UNESP UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências e Letras
Campus de Araraquara - SP
Aline Reck Padilha Abrantes
ARARAQUARA – SP
2012
ALINE RECK PADILHA ABRANTES
Tese de Doutorado apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Educação Escolar da
Faculdade de Ciências e Letras –
Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Doutor em Educação
Escolar.
Linha de pesquisa: Trabalho Educativo:
Fundamentos Psicológicos e Educação
Especial
Orientador: Profa. Dra. Sonia Maria Duarte
Grego
Co-orientadora: Adriana Fontes Melo do
Rego Barros
ARARAQUARA – SP
2012
Abrantes, Aline Reck Padilha
Escola inclusiva: uma leitura possível a partir das elaborações
lacanianas dos quatro discursos / Aline Reck Padilha Abrantes – 2012
107 f. ; 30 cm
Tese (Doutorado em Educação Escolar) – Universidade Estadual
Paulista, Faculdade de Ciências e Letras, Campus de Araraquara
Orientadora: Sonia Maria Duarte Grego
1. Educação. 2. Análise do discurso. 3. Inclusão. 4. Psicanálise.
I. Título.
ALINE RECK PADILHA ABRANTES
ESCOLA INCLUSIVA: UMA LEITURA POSSÍVEL A PARTIR DAS ELABORAÇÕES LACANIANAS DOS
QUATRO DISCURSOS
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Educação Escolar da Faculdade
de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como
requisito para obtenção do título de Doutor em
Educação Escolar.
Linha de pesquisa: Trabalho Educativo:
Fundamentos Psicológicos e Educação Especial
Orientador: Profa. Dra. Sonia Maria Duarte
Grego
Co-orientadora: Ms. Adriana Fontes Melo do
Rego Barros
Data da defesa: 28/03/2012
MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:
Presidente e Orientador: Profa. Dra. Sonia Maria Duarte Grego
UNESP – FCL - Araraquara
Coorientadora: Ms. Adriana Fontes Melo do Rego Barros (Psicanalista)
Lugar de Vida – São Paulo
Membro Titular: Prof. Dr. Edmundo Narracci Gasparini
Departamento de Letras, Arte e Cultura – Universidade Federal de São João Del-Rei- Minas Gerais
Membro Titular: Prof. Dr. Antonio César Frasseto
UNESP-IBILCE- Rio Preto
Membro Titular: Profa. Dra. Alessandra Fernandes Carreira
Faculdade de Psicologia – UNAERP – Ribeirão Preto
Membro Titular: Profa. Dra. Andréa Theodoro Tocci Dias
Faculdade de Psicologia – UNIP - Araraquara
Local: Universidade Estadual Paulista
Faculdade de Ciências e Letras
UNESP – Campus de Araraquara
AGRADECIMENTOS
À Profa. Dra. Sonia Grego, orientadora, que com muita responsabilidade assumiu a
tarefa de acompanhar meu percurso já iniciado, e soube com clareza e rigor apontar caminhos
para a construção do produto que aqui se apresenta.
Agradeço particularmente a Adriana Fontes Melo do Rego Barros, coorientadora,
companheira de longa jornada, pela parceria, por fazer parte de minhas conquistas teórico-
práticas, com sua escuta singularmente especial e principalmente pela orientação valiosa, sem
a qual este produto não seria o mesmo.
Ao Prof. Dr. Edmundo Narracci Gasparini por seu generoso ato de ser interlocutor
dessa produção.
À Profa. Dra. Andréa Theodoro Tocci Dias, amiga de longa data e colega de prática
clínica, por fazer parte dessa jornada, pelas estimadas contribuições na qualificação, e
principalmente pela amizade que muito prezo.
Ao Prof. Dr. Antonio César Frasseto que, com suas valiosas análises no exame de
qualificação, contribuiu para esta realização.
À amiga e colega de Lalíngua – Espaço de Interlocução em Psicanálise, Profa. Dra.
Alessandra Carreira, por compartilhar de minhas leituras Lacanianas com rigor teórico sendo
uma especial interlocutora.
À minha análise que possibilitou fazer deste, um ato.
Aos meus três amores André, companheiro da vida, e Victor e Letícia, pelo apoio e
compreensão e, principalmente, por suportarem com carinho minha presença-ausente durante
a execução dessa tese.
Ao meu pai, que com suas escolhas me mostrou a importância do trabalho na
transformação da vida.
À minha mãe que, com suas experiências, me ensinou a nunca desistir.
Aos meus irmãos por me acompanharem em todos os momentos vividos, e
especialmente minhas sobrinhas, que com muitas interrogações, souberam perdoar minha
retirada.
