PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
JULIA DE MENEZES NOGUEIRA
TRIBUTAÇÃO DO SEGURO, DO RESSEGURO E DOS PLANOS
DE PREVIDÊNCIA PRIVADA,
DAS SEGURADORAS, RESSEGURADORAS E ENTIDADES DE
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR,
SOB A ÓPTICA DO CONSTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO
DOUTORADO EM DIREITO
São Paulo
2014
JULIA DE MENEZES NOGUEIRA
TRIBUTAÇÃO DO SEGURO, DO RESSEGURO E DOS PLANOS
DE PREVIDÊNCIA PRIVADA,
DAS SEGURADORAS, RESSEGURADORAS E ENTIDADES DE
PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR,
SOB A ÓPTICA DO CONSTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO
DOUTORADO EM DIREITO
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Direito Tributário sob a orientação do Prof. Dr. Paulo de Barros Carvalho.
São Paulo
2014
Banca Examinadora:
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RESUMO
Nosso objetivo, neste trabalho, é analisar, sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico, as normas tributárias incidentes sobre o seguro, o resseguro e os planos de previdência privada. Também nos ocupamos da tributação incidente sobre as receitas e lucros (ou superávit) das entidades que são partes necessárias nesses contratos: seguradoras, resseguradoras, entidades abertas e fechadas de previdência complementar. A análise desses conjuntos normativos sob ponto de vista único se justifica, pois os contratos em foco e as atividades desenvolvidas pelas referidas entidades têm como objetivo comum garantir cobertura de riscos. No caso do seguro, riscos de qualquer natureza, bastando que sejam lícitos e submetidos às categorias de seguro de dano e seguro de pessoas. No caso da previdência privada, protege-se primordialmente o risco social da velhice. No último capítulo, nos concentramos sobre o sistema construído no País, nas últimas duas décadas, voltado à tributação dos planos de previdência privada. Analisamos cada uma de suas etapas, para concluir que atualmente se adota regime denominado “IIT”, segundo o qual há isenção e dedutibilidade na etapa das contribuições, isenção na etapa da acumulação dos recursos no plano, havendo tributação somente por ocasião da percepção dos benefícios, ou resgate, pelo beneficiário, privilegiando-se a poupança de longo prazo em detrimento do consumo imediato. Palavras-chave: Seguro. Resseguro. Previdência privada. Seguradoras. Resseguradoras. Entidades de previdência. Planos previdenciários. Tributação. Imposto. Renda. Receita.
ABSTRACT
The goal of this thesis is to analyze, from the perspective of Logical-Semantic Constructivism, all the tax norms incident on insurance, reinsurance and pension plans. We also went through the tax rules applicable to revenues and profits (or surplus) of the entities that are necessary parties to those contracts: insurers, reinsurers, open and closed private pension entities. The analysis of these normative sets under a single point of view is justified, since the contracts on focus and the activities of these entities have a common goal of ensuring risks. In the case of insurance risks, the risks must only be lawful and subject to the categories of damage insurance and personal insurance. In the case of private pension, it protects primarily the social risk of old age. Regarding the taxation of the entities, identity is shown in many aspects, especially the requirement for establishment of technical provisions to meet the future obligations, providence that must necessarily be observed by the Tax Law. In the last chapter, we concentrate on the system built in Brazil, during the last two decades, regarding the taxation of private pension plans. We analyzed each of its stages, to conclude that currently a scheme called "EET" (exemption/exemption/taxation) is adopted, according to which in the first step exemption and deductibility of contributions are granted, in the second step there is also income tax exemption during the accumulation of resources in the plan, with taxation only in the third stage, when the perception of benefits or redemption by the beneficiary occurs, privileging the long-term savings as opposed to the immediate consumption of the income.
Keywords: Insurance. Reinsurance. Pension. Insurers. Reinsurers. Pension funds. Pension plans. Taxation. Tax. Income. Revenue.
Sumário
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 9
1 PREMISSAS METODOLÓGICAS ....................................................................... 15
1.1 O Risco na Sociedade Contemporânea ................................................................. 15
1.2 Sistema Jurídico sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico .......... 17
1.3 Norma Jurídica como expressão mínima irredutível de manifestação do dêontico ................................................................................................................. 22
1.4 Teoria da Regra-Matriz de Incidência Tributária .................................................. 26
2 PRINCÍPIOS RELACIONADOS À ATIVIDADE SECURITÁRIA .................. 29
2.1 Noção de Princípio ................................................................................................ 29
2.2 O Seguro e a Previdência Complementar na Constituição .................................... 31
2.3 O Princípio do Mutualismo ou Solidariedade ....................................................... 35
2.4 O Princípio da Capitalização ................................................................................. 38
2.5 Outros princípios aplicáveis ao Seguro e à Previdência Privada .......................... 43
3 TRIBUTAÇÃO DO SEGURO E DO RESSEGURO ........................................... 46
3.1 Definição do conceito de seguro ........................................................................... 46
3.2 Definição do conceito de resseguro ....................................................................... 51
3.2.1 Peculiaridades dos contratos de seguro e resseguro a serem consideradas pelo Direito Tributário ................................................................ 54
3.2.2 Imposto sobre Operações Financeiras – Seguro ............................................... 56
3.2.2.1 Competência constitucional para a instituição do IOF – Seguro ................. 56
3.2.2.2 Enunciados de competência do CTN acerca do IOF – Seguro .................... 59
3.2.2.3 RMIT do IOF – Seguro ................................................................................ 61
3.3 Imposto sobre a Renda na Fonte sobre remessas de prêmio de seguro ao exterior ................................................................................................................... 62
3.2.1 Princípios da Territorialidade e da Universalidade .......................................... 63
3.2.2 Definição da alíquota aplicável a remessas de prêmio de seguro e resseguro ........................................................................................................... 66
3.2.3 Redução da base de cálculo do IRRF nas remessas de prêmio de resseguro ........................................................................................................... 71
3.2.4 RMIT do IRRF sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro ............... 73
3.2.5 Aplicação do artigo 7º do Tratado Modelo da OCDE aos pagamentos de prêmio de seguro e resseguro ao exterior ......................................................... 74
3.2.5.1 Tratados Internacionais – Modelo da OCDE ............................................... 74
3.2.5.2 Tratamento atribuído aos rendimentos de serviços ...................................... 76
3.2.5.3 Aplicabilidade do artigo 7º aos prêmios de seguro e resseguro ................... 83
3.4 PIS e COFINS-Importação sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro ao exterior – Hipótese de não-incidência tributária .............................. 85
3.5 Tributação da indenização recebida pelo segurado ............................................... 87
3.5.1 Definição do conceito de indenização .............................................................. 87
3.5.2 A indenização no contrato de seguro ................................................................ 88
3.5.3 Distinção entre os conceitos de indenização e renda ........................................ 91
3.5.3.1 Renda versus transferências patrimoniais .................................................... 94
3.5.3.2 Indenização por prejuízos extrapatrimoniais versus renda .......................... 98
3.5.3.3 Pagamento do capital segurado versus renda ............................................. 103
3.5.3.4 Indenização por lucros cessantes versus renda .......................................... 107
3.5.3.5 Indenização superior ao valor contábil versus renda ................................. 108
3.5.4 Não incidência de PIS e COFINS sobre indenizações ................................... 111
3.5.4.1 Jurisprudência do CARF e da CSRF ......................................................... 115
4 TRIBUTAÇÃO DAS SEGURADORAS E RESSEGURADORAS ................... 120
4.1 Definição dos conceitos de Seguradora e Resseguradora ................................... 120
4.2 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário ............................. 123
4.3 PIS e COFINS devidos pelas Seguradoras e Resseguradoras – Hipótese de não-incidência tributária ...................................................................................... 126
4.3.1 Legislação aplicável ....................................................................................... 126
4.3.2 Declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º, da Lei nº 9.718/98, e seus efeitos sobre as seguradoras e resseguradoras ..................... 128
4.3.3 Da adequada definição de faturamento e consequências para o PIS e a COFINS das Seguradoras e Resseguradoras .................................................. 131
4.3.4 Prêmio versus receita ...................................................................................... 133
4.4 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos por Seguradoras e Resseguradoras ............. 137
5 TRIBUTAÇÃO DAS ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PRIVADA ........................................................................... 140
5.1 Definição do conceito de Previdência Complementar Privada ........................... 140
5.2 Entidades de Previdência Complementar Privada ............................................... 144
5.2.1 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário ........................ 144
5.2.2 Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) .......................... 147
5.2.2.1 A questão da imunidade das EFPC ............................................................ 151
5.2.2.1.1 Jurisprudência do STF ........................................................................... 154
5.2.2.2 PIS e COFINS e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ........... 162
5.2.2.2.1 Aplicabilidade da isenção do artigo 15 da Lei nº 9.532/96 às EFPC ..................................................................................................... 165
5.2.2.2.2. Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EFPC .................. 167
5.2.2.2.3 Contribuições recebidas por EFPC versus receita ................................ 170
5.2.2.3 IRPJ, CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ............... 174
5.2.2.3.1 Lucro versus superávit .......................................................................... 174
5.2.2.3.2 IRPJ e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária ...................... 179
5.2.2.3.3 O tratamento atribuído pela MP nº 2.222/01 aos rendimentos das entidades de previdência privada .......................................................... 181
5.2.2.3.4 A isenção concedida pela Lei nº 11.053/04 .......................................... 184
5.2.2.3.5 CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária .................... 187
5.2.3 Entidades Abertas de Previdência Complementar - EAPC ............................ 190
5.2.3.1 PIS e COFINS e as EAPC – Hipótese de Não-Incidência Tributária ........ 191
5.2.3.1.1 Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EAPC .................. 192
5.2.3.1.2 Contribuições a planos de previdência privada aberta versus receitas ................................................................................................... 195
5.2.3.2 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos pelas EAPC ........................................ 199
6 TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA ..................... 203
6.1 Definição do conceito de plano de previdência privada ...................................... 203
6.2 Tratamento tributário das contribuições efetuadas aos planos ............................ 208
6.2.1 Contribuições dos participantes ...................................................................... 208
6.2.1.1 Definição do conceito de contribuições ..................................................... 209
6.2.1.2 Dedução das contribuições na legislação ordinária ................................... 210
6.2.1.3 Aspectos constitucionais da dedutibilidade das contribuições .................. 214
6.2.2 Contribuições da Patrocinadora ou Instituidora ............................................. 215
6.2.2.1 Dedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e da CSLL ............................. 215
6.2.2.2 Semelhança dos benefícios aos da previdência social ............................... 219
6.2.2.3 Jurisprudência do CARF ............................................................................ 221
6.2.2.4 Isenção de IRPF para os participantes ....................................................... 223
6.2.2.5 Isenção de contribuição previdenciária ao INSS ....................................... 228
6.2.2.6 Contribuições em favor de beneficiário residente no exterior ................... 229
6.3 Isenção de IRRF sobre os rendimentos dos planos ............................................. 231
6.4 Tratamento tributário dos benefícios e resgates recebidos pelos participantes ......................................................................................................... 234
6.4.1 Regime tradicional – Incidência do IR / tabela progressiva ........................... 236
6.4.2 Regime optativo – Incidência do IR / alíquotas regressivas ........................... 239
6.4.3 RMIT do IRRF incidente sobre resgates e benefícios da previdência privada ............................................................................................................ 244
6.5 Benefícios e saldos de conta recebidos pelos beneficiários ................................ 246
6.5.1 Tributação dos benefícios de pensão por morte ............................................. 247
6.5.2 Isenção do capital segurado pago por entidades de previdência privada ....... 248
6.5.3 Tributação do saldo de conta pago a beneficiários ......................................... 249
6.5.4 Entendimento da RFB .................................................................................... 250
6.5.5 Jurisprudência do STJ ..................................................................................... 253
6.6 VGBL – Seguro de Vida com cláusula de cobertura por sobrevivência ............. 258
6.6.1 RMIT do IRRF incidente sobre benefícios e resgates de VGBL ................... 262
6.7 Portabilidade ........................................................................................................ 263
6.8 Benefícios e resgates pagos a domiciliados no exterior ...................................... 264
CONCLUSÕES ........................................................................................................... 268
9
INTRODUÇÃO
Quando iniciava a elaboração desta tese, emergiram, inesperadamente, os
protestos precipitados pela centelha do “Movimento Passe Livre”, que se alastraram
rapidamente por todo o País. Essas manifestações deixaram a todos atordoados e nem
mesmo seus participantes pareciam estar seguros quanto ao que se opunham. Eram
movidos, basicamente, por um sentimento de revolta contra as motivações e os meios
utilizados tradicionalmente na política, mas as bandeiras variavam desde a rejeição à
PEC 37, que limitava os poderes de investigação do Ministério Público, até a repulsa ao
projeto de “Cura Gay” defendido por um deputado e pastor evangélico. Fato é que nem
os políticos, nem a mídia, sabiam como reagir a acontecimentos tão imprevistos. O
emergir desse movimento fez crescer em mim, ainda mais fortemente, a percepção do
quão complexa é a sociedade em que vivemos.
A globalização e o amplo acesso à informação, proporcionados pelos meios
de comunicação de massa, em especial pela internet, aumentam progressivamente essa
complexidade. As informações obtidas por esses meios nem sempre provêm de fontes
seguras. Aliás, as fontes, na internet, são majoritariamente obscuras ou desconhecidas.
Bombardeados por um emaranhado de informações e nelas fundados, obrigamo-nos, na
vida cotidiana e profissional, a um sem-número de tomadas de decisões que, por sua
vez, nos expõem a erros, falhas e seus decorrentes prejuízos. Como consequência dessa
realidade, o risco é uma das mais fortes marcas do mundo contemporâneo.
Lidar racionalmente com riscos é habilidade inata, aperfeiçoada na espécie
humana. A capacidade de ter consciência de sua existência, enfrentá-los e vencê-los fez
com que a Humanidade se conservasse e evoluísse entre tantas outras espécies que
pereceram. Inicialmente, o homem enfrentava os perigos da natureza: frio, tempestades,
enchentes, secas, ataques de animais ferozes, doenças. Com o passar do tempo, foi
aprendendo a se defender, mediante o desenvolvimento de mecanismos de proteção
quase sempre físicos e concretos, como vestimentas, armas e moradias protegidas,
assim como através do desenvolvimento da ciência e da medicina. Mais recentemente,
sobretudo após a Revolução Industrial, a sociedade passou a se deparar, também, com
riscos sociais, como o desemprego e a incapacidade para o trabalho, e a buscar meios
para enfrentá-los da forma menos penosa possível.
10
Todavia, com a modernização, à medida que o mundo se torna mais
complexo, os riscos de todos os tipos se multiplicam e agravam. Sua existência é
inerente à vida e aceita como inevitável, mas, conquanto inafastáveis, podem ser
controlados e por isso, enquanto se agravam, se aperfeiçoam também as técnicas para
lhes dar combate. O próprio Direito é encarado pela Sociologia como tendo a função de
atenuar riscos1.
Como é patente, uma das formas mais eficientes encontradas pelo Direito
para minimizar riscos são os sistemas normativos securitários, ou seja, conjuntos de
normas que visam oferecer compensações financeiras, ante a ocorrência de evento
danoso, em razão de risco previamente identificado. Esses sistemas tiveram origem no
fim da Idade Média, com o crescimento da atividade comercial e das viagens marítimas
e, consequentemente, de seus riscos.
Ensina BURANELLO que “a primeira forma de seguro na Idade Média foi o
seguro marítimo. No contrato de seguro marítimo o capitalista se obrigava a pagar
determinada soma ao segurado, caso o navio não chegasse ao local de destino. Só
posteriormente, na Inglaterra, apareceu o seguro terrestre”.2 Já o seguro de vida é
derivado do seguro de escravos, que eram considerados bens móveis. Muito depois é
que se criou seguro de vida para os navegantes, a fim de que seus dependentes fossem
indenizados na hipótese de seu falecimento durante as viagens. O revogado Código
Comercial, curiosamente, proibia a contratação de seguro sobre a vida de homem livre,
algo que somente veio a ser derrogado pelo Código Civil de 1916.
Inicialmente, o seguro era estruturado de forma alheia ao Direito, como
jogo, aposta, baseado exclusivamente na alea. Com o tempo, foi se especializando e
sendo normatizado, tornando-se cada vez mais técnico e organizado, de modo a dar
conta dos riscos atuais, muito mais complexos que os medievais.
Desde então, a Humanidade passou pela Revolução Industrial e há quem
diga, como o festejado sociólogo ULRICH BECK, que hoje se vive numa “Sociedade de
1 ZOVICO, Marcelo Luis Roland. Os limites do direito diante da teoria do risco: uma abordagem sobre a (in)eficiência das políticas de segurança pública. 2012. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 14.
2 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 25.
11
Risco”, ou seja, numa sociedade marcada pela insegurança. Afirma esse autor que os
riscos e ameaças de hoje diferem
[…] de seus equivalentes medievais, com frequência semelhantes por fora, fundamentalmente por conta da globalidade de seu alcance (ser humano, fauna, flora) e de suas causas modernas. São riscos da modernização. São um produto de série do maquinário industrial do progresso, sendo sistematicamente agravados com seu desenvolvimento ulterior3.
A ideia de risco como elemento marcante da sociedade contemporânea
também é assinalada fortemente na obra de NIKLAS LUHMANN. Ele ressalta em seus
escritos que
[…] o risco é ligado ao saber, poder, poder escolher e possuir alternativa, e essas são todas no mesmo sentido, característica da modernidade e da sociedade moderna. Só na Sociedade Moderna a Ação é livre, no sentido de que pode ser realizada de outra maneira. Nesse sentido, a ação que segue uma direção pode ou deve se dar de outro modo, ou mesmo em outra forma, não sendo determinada.4
Sob esse ponto de vista, “o risco é uma técnica como o Direito voltada para
o futuro. Assim, risco possui um caráter estrutural de ação na sociedade moderna”5. A
ideia central de LUHMANN é: a multiplicidade de escolhas é a marca da sociedade
contemporânea, e isso implica riscos cada vez maiores.
J. J. CALMON DE PASSOS também refletiu com argúcia sobre esse tema, tal
como inserido na sociedade atual, distinguindo as noções de perigo e risco:
A ciência, a tecnologia, a economia de nossos dias contribuíram para a redução do perigo. A previsibilidade e o controle que a tecnologia já permite no tocante aos acontecimentos externos autorizam esta conclusão. O que é danoso por determinação externa se tornou altamente previsível e controlável, graças aos avanços da ciência. Contudo, na medida em que se tornam evidentes e mais numerosas as possibilidades de decisão em relação a comportamentos, ou na medida em que podem se tornar visíveis as possibilidades das quais depende a ocorrência de danos futuros efetivos, impõe-se a tematização dos riscos. O horizonte do futuro se retrai, a sua prospectiva se desloca do âmbito do perigo para o âmbito do risco. Os riscos, agora, estão estreitamente relacionados ao desenvolvimento da própria sociedade, ao desenvolvimento da ciência, da tecnologia, da medicina, da política
3 BECK, Ulrich. Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Trad. Sebastião Nascimento. São Paulo: 34, 2010, p. 26.
4 Apud ZOVICO, Marcelo Luis Roland. Os limites do direito diante da teoria do risco: uma abordagem sobre a (in)eficiência das políticas de segurança pública. 2012. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 61
5 Quem resume o entendimento de Luhmann sobre essa questão é Marcelo Luis Roland Zovico (ibid., loc. cit.).
12
e em geral às transformações da estrutura nas quais se torna possível a comunicação social. Em suma, concluem, o risco se fez integrante do próprio modo de ser da sociedade contemporânea.6
Quanto mais ampla a possibilidade de diferentes decisões, ou seja, quanto
maior a liberdade de escolha, mais elevado o risco, e mais forte a insegurança. Por isso,
como diz J. J. CALMON DE PASSOS, o risco se fez integrante do modo de ser da
sociedade contemporânea. Pouco há, hoje, que falar em perigo, ou seja, fatores externos
danosos, imprevisíveis e incontroláveis. Cresceu, porém, exponencialmente, a
exposição ao risco, ou seja, a variabilidade de resultado conhecida e enfrentada como
condição para o desenvolvimento.
As seguradoras, resseguradoras, entidades abertas e fechadas de previdência
privada, assim como os institutos jurídicos do seguro, do resseguro e do plano de
previdência privada, nada são além de mecanismos criados, por feixes de normas
jurídicas, para permitir que se enfrentem os riscos das atividades complexas da
sociedade atual, inerentes às pessoas e empresas, com maior eficácia e estabilidade.
A noção de risco é, portanto, o elemento que reúne e assemelha a atividade
exercida por essas entidades e os seus produtos e, consequentemente, a legislação que
os rege. Com efeito, as seguradoras, resseguradoras e entidades de previdência privada
se especializaram na avaliação de riscos, com utilização do instrumental oferecido pela
ciência atuarial. Feita a avaliação, chamada no jargão securitário de underwriting (ou,
em português, subscrição) é estabelecido um valor a ser pago pelo
segurado/participante em contraprestação a uma cobertura para o caso de sinistro
(prêmio, no seguro, ou contribuição, na previdência privada). A partir daí, essas
entidades vão envidar esforços para acumular recursos (reservas ou provisões e seus
rendimentos no mercado financeiro) para fazer frente à possível (ou certa, no caso da
previdência privada e do seguro de vida) necessidade de indenização.
Os sistemas securitários, conjuntos de normas jurídicas criados para
oferecer cobertura a riscos, são subsistemas normativos bastante peculiares. A
tributação aplicável às riquezas geradas e auferidas pelas entidades que operam nesses
6 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 2.
13
sistemas deve atentar para seus caracteres distintivos, assim como a tributação dos
contratos e das empresas de seguro, resseguro e previdência privada.
O objetivo deste trabalho é observar e descrever como se estruturaram, no
Brasil, os subsistemas tributários que regulam as atividades econômicas securitárias e
previdenciárias privadas, as quais têm o risco como denominador comum.
Dentre muitas peculiaridades a que o Direito Tributário deve estar atento
acha-se o fato de que, como essas entidades têm o objetivo de indenizar sinistros
(seguradoras e resseguradoras) ou pagar benefícios na velhice ou incapacidade dos
participantes (entidades de previdência privada), precisam acumular riquezas para arcar
com o pagamento de indenizações decorrentes de tais acontecimentos. Portanto, o
patrimônio poupado para essa finalidade não podem ser amesquinhado
indiscriminadamente por tributos, de forma inadequada à sua natureza, sob pena de
frustrar seu objetivo, que tem relevante papel social.
Com efeito, o fim análogo de dar cobertura a riscos naturais e sociais faz
com que seguradoras, resseguradoras e entidades de previdência privada tenham
características comuns, merecendo tratamento tributário com notas semelhantes.
Diferentemente de outras pessoas jurídicas de direito privado, essas
entidades são verdadeiros repositórios de poupança (inclusive por isso as seguradoras e
entidades abertas são consideradas parte do “sistema financeiro nacional”), na medida
em que precisam acumular fundos para o pagamento de futuras indenizações e
benefícios. Por serem, do ponto de vista econômico, gestoras de grandes volumes de
recursos de terceiros, sua atividade é regulada pelo Estado e, portanto, são obrigadas a
constituir reservas técnicas suficientes para satisfazer seus prováveis compromissos
futuros com os segurados e participantes.
Os ingressos de recursos nessas entidades, por conseguinte, não podem ser
tratados igualmente aos valores recebidos por empresas comerciais ou prestadoras de
serviços. A constituição de provisões técnicas deve ser sempre levada em consideração
e excluída da base de cálculo dos tributos, até a sua definitiva reversão ao final do
contrato, se o sinistro não se efetivar. Da mesma forma, os ganhos obtidos com a
aplicação desses recursos merecem tratamento especial do Direito Tributário.
14
Considerando as semelhanças que unem as atividades de seguradoras,
resseguradoras e entidades de previdência privada aberta e fechada, bem como os
respectivos contratos, o seguinte percurso será trilhado. Primeiramente, serão expostas
as premissas metodológicas, quando se investigará o conceito de risco, vetor comum a
todos os institutos cuja tributação é estudada nesse trabalho. Em seguida, se discorrerá
sobre a visão do sistema jurídico pelo prisma do Constructivismo Lógico-Semântico.
Tal exposição é essencial, pois o método científico utilizado é norteado, do começo ao
fim, por tal perspectiva. Ainda neste capítulo será abordada a teoria da regra-matriz de
incidência tributária, utilizada para a demonstração da estrutura normativa de todos os
tributos incidentes sobre os contratos e entidades securitárias objeto de análise.
O segundo capítulo é dedicado à análise dos princípios constitucionais que
fundamentam toda a legislação complementar e ordinária que trata das atividades e
contratos securitários objeto do presente estudo.
No terceiro, munidos das premissas colocadas no primeiro e no segundo
capítulo, adentraremos o estudo da tributação aplicável aos contratos de seguro e
resseguro, construindo as regras matrizes dos diversos tributos que os oneram, seja
quando firmados entre partes domiciliadas no País, seja vinculando parte domiciliada no
exterior. Nesse contexto, fez-se necessário tratar de assuntos de Direito Tributário
Internacional, como os princípios da territorialidade e da universalidade e a aplicação
das convenções para evitar a dupla tributação da renda.
Em seguida, nos capítulos 4º e 5º, trataremos da tributação aplicável às
entidades securitárias, e não mais aos respectivos contratos. Assim, o Capítulo 4º será
dedicado à tributação das seguradoras e resseguradoras, e o 5º cuidará da tributação
disciplinadora das entidades abertas e fechadas de previdência complementar.
Por fim, no Capítulo 6º, abordaremos o regime tributário especial aplicável
aos planos comercializados pelas entidades abertas e fechadas de previdência privada.
Feita essa introdução, e tendo sido ressaltada, inicialmente, a especificidade
das atividades securitária e previdenciária privada, passamos à tese, cujo objetivo é
analisar as normas tributárias direta ou indiretamente relacionadas aos contratos de
seguro, resseguro e previdência privada.
15
1 PREMISSAS METODOLÓGICAS
1.1 O Risco na Sociedade Contemporânea
A vida na sociedade moderna se tornou tão complexa que aceitamos o risco
como inseparável de toda e qualquer atividade. São muitos os exemplos que o
comprovam. Um deles é expressivo: o uso de placebos em testes com medicamentos.
Médicos e pacientes aceitam, por um lado, correr o risco de os novos medicamentos não
terem a eficácia esperada e até mesmo gerarem danosos efeitos colaterais e, por outro, o
fato de que parte dos pacientes não receberá tratamento, o que implicará em
agravamento do seu quadro. Esses riscos são enfrentados conscientemente, para que se
alcance um resultado benéfico à coletividade: a identificação de droga eficiente contra
certa enfermidade.
O risco é, pois, parte indissociável da vida contemporânea. A sociedade
aprendeu a com ele conviver e até a extrair dele benefícios. Tanto o seguro quanto a
previdência privada têm o objetivo comum de “satisfazer interesses derivados do risco”,
como ensina PÓVOAS7. Os sistemas securitários, por um lado, permitem às pessoas e
empresas lidar melhor com os riscos que inexoravelmente enfrentam e, por outro, obter
lucro com sua atividade empresarial (no caso da previdência privada, somente as
entidades abertas).
Sobre a importância social do controle dos riscos, ensina GAUDENZI:
Há uma convergência dos interesses individuais com os interesses coletivos: importa a todos individualmente e à sociedade como um todo (ao país, por exemplo) que possíveis infortúnios não se transformem em prejuízos irreparáveis. A lógica do seguro é de uma racionalidade cristalina e se move única e exclusivamente com base no cálculo de probabilidades. Todo um sistema é criado, todo um mercado funciona apenas em função de acontecimentos virtuais, os
7 “[…] como qualquer contrato, o previdenciário desempenha uma função social e uma função econômica. Nas várias classificações atendendo a estas funções, aparecem os de seguro como os que objetivam a satisfação de interesses derivados do risco, considerado este como o evento cuja materialização leva a seguradora a proporcionar os meios materiais para compensar o segurado das respectivas consequências danosas” (PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 270).
16
chamados “riscos previsíveis” – e quanto mais riscos forem previstos, mais a sociedade estará coberta.8
PÓVOAS classifica os riscos sociais, cobertos pelas previdências social e
privada, como endógenos ou exógenos:
Em nossa concepção, riscos sociais são os perigos a que estão submetidos os homens, em sociedade, e cuja materialização se reflete sempre, negativamente, em seu bem estar e no de sua família, criando problemas sociais. Distinguimos duas classes de riscos sociais: os exógenos que se materializam por causas alheias ao indivíduo; e os endógenos que se materializam por causas inerentes à natureza biossocial do indivíduo. Na primeira classe, temos os causados pela natureza e os causados pela conjuntura econômica e social, e na segunda classe temos os causados pela degradação da vida humana. Assim, as enchentes, as secas, as alterações ambientais, podem determinar migrações, fome, doença, morte, desemprego e invalidez; as conjunturas desfavoráveis podem ter as mesmas consequências; a degradação da vida humana pode determinar a doença, a invalidez e a morte.9
Ensina BURANELLO que
[…] a função do seguro é socializar entre as pessoas expostas a determinado risco as repercussões econômicas de sua verificação, o chamado “mutualismo”. Por essa razão, é inegável que o seguro e a previdência privada configuram atividades de interesse público, estando, portanto, sujeitas a intensa supervisão estatal. Continua o autor assinalando que “as seguradoras lidam, na prática, com a economia de incontáveis segurados, com a economia popular e a captação de poupança, que levam à constituição de fundo comum para garantir os riscos, atividade estrita ao elo principal do ciclo econômico. Isso ressalta a importante função social do seguro”.10
Também sobre a importância social do seguro (e, permitimo-nos
acrescentar, da Previdência Privada) na sociedade de risco e o interesse geral nessa
atividade, mais uma vez vale transcrever preciosa lição de J. J. CALMON DE PASSOS:
Para se tornar operacional a teoria do risco, sem disfuncionalidade, impôs-se a solução pelo seguro, que institucionaliza, em termos técnicos, o imperativo da solidariedade numa sociedade de riscos. O que surgiu como um contrato entre pessoas, no qual uma delas assumia os riscos de indenizar a outra por força de algum sinistro que viesse a atingir o seu patrimônio ou a sua pessoa, bem mais próximo do jogo e da aposta que de algo relacionado com algum interesse
8 ALBERTI, Verena et al. (Coords.). Entre a solidariedade e o risco: história do seguro privado no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2001, p. 12.
9 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 65.
10 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 32.
17
social relevante, o que antes fora assim pensado, tornou-se uma técnica a serviço do interesse geral, mais adequadamente definível como seguridade social ou segurança social, publicizando-se, ou socializando-se, se assim se preferir. Deixou de ser possível, por conseguinte, entender-se a atividade securitária como de natureza estritamente privada, passando a ser vista, em muitas de suas manifestações, como vinculada ao interesse geral, retirada do campo da pura autonomia da vontade, passando a ser regulada, de forma cogente e minuciosa, pelo Poder Público.11
J. J. CALMON DE PASSOS qualifica como “transindividual” a natureza do
direito protegido pelo seguro. Direito transindividual ou difuso seria aquele em que, “à
semelhança das universalidades de direito, uma pluralidade é juridicamente concebida
como constituindo uma unidade”12. Os direitos individuais, para além dos direitos
privados, são de interesse geral e por isso merecem regulação do Estado.
Embora as atividades securitária e de previdência privada sejam distintas e
exibam peculiaridades muito marcantes, sua característica comum de amenizar a lida
com os riscos, oferecendo cobertura a sinistros, permite-nos dar-lhes tratamento
razoavelmente homogêneo neste trabalho.
A relevância do risco na sociedade contemporânea dá cada vez maior
importância social aos sistemas que buscam amenizar seus efeitos. Esse papel social
pode e deve ser levado em conta pelo Direito Tributário e por isso passaremos a analisar
as normas que preveem a tributação dos contratos de seguro e previdência e das
respectivas partes, sob essa ótica.
1.2 Sistema Jurídico sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico
O objetivo deste trabalho é conhecer (que, segundo PAULO DE BARROS
CARVALHO, significa “construir proposições sobre”) o subconjunto das normas
tributárias que incidem sobre o seguro, o resseguro, os planos de previdência privada e
sobre as entidades que operam esses contratos.
Contudo, antes de iniciar essa análise, imprescindível expor o método a ser
utilizado para a abordagem desse conjunto de normas. O primeiro passo para tanto é a
11 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 2.
12 Ibid., p. 5.
18
externalização do que entendemos sobre “Direito”. Só depois poderemos aproximar as
lentes para identificar as normas que compõem o subsistema jurídico tributário
brasileiro e, enfim, o subconjunto que trata do seguro, do resseguro e da previdência
privada.
Já assinalamos que o Direito, Sistema ou Ordenamento Jurídico13, exerce
importante papel na estabilização dos riscos sociais. Embora não tenha o condão de
prevenir a ocorrência de condutas indesejadas e os efeitos delas decorrentes, incumbe ao
aparato do Estado a aplicação de medidas sancionatórias como consequência da sua
prática. Naturalmente, na medida em que a sociedade se torna mais complexa, o Direito
precisa ajustar-se a essa complexidade, criando regras para regular condutas cada vez
mais numerosas e multifacetadas. O ordenamento jurídico se torna progressivamente
mais vasto e intrincado.
Em face desse cenário, nunca foi tão necessário um modelo de aproximação
do objeto que o simplifique e permita que seja estudado de forma científica e
sistemática. Não é por outro motivo que PAULO DE BARROS CARVALHO aponta a
“cientificidade” como característica essencial do método que deve ser utilizado para
estudar o Direito. Ensina que “o saber científico dos tempos atuais é enfático em um
ponto: todos entendem que não há como abrir mão da uniformidade na apreciação do
objeto, bem como da rigorosa demarcação do campo sobre o qual haverá de incidir a
proposta cognoscitiva” 14. Com essa afirmação, ressalta alguns axiomas científicos
importantes para o estudo do Direito. O primeiro é o da uniformidade na apreciação do
objeto. Uma ciência deve entender seu objeto de forma homogênea. No caso da Ciência
do Direito, e seguindo-se na linha positivista adotada pelo Professor, toma-se como
premissa que é um sistema composto exclusivamente por normas. Trata-se de uma visão
uniforme, pois não permite a presença de elementos estranhos no sistema. Todos os
elementos identificados no ordenamento – como fatos e valores – são reconduzidos à
norma jurídica.
13 Utilizamos as expressões “sistema” e “ordenamento” como sinônimos, na linha de PAULO DE BARROS CARVALHO: “Sistema é o discurso da Ciência, mas sistema também é o domínio finito, mas indeterminável, do direito positivo. Advirto, portanto, que emprego, livremente, no curso desta obra, ‘ordenamento’ como sinônimo de ‘ordem positiva’, ‘direito posto’ e ‘direito positivo’.” (Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 218).
14 Ibid., p. 17.
19
A fim de analisar o sistema jurídico e as normas jurídicas que o compõem,
adotaremos a premissa do “Construtivismo Lógico-Semântico”15, segundo a qual a
realidade é constituída pela linguagem. Os seguidores do Construtivismo Lógico-
Semântico tomam o Direito como linguagem, estudando-o sob essa perspectiva. Esta
constatação permite que o estudioso se valha do rico instrumental teórico desenvolvido
pela Filosofia da Linguagem e pela Semiótica, obtendo resultados teóricos e práticos
surpreendentes.
PAULO DE BARROS CARVALHO situa essa corrente de pensamento na
filosofia atual e demonstra, com precisão analítica, a utilidade científica de suas
premissas:
Certo é que o Direito, tomado como um grande fato comunicacional, é concepção relativamente recente, tendo em vista a sua perspectiva histórica, numa análise longitudinal da realidade. Situa-se, como não poderia deixar de ser, no marco da filosofia da linguagem, mas pressupõe interessante combinação entre o método analítico e a hermenêutica, fazendo avançar seu programa de estruturação de uma nova e instigante Teoria do Direito, que se ocupa de normas jurídicas enquanto mensagens produzidas pela autoridade competente e dirigidas aos integrantes da comunidade social. Tais mensagens vêm animadas pelo tom da juridicidade, isto é, são prescritivas de condutas, orientando o comportamento das pessoas de tal modo que se estabeleçam os valores presentes na consciência coletiva.16
Com efeito, a filosofia da linguagem entende a própria sociedade como um
grande sistema comunicacional. O sistema do Direito seria, então, um subsistema
comunicacional inserido num sistema comunicacional social mais amplo. Contudo, o
Direito se distingue do sistema social amplo por ser especializado na regulação de
condutas intersubjetivas. São diversos os subsistemas sociais, cada qual com sua
especialização funcional, como o Direito, a Economia, a Psicologia e a Sociologia,
devendo-se evitar transitar inadvertidamente entre eles, uma vez que operam com
sistemas binários distintos. Nesse sentido é esclarecedora a afirmação de FABIANA DEL
PADRE TOMÉ:
15 “Construtivismo lógico-semântico” é expressão que vem sendo utilizada por PAULO DE BARROS CARVALHO para designar o “método de trabalho, simples na sua concepção, mas objetivo e fecundo nos seus resultados, apto para explorar, com o rigor possível, as estruturas lógico-sintáticas do texto examinado, abrindo desse modo o caminho às atribuições de sentido, dentro delas as estipulações axiológicas tão vivas no ato cognoscente dos objetos da cultura” (Prefácio. In: CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo Lógico-Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. XXVII).
16 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 164.
20
Dentro da rede de comunicações que é o sistema social, identificamos subsistemas compostos por comunicações diferentes entre si, como é o caso do subsistema do direito. Este se apresenta como um conjunto comunicacional peculiar e com função específica, sendo inadmissível transitar livremente entre o sistema jurídico e os demais sistemas verificados no interior do macrossistema da sociedade, como o econômico, o político e o religioso.17
A contextualização filosófica do estudo do Direito no âmbito da Filosofia da
Linguagem conduz a resultados práticos impressionantes. Foi após tal exercício, quando
passou a estudar o Direito sob a perspectiva do Constructivismo Lógico-Semântico, que
PAULO DE BARROS CARVALHO chegou à revolucionária conclusão – entre outras – de
que a norma não “incide automática e infalivelmente”, sendo necessária linguagem
competente para converter o fato social em fato jurídico, irradiando assim as
consequências previstas pela norma geral e abstrata. A partir desta, surgiram diversas
outras implicações, como a conclusão de que o lançamento é constitutivo da obrigação
tributária, e não declaratório; de que a decadência só opera quando vertida em
linguagem competente, e de que as fontes do Direito são única e exclusivamente os
enunciados introdutores de normas no sistema.
Já explicitamos a nossa convicção de que, para conhecer bem um objeto é
necessário demarcá-lo, separá-lo de todos os outros. Não recusamos a existência de
relações entre os sistemas (por exemplo, Direito e Economia), mas entendemos que o
trabalho jurídico se limitará a estudar normas jurídicas, fazendo-se o corte
epistemológico necessário para separar o seu objeto de elementos que digam respeito a
outras ciências. Com isso, consegue-se maior profundidade e analiticidade no estudo.
Importante ressaltar, também, que o sistema jurídico, tal como o
compreendemos, se organiza de forma hierarquizada18. Trata-se não apenas de um
17 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 40. 18 Esclarecedora a lição de PAULO DE BARROS CARVALHO sobre o hierarquização das normas jurídicas:
“O sistema do direito oferece uma particularidade digna de registro: suas normas estão dispostas numa estrutura hierarquizada, regida pela fundamentação ou derivação que se opera tanto no aspecto material quanto no formal ou processual, o que lhe imprime possibilidade dinâmica, regulando, ele próprio, sua criação e suas transformações. Examinando o sistema de baixo para cima, cada unidade normativa se encontra fundada, material e formalmente, em normas superiores. Invertendo-se o prisma de observação, verifica-se que das regras superiores derivam, material e formalmente, regras de menor hierarquia. A Carta Magna exerce esse papel fundamental na dinâmica do sistema, pois nela estão traçadas características dominantes das várias instituições que a legislação comum posteriormente desenvolverá. Sua existência imprime, decisivamente, caráter unitário ao conjunto, e a multiplicidade de normas, como entidades da mesma índole, lhe confere o timbre de homogeneidade”. (Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 218).
21
axioma, mas também de uma necessidade do objeto. É de fato absolutamente necessário
que existam regras para determinar a hierarquia entre as normas, a fim de que se possa
identificar qual norma aplicar em caso de incompatibilidade.
Ensina PAULO DE BARROS CARVALHO:
Chega a ser um contra-sentido falar em sistemas de normas sem organização hierárquica. Se o valor integra a própria raiz do dever-ser e se um de seus predicados sintáticos é a gradação dos preceitos em escala de hierarquia, o deôntico vem, desde logo, marcado pela presença indispensável dessa cadeia de vínculos de subordinação.19
Dissemos que, além de axioma, a hierarquia é também uma necessidade do
objeto, pois o Direito precisa se autoproduzir, de acordo com as normas de competência
que o compõem, e para isso tem de haver hierarquia. As normas de superior hierarquia
dão fundamento de validade àquelas que lhes estão submetidas hierarquicamente,
inclusive determinando as regras para sua produção (normas de competência). Explica
TACIO LACERDA GAMA:
São justamente as normas de competência que qualificam quem pode ser o sujeito X, que prescrevem o que compreende o ato Y e indicam as materialidades sobre as quais pode versar a norma Z. Ao fazer isso, programam como deve ser enunciadas e fundamentam a validade das normas criadas segundo seus preceitos.20
A hierarquização das normas que compõem o Sistema do Direito Positivo as
conduz a terem, todas, o mesmo fundamento de validade, obtendo-se a coesão do
sistema. Também permite que nos refiramos ao Direito Positivo como “sistema”,
“conjunto de elementos inter-relacionados que e se aglutinam perante um referencial
comum. Assim, onde houver a possibilidade de reunirmos, de forma estruturada,
elementos que se conectam sob um princípio unificador, estará presente a noção de
sistema”21, como ensina AURORA TOMAZINI DE CARVALHO.
Ora, se para tipificar um conjunto como sistema é necessário colocar todos
os seus elementos sob um denominador comum, então essa construção dependerá
sempre do uso da inteligência e da interpretação.
19 CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e Positivação no Direito Tributário. V. II. São Paulo: Noeses, 2013, p. 247.
20 GAMA, Tácio Lacerda. Competência tributária – fundamentos para uma teoria da nulidade. São Paulo: Noeses, 2008, p. 30-31.
21 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo Lógico-Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. 122.
22
Os sistemas são, portanto, obtidos pela interpretação (linguagem), mediante
a análise de determinado conjunto de objetos. No caso do Direito, esses objetos são,
também eles, empíricos e linguísticos, como as normas jurídicas, das quais trataremos a
seguir.
1.3 Norma Jurídica como expressão mínima irredutível de manifestação do
dêontico
A partir da premissa de que o Direito é um sistema comunicacional
homogêneo, composto exclusivamente de normas jurídicas, cabe esclarecer como as
entendemos. Todo o estudo científico que se seguirá deverá estar fundado nessa
premissa e apreender seu objeto sob a óptica de que é composto apenas por tais
elementos linguísticos, chamados por PAULO DE BARROS CARVALHO de expressão
mínima irredutível de manifestação do deôntico22, ou seja, a estrutura mínima
necessária para transmitir um comando apto a regular condutas intersubjetivas, objetivo
essencial do Direito.
Numa primeira aproximação (plano da interpretação “S1”), encontramos o
Direito como texto veiculado em suportes físicos, de forma ainda incompreensível,
ainda “tinta sobre o papel”. Num segundo momento (“S2”), já poderemos identificar
conjuntos de grafemas, com sentido, nos artigos, parágrafos, incisos e outros
dispositivos grafados em instrumentos introdutores de normas, veiculando os chamados
enunciados prescritivos. Uma vez compreendidos pelo intérprete, esses enunciados
assumem a natureza de proposições prescritivas, ou seja, enunciados com sentido
atribuído pela interpretação (S3), com a função linguística de regulação de condutas,
estruturados sintaticamente na forma lógica da implicação deôntica. Depois, o intérprete
deverá concatenar essas proposições prescritivas com as outras que compõem o sistema
e com elas se inter-relacionam por coordenação e subordinação (“S4”)23.
