UNIVERSIDADE DO PORTOFaculdade de Desporto
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Socialde jovens em risco, através do Desporto:
Será possível?
Dissertação apresentada à Faculdade de Desporto,
com vista à obtenção do grau de Mestre em Ciências
do Desporto na área de especialização em Actividade
Física Adaptada (Decreto-Lei n.º 216/92, de 13 de
Outubro).
Orientador: Professor Doutor António Fonseca
Maria Leonor Ventura Regueiras
Porto, 2006
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Regueiras, Maria Leonor Ventura
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social de jovens em risco através do Desporto: Será possível? 2006-05-15
Orientador: Professor Doutor António FonsecaDissertação (Mestrado) – Faculdade de Desporto, Universidade do Porto.
DESPORTO, RESPONSABILIDADE, EDUCAÇÃO, INTERVENÇÃO, ACTIVIDADEFÍSICA ADAPTADA
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Ao João Maria e ao Mário João
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Agradecimentos
Aos meus pais, Maria Antónia e João, que sempre me olharam como se eu
fosse capaz de ir mais longe. Nunca esperaram de nós, filhos, menos do que
os nossos dons. Obrigada.
Agradeço aos meus irmãos e cunhados, sempre amigos e disponíveis, e à
família que me apoiou e “dispensou” nos momentos de maior aperto.
Agradeço à Zélia porque me trouxe de volta pela mão e me puxou para junto
dela e dos meus amigos para que eu sentisse que trabalhava “em casa”.
Ao Nuno Corte-Real sempre presente, sempre cavalheiro e sempre amigo; ao
Rui Corredeira disponível e solidário; ao José Maia um apoio esclarecido e
generoso, obrigada.
Ao Mário Paiva “orientador espiritual” que me ajudou a arrumar ideias, a ser
metódica e a começar cedo para chegar ao fim, um agradecimento muito
especial.
Aos amigos colegas do INA, que foram fornecendo as doses de confiança e de
fé necessárias para que eu fosse acreditando em mim para além das minhas
próprias expectativas.
À Maria Helena, que sabe como se escrevem as coisas verdadeiramente
importantes, como amizade e fidelidade, e que não nos deixa esquecer que o
sentido da palavra é mais forte que a sua ortografia, obrigada.
Agradeço também à Sameiro, à Luísa e à Carmem que, por amizade, me
ajudaram traduzindo os resumos.
À minha escola, Instituto Nun’Alvres do Colégio das Caldinhas, ao meu
Director Pedagógico e amigo Engº Pedro Monteiro, aos Directores de Turma,
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ao Departamento de Educação Física, ao Gabinete Psicopedagógico e
Biblioteca, obrigada a todos.
Para os meus alunos que são bons amigos e que, mesmo sem entenderem
para que servem tantos inquéritos, papeis e avaliações, os aceitam porque fui
eu que pedi… Um obrigada especial.
Agradeço ainda a April Tripp, Doris Watson, Don Hellison, Feliciano Henrique
Veiga e Tom Martinek que me ajudaram cedendo generosamente a
experiência, os materiais de que dispunham, o seu tempo e a sua orientação.
À minha faculdade que, na pessoa dos que nela trabalham e estudam, me
possibilitou mais esta experiência disponibilizando o apoio científico e o bom
ambiente que a caracteriza, obrigada.
“Os orientadores podem escolher um de dois caminhos: Indicar um tema que
já conheçam muito bem e no qual possam facilmente seguir o mestrando, ou
permitir a escolha de um outro que não conheçam tão bem e, sobre o qual,
quereriam saber mais”. Diz Umberto Eco que o segundo critério é o mais
honesto e generoso e exige confiança no candidato.
Por tal confiança agradeço especialmente ao meu orientador Professor Doutor
António Manuel Fonseca.
Ao João Maria que tem sido sempre um bom filho e uma óptima companhia.
Ao Mário João que fez a parte mais importante do mestrado – manter todo o
resto a rolar.
Obrigada.
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ÍNDICE GERAL
ÍNDICE DE QUADROS
ÍNDICE DE FIGURAS
ÍNDICE DE ANEXOS
RESUMO ABSTRACT RESUMÉ
Introdução 1
1. Sucesso Educativo 9
1.1. Introdução 9
1.1.1. Sucesso educativo / Sucesso escolar 9
1.1.2. Finalidades do ensino 16
1.1.3. Desigualdades de acesso ao sucesso 19
1.2.Condicionantes do sucesso escolar 25
1.2.1. A Escola 25
1.2.2. O Currículo 29
1.2.3. O Aluno 32
1.2.4. Os Métodos 361.3. Indicadores de sucesso escolar 43
1.3.1. Comportamento 431.3.2. Rendimento académico 481.3.3. Autopercepções 491.3.4. Gosto pela escola 52
1.4.Papel da educação desportiva 55
2. Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social 652.1. Introdução 652.2.Resultados da aplicação do Modelo de Intervenção TPSR 732.3.Estrutura das sessões e estratégias 75
2.3.1. Conversa individual 752.3.2. Consciencialização 762.3.3. Actividade física 772.3.4. Reunião de grupo 772.3.5. Tempo de reflexão 78
3. Metodologia 813.1.Objectivos do estudo 813.2.Tipo de estudo 813.3. Variáveis 81
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3.3.1. Variáveis independentes 813.3.2. Variáveis dependentes 81
3.4.Duração da intervenção 823.5.Enquadramento e caracterização da amostra 823.6. Implementação do Modelo de Intervenção TPSR 853.7. Instrumentos 87
4. Apresentação e Interpretação dos Resultados 954.1.Os grupos GE e GC antes da implementação do programa 954.2.Os grupos GE e GC depois da implementação do programa 994.3.Análise mais detalhada da evolução individualizada dos alunos
dos grupos GC e GC 104
5. Conclusões e Sugestões 121
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANEXOS
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ÍNDICE DE QUADROS
Quadro I: Níveis de Responsabilidade Pessoal e Social Definidos por Diferentes Autores 67
Quadro II: Níveis e Componentes de Responsabilidade Pessoal e Social 68
Quadro III: Características do Grupo Experimental 84
Quadro IV: Características do Grupo de Controlo 85
Quadro V: Tabelas Representando a Média para Cada Variável e para Cada Grupo nos Momentos Inicial e Final daIntervenção 103
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1I: Valores Médios de Auto-estima Inicial por Grupo 95
Figura 2: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Rendimento Académico Inicial 96
Figura 3: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Comportamento Inicial Através de Auto-avaliação eHetero-avaliação 97
Figura 4: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Disrupção Escolar Inicial dos alunos do GE e do GC em Auto-avaliação e Hetero-avaliação 97
Figura 5: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Aborrecimento e Satisfação/Divertimento Iniciais com a Escola 98
Figura 6: Nível Inicial de Responsabilidade Pessoal e Social dos Grupos GE e GC 98
Figura 7: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios da Auto-estima Final 99
Figura 8: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Rendimento Académico Final 100
Figura 9: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Comportamento Geral Final em Auto e Hetero Avaliações 100
Figura 10: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Disrupção Escolar Final em Auto e Hetero Avaliações 101
Figura 11: Comparação Entre Grupos dos Valores Médios Finais de Aborrecimento e Satisfação/Divertimento com a EscolaEntre os Grupos GE e GC 101
Figura 12: Comparação dos Valores Médios Finais do Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Entre os Grupos GE eGC 102
Figura 13: Variações de Auto-estima nos Alunos do Grupo Experimental 105
Figura 14: Variações de Auto-estima nos Alunos do Grupo de Controlo 105
Figura 15: Variações de Sucesso Académico dos Alunos do Grupo Experimental 105
Figura 16: Variações de Sucesso Académico dos Alunos do Grupo de Controlo 105
Figura 17: Variações em Problemas de Realização Escolar dos Alunos do GE (Auto-avaliação) 107
Figura 18: Variações em Problemas de Realização Escolar dos Alunos do GC (Auto-avaliação) 107
Figura 19: Variações em Problemas de Realização Escolar dos Alunos do GE (Hetero-avaliação) 107
Figura 20: Variações em Problemas de Realização Escolar dos Alunos do GC (Hetero-avaliação) 107
Figura 21: Variações em Problemas de Hostilidade dos Alunos do GE (Auto-avaliação) 108
Figura 22: Variações em Problemas de Hostilidade dos Alunos do GC (Auto-avaliação) 108
Figura 23: Variações em Problemas de Hostilidade dos Alunos do GE (Hetero-avaliação) 108
Figura 24: Variações em Problemas de Hostilidade dos Alunos do GC (Hetero-avaliação) 108
Figura 25: Variações em Problemas de Cumprir o Papel de Aluno dos Alunos do GE (Auto-avaliação) 109
Figura 26: Variações em Problemas de Cumprir o Papel de Aluno dos Alunos do GC (Auto-avaliação) 109
Figura 27: Variações em Problemas de Cumprir o Papel de Aluno dos Alunos do GE (Hetero-avaliação 109
Figura 28: Variações em Problemas de Cumprir o Papel de Aluno dos Alunos do GE (Hetero-avaliação) 109
Figura 29: Variações em Problemas de Isolamento Social dos Alunos do GE (Auto-avaliação) 110
Figura 30: Variações em Problemas de Isolamento Social dos Alunos do GC (Auto-avaliação) 110
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Figura 31: Variações em Problemas de Isolamento Social dos Alunos do GE (Hetero-avaliação) 110
Figura 32: Variações em Problemas de Isolamento Social dos Alunos do GC (Hetero-avaliação) 110
Figura 33: Variações em Comportamento Disruptivo dos Alunos do GE (Auto-avaliação) 111
Figura 34: Variações em Comportamento Disruptivo dos Alunos do GC (Auto-avaliação) 111
Figura 35: Variações de Comportamento Disruptivo dos Alunos do GE (Hetero-avaliação) 111
Figura 36: Variações de Comportamento Disruptivo dos Alunos do GC (Hetero-avaliação) 111
Figura 37: Variações em Aborrecimento dos Alunos do GE 112
Figura 38: Variações em Aborrecimento dos Alunos do GC 112
Figura 39: Variações em Satisfação/Divertimento dos Alunos do GE 112
Figura 40: Variações em Satisfação/Divertimento dos Alunos do GC 112
Figura 41: Variações no Nível de Responsabilidade Pessoal e Social dos Alunos do GE 113
Figura 42: Variações no Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Alunos do GC 113
Figura 43: Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Momentos Inicial e Final 114
Figura 44: Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Trajecto Durante a Intervenção 114
Figura 45: Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Relativo aos 2º e 3º Momentos 114
ÍNDICE DE ANEXOS
Anexo A: Quadro de Caracterização dos Níveis de Responsabilidade Pessoal e Social Utilizado por Linda Masser
Anexo B: Perguntas que podem ajudar a auto-avaliação
Anexo C: Questionário – Escala de Disrupção Escolar Professada (EDEP)
Anexo D: Questionário – Escala de Disrupção Escolar Inferida (EDEI)
Anexo E: Questionário – Caracterização do Comportamento (Auto)
Anexo F: Questionário – Caracterização do Comportamento (Hetero)
Anexo G: Ficha de Avaliação de Satisfação com a Escola
Anexo H: Ficha de Avaliação da Sessão
Anexo I: Questionário – Auto-estima
Anexo J: Ficha de Auto-avaliação – Taking Personal and Social Responsibility
Anexo K: Ficha de Hetero-avaliação – Taking Personal and Social Responsibility
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Resumo
A aplicação de um programa de desenvolvimento da responsabilidade pessoal e social (Taking Personal
and Social Responsibility Model - TPSR) através do desporto a jovens em risco de insucesso e de
abandono escolares e posterior analise dos resultados dessa aplicação, foram os nossos objectivos
principais.
Constituiu a nossa amostra um grupo de 26 alunos (9 do sexo feminino e 17 do sexo masculino) do
Instituto Nun’ Alvres, escola em agrupamento vertical com cinco escolas do 1º Ciclo no Vale do Ave,
posteriormente distribuídos por um grupo de controlo (GC) e um grupo experimental (GE).
Da amostra total, 6 tinham ficado retidos no 7º ano, 12 tinham dois ou mais anos de atraso em relação ao
nível esperado de escolaridade, 10 apresentavam problemas disciplinares ou de integração na vida
escolar e 2 foram indicados pelo Gabinete Psicopedagógico como adolescentes com dificuldades várias
(de integração e/ou rendimento académico). Alguns dos alunos apresentavam, simultaneamente, mais
do que uma das características referidas. O GE (n=12) foi constituído por todos os alunos que se
inscreveram no grupo desportivo e o GC (n=14) pelos alunos que não se inscreveram.
O trabalho foi de natureza longitudinal, de delineamento experimental, tendo-se desenrolado ao longo de
25 sessões de treino desportivo no contexto de um Grupo Desportivo Escolar – Multi-actividades.
Foram usados os seguintes instrumentos de avaliação: versão portuguesa do Physical Self-Perception
Profile (A. M. Fonseca & Fox, 2002) ; a Escala de Disrupção Escolar Professada (EDEP) e a Escala de
Disrupção Escolar Inferida (EDEI) para avaliação do comportamento disruptivo escolar professado e
inferido, elaborado por Veiga. (1991); Questionário de Satisfação com a Escola (Duda & Nicholls, 1992);
questionários de avaliação do Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Hellison, 1995);
questionários de avaliação do Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Watson &
Newton, 2001). Complementarmente à auto-avaliação, foram utilizados instrumentos de hetero-avaliação,
preenchidos pelos professores, de forma a obter dados que permitissem corroborar os recolhidos junto
dos próprios alunos.
Da análise de resultados evidenciou-se, em primeiro lugar, a inexistência de diferenças estatisticamente
significativas entre o GE e o GC, tanto antes como depois da aplicação do programa. Apesar disso, uma
análise mais detalhada da evolução dos alunos demonstrou não ser igual a amplitude dos resultados
individuais de cada um dos grupos. Estas diferenças consistiram numa diminuição dos Problemas de
Comportamento dos alunos do grupo GE (em 75% dos alunos) com maior amplitude que no grupo GC
(em 64% dos alunos), numa diminuição igualmente mais relevante do Aborrecimento com a vida escolar
no grupo GE (diminuição em 67% do Aborrecimento na escola) e no implemento das Relações
Interpessoais nos alunos do GE (diminuição de 58% no Isolamento Social). A alteração de maior
importância, para o grupo GE em relação ao GC, verificou-se ao nível do aumento dos valores relativos à
Responsabilidade Pessoal e Social (aumento dos níveis de Responsabilidade Pessoal e Social para 75%
dos alunos do GE e de 57% para os do GC).
Em suma, os nossos resultados parecem sugerir a utilidade da aplicação do modelo Taking Personal
and Social Responsibility como um meio para promover o desenvolvimento dos níveis de
responsabilidade pessoal e social de jovens em risco de insucesso e abandono escolares, sendo, ainda
assim, necessário realizar mais estudos no sentido de corroborar os por nós aqui encontrados
DESPORTO, RESPONSABILIDADE, EDUCAÇÃO, INTERVENÇÃO, ACTIVIDADE FÍSICA ADAPTADA
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Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Abstract
The application of one program of development of the personal and social responsibility (Taking Personal
and Social Responsibility Model - TPSR) through the sport, in young at risk of pertaining to school failure
and abandonment, and, posterior analyzes of the results of this application, had been our main propose.
Our sample comprises a group of 26 pupils attending Instituto Nun’Alvres, a school in vertical grouping
with five schools of 1º Ciclo in Vale do Ave, 9 girls and 17 boys.
From the whole sample, 6 have failed in the 7th year, 12 were two or more years of delay whith respect to
the schooling expected level, 10 presented disciplinary or school life integration problems and 2 were
pointed out by the Gabinete Psicopedagógico as being teenagers with several problems (integration
and/or academic income). Some of the pupils presented more than one referred features simultaneously.
The sample was divided into an experimental group (GE) (n=12) and a control group (GC) (n=14).
The assignment was of longitudinal based, of experimental delineation, having been developed for 25
sports training sessions in the contest of Grupo Desportivo Escolar – Multi-actividades.
The following assessment instruments have been used: Portuguese version of Physical Self-Perception
Profile (A. M. Fonseca & Fox, 2002); The questionnaires Escala de Disrupção Escolar Professada
( EDEP) and Escala de Disrupção Escolar Inferida (EDEI) for evaluation of the declared and inferred
behaviour, elaborated by Veiga, (1991); Questionário de Satisfação com a Escola (Duda & Nicholls,
1992); assessment questionnaires of Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Hellison,
1995); assessment questionnaires of Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Watson &
Newton, 2001). Complementarily to self-evaluation it was used instruments of hetero-evaluation to obtain
data which would allow confirming those collected near the pupils themselves.
From the analysis of results becomes evident, in first place, the inexistence of statistics significant
differences between GE and GC in such a way before as after the application of the program. Despite
this, a more detailed analysis of the evolution of the pupils, demonstrated some differences in the
amplitude of the individual results of each one of the groups. These differences had consisted of a
reduction of the Problems of Behaviour of the pupils of group GE (in 75% of the pupils) with bigger
amplitude than in group GC (in 64% of the pupils), a important reduction of the Annoyance with the
pertaining to school life in group GE (reduction in 67% of the Annoyance in the school) and in the
implement it of the Interpersonal Relations in the pupils of GE (reduction of 58% in the Social Isolation).
The alteration was more important for group GE than to GC, verified the increase of level on the values of
the Personal and Social Responsibility (the increase of the levels of Personal and Social Responsibility
was 75% for the pupils of GE and for 57% for the ones of the GC).In short, our results seem to suggest the utility of the application of the model, Taking Personal and SocialResponsibility as a way to promote the development of the levels of responsibility personal and social ofyoung in risk of pertaining to school failure and abandonment, being, still thus necessary to carry throughmore studies in the direction to corroborate for here joined us
SPORT, RESPOSIBILITY, EDUCATION, INTERVENTION, ADAPTEDPHYSICAL ACTIVITY
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Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Résumé
L'application d'un programme de développement de la responsabilité personnelle et sociale (Taking
Personal and Social Responsibility Model - TPSR) à travers le sport, chez les jeunes en risque d’échec
et d’abandon scolaire, a été notre objectif principal.
Notre échantillon était constitué d’un groupe de 26 élèves de l’Instituto Nun’Alvres, école en groupement
vertical avec cinq écoles du premier cycle de la vallée de l’ Ave. 9 étaient de sexe féminin et 17 de sexe
masculin.
De l’échantillon total, 6 avaient redoublé la cinquième, 12 avaient au moins deux années de retard par
rapport au niveau de scolarité espéré, 10 présentaient des problèmes disciplinaires ou d’intégration dans
la vie scolaire et 2 avaient été signalés par le Bureau Psychopédagogique comme étant des adolescents
à difficultés diverses (d’intégration et/ou de rendement académique). Quelques uns des élèves
présentaient simultanément plus qu’une des caractéristiques indiquées. L’échantillon a été divisé en
groupe expérimental (GE) (n=12) et groupe de contrôle (GC) (n=14).
Le travail semi-expérimental a été mené longitudinalement, et s’est développé au long de 25 séances
d’entraînement sportif dans le contexte du Grupo Desportivo Escolar – Multi-actividades.
Ont été employés les instruments d’évaluation suivants : Version portugaise de Physical Self-Perception
Profile (A. M. Fonseca & Fox, 2002); les questionnaires Escala de Disrupção Escolar Professada ( EDEP)
et Escala de Disrupção Escolar Inferida (EDEI) pour l’évaluation du comportement inadapté scolaire
avoué et inféré, élaboré par Veiga, (1991) ; Questionário de Satisfação com a Escola (Duda & Nicholls,
1992); questionnaires d’évaluation de Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Hellison,
1995) ; questionnaires d’évaluation du Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (Watson
& Newton, 2001). En complément de l’autoévaluation ont été utilisés des instruments de manière à
obtenir des données qui permettent de corroborer celles recueillies auprès des élèves eux mêmes.
A partir de l'analyse de résultats a devenu évidente, en premier lieu, l'inexistence de différences
statistiquement significatives entre GE et GC tant avant qu'après l'application du programme. Malgré de
cela, une analyse plus détaillée de l'évolution des élèves, a démontré ne pas être égale l’amplitude des
résultats individuels de chacun des groupes. Ces différences ont consisté à une diminution des
Problèmes de Comportement des élèves du groupe GE (dans 75% des élèves) avec plus grande
amplitude que à le groupe GC (dans 64% des élèves), dans une diminution également plus importante de
l'Ennui avec la vie scolaire dans le groupe GE (diminution dans 67% de l'Ennui á l'école) et dans les
Relations Interpersonnelles dans les élèves du GE (diminution de 58% dans l'Isolement Social). La
modification la plus importante, pour GE par rapport à GC, s'est vérifiée au niveau de l'augmentation des
valeurs relatifs à la Responsabilité Personnelle et Sociale (augmentation des niveaux de Responsabilité
Personnelle et Sociale pour 75% des élèves du GE et de 57% pour ce de GC).
En résumée, nos résultats semblent suggérer l'utilité de l'application du modèle, Taking Personal and
Social Responsibility comme un moyen pour promouvoir le développement des niveaux de responsabilité
personnelle et sociale de jeunes en risque d’échec et d’abandon scolaire, étant, encore ainsi, du
nécessaire réaliser plus études dans le but de corroborer les résultas trouvées par nous.
SPORT, RESPONSABILITÉ, EDUCATION, INTERVENTION, ACTIVITÉPSYSIQUE ADAPTÉE,
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LISTA DE ABREVIATURAS
AA Agressão à Autoridade Escolar
AC Autoconceito
ACA Autoconceito académico
ACE Autoconceito emocional
ACF Autoconceito físico
ACnA Autoconceito não académico
ACS Autoconceito social
AE Auto-estima
AP Agressão aos Colegas (Pares)
CD Comportamento disruptivo
cf. Confrontar, ver também
CG Comportamento Geral
DE Disrupção Escolar
DREN Direcção Regional de Educação do Norte
DRPS Desenvolvimento da responsabilidade pessoal e social
DT Distracção Transgressão
EDEI Escala de Disrupção Escolar Inferida
EDEP Escala de Disrupção Escolar Professada
EUA Estados Unidos da América
p. ex. Por exemplo
GC Grupo de controlo
GE Grupo experimental
Ho Hipótese nula
IE Insucesso escolar
Max. Máximo
MR Modelo de responsabilização
NEE Necessidades educativas especiais
NRPS Níveis de responsabilidade pessoal e social
org. Organizador
SE Sucesso escolar
StE Satisfação com a escola
SV Satisfação com a vida
TPSR Taking Personal and Social Responsibility
XXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Introdução
“ Os indivíduos que, no seu tempo, não se enquadraram na norma em relação à sua aparência
ou comportamento, sempre foram alvo dum tratamento diferente. Este tratamento variou do
cruel ao humano e vice-versa. Historicamente, aqueles que foram considerados “diferentes”
foram eliminados, torturados, exorcizados, esterilizados, ignorados, exilados, explorados, alvo
de piedade, cuidados, classificados, educados e até considerados divinos.”
Hewet and Forness, 1974α
A Escola é hoje um espaço a que todos têm acesso e o ensino em Portugal
(como no resto da Europa) é actualmente um bem a que todos têm direito.
Apesar destes progressos, continuam a existir na Escola alunos que não se
integram em parâmetros de “normalidade” e que, por isso, não têm as mesmas
oportunidades que os outros.
Muito se tem avançado no sentido de criar condições para que,
fundamentalmente durante os anos de educação escolar, todas as crianças e
jovens tenham acesso ao ensino, à cultura, ao lazer, à saúde, a condições de
vida dignas, ao afecto, ao desenvolvimento no seio da comunidade e a tantos
outros bens necessários à realização do ser humano de hoje.
Projectos de apoio, de integração e, mais recentemente, de inclusão têm sido
desenvolvidos de forma a permitir a cada um crescer, instruir-se, relacionar-se,
autonomizar-se, como é aspiração legítima de todos. Mesmo tendo em conta
toda esta evolução, no sentido da humanização da sociedade, um olhar pelas
nossas escolas mostra-nos uma realidade pouco desenvolvida nesse sentido.
Àqueles a quem são reconhecidas Necessidades Educativas Especiais (NEE)
é dado um lugar na escola e, numa grande parte dos casos, na escola da sua
α Hewet and Forness citados por DePauw & Gavron (1995) in Part II Sport and SportModifications. Disability and Sport. USA, Human Hinetics: 117 - 192
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Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
comunidade, muito embora havendo ainda caminho a fazer no sentido de lhes
dar o atendimento de que realmente necessitam.
A política integrativa (surgida das reformas educativas pós 25 de Abril de
1974), apesar de ter integrado na escola regular as crianças com NEE, deixou
sem direito a atendimento personalizado e, portanto, sem condições de justo
acesso ao sucesso, um grande número de crianças e jovens. Referimo-nos a
alunos com dificuldades de aprendizagem, de integração, ou em situação de
insucesso escolar, mas que não apresentam qualquer deficiência (tal como é
definida no âmbito médico).
Em consequência dessa política é publicado, em 1991, o Decreto-lei nº 319/91
que vem actualizar, à luz das novas concepções, a regulamentação da
integração dos alunos com Necessidades Educativas Especiais nas escolas
regulares ("Decreto Lei nº 319/91").
Na Introdução deste decreto chama-se a atenção para o facto da legislação
anteriormente em vigor carecer de “actualização e de alargamento” em virtude
da evolução sofrida pelos conceitos relativos à educação especial. Na mesma
introdução pode ler-se: “ (havendo a salientar...) a substituição da classificação
em diferentes categorias, baseadas em decisões de foro médico, pelo conceito
de «alunos com necessidades educativas especiais», baseado em critérios
pedagógicos”.
Neste decreto pode verificar-se já, pelo menos do ponto de vista dos conceitos,
o germinar de uma ideia de Inclusão, quando se refere ”A abertura da escola a
alunos com necessidades educativas especiais numa perspectiva de «escola
para todos»;...”
O mais recente impulso, em termos de enquadramento legal, foi dado em
Junho de 1994, em Espanha, na “Conferência Mundial Sobre Necessidades
Educativas Especiais: Acesso e Qualidade” com a Declaração de Salamanca
XXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
sobre os Princípios, a Política e as Práticas na área das Necessidades
Educativas Especiais e um Enquadramento da Acção (UNESCO, 1994).
Esta declaração dá corpo a um novo paradigma educativo (já patente no
discurso de estudiosos e na prática de outros tantos educadores) que tem
como base a convicção de que a educação verdadeiramente humanizante é
aquela que restitui à comunidade a responsabilidade da educação de todos os
seus membros.
Esta responsabilidade implica que todas as instituições ao serviço duma
comunidade se inspirem no princípio da Inclusão e assim devolvam a cada
cidadão um sentimento profundo de integração, de pertença, de unidade e de
direito de participação (Vasconcelos et al., 1999).
