LEW & WONG (2002, p.7) falam em 30,6 milhões em 1991, embora
tais dados estejam defasados; Wikipédia, com base nos censos de cada país, fala em
aproximadamente 47,5 milhões em 2012, ainda que tal fonte seja duvidosa26
;o
Escritório de Estatística da Alemanha (State Statistical Office, Germany) relata que os
20 países com maior população chinesa somam 39,6 milhões de pessoas27
; um centro de
estudos sobre a China, da Universidade de Ohio, estima em 32,6 milhões, com base em
censos nacionais realizados nos anos 1990 e começo dos anos 2000.28
DING (2010, p.2) aponta uma taxa de crescimento anual de 1,8% da população
chinesa no exterior a partir de 1979, quando ocorreram reformas políticas na China que
a tornaram mais aberta para o mundo. Em 2005, essa população totalizava 38,4 milhões
de pessoas.
VERAS (2008, p.82) também aborda o tema, o que reforça as disparidades
entre as fontes: de acordo com Chu Wan Tai, entre 50 e 70 milhões (MUSEU DA
IMIGRAÇÃO, 1997, P.6 apud.VERAS, 2008); para a Academia de Ciências Sociais de
Pequim, cerca de 35 milhões (JORNAL BBC, 2007, apud. VERAS, 2008) e 55 milhões
para CHIN (1999, apud. VERAS, 2008).
Talvez a fonte mais confiável de dados, ainda que certas objeções possam ser
levantadas, é o Overseas Community Affairs Council (OCAC), da República da China
(Taiwan), que fala em aproximadamente 41,4 milhões de chineses espalhados pelo
mundo no ano de 2012. Confiável pois dispõe de dados, informações e instrumentos
estatais e, logo, exclusivos. Tais objeções mencionadas referem-se aos entraves
Contribution_of_Wang_Gungwu_Journal_of_Chinese_Overseas_6_1_May_2010_1-21>. Acesso em:
06/11/2013 26
OVERSEAS CHINESE. IN: Wikipedia, The Free Encyclopedia. 2013. Disponível em:
<http://en.wikipedia.org/wiki/Overseas_Chinese#Current_numbers>. Acesso em: 06/11/2013 27
GERMANY: State Statistical Office. Manager Magazin, n. 42, 3/2012, p. 87.Disponível em:
<http://www.statista.com/statistics/223451/countries-with-the-largest-number-of-chinese-expatriates/>.
Acesso em: 06/11/2013 28
DISTRIBUITON OF CHINESE OVERSEAS POPULATION. IN: Dr. Shao You-Bao Overseas
Chinese Documetation and Research Center.Ohio University. Disponível em:
<http://www.library.ohiou.edu/hosted/shao/ch_databases_popdis.html>. Acesso em 06/11/2013.
29
históricos entre a RPC (China continental, comunista) e a RC (Taiwan), além dos
problemas com os chineses no exterior levantados anteriormente. Os dados são
apresentados na tabela abaixo, onde constam apenas as comunidades com mais de 200
mil pessoas29
:
QUADRO 2 - POPULAÇÃO CHINESA NO EXTERIOR (CHINESE OVERSEAS) - 2012
PAÍS POPULAÇÃO (milhões de pessoas)
TOTAL 41,36
ÁSIA 30,72
Indonésia 8,12
Tailândia 7,51
Malásia 6,78
Singapura 2,83
Filipinas 1,41
Mianmar 1,06
Vietnã 1
Japão 0,68
Rússia 0,47
AMÉRICA 7,69
Estados Unidos 4,24
Canadá 1,56
Peru 0,99
Brasil 0,28
EUROPA 1,61
França 0,46
Reino Unido 0,42
Itália 0,20
OCEANIA 1,07
Austrália 0,87
ÁFRICA 0,27
FONTE: República da China: Overseas Community Affairs Council. (2012)
O quadro mostra que aproximadamente 73% dos chineses ultramarinos
encontra-se no continente asiático, o que se explica pela proximidade geográfica e pela
emigração de longa duração, conforme já exposto. Nas Américas encontram-se 19% da
29OVERSEAS CHINESE POPULATION DISTRIBUITON. IN: Overseas Community Affairs Council
(OCAC).Republic of China (Taiwan). 2012. Disponível em:
<http://www.ocac.gov.tw/english/public/public.asp?selno=8889&no=8889&level=B>. Acesso em:
06/11/2013.
30
população chinesa no exterior, tema que será tratado no capítulo II. Em seguida temos
Europa (4%), Oceania (3%) e África (1%).
Dada a grande dispersão da população chinesa na região sudeste da Ásia, além
de sua importância econômica e cultural, alguns autores utilizam o conceito "China
Cultural" ou "Grande China" para se referirem a este fenômeno.
Assim sendo, a "Grande China" não é apenas uma concepção abstrata. É uma
realidade cultural e econômica que cresce rapidamente, e que está começando
a se tornar uma realidade política. Os chineses foram responsáveis pelo
espetacular desenvolvimento econômico dos anos 80 e 90: na China
continental, nos Tigres (dos quatro, três eram chineses) e nos países do
sudeste asiático, cujas economias estavam dominadas por chineses (...) Em
outras áreas do Sudeste Asiático, os chineses de ultramar dominaram as
economias de seus respectivos países. No começo da década de 90, os
chineses representavam 1 por cento da população da Filipinas, mas
respondiam por 35 por cento das vendas das empresas de propriedade
nacional. Na Indonésia, em meados da década de 80, os chineses eram de
dois a três por cento da população, porém eram donos de cerca de 70 por
cento do capital privado doméstico. Dezessete das 25 maiores empresas eram
controladas por chineses, e consta que um conglomerado chinês respondia
por cinco por cento do PNB da Indonésia. No início dos anos 90, os chineses
formavam 10 por cento da população da Tailândia, mas eram donos de nove
dos 10 maiores grupos empresariais e respondiam por 50 por cento do seu
PNB. Os chineses são cerca de um terço da população da Malásia, porém
dominam quase totalmente a economia do país. Fora Japão e Coréia, a
economia da Ásia Oriental é basicamente uma economia chinesa.
(HUTINGTON, 1997, p. 211-212 apud. VERAS, 2008, p. 81-82).
A importância econômica dos chineses ultramarinos para a China é enorme. Se
antes estes eram considerados traidores por terem deixado o país em busca de melhores
condições de vida, a partir das reformas políticas e econômicas promovidas por Deng
Xiaoping no final dos anos 1970 essa situação se reverte. Uma frase sua resume bem
esta transformação: "Chineses de todo mundo, enriquecei-vos" (CHUNG, 2005, p. 32
apud. VERAS, 2008, p.67).
Os chineses de além-mar passam a confiar no mercado financeiro da China e se
tornam a principal fonte de investimento estrangeiro, alavancando o desenvolvimento
do país nas últimas décadas. HUNTINGTON (1997, p. 213 apud. VERAS, 2008, p. 89)
aponta que 80% dos investimentos estrangeiros diretos na China, em 1992, vieram de
chineses fora da China continental, e as remessas internacionais para a China em 2009
somaram 47 bilhões de dólares (IOM, 2010, p.168).
31
Xiaoping, mais do que criar condições propícias e incentivar estes
investimentos, estimula o reforço dos laços culturais e sentimento de identidade do povo
chinês (chineseness) e das comunidades chinesas no exterior, que agora são motivo de
orgulho e vistas com bons olhos.
32
FIGURA 2 - A DIÁSPORA CHINESA
FONTE: WSJ Research, The Shao Center at Ohio University, CIA World Factbook.30
NOTA: Com o declínio econômico e social do Império Qing durante o século XIX, muito cidadãos
deixaram o país, inadvertidamente ajudando a China a estabelecer uma presença global. Este mapa
mostra onde estão os chineses ultramarinhos hoje.
30 Disponível em:<filipspagnoli.wordpress.com/tag/diaspora>. Acesso em: 30/11/2013
33
CAPÍTULO 2 – A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA AS AMÉRICAS E O BRASIL
2.1 - A IMIGRAÇÃO FEZ A AMÉRICA
A importância que a imigração internacional teve na formação do continente
americano já é largamente conhecida e, em linhas gerais, bem documentada e estudada.
Ainda que toda a colonização do continente tenha sido feita por imigrantes, no sentido
de pessoas nascidas em outros lugares, sem esquecer os povos indígenas que aqui
viviam e os africanos escravizados trazidos para estas terras, é apenas no século XIX
que os fluxos migratórios para as Américas se tornam mais substantivos e passíveis de
análises mais específicas sobre tal.
Herbert Klein (2000)31
parte do pressuposto que a equação entre fatores de
expulsão e fatores de atração (pull-push factors) é fundamental na escolha de uma
pessoa sair de sua região. Na maioria das vezes, as questões econômicas são centrais
nesse processo, mas pode haver também questões políticas, religiosas, dentre outras.
Ele divide a imigração para as Américas em dois períodos, mas cujo principal
fator de expulsão era comum: a transição demográfica na Europa, influenciada pela
revolução industrial dos meios de produção, que diminuiu a necessidade de mão-de-
obra humana devido ao surgimento das máquinas, aliada ao crescimento populacional,
causado pelo aumento da natalidade e diminuição da mortalidade, graças aos avanços
científicos na saúde e produção de alimentos. (KLEIN, 2000, p.14)
Já o fator de atração principal era o acesso a terra, uma vez que as Américas
possuíam grandes quantidades disponíveis à ocupação e usufruto, e logo, mais baratas
que na Europa, se é que tinham dono, além da escassez da mão-de-obra, o que a
encarecia. (KLEIN, 2000, p.16)
O primeiro período, chamado de "Velha Imigração", vai do início da
colonização do continente até 1880, sendo que durante os primeiros 200 anos o aporte
31 KLEIN, Herbert S. Migração Internacional nahistória das Américas. IN: FAUSTO, B. (org.). Fazer a
América. São Paulo. Edusp, p. 13-31
34
de imigrantes era pequeno e vai crescendo paulatinamente até atingir maior volume no
século XIX.
Esse período é caracterizado por fluxos constantes de camponeses europeus,
em sua maioria do norte do continente e com destinos principais na América do Norte,
Brasil e Argentina. Junto a isso, os escravos africanos também entraram em grande
número, estimados em cerca de 3,6 milhões somente para o Brasil.
A partir de 1880 há grande mudança no volume do fluxo migratório Europa -
América, que, favorecido pelas melhorias tecnológicas das comunicações e transportes,
aumenta exponencialmente os intercâmbios entre o Velho e o Novo Mundo até o ano de
1915, agora caracterizado por europeus do sul e do leste, período conhecido como
"Grandes Imigrações". (KLEIN, 2000)
Embora dez milhões de africanos e possivelmente cerca de quinze milhões de
europeus houvessem cruzado o Atlântico antes de 1880, a penúltima década
do século XIX assinalou um ponto decisivo no fluxo migratório da Europa.
(...) O ritmo da migração europeia intensificou-se durante o último quartel do
século XIX e atingiu seu pico nas primeiras duas décadas do século XX.
Entre 1881 e 1915, cerca de 31 milhões de imigrantes chegaram às Américas.
Mais uma vez, como no período anterior a 1880, os Estados Unidos eram o
principal país de recepção, recebendo 70% desses imigrantes. O segundo
lugar em importância, porém, não era o Canadá, que recebeu apenas 2,5
milhões, mas dois países latino-americanos: a Argentina, com 4,2 milhões, e
o Brasil, com 2,9 milhões de imigrantes. (KLEIN, 2000, p. 23-25).
Os fluxos migratórios para as Américas diminuem durante o período das duas
grandes guerras (1914 - 1945), chegando a serem quase insignificantes. Ressurgem,
entretanto, após a década de 1950, porém agora com novo perfil caracterizado por mão-
de-obra qualificada e por imigrantes de origens diversas: os europeus perdem sua
centralidade e agora dividem lugar com os asiáticos (em sua maioria chineses) e os
próprios americanos, cuja migração interna ao continente ganha expressão. (KLEIN,
2000)
35
2.2 - O COMÉRCIO DE COOLIES
Há estudos32
que apontam a chegada dos chineses às Américas e ao Brasil
antes de Colombo e Cabral, fato que contradiz toda a história que nos é ensinada
durante a vida escolar e que recebeu críticas de diversos historiadores, apontando a
insuficiência de provas para tais afirmações.
No Brasil, o contato teria ocorrido em 1421, pelo litoral dos estados que hoje
chamamos de Pernambuco e Maranhão, sendo que em seguida os almirantes chineses
rumaram para Argentina e completaram uma volta ao redor da Terra. (MENZIE, 2009
apud. FONTOURA, 2012, p.112)
Afirmar o primado da exploração chinesa no Novo Mundo e da Austrália não
(...) (subestima) as realizações e memórias de Bartolomeu Dias, Colombo,
Magalhães e Cook. As façanhas desses homens bravos e hábeis jamais serão
esquecidas, mas é hora de reverenciar outros homens que se permitiu caírem
no esquecimento por tempo demais. Esses notáveis almirantes chineses
dobraram o Cabo da Boa Esperança 60 anos antes de Bartolomeu Dias,
passaram pelo Estreito de Magalhães 98 anos antes de Magalhães, fizeram o
levantamento da Austrália três séculos antes do capitão Cook e da América
70 anos antes de Colombo. Os grandes almirantes Zheng He, Hong Bao,
Zhou Man, Zhou Wen e Yang Qing merecem também ser lembrados e
celebrados, pois foram os primeiros, os mais bravos e os mais ousados de
todos. Os que os seguiram, por maiores que tenham suas realizações,
navegaram na esteira por eles deixada. (MENZIE, 2009, p. 408 apud.
FONTOURA, 2012, p. 112).
De acordo com a historiografia oficial, a imigração chinesa para as Américas
data do início do século XIX, mas adquire maiores dimensões a partir de meados do
século, quando surge o comércio de coolies33
como alternativa à mão-de-obra escrava.
Assim, insere-se no segundo período migratório descrito no capítulo anterior.
Entretanto, comércio de coolies significa que eles eram literalmente a
"mercadoria" da troca, ou seja, estavam em condição análoga à da escravidão negra
ainda presente em diversos países americanos. Muitas vezes eram pessoas sequestradas
32 Cf. MENZIE, Gavin. 1421: O ano em que a China descobriu o mundo. Tradução: Ruy Jungmann. 6ª
ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. 33
Palavra oriunda do hindu kuli e que significa "massa móvel de trabalhadores assalariados que se
espalharam pelo mundo". (YANG, 1974, p. 5-6 apud. VERAS, 2008, p.107).
36
e contrabandeadas, outras forçadas a assinar contratos fictícios e submetidas a condições
de viagem e trabalho sub-humanas.
Segundo HUI (1995 apud. VERAS, 2008, p. 40) os coolies, também
conhecidos por porcos humanos (chu-tsai), foram comerciados oficialmente de 1840 a
1920. Dentre os principais destinos estavam Cuba, onde entraram 125 mil chineses
dentro desse sistema e são apontados como pilares da sociedade cubana (MOTES, 2000;
MORENO-FRAGINALS, 1989; HU-DeHART, 2004, apud. VERAS, 2008).
Também foram levados para trabalhar em minerações na África do Sul, com
cana no Havaí, tabaco na Sumatra, além de Samoa, Rússia (recrutados pelo exército
para lutar na 1ª Guerra Mundial), Guiana, Caribe (por volta de 150 mil pessoas),
Jamaica e México (onde desempenharam atividades de burguesia comercial), Chile,
Austrália, Canadá e EUA, entre outros.
No México, os chineses somavam mais de um milhão de pessoas na época da
Revolução (1919), concentrados principalmente na província de Sonora, região de
fronteira com os EUA. Por terem ascendido socialmente enquanto parte de uma
burguesia comercial, durante a Grande Depressão foram vítimas de ataques e
expropriações por partes dos exércitos revolucionários, que resultaram em sua expulsão
da região. (HU-DeHART, 2004, apud. VERAS, 2008)
O Panamá recebeu também grande fluxo de imigrantes chineses,
aproximadamente 100 mil, mas apresenta uma característica particular: ao contrário do
restante da América, onde costumavam trabalhar na economia agrícola, os coolies ali
foram utilizados na construção de ferrovias, financiadas pelos Estados Unidos. (SIU,
2004, apud. VERAS, 2008).
Lesser (1995)34
diz que as principais colônias asiáticas (chineses, coreanos e
japoneses) na América do Sul são Brasil, Peru e Paraguai. No Brasil ressalta a
imigração pós-1949, sendo que a maioria da comunidade chinesa no Brasil, estimada
pelo consulado chinês de São Paulo em 120 mil pessoas no ano de 1993, veio de
Taiwan.