22 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 609.
23 É necessário, portanto, interpretar os grafemas encontrados nos suporte físico até se chegar à compreensão completa da mensagem normativa. Como ensina Paulo de Barros Carvalho, “seguindo esta construção exegética e partindo da premissa da unicidade do texto jurídico-positivo que se pode alcançar os quatro subsistemas pelos quais se locomovem obrigatoriamente todos aqueles que se dispõem a conhecer o sistema jurídico normativo: a) o conjunto de enunciados, tomados pelo plano da expressão; b) o conjunto de conteúdos de significação dos enunciados prescritivos; c) o domínio
23
Há quem chame os enunciados ou as proposições prescritivas obtidos no
plano “S2” de normas jurídicas lato sensu, ou em sentido amplo, pois já nessa segunda
etapa do percurso interpretativo apresentam a função, o objetivo de prescrever condutas.
Contudo, só se estará diante de uma prescrição eficaz e completa de condutas quando
for construída a norma jurídica em sentido estrito – stricto sensu – que na maioria das
vezes exige a conjugação de vários enunciados prescritivos (“S3”). Essa estrutura se
compõe de antecedente, no qual é descrito um determinado fato, e de um consequente,
onde se descreve uma relação jurídica modalizada (pelos modais permitido, proibido ou
obrigatório), que nasce como consequência da realização daquele fato.
Nossa linha de raciocínio é a mesma adotada por AURORA TOMAZINI DE
CARVALHO, quando afirma:
Uma significação, para expressar a completude da mensagem legislada, além de ser construída a partir dos textos do direito positivo, deve estar estruturada na forma hipotético-condicional, pois esta é a fórmula lógica das ordens, é assim que as linguagens prescritivas se manifestam formalmente.24
Importante esclarecer que a norma jurídica está no Direito Positivo e é
objeto de estudos da Ciência do Direito. Ora, o coração está no corpo humano ou na
Medicina cardíaca? Não há dúvida de que está no corpo humano, assim como as normas
jurídicas fazem parte do Direito Positivo. Mas o entendimento, as proposições sobre o
que é o coração e sobre o que são as normas jurídicas estão nas ciências que estudam
esses objetos.
No caso do Direito, a separação entre a Ciência e seu objeto é mais tênue,
pelo fato de o objeto em questão – as normas jurídicas – ser linguístico, assim como a
ciência que o estuda. Todavia, continua válida a mesma conclusão.
A linguagem não tem sentido completo sem que estejam integrados os seus
três planos de significação: sintático, semântico e pragmático. Por isso se diz que as
normas são a significação atribuída ao texto de direito positivo. Isso não significa que o
objeto passe a ser parte da Ciência, mas sim que, como objeto linguístico, só é
compreendido em sua inteireza no plano da significação.
articulado de significações normativas; e d) os vínculos de coordenação e de subordinação que se estabelecem entre as regras jurídicas” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 186).
24 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo Lógico-Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. 281.
24
No terceiro plano (“S3”), do domínio articulado das significações
normativas, é que estão as normas jurídicas, também chamadas proposições jurídico-
normativas. Essas unidades são sintaticamente homogêneas, isto é, têm todas a mesma
configuração lógica. Por primeiro, há uma proposição (também chamada antecedente ou
hipótese) veiculadora das características de um evento de possível ocorrência. Esta
proposição está ligada a outra (consequente ou tese), em que se descrevem as notas de
uma relação jurídica. Para demonstrar essa estrutura sintática, nada melhor que a
formalização:
Hip. F
Nj ↓ DSn
Cons. S’R S”
DSm
Nesta formalização da norma jurídica (Nj), temos Hip. (hipótese), que
corresponde a F (notas de um fato) e Cons. (consequência), correspondente às notas de
um fato relacional entre dois sujeitos de direito (S’ R S”). A hipótese se liga à
consequência pelo dever-ser neutro (DSn), que estabelece entre a primeira e a tese uma
relação de causalidade deôntica, ou imputação. Tal causalidade faz com que, ocorrido o
fato jurídico tributário tal qual descrito na hipótese, nasça, automática e infalivelmente,
a relação jurídica descrita no consequente. Formalmente, essa relação é uma implicação
(Se A, então B), porém difere da causalidade natural por derivar de um ato de vontade
do legislador, decorrente do exercício de sua competência legislativa.
Dentro da consequência, por seu turno, há outro dever-ser, dessa vez
modalizado – DSm – (convertido em obrigado, proibido ou permitido), regulando a
conduta do sujeito passivo perante o sujeito ativo. Todos os elementos do repertório do
direito positivo exibem essa configuração sintática. Cada qual deles, porém, terá
conteúdo semântico próprio, ou seja, descreverá diferentes eventos possíveis, para os
quais serão imputadas as consequências relacionais cabíveis.
Note-se, porém, que, para grande parte dos cientistas do Direito filiados a
correntes normativistas, a sanção é característica essencial da norma jurídica. Norma de
direito seria, para eles, norma de um sistema que prevê sanções socialmente
25
organizadas. HANS KELSEN, por exemplo, distingue o Direito da Moral afirmando que
“a reação do Direito consiste em uma medida de coerção decretada pela ordem e
socialmente organizada, ao passo que a reação moral contra a conduta imoral não é nem
estabelecida pela moral, nem é, quando estabelecida, socialmente organizada”25.
KELSEN tem razão quando diz que o Direito – como sistema – não pode
prescindir da coação. Todavia, entendemos que as normas jurídicas primárias não-
sancionatórias – que descrevem na sua hipótese fatos lícitos de possível ocorrência –
têm existência autônoma, não sendo imprescindível que conformem estrutura dual
(norma primária e norma secundária, ou endonorma e perinorma). Como bem assevera
AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, “a norma secundária atribui juridicidade à primária,
caracterizando-a como jurídica”26.
A estrutura lógico-semântica das normas jurídicas, acima descrita, aplica-se
igualmente às “sanções” (entendidas como normas que em sua hipótese descrevem um
ilícito), seja àquelas chamadas normas primárias sancionatórias – que preveem uma
consequência de direito material para o descumprimento de obrigação prevista no
consequente de norma primária –, seja às normas secundárias propriamente ditas – que
preveem a possibilidade de movimentação do aparato estatal para promover coação no
sentido do inadimplemento daquela obrigação27.
Sendo o Ordenamento Jurídico um sistema comunicacional composto
exclusivamente por normas jurídicas, o método de aproximação do objeto utilizado
neste trabalho consistirá na construção, mediante interpretação, das normas que se
relacionam, direta ou indiretamente, à tributação do seguro, do resseguro e da
previdência privada. Discorreremos sobre essas normas, especialmente sobre as regras-
matrizes de incidência tributária identificadas, tratando de sua adequação aos princípios
que regem tais atividades e aos demais princípios constitucionais em matéria tributária.
No próximo tópico, trataremos, por necessário, da teoria da regra-matriz de
incidência tributária, preconizada por PAULO DE BARROS CARVALHO.
25 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 28. 26 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de Teoria Geral do Direito (O Constructivismo Lógico-
Semântico). São Paulo: Noeses, 2009, p. 308. 27 Quanto aos diferentes tipos de norma sancionatória, LOURIVAL VILANOVA salienta que “temos
sanções integrantes da relação jurídica substantiva (de direito privado ou de direito público); e sanções integrantes da relação jurídica processual”. (Causalidade e Relação no Direito. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 131.
26
1.4 Teoria da Regra-Matriz de Incidência Tributária
Já vimos, linhas acima, que as leis não trazem normas jurídicas prontas e
logicamente organizadas. É necessário ao intérprete percorrer os vários planos da
interpretação, a fim de construir estruturas hipotético-condicionais modalizadas, que
contemplem todas as variáveis necessárias à orientação da conduta.
A esse respeito, vale transcrever o preciso ensinamento de PAULO DE
BARROS CARVALHO:
Certamente ninguém entenderia uma ordem, em todo seu alcance, apenas com a indicação, por exemplo, da conduta desejada: ‘pague a quantia de x reais’. Adviriam desde logo algumas perguntas e, no segmento das respectivas respostas, chegaríamos à fórmula que tem o condão de oferecer o sentido completo da mensagem, isto é, a identificação da pessoa titular do direito, do sujeito obrigado e, ainda, como, quando, onde e por que deve fazê-lo. Somente então estaríamos diante daquela unidade de sentido que as prescrições jurídicas necessitam para serem adequadamente cumpridas. Em simbolismo lógico represento assim: D [F → (S’RS’’)], que interpreto: deve ser que, dado o fato F, então se instale a relação jurídica R, entre os sujeitos S’ e S”.28
Estamos convencidos de que somente através dessa estrutura lógica o
Direito se manifesta, não importando se estamos diante de Direito Civil, Penal ou
Tributário. Esse sistema comunicacional especializado só logra regular condutas
intersubjetivas através de proposições linguísticas modalizadas, valendo-se da
coercitividade imposta pelo aparato do Estado através de normas secundárias com a
mesma estrutura que, invariavelmente, são encontradas no sistema para se lhes acoplar,
quando necessário.
No Direito Tributário não poderia ser diferente. As normas que compõem
esse subsistema, destacado para fins didáticos, pretendem extrair dinheiro do particular
para ser entregue aos cofres públicos. Com efeito, os subsistemas penal e tributário
estão entre os mais invasivos do Direito, pois o primeiro cerceia a liberdade do
indivíduo (e em alguns países até a vida) e o segundo, o seu patrimônio. As normas que
compõem esses ramos do Direito precisam estar, portanto, organizadas mediante forma
lógica precisa, a fim de poderem atingir seu intento da forma esperada. Por isso vigora o
28 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 609.
27
princípio da tipicidade cerrada, tanto no Direito Tributário quanto no Direito Penal,
justamente pela necessidade de perfeita descrição dos fatos que devem compor o
antecedente da norma, com todos os seus elementos identificados da forma mais
pormenorizada possível, não deixando margem a qualquer dúvida, para que possam
fazer incidir a relação jurídica prevista no consequente, através, é claro, da aplicação.
Identificando a peculiaridade da norma que perfaz a incidência tributária,
PAULO DE BARROS CARVALHO palmilhou minucioso percurso, visando atingir o útil e
importante intento de especificar a estrutura lógico-semântica de norma jurídica para o
âmbito da incidência dos tributos, criando a chamada regra-matriz de incidência
tributária. Esta consiste num juízo composto por duas proposições, unidas pelo dever-
ser interproposicional29. Expõe o precursor da fórmula:
Efetuadas as devidas abstrações lógicas, identificaremos, no descritor da norma, um critério material (comportamento de uma pessoa, representado pelo verbo pessoal e de predicação incompleta, seguido pelo complemento), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência, observaremos um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota).30
Embora o Direito Tributário tenha, como objeto de estudo, todas as normas
direta ou indiretamente relacionadas à exigência de tributos, a regra-matriz de
incidência tributária trata especificamente da percussão tributária. Consiste, assim como
qualquer norma jurídica, num juízo composto por duas proposições concatenadas pelo
dever-ser neutro.
Chama-se à primeira proposição hipótese tributária, antecedente ou
descritor, pois nela se encontra a descrição de um evento que se terá como ocorrido em
determinadas coordenadas de espaço e tempo. Esse evento é sempre uma conduta
humana, composta por um verbo e um complemento especificadores, escolhidos pelo
legislador para produzir efeitos jurídico-tributários. A esse conjunto de verbo e
complemento chama-se critério material do antecedente. Compõe também a hipótese a
indicação do momento em que a conduta se considerará realizada, que se denomina
critério temporal, e do local onde sua realização se dará, o critério espacial.
29 Conferir, a respeito, CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 338-340.
30 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 611.
28
A segunda proposição que forma o juízo é o consequente ou prescritor.
Nela está especificada a relação jurídica que surgirá se e quando realizado o fato lícito
descrito no antecedente. Essa especificação exige que dois critérios estejam presentes: o
subjetivo, onde se determinam os sujeitos passivo (devedor) e ativo (credor) da
obrigação, e o quantitativo, onde se encontram os elementos que identificarão o objeto
da prestação de que será incumbido o sujeito passivo, em expressão pecuniária: base de
cálculo e alíquota.
A estruturação da norma tributária nos termos acima expostos, além de
permitir aprofundamento máximo ao estudo da incidência tributária, tem outras
utilidades práticas, permitindo, como salienta PAULO DE BARROS CARVALHO, “quase
que de forma imediata, penetrarmos na secreta intimidade da essência normativa,
devassando-a e analisando-a de maneira minuciosa”. Além disso, “experimentando o
binômio base de cálculo/hipótese de incidência, colhido no texto constitucional para
marcar a tipologia dos tributos, saberemos dizer, com rigor e presteza, da espécie e da
subespécie da figura tributária que investigamos”31.
O conceito, logicamente anterior, de norma jurídica, e a definição da regra-
matriz de incidência tributária, orientarão todo o curso deste trabalho.
Procurar-se-á analisar, assim, o conjunto de normas relacionadas à
tributação do seguro, do resseguro e da previdência privada no Brasil e, dentre elas,
diversas regras matrizes de incidência tributária. Esse instrumental permitirá identificar
os fatos que ensejam cada incidência tributária, assim como os respectivos sujeitos
passivos e a estipulação do montante devido a título de tributo. Trata-se do terceiro
plano de interpretação dos textos jurídicos, no qual, como já afirmado, se articulam as
proposições normativas.
Seguiremos nesse percurso para estarmos aptos a chegar ao quarto e último
plano da interpretação, no qual confrontaremos as regras identificadas com as demais,
com que se inter-relacionam por coordenação e subordinação, a fim de podermos
avaliar o subsistema que dispõe sobre a tributação do seguro, do resseguro e da
previdência privada.
31 Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 343.
29
2 PRINCÍPIOS RELACIONADOS À ATIVIDADE SECURITÁRIA
2.1 Noção de Princípio
Ao tratar do Sistema Jurídico, em capítulo anterior, reiteramos a premissa de
que seus componentes são uniformes, ou seja, de que só são aceitos como elementos
desse conjunto normas jurídicas, todas com idêntica organização sintática. A esse
respeito, vale recapitular a observação de PAULO DE BARROS CARVALHO:
O direito positivo, então, apresentar-se-á aos olhos da Dogmática como um conjunto finito, mas indeterminado de normas jurídicas, nas quais surpreendemos fatos jurídicos e relações jurídicas, associados por um ato de vontade de quem pôs as regras no sistema, ato psicológico este que o cientista coloca entre parênteses metódicos, para não se imitir em territórios alheios como, por exemplo, a Psicologia e outras Ciências que poderiam explicar aspectos parciais do fenômeno.32
Mantemo-nos firmes nessas premissas. Sendo assim, não poderíamos
afirmar, em relação aos princípios, que são outra coisa senão norma jurídica, sob pena
de serem sumariamente excluídos do sistema do Direito Positivo, em razão de sua
homogeneidade sintática.
Princípios são normas jurídicas. Contudo, recebem designação especial pela
grande influência que exercem nos subsistemas que integram, seja pela sua supremacia
hierárquica (hierarquia constitucional, por exemplo, ou matéria tratada em lei
complementar), seja por apresentarem forte carga axiológica. Como explica PAULO DE
BARROS CARVALHO, “é o nome que se dá a regras do direito positivo que introduzem
valores relevantes para o sistema, influindo vigorosamente sobre a orientação de setores
da ordem jurídica”33. Nessa mesma linha, FABIANA DEL PADRE TOMÉ:
Os princípios não existem ao lado das normas, justapondo-se ou contrapondo-se a elas. Impossível admitir a coexistência de normas e princípios, como se fossem entidades diferentes convivendo no sistema do direito positivo. Princípios nada mais são que normas jurídicas carregadas de forte conotação axiológica.34
32 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 260-261.
33 Ibid., p. 261. 34 TOMÉ, Fabiana Del Padre. A prova no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 216.
30
É de grande utilidade a classificação proposta por PAULO DE BARROS
CARVALHO, entre princípios que encartam valores e os que veiculam limites objetivos.
Em ambos os casos se estará diante de normas jurídicas de alta hierarquia e
expressividade no sistema. Contudo, os primeiros estabelecem nortes axiológicos para
orientar o legislador e o intérprete em relação a situações incertas e indeterminadas. Já
os outros são normas que estabelecem comandos precisos para o legislador, também
podendo ser utilizados como critérios objetivos para a solução de antinomias e lacunas
eventualmente encontradas no sistema jurídico.
Exemplo desse uso dos princípios para suprir lacunas de regras é dado por
HUMBERTO ÁVILA, quando trata daquilo que chama de “eficácia interna” dos princípios:
“se não há regra expressa que oportunize a defesa ou a abertura de prazo para
manifestação da parte no processo – mas elas são necessárias –, elas deverão ser
garantidas com base direta no princípio do devido processo legal”35. Este, a nosso ver, é
um princípio limite objetivo36.
Os princípios “limites objetivos” também servem para viabilizar a aplicação
de outros, que impõem valores, como é o caso do princípio da anterioridade em relação
ao da segurança jurídica. Como esclarece PAULO DE BARROS CARVALHO, “trabalham no
sentido de realizar tais valores, funcionam como verdadeiros mecanismos que dão força
de eficácia a esses primados axiológicos do direito”37.
E como saber se estamos diante de uma norma jurídica que merece ser tida
como princípio? A orientação de PAULO DE BARROS CARVALHO é precisa:
35 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 12. ed., ampliada. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 97.
36 HUMBERTO ÁVILA discorre longamente sobre as distinções que entende existentes entre “regras” e “princípios”. Não adotamos, neste trabalho, essa distinção, tampouco suas consequências. Contudo, observamos que mesmo este autor parte da premissa de que ambos – regras e princípios – são normas jurídicas: As regras podem ser dissociadas dos princípios quanto ao modo como prescrevem o comportamento. As regras são normas imediatamente descritivas, na medida em que estabelecem obrigações, permissões e proibições mediante a descrição de uma conduta a ser cumprida. Os princípios são normas imediatamente finalísticas, já que estabelecem um estado de coisas cuja promoção gradual depende dos efeitos decorrentes da adoção de comportamentos a ela necessários. Os princípios são normas cuja qualidade frontal é, justamente, a determinação da realização de um fim juridicamente relevante, ao passo que característica dianteira das regras é a previsão do comportamento” (ibid., p. 216). Além da distinção entre princípios e regras quanto ao modo como prescrevem o comportamento, o autor ainda os distingue quanto ao modo como contribuem para a decisão. Todavia, ao tratar da matéria sempre faz questão de frisar que ambos são normas jurídicas que podem ser reconduzidos à sua estrutura hipotético-condicional, ficando resguardada, portanto, a homogeneidade sintática do sistema jurídico.
37 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 272.
31
Toda vez que houver acordo, ou que um número expressivo de pessoas reconhecerem que uma norma ‘N’ conduz um vector axiológico forte, cumprindo papel de relevo para a compreensão de segmentos importantes do sistema de proposições prescritivas, estaremos diante de um “princípio”. Quer isto significar; por outros torneios, que “princípio” é uma regra portadora de núcleos significativos de grande magnitude influenciando visivelmente a orientação de cadeias normativas, às quais outorga caráter de unidade relativa, servindo de fator de agregação para outras áreas do ordenamento.38
No presente trabalho, trataremos de diversas normas que identificamos
como verdadeiros princípios relacionados à atividade securitária, bem como de
princípios tributários propriamente ditos. Ao longo do estudo, esses princípios serão
sopesados e relacionados às regras-matrizes de incidência tributária que oneram o
seguro, o resseguro, e a previdência privada.
2.2 O Seguro e a Previdência Complementar na Constituição
A estrutura hierarquizada do Direito exige que o estudo de qualquer matéria
jurídica se inicie pela interpretação das normas constitucionais que irradiam efeitos
sobre o subsistema enfocado.
A Constituição contempla normas da mais alta hierarquia, em geral voltadas
para o regramento da produção de normas pelo legislador, e densamente carregadas de
valores. Com efeito, são as chamadas normas de competência, algumas delas
identificadas como princípios, que vão regular a conduta dos legisladores
complementares e ordinários aos quais for atribuída a função de criar normas sobre toda
e qualquer matéria. É imprescindível conhecê-las, interpretá-las e, em seguida, avaliar
se as normas sujeitas ao seu influxo estão de acordo com as regras de competência
constitucionalmente previstas.
A Constituição de 1988, desde seu artigo primeiro, inclui a dignidade da
pessoa humana entre os fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1o, IV). Ao
tratar da ordem econômica, estabeleceu estar fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, impondo-lhe como fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados, entre outros princípios, o da redução
38 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 274.
32
das desigualdades sociais (art. 170, VII). Até mesmo ao tratar do Sistema Financeiro
Nacional, estabeleceu que seria estruturado de forma a promover o desenvolvimento
equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade (artigo 192).
Essas normas de competência têm característica de princípios que encartam
valores. Os referidos princípios direcionam fortemente o legislador à proteção dos
interesses transindividuais, ao respaldo à amenização de riscos, à tutela da velhice e da
incapacidade laboral, todos esses interesses protegidos pelo seguro e pela previdência
privada.
Em face dessas premissas, inevitável o reconhecimento de que a política
brasileira de seguros privados está inserta nos fundamentos constantes do artigo 1o da
Carta Magna. Nessa linha, ensina SILVA que “as operações de seguro devem atender ao
fundamento da soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e da livre-iniciativa e o pluralismo político, com vista a preservar os ditames do
Estado Democrático de Direito de nossa República”39.
Não bastassem os princípios constitucionais acima indicados, os quais, por
si, já seriam suficientes para informar as atividades securitária e previdenciária privada,
observamos ainda que o Seguro e a Previdência Complementar foram eleitos como
matérias de relevância constitucional, por envolverem gestão de vultosa poupança
popular e pelo expressivo interesse social nessas atividades. Com efeito, interessa a toda
a sociedade que se possa lidar com os riscos inerentes à vida atual da forma mais
organizada possível e, consequentemente, com mínima ocorrência de sobressaltos.
De início, a Constituição Federal já atribui à União competência exclusiva
para legislar sobre política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores (artigo
22, VII) e seguridade social (artigo 22, XXIII).
Além disso, observa-se que a previdência privada foi inserida no sistema da
Seguridade Social. Com efeito, a Constituição Federal de 1988 tratou da Previdência de
forma pormenorizada, situando-a no Título VIII, que trata ‘Da Ordem Social’. O Poder
Constituinte Originário, ao inaugurar o referido Título, estipulou que “a ordem social
tem como base o primado do trabalho e, como objetivo, o bem-estar e a justiça sociais
(art. 193).
39 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 40.
33
Ainda em sede introdutória, nas disposições gerais, dispôs que “a
seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes
Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social” (art. 194). É, portanto, dentro desse ambiente de
princípios constitucionais que a previdência complementar está inserida e deverá ser
provida.
Com a Emenda Constitucional no 20/98, dedicou-se à previdência
complementar o artigo 202 da Constituição, inserido no capítulo da Ordem Social, e na
Seção da Previdência Social, estabelecendo-se ali seus princípios básicos e sua
necessária regulação por lei complementar.
Além de a previdência complementar estar sujeita aos princípios
constitucionais gerais (neste caso, princípios que veiculam valores) da dignidade da
pessoa humana e da justiça social, entende a Doutrina que o princípio da capitalização
(que veicula limite objetivo com a finalidade de implantar os valores almejados) foi um
dos princípios especiais previstos pelo caput do artigo 202, ao estabelecer que o regime
de previdência privada seria baseado na “constituição de reservas que garantam o
benefício contratado”.
Entendeu-se, portanto, que, visando pudesse a previdência complementar
contribuir para a aplicação daqueles valores, a técnica mais adequada para o custeio de
suas reservas seria a da capitalização que, como veremos a seguir, se distingue da
sistemática mútua ou solidária que rege o seguro e a previdência social.
Segundo RODRIGUES, ao mencionar a capitalização, a Constituição
estabeleceu que
[…] tanto os planos das entidades fechadas, como os planos das entidades abertas deverão acumular valores ao longo do tempo para satisfazer o pagamento dos benefícios previdenciários, independentemente de serem planos na modalidade de benefício definido ou de contribuição definida.40
Também foi plasmado na Constituição o princípio da publicidade, para o
participante, das informações relativas ao plano, quando o § 1o do artigo 202
determinou que a lei complementar assegurasse ao participante de planos de benefícios
40 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 10.
34
de entidades de previdência privada pleno acesso às informações relativas à gestão de
seus respectivos planos41. Trata-se, aqui, a nosso ver, de princípio limite objetivo, pois
está claramente estabelecido que todas as informações relevantes, relacionadas à gestão
de planos de previdência privada, deverão ser passadas aos participantes.
A natureza autônoma dos planos previdenciários em relação ao contrato de
trabalho também foi explicitada na Constituição, restando claro que as contribuições do
empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos,
regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram
o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios
concedidos, não integram a remuneração dos participantes. A despeito disso, a
discussão quanto à competência para julgar controvérsias relacionadas a esses contratos
perdurou até recentemente, quando o Supremo Tribunal Federal afinal decidiu que as
matérias atinentes a planos previdenciários não decorrem da relação de trabalho, mas
sim de contrato autônomo, devendo ser julgadas pela Justiça Comum, e não pela Justiça
do Trabalho42.
Por fim, a Constituição também atribuiu à lei complementar a competência
para estabelecer os requisitos da designação dos membros das diretorias das entidades
fechadas de previdência privada e disciplinar a inserção dos participantes nos
colegiados e instâncias de decisão em que seus interesses sejam objeto de discussão e
deliberação. Essa determinação evidencia o cuidado do constituinte de inserir os
próprios participantes na gestão dessas entidades, que lidam com a grande
responsabilidade de gerir a poupança que lhes garantirá a aposentadoria. Interessa ao
Estado que essa atividade se desenvolva da forma mais estruturada, transparente e
41 Ressaltando a importância desse princípio, esclarece FLÁVIO MARTINS RODRIGUES (Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 10-11): “Os planos previdenciários complementares são pactos longos e, por regra, decorrem muitas décadas entre os primeiros aportes contributivos e as últimas prestações previdenciárias. Como se disse, durante todo esse tempo, os valores vão sendo capitalizados, submetendo-se esse processo a aferições regulares por meio de estudos atuariais. Como os participantes e os assistidos têm óbvio interesse no acompanhamento desse processo, o Constituinte Derivado assegurou-lhes “o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos” (§1o do art. 202). Não trata-se de mero conhecimento de alguns dados consolidados, mas sim da forma como está sendo realizada a gestão dos planos, isto é, a alocação de seus ativos e a contabilização dos passivos respectivos, os custos administrativos incidentes, dentre outros elementos gerenciais de interesse”.
42 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 586.453/SE. Relatora: Ministra Ellen Gracie. Julgamento: 20 fev. 2013. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJe 06 mar. 2013.
35
segura possível, pois isso propicia um ambiente de segurança social menos oneroso para
os entes públicos e se alia à busca pelos valores da dignidade da pessoa humana e da
justiça social.
O tratamento constitucional acima referido, dado aos seguros e à
previdência privada, decorre da natureza “transindividual” desses direitos, para utilizar a
precisa conceituação de J. J. CALMON DE PASSOS. Discorre o Autor magistralmente
sobre a dimensão social dos interesses protegidos por esses contratos:
Característico dos interesses transindividuais é sua ineliminável dimensão social, diríamos melhor, pública não estatal, pelo que a responsabilidade por sua tutela é função dos agentes estatais, a par da titularidade das entidades e organizações não governamentais. O que a todos ou a muitos afeta não pode ser deixado à disponibilidade dos indivíduos, porque a insatisfação de um só que seja legitima a efetivação da tutela de um interesse que é, por essência, indivisível e versa sobre um bem inapropriável.43
O estudo das normas jurídicas que compõem os sistemas securitário e
previdenciário privado, bem como do subsistema tributário que onera os respectivos
contratos e entidades operadoras, estará sempre fundado no tratamento que lhes foi dado
pelas normas de competência da Constituição Federal.
Analisemos agora os princípios especiais que norteiam esses sistemas.
2.3 O Princípio do Mutualismo ou Solidariedade
Para analisar e compreender a tributação aplicável aos sistemas securitários
é necessário utilizar como premissas, também, alguns princípios e regras (ambos,
repetimos, normas jurídicas) que lhes são próprios, em especial o princípio do
mutualismo ou solidariedade.
Esse princípio é determinante no âmbito dos sistemas securitários,
principalmente no seguro e na previdência social. Contudo, ainda que em menor
intensidade, é também indissociável do subsistema da previdência privada. Estamos
convictos de que o princípio da solidariedade, dentro do sistema constitucional
brasileiro, é corolário dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e
43 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 5.
36
da justiça social, pois atua como linha mestra para a operacionalização dos sistemas
securitários que, por sua vez, contribuem para a concretização daqueles valores.
A ideia de mutualismo (pactos de auxílio mútuo) nasceu no âmbito do
seguro, pois o instituto se funda no pressuposto de que, se muitos contribuírem com
pouco, será possível para a seguradora arcar com o risco que só se efetivará em alguns
casos.
Já na previdência social, o mutualismo (ou solidariedade) aparece sob forma
diferente, pois nesse universo o que ocorre é o subsídio de uma geração (os ativos) para
custear a aposentadoria da geração mais idosa (aposentados). Por esta razão, na
previdência social, nos referimos ao mutualismo como “solidariedade intergerações”,
também conhecido como regime de “repartição simples”44.
IVAN DE OLIVEIRA SILVA define o princípio do mutualismo como “a
concentração de esforços coletivos destinados a garantir a recomposição patrimonial
dos membros que, individualmente, foram vitimados pelas desventuras da fortuna”45.
Com efeito, como explica ALVIM, “é mais fácil suportar coletivamente as consequências
danosas dos riscos individuais que deixar o indivíduo só e isolado exposto a essas
consequências”, porque,
[…] quando um risco ameaça uma coletividade, há um movimento quase instintivo de aproximação dos indivíduos que procuram mutuamente o amparo de que necessitam. Este impulso gera a solidariedade, que é um dos fundamentos do seguro. Ele nada mais é que um fundo comum alimentado pela pequena participação de cada um e administrado em benefício de todos para socorrer as necessidades daqueles que são vítimas do evento temido.46
Ainda sobre mutualismo, recapitule-se o esclarecimento de J. J. CALMON DE
PASSOS:
44 Explica WEINTRAUB: “O regime da Previdência Social tem por base um plano de benefício definido, regrado pela repartição simples. No regime de repartição simples, quem trabalha paga pelos benefícios de quem já está aposentado. Esta é a chamada solidariedade intergerações. A premissa da solidariedade social intergerações pressupõe que o esforço geral beneficie os mais necessitados. No plano de benefício definido do regime de repartição, o princípio do solidarismo é mais patente” (WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 48, grifos do autor).
45 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 47. 46 SUMIEN, Paul. Traité Théorique et Pratique des Assurances Terrestres apud ALVIM, Pedro. O
Seguro e o Novo Código Civil – Organização e Compilação de Elizabeth Alvim Bonfioli. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 9.
37
Na verdade a operação de seguro implica a organização de uma mutualidade, ou o agrupamento de um número mínimo de pessoas submetidas aos mesmos riscos, cuja ocorrência e tratamento são suscetíveis de tratamento atuarial, ou previsão estatística segundo a lei dos grandes números, o que permite a repartição proporcional das perdas globais, resultante dos sinistros, entre os seus componentes. A atividade do segurador consiste justamente na organização dessa mutualidade, segundo a exigência técnica de compensação do conjunto de sinistros previsíveis pela soma total de contribuições pagas pelos segurados.47
Para diluir o risco, fez-se necessário repartir as consequências econômicas
do evento danoso por um grande número de pessoas submetidas às mesmas incertezas.
Segundo BURANELLO, criou-se um sistema cujas partes “contribuíam com certa soma
em dinheiro para reparação dos encargos do grupo e se uniam pelos deveres de
solidariedade recíproca. É a prática da mutualidade, um dos fundamentos essenciais da
atividade securitária”48.
“Solidariedade”, “solidarismo” e “mutualismo” são muitas vezes utilizados
como sinônimos. A solidariedade, na previdência, é típica da Seguridade Social,
podendo ser vista como seu postulado fundamental. Esclarecedora a lição de MARTINS
sobre o tema:
Sua origem é encontrada na assistência social, em que as pessoas faziam uma assistência mútua para alguma finalidade e também com base no mutualismo, de se fazer um empréstimo ao necessitado. É uma característica humana, que se verifica no decorrer dos séculos, em que havia uma ajuda genérica ao próximo, ao necessitado. Certos grupos vinham se cotizando para cobrir determinadas contingências sociais, como fome, doença, velhice, morte etc., visando, mediante a contribuição de cada participante do grupo, prevenir futuras adversidades. Passados os tempos, essa cotização foi aumentando, formando-se grupos por profissionais, por empresas etc., que por intermédio de esforços em comum, ou da criação de determinado fundo, vinham se preparando para quando não mais pudessem trabalhar. Daí o surgimento de pequenos descontos no salário para cobrir futuras aposentadorias, principalmente quando a pessoa não mais tinha condição de trabalhar para seu sustento. A solidariedade consistiria na contribuição da maioria em benefício da minoria. Os ativos sustentam os inativos.49
47 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 5.
48 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 3.
49 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. São Paulo: Atlas, 2009, p. 53.
38
Na previdência social, a solidariedade ocorre sempre que várias pessoas
economizam em conjunto para assegurar benefícios quando essas mesmas pessoas
necessitarem. As contingências são distribuídas igualmente a todos os componentes do
grupo. Quando uma pessoa é atingida pela contingência, todas as outras continuam
contribuindo para a cobertura do benefício ao necessitado.
Verifica-se, assim, a importância e a força do mutualismo na atividade
securitária, razão pela qual não se poderá deixar de levar em consideração tal princípio
ao analisar as normas tributárias relacionadas a esse universo.
Embora o mutualismo tenha se originado do seguro, e a solidariedade
intergerações marque profundamente a previdência social, este princípio também já
influenciou fortemente a previdência privada, em especial enquanto a maioria dos
planos oferecidos concediam benefícios definidos, baseados em cálculos atuariais com
fundamento mutualista.
Contudo, a presença do mutualismo na previdência privada vem
diminuindo, e segundo a Doutrina, tende a desaparecer. É verdade que, como ressalta
WEINTRAUB “a solidariedade é um princípio jurídico essencial da Previdência, seja ela
básica ou complementar. A noção de proteção social inexiste sem o solidarismo”50.
Contudo, com o abandono gradativo dos planos de benefício definido (BD), e sua
progressiva substituição pelos planos de contribuição definida, vem-se migrando, na
Previdência Privada, para a supremacia do princípio da capitalização para acumulação
dos recursos a serem pagos no futuro aos participantes, sob a forma de resgate ou
benefício.
Trataremos, a seguir, do princípio da capitalização, a fim de identificar em
que medida difere do mutualismo.
2.4 O Princípio da Capitalização
Faz sentido que a previdência privada venha migrando da supremacia do
princípio do mutualismo para a prevalência do princípio da capitalização. Como a
previdência privada é complementar à social, é mais adequado que a forma de
50 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 48.
39
acumulação de recursos aqui adotada seja diversa, de modo a amenizar os possíveis
efeitos negativos derivados do mutualismo, como eventuais déficits decorrentes de
inversões na pirâmide demográfica, assim como o risco inerente à gestão estatal.
Tanto o mutualismo quanto a capitalização visam acumular recursos para
fazer frente a infortúnios. São formas de obter poupança suficiente para o pagamento de
uma indenização de sinistro ou de uma aposentadoria, objetivos do seguro e da
previdência. Contudo, o regime de capitalização é estruturado de modo a gerar reservas
capazes, por si próprias e por seus rendimentos no mercado financeiro, de garantir o
pagamento de determinado benefício ou cobertura. Explica FIALDINI:
A previdência privada é contributiva, isto é, protege apenas os participantes do contrato que arcam com o custeio, por meio de recursos próprios (autoprevidência), ou por meio de contribuições de seus empregadores. Além disso, as necessidades protegidas são aquelas livremente ajustadas no contrato, possuindo aptidão para proteger, inclusive, eventos não alcançados pela previdência social.51
O regime de capitalização tem como característica principal a
individualidade. Cada segurado contribui para o seu próprio benefício futuro,
estabelecendo desta forma uma correspondência entre o custeio e o benefício de cada
um. Trata-se da constituição de uma poupança individual. Sua desvantagem
relativamente aos sistemas baseados no mutualismo é o fato de que os benefícios
futuros dependerão sempre e exclusivamente dos rendimentos obtidos pelas entidades
de previdência no mercado financeiro. Por outro lado, não se corre o risco de déficit a
que está sujeita a previdência social, em razão de alterações demográficas (isto é,
diminuição do número de contribuintes na ativa e aumento do número de aposentados).
A previdência brasileira é fundada em sistema referido como sendo de
“múltiplos pilares". A esse respeito, leia-se o esclarecedor excerto de Rodrigues:
O Primeiro Pilar, em geral, possui natureza pública, compulsória e básica, tem a iniciativa do ente estatal, é custeado por regime de repartição simples e conta com limite máximo de prestações. O denominado Segundo Pilar possui natureza privada, podendo ser ou não compulsório, tem a iniciativa patronal, é custeado em regime de capitalização e conta também com limite máximo de prestações (superior ao limite do Primeiro Pilar e, no mais das vezes, tem como montante a ser suprido a própria remuneração do segurado, daí a
51 FIALDINI, Fabiana Ulson Zappa. A Previdência Privada e a Incidência do Imposto de Renda. 2007. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007, p. 59.
40
denominação de complementar). O Terceiro Pilar possui natureza privada e não compulsória (em geral deriva de conta individual em sociedade seguradora), tem a iniciativa do próprio trabalhador que pretende ter renda mais elevada quando deixar de trabalhar, é custeado em regime de capitalização e não conta com limite máximo de prestações.52
Nesse sistema de múltiplos pilares, portanto, a previdência privada (segundo
e terceiro pilares) é hoje custeada essencialmente de acordo com o regime de
capitalização, isto é, as contribuições são aportadas pelo próprio participante,
juntamente com seu empregador (segundo pilar, previdência complementar fechada) ou
individualmente (terceiro pilar, previdência complementar aberta53), e a importância da
aposentadoria é limitada pelo valor de sua própria remuneração (segundo pilar) ou
ilimitada (terceiro pilar), não sendo baseada nos parâmetros estabelecidos pelo Estado.
Sobre o princípio da capitalização, esclarece WEINTRAUB:
Os participantes formam fundos (individuais ou coletivos) onde são investidos pecúlios destinados às suas aposentadorias. O objetivo da capitalização não pressupõe a solidariedade intergerações. Logo, cada participante pode seguir com seu plano previdenciário de forma independente entre gerações. Isto não é mutualismo, pois a solidariedade é mitigada.54
Esse afastamento da previdência complementar, relativamente ao
mutualismo, é compreensível, em face das já alterações na pirâmide demográfica e
também por força dos riscos a que se expõe a gestão pública da previdência social.
Com efeito, de acordo com o Censo do IBGE que abarcou o período de
2000 a 201055, ao longo dos últimos cinquenta anos, a população brasileira quase
triplicou: passou de 70 milhões, em 1960, para 190,7 milhões, em 2010. O crescimento
do número de idosos, no entanto, foi ainda maior. Em 1960, 3,3 milhões de brasileiros
tinham 60 anos ou mais e representavam 4,7% da população. Em 2000, 14,5 milhões,
ou 8,5% dos brasileiros, estavam nessa faixa etária. Na última década (de 2000 a 2010),
52 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 3.
53 O empregador também pode fazer contribuições a plano gerido por entidade de previdência aberta. Essas entidades, contudo, gerenciam planos que podem ser contratados com os particulares diretamente, sem a participação de uma patrocinadora ou instituidora.
54 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 56.
55 IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em: <http://censo2010.ibge.gov.br>. Acesso em: 17 ago. 2013.
41
o salto foi grande, e em 2010 a representação passou para 10,8% da população (20,5
milhões).
A taxa de fecundidade da mulher brasileira, por sua vez, sofreu redução
expressiva nas últimas décadas. Em 2010, cada brasileira tinha em média 1,9 filho. Foi
a primeira vez que o número ficou abaixo do chamado nível de 2,1 filhos por mulher,
que garante a reposição populacional.
O número de filhos por mulher caiu 20,1% no curso da última década. Em
2000, cada mulher tinha em média 2,38 filhos. Há 50 anos, a taxa de fecundidade era de
6,3 filhos por mulher - mais que o triplo da atual. Mantida essa tendência (que é o mais
provável, como vem acontecendo nos países desenvolvidos), a população brasileira
deve começar a decrescer em futuro próximo.
Com isso, a solidariedade geracional na previdência vai se tornando
inviável, pois diminui o número de jovens para sustentar a aposentadoria de um idoso,
passando a haver mais idosos para ser sustentados por menos jovens em atividade,
exatamente o contrário do que pressupõe o mutualismo (muitos garantindo o risco de
poucos).
A única alternativa que se apresenta para a previdência, em especial a
privada, que não dispõe de recursos estatais para seu custeio, é o regime de
capitalização, em que cada um contribui para sua própria aposentadoria, e não para a da
geração anterior. Como explica WEINTRAUB, “a capitalização na Previdência Privada
não é ideal, mas é a alternativa viável frente ao sistema de repartição simples, podendo
os dois regimes coexistir num regime híbrido”56.
Com efeito, atualmente a previdência complementar, no Brasil, está
preponderantemente lastreada no chamado princípio da capitalização. Foram
praticamente extintos os antigos planos de benefício definido (BD), baseados em
cálculos atuariais, em que ainda se identificavam traços do princípio da solidariedade,
ainda presente, contudo, na previdência social estatal57.
56 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 63.
57 “Na origem, os planos oferecidos pelas entidades fechadas, em todo o mundo, eram do tipo BD e, no Brasil, não se discrepou. Pretendia-se que o Primeiro Pilar proporcionasse valor certo, mas com limite máximo, e os fundos de pensão complementassem a renda na inatividade até determinado patamar. Até a década de 80, permaneceu o oferecimento maciço de planos do tipo BD, porém, em razão da
42
Já vimos que esse princípio advém do texto constitucional, quando
estabelece, no caput do artigo 202, que o regime de previdência privada seria baseado
na constituição de reservas que garantissem o benefício contratado. Ademais,
observamos que, desde a edição da Lei Complementar 109/01, as entidades fechadas de
previdência complementar só podem oferecer planos de benefícios na modalidade
contribuição definida (artigo 31, § 2o, II). Os planos BD ainda existentes encontram-se,
majoritariamente, fechados para novas adesões.
Os novos planos pelos quais foram substituídos são os chamados planos CD
(contribuição definida), na previdência privada fechada, e PGBL (Planos Geradores de
Benefícios Livres), PRGP (Planos com Remuneração Garantida e Performance), PAGP
(com Atualização Garantida e Performance), VRGP (Vida com Remuneração Garantida
e Performance) e VAGP (Vida com Atualização Garantida e Performance), na
previdência privada aberta.
De todo o exposto, pode-se concluir que o princípio do mutualismo é
indissociável do seguro. Já na previdência social, pelo menos no caso brasileiro, ainda é
relevantíssima a sua aplicação, na modalidade “solidariedade intergerações”, visto que
inviável a acumulação de recursos por cada indivíduo para sua aposentadoria futura.
Ainda é necessário, para a preservação da dignidade humana, valor prestigiado pela
Constituição, que a geração ativa contribua para a aposentadoria da mais idosa,
aposentada, e por esta razão os valores dos benefícios ficam sujeitos a limites pré-
estabelecidos pelo Estado, não vinculados à remuneração do segurado.
Por seu turno, a previdência privada se encaminha gradativamente para o
abandono do mutualismo e para a exclusividade do regime de capitalização, que
determina a constituição de reservas individuais, incrementadas pelos ganhos
financeiros obtidos pelas entidades gestoras, para fins de aposentadoria futura58.
responsabilidade pelo custeio que se coloca sobretudo com relação às contribuições patronais, tem-se verificado, em todo o mundo, a oferta majoritária de planos na modalidade de CD”. (RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 6).