A Declaração de Salamanca reforça o direito de cada criança à educação; na
convicção de que cada ser humano tem características, interesses,
capacidades e necessidades de aprendizagem próprias e de que os sistemas
educativos devem respeitar a diversidade das características de cada aluno –
na pedagogia centrada na criança e no ensino que busca o sucesso indo ao
encontro das competências e necessidades referidas.
Na escola persiste (de forma latente) a crença de que a população estudantil é
homogénea, muito embora esta posição tenha sido banida do discurso
pedagógico de (quase) todos.
A aceitação da diversidade, a que se tenta responder através da
implementação da escola inclusiva, é muito exigente, uma vez que obriga a
que se busquem mais as estratégias eficazes para cada aluno do que soluções
universais (Stainback & Stainback, 1999).
De facto, com a generalidade das crianças e jovens na Escola, assistimos
actualmente à multiplicação dos problemas a enfrentar e ao aumento notável
XXIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
de esforço pedido aos professores, no sentido da busca das referidas
estratégias.
Nas nossas escolas existe um grande grupo de alunos que não acede ao
sucesso em termos educativos e que é caracterizado por apresentar
diferenças individuais, muitas vezes não passíveis da atribuição do estatuto de
NEE. Estes têm estilos de aprendizagem muito diversos e não se integram
bem no ambiente escolar, não obtendo, consequentemente, bons resultados
académicos. Estas dificuldades de integração e de sucesso representam,
fatalmente para muitas crianças e jovens, um sério risco de exclusão e de
abandono escolar.
As necessidades educativas deste tipo de alunos são consideradas especiais,
na medida em que os mesmos reúnem um conjunto de factores de risco de
insucesso. De acordo com a literatura consultada (M. H. D. Silva, Fonseca,
Alcoforado, & Vieira, 2004), estes factores aumentam a probabilidade de
abandono da escola e de fraco desenvolvimento de competências para a
integração social (quer na escola, quer no mundo do trabalho).
Alunos com estas características representam uma percentagem considerável
(porventura ainda não exactamente quantificada) dos jovens que se
matriculam no ensino obrigatório.
Um grupo de adolescentes como os que acabamos de descrever viria a
configurar o objecto do nosso estudo.
Começámos por estudar a literatura que nos permitiria uma abordagem
compreensiva dos problemas do sucesso escolar contextualizados na
realidade do Sistema Educativo Português (ver pp. 9-42).
Continuámos a nossa investigação tentando clarificar o contributo da educação
através do desporto na educação global de cada cidadão e, mais
especificamente, daquele que manifeste factores de risco de exclusão escolar
e, consequentemente, social (ver pp. 55-62).
XXV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
A questão que se colocou então foi: que modelo de intervenção pedagógica
deveríamos eleger como base da nossa actividade com o grupo específico de
jovens com que iríamos trabalhar?
Na tentativa de encontrar resposta iniciámos uma busca na literatura
disponível. Dos vários modelos de intervenção encontrados, optámos pelo
aprofundamento de um, referido como Taking Personal and Social
Risponsibility (TPSR), cujo autor, Don Hellison, tinha desempenhado funções
de professor de Educação Física e de treinador de grupos de jovens em
escolas de bairros de risco (ver pp. 65-72).
Os resultados que encontrámos na bibliografia referentes a este modelo de
intervenção pedagógica (Hellison, 1995), e o facto de não termos encontrado
registo da implementação em Portugal de um programa de desenvolvimento
da responsabilidade pessoal e social, de conteúdo desportivo, como forma de
contrariar o insucesso e o abandono escolares, serviram de motivação para o
nosso trabalho.
Um outro motivo para esta escolha prendeu-se com o facto de o conteúdo da
intervenção ser o treino desportivo, uma vez que este não só configurava a
área pedagógica de actuação do presente trabalho, como também continha
em si a virtualidade motivadora que representa o desporto para os jovens
adolescentes.
Após a constituição do grupo de alunos que seria alvo da intervenção e do
grupo de controlo iniciou-se a programação das sessões de treino
propriamente ditas e a sua execução (ver pp. 75-80).
Definidos os objectivos pedagógicos e os meios para os atingir foi necessário
escolher parâmetros e instrumentos de avaliação que nos permitissem
desenvolver o nosso estudo. De todas estas decisões demos conta no capítulo
relativo à Metodologia desta dissertação (ver pp. 81-94).
XXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Terminada a intervenção, debruçámo-nos sobre os dados recolhidos junto dos
alunos e junto dos seus professores, registando-os e discutindo a sua
importância para a consecução dos objectivos a que nos propusemos (ver pp.
95-120).
Finalmente, registámos as conclusões a que chegamos, deixando, para
trabalhos posteriores, algumas sugestões que nos pareceram pertinentes (ver
pp. 121-124).
XXVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
XXVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
XXIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1. Sucesso Educativo
1.1 Introdução
1.1.1 Sucesso educativo / Sucesso escolar
A sociedade humana e as suas instituições estão em evolução permanente.
Esta evolução dá-se em períodos que alternam entre grandes acelerações e
avanços tão lentos, que se confundem com estagnação e mesmo com
retrocesso.
As grandes mudanças sociais são lentas e imperceptíveis para quem as olha
a partir do seu próprio tempo. Só uma distância crítica razoável permite avaliar
verdadeiramente a qualidade e o sentido da mudança.
Assim, o impacto que determinada opção tem, em termos de paradigma
educativo em determinada sociedade, só à distância pode ser verdadeiramente
avaliado no que respeita aos resultados dos investimentos feitos.
Por isso mesmo, falar da escola de hoje ou de há vinte anos não é certamente
a mesma coisa. O tempo que nos está mais próximo provoca, na observação,
uma distorção da imagem tal qual ela é. Apesar disso, este fenómeno não
pode servir de justificação à habitual falta de avaliação e de sistematização na
recolha de indicadores fundamentais para orientação do ensino no futuro.
Mais dramática do que esta falta de informação (de feedback) a respeito da
escola no nosso país, é a febre revisionista de que este parece padecer
cronicamente. A uma reforma seguem-se outras que, ao invés de serem
informadas pelos resultados das anteriores, reflectem apenas a vontade de
fazer diferente, de mudar mesmo que seja só por mudar, independentemente
da pertinência da mudança e da eficácia do que se vinha fazendo.
XXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
É pois fundamental que, em época de grande mutação social como a que se
atravessa hoje ao nível do país, ao nível da Europa e ao nível mundial, se olhe
para os indicadores que vão sendo fornecidos pelo próprio sistema educativo e
por outras estruturas da nossa sociedade para que, com base nestes, se
definam linhas de sucesso educativo a que se quer dar prioridade.
Torna-se assim necessário, à partida, saber o que se entende por sucesso no
contexto do discurso educativo.
Segundo Joaquim Azevedo, educar “não é apenas escolarizar e certificar, é
fomentar a aquisição de saberes e o desenvolvimento de competências, é
estimular a aquisição de atitudes e de comportamentos capazes de
proporcionar uma cidadania responsável e uma capacidade renovada de
geração de formas superiores de vida em comum” (Azevedo, 2002, p.8)
O Sucesso Educativo é, para este e para outros autores, mais do que o
simples Sucesso Escolar. O Sucesso Educativo é mais abrangente e mede-se
na realização do cidadão em termos da sua capacidade de adaptação à
sociedade em que se integra e, paradoxalmente, simultaneamente em termos
da capacidade de intervir criativamente nessa mesma sociedade.
Ser um cidadão de sucesso, em termos educativos, é ser capaz de descobrir
aquilo que o distingue e aquilo que o identifica com os outros vivendo esta
descoberta como uma realização de si, no seu papel e no seu estatuto.
O sucesso educativo deve representar, para o indivíduo, a aquisição da
capacidade de aprender a conhecer, isto é, de ser capaz de compreender o
que se passa à sua volta; de aprender a fazer para poder agir e intervir no seu
envolvimento; de aprender a viver com os outros a fim de poder participar da
vida comum e assim tirar e dar proveito da sua riqueza pessoal; aprender a
ser, desenvolvendo atitudes de reflexão e de auto conhecimento, de forma a
XXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
buscar a sua autonomia, a sua capacidade de formular juízos, de escolher, de
decidir e de fazer opções esclarecidas (Delors et al., 1996).
É evidente que o restrito Sucesso Escolar, entendido como o avançar dentro
dos níveis definidos em cada ciclo de estudos, de forma mais ou menos
regular e com resultados académicos aceitáveis, em termos predefinidos, não
garante por si só o sucesso educativo do cidadão. Pela sua abrangência e
complexidade, o sucesso educativo resulta de um processo onde intervêm,
evidentemente, a escola, a sociedade em geral e, essencialmente, a família
com a sua circunstância.
Apesar disto, a escola e o sucesso no âmbito escolar, assumem um papel de
importância única no sucesso/felicidade do Homem de hoje. Malgrado o
desempenho insubstituível da família e dos outros intervenientes educativos, a
escola, pelo tempo que o jovem nela permanece, pelo envolvimento
comunitário que oferece, pela especificidade de competências que desenvolve
e pela oportunidade de redução das injustiças sociais que deve promover, é a
estrutura educativa por excelência da sociedade actual.
É pois fundamental buscar o Sucesso Escolar pelo que este representa, não
só para o aluno no presente, para o seu bem-estar em cada etapa do seu
desenvolvimento, mas também pelo que este significa, em termos de
realização futura, de autonomia, de inserção no mundo do trabalho e de
reconhecimento social.
No seguimento do que foi dito, aparece por oposição ao conceito de Sucesso
Escolar, o de Insucesso Escolar. Este é verdadeiramente importante no
contexto do presente trabalho pois é sobre este fenómeno, ou sobre algumas
expressões dele, que pretendemos actuar através do modelo de intervenção
Taking Personal and Social Responsibility (TPSR) (ver ponto ).
XXXII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
O Insucesso Escolar pode ser definido a vários níveis: “No senso comum falar
de insucesso é o mesmo que falar de reprovações (...) costumamos medir o
Insucesso Escolar pelas suas consequências – as repetições e os
abandonos”1.
A definição legal reporta para os mesmos parâmetros. Segundo João
Formosinho e Sousa Fernandes2, a definição legal de Insucesso Escolar é a
retenção e o abandono acrescentando que esta definição “pressupõe um
regime que, no fim de cada ano, compara o nível de conhecimentos obtido em
cada disciplina com um padrão mínimo”.
O Insucesso Escolar pode ser definido numa óptica mais centrada no aluno,
como seja “a grande dificuldade que pode experimentar uma criança com um
nível de inteligência normal ou superior, para acompanhar a formação escolar
correspondente à sua idade” (Martínez Muñiz, 1993, p.9), ou numa perspectiva
mais global e abrangente como se verifica na afirmação seguinte: “Muito do IE
das crianças é apenas o espelho do insucesso social e pedagógico que não
permite responder às suas necessidades” (V. Fonseca, 1999, p.519).
O Insucesso Escolar nem sempre foi reconhecido como um verdadeiro
problema. Este é um termo relativamente recente, pois, só a partir dos anos 40
começa a fazer parte da linguagem, inicialmente do discurso clínico e,
posteriormente, do discurso pedagógico de professores e pais (Duarte, 2000).
Até à década de 40, foi aceite como normal que uma grande parte dos alunos
abandonasse muito precocemente os estudos. Com a massificação da
escolaridade que se seguiu à II Guerra, o optimismo inicial dá lugar à evidência
de que existe, à partida, uma desigualdade de acesso à educação entre
grupos sociais diferentes.
O sonho da democratização da sociedade a partir da escola é contrariado por
vários estudos que provam que o acesso livre ao sistema de ensino e o1 Lemos Pires Rodrigues, Stoer, Magalhães, Barroso, Correia, Cortesão, Sarmento, Rodrigues,Ainscow, Ferreira, César, Roldão, Dee, Florian, Porter, Robertson, Pinto, Johnstone andBloemers (2003) p. 672 João Formosinho e Sousa Fernandes (idem.), p. 67
XXXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
incentivo ao estudo, acompanhados pela expansão das redes escolares, não
só não resolvem automaticamente as diferenças e os conflitos sociais, como
até os reproduzem. O atingir a expansão da democratização da escola não foi
sinónimo de democratização sociocultural (V. Fonseca, 1999).
Nas palavras de David Rodrigues “ o certo é que, pensada para ser a solução
de um problema, esta escola foi-se tornando parte do problema que tinha por
objectivo resolver” (Rodrigues, 2001, p.16).
Estudos realizados no campo da sociologia da educação (Duarte, 2000)
encontraram teses diversas para a explicação da dimensão discriminatória dos
sistemas educativos.
Segundo Lopes (2004)3, por exemplo, a desadaptação de algumas crianças à
escola foi explicada, logo desde o início do século XX, pela imposição de um
modelo único, inflexível que veiculava valores próprios de “uma burguesia
citadina diferentes e estranhos nos meios populares”.
Assim, as razões encontradas variavam desde as de ordem política,
sociológica, económica, cultural e individual às que se prendem com a
estrutura e com a maneira de actuar da própria instituição escolar; por
exemplo, quando determinado método se mostra eficaz para a maioria dos
alunos, a sua adopção generalizada gera fatalmente processos de segregação
para outras crianças (V. Fonseca, 1999).
A própria massificação do ensino, promovendo a “educação de massas”, agiu
contra o sucesso escolar, não só expandindo quantitativamente o Insucesso
Escolar como dando-lhe maior visibilidade e notoriedade (Rolla, 1994).
Por outro lado, paralelamente ao engrandecimento do problema do Insucesso
Escolar, dá-se, de certa maneira, uma desculpabilização da escola pois, ao dar
livre acesso a todos e verificando-se que a distribuição das situações de
3 In Silva, Fonseca, Alcoforado and Vieira (2004) p. 59
XXXIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
insucesso consubstanciava as desigualdades sociais, deixa-se subentender
que o problema é exterior à escola e, portanto, de forma alguma determinado
pela estrutura desta (Rolla, 1994).
Esta forma de pensar, comum entre muitos profissionais de educação e pais,
justifica, ainda hoje, o fracasso escolar, determinando a adopção de atitudes
passivas e fatalistas em relação ao problema que, inevitavelmente, tolhem a
capacidade de buscar soluções.
Em Portugal, o estudo do insucesso escolar foi acompanhando o dos outros
países ocidentais, embora com algum atraso atribuído ao isolamento em que
se viveu até aos anos 70.4
A preocupação, pós 25 de Abril, com a justiça social e as condições de acesso
ao sistema educativo conduziram à massificação crescente do ensino, mas foi
a persistência de problemas em torno do sucesso escolar que determinou a
proliferação de estudos sobre a educação (Cachadinha, 2004).
O Insucesso Escolar foi explicado, segundo Benavente (1989), inicialmente
pelas “maiores ou menores capacidades dos alunos, pela sua inteligência (e)
pelos seus dotes naturais” e, a partir dos finais dos anos 60, “pela pertença
social, pela maior ou menor bagagem cultural de que os alunos dispõem à
entrada na escola”. Finalmente, a partir de meados dos anos 70, reconhece-se
a “necessidade de diversidade e de diferenciação pedagógica pondo em
evidência o carácter activo da escola na produção do sucesso”5.
Os primeiros estudos que se realizaram em Portugal, no sentido de se
buscarem as raízes das desigualdades nos resultados escolares, datam de
19756. A partir dessa data muitos outros investigadores, particularmente da
Universidade do Minho, se debruçaram sobre esta problemática (Rolla, 1994).
4 Note-se a propósito que a expressão “democratização do ensino” começa a ser utilizada emPortugal a partir de 1970, aparecendo frequentemente nos discursos do então Ministro daEducação Veiga Simão Carvalho (1986) 5 In Almeida and Ramos (1992) p. 76 Angelo, Vítor, “O ensino discriminatório: liceu e escola técnica resultados de um inquérito,Análise Social”, nº 44, vol. XI, 1975 in Rolla (1994)
XXXV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Definir Insucesso Escolar para melhor delimitar e entender as suas causas e
consequências e assim propor estratégias (globais e individuais) que permitam
minimizar o problema ao nível de cada aluno, não é uma tarefa fácil para a
investigação em educação (Delgado & Gárcia López, 1994) mas é, sem
dúvida, uma tarefa obrigatória.
XXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.1.2 Finalidades do ensino
De uma forma geral, pode dizer-se que o Insucesso Escolar é a situação
resultante do não atingir as finalidades da educação. Por isso se torna
importante que o conhecimento das mesmas instrua todas as tarefas
educativas.
A educação escolar tem como finalidades, nas palavras de Sousa Fernandes
(1987)7, “instruir, estimular e socializar os educandos”.
Para Joaquim Azevedo (2002), à Escola cabe a tarefa de promover a aquisição
de saberes, o desenvolvimento de competências, de atitudes e de
comportamentos que permitem o exercício de uma cidadania responsável. São
estas as finalidades do ensino segundo o referido autor.
Segundo Vítor da Fonseca, (1999, p. 511), “A finalidade da escola é
proporcionar a todas as crianças (...) o desenvolvimento do seu potencial e o
prazer da cultura adquirida pela experiência social das gerações
antecedentes”.
Em relação a este assunto, pode ler-se na Lei de Bases do Sistema Educativo
português que este deve contribuir para o desenvolvimento pleno e
harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de
cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários, valorizando ainda a
dimensão humana do trabalho. É, pois, com base no conhecimento destas
finalidades que será possível ir analisando a acção educativa com vista à
avaliação do seu próprio sucesso ("Lei de Bases do Sistema Educativo",
1998).
Nesta análise, à medida que nos afastamos dos objectivos de ensino mais
globais e nos centramos na realidade de cada nível de escolaridade, de cada
7 In Ibid. p.5.
XXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
comunidade e de cada escola, o conceito de Insucesso Escolar vai-se
tornando menos teórico com mais necessidade de maior objectivação.
Embora não seja um problema unicamente português, pois estudos mostram
que se debatem com o fracasso escolar países como os Estados Unidos da
América, Canadá, Países Baixos, Dinamarca e França (Lopes, 2002), em
Portugal o Insucesso Escolar assume, no entanto, maior gravidade.
Apesar dessa gravidade, traços de alguma evolução aparecem também na
literatura disponível, por exemplo, Benavente concluiu, num estudo publicado
em 19968 e realizado com uma amostra representativa da população de
Portugal Continental, que, embora a situação de literacia da época só fosse
comparável à da Polónia, sendo bastante pior que a do Canadá, Alemanha,
Holanda, Suécia, Suíça e Estados Unidos da América (países com indicadores
de desenvolvimento muito superiores aos portugueses), ela tinha evoluído
positivamente nas últimas gerações.
Corrobora esta ideia a constatação de que, mesmo tendo em consideração o
decréscimo de população escolar explicado pela diminuição demográfica, a
verdade é que são cada vez mais numerosos os cidadãos que terminam com
êxito o 3º Ciclo. Em 2001, este valor foi de 67%, contra 35% em 1991
("População Escolar no Ensino Básico Obrigatório", 2001).
Em 1999, apenas 23,8% da população do grupo etário 25-59 tinha obtido o 12º
ano. Tendo em conta a recuperação e o investimento feito na educação nos
últimos anos, calcula-se que atingiremos aproximadamente em 2015, a actual
média europeia.
No entanto, se considerarmos que a média europeia manterá a tendência de
evolução actual, só por volta de 2025 Portugal atingirá o valor médio de
qualificação dos países da União (Azevedo, 2001).
8 Benavente (coord.), Rosa, Costa e Ávila, 1996.
XXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Não obstante a evolução positiva que se vem a verificar, particularmente nos
últimos 6 anos, a relação reprovação/abandono mantém-se: 70% dos
abandonos (antes dos 16 anos) correspondem a alunos repetentes (na sua
maioria no 2º ciclo) e este facto por si só representa uma forte contrariedade à
prossecução das finalidades do ensino ("População Escolar no Ensino Básico
Obrigatório", 2001).
O optimismo dos números pode, na opinião de vários autores (Abrantes, 2001;
Azevedo, 2001; V. Fonseca, 1999; ME, 2003; Rolla, 1994), esconder um
problema latente: o insucesso que se manifesta numa taxa de retenções ainda
elevada e na persistência de baixos níveis de qualificação dos nossos alunos
comparativamente com os seus colegas europeus (ME, 2004).
A este propósito, Joaquim Azevedo chama a atenção para o facto de que o
súbito aumento da taxa de aproveitamento possa reflectir apenas um conjunto
de medidas administrativas que escondem ainda o verdadeiro problema, que é
o de promover o desenvolvimento adequado de todas a crianças, mesmo das
que têm dificuldades de aprendizagem. (Azevedo, 2001).
Daqui decorre que melhorias quantitativas do sistema educativo devem ser
olhadas com verdadeira parcimónia. Importa sobretudo fazer com que todos os
envolvidos na esfera da educação se preocupem mais com a evolução
qualitativa do referido sistema.
O atingir das finalidades primeiras da Educação está ainda comprometido,
exigindo um grande esforço nacional.
Sem um investimento sério na educação básica, ao nível de um verdadeiro
pacto nacional, não será possível mudar o nosso panorama se tivermos como
referência a qualidade, a competitividade e a vivência de uma democracia mais
plena, a exemplo da dos outros países da Europa e do mundo chamado
civilizado (Delors et al., 1996).
XXXIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.1.3 Desigualdades de acesso ao sucesso
Vencida que foi a batalha da massificação da escolaridade, não foram dadas
respostas eficazes ao problema da alta taxa de retenção que ainda se verifica
nas escolas (nomeadamente do ensino básico), e para o decorrente abandono
dos estudos que geralmente lhe está associado.
Nas palavras de Joaquim Azevedo “às políticas de democratização do acesso
aos benefícios educacionais não terá correspondido uma idêntica e persistente
política de procura de maior igualdade no sucesso e na obtenção genérica de
resultados equivalentes para todos os cidadãos” (Azevedo, 2001, p.40).
Em Portugal, verifica-se que, apesar da legislação favorável ("Lei de Bases do
Sistema Educativo", 1998), os cidadãos não são verdadeiramente iguais
perante o acesso à educação. Tal igualdade existe, eventualmente, apenas no
acesso à escola, uma vez que, após a entrada do aluno na instituição escolar,
toda a assimetria sociocultural e económica se abate sobre este (Rolla, 1994).
Segundo um estudo de Bártolo Campos9, é maior a percentagem de alunos
que reprovam no ensino básico provenientes de famílias de nível
socioeconómico baixo. No mesmo trabalho, o autor afirma ainda que “ a maior
parte dos alunos que reprovam (no 1º ou 2º ciclos) não continua a
escolaridade” e assim se mantém, por um fenómeno de reprodução social, o
nível sociocultural de uma geração na geração seguinte.
Referindo-se a factores premonitórios de insucesso, Perret-Clermont (1978)10
chama a atenção para a interacção de vários factores, evidenciando que “Não
é (por exemplo) a classe social, em si mesma, a responsável pelos atrasos de
desenvolvimento intelectual ou escolar, mas sim uma forma de carência social
que se lhe encontra estreitamente ligada”. Por outras palavras, estudos
afirmam que nem todas as crianças de “bairros pobres” abandonam
9 CAMPOS, Bártolo Paiva – Projectos escolares e profissionais dos jovens. Cadernos deConsulta Psicológica. 1985 (1) in Azevedo (2001) p. 3810 Perret-Clermont, 1978, in Silva, Fonseca, Alcoforado and Vieira (2004) p. 149
XL
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
precocemente a escola há as que o fazem e as que continuam a sua
escolaridade. Apesar disso é claro, nos estudos referidos, que o abandono
escolar precoce é um fenómeno fortemente ligado à exclusão social.
As assimetrias geográficas são também o reflexo desta realidade. Num estudo
de 1999/2000 feito pelo Ministério da Educação, a taxa bruta de
escolarização11 para cidadãos entre os 15 e os 17 anos era de 74,6 para a
Região Norte e de 105,8 para Lisboa e Vale do Tejo (Azevedo, 2001, p.41).
Embora estes valores possam ser explicados por vários fenómenos (por
exemplo, o número de retenções ou alunos deslocados para escolas de outra
localidade), a verdade é que a diferença evidenciada é considerável.
Outros estudos chamam a atenção para o facto de que, se as assimetrias
regionais poderão explicar parte dos problemas de insucesso escolar, outros
factores parecem sobrepor-se a estas no caso actual português pois, segundo
conclusões de um estudo coordenado por Valadares Tavares do Instituto
Superior Técnico sobre a qualidade do ensino Secundário em Portugal, as
assimetrias, nomeadamente as económicas do país “não serão as únicas
causas do insucesso escolar, pesando para isso outros factores como seja o
clima da escola, a qualidade pedagógica ou o corpo docente” ("Factor
Económico Não Explica o Insucesso", 2003).
Da qualidade da intervenção pedagógica pode também resultar, em última
análise, a qualidade da aprendizagem dos alunos e o sucesso escolar dos
mesmos, uma vez que, dentro de uma mesma região, se podem encontrar
escolas que se destacam pela positiva quando o seu enquadramento
geográfico faria supor o contrário.
Poderemos concluir pelo exposto que, ao não serem capazes de
verdadeiramente reduzir estas assimetrias à partida, as políticas educativas (e
11 Taxa Bruta de Escolarização resulta da divisão do somatório de alunos que frequentam umdeterminado nível de ensino pelo total da população a cuja faixa etária corresponde afrequência esse nível de ensino. É a razão entre os alunos realmente matriculados emdeterminado ano ou ciclo e a população que, de acordo com a regulamentação oficial, deveriaestar a frequentar esse mesmo ano ou ciclo de ensino
XLI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
a política social em geral) falharam. Lograram apenas liberalizar a abertura da
“porta de entrada” das escolas a todos, reservando, a uma parte significativa
da população, a descoberta de uma “caixa negra” onde a esperava a retenção,
a exclusão e o insucesso educativo (Azevedo, 2001).
João Barroso (2003) chama a este fenómeno de insucesso educativo, a
“Inclusão Exclusiva”, de certa forma fabricado pelo modo de actuar da escola,
onde o que está em causa é a imposição de modelos de intervenção
pedagógica que em nada se adequam às necessidades educativas daqueles
que estão na escola (“desfasamento entre a oferta e a procura”) (Rodrigues,
2003).
Uma educação de qualidade, onde se adquiram conhecimentos e
competências necessárias, é hoje fundamental, seja para o exercício da
cidadania plena, para a obtenção e manutenção do emprego ou para a
melhoria da produtividade ao longo da vida. O insucesso escolar é um golpe
premonitório do insucesso humano dos cidadãos (Macrae, Maguire, &
Milbourne, 2003). Os excluídos da escola hoje serão provavelmente os
excluídos da sociedade amanhã.