A todos que fazem parte da escola CID, profissionais, estudantes e pais, pelas
palavras, pois sem elas não seria possível a escuta e principalmente por fazerem deste espaço
escolar uma prática educativa muito singular.
Aos colegas de Lalíngua- Espaço de Interlocução em Psicanálise, pela transmissão.
Essa paixão do significante, por conseguinte, torna-se uma nova
dimensão da condição humana, na medida em que não somente o
homem fala, mas em que, no homem e através do homem, isso fala,
em que sua natureza torna-se tecida por efeitos onde se encontra a
estrutura da linguagem em cuja matéria ele se transforma, e em que
por isso ressoa nele, para além de tudo o que a psicologia das idéias
pôde conceber, a relação da palavra.
Jacques Lacan (1998b, p.695.
RESUMO`
A estrutura dessa tese é a extensão da pesquisa realizada na dissertação de mestrado. A
inclusão, eixo deste percurso que se iniciou em 2004, teve seus efeitos iniciais com o estudo
de caso da Escola de Educação Infantil e Ensino Fundamental – Centro Integrado de
Desenvolvimento – CID, dissertação defendida em 2007. No entanto, as inquietações com os
resultados obtidos originaram a fundamental questão deste trabalho: O que sustenta o
trabalho da Escola de Educação Infantil e Ensino Fundamental Centro Integrado de
Desenvolvimento - CID com a inclusão?A incursão nesta jornada teórica se iniciou com a
apresentação da escola e seu funcionamento, para em seguida, diferenciar esse funcionamento
do grupo teorizado por Freud, e aproximar da “escola” proposta por Lacan. A partir desta
orientação direcionamos nosso foco para a estrutura discursiva da escola aonde recorremos às
formulações teóricas de Lacan sobre o inconsciente e a linguagem. Para tanto, retomamos a
teoria freudiana sobre o mito Totem e Tabu e o complexo de Édipo. Em seguida, tentamos
acompanhar o percurso de Lacan sobre o Nome-do-Pai para obtermos suporte teórico e
articularmos estes conceitos já trabalhados, ao discurso da escola que apresenta como
significante a “inclusão” e revela sua posição política em contraponto ao discurso social
dominante. Para tanto retomamos os dados obtidos, mais especificamente as falas dos
profissionais desta escola e, sustentados na teoria de Lacan sobre os discursos, averiguamos e
formalizamos a hipótese inicial de que o trabalho desta escola com a inclusão se sustenta nos
giros discursivos.
Palavras – chave: Educação. Inclusão. Discurso. Psicanálise. Sujeito.
RÉSUMÉ
Ce travail a été structuré dans la continuation de la recherche effectuée au cours du
"mestrado". L´inclusion scolaire, l´axe du travail commencé en 2004, a connu ses tout
premiers effets dans le cas de la "Escola de Educação Infantil e Ensino Fundamental – Centro
Integrado de Desenvolvimento – CID", avec la thèse soutenue en 2007. Néanmoins, les
inquiétudes conséquentes aux résultats obtenus ont donné origine à la question fondamentale
du présent travail : Qu´est-ce qui soutient le travail de la "Escola Escola de Educação Infantil
e Ensino Fundamental Centro Integrado de Desenvolvimento – CID" dans le travail de
l´inclusion? Le parcours théorique a commencé par la présentation de l´école et de son
fonctionnement, pour ensuite établir la différence entre ce mode de fonctionnement et le
groupe théorisé par Freud et par le rapprochement de l´"école" proposée par Lacan. Nous
avons alors orienté notre proposition vers la structure discursive de l´école avec les
formulations théoriques de Lacan sur l´inconscient et le langage. Pour ce faire, nous avons
repris la théorie freudienne proposée en Totem et Tabou et dans le complexe d´Œdipe, en
essayant d´accompagner le parcours de Lacan sur le Nom-du-Père dans le but d´obtenir un
support théorique et d´articuler les concepts déjà discutés avec les discours de l´école qui
présente comme signifiant l´"inclusion" et qui démontre sa position politique en contrepoint
au discours social dominant. Nous avons ainsi repris les données obtenues, plus
particulièrement les paroles des professionnels de cette école et, basés sur la théorie de Lacan
sur les discours nous avons vérifié et formalisé l´hypothèse initiale selon laquelle le travail
d´inclusion dans cette école est soutenu par les tours discursifs.
Mots-clés: Education. Inclusion. Discours. Sujet.
ABSTRACT
The structure of this thesis is a research extension built up over my master degree dissertation.