34LESSER, Jeffrey.Asians in South America. IN: Encyclopedia of World Cultures. Vol. 7, South
America.Edited by Johannes Wilbert. New York: G.K. Hall/Macmillan, 1995. P. 58-61. Disponível em :
<http://www.everyculture.com/South-America/Asians-in-South-America.html>. Acesso em: 08/11/2013.
37
O Peru, ao contrário do Brasil, incentivou a imigração chinesa ainda na
segunda metade do século XIX, uma vez que era um país pouco atrativo para imigrantes
europeus devido à escassez de terras e baixos salários. Dessa forma, 133 mil chineses
entraram no Peru nesse período, principalmente para trabalhar em plantações de cana-
de-açúcar, mas também na mineração de guano35
e na construção de ferrovias através
dos Andes. (LESSER, 1995, p. 2)
Já os Estados Unidos começam a receber coolies chineses após sua
Independência, em 1865, numa tentativa de substituir a mão-de-obra escrava pela
assalariada, devido à proibição do tráfico de escravos. Conforme já apontado, o
comércio de coolies nasce com essa ambição, mas já nasce morto.
Nesse país, eles foram empregados principalmente na mineração e na
construção de ferrovias e constituíram as famosas Chinatowns, já retratadas em filme
homônimo. A vida nesses guetos deixou-os isolados e criou um enclave étnico, pois era
desnecessário o contato com a sociedade receptora uma vez que se obtinha todo o
necessário ali dentro. (VERAS, 2008, p. 105)
No século XIX, os imigrantes chineses representavam 4% do total de
imigrantes nos Estados Unidos (LIU, 1995, apud. VERAS, 2008, p. 104). Porém a
partir do ano de 1882, no qual é criada uma lei que proíbe a entrada de chineses, essa
população começa a diminuir e ser alvo de represálias e preconceitos.
Tal lei ficou conhecida como Lei de Exclusão Chinesa e insere-se dentro de um
debate sobre a qualidade dos imigrantes chineses na formação da Nação, suscitando
questões acerca dos perigos da "raça amarela" e de suas características biológico-
culturais, as quais a levariam a uma possível inassimilação, conforme será mostrado no
final deste capítulo.
Segundo o World Migration Report (IOM, 2010, p. 166) aproximadamente
24% dos 10 milhões de emigrantes da Ásia estavam nas Américas em 2000, sendo que
60% do total eram de origem chinesa.
35 Fezes de pássaros acumuladas em ilhas do Pacífico e exportadas durante a virada do século para
utilização como fertilizante natural.
38
QUADRO 3 - CHINESES NA AMÉRICA, POR PAÍS DE RESIDÊNCIA - CENSOS
CENSOS
País Anos
1960
Anos
1970
Anos
1980
Anos
1990
Anos
2000 Anos 2010
1
Argentina - - - 2297 4184 8929
Bolívia - - - 489 533 -
Brasil 5188 8255 11213 8322 10.301 19.397
Canadá - - - - 657.930 -
Chile - 491 - 788 1653 -
Costa Rica - 828 2024 - 1327 389
Equador - - 816 480 1214 -
EUA - - - 921.070 1.518.650 -
México - 1846 54 1129 1648 -
Panamá -
- - 3244 9093 13.910(RPC) /
248(Taiwan)2
Paraguai - - - 1868 865 -
Peru - - 1714 3728 - -
Venezuela - - 5334 6121 9364 -
FONTE: CELADE/CEPAL (2006)36
Nota: Os dados referentes aos censos de 2010 e anos próximos foram buscados nos sites de cada país,
tendo sido encontrados apenas estes. 2Nota: RPC refere-se à República Popular da China, continental e comunista. Taiwan refere-se à
República da China (RC), governo republicano que fugiu da China continental em 1949, por causa da
Revolução Comunista, e instalou-se na ilha de Taiwan.
QUADRO 4 - POPULAÇÃO CHINESA NA AMÉRICA - 2012
PAÍS POPULAÇÃO (milhões de pessoas)
TOTAL 7,69
Estados Unidos 4,24
Canadá 1,56
Peru 0,99
Brasil 0,28
Panamá 0,14
Argentina 0,1
Venezuela 0,08
México 0,06
Costa Rica 0,04
Jamaica 0,03
Equador 0,03
República Dominicana 0,02
Chile 0,02
Guatemala 0,02
Suriname 0,01
Guiana 0,01
Trindade e Tobago 0,01
Outros 0,05
FONTE: República da China: Overseas Community Affairs Council. (2012)
36 MIGRACIÓN INTERNACIONAL. Ano 1, nº 1. Santiago do Chile: CEPAL/ONU, 2006.
39
As diferenças percebidas entre os dados de ambos os quadros têm sua origem,
a meu ver, principalmente na forma como são conduzidos os censos. Ainda que não
tenha tido acesso aos censos dos outros países, a pergunta realizada no caso brasileiro é
sobre o país de residência em determinada data do passado, cuja informação sobre a
nacionalidade só veio a ser incluída a partir do censo de 2000.
Dessa forma, se exclui das contagens tanto a população descendente como, na
falta da pergunta sobre a nacionalidade, aquelas pessoas naturais de determinado país,
mas que se encontravam residindo em outro na data apontada pelo questionário, e,
porventura, brasileiros que residiam em outro país são incluídos na contagem. Além
disso, obviamente os imigrantes ilegais não são contabilizados nos censos.
Quanto aos métodos e instrumentos utilizados para a obtenção dos dados
fornecidos pela República da China, não disponho de informações, mas devido aos altos
números provavelmente dizem respeito às comunidades chinesas em cada país, que
inclui os huaqiao e huayi, chineses no exterior e seus descendentes, respectivamente.
No quadro 4 percebe-se a continuidade histórica do fluxo migratório chinês
para cada país, pois aqueles que receberam grande número de imigrantes durante o
século XIX, sob o comércio de coolies, continuam a figurar entre as comunidades
chinesas mais expressivas, como é o caso dos Estados Unidos, Panamá, Canadá e Peru.
Entretanto, a ausência de Cuba no quadro 4 é estranha, pois foi um dos países com
maior influência chinesa na sua formação. (MOTES, 2000 apud. VERAS, 2008).
A continuidade histórica das migrações confirma a importância de contatos e
redes pré-estabelecidas nas escolhas dos migrantes pelo país de destino e também o
caráter coletivo (leia-se social) das migrações.
Ao contrário dos outros países, o Brasil não recebeu grande aporte de
imigrantes chineses até pelo menos metade do século XX, embora o país esteja na
quarta posição entre aqueles com maior número de chineses overseas. Tal fato reitera
minha hipótese de que a imigração chinesa para o Brasil apenas ganha importância a
40
partir da Revolução Comunista, conforme exponho adiante.37
Sobre a população chinesa
residente no Brasil e as fontes estatísticas de dados, conferir o terceiro capítulo.
2.3 - A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL
A presença chinesa no Brasil tem seus primeiros contornos em 1807 quando se
pensou na possibilidade de trazer dois milhões de chineses para trabalhar na agricultura,
mas o primeiro registro de entrada de chineses acontece em 1810, quando alguns foram
trazidos para trabalhar no cultivo de chá, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro,
incentivados por D. João VI. (LESSER, 2001, p. 40)
Tal projeto foi considerado um fracasso pelo governo da época, devido à
dificuldade de comunicação e preconceitos mútuos entre ambos os povos. Além disso,
os chineses estavam sujeitos a condições deploráveis de trabalho, o que levou muitos a
fugir e tentar outras profissões, como mascates e cozinheiros.
A imigração chinesa passa a ser mal vista tanto pelo governo brasileiro como
pelo chinês, que não queria seus cidadãos submetidos à escravidão, e por isso não se
desenvolve (LESSER, 2001). Em 1845 foi aprovada a Lei Aberdeen que tornava pirata
os navios negreiros e dificultava o transporte de escravos para o continente americano,
fato que reacende a possibilidade de se importar mão-de-obra chinesa.
Lesser (2001, p. 45) afirma que por volta de 1860 havia menos de mil chineses
no Brasil e Chang-Sheng (2009)38
estima que quatro mil chineses tenham vindo para o
país até o fim do período imperial, em 1889.
Em 1873 o governo chinês proíbe a imigração, exceto a voluntária, visando
parar o comércio de coolies. Ainda assim, o contrabando de chineses para o Brasil
continuou, juntamente com as discussões acerca da questão chinesa. Esse fato levou o
governo brasileiro a assumir a dianteira na busca por imigrantes, influenciado pelo
37 Outros autores têm posicionamentos semelhantes. Cf. VERAS (2008), PINHEIRO-MACHADO
(2009), ARAÚJO (2009), FONTOURA (2012). 38
CHANG-SHENG, Chu. Imigrantes e Imigração Chinesa no Rio de Janeiro (1910-1990). Revista
Eletrônica Boletim do TEMPO, Ano 4, Nº07, Rio de Janeiro, 2009 [ISSN 1981-3384]
41
senador alagoano João Lins Vieira Cansação de Sinimbu. Esse papel, que até então era
atribuído aos homens de negócio, transformou a questão da imigração em política
nacional. (LESSER, 2001)
No ano de 1880 é assinado o tratado de "amizade, comércio e navegação" com
a China, que ainda assim se recusa a permitir a contratação de seus cidadãos, pois
acreditava que estes seriam tratados como os escravos negros.
Dois anos depois, em 1882, é criada a Companhia do Comércio e Imigração
Chinesa (CCIC), que trouxe mil chineses para trabalhar na empresa britânica
Companhia Mineradora de São João d'El-Rey, dona da maior mina da América do Sul.
Ao chegarem e perceberem as condições de trabalho, os chineses se recusaram a
trabalhar ou fugiram pouco tempo depois. Devido ao seu fracasso, essa Companhia é
dissolvida no ano seguinte. (LESSER, 2001, p. 58)
No ano de 1883 é criada a Sociedade Central de Imigração39
, privada e não
governamental, que tinha por objetivo promover e organizar a vinda de estrangeiros
para o Brasil, dentro de um projeto maior de modernização do país. Entretanto, os ideais
que pautavam tal projeto concebiam as populações mestiças como degeneradas e
visavam à importação de mão-de-obra branca e europeia, conforme se percebia na sua
publicação mensal, A immigração.
Em 1890, após o fim da escravidão e a Proclamação da República, é
promulgado pelo governo republicano o decreto 528, que pretendia regularizar a entrada
de imigrantes e que demonstrava a posição do Estado sobre os imigrantes não brancos,
como os asiáticos e os africanos, que foram proibidos de entrar no país sem a aprovação
do Congresso Nacional (LIMA, 2005, p.110)40
:
Art. 1º. É inteiramente livre a entrada, nos portos da República, dos
indivíduos válidos e aptos para o trabalho, que não se acharem sujeitos à ação
criminal do seu país, excetuados os indígenas da Ásia, ou da África que
somente mediante autorização do Congresso Nacional poderão ser
admitidos de acordo com as condições que forem então estipuladas.
39 HALL, Michael M. (1976). Reformadores de classe média no império brasileiro: a Sociedade Central
de Imigração. IN:Revista de História, Ano XXVII, vol. LIII, nº105, pp. 147-171. 40
LIMA, Silvio C. de Souza. Determinismo Biológico e Imigração Chinesa em Nicolau Moreira
(1870-1890).Dissertação (Mestrado em História das Ciências da Saúde), FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 2005.
42
Art. 2º. Os agentes diplomáticos e consulares dos Estados Unidos do Brasil
obstarão pelos meios a seu alcance a vinda dos imigrantes daqueles
continentes, comunicando imediatamente ao Governo Federal pelo telégrafo
quando não o puderem evitar.
Art. 3º A polícia dos portos da República impedirá o desembarque de tais
indivíduos, bem como dos mendigos e indigentes. (LIMA, 2005, p. 110,
grifos do autor).
Tal decreto reflete a posição das elites econômicas e intelectuais da época, que
tinham na Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional o principal palco de debates
sobre a "questão chinesa". Posteriormente, os debates sobre a integração étnica
continuam, agora tendo como palco os principais jornais da época.
Em 1900, é registrada a primeira entrada oficial de chineses em São Paulo, em
número próximo a uma centena. Em 1911, ano da Revolução Republicana da China que
pôs fim a quase cinco mil anos de império, imigram para o Rio de Janeiro chineses da
cidade de Qingtian, na província de Zheijiang. Sua principal atividade era o comércio
ambulante, conhecido como tibao, atividade que requeria pouco capital e era flexível
em relação ao espaço e ao tempo. (CHANG-SHENG, 2009)
Durante a guerra sino-japonesa (1931-1945) chegaram ao Brasil alguns
industriais chineses que optaram por transferir suas fábricas para cá, fugindo da guerra e
da revolução comunista em seguida. (JYE et al., 2009)41
O ano de 1949 foi marcado pela Revolução Comunista Chinesa, liderado por
Mao Tsé-Tung. Muitos chineses fugiram para a ilha de Taiwan, principalmente aqueles
com maiores posses e os líderes da República da China, e alguns fugiram em direção a
outros países. Diversos países fecharam suas embaixadas na China e as transferiram
para outros lugares. O Brasil, por exemplo, mudou sua representação diplomática para o
Japão e em seguida para Taiwan, negando-se a reconhecer o regime comunista e sob
forte influência política dos Estados Unidos. (CHANG-SHENG, 2009)
Para fins analíticos, divido a imigração chinesa para o Brasil em dois períodos
históricos. O primeiro, que vai do início do século XIX até meados do XX, no qual o
41 JYE, Chen T., SHYU, David J.S., BEZERRA DE MENEZES JR, Antonio J. Os imigrantes chineses
no Brasil e a sua língua. In: Synergies Brésil n° 7, pp. 57-64, São Paulo, 2009. Disponível em:
http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Bresil7/chen.pdf. Acesso em: 07/11/2013
43
fluxo migratório é pequeno e marcado por episódios pontuais, período em que
predomina a migração dos coolies, não apenas no Brasil como também no mundo. Além
disso, essa fase da imigração chinesa suscitou debates acerca da identidade nacional,
conforme aponta Jeffrey Lesser (2001).42
O segundo período se inicia a partir da metade do século XX até os dias atuais,
no qual a migração é "livre" e começa a adquirir volume expressivo, principalmente no
final do século. O marco temporal por mim instituído para tal divisão é o ano de 1949,
data da revolução comunista chinesa, que desencadeia uma série de fatos que servirão
como vetores para a diáspora chinesa. Este período é o tema do próximo capítulo.
2.4 - A QUESTÃO CHINESA
A imigração chinesa para o Brasil foi marcada por um debate sobre a questão
da identidade nacional. A partir de meados do século XIX anunciava-se o fim do tráfico
de escravos negros para as Américas e surgia a demanda por um novo tipo de mão-de-
obra para substituir aquela, processo que ocorreu por todo o continente.
Junto a isso, o Brasil passava por um período de formulação da identidade
nacional, uma questão presente nos debates da intelligentsia brasileira e das elites
econômicas, influenciadas pelas correntes europeias da biologia cultural e da
antropometria, nas quais questões culturais estavam intimamente relacionadas às
biológicas. Além dessas correntes, o darwinismo social, que era uma adaptação das
teorias biológicas evolucionistas de Darwin para a esfera social, também exercia grande
influência sobre o pensamento ocidental, o que se refletia no Brasil.
Tais correntes acima descritas, pretensamente científicas, propunham uma
escala evolutiva das raças, em que na base estariam os negros e no topo os europeus, os
asiáticos estando no meio. Raça era um conceito que delimitava as características
42 LESSER, Jeffrey. A mão de obra chinesa e o debate sobre a integração étnica. In: LESSER, Jeffrey. A
negociação da identidade nacional: Imigrantes, minorias e a luta pela etnicidade no Brasil, p. 37- 85,
São Paulo, SP: UNESP, 2001.
44
culturais de um povo, sendo os negros selvagens e próprios para trabalhos pesados, os
amarelos dóceis, mas inassimiláveis, e os brancos, o suprassumo da humanidade.
Dessa forma, o debate acerca da possibilidade de utilização da mão-de-obra
asiática envolvia a discussão sobre seu grau de assimilação e sua contribuição para a
construção da identidade nacional. Temia-se que os asiáticos fossem agravar ainda mais
a degeneração da nação, "mongolizando-a".
Para as elites, um país que já contava com grande quantidade de negros e
índios em sua constituição necessitava um processo de "embranquecimento", que
apenas seria alcançado por meio da inserção de europeus, cuja miscigenação
paulatinamente produziria uma nação melhor e mais branca.
A "questão chinesa" nunca pôde ser desvinculada das ideias sobre o futuro do
Brasil, dividindo opiniões das mais variados pessoas, como Quintino Bocaiúva
(político), Alfredo d'Escragnolle Taunay (senador), os barões de Mauá e de Cotegipe,
Joaquim Nabuco, Sinimbu, Lacerda Werneck, Nicolau Moreira, Xavier Pinheiro,
Salvador de Mendonça, entre outros. (LESSER, 2001, p. 39).
