8 Seminário realizado na Assembléia Legislativa paulista debateu a regulação dos serviços públicos privatizados e a atuação das agências reguladoras
10 Projeto Genoma Humano do Câncer coloca à disposição da comunidade científica internacional 280 mil fragmentos de seqüências de genes expressos em tumores
18
Pesquisadores do projeto Genoma Funcional encontram a chave para realizar a transformação genética da bactéria Xylella fastidiosa e abrem caminho para o controle da CVC
Capa: Hélio de Almeida,
sobre foto do HST
23 Estudo consegue isolar um peptídeo
presente no sangue da aranha caranguejeira (Acanthoscurria gomesiana) com potente
ação antimicrobiana e que age mais rápido do que os antibióticos convencionais
EDITORIAL 5 MEMORIAS 6 OPINIÃO 7 POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLOGICA 8 CIÊNCIA 18 TECNOLOGIA 40 HUMANIDADES 50 LIVRO 56 LANÇAMENTOS 57 ARTE FINAL 58
30 Com participação brasileira, está nascendo na Argentina o Observatório Pierre Auger de raios cósmicos
40 As incubadoras de micro e pequenas empresas tornam-se o principal meio de transferência de tecnologia dos laboratórios de universidades e centros de pesquisa para o mercado.
50 Pesquisa sobre a história da indústria farmacêutica nacional revela que ela nasceu forte e ligada aos laboratórios de pesquisa
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • 3
PESQUISA FAPESP É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL
DA FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
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4 • AGOSTO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
CARTAS
Pesquisa FAPESP
Como pesquisador científico aposentado pelo Instituto Florestal paulista e assessor (ex) da FAPESP, desejo congratular-me com a equipe responsável, conselho editorial e colaboradores pela excelência da revista Pesquisa FAPESP, de maio do corrente. Seu texto engrandece o trabalho encetado pelos pesquisadores em nosso meio.
Dilema
ALCEU DE ARRUDA VEIGA
São Paulo, SP
Excelente a matéria sobre a pesquisa de Paulo de Carvalho Fortes, da Faculdade de Saúde Pública da USP ("Salvar, uma decisão dramática", edição N° 53). Houve um pequeno problema na apresentação da tabela sobre os dilemas da escolha para internação. Há dados que diferem da interpretação do texto (a tabela indica 71% de estudantes do quarto
ano que optaram pela opção 1, mas o texto menciona a opção 2). Pena que a tabela não reproduz as escolhas da amostra de 400 pessoas de Diadema. Serià possível reproduzir a tabela mais completa a que se refere a reportagem?
LUI Z A. DE CASTRO SA TOS
Professor Adjunto Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Houve, de fato, um erro no texto da reportagem e outro na tabela publicada. A criança de 1 ano (Opção I) e não a de 7 (Opção II) é que foi escolhida por 60% dos alunos de primeiro ano de curso de administração hospitalar. A criança de 1 ano foi também a opção de 29% dos alunos de quarto ano, e não 71 %, como publicado. De fato, 71% dos estudantes do quarto ano escolheram a opção II ( criança de 7 anos). As escolhas dos acompanhantes de usuários do hospital de Diadema, recém-pub licada na tese de livre-docência de Paulo de Carvalho Fortes, são as seguintes:
Dilemas apresentados a acompanhantes de usuários do Hospital Público de Diadema
OPÇÃO I
Criança de I ano = 280 (70.9%)
Criança de 7 anos = 287 (72%)
Homem de 25 anos = 143 (36.2%)
Mulher= 314 (79.5%)
Mulher com 3 filhos menores = 354 (89.6%)
Mulher casada = 297 (75.2%)
Homem empregado = 30 (7.6%)
Mulher com renda familiar de R$ 500,00 = 376 (95.2%)
Professor de colégio estadual de 40 anos = I 02 (25.8%)
Trabalhador na construção civil com 2 filhos menores = 366 (92.7%)
OPÇÃO 11
Criança de 7 anos = 81 (20.5%)
Homem de 65 anos = 90 (22.8%)
Homem de 65 anos = 240 (60.8%)
Homem= 44 (11. 1%)
Mulher com I filho menor= 27 (6.9 %)
Mulher solteira = 70 ( 17.7%)
Homem desempregado = 353 (89.4%)
Mulher com renda familiar de R$ 3.000,00 = 6 ( 1.5 %)
Trabalhador na construção civil de 40 anos = 264 (66.8%)
Padre católico = 12 (3.0%)
Operário metalúrgico sem filhos = 251 (63.5%) Pastor evangélico = 116 (29.4%)
Homem fumante= 178 (45.1%) Homem não-fumante = 203 (51.4%)
Mulher de 25 anos Mulher de 25 anos e HIV positivo= 192 (48.6%) e diabética= 188 (47.6%)
Mulher de 40 anos Mulher de 40 anos com hepatite = 325 (82.3%) e alcoólatra = 57 ( 14.4%)
SEM RESPOSTAS
34 (8.6%)
18 (4.6%)
12 (3.0%)
37 (9.4%)
14 (3 .5%)
28 (7.1 %)
12 (3%)
13 (3.3%)
29 (7.3%)
17 (4.3%)
28 (7.1%)
14 (3.5%)
15 (3.8%)
13 (3.3%)
Homem de outra cidade = 238 ( 60. 3 %) Homem residente na cidade = 128 (32.4%) 29 (7.3%)
Fonte: Fortes, Paulo Antonio de Carvalho O dilema bioétko de seledonar quem deve viver: um estudo de microolocoção de recursos escassos em saúde. São Paulo 2000; tese de livre-docência - Faculdade de Saúde Pública - Universidade de São Paulo
EDITORIAL
Um enlace visível entre ciência e tecnologia
Mesmo a pesquisa de partículas produz inovação e efeitos no mercado
Por mais notáveis que tenham sido os avanços obtidos no conhecimento sobre a estrutura e a origem do universo ao longo do século 20,
fenômenos que permanecem como mistérios fascinantes nesse campo continuam a desafiar a vontade de saber e de explicar de cientistas do mundo todo- dos físicos em particular. As chamadas partículas de altíssimas energias ou de energias extremas constituem, sem sombra de dúvida, um desses grandes mistérios. Afinal, o que são essas partículas com massa ínfima, suba-tômica, e que, no entanto, são dota-
Nesta edição, vale também destacar as matérias referentes ao campo do conhecimento que recentemente projetou a ciência feita no Brasil para um lugar de visibilidade e reconhecimento internacional jamais alcançado antes em sua história. Estamos falando, é claro, de genômica. E aqui damos notícia da elevação significativa dos investimentos no Genoma Humano do Câncer, decidida pelas duas instituições responsáveis pelo projeto - FAPESP e
Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer -, em paralelo à decisão de dobrar a meta inicial de produ-
das de uma tal energia que o fenômeno mais energético produzido na Terra, a aceleração de partículas dentro do Fermilab, só consegue atingir um quantum de energia 1 milhão de vezes menor do que a que elas carregam? De que parte do Universo provêm essas partículas raras, que chegam à atmosfera da Terra na fre-
"Além da ciência, a indústria nacional também participa
ção de seqüências de genes expressos em tumores, de SOO mil (já atingida) para 1 milhão de seqüências até o final deste ano. Damos noticia também dos dois novos projetas geno-ma iniciados há pouco pela Fundado projeto
Pierre Auge r, ção: o de uma variedade da Xylella que ataca as videiras da Califórnia, em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (o que, aliás, provocou ciumeira e disputa por parte de um laboratório norte-americano), e o da Leifso-
qüência de apenas uma por século, por quilômetro quadrado?
Ninguém tem, por enquanto, respostas a oferecer para essas questões e entre os que estão empenhados em obtê-las destacam-se os cientistas envolvidos no projeto do Observa-tório Pierre Auger de Raios Cósmicos, tema de capa desta edição de Pesquisa FAPESP. Com apoio de US$ 1,6 milhão da FAPESP e de US$ 340 mil do Ministério da Ciência e Tecnologia, a participação brasileira é decisiva nesse grande empreendimento internacional, seja em termos dos recursos humanos de alto nível colocados à disposição do projeto, seja em relação à infra-estrutura do observatório, que conta com equipamentos essenciais, centrais mesmo, aqui desenvolvidos e produzidos pela indústria nacional. Idealizado pelo físico norteamericano James Cronin, prêmio Nobel de 1980, o Observatório Pierre Auger terá primeiro um sítio sul, que já começou a ser implantado em Mendoza, na Argentina, com previsão para estar completamente instalado em 2003. Feito isso, os coordenadores do projeto definirão a estratégia de implantação do sítio norte em Utah, nos Estados Unidos.
• nia xyli subsp.xyli, conhecida anteriormente como Clavibacter, que afeta a cana-de-açúcar, em parceria
com um instituto de pesquisa australiano e a Copersucar. E finalmente, ainda nos domínios da genômica, esta edição traz uma reportagem sobre um avanço muito importante obtido em relação à transformação genética da Xylella fastidiosa- pela primeira vez conseguiu-se em laboratório uma seqüência de DNA que foi "aceita" pelo genoma da bactéria-, que abre o caminho para estratégias de base genética de combate à praga do amarelinho, um inimigo poderoso da citricultura paulista.
De uma certa maneira, nas matérias citadas há um enlace visível entre ciência, tecnologia e sociedade. Já a reportagem sobre incubadoras de empresas, na seção de Tecnologia, lança algumas luzes especificamente sobre os efeitos benéficos da construção de pontes institucionais entre laboratórios de universidades e o mercado, num país como o Brasil.
PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 1000 • 5
MEMÓRIAS
O inventor do país mestiço
Em 1933, a publicação do livro Casa Grande & Senzala, do sociólogo pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987), cujo centenário se comemora, deu nova dimensão
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Na África, com chapéu de antropólogo: pioneiro no estudo de culturas
Com o pai, Alfredo, em 1917
Casa-grande, senzala e carro de sinhá '-----------"'""""'""""------'
à historiografia nacional: ela deixou de ser
Ao lado do escritor e amigo José Lins do Rego Com o educador Anísio Teixeira e Jorge Amado
mera sucessão de fatos e nomes grandiosos e passou a fixar-se no cotidiano, na vida social, no jeito de ser brasileiro. Freyre, que fez estudos superiores em Recife e nos Estados Unidos, foi pioneiro aqui em sociologia e antropologia. Lançou um olhar sobre o país com a frieza do analista e a paixão do nativo. Uma mistura, como a mescla étnica e cultural brasileira que ele tanto estudou, da qual surgiu
no mundo e indispensável ao entendimento desta nação tropical. "O tempo nunca é só passado, nem só presente, nem só futuro, mas os três simultaneamente. Vivo nesses três tempos", disse o autor, que complementaria o clássico Casa Grande com Sobrados e Mocambos (1936). O resultado de seus "esforços de ressurreição do passado" foi uma obra pluridisciplinar em que dissecou
uma obra reconhecida O lugar de trabalho da casa de Apipucos, Recife as entranhas da nação.
6 · AGOITO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
OPINIÃO
ANTONIO CARLOS DE CAMARGO
Serpentes e indústria farmacêutica Como mostra o Butantan, venenos podem originar medicamentos
Como entender por que as serpentes, uma das espécies animais mais temidas pelo homem desde a pré-história, exercem em nós
tão irresistível atração? Essa atração é uma das principais razões que têm feito do Butantan uma instituição conhecida mundialmente.
A fascinação pela serpente é milenar. Para os sumérios, há 4.000 anos, a imortalidade ou a cura das doenças era uma atribuição do deus Ningishzida, representado pelas cobras gê-meas. Essas são até hoje o emblema da medicina. Os romanos herda-
raca, que a indústria farmacêutica multinacional desenvolveu o captopril, o remédio mais usado para tratar a hipertensão arterial. As pesquisas que levaram ao desenvolvimento desse remédio por multinacionais farmacêuticas geram um faturamento de cerca de US$ 10 bilhões por ano. Essa quantia é de três a quatro vezes superior à que nosso presidente quer investir no combate à pobreza no Brasil, ou cem vezes superior àquela que gastamos na fa-
bricação de vacinas para todo o país. Que obstáculos nos impedem de
utilizar nosso imenso potencial de ram dos etruscos o culto às serpentes antes de cederem à influência da medicina grega. Já entre os hebreus, simbolizavam maldição. No Butantan, elas são tratadas com respeito e admiração, pois seu veneno tem ajudado o homem a entender e a curar doenças.
Como o poder mortal do veneno das serpentes pode ser convertido em remédio? Na Antigüidade, mui-
"Temos de superar o fosso que separa o laboratório de pesquisa, mantido com recursos públ icos, da iniciativa privada,
recursos naturais e humanos na geração de produtos e evitar que fatos semelhantes se repitam? Citamos aquele que é uma das mais visíveis características do subdesenvolvimento, traduzida pelo fosso que separa o laboratório de pesquisa (mantido com recursos públicos) da iniciativa privada. Na área farmacêutica temos, numa ponta, recursos humanos
tos curandeiros, feiticeiros, médicos e cientistas buscavam nos venenos o remédio para as doenças por acre-ditar que "o mal com o mal se cura" (equivalente ao aforisma médico "similia similibus curantur"). Foi buscando no veneno da serpente o remédio para a cura dos males por ele causado que o médico Vital Brazil, fundador do Instituto Butantan, fez companhia a dezenas de personagens famosos da história da medicina. Sua admiração por esses animais ajudou a desenvolver no país o soro antiofídico e ainda despertou em nossos cientistas o interesse pelas suas toxinas. Os venenos são também uma fonte de cobiça pelo potencial de gerar riquezas que têm, por servirem de modelo para novos remédios e pesticidas.
É notório que nós, brasileiros, não sabemos valorizar nossas riquezas naturais. Exemplos existem também no uso farmacêutico dos venenos. Poucos sabem que foi a partir das pesquisas feitas em laboratórios brasileiros, com o veneno da jara-
qualificados provenientes do meio ·científico e, na outra, uma indústria farmacêutica brasileira desenvolvida em muitos aspectos, mas com pouquíssima capacidade de aproveitamento das pesquisas biomédicas.
Passos importantes pará a necessária aproximação entre a bancada dos laboratórios e a iniciativa privada têm sido dados pela FAPESP, criando iniciativas que ajudam a contornar a dificuldade do governo para enfrentar as engrenagens emperradas de muitas instituições públicas. Mas é fundamental que tais instituições se associem à iniciativa privada para ganhar competitividade e eficiência, desonerando o Estado e beneficiando a sociedade.
ANTONIO CARLOS M. DE CAMARGO, médico, é professor da USP e diretor do Centro de Toxinologia Aplicada do Instituto Butantan
**Artigo publicado originalmente na íntegra na Folha de São Paulo de 24/08/2000
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 1000 • 7
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
SETOR PÚBLICO
O controle social da privatização
Seminário organizado pela Assembléia Legislativa e FAPESP debate a regulação dos serviços públicos
AFAPESP aposta que as universidades e os institutos de pesqui
sa paulistas têm grande contribuição a dar na avaliação do impacto das privatizações dos serviços públicos e das estratégias de atuação das agências reguladoras. E, em parceria com a Assembléia Legislativa de São Paulo, está promovendo uma série de debates sobre os direitos e deveres dos usuários e das empresas concessionárias, as formas de controle social da qualidade e preço dos serviços dos diversos setores e as perspectivas de universalização do acesso aos serviços públicos privatizados.
A primeira rodada de discussão do tema ocorreu durante o seminário Regulação dos Serviços Públicos, realizado nos dias 3 e 4 de agosto, na Assembléia Legislativa, que teve como objetivo avaliar os resultados obtidos com a concessão de serviços públicos no Brasil. O evento integrou a pauta do Fórum São Paulo Século 21. O público, composto por especialistas de diversos setores, formadores de opinião, representantes de entidades de defesa do consumidor, entre outros, lotou o auditório Teotônio Vilela, superando as expectativas dos organizadores.
8 • AGOSTO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
Diretores das agências reguladoras dos serviços explicaram a atuação e as dificuldades encontradas pelos órgãos criados para o controle das concessionárias. O diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Júlio Colombi Netto, afirmou que todas as legislações deverão ter maior dinamismo para acompanhar as evoluções tecnológicas que estão acontecendo no mundo moderno. "Muitos dos problemas enfrentados na área de regulação são frutos de erros cometidos no processo de elaboração dos contratos de concessão': afirmou Colombi. Marcelo Poppe, assessor especial da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), explicou que a Agência está atuando de forma rigorosa com as empresas. Segundo ele, a sensação de ausência de medidas ocorre por causa do grande número de empresas que recorre das multas aplicadas. "As concessionárias estão recorrendo das multas para não correr o risco de perder as concessões", afirmou.
Modelo de regulação- Mas não faltaram críticas ao processo de privatização das empresas públicas. Para o professor da Universidade Estadual
de Campinas Márcio Wohlers, o atual modelo de regulação não tem dado conta das questões que estão surgindo na sociedade. "As mudanças e os avanços tecnológicos que estão ocorrendo no mundo obrigam as agências a fazerem reavaliações permanentes em suas atuações", disse. Na sua opinião, essas instituições precisam estar sempre incorporando as novas questões que surgem a cada dia. "A Internet é um bom exemplo. Enquanto se fala em universalização do telefone, já existe uma nova demanda social por acesso à Internet, que não foi planejada ainda", afirmou Wohlers.
Flávia Lefevre Guimarães, coordenadora jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), afirmou que a população quer entender o que está acontecendo no processo de privatização, mas ressalvou que a carência de informações é o que impera neste momento.
Steve Thomas, da Universidade de Sussex, na Inglaterra, país que já vivenciou a experiência da privatização, avaliou que muitos dos problemas registrados na concessão dos serviços decorrem da rapidez do pro-
Especialistas de diversos seto res avaliaram os resultados obtidos
cesso de transferência das empresas públicas à iniciativa privada. Sugeriu que as agências reguladoras no Brasil avaliem as experiências dos diversos países para evitar vários equívocos.
Thomas: rapidez na concessão pode
trazer problemas
Para o secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, José Aníbal, o grande desafio das agências reguladoras é criar instrumentos para que a sociedade interaja com as empresas privatizadas de forma benéfica. "O interesse despertado pelo evento demostrou de forma clara que muito ainda precisa ser feito para que o modelo de agências implantado no Brasil atenda às necessidades da população." José Geraldo Piquet Carneiro, membro da Comissão de Ética Pública do Governo Federal, ressaltou que o conceito de Agências de Regulação ainda não foi assimilado no Brasil. Lembrou o caso das privatizações do setor de transportes que, ainda hoje, não possui uma agência fiscalizadora. "É errado privatizar primeiro para depois regulamentar. O processo correto é o contrário': Depois
STEVE O THOMAS
alertou que é necessário que as Agências possuam "independência decisória", sem que sejam contaminadas pelos órgãos e interesses do governo. ''A função das agências é estimular a concorrência e melhorar a qualidade dos serviços públicos", concluiu.
Criação do conhecimento - A participação da FAPESP na organização do seminário é reflexo do interesse da instituição na criação do conhecimento. O presidente da Fundação, Carlos Henrique de Brito Cruz, ressaltou que a necessidade de avanços na esfera do poder público e a incorporação de conhecimento são fundamentais no atual es-
tágio da sociedade brasileira. "Muitas pessoas pensam que a FAPESP só financia pesquisa sobre raio laser, genoma, biologia molecular e computadores': disse. Lembrou que, para atender ao setor público, a entidade mantém o Programa de Apoio à Pesquisa em Políticas Públicas, que incentiva a parceria entre universidades, institutos de pesquisa e órgãos de governo para o desenvolvimento, a análise e o diagnóstico de políticas públicas e até mesmo para a aplicação em escala piloto.
"O evento foi muito importante e funcionou como um balanço da situação das empresas privatizadas'~ afirmou Francisco Romeu Landi, diretor-presidente da FAPESP. Ele explicou que, ao promover o seminário e os debates em torno do tema, a Fundação tem como objetivo estimular o desenvolvimento de pesquisas que apóiem os diversos setores envolvidos.
Publicação especial- Em continuidade ao seminário, serão organizados encontros
por áreas, onde grupos de traba-
lho detalharão propostas institucionais e farão sugestões de pesquisa em diversos setores dos serviços públicos envolvidos. Os resultados do seminário e dos deba
tes nos grupos de trabalhos serão reunidos numa publicação especial, editada pela FAPESP em parceria com o Legislativo paulista.
O deputado Arnaldo Jardim (PPSSP), relator do Fórum São Paulo Século 21, afirmou que o encontro funcionou como mola propulsora para estimular o interesse de novos pesquisadores para essa área da sociedade. "Eu acredito que o número de pesquisadores dos meios acadêmicos se multiplique e o seminário estimule profissionais para isso", disse. "Os trabalhos com essas questões tendem a aumentar em número e profundidade", estimou Jardim. •
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • 9
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
GENOMA CÂNCER
Projeto ganha mais US$ 5 milhões
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Governador Mário Covas anuncia publicação de resultados do Genoma Câncer em banco de dados internacional
FAPESP e Ludwig publicam resultados e ampliam investimentos
AFAPESP e o Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer -
agências financiadoras do projeto Genoma Humano do Câncer - estão compartilhando com a comunidade científica internacional os dados obtidos no seqüenciamento de genes ativos em tumores do câncer. A maior parte dos dados brutos, como é chamado o conjunto de letras correspondentes aos nucleotídeos que se obtêm com o seqüenciamento de genes, já está disponível na Internet, no maior banco de dados públicos internacional, o GenBank.
O sucesso do projeto levou a FAPESP e o Ludwig a investir, até o fim
I O · AGOSTO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
do ano, mais US$ 5 milhões no projeto, totalizando US$ 20 milhões, o dobro dos recursos inicialmente previstos. A divulgação dos resultádos da pesquisa e os novos investimentos foram anunciados em São Paulo, no dia 21 de julho, em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes. "Estamos dobrando os investimentos para dobrar as conquistas" afirmou o governador Mário Covas.
Desde março de 1999, data do início do Genoma Câncer, os pesquisadores obtiveram 500 mil fragmentos de seqüências de genes humanos expressos em tumores de mama, intestino, estômago, cabeça, pescoço e outros. Desse total, 280 mil já foram depositados no GenBank. Atualmente o Brasil é o segundo país produtor de seqüências derivadas do câncer e o terceiro maior do mundo em termos de ESTs humanas (Expressed Sequence Tags). Perde apenas para os proje-
tos americanos do CGAP ( Cancer Genomic Anatomy Project), que tem 990 mil, e do MERC, na Universidade de Washington, que produziu 600 mil seqüências. A previsão da coordenação do Genoma Câncer brasileiro é gerar, até o fim do ano, 1 milhão de seqüências.
A técnica utilizada para o seqüenciamento dos genomas, batizada de Orestes, foi desenvolvida no Brasil por Andrew Simpson, coordenador do projeto, e o biólogo mineiro Emmanuel Dias Neto, de 33 anos. A Orestes surgiu ao longo da tarefa de selecionar, clonar, seqüenciar e observar os resultados de cada um dos genes identificados na pesquisa de variabilidade genética do Schistosoma mansoni, objeto da tese de doutorado de Dias Neto, sob a supervisão de Simpson. Os recursos da bioinformática ainda não estavam disponíveis, mas eles se aproximavam cada
vez mais de genes raros e de sua posição exata, o que permitia, por exemplo, identificar a proteína. A técnica foi aperfeiçoada na análise de 1 O mil seqüências de tumores de mama, financiada pelo Ludwig e FAPESP, que, em função dos resultados, decidiram propor o desenvolvimento do projeto em larga escala.
Publicação de dados - Os cientistas responsáveis pelo projeto não temem que a publicação dos dados, ainda que brutos, prejudique os pesquisadores brasileiros. "O importante é avançar na busca da cura. Quanto antes ela
Patenteamento - Tanto a FAPESP como o Instituto Ludwig têm adotado a posição de aceitar o patenteamento de genes, desde que completos e com a função conhecida. "Somos a favor de patentear o invento. Só faremos patente de genes quando soubermos a sua utilização prática e função. Não queremos patentear um conjunto de letras ou a própria natureza", completou Perez. Segundo ele, um dos desafios do Programa Genoma da FAPESP, em particular do projeto Genoma Câncer, é avançar na discussão da questão das patentes. "Não podemos ficar numa si-
guma companhia alimentícia poderia fazê-lo" justifica Perez. "Estamos patenteando inventos, gene com função e com utilização prática." No Genoma Humano do Câncer já há alguns genes sendo considerados, mas ainda nenhuma patente.
Para cuidar da proteção à propriedade intelectual de inventos originários das pesquisas que financia, a FAPESP criou o Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) . "Estamos aprendendo como funciona. O Brasil tem carência enorme de patentes. A Coréia deposita nos EUA cerca de
z 1.500 patentes por ano ~ e o Brasil apenas 30. §
Temos poucas paten-~ z: tes acadêmicas porque
o pesquisador não sabe como agir. Precisamos criar uma cultura que valorize a propriedade intelectual", disse Perez.
vier, melhor", afirmou Simpson. Antes de estarem disponíveis no banco público de dados, as informações passam por um processo que lhes confere um critério de qualidade, garantindo a correção do que está sendo divulgado. No decorrer desse processo, os pesquisadores já começam a fazer hipóteses sobre a função dos genes, o que dá uma certa vantagem competitiva em rela
Técnica Orestes foi desenvolvida por Dias Neto com su~ervisão de Simpson
O próximo passo será partir para o estudo do Genoma Clínico do Câncer, cuja verba prevista será de US$ 1 milhão. Numa primeira etapa serão analisados os genes que podem ser usados
ção àqueles que observam os genes pela primeira vez na base de dados pública.
A publicação dos dados do Genoma Humano do Câncer no GenBank marca uma posição das instituições financiadoras em relação às pesquisas genéticas: quando os dados passam a ser de domínio público ninguém mais pode patenteá-los, nem mesmo redescobrir um gene isoladamente. "É uma espécie de 'sabotagem' contra aqueles que não têm a mesma posição que a nossa", explica José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP. "O que deve ou não ser patenteado é uma discussão a ser feita em congressos. O nosso dever é produzir dados científicos e dar para a humanidade", acrescenta Simpson.
tuação que iniba o investimento em biotecnologia no país porque vamos ficar numa posição diferente da dos países desenvolvidos", disse. Perez se referia à possibilidade de patenteamento de fragmentos de genes, admitida pelos Estados Unidos e Inglaterra, embora o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, e o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, tenham se manifestado favoráveis ao patenteamento de genes inteiros e com função definida.
A FAPESP já patenteou nove genes descobertos no projeto Genoma da bactéria Xylella fastidiosa. Os genes patenteados estão relacionados à produção da goma xantana, um espessante utilizado na indústria alimentícia. "Se não registrássemos a patente, al-
como marcadores no diagnóstico e prognóstico, além de predisposição, em diversos tumores humanos. A partir daí, as pesquisas irão se concentrar em pacientes individuais. A idéia é analisar os genes associados ao câncer, o que permitiria elaborar um tratamento mais adequado para cada paciente, melhorando o diagnóstico. "Se a doença for identificada mais cedo é possível otimizar o uso das ferramentas que já se tem e ampliar a incidência de cura", afirma Simpson.
O endereço para acessar o GenBank na Internet é www.ncbi.nlm.nih.gov Trata-se da página central do National Center for Biotechnology Information, com links para o GenBank. •
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • li
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
CANA-DE-AÇÚCAR
Reforço na pesquisa do genoma Universidade de Pernambuco inaugura laboratório de genética
ONordeste, a mais antiga região produtora de cana-de-açúcar
do Brasil, integrou-se ao esforço na
O sucesso dos projetas de seqüenciamento da Xylella e de genes específicos da cana-de-açúcar, ambos financiados pela FAPESP, deverá alavancar recursos federais. Em Recife, Sardenberg anunciou a intenção do governo federal de investir R$ 240 milhões, nos próximos quatro anos, na conservação de recursos genéticos por meio da biotecnologia no país.
"Já encontramos na cana-de-açúcar proteínas análogas às presentes no genoma humano, responsáveis por processos de infecção", revela o pesquisador Paulo Arruda, diretor do Centro de Biologia Molecular da Unicamp e coordenador do Projeto Genoma Cana, da FAPESP.
Atualmente, 150 cientistas brasileiros participam de 12 projetas de
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cional pelo seqüenciamento de genes específicos da planta, coordenado pela FAPESP. Marco dessa nova investida foi a inauguração do Laboratório de Genética da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), no dia 20 de julho. Nas modernas instalações, cientistas pernambucanos trabalham em regime frenético para seqüenciar 2 mil fragmentos do genoma da cana até o fim de agosto, quando todo o trabalho dos 23 laboratórios que integram a Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos - Onsa, estará concluído. A meta é atingir, neste prazo, 200 mil seqüên
Pesquisado res da UFRPE t rabalham no seqüenciamento de 2 mil fragm entos do genoma
cias de genes estudadas, o que torna o projeto brasileiro, iniciado em julho do ano passado, o maior do mundo na área de genética vegetal.
O ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, presente à solenidade de inauguração do laboratório, comemorou a recente repercussão internacional do projeto brasileiro envolvendo a bactéria Xylella fastidiosa, causadora de doenças nos laranjais. "Seguiremos o mesmo caminho com a cana-de-açúcar, planta de grande impacto econômico e social no Nordeste", destacou o ministro.
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Genoma funcional - Concluído o seqüenciamento, os cientistas iniciam as pesquisas com o genoma funcional da cana para identificar as funções dos vários fragmentos genéticos. Para tanto, a Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe) está investindo R$ 1 milhão em laboratórios de biologia molecular. Paralelamente, vão garimpar, no data mining, dados para comparação dos genes da cana com seqüências genéticas semelhantes existentes em bancos de dados internacionais.
data mining. Uma das possibilidades é, no futuro, usar a genética para produzir açúcar que não engorda.
Desde agosto, 37 trabalhos estarão sendo desenvolvidos em diferentes áreas de pesquisa do genoma da cana. Pernambuco aprovou quatro deles. Na UFRPE, serão identificados genes relacionados à fertilidade da cana, permitindo no futuro fazer clonagens para evitar plantas estéreis. Além do laboratório recém-inaugurado, que custou R$ SOO mil, outros três centros de pesquisa pernambucanos preparam-se para participar do
projeto. O Instituto de Pesquisas em Agronomia (IPA), órgão estadual, se dedicará ao estudo de genes ligados à resistência da planta a doenças. Na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), um projeto estudará o papel dos genes na defesa da cana contra pragas e outro identificará proteínas produzidas pelo vegetal submetido a situação de estresse. O objetivo é chegar a variedades de .cana-de-açúcar mais resistentes à seca. Na última estiagem, em 1998 e 1999, os canaviais pernambucanos perderam até 82% da produção.
Seqüências homólogas - No Departamento de Genética da UFPE, dez computadores ligados em rede e conectados à Internet fazem o trabalho de garimpo de seqüências genéticas homólogas às da cana-de-açúcar em bancos de dados internacionais. No Centro de Informática, um computador de R$ 150 mil foi instalado para o desenvolvimento de software e ferramentas computacionais de suporte aos futuros projetas de seqüenciamento genético. Com alto poder de memória, a máquina faz o cruzamento de dados para o desenho do complexo mosaico genético de seres vivos. Um dos benefícios será aplicar ao milho, ao arroz e ao sorgo os resultados obtidos com a cana-de-açúcar, pertencente à mesma família vegetal.
Os novos laboratórios são
Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar), o Projeto Genoma Cana, prevê o seqüenciamento de genes, especialmente aqueles ligados com o metabolismo da sacarose, com a resistência da planta a pragas e doença e a condições adversas de clima e solo. O método utilizado é o ESTs (Expressed Sequence Tags), uma tecnologia de seqüenciamente rápida e baseada apenas nas proporções dos genes expressos, que codificam proteínas.
O genoma da cana pode ser tão vasto quanto o humano. Até agora, já foram identificados mais de 5 mil ge-
fruto da parceria inédita entre Arruda: 37% dos genes identificados são novos
duas fundações estaduais de apoio à pesquisa - a FAPESP e a Facepe. O intercâmbio, formalizado no ano passado, previa, além da montagem de uma infraestrutura de laboratórios de seqüenciamento genético e de bioinformática, a capacitação de cientistas pernambucanos em biologia molecular e genética. Quarenta pesquisadores já participam dos projetas com a cana-de-açúcar.
Lançado oficialmente em abril do ano passado, em parceria com a
nes, um avanço sem precedentes nas pesquisas da cana. Deste total, 3 7% são absolutamente novos, sem semelhança em qualquer outro organismo. Os pesquisadores supõe que estes genes inéditos podem ser a chave para identificar a cana em relação a outros seres. Estas novas estruturas podem estar associadas à produção de proteínas importantes. Os outros genes já identificados têm similaridade ou são homólogos aos já seqüen-
ciados em outras espécies. Por serem conhecidos, será mais fácil saber quais são realmente importantes nas pesquisas aplicadas.
Leishmania chagasi - A partir do conhecimento gerado no seqüenciamento genético do vegetal, o grupo de Pernambuco pretende centralizar, ainda neste ano, uma rede de laboratórios dedicada às pesquisas com o genoma da Leishmania chagasi, parasita transmissor da leishmaniose visceral. A doença é endêmica no Brasil, principalmente no Nordeste. Em todo o mundo, registram-se, por ano, 2 mi
lhões de novos casos de leishmaniose, incluindo os dois tipos: a visceral e a cutânea.
Já foram identificados dezenas de genes envolvidos na absorção e no transporte de nutrientes, que servirão de base para o desenvolvimento devariedades de plantas mais eficientes na absorção iônica. Os pesquisadores também já reconheceram 57 genes anteriormente identificados em outras plantas, que viabilizam a fixação do dióxido de carbono, a síntese de amido e sacarose e o metabolismo de frutose e manose, processos vitais para a planta, que a tornam mais ou menos interessante do ponto de vista econômico. As pesquisas revelaram ainda, dezenas de genes da cana semelhantes a outros, de outras espécies, que conferem resistência a bactérias, fundos e vermes nematóides.
"O pior é que a doença, tipicamente rural, está invadindo as grandes cidades em decorrência da deterioração das condições de vida nas periferias", adverte a bióloga Luíza Martins, da UFRPE. O projeto de pesquisa vai seguir o modelo criado pela FAPESP para os estudos do genoma da cana-de-açúcar. De início, dez laboratórios nordestinos deverão participar da rede que, no momento, busca adesão das instituições de São Paulo. •
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • 13
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
NOVOS GENOMAS
Mais duas bactérias
• na m1ra da Onsa
Pesquisadores vão decodificar genes da Xylella da videira e da Leifsonia
D epois de decifrar o genoma da Xylella fastidiosa e se aproxi
mar da conclusão dos projetos genoma cana, câncer e Xanthomonas axonopodis pv citri, pesquisadores ligados à Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos - Onsa, a rede virtual de laboratórios de pesquisa genômica criada pela FAPESP, iniciam a decodificação dos genomas de duas outras bactérias: o da variedade da Xylella responsável pela destruição das videiras e o da Leifsonia xyli subsp.xyli, conhecida anteriormente como Clavibacter, que ataca o talo da cana-de-açúcar. Os dois projetos se desenvolvem no âmbito de um novo programa, batizado de Genomas Ambientais e Agronômicos.
O projeto de seqüenciamento da Xylella das videiras será desenvolvido em parceria com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). A bactéria, parente próxima da Xylella fastidiosa, ameaça as videiras da Califórnia, região produtora de vinhos nobres. Igualmente transportada por espécies da cigarrinha, a
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Xylella da vinha provoca a doença de Pierce, que entope os vasos que transportam a seiva, causando a redução de tamanho e amarelamento das folhas e a morte da planta. O resultado é um prejuízo anual estimado em US$ 40 milhões.
O acordo de cooperação entre o USDA e a FAPESP já está assinado. As duas instituições vão dividir um investimento de US$ SOO mil na aquisição de seis máquinas de última geração que serão utilizadas na decodificação do genoma. Os resultados serão divulgados até agosto de 2001.
O projeto de seqüenciamento do DNA da Xylella da videira foi disputado por laboratórios norte-americanos. Na tentativa de fechar o acordo com o USDA, os pesquisadores do Joint Genome Institute (JGI) de Walnut Creek, na Califórnia, se ofereceram para realizar a leitura do DNA da bactéria em duas semanas e, posteriormente, chegaram a reduzir esse prazo para apenas um dia. Mas a pressa pode ser inimiga da perfeição. Edwin Civerolo, do Serviço de Pes-
quisa Agrícola (ARS) do USDA, declarou à Folha de S. Paulo que "nunca ficou claro como esse seqüenciamento poderia ser feito tão rápido': Além disso, a equipe do JGI não se comprometia a fazer as anotações do genoma, ou seja, identificar, entre milhões de "letras" químicas, as receitas de proteínas específicas. Essa omissão contou pontos a favor da rede Onsa. "Tempo é um parâmetro crítico, mas a qualidade e a interpretação dos dados também", comentou à Folha o responsável por programas internacionais no ASR/USDA, Richard Greene. O Brasil ganhou a disputa e o JGI ficou com a tarefa de seqüenciar outra cepa da Xylella que ataca plantas da amendoeira.
Genômica comparativa - O acordo com os americanos é estratégico, uma vez que coloca o Brasil como parceiro de uma instituição do porte de um USDA, uma espécie de Ministério da Agricultura dos Estados Unidos, e reafirma o interesse internacional pelo programa funcional da
A bactéria Leifsonia se propaga pelo uso do facão contaminado e ataca as touceiras de cana
Xylella, praga que ataca mais de 150 plantas em todo o mundo. "Não se trata de venda de serviços, mas de uma pesquisa de importância científica que permitirá a genômica comparativa das Xylellas da uva e da laranja e que pode ajudar a entender a patogenicidade de cada uma delas",
Xylella da videira: projeto vai buscar o controle da doença de Pierce
diz José Fernando Perez, diretor científico da FAPESP.
