UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO - BIGUAÇU O RECURSO ADMINISTRATIVO POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO
HUMBERTO AQUILINO SCHMITT
Biguaçu (SC), junho de 2008.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS CURSO DE DIREITO - BIGUAÇU O RECURSO ADMINISTRATIVO POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO
HUMBERTO AQUILINO SCHMITT
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: MSc. Rafael Burlani Neves
Biguaçu (SC), junho de 2008.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela generosidade de
permitir a realizar este sonho.
Agradeço aos familiares, em especial, a
minha mãe Solange Wollinger Schmitt pela
educação, e aos sinceros amigos por me
incentivarem a seguir em frente.
Agradeço aos professores pelo
conhecimento adquirido a partir deles,
especialmente o orientador e professor
Rafael Burlani Neves, por me apoiar
imprescindívelmente na elaboração desta
Monografia.
Finalmente, agradeço aos colegas de
trabalho por possibilitarem as constantes
ausências e palavras incentivadoras.
DEDICATÓRIA
Dedico esta Monografia aos meus Pais, por
terem ensinado a discernir os valores da
vida, em especial ao pai João Aquilino
Schmitt, pois tanto me amou e não se faz
presente para compartilhar está vitória.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para os devidos fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a
coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer
responsabilidade acerca do mesmo.
Biguaçu (SC), junho de 2008.
HUMBERTO AQUILINO SCHMITT Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente Monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí
– UNIVALI, elaborada pelo graduando Humberto Aquilino Schmitt, sob o título O
Recurso Administrativo por Infração de Trânsito, foi submetida em 19 de junho de 2008 à
banca examinadora composta pelos seguintes professores: Msc. Rafael Burlani Neves,
Msc. Maria Letícia Iconomos Baixo e o MSc Helena Nastassya Paschoal Pítsica, e
aprovada com a nota XX (XX).
Biguaçu/SC, 19 de junho de 2008.
Professor MSc. Rafael Burlani Neves Orientador e Presidente da Banca
Professora MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho com seus respectivos conceitos operacionais.
Agente da autoridade de trânsito
Pessoa, civil ou policial militar, credenciada pela autoridade de trânsito para o
exercício das atividades de fiscalização, operação, policiamento ostensivo de
trânsito ou patrulhamento.1
Ato jurídico perfeito
É aquele que está em condições de produzir efeitos jurídicos, porque já
completou todo o seu ciclo de formação.2
Autoridade de trânsito
Dirigente máximo de órgão ou entidade executivo integrante do Sistema Nacional
de Trânsito ou pessoa por ele expressamente credenciada.3
Dispositivo de segurança
Qualquer elemento que tenha a função específica de proporcionar maior
segurança ao usuário da via, alertando-o sobre situações de perigo que possam
colocar em risco sua integridade física e dos demais usuários da via, ou danificar
seriamente o veículo.4
Estacionamento
Imobilização de veículos por tempo superior ao necessário para embarque ou 1 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro – 4 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2003. p. 661. 2 DI Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Maria Sylvia Zanella Di Pietro. 19 ed. 2 reimpr. São Paulo: Atlas, 2006. p. 234. 3 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado – Geraldo de Faria Lemos Pinheiro, Dorival Ribeiro – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2000. p. 31. 4 BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. Código de Trânsito Brasileiro: instituído pela Lei n. 9.503, de 23/09/97 – Brasília: DENATRAN, 2006. p. 87.
desembarque de passageiros.5
Estrada
Via rural não pavimentada.6
Faixas de domínio
Superfície lindeira as vias rurais, delimitada por lei especifica e sob
responsabilidade do órgão ou entidade de trânsito competente com circunscrição
sobre a via.7
Faixas de trânsito
Qualquer uma das áreas longitudinais em que a pista pode ser subdividida,
sinalizada ou não por marcas viárias e que tenham uma largura suficiente para
permitir a circulação de veículos automotores.8
Fiscalização
Ato de controlar o cumprimento das normas estabelecidas na legislação de
trânsito, por meio do poder de polícia administrativa de trânsito, no âmbito de
circunscrição dos órgãos e entidades executivos de trânsito.9
Infração
Inobservância a qualquer preceito da legislação de trânsito, às normas emanadas
do Código de Trânsito, do Conselho Nacional de Trânsito e a regulamentação
estabelecida pelo órgão ou entidade executiva do trânsito.10
Licenciamento
5 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 662. 6 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 32. 7 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 88. 8 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro: (direito de trânsito e direito administrativo de trânsito). Nei Pires Mittidiero. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 1398. 9 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 32. 10 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 88.
Procedimento anual, relativo a obrigações do proprietário de veículo, comprovado
por meio de documento específico (Certificado de Licenciamento Anual).11
Logradouro público
Espaço livre destinado pela municipalidade à circulação, parada ou
estacionamento de veículos, ou à circulação de pedestres, tais como calçada,
parques, áreas de lazer, calçadões.12
Manobra
Movimento executado pelo condutor para alterar a posição em que o veículo está
no momento em relação à via.13
Marcas Viárias
Conjunto de sinais constituídos de linhas, marcações, símbolos ou legendas, em
tipos e cores diversas, apostos ao pavimento da via.14
Operação de trânsito
Monitoramento técnico baseado nos conceitos de Engenharia de tráfego, das
condições de fluidez, de estacionamento e parada na via, de forma a reduzir as
interferências tais como veículos quebrados, acidentados, estacionados
irregularmente atrapalhando o trânsito, prestando socorros imediatos e
informações aos pedestres e condutores.15
Parada
Imobilização do veículo com a finalidade e pelo tempo estritamente necessário
para efetuar embarque ou desembarque de passageiros.16
11 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 663. 12 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1399. 13 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 89. 14 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 664. 15 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 34. 16 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 90.
Patrulhamento
Função exercida pela Policia Rodoviária Federal com o objetivo de garantir
obediência às normas de trânsito, assegurando a livre circulação e evitando
acidentes.17
Pista
Parte da via normalmente utilizada para a circulação de veículos, identificada por
elementos separadores ou por diferença de nível em relação às calçadas, ilhas ou
aos canteiros centrais.18
Placas
Elementos colocados na posição vertical, fixados ao lado ou suspensos sobre a
pista, transmitindo mensagens de caráter permanente e, eventualmente,
variáveis, mediante símbolo ou legendas pré-reconhecidas e legalmente
instituídas como sinais de trânsito.19
Policiamento ostensivo de trânsito
Função exercida pelas Polícias Militares com o objetivo de prevenir e reprimir atos
relacionados com a segurança pública e de garantir obediência às normas
relativas à segurança de trânsito, assegurando a livre circulação e evitando
acidentes.20
Regulamentação da via
Implantação de sinalização de regulamentação pelo órgão ou entidade
competente com circunscrição sobre a via, definindo, entre outros, sentido de
direção, tipo de estacionamento, horários e dias.21
Renach 17 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 665. 18 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1401. 19 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 90. 20 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 665. 21 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 35.
Registro nacional de condutores habilitados.22
Renavam
Registro nacional de veículos automotores.23
Rodovia
Via rural pavimentada.24
Sinalização
Conjuntos de sinais de trânsito e dispositivos de segurança colocados na via
pública com o objetivo de garantir sua utilização adequada, possibilitando melhor
fluidez no trânsito e maior segurança dos veículos e pedestres que nela
circulam.25
Trânsito
Movimentação e imobilização de veículos, pessoas e animais nas vias
terrestres.26
Via
Superfície por onde transitam veículos, pessoas e animais, compreendendo a
pista, a calçada, o acostamento, ilha e canteiro central.27
Via local
Aquela caracterizada por interseções em nível não semaforizadas, destinada
apenas ao acesso local ou a áreas restritas.28
22 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1402. 23 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 666. 24 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 35. 25 BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 91. 26 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 35. 27 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1403. 28 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 667.
Via rural
Estradas e rodovias.29
Via urbana
Ruas, avenidas, vielas, ou caminhos e similares abertos à circulação pública,
situados na área urbana, caracterizando principalmente por possuírem imóveis
edificados ao longo se sua extensão.30
29 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 36. 30 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1403.
ROL DE ABREVIATURAS
Rol de abreviaturas que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
AIT Auto de Infração de Trânsito
ANTT Agência Nacional de Transportes Terrestres
BINCO Base de Índice Nacional de Condutores
CAP Capítulo
CC Código Civil
CETRAN Conselho Estadual de Trânsito
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CFC Centro de Formação de Condutores
CNH Carteira Nacional de Habilitação
CNT Código Nacional de Trânsito, Lei n. 5.108/66
CONTRAN Conselho Nacional de Trânsito
CONTRANDIFE Conselho de Trânsito do Distrito Federal
CPC Código de Processo Civil
CRLV Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo
CTB Código de Trânsito Brasileiro, Lei n. 9.503/97
DENATRAN Departamento Nacional de Trânsito
DETRAN Departamento de Trânsito
DPRF Departamento de Policia Rodoviária Federal
INMETRO Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualificação
JARI Junta Administrativa de Recurso e Infração
PORT Portaria
RENACH Registro Nacional de Carteiras de Habilitação
RENAVM Registro Nacional de Veículos Automotores
RES Resolução
SNT Sistema Nacional de Trânsito
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................................1
1 DIREITO DO TRÂNSITO...............................................................................................3
1.1 ESBOÇO HISTÓRICO – CONCEITUAL......................................................................6
1.2 LEGISLAÇÃO DE TRÂNSITO NO BRASIL................................................................8
1.3 INTERDISCIPLINARIDADE DO DIREITO DE TRÂNSITO....................................12
1.4 PRINCÍPIOS..................................................................................................................16
1.5 SISTEMA NACIONAL DE TRÂNSITO......................................................................22
2 PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO....................................................................26
2.1 PROCESSO ADMINISTRATIVO............................................................................... 26
2.1.1 O termo procedimento.................................................................................................26
2.1.2 O ato administrativo....................................................................................................29
2.1.3 Importância do processo administrativo......................................................................35
2.2 ATO PUNITIVO........................................................................................................... 39
2.2.1 Infração de trânsito......................................................................................................40
2.2.2 Auto de infração..........................................................................................................40
2.2.3.1 Registro eletrônico...................................................................................................43
2.2.4 Notificação..................................................................................................................44
2.3 DA PENALIDADE........................................................................................................49
2.3.1 Atribuição dos pontos ao infrator................................................................................50
2.3.2 Advertência por escrito...............................................................................................52
2.3.3 Apreensão do veículo..................................................................................................52
3 RECURSOS ADMINISTRATIVOS DE TRÂNSITO.................................................54
3.1 NOÇÕES PRELIMINARES..........................................................................................54
3.1.1 Pressupostos Recursais................................................................................................56
3.1.2 Efeitos Recursais.........................................................................................................58
3.1.3 Apresentação do condutor...........................................................................................59
3.2 FASES DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE TRÂNSITO.................................61
3.2.1 Recurso de defesa de autuação....................................................................................62
3.2.2 Recurso a JARI............................................................................................................66
3.2.3 Recurso ao CETRAN..................................................................................................72
3.3 FASES DO PROCESSO ADMINISTRATIVO PUNITIVO........................................75
3.3.1 Considerações gerais...................................................................................................76
3.3.2 Processo de suspensão e cassação da habilitação........................................................77
3.3.3 Reabilitação.................................................................................................................82
CONCLUSÃO....................................................................................................................84
REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS....................................................................87
ANEXOS.............................................................................................................................89
RESUMO
De todas as leis especiais, sem dúvida a que mais despertam interesse na
sociedade é Código de Trânsito Brasileiro, tendo em vista que um dos direitos
fundamentais, garantido pela CRFB/88 que é o direito de ir e vir. Tal direito é ser
pleno, todavia, a superlotação das vias públicas exige que o Estado interfira
nesse processo, do ir e vir, com vista a organizar e evitar que no exercício pleno
de seu direito um cidadão acabe interferindo no direito do outro, resultando em
punições previstas em face da violação das normas de trânsito. Muito importante
se faz o estudo do processo administrativo concernente as infrações de trânsito,
pois pelo fato de prever punições pecuniárias e restritivas de direito aos
condutores de veículos, deve-se aplicar as garantias, princípios constitucionais e
administrativos no processo administrativo concernente as infrações de trânsito, a
fim de garantir uma decisão mais justa por parte da administração pública. O
presente trabalho tem como abordagem principal os recursos administrativos de
infração de trânsito, com observância das garantias que devem revesti-los,
agindo-se dentro da lei e nos limites estabelecidos por ela, e identificando as
fases relativas ao processo administrativo de trânsito, esclarecendo os pontos
relevantes do recurso no processo administrativo por infração de trânsito.
Palavras-chave: Direito de trânsito. Processo administrativo de trânsito. Processo
punitivo de trânsito. Recurso administrativo.
ABSTRACT
One of all the special laws in Brazil, that certainly interests and concern the society
is the Code of Traffic. The reason is one of the fundamental rights assured by
Constituição Federal (Brazil´s most important law), is to be free to walk to
wherever place. This right is absolute, however, the overcrowded publics streets
claims to the State to interfere with this, to organize and avoid people’s conflict.
The State’s intervention results in punishment, when the citizen transgress the
rules. In this way is so important to study the lawsuit, because the State can
punish the citizen with fine and restriction. The traffic’s lawsuit must be assured by
the legal rights to have a correct decision and punishment. The preset work aims
to study the lawsuits proceeded by the traffic, which must obey the Brazilian´s
laws. Likewise will be showed all the steps of Brazilians lawsuit included each
appeal.
Keywords: Traffic´s right. Lawsuit. Appeal.
1
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto denotar os aspectos
formais e legais do processo administrativo, baseado no Código de Trânsito
Brasileiro.
Sua elaboração atende a dois objetos fundamentais: o
objeto investigatório geral e descritivo e o objeto investigatório específico e
descritivo. Objeto investigatório geral e descritivo do recurso administrativo por
infração de trânsito como garantia da ampla defesa e do contraditório, as
disposições legais, os entendimentos doutrinários e o comportamento
jurisprudencial acerca do procedimento no processo administrativo nas infrações
de trânsito.
Finalmente, o objetivo investigatório especifico e descritivo é
demonstrar o caminho mais adequado sob a ordem jurídica e estabelecer as
fases do processo administrativo nas infrações de trânsito.
Para tanto, no Capítulo 1 tratar-se-á das noções básicas
resumidamente evolução histórica, os princípios que regem a administração
pública de trânsito e o sistema nacional de trânsito.
O Capítulo 2 referir-se-á sobre a esfera administrativa do
fenômeno trânsito; do processo administrativo; processo punitivo por infração de
trânsito.
O Capítulo 3 exporá do recurso administrativo de trânsito, os
pressupostos recursais, efeitos recursais; apresentação do condutor; fases do
processo administrativo de trânsito; processo de suspensão e cassação de
habilitação.
O presente relatório de pesquisa encerra com as
considerações finais, nas quais serão apresentados os pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre o recurso administrativo por infração de trânsito.
2
Para a presente monografia foram levantadas a seguintes
situações: a) aplicação dos princípios constitucionais da ampla defesa e do
contraditório, no julgamento das infrações de trânsito sendo esta assegurada em
sua plenitude somente após a edição da resolução n. 149/2003 e 182/2005
ambas do CONTRAN; b) a materialização, elaboração do recurso sobre a
determinada violação da norma de trânsito; c) enfocar a necessidade de um
procedimento único entre os órgãos de trânsito referente às infrações de trânsito,
diante da irregularidade encontrada no processo administrativo.
Quanto à metodologia empregada, foi utilizado o método
dedutivo, pois parte do particular, (processo administrativo de trânsito) e
generaliza na abordagem do processo administrativo de forma ampla. O método
utilizado para análise da pesquisa foi a utilização de fontes bibliográficas, ou seja,
obras literárias, legislação, jurisprudência, jornais, entre outras.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
3
1 DIREITO DO TRÂNSITO
Descuidado seria falar sobre o recurso administrativo de
infração de trânsito sem abordar, preliminarmente, os princípios e conceitos em
geral. Direito de trânsito é o conjunto de regras e princípios que disciplinam a
movimentação e a imobilização do homem, nas acepções de pedestres, condutor
de veículos ou animais, e a destes, indistintamente, pelas vias terrestres abertas
para fins de circulação, parada e estacionamento, este compreendendo também
as operações de carga ou descarga.31
O sentido de trânsito corresponde a qualquer movimentação
ou deslocamento de pessoas, animais e veículos, de um local para outro.
Definição encontrada no dicionário32, expressa ação ou efeito de passar, de
caminhar equivalente, pois, a caminho ou marcha. Mas conforme o próprio CTB33,
relativo aos conceitos e definições que seguem, há mais amplitude:
“movimentação e imobilização de veículos, pessoas e animais nas vias
terrestres”. Percebe-se a inclusão do termo imobilização, embora na literalidade a
palavra se oponha ao significado, e com justa razão, eis que o CTB disciplina
igualmente os casos dos veículos estacionados, prevendo cominações para
aqueles que são colocados em lugares proibidos. 34
Subjetivamente, Direito de trânsito é a vantagem provinda
da lei que tem o homem de movimentar-se ou imobilizar-se pelas vias terrestres
abertas a circulação para fins de circular, parar e ou estacionar, sendo que este
último pode abarcar operações de carga ou descarga.
31 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro: (direito de trânsito e direito administrativo de trânsito). Nei Pires Mittidiero. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 26. 32 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio: O minidicionário da língua portuguesa. 6 ed. rev. e atualizada. Curitiba, ed. Positivo, 2004. p. 786. 33 Dos Conceitos e definições. (RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro – 6 ed. ver., atual e ampl. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2007). p. 666. 34 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro – 6 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2007. p. 34.
4
De acordo com Mitidiero, eis, valendo-se parcialmente da
lição de Carlos Tabasso35, os caracteres individuais que dão autonomia ao direito
de trânsito, homogeneizando-os:36
a) O seu objeto, que é único universalmente, consiste na regulação da movimentação e imobilização das pessoas, veículos e animais em uma dimensão própria e individualizada, peculiaridade, certamente, mais forte da legislação viária;
b) Ao regulá-las, a legislação descreve, impõe, permite, coíbe, reprime e castiga atos e condutas de trânsito os mais diversos, próprios, impróprios meramente administrativos etc. sob fundamentos únicos e cria relações precípuas inexistentes em outros complexos e plexos jurídicos, isto é, ramos do direito;
c) O seu âmbito palmar de incidência: movimentação e imobilização apenas nas vias terrestres abertas a circulação. Ocorrendo fora desse estádio, desde que atos próprios de trânsito é-lhe indiferente;
d) O fundo preceptivo: basicamente, preceitos fundados na ciência e na tecnologia solucionam, resolvem as dificuldades e problemas do acontecer viário, restando, em plano francamente secundário, os critérios políticos da oportunidade, conveniência e fungibilidade;
e) Sujeitos próprios: o Estado como autoridade viária, os utentes das vias terrestres abertas à circulação;
f) Teleologia própria: os seus fins são proeminentemente a segurança e a fluidez viárias; em ótica posterior: a comodidade, o conforto viários, a incolumidade dos bens públicos e privados, e do meio ambiente exposto às cenas puras de trânsito;
g) A segurança material, isto é, aquela vinculada a cena viária, e não a segurança jurídica (do mundo dos princípios e leis do direito) é a que informa a legislação viária, voltando-se a uma realidade física transparente, na qual pretende-se mínimo o risco ou o perigo – visto que, sem tais, essa realidade inexiste – aos usuários das vias terrestres abertas a circulação;
h) Normatização de polícia: na medida em que deve atuar no momento mesmo em que ocorrem os atos e condutas viários, sob a conseqüência de ineficaz; e
35 TABASSO, Carlos. Derecho del tránsito – Los Princípios, Buenos Aires: Julio César Faria – Editor, 1997. p. 68. 36 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 26.
5
i) Normatização assemelhada em outros países; tendência a unicidade, de substância, em face de pressuposto único, restando, essa característica do direito comparado, mais um vigoroso dado a garantir a autonomia do direito de trânsito.
Entretanto, enquanto formas de movimentação e
imobilização, e correlata ocupação daquela dimensão espaço-temporal, o trânsito
passa a preocupar o Estado, porquanto de sumo interesse, deste, que ocorra de
maneira disciplinada, organizada e que seja seguro, fluido, confortável, cômodo.