As posições assumidas por esses políticos nem sempre eram coerentes com
sua filiação liberal ou conservadora, e alianças políticas as mais bizarras eram
a norma. O grupo "anti" reunia os nacionalistas/racistas ardorosos, que
asseguravam que os chineses eram biologicamente degenerados; os
abolicionistas, que acreditavam que os chineses viriam a constituir uma
classe de neo-escravos; e alguns grandes proprietários de terras, que estavam
convencidos de que apenas os africanos eram biologicamente adequados ao
extenuante trabalho na lavoura. O outro lado agrupava uma mistura de
fazendeiros que queriam substituir os escravos africanos por um grupo mais
barato e mais dócil; outros fazendeiros, que acreditavam que os chineses
eram biologicamente adequados ao trabalho agrícola, podendo assim
contribuir para tornar o Brasil mais competitivo no mercado mundial; e os
abolicionistas, que viam que os chineses, como mão-de-obra contratada,
representariam um passo adiante em direção a um regime pleno de trabalho
assalariado. Mas todos estavam de acordo quanto a que os trabalhadores
chineses eram pouco mais que uma mercadoria. (LESSER, 2001, p, 39-40).
O principal crítico da imigração chinesa foi o fazendeiro Lacerda Werneck. Em
suas Idéias sobre a Colonização, de 1855, diz que tal povo é avesso à civilização,
moralmente atrasados e presos à tradição. Anuncia o desaparecimento dos povos
45
orientais frente ao poder ocidental, que seria o único capaz de transformar o Brasil em
um país civilizado. (LIMA, 2005)
Do outro lado estava o republicano Quintino Bocaiúva, que em 1968 escreve A
crise da Lavoura, em que apontava a imigração de coolies como principal alternativa à
escassez de força de trabalho advinda do gradual término da escravidão e utiliza os
exemplos dos Estados Unidos e outros países para reforçar seus argumentos sobre o
sucesso da introdução de imigrantes chineses.
Junto a Bocaiúva, Xavier Pinheiro também era um árduo defensor da imigração
chinesa, conforme se nota em um trecho de sua obra Importação de trabalhadores
chins, na qual ataca os sinófobos e explicita as diferentes posições que permeavam o
debate sobre o tema:
Não foram poucos os que se receiaram da superstição dos chins, da sua
fealdade repugnante, do cruzamento de sua raça com alguma das raças
existentes no país, dos seus hábitos extravagantes. Da sua linguagem pouco
eufônica e até seus trajes sem elegância. Ouvindo esses prudentes encarecer
temores, crera qualquer um que o povo brasileiro corria o risco de perder a
sua fé de católico ante o exemplo dos adoradores de Buda, de assombrar-se
com a vista, mais jocosa do que terrível, dos súditos do filho do céu, de
contaminar o seu bom gosto imitando a moda de pekim e nanking, de
degenerar na pureza de sangue pela aliança com esses homens emigrados do
extremo oriente. Deviam tranqüilizar-se. Não vinham eles nem para nos
converter à sua religião, nem para se casarem com brasileiras, nem para
fazerem competência com os mestres do bom gosto parisiense que abriram
escola na Rua do Ouvidor. Vinham trabalhar muito, ganhar salários módicos
e depois de um prazo tornariam a sua terra com algumas escassas economias.
Não poderia haver mais modesta ambição, nem mais inocente viver.
(PINHEIRO, 1869, p. 20-21 apud. LIMA, 2005, p. 89)
Ambos, Quintino Bocaiúva e Xavier Pinheiro, encaravam tal questão
primordialmente pelo seu aspecto econômico, pois os chineses forneceriam uma mão-
de-obra barata e servil, aptos ao trabalho na lavoura e de difícil assimilação, o que faria
com que voltassem para a China após o término dos contratos de trabalho. Ainda assim,
compartilhavam os ideais evolucionistas da época, nos quais os asiáticos eram vistos
como povos inferiores e moralmente pervertidos, além de serem viciados em ópio.
(LIMA, 2005; LESSER, 2001)
46
Durante as buscas por alternativas à mão-de-obra escrava, o governo brasileiro
solicitou que Salvador de Mendonça, cônsul-geral do Brasil nos Estados Unidos,
relatasse a experiência da imigração chinesa naquele país. Para esse diplomata, a
introdução dos asiáticos no país seria uma boa solução para o problema da mão-de-obra,
pois estes eram de fácil adaptação e dispostos ao trabalho. Além disso, o ideal seria o
direcionamento dos orientais para a agricultura e dos norte-americanos para a
colonização do país. (PEREIRA, 2009)43
É importante lembrar a associação que muitos brasileiros faziam entre os
coolies (índios da Ásia) e os índios brasileiros, ambos pertencentes à raça amarela, o
que servia de argumento tanto para contrariar sua vinda, alegando sua inabilidade ao
trabalho pesado e raça degenerada, quanto para apoiá-la, uma vez que se dissipariam em
meio à sociedade brasileira, como havia acontecido com os índios brasileiros (que mais
que dissipados, foram dizimados), argumentos igualmente racistas. (LESSER, 2001)
Por volta de 1870 ressurge o debate sobre a "questão chinesa", quando uma
comissão especial da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, criada para estudar
as possibilidades da imigração chinesa, apresenta um parecer no qual defende a
importação de mão-de-obra coolie e convence o governo imperial a decretar um plano
para tanto.
Tal parecer apoiava-se na crença de que eles seriam o tipo ideal para trabalhar
nas lavouras brasileiras, pois eram dóceis, climaticamente adaptáveis, dispostos a
trabalhar por baixos salários e a voltar para sua terra assim que juntassem dinheiro, não
tendo ambições de se tornarem proprietários.
A reação dos opositores foi imediata e, a partir de então, esta instituição foi
palco de boa parte dos debates sobre o tema, em que havia tanto posicionamentos a
favor, como contra a vinda de asiáticos para o Brasil, fortemente influenciados pelas
experiências com a mão-de-obra coolie em outros países do mundo presentes em
diversos relatos e livros publicados na Europa. Em seguida, tais debates ganham a
imprensa e passam a ser realizados por toda a sociedade. (LIMA, 2005; LESSER, 2001)
43 PEREIRA, Gabriel T. A diplomacia da americanização de Salvador de Mendonça (1889-1898). São
Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. ISBN 978-85-7983-006-8. Disponível em:
<books.scielo.org/id/gshz7/02>. Acesso em: 19/11/2013
47
Outro ponto que merece atenção é a questão da sexualidade e da miscigenação,
introduzida no debate pelo fazendeiro Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho.
Segundo ele, por serem os homens os produtores da identidade nacional, as relações
sexuais inter-étnicas produziram filhos degenerados e mongolóides, e o mesmo era
defendido por quem acreditava que a "cultura fluía do útero". (LESSER, 2001, p. 55).
Tanto Jaguaribe como Joaquim Nabuco, pretensos abolicionistas, combatiam
veementemente a imigração asiática e o casamento inter-étnico, pois acreditavam que
tal mistura degeneraria a população brasileira e sua identidade nacional ainda precoce.
Após a Proclamação da República, a corrente sinófoba tem seu principal defensor na
pessoa do senador Alfredo d'Escragnolle de Taunay.
Tais debates contribuíram para retirar do dualismo brancos/negros a questão da
identidade nacional e preparar o terreno para o período das grandes imigrações. Ainda
que a imigração chinesa tenha sido incipiente durante o século XIX, os debates sobre
ela fizeram com que se criassem parâmetros e projetos para o futuro do Brasil e revelam
mais sobre a formação da identidade nacional do que sobre os chineses propriamente
ditos. Conforme escreve Lesser (2001, p.47): "embora o tópico fosse a mão-de-obra
chinesa, o assunto era a identidade nacional."
48
CAPÍTULO 3 – A IMIGRAÇÃO CHINESA PARA O BRASIL NA SEGUNDA
METADE DO SÉCULO XX
A Revolução Comunista na China, em 1949, leva grandes contingentes
populacionais a sair do país, muitos em direção a Taiwan, para onde se transfere a sede
do governo da República da China e se refugiam muitos chineses do continente,
receosos de perderem suas posses e das consequências do novo regime. Além de
Taiwan, é grande o fluxo de migrantes internacionais para outros países.
Entre os anos de 1949 e 1978 o fluxo migratório de chineses para o Brasil é
pequeno, devido à ascensão do comunismo na China, às guerras da região e à
Revolução Cultural chinesa. Nesse período, a maioria dos trabalhadores que migraram o
fizeram clandestinamente, uma vez que era proibido deixar o país durante o regime de
Mao e o Brasil não tinha relações diplomáticas com a RPC, que são restabelecidas
apenas em 1974.
Após 1979, com a reabertura econômica e política da China e com o
restabelecimento das relações diplomáticas com Brasil, começa a crescer o número de
imigrantes, alguns em busca de oportunidades profissionais e outros visando reencontrar
parentes que aqui estavam.
Durante minha pesquisa de campo, constatei que a maior parte dos chineses
contatados havia entrado no país após o ano de 1979, principalmente nos últimos 20
anos do século. Apenas um deles havia vindo em período anterior, na década de 1950,
ainda criança.
KLEIN (2000)44
observa que a partir dos anos 1960, a imigração asiática para a
América começa a ganhar força, principalmente para o Brasil e EUA. Muito semelhante
ao padrão da imigração europeia da virada do século, esses imigrantes aceitam trabalhos
de baixo status e salários (altos em comparação a terra de origem). Peculiar a ela é a
tendência de se investir na educação dos filhos como forma de escapar da classe
44 KLEIN, Herbert S. Migração Internacional na história das Américas. IN: FAUSTO, B. (org.). Fazer a
América. São Paulo. Edusp, p. 13-31
49
trabalhadora, "subir de vida", conforme constatado também em minha pesquisa de
campo.
3.1 - CHINESES NO BRASIL DE HOJE
A imigração chinesa para o Brasil, principalmente a que ocorreu a partir de
meados do século XX e que se torna cada vez mais visível nos dias de hoje, é quase que
desconhecida.
Na verdade, ela é bem conhecida nos grandes centros urbanos pela maioria da
população, pois o número de comércios sob a direção de chineses é expressivo o
suficiente para que qualquer habitante de metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo e
Curitiba já tenha entrado em algum. Ainda que se saiba que existem chineses por aqui e
por aí, tal fato permanece um mistério.
Esse mistério reside em três fatores: i) o mais imediato, sua "exoticidade",
devido à distância cultural que os separam de nós, brasileiros, e sua (nossa também)
falta de "predisposição à interação"; ii) a falta de dados e informações sobre o fluxo
migratório China - Brasil, lacuna causada pela inabilidade dos órgãos e da estatística
oficial (estatal) em mensurar tal fenômeno e também pelo fato da migração ilegal; iii)
causa (e talvez consequência) dos outros fatores, a pouca atenção da Academia/Ciência,
especialmente das Ciências Sociais, ao tema.
Diversas fontes tentam estimar a quantidade de chineses no Brasil. VERAS
(2008, p. 128) traz depoimentos que dizem 100 mil, outro 150 mil, e o Consulado de
São Paulo fala 200 mil. De qualquer forma, a maioria das estimativas falam entre 100 e
250 mil chineses e descendentes em território brasileiro, ainda que a variação de 150
mil pessoas seja enorme. Todas as fontes consultadas concordam que o estado de São
Paulo abriga a grande maioria da população sino-brasileira.
É difícil dimensionar a presença chinesa no Brasil. Existem problemas de
declaração de nacionalidade e imigrantes irregulares. O Consulado Geral da
China no Rio de Janeiro calcula que há 150 mil pessoas no Brasil entre
chineses, chineses naturalizados e descendentes— 7 mil no Rio de Janeiro,
50
140 mil no Estado de São Paulo, 3 mil em Curitiba. Mas existem também
estimativas de uma população em torno de 250 mil, da qual cerca de 10 mil
residem no Rio de Janeiro. Os levantamentos indicam a capital paulista como
o grande centro chinês, com cerca de 90% dessa população. Rio de Janeiro e
Curitiba viriam na seqüência do ranking populacional. (CHANG-SENG,
2009, p. 1)
Em 1987 a estimativa é de que havia 100 mil chineses no Brasil, população que
praticamente dobra nos dias de hoje, ainda que as estatísticas tenham dificuldades
devido ao alto índice de imigrantes ilegais. (HUI, 1992 apud. SHOJI, 2004, p.76)
Segundo CHANG-SHENG (2009, p. 5) "em 1995, havia no Saara apenas duas
ou três lojas atacadistas chineses, número que aumentou cada vez mais. Em 2007, o
número chegou a 40 lojas qingtianesas e, hoje, os chineses ocupam mais de 20% dos
espaços comerciais da área", o que demonstra o crescimento da população chinesa no
Brasil ao final do século.
3.2 - MARCOS JURÍDICO E INSTITUCIONAL
No Brasil, os assuntos relacionados à imigração são de competência
compartilhada entre os Ministérios do Trabalho e Emprego, da Justiça e das Relações
Exteriores, cujos principais órgãos e atribuições estão expostos abaixo.
Dentro do Ministério do Trabalho e Emprego, o Conselho Nacional de
Imigração (CNIg), que tem por atribuição orientar, coordenar e fiscalizar as atividades
de imigração; e a Coordenadoria Geral da Imigração (CGIg), encarregada de coordenar,
orientar e supervisionar as atividades relacionadas a autorização de trabalho a
estrangeiros. (OIM, 2010, p.60)45
No Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Estrangeiros da
Secretaria Nacional de Justiça, cujas competências são processar, opinar e encaminhar
os assuntos relacionados à nacionalidade, naturalização, regime jurídico dos
45 OIM (Organização Internacional para Migração). Perfil Migratório Brasileiro 2009. 2010, Disponível
em : <publications.iom.int/bookstore/free/Brazil_Profile2009.pdf>. Acesso em: 10/11/2013
51
estrangeiros, extradição, expulsão, deportação, refúgio e asilo político; CONARE
(Comitê Nacional para Refugiados), que conduz a política nacional sobre refugiados;
Departamento da Polícia Federal, responsável pelo controle das fronteiras e registros
dos estrangeiros. (OIM, 2010, p. 60)
E o Ministério das Relações Exteriores, mediante o Departamento de
Imigração e Assuntos Jurídicos, a quem compete a concessão de autorização para
entrada e permanência de estrangeiros no país e também de vistos de trânsito.
Quanto ao marco jurídico, as leis que regem os assuntos relacionados à imigração
são: Estatuto do Estrangeiro, que cria o Conselho Nacional de Imigração (CNIg) (Lei Nº
6.815/80); Lei de Refugiados, que cria o Conselho Nacional de Refugiados (CONARE)
(Lei Nº 9.474/97); Plano Nacional contra o tráfico de pessoas (Lei Nº 11.106/05); e a
que estabelece a política de imigração (Lei Nº 10.683/03).
A Lei Nº 6.815/80, conhecida por Estatuto do Estrangeiro, dispõe sobre a
situação jurídica dos estrangeiros e cria o Conselho Nacional de Imigração (CNIg),
órgão colegiado responsável por formular, orientar e coordenar as atividades e políticas
referentes à imigração, dentre outras atribuições.46
Posteriormente essa lei é reformulada
pela Lei Nº 6.964/81.
A atual Lei dos Estrangeiros foi aprovada em regime de urgência no ano de
1980, sob pressão do poder executivo federal, à época ditatorial. A situação política fez
com que tal lei tratasse o tema das migrações internacionais sob a ótica da segurança
nacional, além de restringir a elaboração das políticas de migração ao executivo.
Critica-se também sua inobservância aos tratados internacionais e aos direitos humanos.
(OIM, 2010).
Em 2009 o poder executivo enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei
5.655, que pretende substituir o atual Estatuto dos Estrangeiros, além de transformar o
Conselho Nacional de Imigração (CNIg) em Conselho Nacional de Migração. Há
quatro anos está tramitando no Congresso, ainda que esteja sob regime de prioridade.
46 Para mais informações, acessar: http://portal.mte.gov.br/cni/conselho-nacional-de-imigracao-cnig.htm
52
Atualmente "aguarda parecer na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional
(CREDN)".47
Essa mudança reflete o novo foco que se almeja dar ao tema, inserindo as
questões dos direitos humanos e não criminalizando o imigrante ilegal, promovendo
políticas públicas que sejam capazes de lidar com as atuais especificidades temáticas
advindas da globalização.
3.3 - DADOS ESTATÍSTICOS SECUNDÁRIOS
Os dados que serão apresentados a seguir foram coletados junto às mais
diversas fontes, todas ligadas ao Estado. São chamados de secundários por não terem
sido produzidos pelo autor do texto, e a maior parte deles foi obtida pela Lei de Acesso
à Informação (Lei nº 12.527/11).