No caso da Xylella da videira, os pesquisadores brasileiros vão utilizar a mesma estratégia adotada na decodificação do genoma do Xanthomonas axonopodis pv citri para facilitar a anotação. "Não vamos seqüenciar o genoma completo", explica Marie-Anne Van Sluys, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), que, junto com Mariana Cabral de Oliveira, coordena o projeto. O genoma da bactéria que ataca as vinhas deve ter entre 2,7 milhões e 3 milhões
de pares de base. Serão seq üenciados pedaços aleatórios do genoma, de tal forma a cobrir entre 1.000 e 4.000 pares de base, ou seja, a oitava parte do genoma. "A nossa intenção é chegar o mais próximo possível da cura e caminhar na direção do controle da doença", afirma Marie-Anne.
Os resultados também permitirãq identificar semelhanças e diferenças que possam existir entre a Xylella dos
citros e a da videira e até mesmo confirmar se as duas bactérias são inesmo variedades distintas da Xylella, já que a classificação atual foi feita por critérios convencionais da bacteriologia e não pelo seqüenciamento do genoma.
Genoma da Leifsonia - O programa de seqüenciamento do genoma da Leifsonia xyli subsp.xyli também será resultado de cooperação internacional. A proposta de parceria foi feita por um instituto de pesquisa da Austrália, país produtor de cana-de-açúcar que convive com a praga nas touceiras da planta. Também será co-financiado pela Cooperativa dos Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do
Estado de São Paulo (Copersucar), que já tinha manifestado interesse em patrocinar a pesquisa. Neste caso, será seqüenciado o genoma completo da bactéria, que, os pesquisadores suspeitam, deve ter algo em torno de 3 milhões de pares de base.
A Leifsonia se desenvolve no mesmo núcleo ecológico da Xylella, mas com hospedeiro distinto, no caso a cana-de-açúcar, e é transmitida pelo caldo da cana que fica no facão, na hora da colheita. A decodificação do genoma deverá expor
os genes envolvidos com a patogenicidade da bactéria e permitir a identificação dos genes-candidatos ao controle da doença. "Queremos observar se ela tem os mesmos padrões quando em contato com a uva ou com a laranja", explica Luís Eduardo Aranha Camargo, do Departamento de Fitopatologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP. •
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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
ESTRATÉGIAS . . .
Católica de Cam pinas (PUC-Campinas), receberam , no dia 16, o Prêmio Nacional de Excelência em Educação a Distância, concedido pela Associação Brasileira de Educação a Distância. O prêmio foi dado pelo desenvolvimento, por Prates e Loyolla,
Fernando Henrique com Perez, Br ito e o ministro Sardenberg
da Metodologia EDMCEducação a Distância Mediada por Computador. A metodologia surgiu
Prêmio e medalha
O presidente Fernando Henrique Cardoso fez a entrega, no dia 14 deste mês, do Prêmio Almirante Álvaro Alberto ao cientista Aziz Ab'Saber e ao empresário Ozires Silva e das medalhas da Ordem Nacional do Mérito Científico, em solenidade no Palácio do Planalto. Entre os 70 agraciados nos diversos graus estavam os pesquisadores paulistas Carlos Henrique de Brito Cruz e José Fernando Perez, ambos da área de Ciências Físicas; Elisaldo Luiz Carlini, Maurício Rocha e Silva, Mayana Zatz e Gerhard Malnic, na área de Ciências Biológicas; Adolpho José Melfi, na área de Ciências da Terra; Jacques Marcovitch, na área de Ciências Sociais; Fernando Galembeck, Hernan Chaimovich, Walter Colli e Paulo Arruda, na área de Ciências Químicas. David Zylberstajn, José Aníbal Peres Pontes, Vilmar Evangelista Faria
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e José Augusto Guilhon de Albuquerque receberam medalhas como personalidades nacionais e o pesquisador Andrew Simpson, coordenador do Genoma Xylella e do Genoma Humano do Câncer, recebeu uma das medalhas destinadas a personalidades estrangeiras.
Prêmio de educação a distância
Os pesquisadores Maurício Prates de Campos Filho, membro do Conselho Superior da FAPESP, e Waldomiro Loyolla, ambos da Pontifícia Universidade
em 1997 para atender à enorme demanda de profissionais de todo o país pelo m estrado em Informática, implantado pela PUC-Campinas em 1992. Incapaz de abrigar a todos, a alternativa encontrada foi o ensino a distância do programa do mestrado. A aplicação da EDMC- que pressupõe um conjunto de ferramentas tecnológicas e pedagógicasocorreu em 1998. Atualmente, o mestrado em Gerenciamento de Sistemas da PUCCampinas atende a mais de 150 alunos, de cidades e estados diversos. A metodologia foi aplicada
Prates (à dir.) e Loyola: democratizando o ensino
também pela Universidade Católica de Brasília, no mestrado em Gestão de Tecnologias da Informação.
Prêmio de inovação tecnológica
A técnica Orestes, uma nova metodologia de análise de genes desenvolvida pelos pesquisadores do Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer Andrew Simpson e Emmanuel Dias Neto, foi a vencedora da etapa brasileira do III Prêmio Alcatel à Inovação Tecnológica na América Latina, concorrendo com outros 32 projetos de diversas áreas de todo o Brasil. O projeto, agora, irá representar o país na próxima etapa, em outubro, no Peru, quando será escolhido o vencedor latino-americano.
Ciência e tecnologia em Alagoas
No âmbito de uma reforma administrativa realizada há dois meses, foi criada, em Alagoas, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Estado. A posse do primeiro secretário, Williams Soares Batista, foi no dia 10 deste mês. Compõem a estrutura da nova secretaria a Fundação de Amparo à Pesquisa de Alagoas (Fapeal), o Laboratório Farmacêutico do Estado de Alagoas (Lifal), a Fundação Universitária de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) e a Fundação Universidade do Estado.
Ciência e tecnologia no Maranhão
No ano passado, o governo do Estado do Maranhão realizou uma reforma administrativa que extinguiu as secretarias e os órgãos a elas vinculados, entre os quais a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Maranhão (Fapema). No seu lugar, criou o Fundo de Apoio à Pesquisa do Estado do Maranhão (Fapem), ligado à Gerência de Planejamento e Desenvolvimento Econômico. A secretaria executiva do Fapem ficou sob a responsabilidade da subgerência de Ciência e Tecnologia. No dia 16 deste mês, o titular do cargo, Carlos Alberto dos Santos Marques, esteve em visita à FAPESP. O objetivo foi buscar uma parceria com a fundação paulista para a implantação de um novo modelo de gestão para a pesquisa no Maranhão.
Alterações mudam estrutura do MCT
O governo federal promoveu uma série de alterações na estrutura do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). No âmbito do MCT, foram criadas quatro secretarias. Três possuem fins bem específicos, como a de Coordenação das Unidades de Pesquisa, de Política Tecnológica e Empresarial e de Política de Informática. A quarta, de Políticas e Programas de C&T, terá atuação mais ampla e contará com três
departamentos: de Programas Temáticos, de Política Científica e Programas Especiais e de Assuntos Nucleares e de Bens Sensíveis. OCNPq teve seu estatuto modificado e nove centros de pesquisa foram transferidos para o MCT. São eles: Museu Paranaense Emílio Goeldi, Observatório Nacional, Museu de Astronomia e Ciências Afins, Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, Instituto de Matemática Pura e Aplicada, Centro de Tecnologia Mineral, Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, Laboratório Nacional de Astrofísica e Laboratório Nacional de Computação Científica. Também foi extinta a Fundação Centro Tecnológico para Informática.
Solidariedade à Argentina
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) encaminhou ao secretario de Estado para la Tecnologia, la Ciencia y la Innovación Productiva da Argentina nota de solidariedade à comunidade científica daquele país, na defesa da preservação de seu patrimônio científico. Segundo a nota, "qualquer mudança nas instituições ligadas ao avanço do conhecimento, particularmente em épocas de dificuldades financeiras, deve ser ampla
e profundamente discutida, de modo a evitar os impactos negativos, que por vezes são irreversíveis". E prossegue: "Tanto para sobreviver como para revigorar-se, o sistema de C&T depende basicamente de ações continuadas e apoiadas com absoluta regularidade. Reestruturações abruptas e unilaterais podem levar a prejuízos inestimáveis e até à rápida destruição daquilo que custou décadas para ser construído". A nota da SBPC atendeu a uma solicitação dos próprios cientistas argentinos dirigida a toda • a comunidade científica do Hemisfério, com o objetivo de gerar uma pressão internacional sobre o governo. Depois de haverem encaminhado, no mês passado, uma carta ao presidente Fernando de la Rua (Pesquisa FAPESP 54), os cientistas argentinos elaboraram um manifesto em defesa da pesquisa científica e do Conselho Nacional de Ciencia (Conicet) daquele país. Segundo eles, o Conicet, principal agência estatal de apoio à pesquisa, está sendo desmantelado e ameaçado de extinção. O orçamento para
educação e C&T na Argentina foi reduzido em US$ 120
milhões e hoje apenas 0,4o/o do Produto
Nacional Bruto do país
é destinado à ciência e tecnologia.
Os salários dos servidores
públicos, inclusive os da área de C&T,
foram reduzidos em 12o/o e o pagamento dos auxílios a pesquisadores foram adiados temporariamente.
A França e o genoma humano
"A França pode e deve permanecer no primeiro plano no campo da pesquisa genômica." A afirmação, feita pelo primeiro-ministro Lionel Jospin, está se traduzindo em investimentos. O país decidiu destinar 1 bilhão de francos, por cinco anos, para as pesquisas sobre o genoma humano. Essa quantia vem somar-se aos 500 milhões de francos anuais que a França já destina às pesquisas nessa área do conhecimento. Uma parte substancial dos novos recursos suplementares irá para a nova rede GenHomme, criada para coordenar os trabalhos de laboratórios públicos, associações filantrópicas e indústrias, a fim de acelerar a valorização dos conhecimentos obtidos. A criação da rede GenHomme faz parte do programa Génomique, que o governo francês lançou em janeiro de 1999 para coordenar e estruturar os esforços de laboratórios e empresas.
PESQUISA FAPESP · AGOSTO OE 1000 • 17
CIÊNCIA
GENOMA FUNCIONAL
AXyle//ase rende e deixa entrar os convidados CARLOS FlORAVANTI
Bactéria do amarelinho incorpora fragmento de DNA que pode mudar as funções originais de seu genoma
Está aberto o caminho para a transformação genética da Xylella fastidiosa, de modo que se possa reduzir a ação indeseja-
da da bactéria causadora da clorose variegada dos citros (CVC), o popular amarelinho, que tornou improdutivo um terço dos laranjais paulistas. A bióloga Patrícia Brant Monteiro, pesquisadora do Fundo Paulista de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), com apoio da FAPESP, desenvolveu um plasmídeo - no caso, uma seqüência de DNA construída em laboratório -com partes do cromossoma da própria bactéria, que conseguiu se integrar ao seu genoma. Até então, a Xylella não era receptiva a qualquer outro fragmento de DNA. Daqui para a frente, ao transportar genes que alterem as funções originais do genoma, o plasmídeo dará origem às Xylellas mutantes, cuja construção,
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na medida em que se torne rotineira, deve pôr em ritmo mais acelerado os estudos que buscam a compreen~ão dos genes da praga do amarelinho -tanto os já conhecidos, quanto, principalmente, os desconhecidos. É esse, justamente, o objetivo prioritário do Projeto Genoma Funcional, iniciado no ano passado pela FAPESP.
Com esse plasmídeo, a Xylella enfim se rendeu. É agora o que se chama de transformante, uma célula modificada geneticamente por meio da introdução de um DNA de origem externa. Processo largamente utilizado para modificar o genoma de outros microrganismos, era inédito no caso da praga do amarelinho. "É a primeira vez que se fazem transformantes de Xylella': atesta o bioquímico Jesus Aparecido Ferro, coordenador do Funcional. A seu ver, o projeto vai agora "sair da possibilidade remota para a possibilidade real" de realizar desco-
bertas importantes a respeito do genoma dessa bactéria. Segundo Ferro, pode ocorrer até mesmo uma explosão de resultados, pois as equipes do Funcional que se dispuserem a testar genes vão se beneficiar diretamente do novo plasmídeo, resultado, por sua vez, do seqüenciamento do genoma da Xylella, concluído no início do ano.
A inovação de Patrícia, que fez com que o plasmídeo funcionasse, reside essencialmente no emprego de um trecho do cromossoma da própria bactéria, chamado origem de replicação ou, de modo abreviado, OriC. É esse fragmento que inicia o processo de replicação do cromossoma, durante a duplicação da bactéria. Outra abordagem que ela pôs em prática e não se mostrou tão proveitosa foi tentar introduzir na Xylella plasmídeos com origens de replicação vindos de outras bactérias, como a Escherichia coli, Xanthomonas ou
Pseudomonas. Com ela, não funcionou. "Os plasmídeos feitos com origens de replicação de outras bactérias são incompatíveis com o sistema de replicação de DNA da Xylella", explica. "Podem até entrar na bactéria, mas são instáveis."
Um ano perdido - A certeza é a filha da persistência, tanto foram as tentativas mal-sucedidas. Entre dezembro de 1998 e junho deste ano, Patrícia trabalhou como pesquisadora do Fundecitrus no Institut National de La Recherche Agronomique (INRA), semelhante à Embrapa brasileira, na cidade portuária de Bordeaux, sul da França. Seu objetivo era o mesmo de outros grupos do Funcional: estudar a biologia molecular da Xylella e construir um plasmídeo que permitisse sua transformação genética. Mas, agora ela sabe, insistiu durante um ano no caminho errado.
Uma bactéria muito semelhante à Xylella, a Xanthomonas citrii, que causa o cancro cítrico e é o objeto de outro programa de seqüenciamento financiado pela FAPESP, aceita plasmídeos de outras bactérias. Por essa razão, tinha-se como certo que a Xylella também aceitaria. Patrícia testou 15 plasmídeos, por métodos diferentes - e nada. Em dezembro de 1998, imaginou que poderia conseguir o que queria se usasse partes do genoma da Xylella, mas seu próprio orientador, o biólogo francês Joel Renaudin, a desestimulou a seguir por esse caminho. Ele havia gasto dez anos até conseguir mutantes de uma bactéria que ataca laranjais na Europa, o Spiroplasma citri, com fragmentos do próprio microrganismo. E sugeriu que ela tentasse todos os plasmídeos disponíveis para Xanthomonas, dada a semelhança que havia entre as duas bactérias.
Patrícia Monteiro no viveiro de mudas com as marias-sem-vergonha: planta modelo para a pesquisa de Xylellas mutantes
Mineira de Bocaiúva que decidiu ser cientista aos 13 anos, ao conhecer na escola as Leis de Mendel, Patrícia no primeiro momento aceitou o conselho. Os franceses, afinal, são respeitados internacionalmente pelo trabalho com bactérias que atacam os vasos condutores das plantas, como a Xylella. Por essa razão é que estava ali. Mais tarde- após ver centenas de experimentos fracassados e ter acesso ao banco de dados do genoma de Xylella, que mostrava que ela se assemelha, de fato, à E. coZi - resolveu apostar na intuição.
Com a ajuda de Diva do Carmo Teixeira, farmacêutica de formação e primeira pesquisadora do Fundecitrus a fazer um estágio no INRA, em 1997 e 1998, que lhe enviava informações por e-mail sobre como cultivar Xylella, Patrícia, às vésperas do Natal do ano passado, começou a montar plasmídeos com trechos copiados, ou melhor, clonados do genoma da bactéria. Desta vez, foram apenas quatro arquiteturas até verificar, no final de junho, dez dias antes de voltar ao Brasil, que uma de suas invenções havia finalmente se incorporado ao genoma da bactéria e se mantinha estável nas células filhas resultantes do processo de divisão celular.
Bagagem preciosa - Da França, além de dezenas de tubos de ensaio com as bactérias transformadas, outros vidros com o plasmídeo na forma de um pó cor de baunilha e umas poucas garrafas de vinho, que aprendera a apreciar, Patrícia trouxe uma planta com flores brancas que promete ser bastante útil na etapa inicial de testes das Xylellas mutantes, provavelmente daqui a dois anos. É a maria-sem-vergonha, mimosa ou vinca ( Catharanthus roseus), que cresce facilmente em áreas sombreadas. Essa planta é um dos hospedeiros naturais de Xylella fastidiosa, que, nesse caso, provoca uma doença denominada
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periwinkle wilt (PW) ou, literalmente, murchamento da vinca.
Os exemplares que Patrícia trazia a tiracolo, delicadamente assentados em embalagens de perfume, com as raízes envolvidas por papel embebido em água, haviam sido há um ano e meio infectados com a linhagem de Xylella usada para o seqüenciamento do genoma, a 9a5c. Tinham problemas de crescimento e as folhas um pouco retorcidas e pontuadas por manchas amarelas. Eram os sintomas não de periwinkle wilt, mas de CVC. Uma raridade, portanto. A partir dessas evidências, a maria-sem-vergonha - bastante pesquisada por conter alcalóides empregados no tratamento de alguns tipos de câncer -torna-se uma alternativa a mais de planta experimental, na qual a bactéria cresce mais rápido do que nos laranjais. Em dois meses, a maria-semvergonha apresenta os primeiros sintomas do amarelinho, que demora de cinco a nove meses para despontar nos pés de laranja.
No início do ano, os pesquisadores do Funcional não contavam sequer com uma planta para acompanhar em laboratório o desenvolvimento da infecção causada pela Xylella. O fitopatologista Sílvio Lopes, do Laboratório de Biologia Molecular da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp ), resolveu o problema ao demonstrar que a bactéria poderia crescer de modo satisfatório em uma variedade de tabaco (Nicotiana tabaccum), bem mais fácil de cultivar que uma laranjeira (ver Pesquisa Fapesp no 53). A falta de uma planta modelo era um dos gargalos do Funcional, mas não foi o primeiro. Logo depois de iniciado o projeto, os pesquisadores também sentiam falta de um meio de cultura definido para a Xylella crescer e se multiplicar. Poucos meses depois, o desafio foi superado com uma formulação elaborada pelas bioquímicas Eliana de Macedo Lemos e Lúcia Carareto Alves, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal, que trabalhavam há cinco anos com a bactéria do amarelinho (ver
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Uma forma de modificar a Xylella As funções originais do genoma podem ser alteradas acrescentando-se genes
transportados por um plasmídeo feito com partes do DNA da bactéria
o o ~ <.> z ~ u .,;
Notícias Fapesp no 45). Patrícia arrisca que, com a possibilidade de criar mutantes, seja possível também reduzir o tempo de reprodução da XyZella, hoje de seis a dez horas. É quase uma eternidade quando comparado com os 20 minutos da E. coZi, uma bactéria bastante usada em laboratório para multiplicar plasmídeos.
A estrutura bem-sucedida - O plasmídeo que deu certo é chamado de pl6KOC por causa das três partes que o constituem: a origem de repli-
combinação homóloga, como é chamada a troca de partes no genoma. A recombinação homóloga, que tem esse nome por se tratar de fragmentos do próprio organismo, é um mecanismo natural dos seres vivos que permite a contínua rearrumação entre genes dispersos entre os cromossomos. "Quanto maior a variabilidade genética, maiores são as chances de uma espécie passar pela seleção natural e evoluir': diz ela.
Nesse caso, ocorre uma troca única, chamada singZe crossing over, entre
Zelia pela técnica de PCR (reação em cadeia de polimerase), é o Pl6SrRNA. Tem esse nome porque dirige a formação de um tipo especial de RNA, o RNA ribossomal, que compõe os ribossomos, compartimentos das células onde se produzem proteínas. Relativamente pequeno, o Pl6 tem 831 pares de bases. Os promotores regulam a expressão dos genes. Na prática, informam quando e quanto de um gene vai atuar na formação de uma proteína- para quebrar as moléculas de glicose e produzir energia, por
• • .. -------------------------• exemplo. ~ ~ Como um chefe de equipe, o Pl6
• c
•
o
• • •
Seleção de Xylel/as: cresce apenas a colônia que aceita o plasmídeo (esfera maior)
cação, um trecho de DNA chamado promotor, ambos copiados da própria XyZella, e o gene que confere resistência ao antibiótico kanamicina, proveniente de um plasmídeo de E. coZi. A origem de replicação, OriC, que controla o processo de duplicação do único cromossoma da XyZella, é o maior dos três fragmentos. Tem 1.890 pares de bases nitrogenadas ou nucleotídeos (adenina, citosina, guanina ou timina), elementos básicos do genoma de qualquer ser vivo.
Formado por sua vez de duas partes, o gene dnaA e os dnaABoxes, o trecho OriC permite ao plasmídeo se multiplicar algumas vezes no interior da bactéria, independente do cromossoma. Desse modo, diz a pesquisadora, dá tempo de ocorrer a re-
o promotor do plasmídeo e o promotor da XyZella. Algo que, à primeira vista, pode parecer um pouco estranho: é uma troca em que apenas um lado sai ganhando. Em outras situações, quando a operação prossegue, no chamado doubZe crossing over, um cromossoma cede trechos de DNA para outro cromossoma- aí, sim, se dá urna real permuta. Mas haveria também o risco de a bactéria não incorporar outras partes do plasmídeo além do promotor. Na troca única, o resultado final, é a incorporação de todo o plasmídeo no cromossoma da XyZella. É algo incomurn. Em outras situações, apenas partes dos plasmídeos saltam para qualquer lugar do genoma.
O outro fragmento do plasmídeo, também copiado do genoma da Xy-
~ dirige a expressão do segundo trecho, ~ o gene Kan, retirado de um plasmí~ ~ deo de E. coZi. O Kan, com 1.100 pa-~ res de bases, produz uma proteína <
que permite à bactéria escapar à ka-namicina. É esse gene que seleciona as bactérias cujo cromossoma incorporou o plasmídeo, quando submetidas a um banho de kanamicina, que elimina as que o recusaram, por não serem resistentes a esse antibiótico.
Esses três fragmentos de DNA foram adicionados à estrutura de um plasmídeo de E. coZi, o pBS, bastante utilizado no seqüenciamento da XyZella para transportar e multiplicar fragmentos do genoma. Mas agora o caminho é inverso: o mesmo vetar que transporta pedaços da XyZella para longe dela mostra-se, com alguns ajustes, eficaz também para transportar DNA para dentro dela. O próprio plasmídeo, independentemente do que lhe foi adicionado, consegue se duplicar por conta própria, como resultado da ação da origem de replicação colElori, vinda de E. coZi. Desse modo, ao dar carona para os outros fragmentos de DNA, torna-se apto a se multiplicar no interior da E. coZi e da XyZella. Ganhou versatilidade, portanto.
"O plasmídeo tinha de ser o mais semelhante possível para ser aceito e permanecer no cromossoma", diz a pesquisadora. Mesmo assim, havia o risco de nem sequer entrar na bactéria. Por essa razão, Patrícia não deu chance de a XyZella recusar o hóspe-
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 1000 • 21
de. Por meio de uma técnica chamada eletroporação, submeteu a praga do amarelinho a pulsos de alta voltagem, de 2,5 kiloVolts, quase 200 vezes a energia de uma tomada comum. Foi o bastante para fazer com que amembrana externa da bactéria se tornasse mais permeável e deixasse passar o plasmídeo. Lá dentro, o promotor Pl6 do plasrnídeo emparelha-se com o promotor da bactéria. "Esse foi o único ponto em que a operação progrediu com sucesso", diz a pesquisadora. O plasmídeo integra-se ao cromosso-
Colônia de Xylella ampliada cerca de I O vezes e uma laranjeira
infectada: queda de produtividade
genicidade da Xylella no lugar do promotor, por exemplo, o espião pode de fato mostrar como impedir que a Xylella se instale nos laranjais interrompendo a condução de água e sais minerais no xilema, os vasos condu-
mo quando é copiado pela enzima DNA polimerase, no início do processo de divisão celular (ver ilustração).
Maria-sem-vergonha com CVC: folhas
retorcidas com manchas amarelas
Refinamentos - Patrícia criou um espião perfeito. Consegue enganar a Xylella, instala-se em seu genoma, 378, 2 vezes maior, e passa despercebido, de modo que cumpre sua missão, ainda amena. Os plasmídeos enviados até agora são, de certo modo, inofensivos. Têm a tarefa, tãosomente, de testar a vulnerabilidade das defesas inimigas. No centro de pesquisas da Fundecitrus, em Araraguara, Patrícia dedica-se ao desenvolvimento de plasmídeos com versões mais refinadas, evidentemente com missões mais difíceis. Portando genes diretamente envolvidos com a pato-
22 • AGOSTO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
tores mais internos dos vegetais mais evoluídos.
À frente do projeto Produção e Caracterização de Mutantes Não-Patogénicos de Xylella fastidiosa, que conta com R$ 42,8 mil mais US$ 45,4 mil financiados pela FAPESP, Patrícia criou um plasmídeo em que encurtou o trecho OriC. Ficou apenas com uma das partes, a região dnaABox, que funcionou do mesmo modo. Com uma vantagem: por ser menor, reduz as chances de encaixes com ou-
tras partes do cromossomo. Utilizando alternativas como essa, ela acredita que será posssível anular, bloquear ou, como se diria a partir da expressão knock out, nocautear os genes indesejados, para que não
mais se expressem. Outra 51 ~ possibilidade, é acrescen-z ~ tar ao genoma da bactéria ~
~ genes que dêem alguma ~ ~ vantagem à planta, de ~ modo a informar à planta <
que a Xylella está se insta-lando no xilema, antes que sejam entupidos. "Aí é que começa o trabalho que não sei quanto tempo vai demorar", suspira, ainda com resquícios do sotaque do norte de Minas. O plasmídeo, segundo ela, agora carrega qualquer gene.
Sobrando tempo, quer trabalhar também com as cigarrinhas, os insetos que transmitem a Xylella às laranjeiras. "Quem sabe não é possível fazer com que a bactéria produza uma proteína que possa matar as cigarrinhas?': imagina. Novamente, a pesquisadora mineira diz ter apenas uma vaga noção de como desenvolver o trabalho. Mas comentava algo parecido ao iniciar a busca de genes para a
construção dos plasmídeos. •
P ERFIL:
• PATRICIA BRANT MONTEIRO, 34 anos, cursou Biologia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, fez o mestrado e o doutorado na Universidade de São Paulo (USP) e o pós-doutorado na Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. É pesquisadora do Fundecitrus desde 1998. Projeto: Produção e Caracterização de Mutantes Não-Patogénicos de Xylella fastidiosa Investimento: R$ 42.860,00 mais US$ 45.410,45
CIÊNCIA
BIOQUÍMICA
Antibiótico extraído da aranha Peptídeo encontrado em caranguejeira exerce forte ação antimicrobiana
Os antibióticos não precisam ser produzidos apenas a partir
de fungos. Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) extraíram da aranha caranguejeira (Acanthoscurria gomesiana) uma substância- a gomesina- que funciona como um antimicrobiano mais eficaz e de efeito mais rápido que os convencionais. Tem também um efeito mais abrangente: em laboratório, mostrou uma forte ação contra 24 espécies de bactérias, nove fungos e cinco leveduras. Podendo ser testada em seres humanos daqui a pelo menos três anos, a gomesina representa uma nova linha de antibióticos -formados por moléculas empregadas por animais invertebrados no combate aos microrganismos - e uma saída promissora contra o surgimento de bactérias super-resistentes, que exigem mais potência e eficiência dos medicamentos, numa velocidade que a indústria farmacêutica não consegue mais acompanhar. Hoje, não é mais tão simples tratar uma infecção como após a descoberta da penicilina, em 1928. Naquela época, bastavam cinco a sete dias de tratamento à base de antibiótico e a recuperação era completa.
"O uso dessa nova geração de antibióticos em infecções é muito promissor", afirma Antonio Gildo Bianchi, professor do Departamento de Parasitologia do ICB e coordenador do projeto temático Genes, Peptídeos e Proteínas de Artrópodes de Interesse
Médico e Veterinário, que conta com um financiamento de R$ 380,6 mais US$ 358 mil da FAPESP. "Também é muito interessante descobrir essa aplicação a partir de um estudo básico do sistema imunológico de invertebrados': comenta Bianchi. No carrapato do boi (Boophilus microplus), outro invertebrado estudado, os pesquisadores do ICB identificaram três peptídeos (moléculas de baixo peso molecular formadas por uma cadeia
Caranguejeira: no sangue, substâncias eficazes contra bactérias, fungos e leveduras
de aminoácidos) que, embora não estejam tão bem caracterizados quanto o similar da aranha, exercem a mesma função: formam uma primeira barreira contra microrganismos invasores. Um deles encontra-se no intestino do carrapato e dois, com ação antibacteriana, na hemolinfa, como é chamado o sangue dos artrópodes, o grupo de animais que inclui também os insetos e as aranhas.
Sirlei Daffre, pesquisadora do ICB que coordena o subprojeto voltado à identificação e caracterização dessas novas substâncias, ficou surpresa ao descobrir que um dos peptídeos do carrapato, com ação contra bactérias
e fungos, é na verdade um fragmente da hemoglobina (a molécula que transporta oxigênio para as células) do boi. Para ela, trata-se de uma indicação de que o carrapato deve ter uma ou mais enzima capaz de cortar a hemoglobina do boi, extraindo dela um fragmento que lhe serve de proteção contra infecções. "Faz sentido': diz. Os carrapatos habitam regiões próximas aos genitais do boi, uma área bastante suscetível à contaminação, e extraem do próprio alimento digerido um peptídeo que lhe garan-
te imunidade. "É um parasita perfeito", comenta.
Situação grave - O problema da resis
tência a antibióticos, que agora começa a ser ame
nizado, é sério principalmente nos hospitais, onde as infec
ções encontram um campo fértil para a disseminação, em vista da baixa resistência do organismo dos pa
cientes que se encontram ali para se tratar. Segundo o Ministério
da Saúde, a infecção hospitalar no Brasil é da ordem de 13,1%
e ainda está fora de controle, mesmo com as medidas preventivas exigidas pelo Programa de Controle de Infecção Hospitalar da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVS). A superlotação de hospitais, o uso indiscriminado de antimicrobianos e a falta de atualização de profissionais da saúde são alguns dos motivos apontados pela ANVS para o crescimento das taxas de infecção hospitalar, hoje a quarta causa de óbitos no Brasil.
Dos antibióticos hoje comercializados, a maioria atua seletivamente sobre um grupo de bactérias, inibindo seu crescimento e assim as destruindo. Sua ação, porém, é lenta, se comparada à velocidade de duplica-
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 1000 • 23
ção de uma bactéria, que é de apenas 20 minutos. Segundo Sirlei, essa diferença de ritmos leva à formação de gerações cada vez mais resistentes de bactérias e põe em xeque a eficácia dos antibióticos convencionais. Especializada em imunologia de insetos e biologia molecular, a pesquisadora tem encontrado uma situação oposta e bem mais confortável à medida que avança seu trabalho com a gomesina, extraído das caranguejeiras fornecidas pelo Instituto Butantan e cuidadas no ICB pelo doutorando Pedro Ismael da Silva Jr. no laboratório. É ele, geralmente, no primeiro passo para a purificação e caracterização dos peptídeos antimicrobianos, que extrai a hemolinfa do vaso dorsal das aranhas. Para fazer isto, as aranhas são depiladas e mantidas por 15 minutos a -20°C.
cionais demoram de 4 horas (no caso da vancomicina) a 24 horas (no caso de norfloxacina). Além do tempo de ação, estão a favor dos peptídeos os indícios de que provocam menos efeitos colaterais e são pouco ativos contra células musculares e de outros tecidos. A princípio, são também pouco hemolíticas, ou seja, destróem menos glóbulos vermelhos que os antibióti-
cies de bactérias causadoras de infecções hospitalares, Staphylococcus aureus, Staphylococcus saprophyticus, Streptococcus pyogenes e Pseudomonas aeruginosa, que também causa infecções no trato urinário e em queimaduras. Seguem-se, igualmente dizimadas, as Staphilococcus saprophyticus, que provoca infecção urinária, as Staphylococcus aureus, causadora de
meningite e furúnculos, e a Streptococcus pyogenes, da febre reumática. A lista é reforçada com a Klebsiella pneumoniae, causadora da pneumonia; Listeria monocytogenes, associada à meningite e pneumonia; Candida albicans, origem da candidíase; Cryptococcus neoformans, da meningite; Salmonella thyphimurium, da salmonelose; e Tricophyton mentagrophytes, da micose superficial. A gomesina atua também contra o parasita que causa leishmaniose, Leishmania amazonensts.
"A gomesina tem ação mais rápida que os antibióticos convencwna1s porque atua diretamente na membrana da bactéria': explica Sirlei. Os experimentos indicam que os peptídeos antimicrobianos fazem buracos na membrana da bactéria e assim a levam rapidamente à morte. Os antibióticos convencionais têm outro mecanismo: atuam no interior da
A estrutura tridimensional da gomesina: em forma de grampo
Os peptídeos exercem um papel importante no sistema imunológico de animais e plantas. Constituem as primeiras barreiras contra bactérias e fungos invasores, antes que o organismo elabore respostas mais específicas, por meio da produção de anticorpos e de células de Para os invertebrados, que células, em processos de formação de
proteínas e na síntese de ácidos nucléicos como o DNA e o RNA. Por isso, são mais lentos. Essas diferenças tornaram-se evidentes com um experimento que comparou os antibióticos convencionais com um peptídeo semelhante à gomesina, a protegrina, extraída de leucócitos (células do sangue) de porcos, animais que não perderam os mecanismos de defesa mais antigos mesmo com sistema imunológico mais sofisticado.
Resultado: a protegrina leva 1 O minu tos para provocar uma redução no número de bactérias de 1.000.000 para 1.000, enquanto antibióticos conven-
24 · AGOSTO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
cos convencionais, algo que pode ser uma tábua de salvação em casos extremamente graves, quando se trata de organismos muito debilitados.
Efeito abrangente - Além da baixa concentração necessária para obter o efeito desejado, o gomesina é um forte candidato a ser utilizado como antibiótico peptídico por ter um largo espectro de atividade. Testes realizados em cultura de células demonstraram que esse peptídeo apresenta uma forte ação contra 14 bactérias do tipo gram-positivas, dez bactérias gramnegativas, nove tipos de fungos e cinco leveduras. Abrem a lista três espé-
defesa. contam somente com o sistema imunológico inato, os peptídeos são vitais. "Diferentemente dos vertebrados': conta Sirlei, "os invertebrados não produzem anticorpos e a resposta a um microrganismo invasor é sempre a mesma". Os vertebrados contam com peptídeos como defensinas, protegrinas e lisozimas do sistema inato que atuam em secreções das mucosas nas vias respiratórias, no trato digestivo, urinário e nos genitais impedindo que microrganismos penetrem e se instalem no organismo.
Segundo Sirlei, o estudo das aplicações dos peptídeos, para avançar,
teria de contar com uma estrutura de pesquisa mais sotifisticada e o interesse das indústrias farmacêuticas. Além de resultados consistentes, atestados por revistas científicas de circulação internacional- a mais recente é o ]ournal Biological Chemistry, que aceitou para publicação o estudo de determinação da estrutura da gomesina-, a equipe do ICB dispõe de ou-
uso local, mas testes realizados com camundongos indicam que são também eficientes na forma injetável. "A administração oral também seria viável, mas depende do desenvolvimento de uma composição que não se altere com a ação das enzimas digestivas", diz ela. Quando comparada com alguns entre os cerca de 500 peptídeos identificados, a gomesina
Sirlei: descobertas resultam do estudo do sistema imunológico de invertebrados
tro trunfo para negociar essa próxima etapa: a gomesina está patenteada há já dois meses. No exterior, as pesquisas avançam e até mesmo os testes com seres humanos, ainda distantes no Brasil. A própria Sirlei trabalha em colaboração com Philippe Bulet, do Conselho Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) de Estrasburgo (França), que se aliou com outros pesquisadores para abrir uma empresa e produzir peptídeos de artrópodes em escala industrial, com fins terapêuticos. Nos Estados Unidos, uma linha de pesquisa em fase empresarial trabalha com a protegrina, em busca de um composto para tratamento de úlceras na mucosa bucal. No Canadá, um produto para assepsia de cateteres com base nessas substâncias já foi liberado para uso.
Perspectivas- Segundo Sirlei, a aplicação dos peptídeos está focada no
apresenta uma vantagem: é uma cadeia relativamente pequena, com apenas 18 aminoácidos. Por essa razão, sua produção por síntese química torna-se mais simples.
Há indícios de que a gomesina pode também ser obtida por engenharia genética. Sirlei conta que, embora essa experiência ainda não esteja concluída, o gene da aranha responsável pela produção desse peptídeo já foi clonado. Abre-se também a perspectiva de, por meio da clonagem gênica, modificar geneticamente mosquitos transmissores de doenças de forma que se tornem menos hospitaleiros aos parasitas- contra os quais os peptídeos antimicrobianos também atuam. Desse modo, o parasita seria atacado pelos peptídeos no interior do inseto, rompendo o ciclo parasitário.
É nesse direção que corre outro subprojeto coordenado por Bianchi.
