UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA EDUCAÇÃO – FAED
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
MARILIA GABRIELA PETRY
DA RECOLHA À EXPOSIÇÃO:
A CONSTITUIÇÃO DE MUSEUS ESCOLARES EM ESCOLAS PÚBLICAS
PRIMÁRIAS DE SANTA CATARINA (BRASIL – 1911 A 1952)
FLORIANÓPOLIS, SC
2013
MARILIA GABRIELA PETRY
DA RECOLHA À EXPOSIÇÃO:
A CONSTITUIÇÃO DE MUSEUS ESCOLARES EM ESCOLAS PÚBLICAS
PRIMÁRIAS DE SANTA CATARINA (BRASIL – 1911 A 1952)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade do
Estado de Santa Catarina (Udesc), como
requisito para a obtenção do título de Mestre
em Educação – Área de Concentração:
História da Educação.
Linha de Pesquisa: História e Historiografia da
Educação
Orientadora: Professora Dr.ª Vera Lucia Gaspar da Silva
Co-orientadora:
Professora Dr.ª Gisela Eggert-Steindel
FLORIANÓPOLIS, SC
2013
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da UDESC
P498d Petry, Marilia Gabriela
Da recolha à exposição : a constituição de museus escolares em
escolas públicas primárias de Santa Catarina (Brasil – 1911 a 1952) /
Marilia Gabriela Petry – 2013.
222p. : il.; 30 cm
Orientadora: Vera Lucia Gaspar da Silva
Bibliografia: p.199-220
Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado de Santa Catarina,
Centro de Ciências Humanas e da Educação, Mestrado em Educação,
Florianópolis, 2013.
1. Museus – Aspectos educacionais. 2. Museus e escolas. 3. Ensino
de primeiro grau – Santa Catarina. 4. Museu escolar. 4. Museu
pedagógico. 5. Associação auxiliar da escola. 6. Material escolar.
I. Silva, Vera Lucia Gaspar da (Org.). II. Universidade do Estado de
Santa Catarina. Mestrado em Educação. I. Título
CDD:372.83 - CDD 20ª ed.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
pela concessão de bolsa durante os dois anos em que esta pesquisa foi realizada.
À professora Vera Lucia Gaspar da Silva, pela competência, seriedade, dedicação e
entusiasmo na orientação. Agradeço o aprendizado proporcionado nestes seis anos de
convivência quase diária (desde a extensão e iniciação científica), a paciência em me orientar
em assuntos variados e o interesse por minha formação geral. Agradeço, sobretudo, a aposta
no meu potencial acadêmico, valorizando cada resumo, resenha e artigo, cuidado que me
possibilitou uma formação singular.
À professora Gisela Eggert-Steindel, por ter aceitado co-orientar esta pesquisa, pelas
leituras atentas de suas várias versões, pelas observações pontuais e correções referentes à
normalização do texto.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da Udesc, em especial
àqueles com os quais eu tive aula, por seus ensinamentos.
Às professoras Maria Helena Camara Bastos, Maria das Dores Daros e Maria Teresa
Santos Cunha por terem aceitado participar da banca de qualificação, pelas indicações,
sugestões e pela gentil cessão de material de pesquisa.
À professora Azilde Andreotti, coordenadora do Acervo Histórico do Livro Escolar
(AHLE) da Biblioteca Monteiro Lobato da Prefeitura Municipal de São Paulo, pela pronta
disposição em enviar cópia digital de livro por e-mail.
À professora Giani Rabelo, coordenadora do Grupo de Pesquisa História e Memória
da Educação (Grupehme) da Unesc, pelo envio de documentação relativa às escolas do sul
catarinense.
Aos funcionários do Arquivo Público do Estado de Santa Catarina, em especial a
Giovania Nunes e aos funcionários contratados Flávia Sardá da Conceição e Paulo Henrique
Campos, pela assistência nesses anos de pesquisa, desde a iniciação científica.
Aos funcionários da Biblioteca Pública do Estado, da Biblioteca do Instituto Histórico
e Geográfico e do Setor de Obras Raras da Universidade Federal do Estado de Santa Catarina.
À Marlei Maccari Blazius, técnica universitária do Museu da Escola Catarinense, por
ter facilitado o acesso à documentação enquanto o museu esteve fechado para reforma.
Ao Anderson Mendes, técnico universitário da Udesc, pelos inúmeros auxílios e
préstimos de socorro quando os equipamentos do grupo de pesquisa não funcionavam, pela
disponibilidade em ajudar sempre de imediato.
À Raquel Xavier de Souza Castro, por me incentivar a ingressar no mestrado e por
compartilhar comigo o desenvolver de sua dissertação.
À Danielly Samara Besen, companheira de pesquisa/extensão quando ainda estávamos
no Museu da Escola Catarinense, pelo aprendizado.
Ao Paulo Rogério Sily, pelas indicações de referências e conversas, mesmo que
breves, nos congressos.
À Elaine Aparecida Teixeira Pereira, à Fernanda de Azevedo, à Fernanda Ramos
Oliveira Prates, à Luani de Liz Souza e à Rosangela Kirst da Silveira, pelas trocas de
documentação relativa à educação em Santa Catarina e pela disposição em contribuir com
questões pontuais.
À Franciele Otto, minha primeira interlocutora acerca das associações auxiliares da
escola, por sua confiança e generosidade em partilhar seu trabalho comigo, ainda em versão
preliminar.
À Maristela da Rosa, a companhia ao longo do mestrado, o incentivo e as palavras de
alento.
Às bolsistas de iniciação científica, Ana Paula de Souza Kinchescki, Camila Mendes
de Jesus e Luiza Pinheiro Ferber, pela experiência compartilhada e pela ajuda nos arquivos,
sempre atentas ao meu objeto de estudo. Em especial à Ana, pela leitura do texto e
observações valiosas.
À Carolina Ribeiro Cardoso da Silva, pela presença, alegria, força e inteligência que
revigorou meu ânimo em 2012, pela leitura atenta do texto de qualificação e versão final da
dissertação.
Às amigas Flávia Luiza da Silva e Daira Raiser da Cruz, que pouco tenho visto, mas
que estão comigo praticamente em “nota de rodapé” a cada conversa.
À minha família, por ter possibilitado a minha vinda a Florianópolis para cursar a
graduação em Pedagogia, pela confiança e por ter apostado em minha vontade de dar
continuidade aos estudos. Particularmente às minhas irmãs: Raquel Karlise Petry, pelo auxílio
com o design gráfico; e Karine Fernanda Petry, pela leitura do texto da qualificação e por
enfatizar a importância do meu trabalho quando eu insistia em não acreditar nele.
Ao André Sato Wakasugui, por fazer parte da minha vida e tornar meus dias mais
alegres. Agradeço a ajuda nas horas mais improváveis, editando imagens e recuperando
arquivos perdidos que nunca existiram, além do subsídio de ordem tecnológica que facilitou
muito meu trabalho nos arquivos e em casa.
RESUMO
PETRY, Marilia Gabriela. Da recolha à exposição: a constituição de museus escolares em
escolas públicas primárias de Santa Catarina (Brasil – 1911 a 1952). 2013. 222 f. Dissertação
(Mestrado) - Centro de Ciências Humanas e da Educação, Universidade do Estado de Santa
Catarina, Florianópolis, 2013.
O presente trabalho tem como objeto de estudo os museus escolares introduzidos em escolas
públicas primárias do estado de Santa Catarina entre 1911 e 1952, considerados como apoio
material ao desenvolvimento de atividades pedagógicas desde o século XIX. A investigação
insere-se nas discussões acerca da cultura escolar e cultura material, tendo por referência os
trabalhos de Escolano Benito, Viñao Frago, Souza, Bucaille e Pesez, e Meneses. A análise
histórica documental permitiu mapear a incidência de museus em escolas primárias, com foco
em sua organização e sua composição material. O corpus documental da pesquisa compõe-se
de textos e livros brasileiros e estrangeiros publicados no período, de revistas educacionais,
legislação do ensino – sobretudo decretos, regulamentos, programas de ensino e circulares –,
relatórios de governo e de inspeção, de atas de reuniões pedagógicas e atas e relatórios de
museus escolares. Enquanto estratégia material para o ensino de lições concretas, os museus
fazem parte do imaginário pedagógico brasileiro, pelo menos desde 1883, quando da criação
do Museu Escolar Nacional no Rio de Janeiro, instituição voltada à exposição de objetos,
móveis e materiais de ensino, além da formação de professores que exerciam o magistério.
Pesquisas já realizadas indicam que esta instituição foi substituída pelo museu pedagógico
denominado Pedagogium, em 1890. Entre os objetivos do Pedagogium estavam a
disseminação de instituições similares em outros estados brasileiros e a organização de
museus escolares nas escolas, por sua vez compostos de coleções mineralógicas, botânicas e
zoológicas. Nas escolas públicas primárias de Santa Catarina, a introdução deste aparato
pedagógico foi prevista na reforma do ensino de 1911, durante a qual apenas os grupos
escolares recém-criados receberam em sua estrutura física espaço destinado à instalação de
um gabinete para o armazenamento de peças destinadas a compor o museu. Com ênfase,
informavam as autoridades que as coleções haviam sido compradas na França, no
estabelecimento E. Deyrolles & Fils. Dos anos 1930 em diante, o museu deixou de ser visto
como parte do aparelhamento material das escolas, tornando-se uma associação auxiliar.
Como resultado de um empreendimento por parte do Departamento de Educação, as
associações disseminaram-se pelas escolas de todo o estado. Nesse período, a presença de
museus cresceu consideravelmente, entre outros fatores, em decorrência da modificação da
sua composição material. Se no início do século XX ele era fornecido pelo poder estadual –
formado por coleções de quadros e amostras naturais importadas –, dos anos 1940 em diante
passa a ser constituído por obra de professores e alunos, com elementos por eles recolhidos e
selecionados da natureza. Contudo, apesar de transparecer uma suposta simplificação, a
tendência acompanhou as proposições teóricas elaboradas desde o século XIX, cujo objetivo
consistia em envolver as crianças na montagem dos museus, o que por si só era um meio
facilitador do ensino. A tentativa de implantação de museus em escolas catarinenses
demonstrou o desejo de sintonizar os processos educativos aqui desenvolvidos com as
“últimas” tendências pedagógicas; todavia, a partir da análise documental empreendida,
considera-se que boa parte dos museus tenha logrado mais êxito no nível simbólico do que no
didático.
Palavras-chave: Museu escolar. Museu pedagógico. Associação auxiliar da escola. Cultura
material escolar. Escola primária.
ABSTRACT
PETRY, Marilia Gabriela. From the collecting to the exhibition: the constitution of school
museums in public elementary schools in Santa Catarina (Brazil – 1911 to 1952). 2013. 222 f.
Master’s Thesis - Center of Human Science and Education, University From the State of
Santa Catarina, Florianópolis, 2013.
The purpose of the present paper is the study of school museums introduced in public
elementary schools in the state of Santa Catarina between 1911 to 1952, considered as
material support to the development of pedagogical activities since the 19th
century. The
investigation is inserted into the discussions about school culture and material culture, having
as reference the works of Escolano Benito, Viñao Frago, Souza, Bucaille and Pesez, and
Meneses. The historical document analysis made it possible to map the incidence of museums
in elementary schools, focusing in their organization and material composition. The
documental corpus of the research is composed of Brazilian and foreign texts and books
published in the period, educational magazines, education legislation – specially decrees,
regulations, educational programs and circular letters –, government and inspection reports,
pedagogical meeting minutes and school museums reports and meeting minutes. As material
strategy for teaching concrete lessons, the museums are a part of the Brazilian pedagogical
imaginary, at least since 1883 when the National School Museum of Rio de Janeiro was
created, an institution dedicated to the exhibit of educational objects, furniture and materials,
in addition to the professional training of working teachers. Previous researches indicate that
this institution was replaced by the pedagogic museum named Pedagogium, in 1890. Among
the objectives of the Pedagogium were the dissemination of similar institutions in other
Brazilian states and the organization of school museums in schools, composed by
mineralogical, botanical and zoological collections. In the public elementary schools of Santa
Catarina, the introduction of this pedagogic device was due to the education reform in 1911,
during which only newly-created school groups received in their physical structure a space for
the installation of an office to store pieces to compose the museum. Emphatically, the
authorities informed that the collections had been bought in France, at the establishment E.
Deyrolles & Fils. From the 1930’s on, the museum stopped being seen as a part of the schools
material devices, becoming an auxiliary association. As a result of an Educational
Department undertaking, the associations were disseminated through all the state schools.
During this time, the museum presence had a considerable increased, among other reasons,
due to its material composition modification. If in the beginning of the 20th
century it was
provided by the state power – formed by painting collections and imported natural samples –,
from the 1940’s on it starts being composed by teachers and students’ works, with elements
picked by them and selected from nature. However, in spite of letting show a supposed
simplification, the tendency followed the theoretical propositions elaborated since the 19th
century, which the objective consisted in involving the children in the montage of the
museums, which in itself was a facilitator way of educating. The implementation attempt of
museums in schools in Santa Catarina demonstrated the wish to sync the educational
processes developed here with the “latest” pedagogical trends; however, from the documental
analysis made, it is considered that a considerable part of the museums have achieved more
success in the symbolic level than in the didactic.
Key-words: School museum. Pedagogical museum. School auxiliary association. Material
school culture. Elementary school.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Exemplar de quadro “museu escolar” da coleção francesa........................ 34
Figura 2 - Exemplar de quadro “museu escolar” da coleção brasileira...................... 34
Figura 3 - Armário em madeira com portas de vidro.................................................. 36
Figura 4 - “Armoire porte-tableaux”........................................................................... 37
Figura 5 - Quadro mural de zoologia editado pelo Museu Nacional em 1921........... 53
Figura 6 - Quadro mural de botânica editado pelo Museu Nacional em 1922........... 53
Figura 7 - Exemplar de quadro francês para o ensino de instrução cívica.................. 69
Figura 8 - Exemplar de quadro francês para o ensino de instrução cívica.................. 69
Figura 9 - Localização dos municípios cujas escolas possuíam museu escolar entre
1944 e 1951................................................................................................
143
Figura 10 - Olavo Bilac, patrono do museu da Escola Paranaguá Mirim, Joinville..... 178
Figura 11 - D. Pedro II, patrono do museu da Escola Mista Estadual Desdobrada
Getúlio Vargas, Araquari...........................................................................
178
Figura 12 - Capa do programa de festa organizada pelo museu Pedro Américo.......... 179
Figura 13 - Desenho na ata do museu escolar Carmem Seara Leite, GE Henrique
Lage, Laguna..............................................................................................
184
Figura 14 - Desenho na capa do relatório do museu escolar, GE Olavo Bilac,
Joinville......................................................................................................
184
Figura 15 - Desenho na capa do relatório do museu escolar Getúlio Vargas, Escola
Mista Estadual de Salto, Campo Alegre....................................................
185
Figura 16 - Colagem no relatório do museu escolar, Escola Mista Estadual
Desdobrada estrada do sul km 10, Joinville...............................................
186
Figura 17 - Desenho no relatório do museu de uma escola não identificada................ 186
Figura 18 - Colagem na capa do relatório do museu escolar, Escola Mista Municipal
Donato Bulhões, São Francisco do Sul......................................................
186
Figura 19 - Desenho no relatório do museu escolar Tiradentes, Escola Mista
Municipal Guaxanduva, Joinville..............................................................
186
Figura 20 - Desenho do museu escolar Tiradentes, Escola Mista Municipal Tromba
de Pirabeiraba, Joinville.............................................................................
187
Figura 21 - “Pequena amostra do nosso museu” – Desenho do museu escolar Duque
de Caxias, Escola Mista Municipal de Barra Grande, Taió.......................
187
Figura 22 - Fotografia do museu Silva Jardim: Escola Estadual de Papanduva,
Campo Alegre, 1946..................................................................................
188
Figura 23 - Fotografia do “Material de ciências”: GE anexo ao Ginásio São José,
Porto União, 1943......................................................................................
189
Gráfico 1 - Distribuição das imagens constantes nos documentos de acordo com
categorias....................................................................................................
183
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Disciplinas em que o museu seria utilizado nos programas de ensino da
escola primária catarinense........................................................................
66
Quadro 2 - Referências de verbetes, artigos e livros que tratam sobre museus
escolares.....................................................................................................
76
Quadro 3 - Divisões e subdivisões de um museu escolar segundo Buisson................ 94
Quadro 4 - Plano de um museu escolar segundo Bannwarth....................................... 96
Quadro 5 - Estabelecimentos de ensino primário que possuíam museu segundo o
IBGE...........................................................................................................
110
Quadro 6 - Estabelecimentos de ensino primário que possuíam instituições
escolares segundo o IBGE.........................................................................
113
Quadro 7 - Estabelecimentos de ensino primário que possuíam instituições
escolares em Santa Catarina......................................................................
115
Quadro 8 - Documentos sobre museu escolar produzidos pelas escolas entre 1944 e
1951 e arquivados no Apesc – até junho de 2012......................................
142
Quadro 9 - Informações complementares da figura 9: número e nome dos
municípios e quantidade de museus localizados em cada município.........
144
Quadro 10 - Relação do acervo do museu do GE José Boiteux situado em
Florianópolis...............................................................................................
175
Apêndice - Disciplinas que constam nos programas de ensino dos grupos escolares
e escolas isoladas: 1911, 1914, 1920, 1928, 1939 e 1946..........................
221
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Apesc Arquivo Público do Estado de Santa Catarina
BA Bahia
Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CBHE Congresso Brasileiro de História da Educação
Cf. Confira
Cileme Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e Elementar
CNPq Conselho Nacional de Pesquisa
Dasp Departamento Administrativo do Serviço Público
DE Departamento de Educação
Deinfra Departamento Estadual de Infraestrutura
DF Distrito Federal
EI Escola Isolada
EPENE Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino
ER Escola Reunida
Fig. Figura
GE Grupo Escolar
Grupehme Grupo de Pesquisa História e Memória da Educação
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IHGSC Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina
Inep Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos
MA Maranhão
MG Minas Gerais
N. Número
PE Pernambuco
PI Piauí
PUC Pontifícia Universidade Católica
RJ Rio de Janeiro
SC Santa Catarina
SE Sergipe
SP São Paulo
Udesc Universidade do Estado de Santa Catarina
UFMA Universidade Federal do Maranhão
UFPel Universidade Federal de Pelotas
UFPR Universidade Federal do Paraná
Ufsc Universidade Federal de Santa Catarina
Unesc Universidade do Extremo Sul Catarinense
Unesco United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
(Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura)
USP Universidade de São Paulo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................ 13
1 MUSEUS EM VIAGEM: CIRCULAÇÃO DE IDEIAS E MODELOS
PEDAGÓGICOS.........................................................................................................
30
1.1 SENTIDOS ATRIBUÍDOS AO TERMO MUSEU ESCOLAR................................. 30
1.2 HISTÓRIA NATURAL, CIÊNCIA E ENSINO........................................................ 39
1.3 DAS EXPOSIÇÕES UNIVERSAIS À INSTITUCIONALIZAÇÃO DE MUSEUS
PEDAGÓGICOS........................................................................................................
43
1.4 DISCUSSÕES EM SOLO BRASILEIRO: O MUSEU ESCOLAR NACIONAL
(1883) E O PEDAGOGIUM (1890)...........................................................................
48
1.5 MUSEUS ESCOLARES EM SANTA CATARINA: INDÍCIOS A PARTIR DA
REFORMA DO ENSINO DE 1911...........................................................................
56
1.5.1 A presença do museu nos programas de ensino da escola primária e da
escola normal..........................................................................................................
61
2 ESCRITOS POR E PARA PROFESSORES: O MUSEU ESCOLAR EM
PERSPECTIVA..........................................................................................................
74
2.1 SELEÇÃO DE TEXTOS E AUTORES: IMPRESSÕES INICIAIS.......................... 74
2.2 PROXIMIDADADES E DISTÂNCIAS EM DEFESA DE UM “MÉTODO”.......... 82
2.3 ESPECIFICIDADE BRASILEIRA? EVERARDO BACKHEUSER (1934) E
LEONTINA BUSCH (1937)......................................................................................
90
2.4 COMO MONTAR UM MUSEU ESCOLAR: SUGESTÕES PARA O
PROFESSORADO.....................................................................................................
93
3 ASSOCIAÇÕES AUXILIARES DA ESCOLA NOS ANOS 30............................. 100
3.1 CRIAÇÃO E DISSEMINAÇÃO DE ASSOCIAÇÕES: UMA APOSTA NO
“NOVO”.....................................................................................................................
100
3.2 LEGISLAR, COMUNICAR E FISCALIZAR: IMPERATIVOS DE
HOMOGENEIZAÇÃO..............................................................................................
116
3.3 O MUSEU NA CONDIÇÃO DE ASSOCIAÇÃO AUXILIAR DA ESCOLA......... 132
4 NO INTERIOR DAS ESCOLAS: O COTIDIANO DOS MUSEUS ENTRE
1944 E 1951..................................................................................................................
140
4.1 LOCALIZAÇÃO DOS MUSEUS NO ESPAÇO E NO TEMPO............................... 141
4.2 O MUSEU NA PRÁTICA E A PRÁTICA NO MUSEU........................................... 145
4.2.1 O que faria parte dos museus e para quê............................................................. 146
4.2.2 Museu como ornamento: um espaço de visitas, de aulas ou um centro de
interesse?..................................................................................................................
148
4.2.3 Pequenos festejos: o museu a serviço da Pátria................................................... 156
4.2.4 Colecionar, classificar, limpar e expor.................................................................. 158
4.2.5 Estratégias de formação dos acervos.................................................................... 161
4.2.6 O espaço destinado ao museu................................................................................ 169
4.2.7 A diversidade dos acervos...................................................................................... 171
4.2.8 Patronos de museus................................................................................................ 177
4.2.9 Casos singulares...................................................................................................... 179
4.2.10 Modo de registro de atas e relatórios.................................................................. 180
4.3 DESENHOS, COLAGENS E FOTOGRAFIAS EM ATAS E RELATÓRIOS......... 182
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 191
REFERÊNCIAS............................................................................................................... 199
DOCUMENTOS CONSULTADOS............................................................................... 212
APÊNDICE....................................................................................................................... 221
| 13
INTRODUÇÃO
“Nenhum atributo de sentido é imanente [...] Por
isso, seria vão buscar nos objetos o sentido dos
objetos”1.
Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses
Esta epígrafe representa boa parte do percurso deste trabalho, embora sua escolha
tenha ocorrido já nas últimas etapas. A dissertação aqui apresentada foi motivada pela
descoberta de que um mesmo termo, uma palavra, quando historicizada, poderia remeter a
significados distintos. Se a pesquisa tivesse sido encerrada após a descoberta do primeiro
móvel-museu e de suas propriedades “imanentes”, por certo este texto não estaria sendo lido,
ou, outra seria a história.
O tema da dissertação começou a ser delineado em 2007 quando atuávamos como
bolsista de extensão no Museu da Escola Catarinense2
, Órgão Suplementar Superior
vinculado à Reitoria da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), naquele momento
coordenado pela professora Vera Lucia Gaspar da Silva. Cabia-nos, dentro do projeto de
extensão, intitulado “Objetos da Escola: registro e inventário dos móveis e objetos do Museu
da Escola Catarinense”, a tarefa de realizar o inventário3 das peças que compunham o acervo.
Entre as peças, havia um móvel que, em função de alguns indicativos, era considerado um
“museu escolar”. Tratava-se de um armário utilizado como armazenador de objetos
provavelmente empregados no ensino intuitivo.
A certeza quanto ao nome e função de tal armário passou a ser questionada em 2008,
momento em que passamos à condição de bolsista de iniciação científica, em projeto4
originado do projeto de extensão, cujo objetivo consistia em localizar pistas de prescrição,
compra e uso destes e outros objetos em escolas catarinenses. Naquele período, tivemos
acesso ao texto A invenção da modernidade educativa: circulação internacional de modelos
pedagógicos, sujeitos e objetos no oitocentos de autoria da professora Diana Gonçalves Vidal
1 MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Memória e cultura material: documentos pessoais no espaço público.
Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 11, n. 21, 1998. p. 89-103. 2 O Museu da Escola Catarinense foi idealizado a partir do projeto de extensão “Resgate da história e da cultura
material da escola catarinense”, em finais de 1992, coordenado pela professora Maria da Graça Machado
Vandresen, o qual deu origem a diversos projetos de pesquisa e extensão. Em agosto de 2007, ocupou sua nova
sede, o prédio construído no início do século XX para abrigar a Escola Normal Catharinense, tendo sediado, a
partir de 1963, a Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina. Também em 2007, o
museu assumiu a condição de Órgão Suplementar Superior. 3 A experiência deste trabalho está registrada em Gaspar da Silva; Petry (2011).
4 Tratava-se da primeira edição do projeto “Objetos da escola: cultura material da escola graduada (1870-1950)”
– (Udesc-CNPq).
| 14
(2009), ainda na sua versão preliminar, gentilmente cedido aos integrantes do Grupo
Temático 25 do projeto – Por uma teoria e uma história da escola primária no Brasil:
investigações comparadas sobre a escola graduada (1870-1950) –, coordenado pela
professora Rosa Fátima de Souza. Ao ler o artigo, sem conhecer as publicações anteriores
sobre este assunto, intrigou-nos “descobrir” como um mesmo termo – museu escolar –
poderia designar coisas tão diferentes. Se já tínhamos conhecimento do museu-armário,
passamos a conhecer a coleção de quadros museu escolar; estes últimos, objeto de reflexão do
artigo mencionado.
Foi-se criando assim uma imprecisão conceitual, acentuada na volta da professora
Vera Lucia Gaspar da Silva de estágio realizado na Europa quando nos entregou uma
diversidade de textos de origem portuguesa, espanhola e francesa que discorriam sobre museu
escolar e museu pedagógico. Este termo, por mais que se parecesse com os que conhecíamos,
não era sinônimo; portanto, mais um “problema” a compreender. Naquele momento, ainda
não havíamos tomado conhecimento dos trabalhos de pesquisadores brasileiros que já haviam
tratado deste assunto, mesmo não constituindo o foco principal de suas pesquisas. Portanto,
tudo era novidade e uma novidade desconcertante, pois não conseguíamos descobrir “o que
era um museu escolar de verdade”, e pensávamos que poderíamos fazê-lo.
Tomadas por essas dúvidas, fomos aos poucos encontrando vestígios da presença de
museus escolares em Santa Catarina (SC) nas idas aos arquivos durante o levantamento de
dados da pesquisa ainda na iniciação científica. O que era apenas uma inquietação, delineou-
se na problemática desta investigação: Como se constituíram os museus escolares em escolas
públicas primárias catarinenses no período de 1911 a 1952?
A fim de responder a esta questão, procuramos compreender o processo de
constituição do aparato, recorrendo à metáfora do título, desde o processo de recolha de
objetos até o momento de exposição nas salas de aula ou gabinetes. Assim é que se foi
delineando o objetivo principal deste trabalho: mapear museus que estiveram presentes em
escolas públicas primárias no período citado e dar-lhes visibilidade. Deste, derivaram os
seguintes objetivos específicos: revisitar parte da literatura pedagógica do final do século XIX
e início do XX, que de algum modo tenha discorrido sobre museus escolares; dar indicativos
de objetos que houvessem composto os acervos de museus escolares em Santa Catarina e de
como haviam sido organizados; apreender singularidades com que escolas se haviam
5 Este Grupo Temático dedicava-se ao estudo da cultura material da escola, e foi integrado naquele período pelos
seguintes professores pesquisadores: César Augusto Castro (UFMA), Diana Gonçalves Vidal (USP), Eliane
Peres (UFPel), Gizele de Souza (UFPR) e Vera Lucia Gaspar da Silva (Udesc), envolvendo também estudantes
de graduação e pós-graduação.
| 15
apropriado da proposta de instalação de museus; perceber a generalidade que se pudesse
depreender das singularidades, a fim de compor um retrato de como o museu escolar se havia
materializado em Santa Catarina no período mencionado.
Ao tratar de museu escolar, neste trabalho, se farão referências a coleções de objetos
recolhidos e organizados, além de comprados, por professores e alunos e destinados ao
ensino.
Em termos econômicos, os museus escolares poderiam tanto ser dispendiosos, quanto
simples em sua instalação e manutenção. Algumas empresas dedicavam-se a fabricar artigos
para estas coleções, tais como a conhecida Maison Deyrolle; por outro lado, há indicações que
orientam alunos e professores a organizar por conta própria e adquirir por meio de excursões,
de visitas a fábricas e de doações tudo o que fosse necessário ao ensino prático. Destes dois
formatos genéricos, o segundo será alvo de maior atenção, visto que representa o sentido de
construção de um momento de pesquisa e busca por objetos, até sua “exibição” em classe.
Neste aspecto, interessa compreender como os museus eram constituídos pelos sujeitos
escolares. Tal processo remete a dois sentidos: primeiro, de aparelhamento das escolas pelo
estado e, segundo, de seu “aparelhamento” por parte de crianças e professores.
Considerando que qualquer seleção carrega consigo algo de arbitrário, o mesmo se
aplica à delimitação de um período temporal para pesquisa. Tendo isto em mente, o critério
que se procurou seguir neste trabalho foi o da emergência e disponibilidade de documentos.
Portanto, os utilizados ao longo do texto correspondem aos que foram encontrados no período
de realização da pesquisa empírica, por isso não são considerados únicos ou mais legítimos.
Embora se tenha definido para início da análise o ano de 1911, recorreu-se a
documentos anteriores ao período, sobretudo no que se refere a literatura pedagógica e a
regulamentação do ensino em termos de Brasil, no intuito de melhor compreender a temática
(cf. capítulos 1 e 2). Levando em conta que esta pesquisa se circunscreve ao estado de Santa
Catarina, optou-se por definir como marco inicial o ano da reforma do ensino que implantou
os primeiros grupos escolares e expediu os documentos que passaram a mencionar a presença
de museus nesta modalidade escolar. Admitia-se que a entronização de museus tivesse
constituído um objetivo do governo estadual a partir desta reforma, com a previsão de um
gabinete específico para armazenar as coleções. Por outro lado, deste período parca
documentação foi localizada, com privilégio da que adveio do poder estadual, em detrimento
de registros menos autorizados como, por exemplo, anotações de professores, livros de
registros de escolas, entre outros. Ainda assim, as primeiras décadas do século XX apontam
| 16
para um projeto de modernidade educacional que deveria acompanhar o processo de
modernização urbana. A este projeto educacional filiava-se o do museu escolar.
Além dos indícios de compra de coleções para este fim (SANTA CATARINA, 1912;
SANTA CATARINA, 1914d) e da destinação de um espaço físico para a sua instalação na
estrutura dos grupos escolares, considera-se importante a “influência” então exercida pelo
estado de São Paulo. Considerado o modelo a ser seguido, este estado de fato serviu de
inspiração para Orestes de Oliveira Guimarães6, o reformador do ensino catarinense (FIORI,
1991). Os grupos escolares paulistas já dispunham de museus desde sua criação em 1883,
conforme indicado na pesquisa de Souza (1998). O exemplo das escolas paulistas, com seus
respectivos museus, foi perseguido como um “objeto de desejo” por Santa Catarina.
Por sua vez, o marco final deste estudo é o ano de 1952. Esta data se deve à forma de
organização da documentação disponível no acervo do Arquivo Público do Estado de Santa
Catarina (Apesc) relativa aos museus escolares, catalogada até este ano. Como a pesquisa foi
realizada neste acervo, bastante volumoso, que agrega documentos de todo o estado, optou-se
por não incluir documentos provenientes de escolas específicas. Este é o caso de quatro
grupos escolares situados no sul de Santa Catarina, cujos dados se referem ao período situado
entre 1955 e 19707; o mesmo ocorre com um grupo escolar de Florianópolis, cujos registros
disponíveis datam de 1965 e 1966.
Duas razões, portanto, justificam o ano-limite da pesquisa: a primeira, relacionada ao
corpus documental, composto por um conjunto de documentos de várias escolas e localidades
abrigados no Apesc; a segunda, a extensão do período de análise, que não poderia ser tão
longo, a fim de tornar possível seu exame em dois anos de pesquisa.
Nos 41 anos contemplados, se divididos por décadas, os dados levantados não se
mantêm estáveis em quantidade. Alguns períodos contêm maiores informações, como é o
caso do final da década de 1930 em diante, momento em que cresce o número de documentos
salvaguardados e disponíveis para consulta. Uma explicação para tal ocorrência está na maior
6 Paulista de Taubaté “[...] nasceu em 27 de fevereiro de 1871. Ingressou na Escola Normal de São Paulo em
1887, concluindo-a no ano de 1889 [...] Antes de vir para Santa Catarina, afora uma experiência de seis anos
como professor de escola isolada e de escola ambulante no interior paulista, Orestes Guimarães dirigira os
grupos escolares de Taubaté, sua terra natal, de Ribeirão Preto e de Botucatu. De 1906 a 1909 dirigiu o Colégio
Municipal de Joinville e de volta a São Paulo, em 1909, foi convidado para dirigir o Grupo Escolar do Braz, na
época o maior estabelecimento de ensino do Estado, aí permanecendo até 1910, quando aceita o novo
comissionamento proposto pelo Governo do Estado de Santa Catarina” (AURAS, 2006, p. 3788-3789). De
volta a Santa Catarina em 1911, ocupa o cargo de inspetor geral do ensino, atuando como reformador da
Instrução Pública. Em 1918, cria-se o cargo de inspetor federal das escolas subvencionadas pela união, posto
que será ocupado por Guimarães até o seu falecimento, em Florianópolis, no ano de 1931 (BOMBASSARO,
2006, p. 10/33). 7 Estes documentos foram localizados, digitalizados e catalogados pelo Grupo de Pesquisa História e Memória
da Educação (Grupehme) da Unesc.
| 17
regulamentação exercida por parte do Departamento de Educação (DE), que cobrava
rigorosamente das escolas que procedessem à escrituração de atas e relatórios.
Além da delimitação temporal, outras foram estabelecidas, como o tipo de instituição
que será considerado. Optou-se por investigar apenas as escolas públicas primárias8, em
detrimento das particulares, secundárias e normais, embora se tenha registro de que muitas
destas também tiveram seus museus9. Apesar de relevante o cruzamento de dados de um
mesmo “aparato didático” em diferentes níveis de ensino e instituições, para este estágio de
pesquisa o referido investimento não foi possível. Ainda assim, ao longo do trabalho não se
deixou de fazer menção a documentos provenientes de instituições de diferentes níveis de
ensino, públicas ou privadas, quando a informação foi considerada importante.
Por sua vez, o espaço de análise é alargado, pois compreende todo o estado de Santa
Catarina. Essa primeira seleção também decorreu dos vestígios. O levantamento de dados foi
realizado principalmente no acervo do Apesc, que contém um conjunto expressivo de
documentos sobre museus escolares de distintas localidades. A circunscrição a apenas uma
instituição ou município não pareceu viável, em razão do reduzido número de documentos,
sobretudo dos que registram aspectos da rotina ou do cotidiano escolar.
A fim de alcançar os objetivos propostos, investiu-se no estudo de três grandes
conjuntos documentais:
1. Impressos10
: livros, artigos e dicionários do período que incluem a discussão
sobre o tema museu escolar;
2. Documentos produzidos pelo estado: legislação do ensino (decretos,
regulamentos, regimentos e programas de ensino), relatórios de governo, de
8 Considerou-se escola primária a da esfera municipal e estadual que oferecesse quatro anos de escolarização
obrigatória, para crianças entre sete e onze anos, ou seja, ensino elementar oferecido em escolas isoladas,
reunidas ou grupo escolar. Não foram consideradas as regulamentações e programas do curso primário
complementar ou escola complementar e de escola primária supletiva. Entretanto, é importante lembrar que os
cursos complementares funcionavam muitas vezes anexos aos grupos escolares e desenvolviam algumas
atividades em conjunto com as classes primárias, caso de alguns museus investigados. Portanto, a princípio, o
museu tornava-se um instrumento didático, tanto das classes elementares quanto das complementares,
tornando-se difícil a sua análise em separado. 9 Consultar: Schlickmann (2011), acerca do museu do Seminário Sagrado Coração de Jesus, localizado no
município de Corupá/SC, e Petry (2011), acerca do museu do Ginásio Catharinense, localizado em
Florianópolis/SC. 10
Os textos estrangeiros utilizados ao longo da dissertação foram localizados nos países de origem pela
professora Vera Lucia Gaspar da Silva durante estágio realizado em junho de 2009 no Centro Internacional de
la Cultura Escolar/Espanha, coordenado pelo professor Agustín Escolano Benito, e na biblioteca particular do
professor António Nóvoa/Portugal, além de pesquisa efetuada na Biblioteca de Maestros, Argentina, em 2011.
Tal empreendimento visou a subsidiar os trabalhos da pesquisa Objetos da escola: cultura material da escola
graduada (1870-1950) – (Udesc-CNPq).
| 18
inspeção, circulares do DE e anuários estatísticos do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE);
3. Documentos produzidos por escolas: relatórios de atividades anuais, relatórios
de associações auxiliares, atas de reuniões pedagógicas, atas de associações
auxiliares e inventário escolar.
Sobre o terceiro lote de documentos é importante precisar que foram consultados
exclusivamente os volumes de atas e relatórios depositados no Apesc. Durante a conclusão da
pesquisa empírica no primeiro semestre de 2012, o fundo documental “educação” passou por
uma reorganização dos exemplares disponíveis para consulta – em torno de 450 volumes –, o
que resultou numa nova disposição das encadernações que vinham sendo consultadas. Deste
processo destaca-se que foram consultados 79 exemplares de relatórios e atas enviados por
escolas ao DE; contudo, esse número está sujeito a alteração, uma vez que o arquivo iniciou o
processo de higienização e catalogação dos documentos da educação não disponíveis para
consulta. De acordo com o índice topográfico geral do acervo (DIRETORIA..., 2010), o total
de documentos não acessíveis aproxima-se de 3.500 volumes, número expressivo e que, sem
dúvida, alteraria o corpus documental desta pesquisa e de muitas outras realizadas neste
acervo, caso viessem a ser desenvolvidas novamente. Portanto, ressalta-se que os documentos
provenientes das escolas aqui utilizados correspondem aos disponibilizados para pesquisa no
Apesc até o mês de junho de 2012.
A importância da articulação de diferentes vestígios para a escrita da história tem sido
uma questão consensual entre os pesquisadores. A este respeito, Lombardi (2004, p. 156)
salienta que “é importante não recorrer a uma única fonte, mas sim confrontar várias fontes
que dialoguem com o problema de investigação e que possibilitem (ou não) que se dê conta
de explicar e analisar o objeto investigado”. Nesta tarefa, todo tipo de indício é considerado
válido.
Contudo, mesmo com a organização de documentos em arquivos, lacunas serão
encontradas. Nunes e Carvalho (2005, p. 35) esclarecem que não cabe ao historiador “[...]
falar de tudo, determinar e articular tudo, mas sofisticar sua análise o suficiente, com o intuito
de ao menos perceber de que modo alguns aspectos, dos quais não trata diretamente (seja pelo
silêncio das fontes, seja pelas suas opções), atuam sobre aqueles nos quais se fixa”. Deste
modo, as lacunas também são utilizadas para melhor compreender o objeto.
Neste sentido, ressalta-se que, embora este trabalho busque cercar o objeto de que trata
a partir da interlocução de diversos tipos de documentos, tem-se clareza da impossibilidade de
| 19
falar de tudo, de determinar e articular tudo sobre o mesmo objeto. Além disso, embora uma
das intenções seja identificar do que se compunham esses museus, destaca-se que o acesso à
informação se faz mediante o relato escrito, pois não foram encontrados exemplares materiais
que tivessem sobrevivido ao tempo11
. Entre as possíveis razões, está a particularidade dos
acervos, compostos, em sua maioria, por peças facilmente deterioráveis. Apesar de vinculado
à noção de cultura material, cujo protocolo de pesquisa inclui a investigação a partir de
registros materiais, este trabalho não se detém na análise da materialidade propriamente dita,
mas no registro a seu respeito.
Após a apresentação dos principais marcadores metodológicos do trabalho, passa-se à
localização do objeto deste estudo no campo que lhe dá sustentação, ou seja, a História da
Educação. Nos últimos anos, é significativo o número de trabalhos que buscam fazer balanços
das produções na área da história da educação (GONDRA, 2005; LOMBARDI;
NASCIMENTO, 2004; VIDAL; FARIA FILHO, 2005), atentando para o tratamento dado a
objetos, fontes, períodos, metodologias e teorias, entre outros aspectos. Estão presentes
também aqueles que discutem redimensionamentos do campo, tanto na perspectiva da
história, quanto no da educação, com destaque para as “novas” vertentes e suas
especificidades.
Ao tratar da historiografia da educação e suas fontes, Nunes e Carvalho (2005, p. 45)
afirmam que “já se tornou um lugar-comum falar da emergência de novos objetos na
produção historiográfica contemporânea”, mas consideram que os pesquisadores estão pouco
atentos para uma questão importante desse movimento de emergência, qual seja, “[...] a de
que os novos objetos da chamada nova história são novos na medida em que são objetos cuja
historicidade adquire visibilidade, fazendo com que estudos sobre sua história passem a ser
pensados como possíveis e relevantes” (NUNES; CARVALHO, 2005, p. 45).
Entre os objetos de estudo cuja historicidade foi adquirindo, aos poucos, visibilidade
para os pesquisadores da história da educação, estão os objetos/materiais escolares (também
designados como utensílios ou artefatos). As pesquisas dedicadas parcial ou totalmente à sua
investigação relacionam-se às que se interessam pela cultura escolar, tendo-se aproximado do
11
Isto para o caso das escolas públicas primárias. Ao contrário, verifica-se que algumas instituições de ensino
privado ainda contêm exemplares ou acervos inteiros de museus constituídos ao longo dos séculos XIX e XX.
Este é o caso do Museu Irmão Luiz Gartner, localizado no Seminário Sagrado Coração de Jesus, no município
de Corupá/SC, cujo acervo foi investigado por Schlickmann (2011). Outro exemplo é o acervo do Memorial do
Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo/SP, no qual se encontram, entre outros artigos, cerca de 700
instrumentos que compuseram o museu escolar da instituição ainda no século XIX, de acordo com Braghini,
Pedro e Piñas (2011).
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que se convencionou chamar de cultura material escolar. Segundo Souza (2007, p. 170), esta
expressão:
[...] passou a ser utilizada na área da História da Educação nos últimos anos,
influenciada pelos estudos em cultura escolar, pela renovação da área provocada
pela Nova História Cultural e pela preocupação crescente dos historiadores em
relação à preservação de fontes de pesquisa e de memória educacional em arquivos
escolares, museus e centros de documentação.
A preocupação quanto à preservação de vestígios aproximou os historiadores da
educação de outros campos, como da biblioteconomia, arquivologia, antropologia e
museologia. À medida que esses objetos (carteiras, quadros, livros, mapas, globos, cadernos,
etc.) passaram a ser preservados, mas não necessariamente de modo conjunto, os
pesquisadores têm buscado ferramentas para construir análises sobre os artefatos12
e a partir
deles, pois entendem que tais materiais podem constituir fonte e objeto de pesquisa.
No curso desse processo de salvaguarda e interlocução, um número ainda reduzido,
porém crescente, de pesquisas foi realizado, tendo por ponto fulcral um ou mais objetos de
destinação escolar. Essa ampliação das discussões no âmbito da cultura material escolar pode
ser observada a partir dos eixos temáticos que agrupam os trabalhos em congressos de história
da educação. Por exemplo, o Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação do ano de
2010 contou com um eixo dedicado à cultura material. Esta inserção se verifica também no
Congresso Brasileiro de História da Educação (CBHE), de 2011, e novamente no Luso-
Brasileiro de 2012, bem como nos eixos propostos para o CBHE de 2013.
Dos estudos acerca da materialidade, os que se ocupam de livros e cadernos compõem
um grupo significativo, abrangendo um leque numeroso de pesquisas (SOUZA, 2007). Já a
investigação de artefatos materiais referentes a mobiliário13
, utensílios de escrita14
(caneta,
tinteiro, mata-borrão), materiais visuais sonoros e táteis15
(globos, mapas, projetores),
instrumentos organizadores do ensino (livro de chamada, relógio, campainha, quadro de
12
Sobre essa questão, arriscamo-nos a dizer que temos sido mais felizes em interpretar discursos acerca dos
objetos, seja por meio de entrevistas, legislação, imagens ou catálogos de empresas, do que propriamente a
partir de exemplares físicos, com exceção daquelas pesquisas voltadas a livros, manuais, jornais, entre outros
impressos. 13
Ver produções de Raquel Xavier de Souza Castro, Valdeniza Maria Lopes da Barra e Wiara Rosa Rios
Alcântara. 14
Trabalhos acerca desta temática têm sido desenvolvidos por Diana Gonçalves Vidal e Silvina Gvirtz, entre
outros. 15
Ver pesquisas de Reginaldo Alberto Meloni acerca dos instrumentos para o ensino de física e química.
| 21
avisos), bem como ornamentos, jogos, brinquedos, trabalhos de alunos16
, entre outras
expressões materiais17
, congregam ainda um número reduzido. Para Souza (2007, p. 165), a
presença de poucos estudos dedicados à história da cultura material escolar no Brasil, no
momento da publicação de seu texto, justificava-se, pois se tratava “[...] da construção de um
objeto de pesquisa, uma nova entrada para a decifração das práticas educativas”. De lá para
cá, vários têm sido os empreendimentos no sentido de melhor definir este objeto.
Entre outras iniciativas presentes no cenário brasileiro, registra-se um fórum
especialmente dedicado ao estudo da cultura material escolar em suas diversas expressões.
Trata-se de um grupo de trabalho criado no interior do projeto de pesquisa já anunciado,
intitulado Por uma teoria e uma história da escola primária no Brasil: investigações
comparadas sobre a escola graduada (1870-1950), coordenado pela professora Rosa Fátima
de Souza, entre 2008 e 2010, e, posteriormente, no projeto História da escola primária no
Brasil: investigação em perspectiva comparada em âmbito nacional (1930-1961), iniciado
em 2011, sob a mesma coordenação. Dentro desses dois projetos, um dos grupos de trabalho
dedicou-se a investigar questões relativas aos materiais de ensino, mobiliário, edificações,
enfim, registros materiais que informam sobre uma cultura material advinda da escola. Deste
grupo, na primeira e segunda edição, fez parte o projeto intitulado Objetos da escola: cultura
material da escola graduada (1870-1950), coordenado pela professora Vera Lucia Gaspar da
Silva e desenvolvido ao abrigo da Udesc, projeto ao qual esta investigação se atrela.
Uma vez estabelecido o campo em que esta pesquisa se situa, passamos à apresentação
das concepções a que ela se vincula. A primeira delas é a discussão a respeito da cultura
material, com a ressalva de que não pretende recompor a materialidade das escolas e/ou
museus investigados. Tomam-se aqui as referências com origem na história e na museologia
que problematizam a noção de cultura material como suporte à compreensão da história, neste
caso, escolar. Estas referências contribuem no sentido de visualizar os objetos como
portadores de significados e como peças importantes para elucidar questões que outros
registros não possibilitam. Contudo, saber quais objetos compunham os museus e
compreender sua lógica de funcionamento em consonância com os métodos pedagógicos não
é suficiente para compreender a cultura material; fornece, no limite, dados que a explicam
parcialmente.
16
A maioria das pesquisas em relação a este material diz respeito aos cadernos escolares. Sobre a temática ver
produções e coletâneas organizadas por Ana Chrystina Venancio Mignot, além de trabalhos de Maria Helena
Camara Bastos, Maria Teresa Santos Cunha, Silvina Gvirtz, entre outros. 17
Categorias extraídas do relato dos trabalhos de pesquisa presente em Castro (2011).
| 22
O uso feito dessa noção (BUCAILLE; PESEZ, 1989) é como um desdobramento da
noção de cultura escolar, ou seja, o campo de referência é a história da educação, e não
diretamente a história, ou então a arqueologia. Deste modo, a expressão cultura material é
empregada no sentido de que considera as condições materiais; considera que os objetos
caracterizam esse ambiente escolar e, portanto, fundam uma cultura específica.
Segundo os autores Bucaille e Pesez (1989), a noção de cultura material não chega a
constituir um conceito, se restringido a uma ideia ou expressão. Embora tenha sido
largamente usada, nunca foi definida. Seu uso ocorre de modo implícito nos trabalhos; ainda
assim, não se trata de uma noção precisa e transparente, nem de fácil apreensão. A
constituição dessa noção no percurso da história se inicia a partir de 1850, período em que a
ciência aplica a atenção ao concreto e à “[...] vontade de nele basear a explicação e a síntese”
(BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 14). Até os anos 1920, a noção “[...] completa o seu longo
processo de maturação e toma realmente corpo” (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 15). É nesse
momento que passa a “ser objeto de história” e o estudo da cultura material torna-se então
história da cultura material.
Segundo estes autores, os estudiosos da pré-história foram desde cedo levados ao
estudo da cultura material, pela especificidade de suas fontes, concretas, e pela ausência de
arquivos escritos. Se o estudo da cultura material se tivesse limitado à exploração de
documentos escritos, sua história seria breve (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 18). Por outro
lado, só a presença dos objetos não resolve o problema, pois, “[...] a cultura material é
composta em parte, mas não só, pelas formas materiais da cultura” (BUCAILLE; PESEZ,
1989, p. 20). Além disso, ela está interessada pela cultura do “grosso da população”, ou seja,
pela cultura do majoritário, do coletivo, não do individual e particular; interessa-se por fatos
repetidos, estáveis, portanto, em quantidade e tempo longos (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p.
21).
Para os autores, a explicação sobre os objetos deve introduzi-los “[...] onde encontram
o seu lugar e o seu significado” (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 24). Para tanto é necessário
conhecer o objeto em termos de dimensão, forma, matéria, modos de fabricação e
proveniência, para que o ambiente que lhe deu origem possa ser explicado, bem como o grupo
sociocultural de onde provém, a época, como e porque foi concebido, utilizado e
compreendido (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 24-25).
Longe de não atentar para a atuação humana nesse contexto, os autores lembram que
“a vida material é constituída pelos homens e pelas coisas, pelas coisas e pelos homens”
(BRAUDEL, 1967 citado por BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 28). Vale lembrar que quem
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pensa o espaço, constrói, habita, modifica, destrói etc. é o ser humano; portanto, compreender
essas variáveis materiais permite, sem dúvida, compreender esse sujeito.
Entre os intelectuais brasileiros, Ulpiano Bezerra de Meneses, referência nas
discussões acerca da cultura material, em entrevista recente concedida à revista Estudos
Históricos (2011) fez várias considerações a respeito dessa temática de pesquisa. Um primeiro
princípio a se considerar nesse tipo de estudo, de seu ponto de vista, é que o interesse da
pesquisa deve recair sobre o estudo da sociedade; entretanto, estudá-la holisticamente é
bastante difícil. Por isso, são selecionados pontos de observação, são estabelecidas “fatias”,
entre as quais estão a arte, os objetos, etc.
Nesse sentido, Meneses (2003, 2011) aponta que não deve haver uma história da
cultura material, pois:
[...] aí não é história, é história documental, é história de fonte. Você estaria
confundindo a fonte com o problema. Você faz a história das meias, das escovas de
dente, do que quer que seja [...] Mas, para mim, a cultura material deve dar conta da
dimensão material de qualquer segmento da vida social. Em todos os segmentos da
história há uma dimensão sensorial: na história econômica, na história política, na
história institucional, na história das minorias, das maiorias, seja lá o que for. Então,
a ideia de uma história à parte do material, para mim, desfigura a natureza do
problema histórico (MENESES, 2011, p. 422).
Em certa medida, o desmembramento dos componentes materiais de uma escola para
um estudo particular pode transformar o resultado em uma “história das coisas”, do objeto e
não da escola. Neste sentido, o estudo dos objetos escolares deveria ter no horizonte a
compreensão da escola e, num espectro maior, da sociedade; caso contrário, será feita uma
história da fonte, como aponta o autor.
Nesta direção, o artefato deve ser tomado como documento para estudar a sociedade e
ser visto como uma das dimensões do jogo social. Para Meneses:
[...] O estudo da cultura material não é o estudo das fontes materiais. A natureza do
problema histórico é que vai configurar a materialidade a ser trabalhada. Para isso,
supõe-se que as fontes materiais tenham alguma coisa de específico a dizer, mas não
se trata de fazer história dos documentos, história de fontes (MENESES, 2011, p.
423).
Tendo isso em mente, os objetos devem assumir o mesmo estatuto de qualquer outro
documento, sendo utilizados quando capazes de auxiliar a compreender o problema da
pesquisa, ao invés de ser tomados como o problema. Do mesmo modo que nenhum
documento fala por si só, o documento material segue a mesma regra (MENESES, 1998).
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Cientes dessas questões, advindas de um campo diversificado, que engloba a pré-
história, a antropologia, a arqueologia e a história, os historiadores da educação tomaram de
empréstimo a noção de cultura material, adjetivando-a para escolar.
Souza (1998, p. 224), apoiada em Viñao Frago (1995), considera que “o aparecimento,
uso, transformação e desaparecimento dos objetos escolares são reveladores das práticas
educacionais e suas mudanças”. Tendo isso em mente, buscou compreender três elementos
materiais representantes da escola primária paulista: cadernos, livros de leitura e museus
escolares, os quais, de acordo com a autora, “[...] tiveram um significado importante na
configuração da cultura escolar” (SOUZA, 1998, p. 228) daquela escola.
Nessa mesma direção, estudos que têm investigado a cultura escolar se preocupam
com a questão material, por entenderem que compõe uma das dimensões dessa. Para Viñao
Frago (1995), a cultura escolar corresponde a um “conjunto de aspectos institucionalizados”,
que engloba: práticas e condutas, modos de vida, hábitos e ritos, “[...] objetos materiales –
función, uso, distribución en el espacio, materialidad física, simbología, introducción,
transformación, desaparición [...]”18
(VIÑAO FRAGO, 1995, p. 68-69), modos de pensar,
significados e ideias compartilhadas. Entre estes aspectos, alguns são considerados mais
importantes pelo autor, pois são elementos organizadores que conformam e definem essa
cultura; entre eles, o autor tem dado mais atenção ao tempo e ao espaço.
Assim como Viñao Frago, Escolano Benito é um dos historiadores da educação que se
dedica ao estudo de questões envolvendo os materiais escolares. No seu entendimento, a
escola nos legou e tem legado utensílios materiais que são “reflexos” de sua cultura empírica,
de uma tradição corporativa agregada ao ofício do professor e também aos discursos teóricos
e normativos projetados sobre a escolarização (BENITO, 2010, p. 16). Poder-se-ia pensar, a
partir disso, que a investigação dos artefatos pode contribuir para o entendimento do mosaico
da cultura escolar, seja pela adoção dos objetos como instrumentos de trabalho do professor,
seja pela indicação nos discursos da necessidade de determinadas condições materiais para a
realização do ensino; tanto pelo clamor dos professores em relação a melhores condições reais
de trabalho, quanto pelos governantes no anúncio de investimentos em estrutura material às
escolas, como expressão de avanço, modernidade e qualidade do ensino.
Para pensar na dimensão material da cultura das escolas, Martín (2006) considera três
variáveis como fundamentais, a saber: o edifício, o mobiliário e o material de ensino. No caso
do museu, estes elementos encontram-se imbricados, uma vez que a ele é destinada uma sala
18
“[...] objetos materiais – função, uso, distribuição no espaço, materialidade física, simbologia, introdução,
transformação, desaparecimento [...]” (Tradução nossa).
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específica em determinadas escolas, por ele se ordenar de acordo com o mobiliário – para a
disposição das coleções –, e por fornecer (ou ser?) o material didático para o desenvolvimento
das aulas. Segundo Martín (2006), a investigação didática considera o material de ensino
como um componente essencial na determinação e controle do currículo, uma vez que é
investido de um papel de mediador, oferecendo chaves para compreender a complexidade das
relações estabelecidas entre os elementos que conformam a cultura escolar.
Acompanhando Faria Filho (2007, p. 196-197), toma-se aqui a cultura escolar “[...]
como uma categoria, como um constructo teórico que permite, metodologicamente,
operacionalizar a pesquisa e, do ponto de vista analítico, organizar e compreender as múltiplas
facetas da experiência escolar”. Dentre os aspectos que a recobrem, busca-se, em especial, ter
acesso a práticas nas quais os museus se fizeram presentes, mesmo sabendo-se da dificuldade
deste empreendimento. Na pauta dos estudos da cultura material, esta etapa refere-se à
observação dos usos.
Quanto a isso, vale lembrar que “[...] em boa parte das vezes, estamos lidando com
práticas de prescrição de práticas, ou seja, em boa parte estamos lidando mais com culturas
escolares prescritas do que com culturas escolares praticadas no interior das escolas” (FARIA
FILHO, 2007, p. 207, grifo do autor). Por essa razão, optou-se, no presente trabalho, por
incluir na análise documentos advindos do cotidiano escolar, tais como atas de reuniões,
relatórios e atas da associação auxiliar “museu”. Por outro lado, como adverte Faria Filho
(1998b), documentos deste tipo atendem a uma demanda imposta pelo Estado; são
mecanismos utilizados para acompanhar o cumprimento ou não do dispositivo legal. Ou seja,
de certa forma a ação de registrar também se torna um ato prescritivo, pois são registros
produzidos para comprovar determinada expectativa e a ela atender.
Nessa mesma direção, Correia e Gaspar da Silva (2003, p. 10, grifo dos autores)
apontam que “[...] no caso de relatórios de professores, reitores/directores de escolas, por
exemplo, a maioria deles produzirá uma representação da realidade empírica, mais em
conformidade com o que está estabelecido que deve ser do que com aquilo que é, na
realidade”. Por outro lado, se são esses os documentos que se dispõem para pesquisa, deixar
de utilizá-los não resolve o problema; portanto, considera-se mais produtivo utilizá-los,
cientes desse limite, sem a pretensão de “reconstituir” as práticas pretéritas.
Com o intuito de tomar conhecimento de produções que abordam a questão dos
museus, procedeu-se à busca de pesquisas, sobretudo no quadro brasileiro. Para tanto, foram
considerados e perscrutados os seguintes fóruns de publicação de trabalhos científicos: banco
de teses e dissertações da Capes, referente ao período de 1987 a 2010; anais dos seis
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Congressos Brasileiros de História da Educação, realizados entre os anos 2000 e 2011;
Revistas da Sociedade Brasileira de História da Educação, do número 1 (2001) ao 27 (3º
volume de 2011); anais do 6º, 7º e 8º Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação
(2006, 2008, 2010); anais do IX Congresso Iberoamericano de História da Educação Latino-
Americana (2009); anais do I e II Encontro de Arquivos e Museus Escolares (2005, 2008),
além de livros organizados com produções da área e demais periódicos e eventos, sem
considerar todas as edições. A busca foi realizada tendo como parâmetro os títulos e resumos
das publicações, além da procura pelo sistema de buscas do descritor «museu», entendendo
que os termos a ele correlacionados também foram contemplados, como museu da escola,
museu escolar, museu e escola, etc.
Após consulta a esses veículos de divulgação, pôde-se inferir que um número
considerável de artigos19
faz menção ao termo museu escolar ou museu pedagógico20
.
Considera-se que esses trabalhos tangenciam a problemática dos museus quando mencionam
a sua presença, seja na legislação, em impressos ou de fato em escolas. O museu, como um
espaço físico, aparece principalmente em textos que tratam da institucionalização da escola
primária e de sua arquitetura. De modo geral, esta produção21
se volta ao estudo dos grupos
escolares e, em menor número, de manuais escolares. No primeiro caso, é feita menção à
presença de museus, vistos como um dos aspectos inovadores deste tipo de escola; no
segundo, aparecem no discurso de autores do período, que ressaltam a importância deste
“aparato didático”.
Num segundo conjunto de trabalhos consultados, o assunto é tomado de modo mais
aprofundado, visto tratar-se de investimentos de pesquisas preocupadas especialmente com a
temática, ou, de divulgação de resultados preliminares de pesquisas em nível de pós-
graduação. Estes artigos são mais facilmente encontrados em livros e dossiês de revistas, para
o caso de autoria de pesquisadores consolidados, e em congressos, quando de autoria de
estudantes de pós-graduação. Desta parcela, foram localizados os seguintes trabalhos: Bastos
(2002); Cunha (2001, 2008); Felgueiras (2011); Poggiani (2009, 2010, 2011b); Souza (1998)
e Vidal (1999, 2006, 2007, 2009, 2012).
19
Dos trabalhos aceitos e publicados nos anais dos congressos brasileiros e luso-brasileiros foram considerados
apenas aqueles em sua forma completa, excluindo-se deste balanço os resumos que se propunham discutir de
algum modo os museus escolares. 20
Além de trabalhos ocupados dessa temática, foram localizadas pesquisas acerca das associações auxiliares da
escola, das quais o museu fez parte em determinado período e de produções preocupadas com a discussão da
cultura material. Estas serão acionadas ao longo da dissertação, quando necessário. 21
São exemplos desse tipo de produção: Bencostta; Braga (2011); Silva (2011); Lopes (2010); Sily (2008, 2010,
2012); Veiga (2009); Valdemarin (2008a); Faria Filho; Vidal (2000); Faria Filho (1998a).
| 27
Da produção presente no portal da Capes, localizou-se o trabalho “Educação pelo
olhar: aspectos das tecnologias do ensino intuitivo e da informática na arte/educação”, de
autoria de Fernanda Pereira da Cunha (2004), desenvolvido na Universidade de São Paulo, o
qual realizou intersecção entre uma análise histórica e contemporânea. A autora enfocou as
tecnologias do ensino do final do século XIX e início do século XX, relacionadas à área das
artes visuais e seu ensino, bem como às da transição do século XX para o XXI. Para tanto,
apresentou, na primeira parte, as tecnologias utilizadas na educação e arte-educação, tendo
como referência o acervo do antigo “Museu Pedagógico da Escola Caetano de Campos” de
São Paulo.
Por intermédio dos textos veiculados nos congressos acima citados, localizou-se a
seguinte dissertação: “Os museus escolares na primeira metade do século XX: sua
importância na educação brasileira”, de autoria de Ana Maria Lourenço Poggiani (2011a),
apresentada na Universidade Católica de Santos. Este trabalho pode ser considerado pioneiro
na discussão acerca dos museus escolares em âmbito nacional. A autora buscou compreender
a relação existente entre a implantação de museus e uma renovação da escola, com destaque
para a primeira metade do século XX. Para tanto, fez uma incursão na legislação educacional
do estado de São Paulo e privilegiou a análise de algumas obras educacionais que se
dedicaram à questão dos museus.
Foi encontrada ainda a dissertação de Maria de Fátima Meneses (2003), desenvolvida
na Universidade de Lisboa, intitulada “Museus e ensino: uma análise histórica sobre os
museus pedagógicos e escolares em Portugal (1836-1933)”. A autora realizou levantamento
da legislação do ensino e de publicações pedagógicas, que versavam sobre a temática, ao
longo de quase um século. Seu objetivo foi compreender em que medida esses museus se
alinhavam a uma tendência museológica e de que modo poderiam contribuir para o ensino, na
ótica da prescrição, haja vista que não foram utilizados registros provenientes de instituições
escolares. Boa parte do referencial pedagógico do final do século XIX e início do XX
utilizado pela autora também foi contemplado nesta pesquisa; neste sentido, essa dissertação
auxiliou na confrontação de percepções em relação aos escritos (cf. capítulo 2).
A partir destes esclarecimentos iniciais e considerando que os artefatos escolares
expressam práticas, informam sobre tendências pedagógicas, fornecem condições para o
desenvolvimento de métodos de ensino, etc., fica o desafio de compreender onde se situam os
museus escolares. Com o intuito de responder à problemática deste estudo, o presente trabalho
se estrutura em quatro capítulos.
| 28
O primeiro capítulo apresenta o modo como os museus escolares foram gestados pelo
poder público em diferentes países, por meio da iniciativa de desenvolvimento de museus
pedagógicos, até se chegar à materialização de projeto análogo no Brasil. Para tanto, fez-se
necessário um mergulho na circulação de ideias e modelos pedagógicos para relacionar os
museus ao movimento educacional que os impulsionou, compreendendo-os como parte de um
projeto educacional amplo, que sofreu desdobramentos. Vale lembrar que se consideram aqui
as marcas de grandes iniciativas do Estado referentes às instituições públicas de ensino, ou
seja, leva-se em conta a possibilidade da existência de projetos similares, em momentos
posteriores e distintos, por parte de congregações religiosas, iniciativa privada ou outras
entidades ocupadas com a educação.
Este capítulo esboça ainda um quadro de diferentes sentidos atribuídos ao termo
museu escolar, a fim de ampliar a sua noção e de alguma forma fornecer maior precisão a seu
emprego no tempo e espaço. Por fim, apresenta o primeiro movimento de implantação de
museus nas escolas públicas primárias catarinenses, apreciado por meio do discurso
autorizado do estado, presente mormente na legislação educacional em vigor entre 1911 e
1935.
O segundo capítulo opera um recuo e um avanço temporal ao buscar compreender o
que estava sendo escrito sobre os museus no final do século XIX e nas primeiras décadas do
XX em diferentes países, considerando, do mesmo modo, uma circulação de ideias que
ocorria em grande parte via escrita e, em menor escala, pelo trânsito de pessoas. Ao enfocar
autores e impressos que se dedicaram em algum período a escrever sobre museu, evidenciam-
se semelhanças e diferenças de concepção teórica e metodológica empregadas em defesa de
um objeto pedagógico e/ou método de ensino, buscando perceber como o museu esteve
representado nos escritos selecionados.
Após a construção deste quadro inicial, o terceiro capítulo foca a atenção sobre
prescrições e práticas. Neste momento, o olhar se volta ao período posterior à reforma do
ensino catarinense de 1935. Buscou-se compreender a ressignificação pela qual o museu
passou através da legislação que o “promoveu” a associação auxiliar da escola. O interesse
recaiu sobre o modo como as escolas recebiam as normativas e se apropriavam delas, a partir
dos registros em circulares, comunicados e atas de reuniões pedagógicas. Neste capítulo, fez-
se um mapeamento da presença de associações em relatórios de governo e anuários do IBGE,
que possibilitou visualizar o processo de expansão das associações em Santa Catarina.