3.3.1 - Polícia Federal
De acordo com a Coordenação Geral de Polícia de Imigração da Polícia
Federal, responsável pelo controle das fronteiras e pelo registro dos estrangeiros que
entram e residem no país, existem 39.393 chineses no Brasil com registros ativos no
SINCRE (Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangeiros).48
O pedido de informações para a Polícia Federal foi feito por meio da Lei de
Acesso a Informação. Ao solicitar dados mais específicos, com detalhamentos anuais do
fluxo de migrantes chineses, o órgão apontou a dificuldade na produção e extração de
informações do SINCRE,o que acarretaria em ônus ao trabalho da Polícia Federal e
47 A tramitação da PL 5.655/2009 pode ser acompanhada em:
<www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=443102>. 48
O SINCRE (Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangeiros) é um sistema criado em 1986
para o registro unificado da entrada e saída de imigrantes, mas que cujo manuseio para a extração de
informação é limitado e requer trabalho de especialistas. Atualmente está em fase avançada de
desenvolvimento o SINCRE II, um sistema mais moderno.
53
tornaria o fornecimento de tais dados inviável. Os dados fornecidos são fruto de
levantamento já feito pelo órgão.
QUADRO 5 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - BRASIL - 2013
Classificação Estrangeiros com Registro Ativo no SINCRE
Permanente 37046
Temporário 2292
Provisório 04
Outra 51
TOTAL 39393
FONTE: O autor com base em dados fornecidos pela Polícia Federal via Lei de Acesso a Informação.
Dados emitidos em 12/09/2013.
De acordo com o mesmo órgão, os números de imigrantes chineses para o
estado do Paraná são os seguintes:
QUADRO 6 - CHINESES COM REGISTRO ATIVO NO SINCRE - PARANÁ - 2013
Estrangeiros Masculino Feminino
Permanentes 1336 1228
Temporários 16 10
TOTAL 2590
FONTE: O autor com base em dados fornecidos pela Polícia Federal via Lei de Acesso a Informação.
Dados emitidos em 31/05/2013
As categorias utilizadas nos quadros referem-se a situação do estrangeiro junto
à Polícia Federal, que é vinculada ao Ministério da Justiça. Este é responsável pelo
registro dos estrangeiros que pretendam residir no Brasil, para fins de estudos, trabalho,
refúgio, asilo ou outros. Vale ressaltar que a emissão de vistos, que são expectativas de
direito, são atos administrativos de atribuição do Ministério das Relações Exteriores, e
referem-se apenas ao ingresso no país.
O termo permanente se refere àquelas pessoas que pretendem fixar-se
definitivamente em território nacional; o termo temporário àquelas pessoas que
possuem vínculos por tempo determinado; o termo provisório diz respeito aos
54
estrangeiros em situação irregular e que desejam regularizar-se, como os que entraram
com pedido de anistia, conforme se verá adiante.
De acordo com o Ministério da Justiça, em junho de 2011 havia cerca de 1.4
milhão de estrangeiros no Brasil, dos quais 35 mil eram chineses. Isso representa um
aumento de quase 50% em seis meses, já que em 2010 esse número era de 27 mil e o
total quase um milhão (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2011).49
Já o jornal Folha de São
Paulo (2000)50
, tendo como fonte a Polícia Federal, diz que em 2000 haviam 30.337
chineses legalizados no país.
3.3.2 - IBGE
O quadro abaixo apresenta a evolução demográfica brasileira entre 1872 e
2010, com especificação dos naturalizados brasileiros e estrangeiros. Percebe-se que a
população estrangeira mantém-se praticamente estável até o censo de 1970, quando
começa a decrescer.
A queda acentua-se nos três últimos censos, atingindo o menor patamar, em
números absolutos e proporcionais à população, desde o ano de 1872, quando se iniciou
o censeamento da população. Proporcionalmente, o ápice da população estrangeira foi
no ano de 1900, quando essa representa quase 6% do total do país, refletindo o grande
afluxo de imigrantes do período das grandes imigrações.
49 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Número de estrangeiros regulares no Brasil
aumenta 50% em seis meses. 01/11/2011. Disponível em: <portal.mj.gov.br>. Acesso em: 17/09/2013;
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Anistia a estrangeiros irregulares atende
expectativa do governo. 07/01/2010. Disponível em: <portal.mj.gov.br>. Acesso em: 16/09/2013 50
JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO. "Anistia da PF regularizou 9.229 imigrantes". IN: Folha de São
Paulo, São Paulo, 23 de julho de 2000. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2307200009.htm>. Acesso em: 25/11/2013.
55
QUADRO 7 - MIGRAÇÕES - ESTRANGEIROS E NATURALIZADOS NOS CENSOS
Período População total Brasileiros natos Naturalizados brasileiros Estrangeiros
1872 9.930.478 9.547.149 1.288 382.041
1890 14.333.915 13.982.603 - -
1900 17.438.434 16.159.371 - 1.074.511
1920 30.635.605 29.045.227 52.326 1.513.635
1940 41.236.315 39.822.487 122.736 1.283.833
1950 51.944.397 50.727.113 128.897 1.085.287
1960 70.191.370 68.790.890 148.013 1.252.467
1970 93.139.037 91.909.909 146.383 1.082.745
1980 119.002.706 117.900.142 198.062 912.848
1990 146.825.475 - - 767.781
2000 169.872.856 169.189.026 173.763 510.067
2010 190.755.799 190.163.229 161.250 431.319
Fonte: IBGE51
De acordo com o Censo 2010 (IBGE, 2012)52
, dos 431 mil estrangeiros que
moravam no Brasil, 303 mil fixaram residência antes do ano 2000, 42 mil de 2001 a
2005 e 85 mil nos 5 anos que antecederam o censo, entre 2006 e 2010.
Ainda que o site do IBGE disponibilize diversos dados, informações, séries
históricas, estudos e análises, não foi possível localizar informações mais específicas
sobre o tema da imigração chinesa. Em geral, os dados encontrados no site do IBGE não
especificam a nacionalidade dos estrangeiros residentes ou dos brasileiros naturalizados,
indicando apenas a quantidade de estrangeiros que entraram no Brasil (com série
histórica de 1820 a 1975) e as populações residentes no país, estados e municípios com
base no último local de residência (de cinco anos para trás), e no tipo de nacionalidade
(brasileira, naturalizada ou estrangeira).
51Directoria Geral de Estatística, [187?] -1930, Recenseamento do Brazil 1872-1920; IBGE, Censo
Demográfico 1940-2010. Até 1980, dados extraídos de Estatísticas do Século XX, Rio de Janeiro, 2007
no Anuário Estatístico do Brasil 1995. Rio de Janeiro: IBGE, v. 55, 1995. IBGE, Censo Demográfico
1972/1991.Disponível em:
<http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=CD105&t=migracoes-
estrangeirosnaturalizados-censos-demograficos>. Acesso em 01/11/2013 52
IBGE, Censo Demográfico 2010. Nupcialidade, Fecundidade e Migração: resultados da amostra. Rio
de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/d_detalhes.php?id=798>. Acesso em:
18/11/2013
56
Ao solicitar informações ao Instituto Brasileiro de Geografia Estatística
(IBGE), via Lei de Acesso à Informação, sobre os dados referentes à imigração chinesa,
obtive a seguinte tabela como resposta:
TABELA 1 - POPULAÇÃO DE CHINESES QUE RESIDEM NO BRASIL, PARANÁ E CURITIBA -
2010
Lugar de residência População nascidos na China
Brasil 19397
Paraná 1761
Curitiba 977
FONTE: BME. Censo Demográfico 2010.
A primeira informação que salta aos olhos é a diferença entre os dados do
IBGE e da PF apresentados anteriormente. Os números do primeiro órgão são inferiores
que aos do segundo, tanto a nível nacional, quanto estadual. Segundo o IBGE, residiam
no Brasil, no ano de 2010, aproximadamente 20 mil chineses, enquanto a PF aponta o
número de quase 40 mil chineses registrados em solo nacional, um número duas vezes
maior.
No que tange ao estado do Paraná, a discrepância entre ambas as fontes passa
próxima de 800 pessoas, o que talvez possa ser explicado por deslocamentos
populacionais constantes na região oeste, entre as cidades de Foz do Iguaçu, no Brasil, e
Ciudad del Este, no Paraguai, conforme aponta Rosana Pinheiro-Machado (2009).
Além disso, se compararmos ambas as fontes às estimativas da população sino-
brasileira, as contagens oficiais chegam a ser dez vezes inferiores, ainda que o Censo e
o SINCRE não contabilizem descendentes e nem ilegais.
Analisando a evolução da população chinesa no Brasil através dos Censos,
constata-se um crescimento de quase 100% em comparação ao último censo, de 2000,
quando foram registrados 10 mil chineses. Do censo de 1990 para o de 2000, o
crescimento foi de 24%, e de 1980 para 1990 houve decrescimento de 26% (cf. Quadro
4).
57
Quanto à imigração de data fixa, na qual se investiga o local de residência há
exatos cinco anos atrás, aproximadamente 268 mil pessoas declararam residir em outro
país no Censo 2010, dos quais 3.571 na China, ainda que não haja distinção por
nacionalidade e saiba-se que a taxa de retorno geral foi de 65,6%. (IBGE, 2012)
Em uma tentativa de se medir o fluxo migratório entre China e Brasil, os dados
apresentados abaixo revelam uma entrada de quase seis mil chineses na última década.
QUADRO 8 - FLUXO E SALDO MIGRATÓRIO CHINA - BRASIL
TOTAL Homens Mulheres
A) Pessoas que residiam há menos de 10 anos ininterruptos na
UF, segundo o país de residência anterior - CHINA 7261 3905 3356
B) Brasileiros natos que residiam há menos de 10 anos
ininterruptos na UF, segundo país de residência anterior -
CHINA
1337 628 709
Saldo (A - B) 5924 3277 2647
FONTE: IBGE, CENSO 2010
3.3.3 - Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
Outra fonte de dados que pode ser utilizada na tentativa de mensuração do
fenômeno migratório e da população chinesa no Brasil é o Ministério do Trabalho e
Emprego, por meio das autorizações de trabalho concedidas a estrangeiros e publicadas
em relatórios anuais pela Coordenação Geral de Imigração (CGIg) e pelo Conselho
Nacional de Imigração (CNIg).53
QUADRO 9 - AUTORIZAÇÕES DE TRABALHO CONCEDIDAS A CHINESES - 1993 À 2012
ANO AUTORIZAÇÕES CONCEDIDAS
1993-1997 1103
1998-2004 4051
2005-2008 6002
2009 1405
2010 2160
2011 2602
2012 3104
1993-2012 (TOTAL) 20427
FONTE: Base Estatística Coordenação Geral de Imigração, Ministério do Trabalho e do Emprego;
53 Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/trab_estrang/estatisticas.htm>. Acesso em 20/11/2013
58
De acordo com o quadro, que não faz distinção entre autorizações permanentes
e provisórias, e ainda que até 2008 os dados estejam agregados por período, percebe-se
o crescimento anual da quantidade de autorizações, que atinge seu valor máximo em
2012, o que indica um crescimento na imigração chinesa ou um maior índice de
migrantes legais.
3.4 - ANISTIAS
Os imigrantes em situação irregular são muitas vezes submetidos a trabalhos
forçados e desumanos, pois sua condição ilegal lhes impede de recorrer às autoridades e
de certa forma os torna vulneráveis à agência de máfias e outros aproveitadores de sua
situação, além de não terem acesso aos serviços públicos básicos. Para combater tais
situações, eventualmente o governo fornece a possibilidade de legalização de sua
residência.
No Brasil foram realizadas quatro anistias a imigrantes ilegais, permitindo sua
regularização nos anos de 1980, 1988, 1998 e 2009. Esta última foi promovida pela Lei
Nº 11.961/09 e pelo Decreto Nº 6.893/09, possibilitando a regularização de estrangeiros
que tenham entrado no país até 1º de fevereiro do mesmo ano e que se encontram em
situação irregular, por meio da concessão de residência provisória, em sua primeira fase,
e a transformação dessa em permanente, durante a segunda fase, em 2011.
De acordo com Rosita Milesi (2013)54
, na anistia de 1980 cerca de 27 mil
estrangeiros requereram regularização, na de 1988 foram aproximadamente 37 mil e na
anistia de 1998 quase 41 mil pessoas o fizeram.
Abaixo seguem os dados referentes aos anos de 1998 e 2009, fornecidos pela
Polícia Federal e disponíveis na imprensa e site do Ministério da Justiça. Informações
sobre as duas primeiras anistias não forem encontrados, e quando solicitados à PF
54 MILESI, Rosita, ANDRADE, Willian C. Migrações Internacionais no Brasil: Realidade e Desafios
Contemporâneos. IMDH, 2013. Disponível em
:<www.gritodelosexcluidos.org/media/uploads/migracionesintbr.pdf>. Acesso em: 25/11/2013.
59
alegaram as mesmas dificuldades em extrair dados estatísticos do SINCRE apontadas
anteriormente.
QUADRO 10 - ANISTIAS CONCEDIDAS A CHINESES - 1998 / 2009
ANO 1998 2009
ANISTIAS CONCEDIDAS
CHINESES 9.229 5.492
FONTE: Ministério da Justiça; Departamento da Polícia Federal
Na anistia de 1998 foram regularizados quase 41 mil estrangeiros em situação
irregular, dos quais 9.229 eram chineses (JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO, 2000).
VERAS (BARRETO, 2001, p. 65 apud. VERAS, 2008, p. 128) também apresenta estes
dados, entretanto o número de chineses beneficiados é 9.940. Dependendo da fonte, os
chineses são o primeiro ou segundo maior grupo beneficiado por esta anistia.55
Já na anistia de 2009 os dados são mais precisos: de cerca de 43 mil
regularizações realizadas, 5.5 mil foram de chineses, que ocupam a segunda posição
entre as nacionalidades mais beneficiadas, atrás apenas dos bolivianos, com quase 17
mil imigrantes regularizados. Os estados com maior número de requerimentos foram
São Paulo, com 30.402, Rio de Janeiro, com 2.425 e Paraná, com 1.489. (MILESI,
2013, p. 6)
3.5 - CHINESES NO PARANÁ
Segundo o Censo 2010 (IBGE, 2012), o estado do Paraná foi o que apresentou
o maior índice de imigrantes internacionais nos últimos 10 anos. Das 611.903 pessoas
que residiam no estado há menos de 10 anos, 67 mil (11,2%) eram oriundas de países
estrangeiros. No total, aproximadamente 455 mil pessoas imigraram de outros países
para o Brasil no mesmo período, sendo que 14,7% dirigiram-se para o Paraná.
55 Ainda que a diferença seja pequena, de aproximadamente 700 pessoas, ambas as fontes divergem de
maneira mais acentuada sobre os números de imigrantes bolivianos: a FOLHA aponta 9.155 beneficiados
e VERAS diz que foram 14.006. Não saberia dizer a origem de tal discrepância.
60
Mais da metade dos imigrantes internacionais da última década chegaram ao
Brasil nos dois últimos anos antes do censo, ou seja, 2008 e 2009, o que está
relacionado com a crise econômica mundial. Entretanto, não é possível saber qual a
porcentagem de estrangeiros e brasileiros nos números apresentados acima, e a
migração de retorno é parte considerável deles visto que os principais países de destino
são Estados Unidos e Japão, que receberam grande número de brasileiros em décadas
passadas.
QUADRO 11 - POPULAÇÃO RESIDENTE POR NACIONALIDADE - PARANÁ - 2000/2010
ANO Total Brasileiros Natos Naturalizados brasileiros Estrangeiros
2000 9.564.643 9.514.981 20.504 29.158
2010 10.444.526 10.394.109 21.816 28.601
FONTE: IBGE
Além da população chinesa na cidade de Curitiba, que será objeto do próximo
capítulo, é importante ressaltar o caso das cidades de Foz do Iguaçu, no oeste do estado,
e Ciudad del Este, no Paraguai, que, a despeito de se encontrarem em dois países
distintos, podem ser consideradas um mesmo centro urbano.
É nessa região que Rosana Pinheiro-Machado (2009) realizou suas pesquisas
acerca da comunidade chinesa e das redes de mercadorias estabelecidas entre a China,
Paraguai e Brasil. Segundo ela, a região concentra uma população de aproximadamente
10 mil chineses, metade da que existia nos anos 1990. (PINHEIRO-MACHADO, 2006,
p. 2)56
Nos anos 1970 e 1980, como descrito por Cunha e Mello (2005) e também
por Machado (2006), boa parte dos chineses em atividade no Brasil penetra
por Foz do Iguaçu, no Paraná, vindos de Ciudad de Leste, no Paraguai.