58 Sobre a migração do sistema de repartição simples para o regime de capitalização, interessante a ponderação de MARTINEZ: “Assim, frequentemente, o regime de capitalização é o próprio do neoliberalismo, enquadrado como poupança individual e disponível, da iniciativa privada, para o plano do tipo contribuição definida, com baixo nível de solidariedade, hodierno e com tendência a se universalizar. Bom para as prestações programadas. Por outro lado, o regime de repartição simples, ideologicamente seria social-democrático, técnica previdenciária, de iniciativa estatal, para o plano do
43
2.5 Outros princípios aplicáveis ao Seguro e à Previdência Privada
Diversos outros princípios informam a atividade securitária e previdenciária
privada.
No âmbito securitário, além dos já mencionados princípios do mutualismo
ou solidariedade, IVAN DE OLIVEIRA SILVA59 também chama a atenção para a atuação
dos seguintes princípios:
(i) Princípio da Pulverização dos Riscos, segundo o qual “é imprescindível
que os riscos sejam fracionados entre uma multiplicidade de pessoas capazes de
suportar o evento”,
(ii) Princípio da Garantia, o qual determina que “aquele ou aqueles entes
econômicos que assumem o risco nada mais fazem do que garantir a recomposição dos
danos suportados pela vítima do dano”,
(iii) Princípio da Função Sócio-Econômica, que dá relevância à “franca
relação do Direito do Seguro com os interesses socioeconômicos de pessoas físicas e
jurídicas”, e
(iv) Princípio da Licitude do Interesse Segurado, segundo o qual “o Direito
do Seguro somente dá legitimidade às operações securitárias lícitas”.
Já no âmbito da Previdência Privada, temos como exemplo de princípios
aplicáveis o da distributividade, o da universalidade da cobertura e do atendimento, e o
do equilíbrio financeiro-atuarial.
Para FIALDINI, o princípio da distributividade, específico da previdência
social, também pode ser adaptado, com certas reservas, à previdência complementar,
especialmente para o caso dos planos coletivos custeados pelos empregadores em
benefício de seus empregados. Entende a Autora que, nesses planos,
[…] a distributividade autoriza o empregador a custear de forma desigual os benefícios previdenciários, conforme as necessidades econômicas de cada categoria de empregados. Assim, por exemplo, o plano de benefícios previdenciários em favor daqueles com menor
tipo benefício definido, com elevada solidariedade, ultrapassado no tempo e com tendência a desaparecer. Próprio das prestações programadas.” (MARTINEZ, Wladimir Novaes. Primeiras Lições de Previdência Complementar. São Paulo: LTr, 1996, p. 223).
59 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 48.
44
capacidade econômica (mais necessitados) seria integralmente custeado pelo empregador, e os empregados com maiores salários auxiliariam no custeio do plano em benefício próprio. Com isso, entendemos que o plano coletivo de previdência privada atenderia perfeitamente ao princípio da distributividade, ainda que de uma forma mitigada.60
O princípio da universalidade da cobertura e do atendimento, previsto no
artigo 194, I da Constituição Federal61, também é próprio da previdência social.
Contudo, com as devidas adaptações, é aplicável à previdência privada, que como visto
consiste em dois dos três pilares da previdência social.
Exemplo dessa aplicação é o fato de que, embora os planos de previdência
privada não ofereçam cobertura a todas as pessoas, em face de quaisquer contingências
sociais, como é o caso da previdência social, a Lei Complementar no 109/01 estabeleceu
que “os planos devem ser, obrigatoriamente, oferecidos a todos os empregados dos
patrocinadores ou associados dos instituidores”. Por conseguinte, mesmo tendo caráter
contratual, em se tratando de planos operados por entidades fechadas, o empregador
deverá disponibilizar planos, indistintamente, a todos os seus empregados.
No que respeita ao Princípio do Equilíbrio Financeiro-Atuarial, indicado no
caput do artigo 201 da Constituição Federal62, foi expressamente absorvido pela LC
109/2001 que tratou de mencioná-lo logo em seus dispositivos iniciais. Com efeito, seu
artigo 7º dispôs que “os planos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo
órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência,
liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial”. Esse princípio também foi
referido por diversos outros dispositivos da LC 109/200163.
60 FIALDINI, Fabiana Ulson Zappa. A Previdência Privada e a Incidência do Imposto de Renda. 2007. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007, p. 63.
61 “Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento; […]” (BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988).
62 Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (ibid.).
63 Nessa linha, o art. 3º, em seu inciso III, estatuiu que “a ação do Estado será exercida com o objetivo de determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada
45
Sobre a aplicação do princípio do equilíbrio financeiro-atuarial aos planos
de previdência privada, ressalta FLÁVIO MARTINS RODRIGUES que “devem estar
estruturados para atender às obrigações de curto, médio e longo prazo, não bastando que
existam recursos para saldar compromissos atuais ou num futuro breve”. Continua
pontuando que “o equilíbrio pretendido tem alcance muito maior. Volta-se para todo o
grupo envolvido, devendo projetar um fluxo alongado de entradas e saídas financeiras
de acordo com as perspectivas atuarialmente estimadas”. E conclui:
Os planos devem, por consequência, possuir meios institucionais para realizar estudos atuariais, apurando o passivo devido e comparando com os ativos econômicos existentes. Deve-se, por conseguinte, verificar se as premissas estão adequadas para a massa envolvida. Assim, as tábuas de longevidade devem possuir aderência com relação ao grupo abrangido, a estimativa de rentabilidade dos ativos econômicos acumulados deve ser realista com os padrões observados nos mercados nos quais estão investidos, dentre outros elementos técnicos de que se utiliza a ciência atuarial.64
A aplicação desses princípios, assim como a harmonia entre eles e a
tributação estabelecida pelo legislador para o seguro e a previdência privada serão
observados e analisados ao longo do presente trabalho.
entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades”. Já o § 2º do art. 18, dispõe que “observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor”. (BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001).
64 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 19.
46
3 TRIBUTAÇÃO DO SEGURO E DO RESSEGURO
3.1 Definição do conceito de seguro
O que é “seguro”? Os americanos, como sempre muito práticos, oferecem
uma definição clara. Dizem que, ao comprar uma apólice de seguro, um indivíduo (o
segurado) transfere o risco, ou a variabilidade de possíveis resultados, a uma companhia
seguradora (o segurador), em troca de um pagamento estabelecido (o prêmio). Com
isso, se um segurador vende n apólices para n indivíduos, assume o risco total dos n
indivíduos. Porém, se o segurador analisou e selecionou cuidadosamente esses riscos,
seu risco médio será relativamente menor, comparado ao individual dos segurados 65.
Trata-se, portanto, de um contrato através do qual o segurado transfere o
risco a que está sujeito a uma seguradora, que o assume. Isso se dá mediante relação
jurídica na qual o segurador se obriga, perante o segurado, à garantia do risco objeto do
contrato, consistente na obrigação de pagar a indenização na hipótese de sinistro.
O início da atividade securitária, no Brasil, se deu em 1808, com a abertura
dos portos ao comércio internacional e a concessão de autorização para o
funcionamento da primeira sociedade de seguros no País, a Companhia de Seguros Boa-
Fé, de seguro marítimo.
O seguro foi uma das primeiras atividades reguladas no País, através das
Regulações da Casa de Seguros de Lisboa, 1791, vigentes até a declaração da
independência em 1822. A fiscalização da atividade se iniciou em 1831, com a
instituição da Procuradoria de Seguros das Províncias Imperiais. A regulação precoce
demonstra o interesse social e público que contempla, e consequentemente a
preocupação do Estado com que a atividade fosse exercida sob parâmetros adequados e
com segurança para os usuários.
65 “By purchasing an insurance policy, an individual (the insured) can transfer the risk, or variability of possible outcomes, to an insurance company (the insurer) in Exchange for a set payment (the premium). We might conclude, therefore, that if an insurer sells n policies to n individuals, it assumes the total risk of n individuals. In fact, the insurer, through careful underwriting and selection will end up with an average risk that is relatively smaller compared to the original risk to individual policyholders” (BROWN, Robert L.; GOTTLIEB, Leon R. Introduction to ratemaking and loss reserving for property and casualty insurance. 3rd edition. Winsted, Connecticut: Actex Publications, 2007, p. 3).
47
O Código Comercial de 1850 definia regras apenas para o seguro marítimo,
nada dispondo sobre outras modalidades, que eram regidas pelas normas gerais dos
contratos. Como esclarece IVAN DE OLIVEIRA SILVA, “a vacância legislativa do século
XIX, porém, não impediu a criação de empresas seguradoras no Brasil (tendência já
experimentada por outros países), eis que encontramos nos anais da história as primeiras
companhias seguradoras em solo pátrio”66.
Depois, o Código Civil de 1916 propiciou a expansão da atividade, tratando
do seguro terrestre e de pessoas. Não há, contudo, no Brasil, um Código de Seguro,
embora muitos defendam que seria recomendável sua criação, para dispor
minuciosamente sobre a matéria67. Atualmente, o seguro é regulado pelo Código Civil,
que o disciplina como contrato típico.
O Sistema Nacional de Seguros Privados - SNSP foi instituído pelo artigo
8º, do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, que constituiu os seguintes
órgãos: (i) Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), (ii) Superintendência de
Seguros Privados (SUSEP), (iii) resseguradores, (iv) sociedades autorizadas a operar em
seguros privados e (v) corretores habilitados.
A atividade securitária é fiscalizada pelo Poder Público por meio do poder
de polícia atribuído pelo Decreto no 73/66 ao Conselho Nacional de Seguros Privados e
à Superintendência de Seguros Privados, no interesse dos segurados e beneficiários dos
seguros (art. 2o). Interessante observar que, em atitude pioneira, vinte e quatro anos
antes do Código de Defesa do Consumidor, essa norma já focava a proteção ao
consumidor. Ademais, todas as operações de seguros privados, sejam eles obrigatórios
ou facultativos, realizadas no País, estão subordinadas às disposições do Decreto-lei no
73/66. Ressalte-se que esse decreto-lei, como estatuto básico da regulamentação
securitária, foi recepcionado com status de lei complementar pela Constituição Federal
de 1988, atendendo, assim, ao disposto no artigo 192 da Carta.
Voltando ao tratamento dado pelo Código Civil de 2002 ao seguro,
observamos que estabeleceu a seguinte definição: “Art. 757. Pelo contrato do seguro, o
66 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 38. 67 MARENSI, Voltaire Giavarina. O Seguro no Direito Brasileiro. 6. ed. Porto Alegre: Síntese, 2001, p.
71.
48
segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do
segurado, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados”.
Como se extrai desse comando o segurador se obriga, pelo contrato de
seguro, a garantir interesse legítimo do segurado contra riscos predeterminados. Se o
sinistro ocorrer, o segurador estará obrigado a pagar a indenização. Não se trata de
obrigação de fazer e, portanto, não se está diante de contrato de prestação de serviços.
Tampouco se cogita de obrigação de dar, pura e simples, pois só haverá pagamento se
ocorrer o sinistro, e não é do interesse de nenhuma das partes que este ocorra.
Como antecipado, é contrato típico, contrato de seguro, não se confundindo
com outras figuras. Tanto é verdade que a Constituição atribuiu aos Municípios a
competência para instituir imposto sobre serviços de qualquer natureza, e à União
competência para tributar operações de crédito, câmbio e seguro.
Como proclama a Doutrina, para que se aperfeiçoe o contrato de seguro, “é
imperativa a existência de cinco elementos, a saber: garantia, interesse, risco, prêmio e
empresarialidade”68.
A garantia é o objeto do contrato de seguro. É o comportamento a que a
seguradora está obrigada, perante o segurado. Por isso o contrato de seguro não
contempla obrigação de dar nem de fazer, não podendo ser confundido com operação de
compra e venda ou prestação de serviço. Como esclarece COMPARATO, “as operações de
seguro representam a garantia de um interesse contra a realização de um risco, mediante
o pagamento antecipado de um prêmio”69. A obrigação da seguradora perante o
segurado é, portanto, de garantir, não de dar, nem de fazer. A obrigação de garantir só
se converte em obrigação de dar se vier a ocorrer o sinistro.
Já o interesse segurável é bem definido por BURANELLO:
Representa a relação econômica ameaçada por um ou vários riscos, que une o segurado ou beneficiário a uma determinada coisa ou pessoa. A distinção entre o interesse segurável e a coisa ou objeto a que esse interesse se refere explica o fato de que possa existir às vezes uma multiplicidade de seguros do mesmo tipo, referentes à mesma
68 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 114.
69 COMPARATO, Fábio Konder. Obrigações de meios, de resultado e de garantia. In: ______. Ensaios e Pareceres de Direito Empresarial, p. 537 apud ibid., p. 115.
49
coisa, com titularidades diferentes, mas protegendo interesse econômico diverso.70
O risco, como já dito, é a própria causa do contrato de seguro. O seguro só
existe porque são identificados diferentes possíveis resultados para uma ação ou
conjunto de ações, sendo que algum ou alguns desses resultados são indesejados.
Segundo ALVIM, o risco é a causa do contrato. É a possibilidade de um evento
desvantajoso para o segurado ou seus beneficiários71.
O prêmio também é elemento essencial do contrato de seguro. É a
contraprestação paga pelo segurado, para obter a garantia da seguradora. Define-o
BURANELLO:
De forma simples, pode ser definido como o percentual aplicado sobre a importância segurada que corresponde à contraprestação pela garantia assumida pela seguradora. É a remuneração paga pelo segurado ao segurador em contraprestação à cobertura do interesse segurado. O seu valor é determinado conforme a maior ou menor probabilidade de ocorrência do risco.72
Esclarece VIVANTE que o prêmio pode ser decomposto em prêmio puro e
carregamento:
Em outros termos, o prêmio, denominação do pagamento por que se obriga o segurado perante a seguradora, decompõe-se em duas partes: a) prêmio puro, correspondente ao valor do risco assegurado, que é a contribuição para o fundo, gerido pela seguradora, que garante o pagamento das prestações na hipótese de verificação do evento coberto pelo seguro; b) carregamento, que remunera especificamente os serviços securitários, cobrindo as despesas operacionais e proporcionando lucro. O fundo formado pela arrecadação dos prêmios deve ser matematicamente calculado e destacado em linha específica no passivo de cada balanço, como um débito da companhia para com os segurados. A garantia eficaz dos direitos dos segurados está na conservação e no cauteloso emprego desse fundo.73
A empresariedade, por sua vez, é a característica a que a atividade
seguradora chegou depois de séculos de desenvolvimento.
Inicialmente, o seguro era assemelhado ao jogo, à aposta. Hoje é altamente
complexo, pois fortemente centrado na ciência atuarial. Esclarece TZIRULNIZ:
70 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 116.
71 ALVIM, Pedro. O Seguro de Crédito, p. 40, apud ibid., p. 117. 72 Ibid., p. 120. 73 VIVANTE, Instituições de Direito Comercial, p. 218 apud ibid., p. 122.
50
De acordo com os cálculos atuariais realizados com base no conhecimento da regularidade dos sinistros e da intensidade de seus efeitos, pelo estudo do risco, deve ser achado o valor adequado para fazer frente aos eventos (prêmio puro de risco). Tal só é possível por meio de massificação e homogeneização dos riscos que por sua vez só pode ser implementada por entidades especialmente constituídas e tecnicamente aptas para tanto, ou seja, pela empresariedade.74
Além disso, o próprio Código Civil define o contrato de seguro como aquele
que tem como parte contratada, obrigatoriamente, uma seguradora, não podendo atuar
como tal uma pessoa física ou jurídica qualquer (ao contrário do Reino Unido, onde isto
é possível).
O contrato de seguro é formal, necessariamente instrumentado pela apólice.
Importante peculiaridade é se tratar de contrato de direito privado, mas que ao mesmo
tempo é regulado pelo Estado. Tem caráter híbrido, como explica BURANELLO:
O contrato de seguros está na origem da relação jurídica, submetido a normas heterogêneas de Direito Público e Direito Privado, destacando-se, nitidamente, a regulação do Estado, tanto no conteúdo como na direção do contrato, não afastada a sua feição contratual de Direito Privado. As operações e a contratação estão submetidas ao controle e à fiscalização do Estado, na disciplina a priori das condições gerais das apólices de seguros que integram os futuros contratos e a posteriori, na fiscalização das atividades das seguradoras e aplicação de sanções aos agentes na prática de atos considerados ilícitos.75
Veremos, mais adiante, que da regulação do contrato de seguro decorrem
consequências tributárias. Exemplo disso é o fato de as provisões técnicas de
companhias de seguro, obrigatórias nos termos da regulação aplicável, serem dedutíveis
para a apuração dos tributos incidentes sobre a receita e o lucro, embora provisões feitas
por outras pessoas jurídicas não reguladas não o sejam, por não caracterizarem despesas
definitivas.
Por fim, é importante mencionar que as operações de seguros desdobraram-
se em dois grandes grupos, com algumas características bastante distintas e que
produzirão efeitos também na seara tributária: seguro de dano e seguro de pessoa.
Explica ALVIM:
74 TZIRULNIK, Ernesto; CAVALCANTI, Flávio de Queiroz; PIMENTEL, Ayrton. O Contrato de Seguro de acordo com o novo Código Civil Brasileiro, 2. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 38.
75 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 34-35.
51
Nos seguros de dano, é manifesto o seu caráter indenitário, porque o seguro não ultrapassa o valor da coisa, que constitui o limite máximo do ressarcimento, ainda que a verba segurada seja maior. Nos seguros de pessoa, o critério é diferente. Não há limite para o valor do seguro. Cada um faz o seu, de acordo com sua vontade e segundo suas posses. É que a vida humana não tem preço. A seguradora paga o valor consignado no contrato. Não existe, pois, o caráter indenitário, como no grupo anterior.76
A incidência de imposto sobre a renda nas indenizações deverá levar em
conta o fato de que, nos seguros de pessoas, a indenização não visa repor um bem
perecido, é paga conforme o valor consignado no contrato, implicando o seu
recebimento em acréscimo patrimonial, em sentido estrito, para o segurado ou
beneficiário. Desse modo, outros valores e fundamentos deverão ser utilizados para
fundamentar eventual isenção ou não incidência do imposto sobre a indenização do
seguro de pessoas.
3.2 Definição do conceito de resseguro
É discreta a diferença conceitual entre os contratos de seguro e de resseguro.
A peculiaridade do resseguro é ter como parte segurada (isto é, ressegurada) a própria
seguradora, que busca, ela também, reduzir a sua fonte exposição a riscos. É lúcida a
definição de ALFANO:
O resseguro é um instrumento de distribuição da cobertura do risco entre duas ou mais seguradoras. É um novo seguro contratado pelo segurador para exonerar-se no todo ou em parte do risco tomado. O segurador desempenha nesse contrato o papel de segurado. O elemento básico do resseguro, em sentido estrito, é a transferência do risco do segurador primário a seu próprio segurador, é dizer, o ressegurador.77.
O contrato de resseguro tem como partes, necessariamente, a seguradora e a
resseguradora, e como objeto da relação jurídica, assim como no seguro, a garantia
oferecida pela última. O segurado original não é parte nesse contrato, estando presente
76 ALVIM, Pedro. O Seguro e o Novo Código Civil – Organização e Compilação de Elizabeth Alvim Bonfioli. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 6.
77 ALFANO, Orlando Hugo. El Control de seguros y reaseguros, p. 239 apud BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 131.
52
apenas na relação jurídica com a seguradora, única responsável pelo pagamento da
indenização que porventura lhe seja devida78.
Observamos, ainda, que entidades de previdência privada também podem
contratar resseguro, na posição ocupada pela seguradora na relação jurídica de
resseguro. O artigo 11 da Lei Complementar no 109 dispõe sobre a possibilidade (por
iniciativa própria ou do órgão regulador e fiscalizador) de as entidades de Previdência
Privada (abertas ou fechadas) contratarem operações de resseguro, para garantir
compromissos assumidos perante participantes e assistidos de planos de benefícios.
A atividade ressecuritária é ainda mais complexa do que a securitária, pois
nem sempre o objeto do resseguro é apenas um contrato firmado pela seguradora. Há
diversos tipos de contratos de resseguro (que não nos cabe analisar aqui), inclusive
aquele que dá cobertura à própria carteira da seguradora. A respeito dessa
complexidade, explica LUIZ DE CAMPOS SALLES que, em tais casos,
[…] o ressegurador precisa, além de conhecer os riscos diretos, no caso de resseguros avulsos, conhecer também, e em detalhes, as carteiras das seguradoras que garante, porque o seu risco normal é a saúde das carteiras resseguradas e se estas estiverem mal dimensionadas, com certeza ele vai ter prejuízo. Operando com margens de rentabilidade mínimas e com projeções de longo prazo, um desvio por menor que seja pode comprometer o resultado da resseguradora, gerando perdas de vulto.79
O resseguro é essencial para dar segurança e estabilidade ao sistema
nacional de seguros privados. Além disso, a atividade securitária é tão sofisticada e
enfrenta riscos tão vultosos que necessita também da retrocessão80, ou seja, o seguro do
resseguro, e do cosseguro, que consiste na divisão do risco entre mais de uma
seguradora.
78 “O resseguro é uma operação entre companhias de seguros e de resseguros em que uma se compromete a ressarcir a outra na ocorrência de determinados eventos. Essa operação é transparente para o segurado original, que será sempre ressarcido integralmente pela seguradora com a qual fez apólice, sob a forma de contrato exclusivo e intransferível. Esta seguradora é, perante o segurado, a única responsável pelo pagamento da indenização. Ela, por sua vez, poderá ser ressarcida por seu ressegurador de parte do que pagou, com base num outro contrato, este de resseguro, entre ela e o ressegurador, sem nenhum envolvimento do segurado”. (BOTTI, Paulo Eduardo de Freitas. Introdução ao resseguro (para brasileiros). São Paulo: Nobel, 1995, p. 25-26).
79 SALLES, Luiz de Campos. Apresentação. In: ibid., p. 12. 80 “A retrocessão, outra modalidade de pulverização de riscos, é a operação pela qual o ressegurador
transfere a outra resseguradora o excedente das responsabilidades aceitas em contratos de resseguro. É o que se costuma chamar de resseguro do resseguro” (SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 233).
53
Com efeito, muita vez os montantes envolvidos nos contratos de seguro são
tão vultosos que mesmo o resseguro reclama cobertura. Nesse caso, a pulverização de
risco é feita com resseguradoras nacionais ou internacionais, recebendo, então, o nome
de retrocessão. Quanto mais alto o valor do contrato de seguro, maior a necessidade de
participação de um grupo ressegurador. Além de pulverização entre as resseguradoras, o
valor do bem segurado também pode ser dividido entre duas ou mais seguradoras. Essa
operação é chamada de cosseguro. Assim, ficam distribuídas as responsabilidades entre
as seguradoras conforme sua quota de participação.
A pulverização do risco pode ocorrer entre resseguradoras nacionais ou
internacionais. Antigamente, a pulverização só podia ser feita com resseguradores
internacionais, através do IRB (Instituto Brasileiro de Resseguros). Esse regime
prevaleceu até a edição da Lei Complementar no 126, de 15 de janeiro de 2007, que
abriu o mercado de resseguros brasileiro. Essa lei complementar alterou vários artigos
do Decreto-Lei no 73/66 e rompeu o monopólio do IRB nas operações de resseguros e
retrocessão, que perdurava desde a década de 1940.
A Lei Complementar nº 126, de 15 de janeiro de 2007, dispôs sobre uma
nova política de resseguros, retrocessão e cosseguros, admitindo, também, mas não
exclusivamente, a contratação de operações securitárias em moeda estrangeira81.
Estabeleceu que as operações de resseguro e retrocessão poderiam ser
realizadas com resseguradores locais (sociedades anônimas sediadas no País, tendo por
objeto exclusivo a realização de operações de resseguro e retrocessão) admitidos
(sediados no exterior, com escritório de representação no País, cadastrados como tal no
órgão fiscalizador de seguros); e eventuais, (resseguradores sediados no exterior,
cadastrados como tal no órgão fiscalizador de seguros).
Entre muitas outras determinações, estabeleceu a definição do capital
mínimo para a constituição de uma empresa de resseguro local; as bases da cessão
preferencial aos resseguradores locais, sendo 60% nos três primeiros anos de
funcionamento e 40% nos demais, limites de retrocessão e documentos necessários para
o registro das empresas na SUSEP.
81 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 57.
54
Determinou, ainda, que se aplicam aos resseguradores locais, observadas as
peculiaridades técnicas, contratuais, operacionais e de risco da atividade e as
disposições do órgão regulador de seguros, o Decreto-Lei no 73, de 21 de novembro de
1966, e as demais leis aplicáveis às sociedades seguradoras, inclusive as que se referem
à intervenção e liquidação de empresas, mandato e responsabilidade de administradores;
e as regras estabelecidas para as sociedades seguradoras.
Em vista disso, as normas tributárias aplicáveis aos resseguradores locais
serão, em regra, as mesmas aplicáveis a seguradoras brasileiras. Haverá, contudo,
questões específicas atinentes às vultosas remessas, para o exterior, de prêmios de
resseguro e retrocessão, as quais serão abordadas a seguir, logo após os tópicos
destinados ao tratamento tributário do seguro.
3.2.1 Peculiaridades dos contratos de seguro e resseguro a serem consideradas
pelo Direito Tributário
Analisamos, no tópico anterior, os atributos essenciais dos contratos de
seguro e resseguro. Evidentemente, todas essas características devem ser levadas em
consideração pelo legislador, ao instituir normas tributárias que descrevam a
contratação de seguro em sua hipótese de incidência tributária. Não obstante,
entendemos importante discorrer, aqui, sobre algumas peculiaridades desses contratos
que não devem, de modo algum, ser desprezadas pelo legislador tributário.
Em primeiro lugar, necessário ter presente o fato de serem contratos típicos
e distintos de todos os outros previstos pelo Código Civil. A própria Constituição
reconheceu isso, ao atribuir à União competência para tributar especificamente
operações de seguro, o que impede se confunda esse contrato, para qualquer fim
tributário, com outros de natureza distinta, como o contrato de prestação de serviços.
Com efeito, a Constituição Federal previu, em seu artigo 153, V, competir à
União instituir impostos sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a
títulos ou valores mobiliários. E o Código Tributário Nacional, por sua vez, estatui em
seu artigo 110 que a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de
institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente,
55
pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do
Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
Isso significa dizer – e veremos que é premissa de extrema relevância – que
o conceito de seguro, constante do Direito Privado, isto é, contrato típico com as
características anteriormente relacionadas, deve ser necessariamente observado pela lei
tributária, uma vez que foi utilizado pela Constituição Federal para definir
competências.
Outra premissa que entendemos importante reiterar e que deve ser levada
em conta pelo Direito Tributário é o fato de o objeto dos contratos de seguro e resseguro
não ser nem uma obrigação de dar, nem de fazer, mas sim de garantir. Sobre o assunto,
é precisa a lição de SILVA:
À luz do que identificamos como objeto do contrato de seguro (vale repetir: a garantia), entendemos que, ao lado das clássicas obrigações de dar, de fazer e de não fazer, o Direito do Seguro apresenta outra categoria obrigacional, qual seja a obrigação de garantia. Assim, o segurador, por meio do contrato de seguro, fonte legítima de obrigação, se obriga a garantir interesse legítimo do segurado. A obrigação de garantia constante no contrato de seguro não se encaixa nas figuras das obrigações de dar, fazer e não fazer, visto se tratar de uma espécie obrigacional específica e, portanto, peculiar às obrigações securitárias. Há de se observar, então, que o segurador se obriga por meio do contrato de seguro a prestar obrigação de garantia ao segurado e, em função disso, na medida em que essa obrigação não for atendida, o garantidor estará em mora.82
O objeto dos contratos de seguro e resseguro é, portanto, a garantia de
interesse legítimo do segurado ou ressegurado, obrigação essa que pode, ou não,
converter-se no pagamento de uma indenização, se ocorrer o sinistro. O que pretende o
segurado ou ressegurado, ao contratar o seguro ou resseguro, é obter o direito a gozar de
tranquilidade, uma vez que seu interesse legítimo sobre pessoa ou coisa estará
resguardado contra os riscos predeterminados no momento da contratação.
Essas singelas afirmações deveriam ser suficientes para apartar
definitivamente os contratos de seguro e resseguro do contrato de prestação de serviços.
Contudo, como veremos, o legislador tributário, assim como a Receita Federal do
Brasil, obstinam-se em tê-los como análogos, o que é inaceitável, sob pena de fazer
tabula rasa de todo o sistema tributário brasileiro.
82 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 84.
56
Munidos dessas premissas, passamos, inicialmente, a tratar da incidência do
Imposto sobre Operações Financeiras – IOF, tributo que, por definição, incide com
exclusividade sobre prêmios de seguro e resseguro. Entendemos relevante tratar,
também, do imposto de renda incidente sobre prêmios de seguro e resseguro remetidos
ao exterior e da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre essas mesmas
remessas, a fim de esclarecer dúvidas e obscuridades.
3.2.2 Imposto sobre Operações Financeiras – Seguro
3.2.2.1 Competência constitucional para a instituição do IOF – Seguro
Ao atribuir competência tributária para que o legislador ordinário da União
instituísse impostos, o Constituinte indicou, entre as materialidades passíveis de
tributação, as operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores
mobiliários. A competência tributária em questão foi atribuída pelo artigo 153, V, e
delimitada pelo respectivo parágrafo 1º, assim como pelo artigo 150, § 1º da Carta,
abaixo transcritos:
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: […] V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; § 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: III - cobrar tributos: […] b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos
57
arts. 155, III, e 156, I. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)83.
Como se pode verificar, o Constituinte incluiu, no mesmo inciso V, a
indicação de quatro materialidades distintas, aptas a serem tributadas pelo legislador
ordinário: as operações de crédito, câmbio, seguro e relativas a títulos ou valores
mobiliários. Trata-se de operações completamente distintas, que em comum não têm
sequer o fato de serem financeiras, como ressalta ROBERTO QUIROGA MOSQUERA:
Quanto às operações de seguro, não se pode dizer que elas se enquadrem no conjunto de operações realizadas no mercado de valores mobiliários e no mercado financeiro. Apesar de aparentarem certas similitudes (por exemplo: autorização do Estado para funcionamento das empresas seguradoras), o seguro é operação que não se confunde com as operações de crédito, câmbio e relativas a títulos ou valores mobiliários.84
Essa técnica legislativa parece ter sido usada pelo fato de o constituinte ter
pretendido atribuir natureza extrafiscal ao IOF em suas quatro modalidades (crédito,
câmbio, seguro e valores mobiliários), mitigando a tipicidade cerrada em relação à
determinação de suas alíquotas, e excetuando-as à aplicação do princípio da
anterioridade.
PLÍNIO MARAFON discorre sobre a extrafiscalidade do tributo:
Essa exceção ao princípio da legalidade tributária (de que o IOF faz parte) advém da natureza extrafiscal dos tributos ali mencionados, de forma que a faculdade atribuída ao Poder Executivo para alterar as alíquotas de tais impostos, incluindo o IOF, não consubstancia poder discricionário, devendo ser exercida, sempre, de forma fundamentada. No caso do IOF, a fundamentação deve estar relacionada aos objetivos das políticas monetária e fiscal, nos termos em que determinam os parágrafos únicos dos arts. 1º e 5º, da Lei n. 8.894/94, não podendo funcionar como simples instrumento por parte do Estado.85
BERNARDO RIBEIRO DE MORAES esclarece que, “juridicamente, não há de se
distinguir o imposto fiscal do imposto extrafiscal. Nada justifica essa separação, em
áreas estanques, dos dois tipos de impostos”. Com efeito, do ponto de vista da regra-
matriz de incidência tributária, tributos fiscais e extrafiscais são idênticos, uma vez que
83 BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988.
84 MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação no Mercado Financeiro e de Capitais. São Paulo: Dialética, 1998, p. 89-90.
85 MARAFON, Plínio J. IOF. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de Direito Tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 665.
58
a qualificação se baseia na suposta “vontade do legislador” de atingir certos objetivos
com os tributos. Aliás, nem mesmo é possível apartar com precisão tributos fiscais de
extrafiscais, pois todos terão, fatalmente, ambas as características, em maior ou menor
intensidade.
De qualquer modo, alguns tributos, como é o caso do IOF em suas quatro
modalidades, têm a característica da extrafiscalidade mais patente, inclusive tendo sido
flexibilizada a aplicação de princípios constitucionais para permitir mais ampla margem
de manobra pelo Estado em sua utilização. Ensina MORAES:
Através do seu poder fiscal, o Estado intervém no controle da economia e do meio social, passando o imposto a possuir, ao lado da função fiscal, uma função extrafiscal (o imposto é visto como instrumento de intervenção ou regulação pública, de dirigismo estatal). Impostos extrafiscais, são, pois, os impostos de ordenamento, buscando finalidade no âmbito da política econômica e social. Enquanto que os impostos fiscais se esgotam num campo relativamente estreito – obter receitas para o gasto público -, os impostos extrafiscais possuem outros fins, podendo abranger os de política econômica e social, ou de política administrativa, de política demográfica, de política sanitária, de política cultural etc. Lembrando que existem impostos que percebem fins fiscais e extrafiscais ao mesmo tempo, v.g., os impostos que oneram o cigarro, a bebida alcoólica, etc. 86
Com o objetivo de permitir a utilização extrafiscal do IOF pelo Poder
Executivo, o Constituinte, em primeiro lugar, afastou a obrigação de atendimento, pela
respectiva legislação, aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, encartados
no artigo 150, III, “b” e “c”. Por conseguinte, o IOF pode ser cobrado no mesmo
exercício financeiro, e antes de decorridos noventa dias da publicação da lei que o
instituiu ou aumentou.
Quanto à regra do parágrafo único do artigo 153, que autoriza o Poder
Executivo a alterar a alíquota do imposto, concordamos com QUIROGA MOSQUERA
quando afirma não se tratar de exceção ao princípio da legalidade tributária, pois o
legislador constitucional não deixou o Poder Executivo livre para manipular o aspecto
quantitativo da hipótese de incidência. Com efeito, foi dado a este, apenas, o direito de
alterar as alíquotas dos impostos sobre operações de crédito, câmbio, seguro ou relativas
86 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de Direito Tributário. Ed. rev., aumentada e atualizada. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 443.
59
a títulos ou valores mobiliários, nas condições e limites devidamente estabelecidos pelo
legislador ordinário. Conclui o autor:
Portanto, cabe ao legislador estabelecer, em Lei, todos os critérios das regras-matrizes tributárias dos impostos referidos e, em especial, estabelecer as alíquotas máxima e mínima aplicável. Ao Executivo somente caberá a prerrogativa de alterar essas alíquotas dentro dos limites mínimos e máximos possíveis. Qualquer extrapolação dos limites pelo Executivo viciará o ato administrativo respectivo, por ofensa ao princípio constitucional da legalidade tributária.87
Quanto aos demais princípios constitucionais que orientam a instituição e a
cobrança de tributos, são integralmente aplicáveis ao IOF88.
Da análise das disposições constitucionais que atribuem à União
competência para instituir o IOF – Seguro, conclui-se que o contrato de seguro (e
resseguro), típico e com características próprias que o estremam definitivamente de
figuras como a da compra e venda e a da prestação de serviços, deve ser tributado
exclusivamente pela incidência desta RMIT, cuja competência foi atribuída à lei
ordinária federal e deve ser exercida com obediência a todos os princípios
constitucionais aplicáveis a tributos e impostos, como os da capacidade contributiva e
da proibição de confisco, excepcionada a observância ao princípio da anterioridade e
flexibilizada a submissão ao princípio da legalidade, na medida em que, dentro dos
parâmetros estabelecidos por lei, sua alíquota pode ser alterada pelo Poder Executivo.
3.2.2.2 Enunciados de competência do CTN acerca do IOF – Seguro
Além das normas constitucionais que atribuem à União competência para
instituir o IOF – Seguro, há também enunciados do Código Tributário Nacional que
delimitam a atribuição concedida ao legislador ordinário. Com efeito, como o CTN tem
87 MOSQUERA, Roberto Quiroga. Tributação no Mercado Financeiro e de Capitais. São Paulo: Dialética, 1998, p. 95.
88 “Os demais princípios constitucionais devem ser aplicados in totum aos impostos sobre operações de crédito, câmbio, seguro e títulos ou valores mobiliários. Assim, em especial o legislador ordinário: a) não poderá exigir os impostos referidos em relação a fatos ocorridos antes do início da vigência da
Lei que os houver instituído ou aumentado (princípio da irretroatividade tributária); b) não poderá estipular, para os impostos aludidos, alíquotas elevadas que os tornem confiscatórios
ou com fins confiscatórios (princípio da impossibilidade de confisco); c) não poderá, com os impostos acima mencionados, instituir tratamento desigual entre contribuintes
que se encontrem em situação equivalente (princípio da isonomia tributária); d) não poderá, com os impostos acima apontados, onerar bens ou entidades imunes a impostos
(imunidades constitucionais).” (ibid., p. 96).
60
status da lei complementar prevista no artigo 146, III da Constituição, cabe-lhe
estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária sobre os fatos geradores,
bases de cálculo e impostos nela discriminados.
Sobre o imposto, dispôs o CTN:
Art. 63. O imposto, de competência da União, sobre operações de crédito, câmbio e seguro, e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários tem como fato gerador: […] III - quanto às operações de seguro, a sua efetivação pela emissão da apólice ou do documento equivalente, ou recebimento do prêmio, na forma da lei aplicável; Art. 64. A base de cálculo do imposto é: […] III - quanto às operações de seguro, o montante do prêmio; […] Art. 65. O Poder Executivo pode, nas condições e nos limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas ou as bases de cálculo do imposto, a fim de ajustá-lo aos objetivos da política monetária. Art. 66. Contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação tributada, como dispuser a lei. Art. 67. A receita líquida do imposto destina-se a formação de reservas monetárias, na forma da lei89.
Quanto à hipótese de incidência do IOF nas operações de seguro,
estabeleceu o CTN que poderia ser a emissão da apólice ou o pagamento do prêmio.
Sua base de cálculo, determinou ser o montante do prêmio. Com efeito, não poderia ser
outra, pois o prêmio corresponde à remuneração da seguradora pela cobertura de risco
oferecida, consistindo, portanto, na perspectiva dimensível da hipótese de incidência
tributária.
O artigo 65 do CTN, por sua vez, apenas reitera o disposto no artigo 153, §
1º, da Constituição, cabendo observar que este não permite alteração da base de cálculo
do imposto pelo Poder Executivo, mas apenas da alíquota. Por essa razão, a faculdade
de alterar a base de cálculo deve ser tida como não recepcionada pela Constituição de
1988.
Quanto aos sujeitos passivos, o artigo 66 deixa a critério do legislador
ordinário escolher qualquer das partes na operação tributada. Por fim, o artigo 67 trata
89 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. “Código Tributário Nacional”. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília: DOU, retificado em 31 out. 1966.
61
da destinação do produto da arrecadação do IOF, consistente na formação de reservas
monetárias90.
3.2.2.3 RMIT do IOF – Seguro
Com base na competência que lhe foi atribuída pela Constituição e nos
enunciados do Código Tributário Nacional, o legislador federal instituiu o IOF –
Seguro, atualmente normatizado pelas seguintes leis e decretos: Lei nº 5.143/66,
Decreto-Lei nº 1.783/80, Decreto nº 6.306/07, Decreto-Lei nº 2.471/88 e Lei nº
9.718/98, com suas alterações posteriores.
Com base nos enunciados veiculados desses instrumentos introdutores, é
possível construir a regra-matriz de incidência tributária do IOF – Seguro, atualmente,
com a seguinte conformação:
Hipótese:
Critério material: Realizar operação de seguro (seguros de vida e
congêneres, seguro de acidentes pessoais e do trabalho, seguros de bens,
valores, coisas, resseguro e outros não especificados).
Critério espacial: Território nacional
Critério temporal: Momento do recebimento total ou parcial do prêmio
Consequente:
Critério pessoal: Sujeito ativo: União
Sujeito passivo: Seguradora ou Resseguradora, na
condição de responsável por substituição.
Critério quantitativo: Base de cálculo: montante integral do prêmio.
Alíquota: atual geral de 7,38% (máxima de 25%)91
90 Ressalvado o disposto no artigo 77 da CF/88. “Art. 72. Integram o Fundo Social de Emergência: (Incluído pela Emenda Constitucional de Revisão
nº 1, de 1994) […] II - a parcela do produto da arrecadação do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza e do
imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos e valores mobiliários, decorrente das alterações produzidas pela Lei nº 8.894, de 21 de junho de 1994, e pelas Leis nºs 8.849 e 8.848, ambas de 28 de janeiro de 1994, e modificações posteriores; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 10, de 1996)” (BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988).
62
Ressalte-se que, como a seguradora e a resseguradora foram postas, pelo
legislador, no polo passivo da obrigação tributária como responsáveis (substitutas)
tributárias, além da RMIT extrai-se do texto legal outra norma, a que denominamos
“norma de retenção”, que lhes atribui o direito de incluir no valor do prêmio o montante
do IOF – Seguro, repassando seu ônus econômico ao segurado/ressegurado, indicado
pela legislação como “contribuinte” do imposto.
Observamos, ainda, que o imposto não incide sobre seguros e resseguros
contratados com seguradoras/resseguradoras no exterior, pois, como visto, de acordo
com a RMIT vigente são sujeito passivo do imposto (na condição de substitutas) e,
sendo domiciliadas no exterior, não estarão sujeitas ao imposto brasileiro.
3.3 Imposto sobre a Renda na Fonte sobre remessas de prêmio de seguro ao
exterior
O Imposto sobre a Renda na Fonte – IRRF incide sobre as remessas de
prêmio de seguro e resseguro em favor de residentes e domiciliados no exterior, por
tomar-se o prêmio como rendimento auferido pelos beneficiários (seguradoras e
resseguradoras). O sujeito passivo do IRRF, na condição de substituto tributário, é a
fonte pagadora do prêmio, domiciliada no País.
Discorreremos, a seguir, sobre essa incidência tributária, seus princípios
informadores e limites.
91 De acordo com a redação vigente do artigo 22 do Decreto nº 6.306/07, embora a alíquota aplicável à generalidade dos contratos tenha sido estabelecida em 7,38%, a alíquota do IOF-Seguro está reduzida a zero nas seguintes operações: resseguro; seguro obrigatório, vinculado a financiamento de imóvel habitacional, realizado por agente do Sistema Financeiro de Habitação; seguro de crédito à exportação e de transporte internacional de mercadorias; de seguro contratado no Brasil, referente à cobertura de riscos relativos ao lançamento e à operação dos satélites Brasilsat I e II; em que o valor dos prêmios seja destinado ao custeio dos planos de seguro de vida com cobertura por sobrevivência; seguro aeronáutico e de seguro de responsabilidade civil pagos por transportador aéreo; seguro garantia.
O Decreto nº 6.306/07 também reduz a 0,38% a alíquota aplicável às nas operações de seguro de vida e congêneres, de acidentes pessoais e do trabalho, incluídos os seguros obrigatórios de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não e excluídas aquelas de que trata a alínea “f” do inciso I. Por fim, nas operações de seguros privados de assistência à saúde, a alíquota esta atualmente fixada em 2,38%.
63
3.2.1 Princípios da Territorialidade e da Universalidade
No Sistema Constitucional Tributário brasileiro coexistem harmonicamente
os princípios da territorialidade e o da universalidade.
Tal coexistência é bem delineada por PAULO DE BARROS CARVALHO,
quando explica que “não obstante seja este o atual regime de tributação das pessoas
jurídicas, de modo algum tal circunstância poderá ter o condão de levar-nos a concluir,
apressadamente, que a opção pelo princípio da universalidade tenha afastado
aquel’outro, da territorialidade”. Esclarece que, “ao contrário, o princípio da
universalidade implica o da territorialidade, e esta servirá como nexo para determinar o
regime jurídico das rendas auferidas no interior do Estado brasileiro, seja por residentes
ou não residentes”92.
