UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
LARISSA DEMARQUES MOURA
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DIFERENCIADO DE
CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC): o conflito entre a Administração Pública
Gerencial e Burocrática.
VIÇOSA - MINAS GERAIS
2014
LARISSA DEMARQUES MOURA
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DIFERENCIADO DE
CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC): o conflito entre a Administração Pública
Gerencial e Burocrática.
Monografia, apresentada ao Curso de Direito da
Universidade Federal de Viçosa como requisito para
obtenção do título de bacharel em Direito.
Professor Orientador: Gabriel Gori Abranches.
VIÇOSA - MINAS GERAIS
2014
RESUMO
A presente pesquisa remonta-se à análise da inconstitucionalidade do Regime Diferenciado de
Contratações Públicas (RDC), o qual foi inserto ao ordenamento pátrio em detrimento dos
preceitos fundamentais instituídos pela Lei 8.666/93. A priori, a Lei 12.462/2011possuía
natureza excepcional, admitindo-se sua aplicação somente para a contratação de bens e
serviços atinentes a realização dos eventos desportivos sediados pelo Brasil. O cunho efêmero
dessa legislação, contudo, se desfez frente à ampliação gradativa do seu âmbito de incidência,
perdendo sua aparente taxatividade, antes tida enquanto condição de existência, para ter suas
hipóteses ampliadas ao bel prazer do legislador. Não obstante, sua implementação não se
sucedeu de forma límpida, encontrando-se em manifesta afronta ao devido processo
legislativo e separação dos poderes. Ademais, as inovações incutidas pela mesma possibilitam
fraudes e direcionamento das licitações públicas de modo a fomentar toda e qualquer forma
de abuso do poder e suprimir o controle dos procedimentos versados pela Lei Geral de
Licitação e Contratos Públicos. Em verdade, a instituição do RDC representa a consolidação
de uma cultura gerencial na Administração Pública brasileira que, com fulcro no imperativo
da Eficiência, consagrado pelo caput do artigo 37 da Constituição Federal por força da EC
19/98, visa promover uma política de resultados em detrimento da estrita legalidade. Neste
sentir, figura o conflito entre Administração Pública Burocrática e Gerencial, sendo incutida
ao senso comum a falsa assertiva de que àquela é permeada pela ineficiência e morosidade do
aparato estatal. Por todo o exposto, mostrar-se-á de inobjetável clareza o vício substantivo que
macula todo o regime e que, por razões óbvias, merece ser extirpado do diploma nacional por
ofender a supremacia da ordem constitucional e subverter a função primordial da
Administração, qual seja, a defesa do interesse público primário.
Palavras-chave: Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC); Administração
Pública Burocrática; Administração Pública Gerencial; Princípio da Eficiência;
Inconstitucionalidade.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade
ANAC Agência Nacional de Aviação Civil
APO Autoridade Pública Olímpica
Art. Artigo
C.O.I. Comité Olímpico Internacional
CF/88 Constituição Federal de 1988
DEM Partido dos Democratas
EC Emenda Constitucional
FHC Fernando Henrique Cardoso
FIFA Federação Internacional de Futebol
MARE Ministério da Administração e Reforma do Estado
MC Medida Cautelar
MP Medida Provisória
OS Organizações Sociais
OSCIP Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
PPP Parceria Público-Privada
PPS Partido Popular Socialista
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PVL Projeto de Lei de Conversão
RDC Regime Diferenciado de Contratações Públicas
STF Supremo Tribunal Federal
TCU Tribunal de Contas da União
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................................................... 06
1. REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC).................................................... 08
1.1 Conceito e contextualização..................................................................................................................... 08
1.2 Trajetória Legislativa................................................................................................................................ 09
1.3 Âmbito de aplicação................................................................................................................................. 17
1.4 Principais inovações à ritualística Lei Geral de Licitação (Lei nº: 8.666/93).......................................... 21
2. O CONFLITO ENTRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BUROCRÁTICA E GERENCIAL................... 25
2.1 Administração Pública Burocrática.......................................................................................................... 25
2.2 Administração Pública Gerencial e Princípio da Eficiência..................................................................... 29
2.2.1 A Administração Pública Gerencial................................................................................................. 29
2.2.1.1 A Reforma Administrativa no Brasil.................................................................................... 32
2.2.2 O Princípio da Eficiência.................................................................................................................. 35
2.3 A desburocratização da Administração e o RDC..................................................................................... 38
3. ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO RDC....................................................... 41
3.1 Afronta aos Princípios Basilares da Administração Pública.................................................................... 41
3.1.1 Violação à Legalidade..................................................................................................................... 42
3.1.2 Violação à Impessoalidade.............................................................................................................. 46
3.1.3 Violação à Moralidade..................................................................................................................... 50
3.1.4 Violação à Publicidade.................................................................................................................... 52
3.1.5 Violação à Eficiência....................................................................................................................... 56
3.2 Regime de exceção X Tentativa de supressão do certame licitatório....................................................... 59
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................................. 61
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................................................ 63
6
INTRODUÇÃO
Como é cediço, historicamente o Estado concentrou diversas prerrogativas em sua
esfera de atuação necessárias à gestão dos interesses e bens da coletividade. No entanto, tais
prerrogativas não são irrestritas, mas comedidas pelo próprio interesse público, evitando-se
que os detentores do exercício do poder estatal ajam arbitrariamente e se afastem das
disposições legais regentes do Estado Democrático de Direito.
Nesta senda, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 instituiu uma
sistemática jurídico-principiológica com o desiderato de conduzir as atividades da
Administração Pública e coibir condutas abusivas atentatórias ao erário e aos interesses
individuais, assim considerados na sua faceta coletiva enquanto partícipes da sociedade1.
Sob essa ótica, o legislador constituinte fez expressa alusão a axiomas tais quais, a
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, que se consubstanciam em
verdadeiros deveres de conduta do administrador e garantia do administrado, que poderá
estabelecer meios de controle social em vista desses parâmetros constitucionais. Não obstante,
tratou de resguardar procedimento rigorosamente determinado na conformidade legal,
intitulado por licitação pública, que assegure a contratação de obras, serviços, compras e
alienações no âmbito público.
É dentro dessa perspectiva, legalmente delineada, e contrapondo-se à exegese da Lei
Maior que será instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, Lei 12.462 de 04
de agosto de 2011, enquanto medida excepcional, tomada em decorrência da realização de
competições esportivas de repercussão mundial – Copa do Mundo, Copa das Confederações e
Olímpiadas – tendo o Brasil como país anfitrião.
Não há como negar que o quê a princípio fora criado com a intenção de ser um
“regime de exceção”, mostrou-se como uma tentativa de suprimir todo o preceito licitatório
promovendo a inobservância de postulados fundamentais instituídos pela Constituição.
Ademais, a própria origem do instituto e a expansão gradativa do seu âmbito de aplicação,
antes limitado, são rechaçadas tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.
Fruto da omissão político-administrativa e da inércia governamental, decorrida de
considerável lapso temporal desde a declaração do Brasil enquanto país sede para a tomada de
atitudes atinentes a preparação infraestrutural, a Administração valeu-se de uma nova
1 MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. rev. e atual. São Paulo:
Malheiros, 2011. p. 61-62.
7
modalidade licitatória que supostamente proporciona celeridade e eficiência às contratações
públicas, em completo afastamento dos preceitos expostos pela legislação geral, Lei 8.666/93.
Mister salientar que esse regime também é oriundo de uma mudança do modelo
operacional da Administração Pública que sofre inúmeras influências de uma cultura
gerencial perpetuada pela Reforma Administrativa suscitada no governo de Fernando
Henrique Cardoso.
Por oportuno, questionar-se-á no presente estudo se a instituição do RDC, que
inicialmente fora criado a título de provisão a demanda imediata, consistirá em regra e no
afastamento progressivo do certame licitatório previsto pela Lei nº 8.666/93 e na consequente
abolição do controle funcional e metodológico semeado no modelo burocrático de
Administração.
Desta forma, mostra-se patente o estudo da (in) constitucionalidade desse regime
examinando-se os institutos trazidos pela Lei nº 12.462/11, propulsora do RDC, assim como
suas vantagens, seus equívocos, as perspectivas e as discussões econômico-jurídicas que a
rodeiam.
Propõe-se ainda o breve estudo dos modelos de Administração Pública no intuito de
determinar se a adoção de medidas inovadoras pautadas na “eficácia” dos resultados e
personificadas no RDC, caracterizam uma mudança da Administração, pura e simplesmente
burocrática para a gerencial e se tal fato representa um avanço histórico como vem sendo
divulgado.
Adverte-se que tais análises ocorrerão a partir de artigos de periódicos, doutrina,
decisões judiciais, bem como demais materiais de conhecimento científico difundidos pelos
meios virtuais de informação, que permitam investigar acerca dos pontos controversos do
RDC em relação Lei 8.666/93 e, por conseguinte, tecer críticas e levantar os pormenores da
adoção do regime em apreço.
Para a construção do conflito entre as aludidas vertentes da Administração Pública
adotar-se-á, no decorrer do presente estudo, o raciocínio indutivo que permita verificar a
mudança na forma de atuação estatal e avaliar as consequências oriundas.
Por derradeiro, através da junção dos métodos dedutivo e dialético, pretende-se aferir a
(in) constitucionalidade do RDC construindo, para tanto, um modelo teórico que abarque todo
o contexto social, político e econômico no qual sucedeu a instituição de seus preceitos.
8
1. REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (RDC)
1.1 Conceito e contextualização
O Regime Diferenciado de Contratações Públicas, comumente abreviado na sigla
RDC, trata-se de uma nova modalidade licitatória, como bem se depreende a partir da
interpretação literal da expressão. Nesse sentido prelecionam Ricardo Barreto de Andrade e
Vitor Lanza Veloso:
[...] registre-se que a Lei nº 12.462 parece ter instituído uma nova modalidade de
licitação, combinando alguns elementos das modalidades até então existentes na
disciplina administrativa com a introdução de relevantes inovações, para conformar
o que denomina Regime Diferenciado de Contratações Públicas. Nessa perspectiva,
no seu âmbito de incidência, o RDC constitui modalidade autônoma, abrangendo a
seleção e a contratação necessárias à obtenção do bem ou serviço demandado pela
Administração2.
Com efeito, a conceituação desse regime encontra-se intrinsicamente relacionada ao
contexto de sua implementação, o qual merece especial atenção no presente tópico.
Sua instituição desencadeou-se devido a proximidade e a consequente urgência para
proporcionar a infraestrutura necessária à realização dos eventos esportivos mundiais que
foram e serão sediados pelo nosso país, quais sejam, a Copa das Confederações da Federação
Internacional de Futebol - FIFA2013, a Copa do Mundo FIFA 2014 e os Jogos Olímpicos e
Paraolímpicos de 2016.
Salienta-se, sobretudo, que a escolha do Brasil para sediar os aludidos eventos
futebolísticos ocorreu em 30 de outubro de 20073. Da mesma maneira, em 02 de outubro de
20094, sobreveio a escolha do Rio de Janeiro para recepcionar as delegações estrangeiras nos
maiores episódios multiesportivos do mundo, as Olimpíadas e as Paraolimpíadas.
Num primeiro momento, torna-se forçoso reconhecer que tais designações, ocorridas
com mais de 05 anos de antecedência da realização dos eventos em questão, concederam
prazo hábil para munir as cidades-sede e todo seu entorno da infraestrutura imprescindível,
em atenção aos padrões de exigência da FIFA e do Comité Olímpico Internacional – C.O.I.,
por meio dos procedimentos de contratação pública usuais.
2 ANDRADE, Ricardo Baretto de; VELOSO, Vitor Lanza. Uma visão geral sobre o Regime Diferenciado de
Contratações Públicas: objeto, objetivos, definições, princípios e diretrizes. In: JUSTEN FILHO, Marçal;
PEREIRA, Cesar A. Guimarães (Coord.). O Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC):
Comentários à Lei nº 12.462 e ao Decreto nº 7.581. 2ª ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2013,
p.31. 3 Data retirada do site oficial da Copa do Mundo da FIFA 2014. Disponível em:
<http://pt.fifa.com/worldcup/news/newsid=1158962/>. Acesso em março de 2013. 4 Data disponível no endereço:< http://www.abril.com.br/esportes/rio2016/>. Acesso em março de 2013.
9
Ocorre, contudo, que o aparato governamental manteve-se inerte e como escusa
incutiu a ideia de que os procedimentos nas contratações públicas, instituídos pela legislação
geral, são lentos e burocratizados o suficiente para atender tempestivamente as demandas da
coletividade, sendo necessário propiciar a eficiência nas contratações públicas, que carecem
de medidas mais céleres, econômicas e competitivas.
Em verdade, essa morosidade administrativa representa verdadeira manobra política
para criação de uma legislação excepcional, apta à promoção do encurtamento de prazos,
simplificação de procedimentos e flexibilização de requisitos, afastando qualquer incidência
da ritualística Lei nº 8.666, de 1993, responsável pela instituição de normas gerais para
licitações e contratos. Assim, com fulcro na omissão intencional e na “suposta” atenuação dos
atrasos para a realização dos jogos, passou a integrar o ordenamento jurídico, por intermédio
da conversão da Medida Provisória nº 527 na Lei Federal 12.462/2011, o RDC.
A princípio o que fora criado com a intenção de ser um “regime de exceção”,
instrumentalizou-se no meio hábil para suprimir todo o certame licitatório e, por conseguinte,
burlar a observância de todos os preceitos principiológicos instituídos pela Constituição,
consoante será doravante alinhavado.
Com efeito, a criação desse regime traduz a incapacidade fática da Administração
Pública em promover estratégias de planejamento a longo prazo, tentando silenciar os anseios
sociais através de procedimentos rotineiros de exceção com eficácia limitada, que atuam em
completo descompasso à realidade jurídica, econômica e cultural da nossa nação.
1.2 Trajetória Legislativa
A conversão da Medida Provisória nº 527 na Lei nº 12.462, de 04 de agosto de 2011,
responsável pela instituição do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, tratou-se de
um processo peculiar eivado de vícios formais de inconstitucionalidade.
A princípio, a aludida MP fora editada pela Presidente da República, no exercício dos
atributos que lhe conferem o art. 62 da Constituição5, no desígnio de alterar a Lei nº
5 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o
presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato
ao Congresso Nacional. § 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a)
nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual
penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de
seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e
suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de
poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada
em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.
10
10.683/2003, cujo intuito original limitava-se, dentre outras medidas, à organização do Poder
Executivo e a reformulação do quadro institucional da gestão da aviação civil6.
Eis que durante a tramitação da medida na Câmara dos Deputados, é apresentado pelo
seu relator, o Deputado José Guimarães7, o Projeto de Lei de Conversão (PVL) através do
qual propôs emendas parlamentares substanciais que não guardavam qualquer pertinência
lógica com as proposições originais da Medida8.
Sendo esse projeto apreciado e aprovado pelo Senado Federal e, posteriormente,
sancionado, pela Presidente, entra em vigor em 05 de agosto de 2011 a Lei 12.462, instituindo
o RDC.
A despeito da inconstitucionalidade formal da norma supramencionada não ser o
objeto principal de estudo, neste presente tópico faz-se necessária sua breve análise a fim de
compreender, em sua totalidade, a desconformidade da mesma com regras de competência e
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I,
II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o
último dia daquele em que foi editada. § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12
perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos
termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo,
as relações jurídicas delas decorrentes. § 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida
provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. § 5º A deliberação de cada
uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre
o atendimento de seus pressupostos constitucionais. § 6º Se a medida provisória não for apreciada em até
quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada
uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais
deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual
período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a
sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. § 8º As medidas provisórias terão sua votação
iniciada na Câmara dos Deputados. § 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as
medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário
de cada uma das Casas do Congresso Nacional. § 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de
medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. § 11. Não
editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de
medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência
conservar-se-ão por ela regidas. §12: Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da
medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto. 6 Eis a redação do preâmbulo da Medida Provisória nº 527, de 18 de março de 2011: “Altera a Lei no 10.683, de
28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, cria a
Secretaria de Aviação Civil, altera a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC e da Empresa
Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, cria cargos de Ministro de Estado e cargos em
comissão, dispõe sobre a contratação de controladores de tráfego aéreo temporários, cria cargos de Controlador
de Tráfego Aéreo”. In: BRASIL, Medida Provisória nº 527, de 18 de março de 2011. Planalto, Brasília: DF,
2011. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Mpv/527.htm>.Acesso em
março de 2013. 7 O deputado federal José Nobre Guimarães pertence ao Partido dos Trabalhadores do Estado do Ceará.
8 BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social Democracia
Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei 12.462/2011,
que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e
contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014
e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:
<http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acessado em abr. de
2013.
11
com o procedimento constitucionalmente estabelecido para seu ingresso no mundo jurídico.
Ademais, o conhecimento desse vício de forma favorecerá a compreensão da contrariedade
substantiva entre o regime de exceção em apreço e normas basilares do nosso ordenamento.
Em um primeiro momento, essa inconstitucionalidade orgânica pode ser sentida na
ausência dos pressupostos constitucionais necessários à edição da medida provisória, quais
sejam a urgência e a relevância, preceituados no art. 62 da Lei Maior.
Neste liame, cumpre mencionar que a competência investida ao Chefe do Executivo
trata-se de uma exceção ao postulado legislativo inerente ao Congresso Nacional, devendo
assim ser exercida tão somente quando preenchidos os pressupostos formais aptos à
legitimação da Medida Provisória.
Para tanto, deverá configurar-se situação na qual o Executivo seja obrigado a produzir
norma jurídica, sob pena de “acarretar dano de difícil ou impossível reparação para o interesse
público9”. Nesse sentido, posicionou-se o Ministro Celso de Mello no julgamento da ADI-MC
293:
[...]O que justifica a edição das medidas provisórias é a existência de um estado de
necessidade, que impõe ao Poder Executivo a adoção imediata de providências
de caráter legislativo, inalcançáveis segundo as regras ordinárias de
legiferação, em face do próprio "periculum in mora" que certamente
decorreria do atraso na concretização da prestação legislativa.[...]10
[sem grifos no original].
A exegese jurisprudencial é corroborada pelo entendimento doutrinário de Celso
Antônio Bandeira de Mello que assevera:
Já que são excepcionais, ou seja, fórmulas atípicas, anômalas, de introduzir normas
primárias, só admissíveis para atender interesses relevantes, resulta imediatamente
claro que não é qualquer espécie de interesse que lhes pode servir de justificativa,
pois todo e qualquer interesse público é, ipso facto, relevante. Donde – e como nem
a lei nem a Constituição tem palavras inúteis – há de se entender que a menção do
art. 62 à “relevância” implicou atribuir uma especial qualificação à natureza do
interesse cuja ocorrência enseja a utilização de medidas provisórias. É Certo, pois,
que só ante casos graves, ante interesses invulgarmente importantes, justifica-se a
adoção de medidas provisórias. Isto, entretanto, não é suficiente para o cabimento
delas. Cumpre, ademais, que a cura de tal interesse deva ser feita sem retardamento
algum, à falta do quê a sociedade expor-se-ia a sérios riscos ou danos. Em suma: é
preciso que exista a “urgência” a que alude o art.62.
Que é urgência? Que coisa deve ser havida como urgente? Mesmo que a palavra
contenha em si algum teor de fluidez, qualquer pessoa entenderá que só é urgente o
que tem que ser enfrentado imediatamente, o que não pode aguardar o decurso do
9 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires
Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 6ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. p.913. 10
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-MC
nº 293. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Presidente da República. Relator: Ministro
Celso de Mello. Brasília: DF. Data de Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 16-04-
1993. PP-06429. EMENT VOL-01699-01 PP-00009. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2907836/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-
adi-mc-293-df>. Acesso em jan. de 2014.
12
tempo, caso contrário o benefício pretendido será inalcançável ou o dano que se quer
evitar consumar-se-á ou, no mínimo, existirão sérios riscos de que sobrevenham
efeitos desastrosos em caso de demora11
.
Observado o conteúdo originário da MP nº 527, acima sintetizado, urge os
questionamentos: Onde está a urgência e a relevância na reestruturação organizacional da
Administração Pública Federal? Não seria esse tema ordinário e trivial o suficiente para
suscitar a edição de uma MP?