Em seguida, no quarto capítulo, as lentes foram ajustadas e o foco recaiu sobre o
cotidiano escolar a partir da “atuação do museu”, procurando vincular práticas e objetos.
| 29
Procurou-se identificar objetos que compuseram esses museus, em busca da singularidade
com que as escolas deles fizeram uso; ao mesmo tempo buscou-se a generalidade que se pode
depreender a partir das particularidades, captando representações de como o museu foi
efetivado nas escolas. Neste capítulo, foram exploradas características dos museus presentes
em atas e relatórios, tais como: quais objetos compunham o acervo, como eram angariados,
como eram organizados, se havia ou não critérios para sua seleção, se aulas eram dadas a
partir dos objetos do museu ou mesmo no museu, ou se as crianças apenas visitavam aquele
espaço.
Por fim, conclui-se com considerações que retomam os pontos principais
desenvolvidos em cada capítulo.
| 30
1 MUSEUS EM VIAGEM: CIRCULAÇÃO DE IDEIAS E MODELOS
PEDAGÓGICOS
A internacionalização de ideias pedagógicas por meio de viagens de pessoas que
ocuparam diferentes lugares na organização do ensino e pela circulação de impressos
especializados pode auxiliar a compreender a constituição do campo educacional brasileiro,
bem como o de outros países. A circularidade de propostas, modelos, métodos e objetos
escolares é passível de ser visualizada tanto em iniciativas de formação de professores, quanto
na educação em jardins de infância e na escolarização primária.
Empreendimentos têm sido realizados tentando compreender em rede as questões
educacionais do passado, muitos oriundos de projetos de investigação conjuntos entre
pesquisadores brasileiros e estrangeiros22
. Estas pesquisas evidenciam que uma parte dos
intelectuais da educação, ao menos os que ganharam determinada projeção social e política,
vislumbrava cada um, em sua época, a necessidade de estabelecer contato com experiências
estrangeiras “bem-sucedidas”, e com educadores de renome, para conquistar legitimação. Para
Houssaye (2007), os pedagogos do século XVIII, XIX e início do XX sempre cultivaram a
dimensão internacional, mas foi a partir dos anos 1950 que se tornou mais natural pensar a
educação em nível global.
Este contato com experiências internacionais em alguns casos ocorreu por meio de
viagens ao exterior, como também pela recepção de personalidades estrangeiras no Brasil e,
talvez em maior número, pela recepção de impressos em diferentes idiomas. Em linhas gerais,
o que se espera com o primeiro e o segundo capítulo desta dissertação é demonstrar que a
criação de museus escolares no Brasil, e em Santa Catarina em particular, teve inspiração em
propostas desenvolvidas em países como Estados Unidos da América, Espanha, França e
Portugal. Assim sendo, a análise desse “movimento” pode evidenciar associações a modelos
pedagógicos e métodos de ensino dados a conhecer pela viagem de um conjunto de objetos
que, ordenados, comporiam um museu escolar.
1.1 SENTIDOS ATRIBUÍDOS AO TERMO MUSEU ESCOLAR
Nota-se que o termo museu escolar carrega consigo alguma imprecisão. Pode, em
alguns casos, evocar tipos de museus que não o representam em verdade, tais como de arte,
22
Ver, por exemplo: Pintassilgo (Org.) et al. (2006); Fernandes; Lopes; Faria Filho (Org.) (2006); Kuhlmann
Júnior (2001); Mignot; Gondra (Org.) (2007); Gondra (Org.) (2010), entre outros.
| 31
históricos ou mesmo de escolas, como, por exemplo, o Museu da Escola de Minas Gerais ou o
Museu da Escola Catarinense. É este tipo de museu que causa maiores dúvidas, pois se
relaciona à temática educativa numa perspectiva muitas vezes histórica, mas não é de fato
extensão ou continuidade dos museus pedagógicos (cf. item 1.3). Ainda que possam ter
finalidades que se assemelhem a “institutos de formação de professores”, são fruto de um
contexto bastante diverso do século XIX e início do XX.
O termo confunde, ainda, por se relacionar a diferentes modos de disposição de
objetos para o ensino e, inclusive, por nomear algumas coleções de objetos. Manoel José
Pereira Frazão, educador brasileiro, nas atas e pareceres do Congresso de Instrução Pública do
Rio de Janeiro (1884), sintetiza em poucas linhas o significado que um museu escolar possuía
no Brasil no final do século XIX.
Chama-se museu escolar uma reunião metódica de coleção de objetos comuns e
usuais, destinados a auxiliar o professor no ensino de diversas matérias do programa
escolar. Os objetos devem ser naturais, quer em estado bruto, quer fabricados, e
devem ser representados em todos os estados por que os fizer passar a indústria. Os
que não puderem ser representados em realidade, se-lo-ão por desenhos e modelos
(FRAZÃO, 1884 citado por VIDAL, 1999, p. 110, grifo meu).
Observa-se, nesse excerto, que um museu corresponde a coleções de objetos, e, na
perspectiva do autor, estes deveriam servir ao ensino de várias matérias escolares. Por sua
vez, o paranaense Nicephoro Modesto Falarz, em tese publicada nas atas da I Conferência
Nacional de Educação, em 1927, menciona que “o museu escolar deve possuir uma coleção
bem organizada, completa e bem conservada, de tudo o que nos fale, relativamente, da
localidade, da Pátria, do mundo e da natureza em geral com os seus três reinos” (FALARZ,
1927, edição de 1997, p. 118).
Após uma leitura sistemática de parte da literatura pedagógica do período e dos
documentos utilizadas no presente estudo, foram elaboradas seis aproximações ao termo
museu escolar, razão pela qual se passou a considerá-lo polissêmico, visto que varia de
sentido dependendo do contexto. Assim como ocorre com toda palavra desta ordem, há
necessidade, no momento de sua aplicação, de se remeter ao conteúdo e ao contexto
especificado, uma espécie de adjetivação da palavra.
A primeira relação de proximidade já mencionada está no uso dos termos museu
escolar e pedagógico. Estes, muitas vezes, são tomados como sinônimos, inclusive no período
em que estavam sendo implementados, quando de fato fazem referência a modelos diferentes.
O que importa, neste caso, é mais o fato de haver diferença do que os termos terem sido
| 32
empregados de modo adequado ou não. Numa ligeira incursão pela literatura educacional do
final do século XIX e início do XX, pode-se distingui-los da seguinte maneira: o primeiro
(escolar), alojado dentro das instituições educativas, deveria servir a professor e a alunos para
a realização de estudos pautados no concreto, isto é, agregar um conjunto de objetos para
tornar a aprendizagem intuitiva. O segundo (pedagógico), caracteriza-se como um centro de
formação para professores, onde seriam desenvolvidos, testados, apresentados e difundidos
novos métodos, mobiliários e instrumentos didáticos.
A distinção entre estes termos pode ser encontrada no dicionário dirigido por Buisson
(nas edições de 1887 e 1911), no editado por Monroe (1926), no texto de Frazão nas atas do
Congresso de Instrução Pública (1884 citado por VIDAL, 1999) e no artigo de Lemos (1923).
As funções de um museu pedagógico foram descritas também por Cossío (1884, [18--?]),
diretor do Museu Pedagógico Nacional da Espanha.
Sobre a confusão entre os dois termos, Cossío esclarece:
Ambos contienen material de enseñanza, y el mismo material de enseñanza. De aquí
la confusión que fácilmente puede hacerse y se hace con frecuencia entre unos y
otros. Sin embargo, la distinción se halla claramente establecida y de un modo
absoluto, mediante la nota, ya indicada, del examen crítico. Entre un Museo escolar
e uno pedagógico hay la misma diferencia que entre educación y pedagogía. El
material del primero ha de servir para educar; el del segundo para aprender a
educar23
(COSSÍO, [18--?], p. 134, grifo do autor).
A partir do exposto, temos uma breve visão do que seria um museu pedagógico, ou
seja, um espaço que agregaria objetos que ensinariam e auxiliariam os professores na tarefa de
educar.
O emprego dos termos escolar e pedagógico em situações distintas, ou seja, seu uso
independente dessa classificação teórica, pode ser visualizado na seguinte passagem da
entrevista com o professor catarinense, aposentado, Januário Serpa. Ao rememorar sua
infância escolar, ele explica que, por volta do ano de 1942, mudou-se de cidade e de escola.
Dos aspectos físicos ressalta:
Mas a escola, o prédio, as instalações eram praticamente as mesmas, só que na
segunda escola nós tínhamos o museu pedagógico. Era uma mesa, de
aproximadamente 1,20m por 0,60, 0,70m. A professora tinha ali algumas rochas,
alguns animais empalhados, alguma coisa e tal. Às vezes nós tínhamos aula no
23
“Ambos contêm material de ensino, e o mesmo material de ensino. Daí a confusão que facilmente pode fazer-
se e faz-se com frequência entre uns e outros. Sem dúvida, a distinção é claramente estabelecida e de um modo
absoluto, mediante a nota, já indicada, do exame crítico. Entre um Museu escolar e um pedagógico há a mesma
diferença que entre educação e pedagogia. O material do primeiro tem de servir para educar; e o do segundo
para aprender a educar” (Tradução nossa).
| 33
museu pedagógico. E o museu pedagógico ficava ali no meio da sala da escola
(SERPA, 1994. In: GASPAR DA SILVA; SCHÜEROFF, 2010, p. 204-205).
Neste excerto, faz-se menção a um formato de disposição dos objetos – numa mesa –,
e à denominação do aparato didático como museu pedagógico. O fato de a presença do museu
ser destacada mostra uma distinção, um elemento que caracterizava a segunda escola como,
no mínimo, diferente.
A segunda referência, a que o termo museu escolar remete, pode ser encontrada mais
facilmente na historiografia educacional brasileira, a partir das pesquisas de Vidal (1999,
2006, 2009, 2012) sobre o Museu Escolar Brasileiro, uma versão nacionalizada do Musée
Scolaire Deyrolle. Segundo esta autora, o Museu Escolar Brasileiro corresponde a uma
coleção de quadros parietais produzidos na França, traduzidos, adaptados e trazidos para o
Brasil, ao que tudo indica, por Menezes Vieira (diretor do Pedagogium de 1890 a 1896). Estes
quadros com estampas destinavam-se “[...] ao ensino elementar das ciências naturais,
principalmente, mas também da história e do que modernamente denominamos de geografia
humana” (VIDAL, 2009, p. 44). Não só a casa Deyrolle tinha sua “coleção museu”, o Dr.
Saffray também organizou o Museu Caixa Saffray, que figurou na Exposição Pedagógica24
de
1883 no Rio de Janeiro (BASTOS, 2002; VIDAL, 2006, 2009).
Visualizam-se, abaixo, dois exemplos de quadros desta coleção. A imagem da direita é
de um exemplar francês e a da esquerda, de um modelo traduzido e adaptado por Menezes
Vieira à realidade brasileira. Ambos fazem parte acervo da Escola Normal Caetano de
Campos (Fig. 1 e 2).
24
Dos representantes nacionais presentes nesta exposição, “[...] os senhores Faro e Lino, da Livraria
Contemporânea, também do Rio de Janeiro, apresentavam o ‘museu das escolas’ – caixas do mesmo tipo que
as fornecidas às escolas pela municipalidade de Paris, que continham: pedras e metais; madeira, louças e
vidros; iluminação e aquecimento; vestuário, duas caixas; alimentação, outras duas. Além destas sete caixas,
anunciavam-se mais três para breve” (KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 215).
| 34
Figura 1 – Exemplar de quadro “museu
escolar” da coleção francesa
Figura 2 – Exemplar de quadro “museu
escolar” da coleção brasileira
Fonte: (VIDAL, 2006, p. 256). Fonte: (VIDAL, 2006, p. 256).
Além de quadros neste estilo, a empresa Deyrolle fabricava ainda “[...] peças de
anatomia humana e anatomia comparada e modelos de flores e frutos” (VIDAL, 2009, p. 48).
Vidal (2009) observou a presença de materiais desta empresa25
em inventários e
correspondências da Escola Normal Caetano de Campos e Escola Normal do Brás (SP).
É certo que algumas escolas paulistas contaram com a presença destes materiais
importados, tais como as duas mencionadas. No entanto, Souza (1998, p. 230) salienta que,
“[...] foram poucos os grupos escolares agraciados com esse moderno recurso de ensino”, bem
como com outros materiais importados, os quais figuravam sobretudo em escolas urbanas. Em
Santa Catarina, são poucas as pistas que evidenciam a compra e presença de museus
importados; há, sim, registro em livro de inventário26
de uma diversidade de quadros
destinados ao ensino de várias matérias (ciências naturais, geografia, história, matemática,
entre outras), com ênfase em ciências naturais, os quais se encontravam armazenados em
museus escolares nos anos 1941 e 1942 (PETRY, 2012). Pelo registro constante no referido
livro, nota-se que parte destes quadros estava em estado de conservação “regular ou
estragado”, provável indício de que fizessem parte do acervo das escolas há algum tempo.
Resta saber qual era a situação predominante dos acervos, se compostos por objetos
25
Entre os catálogos disponíveis em 1898, encontram-se dois específicos sobre museu, intitulados: “Installations
complètes de musées et cabinets d'histoire naturelle” e “Musée scolaire pour leçons de choses comprenant 700
échantillons en nature et 3.000 dessins coloriés” (LES FILS D’ÉMILE DEYROLLE, 1898). 26
Trata-se de uma encadernação de listas de inventário (ARQUIVO..., 1941-1942), enviadas tanto por grupo
escolar, quanto por escola isolada ao DE. A prática de inventariar fazia parte das obrigações das escolas pelo
menos desde a década de 1910.
| 35
industrializados ou recolhidos por professores e alunos, portanto, financeiramente mais
modestos.
Em terceiro lugar, encontra-se uma alusão ao móvel que guarda as coleções de objetos
para as lições de coisas, que também pode ser nomeado de museu escolar. Um móvel
emblemático é o armário em madeira, com portas parcialmente envidraçadas (TEIVE, 2007),
bastante comum no mobiliário de escolas ao longo do século XX, o qual pode ser visualizado
em diversas fotografias de sala de aula. Tal objeto, dependendo do papel que exerceria,
assumia a função de museu. Pela sua versatilidade, este mobiliário poderia desempenhar
diferentes funções. De acordo com o Regimento Interno dos grupos escolares de 1914
(SANTA CATARINA, 1914b), cada classe deveria possuir “um armário de porta de vidro”,
cuja função seria arrecadar o material dos alunos.
Encontra-se tal referência a museu como armário no relatório do GE27
Particular Stella
Maris e Curso Complementar Anexo do município de Laguna, no ano de 1947. De acordo
com o inventário do mobiliário e material existente nas classes, havia na sala do 4º ano um
armário precedido da indicação, entre parênteses – (museu) –, em bom estado, no valor de
300 cruzeiros (GRUPO..., 1947, p. 46).
A figura 3 é representativa do móvel mencionado e que será indicado por boa parte da
literatura pedagógica para armazenar as coleções. Trata-se de um exemplar do acervo do
Museu da Escola Catarinense, de Florianópolis, que motivou o início desta pesquisa,
conforme informamos na introdução.
27
Doravante, para efeitos de referência, Grupo Escolar será assim citado, GE, quando acompanhar o nome de
uma escola.
| 36
Figura 3 – Armário em madeira com portas de
vidro
Fonte: acervo do Museu da Escola Catarinense
(fotografia tirada pela autora – 22/1/2013).
O provimento das escolas com armários-museus é tratado por Martin Lawn (2005) no
texto “A Pedagogy for the Public: the place of objects, observation, mechanical production
and cupboards”. De acordo com o autor, a partir de 1871 as ciências naturais foram
adicionadas ao currículo escolar na Inglaterra, tornando-se obrigatórias em 1882. Esta
obrigação ocasionou a necessidade de angariar inúmeros objetos que permitissem o ensino
das lições. Como resultado do crescimento da quantidade de objetos que ingressaram nas
escolas, tornou-se necessário seu armazenamento em armários-museus, que deveriam ser
fornecidos pelo Conselho Escolar. Desde 1888, este problema constava nas atas desse órgão,
que recomendava que os comitês locais acatassem os pedidos dos diretores das escolas
providenciando os armários.
Na análise do autor:
As lições de coisas geraram os objetos, que geraram os gabinetes. A série de eventos
que conduziu o currículo de instrução a uma pequena indústria de objetos supriu e
criou os gabinetes escolares ou museus que dentro de alguns anos tornou-se prática
comum em muitas escolas públicas28
(LAWN, 2005, p. 160).
28
“Object lessons begat objects which begat cabinets. The series of events which lead from a curriculum
instruction to a minor industry of object supply and the creation of school cabinets or museums took place
within a few years in many state schools” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni
de Sousa).
| 37
Nesse processo, as escolas precisaram desenvolver uma capacidade de estocar objetos
(LAWN, 2005). Sua solução foi encontrada no fornecimento e aquisição de armários.
Outro exemplo de mobiliário cuja função seria abrigar objetos do museu,
especificamente os quadros no estilo daqueles investigados por Vidal (Fig. 1 e 2), é um
armário com repartições internas móveis, onde poderia ser guardado um número elevado de
pranchas. Este armário permitia que as estampas do museu ficassem em frente aos olhos das
crianças sem que fosse necessária uma grande superfície mural, e ao mesmo tempo os
mantinha ao abrigo da poeira (LES FILS D’ÉMILE DEYROLLE, 1898).
A figura 4 corresponde a este armário em carvalho com 2,20m de altura, 1,24m de
largura e 0,40m de profundidade. Foi extraída de um catálogo29
de vendas de mobiliário e
material de ensino da Maison Deyrolle.
Figura 4 – “Armoire porte-tableaux”
Fonte: (LES FILS D’ÉMILE DEYROLLE, 1898, p. 34).
Além destes, o museu assume um quarto formato, a saber, o museu dentro da sala de
aula. Este se vincula especialmente aos móveis acima descritos, pois, em geral, este museu
seria composto de armário, estante ou outro móvel que servisse como armazenador dos
objetos. O que interessa nesses dois casos, é que as duas versões foram pensadas e postas em
prática sem serem excludentes, como pode ser observado em relatórios escolares. Neste caso,
29
A localização deste documento foi realizada por Luani de Liz Souza, a quem sou grata. O catálogo está
disponível para consulta no blog do projeto de pesquisa “Objetos da escola”.
<http://seminarioculturamaterialescolar.blogspot.com.br/search/label/Cat%C3%A1logos>.
| 38
em especial, referimo-nos ao relatório do GE Lauro Müller e do Curso Complementar Anexo
do ano 1946. De acordo com a diretora da instituição: “cada classe possui o seu museu.
Durante o ano, cada professora vai coletando o que os alunos levam. No final do ano, os
objetos ou coisas mais interessantes são levados ao Museu Geral” (GRUPO..., 1946, p. 24).
Além de informar sobre disposições físicas do museu, a citação fornece pistas sobre uma
metodologia empregada na constituição do acervo do museu geral.
A esta quarta forma, soma-se uma quinta, neste caso na condição de espaço físico. O
museu não só dava nome a coleções de quadros, objetos diversos e móveis, como poderia
ocupar um espaço físico nas escolas, um pequeno gabinete onde seriam guardadas as
coleções. A destinação de um espaço específico para o museu na arquitetura da escola
compõe uma questão instigante, visto tratar-se, à primeira vista, da incorporação de uma
máxima pedagógica – a necessidade de instaurar processos de ensino mais concretos –,
criando condições materiais para a sua realização, em detrimento de outras atividades que
poderiam ser exercidas dentro do espaço escolar.
Por último, o museu adquire nova roupagem, ao menos na legislação catarinense,
tornando-se uma Associação Auxiliar da Escola30
no início da década de 1940 (cf. capítulo 3).
Faziam parte do rol de associações, entre outras, a liga de bondade, o pelotão de saúde, o
clube de leitura e a liga pró-língua nacional, as quais tinham funções e objetivos específicos,
mas, de modo geral, deveriam promover o associativismo estudantil, preparando os estudantes
para viver em sociedade, promovendo no interior das escolas a criação de sociedades em
miniatura, as quais desenvolveriam no educando qualidades como ordem, iniciativa e
liderança (SANTA CATARINA, 1941b).
Na condição de associação, o museu deveria cumprir uma série de expedientes
burocráticos, como a eleição de diretoria, registro das reuniões em atas e escrita de relatórios
anuais das atividades desenvolvidas, objetos adquiridos, etc. Esta demanda, criada pelo DE na
década de 1940, fez com que o número de registros relativos a esse período, depositados no
Apesc e que informam sobre museus, seja bastante superior ao das décadas anteriores. O
status associativo leva a alguns questionamentos: Tratou-se, afinal, de uma renovação das
funções e perfil dos museus? Ou, mudou apenas o estatuto que os nomeava dentro das
escolas? Em que medida as funções do museu se assemelham às das outras associações?
30
O processo de investigação acerca das associações auxiliares da escola contou com a parceria de Franciele
Otto, mestre pelo Programa de Pós-Graduação da USP, cuja dissertação se intitula “As associações auxiliares
da escola e a forma de transmissão das dimensões valorativa e moral da sociedade catarinense: o caso das
‘Ligas de Bondade’ (1944-1950)”.
| 39
O museu, como associação, permaneceu na memória da professora Laurita Pereira. Ela
conta que em uma das escolas em que lecionou, entre a década de 1940 e 1960, “[...] além da
sala de aula e da horta, havia as Instituições Escolares: o Jornalzinho, o Museu, o Clube de
Leitura, tudo dentro da escola. O museu era uma estante com pouca coisa, essas coisas do
mar, estrela-do-mar... não tinha muita coisa, uma avezinha” (PEREIRA, 1994. In: GASPAR
DA SILVA; SCHÜEROFF, 2010, p. 244). Embora o status do museu seja de instituição
escolar, pode-se indagar em que medida ele se distancia dos outros modelos apresentados.
Antes de nos aproximarmos do terreno das escolas catarinenses, nos espaços dos
museus situados dentro destas escolas, é necessário compreender as inspirações para a criação
e disseminação de instituições deste gênero.
1.2 HISTÓRIA NATURAL, CIÊNCIA E ENSINO
A história dos museus no Brasil teve início com os de história natural. Este foi o
modelo seguido durante o século XIX, com o qual outras disciplinas estiveram enredadas,
como a antropologia e a história. O museu histórico, por sua vez, tornou-se uma categoria
distinta no Brasil apenas na década de 1920 (MENESES, 2005, p. 22). Sendo assim, o museu
de história natural deu origem aos que se encarregariam de “[...] musealizar e institucionalizar
a História oficial do país”, como o Museu Histórico Nacional (RJ) e o Museu Paulista (SP)
(LOPES, 2009, p. 328). Nos museus de história natural, explicitar os princípios de
organização das coleções e exposições era norma:
Mais ainda, é no museu de História Natural oitocentista que se encontra, como se
disse, a articulação mais íntima e fecunda entre museus e produção de
conhecimento. Na realidade, é o único modelo (com seu derivado antropológico)
que funcionou plenamente como instrumento institucional da contribuição
museológica à atividade científica (MENESES, 2005, p. 33).
O Museu Nacional do Rio de Janeiro é tomado como o exemplo mais ajustado a esse
modelo no Brasil. A primeira fase da trajetória dos museus no território nacional se estende
do final do século XVIII – com a Casa dos Pássaros e, depois, em 1818, com o Museu
Nacional31
–, até os anos 1860, período em que as duas instituições atuaram quase que
sozinhas. A segunda fase tem início no final de 1860 e se estende até o começo do século XX,
31
A Casa dos Pássaros, nome popular da Casa de História Natural, foi criada em 1784. Em 1818, foi criado o
Museu Real, que incorporou a coleção mineralógica da antiga casa (LOPES, 2009, p. 25/27). Com a
Independência, em 1822, seu nome mudou para Museu Imperial, sendo chamado de Museu Nacional a partir
do período republicano, iniciado em 1889.
| 40
com os novos museus organizados nas províncias, reunindo coleções de ciências naturais,
inclusive históricas e artísticas (LOPES, 2009, p. 323).
A Casa dos Pássaros estava inserida no contexto da dinamização da atividade
científica em Portugal, compondo o projeto de funcionamento dos museus portugueses.
Enquanto ela foi um “entreposto colonial”, servindo à metrópole, o Museu Nacional foi “um
Museu Metropolitano de caráter enciclopédico e universal”, não podendo ser visto como uma
continuidade natural do primeiro (LOPES, 2009, p. 324).
A Casa dos Pássaros “[...] por mais de vinte anos colecionou, armazenou e preparou
produtos naturais e adornos indígenas para enviar a Lisboa” (LOPES, 2009, p. 25-26).
Nesse período era costume dos Vice-Reis o envio de “objetos” da natureza do Brasil
para a metrópole a fim de divulgar e tornar conhecido o que existia na terra,
expor o exótico, apresentar à corte de Lisboa as belezas e riquezas naturais da
colônia. Eram enviados exemplares de animais, plantas, minerais e adornos
indígenas, coletados no Brasil por viajantes e colonizadores (SILY, 2008, p. 2).
Até meados do século XIX, predominou aqui o modelo dos museus portugueses e
europeus, vistos como “escolas demonstrativas da natureza” (LOPES, 2009, p. 324). Já na
segunda fase, principalmente a partir de 1890, rompeu-se com esse modelo de museu geral,
enciclopédico, preferindo-se os especializados das províncias (LOPES, 2009, p. 324-325).
Cada um, a seu modo, contribuiu com a institucionalização das ciências naturais no
País. O Museu Nacional, por exemplo, funcionou “[...] como órgão consultor governamental
para assuntos de Geologia, mineração e recursos naturais” (LOPES, 2009, p. 327). Ao lado da
prestação de serviço, por meio de análises químicas, especialmente do carvão mineral, esses
museus ocupavam-se de estudos paleontológicos, além da implantação de outras disciplinas,
como a antropologia, pelo estudo dos crânios da “raça” brasileira (LOPES, 2009, p. 327-328).
As coleções do museu passaram por várias mudanças em conformidade com os princípios dos
diretores, sendo muitas vezes reorganizadas. O catálogo mais completo e antigo do museu, de
1838, informa que os objetos obedeciam à seguinte divisão: produtos zoológicos, botânicos,
orictognósticos, produtos das belas-artes, e objetos relativos às artes, usos e costumes de
diversos povos (LOPES, 2009, p. 68).
Tornou-se preocupação constante dos museus divulgar pesquisas por meio de revistas
científicas, do mesmo modo que já era uma preocupação a educação em ciências naturais. Tal
empreendimento ocorria com a oferta de cursos e conferências, além do empréstimo de
coleções para estudo. O acervo do Museu Nacional fora utilizado pelos alunos da Escola
Militar do RJ, pela Faculdade de Medicina, pelas Escolas Normais da Sociedade Auxiliadora
| 41
da Indústria Nacional e pelo Colégio Pedro II. Não apenas o acervo foi compartilhado, como
também professores (funcionários), salas, laboratórios, coleções e instrumentos (LOPES,
2009, p. 329).
O uso dos acervos do museu pelas instituições de ensino indica, de algum modo, uma
adaptação à falta de estrutura própria. Se na reforma da Universidade de Coimbra (1772) a
Faculdade de Filosofia e História Natural ganhou um gabinete de física, um laboratório de
química, um museu de história natural e um jardim botânico (para uso comum com a
Faculdade de Medicina), a fim de observar e fazer demonstrações a partir dos três reinos da
natureza (LOPES, 2009, p. 31), essa não foi a realidade vivida pela maioria das instituições de
ensino existentes no Brasil no século seguinte.
O museu de história natural e o jardim botânico da universidade ficaram a cargo de
Domingos Vandelli, cuja coleção particular deu início ao acervo. As coleções eram compostas
por minerais e plantas enviados de Portugal, do Brasil, da Ásia e da África (LOPES, 2009, p.
32). A Academia Real de Ciências, de Lisboa, também possuía um gabinete de história
natural, que funcionava como apoio às atividades pedagógicas. “Essas primeiras coleções,
caracterizam, para o caso português, a transição de gabinetes a museus que se verifica no
século XVIII, por toda a Europa” (LOPES, 2009, p. 34).
Com a transferência da Corte para o Rio de Janeiro, ampliaram-se as instituições
ligadas ao projeto modernizador, tal como a Biblioteca Nacional e o Museu Real. No projeto
de criação de uma Academia Real do Rio de Janeiro, o museu já estaria garantido, pois, D.
João VI mandou organizá-lo a partir de coisas vindas de Lisboa, relacionadas a física e
história natural (LOPES, 2009, p. 39). Meses antes da criação do Museu Real, foi criado, na
Academia Militar, um gabinete dos produtos da mineralogia e história natural, destinando-se a
organizar materiais para as aulas (LOPES, 2009, p. 29).
Por um longo tempo, desde 1830, o Museu Nacional travou debates sobre a criação de
cursos superiores de ciências naturais no País. Essa tentativa foi abandonada no final do
século XIX, priorizando as atividades de pesquisa. Contudo, seu espaço foi um dos mais
importantes na formação prática de naturalistas. Na reforma efetuada em 1911, o regulamento
do Museu Nacional previa a criação de um museu escolar. Uma aproximação maior da
escolarização ocorrerá com o regulamento de 1916, tendo esse museu passado a funcionar
como serviço de atendimento às escolas em nível nacional, serviço que daria origem, na
década de 1930, ao educativo (LOPES, 2009, p. 229-231).
| 42
Em síntese, a principal característica deste museu e dos outros que foram sendo
criados no Brasil no século XIX era a vinculação com a pesquisa. Os museus brasileiros,
mesmo com suas dificuldades:
[...] desempenharam especificamente suas funções de centros de pesquisa, não se
restringindo apenas a atuarem como repositórios de objetos, mas buscando
firmarem-se pela relevância de sua produção científica e de sua pesquisa
experimental, ao lado das funções de catalogação e classificação das coleções
(LOPES, 2009, p. 335).
Sua prática científica aos poucos foi perdendo espaço para os laboratórios. Do período
de 1892 às primeiras décadas do século XX, o Museu Nacional perde a sua hegemonia
científica, ao disputar com novas instituições, como o Museu Paraense Emílio Goeldi e o
Museu Paulista. Esse período é também o do fim da era dos museus, deslocando-se “[...] para
os laboratórios a prioridade dos estudos experimentais” (LOPES, 2009, p. 24).
Criados na Europa nos séculos XVII e XVIII e espalhados pelo mundo no século XIX,
os museus de história natural foram responsáveis pela mobilização que forjou as ciências
naturais, entusiasmados pela classificação e pelo conhecimento enciclopédico (LOPES, 2009,
p. 14). A tese defendida por Lopes (2009) é de que antes do século XX existia produção
científica no Brasil, ao contrário do que parte da literatura afirma, estando essa produção
localizada nos museus de história natural.
“Reunir coleções foi a razão de ser dos museus, uma vez que estas materializavam os
próprios objetivos centrais da História Natural da época: mobilizar o mundo, classificá-lo e
ordená-lo, nos espaços institucionais especialmente concebidos para tal fim, os museus”
(LOPES, 2009, p. 22).
O problema da cessão de espaço, de laboratórios, coleções, instrumentos e mesmo
pesquisadores para ministrar aulas em instituições de ensino superior, militares, científicas e
culturais, de algum modo foi resolvido com a criação de gabinetes, museus de história natural
ou escolares dentro das instituições de ensino. Mas, se os museus escolares podem ser
considerados uma invenção genuína dos pedagogos e da escola (FELGUEIRAS, 2011, p. 83),
sua inspiração parece ter vindo dos de história natural, a começar pelo princípio de
classificação decorrente dos reinos da natureza. Tanto é que haverá um esforço por parte dos
intelectuais da educação em expandir sua ação, tentando, de certo modo, retirar-lhes a aura
das ciências naturais, tornando-os um objeto didático a serviço de todas as disciplinas
escolares (cf. capítulo 2).
| 43
Para Vidal (2012), o campo pedagógico e etnográfico estavam muito próximos no
século XIX, considerando que, para a nova inteligibilidade que desenhava a ciência, decifrar a
natureza permitiria decifrar também o humano. O método intuitivo32
não se distanciava dessa
vertente, pois “o conhecimento da natureza e as lições de coisas preparavam o escolar para
uma concepção evolucionista da ciência e do homem” (VIDAL, 2012, p. 203).
Embora possamos considerar que os museus escolares estejam muito próximos aos de
história natural no quesito composição material e organização das coleções, bem como se
relacionavam ao método intuitivo, possibilitando a aprendizagem por meio dos objetos, o
impulso de sua criação e disseminação parece ter-se dado em decorrência dos pedagógicos e,
em alguns casos, concomitantemente a eles. Afinal o que teriam sido os museus pedagógicos
criados em meio à efervescência das ciências no século XIX?
1.3 DAS EXPOSIÇÕES UNIVERSAIS À INSTITUCIONALIZAÇÃO DE MUSEUS
PEDAGÓGICOS
Estudos historiográficos no campo educativo33
indicam que os museus escolares foram
impulsionados por outra modalidade de museus, os pedagógicos. Estes conheceram seu auge
nas exposições universais, que funcionaram como uma espécie de estímulo à criação de
museus ocupados da temática educativa (BASTOS, 2002, p. 254). Aliados a estas exposições,
ocorriam congressos34
nas mais diferentes áreas, que se caracterizaram como espaços de
32
Este método, criado no século XIX, pretendia substituir “[...] o caráter abstrato e pouco utilitário da instrução”,
fundamentando-se nos princípios de que “[...] o ato de conhecer tem início nas operações dos sentidos sobre o
mundo exterior, a partir das quais são produzidas sensações e percepções sobre fatos e objetos que constituem
a matéria-prima das idéias. As idéias assim adquiridas são armazenadas na memória e examinadas pelo
raciocínio, a fim de produzir o julgamento” (VALDEMARIN, 2000, p. 76-77). Para Buisson, a lição de coisas
é a aplicação mais comum do método intuitivo. O autor destaca que ela não é uma disciplina e sim um
procedimento, devendo estar presente em todas as atividades escolares (BASTOS, 2013, p. 234). Essa ideia era
compartilhada por Marie Pape-Carpantier. A autora estabelece uma teoria das lições de coisas, devendo sua
aplicação seguir a ordem das percepções da inteligência “inicialmente, despertar a curiosidade da criança, a
partir da identificação da cor, forma, uso, matéria, origem dos objetos, para depois iniciar as lições de coisa
propriamente ditas” (BASTOS, 2011, p. 66). Pape-Carpantier é considerada a responsável pela introdução e
popularização desse tipo de lição na educação da primeira infância (BASTOS, 2011; 2013). A discussão em
torno destes dois termos é ampla. De acordo com Valdemarin (2000), nem tudo que se rotula como lições de
coisas e método intuitivo possui coerência, podendo, inclusive, ter concepções contraditórias. Alguns autores
que escreveram a respeito foram: Fanny Delon, Jules Paroz, Norman Calkins e Saffray (VALDEMARIN,
2000). 33
Principalmente: Felgueiras (2011); Mogarro (2010); M. de F. Meneses (2003); Bastos (2002); Vidal (1999,
2006, 2009). 34
A partir da exposição de Paris de 1878, passou a ser obrigatória a realização de congressos durante as feiras
internacionais. Estes se tornaram mais uma coisa a ser exposta. Eram divulgados “como os principais
espetáculos de ciência e progresso, mas abertos apenas para públicos selecionados”. Passaram a realizar-se
também exposições com temáticas específicas, aliadas ou não aos congressos. Da educação, têm-se três
| 44
discussão que procuravam padronizar alguns setores; no caso da indústria, por exemplo, a
adoção de padrões permitia maior expansão do mercado. Foram “[...] Congressos de pesos e
medidas, jurídicos, pedagógicos, médicos, de higiene, de assistência, de proteção à infância,
etc. Em todos esses eventos, o internacionalismo mostra-se como um dos elementos
constituintes das nacionalidades” (KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 87). A alusão nos
discursos do período (segunda metade do século XIX) às exposições e congressos (estes a
partir de 1878) tornou-se um mecanismo de legitimação, uma referência constante a fim de se
justificarem propostas de diferentes ordens como modernas e científicas (KUHLMANN
JÚNIOR, 2001, p. 207).
As exposições universais foram espaços nos quais as “influências” internacionais
estiveram visíveis em variados segmentos; contudo, a adoção de modelos não ocorreu por
simples procedimentos de cópia (KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 18). Embora o estudo de
Kuhlmann Júnior não se tenha detido na questão da expansão de museus pedagógicos e
escolares, pode-se tomá-lo como parâmetro para compreender como questões de ordem
internacional estiveram sendo debatidas e assimiladas por diferentes nações.
Para Vidal (2009, p. 37), a segunda metade do século XIX caracterizou-se por ser o
momento de crescimento de uma indústria voltada a abastecer materialmente a escola, que
encontrou nas exposições universais uma estratégia de divulgação desses produtos que
poderiam alcançar mercados internacionais. Ao mesmo tempo, a autora lembra que se
elaborava uma legislação escolar que previa a obrigatoriedade do ensino; portanto, ampliava o
mercado consumidor em potencial e sujeitos educacionais estavam ocupados na criação ou
tradução de objetos para uso escolar, como foi o caso de Menezes Vieira.
Para Lawn (2005, p. 145) a organização e internacionalização da escolarização
requereu sua “[...] sustentação através de tecnologias simples” 35
, assim como o advento das
escolas públicas e de um currículo prescrito permitiu a chegada de utensílios e objetos nas
escolas inglesas36
(LAWN, 2005, p. 146). Esta análise pode ser estendida ao caso brasileiro.
De certa forma, o abastecimento das escolas com museus pode ser vinculado a esse processo
de expansão do ensino.
Do mesmo modo que os materiais de ensino passaram a figurar nas “feiras”
internacionais a partir da exposição de 1855 (Paris) e, com mais relevo a partir de 1862
exemplos de eventos desta ordem, em 1880 na Bélgica, em 1883 no Brasil e em 1884 na Inglaterra
(KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 88). 35
“[...] the relation between the organization of mass schooling and its sustenance by simple technologies”
(Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni de Sousa). 36
“In England, the advent of state schools and a prescribed curriculum permitted a range of tools and objects to
arrive in their wake” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni de Sousa).
| 45
(Londres), quando a temática educacional ganhou um espaço específico37
(KUHLMANN
JÚNIOR, 2001, p. 30-31), alguns países realizaram exposições pedagógicas e, a partir delas,
criaram museus do mesmo gênero. Este foi o caso da Inglaterra, em 1854. O país realizou
uma exposição pedagógica em Londres, fruto das coleções apresentadas em 1851 na
Exposição Internacional, a partir da qual se formou o Museu de Educação, formando uma
divisão do South Kensigton Museum em 1857 (KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 30/71;
BASTOS, 2002, p. 255). Em 1892, outro museu da educação é criado na Inglaterra pela
Teachers’ Guild (PELLISSON, 1911).
Antes disso, em 1851, a Alemanha havia criado seu primeiro museu pedagógico,
sendo o país com maior número deste tipo de estabelecimento. Apresentam-se, na sequência,
os primeiros museus criados em diferentes países, seguidos quase em sua maioria por outras
instituições posteriores. Canadá cria seu museu em 1857; em 1864 é a vez da Rússia; em
1872, da Áustria; em 1874, foi a vez da Itália; em 1875, da Suíça; em 1877, a Hungria
inaugura seu museu, bem como a Holanda; em 1878 é a vez do Japão; em 1879, da França e
em 1880, da Bélgica. Em 1881 é inaugurado um museu nos Estados Unidos; em 1887, na
Dinamarca; em 1890, na República Tcheca, em 1898, na Sérvia e na Eslovênia e em 1901, na
Croácia (PELLISSON, 1911). Contudo, em cada localidade os museus adquiriram formato
próprio; em alguns casos dedicaram-se a um segmento escolar; em outros, à instrução pública
como um todo. Alguns se centraram em uma cidade específica; outros tiverem caráter mais
nacional, atuando enfim com finalidades distintas.
O Museu Pedagógico Municipal de Lisboa foi o primeiro deste gênero criado em
Portugal. Inaugurado em 1º de julho de 1883, teve como primeiro diretor Adolfo Coelho. Em
setembro de 1883 foi aberto à visita de professores e ao público em geral apenas em 1885
(MENESES, 2003). Em 1892, o Estado tornou-se o responsável no lugar da municipalidade,
passando o museu a se chamar Museu Pedagógico de Lisboa. De acordo com Mogarro, já
neste período o museu “[...] entrou numa fase irreversível de decadência, sendo os seus
materiais dispersos por várias instituições, num processo lento que se arrastou pelos anos
seguintes. Assim desaparecia outra referência da modernização pedagógica do país”
(MOGARRO, 2010, p. 110).
Já o Museo de Instrucción Primaria, da Espanha, foi criado um ano antes, em 6 de
maio de 1882, vindo a ser mais tarde denominado Museu Pedagógico Nacional. Teve início
37
Foi a partir da exposição de Viena, em 1873, que a educação ganhou maior importância, quando a seção foi
subdividida de acordo com propostas pedagógicas voltadas à primeira infância, por exemplo, à demonstração
de modelos de escolas, materiais didáticos afinados a determinados métodos, entre outros aspectos
(KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 33).
| 46
com os objetos da Exposição Pedagógica do Congresso Nacional Pedagógico do mesmo ano e
foi aberto em 1884. Manuel Bartolomé Cossío foi seu diretor desde fins de 1883 até 1929. Em
1941, o museu encerrou suas atividades (FRAILE, 1987; DUJO, 1985).
Conforme aludido, as exposições estimularam e impulsionaram a disseminação de
museus pedagógicos; contudo, não se pode creditar a elas sua invenção. Longe de encontrar o
marco zero destas instituições, os exemplos levantados servem para mostrar a existência de
projetos que não são tomados necessariamente como precursores. Em 1817, A. Jullien (de
Paris) publicou a obra Esquisse et vues préliminaires d’un ouvrage sur l’éducation comparée.
Nesta obra se encontra o programa considerado como a primeira ideia de criação de um
museu pedagógico (PELLISSON, 1911).
Na América Latina, o projeto brasileiro foi o primeiro, datado de 1883; o projeto
argentino data de 1888 e o uruguaio, de 1889 (PELLISSON, 1911). O Museu Pedagógico
Uruguaio foi “atestado” por Armanda Álvaro Alberto em sua viagem oficial ao país em
outubro de 1931, como integrante da Comissão de Intercâmbio Intelectual Brasil-Uruguai,
lugar onde proferiu conferência. Nas palavras da professora, o museu era “riquíssimo e
suntuoso” e possuía “coleções interessantíssimas de quase todos os países sul-americanos,
menos do Brasil” (ALBERTO, 1931 citada por MIGNOT, 2010, p. 54).
Após o período de estadia no Uruguai, quando conheceu o ensino primário daquele
país, Armanda correspondeu-se com autoridades, diretoras, professoras e alunos de escolas
que visitou durante a viagem. Ao manusear essas “missivas”, Mignot (2010, p. 59) encontrou,
entre outros assuntos, agradecimentos pelo “[...] envio de material para o Museu Pedagógico –
cartões-postais, insetos, frutos e sementes, organizados pelo Museu Nacional e pelo Jardim
Botânico [...]”. Passados mais de dez anos da visita ao Uruguai, Armanda ainda recebia
cartas, em especial de Afonsa Briganti, que fora diretora da Escola n. 12 de 2º grau de
Montevidéu. Em carta datada de 2 de outubro de 1945, Afonsa relata o encontro com ex-
alunos, alguns já professores, os quais ainda se recordavam de sua visita à escola n. 12 e do
“formoso material” que ela lhes havia enviado para compor o museu escolar (MIGNOT,
2010, p. 62).
A Argentina contou com inúmeras iniciativas de criação e remodelação de museus
pedagógicos, na tentativa de manter estes estabelecimentos. De acordo com García (2010), em
1885 o Conselho Nacional de Educação argentino resolveu criar um Museu Escolar Nacional
e, em fins de 1888, aprovou seu regulamento inspirado em partes no Museu Escolar da
Bélgica. Em 1889, o museu foi anexado à Biblioteca de Maestros e, em 1906, não sobreviveu
à morte de seu diretor, ficando as coleções abandonadas no Conselho Nacional de Educação.
| 47
Segundo García (2010, p. 97), “la idea de establecer museos para el uso de las escuelas
se insinuó en otras partes del país, aunque con escaso éxito. En la ciudade de Buenos Aires,
algunos consejos escolares de distrito organizaron pequeños museos para uso de las escuelas
de su área” 38
. Nesta corrente, foi aberto, em 1904, o Museo Escolar Argentino; em 1910, o
Museo Histórico Escolar, junto do qual foi criado o Museo Escolar Sarmiento. Em 1911,
fundou-se o Museo Educacional, um museu regional da localidade de Mendoza; em 1914,
criou-se o Museo Escolar de Ciencias Naturales “Florentino Ameghino”, em Santa Fé, e em
1916, o Museo Pedagógico de la Provincia de Buenos Aires, exemplos de iniciativas
regionais implantadas na Argentina.
Boa parte destas instituições teve seu fim decretado ainda no século XX. Não foram
muitos os que sobreviveram ao tempo e permanecem em atividade. Destes, destaca-se o
Musée Pedagogique (1879) francês, atual Musée National de l'Éducation que:
[...] existe até hoje39
como parte dos serviços do Institut National de Recherche
Pédagogique. Instalado confortavelmente na cidade de Rouen, dispõe de uma sede
para exposições no centro urbano e uma grande reserva localizada em bairro mais
afastado. Nele podem-se encontrar diversos materiais escolares que remontam ao
século XVIII (VIDAL, 2006, p. 260).
Apesar das particularidades, estes museus tinham a característica comum de
funcionarem como instituições formadoras de professores; em geral, possuíam bibliotecas
anexas, produziam e distribuíam periódicos e livros voltados aos modernos métodos e
materiais de ensino, a fim de instrumentalizar a prática dos professores.
Para o português Álvaro Viana de Lemos (1923, p. 104, grifo meu), deveria haver três
espécies de museus: o pedagógico, o escolar e o municipal ou regional. De acordo com ele:
O museu pedagógico para instrução do próprio professor, deve ser instalado em
grandes centros, junto das Escolas Normais, possuindo colecções de material
didático natural ou reduzido, tanto nacional como estrangeiro, e colecções de
fotografias e estampas. Deve ser um centro produtor de clichés para projecções e
cinematografia escolar, e um arquivo de trabalhos apreciáveis de alunos e
professores, tanto de ordem intelectual como manual, etc.40
Diferente dos museus pedagógicos que possuíam autonomia administrativa e
funcionavam, em alguns casos, anexos às escolas normais, os museus escolares situavam-se
38
“A ideia de estabelecer museus para o uso das escolas se insinuou em outras partes do país, embora com
escasso êxito. Na cidade de Buenos Aires, alguns conselhos escolares distritais organizaram pequenos museus
para uso das escolas de sua área” (Tradução nossa). 39
De fato, o museu continua em atividade até o momento. Maiores informações estão disponíveis em:
<http://www.cndp.fr/musee/>. Acesso em: 20 maio 2012. 40
Optou-se, neste trabalho, por conservar a grafia original de textos e documentos.
| 48
dentro das escolas. Estes serviam diretamente aos professores e alunos para o estudo das
matérias a partir de elementos concretos, vinculando-se a um ensino mais intuitivo.
1.4 DISCUSSÕES EM SOLO BRASILEIRO: O MUSEU ESCOLAR NACIONAL (1883) E
O PEDAGOGIUM (1890)
A concepção de um museu pedagógico inseriu-se na “representação da modernidade
educacional brasileira” a partir de 1870, consequência da “participação nas exposições
internacionais, do contato com publicações e de visitas a estabelecimentos estrangeiros”
(BASTOS, 2002, p. 258).
A criação do primeiro museu pedagógico brasileiro data de 2 de dezembro de 1883,
tendo sido chamado de Museu Escolar Nacional, situado no Rio de Janeiro. Sua concepção se
deu em decorrência da Primeira Exposição Pedagógica, a qual legou parte dos objetos que
viriam a constituir o acervo do museu.
A autoria do projeto que lhe deu origem é um tanto controversa, envolvendo disputas
políticas. O deputado Franklin Dória apresentou projeto no Congresso Nacional em 3 de
agosto de 1883, a partir de ideia da Comissão do Congresso Pedagógico, presidida pelo conde
d’Eu. Contudo, Rui Barbosa reivindicava ser o precursor da ideia, com projeto de 12 de
setembro de 1882, publicado na obra Reforma do Ensino Primário e várias Instituições
Complementares da Instrução Pública, em 1883, na qual dedicou um capítulo para tratar da
criação de um Museu Pedagógico Nacional, baseado em experiências estrangeiras (BASTOS,
2002).
A criação de bibliotecas e museus pedagógicos também já havia sido prevista por
Leôncio de Carvalho, no Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879, que, em seu 8º artigo,
recomendava “fundar ou auxiliar bibliotecas e museus pedagógicos nos lugares onde houver
escolas normais” (RIO DE JANEIRO, 1879, p. 279). Contudo, para Rui Barbosa, essa
indicação não era suficiente para garantir a criação de um museu pedagógico, que deveria ser
custeado pelo Estado (BASTOS, 2002). Além destes personagens, Manoel Pereira Frazão
também discorreu a respeito de museus pedagógicos e escolares no parecer encomendado pela
organização do Congresso da Instrução, que não se realizou, mas teve as atas publicadas em
1884.
O projeto apresentado por Dória (1883) não foi aprovado, mas resolveu-se que o
Estado ficaria responsável pelos objetos da Exposição Pedagógica até que fosse fundado um
museu pedagógico. Isso ocorreu com o encerramento da exposição, quando se criou a
| 49
Sociedade Mantenedora do Museu Escolar Nacional, por proposição do conselheiro Manuel
Francisco Correia, sendo a sociedade presidida pelo conde d’Eu.
O Congresso da Instrução, que deveria ser realizado em 1883, começou a ser
preparado no final de 1882 pela comissão organizadora composta pelo conde d’Eu, pelo
visconde do Bom Retiro, pelo senador Manoel Francisco Corrêa, por Carlos Leôncio de
Carvalho e Franklin Américo de Menezes Dória. Foi a partir da terceira sessão preparatória
em janeiro de 1883 que se desenvolveu a proposta de realizar uma exposição pedagógica
concomitante ao congresso, solicitando-se, a partir disso, o envio de objetos e publicações de
países da Europa e América. O congresso seria dividido em duas seções, uma dedicada ao
ensino primário, secundário e profissional e outra, ao ensino superior. Elaboraram-se 46
pareceres a partir de questões formuladas41
, 29 referentes à primeira seção, e 17 à segunda
(KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 97).
Mesmo sem a realização do congresso, devido à não-aprovação de verbas pelo
Senado, solicitou-se a permanência da exposição, uma vez que muitos países já haviam
enviado objetos. Sendo assim, ela foi realizada com donativos de particulares, do próprio D.
Pedro II e do conde e condessa d’Eu. Embora o congresso não se tenha realizado, várias
conferências foram promovidas pela exposição (KUHLMANN JÚNIOR, 2001, p. 101).
Depois de fundado, o Museu Escolar Nacional passou a funcionar no andar superior da
Imprensa Nacional, sendo aberto ao público duas vezes por semana, estando aberto o dia
inteiro apenas no domingo. Entre 1884 e 1887 promoveu exposições escolares anuais.
Entretanto, não faltaram críticas a esse projeto, entre outros motivos, por ser dirigido por uma
associação particular, por estar pouco aberto ao público e por não possuir espaço próprio
(BASTOS, 2002, p. 268-269).
Em que pesem as críticas, o fato de o museu ser aberto à população e não apenas às
pessoas ligadas a instituições de ensino, demonstra a amplitude que se pretendia com o
projeto e a importância atribuída à causa educativa, cujo raio de alcance deveria ser estendido.
Em 1890 funda-se um “novo” museu pedagógico, intitulado Pedagogium, por meio do
Decreto nº 667, de 16 de agosto de 1890, durante a atuação do ministro Benjamin Constant.
Este museu teve início, ao que tudo indica, com a biblioteca e material clássico da Associação
Mantenedora do Museu Escolar, então extinta, e da Associação Promotora da Instrução.
Menezes Vieira foi nomeado diretor do Pedagogium em 20 de agosto de 1890, podendo “[...]
ser considerado o seu criador e grande estimulador” (BASTOS, 2002, p. 274).
41
A 14ª questão referia-se a bibliotecas, museus escolares e pedagógicos, e caixas escolares. Contou com os
pareceres de Manoel José Pereira Frazão e Dr. L. R. Vieira Souto (BASTOS, 2002, p. 266).
| 50
Segundo Vidal (2009), na viagem que Menezes Vieira fez à França em 1889 para
participar como delegado no Congrès International de l’Enseignement Primaire, ele colheu
elementos que seriam postos em prática no Pedagogium um ano depois, pois o “seu” Museu
Pedagógico em tudo se parecia com o Musée Pedagogique francês:
[...] seja pelo interesse em preservação de um acervo sobre a escola pública
brasileira, seja por sua associação a uma biblioteca de apoio docente, seja pela
edição de uma Revista Pedagógica que tomava o nome da francesa Revue
Pédagogique, seja ainda pela publicação da série Memórias e documentos, inspirada
na Memoires et documents scolaires (VIDAL, 2009, p. 52, grifo da autora).
De acordo com o Decreto nº 980, de 1890, em seu artigo primeiro, o Pedagogium
tinha por fim “constituir-se o centro impulsor das reformas e melhoramentos de que carece a
educação nacional, offerecendo aos professores publicos e particulares os meios de instrucção
profissional, a exposição dos melhores methodos e do material de ensino mais aperfeiçoado”
(RIO DE JANEIRO, 1890a, não paginado). Estas funções tornaram o museu um lugar não
apenas de exposição, indicando uma dimensão de formação profissional daqueles professores
atuantes nas escolas, servindo como modelo a ser seguido na aplicação de métodos e emprego
de materiais.
Conforme antes indicado, entre as atividades do Pedagogium esteve a edição de uma
revista intitulada Revista Pedagogica:
A Revista Pedagogica teve uma duração de seis anos, tendo iniciado sua circulação
em 15/11/1890, uma data que nos sugere ser comemorativa do primeiro aniversário
do novo regime republicano. O último número, pelo que consta no acervo da
Biblioteca Nacional, foi publicado em 15/6/1896, embora no periódico Educação e
Ensino, que se apresenta como o sucessor da Revista Pedagogica, haja a informação
de que o último número tenha sido publicado em janeiro de 1897 (GONDRA, 1997,
p. 375, grifo do autor).
Segundo Gondra (1997, p. 378-379), a revista consistiu num “[...] instrumento para
fazer circular o discurso republicano a ser distribuído gratuitamente a todos os professores -
públicos e particulares”. Além desta publicação, o museu ainda promoveu, entre 1891 e 1896,
cursos e conferências, bem como exposições escolares anuais, com trabalhos de alunos,
professores e material de ensino.
Num primeiro momento, o Pedagogium ocupou quatro salas numa sede provisória,
mudando-se depois para uma sede com três andares. Do material deixado pelo Museu Escolar,
Menezes Vieira contabilizou 4.147 obras, incluindo relatórios, anais, discursos e programas,
os quais para ele não tinham valor pedagógico, tornando-se necessária a aquisição de material
| 51
concreto. Doações foram efetuadas por professores, inspetores e comissões enviadas às
exposições universais, auxiliando no crescimento do acervo do museu (BASTOS, 2002, p.
280). Em agosto de 1895, ganha sede própria na Rua do Passeio, n. 66, e passa a contar com
uma escola-modelo anexa, tendo sido instalada em prédio próprio e considerada uma das
seções do museu; do mesmo modo que a biblioteca, a exposição permanente, entre outras.
Entre os objetivos do Pedagogium esteve também a disseminação de instituições
similares nos outros estados e a organização de museus escolares nas escolas brasileiras. A
presença de museus nas escolas estava prevista no 9º artigo do Regulamento da Instrução
Primária e Secundária do Distrito Federal, aprovado pelo Decreto nº 981, de 8 de novembro
1890.
Cada escola primária terá, além das salas de classe e outras dependencias, sua
biblioteca especial, um museo escolar provido de collecções minerologicas,
botanicas e zoologicas, de instrumentos e de quanto for indispensavel para o ensino
concreto, um gymnasio para exercicios physicos, um pateo para jogos e recreios, e
um jardim preparado segundo preceitos pedagogicos (RIO DE JANEIRO, 1890b,
não paginado, grifo meu).
De acordo com Bastos (2002, p. 294, grifo da autora), “era recomendado que cada
museu escolar adotasse um plano metódico que se aproximasse do indicado por Buisson, no
seu Dictionaire de Pedagogie et d’Instruction Primaire”42
. Segundo a autora, o museu escolar
se destinaria ao ensino das lições de coisas, vistas mais como ensino de ciências físicas e
naturais; professores e alunos iriam organizá-lo tomando como referência as coleções
Saffray43
, Deyrolle44
, Dorangeon45
e “algumas caixas da Casa Palavra46
, da Itália” (BASTOS,
2002, p. 295). Este aspecto demonstra um direcionamento efetuado pelas instruções
42
Para esclarecimentos sobre o plano de Buisson, ver capítulo 2, item 2.5. 43
As amostras desta coleção são divididas em duas partes, denominadas de museu tipo e museu anexo. O
primeiro, compreende objetos necessários ao ensino por aspectos, para a demonstração tangível que deve
acompanhar toda lição de coisa, toda conversa de história natural. O segundo, pelos objetos destinados a dar
noções um pouco detalhadas sobre as produções e as indústrias da região. “[...] désigne sous le nom de musée
type, comprenant les objets nécessaires pour l’enseignement par l’aspect, pour la démonstration tangible qui
doit accompagner toute leçon de choses, toute causerie d’histoire naturelle. Il appelle, d’autre part, musée
annexe les objets destinés à donner des notions un peu détailées sur les productions et les industries de la
région” (BROUARD; DEFODON, 1887, p. 385) (Tradução nossa). 44
Conforme já indicado, as coleções Deyrolle eram compostas tanto de quadros murais, com ilustrações a cores,
quanto de modelos de anatomia humana, flores, frutos, entre outros, que serviam como materiais para lições de
coisas, bem como para outras áreas do saber. 45
“O museu industrial escolar Dorangeon se compõe de 12 pranchas em cartão, sobre as quais são suspendidos
os objetos ou substâncias que devem servir as lições de coisas” (Tradução nossa). Compreende os temas:
alimentação, vestimenta, habitação e necessidades intelectuais (indústrias). “Le musée industriel scolaire
Dorangeon se compose de 12 planches en carton, sur lesquelles sont suspendus les objets ou substances qui
doivent servir aux leçons de choses” (DORANGEON, 1884, p. 7, grifo do original). 46
No percurso de realização deste trabalho não foram localizadas menções a este material, nem referências que o
descrevessem.
| 52
brasileiras da função do museu escolar. Uma vez que analisados os planos propostos por
Buisson e Bannwarth (cf. item 2.5), nota-se a extrapolação do estudo das ciências físicas e
naturais, ao se contemplarem questões como indústria, construção, habitação e vestuário,
entre outras.
A organização de museus escolares “modelo” era uma das atividades previstas do
Pedagogium. Por essa razão, em 1891, Benjamin Constant, ministro da Instrução Pública,
solicitou ao diretor do Museu Nacional, Ladislau Neto, “[...] que preparasse pequenas
coleções de história natural apropriadas para o ensino elementar que deveriam ser remetidas
ao Pedagogium para posterior distribuição nos estabelecimentos de ensino” (SILY, 2010, p. 9,
grifo meu).
De fato, o Museu Nacional entre as suas atividades produzia material didático para ser
enviado às escolas. Sily (2008, 2010, 2012) pesquisou algumas práticas educativas do Museu
Nacional do Rio de Janeiro na primeira metade do século XX. Segundo esse autor, a partir de
1916 o Regulamento do Museu Nacional fixou como uma das finalidades “estudar, ensinar e
divulgar a história natural”, passando a preparar regularmente espécimes e coleções em seus
laboratórios, as quais seriam distribuídas entre as escolas, para o ensino de história natural nos
gabinetes e museus escolares. De acordo com relatório do Museu Nacional de 1920, duas
escolas catarinenses receberam coleções didáticas (SILY, 2008, p. 9). As temáticas dos
mapas, entre 1919 e 1922, foram: antropologia, zoologia, geologia e botânica (SILY, 2008, p.
10). Abaixo podem ser visualizados dois exemplares de “quadros elementares de história
natural do Brasil organizados pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro”, referentes a botânica e
zoologia.
| 53
Figura 5 – Quadro mural de zoologia editado
pelo Museu Nacional em 1921
Figura 6 – Quadro mural de botânica editado
pelo Museu Nacional em 1922
Fonte: (SILY, 2012, p. 261). Fonte: (SILY, 2012, p. 264).
Em relação a Santa Catarina, até o momento o registro que se tem quanto à aquisição
destas coleções refere-se ao Ginásio Catarinense, instituição privada, católica e destinada ao
público masculino. Segundo dados do relatório anual de 1929, o lente de História Natural,
Padre Maute, foi ao Rio de Janeiro “para estudar nos museus da capital federal as installações
mais recentes e para augmentar o nosso museu”. Angariou objetos em diferentes instituições –
Ministério da Agricultura, Instituto Biológico, Jardim Botânico, entre outros –, tendo
conseguido no Museu Nacional 20 quadros murais destinados ao ensino de história natural
(GYMNASIO..., 1929, p. 65).
Em relação às escolas públicas, tem-se a seguinte informação procedente do relatório
do Colégio Municipal de Joinville, redigido por Orestes Guimarães, diretor do
estabelecimento entre 1907 e 1909. No item material escolar, o diretor observa:
Hoje o Collegio possue uma boa colleção de mappas muraes para o ensino de
schiencias naturaes (collecção, Deyrolles, abrasileirada), mappas para o ensino de
geographia, sobretudo patria (Olavo Freire e Rio Branco), globo terrestre, celeste e
ardosiado, apparelho Level, etc. tudo constando do inventario (anexo 37). Este
material adoptado nas escolas de S. Paulo alguns feito sob a direcção do
Pedagogium Brasileiro, é dos melhores e resiste a qualquer critica, como material
didactico (COLÉGIO..., 1909, p. 16-17, grifo meu).
Esta citação fornece dois elementos para pensarmos na circulação de objetos escolares,
os quais mostram que Santa Catarina estava conectada às novidades pedagógicas. Primeiro, a
| 54
menção da existência da coleção de quadros para o ensino de ciências naturais Deyrolle, na
versão traduzida e adaptada, conforme anunciado anteriormente, referente às pesquisas de
Vidal (1999, 2006, 2009). Em segundo, a referência de que alguns destes materiais eram
provenientes do Pedagogium, sem a indicação de que fossem produzidos ou apenas
distribuídos por ele – vale adiantar que neste período o Pedagogium já havia sido
municipalizado.
Desde o início, o Pedagogium enfrentou dificuldades em relação à sua vida
institucional, sendo ameaçado de extinção, sem definição orçamentária e sem espaço próprio.
Com a morte de Benjamin Constant em 1891, perdeu-se um apoio político indispensável
(BASTOS, 2002, p. 300).
Estas tensões apareciam nas publicações da Revista Pedagogica, utilizada como
instrumento de convencimento dos parlamentares e do governo da importância do Museu
Pedagógico e da própria revista, bem como do reforço dessa importância junto à comunidade
escolar. A publicação dos trabalhos realizados pelo museu fez parte desse projeto de
afirmação pública (GONDRA, 1997, p. 381).
Após intensas discussões a respeito da importância de permanência do museu e de sua
defesa por parte de Menezes Vieira, que relembrava Benjamin Constant no afã de conseguir
apoio político para que o museu não perdesse seu orçamento, a partir de 3 de janeiro de 1897
o museu passou à administração municipal do Distrito Federal, sendo Manoel Bonfim o novo
diretor. Menezes Vieira ocupou este cargo até dezembro de 1896 (BASTOS, 2002, p. 308).
Com a transferência para a municipalidade, a Revista Pedagogica também sofreu uma
remodelação. Perdeu “[...] seu caráter mais abrangente, de periódico nacional e internacional,
voltando-se primordialmente para um público local” (GONDRA, 1997, p. 388). Contudo,
apesar do novo formato, Gondra considera que a revista, então com o subtítulo “Educação e
Ensino - Revista Pedagogica da Instrucção Publica Municipal do Districto Federal”, deu
continuidade às funções da primeira, sobretudo por ter como função ser guia dos professores.
Após o período de municipalização, mais precisamente de 1899 a 1902, a Academia
de Medicina passou a ocupar uma das repartições do edifício do Pedagogium. Aos olhos do
dr. Alfredo Nascimento, a Academia passou a conviver com um moribundo. Para Luis Reis
(1914 citado por BASTOS, 2002, p. 313), depois de 1897 o Pedagogium “[...] senão morreu,
vegeta por aí abandonado ou esquecido [...]”.
O Pedagogium é extinto em 1919. Mas a idéia não morreu. Em 1937, é criado o
Instituto Nacional de Pedagogia (lei nº 378, de 13 de janeiro), que retoma parte das
funções do Pedagogium. É instalado, no ano seguinte, com o nome de Instituto
| 55
Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), vinculado ao Ministério de Educação e
Saúde Pública (BASTOS, 2002, p. 314, grifo da autora).
Além desta iniciativa nacional, alguns estados empenharam-se em criar seus museus
pedagógicos. O estado de Alagoas instalou seu Pedagogium em 3 de maio de 1891 e o de São
Paulo criou, em 1895, o Instituto Pedagógico Paulista (BASTOS, 2002, p. 296).