Preserve e proteja os bens públicos e privados, assim como o administrador do
trânsito, em suas águas, sob a luz do direito administrativo do trânsito, calhando-
lhe bem o nome de Direito Administrativo de Trânsito, já que se constitui em um
complexo de regras e princípios jurídicos que rege as atividades e as relações da
Administração Pública enquanto planejadora, organizadora, executora e
controladora do trânsito. Atividades estas tendentes a realizar concreta e
imediatamente a vontade e os fins do Estado. 37
Diferentes conceitos podem ser atribuídos a Administração
de Trânsito, podemos destacar que Administração de Trânsito, em sentido formal,
é o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetos do governo; em
sentido material, é o conjunto de funções necessárias aos serviços públicos em
geral; em acepção operacional, é o desempenho permanente e sistemático, legal
e técnico, dos serviços próprios do poder público ou por ele assumidos, no
interesse comum. 38
Resumindo: Administração de trânsito é um conjunto de
órgãos, compreendendo um conjunto de funções, que executam uma série de
atribuições para a consecução dos objetivos do governo em relação ao trânsito,
ou seja, em relação à utilização das vias terrestres.39
Destaca-se no atual CTB o caráter punitivo, na tentativa de
reduzir o número de acidentes constatados sob a luz do código anterior. Essa
37 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 28. 38 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. Campinas: Millennium, 2000. p. 5. 39 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 5.
6
desconsideração tornaria desorientada a pesquisa; inconsistente a composição
do material de estudo; precária a exposição e prejudicado, conseqüentemente, o
aprendizado.
Destarte, este capítulo preocupa-se com a conceituação do
direito de trânsito, sua evolução histórica; seus elementos, requisitos e princípios
fundamentais.
1.1. ESBOÇO HISTÓRICO - CONCEITUAL
Uma das primeiras civilizações a utilizar regras para a
circulação e condutas no trânsito foi a Romana, razão pela qual até hoje é
utilizada a expressão todos os caminhos levam à Roma.
No “direito romano havia as servidões de passagem, forma
de constituir o caminho que se prolongou até os tempos modernos, e que deram
origem a inúmeras vias”.40
Na antiguidade, isto é, o período compreendido entre o
começo da civilização e o séc. V (queda do Império romano do Ocidente), já
apresentava o problema trânsito, a circulação viária caótica, a violência
emergente, causados, a um primeiro lanço de olhos, pela disposição das ruas,
tendentes a desembocar os seus fluxos em um ponto central das cidades, nas
praças nucleares, isto já vindo desde os romanos, tanto que, no séc. I a. C., Júlio
César” baniu todos os veículos de Roma durante o dia, e a medida foi estendida
gradativamente a cidades nas províncias.41
O gênio Leonardo da Vinci, em 1500, reservou lugares para
os pedestres e para as viaturas, nas vias urbanas, projetando estas em diferentes
níveis, um para circulação dos veículos (pista) e outro para a dos pedestres, mais
elevado (calçada ou passeio), segregação providencial e solução ótima, que,
40 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2003. p. 31
41 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 04.
7
entretanto, só vieram à tona, efetivamente, no séc. XX.42
De modo geral com a invenção do automóvel em meados do
século XIX, e sua propagação com a Primeira Grande Guerra, foram expandidas
as ruas e estradas, adequando-se ao tráfego de veículos automotores, as quais
foram aplainadas, alargadas e sinalizadas.43
Em 1908, quando verdadeiramente iniciou a denominada
“Era da Automobilização”, Henry Ford lançou o seu famoso carro universal “T”.
Em 1927, quando cessada a fabricação deste, quinze milhões deles já
transitavam pelas vias, exigindo-se, a partir daí, nova abordagem às questões
viárias, uma vez que o número de veículos, em um crescendo vertiginoso, hoje,
fez insurgir um trânsito terrestre calamitoso, que perdura e preocupa
incomparavelmente mais que ontem. Assim, qualquer caminho no território
nacional que ocorre a passagem ou movimentação no trânsito de veículos
submete-se as regras do CTB, não importando a espécie do veículo. 44
Cabe salientar que os veículos de fabricação estrangeira
que façam parte da frota estrangeira encontram-se também submetidos à regra
do CTB, podendo circular livremente, desde que possuam documentos provando
a propriedade e a habilitação do motorista, devendo respeitar as normas vigentes
no Brasil.
O CTB define o trânsito como o uso das vias por pessoas,
veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para a circulação,
parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.45
De acordo com Honorato, existe uma distinção entre trânsito
e tráfego:
A doutrina distingue trânsito e tráfego. O Desembargador Dr.
42 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 05. 43 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2007. p. 39. 44 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 05. 45 BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. Código de Trânsito Brasileiro: instituído pela Lei n. 9.503, de 23/09/97 – Brasília: DENATRAN, 2006. p. 31.
8
Geraldo de Farias Lemos Pinheiro, Tráfego e trânsito, com o significado de circulação de veículos e pedestres, são quase sinônimos, quer na linguagem dos técnicos, quer na boca do povo, mas é incontestável uma tendência no sentido do emprego recomendado por Durval Lobo e por Menezes Cortes, [...] tráfego para veículos exclusivamente e trânsito para pedestres e veículos. Mas esta solução ainda é incompleta, pois, embora exista acordo tácito sobre a impropriedade de se dizer tráfego de pedestres, não está decidido quando será mais próprio dizer tráfego de veículos ou trânsito de veículos. Conclui o citado autor que o legítimo seria usar-se sempre trânsito, quer para pedestres, quer para veículos.46
Conclui: Assim, por exemplo, um caminhão vazio, quando se
desloca por uma rodovia, está em trânsito; quando se desloca transportando
mercadoria, está em tráfego. Daí a distinção entre normas de trânsito e normas
de tráfego: aquelas dizem respeitos às condições de circulação, estas cuidam das
condições de transporte nas vias de circulação.47
No presente trabalho acadêmico é utilizada com maior
freqüência a expressão TRÂNSITO, por considerar tecnicamente mais adequada,
como por exemplo, no art. 1º do Código de Trânsito Brasileiro.
Conforme o artigo 5° da CRFB/8848 institui-se um novo
direito, a garantia a um trânsito seguro, regular, organizador ou planejado, não
apenas pertinente a defesa da vida e da incolumidade física, mas também
relativamente à regularidade do próprio trafegar, de modo a facilitar a condução
dos veículos e a locomoção das pessoas.
1.2 LEGISLAÇÃO DE TRÂNSITO NO BRASIL
A primeira legislação referente ao trânsito brasileiro foi
46 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 02 47 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 21. 48 Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, a liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. 35 ed. Brasília: Saraiva, 2006. p. 21)
9
editada em 27 de outubro de 1910 sob a forma do Decreto Legislativo n. 8.324
que cuidava do serviço de transporte por automóveis.49
Mais tarde foi criado o Decreto Legislativo n. 4.460, de 11 de
janeiro de 1922 que destacou-se por regulamentar a construção de estradas, a
qual foi oficialmente utilizada a expressão “mata-burros”. Esta expressão
relacionava-se ao impedimento da passagem de animais em pontes, para coibir o
congestionamento do tráfego de automóveis.50
Ao tempo do Presidente Washington Luiz, grande incentivador da construção de estradas, o Decreto Legislativo n. 5.141 de 5 de janeiro de 1927, pela primeira vez mencionou os autocaminhões; e o Decreto n. 18.323, de 24 de julho de 1928, aprovou o regulamento para a circulação internacional de automóveis no território brasileiro e para a sinalização, segurança do trânsito e policia nas estradas de rodagem. Além desse diploma legal de âmbito nacional, os Estados e Municípios também tiveram sua legislação própria, como a Postura Municipal tiveram sua legislação própria, como a Postura Municipal nº. 858, de 15 de abril de 1902, do Rio de Janeiro, regulando a velocidade do automóvel na zona urbana. Em São Paulo, a Lei municipal n 2.264, de 13 de fevereiro de 1920, dispôs sobre a inspeção e fiscalização do trânsito de veículos no Município. 51
O Decreto n. 18.323, de 24 de julho de 1928, que “[...]
aprova o regulamento para a circulação internacional de automóveis, no território
brasileiro e para a sinalização, segurança do trânsito e polícia das estradas de
rodagem”.52
O Decreto Legislativo n. 18.323, de 1928 com 93 artigos
durou até o primeiro Código Nacional de Trânsito – CNT, regido pelo Decreto
Legislativo n. 2.994, de 28 de janeiro de 1941, revogado pelo Decreto Legislativo
49 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 10. 50 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado – Geraldo de Faria Lemos Pinheiro, Dorival Ribeiro – São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2000. p. 01. 51 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 01. 52 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 12.
10
n. 3.651, de 25 de setembro de 1941.53
Esse mesmo Decreto Lei n. 3.651 foi revogado pela Lei n.
5.108, de 21 de setembro de 1966, o CNT anterior, cujo Regulamento surgiu
através do Decreto n. 62.127, de 16 de janeiro de 1968.54
No mesmo entendimento segue Silva:
O primeiro Anteprojeto de Código de Trânsito, em substituição ao que vigia desde 1941, surgiu após o II Congresso Nacional de Trânsito, realizado em 1958, em Quitandinha, tendo o documento sido entregue ao Ministro da Justiça em dezembro de 1958. Em 26 de agosto de 1960 foi remetida ao Congresso Nacional a Mensagem n 329/60, do Poder Executivo. Na Exposição de Motivos, o Ministro Armando Ribeiro Falcão declarava que o “vigente Código Nacional de Trânsito, aprovado pelo Decreto Lei nº 3.651, de 25 de setembro de 1941, em que pese ao seu alto teor, está, no consenso dos que lhe devem da aplicação ou cobrar-lhe respeito, como de quantos se sujeitam as suas regras, a reclamar reforma, a fim de se adequar as exigências das novas conquistas no campo da técnica e oferecer ou possibilitar solução a problemas levantados pelo crescimento das populações dos grandes centros e pelo enorme desenvolvimento do tráfego urbano e interestadual.55
Em 1973, o Ministério da Justiça sistematizou a revisão da
legislação de trânsito, com a Portaria Ministerial n. 345-B, de 21 de setembro de
1973, nomeando uma comissão de técnicos para proceder à revisão, cuidando
especialmente da Lei n. 5.108. Entretanto restou ineficaz o trabalho da Comissão
revisora, pois não foi acolhido o anteprojeto entregue em 23 de agosto de 1974 ao
Ministério da justiça. Mas em 6 de junho de 1991 o Vice-Presidente da Republica
no exercício da Presidência, expediu Decreto criando comissão Especial com o
objetivo de elaborar novo anteprojeto do Código Nacional de Trânsito. 56
53 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 1. 54 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 12. 55 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 1. 56 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 4.
11
Os novos motivos do Ministro da Justiça referiram-se
basicamente a situação do trânsito no Brasil, destacando-se como calamidade
pública, ressaltando que a violência no trânsito não tinha limites e aqueles que a
cometem eram mantidos na impunidade. O projeto de lei remetido ao Congresso
Nacional tomou o n. 3.170/93, tendo como relator o Deputado Beto Mansur, que
cuidou de examinar as emendas e sugestões, oferecendo finalmente em 1 de
dezembro de 1973, um terceiro substitutivo, passando o estatuto a ser
denominado CTB.57
Desde 1993 em tramitação no Congresso Nacional, o CTB
procura, realmente, distribuir as responsabilidades, e, assim, conclamar a todos
para sairmos do trágico cenário de mortes, mutilações de pessoas e destruições
de patrimônio que representa atualmente o trânsito.58
Em 8 de março de 1994 interpuseram o Deputado Adylson
Motta e outros o recurso previsto no art. 132 § 2º, do Regimento, solicitando a
aprovação do projeto pelo Plenário. O recurso foi retirado pelos signatários dez
dias após a sua protocolização. 59
O texto então encaminhado ao Senado Federal, nos termos
do art. 65, da Constituição Federal, composto de 325 artigos e 2 Anexos, seguiu
uma filosofia de caráter legislativo diversa daquela adotada pela vigente
legislação de trânsito, ao integrar no corpo normativo, disposições e preceitos
comumente veiculados em diploma infra legal, ou seja, em Regulamento. No
curso do prazo regimental foram oferecidas 137 emendas e apensados projetos
de lei em tramitação. Com o encerramento da 49ª legislatura e com a saída de
alguns membros, inclusive do seu Presidente, houve necessidade da reinstalação
da Comissão, sendo apresentadas mais 119 emendas, totalizando, portanto 256.
Aprovado o projeto em primeiro turno, outras 207 emendas foram registradas,
para julgamento.60
57 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p.4 58 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 5. 59 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. 4 60 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p..5
12
Destacam-se as modificações ocorridas a partir da Lei n.
9.503/97, que instituiu o atual CTB o qual no seu art. 341 revogou a Lei n. 5.108,
de 21 de setembro de 1966, antigo CTB.
Um capítulo importante do CTB vigente que merece
destaque é o Capítulo VI 61, o qual prevê a educação para o trânsito, que há muito
tempo tenta-se implantar, dadas as proporções cada vez maiores dos acidentes
de trânsito.
Este capítulo determina que em cada órgão de trânsito
haverá uma coordenação que planeja e dirige as atividades no setor educacional,
como por exemplo, prevendo campanhas educativas entre a administração
federal, estadual e municipal.
1.3 INTERDISCIPLINARIDADE DO DIREITO DE TRÂNSITO
A Lei n. 9.503/97 no seu art. 1º, § 1º traz o conceito de
trânsito como: “a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou
em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e
operação de carga ou descarga”62
Trânsito é um fenômeno mais amplo do que geralmente é
compreendido, em razão de englobar todos os usuários das vias terrestres,
mesmo que não se encontrem embarcados em veículos automotores, e mesmo
que não se encontrem em deslocamento. Por exemplo, uma pessoa caminhando
ou sentada em um banco de uma praça, estará sujeita as normas impostas pelo
CTB.63
O conceito de trânsito segundo Rizzardo não restringe a
circulação em si, abrange o corpo administrativo que cuida e trata da
movimentação ou circulação dos veículos, ou o conjunto de ações e normas
dirigidas para a administração dos veículos enquanto se encontram nas vias. 61 Capítulo VI. Da educação para o trânsito. (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 62 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2007. p. 35. 63 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 02.
13
Nesse sentido não se diferencia bastante de repartições públicas, como
Delegacia de Trânsito, ou Divisão de Trânsito.64
Trânsito significa ato ou efeito de caminhar; marcha; ato ou
efeito de passar, passagem; caminho, trajeto, passagem; morte, passamento;
mudança; movimento, circulação, afluência de pessoas ou de veículos; trânsito
nas cidades, considerando no conjunto; acesso fácil, boa aceitação; instrumento
usado em topografia para medir ângulos horizontais.65
O Direito de Trânsito em regra não é ramo próprio e nem
autônomo de direito, e sim mera face do direito administrativo. Já a edição de
normas de Direito Administrativo compete às três esferas da Administração, e o
mesmo ocorre com o Direito de Trânsito.
Dentro do direito público, o trânsito situa-se, em parte, no
âmbito do direito administrativo, posto que subsiste nas suas águas, “é o conjunto
harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as
atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins
desejados pelo Estado, e noutra parte, no direito penal, em face da
normatividade, estampada no Cap. XIX do CTB66, correlata de trânsito.67
Conforme Hely Lopes Meirelles, o Direito Administrativo
pertence a um ramo do Direito Público, razão pela qual não são todos os
princípios de hermenêutica do Direito Privado que lhe são adequados. 68
Já para Celso Antônio Bandeira de Mello o direito
administrativo é o ramo do direito público que disciplina a função administrativa e
os órgãos que a exercem.69
64 RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2007. p. 36. 65 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 21. 66 Cap. XIX do CTB: Dos crimes de trânsito. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 67 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 09. 68 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 49. 69 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 21 ed. São Paulo:
14
O direito administrativo é o ramo do direito público que tem
por objeto os órgãos, agentes e pessoas jurídicas administrativas que integram a
administração pública, a atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens
de que se utiliza para a consecução de seus fins, de natureza pública.70
Especificamente, no que respeita aos seus elementos
próprios e essenciais, as relações jurídicas de trânsito conformam-se a um
emergente direito autônomo, verdadeiro Direito de Trânsito, complexo de
princípios e regras jurídicas, ditado pelo interesse público, regulador da
movimentação e imobilização de pessoas, veículos e animais nas vias terrestres
abertas a circulação.71
Importante correlacionar o Direito Administrativo com o
Direito de Trânsito, pois se aplicar ao Processo Administrativo de Trânsito os
princípios e regras intrínsecas ao Processo Administrativo em sentido lato.
Destaca-se que a administração de Trânsito baseia-se na
CRFB/88, na Lei n 9.503/97 e na legislação esparsa, inclusive Resoluções e
Portarias emanadas dos Órgãos pertencentes ao Sistema Nacional de Trânsito.
Cumpre, outrossim, registrar que compete privativamente a
União legislar sobre o trânsito (art. 22, XI da CRFB/8872), competindo aos Estados
e ao Distrito Federal elaborar normas regulamentares no âmbito das respectivas
competências (art. 14, II do CTB73), e, aos Municípios, excepcionalmente, legislar
sobre registro e licenciamento dos veículos de propulsão e tração humana (art.
129 do CTB74), concluindo alguns, apressada e equivocadamente, não poderem
Malheiros, 2006. p. 37. 70 DI Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Maria Sylvia Zanella Di Pietro. 19 ed. 2 reimpr. São Paulo: Atlas, 2006. p. 66. 71 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 09. 72 Art. 22. Compete Privativamente a União legislar sobre; XI – trânsito e transporte. (BRASIL. Constituição da Republicada Federativa do Brasil, 2006). 73Art. 14. Compete aos Conselhos Estaduais de Trânsito – CETRAN e ao Conselho de trânsito do Distrito Federal – CONTRANDIFE; II – elaborar normas no âmbito das respectivas competências. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006).
74 Art. 129. O registro e o licenciamento dos veículos de propulsão humana, dos ciclomotores e dos veículos de tração animal obedecerão à regulamentação estabelecida em legislação municipal
15
os Estados, os Municípios e o Distrito Federal legislar sobre trânsito. 75
Porquanto a competência da União para legislar sobre
trânsito, conforme art. 22, XI da CRFB/88, sendo privativa, como a é, admite
suplementariedade (e está lamentavelmente, tornando-se comum tacharem-se
inconstitucionais, não as sendo, variadas leis estaduais e municipais sobre
trânsito, sob o argumento, falho e falso, de que matéria de competência privativa
da União), a formulação de normas, pelos Estados, Municípios e Distrito Federal,
que desdobrem o conteúdo de princípios ou normas gerais elaboradas pela União
ou que supram a ausência ou comissão das últimas.76
Nesse sentido:
ADI nº 2.644 – PR, Relatora Min. Ellen Gracie; ADI nº 2.802 – RS (sinalização, controle de velocidade etc.), Relatora Min. Ellen Gracie, julgada em 09/10/2003 e ADI nº 2.814 – SC (isenção de pagamentos de valores de multas), Relator Min. Carlos Velloso, julgada em 15/10/2003.
De outra parte, é possível, aos Estados, aos Municípios e ao
Distrito Federal, legislar sobre trânsito, a luz do disposto nos arts. 22, XI e
parágrafo único77, 30, I e II, e 32, parágrafo 1º, ambos da CRFB/88, acrescendo-
se, ainda, tratar-se de competência comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios (art. 23, caput da CRFB/88)78, estabelecer e implantar
política de educação para a segurança do trânsito”.79
De acordo com o CTB, no seu Capítulo II, Seção II, art. 12 e
seguintes trata do Sistema Nacional de Trânsito, repartindo a competência entre do domicílio ou residência de seus proprietários. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 75 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 15. 76 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 15. 77 Art. 22. Compete Privativamente a União legislar sobre: XI – trânsito e transporte. § único: Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. (BRASIL. Constituição da Republicada Federativa do Brasil. 2006). 78 Art. 23. É de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: XII – estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito. (BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 2006). 79 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 16.
16
União, os Estados e os Municípios.
A competência é da União Federal, no que já se manifestou
a jurisprudência:
A legislação sobre trânsito é de competência privativa federal – CF/1988, art. 22, XI. Assim, a Lei 6.908/1997, do Estado do Mato Grosso, que autoriza o uso de película de filme solar nos vidros do veículo é inconstitucional, porque a questão diz respeito ao trânsito. (STF, Pleno, ADIn 1.704-1/MT, DJU 20.09.2002, Boletim de Jurisprudência ADCOAS 02, jan. 2003, p. 20.) A respeito da competência, é ainda aplicável a lição de Hely
Lopes Meirelles:
De um modo geral, pode-se dizer que cabe a União legislar sobre os assuntos nacionais de trânsito e transporte, ao Estado-membro compete regular e prover ao aspecto regional e a circulação intermunicipal em seu território, e ao Município cabe a ordenação do trânsito urbano, que é de seu interesse local (art. 30, inc. I e V da CRFB/88). Realmente, a circulação urbana e o tráfego local, abrangendo o transporte coletivo em todo o território municipal, são atividades da estrita competência do Município para atendimento das necessidades específicas de sua população.80 Ao Estado cabe implantar leis de interesse regional ou
intermunicipal, em vias sob sua circunscrição, igualmente, quem organiza as vias
municipais, estabelecendo sinalização, velocidade, estacionamento, dentre outros
é o próprio Município, porém a União cabe legislar sobre assuntos nacionais de
trânsito e transporte.