Não obstante a organização infraestrutural do aparato governamental e gerenciamento
da aviação civil12
sejam matérias de suma importância, carecem da urgência autorizativa para
fins de edição da espécie normativa em comento. Afinal, tais ações são recorrentes no cenário
político nacional, sendo habitual a criação de órgãos, repartições e remanejamento do quadro
de servidores públicos. Isso sem mencionar o fato de que tais medidas podem ser prontamente
alcançadas a partir do planejamento da gestão e a partir da prestação legislativa ordinária, não
se caracterizando danos irremediáveis decorrentes do atraso da atividade legiferante pelo
Congresso Nacional.
Portanto, são nos pressupostos formais apregoados pelo art.62 da Lei da República,
que se esbarra a inconstitucionalidade formal da MP nº527.
A ausência desses preceitos importa ao Presidente, agente privativamente competente
pela edição do ato, manifesto abuso do poder de legislar, excedendo os limites da atividade de
criação das leis concedida ao Executivo no exercício de suas funções atípicas.
Sendo assim, a omissão dos imperativos de urgência e relevância material acabam por
retirar a legitimidade extraordinária constitucionalmente outorgada ao Chefe do Executivo,
fazendo com que este se aproprie da função institucional do Congresso Nacional, afetando
diretamente a harmonia existente ente os três poderes e ultrajando o Princípio Republicano da
Separação dos Poderes (art.2º da CF/88).
Não bastasse a violação do art. 62 da CF/88, o que por si só macula a
constitucionalidade da MP nº527 e, por conseguinte, da Lei 12.462/11, imperioso mencionar
11
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit. p. 131-132. 12
Não só o aumento na demanda mas, principalmente, a qualidade do serviço pelo setor de aviação civil
tornaram-se temas cogentes no cenário nacional. A deficiência na infraestrutura, os constantes atrasos e
cancelamentos de voos, furtos e extravio de bagagens, baixa oferta de viagens regionais, estagnação de
pequenos e médios aeroportos e o abarrotamento daqueles situados em grandes centros urbanos, destacam-se
dentre às inúmeras reivindicações dos usuários desse setor. Ademais, é manifesto o déficit nas comunicações
internas entre a ANAC e os próprios consumidores e entre as empresas e seus passageiros, o que resulta no
aumento considerável do número de reclamações formais e ações judiciais. Atento às irregularidades e
insuficiência do setor, o legislador tratou de assegurar a aviação civil dentre as hipóteses, a princípio,
excepcionais de adoção do Regime Diferenciado de Contratações – RDC, mais precisamente no art. 1º, inciso
III da Lei 12.462/2011. Tal medida externaliza a preocupação com o tráfego aéreo e eficiência dos serviços
durante a realização dos eventos desportivos sediados pelo Brasil.
13
o abuso do poder de emendar, característico no trâmite da medida provisória e na conversão
da Lei em questão.
Frise-se, nesse primeiro momento, a natureza dúplice da medida provisória: “É norma
jurídica com força cogente, e ao mesmo tempo, projeto de lei de iniciativa do Executivo, a ser
deliberado pelo Congresso Nacional 13
”.
Com força de lei e vigência imediata, as demais normas incompatíveis com a MP terão
sua eficácia suspensa até que tal ato normativo primário seja convertido ou não em lei.
Por outro lado, enquanto projeto de lei de iniciativa reservada, em que o Presidente é
investido de ampla margem de discricionariedade em relação aos requisitos de urgência e
relevância, sendo essa uma apreciação puramente política, haverá limites a tal arbítrio,
devendo a medida submeter-se ao escrutínio do Congresso Nacional, como bem se depreende
da lição exposta pelo Ministro Celso de Mello na ADI-MC 293, a seguir transcrita:
As medidas provisórias configuram, no direito constitucional positivo brasileiro,
uma categoria especial de atos normativos primários emanados do Poder Executivo,
que se revestem de força, eficácia e valor de lei . - Como a função legislativa
ordinariamente pertence ao Congresso Nacional, que a exerce por direito
próprio, com observância da estrita tipicidade constitucional que define a
natureza das atividades estatais, torna-se imperioso assinalar - e advertir - que
a utilização da medida provisória, por constituir exceção derrogatória do
postulado da divisão funcional do poder, subordina-se, em seu processo de
conversão legislativa, à vontade soberana do Congresso Nacional [...]
A plena submissão das medidas provisórias ao Congresso Nacional constitui
exigência que decorre do princípio da separação de poderes. O conteúdo
jurídico que elas veiculam somente adquirirá estabilidade normativa, a partir
do momento em que - observada a disciplina ritual do procedimento de
conversão em lei - houver pronunciamento favorável e aquiescente do único
órgão constitucionalmente investido do poder ordinário de legislar, que é o
Congresso Nacional . - Essa manifestação do Poder Legislativo é necessária, é
insubstituível e é insuprimível. Por isso mesmo, as medidas provisórias, com a sua
publicação no Diário Oficial, subtraem-se ao poder de disposição do Presidente da
República e ganham, em conseqüência, autonomia jurídica absoluta, desvinculando-
se, no plano formal, da autoridade que as instituiu14
. [sem grifos no original].
13
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social Democracia
Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei 12.462/2011,
que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e
contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014
e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<
http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acessado em abr. de
2013. 14
BRASIL, Supremo Tribunal Federal.Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-
MC nº 293. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Presidente da República. Relator:
Ministro Celso de Mello. Brasília: DF. Data de Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação:
DJ 16-04-1993; PP-06429; EMENT VOL-01699-01; PP-00009. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2907836/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-
adi-mc-293-df>. Acesso em jan. de 2014.
14
Do exercício pelo Congresso Nacional da função legislativa, que lhe foi primariamente
constituída, urge a possibilidade de emendas parlamentares, com vista no §12º do art.62 da
CF/8815
.
No entanto, insta salientar que essa possibilidade não é irrestrita, devendo sempre
pautar-se pela pertinência entre as alterações suscitadas e os preceitos originais da MP, sob
pena de deturpar a competência privativa do Chefe do Executivo. Sob este prisma, encontra-
se entendimento firmado pelo excelso Supremo Tribunal Federal, veja-se:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA - INSTAURAÇÃO DE PROCESSO LEGISLATIVO
VERSANDO A ORGANIZAÇÃO E A DIVISÃO JUDICIÁRIAS DO ESTADO -
INICIATIVA DO RESPECTIVO PROJETO DE LEI SUJEITA À CLÁUSULA
CONSTITUCIONAL DE RESERVA (CF, ART. 125, § 1º,"IN FINE")-
OFERECIMENTO E APROVAÇÃO, NO CURSO DO PROCESSO
LEGISLATIVO, DE EMENDAS PARLAMENTARES - AUMENTO DA
DESPESA ORIGINALMENTE PREVISTA E AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA -
DESCARACTERIZAÇÃO DA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA ORIGINAL, MOTIVADA PELA AMPLIAÇÃO DO NÚMERO DE COMARCAS, VARAS E
CARGOS CONSTANTES DO PROJETO INICIAL - CONFIGURAÇÃO, NA
ESPÉCIE, DOS REQUISITOS PERTINENTES À PLAUSIBILIDADE JURÍDICA
E AO "PERICULUM IN MORA" - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA . - O
poder de emendar projetos de lei - que se reveste de natureza eminentemente
constitucional - qualifica-se como prerrogativa de ordem político-jurídica
inerente ao exercício da atividade legislativa. Essa prerrogativa institucional,
precisamente por não traduzir corolário do poder de iniciar o processo de
formação das leis (RTJ 36/382, 385 - RTJ 37/113 - RDA 102/261), pode ser
legitimamente exercida pelos membros do Legislativo, ainda que se cuide de
proposições constitucionalmente sujeitas à cláusula de reserva de iniciativa
(ADI 865/MA, Rel. Min. CELSO DE MELLO), desde que - respeitadas as
limitações estabelecidas na Constituição da República - as emendas
parlamentares (a) não importem em aumento da despesa prevista no projeto de lei,
(b) guardem afinidade lógica (relação de pertinência) com a proposição original
e (c) tratando-se de projetos orçamentários (CF, art. 165, I, II e III), observem as
restrições fixadas no art. 166, §§ 3º e 4º da Carta Política. Doutrina. Jurisprudência .
- Inobservância, no caso, pelos Deputados Estaduais, quando do oferecimento das
emendas parlamentares, de tais restrições. Precedentes do Supremo Tribunal
Federal. Suspensão cautelar da eficácia do diploma legislativo estadual impugnado
nesta sede de fiscalização normativa abstrata.16
[sem grifos no original]
O poder de emendar concedido aos parlamentares esbarra na impossibilidade de
veicular matérias diferentes das versadas na lei de iniciativa exclusiva do Presidente, de modo
a desfigurá-la, tornando acessória as previsões inicias da medida.
Trata-se, na verdade, de um imperativo lógico da Separação dos Poderes, o qual
resguarda a autonomia e independência do Executivo, Legislativo e do Judiciário, designando
15
Vide nota de rodapé nº.5. 16
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI-MC
nº 1050. Requerente: Procurador Geral da República; Requerido: Governador do Estado de Santa Catarina e
Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Relator: Ministro Celso de Mello. Santa Catarina- SC,
Data de Julgamento: 20/09/1994. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 23-04-2004. PP-00006; EMENT
VOL-02148-02; PP-00235 RTJ VOL-00191-02 PP-00412. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/747391/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-
adi-mc-1050-sc>. Acesso em jan. de 2014.
15
a cada um funções típicas, inerentes e ínsitas à sua natureza, e atípicas, asseguradas pelo
constituinte originário. Esse paradigma permite maior interpenetração entre os poderes
culminando na harmonia desse mecanismo recíproco de controle, denominado de sistema de
freios e contrapesos17
.
É cediço que os motivos originários da MP nº527, destinados sucintamente a alteração
da estrutura administrativa do Poder Executivo Federal, não se coadunam com a temática de
licitações e contratações públicas, que culminou na instituição do RDC. Tanto é, que o
próprio Relator da proposição, o Deputado José Guimarães, em parecer apresentado no
plenário de sua Casa, em 15/06/2011, reconhece a impertinência temática das emendas
propostas:
[...] As peculiaridades que cercam a tramitação da MP 527 impõem que se fracione a
análise do mérito da matéria em dois compartimentos distintos, ainda que
mutuamente relacionados. No primeiro deles, a seguir inserido, examina-se o teor do
texto original e das emendas que lhe foram apresentadas pelos parlamentares. Em
sequencia, serão abordados aspectos correlatos ao tema abordado na MP, mas que
não constam do teor levado a conhecimento público quando da publicação do
instrumento de que se cuida no Diário Oficial da União.[...]
Como se afirmou anteriormente, a análise de mérito da MP deve prosseguir pela
abordagem de tema que não consta de seu teor original ou das emendas que lhe
foram oferecidas, mas que possui acentuada relação com os propósitos
fundamentais do instrumento. Tece-se referência ao regimento diferenciado de
licitações públicas, que o grupo hoje investido da responsabilidade de administrar o
país vem tentando ver aprovado desde a gestão anterior à atual, isto é, ainda sob a
administração do ex-Presidente Lula18
.”
O relato acima apenas ratifica que o exercício do direito subjetivo constitucional,
tocante aos parlamentares, excedeu os limites que lhes são próprios ao não resguardar a
pertinência temática da emenda à proposição normativa originária.
17
Nas palavras do doutrinador Alexandre de Moraes: “[...] O Direito Constitucional contemporâneo, apesar de
permanecer na tradicional linha da ideia de Tripartição dos Poderes, já entende que essa fórmula, se
interpretada com rigidez, tornou-se inadequada para um Estado que assumiu a missão de fornecer a todo o seu
povo o bem-estar, devendo, pois, separar as funções estatais, dentro de um mecanismo de controle recíprocos,
denominado ‘freios e contrapesos’ (checks and balances)”. In: MORAES, Alexandre de. Direito
Constitucional - 21 ed. – São Paulo: Atlas. 2007. p. 389. 18
DISTRITO FEDERAL. Câmara dos Deputados – DETAQ. Sessão: 153.1.54.O. Hora: 17:50. Fase: OD.
Orador: José Guimarães, PT-CE. Data: 15/06/2011. Parecer, pela Comissão Mista, à Medida Provisória 527
de 2011 (Altera a Lei 10.683 de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos
Ministérios, cria a Secretaria de Aviação Civil, altera a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil -
ANAC e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, cria cargo de Ministro de
Estado e cargos em comissão, dispõe sobre a contratação de controladores de tráfego aéreo temporários, cria
cargos de Controlador de Tráfego Aéreo). Disponível em
<http://www.camara.gov.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=153.1.54.O%20%20%20
%20%20&nuQuarto=116&nuOrador=2&nuInsercao=27&dtHorarioQuarto=17:50&sgFaseSessao=OD%20%2
0%20%20%20%20%20%20&Data=15/06/2011&txApelido=JOS%C3%89%20GUIMAR%C3%83ES,%20PT-
CE&txFaseSessao=Ordem%20do%20Dia%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20
%20%20%20&txTipoSessao=Ordin%C3%A1ria%20-
%20CD%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20&dtHoraQuarto=17:50&txEta
pa=> . Acesso em mar. de 2013.
16
Logo, o Projeto de Lei de Conversão padeceu por emenda parlamentar substancial sem
correlação, o que promoveu uma verdadeira desvirtualização do rol de dispositivos inseridos
no texto da referida Medida Provisória19
.
A não observância dessa limitação temática, que deveria ser elementar ao próprio ato
de emendar, criou obstáculos à atuação institucional dos demais parlamentares uma vez que
inibe o direito de discutir publicamente e, por conseguinte, de apresentar emendas às
proposições em votação.
Isso ocorre uma vez que os parlamentares somente tomarão conhecimento da matéria
que será votada no momento em que devem exercer o direito de voto, sem mencionar a
existência de constrições regimentais que impedem o oferecimento de emendas por
parlamentares em matérias novas incluídas em plenário pelo relator da proposição.
A subversão do trâmite da Medida Provisória, para incutir em seu bojo matérias sem
qualquer pertinência, afinidade ou conexão com aquela inicialmente proposta, representa
verdadeira “manobra” do Legislativo de usurpar a competência própria investida ao Executivo
por força da excepcionalidade que abarca os imperativos indelegáveis da apreciação da
urgência e relevância inerentes à adoção da medida. Com efeito, figura-se, nesse caso,
manifesta afronta ao Princípio da Separação dos Poderes (art. 2º da CF/8820
) e, sobretudo, à
Supremacia da Ordem Constitucional.
Igualmente, na medida em que se promove verdadeiro atropelo ao processo de
conversão, na tentativa de contornar os trâmites legislativos ordinários suplantando em
medidas provisórias “normas que não tenham sido objeto de exame pelas comissões temáticas
das Casas do Congresso Nacional21
”, amolda-se a violação ao Devido Processo Legal (art. 5º
LIV, art. 59 e 62 da CF/8822
).
19
Salienta-se que essa prática, contudo, vem se tornando rotineira no Parlamento brasileiro e representa
verdadeiro abuso do poder de emendar, através do qual se prima pela prevalência de interesses puramente
políticos em detrimento da estrita legalidade. 20
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 2º: São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 21
REZENDE, Renato Monteiro de. O Regime Diferenciado de Contratações Públicas: Comentários à Lei
12.462, de 2011. Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado. Texto para discussão 100. Agosto/2011.
Disponível em:
<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:Yr2FIw6jUxcJ:www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_disc
ussao/TD100-RenatoRezende.pdf+Redime+diferenciado+de+contrata%C3%A7%C3%B5es+publicas&hl=pt-
BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjC3RjC5uw6Ihzeyq1Ig2V1dD-
bB7YoyqbWvWImmau64bvJ62cON9u_MhcoZLGpnd1040u8OVVWr24uYU4SNq_bXkRLGxgJIweKAjKET
D5pv1NeP8k8Q9Kh4tZQWq_tsq7jt8zH&sig=AHIEtbQ7VF-lLmjU5U5FDsWkCM85QiX5Mw.> Acesso em
mar.de 2013. 22
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, inciso LIV: ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Art. 59. O processo legislativo compreende a
elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V
- medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá
17
Imperioso esclarecer, por fim, que a sanção presidencial a projeto de lei que veicule
norma resultante de emenda parlamentar aprovada com transgressão da finalidade
originariamente proposta por meio de medida provisória, não tem o condão de sanar os vícios
de inconstitucionalidade formais acima suscitados.
Por óbvio, a simples anuência do Chefe do Executivo - ainda que deste seja a
prerrogativa institucional usurpada, como ocorreu no caso em deslinde - revela-se
juridicamente insuficiente para convalidar os descumprimentos de ordem constitucional23
.
Desta feita, manifesta ofensa aos preceitos constitucionais, acabam por desvestir de
validade não só a MP nº 527 mas, principalmente, a Lei 12.462/11, sendo a declaração de
inconstitucionalidade desta última, medida que se impõe em defesa da Supremacia do Estado
Democrático de Direito.
1.3 Âmbito de aplicação
Criado com a função precípua de erigir a infraestrutura necessária para a recepção dos
eventos desportivos sediados no nosso país, o RDC insurgiu na figura de modalidade
licitatória excepcional à Lei nº 8.666/93, apta a promover o encurtamento de prazos e
irromper com o trâmite burocrático permeado pela legislação geral de licitações e
contratações públicas. Pelo menos, essa foi a ideia semeada pelos nossos representantes
políticos no intuito de ver aprovado o aludido regime.
sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis. Caput do Art. 62: Em caso de relevância e
urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las
de imediato ao Congresso Nacional. 23
Eis a jurisprudência pátria acerca do tema: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -
DEFENSORIA PÚBLICA - REMUNERAÇÃO - PISO REMUNERATORIO NÃO INFERIOR A SETE (7)
VEZES O MENOR VENCIMENTO DA TABELA DO PODER EXECUTIVO - VINCULAÇÃO
REMUNERATORIA CONSTITUCIONALMENTE VEDADA - NORMA LEGAL RESULTANTE DE
EMENDA PARLAMENTAR - ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL (CF, ART. 63, I)
E MATERIAL (CF, ART. 37, XIII)- PLAUSIBILIDADE JURÍDICA - PERICULUM IN MORA
CARACTERIZADO - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. PROCESSO LEGISLATIVO E ESTADO-
MEMBRO: A atuação dos membros da Assembleia Legislativa dos Estados acha-se submetida, no processo de
formação das leis, a limitação imposta pelo art. 63, I, da Constituição, que veda - ressalvadas as proposições de
natureza orçamentária - o oferecimento de emendas parlamentares de que resulte o aumento da despesa
prevista nos projetos sujeitos ao exclusivo poder de iniciativa do Governador do Estado. USURPAÇÃO DE
INICIATIVA E SANÇÃO EXECUTIVA: A sanção a projeto de lei que veicule norma resultante de
emenda parlamentar aprovada com transgressão a cláusula inscrita no art. 63, I, da Carta Federal não
tem o condão de sanar o vício de inconstitucionalidade formal, eis que a só vontade do Chefe do
Executivo - ainda que deste seja a prerrogativa institucional usurpada - revela-se juridicamente
insuficiente para convalidar o defeito radical oriundo do descumprimento da Constituição da Republica.
[...]. In: BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade:
ADI-MC 1070 MS. Relator: Celso de Mello, Data de Julgamento: 23/11/1994, Tribunal Pleno. Data de
Publicação: DJ 15-09-1995 PP-29507 EMENT VOL-01800-01 PP-00187. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/746928/medida-cautelar-na-acao-direta-de-inconstitucionalidade-
adi-mc-1070-ms>. Acesso em dez. de 2013.
18
Assim sendo, na redação originária do art. 1º da Lei 12.462/1124
, fruto da conversão da
MP nº 527, constavam apenas 3 (três) hipóteses exclusivas que autorizavam a adoção do
regime, são elas: os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; a Copa das Confederações da
Federação Internacional de Futebol Associação - FIFA 2013 e a Copa do Mundo FIFA 2014 e
as obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos
Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades
sedes das referidas competições.
Ainda que a aplicação desse regime se restrinja, nesse primeiro momento, à realização
dos eventos em questão, deve-se reconhecer que o caput do aludido dispositivo, todavia, não
permite a delimitação do objeto com tanta precisão, por fazer constar em sua redação a
seguinte expressão: “[...] aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à
realização:[...]”.