Além destes, Leontina Busch (1937) identificou na legislação educacional de alguns
estados a presença desta instituição. Por exemplo: consta no Regulamento da Instrução
Pública Primária do Rio de Janeiro, de 1929, que foi criado um museu pedagógico. De acordo
com Regulamento de 1932, o Maranhão criou na capital seu museu pedagógico. Em 1934, em
exposição sobre a organização do ensino em Pernambuco, menciona-se a presença de um
museu pedagógico central, criado em 1931, e que permanecia “no início” devido à recente
concessão de recursos.
O Rio Grande do Sul publicou, em 1963, na Revista do Ensino, estatutos para museus
escolares do seu estado. Estes tinham funções muito próximas de um museu pedagógico,
como, por exemplo, fornecer ao professor, por meio de material didático, os meios para
atender às demandas da técnica educativa, além de adquirir, colecionar e classificar materiais
de ensino “orientando os professôres na aplicação dos mesmos” (REVISTA DO ENSINO,
1963, p. 50). Estes museus seriam organizados por seções, a saber, audiovisual, material
didático especializado e documentação.
Se à primeira vista a proliferação de museus escolares parece não ter surtido grande
efeito, um olhar mais atento encontra vestígios desse aparato em alguns estados brasileiros,
como é o caso de São Paulo (POGGIANI, 2011a; CUNHA, 2008; SOUZA, 1998), Minas
Gerais (BENCOSTTA; BRAGA, 2011; FARIA FILHO, 1998a) e Santa Catarina (PETRY,
2012; TEIVE; DALLABRIDA, 2011; TEIVE, 2007; FIORI, 1991). De acordo com a
professora Leontina Busch (1937), museus escolares e pedagógicos estiveram presentes na
legislação de pelo menos sete estados brasileiros47
nas décadas de 1920 e 1930.
Por sua vez, Sily menciona que na correspondência trocada entre escolas e o Museu
Nacional, aquelas com intuito de conseguir coleções didáticas:
[...] foram encontradas 35 cartas enviadas de diferentes colégios e ginásios, em sua
maioria do estado de Minas Gerais, e do antigo Distrito Federal, onde já existiam ou
estavam sendo organizados museus escolares ou gabinetes de História Natural, nas
décadas de 1920, 1930 e 1940 (SILY, 2010, p. 15).
47
São eles: Minas Gerais (MG), Distrito Federal (DF), Bahia (BA), Sergipe (SE), Piauí (PI), Pernambuco (PE) e
Maranhão (MA).
| 56
Este dado corrobora a “revelação” de que os museus existiram em escolas brasileiras e
fornece pistas para um melhor entendimento deste “aparato pedagógico”. Vejamos como a
introdução dos museus ocorreu em Santa Catarina no início do século XX.
1.5 MUSEUS ESCOLARES EM SANTA CATARINA: INDÍCIOS A PARTIR DA
REFORMA DO ENSINO DE 1911
Conforme anunciado na introdução, este trabalho tem como primeira baliza temporal a
reforma de 1911, levando em conta o contexto catarinense, momento a partir do qual
consideramos ter-se tornado um objetivo do governo a implantação de museus escolares no
interior dos grupos escolares, tanto pela previsão de um espaço físico, quanto pela compra de
coleções com denominação idêntica. Mesmo que na “origem” da proposta de museus (cf.
capítulo 2) não houvesse a inclinação para determinado tipo de escola, em Santa Catarina
tem-se a indicação de provimento apenas para os grupos escolares. Neste sentido, o museu
seria mais um dos símbolos que endossariam o imaginário desta escola como uma “vitrine da
República” 48
.
A reforma do ensino de 1911 é conhecida por ser a que implantou os primeiros grupos
escolares em Santa Catarina, por meio da construção de edifícios próprios, bem como pela
reformulação dos documentos normativos, tais como regulamento, regimento e programa de
ensino, do ensino primário, das escolas complementares e da escola normal. Este formato de
escola, denominado grupo escolar, já aparecia na legislação de 1904 (GASPAR DA SILVA,
2006). A novidade da reforma de 1911 é justamente a materialização desta proposta de escola
graduada, além da reformulação do ensino público em geral, cujo ponto fulcral era a formação
de professores pela escola normal.
Para Fiori (1991, p. 83), “a originalidade da ação de Orestes Guimarães repousa no
fato de que, ao invés de começar uma reforma de ensino construindo uma superestrutura
administrativa, ele iniciou, pelos estabelecimentos de ensino, a sua ação reformadora”. A
reforma por ele empreendida teve início durante o governo de Vidal José de Oliveira Ramos
(1910-1914). Vidal Ramos era natural de Lages e pertencia a uma família de latifundiários
rurais. Iniciou-se com ele uma linhagem de políticos da família Ramos. Seus filhos Nereu e
Celso comandariam o governo estadual em anos posteriores (FIORI, 1991, p. 80).
48
Termo cunhado por Gaspar da Silva (2006).
| 57
Criou-se a Inspetoria Geral da Instrução Pública, órgão responsável pelo controle e
orientação do ensino que contava com três cargos. Orestes Guimarães era o inspetor geral do
ensino, sendo sucedido pelos inspetores escolares, auxiliados pelos chefes escolares, que
fiscalizavam as escolas isoladas e ambulantes. Os inspetores possuíam status elevado e vários
destes personagens teriam atuação política no cenário educativo em anos seguintes. Entre
eles, encontravam-se Luiz Sanchez Bezerra da Trindade e João dos Santos Areão (FIORI,
1991, p. 97/99).
Ao analisar a documentação decorrente desta reforma, Teive (2010) observa uma
inclinação condizente com a pedagogia moderna e o método intuitivo. É certo que nenhuma
pedagogia funciona por decreto; contudo, percebe-se determinado alinhamento da proposta
reformadora catarinense com as supostas novidades pedagógicas postas em prática em centros
urbanos como São Paulo e países considerados avançados, entre eles França e Estados Unidos
da América.
A predileção por processos de ensino intuitivos não poderia ser mais bem representada
do que pelos museus escolares. Estes deveriam ser considerados como “[...] a mais cabal
integração do ensino intuitivo, e todos o devem reconhecer ainda mesmo aqueles muito
acorrentados [ilegível] ao velho aforismo do magister dixit [o mestre disse]!” (FIGUEIREDO,
1924, p. 451, grifo do autor).
Apesar de registrar a necessidade da adoção de um ensino menos teórico, o
Regulamento da Instrução Pública, o Regimento e Programa de Ensino para os grupos
escolares e escolas isoladas de 1911 ainda não mencionavam a presença de museu escolar em
qualquer tipo de escola, nem mesmo na escola normal. Este dado é curioso, pois, no ano
seguinte, em relatório das atividades do governo, o secretário geral dos negócios do estado irá
listar como um dos componentes dos primeiros grupos escolares, os museus, que teriam sido
importados. O registro da importação no relatório demonstra, de certa forma, um recurso
discursivo cujo objetivo consistia em afirmar a sintonia das ações do governo a projetos de
escolarização considerados modelares.
Uma possível explicação para essa ausência inicial está no direcionamento dos três
textos normativos acima mencionados. Isto quer dizer que foram eles os primeiros
documentos expedidos após a Lei nº 846, de 11 de outubro de 1910, que autorizou a reforma
do ensino. Talvez por essa razão sejam mais genéricos em alguns pontos, como, por exemplo,
em relação a mobiliário, livros e objetos que “deveriam seguir o determinado pelo Secretario
Geral” (sem maiores indicações) (SANTA CATARINA, 1911b). Outros aspectos, entretanto,
estavam bem-delimitados, como as funções de cada segmento subordinado à Diretoria de
| 58
Instrução Pública, incluindo diretor, inspetor e chefes escolares (SANTA CATARINA,
1911a), além das funções das personalidades atuantes nas escolas, como diretor, professores,
porteiro, servente e até alunos, sobre os quais pesavam deveres e penalidades (SANTA
CATARINA, 1911b).
No que diz respeito ao ensino, o Regimento prevê, no artigo sexto que:
As licções sobre as materias de qualquer dos annos do curso, deverão, de accordo
com o programma adoptado, ser mais praticas e concretas do que theoricas e
abstractas, e encaminhadas de modo que as faculdades das creanças sejam incitadas
a um desenvolvimento gradual e harmonico. § unico. Cumpre que o professor tenha
em vista desenvolver a faculdade de observação e, para isso, empregue os
processos intuitivos (SANTA CATARINA, 1911b, p. 4, grifo meu).
Os professores deveriam, ainda, “concretizar o ensino, adoptando os processos
intuitivos e evitando, quanto possível, o modo individual e a aprendizagem puramente de
memoria” (SANTA CATARINA, 1911b, p. 23). Os conteúdos que deveriam ser ministrados
encontravam-se pré-determinados pelo programa de ensino, tanto dos grupos escolares quanto
das escolas isoladas.
Mesmo não tendo sido prevista textualmente no Regimento, no relatório da Secretaria
dos Negócios do Estado de 1911 (SANTA CATARINA, 1911e), já constava a indicação de
que fora importado mobiliário da América do Norte e que este se achava em depósito, bem
como o material didático e de expediente, os quais seriam remetidos aos grupos recém-
criados. Estariam, no meio desse material, os museus escolares?
Ao findar o ano de 1912, em novo relatório remetido ao governador, o secretário
afirma:
Em cada grupo, como acima alludi, existe um pequeno, porém apropriado museu
escolar, constando de especimens sobre historia natural, apparelhos de physica e de
chimica, que se prestam às experiências relativas aos programmas dessas materias;
quadros allegoricos sobre a nocividade do uso do alcool; quadros dos productos do
paiz, de machinas de uso na lavoura e da industria pecuaria. O museu para o grupo
Conselheiro Mafra bem como para todos os outros do Estado, faltando apenas para o
de Itajahy, cuja creação foi resolvida após a encommenda, foi adquirido em Paris,
na conhecida casa E. Deyrolles & Fils (SANTA CATARINA, 1912, p. 61, grifo
meu).
A partir desta passagem, delineia-se uma imagem bastante genérica do que seria o
museu, a saber, uma coleção de espécimes sobre história natural. Isto significa dizer que se
poderia constituir de pequenos animais empalhados ou cartonados (no caso de borboletas, por
exemplo), ou ainda de quadros temáticos de acordo com as matérias de ensino. Ressalta-se
| 59
que os aparelhos de física e química listados ao lado do museu não faziam parte,
necessariamente, do seu acervo, mas do gabinete de física e química, tendo sido dispostos
junto daquele. Isso só não ocorreu no GE Vidal Ramos, no município de Lages, pois, devido a
uma maior amplitude, o prédio comportou uma sala exclusiva para o gabinete de física e
química e outra para o museu. Neste grupo:
[...] no pavimento terreo existem quatro salões de 11m,40 x 8 x 5 e seis
compartimentos – directoria, gabinete do museu escolar e quatro pequenos
commodos para deposito, sendo dois na secção masculina e dois na secção feminina.
No pavimento superior estão situados mais quatro salões, iguaes ao do pavimento
terreo, e tres compartimentos, sendo um para o gabinete de physica e chimica (nos
demais grupos estes gabinetes estão instalados no compartimento destinado ao
museu escolar), o segundo para sala dos professores e o terceiro destinado aos
ensaios collectivos de cantos escolares (SANTA CATARINA, 1914d, p. 153, grifo
meu).
A importação das primeiras coleções de museus da França pode ter, de fato, ocorrido,
uma vez que a produção de mapas murais e coleções didáticas pelo Museu Nacional se
desenvolverá regularmente somente a partir de 1916 (SILY, 2010). Na listagem do material
didático importado para os grupos escolares e a escola normal, encontram-se 1.770 carteiras,
oito museus escolares e sete pequenos gabinetes de física e química, incluindo um museu e
um gabinete “mais completo” para a escola normal. O preço das carteiras Chandler, dos
museus e dos gabinetes totalizaram Rs. 7:963$040 (SANTA CATARINA, 1914d). Vale
lembrar, entretanto, que o relatório apresentado ao governador cumpre a função de informar
sobre as realizações de seu governo, ao mesmo tempo em que busca legitimar sua ação,
destacando grandes feitos, como a compra de objetos pedagógicos internacionais.
Segundo Houssaye (2007, p. 303-304), “quando se pretende fornecer ‘o’ bom
‘método’ comprovado, não há mais razão, é claro, para apoiar-se numa especificidade
nacional ou local. Ao contrário disso, o que é particular só pode desvalorizar”. Neste sentido,
a vinculação de um projeto de escolarização a tendências internacionais objetiva claramente à
sua valorização.
No relatório de 1912, o secretário relata que os grupos escolares Conselheiro Mafra e
Lauro Müller possuíam oito salas de aula, mais gabinetes para o diretor, professores e para o
museu, além dos galpões, área de recreio e jardim. Está se falando aqui de duas perspectivas
de museu: em primeiro, das coleções e em segundo, do espaço físico. Este dado é importante,
pois uma escola poderia possuir a coleção “museu escolar” sem dispor de um espaço
específico para ele, o que influenciaria no modo de conceber esse “instrumento didático”, uma
| 60
vez que a disponibilidade de espaço oportunizaria maiores atividades escolares e a
constituição de um acervo mais volumoso.
O edifício dos grupos seguia um padrão de distribuição do espaço. Em 1911, o
Regimento previa a existência de oito salas de aula, metade para a seção masculina e metade
para a feminina. No caso de existirem mais salas disponíveis, seriam criadas novas turmas de
1º e 2º ano; além disso, menciona-se a existência de biblioteca para empréstimo de livros aos
professores. Já em 1914, entrou em vigor nova regulamentação para o ensino primário49
,
aprovada pela Lei nº 967, de agosto de 1913, que autorizou a revisão dos regulamentos de
então. Desta vez, os textos passaram a ser mais detalhados, inclusive em relação ao aspecto
físico e aos materiais escolares.
O Regimento em vigor a partir de 1914 determinava que os grupos escolares tivessem
oito classes. De modo similar ao de 1911, as classes seriam separadas em seção masculina e
feminina; a dimensão das salas deveria obedecer ao mínimo de 9m x 7m x 5m. Além destes
compartimentos, este documento esclarece que cada grupo deverá possuir: um gabinete para
o museu escolar; um gabinete para o diretor; um cômodo para a portaria; um galpão de abrigo
para cada seção, com privadas, lavatórios e mictórios na seção masculina; e pátios arborizados
para os recreios (SANTA CATARINA, 1914b, p. 8). Curiosamente, a presença da biblioteca
era facultativa, podendo o grupo possuí-la ou não; no caso de a possuir, o acervo seria
emprestado tanto aos professores quanto aos alunos do estabelecimento, o que representa um
avanço em relação ao regimento de 1911.
De fato, tal modelo de configuração do espaço escolar foi o mesmo empregado na
construção dos primeiros grupos escolares, exceto para o caso de Joinville, cujo prédio,
municipal, passou por reformas, e em Lages, cuja construção, de dois andares, tornou esta
unidade mais ampla que as demais. Em 1912, o secretário geral ponderava que o GE Lauro
Müller estava em condições de ser adotado como tipo (modelo) para os demais que seriam
construídos, seguindo a tendência das plantas em formato de U, fornecendo ampla ventilação
e abundância de luz.
Entre as vantagens de instalação dos grupos escolares estava a economia feita com
materiais didáticos, uma vez que as oito classes poderiam usufruir dos mesmos utensílios.
Esta observação foi feita pelo reformador do ensino, Orestes Guimarães, em relato de suas
atividades transcrito no relatório do secretário geral em maio de 1914, e reforçada pelo
49
Regulamento da Instrução Pública: Decreto nº 794 (SANTA CATARINA, 1914a); Regimento Interno dos
grupos escolares: Decreto nº 795 (SANTA CATARINA, 1914b) e Programa de ensino dos grupos escolares e
escolas isoladas: Decreto nº 796 (SANTA CATARINA, 1914c).
| 61
governador Vidal Ramos, em sinopse de atividades do quadriênio 1910-1914 (SANTA
CATARINA, 1914e, p. 146). De acordo com Guimarães, os grupos possibilitavam economia
das instalações pedagógicas, visto que o “material escolar (museu, gabinete, quadros, mapas,
etc.)” poderia ser utilizado em comum pelos professores das oito classes (SANTA
CATARINA, 1914d, p. 142).
Ao tratar do material escolar na sinopse de seu governo, Vidal Ramos frisa que “cada
grupo tem um pequeno gabinete de physica e chímica e um museu escolar, que consta de
quadros e especimens relativos à botânica, zoologia, mineralogia, anatomia, physiologia,
agronomia e zootechnia, adequados ao ensino preliminar e complementar” (SANTA
CATARINA, 1914e, p. 149). Pela descrição, percebe-se uma filiação dos objetos a
determinadas matérias de ensino, voltadas ao estudo da natureza em suas variadas expressões.
Além de figurar nos documentos já apresentados, o museu apareceu, ainda que
timidamente, em alguns programas de ensino. Segundo Daros (2005, p. 11), “os currículos
nas reformas educacionais assumem posição estratégica, já que representam o sentido social e
político que se quer dar a uma determinada formação escolar [...]”. Tendo isto em mente,
considerou-se apropriado um olhar mais atento aos currículos propostos para a escola
primária a partir da reforma de 1911, que sofreram quatro remodelações enquanto ela esteve
em vigor (SANTA CATARINA, 1911c, 1914c, 1920 e 1928a) e, em 1946 (SANTA
CATARINA, 1946d), após a Lei Orgânica do ensino. Além disso, fez-se uma breve incursão
pelos currículos da escola normal (SANTA CATARINA, 1911d, 1919, 1928b, 1947) a fim de
observar se, entre os conteúdos estudados pelos futuros professores, constava alguma
orientação acerca do uso do museu.
1.5.1 A presença do museu nos programas de ensino da escola primária e da escola
normal
Costuma-se considerar que a estrutura básica do ensino proposta pela reforma de 1911
se manteve até 1935, momento em que é baixada nova reforma (Decreto nº 713. SANTA
CATARINA, 1935), realizada por Luiz Sanchez Bezerra da Trindade50
, diretor da Instrução
Pública (FIORI, 1991). A partir desse momento, a diretoria transforma-se no Departamento de
50
Luiz Sanchez Bezerra da Trindade nasceu em Florianópolis no ano de 1892. Formou-se no ensino secundário
pelo Ginásio Catarinense em 1912 e aos 20 anos iniciou a carreira de professor primário, tendo exercido
funções públicas ao longo de sua vida. Atuou como diretor de grupos escolares; tornou-se inspetor escolar em
1920; elegeu-se vereador do município de Florianópolis em 1936. Dirigiu o DE de 1933 a 1938 e, novamente
em 1950, quando então se aposentou (BOMBASSARO, 2006, p. 40-41).
| 62
Educação. Para o caso do ensino normal a observação é pertinente, uma vez que era o foco
dessa segunda remodelação, momento em que as escolas normais são transformadas em
institutos de educação e as escolas complementares substituídas pela escola normal primária
(DAROS, 2005, p. 14). Por sua vez, o ensino primário não sofreu remodelações significativas
diretas, ou seja, diríamos, numa linguagem atual, que foi contemplado em efeito cascata,
quando da reestrutuação da formação de professores. Na avaliação de Moreira51
(1954, p.
27/85), tratou-se de uma reforma da superestrutura administrativa, que não tocou na essência
dos currículos escolares e que, aos poucos, foi sendo derrubada pela introdução de novas leis
e decretos.
Uma das novidades desta reforma foi a criação de sete subdiretorias dependentes do
DE; entre elas, estavam a subdiretoria de educação física, recreação e jogos e a subdiretoria
de bibliotecas, museus e rádio-difusão. De acordo com Moreira (1954, p. 27), depois de 1940
permaneceram apenas as subdiretorias administrativa, de expedição e de cadastro, sendo
extintas a subdiretoria técnica, e as demais, que nem haviam sido instaladas. Foram criadas
ainda a Inspetoria do Ensino Normal e das Associações Escolares.
A reforma Trindade efetuou-se durante o governo de Nereu Ramos, tendo sido
articulada e iniciada no governo de Aristiliano Ramos, seu primo, que ocupava, naquele
momento, o cargo de interventor federal. Após a revolução de 1930, durante o governo
provisório de Getúlio Vargas, três interventores foram nomeados dirigentes de Santa Catarina.
Já durante o governo constitucional de Vargas, Nereu Ramos ganhou as eleições indiretas em
1935, tornando-se governador do estado. Em decorrência do Estado Novo, Nereu Ramos
tornou-se interventor federal em 1937, permanecendo no cargo até 1945, fim da ditadura
Vargas52
.
No período entre 1935 e 1950, a educação catarinense foi liderada pelos inspetores
Luiz Sanchez Bezerra da Trindade, João dos Santos Areão e Elpídio Barbosa, os quais se
revezaram entre os cargos mais importantes, passando a ser conhecidos como a santíssima
trindade da educação. Em decorrência do poder de decisão que possuíam, o interventor Nereu
Ramos achou por bem criar, em 1938, a Superintendência Geral do Ensino, órgão ao qual o
DE estaria subordinado. O cargo de superintendente foi ocupado pelo paulista Sebastião de
Oliveira Rocha; contudo, sua tímida atuação levou Nereu Ramos a nomear Elpídio Barbosa
51
Para conhecer a trajetória de João Roberto Moreira (1912-1967), intelectual catarinense que teve projeção
nacional e internacional, ver pesquisas e publicações de Leziany Silveira Daniel e Lea Pinheiro Paixão. 52
Informações disponíveis no histórico dos governadores de Santa Catarina: <http://www.sc.gov.br/conteudo/san
tacatarina/historia/paginas/governadores.html>. Acesso em: 13 jan. 2013.
| 63
para o cargo no final de 1940. Em 1942, a Superintendência foi extinta, voltando o DE à sua
posição de mando (FIORI, 1991, p. 124-125).
A organização do ensino normal proposta pela reforma de 1935 teve vida efêmera. No
ano de 1938 (dezembro), as escolas normais primárias voltaram a ser chamadas de escolas
complementares, visto funcionarem, na prática, mais como cursos complementares aos grupos
escolares do que formadoras de professores (SILVA, 2003, p. 87). Além disso, em 1939
extinguiu-se a escola normal superior vocacional criada em 1935. Em seu lugar, surgiu o
curso normal, de dois anos. Enquanto isso, os programas de ensino dos institutos de educação
criados em 1935 foram reformulados, a título provisório, em 1937 e 1939 (SILVA; DANIEL;
DAROS, 2005).
O ensino primário, por sua vez, sofreu as seguintes remodelações: a partir do Decreto
nº 244, de 9 de dezembro de 1938, expede-se novo regulamento para os grupos escolares em
3 de março de 1939, substituindo o anterior de 1914, para também regulamentar as escolas
isoladas e cursos noturnos (Decreto nº 714. SANTA CATARINA, 1939). Contudo, em 1946,
será substituído pelo regulamento geral para os estabelecimentos de ensino primário (SANTA
CATARINA, 1946b), decorrente da Lei Orgânica do ensino primário nº 298, expedida em 18
de novembro de 1946 (SANTA CATARINA, 1946a), dez meses após o Decreto-lei federal nº
8.529, de 2 de janeiro de 1946 (BRASIL, 1946).
As Leis Orgânicas de 1946, no que tange ao ensino normal e primário, supriram a
ausência de regulamentação federal, pois fizeram “[...] parte de um movimento de
centralização e padronização do sistema educativo nacional” (DAROS, 2005, p. 150). No
período de atuação do ministro Capanema (1934-1945), ampliou-se o controle sobre os
sistemas de ensino, com exceção do primário e normal, cujas leis orgânicas, acima citadas,
foram expedidas somente após o Estado Novo (SILVA; DANIEL; DAROS, 2005, p. 25).
A partir das reformas decorrentes dos anos 1930, apenas em 1946 é que foi delineado
um programa de ensino53
para as escolas primárias. As diferenças mais perceptíveis em
relação aos conteúdos listados na década de 1910 e 1920 são: a ausência das ciências naturais;
e uma nova proposta de organização dos saberes, agora por eixos temáticos que agregam um
conjunto de matérias a serem ensinadas. Em 1939, com a expedição de novo regulamento
53
Este programa foi aprovado a título provisório até que o Ministério da Educação e Saúde preenchesse o
disposto pela Lei Orgânica federal de 1946. Isso ocorreu a partir de 1948 até 1959, quando a Secretaria de
Educação e Cultura de Santa Catarina publicou uma encadernação com o programa “provisório” de 1946 e os
decretos subsequentes, que foram incorporando os programas organizados pelo Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (Inep), num total de cinco incorporações, tanto para o ensino primário quanto para o
complementar, e uma diretriz elaborada pela Inspetoria de Educação Física a partir das orientações do Inep
(SANTA CATARINA, 1959).
| 64
para a escola primária, foram listadas as disciplinas que comporiam o programa; contudo, não
se localizou texto que contivesse o currículo detalhado. Em relação ao programa de 1928, são
suprimidas as disciplinas de higiene e agricultura (Apêndice A).
Essas remodelações ocorridas em 1946 são frutos de uma nova reforma do ensino,
capitaneada pelo diretor do DE Elpídio Barbosa54
, cujo objetivo consistiu em adaptar o
sistema de ensino estadual às Leis Orgânicas Federais (janeiro de 1946). No caso do ensino
primário, a Lei Orgânica do estado (novembro de 1946) teve como complementos o
regulamento e o programa para os estabelecimentos de ensino primário, bem como o
regulamento para o serviço de inspeção escolar.
Esta reformulação ocorreu no período de redemocratização do País, com o término da
Segunda Guerra Mundial e da ditadura Vargas. Entre outubro de 1945, quando Nereu Ramos
é deposto, e março de 1947, quando Aderbal Ramos da Silva é eleito governador, são
nomeados dois interventores, Luiz Gallotti e Udo Deeke55
. Durante a atuação deste último,
ocorreu a adaptação às Leis Orgânicas Federais, continuando Elpídio Barbosa na direção do
DE. A evolução do número de escolas e a ampliação da matrícula nos grupos escolares,
escolas isoladas e reunidas entre 1914 e 1935, pode ser consultada em Hoeller (2009, p. 55).
Os mesmos dados em anos anteriores e posteriores podem ser consultados em Fiori (1991).
A Lei Orgânica Estadual do ensino primário é uma réplica da Lei Federal, com
algumas inserções; enquanto a Lei Federal contém 53 artigos, a Lei Estadual possui 61,
decorrentes da supressão e inserção de determinados pontos, sem que alterassem o sentido
principal da proposta nacional que deveria ser seguida.
Entre os anos 1911 e 1928, o programa para as escolas primárias sofreu quatro
reformulações, um indicativo da necessidade de ajustamento do “sentido social e político”
pretendido com a formação escolar. O programa de 1911 indica basicamente os conteúdos a
serem ministrados; faz uma composição entre o conteúdo e a ação no infinitivo que se espera
que a criança realize como: “desenhar objetos”, “copiar palavras”, “ler e escrever números”,
54
Nascido em 1909 na capital catarinense, estudou no Ginásio Catharinense no início dos anos 1920. Barbosa
atuou como professor de escola primária; foi diretor de grupos escolares em Mafra, Joinville e Joaçaba; foi
inspetor escolar da circunscrição de Florianópolis (1931-1934); trabalhou ainda como subdiretor técnico do DE
(1935-1940); cursou direito na Faculdade de Direito de Santa Catarina, formando-se em 1938. Foi
superintendente geral do ensino e diretor do DE (1940-1950). Em 1950, foi eleito deputado estadual (1951-
1955). Atuou na transformação do DE em Secretaria de Educação e Cultura em 1961; em 1963 assumiu o
cargo de secretário da Educação e Cultura. Atuou ainda como professor universitário. Foi o primeiro reitor da
Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (Udesc) e primeiro presidente eleito do
Conselho Estadual de Educação (1961-1966), cargo ocupado até o seu falecimento (FIORI, 1991, p. 145-146);
Site do Conselho Estadual de Educação. Disponível em: <http://www.cee.sc.gov.br/index.php?option=com_co
ntent&task=view&id=55&Itemid=130>. Acesso em: 4 out. 2012. 55
Informações disponíveis no histórico dos governadores de Santa Catarina: <http://www.sc.gov.br/conteudo/san
tacatarina/historia/paginas/governadores.html>. Acesso em: 13 jan. 2013.
| 65
etc. A organização segue a estrutura por série do 1º ao 4º ano para o grupo escolar e uma
divisão por disciplina para a escola isolada do 1º ao 3º ano. A descrição dos conteúdos é
sucinta (um ou dois parágrafos). Não são sugeridas ações aos professores sobre como abordar
o assunto e/ou a metodologia. Comparando os programas para essas duas escolas, o da escola
isolada é mais conciso e fornece a indicação de livros de leitura ou a proibição de seu uso
(SANTA CATARINA, 1911c).
Em 1914, a disposição das matérias segue o critério adotado em 1911, diferenciado
para o grupo escolar e a escola isolada. Por outro lado, os conteúdos são exaustivamente
detalhados, chegando, em alguns casos, a ocupar três páginas. As indicações começam a ser
dirigidas ao que o professor deve fazer ao invés da habilidade que o aluno deve adquirir.
Algumas vezes, sugerem-se ao professor ações mecanizadas, como apontar para a “estampa”
no momento de indagação à turma. São inseridos também comentários relativos ao
comportamento dos alunos, “vícios” que devem ser corrigidos pelo professor. Indica-se qual
método deve ser utilizado e ordenam-se algumas ações como “faça no quadro negro...”,
“chame dois alunos e coloque...”. As maiores indicações são reservadas ao aprendizado da
linguagem nos primeiros anos; com o avançar das séries, diminuem as frases com efeitos
diretivos ao professor, o que evidencia a internalização de um aprendizado por parte do aluno,
que, supõe-se, já deveria estar acostumado à rotina escolar estabelecida (SANTA
CATARINA, 1914c).
O programa de 1920 não se distancia muito do de 1914, sendo, em muitos casos,
idêntico56
. A diferença é que, em 1920, algumas disciplinas dispersas de 1914 passam a
compor o conjunto temático “noções de ciências físicas e naturais e de higiene”, e as questões
de linguagem serão agrupadas na disciplina de “português”, isso para o caso dos grupos
escolares, pois a estrutura da escola isolada permanece igual (SANTA CATARINA, 1920).
Em 1928, o programa é mais condensado. Em cada disciplina listam-se os conteúdos e ao
final da listagem, no campo “nota”, inserem-se as observações de caráter mais prático e
instrutivo ao professor (SANTA CATARINA, 1928a).
O programa de 1946 efetua uma mescla de conteúdos e orientações práticas. É um
programa de caráter mais pedagógico, pois expõe os objetivos do ensino para cada ano
escolar, esboça um sumário da matéria com os conteúdos a serem ensinados, mas com um
tom mais prescritivo; por fim, fornece sugestões práticas em relação àquele conteúdo. Ao
final da exposição de cada disciplina para todos os anos, acrescentam-se mais recomendações
56
Enquanto o programa para o ensino primário foi reformulado em 1920, os da escola normal e complementar já
o tinham sido em 1919.
| 66
ao professor. O mais importante, neste programa, é a não-distinção de conteúdos para um tipo
específico de escola, uma vez que escola isolada, reunida, e grupo escolar obedecerão ao
programa previsto para o ensino primário elementar (SANTA CATARINA, 1946d).
O museu se fará presente a partir de 1914, no programa dos grupos escolares. Sua
ausência momentânea em escolas isoladas talvez se possa explicar pela crença ou pela aposta
num formato de museu industrializado, composto por coleções compradas, demasiado caras
para serem distribuídas para todos os tipos de escolas. Porém, a situação se inverteu a partir
dos anos 1930 e, com mais intensidade, na década de 1940, quando os museus passaram a ser
compostos, em sua maioria, por objetos coletados pelos alunos, uma das possíveis razões para
passaram a estar presentes em muitas escolas isoladas. Cabe lembrar que esta concepção de
museu – composto por objetos comuns – já se encontrava na literatura pedagógica no século
XIX (cf. capítulo 2), mas parece ter sido ignorada pelos agentes políticos catarinenses ao
longo das primeiras décadas do século XX, em privilégio das coleções importadas.
Além desse aspecto financeiro, a ausência de museus em escolas isoladas também
pode ser atribuída à sua vinculação por parte da legislação a uma área do saber da qual esta
escola estaria privada, qual seja, as ciências físicas e naturais.
No quadro 1, observa-se a indicação do uso do museu para os diferentes anos
escolares em disciplinas específicas dos currículos prescritos para a escola primária57
.
Quadro 1 – Disciplinas em que o museu seria utilizado nos programas de ensino
da escola primária catarinense
2º ano 3º ano 4º ano
Programa de ensino dos GE de 1914
Zoologia
Linguagem oral
Linguagem oral Aritmética
Botânica
Física e química
Zoologia
Zoologia Mineralogia
Física e química
Programa de ensino dos GE de 1920
– Aritmética Zoologia
Programa de ensino dos GE de 1928
– – Zoologia
Programa do ensino primário (EI, ER e GE) de 1946
Conhecimentos gerais
aplicados à vida social, à
educação para a saúde e ao
trabalho
– –
Fonte: dados sistematizados pela autora.
57
O desenho do currículo proposto para os grupos escolares, escolas isoladas e reunidas entre os anos 1911 e
1946 pode ser visualizado por completo ao final da dissertação (Apêndice A).
| 67
Percebe-se, de imediato, a ausência da recomendação de uso do museu para o 1º ano
escolar, dado interessante ao se considerar que este aparato pedagógico estabelecia uma
íntima relação com o ensino intuitivo, e que no ano de 1920 uma das disciplinas para esta
série se chamava “lições de coisas” (Apêndice A), apesar da recomendação contrária dos
pedagogos. A diminuição do rol de disciplinas em que o museu aparece no quadro acima pode
ser compreendida pelo movimento do currículo, pois, com o passar dos anos, algumas
disciplinas foram suprimidas e outras, em menor número, inseridas.
Do programa de 1920 para o de 1928, elimina-se do 2º ano a disciplina “noções de
ciências físicas, naturais e de higiene” 58
e insere-se “agricultura” do 1º ao 4º ano. No
programa de 1928, para o 3º e o 4º ano as matérias de física, botânica, zoologia, fisiologia e
higiene tornam-se independentes, ou seja, deixam de compor a temática “noções de ciências
físicas, naturais e de higiene”. Os estudos da mineralogia, contemplados em 1914, e os de
química em 1914 e 1920, também foram excluídos na reformulação do programa em 1928.
Considera-se, a partir disso, que as disciplinas ligadas às ciências físicas e naturais vão
compondo um conjunto mais especializado de questões, que se torna exclusivo dos dois
últimos anos da escolarização primária. Na mesma medida, o museu vai se tornando um
recurso didático específico do 4º ano (até 1928), o que, de certo modo, representa uma
inversão na ótica defendida pelo método intuitivo de que o aprendizado deveria partir, de
modo gradual, do concreto para o abstrato.
A ausência de disciplinas ligadas às ciências da natureza em 1946 é uma questão
interessante e que demanda maior investigação para sua compreensão. Mas, em princípio,
nota-se um discurso de amor à natureza muito próximo ao da questão nacionalista, de
reconhecimento da importância dos bens naturais para o País, vistos como sua maior riqueza.
As incursões pelo ambiente “natural” relacionam-se ao conhecimento da localidade onde a
escola está inserida, sua história e a história do País.
Por outro lado, visualiza-se, pelo exame do quadro 1, que o museu não era
considerado pelas normativas como um recurso exclusivo do estudo da natureza e seus
fenômenos, uma vez que sua utilização era recomendada em linguagem oral e aritmética.
Nestas duas disciplinas, havia uma explicação mais detalhada de seu uso, enquanto que nas
outras, havia apenas a indicação do uso, ao lado do nome da disciplina, entre parênteses
58
Para o 1º ano, esta disciplina foi recomendada no programa de 1911 e 1914, sendo eliminada no de 1920; em
1939, o regulamento dos grupos escolares irá mencioná-la como uma das disciplinas do programa, sendo
excluída novamente em 1946.
| 68
(observação do natural ou dos quadros do museu), (observação do museu) ou (usando o
museu).
Em 1914, um dos conteúdos a serem estudados pelo 3º ano em aritmética era o sistema
métrico: “[...] o metro, multiplos e submultiplos. Medidas derivadas do metro, multiplos e
submultiplos. Conhecimento e uso pratico dos apparelhos do museu. Conhecimento das
medidas de superfície [...]” (SANTA CATARINA, 1914c, p. 49, grifo meu). Em 1920, a
indicação e o excerto são idênticos.
Em zoologia, no 4º ano seria estudado o “systema nervoso (idéias succintas). Noções
elementares sobre os vertebrados e invertebrados (estudo muito elementar, sobretudo de
reconhecimento pelo aspecto exterior, usando do museu). Divisão dos vertebrados” (SANTA
CATARINA, 1920, p. 34, grifo meu). Esta indicação é idêntica à do programa de 1928.
Em linguagem oral, os alunos do 3º ano deveriam “[...] descrever assumptos
representados pelas estampas do museu (quadros contra o alcoolismo, apparelhos agrarios,
quadros da industria pecuaria) orientando o professor as descripções, de modo a educar os
alumnos quanto a concatenação nas descripções” (SANTA CATARINA, 1914c, p. 47-48,
grifo do original). Já os alunos do 4º ano, além de realizar esta tarefa, teriam sua “linguagem”
corrigida pelo professor, que deveria explicar-lhes o motivo das correções.
É conveniente perceber o sentido que o programa confere ao uso do acervo do museu:
se, à primeira vista, os quadros contra o alcoolismo se afinam mais à disciplina de educação
moral e cívica, aqui eles são reapropriados e indicados para o aprimoramento da linguagem
oral. Essa passagem indica uma das dificuldades em apreender os sentidos atribuídos a um
objeto situado num tempo distante e de modo isolado.
Ainda assim, é interessante pensar acerca da necessidade da introdução de estudos
deste gênero na escola. Afinal, qual a importância de educar as crianças sobre o alcoolismo e
preveni-las dele? Pode-se pensar na incorporação, pelo currículo escolar, de uma questão
social maior, a incorporação de uma demanda externa à escola pelo programa, transformada
em objeto didático, neste caso, em quadros ilustrativos.
Nos cursos de formação de professores, o tópico “alcoolismo e tabagismo” também
compõe o currículo. Em 1919, os alunos do 4º ano da escola normal estudariam, na disciplina
de higiene sobre “Bebidas alcoolicas, fumo, opio e vicios elegantes: Morphina e Cocaína”
(SANTA CATARINA, 1919, p. 68). Em 1928, os alunos das escolas complementares
estudariam em higiene no 3º ano sobre o alcoolismo e tabagismo (SANTA CATARINA,
1928b). Já em 1937, no programa provisório para a Escola Normal Superior Vocacional, o
“alcoolismo e vários vícios sociais” se tornam assunto da disciplina de sociologia geral no 1º
| 69
ano (Ver programa anexo em: DAROS; SILVA; DANIEL, 2005, p. 48). Ocorre, portanto,
uma migração da discussão de higiene para sociologia, o que, de certa forma, reflete a nova
disposição do currículo, repleto das ciências da educação, além de outro viés de discussão da
temática.
As figuras 7 e 8 são ilustrações de dois exemplares de quadros reeditados da coleção
Deyrolle, indicados no catálogo original para a disciplina de instrução cívica e que se podem
aproximar daqueles existentes no início do século XX em Santa Catarina.
Figura 7 – Exemplar de quadro francês
para o ensino de instrução cívica
Figura 8 – Exemplar de quadro francês
para o ensino de instrução cívica
Fonte: (BROGLIE, 2010, p. 122). Fonte: (BROGLIE, 2010, p. 125).
Estas duas imagens são representativas do conjunto de pranchas presentes no catálogo
consultado (BROGLIE, 2010). Na figura 7, visualizam-se duas cenas trágicas relacionadas ao
alcoolismo e ao exercício de uma profissão. A imagem superior ilustra um acidente num trilho
de trem, cuja legenda indica: “o bebedor perde a noção do perigo, de seus deveres
profissionais e de suas responsabilidades”; a inferior ilustra um “sinistro marítimo”, seguido
da explicação: “o bebedor perde o sangue frio, a prudência, a habilidade e corre riscos
contínuos”. Em letras maiúsculas, lê-se: “o homem sóbrio é mestre de si, o bebedor perde a
confiança de todos” 59
.
59
“L’alcoolisme et les professions. Accident de chemin de fer. Le buveur perd la notion du danger, de ses
devoirs professionels et de ses responsabilités. Sinistre maritime. Le buveur perd le sang froid, la prudence,
l’habilité et court des risques continuels. L’homme sobre est maitre de lui – le buveur perd la confiance de
tous” (BROGLIE, 2010, p. 122) (Tradução nossa).
| 70
Já na figura 8 se encontra uma comparação entre os malefícios do álcool e os
benefícios de uma vida saudável. O quadro, situado no lado direito superior, compara o porte
físico de um adulto alcoólico, com 25 anos, e outro sadio, com 45 anos, com o objetivo de
informar as propriedades nutritivas de algumas bebidas alcoólicas em comparação com
alimentos tais como pão, leite e ovos. As outras imagens comparam o porte muscular e de
resistência, demonstrando um efeito ligado à saúde e não diretamente à condição social. As
cenas das demais pranchas seguem esse estilo.
Esta temática permanece nas questões do ensino primário catarinense com o passar
dos anos. No regulamento de 1946, nas instruções quanto à higiene dos alunos, sugere-se que
os professores em suas classes ou o diretor, reunindo várias classes – inclusive da seção
feminina – e com auxílio do pelotão de saúde, “[...] farão preleções educativas combatendo o
uso do fumo e do alcool, para que usarão os quadros adequados do museu [...]” (SANTA
CATARINA, 1946b, p. 48).
A presença de quadros sobre o alcoolismo verifica-se no inventário do museu do GE
Jerônimo Coelho, no ano de 1941, segundo o qual o museu possuía 12 quadros sobre a
temática, o maior número deste tipo de objeto, tendo em vista que aqueles sobre os demais
assuntos variavam na quantidade de um para quatro. Uma sala de aula60
do GE Vitor
Meirelles possuía nove quadros similares, também em 1941 (ARQUIVO..., 1941-1942).
Se no Regulamento de 1946 o museu aparece associado à questão higiênica, no
programa de ensino a única inserção ocorre na disciplina de “conhecimentos gerais aplicados
à vida social, à educação para a saúde e ao trabalho”; no segundo ano, na parte dedicada à
prática de ensino. Para a ampliação do horizonte da criança e a inserção da discussão sobre o
bairro e localidade, observa-se que:
as excursões começam a apresentar-se como instrumento de observação excelente
no estudo de geografia. Das excursões, trazem os alunos elementos para organizar
álbuns e coleções, e contribuições para o museu da classe ou da escola; tal trabalho
deverá ser articulado com as demais matérias do programa (SANTA CATARINA,
1946d, grifo meu).
A aproximação entre excursões e arrecadação de elementos para o museu é uma
constante na literatura pedagógica voltada a essa temática (cf. capítulo 2). Uma possível
explicação para a presença tímida do museu no programa de 1946 é que nesse período ele
60
A presença deste objeto nas salas de aula de outras escolas do período não pode ser precisada, considerando
que a análise do inventário levou em conta apenas os artigos listados nos inventários dos museus escolares. A
transcrição dos objetos relacionados nos inventários de salas de aula ocorreu apenas no caso do GE Vitor
Meirelles, a título de compreensão da estrutura do documento.
| 71
deixa de ser considerado um aparato material e se torna uma associação auxiliar da escola (cf.
capítulo 3). Neste caso, seu uso ocorreria mediante a criação de centros de interesse,
considerados como pequenos museus da classe. Ainda assim, apenas nesse ano se menciona
um modo de constituição do museu, enquanto que, nos anteriores, este aparece como um
dado, ou seja, um elemento conhecido que não demanda explicação. É provável que se fazia
anteriormente referência ao museu como coleção adquirida.
Por sua vez, os programas do ensino normal foram sendo reformulados ao mesmo
tempo que os das escolas primárias. Na tentativa de identificar modos pelos quais os futuros
professores seriam formados para trabalhar no ensino primário com essa nova tecnologia do
ensino, o museu escolar, consultaram-se os programas prescritos para a escola normal entre
1911 e 194761
.
Pôde-se perceber, tal como apontado por pesquisas (DAROS, 2002; DAROS; SILVA;
DANIEL, 2005), que o currículo da Escola Normal Catharinense, nos anos 1930, foi perdendo
o caráter “técnico” – de aprendizado dos conteúdos a serem ensinados – e foi, aos poucos,
adquirindo um caráter mais científico, com a introdução das “ciências fonte da educação”.
Contudo, a característica em listar os conteúdos a serem estudados permanece, com pequenas
inserções dos materiais ou estratégias que poderiam ser empreendidas. Até 1928, as
disciplinas pedagógicas que compunham o currículo da escola normal eram apenas pedagogia
e psicologia, diferenciando-se dos conteúdos estudados na escola primária pela inserção de
francês, alemão e latim.
A análise aqui pretendida torna-se parcial na medida em que nem todos os programas
foram publicados por completo, dificultando a apreensão dos conteúdos que deveriam ser
estudados no curso de formação de professores. Do currículo desenhado em 1935, dividindo o
ensino normal em três níveis, apenas em 1937 é publicado o programa da Escola Normal
Superior Vocacional, ou seja, apenas para o último estágio da formação, sendo detalhadas
somente as disciplinas de caráter pedagógico. Na verdade, não se tem conhecimento do teor
das demais disciplinas. Em 1939, foi localizado apenas o programa do curso normal, faltando
61
Ressalte-se que existe uma distância entre a proposição dos regulamentos e a publicação dos programas. Isso
quer dizer que, enquanto no regulamento são listadas as disciplinas que deveriam fazer parte do currículo, em
alguns casos, no texto do programa, muda-se a nomenclatura ou suprime-se alguma disciplina. Em 1935,
com a reforma do ensino, são listadas as disciplinas dos três níveis de ensino normal; contudo, apenas em 1937
estas escolas entram em funcionamento, momento em que se publica o primeiro programa, ainda a título
provisório, da Escola Normal Superior Vocacional, contendo a descrição apenas do conteúdo das disciplinas de
caráter pedagógico.
| 72
o do fundamental, que seria ministrado em cinco anos, preparatórios para o normal (dois
níveis do Instituto de Educação)62
.
Os programas expedidos para o Instituto de Educação em 1937, 1939 e 1947 eram
provisórios até serem preenchidos pelo Ministério da Educação e Saúde. É justamente em
1937 que o museu, como elemento didático, é inserido no programa. Trata-se da disciplina de
“metodologia do ensino primário e didática”. No 2º ano, no estudo do ensino da geografia,
recomendava-se o uso do seguinte “[...] material de ensino; mapas, globos, projeções,
fotografias, livros de testes, bibliotecas e museus, gráficos e cartograma” (DAROS; SILVA;
DANIEL, 2005, p. 55) e, em história natural destacavam-se “[...] meios que auxiliam a
observação; excursão, museu, jardins, aquários, coleções, projeções, etc.” (DAROS; SILVA;
DANIEL, 2005, p. 55).
Texto idêntico será reproduzido no programa de 1947. A disciplina é “metodologia do
ensino primário”, ministrada para a 2ª e a 3ª série (SANTA CATARINA, 1947). Num arco de
dez anos, vê-se a inserção do museu como instrumento de ensino, ainda assim tomado em sua
forma simplificada, sem maiores explicações sobre o que seja, como se use, etc. Entre estes
dois programas, em 1939 o museu entra como um assunto, ao lado das “instituições
escolares”; faz parte da disciplina de pedagogia, oferecida no 1º ano do curso normal; na
segunda parte da disciplina, que dizia respeito aos “fundamentos e condições gerais da ação
educativa escolar”, estavam também a observação, o compêndio, os prêmios e castigos
(DAROS; SILVA; DANIEL, 2005, p. 64).
Na disciplina de “prática de ensino”, os alunos aprenderiam aspectos ligados ao
funcionamento da escola; primeiro, observando os trabalhos dos professores nas escolas,
coparticipando destes e, por último, assumindo a classe. No 1º ano, aprendia-se acerca da
decoração e organização da sala de aula, da organização de festas, trabalhos gráficos,
organização do museu da escola e da biblioteca. No 2º ano, eram assunto de estudo as
“associações auxiliares da escola” (DAROS; SILVA; DANIEL, 2005, p. 69-72).
Nesta disciplina ocorre uma mescla do museu como elemento material e como
associação; contudo, no 1º ano é tema de aprendizagem concreta. Se em 1937 e 1947 o museu
era apontado como um material de ensino ou um meio que auxiliava a observação, em 1939
ele é objeto de aprendizagem, de “confecção”.
Considerando que no programa dos grupos escolares o museu aparece como elemento
auxiliar do ensino desde 1914, com indicações das disciplinas que dele fariam uso, a inserção
62
Para visualizar o currículo desenhado para a formação de professores entre 1883 e 1946, consultar: Daros
(2005, p. 16-17).
| 73
do museu como um material didático apenas em 1937, no programa da escola normal, e não
como tema de estudo é de algum modo tardia. Percebe-se, a partir disso, um descompasso
entre a formação e os requisitos exigidos na atuação dos professores na primeira metade do
século XX no que diz respeito ao manejo de um “novo” objeto da escola.
Se os programas fornecem pouca margem à compreensão do que e como os
professores aprendiam sobre o museu, cabe perguntar: Que estratégias o governo catarinense
empreendeu para habilitar os professores no uso dessa nova tecnologia de ensino? Nos
próximos capítulos (2 e 3), serão abordados dois aspectos que participaram deste processo
formativo. No segundo capítulo será apresentada parte da produção impressa que chegava aos
professores, procurando entender o que elas veiculavam e, consequentemente o que
ensinavam.
| 74
2 ESCRITOS POR E PARA PROFESSORES: O MUSEU ESCOLAR EM
PERSPECTIVA
As pesquisas interessadas em compreender a cultura escolar indicam uma gama de
possibilidades de investigação, diferentes canais que podem adentrar em seu “cotidiano”, seja
por saberes, disciplinas, materiais escolares, espaço, tempo, etc. Levantamento realizado por
Faria Filho et al. (2004) mostra que, num conjunto de estudos que tomam a cultura escolar
como categoria de análise ou campo de investigação, três grandes eixos se evidenciam:
saberes, conhecimentos e currículos; espaços, tempos e instituições escolares; materialidade
escolar e métodos de ensino.
Para esses autores, o primeiro eixo é aquele que “[...] mais direta e fortemente tem se
utilizado dos diversos arcabouços teóricos subjacentes às diversas acepções de cultura escolar
[...]” (FARIA FILHO et al., 2004, p. 150). Este eixo possui três focos principais: um,
dedicado aos impressos pedagógicos como estratégias de difusão de modelos e ideias
pedagógicas; outro, voltado à análise das práticas de leitura e escrita; por fim, um interessado
na história do currículo e das disciplinas escolares.
Aproximando-se do primeiro grande eixo e primeira subdivisão apontada, este
capítulo toma como fonte impressos de destinação escolar para professores caracterizados de
modo geral como manuais de ensino/didáticos. Dentro dessa ampla classificação, foram
selecionados para análise escritos com características de manuais que, entre outras coisas,
discorrem sobre os museus escolares. Esse aparente deslocamento visa, em última instância, a
constituir bases para uma melhor compreensão da materialidade escolar exposta no terceiro, e
no quarto e último capítulo.
Através da análise de escritos (manuais, artigos e verbetes de dicionário) que tratam de
museus escolares, procuramos compreender se as indicações sobre a criação e a intenção de
uso de museus escolares se modificam com o passar dos anos e se existe uma proposta
comum entre os autores; dito de outro modo, almejamos perceber como o museu esteve
representado nos escritos selecionados.
2.1 SELEÇÃO DE TEXTOS E AUTORES: IMPRESSÕES INICIAIS
Ao lado da proliferação de museus, na corrente das exposições universais, vê-se um
número considerável de indicações daquilo que caracterizaria um museu pedagógico e um
museu escolar, tais como: em conferências proferidas nas referidas exposições (BAGNAUX,
| 75
1879), na dicionarização de verbetes relacionados ao assunto (CAMPAGNE, 1886;
BUISSON, 1887, 1911; MONROE, 1926), na escrita de livros (SENET, 1896; CROCE;
CAMPOAMOR, 1908; BANNWARTH, 1925), na publicação e veiculação de artigos em
periódicos educacionais (FERREIRA, 1914; LEMOS, 1923; FIGUEIREDO, 1924;
REXACH, 1926; AMOR, 1935), entre outros.
No Brasil, localizamos a partir de pesquisa bibliográfica dois livros que tratam dos
museus escolares. O primeiro, dedicado totalmente ao tema, é de autoria da professora
Leontina Silva Busch63
(1937); o segundo, de Everardo Backheuser64
(1934), dedica um
tópico do último capítulo ao assunto. Além destas duas obras foram encontrados artigos65
que
exploram a temática, mas que exigiriam um investimento maior para precisar títulos, autores e
veículos de divulgação. Registramos em especial a publicação da tese n. 15 intitulada:
“Organização dos museus escolares: sua importância”, escrita por Nicephoro Modesto Falarz
publicada nas atas da I Conferência Nacional de Educação realizada em Curitiba (PR) em
1927 (FALARZ, 1927, edição de 1997). Na IV Conferência Nacional de Educação, em 1931,
as instituições escolares, entre as quais possivelmente constava o museu, foram tema da
conferência de Amélia Monteiro, intitulada “Instituições Escolares; sua aplicação na Escola
Experimental; resultados e perspectivas novas” (BOMBASSARO, 2006, p. 85).
Embora não tenham sido localizadas informações mais precisas sobre a circulação no
Brasil da produção dos autores estrangeiros citados anteriormente, verificamos, sobretudo em
textos normativos, uma forte semelhança com as proposições teóricas estrangeiras, o que, no
limite, evidencia uma circularidade de ideias pedagógicas. Além disso, notamos indicações
explícitas às formulações de Buisson em discursos de autoridades pedagógicas no final do
oitocentos.
63
Leontina Silva Busch nasceu em Limeira (SP) em 11/6/1901 e faleceu em São Paulo (SP) em 9/1/1990.
Formou-se na Escola Normal de Pirassununga (SP) e iniciou sua carreira como professora em uma escola rural,
tendo lecionado posteriormente em grupos escolares na cidade de Limeira, Campinas e São Paulo, bem como
na Escola Normal de Pirassununga e na Padre Anchieta (SP). Casou-se em 1927 com Reynaldo Kuntz Busch
professor primário e posteriormente médico, com quem teve quatro filhos (POGGIANI, 2011a, p. 53). 64
“Backheuser nasceu em Niterói, estado do Rio de Janeiro, em 1879, e faleceu em 1951. Formou-se engenheiro
e dedicou grande parte de sua vida à educação. Foi professor da Escola Nacional de Engenharia; organizador
do Museu Central Pedagógico, sob a gestão de Fernando de Azevedo na Diretoria da Instrução Pública do
Distrito Federal; idealizou a Associação Cruzada Pedagógica pela Escola Nova. Fez parte da ABE [Associação
Brasileira de Educação], de sua fundação até 1931, sendo que em 1932, quando foi publicado o Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova, já não integrava seus quadros. Em 1933, quando a Associação Católica de
Educação adquiriu caráter nacional, transformando-se em Confederação Católica Brasileira de Educação,
Backheuser tornou-se seu primeiro presidente. Converteu-se ao catolicismo em 1928, por ocasião do
falecimento de sua esposa” (CUNHA; ERREIRAS, 2000, p. 33). 65
Como por exemplo, o texto de Luiz Galhanone “As bibliothecas e os museus escolares em face das novas
técnicas do ensino” publicado na Revista de Educação, São Paulo, n. 8, dez. 1934, p. 123-133 (citado por
VIDAL, 2007, p. 510).
| 76
Para o caso catarinense, no início da década de 1940, é possível afirmar, com certa
tranquilidade, a circulação de diversos livros dos seguintes autores: Everardo Backheuser,
Miguel Aguayo, João de Toledo66
e Pedro Anisio. A presença destes autores está registrada
em dois volumes que contêm atas de reuniões pedagógicas, planos de ensino e comunicados
elaborados por professores e diretores de escolas catarinenses no ano de 1941 (ARQUIVO...,
1941a; ARQUIVO..., 1941c). Dentre estes gêneros textuais, os “comunicados” se assemelham
a uma pequena dissertação de assunto relativa ao cotidiano escolar, que, em alguns casos
estabelece diálogo com algum autor. O autor Miguel Aguayo aparece em oito dos
comunicados lidos, sendo a obra Didática da Escola Nova67
citada nove vezes e, duas vezes,
Pedagogia Científica; Everardo Backheuser esteve presente em quatro comunicados68
, com a
obra Técnica da Pedagogia Moderna, seguido por João de Toledo, citado três vezes, e Pedro
Anisio, duas.
O quadro 2 apresenta uma relação resumida das referências dos verbetes, artigos e
livros que abordam a questão dos museus escolares e que foram utilizados mais detidamente
para escrever este capítulo. A listagem obedece à ordem cronológica.
Quadro 2 – Referências de verbetes, artigos e livros que tratam sobre museus escolares
Classifi-
cação Autor Título Ano
Dic
ion
ári
o
Émile Mathieu Campagne
(diretor)
Museus Escolares. In: Diccionario Universal de Educação e
Ensino. [edição portuguesa] 1886
Ferdinand Buisson
(diretor)
Musée scolaire. In: Dictionnaire de Pédagogie et d’Instruction
Primaire. 1887
Per
iód
ico
Fernando P. P. Ferreira Museus Escolares. In: Separata do Anuário da Casa Pia de
Lisboa. 1914
Fernando P. de Figueiredo Ensino Intuitivo: Museus Escolares. In: Revista Escolar. 1924
Manuel Antunes Amor Museus Escolares. In: Revista Escolar. 1935
(continua)
66
O programa de ensino dos estabelecimentos primários de Santa Catarina faz uma citação indireta a este autor
em nota explicativa sobre o ensino de linguagem no 1º ano (SANTA CATARINA, 1946c, p. 7). 67
A aquisição desta obra foi recomendada aos diretores de grupo escolar pela Circular n. 32 de 26 de setembro
de 1935, juntamente com outras 15 que compunham a “Biblioteca Pedagógica Brasileira” dirigida por
Fernando de Azevedo. Isso demonstra a preocupação do governo catarinense em proporcionar aos professores
proximidade com obras e autores considerados importantes na área educacional (SILVA; DANIEL; DAROS,
2005, p. 31-32). 68
Um destes comunicados foi escrito pela professora substituta do 4º ano Z, Helmy Wendt Pavão, do GE
Almirante Barroso, localizado em Canoinhas, na data de 20 de agosto de 1941. É interessante que o
comunicado é específico sobre os museus escolares, tendo a professora articulado em seu texto pontos da obra
de Backheuser e Aguayo, no que diz respeito a observação de coleções. A professora reproduz as orientações
de Backheuser quanto as características de um museu e a distinção entre museu da classe e da escola,
posicionando-se favorável a opinião do autor (ARQUIVO..., 1941c, p. 126-127).
| 77
(continuação)
Liv
ro Everardo
Backheuser
Detalhes da técnica da escola nova. In: Técnica da pedagogia
moderna: teoria e prática da Escola Nova. 1934
Leontina Silva
Busch Organização de Museus Escolares. 1937
Fonte: dados sistematizados pela autora.
Estas referências foram produzidas em países que de algum modo contaram com a
presença de museus (cf. item 1.3); contudo, é preciso lembrar que foram desenvolvidas dentro
de um contexto específico, atendendo a determinada demanda. Adotá-los como parâmetro
para a realidade brasileira, mais especificamente, catarinense, supõe encontrar ou não eco
desses discursos. No entanto, há que se levar em consideração o trânsito recorrente de ideias.
Entre os autores portugueses, Felgueiras (2011) menciona Augusto de Vasconcelos,
que em 1917 publicou a obra “Museus escolares: sua necessidade, organização e
funcionamento”, com a qual propunha o museu como o espaço ideal para o aprendizado de
ciências naturais e de história. Adolfo Lima incluiu a discussão acerca dos museus no seu
livro Metodologia, de 1921, apresentando um plano semelhante ao de Buisson. Além destes,
Augusto Coelho, na obra Noções de Pedagogia Elementar, 1903, prevê a organização de um
museu em três seções, a saber, história natural, agricultura e produção fabril.
Os textos listados no quadro 2, a partir de uma afinidade funcional (CHOPPIN, 2009),
ainda que discutível, foram caracterizados de modo geral como “manuais”, considerados
como fonte de pesquisa para compreender uma questão secundária que os perpassa. De
acordo com pesquisadores vinculados ao estudo de impressos educativos, sua utilização com
o objetivo de analisar-lhes o conteúdo com vistas a compreender outras questões caracteriza a
maioria das pesquisas em história da educação, constituindo exceção as que os tomam como
objetos de estudo (BATISTA; GALVÃO, 2009).
Ao realizar um exaustivo estado da arte da história mundial dos livros e edições
didáticas, das publicações científicas posteriores aos anos 1960, Choppin (2004) distingue
duas categorias de pesquisa. Na primeira, os livros didáticos são tomados como documento
histórico, e a finalidade é analisar os seus conteúdos. A segunda toma o livro como objeto
físico, produto, “descolado” de seu conteúdo. Quanto ao primeiro caso, Choppin (2004, p.
554) esclarece que “[...] a história que o pesquisador escreve não é, na verdade, a dos livros
didáticos: é a história de um tema, de uma noção, de um personagem, de uma disciplina, ou de
como a literatura escolar foi apresentada por meio de uma mídia particular”. Já no segundo
caso, o interesse recai sobre o livro, sua produção, distribuição e recepção.
| 78
Apesar de Choppin se referir ao livro didático, em sua pesquisa considera também os
manuais escolares antigos, uma espécie de precursores do livro didático contemporâneo.
Mesmo dentro da primeira perspectiva, o estudo destes materiais auxilia na compreensão de
como determinadas questões estavam sendo pensadas em momentos específicos. No caso de
menção aos museus, os impressos deixam entrever tendências pedagógicas, metodológicas,
didáticas e de concepção de ensino e aprendizagem em circulação.
Quanto a esta questão, Carvalho (2006a) esclarece: mesmo quando uma tendência
pedagógica não é mais predominante, os impressos produzidos sob sua influência continuam
a circular e formar professores; além disso, outros, com as mesmas características, serão
produzidos, mesmo que “fora de contexto”, sendo (re)apropriados e (re)atualizados.
Objetos culturais datados, produzidos em circunstâncias marcadas por estratégias
políticas, pedagógicas e editoriais determinadas, esses Manuais ganham vida
própria, passando a circular por circuitos estranhos à situação particular em que
foram produzidos (CARVALHO, 2006a, p. 8).
Carvalho (1998, p. 39) explica ainda que “estratégias pedagógicas de remodelação das
práticas escolares muito frequentemente fracassam, mesmo quando alguns dos materiais
impressos que puseram em circulação resistem, ganhando vida autônoma nas rotinas
escolares”. Tendo isto em mente, procuramos fazer uma leitura dos textos buscando marcas
em seus conteúdos que os caracterizassem, independente de amarras temporais e/ou
político/pedagógicas.
Postos em série, os manuais possibilitam ao pesquisador observar, “[...] a longo prazo,
a aparição e as transformações de uma noção científica, as inflexões de um método
pedagógico ou as representações de um comportamento social” (CHOPPIN, 2002, p. 15).
Sendo assim, a comparação entre impressos de diferentes períodos possibilita visualizar
permanências e rupturas. De um modo bastante tímido, a interlocução entre os textos aqui
selecionados tem essa pretensão, uma vez que os manuais fornecem indícios sobre “[...] os
canais de propagação das idéias e as vias de circulação dos capitais” (CHOPPIN, 2002, p. 16).
Toma-se como ponto de partida o dicionário de Buisson (1887), primeiro a ser
publicado entre os textos aqui utilizados. Embora a edição portuguesa do dicionário de
Campagne date de 1886, conforme se verifica no quadro 2, acima, considera-se que o verbete
museu escolar presente no dicionário editado por Buisson seja precursor. O verbete,
publicado em Portugal em 1886 sob o mesmo nome, na tradução do dicionário dirigido por
Émile Mathieu Campagne para o português por Camilo Castello Branco, é praticamente
| 79
idêntico ao do dicionário de Buisson, sendo uma espécie de resumo deste, menos detalhista e
mais conciso.
Na edição francesa de 1872 do Dictionnaire universel d'éducation et d'enseignement,
dirigida por Campagne, não consta o verbete museu escolar (CAMPAGNE, 1872). A primeira
publicação deste dicionário data de 1853 (DUBOIS, 2000). Em 1886 Castello Branco traduziu
e ampliou o dicionário “nos vários assuntos relativos a Portugal”, sendo a edição portuguesa
ilustrada e consideravelmente aumentada com artigos dos “principais escritores de
pedagogia”, coordenados por José Nicolau Raposo Botelho, segundo informações extraídas
da capa do exemplar. Por essas razões, presume-se que o verbete tenha sido introduzido na
versão portuguesa. Embora a publicação do dicionário dirigido por Buisson date de 1887, os
verbetes foram publicados separadamente, por ordem alfabética, desde 1878 (DUBOIS,
2000).
No verbete museu escolar, Buisson69
expande a noção de museu e de seu uso, ao não
considerá-lo ferramenta apenas de estudo das ciências naturais. Para o autor, um museu
deveria ser formado por coleções de naturezas diversas, destinadas ao ensino, sem
direcionamento para um saber específico. Contudo, reconhece que há uma aproximação maior
às lições de coisas, cuja função seria fornecer às crianças ideias claras e exatas de tudo que as
rodeia. Dos textos aqui analisados, o termo lições de coisas deixa de ser empregado apenas
nos escritos de Backheuser e Busch, na década de 1930, embora permaneça a compreensão de
que o museu serviria a um ensino intuitivo/ativo.