1.4 PRINCÍPIOS
Pela hierarquia das normas qualquer legislação brasileira
deve respeitar a nossa Constituição da República Federativa do Brasil e seus
princípios. Com o CTB não há nenhuma diferença, já que em todo o seu
regulamento devem-se observar os princípios que regem a administração pública.
80 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 339.
17
De acordo com Mello, violar um princípio constitui uma
infração funcional mais grave que inobservar a norma expressa, pois aquele é
precursor de todo o conjunto de normas que rege a função administrativa do
Estado. 81
O Regime administrativo do Sistema Nacional de Trânsito,
assim como a Administração Pública em geral, sujeita-se a dois princípios
fundamentais: Supremacia do Interesse Público e Indisponibilidade dos Interesses
Públicos pela Administração. No entanto o enfoque do presente trabalho é o
recurso por infração de trânsito, razão pela qual os princípios abordados serão o
do contraditório e da ampla defesa ou do devido processo legal, legalidade,
impessoalidade, moralidade, verdade material e o duplo grau de jurisdição. 82
O princípio do contraditório e ampla defesa, de acordo com a
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 trouxe de modo bastante
explícito no art. 5º, inc. LV da CRFB/88.83
O conceito do contraditório significa dizer que se deve
propiciar a oportunidade de manifestação, ante os fatos ou documentos que
integram o processo administrativo. Não basta preservar a acessibilidade aos
autos, necessário se faz que seja assegurado o direito de petição.84
A instrução do processo deve ser contraditória, isso significa
que não basta que a Administração Pública, por sua iniciativa e por seus meios,
colha os argumentos ou provas que lhe pareçam significativo para a defesa dos
interesses do particular. É essencial que ao interessado ou acusado seja dada a
possibilidade de examinar e contestar os argumentos, fundamentos e elementos
81 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 230. 82 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 52. 83 Art. 5º, inc. LV: Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 84 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 1.ed. 5 tir. Curitiba: Juruá, 2006. p. 49.
18
probantes que lhe sejam desfavoráveis.85
O primeiro requisito para que alguém possa exercitar o
direito de defesa de maneira eficiente é saber do que está sendo acusado. Por
isso é essencial que qualquer processo punitivo comece pela informação ao
acusado daquilo que, precisamente, pesa contra ele. Não basta, por exemplo,
publicar um edital dizendo que determinada pessoa cometeu um infração de
trânsito, sem especificá-la; é preciso efetivamente fazer chegar ao acusado a
informação precisa de qual especifica infração teria sido por ele cometida, com
todos os detalhes necessários ao exercício da defesa.86
Nos processos que envolvam sanções, o princípio do
contraditório e da ampla defesa exige que a defesa do acusado (vale dizer: a
oportunidade para exercitá-la) precede o ato administrativo que encerre a
decisão.87
O princípio do devido processo legal, conforme art. 5º, LIV,
da CRFB/88, em que ninguém será privado de liberdade ou de seus bens sem o
devido processo legal, ou seja, a administração pública não poderá proceder
contra alguém passando diretamente a decisão que repute cabível, pois terá,
desde logo, o dever jurídico de atender ao contido nos mencionados versículos
constitucionais.88
Revela a idéia de que todo interessado, acusado ou
demandado tem assegurado que suas pretensões, de defesa ou acusação, ou
qualquer outro interesse operacionalizado pela via procedimental, passarão por
formalidades preestabelecidas para discussão desses direitos e interesses. Ou
seja, a pretensão do Estado ou do particular, de defesa ou de acusação, ou
qualquer outra operacionalização de direitos, apenas estará adequada se passar
pelo devido rito legal, não bastando à mera regularidade material da pretensão.
85 FERRAZ, Sérgio. Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari. Processo Administrativo. 1º ed, 3ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 72. 86 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 70. 87 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 50. 88 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 111.
19
Não basta a conformidade do objeto da pretensão com norma superior, é preciso
respeito aos trâmites legais necessários à consecução desse objeto.89
O princípio da legalidade encontra-se expressamente
consagrado no art. 5º, inciso II da CRFB/8890. O principio da legalidade na
administração pública está em toda atividade funcional, sujeito aos mandamentos
da Lei, e as exigência do bem comum, e deles não pode afastar ou desviar, sob
pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e
criminal conforme o caso.91
O principio da legalidade significa que o administrador
público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e
as exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena
da praticar ato invalido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal,
conforme o caso.92
O principio da impessoalidade, refere-se aos fins
pretendidos pelo ato administrativo, aqueles, aos destinatários. O art. 3 do CTB93
reafirma o presente principio. É denominado de isonomia, ou seja, obrigação
imposta aos administradores públicos de conferirem tratamento igual a todos que
se encontrem nas mesmas condições, e tratamento diferenciado na medida em
que os cidadãos se desigualam.”94
Ressalta Capez, com fundamento no art. 37, §1º da
89 SANTOS, Rodrigo Valgas dos. Procedimento administrativo nos tribunais de contas e câmaras municipais. Belo Horizonte: Del Rey. 2006. p. 109. 90 Art. 5, inc. II: Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 91 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 13 92 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 86 93 Art. 3: As disposições deste Código são aplicáveis a qualquer veículo, bem como aos proprietários, condutores dos veículos nacionais ou estrangeiros e às pessoas nele expressamente mencionadas. (RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2007). 94 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 17.
20
CRFB/8895, e citando o professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que existe um
segundo aspecto relacionado ao princípio da impessoalidade. Em relação aos
administradores, significa que os atos e provimentos administrativos são
atribuídos não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade
administrativa em nome da qual age o funcionário. As realizações administrativo-
governamentais não são do funcionário ou da autoridade, mas da entidade
pública, sendo vedada qualquer forma de publicidade destinada à autopromoção
do administrador, sob pena de nulidade, obrigação de devolução do dinheiro aos
cofres públicos e práticas de ato de improbidade.96
O princípio da moralidade conforme a CRFB/88 elegeu como
um de seus princípios fundamentais a moralidade como um todo, conforme art.
37, caput97, está posta a moralidade como um princípio da Administração Pública.
O Principio da Moralidade que impõe a Administração Pública o dever de pautar
sua conduta em atos administrativos moralmente aceitos pelo corpo social, não
basta que o comportamento do administrador seja legal, adequado aos frios
termos da lei, é necessário que seja moral.98
O grande problema está na inexistência de padrões de moral
automaticamente aplicáveis aos casos concretos e na instabilidade, temporal,
social e geográfica, da noção do que é e do que não é moral, dada a íntima
relação com preceitos e credos de ordem religiosa, política etc. É perfeitamente
possível zelar pela moralidade administrativa, por meio da correta utilização dos
instrumentos para isso existentes na ordem jurídica, entre os quais merece
posição de destaque exatamente o processo administrativo, pela extrema
amplitude de investigação que nele se permite, chegando mesmo ao mérito do
95 Art. 37 § 1º. A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizam promoção pessoal de autoridade ou servidores públicos. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 96 CAPEZ, Fernando e Gonçalves, Victor Eduardo Rios. Aspectos Criminais do Código de Trânsito, São Paulo: Saraiva, 1999. p. 15. 97 Art. 37, caput: A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. (BRASIL. Constituição da Republicada Federativa do Brasil. 2006). 98 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 18.
21
ato ou da decisão, ao questionamento de sua oportunidade e conveniência.99
O princípio da verdade real, no processo administrativo, é
buscado na decisão final e autoriza que a autoridade julgadora valha-se de
elementos de prova que ela mesma obteve. Não ocorre o atrelamento ao que foi
alegado pela parte interessada.100
A autoridade administrativa competente para decidir não fica
na dependência da iniciativa da parte ou das partes interessadas, nem fica
obrigada a restringir seu exame ao que foi alegado, trazido ou provado pelas
partes, podendo e devendo buscar todos os elementos que possam influir no seu
convencimento.101
A Administração, no dever de alcançar a realidade dos fatos,
pode trazer para o bojo do processo informações, documentos etc. que julgar
relevantes para o deslinde da controvérsia instalada. É a verdade material contra
a verdade formal inerente ao processo judicial.102
O princípio do duplo grau de jurisdição é um princípio tão
elementar na teoria geral do processo que muito pouco existe na doutrina a seu
respeito. O art. 5º, LV, da CRFB/88103 garante aos litigantes em geral a ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Numa primeira leitura, parece
que a expressão “recursos” figura com uma redundância, no sentido de “recursos
de defesa, elementos de defesa, meios hábeis para a efetividade da defesa”,
podendo significar também recursos técnicos (advogando) e financeiros
(assistência judiciária).104
Portanto, embora não haja uma determinação constitucional
99 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 70. 100 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 52. 101 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 86. 102 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 52. 103 Art. 5º, inc. LV: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 104 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 88.
22
clara e expressa afirmando textual e literalmente o direito de revisão das decisões
processuais, esse direito está afirmado de maneira indireta com relação às ações
judiciais, pela simples previsão dos recursos ordinários e de oficio. No tocante ao
processo administrativo o duplo grau de jurisdição decorre de imposições de
ordem lógica e de justiça, além da analogia.105
Dessa forma, caso seja realizado um ato ilegal ou abusivo
pela Autoridade de Trânsito ou seus agentes, o cidadão que se sentir prejudicado
poderá fazer uso do sistema de recursos administrativos contidos nos artigos 281
a 290 do CTB, bem como, e sem interesses junto ao Poder Judiciário. Em relação
ao “Exercício do Direito de Defesa”, junto à esfera administrativo, e ao “Direito de
Ação” perante os órgãos do Poder Judiciário, discorre o capítulo 3 sobre recursos
administrativo.106
1.5 SISTEMA NACIONAL DE TRÂNSITO
Destacam-se as modificações ocorridas no CTB a partir da
Lei 9.503/97, que instituiu o atual Código de Trânsito Brasileiro o qual no seu art.
341 revogou a Lei nº. 5.108, de 21 de setembro de 1966, antigo CTB.
O SNT é o conjunto de órgãos e entidades com a
incumbência de viabilizar um trânsito seguro, fluente, confortável, cômodo, que
proteja e preserve o meio ambiente e os bens públicos e privados. O termo órgão,
derivado do latim organum (instrumento), originalmente exprime ou designa tudo
que possa servir de meio a realização ou a execução de alguma coisa. É o
instrumento a que se comete uma função determinada. No caso presente, cuida-
se de órgão administrativo de trânsito.107
Entidade, do latim entitas, é o vocábulo usado para indicar a
existência ou tudo que existe, real ou efetivamente, ou mesmo por idéia ou por
ficção legal. Especificamente, no que diz com o dispositivo sob foco, trata-se de
105 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 88. 106 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 24. 107 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 57.
23
entidade administrativa de trânsito.108
O SNT é um conjunto de órgãos e entidades da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que têm como finalidade o exercício
das atividades como planejamento; administração; normatização; pesquisa;
educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização,
julgamento de infrações e de recursos e aplicações de penalidades, conforme o
art. 5º da Lei 9.503 de 23 de setembro de 1997109. Todos os órgãos que
compõem o Sistema Nacional de Trânsito são uma parcela da Administração
Pública, ou seja, estão sujeitos às mesmas normas, responsabilidade e princípios
impostos ao administrador público em geral.
Obrigatória, ainda, a observância do Decreto nº 86.714/81,
que promulgou a Convenção sobre Trânsito Viário. Trata-se da Convenção
internacional de trânsito, celebrada em Viena, aprovada pelo Decreto Legislativo
n. 33, de 1980. Embora a Convenção tenha sido realizada antes da elaboração e
da publicação do Código Nacional de Trânsito (21 de setembro de 1966),
somente ingresso em nosso ordenamento jurídico em 1981. Dessa forma, muitas
regras, especialmente as voltadas à circulação internacional, não apresentavam
sintonia entre as normas internacionais aprovadas e as disposições do Código de
Trânsito então vigente.110
Houve, em relação à lei anterior, sensível mudança figurada
na municipalização da administração do trânsito, através de órgãos e entidades
executivos, que, a partir da vigência do Código, planejam, projetam,
regulamentam e operam o trânsito de veículos, de pedestres e de animais em
suas áreas territoriais, promovendo, por igual, o desenvolvimento da circulação e
108 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 58. 109 Art. 5. O Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infração e de recursos e aplicação de penalidades. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 110 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 26.
24
da segurança dos ciclistas, conforme art. 24, II do CTB111. O gerenciamento de
trânsito pelos municípios constitui-se em iniciativa lógica e coerente, eis o trânsito
uma questão local, ressaltando-se, todavia, como ressalvado quando do comento
ao art. 1º, competir privativamente a União legislar sobre o trânsito, conforme art.
22, XI da CRFB/88.112
Analisando, o capítulo sobre recursos, pode-se perceber
que, praticamente, cada um dos órgãos e das entidades componentes do SNT
são regidos por regimentos internos próprios, revelando estruturas diferenciadas e
procedimentos distintos para interposição, análise e julgamento dos diversos
“recursos”.113
No art. 6 do CTB, estabelece o plano geral de Política
Nacional de Trânsito, orientando a consecução da segurança, fluidez, conforto,
defesa ambiental e educação para o trânsito. Objetiva-se padronizar, através de
regras e procedimentos, as ações dos órgãos e entidades incumbida da
administração do trânsito enfatizada a imprescindível e permanente troca de
informações entre os precitados entes administrativos.114
Dentro do SNT destaca-se dois princípios fundamentais qual
sejam, o princípio da “Supremacia do Interesse Público que confere poderes ao
administrador público” e o princípio da Indisponibilidade dos Interesses Públicos
pela Administração que “impõe deveres funcionais e atribui sanções aos
negligentes”. É a partir desses dois princípios que surgem outros princípios que
regem a administração pública. 115
Conforme Hely Lopes Meirelles:
Os princípios básicos da administração pública estão 111 Art. 24, inc. II: Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos municípios, no âmbito de sua circunscrição; planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 112 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 58. 113 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 26. 114 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 59. 115 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 11
25
consubstanciados em doze regras de observância permanente e obrigatória para o bom administrador: legalidade, moralidade, impessoalidade ou finalidade, publicidade, eficiência, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, motivação e supremacia do interesse público. Os cinco primeiros estão expressamente previsto no art. 37, caput da CF de 1988; e os demais, embora não mencionados, decorrem do nosso regime político, tanto que, ao lado daqueles, foram textualmente enumerados [...], Administração Pública deve obedecer aos princípios acima referidos.116
Conforme o art. 7 do CTB compõe o SNT os seguintes
órgãos e entidades:
a) O Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, de âmbito da União, coordenador do Sistema e órgão máximo normativo e consultivo; b) Os Conselhos Estaduais de Trânsito – CETRAN e o Conselho de Trânsito do Distrito Federal – CONTRANDIFE, órgãos normativos consultivos e coordenados em cada unidade da federação; c) Os órgãos e entidades executivos de trânsito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; d) Os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; e) A Polícia Rodoviária Federal; f) As Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal; e g) As Juntas Administrativas de Recursos de Infrações – JARI:117 O principal objetivo do SNT é de estabelecer diretrizes da
política Nacional de Trânsito, com vistas à segurança, a fluidez, a defesa
ambiental e a educação para o trânsito e fiscalizar o seu cumprimento, conforme
art. 6º do CTB.
116 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 86 117 BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 24.
26
2 PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
O significado da expressão procedimento administrativo é de
suma relevância para o desenvolvimento deste trabalho. Prepara o apreciador
para uma noção coordenada de informações, concatenadas para adentrar no
recurso administrativo por infração de trânsito, abordado no capítulo três, a que
converge atenção maior desta monografia.
2.1 PROCESSO ADMINISTRATIVO
A palavra processo deriva do latim processu e significa ato
de proceder, de ir para adiante; seguimento, curso, marcha. Atividade por meio da
qual se exerce concretamente, em relação a determinado caso, a função
jurisdicional, e que é instrumento de composição das lides. Pleito judicial litígio.
Conjunto de peças que documentam o exercício da atividade jurisdicional em um
caso concreto, autos: a leitura do processo.118
Os juristas por muitas décadas discutiram sobre a correção
ou não da utilização da expressão processo administrativo, mas sempre houve
quem defendesse que a denominação correta fosse procedimento administrativo,
para designar a série encadeada de fases que culminasse na edição de um ato
administrativo. Para alguns há uma distinção clara entre uma e outra expressão.
O processo administrativo pode ser instaurado mediante
provocação do interessado ou por iniciativa da própria Administração, estabelece
uma relação bilateral, ou seja, de um lado o administrado que deduz uma
pretensão, e de outro, a Administração que quando decide, não age como
terceiro, estranho a controvérsia, mas como parte que atua no próprio interesse e
nos limites que lhe são impostos por lei. 119
2.1.1 O termo procedimento 118 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio. 2004. p. 655 119 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 2006. p. 599.
27
No aspecto substancial, procedimento distingue-se de
processo porque, basicamente, significa a sucessão encadeada de atos.
Processo, no entanto, implica, além do vínculo entre os atos, vínculos jurídicos
entre os sujeitos, englobando direitos, deveres, poderes, faculdades, na relação
processual. Processo implica, sobretudo, atuação dos sujeitos sob prisma
contraditório. Assim, o processo administrativo caracteriza-se pela atuação dos
interessados, em contraditório, seja ante a própria administração, seja ante outro
sujeito (administrativo em geral, licitante, contribuinte, por exemplo), todos, neste
caso, confrontando seus direitos ante a administração.120
Não sem uma ponderação inicial, que tomamos por
empréstimos de Rogério Soares: “É evidente que com uma denominação ou outra
o mundo continua a girar. Só que um nome ou outro pode exprimir mais ou menos
vivamente a realidade que lhe subjaz ou das intenções, pretensões ou ilusões de
quem procurou denominá-la”.121
E por isso, pode vir a causar erro e más interpretações, ou
mesmo determinar regimes inconvenientes. É inequívoco que, em nossos dias,
avulta na doutrina o rol dos autores que vêm prestando sua prestigiosa adesão a
expressão “processo administrativo” para indicar o conjunto maior a que antes
nos referimos. Tais doutos reservam a palavra “procedimento” para identificar o
complexo dos atos que compõem o processo, ou seja, o iter que vai da
instauração a decisão.122
Estudiosos do Direito Administrativo entendem que a opção
mais adequada seria procedimento administrativo. A título meramente ilustrativo
menciona Roberto Dromi, João Carlos Simões Gonçalves Loureiro, Paulo Ferreira
da Cunha, Celso Antonio Bandeira de Melo, Carlos Ari Sundfeld, Marçal Justen
Filho. Doutra banda, não menos relevantes são os defensores da opção processo
administrativo, a exemplo de José Cretella Júnior, Maria Sylvia Zanella Di Pietro,
120 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 8 ed. ver. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. p. 193. 121 SOARES, Rogério. Direito Administrativo. Porto, Universidade Católica, 1980. Apud FERRAZ, Sergio. Processo Administrativo. 2003. p. 32. 122 FERRAZ, Sérgio. Processo Administrativo. 2003. p. 32.
28
Egon Bockmann Moreira, Sérgio Ferraz, onde para estes, o procedimento seria
sinônimo de rito, do caminho a ser trilhado pelo processo. Ainda entre os que
adotam a nomenclatura processo, é crescente a adesão dos doutrinadores que
compreendem o processo administrativo enquanto expressão do procedimento
aliado a colaboração de sujeitos e sob crivo do contraditório. Tal parâmetro como
critério diferenciador entre processo e procedimento teve grande influência na
doutrina brasileira a partir do trabalho de Elito Fazzalari, que influenciou
processualistas como Cândido R. Dinamarco e Ada Pellegrini Grinover. 123
Não se confunde processo com procedimento. O primeiro
existe sempre como instrumento indispensável para o exercício de função
administrativa, tudo o que a Administração Pública faz, operações materiais ou
atos jurídicos, fica documentado em um processo, cada vez que ela for tomar
uma decisão, executar uma obra, celebrar um contrato, editar um regulamento, o
ato final é sempre precedido de uma série de atos materiais ou jurídicos,
consistentes em estudos, pareceres, informação, laudos, audiência, enfim, tudo o
que for necessário para instruir, preparar e fundamentar o ato final objetivado pela
Administração. O procedimento é o conjunto de formalidade que devem ser
observadas para a prática de certos atos administrativos, equivalente a rito, a
forma de proceder, o procedimento se desenvolve dentro de um processo
administrativo.124
Apesar da magnitude do entendimento daqueles que
advogam a locução processo e não procedimento, para definir a processualidade
no âmbito da função administrativa, dele não compartilha, por entender que
processo é locução mais apropriada ao legítimo exercício da função jurisdicional,
e não das funções legislativas e administrativas, embora se registre que quando a
função jurisdicional atuar administrativamente também exercendo sua função por
procedimento administrativo.125
123 SANTOS, Rodrigo Valgas dos. Procedimento administrativo nos tribunais de contas e câmaras municipais. 2006. p. 19. 124 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 2006. p. 600. 125 SANTOS, Rodrigo Valgas dos. Procedimento administrativo nos tribunais de contas e câmaras municipais. 2006. p. 20.