O termo licitações e contratos dá margem a ampla interpretação pela qual não há
limites das obras, serviços e aquisição de bens que poderão realizar-se por meio desse regime
diferenciado. Tal abrangência terminológica, portanto, inviabiliza a identificação de quais
seriam os projetos beneficiados pela aplicação do complexo normativo em comento, como
bem se assentaram as inquietações doutrinárias acerca do tema:
Com efeito, a expressão “licitações e contratos necessários à realização” (art.1º,
caput) dá margem a larga interpretação, pelo que o RDC poderia abranger desde
obras de estádios, passando por intervenções de mobilidade urbana e, até mesmo,
investimentos em saúde, educação profissionalizante e segurança pública. Os incisos
do art. 1º igualmente não contribuem para a definição do âmbito de aplicação do
RDC25
.
Não se pode olvidar, sobretudo, o questionamento no que concerne a existência de um
limite temporal aos contratos celebrados com fulcro nesse regime diferenciado.
Neste contexto, por ser manifesta a limitação de ordem temática a qual vincula a
adoção do RDC aos eventos supracitados, caso o objeto da contratação não tenha a remota
24
Lei 12.462/2011 - Art. 1º: É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável
exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização: I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de
2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); II
- da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do
Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir,
aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a
realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às
constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; III -
de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da
Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos
nos incisos I e II. 25
ANDRADE, Ricardo Baretto de; VELOSO, Vitor Lanza. Uma visão geral sobre o Regime Diferenciado de
Contratações Públicas: objeto, objetivos, definições, princípios e diretrizes. In: JUSTEN FILHO, Marçal;
PEREIRA, Cesar A. Guimarães (Coord.). Op. cit., p. 32.
19
possibilidade de findar-se a tempo da realização das competições, por óbvio, restará impedida
a aplicação deste regime.
Todavia, salienta-se a divergência no que diz respeito às obras e serviços que se
perpetuam no tempo, não sendo finalizadas para a celebração dos jogos. Acerca desta matéria,
posicionou-se o TCU, retificando escólio anteriormente prolatado por meio do acórdão 1538
de 2012, pacificando-a no seguinte sentido:
[...] a utilização do RDC em obras com término posterior à Copa do Mundo de
2014 – ou às Olimpíadas de 2016, conforme o caso – só é legítima nas situações
em que ao menos fração do empreendimento tenha efetivo proveito para a
realização desses megaeventos esportivos, cumulativamente com a necessidade de
se demonstrar a inviabilidade técnica e econômica do parcelamento das frações da
empreitada a serem concluídas a posteriori, em atendimento ao disposto nos arts. 1º,
incisos de I a III; 39 e 42 da Lei 12.462/2011, c/c o art. 23, § 1º, da Lei 8.666/9326
.
[sem grifos no original].
Evidente que a fundamentação legal, a qual vinculava a aplicação do RDC à realização
tempestiva das competições, era efêmera e, em verdade, representava apenas a ambição
política no sentido de implementar um regime excepcional capaz de sobrelevar todo o rigor
inerente ao procedimento licitatório incutido pelas normas gerais.
Em que pese a aparente taxatividade, progressivas alterações na letra da lei foram
aprovadas pelo Congresso Nacional, sendo o rol taxativo do art.1º da Lei 12.462/2011
acrescido ao bel prazer do legislador na medida em que se autorizou sua adoção para matérias
que não correspondem à finalidade originariamente proposta, veja-se:
Art. 1º É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC),
aplicável exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização:
I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de
Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e
II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol
Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo
Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e
supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo
Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014,
restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de
responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios;
III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos
das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e
cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e
II;
IV - das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
(Incluído pela Lei nº 12.688, de 2012);
V - das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde -
SUS. (Incluído pela Lei nº 12.745, de 2012);
26
BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1538/2012. Plenário. Relator: Ministro Valmir Campelo.
Sessão de 20/06/2012. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:c0KnICL4DQoJ:www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Do
cs/judoc/Acord/20120622/AC_1538_23_12_P.doc+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de
2014.
20
VI - das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma
de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. (Incluído
pela Medida Provisória nº 630, de 2013);[...]
§ 3º Além das hipóteses previstas no caput, o RDC também é aplicável às
licitações e contratos necessários à realização de obras e serviços de engenharia
no âmbito dos sistemas públicos de ensino. (Incluído pela Lei nº 12.722, de 2012).
[sem grifos no original]27
.
Fato é que o objeto de incidência delimitado tematicamente e, a princípio, apregoado
enquanto verdadeira condição de existência do RDC, fora gradativamente sofrendo
adulterações, tornando ilimitado o seu campo de abrangência e extirpando a transitoriedade
característica às suas normas.
A inclusão das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
no rol de incidência apenas corrobora essa assertiva ao passo que, traçado enquanto
verdadeiro modelo de estímulo ao crescimento econômico por intermédio de investimento em
setores basilares, promove a consecução de obras faraônicas de infraestrutura social, urbana,
logística e energética do país28
, não sendo fixados parâmetros mínimos para identificar quais
seriam os projetos inseridos nesse plano estratégico do Governo Federal. Deste modo,“basta
ao governo rotular a obra como parte deste programa para que ela esteja autorizada a adotar o
RDC”29
.
A partir desta, seguiram-se as demais modificações com vista a atender outras
demandas sociais, tornando optativa a aplicação do regime no âmbito do Sistema Único de
Saúde (SUS), obras de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo,
assim como no sistema público de ensino.
Notadamente, a inclusão de tais serviços públicos essenciais à sociedade poderá
acometer danos econômicos e sociais irremediáveis conquanto a adoção deste regime afasta a
27
BRASIL, Lei nº 12.462, de 04 de Agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas -
RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da
República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e a legislação da
Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de
Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de
controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de 12
de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de março
de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de 2001; e
revoga dispositivos da Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida Provisória nº
527, de 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm>,
Acessado em mar. de 2013. 28
A exposição dos motivos foi retirada do site do Portal Brasil no endereço <http://www.pac.gov.br/> acessado
em 15/03/2013. Nesse link também se encontram as funções institucionais, assim como dados fáticos do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) instituído pelo Governo Federal. 29
Estes são os dizeres do Advogado e professor universitário Rafael Valim, diretor executivo do Instituto
Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (Ibeji), reproduzidos a título de entrevista veiculada na
Revista Eletrônica Brasil Econômico, na reportagem de Juliana Garçon. In: GARÇON, Juliana. “Atalho” para
obras da Copa já domina licitações públicas. Dispositivo já é usado em nove concorrências e também será
adotado em novos setores. Brasil Econômico. São Paulo. 11,12 e 13 da janeiro de 2013.
21
aplicação da Lei 8.666/93 com todos os seus princípios, o que macula a transparência, a
isonomia, a objetividade no julgamento, o caráter competitivo, enfim, toda a lisura do certame
licitatório, extirpando a possibilidade de selecionar a proposta realmente mais vantajosa para a
Administração.
Ademais, a inconstitucionalidade que macula os preceitos regentes deste regime abre
margem à desobediência aos reclames de probidade administrativa e à prevalência de
vontades particulares e, até mesmo, do próprio Estado sobre o interesse público primário.
Com efeito, as inovações legislativas elidiram a taxatividade das hipóteses de
aplicação do RDC, dissipando a excepcionalidade que revestia o aludido complexo normativo
e o fim colimado para sua criação.
1.4 Principais inovações à ritualística Lei Geral de Licitação (Lei nº: 8.666/93)
A despeito de não ser objeto de estudo tecer os pormenores dos institutos abrangidos
pelo RDC, insta trazer a baila algumas das suas principais inovações no certame licitatório a
título de comparação com as normas gerais de contratação pública.
Adverte-se que, nesta oportunidade, não serão aprofundados os comentários atinentes
a constitucionalidade de seus preceitos, matéria esta que será apreciada no capítulo III da
presente pesquisa. Desta forma, este tópico destina-se tão somente a sobrelevar algumas das
principais inovações inauguradas por este regime de exceção contrapondo-as às premissas
instituídas pela legislação geral e introduzir brevemente a temática da inconstitucionalidade
que macula todo o diploma normativo em comento.
O aludido regime apregoa, enquanto regra geral, em seu art. 6º, §3º30
, a presunção de
sigilo do custo das obras, restringindo a publicidade do orçamento previamente estimado para
a contratação.
Resguardadas as devidas exceções, o sigilo vigorará durante todo o certame, não
constando no instrumento convocatório o que, de fato, inviabilizará o seu conhecimento
prévio pelos licitantes, muito embora o mesmo deva ser exclusivamente disponibilizado para
os órgãos de controle externo e interno. A divulgação do orçamento se dará somente após o
encerramento do trâmite legal.
30
Lei 12.462/11 - Art. 6º, § 3º:Se não constar do instrumento convocatório, a informação referida nocaputdeste
artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e permanentemente aos órgãos de controle externo
e interno.
22
Neste ponto, o aludido regime destoa-se da previsão dos artigos 3º, § 3º; 40, § 2º,
II;44, § 1º, da Lei nº 8.666, de 199331
, os quais preceituam a ampla divulgação do orçamento
para todas as modalidades licitatórias, com vista a consagração do princípio da Publicidade,
regente de toda a atividade da Administração Pública.
Outrossim, institui a contratação integrada (art. 9º, caput32
), a partir da qual se
transfere ao particular a responsabilidade pela “elaboração e o desenvolvimento dos projetos
básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização
de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega
final do objeto”33
, devendo constar no instrumento convocatório o anteprojeto de engenharia
que forneça aos participantes um delineamento do objeto da licitação (art. 9º, §2º, I34
).
A atribuição dos encargos acima mencionados encontra justificativa no imperativo da
eficiência de ordem técnica e econômica na medida em que os riscos relativos a execução do
contrato são compartilhados com o licitante para os casos de prestações dotadas de maior
complexidade.
Acerca da empreitada integral, urge o escólio de Marçal Justen Filho:
É adequada nas hipóteses de objetos dotados de elevada carga de complexidade, em
que a Administração não dispõe de condições de identificar, de modo preciso e
exato, as etapas, as tecnologias e os custos mais adequados. A empreitada integral
propicia, nesses casos, que a Administração atribua aos licitantes uma margem mais
ampla de autonomia para conceber soluções complexas e heterogêneas35
.
Importa destacar que a previsão deste regime de execução indireta pelo particular
contraria normas da Lei nº 8.666/93, mais precisamente os artigos 7º, § 2º, I e II e 40, § 2º, I e
31
Lei 8.666/93 – Art 3º, §3º: A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu
procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.
Art. 40, § 2º: Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: [...] II –orçamento estimado em
planilhas de quantitativos e preços unitários;
Art. 44, § 1º: § 1º: É vedada a utilização de qualquer elemento, critério ou fator sigiloso, secreto, subjetivo ou
reservado que possa ainda que indiretamente elidir o princípio da igualdade entre os licitantes. 32
Lei 12.462/2011 - Art. 9º: Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser
utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justificada e cujo objeto envolva, pelo
menos, uma das seguintes condições: 33
Lei 12.462/2011 - Art.9º,§ 1º: A contratação integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos
projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes,
a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. 34
Lei 12.462/2011 – Art.. 9º, §2º, I: O instrumento convocatório deverá conter anteprojeto de engenharia que
contemple os documentos técnicos destinados a possibilitar a caracterização da obra ou serviço, incluindo: a) a
demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições
quanto ao nível de serviço desejado; b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega,
observado o disposto no caput e no § 1o do art. 6o desta Lei; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os
parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos
impactos ambientais e à acessibilidade. 35
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14 ed. São Paulo:
Dialética, 2010. p.131.
23
II36
, segundo as quais a existência do projeto básico é elementar à consecução de grandes
obras e serviços, devendo o mesmo ser elaborado pela entidade licitante uma vez que esta
procederá o certame de acordo com as suas prementes necessidades. Ademais, tais
dispositivos asseveram a preexistência deste projeto que deverá encontrar-se disponível no
edital para exame dos interessados em participar do processo licitatório.
Os artigos 10 e 2337
do diploma em apreço, por seu turno, incorporam mecanismos de
remuneração do contratado que subordina a contraprestação do mesmo à resultado futuro e
incerto, assemelhando-se a sistematização dos contratos de risco38
.
O primeiro dispositivo prevê a remuneração variável para obras e serviços públicos,
decorrente do desempenho da contratada na consecução de metas e padrões de qualidade além
do esperado e, por conseguinte, da satisfatoriedade da licitante.
O segundo, em contrapartida, institui o contrato de eficiência, a partir do qual a
remuneração devida ao particular ocorrerá segundo a percentagem de economia gerada à
Administração graças à redução de despesas correntes durante a execução do contrato. Assim,
caso não se atinja a economia esperada pelo instrumento contratual, poderá haver o desconto
na remuneração, assim como aplicação de sanções de inexecução do objeto.
Tais hipóteses contrapõem-se aos preceitos regidos pela legislação geral que não
vincula a remuneração do particular à obtenção de metas acerca das quais paira a incerteza de
sua concretização.
Reputa-se, por fim, a dispensada publicação em diário oficial, preceituado pelo art. 15,
§2º39
, nas licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais)
36
Lei 8.666/93 – Art. 7º, § 2º: As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando: I - houver projeto
básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do
processo licitatório; II - existir orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os
seus custos unitários. Art. 40, § 2º: Constituem anexos do edital, dele fazendo parte integrante: I - o projeto
básico e/ou executivo, com todas as suas partes, desenhos, especificações e outros complementos; II -
orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários; 37
Lei 12.462/2011 - Art. 10. Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser
estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de
qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e
no contrato. Parágrafo único. A utilização da remuneração variável será motivada e respeitará o limite
orçamentário fixado pela administração pública para a contratação. Art. 23: No julgamento pelo maior retorno
econômico, utilizado exclusivamente para a celebração de contratos de eficiência, as propostas serão
consideradas de forma a selecionar a que proporcionará a maior economia para a administração pública
decorrente da execução do contrato. 38
Nas palavras de Rafael WallbachSchwind: “[...] Adota-se uma sistemática de contrato de risco, em que o
contratado assume o risco de ter ao menos parte da sua remuneração diretamente vinculada à obtenção de
certos resultados[...]”. Ainda segundo o autor esse modelo de contrato de risco deve ser mais utilizado pela
Administração Pública visto que: “[...] tem muito a contribuir para a maior eficiência na execução de obras e
serviços, sem colocar em risco as prerrogativas da Administração nem comprometer a busca pela satisfação
dos interesses público envolvidos.”. In: SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração variável e contratos de
eficiência no Regime Diferenciado de Contratações Públicas. In: JUSTEN FILHO, Marçal; PEREIRA,
Cesar A. Guimarães (Coord.). Op. cit., p.175-176.
24
para obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de engenharia.
Tal previsão significa manifesta afronta ao Princípio da Publicidade materializado no âmbito
das licitações públicas e consagrado nos artigos 3º,caput e §3º e 21, incisos I, II e III da Lei
8.666/9340
.
Discriminados os preceitos fundamentais do RDC, há que se atentar à forma de
atuação do Estado, no que concerne ao seu posicionamento com a instituição desse regime e,
por conseguinte, de promover o gradual afastamento do procedimento licitatório tradicional
previsto pela Norma Geral de Licitação e Contratos.
Neste ínterim, estaria a Administração afastando os parâmetros burocráticos para
vestir medidas puramente gerenciais? No intuito de encontrar resposta a esse questionamento
remonta-se ao estudo aprofundado dos modelos de Administração Pública.
39
Lei 12.462/2011 – Art. 15. § 2º: No caso de licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e
cinquenta mil reais) para obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de
engenharia, é dispensada a publicação prevista no inciso I do § 1º deste artigo. 40
Lei 8.666/93 – Art. 3º, caput: A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da
isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento
nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da
legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da
vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.[...] § 3º: A
licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao
conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.
Art. 21. Os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e
dos leilões, embora realizados no local da repartição interessada, deverão ser publicados com antecedência, no
mínimo, por uma vez: I - no Diário Oficial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade
da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras financiadas parcial ou totalmente com
recursos federais ou garantidas por instituições federais; II - no Diário Oficial do Estado, ou do Distrito Federal
quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Estadual
ou Municipal, ou do Distrito Federal; III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se
houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço,
fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração, conforme o vulto da licitação, utilizar-
se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição.
25
2. O CONFLITO ENTRE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BUROCRÁTICA E
GERENCIAL
Primeiramente, antes de ser trazer à tona as modalidades de Administração Pública, é
preciso definir com precisão o significado deste termo e suas atribuições.
Em linhas gerais, a Administração Pública nada mais é do que as atividades
desenvolvidas pelo aparato Estatal no intuito de planejar, dirigir e executar as decisões
políticas tomadas no âmbito de qualquer dos três poderes – Executivo, Legislativo e
Judiciário. Trata-se do desenvolvimento inexaurível, sistemático, técnico e legal das funções
precípuas assumidas pelo Estado na gestão da res pública.
O exercício dessas funções deverá ser neutro, despido de ambições particulares,
estritamente vinculado à normatividade, observando-se os ditames da responsabilidade
funcional, enfim, conforme preleciona Hely Lopes Meirelles, “preordenado à realização de
serviços, visando a satisfação das necessidades coletivas41” e colimando a supremacia e a
indisponibilidade do Interesse Público.
Alexandre de Moraes a resume da seguinte maneira:
A administração Pública pode ser definida objetivamente como atividade concreta e
imediata que o Estado desenvolve para a consecução dos interesses coletivos e
subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei
atribui o exercício da função administrativa do Estado42
.
Assim definida, cumpre-nos discorrer sobre o modelo burocrático da Administração.
2.1 Administração Pública Burocrática
A fim de tecer os pormenores dessa vertente burocrática faz-se necessário ponderar
brevemente a vertente antecedente, qual seja a patrimonialista. Esta, por sua vez, era adotada
pelas monarquias absolutistas que precederam o capitalismo e a democratização e
caracterizava-se pela confusão entre o patrimônio público e privado, consubstanciando-se em
verdadeira “extensão do poder soberano do monarca43
”.
41
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ªed. atual. São Paulo: Malheiros, 2002.
Pág.63. 42
MORAES, Alexandre de. Op. cit., p. 303. 43
HENRIQUE, Marco Antônio. Administração Pública Burocrática versus Gerencial: uma análise crítica.
XV Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e XI Encontro Latino Americano de Pós-Graduação –
Universidade do Vale do Paraíba. Disponível em:
<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:qVt1hImQ0XQJ:www.inicepg.univap.br/cd/INIC_2011/anais/
arquivos/0023_0043_01.pdf+administra%C3%A7%C3%A3o+publica+burocratica+a+gerencial&hl=pt&gl=br
26
Marina Silva traduz o modelo do seguinte modo:
O Patrimonialismo é a apropriação privada dos bens públicos. E quando se fala em
bens públicos, não se trata apenas de bens materiais, mas do próprio exercício do
poder. Na visão patrimonialista, o governante é um senhor – como no tempo da
colônia – que tudo pode e o Estado é como se fosse sua propriedade particular.
Consequentemente, os cidadãos não têm direitos de fato. Recebem benesses aqui e
ali, em lugar de exigir os serviços e benefícios que são devidos à sociedade pelo
poder público. Troca-se cidadania por relações de favor pessoal. Aí morrem os
direitos, a justiça, a ética, o bem comum, os valores morais. E aí vicejam a
subserviência, o engodo, o banditismo político, a impunidade, o mau uso do dinheiro
público e a miséria social44
.
Frente à concentração de poderes nas mãos dos monarcas e os germes da nobreza, esse
período foi marcado pela corrupção, nepotismo e usurpação do poder, razão pela qual emergiu
a necessidade de pugnar por uma Administração verdadeiramente Pública que resguardasse os
interesses do corpo social e não dos seus próprios governantes.
Eis que surge a burocratização como consequência de uma ordem racional-legal, a
qual promove uma mudança quantitativa e qualitativa da Administração que carece da
estrutura adequada para garantir condições mínimas de gerenciamento, planejamento,
manutenção do aparato estatal e acompanhamento dos anseios sociais dentro de um contexto
socioeconômico tão complexo como mostrou ser o capitalismo.