Na mesma linha segue HELENO TAVEIRA TORRES, quando demonstra ser
incorreto afirmar que o primeiro tenha sido suplantado pelo segundo. É sua a
elucidativa explanação:
O conceito de territorialidade reflete a própria noção de soberania jurídica de um ordenamento sobre um determinado espaço territorial, especialmente no que concerne às atividades tributárias. Para muitos, esse princípio ficou subordinado ao princípio da renda mundial, para outros, não passa de modalidade arcaica de fixação dos limites do alcance normativo. Duplo erro de conclusões sobre sua verdadeira dimensão de princípio fundamentador da criação e aplicação das normas tributárias. O conceito de territorialidade é imprescindível para o tratamento de qualquer elemento de direito internacional. […] É o princípio da territorialidade que fundamenta o alcance espacial das normas tributárias sobre os fatos juridicizados pelo ordenamento, estabelecendo uma reserva de exclusividade para a aplicação das leis do Estado aos fatos ocorridos neste espaço, mediante uma conexão material (presença da fonte de produção do rendimento), promovidos por residentes ou não residentes; e bem assim àqueles fatos identificados fora do respectivo território, mas colhidos para tributação no âmbito interno, por conexão subjetiva (qualificação interna de residente atribuída a um dado sujeito). Desse modo, reconhece-se a legitimidade dos atos internos de lançamentos tributários, de modo a constituir o respectivo crédito tributário em favor da fazenda pública, mediante um critério de conexão pessoal, aplicados apenas àqueles sujeitos qualificados como “residentes” do respectivo território, exclusivamente (universalidade ou princípio da
92 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 677-678.
64
renda mundial), ou um critério de conexão material, pela presença da fonte de produção do rendimento.93
Se o princípio da territorialidade reflete a própria noção de soberania,
conforme bem apontado pelo autor, o princípio da universalidade é extraído da
interpretação dos enunciados do artigo 153, § 2o, I, da Constituição Federal94.
Ambos regulam a competência do legislador ordinário para a determinação
da base de cálculo do imposto sobre a renda, conduzindo-a a abranger todos os
elementos configuradores de riqueza nova, incluindo tanto os rendimentos auferidos por
residentes fiscais no Brasil, ou provenientes de fontes pagadoras ou de produção
domiciliadas no País (decorrência da territorialidade), quanto aqueles auferidos por
domiciliados no País, mas originados de fontes pagadoras/de produção estrangeiras 95.
Trata-se, portanto, de normas que dizem respeito à base de cálculo do
imposto sobre a renda. A relação do princípio da universalidade com a base de cálculo
do imposto sobre a renda é salientada por JOSÉ ARTUR LIMA GONÇALVES:
A lei brasileira, ao determinar que devam ser incluídos na base de cálculo do imposto sobre a renda da pessoa jurídica domiciliada no país os seus lucros, os seus rendimentos e os seus ganhos de capital auferidos no exterior, manifesta decisão política, soberanamente tomada pelo órgão competente – legislativo federal –, para exercício da competência tributária impositiva em matéria de imposto sobre a renda.96
93 TORRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-Residentes no Brasil. Prestações de serviços no exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento. In: ______. Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 78.
94 “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: […] III - renda e proventos de qualquer natureza; […] § 2o - O imposto previsto no inciso III: I - será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da
lei; […]” (BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988).
95 RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA explica a eficácia dessa norma: “Esta amplidão dos fatos capazes de gerar a incidência do imposto de renda conforma-se com o princípio da universalidade, que obrigatoriamente informa esse tributo em virtude do disposto no inciso I do § 2o do art. 153 da Constituição Federal, eis que tal critério exige seja considerada, no fato gerador e na base de cálculo de uma determinada obrigação tributária, a universalidade de todos os fatores que atingem positiva e negativamente o patrimônio do contribuinte durante o período-base fiscal” (O Conceito de Renda – Inovação do art. 43 do CTN pela Lei Complementar nº 104 (a Questão da Disponibilidade sobre Lucros de Coligadas e Controladas no Exterior). Revista Dialética de Direito Tributário, n. 73, out. 2001, p. 108).
96 Imposto sobre a Renda – Resultados Auferidos no Exterior por Filiais, Sucursais, Controladas e Coligadas. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 74, nov. 2001, p. 73.
65
Assim, o princípio da universalidade vai influenciar a conformação da base
de cálculo do imposto sobre a renda das pessoas físicas e das pessoas jurídicas
residentes e domiciliadas no País (os chamados IRPF e IRPJ), permitindo que o
legislador ordinário inclua em suas bases de cálculo rendimentos auferidos no exterior.
Esclarece TORRES:
Justifica-se, assim, a ultraterritorialidade do alcance as normas de Direito Tributário Internacional, para atribuir aos respectivos contribuintes – conexos pessoalmente – as correspondentes obrigações tributárias formadas a partir de fatos imponíveis constituídos mesmo sobre as fontes redituais localizadas no exterior.97
XAVIER observa:
De harmonia com a lógica do princípio da universalidade, torna-se irrelevante o local em que se encontra a fonte de produção ou a fonte de pagamento da renda. Assim, o fato de a fonte de produção ou pagamento situar-se no exterior […] não impede a tributação no Brasil dos respectivos rendimentos.98
Por seu turno, o princípio da territorialidade autoriza, como decorrência
lógica do princípio da soberania, primeiramente a tributação de todos os fatos jurídicos
tributários realizados no País, por residentes fiscais, em que estes aufiram renda.
Todavia, estão também abrangidos pela soberania territorial os fatos jurídicos tributários
nos quais o residente fiscal brasileiro atua como fonte pagadora do rendimento, fatos
estes que ensejam aquisição de renda por um residente no exterior. Trata-se, neste
último caso, da utilização do critério de conexão da fonte pagadora dos rendimentos.
Quanto ao critério de conexão, a Doutrina discute a necessidade de a fonte
ser necessariamente de “produção” da renda, ou se poderia ser simplesmente fonte de
“pagamento” localizada no Brasil. A nosso ver, a legislação ordinária brasileira, a
despeito das críticas que possam ser feitas, adotou a segunda linha, determinando a
incidência do imposto sobre a renda no País, sobre rendimentos pagos, creditados,
remetidos, entregues ou empregados por pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas no
País, em benefício de residente no exterior, bastando para isso que a fonte de pagamento
aqui esteja. Todavia, entendemos relevante a lição de TORRES, para quem só se pode
97 TORRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-Residentes no Brasil. Prestações de serviços no exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento. In: ______. Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 78.
98 Direito Tributário Internacional do Brasil. 7. ed. reformulada e atualizada até outubro de 1998. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 340.
66
eleger a fonte de pagamento como critério de conexão, quando a fonte de produção de
rendimento também for localizada no País:
Todo o regime de tributação territorial de sujeitos não residentes, quando vinculados ao ordenamento por algum nexo material, está fundado nos mecanismos de retenção exclusiva na fonte, ao que, para bem compreender seu alcance, temos de considerar dois conceitos distintos entre si, mas funcionalmente complementares. O primeiro é o de “fonte efetiva de rendimento” (i), que é o critério que se presta para os fins de determinar a conexão material entre o sujeito (contribuinte) e o território; e o segundo, quanto aos efeitos sobre o sujeito “residente” tomado e qualificado como tal, sob a forma de “fonte de pagamento” (ii), definido como espécie de responsável tributário, deixando bem claro que este só se aperfeiçoa quando em presença daquela primeira hipótese, qual seja, a presença da fonte efetiva de rendimento no território nacional.99
Feitos esses esclarecimentos prévios, trataremos, a seguir, da tributação de
fonte, estabelecida pelo legislador ordinário brasileiro, sobre rendimentos pagos a
residentes no exterior, e o adequado tratamento a ser dado aos prêmios de seguro.
3.2.2 Definição da alíquota aplicável a remessas de prêmio de seguro e
resseguro
O legislador ordinário, em face da competência que lhe foi atribuída pela
Constituição, editou normas determinando a incidência na fonte do imposto de renda
sobre rendimentos pagos, creditados, entregues ou empregados em favor de residentes
no exterior. O Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR/99) consolidou a legislação
ordinária existente sobre o assunto da seguinte forma:
Art. 685. Os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente no exterior, estão sujeitos à incidência na fonte (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 100, Lei nº 3.470, de 1958, art. 77, Lei nº 9.249, de 1995, art. 23, e Lei nº 9.779, de 1999, arts. 7º e 8º): I - à alíquota de quinze por cento, quando não tiverem tributação específica neste Capítulo, inclusive: a) os ganhos de capital relativos a investimentos em moeda estrangeira; b) os ganhos de capital auferidos na alienação de bens ou direitos; c) as pensões alimentícias e os pecúlios;
99 TORRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-Residentes no Brasil. Prestações de serviços no exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento. In: ______. Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 90.
67
d) os prêmios conquistados em concursos ou competições. II - à alíquota de vinte e cinco por cento: a) os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços; b) ressalvadas as hipóteses a que se referem os incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 691, os rendimentos decorrentes de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 245.100
Como regra geral (há outros dispositivos tratando da tributação aplicável a
rendimentos específicos), temos que o pagamento e outras hipóteses de disponibilização
de rendimentos a residentes no exterior, quando decorrentes de prestação de serviços,
estão sujeitos à incidência do imposto à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento). Já os
rendimentos para os quais não houver tributação específica prevista na lei estão sujeitos
à incidência do imposto à alíquota de 15% (quinze por cento).
No contexto do presente estudo, a questão que se apresenta neste momento é
investigar qual dessas alíquotas aplicar aos prêmios de seguro remetidos para o exterior.
Já tivemos oportunidade de externar, aqui, que o seguro é contrato típico,
não se confundindo com nenhum outro. Com efeito, ao analisarmos o artigo 757, do
Código Civil, concluímos que, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir
interesse legítimo do segurado contra riscos predeterminados. Se o sinistro ocorrer, o
segurador estará obrigado a pagar a indenização. Não se trata de obrigação de fazer e,
portanto, não se está diante de contrato de prestação de serviços. Tampouco se trata de
obrigação de dar pura e simples, pois o segurador só deverá pagar a indenização na
remota hipótese de ocorrer o sinistro, o que não é desejado por nenhuma das partes, de
modo que a regra é que esse pagamento não ocorra.
Não obstante, as autoridades fiscais brasileiras vêm adotando o
entendimento de que os prêmios de seguro devidos a residentes no exterior devem
sujeitar-se ao imposto sobre a renda na fonte à alíquota de 25%, aplicável, como visto,
exclusivamente aos rendimentos decorrentes da prestação de serviços, ou a remessas
efetuadas a beneficiários domiciliados em paraísos fiscais.
100 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999.
68
Ora, esse entendimento é totalmente equivocado. O prêmio de seguro não
tem, absolutamente, natureza de remuneração pela prestação de serviços. Ao contrário,
a natureza jurídica dos contratos de seguro e de prestação de serviços são perfeitamente
distintas.
O conceito de serviço tem por base o exercício de determinada atividade
(intelectual ou material) com finalidade produtiva ou de lucro. Já o seguro tem como
objeto a garantia de interesse legítimo do segurado, contra riscos predeterminados. No
contrato de prestação de serviços verifica-se obrigação de fazer, de executar um
trabalho em benefício de alguém; no de seguro (e resseguro), o segurador se obriga a
garantir. A obrigação de dar (pagar indenização) só surgirá se e quando o sinistro
ocorrer.
No Brasil, conforme previsão expressa da Constituição Federal, o seguro é
tributado pelo imposto sobre operações financeiras – IOF na modalidade “seguro”, cuja
regra-matriz de incidência tributária já foi analisada. A própria Constituição Federal
distingue o seguro do serviço, atribuindo à União competência para tributar o primeiro
pelo IOF, e aos Municípios a competência para tributar o segundo pelo ISS.
É tão clara a distinção, que a atividade securitária não sofre tributação pelo
imposto sobre serviços – ISS. Com efeito, a Lei Complementar 116/01 não contempla,
em sua lista anexa, nenhuma atividade que possa abarcar a garantia de riscos oferecida
por seguradores, e consequentemente nenhuma legislação municipal poderá fazê-lo.
Atividades relacionadas, como a corretagem de seguros e a representação, são tributadas
pelo ISS por configurarem verdadeiras obrigações de fazer.
Fica evidente, portanto, que o legislador não poderia, em hipótese alguma,
equiparar o seguro a serviço, para fins tributários.
Essa conclusão pode ser extraída da própria repartição exclusiva de
competências tributárias, feita na Constituição Federal. Contudo, como se não bastasse,
é também explicitada no Código Tributário Nacional, quando determina expressamente,
no artigo 110, que
[…] a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas
69
Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.101
Se a lei tributária ou o aplicador pudessem fazê-lo, ruiria todo o sistema de
repartição de competências. Os entes federativos invadiriam as competências uns dos
outros, instalando-se o caos tributário.
É patente, portanto, que “seguro” e “serviço” foram conceitos utilizados
pela Constituição Federal para a repartição de competências, não podendo o legislador
ordinário, em hipótese alguma, alterar o alcance do termo “serviço” para fazê-lo abarcar
“seguro”.
O que se observa é que, de fato, o legislador do imposto sobre a renda
limitou-se a exercer, no particular, sua competência tributária dentro dos limites
traçados pela Constituição, não incorrendo em ilícito legislativo. A equivocada
equiparação de seguro a serviço vem sendo adotada e aplicada pelas autoridades fiscais,
a despeito de a lei tratar da matéria adequadamente. Não obstante a clareza da distinção
entre a atividade de garantia de riscos e de prestação de serviços, a Receita Federal do
Brasil, historicamente, tem manifestado entendimento no sentido da aplicação, às
remessas para o exterior de prêmios de seguro e resseguro, da regra de incidência do
imposto sobre a renda prevista para a remuneração pela prestação de serviços.
Há várias respostas a consultas formais de contribuintes dadas pela Receita
Federal neste sentido. Vem sendo aplicada ao prêmio de seguro remetido para residente
no exterior a alíquota de 25% (vinte e cinco por cento), expressamente prevista para
serviços, em lugar da alíquota de 15% (quinze por cento), prevista para outros
rendimentos não especificados. Vejamos um exemplo:
Assunto: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte - IRRF Ementa: IRRF. PRÊMIO DE SEGURO. ACORDO PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÂO BRASIL/ESPANHA. Os valores enviados a título de prêmio de seguro contratado com seguradora, que não tenha estabelecimento permanente no País, situada na Espanha, deverão ser tributados à alíquota de 25% pelo IRRF, conforme estabelecido no artigo 682, inciso I, combinado com o artigo 685, inciso II, do RIR, podendo a seguradora espanhola, por sua vez, deduzir do imposto que lá lhe será cobrado um montante igual ao imposto sobre a renda pago ao Brasil, conforme artigo 23 da Convenção Destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos
101 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. “Código Tributário Nacional”. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília: DOU, retificado em 31 out. 1966.
70
sobre a Renda, firmada entre a República Federativa do Brasil e o Estado Espanhol. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei no 5.172/1966; Decreto Legislativo no 62/1975; Decreto Legislativo no 30/1994, Lei nº 10.406/2002; Medida-Provisória no 2.158-35/2001; Decreto no 76.975/1976; Decreto no 1.355/1994; Decreto no 3.000/1999; Decreto 70.235/1972; IN SRF 230/2002. SÉRGIO MARTINS FILHO CHEFE.102
O Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda (atual Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais), também já incorreu no equívoco de equiparar
“seguro” a “serviço” para fins de tributação de remessas de prêmios ao exterior. O
Acórdão 104-19.267, prolatado no Processo no 13884.004869/2001-66, em sessão de
19/03/2003 foi assim ementado:
REMESSA DE NUMERÁRIO AO EXTERIOR — PAGAMENTO DE SEGUROS — RETENÇÃO PELA FONTE PAGADORA — A remessa para pagamento de prêmio estipulado em contrato de seguros com pessoa jurídica domiciliada no exterior, por configurar pagamento de serviços prestados, constitui rendimento, tomando obrigatória à retenção do imposto de renda e o correspondente recolhimento pela fonte pagadora.103
Em trecho do voto do relator NELSON MALLMAN lê-se esta fundamentação:
Como se vê os pagamentos referem-se à amortização de uma dívida decorrente da contratação de seguros junto à pessoa jurídica domiciliada no exterior. Não há como negar que neste tipo de contrato existem o segurador e o segurado. Este fornece àquele uma contribuição periódica e moderada, chamada prêmio, em troca do risco que o segurador assume de, em caso de sinistro, indenizar o segurado dos prejuízos por ele experimentados. Assim, o prêmio de seguro se afigura como receita/faturamento de uma companhia seguradora, que exerce sua atividade fim essencialmente através da prestação de serviços de assunção de riscos de sinistros de vida ou bens, mediante o pagamento de um prêmio — receita — que lhe assegure, inclusive, margem de lucro.104
Esse entendimento é absolutamente equivocado e deve ser evitado. Tributar
seguro como serviço, como vimos, implica afronta direta à Constituição e ao Código
102 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 7ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 554, de 16 de novembro de 2004. Chefe: Sérgio Martins Filho. Julgamento: 16 nov. 2004. Publicação: DOU, 14 mar. 2005.
103 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 104-192.67. Processo nº 13884.004869/2001-66. Recurso: Voluntário. Matéria: IRF- ação fiscal – outros. Relator: Nelson Mallmann. Julgamento: 19 mar. 2003. Órgão Julgador: Quarta Câmara / Primeiro Conselho. Publicação: 19 mar. 2003, grifamos.
104 Ibid., grifamos.
71
Tributário Nacional. Consequentemente, não temos dúvida de que a alíquota a aplicar,
nas remessas para o exterior de prêmios de seguro e resseguro, é a de 15%, prevista na
lei para todos os rendimentos não expressamente indicados.
3.2.3 Redução da base de cálculo do IRRF nas remessas de prêmio de resseguro
Ao dispor sobre a incidência do IRRF especificamente sobre as remessas,
para o exterior, de prêmio de resseguro, a legislação determina que seja considerada
como base de cálculo do imposto apenas parcela correspondente a 8% (oito por cento)
do valor do prêmio105. Com isso, o resultado final é um ônus de IRRF correspondente a
2% (dois por cento) do valor do prêmio, se considerada a aplicação da alíquota de 25%,
pretendida pela RFB, ou 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento), se considerada a
alíquota de 15%, que entendemos ser a aplicável a remessas de prêmios de seguro e
resseguro para o exterior.
A redução é justificada.
A uma porque, como já tivemos oportunidade de mencionar, a atividade
securitária obriga a seguradora/resseguradoras a constituir vultosas reservas para
garantir o pagamento das indenizações contratadas, reservas essas que devem ser
mantidas durante toda a vigência da apólice. Assim, as seguradoras e resseguradoras
não reconhecem no resultado, de imediato, a integralidade do prêmio cobrado. Isso só
ocorre ao final da vigência da apólice. Neste momento, deve cotejar os prêmios
recebidos com todas as despesas em que tiver incorrido, em especial as correspondentes
ao pagamento de indenizações. Sendo assim, tributar antecipadamente, mediante
retenção na fonte, parcela vultosa do prêmio pago, implicaria em tributar renda ainda
não auferida, nem jurídica nem economicamente.
A duas porque, se realizada a retenção na fonte, ou bem se inviabilizaria a
contratação de resseguro no exterior, tão necessária ao mercado securitário brasileiro,
pois as resseguradoras no exterior se recusariam a apresentar propostas por não
105 “Art. 26. A base de cálculo do imposto de renda incidente na fonte sobre prêmios de resseguro cedidos ao exterior é de oito por cento do valor pago, creditado, entregue, empregado ou remetido” (BRASIL. Presidência da República. Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001. Altera a legislação das Contribuições para a Seguridade Social - COFINS, para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP e do Imposto sobre a Renda, e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 ago. 2001).
72
pretenderem sujeitar-se à retenção, ou esta se tornaria excessivamente onerosa para as
seguradoras contratantes no Brasil, que acabariam obrigadas a arcar com o ônus do
imposto, mediante reajustamento da base de cálculo.
Em tal cenário, nosso único ponto de discordância diz respeito à limitação,
do benefício de redução da base de cálculo, ao pagamento de prêmio de resseguro para
o exterior, não sendo este aplicável aos pagamentos de prêmios de seguro devidos a
seguradoras estrangeiras. As situações jurídicas são idênticas, uma vez que a natureza
das atividades de seguradoras e resseguradoras é análoga, e por isso anti-isonômica a
distinção de tratamento.
Ora, a contratação de seguro no exterior, para risco localizado no Brasil, é
excepcionalíssima. Com efeito, a Lei Complementar nº 126/07 dispõe, em seu artigo 20,
que está restrita às seguintes situações: (i) cobertura de riscos para os quais não exista
oferta de seguro no País, desde que sua contratação não represente infração à legislação
vigente; (ii) cobertura de riscos no exterior, em que o segurado seja pessoa natural
residente no País, com vigência restrita ao período em que o segurado se encontrar no
exterior; e (iii) seguros que sejam objeto de acordos internacionais referendados pelo
Congresso Nacional; além daqueles que, na data de publicação da lei, já tivessem sido
contratados no exterior.
Além disso, o parágrafo único do referido dispositivo exige que, para que
pessoas jurídicas possam contratar seguro no exterior, para cobertura de riscos também
no exterior, informem essa contratação ao órgão fiscalizador de seguros brasileiro.
Além dos seguros de viagem, a situação mais usual de necessidade de
contratação de seguro no exterior é aquela em que não é oferecida cobertura no País.
Nesses casos, não resta alternativa ao segurado senão buscar seguradoras no exterior
que aceitem seu risco. Muitas vezes, trata-se de riscos excessivamente vultosos ou que
exigem cálculos atuariais complexos, para os quais as seguradoras brasileiras não estão
preparadas. Nesses casos, contudo, é comum que, a despeito de se obter no exterior a
cobertura almejada, a contratação seja inviabilizada pela exigência de absurdos 25% de
IRRF. Aliás, até mesmo a incidência do imposto à alíquota de 15% já seria muito
onerosa, considerando as margens de lucro usuais das seguradoras, ou a necessidade de
assunção do ônus pelo segurado no Brasil (o que faz a alíquota passar de 15% para
17,7% ou de 25% para 33%).
73
Conforme se verá mais adiante, a legislação do PIS e da COFINS-
Importação (Lei nº 10.865/04), ao onerar, de forma absolutamente inconstitucional as
remessas para o exterior de prêmios de seguro e resseguro, também estabeleceu redução
semelhante na base de cálculo, inicialmente diminuída para 8% (oito por cento) do valor
do prêmio, e posteriormente para 15% (quinze por cento). A despeito da
inconstitucionalidade dessa exigência, a referida lei não estabeleceu distinção entre
prêmios de seguro e resseguro, concedendo a redução de base de cálculo para ambos.
Consequentemente, por um lado, é louvável a redução de base de cálculo
empreendida pelo legislador, para fim de incidência do IRRF sobre prêmios de
resseguro remetidos ao exterior. Por outro, é anti-isonômica a diferença de tratamento
entre prêmios de resseguro e prêmios de seguro, que não fazem jus à redução.
3.2.4 RMIT do IRRF sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro
Feitas as digressões e ressalvas acima, necessário, neste ponto, demonstrar a
composição da RMIT do IRRF incidente sobre as remessas de prêmio de seguro e
resseguro ao exterior.
Hipótese: Critério material: Creditar, entregar, empregar ou remeter prêmio de seguro ou resseguro a seguradora ou resseguradora domiciliada no exterior Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do crédito, entrega, emprego ou remessa do prêmio Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Segurado ou Seguradora (na hipótese de resseguro) Critério quantitativo: base de cálculo: montante total do prêmio, na hipótese de prêmio de seguro, ou 8% do prêmio, na hipótese de resseguro.
alíquota: 15%
Ressalte-se que, como o Segurado/Seguradora foram postos, pelo legislador,
no polo passivo da obrigação tributária como responsáveis (substitutos) tributários, além
da RMIT extrai-se do texto legal outra norma, a que denominamos “norma de
retenção”, que lhes atribui o direito de reter, do valor do prêmio, o montante do IRRF,
repassando seu ônus econômico à Seguradora/Ressegurada, que deve com ele arcar por
ser aquele que aufere renda na operação.
74
3.2.5 Aplicação do artigo 7º do Tratado Modelo da OCDE aos pagamentos de
prêmio de seguro e resseguro ao exterior
Observamos, ainda, que a tributação ora examinada também vem sendo
aplicada nas situações em que há Convenção para Evitar a Dupla Tributação
(“Tratado”) para evitar a dupla tributação firmado entre o Brasil e o país onde a
seguradora é domiciliada, o que não se pode admitir.
Estabelecida a premissa de que o IRRF só pode incidir sobre prêmios de
seguro pagos (remetidos, creditados ou empregados) a seguradoras no exterior, à
alíquota de 15%, interessa analisar o tratamento a ser conferido a tais rendimentos
quando houver Tratado firmado entre os países de domicílio do segurado e da
seguradora.
3.2.5.1 Tratados Internacionais – Modelo da OCDE
Os tratados para evitar dupla tributação são firmados pelos Estados, no
âmbito do Direito Internacional, para evitar que, nas relações econômicas entre
empresas neles domiciliadas sejam aplicados os ordenamentos jurídicos de ambos,
gerando conflito. Tais disputas, e a bitributação delas decorrente, devem ser evitadas
consensualmente, pois dificultam o comércio internacional e a prestação de serviços
entre empresas estrangeiras. A esse respeito, vale transcrever o esclarecimento de
EDUARDO MANEIRA e DONOVAN MAZZA LESSA:
Tais regras, materializadas em Tratados ou Convenções, visam definir a competência de cada país para tributar os negócios envolvendo empresas estabelecidas em países diferentes. Neste contexto, os instrumentos mais utilizados são os Tratados contra a Dupla Tributação, assinados bilateralmente entre os países interessados. Para que haja uma certa padronização nestes acordos – com vistas a possibilitar maior segurança jurídica – a comunidade internacional desenvolveu perante a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) um modelo de Tratado, que é normalmente utilizado pelos países membros. O Brasil, por sua vez, adota o modelo OCDE nos tratados firmados com outros países, sendo
75
certo que, eventualmente, algumas das normas contratuais podem ser modificadas de acordo com a vontade das partes.106
Como visto, o Brasil, apesar de não ser membro da OCDE, utiliza o modelo
de tratado adotado para padronização por esse organismo internacional.
Conforme assinalado no item anterior, o legislador ordinário, exercendo a
competência atribuída à União para tributar a renda, inclusive rendimentos remetidos
por fonte brasileira a beneficiário no exterior, estabeleceu regras determinando a
incidência do imposto em diversas hipóteses.
Com efeito, é usual que, no fluxo de recursos decorrentes de transações
econômicas internacionais, o país de origem, baseado no critério de conexão da fonte de
pagamento e produção da renda, determine a retenção do imposto sobre a renda pela
fonte pagadora situada em seu território, relativamente aos valores pagos a beneficiário
no exterior. Trata-se, como visto, de decorrência do princípio da territorialidade, que
por sua vez é corolário do princípio da soberania.
De outro lado, porém, os mesmos países também submetem a tributação o
lucro apurado pelas pessoas físicas e pelas empresas, dentro de períodos
preestabelecidos, incluindo os rendimentos provenientes tanto de fontes locais quanto
de fontes internacionais. Essa tributação mais abrangente é autorizada pelo princípio da
universalidade, que como foi visto é veiculado pelo artigo 153, § 2º, I da Constituição
Federal.
Coexistindo as duas formas de tributação, se não houver normas auxiliares
aptas a neutralizar os efeitos dessa multiplicidade de incidências, fatalmente haverá
dupla tributação dos mesmos rendimentos.
Por essa razão, os Tratados – em especial os que utilizam o modelo da
OCDE – se valem de duas técnicas para evitar a dupla tributação: a da isenção e a do
crédito. Para cada tipo de rendimento classificado pelo tratado, ou se atribui isenção
tributária num dos países signatários, ou se estabelece que um país deve permitir que o
imposto pago ao outro seja creditado (isto é, descontado) do que lhe for devido.
106 MANEIRA, Eduardo; LESSA; Donovan Mazza. Inexigibilidade do IRRF sobre pagamentos efetuados a empresas no exterior pela prestação de serviços. Conceito de Lucro nos Tratados contra a dupla tributação do Modelo OCDE. In: Sacha Calmon Misabel Derzi. p. 1-14. Disponível em: <http://sachacalmon.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2012/08/Artigo-N%C3%A3o-incid%C3%AAncia-do-IRRF-Tratado-Modelo-OCDE.pdf>. Acesso em: 9 set. 2013.
76
Para determinar o tratamento aplicável aos rendimentos, estes são
classificados sob diversas rubricas, como dividendos (art. 10), juros (art. 11), royalties
(art. 12), ganhos de capital (art. 13), lucros de empresas (art. 7º) e demais rendimentos
(art. 21). Como explica HELENO TORRES, “a qualificação sobre o tipo do rendimento
envolvido precisa ser muito bem definida, sob pena de se manter o efeito de dupla
tributação internacional ou não aplicar a convenção internacional, o que poderia
implicar a respectiva denúncia tácita do compromisso”107.
3.2.5.2 Tratamento atribuído aos rendimentos de serviços
Antes de iniciarmos a análise do tratamento que deve ser dado aos prêmios
de seguro, necessário, pelas razões que virão adiante, analisar o que vêm recebendo os
rendimentos decorrentes de prestação de serviços. Esses rendimentos se enquadram no
conceito de “lucro das empresas”, constante do art. 7º do modelo de tratados da OCDE.
O modelo estabelece que os “lucros das empresas” só podem ser tributados no país de
destino dos rendimentos, a menos que o destinatário possua um estabelecimento
permanente no país de origem.
Dispõe o referido artigo 7º:
ARTIGO 7º Lucros das Empresas 1. Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado; a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante, por meio de um estabelecimento permanente ali situado. Se a empresa exerce suas atividades na forma indicada, seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem atribuíveis àquele estabelecimento permanente.108
Quando os tratados mencionam, no artigo 7º, os “lucros das empresas”,
referem-se a todos os rendimentos não expressamente mencionados, que necessitem de
ser confrontados com custos e despesas para que a renda auferida pelo beneficiário seja
107 TORRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-Residentes no Brasil. Prestações de serviços no exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento. In: ______. Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 101.
108 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto nº 355, de 2 de dezembro de 1991. Promulga a Convenção Destinada a Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Imposto sobre a Renda, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino dos Países Baixos. Brasília: DOU, 3 dez. 1991.
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apurada. Nestes casos, não haverá falar em tributação no Estado de origem, pois neste
encontra-se apenas a fonte de pagamento e produção, e não o beneficiário do
rendimento, que poderá efetuar tal apuração. Por tal razão, opta-se por utilizar a técnica
da isenção, eximindo os rendimentos de tributação no Estado de origem, para submetê-
los a tributação apenas no Estado de destino, onde a renda efetiva será determinada.
No pertinente aos rendimentos decorrentes da prestação de serviços sem
transferência de tecnologia, durante muito tempo discutiu-se, no País, seu
enquadramento no artigo 7º, que ensejaria a isenção de tais rendimentos. Entendia a
antiga Secretaria da Receita Federal (SRF) – atual Receita Federal no Brasil (RFB) –
que o correto enquadramento desses rendimentos seria no artigo 21, aplicável aos
“demais rendimentos”, que permite a tributação no País, com a concessão de crédito no
país de destino.
A SRF chegou a editar Ato Declaratório COSIT 01/2000 externando seu
entendimento nesse sentido, o que acabou por impedir a aplicação do tratado nessas
hipóteses:
O COORDENADOR-GERAL SUBSTITUTO DO SISTEMA DE TRIBUTAÇÃO, no uso das atribuições que lhe confere o art. 199, inciso IV, do Regimento Interno aprovado pela Portaria MF nº 227, de 3 de setembro de 1998, e tendo em vista o disposto nas Convenções celebradas pelo Brasil para Eliminar a Dupla Tributação da Renda e respectivas portarias regulando sua aplicação, no art. 98 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 e nos arts. 685, inciso II, alínea "a", e 997 do Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, declara, em caráter normativo, às Superintendências Regionais da Receita Federal, às Delegacias da Receita Federal de Julgamento e aos demais interessados que: I - As remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia sujeitam-se à tributação de acordo com o art. 685, inciso II, alínea "a", do Decreto nº 3.000, de 1999. II - Nas Convenções para Eliminar a Dupla Tributação da Renda das quais o Brasil é signatário, esses rendimentos classificam-se no artigo Rendimentos não Expressamente Mencionados, e, consequentemente, são tributados na forma do item I, o que se dará também na hipótese de a convenção não contemplar esse artigo. III - Para fins do disposto no item I deste ato, consideram-se contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia aqueles não sujeitos à averbação ou
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registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI e Banco Central do Brasil.109
Embora esse ato, a rigor, tenha cogitado apenas das remessas decorrentes de
contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de
tecnologia, externava o entendimento da então Secretaria da Receita Federal – atual
Receita Federal do Brasil – sobre a matéria.
A Doutrina majoritária, contudo, sempre entendeu que o correto seria
aplicar aos rendimentos decorrentes da prestação de serviços o tratamento de “lucros
das empresas”, porquanto é sabido que o lucro auferido por uma empresa ou pessoa
física prestadora de serviços só pode ser determinado mediante acurado confronto entre
as receitas e despesas incorridas num dado período e tende a ser parcela minoritária dos
pagamentos recebidos. O artigo 21, no entender da Doutrina, teria que ser usado
exclusivamente em hipóteses excepcionais, em que o rendimento não se enquadrasse
nem entre aqueles expressamente previstos no Tratado, nem como “lucro das
empresas”. Veja-se, a esse respeito, a opinião de XAVIER:
“Outros rendimentos” abrangidos no art. 21 são rendimentos atípicos, inusuais ou de pequena expressão, que não justificam um tratamento convencional separado, à semelhança, do que é reservado aos lucros, dividendos, juros, royalties, rendimentos do trabalho dependente e independente, ganho de capital e outros. […] Vejam-se os exemplos citados por Vogel, que observa ser o escopo do art. 21 ‘muito estreito’: (i) anuidades de previdência social; (ii) pagamentos de manutenção de parentes; (iii) indenizações que não sejam pela perda de rendimentos abrangidos; (iv) resgate de plano de pensão; (v) prêmios artísticos e acadêmicos; (vi) lucros de novos instrumentos financeiros, como derivativos, caso não estejam abrangidos nos art.s 7º e 11; (vii) prêmios de jogo e loteria.110
A questão relacionada aos rendimentos decorrentes da prestação de serviços
foi levada ao Poder Judiciário pelos contribuintes, que começaram a obter decisões
favoráveis nos Tribunais Regionais Federais111. Essas cortes entenderam que os tratados
109 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Ato Declaratório (Normativo) COSIT nº 0 (Normativo) COSIT nº 001, de 05 de janeiro de 2000. Dispõe sobre o tratamento tributário a ser dispensado às remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e serviços técnicos sem transferência de tecnologia. Brasília: DOU, 5 jan. 2000.
110 XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional do Brasil. 7. ed. reformulada e atualizada até outubro de 1998. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 569.
111 Exemplo de acórdão nesse sentido foi o prolatado em 16 de maio de 2013 pelo TRF da 3ª Região: “APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO No 0006803-34.2011.4.03.6130/SP
2011.61.30.006803-6/SP EMENTA
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DIREITO TRIBUTÁRIO. TRATADOS INTERNACIONAIS. AGRAVO RETIDO. ATO COATOR. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. ARTIGO 7º, LEI 9.779/99. SERVIÇOS PRESTADOS NO EXTERIOR. EMPRESA ESTRANGEIRA. CONTRATANTE BRASILEIRA. REMESSA AO EXTERIOR. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. TRIBUTAÇÃO EXCLUSIVA NO PAÍS DE DESTINO.
1. Caso em que embora reiterado do agravo retido, não cabe dele conhecer, uma vez que a matéria nele versada foi devolvida pela própria apelação, recurso de maior extensão.
2. De outro tanto, é manifesta a improcedência da alegação de ausência de ato coator, na medida em que o mandado de segurança tem caráter preventivo, em face da resistência da autoridade coatora em reter o imposto de renda na fonte.
3. Consolidada a jurisprudência da Suprema Corte no sentido de que tratados internacionais, regularmente incorporados ao direito nacional, não têm superioridade hierárquica sobre o direito interno, assim a definição da norma a prevalecer, em caso de antinomia, sujeita-se à verificação da efetiva revogação, ou não, da anterior pela posterior.
4. Caso em que se postula a aplicação de acordo internacional, destinado a evitar a dupla tributação, em matéria de imposto de renda e capital, firmado pelo Brasil com a França (Decreto 70.506/72).
5. O tratado internacional dispõe, basicamente, que “Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente aí situado. Se a empresa exercer sua atividade na forma indicada, seus lucros serão tributáveis no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem atribuíveis a esse estabelecimento permanente. Quando uma empresa de um Estado Contratante exercer sua atividade no outro Estado Contratante através de um estabelecimento permanente aí situado, serão atribuídos em cada Estado Contratante, a esse estabelecimento permanente os lucros que obteria se constituísse uma empresa distinta e separada exercendo atividades idênticas ou similares, em condições idênticas ou similares, e transacionando com absoluta independência com a empresa de que é um estabelecimento permanente. No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente, é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração assim realizados. Nenhum lucro será atribuído a um estabelecimento permanente pelo simples fato de comprar bens ou mercadorias para a empresa. Quando os lucros compreenderem elementos de rendimentos tratados separadamente nos outros artigos do presente acordo, as disposições desses artigos não serão afetadas pelo presente artigo.”
6. Para defender a incidência do imposto de renda, em casos que tais, a União invocou o Ato Declaratório Normativo COSIT 01/2000, e o artigo 7º da Lei 9.779/1999. Dispõe o primeiro, no que ora releva: “I - As remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia sujeitam-se à tributação de acordo com o artigo 685, II, alínea ‘a’, do Decreto nº 3.000/99; II - Nas Convenções para Eliminar a Dupla Tributação da Renda das quais o Brasil é signatário, esses rendimentos classificam-se no artigo Rendimentos não Expressamente Mencionados, e, conseqüentemente, são tributados na forma do item I, o que se dará também na hipótese de a convenção não contemplar esse artigo”.
7. Todavia, ato normativo da Administração não cria hipótese de incidência fiscal e, além disso, a situação nele disciplinada refere-se apenas à serviços técnicos, não equivalentes aos que são discutidos na presente ação. Já o artigo 7º da Lei 9.779/1999 estabelece que “os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento”.
8. Não houve revogação do tratado internacional pelo artigo 7º da Lei 9.779/1999, pois o tratamento tributário genérico, dado pela lei nacional, às remessas a prestadores de serviços domiciliados no exterior, qualquer que seja o país em questão, não exclui o específico, contemplado em lei convencional, por acordos bilaterais. Embora a lei posterior possa revogar a anterior (“lex posterior derogat priori’“, o princípio da especialidade (“lex specialis derogat generalis”) faz prevalecer a lei especial sobre a geral, ainda que esta seja posterior, como ocorreu com a Lei 9.779/1999.
9. Acordos internacionais valem entre os respectivos subscritores e, assim, tem caráter de lei específica, que não é revogada por lei geral posterior, daí porque a solução do caso concreto encontra-se, efetivamente, em estabelecer e compreender o exato sentido, conteúdo e alcance da legislação convencional, a que se referiu a inicial. Esta interpretação privilegia, portanto, o entendimento de que, embora não haja hierarquia entre tratado e lei interna, não se pode revogar lei específica anterior com lei geral posterior. Ademais, estando circunscritos os efeitos de tratados às respectivas partes
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internacionais não se sobrepõem à legislação interna, porém, dispositivos como o
mencionado (a isenção concedida pelo artigo 7o) devem prevalecer em virtude de sua
especialidade. Entenderam também que o termo “lucro”, utilizado pelo modelo de
tratado da OCDE, usualmente adotado no Brasil, inclui as receitas ou rendimentos que,
após a dedução de custos e despesas, vão permitir a apuração do resultado tributável.
Concluíram, portanto, que nessas hipóteses fica afastada a aplicação da lei interna, que
prevê tributação, pela fonte pagadora no Brasil, de pagamentos de remuneração pela
prestação de serviços em benefício de residentes no exterior.
O Superior Tribunal de Justiça também já adotou entendimento semelhante,
de modo a nos fazer crer que a jurisprudência tende a se consolidar no sentido da
aplicabilidade do artigo 7o dos Tratados em todos os casos em que estejamos diante de
rendimentos que comporão o lucro do beneficiário domiciliado no outro Estado
contratante, que não tenha estabelecimento permanente no Brasil. O Acórdão do STJ
sobre a matéria, prolatado no Recurso Especial no 1.161.467-RS, tem a seguinte ementa:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. CONVENÇÕES INTERNACIONAIS ENTRE BRASIL-CANADÁ E BRASIL-ALEMANHA. SERVIÇOS PRESTADOS POR EMPRESA ESTRANGEIRA SEM TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA. REMUNERAÇÃO. REMESSA AO EXTERIOR. NATUREZA JURÍDICA.
contratantes, possível e viável o convívio normativo da lei convencional com a lei geral, esta para todos os que não estejam atingidos pelos tratados, firmados com o objetivo de evitar a dupla tributação. Se isto fere a isonomia, a eventual inconstitucionalidade deve ser discutida por parte de quem foi afetado pela lei nova que, ao permitir a retenção pela fonte no Brasil, abriu caminho para a dupla oneração do prestador de serviço com domicílio no exterior.
10. O tratado refere-se a “lucros”, porém resta claro, a partir dos textos respectivos, que a expressão remete, tecnicamente, ao conceito que, na legislação interna, equivale a rendimento ou receita, tanto assim que a norma convencional estipula que “No cálculo dos lucros de um estabelecimento permanente, é permitido deduzir as despesas que tiverem sido feitas para a consecução dos objetivos do estabelecimento permanente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração assim realizados”.
11. Despesas e encargos são deduzidos da receita ou rendimento a fim de permitir a apuração do lucro, logo o que o tratado excluiu da tributação, no Estado pagador, que contratou a prestação de serviços no exterior, não é tão-somente o lucro, até porque o respectivo valor não poderia ser avaliado por quem simplesmente faz a remessa do pagamento global. O que excluiu o tratado da tributação no Brasil, para evitar a dupla incidência, foi o rendimento auferido com a prestação do serviço para que, no Estado de prestação, ou seja, no exterior, seja promovida a sua tributação, garantida ali, conforme a lei respectiva, a dedução de despesas e encargos, revelando, portanto, que não existe espaço válido para a prevalência da aplicação da lei interna, que prevê tributação, pela fonte pagadora no Brasil, de pagamentos, com remessa de valores a prestadoras de serviços, exclusivamente domiciliadas no exterior.
12. Agravo retido não conhecido, e apelação e remessa oficial desprovidas”. (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Apelação Cível: AMS 6803/SP. Relator: Juiz Federal Convocado Roberto Jeuken. Julgamento: 16 maio 2013. Órgão Julgador: Terceira Turma. Publicação: DE 27 maio 2013).