Há um ano e meio, sob a orientação de Osvaldo Marinotti, que implantou no ICB a linha de pesquisa com mosquitos geneticamente transformados, uma equipe se dedica à identificação de subespécies de Anopheles, o gênero de mosquitos transmissores da malária, e ao estudo de sua relação com o parasita Plasmodium, o protozoário causador da doença. O que se quer é impedir a sobrevivência do parasita no inseto. "Já se estudou muito a ação do Plasmodium em humanos, mas ainda pouco se sabe da relação do parasita com o mosquito", afirma Bianchi. "É claro que criar um mosquito transgênico implica uma série de questões éticas e exige pesquisas sobre o impacto no meio ambiente." Os resultados, embora já bastante animadores, não devem ganhar uma aplicação tão imediata quanto o controle das infecções com os peptídeos extraídos dos invertebrados. •
PERFIS:
• ANTONIO GILDO DE BIANCHI, 58 anos, formou-se em Biologia em 1967, concluiu o doutorado em 1972 e a livre-docência em 1977 Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é professor convidado do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP. • S!RLEI DAFFRE, 42 anos, formada em Biologia em 1980, terminou o mestrado em 1983 e o doutorado em 1988 no Instituto de Química da USP. Concluiu em 1992 o pósdoutorado sobre o sistema imunológico da Drosophila melanogaster, a mosca-da-fruta, na Universidade de Estocolmo, na Suécia. É professora do Departamento de Parasitologia do ICB da USP desde 1988. Projeto: Genes, Peptídeos e Proteínas de Artrópodes de Interesse Médico e Veterinário Investimento: R$ 380.670,00 mais US$ 358.000,00
PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2000 • 25
CIÊNCIA
BIOQUÍMICA
Estudando o metabolismo das frutas depois de colhidas, equipe desvenda os processos bioquímicos que as tornam doces e macias. A pesquisa abre o caminho para mudanças que retardem o amadurecimento e o amolecimento
Será que os quadros de naturezamorta retratam de fato nature
zas mortas? A resposta negativa surge inevitavelmente quando entramos no laboratório do professor Franco Lajolo, chefe do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP): ali, bananas e mamões respiram normalmente em compartimentos com tubos, por onde absorvem oxigênio e soltam gás carbônico.
Esse é o cenário principal do projeto temático Transformações Bioquímicas Pós-Colheita e Qualidade de Ali-
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mentos e Matérias-primas. Iniciado há dois anos com financiamento da FAPESP, ele abrange dois temas: o adoçamento e a textura dos vegetais. Os resultados poderão permitir a produção de bananas mais (ou menos) doces. No caso da textura, o estudo das paredes celulares poderá ajudar a prevenir problemas inversos: amolecimento do mamão e endurecimento do feijão.
As frutas são mantidas em condições controladas de umidade e temperatura, enquanto se recolhem amostras periodicamente para estudar o metabolismo delas à medida que amadure-
cem. Para sua preservação, as amostras ficam congeladas em nitrogênio líquido a 80 graus Celsius negativos.
Mais qualidade - As frutas estão "vivas", inteiras ou cortadas, porque seus processos fisiológicos continuam depois da colheita, fazendo-as mudar de cor, cheiro, sabor e maciez. Coordenado por Lajolo, farmacêuticobioquímico doutorado em Ciência dos Alimentos, o projeto busca desvendar as atividades metabólicas nessa fase- ou seja, descobrir tudo o que acontece nas frutas desde a colheita.
As frutas são de procedência conhecida e os pesquisadores acompanham seu desenvolvimento desde que surge a flor. "Temos o controle da vida do fruto, para poder fazer todas as comparações necessárias': diz a química Beatriz Rosana Cordenunsi. São feitos controles de umidade, temperatura e respiração, bem como estudados os compostos químicos e a dosagem de
,
carboidratos, açúcares, amido, sacarose e frutose, entre outras substâncias.
Lajolo está otimista com os resultados já obtidos. Explica que as frutas ficam doces porque seus carboidratos mudam e macias porque há alterações nas paredes celulares da polpa. São diversas as transformações bioquímicas em estudo. Altamente coordenadas, essas modificações se relacionam à ação de enzimas e têm participação de hormônios.
"A idéia do projeto': diz ele, "é saber o que controla essas transformações, qual o mecanismo e as bases moleculares envolvidas nesse processo. Por isso estamos estudando mais a fundo os mecanismos associados aos carboidratos (para o adoçamento) e à parede celular (para a textura), que são parâmetros importantes de qualidade." Quando se conhecer bem todo esse processo, será possível desenvolver tecnologias que aumentem a qualidade e a durabilidade dos frutos.
Enzimas adoçam banana -
Para o adoçamento, a pesquisa se concentrou na banana (Musa paradisíaca), considerada um bom modelo do metabolismo de carboidratos: é fácil acompanhar seu amadurecimento, por exemplo, pelas sucessivas mudanças de cor. Enquanto amadurece, sua respiração se acelera. Além disso, seu consumo de oxigênio cresce à medida que as mudanças aumentam. Medindo a respiração, os pesquisadores captam os sinais do trabalho interno de amadurecimento.
A equipe já fez descobertas importantes. A ba
nana é composta por cerca de 20% de amido, que no amadurecimento se transforma em açúcar: isso ocorre porque várias enzimas agem sobre os grãos de amido e os degradam, ehquanto outras enzimas os transformam sintetizando a sacarose (uma das formas naturais do açúcar). "Uma dessas enzimas, a SPS (sacarose-fosfato sintase), interessou-nos particularmente. O que nós vimos -e que não se sabia- é que, no processo de amadurecimento, essa enzima tem a quantidade aumentada por ativação do respectivo gene: então, é ela que pode controlar a síntese da sacarose': conta Lajolo.
Ele revela que outra enzima, asacarose sintase (SS), também pode atuar na formação da sacarose, mas não se sabia como intervinha no processo. Agora se sabe que na banana a SS não participa da síntese da sacarose: enquanto o gene da enzima SPS é ativado, o da SS é desligado.
Genes seqüenciados - Outra conquista possibilitou essas conclusões. "Um dos resultados inéditos do trabalho foi a clonagem e o seqüenciamento dos genes da enzima SPS da banana bem como da ss': ressalta João Roberto Oliveira do Nascimento, também farmacêutico-bioquímico, doutorado em Ciência de Alimentos e que trabalha na área de biologia molecular do projeto. Ele isolou e clonou o pedaço de DNA (ácido desoxirribonucléico) que contém o código para essas enzimas. Os fragmentos de DNA foram seqüenciados e então se pôde determinar a fórmula desses genes.
"O que nós percebemos sobre a SPS é que, quando a banana amadurece e produz bastante açúcar, durante dois, três dias, vemos um aumento da quantidade de RNA (ácido ribonucléico), sinal de que aquele gene está sendo ativado': resume Nascimento. Esse resultado foi confirmado por análises com anticorpos produzidos contra as proteínas do fruto previamente purificadas. O grupo continua a estudar a função das demais enzimas que quebram as moléculas dos grãos de amido, fornecendo substrato para a síntese do açúcar.
Também já foram parcialmente obtidas as seqüências dos genes de fosforilases a e ~ amilases. Resultados iniciais com sondas de DNA e anticorpos mostram que a atividade de algumas enzimas depende da ativação de genes no amadurecimento, enquanto a de outras (como a fosforilase) não.
Por dentro da célula - A metodologia básica é avançada: microscopia eletrônica, sondas de DNA, anticorpos, espectrometria de massa. Mas nem tudo precisa ser tão sofisticado, e um exemplo são os modelos que o grupo desenvolveu.
Beatriz Cordenunsi, doutorada em Ciência de Alimentos e responsável pelos estudos bioquímicos do adoçamento, explica: "Pegamos a banana, limpamos bem por fora para que não haja contaminação e a colocamos em caixas especiais numa temperatura controlada. No recipiente, há uma sé-
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 1000 • 27
rie de tubos para entrada e saída de ar. O ar que sai passa por um aparelho, onde é medida a respiração do fruto."
Outro modelo de estudo usa fatias de banana. Os pesquisadores infiltram nas fatias substâncias que interferem no metabolismo, para posterior estudo das reações. Aqui, outra descoberta: as infiltrações com os hormônios vegetais ácido indol-acético e ácido giberélico atrasaram o amadurecimento da banana. Verificou-se que eles afetam a expressão
dos genes ligados à quebra do amido (a e~ amilase).
Textura do mamão - Os estudos sobre textura estão sendo feitos justamente a partir do mamão ( Carica papaya), que amolece com rapidez, além do feijão (Phaseolus vulgaris), que tende a endurecer depois de colhido.
O mamão foi considerado um bom modelo pela evolução de sua textura: como em outros frutos tropicais, ele muda rapidamente depois da colheita e o amolecimento acelerado causa grandes perdas.
Pouco se sabe sobre as bases bioquímicas desse amolecimento, mas a equipe resolveu concentrar-se na parede celular. "Estamos associando a estrutura química da parede celular e sua organização química com as enzimas que fazem todas essas transformações. E já vimos que há pelo menos uma enzima importante sintetizada no processo- a betagalactosidase (~gal)': adianta Lajolo.
Os pesquisadores amplificaram parte do gene dessa enzima, que foi
28 • AGOSTO DE lODO • PESQUISA FAPESP
clonado e seqüenciado. Revelou-se que no amadurecimento aumenta a atividade dessa e de outras enzimaspectinametilesterase (PME), poligalacturorase (PG) e celulase. Constatou-se que radiações ionizantes (com raios gama) atrasam em dois dias o início do amadurecimento e também retardam o aumento da presença dessas enzimas (exceto a celulase) -ou seja, retardam o amolecimento.
Estudos de imunolocalização, desenvolvidos em colaboração com o
John Innes Center (do Reino Unido), são feitos com anticorpos específicos e microscopia eletrônica. Eles estão mostrando os locais na parede celular e na lamela média, onde ocorrem modificações estruturais associadas a essas enzrmas.
Já com o feijão, freqüentemente armazenado nas condições de umidade e temperatura elevadas que prevalecem em grande parte do país, ocorre o endurecimento pós-colheita. Então, sua reidratação fica difícil e o tempo necessário ao cozimento aumenta. "Há prejuízo sensorial, nutricional e econômico': ressalta Lajolo. No caso, estuda-se a evolução dos processos nas paredes celulares, cujos polissacarídeos são isolados para estudo de sua composição. Não há
conclusões decisivas, mas a pesquisa aponta o ácido ferúlico e a extensina como possivelmente envolvidos no processo de endurecimento.
Transgênicos - "Com esses estudos, estamos dando a base para que possam ser desenvolvidos novos processos de conservação e de qualidade dos frutos, até o limite de propiciar o desenvolvimento de novas variedades por engenharia genética", admite Lajolo. Ele diz nada ter contra produtos
transgênicos, pois considera importante usar os avanços disponíveis para criar novas variedades, aumentar a vida útil e melhorar a qualidade dos alimentos. "Do ponto de vista de segurança, não há evidências científicas de risco à saúde."
O trabalho também poderá influir no setor de alimentos semiprocessados - caso dos vegetais já descascados, cortados e embalados-, que são mais perecíveis. Assim, é importante saber como o fruto amadurece não só inteiro, mas também
quando semiprocessado, para aumentar sua vida útil e sua qualidade. •
PERFIL:
• FRANCO MARIA LAJOLO, 59 anos, formado em Farmácia e Bioquímica pela USP, fez pós-doutorado em Bioquímica de Alimentos no Massachusetts Institute ofTechnology (MIT), dos Estados Unidos, é professor de Ciência de Alimentos e Nutrição Experimental e responsável por várias disciplinas de graduação e de pós-graduação na USP. Projeto: Transformações Bioquímicas Pós-Colheita e Qualidade de Alimentos e Matérias-primas Investimento: R$ 180.245,97 e US$ 345.645
CIÊNCIA
. LABORATÓRIO ,
Problemas no Pólo Norte
Fruto do babaçu: experimentos atestam novas aplicações
A última vez foi há 50 milhões de anos, mas aconteceu de novo: o Pólo Norte está começando a derreter. De modo totalmente inesperado, pesquisadores da Comissão Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, patrocinada pela ONU, verificaram que uma faixa de gelo de pelo menos 1,6 quilômetro de largura do Oceano Polar Ártico virou água, numa indicação de que o aquecimento global pode de fato estar afetando as condições climáticas em escala planetária. No início deste mês, numa viagem a bordo de um quebra-gelo russo, o oceanógrafo James McCarthy, da Universidade de Harvard, Estados Unidos, e um dos coordenadores da Comissão da ONU, encontrou camadas de gelo finas a ponto de serem atravessadas pela luz solar, que sustentava o plâncton, logo abaixo. Segundo ele, nunca antes havia sido encontrado água na superfície do pólo. •
Babaçu contra úlceras gástricas
Adotado popularmente como remédio contra reumatismo, celulite e até leucemia, o babaçu ( Orbignya phalerata martins) ganhou outra indicação, desta vez atestada cientificamente: pode também ser usado para lesões gástricas. Especialistas do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em experimentos com ratos, comprovaram que o babaçu pode ter, nesses casos, uma eficácia de 70%, enquanto os medicamentos tradicionais variam ao redor de 27%. Nesse estudo, coordenado por Maria Bernardete Maia, empregou-se o pó do fruto do babaçu, a partir do qual se faz o extra to. Vindo do Maranhão, um pacote de 250 gramas do pó de babaçu custa R$ 2,50. Em farmácias, cinco vezes mais.
O bicho-da-seda transgênico
•
Após 12 anos de trabalho, finalmente deram certo as experiências de manipulação
genética do bicho-da-seda (Bombyx mori), realizadas por duas equipes francesas -uma do Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS) e outra do Instituto Nacional de Pesquisas Agronômicas (INRA) de Lyon - em colaboração com grupos japoneses e americanos. Usando os mesmos métodos de manipulação genética do camundongo e da drosófila, os pesquisadores criaram um vetor, o transposon piggyBac, que se mostrou eficiente para enxertar, no patrimônio genético do inseto, genes que a partir de agora podem ser úteis não só para a produção de seda como para a indústria farmacêutica. O bichoda-seda é um dos primeiros insetos do grupo dos lepidópteros a incorporar genes que lhe são estranhos. •
Os novos sagüis da Amazônia
Três novas espécies de sagüis descobertas na Amazônia alargam a vantagem do Brasil como o país que apresenta a
Bombyx mori: com genes de outra espécie
maior diversidade de primatas do mundo, com 25% de todas as espécies conhecidas. Na Bacia do Rio Madeira, um grupo de primatologias apoiados pela União Mundial
de Conservação (IUCN) -Marc van Roosmalen, Tomas van Roosmalen, Russell Mittermeier e Anthony Rylands - identificaram duas novas espécies, o Callithrix manicorensis e o Callithrix acariensis, ambos com o tamanho aproximado de um esquilo. O primeiro tem o corpo banco ou prateado e a cauda preta. O outro é branco, com a cauda preta terminando com uma mancha laranja. Foram encontrados em 1996 vivendo próximos a comunidades ri-
O Callithrix acariensis (esq.) e o manicorensis
beirinhas, que os adotavam como animais de estimação. Tais relatos somam-se aos de dois primatologistas brasileiros, José de Sousa e Silva Júnior, do Museus Goeldi, do Pará, e Maurício de Almeida Noronha, da Fundação Floresta Amazônica, que anteriormente haviam identificado outra espécie, a Callithrix saterei sp.n. Encontrado em 1994 entre os rios Madeira e Tapajós, tem a face dourada e nua, coberta por raros pêlos alaranjados, orelhas nuas e a genitália também cor de laranja brilhante. É também conhecido como mico-leão ou sauimde-cara-branca. Desde 1990, dez novos macacos foram descobertos no Brasil. O total agora é de cerca de 80. •
PESQUISA FAPESP • AGOSTO DE 2000 29
Observatório deverá decifrar partículas de altas energias que atravessam a atmosfera
MARILUCE MOURA
30 · AGOSTO OE 2000 • PESQUISA FAPESP
erra E
m Pampa Amarilla, uma região semidesértica no sul da província argentina de Mendoza, que se estende a oeste até o pé da Cordilheira dos Andes, está nascendo, com participação do Brasil e de duas dezenas de outros países, o Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos. Por ora, apenas uma torre de comunicação, um edifício em iní
cio de construção e o primeiro tanque detector anunciam, perto de Malargue, o futuro empreendimento nessa área de baixíssima densidade populacional -só pequenos criadores de bovinos e caprinos animam aqui e ali uma paisagem em que a planície é a regra, desdobrando-se por uma imensidão de 70 por 50 quilômetros, quebrada por pequenas elevações de, no máximo, 60 metros.
Mas, em 2003, nessa região deverão estar espalhados por uma área total de 10 mil quilômetros quadrados, à distância regular de 1,5 quilômetro entre cada um, os 1.600 detectores de superfície do observatório - os chamados tanques Cerenkov. Deverão estar instalados também quatro detectores de fluorescência- os telescópios "olho-de-mosca"-, um dos quais esférico, com 12 espelhos, no lugarejo chamado Los Leones e três semi-esféricos, com seis espelhos, em pontos periféricos nos limites norte, sul e leste do imenso sítio sul do Pierre Auger. A partir daí, o observatório estará completamente equipado para dectetar, analisar e interpretar as partículas raras de altíssimas ener-
PANGUIPALLI 3740
Telescópio de fluorescência --
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PONTO DE IMPACTO
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gias que, ao bater na atmosfera da Terra, a uma altura de cerca de 50 mil metros da superfície do planeta, iniciam um processo de produção múltipla de novas partículas que geram um enorme chuveiro de mais de 1 bilhão de partículas a atravessar celeremente a atmosfera.
O que se quer com essa caçada de tais partículas? Saber o que elas são e de onde vêm. E se possível, a partir desse conhecimento, compreender algo mais sobre o bigbang, a portentosa explosão primordial
que, segundo uma das teorias mais aceitas pela física, deu origem ao nosso universo.
Em termos concretos, os cientistas envolvidos no projeto Pierre Auger - que, além do sítio sul, em Mendoza, deverá ter, mais adiante, um sítio norte em Utah, nos Estados Unidos - vão investigar partículas que chegam à Terra na freqüência de apenas uma por século, por quilômetro quadrado. São, portanto, agentes de um fenômeno astrofísico raro, que por isso mesmo demandam para sua observação direta, além de uma área com céu límpido, com pouca cobertura de nuvens e quase nenhuma interferência de luz decorrente da atividade humana (que atrapalharia o trabalho dos telescópios), grandes extensões e
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equipamentos detectores de superfície em número considerável.
Para ter uma idéia mais clara da raridade do evento, vale observar que, em média, apenas 30 partículas atingem, por ano, a atmosfera sobre a área de 10 mil quilômetros quadrados reservada para o observatório em Mendoza. E uma vez que uma dessas partículas tenha chegado à atmosfera, em apenas 10 ( -4) segundos ou, o que é o mesmo, 100 microssegundos, o chuveiro a que elas deram origem atinge a superfície da Terra. Ou seja, além de raro, o fenômeno todo é muito rápido, daí a necessidade também de um sistema lógico de transmissão e análise de informações extremamente preciso e sofisticado como
o que foi concebido para o Pierre Auger. Mas certamente a característica mais essencial das
partículas em questão é que, sendo subatômicas, com uma massa ínfima de 10 -27 quilogramas, elas têm uma energia que alcança 50 joules, algo equivalente à energia de uma bola de tênis de cerca de 100 gramas no momento em que parte do saque potente de um tenista profissional, da categoria do brasileiro Gustavo Küerten ou, melhor ainda, do suíço Marc Rosset, a uma velocidade em torno dos 200 quilômetros por hora. Assim, não é à toa a fascinação que exercem sobre os físicos: note-se, a propósito, que a energia gerada pela aceleração de partículas dentro do famoso laboratório norte-americano Fermilab, situado em Illinois, a cerca de 60 quilômetros de Chicago, que vem a ser nada menos que o fenômeno mais energético produzido no planeta, é 100 milhões de vezes menor do que a energia das partículas que estão no alvo do projeto Pierre Auger.
Formalmente, a participação brasileira nesse projeto foi anunciada em 17 de julho último, numa cerimônia no Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ), presidida por seu diretor (e presidente da FAPESP), Carlos Henrique de Brito Cruz. Em termos financeiros , isso deverá se tradu-
zir, até 2003, num investimento total de US$ 3,5 milhões. Por enquanto, foram concedidos quase US$ 2 milhões, dos quais US$ 1,6 milhão estão sendo aplicados pela FAPESP e US$ 340 mil pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), através do Programa de Núcleos de Excelência em Pesquisa (Pronex). Da parte da Fundação, conforme detalhou seu diretor científico, José Fernando Perez, US$ 1 milhão destinam-se a equipamentos (boa parte deles produzida no Brasil) e material de consumo, enquanto US$ 600 mil são para bolsas de doutoramento e pós-doutoramento para pesquisadores de São Paulo engajados no projeto.
as se a entrada institucional do Brasil no Pierre Auger é recente, a efetiva participação de pesquisadores brasileiros no projeto vem ocorrendo desde que ele começou a ser mais seria
mente formulado. A rigor, o observatório começou a ser pensado em 1992, pelo físico norte-americano James Cronin, ganhador de um Nobel em 1980 (ver entrevista na página 36). Logo em seguida, Cronin obteve o apoio de um colega escocês, Allan Watson. Em 1994, tornou-se claro que o observatório teria de ser muito grande e dispor de tecnologia avançada, o que exigia cooperação internacional- e nesses termos, organizouse uma reunião de trabalho em Paris. Em julho de 1995, nova reunião, de cerca de dez pessoas, no Fermilab. Ali se encontrava um entusiasmado físico brasileiro, Carlos Escobar, hoje professor titular do Departamento de Raios Cósmicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Originário, como Cronin, da comunidade dos físicos de aceleradores de partículas, e àquela altura
professor no Departamento de Física Nuclear do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), depois de ter passado alguns anos no Departamento de Física Matemática, Escobar pouco tempo depois foi convidado a participar de uma reunião da Associação Física Argentina, em Bariloche, onde a questão do observatório seria discutida.
Foi em Bariloche que, junto com colegas argentinos e brasileiros, Escobar se preparou para liderar o esforço pela implantação do sítio sul do observatório na Argentina. Retornando ao Brasil, procurou Perez, na ocasião já diretor científico da FAPESP, e Lourival Carmo Mônaco,
então presidente da Financiadora de Estudos e Projetas (Finep ), para sondar as possibilidades de apoio institucional ao projeto. "Imaginávamos, naquele momento, que a participação brasileira no projeto teria de ser da ordem deUS$ 10 milhões, até porque o Menem (Carlos Menem, então presidente da Argentina) acenava àquela altura com uma oferta deUS$ 15 milhões para a implantação do observatório em seu país", lembra Escobar. Apesar da cifra um tanto espantosa, que terminou serevelando bastante superdimensionada, como de resto se mostraram muito fora das reais possibilidades argentinas os acenos de Menem, Escobar recebeu estímulos, nas duas agências de fomento, para ir tocando adiante o projeto. Ele faz questão de ressaltar o apoio que também recebeu do físico Oscar Sala, ex-presidente da FAPESP. "As pessoas compreendiam o alcance que o projeto poderia ter para a pesquisa, e até para a indústria brasileira, já que os recursos seriam gastos em sua maior parte no país", comenta. Escobar explica que uma cláusula do projeto do observatório estabelece que no máximo 20%
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dos investimentos de cada país destinam-se a fundos comuns do empreendimento.
Em novembro de 1995, "com a lição de casa bem feita", um grupo de 20 argentinos e brasileiros, entre os quais, além de Escobar, estavam Ronald Shellard, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), do Rio de Janeiro e Armando Turtelli Jr., da Unicamp, seguiu para uma reunião na sede da Unesco, em Paris, onde seria decidido, entre outras coisas, o local para o sítio sul do Pierre Auger. A Argentina dispunha de três diferentes locais, enquanto Austrália e África do Sul dispunham cada uma de um local, todos já visitados por um search team integrado por um francês, um inglês e um norte americano. Para encurtar a história, com condições objetivas de fato melhores e uma torcida bem organizada (na reunião só havia dois cientistas australianos e dois da África do Sul), a Argentina terminou ganhando a parada, com a área de Mendoza. A lamentar apenas que a escolha da Argentina tenha afastado temporariamente o Japão do projeto, sob alegação da grande distância entre
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os dois países. Há uma possibilidade em aberto de ele participar do sítio norte, que deverá ser em Utah, conforme decisão tomada em 1997 e cuja implementação está, na verdade, condicionada à demonstração, no sul, de que a concepção técnica geral do observatório é boa.
Outro resuhado da reunião em Paris foi a escolha de Escobar como chairman do Colaboration Board do projeto por dois anos, função para a qual foi reconduzido uma vez- desde setembro do ano passado, o cargo é ocupado pelo físico francês Murat Boratav.
Desde a reunião de novembro de 1995, o projeto andou muito. Hoje estão instalados na área do observatório dois tanques, outros 18 deverão seguir para lá até o final de setembro e, se tudo correr conforme o cro
nograma, em novembro já serão 40. São todos produzidos pela Alpina Termoplástica Ltda., uma empresa paulista instalada no bairro do Jabaquara, na capital, que pode ser situada entre pequena e média (100 empregados), pertencente a um grupo familiar que começou a se formar em 1953, a partir da Alpina Equipamentos Industriais Ltda. "Estamos muito orgulhosos de trabalhar para esse projeto': diz o gerente geral da empresa, Estéban Peres, um espanhol de Madrid que há 45 anos trabalha para o grupo. "Fomos escolhidos para fazer o trabalho por
cientistas que visitaram várias outras empresas em outros países. Se concluíram que tínhamos capacidade de realizá-lo, é porque estamos de algum modo na vanguarda tecnológica nessa área", completa ele.
Os tanques, em resina especial, têm 3,60 metros de diâmetro e altura de 1,20 metro, na parte do reservatório de 12 mil litros de água. Considerando-se também a estrutura de reforço da parte superior, a altura total alcança 1,60 metro. O que acontece nesses tanques quando as partículas atingem a água é, primeiro, a produção de uma radiação azulada, que é captada por fotossenso-
Área do observatório Pierre Auger Sul
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res imersos nessa água. Trata-se de uma radiação diferente daquela produzida na atmosfera, passível de ser captada pelos telescópios, porque neste caso as partículas excitam as moléculas de nitrogênio, em seguida elas sofrem uma "desexcitação" e aí é
Rodovia
Ferrovia
que emitem uma luz que sai em todas as direções, com intensidade equivalente à de uma lâmpada de 5 wats, que percorre a atmosfera à velocidade da luz, a 30 quilômetros de distância. Trata-se, assim, de um processo atômico. Já na água, explica Escobar, "a partícula provoca uma modificação das propriedades dielétricas do líquido, e é coletivamente que suas moléculas vão emitir aradiação". E aí trata-se de uma radiação muito mais intensa, com quantidade muito maior de fótons e direção cônica, como uma onda de proa. "Como a velocidade da
partícula que entra na água é maior do que a velocidade da luz na água, a captação da radiação nesse meio é muito mais eficiente", diz Escobar.
as é a combinação entre os dois processos de detecção a grande sacada do projeto Pierre Auger. Porque se as partículas de um chuveiro entram, em determinado instante num tanque, há ali
uma única informação, de alta precisão, enquanto em algum dos telescópios que olham para dentro da área do observatório vai se encontrar uma medida mais contínua da radiação do chuveiro, refletindo o acompanhamento do fenômeno em vários pontos, ao longo de seu percurso de 30 quilômetros. E, mais que isso, há uma "conversa" entre os dois sistemas intermediada por um sistema lógico. Como? Primeiro, os fotossensores do tanque mandam sinais para um sistema lógico do próprio tanque e, se os pontos de radiação superarem um determinado limiar, esse sistema alerta o sistema central de computação, que
distribui a informação para o telescópio e para outros tanques. Já no telescópio, se seus fotossensores dispararem e três deles formarem um padrão geométrico razoável, também ocorre o envio de informações para o sistema central e daí para os tanques. Posteriormente, na área de processamento de dados, coordenada por Shellard, o evento será analisado e, se for o caso, guardado. "Mas de modo geral nosso database ficará mais ocupado com eventos de calibração do que com eventos físicos", prevê Escobar.
Mas a grande questão que persiste para quem não é do ramo é por que os físicos acreditam que essa observação poderá levá-los a saber o que são e de onde vêm as partículas de altíssimas energias. Bem, eles acreditam que as partículas em questão não são fótons, são matéria: têm massa e carga elétrica. Portanto, em princípio seriam desviados pelos campos eletromagnéticos que permeiam o
universo. Mas esses campos são fracos e a energia das partículas, ao contrário, imensa. Assim, parece difícil tal desvio, e as partículas provavelmente mantêm sua rota, que talvez seja possível investigar até uma distância de 300 milhões de anos luz. Ao fim dessa rota talvez estejam colisões de galáxias, núcleos ativo de galáxias ou, mais provavelmente, matéria escura, relíquias do big-bang apri- · sionadas no halo da galáxia, massa escura escondida no universo. Por ora, ninguém sabe. Os físicos do Pierre Auger querem saber.
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A assimetria que possibilitou --~--------------------------------------------------
acria~ãodo Havia um pouco mais de matéria que de anttmatéria no big-bang. Ainda bem!
universo mat
Um tanto cansado da rotina de sua área tradicional de trabalho- aceleradores de partículas -, o físico norte-americano James Watson Cronin, 68 anos, decidiu, em 1992, que passaria a explorar a região de energia
dos raios cósmicos. Mas decidiu igualmente que levaria para seu novo campo de atuação, sem dúvida bem mais especulativo, a filosofia de trabalho pragmática da comunidade dos físicos de aceleradores, que inclui entre seus pilares usar sempre a melhor tecnologia de ponta disponível para pesquisa e, se necessário, desenvolver a instrumentação apropriada aos objetivos de cada projeto. Foi a partir dessas decisões que ele começou a idealizar o projeto do Observatório Pierre Auger de Raios Cósmicos que, coerentemente com sua experiência passada, é bastante inovador na concepção técnica e dispõe de uma série de equipamentos desenhados especificamente para os objetivos de detecção das partículas de altas energias.
Cronin, que em 1980 dividiu com o colega Val Logsdon Fitch o prêmio Nobel de Física, pela descoberta das violações de princípios fundamentais de simetria no decaimento dos mesons-k neutros, esteve em São Paulo em julho, participando da cerimônia que marcou o apoio formal do Brasil ao projeto Pierre Auger. E foi nessa ocasião, no Instituto de Física Gleb Wataghin, na Unicamp, que ele concedeu a Mariluce Moura a entrevista que se segue.
• O senhor poderia tentar explicar em palavras inteligíveis para um leigo o que é antimatéria, um conceito fundamental na descoberta que lhe valeu um Nobel?
-Antimatéria ? O.k. É um fato descoberto empiricamente para toda porção de matéria. Tomemos um hidragênio: é um próton com um elétron girando em volta. Mas sabemos que há um antipróton. Foi descoberto e fisicamente produzido num acelerador. E a natureza da antimatéria é tal que, quando se encontra com matéria, ela se destrói e simplesmente se torna ... bem, digamos, pura energia ou partículas instáveis e acaba se transformando no que chamamos fótons ou "partículas leves': Mas o importante é que não poderia haver nenhuma vida, não poderia haver nada se tivéssemos uma igual mistura de matéria e antimatéria. É extremamente importante que a Natureza de algum jeito tenha sido capaz
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de desdobrar-se de tal modo que a matéria dominasse, nas galáxias com rerteza e, provavelmente, no Universo. Então, toda partícula é gêmea de uma antipartícula, o próton é carregado positivamente, e o antipróton, negativamente. E quando eles se juntam, todas as estruturas se anulam.
• O senhor e Val Fitch receberam o prêmio Nobel em 1980 pela descoberta das violações de princípios fundamentais de simetria no decaimento de mesons-k neutros. O que isso tem a ver com a relação entre matéria e antimatéria?
-Creio que não é o caso de explicar aqui os detalhes dessa violação de simetria em mesons-k. O que de fato interessa é que encontramos uma violação no que pensávamos ser uma simetria entre matéria e antimatéria. E vimos que, de fato, no estudo em detalhe dessa partícula elementar encontra-se uma pequena diferença nas leis da física, entre o universo da matéria e o universo da antimatéria. E acho que a importância da descoberta transcende de longe a própria física das partículas, porque ela permite que se entenda como o Universo começou com um big-bang quente, ou o que quer que seja, onde a energia é tão alta que não
há como separar matéria e antimatéria. Contudo, com a violação da simetria, e alguns outros detalhes, a assimetria resultante entre matéria e antimatéria pôde conduzir a um pequeno excesso de matéria. E o modo como percebemos as coisas agora nos diz que no big-bang havia quase tanta matéria quanto antimatéria, mas um pouquinho menos desta, algo, digamos, como uma parte em um bilhão. E, no mais, toda matéria e antimatéria se aniquilaram produzindo os fótons, esse pano de fundo de microondas que está lá, do qual sabemos e que vemos. O que sobrou, somos nós: uma parte em um bilhão. Isso foi tudo o que foi preciso para fazer a matéria do Universo. Se você calcular a quantidade de matéria, ou seja, os prótons, e calcular os fótons, é exatamente este o fator que encontrará, de um em um bilhão.
• Mas exatamente o que impediu que no big-bang matéria e antimatéria se aniquilassem completamente?
- Mas elas se destruíram! Só que por causa da assimetria, da violação da simetria, um pouco de excesso foi produzido. Quero lembrar que foi o físico Andrei Saka-
''Toda matéria e antimatéria se anig,uilaram produzindo os fotons. O que sobrou somos nós: uma parte em um bilhão,,
rov, num artigo publicado em 1967 num jornal russo, quem primeiro exprimiu a idéia de como a noção de uma assimetria entre matéria e antimatéria poderia conduzir a um universo dominado pela matéria. Foi ele, portanto, a primeira pessoa que apontou a significação cosmológica do nosso experimento, que havia sido feito três anos antes, em 1964.
• O senhor poderia estabelecer uma relação entre a sua descoberta e as mais recentes especulações cosmológicas?
-Você deve estar se referindo às mais recentes medições cosmológicas, ao "universo plano", coisas dessa natureza. Mas acho que a importância da nossa descoberta, no que toca à cosmologia, é o que acabamos de discutir, ou seja, ela permite entender por que estamos num universo dominado pela matéria. As novas descobertas da cosmologia são fantásticas. Sabemos agora que, ao que parece, o Universo é muito plano, não tem uma geometria curva de um modo ou do outro. E temos também estes belos sinais do Universo muito jovem, ainda com 4 mil anos, quando o pano de fundo de microondas foi originado.
• E o fechamento do Universo? Ele vai entrar em colapso ou vai continuar a se expandir?
- Bem, o que sugerem os dados atuais- e são dados, não especulações - é que ele não vai se fechar nem explodir, apenas gradualmente irá crescendo. Não há fim para ele.
• Quais são suas expectativas quanto ao Observatório Pierre Auger?
- Minhas esperanças são de que sejamos capazes de coletar eventos de alta energia o bastante e que eles mostrem, por seu caráter, tanto o que são quanto de onde vêm, e que tipos de energia têm. Esses eventos deverão nos dar os tipos de pistas de que precisamos para decidir se há desordem no Universo jovem ou que processos nele acontecem, se há objetos astrofísicos que não conhecemos etc. Quem sabe nos dêem algumas pistas de coisas que simplesmente não entendemos na nova física, coisas necessárias para entendermos nossas medições. Nosso trabalho, então, é fazer as melhores medições possíveis e, ao mesmo tempo, excluir quaisquer preconceitos sobre as respostas que estaremos encontrando.
• O senhor vê seu trabalho no Pierre Auger como uma conseqüência natural daquela pesquisa que lhe valeu o Nobel?
-A única coisa em comum entre um momento e outro é a nossa procura por fenômenos grandes e importantes. Tem a ver com a cosmologia, num certo sentido. Ela estava presente quando fizemos o experimento original, ainda que estivéssemos trabalhando num espaço apertado como um acelerador. E sempre me espantou que ali tivéssemos feito algo tão especial, tão misterioso e com conseqüências de t'ão extraordinária magnitude.
• Vocês não estavam procurando o que encontraram?
-Não. E isso é o que chamamos "cientificidade": você faz uma coisa numa direção e, no fim das contas, faz uma descoberta que tem conseqüências extraordinárias.
• O trabalho com o Observatório Pierre Auger vai obrigá-lo a vir ao Brasil com freqüência?
- O meu trabalho, além de procurar ficar a par do que as outras pessoas estão fazendo, é tentar garantir o apoio político e financeiro para o projeto. Temos um diretor de projeto que realmente se ocupa de todos os detalhes. Isso quer dizer que eu venho para o Brasil, vou ao Vietnã, à Argentina, aonde for preciso. Aqui já estou certo de que temos o apoio do Estado de São Paulo e também do governo federal. Na Argentina temos um apoio extraordinariamente bom da província de Mendoza, mas ainda temos problemas com o governo federal. •
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CIÊNCIA
QUALIDADE DO AR
A saúde dos prédios em exame Concentração de gases maléficos cria edifícios "doentes" nas cidades
A qualidade do ar em interiores é um problema quase desconhe
cido no Brasil, segundo o professor Racine Prado, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), autor de uma pesquisa financiada pela FAPESP para detectar poluentes em prédios da cidade de São Paulo.
Racine, que teve a ajuda do bolsista Adriano Trotta do Carmo, baseou-se em limites toleráveis segundo padrões norte-americanos e canadenses. O trabalho revelou a importância da ventilação para dispersar poluentes e mostrou que a concentração deles depende muito do tamanho das áreas internas e do número de usuários.