29
Particularmente, parafraseando Cretella Júnior126 que
enxerga proveito meramente didático, na separação entre um termo e outro.
Processo designa entidade que, em natureza, ontologicamente, nada difere da
que se designa por procedimento, podendo-se quando muito, quantitativamente,
empregar o primeiro termo para mostrar o conjunto de todos os atos e
procedimentos para designar cada um desses atos: processo é o todo;
procedimento, as diferentes operações que integram esse todo. De qualquer
forma, soa despropositado na atualidade, não admitir a existência de processo
administrativo.127
Em consonância com o que estabelece a CRFB/88, o
legislador de trânsito cunhou um processo administrativo para imposição de
sanções viárias. Equivale dizer, não se satisfaz com mero procedimento para que
tal atividade encontrasse corpo no mundo jurídico. Neste passo, cumpre breve
alinhamento de conceitos, nada obstante grasse verdadeira celeuma doutrinária
sobre os mesmos.128
O CTB, ao tratar dos procedimentos relativos à apuração e a
punição das infrações de trânsito, de modo expresso, qualificou-os como
integrantes de um processo administrativo. O capítulo XVIII do CTB refere em
letras maiúsculas a expressão DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. Isto significa
que os atos e termos do procedimento punitivo por infração a legislação de
trânsito formam uma espécie de processo do gênero processo administrativo.
Essa lição é deveras importante, à medida que, compondo o gênero processo
administrativo, o processo punitivo por infração de trânsito não pode se afastar do
complexo de normas jurídicas que informam o instituto.129
2.1.2 O ato administrativo
126 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de direito Administrativo. 7 ed. Forense.1983. Apud MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 44 127 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 44. 128 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1323. 129 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 67.
30
O ato administrativo constitui um dos modos de expressão
das decisões tomadas por órgãos e autoridades da Administração Pública, que
produz efeitos jurídicos, em especial no sentido de reconhecer, modificar,
extinguir direitos ou impor restrições e obrigações, com observância da
legalidade. Quanto à denominação, alguns autores empregam o termo elementos.
Outros adotam o vocábulo requisitos, por vezes repartindo-os em intrínsecos e
extrínsecos. Outros optam pelo termo pressupostos. Outros separam requisitos
de pressupostos.130
Para fins deste trabalho acadêmico, não se adentrará em
discussão a respeito dessa terminologia. Será utilizada a palavra elementos,
conforme definida no rol de categorias.
O ato administrativo é um ato jurídico, pois se trata de uma
declaração que produz efeitos jurídicos. É uma espécie de ato jurídico, marcado
por características que o individualizam no conjunto dos atos jurídicos. O que
particulariza o ato administrativo e justifica que se formule um conceito que o isole
entre os demais atos jurídicos, é a circunstância de que ele tem peculiaridades no
que concerne à condição de sua válida produção e no que atina à eficácia que lhe
é própria. Sendo ato jurídico, aloca-se dentro do gênero fato jurídico, portanto,
pode ser um evento material ou uma conduta humana, voluntária ou involuntária,
preordenada ou não a interferir na ordem jurídica.131
A compreensão do significado da expressão ato
administrativo é de grande importância, assim é de se ver que o ato administrativo
é o instrumento de exteriorização da palavra (manifestação da vontade) da
Administração. Maria Sylvia Zanella di Pietro132 fez interessante retrospectiva
histórica em torno do tema, esclarecendo que:
[...] o certo é que o primeiro texto legal que fala em atos da Administração Pública em geral foi a Lei de 16/24.08.1790, que vedava aos Tribunais conhecerem de “operações dos corpos
130 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 2004. p. 158. 131 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 353. 132 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 2006. p. 201.
31
administrativos”. Depois, a mesma proibição constou da Lei de 03.09.1975, onde se proibiu “aos tribunais conhecer dos atos da administração, qualquer que seja a sua espécie”. Essas normas é que deram origem, na França, ao contencioso administrativo; para separarem-se as competências, houve a necessidade de elaboração de listas dos atos da Administração excluídos da apreciação judicial. Em texto doutrinário, a primeira menção encontra-se no Repertório Merlin, de Jurisprudência, na sua edição de 1812, onde ato administrativo se define como “ordenamento ou decisão de autoridade administrativa, que tenha relação com a sua função”. Na realidade, a noção de ato administrativo só começou a ter sentido a partir do momento em que se tornou nítida a separação de funções, subordinando-se cada uma delas a regime jurídico próprio. Décio Carlos Ulla (1982: 24) demonstra que a noção de ato administrativo é contemporânea ao constitucionalismo, à aparição do princípio da separação de poderes a submissão da Administração Pública ao Direito (Estado de Direito); vale dizer que é tudo produto de certa concepção ideológica; só existe nos países em que se reconhece a existência de um regime jurídico administrativo, a que se sujeita a Administração Pública, diverso do regime de direito privado. 133
Ainda que a definição do ato administrativo não guarde
uniformidade de opiniões, contudo, os conceitos encontradiços nos manuais
denotam a existência de caracteres comuns em todas elas.134
Para Hely Lopes Meirelles:
ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos ou impor obrigações aos administrativos ou a si própria.135 O ato administrativo necessita, como os demais atos
jurídicos, da integração de certos elementos essenciais para sua validade. A
ausência ou o vício desses requisitos básicos tornará o ato administrativo
133 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 13. 134 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 14. 135 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 150.
32
inexistente, nulo ou anulável, segundo a intensidade da perturbação verificada em
sua formação.136
O ato administrativo tem dois critérios: subjetivo e objetivo; o
primeiro levando em consideração o órgão que pratica o ato e, o segundo, o tipo
de atividade exercida. Pelo critério subjetivo, orgânico ou formal, o ato
administrativo é o que ditam os órgãos administrativos, ficam excluído os atos
provenientes dos órgãos legislativo e judicial, ainda que tenham a mesma
natureza jurídica. Pelo critério objetivo, funcional ou material, ato administrativo é
somente aquele praticado no exercício concreto da função administrativa, seja ele
editado pelos órgãos administrativos ou pelos órgãos judiciais e legislativos.137
A validade do ato administrativo exige cinco requisitos
básicos: competência, finalidade, forma, motivo e objeto.
Competência é quando a autoridade que pratica o ato
administrativo precisa estar adornada de poderes, para tanto; a validade do ato
administrativo exige que o agente público detenha legitimidade para praticá-lo. A
verificação da competência do agente se efetua com base em três pontos: a)
matérias incluídas entre suas atribuições, levando-se em conta o grau hierárquico
e possível delegação (competência ratione materiae); b) âmbito territorial em que
as funções são desempenhadas (competência ratione loci), de muita relevância
num Estado federal; c) limite de tempo para o exercício das atribuições, com início
a partir da investidura legal e término na data da demissão, exoneração, término
do mandato, falecimento, aposentadoria, revogação da delegação etc.
(competência ratione temporis);138
A finalidade tem como objetivo o interesse público a atingir,
é elemento vinculado de todo ato administrativo, discricionário ou regrado, porque
o direito positivo não admite ato administrativo sem finalidade pública ou desviado
de sua finalidade especificas. Não se compreende ato administrativo sem fim
136 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 338. 137 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 2006. p. 203. 138 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 17.
33
público. A alteração da finalidade expressa na norma legal ou implícita no
ordenamento da Administração caracteriza o desvio de poder (détournement de
pouvoir – sviamento di potere), que rende ensejo a invalidação do ato, por lhe
faltar um elemento primacial em sua formação: o fim público desejado pelo
legislador;139
Forma é o revestimento exterior do ato; portanto, o modo
pelo qual este aparece e revela sua existência. A forma pode, eventualmente, não
ser obrigatória, isto é, ocorrerá, por vezes, ausência de prescrição legal sobre
uma forma determinada, exigida para a prática do ato. Contudo, não pode haver
ato sem forma, porquanto o Direito não se ocupa de pensamentos ou intenções
enquanto não traduzidas exteriormente. Ora, como a forma é o meio de
exteriorização do ato, sem forma não pode haver ato. Não se deve confundir
forma, na acepção enunciada, com formalização, que é um modo específico de
apresentação da forma, ou seja, uma dada solenização requerida para o ato. Esta
última é um pressuposto formalístico;140
Já motivo é o ato que surge por força da ocorrência de fatos,
circunstâncias ou acontecimentos precedentes que informam a sua emanação.
Motivo é exatamente o elemento motor (fato, circunstância ou acontecimento) que
impulsiona a exteriorização da vontade administrativa. A lei pode, ou não,
enunciar o motivo que levou o agente à prática do ato. Em se tratando de motivo
vinculado pela lei, o agente da Administração, ao praticar o ato, fica na obrigação
de justificar a existência do motivo, sem que o ato será invalidado ou, pelo menos,
invalidável, por ausência de motivação. Quando, o motivo não for exigido para a
perfeição do ato, fica o agente com a faculdade discricionária de praticá-lo sem
motivação;
Por último, o objeto ou conteúdo, é quando todo ato
administrativo tem por objeto a criação, modificação ou comprovação de
situações jurídicas concernentes a pessoas ou atividades sujeitas a ação do
Poder Público. Nesse sentido, o objeto identifica-se com conteúdo do ato, através
139 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 152. 140 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 375.
34
do qual a Administração manifesta seu poder e sua vontade, ou atesta
simplesmente situações preexistentes. O objeto, nos atos discricionários, fica na
dependência da escolha do Público, constituindo essa liberdade opcional o mérito
administrativo. Não se pode, pois, em tal elemento, substituir o critério da
Administração pelo pronunciamento do Judiciário, porque isto importaria revisão
do mérito administrativo, por uma simples mudança de juízo subjetivo do
administrador pelo juiz, sem qualquer fundamento em lei.141
Tendo em consideração que os atos relacionados a
imposição de penalidades na esfera administrativa de trânsito são considerados
atos administrativos, conclui-se que em relação a cada auto de infração,
conversão em multa, aplicação de penalidade, ou decisão emanada de órgão
integrante do Sistema Nacional de Trânsito, poderão ser questionados os
referidos requisitos de existência e de validade. Assim, sendo constatada uma
infração de trânsito e lavrado o auto de infração, deve-se questionar:
a) se auto de infração preenche os requisitos exigidos pela res. n. 01/98 do CONTRAN (forma do ato); b) se a formalização do auto encontra-se correta, ou seja, se todos os campos foram adequadamente preenchidos; se as datas encontram-se corretas e foi indicado o número de identificação do equipamento que aferiu a velocidade; se houve uma das formas de notificação válida (formalização do ato); c) considerando que competência é a prerrogativa jurídica para a prática de determinados atos, deve-se questionar se o agente de trânsito era competente para elaborar a autuação; se a autoridade que converteu o auto em multa era a Autoridade de Trânsito com circunscrição sobre a via terrestre; se a autoridade que aplicou a penalidade apresentava essa prerrogativa ou se deveria levar o fato a conhecimento de outrem; se o órgão municipal de trânsito encontra-se devidamente integrado ao Sistema Nacional de Trânsito (competência da pessoa física, do órgão e da pessoa jurídica); d) a existência de órgãos julgadores (JARI) junto ao órgão ou entidade executivo de trânsito, compostos por profissionais dotados de conhecimento adequado e regularmente instituídos, segundo disposto em seu Regimento Interno;
141 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2007. p. 155.
35
e) se o conteúdo do ato administrativo realmente descreve a inobservância de um ou mais preceitos do Código de Trânsito, da Legislação Complementar ou das resoluções do CONTRAN (conteúdo ou objeto do ato); f) se o ato foi realizado com finalidade preventiva, educativa, buscando a segurança do trânsito e dos usuários das via terrestres, ou se decorreu de vingança, rivalidade, favoritismo, sentimentos pessoais, interesses alheios aos objetivos da Lei de Trânsito (móvel do agente e finalidade do ato); g) a devida motivação dos atos e a fundamentação das decisões em relação à defesa prévia e aos recursos administrativos (motivação). 142
2.1.3 Importância do processo administrativo
O processo administrativo decorre do fato de ser um meio
apto a controlar o “iter” de formação das decisões estatais, que passou a ser um
recurso extremamente necessário a partir da multiplicação e do aprofundamento
das ingerências do Poder Público sobre a sociedade. Estas se alargaram, se
intensificaram como fruto das profundas transformações ocorridas na concepção
de Estado e, pois, das missões que lhe são próprias.143
Alberto Xavier144 propõe a existência de cinco fases: inicial
ou introdutiva, instrutória, decisória, complementar e de impugnação, e Hely
Lopes Meirelles vê também cinco fases, mas as denomina de: instauração,
instrução, defesa, relatório e julgamento.145
O desenvolvimento tecnológico engendrou um novo mundo,
um novo sistema de vida, tornando inevitável uma intensa organização,
regulamentação e fiscalização dos comportamentos individuais e coletivos para
evitar que se convertessem em fonte de sérios distúrbios e inconvenientes
suscetíveis de tornar intolerável o convívio social. O Estado tinha, pois, que
regular tudo e imiscuir-se em quase tudo, como resultado das novas condições de
142 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 338. 143 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 471. 144 XAVIER, Alberto. Do procedimento Administrativo. ed. Bushatsky, 1975. p. 151. Apud. MARTINS, Sidney. Multas de trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 54. 145 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 54.
36
vida.146
Para MARTINS, o processo administrativo compreende três
fases: a instauração, instrução e decisão. A fase de instauração congrega os atos
que se prestam ao início do procedimento. São os atos que identificam os motivos
que ensejaram a abertura do processo, o início do processo pode derivar de ato
de ofício da Administração (decreto, portaria, auto de infração, despacho) ou de
provocação de interessados outros (particulares ou servidores). Já na fase
instrutória encontram-se concentrados os atos relacionados com as provas
(documentos, depoimentos de testemunha, laudos periciais), essas provas que
podem ser produzidas são aquelas admissíveis em Direito, mas pode haver
limitações fixadas por legislação específicas. Por último a fase do processo é da
decisão que corresponde ao julgamento do objeto processual, a decisão deverá
vir sempre fundamentada já que, constituindo um ato administrativo, a motivação
se impõe. A decisão poderá ser proferida por uma determinada autoridade
(unipessoal) ou por um colegiado.
Distinguem-se as seguintes fases no procedimento
administrativo: a) fase de iniciativa ou propulsória; b) fase instrutória; c) fase
dispositiva; d) fase controladora ou integrativa; e e) fase de comunicação.147
A tipologia do processo administrativo também não encontra
uniformidade na doutrina. As classificações não são poucas, algumas tratadistas
adotam a postura de aglutinar as características que julgam comuns entre os
diversos processos administrativos, formando grupos mais ou menos gerais,
enquanto outros juristas preferem separações mais distintas. Segundo os critérios
de José Cretella Júnior, o processo administrativo pode ser classificado: quanto
ao raio de ação é externo ou interno, quanto ao objeto ele é disciplinar ou
criminal, quanto a jurisprudência é contencioso ou gracioso, quanto ao desfecho é
condenatório ou absolutório, quanto a forma é sumário ou integral.148
146 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 472. 147 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 477. 148 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 55.
37
Na visão de Figueiredo149, os procedimentos administrativos
(a autora prefere essa nomenclatura ao invés de processos administrativos)
podem ser nominados ou inominados, revisivos e disciplinares, ou sancionatórios.
O Gasparini150 afirma existirem cinco espécies de processo administrativo: os de
outorga, polícia, controle, punição e expediente. Concessa vênia, acompanhando
a dinâmica do Direito, especialmente o Administrativo, e a consagração ao longo
dos tempos de certas nomenclaturas, esboço uma classificação despretensiosa, o
processo administrativo pode ser: a) de simples expediente; b) licitatório; c)
sancionatório; d)disciplinar; e) fiscal; f) de controle.151
Considera-se perfeito o ato administrativo que resultou do
cumprimento de todas as fases relativas a sua formação, podendo, então,
ingressar no mundo jurídico. Vigência é usado para designar o período de sua
vida ou duração, desde o momento em que passa a existir no mundo jurídico até
o instante que desaparece, ao ser desfeito por outro ato ou por ter completado o
tempo de duração que recebeu ao ser editado. Entrada em vigor ou início da
vigência consiste no momento da inserção do ato administrativo no ordenamento
jurídico, a entrada em vigor constitui o ponto no tempo que separa o passado do
futuro dos efeitos do ato. Perda da vigência é o momento em que o ato sai do
mundo jurídico.152
O recurso, em matéria de trânsito, deve ser interposto em
tempo hábil, isto é, dentro do prazo estabelecido pelo CTB. Uma vez escoado o
prazo estipulado, torna-se precluso, para o autuado, o direito de recorrer.153
Validade por sua vez, diz respeito ao atendimento a todas as
exigências legais, para que seus efeitos do ato administrativo sejam reconhecidos
na ordem jurídica. O ato administrativo pode ter completado todas as fases de sua
formação, ter entrado em vigor e, no momento, conter ilegalidade que implicará
149 VALLE, Lúcia Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. Malheiros, 1994. Apud MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 55. 150 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 6 ed. 2001. p. 23. 151 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 55. 152 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 2004. p. 164. 153 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 9.
38
no não reconhecimento de efeitos que tenha produzido. Já eficácia quer dizer
realização do efeito a que o ato administrativo visa é a produção de efeitos
jurídicos, para que possa ser eficaz o ato administrativo deve ter vigência; antes
da entrada em vigor, não pode cogitar de eficácia.154
Distingui-se validade e eficácia de um ato. A validade diz
respeito à formulação do ato em si, ou seja, se o ato é saudável ou se eivado de
vícios. A eficácia refere-se à qualidade de produzir efeitos. Assim, um ato, mesmo
viciado ou inválido, permanece eficaz e produzindo efeitos até que seja declarado,
pela administração ou pelo judiciário, e tenha sua eficácia retirada.155
O não exercício dos jus puniendi estatal conduz a perda do
mesmo em face do lapso temporal transcorrido. A prescrição corresponde,
portanto, à perda do direito de punir pela inércia do Estado, que não o exercitou
dentro do lapso temporal previamente fixado. São duas as espécies de
prescrição: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão
executória. A primeira também denominada prescrição da ação penal, verifica-se
antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória; já a segunda
prescrição da condenação ocorre após o trânsito em julgado da decisão.156
A prescrição existe porque o particular não poderá
permanecer para sempre sujeito a sanção administrativa, nem o Estado poderá
ser prejudicado pela inércia daquele. Já no art. 281, inc. II, § único do CTB, diz
que “o auto de infração será arquivado e seu registro julgado insubsistente: se no
prazo de trinta dias, não for expedida a notificação da autuação.157
O recurso a ser interposto pelo autuado terá um prazo não
inferior a trina dias, sendo contado a partir da data da notificação da penalidade.
O prazo para interposição de recurso deverá constar da notificação, razão pela
154 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 2004. p. 165. 155 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 338. 156 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p.340. 157 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 17.
39
qual estatui o art. 286158, caput do CTB.159
Suscitadas as preliminares, passa-se então, a exposição dos
fatos e do direito, buscando comprovar: a) a inexistência do fato descrito no auto
de infração ou na multa, b) a incorreta tipificação do fato ao modelo descrito no
Capítulo das Infrações (art. 162/255 do CTB), c) buscando justificar a conduta
realizada.160
2.2 ATO PUNITIVO
A conduta exigida do cidadão vem traçada na norma jurídica
que a prescreve ou a define. A norma também delineia as conseqüências quando
houver o afastamento ou o descumprimento da conduta exigível. O ilícito espelha
uma violação de modelo comportamental definido pela norma jurídica, já a sanção
corresponde à conseqüência decorrente da violação da norma. O direito
administrativo utiliza o vocábulo infração como representativo do ilícito
administrativo.161
Recurso administrativo próprio ocorre quando for dirigido a
órgão ou autoridade de hierarquia a que emanou o ato impugnado e por ele ou
ela julgado. Temos como exemplo, a defesa prévia apresentada a autoridade de
trânsito, contra ato do agente da autoridade de trânsito, seria um caso de recurso
administrativo próprio. Já o recurso administrativo impróprio ocorre quando o
recurso for dirigido a órgão ou autoridade estranha a hierarquia da que expediu o
ato recorrido e, por esse órgão ou autoridade julgado.162
A decisão do recurso administrativo há de ser
fundamentada, com motivação própria do julgador ou aceitação expressa das
razões do recorrente, ou das informações do recorrido, ou de pareceres emitidos
158 Art. 286, caput: O recurso contra a imposição de multa poderá ser interposto no prazo legal, sem o recolhimento do seu valor. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 159 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 10. 160 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 342. 161 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 66. 162 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 14.