As obras de Buisson e Ferreira são as únicas que procuram estabelecer um período
inicial para a ideia/concepção de museu. Para Buisson (1887), a ideia está presente, ao menos
implicitamente, em Rabelais, Comenius, Rousseau e Pestalozzi, autores que defendiam que as
crianças deveriam estudar as coisas e não as palavras. Entretanto, segundo Buisson, é na obra
de Andreas Reyher, Schul-Methodus, publicada em 1645 por ordem de Ernest de Pieux que se
faz menção aos museus escolares de maneira mais explícita. Para Buisson, Pestalozzi
vislumbrou os princípios do que seria um museu escolar, mas, não o aplicou, deixando pouca
precisão a respeito em suas obras. Ferreira (1914), por sua vez, estabelece como marco de
fundação dos museus escolares os finais do século XVIII. Segundo ele, o padre luterano João
Frederico Oberlin os teria introduzido pela primeira vez nas escolas do Ban de La Roche,
departamento de Vosges (França – região da Alsácia), seguindo o método de Pestalozzi.
69
Considera-se aqui que o verbete museu escolar presente no dicionário dirigido por Buisson, possa ter sido por
ele escrito, pois não consta a assinatura de outro autor/colaborador ao final do artigo. Contudo, uma pesquisa
mais detalhada precisa ser feita a fim de precisar a autoria do texto.
| 80
Vale frisar que todos os escritos adotam um tom narrativo. Analisam, mesmo que
brevemente, a situação das escolas no seu período; pontuam deficiências no ensino,
considerado pouco concreto, e apontam soluções para a renovação da educação.
Após apresentar um breve histórico dos museus escolares e assinalar seu lento e
progressivo desenvolvimento nas escolas francesas, Buisson se detém em explicar como
poderia ser sua criação e organização.
Sendo o museu escolar o auxiliar das lições de coisas, o professor deverá, antes de
constituí-lo, ter bem em vista o que entende por lição de coisas. Depois estabelecerá
um programa desta parte do seu ensino, e é este programa que deve guiá-lo na
organização do seu museu. Se organizar as coleções ao acaso, sem plano
determinado, amontoará uma multidão de objetos sem utilidade, e negligenciará de
recolher coisas mais indispensáveis. O mestre não deve perder de vista que o museu
escolar é que deve ser apropriado ao ensino, e não o ensino ao museu70
(BUISSON,
1887, p. 1991, grifo meu).
Esta passagem sintetiza a tônica do texto do autor, para quem a preocupação maior do
professor deveria centrar-se na constituição de um museu que se relacionasse com a temática
de estudo, importando menos o que faria parte dele, mas a razão de fazê-lo. A professora
brasileira Leontina Busch também se aproxima dessa reflexão. A diferença está na
polarização que a autora estabelece entre o museu da escola tradicional e o da escola nova,
característica presente em escritos desse período (década de 1930), que intentam delinear a
posição de onde falam. Sua argumentação segue:
Perdendo aquelle caracter estatico, que lhe dava a escola tradicional, de collecções
de quadros Deyrolle, de historia natural e de outros, de animaes empalhados, etc.,
não raro representando ou concretizando muita cousa estranha ao programa escolar,
o museu da escola evoluida, senão renovada, deve ser dynamico e seu conteudo
deve reflectir o proprio programma de ensino. Constituido, a pouco e pouco, em
funcção do desenvolvimento mesmo do programma de ensino de cada matéria, pelo
esforço conjugado dos alunos e do mestre, este guiando e aquelles multiplicando
suas atividades de pesquisa de cousas do meio e à distancia [...] (BUSCH, 1937, p.
36, grifo meu).
Tanto na obra de Busch quanto na de Backheuser existe uma clara distinção entre o
novo e o velho. Houssaye (2007) aponta que a necessidade de demarcar uma diferença é o que
dá a uma “nova” pedagogia o status de nova. O esquecimento das ideias anteriores é
70
“Le musée scolaire étant l’auxiliaire de la leçon de choses, l’instituteur devra, avant de le constituer, se rendre
un compte exact de ce qu’il faut entendre par leçon de choses. Puis il établira le programme de cette partie de
son enseignement, et c’est ce programme qui le guidera dans l’organisation de son musée. S’il réunit ses
collections au hasard, sans plan conçu à l’avance, il entassera une foule d’objets qui ne lui seront jamais
d’aucune utilité, et il négligera de recueillir les choses les plus indispensables. Le maître n’oubliera pas que le
musée scolaire doit être approprié à l’enseignement et non l’enseignement au musée” (Tradução nossa).
| 81
fundamental nesse processo, pois, caso contrário, o novo pensamento se tornaria herdeiro do
anterior e não criador, o que supõe mentir sobre suas origens, na perspectiva do autor.
A aproximação aqui efetuada sinaliza que os autores brasileiros, que se autointitulam
novos, não apagam por completo a existência de museus nas escolas antecessoras, mas lhes
conferem características que os classificam como estáticos, portanto, pouco eficientes em
relação ao ensino. Um qualificativo que leva, em última instância, ao esquecimento ou, ao
menos, à diferenciação entre o que “era um museu” e como ele deveria ser a partir de então.
O museu escolar na escola nova não pode ser identico ao da escola tradicional.
Nesta, estando a escola preocupada essencialmente com o ensinar, o museu que
interessava era apenas o museu de historia natural, com algumas pedras, alguns
vegetais, alguns animais (BACKHEUSER, 1934, p. 295, grifo do autor).
A partir desse excerto, nota-se uma aproximação entre a proposição de Backheuser e
Buisson, quando promovem a abrangência do que um museu poderia ensinar, não se
restringido à aplicação das lições de coisas ou à história natural. Por outro lado, nota-se certa
predominância dos aspectos “naturais” nas proposições dos autores aqui mencionados e,
inclusive, um leve apagamento de outras áreas do saber, talvez pela facilidade com que se
encontram exemplos de objetos para o estudo da fauna, da flora, da mineralogia, da
agricultura, etc., particularmente se relacionados à história e à linguagem.
Sobre esta questão, Rexach menciona que as ciências naturais contribuem em maior
proporção na formação de museus, “[...] pues siendo sus conocimientos essencialmente
objetivos, todas las cosas, por insignificantes que sean, tienen un lugar adecuado y una
utilización bien definida”71
(REXACH, 1926, p. 363).
Se é notável uma semelhança entre os dois autores acima mencionados, a proximidade
declarada entre autores pode, por sua vez, ser observada no artigo de Manuel Antunes Amor e
no de Leontina Silva Busch. No caso do texto de Amor, vemos uma afinidade com o verbete
de Buisson. Amor faz menção ao dicionário deste último, registrando que se inspirou nele
para a escrita do artigo, como se verifica na declaração: “Segundo indicações de F. Buisson,
insertas no seu famoso Dicionário de Pedagogia, a pág. 1376, obra onde eu colhi, em parte,
ideias para a elaboração dêste artigo doutrinário [...]” (AMOR, 1935, p. 470).
No caso brasileiro, a professora Leontina Busch cita a obra de Everardo Backheuser e
reproduz explicitamente uma parte de suas orientações:
71
“[...] pois sendo seus conhecimentos essencialmente objetivos, todas as coisas, por insignificantes que sejam,
têm um lugar adequado e uma utilização bem definida” (Tradução nossa).
| 82
Nossa literatura didactica é muito pobre no que toca a estudos de organização de
museus. O unico livro de divulgação que lhe dedicou meia dúzia de boas paginas foi
a Technica da Pedagogia Moderna, de Everardo Backheuser, autor das instrucções
que, com a devida venia, abaixo transcrevemos, elaboradas para orientar o
magisterio carioca na administração Fernando Azevedo (1926-1930) (BUSCH,
1937, p. 26-27, grifo da autora).
Neste excerto Busch (1937) não apenas critica a literatura “pobre” existente até então,
como considera “boas” as páginas escritas por Backheuser. E continua:
[...] a visão pedagógica do reformador do ensino do Districto Federal era tão larga e
penetrante que aproveitou um elemento puramente estático e pouco interessante da
escola tradicional – o museu escolar dos quadros Deyrolle e outros – transformando-
o em instituição dynamica [...] (BUSCH, 1937, p. 27).
Nesta passagem, volta a situar em polos opostos o museu estático da escola tradicional
e o museu dinâmico da escola nova.
A partir da análise de manuais de João Toledo e Antonio D’Ávila, Valdemarin (2008b,
p. 81) pontua que “[...] a influência da pedagogia renovada se dá principalmente no plano
discursivo, pela incorporação do vocabulário, pela citação de autores e recomendação de
obras para leitura”. Para a autora, a apropriação das novas ideias no plano educativo ocorreu
inicialmente “[...] pela incorporação discursiva de elementos próprios da nova concepção que
conviveu com a permanência de antigas práticas justificadas de modo novo [...]”
(VALDEMARIN, 2008b, p. 77).
Embora trate da obra de outros autores em circulação no período, sua reflexão parece
apropriada para pensar acerca do museu enquanto artefato produzido no século XIX e
aparentemente ressignificado pelos intelectuais brasileiros dos anos 1930.
2.2 PROXIMIDADES E DISTÂNCIAS EM DEFESA DE UM “MÉTODO”
“Assim como a parte da alfabetização da instrução
é favorecida pela biblioteca escolar, do mesmo
modo é a parte científica apoiada pelo museu
escolar” 72
.
Thomas Raymont
72
“Just as the literary part of instruction is furthered by the school library, so is the scientific part helped by the
school museum […]” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni de Sousa).
(RAYMONT, 1937 citado por LAWN, 2005, p. 159) - (RAYMONT, Thomas. A History of the Education of
Young Children. London: Longmans, Green & Co, 1937).
| 83
A frase, escrita por Raymont em 1937, condensa boa parte das perspectivas adotadas
pelos autores aqui listados, sem que tenham estabelecido tal relação. Ela sintetiza em poucas
linhas a associação entre dispositivo material e fundamento pedagógico, aspecto indispensável
para compreender a finalidade desempenhada pelos materiais, neste caso, os museus.
Neste item, procuramos assinalar aspectos recorrentes entre os autores, evidenciando
concordâncias e discordâncias em torno de um mesmo tópico. As indicações de Buisson
(1887) são tomadas como parâmetros para desenrolar os itens. O primeiro dado que chama a
atenção é a defesa de que os museus devem se adequar à realidade da região onde está
inserida a escola: se estiver no campo, valer-se-á de produtos agrícolas; se estiver no litoral,
terá coisas do mar; se localizado numa área industrial, terá produtos das indústrias. Para
Buisson, museus criados a partir da realidade da região onde se encontra a escola têm
vantagens sobre as coleções prontas para venda, em geral compradas por altos preços e que
não mantêm relação com à especificidade da localidade dos estudantes. Essa afirmação é uma
crítica indireta às famosas coleções Deyrolle e Saffray. Por sua vez, Rexach (1926) considera
que o museu não deve ser um armazém de produtos da indústria, pois estes são por demais
perfeitos e atendem mais a fins comercias do que a fins educativos.
Além do inconveniente do preço e da pouca relação com a realidade, há ainda o
entrave da língua. Honorio Senet (1896), inspetor das escolas da província de Buenos Aires,
diz que os quadros da coleção Deyrolle, embora sejam bons, apresentam sérios
inconvenientes para as escolas, pois os títulos e descrições estão em francês, e os exemplares
eleitos em zoologia e botânica são por demais exóticos, além de seus altos preços impedirem
sua aquisição por parte das escolas. Por tais razões, defende a criação de museus pelos
próprios escolares.
A constatação do inspetor Senet parece ter sido considerada pelos empresários
franceses, que perceberam a existência de um importante mercado consumidor. Em catálogo
da casa comercial francesa, em 1897 e 1898, encontram-se, para comercialização, pranchas
editadas para a América, com versão em espanhol e português, acerca das seguintes temáticas:
elementos de ciências naturais (20 quadros), animais e vegetais úteis (23), indústrias
extrativas/tecnologia (26) e anatomia humana (12), num total de 81 quadros (LES FILS
D’ÉMILE DEYROLLE, 1898).
De acordo com Vidal (2009, p. 53), a Maison Deyrolle possuía forte tino comercial.
Criada em 1831, começou a produzir as pranchas escolares em 1861 e, em 1870 o governo
francês já era seu principal comprador. No Brasil, a empresa matinha um representante
comercial. A data do início da tradução das pranchas para o português não é precisa. Segundo
| 84
Vidal (2009, p. 48), os quadros em português e espanhol compunham o catálogo de 1897,
contudo, em 1895, a Escola Normal de São Paulo já os possuía na versão traduzida, conforme
se verifica em álbum fotográfico.
Em catálogo já em 1939, são oferecidos para venda “quadros muraes a cores montados
em cartão”. Trata-se da coleção museu escolar para lições de coisas em português. A primeira
página do catálogo informa que “este Museu é apresentado em quadros de 0,59 x 0,47 com
desenhos coloridos e amostras do natural” (ESTABELECIMENTOS DEYROLLE, 1939, p.
1), sendo estes os componentes da coleção Museu Escolar completa. Além das temáticas
presentes em 1898, insere-se uma série de quadros chamada “tipos comparados”73
e
suprimem-se os quadros de tecnologia, totalizando 156 unidades e 500 amostras naturais74
. Os
quadros que não possuíam amostras naturais correlatas, poderiam ser comercializados em
papel, sem serem montados em cartão, o que significava redução no preço.
Do mesmo modo que Senet (1896), Ferreira (1914) também apresenta argumento
contrário aos cartões Deyrolle ou às colecções Saffray, pois, quando compradas pelas escolas
portuguesas, não eram franqueadas ao uso dos alunos, devido aos altos custos e ao temor de
que as fossem estragar, afora o fato de serem estrangeiras e promoverem um país estranho ao
do local da escola. Por esses motivos, Ferreira defende a criação de museus nacionais, sendo
os exemplares estrangeiros utilizados apenas para estudos comparativos.
Embora direcionados à realidade local, os museus deveriam evitar a demasiada
especialização das coleções, pois, segundo Buisson (1887), as crianças precisam ter noções
exatas de tudo que as rodeia e não apenas de alguns aspectos. Do mesmo modo, Backheuser
(1934) assinala que o objetivo do museu não precisa se restringir a um ramo do saber. Por sua
vez, a classificação75
dos objetos deve seguir os capítulos do programa de ensino. Para
Buisson, objetos mais curiosos do que úteis também devem ser evitados. Cita, entre estes, as
peças arqueológicas e numismáticas (referentes a moedas e medalhas). A mesma
recomendação verifica-se em Amor (1935); para este autor, entram no grupo de curiosidades
moedas e selos. Por outro lado, para Senet (1896) e Busch (1937) parece não haver
73
Cada lâmina desta série apresenta a ilustração de uma espécie com seus semelhantes. Os exemplos vão desde
mamíferos a moluscos e micróbios. 74
Possuíam amostras naturais as seguintes séries: elementos de ciências naturais; animais e vegetais e as
indústrias extrativas. 75
Junto ao verbete, Buisson apresenta uma proposta de classificação de um museu, podendo ser ajustada pelos
professores. Reconhece, por exemplo, que, dependendo da localidade onde a escola se encontra, algum aspecto
poderá ser mais contemplado que outro. A classificação contém os seguintes grandes grupos: produtos
alimentares; indústrias diversas; materiais de construção; aquecimento e iluminação; geologia e mineralogia;
botânica; zoologia; agricultura; química; física.
| 85
empecilhos em selos fazerem parte das coleções, sendo, inclusive, listados como possíveis
componentes.
Ainda em relação à classificação, Ferreira (1914) previne o professor para que não se
prenda à nomenclatura da classificação rigorosa dos cientistas. Indícios de que o autor
considera haver especificidades no estudo feito por crianças das “coisas da natureza”,
diferentemente do procedimento seguido por especialistas no assunto em laboratórios e
universidades.
O educador brasileiro Frazão (1884) esteve atento a esta questão ao informar:
[...] os melhores pedagogistas reprovam nos museus escolares as coleções preciosas
de objetos científicos, mais ou menos raros. E a razão que dão é que na escola
primária não se trata de ciência. Sua alçada não vai além dos conhecimentos usuais;
e tudo que nele se acha deve corresponder ao fim da instituição, que é auxiliar por
meio dos sentidos os esforços do mestre nas suas explicações diárias (FRAZÃO,
1884 citado por BASTOS, 2002, p. 260, grifo meu).
Sua afinidade com as proposições de Buisson ficam explícitas quando em viagem
oficial pela Europa (1890-1892), anos depois da publicação do parecer nas atas do congresso
em 1884. Naquele momento, Frazão se vale do dicionário de Buisson e da legislação dos
países visitados para redigir seu relatório de viagem (SCHUELER, 2007, p. 97). Durante a
viagem, o educador não deixou de visitar museus pedagógicos, registrando sua boa impressão
em relação ao da cidade de Gênova (SCHUELER, 2007, p. 98).
Evitando, do mesmo modo, essa tecnificação, Busch (1937) propõe uma solução
didática. Para a autora, cada coleção ou trabalho que constar no museu deverá possuir uma
ficha descritiva, relatando os conhecimentos usados durante a preparação, indicativo de que a
aprendizagem também se faz mediante o conhecimento do processo.
Por sua vez, Backheuser (1934, p. 297) considera que “o carater pratico dos museus
escolares deverá ser tal que permita ao aluno aprender por si, vendo, tocando e até
manipulando os objetos expostos, reduzindo o papel dos mestres ao minimo indispensavel de
orientação”. Esta proposição aproxima-se da de Ferreira (1914), para quem o museu deve
desempenhar o papel de um armazém e ser um grande livro, um mestre mudo, que a criança
percorre e aprende sem se dar conta. Para que isso ocorra, as legendas desempenham papel
importante.
Incentivando ainda o manuseio dos objetos pelos alunos, Ferreira (1914) menciona
que os museus não são apenas para visita; sendo assim, as coleções se manterão por muito
| 86
tempo, uma vez que ácaros e traças não se instalam em exemplares frequentemente
manipulados.
Nas crônicas de Cecília Meirelles, publicadas na Página de Educação no Diário de
Notícias, sobre as escolas do Distrito Federal, a prática de tocar nos objetos não é relatada; ao
contrário, entre os “objetos detestáveis”, “coisas mortas”, “de outros tempos”, a professora e
escritora lista as “[...] coisinhas armadas nas tabuinhas dos armários chamados museus, nas
quais não se pode bulir para não estragar, e que tem um rotulozinho em cima, tal qual os
vidros de remédios” (MEIRELES, 1930 citada por PIMENTA, 2006, p. 318).
Voltando à questão da presença apenas de objetos úteis ao ensino no museu,
Backheuser reproduz em seu livro algumas das orientações que elaborou quando organizou o
Museu Central Pedagógico76
durante a administração de Fernando Azevedo na diretoria da
Instrução Pública do Distrito Federal, entre 1926 e 1930. Segundo o autor, “é necessário
orientar a colaboração das famílias na obra dos museus, para evitar ofertas inúteis ou em
certos casos até inconvenientes” (BACKHEUSER, 1934, p. 298). Para Backheuser, os
museus são exposições de caráter prático, não apenas de objetos raros ou cientificamente
curiosos. Para Busch, isso se resolve ao considerar que “nenhum material deverá ser integrado
no museu sem que tenha sido objecto de aprendizado dos escolares (evita o mal do amontoado
de cousas sem significação para os alunos)” (BUSCH, 1937, p. 38).
Backheuser alerta ainda que, no princípio, o professor não deve desprezar aquilo que
os alunos trouxerem, para não os intimidar; contudo, aos poucos a classe sozinha saberá fazer
a seleção. Quarenta e sete anos antes, Buisson (1887, p. 1992) ponderava que “a acumulação
de todas essas riquezas acarretará sem dúvida um pouco de confusão no começo; mas a ordem
se fará pouco a pouco”77
.
Os autores são enfáticos ao considerar dispensável a aplicação de recursos para a
constituição de um museu escolar:
Postos esses princípios, passa-se aos meios de execução supondo de início a escola
desprovida de todos os recursos, o que é o caso mais frequente. Antes de tudo,
respondem [os professores] com uma objeção: «Se o professor não quer ou não pode
fazer nenhuma despesa, diremos, será possível recolher apenas objetos conhecidos
por todas as crianças, seu museu será então muito incompleto e muito pouco
76
A partir de um breve levantamento efetuado, considerou-se que a atuação de Backheuser frente ao Museu
Central Pedagógico foi pouco explorada pela historiografia da educação brasileira. Embora alguns textos
mencionem esse acontecimento, não foi localizado trabalho específico acerca da questão ou que explicasse no
que de fato se constituiu o referido museu. Em termos documentais, apenas as instruções elaboradas pelo autor
e transcritas na obra Técnica da Pedagogia Moderna foram aqui localizadas e acessadas. 77
“l’accumulation de toutes ces richesses amènera sans doute un peu de confusion au début; mais l’ordre se fera
peu à peu” (Tradução nossa).
| 87
interessante». Existe aí um erro também muito grave, pois este pretexto é alegado
mais por aqueles que exitam ainda a criar museus escolares78
(BUISSON, 1887, p.
1992).
Em resposta a essa objeção formulada pelos professores, Buisson argumenta que o
importante é as crianças conhecerem os objetos que as rodeiam, mesmo sendo coisas vistas
todos os dias, pois um professor hábil saberá fazê-las observar e conhecer novos aspectos.
Frazão (1884 citado por BASTOS, 2002, p. 267) esclarece que se o museu for formado com
objetos familiares às crianças, o professor as fará notar a diferença entre uma noção
superficial e uma observação atenta e metódica.
Quanto às possibilidades de organizar um museu sem recursos, Buisson (1887, p.
1992) sugere: “enfim, com um pouco de boa vontade, o professor procurará sem gastos, pelas
suas relações com industriais do país, com os pais de seus alunos, em suas próprias viagens,
uma multidão de objetos que virão enriquecer seu museu”79
. Já Amor é mais enfático na
postura a ser assumida pelo professor: “[...] para um bom professor, para um verdadeiro
apóstolo da instrução pela educação, o Museu Escolar deverá reünir coleções de toda a
natureza apropriadas ao ensino que ministra [...]” (AMOR, 1935, p. 465-466, grifo meu).
É comum também esses autores se valerem de narrativas com exemplos de professores
que organizaram museus e obtiveram êxito. Figueiredo (1924) relata o caso de um docente
que tomou posse em uma escola, entrou alegre e saiu cabisbaixo, mas, o professor, “autêntico
sacerdote” que era, operou uma transformação no seu “templo”, pois em pouco mais de seis
meses conseguiu, dotá-lo de variados apetrechos, mobiliário e material didático. O professor
conseguiu com amigos que estavam na África, pequenos exemplares embalsamados da fauna
do lugar, algumas folhas secas de tabaco, polião, algumas sementes de purgueira, etc. Num
dos passeios que fez com os alunos, adquiriu uma porção de calcário, zuraque, uma pedrinha
pejada de mica, etc. Afinal, para o autor, “a boa vontade supre com vantagem muitas lacunas
[...]” (FIGUEIREDO, 1924, p. 454).
78
“Ces principes posés, passons aux moyens d’exécution, en supposant d’abord l’école dénuée de toutes
ressources, ce qui est le cas le plus fréquent. Avant tout, répondons à une objection. «Si l’instituteur ne veut ou
ne peut faire aucune dépense, dira-t-on, il ne lui sera possible de recueillir que des objets connus de tous les
enfants; son musée sera donc très incomplet et très peu intéressant». Il y a là une erreur d’autant plus grave,
que ce prétexte est allégué par la plupart de ceux qui hésitent encore à créer des musées scolaires” (Tradução
nossa). 79
“enfin, avec un peu de bonne volonté, l’instituteur se procurera sans frais, par ses relations avec les industriels
du pays, avec les parentes de ses élèves, dans ses propres voyages, une foule d’objets qui viendront enrichir
son musée” (Tradução nossa).
| 88
“Na virada do século passado [XIX], as revistas que foram produzidas para os
professores ofereciam soluções práticas para a falta de recursos, fiscalização e análise”80
(LAWN, 2005, p. 155). Entre o material publicado na Inglaterra estavam modelos de
avaliação, relatórios de inspeção e respostas a questões como onde obter material barato.
“Teachers’Aid publicou uma série de artigos sobre o Museu Escolar, e após a primeira
recebeu centenas de pedidos de informações” 81
(LAWN, 2005, p. 156, grifo do autor). A
partir disso, a publicação produziu cartazes com o nome de empresas que poderiam ajudar os
professores fornecendo amostras.
Como encontrar objetos a serem utilizados nas lições de coisas sem um orçamento?
O conselho oferecido ao leitor era simples. Escrever para fornecedores, trabalhando
com o comércio ou na fabricação, que pudesse fornecer amostras ou modelos de
graça ou a baixo custo82
(LAWN, 2005, p. 156).
Um distanciamento da visão da profissão de professor como um sacerdócio, como
apontado por Figueiredo (1924), ou da articulação escola e mercado, conforme demonstrado
por Lawn (2005), aparece nos textos de Backheuser (1934) e Busch (1937). Esses dois autores
propõem como solução a arrecadação de fundos através dos círculos de pais, das caixas
escolares, das famílias dos alunos e da promoção de campanhas de cooperação monetária,
quando da necessidade de comprar objetos que não puderam ser adquiridos por outros meios.
Neste sentido, Buisson também sugere que o professor obtenha subvenções com a
municipalidade; contudo, o dinheiro conseguido não deve ser utilizado para comprar as
coleções de museus já prontas, mas para compra de armários envidraçados para proteger as
coleções da poeira.
A ênfase dada à ação do professor com boa vontade relaciona-se, sobretudo, ao caráter
artesanal que os museus deveriam possuir, valendo-se, por exemplo, de excursões escolares,
por meio das quais alunos e professores recolheriam insetos, plantas e minerais. A temática
das excursões vai ganhando peso. Nas obras de Backheuser (1934) e Busch (1937) um item é
dedicado ao assunto. O primeiro focaliza sobretudo a necessidade de um plano de excursão,
de atividades dirigidas antes e depois da atividade de campo, para que não se transforme
80
“At the turn of the last century, magazines were produced for teachers which offered practical solutions to the
pressing problems of resources, inspection and examination” (Tradução do original de David Antonio da Costa
e Gustavo Rugoni de Sousa). 81
“Teachers’Aid ran a series of articles on the School Museum, and after the first one received hundreds of
applications for further information” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni de
Sousa). 82
“How to find objects to be used in the class object lesson without a budget? The advice offered to the reader
was simple. Write to suppliers, working in commerce or manufacturing, who might supply samples or models
for free or a little cost” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni de Sousa).
| 89
apenas em passeio. A relação da excursão com o angariar objetos para o museu é um pouco
menos evidente, sugerindo outra atividade. Segundo o autor, após a volta para a escola, o
professor:
fará com que os alunos desenhem em conjunto o trajeto da excursão ou reproduzam
em desenho e modelagem algumas das impressões que mais lhes hajam ferido a
atenção. Esses desenhos e modelagens durante alguns dias terão o melhor lugar no
museu da classe (BACKHEUSER, 1934, p. 270, grifo do autor).
Leontina Busch (1937, p. 64), por sua vez, afirma que “não se pode cogitar da
instituição de um museu escolar, de forma activa, sem incluir no plano excursões escolares
para collecta de muitos dos materiaes de estudo que o devem compor”. Nesta direção, Amor
(1935) apresenta um argumento que justifica o uso do museu. Para ele, o museu deve ser
utilizado quando o professor não puder levar os alunos ao campo para ver diretamente as
coisas. Caso não possua coleções, deverá utilizar imagens e, apenas em último caso, poderá
fazer desenhos representativos na lousa.
Embora a organização dos museus seja motivo de descrição em todos os textos, é no
artigo de Ferreira que se encontram maiores detalhes e sugestões do que pode compor as
coleções, de como o professor pode acondicioná-las, em que recipientes, etc.:
Um bom canivete na falta de escalpelo, uma ou duas pinças, alicates, alfinetes, um
pedaço de sabão arsenical ou na sua falta um pouco de naftalina, para misturar a
qualquer sabão branco, uma boa porção de estopa ou algodão, mas aquela de
preferencia, não falando do gesso para impedir o sujar das penas, quando da
preparação de aves: é quanto basta [...] As amostras minerais colocar-se-hão em
caixas pequenas feitas pelas crianças em trabalhos manuais; os vegetais, secos, sobre
folhas de papel, as sementes e as vagens em frascos; os animais – os insectos nos
alfinetes em caixas apropriadas, cuja proveniencia seja a das caixas para os minerais,
os reptis serão empalhados ou metidos em alcool, mamiferos e aves empalhados e
montados, mas dando aos indivíduos a maior naturalidade possível, fugindo aos
ultimos com os classicos poleiros torneados (FERREIRA, 1914, p. 7).
Dentre as obras e textos mencionados, este é o que mais se assemelha a um
receituário, aproximando-se de um tipo de manual designado por Carvalho (2006a) como
caixa de utensílios, o qual “[...] se organiza segundo a lógica de fornecer ao professor ‘coisas
para usar’ na sala de aula, compondo um programa curricular: uma poesia aqui, um canto ali,
uma estorinha lá” (CARVALHO, 2006a, p. 2). Assume, desse modo, um tom sugestivo,
dando ideias aos professores do que eles podem utilizar como ferramenta de ensino em cada
situação. Esse tipo de impresso esteve fortemente atrelado à concepção de ensino como arte
de saber-fazer-com, ou seja, numa perspectiva em que “ensino e aprendizagem são práticas
| 90
fortemente atreladas à materialidade dos objetos que lhes servem de suporte” (CARVALHO,
2006b, p. 147).
2.3 ESPECIFICIDADE BRASILEIRA? EVERARDO BACKHEUSER (1934) E
LEONTINA BUSCH (1937)
Este tópico pretende dar visibilidade a algumas proposições consideradas peculiares
aos dois autores brasileiros. Em primeiro lugar, ressalta-se que apenas nos textos desses dois
autores aparece a diferenciação entre museus da sala de aula e museus da escola. Essa
distinção não foi localizada, a princípio, na literatura estrangeira, mas apresenta-se de modo
frequente na legislação escolar brasileira. A principal diferença entre esses dois “tipos de
museu” está na proporção e no modo de angariar objetos: enquanto o museu da classe é
alimentado pelos alunos e professores no decorrer do ano letivo, o museu da escola ou museu
geral, recebe doações dos museus das classes, tendo maior vulto no final do ano escolar.
Em relação a esses dois formatos, Backheuser aponta que “o museu da escola crescerá
não só com o trabalho dos alunos, escolhidos dentre os melhores produzidos na escola, mas
ainda com os que as professoras fizerem ou forem oferecidos ao próprio museu”
(BACKHEUSER, 1934, p. 298, grifo meu). Esta passagem dá uma ideia de museu mais
ligada aos trabalhos dos alunos do que a objetos corriqueiros.
Outro elemento que destoa no texto de Backheuser é a criação de “suspense” entre os
alunos, tornando o museu da escola motivo de curiosidade. Segundo o autor, convém que o
museu não esteja:
[...] constantemente franqueado aos alunos, o que o tornaria em breve objeto de
menor curiosidade, mas sempre que nele haja sido feita qualquer modificação ou
melhoramento, a classe deverá ser disso informada, para que se desperte o desejo de
nova visita, ensejo de novas observações (BACKHEUSER, 1934, p. 298).
Outra diferença refere-se à temática que deveria fazer parte do museu. Para o autor,
esse deveria ter também caráter cívico e moral. “Reservar-se-ão certas partes da sala à
relembrança de feitos patrióticos. Legendas morais encontram em tudo lugar de serem postas
em realce” (BACKHEUSER, 1934, p. 296).
Além dos conteúdos, as crianças aprenderiam através da ambiência, ou seja, a
disposição das coleções seria um elemento educativo:
| 91
Será naturalmente cientifico, isto é, será disposto em obedicencia ao que é prescrito
pela Ciencia, mas não devemos precindir de fazer incluir nele também os objetos de
arte, os de carater histórico, tudo disposto com bom gosto e elegancia, de modo que
o seu proprio arranjo já seja um elemento de educação artistica (BACKHEUSER,
1934, p. 295-296, grifo meu).
Esse aspecto parece ser importante para o autor, que insiste na educação pelos
elementos decorativos.
O museu da classe dará vivacidade e alegria á sala, envolvendo e transformando-se
dia a dia, de modo que se eduque o gosto artístico do aluno, graças a novos e
melhores arranjos dos objetos, principalmente desenhos, aquarios, gaiolas e vasos
de plantas em germinação (BACKHEUSER, 1934, p. 297, grifo meu).
Backheuser (1934), em princípio, é o único autor a registrar a preocupação com a
estética dos museus.
Em relação à obra de Busch (1937), o destaque que a distingue dos demais textos aqui
mencionados é o fato de se tratar de uma obra totalmente dedicada ao tema. O livro nasceu de
uma experiência realizada pela autora durante as aulas ministradas na disciplina de prática de
ensino, no ano de 1936, na Escola Normal Padre Anchieta, em São Paulo, no curso de
formação profissional de professores. Por se tratar de uma obra extensa, privilegiaram-se para
análise, apenas três tópicos. A autora discorre sobre a legislação referente aos museus
escolares e pedagógicos em sete estados brasileiros (MG, DF, BA, SE, PI, PE e MA),
concluindo que: “[...] existe, bem delineada em nossa legislação escolar, a instituição dos
museus de classe, de escola (de grupo escolar e de grandes escolas como as normais) e
central, cuja funcção auxiliar do bom ensino pode ser poderosissima, desde que saibam
utilizal-os” (BUSCH, 1937, p. 6).
Apresenta os objetivos que a levaram à publicação do livro, entre eles, a proposição de
uma solução para a lacuna pedagógica, advinda da falta de ensino concreto, por meio da
formação de professoras. Explica como foi desenvolvido o museu didático na escola normal a
partir do trabalho com 203 alunas. Entre as atividades, esteve a “doutrinação das 4 classes
sobre o conceito de museu didactico e o seu valor incalculavel para facilitar e tornar mais
efficaz o ensino” (BUSCH, 1937, p. 24).
A primeira diferença está na nomenclatura utilizada para designar o museu,
denominado de museu didático; contudo, em termos de operacionalização não chega a ser tão
diferente dos demais. O que marca a distância entre os outros textos é a elucidação da função
do museu como meio de facilitar o ensino e dos princípios que regem a aprendizagem pautada
em objetos concretos.
| 92
A introdução do componente jogo no museu também é um diferencial em relação aos
demais escritos. “[...] Alguns jogos de leitura, de calculo, de escripta, de geografia, de historia
servirão para encantar as crianças e vitalizar-lhes o esforço em horas de ocupação proveitosa”
(BUSCH, 1937, p. 37). As palavras que dão contorno ao texto são: motivação, meios
atraentes de apresentar o material de ensino, atenção, interesse, estímulo do aprendizado
ativo, entre outras, que se aproximam do seguinte postulado: “[...] são as cousas palpaveis,
apresentadas de maneira activa pelo mestre, em atitude alegre, animada e sugestiva, que
possuem o condão de emocionar as crianças tornando-as naturalmente attentas” (BUSCH,
1937, p. 32, grifo meu).
O museu, na sua perspectiva, é visto como “órgão” destinado a tornar o ensino
intuitivo; “sua ausencia ou disfuncção será um entrave à consecução de grande rendimento no
ensino”; é um “optimo elemento de activação do aprendizado, fazendo sua influencia
repercutir até sobre a disciplina dos escolares” (BUSCH, 1937, p. 31). Vê-se, aqui, a
introdução de um novo elemento, o material de ensino como garantia não apenas de
aprendizado, mas de controle sobre as crianças. A autora considera como problema principal a
dificuldade dos professores em despertar, manter e dirigir a concentração mental dos
estudantes nas aulas. O princípio de aprendizagem defendido por Busch (1937, p. 31) centra-
se na atenção:
A noção que temos de attenção é que ella é ‘uma attitude de concentração mental
que determina uma maior clareza de nossos estados de consciencia’. O facto ou a
cousa que provoca, em cada momento, esse estado de concentração, domina o fóco
da consciência absorvendo a actividade cerebral do individuo durante os instantes
em que a attenção se mantem voltada para ella. Então, por força dessa concentração,
todas as actividades mentaes se globalizam, eliminando-se as inuteis, para servirem
ao aprendizado da cousa.
Assim sendo, a introdução de elementos materiais consiste em auxiliar na garantia da
atenção para que o foco da consciência seja direcionado apenas à aprendizagem do que está
em pauta.
Segundo Busch (1937), dizer que o museu tem como função oferecer materiais para o
ensino intuitivo ou para lições de observação não define sua função dentro de uma escola que
pretende ensinar pelo método ativo. Neste ponto, percebe-se o direcionamento da crítica e o
posicionamento da autora em defender a Escola Nova como escola ativa83
.
83
A respeito das diferentes formas de compreender e designar a Escola Nova, ver: Backheuser (1934).
| 93
[...] o material que provier do museu ou a elle se destinar terá um caracter peculiar,
de cousa vitalisada, que se distinguirá de outras semelhantes pela marca – se
pudessemos dizer – psychologica, que lhe imprimiram as actividades desenvolvidas
em torno dele, desde a imaginação prévia de suas características e a concepção e
execução de planos para sua acquisição, até sua presença em aula facilitando a
aprendizagem objectiva de suas propriedades intrínsecas e de suas utilidades, tudo
bem estructurado numa concatenação harmoniosa, ajustando gostosamente seu
conhecimento ao fim visado (BUSCH, 1937, p. 33, grifo meu).
Para a autora, seria melhor dizer que “[...] o museu vale mais pela sua funcção de
cooperar, motivando ou estimulando o aprendizado activo, do que como simples repositório
de material de ensino a que os professores podem recorrer ameude para suas lições
objectivas” (BUSCH, 1937, p. 33). Entre as funções que o museu desempenhará ao longo de
sua organização, está a formação de hábitos de colecionar, fichar, escriturar e conservar com
zelo. Outro aspecto levantado por Busch é o intercâmbio de objetos dos museus entre escolas,
aspecto que será incluído nas orientações catarinenses e adotado por algumas delas (cf. item
3.3).
A partir da leitura destes textos, considera-se que a obra de Busch foi a única que
discorreu de forma mais detida sobre a concepção de aprendizagem intuitiva que lhe é
intrínseca, e numa proporção menor, Buisson, o que pode ser explicado pelo gênero textual
em que ele se encaixa, caracterizado pela brevidade. Nos outros textos, notou-se uma
desobrigação de dissertar sobre o assunto, a partir do momento em que os autores vinculavam
a proposta dos museus ao ensino intuitivo, às lições de coisas, ou mesmo à escola ativa. Vale
lembrar que da obra de Backheuser se observou de modo mais detido apenas o item dedicado
aos museus escolares, o qual compõe o décimo capítulo intitulado Detalhes da técnica da
escola nova. Pela própria natureza do capítulo, encontram-se mais facilmente indicações de
detalhes técnicos e práticos do que um tratado pedagógico.
2.4 COMO MONTAR UM MUSEU ESCOLAR: SUGESTÕES PARA O PROFESSORADO
A partir dos impressos explorados e de outros aqui inseridos, procurou-se destacar
neste espaço as sugestões de alguns autores, de maneiras sobre como o museu escolar poderia
ser criado. Observa-se de início que praticamente todos os textos utilizados como fonte
fornecem explicações de como criar um museu, mas abstêm-se de explicar como utilizá-lo
didaticamente durante as aulas. Dito de outro modo, os autores ensinam o professor a preparar
coleções, mas não discorrem sobre como usá-las no ensino.
| 94
A definição dos objetos que comporiam o acervo de um museu perpassava
primeiramente a delimitação de sua função, as disciplinas nas quais ele seria utilizado como
recurso; se voltado para todos os assuntos, o acervo seria o mais variado, se voltado para o
estudo de uma localidade, reduziam-se as opções; se preocupado com uma disciplina em
especial, outro recorte seria feito. Portanto, listar os artigos de um museu não é tarefa fácil.
Talvez o inverso seja mais produtivo, isto é, observar os objetos que eram indicados ou que
existiam de fato a fim de entender a que o museu se destinava.
Concomitante ao processo de recolha de artigos para composição do acervo, deveriam
ser realizadas a organização, a classificação e o armazenamento dos objetos. Alguns autores
indicam que a classificação deveria obedecer aos três reinos da natureza: animal, vegetal e
mineral, ou, zoologia, botânica e mineralogia. Sugeria-se ainda a separação entre coleções
nacionais e estrangeiras.
Nos quadros 3 e 4, apresenta-se, na íntegra, a classificação proposta por Buisson
(1887), e as categorias indicadas por Bannwarth (1925) no Livro auxiliar do mestre para
organização de museus escolares.
Quadro 3 – Divisões e subdivisões de um Museu Escolar segundo Buisson
Produtos alimentares
Cereais, leguminosas
Farinhas, amidos
Café, cacau, chá, açúcar, etc.
Especiarias
Bebidas
Indústrias diversas
Matérias têxteis
Matérias colorantes
Couro
Metais e minerais
Vidros
Porcelanas, faianças, cerâmica
Papel
Materiais de construção
Madeira (seção transversal, seção longitudinal com casca, madeira
polida, envernizada)
Pedras, gesso, cal, etc.
Ardósia, telha
Aquecimento e iluminação
Lenha
Hulha e coque, etc.
Velas de sebo, cera e estearina
Petróleo
Azeite, sementes e oleaginosas
Geologia e mineralogia
Principais minerais
Fósseis, hulha com impressões
(continua)
| 95
(continuação)
Botânica
Herbário (indícios característicos para as plantas medicinais usuais e
para as plantas venenosas)
Zoologia
Insetos
Mamíferos e aves
Úteis
Nocivos
Úteis (gravuras, ou, na falta destas, uma simples
nomenclatura chamando para eles a atenção do
professor e dos alunos)
Nocivos
Agricultura
Instrumentos e máquinas agrícolas (modelos reduzidos feitos pelos
estudantes)
Química Produtos químicos usuais
Física Pequenos aparelhos fabricados pelo mestre e estudantes
Fonte: (BUISSON, 1887, p. 1992).
Observa-se que Buisson propõe dez temáticas gerais e sugere assuntos a serem
desmembrados de cada tema, com exemplos de produtos que fazem referência ao assunto. O
autor sugere que em cada subdivisão o museu seja composto pela matéria-prima em estado
bruto e nas principais fases de transformação por que passou antes da forma definitiva.
A classificação proposta por Buisson foi recomendada em circular pelo inspetor-geral
do Distrito Federal dr. Benjamin Franklin Ramiz Galvão, no ano de 1891, aos inspetores
escolares. De acordo com o inspetor, “[...] uma vez começada a coleção, o professor deve
classifica-la segundo um plano metódico que se aproxime do indicado por Buisson: produtos
alimentares, indústrias diversas, materiais de construção, combustíveis, geologia e
mineralogia, botânica, zoologia, agricultura, física” (GALVÃO, 1891 citado por BASTOS,
2002, p. 294-295).
De modo diferente, Bannwarth (1925) escolhe 12 áreas de saber e em sete delas
propõem aspectos a serem explorados. É interessante que em primeiro lugar se encontram as
lições de coisas, entendidas como um corpo de conhecimentos em separado e não como um
método para guiar qualquer estudo.
| 96
Quadro 4 – Plano de um Museu Escolar segundo Bannwarth
A. Lições de coisas
1. Alimentação
2. Aquecimento, iluminação
3. Vestuário
4. Habitação
5. Indústrias diversas
B. Ciências naturais
1. O homem
2. Higiene prática
3. Animais
C. Ciências usuais
1. Física
2. Química
D. Botânica
1. Botânica geral
2. Herbário
E. Agricultura
1. O solo e o campo
2. A pradaria e o jardim
F. História
G. Instrução cívica
H. Geografia
I. Geologia 1. As rochas
2. Fenômenos geológicos
J. Matemática
1. Cálculo
2. Sistema métrico
3. Geometria
K. Moral
L. Língua francesa
Fonte: (BANNWARTH, 1925, p. 37-38).
Após a exposição deste plano, o autor propõe ao longo do livro, para cada letra do
plano, uma extensa tabela em três colunas; a primeira, com a lição a ser ensinada; a segunda,
com os objetos necessários; a terceira, com endereços ou referências, nesta parte o autor
sugere aproximadamente 25 endereços comerciais onde poderiam ser encontrados os artigos
necessários ou o nome de empresas que forneciam amostras gratuitamente. Ao final de cada
tabela, o autor relaciona o preço de alguns artigos ou a sua distribuição gratuita, por exemplo:
Les Fils Deyrolle, Paris (7e), 41, rue du Bac; La Société des Raffineries et sucreries Say.
Paris, 123, Boulevard de la Gare (13e), envoie gratuitement échantillons et sous-produits
(BANNWARTH, 1925, p. 40).
Este tipo de impresso, seja livro ou revista, que incentiva os professores a manter
relação com empresas que fornecem amostras gratuitamente também se encontrava na
Inglaterra, conforme já indicado. Para Lawn (2005), essa é uma das expressões da cultura “do
| 97
fazer e emendar”, a que a escola inglesa estava sujeita. Em texto anterior Lawn e Grosvenor
(2001) apontam que as escolas não tinham um poder de compra significativo, o que as
obrigava a encontrar soluções sem custo, conservando e reutilizando os materiais.
[...] Era uma economia de escambo, uma abordagem “ensacados e emprestado” e
acima de tudo, isso simbolizava uma cultura, denominada em algumas regiões pela
expressão “fazer e consertar”. Professores representaram um tempo em que as
pessoas resolviam seus problemas de trabalho criando as suas próprias soluções –
uma abordagem artesã – e uma economia escolar que não tinha recursos financeiros
significativos84
(LAWN; GROSVENOR, 2001 citados por LAWN, 2005, p. 155).
Nessa linha de raciocínio, o museu escolar representa exemplarmente a cultura do
improviso, embora esse modo de constituí-lo se apresente através de um discurso bem mais
positivo, sob o argumento de tratar-se de um ensino ativo.
Além desses dois autores, outros se ocuparam em elaborar proposições metódicas para
a constituição de museus escolares, tal como o português Vasconcelos, em obra de 1917.
Segundo Felgueiras (2011), o autor considerava os museus existentes inadequados à escola
primária, pois seguiam critérios científicos incompatíveis ao que se pretendia ensinar às
crianças; por essa razão, o autor elabora para o museu um programa que contém os seguintes
pontos: “instrumentos, máquinas, aparelhos, herbário, espécies zoológicas indígenas, uma
colecção de ninhos e ovos autênticos, produtos agrícolas e industriais, máquina de projecções
luminosas e um pequeno laboratório de química [que funcionaria à parte]” (FELGUEIRAS,
2011, p. 85).
Para o contexto argentino, Senet (1896, p. 8-17) propõe a organização de museus em
seis seções:
1. reino animal: vertebrados, articulados, moluscos, zóofitos;
2. reino vegetal;
3. reino mineral;
4. indústria: apresenta 17 exemplos, desde papel, cerâmica a cereais e plantas;
5. objetos variados: artes domésticas, correio, moedas e medalhas, documentos e
papéis comerciais, vários impressos, gravações (imagens) e história;
6. obras das crianças: geometria, geografia, caligrafia e desenho.
84
“It was a barter economy, a ‘begged and borrowed’ approach and most of all, it symbolized a culture, denoted
in some regions by the expression ‘make do and mend’. Teachers reflected a time in which people solved their
work problems by making their own solutions – a craft approach – and a school economy that had no
significant financial resources of its own” (Tradução do original de David Antonio da Costa e Gustavo Rugoni
de Sousa).
| 98
Além de indicar os possíveis componentes de cada seção, o inspetor fornece
explicações acerca da preparação e conversação da seção um e dois, com noções básicas de
taxidermia e formação de herbários.
Depois de recolhidos os objetos e ao mesmo tempo em que fossem classificados,
tornava-se necessária sua organização e guarda, neste quesito há uma diversidade de
orientações entre os autores já mencionados. Os objetos poderiam ser armazenados em:
álbuns; armários com portas de vidro; arquivo; caixas; estantes; gavetas; mesas; pastas ou
vidros. A variação obedeceria também ao tipo de material que deveria ser conservado.
Se por um lado Buisson (1887) indicava o uso de armários para abrigar as coleções da
poeira, Frazão (1884) os considerava inadequados. Ao comentar a exposição dos museus do
Colégio de Menezes Vieira e do Instituto dos Surdos-Mudos na Exposição Pedagógica de
1883, no Rio de Janeiro, o professor mencionou que “[...] um defeito, entretanto, notei nesses
museus, é que ambos adotam o sistema de armários, quando é mais recomendado e mais
cômodo guardar as coleções em caixas de vidro sobre mesas, ficando os objetos muito mais
visíveis do que em armários” (FRAZÃO, 1884 citado por BASTOS, 2002, p. 268).
***
Encontra-se uma proposta singular de museu escolar em texto assinado por M. Barrier,
no Le volume: journal des instituteurs et des institutrices, correspondente ao período de 1902
e 1903. Ao argumentar que é “coisa impossível” cada professor reunir os elementos
necessários para um museu e que o modelo desejado pela administração escolar francesa é
muito caro, o jornal decidiu facilitar a “delicada tarefa”. Em vista disso, resolveu a
“dificuldade” em conjunto com a edição do Petit français illustre, o “jornal dos alunos e
alunas”.
Alguns colaboradores do Le volume elaboraram uma lista metódica, de três séries
iniciais, sobre ciência, história e geografia. Desenvolveu-se uma espécie de projeto de
maquete, composto por “folhas de construção” impressas, que deveriam ser coloridas e
coladas sobre cartão pelos alunos. Essas folhas seriam distribuídas nos suplementos gratuitos
que acompanhavam cada número do Petit français illustre.
Foram escolhidas “cenas” científicas de difícil compreensão pelos alunos, cenas
históricas difíceis de serem reconstituídas e cenas geográficas que o aluno “jamais” poderia
ver na realidade. Estas cenas seriam representadas por “maquetes” reduzidas, mas, que fossem
vistas por toda classe, cuja intenção era fornecer “a impressão de realidade, com seu relevo,
| 99
planos, sombras, cor e mesmo movimento quando necessário for”85
(BARRIER, 1902-1903,
p. 512).
Aos mestres seria necessário apenas “papel cartão, cola, um pouco de paciência e
atenção” (BARRIER, 1902-1903, p. 512). Cada maquete ficaria pronta com dois ou três
suplementos, quando mais simples, e quatro ou cinco, quando mais complicada. Além disso, o
Pequeno francês ilustrado daria um exemplar colorido que serviria de modelo para colorir os
outros. Depois de montadas, as maquetes formariam uma “agradável galeria” que decoraria a
sala de aula e, em dias de lição, sairia do “pequeno museu”.
Como esperado, o texto reforça a boa intenção requerida com tal empreendimento ao
mencionar que o museu custaria caro se fosse vendido todo montado. Neste pequeno artigo
nota-se uma estratégia sedutora para angariar compradores do referido jornal86
, por meio do
qual se obteriam as “folhas de construção” do museu. Do mesmo modo que o observado na
Inglaterra por Lawn (2005), este elo entre indústria e escola por meio do fornecimento de
amostras grátis de produtos a reconhece “[...] como um lugar de publicidade e de
desenvolvimento de novos clientes”87
(LAWN, 2005, p. 146).
***
Finalizando essa incursão pela literatura estrangeira e nacional na busca por
representações de museus escolares, fica o registro da necessidade de se efetuar um
mapeamento mais detalhado dos impressos pedagógicos nacionais e daqueles do exterior, que
no Brasil circularam e se dedicaram a dissertar sobre os museus. Os autores e textos aqui
mobilizados foram reunidos a partir de buscas em arquivos e indicações presentes em
pesquisas da área de história da educação; contudo, não pretendeu ser exaustiva, do mesmo
modo que se deteve apenas na observação do conteúdo dos impressos, não atentando para os
seus contextos de produção, autorias e suportes materiais.
Desvinculando-se desse panorama geral acerca dos princípios propagados quanto à
criação e uso de museus escolares, o terceiro capítulo centra a análise no contexto catarinense,
buscando no corpo da legislação educacional indícios de conceitos e práticas às quais os
museus se atrelariam.
85
“l’impression de la réalité, avec son relief, ses plans, ses ombres, sa couleur et même le mouvement quand
besoin sera” (Tradução nossa). 86
Em 1920 a unidade do jornal custava 0.30 fr, conforme estava expresso na capa; visualiza-se na contracapa o
valor da assinatura, sendo 4 francos para 3 meses, 7fr.50 para 6 meses e 14 francos para um ano, para França e
Colônias. Fonte: Bibliothèque Nationale de France. Le petit journal illustré. Paris, 1920. Disponível em:
<http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k717451x.image>. Acesso em: 23 maio 2012. 87
“[...] as a place of advertising, and of developing new customers” (Tradução do original de David Antonio da
Costa e Gustavo Rugoni de Sousa).
| 100
3 ASSOCIAÇÕES AUXILIARES DA ESCOLA NOS ANOS 30
Centrando a análise no contexto catarinense, este capítulo procura perceber como o
museu escolar foi delineado em sua legislação escolar a partir da década de 1930 e como as
escolas foram incorporando essas medidas. Por tal razão, incursionamos pela legislação
referente às associações auxiliares da escola, novo estatuto alcançado pelo museu, ao menos
na letra da lei. O presente capítulo apresenta uma das estratégias utilizadas pelo governo
catarinense na formação dos professores atuantes na escola primária, a fim de “aprimorar” sua
prática no uso da tecnologia “museu escolar”, bem como a prática das demais associações
auxiliares da escola.
3.1 CRIAÇÃO E DISSEMINAÇÃO DE ASSOCIAÇÕES: UMA APOSTA NO “NOVO”
Entre os sentidos atribuídos ao museu escolar apresentados no 1º capítulo, item 1.1, a
sexta aproximação dizia respeito às associações auxiliares da escola. Estas aparecem nos
documentos e na bibliografia sob variadas nomenclaturas, entre elas: associações escolares,
instituições escolares, instituições complementares, associações pré, peri, post ou intra-
escolares. Portanto, mesmo quando variar a denominação, neste texto se estará tratando da
mesma modalidade, ainda que tenham especificidades, de organização de atividades com fins
educativos no interior das escolas.
Em 1944 o DE de Santa Catarina regulamentava a existência das seguintes
associações: liga pró-língua nacional; biblioteca; jornal escolar; clube agrícola; círculo de pais
e professores; museus escolares; centros de interesse; liga de bondade; clube de leitura e
pelotão de saúde (SANTA CATARINA, 1944c). Contudo, em anos anteriores também eram
consideradas a caixa escolar, a cooperativa escolar de consumo, o orfeão e a sopa escolar88
(SANTA CATARINA, 1942b, 1942d, 1943d). Todas teriam funcionamento gradativo. O
orfeão e o clube agrícola seriam instalados “quando possível” (SANTA CATARINA, 1943b).
Entretanto, muito antes de serem assim caracterizadas, algumas destas “instituições” já faziam
parte do cotidiano das escolas, caso do museu e da biblioteca (desde a década de 1910), da
88
Em alguma medida pode-se dizer que não havia muita clareza de quais eram de fato as associações auxiliares
da escola, pois, há uma variação na listagem das mesmas de acordo com o suporte do discurso, se circular,
decreto, regulamento, etc. Se em 1942, 1943 e 1944 era mais ou menos esse o panorama, em 1946 o
Regulamento do ensino primário considera novamente que a cooperativa escolar e o orfeão eram associações
(SANTA CATARINA, 1946b, p. 124). Contudo, não foi realizada pesquisa para saber se essas duas possuíam
estatuto próprio, já que não constavam no Decreto nº 2.991 de 1944, que baixou as instruções para o
funcionamento das associações.
| 101
caixa escolar (SANTA CATARINA, 1916) e dos clubes agrícolas – introduzidos a partir de
1935, conforme Fiori (2002).
As associações auxiliares da escola consistiam basicamente em organizações
estudantis, formadas por alunos de diferentes séries, coordenadas por um professor
responsável, cada uma com tarefas determinadas de acordo com seu propósito. Elas
funcionavam como uma espécie de organismo auxiliar da atividade de ensino ou de
socialização, moralização e civilização dos estudantes, bem como de aproximação da escola
com a família. As associações eram (re)organizadas no início de cada ano letivo, quando um
professor era designado para sua coordenação, em geral na primeira ou segunda reunião
pedagógica. A partir disso, elegia-se uma diretoria composta por alunos que deveriam cumprir
algumas tarefas, as quais deveriam ser registradas em atas mensais e relatórios anuais, umas e
outros a se remeter ao DE.
No cenário catarinense foram identificadas duas dissertações dedicadas à temática: a
primeira, de Mariane Zen (2007), investiga a biblioteca e o clube de leitura de uma instituição
específica, o GE Alberto Torres, do município de Brusque, entre 1938 e 1950; a segunda de
Franciele Otto (2012), procurou identificar, descrever e interpretar a transmissão da dimensão
moral expressas pelas ligas de bondade presentes em escolas catarinenses entre 1935 e 1950.
Localizou-se também um trabalho de conclusão do curso de Pedagogia, de autoria de Mariane
Niehues89
(2011), acerca das regras de civilidades prescritas pelas ligas de bondade nas
escolas públicas estaduais do sul do estado de Santa Catarina entre 1953 e 1970.
Além destes trabalhos, localizaram-se os seguintes artigos: o primeiro, de autoria de
Neide Fiori (2002), que pesquisa o ruralismo brasileiro por meio dos clubes agrícolas de 1930
a 1945; além de levantamento bibliográfico e de legislação, a autora incluiu na análise escritos
de alunos em atas e relatórios das atividades do clube agrícola. Fiori (2002) percebe um
desvio na função destes clubes, num primeiro momento relacionada ao combate do êxodo
rural e num segundo período, de preparação para a vida em sociedade, através do exercício de
atividades agropecuárias.
O segundo artigo, escrito em coautoria, de Maria de Andrade, Karina Tomelin e
Gilson Pereira (2004), investiga a liga de bondade Princesa Izabel, fundada em 1951 no GE
Teófilo Nolasco de Almeida na localidade de Benedito Novo. O terceiro texto, de Maria
Teresa Santos Cunha (2010), aborda preceitos de civilidades, veiculados a partir da orientação
89
A autora tem publicado artigos referentes a esta temática que, deu origem à sua pesquisa em nível de mestrado
(2012). Para maiores informações, consultar o currículo Lattes da autora.
| 102
de conduta em uma liga de bondade, registrados em um jornal infantil manuscrito de um
colégio feminino religioso de Florianópolis no período de 1945 a 1952.
Os dois últimos artigos, publicados em 2012, ano limite do levantamento bibliográfico
aqui efetuado, compõem os anais do IX Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul.
Um deles, de autoria de Mariane Niehues e Giani Rabelo (2012), constitui-se em
desdobramento da pesquisa de mestrado da primeira autora, orientada pela professora e
coautora. Trata-se de uma síntese do trabalho de conclusão de curso acima citado, que deu
origem a pesquisa de mestrado. O segundo artigo, por sua vez, foi escrito, também em
coautoria por Fernanda Prates, Julia de Oliveira e Gladys Teive (2012). Neste, as autoras
identificam vestígios da incorporação da liga pró-língua nacional, da liga da bondade e do
pelotão de saúde na cultura escolar de dois grupos escolares – Lauro Müller e Alberto Torres
– nos anos 1946 e 1956.
Estes trabalhos são precursores na abordagem das ações de associações específicas,
com destaque para as ligas de bondade, e contribuíram para uma visão mais abrangente de seu
funcionamento. Com exceção dos dois primeiros artigos e da primeira dissertação, os demais
trabalhos situam-se da década de 2010 em diante, o que demonstra uma emergência do tema
nos últimos três anos.
Ao consultar as circulares enviadas pela Diretoria de Instrução Pública a partir de
1930 e, posteriormente, pelo DE aos inspetores, diretores e professores, nota-se que do ano de
1941 em diante a menção às associações é sistemática. Foi expedido em 1944, o Decreto nº
2.991, com as instruções para o funcionamento de cada associação, o documento marca as
diretrizes a serem adotadas nas décadas seguintes, assumindo o lugar antes ocupado pelos
comunicados para fornecer instruções (no item 3.3 este decreto será explorado no que tange
ao museu escolar).
A Circular n. 5, de 6 de janeiro de 1941, enviada antes do início do período letivo,
recomendava “com muita insistência” que fossem organizadas associações auxiliares da
escola nos estabelecimentos de ensino primário, cujas finalidades eram:
1) preparar o indivíduo a viver em sociedade; 2) tornar o indivíduo guia de si
mesmo; 3) ensinar o valor da cooperação; 4) despertar o interêsse do educando pela
Escola; 5) despertar no educando os sentimentos de ordem e de legalidade; 6)
desenvolver certas qualidade: – iniciativa, liderança, características pessoais e
habilidades (SANTA CATARINA, 1941b, p. 71).
Os inspetores escolares seriam incumbidos de repassar à Superintendência Geral do
Ensino as dificuldades encontradas, “especialmente quando diretores e professores se
| 103
mostrarem infensos [contrários] à criação dessas associações” (SANTA CATARINA, 1941b,
p. 71). Esta circular pretendia, de modo claro, estimular a fundação e expansão de
associações, vistas como potencializadoras das características acima mencionadas, então
valorizadas pelos dirigentes do ensino.
A importância social a elas atribuída pode ser mensurada por um texto de meia página
publicado na capa do Diário Oficial n. 2.125 de 22 de outubro de 1941, intitulado
“Associações Escolares”. O texto ressalta a importância das associações, pois contribuem para
que as escolas se aproximem das novas correntes pedagógicas e menciona a atenção que o
interventor Nereu Ramos havia dado a esses “grêmios escolares”. Dá ênfase às cooperativas e
caixas escolares, com relevo também aos clubes agrícolas e às ligas pró-língua nacional
(SANTA CATARINA, 1941d).
O direcionamento ou atribuição de maior importância a determinadas associações é
visível em algumas orientações do DE, nas cobranças de inspetores e diretores em reuniões
pedagógicas, além da postura assumida pelos próprios professores. Isso é perceptível em duas
cartas enviadas ao DE, abaixo relatadas.
Na primeira, de 1949, o professor responsável pela Escola Mista Municipal da Serra
do Amoado, do município de Rio do Sul, comunica ao diretor do DE que deixou de enviar os
relatórios das associações escolares pelo motivo de sua escola haver sido criada naquele ano,
tendo encontrado dificuldades para tal feito, razão pela qual não teria sido possível “criar nem
mesmo a própria caixa escolar” (ARQUIVO..., 1949d, p. 121). No mesmo ano, o professor da
Escola Mista Municipal de Encruzilhada da Frueteira declarou que “em minha Escola não
existe Caixa Escolar, por motivo de ser uma Zona Pobre e ao mesmo tempo, começada em
Março do corrente ano, motivo esse que não tem a mesma [caixa escolar]. Espero que no
decorrer de 1950, possa conseguir uma” (ARQUIVO..., 1949d, p. 400).
Vale frisar que não havia dispositivo legal que obrigasse à criação de todas as
associações. Isto ocorria apenas no caso da caixa escolar, cuja obrigatoriedade foi instituída
no ano de 193890
, e das cooperativas escolares91
; contudo, em alguns momentos esta não é
90
Pelo Decreto-lei nº 55, de 3 de fevereiro de 1938, as caixas escolares eram consideradas “organizações de
assistência aos escolares desajudados da fortuna” (SANTA CATARINA, 1938c, p. 33). A partir deste decreto,
todos os estabelecimentos de ensino primário, estaduais e municipais, deveriam organizá-las. Para cada
modalidade de escola, se grupo ou isolada – variava o valor fixado como contribuição mínima, cabendo aos
pais a composição da diretoria, o que se modificará com a sua passagem para o rol de associações auxiliares da
escola nos anos seguintes. 91
De acordo com o Decreto nº 945, de 25 de janeiro de 1941, tornou-se obrigatória a organização de
cooperativas escolares nos institutos de educação, cursos complementares e grupos escolares, sendo facultativa
nas escolas isoladas. O objetivo principal da cooperativa consistia em fornecer, por meio de venda aos alunos,
livros, cadernos, material escolar, uniformes e calçados pelo menor valor possível. Ela poderia ainda contribuir
com a formação de bibliotecas, compra de material científico, manutenção do museu escolar, do campo de
| 104
considerada uma associação. Ainda assim, os professores sentem-se compelidos a justificar
sua ausência, quando as escolas não as têm.
Cobranças voltadas a criação de associações específicas também ocorriam por parte
dos inspetores. Por exemplo, o inspetor Celso Rila, responsável pela 2ª circunscrição92
(região
de Blumenau), desconsidera pontos do termo de visita/formulário e acrescenta outros. Ao
invés de preencher a “falta de material”, o inspetor listava as associações que a escola possuía,
além de recomendar ao professor a criação de alguma associação que considerasse
indispensável.
Este é o caso da escola regida pelo professor Rodolfo Decker, em 1941. Mesmo tendo
em funcionamento caixa escolar, biblioteca, jornal, clube agrícola, museu e pelotão de saúde,
o inspetor recomendava “organizar a liga pró-língua nacional, conforme já lhe foi
determinado em reuniões” (ARQUIVO..., 1941b, p. 157). Em outros dois termos de visita, o
inspetor recomenda aos professores que organizem as associações indicadas pelo DE.
Além dessas cobranças, encontraram-se vários registros similares em atas de reuniões
pedagógicas93
. Na reunião de fevereiro de 1952, na Escola Reunida (ER) de Pôrto-Belo,
mencionou-se que “as associações obrigatórias nas escolas são as seguintes: Caixa Escolar e
Círculo de Pais e Mestres. As demais, são facultativas” (ARQUIVO..., 1952, p. 58). Já na
reunião do mês de março de 1952 das escolas isoladas estaduais e municipais do município de
Camboriú, presidida pelo inspetor escolar Alcides Rocha, encontra-se o seguinte registro:
Falando sobre as Associações Auxiliares da Escola, [o inspetor] determinou o
seguinte: Que as mesmas, uma vez fundadas, deveriam completar sua finalidade.