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ENQUADRAMENTO. ATO DECLARATÓRIO COSIT. APLICAÇÃO. 1. Não há supremacia hierárquica dos acordos internacionais relativamente à lei ordinária, tampouco conflito entre as convenções, firmadas pelo Brasil e regularmente incorporadas ao direito interno, e a legislação do imposto de renda. Na esteira da jurisprudência do STF, os tratados internacionais situam-se no mesmo plano normativo das leis ordinárias, não ocorrendo primazia hierárquica sobre a legislação interna. Com efeito, não revogam nem modificam a lei ordinária anterior ou posterior, coexistindo harmonicamente. Eventual conflito se resolve pelo critério da especialidade, ou seja, diante da situação especial indicada pelo tratado, não se aplica a lei interna, afastando-se a norma geral, ou a lei interna é aplicável, porém com a limitação prevista no tratado. 2. A legislação do imposto de renda aplicada pela União não contém preceito dispondo de forma diversa do estabelecido nos acordos internacionais sub judice, para aplicação exatamente na situação por ele regulada. 3. Os acordos internacionais, para evitar a dupla tributação, atribuem o poder de tributar a renda ao Estado em cujo território os rendimentos foram produzidos (critério da fonte produtora) ou em cujo território foi obtida a disponibilidade econômica ou jurídica (critério da fonte pagadora), conforme a natureza do rendimento considerado. A classificação deste deve ser feita segundo a lei interna do Estado que aplica o tratado. Solução diversa implicaria verdadeira introdução de legislação alienígena no ordenamento jurídico pátrio. 4. De acordo com os acordos internacionais firmados pelo Brasil, os rendimentos que não tenham sido expressamente tratados no seu texto serão tributáveis pelo Estado do residente de onde se originam. Ou seja, se os valores remetidos pela autora às empresas estrangeiras não se enquadrarem em alguma categoria específica referida pela Convenção, serão tributáveis no Brasil. Já quanto aos rendimentos que são expressamente mencionados nas convenções, em tese somente na categoria "lucro" poder-se-ia enquadrar o valor pago pela empresa brasileira às estrangeiras, em virtude da prestação de serviços no exterior. 5. Os rendimentos obtidos pela empresa estrangeira com a prestação de serviços à contratante brasileira, examinados à luz da lei brasileira, integram o lucro daquela, respeitada, para tal conclusão, a sistemática específica de apuração do lucro tributável, com sua previsão de adições e exclusões, que não desnatura como rendimento (porque receita operacional) componente do lucro aquele valor recebido em pagamento. 6. A remessa de rendimentos para o exterior, para pagamento de serviços prestados por empresa estrangeira, constitui despesa para a empresa remetente, e não rendimento. 7. É equivocada a tentativa do Ato Declaratório COSIT n.º 01, de 05.01.2000, de enquadrar como "rendimentos não expressamente mencionados "os pagamentos ora discutidos, quando estes claramente
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constituem rendimento integrante do lucro da empresa que os aufere, situada no exterior.112
Seguindo a referida orientação jurisprudencial, a Procuradoria Geral da
Fazenda Nacional publicou, em março de 2014, o Parecer PGFN/CAT/ Nº 2363/2013,
alterando seu entendimento anterior sobre a matéria113.
Esse parecer decorreu da análise da Nota Técnica Cosit nº 23, elaborada
pela RFB após receber ofício do Ministério das Finanças da Finlândia, cujo Governo
manifestou a intenção de apresentar denúncia do acordo para evitar a dupla tributação,
assinado com o Brasil, caso se confirmasse o entendimento firmado pela RFB,
favorável à tributação no Brasil de remessas em pagamento de serviços técnicos
realizados na Finlândia.
Depois de mais de uma década de adoção equivocada do entendimento
externado no Ato Declaratório COSIT nº 1/2000, que determinava a tributação, pelo
Brasil, dos rendimentos classificados como “lucros das empresas” nos tratados firmados
112 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial no 1.161.467-RS. Relator: Ministro Castro Meira. Julgamento: 17 maio. 2012. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJe, 1º jun. 2012.
113 A conclusão da PGFN no mencionado parecer foi a seguinte: “25.1. O Parecer PGFN/CAT/Nº 776/2011 foi exarado em um contexto de defesa judicial da Fazenda
Nacional (REsp nº 1.161.467/RS), cuja tese restou vencida no STJ, o qual, por sua vez lançou outros argumentos técnicos sobre a questão, passíveis de acolhimento em sede administrativa, haja vista a sua robustez. Portanto, à luz da possibilidade de se atribuir ao lucro disposto no art. 7º da Convenção Modelo da OCDE um conceito amplo; à vista do princípio da especialidade; e sedimentados sobre uma das finalidades mestras dos tratados para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre a renda assinados pelo Brasil, que é a de evitar a bitributação internacional, sugere-se a revogação do Parecer PGFN/CAT/Nº 776/2011.
25.2. Consequentemente, opina-se na linha de que remessas ao exterior decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia melhor se enquadram no artigo 7º (“Lucros das Empresas”) dos mencionados pactos, ao invés dos arts. 21 ou 22 (“Rendimentos não Expressamente Mencionados”). Assim, tais valores seriam tributados somente no país de residência da empresa estrangeira, não estando sujeitos à incidência do IRRF.
25.3. A conclusão acima não se aplica nos casos em que a empresa exerça sua atividade através de um estabelecimento permanente situado no Brasil e tampouco quando, advindos de negociações entre os países signatários, houver disposição expressa nos acordos autorizando a tributação no Brasil. Ou seja, neste último caso, nas hipóteses em que os acordos internacionais ou dispositivo de protocolo autorizem a tributação no Brasil, a exemplo dos tratados e protocolos que caracterizem os valores pagos como royalties, tais serviços poderão ser submetidos ao tratamento previsto no art. 12 da Convenção Modelo – pagamento de royalties, independentemente do caráter em que a prestação do serviço foi efetuada (em caráter principal ou acessório), não incidindo, portanto, o art. 7º.
25.4. A análise aqui empreendida é restrita aos casos de remessas ao exterior decorrentes de contratos de prestação de assistência e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia e quando existente tratado para evitar a dupla tributação, sendo o âmbito da apreciação circunscrita aos arts. 7º e 21 (ou 22), com as ressalvas do item anterior. Ademais, é de se alertar que para a aplicação do entendimento ora espelhado é necessária a total subsunção dos casos concretos à discussão aqui exposta e desde que não haja a configuração de planejamentos tributários abusivos” (BRASIL. Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Parecer nº 2363, de 2013. IRRF. Imposto sobre a renda retido em fonte. Nota Cosit nº 23/2013. Remessas ao exterior. Pagamento de serviços técnicos e de assistência técnica. Procuradora: Núbia Nette Alves Oliveira de Castilhos. Órgão: PGFN/CAT. Brasília: 19 dez. 2013).
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com outros países, a jurisprudência vem se encaminhando de forma incisiva, no sentido
da aplicabilidade da isenção prevista no artigo 7o, em especial sobre os rendimentos
decorrentes de contratos de prestação de serviço.
Essa nova orientação, agora corroborada inclusive pela Receita Federal do
Brasil e pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, é a juridicamente mais
consistente, por todas as razões já expostas, e resguarda o respeito do País aos tratados
internacionais a que se vinculou, o que lhe confere confiabilidade nas relações externas.
3.2.5.3 Aplicabilidade do artigo 7º aos prêmios de seguro e resseguro
Como visto no item anterior, a jurisprudência vem reconhecendo a
aplicabilidade da regra, estabelecida pelo modelo de tratados da OCDE, de isenção no
País da fonte pagadora, quanto ao IRRF incidente sobre “lucros das empresas”.
Além de constar dos tratados firmados pelo País, os quais contemplam
regras especiais em relação à legislação interna (por terem natureza contratual e serem
aplicáveis apenas inter partes), o que por si só já obrigaria ao seu cumprimento,
observamos ainda que a regra de isenção prevista nos tratados é perfeitamente
justificável. A tributação do rendimento somente no Estado de destino torna possível
que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente
tributável. Caso se admita a retenção do imposto no Estado de origem, serão inviáveis
os referidos ajustes, impedindo-se a compensação do imposto retido se apurado lucro
real negativo no final do exercício financeiro. Portanto, como vimos assinalando, o
conceito de "lucros das empresas" deve ser interpretado em acepção ampla, como
receita componente do lucro operacional, sob pena de tornar inútil o dispositivo.
Adotada essa interpretação, os prêmios de seguro e resseguro pagos,
creditados, remetidos, entregues ou empregados a residentes no exterior também
merecerão, indubitavelmente, o tratamento de “lucros das empresas”, e
consequentemente a isenção de imposto sobre a renda na fonte prevista pelo artigo 7o
dos Tratados.
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Os prêmios de seguro e resseguro são o típico exemplo de rendimentos que
deverão, necessariamente, ser confrontados pela seguradora com seus custos e despesas,
a fim de que possa ser apurada a efetiva renda ou lucro obtido na transação.
Em primeiro lugar, será necessária a constituição de reservas ou provisões
técnicas, exigidas pela legislação e pela regulamentação de qualquer país onde a
atividade securitária e ressecuritária seja empresarial. Como vimos, essas provisões e
reservas constituem a própria essência das seguradoras e resseguradoras, que funcionam
como verdadeiros reservatórios de recursos que servirão ao pagamento de sinistros,
cujas chances de ocorrência são determinadas pela ciência atuarial. Dessa forma,
tributar antecipadamente o prêmio inviabiliza por completo a realização dos
procedimentos contábeis obrigatórios de qualquer seguradora, uma vez que já são
retirados antecipadamente valores do prêmio calculado atuarialmente para compor suas
reservas.
Deve-se observar, ainda, que o lucro das seguradoras e resseguradoras, em
relação a determinado contrato, só será apurado ao longo do prazo de vigência da
apólice. O reconhecimento da receita correspondente ao prêmio é, inclusive, diferido,
pois esta receita só se torna definitiva ao final do prazo de vigência da apólice, quando
as respectivas reservas e provisões são revertidas total ou parcialmente.
Tudo isso serve para demonstrar que os prêmios de seguro e resseguro
merecem o tratamento de “lucro das empresas” previsto no artigo 7o dos Tratados, pois
sem sombra de dúvida constituem apenas parcelas da receita bruta das seguradoras e
resseguradoras, as quais serão imediatamente convertidas, na sua maior parte, em
reservas e provisões técnicas obrigatórias, somente vindo a tornar-se renda ao final do
prazo de vigência da apólice.
Por esta razão, sempre que firmado contrato de seguro ou resseguro entre
segurado (ou seguradora) no Brasil e seguradora (ou resseguradora) no exterior, deve-se
verificar se os países onde as contratadas estão domiciliadas são signatários de
Convenção para Evitar a Dupla Tributação da Renda, hipótese em que os prêmios
remetidos para fora do País serão isentos da incidência do IRRF.
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3.4 PIS e COFINS – Importação sobre as remessas de prêmio de seguro e
resseguro ao exterior – Hipótese de não-incidência tributária
Outra questão que se coloca, sobre o pagamento de prêmio de seguro e
resseguro a domiciliados no exterior, diz respeito à incidência da contribuição ao PIS e
da COFINS – Importação (alíquotas de 1,65% e 7,6% respectivamente). Neste caso, não
se trata de interpretação das autoridades fiscais, mas de incidência expressamente
prevista na respectiva legislação, não obstante tais tributos só devessem incidir sobre
importações de bens e serviços.
Com efeito, desde a edição da Lei Complementar 42/2003, o artigo 195, IV,
da Constituição Federal, prevê que a seguridade social será financiada, entre outras, por
contribuições sociais do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a
ele equiparar, de competência da União.
As regras-matrizes de incidência tributária do PIS e da COFINS –
Importação foram previstas pela Lei 10.865/04. Ao estabelecer as hipóteses de
incidência tributária dessas contribuições determinou, em seu artigo 3o, incisos I e II,
que seriam (i) a entrada de bens estrangeiros no território nacional; e (ii) o pagamento, o
crédito, a entrega, o emprego ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no
exterior como contraprestação por serviço prestado. Sendo assim, em conformidade
com a competência tributária que lhe foi atribuída, somente a importação de bens e de
serviços foi descrita nos antecedentes daquelas regras-matrizes de incidência tributária.
A Constituição se refere expressamente à competência para tributar
importações de “bens” e “serviços”. Apesar de a própria Lei 10.865/04 não ter
contemplado outras hipóteses de incidência tributária, ao dispor em seu artigo 7o sobre o
critério quantitativo das referidas regras-matrizes, incluiu, para a nossa perplexidade,
em seu § 1o, a previsão de que "a base de cálculo das contribuições incidentes sobre
prêmios de resseguro cedidos ao exterior é de 15% (quinze por cento) do valor pago,
creditado, entregue, empregado ou remetido”114.
114 “Art. 7o A base de cálculo será: I- o valor aduaneiro, assim entendido, para os efeitos desta Lei, o valor que servir ou que serviria de
base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e
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Esse dispositivo tratou expressamente dos prêmios de resseguro. Contudo, o
enunciado também se aplica a prêmios de seguro, pois o § 2o do mesmo artigo
determina que “o disposto no § 1o deste artigo aplica-se aos prêmios de seguros não
enquadrados no disposto no inciso X do art. 2o desta Lei” (o inciso X do art. 2o dispõe
sobre o custo do transporte internacional e de outros serviços, que tiverem sido
computados no valor aduaneiro que serviu de base de cálculo da contribuição).
Assim como dito em relação ao imposto sobre a renda, também neste caso
está-se diante de uma tentativa de tributar como serviço algo que não o é (prêmios de
seguro e resseguro), com a diferença de que ali tínhamos uma interpretação equivocada
das autoridades fiscais, enquanto que aqui temos um ilícito legislativo cometido pelo
legislador ordinário, que acabou, por via transversa, tributando demonstração de riqueza
não incluída em sua competência tributária.
Como visto, não há autorização constitucional para que a Lei nº 10.865/04
submeta os prêmios de seguro e resseguro à incidência das contribuições incidentes na
importação, pois o segurado que contrata apólice no Exterior não se enquadra,
absolutamente, como importador de serviços do exterior, tampouco tendo sido
equiparado pela lei ao importador de bens ou serviços do exterior.
Ademais, deve-se frisar que o artifício utilizado pelo legislador, de incluir
prêmios de seguro e resseguro na base de cálculo das contribuições, sem que a
respectiva contratação estivesse prevista na hipótese de incidência dos tributos, criou
uma aberração jurídica.
Intermunicipal e de Comunicação - ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso I do caput do art. 3o desta Lei; ou
II - o valor pago, creditado, entregue, empregado ou remetido para o exterior, antes da retenção do imposto de renda, acrescido do Imposto sobre Serviços de qualquer Natureza - ISS e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso II do caput do art. 3o desta Lei.
§ 1o A base de cálculo das contribuições incidentes sobre prêmios de resseguro cedidos ao exterior é de 15% (quinze por cento) do valor pago, creditado, entregue, empregado ou remetido. (Redação dada pela Lei nº 12.249, de 2010).
§ 2o O disposto no § 1o deste artigo aplica-se aos prêmios de seguros não enquadrados no disposto no inciso X do art. 2o desta Lei” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004. Dispõe sobre a Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social incidentes sobre a importação de bens e serviços e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 abr. 2004).
Obs: A redação original da lei, a base de cálculo correspondia a 8% do valor do prêmio, tendo sido alterada posteriormente para 15% pela Medida Provisória 472/2009, convertida na Lei 12.249/2010.
87
Ora, segundo PAULO DE BARROS CARVALHO, “a base de cálculo é a
grandeza instituída na consequência da regra-matriz tributária, e que se destina,
primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do
fato jurídico […]”.115 É no consequente da regra-matriz de incidência tributária que se
estabelecem os critérios (base de cálculo e alíquota) necessários à determinação do valor
devido a título de tributo. Assim, necessariamente, a base de cálculo deverá refletir,
dimensionar, medir a riqueza demonstrada pela hipótese de incidência, no caso dos
impostos e contribuições. Do contrário, a tributação incidirá sobre fato distinto do
descrito na hipótese de incidência, e consequentemente alheio à competência do ente
tributário que instituiu o tributo.
Neste caso, incluir-se o prêmio de seguro e resseguro pago a residente no
exterior na base de cálculo do PIS e da COFINS incidentes na importação implica em
situar – indevidamente – esses contratos sob a incidência de tributos, sem que tenha sido
atribuída, à União, competência constitucional para tanto.
Afiguram-se, portanto, inconstitucionais os parágrafos 1º e 2º do artigo 7º da
Lei 10.865/2004. A matéria, contudo, deve ainda ser submetida à apreciação do
Supremo Tribunal Federal, intérprete definitivo da Constituição, apto a excluir do
sistema enunciados inconstitucionais.
3.5 Tributação da indenização recebida pelo segurado
3.5.1 Definição do conceito de indenização
Antes de adentrarmos a análise da tributação aplicável à indenização paga
pela seguradora e recebida pelo segurado, na hipótese de ocorrência de sinistro,
necessário determinar qual a definição atribuída ao conceito. Adotamos a explicitada
por ORLANDO GOMES, que assevera:
A obrigação de reparar danos tem como objeto prestação especial, que consiste no ressarcimento dos prejuízos causados a uma pessoa por
115 Curso de Direito Tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 324.
88
outra ao descumprir obrigação contratual ou praticar ato ilícito. Denomina-se indenização o objeto dessa prestação.116
O grande civilista baiano complementa essa definição esclarecendo, ainda,
que “a obrigação de indenizar danos pode ter as seguintes causas: a) o ato ilícito; b) o
inadimplemento de obrigação contratual; c) o dever legal de responder pelo risco; d) o
dever legal de responder sem culpa”117.
Do ponto de vista normativo, consiste no objeto da prestação. É encontrada,
portanto, no consequente da norma que prevê em seu antecedente o fato de uma pessoa
causar prejuízo a outra.
No âmbito do contrato de seguro, define-se indenização como “a
importância em dinheiro que a seguradora se obriga a transferir ao segurado. Sua
finalidade é compensar o eventual prejuízo econômico-financeiro, com os riscos
previstos e assumidos na apólice, pela seguradora”118.
Podemos concluir também, ao analisarmos as possíveis causas da obrigação
de indenizar, que, no caso do contrato de seguro, a obrigação que cabe à seguradora tem
como causa o dever legal e contratual de responder pelo risco.
Feita essa breve introdução, passamos a analisar a natureza jurídica da
indenização no âmbito do contrato de seguro, suas espécies e relação com o conceito de
renda.
3.5.2 A indenização no contrato de seguro
O contrato de seguro prevê a obrigação da seguradora de ressarcir os
prejuízos do segurado, na hipótese de sinistro. A indenização é o objeto (prestação)
dessa obrigação.
De acordo com o artigo 781 do Código Civil, a indenização do seguro não
pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, ressalvada
apenas a hipótese de mora do segurador:
116 GOMES, Orlando. Obrigações. 15. ed. revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 61.
117 Ibid., p. 62. 118 SOARES, Antonio Carlos Otoni. Fundamento Jurídico do Contrato de Seguro. São Paulo: Manuais
Técnicos de Seguro, 1975, p. 34.
89
Art. 781. A indenização não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em hipótese alguma, o limite máximo de garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora do segurador.119
Essa limitação se aplica aos chamados “seguros de dano”, nos quais
prevalece o “princípio indenitário”, isto é, aquele segundo o qual o segurado não pode
lucrar com o seguro. Como bem explica ALVIM, nos seguros de dano o segurado deve
receber o valor real dos bens destruídos ou danificados, pois “a finalidade do seguro de
coisa é repor o segurado na situação em que se encontrava imediatamente antes da
ocorrência do risco. Não pode fazer do contrato um meio de obter qualquer vantagem,
pretendendo receber garantia superior ao valor dos bens atingidos”120.
Na mesma linha, esclarece SILVA que
[…] os seguros de dano são aqueles que detém natureza tipicamente indenitária, ou seja, são voltados à recomposição patrimonial do segurado, de modo que, ocorrendo o sinistro, o sujeito favorecido pela indenização deverá fazer prova dos prejuízos econômicos sofridos121.
Nos seguros de dano, a indenização pode ser inclusive de montante inferior
ao valor declarado no contrato, mas não pode, em hipótese alguma, superar o prejuízo
sofrido pelo segurado.
CLÓVIS BEVILAQUA, ao comentar o Código Civil de 1916, já assinalava que “nos seguros de bens materiais a indenização nem sempre corresponde, exatamente, à soma declarada no contrato, porque, não sendo o seguro um contrato lucrativo e, sim, de indenização, cumpre determinar qual o prejuízo que, realmente, sofreu o segurado. A soma declarada na apólice indica o máximo até o qual responde o segurador. É essa operação que se denomina liquidação do prejuízo”122.
Nesse sentido, é lícito afirmar que o valor da indenização é igual ao do
prejuízo, limitado à importância segurada fixada na apólice, o que é aplicação direta e
imediata do princípio indenitário.
119 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: DOU, 11 jan. 2002.
120 ALVIM, Pedro. O Seguro e o Novo Código Civil – Organização e Compilação de Elizabeth Alvim Bonfioli. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 111-112.
121 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 213. 122 BEVILAQUA, Clóvis. Código Civil. v. 5, p. 216 apud ALVIM, Pedro, op. cit., p. 112.
90
Somente na hipótese de mora do segurador, no pagamento da indenização
do seguro de dano, esta poderá ter valor superior ao interesse segurado informado na
apólice e ao efetivo prejuízo do segurado123.
A fim de restabelecer o patrimônio ao patamar anterior ao sinistro, no
seguro de dano, a indenização vai corresponder ao valor de mercado dos bens perecidos.
Esse valor pode ultrapassar o valor contábil, que não corresponde ao de mercado e já
poderá ter sofrido alguma depreciação. A diferença poderá implicar efeitos tributários
para as pessoas jurídicas.
No seguro de pessoas, o cenário é diferente daquele identificado nos seguros
de dano, como explica ALVIM:
Enquanto nos seguros de dano o objetivo perseguido pelos contratantes é a reparação de prejuízos que se submetem a uma avaliação em dinheiro, nos seguros de pessoa essa avaliação é impossível. A vida humana não tem preço, nem tampouco a saúde das pessoas ou as lesões corporais. Parte dessa consideração fundamental a diferença entre os dois grupos. No primeiro, a indenização decorre de danos que avaliam depois do sinistro; é fixada a posteriori; no segundo, a quantia devida pelo segurador é determinada pelo próprio segurado, não está sujeita a qualquer avaliação; é fixada a priori. A ideia de reparação pecuniária inerente aos seguros de dano é repelida pela natureza dos seguros de pessoas, uma vez que qualquer soma em dinheiro jamais compensaria a vida do ser humano, sua saúde ou integridade física124.
Os seguros de pessoas125 têm por objetivo garantir o pagamento de uma
indenização ao segurado ou a seus beneficiários, observadas as condições contratuais e
as garantias contratadas. Não se trata, aqui, de reparação patrimonial em sentido estrito
pois, como bem apontado por ALVIM, não é possível estabelecer um valor exato para a
vida humana ou sua integridade. Sendo assim, nesses casos, é pré-estabelecida uma
quantia, o “capital segurado”, a ser paga pela seguradora ao segurado, ou ao
beneficiário, na hipótese de sinistro.
123 Esclarece IVAN DE OLIVEIRA SILVA: “Sublinhe-se, ainda, que a indenização, pela própria natureza do contrato de seguro, não visa lucro. Dessa forma, o valor da indenização não poderá ultrapassar o montante do interesse segurado informado na apólice, salvo na hipótese de mora do segurador na inadimplência de sua obrigação contratual” (SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 152).
124 ALVIM, Pedro. O Seguro e o Novo Código Civil – Organização e Compilação de Elizabeth Alvim Bonfioli. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 150.
125 Como exemplos de seguros de pessoas, temos o seguro de vida, o seguro funeral, o seguro de acidentes pessoais, o seguro educacional, o seguro viagem, o seguro prestamista, o seguro de diária por internação hospitalar, o seguro desemprego (perda de renda), o seguro de diária de incapacidade temporária, o seguro de perda de certificado de habilitação de voo e outros.
91
Com relação à indenização no seguro de vida (modalidade de seguro de
pessoas) o Código Civil estabelece total liberdade para sua estipulação, sendo possível
ainda a contratação de vários seguros com o mesmo ou diversos seguradores:
Art. 747. É livre às partes fixar qualquer valor no seguro sobre a vida, bem como ao segurado contratar mais de um seguro sobre a vida, no momento ou em diversos valores, com o mesmo ou diversos seguradores.126
Resta claro, portanto, que a natureza jurídica da indenização no seguro de
dano e no seguro de pessoas é distinta. Tanto assim que, por força de opção legislativa,
a expressão “indenização” é usada nos seguros de dano, enquanto a expressão
“pagamento do capital segurado” é o correspondente análogo aplicado ao seguro de
pessoas. Ademais, diferentemente dos seguros patrimoniais, ou de dano, aqui
prepondera o princípio da capitalização.
A fim de evitar imprecisões, quando nos referirmos a “indenização”, no
presente trabalho, estaremos indicando apenas a prestação decorrente do seguro de
dano. Ao falar de seguro de pessoas, utilizaremos sempre a expressão “pagamento do
capital segurado”.
3.5.3 Distinção entre os conceitos de indenização e renda
“Indenização”, por definição, é conceito que se contrapõe a “renda”.
Como visto, nos contratos de seguro, o conceito de “indenização” é definido
como a prestação decorrente da obrigação de reparar um prejuízo. Essa prestação não
pode ultrapassar o valor do interesse segurado (exceto em caso de mora do segurador),
destinando-se, exclusivamente, à recomposição do patrimônio diminuído pelo dano.
Ao falar de “renda”, por outro lado, se estará tratando de acréscimo, e não
de recomposição patrimonial. Fundados na Constituição e no Código Tributário
Nacional, adotamos a definição de renda proposta por ROBERTO QUIROGA MOSQUERA,
para quem só haverá essa riqueza em face de “mutação patrimonial que se constitui num
126 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: DOU, 11 jan. 2002.
92
acréscimo de seus elementos, acréscimos estes originados do trabalho, do capital, da
aposentadoria ou de qualquer outra fonte geradora de riqueza nova”127.
A correlação entre renda e patrimônio, representando aquela variação
positiva deste, é reforçada por RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA, que assevera:
Há, pois, plena coerência entre a visão constitucional sobre o imposto de renda e o conceito privado de patrimônio, de tal arte que o fato gerador é a diferença positiva entre a universalidade patrimonial no início do período e a universalidade patrimonial no final do mesmo, cuja diferença é constituída pela universalidade de fatores positivos e negativos integrados à massa patrimonial primitiva ou dela desintegrados, descontadas as simples transferências patrimoniais ativas (aumentos de capital, inclusive seus ágios, doações e subvenções recebidas) e as transferências patrimoniais negativas.128
Para que haja renda, portanto, é necessário que ocorra mutação patrimonial
positiva e que o acréscimo seja originado por uma fonte geradora de riqueza nova.
Colocados os conceitos, logo se percebe que são diametralmente opostos.
De um lado, a indenização, recomposição do patrimônio diminuído pelo dano,
recomposição essa que, por força de lei, não pode ultrapassar o valor do prejuízo. De
outro, a renda, acréscimo patrimonial obtido com o cotejo de receitas e despesas, ao
final de certo período. Acrescente-se, ainda, o fato de que o próprio princípio
indenitário que rege o contrato de seguro, adotado pelo Código Civil, obriga a que a
indenização nunca ultrapasse o valor do dano, já que sua função é estritamente
recompor o patrimônio, jamais propiciar enriquecimento.
Daí porque sempre que se falar em indenização em sentido estrito, isto é,
efetiva recomposição do patrimônio ao patamar anterior ao dano, estará afastada a sua
tributação pelo imposto sobre a renda129.
127 MOSQUERA, Roberto Quiroga. Renda e Proventos de Qualquer Natureza – O Imposto e o Conceito Constitucional. São Paulo: Dialética, 1996, p. 110.
128 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 75.
129 Nesse sentido já se manifestou o antigo Conselho de Contribuintes, atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, no Acórdão 105-16.064, prolatado por sua 5ª Câmara em 18/10/2008. Transcrevemos passagem do voto do Relator Irineu Bianchi que bem ilustra os seus fundamentos: “Em suma, a decisão judicial determinou que a ora recorrente fosse indenizada pelo valor atualizado do loteamento adquirido, deduzindo-se, também de forma atualizada, o valor pago quando da aquisição, não se vislumbrando, por consequência, qualquer acréscimo patrimonial em favor da ora recorrente. Assim, visando a indenização de que tratam os presentes autos, à substituição de patrimônio já existente, ela não se constitui em riqueza nova ou acréscimo passível de ser tributado, haja vista que não se vislumbra a realização do fato gerador do IR, por não se adequar a realidade factual aos preceitos abstratos da norma.” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo
93
Como regra, portanto, a indenização paga pela seguradora ao segurado está
fora do campo de incidência do imposto sobre a renda. Não há necessidade de o
legislador ordinário instituir isenção ou de estar constitucionalmente prevista
imunidade. Trata-se de verdadeira hipótese de não-incidência tributária, uma vez que os
valores auferidos não caracterizam mutação patrimonial positiva, mas mera
recomposição do patrimônio preexistente. Foi esta, também, a conclusão a que chegou
BARRETTO JÚNIOR:
Dessa maneira, tendo em vista ter a indenização pelos danos emergentes a finalidade precípua de recompor o patrimônio da vítima, buscando-se a reposição em espécie ou em dinheiro pelo valor equivalente ao decréscimo patrimonial sofrido, de modo a poder-se indenizá-la plenamente, operando-se a recondução do seu patrimônio ao estado em que se encontraria se não tivesse ocorrido o fato danoso, não há que se cogitar da incidência do imposto sobre a renda ou proventos de qualquer natureza.130
Contudo, é precipitado afirmar que qualquer indenização meramente
recompõe o patrimônio diminuído pelo dano, e consequentemente não cabe no conceito
de renda.
Com efeito, nas indenizações por dano patrimonial (dano emergente) essa
situação (simples recomposição patrimonial) estará definitivamente caracterizada,
porém haverá inúmeras outras em que a importância da indenização não corresponderá
ao montante da diminuição patrimonial, por variadas razões. Exemplos dessas situações
são as indenizações por danos extrapatrimoniais, as indenizações por lucros cessantes e
as indenizações que ultrapassam o valor contábil dos bens cobertos, pagas no âmbito de
seguros de dano.
Quando nos deparamos com tais situações, surge a dúvida quanto à
incidência ou não do imposto sobre a renda, uma vez que, se as analisarmos
estritamente sob a ótica da verificação ou não de acréscimo patrimonial, este será
identificado e, consequentemente, poder-se-á concluir pela incidência do imposto.
de Recursos Fiscais. Acórdão nº 105-16.064. Processo nº 11516.001910/2004-58. Recurso nº 144.307. Matéria: IRPJ E OUTROS - EXS.: 1999 a 2003. Relator: Irineu Bianchi. Julgamento: 18 out. 2008. Órgão Julgador: Quinta Câmara. Publicação: DOU, 18 out. 2006).
130 BARRETTO JUNIOR, Valter Pedrosa. O regime jurídico tributário das indenizações por atos ilícitos. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 266, 30 mar.2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/5017>. Acesso em: 30 set. 2013.
94
Torna-se oportuno, por conseguinte, neste momento, trazer à baila a
distinção entre renda e transferências patrimoniais, apontada por diversos doutrinadores,
bem representados por RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA.
3.5.3.1 Renda versus transferências patrimoniais
Sobre a distinção entre renda e mera “transferência patrimonial” esclarece
MARIZ DE OLIVEIRA:
Tendo-se em conta que o fato gerador do imposto de renda sempre importa em haver aumento patrimonial e, inclusive, sabendo-se que o art. 43 do CTN, ao definir proventos de qualquer natureza, refere-se aos demais acréscimos de patrimônio não provindos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, poder-se-ia chegar a afirmar que todo e qualquer acréscimo de patrimônio, qualquer que fosse a sua causa geradora, poderia ser tomado como participante do fato gerador e da base de cálculo do imposto sobre a renda. Entretanto, a Doutrina arguta percebeu, há muito tempo, a necessidade de uma distinção limitadora dessa aparente ilimitação dos acréscimos patrimoniais passíveis de incidência do imposto de renda e demonstrou que o incremento patrimonial que integra a sua base de cálculo deve sempre se originado de causas das quais participe a própria fonte produtora, que é o patrimônio ou o seu titular. As colocações dessa doutrina servem tanto para distinguir rendas de transferências patrimoniais, quanto estas de receitas, dado que receitas são entradas correspondentes às rendas em sentido lato.131
No entendimento do autor, nem todos os ingressos patrimoniais podem ser
considerados receitas ou rendimentos, vindo a compor a renda de pessoas físicas ou
jurídicas, porque parte deles consistiria em meras “transferências patrimoniais”. Só
poderiam ser caracterizados como rendimentos aptos a compor a renda os ingressos
oriundos do próprio patrimônio do titular. Os acréscimos patrimoniais oriundos do
patrimônio de outras pessoas, físicas ou jurídicas, sem correlação direta com o
patrimônio do titular, seriam meras transferências patrimoniais, que extrapolam os
conceitos de receita e rendimento, tampouco podendo compor a renda (i.e, acréscimo
patrimonial oriundo de fonte geradora de riqueza nova).
O exemplo clássico e mais elucidativo de transferência patrimonial seria a
injeção de capital realizada pelos sócios numa pessoa jurídica. O capital social
131 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 144-145.
95
integralizado não é fruto da atividade da pessoa jurídica. Logo, também não pode vir a
compor sua renda. Trata-se da mera transferência de um patrimônio (dos sócios) para
outro (da pessoa jurídica), que não pode ser considerada renda ou receita. As doações,
sejam elas públicas ou privadas, teriam a mesma natureza, pois “não são produtos da
atividade da pessoa titular do patrimônio aquinhoado nem do emprego de qualquer dos
seus componentes (não são contraprestacionais)”132. Mais uma vez cabe recordar a
elucidação de MARIZ DE OLIVEIRA:
[…] as transferências patrimoniais distinguem-se das receitas porque, ao contrário destas, que são produtos do esforço do próprio patrimônio ou do seu titular, aquelas são injetadas de fora para dentro do patrimônio, para que este passe a contar com novos recursos necessários à produção de suas receitas e, por conseguinte, para frutificar.133
A inteligência acima exposta, que distingue renda de transferências de
capital, filia-se à teoria da “renda-produto”, segundo a qual nem todo acréscimo
patrimonial caracteriza renda. Somente os frutos decorrentes da aplicação do patrimônio
(na produção ou no trabalho) ou do capital poderiam ser considerados “renda”. Assim,
alguns valores que ingressam no patrimônio das pessoas físicas e jurídicas, como
doações e subvenções, seriam meras transferências patrimoniais, que embora impliquem
acréscimo do patrimônio que as recebe, não caracterizariam receitas ou rendimentos, e
consequentemente não comporiam a renda ou lucro do beneficiário.
Feita essa distinção, as indenizações de seguro seriam classificadas como
transferências de capital, não se enquadrando nos conceitos de receita e renda, e
consequentemente restando excluídas das incidências tributárias que utilizam tais
materialidades como base de cálculo, porque a natureza de “transferência de capital”
independe de a indenização apenas recompor ou ultrapassar o patrimônio diminuído
pelo dano. Caracteriza-se pelo fato de a indenização não ser contraprestação do trabalho
ou da venda de mercadorias, nem de qualquer tipo de aplicação do patrimônio das
pessoas físicas ou jurídicas. A indenização é elemento extrínseco, que se destaca do
patrimônio da parte indenizante (no caso do seguro, a seguradora) e passa a compor o
patrimônio do indenizado (no caso do seguro, o segurado).
132 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 154.
133 Ibid., op. cit.
96
A nosso ver, contudo, ao delinear a competência para instituição do imposto
sobre a renda, o sistema tributário brasileiro não adotou a teoria da “renda-produto”.
Embora a Constituição Federal não tenha definido esse conceito, entendemos que os
enunciados de competência do Código Tributário Nacional indicam a adoção da
doutrina da “renda-acréscimo”, segundo a qual renda é qualquer acréscimo patrimonial,
independentemente de sua origem. Extraímos esse entendimento, inicialmente, do artigo
43 do Código, que define “renda”, em seu inciso I, como “o produto do capital, do
trabalho, ou da combinação de ambos”, e no inciso II, “proventos de qualquer
natureza”, como “quaisquer acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso
anterior”.
Se o Código Tributário Nacional tivesse adotado a teoria da renda-produto,
teria estabelecido, exclusivamente, que renda e proventos de qualquer natureza são o
produto do capital, do trabalho, ou da combinação de ambos. Contudo, preferiu ser mais
abrangente, estabelecendo que estão abarcados no conceito “quaisquer acréscimos
patrimoniais”.
Essa conclusão é confirmada por PAULO DE BARROS CARVALHO que, após
analisar as opiniões doutrinárias relacionadas ao conceito de renda, conclui que
prevalece no Direito Brasileiro a “teoria do acréscimo patrimonial”,
[…] segundo a qual o que interessa é o aumento do patrimônio líquido, sendo considerado como lucro tributável exatamente o acréscimo patrimonial líquido verificado no patrimônio da empresa, durante período determinado, independentemente da origem das diferentes parcelas. É o que se depreende do art. 43 do Código Tributário Nacional.134
Portanto, a rigor, sempre que estivermos diante de ingressos no patrimônio
das pessoas físicas ou jurídicas que tenham o potencial para acrescê-lo, estaremos diante
de rendimentos aptos a compor a renda. Naturalmente que, para verificar se houve ou
não renda tributável, será necessário cotejar rendimentos e despesas dentro de certo
período, determinado por lei. Contudo, não será possível excluir previamente, desse
cômputo, todo e qualquer ingresso caracterizado como “transferência patrimonial”, a
menos que o legislador tenha isentado expressamente esses valores da incidência do
imposto sobre a renda.
134 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 671.
97
Com efeito, é comum o legislador, sempre fundado em valor que pretenda
prestigiar, estabelecer isenções para transferências patrimoniais. Há também hipóteses
tratadas pela Doutrina como “transferências patrimoniais”, como as injeções de capital,
que ficam fora do âmbito de incidência do imposto sobre a renda, pois de fato não
implicam acréscimo patrimonial, já que contabilmente sua contrapartida imediata é um
passivo, não transitando por contas de resultado.
No que diz respeito às isenções legalmente concedidas às transferências
patrimoniais observa-se, por exemplo, que foi dado esse tratamento às doações
recebidas por pessoas físicas. Por outro lado, não há isenção de imposto sobre a renda
para doações recebidas por pessoas jurídicas, embora em ambos os casos, a rigor,
estejamos diante de “transferências patrimoniais”. A legislação do imposto sobre a
renda das pessoas jurídicas isenta de sua incidência as subvenções (doações estatais)
para investimento, mas não isenta as subvenções para custeio, embora ambas sejam
transferências patrimoniais. Por fim, observamos que os prêmios de loteria, por
exemplo, são transferências patrimoniais, pois não decorrem da aplicação de capital
nem de trabalho de pessoas físicas ou jurídicas, porém sofrem a tributação do imposto
sobre a renda, seja na fonte, seja na apuração final do imposto.
Sendo assim, a despeito da erudição e dos sólidos fundamentos jurídicos da
distinção feita por RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA entre rendimentos, receitas e meras
“transferências patrimoniais”, não a adotaremos neste trabalho, pelas razões já expostas.
Por conseguinte, do cômputo das receitas que compõem a renda não podem ser
excluídas, em princípio, as chamadas transferências patrimoniais. Estas só podem ser
desconsideradas quando houver regra expressa excluindo-as da base de cálculo do
imposto ou quando, por sua própria natureza, estiverem fora do respectivo âmbito de
incidência.
A premissa aqui utilizada será a de que, havendo acréscimo patrimonial,
apurado após o cômputo de receitas, outros ingressos, custos e despesas, haverá renda.
Sem tal incremento, não será possível constituir o fato jurídico descrito na hipótese da
regra-matriz de incidência tributária do imposto sobre a renda e, consequentemente, a
norma não incidirá.
98
Quanto às indenizações, em regra não serão tributadas, pois se limitam a
recompor o patrimônio desfalcado pelo dano. Contudo, se representarem lucro, haverá
incidência do imposto, pois se estará diante de acréscimo patrimonial.
3.5.3.2 Indenização por prejuízos extrapatrimoniais versus renda
Até este pronto, centramo-nos na ideia de que o conceito de indenização
corresponde à recomposição do patrimônio diminuído pelo dano. Entende-se
“patrimônio”, para os fins deste trabalho, como “o complexo de todas as relações
jurídicas de seu titular, desde que dotadas de valor econômico”135.
Contudo, para aprofundar a análise quanto à possibilidade de tributação das
indenizações, é necessário ter presente, também, que nem todos os bens atribuíveis às
pessoas físicas e jurídicas, indenizáveis se objeto de dano, compunham originalmente
seu patrimônio, no sentido estrito acima indicado, antes de serem danificados.
Há bens insuscetíveis de valoração pecuniária anterior ao dano, como o
direito à própria imagem, o direito de ir e vir, o direito de expressão, os direitos
personalíssimos e todos os outros que não tenham valor econômico.
Da verificação deste fato decorre a conclusão de poder haver indenizações
que não venham a simplesmente recompor o patrimônio econômico previamente
existente, porque só no momento do arbitramento da indenização é que esses bens serão
avaliados e traduzidos em pecúnia. Nesse sentido é o esclarecimento de RICARDO
MARIZ DE OLIVEIRA:
Nem toda indenização pode ser substitutiva de uma relação jurídica integrante do patrimônio, no sentido legal, pois ela pode ser atribuída pela violação de um direito que não figurava no patrimônio da pessoa prejudicada. Não obstante, essas indenizações, quando traduzidas em pecúnia, passam a representar direitos com valor econômico, motivo pelo qual estas se integram ao patrimônio, onde antes nada havia em conexão com eles.136
135 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 201.
136 Ibid., p. 202.
99
A despeito dessas diferenças, a Doutrina e a jurisprudência, ao longo do
tempo, já trataram de equiparar a recomposição do dano moral à recomposição do dano
material, para fins cíveis e, mais recentemente, tributários.
Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça entendia, seguindo a linha
preconizada por alguns Doutrinadores, entre os quais HUGO DE BRITO MACHADO, que
[…] se o objeto da indenização é o elemento moral, porque a ação danosa atingiu precisamente o patrimônio moral, não há dúvida de que o recebimento de indenização implica evidente crescimento do patrimônio econômico e, assim, enseja a incidência dos tributos que tenham como fato gerador esse acréscimo patrimonial.137
Foi esse o entendimento adotado, dentre outros, no RESP 748.868/RS,
julgado pela 1ª Seção do STJ em 28/08/07, tendo como Relator o Min. TEORI ALBINO
ZAVASCKI138. Posteriormente, contudo, o STJ o alterou, passando a adotar,
137 MACHADO, Hugo de Brito. Regime tributário das indenizações. In: ______. (Coord.). Regime tributário das indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 109.
138 “1. O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 do CTN, os “acréscimos patrimoniais”, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte.
2. Indenização é a prestação destinada a reparar ou recompensar o dano causado a um bem jurídico. Os bens jurídicos lesados podem ser (a) de natureza patrimonial (= integrantes do patrimônio material) ou (b) de natureza não-patrimonial (= integrantes do patrimônio imaterial ou moral), e, em qualquer das hipóteses, quando não recompostos in natura, obrigam o causador do dano a uma prestação substitutiva em dinheiro.
3. O pagamento de indenização pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo da natureza do bem jurídico a que se refere. Quando se indeniza dano efetivamente verificado no patrimônio material (= dano emergente), o pagamento em dinheiro simplesmente reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, e, portanto, não acarreta qualquer aumento no patrimônio. Todavia, ocorre acréscimo patrimonial quando a indenização (a) ultrapassar o valor do dano material verificado (= dano emergente), ou (b) se destinar a compensar o ganho que deixou de ser auferido (= lucro cessante), ou (c) se referir a dano causado a bem do patrimônio imaterial (= dano que não importou redução do patrimônio material).
4. A indenização que acarreta acréscimo patrimonial configura fato gerador do imposto de renda e, como tal, ficará sujeita a tributação, a não ser que o crédito tributário esteja excluído por isenção legal, como é o caso das hipóteses dos incisos XVI, XVII, XIX, XX e XXIII do art. 39 do Regulamento do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, aprovado pelo Decreto 3.000, de 31.03.99. Precedentes.