Sem vento - Racine explica que, nas cidades, boa parte das pessoas passa entre 80 e 90% do tempo em prédios, muitos considerados "doentes" devido à existência de fontes poluentes neles próprios ou nas vizinhanças e à má ventilação. Hoje, para economizar energia, pouco se usa a ventilação natural das janelas abertas já que, depois da crise do petróleo dos anos 70, generalizaram-se os "edifícios com poucas aberturas para ventilação, que gastam menos energia para manter a circulação e a refrigeração do ar". Os prédios ficaram cada vez mais fechados e dotados de controles de ventilação, temperatura e umidade, enquanto a qualidade do ar foi ignorada. Assim, "as concentrações médias de vários poluentes no ar interno aumentaram
Racine: acúmulo de gente e carros, climatização artificial e geração de
calor em cozinhas favorecem a poluição
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muito, devido à pouca troca de ar entre o interior do edifício e o exterior". Vários gases - monóxido e dióxido de carbono, amônia, óxidos de enxofre e nitrogênio - são gerados por materiais de construção e de limpeza, mofo, cozinhas, lavagem/secagem de roupas e pelo metabolismo humano.
Isso causa duas patologias. Uma é a "síndrome do edifício doente': estado transitório de parte dos usuários (cerca de 20%), cujos sintomas- dor de cabeça, náusea, irritação de olhos, nariz e garganta, cansaço, falta de concentração e problemas de pele - costumam sumir quando as pessoas saem. A outra é a "doença relacionada ao edifício", causada por bactérias, vírus e fungos.
Os mais expostos - Racine destacou os poluentes amônia, monóxido e di-
óxido de carbono, dióxido de nitrogênio, dióxido de enxofre e formaldeído. E selecionou prédios que estariam mais expostos a eles, por características como fachada com poucas aberturas, probabilidade de grande geração de calor interno ou grande movimentação de pessoas e carros. Escolheu hospitais, shoppings, oficinas mecânicas, prédios comerciais e universitários. Dos 23 escolhidos, 12 permitiram as medições: 2 hospitais, 1 oficina, 5 prédios comerciais e 4 do câmpus da USP. Racine usou um medidor portátil de gases com microprocessador.
A escolha também considerou o tipo provável de poluente. Numa sala escolar, por exemplo, a respiração dos alunos produz dióxido de carbono (COz), gás relativamente não tóxico, mas considerado bom indica-
dor da qualidade do ar. Na sala pesquisada, havia 1.000 ppm (partes por milhão) de COz, nível acima do qual pode haver sensação de abafamento e que indica ventilação insuficiente para diluir poluentes mais nocivos.
Na oficina, ao COz somou-se um gás tóxico, o monóxido de carbono (CO), produto da combustão de material fóssil, sobretudo por carros, e cujo limite de segurança é 50 ppm. A oficina, um galpão de 2.400 m 2 com pé direito de 6 m, janelas frontais e cinco aberturas verticais no teto, revelou níveis médios de CO que iam de 173 ppm junto à entrada bem ventilada até 500 ppm na área de funilaria e pintura ao fundo - um excesso que causa problemas respiratórios.
Os hospitais estavam poluídos: a esterilização de objetos, bem como o grande número de pessoas e de microrganismos contribuem para isso. Num deles, o nível de CO era de 148 ppm na sala de espera e na área de endoscopia, bem mais do que na casa de máquinas (52 ppm), cheia de equi-
pamentos poluentes, mas com eficiente sistema exaustor. No outro hospital, o nível máximo de CO era menor na garagem (98 ppm) que na recepção (110 ppm) e na lanchonete (125 ppm). Num restaurante, a combustão de gás liquefeito de petróleo na cozinha liberava no limite do tolerável tanto monóxido (média de 55 ppm) como dióxido de carbono (1.000 ppm).
Outros gases danosos encontrados foram amônia, dióxido de enxofre e formaldeído. Presente na urina, a amônia (NH3) tem cheiro sufocante e níveis toleráveis de 25 a 50 ppm. O dióxido de enxofre (SOz), outro subproduto da combustão fóssil, também tem cheiro sufocante e, acima de 6 ppm, já irrita o sistema respiratório. O formaldeído, exalado por materiais de limpeza e de construção, irrita as mucosas e tem índices máximos de 0,4 ppm nos ambientes internos e 1 ppm nos industriais.
Conclusões - A conclusão básica foi a de que a quantidade excessiva de pes-
soas em determinada área favorece a concentração de poluentes muito mais do que se esperava- mais ainda que a presença de fontes poluidoras como certos equipamentos e revestimentos de piso. O nível de CO aumenta muito onde há combustão, sobretudo a gerada por carros. Já a presença de CO num escritório, ainda que em níveis aceitáveis, sugeriu que esse gás, não produzido pelas pessoas, tivesse sido introduzido pelo sistema de ar-condicionado.
Dados obtidos num prédio comercial em condições distintas (ambiente fechado e aberto) mostraram que computadores, impressoras e carpetes exalam, além de amônia, dióxido de nitrogênio (NOz) - um gás de cor marrom escura e cheiro pungente, produzido sobretudo no tráfego de veículos, que irrita olhos, garganta e sistema respiratório, com máximo recomendável de 5 ppm em ambientes industriais. Em todos os casos, salienta o trabalho, seria possível controlar as fontes poluidoras ou ao menos aumentar a circulação do ar, o que dispersaria os poluentes.
O objetivo foi fornecer dados básicos sobre qualidade do ar interno a alunos de graduação, definir os poluentes, suas fontes mais conhecidas e os efeitos para a saúde, bem como dar uma visão geral de como prevenir e resolver o problema. No Brasil, quase não há pesquisas na área, mas existem muitos prédios doentes, a começar por alguns da capital federal, como se noticiou recentemente. O trabalho, que pode embasar outros mais abrangentes, aponta procedimentos que minimizariam o problema. •
PERFIL:
• RACINE TADEU ARAú JO PRADO, 45 anos, engenheiro civil formado na Escola Politécnica da USP (1987), onde fez mestrado ( 1991) e doutorado ( 1996). Especializado em sistemas prediais. Projeto: Investigação de Campo sobre Poluentes no Ar Interno de Edifícios Investimento: R$ 20.348,75
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TECNOLOGIA
No Centro Incubador de Empresas Tecnológicas, no câmpus da USP, 50% das empresas têm projetes iniciados na universidade
INCUBADORAS
Do laboratório para o mercado Pesquisadores fazem a ponte entre a pesquisa e o mundo dos negócios
MARCOS DE OLIVEIRA *
acrescente aumento no número de incubadoras de micro e
pequenas empresas no Brasil está se transformando na principal ponte de transferência de tecnologia elaborada nos laboratórios de universidades e centros de pesquisa para o mercado
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de produtos e serviços. Em um país não acostumado a fazer pesquisa dentro de empresas, o crescimento de 35% no número de incubadoras instaladas, entre julho de 1999 e junho deste ano, é sem dúvida uma boa notícia. Segundo o recente levantamento da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos de Tecnologias Avançadas (Anprotec), o total desses condomínios empresariais atingiu a marca de 135 unidades contra cem computadas no período anterior.
Esses números não param de crescer há duas décadas. Em 1989,
eram quatro incubadoras. Cinco anos depois, em 1994, elas somavam 19, subindo para 60 em 1997. O acelerado salto na instalação dessas empresas representa uma nova postura no cenário industrial brasileiro. Elas garantem um espaço crescente no ainda carente grupo de empresas brasileiras de base tecnológica. Um grupo empresarial que, ao redor do mundo, ganha cada vez mais importância por ser um forte indicador de competitividade dos países neste mundo globalizado. Vide a emergente influência exercida nos investidores internacionais pelo índice Nasdaq, centrado em Nova York, que concentra ações de empresas de tecnologia.
Os dados da Anprotec apontam a existência de 1.100 empresas nas incubadoras brasileiras, em fases que vão da gestação à juventude empresarial. Todas têm menos de cem funcionários e, em conjunto, geram 5.200 mil postos de trabalho, incluindo os sócios.
Essa movimentação empreendedora só foi possível com uma mudança cultural despertada no meio acadêmico e apoiada por órgãos públicos. Universidades federais e estaduais, além de prefeituras e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) têm bancado a instalação desses condôminios. ''A estabilidade econômica também deu tranqüilidade para a estruturação da passagem do conhecimento científico para o setor produtivo", afirma Luís Afonso Bermúdez, presidente da Anprotec.
Olho dos investidores - Do total de incubadoras, 57% mantêm vínculo formal com universidades e centros de pesquisa e 20% in-
tre pessoas físicas e bancos, procuraram o Cietec em busca de informações sobre a incubadora e suas empresas. "Nada foi fechado, mas as perspectivas de novos investimentos são grandes", avalia.
Instalado em um prédio cedido pelo Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares (Ipen), no câmpus da Universidade de São Paulo (USP), o Cietec segue um padrão comum a grande parte das incubadoras espalhadas pelo país. O espaço é cedido por universidades, centros de pesqui-
CENTRO INCUBADÇR
Para o crescimento da empresa dentro da incubadora também vale a convivência entre os pares. "É muito importante a sinergia existente entre os empreendedores instalados em salas vizinhas ou do outro lado do corredor. Há uma constante troca de informações e de cooperação no desenvolvimento dos projetas", conta Risola. ''As empresas ajudam-se, tanto no intercâmbio de informações tecnológicas como nas questões burocráticas", afirma Gerhard Ett, sócio da Anod-Arc, uma empresa criada
c
em 1998. Ele desenvolve no Cietec uma série de experimentos na área de tratamento de superfície de alumínio, que trouxe do seu doutorado realizado no Ipen. Até agora, ele conseguiu melhorar em três vezes o revestimento desse metal em relação à dureza do processo utilizado nas in
DE EMPRESAS TECNOLOGIC /i 5 dústrias metalúrgica, têxtil e aeronáutica.
formal. Nesse caso, mesmo sem papel assinado, os laboratórios, as consultarias de professores e outros recursos são incorporados ao conhecimento necessário para a efetivação dos projetas.
"Das nossas 15 empresas incubadas, 50% têm projetas iniciados na universidade, sendo que cerca de 75% dos sócios têm doutorado", informa Sérgio Wigberto Risola, gerente do Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), de São Paulo. Ele revela também que, nos últimos oito meses, 19 grupos de investidores, en-
Risola: nos últimos oito meses, 19 grupos de investidores buscaram informações sobre as empresas incubadas
sa e prefeituras. As empresas utilizam-se de toda a infra-estrutura, geralmente gratuita, como telefone, Internet, água e energia elétrica, além de laboratórios da própria incubadora ou da vizinhança acadêmica. Pagam aluguéis que variam de R$ 150,00 a R$ 600,00 ou, dependendo da incubadora, nem pagam. Todas disponibilizam consultores em áreas como administração, marketing e jurídico. As empresas têm prazos que variam de dois a seis anos para se graduar e sair da incubadora.
Apoio financeiro A Anod-Arc é uma das sete empresas instaladas no Cietec, das 15 existentes, que recebem financiamento da
FAPESP dentro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequena Empresa (PIPE). A manutenção do Cietec, como outras incubadoras do país, é realizada pelo Sebrae. Algumas, como o Núcleo de Apoio ao Desenvolvimento de Empresas (Nade), a incubadora da Companhia de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec), são custeadas pela prefeitura da cidade.
No âmbito do Nade, a FAPESP financia projetas para sete empresas das 20 existentes. Segundo o gerente administrativo da incubadora, Décio Sirbone Júnior, 70% dos projetas se originaram na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ). Inaugurada em 1995, a Nade conta com quatro empresas em fase de graduação. São elas a Orion, que fabrica aparelhos de fisioterapia, a Geocamp, uma consul-
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toria de mercado, e a Mult Way e a Well Done, na área de informática.
Outra contribuição importante no financiamento de empresas é dada pelo Programa de Capacitação de Recursos Humanos para Atividades Estratégicas (RHAE), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em forma de bolsa aos sócios e funcionários das empresas. Tomando o Cietec como exemplo, a contribuição do CNPq foi de R$ 1 milhão em bolsas de estudo desde 1998, quando foi criada a incubadora. Nesse mesmo período a FAPESP deu um aporte financeiro total de R$ 1,1 milhão no financiamento para a execução dos projetos.
O Cietec conta com projetos que já resultaram em produtos e serviços, como é o caso da LaserTools (veja matéria na Pesquisa FAPESP no 50), que está até exportando. "Estamos fazendo gravações a laser no painel do rádio de um carro da Ford Americana", conta Spero Penha Morato, um dos sócios da empresa. E a Hormogen (veja Notícias FAPESP n° 43) prepara os testes finais para a aprovação de um hormônio de crescimento desenvolvido por ela. Outra empresa, a Pro-line, já comercializa próteses de compostos cerâmicos para reconstituição de problemas bucofaciais. "Nós temos um projeto na primeira fase do PIPE que prevê o desenvolvimento de um implante dentário inovador", anuncia Laura Braga, uma das sócias da empresa. "Além de todas as facilidades da incubadora, temos acesso a diversos laboratórios do Ipen e do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP onde são realizados os testes em animais."
Rápido crescimento - A história das incubadoras no Brasil é curta. A primeira surgiu em 1984, em São Carlos. "Foi pioneira", afirma Sylvio Goulart Rosa Júnior, presidente da Fundação Parque de Alta Tecnologia (Parqtec). "Contribuiu para essa iniciativa o perfil da mão-de-obra local, que ajudou a atividade de incuba-
42 • AGOSTO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
A evolução das Incubadoras no Brasil
2
Fonte:Anprotec
Relação Incubadoras - Universidades
Inexistente D Informal D Formal •
Fonte:Anprotec
ção", diz Rosa. Ele fala das universidades e centros de pesquisa da região, com duas unidades da Embrapa; a USP e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). "São a base de formação diferenciada do empresariado e da mão-de-obra." Para capacitar esse pessoal no mundo dos negócios, a Parqtec criou a Business School para treinar o empresariado a montar empresas e a administrá-las.
Cerca de 40 empresas passaram pelo Parqtec nos seus 15 anos de vida. Das 12 incubadas atuais, três têm projeto financiado pela FAPESP. Uma delas é a Sensis Eletrônica, empresa fundada em 1995 dentro da incubadora por cinco alunos da pósgraduação do Núcleo de Manufatura Avançada da Escola de Engenharia Mecânica da USP. Eles desenvolveram sensores eletrônicos capazes de controlar com mais precisão o fun-
g ~ cionamento de máquinas industriais. ~ No começo, eles não pagavam nada ~ pelo espaço de 35 m2 e tinham à dis;;; posição linha telefônica e toda a in-
fra-estrutura necessária para o trabalho. Hoje, pagam R$ 600,00 de aluguel e estão perto da graduação.
As incubadoras têm proporcionado muitas novidades e a participação das universidades é grande. Mas nem sempre esse apoio do meio acadêmico foi tranqüilo. "No início, nossas atividades eram vistas como subversivas e fomos acusados de ajudar na privatização da universidade", conta o professor Afrânio Aragão Craveiro, gerente do Parque de Desenvolvimento Tecnológico (Padetec) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Alguns setores acreditavam que esse tipo de atividade não tinha nada a ver com o meio acadêmico. "Mas conseguimos mostrar que essa é uma tendência mundial e a universidade não pode ficar longe do setor de maior valia atualmente, que é o uso do conhecimento."
Criada em 1992, a incubadora especializou-se na área de alimentos, química e produtos naturais. Hoje, as dez empresas incubadas proporcionam um faturamento anual de R$ 2,2 milhões, com a comercialização de 19 produtos, como cápsulas de quitina, substância extraída da casca de crustáceos um subproduto da indústria de pesca do estado. É um pó usado na redução de peso por se tra-
o o <( v z <( u ..
tar de uma fibra natural que evita a absorção de gordura por parte do organismo humano. Também faz sucesso comercial as cápsulas de vegetais liofilizados (em pó), que substituem o consumo diário de verduras, produzidas pela empresa Polimar, que depois de três anos na incubadora está em fase de se tornar independente.
Experiência no ramo - A vocação da incubadora de Fortaleza pela área de produtos naturais seguiu o perfil do ambiente acadêmico existente no local. Foi assim na Parqtec como também é o caso da Fundação Biominas, que há dez anos foi criada por profissionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) para atuar no ramo de biotecnologia. "Hoje, 90% das empresas incubadas são de doutores, mestres ou pesquisadores que atuam ou se formaram na UFMG", informa Patrícia Mascarenhas, gerente da Biominas. Atualmente, as 13 empresas incubadas já possuem 69 produtos registrados no Ministério da Saúde e 31 em desenvolvimento. Elas tiveram, no ano passado, um faturamento médio de R$ 321 mil mensais, produzindo um total de R$ 438 mil em impostos.
Uma das empresas de sucesso da Biominas é a Katal,
que produz reagentes para diagnósticos de exames de colesterol, glicose e mais 21 tipos de análise laboratorial. O professor aposentado do Departamento de Bioquímica e Imunologia da UFMG e sócio da Katal, Leonides Rezende, desenvolveu uma nova técnica de produção para esses produtos aproveitando sua experiência acadêmica. "É uma tecnologia inédita no Brasil em que os reagentes são liofllizados, proporcionando uma diminuição de custo do produto em 30%", in-
Laura Braga, da Pro-line:
acesso a laboratórios
do lpen e da USP
(
Unicamp terá incubadora no câmpus
A mais nova incubadora do Estado de São Paulo vai nascer dentro da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ela deve estar em funcionamento no início de 2001. "Campinas necessita de mais uma incubadora", afirma Davi Sales, assessor técnico do Escritório de Difusão e Serviços Tecnológicas (Edistec) da Unicamp e futuro gerente da incubadora. "Nossa idéia é somar com o Nú-
cleo de Apoio ao Desenvolvimento de Empresas (Nade) e criar mais espaço para alunos que deixam a universidade com uma boa idéia e um espírito empreendedor." A estrutura da nova incubadora será instalada dentro do Centro de Tecnologia da Unicamp e terá dez boxes com 30 m2
cada um. Sem espaço, a Nade não lança,
há dois anos, um edital para sele-
forma Rezende. Com isso, a empresa atingiu um faturamento mensal de R$ 60 mil. "Foi a incubadora que permitiu a existência da empresa, porque eu não tinha o capital necessário para Imciar o negócio!'
O apoio das incubadoras na criação e no fortalecimento de pequenas empresas é fundamental para que elas possam sobreviver no futuro, depois de graduadas. Segundo a Anprotec, o índice de sobrevivência das empresas nascidas em incubadoras é de 84%. Esse dado é proporcionalmente inverso aos levantamentos do Sebrae que apresentam índices de mortalidade de 80% das pequenas e médias empresas (não incubadas) nos dois primeiros anos de vida. "As incubadoras reúnem vantagens que minimizam a taxa de mortalidade dos empreendimentos", diz o engenheiro de produção Maurício Guedes, coordenador da incubadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) .
Criada em 1994 dentro do Parque Tecnológico do Rio de Janeiro, situado na área da UFRJ, a incubadora abriga 12 empresas. Outras 12 já passaram por suas instalações antes de se consolidarem no mercado. A incubadora produz cerca de 200 empregos e desenvolve 40 produtos e serviços de inovação tecnológica. O faturamento total das empresas ali instaladas foi de R$ 5 milhões no ano passado.
ção de novos pretendentes a se instalar na incubadora. A Nade chegou a 22 empresas em menos de um ano da inauguração, em 1995. Numa região com tanta demanda de empresas de base tecnológica como é Campinas, uma nova incubadora é bem-vinda.
Na futura incubadora uma novidade deve atrair novos empreendedores. A universidade vai colocar à disposição as 142 patentes que são de sua propriedade para quem se habilitar a licenciar e a desenvolver os produtos.
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • 43
Guedes credita o bom índice de sobrevivência ao rigoroso processo de escolha das empresas. Ou seja, a triagem indica o que é viável ou não. Vários itens são checados na seleção. Possibilidade de interação com a universidade, viabilidade técnica e econômica, perfil das pessoas envolvidas
e impacto da tecnologia no mercado. "Não apoiamos sonhos. Escolhemos as empresas com idéias que melhor vão aproveitar o ambiente da incubadora", explica Guedes. "Metade das empresas que estão aqui teria morrido se não estivesse na incubadora': garante.
A Oceansat, que realiza consultoria ambiental por meio de sensoriamento remoto, foi uma das quatro empresas escolhidas recentemente pelo processo de seleção da incubadora. Ela é dirigida por pesquisadores que trabalharam na área de sensoriamento no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Os computadores da empresa são abastecidos com informações de satélites sobre as condições ambientais do litoral brasileiro. São boletins que reúnem dados como temperatura da água, velocidade das correntes e até aparecimento de manchas de óleo no
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Prédio da Fundação Biominas onde o professor Rezende, da Katal, produz reagentes para exames clínicos
mar, rios ou lagoas. "Indústrias pesqueiras utilizam esses dados para captura e localização de peixes, e as companhias petrolíferas, para moÍJ.Ítorar vazamentos", diz o oceanógrafo Reynaldo Solewicz, da Oceansat.
Processo de seleção -Ter boas idéias não basta para ser aceito em uma incubadora. É preciso muito mais. "Os empreendimentos são analisados sob critérios como grau de inovação dos produtos, potencial mercadológico e capacidade gerencial, além da interação com a universidade': explica Sheila Oliveira Pires, gerente da Incubadora de Empresas do Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico ( CDT) da Universidade de Brasília (UnB). "O processo de seleção ocorre uma vez por ano e é feito por uma comissão técnica que julga as solicitações."
Com 11 anos de existência, a incubadora da UnB apoiou 45 empre-
sas que produziram 154 novos produtos. Hoje, são 13 empresas que estão no processo de gestação. Entre 1997 e 1999, essas empresas criaram 160 postos de trabalho nas áreas de informática, mecânica, telecomunicações, biotecnologia, racionalização de energia e geofísica.
Alguns laboratórios da UnB são utilizados no desenvolvimento das pesquisas de inovação tecnológica, professores prestam consultaria às empresas e os alunos de graduação são convidados a fazer estágio. Dos sócios e funcionários das empresas da incubadora, 68,5% têm graduação completa, 14,2% possuem mestrado e doutorado e 17% estão na graduação.
Cerca de 70% dos projetos assistidos pela incubadora são apresentados por alunos e ex-alunos da UnB, como é o caso do "pasteurizador híbrido", idealizado por Rubens Júnior no trabalho final do curso de Engenharia Mecânica. Com ajuda dos colegas de turma Weyder Jorge e Jovelino Júnior, o invento ganhou forma e vem chamando a atenção de pequenos produtores. O pasteurizador tem preço baixo e elimina o risco de contaminação. "É cem por cento seguro", diz Jorge. Em uma hora e meia, o equipamento eleva a temperatura de até 50 litros de leite e depois a reduz rapidamente para matar os microrganismos nocivos à saúde humana.
Detalhe: esse processo é realizado com o leite envasado. Normalmente o envase é feito após a pasteurização -procedimento que o novo pasteurizador também pode executar, daí porque é chamado de híbrido.
O equipamento custa R$ 10 mil, metade do preço de um pasteurizador convencional, e está em testes na Secretaria de Agricultura do Distrito Federal. Nesses casos em que o resul-
Solewicz, da Oceansat:
empresa de consultoria
ambiental
tado do trabalho é comercializado, a UnB tem direito a 1 o/o do faturamento do produto a título de royalties.
Nova etapa- "A incubadora tem planos ambiciosos para o futuro': afirma a gerente Sheila. No próximo ano será construído um novo prédio para o empreendimento dentro do parque tecnológico da UnB. Isso aumentará a capacidade do CDT em abrigar cerca de 25 empresas. Essa é mais uma etapa dessa incubadora que recebeu no ano passado o título de melhor projeto do gênero no País, concedido pela Anprotec "Foi o reconhecimento de um trabalho realizado ao longo desses anos': comenta Sheila.
Outra incubadora reconhecida pelo trabalho prestado nos últimos anos é o Centro Empresarial para Laboração de Tecnologias Avançadas (Celta), de Florianópolis, Santa Cata-
nna. O embrião dessa incubadora surgiu nos primeiros anos da década de 80 quando grandes empresas instaladas no estado, como Cônsul, Metal Leve, Weg e Embraco, procuraram a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em busca de soluções para problemas tecnológicos. Daí nasceu, em 1984, a Fundação Certi -Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras, uma entidade privada sem fins lucrativos. A idéia era inten-
sificar a transferência de tecnologia da universidade para o setor privado, com ganhos para ambos os lados.·
Em 1986, a Certi propôs a criação de uma incubadora em Florianópolis com a missão de dar suporte à criação e ao crescimento de novos empreendimentos de base tecnológica. Hoje, o Celta funciona em um prédio de 10.500 m\ onde trabalham cerca de 600 pessoas. Na incubadora, os empresários dispõem de toda a infraestrutura necessária à produção, incluindo secretaria, limpeza, segurança, office-boy, correio, bancos, restaurantes e lojas. Contam também com diversas assessorias. "Só precisam sair daqui para dormir': afirma o gerente de Negócios, Tony Chierighini.
Inovação para o país- Para candidatar-se a uma vaga na incubadora é preciso apresentar um plano de ne-
gócios nas áreas de eletroeletrônica, telecomunicações, informática, engenharia biomédica, mecânica de precisão ou novos materiais. Em qualquer dos casos, o plano deve incluir alguma dose de inovação, pelo menos para o Brasil.
O perfil dos incubados é de jovens estudantes ou recém-formados oriundos das universidades, principalmente da UFSC. "Isso acontece porque, antes, os cursos universitários estavam voltados para formar empregados. Hoje a ênfase é para gerar empreendedores': avalia Chierighini. Ele se orgulha em dizer que o Celta é auto-sustentável. "Na fase inicial o governo do estado bancava um terço das despesas operacionais e também construiu este prédio. Mas hoje vivemos com recursos próprios."
O Celta também se encarrega de buscar parceiros capitalistas para idéias "boas e novas". Nos últimos meses, com a criação do programa Alavanke, a incubadora viabilizou o investimento de R$ 1 milhão de um banco privado em uma empresa incubada. Os nomes ainda não podiam ser divulgados no início de agosto. E há outros cinco investimentos dessa magnitude em andamento.
Ao todo, 21 empresas saíram do Celta. Dessas, 15 foram liberadas entre 1986 e 1995, quando a incubadora ocupava uma área de apenas 1 mil m2 e podia abrigar, no máximo, dez empresas. Atualmente há 30 incubadas e a expectativa é que, até março de 2001, mais dez saiam da incubadora. Das 51 empresas que passaram pelo Celta, 23 nasceram com tecnologia gerada na UFSC. Segundo Chierighini, o índice de mortalidade de empresas após a saída do Celta é zero. "Nós temos empresas que morrem aqui dentro. É um índice de 10%. Mas depois da saída, até agora, nenhuma morreu."
Uma que vai muito bem, obrigado, é a Conversores Estáticos Brasileiros (Cebra). A empresa nasceu na incubadora e lá permaneceu de 1990 a 1994. O investimento inicial dos quatro sócios, todos mestres pela UFSC na
PESQUISA FAPESP · AGOSTO OE 1000 • 45
área de Eletrônica de Potência do curso de Engenharia Elétrica, foi de apenas R$ 6 mil. Eles decidiram tentar a sorte como empreendedores durante o mestrado. Não receberam qualquer tipo de financiamento. Apenas o incentivo, entre 1992 e 1994, de duas bolsas RHAI para dois técnicos contratados. Hoje, os dois estão entre os 35 funcionários da empresa que faturou R$ 2,5 milhões em 1999 e prevê faturar R$ 3,5 milhões este ano.
Outro foco - A Cebra produz fontes de alimentação elétrica chaveadas para as áreas de telecomunicações, automação bancária e comercial. Entre seus clientes estão grandes empresas como Siemens, Intelbrás, IBM, Itautec, Olivetti e Bematec. "Nossa intenção quando entramos na incubadora era fabricar fontes de computadores, mas hoje elas podem ser encontradas por R$ 35,00 em qualquer lojinha de informática. Por isso redirecionamos o nosso foco e passamos a produzir, sob encomenda, fontes especiais, com mais conhecimento tecnológico agregado': explica Alexandre da Cunha, de 36 anos, um dos quatro sócios da Cebra. "Procuramos nichos de mercado que precisem de produtos especiais, produzidos em pequena escala", revela.
Certamente muitos casos de sucesso estão presentes na história desse tipo de condomínio empresarial, com prevalência acadêmica, surgido na década de 50 nos Estados Unidos e na Europa. Os mais famosos são as empresas de informática do Vale do Silício, na Califórnia, e as de eletrônica de Boston, formadas por profissionais vindos do Massachusetts Institute of Technology (MIT). Hoje, existem cerca de mil incubadoras espalhadas pelo mundo. Pouco mais de SOO ficam nos Estados Unidos. Agora, chegou a vez de as incubadoras ganharem espaço no Brasil. •
*Colab o r ar am: W AGNER DE O LI VEIRA (RJ),
SI LVANA PISAN I (SC) , RODRIGO CAETANO (DF)
E L UCAS ECHIMENCO ( São Ca rlos )
46 • AGOITO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
TECNOLOGIA
AGRONOMIA
Na sintonia do tempo
Aparelho controla umidade e permite uso correto de agrotóxicos
Dois engenheiros, um agrônomo e outro eletrônico, uniram-se
num projeto que protege plantações e o meio ambiente: um equipamento que prevê ataques de fungos e a conseqüente doença das folhas, serve para qualquer cultura tropical e reduz dras-
ticamente o uso de agrotóxicos. Fábio Valadão, em sua pequena empresa de Campinas, a Microdesign Informática, desenvolveu o projeto Equipamento para Previsão de Doenças Fúngicas em Vegetais, e Nilson Villa Nova, professor da Escola Superior de Agricultura Luís de Queiroz (Esalq), de Piracicaba, coordenou o trabalho que é financiado pelo Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP.
O aparelho reduz os gastos com fungicidas para até um terço do total
- o que, dependendo da cultura, equivale a até 25% dos custos de produção. Também indica o momento adequado de pulverizar a lavoura e o número de aplicações. Além de tudo, o uso do defensivo na medida certa evita excessos na contaminação das plantas, do meio ambiente, bem como da pessoa que faz a aplicação do veneno e dos consumidores do produto.
Os pesquisadores explicam que o potencial de infestação de doenças fúngicas é diretamente proporcional ao número de horas que a água fica sobre as folhas. E está sempre associado a temperaturas elevadas, e a índices altos de umidade relativa do ar e de chuvas, que contribuem para manter as plantações molhadas.
Em geral, o agricultor resolve pulverizar as plantas simplesmente porque nota que elas fi-
Painel solar mantém bateria e sensores do equipamento cam molhadas por mui-
to tempo. O equipamento, que opera como uma estação de alerta sanitário, evita essa tomada de decisão sem critério científico. Para isso, é dotado de um sistema de previsão da ocorrência de fungos numa cultura, que funciona por meio do processamento de dados meteorológicos.
Painel solar - Chamado de Equipamento de Previsão de Doenças Fúngicas (EPF System), ele tem raio de ação variável, dependendo da topo-
A arquitetura do equipamento, por meio de suas interfaces, permite que as informações dos sensores agrometeorológicos possam ser coletadas em até 30 pontos diferentes. Além da coleta ser disponibilizada por um sistema de rádio de forma automática, existe ainda uma pulseira com um botão metálico que necessita apenas ser encostado no EPF para a coleta dos dados. Depois, todas as informações são armazenadas e processadas num computador do agricultor, de onde é
Vi lia Nova e Valadão: alta precisão, custo baixo e software para cada cultura
grafia do terreno. Nas áreas planas, a amplitude de monitoração pode atingir 10 hectares. Em qualquer situação, ele dispensa a energia elétrica. O EPF é alimentado por meio de baterias de 6 volts, que são carregadas por um painel solar.
Todas as informações são coletadas pelo aparelho por meio de um conjunto de sensores acoplados a um microprocessador, que processa e indica em um visor ou por um tipo de interface de coleta (rádio ou coletores eletrônicos) a possibilidade de infestação da doença e do grau de severidade esperado. Os sensores medem as temperaturas máxima, mínima e média de um período, a umidade relativa do ar, o índice de chuvas, além da intensidade e a duração do período de molhamento foliar.
possível elaborar um relatório que serve para analisar e programar, com facilidade, os momentos mais adequados para a pulverização.
Existem no país outros equipamentos de previsão de doenças vegetais, na maioria importados. São caros - as configurações básicas custam de US$ 3 a US$ 5 mil nos países de origem e chegam ao Brasil pelo dobro -,não contam com assistência técnica aqui e sua manutenção é difícil.
"Esses aparelhos': acrescenta Valadão, "também não fornecem ao usuário comum uma informação simples e clara que o ajude a decidir, porque são destinados mais ao uso na área científica. Não possuem display gráfico e, como os dados são registrados de forma 'empilhada', exigem prévio conhecimento das grandezas monitoradas e
de seu peso no resultado final, o que dificulta o manuseio pelo agricultor."
Tecnologia nacional- Já o equipamento da Microdesign, segundo Valadão "está adaptado às condições tropicais e à realidade agrícola brasileira': Ele revela que só três componentes do equipamento- transdutor de umidade relativa (capta as informações e transforma em grandeza elétrica), pluviômetro (mede a quantidade de chuva) e caixa do abrigo do termohigrômetro (mede a umidade relativa do ar e temperatura) - são importados, porque são produzidos em escala mundial, com preços compatíveis e boa qualidade. O restante é fruto da tecnologia nacional.
A equipe da Microdesign desenvolveu os circuitos eletrônicos utilizados nos sensores do molhamento foliar e os do termohigrômetro, pois os convencionais existentes no mercado não atendiam às especificações do projeto- alta precisão, repetibilidade, confiabilidade, custo baixo e possibilidade de conexão em rede. A empresa também desenvolveu o software embutido no microprocessador (firmware), onde todos os processamentos de sinais matemáticos foram incorporados.
O equipamento está em fase de acabamento. Depois de testados os sensores e o sistema de aquisição dos dados, começaram os testes de campo. Valadão revela: "Estamos encaminhando 20 protótipos para centros de pesquisa como o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), a Esalq e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal, que farão testes de fitopatologia para verificar o desempenho do equipamento e particularmente dos sensores, para saber se há necessidade ou não de alguma modificação no modo de operação deles, para adequá-los a alguma condição mais específica, como a maneira de integração dos sinais, ou mesmo para otimizar ou tornar mais prática a aplicação de campo e, assim, aperfeiçoar o uso do aparelho".
Participação científica - Para Valadão, os convênios entre sua empresa e a
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 • 47
área científica são fundamentais para o estabelecimento dos parâmetros confiáveis nos algoritmos (conjunto de regras bem definidas para solução de problemas com número finito de etapas) de prevenção específicos para cada cultura. Isso é importante porque os algoritmos variam conforme a cultura. "No nosso projeto", acrescenta Villa Nova, "o algoritmo de alerta
estará disponível até o início de 2001. O agricultor poderá comprá-lo numa rede de revendas autorizadas, que terão técnicos treinados para instalar e fazer a manutenção. Poderá ser adquirido em operações de leasing, via Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal: o usuário paga uma prestação mensal, recebe assistência técnica e ao fim de 24 meses fica com o apare
motobomba e válvulas de controle hidráulico).
Esses aparelhos foram lançados no mercado e já estão à venda. Tratase de uma receita importante para o faturamento médio mensal de R$ 20 mil da Microdesign, uma empresa com apenas três empregados que produz e vende 12 produtos.
tem uma fórmula específica para cada cultura, que relaciona a temperatura, a umidade e dá o grau de severidade de ataque da doença. Se em determinada cultura a
" . - lho. Além disso, paga o software de cada
Fundada em 1984, a empresa concentrou-se em informática e aparelhos eletrônicos de uso agrícola. Valadão desenvolveu, por exemplo, um
planta fica molhada 20 ho-ras, por exemplo, a uma temperatura média de 18 graus centígrados, ela estará sujeita a uma infestação fúngica grave."
O equipamento na concepção atual, com quatro tipos de sensores e destinado a funcionar numa área plana, tem o seu custo estimado entre R$ 3,5 mil e R$ 4 mil (ou deUS$ 1,8 a US$ 2 mil),
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cultura, no valor de cerca de R$ 500.
O financiamento da FAPESP já foi empregado no desenvolvimento da
Sensor de molhamento de folhas, à esquerda, e o termohigrômetro que mede a umidade relativa do ar e a temperatura ambiente
•
sistema de automação, por controle remoto, de pivôs centrais de irrigação e um sensor para monitoramento de passagem de grãos em plantadeiras, com o qual conquistou o Prêmio Governador do Estado no 18° Concurso Nacional do Invento Brasileiro, em 1990. Em 1994, um produtor de tomate lhe falou dos problemas que tinha com a pulverização da plantação e queixou-se de gastar muito dinheiro com veneno, muitas vezes, desperdiçado quanto aplicado antes das chuvas. Então o enge-
nheiro começou a pesqm-
pode monitorar 10 hectares e ser usado para qualquer cultura, desde que configurado com o software correspondente. A forma de leitura das informações também vai influir no preço do aparelho. A simples visualização das informações no visor do equipamento ou a captação por meio da pulseira com botão vai deixar o EPF System mais barato. Já com a adaptação para um sistema de radiotransmissor, que leva as informações diretamente ao computador do agricultor, haverá um aumento de R$ 2,5 mil nos custos.
mecânica, na compra de instrumentos de laboratório e na montagem dos protótipos que vão para os centros de pesquisa, onde devem ficar em testes por seis meses. Esses centros receberão royalties pelo trabalho que levar ao aperfeiçoamento das soluções necessárias para cada cultura.
sar seu novo invento. •
O equipamento processa e prepara as informações agrometeorológicas, faz os cálculos baseados nos algoritmos instalados e responde se haverá ou não ocorrência de doenças, bem como o grau de severidade da infestação. A partir daí, o agricultor calcula a dosagem da pulverização, conforme critérios definidos por um fitopatologista.