Que, obrigatóriamente, todas as Escolas deveriam possuir a Caixa Escolar, Liga
Pró Língua Nacional, Biblioteca e Círculo de Pais e Mestres. Dentre estas, deverá
merecer melhor atenção do professor, a Caixa Escolar [...] Voltando às demais
associações, ordenou fossem feitas atas trimestrais, sendo que as reuniões deveriam
ser mensais (ARQUIVO..., 1952, p. 97, grifo meu).
experiências agrícolas, instalação de pelotões de saúde, bem como com fornecimento de leite, sopa e pão, em
colaboração com a caixa escolar. O decreto está transcrito na Circular n. 11, de 30 de janeiro de 1941 (SANTA
CATARINA, 1941c). Segundo Melo (1955, p. 23), essa associação não pôde ser constituída, pois exigia
conhecimentos de contabilidade (que teria de ser feita por professores); após 1944, a pressão oficial foi
diminuindo e as cooperativas deixaram de funcionar. 92
A atuação dos inspetores escolares, bem como do DE, era regulada por zonas geográficas que englobavam
aproximadamente quatro municípios. Estas zonas eram denominadas de circunscrição escolar e seu número
variou de acordo com o ano, sendo, em geral, de 15 a 17, considerando todo o estado de Santa Catarina.
Conforme Moreira (1954, p. 29), em 1953 o número de circunscrições subiu para 45, sendo a sua área
determinada pelo coeficiente da população escolar e número de escolas. 93
A numeração das páginas dos exemplares que contêm atas, planos de aula, comunicados e relatórios, tanto de
reuniões pedagógicas, quanto de associações, segue a organização do Apesc. Trata-se de volumes que contêm
documentos enviados pelas escolas ao DE, que os encadernou de acordo com temáticas específicas. Contudo, a
paginação foi efetuada pelos funcionários do Apesc no momento da catalogação do acervo, não condizendo,
portanto, com o número da página original do livro de atas da escola, por exemplo.
| 105
Para Moreira94
(1954), as determinações do DE tinham o propósito de centralizar as
ações e formalizar o ensino, sendo este princípio contrário à filosofia da educação nova e das
próprias associações. Em defesa das medidas tomadas pelo DE, Melo95
(1955) pontua em sua
análise do livro de Moreira (1954), que, alguns diretores e professores apressaram-se em
implantar todas as associações, temerosos da censura dos superiores, entretanto, isto acarretou
muito trabalho e má vontade. Melo (1955) esclarece que alguns diretores, como foi o seu
caso, organizaram apenas as mais importantes e em número equivalente ao de professores,
para que fossem bem orientadas. É interessante observar alguns pontos de tensão96
. As
palavras de Melo (1955, p. 20) são: “[...] não culpemos o Departamento de Educação pelo
estreitamento que deram, alguns diretores e professôres, às Associações Escolares, nem pela
superficialidade com que foram organizadas em certos educandários”.
A documentação pesquisada indica que os dispositivos fiscalizadores das associações
foram criados antes mesmo da elaboração de parâmetros para o funcionamento destas e até
mesmo da criação dessa modalidade de organização intra-escolar na legislação educacional.
Embora não houvesse uma regulamentação específica, a temática começa a aparecer com
frequência durante as Semanas Educacionais em 1936 (BOMBASSARO, 2006). Em
princípio pode-se considerar que esses eventos plantaram a semente da discussão que foi
sendo burilada nos anos posteriores, culminando com o decreto de 1944 já mencionado.
94
João Roberto Moreira atuou em Santa Catarina como diretor no GE Conselheiro Mafra (Joinville) entre 1934 e
1935 e foi professor no Curso Normal do Instituto de Educação (Florianópolis) entre 1937 e 1943; graduou-se
em Filosofia em 1951 e em Pedagogia em 1954 pela PUC/RJ. Em 1944, iniciou sua atuação em órgãos
federais. “Trabalhou no Dasp (1944/1946), chefiando a Seção de Planejamento da Divisão de Seleção e
Aperfeiçoamento de Pessoal e a de Recrutamento. Em 1947, tornou-se, por concurso, Técnico em Educação,
indo trabalhar mais tarde no Inep (1949/1951) dirigindo a Seção de Documentação e Intercâmbio” (PAIXÃO,
1999, p. 270). Ainda no início da carreira, exerceu o magistério no Paraná (1933/1934); nos anos 1950 atuou
em dois colégios: um em Minas Gerais e outro, no Rio de Janeiro. Em 1952, Anísio Teixeira assumiu a direção
do Inep e convidou Moreira para coordenar a Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e
Elementar (Cileme) em 1954. Trabalhou na sede da Unesco na América Latina no Chile, de 1961 a 1965. Em
1966, atuou como professor visitante e consultor na Universidade de Porto Rico, entre setembro de 1966 e
maio de 1967, mês em que faleceu. Ao longo de sua trajetória, publicou diversas obras (PAIXÃO, 1999). 95
Orlando Ferreira de Melo “foi no ano de 1940, aluno do Professor João Roberto Moreira no Instituto Estadual
de Educação (IEE). Dentre suas funções atuou como professor de Didática e Prática Pedagógica da Escola
Normal Pedro II, da cidade de Blumenau. Melo articulou o processo de organização e implantação da
Faculdade de Educação (FAED 1963-1964), no Estado de Santa Catarina, como Conselheiro do Conselho
Estadual de Educação (CEE). Foi presidente desse órgão entre os anos de 1966 e 1969 e professor em 1966 da
3a
série do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação (FAED), na qual ministrava a disciplina
Administração Escolar. Posteriormente foi Reitor da Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa
Catarina (UDESC) em 1967. Atuou também como Diretor Executivo da Fundação Educacional de Santa
Catarina (FESC), indicado pelo governador Celso Ramos no ano de 1965” (DAROS; MELO, 2006, p. 5). 96
Para situar o debate em questão, vale mencionar que Melo se propõe a comentar em seu texto a monografia
publicada por João Roberto Moreira, em 1954, obra encomendada pela Cileme. Logo na primeira página do
livro, Melo estranha a falta de pronunciamento sobre a obra levada a cabo por Moreira e se incumbe de
elaborar uma crítica e análise técnica de seu conteúdo, em especial acerca dos rumos e execuções pedagógicas
(MELO, 1955, p. 3).
| 106
Vale lembrar que o florescimento das associações ocorre num momento de transição,
entre a reforma efetuada em 1935 àquela que seria empreendida em 1946. Contudo, a
primeira vista as associações não sofrem mudanças abruptas, ao contrário, vão aos poucos
sendo incorporadas e adquirindo dinâmicas próprias.
Na legislação, a primeira menção à existência de associações de modo genérico se faz
no Decreto-lei nº 76, de 1938 (SANTA CATARINA, 1938a), que fixava normas para a
realização de atividades de educação cívica e programas comemorativos. Este decreto parece
ser o predecessor das associações auxiliares da escola, chamadas então de associações de
caráter privado. Os programas e horários dessas associações deveriam ser aprovados pelo
DE, devendo ser brasileiros os professores ou instrutores. O programa das comemorações
nacionais necessitava ser enviado com dez dias de antecedência ao inspetor escolar, que
poderia desaprová-lo.
A fiscalização dessas associações de caráter privado deixa de ser realizada diretamente
pelo inspetor escolar e passa a ser subordinada à Inspetoria Geral das Escolas Particulares e
Nacionalização do Ensino (EPENE), após a sua criação, em junho de 1938 (Decreto-lei nº
124. In: SANTA CATARINA, 1938b). Mesmo tendo sido criada a inspetoria, o cargo de
inspetor das EPENE será criado apenas em 1943, ou seja, cinco anos mais tarde (SANTA
CATARINA, 1943a), quando João dos Santos Areão é nomeado para ocupá-lo. Este inspetor
cumpriria as determinações previstas já em 1938 e, além disso, fiscalizaria as então (1943)
denominadas associações auxiliares da escola.
A inspeção era regulada por portaria de março de 1943. Seu texto será reproduzido em
1946, no Regulamento de Inspeção Escolar. Apenas em 1947 é criado o cargo de inspetor das
associações auxiliares da escola, cujas funções são as mesmas atribuídas anteriormente ao
inspetor das EPENE (Lei nº 40. SANTA CATARINA, 1947). Pode-se considerar que esses
textos de orientação fiscalizadora deram o primeiro tom à homogeneização das características
das associações.
Embora houvesse uma distribuição de tarefas entre inspetor geral do ensino, inspetor
das EPENE e inspetor escolar, os três deveriam incentivar a fundação das associações. Ao
inspetor escolar cabia examinar nos grupos escolares e no curso normal regional se existiam
ou não associações; estimular a sua organização e examinar o funcionamento e escrituração
das existentes. De acordo com o Regulamento de Inspeção, “no têrmo de visita deverá constar
referência aos professores que mostrem interêsse pelas associações peri-escolares, devendo
ser registradas, também, as razões alegadas pelos que ainda não vêm colaborando ativamente”
(SANTA CATARINA, 1946c, p. 9).
| 107
Segundo a Portaria n. 126, de 1943 (In: Circular n. 29. SANTA CATARINA, 1943a,
p. 16), referente à fiscalização das associações auxiliares, estas:
[...] tem por fim a reorganização da escola em bases da comunidade social de
trabalho em cooperação e sua articulação com o meio social por todas as medidas
que tendem a estender seu raio de ação educativa e a tornar estreita a colaboração
entre a escola, a família e as outras instituições sociais.
Nessa perspectiva, as associações são percebidas como elementos que pela ação
educativa ultrapassariam o espaço escolar, integrando a família e demais esferas sociais.
Nesse aspecto, pode-se vislumbrar a ação dos museus, que seriam constituídos mediante o
auxílio de familiares e empresas regionais. Um dos únicos momentos em que se nota uma
afinidade entre eles e as outras associações.
Por outro lado, o documento sublinha que “as obras sociais de maior importância” são
o círculo de pais e professores, caixas e cooperativas escolares, bibliotecas e pelotão de saúde.
Em 1947 entram para o rol das mais importantes, além das já mencionadas o clube agrícola,
jornal, clube de leitura, liga pró-língua nacional e liga da bondade.
Entre as funções do inspetor das associações em 1943 estava a elaboração de estatutos
para “orientar e generalizar a organização dessas obras” (SANTA CATARINA, 1943a, p. 17),
ação, a nosso ver, materializada pelo Decreto nº 2.991 de 1944. Cabe destacar que esta função
atribuída ao inspetor em 1943 é suprimida em 1946 e 1947; portanto, marca de que havia sido
cumprida.
Segundo Moreira, a existência de aparatos fiscalizadores das associações retirou-lhes a
autonomia presente durante a vigência da reforma Trindade, dando início a um “[...] regime
centralista de contrôle e fiscalização [...]” (MOREIRA, 1954, p. 30).
Em resumo, era de responsabilidade do inspetor encarregado de fiscalizar as
associações:
1) propôr ao Departamento de Educação um plano de conjunto para a orientação dos
trabalhos; 2) estudar as condições de cada associação auxiliar da Escola, dar parecer
sôbre as consultas que lhe forem apresentadas e decidir os casos que forem da sua
alçada; 3) promover reuniões, conferências e festas de caráter popular, a fim de
reavivar o entusiasmo por essas Instituições; 4) propôr a aquisição de livros,
revistas, monografias e outras publicações que interessam o Serviço; 5) pôr-se em
contato com a direção de associações congêneres dentro e fora do país, a-fim-de
colher dados e informações sôbre as diversas organizações existentes; 6) organizar
um sistema de fichário, de maneira a estar o Serviço em condições de conhecer do
movimento e das particularidades de cada obra social escolar; 7) entregar relatório
anual ao diretor do Departamento de Educação, em que figurem dados precisos
sôbre a ação das obras sociais fundadas e mantidas (SANTA CATARINA, 1943a, p.
16, grifo meu).
| 108
Dentre estes aspectos, chamam a atenção: o terceiro, por considerar necessário
reavivar o entusiasmo, ou seja, retornar-lhe a vida, reanimar, reacender o interesse que havia
supostamente se perdido; o quinto, por incentivar a correspondência com experiências
externas e, de certo modo, por inserir o projeto catarinense numa rede de interlocução ao
mencionar que existiam associações no País e fora dele, o que atestava sua sintonia com os
processos pedagógicos em voga; e o sexto, por definir as associações como obra social
escolar.
As associações aparecem, em alguns casos, vinculadas às finalidades sociais atribuídas
à escola a partir do movimento de renovação da educação, sobretudo depois dos anos 1920.
De acordo com Souza e Faria Filho (2006, p. 44), em São Paulo as reformas ocorridas no
início de 1930 “[...] ressaltaram a finalidade social da escola pública, enfatizando o caráter
nacional do ensino e o vínculo da escola com o projeto de reforma cultural da sociedade
brasileira”, momento em que foram instituídas, segundo os autores, obras sociais escolares
(associação de pais e mestres, conselhos escolares, caixas escolares, etc.) e instituições
auxiliares da escola (biblioteca infantil, cinema educativo, canto orfeônico, etc.).
Em Minas Gerais, ainda na década de 1920, verifica-se a atuação de instituições
auxiliares da escola por meio da regulamentação do ensino e veiculação de seus princípios na
Revista do Ensino, órgão da diretoria de Instrução Pública daquele estado e objeto de estudo
de Paula Guimarães (2011). A autora evidenciou, a partir do discurso do estado, a presença
das seguintes instituições na educação da infância mineira: associação das mães de família;
caixa escolar; escotismo; ligas de bondade e pelotões de saúde.
Ainda no começo dos anos 1920, mais precisamente em 5 de dezembro de 1923, o
jornal cearense A Tribuna informava a respeito da organização da Sociedade Cearense de
Educação, a qual visava: “[...] nobremente, a defesa e propagação da educação popular,
desenvolvimento da cultura pedagógica, amparo às instituições auxiliares de ensino, como
caixas escolares, museus, bibliothecas, escotismo, apoio ao professorado, etc. [...]” (citado por
CAVALCANTE, 2009, p. 68). A criação desta sociedade coincidiu com o período da reforma
da Instrução Pública empreendida por Lourenço Filho (1922-1923) no Ceará, quando esse
ainda não possuía o prestígio que viria a adquirir anos depois.
A presença destas instituições nas reformas empreendidas tanto em São Paulo quanto
em Minas Gerais [e Ceará] é considerada um indício de que elas estavam disseminadas nas
políticas do final dos anos 1920 em diante, de acordo com Souza e Faria Filho (2006, p. 44-
| 109
45). Essa “hipótese” é reforçada se analisadas as estatísticas nacionais referentes às
instituições escolares.
Uma pesquisa mais aprofundada sobre a temática em nível nacional há de ser feita,
que tenha por objetivo inicial mapear e congregar informações dispersas acerca das
associações escolares presentes nos mais diversos trabalhos acadêmicos. No caso do Rio
Grande do Sul, Bastos (2005) apresenta um panorama muito próximo ao de Santa Catarina.
No final da década de 1930, a regulamentação do ensino primário:
[...] prescrevia que tais instituições deveriam ser “criadas de acordo com as
necessidades do ensino e do meio em que funciona a escola” [...] essas instituições
teriam a finalidade de exercitar “atitudes de sociabilidade, responsabilidade e
cooperação” e deveriam surgir do interesse do aluno (BASTOS, 2005, p. 216).
As instruções indicam que o professor exerceria papel de guia, cabendo aos alunos
executar as tarefas. Diversas orientações relativas a esse recurso de ensino encontravam-se na
Revista do Ensino. Em relatório da Secretaria de Educação e Cultura daquele estado, relativo
aos anos de 1937 a 1942, encontra-se um quadro (transcrito em BASTOS, 2005, p. 217) com
o crescimento das instituições escolares entre 1940 e 1942, estando listadas entre elas muitas
das que tivemos em Santa Catarina, contando, todavia, com peculiaridades, tal como a liga de
boas maneiras.
Mesmo sem a informação precisa de quando a denominação “associação auxiliar” foi
introduzida na legislação de Santa Catarina, algumas interpretações são possíveis. No ano de
1938, o DE enviou circular (SANTA CATARINA, 1941a) aos inspetores de ensino, nela se
transcreviam as questões do Boletim do Convênio Nacional de Estatística Educacional, que
deveria ser preenchido de acordo com as instruções fornecidas pelo inspetor. A partir da
quadragésima nona questão, interroga-se se a escola possui: bibliotecas para alunos e
professores, aparelhos de projeção fixa e/ou animada, laboratórios, museu, aparelhos para
trabalhos manuais, agrícolas e para educação física; e, se as crianças têm: clube de leitura,
clube agrícola, pelotão de saúde e assim sucessivamente, listando todas as associações, sem,
contudo, nomeá-las como tais.
A padronização das estatísticas educacionais deriva de acordo97
estabelecido em 1931
entre o governo central e governos regionais (GIL, 2007, p. 35). Portanto, é a partir de 1932
que as estatísticas educacionais são divulgadas pelo IBGE. Porém, a organização98
das
97
Trata-se do Convênio Inter-administrativo das Estatísticas Educacionais e Conexas (GIL, 2007, p. 38). 98
Dados do ensino primário geral – comum e supletivo – das esferas federal, estadual, municipal e particular.
Para os estabelecimentos de ensino não-primário tem-se outra configuração.
| 110
associações proposta pelo IBGE neste período não é a mesma que se observa nos anos 1940
em nível estadual. Por exemplo: os museus e bibliotecas eram contabilizados pelo IBGE
como aparelhamento escolar, inserindo-se no questionamento o que a escola possui. Já as
instituições escolares encontravam-se no tópico correspondente à questão: o que as crianças
têm.
As instituições se dividiam em intra-escolares: clubes de leitura, auditórios, pelotões
de saúde, organizações de escotismo, clubes desportivos, ligas de bondade (em alguns casos)
e outras; e periescolares: associações de pais e professores, conselhos escolares, caixas
escolares, fundos escolares e outras.
Visualizam-se abaixo os quadros 5 e 6, cujos dados foram sistematizados a partir das
estatísticas disponíveis no site do IBGE. A série “Estatísticas do século XX” foi formulada
com informações extraídas de 64 volumes do Anuário Estatístico do Brasil, publicados entre
1916 e 2000, e da publicação “Estatísticas Históricas do Brasil: séries econômicas,
demográficas e sociais”, de 1550 a 1988, cujos dados foram complementados com
informações de outros documentos produzidas pelo Estado99
. Os dados referentes à educação
encontram-se nas “estatísticas populacionais, sociais, políticas e culturais” e contêm
informações entre os anos 1908 e 2000.
Deste período, há informações referentes ao aparelhamento escolar e a instituições
escolares apenas de 1932 a 1937. O quadro 5 registra os dados do aparelhamento escolar
referente ao museu, num comparativo entre Santa Catarina e Brasil.
Quadro 5 – Estabelecimentos de ensino primário que possuíam museu segundo o IBGE
Ano Total*
Fonte Santa Catarina Brasil
1932 1 539 Anuário estatístico do Brasil 1937, v. 3, Rio de Janeiro:
IBGE, 1937. 1933 26 924
1934 28 1.075
1935 28 1.034 Anuário estatístico do Brasil 1938, v. 4, Rio de Janeiro:
IBGE, 1939.
1936 28 1.081 Anuário estatístico do Brasil 1939/1941, v. 5, Rio de
Janeiro: IBGE, 1941. 1937 46 1.102
* Ensino primário geral – comum e supletivo – esferas federal, estadual, municipal e particular.
Fonte: elaboração da autora a partir dos dados disponíveis em:
<http://www.ibge.gov.br/seculoxx/arquivos_xls/educacao.shtm>.
99
Conforme informações disponíveis em: <http://www.ibge.gov.br/seculoxx/default.shtm>. Acesso em: 28
maio 2012.
| 111
Neste quadro, nota-se a presença de apenas um museu em Santa Catarina em 1932 –
enquanto havia 58 laboratórios e gabinetes100
no item aparelhamento. Uma possível
explicação talvez esteja na composição que poderia haver entre essas duas funções, abrigadas
em um mesmo espaço físico, conforme anunciado no relatório de governo ainda em 1914 (cf.
item 1.5). Nos anos subsequentes, têm-se um ligeiro crescimento, estabilização e um novo
crescimento, a partir de 1937, o qual continuará em ascensão nos anos subsequentes,
conforme se observa no quadro 7. Tendo isso em vista, é possível estabelecer uma relação
entre o aumento das associações e a realização das Semanas Educacionais entre 1936 e 1945?
As Semanas Educacionais caracterizaram-se como espaços de formação continuada de
professores, sobretudo de atualização daqueles que atuavam há mais tempo nas escolas. De
acordo com Bombassaro (2006), as semanas acabaram mais por fornecer técnicas didáticas
para auxílio dos professores do que uma mudança nos princípios filosóficos que regiam a
educação catarinense. Ao lado da esperada modernização do ensino, nas semanas procedeu-se
também a campanha de nacionalização, na qual a ação da liga pró-língua nacional viria a
desempenhar importante papel no cotidiano escolar.
Os conceitos-chave presentes nesses eventos eram “escola ativa” e “centros de
interesse”. Embora estes não apareçam, nas análises da documentação empreendidas pela
autora, como associações auxiliares da escola, são considerados mecanismos de organização
do ensino, digamos assim, sua primeira natureza. A metodologia de sua constituição atraiu a
atenção e preferência dos professores (BOMBASSARO, 2006, p. 108).
O objetivo das semanas era difundir as “[...] teses do pensamento pedagógico nacional
entre o corpo docente” (BOMBASSARO, 2006, p. 49). Para tanto, realizaram-se no período
de 1936 a 1945 nove eventos, sediados em seis cidades diferentes; destes, sete concentraram-
se no primeiro ano.
A hipótese de influência exercida pelas semanas na propagação do número de
associações é, de algum modo, confirmada pelo estudo de Bombassaro (2006). Segundo a
autora, um dos elementos enfatizados durante elas eram as associações escolares. Na listagem
das temáticas presentes nas semanas elaborada pela autora, por ordem de importância, os
clubes agrícolas ocupam a quarta posição, os jornais, a sétima e as bibliotecas, a oitava,
estando a língua vernácula na segunda posição, o que justifica a importância atribuída
também à liga pró-língua nacional, embora não esteja inclusa no conteúdo da Revista de
Educação e nos relatórios de Areão.
100
Conforme Anuário estatístico do Brasil 1937, v. 3, Rio de Janeiro: IBGE, 1937. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/seculoxx/arquivos_xls/educacao.shtm>. Acesso em: 28 maio 2012.
| 112
João dos Santos Areão101
, inspetor federal das Escolas Subvencionadas e
Nacionalização do Ensino no período, corrobora com a constatação ao mencionar em seu
relatório:
Que temos colhido resultado dêsse trabalho [das Semanas Educativas], não se pode
negar. Os dados estão a ressaltar os benefícios que vimos prestando com as semanas
educativas. Temos, conforme já narrei, 157 jornais escolares, 44 clubes agrícolas,
mais de 100 bibliotécas, muitos museus em perspectiva, caixas escolares em todos
os grupos escolares e algumas escolas rurais, enfim, uma porção de organizações
escolares que vem, não só dar novas diretrizes aos trabalhos, como contribuir para a
melhor aparelhagem da nova geração (AREÃO, 1937, p. 3, grifo meu).
Nota-se, neste excerto, a menção a organizações escolares. Mais adiante, no mesmo
relatório, o inspetor refere-se às associações escolares organizadas em Araranguá. Em
relatório do ano de 1936, ao apresentar a Semana Educativa de Brusque, Areão pontua como
assunto das palestras as organizações sociais escolares, mencionando mais a frente a
importância das associações infantis. Esta mudança no modo de referenciar esta modalidade
distinta de educação é um possível indício de que o termo associações auxiliares ainda não
estivesse consolidado no repertório discursivo dos agentes educativos102
. Após a realização
das semanas, era comum a prática de inspeção nas escolas do município onde ocorrera o
evento, a fim de verificar os resultados alcançados pelos professores na adoção de novas
práticas.
Eram consideradas organizações ou associações os jornais, clubes agrícolas, caixas
escolares e bibliotecas. Nas palavras do inspetor:
O cooperativismo escolar tem um profundo efeito educativo, pois fazemos com que
as crianças conjuguem os seus esforços para o bem comum. A jardinagem da escola,
o enfeite da sala, o museu, as bibliotécas, o jornal, são organizações que exigem a
cooparticipação dos alunos (AREÃO, 1936, p. 18).
De acordo com Areão, já tinham sido realizados dois anos de campanha em prol das
associações escolares. No quadro 6, visualizam-se os dados extraídos de Anuários Estatísticos
101
Areão era paulista de Taubaté e afilhado de Orestes Guimarães. Chegou a Santa Catarina em 1912 para
lecionar, a convite de seu padrinho, assim que terminou seu Curso Normal. Atuou logo em seguida da sua
chegada como diretor do GE Jerônimo Coelho (Laguna), função desempenhada por 15 anos. Em 1933,
assumiu a Inspetoria de Nacionalização, cargo ocupado até 1931 por Guimarães, quando do seu falecimento
(FIORI, 1991, p. 141). 102
Após uma consulta aos seis exemplares da Revista de Educação disponíveis na Biblioteca Pública do Estado
de Santa Catarina, conclui-se que, ao menos nos discursos registrados neste veículo de comunicação, o termo
“associações auxiliares da escola”, e mesmo “associações escolares”, ainda não era empregado. A menção
frequente a clubes agrícolas e caixas escolares, e em menor número a bibliotecas, revela uma aproximação
aos princípios da Escola Nova, sem, contudo, agrupá-los num corpo de instituições intraescolares.
| 113
do IBGE, com relação à quantidade de instituições intra e periescolares, tanto para Santa
Catarina, quanto para Brasil, entre os anos 1932 e 1937.
Quadro 6 – Estabelecimentos de ensino primário que possuíam instituições escolares segundo o IBGE
SANTA CATARINA
Instituições Total por ano
Fonte 1932 1933 1934 1935 1936 1937
Intr
a-e
sco
lare
s
Auditório - - - - - - Anuário
estatístico do
Brasil 1937, v. 3,
Rio de Janeiro:
IBGE, 1937.
&
Anuário
estatístico do
Brasil
1939/1940, v. 5,
Rio de Janeiro:
IBGE, 1941.
Clubes de leitura 2 2 6 6 6 3
Clubes desportivos - 1 - - - -
Ligas de bondade Não consta na estatística por estado.
Pelotões de saúde - - - - - 1
Organizações de
escotismo 2 7 3 3 3 3
Outras 25 30 30 30 30 478
Per
i-es
cola
res Associações de pais
e professores - - - - - -
Caixas escolares 1 75 98 108* 141** 154***
Conselhos escolares 76 88 77 71 71 13
Fundos escolares 18 12 10 13 13 5
Outras - - - - - -
* De acordo com dados presentes em relatório do governo de Nereu Ramos, em 1935 havia 34 caixas
escolares no estado (SANTA CATARINA, 1938c, p. 33).
** Em 1936 havia 57 (SANTA CATARINA, 1938c, p. 33).
*** Em 1937 havia 65 (SANTA CATARINA, 1938c, p. 33).
BRASIL
Instituições Total por ano
Fonte 1932 1933 1934 1935 1936 1937
Intr
a-e
sco
lare
s
Auditório 39 308 650 642 748 950 Anuário
estatístico do
Brasil 1938, v. 4,
Rio de Janeiro:
IBGE, 1939.
&
Anuário
estatístico do
Brasil
1939/1940, v. 5,
Rio de Janeiro:
IBGE, 1941.
Clubes de leitura 279 398 730 751 793 970
Clubes desportivos 108 109 152 137 259 286
Ligas de bondade 77 105 141 246 321 437
Organizações de
escotismo 130 177 230 277 323 347
Outras 259 590 311 1.037 2.591 3.435
Pelotões de saúde 171 222 310 338 410 477
Per
i-es
cola
res Associações de pais
e professores 509 609 535 524 540 627
Caixas escolares 1.290 1.295 1.652 1.814 2.248 2.347
Conselhos escolares 222 173 198 209 288 355
Fundos escolares 49 80 195 82 161 228
Outras 394 180 176 202 1.546 2.011
Fonte: elaboração da autora a partir dos dados disponíveis em:
<http://www.ibge.gov.br/seculoxx/arquivos_xls/educacao.shtm>.
Chama a atenção em Santa Catarina a quantidade elevada de instituições intra-
escolares no ano de 1937 declaradas como “outras”, ou seja, que não eram contempladas pela
listagem proposta pelo inquérito. Além disso, nota-se um decréscimo constante dos conselhos
escolares.
| 114
É evidente uma maior presença da caixa escolar a partir de 1933, o que pode se
explicar por sua existência remota, desde 1916, e pela obrigatoriedade à qual ela estava sujeita
a partir de 1938. Neste período, têm-se ainda uma repressão significativa da iniciativa privada
e uma intenção de substituir qualquer unidade escolar por uma escola pública. Contudo,
justificava-se que os recursos mobilizados pelo governo não eram suficientes; portanto, lançar
mão da caixa escolar seria algo engenhoso.
A divergência dos valores apresentados pelo inquérito do IBGE e pelo relatório de
Nereu Ramos é uma questão interessante da pesquisa, a qual não foi aqui contemplada por
não se tratar do objetivo do trabalho, contudo, considerou-se indispensável pelo menos sua
menção.
Em todo caso, os dados disponíveis sugerem que a instituição da obrigatoriedade de
criação da caixa escolar no ano de 1938 foi um mecanismo eficiente. Se, em 1937, havia 65
caixas escolares, conforme dados do relatório de Nereu Ramos (asterisco 3 do quadro 6), em
1938 já serão 757, conforme quadro 7. Se também se considerar a quantidade apontada pelo
IBGE de 154 caixas em 1937 para 757 em 1938, confirmar-se-á um aumento significativo.
É interessante observar no quadro 6 a ausência da liga pró-língua nacional. Seria isto
consequência de uma especificidade das áreas de imigração localizadas na Região Sul do
País?
Abaixo, no quadro 7, visualiza-se a sistematização dos dados presentes em relatórios
catarinenses durante o governo de Nereu Ramos, referente às instituições escolares, também
chamadas pelos relatórios de associações ou organizações escolares. As células marcadas com
um “x” indicam que a associação não figurou na listagem daquele ano; as que contêm um
“hífen”, assim estavam no original, o que representa o valor zero.
Relembre-se que o quadro 5 apresenta o museu como um componente do
aparelhamento escolar, enquanto o quadro 7 informa sobre outro lugar assumido por esse
“aparato pedagógico”, agora como instituição escolar.
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Quadro 7 – Estabelecimentos de ensino primário que possuíam instituições escolares em Santa Catarina103
Instituições escolares 1938 1939 1940 1941 1942
Associações de pais e professores* – 22 108 281 235
Bibliotecas** 330 325 420 723 530
Caixas escolares 757 1.139 1.040 1.672 1.231
Clubes agrícolas*** 143 209 301 606 624
Clubes de leitura 19 17 18 152 180
Clubes desportivos – 23 32 40 x
Conselhos escolares 11 24 7 76 x
Cooperativa x x x x 80
Jornais 79 127 91 432 539
Liga Pró-Língua Nacional x x x x 829
Ligas de bondade 3 16 23 229 261
Museus 71 36 169 397 205
Orfeão x x x x 40
Pelotões de saúde 13 17 64 741 808
Sopa Escolar x x x x 33
Total 1.426 1.955 2.273 5.349 5.595
* A partir de 1941, a nomenclatura muda para “Círculo de pais e professores”.
** De 1938 a 1941, é tabulada em separado a quantidade de bibliotecas para alunos e professores,
divisão extinta em 1942. Para efeito de apresentação dos dados foram somadas as duas
quantidades.
*** De acordo com relatório da Inspetoria Federal, em 1935 havia 21 clubes; em 1936, eram 44 e
em 1937, já eram 124 (AREÃO, 1938, p. 20).
Fonte: elaboração da autora a partir dos dados disponíveis em: (SANTA CATARINA, 1942d, p. 59);
(SANTA CATARINA, 1943d, p. 67).
Os dados a respeito das cooperativas e caixas escolares se encontram em tabelas
separadas, nas quais há o registro dos municípios onde estavam organizadas e do seu capital
financeiro. De acordo com o documento, havia 18 cooperativas durante o ano de 1941 no
estado (SANTA CATARINA, 1942d, p. 59).
Embora a quantidade de ligas pró-língua nacional não apareça nos anos anteriores a
1942, elas existiam em escolas catarinenses pelo menos desde 1938. Segundo Monteiro
(1983, p. 101), neste ano havia em funcionamento oito ligas em todo o estado; em 1939, o
número aumentou para 68 e em 1940, para 123.
De acordo com Zen (2007), em 1938 havia 1.910 estabelecimentos104
de ensino
primário em Santa Catarina, passando para 2.337 em 1942, registrando-se um crescimento de
103
O acesso aos presentes dados ocorreu por intermédio do trabalho de Zen (2007), que apresenta os números de
1938 e 1942. Preferiu-se aqui sistematizar os dados de todos os anos contidos nos relatórios anuais de
governo. 104
A autora utilizou os dados disponíveis nos relatórios apresentados por Nereu Ramos. Vale ressaltar que os
números mencionados em cada estudo não são fidedignos, pois, variam de acordo com a fonte de onde foram
extraídos. Por exemplo, a quantidade citada pelos relatórios de Nereu Ramos difere do número de
estabelecimentos de ensino primário divulgados pelos anuários estatísticos do IBGE; contudo, as diferenças
não são significativas.
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20%. Em relação às associações, analisando os dados acima descritos, a autora constata que
houve crescimento de quase 300%, pois, passou-se de 1.426 associações, no total, para 5.595,
o que a fez concluir que as escolas ampliaram seu quadro de associações. A comparação entre
os três quadros (5, 6 e 7) permite supor que até 1937 os museus eram considerados como
parte da estrutura material da escola, adquirindo status de associação escolar para o poder
estadual a partir de 1938.
De todo modo, importa menos precisar a data que institui essa nomenclatura na
legislação educacional catarinense, do que perceber que a década de 1930 oferece nova
roupagem a elementos da estrutura da escola, também encontrados em momentos anteriores.
Resta descobrir se, vestindo esse novo traje, o museu passaria por uma renovação e adquiriria
outro sentido.
3.2 LEGISLAR, COMUNICAR E FISCALIZAR: IMPERATIVOS DE
HOMOGENEIZAÇÃO
Na sequência, buscamos destacar a recepção das escolas no tocante às orientações
prescritas pelo DE quanto à criação e manutenção de associações auxiliares. Procuramos
cruzar esses dois olhares a partir de três tipos de documentos principais, a saber: circulares
que contêm o que o DE considerava importante enviar às escolas, sobretudo às que
informavam sobre o funcionamento prático das associações, com orientações do que deveria
ou não ser realizado. Do conjunto de circulares consultadas e daquelas apresentadas
anteriormente, as que se seguem têm um tom de correção ou de lapidação das funções das
associações.
São também utilizados comunicados, elaborados por professores, acerca da
importância das associações, os quais compunham as discussões das reuniões pedagógicas e,
em alguns casos, eram anexados às atas. Por fim, mas não necessariamente nesta ordem,
foram pinçados alguns pontos de atas de reuniões pedagógicas quando estas trataram das
associações e quando o seu relato deixa entrever algumas práticas. Mesmo nos casos em que
as atas não discorrem muito sobre os feitos das associações, a incorporação deste assunto na
pauta demonstra a evidência do tema no período.
Em princípio, vale ressaltar uma circularidade de pensamento na documentação em
tela. Conforme mencionado anteriormente, alguns documentos acabam se transformando em
desdobramento de outros e dando continuidade aos mesmos objetivos, com escrita muito
próxima. No caso das circulares, vê-se de fato uma réplica do mesmo princípio em vários
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números, em diferentes anos. Isto evidencia, de algum modo, a busca de um ideal de
concretização das funções e atividades das associações que ainda não havia sido conquistado.
A Circular n. 2, de 2 de janeiro de 1942, inicia uma série de circulares que irão
publicizar o projeto defendido pelo DE em relação à realização das atividades nas
associações, tomando de empréstimo as observações efetuadas por inspetores escolares e
diretores de escolas em seus relatórios anuais. Esta circular registra um comentário do
inspetor escolar Germano Wangenführ. De acordo com ele, as associações periescolares
tiveram bom funcionamento em alguns grupos escolares; todavia, outros não compreenderam
sua finalidade; por essa razão, exigiu que os alunos realizassem os serviços, e que os
professores apenas os orientassem, auxiliando em um ou outro caso de desconhecimento.
Na opinião do inspetor, mais alunos deveriam participar das diretorias das associações,
a fim de aprender o funcionamento de uma sociedade em miniatura, por meio da compreensão
dos deveres de um diretor, pela elaboração de atas e presidência de uma reunião (SANTA
CATARINA, 1942a); ou seja, pelas atividades com fins burocráticos que cabiam às
associações. Além destes aspectos, o inspetor registra como finalidades das associações “[...]
fazer os educandos compreenderem a necessidade do espírito de cooperação, de amor ao
próximo, assistência mútua, do desenvolvimento intelectual e finalmente a cooperação dos
alunos na nacionalização de si próprios, seus colegas e em sua própria família” (SANTA
CATARINA, 1942a, p. 4). Estas observações do inspetor Germano Wangenführ serão
transcritas novamente em Circular de 1943 (n. 76) e em Decreto do ano de 1945 (n. 3.090).
Além disso, seus princípios eram difundidos nas reuniões que presidia; exemplo disso
é a reunião realizada em outubro de 1944, no GE Corrêa Pinto, no município de Lages, cuja
ata perfaz um total de sete páginas. Em relação às associações escolares, o documento
registra:
[...] O sr. Inspetor deu algumas orientações dizendo que tudo valerá, embora mal
feito, desde que seja do aluno e nada si o professor fizer. O dirigente de uma
associação prepara-se para a vida social futura e a finalidade das associações é
aprimorar-lhes essa capacidade, ensinando os afazeres da sociedade. Nas reuniões, o
professor apenas orienta discretamente, deixando tudo a cargo dos alunos. Além
disso, as associações visam sempre um fim especial: moral, educativo, etc. O
professor deve orientar os alunos para atingir esse fim. Cada associação deverá
apresentar seu relatório, trabalho da diretoria, que poderá ser corrigido pelo
professor orientador. O maior número possível de alunos deverá fazer parte da
diretoria (ARQUIVO..., 1944a, p. 241).
A Circular n. 131, de 26 de dezembro do mesmo ano, também apresenta observações
de um inspetor escolar, não identificado. Este inspetor informa que encontrou em alguns
| 118
grupos escolares interessante trabalho realizado pelas associações; contudo, estes eram
executados totalmente pelos professores, ou eram demasiado corrigidos e reformados, não
aparecendo marcas do trabalho infantil. De acordo com o inspetor, isso ocorria pela
compreensão, por parte dos professores, de que o trabalho deveria ser perfeito; contudo,
salienta que valeria mais um trabalho com imperfeições desde que fosse realizado pelo aluno
(SANTA CATARINA, 1942c). Parte das reflexões desta circular será incorporada em 1943
(Circular n. 76).
A partir destas duas circulares é possível perceber algumas características de
apropriação efetuada pelas escolas. A realização das atividades por parte dos professores não
demonstra apenas uma necessidade de mostrar um belo trabalho, mas também estratégias para
a realização de funções que consideravam complexas para serem executadas pelas crianças.
Neste sentido, dão conta de cumprir com o que era determinado pelo DE e procuravam
efetuá-lo da melhor maneira possível, nem que isso significasse realizar o trabalho pelos
alunos. Pode indicar ainda, conforme apontam os inspetores, a falta de compreensão das
finalidades de tal atividade escolar.
Seguindo a tônica das anteriores, a Circular n. 76, de 16 de agosto de 1943 representa
de algum modo a conjunção do pensamento que o DE procurava incutir nas escolas. Após
transcrever a Circular n. 2 de 1942, o DE apresenta uma resposta às queixas dos professores
de que as associações lhes têm custado muito trabalho, tendo verificado o seguinte:
1) que as associações auxiliares da escola vêm, na sua mór parte, sendo dirigidas e
executadas, em tudo e por tudo, pelo professor; 2) que a colaboração dos alunos
tem sido nula; 3) que o professor executa todo o serviço, aparecendo sòmente o
aluno, ‘in nomine’; 4) que há jornal escolar feito exclusivamente pelo professor
(redação, etc. e até a feitura (escrever) do jornal); 5) que os recortes para os albuns
são feitos pelo professor; 6) que o colar os recortes nos albuns também é feito pelo
professor, e assim por diante. Tudo é feito pelo professor e o aluno assina, como se
fosse seu trabalho. O Departamento de Educação conhece os seguintes argumentos
de professores para justificarem êsse modo de ação: 1) que os alunos podem não
recortar bem as gravuras; 2) que os alunos podem, no colar os recortes, sujar o
album; 3) que o jornal pode ficar deficientemente redigido; 4) que, ao passar, as
notícias e artigos para o jornal, o aluno pode copiar mal, má letra e máu desenho, e
além da diversidade de letra (três ou quatro alunos, escrevendo no jornal, prejudica-
se a estética do jornal) (SANTA CATARINA, 1943c, p. 71-72).
A circular segue mencionando que o professor realiza o trabalho que deveria ser feito
por até 20 alunos. O texto é enfático ao dizer que se deseja o trabalho do aluno, seja mal
traçado, mal recortado ou sujo de goma, para que se possa ver a evolução dos trabalhos.
Esta circular dá pistas de vários elementos da prática, entre eles, do modo como as
atividades vinham sendo desenvolvidas, deixando nos registros apenas a marca do professor.
| 119
Isto serve, de algum modo, de aviso à leitura que será feita dos documentos produzidos pelas
associações. Por outro lado, informa que a elaboração dos registros era realizada já em 1943,
provavelmente até mesmo em 1942.
A Circular n. 42, de 1944, divulga o Decreto nº 2.991, com as orientações sobre as
associações. Na ata da reunião realizada no GE Rui Barbosa, Joinville, em agosto de 1944
consta:
O Snr. Inspetor tendo em vista a falta por parte do professorado de instruções que
regulassem as ‘instituições escolares’ uniformisando-as, aproveitou a ocasião para
sanar essa dificuldade distribuindo entre os interessados cópias da circular nº 42 de
10/5/44 que regula essas instituições (ARQUIVO..., 1944a, p. 266).
A Circular n. 74, de 18 de dezembro de 1944, e a de n. 75, de 26 de dezembro do
mesmo ano, apresentam tópicos dos relatórios anuais de diretores dos grupos escolares do ano
de 1944. Encontra-se, nestes, a temática associação auxiliar da escola. Pela observação apenas
dos tópicos referentes às associações, nota-se um duplo movimento; da escola, registrando
que cumpriu as orientações do DE, mesmo que não diretamente, mas mostrando na prática
assuntos veiculados anteriormente em outras circulares; do DE, em selecionar este tipo de
trecho de relatório para socializar, no intuito de reforçar as orientações anteriores.
A Circular n. 74 apresenta dois tópicos sobre as associações. No primeiro, há o relato
de um grupo escolar que, entre as atividades anuais, criou uma nova associação, denominada
Diretoria da Fiscalização das Associações Escolares, a fim de orientar os trabalhos das
demais. Segundo o trecho do relatório, esta diretoria fez com que os alunos trabalhassem
sozinhos; portanto, “a mão do professor foi sendo desviada” (SANTA CATARINA, 1944a).
É interessante que a escola parece ter internalizado essa prática “inspecionante”, criando
dentro dela agências promotoras da inspeção. No segundo, exalta-se a importância das
associações, registrando que “as instruções do Departamento de Educação foram seguidas à
risca” (SANTA CATARINA, 1944a, p. 221). Entre os objetivos que as crianças alcançaram,
estão: habituar-se às normas de cooperação, tolerância, auxílio mútuo, direção e
administração.
Por sua vez, a Circular n. 75 apresenta um tópico intitulado “interesse pelas
associações auxiliares da escola”, no qual relata o alcance das finalidades destas em
determinado grupo escolar. Num tom narrativo e poético, conta situações de envolvimento
dos alunos em cada uma das associações, a movimentação que se instalou na escola, tendo
| 120
conseguido resultados como: iniciativa, cooperação e senso de responsabilidade (SANTA
CATARINA, 1944b).
O Decreto nº 3.090, de 31 de janeiro de 1945, fornece instruções para a reunião dos
inspetores escolares e diretores de grupos escolares. O assunto número nove diz respeito às
associações e caracteriza-se por ser um compilado de circulares anteriores. Este texto
apresenta três depoimentos. O primeiro é a transcrição da Circular n. 2, de 1942; o terceiro, da
Circular n. 76, de 1943; “inédito” é o segundo depoimento, que, na mesma tônica dos demais,
frisa a importância de os alunos dirigirem as associações, sendo o lema do DE prepará-los
“para a vida e pela vida” (SANTA CATARINA, 1945).
Estes depoimentos lembram que os professores devem apenas acompanhar os
trabalhos dos alunos e não realizá-los por si sós, pois as associações ensinam para a vida
futura, em uma sociedade em miniatura. Para que os alunos desempenhem as funções, os
professores precisam depositar nas crianças a confiança necessária e deixar que administrem o
dinheiro das cooperativas, por exemplo. Além disso, ressaltam que os mestres não devem
intervir e corrigir tudo o que os alunos fazem, pois, desse modo, descaracterizam a produção
infantil. Enfatiza-se, mais uma vez, que o importante é que o trabalho seja do aluno, embora
cheio de imperfeições.
Pela leitura inicial das circulares, nota-se alguma sintonia entre as solicitações do DE e
aquelas feitas pelos diretores ou inspetores para os professores, bem como se observa um
esforço por parte das escolas em corresponder às expectativas depositadas nas associações
como um meio eficaz de educação. As circulares podem ser vistas ainda como tentativas de
padronização das atividades, funcionando como lembretes do que estava determinado em
“lei” e nos princípios do DE, com a divulgação de boas iniciativas.
Conforme pontuado por intelectuais do período, como Anísio Teixeira e João Roberto
Moreira, Fiori (1991) lembra que esse período da história da educação representa um excesso
de formalismo e centralização, mas não só. O envio de circulares valoriza a comunicação
entre os dirigentes da educação e os professores, por meio da expressão de uma “[...] linha de
ação pedagógica e administrativa” (FIORI, 1991, p. 127), que serviria como fonte de
ensinamento. Apoiada em Moreira (1954), Fiori (1991) ressalta ainda que, em 1940, dois
terços dos professores catarinenses não tinham formação pedagógica especializada, o que, na
visão da autora, justifica, de certa forma, o rigor formal do DE, visto como ponto de apoio do
professorado. Por outro lado, esse formalismo ia de encontro aos princípios da Escola Nova,
então desejada (FIORI, 1991, p. 132).
| 121
Já na visão de Melo (1955), as instruções do DE não foram tão rígidas, e
corresponderam ao que era possível naquele momento, com o intuito de migrar de uma escola
intelectualista para uma escola renovada. “É na adoção de práticas como as propugnadas pelas
associações auxiliares da escola que se localiza o ponto nevrálgico da transformação da escola
intelectualista em escola ativa ou funcional” (MELO, 1955, p. 19).
“E, realmente, não foram tão rígidas e severas estas instruções, como afirma o Prof. J.
Roberto Moreira. Foram, sim, e inúmeras vezes, como ainda o são, incompreendidas por
grande parte do professorado, que não apreendeu seu verdadeiro sentido e profundo alcance”
(MELO, 1955, p. 18). Na visão deste intelectual, o DE “agiu com muito acêrto, apontando
caminhos capazes de alcançar excelentes resultados, dentro das normas de uma sã pedagogia”
(MELO, 1955, p. 23).
Consideramos que a exploração deste material contribui para compreendermos como
as associações eram recebidas no ambiente escolar. As atas, principalmente, fornecem dados
que nos possibilitam estabelecer um contraponto entre o que era instituído pelo DE e o que
ocorria na prática das escolas, se é que havia distância entre essas duas instâncias. Há que se
lembrar que esses documentos eram lidos pelos técnicos do DE e, possivelmente, passavam
por uma triagem no momento de ser arquivados.
Foram consultados quatro volumes que continham atas de reuniões pedagógicas, de
1941, 1944, 1948 e 1952. Do ano de 1941, algumas atas se limitaram a indicar a presença de
associações auxiliares e dois comunicados versaram sobre o assunto. Portanto, as
considerações abaixo se referem àquelas dos anos 1944, 1948 e 1952. É interessante notar que
em 1941 a temática das associações nas reuniões é ainda bastante tímida, crescendo
vertiginosamente a partir de 1944.
As reuniões pedagógicas realizavam-se todo mês, sendo dirigidas, no caso dos grupos
escolares, pelo diretor, e pelo inspetor escolar, no caso das escolas isoladas. Nestas escolas, as
professoras reuniam-se três vezes ao ano, quando o inspetor escolar se fazia presente para a
realização da reunião e, se por alguma razão impedido, esta era realizada pelo auxiliar de
inspeção. Era costume no início da sessão a leitura e aprovação da ata anterior, passando-se
em seguida à “ventilação” – termo recorrente nos registros – dos assuntos para discussão. Era
comum a leitura das circulares enviadas pelo DE e o fornecimento de instruções aos
professores sobre a elaboração de relatórios, preenchimento dos mapas mensais, entre outras
atividades de caráter burocrático.
Entre os assuntos ventilados, era praxe apresentar um ou dois planos de aula por
reunião, bem como comunicados. Em algumas atas aparece também a modalidade “palestra”.
| 122
Após a apresentação, era feita a aprovação ou reprovação dos temas propostos, sendo pouco
recorrente a reprovação. Entretanto, isto não era motivo para evitar a crítica por parte da
direção. Os planos apresentados nas reuniões em geral haviam sido postos em prática ou o
seriam mediante a presença do diretor, que fazia anotações ao final do plano de aula,
relacionando o proposto com o desenvolvido; tal parecer era conhecido como “crítica”. Com
exceção do volume de 1941, os demais não possuem anexados os planos de aula e
comunicados, limitando-se o leitor a compreendê-los pelo relato da própria ata, que muitas
vezes se restringia a dizer o assunto destes.
Após essa leitura inicial, eram designados os professores responsáveis pela sua
execução na reunião seguinte. Raramente a temática era previamente definida, ficando a cargo
do próprio professor. Depois deste ritual, igual em todas as escolas, passava-se à discussão de
pontos específicos do cotidiano da instituição, tais como disciplina, uso de uniforme,
avaliação e questões de conteúdo. Neste momento, discutia-se a respeito das associações
auxiliares. Os professores podiam expor dúvidas, bem como relatar o desenvolvimento das
atividades. Mas, em geral, o assunto girava em torno da confecção das atas e relatórios, do
cumprimento dos prazos e da necessidade de execução das atividades pelos alunos.
A realização sistemática de reuniões pedagógicas é uma das lembranças dos
professores aposentados, cujos relatos integram o livro “Memória Docente: histórias de
professores catarinenses (1890-1950)” (GASPAR DA SILVA; SCHÜEROFF, 2010). Do
conjunto de 23 entrevistas transcritas em forma de narrativa no livro, em seis delas os
professores mencionaram a realização de reuniões pedagógicas, quando também lembraram
da figura do inspetor. Foi escolhida, como exemplo, a fala da professora Ada Bicocchi
Ramos:
[...] Os inspetores eram formidáveis. Eles vinham, orientavam, ensinavam e faziam
reuniões pedagógicas. Todo mês tinha reunião pedagógica de todos os professores
com o diretor. Quando tinha inspetor no estabelecimento, ele fazia a reunião
pedagógica. Então, cada professor era determinado para fazer um plano para a outra
reunião seguinte. Um professor era designado para fazer um plano de aula ou um
comunicado, e apresentava. Os outros professores na sala de aula iam aproveitar
aquele plano que a gente fez e o comunicado. Na reunião pedagógica o diretor ou
um professor conversava com os professores e perguntava o que eles achavam disto,
daquilo, o que eles achavam melhor para produzir, qual era o assunto melhor para
discutir com os alunos dentro da sala de aula. Orientava como deveria ser feito o
trabalho com os alunos e entre os professores mesmo. Cada um dava uma opinião
para ver qual era a melhor opção para ser aplicada dentro da sala de aula. Cada um
ia fazendo o que tinha pensado e na próxima reunião expunha o que tinha de certo;
assim a gente ia passando, e se dedicando, dedicando... (RAMOS, 1994. In:
GASPAR DA SILVA; SCHÜEROFF, 2010, p. 67).
| 123
Este excerto, ao contrário do observado nas atas, descreve o momento da reunião
como um espaço de troca entre os profissionais, os quais, na memória desta professora,
tinham liberdade de expor a própria opinião. O contraponto entre diferentes registros do
passado é interessante, pois evidencia aspectos particulares. Neste caso, a fala da professora
nos mostra uma dimensão que escapa a outras formas de registro.
A presença da temática “associações” nas atas das reuniões não é sem propósito. O
artigo 35 do Regulamento de Inspeção de 1946 recomendava ao inspetor escolar que fosse
“ventilado” nas reuniões de professores entre outros temas, o das associações auxiliares da
escola (SANTA CATARINA, 1946c).
Nas primeiras reuniões anuais, era realizada a distribuição das associações entre os
professores, que ficariam responsáveis pelo seu desenvolvimento durante aquele ano. Em
algumas escolas, até dois professores cuidavam de uma associação, enquanto em outras um
apenas poderia se responsabilizar por até duas, por força de um quadro de professores menor
ou pela necessidade de afirmação da escola, pondo em prática todas as associações possíveis.
Exemplo disso é a ER Professor Cleto da Silva, de Tubarão. No ano de 1952, cada
professora ficou encarregada de duas associações, totalizando oito. A distribuição obedeceu à
seguinte lógica: liga da bondade e biblioteca; pelotão de saúde e museu; clube agrícola e liga
pró-língua nacional; círculo de pais e professores e caixa escolar. Já na ER Tenente Almachio
de Caiacanga Mirim, em Florianópolis, a professora responsável pela biblioteca também se
encarregou do museu. Por sua vez, o GE Henrique Lage, de Laguna, adotou outro critério de
organização; enquanto oito associações ficaram a cargo de dois professores cada, o museu
ficou sob responsabilidade de uma professora, com a cooperação das demais (ARQUIVO...,
1952).
Salvo determinadas particularidades, o andamento das reuniões seguia o padrão
estabelecido pelo DE e explicitado nos Regulamentos de 1946. O que irá se destacar
sobremaneira nesses escritos é o modo de registro do ocorrido; dito de outro modo, a maior
ou menor descrição ou transcrição das falas dos sujeitos presentes nas reuniões. Algumas atas
limitam-se a pontuar, em ordem numérica, os temas debatidos; outras fazem um breve resumo
do que foi discutido, estando em menor número as que quase transcrevem a fala do diretor ou
inspetor, o que ocorre com mais frequência quando estes fazem uma longa exposição sobre
um único assunto. Portanto, a apreensão dos pontos conflitantes, em caso de existência, é
praticamente impossível, fornecendo a documentação, em seu conjunto, um quadro bastante
estável de aceitação da ordem imposta.
| 124
No Regulamento do ensino primário de 1946, são congregadas recomendações para a
realização das reuniões pedagógicas (título VII) e confecção das atas (título II, X -
escrituração, capítulo XVII). As reuniões nos grupos escolares seriam realizadas no segundo
sábado de cada mês, com exceção de julho, quando seria realizada no primeiro. Nas escolas
isoladas, as três reuniões anuais distribuíam-se entre o início do ano, após as férias de inverno
e antes dos exames finais, nos dias de recebimento dos vencimentos. As reuniões não
deveriam ter tempo inferior a uma hora, nem superior a duas.
Quando os professores não se manifestassem espontaneamente para apresentação de
trabalho, cabia ao presidente da sessão, no caso, diretor ou inspetor, o sorteio, a votação ou
designação de um professor para assumir a tarefa. Aos membros das reuniões, portanto, aos
professores, cabia, além de estudo das temáticas a serem discutidas e da apresentação de uma
palestra, aula, demonstração, plano de aula, comunicado ou conferência, “prestigiar as
reuniões, não tomando atitude opiniática ou de reserva intencional de não cooperação”
(SANTA CATARINA, 1946b, p. 120). As reuniões deveriam ter uma natureza prática e,
“sempre que possível, as reuniões deverão ter o caráter de ‘Círculos de estudos’ ou de ‘grupos
de discussão’” (SANTA CATARINA, 1946b, p. 121). Elas deveriam conter duas partes: a
primeira, composta por assuntos gerais e a segunda, por temas pedagógicos. As questões
administrativas deveriam ser tratadas, no caso dos grupos escolares, em reuniões parciais
(SANTA CATARINA, 1946b). De modo geral, as atas explicitam uma grande ocupação do
tempo com questões de ordem administrativa e/ou burocrática, sendo menores os registros
referentes aos aspectos pedagógicos.
Eram considerados assuntos de interesse social e administrativo:
comunicados sobre realizações de outras escolas [eventos];
relato de atividades extraclasse [notadamente das associações escolares];
leitura de circulares e comunicados [referentes a frequência, escrituração, etc.];
Entre os assuntos de interesse geral e pedagógico, estavam:
disciplinas/conteúdos escolares [leitura, geografia, higiene, música, etc.];
disciplina escolar;
estatística escolar;
associações auxiliares da escola;
festas escolares;
excursões, etc. (SANTA CATARINA, 1946b, p. 121).
| 125
Enquanto as reuniões deveriam seguir este padrão, o registro em ata também era
precedido de instruções. Numa espécie de formulário que deveria ser preenchido, era
recomendada a listagem dos assuntos por numerais e o resumo dos comentários suscitados.
Após essa apresentação de como corriam as reuniões, passaremos ao conteúdo das
atas, que informam sobre as associações. Vale lembrar que não foram incorporados dados de
todas as atas dos três anos contemplados. Fez-se uma seleção de aspectos comuns e
divergentes.
Um primeiro ponto a ser observado é a necessidade de validação da existência de
associações no cotidiano escolar, além da insistência, por parte dos diretores para com os
professores, de sua importância. Registra-se a necessidade de fazer os alunos compreenderem
a finalidade das associações. Isso é muito comum nas atas específicas dos museus, quando, no
início de cada ano letivo e no decorrer do ano, a professora encarregada frisava a importância
e função que o museu desempenharia na escola. Mas esse assunto será tratado mais adiante.
Na reunião do mês de março de 1944 do GE Lauro Müller, da capital do estado:
[...] a sra Diretora pediu às professoras que diariamente dissessem aos alunos das
finalidades das diversas instituições escolares, recomendando que se falasse, em
cada aula, em uma apenas. A Biblioteca Escolar, ora em reorganização será a
primeira a ser tratada. Explicando as finalidades da instituição em apreço deverá, a
docente, falar do cuidado e asseio que merecem os livros (ARQUIVO..., 1944a, p.
64).
De algum modo, essa passagem informa sobre o esforço empreendido por parte dos
professores para que as crianças, e eles próprios, compreendessem a importância desta
modalidade diferenciada de ensino e aprendizagem, tão bradada pelo DE. Embora
reconhecido o benefício que as associações trariam, é notável certa dificuldade do corpo
docente em integrá-las ao currículo já consolidado. Embora a nomenclatura “associações
auxiliares” dê a impressão de se tratar de um organismo acessório/adicional e não
propriamente componente da escola, o diretor do GE Santo Antônio, de Ituporanga, em
reunião do mês de agosto de 1944:
Fez ver que o professor deve saber enquadrar esses trabalhos [das associações] no
programa e que de modo algum constitue uma disciplina à parte, pois as
Associações facilitam o desenvolvimento de todas as demais disciplinas,
proporcionando aos alunos todos os conhecimentos que precisarão na vida pratica
(ARQUIVO..., 1944a, p. 9).
| 126
Para Melo (1955, p. 35), “[...] as associações devem ser a vida mesmo da escola e não
organismos dentro da escola”. Ao levantar explicações sobre a pouca eficácia das associações
em algumas escolas, detém-se na consideração por parte dos professores de que as
associações são organizações à margem do trabalho cotidiano, que conflitam com o programa
de ensino.
Queixa-se o professor da falta de assuntos vitais para dar às suas aulas um cunho
prático e útil; por outro lado, reclama do excesso de preocupações que lhe acarretam
as atividades da Associação a seu encargo. Por que não lhe tem ocorrido, ao
organizar o seu plano de tarefas mensal, semanal ou diário, provocar um inteligente
entrosamento daquelas atividades? Repetimos: as instituições escolares e as matérias
formais de estudo não se opõem [...] Ora, o que é uma Associação Escolar, de um
ponto de vista rigorosamente pedagógico? É um projeto, que deve ser desenvolvido
pelos alunos, sob a orientação dos professôres, na sala de aula, em qualquer
dependência do educandário e fora da própria escola (MELO, 1955, p. 36).
Assim como foi visto no segundo capítulo, em que os autores mobilizados não
fornecem aos professores soluções práticas sobre o uso didático do museu, mas apenas a
respeito de sua constituição, esse dado se repete nas proposições elaboradas por Melo (1955).
Como apêndice de seu texto, o autor apresenta possibilidades de “entrosamento das atividades
das associações escolares com as atividades comuns da classe”, momento em que se detém
em alguns exemplos, como nas aulas de linguagem oral e escrita, de iniciação matemática,
dos conhecimentos aplicados “à vida social e à educação para a saúde e o trabalho”. Neste
momento, lista possibilidades de articulação com a biblioteca, clube agrícola, liga da bondade,
liga pró-língua nacional, pelotão de saúde, jornal escolar, caixa escolar, sopa escolar,
deixando de fora os museus, centros de interesse, clube de leitura e círculo de pais e
professores.
Uma das únicas críticas, senão a única, dirigida às associações por parte do
professorado é a que segue. Embora as circulares enviadas pelo DE deem nota de um
conjunto de reclamações por parte dos professores quanto à realização das atividades das
associações, o comunicado elaborado pela professora Rozália Thomal foi o único encontrado
que ousou fazer uma observação sobre as condições reais para desenvolvimento dessa tarefa.
De acordo com o registro da ata da 2ª reunião do GE Duque de Caxias, de Mafra, no mês de
abril de 1952, foi lido e discutido naquele dia o comunicado escrito pela professora Rozália
Thomal, cujo título era A necessidade da especialização e aperfeiçoamento do professor para
as associações escolares.
Após a apreciação, o comunicado recebeu as seguintes observações:
| 127
[...] as associações escolares só podem viver em função da classe e é na classe que o
professor executa os trabalhos associativos; porém nem sempre a prática
corresponde a expectativa teórica. Entretanto a especialização de um professor para
associações, tais como: Caixa Escolar, Cooperativa Escolar, Biblioteca etc. que
exijam trabalhos extra classe se faz necessário porque o professor não pode deixar
de executá-los e nem prejudicar os trabalhos de sua classe. Para essas instituições é
que devemos, digo deveria haver um professor especializado (ARQUIVO..., 1952,
p. 123).
A partir dos comentários suscitados, conjecturas são possíveis. A consideração de que
os trabalhos associativos deveriam ser executados nas classes levanta algumas dúvidas, pois,
pela consulta ao material produzido pelas associações, verificou-se que elas eram compostas
por alunos de diferentes turmas; portanto, não correspondiam a alunos de um único professor
– isso para o caso dos grupos escolares. Do outro lado, nota-se um consenso entre os
professores de que algumas associações demandavam um conhecimento específico e um
tempo de trabalho superior ao despendido durante as aulas. Porém, o reclamo por um
professor especializado deixa dúvidas se se trataria de um professor responsável apenas pelas
associações ou se se evidencia a necessidade de formação dos professores em questão para
realizar esses trabalhos.
Ao se deparar com a documentação relativa aos clubes agrícolas, Fiori (2002) observa
que as tarefas a serem cumpridas não eram modestas; questiona, então, em que momento
esses trabalhos eram realizados e quanto tempo demandavam, respostas raras vezes
encontradas.
Por sua vez, o assunto mais recorrente nas reuniões relativas às associações era a
confecção das atas e relatórios, a fim de serem enviadas ao DE. A princípio, todas as atas e
relatórios produzidos deveriam ser remetidos ao DE; contudo, em algumas escolas verificam-
se procedimentos diferentes. Conforme orientações da diretora do GE Marechal Bormann, de
Chapecó, as atas do mês de julho de 1952 deveriam sintetizar os assuntos tratados nos meses
anteriores, tendo em vista o envio da ata do referido mês para o DE (ARQUIVO..., 1952, p.
224).
A direção do GE Felipe Schmidt de São Francisco do Sul explicou, na primeira
reunião pedagógica de 1952, que as reuniões das associações deveriam ser mensais, sendo
necessário remeter ao DE a ata de eleição do mês de março, e os relatórios de julho e
dezembro (ARQUIVO..., 1952, p. 126). No caso da ER Professora Olga Boppré, de Tijucas,
há menção da necessidade de realizar três105
reuniões anuais, uma em março, outro em junho
105
Informação similar a esta foi localizada na ata da primeira reunião anual do Curso Normal Regional Bom
Pastor, do município de Chapecó. De acordo com a ata, a realização de reuniões em março, julho e novembro
era uma nova medida tomada pelo DE (ARQUIVO..., 1952, p. 66).
| 128
e novembro (ARQUIVO..., 1952, p. 81). Tal organização talvez se explique pela natureza da
escola (reunida), como uma forma de racionalizar as atividades e ainda assim cumprir com o
esperado pelo DE.
Contudo, cabe o questionamento: em que medida uma associação que mantinha
apenas três encontros anuais faz parte do repertório cultural de uma escola, independente de
ser esta uma determinação do DE ou uma iniciativa da própria escola?
Para além da necessidade de confecção de tais documentos, algumas escolas
preocupavam-se em apresentar um trabalho esteticamente bonito. Este é o caso do GE
Professor Lapagesse de Criciúma. Em uma das reuniões do ano de 1944, determinou-se que
os relatórios fossem “[...] encapados com cartolina desenhada” (ARQUIVO..., 1944a, p. 171).
A cobrança para a “boa realização” das tarefas e o constante estímulo aos professores
justifica-se em alguma medida pela fiscalização à qual estavam sujeitos. No ano de 1948,
encontrou-se registro explícito a este respeito no GE Vitor Meirelles de Itajaí: “Devendo
brevemente vir a este Grupo o snr. Inspetor de associações, é bom que todas estejam em dia
com seus trabalho, devendo até o dia 10 de setembro, cada professora encarregada apresentar
o resultado da associação que dirige” (ARQUIVO..., 1948a, p. 202).