40
no processo. O que não se admite é o acolhimento ou a rejeição imotivada do
recurso, porque isto invalida a decisão omissa.
O julgamento do recurso administrativo torna vinculante para
a Administração seu pronunciamento decisório, e atribui definitivamente do ato
apreciado em última instância. Daí por diante, não poderá ser modificado pela
Administração e só o Judiciário poderá reapreciá-lo e dizer de sua legitimidade. É
evidente que a revisão da decisão em última instância do órgão administrativo,
somente poderá efetivar-se no Judiciário se houver a impetração de mandado de
segurança por parte do administrativo derrotado na esfera administrativa.163
2.2.1 Infração de trânsito
Constitui infração de trânsito a inobservância de qualquer
um dos preceitos da legislação de trânsito, compreendendo-se, neste contexto as
normas emanadas do CTB, do CONTRAN e a regulamentação estabelecida pelo
órgão ou entidade executiva do trânsito. O CTB foi editado através da Lei Federal
n. 9.503/97, sofrendo as alterações feitas pela Lei Federal n. 9.602/98.164
2.2.2 Auto de infração
O processo para apuração de ocorrência de infração de
trânsito inicia-se com a lavratura de auto de infração. Este, de seu termo,
consubstancia-se em um documento escrito, onde se descreve uma conduta
provavelmente ilícita, prevista legalmente no CTB (ANEXO 1).165
O auto de infração é um documento escrito, numerado em
série, revestido de formalidades, pelos menos com três vias, sendo uma delas
obrigatoriamente destinada a quem se impute a infração. O auto de infração está
previsto no art. 280 do CTB. 166
163 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 15. 164 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 67. 165 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1326. 166 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 19.
41
O agente ou a autoridade de trânsito lavrará o auto de
infração (art. 280 do CTB) somente quando tenha efetivamente presenciado.
Quanto ao que for relatado, em face da constatação pessoal inequívoca,
preenchidos os demais requisitos formais resulta a presunção relativa (júris
tantum) de veracidade dos fatos narrados (art. 362 do CPC), em face do principio
da presunção de legitimidade do ato administrativo.167
O CTB prescreve, no art. 280, que no auto de infração
deverá constar:
a) tipificação da infração; b) local, data e hora do cometimento da infração; c) caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários a sua identificação; d) o prontuário do condutor, sempre que possível; e) identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador ou equipamento que comprovar a infração; f) assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração.168
Também através da Res. n. 01/98 do CONTRAN estabelece
quais são as informações mínimas que deverão constar do auto de infração.
Segundo a resolução, compete aos órgãos e entidades executivas de trânsito e
executivos rodoviários de qualquer das unidades da Federação, dentro de suas
respectivas jurisdições, elaborar e implementar o modelo de auto de infração que
será por ela utilizado. Entrementes, essa mesma Resolução prescreve que na
confecção dos autos de infração deve-se adotar um padrão de blocos de
informações, como uma referência mínima.169
Nesta mesma res. n. 01/98 do CONTRAN também atribui ao
Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN, a tarefa de definir e divulgar 167 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z. Norberto de Almeida Carride – 2ª ed. ver. E atual. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2003. p. 59. 168 BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. 2006. p. 78. 169 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 92.
42
os critérios de codificação que deverão ser utilizados para preenchimento dos
blocos de informação constantes dos autos de infração, bem como autoriza-o a
celebrar convênios de cooperação técnica com terceiros, com vistas a
implementação de sistemática padronizada e informatizada para registro, controle
e baixa das multas originadas por infração de trânsito notificadas no território
nacional.170
De outro lado, cumpre não confundir agente da autoridade
de trânsito com a própria autoridade de trânsito. Esta possui múltiplas atribuições
dentro do sistema executivo de trânsito, entre elas a de julgar, conforme
preleciona o caput do art. 281 do CTB, a consistência e a regularidade do auto de
infração, ostentando a qualidade de dirigente máximo de órgão ou entidade
executivo integrante do Sistema Nacional de Trânsito ou pessoa por ele
credenciada. Aquele, de outro lado, toca no que nos interessa neste passo,
proceder à lavratura do auto de infração (isto é, simplesmente assinalar, via auto,
possível prática de conduta típica de trânsito.171
Em sede de autuação, é preciso anotar ainda que o § 3, do
art. 280 do CTB, declara que não sendo possível a autuação em flagrante, o
agente de trânsito relatará o fato a autoridade no próprio auto de infração,
informando os dados a respeito do veículo, além da tipificação, do local, data e
hora do cometimento e dos caracteres da placa de identificação do veículo, sua
marca e espécie, e outros elementos necessários a sua identificação para o
procedimento de julgamento do auto de infração.172
A autuação por infração de trânsito deve ser bem
fundamentada (detalhada, minuciosa, sob pena de ser considerada inconsistente
ou irregular), no campo destinação ao histórico, seja para registrar o local onde foi
constatada a infração (nome do logradouro, número ou anotações que indiquem
pontos de referência), com menção de dia, mês e ano, bem como o horário exato
(horas e minutos) do fato, seja descrevendo a conduta praticada pelo condutor
170 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 93. 171 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1326. 172 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 94.
43
que dá suporte ao enquadramento legal.173
Tal disposição se presta a demonstrar que o auto de
infração não perde a sua validade pelo simples fato de o infrator não ter sido
apanhado em estado de flagrância. Sobre os chamados requisitos do auto de
infração e sua eficácia alerte-se que irregularidades de pequena monta não
tornam inválido o auto.174
O art. 281 deixa claro que a infração de trânsito não é
imposta pelo agente de trânsito, como supõem muitos usuários da via pública.
Apenas lavra o auto de infração, peça acusatória. Quem aplica a penalidade
cabível é a autoridade de trânsito local, competente, se julgar o auto de infração
regular e consistente, os agentes públicos apenas autuam.175
2.2.3 Registro eletrônico
O CTB admite a utilização de aparelho eletrônico,
equipamento audiovisual ou qualquer outro meio tecnológico, para fim de
comprovar a ocorrência de infração de trânsito, mas é imprescindível que os
mesmos sejam aprovados pelo CONTRAN para que o uso seja considerado
regular. Com a evolução tecnológica, as lombadas físicas (aquelas indesejáveis
ondulações na pista de rolamento das vias) passaram a ser substituídas por
controladores eletrônicos de velocidade conhecidos como lombadas eletrônicas
(ANEXO 3).176
Para a validade dos registros oriundos desses equipamentos
é indispensável prévia aferição e não se admite o uso de equipamento não
homologado e aferido pelo INMETRO. Advirta-se ainda que deve ser realizada
aferição anual ou quando for notada alguma irregularidade de seu funcionamento.
173 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z. 2003. p. 61. 174 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 94. 175 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 448. 176 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 94.
44
Bem ilustra é a decisão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato
Grosso do Sul, cuja ementa é a seguinte:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO – MULTA DE TRÂNSITO – “LOMBADA ELETRÔNICA” – EQUIPAMENTO EM ATIVIDADE SEM INSPEÇÃO DO INMETRO – NULIDADE DAS MULTAS SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Havendo disposição legal que sujeita a regularidade das chamadas lombadas eletrônicas a prévia homologação do INMETRO, não tem validade as multas delas derivadas, sem o cumprimento deste requisitos”. (Terceira Turma Cível, AP. Cív. – Classe B – XV – n. 55.634-1 Campo Grande – Relator Des. João Carlos Brandes Garcia). A Res. n. 92/99 do CONTRAN defini e estabelece os
requisitos mínimos necessários para autorização e instalação de instrumentos
eletrônicos de medição de velocidade de operação autônoma. O instrumento de
medição “é aquele que registra e disponibiliza as informações de forma
adequada, dispensado a presença da autoridade ou do agente da autoridade de
trânsito no local da infração, viabilizando a comprovação da infração.177
2.2.4 Notificação
Notificação é uma palavra derivada do latim notificare (dar a
saber), em sentido amplo é empregada para designar o ato judicial escrito,
emanado do juiz, pelo qual se dá conhecimento a uma pessoa de alguma coisa,
ou de algum fato, que também é de seu interesse, a fim de que possa usar das
medidas legais ou das prerrogativas, que lhe sejam asseguradas por lei (ANEXO
2).178
Tendo na devida conta que a notificação cumpre a função de
noticiar ao proprietário a ocorrência de infração de trânsito praticada com o seu
veículo para que se possa exercitar o direito de defesa, urge que a mesma
177 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 95. 178 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.35.
45
estampe tudo quanto seja necessário para tanto. A notificação deverá mencionar
os dados resumidos do auto de infração, como o dispositivo transgredido, local,
data e horário da infração, além é claro, os dados identificadores do veículo e seu
proprietário.179
Quando não for possível identificar o condutor na ocasião da
prática da infração, faz-se a expedição de notificação ao proprietário do veículo
para que este apresente quem estava na direção do veículo.180
A notificação da autuação desempenha papel deveras
importante dentro da sistemática do processo administrativo de trânsito. Através
dela, notificação, rende-se homenagem aos princípios da ampla defesa e do
contraditório, inscritos na Constituição da Republica Federativa do Brasil.181
Referente ao trânsito, a notificação é o conhecimento que se
dá, por escrito, a um infrator das leis de trânsito, de que lhe foi aplicada uma
sanção administrativa pecuniária, a qual traz a indicação do valor e da data do
vencimento, bem como do prazo para a interposição de recurso, se o desejar, ou
uma sanção restritiva de direito, como a suspensão ou cassação do direito de
dirigir.182
Certamente, a notificação de autuação visa em primeiro
plano a propiciar aquele em cujo nome consta o veículo na repartição estadual de
Trânsito – tido preliminarmente como proprietário, a faculdade de denunciar quem
seria o responsável pela infração, ou seja, quem perpetrou a ação infracional.
Mas, em última análise, a notificação tem o fim precípuo de denunciar ao
proprietário do veículo a lavratura de auto de infração e com isso facultar a
oportunidade de oferecimento de defesa. O não envio da notificação ao
proprietário do veículo no entendimento constante do cadastro da repartição de
179 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 102. 180 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 95. 181 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1329. 182 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.35.
46
trânsito ocasiona a nulidade do processo punitivo.183
A guisa de ilustração confiram-se os seguintes julgados:
Mandado de segurança – Licenciamento de veículo – Multas de trânsito – Infrator que não foi devidamente notificado quando as autuações – Necessidade – Omissão da autoridade coatora que impossibilita o exercício do direito de defesa na esfera administrativa – Segurança concedida – Aplicação da súmula 127 do Superior Tribunal de Justiça – Remessa necessária improvida. Mandado de segurança – Multas de trânsito cujo pagamento é exigido como condição para transferência de veículo – Inexistência de prévia notificação do infrator, a fim de que possa oferecer defesa e recurso administrativo cabível – Confirmação da segurança concedida – Reexame necessário improvido – Súmula 127 do STJ.184 A autoridade de trânsito dispõe do prazo decadencial de
trinta dias, contados da data em que se deu a infração, para expedir a notificação
de autuação ao proprietário do veículo. É o que deflui do disposto no inc. I do
parágrafo único, do art. 281 do CTB. Não se deve confundir o ato de expedição
citado no dispositivo com o ato de recebimento. O que exige a legislação é que a
entidade de trânsito expeça a notificação no prazo assinalado e não que a
notificação chegue ao conhecimento do proprietário do veículo em trinta dias.185
Isto quer dizer que, da data da autuação pelo agente da
autoridade de trânsito até a expedição da notificação ao infrator, não pode
ultrapassar trinta dias, sob pena do auto de infração ser cancelado por vício
essencial, previsto no art. 145, III do CC, e por haver ocorrido a prescrição da
pretensão punitivo do Estado em relação a cobrança da multa.186
Arnaldo Rizzardo sustenta que: “... impõe a lei a remessa no
mencionado prazo, e não a efetivação do ato de notificação. Incumbe a
183 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 95. 184 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 95. 185 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 100. 186 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.37.
47
autoridade o cumprimento de sua obrigação. Se não se conseguir notificar o
infrator, não se imputará a falta a autoridade”.187
A notificação é de capital importância nos recursos de
trânsito porque o prazo prescricional começa a fluir da data da ocorrência da
infração e com a notificação o prazo prescricional é interrompido, desde que ela
tenha sido efetuada por qualquer meio devidamente comprovado, ou, quando
impossível fazê-lo, através de edital.188
A legislação de trânsito alude à remessa postal da
notificação (ou outro meio tecnológico hábil) conforme dispõe no caput do art. 282
do CTB. A notificação pela via postal é bastante usual no direito pátrio. No Direito
do Trabalho é inclusive a regra (CLT, art. 841, § 1º). O Código de Processo Civil,
por sua vez, a prevê no art. 221, I. que a notificação não precisa ser pessoal. A
entrega do expediente notificatório no endereço cadastral do destinatário (aquele
constante no registro do DETRAN) é assaz suficiente.189
Em termos genéricos, pode-se dizer que o CTB não
pretendeu impor forma extremamente solene para o ato notificatório, pois
entendeu suficiente comunicado extrajudicial sem maiores rigores. A ementa
jurisprudencial, reproduzida a frente, evidencia com satisfação que a notificação
por carta prescinde do recebimento pelo próprio destinatário. Satisfaz a exigência
legal a entrega da epístola no endereço de quem se pretende ver notificado, ad
litteram:
A jurisprudência corrobora no mesmo entendimento:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. MULTA. ASSINATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO PELO CONDUTOR. NOTIFICAÇÃO. PRAZO PARA A DEFESA. CONVALIDAÇÃO. DEFEITO INSANÁVEL PELO PAGAMENTO. 1. A assinatura do condutor no auto de infração vale como notificação da prática de infração no trânsito a ensejar o exercício da defesa prévia, desde que observado o prazo legal.
187 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 100. 188 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.37. 189 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 101.
48
Precedentes do STJ. 2. Segundo a Súmula 312 do Superior Tribunal de Justiça.190 A ciência ao infrator apenado far-se-á através de um dos
meios usuais de comunicação:
a) notificação pessoal; b) correspondência postal registrada com “aviso de recebimento”; c) utilização de meios eletrônicos (fax, telex etc...) desde que haja o recebimento da mensagem pelo operador receptor; d) edital publicado em órgão oficial com resumo do ato punitivo, após fracassadas as três formas anteriores de comunicação. Estabelece o art. 282 § 1º do CTB, que “a notificação
devolvida por desatualização do endereço do proprietário do veículo será
considerada válida para todos os efeitos”.191
O art. 123, § 2º do CTB, diz que:
No caso de transferência de domicilio ou residência no mesmo município, o proprietário comunicará o novo endereço num prazo de trinta dias e aguardará o novo licenciamento para alterar o Certificado de Licenciamento Anual.
O CTB é taxativo ao prescrever que será válida, para todos
os efeitos, a notificação que for devolvida porque o proprietário do veículo
respectivo deixou de atualizar seu endereço no cadastro mantido pela autoridade
estadual de trânsito, conforme art. 282, § 1º do CTB.192
Além do mais, é passível de autuação deixar de atualizar o
cadastro de registro do veículo ou de habilitação do condutor, nos termos do art.
241 do CTB193. Desta forma, decorridos trinta dias da data da devolução da
190 RIO GRANDE DO SUL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Cível n. 70023974181. Relatora Maria Isabel de Azevedo Souza. Julgado em 18/05/2008. Disponível http://www.tj.rs.gov.br. Acesso em 21 de maio de 2008. 191 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.40. 192 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 98. 193 Art. 241 do CTB: Deixa de atualizar o cadastro de registro do veículo ou de habilitação do condutor. (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro, 2006).
49
notificação, a multa transita em julgado e não caberá mais recurso
administrativo.194
2.3 Da penalidade
O infrator da legislação de trânsito pode sofrer as seguintes
penalidades:
a) advertência por escrito; b) multa; c) suspensão do direito de dirigir; d) apreensão do veículo; e) cassação da Carteira Nacional de Habilitação; f) cassação da Permissão para Dirigir; g) freqüência obrigatória em curso de reciclagem. A possibilidade de aplicação dessas penalidades, pela
própria Administração Pública, decorre dos atributos de imperatividade e de auto-
executoriedade, característicos dos atos administrativos. O poder de policia195
seria inane e ineficiente se não fosse coercitivo e não estivesse aparelho de
sanções para os casos de desobediência a ordem legal da autoridade
competente.196
A aplicação das penalidades previstas no art. 256 do CTB,
elencadas acima, não elimina as punições pela prática de crimes de trânsito, pois
o mesmo traz um capitulo197 dedicado exclusivamente aos ilícitos de natureza
penal.198
As medidas administrativas são providências que deverão
194 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.40. 195 Poder de polícia é a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público. A administração Pública, no exercício da parcela que lhe é outorgada do mesmo poder, regulamenta as leis e controla a sua aplicação, preventivamente (por meio de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou repressivamente (mediante imposição de medidas coercitivas). DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 2006. p.128. 196 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 185. 197 Cap. XIX. Dos crimes de trânsito. (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro, 2006). 198 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 68.
50
ser adotadas pela autoridade de trânsito ou seus agentes quando da prática de
infrações. As autoridades de trânsito e seus agentes devem adotar a ordem, o
consentimento, a fiscalização, as medidas administrativas e coercitivas a seu
cargo com o objetivo prioritário de proteger a vida e a incolumidade física da
pessoa. Não lhes compete buscar fim diverso ou de todo apartado do objetivo
inculcado pela legislação de trânsito. A autoridade de trânsito ou seus agentes, na
esfera das competências estabelecidas no CTB e dentro de sua circunscrição,
deverá adotar as seguintes medidas administrativas:
a) retenção do veículo; b) remoção do veículo; c) recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação; d) recolhimento da Permissão para Dirigir; e) recolhimento do Certificado de Registro; f) recolhimento do Certificado de Licenciamento Anual; g) transbordo do excesso de carga; h) realização de teste de dosagem de alcoolemia ou perícia de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica; i) recolhimento de animais que se encontrem soltos nas vias e na faixa de domínio das vias de circulação, restituindo-os aos seus proprietários, após o pagamento de multas e encargos devidos. 199
2.3.1 Atribuição dos pontos ao infrator
O acumulo de vinte pontos, inicialmente instituído para punir
a reincidência contumaz (leia-se, mesmo vetado, o teor do art. 259, § 1º) e para
fins de imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir. Subsistindo,
resta vinculado aos conteúdos dos arts. 258 e 259, atribuindo determinado
número de pontos a quem comete infrações punidas com multa, visando à
punição da reincidência, que restou suprimida do CTB, a imposição da penalidade
de suspensão do direito de dirigir, a qual, segundo o CONTRAN, permanece
direcionada.200
Os pontos atribuídos ao condutor, em razão do cometimento
199 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 79. 200 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1274.
51
de uma infração de trânsito, somente seriam considerados para efeitos da sua
contagem pelo período de doze meses. Assim, o cômputo da pontuação referente
as infrações de trânsito, para fins de aplicabilidade da penalidade de suspensão
do direito de dirigir, terá a validade do período de doze meses, conforme res. n.
182/05 do CONTRAN.201
O atual CTB submete os infratores a uma sanção mais
rigorosa do que o antigo CTB. Este código se preocupa mais com o
comportamento e a segurança de condutores e pedestres, como por exemplo, a
realização de curso de reciclagem de trânsito do que o antigo.
A quantidade de ponto atribuído ao motorista poderá ensejar
a imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir202, conforme art.
261, § 1º do CTB.203
Esse acumulo de vinte pontos por ter de ser atingido ou
consumado em doze meses, faz eficaz a pontuação por infração a contar da data
em que praticada, por um ano, excogitando-se de prazo decadencial (portanto
ininterrupto e não sujeito a suspensão), na medida em que se refere ao direito da
Administração, ou seja, do DETRAN, no seu respectivo Estado, e do DETRAN-
DF, no Distrito Federal, de computar pontos objetivando aquele cúmulo.204
A cada infração cometida, e devidamente imposta pelo
Poder Público aos usuários da via, será atribuído um determinado número de
pontos, que poderá gerar um aumento do valor das multas e suspensão da CNH.