Sob este prisma, Max Weber, principal expoente deste modelo, ao dedicar-se ao
estudo sistemático de suas organizações, não se preocupou em defini-lo, atribuindo-lhe um
conceito rígido mas limitou-se, tão somente, ao delineamento das características que lhe são
intrínsecas, as quais passam-se, sucintamente, a serem expostas45
:
Autoridade racional-legal: a autoridade do administrador, nesse caso, parte de um
pressuposto legal que legitima suas ações e decisões. Tal normatividade encontra-se livre de
tradições e subjetividades, trazendo meios coercitivos para assegurar sua aplicação. Insta
salientar que essa mesma norma que atribui poderes ao administrador mostra ser fonte de
&pid=bl&srcid=ADGEESjre3Qh6XccIcgujj8_UvXsqBwm__vpcJVEbVRLiBZaIuaxXMKCXwNYqJuaCfkg
Hu2VylNswZZMzTXak0ws5DshlElPstm3QLQKvre8b9PuLzBaswrzGRqdQ6ayx7OX6srBJ_oN&sig=AHIEtb
QFcgOm8Ea-j6QwWCLwC5WIspFOPQ>. Acesso em abr. de 2013. 44
SILVA, Marina. Reflexões sobre a Independência. Publicado na Gazeta do Rio Branco/AC e no site do
senado no link:
<http://www.senado.gov.br/senadores/senador/marinasi/detalha_artigo.asp?data=05/09/2000&codigo=1526>.
apud Apostila da Fapan – Faculdade de Paraíso do Norte. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:tAwtaqYnOlcJ:www.fapanpr.edu.br/site/docente/arq
uivos/Administracao_Publica_Apostila01.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br> Acesso em jan. de 2014. 45
TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Estado, Democracia e Administração Pública no Brasil.
1ªed..Rio de Janeiro: FGV, 2004. Pág. 19-22. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we
beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%
C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014.
27
restrição ao mesmo, haja vista que o agente somente está autorizado a atuar na medida dos
preceitos instituídos, ou melhor, segundo a própria lei (secundum legem).
Regras rígidas: as funções administrativas são meticulosamente discriminadas. Em
linhas gerais, os atos administrativos também são vinculados, não cabendo juízos de valores e
nem análises de conveniência e oportunidade pelo agente.
Hierarquia: o sistema de atribuições dos serviços público é hierarquicamente
organizado, coexistindo superiores e subordinados.
Impessoalidade: Aplicação de regras universalistas e abstratas que abarquem
administradores e administrados. Este preceito externa-se pela consagração do concurso
público enquanto meio de seleção a emprego ou cargo público, através do qual se promove o
acesso amplo, democrático e qualificado ao quadro de pessoal da Administração Pública,
fomentando a moralização do setor estatal em detrimento do nepotismo e política de
privilégios, antes imperantes. Essa universalização de acesso tende a promover a qualificação
do quadro técnico vez que a aprovação somente ocorre quando vencida todas as etapas que
permitem uma análise de conhecimentos específicos e dos títulos do profissional. Neste
diapasão, segundo Weber, o administrador burocrata cria uma espécie de compromisso com a
causa pública, identificando-se com os objetivos instituídos pelo órgão, departamento ou ente
para o qual exerce suas funções. Trata-se de uma assimilação impessoal, ou seja, não se
vincula a uma pessoa, um superior hierárquico, por exemplo, consubstanciando-se, tão
somente, em uma admiração pelos preceitos e serviços atinentes à organização.
Especialização: promove-se verdadeira divisão racional do trabalho “em que as
competências profissionais e jurisdicionais são claramente definidas por critérios técnicos”46
.
Institui-se uma cultura corporativa na qual se separa o planejamento da execução, cabendo a
Administração concretizar os objetivos delimitados pela política.
Continuidade e controle: os serviços públicos são contínuos, ininterruptos, o que
significa que não cessam ao bel prazer dos administradores visto que a prestação dos mesmos
recai sobre a coisa pública, bem pertencente ao corpo social, não se submetendo ao alvedrio
de particulares A existência do controle dos meios e procedimentos também é incisivo,
almejando-se o gerenciamento das atividades e a consecução das finalidades segundo a lei e o
interesse público.
46
Idem. Ibidem. p. 20. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we
beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%
C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014.
28
In suma, essa forma de administração baseia-se no controle rígidos dos meios, na
criação de instituições e órgãos hierarquizados, na impessoalidade, no formalismo, na estrita
observância a procedimentos e regulamentos legalmente delineados, inaugurando o
profissionalismo do serviço público.
Com o advento da Constituição de 1988, instituem-se no ordenamento brasileiro os
preceitos burocráticos, consagrando os princípios regentes de toda a atividade administrativa.
A Carta Magna, sobretudo, esboça traços dessa burocratização, os quais se encontram
previstos em inúmeras de suas disposições, dentre elas a menção expressa aos princípios da
legalidade, legitimidade e economicidade trazidos pelo art. 7047
e aos preceitos de legalidade,
eficácia e eficiência presente no art.74, II48
; a previsão de concurso público enquanto a via
única e legitima para o ingresso no serviço público (art. 37, II49
); o dever de probidade pelo
servidor, assim como as sanções oriundas de sua inobservância, tais como a suspensão dos
direitos políticos, perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao
erário, sem prejuízo da ação penal cabível (§4º do art.3750
) e da propositura de ação civil
pública pelo Ministério Público (Lei 8.429/92); submissão dos processos de obras, aquisição
de bens, serviços e alienações à realização de licitações públicas, nos termos da lei (art. 37,
XXI51
); e etc.
A despeito dos inúmeros atributos acarretados pela forma burocrática, há doutrina que
defende que esse modelo operacional ostenta uma estrutura inflexível e fechada sobre si
mesma, que se divorcia da defesa da res publica e, ate mesmo, da própria democratização,
veja-se:
47
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 70: A fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à
legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo
Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. [sem grifos
no original]. 48
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 74, II: comprovar a legalidade e avaliar os
resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e
entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito
privado; [sem grifos no original]. 49
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, II: a investidura em cargo ou emprego
público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo
com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações
para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; [sem grifos no original]. 50
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 4º: Os atos de improbidade administrativa
importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. [sem
grifos no original]. 51
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, XXI: ressalvados os casos especificados na
legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de
pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as
exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
29
Por um lado, a democracia requer e incentiva a participação individual, além de
desenvolver as condições históricas que exigem o crescimento da administração
pública. Por outro, o modelo burocrático tende a inibir, ou mesmo impedir, a
participação do cidadão anteriormente mobilizado nas decisões mais fundamentais
do Estado.52
.
As exigências da democracia se esbarram nas obstruções desnecessárias inerentes à
burocratização, sendo essa administração “supostamente” ineficiente, lenta e desmotivada,
incapaz de voltar-se para as demandas da sociedade. Sob esta perspectiva, alega-se que a
designação de um modelo focado tão somente no método, mostra ser eficaz no que diz
respeito ao controle de abusos, derivando, porém, na ineficiência de suas repartições e na
morosidade de seus pleitos.
No intuito de aproximar os serviços públicos à população, promovendo-se uma gestão
efetiva e assegurando-se a participação dos interessados por meio dos direito sociais
consagrados pela Carta Maior, é que surge o Princípio da Eficiência basilar à Administração
Gerencial, consoante será abordado a seguir.
2.2 Administração Pública Gerencial e Princípio da Eficiência
2.2.1 A Administração Pública Gerencial
O modelo burocrático, o qual primava pela formalidade, controle dos abusos e rigidez
dos meios sucumbiu frente aos anseios da própria democratização que carecia de uma
participação ativa de seus cidadãos, colimando pela primazia dos interesses dessa
coletividade53
.
Na medida em que o Estado assumia novas dimensões, oriundas das inovações
suscitadas na Carta Política, seus encargos não se restringiram ao controle rígido dos
processos devendo a gestão dos bens coletivos propagar-se no intuito de garantir o pleno
exercício dos direitos sociais consagrados pela CF/88.
52
TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Op. cit., p. 12. Disponível em:
<http://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we
beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%
C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.Acesso em jan. de 2014. 53
Idem. Ibidem, p. 171e ss. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%C3%BAblica+we
beriana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=onepage&q=Administra%C3%A7%
C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>. Acesso em jan. de 2014.
30
Nessa nova sistemática o Estado deixa de assumir funções puramente econômicas para
curar o interesse público primário54
, desvinculando-se da entidade em si, enquanto sujeito de
direito, e assumindo o papel de gestor social, atento às políticas públicas. Tudo isso somado à
selvageria capitalista, à tecnologia da informação e à necessidade de sobrevivência no
contexto internacional, exigiram uma nova postura do aparato estatal, através da qual
objetiva-se uma cultura gerencial nas organizações, que clama por eficiência e qualidade dos
serviços prestados.
A partir de tais inovações incutiu-se o paradigma do cidadão-cliente, compartilhando
algumas diretrizes da iniciativa privada, da qual se assemelha ao sobrelevar a satisfatoriedade
dos cidadãos com os resultados alcançados, como se clientes fossem.
Contudo, é imperioso que tais aproximações não sejam confundidas com uma tentativa
da Administração de imiscuir-se ao setor privado, sendo necessário abalizar as diferenças de
uma dinâmica gerencial para a privatização do aparato estatal em si.
Com efeito, “as condições institucionais terão que ser necessariamente diferentes das
existentes no setor privado, já que o Estado não opera através de trocas mas de transferências,
o mecanismo de controle não é o mercado mas o da política e da administração, e o objetivo
não é o lucro mas o interesse público55
”, como bem asseverou Luiz Carlos Bresser Pereira.
Em atenção à complexidade da realidade imposta, faz-se necessário adaptar as práticas
de gestão comumente empregadas pelos particulares às peculiaridades do setor público,
coordenando a coexistência de agentes públicos e seu rendimento funcional, de organizações
privadas, de instituições do terceiro setor, de cidadãos e politicas públicas.
54
Não há como mencionar o interesse público sem trazer à tona a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello que
promove a distinção entre interesse público primário e secundário: “Uma vez reconhecido que os interesses
públicos correspondem à dimensão pública dos interesses individuais, ou seja, que consistem no plexo dos
interesses dos indivíduos enquanto partícipes da Sociedade (entificada juridicamente no Estado), nisto
incluindo o depósito intertemporal destes mesmos interesses, põe-se a nu circunstâncias de que não existe
coincidência necessária entre interesse público e interesse do Estado e demais pessoas de Direito Público. É
que, além de subjetivar estes interesses, o Estado, tal como os demais particulares, é, também ele, uma pessoa
jurídica, que, pois, existe e convive no universo jurídico em concorrência com todos os demais sujeitos de
direito. Assim, independentemente do fato de ser, por definição, encarregado dos interesses públicos, o Estado
pode ter, tanto quanto as demais pessoas, interesses que lhes são particulares, individuais, e que, tal como os
interesses delas, concebidas em suas meras individualidades, se encarnam no Estado enquanto pessoa. Este
últimos não são interesses públicos, mas interesses individuais do Estado, similares, pois (sob o prisma
extrajurídico), aos interesses de qualquer outro sujeito.” “[...] os interesses secundários do Estado só podem ser
buscados quando coincidentes com os interesses primários, isto é, com os interesses público propriamente
ditos.” In: MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 65-66. 55
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A Reforma Gerencial do Estado de 1995. Revista de Administração Pública
– RAP. Rio de Janeiro (34). Julho, 2000. . 55-72. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/papers/2000/81RefGerenc1995-INA.pdf>. Acesso em jan. de 2014.
31
Salienta-se que dentro dessa perspectiva os clientes-cidadãos possuem mecanismos de
cobrança da eficácia da atividade administrativa, aferindo o desempenho dos agentes públicos
através de mecanismos de controle social.
Apesar desse novo modelo representar um afastamento das diretivas traçadas pela
burocratização, não configura uma completa ruptura com a vertente precedente. O que ocorre,
na verdade, é a flexibilização das principais conquistas da boa administração, tais quais a
avaliação sistemática, a recompensa pelo desempenho e a capacitação permanente,
adaptando-as aos anseios sociais e ao dinamismo característico da cultura gerencial.
Essa reestruturação da máquina administrativa, tenta avivar a capacidade de
implementar políticas públicas e pôr termo ao “anacronismo do modelo burocrático
tradicional”56
.
O modelo gerencial, portanto, promove o fortalecimento do núcleo estratégico do
estado por meio da descentralização das decisões, delegando maiores responsabilidades ao
gestor público, e da política que prima pela eficácia dos resultados.
Logo, será marcado pela alocação racional dos recursos, por uma política de
planejamento, pela resiliência sistemática e pela elasticidade, isso sem mencionar que essa
nova administração também propende exterminar uma obediência acrítica pelo servidor, que
cumpre suas funções segundo os procedimentos arcaicos, metodicamente alinhavados, sem
inová-los ou readaptá-los às necessidade vigentes a cada caso concreto. Neste diapasão,
objetiva-se usufruir não só do conhecimento técnico mas, principalmente, da capacidade
inovadora dos seus agentes, concedendo-os maior autonomia e liberdade de exercício, de
forma a potencializar a tomada de decisões imediatas e sobrelevar a motivação e a autoestima
do funcionalismo público.
Notadamente, a organização e funcionamento desse novel modelo caracteriza-se pela
busca na qualidade e eficácia dos serviços públicos, pela atividade administrativa voltada à
consecução de objetivos, à redução de custos e à predominância de uma política alicerçada
nos resultados57
, tudo isso com vistas a atender satisfatoriamente as demandas do cidadão-
56
Essa ideia é veiculada no Plano Diretor da Reforma do Estado. In: MARE (Ministério da Administração e
Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho Estatal. Brasília: Presidente da República,
Imprensa Oficial. Novembro de 1995. p. 17. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan.de 2014. 57
CUNHA, Marcos André da e RUIZ, Ivan Aparecido. O Princípio da eficiência na Administração Pública:
propostas para a otimização da cobrança judicial da dívida ativa. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Hv5WH9BE_FAJ:www.escoladegoverno.pr.gov.br/
arquivos/File/gestao_de_politicas_publicas_no_parana_coletanea_de_estudos/cap_8_administracao_e_previde
ncia/capitulo_8_3.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014.
32
cliente. Tais atributos, sobretudo, corroboram a estreita relação existente entre a
Administração Pública Gerencial e o Princípio da Eficiência.
Sob este prisma, para fins ilustrativos e no intuito de facilitar o entendimento da
cultura gerencialista, cumpre discorrer, brevemente, a respeito da sua aplicação no
ordenamento pátrio e de sua interligação ao Princípio da Eficiência.
2.2.1.1 A Reforma Administrativa no Brasil
A primeira tentativa de implementar uma Administração Gerencial em detrimento da
burocratização inerente ao setor público brasileiro remonta-se ao Decreto-Lei nº 200 de
196758
. Em verdade, tal espécie normativa consubstanciou-se na tentativa de incutir maior
dinamismo operacional às atividades econômicas do Estado através da descentralização
funcional. Todavia, essa maior operacionalidade foi atribuída somente à Administração
Indireta, permanecendo a estrutura da Administração Direta enraizada à rigidez dos meios e
ineficiência dos resultados não conseguindo irromper, portanto, com a “obsolescência” do
núcleo burocrático e nem consolidar uma vertente gerencial.
Posteriormente a essa iniciativa, adveio a crise nos anos 80, a qual ameaçou o modelo
econômico vigente com a expressiva redução na taxa de crescimento econômico, aumento do
desemprego, elevados índices de inflação e o completo esgotamento da estratégia de
substituição de importação59
.
Nesse contexto, a redefinição do papel do estado na década seguinte tornou-se tema
cogente e, em resposta à crise econômica-social, surge a tentativa de reforma do aparato
estatal com vista a “resgatar a autonomia financeira e capacidade de implementar políticas
públicas60
”, por meio do ajuste fiscal.
Ademais, a reforma da máquina administrativa urgiu da necessidade da própria
democratização e cidadania que exigem a satisfatoriedade e o atendimento das demandas
58
BRASIL, Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração
Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm>. Acesso em agosto de 2013. 59
MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho
Estatal. Brasília: Presidente da República, Imprensa Oficial. Novembro de 1995. Pág. 10. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de
2014. 60
Idem. Ibidem, p.11. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de
2014.
33
sociais. A partir de então, o Estado assumiu um papel decisivo não só no plano econômico
mas, principalmente, social.
No ano de 1995, sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso (FHC), apresenta-se
à sociedade a proposta da Reforma, no intuito de consagrar novas instituições legais e
organizacionais. O elemento ordenador desse marco inaugural da Administração Gerencial foi
o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, elaborado pelo Ministério da
Administração e Reforma do Estado, comumente abreviado por MARE.
A proposta governamental veiculada nessa exposição visou, em primeiro plano,
instrumentalizar a reforma na Administração Pública Federal, mas os preceitos ali expostos
também poderiam incidir no âmbito municipal e estadual.
O Plano Diretor alvitrava, na verdade, a transferência para o setor privado das
atividades que podem ser geridas segundo o mercado e a promoção da publicização, que
consiste na cessão para o setor público não-estatal da “produção de serviços não competitivos
ou não exclusivos de Estado, estabelecendo-se um sistema de parceria entre Estado e
Sociedade para seu financiamento e controle.61
”. A partir de tais inciativas, figura-se a
parceria do setor público com Organizações Sociais (OS), com as Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público (OSCIP) e a celebração dos termos de Parceria Público-Privada
(PPP)62
.
Sob essa sistemática, conduziu-se à privatização de várias empresas estatais nacionais,
tais quais a Companhia Vale do Rio Doce (empresa do setor de mineração e siderurgia), a
Telebrás (empresa de telecomunicações) e o Banespa (banco pertencente ao governo do
estado de São Paulo)63
, que foram adquiridas em sua totalidade ou majoritariamente por
grupos estrangeiros.
Neste toante, reduziu-se significativamente a função do Estado enquanto prestador dos
serviços públicos, para enfatizar seu papel enquanto regulador, gestor, propriamente dito. É
61
Idem. Ibidem, p.13. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan. de
2014. 62
Acerca desses institutos jurídicos asseverou Celso Antônio Bandeira de Mello: “Tais figuras foram concebidas
ou para copiar mimeticamente instituições alienígenas, sem nenhuma relação com a índole do direito local, ou
para proporcionar ampla proteção aos inversores estrangeiros ou mesmo para exponenciar as “privatizações”,
designação que se deu para a retratação do Estado e liberação dos mercados à cobiça dos adventícios. É
prescindendo dizer que na implantação destas “novidades” o Direito Constitucional Pátrio foi atropelado sem
contemplações.” MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op.cit., p.1085. 63
CARVALHO, Leandro. Governo Fernando Henrique Cardoso. Fernando Henrique Cardoso (FHC), durante
os dois mandatos como presidente da República, efetivou o Plano Real, privatizou várias estatais brasileiras e
implantou a política neoliberal. Disponível em:< http://www.brasilescola.com/historiab/governo-fernando-
henrique-cardoso.htm>. Acesso em: fev.de 2014.
34
nesse quadro que se estrutura a migração da política rígida da administração burocrática para
o modelo gerencial em que prevalece a flexibilidade
É preciso, agora, dar um salto adiante, no sentido de uma administração pública que
chamaria de ‘gerencial’, baseada em conceitos atuais de administração e eficiência,
voltada para o controle dos resultados e descentralizada para poder chegar ao
cidadão, que, numa sociedade democrática, é quem dá legitimidade às instituições e
que, portanto, se torna ‘cliente privilegiado’ dos serviços prestados pelo Estado64
.
A reforma suscitada era ampla, abarcando vários setores nacionais e resumia-se
basicamente em promover a liberalização comercial em abandono à estratégia simplesmente
protecionista e instituir uma política de governança vez que a capacidade do estado em
promover políticas públicas encontra-se reduzida em razão da suposta ineficiência e rigidez
dos processos na seara administrativa.
A abertura do mercado nacional às empresas estrangeiras ocasionou duras críticas ao
governo FHC, sendo o nosso país alvo de um crescimento econômico ilusório para vivenciar,
ainda no seu segundo mandato, uma grande recessão econômica.
A experiência de uma cultura gerencial no nosso país inaugurou-se pelo extremismo, o
qual evidenciou que a transferência de serviços essenciais inerentes a Administração Pública à
iniciativa privada pode ocasionar danos irreversíveis à sociedade quando não regulamentados
com propriedade ou quando puramente subvertidos a interesses políticos e de concentração do
poder.
A despeito da existência de inúmeras críticas tecidas a esse governo, não cabe
tecermos os pormenores dessa análise, sob pena de fugir ao objeto central do presente estudo.