The inicial effects of this inclusion began with the study case of Fundamental Teaching and
Children Education School, AKA Centro Integrado de Desenvolvimento (Integrated
Development Center) CID. However, the obtained results brought up the question: What is
this inclusion able to sustain with the work of the Fundamental Teaching and Children
Education School? This theory journey has begun with the presentation of the school and its
inner processes, for then, pointing out the differences of those processes from the Freud
theorized groups while approaching the Lacan proposed school. Throughout this orientation,
we spot the school discursive structure whereas looking for Lacan`s theory formulations about
unconscious and language. This leads us to the Freudian theory about Totem myth and taboo
and Edipo Complex so we can then try following Lacan`s streamline over the Name of the
Father and thus obtaining theory support for binding together those already worked concepts
with the school speech which presents the “inclusion” as significant and reveals its political
position as counterpoint to the dominant social speech. Finally we go back to the obtained
data, which more specifically means the professionals speech into that school and, sustained
by Lacan`s theory of speeches, check and confirm the initial hypothesis that the inclusion
work of this school is sustained by discursive spin.
Keywords: Education. Inclusion. Speech. Psychoanalysis. Subject.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................. 13
1 A ESCOLA CID, UM MODELO SINGULAR DE TRABALHO EDUCATIVO 16
1.1 Sobre o modelo de trabalho educativo com a inclusão........................................ 25
2 DA LÓGICA DO “GRUPO” A ESTRUTURA DA “ESCOLA”........................... 31
3 LINGUAGEM, DISCURSO E A LÓGICA DO SIGNIFICANTE........................ 46
3.1 Do mito do “Pai” na teoria Freudiana a algumas aproximações da lógica
universal do Nome-do-Pai na teoria estruturalista Lacaniana.................................
57
4 “INCLUSÃO”, O SIGNFICANTE DO DISCURSO DA ESCOLA – NA
CONTRAMÃO DO DISCURSO SOCIAL.................................................................
67
5 OS GIROS DISCURSIVOS DA ESCOLA CID, UMA LEITURA DO
DISCURSO COMO FACILITADOR DO TRABALHO COM A DIFERENÇA...
78
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................... 98
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 101
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR...................................................................... 105
INTRODUÇÃO
O que sustenta o trabalho da Escola de Educação Infantil e Ensino
Fundamental Centro Integrado de Desenvolvimento (CID) com a inclusão? Esta
questão teve sua origem no trabalho de mestrado e seguiu presente durante todo
percurso da pesquisa desenvolvida. O estudo de caso realizado nesta escola, de 2005 a
2007, possibilitou avançar nessa investigação e extrair da experiência escolar alguns
elementos indicadores de sua organização e funcionamento prático.
No entanto, ainda que com algumas elaborações construídas acerca do
funcionamento da escola, as interrogações não encontraram resposta. A questão inicial
permaneceu presente provocando um retorno ao que já foi elaborado. O percurso da
pesquisa originou-se do trabalho desta escola, trabalho que inicialmente havia certa
aproximação, uma vez que, em tempos passados, também fiz parte deste trabalho como
profissional, mas à medida que fui me distanciando foi possível observar o que no
interior desta prática não visualizava, mas vivenciava. Tomar a distância me fez ver que
o que ali se pratica como educação está sustentado pela possibilidade de haver muitos
momentos para conversas, diálogos, interlocuções, enfim espaços para os sujeitos se
colocarem por meio da palavra e esta ser acolhida, escutada e interrogada.
Voltar aos dados da pesquisa de mestrado destacou de forma mais clara o que
estava buscando, o discurso dos sujeitos, e assim, a construção de um caminho possível
para contemplar tal interrogação com base na teoria freudiana e nas elaborações teóricas
lacanianas.
Lacan, ao intitular o Seminário “O avesso da Psicanálise”, formulou “a
psicanálise pelo avesso”, referindo-se à sua retomada do projeto Freudiano pelo avesso.
O discurso, segundo Lacan, é uma estrutura necessária que ultrapassa a palavra sempre
mais ou menos ocasional. Os sujeitos falam ocasionalmente e este ocasionalmente diz
sobre a verdade furando a palavra e fazendo sentido.
A estrutura desse trabalho, apoiada nas referidas formulações de Lacan sobre
os discursos, é uma tentativa de realizar a leitura dos efeitos de fala produzidos na
interlocução entre os profissionais da Escola CID, pautada na hipótese de que o trabalho
de inclusão somente se efetiva nessa escola porque aí existe giro discursivo.