Estudos apontam no sentido de que, para muitas crianças, parece haver um
processo cumulativo e dinâmico de adversidades e privações desde a infância
até à idade adulta. Os problemas e as carências vão surgindo e vão-se
agravando ao longo das suas histórias, verificando-se que “ (...) as dificuldades
de aprendizagem, a rejeição pelos colegas, o insucesso escolar, a falta de
supervisão dos pais, a influência do bando de colegas desviantes, o abandono
precoce da escola, a falta de competências profissionais, o desemprego...”
sucedem-se construindo um percurso cada vez mais desviante (M. H. D. Silva,
Fonseca, Alcoforado, & Vieira, 2004, p.30).
A este propósito pode ler-se também no relatório para a UNESCO da
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI: “É necessário que
XLII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
os próprios sistemas educativos não conduzam, por si mesmos, a situações de
exclusão. (...) Então o insucesso escolar surge como irreversível, e dá origem,
frequentemente à marginalização e exclusão sociais. ” Mais adiante, em
relação aos alunos que abandonam precocemente o sistema de ensino, pode
ler-se: “Alguns deles (...), sem capacidade de emprego, ficam definitivamente
excluídos do mundo do trabalho, e privados de qualquer possibilidade de
inserção social” (Delors et al., 1996, p.48).
A nível da União Europeia poderemos verificar a existência de enquadramento
legal que procura a garantia do direito à educação de qualidade para todos: “...
As escolas devem ajustar (-se) a todas as crianças, independentemente das
suas condições físicas, sociais, linguísticas ou outras. (...) As escolas terão que
encontrar formas de educar com sucesso estas crianças, incluindo aquelas
que apresentam incapacidades graves (UNESCO, 1994).”
É também no sentido da promoção do sucesso escolar para todos e para cada
um que aponta a Lei de Bases do Sistema Educativo português.
No § 2º, art. 2º pode ler-se: «É da especial responsabilidade do Estado
promover a democratização do ensino, garantindo o direito a uma justa e
efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares» ("Lei de
Bases do Sistema Educativo", 1998).
Mais adiante, o art. 3º, continua: «O sistema educativo organiza-se de forma a
(...) Assegurar o direito à diferença, mercê do respeito pelas personalidades e
pelos projectos individuais da existência, bem como da consideração e
valorização dos diferentes saberes e culturas».
Num outro documento, orientador da recente reforma do Ensino Básico,
podemos encontrar a mesma preocupação: “ Ainda hoje, muitos alunos não
completam a escolaridade obrigatória na idade normal e muitos outros, quando
o fazem, não têm os conhecimentos e competências que a educação básica
lhes devia proporcionar. Na verdade, a escola, como está organizada, não tem
sido capaz de lidar com a complexidade dos problemas e com a diversidade de
XLIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
situações que a educação a todos coloca, na sociedade actual.” (Gestão
Flexível do Currículo, 1999, p.5)
Mais recentemente, noutro documento preparatório da Reforma Curricular do
Ensino Básico, podia ler-se: “Gerir um currículo significa procurar maneiras
adequadas para que todos aprendam” (Abrantes, 2001, p.5).
Em conclusão, poder-se-ia dizer que, sendo muito variadas as causas do
insucesso escolar, estas podem centrar-se aos mais diversos níveis desde
definição da política educativa, da organização curricular (este nível será
abordado noutro capítulo), até ao nível da estrutura do ciclo de estudos, da
escola, do meio envolvente, da família, dos pares, dos professores e do próprio
aluno.
Enfrentar com determinação este problema exige que se implementem
medidas motivadoras e programas com estratégias mais adequadas a cada
situação.
Para muitos autores, estas medidas passam obrigatoriamente pelo
reconhecimento da grande diversidade em que se dá o desenvolvimento
humano na sociedade actual (Azevedo, Silva, & Fonseca, 2000) e pela
consequente exclusão de formas de ensino rigidamente estandardizadas
(Delors et al., 1996).
XLIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
XLV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.2. Condicionantes do sucesso escolar
1.2.1 A Escola
A Escola sempre tem acompanhado a sociedade humana ao longo do tempo.
Das cerimónias de iniciação tribal aos mais sofisticados centros educativos,
passando pela escola para onde os meninos gregos se dirigiam
acompanhados pelo seu pedagogo12, pelo mosteiro medieval, pelos
seminários, pelas colegiadas, pelas universidades, pelos institutos e pelos
centros educativos, a vida das comunidades passa inexoravelmente pela vida
da Escola (Carvalho, 1986).
“A Escola é um produto do processo de modernização” (Tedesco, 1999, p.13)
e não há tempo onde se possa imaginar uma comunidade humana sem
escola, seja qual for o significado que para essa comunidade a expressão
assuma.
A Escola ocupa o discurso político da actualidade. Desde o autarca da vila
mais remota, ao representante da instituição mundial mais abrangente, a
Escola, o que dela se espera, o que nela se faz é um tópico obrigatoriamente
presente.
Os cidadãos envolvidos actualmente (em sentido lato) com a Escola
representam uma grande fatia dos cidadãos de qualquer nação: considerem-se
neste grupo os alunos, pais, professores, funcionários, técnicos (psicólogos,
terapeutas...), administrativos, um mundo de gente cujas vidas se desenrolam
em torno dela.
As comunidades, as famílias, o turismo e até o trânsito das cidades vivem hoje
ao ritmo e ao sabor da Escola.
12 “Escravo acompanhante” – não deixa de ser um conceito verdadeiramente surpreendente.
XLVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
O porquê desta notoriedade reside no facto de que é à Escola que está
entregue o papel supremo de preparar os novos cidadãos.
Assim, a Escola é o garante da sobrevivência da comunidade tal como é, e é,
ao mesmo tempo, a promessa da renovação. É a cultura de um povo que se
transmite e é a cultura de um povo que se constrói.
Apesar desta notoriedade, a relação Escola/Sociedade não é, e isto não é
novo na História das ambas, uma relação pacífica.
Na escola encontram-se, na pessoa do aluno, dois tipos de saberes: aqueles
que a criança traz consigo (fruto da socialização feita no seio da família e da
comunidade mais próxima) e os saberes transmitidos pela própria Escola.
Da relação entre estas duas culturas (familiar e escolar) resulta a integração do
aluno e o nível de aceitação que a escola vai obter de determinada
comunidade (Cachadinha, 2004; Santos, 1993).
Por este motivo, a Escola está condenada a ser um pomo de tensões, onde os
paradigmas vigentes de determinada sociedade ditam as variações de rumo,
ora em direcção à integração social do cidadão, ora em direcção ao
desenvolvimento pessoal e autónomo do mesmo.
Por ser a Escola ponto de encontro de contradições, os sistemas educativos
são aqueles que, com mais frequência, são alvo de “reformas”. Esta vontade
constante de mudar a Escola, tão típica dos nossos dias, resulta do facto da
sociedade viver a ansiedade de esta não estar a cumprir os fins para que foi
criada (Tedesco, 1999).
De qualquer maneira, toda a educação está organizada para um futuro que
ainda não é presente, e, por isso, representa sempre uma aposta em algo que
apenas parcialmente se pode adivinhar. As decisões, que a qualquer nível se
tomam em relação à Escola, são sempre resultantes da presunção do
conhecimento dum contexto e da sua projecção num futuro irremediavelmente
intuído.
XLVII
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Não é, pois, de admirar que a Escola não satisfaça nunca verdadeiramente
aqueles que a olham.
A vida humana, que serve de pressuposto à educação, é movimento para o
futuro (Vasconcelos et al., 1999).
Assim, da Escola, em termos latos, espera-se que seja o garante da cultura de
determinada comunidade e, ao mesmo tempo, o motor da mudança dessa
mesma cultura.
É da própria natureza da Escola evoluir entre a pressão social que, por um
lado, lhe exige a passagem do testemunho cultural das gerações anteriores
(Delors et al., 1996) e, por outro, a preparação para os desafios do futuro.
É também intrínseca à natureza da Escola a capacidade de provocar os
processos de evolução internos que garantam a sua própria existência como
instituição (Vasconcelos et al., 1999).
À Escola exige-se que seja, ao mesmo tempo, socializadora e promotora de
personalização. Às novas gerações é permitido e desejado que, através da
educação, se insiram na sociedade e que, através da mesma educação, lhes
sejam fornecidos contemporaneamente os meios para se libertarem e criarem
nova cultura.
Esta pressão é muito mais forte hoje numa Escola que, mercê da alteração da
constituição e do papel da família, assume muita da responsabilidade de
transmitir valores (culturais e não só) aos jovens, ao mesmo tempo que muito
lhe é pedido no sentido da atenção ao indivíduo e ao desenvolvimento das
suas competências pessoais (Tedesco, 1999).
Concretamente, é pedida à Escola a garantia do princípio da homogeneidade
no que respeita à incorporação de valores e normas comuns à sociedade, e o
respeito e valorização da diversidade dos indivíduos e dos grupos humanos
que a povoam (Delors et al., 1996).
XLVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
A cada sociedade, em cada momento específico da sua história, compete
definir então o que espera da sua Escola, isto é, quais as grandes finalidades
que atribui ao sistema, mais ou menos complexo, a que chama Educativo.
Esta inquietação obriga a que se definam objectivos e se determinem os meios
da actividade educativa, desde o nível mais elevado de responsabilidade do
sistema – o nível central de decisão política – até ao nível de cada escola, de
acordo com o grau de autonomia que lhe for dado e que esta tomar (porque na
autonomia das instituições como na das pessoas, a força da convicção é da
maior importância).
O que ensinar, como ensinar, a quem ensinar e para quê ensinar, devem ser
as grandes preocupações dos responsáveis pela educação aos mais variados
níveis.
XLIX
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1.2.2 O currículo
O responder às questões educativas que se prendem com o que ensinar leva-
-nos à noção de currículo.
O termo currículo é frequentemente utilizado com significados diferentes:
curso, plano de estudos, conjunto de objectivos, programa ou tudo o que
acontece na escola.
Currículo, palavra que tradicionalmente designava o conjunto das disciplinas, é
um conceito relativamente recente nos sistemas educativos. Em Portugal, por
exemplo, o termo e o conceito começam a ser utilizados a partir da década de
setenta (Freitas, 2000).
Herdando dos ancestrais hábitos de organização do ensino o significado de
“conjunto de disciplinas”, o currículo escolar dos alunos foi, no entanto,
enriquecido com actividades que todos os agentes educativos achavam
importantes para a educação. Eram então chamadas actividades “circum-
escolares” ou, mais tarde, “actividades extracurriculares”.
O currículo, numa linguagem do dia-a-dia das escolas, podia (e pode ainda)
ser também definido como sinónimo de um conjunto articulado de normativos
programáticos (Roldão, 1998).
Segundo Skilbeck (1985)13, o currículo é “uma representação dos valores,
significados e padrões de vida e, simultaneamente, uma fonte de
conhecimentos, compreensões, técnicas, destrezas e estratégias necessárias
para o desenvolvimento pessoal e social do sujeito”.
O termo “currículo” foi tendo assim uma maior abrangência e aparece-nos hoje
como um constructo compreensivo, que tem em conta a natureza complexa do
desenvolvimento do ser humano.
13 In Diogo and Vilar (1998) p. 13
L
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Nas palavras de Paulo Abrantes14 currículo “é um conjunto de experiências de
aprendizagem que se proporciona aos alunos com uma certa intenção e uma
determinada organização” (Abrantes, 2001, p.3).
É esta definição que, não libertando a Administração Central do Sistema
Educativo da tomada de decisões em relação ao currículo prescrito, constitui o
referencial ou matriz para o desenvolvimento dos outros níveis de currículo.
Põe o protagonismo maior na Escola, através do trabalho cooperativo entre os
professores e através do conhecimento que estes tenham dos alunos e dos
seus contextos (Diogo & Vilar, 1998).
A realização do currículo sai assim do âmbito restrito, da responsabilidade
única e fatiada do professor dentro da sua sala de aula, e envolve todo o
espaço e toda a relação entre professores, alunos e comunidade, num
ambiente intensamente educativo que visa o maior desenvolvimento de cada
um.
Nesta noção compreensiva do currículo, as referidas actividades
extracurriculares ou circum-escolares passam a ser integradas no conceito,
pois há estratégias e espaços de aprendizagem dentro 15 da escola que não se
confinam às aulas propriamente ditas nem aos conteúdos específicos de
nenhuma disciplina.
Assim, o currículo, seja ao seu nível mais central (prescrito) seja ao nível do
modo como cada aluno o vive (concretizado), resulta de um encadeamento de
acções e de reflexões dos agentes educativos, que garante a qualidade do
ensino em todas as escolas, a existência de uma unidade básica (nacional)
nos saberes considerados nucleares e, simultaneamente, o respeito por cada
aluno, porque, em última análise, é neste que verdadeiramente se concretizam
todos os níveis de programação curricular.
14 Director do Departamento de Educação Básica em 200115 Neste contexto “dentro” não se reporta ao espaço físico da escola mas, sim, ao conjunto deaprendizagens pelas quais a escola deve proporcionar aos alunos em conjunto com toda acomunidade educativa.
LI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Para implementar a riqueza do currículo ao nível da realização de cada aluno
em particular, deve o currículo nacional, core curriculum, permitir uma gestão
flexível e uma funcionalidade que o adeqúe aos contextos específicos de cada
escola, assegurando, simultaneamente, a existência de referenciais nacionais
de qualidade de modo a “garantir a definição de saberes fundamentais ou
primordiais a adquirir por todos os cidadãos na sociedade de hoje”.
(Vasconcelos et al., 1999, p.42).
Defendendo uma ideia de “funcionalidade do currículo” muitos autores estão
de acordo que este deve, em todos os níveis de programação, ser construído
fundamentalmente como um instrumento de trabalho, organizado em função
de todos os alunos (e de cada aluno), recusando-se por isso qualquer modelo
teórico rígido (Vieira et al., 2003).
Desta forma, cabe aos vários agentes educativos estudar, implementar,
avaliar, corrigir e passar de novo à prática/acção os modelos de intervenção
pedagógica que melhor se adaptem ao aluno/pessoa que se tem na frente.
LII
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1.2.3 O aluno
As últimas afirmações que fizemos levam-nos a uma segunda preocupação
que ocupa os responsáveis pelo ensino: a quem se destina o ensino? Ou de
outra forma; quem são os alunos hoje?
Graças à democratização do ensino a que assistimos nas últimas décadas, o
aluno que hoje podemos encontrar nas nossas escolas, mormente ao nível do
ensino básico, corresponde à quase totalidade da população existente no
escalão etário correspondente.
Embora muitos adolescentes abandonem o sistema educativo precocemente,
entre os 10 e os 15 anos, e de um número considerável de alunos sair do
mesmo sistema após os 18 anos sem ter completado o 3º ciclo ("Abandono e
Insucesso Escolar", 2005), o facto é que este número é relativamente baixo
quando comparado com valores de há 10 anos, por exemplo.
Entre 1991 e 2001, a população de portugueses entre os 25 e os 64 anos que
completou o 9º ano quase duplicou passando de 7,4% para 13,4%
("População Escolar no Ensino Básico Obrigatório", 2001).
Não se podendo, pelo exposto, concluir que o ensino básico em Portugal
atingiu a totalidade da população em idade escolar, teremos que reconhecer
que a margem em falta, no que respeita à obrigação de matrícula, é
praticamente insignificante e que esta é, de acordo com todos os indicadores
de que dispomos, uma batalha ganha.
Esta situação coloca, como fomos mostrando anteriormente, outro tipo de
desafios. O objectivo da democratização do acesso ao ensino foi substituído
por um outro muito mais exigente, o da democratização do sucesso educativo.
Uma vez que o direito à educação é reconhecido a todo o ser humano
("Declaração Universal dos Direitos Humanos") e que se admite que o
Insucesso Escolar representa uma espécie de fatalidade social sendo
LIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
precursor do Insucesso Educativo e gerador de exclusão16 (Macrae, Maguire, &
Milbourne, 2003; M. H. D. Silva, Fonseca, Alcoforado, & Vieira, 2004), a Escola
é tão frequentemente acusada de ser um factor de exclusão, como solicitada
como a instituição chave para a integração ou reintegração do cidadão (Delors
et al., 1996).
As áreas de conhecimento, que têm em consideração os dados das ciências
do desenvolvimento humano, são unânimes em proclamar que todas as
crianças são diferentes, uma vez que provêm de meios socioculturais diversos,
mesmo que geograficamente coincidentes, que transportam consigo um
património genético e social absolutamente ímpar, e que, para além disso,
manifestam diferenças nas tendências, preferências, apetências e dificuldades
pessoais na sua forma de apreender a realidade, de se relacionar com o (s)
saber (es) e de mobilizar os seus conhecimentos.
Aquilo de que determinada criança tem necessidade, que é apreendido como
um valor no seu ambiente familiar ou grupal, aquilo que para ela é
verdadeiramente significativo em termos da sua motivação e, o que ela é
capaz de fazer e produzir em termos de produto de aprendizagem, é tão
variado quantas as pessoas que existem dentro de cada escola. Como dar
então oportunidade a todos de se desenvolverem num panorama de
diversidade tão profundo?
É longa a história de discriminação ao longo dos tempos, dentro dos sistemas
educativos.
Desde a discriminação social predominante em todos os sistemas do passado,
da História nacional (e internacional) dos tempos medievais; do Renascimento
onde a classe social continuou a determinar quem tinha e quem não tinha
acesso à escola; desde as primeiras experiências em que se admitiu que
crianças com deficiências poderiam ser, de alguma forma, educadas (mesmo
16 Estando na origem de marginalizações, violência e desintegração social – o que muitocontribui para a destruição do tecido social.
LIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
que para isso fosse necessário separá-las da sua família e dos outros da sua
idade); atravessando os tempos em que os homens tinham direito a um nível
de ensino a que as mulheres não podiam sequer aspirar (relembramos aqui
que faleceu muito recentemente a primeira engenheira formada em Portugal17),
em que para os filhos das classes socialmente consideradas superiores havia
um tipo de escola e para os filhos dos trabalhadores, mesmo quando de
reconhecido valor, havia outro18; considerando ainda o longo trajecto percorrido
durante o século XX no sentido de se reconhecer o direito à educação a todos
os cidadãos, independentemente da sua origem, raça, género, etnia, religião
ou filiação política; quando olhamos a nossa História, através de todas estas
transformações e revoluções, não podemos deixar de verificar que longo e
humanizante foi o caminho percorrido.
Temos hoje praticamente todas as crianças e jovens dentro da escola.
O desafio que esta situação nos põe é o desafio da Diversidade19.
Como educar com sucesso todos e cada um como é apanágio das finalidades
dos Sistemas Educativos actuais?
Como ponto de partida para qualquer abordagem educativa inclusiva, parece-
nos pertinente que se reconheça que a diversidade e a diferença existem.
“A normalidade ideal imposta, o mito da uniformidade cultural, a exigência da
adaptação da criança à escola, constituem uma panóplia de ideias enraizadas
na cultura escolar que têm que ser abandonadas”(A. Pereira, 2004, p.59).
A escola não pode alhear-se do facto de que, muito embora muitas crianças
aprendam através de estratégias e de processos comuns, outras há, e haverá
sempre, para quem estes mecanismos se desenrolam de uma maneira
peculiar.
17 Referimo-nos a Doutora Maria de Lurdes Pintassilgo referência de vulto da cultura nacionalda actualidade.18 Referimo-nos aos Liceus e Escolas Técnicas reconhecendo, apesar do acessodiscriminatório, a qualidade do ensino ministrado de acordo com os parâmetros da época.19 Segundo João Barroso a Diversidade é a “capacidade de a escola incorporar a diversidade deexperiências e projectos de vida dos alunos e das suas comunidades de pertença” Rodrigues(org.), Stoer, Magalhães, Barroso, Correia, Cortesão, Sarmento, Rodrigues, Ainscow, Ferreira,César, Roldão, Dee, Florian, Porter, Robertson, Pinto, Johnstone and Bloemers (2003)
LV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Sendo cada criança um ser único e sendo a instituição escolar quem
normalmente determina o ritmo de progressão do ensino, como garantir que o
segundo respeita o primeiro?
Um sistema refém de uma ideologia igualitarista não pode abrir o acesso a
percursos escolares diferenciados e não pode garantir, então, o direito
individual a uma educação adequada a diferentes culturas, a diferentes
interesses, a diferentes talentos e a diferentes aspirações.
Este sistema, esta Escola, este professor não estão verdadeiramente a
respeitar o aluno que têm diante de si.
O respeito pelo aluno exige da parte da escola uma evolução na atitude de
todos os intervenientes no sistema educativo.
Esta evolução partirá do estudo e da reflexão dos referidos intervenientes,
muito particularmente dos professores, sobre a realidade social, política e
cultural do mundo actual e sobre o papel de cada um na escola do presente.
A compreensão desta actualidade permitirá ao professor conhecer melhor os
alunos e, consequentemente, eleger os métodos, as estratégias e os
procedimentos mais adequados à sua acção.
Todo este processo implica a interiorização de uma forma de estar mais atenta
por parte de todos os agentes educativos, respeitando o universo que vai em
cada aluno com o seu passado, a sua cultura, as suas expectativas, as suas
necessidades e a sua forma de aprender.
LVI
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1.2.4 Os métodos
Várias foram as respostas encontradas para fazer face ao problema da
diversidade, ao longo do último século. Desde as escolas especiais para
crianças com “deficiências” legalmente e socialmente reconhecidas (Bautista
Jiménez, 1997), até ao reconhecimento de que a escola deve estar preparada
para atender todos os seus alunos nas suas necessidades educativas
pessoais, sem que estas sejam motivo para discriminação, longo foi o percurso
e vários os modelos de ensino implementados.
Apesar das suas características, dificuldades, capacidades, origem familiar e
comunitária e da sua história pessoal, todo o aluno tem direito a fazer parte da
escola regular do seu bairro, da sua freguesia, e sentir-se parte da sua
comunidade.
Esta é a base de uma filosofia educativa que se materializará em diversificados
projectos a partir do fim da década de 80 (Correia, 2003; Rodrigues, 2003;
Stainback & Stainback, 1999; Vasconcelos et al., 1999; Whittaker & Kenworth,
1999). Referimo-nos à Filosofia Inclusiva.
A Inclusão impõe encontrar soluções que busquem o sucesso das crianças e
jovens articulando os meios necessários e os apoios adequados, promovendo
as atitudes mais frutíferas por parte dos educadores, conjugando expectativas,
necessidades e capacidades dos alunos. Mesmo reconhecendo a dificuldade
de tal propósito, estaremos definitivamente a caminho “da escola inclusiva, em
que a assumpção será a de que todos os alunos pertencem, numa perspectiva
cronológica e de diversidade, à classe regular” (Correia, 2001, p.125).
Este conceito emergente de Inclusão carregou consigo uma ligação, por vezes
empobrecedora, entre educação inclusiva e educação especial, de tal forma
que na opinião de Ainscow e Ferreira (2003) chegou a ser argumentado que tal
elo poderia tornar-se numa das principais barreiras à inclusão de todas as
crianças, uma vez que tinha em conta apenas a situação daquelas que
LVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
manifestassem Necessidades Educativas Especiais (NEE) com deficiências
identificadas (Rodrigues, 2003).
As crianças que apresentassem dificuldades de aprendizagem, ou de
integração, ou de comportamento, mesmo que apresentassem insucesso
académico, não tinham direito ao atendimento de que necessitavam.
Assim, toda a atenção e apoio se centravam nas crianças com NEE. Os alunos
cuja situação de insucesso não podia ser justificada por NEE, não tinham, à
partida, as oportunidades previstas para aqueles cujas dificuldades
resultassem claramente de NEE.
Neste modelo educativo “integrativo”, ao não se ter em consideração todas as
crianças na sua individualidade, geram-se injustiças que levam pais a
comentários do género “Se ele fosse deficiente, o que ele sabe chegava para
passar...” (Rodrigues, 2001).
Ainda hoje este tipo de observações, frequentemente escutadas nas escolas
saídas da boca de pais e professores, são elucidativas da insuficiência da
implementação de modelos que melhor evidenciem o potencial de
desenvolvimento de cada um.
O que se pretende verdadeiramente com a Filosofia da Inclusão é que todos
os alunos tenham oportunidade de aprender juntos, sendo respeitados na sua
diversidade em relação aos estilos de aprendizagem, aos interesses, às
experiências e aquisições anteriores, capacidades e condições orgânicas e
ambientais sendo beneficiários de intervenções e apoios individualizados
sempre que tal se mostre benéfico e necessário (Correia, 2003; Freitas et al.,
2001; Rief & Heimburg, 2000a; Rodrigues, 2003).
A Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) defende, desde início, uma
ideia abrangente de escola inclusiva, ideia essa que é reforçada pelo Centro
LVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
de Estudos em Educação Inclusiva20. Este define inclusão como aquela que se
refere a “crianças – com ou sem deficiências ou dificuldades – aprendendo
juntas no sistema regular de ensino, inclusive pré-escolar, em escolas
regulares e universidade, com uma rede de apoio apropriada para responder
às suas necessidades”.
Na mesma Declaração de Salamanca, no ponto 2, pode ler-se: “As escolas
regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios mais
capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades
abertas e solidárias, construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a
educação para todos (...)”.
Este desiderato responderia, de forma apropriada e com alta qualidade, à
diversidade de população em todas as formas que ela pudesse assumir por
razões da sua procedência, etnia, situação económica, necessidades especiais
ou outras. No entanto, na prática, o que se tem verificado é, como já referimos,
que à massificação da Escola nem sempre correspondeu a democratização
das suas estruturas, isto é, nem sempre o seu alargamento foi acompanhado
de uma adequação de meios à sua nova população com novos anseios e
novas necessidades, gerando-se, por isso, novas formas de exclusão.
(Correia, 2001; Rodrigues, 2001; Rodrigues, 2003).
Numa escola democrática, as “exclusões” assumem formas muito mais subtis
e difíceis de identificar. Por isso mesmo, a ideia de Escola Inclusiva é
extremamente exigente do ponto de vista da auto-análise requerida à própria
escola. Não é um desafio fácil e encontra obstáculos pela dificuldade evidente
da sua implementação (por exemplo, no caso da educação de crianças com
NEE severas).
Por tudo isto, a integração deve começar por ser conceptualizada como uma
atitude, como um processo, que levará todos os envolvidos em educação a
20 Centro de Estudos em Educação Inclusiva (CSIE) é um centro de investigação independente,com sede no Reino Unido, que promove a inclusão.
LIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
uma posição filosófica segura, inovadora e progressiva (DePauw & Doll-
Tepper, 2000b) que irá intervindo na escola a partir das mudanças no sistema
escolar (e não exclusivamente lançando mão de apoios directos ao aluno)
(Rodrigues, 2001).