O art. 259 prevê a quantidade de pontos atribuídos as infrações:
a) gravíssima sete pontos; b) grave cinco pontos; c) média quatro pontos; d) leve três pontos.
201 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 189. 202 Além dos casos previstos em outros artigos do CTB e executados aqueles especificados no art. 263, a suspensão do direito de dirigir será aplicada sempre que o infrator atingir a contagem de vinte pontos, prevista no art. 259 do CTB. (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 203 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 79. 204 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1275.
52
Assim, o cômputo da pontuação referente às infrações de
trânsito, para fins de aplicação da penalidade de suspensão da licença para
dirigir, passou a vigorar a partir do art. 3, I da res. 182/05 do CONTRAN. Não há
que se falar em inconstitucionalidade da referida norma, vez que compete a
União legislar sobre trânsito (art. 22, XI da CRFB/88), cabendo ao CONTRAN
estabelecer e normatizar os procedimentos para a imposição de penalidade (art.
12, IX da CTB).205
2.3.2 Advertência por escrito
Na defesa de autuação poderá ser imposta a penalidade de
advertência por escrito206 a infração de natureza leve ou média, passível de ser
punida com multa, não sendo reincidente o infrator, na mesma infração, nos
últimos doze meses, quando a autoridade, considerando o prontuário do infrator,
entender esta providência como mais educativa, conforme art.. 267 do CTB.207
Um dos pedidos que pode ser formulados em sede de
defesa de autuação ou de recurso administrativo é a imposição de advertência,
em substituição a pena pecuniária (multa).208
2.3.3 Apreensão do veículo
A sanção de apreensão de veículo é a ação ou ato de
apreendê-lo (retirá-lo da posse de quem o detém e conservá-lo sob poder), em
face de prática de infração viária, por certo e determinado lapso temporal. Cuida-
se de penalidade viária que embora aparente tratar-se de sanção de execução
instantânea, não a é. Efetivamente, a sanção de apreensão de veículo, ao
contrário do que pode dar a entender, não é de execução imediata, sequer a
205 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 189. 206 A penalidade de advertência por escrito não deve ser confundida com perdão ou graça, trata-se de sanção administrativa, legalmente prevista. É um ato de benevolência, mas um ato contrário ao bem público. (BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. 2006). 207 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1289. 208 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 186.
53
medida administrativa de remoção do veículo, que quase sempre é prevista na
infração que aquela cominam, será sempre adotada.209
O poder de polícia se manifesta em diferentes campos. A
polícia de trânsito, para garantia da segurança e ordem nas vias e rodovias,
afetável por motivo de circulação nelas. A utilização dos meios coativos, por parte
da Administração, é uma necessidade imposta em nome da defesa dos interesses
públicos e está no atingimento da finalidade legal em vista da qual foi instituída a
medida de polícia. É necessário que a Administração “se comporte com extrema
cautela, nunca se servindo de meios mais enérgicos que os necessários a
obtenção do resultado pretendido pela lei, sob pena de vício jurídico que
acarretará responsabilidade da administração”210
Na realidade, a apreensão de veículo, como as demais
penalidades inscritas no CTB, será precedida da possibilitação da mais ampla
defesa e do contraditório, só havendo de ser aplicada após julgamento do auto de
infração, e não no momento em que se constata a prática de infração. Se nesta
ocasião, for imperioso a retirada do veículo da posse de seu condutor, isto se
dará por meio da medida administrativa de remoção veicular, não por intermédio
da apreensão, que só será imposta depois, em momento processual adequado.211
209 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1277. 210 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z.. 2003. p. 41. 211 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1277.
54
3 RECURSOS ADMINISTRATIVOS DE TRÂNSITO
Recurso administrativo, em matéria de trânsito, é o pedido
de reexame feito pelo autuado em infração de trânsito, dirigido ao órgão
colegiado, visando obter principalmente o cancelamento da penalidade imposta.
O direito de recurso, em matéria de trânsito tem assentamento constitucional no
art. 5º, inc. XXXIV, letra a, que diz: são a todos assegurados, independentemente
do pagamento de taxas o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de
direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder.212
3.1 NOÇÕES PRELIMINARES
Constatada a ocorrência de infringência das normas de
trânsito, o agente da autoridade de trânsito deverá lavrar auto de infração, que é
elemento comprobatório do fato. A comprovação da infração não se dará somente
pela declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito levada a
efeito quando da lavratura do auto de infração, mas também poderá ocorrer em
face de constatação da violação das regras por aparelho eletrônico ou por
equipamento audiovisual, reações químicas, ou por qualquer outro meio
tecnologicamente disponível, desde que previamente regulamentado pelo
CONTRAN.213
O processo para apuração de ocorrência de infração de
trânsito inicia-se com a lavratura de auto de infração. Este, de seu turno,
consubstancia-se em um documento escrito, onde se descreve uma conduta
provavelmente ilícita, prevista legalmente no Código de Trânsito Brasileiro.214
A Lei 9.503/97 deixou patenteada que: “o agente da
autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser
servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda policial militar designado pela
212 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p.5. 213 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 90. 214 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1326.
55
autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua
competência”.215
A lavratura do AIT é de competência do agente da
autoridade de trânsito, que pode ser qualquer daqueles indicados pelo art. 280, §
4º do CTB. Aliás, coerentemente, tal noção e consentânea aquela ofertada pelo
CTB, que conceitua agente da autoridade de trânsito como pessoa, civil ou
policial militar, credenciada pela autoridade de trânsito para o exercício das
atividades de fiscalização, operação, policiamento ostensivo de trânsito ou
patrulhamento.216
No que tange a atuação dos policiais militares em municípios
que não aderiram à chamada municipalização do trânsito217, de acordo com o art.
23, III do CTB, compete as policias militares dos Estados e Distrito Federal:
executar a fiscalização de trânsito, quando e conforme convênio firmado, como
agente do órgão ou entidades executivos de trânsito ou executivos rodoviários,
concomitantemente com os demais agentes credenciados. Surgem
questionamento sobre a lavratura de autos por militares em infrações de
circulação, de parada e de estacionamento de veículos, nas vias urbanas de
municípios que não celebram convênios.218
Em face do dispositivo no art. 23, III do CTB, a falta de
convênio nulifica o auto de infração lavrado por policial militar nas circunstâncias
mencionadas no parágrafo acima, isto porque a fiscalização de trânsito pelos
mesmos só pode ser exercida mercê de delegação do poder municipal que é
quem detém a competência originária para autuar. Ninguém será obrigado a
municipalizar o trânsito, mas, assim sendo, deve-se firmar o competente
215 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 90. 216 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1326. 217 Houve, em relação à lei anterior, sensível mudança figurada na municipalização da administração do trânsito, através de órgãos e entidades executivos, que, a partir da vigência do Código, cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições. O gerenciamento de trânsito pelos Municípios constitui-se em iniciativa lógica e coerente, eis o trânsito uma questão local, ressaltando-se, toda via, como ressalvado quando do comento competir privativamente a União legislar sobre o trânsito, conforme art. 22, XI da CRFB/88. (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 2006). 218 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 90.
56
instrumento de delegação de poderes fiscalizatórios ou sancionatórios a Policia
Militar e aos DETRAN’s.219
A Res. n. 121/98 do CONTRAN institui a tabela de
distribuição de competência dos órgãos executivos de trânsito. Trata-se de tabela
de distribuição de competência, fiscalização de trânsito, aplicação das medidas
administrativas, penalidades cabíveis e arrecadação das multas aplicadas,
referente a infrações cometidas em áreas urbanas.220
Atenta contra os princípios a Administração Pública não
firmar convênio para a fiscalização do trânsito, deixando os municípios inermes a
sanha dos motoristas infratores. Pode-se sublinhar que a omissão do Chefe do
Poder Executivo pode até caracterizar a improbidade administrativa de que cuida
a Lei Federal 8.492/92, no art. 11.221
Lei Federal n. 8.492/92, art. 11 “Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade as instituições, e notadamente”.222
3.1.1 Pressupostos Recursais
Em matéria de trânsito, quatro são os pressupostos
recursais: a) motivação; b) singularidade; c) tempestividade; d) legitimidade: 223
Motivação é a exposição dos motivos, a fundamentação de
uma pretensão. Se o recurso de trânsito for interposto sem motivação, seu pedido
será inepto. É necessário que o recorrente, mencione as razões e o fundamento
do pedido de reexame da sua autuação. É mister que a sua indignação
embasada, consista na fundamentação de seu pedido. Quem recorrer deve
219 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 90. 220 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z. 2003. p. 109. 221 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 91. 222ANGHER, Anne Joyce. Vadem Mecum acadêmico de direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 223 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 08.
57
declinar os motivos, demonstrar o prejuízo sofrido em decorrência do ato jurídico
eivado de vício ou irregularidade, e nunca com o objetivo de evitar o pagamento
da multa por infração cometida no trânsito, como maneira de esquivar-se de uma
realidade responsabilidade administrativa.
Singularidade é a aplicação do princípio da
unirrecorribilidade, que consiste na proibição de interposição simultânea de mais
de um recurso, referente ao mesmo caso. O que pode ocorrer, e que haja um
recurso contra a decisão da JARI, dirigido ao CETRAN, mas isto não consiste em
interpor mais de um recurso, e sim, recorrer da decisão contrária de 1º instância,
ao órgão superior de 2º instância.
Já a tempestividade, o recurso em matéria de trânsito, deve
ser interposto em tempo hábil, isto é, dentro do prazo estabelecido pelo CTB.
Uma vez escoado o prazo estipulado, torna-se precluso, para o autuado, o direito
de recorrer. O recurso a ser interposto pelo autuado terá um prazo não inferior a
30 dias, sendo contado a partir da data da notificação da penalidade. O prazo
para interposição de recurso deverá constar da notificação, razão pela qual
estatui o art. 286, caput do CTB. O recurso contra a imposição de multa poderá
ser interposto no prazo legal, sem o recolhimento do seu valo.
Por último a legitimidade como pressuposto subjetivo. O
recurso deverá ser interposto por quem esteja legitimado para tal. A legitimidade
tem ligação com o interesse de recorrer, por parte do proprietário do veículo, do
condutor infrator, ou da autoridade que impôs a penalidade. Em outras palavras,
possui legitimidade para interpor recurso de trânsito, aquelas pessoas que
estiverem ligadas ao auto de infração, consoante o rol estabelecido no art. 257 do
CTB: proprietário, condutor, embarcador, transportador. A autoridade que impôs a
penalidade poderá recorrer da decisão de provimento da JARI, em 2º instância
recursal.
Os três primeiros são pressupostos objetivos, o último,
subjetivo.
A priori cabe recurso em quaisquer infrações de trânsito,
58
desde que o auto de infração esteja eivado de alguma irregularidade. Desta
forma, não vigora, para os recursos de trânsito, o pressuposto da existência e
adequação do recurso, comum no processo civil. O pressuposto do preparo do
recurso, que também existe no processo civil, e que consiste no pagamento das
despesas processuais correspondente ao processamento do recurso interposto,
não vigora nos recursos de trânsito, uma vez que não se exige o pagamento
prévio de nenhuma taxa para a sua interposição, nos termos do art. 5º, XXXIV, a,
CRFB/88, e art. 286, caput do CTB.224
Outro pressuposto existente no processo civil, que é a
regularidade procedimental, não tem aplicação nos recursos de trânsito, uma vez
que inexiste forma prescrita para a sua interposição.
3.1.2 Efeitos Recursais
Em direito processual civil e em direito administrativo, dois
são os efeitos dos recursos: o devolutivo e o suspensivo. Regra geral, os recursos
de trânsito possuem o efeito devolutivo. O efeito suspensivo é exceção à regra.225
Efeito devolutivo consiste em devolver ao órgão a que se
recorre o conhecimento da matéria em debate.
O efeito suspensivo consiste em suspender a execução do
ato ou atividade recorrida, enquanto não decidido o recurso. É possível que o
legislador tenha se equivocado ao afirmar que o efeito suspensivo pode ser
concedido pela autoridade que impôs a penalidade, uma vez que o recurso de
trânsito, neste caso, estaria sendo apreciado pelo órgão colegiado – JARI – logo,
seria a própria JARI quem deveria conceder o efeito suspensivo ao recurso, o
qual não foi julgado no prazo de trintas dias.226
No caso de ser concedido o efeito suspensivo, o recorrente
poderá licenciar seu veículo sem o efetivo pagamento da multa, uma vez que 224 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 07. 225 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 11. 226 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 12.
59
ficará suspensa a eficácia de sua exigência, até que seja proferida a decisão
acerca de seu recurso. Com a concessão do efeito suspensivo, fica proibido a
impetração de mandado de segurança, consoante estabelece o art. 5º, I da Lei n.
1.533/51.
3.1.3 Apresentação do condutor
O exercício do direito de defesa junto à Administração
Pública de trânsito poderá ser realizada pelo próprio interessado, pessoalmente,
ou por meio de terceira pessoa.227
O proprietário do veículo objeto da autuação disporá do
prazo de quinze dias, (antes, dispunha do prazo de trinta dias, consoante a res.
568/1980 do CONTRAN, revogada pela res. 149/2003, o prazo transmudou-se
para os ditos quinze dias) contados do recebimento da notificação da autuação,
para apresentar quem estava na condução de seu veículo no momento da
infração, sob pena de ser considerado responsável pela infração.228
Juntamente com a notificação da infração cometida, o órgão
de trânsito encaminhará ao proprietário do veículo, as informações como o nome
do condutor, o número da sua habilitação e o seu endereço atualizado. O
formulário de apresentação deve ser datado e assinado pelo proprietário e vir
acompanhada da fotocópia da habilitação do infrator apresentado.
Pela res. n. 149/03, o CONTRAN passou a exigir que a
apresentação do condutor venha também assinada pelo mesmo. A necessidade
de assinatura do condutor apresentado no respectivo formulário (quiçá movido
pela possibilidade de fraudes na apresentação) é de se ter por inválida a
indicação de condutor infrator que não atenda a este requisito. A invalidade
equivale a não apresentação.229
Segundo MARTINS, se no prazo deferido ao proprietário 227 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 323. 228 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito. 2006. p. 97. 229 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 97.
60
para apresentar o condutor do seu veículo à ocasião da infração isso não ocorrer,
temos que:
a) no caso de pessoa física, o proprietário será considerado o responsável pela infração, o que implicará a atribuição a ele dos respectivos pontos; b) no caso de pessoa jurídica, não havendo identificação do infrator, será lavrada nova multa ao proprietário do veículo, mantida a originada pela infração, cujo valor é o da multa multiplicada pelo número de infrações iguais cometidas no período de doze meses.
Referida notificação efetiva-se mediante remessa postal ou
qualquer outro meio tecnológico hábil a ciência do acusado, consoante determina
o caput do ar. 282 do CTB. Nesta mesma, o § 1º do precitado artigo determina
que acaso tal notificação não encontre o seu destinatário por desatualização de
seu endereço no órgão cadastral (DETRAN ou DETRAN DF), os efeitos a que ela
se destina a perpetrar operam-se da mesma sorte.230
João Baptista da Silva leciona que:
Nesse caso, a notificação será feita ao proprietário, que terá 15 (quinze) dias de prazo para identificar e apresentar o infrator, passando a ser sua responsabilidade se não o fizer no prazo a ele dado. É o que dispõe o art. 257, § 7º do CTB). Se não tiver endereço atualizado em seu prontuário, e por isso houver devolução da notificação, dar-se-á a chamada notificação ficta: a lei considera feita a notificação para todos os fins (§ 1º). 231
A identificação do transgressor, de outra parte, além de
pautar a concretização do ato punitivo justo, tendo como corolários a prevenção e
a repressão ao ilícito administrativo de trânsito, previne a correta atribuição de
pontos ao condutor, pontuação relevante, na medida em que caminha a punição
mais severa do que aquela representada pela multa, ou seja, a suspensão do
230 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1338. 231 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 99.
61
direito de dirigir, prevista no art. 261, § 1º do CTB.232
Na situação particular de pessoas vinculadas a missões
diplomáticas, a repartição consular de carreira e de representante de organismos
internacional e de seus integrantes, a notificação será remetida ao Ministério das
Relações Exteriores para as providências cabíveis e cobrança dos valores, no
caso de multa (art. 282, § 2º do CTB).233
A jurisprudência corrobora no mesmo entendimento:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. TRÂNSITO. NÃO APRESENTAÇÃO DO CONDUTOR. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO DE SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. - A infração por excesso de peso não pode ser automaticamente imputada ao proprietário, pois de responsabilidade do embarcador e/ou transportador, nos termos do art. 257, §§ 4º, 5º e 6º, do CTB, que não foram identificados. Auto de infração em que expressamente identificado o condutor/infrator. 234
3.2 FASES DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DE TRÂNSITO
Em consonância com o que estabelece a CRFB/88, como
não poderia deixar de ser, sob a inefável conseqüência de inconstitucionalidade
(art. 5º, incisos LIV e LV), o legislador de trânsito cunhou um processo
administrativo para imposição de sanções viárias. 235
O recurso que nasce do inconformismo de uma decisão é
inerente ao espírito humano. O ato de recorrer, em qualquer circunstância,
satisfaz a uma tendência irresistível da natureza humana, é a expressão legal do
instituto que leva todo homem a não se sujeitar, sem reação, ao conceito ou
232 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1269. 233 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 99. 234 RIO GRANDE DO SUL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Cível n.70020104097. Relator Pedro Luiz Pozza. Julgado em 01/11/2007. Disponível http://www.tj.rs.gov.br. Acessa em 21 de maio de 2008. 235 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1323.
62
sentença do primeiro censor do juiz.236
O recebimento do AIT, ou providenciar cópia do mesmo,
trata-se de conduta ou providência a ser tomada por parte do próprio condutor ou
proprietário do veículo, que antecedem a interposição da defesa prévia e do
recurso administrativo, geralmente no período entre a notificação e o protocolo do
requerimento. A primeira conduta positiva a ser adotada pelo condutor do veículo
é assinar no corpo do auto de infração, recebendo, em seguida, a segunda via do
auto. Caracteriza a notificação, nos termos do art. 280, VI, do CTB, o condutor ou
o responsável pela infração contará com algumas vantagens: a) terá em mãos o
primeiro documento necessário a instrução de sua defesa; b) terá a certeza de
somente aqueles fatos serão levados ao conhecimento da autoridade de trânsito;
c) poderá elaborar o requerimento de defesa ou de recurso com base nas
informações constantes da notificação.237
3.2.1 Recurso de defesa de autuação
Deve-se entendê-la como significado ao direito daquele que
foi autuado por infração de trânsito de apresentar defesa antes de se ver
penalizado (ANEXO 5).238
Como se percebe, o CTB, no capítulo destinado ao processo
administrado, não previu com a necessária clareza a possibilidade de interposição
de “defesa prévia”. Inobstante a redação conferida ao artigo 281 do CTB,
evidencia-se a possibilidade de o interessado insurgir-se em relação aos termos
da autuação, face o dever imposto à Autoridade de Trânsito, que deverá julgar “a
consistência do auto de infração” antes de aplicar a penalidade.239
O CONTRAN expediu em 19/09/2003 a res. n. 149/03,
publicada em 13/10/03, admitindo à defesa anterior a imposição de penalidade
236 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 4. 237 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 334. 238 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 103. 239 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 311.
63
viária, ditando o prazo não inferior de quinze dias para o seu exercício perante a
autoridade de trânsito competente para a aplicação da sanção, conforme art. 3º, §
2º da res. 149/03. Pois antes o prazo para protocolo da defesa prévia era de 30
dias, nos termos do art. 2º, da Res. 568/80 do CONTRAN240. O termo a quo, ou
seja, o início da contagem do prazo é o primeiro dia útil seguinte a data de efetiva
notificação da autuação, ou da data prevista na notificação de autuação.241
Tendo em vista o disposto no parágrafo único do art. 314 do
CTB que diz que: “as resoluções do CONTRAN, existentes até a data da
publicação do CTB, continuam em vigor naquilo em que não conflitem com ele”,
há os que defendem o direito a defesa prévia com base na Res. 569/90 do
CONTRAN por entenderem que a mesma não restou revogada e, portanto, está
em pleno vigor.242
Autuação de trânsito é o ato administrativo realizado pelo
agente de trânsito, comunicado a autoridade a constatação de uma ou mais
infrações a legislação de trânsito, através do preenchimento do AIT (ANEXO 1).243
Em um primeiro momento, a partir da elaboração do auto de
infração, surge a autuação. Embora não exista, ainda, o ato denominado multa,
com a efetiva impossibilidade da penalidade, concede-se ao cidadão autuado a
possibilidade de insurgir-se contra os termos da autuação a possibilidade de
insurgir-se contra os termos da autuação, surgindo à primeira forma de exercício
do direito de defesa: a Defesa Prévia.244
240 Essa defesa prévia remonta, modernamente, ao ano de 1980, inserida que na Res. n. 568/80 do CONTRAN, que, em seu art. 2º, redação original, assim dispunha: “Com o recebimento do auto de infração, o interessado poderá, no prazo de cinco (5) dias, apresentar defesa prévia a autoridade de trânsito, antes da aplicação da penalidade” (depois, por meio da Res. n. 744/89, também do CONTRAN, tal dispositivo fora alterado, passando o prazo defensivo a ser de 30 dias). Importante destacar que a partir da notificação da autuação, o acusado dispõe de 15 dias para oferecer defesa, conforme estabelece a Res. n. 149/2003 do CONTRAN (não mais de 30 dias, consoante dispunham as Res. n. 568/1980 e 829/1997 ambas do CONTRAN, atualmente revogadas pela predita Res. n. 149/2003. 241 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1333. 242 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 105. 243 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z. 2003. p. 61. 244 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. Campinas. 2000. p. 311.