De acordo com Moreira (1954), um dos malefícios provocados pela centralização das
ações das associações foi justamente a criação do cargo de inspetor para elas, o que se deu em
1947.
Das atas analisadas, algumas fazem menção direta aos museus escolares. Entre as
atividades escolares, foram dignas de registro em reunião as que se seguem. Durante a última
reunião anual de 1944 do GE General Osório, de Canoinhas, as professoras encarregadas das
associações fizeram o relato das atividades. A professora substituta Malek Hissaine,
responsável pelo museu, declarou nada ter feito devido à falta de experiência e pouco tempo
de atuação no magistério.
Por sua vez, a professora Jandira Medeiros escreveu, em seu comunicado sobre o
museu, lido na 11ª reunião do ano 1944 do GE José Bonifácio, de Blumenau, que havia pouca
cooperação dos alunos e afirmava que “[...] o museu é uma associação muito importante e que
dá à petizada conhecimentos, às vezes, bem amplos, portanto, todos devem auxiliar”
(ARQUIVO..., 1944a, p. 262).
O tema museu escolar também foi escolhido pela professora Olimpia Nepomuceno
para a escrita de seu comunicado. A professora do GE Santa Catarina de Campos Novos
constatou, em 1944, que há dificuldades na organização do museu escolar, apresentando, para
tanto, sugestões. “Todos foram unânimes em reconhecer a necessidade de concretizar as
| 129
aulas, com o auxilio de gravuras e outros objetos, que guardados, irão formar o museu escolar.
Foram aceitas as sugestões da colega” (ARQUIVO..., 1944a, p. 314).
No GE Santo Antônio, de Ituporanga, registrou-se em ata:
Estando em organização um pequeno muséu em nosso Grupo, o sr. Diretor
recomendou a necessária cooperação de todos os professores, os quais deverão
interessar também os alunos para conseguir os materiais indispensáveis para iniciar
a obra. Fez ver também todas as vantagens que trará ao ensino, pois todo o material
que faz parte do muséu será aproveitado como centro de interêsse no preparo e
desenvolvimento das aulas; foram lidas as instruções do Departamento de Educação
[referentes ao museu] (ARQUIVO..., 1944a, p. 19, grifo meu).
Tal como mencionado, fazia parte também do ritual das reuniões a leitura por parte
dos professores de um comunicado por eles elaborado. Este gênero textual se assemelha a
uma resenha crítica ou narrativa, em que o professor expõe algum assunto de relevância para
o cotidiano escolar e em alguns casos apresenta argumentos a partir da obra de autores
conhecidos, posicionando-se favorável ou contra determinadas práticas.
As recomendações para elaboração de comunicados constam no artigo n. 683 do
Regulamento do ensino primário de 1946. O conteúdo do artigo encontra-se com recuo à
direita e entre aspas, o que pode indicar a sua cópia de outra fonte; esta, entretanto, não foi
localizada.
[...] É preciso que o comunicado não fuja à realidade-ambiente, trazendo dessarte
preciosa e eficaz contribuição aos trabalhos educacionais. Ventile-se no
comunicado, tema que decorra do próprio trabalho escolar em apontando solução
que a prática ditou e aconselha a consagração do seu uso. Para isso, como o
Departamento tem insistentemente frisado, o professor terá inteira liberdade de
emitir fundamentada opinião própria, embora contrarie o que vem sendo
recomendado por firme, bom e valioso. Temas como dificuldades que encontra na
ministração do ensino, sugestões que pode apresentar em referência aos métodos
atualmente em vigôr, providências que sugere em relação à sua classe ou em geral,
como encara o magistério (se está satisfeito ou não), etc., podem e devem ser
desenvolvidos e expostos lealmente. Ninguém se escuse a dizer o que sinta (será
aplaudido, ainda que não aprovado). O Departamento quer cooperação leal, pois o
objetivo é o mesmo para todos: - o melhor rendimento do trabalho educacional [...]
(SANTA CATARINA, 1946b, p. 126, grifo meu).
Localizaram-se no acervo do Apesc dois exemplares que contêm comunicados, ambos
do ano de 1941. Um deles é composto de atas de reuniões pedagógicas, nas quais estavam
anexados os planos de aula e comunicados discutidos (ARQUIVO..., 1941a); o outro contém
apenas planos de aula e comunicados avulsos (ARQUIVO..., 1941c). A leitura deste material
favoreceu a compreensão de quais autores circulavam no período, conforme foi pontuado no
| 130
segundo capítulo desta dissertação. Além disso, foram selecionados alguns comunicados que
discorriam sobre as associações auxiliares da escola.
Com o título “Socialização da criança. Devemos não só instruir como educar a criança
para a vida”, a professora Maria Barreiros, docente do GE Cruz e Souza de Tijucas, escreve
seu comunicado:
Graças ao desenvolvimento das ciências psicológicas, filosóficas, biológicas, etc, já
existem meios eficientes para tal ensino [ativo]. Estes meios são as associações,
como sejam: Pelotões de saúde, clubes de leitura, bibliotecas escolares, caixas
escolares, clubes agrícolas, jogos, cooperativas, etc. Estas e outras associações
educam praticamente a criança. Todas elas gostam de sobressair; logo, fazendo parte
destas associações tomam a sério seu trabalho e, daí, o aprenderem com interêsse e
sem esfôrço o que se lhes ensina. [...] as associações escolares, muito embora
imperfeitas, pela falta de meios, estão dando resultados promissores (ARQUIVO...,
1941a, p. 422-423, grifo meu).
A falta de meios a que se refere no encerramento do texto diz respeito às condições
higiênicas que a escola vivia. De acordo com a professora, os alunos estavam entusiasmados
com as atividades do pelotão de saúde; entretanto, as condições do prédio dificultavam o
ensino da higiene, por estar localizado próximo a residências que possuíam casinhas sanitárias
que exalavam mau cheiro, e próximo a uma fábrica que fazia notar seu barulho ensurdecedor.
A professora do 2º ano do GE Gustavo Capanema, de Hamônia, em 1941, Anita
Cardoso, dissertou sobre “As associações escolares como fator de educação”. Segundo a
professora:
Os dirigentes da educação, atualmente, preocupam-se muito com a criação de
associações nas escolas, pois é por meio dessas associações, que a criança aprende a
viver a vida fora da escola. A preocupação da escola nova é preparar a criança, para
a vida prática [...] Vejamos a cooperativa, na qual a criança aprende a manejar com o
dinheiro, pois negociando com os objetos que estão à venda, ela aprenderá a fazer
troco, desenvolver seus cálculos e terá ideia do valor dos objetos. [...] Por meio da
biblioteca escolar, as crianças aprendem a usar uma biblioteca pública. [...] As
associações escolares estimulam não só os alunos, como tambem os professores. As
horas literárias da Liga Pró Língua Nacional, por exemplo, fazem com que os
professores adquiram outra prática, em outro terreno que não seja apenas o do
ensino nas classes (ARQUIVO..., 1941a, p. 451-452).
Neste comunicado, evidencia-se: a vinculação das associações com a chamada escola
nova; a preocupação da professora em fornecer exemplos (mais detalhados no original) que
comprovassem a utilidade delas; o destaque do aprendizado por parte dos professores, como
reconhecimento, de certo modo, desse estágio de transição e aprendizagem pelo qual estavam
passando com a introdução de aspectos diferenciados no ensino.
| 131
Ressalte-se que a leitura destes documentos não foi exaustiva e que os aspectos aqui
apresentados são, sem sombra de dúvida, parciais, estando este material sujeito a inúmeras
revisões e acréscimos.
Algumas aproximações podem ser feitas entre o que foi observado no material aqui
analisado e a documentação analisada por Bombassaro (2006), que trabalhou com artigos
veiculados em periódicos educacionais e notas/depoimentos publicados na imprensa. Nestes
dois tipos documentais, Bombassaro identificou a circulação de um discurso coeso, que
exaltava “[...] a eficiência dos princípios ensinados pelos intelectuais do DE [...]”
(BOMBASSARO, 2006, p. 24). “Sujeitos a uma espécie de formação continuada executada
nas ‘Semanas Educacionais’, os professores pareciam apropriar-se da fala proferida como
regra de conduta na prática docente [...]” (BOMBASSARO, 2006, p. 63).
Guardadas as devidas proporções, pode-se dizer que as exposições em torno das
associações auxiliares da escola foram “contaminadas” por esse discurso de concordância.
Observa-se uma retroalimentação entre o que era divulgado pelo DE, replicado, portanto, por
inspetores e diretores nas escolas; adotado por sua vez pelos professores, ao menos
retoricamente, exposto em comunicados e atas das associações escolares, por sua vez,
remetidas ao DE para aferição. No caso dos relatórios de diretores e inspetores, o DE
reproduzia algumas considerações e remetia novamente para as unidades escolares.
Vale lembrar, de antemão, as condições em que tais discursos foram produzidos e as
possíveis razões para a sua preservação. Embora não se tenham localizado registros
discordantes em relação à postura do DE, sendo escassas as menções de crítica aos
procedimentos normativos (em relação a outros aspectos já é mais comum, como por
exemplo, a estrutura física das escolas), não se pode considerar como dada a passividade em
relação às determinações sem que tenha havido resistência. Exemplo disso são as circulares
que buscam ajustar a conduta dos professores que reclamam do excesso de trabalho, etc.
Porém, este tipo de reclamação em momento algum foi identificado na documentação
mobilizada; das 1.148 atas e relatórios de museu (abordadas a seguir), nenhuma registrou
questionamento ou crítica em relação às condições de execução dos trabalhos.
A partir deste cenário, cabe indagar: por que as atas e os comunicados evidenciam essa
concordância com o DE? Foram aquelas que permaneceram guardadas? Ou os sujeitos
contrários às determinações não se manifestavam por meio do registro escrito?
| 132
3.3 O MUSEU NA CONDIÇÃO DE ASSOCIAÇÃO AUXILIAR DA ESCOLA
No fluxo das normativas até aqui mencionadas, publicaram-se no ano de 1944 as
instruções para o funcionamento das associações auxiliares da escola (Decreto nº 2.991), nas
escolas estaduais, municipais e particulares, enviadas com a Circular n. 42, em maio de 1944
(SANTA CATARINA, 1944c). Este documento foi a primeira normativa estadual a fixar
claramente as funções de cada associação. As orientações para o funcionamento do museu
compõem um texto de pouco mais de uma página, dividido em uma pequena introdução e
outra parte intitulada “como devemos proceder”.
Diferente das instruções baixadas para as demais associações, o texto dedicado ao
museu isenta-se de informar sobre sua parte burocrática, ou seja, não expede normas para
eleição de diretoria, formato de registro de ata, relatório ou outros modelos a serem seguidos,
como de correspondências ou de etiquetas para os objetos, por exemplo.
O texto se limita a fornecer dicas para a constituição do acervo, relacionando questões
de ordem prática e metodológica. É interessante que, se retirado do conjunto de orientações
para as demais associações, o artigo sobre os museus poderia ser inserido em outro veículo de
divulgação, como revistas de educação, extrato de um livro, etc., uma vez que o texto não
caracteriza o museu como uma associação auxiliar da escola.
Dito isto, destacar-se-ão os elementos do texto que se aproximam dos discursos
apresentados no segundo capítulo, procurando perceber em que medida a proposta de museu
para as escolas catarinenses, já na década de 1940, se relaciona ao movimento internacional
que os disseminou no final do século XIX.
Em primeiro lugar, os museus são considerados como um ambiente que fornece
condições para o estudo de determinadas questões a partir da observação, em substituição de
livros massudos e pesados. Como primeiro tópico, elenca-se o estudo de uma zona, por meio
do conhecimento de sua história, fauna, flora e riquezas. Nesse ponto, a finalidade do museu
“consiste em conhecer o ambiente em que está localizada a escola” (SANTA CATARINA,
1944c, p. 142).
De acordo com o documento, a organização do museu demanda tempo e não deve se
preocupar com detalhes relativos aos “técnicos no assunto”. A partir dessa observação,
relembra-se a prevenção de Ferreira (1914) de que o professor não deveria se prender à
nomenclatura dos cientistas. Ou seja, há uma preocupação em simplificar a sua organização
para que sirva de elemento de estudo e se aproxime das necessidades dos estudantes, a fim de
que não se torne um artefato por demais complexo.
| 133
Seguindo a tônica dos textos de Backheuser (1934) e Busch (1937), o decreto também
marca uma diferença entre escolas antigas e novas, ressaltando que “os modernos
educandários já estão aparelhados para êsse fim [constituição de museus escolares], o que não
acontece com os antigos, onde a míngua de espaço é evidente” (SANTA CATARINA, 1944c,
p. 142). Entretanto, conforme se explicitou no item 1.5, na organização do espaço dos grupos
escolares reservava-se um gabinete específico para o museu. Contudo, com a suposta
proliferação de associações auxiliares, a estrutura física das escolas, mesmo das “modernas”,
não tinha condições de abrigar cada associação isoladamente. A partir do inventário de 11
museus existentes em 1941 e 1942, verificou-se que quatro dividiam o espaço com a
biblioteca e um dividia o espaço com mais três associações. Portanto, praticamente a metade
destes museus não desfrutava de espaço próprio (PETRY, 2012, p. 91).
De acordo com o decreto, a organização de um museu deveria ser empreendida por
todos os alunos, mas caberia aos “mais entusiastas e capazes” a tarefa de iniciar os
preparativos. Destaca-se que em praticamente todos os textos referentes às outras associações
há orientações quanto à designação de alunos “mais capazes” para a coordenação das tarefas.
Expandindo a sua ação, considerava-se que “tudo quanto for capaz de oferecer motivo
para estudo deverá fazer parte do museu” (SANTA CATARINA, 1944c, p. 142). Entre os
possíveis componentes estão: coleções que destaquem fatos e vultos nacionais, como selos e
dinheiro. Esse tipo de artefato também era recomendado por Busch (1937). Para a autora, os
selos não eram considerados objetos mais curiosos do que úteis. Além disto, fariam parte das
coleções: insetos, borboletas, pássaros, minerais, produção agrícola, industriaria; pequenos
moluscos e algas que “enfeitam as nossas práias e as margens dos rios” (SANTA
CATARINA, 1944c, p. 142, grifo meu); pássaros, peixes e cobras embalsamadas por
professores que saibam fazê-lo.
As coleções poderiam ser obtidas por correspondência com outros estabelecimentos.
Esta prática também era incentivada por Busch (1937). Algumas evidências de sua efetivação
foram encontradas na documentação proveniente das escolas. No relatório das atividades do
GE Lauro Müller, de 1946, consta uma cópia do questionário elaborado pelo DE sobre as
associações auxiliares da escola, que foi remetido em três vias pela Circular n. 94, de 1942.
O questionário elabora questões para 13 associações, incluindo a caixa escolar, o
orfeão e a sopa escolar. Os questionamentos referentes ao museu são: Geral ou por classe?
Está classificado? De que se compõe? Permuta com outros educandários? (SANTA
CATARINA, 1942b, p. 67). A partir dessas questões, visualizam-se três preceitos
importantes; primeiro, a existência de duas modalidades de museu – uma dentro da sala de
| 134
aula e outra, geral para a escola (cf. item 1.1); segundo, a classificação como prática a ser
alcançada; terceiro, a consideração da possibilidade real de haver troca de objetos entre os
museus de diferentes escolas.
As respostas fornecidas pelo GE Lauro Müller informam que o museu era geral106
.
Não estava classificado. Era composto por aparelhos para experiências, minerais e animais
(cobras, polvos) e não permutava com outros educandários (GRUPO..., 1946). A publicação
deste questionário ocorreu em 1942, tendo sido preenchido pelo referido grupo em 1946.
Considerando que nesse meio tempo, em 1944, foi expedido o Decreto nº 2.991, a
permanência desse instrumento de “avaliação” das associações indica que os aspectos
questionados ainda eram relevantes.
Se este grupo escolar não trocava objetos com outras escolas, o museu escolar
“Osvaldo Cruz” do GE Gustavo Capanema de Ibirama, no ano de 1949, sugeria essa ação
para seus membros, a fim de obter os objetos desejados:
a professora orientadora pediu aos membros da diretoria que troxessem e mesmo
pedissem a outros alunos sêlos de outros paizes, dinheiro antigo, insetos e demais
objetos que sirva para o engrandecimento do museu, [...] tambem por meio de
correspondência podiam pedir a alunos de outros Grupos. Todos prometeram de
ajudarem e escreverem, pedindo objetos [...] (ARQUIVO..., 1949a, p. 72, grifo
meu).
Além desta possibilidade, outras escolas mantinham correspondência com instituições
que poderiam fornecer-lhes materiais diversos. Por exemplo, ao “Herbário Barbosa
Rodrigues”, do município de Itajaí, foi solicitado pelo GE Professor Balduíno Cardoso, de
Porto União, a biografia de João Barbosa Rodrigues, patrono do museu deste grupo
(ARQUIVO..., 1949a, p. 204).
Inicialmente, o museu deveria possuir as seguintes coleções:
a) coleção de madeiras da região e de fora dela: classificadas de acordo com o nome,
habitat e serventia de cada espécie;
b) coleção de minerais existentes na localidade, e se possível, no estado e Brasil: a
classificação deveria ser feita por alguém que realmente conhecesse as
características dos minerais. Conforme o decreto, as amostras pequenas e de
grande valor “devem ser colocados em caixetas cobertas com vidro ou papel
106
Embora no mesmo relatório seja informada a existência de museus por classe e geral, conforme item 1.1.
| 135
transparente, o que evitaria o contacto das mãos e conseqüente decomposição” 107
(SANTA CATARINA, 1944c, p. 142). As coleções seriam organizadas em
estantes, sobre cartolina que contivesse os dados correspondentes a elas;
c) coleção de produtos agrícolas: reunidos por famílias e por município produtor,
seriam distribuídos em pequenos vidros com legenda informando sobre sua
utilidade prática (o milho fornece: farinha, fubá, quirera, cangica, pipoca, etc.).
Também fariam parte dessa coleção os produtos destinados ao tecido, como linho,
algodão, rama, pita, gravatá, tecum, juta, graxima, caroá, etc.;
d) coleção industrial do município: se possível cada tipo de indústria teria uma
representação em miniatura: “As fábricas de bebidas poderão ser representadas
pelos rótulos de seus diversos produtos” (SANTA CATARINA, 1944c, p. 143);
e) coleção histórica: composta por objetos utilizados pelos índios e outros – seria
informada sua procedência a fim de realizar comparações com os objetos da vida
atual, pois existem objetos históricos que, dispersos, não têm valor, mas,
reunidos, podem reconstituir “episódios originais da nossa vida” (SANTA
CATARINA, 1944c, p. 143).
Argumentava-se que a instalação de um museu tornaria a tarefa do professor mais fácil
e as lições seriam assimiladas de modo mais intuitivo pelos alunos. Mesmo que modesto, para
a organização de um museu fazia-se necessário o interesse de alunos e professores; estes
orientariam aqueles que reuniriam os objetos para serem catalogados e estudados.
De acordo com o Decreto nº 2.991, aqui em pauta, os centros de interesse também
formavam uma associação auxiliar da escola, sendo considerados “pequenos museus de
classe” (SANTA CATARINA, 1944c, p. 143).
Segundo a instrução catarinense relativa aos centros de interesse, estes seriam
organizados em cartolina, cada um abrangendo um ponto de ensino, explanando sobre
aritmética, história, botânica, geografia, higiene, linguagem, etc. Além desse recurso, o uso de
objetos retirados do museu geral e levados para a sala de aula traria oportunidade de estudo
por meio de aula prática. Essa transferência de objetos requeria cuidados e por isso eram
fornecidas ideias sobre como organizar o seu empréstimo, deixando, por exemplo, sob a
guarda dos alunos “mais espertos”.
107
Na perspectiva de Ferreira (1914), autor português, os objetos do museu deveriam ser manuseados pelos
alunos, medida que os conservaria, visto que ácaros e traças não atacam objetos comumente manipulados.
Passados 30 anos entre a publicação do texto deste autor e do documento aqui analisado, nota-se a
permanência de uma prática de conservação de objetos escolares mediante o não-uso pelos alunos.
| 136
A discussão em torno dos centros de interesse em Santa Catarina vem de longa data,
fazendo parte inclusive das Semanas Educacionais. Em 1936, o inspetor Areão mencionou,
além da criação de jornais e clubes agrícolas, a visível “[...] transformação do ambiente
escolar, hoje todo colorido com flores, plantadas em vasos, e com cartolina contendo os mais
variados centros de interêsses” (AREÃO, 1936, p. 3-4).
A metodologia dos centros de interesse foi proposta por Ovídio Decroly (1871-1932),
médico neurologista de origem belga, no início do século XX. Tal como Montessori, seu
sistema didático surgiu da observação de crianças deficientes.
Ambos [Montessori e Decroly] observaram os fatos e buscaram registrar relações
funcionais, com isso concorrendo para fazer avançar primeiramente a compreensão
teórica geral e, depois, a didática aplicável a crianças irregulares e regulares, em
bases experimentais. Buscaram assim uma nova compreensão dos fatos e um novo
método (LOURENÇO FILHO, 1978, p. 180).
Embora tenha escrito inúmeros livros, Decroly não escreveu acerca de seu sistema
didático, negando-se de fato a fazê-lo. Argumentava que sua concepção educativa não estava
concluída e avaliava que se publicasse as técnicas recomendáveis, seu sistema se cristalizaria
nos exemplos expostos. Além do mais, ele era composto por princípios ao invés de fórmulas
(LOURENÇO FILHO, 1978). Ainda assim, o autor recebe críticas a rigidez imposta pelo seu
sistema, conforme Backheuser (1934, p. 274): “excelente nas suas mãos, prestou-se a uma
descriteriosa imitação por parte dos adeptos”.
Lourenço Filho (1978) percebe na filosofia de educação de Decroly pontos de
encontro com o pensamento de Dewey e Kilpatrick, bem como de Claparède e Ferrière. Ainda
assim, reconhece a permanência de aspectos intelectualistas. Para Lourenço Filho (1978, p.
188), Decroly é “[...] pragmatista no encarar os fins da educação e ativista nos procedimentos
que recomenda”.
De acordo com Lourenço Filho (1978, p. 190-191), Decroly incorporou todas as
matérias existentes nos programas de ensino “tradicionais”, modificando a sua distribuição,
tendo resultado no seguinte: a) conhecimento, pela criança, de suas necessidades; b)
conhecimento do meio. Entre as propostas do autor, encontra-se a aplicação dos centros de
interesse, vistos como a essência do trabalho escolar. No decorrer do ensino de cada assunto,
a criança percorreria três fases do pensamento: a) observação; b) associação; c) expressão.
O programa proposto atende grandes linhas da globalização, como eixos possíveis
de trabalho natural de conhecer. Para harmonizá-los, com a unidade desejada, será
preciso estabelecer em cada momento um traço de união entre os diversos elementos
| 137
do conteúdo. Esse princípio de associação, ou relação, é o centro de interesse
(LOURENÇO FILHO, 1978, p. 192, grifo do autor).
Sendo assim, o centro de interesse enlaça as disciplinas convergindo-as num mesmo
núcleo. O desenrolar das atividades dependerá do andamento da classe e da curiosidade
manifestada, dando um centro origem a outro, podendo ter duração de dois dias a meses
(LOURENÇO FILHO, 1978, p. 192). Nas palavras de Decroly, citadas por Lourenço Filho
(1978, p. 193):
Os exercícios de observação com animais empalhados e plantas secas, fora de seu
meio natural, ou com quadros ou desenhos, são ineficazes, porque não dão ao
espírito oportunidade para perceber os verdadeiros aspectos da natureza, aqueles que
são mais interessantes e, por conseqüência, mas suscetíveis de serem conservados e
utilizados.
Analisando este fragmento isolado, poder-se-ia considerar que o programa defendido
por Decroly se afasta da proposta de museus nas escolas. Por outro lado, a prática de
excursões parece se aproximar dos princípios defendidos pelo autor.
Segundo Lourenço Filho (1978, p. 196), a aplicação do programa de Decroly ocorria
na escola por este dirigida, sistematicamente apenas a partir do 3º ano. Nas classes iniciais e
no jardim de infância, recomendava-se a aplicação de centros ocasionais, sugeridos pelas
crianças. Estes também podiam ser aplicados para alunos de qualquer idade, na perspectiva do
intelectual brasileiro.
A apropriação dos centros de interesse feita pelo DE catarinense e registrada no
Decreto nº 2.991, aqui em tela, levantou severas críticas do intelectual João Roberto Moreira,
endossadas por Orlando Ferreira de Melo, ainda que este discordasse do primeiro em vários
pontos.
Segundo Moreira (1954, p. 53):
Em lugar de uma didática de projetos não pré-fixados, mas supridos pela própria
vida escolar e da comunidade, [o Departamento de Educação] preferiu a didática dos
«centros de interêsse», em que cada aluno é levado a adaptar-se a um padrão
arbitràriamente estabelecido, sem qualquer consideração por seus interêsses,
aptidões e necessidade. Admitamos, porém, que, mesmo assim, já é um progresso.
Em vez de matérias isoladas, se procurava a globalização e o correlacionamento.
A fim de elucidar na prática seus argumentos, Moreira transcreve a Circular n. 115,
de 11 de dezembro de 1942, considerada por ele como a primeira orientação sobre o assunto,
que nada mais é do que um fragmento de relatório anual de um grupo escolar. Nele, o diretor
| 138
informa sobre a confecção de 40 centros de interesse, além da reforma dos já existentes no
museu, os quais estavam na escola desde a sua fundação. Estaria o diretor se referindo aos
quadros Deyrolle ou similares? Para Moreira (1954), há uma verdadeira confusão no conceito
de centro de interesse, sendo assim chamados os cartazes resultantes das aulas e criados pelas
professoras. Para o autor, o Decreto nº 2.991 consagra essa visão equivocada de centros de
interesse organizados em cartolina.
Neste ponto, Melo concorda com Moreira, sendo, entretanto, a única orientação que
considera equivocada por parte do DE. “Concordamos plenamente com a crítica do Prof.
Moreira. Houve verdadeira confusão na conceituação do que deve ser ‘centro de intêresse’
que, na forma referida, nem de leve se assemelha à prática disseminada por Ovídio Decroly
[...]” (MELO, 1955, p. 23).
Ao que indicam os autores, não só em terras catarinenses os princípios de Decroly
foram mal interpretados. Sobre essa apropriação considerada equivocada, Backheuser aponta:
As cartolinas que eram, no metodo de Decroly, um dos meios excelentes das
crianças gravarem os conhecimentos adquiridos, selecionando as noções principais e
delas fazendo, por desenho ou colagem de objétos, quadros rememorativos,
chegaram a ser aqui no Brasil – pour epàter les autorités [para impressionar as
autoridades] – objéto de fabricação por elementos do magistério e até, sabemos, por
particular habilidoso que as vendia a determinada escola. Fracasso previsivel do
metodo... (BACKHEUSER, 1934, p. 274, grifo do autor).
Os centros de interesse não aparecem somente nas orientações acerca das associações
auxiliares. Dois anos depois, no Regulamento do ensino primário constam as seguintes
orientações: “o ensino será dado pelo método intuitivo, recorrendo-se à observação direta da
natureza, na escola ou em excursões e às projeções fixas e cinematográficas e centros de
intêresses” (SANTA CATARINA, 1946b p. 9). Além disso, “os professores, nas suas lições,
se esforçarão para empregar, o mais freqüentemente possível, os quadros e os apparelhos do
museu, bem como o material da própria classe, inclusive centros de interêsse” (SANTA
CATARINA, 1946b, p. 11).
Nessa passagem, vê-se claramente a articulação entre recursos de ensino e método
intuitivo, num contexto permeado por pretensões alinhadas à Escola Nova. Indício de que as
concepções escolanovistas não se afastavam por completo daquelas propagadas pela
pedagogia moderna desde finais do século XIX, que ganharam terreno em Santa Catarina,
sobretudo a partir da reforma de 1911.
A proximidade teórica e prática entre museu e centro de interesse requer maiores
investimentos para ser compreendida. De imediato, ressalte-se que da documentação
| 139
consultada no Apesc não se localizaram volumes de atas e relatórios dessa associação em
específico; foram localizados apenas alguns documentos esparsos. Isso pode evidenciar uma
composição entre as associações museu e centro de interesse. No quarto capítulo, item 4.2,
será feita menção à escola em que se realizava reunião dessas duas associações de modo
concomitante.
Ao tratar de tecnologias da Escola Nova, Vidal (2007) sugere uma transição do museu
enquanto lugar de exposição para centro de interesse. De acordo com a autora, museus da
escola e da classe pretendiam deixar de ser mostruários onde se encontravam coleções para
acompanhar a atividade escolar:
As coleções deixavam de ser estáveis e abertas unicamente à visualização e
passavam a ser constantemente alteradas, variando conforme os interesses das
crianças e do trabalho escolar. Potes de plantas em germinação, figuras recortadas,
desenhos infantis e tabuleiros de areia para modelagem conjunta constituíam-se nos
“novos” objetos que figuravam nos museus de sala (VIDAL, 2007, p. 511).
No próximo capítulo será apresentada uma visão mais particular dessa questão, ou
seja, em que medida os museus de escolas catarinenses seguiram a tônica presente nas
normativas, bem como nos impressos pedagógicos do período, a partir do exposto no segundo
e terceiro capítulo.
| 140
4 NO INTERIOR DAS ESCOLAS: O COTIDIANO DOS MUSEUS ENTRE 1944 E
1951
Segundo Vidal (2006), na perspectiva da história conectada não basta conhecer as
intenções presentes na produção de um objeto ou modelo para compreendê-lo, visto que, ao
ser distribuído, torna-se autônomo e se mescla. A autora adverte que a compreensão do
consumo de materiais e ideias não se faz apenas com a análise no momento de difusão; ela
implica o estudo de questões locais que se relacionam com o centro difusor e não são
simplesmente dele derivadas.
Além de compreender o museu numa visão macro, tal como se pretendeu com os dois
primeiros capítulos, e, em escala menor, com o terceiro, interessa-nos agora saber se seu uso
em escolas catarinenses está relacionado às intenções presentes no momento de sua difusão.
Para tanto, utilizou-se um conjunto singular de documentos para compor este capítulo,
partindo do interesse por textos produzidos no interior das escolas, neste caso, de alunos e
professores.
Considerando que foram utilizados registros escritos, é pertinente a seguinte
observação de Bucaille e Pesez (1898, p. 19): “[...] a documentação clássica, escrita ou visual,
pode englobar amplos sectores da cultura material, mas só dá deles uma imagem reflectiva,
subjectiva e já interpretada, necessitando, portanto, de certa prudência”. Do contrário, o
registro material – os objetos – não comporta de acordo com os autores, essa interferência.
Para Meneses (1998), trata-se da permanência de uma qualidade do artefato, que não é
alterada nem mesmo com a introdução de novas funções, ou seja, a de que ele não mente.
“[...] À integridade física do artefato corresponde sua verdade objetiva. Os discursos sobre o
artefato é que podem ser falsos” (MENESES, 1998, p. 91-92).
Os objetos, continua o autor, possuem uma trajetória e “[...] para traçar e explicar as
biografias dos objetos é necessário examiná-los ‘em situação’, nas diversas modalidades e
efeitos das apropriações de que foram parte. Não se trata de recompor um cenário material,
mas de entender os artefatos na interação social” (MENESES, 1998, p. 92). Neste sentido,
importa menos saber quantos objetos havia num museu escolar, como e quais eram, pois mais
vale conseguir relacionar essas informações ao ambiente escolar, à questão do método de
ensino, do entendimento da aprendizagem, das rotinas, enfim, da interação que fizeram parte
no passado escolar.
Este capítulo busca olhar para estes aspectos, inserindo o museu no ambiente que lhe
deu significação, ou seja, a escola primária catarinense.
| 141
4.1 LOCALIZAÇÃO DOS MUSEUS NO ESPAÇO E NO TEMPO
No que diz respeito ao conjunto documental, este capítulo foi construído a partir dos
exemplares de atas e relatórios enviados por escolas ao DE depositados no Apesc. De acordo
com o índice do acervo do mês de junho de 2012, o arquivo dispunha, naquele momento, de:
23 volumes de relatórios enviados por escolas dos anos 1944, 1946 a 1949;
6 volumes de relatórios enviados por grupo escolar de 1945 a 1948; e
50 volumes de atas enviadas por grupo escolar nos anos 1941, 1943 a 1953.
O total chega a 79 exemplares. Embora a classificação distinga os documentos entre
enviados por escolas ou grupos escolares, esta organização não é cem por cento fiel, havendo
nos exemplares tanto documentos de escolas isoladas, reunidas, grupos escolares, quanto de
escolas públicas e privadas. Além destes, foram consultados outros nove exemplares que
faziam parte dessas duas categorias antes de junho de 2012108
. Entre eles estavam relatórios
de inspeção, atas de exames, jornais produzidos por alunos e movimento da caixa escolar.
Consultaram-se ainda e se incluíram na análise dois exemplares de relatórios de associações
auxiliares classificados como “Correspondência e Relatório” e “Relatórios das Inspetorias
Escolares”, além de um exemplar classificado como “Relatório avulso”.
Portanto, foram examinados 91 volumes de atas e relatórios classificados ou não como
tais109
. Destes, 36 continham informações relativas ao museu escolar110
, na condição de
associação auxiliar da escola; quatro continham atas de reuniões pedagógicas em que um dos
pontos de discussão eram as associações; logo, restou para uma análise mais detida o
conteúdo de 40 volumes, quatro dos quais já foram abordados no terceiro capítulo, item 3.2.
Deste modo, dos 36 volumes selecionados, que de algum modo fazem referência ao
museu escolar, elaborou-se o quadro abaixo, que informa a quantidade de atas e relatórios
transcritos e examinados.
108
Conforme mencionado na introdução deste trabalho, nos meses de maio e junho de 2012, o Apesc procedeu a
uma reorganização no fundo documental da educação, o que também ocasionou mudanças na classificação
da documentação relativa às associações auxiliares da escola. 109
A consulta a estes documentos e o entendimento da nova lógica do acervo só foi possível devido ao auxílio
prestado pela funcionária Flávia Sardá da Conceição, que, incansavelmente, conferiu boa parte dos
exemplares e localizou outros que foram de grande utilidade. 110
Destes 36 exemplares, quatro referem-se quase na sua totalidade apenas ao museu escolar. São eles:
ARQUIVO..., 1946a, 1949a, 1949c, 1950b.
| 142
Quadro 8 – Documentos sobre museu escolar produzidos pelas escolas
entre 1944 e 1951 e arquivados no Apesc – até junho de 2012
Ano Atas Relatórios
1944 - 12
1945 - 8
1946 104 137
1947 - 1
1948 27 67
1949 368 246
1950 87 33
1951 28 28
Total 616 532
Fonte: dados sistematizados pela autora.
Do ano de 1949, um dos exemplares (ARQUIVO..., 1949c) contém apenas atas de
fundação ou reorganização de museus, ou seja, a primeira ata anual de cada museu. Este
exemplar é composto por cerca de 160 documentos, os quais não oferecem, além do registro
burocrático, muitas pistas acerca das atividades realizadas.
Neste total de 1.148 documentos, estiveram representadas 318 escolas, distribuídas em
diferentes regiões conforme se verifica no mapa seguinte (Fig. 9). Está incluso neste total
(1.148) um relatório do GE Silveira de Souza de Florianópolis do ano de 1944 (GRUPO...,
1944), que descreve as atividades do museu como associação escolar, visto que, no conjunto
dos documentos, este grupo não tinha sido contemplado, embora possuísse museu, totalizando
assim 319 escolas.
A divisão dos documentos apontada no quadro 8 não levou em conta a classificação a
que pertenciam, pois, embora alguns volumes estejam classificados como relatórios,
encontram-se no seu conteúdo também atas. Além disso, a própria denominação das escolas
do que consideravam ata ou relatório, algumas vezes estava equivocada; sendo assim,
considerou-se, tal como em Otto (2012), que relatórios dizem respeito a relatos superiores a
um mês e atas são descrições correspondentes a um dia, nas quais se registra o que se passa
numa reunião, por exemplo. No caso dos museus, os documentos chamados de “movimento
geral” foram classificados como relatórios.
Nota-se que tais volumes começam a tomar corpo a partir de 1944, mais ou menos à
época da criação do cargo de inspetor das EPENE (1943) e da expedição das instruções
contidas no Decreto nº 2.991 de 1944. Isso pode evidenciar que atas e relatórios foram
mecanismos utilizados para comprovar o andamento dos trabalhos de modo mais sistemático
nesse período.
| 143
No mapa abaixo, visualizam-se os municípios111
presentes na documentação
pesquisada. Adotou-se, por base, a divisão administrativa de 1949, pois, dos municípios
localizados, cinco112
foram emancipados em 1948, única alteração do período (1944-1951)
referente às cidades aqui em pauta.
Figura 9 – Localização dos municípios cujas escolas possuíam museu escolar entre 1944 e 1951
Fonte: elaboração da autora, divisão administrativa adaptada do mapa presente em Piazza (1970, p. 49).
Para auxiliar na leitura do mapa, elaborou-se o quadro 9, que informa o nome dos
municípios indicados por números, bem como a quantidade de escolas que mencionou possuir
museu. Os números localizados sobre os municípios no mapa correspondem ao número de
ordem presente no quadro 9. A ordenação dos municípios teve como critério a quantidade de
museus informada, estando, portanto, em ordem crescente.
111
Ao longo da dissertação, não se fez menção ao distrito em que as escolas se situavam, registrando-se apenas o
município, pois esse dado nem sempre era informado pelas escolas. Esta advertência serve, sobretudo, para o
leitor que conhece a atual divisão administrativa de Santa Catarina e a localização de algumas escolas.
Tomamos como exemplo o GE Henrique Lage: atualmente localizado no município de Imbituba, fez parte do
município de Laguna até 1958, quando da emancipação do distrito. 112
São eles: Ituporanga, desmembrado de Bom Retiro e Rio do Sul; Massaranduba, desmembrado de Blumenau,
Itajaí e Joinville; Piratuba, desmembrado de Campos Novos e Concórdia; Taió, desmembrado de Rio do Sul;
e Turvo, desmembrado de Araranguá.
| 144
Quadro 9 – Informações complementares da figura 9: número e nome dos municípios e quantidade
de museus localizados em cada município
Nº ordem Município Nº museus Nº ordem Município Nº museus
1 Biguaçú 1 23 Taió 3
2 Brusque 1 24 Florianópolis 4
3 Imaruí 1 25 Joaçaba 4
4 Ituporanga 1 26 Blumenau 5
5 Nova Trento 1 27 Jaraguá do Sul 5
6 Piratuba 1 28 Itaiópolis 6
7 São Joaquim 1 29 Itajaí 6
8 São José 1 30 Laguna 6
9 Turvo 1 31 Palhoça 7
10 Araranguá 2 32 Massaranduba 8
11 Bom Retiro 2 33 Rio do Sul 9
12 Camboriú 2 34 Indaial 10
13 Campos Novos 2 35 Rodeio 11
14 Concórdia 2 36 Tubarão 13
15 Criciúma 2 37 Campo Alegre 17
16 Curitibanos 2 38 Mafra 18
17 Gaspar 2 39 Urussanga 18
18 Lages 2 40 Araquari 20
19 Porto União 2 41 São Francisco do Sul 20
20 Tijucas 2 42 Ibirama 22
21 Timbó 2 43 Orleans 26
22 Canoinhas 3 44 Joinville 45
Fonte: dados sistematizados pela autora.
Como se depreende do mapa (Fig. 9), o raio de expansão de museus na década de
1940 atingiu praticamente todos os municípios apesar de ser menor, em alguns, a quantidade
de museus. Análises acerca da expansão territorial destes e da pouca ou muita
representatividade em relação ao número de escolas ficam comprometidas, uma vez que não
se têm os dados relativos ao conjunto total de escolas existentes no estado no período.
É evidente a quantidade díspar de museus entre os municípios. Nos que há uma
presença mais elevada, a documentação encontra-se encadernada por cidade ou região,
contendo atas ou relatórios de todas as associações existentes. Esse formato de arquivamento
pode ter possibilitado a sobrevida desses documentos, bem como indicar um trabalho
característico das escolas destas regiões quanto à escrituração.
Pouco menos de 30% da documentação informa o ano em que os museus foram
fundados; deste percentual, a maior parte foi criada nos anos de 1943, 1944 e 1946. Se o
restante dos museus seguiu o mesmo padrão, tem-se um número reduzido de museus
fundados antes da década de 1940.
| 145
4.2 O MUSEU NA PRÁTICA E A PRÁTICA NO MUSEU
Após esse mapeamento inicial – entendendo em que localidades se situam as escolas
que possuíam museu, a quantidade e o período de que se está tratando –, pretende-se, a partir
dos registros localizados, dar visibilidade a práticas desenvolvidas nestes museus.
Recuperando a reflexão iniciada na introdução da dissertação, há que se lembrar que grande
parte dos trabalhos que se ocupam do estudo das práticas escolares do passado tratam,
conforme adverte Faria Filho (2007), de prescrições de práticas. Portanto, referimo-nos aqui a
práticas declaradas, embora não necessariamente efetivadas.
Tendo isso em mente, questiona-se: em que medida os museus identificados fizeram
parte do cotidiano das escolas e foram integrados à cultura escolar de então como elementos
de ensino, quer seja num nível utilitário ou simbólico?
Após a leitura, transcrição113
e releitura dos documentos, criou-se uma classificação
dos conteúdos, entre mais e menos frequentes, tentando compreender detalhes à primeira vista
sem importância ou com função apenas de registro.
Assim como no senso comum, identificamos inicialmente um museu como um local
de guarda de objetos. Mas, o que é um objeto?
Etimológicamente, objectum significa lançado contra, coisa existente fora de nós,
coisa disposta diante, com uma característica material: tudo o que se oferece à vista
e afeta os sentidos (Laurosse). Os filósofos tomam o têrmo no sentido do que é
pensado e se opõe ao ser pensante ou sujeito (MOLES, 1972, p. 13, grifo do autor).
Todavia, nem tudo o que possui característica material é considerado como objeto. No
entendimento de Moles (1972, p. 15, grifo do autor), “o objeto, em nossa civilização, é quase
nada natural. Não se falará de uma pedra, de uma rã ou de uma árvore como de objetos, antes
porém como de coisas. A pedra só se tornará objeto quando promovida ao pôsto de pêso para
papéis”. Neste sentido, a “coisa” adquire uma função que lhe assegura o status de objeto. Este
é entendido como algo produzido pelo ser humano, ou significado enquanto tal, como no
exemplo da pedra e do peso de papel.
No caso dos museus escolares, seus acervos seriam compostos por objetos, coisas, ou
ambos? Quando as coisas da natureza são incorporadas ao museu e passam a assumir a função
de ensino e de representantes do seu correlativo natural (seu semelhante), elas se tornam
113
Assim como se procedeu com os demais documentos utilizados ao longo do trabalho, manteve-se a grafia
original dos escritos das crianças e professores, incluindo os casos em que houve algum desvio da norma
padrão. Além de compreender essa escrita como marca de um tempo, considerou-se apropriado não
descaracterizar a grafia infantil.
| 146
objetos ou permanecem coisas? Este deslocamento de lugar – ambiente natural para a sala de
aula – é suficiente para os tornar objetos ou apenas a mudança na função e uso tem esse
“poder”? Se esses elementos passarem a compor a estante/armário do museu, mas forem
apenas para contemplação, constituirão uma coleção de coisas ou de objetos? Constituirão
uma coleção?
4.2.1 O que faria parte dos museus e para quê
Tendo estas questões em mente, buscou-se compreender o lugar ocupado pelo museu
no currículo escolar, ou seja, a que disciplinas ele esteve vinculado; para tanto, fez-se um
recorte de passagens que indicam a sugestão de coisas e/ou objetos que poderiam compor os
acervos e sua função. Em certa medida, tal processo mostrou algumas limitações ao dar
informações genéricas, tais como: “falou-nos o prof. encarregado que devíamos cooperar
trazendo insetos, pedras, em fim qualquer novidade” (GE José Bonifácio, Blumenau)
(ARQUIVO..., 1950b, p. 112, grifo meu).
Ou ainda, diversas coisas que interessem ao museu, como “objetos de significação”
(Escola Mista Estadual de Pedra Branca, Bom Retiro) (ARQUIVO..., 1949a, p. 26-28),
“enfim tudo que serve para o museu escolar” (Escola Mista Municipal de Linha Ferreira
Pontes, Urussanga) (ARQUIVO..., 1949a, p. 386), ou, ainda, “não só pedras e sim animais e
outras cousas interessantes” (GE Carlos Gomes, Imaruí) (ARQUIVO..., 1949a, p. 114).
Respostas como estas indicam de algum modo que o conhecimento do que deveria compor o
museu é implícito, consensual e compartilhado, seja entre professora e alunos, seja entre os
sujeitos escolares em geral.
Se, num primeiro momento, esse tipo de registro sintético pareça omissão de
informação, obscurecimento de um princípio que não estava claro no momento, ou seja, nem
os professores sabiam ao certo o que era e o que fazer com um museu, por outro lado,
Bucaille e Pesez (1989) sinalizam que aquilo que faz parte do cotidiano e que é de
conhecimento geral, poucas vezes é escrito, afinal, lhes é familiar. Neste sentido, questionam:
“E o que há de mais familiar, conhecido e cotidiano que a cultura material dos objetos, dos
gestos, dos hábitos de todos os dias?” (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 18).
Outros museus fornecem exemplos do que os alunos poderiam arrecadar, como
“objetos velhos, bichos, conchas, etc.” (GE José Bonifácio, Blumenau) (ARQUIVO..., 1949a,
p. 20); ou “objetos antigos e raros” (GE Castro Alves, Araranguá) (ARQUIVO..., 1946a, p.
| 147
69). São esses os únicos casos em que se mencionam objetos velhos como componentes deste
tipo de museu.
Se estas passagens não auxiliam muito a entender a que este espaço se destinaria,
outras são mais evidentes. Boa parte dos museus menciona os três reinos da natureza como
parâmetro da recolha de objetos, bem como de sua classificação. Há ainda documentos que
replicam o discurso autorizado do estado, constante em documentos normativos, tal como já
foi visto no conteúdo das reuniões pedagógicas (cf. capítulo 3, item 3.2). Este é o caso do GE
Roberto Trompowsky, de Joaçaba. Na primeira reunião do ano:
a professora orientadora expôs a finalidade do museu escolar, explicando que tudo
quanto fosse capaz de oferecer motivo para estudo deverá fazer parte do museu.
Assim, por exemplo: selos, dinheiros, insetos, borboletas, aves empalhadas,
minerais, produtos agrícolas e industriais, etc. (ARQUIVO..., 1950b, p. 77, grifo
meu).
O grifo reproduz textualmente parte do mencionado no Decreto nº 2.991 (citado na
página 133 da dissertação, item 3.3). Este excerto será reproduzido ainda em atas de outros
museus.
Em 1949, em reunião do museu do GE Teresa Ramos de Jaraguá do Sul, a diretora
repete as orientações do referido decreto, sem, contudo, citá-lo nominalmente. Entre as
orientações estão:
[o museu] tem a finalidade de preparar ambiente para estudo e observação da vida
histórica, da fauna, flora e das riquezas de uma determinada zona [...] não é só isto
que faz parte de um museu, mais sim tudo quanto possa oferecer motivo para o
estudo [...] disse-nos ainda que poderíamos conseguir estas coleções por meio de
correspondências com nossas colegas de outros estabelecimentos propondo-lhes a
troca de espécimes exdenticos por outro que lhe faltam (ARQUIVO..., 1949c, p. 74).
A vinculação a uma disciplina específica ocorre por parte da Escola Mista Estadual
Desdobrada da Estrada do sul, km 10, Joinville, cuja documentação aponta que “todos os
objetos nos ajudam no ensino das aulas de ciências, tornando-as concretas” (ARQUIVO...,
1945b, p. 104, grifo meu). O museu tem por fim ainda possibilitar a criança “observar e
conhecer as riquezas de sua Pátria e tudo quanto a natureza produz” (Escola Mista Municipal
Cometa, Joinville) (ARQUIVO..., 1951, p. 214).
Ele ainda é considerado “uma interessante instituição, puramente educativa e um
poderoso auxiliar no ensino de historia natural” (Escola Estadual de Batêas de Cima, Campo
Alegre) (ARQUIVO..., 1946c, p. 406-407). Ao contrário do que se esperava, a correlação
direta com a história natural pouco apareceu, como será visto mais adiante.
| 148
Em relação à dimensão educativa mais ampla, encontrou-se o seguinte registro: o
museu “é uma instituição que certas vezes serve para explicação de certas cousas naturais,
homens de idade chegam [a] ver cousas que nunca tinham visto” (Escola Estadual Mista de
Rio Cachorrinhos, Orleans) (ARQUIVO..., 1946a, p. 186). Esta passagem evidencia uma
dimensão sensorial e perceptiva à qual o museu se prestaria, que é a de sensibilização até
mesmo dos adultos que frequentavam a escola, mostrando-lhes aspectos aos quais ainda não
haviam prestado atenção.
A fim de estabelecer um paralelo entre as pretensas funções de um museu escolar e
dos demais tipos de museus, selecionou-se a reflexão de Meneses (2011) acerca dos museus
históricos. No entendimento do autor, o objetivo destes não é ensinar história, tal qual um
manual. Sua função está em “mostrar a historicidade das coisas [...] ensinar a historicidade do
mundo material em que estamos mergulhados” (MENESES, 2011, p. 418). Nessa perspectiva,
as séries de artefatos não servem para dizer “olha, os artefatos de cozinha conhecidos eram
esses e esses”; os artefatos são o “ponto de partida para você trabalhar problemas históricos”
(MENESES, 2011, p. 418). Portanto, para o autor, um museu de história deve ser um museu
de problemas e não de coisas históricas.
Corre-se o risco de cometer um anacronismo fazendo um comparativo entre essa
concepção contemporânea de museu, e a proposta de museu escolar do século XX. Ainda
assim, a partir dessa aproximação, pode-se afirmar que o intuito dos museus escolares se
distancia dos demais justamente porque pretende utilizar os objetos para estudo. Esta é sua
função: possibilitar o conhecimento das ciências, da região onde a escola está inserida, ou o
que quer que seja, numa perspectiva de museu laboratório (próximo dos museus de história
natural do século XIX; cf. item 1.2).
Portanto, o que distingue o museu escolar dos outros tipos de museu é justamente a
função educativa direta; afinal, os objetos são utilizados para e como estudo, podendo,
inclusive, se degradar e ser substituídos. Todavia, o posicionamento de Meneses (2011) não é
consensual, nem garante que seja a realidade dos museus; afinal, muitos museus de arte e de
história acabam pretendendo ensinar arte e história, bem como inúmeros museus escolares
acabaram não ensinando conteúdos escolares diretamente.
4.2.2 Museu como ornamento: um espaço de visitas, de aulas ou um centro de interesse?
Em relação ao lugar ocupado pelo museu na escola, destaca-se o seguinte excerto de
uma ata de 1949:
| 149
[A professora] disse-nos tambem que esforço e dedicação por nós despendidos
seriam de utilidade e que plenamente seriam recompensados. Que o pouco que ja
haviamos feito não era bastante para levarmos de vencida uma obra tão grande e
nem causava embaraços nos nossos estudos, mas sim um grande auxilio (GE Teresa
Ramos, Jaraguá do Sul - ARQUIVO..., 1949a, p. 122, grifo meu).
Em alguma medida, este registro singelo dá conta da dimensão na qual o museu estava
envolto nas escolas do período, num misto de reconhecimento da importância com a
necessidade de justificar sua presença, que não atrapalharia os estudos; pelo contrário, seria
um grande auxílio. Nesta mesma direção, deparamo-nos com o seguinte registro: “cada aluno
deveria trazer alguma coisa para o enriquecimento do Museu, pois esta era tambem uma
associação de grande importância” (GE José Bonifácio, Blumenau) (ARQUIVO..., 1946a, p.
82, grifo meu).
Igualmente são proferidas palavras de estímulo aos sócios do museu para que não
esmoreçam no cumprimento das tarefas. Em boa parte das atas, as professoras encarregadas
por essa associação cumpriam a função de verdadeiras incentivadoras, vinculando o trabalho
de ampliá-la ao serviço em prol da Pátria (ARQUIVO..., 1946a, p. 78). O professor do GE
Carlos Gomes, de Imaruí, lembrou aos alunos que o museu “[...] não pode surgir rapidamente
e tornar-se logo de pronto um museu bonito tendo de tudo. Nós alunos é que devemos
organizá-lo” (ARQUIVO..., 1949a, p. 111). Todas as atas desse grupo durante o ano seguem
um tom incentivador, cobrando mais esforço e menos descuido.
À medida que novos esforços são solicitados, alguns recursos discursivos são
acionados, como a utilização de termos vinculados à boa vontade e ao amor. Dito de outro
modo, a constituição de um museu é menos requerida em termos pedagógicos, e mais em
termos afetivos, como fica evidenciado na seguinte passagem: “Nesses 3 meses os alunos
trataram sempre com amor e carinho de nosso Museu” (II Escola Mista Estadual de José
Boiteux, Ibirama) (ARQUIVO..., 1949a, p. 87).
Mesmo que recorrente, este discurso não é hegemônico. A explicitação das funções do
museu também é utilizada como estratégia para envolver os estudantes. “O museu é um
grande auxiliar do professôr porque com êle, torna-se mais prático o ensino de ciência.
Portanto devemos cada vez [com] mais ardor enriquecer nosso pequeno museu” (Escola Mista
Estadual de Barra do Rio, Itajaí) (ARQUIVO..., 1949j, p. 268).
Se a maioria dos documentos relata um interesse por parte dos alunos ou, ainda, os
estimula para que o tenham em maior consideração, em duas escolas a explicação fica a cargo
do desinteresse: “O museu não tem maior realce por não haver entre os alunos interesse por
| 150
coleções de cobras e outros reptis semelhantes” (Escola Desdobrada de Ilha Grande, Orleans)
(ARQUIVO..., 1946a, p. 184).
Num misto de valorização e incentivo, nota-se um processo contínuo de adjetivação
dos “objetos”. “O que mais enfeita o nosso museu é uma cobra que foi embalsamada, está
dentro de um vidro [e] foi o que mais interessou aos alunos” (Escola Estadual de Avenquinha,
Campo Alegre) (ARQUIVO..., 1944-1947, p. 114).
A qualificação pela qual os objetos passaram e, num espectro maior, os próprios
museus, constituiu um procedimento corriqueiro, identificado no registro de atas e relatórios.
Ao deixarem de fazer parte da natureza e alcançarem o status de objetos didáticos ou peças de
museus, os artefatos foram ressignificados, transformando-se em bonitas conchas, pedras
interessantes, linda casa de marimbondo, objetos bonitos e interessantes, conchas muito
lindas, inseto muito bonito, linda borboleta, lindas penas de pássaros, raríssimos insetos,
lindo e raro exemplar da fauna, passarinho bem feitinho114
, entre outros, utilizando-se, em
alguns casos, o diminutivo.
Este dado pode ser compreendido em dois sentidos: primeiro, como tentativa de
valorização do museu por meio da qualificação de seu acervo, afinal ele não seria composto
apenas por conchas, mas pelas mais belas conchas, conchas especiais, diferentes, dignas de
estarem naquele lugar... E, em segundo, talvez indique o sentido que lhe era atribuído, ou seja,
objeto como ornamento. Essa segunda hipótese é endossada por outros registros que
evidenciam os artefatos como enfeites e ornamentos. Um exemplo disso encontra-se no
registro da Escola Mista Estadual de Lindemberg, de Campos Novos. No mês de março, a
professora “pediu bico de aves, penas, moedas antigas [e] as amostras de madeiras que ainda
faltam para enfeitar o Museu” (ARQUIVO..., 1949c, p. 50). Em junho, a ata informa que “foi
recebido mais umas amostras de cereais e insetos que serviram para ornar melhor o nosso
museu” (ARQUIVO..., 1949a, p. 47).
Enfeitar, ornar, adornar, embelezar, enriquecer são verbos frequentes, vestígios de
uma apropriação criativa efetuada pelas escolas, uma vez que não diz respeito a orientações
formais; não se trata de uma orientação ou exigência e sim de um modo bastante peculiar de
atuar e compreender esse “instrumento didático”.
Presente é outro termo pelo qual os objetos são inúmeras vezes designados. Nesse
sentido, as crianças ofertam peças para compor o museu, os quais não são, à primeira vista,
entendidos como elementos de estudo e sim como objetos decorativos, preciosidades,
114
Esse tipo de adjetivo foi localizado em diferentes documentos de variados anos, tais como: ARQUIVO...,
1944-1947, 1946a, 1945b, 1948g, 1949a, 1949g, 1945/48-1950, 1950c.
| 151
prendas. Para o GE Conselheiro Mafra, de Joinville, tratava-se de curiosidades. Em todos os
meses havia o registro de quais curiosidades foram adquiridas, sendo substituídas algumas
vezes por dádivas (o que se dá e recebe gratuitamente) (ARQUIVO..., 1946a). Aqui, pode-se
entender o museu numa dimensão exótica ou similar, cujo acervo é composto por raridades,
curiosidades, aproximando-se de um fetiche.
Além de os objetos serem qualificados, a associação museu também passa a ser
classificada como útil, utilíssima, bonita, interessante. Por vezes ocorre o inverso, ou seja, o
reconhecimento de que é modesto, pequeno, etc.; no entanto, sempre bem organizado, útil e
em fase de expansão. Tal como pode ser visto: “Aqui na sala temos um pequeno mas bem
organizado [museu] com diversas coleções de milho, feijão, madeira, alguns cascos de
animais, etc.” (Escola Mista Estadual de Ilhota, Itajaí) (ARQUIVO..., 1949c, p. 57, grifo
meu).
“O museu de nossa escola é pequeno, mas bem cuidado pelos alunos” (Escola
Municipal Itinga, Joinville) (ARQUIVO..., 1949h, p. 64). “Há nesta escola um museu muito
simples e desorganizado, mas assim mesmo muito apreciado e interessante” (Escola Estadual
de Guatá, Orleans) (ARQUIVO..., 1947, p. 235).
Das 319 escolas que compõem o conjunto documental aqui utilizado, apenas sete
informaram ter ocorrido ao menos uma visita ao museu, independente do período coberto pela
documentação de cada escola. Esse número diminuto informa que as visitas não faziam parte
do ritual mensal. Localizaram-se apenas dois registros de visita por parte do inspetor escolar.
Uma delas se deu no ano de 1949 na Escola Mista Municipal de São José, município de
Urussanga. Entre as sete escolas referidas, em uma delas o museu “foi visitado pelos socios
do circulo de pais e mestres” (Escola Isolada Estadual Mista Desdobrada de Aiurê, Orleans)
(ARQUIVO..., 1946a, p. 185). Em outra informa-se, de modo genérico, que “aos domingos
vez em quando vem alguem apreciar nosso museu” (Escola Mista Municipal de Barra Grande,
Taió) (ARQUIVO..., 1949a, p. 236).
No GE Henrique Lage de Laguna, na segunda reunião do ano no mês de março, “a
professora encarregada levou os alunos ao museu para estes ficarem conhecendo o mesmo e
todos ficaram muito admirados” (ARQUIVO..., 1946a, p. 174).
No dia 15 de março de 1946, os alunos de um grupo escolar não identificado fizeram a
primeira visita ao museu. Acompanhados da professora:
examinamos tudo que la existia com curiosidade [e] interesse. Vimos muitas coisas
bonitas, mas achamos o nosso museu ainda um pouco pequeno e ficamos muito
entusiasmados para enriquecê-lo e embeleza-lo. A professora Sueli B. Kasting nos
| 152
falou sobre o desenvolvimento do bicho da seda, animalzinho este que muita coisa
interessante nos oferece para o museu, e o qual estamos muito interessados em
adquirir (ARQUIVO..., 1946a, p. 154, grifo meu).
Neste excerto, notam-se a adjetivação dos objetos e o aparelhamento do museu, visto
como exercício de enriquecimento e embelezamento.
No GE José Bonifácio de Blumenau, na primeira reunião de 1950, há o registro em ata
que “[...] devíamos visitar de quando em quando o museu” (ARQUIVO..., 1950b, p. 112). No
relatório final de 1950, consta que ocorreram visitas em abril e maio daquele ano.
Apenas dois grupos escolares registraram a ocorrência mais sistemática de visitas. No
GE General Osório, de Canoinhas, em julho de 1949 o relatório mensal informa que foram
realizadas cinco visitas, enquanto no mês de setembro do mesmo ano o número aumentou
para oito; já em outubro foi realizada visita com todos os alunos das classes, porém a
quantidade não está informada (ARQUIVO..., 1949a, p. 31-32/34).
Em 1946, o GE Professor Padre Schuler de Urussanga informa que no mês de abril “o
museu escolar Getúlio Vargas deste educandário foi visitado não só pelos alunos mas tambem
por pessoas estranhas do estabelecimento” (ARQUIVO..., 1946a, p. 266). No mesmo ano,
ocorreram visitas em maio “só pelos alunos”; em junho, pelos alunos e professores; em julho,
pelos alunos, “pessoas estranhas” e professores; em agosto, setembro e outubro, por
professores e alunos e, em novembro, pelos alunos. Registra-se, portanto, a ocorrência de
visitas mensais ao longo de oito meses em 1946.
Embora não informe propriamente a realização de visitas, uma escola menciona a
necessidade de aumentar o acervo para que elas sejam mais frequentes, e o GE Felipe
Schmidt, de São Francisco do Sul, por sua vez, é bem claro ao informar sobre um dos
aspectos do museu, a saber, sua função frente à comunidade. Com este fim, devem-se
“arranjar objetos que sirvam para aumentar o número de coisas que já tem no Museu e fazer
uma arrumação em ordem para uso das aulas e para bem impressionar a vista das pessoas que
visitem este estabelecimento de ensino” (ARQUIVO..., 1946a, p. 239, grifo meu).
A pouca visitação demonstra o entendimento do espaço como local a ser
visitado/venerado e possibilita pensar em até que ponto não se constituía mais num espaço de
guarda de objetos do que de estudo, o que representaria outra função. De acordo com Falarz
(1927, edição de 1997, p. 118), o museu se torna um meio de instrução e educação “[...]
quando o aluno deixa de ser um mero visitante e passa a ser um operoso freqüentador”. É
interessante notar que o registro de visitas pelos alunos ocorre nos grupos escolares, nos
quais, teoricamente, o museu se localizaria em um gabinete. Já nas escolas isoladas, o espaço
| 153
se resumia muitas vezes à sala de aula, local de instalação do museu. Nestes casos, a visita
ocorria por parte dos pais e pessoas da comunidade.
Pode-se fazer a leitura de que quando o formato do museu deixa de ser exclusivo da
sala de aula ou de um gabinete para se tornar uma associação auxiliar, ele perde a
potencialidade de ligar-se diretamente ao ensino de conteúdos, uma vez que passa a ser gerido
por uma diretoria que determina quais objetos serão recolhidos e promove estratégias para
essa recolha, restando aos demais alunos não-sócios a visita e contribuições esporádicas.
Basicamente na mesma proporção em que eram realizadas visitas, também o eram as
aulas no museu ou com os objetos dele. Cinco escolas mencionam a realização de aulas de
noções comuns: “Os objetos do museu foram todos postos em papel celofane e são sempre
usadas para as aulas de noções comuns” (II Escola Estadual de Fragosos, Campo Alegre)
(ARQUIVO..., 1946a, p. 107). Ou, ainda: “nosso museu escolar apezar de simples e modesto
foi instalado no dia 19-4-1943. É muito prático em uma escola, pois apezar de nele
conhecermos peças vegetais, animais, minerais e outras muito nos auxilia em nossas aulas de
noções comuns” (Escola Estadual Mista Desdobrada de Rio Cêrro II, Jaraguá do Sul)
(ARQUIVO..., 1946d, p. 10).
Esse segundo registro é curioso, pois coloca em contradição o tipo das peças e a
possibilidade de realização de aulas de noções comuns. O uso da conjunção concessiva
apesar, salvo o caso de ser um erro de coesão, dá a entender que, mesmo sendo composto por
peças relativas aos três reinos da natureza, ainda assim auxilia nas aulas de noções comuns.
Na Escola Estadual Desdobrada de Canivete, em Mafra, todas as peças do museu – animais,
vegetais, cereais e mineiras – “muito contribuem para as aulas de noções comuns”
(ARQUIVO..., 1946c, p. 318). Em outra escola, 22 peças, entre cobras, crânios de animais,
raízes e pedras, auxiliam a professora a orientar as aulas de noções comuns (ARQUIVO...,
1946a, p. 247). Mas, afinal, o que são as aulas de noções comuns? Nos programas propostos
para a escola primária entre 1911 e 1946, não se encontra uma disciplina com esse nome
(Apêndice A).
Segundo Valdemarin (2008b), na obra Escola Brasileira de João Toledo (1925), o
autor adota o conceito de experiência a partir dos sentidos; “nessa perspectiva, o programa
escolar deve incluir o ensino de noções comuns (mais abrangentes que as lições de coisas e
menos específicas que o estudo da natureza) que abordam o domínio das coisas que ocorrem
na sociedade à qual o educando pertence” (VALDEMARIN, 2008b, p. 77, grifo meu).
Em obra de 1934, intitulada Planos de lição. Noções comuns, Toledo considera que
“os centros de interesse resumem uma idéia central em torno da qual são apresentados
| 154
conhecimentos seriados reunidos em noções comuns” (VALDEMARIN, 2008b, p. 78, grifo
da autora). Na leitura dessa historiadora da educação, as abordagens e exemplificações
presentes nas obras de Toledo “[...] evidenciam que trata-se de uma justificação conceitual
nova para práticas já existentes”, cujo suporte cognitivo da experiência são os sentidos e não a
atividade (como defendido por Dewey); “as lições de coisas organizadas numa seqüência
diferente são o conteúdo básico para a composição dos centros de interesse que são também
nomeados de noções comuns” (VALDEMARIN, 2008b, p. 79).