A tradição de modos e formas uniformizadas de actuação pedagógica, em que
a estrutura base se mantém, como por exemplo a organização em turmas e
classes de origem burocrática, são, apesar da evolução das ideias a respeito
da questão pedagógica, impedimento da construção de uma pedagogia que
tenha em conta a pessoa (substituindo a pedagogia estritamente colectiva).
Este núcleo duro organizador da escola – classes/turmas graduadas, número
pouco variável de alunos (mesmo no caso das classes com crianças com NEE
("Decreto Lei nº 319/91", 1991)), espaços muito estruturados de acção
pedagógica, métodos baseados fundamentalmente na planta clássica da sala
de aula, com horários rígidos, em disciplinas estanques – dificulta o trabalho
personalizado no ensino simultâneo. Este é um dos problemas que mais
frequentemente se coloca aos professores que, quando bem intencionados,
tentam implementar formas de trabalho que verdadeiramente busquem o
sucesso escolar de todos os seus alunos.
João Barroso refere, a propósito desta dificuldade, que assim se pode gerar
um efeito absolutamente perverso da Inclusão a “exclusão pela inclusão”. Esta
é uma forma subtil de exclusão onde o que está em causa “ é a imposição de
modelos de organização pedagógica e padrões culturais uniformes”21 que
agravam o desfasamento entre aquilo que a escola oferece e aquilo que o
cidadão verdadeiramente procura ou a que tem direito. O aluno, nesta
situação, apesar de se manter dentro do sistema, não encontra na escola o
seu lugar. A escola e aquilo que a envolve deixa de ser significativo para o
aluno (Gestão Flexível do Currículo, 1999).
21 In Rodrigues, Stoer, Magalhães, Barroso, Correia, Cortesão, Sarmento, Rodrigues, Ainscow,Ferreira, César, Roldão, Dee, Florian, Porter, Robertson, Pinto, Johnstone and Bloemers (2003)p. 27.
LX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
A organização da acção pedagógica não é acética. A própria estrutura do
sistema educativo está ao serviço de determinada filosofia educativa como se
foi observando ao longo da História (M. Silva & Tamem, 1981).
Temos absoluta consciência de que as mudanças a fazer na escola
organizada de forma mais tradicional são de vária ordem e profundas. Não se
trata apenas de uma “operação de cosmética” mas de uma reforma total da
escola para a qual contribuem as decisões a nível de currículo (a que nos
referimos anteriormente), da organização académica, dos métodos e
estratégias de ensino e, em consequência, da formação dos professores, do
envolvimento dos pais e da afectação de recursos materiais e humanos
(Hegarty, 2001).
Exactamente pela grandeza das mudanças implicadas, não nos parece
adequada uma abordagem exaustiva das mesmas no âmbito deste trabalho.
Ficar-nos-emos por uma abordagem das características mais comuns às
metodologias, abundantes na literatura, que buscam o respeito pela
diversidade e pela individualidade dos alunos.
Estas metodologias exigem normalmente uma verdadeira autonomia das
escolas em relação à gestão de recursos (Delors et al., 1996) e em relação à
programação da actividade educativa.
É, pois, necessário lançar mão da participação activa da comunidade na
definição do seu projecto educativo e investir na relação dos pais e restante
comunidade local com a escola e na relação interna da própria comunidade
escolar (em sentido restrito), envolvendo na responsabilidade educativa todo o
corpo educacional da escola, desde as tarefas da planificação e de execução
às da avaliação do trabalho que leva ao sucesso escolar.
Desta forma, é a própria comunidade que, sob a liderança de órgãos directivos
responsáveis, se pronuncia sobre os caminhos a tomar para que todos tenham
LXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
acesso à educação de acordo com os valores universais do conhecimento e da
própria comunidade (Correia, 2003).
A flexibilidade curricular do estabelecimento de ensino local em relação às
definições centralizadas de currículo é uma exigência básica para o
funcionamento de todo este o processo.
Outro traço comum a estes modelos de escola é, para além do sentido de
comunidade, o sentido de segurança (Stainback & Stainback, 1999).
Fundamental para que haja aprendizagem, este sentido resulta directamente
da convicção de pertença a um grupo. O sentido de segurança é
absolutamente contrário ao medo, ao baixo autoconceito e à sensação de
ridículo tão comuns nas escolas onde o espírito competitivo exacerbado fez
esquecer o espírito cooperativo e o respeito por cada um.
Vários trabalhos sublinham a importância do treino das competências que
levam ao sentido de pertença e de comunidade. Contribuem de forma decisiva
para o desenvolvimento do referido sentido comunitário e de integração do
jovem na sua comunidade, o exercício, em contexto escolar, de competências
sociais, a promoção das relações interpessoais, o desenvolvimento dos
hábitos de introspecção e de auto avaliação, a auto-estima e o apreço pelo
trabalho em equipa, em colaboração e em cooperação.
Desta forma se trabalha para a diminuição do insucesso e do abandono
escolares (Estêvão & Almeida, 1998; Margolis, 2003; Perrenoud, 2001; A. R.
Silva et al., 1997; Stainback & Stainback, 1999).
É ainda relevante, nestes modelos de intervenção pedagógica, a promoção da
aprendizagem activa e significativa para o aluno e a atenção dada à utilização
das novas tecnologias de informação e comunicação. Estas formas de
promover a aprendizagem são muito exigentes com os professores, pois
obrigam a uma formação contínua dos mesmos. Este esforço poderá ser
largamente recompensado, pois as potencialidades duma aprendizagem
LXII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
activa, lançando mão de novas estratégias, pode aumentar a integração
escolar e social de muitos dos alunos com maiores dificuldades nestes campos
(Correia, 2003).
Outro traço muito presente nos vários modelos de intervenção, que visam a
integração e manutenção de todos os alunos na escola, é o recurso às
actividades desportivas como meio educativo de virtualidades muito
particulares. Deste nos ocuparemos em seguida.
LXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.3. Indicadores de sucesso escolar
Para a execução do presente trabalho impôs-se, à partida, eleger indicadores
que nos permitissem, ao longo da intervenção e no estudo estatístico final,
avaliar a evolução da situação escolar dos alunos considerados em risco de
insucesso e abandono no início do ano lectivo.
Por isso, e perante uma grande variedade de indicadores que se encontram na
literatura que se refere a este assunto, optámos por nos debruçarmos sobre
quatro, a saber: comportamento, rendimento académico, auto-estima e gosto
pela escola.
1.3.1 Comportamento O comportamento dos alunos pode ser estudado sob várias perspectivas. No
presente trabalho, abordaremos as manifestações disruptivas do
comportamento do adolescente, uma vez que estas podem indiciar uma
dificuldade em termos escolares.
Entende-se por Comportamento Disruptivo (CD) ou “Disrupção Escolar um
conjunto de comportamentos definidos como transgressão das normas
escolares” (Veiga, 2001, p.15).
De forma mais abrangente, pode adoptar-se como definição de
comportamento escolar disruptivo aquele que vai em oposição às regras
escolares, danificando o ambiente de ensino, as condições de aprendizagem
ou a empatia das pessoas na escola (Paiva, 2003).
Para Maria Emília Costa (2001), o Comportamento Disruptivo resulta da
exteriorização de um problema de comportamento por parte de determinada
pessoa, e só na medida em que esse comportamento é reconhecido por
alguém como excessivo e inadequado é que é classificado como tal. A mesma
autora chama, por isso, a atenção para as fronteiras lábeis de definição deste
LXIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
conceito, uma vez que para cada “avaliador” varia o referencial de classificação
(Costa et al., 2001).
Por outras palavras, é possível que um mesmo comportamento, mercê da
intencionalidade percebida pelo observador, pelo contexto físico e temporal ou
por outras variáveis, seja considerado disruptivo por uns e não disruptivo por
outros.
Mesmo tendo em consideração a variação dos comportamentos definidos
como disruptivos, dependendo estes do que cada comunidade escolar aprova
como comportamento aceitável, a verdade é que globalmente é entendido
pelos intervenientes na acção educativa que os problemas de comportamento
têm aumentado nos últimos anos (Lourenço & Paiva, 2004). Estudos do
Ministério da Educação, apresentam um claro crescimento das formas de
disrupção mais violentas (agressões, roubos, destruição de propriedade etc.).
Por exemplo, em 1995, o Gabinete de Segurança do Ministério da Educação
registou 433 ocorrências; em 1996 o registo foi de 914; em 1997 e 1998 foram
registados 816 casos; finalmente durante o ano 2000 o relatório do Gabinete
de Segurança dava conta de 1873 casos de violência entre “Acções sobre
bens” e “ Acções sobre pessoas” (Costa et al., 2001).
Ainda que se trate de formas de disrupção menos violentas, como sejam a
falta de atenção e a transgressão das regras da escola, este problema é
considerado por vários autores como uma das principais preocupações
escolares da actualidade (Veiga, 2001).
Estudos apontam para vários factores como causas do comportamento
disruptivo.
- Causas intrínsecas aos próprios alunos, como sejam o ambiente social de
proveniência, o autoconceito, o trajecto escolar, o projecto de vida e
experiências anteriores exteriores à escola (Paiva, 2003).
LXV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
- Causas de âmbito familiar, como sejam o clima educativo que contem em si
hábitos de conduta, expectativas, valor atribuído à cultura escolar (Duarte,
2000; Kirk & Gallagher, 1991; Veiga, 2001).
- A formação dos professores em áreas que dizem respeito, por exemplo, às
suas competências relacionais (Lourenço & Paiva, 2004).
- O sistema social, a começar pela harmonia existente dentro da própria turma,
pelas suas regras informais, pela liderança nela estabelecida, ou fora dela, no
bairro ou rua onde vive o aluno, em que o próprio ambiente social pode
“envenenar”, “intoxicar” o seu desenvolvimento (Hellison, Martinek, & Cutforth,
1996; Watson, Newton, & Kim, 2003), a violência veiculada pelos órgãos de
comunicação social e outras causas tão numerosas quanto os estudos
elaborados sobre o tema.
Costa e seus colaboradores definem as causas do Comportamento Disruptivo
a vários níveis: Nível individual, resultante das características
desenvolvimentais do grupo etário em que se insere o aluno; o nível micro,
constituído pelo sistema da turma e da escola do adolescente; o nível dos
meso-sistemas que vão da família à comunidade (local) de vida do aluno; e,
finalmente, os níveis dos macro e crono-sistemas, constituídos por
determinada sociedade, num tempo e numa cultura específicas, com uma
história própria que influenciam todos os outros níveis com as sua mensagens
(Costa et al., 2001).
O aumento do Comportamento Disruptivo em meio escolar está, para muitos,
relacionado com o aumento da permanência dos alunos na escola, devido à
implementação da escolaridade obrigatória e parece ser agravado com o
desfasamento de muitos alunos face ao currículo que lhes é imposto (Lopes,
2002).
Ter que permanecer num sistema que não corresponde aos anseios pessoais,
confrontado constantemente com o sentimento de não pertença, de não
corresponder às expectativas de pais e professores terá em muitos casos
LXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
como efeito a frustração e a desvalorização pessoais (V. Fonseca, 1999). A
revolta e a tentativa de repôr em níveis pessoalmente aceitáveis uma auto-
estima desgastada pode levar o adolescente a procurar o êxito e a aceitação
grupal através do comportamento desviante (que traduz uma desvalorização,
mesmo quando não consciente, dos objectivos que lhe são impostos).
Segundo Amado e Freire (2002), a investigação feita neste campo permite,
sem sombra de dúvida, concluir o efeito negativo deste tipo de comportamento
no sucesso educativo dos alunos (Amado & Freire, 2002). Entendendo-se
sucesso educativo, não só como o sucesso escolar restrito mas, mais
globalmente, como aquele que tem reflexos negativos na autonomia, na
integração social e na realização profissional do jovem/ adulto.
À mesma conclusão chegou M. Prior (1996) evidenciando vários estudos que
mostram que a influência de problemas de comportamento em ambiente
escolar determina, de forma relevante, consequências negativas na vida
adulta.
Nos estudos de Isabel Freire (2001) verificou-se uma forte associação entre a
atribuição do estatuto de aluno com comportamento indisciplinado e a falta de
aproveitamento. Esta constatação não é tão evidente quando se tenta
encontrar relação entre a mesma atribuição e as aprendizagens, o que leva a
autora a reflectir sobre a hipótese da existência de uma variável intermédia a
influenciar o resultado: a expectativa dos professores.
O Efeito de Pigmalião é descrito desde há muitos anos na literatura
pedagógica, como o efeito que um “pré-conceito” em relação a determinado
estereótipo de aluno, por exemplo “indisciplinado”, pode ter nas avaliações que
o professor fará a respeito dele noutros campos, como por exemplo; na sua
capacidade de aprender. O aparecimento desta distorção da avaliação é
reconhecido como uma consequência frequente do comportamento disruptivo
dos jovens na escola (Martinek, Trouilloud, Sarrazin, & Guillet, 2002).
LXVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Vários autores (Hellison, 1990b; Martinek, Trouilloud, Sarrazin, & Guillet, 2002;
Rolla, 1994; Sparks III, 1993) continuam a chamar a atenção para este tipo de
“correlações” inconscientemente estabelecidas pelos professores e para o seu
efeito perverso no rendimento escolar.
O próprio aluno, mercê da repetição do fenómeno, acaba por reagir de acordo
com a expectativa gerada. Este problema é particularmente grave quando
originado nos professores pois influencia também a restante comunidade
educativa que, normalmente, reforça o valor das atribuições feitas pela escola.
Segundo Veiga (2001), muitos alunos não aprendem, não porque
verdadeiramente não tenham capacidade para o fazerem, mas porque a
escola os “convenceu” de que não são capazes.
Segundo de Hawkins (1988)22, o estabelecimento de relações causa-efeito
entre comportamento disruptivo e rendimento escolar restrito parece não ser
evidente em todos os estudos, no entanto, a relação inversa afigura-se como
certa: existe um maior envolvimento de alunos com insucesso escolar em
comportamentos desviantes e delinquentes na escola e fora dela.
Assim, a disrupção, ou Comportamento Disruptivo Juvenil, não é um problema
que se possa centrar apenas ao nível da escola e dos seus membros, como já
foi referido. As causas do Comportamento Disruptivo encontram-se a vários
níveis e devem ser analisadas numa perspectiva ecológica, resultante da
intercepção de vários factores a diferentes sistemas.
Por estes motivos, perceber os porquês da disrupção escolar por um lado, e
criar programas que obviem o desajuste entre aluno e escola por outro,
parece-nos um propósito fundamental da escola actual.
22 In Amado and Freire (2002) ; Prior (1996)
LXVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.3.2 Rendimento académico
Não abrangendo todas as dimensões do sucesso escolar, o rendimento
académico é normalmente o aspecto mais visível do mesmo na vida de um
aluno.
A avaliação, na sua vertente sumativa, representa para todos os intervenientes
(alunos, professores, pais e sociedade em geral) o reflexo directo do trabalho e
das capacidades do estudante.
Pese embora o esforço de alguns, tentando chamar a atenção para muitos
outros aspectos da aprendizagem e do desenvolvimento dos jovens (por
exemplo: das as competências sociais), não contemplados frequentemente
nos parâmetros de avaliação, a realidade é que a própria legislação valoriza a
classificação registada em testes e em pautas finais de período
(independentemente da qualidade do processo de avaliação que lhe deu
origem).
São pois, em grande medida, as classificações a face pública do sucesso ou
do insucesso dos alunos. O sucesso escolar e, com maior gravidade, o
sucesso educativo, são reduzidos ao Sucesso Académico representado pelos
níveis positivos e negativos atribuídos ao aluno no fim do período, do ano ou
do exame.
Por este motivo, (a importância social dos resultados académicos) parece
haver uma relação entre estes e a imagem que o adolescente faz de si mesmo
(Veiga, 1995) influenciando negativamente a sua auto-estima. O facto de
professor poder fazer juízos “premonitórios” a respeito dos alunos, baixando as
expectativas a respeito das suas capacidades pode, por si só, influenciar
negativamente os resultados académicos provocando um ciclo vicioso de
insucesso (Estêvão & Almeida, 1998; Martinek, Trouilloud, Sarrazin, & Guillet,
LXIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
2002), normalmente, o aluno reforça com o seu aproveitamento e
comportamento as expectativas do professor a seu respeito.
Sendo o baixo rendimento académico o motivo principal de retenção e,
consequentemente, de insucesso, este item enquadra-se no grupo dos
factores de risco e de vulnerabilidade pessoal, prognosticando o abandono
escolar (M. H. D. Silva, Fonseca, Alcoforado, & Vieira, 2004).
Por isso, e pela importância que acaba por revestir para todos os envolvidos, o
Rendimento Académico foi escolhido, no presente trabalho, como um indicador
do sucesso (pelo menos em termos restritos), salvaguardando-se,
evidentemente, as limitações anteriormente descritas.
1.3.3 Autopercepções
Um outro indicador que nos pareceu interessante para o nosso estudo foi o
das autopercepções dos alunos envolvidos. A relação entre a percepção que
um adolescente tem de si mesmo, o seu Autoconceito, e o seu
desenvolvimento aparece na vasta literatura dedicada ao assunto (Bernardo &
Matos, 2003; Estêvão & Almeida, 1998; Leith, 1994a; Paiva, 2003; Rief &
Heimburg, 2000b; M. H. D. Silva, Fonseca, Alcoforado, & Vieira, 2004; Veiga,
1995).
O interesse do estudo deste constructo, o Autoconceito, como item do
presente trabalho resulta do facto de que, para tantos autores, parece haver
uma relação, entre algumas dimensões do sucesso pessoal, nomeadamente
escolar, e do autoconceito. Segundo Veiga (1995, p 11), por exemplo, “ O
estudo do autoconceito tem em geral como base o pressuposto de que a
compreensão do mesmo pode facilitar a promoção de outras dimensões da
personalidade, bem como o rendimento escolar, o relacionamento interpessoal
e a satisfação do indivíduo consigo mesmo”.
LXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Um considerável consenso acerca da definição de Autoconceito (AC) e Auto-
estima (AE), aparece actualmente emergente na comunidade científica
(Bernardo & Matos, 2003).
Segundo vários autores o AC é um constructo multifacetado, descritivo, e que
representa as percepções que o indivíduo tem de si mesmo (Estêvão &
Almeida, 1998; Paiva, 2003). A natureza multifacetada do AC resulta do facto
de que as percepções que referimos se reportam a aspectos distintos da vida
(por exemplo: dimensão escolar, social, emocional e física) (Bernardo & Matos,
2003; A. M. Fonseca & Fox, 2002).
Neste modelo multidimensional o AC encontra-se, segundo Shavelson et al.
(1976)23, estruturado e organizado em Autoconceito Académico (ACA) e Não
Académico (ACnA), sendo o último subdividido em Autoconceito Social (ACS),
Autoconceito Emocional (ACE) e o Autoconceito Físico (ACF). Cada uma
destas facetas do AC é ainda subdividida em várias outras auto percepções
que representam situações específicas do AC global.
Resulta, então, o AC como um constructo, cuja consciência por parte do sujeito
depende da autopercepção que este tem de si em cada uma das facetas que o
compõem. Do desenvolvimento de cada pessoa vai resultando, da
comparação que esta faz de si mesma com os outros com quem contacta, uma
avaliação do tipo satisfação/insatisfação.
A Auto-estima (AE) é a avaliação, o sentimento, que cada pessoa tem em
relação à imagem que faz de si, manifestado como satisfação ou insatisfação
com o conceito que tem de si mesma. A AE é a componente avaliativa do AC
(Marsh, 1997). Respeitando o modelo multidimensional do AC, a AE resulta em
percepções avaliativas (multidimênsionais) do indivíduo nos vários domínios da
vida correspondentes às sub áreas do AC.
23 Citado por Leith (1994b) p. 80
LXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Uma das características do AC e da AE é que se alteram, amadurecem e se
diferenciam, nos seus vários domínios, ao longo do desenvolvimento da
pessoa (Estêvão & Almeida, 1998; Paiva, 2003).
Sendo a adolescência uma idade de grandes ajustes a um corpo em mudança
e, em que novas estruturas cognitivas se consolidam, provoca importantes
alterações ao nível das auto percepções (Bernardo & Matos, 2003; Hay, 2000;
Veiga, 1995). As alterações referidas não se traduzem obrigatoriamente num
balanço negativo para a AE do jovem, a não ser que, a presença de
ocorrências negativas afecte significativamente o sujeito24.
Por outro lado, há estudos que apontam no sentido de que experiências
significativamente positivas, como pode ser o caso da actividade desportiva
(Estêvão & Almeida, 1998), podem influenciar a AE do adolescente no sentido
positivo (Auxter, Pyfer, & Huettig, 1997; Veiga, 1995) melhorando o seu grau
de satisfação consigo mesmo.
No caso de adolescentes em situação de insucesso escolar, uma AE mais
elevada pode actuar como um factor de resiliência interessante e a explorar
pelos educadores, por exemplo, através de programas desportivos dirigidos a
todos os alunos ou a grupos com dificuldades específicas.
O interesse da utilização do AC global (e nas suas dimensões) e da AE, como
itens a observar no nosso trabalho, deve-se sobretudo ao facto de estudos de
revisão apontarem para a existência de relações significativas entre o AC e o
rendimento escolar. Esta posição é defendida por Veiga (1995) referindo os
trabalhos de Diesterhaft e Gerken (1988), Marsh (1988) e Robinson et al.
(1986), sublinhando que apesar de significativas as relações entre as duas
variáveis, a escassez de trabalhos e alguma falta de controlo de variáveis
moderadoras, deixa, na sua opinião, muitas questões a carecer investigação
mais sólida.
24 Marsh 1988, Richardson & Lee 1986 e Skaalvik 1983 in Veiga (1995) .
LXXII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Diz ainda o mesmo autor que “os investigadores partem em geral do princípio
de que as percepções negativas dos sujeitos acerca deles próprios constituem
um factor-chave do insucesso escolar” e mais adiante acrescenta “embora a
relação entre o autoconceito e o fracasso escolar seja complexa e nem sempre
observável, existe um certo apoio da existência de uma ligação significativa e
negativa entre essas variáveis” (Veiga, 1995, pp.57,58).
Em conclusão poderemos dizer, com alguma segurança, que o autoconceito
elevado potencia o rendimento escolar e que, pelo contrário, o fracasso escolar
parece estar relacionado com níveis de auto-estima baixos (KirK e Chalfant,
1984)25 (Estêvão & Almeida, 1998; Veiga, 1995).
Da literatura disponível podemos também concluir que existe uma relação
positiva, atestada pelo menos por 50% dos trabalhos longitudinais revistos
(Cruz, Machado, & Mota, 1996), entre a actividade desportiva e a auto-estima.
A importância dada por vários estudos a esta relação autoconceito/sucesso
escolar motivou-nos a eleger a auto-estima como um dos indicadores a
observar neste trabalho.
1.4.4 Gosto pela escola
Muito relacionado com o capítulo anterior, apresentaremos um outro elemento
de observação da nossa amostra: trata-se da Satisfação com a Escola (StE).
A forma como os jovens se relacionam com a sua escola pode determinar o
gosto com que se integram na vida escolar, com que aderem às propostas
educativas que lhe são feitas. A motivação para a frequência à escola pode ser
determinante no desânimo e na decisão de abandono.
Segundo O’Hagan (1977)26, a atitude dos alunos em relação à escola permite
“classificá-los em: alunos orientados para a escola, alunos indiferentes e
alunos anti-escola”.25 In Estêvão and Almeida (1998) 26 In Lourenço and Paiva (2004) p.28
LXXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Embora comum aos dois sexos, a dinâmica da insatisfação com a escola
assume valores diferentes para rapazes e para raparigas, parecendo mais
generalizada naqueles (Lourenço & Paiva, 2004). Acontece, segundo o mesmo
autor, que os rapazes partilham a sua insatisfação uns com os outros,
enquanto as raparigas atribuem mais facilmente as causas dos insucessos a si
mesmas guardando a insatisfação para si próprias.
Para além desta diferença relacionada com o género parece haver, ao longo
da escolaridade, uma variação naquilo que os jovens pensam da escola. Num
estudo, realizado num bairro desfavorecido dos subúrbios de Lisboa, Cunha e
Cardoso (2004)27 concluíram que, no que no 1º Ciclo do Ensino Básico, 77%
dos alunos que permaneciam na escola afirmavam gostar dela e,
curiosamente, dos que a abandonaram, 75% tinham a mesma opinião. Já no
2º Ciclo, apenas 46% dos jovens que tinham saído diziam ter gostado de a
frequentar. Neste mesmo nível de escolaridade, 88% dos que permaneciam
afirmavam gostar da escola.
Mesmo de entre aqueles que se mostraram satisfeitos com a escola, as
motivações para tal adesão pareciam variadas. De acordo com o mesmo
estudo, 6% dos jovens vêem na escola o local onde fazem amigos; 18%
atribuem-lhe o papel de preparar para a vida e, para 41% o valor da escola
está no facto de proporcionar melhores empregos. Para 35% dos jovens que
continuam a estudar, a escola é sobretudo um lugar de formação.
De vários estudos efectuados ressalta, no entanto, um facto particularmente
importante para o presente trabalho: para os jovens que abandonaram
precocemente a escola, embora persistam imagens positivas da mesma são
as impressões negativas as que surgem com maior relevância. Daí a urgência
de que a escola passe a ser para os alunos um local que facilite a descoberta
27 In Silva, Fonseca, Alcoforado and Vieira (2004) p.147
LXXIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
da identidade, um espaço de bem-estar, de convívio e de segurança e não
apenas uma “oficina de ensino e rendimento” (Bento, Garcia, & Graça, 1999).
Nesta escola em que o rendimento é a medida de todo o (in)sucesso, tantas
vezes repercutido pela vida fora (em termos profissionais e sociais) é
necessário, segundo Pühse, 199428, reequacionar o próprio conceito de
rendimento, apostando no desenvolvimento de competências sociais, de
comunicação e cooperação e de aprendizagem (significativa).
Uma escola que promove atitudes positivas em relação a si mesma e em
relação ao estudo e que contraria a intenção de abandono dos alunos, quebra
um ciclo (muitas vezes familiar) de insucesso e de perda de oportunidades.
De uma maneira geral, as actividades desportivas inserem-se naquelas que os
alunos referem como preferidas, agradáveis e que dão prazer.
Neste sentido, a educação física e o desporto podem assumir-se como
factores importantes de fidelidade à própria escola, contrariando o abandono e
promovendo a escolarização dos jovens.
Por este motivo, pareceu-nos que este item se enquadrava no âmbito do nosso
estudo, uma vez que nos daria informações sobre a imagem que os alunos da
amostra teriam sobre a escola que frequentavam ao longo da intervenção.