Contudo, merece a devida atenção o fato dessa cultura gerencial ter se enraizado no cenário
nacional, sendo possível evidenciar traços característicos na nossa própria Lei Maior. A título
de exemplificação, adverte-se alguns dos principais dispositivos constitucionais nesse sentido:
Art. 37, § 3º65
: que sucintamente viabiliza a participação do usuário na Administração
Pública direta e indireta, garantindo avaliações periódicas da qualidade dos serviços; o acesso
a informações sobre atos do governo e a representação contra o exercício negligente ou
abusivo do cargo, empresa ou função;
64
MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Op.cit., Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso emjan.de 2014. 65
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 3º: A lei disciplinará as formas de
participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: I - as reclamações
relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao
usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; II - o acesso dos usuários a
registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII;
III - a disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na
administração pública.
35
Art. 37, § 8º66
: que institui a figura do contrato de gestão que eleva a autonomia dos
órgãos e entidades públicas em troca da fixação de metas de desempenho a cumprir;
Art. 41, §1º, inciso III67
: Imposição de avaliações periódicas de desempenho.
Obtempere-se que a consagração do Princípio da Eficiência, basilar da atividade
administrativa, fora introduzido à ordem constitucional brasileira por força da EC 19/98
promulgada ainda no primeiro mandato presidencial do FHC, mais exatamente em 04 de
junho de 1998.
Por tais razões, resta clarividente que a positivação desse axioma, juntamente com
todas as outras mudanças no âmbito administrativo, são reflexos das ambições políticas de ver
concretizado o novel modelo gerencial, razão pela qual se passa ao exame desse postulado
constitucional.
2.2.2 O Princípio da Eficiência
O Princípio da Eficiência ingressou expressamente na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 por intermédio da EC 19/98, positivando-se ao lado dos demais
(Legalidade, Impessoalidade, Moralidade e Publicidade) enquanto premissa regente da
Administração Pública, estatuídos no caput do art. 3768
.
Ampla discussão doutrinária paira no sentido de ser a Eficiência um preceito implícito
à atuação do Administrador, balizado aos Princípios da Legalidade e Impessoalidade, vez que
a gestão dos interesses da coletividade é indissociável do dever do agente de agir com
presteza e rendimento funcional na busca pela otimização dos resultados ambicionados.
Afinal, qualquer raciocínio em sentido diverso, remonta a uma incongruência lógico-jurídica
inaceitável à sistemática da Administração Pública. Neste ínterim, urge a lição de Celso
Ribeiro Bastos:
O princípio da eficiência, certamente, é um daqueles que já, antes da Emenda
Constitucional nº 19/98, poderia ser extraído do sistema de princípios que regem a
66
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 8º A autonomia gerencial, orçamentária e
financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a
ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de
desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: I - o prazo de duração do contrato; II - os
controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes; III - a
remuneração do pessoal. 67
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 41, § 1º: O servidor público estável só perderá o
cargo: [...] III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar,
assegurada ampla defesa. 68
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, caput: A administração pública direta e
indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
36
Administração Pública. Isso mostra-se um tanto óbvio, pois não seria razoável
pensar em atividades da Administração Pública desempenhadas com ineficiência e
sem o atingimento dos resultados dentro do seu objetivo maior, qual seja, a
realização do bem comum69
.
O reconhecimento da existência desse princípio anteriormente a sua previsão expressa
por força da aludida emenda, decorre da redação prevista pelo art.74, inc. II da CF/8870
que já
mencionava o controle interno dos poderes para atender a eficiência. Ademais, o Decreto-Lei
200/67, que dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a
Reforma Administrativa e dá outras providências, também possui regras que enaltecem a esse
preceito. A guisa de exemplificação, menciona-se as principais: fortalecimento do sistema de
mérito (art. 25, VII71
); dirigentes capacitados (art.25, V72
); supervisão ministerial das
entidades da administração indireta (art. 26, III73
) e demissão de servidor ineficiente ou
desidioso (art. 10074
).
Outrossim, a própria jurisprudência75
e doutrina76
pátria pacificaram a presença, ainda
que subentendida, desse princípio no nosso ordenamento, determinando-o, na maioria das
vezes, enquanto dever, ou melhor, verdadeiro encargo do agente investido em função ou
cargo público.
Sem adentrar no mérito dessa questão, ressalta-se que o fato do poder constituinte
reformador consagrá-la expressamente apenas positivou o entendimento esposado pela
doutrina e pelos tribunais, corroborando a importância desse princípio no nosso ordenamento
e a imperatividade que impõe sua estrita observância pelos agentes no exercício do múnus
público.
A jurisdicionalização desse preceito, indubitável à Administração Pública Direta e
Indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
é exigência do próprio Estado Democrático e Social do Direito que deve primar pela
69
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito administrativo. São Paulo: Celso Bastos, 2002. p.79. 70
Vide o teor da nota de rodapé nº 45. 71
Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. – Art. 25, VII – Fortalecer o sistema do mérito. 72
Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art. 25, V: Avaliar o comportamento administrativo dos
órgãos supervisionados e diligenciar no sentido de que estejam confiados a dirigentes capacitados. 73
Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art. 26, III: A eficiência administrativa. 74
Decreto-Lei Nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 – Art.100: Instaurar-se-á processo administrativo para a
demissão ou dispensa de servidor efetivo ou estável, comprovadamente ineficiente no desempenho dos
encargos que lhe competem ou desidioso no cumprimento de seus deveres. 75
O doutrinador Alexandre de Moraes evidencia o reconhecimento do princípio da eficiência pelo próprio
Superior Tribunal de Justiça, transcrevendo para tanto parte da ementa do acordão prolatado em sede do
Recurso em Mandado de Segurança nº 5.590/95(STJ. 6ª T – RMS nº 5.590/95 – DF – Rel. Min. Luiz Vicente
Cernicchiaro, Diário da Justiça, Secção I, 10 jun. 1996, p. 20.395), veja-se: “a Administração Pública é regida
por vários princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade (Const. art 37). Outros também
evidenciam-se na Carta Política. Dentre eles, o princípio da eficiência. A atividade administrativa deve
orientar-se para alcançar resultado de interesse público”. MORAES, Alexandre de. Op.cit., p. 308. 76
MEIRELLES, Hely Lopes. Op.cit., p.102.
37
concretização dos resultados socialmente relevantes. A propósito, prelecionou Hely Lopes
Meirelles: “Toda atividade do administrador público deve ser orientada para esse objetivo. Se
dele o administrador se afasta ou desvia, trai o mandato de que está investido, porque a
comunidade não institui a Administração senão como meio de atingir o bem estar social77”
.
Questão de suma importância remonta a definição de Eficiência dentro do
ordenamento nacional, a qual demonstra ser consequência da apropriação pelo constituinte
derivado de termo genuinamente nacional, empregado em sua acepção comum, qual seja: o
rendimento associado aos resultados obtidos e aos recursos empregados.
Desta maneira, a atuação eficiente exprime acepção tanto quantitativa quanto
qualitativa, ao passo que assume uma dimensão de racionalidade e otimização do uso dos
meios, ao mesmo tempo que estima pela satisfatoriedade social dos resultados obtidos por
intermédio da atividade administrativa. Sob este prisma, urge o posicionamento doutrinário:
Assim, a verificação da eficiência atinge os aspectos quantitativo e qualitativo do
serviço, para aquilatar o seu rendimento efetivo, do seu custo operacional e da sua
real utilidade para os administrados e para a Administração. Tal controle
desenvolve-se, portanto, na tríplice linha administrativa, econômica e técnica78
.
Observada essa pluridimensionalidade, é notório que a avaliação meramente
quantificada dos resultados não mostra ser suficiente para aferir a efetividade dessa premissa,
fazendo-se necessário um juízo atinente à qualidade desses efeitos, bem como o correto
aproveitamento dos meios empregados para tanto.
Sendo a concretização do bem comum, ou o interesse primário propriamente dito, o
desiderato máximo da atividade estatal, a eficiência se posta enquanto recurso de otimização
que garanta a proporcionalidade entre a conduta do agente estatal e o efeito social aspirado,
investindo-se enquanto instrumento de “adequação dos meios aos fins”79
.
A eficiência revela-se, portanto, pela aversão aos excessos, formalidades enraizadas e
negligência dos agentes, para se consagrar na idoneidade dos meios e excelência dos
resultados alcançados na razoabilidade do agir administrativo. Acerca do tema, asseveraram
os autores:
O Princípio da Eficiência, assim, apresenta-se como elemento normativo que impõe
ao agente público uma atuação voltada à utilização mais racional dos recursos
disponíveis, precedida de planejamento e organização, objetivando o alcance de
77
Idem. Ibidem, p. 85. 78
Idem. Ibidem, p.103. 79
RODRIGUES, Marilene Talarico M. Princípio da eficiência em matéria Tributária. In: MARTINS, Ives
Gandra da Silva (Coord.). 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais e Centro de Extensão Universitária, 2006.
Pág. 105.
38
melhores resultados institucionais, sem se descurar da finalidade essencial da
Administração Pública, que é o atendimento ao interesse público.80
Convém ressaltar que a inserção desse princípio pelo constituinte derivado originou-se
da Reforma Administrativa de 1998 ter se fundamentado no modelo de Administração
Pública Gerencial, a qual anseia pelo rendimento funcional mas, sobretudo, pela garantia de
resultados satisfatórios segundo o paradigma do cidadão-cliente, como já exposto.
2.3 A desburocratização da Administração e o RDC
A instituição do Regime Diferenciado de Contratação Pública – RDC – significou uma
tentativa do Estado de se evadir dos meios rígidos semeados pela Lei nº 8.666/93 para burlar e
facilitar o direcionamento e as fraude nos certame de licitações e contratações públicas.
Como outrora mencionado, a escusa para a criação de um regime excepcional
sucedeu-se com base na promoção de medidas céleres destinadas a realização dos eventos
desportivos mundiais sediados pelo Brasil, de modo a evitar os riscos de atraso na consecução
da infraestrutura necessária.
Não bastasse, incutiu-se na mídia e nos meios sociais a ideia de que o processo
licitatório promovido segundo a Lei Geral de Licitação e Contratos Públicos representava um
entrave na medida em que engessava o certame com formalidades desnecessárias e era
ineficiente no que tange ao atendimento das demandas da sociedade. Essa falsa acepção fora
criada para fortalecer esse regime excepcional, sendo empregada verdadeira manobra política
para sua implementação, enxertando ao ordenamento proposições concatenadas e bem
articuladas, delineadas segundo a necessidade eminentemente “técnica” de renovar os
institutos jurídicos de acordo com a realidade fática. Esse clamor tecnicista tenta imprimir
uma pretensa neutralidade, diga-se de passagem, bem distante da Lei 12.462/201181
.
Adverte-se, ainda, os vícios formais de constitucionalidade maculados no processo de
concepção do RDC, que se valeu do atropelo à conversão da medida provisória e do direito
parlamentar de emenda para encurtar o devido processo legislativo e usurpar a competência
constitucionalmente designada, rompendo a harmonia entre os Poderes. Associado a tais
vícios encontra-se a constante ampliação das hipóteses, a princípio taxativas, de aplicação do
80
CUNHA, Marcos André da e RUIZ, Ivan Aparecido. O Princípio da eficiência na Administração Pública:
propostas para a otimização da cobrança judicial da dívida ativa. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Hv5WH9BE_FAJ:www.escoladegoverno.pr.gov.br/
arquivos/File/gestao_de_politicas_publicas_no_parana_coletanea_de_estudos/cap_8_administracao_e_previde
ncia/capitulo_8_3.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014. 81
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 1076.
39
RDC e o completo afastamento dos preceitos da Lei nº 8.666/93 quando adotado esse regime,
que, claramente, reafirmam a tentativa da Administração Gerencial de consagrar-se no cenário
nacional.
De fato essa aplaudida necessidade de reestruturar o procedimento licitatório significa
a redefinição da Administração Pública e do processo de desburocratização do aparato estatal.
Trata-se da tentativa da semear os germes de uma cultura gerencial exacerbada no intuito de
sobrelevar a eficiência em detrimento da legalidade, impessoalidade, moralidade, isonomia,
publicidade, transparência nas contratações e outros preceitos regentes das licitações.
Ocorre, na verdade, que o significado de Burocrático e os preceitos expostos por esse
modelo administrativo encontram-se corrompidos pela má utilização, o que não pode ser
entendido por ineficiência. O que deve ser sopesado, nesse caso, é a segurança jurídica
cingida pelo instituto que através da operacionalização dos meios alcança legitimamente os
resultados almejados. Como bem preleciona Celso Antônio Bandeira de Mello, a segurança
jurídica cuida “de evitar alterações surpreendentes que instabilizem a situação dos
administrados e de minorar os efeitos traumáticos que resultem de novas disposições jurídicas
que alcançariam situações em curso[...]”.82
É cediço que a formalização rigorosa do certame licitatório e a impessoalidade,
resguardadas pela Norma Geral, consentem com os moldes burocráticos weberianos, no
intuito de extirpar a discricionariedade individual e subjetividade, atendo-se aos reclames de
probidade administrativa. Tudo isso consente para o fim precípuo da atividade administrativa,
qual seja, atender o interesse público primário, o que somente será alcançado na estrita
observância dos preceitos legais instituídos.
É sob essa perspectiva que o termo burocrático deve ser interpretado, sendo
propiciador do funcionalismo no setor público através da hierarquia, da impessoalidade e da
especialização. Uma suposta obsolescência e rigidez técnica apenas são suscitadas pelos
gerencialistas no intuito de infundir verdadeira intromissão de interesses privados na esfera
pública.
Com efeito, o intuito da Legislação Geral (Lei 8.666/93) é justamente evitar qualquer
forma de controle político sobre a máquina administrativa, bem como delinear a separação
dos papéis designados ao setor público e aos particulares, o que não se configura na
administração gerencial e que resta por comprometer toda a lisura do certame.
82
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 115.
40
O encurtamento de prazos, simplificação de procedimentos e flexibilização de
requisitos demonstram que esse regime excepcional preocupou-se tão somente com os
resultados, sem preponderar se os meios utilizados para tanto são razoáveis e observam a
estrita legalidade inerente a própria atividade administrativa.
Por consequência lógica, não há que se falar em Eficiência na ausência do devido
controle e planejamento dos métodos, fato este que irá denegrir todo e qualquer tipo de
resultado. Esse vocábulo, portanto, não deve ser entendido puramente por apreensões
quantitativas e satisfatórias, mas sim observar a qualidade e a realidade jacente. De que nos
adianta estruturas faraônicas de estádios se a situação no transporte público, educação, saúde e
segurança estão em pleno caos? Como pode haver eficiência pela aplicação do RDC se às
vésperas dos eventos não houve sequer uma efetiva melhora no caos da aviação civil, nas
rodovias e no trânsito caótico dos grandes centros urbanos?
Esse redesenho programático da Administração, ao dar primazia extrema a uma
eficiência apenas aparente e momentânea, afasta a razoabilidade coerente e sobrejulga os
demais preceitos constitucionais consagrados na nossa Lei da República, conforme será
abordado a seguir.
41
3. ANÁLISE DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO RDC
3.1 Afronta aos Princípios Basilares da Administração Pública
Com o advento da Constituição de 1988, foram positivados os princípios regentes da
Administração, o que exprimiu o fenômeno da “Constitucionalização da Administração
Pública83
”, como bem observou Cármem Lúcia Antunes Rocha. Desta feita, por força da EC
19/98, já objeto de estudo, o caput do artigo 37 recebeu a seguinte redação:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:84
[...]
A partir da redação do enunciado e da totalidade do dispositivo em comento (incisos,
alíneas e parágrafos), a Administração se consolidou no ordenamento jurídico, sendo suas
funções meticulosamente delineadas pelo legislador constituinte.
A inserção desse postulado axiológico possibilitou a releitura das atividades precípuas
da Administração, bem como o modus operandi das mesmas. Ademais, sedimentou-se
verdadeira garantia ao cidadão que, em meio ao parâmetro instituído, poderá exercer o
controle sobre os deveres indeclináveis do agente público, condicionando-os à observância
dos preceitos constitucionalizados que significam expressão máxima da vontade do titular dos
interesses administrados – o povo85
.
A Administração pós-1988 deve, assim, ser encarada sob a ótica constitucional e
desvinculada da politicagem que se imiscuía ao exercício de suas funções.
Ante o exposto, remete-se ao exame da constitucionalidade material do RDC,
enfatizando-se os contrapontos com os cânones constitucionais positivados no caput do art.
37 da CF/88. Frise-se que esse regime de exceção macula não só os princípios expressos no
dispositivo em apreço, opondo-se a diversos outros preceitos instituídos na Carta Política,
implícitos ao ordenamento pátrio e até mesmo àqueles incutidos pelas normas
infraconstitucionais, mais precisamente a Lei Geral de Licitação e Contratos.
83
Nas palavras da Ministra do Supremo Tribunal Federal a “administração pública constitucionalizou-se”.
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del
Rey, 1994, p.15. 84
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em mar. de 2013. 85
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p.84.
42
No entanto, por uma questão puramente didática, apenas os postulados constantes do
enunciado do art. 37 da Constituição, serão objetos da análise dessa incompatibilidade
substantiva.
3.1.1 Violação à Legalidade
O Principio da Legalidade é desiderato máximo do Estado Democrático de Direito, na
medida em que representa a submissão do Estado à lei e tem por fundamento a soberania
popular86
, resguardando a sociedade de toda e qualquer tirania ou autoritarismo pelos seus
governantes.
Traduz o postulado de que a Administração Pública somente estará legitimada a agir
dentro dos limites legais, ou melhor, o exercício da atividade administrativa deverá ocorrer na
conformidade da lei. Nesse sentido, assevera Celso Antônio Bandeira de Mello que “[...] a
administração é atividade subalterna à lei; que se subjuga inteiramente a ela; que está
completamente atrelada à lei; que sua função é tão somente a de fazer cumprir lei preexistente
[...]87
”.
Enquanto ao particular é permitido fazer tudo o que a lei não proíbe, para a
Administração pende a restrição no sentido de que somente estará autorizada a agir secundum
legem, consoante previsão legal. Administrar é, portanto, “aplicar a lei de ofício88
”.
Este primado da lei recai estreitamente sob a figura do administrador público que
deverá ser probo e sujeito aos mandamentos legais, ao interesse público primário, do qual não
se pode afastar sob pena de ser responsabilizado na esfera criminal, cível e administrativa
(processo disciplinar)89
. Deste modo, é de inobjetável clareza que não há para esse agente
total liberdade ou subjetividade no exercício de suas funções, sendo predominante a
objetividade e os fins colimados pela lei, até mesmo quando concedida certa
discricionariedade90
.
86
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.100. 87
Idem. Ibidem, p.103. 88
FAGUNDES, Miguel Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 3ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1975. Pág. 17 apud MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo.
28ª ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2011. p.968. 89
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. Cit., p.86. 90
Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello: “Discricionariedade é a margem de “liberdade” que
remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios consistentes de razoabilidade, um , dentre pelo
menos dois comportamentos, cabíveis perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução
mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei ou da
liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente uma solução unívoca para a
situação vertente; [...] percebe-se que se trata necessária e inexoravelmente de um poder demarcado, limitado,
43
Por razões um tanto óbvias, a obediência a este preceito remonta à observância de
todos os demais princípios administrativos, por se tratar de pressuposto fundamental ao
Estado Democrático de Direito, como já abalizado.
O preceito em comento encontra-se radicado ao ordenamento constitucional nos
artigos 5º, II91
e 37, caput92
, dentre outros, de observância obrigatória dos administradores e
administrados, governantes e cidadãos brasileiros, consagrando-se enquanto direito e garantia
fundamental dada sua essencialidade.
Isso posto, passa-se à apreciação da constitucionalidade material do RDC sob o prisma
da estrita legalidade, notadamente, em consonância às previsões do artigo 37, por dirigir-se à
atividade administrativa consignando preceitos básicos de regência.
Neste sentir, cumpre mencionar a previsão do inciso XXI do art. 37, in verbis:
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e
alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade
de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de
pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente
permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.
Nota-se que a licitação é erigida como procedimento de observância obrigatória nas
hipóteses das contratações a serem realizada pelo setor público.