Estima-se que mais de 90% dos chineses no Brasil se estabeleceram em São
Paulo, ocupando áreas geográficas específicas, especializando-se no
comércio de produtos para presentes e itens de papelaria. Os outros 10%
espalharam-se pelo Brasil, com predominância no Rio de Janeiro, Paraná e
áreas de zona franca. (ARAÚJO, 2009, p. 227).
56 PINHEIRO-MACHADO, Rosana. (Re)pensando a diáspora chinesa: Fluxos globais e dinâmicas locais
da imigração contemporânea. IN: Encontro Anual da Anpocs, 30, 2006.
61
Além disso, tal região é um importante meio de entrada de chineses no Brasil a
partir de 1949, pois, com a Revolução Comunista e a quebra das relações diplomáticas
entre Brasil, a RPC e a RC, muitos chineses imigram de Taiwan para o Paraguai, que foi
um dos poucos países a reconhecer e manter relações diplomáticas com a República da
China. Assim, com a inauguração da Ponte da Amizade em 1975, o fluxo de
mercadorias e pessoas entre Brasil e Paraguai é facilitado e, logo, cresce.
62
CAPÍTULO 4 – COMUNIDADE CHINESA EM CURITIBA
O presente capítulo pretende expor e analisar o trabalho de campo realizado
junto à comunidade e imigrantes chineses da cidade de Curitiba, durante o ano de 2013.
Explicitarei minhas motivações, dificuldades e resultados durante esse processo. A
utilização do termo "comunidade" não significa que os chineses residentes nessa cidade
estejam articulados e organizados de forma geral, e nem que exista uma identidade
comum a todos, a não ser pelo fato de terem uma origem comum: a China.
Para tentar compreender o fenômeno migratório e as características da
comunidade chinesa em Curitiba, dividi minha pesquisa empírica com fontes diretas em
dois caminhos: um qualitativo, por meio da interação e conversas informais com todos
os chineses e descendentes que pude ter contato, alguns por indicações de conhecidos,
mas a maioria por abordagem aleatória nos comércios das ruas de Curitiba; e outro
quantitativo, por meio da aplicação de um questionário que seguia o mesmo padrão de
seleção e da pesquisa qualitativa.
Conforme já dito na introdução, a aplicação de questionários não trouxe os
resultados esperados, pois foram poucos os que se dispuseram a respondê-lo e tal
amostra não teria qualquer possibilidade de representar o universo estudado. Dessa
forma, as informações obtidas por meio dele serão utilizadas juntamente às demais, que
são resultados de conversas informais.
Em Curitiba existe a Associação Cultural Chinesa do Paraná (ACCPAR),
localizada no bairro Santa Quitéria e fundada em 1989 pelos sino-moçambicanos
(MACAGNO, 2012, p. 2), cujo presidente atual é Francisco Guo Zude. Segundo ele, "o
trabalho na Associação, que é voluntário, tenta criar elementos, atividades, para unir os
chineses e criar interação com a comunidade brasileira." (FONTOURA, 2012, p. 204).
Por uma série de motivos não consegui me encontrar pessoalmente com o
presidente da Associação, o que sem dúvidas seria de grande importância, pois
conheceria o único elo associativo organizado e institucionalizado da comunidade
chinesa em Curitiba e teria acesso a um discurso oficial. Tal fato é uma lacuna na
realização desse trabalho de campo.
63
4.1 - LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO
Considerando o processo de levantamento bibliográfico, algumas obras
merecem destaque e podem ser apontadas como pioneiras no estudo de tal temática. Na
área das Ciências Sociais, apenas um livro e um artigo sobre a imigração para
Curitiba57
foram encontrados, e alguns outros trabalhos sobre chineses em São Paulo58
,
Rio de Janeiro59
, Pernambuco60
e Foz do Iguaçu/Ciudad del Este61
.
Outras obras que merecem destaque e que não podem ser catalogadas como
pertencentes às Ciências Sociais, ainda que dialoguem com ela, são: SHOJI (2004)62
,
que aborda as reinterpretações do budismo chinês no Brasil; JYE(2009)63
, sobre o
fortalecimento do bilinguismo entre as comunidades sino-brasileiras; CHEN (2010)64
,
acerca da imigração chinesa para a cidade de Cascavel, Paraná; CARVALHO (2011)65
,
que apresenta uma abordagem psicossocial do relacionamento entre brasileiros e
chineses em contextos nos quais o imaginário e as representações simbólicas são
57 FONTOURA, Rubens Oliveira. Cultura e a longa marcha de chineses e chinesas até Curitiba.
Edição do autor, Curitiba, 2012;
MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In: Andréa
Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012, (no prelo). Disponível em
<http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Comunicacoes/Seminario23Fevereiro2012.pdf>. Acesso em:
22/10/2013; 58
VERAS, Daniel Bicudo. As diásporas chinesas e o Brasil: a comunidade sino-brasileira em São
Paulo. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), São Paulo, PUC-SP, 2008; 59
ARAUJO, Marcelo Silva. Chineses no Rio de Janeiro: notas sobre nação, território e identidade através
da prática comercial e religiosa. Cadernos do CEOM – ETNICIDADES. Ano 23, nº 32, p. 221-240,
jun. 2010.Disponível em: <http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/issue/view/77/showToc>.
Acesso em: 22/10/2013
CHANG-SHENG, Shu. Imigrantes e Imigração Chinesa no Rio de Janeiro (1910-1990). Revista
Eletrônica Boletim do TEMPO, Ano 4, Nº07, Rio de Janeiro, 2009 [ISSN 1981-3384] 60
SILVA, Marcos Araújo. Guanxi nos trópicos: um estudo sobre a diáspora chinesa em Pernambuco.
Dissertação de Mestrado (Antropologia Social) PPGA- UFPE. Recife, 2008. 61
PINHEIRO-MACHADO, Rosana.MADE IN CHINA: Produção e circulação de mercadorias no
circuito China-Paraguai-Brasil.Tese (Doutorado em Antropologia Social) PPGAS-UFRGS. Porto
Alegre, UFRGS, 2009. 62
SHOJI, Rafael. Reinterpretação do Budismo Chinês. REVER -Revista de Estudos da Religião. Nº
3,São Paulo, 2004, pp. 74-87. Disponível em <www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_shoji.pdf>. Acesso em:
22/10/2013. 63
JYE, Chen T., SHYU, David J.S., BEZERRA DE MENEZES JR, Antonio J. Os imigrantes chineses no
Brasil e a sua língua. In: Synergies Brésil n° 7, pp. 57-64, São Paulo, 2009. Disponível em:
http://ressources-cla.univ-fcomte.fr/gerflint/Bresil7/chen.pdf. Acesso em: 07/11/2013 64
CHEN, Miao S. Cultura e educação dos imigrantes chineses na cidade Cascavel: dois mundo, um
mesmo objetivo. Monografia, (Curso de Especialização em História da Educação Brasileira). Cascavel,
UNIOESTE, 2010. 65
CARVALHO, João G. da S. Em terra de papagaio dragão não se cria: uma abordagem psicosocial da
relação entre brasileiros e chineses.IN: Contemporânea. N°. 2, p. 165 - 182, jul./dez. 2011.
64
tensionadas; TEIXEIRA (1995)66
, sobre as influências e intercâmbios históricos entre
Brasil e China nas mais diversas esferas, como a cultural, artística e arquitetônica; e
PROCÓPIO (2012)67
, cujo foco são as relações internacionais entre Brasil e China.
Sobre a presença de chineses em Curitiba, o livro do desembargador Rubens
Fontoura (2012) é o estudo mais completo já realizado, no sentido em que pretende
abordar as diversas esferas da vida dessas pessoas à luz da Sociologia e História. O
autor, cujas motivações para a realização da pesquisa foram semelhantes às minhas,
divide seu livro em duas partes: uma, em que retoma a história da China, seus aspectos
culturais e políticos; e a outra, em que apresenta a comunidade chinesa em Curitiba com
base em entrevistas realizadas com imigrantes chineses.
A outra referência sobre a temática da imigração chinesa para Curitiba é a
pesquisa do antropólogo e professor Lorenzo Macagno (2012), da Universidade Federal
do Paraná. Sua pesquisa está focada nos sino-moçambicanos, ou chineses da "Beira",
cidade em Moçambique que, à época colônia portuguesa, recebeu imigrantes chineses a
partir do final do século XIX, durante o período do comércio de coolies. Ali
constituíram uma comunidade expressiva que durou até a guerra pela independência de
Moçambique, entre o final de 1960 e 1975.
Em São Paulo, que abriga o maior contingente de imigrantes chineses no
Brasil, a única obra de maior profundidade a abordar o tema é a tese de doutorado em
Antropologia de Daniel Veras (2008), em que o autor apresenta a questão da diáspora
chinesa pelo mundo, os intercâmbios culturais, políticos, econômicos e populacionais
entre Brasil e China (e também Ocidente e Oriente), o estabelecimento de comunidades
e as transformações das identidades dos sino-brasileiros no estado de São Paulo.
Na cidade do Rio de Janeiro, apenas alguns artigos foram encontrados: o de
Shu Chang-Sheng (2009), que retoma de forma breve a história da imigração chinesa
para o Brasil, com foco no Rio de Janeiro; e o artigo de Marcelo Araujo (2010), que
com base em pesquisa etnográfica entre chineses evangélicos problematiza as noções de
66TEIXEIRA, Jose Roberto Leite.A China no Brasil: influências, marcas, ecos e sobrevivência
chineses na sociedade e na arte brasileiras. Tese (Doutorado em Artes). Campinas, Unicamp,1995. 67
PROCÓPIO, Argemiro. O Capitalismo Amarelo: Relações Internacionais da China. Curitiba, Ed.
Juruá, 2012.
65
território, nação e identidade, que não podem ser consideradas como categorias puras e
estanques, mas sim a partir da circulação e constante atualização dos seus significados.
Marcos Araujo Silva (2008) realizou pesquisa antropológica entre os chineses
de três cidades em Pernambuco visando a análise dos processos de construção de
identidade étnica transnacional desse grupo. Além disso, problematiza, como a obra de
Araujo (2010) no Rio de Janeiro, noções identitárias fixas postas em termos "puros" ou
"tradicionais", relativizando o que seria "ser" chinês fora da China na
contemporaneidade.
Por fim, a produção acadêmica da antropóloga Rosana Pinheiro-Machado
(2006; 2007; 2009)68
merece especial destaque por sua continuidade temporal, fruto de
mais de dez anos de pesquisa, e qualidade, tendo sua tese de doutorado ganho os
principais prêmios acadêmicos do Brasil.
Em sua tese de doutorado, a autora realizou uma pesquisa etnográfica
multissituada em Ciudad del Este, Paraguai, e na província da Cantão, China, tendo
como objeto de estudo a cadeia formal e informal de produção e circulação de bens
entre os dois países acima citados e o Brasil. Junto a isso, analisa as relações sociais
entre os imigrantes chineses e a comunidade que os recebeu.
Além da tese, aborda questões referentes à ética confucionista, que incentiva o
trabalho, a poupança e a harmonia, e suas aproximações com o sistema capitalista,
tendo como referência e contraponto a obra de Max Weber sobre “A Ética Protestante e
o Espírito do Capitalismo”. Analisa o paradoxo existente entre o intenso consumismo
das novas gerações na China e a poupança e trabalho árduo dos chineses de ultramar,
características que os constituem enquanto grupos imigrantes.
68 PINHEIRO-MACHADO, Rosana. “A Ética Confucionista eo Espírito do Capitalismo”:Narrativas
Sobre Moral, Harmonia e Poupançana Condenação do Consumo Conspícuo Entre Chineses Ultramar".
IN: Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 13, n. 28, p. 145-174, jul./dez. 2007.
66
4.2 - TRABALHO DE CAMPO - NOTAS INTRODUTÓRIAS
Por não possuir contatos e nem informantes chineses, optei por iniciar a
pesquisa percorrendo as ruas do centro da cidade e adentrando estabelecimentos
comerciais cujos trabalhadores aparentemente eram de origem chinesa. Dessa forma,
buscava iniciar o diálogo explicando que era estudante e que desenvolvia um estudo
sobre pessoas que mudaram de país em busca de uma nova vida.
Destarte, as dificuldades de comunicação e a urgência do trabalho faziam com
que mais da metade dos chineses abordados se negasse a estabelecer uma conversa.
Embora eu acredite que haja outras razões para tais negativas, como a desconfiança
frente a um desconhecido inquirindo-lhes sobre suas vidas (como me afirmou o dono de
uma lanchonete, ao não querer conversar: "isso diz respeito a minha vida particular"),
eram esses os principais motivos alegados por eles.
Muitos, ao contrário, foram extremamente receptivos, conversando comigo por
algum tempo, ainda que estivessem trabalhando, e me contando suas histórias de vida.
Um ou outro, inclusive, me ofereceu café e água (e também sopa de maçã, que como
disse Ane, "tomamos nas refeições como vocês tomam água ou suco").
Entretanto, por estarem em ambiente de trabalho, diversas vezes a conversa era
interrompida, pois precisavam atender seus clientes e resolver outros assuntos. Mario,
por exemplo, que trabalha em um bar próximo à Praça Santos Andrade, em uma região
"underground" e frequentada por um público seleto, conversava comigo ao mesmo
tempo em que atendia muitas pessoas ao longo do balcão do bar, o que complicava o
desenvolvimento e a compreensão do diálogo.
Em um segundo momento, dadas as dificuldades relatadas, elaborei um
questionário e uma carta de apresentação, contratando uma tradutora para traduzi-la
para o mandarim, o que acreditava tornar o processo de apresentação mais fácil. De
fato, ao apresentar tal carta conseguia perceber que meus interlocutores demonstravam
certa simpatia, o que não significa que se dispunham a conversar e muito menos a
responder o questionário, alegando os mesmos motivos de antes.
67
Responder o questionário enfrentava grande resistência por parte de meus
interlocutores, pois, embora alguns se dispusessem a conversar, quando lhes perguntava
se aceitariam responder um questionário ou se eu podia anotar as respostas, mostravam-
se receosos.
Acredito que esse receio esteja relacionado a uma desconfiança natural em
situações como essa (passei por isso ao trabalhar com pesquisas de intenção de voto),
acrescida à minha pequena inserção em campo e ao estranhamento frente a um
desconhecido ansioso por saber sobre suas histórias de vida.
Dessa forma, optei por abandonar a utilização do questionário, pois havia
conseguido apenas quatro respostas, uma pessoalmente e três pela internet, com jovens
indicados por amigos. A falta de tempo para continuar em busca de pessoas dispostas a
respondê-lo e a baixa representatividade que obteria também pesaram nessa decisão.
Além dos chineses contatados pelos métodos acima descritos, tive a
oportunidade de conversar com alguns jovens estudantes de português do Centro de
Línguas da Universidade Federal do Paraná - CELIN/UFPR, mas que não foram
inseridos no quadro abaixo, que foi elaborado a partir das conversas informais
realizadas durante o presente ano.
68
QUADRO 12 - CONVERSAS REALIZADAS
Nome Naturalidade Idade Ocupação Antes de
Migrar Ocupação Atual
Quando
Imigrou
Yuri Moçambique 50
(aprox.) -
Comerciante -
Distribuidora de Doces
1980
(aprox.)
Wilson
(Pais) Brasil (Taiwan)
22
( - ) Pai - Costureiro
Estudante Química
(Pastelaria)
1970
(aprox.)
Camila Taiwan 30 Estudante Comerciante -
Restaurante 1997
Marcos China (Cantão) 34 Estudante Assalariado -
Restaurante 2005
Ana China 40
(aprox.) Costureira
Comerciante -
Restaurante 1996
Jean China (Cantão) 33 Estudante Comerciante -
Restaurante 1995
Mario China (Cantão) 45 Operário, Agricultor,
Eletricista, Gari
Comerciante - Bar
(Família) 1992
Maria China (Cantão) 40
(aprox.) Operária
Comerciante -
Pastelaria 1993
Luiz China 53 - Comerciante -
Pastelaria 1963
Karina China (Cantão) 38 Estudante Comerciante -
Restaurante 1993
Alex China (Cantão) - - Comerciante -
Lanchonete 1979
Talita China (Cantão) - Vendedora Comerciante -
Lanchonete 1997
Ane China (Cantão) 34 Enfermeira / Médica Comerciante -
Restaurante
Após
2008
Hu China (Cantão) 19 Criança Estudante -
Administração 1999
Yanna China
(Zhejiang) 50 -
Comerciante -
Restaurante 1993
Zhong China (Cantão) 51 - Comerciante –
Restaurante 1993
FONTE: O autor
4.3 - RESULTADOS
Conforme dito na introdução deste trabalho, as questões que deram origem e
que permeiam este estudo são: como explicar a recente imigração chinesa para o Brasil
e mais especificamente para Curitiba? É um grupo com perfil social homogêneo ou
compreende histórias díspares e sem conexões? Quem e quantos são? Quais seus ofícios
69
e onde se estabelecem? Como viviam na China e como estão vivendo hoje? São as
relações com os brasileiros boas ou permeadas por pré-conceitos? Abaixo pretendo
esboçar algumas respostas a partir das conversas realizadas durante meu trabalho de
campo.