28 In Bento, Garcia and Graça (1999)
LXXV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
1.4 Papel da educação desportiva
Com alguma frequência se encontram na literatura programas de intervenção
para alunos em risco de insucesso ou de abandono escolar que utilizam o
desporto como meio privilegiado de educação.
Na nossa intervenção, no presente trabalho, foi também essa a opção. O
primeiro motivo para tal foi, evidentemente, a área disciplinar onde se iria
desenvolver a intervenção – a Educação Física e o Desporto Escolar.
Para Martinek29, o desporto apresenta um conjunto de virtualidades que atraem
e mantêm a fidelidade dos alunos de uma forma mais constante que outras
actividades. Os alunos, de uma maneira geral, gostam de desporto e
encontram-se naturalmente motivados para ele. Esta atracção resulta, em
grande parte, do facto de se apresentar com uma forte componente lúdica.
A actividade desportiva pode veicular a transmissão de valores de uma forma
significativa (porque pragmática do ponto de vista do jovem) e pode contribuir
para a construção da personalidade dos jovens (Martinek, 2005).
Numa escola onde alguns adolescentes se sentem desmotivados e
insatisfeitos, a aula de Educação Física e grupo de Desporto Escolar podem
funcionar como o meio educativo por excelência; podem ser o elo de ligação
entre a cultura familiar e a cultura escolar; podem ser o momento possível de
relação pedagógica com o adulto e com os outros.
Vários autores concluem das suas práticas e dos seus estudos que o Desporto
pode verdadeiramente ajudar alunos em risco de insucesso escolar e de
abandono escolar e, consequentemente, de marginalização social (DiSibio,
2001; Escartí & Gutiérrez Sanmartím, 2001; Escatí & Gutiérrez Sanmartím,
2001; Hellison, 1990a, , 2003b; Hellison, Martinek, & Cutforth, 1996; Hellison &
29 Tom Martinek – Department of Exercice and Sport Science -University of North CarolinaUniversity of North Carolina
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Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Wright, 2003a; Parker & Hellison, 2001; Shields & Bredemeier, 1995; Sparks
III, 1993)30.
Neste ambiente é possível proporcionar aos alunos oportunidades de
enfrentarem desafios, de lidarem com os outros de acordo com regras, de se
esforçarem e de rentabilizarem o esforço, de se exercitarem em grupo e
sozinhos, de se empenharem em atingir objectivos e de proporem os seus
próprios objectivos, de enfrentarem a dificuldade com optimismo e de
experimentarem a satisfação pela vitória pessoal e a admiração pelo sucesso
alheio (Bento, 1998).
As referidas oportunidades de aprendizagem são, em ambiente desportivo, de
frequência muito mais elevada que no decurso normal do dia-a-dia de um
jovem. Por outras palavras, o Desporto proporciona um exercício “concentrado”
das competências pessoais e sociais exigidas pela vida ao ser humano, com a
vantagem de se desenrolar num espaço afastado do real e, por isso, cujas
consequências imediatas se restringem à relação desportiva.
A actividade desportiva, no contexto do desporto/educação, posiciona o adulto
numa situação muito privilegiada em relação às crianças e jovens. Em
momentos do desenvolvimento, em que o adolescente luta pela sua
“autodeterminação” em relação à família e aos educadores, a actividade
desportiva orientada aparece como um meio onde adultos e jovens
estabelecem frequentemente relações de amizade, de diálogo e de apoio que
podem ser determinantes no equilíbrio da transição para a idade adulta
(Edginton & Randall, 2005) .
Toda esta riqueza pedagógica pode ser proporcionada pelo desporto, sem o
peso inerente a uma disciplina “imposta”, proporcionando ao aluno a sensação
de ser activo, útil e capaz.
Ao estimular o desenvolvimento de atitudes positivas em relação à escola, o
desporto poderá potenciar o rendimento académico (Cruz, 1996) e a auto-
estima do aluno (Estêvão & Almeida, 1998), contribuindo para a sua satisfação30 Não podemos deixar de referir que em relação a este aspecto existe também controvérsia,isto é, do mundo do desporto (nomeadamente do desporto espectáculo) chegamexemplos/modelos que de forma alguma se podem considerar condutas socialmentedesejáveis Graça (1997) .
LXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
com a escola e actuando como factor de protecção31 em relação ao abandono
escolar.
Este novo conceito de factor de protecção traduz a importância que tem, para
o sucesso de um programa de intervenção pedagógica, para além, da tentativa
de eliminar os factores de risco32, a promoção de mecanismos que tornam os
indivíduos mais resilientes33 e, portanto, com maior probabilidade de seguirem
um percurso de vida normal (M. H. D. Silva, Fonseca, Alcoforado, & Vieira,
2004).
Sendo, para muitos jovens, uma experiência de relação positiva, o desporto
pode assumir-se verdadeiramente como um factor de protecção contra um
percurso de insucesso educativo e humano.
“A aprendizagem social em Educação Física é um caso especial e real da
aprendizagem social em geral, referenciada necessariamente à vida na
comunidade humana (Bento, Garcia, & Graça, 1999)”. Por isso, as
experiências escolares positivas podem moderar, não só, os efeitos de uma
má relação com o ambiente escolar, mas também, os efeitos negativos de
conflitos familiares ou resultantes do próprio meio onde vive o aluno,
enfraquecendo os problemas daí decorrentes (M. H. D. Silva, Fonseca,
Alcoforado, & Vieira, 2004)
A experiência do jogo desportivo colectivo é normalmente uma das que marca
mais os jovens. Segundo Gerardo Echeita34, o trabalho cooperativo, como31 Factor de protecção é, para Cohler (1995), uma “influência que modifica, melhore ou altera aresposta do indivíduo a certas dificuldades do meio que predispõem para uma evoluçãonegativa” in Silva, Fonseca, Alcoforado and Vieira (2004) p.20.32 Factor de risco “designa todo e qualquer evento, situação ou característica da criança ou doadolescente que aumenta a probabilidade de ocorrência de outro fenómeno (ibid.), p. 17.33 Resiliencia é, para Gross e Capuzzi (2000), uma característica individual associada a “boascapacidades intelectuais, o ter uma boa auto-estima, o encarar a vida de maneira positiva, o terum temperamento dócil ou fácil, a capacidade de antecipar as consequências dos seus própriosactos, a facilidade de relacionamento com os outros, a tendência a encarar de maneira positivaas experiências frustrantes ou negativas e, de um modo geral, uma grande flexibilidade oucapacidade de se adaptar às diferentes situações Silva, Fonseca, Alcoforado and Vieira (2004)p. 20.34 Gerardo Echieta – Universidade Autónoma de Madrid – Lic. em Filosofia e Ciências daEducação e Doutor em Psicologia, professor titular do Departamento de Psicologia Evolutiva eda Educação.
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Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
acontece no desporto (mormente colectivo), aumenta a percepção que o aluno
tem da sua própria competência ao permitir que cada um atribua a si mesmo
uma capacidade positiva pelo efeito sinérgico de todo o grupo.
É o tão popular “Ganhámos!” independentemente do contributo real de cada
um para a vitória (Barnet et al., 2003).
Outros autores salientam também o contributo do desporto para além do
“domínio puramente motor e corporal”. É o caso de Jorge Bento que responde
à questão “Porquê o Desporto?” chamando a atenção para o desenvolvimento
de dimensões cognitivas, afectivas e sociais do desenvolvimento humano, tais
como: a personalidade, a capacidade de rendimento geral e da saúde, a
aquisição dos valores do fair play e do respeito pelos outros, a formação de um
estilo de vida saudável (Bento, Garcia, & Graça, 1999).
Embora não esgotem as potencialidades educativas do desporto estes são,
como refere o mesmo autor, argumentos importantes para a sua legitimação
como actividade educativa.
Tudo isto se vem a tornar relevante também para pais e educadores que
começam a dar importância à capacidade da escola de ajudar os alunos a
desenvolverem competências não restritamente académicas (p.ex.
competência de cooperação, de relação com os outros, de fazer amizades, de
assumir responsabilidade, e outras) (Stainback & Stainback, 1999) e dentro
das actividades escolares o desporto é, sem dúvida, um meio privilegiado para
o desenvolvimento deste tipo de competências. O domínio das actividades
físicas apresenta características únicas que fazem dele um domínio
especialmente apropriado para a intervenção pedagógica (Brustad & Parker,
2005).
Com a intenção de tirar proveito destas (e possivelmente de outras)
virtualidades do desporto, vários são os modelos de intervenção pedagógica
que o utilizam como meio educativo por excelência, quer em contexto de aula
de Educação Física ou de Desporto Escolar, quer como actividade extra
(acampamentos e estágios desportivos) ou após o horário escolar.
LXXIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Apesar de uma parte das crianças e jovens portugueses terem actualmente
acesso à actividade desportiva, pelo menos ao nível do desporto escolar,
poucas são as referências à implementação de programas de intervenção
através do desporto junto de grupos de jovens considerados em risco.
Noutros países, experiências nesta área têm tido lugar de forma sistemática,
desenvolvendo-se programas, recolhendo-se ensinamentos, chegando-se a
conclusões e, fundamentalmente, tirando-se proveito das virtualidades
educativas das actividades físicas.
Alguns desses programas dirigiram-se inicialmente a jovens com NEE,
pretendendo preencher as necessidades específicas de cada um ajudando-os
nas suas dificuldades (Auxter, Pyfer, & Huettig, 1997; Eason, Smith, & Caron,
1983; Leith, 1994b; B. O. Pereira, 2002; Pérez Bunicardi, López Pastor, &
Iglesias Sanz, 2004; Rief & Heimburg, 2000b; Slate & Jones, 2003; Weinberg
& Gould, 2003). Outros evoluíram no sentido de proporcionar programas
desportivos de características mais preventivas, com o objectivo de reforçar
qualidades físicas, psicológicas, sociais, morais e emocionais importantes para
o desenvolvimento da juventude em termos mais globais.
As actividades desenvolvidas por este tipo de programa podem ter lugar
durante as aulas, na escola, ou depois destas, durante as férias em campos de
férias ou em contexto de clube desportivo com actividade regular.
Nessa linha, encontrámos alguns exemplos, como sejam os trabalhos de
Brendemeier e Shields (1995), que apresentam programas cujo objectivo é o
desenvolvimento do carácter através das actividades desportivas. Este tipo de
intervenção exige-se um conhecimento aprofundado sobre os processos de
desenvolvimento da moral nos jovens por parte dos treinadores.
É aconselhado pelos autores que o treinador comece por reflectir sobre os
seus próprios objectivos, filosofia e acções para que haja coerência na sua
forma de actuar. Recomenda-se a máxima “Athletes first, winning second”35
como forma de lembrar permanentemente que é o desporto que está ao
35 “Em primeiro lugar o atleta e em segundo a vitória”
LXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
serviço da educação e não a criança ao serviço das ambições desportivas de
qualquer um.
O treinador deveria pois, segundo os mesmos autores, pôr a tónica da sua
actividade na observação de cada atleta. Independentemente do facto do
desporto desenvolver ou não o carácter, parece certo que durante um jogo, um
treino ou uma competição, o treinador terá oportunidade de “ver” o carácter do
adolescente em acção. Assim, uma observação cuidada de cada um permitirá
uma interacção apropriada à idade do aluno que se tem na frente, não se
modelando, desta forma, a intervenção do educador pela de um treinador de
atletas profissionais.
Alguns destes programas recomendam mesmo estratégias diversificadas para
cada escalão etário. Beedy (1988)36, por exemplo, lembra que para crianças
com menos de 10 anos a cooperação precede a competição e que, por isso,
os alunos não deveriam ter que competir com os próprios colegas para obter
um lugar na equipa. Pelos mesmos motivos é aceitável a adaptação das regras
dos desportos e dos seus torneios aos objectivos educativos e é recomendável
a rotação dos atletas dentro das equipas.
Outro aspecto interessante deste modelo de intervenção é a minimização das
motivações externas, como por exemplo, as medalhas, os troféus. Tais
prémios serviriam apenas, na opinião dos autores, para enfatizar os resultados
em vez da dinâmica do jogo em si.
A propósito do espírito de equipa lembra-se nos referidos trabalhos que os
desportos colocam frequentemente aos jovens o dilema entre ganhar (um
ponto ou uma jogada) e ser correcto (com o colega ou com o adversário),
traduz uma opção constante entre estratégias de êxito e estratégias éticas.
Este confronto, permanente na competição, deve ser aproveitado pelo
professor para o desenvolvimento do código moral do atleta em formação.
O Project Effort é uma outra abordagem ao tema dos programas de
intervenção pedagógica que têm como base o desporto. Este tem como
36 In Shields and Bredemeier (1995)
LXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
objectivo principal a identificação de factores de risco nos jovens de forma a
poder actuar-se na sua prevenção e no reforço dos factores resilientes dos
próprios jovens. Também este modelo de intervenção persegue como metas o
desenvolvimento de ideais, valores e atitudes que se impõem aos objectivos
estritamente de rendimento ou de condição física (Martinek & Griffith, 1993).
Tom Martinek, treinador que muito tem trabalhado na implementação deste
género de programas, quer do ponto de vista da investigação pedagógica quer
da prática de treino regular de grupos, justifica as virtualidades do desporto
como estratégia educativa da seguinte maneira: as actividades desportivas
podem ser formativas do ponto de vista moral; fazem parte da cultura global e
da cultura específica dos grupos de jovens; podem contribuir para a construção
da personalidade e, sobretudo, os jovens gostam de desporto sendo que a
maior parte deles se encontra naturalmente motivada para a sua pratica.
Uma das características que encontrámos neste programa foi a fidelidade que
normalmente, os jovens lhe dedicavam. Segundo Martinek, este fenómeno
devia-se a vários factores tais como: pôr a tónica nas capacidades dos jovens
e não nas suas fraquezas; ir ao encontro das suas necessidades afectivas,
emotivas, sociais e cognitivas; proporcionar-lhes tomadas de decisão
baseadas num sistema de valores; respeitar a sua individualidade; dar-lhes
perspectivas de futuro e, finalmente, oferecer-lhes um ambiente seguro
apoiado por adultos comprometidos a longo prazo.
O contexto através do qual este programa é proposto aos alunos é o do treino
desportivo no clube da escola ou do bairro.
LXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Um outro modelo de intervenção pedagógica que utiliza o desporto como o
meio através do qual se desenrola a actividade educativa é o “Tanking
Personal and Social Responsibility”37 cujo autor, Don Hellison, há muito se
dedica à educação de jovens em risco. Deste assunto nos ocuparemos em
detalhe oportunamente.
37 “Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social” Hellison (1995)
LXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
LXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
LXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
2. Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social
2.1 Introdução
Taking Personal and Social Responsibility (TPSR) é um modelo de intervenção
pedagógica através da actividade física, criado por Don Hellison38 para apoio a
crianças e jovens negligenciados (Hellison & Walsh, 2002).
Segundo o próprio autor, a ideia surgiu do desejo de formar o carácter e ajudar
jovens, que já tinham a experiência de viver em condições sociais muito
problemáticas (Hellison, 2003b), a responsabilizarem-se pelo próprio futuro.
Trabalhando numa zona muito difícil do ponto de vista social, com uma
juventude negligenciada em termos de apoio familiar, Hellison convenceu-se
de que só ajudando os seus estudantes a responsabilizarem-se pelo seu
próprio desenvolvimento e a interessarem-se pelo bem-estar dos outros, os
prepararia para enfrentarem os problemas que se lhes colocavam no dia-a-dia.
Com aquele tipo de crianças, a autoridade imposta do exterior resultava, na
melhor das hipóteses, de forma passageira não sendo certo que tivesse
qualquer efeito perene nas suas “vidas reais”.
Assim, tendo como ponto de partida o objectivo de levar o aluno à auto
responsabilização pelo seu próprio destino, o passo seguinte foi conseguir
articular uma forma de actuar que permitisse a ligação entre o referido
objectivo e as aulas de Educação Física.
38 Don Hellison, é professor no College of Education e no Jane Addams College of Social Workna Universidade de Illinois - Chicago
LXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
A partir de uma análise dos valores a perseguir, Hellison escolheu dois
relativos ao bem-estar pessoal – esforço e autonomia – e dois relativos ao
bem-estar social – o respeito pelos direitos e sentimentos dos outros e a
preocupação com os outros. O facto de optar por dois eixos de valores teve o
propósito de que os alunos se lembrassem, dentro e fora das aulas, dos
objectivos do trabalho e, para isso, tornava-se necessário que estes fossem
simples e em pequeno número.
Eis assim encontrada a primeira versão dos Níveis de Responsabilidade
Pessoal e Social (Hellison, 2003b):
Respeito pelos direitos e sentimentos dos outros.
Esforço
Autonomia
Atenção e ajuda aos outros.
Esta “escala” permitiu-lhe iniciar um trabalho que veio a produzir resultados,
em relação a objectivos diversos nos últimos trinta anos.
Podem encontrar-se, ao longo deste tempo, diferentes versões das
componentes dos níveis inicialmente propostos. Estas diferenças representam,
não só uma evolução no sentido de aproveitar a experiência de todos os que já
tinham trabalhado com este modelo de intervenção, como também a
adaptação do mesmo ao ensino de grupos específicos de alunos com
Necessidades Educativas Especiais ou outras (cf. Quadro I).
LXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Quadro I Níveis de Responsabilidade Pessoal e Social Definidos por Diferentes Autores
Como se pode verificar, há algumas alterações, contudo não significativas, do
projecto inicial de Hellison. Basicamente, os trabalhos referem cinco Níveis de
Responsabilidade Social e Pessoal (NRPS) que abrangem os valores relativos
ao próprio, à sua relação com os outros e à transferência das competências
adquiridas para a vida fora da escola. Estes níveis são propostos aos alunos
ao longo de sessões de Educação Física, treino desportivo ou de actividades
de campos de férias. O número e o conteúdo de cada nível varia um pouco de
autor para autor (cf. Quadro I), de acordo com a população alvo e com os
objectivos específicos a atingir por cada um.
Hellison, 1985Williamson e Hellison,
1992
Martinek, Schilling e
Johnson, 2001Masser, 2004
Nível 0 Irresponsabilidade
Nível I Auto-controlo
Auto-controlo e respeito
pelos direitos e
sentimentos dos outros
Auto-controlo e respeito
pelos outrosRespeito/auto controlo
Nível II Empenhamento Participação e esforço Participação e esforço Participação
Nível III Auto responsabilidade Autonomia AutonomiaAutonomia / auto
responsabilidade
Nível IV Atenção aos outrosAtenção e ajuda aos
outrosAjuda aos outros Atenção aos outros
Nível VAplicação dos níveis
fora do ginásio
Aplicação fora da
Educação Física
Nível VIProjecção no trabalho e
no lazer
LXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Na 2ª edição do seu livro Teaching Responsibility Through Physical Activity
(Hellison, 2003b), Hellison apresenta uma versão actualizada dos Níveis com
base no trabalho de Masser (cf. Quadro II).
Quadro II Níveis e Componentes da Responsabilidade Pessoal e Social
Num artigo publicado em 1990, com o título “Teaching PE to At-risk Youth in
Chicago”, Hellison sublinhou o facto de os vários projectos de ensino da
responsabilidade pessoal e social implementados terem como base um
processo vivencial, de conhecimento, experiência, tomada de decisões e de
Níveis Componentes
IRespeito pelos direitos e sentimentos
dos outros
Auto-controlo
Direito à resolução pacífica dos conflitos
Direito a estar incluído
II Participação e esforço
Auto motivação
Exploração do esforço e de novas tarefas
Coragem de persistir quando a progressão é difícil
III Autonomia
Trabalho autónomo
Progresso nos objectivos
Coragem para resistir à pressão dos colegas
IV Liderança e ajuda aos outros
Atenção e compaixão
Sensibilidade e compreensão
Força interior
V Fora do ginásioTentar aplicar estas ideias noutras áreas da vida
Ser um modelo a seguir
LXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
reflexão pessoal por parte do aluno. Este processo vivencial exigia estratégias
próprias.
A primeira dessas estratégias era a tomada de consciência. Através desta
pretendia que os alunos conhecessem os Níveis de Responsabilidade Pessoal
e Social (NRPS).
A segunda consistia em proporcionar aos alunos experiências de êxito nos
diferentes NRPS convidando-os a respeitar os outros, a arriscar uma atitude
nova em relação a eles ou a perseguirem objectivos próprios no treino.
Uma terceira estratégia envolvia a tomada de decisões e a resolução de
problemas para que os alunos fossem confrontados com as suas próprias
opções e se sentissem estimulados a enfrentar os problemas propostos em
cada NRPS.
A última estratégia sugerida por Hellison era a de reservar em todas as
sessões um pouco de tempo de introspecção para que os alunos reflectissem
sobre os seus valores, intenções e comportamentos em relação aos NRPS.
Voltaremos a este assunto mais detalhadamente quando referirmos a estrutura
das sessões (ver sub capítulo 2.3)
Segundo Parker e Hellison (2001), o TPSR é um processo lento e gradual.
Neste, há uma passagem de responsabilidade do professor para o aluno e o
próprio formato das aulas pode ser usado neste sentido. Por exemplo, ao fim
de algum tempo, um aluno poderá responsabilizar-se por orientar a Conversa
de Consciencialização ou mesmo por moderar o Tempo de Reflexão.
Para Bobby Lifka, a progressão em direcção a níveis mais elevados de
responsabilidade é uma questão de se dar inicialmente ao aluno oportunidade
de intervir e fazer pequenas opções, para posteriormente lhe facilitar uma
intervenção mais significativa e opções de maior importância para si e para os
outros (Parker & Hellison, 2001).
Em toda a literatura sobre este modelo de intervenção está subjacente o
princípio de que a atitude do professor, durante a intervenção, é fundamental
XC
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
para a mudança de atitude dos alunos. Por outras palavras, o ensino da
responsabilização pessoal e social só é verdadeiramente eficaz se o professor
se relacionar com os alunos numa atitude de respeito por este. Caso contrário,
o adolescente recebe uma mensagem “dupla” e, por isso, “dúbia”, que não lhe
permitirá integrar o valor do respeito nem entender como actuar em
conformidade com ele.
É assim que, segundo o autor, se atingem metas que dizem respeito ao
desporto e à actividade física, mas cujos objectivos e estratégias transcendem
o ginásio (Hellison, 1990b).
Vários foram os instrumentos criados pelos diferentes autores no sentido de
operacionalizar a auto e hetero-avaliação propostas aos alunos. Tim Kramer,
por exemplo, utilizava alvos que afixava no ginásio, em que os círculos
representavam os vários níveis e em que, no início e no fim de cada sessão, os
alunos colocavam as suas marcas pessoais expressando, respectivamente, as
suas expectativas ou a sua auto-avaliação final (Hellison, 1995).
Outros autores, como Linda Masser (1990), usavam um cartaz de parede onde
se mostrava aos alunos o conjunto de características correspondentes a cada
nível. Os comportamentos exigidos em cada nível tinham implicações em
vários campos da vida do dia-a-dia do jovem/criança: em casa, no recreio, na
escola e na rua (ver Anexo A).
Para além dos exemplos referidos, outros houve (por exemplo, Curt Hinson,)39
que optaram por códigos de cores correspondentes a cada nível.
Independentemente da forma escolhida para trabalhar com as crianças e
jovens, o TPSR apresentou-se como uma metodologia de intervenção muito
válida que cedo se espalhou e que serviu de base a inúmeros trabalhos.
Foi utilizada em aulas de Educação Física (Hellison, 1995), em actividades de
complemento curricular (Hellison & Wright, 2003a), em programas de apoio a
crianças negligenciadas (Martinek, Schilling, & Johnson, 2001), em programas
de campos de férias (Watson, Newton, & Kim, 2003) e em vários trabalhos
39 In Hellison and Wright (2003a)
XCI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
com crianças e jovens com Necessidades Educativas Especiais (Wright, White,
& Gaebler-Spira, 2004).
Foram aplicados programas TPSR nos Estados Unidos da América, na Nova
Zelândia, em Inglaterra e em Espanha (Hellison & Walsh, 2002).
XCII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
XCIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
2.2 Resultados da aplicação do Modelo de Intervenção TPSR
Num estudo de revisão feito em 2002, Hellison e David Walsh, procurando
responder à questão “Mas isto (TPSR) dá resultado?”, recolheram conclusões
de 26 trabalhos empíricos sobre o impacto do modelo de responsabilização
(TPSR) em crianças e jovens negligenciados, ou em risco.
Verificaram que os estudos feitos permitiam tirar algumas ilações importantes.
Em relação ao atingir dos objectivos do programa:
Havia forte evidência de melhorias a nível de autocontrolo, persistência nas
tarefas, ajuda aos outros, aprendizagem dos princípios da
responsabilização, desenvolvimento da auto-estima, da autonomia, da
condição física, das habilidades motoras, da cooperação em equipa, da
capacidade de comunicação, das relações interpessoais, do sentido de
responsabilidade, da aprendizagem de conceitos desportivos e do espírito
desportivo.
Em relação à transferência dos objectivos para fora do contexto da actividade
(que transcendem o ginásio):
Havia uma forte evidência da melhoria (em sala de aula) do autocontrolo,
do esforço de trabalho, da auto-estima, da transferência dos valores da
prevenção da violência, da redução da taxa de abandono no ensino
secundário, do contributo pessoal positivo na comunidade, da redução dos
incidentes disciplinares e das chamadas de atenção por parte dos
professores, da reflexão e da melhoria das opções feitas e do
desenvolvimento da maturidade na sala de aula.
XCIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Em relação aos processos experimentados pelos participantes nos programas:
Havia forte evidência de que os jovens se tivessem divertido durante as
actividades que desenvolvessem interacção com o adulto responsável, que
desenvolvessem o sentimento de pertença ao grupo e o sentimento de
segurança.
Os resultados dos 26 trabalhos analisados evidenciaram, claramente, o
potencial da intervenção pedagógica visando a responsabilização pessoal e
social dos jovens, nomeadamente daqueles que apresentavam risco de
abandono escolar por desadaptação à escola, insucesso escolar, problemas
disciplinares, familiares ou sociais.
XCV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
2.3 Estrutura das sessões e estratégias
O modelo de intervenção proposto por Hellison para o Desenvolvimento da
Responsabilidade Pessoal e Social (TPSR) sugere um formato de aula que
obedece a uma rotina e que consiste em cinco partes (Hellison, 1990b;
Hellison, Martinek, & Cutforth, 1996; Hellison & Walsh, 2002; Parker & Hellison,
2001; Wright, White, & Gaebler-Spira, 2004):
i. Conversa individual, antes ou depois da sessão, ou noutro momento no decorrer
desta.
ii. Conversa de consciencialização no princípio da sessão que, nas sessões iniciais, tem
como principal objectivo fazer com que os alunos compreendam os Níveis deResponsabilidade Pessoal e Social.
iii. A actividade física em si, respeitando o objectivo do Desenvolvimento da
Responsabilidade Pessoal e Social (DRPS) na interacção com os alunos.
iv. Breve reunião de grupo perto do final, para que os alunos possam exprimir as suas
opiniões acerca de como correu a sessão e que alterações fazer para melhorar.
v. Tempo de reflexão para acabar, de forma que os alunos possam avaliar o nível de
responsabilidade pessoal e social atingido naquela aula.