As noções comuns nessa perspectiva não são tomadas como método de trabalho, visto
que as disciplinas continuam organizadas de acordo com um programa pré-fixado. Também
não correspondem a um conjunto de saberes específicos, sendo relativas aos aspectos sociais
presentes no ambiente do educando, muito próximo ao defendido por Decroly (cf. item 3.3).
Na Escola Mista Estadual de Rio do Morro, município de Araquari, no mês de outubro
de 1946, “foi dado aula pela secretario e pelo presidente de noções comuns, historia e
geografia sobre os objetos que existem no museu” (ARQUIVO..., 1946a, p. 33). Neste mesmo
ano, a escola informa que nos meses de março, maio e junho foi a professora quem deu aula
sobre os objetos.
O uso do museu em ciências, história e higiene pode ser observado em ata do GE
Professor Padre Schuler de Urussanga. Sobre:
a coleção de pássaros foi falado para os alunos que mata-se e coloca-se em alcool
sem organismo para aproveitar uma aula de ciências etc. Também o Museu Escolar
do nosso estabelecimento não deixará de apresentar centros de interêsses para
dispertar entusiasmo aos alunos nas aulas de história higiêne cujos pontos podem
ver mais desenvolvidos e esclarecidos de acordo de cada classe (ARQUIVO...,
1949a, p. 391, grifo meu).
Nesta passagem, além da indicação de uso, evidencia-se uma prática de constituição
do acervo por meio da captura de pequenos animais, cuja espontaneidade da oralidade é
transposta para a escrita, causando certo estranhamento no século XXI, vista como uma
prática impensável de ser incentivada entre os estudantes.
Outras três escolas relatam, de modo genérico, a realização de aulas, exposições ou
palestras sobre a utilidade do museu, sobre um objeto, ou sobre coisas específicas, como
insetos, borboletas e ovos de passarinhos (ARQUIVO..., 1945b, 1946a, 1949h). Na Escola
Mista Estadual de Gasparzinho, município de Gaspar, em todas as reuniões de 1949 e 1950, a
professora explicou o “valor educativo de cada objeto que se acha expôsto no Museu”
(ARQUIVO..., 1949a, p. 57).
| 155
Além de aulas sobre noções comuns e aulas específicas sobre algum objeto, as de
ciências são mencionadas em dois documentos. Relata-se ainda que a secretária (estudante) de
um museu deu uma aula de “conhecimentos gerais” (ARQUIVO..., 1948g, p. 304-305). Em
uma delas, “[...] foi dado aula de ciencia, tendo a professora mostrado uma vertebra de um
mamífero” (ARQUIVO..., 1949a, p. 58). Em outra escola, a presidente da associação:
disse que um museu escolar era de muita necessidade pois que por meio de objetos
existentes no museu, os professores poderiam explicar melhor as aulas de ciências
[...] deu como exemplo uma balança servindo-se do berço do mata-borrão e de
laranjas que partiu, separou os gomos e explicou a germinação da semente (GE
Henrique Lage, Laguna) (ARQUIVO..., 1946a, p. 170).
A descrição da utilização do acervo do museu é rara, sendo os exemplos aqui
transcritos os únicos localizados. Este é o caso da Escola Mista Estadual de Batêas de Baixo,
em Campo Alegre: “tínhamos no nosso museu um casulo e passados alguns dias saiu dele
uma bela borboleta, sendo isto uma ótima aula” (ARQUIVO..., 1944-1947, p. 62). Além das
preleções por parte dos professores, os membros da diretoria poderiam ser incumbidos de
realizar trabalhos referentes à associação e apresentar em reuniões subsequentes
(ARQUIVO..., 1949a, p. 101-102). O uso das peças como incentivo às aulas também é
mencionado (ARQUIVO..., 1946e, p. 447).
Pela baixa recorrência de situações nesse estilo, considerou-se uma especificidade de
poucas escolas a realização mais ou menos sistemática de aulas no museu ou a partir de seus
objetos. Por outro lado, como já mencionado, a condição do museu como associação impede a
visualização de alguns pontos; os registros em ata e o relatório não dão conta de toda a
dinâmica escolar e do que ocorria no interior das salas de aulas, sobretudo de escolas
compostas por várias classes.
Se estes apontamentos dão nota de tentativas de uso dos objetos, a interdição deste
também é ressaltada. “Nesta reunião ficamos avisados para cuidar que, quando abrimos a sala
do Museu não devemos deixar as crianças tocarem com as mãos, os vidros do armário para
não sujarem” (GE Roberto Trompovsky, Joaçaba) (ARQUIVO..., 1949a, p. 131). O mais
interessante nesta passagem não é a proibição de encostar no acervo e sim a proibição de tocar
no vidro do armário, aviso elaborado provavelmente devido à recorrência desta prática entre
os estudantes, que, ao adentrarem na sala do museu, sentiam-se compelidos a se aproximar de
um conteúdo exposto apenas para os olhos.
A relação entre museu e centro de interesse foi mencionada em alguns pontos ao longo
da dissertação. Após a transcrição e leitura das atas e relatórios do museu foram pinçadas
| 156
passagens que faziam menção aos centros de interesse. O modo de fazer referência não
permite compreender a fundo do que se trata, ou seja, o que as escolas entendiam por centro
de interesse, possivelmente por se tratar de um repertório linguístico comum no período, o
que não demandou uma explicação.
A Escola Mista Estadual Desdobrada de Velha Central, de Blumenau, por exemplo,
lista entre os objetos adquiridos ao longo do ano, pedras, borboletas, caramujos e dois centros
de interesse (ARQUIVO..., 1945/48-1950, p. 307). Do mesmo modo, o GE Feliciano Pires de
Brusque menciona o registro de um centro de interesse e de borboletas na reunião de abril
(ARQUIVO..., 1946a, p. 84). Outro museu pede auxílio para os sócios colecionarem alguns
centros de interesse (ARQUIVO..., 1949g, p. 351).
Enquanto essas três escolas dão a entender que o centro de interesse pode ser um
objeto, talvez um cartaz em cartolina, como o indicado pelo DE (cf. item 3.3), outras escolas
consideram o museu como um centro de interesse. “É o nosso pequeno museu um centro de
interesse, pois os alunos desta escola e mesmo as pessoas da localidade, enviam objetos a fim
de serem colocados sobre a mesa” (Escola Estadual Isolada de Ximbuia, Campo Alegre)
(ARQUIVO..., 1946d, p. 189). A conclusão do relatório anual do museu da Escola Estadual
Desdobrada do km 5, Joinville, é de que “o museu teve grande utilidade, como centro de
interesse na interpretação das aulas” (ARQUIVO..., 1949h, p. 278). Na segunda reunião anual
da Escola Mista Municipal de Anaburgo, em Joinville, a professora perguntou aos alunos se
eles sabiam o que era um museu e para que servia. Pediu então para que todos trabalhassem,
“pois um museu dentro de uma sala de aula, é um grande centro de intêresse” (ARQUIVO...,
1951, p. 122). Esta dimensão do museu da classe como centro de interesse é mencionada no
Decreto nº 2.991, de 1944.
Como terceira dimensão aparece os centros de interesse mais fáceis de serem
visualizados, tais como: centro de interesse sobre o café (ARQUIVO..., 1949g, p. 108); “um
quadro do centro de interesse, de diversas paisagens da nossa Patria, e servirá-nos muito para
as aulas de linguagem” (ARQUIVO..., 1948g, p. 279); arrecadação de rótulos de garrafas para
fazer um centro de interesse (ARQUIVO..., 1946a, p. 174); arrecadação de selos e figuras de
animais para serem organizados álbuns e centros de interesse (ARQUIVO..., 1949a, p. 334).
4.2.3 Pequenos festejos: o museu a serviço da Pátria
Entre as práticas desenvolvidas pelo museu como associação auxiliar da escola e que
não estavam estipuladas como sua competência está a realização de rituais simbólicos, além
| 157
de festejos patrióticos. Na Escola Mista Estadual Desdobrada de Itapocu, Araquari, por
exemplo, cada oferta de objeto de um aluno ao museu era saudada por uma salva de palmas
(ARQUIVO..., 1944b, p. 172). Este momento de encontro dos estudantes para cuidar da
associação é envolto numa espécie de espetacularização, sendo ritualizada uma prática que em
tese deveria ser corriqueira e ligada ao ensino, a saber, a entrada de objetos no museu.
A rotina de reuniões do museu do GE Felipe Schmidt, de São Francisco do Sul, era
composta por canto de hino de abertura, elogio aos alunos que haviam arrecadado objetos,
declamação de poesias, fala da professora e encerramento com canto de hino. No dia 30 de
maio de 1949, a professora “Dona Ocirema contou, aos alunos, uma historieta sobre ‘o
passarinho’, a qual muito nos serviu de exemplo, pois, como passarinhos, poderemos carregar
para o ‘museu’ do nosso Grupo Escolar, lindas cousas do mato, da praia, etc.” (ARQUIVO...,
1949a, p. 229).
Em geral, os museus que têm como hábito o canto de hino e declamação de poesias o
fazem em todas as reuniões, enquanto a grande maioria não registra esse tipo de atividade. O
museu do GE José Bonifácio de Blumenau, por exemplo, entre 1946 e 1950, entoou diversos
hinos: à Bandeira; Hino Terra Virgem; Democracia; Terra Brasileira; Quero Voltar; Para a
Escola; a Getúlio Vargas; Esperança da Terra; Estudantes do Brasil; Descobrimento do Brasil;
Canção Matinal; Esperança da Terra de Anita; Duque de Caxias; Sete de Setembro; A
Gaúcha; Desfilemos; Glória aos Homens e De pé Brasil (ARQUIVO..., 1946a, 1949a, 1949c,
1945/48-1950).
Além do canto de hino, alguns museus incluíam em suas reuniões declamação de
poesias, montavam álbuns de poesias e realizavam a hora da arte. Outra forma de expressar
amor e dedicação ao País está na vinculação entre o trabalho realizado no museu para seu
progresso e o engrandecimento do Brasil (ARQUIVO..., 1949a, p. 86). Na ER Professora
Emília Mamede Soares, em Orleans, as associações realizaram em conjunto uma festinha em
homenagem a Rui Barbosa; dividindo o dinheiro arrecadado, couberam ao museu cinco
cruzeiros, com os quais adquiriu cartolina para encapar os relatórios e comprou um caderno
para lavrar as atas (ARQUIVO..., 1949a, p. 160).
Apenas um museu, entre os analisados, realizou atividades em homenagem ao patrono,
João Barbosa Rodrigues. Entre os preparativos para a comemoração, foi enviada
correspondência ao herbário, que levava o mesmo nome em Itajaí, ao qual foi solicitada cópia
da biografia do cientista. Além disso, decidiu-se inaugurar um retrato do patrono, momento
em que seriam feitas comemorações patrióticas. Tal evento ocorreu em 13 de agosto de 1949.
| 158
O programa apresentado foi o seguinte: Hasteamento da Bandeira – Hino Nacional.
Saudação à Bandeira – Adelaide Salutchach. Santa Catarina – poesia – Marlene
Teste. O batismo do Brasil – Lindarei Pinna. A Bandeira – poesia – Nasira Mussi.
Sou brasileiro – Leocadio Matcembach – Ao Brasil – poesia – Verônica
Dombaroski. Hino ao Grupo Escolar. Minha pátria – poesia – Ivete Senff. A terra
brasileira – poesia – Maria Colita. Biografia “João Barbosa Rodrigues” – Emilia
Prieto. Canção de marcha – canto. O senhor inspetor escolar, acompanhado pelo
corpo docente do Grupo Escolar, foi a sala do Museu e inaugurou o retrato do
patrono (GE Balduíno Cardoso, Porto União - ARQUIVO..., 1949a, p. 202).
Em decorrência dessa homenagem, o museu realizou uma exposição que foi “muito
visitada” (ARQUIVO..., 1949a, p. 201).
4.2.4 Colecionar, classificar, limpar e expor
Uma das características dos museus escolares era a disposição de pouco espaço físico.
Deste modo, praticamente tudo o que compunha o acervo permanecia em exposição, ou seja,
aos olhos dos alunos, com exceção das escolas que possuíam museus de classe e museu geral.
Foram identificadas apenas duas exposições para além das costumeiras, no GE Rui Barbosa
de Joinville. Em comemoração ao centenário do patrono da escola, o museu organizou uma
exposição dos produtos de indústrias do município e de Santa Catarina (ARQUIVO..., 1949a,
p. 133).
Já a Escola Estadual Dr. Vidal Ramos de Escalvado, Araquari, ao longo do ano de
1948 realizou uma exposição temática por mês, em quatro meses, entre as quais estiveram
expostas: penas; borboletas; insetos; armas dos índios e animais selvagens do Brasil
(ARQUIVO..., 1948g, 1948i, 1948j).
Ao lado da questão da exposição, encontra-se a de constituição de coleções, que por
sua vez remete a um processo de classificação. O Decreto nº 335 de 28 de setembro de 1948,
no item correspondente ao museu, exigia que fossem informados os objetos existentes no
início do ano e os que fossem adquiridos ou confeccionados pelos alunos. Às outras
associações solicitava-se envio do resumo das atas (SANTA CATARINA, 1948).
A partir de 1948, torna-se sistemático listar a quantidade de objetos existentes no ano
anterior, em relação aos adquiridos ao longo do ano atual. Em alguns museus, esta
metodologia transforma-se na forma de ordenar o acervo. Antes mesmo da expedição deste
decreto, já se fazia menção à existência de objetos “antigos”; porém, é nos relatórios finais de
1948 que essa divisão aparece com mais ênfase.
Ainda assim, foram identificados outros dois métodos recorrentes de organização das
coleções. Primeiro, uma divisão segundo a taxonomia, ou seja, a classificação dos seres em
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três reinos: animal, mineral e vegetal. É interessante perceber que a partir dessa distinção
algumas coisas não se enquadravam, pois referiam-se a objetos manufaturados, ao invés de
seres vivos. Neste caso, a Escola Estadual de Pedra Branca, de Bom Retiro, considera
“artificialmente” pertencentes ao reino vegetal facas, machado, martelo, garfo, etc.
(ARQUIVO..., 1949a, p. 27). Outras escolas optaram apenas por designar a quantidade de
peças existentes em cada grupo, sem as discriminar.
No caso de coleções que seguem os três reinos, usa-se como padrão o elemento natural
ao qual estão ligados, ou seja, origem e semelhança. Um segundo conjunto de museus adota
como critério para constituição das coleções um componente exclusivo. São coleções de:
aves, caramujos, cereais, cobras, conchas, couro, dentes de animais, feijão, insetos, madeira,
ninhos de pássaros, ossos, ovos, pedras, penas, raízes, selos e sementes.
Em um museu havia uma coleção de objetos patrióticos (ARQUIVO..., 1948g, p. 81).
Em outros, encontram-se coleções de produtos agrícolas ou industriais. Contudo, esse tipo de
coleção, de modo distinto do acima mencionado, agrega objetos a partir de uma temática e
não necessariamente com base em uma semelhança. Principalmente no caso de uma coleção
industrial, há uma infinidade de objetos possíveis, enquanto numa de minerais encontram-se
apenas minerais, e numa de ossos encontram-se apenas ossos, ainda que diversificados. O
museu da Escola Mista Municipal de Serra Alto Rio dos Índios, Ibirama, adotou as famílias
como critério de organização das qualidades agrícolas (ARQUIVO..., 1949c, p. 43).
Por sua vez, a Escola Mista Estadual de Alto Rio dos Índios, também de Ibirama,
organizou os objetos em naturais e artificiais (ARQUIVO..., 1948e, p. 55).
Levando em conta essas diferenças, o que se pode considerar como coleção? Para
Pomian (1984, p. 53), uma coleção é: “qualquer conjunto de objectos naturais ou artificiais,
mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito das atividades económicas, sujeitos a
uma protecção especial num local fechado preparado para esse fim, e expostos ao olhar do
público”.
A partir dessa descrição, o autor entende que não fazem parte desses grupos, “todas as
exposições que são apenas momentos do processo da circulação ou da produção dos bens
materiais, e, por outro, todas as acumulações de objectos formados por acaso e também
aqueles que não estão expostos ao olhar (como os tesouros escondidos) [...]” (POMIAN,
1984, p. 53).
Numa adesão estrita a essa argumentação, os museus escolares cujos acervos foram
formados aleatoriamente, não comporiam uma coleção. Além disso, seria necessário que
ficassem expostos ao olhar. Ao mesmo tempo em que os objetos eram organizados em
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“coleções”, alguns museus procediam à identificação das peças, tendo sido encontrados os
seguintes formatos: “nome do museu e do grupo ao qual pertence, nome da espécie e a data da
aquisição, bem como o nome do sócio ou aluno doador” (GE Correa Pinto, Lages)
(ARQUIVO..., 1949c, p. 82).
Com mais frequência fixavam-se rótulos ao redor dos vidros com ou sem o nome do
doador (ARQUIVO..., 1946a, p. 85; ARQUIVO..., 1950b, p. 36). Quanto à guarda e ao
registro do acervo, no GE Teresa Ramos de Jaraguá do Sul, a professora aconselhou as
crianças “que a fim de evitar extravios de certos objetos do ‘Museu’ seria conveniente deixa-
los sôbre a guarda de alunos espertos, que deveriam anotar em cadernos o seguinte: O nome
do doador, dia e mês em que foram doados ou adquiridos” (ARQUIVO..., 1949a, p. 123).
Este tipo de estratégia, designando alunos mais espertos, também aparece nas orientações
acerca das associações (SANTA CATARINA, 1944c).
Um dos aspectos mais frequentes em atas e relatórios diz respeito à higienização dos
museus, prática recorrente e que caracteriza uma generalidade entre as escolas. Por mais
corriqueiro que possa parecer, a limpeza das peças é considerada importante e digna de nota,
sendo, em alguns casos, a única atividade exercida pelos membros dessa associação. Ao
mesmo tempo em que era realizada a limpeza, organizavam-se, excluíam-se objetos
deteriorados e fazia-se a inclusão de novos artefatos. Essa rotina acontecia no mínimo uma
vez a cada mês, chegando, em alguns casos, a ser semanal. O professor da Escola Mista
Estadual Desdobrada de Alto Rio dos Índios, em Ibirama, recomenda “que as meninas do
museu devem todos os dias de manhã arrumar o museu, zelando pela sua conservação”
(ARQUIVO..., 1949a, p. 84).
A partir de registros como esse, nota-se uma distinção de gênero, uma vez que em
praticamente todos os museus a tarefa de limpeza cabia às meninas. Já na Escola Desdobrada
de Ilha Grande, Orleans, o critério para escolha do aluno responsável ao qual foi confiada a
limpeza repousou no interesse, sendo indicado o mais interessado (ARQUIVO..., 1946a, p.
184).
O descarte dos objetos seguia o critério do estado de conservação, sendo eliminados
aqueles que, devido ao tempo, ficavam impróprios (ARQUIVO..., 1949c, p. 7). Esta situação
ocorria mais facilmente com bichos e cereais (ARQUIVO..., 1948g, p. 349), tal como
aconteceu na Escola Estadual Isolada de Ximbuia, em Campo Alegre, onde de agosto até o
final do ano “os ratos liquidaram com os cereais” (ARQUIVO..., 1946d, p. 189).
Uma das formas de conservar pequenos animais e insetos estava na submersão em
álcool, sendo denominado por alguns museus de “estado – conserva” (ARQUIVO..., 1946a, p.
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131). Deste modo, por exemplo, as cobras seriam colocadas em conserva (ARQUIVO...,
1949a, p. 104). Além do uso de álcool, um museu mencionou a conservação de uma cobra na
cachaça (ARQUIVO..., 1949a, p. 354).
Entre as tarefas de limpeza estavam a troca dos papéis das estantes e a nomeação das
peças (ARQUIVO..., 1949g, p. 195). Um museu mencionou que foi lavada a cortina da
estante duas vezes no ano, informação que caracteriza o móvel composto por estante e cortina
(ARQUIVO..., 1949a, p. 310). Em uma das lavagens, o relatório informa que foram lavados
também alguns objetos do museu (ARQUIVO..., 1949a, p. 295).
A necessidade de manter conservado o museu não é o único argumento acionado para
solicitar que os alunos cumpram essa tarefa. Exemplo disso é a seguinte passagem: a
professora “pediu a Secretaria que trouxesse o Museu sempre limpo, sem poeira e para isso
era preciso que na hora do recreio fizesse uma limpeza em todos os utensílios do referido
museu, porque a falta de higiene demonstrava o pouco capricho e asseio da parte dos mesmos
alunos” (Escola Mista Estadual de Lindemberg, Campos Novos) (ARQUIVO...,1949a, p. 48).
Além do aspecto moral relacionado a hábitos saudáveis de higiene, nota-se, neste excerto, que
a atividade deveria ser realizada durante o recreio; portanto, fora do horário da aula.
Os momentos de limpeza serviam também para dispor os objetos, procurando uma
solução estética. “A professora encarregada sempre visita o museu para orientar-nos cada vez
mais e mostrando-nos como pode ficar melhor a posição das cousas” (GE Osvaldo Cruz,
Rodeio) (ARQUIVO..., 1949a, p. 219). Em situação oposta, registra-se: o museu “[...] que
anteriormente apresentava um aspecto de atração, achava-se [no início do ano] em completa
desordem, dando a impressão que, em 1949, os professores não zelaram pelo seu
desenvolvimento. Acrescentamos, também, que muitas das peças desapareceram” (Escolas
Mistas Estaduais de Arvoredo, São Joaquim) (ARQUIVO..., 1950b, p. 46-47).
Por se tratar de uma atividade corriqueira, a limpeza e substituição de objetos
estragados, era por si só, conteúdo para escrita das atas mensais, muitas das quais se resumem
a informar esse tipo de atividade.
4.2.5 Estratégias de formação dos acervos
O Decreto nº 335, de 28 de setembro de 1948 que fornece instruções para a confecção
dos relatórios anuais das associações auxiliares solicitava, no que tange ao museu, a
informação do nome dos alunos, professores ou turmas que mais haviam trabalhado para o
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desenvolvimento da associação (SANTA CATARINA, 1948). Cumprindo com o
determinado, algumas escolas inseriram esse dado em atas e relatórios.
Este procedimento, mais do que o cumprimento de uma determinação, fornece
indícios de uma valorização/visibilização da participação dos alunos, cujo nome passa a ser
registrado em documento que chegará às mãos do diretor do DE. Em algumas escolas, a
participação dos alunos é valorizada pelo coletivo; mesmo quando apenas um aluno ofertou
determinado objeto, é como se a turma o tivesse feito. Nesse quesito, os documentos são bem
distintos. Há os que informam o nome da criança e o objeto doado, bem como os que apenas
informam a “entrada” de um objeto no museu.
Por outro lado, quando as atas registram a doação de algum objeto e enfatizam a “boa
ação” do aluno, pode-se ler esse dado como indício de que os acervos eram compostos
aleatoriamente e não seguiam um programa de estudo. Isso pode ocorrer por diferentes
fatores, inclusive pela maneira como a associação é constituída.
A passagem abaixo ilustra um pouco essa situação. Trata-se de um relatório anual
escrito no mês de dezembro:
Entre os professores que mais trabalharam pelo êxito do nosso museu foram: a sra
Diretora Nemesis de Oliveira, que com o seu método especial incentivou e
encorajou; Lotar Matos do Amaral que fez presente de diversas moedas; Alva B.
Linhares que deu diversos objetos uteis a Otilia Vieira Braga orientadora desta
associação que comprou e doou ao museu a coleção de gravuras e muitos sêlos
usados. Alunos: Nilton Francelino, Doroti Chaves, Antônio Vieira, Vilfredo Correio,
Mário dos Anjos, Nadir Gonçalves, Adriano Constantino e o sr Alfredo R. que nos
deu uma boa quantidade de selos usados e fez a versão dos quadros de animais
fósseis da lingua alemã para a nossa (GE Floriano Peixoto, Itajaí - ARQUIVO...,
1949j, p. 117).
Este relato não informa apenas o nome das pessoas que contribuíram com o museu;
indica, com a mesma diligência, a forma encontrada para dar conta dos trabalhos – doações,
aquisição de material pelos próprios professores, entre outros. Isso se assemelha à cultura do
“fazer e emendar”, identificada por Lawn (2005) na Inglaterra.
Entre as estratégias utilizadas pelos museus para ampliar seus acervos, ou seja, modos
de angariar objetos, identificaram-se sete formas pelas quais os alunos poderiam conseguir
peças.
A primeira forma utilizada diz respeito ao incentivo aos alunos. Boa parte das atas de
reuniões indica que a professora incentivou os estudantes, cobrou maior colaboração e
parabenizou aqueles que trouxeram objetos. Isso faz supor que havia um recurso linguístico
comum entre os professores orientadores de museus, ou então, entre os orientadores de
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associações auxiliares, para que conseguissem envolver os estudantes na “missão” que lhes
cabia frente às associações.
Como prova desse esforço, tem-se o relato da seguinte ata: “também estão dando bom
resultado as nossas palavras de incentivo aos nossos colegas de estudo e das demais classes,
os quais, com entusiasmo, põe-se à caça e procura de insetos e pedras raras” (GE Eliseu
Guilherme, Ibirama) (ARQUIVO..., 1946a, p. 132). A necessidade de “fazer propaganda entre
os alunos que deverão conhecer o valor educativo do Museu” (Escola Mista Municipal de
Serra Alto Rio dos Índios, Ibirama) (ARQUIVO..., 1949a, p. 83) também se impõe como
estratégia para sensibilizar os estudantes.
Uma das formas de selecionar o que deveria ser levado ao museu é pela ausência.
Menciona-se a falta de determinada coisa, por exemplo, carvão de pedra. Diferente das
explicações acerca do que poderia compor um museu, estes casos são mais diretos em
mencionar a necessidade de determinado elemento. A professora designou “um dos alunos
para limpar o Museu diariamente e observar o que falta para pedir aos outros que contribuam
nesse sentido” (Escola Mista Estadual de Lindemberg, Campos Novos) (ARQUIVO..., 1949a,
p. 49).
Seguindo essa lógica, a menção mais frequente é a divulgação entre os alunos de
diferentes classes da necessidade de serem feitas “doações” de peças ao museu. O GE Castro
Alves, de Araranguá, explicita isso. “Duas alunas encarregar-se-ão de ir nas salas do curso
primário Compl. e Regional, afim de fazerem um apêlo para conseguirmos objetos raros e
preciosos, esperando boa cooperação de todos os alunos, para ampliação do museu do nosso
estabelecimento de ensino” (ARQUIVO..., 1946a, p. 10). Uma solução criativa proposta pelo
GE Conselheiro Mafra, Joinville, foi a realização de campanha para arrecadar selos
(ARQUIVO..., 1948i, p. 302). Já no GE Osvaldo Cruz de Rodeio, em cada semana uma sala
ficava responsável por levar alguma coisa ao museu (ARQUIVO..., 1949a, p. 219).
A comunicação entre estudantes de diferentes séries e cursos indica para a
possibilidade de serem efetuados trabalhos em conjunto; por outro lado, a arrecadação de
objetos mediante “apelo” é mais um vestígio de que o acervo se constituía de forma aleatória.
Em outros casos, a divisão por classes obedece a critérios de recolha; dessa forma, os alunos
do 1º ano ficarão responsáveis por trazer insetos, enquanto que os das outras classes terão
outra designação, como ocorreu no GE Costa Carneiro de Orleans (ARQUIVO..., 1949a, p.
175).
A necessidade de efetivar esse dispositivo de comunicação levou alguns museus a
criarem de fato comissões responsáveis em promover o crescimento do acervo.
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[...] foi combinado que além da diretoria, figurasse um aluno de cada classe para
recolher o material que for trazido durante cada mês. Os alunos escolhidos para essa
comissão são os seguintes [total de 13] [...] Os alunos da comissão deverão entregar
o material que for adquirido com o nome dos doadores a diretoria que ficaram
incumbidos de coloca-los nos seus respectivos lugares no museu escolar (GE
General Osório, Canoinhas - ARQUIVO..., 1949c, p. 26).
No GE Deodoro, do município de Concórdia, um dos cargos da diretoria é
denominado de “angariadores”, composto por 12 estudantes em 1950 (ARQUIVO..., 1950b,
p. 107). Na Escola Isolada Mista Estadual de Salto, de Campo Alegre, por sua vez, aparece
um novo cargo, denominado de “colecionadores”, ocupado por todos os alunos da escola
(ARQUIVO..., 1950c, não paginado). Nesses dois casos, as associações promovem uma
institucionalização interna, movidas por uma necessidade do cotidiano, operando taticamente.
A existência de um representante do museu em cada classe fazia parte, em alguns
casos, de um acordo firmado entre os professores. Na segunda reunião pedagógica do GE
Jerônimo Coelho, Laguna, em 1948, no registro feito acerca do museu, mencionou-se que não
possuía patrono, nem diretoria; contudo, cada classe deveria ter um representante
(ARQUIVO..., 1948a, p. 246), ou seja, antes do momento da instituição de uma diretoria,
parecia haver acordo a respeito da existência de um “cargo” praticamente obrigatório.
Uma singularidade em meio a essa questão é a doação de coleções por pessoas ou
famílias “ilustres”. Tal ato não se mostrou uma prática, sendo constatado apenas no seguinte
documento. Em visita do inspetor ao museu, que obteve uma ótima impressão das coleções,
registrou-se: “O inspetor exprimiu-se com palavras elogiosas a respeito da coleção insetos
raros da doação F. Schmidt. Foi combinado que a prof. encarregada desta Liga toma
providencias ao arranjamento do letreiro Doação F. Schmidt na cabeceira da vitrina que
contem citada coleção” (GE Eliseu Guilherme, Ibirama) (ARQUIVO..., 1946a, p. 217).
Neste caso, como nos demais tipos de museus públicos, a doação efetuada por pessoas
renomadas transforma-se numa ação de visibilidade e prestígio, qualidades agregadas à
pessoa ao ter gravado seu nome em registros, quer seja em placas ou legendas. Embora se
trate de proporções distintas, entre a doação de insetos para um museu escolar e a doação de
obras de arte, artefatos históricos, entre outros, para museus públicos a comparação emerge
quase espontaneamente.
Outra possibilidade de arrecadação de objetos consistia em manter correspondência
com outras escolas ou instituições variadas. Um relatório menciona a existência de objetos
provenientes de outras escolas. Trata-se do GE Silveira de Souza, de Florianópolis. Segundo
consta no relatório: “este material foi adquirido por doação dos alunos dêste estabelecimento,
| 165
do Instituto Coração de Jesús, Liceu Industrial, Ginasio Catarinense, do Grupo Escolar
Henrique Lage, etc. Foi conseguido pelos alunos da diretoria por meio de cartas e pedidos
pessoais” (GRUPO..., 1944, p. 82).
Outras três escolas sugeriram em ata que os alunos mantivessem correspondência com
outros estabelecimentos de ensino, isso nos anos 1946, 1948 e 1949, o que nos permite supor
que tal prática fosse incentivada e aos poucos foi se enraizando nas atividades cabíveis aos
museus. Contudo, a interlocução entre as escolas não era a única forma de adquirir objetos.
Por meio da documentação, nota-se a formação de uma rede de “auxílio mútuo” e de
circularidade de materiais. Por exemplo, a Escola Isolada Mista Estadual de Salto do
município de Campo Alegre recebeu, no ano de 1946, uma revista do Museu Nacional
(ARQUIVO..., 1946c). Já a Escola Mista Estadual de Barra do Rio, de Itajaí, recebeu quadros
do Ministério da Cultura (ARQUIVO..., 1946f).
A valorização da comunicação pode ser notada pela “audácia” de algumas escolas em
contatar personalidades “importantes” como o governador da Bahia, Otávio Mangabeira, ao
qual foi solicitado o envio de obras ou objetos sobre Rui Barbosa para figurar em exposição
homenageando o seu centenário, uma vez que ele emprestava o nome ao grupo escolar (GE
Rui Barbosa, Joinville) (ARQUIVO...,1949a).
O contato com instâncias superiores também ocorria para o fornecimento e não apenas
solicitação de material. A Escola Estadual Mista Desdobrada de Rio Cêrro II, de Jaraguá do
Sul, enviou, no ano de 1948, amostras de rochas e minerais encontradas “nesta zona” ao
ministério da agricultura, então a cargo de Daniel de Carvalho. De acordo com o relatório, o
envio ocorreu mediante pedido do ministro (ARQUIVO..., 1948f).
Um pouco mais frequente era o recebimento de amostras das indústrias da região, mas,
ainda assim, não representava a totalidade. O GE Roberto Trompovsky, de Joaçaba, recebeu
“fios de seda de diversos tons da fábrica do vizinho município de Tangará” (ARQUIVO...,
1949a, p. 129). Já o GE Professor Germano Timm, de Joinville, recebeu da Farmácia
Catarinense remédios como “sadol, melagrião, renascim etc. [...]” (ARQUIVO..., 1949g, p.
232).
Entre as escolas mencionadas, o GE Rui Barbosa foi o que obteve mais destaque nessa
atividade. Em 1949, o museu estava empenhado em realizar uma exposição comemorativa do
centenário de Rui Barbosa. Para tanto, solicitou amostras para uma exposição sobre os
produtos industriais do estado, a qual, realizada em novembro, “despertou muito interesse”
(ARQUIVO..., 1949a, p. 132):
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As firmas: “Moinho de trigo Germano Steim e Cervejaria Catarinense”
compreendendo não só o nosso desejo infantil, mas a significação de 5 de novembro
preparam os seus mostruarios de forma original e atraente o que causou agrado
geral. f – A Porcelana Schmitt S. A. do Rio do Testo doou um aparelho de café com
9 peças de trabalho delicado e de feitura original. g – Foi explicado que todas as
amostras são propriedade do Museu e que devem ser cuidados não só pela Diretoria
como por todos os alunos. h – Ficou assentado que será enviada pela imprenssa local
um agradecimento geral às industrias às estações de Radios, e à Imprensa que de
maneira gentil e patriótica deram apoio à nossa iniciativa.
Nos meses que antecederam a comemoração, foram recebidas amostras da Indústria
Renaux de Brusque. Um munícipe doou uma garça empalhada. Foram recebidas gaitinhas da
Fábrica de Gaitas de Blumenau e amostra de uma engrenagem enviada pela Fundição Tupi de
Joinville (ARQUIVO..., 1949e). Em abril, foi enviada uma carta ao setor de estatística do
município solicitando, “um mapa do município e uma planta da cidade para facilitar o estudo
dos alunos”. Em resposta “tanto o mapa do município como a planta da cidade, estão sendo
elaboradas para neles serem introduzidas as modificações impostas pela Lei nº 247 de 30 de
dezembro de 1948 que fixa a divisão administrativa e judiciária do estado, no período de 1949
e 1953” (ARQUIVO..., 1949e, p. 203).
Este grupo é exemplar em mostrar a movimentação do museu, os preparativos para a
exposição do centenário, a confecção de álbuns, a correspondência com empresas, etc.;
contudo, por caracterizar o período que antecedeu a festa do centenário, supõe-se que
ocasionou um movimento atípico.
A prática de solicitar material a outras instâncias indica também uma terceirização dos
serviços. Isso quer dizer que a partir do momento em que as escolas solicitam a outros
departamentos o envio de mapas, por exemplo, o DE sente-se desobrigado de fornecê-los, ou
ainda, a solicitação por parte das escolas indica que o fornecimento pelo DE não era frequente
ou na medida esperada.
Outra forma de terceirizar ou financiar a aquisição de material consistia no pagamento
de mensalidade pelos sócios do museu (ARQUIVO..., 1949a, p. 79/80-81), ou pela
contribuição financeira esporádica, como na Escola Mista Municipal de Linha Ferreira Pontes
de Urussanga. Em reunião, a professora falou “que os alunos devem contribuir com uma certa
quantia de dinheiro para comprar álcool, vidros, etc.” (ARQUIVO..., 1946a, p. 260).
O número de crianças que participava da diretoria do museu e o de sócios chegava, em
geral, a 20 estudantes, no máximo. Contudo, em três escolas, esse número foi bastante
elevado. O museu da Escola Mista Estadual Desdobrada de Riberão Canela, Ibirama
(ARQUIVO..., 1948e, p. 72), tinha 86 sócios; O museu do GE Professor Padre Schuler,
Urussanga (ARQUIVO..., 1949a, p. 329), 163 sócios. No caso deste último a ata informa que
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todos os alunos do estabelecimento eram associados, contando com mais 19 alunos do curso
primário complementar. No museu do GE Felipe Schmidt de São Francisco do Sul havia 200
sócios, sendo 25 alunos do curso complementar e 175 do grupo escolar; não informa, porém,
se a quantidade corresponde ao número total de estudantes da escola (ARQUIVO..., 1946a, p.
237).
Outra estratégia empreendida por duas escolas foi a realização de rifas para
arrecadação de dinheiro que possibilitasse a compra de material necessário115
. No GE Castro
Alves de Araranguá, essa prática se repete em 1946 e 1949. Neste ano, o objetivo era a
aquisição de um filme (ARQUIVO..., 1949a, p. 7).
No GE Professor Padre Schuler, em Urussanga, a mesma estratégia é acionada em
1946, 1949 e 1950. Na primeira ocasião, no mês de agosto, o museu precisava de dinheiro
para comprar álcool, vidro, algodão e cera. Os vidros foram conseguidos pela diretoria; os
demais artigos foram comprados após a venda de bilhetes que concorriam a um quebra-
cabeça, dois carrinhos de madeira e um livro de história infantil. O movimento financeiro foi
assim registrado: “Arrecadação Cr 27,00 despezas 2 garrafas de álcool Cr 8,00 e cera Cr 1,50
depesas CR 18,50 e o saldo para o mês de setembro Cr 9,50” (ARQUIVO..., 1946a, p. 262).
Em outubro, foram gastos Cr 5,60 em uma garrafa de álcool e uma vela. Já em 1949 e 1950
pretendia-se comprar álcool para substituir os recipientes com conteúdo estragado
(ARQUIVO..., 1949a, 1950b).
Nos dois casos citados, tratou-se de uma solução inventiva, levada a cabo pelos
escolares a partir da necessidade do seu cotidiano. Em termos normativos, o “financiamento”
dos museus também poderia ocorrer com apoio das cooperativas escolares, conforme o
decreto que as tornava obrigatórias, popularizadas por meio de circular (SANTA
CATARINA, 1941c) (cf. item 3.1, nota de rodapé 91). Na documentação analisada, os
museus não acionam essa possibilidade; todavia, conforme apontou Melo (1955), as
cooperativas tornaram-se impraticáveis, tendo sido aos poucos extintas.
Na contramão dessas possibilidades de manutenção dos museus, encontram-se aquelas
de caráter mais científico/pedagógico, voltadas à aprendizagem por meio da experiência,
propaladas pela literatura pedagógica, conforme extensamente apresentado no segundo
115
Além da arrecadação de dinheiro para possibilitar atividades no museu, incentivava-se entre as associações,
com relevo na liga da bondade, a arrecadação para efetuar doações à Campanha Pró-Natal dos Lázaros e
Filhos dos Lázaros (acerca disso, ver: OTTO, 2012). Apenas o museu do GE Castro Alves de Araranguá
mencionou o envolvimento com esta questão. Em maio “ficou deliberado aos alunos encarregados desta
associação, arrecadarem uma pequena quantia para o natal dos Lázaros.” (ARQUIVO..., 1949a, p. 9). No mês
de setembro registra-se: “As alunas encarregadas desta associação conseguiram a importância de cinco
cruzeiros e cincoenta centavos para o Natal dos Lázaros” (ARQUIVO..., 1949a, p. 7).
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capítulo. Entre as orientações de como constituir um museu, a realização de excursões é
amplamente defendida. Contudo, no material pesquisado, foi documentada por apenas um
grupo escolar, em uma única ocasião. Em novembro de 1949, os estudantes do GE Professor
Padre Schuler de Urussanga relataram: “fizemos uma escução à praia e de lá trouxemos
bastante coisa que serviu para o museu. Como conchas maritimas corações ossos de peixe etc.
inclusive uma grande variedade de borboletas” (ARQUIVO..., 1949a, p. 274).
Os modos de angariar objetos apontados até aqui explicitam vestígios de uma ação
individualizada, sendo de responsabilidade e boa vontade do estudante a recolha de artefatos
variados, os quais, inúmeras vezes, não estão definidos. Tal situação se daria no ambiente
externo à escola, sem a presença do professor.
Entre as peças presentes nos museus, encontram-se de modo sistemático ovos e ninhos
de passarinhos. Num único mês, os alunos da Escola Mista Municipal Amazonas, em
Joinville, levaram 10 ninhos de passarinhos para o museu (ARQUIVO..., 1949a, p. 142). Na
Escola Mista Municipal Quiriri, em Joinville, o acervo continha ninho de beija-flor, juruviara,
abelha do mato e aranha (ARQUIVO..., 1949h, p. 229).
Em certos casos, avalia-se que o demasiado empenho dos estudantes ocasionava
pequenos problemas ambientais. Em vista disso, consta no verso da capa de uma ata a
seguinte frase: “O museu escolar não deve servir de pretêxto para inuteis depredações. Cabe
aos professores incutir no ânimo das crianças o amor à natureza, que leva a proteção da flóra e
da fauna” (GE Olavo Bilac, Joinville) (ARQUIVO..., 1949e, p. 268).
Acerca da maneira adequada de capturar ovos de passarinhos, a professora da Escola
Mista Estadual de Lindemberg de Campos Novos preveniu os alunos para que:
observassem bem nos ninhos antes de tirar os ovos, que não estivessem em tempo de
cubação, porque acontecêra mais do que uma vez que estes, postos em exposição,
começavam a sair os pintainhos, vindo a falecer por falta do calor do ninho e
aproveitou a ocasião para falar sobre o ditado: - Não devemos bulir no ninho dos
passarinhos (ARQUIVO..., 1949a, p. 46).
Tal passagem evidencia o desconhecimento das crianças e as consequências
decorrentes de intervenções na natureza em prol do “embelezamento” do museu.
Ainda em relação à atuação dos alunos fora do espaço escolar, cinco escolas
mencionaram a importância deles aproveitarem o momento das férias e passeios para
arrecadar coisas.
| 169
A professora encarregada pediu a todos que durante as férias, empregassem esforços
na conquista de novas peças para a maior ampliação da coleção do Museu. E ainda,
que incentivassem seus colegas vizinhos para que em pequenos passeios
procurassem objetos que sirvam para figurar no museu (GE Eliseu Guilherme,
Ibirama - ARQUIVO..., 1949a, p. 78).
Assim como os outros registros incitam a participação dos alunos, a recolha de
materiais é vista como uma maneira de engrandecer o museu, de enchê-lo de coisas
interessantes e belas. No GE Roberto Trompovsky, em Joaçaba, adotou-se um critério distinto
no momento de seleção. “A professora orientadora falou-nos como nós estamos nos
aproximando das férias é para os zeladores avisarem em classes que, os alunos procurem se
interessar pelo nosso Museu, adquirindo objetos em seu meio que despertem a atenção”
(ARQUIVO..., 1949a, p. 128, grifo meu).
Esse argumento também se diferencia daqueles acionados para justificar quais objetos
poderiam fazer parte do acervo, cabendo ao aluno, neste caso, a autonomia de escolha a partir
de aspectos subjetivos.
4.2.6 O espaço destinado ao museu
Encerradas todas as possibilidades de recolha de objetos, tornava-se imprescindível o
seu armazenamento. O quesito disponibilidade de espaço variava de acordo com cada escola;
contudo, sua ocupação não era sempre tranquila.
No GE Costa Carneiro, em Orleans, tem-se um problema de espaço entre 1967 e 1969,
ano limite da documentação disponível. Embora extrapole o período de análise proposto para
este trabalho, a situação vivenciada pela escola é digna de nota. Em 1967, o grupo passou por
uma reforma e a sala destinada ao museu foi utilizada pelos trabalhadores da obra, deixando-o
totalmente “paralisado”. Em 1968, a terceira ata menciona: “não foi possível trabalhar mais,
visto ter sido ocupada a sala onde funcionava o Museu” (GRUPO..., 1955-1969, não
paginado). Em 1969, a sala foi ocupada pela secretaria de um colégio, o que impossibilitou a
realização dos trabalhos. São lavradas três atas nesse ano que mencionam apenas a não-
realização de atividades. É interessante observar que as reuniões, ou ao menos o registro em
ata, continuam acontecendo ao longo de no mínimo três anos sem que houvesse atividades no
museu.
Esse problema vivenciado pelo grupo escolar serve para ilustrar uma questão presente
em muitas escolas ainda na atualidade: a falta de espaço. Esta força a adoção de medidas
provisórias, o que, em muitos casos, pode afetar o desenvolvimento das atividades educativas.
| 170
São comprometidas aquelas que demandam aparato material, como a biblioteca, laboratório
de física e química, laboratório de informática, espaços que sem muita dificuldade são
desativados em virtude de “problemas maiores”. A partir disso, poder-se-ia questionar em que
medida esse tipo de acontecimento evidencia um enraizamento superficial dos instrumentos
de ensino e espaços diversificados na cultura das escolas.
Em anos anteriores, no GE Jacinto Machado, município de Turvo, a questão do espaço
do museu também foi motivo de discussão em reunião. “Falou-se ainda sôbre o movel que
encomendou-se para a exposição dos objetos angariados e da deficiencia de lugar que
encontra-se para os mesmos” (ARQUIVO...,1949a, p. 254).
Os aspectos físicos dos museus foram motivo de menção por algumas escolas isoladas,
as quais dão pistas sobre o lugar a ele destinado, em geral situado dentro da sala de aula, em
um canto. Na II Escola Estadual de Fragosos, Campo Alegre, quando da mudança para a nova
escola, o museu foi “instalado em uma sala contigua a sala de aula” (ARQUIVO..., 1946a, p.
116). Ele poderia funcionar ainda “numa sala menor atras da sala de aula” (Escola Mista
Estadual de Barra do Rio, Itajaí) (ARQUIVO..., 1949j, p. 267).
Dispor de uma sala para o museu era o desejo de alunos e professores. “Para relatar a
verdade do nosso museu e que não temos sala própria para isto. Nós os alunos maiores
fizemos um armário provisório o melhor que pudemos” (Escola Mista Estadual de Rio Belo,
Rodeio) (ARQUIVO..., 1946a, p. 213). Em algumas escolas, a solução encontrada era a
ocupação de uma sala por todas as associações, o que, certas vezes demandava alterações,
visto não comportar todos os materiais. Na Escola Estadual Desdobrada de Canivete, Mafra
(ARQUIVO..., 1946c), o museu achava-se na mesma sala do depósito, ocupando uma estante.
Quando situado dentro da sala de aula, ocupava, na sua maioria, estantes, armários e
prateleiras; poucos armários possuíam portas de vidro. Conforme os registros, um museu
limitava-se a uma mesa pequena, o que ocasionava a exposição ao pó. Outro dispunha de
caixinhas com tampa de vidro para guardar borboletas. Apenas uma escola possuía vitrine, no
valor de 25.000 cruzeiros. Outra expressou o desejo de adquirir. Uma pequena porcentagem
das estantes e armários era confeccionada pelos próprios alunos. Na falta de vidros, foram
utilizadas caixas de fósforos para armazenar sementes e saquinhos de celofane para os cereais;
as borboletas eram presas por alfinetes em cartolina branca.
Na Escola Desdobrada Mista Municipal de Pinheiral, do município de Tubarão, por
não haver uma estante, o museu distribuía-se entre a soleira da janela e um caixão simples
(ARQUIVO..., 1946a).
| 171
4.2.7 A diversidade dos acervos
Na tentativa de identificar singularidades no modo de organizar o espaço e de
encaminhar atividades, aos poucos entre os elementos foram surgindo objetos, artefatos,
coisas, peças de museus, que chamaram a atenção. A partir de agora será apresentada uma
parte destes objetos.
Em alguns museus, integraram o acervo objetos confeccionados pelas próprias
crianças: casinhas em madeira e papelão (ARQUIVO..., 1946a, p. 35), vasinho, pratinho e
boizinho de barro, caminhãozinho, aviãozinho (ARQUIVO..., 1946a, p. 221/227/233/238).
Cinco museus fazem menção à presença de artefatos indígenas. Entre eles estão, dois
machados, flechas, uma pedra pontiaguda e objetos em geral usados pelos indígenas. Seus
artefatos comporiam a coleção histórica, conforme orientações do DE (SANTA CATARINA,
1944c, p. 143).
Moedas, selos ou dinheiro antigo compõem o acervo de cinco museus. Na Escola
Mista Estadual de Rio do Morro de Araquari (ARQUIVO..., 1946a, p. 33), faziam parte do
acervo um cantil de alumínio e um cartucho de bala de fuzil. O GE José Bonifácio, de
Blumenau, recebeu livros e revistas (ARQUIVO..., 1946a) e o GE Jerônimo Coelho de
Laguna possuía mapas no seu acervo (ARQUIVO..., 1949a).
Entre os elementos mais curiosos, estão um dedo mínimo conservado em álcool (GE
Prof. José Arantes, Camboriu) (ARQUIVO..., 1949a, p. 41) e uma apêndice de um dos alunos
que foi operado (Escola Mista Estadual Desdobrada de José Boiteux Iº, Ibirama)
(ARQUIVO..., 1949a, p. 89).
Pequenos animais conservados em álcool, como cobras, são comuns. Entretanto,
alguns museus informaram possuir partes de animais de pequeno e grande porte, tais como:
Barbatana de baleia - GE Carlos Gomes, Imaruí (ARQUIVO..., 1949a, p. 110);
Cabeça de veado - Escola Estadual de Papanduva, Campo Alegre (ARQUIVO...,
1946a, p. 112);
Cabeças de pássaros - Escola Mista Estadual Desdobrada de Serra Vencida,
Ibirama (ARQUIVO..., 1949c, p. 85);
Couro de lagarto, tucano e quati, cobra jararacuçu com mais ou menos 1,20m de
comprimento e regular grossura - Escolas Estaduais Reunidas de Araquari,
Araquari (ARQUIVO..., 1944b, p. 213/48);
| 172
Couro de um porco da Índia - Escola Mista Municipal Desdobrada de Rafael Iº,
Ibirama (ARQUIVO..., 1949a, p. 73);
Dentes de boi e dentes de porco - GE General Osório, Canoinhas (ARQUIVO...,
1949a, p. 36);
Morcego hematófago - GE Eliseu Guilherme, Ibirama (ARQUIVO..., 1949a, p. 79);
Ossos de cabeça de boi, pele de bezerro, baratas, sapos, marimbondos e moscas -
Escola Isolada Estadual Desdobrada de Ribeirão Fidélis, Blumenau (ARQUIVO...,
1949c, p. 19);
Patas de veados - Escola Isolada Estadual de Linha Montauri, Itaiópolis
(ARQUIVO..., 1949c, p. 63);
Aza de passarinho, bicos de tucano, azulão e de pato, cabeça de pombo e de
macaco, cascos de tatu e de tartaruga, casulos de aranha e do bicho da seda,
chifres de vaca e de carneiro, crânio de veado com chifres e de capivara, dentes de
porcos, espinha dorsal de animal, ninhos de maribondos, pé de coati, pele de cobra
coral, queixada de capivara e unha de tamanduá - Escola Mista Estadual I de Nova
Bremen, Ibirama (ARQUIVO..., 1948e, p. 48).
A Escola Mista Municipal de São Lourenço, em Mafra, possuía em seu acervo folhas
de árvores afixadas em cartolina e sementeiras de diversas qualidades (ARQUIVO..., 1946c,
p. 331). Os vasos com flores foram identificados apenas na Escola Mista Estadual de Nova
Stetin, Ibirama (ARQUIVO..., 1948e, p. 152).
Se feito um comparativo entre os artefatos mencionados e as coleções propostas pelo
DE (conforme consta no capítulo 3, item 3.3), nota-se que os museus compuseram os seus
acervos a partir de elementos próximos do seu cotidiano, não se atendo às categorias fixadas
pelo Decreto nº 2.991. As partes de animais indicam uma proximidade com um ambiente
mais rural e a colaboração das famílias na preparação de determinadas peças, como, por
exemplo, na extração da pele de um bezerro, quando de seu abate.
Do mesmo modo, alguns museus mencionaram a presença de artefatos que
caracterizavam a região onde estavam inseridos, em termos de produção e economia, com
destaque para os rótulos de indústrias de bebidas, componente indicado pelo DE (SANTA
CATARINA, 1944c). Foram expostos:
Coleção de caixinhas de cigarro e sabonete - ER Professora Antonia Gasino de
Freita, Orleans (ARQUIVO..., 1949a, p. 171/173).
| 173
Coleção de todas as madeiras do município colocadas em cartolinas; coleção de
produtos agrícolas distribuídas em vidros; coleção de rótulos designando as
bebidas - Escola Estadual Desdobrada de Estação Cocal, Urussanga (ARQUIVO...,
1948d, p. 213);
Diversos rótulos de bebidas das indústrias de Joaçaba, minerais, cristais da
região, produtos agrícolas da região em vidrinhos vazios - GE Roberto
Trompovsky (ARQUIVO..., 1949a, p. 124/126/127/128/129; 1949c, p. 75-76);
Mostruário de bebidas da cervejaria catarinense, da drogaria e farmácia
catarinense S.A. - GE Professor Germano Timm, Joinville (ARQUIVO..., 1949g, p.
41/232);
Produtos do município - Escola Mista Estadual Arapongas, Indaial (ARQUIVO...,
1949i, p. 243);
Qualidades de madeiras mais conhecidas da localidade - Escola de Pedra Branca,
Bom Retiro (ARQUIVO...,1949a, p. 26);
Vidros com cereais pertencentes ao Estado - Escola Mista Estadual Getúlio Vargas,
Araquari (ARQUIVO..., 1946a, p. 53).
Por sua vez, objetos vindos de outras localidades também foram mencionados, embora
em menor número. Por exemplo, o museu possui “grande número de conchas oriundas das
praias de Florianópolis” - Escolas Estaduais de Luzerna, Joaçaba (ARQUIVO..., 1948h, p.
67). As conchas são bastante recorrentes entre os componentes descritos. Uma análise mais
detalhada, a partir da observação da materialidade de cada acervo, pode evidenciar as
características das regiões em que os museus estavam inseridos. Devido ao número elevado
de documentos, esse cruzamento não foi possível neste momento.
Menções como a do museu do GE Henrique Lage de Laguna contribuem nesse
sentido. A professora “falou aos alunos que moram na praia que era mais fácil arranjar coisas
para o museu, trazendo conchas, pedras etc.” (ARQUIVO..., 1949a, p. 154).
Em março de 1949, o museu do GE Carlos Gomes de Imaruí fez a relação dos objetos
existentes no ano anterior. Entre outros, havia uma variedade de vidros que formavam uma
coleção sobre a alimentação, embora não tenha sido assim nomeada.
1 vidro de açucar batido, 1 vidro de conservas alimenticias, 1 de creme de milho, 1
vidro de farinha de banana, 1 vidro de farinha de mandioca, 1 vidro de massa de
tomate, 1 vidro de mandioquina, 1 vidro de oleo exencial, 1 vidro de raspa de
mandioca, 1 vidro de raspa de inhame, 1 vidro de sub produto mandioca e 1 vidro de
vinagre (ARQUIVO..., 1949a, p. 106).
| 174
Entre as “raridades”, destacam-se uma estátua de chumbo de D. Pedro I - Escola Mista
Estadual Rio Mãe Luzia, Urussanga (ARQUIVO..., 1949a, p. 261); um relógio de madeira,
sendo o único relógio relatado entre todos os museus - Escola Mista Municipal Quiriri,
Joinville (ARQUIVO..., 1949h, p. 229) e, como elemento religioso, um presépio de papelão -
Escola Isolada Estadual de Côl. Augusta Vitória, Mafra (ARQUIVO..., 1948j, p. 63).
Para finalizar a exemplificação de parte do acervo, selecionaram-se dois relatórios
representantes daqueles museus mais aparelhados. No GE Horácio Nunes de Porto União
(ARQUIVO..., 1946a, p. 202-203/205/206), há uma lista extensa de coleção de “folhetos”, os
quais foram recebidos por doação. Constam também cartazes, aparentemente confeccionados
pelos estudantes:
1. um cartaz contendo os processos para a fabricação do açúcar;
2. um cartaz contendo quadros da história da nossa pátria;
3. um cartaz contendo a distribuição de alimentos vegetais e minerais;
Folhetos intitulados:
4. distintivos principais das cobras;
5. o leite e seu valor nutritivo – seus derivados – métodos de preparar manteiga em
tempos idos – método prático de pasteurizar o leite em casa – uso terapêutico do
leite – como se preparar o quefir em casa;
6. a fabricação do polvilho – o polvilho de batata;
7. como se matam os animais domésticos;
8. a família dos gatos;
9. o que é e como vive o joão-de-barro;
10. nos domínios da macacada;
11. de que é formado o corpo humano?
12. porque é transparente o vidro?
13. as famosas escavações de Glosel;
14. flores símbolo da pureza. Os crisântemos do João;
15. orquídeas alemãs Dálias;
16. a orquídea – jóia da selva brasileira;
17. a flor dos Paixão – Maracujá;
| 175
18. a farmácia doméstica – primeiros socorros aconselhados em acidentes caseiros –
para prevenir acidentes – regras para não prejudicar a vista na leitura;
19. pombos correio;
20. corôa solar e protuberâncias do sol – as marés.
Por último, apresenta-se o relatório do mês de março de 1949 do GE José Boiteux, de
Florianópolis. A forma de registro adotada pelo museu segue os padrões de registro de
inventário (PETRY, 2012).
Quadro 10 – Relação do acervo do museu do GE José Boiteux situado em Florianópolis
Qualidade Estado Obs.
Origem mineral
9 Cadinhos de porcelana Bom
25 Conchas grandes ‘’
30 Conchas pequenas ‘’
1 Envelope contendo paina de
vidro
‘’
4 Moedas de 40 réis ‘’
1 Moeda de 10 réis ‘’
1 Pedaço de zinco ‘’
1 Pedaço de ferro ‘’
1 Pedaço de chumbo ‘’
10 Pedaços de carvão de pedra ‘’
1 Pedaço de coque ‘’
12 Pedaços de mármore rosa ‘’
2 Pedaços de mármore branco ‘’
3 Pedaços de malacacheta ‘’
11 Pedaços de pedra comum ‘’
1 Pedaço de parafina ‘’
1 Pedaço de madeira plástica ‘’
1 Pedra pome ‘’
1 Pedra magnetita ‘’
1 Vidro contendo cloreto de
sódio
‘’
1 Vidro contendo cal ‘’
1 Vidro contendo pr prateado ‘’
1 Vidro contendo bicarbonato ‘’
120 Total
Origem animal
1 Asa Bom Adquirido pelo 3º ano
3 Cobras jararaca ‘’
3 Cobras verdes ‘’
2 Cobras d’agua ‘’
3 Cobras coral ‘’
(continua)
| 176
(continuação)
2 Cavalinhos do mar ‘’
2 Carochas ‘’
15 Caramujos grandes ‘’
20 Caramujos pequenos ‘’
1 Craneo de macaco ‘’
1 Craneo de veado ‘’
1 Esqueleto de peixe ‘’
3 Estrelas do mar ‘’
3 Ninhos de beija-flor ‘’
2 Ninhos de currequinha ‘’
2 Ninhos de Turru ‘’
1 Ninho de sabiá ‘’
1 Ovo de avestruz ‘’
1 Vidro contendo gafanhotos ‘’
1 Vidro contendo amba ‘’
68 Total
Origem vegetal
100g Arroz Bom
2 Bilros ‘’ Adquirido pelo 3º ano
50g Café ‘’
50g Farinha de milho ‘’
50g Farinha de trigo ‘’
50g Farinha de osso ‘’
50g Farinha mandioca ‘’
50g Herva-mate ‘’
1 Pacote de caulim em pó ‘’
1 Pacote goma laca ‘’
2 Sementes de garapuvú ‘’
1 Vidro contendo pó de urucú ‘’
1 Vidro contendo açúcar ‘’
1 Vidro contendo canela em pó ‘’
1 Vidro contendo cravo de
cheiro
‘’
1 Vidro contendo chá do reino ‘’
18 Total
34 Selos brasileiros Bom Adquirido pelo 3º ano
Fonte: (ARQUIVO..., 1949c, p. 33-34).
Para além deste museu, apenas outros três realizaram o registro em tabelas que
continham, além do objeto e da quantidade, outras informações. O GE Professor José Arantes
de Camboriú adotou, como forma de registro, o dia em que o objeto ingressou no museu, a
espécie, quem foi o ofertante e observações (ARQUIVO..., 1946a, 1949a), enquanto o GE
General Osório de Canoinhas seguiu um número de ordem, especificação, unidade e nome do
aluno que fez a doação (ARQUIVO..., 1948j, 1949a). Por último, o GE Olavo Bilac, de
| 177
Joinville, fez o registro do dia em que foi doado o objeto, o que foi recebido e observações
(ARQUIVO..., 1949e).
4.2.8 Patronos de museus
Uma característica das orientações acerca do funcionamento das associações
auxiliares, já mencionada no item 3.2, diz respeito à pouca explicação do funcionamento do
museu na condição de associação, ou seja, não são explicitadas iniciativas que ele deveria
tomar, como, por exemplo, a escolha de um patrono. Esse procedimento é indicado para
outras associações; porém, não é registrado textualmente no caso do museu. Ainda assim, a
maioria deles procedeu a escolha e homenagem de alguma personalidade.
Os patronos escolhidos podem ser agrupados em oito categorias distintas.
Aproximadamente 40% dos museus não informou quem era o seu patrono, o que não significa
que não o tivessem. Dos 60% restantes, a maioria dos escolhidos são “vultos nacionais” do
Brasil-colônia e Brasil-império. Entre eles, os mais escolhidos foram Duque de Caxias, D.
Pedro II e Tiradentes. Em segundo lugar, estão personalidades do mundo literário e artístico,
como Castro Alves e Olavo Bilac, entre outros, seguidos, em terceiro lugar, dos “vultos
nacionais” do período republicano, como Rui Barbosa e Getúlio Vargas.
Além de “grandes homens da nação”, foram homenageadas personalidades do cenário
político catarinense, como Vidal e Nereu Ramos; ligados ao campo educativo estiveram
Orestes Guimarães e Elpídio Barbosa.
Em quinto lugar, encontram-se nomes vinculados mais precisamente ao campo
científico e educativo. Foram prestadas homenagens a Osvaldo Cruz e Santos Dumont, bem
como a Antônio Pacheco Leão116
e João Barbosa Rodrigues117
. Dentre as professoras
catarinenses, couberam homenagens a três delas: Nila Sardá, Carmem Seara Leite e Ada
Sant’Anna da Silveira.
Em penúltimo lugar, estão os museus que não escolheram propriamente um patrono,
mas criaram um nome original, o que, de algum modo, contraria a norma, pois não
homenageava vultos nacionais nem nomeava um patrono. Por outro lado, esses nomes dão
pistas de como estes museus se caracterizavam, escolhendo uma “marca” original e próxima
116
Antônio Pacheco Leão foi um médico e cientista, bacharel em letras e doutor em medicina: dirigiu o Jardim
Botânico do Rio de Janeiro entre 1915 e 1931, ano de sua morte (CASAZZA, 2011). 117
João Barbosa Rodrigues, botânico, nasceu no Rio de Janeiro em 1842; em 1870, apresentou uma obra em três
volumes sobre orquídeas brasileiras; em 1872, participou de uma comissão para explorar o vale do Rio
Amazonas durante três anos e meio. Em 1883, foi convidado para dirigir o recém-criado Museu Botânico do
Amazonas. Em 1892, foi nomeado diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (SÁ, 2001).
| 178
do cotidiano das crianças, tais como “O sabiá” e “Peixe na Lagoa”, além de alguns nomes
ligados à cultura indígena, como Caramuru e Guarani. Além destes, em menor expressão e,
portanto, em último e oitavo lugar, aparecem personalidades religiosas, como Santa Teresinha
e José de Anchieta.
Na primeira reunião anual, além da escolha da diretoria, procedia-se à escolha de um
patrono, embora essa ação não fosse prescrita, ou se mantinha, por meio de eleição, o nome já
escolhido em anos anteriores. Em 1950, quando da fundação do museu na Escola Estadual
Mista Desdobrada de Lebon Régis, município de Curitibanos, explicou-se que a escolha do
patrono recaiu no “nome do saudoso professor Orestes Guimarães, que é uma das glorias do
magistério catarinense [...]” (ARQUIVO..., 1950b, p. 104).
Em outra ata de fundação de museu que levou o nome de Tiradentes, explicou-se que
ele “foi um grande brasileiro que deu a vida pela pátria. O nome certo dele era Jose de Lima
Xavier” (Escola Estadual Ferreira Viana, Nova Trento) (ARQUIVO..., 1949c, p. 95). Embora
houvesse uma pretensa identificação do museu com a história do personagem escolhido,
apenas dois museus realizaram cerimônias em homenagem aos seus patronos – Duque de
Caxias e Barão do Rio Branco –; em outros momentos, houve homenagem ao patrono da
escola, como mencionado no caso do GE Rui Barbosa.
Uma maneira de homenagear e identificar os patronos resultou na colagem de seus
retratos em atas e relatórios, tal como se vê nas figuras 10 e 11 abaixo.
Figura 10 – Olavo Bilac, patrono do
museu da Escola Paranaguá Mirim,
Joinville
Figura 11 – D. Pedro II, patrono do museu da
Escola Mista Estadual Desdobrada Getúlio
Vargas, Araquari
Fonte: (ARQUIVO..., 1949h, p. 165). Fonte: (ARQUIVO..., 1944b, p. 118).
| 179
Além dos aspectos já levantados, a análise do corpus documental permitiu que fossem
enxergadas práticas distintas, casos particulares que chamaram a atenção. Três delas são
apresentados na sequência.
4.2.9 Casos singulares
O GE José Bonifácio de Blumenau registra a realização de uma festinha em 1949 e de
duas em 1950; numa delas, a temática foi o dia da ave, conforme se visualiza na capa da
programação (Fig. 12).