Para trabalhar a hipótese, a metodologia utilizada foi o estudo de caso. Neste,
encontramos uma articulação entre o campo educativo e o campo psicanalítico. O
estudo de caso é uma metodologia da pesquisa qualitativa em educação que envolve
todo o universo de dados possíveis de serem extraídos do campo de pesquisa. A
psicanálise, no entanto, trabalha com a construção de caso quando se trata de
sistematizar o tratamento dos dados de um caso clínico e sua apresentação pública.
Assim Freud chegou à metapsicologia.
Não se trata de buscar semelhanças e construir um caminho único
desrespeitando o valor de um ou outro campo de pesquisa, mas de realizar o
desenvolvimento teórico desse trabalho com base na sistematização teórico-prática.
Trata-se de tocar o empírico que se encontra nas falas dos sujeitos e pautada na teoria
dos quatro discursos de Lacan extrair daí os discursos presentes.
Nesse percurso iniciamos a seção um, intitulada, “A escola CID, um modelo
singular de trabalho educativo”, no qual apresentamos a Escola de Educação Infantil e
Ensino Fundamental Centro Integrado de Desenvolvimento (CID), detalhando sua
estrutura física, composição de alunos, proposta educacional, organização curricular e
equipe de profissionais. Ainda nessa seção procuramos mostrar o modelo de trabalho
educativo da escola, uma vez que este nos revela seus dispositivos de trabalho, tratados,
no desenvolver da tese, como dispositivos discursivos, pois remetem ao coletivo e aos
espaços que possibilitam o estabelecimento do laço social pela circulação da palavra.
As constatações feitas em um primeiro momento possibilitaram as elaborações
realizadas na seção dois: “Da lógica do “grupo” a estrutura da “escola”. Nesta, partimos
da teorização de Freud sobre grupo em “Psicologia de grupo e análise do ego” (1921), e
apontamos as diferenças em relação ao trabalho da equipe da escola. O propósito
fundamental dessa seção foi marcar a diferença do trabalho da escola em relação à
“lógica de grupo” teorizada por Freud e aproximar da “Escola” proposta por Lacan.
A seção três, Linguagem, discurso e a lógica do significante” apresenta em sua
primeira parte uma incursão sobre a linguagem e a psicanálise. A escola, sendo um
espaço onde os sujeitos estabelecem laços sociais, é uma estrutura discursiva, tecido
estruturado pela linguagem. A leitura dessa estrutura requer a apropriação dos conceitos
teóricos que respondem à colocação de Lacan “o inconsciente está estruturado como
uma linguagem”. Tentamos desenvolver esses conceitos por meio da articulação entre a
teoria e as fórmulas Lacanianas na intenção de uma orientação mais didática. Ainda
nessa seção realizamos o percurso sobre o mito “Totem e Tabu” para trabalhar sobre a
instância da lei e suas implicações na entrada na ordem dos discursos. Com o complexo
de Édipo chegamos à castração e o seu estatuto simbólico. Foi na tentativa de
acompanhar as elaborações teóricas de Lacan em seu percurso sobre o Nome-do-Pai que
recorremos aos termos falo, gozo e objeto a, para obtermos suporte teórico para as
articulações que deram sequência a quarta seção. Em “Inclusão, o significante do
discurso da escola – na contramão do discurso social”, partimos da origem da palavra
escola, desenvolvemos o percurso histórico desse conceito e apontamos a significação
que este carrega marcando a diferença em relação à realidade da educação especial. O
objetivo foi, nesse percurso, chegar à inclusão enquanto proposta determinada por lei
em contraponto à inclusão enquanto significante produto da rede discursiva da escola
CID, e revelador de sua posição política.
Na seção “Os giros discursivos da escola CID, uma leitura do discurso como
facilitador do trabalho com a diferença”, apoiamo-nos nos discursos desenvolvidos por
Lacan no Seminário “O avesso da Psicanálise” para averiguar os discursos presentes na
escola, e preparar o material para formalizar a hipótese levantada, a de que é por meio
dos giros discursivos que esta escola sustenta o trabalho com a inclusão. A isto
seguiram-se as considerações finais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Realizar a análise do trabalho desta escola pela via do discurso possibilitou-nos
constatar que os sujeitos aí implicados possuem determinadas relações estabelecidas.
Relações que fazem fatos, como bem fundamentou Quinet (2009b), “[...] um dizer é
aquilo que, não sendo propriamente da ordem da fala, funda um fato. Os discursos
fundam fatos, que são os laços entre as pessoas. Uma clínica derivada dos discursos é
uma clínica do fato, ou melhor, uma clínica do ato. A definição do ato, segundo Lacan,
é um dizer que funda um fato`.” Importante considerar ainda que, essencialmente por
compartilharem de espaços para circulação da palavra em que o discurso do analista se
faz presente, os giros discursivos acontecem.