5. “Se o objeto da indenização é o elemento moral, porque a ação danosa atingiu precisamente o patrimônio moral, não há dúvida de que o recebimento de indenização implica evidente crescimento do patrimônio econômico e, assim, enseja a incidência dos tributos que tenham como fato gerador esse acréscimo patrimonial” (Hugo de Brito Machado, Regime Tributário das Indenizações, obra coletiva, Coord. Hugo de Brito Machado, p. 109). Em idêntico sentido, na obra citada: Gisele Lemke, p. 83; Hugo de Brito Machado Segundo e Paulo de Tarso Vieira Ramos, p. 124; Fábio Junqueira de Carvalho e Maria Inês Murgel, p. 74. E ainda: Leandro Paulsen, Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 5ª ed., Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2003, p. 655.
6. Configurando fato gerador do imposto de renda e não estando abrangido por norma isentiva (salvo quando decorrente de acidente do trabalho, o que não é o caso), o pagamento a título de dano moral fica sujeito à incidência do tributo. 7. Recurso especial provido” (BRASIL. Superior Tribunal
100
acertadamente, pelas razões que serão expostas a seguir, interpretação ampla do
conceito de patrimônio, não apenas para fins cíveis, mas também para a definição de
renda e da incidência do respectivo imposto, abarcando tanto os bens sujeitos a
avaliação econômica, quanto os imateriais (afetivos e sociais).
O STJ passou a entender que, no momento em que os bens imateriais –
como a honra ou a dignidade – são avaliados para fins de reparação, passam a compor o
patrimônio e a indenização passa a refleti-los, economicamente, na exata medida de sua
expressão pecuniária. Pode-se perceber que se trata, aqui, de realidade criada pelo
Direito, conforme ressalta o Constructivismo Lógico-Semântico preconizado por PAULO
DE BARROS CARVALHO. A reparação dos danos imateriais passou a merecer, portanto,
para fins fiscais, o mesmo tratamento da indenização de prejuízos patrimoniais. A
aplicação do chamado “princípio da reparação integral” foi estendida para o Direito
Tributário, na medida em que se concluiu que, se o Estado pudesse apoderar-se de parte
da indenização, esta seria amesquinhada.
Tal entendimento foi adotado no RESP 1.152.764/CE, julgado pela 1ª Seção
do STJ em 23/06/10, tendo como Relator o Min. LUIZ FUX, assim ementado:
1. A verba percebida a título de dano moral tem a natureza jurídica de indenização, cujo objetivo precípuo é a reparação do sofrimento e da dor da vítima ou de seus parentes, causados pela lesão de direito, razão pela qual torna-se infensa à incidência do imposto de renda, porquanto inexistente qualquer acréscimo patrimonial. (Precedentes: …). 2. In casu, a verba percebida a título de dano moral adveio de indenização em reclamação trabalhista. 3. Deveras, se a reposição patrimonial goza dessa não incidência fiscal, a fortiori, a indenização com o escopo de reparação imaterial deve subsumir-se ao mesmo regime, porquanto ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio. 4. "Não incide imposto de renda sobre o valor da indenização pago a terceiro. Essa ausência de incidência não depende da natureza do dano a ser reparado. Qualquer espécie de dano (material, moral puro ou impuro, por ato legal ou ilegal) indenizado, o valor concretizado como ressarcimento está livre da incidência de imposto de renda. A prática do dano em si não é fato gerador do imposto de renda por não ser renda. O pagamento da indenização também não é renda, não sendo, portanto, fato gerador desse imposto. […] Configurado esse panorama, tenho que aplicar o princípio de que a base de cálculo do imposto de renda (ou de qualquer outro imposto) só pode ser fixada
de Justiça. Recurso Especial nº 748.868/RS. Relator: Teori Albino Zavascki. Julgamento: 28 ago. 2007. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJ, 18 fev. 2008).
101
por via de lei oriunda do poder competente. É o comando do art. 127, IV, do CTN. 5. Se a lei não insere a "indenização", qualquer que seja o seu tipo, como renda tributável, inocorrendo, portanto, fato gerador e base de cálculo, não pode o fisco exigir imposto sobre essa situação fática. […] Atente-se para a necessidade de, em homenagem ao princípio da legalidade, afastar-se as pretensões do fisco em alargar o campo da incidência do imposto de renda sobre fatos estranhos à vontade do legislador." ("Regime Tributário das Indenizações", Coordenado por Hugo de Brito Machado, Ed. Dialética, pg. 174/176).139
A jurisprudência do STJ veio, desde então, se consolidando no sentido de
atribuir às reparações de danos extrapatrimoniais o mesmo tratamento dado às
indenizações de prejuízos patrimoniais, até que, em 08/08/2012, foi aprovada a Súmula
nº 498, estabelecendo que “não incide imposto de renda sobre a indenização por danos
morais”.
Parece-nos que esse entendimento do STJ é o mais coerente com o sistema
jurídico vigente no País e sua interpretação pelos Tribunais. Com efeito, por muito
tempo prevaleceu a ideia, no âmbito do Direito Civil, de que os danos extrapatrimoniais
não poderiam nem mesmo ser reparados. Pensava-se que a indenização desses danos
caracterizaria verdadeira pena, incompatível com a ideia de indenização, que visaria
exclusivamente à recomposição do statu quo ante. Ademais, acreditava-se ser
impossível uma equivalência entre dinheiro e dano moral. Por fim, entendia-se que a
restituição deveria implicar sacrifício de interesse idêntico, enquanto que a pena
consistiria no sacrifício de um interesse diverso, tendo caráter aflitivo para aquele que
causou o dano.
Todavia, a Doutrina e a Jurisprudência civilistas evoluíram em face da
necessidade de encontrar meios tanto para recompor o dano causado aos bens
imateriais, quanto de apenar o causador de tal dano. Passou-se a entender que, de fato, a
reparação do dano moral não se resolve integralmente numa indenização em sentido
estrito, já que indenização significa eliminação do prejuízo e das suas consequências, o
que não é possível quando se trata de dano extrapatrimonial. Contudo, é possível a
compensação do dano extrapatrimonial pelo ofensor, que fica obrigado a pagar certa
quantia em favor do ofendido. Esta obrigação, ao mesmo tempo em que agrava o
patrimônio do ofensor, punindo-o, proporciona ao ofendido uma reparação satisfativa.
139 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.152.764/CE. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgamento: 23 jun. 2010. Órgão Julgador: Primeira Seção. Publicação: DJe, 1º jul. 2010.
102
A Doutrina e a jurisprudência civilistas se pacificaram, a partir daí, no
entendimento de que os bens imateriais compõem o patrimônio intangível das pessoas
físicas e jurídicas e podem ser recompostos por pecúnia quando sofrem dano. Ora, se
essa conclusão é válida para o Direito Civil, deve também ser acatada pelo Direito
Tributário. O mesmo conceito de “patrimônio” válido para o Direito Privado deve valer
para o Direito Tributário, tanto que o Código Tributário Nacional estabelece em seu
artigo 109 que os princípios gerais de Direito Privado utilizam-se para pesquisa da
definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas.
Além disso, o artigo 110 do Código Tributário Nacional veda à lei tributária
alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito
privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas
Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos
Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
Ora, o conceito privatista de “patrimônio”, atualmente aceito como
juridicamente válido pela Doutrina e pela Jurisprudência, compreende tanto o
patrimônio material quanto o imaterial. Considerando que esse conceito foi utilizado
pela Constituição, ainda que de modo implícito, por estar diretamente relacionado ao
conceito de renda (acréscimo patrimonial), a lei tributária deve aceitá-lo como tal, e
consequentemente não deve considerar acréscimo patrimonial (renda) a recomposição
de danos extrapatrimoniais.
Discordamos, portanto, dos autores que, como MARY ELBE QUEIROZ,
entendem que
[…] qualquer valor resultante de indenização que venha a incorporar-se ao patrimônio já existente da vítima caracteriza-se como riqueza nova e, portanto, é passível de sobre ele incidir a tributação do citado imposto, por configurar ‘acréscimo patrimonial’ e revelar capacidade contributiva, salvo na hipótese de lei expressa que a isente.140
A nosso ver, a reparação de dano imaterial está fora do campo de incidência
do imposto sobre a renda, por não corresponder a acréscimo patrimonial, devendo ser
observado o conceito amplo de patrimônio consagrado pela Doutrina e pela
jurisprudência.
140 QUEIROZ, Mary Elbe. As Indenizações sob a Óptica do Imposto sobre a Renda. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 270.
103
Seguindo a linha do Constructivismo Lógico-Semântico, defendida por
PAULO DE BARROS CARVALHO, entendemos que o Direito constrói suas próprias
realidades. Sendo assim, a despeito de determinado bem não ter natureza patrimonial
antes de sofrer dano, ocorrido este, para fins de sua recomposição, o Direito estabelece
ter o valor exato da indenização, que passa a refleti-lo no âmbito patrimonial.
Nesse sentido é o entendimento de SCHOUERI e JARDIM NETO:
O reconhecimento da Ordem Jurídica de que aquele valor corresponde à composição do dano moral é dizer que aquele valor não corresponde a um ingresso no patrimônio, embora possa ser a visão de um direito não patrimonial como patrimonial. Não há acréscimo, embora haja a visão do mesmo bem ou de um bem equivalente de uma outra forma. Caso assim não se entenda, não há como dizer-se que a lesão obriga à indenização. Se não existia apuração do valor econômico anteriormente à ocorrência do dano, isso deriva do fato de que aquele bem extrapatrimonial lesado estar fora do comércio. No entanto, o dano obriga o Direito a reconhecer o valor econômico que já correspondia, no tempo da lesão, ao bem extrapatrimonial lesado. Ou seja, no momento em que há a condenação do ofensor a indenizar a vítima, o direito passar a ver aquele mesmo bem de uma outra forma, por outro ângulo, para que a compensação seja possível. O facho pelo qual o Direito enxergava aquele bem passa a iluminá-lo por outro lado – lado obscuro até aquele momento – tão-somente para que a sua recomposição teórica seja possível. Mas não há ingresso de novo bem ao patrimônio do ofendido, tão-somente a representação econômica de parte ou da integralidade desse bem, para que seja possível a sua recomposição perante o Direito.141
Daí concluirmos que, também nas hipóteses de reparação por dano
imaterial, a indenização paga, seja a pessoa física, seja a pessoa jurídica, tem natureza
de recomposição patrimonial, ficando fora do âmbito da incidência do imposto sobre a
renda, que só incide sobre verdadeiro acréscimo patrimonial.
3.5.3.3 Pagamento do capital segurado versus renda
Ficou estabelecida, linhas atrás, a premissa de que a expressão
“indenização” seria utilizada exclusivamente para designar a prestação devida pelo
segurador ao segurado, na hipótese de sinistro em seguro de dano. Ao tratarmos de
seguros de pessoas, utilizaríamos a expressão “pagamento do capital segurado”.
141 SCHOUERI, Luís Eduardo; JARDIM NETO, José Gomes. Regime Tributário das Indenizações. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 237.
104
Essa distinção é importante porque, no âmbito do seguro de dano, a
indenização efetivamente tem por objetivo recompor o patrimônio reduzido em
decorrência do sinistro. Já no seguro de pessoas, não há falar em recomposição de
patrimônio desfalcado, mas sim na estipulação, pela seguradora, de um prêmio a ser
pago uma única vez, em parcelas, ou por toda a vida, a fim de que o segurado ou seus
beneficiários venham a receber uma quantia predeterminada (e portanto não relacionada
ao valor do suposto prejuízo), quando da ocorrência do sinistro.
A nosso ver, trata-se de prestações com semelhanças e dessemelhanças
consideráveis, que implicam consequências jurídicas e tributárias distintas. Tanto o
seguro de dano quanto o seguro de pessoas são contratos firmados entre o segurado e
uma seguradora, tendo como objeto a garantia perante um risco. O segurado transfere o
risco para a seguradora, que assume a obrigação de indenizar se e quando o sinistro
ocorrer. Ambos têm como partes contratantes, necessariamente, uma seguradora142.
Ambos estabelecem para o segurado a obrigação de pagar o prêmio que lhe garantirá o
direito à indenização (ou restituição do capital segurado) na hipótese de sinistro.
Contudo, o seguro de dano e o seguro de pessoas se distinguem na
quantificação do dano. O seguro de dano tem natureza indenitária, o que significa dizer
que a indenização deve recompor o patrimônio, mas não pode ultrapassar o valor do
dano causado ao interesse segurado. Já no caso do seguro de pessoas, conforme
estabelecido pelo artigo 789 do Código Civil de 2002, o capital segurado é livremente
estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo
interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.
Resta saber, portanto, se o pagamento do capital segurado caracteriza
acréscimo patrimonial (renda) para os beneficiários ou o próprio segurado, ou também
tem natureza de indenização ou reparação do patrimônio, situando-se, portanto, fora do
campo da incidência do respectivo imposto.
Vale observar que a Lei no 7.713/98, no seu artigo 6o, excluiu
expressamente da incidência do imposto sobre a renda das pessoas físicas (i) os
“seguros” recebidos de entidades de previdência privada decorrentes de morte ou
invalidez permanente do participante (redação dada pela Lei nº 9.250, de 1995); e (ii) o
142 Ressalva-se, contudo, que entidades de previdência privada também podem ser partes contratadas nos seguros de pessoas.
105
capital das apólices de seguro ou pecúlio pago por morte do segurado, bem como os
prêmios de seguro restituídos em qualquer caso, inclusive no de renúncia do contrato.
Ressalvamos que a legislação utiliza expressões tecnicamente incorretas.
Refere-se aos “seguros” recebidos decorrentes de morte, e ao “capital das apólices de
seguro ou pecúlio pago por morte do segurado”, quando deveria se referir ao pagamento
do capital segurado pago pela morte de titular de seguro de vida. Mas fato é que excluiu
tais valores da incidência do imposto sobre a renda das pessoas físicas.
Não obstante o tratamento que a lei ordinária dá aos referidos pagamentos
de capital segurado, resta analisar sua natureza jurídica, a fim de apurar se a não-
incidência do imposto decorre de isenção dada pelo legislador ordinário – que
consequentemente pode ser alterada, restringida ou suprimida livremente – ou de
hipótese de não-incidência tributária, por não consistirem em “renda”.
Também é importante ter presente, nessa análise, o fato de que os prêmios
de seguro de pessoas, pagos por pessoas físicas, não são considerados despesas
dedutíveis para efeito de determinação do imposto sobre a renda devido na Declaração
de Ajuste Anual, e se pagos por empregadores em favor de empregados são tributáveis
como remuneração indireta. Assim, se e quando ocorrer pagamento do capital segurado,
seja por morte, seja por invalidez, ao menos uma parcela daquele montante corresponde
aos prêmios pagos pelo segurado e não deduzidos (ou tributados) na apuração de seu
imposto sobre a renda.
Ora, como já visto, os seguros pessoais não têm como objeto a cobertura de
perdas patrimoniais em sentido estrito, ocasionadas por sinistros. Visam,
diferentemente, obter cobertura contra acidentes ou doenças que atentem contra a vida
ou a integridade física. Explica SILVA:
Nos primeiros, mais abrangentes, encontramos a cobertura para o evento morte, qualquer que seja o fato motivador de sua causa. Nos segundos, por conseguinte, tem-se a cobertura para os acidentes sofridos à pessoa do segurado, incluindo a invalidez, e até mesmo, a morte, desde que sejam decorrentes de um evento súbito, externo, violento ou involuntário, ou seja, um acidente na exata acepção da palavra.143
143 SILVA, Ivan de Oliveira. Direito do Seguro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 220-221.
106
Resta claro, portanto, que a indenização paga por morte ou invalidez não
recompõe patrimônio material previamente existente, vindo, isto sim, a acrescê-lo.
Observa-se aqui, inclusive, a peculiaridade de que, no seguro de vida, quem recebe o
pagamento do capital segurado não é o contratante, mas sim os beneficiários que
indicou.
Não obstante reconheçamos que, nos seguros de pessoas, não há reparação
patrimonial em sentido estrito, seja para o segurado (seguro contra invalidez, por
exemplo), seja para os beneficiários (seguro de vida), é preciso considerar, também, que
os riscos cobertos consistem invariavelmente em infortúnios que causam danos morais
aos segurados ou seus beneficiários.
No caso do seguro de vida, a restituição do capital segurado ocorre apenas
na hipótese de falecimento do segurado que, ordinariamente, causa sofrimento aos
beneficiários, no mais das vezes cônjuges e filhos que ficam desamparados. A invalidez
também causa sofrimento, tanto para o segurado quanto para seus familiares. Perde-se a
condição física que habilita às atividades cotidianas, sobretudo ao trabalho, ensejando o
pagamento da indenização.
Sendo assim, também nestes casos se está diante da reparação de danos
imateriais sofridos pelo segurado (invalidez temporária ou permanente) ou por seus
beneficiários (morte de ente querido), que vêm a ser reparados pelo pagamento da
indenização contratada com a seguradora ou entidade de previdência privada. Daí
porque o próprio direito positivo veio a isentá-los da incidência do imposto sobre a
renda.
São duas, portanto, as conclusões possíveis em relação à indenização dos
seguros de dano. Por um lado, poder-se-ia considerar que sempre representará
acréscimo patrimonial e, portanto, renda, pois pela sua própria natureza visa cobrir a
morte ou a invalidez, e não prejuízos previamente quantificados, causados ao
patrimônio material do segurado, como ocorre no seguro de dano.
Por outro, também é possível a conclusão – com a qual estamos de acordo –,
de que a indenização, neste âmbito, só é paga em face da ocorrência de acidente ou
outro infortúnio, não desejado pelo segurado ou por seus beneficiários. Assume, assim,
a natureza de reparação do dano imaterial, previamente quantificado pelo próprio
segurado como equivalente ao capital segurado.
107
Vale mencionar, ainda, que tal conclusão não gera distorção no sistema
tributário, uma vez que os prêmios pagos pelos segurados, no âmbito dos seguros
pessoais, não são dedutíveis, para fim de apuração da base de cálculo do imposto sobre
a renda, e se pagos por pessoas jurídicas em benefício de seus empregados, são
tributáveis.
Assim, pelas razões já expostas ao tratarmos da não incidência do imposto
sobre indenizações por danos ao patrimônio imaterial, também aqui haverá hipótese de
não-incidência tributária, pois a indenização não gerará acréscimo, mas sim
recomposição patrimonial.
3.5.3.4 Indenização por lucros cessantes versus renda
No caso das indenizações por lucros cessantes, o tratamento é habitualmente
diverso. Tanto a legislação, quanto a Doutrina e a Jurisprudência indicam que há
incidência do imposto sobre a renda. Faz sentido essa conclusão, uma vez que, em tais
hipóteses, o bem perecido é justamente o lucro. Substitui-se o lucro que se deixou de
auferir em razão do sinistro ocorrido por indenização, esta assumindo seu lugar e
absorvendo sua natureza. Consequentemente, pode ser tributada.
Nesse sentido é o entendimento de FÁBIO JUNQUEIRA DE CARVALHO e
MARIA INÊS MURGEL:
A situação diverge quando se trata de indenização por lucro cessante. Nesse caso, a indenização visa ressarcir o lesado pela impossibilidade de o mesmo obter ganhos aos quais faria jus não fosse pelo dano havido. Assim, caso não sofresse o dano moral ou material, a vítima do dano iria auferir ganhos patrimoniais que, naquela condição, seriam tributados. Ora, a indenização pelo lucro cessante consiste, justamente, em proporcionar ao lesado o benefício a que teria direito. Por essa razão, tal quantia deve ser tributada pelo imposto de renda, da mesma forma que seria caso a ofensa não sobreviesse.144
Na mesma linha é a explicação de MARY ELBE QUEIROZ:
Os lucros cessantes, sem quaisquer dúvidas, caracterizam-se como riqueza nova, ‘acréscimos patrimoniais’, uma vez que são lucros certos e prováveis que a pessoa iria auferir e deixou de ganhar em decorrência do ato lesivo. Abstraindo-se da ocorrência do ato lesivo,
144 CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 75.
108
caso esses ganhos tivessem sido auferidos na época própria, teria ocorrido, ou não, a incidência do IR de acordo com a respectiva natureza. Em consequência, quando se tratar de indenização por lucros cessantes deverá ser adotado o mesmo tratamento tributário àquele que seria dado caso não tivesse havido o dano. Ocorrerá a incidência, ou não, de conformidade com a previsão legal prevista para a espécie. Caso se tratasse originalmente de ‘renda’ ou ‘provento’ tributável, por exemplo, salários, rendimentos de autônomos etc., que a vítima deixou de perceber em decorrência do ato lesivo, haverá a incidência do imposto.145
Com efeito, conforme vem sendo pontuado até aqui, no seguro de dano (seja
ele material ou imaterial) ou no seguro de pessoas, a indenização visa recompor o
patrimônio (material ou imaterial) diminuído pelo sinistro. Essa indenização, por força
de imposição do próprio Direito, corresponde, sempre, à exata reparação do dano e
consequentemente repõe o patrimônio no seu statu quo ante, sem proporcionar nenhum
ganho ao segurado ou a seu beneficiário.
Na hipótese de indenização por lucros cessantes, o bem perecido é
exatamente o lucro que se deixou de auferir. Este também é recomposto, em sua exata
medida, pela indenização, que para o Direito o substitui integralmente. Entretanto, se a
indenização corresponde a lucro, e este é tributável, não há nada que impeça a
incidência do imposto sobre a renda sobre o respectivo montante146.
3.5.3.5 Indenização superior ao valor contábil versus renda
Quando o montante da indenização é igual ao valor contábil dos bens
perecidos, não há falar em sua tributação. Por um lado, já vimos que indenização
configura hipótese de não-incidência tributária, desde que não represente acréscimo
patrimonial. Por outro lado, mesmo analisando o fato apenas sob a óptica contábil,
verificar-se-ia, adotando-se o método das partidas dobradas, a baixa do bem perecido
como despesa tendo como contrapartida o reconhecimento, como receita, de idêntico
montante correspondente à indenização.
145 QUEIROZ, Mary Elbe. As Indenizações sob a Óptica do Imposto sobre a Renda. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 269.
146 O que se deve identificar, portanto, é se, na quantificação da indenização por lucros cessantes, o valor calculado dos lucros frustrados corresponde ao seu montante bruto, antes da tributação, ou se ao seu valor líquido, após a dedução dos tributos. No segundo caso, não se poderá falar em incidência dos tributos já deduzidos no cálculo.
109
Contudo, o valor recebido pode – e é muito comum que isso ocorra –
ultrapassar o valor contábil dos bens perecidos, seja por já terem sido estes parcialmente
depreciados, seja pelo fato de seu valor de mercado ser superior ao contábil, ou em
razão de a indenização contemplar, por exemplo, correção monetária.
Numa primeira análise, poder-se-ia concluir que, nessas hipóteses, eventual
diferença para mais entre o valor da indenização e o valor contábil do bem indenizado
implicaria em acréscimo patrimonial para o segurado, devendo ser tributada pelo
imposto sobre a renda. Este entendimento já foi, inclusive, adotado pelo antigo
Conselho de Contribuintes, em acórdão assim ementado:
IRPJ/CSLL - INDENIZAÇÃO RECEBIDA POR SEGURADORA EM RAZÃO DE FURTO DE VEICULO – Montante indenizado maior que o valor contábil corrigido monetariamente e acrescido da respectiva depreciação — ganho que deve ser considerado na apuração da base de cálculo.147
O Relator, acompanhado por unanimidade, baseou-se no seguinte
argumento central:
Vale ressaltar que o tratamento dado ao recebimento de indenização e seus reflexos tributáveis na pessoa jurídica difere substancialmente da forma como a mesma é tratada quando o indenizado é pessoa física, pois esta última não está sujeita às regras da depreciação. Se idênticas fossem as formas de tratamento, realmente no presente caso não haveria reflexo algum no patrimônio da Recorrente. Mas, como estamos tratando de uma pessoa jurídica que deprecia seus ativos, gozando assim da permissão legal para deduzi-la como despesa/custo, não se pode admitir a mera comparação entre o valor de aquisição (constante da nota fiscal) e o valor da indenização recebida, como pretende a Recorrente.148
Embora o argumento utilizado impressione, especialmente sob o ângulo
contábil, não resiste a uma análise jurídica mais detida.
Como já visto, o Código Civil estabelece, no artigo 781, que “a indenização
não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em
hipótese alguma, o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora
do segurador”.
147 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Contribuintes. Acórdão nº 107-09.086. Processo n° 18471.000646/2003-67. Recurso n° 153.213. Matéria: IRPJ - AF- lucro presumido (exceto omis. receitas pres. legal). Relatora: Renata Sucupira Duarte. Julgamento: 14 jun. 2007. Órgão Julgador: Sétima Câmara. Publicação: DOU, 14 jun. 2007.
148 Ibid.
110
Por conseguinte, o Direito criou a realidade, a ficção jurídica segundo a qual
o valor da indenização corresponde ao valor do bem. Como consequência dessa ficção,
o pagamento de indenização (excetuada a hipótese de lucros cessantes), corresponderá
sempre à estrita recomposição patrimonial, à mera substituição dos bens perecidos.
Como, para fins securitários, a indenização não ultrapassa o valor do bem sinistrado,
para fins tributários essa mesma premissa deve valer, de modo que eventual diferença
entre o valor contábil do bem e o valor pecuniário da indenização não pode ser
considerada renda nem ser tributada.
SCHOUERI e JARDIM NETO esclarecem:
Mas também é possível verificar que, mesmo nos casos de danos materiais, a indenização muitas vezes não passa de uma compensação imprecisa pelo dano sofrido. Ou seja, a indenização, nesse caso, não representa a recomposição patrimonial do estado anterior, impossível de ser trazido novamente à tona, mas uma compensação atenuante do dano, que dificilmente corresponderá ao seu montante exato, mas a um valor que pode ser maior ou menor que o prejuízo inicial. No entanto, há de ser observado que, quando o Poder Judiciário fixa o montante da indenização, juntamente com os honorários advocatícios devidos e outros acréscimos porventura existentes, a ordem jurídica passa a reconhecer aquele valor como suficiente e adequado para tal compensação. Quando o autor do dano paga a indenização ao ofendido, por sua vez, aquela obrigação decorrente do dano causado é imediatamente extinta. Isso significa que, dali em diante, o ofendido há de ser reconhecido como recompensado149.
Logo, pode-se ter, nessa hipótese, um ganho contábil, na medida em que a
baixa do bem perecido, como despesa, não anulará por completo o reconhecimento da
receita150 correspondente à indenização. Essa diferença, porém, não pode ser entendida
como acréscimo patrimonial ou renda, por força do princípio indenitário segundo o qual
a indenização substitui o bem integralmente, e tem valor idêntico ao seu, não podendo
superá-lo.
Naturalmente que eventuais ajustes poderão ser feitos, para evitar o
enriquecimento sem causa do segurado, em detrimento do Fisco. Dessa forma, pode-se,
por exemplo, estornar as despesas de depreciação anteriormente utilizadas para a
149 SCHOUERI, Luís Eduardo; JARDIM NETO, José Gomes. Regime Tributário das Indenizações. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 235.
150 Trataremos, a seguir, da possibilidade de caracterização de “indenização” como “receita”, para fins tributários. Neste ponto, estamos utilizando a expressão na sua acepção contábil.
111
redução da base de cálculo dos tributos incidentes sobre o lucro, quando seu valor for
recebido na integralidade como indenização e, por conseguinte, não tributado.
O que não se pode olvidar é o fato de que, como bem apontado pelos
autores acima citados, no momento em que, seja o Poder Judiciário, seja a seguradora
na regulação do sinistro, determina o montante da indenização, “a ordem jurídica passa
a reconhecer aquele valor como suficiente e adequado para tal compensação”, não
sendo possível, consequentemente, classificar essa compensação como acréscimo
patrimonial tributável, sob pena de o Direito Tributário afrontar o princípio indenitário,
adotado pelo Direito Civil Securitário.
3.5.4 Não incidência de PIS e COFINS sobre indenizações
Já fizemos, linhas acima, a distinção entre os conceitos de “indenização” e
“renda”, donde chegamos a importantes conclusões quanto à incidência do respectivo
imposto sobre tais valores.
Tão relevante quanto essa distinção é aquela entre “indenização” e “receita”,
uma vez que, se caracterizada a indenização como tal, poderão incidir, sobre essa
grandeza, a contribuição ao PIS e a COFINS, tão ou mais onerosas para a pessoa
jurídica quanto o IRPJ e a CSLL incidentes sobre o lucro.
JOSÉ ANTONIO MINATEL, em obra dedicada ao tema, assinalou com
propriedade que “receita” é expressão utilizada em diferentes contextos, com diferentes
acepções e objetivos. Observou que, na legislação comercial, “receita é ponto de partida
(meio) para a apuração do resultado (fim) cuja aferição pressupõe considerar os custos
correspondentes, um período determinado, segundo princípios específicos valorados
pela legislação comercial para essa finalidade”151. Mostrou também que “o conceito de
receita exteriorizado pela Ciência Contábil é sempre relativo, pois é apreendido pela
perspectiva de realidade que o vincula com a apuração do resultado”152, na mesma
direção do que faz a legislação comercial.
151 MINATEL, José Antonio. Conteúdo Jurídico do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP, 2005, p. 70-71.
152 Ibid., p. 74.
112
O objetivo do autor, em suas investigações, foi definir o conceito de
“receita” no âmbito do Direito Tributário, quando utilizado para fazer incidir tributos
autônomos como a contribuição ao PIS e a COFINS e, portanto, de modo não atrelado à
produção de resultado (legislação comercial) ou lucro (legislação do imposto sobre a
renda). Também será este o objetivo do presente tópico: definir o conceito de receita,
para fins de análise do possível enquadramento das indenizações como tal e
consequentemente da incidência da contribuição ao PIS e da COFINS sobre essa
grandeza econômica.
Analisando a Doutrina sobre a matéria, identifica-se, como denominador
comum, para a definição do conceito de receita, o requisito de que o ingresso em
questão seja definitivo e, principalmente, que derive das atividades da empresa, jamais
de fatores a ela estranhos. Foi nesse sentido, aliás, a irretocável conclusão do Ministro
JOSÉ DELGADO, quando enfrentou justamente a questão do enquadramento das
indenizações como receita:
A indenização recebida por pessoa jurídica por dano que lhe foi provocado não é receita, nem faturamento. É recomposição patrimonial ou compensação por ataque à sua honra objetiva, portanto, sem qualquer incidência de imposto de renda. Não é receita porque não origina-se das atividades normais da empresa. Não são valores recebidos, de modo direto ou indireto, em decorrência de seus objetivos. Não é faturamento porque não tem qualquer característica comercial, não é transação comum da empresa. O fato da indenização ser recebida pela pessoa jurídica não muda sua característica. Ela é a mesma quando tal indenização é recebida por pessoa física. Lança-se a indenização na escrita contábil da empresa a título de recomposição patrimonial ou de compensação, tão-somente, explicitando-se a sua origem e os motivos que a geraram. Cabe ao fisco, apenas, comprovar a sua existência, compatibilizando-a com a realidade e aceitá-la como fora do campo de tributação.153
PAULO DE BARROS CARVALHO também contribuiu decisivamente para a
definição do conceito de receita:
Para a efetiva existência de receita, o ingresso de dinheiro deve integrar o patrimônio de quem a auferiu, havendo alteração de riqueza. Receita é a entrada que, integrando-se ao patrimônio sem quaisquer reservas ou condições, vem acrescer seu vulto, como elemento novo positivo. Assim, quando o particular vende determinado bem que lhe pertence, o dinheiro recebido é receita, uma vez que altera a situação
153 DELGADO, José Augusto. Reflexões sobre o Regime Tributário das Indenizações. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 176.
113
patrimonial do vendedor. Por outro lado, ingressos financeiros que não constituam fatos modificativos do patrimônio, como o recebimento de depósitos recolhidos ou valores recebidos pela alienação de coisa alheia, não se apresentam como receita, sendo mera entrada.154
Com efeito, os requisitos exigidos pela Doutrina para a configuração de
receita para fins tributários, e como hipótese de incidência tributária autônoma, são
essenciais para que se identifique, na referida grandeza, fato signo presuntivo de riqueza
e, consequentemente, aptidão para atrair incidências tributárias. Ingressos não
definitivos ou estranhos à atividade da empresa não exibem esse atributo.
HELENILSON CUNHA PONTES seguiu a mesma linha, ao definir “receita”
como “fruto direto de uma atividade com conteúdo econômico ou de negócios jurídicos
com prestações avaliadas economicamente, fruto este que deve representar um ingresso
positivo, efetivo, definitivo e real ao patrimônio”155.
Baseados nessas premissas, diversos autores prestigiosos chegaram à
conclusão de que as indenizações jamais podem ser consideradas como receitas, para
fins de incidência do PIS e da Cofins.
MARY ELBE QUEIROZ concluiu, terminantemente, que “as indenizações não
são incluídas como faturamento/receita bruta, haja vista que não decorrem das
operações ou transações que constituam o respectivo objeto social ou atividade
principal”156.
No mesmo sentido a conclusão de JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO:
A receita compreende verbas de natureza diferenciada do faturamento, compreendendo demais valores auferidos em operações distintas da compra e venda e da prestação de serviços. Os juros, aluguéis, royalties, lucros distribuídos por outras empresas, ou decorrentes de transações imobiliárias podem ser contabilizados como receitas, jamais considerados como faturamento. A indenização não tem qualquer atinência com as operações mercantis, e prestações de serviços, por decorrerem de ressarcimento patrimonial, ou indenização de ato ilícito ou dano moral. Mesmo no caso do comprador haver pago indenização em decorrência de
154 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 811.
155 PONTES, Helenilson Cunha. A incidência de PIS/Cofins sobre variação cambial gerada nas operações de exportação de mercadorias. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 104, maio 2004, p. 107.
156 QUEIROZ, Mary Elbe. As Indenizações sob a Óptica do Imposto sobre a Renda. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 273.
114
inadimplemento contratual previsto em venda de produtos, a empresa vendedora não poderá promover nenhum tipo de faturamento uma vez que o correspondente valor indenizatório constitui elemento estranho ao preço das mercadorias.157
MINATEL chega a idêntica conclusão, indicando de forma arguta as
diferenças entre indenização e receita e afastando deste último conceito, para que não
pairem quaisquer dúvidas, inclusive as indenizações por lucros cessantes:
Assim, não é preciso maior esforço para responder, por exemplo, que não é receita o valor recebido de uma companhia de seguros pela ocorrência do evento previsto em contrato típico, ainda que a reparação patrimonial cogitada corresponda à cláusula de cobertura por lucros cessantes. Até possível, na hipótese, questionamento acerca de estar-se, ou não, diante de materialidade envolvida pelo conceito de renda, ante a existência de acréscimo patrimonial pelo ingresso tardio dos lucros frustrados em tempo anterior, em razão de acontecimento para o qual não concorreu a empresa beneficiária, mas nem assim tal ingresso reuniria condições para ser qualificado como receita, por lhe faltar o atributo da atividade empresarial.158
Com efeito, embora as indenizações por lucros cessantes possam receber
tratamento distinto no âmbito do imposto sobre a renda e da contribuição social sobre o
lucro, não cabem na moldura de “receitas” para fins de tributação autônoma, pois não
decorrem da atividade econômica da empresa.
Assim também concluiu SOLON SEHN:
Parece bastante claro, portanto, que em ambas as modalidades de seguro – de danos e de responsabilidade civil – não há que se falar em incidência do PIS/Pasep e da Cofins. A indenização do seguro em hipótese alguma pode ser qualificada juridicamente como receita da pessoa jurídica, porque não representa acréscimo patrimonial. Como a indenização sempre corresponde ao valor efetivo dos bens, a situação patrimonial da pessoa jurídica, antes e depois do sinistro, é rigorosamente a mesma, nomeadamente em se tratando de bens que já
157 MELO, José Eduardo Soares de; MELO, Márcia Soares de. Regime Tributário das Indenizações. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2000, p. 209.
158 MINATEL, José Antonio. Conteúdo Jurídico do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP, 2005, p. 119-120. A distinção entre indenização e receita é esmiuçada, ainda, pelo Autor, no seguinte trecho encontrado à p. 121: “Voltando os olhos para o cotejo idealizado no presente tópico, entendemos haver notória contradição em se afirmar que determinado ingresso tem natureza de receita, ao mesmo tempo em que se lhe atribui natureza de indenização. São materialidades dependentes de causas jurídicas inconciliáveis: na primeira, a causa deve ser negócio jurídico em que está presente a vontade, o esforço interno na busca do ingresso externo remunerador da atividade empresarial, a busca da contrapartida pela transferência voluntária e onerosa de direitos; na última, o ingresso vem como reparação material ou de encargos, não tem o negócio jurídico como causa, não decorre de qualquer atividade, nem mesmo da vontade. Portanto, os conceitos são excludentes e contraditórios, na medida em que a confirmação da natureza de um implica na necessária negativa de igual qualificação de outro”.
115
integraram o patrimônio da empresa, como mercadorias em estoques, veículos, equipamentos ou o bem imóvel em que a mesma encontra-se localizada.159
Por tudo isso é importante ter em mente que, a despeito de o termo “receita”
ser utilizado em diferentes contextos, com acepções distintas, deve ser entendido, para
fim de incidência tributária autônoma, de forma a demonstrar verdadeira manifestação
de riqueza, devendo consistir em ingresso definitivo, positivo e real no patrimônio,
decorrente do exercício da atividade empresarial. Da adoção dessa definição decorre a
consequência lógica da inviabilidade de caracterização das indenizações de seguro
como tal, qualquer que seja a sua natureza.
Assim, não caracterizam receita e, por conseguinte, não se sujeitam à
incidência da contribuição ao PIS e da COFINS, as indenizações pagas em decorrência
de seguro de dano (material ou imaterial), por lucros cessantes, ou mesmo o pagamento
de capital segurado, quando se tratar de apólice de seguro de pessoas.
3.5.4.1 Jurisprudência do CARF e da CSRF
A despeito das premissas acima explicitadas, fortemente apoiadas pela
Doutrina mais abalizada, as autoridades fiscais federais costumam adotar inteligência
diversa, entendendo que as indenizações de seguro têm natureza de receita para fins de
incidência da contribuição ao PIS e da COFINS. Veja-se, nesse sentido, a resposta dada
no Processo de Consulta nº 81/07 – SRRF / 7ª RF:
ASSUNTO: Contribuição para o PIS/Pasep EMENTA: INDENIZAÇÃO DE SEGUROS. BASE DE CÁLCULO. INCLUSÃO. Integra a receita bruta para efeito de cálculo do PIS/Pasep o valor recebido, pela Pessoa Jurídica, a título de indenização de seguro pela perda ou sinistro de seus bens do Ativo Permanente e do Circulante. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.718, de 1998, artigos 2º e 3º, Parágrafos 1º e 2º, incisos I/IV. ASSUNTO: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins EMENTA: INDENIZAÇÃO DE SEGUROS. BASE DE CÁLCULO. INCLUSÃO. Integra a receita bruta para efeito de cálculo da Cofins o valor recebido, pela Pessoa Jurídica, a título de indenização de seguro
159 SEHN, Solon. Não-Incidência do PIS/Pasep e da Cofins sobre Reembolsos e Indenizações. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 162, mar. 2009, p. 68.
116
pela perda ou sinistro de seus bens do Ativo Permanente e do Circulante. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 9.718, de 1998, artigos 2º e 3º, Parágrafos 1º e 2º, incisos I/IV. ELIANA POLO PEREIRA Chefe.160
Seguindo essa mesma linha, o CARF sustentou por muito tempo que
“integra a receita bruta para efeito de cálculo da contribuição [PIS e Cofins] o valor
recebido por pessoa jurídica a título de indenização de sinistro por roubo de mercadoria
destinada à exportação”161.
No voto do Relator desse acórdão, contudo, fica claro que a conclusão a que
chegou decorre do vício, muito comum no aplicador da lei, de interpretar supostamente
de forma literal o dispositivo constante da legislação dessas contribuições, segundo o
qual compõem a receita bruta todas aquelas auferidas pela pessoa jurídica, sendo
irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para
as receitas162.
160 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 7ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 81, de 7 de agosto de 2013. Chefe: Eliana Polo Pereira. Julgamento: 19 mar. 2007. Publicação: 29 maio 2007.
161 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Contribuintes. Acórdão nº 3402-001.660. Processo n° 16366.001208/2007-11. Recurso: Voluntário. Relator: Gilson Macedo Rosenburg Filho. Julgamento: 14 fev. 2012. Órgão Julgador: Quarta Câmara / Segunda Turma Ordinária / Terceira Seção. Publicação: DOU, 26 jun. 2012: “ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP. Ementa:
DESPESAS COM SEGUROS PARA ARMAZENAGEM DO PRODUTO. NÃO CUMULATIVIDADE. INSUMOS.
Os custos com a taxa de seguro decorrentes das despesas de armazenagem geram créditos dedutíveis do PIS e da Cofins não-cumulativos, desde que suportados pelo adquirente.
INDENIZAÇÃO DE SEGURO. BASE DE CÁLCULO. Integra a receita bruta para efeito de cálculo da contribuição o valor recebido por pessoa jurídica a
título de indenização de sinistro por roubo de mercadoria destinada à exportação. NÃO CUMULATIVIDADE. RESSARCIMENTO DE SALDO CREDOR. ATUALIZAÇÃO
MONETÁRIA E JUROS. O artigo 15, combinado com o artigo 13, ambos da Lei nº 10.833, de 2003, vedam expressamente a
aplicação de qualquer índice de atualização monetária ou de juros para este tipo de ressarcimento”. 162 Trecho do voto do Relator: “BASE DE CÁLCULO – INDENIZAÇÃO DE SEGURO. Quanto a essa
matéria, entendo que a primeira instância julgou acertadamente o assunto. Devendo ser mantido pelos seus próprios fundamentos, como se segue: A contribuinte insurge-se também, contra a inclusão na base cálculo da contribuição da indenização de seguro obtida referente a sinistro ocorrido com mercadoria destinada à exportação, entendendo não fazer parte do seu faturamento, que é a renda obtida das vendas de mercadorias e serviços. Sobre o assunto, vale lembrar que a Lei n°10.637/2002 ao instituir a incidência não-cumulativa da Cofins. definiu a base de cálculo da contribuição nos moldes constantes da Lei nº 9.718/98, sendo bastante claro o texto legal em determinar que as contribuições para a Cofins serão calculadas com base no faturamento da empresa, que corresponde a receita bruta; entendendo-se por receita bruta a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas. Enquanto o art. 1º §1º da Lei nº 10.637/2002 exprime o caráter bastante amplo da incidência da Cofins. passando a adotar uma base universal para efeitos de exigência dessas contribuições, abrangendo, em princípio, todas as receitas da empresa receita bruta, o § 3º do mesmo artigo delimita as exclusões da base de cálculo de forma
117
Com efeito, todas as “receitas” auferidas pelas pessoas jurídicas se sujeitam
à incidência do PIS e da COFINS, mormente quando submetidas à sistemática não-
cumulativa das Leis nº 10.637/03 e 10.833/04 (já que, sob a égide da Lei nº 9.718/98, as
contribuições só incidem sobre o faturamento, ou seja, receitas decorrentes da venda de
mercadorias ou da prestação de serviços).
Todavia, para que um ingresso qualquer seja tributável é imprescindível que
se enquadre no conceito de “receita”, o qual, como visto, não abarca, absolutamente,
toda e qualquer entrada identificada no patrimônio da pessoa jurídica. Esses ingressos
podem ser considerados “receitas” para fins societários e contábeis (apuração do
resultado) e até mesmo de incidência do imposto sobre a renda (apuração do lucro).