Do dispositivo alhures citado extrai-se não só a obrigatoriedade desse certame, bem
como o fato de sua realização figurar-se enquanto verdadeiro corolário da moralidade e
isonomia inerentes às atividades administrativas e responsáveis por limitar o juízo
discricionário de seu agente. Como outrora mencionado, essa discricionariedade não se
confunde com a liberdade de conduta do servidor público, restringindo-se ao fim colimado
pela lei e atuando nos limites legalmente delineados.
Neste diapasão, há que se suscitar a manifesta inconstitucionalidade que macula a Lei
12.462/2011, especificamente nos seus artigos 1º, inciso I e II e 6593
, por contrariar a estrita
legalidade inerente aos dispositivos constitucionais supramencionados.
contido em fronteiras requeridas até por imposição racional, posto que, à falta delas, perderia o cunho de poder
jurídico. [...] São os próprios pressupostos legais justificadores do ato, a finalidade normativa – ainda que
expressos mediante conceitos algo imprecisos – e a causa do ato que determinam os limites da discrição.”
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit., p.980-981. 91
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, II: ninguém será obrigado a fazer ou deixar
de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; 92
Vide a transcrição do dispositivo na redação do subtópico anterior. - Afronta aos Princípios Basilares da
Administração Pública – do presente estudo. 93
Lei 12.462/2011 - Art. 1º [...] I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de
Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e II - da Copa das
Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014,
definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e
44
In suma, esse primeiro dispositivo delega à Autoridade Pública Olímpica a seleção das
obras e serviços que deverão ser submetidos ao regime excepcional. O outro, por sua vez,
permite que, enquanto não definida a Carteira de Projetos Olímpicos, sejam abraçadas às
decisões que a Administração Pública entender pertinente para o cumprimento das obrigações
assumidas perante o Comitê Olímpico e Paraolímpico Internacional. Ocorre que os
parâmetros definidos pelos aludidos artigos são vagos e imprecisos, subvertendo o uso
indiscriminado desse Regime - o RDC.
Subjuga-se, nesses casos, ao crivo da Administração definir se determinada obra ou
compra destina-se a atender as necessidades dos incisos do art.1º, o que de fato extravasa a
discricionariedade, subvertendo aquilo que realmente seja definido enquanto pressuposto de
oportunidade e conveniência. Não obstante, a redação prevista no art. 65 desse mesmo
diploma normativo, elastece ainda mais essa discricionariedade concedida ao Executivo.
A ausência de critérios objetivos na delimitação da contratação necessária aos eventos
desportivos previstos outorga desproporcional poder de decisão ao Poder Executivo.
Ademais, a mera referência a necessidades vinculadas à realização dos mesmos não oferece
qualquer limitação ao exercício da competência administrativa, o que ocasiona a utilização
arbitrária do RDC que, a princípio, posicionava-se como uma legislação puramente
excepcional.
Torna-se notório que a Lei 12.462/2011, ao estabelecer a previsão correlata aos
dispositivos em apreço, afronta o art. 37, caput e inciso XXI da CF/88 inobservando os
valores constitucionalmente protegidos e, principalmente, admitindo que o regime licitatório
seja definido por ato do Executivo e não por prévia determinação legal.
A partir dessa deturpação de competência, a inconstitucionalidade se faz sentir
também sobre o pleito do art. 22, XXVII94
, que designa à União poder privativo para legislar
sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades. Afinal, como bem
asseverou Celso Antônio:
supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização
da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes
da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; [...] Art. 65. Até que a Autoridade Pública Olímpica defina a Carteira de Projetos Olímpicos, aplica-se,
excepcionalmente, o disposto nesta Lei às contratações decorrentes do inciso I do art. 1o desta Lei, desde
que sejam imprescindíveis para o cumprimento das obrigações assumidas perante o Comitê Olímpico
Internacional e o Comitê Paraolímpico Internacional, e sua necessidade seja fundamentada pelo contratante
da obra ou serviço. [sem grifos no original]. 94
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 22, XXVII: normas gerais de licitação e
contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da
União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas
públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.
45
[...] Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei,
editada, pois, pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as
tendências (inclusive minoritárias) do corpo social - garantir que a atuação do
Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral95
.
Desta feita, nos termos da Carta Política, cabe ao Legislativo e não ao Executivo, por
ato discricionário, determinar o regime jurídico do certame licitatório.
Isto posto, na medida em que o Legislativo legitima a delegação de suas funções
típicas ao Executivo, a violação ao Princípio da Legalidade torna-se inconteste, representando
grande ameaça ao Estado de Direito. Não bastasse, a possibilidade do uso arbitrário desse
regime excepcional contaria toda a soberania popular, pondo em risco a tardia democracia
conquistada pela nação brasileira.
Nesse ínterim, aduziram os Procuradores da República Athayde Ribeiro Costa,
Carolina de Gusmão Furtado, Ana Carolina Oliveira Tannus Diniz e Paulo Roberto Galvão
Carvalho, em nota técnica produzida em ocasião do projeto de lei de conversão da MP nº
521/2010, a qual tentou incutir ao bojo da medida em tramitação no Congresso Nacional
proposições do Regime Diferenciado de Contratação Pública mas que, devido o decurso do
prazo constitucional, perdeu seu efeito, veja-se:
Houve afronta ao artigo 22, inciso XXVII e 37, inciso XXI, ambos da Constituição.
[...]
A nosso ver, a aplicação do regime RDC às “licitações e contratos” “necessários
à realização da Copa das Confederações Internacional de Futebol Associação –
FIFA 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014, definidos pelo Grupo Executivo –
GEOCOPA 2014” é uma cláusula intoleravelmente aberta, e que, à rigor,
indica que esta sendo conferido ao Poder Executivo o poder de definir ou
escolher, com base em critério de elevado subjetivismo, o regime jurídico da
licitação pública. Este poder de regência normativa é exclusivamente do
legislador, e não pode se transferido ou delegado ao Poder Executivo, da forma
que está no projeto.
Não há nenhuma baliza legal sobre a qualificação nos casos concretos do que seja
uma licitação ou contratação “necessária” aos eventos previstos na norma,
outorgando-se desproporcional poder de decisão ao “Grupo Executivo – GEOCOPA
2014”. Sendo indiscutível a relevância dos eventos citados na norma, a mera
referência a necessidade vinculadas aos mesmos não oferece nenhuma limitação
ao exercício da competência administrativa, possibilitando o seu uso com
arbitrariedade. (NOTA AO PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO DA MP
521/2010)96
. (Grifos originais).
95
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.100. 96
COSTA, Athayde Ribeiro. DINIZ, Ana Carolina Oliveira Tannus. FURTADO, Carolina de Gusmão.
CARVALHO, Paulo Roberto Galvão. Nota técnica encaminhada por Procuradores da República
Membros do Grupo de Trabalho Copa do Mundo FIFA 2014 da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão
ao Procurador-Geral da República, Sr. Roberto Gurgel, em ocasião do Projeto de Lei de Conversão da
MP 521/2010 apud BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da
Social Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a
Lei 12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável
às licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do
Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:
46
Destarte, uma vez violado o Princípio da Legalidade, por afronta direta ao art. 37
caput e inciso XXI e art. 22, inciso XXVII, ambos da Constituição, a declaração de
inconstitucionalidade da lei é medida patente que se impõe na defesa da ordem constitucional.
3.1.2 Violação à Impessoalidade
Presente no caput do art. 37 o Princípio da Impessoalide consiste basicamente na
separação entre o agente público e as funções por ele exercidas. Deste modo, durante o
desempenho de suas atividades deverá pautar-se segundo os preceitos da instituição, deixando
de lado favoritismos, anseios e relações de foro pessoal. Seus atos, portanto, deverão ser
imputados diretamente à Adminsitração e nunca a pessoa do agente.
Sob este prisma, Alexandre de Moraes preleciona que “[...] o administrador é um
executor do ato, que serve de veículo de manifestação da vontade estatal, e, portanto, as
realizações administrativo-governamentais não são do agente político, mas sim da entidade
pública em nome da qual atuou97
”.
Por vezes, esse preceito recai sobre o campo de incidência do Princípio da Igualdade
ou confunde-se com o Princípio da Finalidade, de modo que deve ser encarado sob três
perspectivas, são elas:
Impõe a igualdade de tratamento, através da qual a Administração deverá pautar-se
por condutas isonômicas, sem discriminações, animosidades ou políticas de benefícios,
agindo da mesma maneira independente de quem seja o administrado ou de qual seja sua
pretensão. É nessa medida que se traduz o Princípio da Iguadade consagrado pelo art.5º, caput
da CF/8898
e referenciado no art. 37, inciso II e XXI99
;
Impõe observância ao Princípio da Finalidade de forma que o adminsitrador
somente deverá agir almejando o fim legal. Assim, esse fim legal será aquele ditado, expressa
ou implicitamente, pela norma, sendo inafastável o objetivo maior de toda a Administração,
qual seja, o interesse público100
. O ato administrativo deverá ser harmônico aos interesses da
coletividade esquivando-se de todo e qualquer interesse próprio ou a favor de terceiros. Nas
<http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de
2013. 97
MORAES, Alexandre de. Op. cit., p. 305. 98
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 5º, caput: Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:[...]. 99
Vide nota de rodapé de números 47 e 49, nas quais se encontram as transcrições dos aludidos incisos do art. 37. 100
MEIRELLES, Hely Lopes. Op.cit., p. .90.
47
palavras de Hely Lopes, o que esse preceito “veda é a prática de ato administrativo sem
interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente a satisfazer
interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob a forma
de desvio de finalidade.101
”
Impõe neutralidade do agente que fica impedido de fazer autopromoção, como bem
se depreende da vedação expressa constante no §1º do art. 37 da CF/88102
.
Analisando o RDC sob essa perspectiva axiológica, primeiramente, cumpre sobressair
a inovação trazida por este regime denominada de contratação integrada, delineada mais
especificamente pelos arts. 2º, II103
; 8º, V, §5º104
; 9º105
e 36, § 1º106
.
Como já mencionado no presente estudo, a contratação integrada trata-se de um
instituto único através do qual serão realizados o projeto básico, executivo e a execução da
101
Idem. Ibidem, p. 90. 102
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.37, §1º: A publicidade dos atos, programas,
obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação
social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de
autoridades ou servidores públicos. 103
Lei 12.462/2011 – Art. 2º, I: empreitada integral: quando se contrata um empreendimento em sua
integralidade, compreendendo a totalidade das etapas de obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira
responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação,
atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e
operacional e com as características adequadas às finalidades para a qual foi contratada. 104
Lei 12.462/2011 – Art.8º, V: contratação integrada; §5º: Nas licitações para a contratação de obras e
serviços, com exceção daquelas onde for adotado o regime previsto no inciso V do caput deste artigo, deverá
haver projeto básico aprovado pela autoridade competente, disponível para exame dos interessados em
participar do processo licitatório. 105
Lei 12.462/2011 – Art.9º: Nas licitações de obras e serviços de engenharia, no âmbito do RDC, poderá ser
utilizada a contratação integrada, desde que técnica e economicamente justificada e cujo objeto envolva, pelo
menos, uma das seguintes condições: I - inovação tecnológica ou técnica; II - possibilidade de execução com
diferentes metodologias; ou III - possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado.
§ 1o A contratação integrada compreende a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo,
a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as
demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. § 2o No caso de contratação
integrada: I - o instrumento convocatório deverá conter anteprojeto de engenharia que contemple os
documentos técnicos destinados a possibilitar a caracterização da obra ou serviço, incluindo: a) a
demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições
quanto ao nível de serviço desejado; b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega,
observado o disposto no caput e no § 1o do art. 6o desta Lei; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os
parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos
impactos ambientais e à acessibilidade; II - o valor estimado da contratação será calculado com base nos
valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela administração pública em serviços e obras similares
ou na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou
paramétrica. § 3º Caso seja permitida no anteprojeto de engenharia a apresentação de projetos com
metodologias diferenciadas de execução, o instrumento convocatório estabelecerá critérios objetivos para
avaliação e julgamento das propostas. § 4º Nas hipóteses em que for adotada a contratação integrada, é
vedada a celebração de termos aditivos aos contratos firmados, exceto nos seguintes casos: I - para
recomposição do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior; e II - por
necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da
contratação, a pedido da administração pública, desde que não decorrentes de erros ou omissões por parte do
contratado, observados os limites previstos no § 1º do art. 65 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 106
Lei 12.462/2011 – Art.36, § 1º: Não se aplica o disposto nos incisos I, II e III do caput deste artigo no caso
das contratações integradas.
48
obra ou serviço, tudo isso no mesmo procedimento licitátorio e sob o encargo do licitante
vencedor. Justifica-se por meio do imperativo de eficiência de ordem técnica e econômica ao
passo que se transfere ao particular os riscos relativos à consecução do objeto contratual.
Outrossim, essa sistemática imprime a presença do anteprojeto de engenharia no
instrumento convocatório, que forneça aos participantes um breve delineamento do objeto da
licitação (art. 9º, §2º, I107
). Ocorre que essa indefinição do objeto, ou seja, a contratação da
obra/serviço sem que antes o objeto esteja nitidamente individualizado no edital, com todas as
suas minudências expostas, ocasiona manifesta afronta ao Princípio da Isonomia dos
concorrentes assegurado pelo inciso XXI do art. 37 da nossa Carta Política.
A ausência dessa descrição analítica, função assentida ao Projeto Básico por força do
art. 6º, IX da Lei 8.666/93108
, resta por comprometer a lisura do certame e o propósito cingido
à sua realização: a seleção da melhor proposta para a Administração. Por óbvio, é a descrição
pormenorizada do serviço a ser executado que permite aos participantes do certame o
conhecimento do objeto licitado e, por conseguinte, a oferta de proposta pertinente.
Igualmente, será a partir da definição prévia e precisa desse objeto que a própria
Administração poderá delimitar requisitos essenciais à contratação, por exemplo a habilitação
técnica109
, e permitir um parâmetro objetivo para a comparação das propostas. Será neste
último quesito, portanto, que a neutralidade do administrador restará maculada dada a
ausência de critérios desvinculados de subjetividade (sejam eles quantitativos mas,
principalmente, qualitativos), de antemão delineados, para a escolha do proponente que
107
Vide nota de rodapé de nº 101, na qual consta a transcrição do dispositivo em apreço. 108
Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 – Art. 9º, IX - Projeto Básico - conjunto de elementos necessários e
suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou
serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares, que
assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que
possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os
seguintes elementos: a) desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e
identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza; b) soluções técnicas globais e localizadas,
suficientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as
fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem; c) identificação dos tipos de
serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como suas especificações que
assegurem os melhores resultados para o empreendimento, sem frustrar o caráter competitivo para a sua
execução; d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações
provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programação, a
estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso; f) orçamento
detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente
avaliados. 109
A habilitação, também conhecida por qualificação, consiste na fase do procedimento licitatório através da
qual a Administração verificará a aptidão do licitante para a futura contratação. A qualificação técnica, por
sua vez, trata-se da verificação da aptidão profissional e operacional do proponente. A documentação
pertinente a essa habilitação encontra-se exposta no art. 30 da Lei 8.666/93.
49
apresentar a opção mais pertinente e vantajosa em atenção ao interesse não só do ente político
enquanto sujeito de direito mas sim, do corpo social.
O próprio Tribunal de Conta da União, sobretudo, já proferiu entendimento atinente
aos prejuízos da subjetividade no julgamento das propostas e da notória ruptura dos fins
colimados pela licitação, quando da elaboração de um projeto básico falho, evasivo e não
correspondente à real necessidade do setor público:
12. Quanto à necessidade, ou não, de elaboração de orçamento detalhado quando da
contratação de obra em regime de empreitada global, a conclusão foi no sentido de
que a lei exige a elaboração de tal orçamento detalhado para todo e qualquer
tipo de modalidade de contratação, inclusive a empreitada integral, ou turn
key, e de que as razões e ordem material que fundamentam essa exigência legal
também valem para todo e qualquer tipo de contratação, quer seja pela
necessidade de a administração conhecer a estimativa de custos da obra antes
de licitá-la, de compatibilizar as execuções financeira e física do
empreendimento, de avaliar os novos custos em caso de eventual modificação
necessária no projeto, ou, ainda, de garantir que o preço pago seja uma justa
remuneração pelo bem obtido. [...]
21. Conforme informações apresentadas pela CTS, os dois principais contratos da
presente obra foram celebrados sob o regime de execução denominado “empreitada
integral”, por meio do qual as empresas licitantes oferecem um preço
“fechado” pela execução integral do objeto licitado, entregando-o em condições
de plena utilização ou operação.
22. Uma primeira irregularidade grave, já detectada nos autos em instruções
anteriores refere-se à baixa qualidade do projeto básico conforme constava da
licitação, não apenas em seu detalhamento, mas também em suas soluções. [...]
78. No que diz respeito à licitação, conclui-se que o projeto básico não se
encontrava em condições de ser licitado, vez que não espelhava uma solução
viável e suficientemente detalhada. O volume de modificações que se fizeram
necessárias posteriormente demonstram objetivamente essa conclusão.[...]
82. A má qualidade do projeto básico fez surgir a necessidade de diversas e
profundas modificações no desenho original durante a execução da obra, que
deu ensejo à celebração de diversos aditivos, o que também, e a princípio, não é
permitido pela legislação brasileira em obras sob regime de empreitada
integral, salvo para situações imprevisíveis.[...]
118. Com efeito, a precariedade do projeto básico e a inexistência de orçamento
com nível de detalhamento suficiente comprometem a licitação da qual adveio o
contrato, vez que incompatíveis com as condições estabelecidas em lei. As
modificações que se fizeram necessárias durante a execução da obra não só
comprovam essa assertiva, como, por si só, já configuram razão suficiente para
a nulidade do contrato, vez que seu objeto inicial restou desfigurado e que sua
conclusão já exige que as condições inicialmente contratadas sejam alteradas
acima dos limites legais. Além disso, e conforme apontado pela Unidade
Técnica, a simples existência de cláusula de medição e pagamento contrária aos
ditames legais e à moralidade, economicidade e razoabilidade já seria também
suficiente para que se declarasse o contrato nulo, pela flagrante ilegalidade de
cláusula essencial110
. [sem grifos no original]
110
BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2873/2008. Plenário. Processo TC-007.162/2006-0
(Apenso: 005.425/2005-5). Interessado: Congresso Nacional. Responsáveis: Carlos Von Beckerath Gordilho
(002.366.915-20); Denival Damasceno Chaves (004.477.735-34); Fernando Durao Schleder (440.709.507-
53); Flávio Mota Monteiro (635.036.208-00); Frederico Pires da Silva (663.602.507-72); Ivan Carlos Alves
Barbosa (033.422.635-04); Janary Teixeira de Castro (163.535.875-20); Joao Luiz da Silva Dias
(011.089.806-00); José Hamilton da Silva Bastos (056.283.855-49); Luiz Fernando Tavares Vilar
(020.645.705-78); Luiz Otávio Ziza Mota Valadares (110.627.386-91); Nestor Duarte Guimaraes Neto
(110.289.805-82); e Pedro Antonio Dantas Costa Cruz (113.611.405-00).
50
Nãs bastasse, a isonomia entre os licitantes participantes também é corrompida ao
passo que a elaboração do projeto-básico, executivo e a consecução do serviços, ficarão à
cargo do vencedor. Logo, este último poderá criar um pleito demasiadamente detalhado, ou
melhor, epecífico que restrinja plenamente sua execução por outrem, dificultando o acesso de
eventuais participantes e traçando condições autobenéficas.
Ante o exposto, os dipositivos da lei 12.462/2011, ora impugnados, violam
diretamente o Princípio expresso da Impessoalidade ao desatender os postulados de isonomia
entre os licitantes e a neutralidade do próprio administrador afastando-se da finalidade maior
do certame, qual seja, o interesse público.
3.1.3 Violação à Moralidade
A moralidade, por óbvio, sempre consistiu em um valor ínsito ao ordenamento,
consubstanciado enquanto postulado geral do Direito e que existe por força própria. Salienta-
se que a despeito da sua existência implícita no sistema, o que de maneira alguma retira sua
relevância, sua positivação apenas ganhou forma com a Constituição de 1988.
Tal axioma representa verdadeiro pressuposto de validade de todo o agir
administrativo, de modo que se firma a obediência a uma moral jurídica, interpretada como o
“conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração111
”, e não
puramente social. Nesse sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello adverte que haverá
trangressão desse axioma na hipótese de afronta aos valores sociais juridicamente
consagrados112
.