Apoiados na teoria de Lacan sobre os discursos nos foi possível depreender que
o discurso do analista, a partir da posição -não toda- que porta diante do outro no
discurso é que faz girar todos os outros discursos. Da mesma forma, adentrar ao
universo desta escola possibilitou compreender que, o que inicialmente se apresentava
como um funcionamento com determinados dispositivos de trabalho, agora revelam a
fundamental importância de pensarmos sobre estes dispositivos a partir da posição que
ocupam como “dispositivos discursivos” e o papel do discurso do analista nesta
instituição.
Estes dispositivos não foram de antemão determinados, a escola CID não
estabeleceu estes espaços previamente em seu Plano Político Pedagógico, neste contém
apenas seus eixos de trabalho, os quais são a psicanálise, a Pedagogia de Projetos e a
Interdisciplinaridade, sendo assim possível colocar que estes espaços foram sendo
criados no decorrer dos anos de trabalho em que por meio da escuta da queixa se
construiu a demanda.
Os grupos de estudo, conselhos de classe, supervisões e principalmente as
reuniões de grupos são dispositivos discursivos de trabalho desta instituição. Nestes, os
profissionais dão seu testemunho de suas experiências o que os faz suportar o real no
trabalho. Trabalhar com os alunos é deparar-se com a pulsão de morte, a diferença,
enfim com o real, e o real é da ordem do impossível, o impossível de se dizer, o que
escapa ao simbólico. Como coloca Lacan (1992, p.197): “o real não é, antes de mais
nada, para ser sabido”.
Embora não se opere diretamente com o discurso do analista ele se faz presente
nesta escola. A presença de um profissional psicanalista na escola faz a diferença, o
discurso do analista faz uma ruptura nos discursos presentes nesta instituição e aí se
abre a possibilidade de giro discursivo.
Dada a especificidade da função da escola como instituição responsável pela
transmissão do conhecimento já construído pela humanidade, não haveria como a
mesma trabalhar sem convocar em seus profissionais a posição de mestre ou apresentar
seu discurso amarrado a esta posição. No entanto, o que foi possível constatar é que o
mestre neste espaço escolar, não ocupa o lugar de mestria.
A presença do discurso do analista tem aí o valor de revelar um sujeito do saber
que não sabe de si mesmo. Os espaços para falar, escutar o outro e se escutar tornam-se
legíveis por meio da palavra, algo que estes sujeitos desconhecem, algo que não
encontra resposta e os lança ao trabalho apoiados na dialética saber e não saber. A partir
daí a relação destes sujeitos com o saber já não é mais a mesma, estes já não concebem
mais o processo ensino aprendizagem como concebiam antes, já é possível ocupar outra
posição diante do aluno. Ao questionar-se sobre o que pode este aluno dizer de si
mesmo o professor convoca-o a trabalhar. Isso ecoa na maior possibilidade de trabalho
com os alunos, seja aqueles que podem responder na condição de sujeitos desejantes ou
seja aqueles que estão no discurso bem como os que encontram-se apenas na linguagem.
Há uma barra aí, o professor sendo aquele que se faz cargo da transmissão do
conhecimento, ocupa a posição de mestre, no entanto, este posicionamento está referido
a falta, o que nos faz aqui afirmar que pode haver nesta condição acima explicitada, a
incidência de uma barra sobre o mestre. Quero dizer, o reposicionamento que os giros
discursivos provocam nos profissionais da escola, causa o efeito de barra. Há uma oferta
operada pelo discurso do mestre, mas esta oferta está referida a uma falta, o mestre aí se
interroga, distanciando-se também do discurso universitário, onde os conhecimentos
pedagógicos que a ciência apresenta se colocam como verdade cabendo ao aluno o lugar
de objeto.
Os profissionais aí se interrogam e, por se interrogar não permanecem mais na
posição de totalidade, pelo contrário, fazem referencia ao Nome-do-Pai, a falha no
Outro que nenhum saber poderá vir formatar. Esta referência permeia a instituição
possibilitando o trabalho pautado na educação enquanto impossível, na impossibilidade
de total contemplação, na falta que se suporta ao trabalhar com a diferença do outro, e
por que não dizer, com a impossibilidade do outro.
A Escola CID, por operar com o discurso analítico apresenta-se referida a um
Outro barrado, uma posição diferente em relação ao gozo. O Outro da instituição pode
ser furado. É desta forma que é efetivado seu trabalho com a inclusão A efetivação está
na posição mestre barrado, aquele que assume a posição de transmissão do saber, mas
que permite se interrogar e ser interrogado sobre este saber, se deixando apontar sua
falta.
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