Passaremos, em seguida, a descrever mais detalhadamente cada uma destas
partes.
2.3.1.Conversa individual
É fundamental, no contexto do TRPS, que se estabeleça uma relação de
confiança entre o professor e cada um dos alunos; daí a necessidade deste
momento.
A conversa pode ter lugar enquanto o professor prepara o material ou, no fim,
enquanto se dirigem para o balneário ou noutro momento oportuno (durante a
aula, no recreio, no refeitório...). O professor deve ter presente com quem falou
ou não, de forma a não deixar ninguém de fora, devendo mesmo fazer um
pequeno registo destas conversas.
XCVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Estes momentos de interacção podem servir para:
Reconhecer e mostrar respeito pelo esforço de cada um mencionando uma melhoria
recente ou uma habilidade conseguida, relacionar os níveis com desenvolvimentosnoutras áreas (p. ex.: académica), sublinhar o apoio dado a um colega ou a melhoria doambiente da classe, lembrar um nível que precisa de ser mais fortalecido e o potencialdo aluno para fazer melhor.
Reconhecer e mostrar respeito pela individualidade de cada, um através de um
gesto ou sorriso pessoal que forneça um feedback positivo ao esforço do aluno.
Reconhecer e mostrar respeito pela opinião do aluno, revelando genuíno interesse
pelos comentários e questões de cada um.
Reconhecer e mostrar respeito pela capacidade do aluno tomar decisões,
sublinhando as suas escolhas e a importância que estas podem ter para cada umdeles, pedindo opiniões para a solução dos problemas da aula, por ex. pedir a um alunoque se julgue já preparado que se responsabilize por tarefas de nível III ou IV (Hellison,2003b).
2.3.2. Consciencialização
Com este momento pretende-se transmitir, aos alunos reunidos, os cinco
níveis de responsabilidade que lhes vão sendo pedidos.
O professor deve ser breve e objectivo, gastando apenas alguns minutos nesta
conversa.
Pode, a partir do momento em que os alunos conhecem os vários níveis, pedir
a um deles que explique, por palavras suas, do que é que se vai tratar na aula.
As orientações devem ser dadas, tanto quanto possível, por frases curtas
(chavões) como por exemplo “ A única pessoa que te pode modificar és tu
mesmo!” ou “está bem, agora diz isso de uma forma positiva.”
O aprofundamento desta consciencialização pode ser feito de várias maneiras:
pedindo ajuda aos alunos para fazerem cumprir as regras do grupo,
perguntando-lhes como gostariam de ser tratados quando não cumprem. As
sugestões destes podem resultar em normas em que todos estejam de acordo.
XCVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
O fundamental é que os alunos se habituem a pensar a respeito dos assuntos
e a contribuir com a sua maneira de ver as coisas.
2.3.3. A actividade física
Esta corresponde à maior parte da sessão. O ensino das actividades
desportivas deve andar em paralelo com o ensino da responsabilidade pessoal
e social. Este é o pano de fundo de toda a intervenção pedagógica no contexto
da TPSR.
Perante uma ocorrência da aula, por exemplo uma disputa entre dois alunos, o
professor pode perguntar a que nível corresponde o comportamento do aluno
X, ou do aluno Y, ou dos outros que ficaram a assistir. Deste modo leva o
grupo à reflexão, à auto e à hetero avaliações.
As estratégias utilizadas devem visar a integração de todos e a autonomia de
cada um. O jogo condicionado é uma das estratégias que permite aproveitar as
capacidades de cada um e incentivar os que manifestam maiores dificuldades.
Pode desenvolver-se o espírito de equipa ensinando aos alunos técnicas de
resolução de conflitos e o tempo perdido nesta aprendizagem será recuperado,
com vantagem, para o desenvolvimento da responsabilidade pessoal e social.
2.3.4. Reunião de grupo
Neste momento da aula, pretende-se que os alunos tenham oportunidade de
exprimir os seus pontos de vista sobre a mesma, o desempenho dos colegas e
deles mesmos e até mesmo sobre a orientação dada pelo professor.
É por isso mesmo, uma oportunidade muito rica de desenvolvimento de
valores democráticos tais como: ser capaz de deliberar em grupo e reflectir
sobre o que é realmente importante para o bem comum.
XCVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
As regras orientadoras desta parte da aula baseiam-se no Nível I:
Respeitar todos durante a conversa, por exemplo, não fazer pouco ou culpar os outros
(Meadows 1992 in (Hellison, 2003b).
Incluir todos na discussão.
Resolver pacificamente os diferendos.
Normalmente, a reunião é feita no fim da sessão; no entanto, se a situação o
exigir, o professor pode iniciá-la a qualquer momento.
É muito importante que, durante estas reuniões, os jovens aprendam a tomar
decisões em grupo, a importância de as cumprir e, sobretudo, que entendam
que a sua participação na decisão faz toda a diferença. Para tal, o professor
deve proporcionar a oportunidade para os alunos experimentarem as
consequências das decisões do grupo, mesmo que estas não lhe pareçam as
melhores.
Através deste processo, tomarão consciência de que há que convencer, por
argumentação, pelo menos alguns, daquilo que é importante para cada um.
Esta aprendizagem contínua, crescente e nem sempre pacífica, pode levar os
alunos a procurarem a empatia com os outros e a considerarem pontos de
vista diversos dos seus.
Para obviar à limitação do tempo, o professor pode pedir, por exemplo, que
dois alunos digam o que mais lhes agradou e o que mais os incomodou na
aula e pedir aos outros que levantem o braço se estiverem de acordo. Desta
forma, a avaliação far-se-á na mesma sem se perder muito tempo no impasse
inicial.
2.3.5.Tempo de reflexão
Neste último momento da sessão, os alunos têm oportunidade de avaliar as
suas atitudes, intenções e comportamentos em relação aos níveis de
XCIX
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responsabilidade. O método utilizado pode variar, mas o mais simples é avaliar
o atingir de níveis separadamente.
Por exemplo: o professor começa por fazer três perguntas que ajudem a
responder à ficha de auto-avaliação (cf. Anexo J) apenas ao primeiro nível
“Quem não teve hoje nenhum problema com nenhum colega?” ou “Quem teve
um pequeno desentendimento?” ou “Quem ainda precisa de trabalhar este
aspecto?” (cf. Anexo B).
A ficha em si deve ser muito simples, usando sinais de polegar levantado, ou
de lado ou virado para baixo (ou outro esquema semelhante) para dar ideia de
três níveis de consecução dos objectivos da sessão. Depois do professor fazer
as três perguntas que naquele dia vão orientar a avaliação do primeiro nível, os
alunos reflectem e respondem na ficha. Segue-se para o nível seguinte.
Para validar o processo de auto-avaliação é necessário que o professor leia a
ficha de cada um e faça um registo/comentário em cada um, de forma a
registar também a sua impressão acerca da maneira de estar do aluno.
Outras fichas que incluam outro tipo de parâmetros, como por exemplo
condição física, habilidades desportivas, podem também ajudar a auto-
avaliação.
O nível V, em que se pede aos alunos que transfiram valores das sessões para
a vida do dia-a-dia é, por vezes, difícil de compreender. A estratégia das
perguntas orientadoras facilita a tarefa. Outra forma também possível é pedir
aos alunos que descrevam as situações vividas.
Esta maneira de avaliar ajuda a criar um ambiente de honestidade dentro do
grupo. É importante que o aluno que não teve grande êxito, em determinada
sessão, se sinta à vontade para dizer “ainda não foi desta!”.
Este ambiente leva os alunos a analisarem “o porquê” dos seus
comportamentos e as consequências dos mesmos e esta atitude introspectiva
C
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é fundamental para o desenvolvimento da competência para fazer escolhas
responsáveis.
Vários autores (por exemplo, Pete Hockett in Hellison, 2003b) utilizaram
placares, faixas pintadas ou outros materiais representativos dos níveis onde
os alunos deviam tocar no início da sessão (proposta de meta individual) e no
fim (acto da auto-avaliação). Desta forma, o professor poderia acompanhar os
esforços dos seus alunos e/ou intervir na conversa individual, caso o achasse
pertinente. É uma forma de, em caso de manifesta falta de tempo, não se
deixar que os alunos partam sem algum esforço de autoreflexão.
Para além das características que se foram referindo ao longo do presente
capítulo, o modelo de intervenção TPSR apresenta também um conjunto de
orientações de forma a ajudar na definição do perfil do professor que melhor
se lhe adapta. Poderemos destacar as seguintes:
Tratar os alunos como pessoas, com necessidades e interesses emocionais, sociais,
físicos e intelectuais.
Reconhecer os alunos como indivíduos lutadores, fortes, com voz própria e capacidade
de decisão.
Criar um ambiente física e emocionalmente seguro para a aprendizagem e para odesenvolvimento.
Estabelecer com os alunos ligações pessoais e pedagógicas de qualidade. Responsabilizar os alunos tanto quanto eles forem capazes de o ser.
Implementar este modelo através do desenvolvimento da condição física, do desporto,
dos jogos, ou de outras actividades humanas actuais (Wright, White, & Gaebler-Spira,2004).
CI
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3. Metodologia
3.1 Objectivos do estudo
Tal como referimos na Introdução, neste estudo pretendeu-se conhecer a
relação entre a aplicação do modelo de intervenção pedagógica TPSR a
alunos em situação de risco de insucesso e abandono escolares e alguns
indicadores de sucesso seleccionados, tais como: o comportamento, o
rendimento académico, a auto-estima e o gosto pela escola.
3.2. Tipo de estudo
O tipo de estudo que fizemos foi “longitudinal” de delineamento experimental.
3.3 Variáveis
3.3.1 Variável independente
Neste estudo tivemos como variável independente a categoria grupal (definida
pela participação no programa).
3.3.2 Variáveis dependentes
As variáveis dependentes do estudo foram:
- A auto-estima,
- As classificações resultantes da avaliação sumativa,
- Os problemas de comportamento,
- Os problemas disruptivos,
- A satisfação com a escola,
- O Nível de responsabilidade pessoal e social.
CII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
3.4 Duração da intervenção
A intervenção através do Grupo Desportivo Escolar iniciou-se a 8 de Novembro
de 2004 e terminou a 9 de Março, data que correspondeu ao fim do segundo
Período escolar.
Durante estes meses, houve 26 sessões: uma sessão inicial que consistiu na
reunião de todos os alunos que tinham condições para pertencerem à amostra
e 25 sessões práticas.
3.5. Enquadramento e caracterização da amostra
O grupo de alunos que participou na intervenção pertencia ao 7º ano do 3º
Ciclo de Escolaridade Obrigatória, do Instituto Nun’Alvres (INA) do Colégio das
Caldinhas em Santo Tirso.
O INA é uma escola em Contrato de Associação com o Estado Português, o
que lhe confere estatuto de escola gratuita com autonomia pedagógica.
Atende, por isso, alunos de cinco freguesias dos concelhos de Santo Tirso e
de Vila Nova de Famalicão como se duma escola do estado se tratasse.
A escola recebe crianças e jovens desde os 2 anos de idade, para a Escola
Infantil, até ao 12º ano. Disponibiliza, para além do prosseguimento de
estudos, outras ofertas formativas: Ensino Artístico Especializado de Música,
Ensino Profissional, Cursos de Aprendizagem e Cursos de Educação e
Formação Profissional Inicial.
Os concelhos de proveniência da maior parte dos alunos, Vila Nova de
Famalicão (40,11%) e Santo Tirso (47,35%), estão integrados na zona do Vale
do Ave. Esta é, actualmente, uma região em grande crise económica e social,
em virtude do desemprego e da precariedade de emprego provocada pela
CIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
desactivação de grande parte das empresas têxteis, meio de subsistência da
maior parte das famílias de onde procedem os alunos.
O nível de escolarização dos pais dos alunos era relativamente baixo, sendo
que: de 158 alunos do 7º ano, 73% tinha pai ou mãe (ou ambos) com
habilitação igual ou inferior ao 3º ciclo.
A percentagem de alunos que provinham de famílias onde o pai ou a mãe (ou
ambos) tinham habilitações iguais ou inferiores ao 1º Ciclo era de 37%.
Apenas 19% dos alunos eram filhos de pai ou mãe (ou ambos) licenciados.
No 7º ano encontrámos alunos nascidos desde 1988 até 1993, variando as
suas idades entre os 11 e os 16 anos. A média etária era de 12 anos (nascidos
em 1992) sendo esta a idade de 78% dos alunos neste nível de ensino.
Participaram neste estudo 26 alunos do 7º ano, de ambos os sexos. Destes, 6
tinham ficado retidos no 7º ano, 6 tinham transitado com dificuldades a várias
disciplinas, 3 apresentavam dificuldades de aprendizagem (sem qualquer
deficiência diagnosticada), 12 tinham 2 ou mais anos de atraso em relação ao
nível esperado de escolaridade, 10 apresentavam problemas disciplinares ou
de integração na vida escolar e 3 foram indicados pelo gabinete
psicopedagógico como adolescentes com dificuldades várias (integração e/ou
rendimento académico).
Os critérios de inclusão na amostra foram:
i. - Terem idade superior à própria para o ano que frequentavam;
ii. - Não terem transitado no ano anterior ou terem transitado com 3 ou mais disciplinas
com Nível inferior a três (situações especiais).
iii. - Apresentarem problemas sistemáticos de integração ou de relação com professores e
colegas.
iv. - Terem sido recomendados pelo Gabinete Psicopedagógico por problemas de
insucesso escolar ou disciplinar.
CIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Para poder ser incluído na amostra um aluno deveria apresentar pelo menos
um dos critérios referidos.
Todos os alunos que correspondiam ao perfil definido foram convidados a
participar numa reunião onde lhes foi proposta a integração num Grupo
Desportivo Escolar – Multi-actividades. O Grupo Experimental (GE) foi
composto pelos alunos que aceitaram participar no grupo desportivo e
considerou-se Grupo de Controlo (GC) o dos alunos que, respondendo aos
critérios de inclusão, não se inscreveram na actividade proposta.
Da aplicação dos referidos critérios resultaram dois grupos.
i. Um Grupo Experimental com 12 alunos, sendo 4 do sexo feminino e 8 do masculino.
ii. Um Grupo de Controlo com 14 alunos, sendo 5 do sexo feminino e 9 do masculino.
Os alunos distribuíram-se pelos Grupos de Controlo e Grupo Experimental
como se pode verificar nos quadros seguintes.
Quadro III Características do Grupo Experimental
Aluno/Cód Género A B C D E
e F Xb Fk F Xc M X Xh M Xl M X Xg M X X Xi F X Xd M X X X Xj M Xf M X Xa M X X
N=12 nF=4nM=8 n=4 n=3 n=5 n=7 n=2
CV
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Quadro IV Características do Grupo de Controlo
Legenda do Quadro IV e do Quadro V: A – Não transitou ou transitou com dificuldades; B – Com DA sem deficiênciadiagnosticada; C – Idade avançada (nasc. antes de 1991); D – Problemas disciplinares/desintegração; E – Indicado pelo
Gab. Psicopedagógico
Como se pode verificar, vários alunos apresentavam simultaneamente mais do
que uma das características enumeradas.
3.6. Implementação do Modelo de Intervenção TPSR
Os alunos escolhidos para a implementação do modelo TPSR foram
convidados a integrar um Grupo Desportivo, cuja modalidade não seria
previamente determinada, mas escolhida para cada sessão na sessão anterior.
Para a obtenção das autorizações necessárias para o desenvolvimento da
actividade e aplicação de instrumentos de avaliação realizamos contactos com
a Direcção Regional de Ensino do Norte, a Direcção da escola escolhida, com
o Gabinete Psicopedagógico existente na escola, com os Encarregados de
Educação e com os Directores de Turma.
Revestindo-se a participação de um carácter facultativo, a frequência era, no
entanto, determinante para a permanência no grupo.
Aluno/Cód Género A B C D E
x M Xw M X X X Xo M Xp F Xv M Xy F X Xm M Xt M X Xz M Xs F Xq M Xr M Xu F Xn F X
N=14 nF=2nM=9 n=8 n=0 n=7 n=3 n=1
CVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Durante o período de tempo em que se realizou a intervenção foram
proporcionados aos alunos dois treinos por semana: um à Segunda-feira e
outro à Quarta-feira, no intervalo grande de almoço (entre as 12.20h e as
13.20h), com a duração de uma hora aproximadamente.
Os desportos mais escolhidos foram o Andebol e o Badmínton tendo-se jogado
também, embora com menor frequência, Futebol e Goalball.
Ao longo do ano, os alunos tiveram oportunidade de competir com colegas de
uma equipa escolar de Andebol de Braga e de participar nos torneios da festa
do Colégio – as Iníadas – na modalidade de Badmínton.
Em cada uma das sessões foi preocupação nossa a criação de um clima que
proporcionasse o desenvolvimento de valores relativos ao bem-estar pessoal e
ao bem-estar social nos alunos, implicando, de forma crescente, a capacidade
de responsabilização pessoal e social dos mesmos, através da implementação
de competências nas áreas seguintes:
. Respeito pelos direitos e sentimentos dos outros
. Esforço pessoal
. Autonomia
. Atenção e ajuda aos outros.
Melhorando a capacidade de se integrar no trabalho com os outros, de persistir
no trabalho próprio, de confiar nas suas capacidades e de se responsabilizar
pelo bem comum, o aluno teve oportunidade de melhorar o seu
comportamento, o rendimento escolar, a sua integração na escola e o gosto
pela vida escolar.
Para isso, através da interacção professor/aluno, pretendeu estimular-se
competências de autocontrolo, de resolução pacífica de problemas, de
trabalhar em grupo e individualmente de forma persistente resistindo à pressão
exterior para o absentismo e encontrando a automotivação em si mesmos.
Buscou-se também em cada sessão que os alunos descobrissem formas de
CVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
manifestar atenção e compreensão pelos problemas dos outros ajudando-os e
progredindo nos níveis de responsabilidade pessoal e social.
Situações que reforçassem a auto-estima e a capacidade de se auto-avaliar
foram também sistematicamente implementadas.
Para facilitar a organização e a relação entre todos no grupo, estabeleceram-
se de início algumas regras básicas que diziam respeito, fundamentalmente ao
respeito pelo direito de expressão de cada um, à responsabilização pessoal
pelas condutas, ao direito a errar e ser ajudado, à resolução grupal dos
problemas disciplinares e à exclusão do grupo no caso de faltas sistemáticas
às sessões.
3.7. Instrumentos
Utilizaram-se neste estudo os instrumentos cuja aplicação e constituição
passamos a descrever.
Os questionários iniciais foram preenchidos sob a nossa supervisão, sendo as
dúvidas esclarecidas, reforçando-se sempre a ideia de que estes não
“contavam para a classificação” de nenhuma disciplina e de que a honestidade
de preenchimento era fundamental. O mesmo procedimento foi utilizado com
os questionários finais.
Ao longo das sessões foram aplicados alguns instrumentos de avaliação ao
grupo experimental.
Por recomendação dos autores do modelo, foram feitos registos diários sobre
as conversas individuais e sobre o decorrer de cada sessão,
fundamentalmente no que respeitava à intervenção dos alunos.
Para a utilização dos vários questionários foram pedidas aos respectivos
autores as autorizações necessárias.
CVIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
3.7.1 Versão portuguesa do Physical Self-Perception Profile (PSPPp)
Com o objectivo de estudarmos as alterações existentes, ou não, ao nível das
autopercepções dos alunos, ao longo do período de intervenção, utilizámos a
versão portuguesa do Physical Self-Perception Profile (A. M. Fonseca & Fox,
2002) (cf. Anexo I).
O número de itens é de 24, distribuídos por quatro factores: Competência
Desportiva, Condição Física, Aparência Física e Força Física.
Foi pedido aos alunos que escolhessem para cada frase o complemento que
melhor se identificava com a sua maneira de ser.
Esta identificação foi feita através de afirmações organizadas numa escala de
quatro pontos: o nível 1 correspondia à menor identificação possível (“Eu sou
completamente diferente”) e o nível 4 à maior (“Eu sou exactamente assim”).
Este questionário foi aplicado a todos os alunos pertencentes à amostra (GE e
GC) no início e no fim da intervenção.
3.7.2 Caracterização do Comportamento (Auto)
Com este questionário pretendeu-se complementar a informação existente a
respeito do comportamento dos alunos na escola.
Foi elaborado com base na caracterização dos problemas de comportamento
de J. A. Lopes (Lopes, 2002) e contém 26 itens (cf. Anexo E).
- Os itens 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 compõem o factor I - Realização Escolar.
- Os itens de 8 a 18 são englobados no factor II - Hostilidade.
- Os níveis 19, 20 e 21 incluem-se no factor III - Exigências do Papel de Aluno.
- Os níveis 22 a 26 compõem o factor IV - Isolamento Social.
CIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Os itens 19, 25 e 26 são itens de valor inverso obrigando à inversão da
pontuação.
Para o preenchimento do questionário foi solicitado aos alunos que
completassem a frase inicial de cada item com aquela que mais se identificava
com a forma como se sentiam.
As frases para completar a do questionário eram as seguintes: “ Eu sou
completamente diferente”, “Eu sou diferente”, “Eu sou assim” e “Eu sou
exactamente assim”.
A cada frase corresponde uma pontuação de 1 a 4, sendo a pontuação 1 a que
equivale a menor identificação possível.
Este instrumento foi aplicado a todos os alunos da amostra (GE e GC) no início
e no fim do período de intervenção.
3.7.3 Caracterização do Comportamento (Hetero)
Para obter, por parte dos professores, a informação sobre o comportamento
dos alunos, foi elaborado um questionário complementar do anterior (cf. Anexo
F).
A organização em factores foi a mesma, assim como a pontuação.
Este questionário foi preenchido por todos os professores do Conselho de
Turma, no início da intervenção, e pelos Directores de Turma, no fim.
Esta aplicação referiu-se a todos os alunos da amostra (GE e GC).
CX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
3.7.4 Escala da Disrupção Escolar Professada (EDEP)
Para avaliação do comportamento disruptivo escolar foi utilizada a Escala de
Disrupção Professada (EDEP), elaborada por F. H. Veiga em 1991 (Veiga,
1995, , 2001).
Trata-se de um questionário autodescritivo e contém um número limitado de
itens que revelam três dimensões específicas da disrupção escolar: a
Distracção-Transgressão, a Agressão aos Colegas e a Agressão à Autoridade
Escolar.
Estas três dimensões específicas constituem três factores correspondentes:
- Factor I - Distracção Transgressão (DT), abarca os itens 4, 8, 9, 12, 13 e 14,
faz particular alusão a esquecimentos e distracções que traduzem indiferença
pela escola, pelas aulas e pelo absentismo.
- Factor II - Agressão aos Colegas (AP), engloba os itens 1, 2, 3, 15 e 16.
- Factor III - Agressão à Autoridade Escolar (AA), inclui os itens 5, 6, 7, 10 e 11
e faz alusão a comportamentos escolares desafiadores como: ir drogado ou
bêbado para a escola ou enfrentar fisicamente professores.
Da integração destes 3 factores resulta o factor geral que reflecte a Disrupção
Global.
Quanto maior for a pontuação obtida no teste, maior será o nível de disrupção
inferida pelo professor para determinado aluno.
As respostas foram dadas através de uma escala de Likert de 6 pontos,
respeitante à frequência dos comportamentos: completamente em desacordo
(1 ponto), bastante em desacordo (2 pontos), mais em desacordo do que em
acordo (3 pontos), mais de acordo do que em desacordo (4 pontos), bastante
de acordo (5 pontos), completamente de acordo (6 pontos) (cf. Anexo C)
CXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Os itens 3 e 12, pelo facto de serem itens de não disrupção (itens inversos),
obrigam à inversão da pontuação.
Este instrumento foi aplicado a todos os alunos da amostra (GE e GC) no início
e no fim do período de intervenção.
3.7.5 Escala da Disrupção Escolar Inferida (EDEI)
Para recolha da opinião dos professores sobre Comportamento Disruptivo, foi
utilizada a Escala de Disrupção Escolar Inferida (EDE), complementar da
Escala de Disrupção Escolar Professada (EDEP) e elaborada pelo mesmo
autor (Veiga, 1995).
Denominada por Escala de Disrupção Escolar Inferida é constituída pelos
mesmos factores que a EDEP e as perguntas respeitam exactamente os
mesmos itens (cf. Anexo D).
A aplicação foi feita no início do período da intervenção, utilizando-se dois
professores que conheciam os alunos (directores de turma do ano lectivo
anterior e do presente ano), e no fim do período de intervenção, com a
colaboração do director de turma à época.
Esta aplicação referiu-se a todos os alunos da amostra (GE e GC).
3.7.6 Questionário Satisfação com a Escola
Este questionário foi elaborado com base nos itens de avaliação de J. L. Duda
e J. G. Nicholls nos seus trabalhos sobre desporto e motivação para o trabalho
escolar (Duda & Nicholls, 1992) (cf. Anexo G).
Encontra-se organizado em dois factores:
CXII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Factor 1, composto pelos três primeiros itens, diz respeito ao aborrecimento do
aluno em relação à escola (trata-se de itens inversos que obrigaram à inversão
da pontuação).
Factor 2, inclui os cinco itens seguintes que representam a satisfação e o
divertimento com a escola.
Cada item é iniciado por uma frase a que o aluno deve fazer corresponder a
resposta do questionário que mais se identifica com a maneira como
normalmente se sente.
As respostas possíveis são: “Discordo totalmente”, “Discordo”, Nem concordo
nem discordo”, “Concordo” e “Concordo totalmente”.
Este questionário foi preenchido por todos os alunos da amostra, no início e no
fim da intervenção.
3.7.7 Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (DRPS)(Auto)
Para procedermos à auto-avaliação dos alunos, em relação ao seu nível de
responsabilidade pessoal e social, utilizámos um questionário baseado nos
trabalhos do próprio autor do modelo de intervenção pedagógica TPSR
(Hellison, 1995, , 2003b).
Trata-se de um questionário com oito itens, consistindo cada um numa
pergunta a que se seguem imagens de um rosto com expressões de alegria,
indiferença e decepção. Por baixo dos três rostos que compõem as respostas
possíveis existem as expressões “Sim”, “Por vezes” e “Ainda não”,
respectivamente (cf. Anexo J).