No exercicio desse munus público não deverá o agente ater-se tão somente ao
cumprimento da estrita legalidade, mas acatar preceitos éticos que unam a moral
administrativa à supremacia dos interesses da coletividade.
Nesse diapasão, a moralidade administrativa deverá ser sentida nos deveres de
honestidade, lealdade, boa-fé e probidade, relacionando-se intimamente à noção de bom
administrador impedido de agir de maneira imoral ou amoral.
A imoralidade administrativa importa em ato de improbidade, à luz do art. 37 §4º da
CF/88, que ocasiona prejuízo ao patrimônio público pelo enriquecimento ilícito do agente,
Disponível:.<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/mista/orca/tcu/PDFs/Acordao28732008-
TCU-Plen%C3%A1rio.pdf>. Acesso em jan.de 2014. 111
HAURIOU, Maurice. Précis Élémentaires de Droit Administratif. Paris, 1926. p. 197 apud MEIRELLES,
Hely Lopes. Op. cit., p.87. 112
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit.,.p.120.
51
ofensa aos príncipios regentes da Administração Pública ou lesão ao erário. A prática dessa
conduta é sancionada através da suspensão dos direitos políticos, perda da função pública,
indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,
sem prejuízo da ação penal cabível113
. Não obstante, o Ministério Público poderá propor
também ação civil pública no intuito de anular ato lesivo à moralidade administrativa, com
respaldo na Lei 8.429/92.
Colacionado a este preceito encontra-se a previsão de crime de responsabilidade do
Presidente da República que atenta contra a probidade administrativa (art. 85, inciso V114
).
Neste tocante, no capítulo de direitos políticos o § 9º do art. 14115
determina que lei
complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim
de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato e a
normalidade e legitimidade das eleições.
A exigência dessa moralidade é consentânia à toda bagagem principiológica inserida
no caput do art. 37 do diploma constitucional, sendo representação máxima do Estado
Democrático de Direito destinado à assegurar direitos e garantiais fundamentais e sociais que
permitam a coexistência de uma sociedade fraterna, com respaldo mormente na sua ordem
interna.
Contrapondo-se a toda essa moralidade administrativa, urge o RDC, enquanto regime
excepcional à lei 8666/93, com vista a alcançar maior celeridade dos certames licitatórios e
“eficiência” nas contratações em detrimento dos postulados e valores constitucionalmente
consagrados.
Como mencionado no subitem acima, o regime de contratação integrada, inovação
trazida à tona pela legislação em comento (Lei nº 12.462/11), subverte o princípio da licitação
(inciso XXI do art. 37) ao passo que enfatiza a subjetivação do critério da escolha das
propostas, mediante a ausência prévia de individualização do objeto, função destinada ao
Projeto Básico que ficará a cargo do licitante vencedor e não mais da própria Administração.
Sucede que essa inversão lógica, no intuito de transferir os riscos da consecução do
contrato ao particular, torna o certame licitatório mero instrumento formal, eivando toda a
113
Redação do §4º do art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 114
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 85, V: a probidade na administração. 115
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art. 14, §9º: Lei complementar estabelecerá outros
casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a
moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e
legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo
ou emprego na administração direta ou indireta. [sem grifos no original].
52
moralidade do ato uma vez que a Administração se esquiva de cumprir atividades pró-ativas
essenciais à escolha da proposta mais vantajosa.
Além do mais, como pode haver fiscalização e controle da execução dos meios, como
assim se diz a função destinada a Administração no RDC, se não preexiste um parâmetro de
avaliação? Afinal, o anteprojeto de engenharia não é o meio apto para detalhar o objeto,
fornecendo apenas um breve delineamento do mesmo. Isso sem mencionar que a licitação
será instaurada a partir de uma necessidade premente da Administração, e por consequência
lógica, da própria sociedade, sendo aquela a responsável por promover uma descrição
analítica do objeto, aferindo o fim almejado graças a critérios objetivos de avaliação das
propostas. Qualquer subterfúgio a essa sistemática, sobretudo no que tange à subjetividade
por parte da Administração, macula a moralidade erigida pela Carta Constitucional.
O mesmo raciocínio se atribui à inovação introduzida ao bojo do art. 10116
da
legislação ora reprovada, que imprime a remuneração variável para obras e serviços públicos
decorrente do desempenho da contratada na consecução de metas e padrões de qualidade além
do esperado e, por conseguinte, da satisfatoriedade da entidade licitante.
Fato é, que essa previsão em nada se coaduna com os postulados constitucionais,
positivados no caput e inciso XXI do art. 37 da CF/88, ao remeter ao gestor público a opção
do montante a ser pago aos contratados, viabilizando a interpessoalidade entre as esferas
público-privada no fomento de relações “promíscuas” entre esses agentes117
.
3.1.4 Violação à Publicidade
Primeiramente, cumpre mencionar que esse preceito deve ser interpretado sob duas
vertentes, quais sejam, enquanto garantia do acesso à informação e como requisito de eficácia
dos atos administrativos.
No que concerne à perspectiva do direito à informação, adverte-se que se trata da
garantia constitucional que viabiliza o exercício da cidadania ao propiciar o pleno
116
Lei 12.462/2011 – Art.10: Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser
estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de
qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e
no contrato. 117
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social
Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei
12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às
licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do
Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<
http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de
2013.
53
conhecimento das medidas e atos tomados pela Administração e ao assentar meios para a
participação e controle social por intermédio do mandado de segurança (art. 5º, LXIX118
);
direito de petição (art. 5º XXXIV, “a”119
); ação popular (art.5º, LXXIII120
), habeas data (art.
5º, LXXII121
), suspensão dos direitos políticos por improbidade administrativa (art. 37, §
4º122
) e fornecimento de certidão (art. 5º, XXXIV, “b”123
).
Noutro plano, esse princípio firma-se na garantia de que os atos oficiais só tenham
efeitos externos após a sua publicação. Contudo, não se deve confundir eficácia com condição
de existência ou validade do ato, “por isso mesmo, os atos irregulares não se convalidam com
a publicação, nem os regulares a dispensam para sua exequibilidade, quando a lei ou o
regulamento a exige124
”, como bem se posicionou Hely Lopes.
Sendo a Administração responsável pela res publica, outro não podia ser o
entendimento a não ser a ampla divulgação dos atos oficiais. Logo, o sigilo somente será
admitido em hipóteses excepcionais para os casos nos quais o interesse público o justifique.
Uma das exceções ao postulado da publicidade se encontra no art 5º, XXXIII125
da
CF/88, que tratou de assegurar a todos o direito a receber dos órgãos públicos informações de
seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja
imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Fora essa hipótese, segundo a previsão
do inciso X do dispositivo supramencionado, também se faz necessário resguardar a
118
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXIX: conceder-se-á mandado de
segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando
o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no
exercício de atribuições do Poder Público; 119
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, XXXIV, “a”: o direito de petição aos
Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. 120
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXXIII: qualquer cidadão é parte legítima
para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado
participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor,
salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. 121
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, LXXII: conceder-se-á "habeas-data": a)
para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou
bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) para a retificação de dados, quando
não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo. 122
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Art. 37, § 4º: Os atos de improbidade
administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade
dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal
cabível. 123
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º,XXXIV, “b”: a obtenção de certidões em
repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. 124
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. .92. 125
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - Art.5º, XXXIII: todos têm direito a receber dos
órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas
no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança
da sociedade e do Estado.
54
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas126
. Isso sem mencionar que o
sigilo também será a regra durante as investigações policiais.
Sob à ótica da publicidade, é manifesta a contrariedade da Lei 12.462/2011, mais
especificamente do §2º do art. 15. Esse dispositivo, por sua vez, dispensa a publicação de
extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município
para as licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) para
obras ou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para bens e serviços, inclusive de engenharia.
Essa “aberração” jurídica não encontra respaldo em qualquer norma do nosso
ordenamento denotando, ao contrário, manifesta afronta à previsão do caput do art. 37 da
Carta Política. Isso ocorre uma vez que a própria Constituição consagra a plena transparência
dos atos tomados pela Administração o que, via de consequência, remonta à ampla divulgação
dos mesmos à sociedade. Afinal, como bem colacionou Celso Antônio Bandeira de Mello:
Não pode haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no
povo (art. 1º, parágrafo único da Constituição), ocultamento aos administrados dos
assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos
individualmente afetados por alguma medida127
.
Sendo o povo o titular dos interesses administrados, o acesso às informações deverá
ser amplo, ressalvados as devidas exceções, e deverá ocorrer pelo meio oficial de divulgação
da respectiva entidade pública: o Diário Oficial. Essa previsão é no sentido de resguardar a
seguridade da informação que não pode ser veiculada por meios efêmeros e instáveis, como
demonstra ser o virtual.
A simples publicação em sítio eletrônico oficial centralizador de divulgação de
licitações ou mantido pelo ente encarregado do procedimento licitatório na rede mundial de
computadores apesar de mostrar ser uma maneira célere e simplória, não demonstra a mesma
estabilidade da publicação impressa.
Ademais, ainda que a informatização seja uma nova realidade incutida no cenário
nacional, o acesso à internet ainda é restrito seja por condições econômico-sociais ou até
mesmo físicas, que inviabilizem o sinal de rede.
Devendo a divulgação da informação ocorrer na maior medida possível, torna-se
clarividente que apenas o Diário Oficial demonstra ser o meio apto a vencer a amplitude
territorial e as contradições regionais do Brasil.
126
Tais exceções também se encontram dispostas na Lei 12.527/11, responsável por regular o acesso à
informação previsto no inciso XXXIII do art. 5º. 127
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p.105.
55
Salienta-se que a segurança dos meios impressos é assegurada graças à perpetuidade
da informação no tempo, sendo o Diário oficial verdadeiro “repositório oficial e permanente
do registro dos atos estatais, desde 13 de maio de 1808, quando foi criado por D. João, com o
nome de ‘Impressão Régia’.128
”.
O Diário Oficial ao cumprir sua função maior - a divulgação da informação -,
possibilita o amplo conhecimento do cidadão, garantindo-o instrumento eficaz de controle
social.
Corroborando a subversão desse preceito, urge também a regra do § 3º do art. 6º da Lei
ora impugnada, o qual possui a seguinte redação:
Art. 6o:
Observado o disposto no § 3o, o orçamento previamente estimado para a
contratação será tornado público apenas e imediatamente após o encerramento
da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das
demais informações necessárias para a elaboração das propostas.
[...]
§ 3oSe não constar do instrumento convocatório, a informação referida nocaput
deste artigo possuirá caráter sigiloso e será disponibilizada estrita e
permanentemente aos órgãos de controle externo e interno129
.
[sem grifos no original].
Notadamente, há inversão da lógica constitucional em que o sigilo torna-se regra e não
exceção. Segundo o dispositivo em apreço haverá uma presunção desse sigilo haja vista que,
não constando no instrumento convocatório o orçamento previamente estimado, presumar-se-
á o caráter sigiloso dessa informação.
Com respaldo no escólio de Hely Lopes, “em princípio, todo ato administrativo deve
ser publicado, porque pública é a Administração que o realiza130
”, o que de fato destaca a
excepcionalidade do sigilo à informação.
128
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da Social
Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista (PPS), contra a Lei
12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), aplicável às
licitações e contratos de obras de infraestrutura dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do
Mundo de 2014 e da Copa das Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<
http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>. Acesso em abr. de
2013. 129
BRASIL, Lei nº 12.462, de 04 de Agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas
- RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da
República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a legislação da
Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de
Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de
controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de
12 de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de
março de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de
2001; e revoga dispositivos da Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida
Provisória nº 527, de 2011. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2011/Lei/L12462.htm>. Acessado em mar. de 2013. 130
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 94.
56
Com efeito, a transparência e a publicidade das informações são as condutas
colimadas pela Constituição, justificando-se a ausência das mesmas somente nas hipóteses em
que o interesse público seja sobressalente, por exemplo, a segurança da sociedade e do Estado
ou para resguardar um interesse privado substancialmente maior, sob pena de ferir a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem do particular.
Ante o exposto, não se pode olvidar da inconstitucionalidade que macula o §2º do art.
15 e o § 3º do art. 6º, restando por eivar todo o Regime Diferenciado de Contratação Pública.
3.1.5 Violação à Eficiência
O Princípio da Eficiência já foi objeto de exame no presente estudo, notadamente no
subitem 2.2.2, razão pela qual não convém adentrar na sua conceituação ou até mesmo no
contexto de implementação desse postulado no ordenamento pátrio para não tornar repetitivo
e maçante o desenvolvimento deste trabalho.
Entretanto, aproveita-se a ocasião para promover uma releitura do RDC sob a
sistemática da eficácia de resultados pela Administração Pública.
Brevemente, salienta-se a pluridimensionalidade desse preceito: quantitativa, atinente
à busca pela racionalidade e otimização dos meios, e qualitativa, correlata a noção de
satisfatoriedade social com os resultados obtidos.
Ademais, importa colacionar sua introdução ao caput do art. 37 da CF/88, com o
modelo de Administração vigente à época da promulgação da EC 19/98. De fato, a tentativa
de adotar uma cultura gerencial no âmbito da Administração Pública brasileira, voltada para a
noção de cidadão-cliente, foi o fator gerador da inserção do Princípio da Eficiência dentre
aqueles afetos ao direcionamento da atividade do aparato estatal na gestão dos interesses da
coletividade.
Segundo essa dúplice acepção e atentos ao contexto da Administração Gerencialista é
que será guiada essa análise da incompatibilidade substantiva da legislação em comento.
Nesse primeiro momento, destaca-se que a criação desse regime de exceção, que se
originou a partir de uma manobra política, ocorreu com fulcro na busca da eficiência das
licitações e contratações públicas, com vista a romper a morosidade e burocratização
características aos certames, condicionando-os à consecução de resultados.
Na medida em que a Lei 12.462/2011 vincula a adoção do regime à realização de
eventos específicos cria-se meios, tais quais, a contratação integrada; a remuneração variável
de acordo com o desempenho; a dispensa da publicação de extrato do edital em diário oficial
57
a depender do valor e do objeto licitado, bem como a presunção do sigilo no que tange ao
orçamento previamente estimado para a contratação, dentre inúmeros outros, que enfatizam a
discricionariedade do agente público sem se preocupar em ministrar critérios objetivos ao
procedimento.
A ausência de limitação da competência concedida, por sua vez, acaba por deturpar a
finalidade fundamental da licitação – selecionar a proposta mais vantajosa às conveniências
públicas – dando azo ao predomínio de interesses particulares ou, até mesmo, do interesse
público secundário em detrimento do primário.
Outrossim, a própria criação do RDC é resultado da ausência de planejamento, traço
característico à Administração brasileira que teve tempo suficiente para realizar as
contratações necessárias para desenvolver a infraestrutura dos eventos desportivos pelos
instrumentos usuais de contratação. Contudo, o aparato estatal preferiu se mante inerte e, nas
vésperas, emburrar a criação de um regime excepcional.
Essa consagrada falha de planejamento representa um risco de dilapidação do
patrimônio público, ao não identificar previamente quais são as obras necessárias à realização
dos eventos, como ocorre nos incisos I e II do art.1º, bem como na previsão do art. 65 do
diploma em comento.
A escolha a critério do administrador acaba por alimentar um uso indiscriminado do
RDC e a permitir a irrealidade de orçamentos previamente determinados. A título de
exemplificação, há que se mencionar trechos de julgado do TCU que revelam que o
orçamento inicial dos gastos em ocasião dos jogos Pan Americanos de 2007 foi,
absurdamente, ultrapassado (cerca de 10 vezes o valor inicialmente previsto) em razão da
ausência de determinação antecipada das obras necessárias à realização dos jogos, veja-se:
Em decorrência da especialmente da falta de planejamento e da definição tardia da
matriz de responsabilidades, houve evolução da estimativa da despesa ao longo do
tempo, bem como a participação cada vez mais substancial da União. Ao final, as
Unidades Técnicas do Tribunal estimaram o custo dos jogos em cerca de 3,3 bilhões
de reais aos cofres públicos. A participação da União aumentou cerca de 50% sendo
que, do valor global gasto por esse ente, mais de 70% foram aplicados no primeiro
semestre de 2007, em razão de convênios, licitações e contratações de última hora,
resultantes da falta de planejamento131
.
131
Manifestação do TCU no processo TC 014.075/2009 (Acórdão nº 2101/2008 – Plenário de 24/09/2009)
apud BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4655, ajuizada pelo Procurador-Geral da
República, Roberto Gurgel, perante o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Lei 12.462/11, que cria o
RDC (Regime Diferenciado de Contratações Públicas), aplicável a licitações e contratos de obras da Copa de
2014 e das Olimpíadas 2016. Importante mencionar que a ADI fora distribuída por prevenção para o ministro
Luiz Fux, que recebeu a primeira ação ajuizada no Supremo contra o RDC, de autoria do PSDB, DEM e PPS
(ADI nº 4645). Disponível em:
<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?s
eqobjetoincidente=4138546>. Acesso em abr. de 2013.
58
Com respaldo na manifestação acima do TCU, órgão de controle externo da
Administração Pública, não há como ignorar o questionamento a seguir: como poderá existir
eficácia nos resultados sem uma política de planejamento pelo aparato estatal?
Com efeito, não adianta a Administração perseguir apenas a consecução de resultados
sem promover a adequação dos meios, repeitada a devida proporcionalidade. Torna-se, assim,
de inobjetável clareza que a verdadeira intenção da máquina administrativa, corrompida pela
ganância política, resume-se à implementação de uma Eficiência ilusória que mascare, através
de infraestruturas farônicas, toda a ausência do aparato estatal na concretização de políticas
públicas.
Cumpre menionar que as inovações trazidas pelo RDC, ao visarem apenas a celeridade
e resultado das contratações, acabam por elevar a “Eficiência” a todos ao demais valores
consitucionalmente previstos, como passa-se a expor.
Igualmente, na medida em que esses institutos jurídicos inovadores revelam o uso
indiscriminado desse regime excepcional, outorgando um desproporcional poder de decisão
ao aparato administrativo e permitindo até mesmo a delegação de funções típicas do
Legislativo ao Executivo, há evidente tentativa de sobrepor a eficiência à estrita Legalidade,
colocando em risco a própria manutenção do Estado Democrático de Direito.
Ao ocasionar a ruptura da isonomia dos licitantes e abrir azo ao subjetivismo dentro do
certame licitatório, afastando-se da neutralidade exigida do administrador no exercício de suas
funções, há justaposição da Impessoalidade e da Moralidade à Eficiência.
A mitigação da divulgação de informações imprecindíveis da licitação no meio oficial
– Diário Oficial -, respeitadas as hipóteses excepcionais, e a regra da presunção de sigilo,
invetem a lógica constitucional, impondo obstáculos à participação e a mecanismos de
controle pelos cidadãos. Neste plano, o axioma da Publicidade é subjugado à Eficiência.
Manifesta subsunção de todas as premissas constitucionais à Eficiência, remonta a
verdadeira incongruência lógico-jurídica, sendo notório que não pode haver a eficácia de
resultados, sendo esta apenas aparente e fruto de oratória política, em afronta aos demais
princípios basilares da atividade administrativa.
É sob essa análise crítica que a “eficiência” apregoada por esse regime excepcipal
deve ser entendida, não restando dúvidas quanto a violação aos preceitos expostos no caput e
incisos do art. 37 da CF/88.
59
3.2 Regime de exceção X Tentativa de supressão do certame licitatório
A implementação do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, confirma a
“manobra” política do aparato estatal para introduzir ao ordenamento pátrio diploma
normativo diverso da Lei 8.666/93 – Lei Geral de Licitação e Contratos Públicos.
O regime, a priori, excepcional era limitado materialmente e marcado pela
efemeridade de seus dispositivos. Ocorre que, gradativamente, perdeu sua transitoriedade
graças a ampliação do seu âmbito de incidência, fato este que ratifica a tentativa de
consolidação e afastamento dos preceitos instituídos pelo Legislação Geral.
O RDC sedimenta-se enquanto verdadeiro mecanismo de corrupção sistêmica, o qual
perpassa pela alcunha de consolidação da Administração Gerencial e flexibilização dos
procedimentos, para extipar valores que deveriam guiar o aparato estatal nas licitações e
contratações públicas132
.