É extremamente difícil saber quanto chineses vivem atualmente em Curitiba.
SHOJI (2004)69
fala em 5000 famílias, chegadas principalmente a partir de 1998. Além
dos chineses, em sua maioria cantoneses, há também os chineses da Beira, sino-
moçambicanos, estimados em 100 famílias e 1000 indivíduos (MACAGNO, 2012).
O Consulado Geral da China no Rio de Janeiro estima em três mil (CHANG-
SHENG, 2009); Rubens Fontoura, desembargador e autor do único livro sobre os
chineses em Curitiba, e Chang Yuan Chiang, professor de línguas em Curitiba, estimam
em 2000 pessoas (FONTOURA, 2012, p. 256).
4.3.1 - Origens e anos de imigração
Assim como já exposto em capítulos anteriores, as regiões costeiras do sul e
sudeste da China, principalmente Cantão e Fujian, são os principais locais de origem
dos chineses que emigraram pelo mundo. Esse fato pode também ser constatado no caso
de Curitiba, em que a maior parte dos chineses contatados é de origem cantonesa.
Além disso, apenas uma pessoa vindo de Taiwan, uma de Moçambique e uma
de Zhejiang, região também costeira, ao leste da China. Junto a isso, a importância de
redes já estabelecidas e a presença de amigos e familiares facilita e incentiva o fluxo
migratório.
Dez dos dezesseis contatados imigraram para Curitiba durante a década de
1990, apenas quatro antes disso e dois após os anos 2000. Dos que imigraram antes, um
o fez quando era proibido deixar a China (nas primeiras décadas do regime comunistas)
e os outros três logo no início da abertura política do país, no final dos anos 1970.
69 SHOJI, R. Reinterpretação do Budismo Chinês e Coreano no Brasil. Disponível em: <
http://www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_shoji.pdf >. Acesso em: 04/03/2013.
70
4.3.2 - Fatores de expulsão
Ciente da controvérsia acerca dos fatores de expulsão e atração, na qual muitas
vezes tende-se a considerar apenas um deles na análise dos fenômenos migratórios,
tentarei estabelecer abaixo quais foram os principais fatores apontados pelos
entrevistados, tanto do lado do país que expulsa, como do que recebe. Vale lembrar que
KLEIN (2000) considera as condições econômicas como o mais importante fator de
expulsão, o que se verifica parcialmente nos casos analisados aqui.
Os principais fatores de expulsão foram a busca por melhores condições de
vida e trabalho, o que foi mencionado por sete pessoas, e a existência de parentes no
Brasil, mencionado por outras sete. Nesse caso, vieram para ajudar os avós, como é o
caso de Mario e Alex, ou para acompanhar o marido, como Ana e Ane. Alguns ainda
vieram quando crianças, não tendo a opção da escolha e não sabendo elencar os motivos
que trouxeram os pais.
A existência de parentes no Brasil poderia ser enquadrada como fator de
atração, e não expulsão, conforme apontado pelos entrevistados ao serem indagados
sobre o principal motivo que os levou a sair do seu país natal. Entretanto, a importância
que a família tem dentro da cultura chinesa, centralidade oriunda das crenças
confucionistas, faz com que o chamado de um parente que passa por dificuldades seja
motivo suficiente para atravessar o mundo e ajudá-lo.
A utilização do mecanismo de redes com uma complexa dinâmica interna
aciona, com uma eficiência impressionante, estratégias empreendedoras que
se adaptam ao capitalismo ocidental utilizando-se, por vezes, de uma filosofia
genuinamente oriental, o confucionismo: a da edificação do comércio à
semelhança da edificação de uma família. Há um adágio que diz “Quem
quiser fundar uma empresa que funde primeiro uma família”, pois a família
(jiajing) é a base de todo edifício. (ARAUJO, 2010, p. 223).
No caso moçambicano pode-se dizer que os fatores de expulsão foram mais
importantes que os de atração, sendo que, conforme demonstra MACAGNO (2012), a
71
comunidade chinesa em Moçambique encaminhava-se para uma incorporação, pelo
menos nos discurso oficial.
Yuri, proprietário de uma distribuidora de doces no centro de Curitiba, apontou
a Guerra de Independência como principal fator de expulsão de Moçambique, além do
fato de seus pais já morarem aqui e estarem velhos para trabalhar. Voltarei à questão
dos sino-moçambicanos nas páginas seguintes.
4.3.3 - Fatores de atração
Como principal fator de atração, quando questionados sobre o porquê de terem
escolhido o Brasil, a principal razão enunciada foi já terem parentes aqui, sendo que
estes vieram em busca de melhores condições de vida. Entretanto, devido à dificuldade
em ter acesso aos homens da primeira geração migrante, que em geral são aqueles a
imigrar antes e que, após juntar algum dinheiro e estabelecerem-se melhor, trazem suas
famílias, não posso afirmar que a busca por melhores condições de vida seja de fato um
motivo válido para eles ou se está apenas no discurso dos imigrantes mais recentes.
O fato de já existirem redes estabelecidas de migração facilita os movimentos
entre os dois países, pois as comunidades nos lugares de recepção fornecem suporte e
auxílios aos recém-chegados, conforme citado por alguns interlocutores. Muitos
enunciaram o fato de não terem tido escolhas: as esposas, porque os maridos vieram
antes e depois as buscaram; outros porque migraram ainda jovens, com os pais, como é
o caso de Camila, Luiz, Marcos, Jean, Karina e Ana.
Além disso, quando indaguei a alguns o porquê da escolha por Curitiba,
classificaram a cidade como tranquila, com baixo custo de vida, segura e "boa para criar
os filhos", ao contrário de São Paulo e Rio de Janeiro. Acredito que a exaustão
demográfica destas últimas metrópoles, que concentram a maior parte da população
chinesa no Brasil, além da ampla concorrência nos negócios, tenha contribuído na vinda
para Curitiba.
Cabe ressaltar a facilidade de comunicação e a maior abertura dos chineses
mais jovens, alguns nascidos no Brasil, que propiciaram conversas e informações
72
valiosas para a elaboração dessa monografia. Wilson, 22 anos, que conheci na
lanchonete cuja família é dona, nasceu no Brasil e atualmente cursa faculdade de
Química. Disse-me que seus pais vieram de Taiwan há aproximadamente 40 anos e não
sabem falar português muito bem, além de não gostarem de falar sobre o passado.
Uma amiga me passou o contato de Hu (19), estudante de Administração,
nascido na cidade de Kaiping (Cantão), e que veio para Curitiba em 1998, então com
cinco anos, junto à sua mãe e irmã. O pai já estava aqui e, com ajuda de familiares,
juntou dinheiro para pagar a passagem para o resto da família. Apontou como motivo de
saída da China a dificuldade financeira de se viver, tanto antes como agora, pois embora
o país esteja em expansão econômica, as condições de trabalho e remuneração são
deploráveis.
4.3.4 - Educação
A educação é encarada pelos chineses como forma de ascender socialmente,
"subir de vida", o que justifica os onerosos investimentos na educação dos filhos,
conforme aponta Klein (2000, p. 27). A esperança de que as próximas gerações possam
"trabalhar com o que quiserem e não com o que dá" foi enunciada por uma das
entrevistadas. Tal concepção sobre a educação também é apontada por Rosana Pinheiro-
Machado ao pesquisar a comunidade chinesa de Ciudad del Este/Foz do Iguaçu:
Os imigrantes não utilizam qualquer atividade de lazer, abdicam de todas os
prazeres lúdicos em nome de um futuro melhor para seus filhos (que, em
geral, acreditam que vem através da educação). Tudo o que se ganha, através
de uma jornada de trabalho extremamente longa e árdua, poupa-se pensando
no tempo futuro. A lógica é prescritiva. A crença operante é que o único
caminho para construir algo é o do “dia após dia”. (PINHEIRO-MACHADO,
2006, p.20)
Pude constatar tal tendência a investir na educação por meio de um fato
interessante advindo do trabalho de campo: todos os entrevistados, sem exceção,
mantêm seus filhos em escolas particulares, sendo que todas as crianças e jovens na
73
idade do ensino fundamental e médio frequentam o Colégio Bom Jesus, de renome na
capital paranaense.
4.3.5 - Localização geográfica e atuação profissional
O centro da cidade de Curitiba concentra a grande maioria dos chineses aqui
residentes, o que é um fato comum entre as comunidades chinesas pelo mundo, embora
não existam no Brasil as famosas Chinatowns, "modelo clássico de ocupação urbana da
imigração chinesa" (ARAUJO, 2010, p. 230).
No caso de São Paulo talvez não seja válida tal afirmação, por ser uma
metrópole e possuir diversos "centros", embora haja uma maior concentração no bairro
da Liberdade, tradicional reduto de japoneses e atualmente também de chineses
(VERAS, 2008). No Rio de Janeiro também não há tal concentração em "espaços
étnicos territorialmente localizados" (ARAUJO, 2010, p.230), embora muitos se
encontrem na região do comércio popular do SAARA.
Elaborei um mapa com alguns estabelecimentos comercias de chineses na
região central de Curitiba, embora não tenha sido possível um mapeamento mais
completo.
74
FIGURA 3 - COMÉRCIOS NA REGIÃO CENTRAL DE CURITIBA
FONTE: O autor; adaptado de google maps.
A maioria dos chineses que encontrei pelo centro da cidade (talvez mais de
90%) estava trabalhando em comércios de alimentos, que inclui pastelarias,
lanchonetes, bares, restaurantes, distribuidoras de comidas, de doces e empórios. Além
disso, me deparei com lojas de roupas, artigos eletrônicos, e ouvi dizer que há um hotel
cujos donos são chineses.
A escolha pelo comércio de alimentos se dá pela falta de conhecimento e
capacitação para o trabalho em outras áreas, pela pouca necessidade de comunicação,
pela rapidez de retorno financeiro e pelo fato de que a demanda é constante, uma vez
que "todos precisam comer". Alguns alegaram já ter trabalhado em outros ramos, como
comércio de bijuterias e de roupas, mas a maioria está no ramo de alimentação desde
que chegou ao Brasil.
75
Ponto comum na conversa com todos foi a questão do trabalho, principal e
talvez única atividade da qual muitos se ocupam. Diziam-se muito atarefados e essa
questão foi utilizada várias vezes como motivo para interromper a conversa ou sequer
iniciá-la.
Em alguns casos percebia que de fato era inviável estabelecermos um diálogo
em meio aos seus ambientes de trabalho, pois o movimento era constante e requeria
bastante atenção. Em outros, entretanto, creio que tenha sido uma simples desculpa para
não conversar, pois o movimento era pequeno e se encontravam sentados à espera de
clientes.
Acredito que existe certa hierarquia entre os estabelecimentos comerciais do
ramo de alimentação. Na base estariam as pastelarias, lanchonetes e bares, seguidos
pelos restaurantes e distribuidoras de doces. Aqueles que possuem pastelarias são os que
mais trabalham, em jornadas diárias de quase 14 horas, em geral, das 6h da manhã até
22h, sem contar o tempo dedicado à limpeza e à realização de compras, o que faz com
que não sobre tempo para fazer outras coisas.
Já os que possuem restaurantes, embora também trabalhem todos os dias,
costumam servir apenas almoço, o que diminui o tempo dedicado ao trabalho. Karina,
proprietária de um restaurante há 10 anos, afirmou já ter trabalhado em pastelaria
própria e de outros, mas a rotina era muito exaustiva e agora consegue trabalhar menos.
Para Maria, os brasileiros têm mais possibilidades de emprego e de mudar de
vida, enquanto que para os chineses só resta trabalhar arduamente, por falta de
qualificação e por causa da barreira da língua. Ela e o marido são donos de uma
pastelaria há nove anos e trabalham todos os dias das 6h da manhã até às 21h, mas ela é
a principal responsável pelo negócio, uma vez que o marido veio para o Brasil há cinco
anos e não sabe falar português.
É possível distinguir três nichos básicos de atuação profissional destes
imigrantes no Rio de Janeiro: as lojas de artigos para festas (as populares
lojas de 1,99), as pastelarias e os vendedores ambulantes de pequenas – e, em
geral, falsificadas – mercadorias, tais como relógios de pulso, bijuterias etc.
Dentre estas, as duas primeiras são as numericamente mais expressivas.
Considerando o grupo mais proporcionalmente numeroso, Cantão
(Guangdong), região litorânea chinesa, é a província de onde se origina a
maioria dos profissionais de pastelaria. Taiwaneses e imigrantes das demais
76
procedências, estas em número reduzido, atuam em outras modalidades
comerciais. Todos estes partilham, de forma combinada ou não, três aspectos
esclarecedores de sua fixação no Brasil: as razões e oportunidades
econômicas, a prática religiosa em específicos espaços de culto e a existência
de redes sociais baseadas em solidariedade étnica, que fornecem suporte aos
recém-chegados. (ARAÚJO, 2010, p. 230)
Talita, que trabalha no bar/lanchonete dos pais, no centro histórico de Curitiba,
relatou dificuldades em manter os negócios devido ao aumento do custo de vida no
Brasil, dos preços de alimentos, aluguel e bebidas, o que fez com que ela tenha parado
de servir almoço e encontre dificuldades em repassar os aumentos ao consumidor, dada
a grande concorrência na região. Foi comum em alguns relatos certa "reclamação" sobre
a falta de disposição para trabalhar dos brasileiros e sobre a dificuldade em arranjar
empregados.
Uma característica marcante percebida por mim, e também apontada em outros
estudos70
, é a confluência entre os âmbitos do trabalho, da família e do lar, que
costumam se concentrar no mesmo local. Em geral, os estabelecimentos comerciais são
gerenciados pelos membros da mesma família, que muitas vezes fazem do seu local de
trabalho o mesmo de residência. Evitam-se, assim, maiores gastos com aluguel e
deslocamento, por exemplo, ao mesmo tempo em que aumenta a dedicação ao trabalho.
4.3.6 - Língua
A maioria dos chineses ouvidos para essa pesquisa afirmaram que costumam
conversar com a família em chinês (mandarim ou cantonês, em geral). Karina diz
conversar com os filhos apenas em chinês, pois gostariam que eles aprendessem e
mantivessem a língua. Jean também conversa com os filhos em chinês, mas sem
mencionar as razões para isso.
70 Cf. VERAS (2008), PINHEIRO-MACHADO (2009), ARAUJO (2010).
77
Trata-se de uma postura de clausura vivenciada pelos informantes. O extremo
de tal condição pode ser ilustrado através do fato de que a grande maioria dos
imigrantes não domina as línguas locais, português e espanhol, mesmo depois
de 20 anos de imigração. Nem as professoras das escolas supracitadas sabem
falar espanhol. Elas são, em geral, mulheres dos comerciantes e não detêm
formação profissional na área de educação. Dão aula por considerarem que
alguém deve desempenhar esse papel na comunidade. Os imigrantes sabem,
entretanto, a linguagem do comércio, que os possibilita falar com seus
empregados paraguaios e clientes brasileiros. (PINHEIRO-MACHADO,
2006, p.15)
Lucia Lippi (2002)71
aborda a questão da língua ao analisar a imigração para o
Brasil. Segundo ela, o primeiro desafio enfrentado pelo imigrante, também identificado
como estrangeiro, é a barreira linguística, o que definirá o grau de adaptação e os
desafios na nova terra.
O bilinguismo ou a competição entre a língua de origem e a nova definem a
construção da identidade do imigrante como um novo brasileiro ou como um
estrangeiro que vive e trabalha na nova terra. A manutenção da língua
materna, as dificuldades de comunicação com a nova sociedade, os conflitos
linguísticos entre os mais velhos e a nova geração, entre pais e filhos,
marcam também o fenômeno da imigração. O desejo de ser bilíngue se
apresenta como meio de o imigrante se tornar brasileiro e ascender
socialmente. (OLIVEIRA, 2002. p. 12)
Wilson comentou que os pais, há 40 anos aqui, não sabem falar português.
Aliás, muitos demonstraram dificuldade na comunicação, tanto os entrevistados como
outros, que se utilizaram desse fato para não dialogar. Nesse ponto, realmente tenho
dúvidas quanto a veracidade de seu discurso, a meu ver utilizado como forma de
"proteção", para evitar o diálogo.
De qualquer forma, é fato que grande parte dos chineses aqui em Curitiba
encontra dificuldades na comunicação em português, ainda que vivam aqui há 20 anos
ou mais. Se na língua falada já apresentam restrições, alguns disseram ter maior
dificuldade na língua escrita, seja para ler ou escrever, o que acredito aplicável a todos
aqueles que não frequentaram escolas ou cursos de português, ou seja, a maioria dos
imigrantes adultos.