Os vários itens estão organizados nos factores que se seguem.
Factor 1, refere-se ao 1º nível de DRPS: respeito e autocontrolo.
Factor 2, refere-se ao 2º nível de DRPS: participação e empenho.
Factor 3, refere-se ao 3º nível de DRPS: autonomia.
CXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Factor 4, refere-se ao 4º nível de DRPS: liderança e apoio.
Factor 5, contém quatro itens que se referem ao 5º nível de DRPS: (aplicação
dos níveis) fora da sessão.
Este questionário foi aplicado aos alunos pertencentes ao clube desportivo
(GE) em três momentos da intervenção.
3.7.8 Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social (DRPS)(Hetero)
Com o objectivo de recolher informação sobre o nível de responsabilidade
pessoal e social dos alunos envolvidos na intervenção, foi pedido aos seus
professores que preenchessem um questionário em relação a cada aluno.
Esse questionário foi elaborado com base numa adaptação de Contextual Self
Responsibility Questionnaire (Watson & Newton, 2001) (Anexo K).
Encontra-se organizado em factores correspondentes aos níveis de
responsabilidade:
Factor 1 - respeito e autocontrolo, inclui os itens 1, 2 e 3;
Factor 2 - participação e empenho, engloba os itens 4, 5, 6 e 7;
Factor 3 - autonomia, com os itens 8,9,10 e 11;
Factor 4 - liderança e apoio, itens 12, 13, 14 e 15;
Factor 5 - contém todos os itens, uma vez que o questionário se refere às
situações de aula com outros professores (5º nível de DRPS, aplicação dos
níveis fora da sessão).
As respostas possíveis constantes do questionário eram: “Nunca” (1),
“Raramente” (2), “Algumas vezes” (3) e “Muitas vezes” (4). Os algarismos entre
parêntesis correspondem aos pontos atribuídos a cada resposta.
CXIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Este questionário foi preenchido, no início da intervenção e no fim, pelos
professores que compunham os conselhos de turma.
3.7.9 Entrevista
Uma entrevista individual, semidirectiva, foi feita a cada aluno no fim da série
de treinos.
A formulação das perguntas-guia foi previamente preparada de forma que
estas resultassem claras e inequívocas, como por exemplo: “Em que nível de
responsabilidade pessoal e social tiveste mais dificuldade?” ou “Gostaste de
pertencer a este grupo? Porquê?”.
As respostas foram registadas em cassete áudio e posteriormente transpostas
para documentos de texto Word.
CXV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
4. Apresentação e Interpretação dos Resultados
Neste capítulo daremos a conhecer a situação inicial e final da amostra,
tentando compreender as diferenças verificadas, entre o grupo experimental
GE e o grupo de controlo GC, em relação às variáveis do estudo.
4.1Os grupos GE e GC antes da implementação do programa
Ao iniciar o ano lectivo 2004/2005 comparámos os dois grupos da amostra em
relação às variáveis em causa. Os resultados da aplicação do teste Mann
Whitney levaram-nos a rejeitar a Ho de que os dois grupos diferiam entre si
(excepção feita para a variável “Classificações do 2º Período de 2004” com
nível de significância = 0,038).
Nas figuras que a seguir se apresentam, poderemos apreciar
comparativamente as características iniciais de ambos os grupos em relação a
vários itens.
Começando por apreciar os resultados relativos às autopercepções (ver
Figura 1), verifica-se que são semelhantes entre os dois grupos, Grupo
Experimental e de Controlo.G EG C0 , 0 01 , 0 02 , 0 03 , 0 02 , 8 93 , 0 7
Figura 1 Valores Médios de Auto-estima Inicial por Grupo
CXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Ao analisarmos a figura relativa às classificações atribuídas pelos professores
no 2º período do ano anterior, podemos concluir que os alunos da amostra
apresentavam um Rendimento Académico (ver Figura 2) de nível
globalmente negativo (inferior ao nível 3 na escala de 1 a 5) que se relacionava
com a selecção de indivíduos inicialmente feita.
G EG C0 , 01 , 02 , 03 , 04 , 05 , 02 , 8 52 , 6 3
Figura 2 Comparação Entre Grupos dos de Valores Médios do Rendimento Académico Inicial
O indicador Comportamento foi avaliado através de dois testes que nos
permitiram recolher dados sobre o comportamento globalmente considerado e
o comportamento disruptivo propriamente dito.
Na representação gráfica dos resultados iniciais que se segue, é patente uma
equivalência entre os dois grupos para a variável Comportamento Geral (ver
Figura 3). A diferença dos valores médios entre GE e GC foi de 0.02 quer em
situação de auto-avaliação, quer na hetero-avaliação.
CXVII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
G EG C0 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 5 02 , 0 0A u t o - a v a l i a ç ã oH e t e r o - a v a l i a ç ã o1 , 8 91 , 9 11 , 8 71 , 9 3
Figura 3 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Comportamento Inicial Através de Auto-avaliação eHetero-avaliação
Na variável Disrupção Escolar (ver Figura 4), quando comparámos os dados
recolhidos, registámos diferença nas médias obtidas, não só entre grupos,
como também entre a imagem que os professores tinham dos alunos e a que
estes tinham de si mesmos.
Figura 4 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Disrupção Escolar Inicial dos Alunos do GE e do GCem Auto Avaliação e Hetero-avaliação
A figura 5 permite comparar os níveis iniciais de Aborrecimento e de
Satisfação e Divertimento na Escola.
Na primeira variável, podemos assinalar diferença entre os dois grupos, sendo
que o GE manifestava um maior aborrecimento com a vida escolar
(média=7,58) que o GC (média=3,63). Em relação ao item satisfação e
divertimento, ambos os grupos obtiveram níveis relativamente baixos, atingindo
valores médios de 3,63 e 3,80 respectivamente para o GE e para GC.
CXVIII
G E G C0
10
20
30
Auto-avaliaçãoHetero-avaliação
28,3327,17
21,64
31,25
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
G EG C0 , 0 02 , 0 04 , 0 06 , 0 08 , 0 0A b o r r e c i m e n t oS a t i s f a ç ã o / D i v e r t i m e n t o7 , 5 83 , 6 35 , 6 43 , 8 0
Figura 5 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Aborrecimento e Satisfação/Divertimento com a Escola
Por último, apresentamos os valores dos Níveis de ResponsabilidadePessoal e Social (ver Figura 6) da amostra. Também para este indicador é
notória a semelhança entre os dois grupos.
G EG C0 , 0 02 , 0 04 , 0 06 , 0 08 , 0 01 0 , 0 01 2 , 0 01 4 , 0 0N í v e l 1N í v e l 2N í v e l 3N í v e l 4N í v e l 59 , 8 31 2 , 0 31 0 , 6 41 1 , 6 41 1 , 0 41 0 , 0 01 1 , 9 01 0 , 4 71 1 , 3 01 0 , 9 2
Figura 6 Nível Inicial de Responsabilidade Pessoal e Social
Desta análise inicial pudemos concluir que estávamos em presença de uma
amostra composta por dois grupos semelhantes apresentando, no entanto,
CXIX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
algumas características diferentes ao nível da disrupção escolar e do
aborrecimento na escola.
4.2 Os grupos GE e GC depois da implementação do programa
Após 25 sessões de aplicação do modelo de intervenção TPSR, voltámos a
analisar resultados procurando verificar se teria havido alguma alteração nos
valores obtidos.
Da aplicação do teste de Mann Whitney concluímos que os dois grupos GE e
GC não diferiam de forma significativa no momento final da intervenção.
Tal como fizemos na fase inicial, passamos a expor os resultados
comparativos entre o GE e o GC em relação às variáveis em estudo.
A primeira figura (ver Figura 7) dá-nos a conhecer valores finais relativos às
Autopercepções.
G EG C0 , 0 01 , 0 02 , 0 03 , 0 02 , 9 23 , 1 1
Figura 7 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios da Auto-estima Final
Na figura seguinte (ver Figura 8), referente ao Rendimento Académico,verifica-se que neste segundo momento, os dois grupos apresentaram entre si
resultados semelhantes.
CXX
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G EG C0 , 01 , 02 , 03 , 04 , 05 , 02 , 6 32 , 6 6
Figura 8 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios do Rendimento Académico Final
Na avaliação final dos Problemas de Comportamento (ver Figura 9) é de
registar sobretudo uma diferença entre a auto-avaliação feita pelos alunos a
propósito do seu próprio comportamento e a opinião que os professores tinham
do mesmo facto. Esta discordância teve maior amplitude nos resultados do GC
(diferença entre auto e hetero avaliações em GC = 0,13 numa escala de 3
pontos).
G EG C0 , 0 01 , 0 02 , 0 0A u t o - a v a l i a ç ã oH e t e r o - a v a l i a ç ã o1 , 8 91 , 9 21 , 8 82 , 0 1
Figura 9 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Comportamento Geral Final em Auto e HeteroAvaliações
Assistiu-se à mesma discrepância, nos valores médios finais das auto e hetero
avaliações, em relação à Disrupção Escolar (ver Figura 10). Da mesma forma
CXXI
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que para a variável anterior, foi no GC que a diferença entre as respostas dos
alunos e dos professores atingiu maior amplitude (diferença entre auto e hetero
avaliações em GC = 4,21 numa escala de 30 pontos).
G EG C051 01 52 02 53 0A u t o - a v a l i a ç ã oH e t e r o - a v a l i a ç ã o2 5 , 9 22 5 , 4 52 4 , 4 32 8 , 6 4
Figura 10 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios de Disrupção Escolar Final em Auto e Hetero Avaliações
Na análise da figura 11, verificámos que os alunos do GE apresentaram menor
Aborrecimento com a Escola que os do GC. Os valores médios atingidos, na
avaliação final desta variável foram de 6,33 e 7,79 respectivamente para o GE e
para o GC. Em relação à Satisfação/Divertimento a média dos valores
encontrados foi ligeiramente superior para o GE (média de GE = 18,08 e média de GC =
17,50).
CXXII
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G EG C0 , 0 05 , 0 01 0 , 0 01 5 , 0 02 0 , 0 0A b o r r e c i m e n t oS a t i s f a ç ã o / D i v e r t i m e n t o6 , 3 31 8 , 0 87 , 7 91 7 , 5 0
Figura 11 Comparação Entre Grupos dos Valores Médios Finais Aborrecimento eSatisfação/Divertimento com a Escola Entre os Grupos GE e GC
Por último, na comparação dos valores médios finais dos dois grupos em
relação à Responsabilidade Pessoal e Social (ver Figura 12), o GE
apresentou níveis mais elevados em todos os itens que o GC.
G EG C0 , 0 02 , 0 04 , 0 06 , 0 08 , 0 01 0 , 0 01 2 , 0 01 4 , 0 0N í v e l 1N í v e l 2N í v e l 3N í v e l 4N í v e l 51 1 , 0 81 2 , 7 51 2 , 0 01 2 , 8 31 2 , 1 71 0 , 2 11 2 , 2 91 0 , 8 61 1 , 7 91 1 , 2 9
Figura 12 Comparação dos Valores Médios Finais do Nível de Responsabilidade Pessoal e Social Entre osGrupos GE e GC
CXXIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Para finalizar, poderemos dizer que ao longo da intervenção, e olhando à
média dos resultados de cada variável (ver Quadro V), encontrámos algumas
diferenças a salientar:
Em relação à variável Problemas de Comportamento houve um agravamento
no GC registado principalmente pelos professores (média inicial = 1,93; média
final = 2,01).
Na variável Disrupção verificou-se também um aumento na média dos
resultados do GC na auto-avaliação (média inicial = 21,64; média final =
24,43), neste aspecto os resultados obtidos na avaliação feita pelos
professores não é coincidente com a feita pelos alunos (média inicial = 31,25;
média final = 28,64). Em relação a esta variável o GE melhorou os seus
valores médios quer em auto quer em hetero-avaliação.
Ao nível do Aborrecimento e Satisfação com a escola assistimos a uma
inversão entre os valores dos dois grupos após a intervenção. Os alunos do
GE manifestaram, em termos de valores finais, mais satisfação e divertimento
na escola que os do GC, situação inversa da inicial.
Os valores do Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Socialaumentaram ao longo da intervenção de forma mais significativa para o GE
(média das diferenças entre valores finais e valores iniciais = 1,13) que para o
GC (média das diferenças entre valores finais e valores iniciais = 0,37).
Quadro V Tabelas Representando a Média para cada Variável e para cada Grupo nos Momentos Inicial e Final daIntervenção
Grupo Auto-estima Classificações Problemas de ComportamentoAuto-avaliação Hetero-avaliação
Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial FinalGE 2,89 2,92 2,85 2,63 1,89 1,89 1,91 1,92GC 3,07 3,11 2,64 2,66 1,87 1,88 1,93 2,01
CXXIV
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GrupoDisrupção
Aborrecimento e Satisfação /
Divertimento na EscolaAuto-avaliação Hetero-avaliação Aborrecimento Satisf. Divertimento
Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial FinalGE 28,33 25,92 27,17 25,42 5,58 6,33 3,63 18,08GC 21,64 24,43 31,25 28,64 5,64 7,79 3,80 17,50
GrupoNível de Responsabilidade Pessoal e Social (TPSR)
Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4 Nível 5Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial Final
GE 9,83 11,08 12,03 12,75 10,64 12,00 11,64 12,83 11,04 12,17GC 10,00 10,21 11,90 12,29 10,47 10,86 11,30 11,77 10,92 11,29
CXXV
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4.3 Análise mais detalhada da evolução individualizada dos alunos dosgrupos GE e GC
Neste ponto da presente dissertação pretendemos fazer uma análise mais
individualizada da qualidade das mudanças verificadas, uma vez que em
termos de uma estatística descritiva, fundamentalmente em relação aos
valores das médias, se concluiu que essas mudanças existiram. A nossa
intenção foi tão-somente conhecer a eficácia do programa aplicado atentando
às alterações que ocorreram com cada aluno da amostra.
Para melhor interpretar as mudanças referidas, concentrámo-nos nas figuras
dos ganhos individuais relativos a cada variável (os ganhos são calculados
pela diferença entre o valor inicial e o valor final obtido por cada aluno num
item dado), susceptíveis de sugerir alguma relação entre estes e a pertença
aos dois grupos. Desta forma, tentámos compreender como teriam evoluído os
alunos do primeiro para o último momento.
As representações gráficas que se seguem expressam os ganhos (ou perdas)
individuais dos alunos para cada um dos itens que compõem as variáveis.
Em relação à variável Auto-estima, assistiu-se a uma estabilidade ao longo do
tempo, notoriamente mais significativa no GE (ver Figuras 13 e 14).
Verificamos que dos 12 alunos do GE houve 4 em que os valores da auto-
estima desceram, 3 em que aumentaram e 5 para os quais não se registou
alteração. Constatámos que não são muito expressivos os ganhos do GE
quando comparados com os do GC em que 6/14 aumentaram a auto-estima,
5/14 diminuíram e 3 mantiveram os valores iniciais).
CXXVI
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ihkgabcfdljeA l u n o s- 1 , 5 0- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 5 0G r u p o : G E1 , 3 3- 0 , 6 7
nsourmzyvwqtxpA l u n o s- 1 , 5 0- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 5 01 , 0 0- 1 , 0 0
Figura 13 Variações de Auto-estima nos alunos do GE
Figura 14 Variações de Auto-estima nos alunos doGC
A variável Sucesso Académico resultou do cálculo da média das
Classificações do 2º Período (de 2004 e 2005). Analisando as avaliações
sumativas dos dois grupos (ver Figuras 15 e 16) verificámos que no GE houve
alterações em relação às classificações do ano anterior (10/12 baixaram as
suas notas e apenas 2/12 as subiram). No GC mantiveram as classificações
2/14 alunos, desceram 6/12 e obtiveram ganhos 6/12.
CXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
klbhagdcfjieA l u n o s- 1 , 0- 0 , 50 , 00 , 51 , 00 , 6- 0 , 6
psoxvumwqzynrtA l u n o s- 1 , 0- 0 , 50 , 00 , 51 , 00 , 8- 0 , 5
Figura 15 Variações de Sucesso Académico dosalunos do GE
Figura 16 Variações de Sucesso Académico dosalunos do GC
Nas figuras que se seguem, demos conta das alterações verificadas nos
alunos em relação ao Comportamento Geral (CG) e à Disrupção Escolar(DE) nas aulas das várias disciplinas.
Foram aplicados testes de auto-avaliação (aos alunos) ao mesmo tempo que
foi pedido aos professores o preenchimento de um questionário complementar,
de forma a corroborar a opinião que os adolescentes tinham da sua própria
forma de estar.
Nas figuras seguintes teremos, então, paralelamente aos resultados da auto-
avaliação dos adolescentes (Auto), a oportunidade de ver os resultados da
opinião dos professores acerca dos mesmos itens (Hetero)40.
De acordo com os instrumentos utilizados na observação dos
comportamentos, foram registados resultados relativos a quatro factores:40 Lembramos que os “ganhos” nestes dois factores (Comportamento/Disrupção) representam,na verdade, agravamento dos problemas de comportamento e de disrupção.
CXXVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
problemas de realização escolar, problemas de hostilidade, problemas em
cumprir as exigências do papel de aluno e problemas de isolamento social (ver
pag. 90).
CXXIX
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Nas figuras referentes ao aumento de Problemas de Realização Escolar(primeiro factor de CG) (ver Figuras 17 e 18), verificámos que o sentimento dos
alunos, em relação às suas competências de rendimento, não foi muito positivo
– apenas 5 alunos do grupo GE acharam que os seus problemas neste campo
diminuíram.afjgbidkchleA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 1 4- 0 , 7 1
oxqvtzpmwysrunA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 8 6- 0 , 7 1
Figura 17 Variações em Problemas de RealizaçãoEscolar dos alunos do GE
(Auto-avaliação)
Figura 18 Variações em Problemas de RealizaçãoEscolar dos alunos do GC
(Auto-avaliação)
A auto-avaliação, feita pelos alunos, esteve de acordo com a avaliação feita
pelos professores que os acompanharam, como se pode verificar nas figuras
que se seguem (ver Figuras 19 e 20).
CXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
efhcikgbadljA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 5 0- 0 , 4 2
nytrxwmuzqpvosA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 1 4- 0 , 7 9
Figura 19 Variações em Problemas de RealizaçãoEscolar dos alunos do GE
(Hetero-avaliação)
Figura 20 Variações em Problemas de RealizaçãoEscolar dos alunos do GC
(Hetero-avaliação)
No segundo factor, os Problemas de Hostilidade, uma primeira observação
dos resultados, poderia ter-nos levado a pensar que as alterações não tinham
grande significado.
No entanto, uma leitura mais atenta da hetero-avaliação aponta no sentido de
abrandamento dos valores envolvidos, com alguma relevância para o GE, dado
que o valor mínimo em GE foi de 0.55 e em GC foi de 0.23 (cf. Figuras 23 e
24).
CXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Por outro lado, uma observação cuidada dos “ganhos” em problemas de
hostilidade (Hetero) mostra um aumento no GC. O valor máximo em GC foi de
1.18 e em GE foi de 0.64 (cf. Figuras XXIII e XXIV).laihgjbdckfeA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 8 1- 0 , 5 4
xzupmyqvtsowrnA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 1 8- 0 , 7 2
Figura 21 Variações em Problemas de Hostilidaden nos alunos do GE nos alunos do GE (Auto-
avaliação)
Figura 22 Variações em Problemas de Hostilidadenos alunos do GC (Auto-avaliação)
ifdhaegckbljA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 6 4- 0 , 5 5
wnmuytvozpqxsrA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 1 8- 0 , 2 3
Figura 23 Variações em Problemas de Hostilidadenos alunos do GE (Hetero-avaliação)
Figura 24 Variações em Problemas de Hostilidadenos alunos do GC (Hetero-avaliação)
Em relação aos Problemas em Cumprir as Exigências do Papel de Aluno,
os alunos do GE (ver Figura 25) manifestaram progressos sensíveis, tanto nas
suas próprias avaliações (4/12 diminuíram os valores), como na hetero-
avaliação (6/12 diminuíram os valores).
CXXXI
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khcgiafjdeblA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 3 3- 0 , 6 7
wxrtszpvqmunyoA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 01 , 0 0- 0 , 6 7
Figura 25 Variações em Problemas de CumprirExigências do Papel de Aluno nos alunos do GE
(Auto-avaliação)
Figura 26 Variações em Problemas de CumprirExigências do Papel de Aluno nos alunos do GC
(Auto-avaliação)
CXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
ghiafljkbdceA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 8 3- 0 , 6 7
smvqznwupyorxtA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 6 7- 0 , 3 3
Figura 27 Variações em Problemas de CumprirExigências do Papel de Aluno nos alunos do GE
(Hetero-avaliação)
Figura 28 Variações em Problemas de CumprirExigências do Papel de Aluno nos alunos do GC
(Hetero-avaliação)
CXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Outro conjunto de Figuras que nos dá uma perspectiva positiva da presente
intervenção é o que se refere aos Problemas de Isolamento Social (ver
Figuras 29, 30, 31 e 32).
Verificámos uma diminuição dos problemas de isolamento social para os
alunos do GE, da qual dão conta também os professores (na auto-avaliação
diminuem este tipo de problema 7/12 alunos e na hetero-avaliação 6/12). No
GC assistimos também a uma diminuição nos valores desta variável mas para
um grupo mais restrito de alunos (6/14 e 5/14 para a auto e hetero avaliações
respectivamente).fagbjikhdlecA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 4 0- 0 , 8 0
pxotyurnzqswvm - 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 0A l u n o s1 , 0 0- 1 , 2 0
Figura 29 Variações em Problemas de IsolamentoSocial nos alunos do GE
(Auto-avaliação)
Figura 30 Variações em Problemas de IsolamentoSocial nos alunos do GC
(Auto-avaliação)
CXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
ebkchlgidjfaA l u n o s- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 3 0- 0 , 8 0
nptmwousqyrxvzA l u n o- 1 , 0 0- 0 , 5 00 , 0 00 , 5 01 , 0 00 , 8 0- 0 , 6 0
Figura 31 Variações em Problemas de IsolamentoSocial nos alunos do GE
(Hetero-avaliação)
Figura 32 Variações em Problemas de IsolamentoSocial nos alunos do GC
(Hetero-avaliação)
Em relação à variável Comportamento Disruptivo (CD) em ambiente escolar
(ver Figuras de 33 a 34), os progressos feitos pelo GE estenderam-se a um
número interessante de alunos, atingindo, em auto-avaliação, valores
significativos quando comparados com o GC (no GE 6/12 diminuíram os
CXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
valores de disrupção enquanto no GC apenas 3/14 registam resultados
semelhantes).
kglfjahicedbA l u n o s- 2 0- 1 001 02 0
6- 2 4
xwopvymtzsqrunA l u n o s- 2 0- 1 001 02 02 7- 1 1
Figura 33 Variações de Comportamento Disruptivonos alunos do GE (Auto-avaliação)
Figura 34 Variações de Comportamento Disruptivonos alunos do GC (Auto-avaliação)
CXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
liejkdhfbgacA l u n o s- 1 0- 8- 6- 4- 2024681 02- 5
snmypxruqwovtzA l u n o s- 1 0- 8- 6- 4- 2024681 00 , 5- 8
Figura 35 Variações de Comportamento Disruptivonos alunos do GE (Hetero-avaliação)
Figura 36 Variações de Comportamento Disruptivonos alunos do GC (Hetero-avaliação)
A análise das figuras relativas a Satisfação com a Escola, representada pelas
variáveis Aborrecimento e Satisfação/Divertimento (Ver Figuras de 37 a 40),
aponta para a melhoria da atitude dos alunos do GE. Por um lado, verifica-se
uma diminuição das situações de aborrecimento (em 8/12 dos casos), por
outro, o aumento das situações de satisfação e de divertimento na escola (em
12/12).
CXXX
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
No GC, embora os níveis de Satisfação/Divertimento tenham também
aumentado, os valores do Aborrecimento aumentaram de forma relevante
(para 10/14 alunos).lxqkwfhpbsynC ó d i g o- 6- 4- 2024624
mdetguaizjvrcoA l u n o s- 6- 4- 202466- 2
Figura 37 Variações em Aborrecimento nos alunosdo GE
Figura 38 Variações Aborrecimento nos alunos doGC
CXXXI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
qxsbykhlfnwpA l u n o s051 01 52 02 52 0 , 54 , 5
oijdczvmautgerA l u n o s051 01 52 02 52 19
Figura 39 Variações em Satisfação/Divertimentonos alunos do GE
Figura 40 Variações em Satisfação/Divertimento nos alunos do GC
Finalmente, debruçámo-nos sobre um conjunto de figuras que dão conta das
alterações verificadas em relação ao Nível do Desenvolvimento daResponsabilidade Pessoal e Social.
CXL
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
As duas primeiras (ver Figuras 41 e 42) referem-se aos ganhos dos dois
grupos, referidos pelos próprios professores, e nelas é claro o aumento da
competência dos alunos do GE (9/12) em relação aos do GC (8/14).
ikjblceghdafA l u n o s- 1 0- 5051 01 52 02 0- 7 , 5
rynsmzqtvowpxuA l u n o s- 1 0- 5051 01 52 01 5 , 2- 9 , 3
Figura 41 Variações de Nível ResponsabilidadePessoal e Social nos alunos do GE
Figura 42 Variações de Nível ResponsabilidadePessoal e Social nos alunos do GC
O segundo conjunto (ver Figuras 43 e 44) traduz o trajecto percorrido pelos
alunos do GE ao longo das sessões, de acordo com a sua própria auto-
avaliação. Embora este trajecto represente para quase todos os itens um
CXLI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
ganho entre o primeiro e o último momento (ver Figura 43), a verdade é que é
notória uma quebra na manifestação desta competência (responsabilidade)
num momento intermédio (ver Figura 44).
Para explicar este fenómeno admitimos que, num momento inicial, os alunos
pudessem não ter consciência clara do significado dos conceitos envolvidos na
avaliação. Para este tipo de dificuldades chamaram a atenção outros autores
(Hellison, 2003b; Masser, 2004; Tripp, 2004).
CXLII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
13M o m e n t o1 , 7 52 , 0 02 , 2 52 , 5 02 , 7 53 , 0 0
Mé
di
a
N 1 _ R e s p e i t o A u t o c o n t r o l oN 2 _ E m p e n h o P a r t i c i p a ç ã oN 3 _ A u t o n o m i aN 4 _ L i d e r a n ç a e A p o i oN 5 _ F o r a d a S e s s ã o
123M o m e n t o1 , 5 01 , 7 52 , 0 02 , 2 52 , 5 02 , 7 53 , 0 0
Mé
di
a
N 1 _ R e s p e i t o A u t o c o n t r o l oN 2 _ E m p e n h o P a r t i c i p a ç ã oN 3 _ A u t o n o m i aN 4 _ L i d e r a n ç a e A p o i oN 5 _ F o r a d a S e s s ã o
Figura 43 Nível Responsabilidade Pessoal e SocialMomentos inicial e final
Figura 44 Nível Responsabilidade Pessoal e SocialTrajecto durante a intervenção
À medida que as sessões foram avançando é provável que um domínio maior,
por parte dos alunos, em relação às competências a desenvolver tenha vindo a
clarificar os conceitos utilizados para a avaliação das mesmas.