Contudo, para fins de incidência tributária autônoma (PIS e COFINS) é necessário que
se caracterizem como “disponibilidade de ingresso financeiro proveniente de operações
praticadas no exercício da atividade empresarial, seja pela venda de mercadorias ou de
serviços, seja pela cessão onerosa e temporária de direitos”163. Deve-se estar diante,
estreita, quase residual. Assim, as espécies de receitas não alcançadas pela contribuição, estão assim definidas: § 3º Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo as receitas: I decorrentes de saídas isentas da contribuição ou sujeitas à alíquota zero; II (VETADO) III auferidas pela pessoa jurídica revendedora, na revenda de mercadorias em relação às quais a contribuição seja exigida da empresa vendedora, na condição de substituta tributária; IV de venda dos produtos de que tratam as Leis n 9.990, de 21 de julho de 2000, nº 10.147, de 21 de dezembro de 2000, ou quaisquer outras submetidas à incidência monofásica da contribuição; IV de venda de álcool para fins carburantes; (Redação dada pela Lei 10.865, de 2004) (Vide Medida Provisória n° 413, de 3 de janeiro de 2008). V referentes a: a) vendas canceladas e aos descontos incondicionais concedidos; b) reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como perda, que não representem ingresso de novas receitas, o resultado positivo da avaliação de investimentos pelo valor do patrimônio líquido e os lucros e dividendos derivados de investimentos avaliados pelo custo de aquisição, que tenham sido computados como receita. VI- não operacionais, decorrentes da venda de ativo imobilizado. (Incluído pela Lei n°10.684, de 30.5.2003) Por conseguinte, as verbas que não se encontram no rol taxativo das exclusões constantes do § 3º do art. 1º da Lei nº 10.637/2002, devem compor a base de cálculo da contribuição. Neste sentido, ou seja por falta de previsão legal que permita a exclusão da base de cálculo, também é devida a tributação dos valores lançados a título de indenização de seguros. Desse modo, não importando as classificações contábeis adotadas pela empresa, as quais não têm o condão de elidir a ocorrência do fato gerador, os ingressos de valores na empresa compõem a base de cálculo do PIS, por expressa determinação legal, sendo inócua as indagações sobre os aspectos legais e constitucionais, pois questões que versem acerca destes temas não podem ser apreciadas no âmbito deste julgado, por tratar- se claramente de discussão deferida ao Poder Judiciário. Como já mencionado a decisão da DRJ foi objetiva quanto a esse assunto, sabemos que exclusão na base de cálculo de tributos deve ser prevista em lei complementar específica, o que não ocorreu no caso em análise. Neste contexto, mantenho as receitas com indenização de seguros na base de cálculo da exação por falta de previsão legal para sua exclusão” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Contribuintes. Acórdão nº 3402-001.660. Processo n° 16366.001208/2007-11. Recurso: Voluntário. Relator: Gilson Macedo Rosenburg Filho. Julgamento: 14 fev. 2012. Órgão Julgador: Quarta Câmara / Segunda Turma Ordinária / Terceira Seção. Publicação: DOU, 26 jun. 2012).
163 MINATEL, José Antonio. Conteúdo Jurídico do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP, 2005, p. 252-253.
118
portanto, de ingresso positivo e definitivo no patrimônio da pessoa jurídica, decorrente
da utilização de sua capacidade empresarial.
Daí porque acertado o Acórdão 02-03.758, proferido em 11.02.2009 pela
Câmara Superior de Recursos Fiscais164, no qual se concluiu que as indenizações de
seguro não podem ser classificadas como “receita” e, portanto, não se sujeitam à
incidência das contribuições em foco:
PIS. BASE DE CÁLCULO. A base de cálculo das contribuições para o PIS e a Cofins é o faturamento, assim compreendido a receita bruta da venda de mercadorias, de serviços e mercadorias e serviços, afastado o disposto no § 1° do art. 3° da Lei n° 9.718/98 por sentença proferida pelo plenário do Supremo Tribunal Federal em 09/11/2005, transitada em julgado em 29/09/2006. BASE DE CÁLCULO. RECEITA CRÉDITO DO ICMS. O crédito do ICMS registrado extemporaneamente não representa receita, não integrando a base de cálculo do PIS. BASE DE CÁLCULO. INDENIZAÇÃO DE SEGUROS. O recebimento de indenização de seguro não representa ingresso de receita, não integrando a base de cálculo do PIS. Recursos especiais do Procurador negado e do Contribuinte provido.
Deve ser realçado que, em seu voto, a Relatora MARIA TEREZA MARTÍNEZ
LÓPEZ deixa claro que, mesmo não se tratando da base de cálculo mais restrita da Lei nº
9.718/98 (exclusivamente o “faturamento” após a declaração da inconstitucionalidade
do § 1º do seu artigo 3º), de qualquer modo não seria possível caracterizar indenização
de seguro como receita:
Assim, claro está que o crédito de ICMS gerado por um contribuinte não é receita, e nem pode ser equiparado a tal eis que tem natureza meramente contábil, razão porque não devem ser incluídas na base de cálculo da contribuição. Melhor sorte não resta à tese da Procuradoria relativamente às indenizações de seguros recebidas pela contribuinte. Os valores recebidos a título de indenização de seguros correspondem a recuperação de custos da contribuinte. São valores recebidos esporadicamente em contrapartida a uma perda patrimonial não se configurando como receita.165
Interessante notar a distinção feita pela Conselheira entre o conceito de
receita para finalidade “meramente contábil” daquele utilizado para fins de incidência
164 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 02-03.758. Processo n° 13936.000173/00-10. Recurso nº 201-122.666, especial do Procurador e do Contribuinte. Matéria: PIS. Relatora: Maria Tereza Martínez Lopez. Julgamento: 11 fev. 2009. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DOU, 11 fev. 2009.
165 Ibid.
119
do PIS e da COFINS, evidenciando que, mesmo para os tribunais administrativos, nem
todos os ingressos considerados para fins contábeis devem ser considerados como base
de cálculo daquelas contribuições.
Posteriormente, a orientação da Câmara Superior de Recursos Fiscais
passou a ser seguida pelas câmaras baixas do CARF, como exemplificam os Acórdãos
330200.860 e 330200.858, da 3ª Câmara / 2ª Turma Ordinária, de 01.03.2011. Em
ambos decidiu-se que, “tratando-se de ingressos eventuais relativos a recuperação de
valores que integram o ativo, não se pode considerar as indenizações de seguros ora
discutidas como receitas para fins de incidência da contribuição em comento”,
afastando-se a incidência do PIS e da COFINS.
Não identificamos, no âmbito dos Tribunais Superiores, julgados
específicos a respeito dessa matéria. De todo modo, parece-nos, pelo exposto, ser
irretocável o atual posicionamento do CARF sobre a matéria, influenciado pelo
retrocitado acórdão da CSRF, que esclareceu qualquer dúvida possível em relação ao
não enquadramento das indenizações de seguro como receitas das pessoas jurídicas e,
consequentemente, a não incidência da contribuição ao PIS e da COFINS.
120
4 TRIBUTAÇÃO DAS SEGURADORAS E RESSEGURADORAS
4.1 Definição dos conceitos de Seguradora e Resseguradora
O contrato de seguro, de acordo com o Código Civil, deve obrigatoriamente,
ter como parte uma seguradora, definida como pessoa jurídica, constituída sob a forma
de sociedade anônima e autorizada a funcionar como tal pelo órgão regulador (arts. 72,
73 e 74 do DL no 73/1966).166 Ao ser tratado dessa forma, o seguro se configura como o
único contrato exclusivamente “empresarial” previsto no Código Civil.
É, portanto, característica essencial da norma geral e abstrata central do
contrato de seguro ter uma seguradora no polo passivo da relação jurídica prescrita em
seu consequente. Isso decorre do fato de se entender, hoje, que, dada a sua
complexidade, a atividade securitária só pode ser exercida por empresas de alta
qualificação técnica, com atividade exclusiva no ramo de seguros, e submetidas a
regulação específica e fiscalização do órgão regulador estatal167.
Nem sempre foi assim. Nos seus primórdios, a atividade seguradora era
considerada jogo, fundava-se no elemento álea (dado de jogar, em latim), ou seja, sorte,
e não tinha bases técnicas. Existiam, inclusive, seguradores individuais (isto é, não
constituídos sob a forma de empresa), o que hoje se considera um anacronismo, embora
na Inglaterra ainda sejam admitidos.
166 Código Civil – “Art. 757. Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada”.
Decreto-Lei nº 73/66 – “Art. 72. As Sociedades Seguradoras serão reguladas pela legislação geral no que lhes fôr aplicável e, em especial, pelas disposições do presente decreto-lei.
Parágrafo único. Aplicam-se às sociedades seguradoras o disposto no art. 25 da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, com a redação que lhe dá o art. 1º desta lei. (Incluído pela Lei nº 5.710, de 1971)
Art. 73. As Sociedades Seguradoras não poderão explorar qualquer outro ramo de comércio ou indústria.
Art. 74. A autorização para funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comércio, mediante requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por intermédio da SUSEP”. (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: DOU, 11 jan. 2002).
167 Como explica BURANELLO, “em virtude do grande interesse público em torno do negócio de seguro e da enorme influência que exerce sobre a economia nacional, as empresas seguradoras estão sujeitas a controle estatal rigoroso, presente sobre suas operações, no Brasil e em toda parte, inclusive nos países considerados pilares da livre iniciativa, especialmente os Estados Unidos, a Inglaterra e a França” (BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 32).
121
Atualmente, reputa-se essencial à atividade securitária a chamada
“empresarialidade”, que na lição de TZIRULNIK consiste no
[…] exercício sistemático da atividade, a uniformização ou homogeneidade das garantias, uma grande massa de negócios e a constante formação de provisões ou reservas adequadas para a preservação dos interesses da coletividade de economias individuais.168
A empresarialidade é imprescindível à segurança dessa atividade, pois as
seguradoras administram vultosos fundos comuns (ou fundos de poupança coletiva),
constituídos pela multiplicidade de contribuições proporcionais (prêmios) entregues por
cada uma das economias individuais (segurados, estipulantes). A gestão dessa poupança
tem como finalidade garantir, após um período geralmente longo, interesses
predeterminados expostos a certos riscos. Essa gestão complexa e de longo prazo exige,
portanto, alta especialização, responsabilidade e fiscalização estatal.
Quanto à descrição da atividade desempenhada pelas seguradoras, é precisa
a observação de BURANELLO:
A atividade desenvolvida pelas seguradoras consiste em estimar, mediante cálculos atuariais, a probabilidade da ocorrência de certo fato, normalmente um evento de consequências danosas para os envolvidos. De posse desses cálculos, a seguradora procura aceitar a cobertura dos riscos em questão, contra o pagamento do prêmio. Com o produto do prêmio que recebe de seus segurados, se corretos os cálculos atuariais que realizou, a seguradora não só disporá dos recursos necessários ao pagamento das prestações devidas, em razão dos eventos segurados que se verificarem, como também cobrirá as despesas administrativas e operacionais relacionadas ao seu funcionamento, e obterá lucro.169
SOUZA também descreve de modo elucidativo o papel exercido por essas
empresas:
Internamente, as seguradoras têm duas importantes funções: a primeira delas é a atividade operacional propriamente dita, conhecida também como underwriting; e a outra denominada financeira ou patrimonial, decorrente do processo de gestão dos recursos arrecadados. O ciclo completo compreende o oferecimento da proposta pelos corretores, a análise da proposta recebida, a aceitação do risco,
168 TZIRULNIK, Ernesto; CAVALCANTI, Flávio de Queiroz; PIMENTEL, Ayrton. O Contrato de Seguro de acordo com o novo Código Civil Brasileiro, 2. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 40.
169 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 121.
122
envolvendo todos os cálculos atuariais e inspeções técnicas, a emissão da apólice, o recebimento do prêmio, considerando-se todos os procedimentos administrativos de aplicação do percentual do prêmio no mercado financeiro e do cálculo de reservas técnicas, e finalmente, quando ocorre o sinistro, o pagamento da indenização devida ao segurado.170
Para fazer frente à obrigação assumida perante o sujeito ativo do contrato –
o segurado –, de oferecer cobertura para pagar indenização do dano na hipótese de
ocorrência do sinistro predeterminado, as seguradoras são obrigadas a constituir as
chamadas provisões ou reservas técnicas. De acordo com o artigo 84 do Decreto Lei no
73/66 que, com status de lei complementar, regula a atividade securitária, “para garantia
de todas as suas obrigações, as Sociedades Seguradoras constituirão reservas técnicas,
fundos especiais e provisões, de conformidade com os critérios fixados pelo CNSP,
além das reservas e fundos determinados em leis especiais”.
De fato, como afirma SOUZA, “as provisões técnicas são as maiores
obrigações de uma companhia de seguros: as quais representam prêmios ainda não
ganhos (receita de exercícios futuros) e perdas ainda não indenizadas”171.
Quando se diz que as provisões técnicas correspondem a prêmios não
ganhos e perdas não indenizadas, o que se quer afirmar é que, quando as seguradoras
recebem o montante do prêmio, parte daqueles ingressos não consiste, ainda, em receita
definitiva. Por um lado, parte dos valores recebidos como prêmio corresponde a receitas
de períodos futuros (caso a cobertura concedida se estenda por mais de um exercício).
Por outro, parte dos valores recebidos, estabelecida mediante cálculos atuariais levados
a efeito pela seguradora, deve ser reservada para pagamento de indenizações, caso os
sinistros cobertos venham a ocorrer durante o período da cobertura.
Conclui-se, por conseguinte, que as seguradoras são entidades
especialmente constituídas para a atividade de seguros, sob a forma de sociedades
anônimas, sujeitas à regulação e à fiscalização estatal, e que têm como finalidade dar
garantia aos segurados de cobertura dos danos derivados de sinistros predeterminados
em seus contratos. Para isso, precisam constituir reservas obrigatórias, previstas em lei e
na regulação, as quais têm de ser geridas e investidas durante períodos geralmente
longos, para que garantam o cumprimento de suas obrigações.
170 DE SOUZA, Silney. Seguros: contabilidade, atuária e auditoria. 2. ed. rev. e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 83.
171 Ibid., p. 94.
123
Já as resseguradoras ocupam o mesmo papel das seguradoras no contrato de
resseguro, que não está previsto no Código Civil. Todavia, como o resseguro é nada
mais que “seguro do seguro”, está implícito que só pode ter como parte contratada uma
resseguradora. Tanto é assim que a Lei Complementar no 126/2007, que rege a matéria,
estabeleceu em seu artigo 5o aplicar-se aos resseguradores locais, observadas as
peculiaridades técnicas, contratuais, operacionais e de risco da atividade e as
disposições do órgão regulador de seguros, o Decreto-Lei no 73, de 21 de novembro de
1966, e as demais leis aplicáveis às sociedades seguradoras, inclusive as que se referem
à intervenção e liquidação de empresas, mandato e responsabilidade de administradores;
e as regras estabelecidas para as sociedades seguradoras.
É possível, atualmente, nos termos do artigo 4o da Lei Complementar no
126/2007, a contratação de resseguro com resseguradora local, eventual ou admitida.
Resseguradora local é aquela sediada no País, constituída como sociedade anônima,
tendo por objeto exclusivo a realização de operações de resseguro e retrocessão (seguro
do resseguro). Já as resseguradoras eventuais e admitidas são domiciliadas no exterior,
com escritório de representação no País (eventual) ou sem (admitida).
Somente a resseguradora local é uma pessoa jurídica constituída no País,
sujeita à apuração de tributos como as demais empresas brasileiras. Em consequência,
quando abordarmos o tratamento tributário dado às seguradoras e resseguradoras,
estaremos falando das resseguradoras locais. Os aspectos relacionados à tributação dos
resseguradores eventuais e admitidos só serão examinados quando estiver em foco a
tributação da remessa, para o exterior, de prêmios de resseguro.
As especificidades das seguradoras e resseguradoras locais, acima
comentadas, devem ser levadas em consideração, necessariamente, pelo Direito
Tributário, a fim de que este não desvirtue os fins da atividade securitária, os quais,
como visto, são considerados importantes para o atendimento das finalidades
constitucionais do Estado.
4.2 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário
Como antes assinalado, a atividade das seguradoras e resseguradoras é
bastante peculiar. Em razão disso, suas especificidades precisam ser levadas em conta
124
pelo Direito Tributário, a fim de que as regras exacionais estabelecidas não contrariem
princípios próprios da atividade securitária, nem princípios tributários como o da
capacidade contributiva. Por essa razão, é comum que a legislação tributária preveja
regimes jurídicos especiais para essas empresas.
Já tratamos, até aqui, da característica da operação securitária de acumular
recursos para futuro pagamento de indenização de sinistro. A seguradora ou
resseguradora se obriga, perante o segurado ou ressegurado, a garantir a cobertura do
sinistro, não a dar nem a fazer. Garante ao contratante que seu risco será coberto, e que
será indenizado caso ocorra. Para isso, precisa realizar complexos cálculos atuariais e
entesourar os recursos necessários para o pagamento das indenizações calculadas até o
fim dos contratos de seguro. Trata-se da chamada “constituição de reservas técnicas”.
Essas reservas técnicas precisam ser constituídas não apenas por exigência ontológica
da atividade, mas também por obrigação legal e regulatória imposta às seguradoras e
resseguradoras.
Sobre a obrigatoriedade legal e a importância da constituição das reservas
técnicas pelas seguradoras, escreve BURANELLO:
No direito vigente no Brasil, o instrumento destinado a conferir aos segurados a garantia de solvabilidade das seguradoras é a denominada reserva técnica. Atendendo a limites e critérios fixados pelo Conselho Nacional de Seguros Privados, cada companhia seguradora é obrigada a manter parcela de seu patrimônio imobilizado. Para onerar ou alienar bens da reserva técnica, a seguradora precisa de específica e prévia autorização da Superintendência de Seguros Privados, autarquia responsável pela fiscalização da atividade securitária. É, aliás, crime contra a economia popular a ação ou omissão de que decorra insuficiência das reservas técnicas, fundos ou provisões legais ou regulamentares (arts. 84, 85 e 110 do DL no 73/1966).172
As seguradoras são, portanto, obrigadas a manter parte de seu patrimônio
imobilizado como garantia de solvabilidade, isto é, como garantia de que disporá de
recursos para arcar com todas as indenizações de sinistro que vier a ter de pagar. É o
interesse da coletividade, e não das seguradoras, que a constituição de reservas técnicas
visa proteger.
Sobre a natureza das reservas técnicas e o interesse protegido, lapidar a
explicação de J. J. CALMON DE PASSOS:
172 BURANELLO, Renato Macedo. Do Contrato de Seguro – O Seguro Garantia de Obrigações Contratuais. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 126.
125
A nossa Constituição Federal aponta, em vários de seus dispositivos, para essa compreensão. Coloca no âmbito do sistema financeiro nacional as empresas de seguro, dizendo a Lei Maior que este sistema é estruturado para servir aos interesses da coletividade (art. 192, caput e inciso II) reservando-se, com exclusividade, para a União, a competência legislativa sobre a matéria (art. 22,VII). Essa perspectiva conduz ao entendimento necessário de que todo aporte financeiro atribuído pelo segurado à seguradora com que contrata, intitulado de prêmio, é, em verdade parcela que, integrada a outras, constitui um fundo comum de propriedade e destinação comunitária ou coletiva de todos os segurados. Dessa universalidade apenas são extraídos os valores indispensáveis para sua administração, que inclui a justa retribuição do empreendedor, tudo isso regulado por disposições legais de natureza cogente objetivando, precisamente, acentuar e resguardar a propriedade coletiva desse patrimônio e sua destinação social e específica Decorrência disso é a exigência legal de serem instituídas reservas técnicas, mediante as quais se dá ao sistema, como um todo, a estabilidade e segurança de que necessariamente se deve revestir. Vistos tais recursos com o caráter de patrimônio coletivo, público não estatal, configuram o que poderemos chamar de uma universalidade de interesses que se transindividualizam por força de sua destinação, ainda quando diferentes dos que têm uma abrangência universal e derivam da própria natureza das coisas173.
Do esclarecimento de CALMON DE PASSOS, conclui-se que apenas uma
pequena parcela dos valores recebidos pelas seguradoras se integra, imediatamente, ao
seu patrimônio, correspondendo à retribuição direta pela contratação do seguro. Todo o
saldo servirá para a constituição de reservas técnicas cogentes, necessárias para garantir
a cobertura do risco, assegurando direitos coletivos chamados pelo autor de
“transidividuais”, por consistirem numa universalidade de interesses.
Tendo presentes as peculiaridades acima comentadas, passemos à análise
das incidências tributárias sobre os prêmios recebidos pelas seguradoras e sobre o seu
lucro.
173 PASSOS, J. J. Calmon de. O risco na sociedade moderna e seus reflexos na teoria da responsabilidade civil e na natureza jurídica do contrato de seguro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador: CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, n. 5, p. 1-7, ago. 2001, p. 3.
126
4.3 PIS e COFINS devidos pelas Seguradoras e Resseguradoras – Hipótese de
não-incidência tributária
4.3.1 Legislação aplicável
Seguradoras e resseguradoras estão sujeitas à incidência cumulativa do PIS
e da COFINS, cujas regras se encontram, basicamente, na Lei nº 9.718/98. Foram
expressamente excluídas da sistemática não-cumulativa pelo artigo 10º da Lei nº
10.833/03, que manteve nesse regime as pessoas jurídicas referidas nos artigos §§ 6o, 8o
e 9o do art. 3o da Lei nº 9.718/98, a saber: instituições financeiras, seguradoras e
entidades de previdência privada.
Assim, as seguradoras (e as resseguradoras, a quem se aplicam as mesmas
regras tributárias) ficaram submetidas às regras de PIS e COFINS previstas na Lei nº
9.718/98, que a tal respeito dispõem:
Art. 2º As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento, observadas a legislação vigente e as alterações introduzidas por esta Lei. Art. 3º O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. § 5º Na hipótese das pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, serão admitidas, para os efeitos da COFINS, as mesmas exclusões e deduções facultadas para fins de determinação da base de cálculo da contribuição para o PIS/PASEP. § 6º Na determinação da base de cálculo das contribuições para o PIS/PASEP e COFINS, as pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, além das exclusões e deduções mencionadas no § 5º, poderão excluir ou deduzir: […] II - no caso de empresas de seguros privados, o valor referente às indenizações correspondentes aos sinistros ocorridos, efetivamente pago, deduzido das importâncias recebidas a título de cosseguro e resseguro, salvados e outros ressarcimentos. (Incluído pela Medida Provisória nº 2158-35, de 2001).174
As deduções mencionadas no § 5º, referentes ao PIS/PASEP e que também
se aplicam à COFINS, consistem na previsão, pelo artigo 1º IV, da Lei nº 9.701/98, de
que as empresas de seguros privados poderão efetuar, mensalmente, as seguintes
exclusões ou deduções da receita bruta operacional:
174 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Altera a Legislação Tributária Federal. Brasília: DOU, 28 nov. 1998.
127
(i) cosseguro e resseguro cedidos;
(ii) valores referentes a cancelamentos e restituições de prêmios que
houverem sido computados como receitas; e
(iii) a parcela dos prêmios destinada à constituição de provisões ou
reservas técnicas.
O inciso II do § 6º, da Lei nº 9.718/98, acima transcrito, contemplou mais
uma dedução específica para seguradoras, correspondente ao
(iv) valor referente às indenizações correspondentes aos sinistros
ocorridos, efetivamente pago, deduzido das importâncias recebidas a
título de cosseguro e resseguro, salvados e outros ressarcimentos.
À primeira vista, poder-se-ia concluir que a sistemática de PIS e COFINS,
que a legislação ordinária prevê para as seguradoras seria bastante generosa, na medida
em que, se de um lado todos os ingressos em seu patrimônio são considerados
tributáveis, de outro podem ser deduzidos, na apuração da base de cálculo dessas
contribuições, todos os valores destinados à constituição de provisões ou reservas
técnicas, prêmios cancelados ou restituídos, cosseguro e resseguro cedidos (onde se
podem considerar incluídas também as retrocessões feitas por resseguradoras), assim
como o valor das indenizações pagas, deduzidas dos valores recebidos como cosseguro,
resseguro, salvados e outros ressarcimentos.
É possível esperar, com essa sistemática, que ao final, o que se tenha seja a
tributação, como receita, apenas da parcela dos ingressos que efetivamente vai aderir ao
patrimônio da seguradora, excluídos da incidência, em princípio adequadamente, todos
os montantes que obrigatoriamente devem ser destinados a reservas, bem como valores
repassados a resseguradoras ou aos próprios segurados a título de indenizações.
Todavia, aceitar como válida essa conclusão seria precipitado, pois, como se
pode verificar da redação atual dos artigos 2o e 3o da Lei nº 9.718/98, acima transcrito, a
base de cálculo dessas contribuições é o “faturamento”, correspondente à receita bruta
da pessoa jurídica, e é preciso avaliar se cabe qualificar como tal os valores recebidos
pelas seguradoras, seja como prêmio, seja como rendimentos de aplicações financeiras.
Para tanto, é necessário lembrar que, na redação original do artigo 3o, da Lei
nº 9.718/98 este dispositivo contemplava um parágrafo 1o que estabelecia entender-se
por receita bruta “a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo
128
irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para
as receitas”. Este parágrafo, contudo, acabou sendo revogado pela Lei nº 11.941/09,
depois de ter sido reiteradamente declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal e suspenso pelo Senado Federal, conforme será exposto a seguir, quando
analisaremos as possíveis implicações de tal fato para a análise da base de calculo do
PIS e da COFINS devidos por seguradoras e resseguradoras.
4.3.2 Declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º, da Lei nº 9.718/98, e
seus efeitos sobre as seguradoras e resseguradoras
O STF consagrou o entendimento de que, até a edição da Emenda 20/98, o
legislador federal só dispunha de competência para instituir, como base de cálculo das
contribuições sociais indicadas no artigo 195, “b”, o faturamento e não a receita bruta,
conceito mais abrangente, entendido como “a totalidade das receitas auferidas pela
pessoa jurídica”.
Por conseguinte, a Lei no 9.718/98 não poderia estender o conceito de
faturamento à receita bruta, sob pena de desbordar da competência tributária fixada pela
Constituição. Por esta razão, o STF declarou inconstitucional o referido parágrafo 1o do
artigo 3o, “no que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das
receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas
desenvolvida e da classificação contábil adotada”175.
175 “CONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE - ARTIGO 3º, § 1º, DA LEI Nº 9.718, DE 27 DE NOVEMBRO DE 1998 - EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1998. O sistema jurídico brasileiro não contempla a figura da constitucionalidade superveniente. TRIBUTÁRIO - INSTITUTOS - EXPRESSÕES E VOCÁBULOS - SENTIDO. A norma pedagógica do artigo 110 do Código Tributário Nacional ressalta a impossibilidade de a lei tributária alterar a definição, o conteúdo e o alcance de consagrados institutos, conceitos e formas de direito privado utilizados expressa ou implicitamente. Sobrepõe-se ao aspecto formal o princípio da realidade, considerados os elementos tributários. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - PIS - RECEITA BRUTA - NOÇÃO - INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 9.718/98. A jurisprudência do Supremo, ante a redação do artigo 195 da Carta Federal anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, consolidou-se no sentido de tomar as expressões receita bruta e faturamento como sinônimas, jungindo-as à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços. É inconstitucional o § 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98, no que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada”. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 390.840/MG. Relator: Ministro Marco Aurélio. Julgamento: 09 nov. 2005. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJ, 15 ago. 2006, v. 2242-03, p. 372).
129
Considerando tal cenário, tem-se que, para as pessoas jurídicas submetidas à
apuração do PIS e da COFINS sob a égide da Lei no 9.718/98, somente o “faturamento”
poderia ser tomado como base de cálculo. No presente trabalho, importa definir o
conceito de “faturamento”, a fim de determinar se as seguradoras e resseguradoras
recebem ingressos com tal qualificação, pois do contrário restará afastada, por
completo, a possibilidade de incidência do PIS e da COFINS sobre os valores
ingressados em seu patrimônio, que decorrem, majoritariamente, de prêmios de seguro,
resseguro, e rendimentos auferidos no mercado financeiro com o objetivo de fazer
frente a futuros pagamentos de indenização.
A dúvida é fundada, pois muito embora, ao julgar os RE 346.084 (DJ
01/09/2006 – Rel. p/ acórdão Min. MARCO AURÉLIO), 357.950, 358.273 e 390.840
(todos DJ 15.08.06 – Rel. Min. MARCO AURÉLIO), o STF tenha indicado expressamente,
nas ementas de seus acórdãos, que o “faturamento” se limita aos ingressos decorrentes
da venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços, manteve-se forte a
corrente, formada por alguns Ministros do Tribunal e outros aplicadores do Direito, em
especial o Fisco, segundo a qual se deve definir esse conceito como a “soma das receitas
oriundas do exercício das atividades empresariais”, tal como defendido pelo Min.
CÉSAR PELUSO, em seu voto vencido prolatado no RE 346.084 ( DJ 01/09/2006)176.
176 São elucidativos os comentários de Daniel Corrêa Szelbracikowski sobre a controvérsia que se instalou, no STF, após a declaração da inconstitucionalidade do § 1º do artigo 3o da Lei no 9.718/98, quanto ao conceito de faturamento:
“Dessa forma, o conceito constitucional de faturamento ficou assentado, até então, como sendo a “receita das vendas de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços”.
Apesar disso, o Exmo. Sr. Ministro Cezar Peluso, em recursos posteriores, nos quais a delimitação do conceito de faturamento era essencial à composição da lide, entendeu, monocraticamente, que faturamento tinha por significado a “receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, ou seja, soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais”.
A parte final da referida locução nitidamente ampliou o conteúdo do termo faturamento, outrora delimitado pelo Plenário do STF, pois as receitas oriundas do exercício das atividades empresariais podem superar as receitas atinentes à venda de mercadorias ou prestação de serviços. É o caso, por exemplo, da locação, instituto que não se classifica juridicamente como prestação de serviço ou compra e venda, mas pode dar ensejo a receitas oriundas das atividades empresariais.
A despeito da unilateralidade no estabelecimento desse conceito alargado, pois decorrente exclusivamente do “ponto de vista” de um dos julgadores, decisões monocráticas de outros Ministros, algumas já confirmadas pelas respectivas Turmas, utilizaram dessa definição, sempre citando o precedente do atual Presidente do STF, como se fosse aquela estabelecida pelo Plenário da Suprema Corte.
Outrossim, no julgamento da Questão de Ordem no RE 585.235 (Repercussão Geral - DJ 28.11.08 – Rel. Min. Cezar Peluso), que vislumbrou apenas reafirmar a jurisprudência do STF sobre a inconstitucionalidade do artigo 3º, parágrafo 1º da Lei 9.718/1998, também foi indevidamente inserida a locução “soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais” no conceito de faturamento.
130
Ora, prevalecendo o entendimento de que só as receitas decorrentes da
venda de bens, da prestação de serviços, ou de mercadorias e serviços podem ser
entendidas como “faturamento”, estaria afastada a incidência do PIS e da COFINS
sobre as receitas das seguradoras, pois, como já demonstrado no item 3.2 supra,
contrato de seguro – e consequentemente a respectiva contraprestação para a seguradora
– não se confunde, em absoluto, com contrato de prestação de serviços. O contrato de
seguro é típico e não contempla nem obrigação de dar – como no contrato de compra e
venda de mercadorias – nem obrigação de fazer, como no contrato de prestação de
serviços, mas sim obrigação de oferecer cobertura a riscos e, somente se e quando
ocorrido o sinistro, pagar a indenização ou a devolução do capital segurado.
Todavia, caso prevaleça o entendimento de que o “faturamento” consiste na
soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais, o PIS e a COFINS
podem incidir sobre os ingressos recebidos pelas seguradoras, observadas as exclusões
acima indicadas, previstas pelo artigo 3º, § 6º II, da Lei nº 9.718/98.
Observa-se que, no âmbito do STF, foi reconhecida a repercussão geral da
controvérsia objeto do RE 609.096 – RS, que tem como Relator o Ministro RICARDO
LEWANDOWSKI, em 03.03.2011, até o presente momento não julgada pelo Pleno, a
matéria de mérito. De qualquer modo, naquele recurso, a questão de fundo consiste na
natureza das receitas financeiras auferidas por bancos, e não exatamente das receitas de
prêmio de seguro auferidas por seguradoras, embora essas sejam equiparadas a
instituições financeiras.
O alvo da questão de ordem era legítimo: evitar a subida de recursos extraordinários sobre a controvérsia, já devidamente pacificada pelo Plenário do STF.
O objetivo, todavia, não era reabrir o debate acerca do conceito de faturamento, o que sequer seria possível, pois (i) o representativo da controvérsia pretendeu apenas reafirmar a jurisprudência, de modo que não poderia, consequentemente, modificá-la; e (ii) porque a questão relativa ao conceito de faturamento já estava afetada ao Plenário para apreciação no RE 400.479, que discute o conceito à luz das receitas das instituições financeiras e seguradoras, matéria cuja repercussão geral foi reconhecida, posteriormente, no RE 609.096 (ambos os recursos pendentes de julgamento). Realmente, não teria sentido o STF apreciar os limites do conceito de faturamento e, posteriormente, fazê-lo novamente nos RE’s 400.479 e 609.096.
A despeito disso, o acórdão proferido na QO-RE 585.235 permite a interpretação de que houve uma modificação do conceito de faturamento, até então estabelecido apenas como receita bruta da “venda de mercadorias de serviços ou de mercadorias e serviços” e não como “soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais”.
Trata-se de dúvida que poderia não existir se os Ministros da Suprema Corte evitassem transcrever, em suas decisões monocráticas, preceitos exclusivos de determinado julgador, em detrimento de conceitos estabelecidos em julgados do Plenário”. (SZELBRACIKOWSKI, Daniel Corrêa. Conceito de Faturamento causa Insegurança Jurídica. In: Conjur. Consultor Jurídico. São Paulo, 15 abr. 2011. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-abr-15/interpretacao-conceito-faturamento-ainda-gera-duvidas-stf#_ftn4_7995>. Acesso em: 24 fev. 2014).
131
A matéria específica relacionada à incidência de PIS e COFINS sobre as
receitas das seguradoras pende de julgamento, no STF, no RE 400.479, em que a
Seguros Brasil S.A. questiona a incidência das contribuições sobre o faturamento, como
um todo, das seguradoras. A empresa alega que o segmento a que pertence não
comercializa bens nem presta serviços, conforme premissa adotada no presente
trabalho. Portanto, seus ingressos não se enquadrariam no conceito de receita ou
faturamento previsto no artigo 195, inciso I, letra c, da Constituição Federal, para
sujeitar as empresas ao recolhimento do tributo.
4.3.3 Da adequada definição de faturamento e consequências para o PIS e a
COFINS das Seguradoras e Resseguradoras
Como visto linhas acima, o Supremo Tribunal Federal declarou
inconstitucional o § 1º do artigo 3º, da Lei nº 9.718/98, entendendo que este dispositivo
estendia indevidamente o alcance do conceito de “faturamento”, ao equipará-lo à
“totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica”. Entendeu o STF que tal
ampliação conceitual das bases de cálculo do PIS e da COFINS só foi permitida a partir
da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98. Ao julgar desta forma a
controvérsia, ficou consagrado que deveria prevalecer, no âmbito da Lei nº 9.718/98, a
base de cálculo do caput do artigo 3º, restrita ao conceito de faturamento anteriormente
adotado.
Ora, parece-nos claro que o conceito de faturamento vigente na legislação
tributária, à época da edição da Lei nº 9.718/98 e anteriormente à entrada em vigor da
Emenda Constitucional nº 20/98, era aquele positivado no artigo 2º da Lei
Complementar nº 70/91:
Art. 2° A contribuição de que trata o artigo anterior será de dois por cento e incidirá sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza.177
Pretender modificar esse conceito, para fazê-lo abranger a totalidade das
receitas operacionais auferidas pelas pessoas jurídicas, consiste em alteração dos efeitos
177 BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar n° 70, de 30 de dezembro de 1991. Institui contribuição para financiamento da Seguridade Social, eleva a alíquota da contribuição social sobre o lucro das instituições financeiras e dá outras providências. Brasília: DOU, 31 dez. 1991, grifamos.
132
da declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal Federal, com a
finalidade casuística de impedir que certas atividades fiquem alheias à incidência dessas
contribuições.
Estamos certos de que “faturamento” e “receita” são conceitos totalmente
distintos, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal e bem apontado pela
Doutrina mais abalizada, que pode ser representada, aqui, pelo escólio de PAULO DE
BARROS CARVALHO:
É lícito concluir, desde logo, que “receita bruta” é expressão bem mais ampla que “faturamento” A receita bruta, além de abranger o faturamento (valores percebidos em decorrência da comercialização de mercadorias ou da prestação de serviços), incorpora também todas as outras receitas da pessoa jurídica, tais como aluguéis, juros, correções monetárias, royalties, dividendos, etc. São fatos completamente distintos e inconfundíveis.178
Nesta mesma linha é a conclusão de MINATEL:
[…] pode-se afirmar que o conceito de receita tem abrangência mais elástica para incorporar outros valores além do ingresso decorrente do faturamento. Pressupõe a receita um valor qualificado como contraprestação em negócio jurídico, mas não só a venda de mercadorias e serviços, incluindo outras retribuições pelo exercício da atividade; compreende a remuneração de esforço, físico ou intelectual, ou mesmo a retribuição pelo conjunto de direito onerosamente cedidos a terceiros. Nesse sentido, é possível afirmar sem qualquer temor, que o conteúdo semântico emprestado ao vocábulo faturamento, como contrapartida decorrente de ingressos de efetivas operações de vendas de mercadorias e serviços, encaixa-se no conceito de receita, mas a recíproca nem sempre é verdadeira.179
A preocupação de evitar que certos setores da economia se furtem à
incidência de tributos, gerando situação anti-isonômica, tem fundamento. Contudo,
quando verificada tal situação, cabe ao legislador corrigi-la, se dispuser de competência
para tanto, mediante a instituição de regra-matriz de incidência tributária que estabeleça
como base de cálculo as materialidades anteriormente deixadas fora do campo de
incidência da norma. O que não é aceitável é que o aplicador da lei adote interpretação
ampliativa da base de cálculo tributária, cujos limites já foram estabelecidos pelo
próprio Supremo Tribunal Federal (distinção entre faturamento e receita bruta que
178 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 808, grifamos.
179 MINATEL, José Antonio. Conteúdo Jurídico do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP, 2005, p. 98, grifamos.
133
implicou na declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei nº 9.718/98).
Por conseguinte, entendemos que, a partir daí a base de cálculo do PIS e da COFINS
prevista por esta lei passou a se restringir ao “faturamento”, entendido como as receitas
decorrentes da venda de bens ou da prestação de serviços. Consequentemente, como as
seguradoras e resseguradoras não têm faturamento, pois não vendem bens nem prestam
serviços, ficaram excluídas do campo de incidência dessas contribuições.
Nessa linha, vale transcrever mais uma vez observação precisa de PAULO DE
BARROS CARVALHO:
Dada a diferenciação entre faturamento e receita, é inconcebível qualquer tentativa de ampliar o conceito de faturamento a ponto de abarcar outras receitas que não as provenientes da soma dos valores das vendas de mercadorias e serviços prestados. As ideias de fatura e de faturamento são definidas, de há muito, no direito comercial e pertencem, tradicionalmente, ao patrimônio do vocabulário técnico-jurídico brasileiro. Esse é o conteúdo significativo acolhido pela Constituição ao autorizar o legislador federal a instituir contribuições sobre o faturamento. O faturamento empregado no contexto constitucional e sujeito à tributação consiste na expressão financeira indicativa da realização de operações (negócios jurídicos) de venda de mercadorias ou prestação de serviços.180
Atualmente, existe a competência constitucional para tributar a totalidade
das receitas das seguradoras e das resseguradoras. Contudo, não foi exercida pelo
legislador ordinário até o momento, uma vez que a legislação que instituiu novas regras-
matrizes de incidência tributária de PIS e COFINS, após a entrada em vigor da Emenda
Constitucional nº 20/98, estabeleceu expressamente não ser aplicável a instituições
financeiras, inclusive seguradoras e resseguradoras.
4.3.4 Prêmio versus receita
Considerando o cenário jurídico vigente, entendemos que as seguradoras e
resseguradoras não estão sujeitas à incidência do PIS e da COFINS sobre a remuneração
que recebem de segurados e ressegurados (prêmio de seguro e resseguro), pois foram
excluídas da sistemática não-cumulativa veiculada pelas Leis nº 10.637/03 e 10.833/04,
180 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 808-809.
134
sujeitando-se às normas da Lei nº 9.718/98, as quais, por sua vez, contemplam como
base de cálculo dessas contribuições apenas o “faturamento”.
Tal cenário só poderia ser alterado se o legislador ordinário federal criasse
nova regra-matriz de incidência tributária de contribuições sociais, e escolhesse como
base de cálculo a totalidade das receitas auferidas pelas seguradoras e resseguradoras, o
que se tornou possível após a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98.
Isto posto, surge a possibilidade de indagar se os ingressos em questão –
prêmios – recebidos por seguradoras e resseguradoras, poderiam enquadrar-se no
conceito de “receita”, para servir como base de cálculo de contribuições sociais.
No item 3.6.4, empreendemos análise cuidadosa do conceito de “receita”,
com o objetivo de investigar a possibilidade de caracterização da indenização de seguro
como tal, e chegamos a resposta negativa. Fundados na melhor Doutrina, concluímos
que, para fins de incidência autônoma de contribuições sociais, a “receita” deve
necessariamente consistir em ingresso definitivo, positivo e real no patrimônio,
decorrente do exercício da atividade empresarial. Consequentemente, como a
indenização não é ingresso positivo no patrimônio, pois apenas o recompõe, e também
não decorre do exercício da atividade patrimonial, concluímos que não se caracteriza
como receita, em hipótese alguma.
Utilizando-nos, como não poderia deixar de ser, da mesma premissa adotada
no referido tópico, cabe-nos avaliar se os prêmios recebidos pelas seguradoras e
resseguradoras poderiam ser definidos como “receita”, caso uma nova legislação,
posterior à Emenda Constitucional nº 20/98, estabelecesse a incidência de PIS e
COFINS sobre a receita bruta dessas entidades.
Um dos requisitos do conceito jurídico de receita é claramente preenchido
por esses ingressos: a exigência de derivarem do exercício da atividade empresarial, ou
seja, da aplicação do patrimônio da pessoa na geração de um benefício para aquele que
paga a remuneração.
Como vimos, o preciso e exclusivo objeto das seguradoras e resseguradoras
é oferecer cobertura a riscos a que estão sujeitos os segurados e ressegurados, mediante
retribuição através de prêmios. Assim, está cumprido um dos requisitos apontados pela
Doutrina, bem definido por RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA:
135
Portanto, a receita traz consigo esta característica de ser o produto que vem de fora do patrimônio, mas que é derivado de dentro, por derivar de atos, operações ou atividades da pessoa titular do patrimônio, ou do emprego de recursos que compõem esse patrimônio, e de que resulte algum benefício para a pessoa que, em contrapartida, o remunera por isso.181
Por outro lado, também é requisito para caracterização do conceito de
“receita” que o ingresso se incorpore de modo definitivo, positivo e real ao patrimônio
da pessoa jurídica que o aufere. Daí podem surgir indagações respeitantes à
caracterização dos prêmios de seguro e resseguro como tal, uma vez que,
contemporaneamente ao recebimento do prêmio, surgem obrigações para a
seguradora/resseguradora, em especial aquela consistente na necessária constituição de
vultosas reservas técnicas e na contratação de resseguro ou retrocessão, caso os riscos
cobertos sejam excessivos em relação ao seu patrimônio.
Ora, como afirma RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA, ao tratar do conceito de
receita:
[…] o preço de venda é receita porque se trata de um tipo de ingresso ou entrada no patrimônio do vendedor que se integra a ele sem reserva, condição ou compromisso no respectivo passivo, acrescendo-o como elemento novo e positivo, passando a pertencer ao vendedor com sentido de permanência, remunerando a sua atividade, provindo de outro patrimônio para se constituir em propriedade da empresa pelo exercício de atividade que constitui sua fonte de resultado, exprimindo a sua capacidade contributiva e modificando seu patrimônio, para incrementá-lo.182
No caso dos prêmios recebidos pelas seguradoras e resseguradoras, não se
verifica essa integração imediata da totalidade dos ingressos ao seu patrimônio, pois a
própria lei e a regulação aplicável obrigam à constituição – no passivo – de reservas
vultosas e suficientes para fazer frente às suas obrigações futuras. As seguradoras e
resseguradoras também são obrigadas a contratar resseguro e retrocessão, para garantir
riscos excessivos assumidos em relação ao seu patrimônio.