Valadão pretende patentear o equipamento antifungo e calcula que ele
48 • AGOITO DE 1000 • PESQUISA FAPESP
Subprodutos - O projeto não se esgotou no equipamento para previsão de doenças fúngicas: teve como subprodutos uma série de aparelhos controladores para serem usados em estufas, ambientes internos, filtros de lavagem (retrolavagem e lavagem em irrigação localizada), mesas-balanças de viveiros (indicam os períodos corretos de irrigação) e conjuntos bomba-válvula (permitem sincronizar
PERFIS:
• NILSON AUGUSTO VILLA NOVA, 67 anos, é engenheiro agrônomo formado na Esalq, de Piracicaba, onde também fez doutorado em Agrometeorologia. É professor associado da Universidade de São Paulo (USP) na Esalq. • FABIO TAVEIRA VALADÃO, 47 anos, formou-se em Engenheira Eletrônica e de Telecomunicações na Faculdade de Engenharia Elétrica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ). Projeto: Equipamento para Previsão de Doenças Fúngicas em Vegetais Investimento: R$98.277,20
TECNOLOGIA
, __ -. LINHA DE. R_RODUÇî
Pixy: baixa altitude com câmaras fotográficas e de vídeo
Instrumento alado é útil em pesquisas
Um pequeno avião sem piloto e guiado por radiocontrole pode ser o novo objeto de desejo de alguns pesquisadores. Principalmente, aqueles de áreas que necessitem de sensoriamento a baixa altitude como agronomia, geologia, pedologia, hidrologia e geografia. Esse artefato voador capaz de carregar câmaras fotográficas e de vídeos foi desenvolvido na França numa cooperação entre o Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD), Escola Superior de Engenharia de Construções Aeronáuticas (Ensica) e a empresa ABS Aérolight, que já está produzindo o aparelho. Com o nome de Pixy, o avião voa entre 15 e 30 km/h e também está indicado para localizar sítios arqueológicos, acompanhar fenômenos como inundações, desmoronamentos e ajudar na vigilância de
áreas expostas a riscos de poluição. É portátil e pesa seis quilos. •
Teste detecta soja transgênica
Como saber se um produto é ou não transgênico? Essa dúvida já pode ser elucidada por um teste desenvolvido no Brasil, capaz de detectar se um grão ou um subproduto de soja têm modificações genéticas. O teste, que possui similares somente fora do país, foi criado por pesquisadores do Instituto de Biotecnologia Aplicada à Agro pecuária (Bioagro) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais. A coordenação foi dos professores Maurílio Alves Moreira e Everaldo Gonçalves de Barros. A pesquisa identificou o gene de uma bactéria resistente ao herbicida glifosato que foi incorporado ao código genético da planta de soja. "Hoje, po-
demos identificar o DNA de qualquer material transgênico existente em outras espécies vegetais, como o milho", informa Moreira . Diversas empresas estão procurando a Agrogenética, empresa criada pelos professores na incubadora da UFV para comercializar a aplicação do teste. Embora a soja transgênica continue proibida no Brasil, a vigilância sobre esse produto é severa. "Empresas que exportam, principalmente para a Europa, nos procuram em busca de um laudo comprovando a negatividade transgênica." Entre elas está uma que coleta amostras de navios de vários portos do País. O índice geral de detecção de soja modificada não chega a 10%. "São amostras de soja coletadas no porto de Rio Grande (RS), com produtos argentinos ou paraguaios", esclarece Moreira. Grandes empresas como Carrefour, Nutrimental e Seara também pedem análises de matéria-prima de seus produtos e da ração que alimenta os animais comercializados por elas. •
Soja: como tirar a dúvida
Computador fala bem em português
Escutar uma mensagem enviada por e-mail em português fluente, falado de forma natural, é a alternativa que está prestes a ser concretizada em qualquer computador instalado no País. Um projeto de pesquisa que leva o nome de "Síntese de Fala para a Língua Portuguesa" está em fase final de desenvolvimento no Laboratório de Instrumentação Eletrônica (Linse), do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atualmente, existem softwares "falantes" em outras línguas, como inglês, francês e espanhol, mas faltava um em língua portuguesa. "O sotaque será o padrão do Rio de Janeiro, não o popular, mas o falado por locutores de noticiosos da TV e do rádio, por exemplo", explica Rui Seara, coordenador do projeto. Além de fazer a conversão do texto de um e-mail para a fala, o software poderá ser aplicado ao ensino da língua portuguesa, no auxílio à comunicação de deficientes e no uso em diversas aplicações na área de telecomunicações. "Na elaboração desse sistema estão envolvidas a identificação do tipo de palavra, se substantivo, adjetivo, etc., e a sintaxe (disposição das palavras nas frases), resultando num falar mais natural que nos softwares existentes." A pesquisa recebeu cerca de R$ 200 mil de financiamento da Digitro Tecnologia, empresa catarinense do ramo de telecomunicações. •
PESQUISA FAPESP · AGOSTO DE 2000 49
HUMANIDADES
ECONOMIA
Uma indústria que já teve remédio Setor farmacêutico nacional nasceu forte e teve o apoio do Estado
Era uma "criança" forte e com tudo para ser um grande brasilei
ro. Mas algo ocorreu para deixá-la à mercê de seus colegas estrangeiros. Para entender essa mudança, é preciso conhecer a sua história. É o que propõe a professora Maria Alice Rosa Ribeiro em Estado e Indústria Farmacêutica: Ciência, Tecnologia e a Indústria Farmacêutica no Brasil 1890-1950, pesquisa sobre o nascimento da indústria farmacêutica nacional que traz dados pouco conhecidos sobre os primórdios de um dos setores econômicos que mais influência tem sobre o cotidiano dos brasileiros. O estudo, por exemplo, revela a existência de empresas de sucesso logo no primeiro momento de seu surgimento, como o Instituto Pinheiros e o Laboratório Paulista de Biologia. "Essas empresas, constituídas com capital nacional, foram capazes de desenvolver pesquisas e produzir conforme critérios de qualidade rigorosos': afirma a pesquisadora
O estudo também mostra que a participação do Estado (que incentivou e forneceu recursos para alguns dos primeiros laboratórios farmacêuticos) na implantação do setor foi fundamental para a criação de uma massa crítica de cientistas brasileiros. O trabalho desses homens - levando-se em conta a crescente urbanização ocorrida a partir do final do século 19 e suas implicações- está associado tanto ao desenvolvimento de planos de saúde pública como ao trabalho em laboratório e, finalmente, na produção de soros, vacinas e medicamentos feita por empresas pioneiras em um país que entraria tardiamente no sistema capitalista.
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Ao trabalhar com apoio da FAPESP, de quem recebeu R$ 8 mil como auxílio à pesquisa, Maria Alice verificou que essa indústria (que se fortaleceu no início deste século) reunia os recursos necessários para a execução do seu trabalho - como boas instalações, equipamentos adequados e profissionais capacitados- e também as condições que levariam ao crescimento desse setor em nível nacional, o que não ocorreu devido a mudanças de rumo ditadas pela adoção de medidas e planos econômicos - como o Plano de Metas JK - que abriram as portas ao capital estrangeiro, estimulando a implantação de indústrias vindas de outros países e com as quais a indústria nacional não podia concorrer.
Para Maria Alice, que é
tal nacional fundada por médicos treinados por cientistas ligados ao Instituto Butantan, de São Paulo. O lP, que estabeleceu intercâmbios e contratos com cientistas ligados a instituições públicas de pesquisa, adquiriu proje-
professora do Departamento de Economia da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista (Unesp ), "a história dessa indústria no Bra-
Maria Alice: nacionalização das empresas perdeu fo rça
com JK
sil guarda forte relação com a instituição da saúde pública, das práticas sani-tárias de prevenção e combate a doenças infec-ciosas e, em especial, com as instituições de pesquisa básica e aplicada, criadas com a organização do Serviço Sanitário de São Paulo, tais como o Instituto Biológico, que respondia pela defesa sanitária da agropecuária, ligado à Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo".
Ao apontar a construção da rede de relações entre instituições públicas criadas no âmbito da saúde pública e a formação da indústria farmacêutica nacional, a economista destaca o Instituto Pinheiros -Produtos Terapêuticos SA. (lP), criado em 1928, uma empresa privada de capi-
ção nacional e tornou-se o maior produtora de antitoxinas e vacinas (respondia por 80% do abastecimento nacional), podendo competir com Manguinhos e o próprio Butantan.
Outra empresa destacada e já estudada por ela é o Laboratório Paulista de Biologia (LPB), fundado em 1912 por ex-funcionários do Instituto Pasteur, cuja ascensão foi rápida justamente porque contava com profissionais de reconhecida competência. Na fundação do LPB, o principal nome é o do médico Ulisses Paranhos, que, ao lado de dois técnicos de alto nível -Valentim Giolito e Rodolfo Pasqualin
- foi capaz de dar o ponto de partida para um projeto ambicioso que englobava vários produtos, entre eles soros antidiftéricos e antitíficos, soro antigangrenoso e antitetânico e, depois, uma variada gama de medicamentos, imunizantes, soros e vacinas e extra tos orgânicos terapêuticos ( ototerápicos).
Saúde pública - A pesquisadora faz um cruzamento entre a história social (saúde pública, práticas terapêuticas,
O que veio mudar essa realidade foi a expansão cafeeira para o oeste paulista, criadora de novas necessidades, o que deu início a um trabalho que incluía instituições de pesquisa e a definição de uma política de saúde pública. O combate às doenças infecciosas incluía, então, ações de isolamento, vacinação e desinfecção. Para isso, o Serviço Geral de Desinfecções utilizava grandes volumes de substâncias químicas para higienizar portos,
foi o de produção de anilinas vegetais, óleos e ceras, óleos essenciais e medicamentos nativos. Nas últimas décadas do século 19, novas descobertas, como a síntese orgânica, feita em empresas estrangeiras, levaram à diminuição da produção de artigos químicos brasileiros com base em vegetais.
Já a fabricação de produtos derivados de minerais, por depender de maior complexidade tecnológica e matérias-primas importadas (enxo
fre, nitratos, cloro, etc.), começou mais tarde. É verdade que os ácidos comerciais (sulfúrico, clorídrico e nítrico) começaram a ser elaborados em 1895 pelo Luiz de Queiroz & Cia (mais tarde, Elekeiroz S.A.), mas a empresa sempre dependeu de importação. Com a Primeira Guerra, que escasseou a importação da soda cáustica, foi preciso partir para a fabricação do produto, o que foi feito pela Companhia Brasileira de Produtos Químicos, do Rio, a partir de 1921.
Theodore Roosevelt no Butantan, em 1915: know how dos pesquisadores a serviço de empresas
Micróbios e vacinas- A mudança em relação às medidas de saúde pública e desinfecções ocorreu no final dos anos 20, devido aos avanços no campo epidemiológico. Os cientistas des-
formação de uma elite científica) e a história econômica (formação da indústria farmacêutica privada, origem dos empresários e técnicos e do desenvolvimento científico e tecnológico). É preciso, então, voltar ao período anterior a 1892, quando começou a ser estruturado o Serviço Sanitário de São Paulo. Naqueles idos, as medidas sanitaristas eram episódicas, sempre com vistas ao combate de epidemias que surgiam em cidades portuárias como Recife, Salvador e Santos, além do Rio de Janeiro, especialmente, onde estava a capital do Império e depois capital da República.
cortiços, a Hospedaria dos Imigrantes, em geral espaços urbanos deteriorados com moradias baratas e moradores pobres. Utilizava-se toda uma variedade de químicos (entre eles sulfato de cobre, cloreto de cal, ácido sulfúrico, cresol, permanganato de potássio, etc.), importados em grande volumes da Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos.
Indústria brasileira - O pequeno parque industrial químico brasileiro estava relacionado aos recursos naturais - vegetais, minerais e animais. O primeiro segmento a se formar aqui
cobriram que os canais de transmissão das doenças eram mais complexos do que se acreditava até ali. Maria Alice cita (conforme o livro Manguinhos do Sonho à Vida, de Jaime Benchimol): "Os novos conhecimentos sobre o comportamento dos micróbios patogênicos reduziram a importância das antigas noções da bacteriologia pasteuriana sobre o perigo do ar e contágio das doenças( ... ) uma nova concepção arquitetônica substituiu a lógica da organização hospitalar ( ... ) por meio da construção de hospitais pavilhonares .... " Noção presente, por exemplo, no Hospital de Isolamento de São Paulo
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(Emílio Ribas), onde cada pavilhão era específico para cada doença - febre amarela, tifóide, escarlatina, etc.
O Instituto Vacinogênico (de 1802) e o Butantan (criado em 1899, em função de uma epidemia de peste na cidade de Santos) foram as primeiras instituições encarregadas de fabricar produtos biológicos em São Paulo. O primeiro voltava-se à produção de vacina contra varíola, e o segundo ao soro contra a peste, e, mais tarde, às vacinas e soros contra mordida de cobras, aranhas e escorpiões.
"Uma peculiaridade foi que os institutos públicos de pesquisa pertencentes ao Serviço Sanitário foram criados como instituições independentes, antes mesmo da instalação do ensino médico. No caso de São Paulo, o Butantan, o Bacteriológico (em 1892) e o Biológico (em 1927, este ligado à defesa sanitária da agricultura e pecuária) foram responsáveis pela difusão dos conhecimentos da microbiologia e pela revolução no campo da Medicina", afirma Maria Alice.
nio Teixeira afirmam que a produção nacional de medicamentos aumentara no pós Primeira Guerra, com a transferência de pesquisadores da instituições públicas para empresas privadas. "Cientistas das instituições públicas, que detinham o saber-fazer, passaram a ter interesse no estabelecimento de empresas ou no trabalho realizado na iniciativa privada" fala a professora. "O know-how adquirido pelos profissionais seria posto a ser-
Vital Brazil é um dos nomes de peso em saúde pública. Ele, que em 1901 produziu as primeiras doses de soro antiofídico, descobriu as proprie
Vital Brazil (ao centro) no Instituto Bacteriológico, em 1898: um dos defensores da saúde pública •
dades dos soros - ou melhor, que para cada tipo de cobra havia um soro específico para neutralizar seu veneno. "Nos anos 20, ao mesmo tempo em que surgia a BCG, o Butantan passou a produzir em larga escala a vacina contra a febre tifóide. Na próxima década, ao lado da organização mais racional na produção de vacinas antivariólicas, o Butantan atravessou uma séria crise institucional. Tal situação se estendeu até meados dos anos 50, mas já em 48 o governo limitou sua atuação à preparação de produtos de defesa sanitária e à pesquisa de animais peçonhentas", revela a pesquisadora.
Estudos de pesquisadores como Jaime Larry Benchimol e Luiz Anto-
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viço de interesses mercantis", completa. O próprio Vital Brazil, ao deixar o Butantan, devido à discordância com a orientação de Arthur Leiva na direção do Serviço Sanitário, foi para Niterói e instalou o Instituto Vital Brazil. E o próprio Laboratório Paulista foi criado por profissionais que vieram de institutos.
Pesquisa e produção -A pesquisadora recorre aos estudos de Wilson Roberto Gambeta, de 1982, para mostrar os laços entre instituições de pesquisa e produção de imunológicos e o estabelecimento de uma produção nos moldes capitalistas. "O Pasteur, fundado por médicos, membros da elite paulista, comerciantes,
banqueiros e industriais (e que contava com ajuda financeira do Estado), contribuiu para o desenvolvimento da tecnologia necessária ao fabrico de medicamentos com base científica; introduziu a farmacologia bacteriana complementando a galênica e estimulou a divulgação de industrialização de medicamentos", diz a pesquisadora.
Para desenvolver seu trabalho, Maria Alice recorreu a arquivos, depoimentos de ex-funcionários e parentes de proprietários das antigas empresas. Descobriu que o Laboratório Paulista teve uma vida de sucesso. A empresa cresceu, diversificou sua produção, ampliou suas instalações (em 1919, tinha dois laboratórios, uma fazenda de criação de animais e uma ftlial no Rio de Janeiro). Além disso, manteve-se atualizado cientificamente, contratou novos profissionais, brasileiros e estrangeiros, e entrou no segmento das exportações. Em 1936, com 147 funcionários, inaugurou uma sede nova na Avenida São Luís. Parte do sucesso de sua trajetória pode ser atribuída, segundo análise de Gambeta, às "facilidades" da época. "O segredo industrial e o protecionismo das patentes não eram práticas correntes, de modo que o avanço da farmacologia era possível a todos através da bibliografia de domínio público", diz.
De acordo com a pesquisa, o crescimento da empresa foi constante, passando pela Segunda Guerra e os dourados anos 50. "Nos 60 vieram as primeiras dificuldades, pois as grandes empresas estrangeiras assumiram a liderança do mercado, o governo passou a admitir o protecionismo das patentes industriais, concederam-se incentivos a investidores estrangeiros e houve a sofisticação crescente dos processos de produção dos modernos antibióticos."
Logo, o LPB estava exposto à concorrência muito mais acirrada do que em outros segmentos do mercado farmacêutico. "O grau de obsoletismo de sua linha de produtos era imenso, pois mais rápida era a inova-
ção no segmento, quando em 1966 foi comprado pelo Instituto Pinheiros': conta Maria Alice. E o Instituto Pinheiros era, a essa altura, o maior laboratório nacional. Um caminho estava aberto, conforme divulgou a direção do lP, "para se manter a indústria farmacêutica nacional, por meio da formação de um pool de recursos materiais e humanos': Seis anos depois, o lP não resistiu ao assédio e à concorrência dos estrangeiros e foi vendido à americana Sintex do Brasil. "Tal situação, somada ao problema de sucessão, que não pode ser desprezado", como lembra a economista, "levaram ao desaparecimento de várias empresas nacionais do setor."
Com o trabalho em andamento, Maria Alice irá complementar entrevistas e buscar o mais difícil. "São os dados relativos à administração, à parte econômica das empresas, papéis que, por falta de tradição, poucas famílias preservaram", diz a economista. Em sua pauta está, também, levantar o histórico de mais dois laboratórios: o Laboratório Torres, onde trabalhou o cientista Otto Bier, e o Laborterápica, que foi comprado pela Bristol de São Paulo. •
PERFIL:
• MARIA ALICE ROSA RIBEIRO é graduada em Ciências Econômicas pela Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS e tem 48 anos. É mestre em História pela Unicamp, doutora em Economia pela Unicamp, tem pós-doutorado pela Universidade de Londres (com a pesquisa Indústria e Mercado de Trabalho. São Paulo, 1914-1945) e foi residente na Chemical Heritage Foundation, CHF, com uma pesquisa sobre a formação e o desenvolvimento da indústria farmacêutica. É professora da Unesp nos programas de pósgraduação em níveis de mestrado e doutorado. Projeto: Estado e Indústria Farmacêutica: Ciência, Tecnologia e a Indústria Farmacêutica no Brasil1890-1950 Investimento: R$ 8.056,00
HUMANIDADES
ARTES PLÁSTICAS
Que história é essa? Pesquisa pretende elaborar uma história crítica da arte brasileira
A tese de doutorado da crítica de arte Sonia Salzstein Gold
berg, A Questão Moderna: Impasses e Perspectivas da Arte Brasileira, 1910/
1950, procura constituir uma perspectiva teórica com o objetivo de elaborar uma história crítica da arte brasileira. Orientanda da filósofa Marilena Chauí, Sonia iniciou o trabalho em 1994 (recebeu bolsa da FAPESP durante 36 meses), terminou em maio e deve apresentá-lo em novembro ao Departamento de Filosofia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
Desde que se formou em Artes Plásticas pela Escola de Comunica
ções e Artes (ECA-USP), em 1977, as inquietações de Sonia, que também estudou Filosofia na mesma universidade, recaem na problemáti-
ca da arte contemporâ-nea, tanto pelo aspecto his
tórico, quanto no da sua divulgação e organização. Em Arte, Instituição e Mo-
dernização Cultural no Brasil! Uma Experiência Institucional, dissertação de mestrado também orientada por Ma-
rilena Chauí (e que ela apresentou no Departamento de Filosofia, da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas da USP, em 1994), So
nia discutiu a possibilidade de a arte brasileira irradiar-se
por um espaço público com uma presença mais inos1va na vida cultural brasileira.
Além disso, a pesquisadora partiu para a prática, organizando um bem-sucedido espaço de arte contemporânea no Centro Cultu-
ral São Paulo (CCSP), no qual in-
Obra de Aleijadinho: realização poét ica de autonomia co lonial
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centivou a mostra de obras dos chamados artistas emergentes. Foi a partir dessa experiência- e de curadarias de exposições e na Bienal Internacional de Arte de São Paulo em 1987 - que a pesquisadora pôde constatar uma carência de material crítico e teórico para a compreensão da arte brasileira.
~
"Nós ainda não temos uma história da arte moderna brasileira, apesar de sua internacionalização nas últimas três décadas", afirma Sonia. Segundo ela, foi apenas a partir do início dos anos 70 que começaram a surgir com mais regularidade trabalhos sobre o modernismo brasileiro. E cita como exemplos obras como Artes Plásticas na Semana de 22, de Aracy Amaral (Perspectiva, 1972), e De Anita ao Museu, de Paulo Mendes de Almeida (Perspectiva, 1976), entre outras. "Do ponto de vista do enraizamento da arte na vida social, no entanto, o material existente ainda é escasso e o lugar que as artes plásticas passaram a ocupar não redundou no reforço das instituições", avalia Sonia. As iniciativas nesse sentido, de acordo com ela, são pontuais e não revertem em ações sistemáticas a longo prazo, capazes de fazer deslanchar a história da arte brasileira.
~ . :I:
i< ~ ;:
~ " Contradições - O problema gerado ~
por essa carência funciona como fio ~ d d d ~ con utor e A Questão Mo erna: 6
Impasses e Perspectivas da Arte Bra- u
sileira, 1910/1950. A tese procura, assim, contribuir para o preenchimento dessa lacuna e para "despertar a discussão em torno das contradições na produção artística contemporânea no país", como explica a pesquisadora.
Em um primeiro momento, Sonia pensou em orientar sua tese ligando a produção artística da primeira metade do século 21 ao barroco mineiro, do século 18, e mais precisamente à obra de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. "Isso me interessava muito, porque assinalaria geneticamente a possibilidade de pensar
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em uma história da arte brasileira", diz. Em sua opi-
nião, a obra de Aleijadinho é um caso exemplar de realização poética e formal da autonomia colonial. Filho de mãe negra, pai português e de classe não abastada, o artista mulato, para Sonia, é a representação da visualidade autóctone. "Isso me permitiria partir do objeto, o Aleijadinho, para o moderno", conta ela. "Por fim, isso me pareceu uma idéia pretensiosa que redundaria em uma espécie de mosaico superficial da história da arte brasileira."
Sonia optou, então, por se debruçar exclusivamente sobre o período entre 1910 e 1950. Para ela, esse foi o momento que assinalou um profundo processo de renovação formal. "Mais genericamente, da renovação dos temas e motivações do debate cultural no país", observa. "Afinal, foi nessas quatro décadas que a produção artística brasileira começou a ganhar autonomia frente às matrizes culturais que se fixaram como paradigmas importantes no curso de toda a sua formação."
Sonia explica que, mais do que discutir as realizações das gerações inaugurais de nossa arte moderna, o trabalho trata das soluções formais híbridas e contraditórias que uma aspiração ao moderno emancipado produziu nas obras dessas gerações, conferindo-lhes, em suas palavras, "uma pátina inescapavelmente ideológica." Para ela, tal aspiração foi a tônica da produção artística em toda esta primeira metade do nosso século. Nesse contexto, Sonia procurou analisar as contradições que isso suscitou no ambiente cultural brasileiro, durante aquele período, e as formações ideológicas que se detectam na análise do interior das obras produzidas por artistas como Tarsila do Amaral, Di Cavalcanti, Portinari, Guignard e, mais tarde, Mira Schendel.
Mira Schendel: trajetória solitária em busca da fo rma
"Ao ligar-se ao processo de busca da emancipação cultural, a idéia do moderno na arte brasileira marcou, naquele período, a pulsação dessa busca", ressalta. "Isso se manifesta por lados luminosos e renovadores, mas também com momentos regressivos", observa Sonia. Ela ainda constatou que a irregularidade nas obras de arte produzidas no país ocorreu, sobretudo, entre a década de 10 e o fim dos anos 40. "As obras conciliam facetas transformadoras com algum retorno a cânones acadêmicos", explica. A sua crítica apon-
ta, assim, a vinculação orgamca dessas contradições e formações ideológicas a um ambiente cultural formado numa dinâmica de dependência e submetido a embates com ondas cíclicas da modernização.
A ideologia na obra - Esse processo de modernização cultural, segundo Sonia, não se desassocia do processo de modernização do país. Ela assegura, porém, que, apesar da perspectiva histórica, toda a sua análise centrou-se na busca dessas nuances
nas obras, estritamente do ponto de vista formal. Por tudo isso, nas cerca de 200 páginas da tese - divididas em 12 capítulos e extensa bibliografia -, Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti ganharam, cada um, capítulos à parte. Assim como a tríade Tarsila/Di/Portinari ganhou texto em que Sonia analisa e critica a imagem consagratória e celebratória que se formou em torno desses artistas. Ela ressalta que o primeiro estudo crítico dessa ideologia da arte moderna brasileira foi feito por Carlos Zílio em A Querela do Brasil, A
Questão da Identidade da Arte Brasileira - a Obra de Tarsila, Di Cavalcanti e Portinari/1922-1945 (Funarte, 1982, 1" edição).
"A tese busca revisitar a idéia do moderno e olhar o que há de construção ideológica dentro da própria obra, porque essa ideologia, de certa forma, colocou uma camisa-de-força na produção artística", conta a autora. Seu trabalho revela, ainda, que se em um primeiro momento o processo de modernização aparecia de forma incipiente nas obras de Tarsi-
Guignard e Sonia Goldberg: contradição
la do Amaral ou de Guignard, próximo à década de 50 ele desabrochou na produção desses artistas. Finalmente, a tese desemboca na contribuição que esse amadurecimento da idéia moderna original deu à produção neoconcreta do final da década de 50 e em obras como as da artista Mira Schendel.
Nesse sentido, a crítica de arte observa que a produção artística dos anos 50 percorre uma trajetória solitária, por um lado - pelas mãos de artistas como Volpi ou Mira e, mais tarde, Sérgio Camargo -, e em gru-
pos como os cariocas do neoconcretismo. "A década de 50 presenciou a plenitude da experiência moderna e ao mesmo tempo seu estilhaçamenta ou desfibramento", conta Sonia. Assim, para ela, a produção artística naquele período abriu o horizonte dos problemas artísticos contemporâneos.
Nos últimos capítulos de seu trabalho, Sonia trata do ambiente artístico brasileiro contemporâneo. "A tese mostra que, graças a tal experiência heterodoxa da forma, a arte brasileira pôde, em geral, demonstrar consistência e originalidade em face do fenômeno recente da
globalização", explica. "O fenômeno que marca a integração da
arte brasileira ao meio artís-tico internacional é analisa
do como espécie de culminação e esgotamento da potência renovadora que o movimento modernis-ta teve desde os anos 20, e fulcro dos novos desafios que se apresentam
à produção e refle-xão de arte no país",
~ conclui. • ~ § :! PERFIL: L? i'
• SONIA SALZSTEIN
GOLDBERG é crítica de arte formada na Esco-
la de Comunicações e Artes (ECA) da Univer-
sidade de São Paulo, com mestrado em Filosofia na USP, onde faz o doutorado. Iniciou sua vida profissional em 1976, no Idart - Informação e Documentação Artística, da Secretaria Municipal da Cultura. Foi diretora da divisão científica do Museu de Arte Contemporânea (MAC) de São Paulo. Organizou o espaço de arte contemporânea no Centro Cultural São Paulo, da Secretaria Municipal da Cultura. Projeto: A Questão Moderna: Impasses e Perspectivas da Arte Brasileira, 1910/1950
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JOSÉ JOBSON DE ANDRADE ARRUDA
Herdeiros das confrarias Livro refaz a trajetória do jacobinismo até os dias atuais
lacobinos e jacobinismo (EDUSC/FAPESP) é um texto para iniciados, apesar do reduzido número de páginas. Destina-se a leitores en-
o hados com a gramática das revoluções e a sintaxe dos radicalismos políticos. E é o fruto maduro de incomparável historiador, um dos pioneiros na travessia da ponte entre a história de fundamentação marxista e a nova história das mentalidades, no cenário da história da cultura, cujo ímpeto se redobra nos anos 70.
Sem abandonar a temática das conspirações, revoluções, contrarevoluções, Michel Vovelle adentra o campo do imaginário, das atitudes diante da morte, buscando uma síntese própria em que análise e descrição se entremeiam, em que técnicas e métodos são refinados na tensão da pesquisa concreta. Inscrita na longa duração, indispensável à percepção das inflexões no plano das sensibilidades coletivas, a atitude das populações provençais diante da morte revela a laicização dos procedimentos fúnebres, inserindo-se no vasto campo da descristianização. Seu estudo clássico, Ideologias e Mentalidades, publicado em 1986, consagra a reflexão teórica sobre esse procedimento metodológico.
É este historiador referencial que incursiona agora por um tema nevrálgico da história propriamente política: a ação das sociedades políticas, o jacobinismo histórico e transhistórico, levando-nos a uma viagem que parte do decênio revolucionário até os dias atuais. Quem foram os jacobinos? Qual foi a sua herança? Quem foram seus herdeiros? São questões que busca responder numa trajetória que recusa a hipótese de pensar o jacobinismo como uma bolha radical na história, um acidente, retraçando suas origens até as "redes de confrarias de devoção", profanas ou devotas, das quais é tributário singular. Percorre a diás-
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pora ecumênica do jacobinismo, suas múltiplas filiações e configurações, ancorando-as em suportes sociais concretos baseados em acuradas elaborações estatísticas, até os mais remotos confins, onde se encontrariam os filhos perdidos da aventura revolucionária, a exemplo dos alfaiates da Bahia, em 1798.
Partindo da noção de "máquina política", construída por Michelet, estabelece os fluxos e refluxos das visões e contravisões a partir da
história, da historiografia, da mídia e da literatura, especialmente a romanesca, com sua poderosa carga de representação simbólica coletiva. O rejuvenescimento do jacobinismo no século 20, atrelado à revolução socialista em sua identificação com o bolchevismo, só tem paralelo na desconstrução empreendida no contexto da crise do socialismo, especialmente por historiadores que foram outrora co-
. munistas, como François Furet, membro ativo da célula Saint-Just da Sorbone. A trajetória de políticos franceses recentes que não recusam a herança jacobina, co-mo Jean-Pierre Chevenement,
completa o quadro de sua análise. Persistências longínquas do jacobinismo surgem na coincidência entre franceses que disseram não a Maastricht e os locais onde preponderavam os clubes jacobinos.
Por que voltar ao tema do jacobinismo? O que mudou, desde sua morte anunciada nos anos 80? O que traz o tema de volta? Seria a indignação frente à mesmice da história aplastada pela avassaladora hegemonia norte-americana? Só a leitura desta obra inquietante responderá.
]OSÉ ]OBSON DE ANDRADE ARRUDA -Historiador, é professor do Departamento de História da FFLCH da USP.
LANÇAMENTOS
Isaac Newton
O subtítulo desta biografia (lançamento da Editora Record) do cientista inglês, escrita pelo jornalista Michael White, dá a pista para a novidade que ela traz: "O último feiticeiro". Sim, o profeta da razão, mostra o estudo, teria extraído boa parte da inspiração para suas grandes descobertas
científicas de um intenso interesse pela alquimia: dos três milhões de palavras escritas pelo gênio da Física, um milhão delas trata dessa "ciência" esotérica. O livro dá uma imagem inusitada de Newton, um homem obsessivo, neurastênico, inseguro e que perseguia, com ódio exacerbado, os seus rivais.
Um Olhar sobre o Passado
Organizado por Silvia Figueirôa, editado pela Unicamp em parceria com a Imprensa Oficial, este livro quer ser uma "História das Ciências na América Latina". É uma coletânea de textos que tentam entender como foi o desenvolvimento científico nos vários países e de como se deu
a transferência e a posterior adaptação do conhecimento importado no contexto cultural e social da América Latina, tão diverso da fonte original. Para tanto, foram convidados a participar do projeto, feito em conjunto com a Universidade de Rostock, na Alemanha, historiadores do Brasil, México, Chile, Argentina, entre outros.
MAP ÊNCIA 11
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Mapa da Violência 11
Escrito por Jacobo Waiselfisz, este estudo, editado em conjunto pela Unesco,Instituto Ayrton Senna e pelo Ministério da Justiça, trata especificamente dos jovens do Brasil. Com dados atuais, a obra mostra como a violência, tão presente no dia-a-dia nacional, vem afetando a nossa juventude.
O Mapa da Violência II traz dados sobre como morrem os jovens e como essas mortes são causadas pela violência do cotidiano. Os números assustam: 41,8% das mortes juvenis se ligam a homicídios e outras violências. Assim, uma em cada duas mortes de jovens em regiões metropolitanas se deve a esses fatores.
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REVISTAS
Revista de
Antropologia
Revista de Antropologia
Neste que é o volume 43 da revista do Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo Klaas Woortmann analisa o tema da alteridade, do outro, entre os gregos, partindo do conceito do "selvagem", o estrangeiro. Cristina Adams
mostra como as populações caiçaras podem ser vítimas de admiradores excessivos que tendem a deformar a sua real natureza e a sua riqueza cultural. João da! Poz discute a crônica de uma morte anunciada: o suicídio entre os índios Sorowaha. E Aloisio Cabalzar fala sobre a descendência e aliança no espaço tiyuka.
UNB Revista
Na edição especial do informativo da Universidade de Brasília ( cuj'a bela capa traz uma foto de Sebastião Salgado), o destaque é, claro, para o trabalho educativo do professor Anísio Teixeira, cujo nascimento é lembrado
neste ano. Outros tempos, a atualidade traz em questão o problemas das verbas nas universidades, tema do artigo "Uni~rsidade Estrangulada". Menos dramático, "Cordon Bleu à Moda da Casa" conta como o campus de Brasília vai ganhar em sabor com a instalação da célebre escola culinária francesa.
ENGENHARIA·-·--· Engenharia Agrícola AGRÍCOLA
A revista da Sociedade Brasileira de Engenharia Agrícola, de Jaboticabal, chega ao seu número 18. Entre os vários artigos científicos desta edição: "Fatores críticos no sistema de produção da cana-de-açúcar", "Comparação entre três
métodos de estimativa de resistência da cobertura vegetal para a determinação de estresse hídrico em cultura de soja", "Simetria de microbacias de primeira ordem de magnitude na região de Ilha Solteira", "Avaliação do regime de vazão continuamente reduzido em irrigação por sulcos", entre outros.
PESQUISA FAPESP • AGOSTO OE 1000 • 57
E FINA í.S
MIADAIRA
58 • AGOSTO DE 2000 • PESQUISA FAPESP
ESPECIAL
-PENSANDO SAO PAULO Universidades e Institutos
Reitores e diretores mostram como suas instituições se preparam para os desafios do século 21
Aniversidades e os institutos de squisa estão conscientes de
que seu papel é muito importante para que São Paulo e o Brasil superem seus proble
mas e consigam, no século 21, sociedades mais justas. Esta é a conclusão geral de uma série de palestras nas quais reitores de universidades e diretores de institutos apresentaram suas visões para o futuro, em mais uma fase do Fórum São Paulo Século 21, promovido pela Assembléia Legislativa do Estado. Resumos dessas conferências aparecem neste encarte da revista Pesquisa FAPESP.
Durante dois dias no mês de março, reitores e diretores apresentaram suas idéias, seus problemas e, também, suas vitórias. Cláudio Rodrigues, do Ipen, por exemplo, mostrou dados que indicam o sucesso da incubadora de empresas montada no câmpus da USP; Hermano Tavares, da Unicamp, contou como o país montou o melhor
PESQUISA FAPESP
sistema de pós-graduação do Terceiro Mundo, e Alberto Duque Portugal, da Embrapa, lembrou que o Brasil, hoje, é o maior detentor de tecnologia agropecuária tropical e subtropical do mundo.
Os problemas, porém, não foram escondidos. "O Instituto acumula dívidas no mercado': lembrou Plínio Assmann, do
IPT. Sidney Storch Dutra, da Universidade de Santo Amaro, comparou o Brasil a uma saci, que p).lla com uma perna só, produzindo conhecimentos científicos, mas poucas patentes. "As tecnologias de que o mundo tropical precisa não chegam pela Internet nem por satélite", destacou o presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos, Nelson Raimundo Braga.
O presente encarte inclui um texto especialmente preparado pelo deputado Carlos Zarattini, coordenador do grupo de Ciência, Tecnologia e Comunicações do Fórum. Nele, ele expõe suas idéias sobre a situação dessa área no estado.
Transfortnar o conhecitnento etn políticas públicas
O deputado estadual Carlos Zarattini é o coordenador das áreas de Ciência, Tecnologia
e Comunicação do Fórum São Paulo Século 21, organizado pela Assembléia Legislativa do Estado. Preparou cuidadosamente
;::::::====::::;:;::;~=::::~- z O Fórum São Paulo Século 21 foi cria-
os trabalhos do grupo encarregado dessas áreas. Um conselho formado por 20 pessoas, incluindo representantes das universidades e dos institutos de pesquisa de São Paulo, de cientistas e de empresas, discutiu profundamente como tematizar a questão, antes do próprio início dos debates. "Os resultados foram muito bons", afirma. Zarattini não chegou a fazer uma exposição durante os debates. O texto destas páginas, resumindo suas idéias sobre a situação da ciência e tecnologia no Estado, foi produzido especialmente para a revista Pesquisa FAPESP. Defensor dos investimentos em pesquisa científica e tecnológica, acha importante a sociedade entender que essas aplicações são decisivas para o futuro. "Muitas vezes, não se obtêm resultados em um ano ou dois", explica, "mas, dado o passo, certamente eles vão aparecer". Formado em Economia pela Universidade de São Paulo (USP) e técnico em transporte público da Companhia do Metropolitano de São Paulo, Zarattini elegeu-se deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT), em 1998. Antes, foi suplente de vereador na Capital, entre 1992 e 1996, e participou das políticas estudantil e sindical, ocupando, inclusive, o cargo de secretário-geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.