Figura 12 – Capa do programa de festa
organizada pelo museu Pedro Américo
Fonte: (ARQUIVO..., 1945/48-1950, p. 208).
A realização de pequenas festas por parte das associações estava prevista na
legislação, sobretudo para o caso da liga pró-língua nacional, cujas festividades se
relacionavam a momentos cívicos e de exaltação da língua vernácula (SANTA CATARINA,
1944c). Com exceção dos momentos de homenagem a patronos, este foi o único museu que
realizou festinha relacionada à temática do museu.
Na Escola Mista Estadual de Lindemberg, Campos Novos, pode ser acompanhada pela
documentação a progressão de um trabalho didático; a partir da sétima reunião anual de 1949,
soma-se à reunião mensal do museu a do centro de interesse. Nesse mês, agosto, a professora
solicita que os alunos reúnam figuras de animais bravos e domésticos, aves e peixes,
recortando-os de livros e revistas, devendo colá-los em cartões. No mês seguinte, a professora
agradece a colaboração dos alunos, ficando registrado em ata que “ajuntou-se muitas figuras
de animaes domesticos e irão pelos mesmos alunos, sêr colados para mostrar o quanto a fauna
de nossa terra é rica e variada” (ARQUIVO..., 1949a, p. 44).
| 180
Em outubro, a professora utilizou o quadro sobre os animais domésticos para dar
explicações sobre as gravuras. Ela “começou pelo cão, depois o gato, o cavalo, o boi, a vaca,
mostrando a serventia que presta ao homem e o lucro que obtemos de cada um. Foi uma aula
de zoologia muito bôa, da qual tanto aproveitamos” (ARQUIVO..., 1949a, p. 43, grifo meu).
No mês de novembro, a aula de zoologia versou sobre os animais noviços. “Disse que um
deles era o pernelongo que trazia a maleita, o bako, originario da sarna, etc... depois mostrou
outro quadro com as avez e falou sobre o ditado: Não devemos bulir nos ninhos de
passarinhos. Mostrou as inconveniencias desses maus hábitos” (ARQUIVO..., 1949a, p. 42).
Esse ditado foi proferido pela professora em dois momentos distintos.
Na documentação dessa escola, nota-se um esforço em articular as atividades mensais
do museu. Se numa reunião a professora solicita troncos de árvores para dar início a uma
coleção, na ata seguinte está registrada a entrada de espécies como cedro, peroba e pinho
(ARQUIVO..., 1949a).
A confecção de atas e relatórios não servia apenas para atender a uma demanda
imposta pelo estado. O espaço era utilizado também para reivindicar maior atenção. A Escola
Mista Municipal Desdobrada de Ribeirão do Ferro, Ibirama, registra em ata a não-visita pelo
inspetor: “Gostavamos muito que o Inspetor viesse visitar a nossa escola. Mas não apareceu,
já faz dois anos que a nossa escola não foi visitada” (ARQUIVO..., 1946a, p. 126). Nesse
sentido, atas e relatórios não são utilizados apenas como medidas para comprovação de
atividades; são tomadas também como lugares de manifestação.
4.2.10 Modo de registro de atas e relatórios
Para finalizar a análise do conteúdo desta extensa documentação, decidiu-se destacar
alguns pontos em relação ao modo como foram feitos os registros em atas e relatórios, ou
indicar a tônica seguida por professores e alunos entre 1944 e 1951 para compor os registros
requeridos pelo DE.
A grande maioria dos documentos busca seguir uma linguagem formal, apropriando-se
das regras de composição de uma ata e de um relatório, embora sejam raros os documentos
que não contenham erros de redação. Nota-se, em vários momentos, que se procedeu à
correção de escrita, com adendos em outras cores de caneta ou a lápis, indicando uma
supervisão, quer por professores ou pela direção.
Percebe-se também que os documentos provenientes de um mesmo distrito ou
município são, muitas vezes, bem similares, tanto na estrutura quanto na repetição de frases.
| 181
Essa padronização pode ser resultado da orientação dos inspetores durante as reuniões
pedagógicas, ou, ainda, de possíveis trocas efetuadas entre os professores, no intuito de
cumprir as tarefas estabelecidas, numa rede de colaboração.
O padrão de registro em ata contém a abertura, com informações sobre o dia, local e
horário da reunião, seguido da leitura da ata anterior e aprovação. A professora encarregada
pelo museu toma a palavra, fala sobre as necessidades da associação, todos prometem
colaborar, agradece aos alunos que cooperaram, citando os materiais doados. A reunião
encerra-se dando fechamento ao protocolo de registro.
Embora se seguisse um padrão formal, distante do linguajar infantil, encontrou-se o
seguinte registro mais espontâneo. “Para hoje vamos terminar porque não há mais nada a
tratar. Esta ata foi lavrada por mim Artut Krüger secretario do Museu que vai ser assinada no
fim” (Escola Mista Municipal de Caminho do Meio, Ibirama) (ARQUIVO..., 1949a, p. 90).
Um dos aspectos formativos das associações tornou-se justamente o aprendizado de
gêneros textuais como esses, sistematicamente elaborados, mesmo que a partir de padrões
estabelecidos.
O processo de centralização a que as associações foram submetidas, apontado por
Moreira (1954), foi tão intenso que, mesmo quando não havia atividade no museu, procedia-
se ao registro, fosse para informar que “durante este mês não houve movimento no museu” ou
“neste mês foi feita a limpeza do acervo”.
Infelizmente, porém, cremos que o «infelizmente» está aqui bem empregado, houve
depois de 1940, como já indicamos anteriormente, a centralização administrativa das
associações extra-curriculares, e com ela, a fixidez e a obrigatoriedade que, por certo
reduziu de muito a espontaneidade e a iniciativa locais. Querendo o Departamento
de Educação, ao que nos parece, estimular a criação dessas instituições, decretou-as
e, com isso, fêz delas algo imposto à escola e não criado pela escola. As associações
entraram, daí por diante, em plena fase de rotina, estiolando-se, desvitalizando-se...
(MOREIRA, 1954, p. 73, grifo meu).
Boa parte da documentação aqui explorada fornece indícios que comprovam a
observação de Moreira (1954), uma vez que se tornaram vestígios de ações pouco articuladas
com o cotidiano escolar. Além disso, constituem um corpo de registros burocráticos que
pouco espaço reserva à descrição das práticas efetuadas.
Uma das características desses registros, conforme apontado inúmeras vezes, é a
obrigação em prestar contas mesmo quando pouca atividade foi de fato desenvolvida. O
relatório do primeiro semestre da Escola Mista Estadual Desdobrada Itinga II, de Araquari, é
exemplar neste sentido. No mês de fevereiro, “nada foi possível conseguir [...] só foi pelas
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zeladoras espanado as prateleiras e os pequenos objetos do nosso museu”; em março, “nada
conseguimos também, mas para dar melhor impressão as zeladoras trocaram de posição as
mesmas peças de que contávamos em nosso museu escolar”; em abril, a zeladora “conseguiu
alguns vidros com alguns grãos de feijão de diversos tipos e que já deu uma boa impressão
para o museu” (ARQUIVO..., 1948j, p. 317, grifo meu); em maio e junho, nada foi
conseguido, tendo sido espanada a prateleira; em julho, uma aluna levou sementes e goma de
araruta.
O GE Lauro Müller, de Florianópolis, por sua vez, angariou no ano de 1949 apenas
dois casulos, um crânio e uma cobra (ARQUIVO..., 1949k, p. 114). Enquanto na Escola Mista
Municipal Barão do Rio Branco de Guaricanas, Indaial, “o museu ficou paralizado durante
este ano motivo pelo qual estragou-se o objetos. Continuará novamente no ano de 1950”
(ARQUIVO..., 1949i, p. 78).
E, para finalizar as “confissões”, em 1946, a Escola Mista Estadual de Catanduvas, no
município de Joaçaba, informou: “Tenho [que] comunicar a este Departamento que durante
este mês os alunos pouco trabalharão para esta sociedade” (ARQUIVO..., 1946a, p. 136).
Se estes documentos serviram ao DE como forma de controle sobre as associações,
por outro lado, ao se tornarem documentos históricos, constituem vestígios importantes acerca
das práticas desenvolvidas pelas associações. Nessa segunda função, tais documentos não
“denunciam” apenas a escola que não cumpriu com o determinado, mas o próprio DE,
contribuindo para que não se cristalizem representações do passado das associações auxiliares
como experiências altamente bem sucedidas, como se fossem a materialização mais perfeita
da Escola Nova.
Paulatinamente, os museus vão sendo extintos do contexto escolar, encontrando
registros de sua permanência até pelo menos o início dos anos 1970. Talvez tenham seguido
uma tendência similar à de outras associações. O fato é que não foram incorporados à cultura
escolar do final do século XX e não sobreviveram ao tempo. Diferentes destinos tiveram
objetos e materiais pedagógicos como o quadro-negro, a carteira e o livro didático.
4.3 DESENHOS, COLAGENS E FOTOGRAFIAS EM ATAS E RELATÓRIOS
Das 319 escolas cuja documentação foi contemplada neste capítulo, 77 apresentaram
algum registro imagético, seja em forma de desenho ou recorte e colagem de imagens de
livros e revistas. Considerou-se que os desenhos (ou cópias) realizados por professores e
alunos e as imagens recortadas e coladas na documentação contribuem para a compreensão de
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sentidos atribuídos ao museu por aqueles sujeitos. Ou seja, considera-se que as imagens
deixam entrever uma concepção e representação de museu.
Entre os desenhos de próprio punho foi possível identificar dois estilos: o primeiro,
mais próximo de um traçado infantil e o segundo, um pouco mais elaborado, aproximando-se
de cópia ou de um traçado adulto.
O gráfico abaixo apresenta a porcentagem das imagens representadas em 155
documentos. Destes, 131 continham desenhos e 24 gravuras coladas.
Gráfico 1 – Distribuição das imagens constantes nos documentos de acordo com categorias
Fonte: dados sistematizados pela autora.
Nota-se, a partir deste gráfico, que a maioria dos desenhos referem-se a elementos
naturais, animais e plantas. Os 19% relativos à integração fauna e flora correspondem àqueles
em que há harmonia entre dois elementos; por exemplo, um passarinho pousado em um galho
de árvore, ao lado de seu ninho, borboletas sobre flores ou um sapo dentro de uma lagoa com
vegetação no entorno.
Por sua vez, a maioria dos desenhos que integram os 16% da flora referem-se às
flores, enquanto que os 37% da fauna são compostos por uma grande variação, desde o
desenho de insetos, animais domésticos a selvagens. Consideraram-se paisagem natural (10%)
os desenhos que de fato representavam um ambiente mais complexo, não limitado a um
recorte (como pássaro no galho).
Os 4% e 5% referentes à representação de museu e desenhos ou colagens de crianças,
referem-se a ilustrações de objetos que o representavam, tal como estantes com pequenos
objetos, instrumentos de laboratórios, entre outros e, desenhos de crianças brincando entre si
ou com pequenos animais. Por fim, os 9% agrupados como outros são compostos por
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desenhos cuja representatividade esteve entre dois e quatro documentos, agregando imagens
variadas, como símbolos nacionais e personagens infantis.
Selecionaram-se alguns exemplos de cada uma das sete categorias apontadas,
buscando contemplar os dois estilos mencionados acima. A figura 13 compõe a categoria
fauna (37% do total).
Figura 13 – Desenho na ata do
museu escolar Carmem Seara
Leite, GE Henrique Lage, Laguna
Fonte: (ARQUIVO..., 1949a, p.
155).
Praticamente em todos os documentos que contêm desenhos, estes ocupam cerca de 4
cm2 de uma folha pautada tamanho A4, localizados na parte superior, algumas folhas contêm
o símbolo do DE na parte esquerda superior. Os desenhos apresentados abaixo, quando não
são capas de relatórios, foram recortados de acordo com a figura 13, tendo sido selecionados
apenas o desenho, sem o texto.
Abaixo, visualiza-se um exemplo de composição flora e fauna (19% do total).
Figura 14 – Desenho na capa do
relatório do museu escolar, GE Olavo
Bilac, Joinville
Fonte: (ARQUIVO..., 1949e, p. 268).
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A figura 14 decora a capa do relatório do museu, sendo mais elaborada do que a 13,
que ornamenta a parte superior central de uma ata. Vários documentos são feitos
caprichosamente, com a clara intenção de valorizar o trabalho exercido na escola.
Não apenas os desenhos podem ter sido executados pelos professores, como em alguns
casos a grafia rebuscada denota a intervenção de um adulto. Casos que dão sentido ao apelo
do DE para que os professores assumissem a tarefa apenas de orientadores, deixando as
crianças realizarem as tarefas (conforme visto no item 3.2).
A figura 15 representa 16% do total das imagens, correspondente à flora.
Figura 15 – Desenho na capa do
relatório do museu escolar Getúlio
Vargas, Escola Mista Estadual de Salto,
Campo Alegre
Fonte: (ARQUIVO..., 1944-1947, p. 97).
Assim como a figura 14, trata-se, neste caso, de desenho localizado na capa da
documentação, evidenciando haver uma distinção entre eles, dependendo do lugar ocupado,
se em destaque ou como decoração do texto. Coincidentemente ou não, quando localizada
uma série de documentos da mesma escola, as características de ilustração são mantidas, com
capas ou folhas ornamentadas, seguindo um padrão estético.
As imagens agrupadas no conjunto outros (9%) dizem respeito àquelas que não se
aproximaram das demais ilustrações ou, ainda, que aparentemente não se adequavam ao
suporte/texto no qual estavam inseridas. São exemplos as figuras 16 e 17.
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Figura 16 – Colagem no relatório do
museu escolar, Escola Mista
Estadual Desdobrada estrada do sul
km 10, Joinville
Fonte: (ARQUIVO..., 1945b, p. 105).
Algumas imagens não só apresentaram elementos da fauna e flora de modo integrado,
como procuraram contemplar um espaço mais amplo; por essa razão foram consideradas
como paisagens (10%). Tal como a colagem presente na figura 18.
Figura 18 – Colagem na capa do
relatório do museu escolar, Escola
Mista Municipal Donato Bulhões,
São Francisco do Sul
Fonte: (ARQUIVO..., 1948i, p. 458).
Em porcentagem menor, as imagens inserem o elemento humano. Embora a figura de
criança (5%) selecionada retrate um menino, as meninas também foram retratadas ao lado de
pequenos animais.
Figura 19 – Desenho no relatório do
museu escolar Tiradentes, Escola Mista
Municipal Guaxanduva, Joinville
Fonte: (ARQUIVO..., 1949g, p. 81).
Figura 17 – Desenho no relatório do
museu de uma escola não
identificada
Fonte: (ARQUIVO..., 1946a, p. 87).
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Por fim, seis imagens procuraram representar objetos que compunham os museus ou
retratar o próprio museu, como é o caso das estantes abaixo desenhadas. Entre as imagens
desse conjunto, representação de museu (4%), encontram-se desenhos de pequenas coleções
de madeiras, minerais, bem como de pequenos instrumentos de laboratório.
Figura 20 – Desenho do museu
escolar Tiradentes, Escola Mista
Municipal Tromba de Pirabeiraba,
Joinville
Figura 21 – “Pequena amostra do nosso
museu” – Desenho do museu escolar Duque
de Caxias, Escola Mista Municipal de Barra
Grande, Taió
Fonte: (ARQUIVO..., 1949h, p. 19). Fonte: (ARQUIVO..., 1949a, p. 236).
Voltando aos dados presentes no gráfico 1, 72% das imagens são relativas à fauna e
flora, quer de modo conjunto, ou separado. Este dado, expressivo, demonstra uma
autoidentificação por parte dos museus com temáticas ligadas à natureza e, portanto, da
importância do seu estudo, em detrimento de outras questões que eventualmente se poderiam
contemplar.
Ao analisar as imagens presentes nos documentos relativos à liga de bondade, Otto
(2012, p. 154) menciona que “estas ilustrações relacionam-se ao conteúdo presente no texto e,
portanto, estabelecem uma comunicação com os seus leitores na intenção de reforçar as
informações mais importantes”. No caso da liga de bondade, a autora identificou dimensões
como o respeito à natureza, o cuidado com o semelhante, elementos de amor e exaltação à
pátria, bem como outras representações associadas aos valores transmitidos pelas ligas.
No caso do museu, mais do que reforçar o conteúdo das mensagens escritas, as
imagens têm a função de consolidar um sentido a ele atribuído, ou seja, como local de
armazenamento de elementos propícios ao estudo das ciências naturais.
Além destas representações gráficas, localizaram-se duas fotografias (Fig. 22 e 23). A
primeira faz parte do relatório do museu escolar de uma escola isolada; a segunda compõe os
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registros fotográficos anexados ao relatório anual de um grupo escolar particular confessional,
cuja legenda informa tratar-se do “material de ciências”.
Peter Burke é um entusiasta do uso de imagens para a construção de uma cultura
material. Para ele, “[...] imagens frequentemente revelam detalhes da cultura material que as
pessoas na época teriam considerado como dados e deixado de mencionar em textos”
(BURKE, 2004, p. 120). Esta reflexão se aproxima do questionamento de Bucaille e Pesez
(1989) acerca do que há de mais familiar a não ser os objetos, sobre os quais pouco se
escreve, conforme passagem anteriormente citada.
Por essa razão, as duas fotografias localizadas revestem-se de um significado especial,
ao darem sentido à discussão teórica aqui empreendida, sendo difícil distanciar-se do seu uso
como prova histórica.
Figura 22 – Fotografia do museu Silva Jardim: Escola Estadual
de Papanduva, Campo Alegre, 1946
Fonte: (ARQUIVO..., 1946c, p. 424).
A figura 22 ilustra um museu de sala de aula, disposto no fundo da classe. Um exame
detalhado da fotografia dá a ver que os objetos estão organizados sobre a madeira que compõe
a parede na horizontal. O acervo contém, entre outras coisas, galhos de árvore, pele de animal
afixada na parede e um suporte, ao que parece, em tecido, ao lado da pele de animal, com
duas divisões. A sala possui ainda um mapa geográfico e quatro quadros com estampas; os
dois do lado direito da fotografia assemelham-se aos utilizados para o ensino de ciências.
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Figura 23 – Fotografia do “Material de ciências”: GE anexo ao
Ginásio São José, Porto União, 1943
Fonte: (ARQUIVO..., 1950a, p. 267).
A figura 23, por sua vez, registra o material de ciências pertencente a uma escola
particular e confessional. A estrutura do prédio utilizada pelo curso primário e ginasial era
composta, em 1943, por: auditório, biblioteca, sala de geografia e desenho, sala de física,
quimíca e ciências físicas e naturais, sala de história natural, gabinete médico biométrico e
gabinete dentário, entre outras dependências, como sala dos professores.
O material escolar do curso primário foi adquirido pela Congregação dos Irmãos
Franciscanos, sendo os mapas do Brasil e de “diversas espécies” fornecidos pelo DE
(ARQUIVO..., 1950a, p. 250). Entre as associações escolares encontravam-se listadas, no
termo de visitas de 4 a 6 de novembro de 1943, a liga pró-língua nacional, biblioteca, jornal
escolar, orfeão e museu, sendo este “[...] o mesmo do Ginásio e está sempre a disposição do
Curso Primário” (ARQUIVO..., 1950a, p. 252).
Considerando que a legenda da fotografia não indica a que sala o material pertencia,
pode-se supor tratar-se de uma foto montada. Nota-se uma organização do acervo por
coleções, a começar pelos pássaros empalhados, cobras e pequenos animais submergidos em
álcool, caixas com coleções de pequenas pedras, borboletas e besouros, além de pedras,
conchas e modelo do corpo humano e órgãos. O acervo captado pela fotografia mostra-se bem
conservado e dá nota de investimento financeiro na sua constituição, pela presença de
pequenas vitrines envidraçadas e de modelo do corpo humano.
Contudo, a incorporação deste material ao museu ou o seu uso não passaria de mera
especulação. Por outro lado, pode-se extrair das imagens a organização da qual os objetos
faziam parte. Segundo Peter Burke:
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O testemunho de imagens é ainda mais valioso porque revelam não apenas artefatos
do passado (que em alguns casos foram preservados e podem ser diretamente
examinados) mas também sua organização; os livros nas prateleiras de bibliotecas e
livrarias, por exemplo, ou os objetos exóticos arrumados em museus, ou “gabinetes
de curiosidades” como eram descritos no século 17, os animais empalhados e peixes
pendurados no teto, os vasos antigos no chão, uma estatueta num plinto, objetos
menores organizados nas prateleiras e outros ainda menores em gavetas (BURKE,
2004, p. 121).
A descrição realizada pelo autor se aproxima de uma definição de museu escolar,
muito similar à dos gabinetes de curiosidades no seu modo peculiar de organização.
Peter Burke (2004, p. 112) afirmou ainda que “visualizar a organização de objetos,
cientistas e assistentes num laboratório é aprender algo a respeito da organização da ciência,
assunto sobre o qual os textos são silenciosos”; de modo análogo, considera-se que visualizar
a organização de espaços das escolas é aprender algo a respeito das culturas escolares.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Encerrar um trabalho não requer apenas escrever o ponto final, mas, acima de tudo a
sua retomada desde o início, não somente no sentido de rever o que foi escrito a fim de
mencioná-lo sucintamente. Retomar significa “tomar de novo”, encontrar amarração, coesão,
dar legibilidade e sentido às páginas escritas, para que não fiquem perdidas, soltas ou
explicáveis por si sós.
A partir da articulação do conceito de cultura escolar e da noção de cultura material,
esta dissertação procurou compreender como os museus escolares foram constituídos em
escolas públicas primárias do estado de Santa Catarina entre 1911 e 1952. Para tanto, traçou a
trajetória de museus, valendo-se de documentos, como legislação do ensino, impressos
pedagógicos, relatórios, atas de reuniões, além de atas e relatórios específicos de museus
escolares.
Entendendo que “a cultura material é muito diferente da soma pura e simples dos fatos
que a compõem” (BUCAILLE; PESEZ, 1989, p. 33), buscou-se cercar o objeto deste estudo a
partir de discursos oriundos de variadas instâncias, na tentativa de apreendê-lo com mais
propriedade.
No início desta dissertação, foram apresentados brevemente possíveis sentidos
atribuídos ao termo “museu escolar” em parte do século XIX e, sobretudo, no XX. Seis
acepções foram elencadas, a fim de avisar o leitor de que não encontraria no texto e nos
documentos do período uma única definição. Ficou evidente, a partir desse levantamento e do
exposto neste trabalho, a necessidade de se compreender um objeto/artefato/utensílio (ou um
conjunto dele) do passado, inserido no contexto que o produziu, seja retórica ou
materialmente. Dado que também tem sido indicado pela literatura da área.
Ao se falar de museu escolar ou museu pedagógico no final do século XIX, na metade
do século XX e agora no século XXI (no caso dos museus da escola), não se está falando da
mesma coisa, embora em cada momento haja afinidades. Chegou-se à conclusão que dizer
que determinada escola possuía museu escolar não seria suficiente para compreender o
sentido que a expressão tinha naquele tempo e lugar, fazendo-se necessário, portanto,
perguntar que tipo ou modalidade de museu foi pensada e/ou instituída.
O museu não só comporta vários sentidos, materializando-se em diferentes formatos,
como recebe distintas denominações, sendo chamado, por exemplo, de museu didático
(BUSCH, 1937). Além dessas distinções, conceituar e definir o que ele foi a partir de um
sentido, seja museu gabinete ou associação auxiliar da escola, não é simples, uma vez que se
| 192
verificou que cada escola encontrou um jeito único de montar o próprio museu, privilegiou
determinadas peças em detrimento de outras, utilizou-o para funções distintas, como recurso
para aulas de noções comuns ou simplesmente como objeto de contemplação, movimentou-o
durante o ano inteiro, ou o deixou “paralisado” durante anos. Neste sentido, o conteúdo deste
trabalho não permite dar uma explicação clara e objetiva do que foi um museu, sem incorrer
no risco de uma generalização indevida. Em que pesem as discussões de caráter teórico e
metodológico, na prática os museus assumiram formatos diversos, de acordo com o tempo e o
lugar.
A criação de museus escolares articulou-se, de início – de acordo com a tendência
ocidental –, às exposições universais e à propagação de museus pedagógicos, muitos dos
quais decorreram de exposições pedagógicas, nas quais se encontravam expostos mobiliários
e materiais de ensino. Entre os objetivos dos museus pedagógicos estava a formação de
professores e a disseminação de métodos e materiais considerados mais adequados e
internacionalmente reconhecidos como símbolos da inovação educacional. Nessa corrente,
somam-se os museus escolares, vistos como instrumento didático a serviço do método
intuitivo, então em voga.
A articulação entre método, tendência pedagógica e provimento material das escolas é
uma questão importante a ser contemplada nas pesquisas, a fim de se compreender até que
ponto cada um desses aspectos afeta o desenvolver do outro. Ou seja, se a adoção de um
método ocasiona a produção de materiais específicos, ou se a introdução de objetos nas
escolas condiciona sua afinidade com determinados processos educativos. Em um segundo
nível, poder-se-ia questionar em que medida a prática pedagógica se modifica, justamente em
decorrência da adoção de métodos, da vinculação a tendências e da introdução de objetos no
espaço escolar.
Ao apresentar brevemente a proposta de museus escolares do português Augusto
Coelho (1903), Felgueiras (2011, p. 84) menciona que o autor “parece partir do saber para os
meios didácticos e não de uma visão pedagógico-curricular para a organização dos meios de
ensino”. Esta observação é instigante para se pensar no aparelhamento escolar, afinal: o que
determina a inclusão dos objetos, os saberes ou a visão pedagógica?
Os documentos eleitos para análise no primeiro capítulo dão conta de um investimento
político e econômico sintonizado com os acontecimentos internacionais, seja na implantação
do Museu Escolar Nacional (1883) e, posteriormente, do Pedagogium (1890); seja na compra
de coleções para o ou do museu escolar para as escolas catarinenses (1911).
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Por outro lado, o museu desejado e projetado para essa escola tinha um destinatário
definido, a saber, o grupo escolar. O espaço reservado ao museu se sobressaía dentre outros
possíveis de serem escolhidos, como a biblioteca e o laboratório de física e química. O uso a
que o museu estaria submetido e que consta nos programas de ensino desse modelo de escola
a partir de 1914 indica uma aproximação às disciplinas ligadas às “ciências naturais”, como:
botânica, física, química, mineralogia e zoologia; mas não só, o acervo do museu seria
utilizado também nas aulas de aritmética e de linguagem oral.
Já no programa desenhado para o Instituto de Educação, o museu é mencionado pela
primeira vez em 1937, sendo considerado um material para o ensino de geografia e um meio
que auxilia a observação em história natural. Em 1939, na disciplina de prática de ensino, os
normalistas aprenderiam a organizar um museu, visto nesse momento como um componente
material sujeito à ação do professor e não composto apenas por peças compradas e
armazenadas num mesmo espaço. De um ano para o outro, o museu deixa de ser visto como
um material de ensino e torna-se objeto de aprendizagem dos futuros professores; contudo,
essa posição não é fixa, pois, em 1947, o museu volta a ser apontado como meio que auxilia
na observação.
De certo modo fluido, o museu escolar escapa às análises apressadas, confundindo o
estudioso do presente que tenta apreendê-lo. Na mesma situação encontram-se as propostas de
museus delineadas em escritos por e para professores do final do século XIX e primeiras
décadas do século XX. Próximos em muitos aspectos, os autores mobilizados no segundo
capítulo fazem proposições singulares a partir da realidade em que estão inseridos. São
tecidos comentários desde o tipo de mobília a ser utilizada para constituir um museu – seja
armário com portas de vidro ou caixetas –, até a defesa da inserção de objetos nacionais em
detrimento das coleções de quadros em outro idioma, neste caso, o francês. O esboço de
planos, programas e seções a serem seguidos pelos professores indicam associações
pedagógicas a que os museus estariam sujeitos, a partir da composição de coleções sobre
temáticas diversas, por exemplo, sobre indústrias, ou a partir de exemplares materiais, como
produtos agrícolas.
Nos textos dos autores brasileiros da década de 1930, notou-se uma tentativa de dar
novo significado ao termo, alinhando-o ao discurso da Escola Nova. Nesse movimento, o
museu anteriormente implementado não poderia deixar de ser criticado caso se quisesse que
as escolas partícipes da “renovação” contassem do mesmo modo com museus em suas
propostas. Sobre a questão, vale lembrar que a chamada Escola Nova se tornou “[...] um
| 194
movimento aglutinador de tendências, lugar-comum na retórica educacional e justificativa
para diferentes práticas pedagógicas” (VALDEMARIN, 2010, p. 87).
No final dos anos 1930 o DE de Santa Catarina buscou afinar-se aos pressupostos
escolanovistas, entre outros modos pela instituição das chamadas associações auxiliares da
escola. Entretanto, as prescrições quanto à composição de museus escolares, nessa condição,
não se distanciavam dos princípios defendidos por alguns autores já no final do século XIX.
Além disso, a análise de atas e relatórios advindos de instituições educativas mostrou que a
concretização de museus no espaço escolar ficava distante do almejado, sendo poucos aqueles
que de fato registraram um constante trabalho pedagógico a partir dos acervos.
Pôde-se identificar na literatura pedagógica a presença de três diferentes modelos de
museus escolares: o primeiro, seria composto por coisas e objetos do cotidiano das crianças,
insetos e pequenos animais, plantas, pedras, produtos alimentares, entre outros, com o intuito
de estudar a localidade onde a escola se inseria; o segundo, seria formado por coleções
compradas, em muitos casos importadas de empresas especializadas, que continham quadros
ilustrativos, amostras “naturais” e peças de anatomia, variando de acordo com o fornecido
pelo estabelecimento – estas coleções se prestavam ao ensino de temáticas pré-definidas; já o
terceiro modelo seria constituído a partir de amostras doadas por indústrias locais – neste
caso, o estudo estaria circunscrito ao tipo de produção de cada empresa. De toda forma, tais
modelos poderiam ser postos em prática concomitantemente, o que possibilitaria a ampliação
das matérias do programa escolar a ser estudadas a partir de objetos.
Nos verbetes de dicionários pedagógicos, artigos de revistas, capítulos de livros e
livros selecionados, notou-se uma circularidade de pensamento, partindo de referências
diretas e indiretas entre autores de um mesmo período e de aproximações conceituais.
Considerou-se relevante a localização de 20 textos situados entre 1879 e 1937 que, de alguma
forma, discorreram sobre museus escolares e/ou pedagógicos. Embora não se tenha feito um
levantamento exaustivo, tais textos evidenciam uma preocupação de determinados autores em
escrever sobre a questão. Além disso, a não-realização de um trabalho específico acerca
desses impressos e de uma busca mais detalhada dá margem à existência de outras obras e
autores possivelmente em sintonia com as discussões em pauta no período.
Não apenas os impressos concorreram para a formação de normalistas e professores de
lugares distintos e distantes, veiculando tendências e métodos a seguir. Os governos locais
também se esforçaram de diferentes modos na “atualização” dos professores que atuavam em
escolas públicas. Em Santa Catarina, a realização das Semanas Educacionais
(BOMBASSARO, 2006) representa, de modo exemplar, esse esforço por parte do DE.
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No que se refere às associações auxiliares da escola, consideraram-se como
estratégias de homogeneização das práticas a realização de reuniões pedagógicas, o envio
sistemático de circulares para inspetores, diretores e professores, bem como a expedição de
decretos. Embora tais expedientes servissem a outras funções e não tenham sido criados com
o propósito de regular as associações auxiliares, foram acionados engenhosamente pelo poder
estadual.
Não foi possível precisar na legislação a data em que essas associações foram criadas;
todavia, muitas delas faziam parte do repertório escolar há tempos, sem que fossem assim
denominadas. É o caso dos museus, introduzidos nos grupos escolares com a reforma do
ensino de 1911, que no final dos anos 1930 passaram a condição de associação. De acordo
com as estatísticas educacionais sistematizadas pelo IBGE, entre 1932 e 1937 o museu fazia
parte do “aparelhamento escolar”, ao lado das bibliotecas, laboratórios e projeções luminosas.
A partir dessa mudança de status a que foram submetidos em Santa Catarina o museu, a
biblioteca e também a caixa escolar, as associações podem ser vistas como recursos acionados
pelo DE para suprir ausências, entre elas a de estrutura material. Este preenchimento ocorreria
na medida em que incentivava a disseminação e fiscalizava a efetivação das associações que
até então se mantinham mais ou menos de modo improvisado e aleatório.
As funções que o museu deveria desempenhar nessa nova condição assemelham-se
muito àquelas indicadas pela literatura pedagógica, sendo propaladas, a princípio, como
novidade. Por outro lado, poucas são as informações a respeito dos museus catarinenses nas
décadas de 1910 e 1920. Pelo que os documentos indicam, estes eram compostos por coleções
compradas de espécimes sobre história natural e quadros ilustrativos. Por dividirem o
ambiente com o laboratório de física e química, e por seu tamanho reduzido, é provável que o
espaço não fosse utilizado para ministrar aulas práticas. Isso porque nos grupos escolares era
função do porteiro a retirada dos materiais do museu e de outras dependências. Conforme o
artigo 12 do Regimento Interno dos grupos escolares (1914) o material de uso comum ficaria
no gabinete do diretor, na portaria e no gabinete do museu. O quarto parágrafo informa que “o
professor deverá requisitar do porteiro, os quadros ou apparelhos de que necessitar para o
ensino na sua classe e recommendar ao mesmo para que diariamente, terminadas as aulas,
recolha taes apparelhos aos depositos competentes” (SANTA CATARINA, 1914b, p. 9).
Uma das novidades trazidas pela incorporação do museu no rol das associações foi sua
gradativa expansão para escolas isoladas e reunidas. Se em 1928 o seu uso ainda era indicado
apenas para os grupos escolares, conforme o programa de ensino, no início da década de 1940
esse aparato pedagógico se estende às escolas isoladas. Resultado provável de um
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barateamento do seu custo, visto não se tratar mais de coleções compradas, supostamente
importadas.
No estado de São Paulo, essa transição parece ter ocorrido mais cedo. Segundo
pesquisa efetuada por Souza (1998), no período de 1890 a 1910, poucos grupos escolares
receberam os museus “industrializados”. Nas escolas que não contavam com a contribuição
financeira do estado, “[...] a concepção de museu escolar subsistiu [...] de forma simplificada,
não mais com o fausto dos primeiros tempos, nem tampouco como instrumento de aplicação
propriamente das lições de coisas, mas como ‘arremedo’ [...]” (SOUZA, 1998, p. 230). Para a
autora, as coleções organizadas por professores, alunos e famílias caracterizavam esse
arremedo.
Se as coleções formadas pelas escolas eram simples, respondiam, por outro lado, a
orientações da literatura pedagógica, construindo uma visão de museu com função educativa,
apoiada no processo de observação, recolha e exposição. Concomitante ao processo de
expansão, as associações, incluindo o museu, foram alvo de constante fiscalização. Por meio
do registro em ata mensal e relatório anual, cada associação deveria dar nota das atividades
realizadas, remetendo tal documentação ao DE. Em decorrência dessa prática de escrituração
intensificada no ano de 1944, constituiu-se um conjunto documental volumoso, atualmente
depositado no Apesc. Esta documentação possibilitou conhecer o cotidiano de parte dos
museus instalados em escolas públicas primárias.
Deste modo, a última etapa da pesquisa privilegiou a descrição dos objetos em
situação (MENESES, 1998). Foram, para tanto, minuciosamente investigados 1.148
documentos, compostos de atas e relatórios de 319 escolas do território catarinense, com
exceção da região do extremo oeste. Objetivou-se compreender em que medida os museus
identificados teriam sido integrados ao cotidiano das escolas como elementos de ensino, fosse
num nível utilitário ou simbólico.
Muitos registros informaram que os museus não cumpriam com suas funções, seja em
angariar objetos, formar coleções ou utilizá-los nas classes; alguns cumpriram apenas as
exigências formais, realizando a escrituração do inexpressivo desenvolvimento. Em um
número pouco significativo de museus do universo pesquisado ocorriam aulas ou mesmo
visitas, sendo exceções os que possuíam acervo diversificado e volumoso. Apesar de estes
aspectos poderem ser considerados negativos, ou, como entendeu Moreira (1954),
representarem a consequência de uma política centralista e apegada ao formalismo, entende-
se que naqueles em que não se desenvolveu uma utilidade pedagógica a simbolização
sobrepujou a significação funcional (MOLES, 1972, p. 20).
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Isto quer dizer que somente o fato de em uma escola haver um museu, independente
de sua característica ou grandiosidade, já era considerado um motivo de distinção, agregando
a ela valor simbólico. Neste caso, a função simbólica tornou-se autônoma e preponderante em
relação às demais. Ao desempenhar o papel de significar, acabou por eclipsar o uso prático
(BAUDRILLARD, 1972, p. 65). Na leitura de Moles (1972, p. 38, grifo do autor), a moral
dos objetos defendida por Baudrillard evidencia que estes “[...] não mais se apresentam para
fazer, porém para representar”.
Nos casos em que os museus não eram utilizados, cumprindo apenas uma função
simbólica, talvez possamos considerá-los pertencentes à categoria de semióforos. Esta
categoria, conceituada por Pomian (1984, p. 71), designa os objetos que não tem utilidade,
mas que são dotados de um significado. Nas palavras do autor, “[...] um semióforo acede à
plenitude do seu ser semióforo quando se torna uma peça de celebração [...] a utilidade e o
significado são reciprocamente exclusivos: quanto mais carga de significado tem um objecto,
menos utilidade tem, e vice-versa” (POMIAN, 1984, p. 72). Apesar da potencialidade teórica,
essa discussão é tema para outro estudo.
Vale lembrar, ainda assim, que na condição de associação auxiliar os museus
cumpriram com o protocolo estabelecido, realizando reuniões, registrando, confeccionando
relatórios, elegendo diretorias e, em alguns casos, criando novas demandas. Portanto,
estiveram inscritos numa rotina estabelecida que buscava ensinar às crianças a viver em uma
sociedade em miniatura.
Partindo dos elementos apontados ao longo dos quatro capítulos, pode-se concluir que
a introdução de um material de ensino no contexto escolar é fruto de questões pedagógicas e
políticas, mas a sua permanência é resultado, sobretudo, de questões pedagógicas e de ofício
dos professores. É por meio do uso que um objeto adquire significado até o ponto de se tornar
indispensável. Por vezes, museus, bibliotecas e laboratórios continuam a existir fisicamente
nas escolas, mas não se reconhecem neles as funções primeiras da escolarização, sendo,
portanto, tomados como meios auxiliares, complementares, anexos.
Seria precipitado apontar razões para a desinstalação dos museus nas escolas
primárias, uma vez que este trabalho tem como baliza temporal o ano de 1952. Entretanto,
seria interessante investigar as razões que levaram o museu a deixar de fazer parte do
aparelhamento material das escolas. Ter-se-ia ele transformado em outro ambiente ou teria
sido incorporado aos laboratórios, deixando de ser chamado de museu? Seu suposto
esquecimento tem origem numa questão física, de falta de espaço, ou numa questão
pedagógica, de mudança de concepção da aprendizagem sensível?
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Conforme apontado na introdução deste trabalho, as escolas públicas primárias foram
escolhidas como locus da investigação, em detrimento de escolas secundárias, normais e
instituições privadas de ensino; portanto, avalia-se que um trabalho similar a este pode ser
desenvolvido a partir desses outros níveis de ensino, possibilitando comparações. Além disso,
há muito espaço para se investigar os museus em outras localidades e de outros modos, visto
tratar-se, de acordo com o levantamento apresentado no início deste trabalho, de uma temática
relativamente nova na área de história da educação brasileira. O mapeamento da presença de
museus escolares em diferentes países também pode ser um investimento fecundo.
Além destas questões, é fundamental um diálogo entre museus e arquitetura escolar.
No caso catarinense, um ligeiro esforço foi empreendido na localização de plantas
arquitetônicas, a partir das quais se chegou ao acervo do Departamento Estadual de
Infraestrutura (Deinfra), situado em Florianópolis. Este acervo é composto por plantas de
escolas estaduais, sobretudo de ampliação e reforma. As originais dizem respeito a um
período mais recente (a partir da década de 1960). Embora estejam em bom estado de
conservação, não são catalogadas nem por critérios de localidade e período, nem pelo tipo de
planta, uma vez que de algumas escolas se encontra apenas o desenho da fachada ou o
levantamento do terreno. Levando em conta estas questões, optou-se por não incluir este tipo
de documento no corpus da pesquisa, tarefa que demandaria um tempo não-disponível.
Contudo, abrem-se possibilidades para futuras investigações.
Embora profícuo, o uso de diferentes fontes documentais revelou-se trabalhoso. Ao
longo do desenvolvimento da pesquisa percebeu-se que seria necessário mobilizar referenciais
distintos para analisar cada tipo documental e que cada um possuía forte potencial para se
realizar um estudo exclusivo sobre ele. Neste sentido, pondera-se que o uso feito dos
documentos não é homogêneo, tendo escapado de nossa análise vários aspectos atinentes aos
especialistas no manejo de fontes históricas específicas.
Por fim, considera-se que o percurso desenvolvido até o momento de finalização deste
trabalho proporcionou o aprendizado de questões da historiografia educacional que vão muito
além do seu objeto específico. A busca constante pelo museu escolar fez emergir outras
questões a ele vinculadas. Se, num primeiro momento, parecia que os museus não tinham
frutificado em terras catarinenses ou que haviam sido privilégio das escolas mais abastadas,
agora, mais de dois anos depois, um universo foi descortinado, desmentindo as impressões
iniciais. As novas impressões aguardam, a partir daqui, o tempo, que as tornará velhas,
provisórias, como de fato são, para dar lugar a novas interpretações.
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___________. Atas dos grupos escolares para Departamento de Educação. fev./nov.
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Atas de associações auxiliares da escola
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Atas dos grupos escolares
para Departamento de Educação. fev./nov. 1945a.
___________. Atas dos grupos escolares para Departamento de Educação. fev./nov.
1946a. [atas do orfeão e do museu escolar]
___________. Atas dos grupos escolares para Departamento de Educação. fev./ago.
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___________. Atas dos grupos escolares para Departamento de Educação. mar./set.
1948c.
___________. Atas dos grupos escolares para Departamento de Educação. fev./nov.
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diversos órgãos (1869/2006).]
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GRUPO ESCOLAR COSTA CARNEIRO. Livro de atas do museu escolar do Grupo
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História e Memória da Educação (Grupehme) da Unesc.
GRUPO ESCOLAR PROFESSOR LAPAGESSE. Livro de atas do museu escolar do
Grupo Escolar Professor Lapagesse de 1962 a 1965. Criciúma. 1962-1965. Acervo: Grupo
de Pesquisa História e Memória da Educação (Grupehme) da Unesc.
GRUPO ESCOLAR BARREIROS FILHO. Atas do museu escolar do Grupo Escolar
Barreiros Filho de 1965 e 1966. Florianópolis. 1965-1966. [Estas atas compõem o livro de
atas diversas do grupo escolar e fazem parte do acervo documental da Escola de Educação
Básica Lauro Müller, cx. 18.]
GRUPO ESCOLAR JACINTO MACHADO. Livro de atas do museu escolar do Grupo
Escolar Jacinto Machado de 1964 a 1970. Jacinto Machado. 1964-1970. Acervo: Grupo de
Pesquisa História e Memória da Educação (Grupehme) da Unesc.
Circulares
SANTA CATARINA. Departamento de Educação. Circular n. 23, 16 set. 1938. Assunto:
Instruções aos Inspetores de Ensino. In: Circulares 1930-1941. Florianópolis: Imprensa
Oficial do Estado, 1941a. p. 36-40. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 5, 6 jan. 1941. Assunto: Sobre
Associações Auxiliares da Escola. In: Circulares 1930-1941. Florianópolis: Imprensa Oficial
do Estado, 1941b. p. 70-71. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 11, 30 jan. 1941. Assunto: Sobre
cooperativas escolares. In: Circulares 1930-1941. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado,
1941c. p. 79-95. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 2, 2 jan. 1942. Assunto: Associações
Escolares. In: Circulares 1942. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1942a. p. 3-4.
Acervo: Apesc.
| 214
___________. Departamento de Educação. Circular n. 94, 21 out. 1942. Assunto:
Associações Auxiliares da Escola - Questionário. In: Circulares 1942. Florianópolis:
Imprensa Oficial do Estado, 1942b. p. 66-67. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 131, 26 dez. 1942. Assunto:
Associações Escolares. In: Circulares 1942. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado,
1942c. p. 83. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 29, 18 mar. 1943. Assunto: Inspetor de
Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino. Associações Auxiliares da Escola. In:
Circulares 1943-1944. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1943a. p. 16-17. Acervo:
Apesc.
___________. Departamento da Educação. Circular n. 32, 2 abr. 1943. Assunto: Escrituração
Escolar. Associações Auxiliares da Escola. Reuniões Pedagógicas. In: Circulares 1943-1944.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1943b. p. 18. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 76, 16 ago. 1943. Assunto:
Associações Auxiliares da Escola. In: Circulares 1943-1944. Florianópolis: Imprensa Oficial
do Estado, 1943c. p. 71-72. Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 74, 18 dez. 1944. Assunto: Relatórios.
In: Circulares 1943-1944. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1944a. p. 215-223.
Acervo: Apesc.
___________. Departamento de Educação. Circular n. 75, 26 dez. 1944. Assunto: Relatórios
de 1944. In: Circulares 1943-1944. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1944b. p.
223-229. Acervo: Apesc.
Diversas
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Planos de Aulas e
Comunicados dos Grupos Escolares para Departamento de Educação. 1941c.
___________. Inventário escolar dos grupos escolares para Departamento da Educação.
1941-1942.
SANTA CATARINA. Associações Escolares. Diário Oficial n. 2.125, 22 out. 1941. p. 1.
Florianópolis: Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1941d. Acervo: Apesc.
DIRETORIA DA IMPRENSA OFICIAL E EDITORA DE SANTA CATARINA. Arquivo
Público do Estado. Supervisão de Arquivo Permanente, Biblioteca de Apoio e Pesquisa.
Índice Topográfico Geral: acervo II. NUNES, Giovania; SCHMITZ, Neusa Maria;
CAMPOS, Paulo Henrique (Org.). Florianópolis: Apesc, 2010.
| 215
Leis e Decretos
BRASIL. Decreto-lei nº 8.529 de 2 de janeiro de 1946. Expede a Lei Orgânica do ensino
primário. Rio de Janeiro: 125º da Independência e 58º da República, 1946. Disponível em:
<http://www.soleis.adv.br/leiorganicaensinoprimario.htm>. Acesso em: 11 dez. 2012.
RIO DE JANEIRO. Decreto nº 7.247 de 19 de abril de 1879. Reforma o ensino primário e
secundário do município da corte e o superior em todo o Império. 1879. Disponível em:
<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/34/doc01a_34.pdf>. Acesso em: 31 out.
2011.
___________. Decreto nº 980 de 8 de novembro de 1890. Dá novo regulamento ao
Pedagogium da Capital Federal. 1890a. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legis
lacao/ListaTextoIntegral.action?id=49557>. Acesso em: 31 out. 2011.
___________. Decreto nº 981 de 8 de novembro de 1890. Approva o regulamento da
instrucção primaria e secundaria do Districto Federal. 1890b. Disponível em:
<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/4_1a_Republica/decreto%20
981-1890%20reforma%20benjamin%20constant.htm>. Acesso em: 31 out. 2011.
SANTA CATARINA. Decreto nº 713 de 5 de janeiro de 1935. Adoção de novas normas para
regerem os institutos de formação de professores. Diário Oficial n. 246, 8 jan. 1935, p. 1-4.
Florianópolis: Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1935. Acervo: Apesc.
___________. Decreto-lei nº 76 de 4 de março de 1938. Dispõe sobre a educação cívico-
cultural nas associações de caráter privado. Diário Oficial n. 1.151, 4 mar. 1938, p. 2.
Florianópolis: Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1938a. Acervo: Apesc.
___________. Decreto-lei nº 124 de 18 de junho de 1938. Cria a Inspetoria Geral de Escolas
Particulares e Nacionalização do Ensino. Diário Oficial n. 1.232, 20 jun. 1938, p. 1-2.
Florianópolis: Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1938b. Acervo: Apesc.
___________. Decreto nº 2.991 de 28 de abril de 1944. Estabelece instruções para as
associações auxiliares da escola nos estabelecimentos de ensino estaduais, municipais e
particulares. Circular n. 42, 10 maio 1944. In: Circulares 1942/1944. 1944c. p. 122-151.
Acervo: Apesc.
___________. Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Departamento de Educação. Decreto
nº 3.090 de 31 de janeiro de 1945. Estabelece instruções para a reunião dos inspetores
escolares e diretores de grupos escolares em 5 mar. 1945. Florianópolis: Imprensa Oficial do
Estado, 1945. Acervo: Museu da Escola Catarinense.
___________. Decreto-lei nº 298 de 18 de novembro de 1946. Expede a Lei Orgânica do
ensino primário. Diário Oficial n. 3.349, 18 nov. 1946, p. 1-4. Florianópolis: Diário Oficial
do Estado de Santa Catarina, 1946a. Acervo: Apesc.
___________. Lei nº 40, de 12 de dezembro de 1947. Cria cargo de Inspetor das Associações
Auxiliares da Escola e dá providências. Diário Oficial n. 3.609, 16 dez. 1947. Florianópolis:
Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1947. Acervo: Apesc.
| 216
___________. Decreto nº 335, de 28 de setembro de 1948. Aprova as instruções para o
relatório anual das associações auxiliares da escola. Diário Oficial n. 3.797, 1 out. 1948, p. 2.
Florianópolis: Diário Oficial do Estado de Santa Catarina, 1948. Acervo: Apesc.
Regulamentos, Regimentos e Programas de Ensino
SANTA CATARINA. Regulamento para Instrução Pública. Decreto nº 585, 19 abr. 1911.
Gab. Typ. D’<O dia>. Florianópolis, 1911a. Acervo: Apesc.
___________. Regulamento Geral da Instrução Pública. Decreto nº 794, 2 maio 1914. 1914a.
Acervo: Apesc.
___________. Decreto nº 976 de 14 de novembro de 1916. Regulamento das caixas
escolares. Florianópolis: Officinas e elect. da Empresa d’“O DIA”. 1916. Acervo: Apesc.
___________. Regulamento para os grupos escolares. Decreto nº 714, 3 mar. 1939.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1939. Acervo: Apesc.
___________. Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Departamento de Educação.
Regulamento para os estabelecimentos de ensino primário no estado de Santa Catarina.
Decreto nº 3.735, 17 dez. 1946. Florianópolis, 1946b. Acervo: Apesc.
___________. Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Departamento de Educação. Decreto
nº 3.733 de 12 de dezembro de 1946. Expede regulamento para o serviço de inspeção.
1946c. Acervo: Apesc.
___________. Regimento Interno dos grupos escolares. Decreto nº 588, 22 abr. 1911. Gab.
Typ. D’<O dia>. Florianópolis, 1911b. Acervo: Apesc.
___________. Regimento Interno dos grupos escolares do estado de Santa Catarina. Decreto
nº 795, 2 maio 1914. Joinville: Typographia Boehm, 1914b. Acervo: Apesc.
___________. Programa dos grupos escolares e das escolas isoladas do estado de Santa
Catarina. Decreto nº 587, 22 abr. 1911. Florianópolis: Gab. Typ. D’<O dia>, 1911c. Acervo:
Apesc.
___________. Programma e horario da escola normal do estado de Santa Catharina. Decreto
nº 586, 22 abr. 1911. Florianópolis: Gab. Typ. D’<O dia>, 1911d. Acervo: Apesc.
___________. Programa dos grupos escolares e das escolas isoladas do estado de Santa
Catarina. Decreto nº 796, 2 maio 1914. Joinville: Typ. Boehm, 1914c. Acervo: Apesc.
___________. Programa da escola normal. Decreto nº 1.205, 19 fev. 1919. Florianópolis:
Officinas da Imprensa Official, 1919. Acervo: Setor de Obras Raras – Biblioteca da Ufsc.
___________. Programa dos grupos escolares. Decreto nº 1.322, 29 jan. 1920. 1920. Acervo:
Setor de Obras Raras – Biblioteca da Ufsc.
| 217
___________. Programa de ensino dos grupos escolares, escolas isoladas e escolas
complementares. Decreto nº 2.218, 24 out. 1928. Florianópolis: Typ. Livraria Moderna,
1928a. Acervo: Apesc.
___________. Programa de ensino da escola normal. Decreto nº 2.218, 24 out. 1928.
Florianópolis: Typ. Livraria Moderna, 1928b. Acervo: Setor de Obras Raras – Biblioteca da
Ufsc.
___________. Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Departamento de Educação.
Programa para os estabelecimentos de ensino primário do estado de Santa Catarina. Decreto
nº 3.732, 12 dez. 1946. 1946d. Acervo: Apesc.
___________. Secretaria de Educação e Cultura. Diretoria de Ensino. Programas para os
estabelecimentos de ensino primário no estado de Santa Catarina [1946, 1948, 1949,
1959]. Florianópolis: Imprensa Oficial, 1959.
___________. Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Departamento de Educação.
Programa para as escolas normais e institutos de educação. Decreto nº 3.786, 28 jan. 1947.
1947. Acervo: Apesc.
Relatórios de associações auxiliares da escola
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Relatórios das escolas para
Departamento de Educação. 1944b.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1944-1947.
___________. Relatórios dos grupos escolares para Departamento de Educação. 1945b.
___________. Correspondências e relatórios do grupo escolar para Departamento de
Educação. 1945/48-1950.
___________. Relatórios dos grupos escolares para Departamento de Educação. Nov.
1946b.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1946c.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. out./nov.1946d.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1946e.
___________. Relatórios das Inspetorias Escolares para Departamento de Educação.
1946f. [Este volume contém relatórios das associações escolares de Itajaí, Camboriú, Porto
Belo e Joinville correspondentes a 10ª circunscrição.]
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1947.
| 218
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948d.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948e.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948f.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948g.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948h.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1948i.
___________. Relatórios dos grupos escolares para Departamento de Educação. 1948j.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949d.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949e.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949f.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949g.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949h.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949i.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949j.
___________. Relatórios das escolas para Departamento de Educação. 1949k.
Relatórios de escolas
COLÉGIO MUNICIPAL DE JOINVILLE. Relatório do colégio de 1907 a 1909,
apresentado ao Superintendente Municipal pelo diretor em comissão, Orestes de
Oliveira Guimarães. 20 abr. 1909. Acervo: Arquivo Histórico de Joinville.
GYMNASIO CHATARINENSE. Relatorio publicado no fim do anno lectivo de 1929.
Florianópolis: [s.n.], 1929. Acervo: Acervo Documental do Colégio Catarinense.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA DE SOUZA E CURSO COMPLEMENTAR ANEXO.
Relatório de 1944. [Este volume faz parte do acervo do Apesc e está classificado como
relatórios avulsos dos diversos órgãos (1869/2006).]
GRUPO ESCOLAR LAURO MÜLLER E CURSO COMPLEMENTAR ANEXO. Relatório
das atividades da escola no ano de 1946. Florianópolis. Diretora: Maria da Glória Mattos.
Enviado ao Departamento de Educação do estado de Santa Catarina, 1946. Acervo: Museu da
Escola Catarinense.
| 219
GRUPO ESCOLAR PARTICULAR STELLA MARIS E CURSO COMPLEMENTAR
ANEXO. Relatório das atividades da escola no ano de 1947. Laguna. 1947. [Este
documento compõe o acervo do Apesc, encontra-se num volume de atas de exames
classificadas como Quadro Geral de Exames, 1948.]
Relatórios de inspeção e de governo
AREÃO, João dos Santos. Relatório apresentado ao Ministério da Educação e Saúde
Pública. Inspetoria Federal das Escolas Subvencionadas. Estado de Santa Catarina.
Florianópolis, 25 jan. 1937. 4º trimestre de 1936.
___________. Relatório apresentado ao Ministério da Educação e Saúde Pública.
Inspetoria Federal das Escolas Subvencionadas. Estado de Santa Catarina. Florianópolis, 10
abr. 1937. 1º trimestre de 1937.
___________. Relatório apresentado ao Ministério da Educação e Saúde Pública.
Inspetoria Federal das Escolas Subvencionadas. Estado de Santa Catarina. Florianópolis, 10
jan. 1938. 4º trimestre de 1938.
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Relatórios das Inspetorias
Escolares para Departamento de Educação. mar./nov. 1941b. Relatórios de inspeção da 2ª
circunscrição, Blumenau.
SANTA CATARINA. Secretaria Geral dos Negócios do Estado de Santa Catarina. Relatório
apresentado ao Exm. Sr. Coronel Vidal José de Oliveira Ramos, Governador do Estado,
pelo Tenente-Cnel. Caetano Vieira da Costa, Secretário Geral em 30 de junho de 1911. 1911e. Acervo: IHGSC.
___________. Secretaria Geral dos Negócios do Estado de Santa Catarina. Relatório
apresentado ao Exm. Sr. Coronel Vidal José de Oliveira Ramos, Governador do Estado,
pelo Tenente-Cnel. Caetano Vieira da Costa, Secretário Geral em 31 de maio de 1912.
Florianópolis: Gab. Typ. D’O DIA, 1912. Acervo: IHGSC.
___________. Relatório apresentado ao Exmo. Sr. Cel. Vidal José de Oliveira Ramos,
Governador do Estado, por Gustavo Lebon Regis, Secretário Geral em maio de 1914.
Florianópolis: Typ. da Livraria Central, 1914d. Acervo: IHGSC.
___________. Sinopse das ações do governo do Estado de Santa Catarina
correspondente ao quadriênio 1910-1914: Apresentada pelo Coronel Vidal José de Oliveira
Ramos ao Major João de Guimarães Pinho presidente do Congresso Representativo do
Estado, ao passar-lhe o governo, no dia 20 de junho de 1914. Florianópolis: Gab. Typ. D’O
DIA, 1914e. Disponível em: <http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u968/> Acesso em: 16 fev. 2011.
___________. Relatório apresentado em outubro de 1938 ao Exmo. Sr. Presidente da
República, pelo Dr. Nereu Ramos, Interventor Federal do Estado de Santa Catarina. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1938c. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de
Santa Catarina.
| 220
___________. Relatório apresentado em outubro de 1942 ao Exmo. Sr. Presidente da
República, pelo Dr. Nereu Ramos, Interventor Federal do Estado de Santa Catarina,
referente ao exercício de 1941. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1942d. Acervo:
Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina.
___________. Relatório apresentado em outubro de 1943 ao Exmo. Sr. Presidente da
República, pelo Dr. Nereu Ramos, Interventor Federal do Estado de Santa Catarina,
referente ao exercício de 1942. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1943d. Acervo:
Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina.
Revistas
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. I, n. 1, jan./fev. 1936.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. I, n. 2, mar./abr. 1936.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. I, n. 3, maio/jun. 1936.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. I, n. 4 e 5, jul./out. 1936.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. II, n. 6, nov./dez. 1936.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DE EDUCAÇÃO: órgão do professorado catarinense, v. II, n. 7, jan./fev. 1937.
Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado. Acervo: Biblioteca Pública do Estado de Santa
Catarina.
REVISTA DO ENSINO - RS. Estatutos para museus escolares do estado do Rio Grande
do Sul, v. 12, n. 94, jul. 1963. Secretaria de Educação e Cultura - Centro de Pesquisas e
Orientação Educacionais (CPOE). 1963. p. 50-51.
| 221
APÊNDICE A – Disciplinas que constam nos programas de ensino dos grupos escolares e escolas isoladas: 1911, 1914, 1920, 1928, 1939 e 1946
Programas por série, ano e modalidade de escola (a ordem das disciplinas obedeceu ao original)
Grupos Escolares
Escolas Isoladas, Escolas
Reunidas e Grupos
Escolares
Ano escolar 1911 1914 1920 1928 1946
1º ano
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
Ciências físicas e naturais –
higiene
Ginástica
Música
Desenho
Geometria
Trabalho manual
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Caligrafia
Aritmética
História
Geografia
Elementos de ciência e de
higiene
Desenho
Música
Ginástica
Trabalhos manuais
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geografia
Lições de coisas
Higiene
Educação moral
Desenho
Música
Trabalhos manuais
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Caligrafia
Aritmética
Geografia
Higiene
Agricultura
Educação moral e cívica
Canto
Trabalhos manuais
Ginástica
Leitura e linguagem oral e
escrita
Iniciação matemática
Conhecimentos gerais
aplicados à vida social, à
educação para a saúde e ao
trabalho
Desenho e trabalhos
manuais
Canto orfeônico
Educação física
2º ano
Leitura
Linguagem
Aritmética
Geografia
História do Brasil
Ciências físicas e naturais –
higiene
Educação cívica e moral
Ginástica e exercícios
militares
Música
Desenho
Geometria
Trabalhos manuais
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geometria prática
Geografia
História do Brasil
Botânica
Zoologia
Física e química Educação moral e cívica
Música
Caligrafia
Desenho
Trabalhos
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geometria
Noções de ciências físicas e
naturais e de higiene:
Botânica
Física e química
Geografia
História
Educação moral e cívica
Desenho
Música
Trabalhos manuais
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Caligrafia
Aritmética
Geometria
Higiene
Geografia
História
Educação moral e cívica
Agricultura
Desenho
Canto
Trabalhos manuais
Ginástica
Leitura e linguagem oral e
escrita
Iniciação matemática
Geografia e história do
Brasil
Conhecimentos gerais
aplicados à vida social, à
educação para a saúde e
ao trabalho
Desenho e trabalhos
manuais
Canto orfeônico
Educação física
3º ano
Leitura
Linguagem
Aritmética
Geografia e cosmografia
História do Brasil
Ciências físicas e naturais –
higiene
Instrução cívica e moral
Ginástica – exercícios
militares
Música
Desenho
Geometria
Trabalho manual
Leitura
Linguagem oral Linguagem escrita
Aritmética Geometria
Geografia
História
Educação moral e cívica
Botânica
Zoologia
Mineralogia
Física e química
Música
Caligrafia
Desenho
Trabalhos
Ginástica
Português:
Leitura e linguagem oral
Rudimentos gramaticais
Linguagem escrita
Aritmética
Geometria
Noções de ciências físicas e
naturais e de higiene:
Botânica
Zoologia
Física e química
Geografia
História
Educação moral e cívica
Desenho
Música
Trabalhos manuais
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geometria
Higiene
Física
Botânica
Zoologia
Agricultura
Geografia
História
Educação moral e cívica
Desenho
Música
Trabalhos manuais
Ginástica
Leitura e linguagem oral e
escrita
Iniciação matemática
Geografia e história do
Brasil
Conhecimentos gerais
aplicados à vida social, à
educação para a saúde e ao
trabalho
Desenho e trabalhos
manuais
Canto orfeônico
Educação física
4º ano
Leitura
Linguagem
Aritmética
Geografia
História do Brasil
Ciências físicas e naturais – higiene
Instrução cívica e moral
Ginástica e exercícios militares
Música
Desenho
Geometria
Trabalho manual
Leitura
Linguagem oral Linguagem escrita
Aritmética
Geometria
Geografia
História
Botânica
Zoologia Mineralogia
Física e química
Educação moral e cívica
Caligrafia
Música
Desenho
Trabalhos
Ginástica
Português:
Leitura e linguagem oral
Gramática
Linguagem escrita
Aritmética
Geometria
Noções de ciências físicas e
naturais e de higiene:
Botânica
Zoologia Física
Geografia
História do Brasil
Educação moral e cívica
Desenho
Música
Trabalhos de agulha
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Caligrafia
Aritmética
Geometria
Higiene
Botânica
Zoologia Fisiologia
Física
Agricultura
Geografia
História
Educação moral e cívica
Desenho
Canto
Trabalhos manuais
Ginástica
Leitura e linguagem oral e
escrita
Iniciação matemática
Geografia e história do
Brasil
Conhecimentos gerais
aplicados à vida social, à
educação para a saúde e ao
trabalho
Desenho e trabalhos
manuais
Canto orfeônico
Educação física
Em 1939, de acordo com o Regulamento dos Grupos Escolares, Decreto nº 714 de 3 de 1939, o programa compreenderia as disciplinas de: leitura, linguagem, aritmética,
geografia, geometria, história do Brasil, instrução cívica, ciências físicas e naturais, trabalhos manuais, desenho, canto e ginástica.
As células em destaque indicam a prescrição do uso do museu escolar.
(continua)
| 222
(continuação)
Escolas Isoladas
Ano Escolar 1911 1914* 1920 1928 1946
1º ano
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
História
Educação cívica
Canto
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
História*
Educação cívica*
Canto*
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geografia
Higiene
Cantos
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Agricultura
Aritmética
Caligrafia
Canto
Ginástica
Higiene
Idem disciplinas listadas
acima
2º ano
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
História
Educação cívica
Canto
Trabalhos
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
Trabalhos
História*
Educação cívica*
Canto*
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geografia
História
Educação moral e cívica
Geometria e desenho
Higiene
Trabalhos
Canto
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Caligrafia
Linguagem escrita
Agricultura
Aritmética
Cantos
Desenho
Educação moral e cívica
Geografia
Ginástica
História
Higiene
Trabalhos manuais
Idem disciplinas listadas
acima
3º ano
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
História
Educação cívica
Canto
Ginástica
Trabalhos
Leitura
Linguagem
Caligrafia
Aritmética
Geografia
Trabalhos
História*
Educação cívica*
Canto*
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Aritmética
Geografia
História
Educação moral e cívica
Geometria e desenho
Higiene
Trabalhos
Canto
Ginástica
Português:
Leitura
Linguagem oral
Linguagem escrita
Caligrafia
Agricultura
Aritmética
Cantos
Desenho
Educação moral e cívica
Geografia
Ginástica
História pátria
Higiene
Trabalhos manuais
Idem disciplinas listadas
acima
* Estas disciplinas encontram-se avulsas, ou seja, sem indicação do ano escolar em que seriam estudadas.
Fonte: dados sistematizados pela autora a partir dos documentos: (SANTA CATARINA, 1911c, 1914c, 1920, 1928a, 1939, 1946d).
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