64
Na verdade, dito escrito ainda não passa de um mero
registro da infração (auto de infração). A multa, como penalidade, poderá advir
depois com o julgamento do auto.245
Logo após lavrado o auto de infração pelo agente da
autoridade de trânsito e notificado o possível infrator desta autuação para
contrastar, via defesa, o conteúdo e a forma do auto infracional, obviamente
transcorrido o prazo de defesa, deve a autoridade de trânsito julgar a consistência
(materialidade) e a regularidade (formalidade) da peça inicial do processo
administrativo. Se consistente e regular o auto de infração, impõe o dever de
aplicar a penalidade. Ao revés, se convencer da inconsistência ou irregularidade
do auto de infração como casos de divergência de marca, modelo, espécie e cor;
erros de autuação ou de digitação; incorreção na identificação do local,
cruzamento, via ou interseção inexistente, deverá a autoridade de trânsito
arquivar o mesmo, como dita o art. 281, § único, I do CTB, e conseqüentemente
cancelar a pontuação, bem como a pena pecuniária e informar o fato ao
proprietário do veículo, conforme res. 149/2003 do CONTRAN 246
Informação interessante encontra-se prevista no art. 286 do
CTB: “O recurso contra a imposição da multa poderá ser interposto no prazo
legal, sem o recolhimento do seu valor”. A mesma regra é aplicável a defesa
prévia, aliás com maior propriedade, pois nesta fase do procedimento ainda não
houve imposição de penalidade, havendo, tão somente, um ato administrativo
destinado a levar ao conhecimento da autoridade competente a constatação de
uma infração de trânsito. Nada impede, porém que seja recolhido o valor da
multa. Neste caso, o responsável pelo pagamento gozará de um benefício legal,
qual seja: recolher esse valor com desconto de 20%, se o fizer até a data do
vencimento (art. 284 do CTB).247
A CRFB/88, fala em devido processo legal (inc. LIV, art. 5º)
com o assegurar do contraditório e ampla defesa (inc. LV, art. 5º) em processos
245 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 103. 246 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1335. 247 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. Campinas. 2000. p. 316.
65
de qualquer natureza (judicial ou administrativo). A referência constitucional ao
vocábulo ampla antes da defesa só pode ser considerada como proposital. Para
que se dê essa amplitude do direito de defesa no processo administrativo, mister
se faz o asseguramento de que o exercício do mesmo ocorra de forma prévia.248
Não há previsão para a solução ou apreciação e julgamento
da defesa prévia. Tampouco há previsão de que o recebimento da defesa prévia
confere efeito suspensivo ao procedimento. Inobstante a omissão da Lei e das
resoluções do CONTRAN, o certo é que a omissão do Estado, deixando de
apreciar o “recurso” em período breve, não poderá gerar prejuízos ao
administrado. Dessa forma, recebida a defesa prévia, tem-se por suspenso o
procedimento de imposição de penalidade até a decisão da Autoridade de
Trânsito. Negando provimento a defesa prévia, a autoridade de trânsito
converterá o auto em multa e, sendo competente, determinará a imposição das
demais penalidades cabíveis. Da decisão, deverá o interessado ser regularmente
notificado.249
A decisão da autoridade de trânsito deverá ser devidamente
fundamentada, em atenção ao princípio da motivação250, possibilitando ao
recorrente conhecer os fundamentos da decisão e apreciar se o pedido foi
analisado com justiça e mediante respaldo na legislação de trânsito vigente.
Deverá ainda, analisar todos os fundamentos expostos e pedidos formulados pelo
recorrente, sob pena de nulidade da decisão.251
Da decisão emanada da autoridade de trânsito, em relação
ao pedido formulado em defesa prévia, tecnicamente, não cabe recurso. Pode-se 248 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 103. 249 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 317. 250 “Parece que a exigência de motivação dos atos administrativos, contemporânea à prática do ato, ou pelo menos anterior a ela, há que ser tida como uma regra geral, pois os agentes administrativos não são “dono” da coisa pública, mas simples gestores de interesses de toda a coletividade, esta, sim, senhora de tais interesses, visto que, nos termos da CRFB/88, “todo o poder emana do povo...” (art. 1º, § único). Logo parece óbvio que, praticado o ato em um Estado Democrático de Direito” (art. 1º, caput), proclamando, ainda, ter como um de seus fundamentos a “cidadania” (inciso II), os cidadãos e em particular o interessado no ato tem o direito de saber por que foi praticado, isto é, que fundamentos o justificam”. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Constitucional, 1993, p. 183. 251 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 317.
66
até afirmar que se trata de decisão irrecorrível. Ocorre, no entanto, que, sendo
denegada a defesa prévia, um novo ato administrativo252 será produzido: a
conversão do auto em multa e a imposição da penalidade. Desse novo ato
administrativo, de competência exclusiva da autoridade de trânsito com
circunscrição sobre a via terrestre onde ocorreu a infração de trânsito, caberá
uma segunda forma de exercício do direito de defesa, denominada recurso
administrativo endereçado a autoridade de trânsito.253
Conforme HONORATO recebida a autuação pela autoridade
de trânsito, e não havendo defesa prévia no prazo legal ou sendo esta indeferida,
o ato administrativo denominado autuação será convertido em multa, pela
autoridade de trânsito, impondo-se a penalidade administrativa ao condutor ou ao
proprietário do veículo.
A jurisprudência corrobora no mesmo entendimento:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DA AUTUAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA PRÉVIA. ANULAÇÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 281, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE PUNIR. RECURSO ADESIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. Não havendo notificação do infrator para defesa dentro do lapso de trinta dias previsto no art. 281, parágrafo único, II, do CNT.254
3.2.2 Recurso a JARI
As JARI’s são órgãos colegiados componentes do Sistema
Nacional de Trânsito – SINATRAN, responsáveis pelo julgamento dos recursos
interpostos contra penalidades aplicadas pelos próprios órgãos ou entidades
252 Há quem entenda que não se trata, na realidade, de um “novo” ato administrativo, integrante de um procedimento, e sim de uma nova manifestação que complementa o ato complexo de imposição de penalidade. 253 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 318. 254 RIO GRANDE DO SUL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Cível n.70023615263. Relator Marco Aurélio Heinz. Julgado em 07/05/2008. Disponível http://www.tj.rs.gov.br. Acessa em 21 de maio de 2008.
67
executivos de trânsito ou executivos rodoviários (ANEXO 4).255
O CTB dispõe expressamente em seu art. 16 que cada
órgão ou entidade executivo de trânsito ou rodoviário devem criar e instalar o que
a legislação cognominou de Junta Administrativa de Recursos e Infrações e deve
funcionar junto ao respectivo ente de trânsito instituidor que deverá emprestar-lhe
apoio administrativo e financeiro. A junta, como o próprio nome sugere, se
constituirá num colegiado que ficará responsável pelo julgamento dos recursos
interpostos contra as penalidades impostas pelas autoridades de trânsito a que se
vincular (aquela que a criou). O funcionamento da JARI e outros detalhes
correlatos deverão estar mencionados em regimento próprio, cujas diretrizes são
fixadas pelo CONTRAN (art. 12, inc. VI do CTB).256
O CTB em seu art. 17 define que compete à JARI:
a) julgar os recursos interpostos pelos infratores; b) solicitar aos órgãos e entidades executivos de trânsito e executivos rodoviários informações complementares relativas aos recursos, objetivando uma melhor análise da situação recorrida; c) encaminhar aos órgãos e entidades executivos de trânsito e executivos rodoviários informações sobre problemas observados nas autuações e apontados em recursos, e que se repitam sistematicamente. c) encaminhar aos órgãos e entidades executivos de trânsito e executivo rodoviários informações sobre problemas observados nas autuações e apontadas em recursos, e que se repitam sistematicamente .257 Das decisões das JARI é cabível recurso para órgãos
considerados normativos do Sistema Nacional de Trânsito, nos termos do art. 289
do CTB. Esse recurso é processado nos próprios autos do “recurso
administrativos”, mediante requerimento.258
Devem, por igual, segundo atribuição normativa outorgada 255 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 55. 256 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 138. 257 BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro. 2006. 258 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 320.
68
pelo CONTRAN através das diretrizes para a elaboração do regimento interno das
JARI’s (estabelecidas no anexo da res. n. 147/03, que revogou as res. n. 64/98,
96/99 e 139/02 todas do CONTRAN), formular seus regimentos internos. Salienta-
se que tratando de JARI’s de órgãos ou entidades municipais, deveram
credenciar-se junto aos CETRAN’s (anota-se que, no Distrito Federal, inexistem
municípios e, sim, a cidade de Brasília e cidades-satélites), se forem dos Estados
ou do Distrito Federal, aos CETRAN’s respectivos ou ao CONTRANDIFE, e se
JARI’s atuantes rentes aos órgãos ou entidades executivos rodoviários da União e
a Polícia Rodoviária Federal, junto ao DENATRAN.259
O texto original do art. 283 do CTB aprovado no congresso
Nacional previa que o prazo recursal iniciava a partir da data de imposição da
penalidade. O artigo foi vetado por que: a disposição estabelece que o prazo de
apresentação do recurso tem como marco inicial a data da imposição da multa,
quando é princípio assentando no Direito que o prazo para a defesa deve iniciar
na notificação efetiva. Para suprir a lacuna deixada, veio a Lei n. 9.602/1998 que
inseriu no art. 282 do CTB o § 4º que obrigou as entidades de trânsito a fazer
constar na notificação a data até a qual admite-se protocolar do recurso a JARI.260
Ocorre, no entanto, que, sendo denegada a defesa prévia,
um ato administrativo261 será produzindo: a conversão do auto em multa e a
imposição da penalidade. Desse novo ato administrativo, de competência
exclusiva da autoridade de trânsito com circunscrição sobre via terrestre onde
ocorreu a infração de trânsito, caberá uma segunda forma de exercício do direito
de defesa, denominada recurso administrativo. Recebida a autuação pela
autoridade de trânsito, e não havendo defesa prévia também no prazo legal o ato
administrativo denominado autuação será convertido em multa, pela autoridade
de trânsito, impondo-se as penalidades administrativas ao condutor ou ao
259 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1289. 260 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 142. 261 Há quem entenda que não se trata, na realidade, de um “novo” ato administrativo, integrante de um procedimento, e sim de uma nova manifestação que complementa o ato complexo de imposição de penalidade.
69
proprietário do veículo.262
Ainda HONORATO afirma que em relação a esse segundo
ato administrativo, ora denominado multa, surge à possibilidade de o interessado
promover recurso administrativo, endereçado a autoridade de trânsito, sendo
recebido por esta e remetido para julgamento perante uma Junta Administrativa
de Recursos de Infrações.263
No caso de penalidade de multa, a data estabelecida como
de término do prazo para recorrer da imposição será a data para recolhimento de
seu valor (art. 282, § 5º da CRFB/88, inserido pela Lei n. 9.602/98). Até a data de
recolhimento da multa permite-se o seu pagamento em 80% (oitenta por cento) do
seu valor. Na hipótese de que o recurso venha a lograr êxito (seja julgado provido
de improcedência da penalidade), ser-lhe-á devolvida a importância paga,
atualizada em UFIR ou por índice legal de correção dos débitos fiscais.264
Martins observar como regra geral, todo e qualquer recurso
é dotado de efeito devolutivo que significa, sinteticamente, que se devolve à
instância superior (para a qual se recorre) o conhecimento da matéria atinente a
decisão recorrida (reexame da decisão objeto). Ao recurso pode-se atribuir
também o chamado efeito suspensivo que, basicamente, importa na suspensão
dos efeitos da decisão recorrida até que o recurso seja julgado pela instância
superior, isto é, não pode a autoridade recorrida dar imediato cumprimento a sua
decisão.
Ainda Martins, o efeito devolutivo é inerente ao recurso,
enquanto que o efeito suspensivo deve vir expresso no diploma legal que rege o
tema tratado no mesmo. O recurso em sede de trânsito em princípio somente tem
efeito devolutivo. Porém, se por motivo de força maior, o recurso não for julgado
dentro do prazo de trinta dias, a autoridade que impôs a penalidade, de ofício, ou
por solicitação do recorrente, poderá conceder-lhe efeito suspensivo.
262 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 319. 263 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 319. 264 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 137.
70
A prescrição alcança, de regra, não só a ação, mas também
a pretensão, admitindo suspensão e interrupção. No caso, a pretensão e a ação
punitiva da Administração Pública, no exercício de polícia. Já a preclusão (ou
decadência), de seu turno, apanha o direito (eficácia da relação jurídica e fonte
da pretensão e ação) preclui o que deixa de estar incluído no mundo jurídico. O
prazo de que trata o art. 281, § único, II do CTB, é decadencial, porquanto apanha
o direito de notificar da autuação da Administração Pública, com o que, súbito,
inviabiliza igualmente o seu direito de punir (uma vez que se inadmite, dentro do
ordenamento pátrio, julgar sem prévia oitiva do acusado). De conseguinte,
desconhece causas interruptivas e suspensivas e o seu termo final consome o
direito, banindo-o do mundo jurídico. 265
O excessivo volume de recursos interpostos justifica o
extrapolar do prazo pela Administração, mas a obriga a conceder efeito
suspensivo ao recurso. O verbo poderá assume contornos de deverá já que o
recorrente não pode ser prejudicado com a demora no julgamento de seu
recurso.266
Para MARTINS o recurso deverá ser interposto perante a
autoridade que impôs a penalidade, a qual remetê-lo-á à JARI. A autoridade que
impôs a penalidade remeterá o recurso ao órgão julgador, dentro de dez dias
úteis subseqüentes a sua apresentação. O eventual descumprimento desse prazo
de remessa não ocasiona o provimento do recurso ou o arquivamento do auto de
infração. Quando muito, em sendo justificado a demora, pode levar a
responsabilização do agente desidioso. Se a autoridade impositora da penalidade
entender que o recurso é intempestivo (interposição fora do prazo legal),
incumbe-lhe assinalar o fato no despacho de encaminhamento. Não lhe é dado
impedir o seguimento do recurso a JARI.
A infração cometida em localidade diversa daquela do
licenciamento do veículo torna possível a apresentação do recurso junto ao órgão
ou entidade de trânsito da residência ou domicílio do infrator. A autoridade de
265 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1336. 266 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 144.
71
trânsito que receber o recurso deverá remetê-lo, de pronto, a autoridade que
impôs a penalidade, acompanhando das cópias dos prontuários necessários ao
julgamento.
O prazo é de até trinta dias para o julgamento do recurso
pela JARI, mas esse prazo pode ser superado diante de motivos de força maior,
situação em que o recurso terá efeito suspensivo. Assim como no julgamento do
auto de infração, o colegiado julgador (JARI) deve formalizar ato que traga a
decisão sobre o recurso interposto. Esse ato também deve ser motivado, isto é,
hão que ser declarados os fundamentos pelos quais deliberou-se daquele
modo.267
Como toda regra decadencial, o lapso temporal de 30 (trinta)
dias fora construído com vistas à segurança jurídica. Não se pode, agora, superá-
lo, objetivando-se verdadeiro conserto na atividade dos entes administrativos.268
O CTB não disciplinou a forma como se deve noticiar o
resultado do julgamento do recurso pela JARI. No art. 282 do CTB, elegeu a via
postal (ou qualquer outro meio tecnológico hábil) para dar-se ciência da imposição
da penalidade.
Nada obstante que o CTB não preveja notificação para o
caso de arquivamento do auto de infração, deve a Administração Pública
procedê-la, tendo em conta o princípio da informação ao administrado de
situações jurídicas a ele pertinente. Esta notificação deve ser feita nos moldes
daquela que comunica a aplicação da penalidade e franqueia o recurso.269
As decisões da JARI não são por si só definitiva e podem
ser atacadas mediante recurso ao respectivo Conselho Estadual de Trânsito –
CETRAN.
A jurisprudência corrobora no mesmo entendimento:
267 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 151. 268 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1336. 269 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1339.
72
EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE TRÂNSITO. APLICAÇÃO DE MULTA. DEFESA PRÉVIA. DECADÊNCIA DO DIREITO DE PUNIR. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. DECADÊNCIA. Por se ter operado a decadência do direito de punir prevista no art. 281, parágrafo único, inc. II, do CTB, mostra-se impossível a renovação do procedimento administrativo com base no auto de infração, após o trânsito em julgado. CORREÇÃO MONETÁRIA.270
3.2.3 Recurso ao CETRAN
A decisão da JARI deve ser notificada ao recorrente, para
que, se querendo, possa interpor recurso junto ao CETRAN. O recurso é
analisado em 2º instância, pelo Conselho Estadual de Trânsito (CETRAN ou
CONTRANDIFE).271
O CETRAN julgará os recursos contra decisões da JARI por
penalidade imposta por órgão ou entidade de trânsito dos Estados ou do
Município, no prazo de trinta dias contado da publicação ou da notificação da
decisão. 272
São órgãos de julgamento de recurso, em 2º instância, o
CONTRAN, o CETRAN e o CONTRANDIFE. Quando a penalidade for imposta
pelo órgão ou entidade de trânsito da União (DNER ou PRF), em caso de
suspensão do direito de dirigir por mais de seis meses, ou cassação do
documento de habilitação ou penalidade por infração gravíssima, já julgadas
pelas respectivas JARI, o CONTRAN será o órgão de 2º instância que julgará o
recurso interposto nos termos do art. 289, I, a, CC e art. 12, XII do CTB.273
270 RIO GRANDE DO SUL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Cível n. 70024318222. Relatora Rejane Maria Dias de Castro Bins. Julgado em 21/05/2008. Disponível http://www.tj.rs.gov.br. Acessa em 21 de maio de 2008. 271 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50. 272 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 163. 273 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50.
73
Reunida a petição, os documentos considerados relevantes
e comprovante do pagamento da multa, os autos serão remetidos pela própria
JARI ao órgão competente, para conhecer e julgar o recurso, onde será
designado o relator e analisado o pedido.274
Possui legitimidade para a interposição de recurso em 2º
instância, conforme art. 288 do CTB
a) o responsável pela infração, no caso do não provimento do recurso interposto; b) a autoridade de trânsito que impôs a penalidade, no caso de provimento do recurso interposto pelo infrator. Destaca-se o art. 288, § 1º do CTB, onde a autoridade que
impôs a penalidade que esteja inconformada com a decisão da JARI que julgou
pelo arquivamento do auto de infração poderá interpor recurso.275
É necessário, para a interposição de recurso em 2º
instância, a comprovação do recolhimento do valor da multa, nos termos do art.
288, §2º do CTB, o que não se exige para a interposição de recurso em 1º
instância, desde que no prazo legal. Inexistindo o depósito prévio do valor da
multa, o CETRAN fica impedido de examinar as razões em que se funda o
recurso. O recurso a ser interposto na 2º instância deve obedecer o prazo de
trinta dias, contados da publicação ou da notificação da decisão da JARI.276
A jurisprudência dominante assim firmou-se:
EMENTA: CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – MULTA – DEPÓSITO PRÉVIO – EXIGÊNCIA PARA INTERPOR RECURSO ADMINISTRATIVO – PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL – OFENSA A CF QUE NÃO SE CARACTERIZA – PRECEDENTE DO STF – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.277
274 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 321. 275 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 162 276 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50. 277 SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL. RE n.282243/RN – STF – Primeira Turma. Relator Ministro Moreira Alves. Julgado em 12/12/2000. Disponível http://www.stf.gov.br. Acessa em 21 de maio de
74
O prazo para a apreciação do recurso em 2º instância é de
trinta dias, nos exatos termos do art. 289, caput do CTB. Importante salientar a
edição da Medida Provisória n. 75, de 24 de outubro de 2002, publicada no DOU
de 25/10/2002, republicada em 28 do mesmo mês e ano, que consoante o seu
art. 39, modificara os arts. 285 e 288 do CTB, especificando prazo de 60
(sessenta) dias para julgamento do recurso pela JARI, estabelecendo o
cancelamento da penalidade aplicada caso não respeitado tal prazo, em relação
ao julgamento de recurso pelo CETRAN, especificando o prazo de 90 (noventa)
dias, o qual, uma vez desatendido, geraria automático provimento do mesmo.