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" ~ ~ do, em 1999, com o objetivo principal de 0 estabelecer um diálogo entre a Assembléia " Legislativa do Estado de São Paulo e os di-
versos setores da sociedade. A partir desse encontro, o Legislativo quer discutir um projeto capaz de fazer com que São Paulo se mantenha no rumo do desenvolvimento e esteja à sua frente, aumentando a qualidade de vida da população do estado e melhorando as condições de produção.
O fórum e esta reflexão só estarão terminados no fim deste ano. Mas o que se conseguiu até agora já é muito importante. Surgiram novas propostas. Foram dados subsídios para que tanto o Executivo como o Legislativo apresentem novos proje-
Carlos Zarattini tos. No caso específico da Comissão de Ciência e Tecnologia, a Assembléia tem
agora um conhecimento muito melhor do que representa e como se constitui esse sistema no estado. Principalmente, são visualizadas de maneira mais ampla as perspectivas de que esse sistema leve a indústria, a agricultura, os serviços de São Paulo a se desenvolverem mais e aumentarem o bem-estar de seus habitantes.
Muitos problemas ainda têm que ser enfrentados. Entre eles, os problemas financeiros das universidades pú-blicas do estStdo, que não estão ainda resolvidos, nem equacionados. As universidades não conseguem mais reter seus professores. Eles saem, em muitos casos aposentados, para ganhar mais em outros lugares. O número de profissionais que deixa as universidades públicas atingiu dimensões muito grandes. Não é só isso. Há a questão do grande volume de aposentadorias, que pesa de forma significativa nos orçamentos das universidades.
Há o problema dos hospitais universitários, que atendem a população e não são devidamente ressarcidos pelo SUS. São assuntos para os quais é necessário apresentar soluções. Precisam ser resolvidos para que as universidades públicas paulistas não sofram do mesmo mal que acomete as universidades federais. Nelas, qualquer coisa se torna difícil, pois nenhum tipo de recurso está garantido. Elas dependem, para funcionar, de verbas e da execução orçamentária do Ministério da Fazenda. Não se pode deixar que as três universidades públicas paulistas tenham o mesmo problema.
Quanto aos institutos, eles claramente precisam de maiores investimentos. Os institutos poderiam ser bem
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melhor aproveitados do que ocorre hoje. Alguns estão em situação bastante difícil. Outros estão um pouco melhor. Mas todos enfrentam o problema de que é preciso melhorar a remuneração de sua mão-de-obra. Ao lado disso, existe a questão de situar qual é o papel dos institutos. O governo não definiu isso claramente. É preciso determinar como eles serão interligados com a produção, com setores do desenvolvimento e da economia.
As universidades públicas devem também ser racionalizadas e democratizadas. Da maneira como é montado, o sistema universitário público de São Paulo sofre da falta de uma dinâmica muitas vezes necessária. E não se pode esquecer
PENSANDO SÃO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTO S
também, por meio de incentivos fiscais e de crédito. Uma empresa que realiza um investimento para desenvolver um novo produto não pode pagar a mesma taxa de juros e o mesmo nível de impostos de quem não faz nada e simplesmente compra uma patente estrangeira.
Muitas vezes se avalia que uma nova tecnologia, ao ser incorporada a um sistema de produção, leva ao desemprego. Esse debate vem sendo mal colocado. É verdade que novas tecnologias, muitas vezes, levam ao desemprego numa área específica. Mas, se o Brasil desenvolver inteiramente novas tecnologias, estará gerando mais e melhores
empregos. Hoje, até projetas de edifícios são feitos fora do país. O
as universidades particulares. Elas vêm tendo um crescimento explosivo. Está na hora de exigir que elas também façam investimentos em pesquisa científica. Essa deve ser uma cobrança da sociedade. É preciso criar condições para que a expansão dessas universidades leve a uma qualidade comparável à das universidades públicas.
''o Brasil, hoje, não tem
autonomia do ponto de vista
que o Brasil compra de projetas e patentes no exterior é gerador de desemprego na sua população. Qual a solução? É ter dentro do país um sistema de pesquisa e desenvolvimento capaz de criar novos tipos de emprego, de maior qualificação.
Não se trata de um problema de tecnologia versus emprego. A questão é de como o Brasil se inseriu na chamada globalização e no sis-Apesar de todas essas dificulda
des, São Paulo tem o sistema de
da tecnologia''
ciência e tecnologia mais avança-do do país. Mas não tem ainda algo necessário para dar o grande salto. Trata-se da participação da empresa privada na pesquisa científica e, principalmente, no desenvolvimento tecnológico. Essa é a grande questão que ainda está por ser resolvida. Ainda não está claro de que forma esse salto vai ocorrer.
Particularmente, creio que o governo estadual pode ter um papel decisivo nesse assunto. Ele pode determinar quais são suas prioridades e, por meio de suas empresas e de iniciativas governamentais, incentivar as empresas privadas a desenvolver pesquisas sobre questões básicas para a qualidade de vida da população. Em outros países, especialmente nos Estados Unidos, existem políticas nesse sentido. As Forças Armadas dos Estados Unidos e a NASA estimulam empresas privadas a resolver questões relacionadas com a defesa e o programa espacial. Uma boa parte do desenvolvimento científico norte-americano saiu dessa base.
Os problemas de São Paulo são outros. Mas pesquisas sobre algumas questões fundamentais para a população paulista poderiam ser incentivadas dessa forma. Há o exemplo do lixo, do saneamento básico. São Paulo tem problemas gravíssimos nessa área, especialmente nas regiões metropolitanas da capital, de Santos e de Campinas. As condições são dramáticas. Novas técnicas são necessárias. As que existem hoje não resolvem mais os problemas.
O governo estadual poderia agir, por exemplo, garantindo a compra, por intermédio de suas empresas, de um produto após seu desenvolvimento. Poderia trabalhar,
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tema produtivo mundial. Até agora, o país se inseriu de maneira su
bordinada. O Brasil está mais a reboque do que na dianteira. Aliás, bem a reboque.
Um grande desafio é o que universidades e institutos podem fazer para diminuir a desigualdade social. O número de pesquisas é bastante grande. Mas o retorno em termos de democracia social tem sido pequeno. A desigualdade social no Brasil não está diminuindo. Pelo contrário, está aumentando. ·um dos objetivos da pesquisa científica e do desenvolvimento tecnológico deve ser evitar que isso ocorra. O país, hoje, não tem autonomia do ponto de vista tecnológico. Não consegue crescer e ao mesmo tempo diminuir as desigualdades de renda de sua população. É preciso inverter isso. A solução não está somente no desenvolvimento científico e tecnológico. Mas passa por ele.
Evidentemente, tudo o que se fala e discute no fórum se transforma numa discussão política. Com certeza, o que se discute no fórum chegará à sociedade por meio do debate político. É necessário aproveitar o conhecimento acadêmico e transformá-lo em políticas públicas.
Não é possível conceber qualquer tipo de crescimento, no Brasil ou em qualquer outro lugar, sem grandes investimentos em ciência e tecnologia. No Brasil, esse investimento ainda é muito pequeno. Não existe ainda uma consciência de como é necessária a autonomia nesse campo. O país tem um número enorme de necessidades, de problemas. O patrimônio intelectual brasileiro tem condições de resolvêlos. Mas é preciso organizar o sistema de ciência e tecnologia. Sem investir nessa área, será muito difícil avançar.
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O prin1eiro lugar do sisten1a cabe à educação
O professor Jacques Marcovitch é reitor da Universidade de São Paulo (USP) desde
novembro de 1997. Antes, entre 1994 e 199 7, foi pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária. Com 35 unidades espalhadas pelo Estado e um posto avançado em Marabá, na Amazônia Paraense, a USP é uma das maiores universidades do Hemisfério Sul. Foi criada na década de 30. Mas algumas de suas unidades são bem mais antigas. A F acuidade
~ Penso que este evento começa num ~ ambiente de realização da comunidade 3 científica. O projeto Genoma Xylella, am" piamente divulgado, mostrou a vitalidade
e a capacidade de articulação dessa comunidade, para obter resultados reconhecidos internacionalmente. Sem dúvida, sempre haverá preconceitos, por parte de alguns. Mas acho que temos a capacidade de conseguir resultados que se destacam em escala internacional.
de Direito, por exemplo, é de 1827. Jacques Marcovitch
Não se pode subestimar o momento histórico pelo qual passa a humanidade. O ser humano passou da comunicação pelo gesto para a comunicação pela fala e começou a se comunicar pela palavra escrita há apenas 7 mil anos. Só SOO anos atrás teve origem a comunicação impressa. Foi há poucos anos que se iniciou o A Escola Politécnica, de 1893.
Marcovitch formou-se em Administração em 1968, na própria USP. Em 1972, obteve o mestrado na Graduate School of Management da Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos. O doutorado, em Administração, foi conseguido na USP, com uma tese sobre Eficácia Organizacional. Marcovitch fez o pós-doutoramento em 1978, no lnternational Management lnstitute, de Genebra, na Suíça. Sua experiência inclui a diretoria da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), de 1983 a 1986, e a do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, entre 1988 e 1993. Entre 1987 e 1995, foi coordenador do Núcleo de Política e Gestão Tecnológica da USP. Suas atividades de ensino e pesquisa estão concentradas nas áreas de Gestão da Inovação, Gestão da Cooperação Internacional, Gestão Tecnológica e Estratégia Empresarial. Como professor, além de lecionar nos cursos de graduação e pós-graduação de Administração, participa de programas de especialização e em cursos de desenvolvimento gerencial.
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uso da digitalização como forma de armazenar, acessar e comunicar informações.
Cada uma dessas migrações trouxe grandes mudanças. A migração do escrito para o impresso levou a humanidade a duas grandes revoluções, uma científica, por volta de 1600, e uma tecnológica, por volta de 1800. Pode-se dizer que a era digital, na qual a humanidade está entrando, antecipa duas grandes revoluções, semelhantes às anteriores mas ·ainda mais intensas, porque muito provavelmente ocorrerão simultaneamente.
Medindo as tendências, observamos que nos últimos 100 anos, o Brasil e o Estado de São Paulo se destacaram mundialmente com relação à sua evolução demográfica. A população mundial, nesse período, aumentou de 1,6 bilhão para 6 bilhões de habitantes. Portanto, cresceu em torno de 3,5 vezes. Já o Brasil, que passou de 17 milhões para 170 milhões de habitantes, aumentou dez vezes em termos demográficos. Esse aumento, sem qualquer discussão, provoca dores de crescimento, semelhantes às de um jovem adolescente que cresce de maneira muito rápida.
Assim, as dificuldades do Brasil não são as de uma estrutura que sofre as dores terminais. Pelo contrário, são dores de crescimento. São elas as que devemos equacionar e enfrentar. Esse crescimento, único em escala mundial, ocorreu de maneira simultânea com um processo de urbanização que também se deu no menor prazo conhecido em todo o mundo. Em apenas 30 anos, passamos de uma relação de 75% para 25%, na compa-
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ração entre as populações rural e urbana, para exatamente o inverso.
Mas, se os brasileiros nunca foram tantos e nunca estiveram tão próximos, nunca estiveram tão distantes, na distribuição da renda e na dualidade socioeconômica. A distância entre os níveis socioeconômicos está crescendo, cobrando os preços de violência e de criminalidade dos quais todos são testemunhas.
As rupturas tecnológicas fazem parte dessas tendências. Mas, felizmente, no Brasil, e este fórum é um exemplo disso, estrutura-se uma consciência na qual as gerações presentes preocupam-se com as gerações ainda não nascidas. A
PE NS A N DO SÃ O PAULO: U N IVER S IDADE S E IN STIT UTO S
O primário é o local básico que deve desmistificar, desde os primeiros dias de aula, os meios de comunicação que acabam por desenvolver um falso imaginário na mente das crianças, quer seja a televisão, quer seja o espaço virtual. O secundário deve familiarizar o jovem com a linguagem que o acompanhará ao longo da vida. O curso superior deve ser entendido como a primeira etapa da educação continuada, que acompanhará o ser humano ao longo de toda a sua vida.
O segundo componente desse sistema de inovação é o sistema de pesquisa, que inclui universidades, institu
tos, laboratórios de pesquisa e desenvolvimento das empresas e as
idéia de um fórum que olha para os próximos 25 anos, mas estende seu horizonte até o final do século, constitui um exemplo dessa preocupação.
A universidade, que recebe hoje jovens de 18 anos, que devem viver até 2070, sabe como é importante esta visão voltada para o futuro. Pois também há notícias positivas. A esperança de vida aumentou, a qualidade de vida me-
''Queremos uma economia de mercado,
nao uma sociedade
de mercado''
agências de financiamento. O terceiro é o subsistema empresarial, de produção e prestação de serviços, constituído de dirigentes, capitalistas, acionistas, sindicalistas, organizações não-governamentais e associações de pequenas e médias empresas. Finalmente, existem os sistemas articulador e regulador, que são de responsabilidade do Estado.
lhorou, a interdependência entre os atores sociais se ampliou. Mas, infelizmente, uma economia criminosa está crescendo. Um fundamentalismo de tipo religioso se instala pelo mundo, com a erosão do papel do Estado, quando, na nossa sociedade, por ser fragmentada, o Estado precisa consolidar-se.
Quais são os impasses? A tecnologia está avançando mais que as habilidades humanas. O desenvolvimento sustentado precisa de uma visão a-médio e longo prazo. A instabilidade monetária de um lado e uma estrutura partidária que acaba privilegiando o curto prazo de outro tornam difícil qualquer equacionamento de um desenvolvimento sustentado. A competição, que é natural na economia de mercado, não é natural numa sociedade. Queremos uma economia de mercado, mas não uma sociedade de mercado. Não se pode substituir o ser pelo ter.
Por outro lado, do ponto de vista da comunicação, o Brasil sai de uma era na qual a informação era a comunicação libertada. Quem viveu o período da ditadura no Brasil sabe como a comunicação libertava. Mas hoje, como disse Ignacio Ramonet, editor de Le Monde Diplomatique, entramos numa era de tirania da comunicação. A comunicação, pelo excesso e pela falta de filtros qualitativos, está inibindo o poder criativo de adultos e jovens. Isso nos leva a entender a ciência e a tecnologia como integrantes de um sistema de inovação mais amplo, constituído em primeiro lugar pelo sistema educacional, do primário até a educação continuada.
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Esses quatro componentes as-seguram o surgimento do novo.
Portanto, quando se fala em mais investimentos na área da ciência e tecnologia, isso significa mais recursos humanos e financeiros para todo o sistema de inovação, aquele que abre o novo para enfrentar novos desafios. Não quer dizer mais dinheiro para um ou outro componente, mas sim recursos para que esses quatro componentes possam assegurar uma relação mais harmoniosa, voltada para ó futuro.
Mas o que resta a ser feito? Lembremos o Projeto Genoma. Ele envolveu 196 cientistas, dos quais 172 eram de universidades públicas em geral e 144 eram das universidades públicas do Estado de São Paulo. Desses, 76 eram de minha universidade, a USP. Eles contribuíram para que o Brasil desse esse salto para o futuro.
As universidades públicas ajudaram a formar novas gerações e colaboraram para o avanço do conhecimento. Na USP, a universidade que melhor conheço, isso não ocorreu apenas na capital. Aconteceu na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, em Piracicaba; aconteceu na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto; ocorreu em Bauru, em São Carlos, em cada canto do estado onde as universidades estão instaladas.
As universidades públicas contribuíram também com suas atividades de extensão. Desde 1911, os alunos da Faculdade de Direito, do Centro XI de Agosto, prestam assistência jurídica gratuita aos excluídos. Outros exemplos importantes são a Estação Ciência e o Projeto Avizinhar, que aproxima as universidades das comunidades de ex-
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P ENSAN DO SÃO PA U LO: UN IVER SIDADE S E I NSTITUTO S
cluídos em sua volta. As universidades também ajudaram a preservar e consolidar uma identidade nacional. O Museu Paulista, cujo patrimônio a Universidade de São Paulo tem o privilégio de zelar, é um exemplo de como os historiadores e os museólogos estão dedicados à preservação da identidade nacional.
Finalmente, não menos importante, a USP se debruçou sobre os temas das políticas públicas, saúde, educação, meio ambiente, violência, emprego. Colocou fora da universidade o que cada um de seus 4. 700 professores e 25 mil alunos de pós-graduação fizeram sobre esses temas. Mas isso não chega. É preciso fazer mais, é preciso aju-
conformismo e a incerteza que conduzem o jovem a perceber, no conhecimento incompleto, a forma de lidar com o desconhecido.
Um jovem que está hoje nos bancos da universidade e deverá enfrentar os desafios de 2030 e 2040, longe de receber um quadro profissionalizante acabado, precisa desenvolver em si mesmo a capacidade de lidar com o incerto, por meio do inconformismo. Isso se aplica desde a pesquisa nas áreas exatas e biomédicas até a que ocorre nos setores mais aplicados da engenharia.
É preciso fazer mais na formação de recursos humanos. Isso significa uma graduação que deve ser ampliada, mas sem
dar a abrir um espaço de reflexão estrutural, baseado na prospectiva. Nas palavras de Antônio Cândido, as universidades fizeram muito, mas ainda não fizeram o suficiente.
As Humanidades têm o papel determinante de construir essas visões do futuro, centradas no ser humano, como epicentro da sociedade moderna. Não se trata mais de ciência e tecnologia no sentido
''o jovem prec1sa
desenvolver a capacidade
de lidar com o incerto''
pre tendo uma referência qualitativa favorável à estruturação dos projetos de vida dos jovens; uma pós-graduação que forme não só pesquisadores, mas prepare os quadros docentes necessários à expansão do ensino superior, público e privado; e uma educação continuada formada de maneira a dar a todos um espaço acessível, no qual possam atualizar-se cons-
restrito. Mas de filósofos, antropó-logos, psicólogos, sociólogos que se debruçam para entender como o ser humano se insere numa sociedade onde o material e o tecnológico passaram a constituir o centro das atenções.
As Letras têm a missão de transformar visões e linguagens, de forma que sejam capazes de arquitetar novas mentalidades que possam conciliar valores humanos e o sistema econômico e político. Esses valores devem promover a cultura do respeito humano, apesar das diferenças. Devem ser valores de solidariedade e de universalismo, buscando um sistema econômico que induza a eficácia e a complementaridade nas cadeias setoriais, assegurando a competição de mercado, mas sem nunca inibir a cooperação entre os agentes econômicos.
Deve buscar-se também um sistema político que assegure o pluralismo de idéias, mas com o imprescindível consenso duradouro, que permita a implantação de projetas ousados de políticas públicas. Já houve, no passado, clássicos da literatura que influiram no imaginário da juventude. Cada um desses clássicos tem seu papel. Como leitura obrigatória nas escolas, eles mostram muito bem como as letras dão sua contribuição para a arquitetura das mentalidades.
É preciso também fazer mais no avanço do conhecimento, e isso quer dizer a pesquisa. Ela deve constituir a base do inconformismo com o qual se lida com as incertezas. Não se pode imaginar a pesquisa isolada do ensino. O pesquisador que ensina leva para a sala de aula o in-
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tantemente. Quanto à Assembléia Legisla
tiva, que vem dando toda a consideração às universidades públicas, peço que continue a entender o ciclo longo das instituições universitárias e sua necessidade de previsibilidade de recursos e de autonomia, com rigorosa avaliação. As universidades públicas querem ser cobradas, mas é preciso entender que seus ciclos de tempo são diferentes. Teses podem levar dez ou 15 anos para serem conclÚídas. Um ciclo de formação, em algumas áreas, leva mais de dez anos.
As universidades precisam de previsibilidade e autonomia. Uma forma de sedimentar a previsibilidade seria constitucionalizar a quota parte das universidades. Hoje, nos recursos das universidades, estão embutidas, por exemplo, despesas com hospitais e com a previdência. A sociedade tem uma falsa percepção dos investimentos que estão sendo realizados.
É necessário também cada vez mais promover estudos estratégicos, usando as metodologias disponíveis. Por exemplo, olhar para o século 21 e ter dados razoavelmente sólidos sobre demografia, urbanização, dualidade socioeconômica e tecnologia, para que a sociedade possa ser mais responsável com relação ao futuro.
As universidades públicas do Estado de São Paulo estão prontas para empreender esse trabalho, visando à alimentação das decisões a serem tomadas sobre as políticas públicas. Este espaço, aberto na Assembléia Legislativa, destinado a articular os atores sociais para pensar sobre o futuro, deve ser multiplicado.
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Pesquisa brasileira precisa de u111 novo perfil
O professor Hermano de Medeiros Ferreira Tavares, reitor da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), já completou 25 anos de trabalho na universidade. É professor titular da F acuidade de Engenharia Elétrica e de Computação. Com cerca de 90 trabalhos científicos publicados, suas principais áreas de atuação estão nos campos
~ Mais do que nunca, São Paulo preci~ sa de iniciativas como este fórum. OBrail sil atravessa uma década que não pode " ser considerada perdida. Nos últimos
dez anos, o país evoluiu e trilhou caminhos, embora sem qualquer planejamento. O professor Jacques Marcovitch, reitor da Universidade de São Paulo, referiu-se à possibilidade de que este fórum pense os próximos 25 anos, talvez o próximo século. Vou restringir-me a pensar os próximos dez anos.
Se este fórum fizer o trabalho de pensar os próximos dez anos do Estado de São Paulo, particularmente no que diz respeito ao desenvolvimento econômico e seu relacionamento com a ciência e a tec-
da pesquisa operacional/problemas combinatoriais, inteligência artificial, planejamento de sistemas telefônicos e análise de sistemas Hermano de M. Ferreira Tavares nologia, fará não somente um trabalho econômicos. Tavares é engenheiro eletrônico, formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), de São José dos Campos, em 1964. Em 1966 e 1968, fez mestrado e doutorado na Universidade de Toulouse, na França. Antes de ir para a Unicamp, lecionou nas universidades federais da Paraíba e de Pernambuco, no ITA e na Escola de Engenharia da USP em São Carlos. Apesar de relativamente nova, pois começou a funcionar em outubro de 1966, a Unicamp é uma das mais importantes universidades brasileiras. De seus institutos sai 15% da produção científica do país. Eles abrigam, ainda, 10% dos estudantes de pós-graduação. Com 2 mil professores, a Unicamp tem cerca de 10.500 alunos de graduação e 1 O mil de pós-graduação.
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útil para toda a população. Será uma tarefa particularmente preponderante e indispensável para o desenvolvimento das universidades públicas do Estado de São Paulo, as quais, ao cabo de dez anos de autonomia, enfrentam dificuldades claríssimas.
A revista inglesa The Economistpublicou recentemente dados sobre a evolução do Produto Nacional Bruto per capita da Europa Ocidental nos últimos 1.000 anos. Pela ausência de contas públicas rigorosas, esses dados, naturalmente, envolvem muitas suposições. Mas pode-se ver com clareza que do ano 1000 até por volta de 1700, a renda per capita do europeu manteve-se particularmente estável, oscilando por volta de US$ 700 anuais (em valores corrigidos para 1990).
Dentro do espaço de vida de um ser humano, que era de entre 40 e 50 anos, não havia, assim, qualquer evolução. De um ano para outro, o avanço econômico era quase que rigorosamente zero por cento. O avanço econômico era praticamente insignificante, resumindo-se basicamente a cobrir o aumento da população, que também era bastante lento. O ser humano nascia e vivia sem qualquer perspectiva de crescimento e mudança nas suas condições econômicas e em sua quali-dade de vida.
Essa camisa de força, de dificuldade para a mudança econômica, foi rompida por volta de 1750, época em que se observa o início de um nítido avanço na renda per capita dos europeus. O processo se acelerou notavelmente nos últimos 100 anos. Em 1900, a renda per capitada Europa Ocidental era de cerca de US$ 2 mil por ano. Hoje,
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PENSANDO SÃO PAULO: UN IVE RS ID A D ES E INST ITUTOS
a cifra ultrapassa os US$ 20 mil na maioria dos países países europeus.
O que aconteceu nessa época para causar tal mudança? Houve o início do processo de incorporação da tecnologia à produção de bens, processo esse que a partir desse ponto se intensificou. Esse foi um fenômeno inicialmente europeu, mas que se irradiou para países como o Brasil, de cultura européia. Não é possível admitir, porém, sem qualquer possibilidade de erro, de que esse avanço seja algo inexorável.
Quando os portugueses chegaram ao Brasil, em 1500, a cultura mais importante do mundo, em termos científicos e
tituto de Pesquisas Tecnológicas, muito importante, mais dirigido para a área produtiva, multissetorial.
As indústrias respondem, por sua vez, por uma parcela mínima do desenvolvimento da ciência e da tecnologia no Estado de São Paulo. Essa é uma das características básicas do sistema brasileiro.
As universidades brasileiras tiveram um aparecimento bastante tardio. Rigorosamente, pode-se dizer que a primeira universidade brasileira, na acepção plena do termo, foi a Universidade de São Paulo, criada em 1934, por meio de um movimento extremamente meri-
tório, facilitado pelo momento político vivido então pela Euro
tecnológicos, era a chinesa. Mas essa cultura sofreu percalços e não avançou. Pelo contrário, a qualidade de vida de seu povo piorou. Há outros exemplos que apontam nessa mesma direção. Um deles é o da cultura islâmica, que teve desenvolvimentos notáveis até 1300, sobretudo na área da Matemática. Mas esses desenvolvimentos não tiveram seqüência.
''o modelo de universidade existente hoje talvez tenha
chegado
pa. Na década de 50, foram criadas várias outras universidades no país, sobretudo federais. Finalmente, na década de 70, ocorreu uma importante reforma na universidade brasileira, que levou ao modelo de universidade existente hoje e que, talvez, tenha chegado ao seu esgotamento.
ao esgotamento'' Essa reforma universitária da década de 70 tinha como pilares básicos a organização em departamentos, com a derrubada das cá
Portanto, não podemos presumir que o crescimento como o verificado na Europa vá continuar para sempre. Esse crescimento é decorrente da incorporação da tecnologia à produção. A tecnologia, por sua vez, é, com algum tempo de atraso, puxada pelo desenvolvimento das ciências básicas.
O que garante a incorporação da tecnologia ao mundo produtivo é, provavelmente, um conjunto de valores culturais, instituições políticas e instituições econômicas. Portanto, é da maior importância que estejam juntos, como aqui neste fórum, segmentos universitários, que imprimem os valores culturais de um povo, e segmentos políticos, como o representado por esta Assembléia Legislativa. Juntos, como está proposto na carta básica do Fórum Século 21, eles podem pensar o futuro do estado, fixar metas e determinar trilhas para serem seguidas pelas autoridades.
A pesquisa científica no Brasil é feita, sobretudo, nas universidades públicas e nos centros de pesquisa do sistema do Ministério de Ciência e Tecnologia. Uma fração menor dessa atividade é encontrada nas empresas estatais e nos institutos de pesquisa estaduais. No Estado de São Paulo, em particular, existe um segmento bastante importante de institutos estaduais de pesquisa.
Existe, por exemplo, a rede de institutos de pesquisa da Secretaria da Saúde, representada pelo Instituto Butantan e outros, igualmente notáveis. Há também a rede da Secretaria da Agricultura, representada pelo Instituto Agronômico de Campinas. Pode-se citar, também, o Ins-
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tedras, a adoção do regime de dedicação exclusiva e a implantação da pós-graduação. A criação da pós-graduação talvez seja o fato mais relevante da evolução da universidade brasileira nos últimos 30 anos.
Ela fixou a pesquisa e permitiu a criação de quadros renováveis, jovens que se dirigem cada vez mais para a universidade, dando ao Brasil uma posição ímpar no cenário mundiál. O país tem, talvez, o melhor sistema de pós-graduação do Terceiro Mundo. Desse modo, embora tenha começado a montar suas universidades tardiamente, o Brasil tem hoje as melhores universidades da América Latina.
Na década de 70, assim, com a reforma pela qual passaram na ocasião, as universidades brasileiras assumiram papel de destaque. A principal característica desse papel foi a integração entre a pesquisa científica e o ensino de pós-graduação. Entretanto, por ser um país que pratica uma ciência relativamente nova, o Brasil tende a praticar uma ciência reflexa dos países avançados. A pesquisa desenvolvida nas universidades brasileiras não é, necessariamente, aquela da qual o país precisa. De certa maneira, ela segue a tendência acadêmica mundial, o que facilita, por exemplo, sua inclusão em grupos internacionais e a publicação de artigos em periódicos de circulação mundial.
É preciso, neste momento, com o amadurecimento da pós-graduação no Brasil e a necessidade de um desenvolvimento de um perfil competitivo no mercado mundial,
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que a pós-graduação e a pesquisa brasileira procurem caminhos próprios. Faz-se necessário, sobretudo, que seja incorporada à nossa pesquisa, que é de boa qualidade, a indispensável preocupação com problemas de relevância social para o país. É necessário fazer pesquisa que tenha relevância social e cuja aplicáção possa ir ao encontro das necessidades de melhoria da qualidade de vida da população brasileira.
Oitenta por cento das atividades científicas brasileiras estão concentrados na Região Sudeste. É o que mostra o mapa. Boa parte desta concentração está em São Paulo, o estado mais rico e mais populoso. Nem por isso, aliás, a situação do
PENSANDO SÃO PAULO: U NIVERSIDADES E INSTITUTOS
próximos dez anos. Não será necessária nenhuma mágica. O objetivo não é extremamente difícil. A Argentina e o Chile têm proporções superiores à brasileira. Não dos 15% atuais, mas do dobro, dos 30%.
Tenho 60 anos. Estou às portas da aposentadoria. Passei a vida trabalhando no sistema universitário. Esperei a vida inteira por uma oportunidade como a que existe no momento no estado. Temos, através deste Fórum São Paulo Século 21, a oportunidade de pensar, planejar e preparar o Brasil, e especialmente o Estado de São Paulo, para os próximos dez anos. E é mais que
óbvio: o desenvolvimento científico, a melhoria da qualidade de
estado é extremamente cômoda. Essa distorção geográfica decorre de um processo de desenvolvimento heterogêneo. Não poderá ser solucionado apenas com um esforço financeiro de promoção à pesquisa. É necessário um esforço mais profundo. Não se trata, simplesmente, de um problema de financiamento da pesquisa.
''As universidades públicas
vida e o resgate da dívida social passam necessariamente pelo crescimento de uma ciência e uma tecnologia que possam ser aplicadas à melhoria das condições de vida do povo brasileiro.
de São Paulo formam a metade
dos doutores Existe a possibilidade de que
isso seja feito agora. As universidades públicas devem ser colocadas a serviço desse objetivo. Não se pode adiar mais uma posição.
do Brasil'' Um aspecto muito importante
para a compreensão do problema está na distribuição da formação de quadros para o ensino superior. O Brasil, em termos de graduação, forma cerca de 300 mil bacharéis por ano. Nesse total, a contribuição das universidades públicas no Estado de São Paulo é bastante modesta, de cerca de 10 mil bacharéis, ou 3% do total brasileiro. As instituições federais de ensino superior, que de certa maneira constituem a espinha dorsal do ensino universitário, contribuem com cerca de 18% desse total.
Mas, quando se trata da pós-graduação, a posição das universidades públicas paulistas é bem mais expressiva. As cinco universidades públicas existentes no Estado de São Paulo, três estaduais (USP, Unesp e Unicamp) e duas federais (Unifesp e Universidade Federal de São Carlos) são as responsáveis por cerca de 50% da formação de doutores no país. De certa maneira, as universidades públicas paulistas são escolas de escolas. Elas formam uma boa parte dos profissionais que vão lecionar nas universidades brasileiras. Esse quadro é da maior importância quando se trata de pensar o futuro.
De qualquer maneira, deve-se estar atento para o fato de que apenas 15% da população potencialmente universitária do Brasil- os jovens com entre 20 e 24 anos- chegam às escolas superiores. Mesmo em São Paulo, onde se poderia esperar um resultado bem melhor, devido à sua situação com relação ao restante do país, essa proporção é de apenas 17%. Essa parcela é dramaticamente baixa. Para se ter um futuro melhor, é preciso estabelecer metas com cuja aplicação será possível dobrar esse número nos
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É possível criar metas válidas para esses próximos dez anos, deli
neando, por exemplo, quantos estudantes universitários queremos ter no futuro e que tipo de pesquisa se pretende fazer.
Devem ser cobrados resultados dessas pesquisas e o processo de avaliação das universidades deve ser permanente. O financiamento das universidades públicas do Estado de São Paulo precisa ser encarado com o máximo de seriedade: Parte substancial desse financiamento é destinada, no momento, ao pagamento de inativos e à manutenção dos hospitais universitários. São pelo menos esses dois fatores que vêm estrangulando atualmente as universidades públicas estaduais paulistas.
Finalmente, há mais um fator que não pode deixar de ser pensado pelo Fórum São Paulo Século 21. Trata-se da necessidade de revigorar a rede de institutos de pesquisa do Estado de São Paulo. Essa rede é da maior importância. O desenvolvimento do sistema agrícola paulista, que é importantíssimo, dependeu fortemente dos institutos ligados à Secretaria da Agricultura. Mas boa parte deles mereceu, nas últimas décadas, um tratamento que não foi o melhor que poderiam ter recebido.
Essa rede de institutos é de importância fundamental para o desenvolvimento de nosso estado. Mesmo assim, não tem recebido a atenção e o tratamento adequados. É indispensável pensar no revigoramento e no crescimento desse sistema. E, ao seu lado, pensar também no problema do dimensionamento das universidades públicas e do seu financiamento.
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Cuidado cotn as falsas detnandas sociais
O reitor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Antonio Manoel dos Santos
Silva, é um veterano da instituição, na qual leciona há 33 anos. Com dez livros e mais de 100 artigos publicados, é professor de Literatura Brasileira no Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas do câmpus da Unesp em São José do Rio Preto. Antes de ser escolhido para a reitoria, ocupou os cargos de pró-reitor
A Unesp é uma universidade nova. Foi criada em 1976. Mas também é uma universidade com origens que remontam ao início do século. Muitas das unidades que formaram o conglomerado para sua constituição são antigas. Suas faculdades mais antigas são as de Odontologia e Farmácia em Araraquara; começaram a funcionar em 1923. A Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias de Jaboticabal tem origem numa escola agrícola fundada em 1921. A Unesp tem esta particularidade: é a mais nova das universidades públicas, mas, em alguns pontos, também é antiga. Sua estrutura foi muito violentada quando de sua criação: foram extintos cursos de graduação, ou-
de Pós-Graduação e Pesquisa e de vice-reitor. Entre seus
Antonio Manoel dos Santos Silva tros foram deslocados, alguns foram
trabalhos, está a consolidação do sistema de pós-graduação da universidade. Entre 1989 e 1993, o professor Silva foi vice-reitor da Universidade Ibero-Americana de Pós-Graduação, com sede em Salamanca, na Espanha. Desde então, é diretor regional da Associação Universitária Ibero-Americana para o Brasil, Portugal e Cone Sul. Foi até o início deste ano membro do Conselho Superior da FAPESP. A Unesp está presente na maioria das regiões do Estado, com 15 campi universitários, três campi avançados, 24 unidades universitárias e dez unidades complementares em 15 cidades. Com cerca de 3.500 professores, atende cerca de 23.260 alunos. Mantém 80 cursos de graduação e 46 de pós-graduação, com 92 programas de mestrado e 67 de doutorado.
lO
criados. Sua reitoria estava oficialmente em Ilha Solteira, a 666 km de São Paulo.
Em 1984, a Unesp passou por uma reestruturação. De certa maneira, foi democratizada, uma vez que muito mais pessoas passaram a participar dos órgãos colegiados que definem seus destinos. Importantíssimo foi o ano de 1989, quando se estabeleceu a autonomia das três universidades públicas do Estado, entre elas a Unesp, que passaram a ter aplicado nelas um índice do orçamento do Estado. A partir desse ano, a Unesp teve um crescimento relativamente muito forte. Isso influenciou seu papel de preparar cientistas e diferentes tipos de profissionais e situar-se na fronteira do conhecimento dentro do Estado de São Paulo, em pesquisas e desenvolvimento.
No início da autonomia, em 1989, a Unesp tinha 12 mil alunos de graduação. Hoje, tem 21 mil. Tinha 900 alunos regulares na pós-graduação. Hoje, tem 7 mil. Os números relativos ao crescimento do número de alunos das outras duas universidades estaduais não devem ser muito diferentes. Esse crescimento em dez anos mostra como foi importante para a universidade ter autonomia na gestão dos recursos que, aprovados pela Assembléia Legislativa, o Estado é obrigado mensalmente a repassar para a universidade pública.
Mas a Unesp está, de certa maneira, estrangulada. Não porque não esteja desenvolvendo bem o que desenvolve hoje. Mas porque não pode usar seu potencial para se desenvolver mais. A Unesp tem uma potencialidade altíssima para desenvolver o ensino e pesquisa.
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Mas não pode fazer mais do que faz. Os cordões que fazem este estrangulamento são vários. Vou citar um exemplo. Em 1989, no começo da autonomia, o pagamento de inativos consumia 7% dos recursos da Unesp. Hoje, consome 26%.