71 OLIVEIRA, Lúcia L. O Brasil dos Imigrantes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editores, 2ª ed., 2002.
78
Além da língua, apontada por vários como uma das principais dificuldades
encontradas ao mudar-se para o Brasil, a diferença entre os costumes também foi
mencionada como um grande choque nessa transição entre os dois países,
principalmente os costumes alimentares.
Karina relatou que foi muito difícil a adaptação de sua família ao Brasil: seu
pai veio antes, pois os avós já estavam aqui, e depois voltou para buscar a família.
Estabeleceram-se primeiramente na cidade de Santos (SP), mas não gostaram do lugar e
após um ano mudaram-se para Curitiba. Lembra-se que, no começo, sua mãe chorava
bastante, pois queria voltar para a sua terra natal.
4.3.7 - Desejo de retornar à China
Quando indagados se desejam voltar para a China, Luiz foi o único a afirmar
que sim, mas que só não volta por falta de dinheiro. Disse que hoje em dia é muito
melhor lá do que aqui, mas antes, quando o comunismo era mais rígido, era pior.
Wilson afirmou que, ao contrário dele, seus pais desejam voltar, mas não o fazem
porque tem que pagar seus estudos aqui. Talita também gostaria de voltar para a China,
pois tem um filho de nove anos que vive lá.
A resposta mais comum para essa questão foi que, embora tivessem saudades,
não pretendiam voltar nesse momento, pois haviam construído uma vida aqui, tinham
empregos e família, e que lá teriam que começar tudo do zero, embora muitos
costumem visitar frequentemente a China, o que ficou mais fácil com o barateamento
das passagens aéreas, segundo Alex.
A disseminação do acesso à internet facilitou o contato entre os chineses no
Brasil e seus parentes e amigos em sua terra natal, conforme relatado em algumas
conversas. Ana, que há 15 anos era dona de um restaurante, recentemente fechado, disse
que quando as cartas eram o principal meio de comunicação, conversar com os parentes
e amigos na China era um processo lento, pois as cartas demoravam até três meses para
chegar, mas agora, com o advento da internet, é tudo mais rápido e barato.
79
O mais surpreendente nesse tema foi a afirmação, de pelo menos seis
entrevistados, de que a situação da China está mudando muito rapidamente e para
melhor, sendo que muitos afirmaram ter melhor remuneração lá do que aqui, que há
vários chineses voltando para lá e também brasileiros indo em busca de oportunidades.
Camila disse haver muitos impostos no Brasil e Mario que falta mão-de-obra tanto lá
quanto aqui.
Hu afirmou que o fluxo migratório de chineses para o Brasil diminuiu
consideravelmente, pois várias famílias chinesas ricas, aqui no Brasil, não conseguem
mais atrair chineses, embora ofereçam casa, salário, comida, trabalho e uma condição de
vida melhor do que teriam lá.
4.4 - SINO-MOÇAMBICANOS
Em um artigo intitulado "Os chineses da Beira, Moçambique. Itinerários de
uma dispersão", MACAGNO (2012)72
analisa a imigração chinesa para Moçambique,
no final do século XIX, e sua posterior dispersão pelo mundo devido à guerra de
independência de Moçambique. Os principais destinos foram Macau, Taiwan e Curitiba.
Chegam à África no período de transição da mão-de-obra escrava para a
assalariada, na qualidade de coolies, e estabelecem uma comunidade na cidade de Beira,
Moçambique, então colônia portuguesa. Ocupam-se, no começo, com pesca,
horticultura e carpintaria, além de trabalharem nas filias das companhias britânicas de
comércio marítimo. Com o tempo, passam a ocupar cargos na administração colonial e
surgem comerciantes e empresários. (MACAGNO, 2012, p.2)
Na metade do século XX, em um contexto em que Portugal adota um discurso
de multirracialidade e simpatia para com os habitantes de suas colônias, previa-se a
incorporação desses chineses à comunidade lusa. Além disso, os principais jornais da
72 MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma dispersão. In:
Andréa Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento, Brasília, 2012.
80
Beira aumentavam a atenção aos sino-moçambicanos, por meio de um discurso
adulatório aos “bons portugueses”. (MACAGNO, 2012, p.6)
Entretanto, durante a guerra pela independência de Moçambique, travada entre
a Frente de Libertação de Moçambique - FRELIMO e o exército português, muitos
chineses são convocados para lutar pelo exército português. Após a vitória do exército
revolucionário e a consequente independência do país, os chineses da Beira passam a
sofrer perseguições e hostilidades, vistos como cúmplices do regime, e iniciam sua
diáspora pelo mundo, tendo como principal destino a cidade de Curitiba, Brasil. O
receio da implantação de um regime comunista em Moçambique também influenciou
nessa diáspora, pois muito haviam ido para este país fugindo do regime de Mao
(MACAGNO, 2012).
"Com a independência de Moçambique, o tênue fio da simpatia – aquele que
fazia dos chineses “bons portugueses” – é quebrado. As circunstâncias
políticas mudam. No Portugal da Revolução dos Cravos, a figura dos
retornados, incluindo a dos “sino-moçambicanos”, passa a se tornar
incômoda. Em troca, o Brasil, governado naquela altura por Ernesto Geisel –
e no contexto das políticas de recepção para os retornados da África
portuguesa – permite-lhes o acesso aos vistos de estadia e autorizações de
trabalho." (MACAGNO, 2012. p. 17)
A partir disso, podemos tomar a história de vida de Yuri como exemplo desse
fluxo migratório, percebendo como a macro e micro história se entrelaçam. Aliadas às
forças históricas (fatos) estão os aspectos subjetivos (indivíduos), que se co-constituem.
Yuri, nascido em Moçambique73
, muda-se para Macau durante a guerra de
independência, vindo para o Brasil algum tempo depois, no começo dos anos 1980.
Teve pastelaria e restaurante, e há 15 anos tem uma distribuidora de doces na Praça
Santos Andrade.
Em seu discurso, alguns pontos merecem destaque: fica evidente a sua empatia
para com negros que, segundo ele, não gostam de brancos e são "muito selvagens".
Além disso, acha os chineses "fechados, sem muita simpatia,"o que me leva a crer que
73 Não sei se ele nasceu na cidade da Beira, pois só fui descobrir a história dos sino-moçambicanos em
pesquisa posterior à entrevista.
81
ele não se identifica enquanto chinês, mas seria precipitado afirmar que ele se considere
"branco", embora seu discurso aponte para isso.
4.5 - TRAJETÓRIAS DA IMIGRAÇÃO
O termo assimilação passou por diversas acepções ao longo de sua utilização
no âmbito da Sociologia da Imigração, conforme aponta TRUZZI (2012).74
Cunhado
inicialmente nos Estados Unidos, anos 20, pelos integrantes da Escola de Chicago,
entendia-se que os imigrantes se "aculturavam", perdiam sua identidade étnica em favor
de uma americana, sendo incorporados ao mainstream. Nos anos 50 e 60, esse processo
era visto não apenas como inevitável, mas desejável. Sob a acusação de etnocêntrico e
anglo-conformista, esse modelo é criticado nos anos 70 pelos pluralistas e "assimilação"
passa a ser entendida como um processo mais complexo, multidirecional, que não
implica o desaparecimento de características étnicas, mas sim sua manutenção e
transformação, focando-se mais no processo, que deve ser analisado em suas
especificidades.
O conceito de assimilação passa por nova acepção com o trabalho de Alba e
Nee (2003), que difere das acepções assimilacionistas clássicas e das pluralistas,
aproximando este conceito à "etnicidade", ou seja, concomitante ao processo em que se
constrói uma identidade pautada por características étnicas e pelas da sociedade
acolhedora, há também o processo de eliminação das fronteiras e distinções entre os
diferentes grupos que compõe a sociedade.
"o declínio de uma distinção étnica e de suas diferenças culturais e sociais
resultantes. Declínio significa nesse contexto que tais distinções se tornam
menos relevantes, que as ocorrências para as quais elas são significativas
diminuem em número, e que, portanto, elas produzem efeitos sobre domínios
cada vez mais restritos da vida social. As origens étnicas dos indivíduos
tornam-se cada vez menos relevantes em relação a membros de outro grupo
étnico (tipicamente, mas não necessariamente, o grupo étnico majoritário), e
que indivíduos de ambos os lados da fronteira se vêem como cada vez mais
74 TRUZZI, Oswaldo. Assimilação Ressignificada: Novas Interpretações de um Velho Conceito. Dados,
vol. 55, n. 2, pp. 517-553
82
parecidos, assumindo-se como similares em termos de algum outro fator
crítico, como a classe social;" (ALBA e NEE, apud. TRUZZI, 2012)
A partir desse conceito, ao analisar o caso da imigração chinesa posso perceber
que ainda são grandes as barreiras e distinções entre a comunidade chinesa e a
curitibana, embora não tenha entrado especificamente nesse tema e sequer tenha
abordado a questão de um possível preconceito, com exceção da conversa com Wilson,
brasileiro, que afirmou que "não temos nenhum tipo de preconceito" ao ser indagado
sobre a relação com os outros brasileiros.
Em algumas falas era perceptível o isolamento dos chineses em torno da
família e da comunidade étnica, ainda que muitos afirmassem frequentar ocasiões
sociais esporadicamente, na ocasião de festas familiares ou comemorações tradicionais.
Karina, por exemplo, afirmou ter mais de 100 parentes em Curitiba e que costumam se
reunir em festas. Maria e Marcos, ao contrário, disseram que são raros os momentos de
lazer fora do âmbito familiar mais próximo, pois o trabalho demanda muito tempo e
energia.
Arrisco-me a afirmar, pautado nas falas de Maria, por exemplo, que disse ser
muito difícil para eles conseguir um emprego em outro lugar, e de Mario, que apontou a
educação como possibilidade de ascender socialmente e que deposita em seus filhos
essa esperança, que a assimilação, nos termos de Alba e Nee, ainda é incipiente no caso
dos chineses em Curitiba.
Além disso, a maior parte da imigração chinesa em Curitiba é muito recente, a
maioria tendo chegado a partir dos anos 1990, o que faz com que a adaptação ainda
esteja em curso e os entraves linguísticos continuem presentes. Entretanto, concordo
com Hu quando ele diz que "[provavelmente] a segunda geração em diante de chineses
aqui no Brasil (no caso a minha e demais), seguirão os mesmos passos que as colônias
japonesas: largam os negócios dos pais, seguem carreira acadêmica (i.e. se formam em
alguma universidade publica) pra entrar num mercado de trabalho de advogado, médico,
engenheiro, enfim..."
83
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As diásporas chinesas pelo mundo já duram dois mil anos. Primeiramente
restritas ao sudeste asiático, chegam às Américas, África e Europa a partir do século
XVIII, sob a forma do comércio de coolies, trabalhadores considerados mercadorias e
destinados ao trabalho árduo, seja na agricultura, seja em minerações e construções de
ferrovias.
Segundo GUNGWU (1991, apud LEW & WONG, 2002), a diáspora chinesa
pode ser dividida em quatro períodos: o primeiro, entre século III a.C. e XVI d.C., é
caracterizado pelo Huashang (chinês comerciante); o segundo período, Huagong (chinês
coolie), vai de 1840 até 1920;o terceiro é caracterizado pelos migrantes Huaqiao (chinês
de estadia temporária) e dura de 1911 a 1949; enfim, do final dos anos 1970 aos dias de
hoje, a diáspora assume uma forma moderna de migrantes Huashang (comerciantes) e
Huagong (trabalhadores), além dos Huayi (descendentes), que reemigram para outros
países.
Para dar conta da grande quantidade de chineses pelo mundo é criado o termo
chineses overseas, usado para designar aqueles chineses que, mesmo no exterior, nunca
deixam de carregar sua identidade cultural e étnica. As estimativas sobre o número de
chineses no exterior diferem bastante, indo de trinta a setenta milhões de pessoas. Neste
trabalho, adotei os dados do Overseas Community Affairs Council (OCAC), da
República da China (Taiwan), que fala em aproximadamente 41,4 milhões de chineses
espalhados pelo mundo no ano de 2012.
No Brasil, a imigração chinesa como alternativa à mão-de-obra escrava
suscitou uma série de debates durante a segunda metade do século XIX acerca da
construção da identidade nacional e do futuro do país. Tais debates contribuíram para
retirar do dualismo brancos/negros a questão da identidade nacional e preparar o terreno
para o período das grandes imigrações.
Ainda que a imigração chinesa tenha sido incipiente durante o século XIX, os
debates sobre ela fizeram com que se criassem parâmetros e projetos para o futuro do
Brasil e revelam mais sobre a formação da identidade nacional do que sobre os chineses
84
propriamente ditos. Conforme escreve Lesser (2001, p.47): "embora o tópico fosse a
mão-de-obra chinesa, o assunto era a identidade nacional."
É somente após a Revolução Comunista Chinesa, em 1949, que o fluxo de
chineses para o Brasil ganha força, fortalecendo-se nas duas últimas décadas do
segundo milênio. O principal destino desses imigrantes é São Paulo, que concentra
quase 90% da população chinesa no Brasil. Além de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e
Curitiba também possuem comunidades sino-brasileiras expressivas.
Sobre o número de chineses no Brasil, as estimativas são variadas, indo desde
100 mil até 280 mil. Além disso, os métodos de mensuração dos estoques de migrantes
e dos fluxos migratórios carecem de precisão e as fontes oficiais consultadas apresentam
dados desencontrados, sendo que o IBGE fala em 20 mil chineses e a Polícia Federal
em 40 mil.
Em Curitiba, acredito que a população chinesa seja entre três e cinco mil
pessoas, vinda principalmente a partir do ano de 1980, em busca por melhores
condições de vida e trabalho. Além disso, a existência de parentes e redes já
estabelecidas é um fator importante nesse movimento migratório.
Nessa cidade, a origem mais comum dos imigrantes é a região sul da China,
principalmente a província do Cantão, havendo também chineses oriundos de Taiwan e
outras regiões costeiras. Especial destaque àqueles chineses vindos de Moçambique, na
África, em decorrência da guerra pela independência do país.
A maior concentração demográfica dos chineses em Curitiba é no centro da
cidade, em que atuam majoritariamente em negócios ligados à alimentação, como
pastelarias, restaurantes e lanchonetes, pois é um ramo que exige pouca qualificação e
domínio da língua portuguesa e cujo retorno financeiro é imediato e permanente, uma
vez que "todos precisam comer".
É característica sua dedicação ao trabalho, que em pastelarias e lanchonetes
começa às 6h da manhã e vai até às 22h, todos os dias da semana. Já em restaurantes
exige-se menor jornada de trabalho, o que acredito estabelecer uma hierarquia entre os
estabelecimentos, estando pastelarias, lanchonetes e bares na base e restaurantes um
nível acima, sinal de ascensão profissional.
85
Chamam atenção seus investimentos na educação dos filhos, esperança de
ascensão social nas próximas gerações, "para trabalhar com o quiserem, e não com o
que dá". Optam por matricular os filhos especificamente em um colégio particular
renomado da cidade, além de alguns deles cursarem faculdades particulares.
O desejo pela manutenção da língua materna e da cultura chinesa também foi
um fato percebido nessa pesquisa, uma vez que muito interlocutores afirmaram
conversar com familiares apenas em mandarim, e às crianças é ensinado esta língua em
casa e o português na escola, o que a torna bilíngue.
A vontade e possibilidade de fazer uma pesquisa empírica (trabalho de campo)
durante minha monografia foi um fator importante na escolha do tema aqui apresentado.
Além disso, a falta de estudos na área das Ciências Sociais e a curiosidade
(compartilhada por muitos colegas) pela questão da imigração chinesa para Curitiba
também contribuíram para essa decisão.
Entretanto, reconheço diversas lacunas em minha pesquisa e a insuficiência do
trabalho de campo realizado, que careceu de maior dedicação e esforço, além de tempo.
Ainda assim, considero essa experiência de pesquisa fundamental em minha formação
acadêmica enquanto cientista social.
Espero que essa monografia possa contribuir para um maior entendimento do
fenômeno migratório China-Brasil e para uma melhor compreensão da comunidade
chinesa de Curitiba, além de reduzir distâncias étnicas e culturais, que fazem da China e
de seus representantes pouco e superficialmente conhecidos pelos brasileiros, ainda que
em muitos casos convivam cotidianamente nas grandes cidades.
Mais do que oferecer respostas, esse trabalho exige aprofundamentos e mostra
possibilidades de novos estudos, abrindo caminhos para maiores intercâmbios
acadêmicos e culturais entre Brasil e China, esferas que não têm acompanhado a
crescente interação econômica e política entre ambos os países.