23M o m e n t o1 , 5 01 , 7 52 , 0 02 , 2 52 , 5 02 , 7 53 , 0 0
Mé
di
a
N 1 _ R e s p e i t o A u t o c o n t r o l oN 2 _ E m p e n h o P a r t i c i p a ç ã oN 3 _ A u t o n o m i aN 4 _ L i d e r a n ç a e A p o i oN 5 _ F o r a d a S e s s ã o
Figura 45 Nível Responsabilidade Pessoal e Social relativo aos2º e 3º momentos
CXLIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Uma figura que contempla apenas resultados obtidos nos 2º e 3º momentos
ilustra aquilo que acabámos de expor (ver Figura 45).
Diremos, para finalizar esta análise, que pudemos concluir que houve algumas
alterações nos resultados dos alunos em relação às variáveis em estudo,
durante o período em que durou a intervenção.
Vimos que estas alterações foram assinaláveis para o GE quando se referiram
às variáveis Comportamento/Disrupção Escolar, Satisfação/Aborrecimentocom a escola e Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social.
Não houve alteração relevante no âmbito das Autopercepções. No entanto,
esta pode ser considerada uma situação positiva para o GE, uma vez que,
uma certa estabilidade neste campo pode configurar um reforço da resiliência
relativamente ao risco de insucesso (Veiga, 1995).
Verificámos ainda que, em termos de Sucesso Académico, o GE obteve
resultados negativos quando comparados com os do GC, que obteve valores
maiores na classificação final de período.
Tal facto merece um olhar mais atento em estudos próximos, uma vez que
sendo, como já referimos, o “rosto visível” do sucesso, a avaliação sumativa é
uma variável difícil de controlar41 e, ao mesmo tempo, muito resistente à
mudança em curto espaço de tempo (Hellison, 1990b; Lourenço & Paiva, 2004;
Martinek, Trouilloud, Sarrazin, & Guillet, 2002; Sparks III, 1993).
Apesar disso, outros dados que se foram recolhendo paralelamente à
intervenção mostraram-nos que, em indicadores mais discretos do sucesso, os
alunos do GE evidenciaram melhorias consideráveis quando comparados com
o GC. Tal é o caso, por exemplo, da queda em dupla e tripla retenção.
Tendo um índice de retenção mais elevado que o GC (o que decorre com
alguma naturalidade das classificações do 2º Período), os alunos do GE não
41 Lembramos mais uma vez que a compreensão de todos os seus processos é muitocomplexa () e que qualquer mudança tem que vencer a resistência das atitudes “à priori” dosprofessores e dos próprios alunos.
CXLIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
incorreram com a mesma frequência em duplas e triplas retenções (ficaram
nessa situação 2/12 do GE e 8/14 de GC), o que, em termos de prognóstico de
insucesso e abandono escolares, seria uma situação bastante mais grave
(Delgado & Gárcia López, 1994; ME, 2003; Rodrigues (org.) et al., 2003; M. H.
D. Silva, Fonseca, Alcoforado, & Vieira, 2004).
A diminuição dos Problemas em Cumprir as Exigências do Papel de Alunopode representar também um progresso no desenvolvimento pessoal do
adolescente em risco e ser um sinal de melhor prognóstico na sua inclusão no
ambiente escolar (Lopes, 2002).
Os resultados a nível dos Problemas de Isolamento Social foram positivos.
Este facto é reforçado pelas entrevistas finais feitas aos alunos, onde 60%
destes refere ter feito “novos amigos” como resultado da pertença ao grupo e
75% responde que “as sessões os ajudaram nas suas relações com os
outros”.
A diminuição destes problemas, registada quer por alunos quer professores,
pode representar progresso na situação de insucesso dos primeiros. Por trás
de um comportamento anti-social escondem-se, muitas vezes, jovens com um
autoconceito degradado, com falta de competências sociais e que se sentem
excluídos (Lopes, 2002; Veiga, 1995). Inverter o sentido destes fenómenos é
um objectivo claro da educação para a responsabilidade.
Estas conclusões estão em concordância com resultados obtidos por outros
autores (Helisson & Georgiadis, 1992; Herber & Parker, 1997; Pucket, 2000;
Wright, 2001; Cutforth, 1997; Kallusky, 2000; Lifka, 1990; Williamson &
Georgiadis)42 que, aplicando o mesmo modelo de intervenção, obtiveram
resultados positivos em relação às competências de comunicação, de
cooperação, de relação interpessoal e de ajuda aos outros.
As alterações verificadas em relação aos problemas de ComportamentoDisruptivo atingiram um número elevado de alunos. Os professores
registaram redução deste tipo de comportamentos em cerca de 75% dos
42 Citados num estudo de revisão de Don Hellison e David Walsh Hellison and Walsh (2002)
CXLV
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alunos do GE, para 64% do GC. Por sua vez, os alunos reconheceram, nas
suas auto-avaliações neste parâmetro, a melhoria para 50% dos casos no GE
e, apenas, para 21% do GC.
Uma relação positiva entre a intervenção tendo como base o modelo TPSR e a
diminuição dos problemas de disrupção foi descrita por vários autores
(Hellison, Martinek, & Cutforth, 1996; Hellison & Walsh, 2002; Sparks III, 1993;
Watson, Newton, & Kim, 2003). Esta parece ser uma das potencialidades
educativas do TPSR.
Também nas variáveis que diziam respeito ao Gosto pela Escola, o GE
manifestou aquisições quando comparado com o GC, particularmente nos
valores relativos ao aborrecimento com a vida escolar. A diminuição do
aborrecimento com a vida escolar por parte dos alunos do GE é corroborada
por outros indicadores tais como: a frequência às aulas e o gosto pela
permanência na escola expresso nas entrevistas finais.
Como curiosidade, diga-se que em relação à frequência às aulas, no ano
lectivo 2004/05, cada membro do GE faltou43 1,8 vezes, enquanto no GC, esse
número foi de 6,9 vezes. No ano anterior, os valores tinham sido de 1,5 para o
GE e de 3,7 para o GC.
Estes valores adquirem relevância se lhes juntarmos as palavras
dos próprios alunos: Aluno e - “…ganhei gosto em vir para a escola às segundas e
às quartas (eram os dias dos treinos)”;
sim… gostava mais de vir para a escola “;
Aluno h - “ vir para a escola?... Até comecei a gostar quando
pensava que tinha desporto escolar (sessões TPSR)”;
Aluno d - “quando andava mais chateada… quando vinhapara o desporto escolar ficava mais animada” (…).
43 Referimo-nos à média de faltas dada por cada grupo.
CXLVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Em relação aos desenvolvimentos no âmbito da Responsabilidade Pessoal eSocial ficou patente, na apresentação dos resultados, que houve ganhos a
salientar no GE.
Para além dos questionários que preencheram (no início e no fim do programa)
alunos dos dois grupos e respectivos professores, o GE fez, em três momentos
da intervenção, uma auto-avaliação centrada no desenvolvimento dos níveis
TPSR.
De início, como já dissemos, manifestaram uma certa dificuldade em tomar
consciência do que verdadeiramente era pedido em cada nível. Com o tempo,
no entanto, estes conceitos entraram no vocabulário do grupo e eram os
próprios alunos que chamavam a atenção quando uma das exigências de
qualquer nível estava a ser violada.
Os professores das outras disciplinas sentiram o esforço feito por cada um,
referindo, apenas, relativamente a dois alunos uma ausência de progresso na
responsabilidade. Aqui o GC teve valores diferentes, pois foram referidos seis
alunos em que não houve desenvolvimento neste âmbito.
Nas entrevistas finais, os membros do GE especificaram em que níveis tinham
tido mais dificuldade e em qual tinham progredido mais.
Os níveis mais nomeados como difíceis de ultrapassar foram o Nível 3 –
Autonomia e o Nível 5 – Aplicar os níveis apreendidos fora dos treinos.
Exemplos de respostas dadas:Aluno k - “Para mim o mais difícil foi… treinar sozinha… ir
aos treinos sem os meus amigos…”
Aluno a - “para mim o mais difícil foi… aplicar os níveis forado colégio… fazer os TPC nível 5…”
Com alguma frequência (para 5 dos alunos), o nível em que disseram ter mais
dificuldade foi também aquele em que disseram ter progredido mais. Este facto
denota esforço pessoal e autoconhecimento.
CXLVI
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
De uma maneira geral, os níveis onde a maioria disse ter progredido mais
foram o Nível 2 – Empenho e Participação e o Nível 3 – Autonomia.
Destas dificuldades, relatadas pelos membros do GE, fomo-nos apercebendo
ao longo da implementação do programa. Por isso mesmo, a programação
inicial de introdução dos níveis nas sessões foi francamente ultrapassada. O
Nível 5, por exemplo, só foi apresentado na 18ª sessão, quando nos pareceu
que, para a maior parte dos alunos, aquele era o momento propício.
Apesar disso, considerámos que ao fim das 25 sessões que compuseram a
intervenção, os alunos tinham tomado consciência e aplicado, em diferentes
graus, os cinco níveis de desenvolvimento pessoal e social e feito aquisições
importantes em relação à sua maneira de estar em escola e de se
relacionarem com os outros – colegas e professores.
Ao mesmo tempo, foram ganhando gosto pela vida escolar e adquirindo
competências que lhes foram permitindo controlar, de forma mais eficaz, o seu
comportamento.
CXLVI
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CXLIX
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5. Conclusões e Sugestões
Tendo partido para este trabalho com objectivos, que hoje reconhecemos
ambiciosos, temos a sensação de que ficámos longe das potencialidades que
o programa oferecia. Uma intervenção deste âmbito exige mais tempo e maior
domínio das variáveis em presença para que se retire dela todo o proveito e
saberes.
Apesar destas constatações poderemos concluir que os objectivos gerais deste
trabalho foram atingidos.
Analisámos em que medida a implementação de um programa de intervenção
pedagógica de conteúdo desportivo (TPSR) se poderia relacionar com alguns
factores de sucesso escolar de um grupo de alunos e os nossos resultados
parecem sugerir a utilidade da aplicação do modelo Taking Personal and
Social Responsibility como um meio para promover o desenvolvimento dos
níveis de responsabilidade pessoal e social de jovens em risco de insucesso e
abandono escolares.
Durante todo o processo, foi possível verificarmos a possibilidade de
implementação deste tipo de programa numa escola portuguesa de ensino
básico/secundário.
Para tal, fizemos as adaptações necessárias à cultura, aos hábitos de trabalho,
às estruturas e às pessoas envolvidas.
Não havia, tanto quanto conseguimos ter conhecimento, experiência de
implementação deste modelo de intervenção em Portugal. Daí que nos tenha
sido exigido um grande esforço no sentido de se preparar toda a actividade
com os alunos. Devemos, no entanto, deixar registo da ajuda empenhada que
recebemos de educadores que noutros países, nomeadamente dos EU, se
prontificaram a fornecer o esclarecimento técnico e os materiais de que
dispunham
CL
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Saber da receptividade de uma intervenção dirigida a uma população em risco
de insucesso e de abandono escolar, junto da comunidade educativa
(instituição, pais e alunos), foi também uma aquisição importante.
A iniciativa a que nos dedicámos durante um ano só foi possível porque teve
um apoio muito notório por parte dos órgãos de direcção da escola e por parte
dos professores da mesma.
Cabe-nos, por isso, salientar a adesão e apoio ao projecto por parte dos
Directores de Turma dos alunos envolvidos, vindo desta forma dar força a uma
convicção que manifestámos inicialmente: alunos em risco de insucesso e de
abandono escolares são uma preocupação premente para os principais
responsáveis pela tarefa educativa.
Por último, propúnhamo-nos estudar a relação eventual entre as diversas
variáveis em presença e a implementação do referido modelo de intervenção
pedagógica.
Concluímos, da análise das variáveis, que o modelo TPSR apresenta uma
eficácia considerável na promoção e desenvolvimento de competências de
vários domínios, a saber:
- Domínio das atitudes em relação à escola, nomeadamente do gosto pela vida
escolar e da satisfação com o ambiente de relação que esta envolve.
- Domínio das relações interpessoais com toda a exigência que a
responsabilidade social de cada um (em relação ao outro) envolve. Cabe neste
domínio toda a experiência feita pelos alunos em matéria de respeito,
compreensão e liderança.
- Domínio da responsabilidade pessoal em relação à aprendizagem própria,
isto é, esforço e perseverança no trabalho individual. As competências nesta
área foram largamente experimentadas por este grupo de alunos nas sessões
em que esteve envolvido. Foi por isso uma das etapas referidas por eles como
mais difíceis de ultrapassar.
Como limitações à implementação deste tipo de intervenção pedagógica está
em primeiro lugar o tempo.
CLI
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Todo o acto educativo visa o desenvolvimento, por outras palavras, visa a
mudança pessoal. Assim sendo, não há verdadeira mudança sem estabilidade
e convicção por parte daquele que é educado.
Quer isto dizer que o tempo para “tomar consciência” de que tanto fala
Hellison, o criador e impulsionador do TPSR, é tanto mais longo quanto
maiores forem as dificuldades dos alunos e a inexperiência dos professores
neste tipo de intervenções.
Uma outra limitação decorreu do facto de a experiência, como forma de intervir
junto dos alunos, se ficar por duas sessões por semana, integradas no âmbito
da educação desportiva e de, por isso, desperdiçar (por uma questão
específica do enquadramento deste estudo) a colaboração mais directa de pais
e da comunidade educativa em geral.
Após o estudo realizado, tendo como ponto de apoio a bibliografia consultada
e como corolário dos constrangimentos descritos, seguem-se algumas
sugestões que nos parecem oportunas para trabalhos futuros:
1- Dar especial atenção à duração deste tipo de intervenção. Outros
trabalhos (constantes da bibliografia anexa) referem experiências bem
sucedidas em Campos de Férias, dado que, tratando-se de um intervalo
de tempo mais curto, permite, porém, um contacto mais intenso com os
jovens.
2- Partilhar este tipo de experiência com os outros educadores que
trabalham com os mesmos alunos. Integrar a metodologia presente no
Projecto Curricular das Turmas, de forma a envolver todo o Conselho de
Turma.
3- Envolver pais e famílias nos objectivos dos alunos. Dar-lhes a conhecer
a forma de trabalhar e o seu papel específico na aquisição das
competências necessárias ao desenvolvimento da responsabilidade dos
alunos.
CLII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
Para finalizar, gostaríamos de deixar dito que o modelo de intervenção TPSR
tem virtualidades educativas que potenciam as da educação através do
desporto.
Por isso mesmo, e pelo contacto privilegiado que nos facultou com um grupo
inesquecível de alunos, esta foi uma experiência pedagógica muito motivante e
enriquecedora em termos pessoais e profissionais.
Mais uma vez passamos a palavra aos alunos:
“… eu continuo. Se houver grupo para o ano, eu entro!”
Aluno j
CLIII
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CLIV
Desenvolvimento da Responsabilidade Pessoal e Social, em jovens em risco, através do Desporto – Será possível?Maria Leonor Ventura Regueiras
CLV
ANEXOS
ANEXO A
Quadro de Caracterização dos Níveis de Responsabilidade Pessoal e Social Utilizado por Linda Masser(Hellison, 2003b)
ANEXO BPerguntas que podem ajudar a auto-avaliação
Nível I Quem chamou hoje nomes aos colegas? Quem resolveu uma discussão pedindo tempo? Quem teve ainda alguns problemas com os colegas? Quem perdeu hoje as “estribeiras”?
Nível II Quem levou as tarefas até ao fim? Quem ainda não aguentou todas as repetições? Quem teve que desistir antes do fim? Quem perdeu ainda algum tempo a brincar?
Nível III Quem esteve muito próximo das metas que se propôs? Quem ainda não consegui a marca que queria para hoje? Quem teve que rever as próprias metas? Quem subiu a sua marca pessoal em flexibilidade? Quem bateu hoje o seu próprio recorde em...?
Nível IV A quem ajudaste hoje? Quem encorajou o colega a fazer melhor? Quem ajudou um colega a bater o seu recorde pessoal? Quem proporcionou um bom ambiente na sessão? Quem orientou a equipa no trabalho de grupo? Quem se ofereceu para arbitrar?
Nível V Como foi o auto-controlo nas aulas durante a semana que passou? Quem estudou fez os trabalhos de casa por sua própria iniciativa? Quem teve menos chamadas de atenção durante as aulas? Quem ajudou outro no trabalho das aulas? Que objectivo pessoal conseguiste atingir esta semana? Quem fez o esforço de estudar 1 hora por dia seguida? Quem ajudou um colega a estudar uma matéria depois das aulas? Quem fez o teste sem copiar? Quem fez a tarefa domestica a que se comprometeu? Quem se propôs como meta um trabalho doméstico?
ANEXO CQUESTIONÁRIO (EDEP) Data: ___/___/___
O questionário que se segue serve para te descreveres a ti próprio(a).Para que tenha valor, peço-te que respondas com o máximo de sinceridade.As suas respostas são confidenciais e serão apenas usadas para um estudo na Faculdade deCiências do Desporto e da Educação Física da Universidade do Porto.
Muito obrigada pela tua colaboração.
Pedimos-te o favor de responder ao questionário que se segue:
As respostas são do tipo:Completamente em desacordo ................... 1Bastante em desacordo .............................. 2Mais em desacordo que de acordo ............ 3Mais de acordo que em desacordo ............ 4Bastante de acordo ..................................... 5Completamente de acordo ......................... 6
As afirmações que se seguem são para te ajudar a descrever a ti próprio. Dá as tuasrespostas como se estivesses a falar de ti próprio contigo mesmo. As tuas respostas nãoserão comunicadas a ninguém.
Lê atentamente cada afirmação. Depois marca um X na quadrícula que está mais de acordocontigo. Só podes pôr uma cruz para cada afirmação. Por exemplo na afirmação 12.“Sou pontual a chegar às aulas.” Pões um X no 2 se chegasmuitas vezes atrasado.
Afirmações Resposta1 2 3 4 5 6
1. Destruo ou estrago intencionalmente o material da escola.2. Agrido fisicamente os meus colegas.3. Sou obediente aos professores.4. Falo sem autorização, perturbando as aulas.5. Agrido fisicamente os professores. 6. Digo palavrões na aula.7. Venho bêbado(a) ou drogado(a) para a escola.8. Saio do lugar, faço barulho e outros distúrbios, perturbando a aula.9. Esqueço-me de trazer material para as aulas.10. Roubo coisas na escola.11. Agrido verbalmente os professores.12. Sou pontual a chegar às aulas.13. Falto às aulas por desinteresse.14. Estou distraído(a) nas aulas.15. Agrido verbalmente os colegas.16. Ameaço as pessoas da escola.
Depois de teres respondido ao questionário, se entenderes conveniente fazer algumcomentário, podes utilizar o verso desta folha.
Obrigado.
Código
QUESTIONÁRIO (EDEI) ANEXO D
O presente questionário insere-se num trabalho de investigação sobre Insucesso Escolar,este fazendo parte do Mestrado em Actividade Física Adaptada da Faculdade de Ciênciasdo Desporto e de Educação Física – UP, tendo como objectivo recolher a opinião deprofessores sobre comportamentos disruptivos frequentes nos alunos do 3º Ciclo.Para que se possa atingir a finalidade desejada, solicita-se que responda com o máximo desinceridade.As suas respostas são confidenciais e serão apenas usadas para o fim supra citado.
Muito obrigada pela sua colaboração.
Pedimos-lhe o favor de responder ao questionário que se segue, relativo aoscomportamentos dos alunos.
As respostas são do tipo:
Completamente em desacordo ............................................... 1Bastante em desacordo ........................................................... 2Mais em desacordo que de acordo ......................................... 3Mais de acordo que em desacordo ......................................... 4Bastante de acordo ................................................................. 5Completamente de acordo ..................................................... 6
Na folha de respostas, preencha, para cada aluno, as quadrículas com 1, 2, 3, 4, 5 ou 6,tendo em conta cada um dos itens do seguinte questionário.
17. Destrói ou estraga intencionalmente o material da escola.18. Agride fisicamente os colegas.19. É obediente aos professores.20. Fala sem autorização, perturbando as aulas.21. Agride fisicamente os professores. 22. Diz palavrões na aula.23. Vem bêbado(a) ou drogado(a) para a escola.24. Sai do lugar, faz barulho e outros distúrbios, perturbando a aula.25. Esquece-se de trazer material para as aulas.26. Rouba coisas na escola.27. Agride verbalmente os professores.28. É pontual a chegar às aulas.29. Falta às aulas por desinteresse.30. Está distraído(a) nas aulas.31. Agride verbalmente os colegas.32. Ameaça as pessoas da escola.
Depois de ter respondido ao questionário, se entender conveniente fazer algum comentário,pode utilizar o verso da folha de respostas. Obrigado.
Data ___/___/___ ANEXOE
Código
Coloca uma cruz no rectângulo que está mais de acordo com aquilo que se passa contigo.Eu sou
completamente diferente
Eu soudiferente
Eu tambémsou assim
Eu souexactamente
assim
1 Há alunos que acham que não conseguem aprender naescola...
2 Há alunos que desistem facilmente de estudar asmatérias...
3 Há alunos que dizem sempre “não sei”...
4 Há alunos que têm dificuldade em seguir as instruções dosprofessores, ou não entendem o que é que eles querem...
5 Há alunos que começam os trabalhos mas nãoconseguem acabar...
6 Há alunos que mesmo quando estudam não se lembramdas coisas nos testes...
7 Há alunos que aprendem mais devagar...
8 Há alunos que ameaçam os outros quando acham que têmrazão...
9 Há alunos que batem ou empurram os outros quandoacham que têm razão...
10 Há alunos que pintam paredes, ou estragam coisas dasoutras pessoas...
11 Há alunos que chamam nomes aos outros, ou os tratammal quando acham que têm razão...
12 Há alunos que se zangam facilmente...
13 Há alunos que são desobedientes aos professores...
14 Há alunos que sentem dificuldade em cumprir as regrasdas aulas, ou da escola...
15 Há alunos que tratam mal o material dos outros alunosmesmo sem o estragarem...
16 Há alunos que têm jeito para gozar na aula sem oprofessor dar por isso...
17 Há alunos que respondem aos professores dizendo quenão são obrigados a fazer o que eles mandam...
18Há alunos que não obedecem aos professores ficando“trombudos”, ou olhando para o lado, ou fazendo pouco doprofessor...
19 Há alunos que estão quietos nas aulas...
20 Há alunos que falam demais nas aulas...
21 Há alunos que se distraem facilmente...
22 Há alunos que são sempre os últimos a serem escolhidospara brincar ou trabalhar em grupo...
23 Há alunos que estão sempre a ser gozados pelos outros...
24 Há alunos que são muito sossegados e não fazembarulho...
25 Há alunos que oferecem para fazer tudo nas aulas...
26 Há alunos que estão sempre a chamar a atenção...
Obrigada pela colaboração.CARACTERIZAÇÃO DE COMPORTAMENTO ANEXO F
CódigoData ___/___/___
Coloque uma cruz na resposta que esteja mais de acordo com o que pensa sobre ocomportamento do aluno.
O aluno apresenta estecomportamento... Nunca Rarament
eFrequente
-mente Sempre
1 Sente-se frustrado com o seu trabalho escolar.
2 Desiste facilmente das tarefas.
3 Responde frequentemente “não sei”.
4 Tem dificuldades em seguir as orientações.
5 Tem dificuldade em acabar os trabalhos.
6 Tem baixa capacidade de retenção
7 Progride lentamente.
8 Intimida e ameaça os outros.
9 Bate ou empurra os outros.
10 Danifica propriedades ou materiais dos outros.
11 Exibe a sua hostilidade.
12 Zanga-se facilmente.
13 Opõe-se com teimosia ao professor.
14 Submete-se com dificuldade às regras.
15 Altera ou desfigura objectos, mesmo sem danificar.
16 Perturba sub-repticiamente.
17 Resiste verbalmente com expressões do como:“não me pode obrigar”, ou “não faço”.
18 Resiste de forma não verbal com atitudes do tipo:carrancudo, olhar para o lado, rir-se do professor.
19 Está quieto na aula.
20 Faz comentários ou fornece respostasinapropriadas.
21 Distrai-se facilmente.
22 Vê-se forçado a trabalhar ou a brincar sozinho.
23 É o alvo do “gozo” dos outros.
24 É sossegado e sóbrio.
25 Toma iniciativas e oferece-se como voluntário.
26 Chama a atenção sobre si próprio.
Obrigada pela colaboração.
ANEXO G
Ficha de Avaliação da Satisfação com a Escola
Data ___/___/___ Código
ItemDiscordoTotalmente Discordo
Nemconcordo
nemdiscordo
concordo Concordototalmente
Na escola, frequentemente “sonhoacordado” em vez de meconcentrar nas tarefas Na escola estou normalmenteaborrecido
Frequentemente desejo que asaulas acabem depressa
Normalmente faço as tarefas dasaulas com agrado
Normalmente gosto de aprenderna escola
Normalmente as aulas sãointeressantes
Normalmente empenho-me nasactividades da escola
Quando estou na escola o tempo“voa”
Quadros elaborados com base nos itens de Nicholls et al., 1984, 1989 (Duda and Nicholls1992)
ANEXO H
ANEXO I
ANEXO J
ANEXO KAVALIAÇÃO
RESPONSABILIDADE PESSOAL e SOCIAL
Data ___/___/___ Código
Instruções: Por favor coloque um X no quadrado que melhor representa a maneirade participar do aluno observado.
Enquanto participa na aula/sessão de ________________________
Afirmações Nunca Raramente Algumasvezes Muitas vezes
1. É paciente com os outros emantém a calma
2. Controla o seu comportamento
3. Respeita os outros
4. Empenha-se / esforça-se
5. É assíduo
6. Consegue trabalhar sozinho
7. Atinge as metas propostas
8. É capaz de controlar as suasacções
9. Responsabiliza-se pelo que faz
10. Participa activamente
11. É capaz de propor objectivos
12. Preocupa-se com os outros
13. Apoia os outros alunos notrabalho
14. Tenta fazer o que o professormanda
15. Escuta os outros alunos comatenção
Adaptação de Contextual Self Responsibility Questionnaire (Newton & Watson, 2001)
Obrigada pela Colaboração.
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