Mesmo assim, a Unesp continua a crescer. Em 1989, a proporção do corpo docente com titulação mínima de doutor era de 38%. Hoje, subiu para 72%. Há a previsão de chegar ao fim do ano 2000 com uma proporção próxima às da USP e da Unicamp, de 85%. Daqui a seis anos, a Unesp terá condições de abrigar 30 mil alunos na graduação e 12 mil na pós-graduação. O papel da uni-
P ENSAN D O SÃ O PAUL O: UN I V ER S ID A DE S E I NST ITU TOS
As universidades têm de expor isso às instâncias que tomam as decisões, o Executivo e o Legislativo. Esses problemas não são só das universidades, são também da sociedade que as sustenta. As universidades públicas e os institutos de pesquisa do Estado de São Paulo formam a estrutura e a base para o desenvolvimento científico e tecnológico fundamental para o desenvolvimento do País.
Assim, um dos problemas das universidades é como trabalhar as demandas sociais de maneira a distinguir as realmente humanas das ditadas pelo eixo exclusivo do mercado. Elas têm de trabalhar isso muito bem, até
mesmo para atender às próprias exigências do mercado. Têm de
versidade na preparação de cientistas e profissionais qualificados é justamente este: o de formar seres humanos, na graduação e na pós-graduação. As universidades fizeram muito, de acordo com os objetivos ou metas estabelecidos por diversas instâncias, quando foram criadas. Mas não fizeram o suficiente.
''Para matar pensar muito nisso. Essa é uma questão que vem sendo discutida de maneira candente dentro das próprias universidades. a universidade
pública, basta exigir que atenda
ao imediato do mercado''
Outra insuficiência da universidade pública é sua territorialidade. As universidades públicas ocupam quase todo o Estado de São Paulo, mas não todo o estado. Há vazios. Pode-se citar dois lugares, o Vale do Ribeira e o lito-Um dos problemas diz respei
to às relações da universidade com as empresas inovadoras. Falta algo para que elas possam absorver e desenvolver a pesquisa nacional. Outro é sua situação no que diz respeito às demandas sociais. Quem lidera essas demandas e quais são elas? Hoje, as universidades públicas recebem demandas de diversas instâncias. Uma das mais agressivas é a mídia. Ela pensa a curto prazo, enquanto o prazo na universidade é no mínimo médio e longo. Não se faz melhoramento genético em menos de dez anos. Pode ser que com as novas tecnologias esse prazo diminua. Mas não se fazem coisas assim em prazo curto.
Um dos elementos a serem considerados é o tempo do próprio pesquisador. Ele tem de dividir a tarefa de pesquisar com a docência, o tempo dedicado a formar aqueles que vão dar continuidade às linhas de pesquisa. Isso é demoradíssimo. É necessário levar em conta, também, o tempo dedicado à própria constituição da universidade. Ela precisa ser dinâmica e perceber as mudanças que ocorrem em sua volta.
As demandas sociais feitas às universidades são de dois tipos. Algumas são ditadas pelo mercado e podem ser extremamente perigosas. Outras são demandas sociais realmente humanas. Sua identificação é um dos maiores problemas das universidades, não só para o desenvolvimento da pesquisa e da tecnologia como para a formação dos recursos humanos. Para matar a universidade pública, basta exigir que elas atendam ao imediato do mercado.
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ral. Eles não têm universidades públicas e lá o desenvolvimento
científico e tecnológico é precário. As três universidades estaduais não podem resolver
os problemas que estrangulam o sistema público do ensino superior de São Paulo. Mas podem contribuir com as instâncias que decidem, deliberando ou executando. Isso não está fora do tema central deste encontro, o desenvolvimento científico e tecnológico, pois isso nos conduz para ó eixo central, a sociedade do conhecimento. Se, de fato, a sociedade do século 21 for a sociedade do conhecimento, quem não tiver acesso direto ou indireto aos atores do conhecimento, que são as universidades, estará excluído dessa sociedade.
Se me perguntassem como resolver esses problemas, responderia "não sei". Mas sou professor há 37 anos e creio que as universidades, com seu grande corpo de especialistas, doutores, cientistas, pesquisadores de ponta, podem juntar-se aos que devem pensar o futuro do estado. Assim, será possível chegar a algumas soluções, inclusive a de dobrar o número de alunos nas escolas públicas superiores de São Paulo.
Isso não é tão difícil. Lugares mais pobres do que São Paulo já o conseguiram. São Paulo é privilegiado com relação à infra-estrutura física, comercial, industrial. A infra-estrutura oferecida pelas suas universidades públicas e por algumas universidades privadas pode fazer com que, além de não ter excluídos pela miséria da fome e da falta de moradia, São Paulo não tenha também os excluídos do conhecimento.
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O gigante que pula colll ullla perna só
Reitor da Universidade de Santo Amaro (Unisa), Sidney Storch Outra é o representante
iiiiiiiiiiiiiiiiii;:::====;;jjjjjjjjiiiiiiiiii ~ A vigésima sétima Conferência Geral
da Região 3, que compreende os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, no conselho deliberativo do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB). Outra é formado em Engenharia Eletrônica pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), tem especialização
~ da Unesco sobre educação superior, reali~ zada em novembro de 1993, em Paris, ;o apresentou ao mundo uma definição so-
bre o que efetivamente é educação superior. Trata-se, afirma, de "todo tipo de estudos, treinamento ou formação para pesquisa em nível pós-secundário, oferecido por universidades ou outros estabelecimentos educacionais aprovados como instituições de educação superior pelas autoridades competentes do Estado."
em Administração Financeira pela Escola de Administração Sidney Storch Outra
Essa definição tem a ver efetivamente com o papel das universidades no processo de desenvolvimento das nações e dos povos, tema central deste fórum. A proposta que trago para este seminário é a de que as universidades assumam, de fato, um papel de liderança no processo de desenvol-de Empresas da Fundação Getúlio
Vargas e MBA na Sociedade de Desenvolvimento Empresarial de São Paulo. Atualmente, faz doutorado em Educação pela Universidade Andrews, dos Estados Unidos. Foi diretor-geral do Hospital São Vicente, de Curitiba, e diretor administrativo e financeiro da Amico Assistência Médica de São Paulo. A Universidade de Santo Amaro funciona em dois campi na Zona Sul da cidade de São Paulo. Surgiu em 1968, como Organização Santamarense de Educação e Cultura (Osec). Ganhou o novo nome ao adquirir o status de universidade, em 1994. Tem 10 mil alunos e 800 professores, em 27 cursos superiores. O CRUB reúne reitores de dezenas de universidades brasileiras. Participa da busca de soluções para problemas como o financiamento dos hospitais universitários e participa de projetas como a Ação da Cidadania contra a Fome e a Universidade Solidária.
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vimento, no que tange à ciência e tecnologia. Essa é uma conclusão óbvia, devido ao fato de que as universidades dispõem de trunfos únicos para desempenhar este papel.
Isso está inerente à sua própria missão, que consiste, primeiramente, em formar os dirigentes de amanhã. Essa formação é papel da universidade. Ao mesmo tempo em que ela forma pessoas no nível superior, forma líderes. A pesquisa dentro da universidade deve, acima de tudo, procurar ampliar os horizontes e expandir as mentes. As-sim, os líderes poderão, de fato, pensar no benefício do seu próximo e da sociedade.
A natureza fundamental da existência da universida-de é a de ser o motor do saber dentro da sociedade. Nos 35 anos que correram até 1995, o número de alunos matriculados em cursos superiores em todo o mundo multiplicou-se por mais de seis. Hoje, existem provavelmente 90 milhões de pessoas matriculadas no ensino superior. A afirmação de que a educação é a alavanca do conhecimento não é ouvida só no Brasil. Ela ocorre em todo o mundo.
Esse aumento quantitativo não foi acompanhado por um crescimento qualitativo no sentido e contexto do desenvolvimento das nações. Ficou constatado que ocasionou um aumento ainda maior na disparidade entre os países. No contexto mundial, 75% de novos conhecimentos no mundo provêm de um número restrito de países, a saber, Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra, Japão, França e Canadá. Esses países representam apenas 13% da população do globo. Praticamente todos os 87% restantes com-pram e consomem conhecimento, tecnologia e ciência.
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Isso pode ser corroborado por um dado publicado na edição de março de 1995 da revista Science. De acordo com esse dado, a América Latina produz apenas 0,9% das pesquisas realizadas no mundo. Deve-se ressaltar que, destes 0,9%, 70% das pesquisas da América Latina são realizadas no Brasil. Portanto, apesar do número global não ser favorável, o Brasil é líder dentro do contexto da América Latina. Trata-se de um fator importante.
De qualquer forma, pode-se fazer o diagnóstico de que o Brasil é fundamentalmente um consumidor de conhecimento. Vamos analisar um pouco mais profundamente essa questão. Para isso, vou usar dados de um trabalho produ-
PEN S ANDO SA O PAULO: U NIVER S IDAD ES E IN STITUTO S
ses países, quem paga a pesquisa básica é o governo, quem executa é a universidade. Na pesquisa aplicada, quem paga, fundamentalmente, é a indústria, com alguma participação do governo. A parcela governamental corresponde em grande parte à compra de patentes e de tecnologia, para que elas sejam trazidas para dentro do país. Quanto ao desenvolvimento de novos produtos, quem paga e quem realiza é o setor privado. É a outra perna do Saci.
Este modelo, no qual a universidade faz a ciência fundamental, a pesquisa básica, e a indústria aplica e desenvolve tecnologia, parece ser o que mais fomenta o desen
volvimento de forma rápida e segura. Não é função da universi
zido pelo presidente da FAPESP, professor Carlos Henrique de Brito Cruz. Nele, é comparada a distribuição institucional da atividade de pesquisa e desenvolvimento no Brasil com a de outros países.
''Não faz parte das funções
dade desenvolver produtos finais. Isso exige conhecimentos de características do mercado e um envolvimento comercial não pertinentes à universidade. A universidade faz a pesquisa básica e a indústria faz a pesquisa aplicada. Os dados mostram que existe
uma diferença significativa. Nos Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Inglaterra, Itália e Canadá, a maior parte da atividade de pesquisa e desenvolvimento é realiza-
da universidade desenvolver
produtos finais para o mercado''
No modelo brasileiro, já existe uma perna. Está faltando a outra, que é a aplicação e o investimento do setor privado. As universidades
da na indústria. No Brasil, ocorre exatamente o inverso. A pesquisa é realizada fundamentalmente na universidade. O trabalho também compara artigos científicos publicados e patentes registradas nos Estados Unidos. O Brasil aparece entre os países que produzem artigos científicos de maneira significativa, mas não está entre os que registram patentes.
Vale uma comparação com a Coréia, país que há 20 anos estava numa situação muito semelhante à do Brasil. Hoje, a Coréia aparece significativamente como grande publicadora de artigos científicos e registro de patentes, ou seja, possui as duas pernas que medem a questão da pesquisa e desenvolvimento de forma mais equilibrada. Todos devem concordar que no Brasil temos uma situação diferente, estamos com uma perna só, publicamos muito e quase não registramos patentes. Usando uma figura da mitologia brasileira, poderíamos afirmar que ainda sofremos da síndrome do Saci. O Brasil está pulando com uma perna só. Faz pesquisa nas universidades, mas não consegue transformar esta ciência e tecnologia em efetivo desenvolvimento para benefício de seu povo.
Na década de 80, o Brasil tinha uma situação até um pouco melhor que a da Coréia. Por volta de 1984 e 1985, porém, houve uma grande mudança na situação coreana. Naquele período, houve um significativo aumento nos investimentos das empresas em pesquisa e desenvolvimento, o que gerou um grande acréscimo no registro de patentes.
É possível observar que o modelo coreano é quase uma cópia do modelo seguido nos Estados Unidos. Nes-
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podem e devem tomar a iniciativa, liderar e buscar esse processo.
Durante muitos anos, a universidade brasileira esteve um pouco dissociada de sua real função. Isso ocorreu como uma reação ao regime militar, no qual a universidade, com raras exceções, esteve mais voltada para a questão política, para a implantação da democracia. No setor privado, não havia razão para investir em pesquisa e gerar novas tecnologias. Havia um exagerado protecionismo e a reserva de mercado, ~orno no caso da informática, por exemplo.
Hoje, a sociedade brasileira paga por esses 20 anos de nossa história. Para solucionar o problema, o Brasil precisa ser ágil. Não pode demorar muito. A impressão é a de que as instituições não-públicas têm um pouco dessa agilidade. Devido a essa velocidade, as instituições privadas podem exercer um papel importantíssimo de atrair contratos de parceria com o setor público e rapidamente gerar expertise em determinados nichos de mercado. A partir daí, é possível ter o retorno desejado em termos de desenvolvimento que tanto se almeja, do qual o país tanto precisa, e que certamente nos conduzirá a um Brasil mais justo. Afinal, esta é a proposta fundamental deste fórum.
Concluindo, reafirmo que acima de tudo a função primeira das universidades ainda é a de combater a escassez de material humano. As grandes indústrias mundiais implantarão suas atividades de pesquisa e desenvolvimento onde houver potenciais de recursos humanos. Portanto, o aumento do investimento privado em ciência e tecnologia depende significativamente da nossa capacidade de recrutar e desenvolver talentos.
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Surgetn novas oportunidades para a educação continuada
O professor José Rubens Rebelatto, reitor da Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), formou-se em Educação Física em 1975 e em Fisioterapia em 1978, nos dois casos pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Começou a lecionar na UFSCar em 1980. Nessa universidade, fez especialização em Análise e Programação de Condições
~ Quando se analisa o papel de uma ins§ tituição social em relação aos vários segil mentos sociais, é necessário estabelecer " com clareza quais são seus objetivos, suas
metas, sua missão. É preciso determinar qual é seu contrato social ou, pelo menos, qual era na sua gênese, quando a instituição foi concebida. O assunto é polêmico, mas neste debate vou assumir uma determinada missão para a universidade pública. Trata-se da tarefa de produzir conhecimento e de torná-lo acessível a todas as pessoas que possam precisar dele.
de Ensino, em 1983, o mestrado, em Educação Especial, em 1986, e o doutorado, em Educação, José Rubens Rebelatto
Até pouco tempo atrás, era usual ouvir que os objetivos das universidades, pelo menos as públicas, eram o ensino, a pesquisa e a extensão. Mais recentemente, demonstrou-se, inclusive em trabalhos acadêmicos, que essas são apenas atividades. em 1991. Suas áreas principais
de pesquisa são as de Prevenção em Fisioterapia e de Ensino em Fisioterapia. Antes de chegar à reitoria, o professor Rebelatto ocupou diversos cargos na UFSCar, inclusive os de chefe dos departamentos de Ciências da Saúde e de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, vice-coordenador dos órgãos suplementares, pró-reitor de extensão e vice-reitor. A Universidade Federal de São Carlos tem atualmente cerca de 4.800 alunos na graduação e 1.400 na pós-graduação, çom 25 cursos de graduação e 28 opções em pós-graduação. Além das instalações em São Carlos, tem outro câmpus permanente na cidade de Araras, onde funciona o curso de Engenharia Agronômica. Dos seus professores, nada menos do que 96,31% têm mestrado ou doutorado. É a maior proporção entre as universidades federais brasileiras.
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As razões de ser dessas atividades é que devem evidenciar a missão da instituição. Para que fazer pesquisa, para que produzir o conhecimento, para que realizar a atividade do ensino de extensão, se não for para a produção do conhecimento e tornar esse conhecimento acessível?
A primeira parte é a produção do conhecimento. A universidade pública está produzindo o conhecimento? Quais são as atividades dessa instituição no seu dia-adia que caracterizam a consecução desta parte de seu compromisso social? Aparentemente, sim. Mais de 96% do conhecimento científico e tecnológico brasileiros são produzidos nas universidades públicas. As atividades de pesquisa e de formação de futuros cientistas são feitas, majoritariamente, nas universidades públicas.
Quais as atividades desenvolvidas cotidianamente pelas instituições públicas para tornar esse conhecimento acessível? Uma das mais tradicionais e conhecidas dessas maneiras é a formação dos futuros profissionais, que vão interferir na sociedade para resolver seus problemas. Outra, menos conhecida, é a pós-graduação. Ao formar profissionais cientistas para o país, torna acessível à sociedade o conhecimento gerado pela universidade.
Existe, porém, uma atividade ainda menos conhecida, que é a de extensão. Ela está passando por uma evolução muito grande. Ela entra na concepção da educação continuada, educação permanente ou educação para a vida toda. Essa atividade tem características que a tornam diferente das outras. Nem melhor nem pior, mas diferente e com um potencial de atendimento de demanda superior
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bastante privilegiado. Esse privilégio vem, entre outros fatores, de não ter os limites formais da graduação e da pós-graduação, podendo, por isso, atender demandas específicas da sociedade.
A extensão é pouco explorada, especialmente por ser um universo inacabado. Existe uma quantidade significativa de formas de atividades de extensão que precisam ser mais bem estudadas, descobertas e implementadas. A Universidade Federal de São Carlos está desenvolvendo várias experiências nesse campo. Três formas vão ser citadas, por suas características especiais. São os núcleos de extensão, os escritórios regionais e as incubadoras de co-
PENSANDO SÃO PAULO: UN IVERSIDADES E I NSTITU T OS
O terceiro exemplo é a incubadora de cooperativas que a Universidade Federal de São Carlos está pondo em prática em conjunto com a UniTrabalho. O problema a ser enfrentado, no caso, é o desemprego e a exclusão social, resultados do momento político-econômico existente atualmente em todo o mundo e também no Brasil. O projeto partiu da convicção de que determinadas camadas sociais poderiam usar o auxílio de várias áreas do conhecimento, como engenharia de produção, engenharia civil, ciências sociais, psicologia, advocacia e outras, para enfrentar essa situação.
A universidade fornece o co-nhecimento e uma infra-estrutu
operativas. Os núcleos de extensão da Uni
versidade Federal de São Carlos estão voltados para determinados segmentos sociais. Eles surgiram da necessidade de organizar atividades da universidade. Há núcleos voltados para empresas, sindicatos, município, saúde e cidadania. Além de se mostrarem eficazes na organização das atividades internas, eles se mostraram potentes
''Primeira cooperativa formada na
ra básica para que as pessoas formem uma cooperativa. A partir daí, elas vão ao mercado e oferecem seus serviços. A primeira cooperativa formada na Universidade Federal de São Carlos foi uma cooperativa de serviços de limpeza. Antes, eram pessoas excluídas totalmente do mundo do trabalho. Hoje, fornecem serviços de limpeza inclusive para a própria
U FSCar hoje faz a limpeza
da universidade''
organismos de interlocução do diagnóstico das demandas dos segmentos sociais e de agilização de trabalhos.
Quanto ao segundo exemplo, a UFSCar tem hoje escritórios regionais em três cidades: Araçatuba, Assis e Fernandópolis. Eles surgiram da freqüência com que prefeitos ou associações comerciais de municípios distantes da sede procuravam a universidade, pedindo seu auxílio para a solução de problemas específicos. Isso levou à criação de um programa, com o qual, a partir de uma infraestrutura fornecida pelos interessados e com a supervisão de um pesquisador e professor da universidade, eram traçados alguns objetivos, como diagnosticar mais corretamente o problema levantado.
O programa envolve o uso de grupos de pesquisa e alunos de graduação e pós-graduação da universidade para o treinamento de pessoas do próprio município, capazes de resolver os problemas quando a universidade se retira. Nem sempre o programa corre bem. Esse tipo de atividade levanta um grande número de problemas. Um deles é a descontinuidade político-partidária na direção dos municípios. Muitas vezes, o escritório está funcionando muito bem, mas é fechado quando se muda o prefeito. Houve cidades em que o mesmo escritório foi inaugurado quatro vezes. Quando isso aconteceu, foi estabelecida a exigência de que um escritório regional só é montado depois que uma legislação a respeito é estudada e aprovada pela Câmara Municipal. Isso deu maior estabilidade ao programa.
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universidade, pois ganharam a licitação. A universidade consegue
serviços por um preço bem menor que o pago a outras empresas e os cooperados ganham muito mais do que receberiam como empregados dessas empresas.
A educação continuada tem relação com o compromisso da universidade pública de, além de formar futuros profissionais, ser responsável pela educação do cidadão no decorrer de sua vida. Isso exige outra concepção do que deve ser o papel da universidade no que era chamado de extensão. A Universidade Federal de São Carlos estudou o que vem sendo chamado de educação continuada ou educação permanente em vários países, Portugal, Espanha, Itália e Inglaterra. Descobriu que grande parte do que é feito nesses países já se faz nas universidades públicas brasileiras.
A diferença exigida para que esse passo seja dado é basicamente uma postura a favor dessas atividades, com maior agilidade administrativa e disposição para a captação de recursos. A diferença está principalmente nessas três posições, embora nem mesmo elas devam ser encaradas como fundamentais.
A missão de produzir o conhecimento e torná-lo acessível e a realização das atividades de pesquisa, ensino e principalmente de extensão são exemplos do compromisso e da contribuição das universidades públicas para o desenvolvimento da ciência e tecnologia. Isso, se concatenado com uma política governamental, da Secretaria de C&T, poderia fazer do Estado de São Paulo um exemplo único de desenvolvimento regional e evolução social no país.
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Sucesso leva à atnpliação da incubadora de etnpresas
O professor Claudio Rodrigues, superintendente do Instituto de Pesquisas Energéticas
e Nucleares (lpen), é um dos mais experientes cientistas brasileiros no campo da física nuclear. Desde 1965, quando foi contratado como pesquisador auxiliar do Instituto de Energia Atômica, antigo nome do lpen, ele trabalha nessa área. Formado em física pela Universidade de São Paulo (USP), Rodrigues obteve o doutorado em 1970, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com Claudio Rodrigues
O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) foi fundado em 19S6. Pouco mais de um ano depois de sua fundação, começou a operar, no câmpus da Universidade de São Paulo (USP), o primeiro reator nuclear de pesquisa do Hemisfério Sul. É uma instituição científica e tecnológica cujo compromisso é melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro. Para isso, produz conhecimento científico, desenvolve tecnologias, gera produtos e serviços e forma recursos humanos. Tem cursos de pós-graduação que outorgaram, no ano passado, 29 títulos de doutor e 43 de mestre. Sua área, de SOO mil metros quadrados, ocupa cerca de um quarto do câmpus da Cidade Universitária de São Paulo.
uma tese sobre os movimentos dos átomos do metanol estudados através do espalhamento de nêutrons. De 1971 a 1973, com uma bolsa de pós-doutorado da FAPESP, esteve no Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos Estados Unidos, participando de pesquisas sobre a presença do dióxido de carbono de origem industrial na atmosfera. O atual mandato é o segundo de Rodrigues como superintendente do lpen. Ele ocupou o mesmo cargo de 1985 a 1990, período no qual entrou em funcionamento o primeiro reatar nuclear construído no Brasil, o IPEN/MB-01. Os produtos preparados no lpen são usados hoje na medicina, na indústria e na agricultura de todo o Brasil e de vários países da América Latina. As atividades de pesquisa desenvolvidas no instituto, no entanto, não se limitam ao campo estritamente nuclear. Ali se investigam, também, áreas como a obtenção de hormônios humanos por engenharia genética e o crescimento de monocristais para uso em lasers.
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A principal atividade atual do Ipen está na área da saúde. Produz medicamentos e outros materiais radioativos para diagnóstico e terapia de diversas doenças. A distribuição desses medicamentos atinge todo o território brasileiro. Mais de SOO hospitais e clínicas recebem, em média quatro vezes por semana, materiais radioativos produzidos pelo Ipen. Os produtos do Instituto foram responsáveis, em 1999, pelo atendimento de mais de um milhão e meio de pacientes.
A distribuiÇão do material radioativo é just in time. O material radioativo produzido é transportado aos hospitais imediatamente; se não chegar rapidamente ao cliente, perde a atividade. Há materiais radioativos com meiavida de duas horas, ou seja, depois de duas horas, o medicamento já perdeu metade da atividade. É por isso que o Ipen funciona sem interrupções, em três turnos.
Há alguns anos, o Ipen desenvolveu um novo mecanismo de gestão. Adotou uma política e um planejamento de gestão que focam principalmente as atividades do Instituto dirigidas para a demanda da sociedade e para o cliente. Em função disso, entrou fortemente num projeto de excelência tecnológica patrocinado pelo Conselho Nacional de Pesquisas e pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Todos os produtos médicos que saem do Ipen têm o certificado ISO 9002.
O Instituto, porém, não está ausente do novo paradigma da participação das instituições de pesquisa de São Paulo. Faz parte de uma importante parceria constituída pelo Ipen, o IPT e a USP, com a forte participação do Sebrae, que instalou no câmpus da USP em São Paulo uma
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incubadora de negócios de base tecnológica. Trata-se do Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec).
A missão do Centro é ajudar o nascimento de novos negócios, idéias e empreendimentos de base tecnológica. Fornece uma infra-estrutura básica com condições de aumentar o índice de sobrevivência e competitividade das novas empresas. Seu objetivo é auxiliar o crescimento da economia brasileira, aumentar a geração de empregos e melhorar a capacidade de exportação. A incubadora foi inaugurada no segundo semestre de 1998.
Há vários exemplos de empresas já incubadas no Cietec. Na área da biomedicina, há empresas que desenvolvem tecno-
P ENSANDO SA O PA U LO : U N I V ER S IDADE S E I NS TIT UT O S
USP, aproveitando espaços ainda disponíveis. Ele contribuiria para a política de atração de investimentos de qualidade da Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, contribuiria para a alteração da vocação econômica da Região Metropolitana de São Paulo e intensificaria a interação do Ipen, IPT e USP com as empresas.
O parque serviria, ainda, como motivação para a participação dos cerca de 4 mil pesquisadores que trabalham hoje na área e seria um estímulo para a ampliação dos empreendimentos bem-sucedidos a partir da incubadora
do câmpus. Esse parque tecnológico já está em gestação. Um gru
logias para a produção de válvulas para catéteres, grampeadores cirúrgicos e endoscópios. Na biotecnologia, a fabricação de hormônio de crescimento humano, sintetizado por bactérias geneticamente mõdificadas, é exemplo de uma pesquisa que começou no Ipen e que está sendo transformada num negócio de importância significativa para a sociedade, principalmente se considerarmos o alto ín-
''o conhecimento e a tecnologia
obtidos nas universidades
devem chega r à sociedade''
po executivo formado pelos parceiros e constituído pela Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico está dando os primeiros passos para transformá-lo em realidade.
Há várias sugestões, proposições e ações para que a produção científica e tecnológica seja efetivamente utilizada no desenvolvimento social e econômico de São
dice de nanismo encontrado na população brasileira.
No início, havia o prognóstico de que seriam necessários entre três e quatro anos para que empresas de base tecnológica ocupassem o espaço alocado, capaz de abrigar 15 empresas. O prognóstico estava errado. Em pouco mais de um ano, os 15 módulos já estavam ocupados. Hoje, mais de 80 empresas e negócios esperam a oportunidade de serem incubadas no parque.
Já existe uma proposta da parceria Ipen-IPT-USP, encaminhada à Secretaria da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico, para a adequação de um número maior de galpões. Assim, o Centro receberia um número bem maior de empresas. Num primeiro momento, seriam criados mais 15 módulos. Mas é possível que o total de 70 empresas incubadas possa ser atingido antes do fim do ano. É provável que seja aberto no câmpus do IPT um espaço para empresas que tenham sinergia com esse Instituto. É um novo modelo. Pela primeira vez, uma incubadora instalada na área da USP teve sucesso e o sucesso foi forte.
O objetivo desse trabalho é criar condições para que a iniciativa privada participe um pouco mais da ciência no Brasil. O conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico obtidos nas universidades devem chegar realmente à sociedade, ao mercado. A proposta é fazer isso em parcerias com empresas privadas, pequenas, médias e mesmo grandes.
Esse seria o objetivo de um parque tecnológico que poderia ser instalado inicialmente dentro da área da
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Paulo. É importante, de qualquer maneira, captar o interesse do setor,
por sua participação na definição de políticas e dos programas de incentivo à cooperação entre instituições de pesquisa e empresas. É preciso tentar flexibilizar os mecanismos legais que impedem ou dificultam essa cooperação.
São necessários novos programas governamentais de apoio à inovação tecnológica que estejam voltados para a realidade, que sejam capazes de apoiar a inovação nas empresas de ·acordo com sua capacidade. As instituições de pesquisa precisam contar com o apoio de programas e organismos governamentais capazes de auxiliá-las no desenvolvimento dessas atividades, principalmente na sua interação com as empresas e na preparação de novos negócios dentro ou perto dos câmpus universitários.
Não é possível, ainda, esquecer o problema do capital de risco. As empresas residentes ou incubadas num Centro de Criação de Empresas Tecnológicas ou num parque tecnológico precisam de capital de risco. Mas a solução desse probléma ainda está distante dos modelos propostos para a interação da ciência e da tecnologia.
As novas empresas não estão acostumadas a buscar capital de risco e não sabem onde procurá-lo. As grandes empresas, por sua vez, ou não estão interessadas numa associação ou, muitas vezes, não sabem falar a linguagem existente no mundo científico. Nosso mundo científico não está acostumado ou não está interessado em ouvir o discurso das empresas. É preciso fazer com que esses paradigmas sejam destruídos. Só assim, realmente, o saber alcançará o fazer.
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Área da saúde precisa de tratatnento diferenciado
O professor José da Rocha Carvalheira é o responsável pela Coordenação
dos Institutos de Pesquisa, um órgão da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. É também o presidente da comissão brasileira que estuda as vacinas contra a Aids. O estudo das doenças transmissíveis, como o mal de Chagas, faz parte de sua carreira. Carvalheira era professor titular do Departamento de Medicina Social da F acuidade de Medicina
~ O esforço de coordenação de ciência e ~ tecnologia na Secretaria da Saúde comea çou há pelo menos 30 anos, com a refor" ma administrativa de 1969, quando foi
de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, de onde
José da Rocha Carvalheira
criada a coordenadoria dos Institutos de Pesquisa. Os institutos tradicionais de pesquisa da área, porém, trabalham desde o início do século. Portanto, por serem anteriores até à constituição da própria Universidade de São Paulo, têm um papel extremamente relevante na história da pesquisa básica, da pesquisa aplicada e dos processos de produção associados. O Instituto Butantan fará 100 anos em 2001. O Instituto Adolfo Lutz é anterior ao Butantan. O Hospital Emílio Ribas e o Instituto Pasteur também são do começo do século.
se aposentou, em 1994, para dirigir o Instituto de Saúde, outro órgão estadual. Da direção do Instituto, passou para a coordenação dos institutos. Embora a coordenação seja relativamente recente, pois foi criada em 1969, ela é responsável por alguns nomes muito tradicionais da ciência brasileira, como o Instituto Butantan, o Instituto Adolfo Lutz, o Instituto Emílio Ribas, o Instituto Pasteur, a Hemorrede e outros organismos do governo estadual de São Paulo. Uma de suas funções é justamente a de servir como órgão de gestão, política, técnica e orçamentária, desses organismos, dos centros de vigilância e dos programas de ação coletiva ligados à saúde no estado.
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Essas instituições deram o tom da introdução da pesquisa experimental no Brasil. É preciso refletir sobre o que representava o paradigma adotado nessa época e que norteou a composição dessas instituições. A questão era sempre determinada socialmente. Havia problemas com os quais a sociedade se defrontava e para os quais era necessário encontrar algum tipo de solução.
Na área da saúde, o paradigma era dado pelo Instituto Pasteur de Paris. Era um aprofundamento da pesquisa básica, dentro aa percepção de que a pesquisa básica deveria ser informada pela realidade concreta, por meio de trabalhos de campo. Mais que isso, havia uma associação íntima com a pesquisa clínica e com a produção de soros e, posteriormente, de vacinas. Era assim que as instituições enfrentavam os problemas colocados pela sociedade.
A coordenação incorporou essas estruturas com toda a sua perspectiva e todo o seu trabalho acumulado. A estrutura mais nova a ser criada foi o Instituto de Saúde, voltado fundamentalmente para uma característica da área de saúde menos existente em outras áreas, que é o aparecimento de uma tecnologia que não é material, mas tem maior importância.
O papel de uma secretaria da saúde é dar conta da situação de saúde da população, promover e preservar a saúde, prevenir no que for possível a ocorrência de doenças, atender as pessoas que caíram doentes e, no final, tentar recuperar as seqüelas dos que adoeceram e completaram o ciclo da doença.
Uma secretaria desse tipo não pode, assim, valer-se única e exclusivamente de tecnologias materiais, como
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medicamentos, equipamentos, vacinas e outros produtos dessa natureza. Na área da saúde, é da maior importância a tecnologia não material, de organização de serviços e das modalidades de gestão e atendimento, para que o poder público possa cumprir seus papéis. Este é o grande problema com o qual se defronta, atualmente, a coordenação.
Apesar de seu nome indicar uma coordenação de institutos de pesquisa, ela assumiu uma dimensão mais ampla. Passou a incorporar uma parcela do que se convencionou chamar de saúde coletiva, envolvendo aí todos os sistemas de vigilância epidemiológica e sanitária e mesmo estruturas ambulatoriais e hospitalares destinadas ao comba-
PENSANDO SAO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS
dor Mário Covas. A comissão fez várias sugestões ao Executivo, ao Legislativo e a outras áreas de âmbito federal.
Uma dessas recomendações propunha a criação, no âmbito federal, de um organismo parecido com o Conselho de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo (Concite). Esse conselho teria caráter deliberativo e, portanto, poderes muito maiores, com comissões voltadas para diversos setores e que acompanhariam o estado da arte em cada área, mantendo o conselho informado sobre o assunto.
Recomendava-se, ainda, a criação de um Instituto de Altos Estudos associado ao Congresso Nacional para cui
dar dessas questões. O Congresso dos Estados Unidos tem um orga
te a doenças transmissíveis, como é o caso do Instituto Emílio Ribas e do Centro de Referência de Aids.
Trata-se de um problema de extrema complexidade e inclui a análise do processo social mais importante vivido atualmente pelo Brasil, o processo de municipalização da saúde. Um processo dessa envergadura não pode deixar de ser analisado por um pensamento crítico, de passar por uma
''os principais beneficiários não
consegu1nam comprar a
vacina contra
nismo semelhante. Uma Assembléia Legislativa do porte da de São Paulo também poderia pensar em ter um instrumento como esse, de modo a acompanhar os processos que tramitam pelo Legislativo estadual.
Existem permanentemente em tramitação questões de extrema complexidade e que, portanto, devem merecer uma reflexão
a Aids''
análise científica detalhada. Essa é uma das tarefas a que estão associadas as instituições de pesquisa da Secretaria da Saúde de São Paulo.
Nos últimos dez anos, apareceu uma característica de extrema relevância na área da saúde. Foi a criação de um mecanismo de controle social representado por conselhos municipais, estaduais e, no nível federal, pelo Conselho Nacional de Saúde. Além dos conselhos, que são o instrumento paritário de controle social, existem, de maneira também paritária, as conferências municipais e estaduais e a Conferência Nacional de Saúde. As conferências, realizadas periodicamente, são os instrumentos que indicam os rumos desejados pela população brasileira para seu sistema de saúde.
Foi realizada em 1993, em Brasília, uma primeira conferência nacional de ciência e tecnologia em saúde. Entre as teses mais importantes levadas por São Paulo a essa conferência estava a de que, na convergência do sistema de ciência e tecnologia com o sistema de saúde, a orientação deve ser dada pelo SUS, com base nas necessidades de saúde da população. Propôs-se, na época, a criação de uma Secretaria Nacional de Ciência e Tecnologia em Saúde, que nunca foi constituída, e de coordenações estaduais, semelhantes à existente em São Paulo.
Antes disso, em 1991, o Congresso Nacional organizou uma Comissão Parlamentar de Inquérito mista para examinar as causas e dimensões do atraso tecnológico brasileiro. A rela tora era a deputada Irma Passoni e o presidente da comissão era o então senador e hoje governa-
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de grande profundidade. Na área da saúde, há situações de extre
ma sensibilidade, nas quais o problema da propriedade intelectual e transferência de tecnologia precisa ser tratado com uma ótica diferente da mera análise do ponto de vista do mercado e da consideração de produtos ou processos como meras mercadorias. Um exemplo, no qual estou diretamente inserido atualmente, é a tentativa, da qual participa toda a humanidade, de se conseguir uma vaéina contra a Aids.
Exatamente sobre esse ponto, no qual os principais beneficiários seriam seguramente países incapazes de adquirir a vacina em quantidades suficientes, coloca-se em nível internacional uma discussão de extrema profundidade sobre mecanismos alternativos para trabalhar a questão da propriedade intelectual.
A Fundação Rockefeller, por exemplo, propôs que uma terceira parte, a Organização Mundial de Saúde ou a própria Fundação, sirva como intermediário sobre essas questões, permitindo que fossem abrandadas as exigências de propriedade intelectual para a transferência da tecnologia de produção de alguns produtos mais avançados do ponto de vista tecnológico. O objetivo seria tornálos acessíveis aos necessitados sem obedecer, obrigatoriamente, às leis do mercado.
O preço da vacina contra a hepatite levou quase 20 anos para cair de US$ 50 por dose para alguns centavos por dose e poder, assim, ser distribuída nos países pobres, do Terceiro Mundo. Na área da saúde, assim, esta é uma questão de extrema importância.