86
REFERÊNCIAS
ALBA, R. & NEE, V. Remaking the American Mainstream. Assimilation and
Contemporary Immigration. Cambridge, Harvard University Press. 2003
ARAÚJO, Marcelo Silva. Chineses no Rio de Janeiro: notas sobre nação, território e
identidade através da prática comercial e religiosa. Cadernos do CEOM –
ETNICIDADES. Ano 23, nº 32, p. 221-240, jun. 2010. Disponível em:
<http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/issue/view/77/showToc>.
Acessoem: 22/10/2013
CARVALHO, João G. da S. Em terra de papagaio dragão não se cria: uma abordagem
psicosocial da relação entre brasileiros e chineses. IN: Contemporânea. N°. 2, p. 165 -
182, jul./dez. 2011.
CARTIER, Carolyn; MA, Laurence J.C. The Chinese Diaspora. Space, place,
mobility and identity. Lanham, MD: Rowman & Littlefield Publishers, 2003.
CHAN, Stephen. What is this thing called a Chinese diaspora? IN: Contemporary
Review. 274 (February): 81-83. 1999
CHAN, Kwok-bun. Migration, ethnic relations and chinese business. London:
Routledge, 2005.
CHANG-SHENG, Chu. Imigrantes e Imigração Chinesa no Rio de Janeiro (1910-
1990). Revista Eletrônica Boletim do TEMPO, Ano 4, Nº07, Rio de Janeiro, 2009
[ISSN 1981-3384]
CHEN, Miao S. Cultura e educação dos imigrantes chineses na cidade Cascavel:
dois mundo, um mesmo objetivo. Monografia, (Curso de Especialização em História
da Educação Brasileira). Cascavel, UNIOESTE, 2010.
CHIN, Ko-Lin. Smuggled Chinese: Clandestine Immigration to the United States.
Philadelphia: Temple University Press, 1999
CHINA. IN: Encyclopædia Britannica. Encyclopædia Britannica Online, 2013.
Disponível em: <http://www.britannica.com/EBchecked/topic/111803/China>. Acesso
em: 02/11/2013.
DA MATTA, Roberto. O ofício do etnólogo ou como ter anthropological blues. IN:
NUNES, Edson O. (org.) A aventura sociológica: objetividade, paixão, improviso e
método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
DING, Sheng. Sons of the Yellow Emperor Go Online: The State of the Chinese Digital
Diaspora. Global Migration and Transitional Politics Series, N. 13, George Mason
University, 2010. Disponível em:
<http://gmtp.gmu.edu/publications/gmtpwp/gmtp_wp_13.pdf>. Acesso em: 05/11/2013.
87
DISTRIBUITON OF CHINESE OVERSEAS POPULATION. IN: Dr. Shao You-Bao
Overseas Chinese Documetation and Research Center.Ohio University. Disponível
em: <http://www.library.ohiou.edu/hosted/shao/ch_databases_popdis.html>. Acesso em
06/11/2013.
DWYER, Tom. A China e o Brasil: mudanças e desafios para a Sociologia brasileira.
Conferência proferida durante o XV Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado em
Curitiba, 2011. Disponível em:
<http://www.gr.unicamp.br/ceav/content/pdf/pdf_seminario_china_tpdwyer.pdf>
Acesso em: 22/10/2013. Além disso, pode também ser encontrado em
<http://www.youtube.com/watch?v=uTphy-HKCV8>. Acesso em: 22/10/2013.
FAZITO, Dimitri. Situação da migrações internacionais no Brasil contemporâneo. IN:
Populações e políticas sociais no Brasil: os desafios da transição demográfica e das
migrações internacionais. Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2008. p.
150-172. Disponível em: <http://www.cgee.org.br/publicacoes/demografica.php>.
Acesso em 06/11/2013.
FONTOURA, Rubens Oliveira. Cultura e a longa marcha de chineses e chinesas até
Curitiba. Edição do autor, Curitiba, 2012
GERMANY: State Statistical Office. Manager Magazin, n. 42, 3/2012, p.
87.Disponível em: <http://www.statista.com/statistics/223451/countries-with-the-
largest-number-of-chinese-expatriates/>. Acesso em: 06/11/2013
GUNGWU, Wang. China and the Chinese Overseas. Singapore: Times Academic
Press. 1991
HALL, Michael M. (1976). Reformadores de classe média no império brasileiro: a
Sociedade Central de Imigração. IN: Revista de História, Ano XXVII, vol. LIII, nº105,
pp. 147-171.
HOOD, M. “Sourcing the problem: why Fuzhou?”, in Smith 1997: 76-92. 1997
______. “Fuzhou” and “Clandestine migration”, in Pan 1998: 33-35, 63 and 66-67.
IGC, 1998
HU-DeHART, Evelyn. El Caribe. Los culíes, los tenderos y sus descendientes. IN:
BANCO INTERAMERICANO DE DESARROLLO (2004). Cuando Oriente llegó a
America; Contribuiciones de inmigrantes chinos, japoneses e coreanos.
Washington, D.C.: Banco Interamericano de Desarrollo, 2004, p. 53-78
HUI, Juan Hung. Chinos en América. Bilbao: Editorial Mapfre, 1992.
HUI, Ong Jin. Chinese Industrial Labour: Coolies and Colonies. IN: COHEN, Robin
(ed.) (1995). The Cambridge Survey of World Migration.Cambridge: Cambridge
University Press, 1995, p. 51-56
HUTINGTON, Samuel P. O choque das civilizações e a recomposição da ordem
mundial. Tradução de M.H. Cortes. Rio de Janeiro: Objetiva. 1997
88
IBGE, Censo Demográfico 2010. Nupcialidade, Fecundidade e Migração: resultados
da amostra. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em:
<http://biblioteca.ibge.gov.br/d_detalhes.php?id=798>. Acesso em: 18/11/2013
IBGE. Directoria Geral de Estatística, [187?] -1930, Recenseamento do Brazil 1872-
1920; IBGE, Censo Demográfico 1940-2010. Até 1980, dados extraídos de Estatísticas
do Século XX, Rio de Janeiro, 2007 no Anuário Estatístico do Brasil 1995. Rio de
Janeiro: IBGE, v. 55, 1995. IBGE, Censo Demográfico 1972/1991. Disponível em:
<http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=CD105&t=mi
gracoes-estrangeirosnaturalizados-censos-demograficos>. Acesso em 01/11/2013
IOM (International Organization for Migration). World Migration Report 2010: The
future of migration: building capacities for change. 2010. Disponível
em:<http://publications.iom.int/bookstore/free/WMR_2010_ENGLISH.pdf>. Acesso
em: 02/11/2013.
JIANLI, Huang. Conceptualizing Chinese Migration and Chinese Overseas: The
Contribuition of Wang Gungwu. IN: Journal of Chinese Overseas. N°. 6, 2010, p. 1-
21. Disponível em:
<http://www.academia.edu/380322/_Conceptualizing_Chinese_Migration_and_Chinese
_Overseas_The_Contribution_of_Wang_Gungwu_Journal_of_Chinese_Overseas_6_1_
May_2010_1-21>. Acesso em: 06/11/2013
JORNAL BBC. "China sofre a pior fuga de cérebros do mundo, diz relatório" IN: BBC,
Brasil, 2007.
<www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/story/2007/02/070213_chinafugacerebrosfn.shtml
>. Acesso em 06/11/2013.
JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO. "Anistia da PF regularizou 9.229 imigrantes". IN:
Folha de São Paulo, São Paulo, 23 de julho de 2000. Disponível em:
<www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2307200009.htm>. Acesso em: 25/11/2013.
JYE, Chen T., SHYU, David J.S., BEZERRA DE MENEZES JR, Antonio J. Os
imigrantes chineses no Brasil e a sua língua. In: Synergies Brésil, n° 7, pp. 57-64, São
Paulo, 2009. Disponível em: http://ressources-cla.univ-
fcomte.fr/gerflint/Bresil7/chen.pdf. Acesso em: 07/11/2013
KLEIN, Herbert S. Migração Internacional na história das Américas. IN: FAUSTO, B.
(org.). Fazer a América. São Paulo. Edusp, p. 13-31
LESSER, Jeffrey. Asians in South America. IN: Encyclopedia of World Cultures.
Vol. 7, South America. Edited by Johannes Wilbert. New York: G.K. Hall/Macmillan,
1995. P. 58-61. Disponível em : <http://www.everyculture.com/South-America/Asians-
in-South-America.html>. Acesso em: 08/11/2013.
______. A negociação da identidade nacional – Imigrantes, minorias e a luta pela
etnicidade no Brasil. São Paulo, UNESP, 2001.
89
LEW, A.A. and WONG, A. Tourism and the Chinese Diaspora.In: C.M. Hall & A.M.
Williams (orgs.). Tourism and Migration: New Relationships Between Production
and Consumption. Kluwer Academic, Dordrecht, The Netherlands, 2002, (no prelo).
Disponível em: <http://www.geog.nau.edu/publications/Lew_Wong-Chinese-
Diaspora.pdf>. Acesso em: 28/10/2013
LIMA, Silvio C. de Souza. Determinismo Biológico e Imigração Chinesa em Nicolau
Moreira (1870-1890). Dissertação (Mestrado em História das Ciências da Saúde),
FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 2005.
MACAGNO, Lorenzo. Os “chineses” da Beira, Moçambique. Itinerários de uma
dispersão. In: Andréa Lobo & Juliana Bras Dias (orgs.), África em movimento,
Brasília, 2012, (no prelo). Disponível em
<http://pascal.iseg.utl.pt/~cesa/files/Comunicacoes/Seminario23Fevereiro2012.pdf>.
Acesso em: 22/10/2013
MARTINS, José de Souza. O imaginário da Imigração Italiana. São Caetano do Sul:
Fundação Pró-Memória. 2003
MIGRACIÓN INTERNACIONAL. Ano 1, nº 1. Santiago do Chile: CEPAL/ONU,
2006.
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Número de estrangeiros regulares
no Brasil aumenta 50% em seis meses. 01/11/2011. Disponível em:
<portal.mj.gov.br>. Acesso em: 17/09/2013;
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / ESTRANGEIROS. Anistia a estrangeiros irregulares
atende expectativa do governo. 07/01/2010. Disponível em: <portal.mj.gov.br>.
Acesso em: 16/09/2013
MENZIE, Gavin. 1421: O ano em que a China descobriu o mundo. Tradução: Ruy
Jungmann. 6ª ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.
MILESI, Rosita, ANDRADE, Willian C. Migrações Internacionais no Brasil:
Realidade e Desafios Contemporâneos. IMDH, 2013. Disponível em
:<www.gritodelosexcluidos.org/media/uploads/migracionesintbr.pdf>. Acesso em:
25/11/2013.
MUSEU DA IMIGRAÇÃO. Setor de História Oral, Série Depoimentos. Depoimentos
colhidos pela pesquisadora Sônia de Freitas. Número 80. Entrevistado: Chu Wan Tai.
1997
OIM (Organização Internacional para Migração). Perfil Migratório Brasileiro 2009.
2010, Disponível em : <publications.iom.int/bookstore/free/Brazil_Profile2009.pdf>.
Acesso em: 10/11/2013
OLIVEIRA, Lúcia L. O Brasil dos Imigrantes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editores,
2ª ed., 2002.
90
OVERSEAS CHINESE. IN: Wikipedia, The Free Encyclopedia. 2013. Disponível
em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Overseas_Chinese#Current_numbers>. Acesso em:
06/11/2013
PEREIRA, Gabriel T. A diplomacia da americanização de Salvador de Mendonça
(1889-1898). São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. ISBN
978-85-7983-006-8. Disponível em: <books.scielo.org/id/gshz7/02>. Acesso em:
19/11/2013
PINHEIRO-MACHADO, Rosana. “A Ética Confucionista e o Espírito do Capitalismo”:
Narrativas Sobre Moral, Harmonia e Poupança na Condenação do Consumo Conspícuo
Entre Chineses Ultramar". IN: Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 13, n. 28,
p. 145-174, jul./dez. 2007.
______. MADE IN CHINA: Produção e circulação de mercadorias no circuito
China-Paraguai-Brasil. Tese (Doutorado em Antropologia Social) PPGAS-UFRGS.
Porto Alegre, UFRGS, 2009.
______. (Re)pensando a diáspora chinesa: Fluxos globais e dinâmicas locais da
imigração contemporânea. IN: Encontro Anual da Anpocs, 30, 2006. Disponível em:
<http://www.anpocs.org/portal/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=
3335&Itemid=232>. Acesso em: 01/11/2013.
POUTIGNAT, P. & STREIFF-FERNART, J. Dos imigrantes aos étnicos. IN: Teorias
da Etnicidade. São Paulo: UNESP, 1998. pp. 65-79.
PROCÓPIO, Argemiro. O Capitalismo Amarelo: Relações Internacionais da China.
Curitiba, Ed. Juruá, 2012.
SAHLINS, M. Cosmologias do capitalismo: o setor transpacífico do “sistema mundial”.
IN: Cultura na prática. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2004. P. 445-502.
SILVA, Marcos Araújo. Guanxi nos trópicos: um estudo sobre a diáspora chinesa em
Pernambuco. Dissertação de Mestrado (Antropologia Social) PPGA- UFPE. Recife,
2008.
______. Patrimônio Desterritorializado: transmigrantes chineses e suas “negociações”
culturais em Pernambuco. IN: Anais da I Reunião Equatorial de Antropologia.
Aracaju: UFS/ABA. 2007
SKELDON, Ronald. Myths and Realities of Chinese Irregular Migration. IOM
Migration Research Series, Suiça, n. 1, 2000.Disponível em:
<http://publications.iom.int/bookstore/free/mrs_1_2000.pdf>. Acesso em 02/11/2013.
SHOJI, Rafael. Reinterpretação do Budismo Chinês. IN: REVER -Revista de Estudos
da Religião. Nº 3, São Paulo, 2004, pp. 74-87. Disponível em
<www.pucsp.br/rever/rv3_2004/p_shoji.pdf>. Acesso em: 22/10/2013.
OVERSEAS CHINESE POPULATION DISTRIBUITON. IN: Overseas Community
Affairs Council (OCAC).Republic of China (Taiwan). 2012. Disponível em:
91
<http://www.ocac.gov.tw/english/public/public.asp?selno=8889&no=8889&level=B>.
Acesso em: 06/11/2013
TEIXEIRA, Jose Roberto Leite.A China no Brasil: influências, marcas, ecos e
sobrevivência chineses na sociedade e na arte brasileiras. Tese (Doutorado em
Artes). Campinas, Unicamp,1995.
TRUZZI, Oswaldo. Assimilação Ressignificada: Novas Interpretações de um Velho
Conceito. Dados, vol. 55, n. 2, pp. 517-553. Disponível em:
www.scielo.br/scielo.php?pid=S001152582012000200008&script=sci_abstract&tlng=p
t. Acesso em: 05/03/2013
VELHO, Gilberto. Observando o Familiar. IN: NUNES, Edson O. (org.) A aventura
sociológica: objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de
Janeiro: Zahar, 1978.
VERAS, Daniel Bicudo. As diásporas chinesas e o Brasil: a comunidade sino-
brasileira em São Paulo. Tese (Doutorado em Ciências Sociais), PUC-SP, 2008
WEI-MING, Tu. Cultural China: The Periphery as the Center. IN: WEI-MING, Tu.
(org.). The Living Tree: The changing meaning of being Chinese today. Stanford,
California: Stanford University Press, 1994, p. 1-34
92
APÊNDICE A
Olá,
Meu nome é Gabriel e sou estudante de Sociologia na Universidade Federal do
Paraná. Estou estudando a imigração chinesa para Curitiba e a comunidade aqui
estabelecida, tentando entender as causas e os fatores que levaram muitas pessoas a sair
da China e escolher o Brasil como lugar para estabelecer residência e construir uma
nova vida.
O objetivo desse estudo é entender um pouco melhor a vida, a cultura e os
costumes da população chinesa e de seus descendentes em Curitiba, na crença de que
através disso possa haver maior aproximação entre brasileiros e chineses que aqui
convivem, ao mesmo tempo em que se busca maior diálogo inter-cultural e maior
compreensão das diferenças intrínsecas a cada cultura.
Por isso gostaria de saber se você está disposto a conversar comigo sobre sua
vida, e se possível responder a um breve questionário, que contém perguntas sobre sua
vida na China e no Brasil. Desde já esclareço que o questionário pode ser respondido de
forma anônima e que todas as informações têm um fim meramente acadêmico. Além
disso, você não precisa responder às perguntas que não quiser e pode desistir a qualquer
momento.
Desde já agradeço pela atenção, compreensão e colaboração.
Atenciosamente
Gabriel Portugal Sorrentino
Telefone: 3016-0925 / 9944-3364
Universidade Federal do Paraná
93
94
ANEXO
Top Related