Todavia tal medida provisória foi rejeitada mediante ato do Presidente da Câmara
dos Deputados, publicado no DOU em 19/12/2002.278
A natureza, o tipo da penalidade imposta e a autoridade
impositora de origem definirão a entidade competente para apreciar o recurso
contra a decisão da JARI.279
Recurso ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN)
será competente para julgar os recursos contra as decisões da JARI, em que as
penalidades foram originalmente aplicadas por órgão de trânsito da União, e
desde que a pena consista em:
a) suspensão do direito de dirigir por mais de seis (06) meses; b) cassação de documento de habilitação (CNH ou permissão para dirigir) c) se trate de pena decorrente de infração gravíssima. Recurso ao Colegiado ou a própria JARI, quando a
penalidade tiver sido imposta pelo órgão ou entidade de trânsito da União e não
se enquadrar no rol das situações descritas acima nas letras a, b e c. Forma-se
um colegiado tido por especial, composto pelo Coordenador geral da JARI, pelo
Presidente da junta que apreciou o recurso e por mais um Presidente da junta, a
ele competirá o julgamento do recurso. Em não havendo mais de uma JARI, o 2008. 278 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1346. 279 MARTINS, Sidney. Multas de Trânsito: defesa prévia e processo punitivo. 2006. p. 163.
75
recurso será interposto pelo próprio membros da JARI recorrida.
Recurso ao CETRAN julgará o recurso contra julgamento da
JARI por penalidade imposta por órgão ou entidade de trânsito dos Estados
(DETRAN’s) ou do Município. No Distrito Federal, cabe ao CONTRANDIFE julgar
o recurso por penalidade imposta pela repartição de trânsito.
Se após todo o processo administrativo, restar aplicada a
penalidade, a mesma deverá ser cadastrada no RENACH, conforme prevê o
parágrafo único do art. 290 do CTB.280
Com a apreciação do recurso pelo CETRAN, está encerrada
a instância administrativa de julgamento de infrações e penalidade, nos termos do
art. 290 do CTB. Isto quer dizer, se o recorrente entender que seu direito é
legítimo, mesmo havendo perdido nas esferas administrativas, ele poderá utilizar
em seu favor o remédio constitucional do mandado de segurança provocando a
apreciação judicial do seu pedido.281
3.3 FASE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO PUNITIVO
O processo administrativo punitivo é todo aquele promovido
pela Administração para a imposição de penalidade por infração de lei,
regulamento ou contrato. Esse processo deve ser necessariamente contraditórios,
com oportunidade de defesa e estrita observância do devido processo legal, sob
pena de nulidade da sanção imposta.282
Como o processo administrativo punitivo é uma modalidade
de processo administrativo que culmina com a imposição de uma sanção ao
administrado, o procedimento que o norteia deve estar sedimentado nos
princípios do contraditório e da ampla defesa, a fim de que não seja cerceado o
direito de defesa do infrator. Ao ser regido pelo contraditório e ampla defesa, o
processo administrativo punitivo demonstrará, a saciedade, quão cristalina e 280 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1347. 281 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50. 282 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50.
76
insuspeita foi a atitude da Administração Pública em aplicar a penalidade prevista
em lei.283
Consoante ao mesmo entendimento a ementa do recurso
especial n. 60.607-SP – 2ª Turma do STJ – Rel. Min. Adhemar Maciel, publicada
na Revista do STJ/Brasília, junho de 1998, p. 169 que diz:
Apreensão da carteira nacional de habilitação. Prévio procedimento administrativo, regido pelos princípios do contraditório e da ampla defesa: necessidade. Recurso não conhecido. Apreensão da carteira nacional de habilitação fica condicionada a prévio procedimento administrativo, regido pelos princípios do contraditório e da ampla defesa.
3.3.1 Considerações gerais
Quando se fala em “direito de dirigir”, dá-se a impressão que
obter a CNH e conduzir veículo automotor em vias terrestres é um direito
inviolável. Muito pelo contrário, obter a CNH e conduzir um veículo deveria ser
entendido como uma licença do Poder Público ao particular, para que este
pudesse conduzir veículo automotor em via terrestre, sob determinadas
condições. Não cumprida essas condições imposta, a licença poderia ser
suspensa ou cassada (ANEXO 6).284
Licença, segundo MELLO, é o ato administrativo vinculado,
unilateral, pelo qual a administração faculta a alguém o exercício de uma
atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos
legais exigidos.285
Antes de instaurar qualquer procedimento administrativo que
visa a suspensão do direito de dirigir, é necessário que o processo referente ao
mérito da autuação tenha transitado julgado perante a JARI, ou se for o caso
CETRAN ou CONTRAN.
283 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 50. 284 HONORATO, Cássio Mattos. Trânsito: infrações e crimes. 2000. p. 197. 285 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 2006. p. 210.
77
Constam do rol das penalidades descritas no art. 256 do
CTB:
a) suspensão do direito de dirigir; b) cassação da carteira nacional de habilitação, e; c) cassação da permissão para dirigir. Já o art. 265 do CTB dita que as penalidades de suspensão
do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas
por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, que in casu é o
diretor do DETRAN do respectivo Estado de registro do condutor, em processo
administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa, por força do art.
22, VI do CTB.
Portanto, a autoridade de trânsito, ao aplicar a penalidade de
suspensão do direito de dirigir e de cassação do direito de dirigir e de cassação
do documento de habilitação, deverá instaurar processo administrativo punitivo,
assegurando-se ao infrator, o contraditório e a ampla defesa, em face do que
estabelece os arts. 5º, LV da CRFB/88, art.. 265 do CTB. 286
3.3.2 Processo de suspensão e casacão da habilitação
O processo administrativo para a suspensão e cassação da
CNH dos condutores autuados por infrações ao CTB e que, no período de doze
meses, tenham atingido ou ultrapassado a somatória de 20 pontos, ou praticado
infrações que, por si só, estabelecem diretamente a suspensão do direito de
dirigir, independendo da contagem de pontos. No tocante aos condutores que
tenham alcançado pontuação igual ou inferior a 20 pontos, no período de 12
meses, ou autuados por infrações que, por si só, motivem a suspensão do direito
de dirigir, estes deverão constar de uma relação a ser publicada no Diário Oficial
do Estado, a qual dará início ao processo, com a mesma validade da portaria da
autoridade de trânsito.287
286 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 63. 287 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 67.
78
Os condutores relacionados deverão ser notificados
individualmente para que, no prazo de trinta dias, contados a partir da data de sua
notificação, apresentem defesa escrita junto ao órgão de trânsito de sua atual
residência ou domicílio.
A defesa escrita admitir-se-á, para a sua instrução, a
apresentação de qualquer escrito, instrumento ou papel, público ou particular.
Poderá, ainda, o infrator na defesa escruta solicitar a oitiva de qualquer pessoa,
no que será observado o principio do contraditório.288
Essa portaria é um despacho da autoridade de trânsito
competente para a imposição da penalidade. Tal documento deverá declarar o
fato punível, circunstanciando-o e indicando o administrador condutor nele
envolvido como autor ou protagonista, qualificando-o, juntamente com
documentos que provem verdadeiro aquilo que a ele se imputa, proporcionando-
lhe, desse modo, condições para o exercício do contraditório e da ampla
defesa.289
O autor SILVA observar que a autoridade devera proceder à
notificação do condutor, a qual conterá uma exposição sucinta da infração e o
prazo para apresentação de defesa escrita. Seria de bom alvitre que, junto com a
notificação a autoridade encaminhasse uma cópia da Portaria inaugural, e fizesse
constar o recebimento da aludida cópia na própria via de notificação que será
juntada aos autos.
Da decisão da autoridade de trânsito conterá:
a) qualificação do condutor; b) a exposição sucinta da defesa; c) a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar
a decisão; d) a indicação dos artigos de lei aplicado, e; e) a penalidade de suspensão ou cassação do direito de dirigir,
levando-se em conta a gravidade da infração, as
288 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 68. 289 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1285.
79
circunstâncias em que foi cometida e os antecedentes do infrator como condutor.
Caso seja apresentada a defesa escrita, ou após
transcorrido o prazo de trinta dias, a autoridade de trânsito, analisará os
elementos cognitivos acostados ao processo e fundamentará sua decisão,
determinando o seu arquivamento ou a imposição da penalidade, indicando, neste
caso, o período de suspensão ou as razões que determinaram a cassação.290
A decisão da autoridade de trânsito, portanto, deve ser
fundamentada, e poderá constar num relatório bem elaborado, no qual será
descrita a qualificação do condutor, a exposição sucinta da defesa, ou a sua não
apresentação, a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a
decisão, a indicação dos artigos aplicados e a penalidade com a indicação do
período. No caso da não apresentação da defesa escrita, por parte do condutor
devidamente notificado, o processo prosseguirá normalmente, devendo o fato
constar de seu cadastro, a fim de resguardar os interesses da Administração
Pública.291
Quando o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais
infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as respectivas penalidades,
explicita o art. 266 do CTB, punido de forma múltipla aquele que assim proceder,
tomando cuidado para não ocorrer o bis in idem, ou seja, punido duas vezes na
mesma infração.292
A autoridade de trânsito que impôs a penalidade deverá
intimar o condutor da decisão proferida, visando assegurar-lhe o direito de
recorrer da decisão, caso lhe seja contrária. A cientificação da decisão ao
condutor infrator é importante, uma vez que fixa o prazo de trinta dias para a
interposição de recurso perante a JARI, instalada junto a unidade de trânsito
competente, a contar do dia em que o condutor foi intimado. O recurso interposto
290 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 54. 291 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 68. 292 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1287.
80
junto a JARI não possui efeito suspensivo. 293
O período da suspensão só terá início com a efetiva
apreensão da CNH. O infrator será intimado para apresentar a sua CNH, a qual
será apreendida e a este entregue uma cópia do respectivo auto.294
A freqüência em curso de reciclagem é uma exigência do
art. 268, II do CTB, e concedida à devolução da CNH. Diz o § 2º do art. 261 do
CTB, que quando ocorrer a suspensão do direito de dirigir, a Carteira Nacional de
Habilitação será devolvida a seu titular imediatamente após cumprida a
penalidade e o curso de reciclagem. Isso que dizer que o infrator deve ser
aprovado no curso de reciclagem, cumprir o período integral da suspensão, para
então ter de volta seu documento de habilitação.295
Caso o infrator deixar de comparecer sem motivação
justificado, a qualquer ato que tenha sido intimado, o procedimento seguirá a sua
revelia.296
Portanto, estar com a CNH apreendida (ou recolhida)
equivale a não ter habilitação para dirigir, as situações praticamente se
equivalem, quanto à falta de autorização para dirigir.297
Ao aludir, no art. 261, a sanção de suspensão do direito de
dirigir, o CTB apenas refere à Carteira Nacional de Habilitação, determinando
segundo o § 2º, que cumprida a penalidade e concluído o curso de reciclagem,
deva a CNH ser devolvida imediatamente ao seu titular.298
Ambas as sanções, previstas no art. 256, III e VII do CTB,
293 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 55. 294 PINHEIRO, Geraldo de Faria Lemos. Código de Trânsito Brasileiro Interpretado. 2000. p. 256. 295 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 70. 296 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 70. 297 CARRIDE, Norberto de Almeida. Direito de trânsito e responsabilidade civil de A a Z. 2003. p. 27. 298 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1278.
81
toda vez que participante do trânsito cometa infração viária em que cominada
suspensão do direito de dirigir, serão simultaneamente impostas, consoante deixa
certo o art. 268, II do CTB. Resta, então, a imposição da suspensão do direito de
dirigir sempre acompanhada pela sanção de freqüência obrigatória a curso de
reciclagem, a lume do que se contém nos arts. 256, III e VII, e 268, II do CTB,
devendo necessariamente, a autoridade de trânsito, fundamentar a imposição
dessa segunda penalidade, demonstrando juridicamente, porque se lhe impõe.299
Tem-se ainda no art. 261 do CTB que:
A penalidade de suspensão do direito de dirigir será aplicada, nos casos previstos neste Código, pelo prazo mínimo de um mês até o máximo de um ano e, no caso de reincidência no período de doze meses, pelo prazo mínimo de seis meses até o máximo de dois anos, segundo critérios estabelecidos pelo CONTRAN. Este dispositivo trata-se, sem dúvida, de uma norma de
trânsito em branco, ou seja, que necessita de uma norma complementar que
estabeleça quais sejam os critérios a serem seguidos, quando da aplicação da
dosimetria do prazo de suspensão.
A Res. n. 182/05 do CONTRAN complementou o dispositivo,
estabelecendo a dosimetria do prazo de suspensão nas diversas gravidades de
infrações que ensejam a penalidade da suspensão do direito de dirigir, levando
em conta a gravidade da infração, as circunstâncias em que foi cometida e os
antecedentes do infrator para estabelecer o período da suspensão, na forma do
art. 261 do CTB. 300
Em um caso, porém, a freqüência obrigatória não
acompanhará a suspensão, naquele em que o condutor está habilitado mediante
a expedição da Permissão para Dirigir, hipótese em que terá de reiniciar todo o
processo de habilitação, a força do disposto no art. 148, § 3º e 4º do CTB.301
299 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1276. 300 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 61. 301 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1277.
82
O infrator poderá recorrer, em 1º instância, a JARI (art. 16
caput e art. 17, inciso I, ambos do CTB), e em 2º instância ao CETRAN ou
CONTRANDIFE (art. 288 caput, e art. 289, inciso II, ambos do CTB).
A jurisprudência corrobora no mesmo entendimento:
EMENTA: APELAÇÃO CRIME. VIOLAÇÃO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. ART 307 DO CTB. SANÇÃO ADMINISTRATIVA OU CONDENAÇÃO CRIMINAL. 1- O Código de Trânsito Brasileiro prevê a suspensão ou proibição de dirigir veículos automotores, oriundas tanto de condenação criminal quanto de sanção administrativa. A violação de qualquer uma delas configura o delito do art. 307 da Lei 9.503/97 2- Comprovadas a existência e a autoria do delito, inclusive com a confissão.302
3.3.3 Reabilitação
Reabilitação deriva de reabilitar, formado de habilitar e do
prefixo re, que dá a idéia de ação retroativa ou retorno ao anterior, exprime,
geralmente, o fato, que vem restituir a capacidade de uma pessoa ou que vem
restabelecer uma situação anteriormente perdida. A reabilitação, portanto, restitui
a capacidade, em virtude do que a pessoa está novamente habilitada a agir,
segundo os direitos que lhe são assegurados por lei. Ou é recolocada na situação
jurídica de que fora afastada.303
Decorridos dois anos da cassação da Carteira Nacional de
Habilitação, o infrator poderá requerer sua reabilitação a autoridade de trânsito do
seu domicílio, submetendo-se a todos os exames necessários a habilitação, na
forma estabelecida pelo CONTRAN, esclarece o art. 263, § 2º do CTB.304
O requisito subjetivo, o candidato a reabilitação deverá
comprovar que deixaram de existir os motivos determinante da cassação de sua
302 RIO GRANDE DO SUL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Apelação Cível n.71001579978. Relatora Cristina Pereira Gonzáles. Julgado em 28/04/2008. Disponível http://www.tj.rs.gov.br Acesso em 21 de maio de 2008. 303 SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, vol. IV, 9ª ed. 1986. p. 27. 304 MITTIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro. 2005. p. 1283.
83
habilitação, como no caso de embriaguez ou dependência química de substância
entorpecentes, o candidato deverá comprovar sua reabilitação através de laudos
médicos de avaliação, que não é mais dependente químico ou alcoólico.
O infrator deverá requerer sua reabilitação à autoridade de
trânsito do seu domicílio. Da decisão da autoridade de trânsito que denegar o
pedido de reabilitação, caberá recurso ao CONTRAN, no prazo de trinta dias,
contados da publicação da decisão no órgão oficial ou do conhecimento, por
qualquer modo, pelo infrator.305
305 SILVA, José Geraldo da. Dos recursos em matéria de trânsito. 2001. p. 74.
84
CONCLUSÃO
Sem dúvida, um longo caminho percorrido desde
a abordagem do direito de trânsito, até o recurso administrativo de trânsito em
que a inteligência e o senso de justiça dos Tribunais, alinhados pela sabedoria
dos mestres doutrinadores, permitiram prazeroso acesso aos seus julgados e
entendimentos.
A necessidade, fundada, inicialmente na especificidade
do objeto, no grande interesse de que a pesquisa atingisse a todos os níveis
de formação acadêmica, e, por fim, na própria pertinência dos temas, exigiu
que se retrocedesse no tempo e na ordem lógica dos elementos.
Em assim procedendo, caminhando do histórico de direito do
trânsito; conceito, histórico, interdisciplinaridade do direito do trânsito, princípios e
do sistema nacional de trânsito, possibilita-se uma compreensão lógica da
matéria, em que pese sem grande profundidade.
A pesquisa demonstrou à possibilidade de um processo
administrativo posterior a aplicação de penalidade contra cidadão, toda vez que
violar os dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro. Destaca-se um dos mais
importantes princípios que regem o direito administrativo é denominado de
autotutela administrativa, onde a Administração Pública fiscaliza e revê seus
próprios atos, retirando-os de circulação quando não sejam mais interessantes,
convenientes e oportunos ou, se manifestamente ilegais.
Verificou-se que o recurso administrativo em matéria de
trânsito é o pedido de reexame feito pelo autuado em infração de trânsito,
dirigindo ao órgão colegiado, visando obter o cancelamento da penalidade
imposta.
Resumidamente administração de trânsito é um conjunto de
órgãos, compreendendo um conjunto de funções, que executam uma série de
85
atribuições para a consecução dos objetivos do governo em relação ao trânsito,
ou seja, em relação a utilização das vias terrestres.
Dessa forma, por determinação da Lei n. 9.503/97, as
resoluções do Conselho Nacional de Trânsito constituem norma jurídica infralegal
de observância obrigatória, cujo desrespeito sujeita o infrator a sanções de ordem
administrativa. Um exemplo claro era a norma que determinava a obrigatoriedade
do uso do cinto de segurança nas rodovias, no período anterior ao atual Código
de Trânsito Brasileiro. A referida norma não constava do revogado Código
Nacional de Trânsito.
É evidente que somente será admitido recurso, em matéria
de trânsito, quando houver violação a direito do autuado, ou quando a lavratura
do auto de infração estiver eivada de alguma irregularidade. Do contrário, é dever
de acatar a penalidade imposta. O recurso deverá ser interposto por quem esteja
legitimado para tal.
Requisito primordial e básico, inarredável e imperativo, em
todo recurso, é a lesividade, para o recorrente, da sentença ou decisão contra a
qual se recorre. Sem prejuízo ou gravame a direito da parte, não pode esta
pretender recorrer.
Encerra-se a monografia com as palavras de IHERING:
O direito e a justiça só prosperam em um país, quando o juiz está todos os dias preparado no tribunal e quando a polícia vela por meio dos seus agentes, mas cada um deve contribuir pela sua parte para essa obra. Todos aqueles que fruem os benefícios do direito devem também contribuir pela sua parte para sustentar o poder e a autoridade da lei, em resumo cada qual é um lutador nato, pelo direito, no interesse da sociedade.306 Portanto trânsito é um fenômeno mais amplo do que
geralmente é compreendido, em razão de englobar todos os usuários das vias
terrestres, mesmo que não se encontrem embarcados em veículos automotores,
306 IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo Direito, Rio de Janeiro: Forense, 17 ed. 1999, traduzido por João Vasconcelos. p. 48.
86
e mesmo que não se encontrem em deslocamento. Uma pessoa, caminhando ou
sentada em um banco de uma praça, estará sujeita as normas imposta pelo
Código de Trânsito Brasileiro.
O julgamento do recurso administrativo torna vinculante para
a Administração seu pronunciamento decisório, e atribui definitivamente do ato
apreciado em última instância. Daí por diante, não poderá ser modificado pela
Administração e só o Judiciário poderá reapreciá-lo e dizer de sua legitimidade. E
evidente que a revisão da decisão em última instância do órgão administrativo,
somente poderá efetivar-se no judiciário se houver a impetração de mandado de
segurança por parte do administrado derrotado na esfera administrativa.
87
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89
ANEXO 1
90
ANEXO 2
91
ANEXO 3
92
ANEXO 4
93
ANEXO 5
94
ANEXO 6
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