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En1 busca de recursos para novas necessidades
F armado em Engenharia Elétrica e Mecânica
;;;;;;;=:==========::;;.;;;;;.; ~ O Instituto de Pesquisas Tecnológicas § já completou 100 anos. Sua existência tem & sido um exemplo de pioneirismo. É o retra" to da saga paulista da busca da construção
pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Plínio Assmann acumulou uma enorme experiência antes de assumir o cargo de diretor-superintendente do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), em junho de 1998. Entre os cargos que ocupou estão o de secretário dos Transportes do Estado de São Paulo, o de presidente da Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa), o de presidente do Metrô de São Paulo e o de presidente do conselho de administração do Metrô do Rio de Janeiro. Assmann foi ainda fundador e primeiro presidente da Associação Nacional dos Transportes Públicos, fundador e presidente da Associação de Administração Participativa (Anpar) e da Agência de Desenvolvimento de Cubatão (ADC) e presidente do Instituto Brasileiro de Siderurgia e do Instituto de Engenharia de São Paulo. Também ocupou a presidência dos conselhos de administração da Ferrovia Paulista (Fepasa), da Dersa, da Caraíba Metais e da Companhia Brasileira do Cobre. Com cerca de 1.000 funcionários, dos quais 800 são pesquisadores e técnicos, o IPT tem 72 laboratórios, com condições de realizar mais de 3 mil tipos de ensaios, testes e análises. O Instituto já está entrando em seu segundo século. Foi fundado em 1899, como Gabinete de Resistência de Materiais da Escola Politécnica.
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de um país industrialmente competitivo e de um povo que quer a modernidade. O IPT foi o berço do concreto armado no Brasil. Foi também a origem da indústria aeronáutica brasileira, muito antes da Embraer, com seus protótipos de aviões com estrutura de madeira brasileira, muitos, muitos mesmo, ainda hoje servindo aos aeroclubes do país. .
Foi também a origem da engenharia de construção naval, experimentada no seu banco de provas para navios, o primeiro do Brasil. Esteve no começo do estudo da
Plínio Assmann mecânica de solos para áreas de risco em obras de infra-estrutura e áreas urbaniza
das. Isso também ocorreu com a tecnologia do álcool-motor. O IPT foi a principal base tecnológica de todo um processo de desenvolvimento econômico brasileiro durante o meio século da política de substituição das importações.
Durante esse tempo, o IPT forjou um conceito de pesquisa industrial básica adequada aos movimentos de desenvolvimento do país, adequou extensões tecnológicas às necessidades do mercado e formou uma numerosa equipe de pesquisadores competentes na gestão de políticas públicas, ética e profissionalmente preparados. Em fase importante de sua vida o IPT teve continuidade administrativa invejável. Inquestionavelmente, o IPT é um elemento significativo da política industrial.
No caso brasileiro atual, o IPT é parte da política industrial real e não formal. Atrás de cada laboratório do IPT há procedimentos básicos para setores industriais que podem progredir ou não, direcionar-se nessa ou naquela direção, na medida dos estímulos tecnológicos dominados no IPT.
Uma recente pesquisa divulgada pela Sobeete, a associação de empresas e profissionais dedicada aos estudos dos impactos da globalização no país, mostrou que empresas multinacionais, que representam 15% do PIB industrial, investem 3% do seu faturamento em inovação e capacitação para adaptar os produtos e processos já desenvolvidos pelas suas matrizes e, em 40% dos casos analisados, para desenvolver novos produtos.
Se, por um lado, isso mostra que a abertura da economia não resultará no extermínio dos esforços de inovação
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tecnológica no Brasil, indica, por outro, o quanto a indústria nacional precisa investir para se manter competitiva e o quanto é preciso fazer para dominar tecnologias em nosso ambiente, particularmente aquelas tecnologias adequadas às vantagens competitivas brasileiras, que somente serão estudadas por nós mesmos. Vale dizer, por nossos institutos de tecnologia.
As instituições de fomento à pesquisa estão cada vez mais abrindo programas de cooperação com empresas. Esse caminho está certo e tudo que se fizer nessa parte ainda será pouco. A ciência tem sido mais fomentada do que a tecnologia com recursos pú-blicos. O que distingue o esforço
PENSANDO SÃO PAU LO: UN I VERS I DADES E I NST ITUTOS
prática, de objetivos e de caráter nitidamente pró-ativo, elegeu dois programas-mestres: o primeiro, de apoio tecnológico a micro e pequenas empresas, por meio de laboratórios itinerantes que vão às fábricas prover conhecimento e o domínio tecnológico do qual essas empresas estão hoje órfãs. É o chamado Projeto Prumo. O segundo, de apoio de extensão tecnológica à exportação, é o Projex.
Há que mencionar um dilema que não é apenas do IPT, mas de todos os institutos que trabalham abaixo de seu ponto de equilíbrio. De um modo geral, as agências de fomento não remuneram a aplicação de mão-de-obra
própria da instituição nos projetas propostos. Cobrem apenas
científico do esforço de desenvolvimento tecnológico é a política industrial. Atrás do desenvolvimento científico vem o conhecimento, atrás do conhecimento tecnológico vem o emprego.
O IPT tem grande potencialidade de crescimento e pode fazêlo rapidamente. Sua vocação é multidisciplinar. Os seus 70 laboratórios abrangem praticamente todos os campos da tecnologia
''os últimos investimentos significativos
feitos pelo
materiais, equipamentos e mãode-obra contratados com terceiros. No caso do IPT, temos dificuldade de usar esses fundos de agências na proporção adequada para o programa de metrologia. Se forem usados os próprios pesquisadores do IPT no trabalho, ele será obrigado a pleitear maior subsídio do Tesouro do Estado para compensar a receita cessante,
IPT ocorreram na década de 70''
industrial e podem trabalhar em conjunto, o que praticamente coloca o IPT numa situação ímpar no contexto. Mas o IPT precisa modernizar-se. Os últimos investimentos significativos que fez ocorreram na década de 70.
De lá para cá, o país abandonou a sua política industrial autárquica, a economia modernizou-se e o mundo se globalizou. Particularmente, hoje é importante a ação na tecnologia metrológica, fundamental para a competição industrial, tanto no mercado interno como externo. Dificilmente duplicaremos as exportações brasileiras sem uma base metrológica moderna. Igualmente o comércio eletrônico, business to business, somente será possível com metrologia garantida nos produtos comercializados.
A atualização dos laboratórios de metrologia do IPT é orçada em aproximadamente US$ 12 milhões. A metrologia é essencial para embasar a exportação e conter a importação de produtos de baixa qualidade. É ainda fundamental para agilizar a elaboração de normas, feitas profissionalmente e não de forma amadora, como ocorre no Brasil, assim como para construir barreiras técnicas e regulamentos que respondam às necessidades de controles quanto aos aspectos de saúde, segurança e meio ambiente. O Brasil não pode escancarar as porteiras à importação sem se proteger, como fazem os países adiantados, contra produtos que não lhe interessam.
Além de propugnar pela agilização da normalização com base em modernização metrológica, o IPT, incorporando uma opção consciente por uma política industrial
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para o que não há lógica. Outra questão relevante é a prá
tica do fomento de não financiar a pessoa jurídica. As agências organizaram-se para financiar o pesquisador. Isso pode ser adequado para a pesquisa científica, mas nem sempre é para a pesquisa tecnológica. Esse assunto precisa ser resolvido até para o benefício das próprias agências de fomento, que estão sujeitas a críticas, ao privatizarem recursos públicos à margem das práticas da legislação em vigor.
O IPT vai crescer para atender às demandas da moderna tecnologia. Neste ano, pretende aumentar em 50% o seu ritmo de investimentos e crescer 15%. Mas a situação financeira do Instituto não é boa. Ele acumula dívidas no mercado, vencidas e não pagas. Necessita rapidamente de um aporte extraordinário para poder continuar atuar normalmente. É certo que o desenvolvimento do IPT não deverá estrategicamente basear-se em recursos extras. Eles são, no entanto, agora necessários na situação de curto prazo, mas, superado esse problema, o IPT trabalhará no seu ponto de equilíbrio, o que não consegue fazer hoje. A partir daí, poderá crescer em condição saudável e permanente.
Na base desse crescimento, é imprescindível a presença permanente de recursos do Tesouro, como hoje, numa proporção de 50% do orçamento total. Para cada real que o IPT crescer com recursos auferidos de sua atuação no mercado, o Estado deverá crescer numa participação igual. Esta é uma proposta aceitável para a sociedade, e sua execução dará a ela um IPT tão atuante como no seu primeiro século de vida.
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Novas responsabilidades ' . se sotnatn a pesquisa
O engenheiro agrônomo Eduardo Antonio Bulisani, diretor-geral do Instituto
Agronômico de Campinas (IAC), formou-se pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade
iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii;;;;;:::::;;;;;;:==::; z Os institutos de pesquisas ligados à ~ agricultura em seu sentido amplo foram
6 fundados no Estado de São Paulo para re" solver problemas da comunidade por meio
de São Paulo. Em 1979, obteve o mestrado, pela Universidade do Estado de Washington, nos Estados Unidos, e em 1994 o doutorado, pela Esalq.
de experimentação e pesquisa, essencialmente, e também para se conseguir apropriação de conhecimento e prestar serviços tecnológicos. A impressão é a de que os casos paulistas foram extremamente bem-sucedidos. Em poucos lugares do mundo foi possível alcançar tanto sucesso com relação aos recursos investidos. Os cálculos de taxa de retorno desses investimentos são todos altamente expressivos e ainda mais quando se consideram produtos individuais, como café, cana-de-açúcar, algodão e citros.
Desde 1969, Bulisani é pesquisador do Instituto Agronômico, trabalhando especialmente no setor de Leguminosas. De 1981 a 1992, foi chefe da seção técnica e,
Eduardo Antonio Bulisani É sempre bom lembrar casos que rele
vam a importância da pesquisa agrícola. Um dos mais citados é o do algodão.
de 1992 a 1998, diretor de divisão. Tem cerca de 30 artigos científicos publicados, especialmente sobre feijão, soja e adubação verde. Ganhou duas vezes o prêmio de Honra ao Mérito do governo de Estado de São Paulo, pelo desenvolvimento de novos cultivares de soja e feijão. O Instituto Agronômico já completou seu primeiro século. Foi fundado em 1887 pelo imperador dom Pedro 11, com o nome de Estação Agronômica de Campinas, e passou para o governo do Estado de São Paulo em 1892. Nos últimos 50 anos, lançou mais de 300 novos cultivares de diversas plantas. Atualmente, seus pesquisadores trabalham em cerca de 140 projetas, usando 6 mil hectares distribuídos por 20 estações experimentais espalhadas pelo estado.
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Quando, em 1929, houve uma crise de excesso de produção de café, o algodão já existia como uma alternativa tecnológica pronta para ser adotada. Isso contribuiu para que o Estado de São Paulo e o país sofressem menores perdas do que ocorreria normalmente.
Há exemplos mais recentes. A importância da existência de uma tecnologia brasileira foi realçada por um fato, também ligado ao algodão, que ocorreu na safra de 1998 e 1999 no Esrado de Goiás. Os produtores, trabalhando com material importado, tiveram um prejuízo de aproximadamente R$ 55 milhões, devido ao intenso ataque de uma doença pouco importante para os cultivares de algodão desenvolvidos no Brasil. Ou seja, devido ao açodamento da iniciativa privada em importar materiais novos e plantá-los em larga escala, sem verificar se estavam perfeitamente adaptados ao meio, o potencial dos prejuízos causados por um agente, responsável por uma moléstia, elevou-se a tal ponto que nem os cultivares aqui desenvol-vidos, tidos como tolerantes, suportaram o ataque. Centenas de outros exemplos mostram como os institutos da área agrícola trabalhavam e trabalham com questões de alta relevância para a socioeconomia do país.
Os institutos paulistas ligados à agricultura, com o passar do tempo, passaram por um processo de especialização. Os diversos institutos criaram escolas e, principalmente, uma competência para resolver problemas, especialmente quando atuam de maneira multidisciplinar e articulada. Sua capacidade instalada sempre pronta a se organizar e reorganizar permitiu que em pouco tempo
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fossem resolvidas dificuldades como a ocorrida em Goiás, a do nematóide de cisto da soja, a da nova mosca branca e dezenas de outras.
Nessa trajetória, os institutos se especializam cada vez mais. Vão sendo formados especialistas focados no conhecimento dos produtos e relativamente poucos voltados para os sistemas produtivos como um todo. Mas, de qualquer maneira, eles têm uma participação importante na definição de uma tecnologia agrícola tropical. Trata-se de uma tecnologia que não pode ser importada. Ela precisa ser brasileira. E hoje, sem dúvida, o Brasil é detentor do maior e mais abrangente co-nhecimento desse setor no mundo.
PENSANDO SÃO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS
chamar de "agro-silvo-pastoril e pesca" é o de que eles assumiram, de maneira clara e precípua, a tarefa da difusão e transferência de conhecimento. Os institutos não podem prescindir dessa atividade. Mas essa responsabilidade ajudou a quebrar um tripé que existia há algum tempo, no qual os componentes do ensino, da pesquisa e da extensão rural apareciam separados. Agora, os institutos são cobrados permanentemente pela difusão e transferência de tecnologia, de uma maneira até um tanto contundente, pois há uma certa confusão entre difundir e transferir com treinar. Treinar um determinado número de produ-
tores ou industriais é até relativamente fácil. Coloca-se o pessoal
Mas estão ocorrendo acontecimentos importantes. Examinando-se o quadro de pessoal, de fins de 1992 até hoje, verifica-se que o IAC conseguiu manter, aproximadamente, o mesmo número de pesquisadores. Entretanto, vem ocorrendo uma perda sensível de pessoal de apoio. Nessa área, a redução atingiu praticamente a metade do quadro de pessoal do Instituto. Trata-se de uma gran-
''o Estado não tem a i nda mecanismos eficazes para
a proteção
num auditório e passam-se as explicações. Porém, treinar todos os produtores do estado, ou mesmo segmentos de cadeias produtivas em sua totalidade, é muito mais complicado, especialmente com as estruturas e pessoal hoje existentes.
Houve, assim, uma mudança de trajetória com relação à pesquisa agropecuária, à produção de bens e à prestação de serviços fei-
do conhecimento''
de dificuldade, que deve ser mais bem avaliada.
Quando se examina a produção científica e tecnológica dos institutos, somada à sua prestação de serviços, nota-se uma diferença em relação a um passado não distante. O que aconteceu, e está acontecendo cada vez com maior intensidade, não é um desvio de função ou missão. Mas eles estão assumindo cada vez mais o papel de difusores de tecnologias e principalmente, em conjunto com as universidades, um papel de apoio ou de complementaridade nos cursos de pós-graduação. Esse é um fato observado praticamente em todos os países onde se desenvolvem pesquisa e ensino públicos.
O processo, incipiente até 1970, foi evoluindo em função da capacidade instalada e da competência do pessoal formado em pós-graduação nos institutos. Hoje, é fato corriqueiro, na análise de currículos de pesquisadores, encontrarmos também a qualificação de docente.
Isso pode explicar em parte por que não ocorre uma queda na produção científica dos institutos. Muito pelo contrário, observa-se em determinadas áreas até um acréscimo acentuado. Isso ocorre porque a participação dos bolsistas está aumentando. O Instituto Agronômico abriga, hoje, um grande número de bolsistas, estagiários de universidades e empresas ou recém-formados. Com 212 pesquisadores científicos, atende até 300 bolsistas por ano, não propriamente trabalhando, mas estudando no IAC.
Outro fator que levou a mudanças de imagem e atividade dos institutos de pesquisa na área que podemos
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tas pelos institutos da área agrícola. Existem hoje, como diretrizes
básicas em função da realidade socioeconômica do país, da globalização e da modernização dos produtos e processos, quatro pontos que devem ser incorporados na concepção de sua atuação como básicos à sua inserção nas políticas públicas e na comunidade. Esses pontos são a geração de renda, a geração de trabalho, a inclusão social e a qualidade certificada dos produtos. Os institutos, hoje, têm dificuldade para articular sua programação científica dentro dessas diretrizes básicas. Os próximos passos para que eles consigam continuar a trabalhar bem, prestar serviços à comunidade e avançar no conhecimento devem estar ligados à criação de mecanismos de apropriação do conhecimento gerado.
Existe porém, nesse campo, a questão do tratamento desse conhecimento e da maneira como os institutos podem apropriar-se desse conhecimento em seu benefício próprio, auferindo recursos dele. Hoje, esse conhecimento é público e o que é público não protege o seu conhecimento. O Estado não tem ainda mecanismos eficazes para sua proteção, ou mesmo para cobrar royalties ou usar processos de outra natureza para que esses recursos voltem para as instituições geradoras.
Além disso, será necessário criar novos mecanismos da gestão da pesquisa propriamente dita, principalmente da gestão das instituições, do ponto de vista financeiro, administrativo e patrimonial, a partir do imenso patrimônio e da capacidade instalada para se executar ciência e tecnologia no estado.
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Medidas para tnotivar e tnanter os funcionários
O presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo,
Nélson Raimundo Braga, é engenheiro agrônomo formado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRJ) e trabalha como pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Obteve o mestrado no departamento de Fitotecnia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com um trabalho
~ A conjuntura mundial vive, hoje, um ~ processo de implosão dos Estados nacio-6 nais. Tudo o que ocorre hoje em termos i' de debilitamento de empresas públicas,
de comparação de dez cultivares de soja num ambiente de alto rendimento. O doutorado foi
Nélson Raimundo Braga
de institutos de pesquisa e de universidades vem de uma compressão orçamentária com relação aos gastos sociais, resultante desse processo. O prioritário para o Estado, hoje, é pagar dívidas. Como se fosse uma homenagem aos 500 anos do descobrimento, a dívida pública brasileira, interna ou externa, atingiu cerca de US$ 500 bilhões. Esse é o fato maior da conjuntura em que vive o Brasil e o mundo. Sem olhar isso, não é possível falar de instituições de pesquisa ou de coisa alguma. A situação das instituições de pesquisa reflete o que ocorre com o país.
conseguido no departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Minas Gerais. A tese examinou as possibilidades do cultivo do grão-de-bico na área de Viçosa. No IAC, onde está desde 1975, Braga trabalha no Centro de Plantas Graníferas e é autor de diversos trabalhos sobre a adaptação do cultivo de grão-de-bico ao Estado de São Paulo e sobre o melhoramento da soja. Participou do lançamento de diversos novos cultivares de soja. Nos últimos anos, vem pesquisando também a adubação verde, uma técnica com a qual é possível melhorar o solo e a produtividade das plantas com pouco ou nenhum uso de adubos químicos. Este é o seu terceiro ano, num segundo mandato, na presidência da Associação dos Pesquisadores.
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Quanto à dimensão do setor de ciência e tecnologia, é dispensável e redundante falar da importância de instituições como os 17 institutos de pesquisa paulistas, da Embrapa e das universidades públicas, estaduais e federais, em termos de geração de conhecimento básico e de sua tradução em tecnologias capazes de responder a questões concretas apontadas pela sociedade. As tecnologias de que o mundo tropical precisa não · chegam pela Internet nem por satélite. Por isso, é fundamental que o 13rasil revigore os institutos de pesquisa e as universidades do sistema público.
As dificuldades em São Paulo não começaram hoje. Uma pesquisa feita em 1984 pelo Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia indicava já um quadro de crise, de retração orçamentária, de evasão de pessoal, de descontinuidade de medidas governamentais que sustentassem os institutos de pesquisa. É preciso, porém, conhecer os motivos da crise que atinge instituições de pesquisa da dimensão do Instituto Agronômico de Campinas. Em 1975, o IAC dispunha de 3.200 servidores. Hoje, tem menos de 1.500.
Se for feito o mapeamento desse pessoal, será possível observar que os pólos de criação de tecnologia no Instituto Agronômico foram os mais debilitados. Um dos laboratórios do Instituto, que participou do Projeto Genoma, merecedor de uma homenagem expressiva do governo do Estado, não dispunha de nenhum servidor de apoio permanente. Realizou a sua missão com competência, mas recrutando pessoas na forma de bolsas e outras formas de emprego não-estáveis. A situação dos institutos de pesquisa está chegando ao limiar do escândalo.
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Eles hoje recrutam pessoal para trabalhar inclusive sem respeitar a legislação trabalhista.
No caso do Instituto Agronômico, em particular, seus pesquisadores tiveram este ano uma surpresa desagradável. Em janeiro, foram informados de que, diante da falta de recursos, teriam de pagar parte do custo da publicação de seus trabalhos. Ou seja, o autor de uma pesquisa tem de tirar do seu bolso, do seu salário, os recursos para cobrir os custos de um periódico da instituição. O estado de penúria dos pesquisadores seria ainda pior se, no ano passado, o governador Mário Covas, após quatro ou cinco anos de luta de parte da Associação dos Pesquisadores e de setores so-
PE NS AN DO SÃO PA U LO: UN IV ERSIDADE S E INS TIT UTOS
nha condições de custear nossas atividades, como parte do trabalho. Assim, perderemos nossa autonomia e a isenção imprescindíveis a quem cumpre uma função pública de interesse social.
Não é digno que isso aconteça, não é justo. Ou se tomam medidas urgentes de recuperação e de restauração dos institutos de pesquisa, ou eles passarão a representar o papel de tradutores de tecnologias importadas, difusores de tecnologia feita por outros e com interesse diferente do brasileiro. O país precisa buscar um caminho próprio, independente, autônomo e soberano, embora
evidentemente com uma visão global e universal. É preciso inse
ciais solidários, não tivesse consagrado a equiparação que os pesquisadores tinham por lei com os salários dos docentes das universidades estaduais.
Sem dúvida, foi um ato de grandeza do governador. Mas, com relação ao pessoal de apoio, nada, porém, foi concretizado. A associação encaminhou ao governador um anteprojeto que sinalizava uma nova concepção de car-
''o país precisa buscar um
caminho próprio, independente,
autônomo
rir-se nesse mundo, dito globalizado, mas com soberania, com independência e com a cara de Brasil. É a isso que os institutos de pesquisa se prestam. É para isso que foram edificados.
A médio e longo prazo, o caminho definitivo para recuperar uma política de pessoal que fixe, motive e dê estabilidade aos institutos é proteger a carreira de pes-
e soberano''
reira. Até o valor correspondente do orçamento era secundário naquele instante. O objetivo da associação era mostrar ser possível uma gestão moderna nos institutos, para que eles possam recrutar, fixar, motivar e dar estabilidade ao seu pessoal permanente.
Parece, porém, que dentro de todos os governos, inclusive do atual governo estadual de São Paulo, existe um entulho burocrático, formado por pessoas que aprenderam profissionalmente a técnica de dizer não. Sempre que se encaminha ao governo alguma coisa que tenha mérito social, essas pessoas têm o capricho de justificar o não, de explicar o não.
De qualquer maneira, vive-se hoje um processo de sensibilização do governo, da Assembléia Legislativa, de todos os deputados, de todos os partidos. Esse movimento não tem caráter partidário, é um movimento em defesa do Brasil, de São Paulo e das suas instituições. Quem estiver ao lado dessas instituições, integra o movimento. Devemos buscar o caminho definitivo para conquistar uma política de recursos humanos que dê estabilidade aos institutos a médio e longo prazo. Para isso, é fundamental tomar medidas que protejam os servidores de apoio à pesquisa.
O objetivo é evitar um mal maior, o colapso de instituições que vão perder a sua característica de instituições públicas para se transformarem talvez, na melhor das hipóteses, em prestadoras de serviços a terceiros. Daqui a alguns anos, nós, que pesquisamos soja, talvez sejamos compelidos a sair fazendo palestras ou outras atividades, sob o patrocínio da Monsanto ou de quem quer que te-
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soal de apoio. Em caráter emergencial, porém, é básico estender o
diferencial salarial concedido ao pessoal de apoio à saúde a todos os outros servidores, de maneira universal e não excludente. Se o Brasil não tiver a Embrapa, empresas estaduais e universidades fortalecidas, não terá como reagir para desenvolver-se com soberania e justiça social. Abrigará uma população de consumidores e produtores reféns de poucas transnacionais, que imporão aos brasileiros o que e cÓmo eles vão produzir e consumir.
Os institutos de pesquisa vivem hoje um momento dramático. A associação tem sugerido que o Poder Executivo e a Assembléia Legislativa realizem visitas e audiências públicas nos próprios institutos. A posição dos pesquisadores científicos é de transparência, é de respeito à verdade dos fatos. Não há nada a esconder. É preciso evidenciar méritos e carências de cada instituição.
O governador teria uma caminhada muito positiva se ele fosse aos institutos. Apesar das crises, ele encontraria o Instituto Agronômico, por exemplo, produzindo novas variedades de manga, de café, de soja, amendoim, trigo, feijão, participando do Projeto Genoma, com espírito criativo e produtivo e tentando romper as dificuldades. Depois destas audiências, governador e deputados poderiam assumir suas decisões com mais convicção. O que os pesquisadores representados pela associação pedem neste momento é a ajuda do Poder Legislativo e do Executivo para retirar os institutos do isolamento e da marginalidade e para que suas realidades, finalmente, sejam conhecidas e modificadas.
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Para crescer, a agricultura precisa ser cotnpetitiva
A o defender a adoção de novos parâmetros para avaliar os resultados
da pesquisa agropecuária no Brasil, o ~ngenheiro agrônomo Alberto Duque Portugal pisa em terreno conhecido. Ele concentrou seus estudos e pesquisas nas áreas de gestão de pesquisa, socioeconomia, economia agrícola e desenvolvimento rural. Desde maio de 1995, ele é presidente
w O americano Jeffrey Sachs afirmou ~ d _ recentemente que o mundo não está ivi-~ dido pela ideologia, mas pela capacidade g ~ de gerar e absorver tecnologia. Informa-~ ções da Unesco e do Banco Mundial in-
da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada ao Ministério da Agricultura Alberto Duque Portugal
dicam, realmente, que há uma forte correlação entre indicadores de renda e intensidade de ciência e tecnologia entre países. Relacionando-se a renda per capita PPA (Paridade de Poder Aquisitivo) com o número de pesquisadores científicos por milhão de habitantes, constatase que as regiões mais desenvolvidas do mundo, as que têm renda per capita acima de US$ 20 mil ao ano, têm acima de 3 mil pesquisadores por milhão de habitantes. Blocos de países em desenvolvimento, como a América Latina, possuem uma renda per capita PPA entre US$ 5 e Abastecimento, responsável,
em boa parte, pela posição de destaque do país com relação à agricultura em áreas tropicais e subtropicais. Sua experiência inclui um período, entre setembro de 1993 e março de 1994, no qual foi secretário-executivo e ministro interino, no Ministério da Agricultura. Portugal formou-se engenheiro agrônomo pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1968, e obteve o doutorado em sistemas agrícolas pela Universidade de Reading, na Inglaterra, em 1982. Trabalhou como engenheiro agrônomo e agente de extensão rural em Minas Gerais e Goiás. Foi chefe do Departamento de Zootecnia e diretor de Operações Técnicas da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Antes de ir para Brasília, chefiou o Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Leite (CNPGL) da Embrapa, em Coronel Pacheco (MG). No setor privado, foi produtor rural e serviu como presidente da Associação de Produtores Rurais do Vale do Rio Preto (MG).
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mil e US$ 10 mil, e sua relação é de menos de 500 pesquisadores por milhão de habitantes.
A mesma relação é observada quando se compara a renda per capita PPA com a porcentagem de investimentos em ciência e tecnologia ( C&T) com relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Tomando apenas o produto agrícola bruto, os países desenvolvidos investiram, em média, 2,3% no ano de 1997. Alguns se aplicaram mais do que i~so. Os Estados Unidos investiram 3,4%, o Reino Unido, 3,7% e o Canadá, 5,3%. Os países desenvolvidos investem mais de 2% de seu PIB em C&T, enquanto, para as nações em desenvolvimento, o valor médio é de 0,5%. Estima-se que a África invista apenas ao redor de 0,3% de seu PIB em C&T.
Um fator importante é que essa diferença está aumentando. Entre 1971 e 1992, houve um crescimento de 68,7% nos investimentos em ciência e tecnologia dos países mais ricos. Nos menos desenvolvidos, o aumento foi de 27%.
O Brasil melhorou bastante, nos últimos anos. Estima-se que esteja investindo ao redor de 1,0% de seu PIB em atividades de C&T, computando-se os setores público e privado. Este valor está muito acima da média dos países em desenvolvimento, de 0,5%, graças a esforços do governo federal e de vários estados, inclusive São Paulo. Mas, embora os investimentos estejam aumentando, ainda estão aquém das potencialidades e necessidades para que o Brasil entre num ritmo de desenvolvimento mais rápido.
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Que fatores levam a essa diferença entre países ricos e países pobres? Primeiro, os países ricos dão maior importância à C&T do que os países pobres. Portanto, investem mais em C&T. Outro fator é a participação do Estado. Nenhum país é capaz de criar um sistema forte de ciência e tecnologia, capaz de proporcionar desenvolvimento, sem a ativa participação do Estado. Além disso, em todos os países mais ricos há uma crescente presença do setor privado, complementando ou somando esforços com o poder público. É um diferencial que não se observa nos países em desenvolvimento.
Existe ainda um fator extremamente importante, que é a
PENSANDO SÃO PAULO: UNIVERSIDADES E INSTITUTOS
sível de agentes econômicos, especialmente pequenos produtores rurais. Esses desafios só poderão ser vencidos se a estrutura produtiva brasileira tiver o suporte de uma forte estrutura de ciência e tecnologia.
Há áreas de C&T que farão a diferença, com impactos muito fortes sobre a agricultura no século que se inicia. Entre elas há áreas inovadoras como a biotecnologia, incluindo a engenharia genética. Elas estão mudando as vantagens competitivas entre regiões e países. Elas tornam possível, por exemplo, desenhar um produto de acordo com os desejos do mercado. Podem
também levar a métodos de produção mais baratos e com o me
existência de um arcabouço legal adequado, capaz de proteger a propriedade intelectual. O Brasil começou agora, na década de 90, a montar um arcabouço legal desse tipo, com agilidade e flexibilidade, capaz de dar condições para que a ciência e a tecnologia avancem rapidamente e de estimular a participação do setor privado em parceria com o setor público.
''o agronegócio pOSSUI Um
grande potencial
nor uso de defensivos. Outra área inovadora é a agri
cultura de precisão. Constitui-se em um sistema integrado de informações e tecnologias, baseado no conceito de que as variabilidades espacial e temporal influenciam os rendimentos de cultivos e a sua sustentabilidade. Seu uso permite a redução do risco econômico, ao diminuir custos de
de crescimento no Brasil''
Há vários motivos para que o Brasil e, em particular, o Estado de São Paulo continuem a investir em pesquisa agropecuária. Embora tenha decrescido a participação da agricultura na renda nacional, o que é normal num processo de desenvolvimento, a contribuição do agronegócio, como um todo, representa ao redor de 25% do PIB nacional. Além de ser, isoladamente, o setor mais importante da economia, possui um grande potencial de crescimento, pela abundância de seus recursos naturais, como terras nos cerrados, e pela disponibilidade de tecnologia e capacidade empresarial.
Num mundo em rápido processo de globalização, com crescente abertura comercial, a agricultura para crescer deve ser competitiva, em termos de qualidade dos produtos, preços e continuidade de oferta. Ao mesmo tempo, precisa estar constantemente preocupada com a sustentabilidade, especialmente do ponto de vista ambiental. O Brasil precisa ser competitivo, mas sem perder de vista essa questão. A questão ambiental já está colocada de maneira decisiva e definitiva em toda a sociedade. Há ainda a questão da qualidade da nutrição. Serão cada vez mais valorizados os vínculos existentes entre agricultura, alimento, nutrição e saúde. Estes são três desafios comuns à agricultura de qualquer país do mundo.
O Brasil tem, ainda, outro desafio: a eqüidade social. Precisa incorporar ao processo produtivo de mercado, ao processo de desenvolvimento, o maior número pos-
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produção. Permite também reduzir o risco de contaminação, do
solo e da água, já que os insumos são aplicados localizadamente, em quantidades variáveis e em tempos específicos, de conformidade com mapeamentos obtidos anteriormente.
Outras tecnologias são aquelas que agregam valor ao produto agropecuário, ou atuam sobre o processamento ou a diversificação de seu uso. Há ainda as tecnologias que torn(lm mais ágil o acesso e a disseminação de informações. Se o Brasil não conseguir dominar bem essas tecnologias, dificilmente será capaz de vencer os seus desafios e manter-se no mercado. Todas essas tecnologias terão um impacto muito grande no século 21.
A superação dos desafios e o domínio dessas tecnologias são importantes não somente para a agricultura brasileira. Eles têm outros efeitos positivos. O Brasil tem uma posição geográfica similar à de países menos desenvolvidos no mundo tropical: África, Ásia e América Latina. País tropical e subtropical, é detentor de um forte estoque de conhecimento de tecnologia para o agronegócio nessas áreas. O estoque de tecnologia tropical e subtropical desenvolvido pelo Brasil pode ser um excelente instrumento de cooperação técnica com países da África, Ásia e da própria América Latina e do Caribe, com a conseqüente integração comercial e política, colocando o Brasil em posição privilegiada.
A Embrapa está inserida em todo esse contexto. A sua missão é viabilizar soluções para o desenvolvimento sustentável do agronegócio brasileiro por meio da
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PENSAN D O SÃO PAU LO: UN IVERS ID ADES E I NS TI TU TOS
geração, adaptação de transferência e conhecimentos e tecnologias em benefício da sociedade. O papel da Embrapa hoje não é simplesmente fazer pesquisa, mas viabilizar soluções por meio da pesquisa, com a preocupação de olhar a do agronegócio com uma visão que vai desde a do pequeno produtor até à do grande empresário.
A Embrapa entende como agronegócio não só a grande empresa, mas todo um conjunto, composto pelo que está dentro da fazenda, antes da fazenda e depois da fazenda, incluindo aí o pequeno produtor. Sua política de administração está baseada numa filosofia de relacionamento
buscar a eficiência e a racionalização no uso de recursos e ter foco nas necessidades dos mais diversos segmentos da sociedade. Devem ser modelos com processos azeitados, embasados em avaliações por resultado.
Outro aparte é o necessário engajamento do setor privado. Esse setor participa ativamente no desenvolvimento da ciência e tecnologia em países desenvolvidos. A equação do desenvolvimento brasileiro, em todas as áreas, mas especialmente no agronegócio, não poderá ser adequadamente resolvida somente com os recursos do Estado. O setor privado terá de participar decisiva-
mente desse esforço. Finalmente, investimentos em
com a sociedade e com o mercado, entendido num sentido amplo, não se limitando ao que se refere a transações financeiras, e com três políticas setoriais bem definidas, uma de pesquisa e desenvolvimento, outra de negócios tecnológicos e uma terceira de comunicação empresarial.
Essas políticas partem da premissa de que a Embrapa está num negócio, como outro qualquer.
''o pequeno tem de receber a tecnologia,
po1s nao tem condições de comprá-la''
ciência e tecnologia agropecuária pelo Estado de São Paulo manterão a sua liderança, em relação ao resto do Brasil, que resultará em futuros bons negócios para o estado. A Embrapa tem hoje em São Paulo cerca de 40 projetas de pesquisa em andamento, envolvendo 13 instituições em Jaguariúna, Campinas e São Carlos. A Embrapa tem procurado fazer
Mas está entendido que a Embra-pa não vai vender tecnologia para o pequeno produtor. Ele tem de receber essa tecnologia, pois não tem condições de comprá-la. Então, é óbvio que órgãos de desenvolvimento, ministérios, secretarias estaduais, cooperativas, associações, têm de tornar viável essa tecnologia.
Mas como podem o Estado de São Paulo e o Brasil aumentar suas capacidades de gerar ciência e tecnologia agropecuárias? Há quatro questões fundamentais a considerar. A primeira é a valorização institucional. É de fundamental importância que a população brasileira encare a questão da ciência e tecnologia como um seta r estratégico, tão importante para o seu futuro como a educação, a segurança e o transporte.
Outro ponto é o arcabouço legal. Felizmente, nos últimos anos, o Brasil aprovou uma legislação sobre propriedade intelectual, o que aumentou a possibilidade de o setor privado investir também na área. Mas, ainda, é preciso buscar, dentro do arcabouço legal brasileiro, um nicho que dê à ciência e tecnologia um ambiente propício para o desenvolvimento institucional. A pesquisa precisa de continuidade, estabilidade, agilidade e flexibilidade, características essenciais a instituições que queiram acompanhar o avanço científico mundial.
Também é fundamental desenvolver e exercitar modelos de gestão capazes de atender às expectativas da sociedade e do próprio governo, que é quem banca os recursos das instituições públicas. Esses modelos devem
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um grande esforço. Acho que toda a estrutura de ciência e tec
nologia tem que fazer seu dever de casa nesse sentido.
FORU M SÃO PAULO SÉCU LO 2 1
PRESIDENTE: DEPUTADO VANDERLEI MACRIS
RELATOR-GERAL: DEPUTADO ARNALDO JARDIM
GRU PO T E M Á TIÇO NÚM E RO 13
CL~NCJA, T EC NOLOG IA E C OMUNIC A ÇOES
COORDENADOR: DEPUTADO CARLOS ZARATTINI
RELATOR: DEPUTADO EDMUR MESQUITA
CONSELHO TEMATICO:
JosB ANIBA L PERES DE P ONTES
F LAVIO GRYNSZPAN
OZIRES SILVA
ALDO M ALAVASI
H ERNAN CHA IMOVICH
ANTON IO M ANOEL DOS SANTOS SILVA
CARLOS VOGT
CRODOWALDO PAVAN
JOAO PISYSIEZNIG F ILHO
NELY BACELAR
0 TAVIANO H ELENE
NBLSON RAIMU DO B RAGA
EDUARDO ANTONIO B ULISANI
FERNANDO L EÇA
CARLOS H ENRIQUE DE BRITO CRUZ
CLAUD IO RODRIGUES
H BLIO WALDMAN
MARCOS ANTONIO MONTEIRO
M ONICA TEIXEIRA
PESQUI SA FAPESP
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