Frise-se que os defensores desse modelo gerencial pervertem os institutos burocráticos
afirmando a incapacidade dos mesmos em atender os anseios sociais. Em verdade, não pode
haver Administração Pública que não prime pela heraquia funcional, controle metodológico,
organização procedimental, seleção técnica do seu quadro de servidores, divisão racional dos
trabalhos, impessoalidade, moralidade e que permita a incidência de meios de controle pelos
próprios cidadãos, conforme direciona a vertente burocrática. Somente a partir de tais
postulados será alcançada a Eficiência e a sintonia entre Estado de Direito e Soberaia Popular.
O que não pode acontecer é a total flexibilização desses institutos permitindo uma
dinâmica gerencial que promova a confusão entre o setor público e privado, entregando a este
último funções precípuas da Administração na defesa dos interesses da coletividade, como se
configurou na Reforma Administrativa suscitada no mandato de Fernando Henrique Cardoso
e como vem acontecendo por intermédio do RDC.
Sem sombra de dúvidas, a Eficiência adotada pela Administração Pública Gerencial
não pode ser alcançada a qualquer custo, sobrejulgando todos os demais princípios estimados
pela Constituição, consoante estudado acima.
Por todo o exposto, adverte-se que a suposta acusação de obsolescência da Lei Geral,
Lei. 8.666/93, pelos legisladores fora apenas um oportunismos político imbuído pela tentativa
de investir em mecanismos menos rigorosos de defesa contra fraudes nas licitações.
132
SERRANO, Pedro Estevam. Contratos realmente "diferenciados". O Regime Diferenciado de
Contratação usado pelo governo Dilma nas licitações da Copa do Mundo é um mecanismo nefasto de
corrupção sistêmica. In: Carta Capital. Publicado em 03 de junho de 2012. Disponível
em:<http://www.cartacapital.com.br/politica/contratos-realmente-diferenciados/>. Acesso em: abr. de 2013.
60
Deste modo, torna-se manifesta a intenção do Estado, com fulcro no imperativo da
eficiência, de valer-se de um regime simplificado de contratações, o qual se respalda no
encurtamento de prazos, simplificação de procedimentos e flexibilização de requisitos, para
burlar o certame constitucional de licitação e promover o favorecimento e a pessoalidade nas
contratações. Essa desburocratização administrativa, na verdade, não exprime apenas um
pensamento gerencial mas descumpre todos os Preceitos Constitucionais.
61
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final do presente estudo conclui-se:
1) A priori, o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) fora criado
enquanto regime de exceção à Lei 8.666/93, para promover uma modalidade de certame
licitatório mais célere e supostamente mais eficiente frente à necessidade de proporcionar a
infraestrutura nacional necessária à recepção dos eventos desportivos sediados no Brasil;
2) Sua trajetória legislativa foi marcada por vícios formais de
inconstitucionalidade uma vez que a Lei 12.462/2011 é fruto da conversão da medida
provisória nº 527, a qual padeceu dos pressupostos constitucionais para sua edição. Não
obstante, a incompatibilidade orgânica também é sentida no manifesto abuso do poder de
emenda concedido aos parlamentares, que excederam os limites que lhes são próprios ao não
resguardar a pertinência temática à proposição normativa originária no trâmite de conversão
da medida provisória em Lei no Congresso Nacional;
3) A despeito da limitação de ordem temática, atinentes a realização das
competições esportivas supracitadas no presente estudo, a excepcionalidade do regime nunca
fora bem delineada, o que inviabilizava a identificação dos projetos contemplados, bem como
a perpetuidade do diploma normativo em apreço no ordenamento pátrio. Ademais, a aparente
taxatividade do rol de aplicação sofreu progressivas alterações a bel prazer do legislador que
desvestiu o regime da transitoriedade que lhe era ínsita. Notadamente, o RDC introduziu
diversas inovações jurídicas que se contrapõem às premissas instituídas pela ritualística Lei
8.666/93;
4) A Administração Pública Burocrática tem por expoente máximo a introdução
do funcionalismo público, sendo caracterizada pela hierarquia, impessoalidade, discriminação
meticulosa das atividades, principalmente no que tange ao detalhamento dos procedimentos a
serem observados e ao controle rígido dos meios. Neste ínterim, há vertente que defenda a
suposta ideia de que esse modelo é calcado pela ineficiência, sendo incapaz de prover as
demandas sociais.
5) Administração Pública Gerencial, por sua vez, surge com o desiderato máximo
de trazer a eficiência para o âmbito das contratações públicas, direcionando todo o aparato
estatal a promoção de uma política alicerçada nos resultados. Dessa forma, afasta-se da
rigidez setorial, promove-se a extrema flexibilização das principais conquistas da boa
administração e introduz o paradigma do cidadão-cliente, compartilhando diretrizes da
62
iniciativa privada e transferindo a esta o encargo antes pertencente exclusivamente à seara
administrativa pública. Neste sentir, ampla doutrina acerca do tema difunde a ideia de um
“anacronismo do modelo burocrático tradicional133
”, para justificar a necessidade de
implantar uma cultura gerencial intimamente relacionada à sobreposição do Princípio da
Eficiência. No Brasil, essa Administração Pública Gerencial inaugurou-se através da proposta
de redefinição do papel do estado, o que ocorrerá sob a presidência de Fernando Henrique
Cardoso (FHC), sendo marcada pelo extremismo e evidenciando que a transferência de
serviços essenciais inerentes ao setor público à iniciativa privada pode ocasionar danos
irreversíveis à sociedade. Obtempere-se que a consagração do Princípio da Eficiência
enquanto regente da atividade da máquina estatal, positivando-o expressamente no caput do
art. 37 da CF/88, aconteceu nesse mesmo período por força da EC 19/98. Esse axioma da
Eficiência assume uma pluridimensionalidade a qual deve ser interpretada sob duas óticas:
otimização do uso dos meios e satisfatoriedade social dos resultados obtidos.
6) Em verdade, a “aclamada” necessidade de se reestruturar o certame licitatório
representou o processo de desburocratização estatal, exemplificada pela própria introdução do
RDC em completo afastamento dos preceitos instituídos pela Lei nº 8.666/93, semeando os
germes de uma cultura gerencial exacerbada no cenário nacional.
7) As inovações incutidas pelo RDC representam a sobreposição da “Eficiência” a
todos os demais postulados constitucionalmente consagrados, representando verdadeira
ameaça à supremacia da ordem constitucional e ao Estado Democrático de Direito. Na medida
em que patente inconstitucionalidade substantiva se materializa, afasta-se o ideal da política
dos resultados haja vista que, por remeter-se à verdadeira incongruência lógico-jurídica, não
pode haver eficiência na ausência da estrita legalidade, impessoalidade, moralidade e
publicidade. Desta forma, a “eficiência” divulgada é apenas aparente e ilusória.
8) Cediço, portanto, que o RDC, enquanto regime de “exceção”, aos poucos
perdeu esse caráter para assumir a manobra política de consolidar-se no ordenamento e
gradativamente suprimir os ditames licitatórios apregoados pela legislação geral e pela Lei da
República.
133
MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do Aparelho
Estatal. Brasília: Presidente da República, Imprensa Oficial. Novembro de 1995. p. 17. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.> Acesso em jan.de
2014.
63
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito administrativo. São Paulo: Celso Bastos, 2002.
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da
Social Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista
(PPS), contra a Lei 12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de
Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e contratos de obras de infraestrutura
dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014 e da Copa das
Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:<
http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>.
Acesso em abr. de 2013.
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4655, ajuizada pelo Procurador-
Geral da República, Roberto Gurgel, perante o Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Lei
12.462/11, que cria o RDC (Regime Diferenciado de Contratações Públicas), aplicável a
licitações e contratos de obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas 2016. Importante mencionar
que a ADI fora distribuída por prevenção para o ministro Luiz Fux, que recebeu a primeira
ação ajuizada no Supremo contra o RDC, de autoria do PSDB, DEM e PPS (ADI nº 4645).
Disponível
em:<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProce
ssoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4138546>. Acesso em abr. de 2013.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em mar. de
2013.
BRASIL, Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da
Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/del0200.htm>. Acesso em agosto de 2013.
BRASIL, Lei nº 12.462, de 04 de Agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de
Contratações Públicas - RDC; altera a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe
sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, a legislação da Agência
Nacional de Aviação Civil (Anac) e a legislação da Empresa Brasileira de Infraestrutura
Aeroportuária (Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de Ministro de Estado,
cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a contratação de
controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nos 11.182, de 27 de setembro de
2005, 5.862, de 12 de dezembro de 1972, 8.399, de 7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de
outubro de 2007, 11.458, de 19 de março de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a
Medida Provisória no 2.185-35, de 24 de agosto de 2001; e revoga dispositivos da Lei no
9.649, de 27 de maio de 1998. É oriunda da conversão da Medida Provisória nº 527, de 2011.
Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm>,
Acessado em mar. de 2013.
64
BRASIL, Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI da
Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e
dá outras providências. Disponível em:
BRASIL, Medida Provisória nº 527, de 18 de março de 2011. Planalto, Brasília: DF, 2011.
Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2011/Mpv/527.htm>.Acesso em mar. de 2013.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de
Inconstitucionalidade: ADI-MC nº 1050. Requerente: Procurador Geral da República;
Requerido: Governador do Estado de Santa Catarina e Assembleia Legislativa do Estado de
Santa Catarina. Relator: Ministro Celso de Mello. Santa Catarina- SC, Data de Julgamento:
20/09/1994. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 23-04-2004. PP-00006; EMENT VOL-
02148-02; PP-00235 RTJ VOL-00191-02 PP-00412. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/747391/medida-cautelar-na-acao-direta-de-
inconstitucionalidade-adi-mc-1050-sc>. Acesso em jan. de 2014.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta de
Inconstitucionalidade: ADI-MC nº 293. Requerente: Procurador Geral da República;
Requerido: Presidente da República. Relator: Ministro Celso de Mello. Brasília: DF. Data de
Julgamento: 06/06/1990. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 16-04-1993; PP-06429;
EMENT VOL-01699-01; PP-00009. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/2907836/medida-cautelar-na-acao-direta-de-
inconstitucionalidade-adi-mc-293-df>. Acesso em jan. de 2014.
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Medida cautelar na Ação Direta de
Inconstitucionalidade: ADI-MC 1070 MS. Relator: Celso de Mello, Data de Julgamento:
23/11/1994, Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJ 15-09-1995 PP-29507 EMENT VOL-
01800-01 PP-00187. Disponível em:
<http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/746928/medida-cautelar-na-acao-direta-de-
inconstitucionalidade-adi-mc-1070-ms>. Acesso em dez. de 2013.
BRASIL, Tribunal de Contas da União.Acórdão nº 1538/2012. Plenário. Relator: Ministro
Valmir Campelo. Sessão de 20/06/2012. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:c0KnICL4DQoJ:www.tcu.gov.br/C
onsultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20120622/AC_1538_23_12_P.doc+&cd=1&hl=pt-
BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014.
BRASIL, Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 2873/2008. Plenário. Processo TC-
007.162/2006-0 (Apenso: 005.425/2005-5). Interessado: Congresso Nacional. Responsáveis:
Carlos Von BeckerathGordilho (002.366.915-20); Denival Damasceno Chaves (004.477.735-
34); Fernando DuraoSchleder (440.709.507-53); Flávio Mota Monteiro (635.036.208-00);
Frederico Pires da Silva (663.602.507-72); Ivan Carlos Alves Barbosa (033.422.635-04);
Janary Teixeira de Castro (163.535.875-20); Joao Luiz da Silva Dias (011.089.806-00); José
Hamilton da Silva Bastos (056.283.855-49); Luiz Fernando Tavares Vilar (020.645.705-78);
Luiz Otávio Ziza Mota Valadares (110.627.386-91); Nestor Duarte Guimaraes Neto
(110.289.805-82); e Pedro Antonio Dantas Costa Cruz (113.611.405-00).
Disponível:.<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/mista/orca/tcu/PDFs/Acorda
o28732008-TCU-Plen%C3%A1rio.pdf>. Acesso em jan.de 2014.
65
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e
dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm>. Acesso em mar. de 2013.
CARVALHO, Leandro. Governo Fernando Henrique Cardoso. Fernando Henrique
Cardoso (FHC), durante os dois mandatos como presidente da República, efetivou o Plano
Real, privatizou várias estatais brasileiras e implantou a política neoliberal. Disponível em:<
http://www.brasilescola.com/historiab/governo-fernando-henrique-cardoso.htm>. Acesso em:
fev.de 2014.
COSTA, Athayde Ribeiro. DINIZ, Ana Carolina Oliveira Tannus. FURTADO, Carolina de
Gusmão. CARVALHO, Paulo Roberto Galvão. Nota técnica encaminhada por
Procuradores da República Membros do Grupo de Trabalho Copa do Mundo FIFA
2014 da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão ao Procurador-Geral da República, Sr.
Roberto Gurgel, em ocasião do Projeto de Lei de Conversão da MP 521/2010 apud
BRASIL, Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4645, ajuizada pelo Partido da
Social Democracia Brasileira (PSDB), dos Democratas (DEM) e do Partido Popular socialista
(PPS), contra a Lei 12.462/2011, que instituiu o chamado “Regime Diferenciado de
Contratações Públicas” (RDC), aplicável às licitações e contratos de obras de infraestrutura
dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, da Copa do Mundo de 2014 e da Copa das
Confederações da FIFA de 2013. Disponível na íntegra em:
<http://www.institutocertame.com.br/adin-4645-rdc-regime-diferenciado-contratacoes>.
Acesso em abr. de 2014.
CUNHA, Marcos André da e RUIZ, Ivan Aparecido. O Princípio da eficiência na
Administração Pública: propostas para a otimização da cobrança judicial da dívida ativa.
Disponível
em:<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:Hv5WH9BE_FAJ:www.escola
degoverno.pr.gov.br/arquivos/File/gestao_de_politicas_publicas_no_parana_coletanea_de_est
udos/cap_8_administracao_e_previdencia/capitulo_8_3.pdf+&cd=1&hl=pt-
BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em jan. de 2014.
DISTRITO FEDERAL. Câmara dos Deputados – DETAQ. Sessão: 153.1.54.O. Hora: 17:50.
Fase: OD. Orador: José Guimarães, PT-CE. Data: 15/06/2011. Parecer, pela Comissão
Mista, à Medida Provisória 527 de 2011 (Altera a Lei 10.683 de 2003, que dispõe sobre a
organização da Presidência da República e dos Ministérios, cria a Secretaria de Aviação Civil,
altera a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC e da Empresa Brasileira de
Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, cria cargo de Ministro de Estado e cargos em
comissão, dispõe sobre a contratação de controladores de tráfego aéreo temporários, cria
cargos de Controlador de Tráfego Aéreo). Disponível em
<http://www.camara.gov.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=153.1.54.
O%20%20%20%20%20&nuQuarto=116&nuOrador=2&nuInsercao=27&dtHorarioQuarto=1
7:50&sgFaseSessao=OD%20%20%20%20%20%20%20%20&Data=15/06/2011&txApelido
=JOS%C3%89%20GUIMAR%C3%83ES,%20PT-
CE&txFaseSessao=Ordem%20do%20Dia%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20
%20%20%20%20%20%20%20&txTipoSessao=Ordin%C3%A1ria%20-
%20CD%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20%20&dtHoraQua
rto=17:50&txEtapa=> . Acesso em mar. de 2013.
66
GARÇON, Juliana. “Atalho” para obras da Copa já domina licitações públicas.
Dispositivo já é usado em nove concorrências e também será adotado em novos setores. Brasil
Econômico. São Paulo. 11,12 e 13 da janeiro de 2013.
HENRIQUE, Marco Antônio. Administração Pública Burocrática versus Gerencial: uma
análise crítica. XV Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e XI Encontro Latino
Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba. Disponível em:
<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:qVt1hImQ0XQJ:www.inicepg.univap.br/cd/I
NIC_2011/anais/arquivos/0023_0043_01.pdf+administra%C3%A7%C3%A3o+publica+buro
cratica+a+gerencial&hl=pt&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjre3Qh6XccIcgujj8_UvXsqBwm
__vpcJVEbVRLiBZaIuaxXMKCXwNYqJuaCfkgHu2VylNswZZMzTXak0ws5DshlElPstm3
QLQKvre8b9PuLzBaswrzGRqdQ6ayx7OX6srBJ_oN&sig=AHIEtbQFcgOm8Ea-
j6QwWCLwC5WIspFOPQ>. Acesso em abr. de 2013.
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
14 ed. São Paulo: Dialética, 2010.
JUSTEN FILHO, Marçal; PEREIRA, Cesar A. Guimarães (Coord.). O Regime Diferenciado
de Contratações Públicas (RDC): Comentários à Lei nº 12.462 e ao Decreto nº 7.581. 2ª ed.
rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2013.
MARE (Ministério da Administração e Reforma do Estado): Plano Diretor da Reforma do
Aparelho Estatal. Brasília: Presidente da República, Imprensa Oficial. Novembro de 1995.
Disponível
em:<http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf.>
Acesso em jan.de 2014.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ªed. atual. São Paulo:
Malheiros, 2002.
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. rev. e atual.
São Paulo: Malheiros, 2011.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. Gilmar Ferreira Mendes,
Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 6ª Ed. rev. e atual. – São Paulo:
Saraiva, 2011.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional - 21 ed. – São Paulo: Atlas. 2007.
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A Reforma Gerencial do Estado de 1995. Revista de
Administração Pública – RAP. Rio de Janeiro (34). Julho, 2000. Disponível em:
<http://www.bresserpereira.org.br/papers/2000/81RefGerenc1995-INA.pdf>. Acesso em jan.
de 2014.
REZENDE, Renato Monteiro de. O Regime Diferenciado de Contratações Públicas:
Comentários à Lei 12.462, de 2011. Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado. Texto para
discussão 100. Agosto/2011. Disponível em:
<https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:Yr2FIw6jUxcJ:www.senado.gov.br/s
enado/conleg/textos_discussao/TD100-
RenatoRezende.pdf+Redime+diferenciado+de+contrata%C3%A7%C3%B5es+publicas&hl=p
67
t-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjC3RjC5uw6Ihzeyq1Ig2V1dD-
bB7YoyqbWvWImmau64bvJ62cON9u_MhcoZLGpnd1040u8OVVWr24uYU4SNq_bXkRL
GxgJIweKAjKETD5pv1NeP8k8Q9Kh4tZQWq_tsq7jt8zH&sig=AHIEtbQ7VF-
lLmjU5U5FDsWkCM85QiX5Mw.> Acessado em mar.de 2013.
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública.
Belo Horizonte: Del Rey, 1994.
RODRIGUES, Marilene Talarico M. Princípio da eficiência em matéria Tributária. In:
MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais e Centro
de Extensão Universitária, 2006.
SERRANO, Pedro Estevam. Contratos realmente "diferenciados". O Regime Diferenciado
de Contratação usado pelo governo Dilma nas licitações da Copa do Mundo é um mecanismo
nefasto de corrupção sistêmica. In: Carta Capital. Publicado em 03 de junho de 2012.
Disponível em:<http://www.cartacapital.com.br/politica/contratos-realmente-diferenciados/>.
Acesso em abr. de 2013.
SILVA, Marina. Reflexões sobre a Independência. Publicado na Gazeta do Rio Branco/AC
e no site do senado no link:
<http://www.senado.gov.br/senadores/senador/marinasi/detalha_artigo.asp?data=05/09/2000
&codigo=1526>. apud Apostila da Fapan – Faculdade de Paraíso do Norte. Disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:tAwtaqYnOlcJ:www.fapanpr.edu.b
r/site/docente/arquivos/Administracao_Publica_Apostila01.pdf+&cd=1&hl=pt-
BR&ct=clnk&gl=br> Acesso em jan. de 2014.
TORRES, Marcelo Douglas de Figueiredo. Estado, Democracia e Administração Pública
no Brasil. 1ªed..Rio de Janeiro: FGV, 2004. Disponível em:
<http://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=jvDrA9D6vSAC&oi=fnd&pg=PA11&dq=Administra%C3%A7%C3%A3o+p%
C3%BAblica+weberiana&ots=bgqVHyheu2&sig=z4gMsV8DecyoJqXDW2nY_xS2klw#v=o
nepage&q=Administra%C3%A7%C3%A3o%20p%C3%BAblica%20weberiana&f=false>.
Acesso em jan. de 2014.
Top Related