Daí ser possível dizer, de antemão, que apenas parte dos prêmios recebidos
pode entender-se como receita, tendo cabimento a exclusão dos valores que,
sabidamente, não deverão aderir de imediato ao seu patrimônio. Não por outra razão,
181 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 106.
182 Ibid., loc. cit.
136
aliás, a legislação que rege, atualmente, a incidência do PIS e da COFINS sobre
seguradoras e resseguradoras faz uma série exclusões nas respectivas bases de cálculo.
Como dissemos, essa legislação é inaplicável, pois no âmbito da Lei nº
9.718/98 somente o “faturamento” pode servir como base de cálculo para o PIS e para a
COFINS, e as pessoas jurídicas em questão não vendem mercadorias nem prestam
serviços. Contudo, caso a base de cálculo dessas contribuições venha a ser, no futuro, a
totalidade das receitas das seguradoras e resseguradoras, a tributação das receitas dessas
entidades deverá necessariamente levar em conta a peculiaridade de suas atividades.
Esse tratamento especial foi, inclusive, instituído pelo inciso II do § 6º do artigo 3º da
Lei nº 9.718/98, que excluiu da base de cálculo do PIS e da COFINS os valores que,
conquanto integrantes do prêmio de seguro, não poderão vir a compor o patrimônio das
seguradoras e resseguradoras.
Analisando-se as exclusões atualmente previstas na legislação, observa-se,
primeiramente, que as correspondentes ao cosseguro e resseguro cedidos se justificam
plenamente, uma vez que se trata de dispêndios obrigatórios das entidades, que devem
repassar a outros seguradores ou resseguradores parte do prêmio recebido, para repartir
ou repassar parcela do risco. Já quanto aos valores referentes a cancelamentos e
restituições de prêmios que tiverem sido computados como receitas, configuram
verdadeiros cancelamentos, ou seja, receitas estornadas, não caracterizando, portanto,
exclusões ou reduções propriamente ditas da base de cálculo.
No que tange à referência feita na legislação à parcela dos prêmios
destinada à constituição de provisões ou reservas técnicas, trata-se de verdadeira
adequação do conceito de receita a resseguradoras ou resseguradoras, uma vez que a
obrigatoriedade da constituição desses passivos exclui de antemão a possibilidade de
tributá-los como receitas, pois esses valores são reservados e não aderem ao patrimônio
da seguradora ou resseguradora, até que sejam revertidos, na hipótese de não ocorrência
(ou ocorrência parcial) do sinistro ao final do prazo de cobertura.
É também justificada a exclusão prevista na legislação do valor referente às
indenizações correspondentes aos sinistros ocorridos, deduzidos das importâncias
recebidas a título de cosseguro e resseguro, salvados e outros ressarcimentos, pois mais
uma vez estamos diante de obrigação legal das seguradoras e resseguradoras.
137
Conclui-se, portanto, que o conceito de “receita” de seguradoras e
resseguradoras, para fins de possível futura incidência do PIS e da COFINS (uma vez
que a Lei nº 9.718/98 não lhes é aplicável) terá de ser adaptado, de modo a observar as
peculiaridades de sua atividade, cingindo-se aos ingressos definitivos, positivos e reais
no patrimônio, decorrentes do respectivo exercício.
4.4 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos por Seguradoras e Resseguradoras
O Imposto sobre a Renda, em todas as suas modalidades, assim como a
Contribuição Social sobre o Lucro, cuja base de cálculo é muito semelhante, são os
tributos que, pela própria natureza da materialidade sobre a qual recaem, estão mais
fortemente ligados ao princípio da capacidade contributiva.
Ao estabelecer as regras-matrizes de incidência tributária desses tributos,
cabe ao legislador detalhar o que se deve entender por “lucro tributável” das pessoas
jurídicas, tarefa na qual deverá ter presente, necessariamente, a peculiaridade das
atividades por elas desenvolvidas, a fim de que o tributo incida conforme a capacidade
contributiva de cada uma. É esta a maior dificuldade enfrentada pelo legislador na
positivação do imposto sobre a renda, como anota PAULO DE BARROS CARVALHO:
Convenhamos que os problemas mais agudos relativos à capacidade contributiva não se inscrevem no quadro que orienta a singela escolha, por parte do autor da regra, de ocorrências reveladoras de alguma forma de riqueza. Mais além, as dificuldades surgem quando, implantados esses pressupostos, põe-se o legislador a pesquisar, dentro da amplitude econômica já reconhecida, qual a medida que cabe ao sujeito passivo suportar. Não é, portanto, a capacidade contributiva absoluta, mas a capacidade contributiva relativa que causa as maiores dificuldades.183
Seguradoras e resseguradoras são pessoas jurídicas que exercem atividade
peculiar que, a despeito de ter natureza privada, é fortemente regulada pelo Estado, pelo
fato de serem gestoras de vultosa poupança popular de longo prazo. A regulação vem
proteger essa universalidade de direitos que, na denominação utilizada por J.J. CALMON
DE PASSOS, têm natureza “transidividual”.
183 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 667.
138
A primeira consequência, no que tange ao imposto sobre a renda, da
natureza especial da atividade desenvolvida pelas seguradoras é a obrigatoriedade de
apurarem o tributo pela sistemática do Lucro Real, não lhes sendo dado optar pela
sistemática simplificada do Lucro Presumido184. Essa obrigatoriedade decorre de sua
equiparação às instituições financeiras – pelo elevado volume de recursos financeiros
que gerenciam – exigindo-se que cumpram todas as obrigações contábeis e tributárias
atribuídas às pessoas jurídicas, sem nenhum tipo de simplificação.
No âmbito dessa regulação protecionista, surge ainda, conforme assinalado
aqui, a obrigação de manter reservas vultosas durante todo o prazo de vigência das
coberturas representadas pelas apólices (provisões técnicas), bem como de contratar
resseguro ou retrocessão. Naturalmente, portanto, a legislação do imposto sobre a renda
não poderia olvidar essas peculiaridades, ao definir a base de cálculo do tributo, sob
pena de ignorar a verdadeira capacidade contributiva dessas entidades.
Daí porque o legislador do imposto sobre a renda introduziu enunciado
expresso no sistema, conformando da seguinte forma sua base de cálculo para as
seguradoras:
Art. 13. Para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, são vedadas as seguintes deduções, independentemente do disposto no art. 47 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964: I - de qualquer provisão, exceto as constituídas para o pagamento de férias de empregados e de décimo terceiro salário, a de que trata o art. 43 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, com as alterações da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995, e as provisões técnicas das companhias de seguro e de capitalização, bem como das entidades de previdência privada, cuja constituição é exigida pela legislação especial a elas aplicável; […]185
A legislação do imposto sobre a renda veda a dedução, como despesa, de
qualquer provisão, por entender que não são dispêndios definitivos da pessoa jurídica.
184 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Altera a Legislação Tributária Federal. Brasília: DOU, 28 nov. 1998: “Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas: […] II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financimento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta; […]”.
185 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 1995.
139
Com efeito, as provisões são alocações temporárias no passivo das pessoas jurídicas,
que têm por objetivo reservar recursos para possíveis gastos futuros.
Ocorre que, no caso das seguradoras e resseguradoras (e também das
entidades de previdência privada), as provisões técnicas são obrigatórias e estabelecidas
pela regulação aplicável. Em tais condições, impedir sua dedução como despesa, para
fim de determinação do lucro tributável do período, equivaleria a tributar o patrimônio
dessas pessoas jurídicas, e não seu verdadeiro acréscimo patrimonial, extrapolando os
limites da capacidade contributiva da seguradora.
Consequentemente, as provisões técnicas constituídas por companhias de
seguro e resseguro são dedutíveis logo que constituídas no termo da regulação a elas
aplicável. Se e quando forem parcial ou totalmente revertidas, serão adicionadas às
bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A regra-matriz de incidência tributária específica, do IRPJ e da CSLL186,
para as seguradoras e resseguradoras pode, pois, ser construída da seguinte forma:
Hipótese: Critério material: Auferir renda Critério espacial: Território nacional Critério temporal: 31 de dezembro de cada ano (apuração anual) ou 30/03, 30/06, 30/09 e 31/12 (apuração trimestral) Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Seguradoras e Resseguradoras Critério quantitativo: base de cálculo: Lucro Real (em cujo cômputo são deduzidas, adicionalmente aos demais custos e despesas autorizados pela legislação, as provisões técnicas cuja constituição é exigida pela legislação especial aplicável), alíquota: IRPJ – 25% mais adicional de 10% sobre o montante da renda que ultrapassar R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais anuais). CSLL – 15%
186 Ressalvamos diferenças mínimas entre RMIT do IRPJ e a RMIT do CSLL, que não entendemos relevante adentrar neste trabalho.
140
5 TRIBUTAÇÃO DAS ENTIDADES DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR
PRIVADA
5.1 Definição do conceito de Previdência Complementar Privada
Após a Revolução Industrial, avolumaram-se os riscos sociais,
especialmente os decorrentes das relações de trabalho, obrigando os Estados a criar
sistemas de seguridade social para dar proteção aos trabalhadores187. Quando os
sistemas públicos de seguridade social começaram a ser insuficientes, por diversos
motivos, entre os quais as duas grandes guerras mundiais, intensificou-se o
desenvolvimento de sistemas privados de previdência, em complemento aos estatais188.
Historicamente, a previdência privada é instituto novo, nascido no final do
século XIX, como rememora FLÁVIO MARTINS RODRIGUES:
Foi somente em 1875 que acabou por ser instituído o primeiro plano formal de aposentadoria de que se tem notícia. A American Express Company, empresa norte-americana de transportes (hoje pujante grupo financeiro), criou para seus empregados um programa previdenciário1. Tratava-se de plano privado instituído por iniciativa do empregador e voltado para a generalidade de seus empregados. Poucos anos depois, em 1880, formulou-se, na Alemanha do Chanceler Otto Von Bismarck, o primeiro programa público de bem-estar social, com especial ênfase na previdência.189
187 “Quando se olha a revolução mercantilista e depois a revolução industrial nos seus efeitos históricos, temos de considerá-las como marcos na evolução da humanidade, em termos de bem-estar. A denominação de revolução significa, no entanto, que um grama social se desenvolveu durante os longos anos de estratificação do respectivo processo e que consubstancia o ajustamento dos que tendo vivido, tradicionalmente, em estruturas familiares e corporativas, foram arrastados para o turbilhão da cidade grande, sem casa, sem organização e sem apoio e, pior do que isso, perdendo no processo industrial sua qualificação de homens, para serem considerados meros componentes laborais. O ajustamento social foi o processo de recuperação dessa qualificação, em que os Estados tiveram que abandonar a sua cômoda posição liberal e tomar decidida posição na questão social, quando as correntes socialistas, sobretudo a do socialismo científico, ameaçaram solapar as bases do capitalismo”. (PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 37-38).
188 “Por esta quebra na equação econômico-financeira é que ao lado do Sistema de Seguridade Social administrado pelo Estado, sobrevive e coexiste o que se pode chamar de Sistema Privado, seja de saúde, seja de previdência, seja de assistência social” (RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de. As Entidades de Previdência Privada e as Contribuições sobre o Faturamento. In: TORRES, Heleno Taveira. (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 532-533).
189 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 2.
141
A previdência privada passou a compor gradativamente os sistemas de
seguridade social em todo o mundo, contribuindo para o seu sustento e manutenção, a
ponto de passar a ser denominada “terceiro pilar” pelo Banco Mundial, no seu relatório
“Envelhecer sem Crise”190.
Foi na Europa que o terceiro pilar se implantou mais cedo e também ali,
pela primeira vez, os regimes gerais estatais de previdência social começaram a se
mostrar insuficientes, tornando necessária sua complementação para que a segurança
social continuasse a atuar de forma eficaz.
No Brasil, foi institucionalizada pela Lei 6.435 de 15 de julho de 1977, que
utilizou e consagrou juridicamente a expressão “previdência privada”, apartando-a do
sistema compulsório da previdência complementar administrado pelo Estado. Como
explica MANUEL SEBASTIÃO SOARES PÓVOAS, essa expressão “é exclusivamente
brasileira, e objetivou identificar facilmente a instituição que, em relação ao domínio
previdenciário geral, ocupa ou pode ocupar os espaços vazios deixados pela previdência
social, em termos de satisfação das necessidades previdenciárias”191.
Após a Emenda Constitucional no 20/98, muitos passaram a preferir a
expressão “previdência complementar”, embora, a rigor, a previdência privada sempre
tenha tido essa característica. Foi revogada a Lei 6.435/77 e editada a Lei
Complementar 109/2001, novo marco legal do setor.
Os regimes público e privado de previdência se estruturam, no Brasil, de
forma perfeitamente distinta e com regras próprias, como explica PATRÍCIA GAUDENZI:
O regime geral da previdência social – como é chamada a previdência social obrigatória – está voltado para segurar os trabalhadores, garantindo-lhes cobertura na modalidade benefício definido, segundo o regime de repartição simples, em que os participantes ativos contribuem para o pagamento de benefícios aos beneficiários inativos, sem qualquer individualização das contribuições arrecadadas, gerando o que Marcos Antônio Simões chamou de “pacto social entre gerações”. A previdência privada, por outro lado, organizada na forma de planos de benefícios das modalidades benefício definido, contribuição definida ou contribuição variável, está voltada para assegurar benefícios previdenciários a todos aqueles, trabalhadores ou não, que
190 DIEESE. Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos. A situação do trabalho no Brasil. São Paulo: Dieese, 2001.
191 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 103-104.
142
venham a se associar a seus planos, observados os critérios estabelecidos na legislação. Este segmento da previdência está baseado no regime de capitalização, em seu formato escritural ou financeiro. No primeiro, as contribuições são aplicadas em contas individuais, porém os fluxos financeiros são usados para pagar os benefícios de inativos existentes; no segundo, as contribuições e seu fluxo financeiro integram uma reserva individual, usada para pagamento do benefício tão somente ao seu titular.192
Como delimitar os domínios da previdência pública e os da previdência
privada? Segundo MANOEL SEBASTIÃO SOARES PÓVOAS “estes dois subdomínios não
têm fronteiras rígidas, pois será sempre a abrangência do sistema compulsório que
determinará o campo deixado à previdência voluntária que pode ou não ocupá-lo, na
totalidade”. Continua assinalando que, “num futuro que já está próximo, a dimensão da
previdência privada alargar-se-á até a complementação plena da satisfação das
necessidades previdenciárias sentidas por cada cidadão, em relação à satisfação que
recebem da segurança social”193.
O contrato de previdência privada ou complementar é um pacto securitário
firmado entre entidade e participante, para garantir a este uma renda futura. O valor do
“prêmio”, neste caso referido como “contribuição”, é aplicado pela entidade gestora, a
fim de propiciar o maior benefício de aposentadoria possível. Os contratos
previdenciários também podem oferecer seguros de pessoas, os chamados benefícios de
risco. No Brasil, a previdência privada pode ser do tipo aberta ou fechada, como será
exposto a seguir.
No que tange à suposta complementaridade da Previdência Privada,
importante ressaltar que, embora sob o ponto de vista econômico se possa dizer que a
previdência pública e a privada são complementares, juridicamente já não existe tal
vinculação com a previdência social. Inclusive, já agora, nem mesmo a Lei
Complementar no 109/2001 utiliza essa expressão. Esclarece WEINTRAUB:
Hoje, estes termos estão ultrapassados, pois constitucionalmente não há vinculação dos benefícios da Previdência Privada com os benefícios oficiais. O termo “complementar”, preceituado na Constituição, tem interpretação agora de suplemento, expressão
192 GAUDENZI, Patricia Bressan Linhares. Tributação dos investimentos em previdência complementar privada: fundos de pensão, PGBL, VGBL, FAPI e outros. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 30-31.
193 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 63-64.
143
inócua, pois o valor médio dos benefícios da Previdência Privada suplanta aqueles da Previdência Social.194
Além da dicotomia entre previdência pública e privada, esta última ainda se
subdivide, no Brasil, entre previdência fechada e aberta195. A primeira é operada por
entidades sem fins lucrativos, constituídas sob a forma de fundação ou sociedades
simples, que disponibilizam planos acessíveis apenas aos empregados de uma empresa
ou grupo de empresas. A segunda é operada por entidades com fins lucrativos,
constituídas como sociedade anônima para operar planos acessíveis a qualquer pessoa.
Sobre as diferenças entre previdência privada aberta e fechada, são esclarecedoras as
observações de CARVALHO e MURGEL:
A distinção entre os dois grupos de previdência complementar, aberta e fechada, reside na obrigatoriedade desta última de vínculo empregatício entre o participante e a empresa patrocinadora do fundo ou, então, de vínculo associativo entre o participante e a entidade de classe instituidora do fundo (associações, cooperativas, sindicatos, etc.), no fato de que não pode possuir finalidade de lucro e, finalmente, na universalidade da oferta do plano de benefícios, que obrigatoriamente deve ser oferecido a todos os empregados, associados ou membros da patrocinadora.196
A previdência complementar privada, seja aberta seja fechada, cresce e se
desenvolve exponencialmente no País, na proporção em que se avolumam os riscos
sociais e o propósito dos participantes de auferir benefícios que, dentro do possível, lhes
garantam a manutenção do padrão de vida, uma vez que a previdência social é, para
muitos, insuficiente, pois seu objetivo de fato é o de prover apenas ao mínimo
existencial.
Por outro lado, também acaba sendo importante benefício oferecido por
empresas empregadoras, para atrair e manter talentos. Como afirma PIERRE MOREAU, “a
194 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 78.
195 É didático o histórico normativo trazido por CARVALHO e MURGEL (Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 38): “O legislador dividiu a previdência privada em dois subdomínios distintos: previdência complementar fechada e previdência complementar aberta. A regulamentação da Lei n. 6.435/77 observou essa divisão, tendo sido editados decretos distintos e específicos para tratar de forma independente das disposições sobre a previdência complementar fechada (Decreto n. 81.240, de 20/1/1978) e da previdência complementar aberta (Decreto n. 81.402, de 23/2/1978). Esses três diplomas normativos eram, até meados de 2001, a base legal da previdência complementar no Brasil. Atualmente, essas entidades são regidas pela Lei Complementar n. 109, de 29 de maio de 2001. Nessa mesma data, foi também promulgada a Lei Complementar n. 108, regulamentando a relação entre a União, Estados, Distrito Federal, Municípios, suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e outras entidades públicas e suas respectivas entidades fechadas de previdência complementar”.
196 Ibid., p. 39.
144
previdência complementar, portanto, hoje não é mais um benefício especial concedido
pelo empregador a seus empregados. Na verdade, quase está integrado à relação de
trabalho estabelecida no mundo empresarial”197.
Em vista disso, torna-se relevante a análise das normas tributárias
relacionadas à previdência privada, levando em conta suas peculiaridades.
5.2 Entidades de Previdência Complementar Privada
5.2.1 Peculiaridades a serem consideradas pelo Direito Tributário
A importância da previdência privada como terceiro pilar do sistema de
seguridade social vem sendo realçada ao longo desse trabalho. É inegável seu papel
como fomentadora da justiça e da igualdade social, valores tutelados pela Constituição.
Isso, por si só, já faz com que o seu tratamento tributário seja merecedor de extrema
atenção, uma vez que consiste em subsistema jurídico que visa à acumulação de
recursos durante longo período de tempo, para o pagamento de benefícios futuros,
atraindo o interesse arrecadatório do Estado.
A questão tributária na Previdência Privada é fundamental. O tributo, por
sua própria natureza, retira parcela do patrimônio das pessoas físicas e jurídicas,
enquanto que a previdência privada tem por objetivo a sua acumulação. São vetores
opostos. O vetor tributário deve coexistir com o vetor da acumulação, sem anulá-lo ou
tornar a previdência privada sem atrativos para a sociedade. O objetivo constitucional
da proteção social deve ser observado pela legislação tributária. Como afirma
WEINTRAUB, “participantes, empregadores (patrocinadores) e entidades devem ter a
possibilidade de encontrar um cenário tributário favorável à manutenção dos recursos na
Previdência Privada”198.
Pois bem, as entidades de previdência privada devem, assim como as
seguradoras, constituir reservas técnicas, ou provisões, para garantir o pagamento dos
197 MOREAU, Pierre. Previdência Complementar – Tratamento dos Expatriados Brasileiros na União Européia. In: TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 559.
198 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 227.
145
benefícios futuros que lhes compete proporcionar aos participantes dos planos que
administram. Ensinam BORGES E REIS:
Tendo em vista a natureza especialíssima das atividades desempenhadas pelas entidades de previdência privada, essencial para que alcancem seus objetivos institucionais é a acumulação de um patrimônio constituído por reservas, provisões e fundos, de conformidade com os critérios e normas fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.199
Com efeito, a Constituição vigente prevê, no caput do artigo 202, que o
regime de previdência complementar será “facultativo e organizado de forma autônoma
em relação ao regime geral de previdência social”. Esse mesmo dispositivo da Carta
revela que o regime de previdência complementar objetiva a “constituição de reservas
que garantam os benefícios contratados”.
As reservas matemáticas são, portanto, da própria essência da previdência
privada que, em fórmula simplificada, consiste em poupança de longo prazo
especialmente dedicada à garantia de uma aposentadoria. A importância dessas reservas
ou provisões é assinalada por PÓVOAS:
Na sua forma mais simplificada, podemos conceituar a reserva matemática como o fundo que a entidade tem que possuir para poder cumprir integral e pontualmente os compromissos que assumiu para com a massa de seus participantes. Este fundo é formado com a parte das contribuições que a entidade, de harmonia com as regras determinadas pelo cálculo atuarial, guarda e capitaliza.200
A natureza das provisões técnicas não pode, em hipótese alguma, ser
desprezada pelo Direito Tributário. Os vultosos recursos guardados por essas
verdadeiras “caixas” não significam que tenham capacidade contributiva e que parte
dessas riquezas deva ser dividida com o Estado. O Estado obtém benefício, com a
previdência privada, de outra forma: mediante a diminuição do ônus social decorrente
da velhice e da invalidez, entre outros riscos sociais atenuados por esse subsistema.
Como veremos a seguir, portanto, especificamente no que concerne às
reservas técnicas obrigatórias, é essencial que seu montante seja integralmente excluído
de toda e qualquer tributação porventura incidente sobre a receita bruta, o faturamento
199 BORGES, José Cassiano; REIS, Maria Lucia Américo. O Regime Jurídico-tributário dos Fundos de Pensão e suas Inconsistências. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 78, mar. 2002, p. 36-37.
200 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 180-181.
146
ou o lucro das entidades de previdência privada. Com efeito, à entrada dos recursos
correspondentes às contribuições dos participantes ou empregadores no patrimônio
(ativo) das entidades de previdência privada se segue, imediatamente, a constituição de
obrigações, de passivos (reservas ou provisões técnicas) obrigatórios conforme a lei e a
regulação, para fazer frente ao pagamento futuro de benefícios previdenciários. Logo,
embora os ativos das entidades sejam de fato, ordinariamente vultosos, haverá sempre
uma contrapartida diretamente proporcional em obrigações para com os participantes.
A essa mesma conclusão chegaram CARVALHO e MURGEL, ao afirmar:
[…] os rendimentos decorrentes das aplicações financeiras de entidades fechadas de previdência complementar, bem como os valores recebidos do patrocinador e dos participantes de uma entidade de previdência complementar, estão vinculados ao pagamento de benefícios ou à composição de suas reservas técnicas, permanecendo, sempre, voltados para a atividade fim dessas entidades.201
Pertinente, portanto, a constatação de RODRIGUES, de que é um equívoco
comum imaginar que os montantes acumulados denotam capacidade financeira elevada
(muitas vezes até capacidade tributária):
O que, de fato, ocorre, é que, nos modelos capitalizados, as reservas são acumuladas ao longo de muitos anos para serem consumidas posteriormente. Assim, o patrimônio dos planos de previdência administrados por essas pessoas jurídicas está voltado para garantir compromissos futuros. Caso esses valores sejam utilizados a maior no presente, haverá falta de recursos para o pagamento das prestações previdenciárias no futuro.202
Deve-se ressaltar, ainda, que a formação de uma poupança de longo prazo é
tarefa desafiadora para os indivíduos, por diversas razões. Há, antes de tudo, o apelo à
satisfação imediata do consumo, especialmente no momento histórico que vivemos.
Observa-se, também, a desconfiança em relação à gestão dos recursos pelas entidades
que, a despeito da fiscalização do órgão regulador, não raro é temerária. Além disso,
ainda que a gestão das entidades seja responsável, pelo simples fato de exigir
investimentos no mercado financeiro está inevitavelmente exposta a riscos.
201 CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 95.
202 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 5.
147
Por outro lado, o Brasil é um país marcado pela instabilidade econômica.
Estão se completando apenas vinte anos desde a implantação do Plano Real, que
resgatou o País da hiperinflação que o assolava havia décadas. A lembrança das crises e
do quadro econômico e institucional instável ainda assombra os brasileiros, ao menos
aqueles cuja idade, atualmente, conta mais de trinta anos.
Em face disso, e considerando a importância da previdência privada para o
alcance dos objetivos sociais constitucionais brasileiros, seria um contrassenso
enfraquecê-la com tributação inadequada. Ao contrário, sempre que possível, a
extrafiscalidade deve entrar em ação para incentivar a atividade previdenciária privada,
objetivando resguardar os valores da igualdade e da justiça social.
Por todas essas razões, a própria Lei Complementar no 109/2001, embora
não tivesse como objetivo tratar especificamente de temas de natureza tributária,
introduziu no ordenamento normas que limitam o poder de tributar do legislador
ordinário e reforçam a necessidade de conceder às entidades de previdência
complementar tratamento tributário adequado a seus fins.
Essas regras de competência, veiculadas por lei complementar (à qual não
cabe nem instituir regras matrizes de incidência, nem isenções), e outras normas
tributárias relacionadas, direta ou indiretamente à previdência privada, vêm sendo
introduzidas no sistema pelo legislador ordinário e serão analisadas a seguir, sempre sob
a égide das peculiaridades da previdência privada.
5.2.2 Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC)
A previdência privada pode ser operada por entidades fechadas ou abertas
de previdência complementar, nos termos do que dispõe, atualmente, a Lei
Complementar 109/2001. Como já assinalado, a previdência social brasileira se baseia
em três pilares: o primeiro é o da previdência social, o segundo é o da previdência
complementar fechada e o terceiro é o da previdência complementar aberta. Embora
apresentem semelhanças, cada um desses subsistemas normativos exibe características e
regime jurídico próprio.
148
As entidades fechadas de previdência complementar, também conhecidas
como fundos de pensão, se constituem por iniciativa de uma ou mais empresas
empregadoras ou por entidade de classe que pretenda contribuir para complementar a
aposentadoria de seus empregados e associados, tornando-se patrocinadora (ou no caso
das entidades de classe “instituidora”) de um ou mais planos de previdência privada.203
Esclarece PÓVOAS:
Entidades fechadas são as constituídas por iniciativa de uma empresa ou de um grupo de empresas para ocorrerem exclusivamente – daí a qualificação de fechadas – às necessidades suplementares previdenciárias dos seus empregados. A empresa ou empresas que instituem a entidade fechada, por razão do encargo legal que assumem de suportarem na totalidade ou em parte o custeio do plano de benefícios, tomam o nome de patrocinadoras.204
WEINTRAUB assinala que muitos se equivocam ao pensar que a empregadora
é dona do fundo de pensão que criou. Na verdade, “a empresa empregadora (ou
empregador) é ‘patrocinadora’, podendo fazer parte do quadro dos órgãos internos da
entidade previdenciária (conselho deliberativo, conselho fiscal e diretoria executiva),
porém jamais poderá deter a propriedade do fundo de pensão que patrocina”205.
As entidades fechadas de previdência complementar são, portanto,
vinculadas às patrocinadoras ou instituidoras dos planos que administram, porém
autônomas em relação a estas. Do ponto de vista societário, a entidade “nasce como
fundação ou associação civil, com a finalidade exclusiva de gerir recursos dos
trabalhadores, isto é, gerir poupança previdenciária dos trabalhadores, composta pelas
203 “As entidades fechadas ‘são aquelas acessíveis […] I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores’ (art. 31 da LC 109/2001). Explica-se, por consequência, a denominação de entidades fechadas, uma vez que voltadas para um grupo restrito de pessoas, que deverão possuir um vínculo laborativo comum com o empregador privado ou público ou um vínculo comum associativo, profissional ou sindical. Essas entidades organizam-se sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos, portanto todos os recursos obtidos voltam-se exclusivamente para o custeio dos planos previdenciários”. (RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 15 e 16).
204 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 81.
205 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 117.
149
contribuições destes, dos empregadores (nos planos patrocinados) e da sua
rentabilidade”206.
As entidades fechadas, de acordo com a legislação hoje vigente, podem
administrar um ou mais planos de previdência privada. Quanto ao número de planos que
administram, são classificadas como: de plano comum (quando administram um plano
ou um conjunto de planos acessíveis ao universo de participantes) ou de multiplano
(quando administram um plano ou um conjunto de planos de benefícios para diversos
grupos de participantes, com independência patrimonial), conforme disposto no art. 34,
I, da Lei Complementar no 109/2001.
Além de gerir mais de um plano de previdência, as entidades fechadas
também podem estar vinculadas a apenas um ou a vários patrocinadores ou
instituidores. Serão classificadas como “singulares”, quando ligadas a apenas um
patrocinador ou instituidor, ou “multipatrocinadas”, quando congregarem mais de um
patrocinador ou instituidor (art. 34, II da Lei Complementar 109/01).
Sua forma de constituição ainda gera controvérsia na Doutrina, porque a Lei
Complementar no 109/2001 estabeleceu que deveriam ser constituídas como fundação
ou sociedade civil. Contudo, após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, deixou
de existir a figura da sociedade civil sem fins lucrativos, e a fundação passou a ter
objetivos restritos, não incluindo a previdência privada (cfr. os artigos 44, 62, § único, e
981, do CC/2002). A esse respeito, discorre GAUDENZI:
Diante disso, a doutrina divide-se em considerar, por alguns, que a espécie de organização jurídica aplicável às entidades fechadas de previdência complementar desde o advento do novo Código Civil é o da associação, pois, dos tipos mencionados no art. 44 supratranscrito, é aquele que mais se assemelha a estrutura da previdência complementar fechada, e por outros, que o disposto no art. 31, §1o, da Lei Complementar no 109/01, ainda é aplicável por se tratar de norma complementar à Constituição Federal e de caráter especial, pois regula o regime jurídico da previdência complementar privada. Há ainda aqueles que concluem pela defesa de que as entidades fechadas de previdência complementar passaram à condição de entidades sui generis. Não obstante tal discussão, a Secretaria de Previdência Complementar, por intermédio da Portaria no 2, de 08 de janeiro de 2004, dispensou as entidades fechadas já constituídas anteriormente à
206 REIS, Adacir. Aspectos Legais e Contratuais Fundamentais da Previdência Complementar Fechada. In: SEMINÁRIO “A Previdência Complementar Fechada no Brasil: Perspectivas e Aspectos Legais Fundamentais”. Foz do Iguaçu, 25-28 de outubro de 2010, Anais… Foz do Iguaçu, 2010, p. 30.
150
edição do Código Civil de 2002, à promoção de modificações em seus estatutos.207
Assim, quanto às entidades fechadas de previdência privada constituídas
anteriormente ao Código Civil de 2002, a questão foi resolvida pelo órgão regulador,
que as dispensou de alterar seus estatutos. No que se refere às entidades constituídas
após sua edição, ainda há controvérsia. No entendimento de WEINTRAUB, por exemplo,
devem ser organizadas sob a forma de fundações:
A figura das sociedades civis sem fins lucrativos não foi recepcionada pelo atual Código Civil, restando apenas a figura da fundação, que, por suas características fundamentais, não admite finalidade lucrativa. Os fundos de pensão devem se adaptar à nova estrutura civil imposta pelo novel Código. Após o advento do Código Civil novo, os próprios cartórios de registro de pessoas jurídicas não mais estão registrando as entidades fechadas como sociedades civis sem fins lucrativos, e sim apenas como fundações.208
Conforme dissemos, característica essencial das entidades fechadas é o fato
de não poderem ter fins lucrativos, diferentemente do que ocorre com as entidades
abertas de previdência complementar, às quais é facultado ter essa finalidade. Nesse
sentido, o artigo 31, § 1o, da Lei Complementar no 109/01 estabelece que “as entidades
fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins
lucrativos”. Esclarece REIS:
Todo excedente do fundo de pensão é aproveitado em favor de seus próprios integrantes, não sendo possível a destinação de recursos para um terceiro que não sejam os próprios participantes e assistidos dos planos de benefícios. Não existe a figura do “empresário”, “acionista” ou “cotista”, mas se existir, vai se confundir necessariamente com os próprios destinatários do plano de previdência.209
Sendo organizadas sob a forma de entidades sem fins lucrativos, o resultado
por elas auferido corresponderá a superávit ou déficit, mas não a lucro ou prejuízo. Se
superavitário, deverá ser integralmente revertido em favor dos beneficiários dos planos
por ela administrados, por imposição do artigo 20 da referida Lei Complementar.
207 GAUDENZI, Patricia Bressan Linhares. Tributação dos investimentos em previdência complementar privada: fundos de pensão, PGBL, VGBL, FAPI e outros. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 72-73.
208 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 117.
209 REIS, Adacir. Aspectos Legais e Contratuais Fundamentais da Previdência Complementar Fechada. In: SEMINÁRIO “A Previdência Complementar Fechada no Brasil: Perspectivas e Aspectos Legais Fundamentais”. Foz do Iguaçu, 25-28 de outubro de 2010, Anais… Foz do Iguaçu, 2010, p. 30.
151
Além das características acima, as entidades fechadas de previdência
complementar estão sujeitas à regulação e à fiscalização da Superintendência Nacional
de Previdência Complementar – PREVIC, submetida ao Ministério da Previdência
Social. Já as Entidades Abertas, assim como as seguradoras e resseguradoras, se
submetem à fiscalização da SUSEP – Superintendência de Seguros Privados, autarquia
vinculada ao Ministério da Fazenda. Com isso, a previdência social e a previdência
aberta se aproximam dos mercados securitário e financeiro.
Fica claro, portanto, que o único e exclusivo objetivo de uma entidade
fechada de previdência complementar é dar cobertura a riscos sociais, em especial à
velhice, em colaboração com o Estado que, através da assistência social que lhe
incumbe prestar, deve garantir proteção à família, à maternidade, à infância, à
adolescência e à velhice.
O fato de essas entidades não poderem ter fins lucrativos lhes confere
natureza especial, uma vez que só existem pelo fato de as empresas, em atenção ao seu
papel social, pretenderem contribuir, com ou sem a participação de seus empregados,
para que estes venham a auferir aposentadoria capaz de lhes propiciar padrão de vida
correspondente ao que desfrutavam quando na ativa.
Essas características distinguem nitidamente as entidades fechadas das
abertas, e certamente precisam ser levadas em conta quando da definição de seu regime
tributário.
5.2.2.1 A questão da imunidade das EFPC
As entidades fechadas de previdência complementar são assistenciais? Essa
questão já foi, e continua sendo, inflamadamente debatida pela Doutrina e na
Jurisprudência. Da resposta podem derivar consequências importantes, especialmente
quanto à sua qualificação como imunes à incidência de impostos, nos termos do artigo
150, VI, “c” da Constituição Federal210, e contribuições previdenciárias, conforme seu
artigo 195, § 7o.211
210 “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[…]
152
No passado, as entidades fechadas já foram expressamente equiparadas às
instituições de assistência social pelo artigo 39, § 5o da Lei no 6.435/77212. Esse
dispositivo, contudo, acabou sendo revogado pelo artigo 6o, § 3o, do Decreto-Lei no
2.065/83, provocando acirrada controvérsia entre os doutrinadores quanto ao novo
tratamento aplicável.
Além disso, no texto da Constituição de 1967, a assistência e a previdência
social eram tratadas conjuntamente. Já na Constituição de 1988, essas matérias
passaram a ter tratamento distinto, reservando-se os artigos 201 e 202 para a
previdência social e os 203 e 204 para a assistência social, inclusive em seções
diferentes do Capítulo da Seguridade Social, causando dúvidas ainda maiores quanto à
possibilidade de uma instituição de natureza previdenciária ser classificada como
assistencial.213
A despeito dessa separação tópica feita pela Constituição de 1988, desde sua
promulgação a Doutrina dominante sempre defendeu a subsistência do entendimento de
que as entidades fechadas de previdência complementar, sem fins lucrativos por
determinação legal, continuavam merecendo a qualificação de assistenciais, sendo
portanto imunes à incidência de impostos sobre seu patrimônio, renda e serviços, assim
como de contribuições previdenciárias.
VI - instituir impostos sobre: […] c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades
sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;” (BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988).
211 “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: […]
§ 7o - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.” (ibid.).
212 “§ 3o As entidades fechadas são consideradas instituições de assistência social, para os efeitos da letra c do item II do artigo 19 da Constituição”. (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977. Dispõe sobre as entidades de previdência privada. Brasília: DOU, 20 jul. 1977).
213 Como afirmam BORGES e REIS, “sob a égide da Constituição anterior onde as regras eram mais claras, já que a atividade previdenciária estava inserida no contexto da assistência social, a questão da imunidade dos fundos de pensão fechados já causava polêmica, sob a vigência da Constituição atual, que distinguiu a previdência da assistência social, tornou-se mais polêmica ainda, ao argumento de que a imunidade não os alcançaria, tendo em vista que assistência social não se confunde com previdência, independentemente do fato de os fundos de pensão não terem, por definição, fins lucrativos”. (BORGES, José Cassiano; REIS, Maria Lucia Américo. O Regime Jurídico-tributário dos Fundos de Pensão e suas Inconsistências. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 78, mar. 2002, p. 37).
153
Esta era, por exemplo, a posição veementemente defendida por ALBERTO
XAVIER, que incluía, mesmo após o advento da Constituição Federal de 1988, a
previdência privada entre os meios de realização de assistência social:
Em suma: assistência é liberalidade; assistência social, liberalidade cuja causa/função é o auxílio a pessoas de ‘status’ patrimonial desfavorecido; previdência social privada é uma modalidade de assistência baseada em métodos securitários, capitalizadores, atuariais, de prevenção de ‘riscos sociais’. Ora, a verdade é que as grandes organizações altruístas, filantrópicas, caritativas e religiosas não deixaram de utilizar o método previdenciário (baseado na teoria dos seguros privados) como forma de realizar a beneficência e a assistência social.214
XAVIER também sempre entendeu que o fato de as entidades preverem, nos
regulamentos de seus planos, a participação dos beneficiários no respectivo custeio, não
afastaria sua natureza assistencial, pois a existência e a manutenção das entidades de
qualquer modo dependeriam de liberalidade do patrocinador:
O caráter misto dos dois tipos de contribuições, gratuitas as do patrocinador e onerosas as do participante, não retira o caráter assistencial da entidade receptora, pois no conjunto existe sempre um desequilíbrio patrimonial que favorece os participantes, desequilíbrio este que resulta do ato de liberalidade do patrocinador.215
A respeito dessa questão, é importante lembrar que, como já ressaltado, as
entidades fechadas de previdência complementar, diferentemente das abertas, são
proibidas, por lei, de ter fim lucrativo. Poderão entrar em déficit ou alcançar superávit,
se o resultado do confronto entre suas receitas e despesas não corresponder a zero.
Porém, se apurado superávit, este deverá ser integralmente revertido em benefício dos
participantes dos planos. Seu único objetivo, portanto, é oferecer cobertura a riscos
sociais, em especial o da velhice 216, em colaboração com o Estado que, através da
214 XAVIER, Alberto. As Entidades Fechadas de Previdência Privada como Instituições de Assistência Social. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 52, jan. 2000, p. 29.
215 Ibid., p. 32. A conclusão do autor, nesse artigo, é a seguinte: “Em face das suas características essenciais, tal como definidas na lei, torna-se fácil concluir que as entidades fechadas de previdência privada revestem a natureza de entidades de assistência social, pois assentam em atos de liberalidade que visam beneficiar um círculo de pessoas definido em função do ‘status’ sócio-profissional duradouro de empregados de uma empresa ou de um grupo de empresas.
Com efeito, a contribuição do patrocinador é um ato de liberalidade em favor de terceiro. É um ato de liberalidade, pois tem por conteúdo um enriquecimento de outrem (o participante) sem a
correspondente contrapartida, consistindo numa vantagem patrimonial de um sujeito não contrabalançada por um correlativo sacrifício”.
216 A Lei Complementar 109/01 inclusive restringe seu escopo a esta atividade: “Art. 32. As entidades fechadas têm como objeto a administração e execução de planos de benefícios
de natureza previdenciária.
154
assistência social que lhe incumbe prestar, deve garantir proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice.
Por outro lado, necessário lembrar também que a imunidade tributária
conferida a entidades de assistência social não é um mero favor do Constituinte. Trata-
se de uma necessidade e um imperativo lógico. Explica CAMPOS:
No que tange às entidades assistenciais, a imunidade a elas prevista tem por objetivo suprir as ineficiências do Estado, donde a norma imunizante busca estimular o particular no auxílio de funções essenciais do Estado, ou seja, nas funções que este deveria cumprir, mas, por inúmeras carências, não a faz .217
Conclui a autora, acertadamente, que não se trata de favor ou renúncia
fiscal, mas ao contrário, de um necessário incentivo à solidariedade social, demonstrada
pelo auxílio do particular às funções essenciais do Estado.
Em vista disso, parece-nos cristalina a conclusão de que as entidades
fechadas de previdência complementar merecem o tratamento das entidades
assistenciais, fazendo jus à imunidade tributária a elas atribuída, especialmente por não
terem fins lucrativos e ser sua finalidade essencial o amparo à velhice, um dos objetivos
primordiais da assistência social, nos termos ditados pelo artigo 202, inciso I da
Constituição Federal218.
5.2.2.1.1 Jurisprudência do STF
Lamentavelmente, contudo, não foi esse o caminho trilhado pelo Supremo
Tribunal Federal, no caso líder decidido em 2001, que posteriormente ensejou a edição
de súmula no mesmo sentido.
Parágrafo único. É vedada às entidades fechadas a prestação de quaisquer serviços que não estejam no âmbito de seu objeto, observado o disposto no art. 76” (BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001).
A exceção feita pelo artigo 76 diz respeito a planos assistenciais à saúde oferecidos pelas entidades anteriormente à edição da Lei Complementar 109/01, os quais poderão ser mantidos, desde com custeio específico e patrimônio separado.
217 CAMPOS, Daniele Russi. Imunidade Tributária das Entidades Fechadas de Previdência Privada. Revista Tributária de Finanças Públicas, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 46, 2002, p. 113.
218 “Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; […]” (BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 out. 1988).
155
Com efeito, no Acórdão prolatado no “Caso CERES” (RE 202.700-6/DF,
julgado em 08/11/2001), em que se discutia a sujeição das entidades fechadas de
previdência privada à incidência do IPTU, decidiu o STF, por maioria, que somente
aquelas cujos planos não recebessem “contraprestação” dos participantes – as chamadas
entidades “não-contributivas” – seriam assistenciais e fariam jus à imunidade:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIA PRIVADA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INEXISTÊNCIA. Entidade fechada de previdência privada. Concessão de benefícios aos filiados mediante recolhimento das contribuições pactuadas. Imunidade tributária. Inexistência, dada a ausência das características de universalidade e generalidade da prestação, próprias dos órgãos de assistência social. As instituições de assistência social, que trazem ínsito em suas finalidades a observância ao princípio da universalidade, da generalidade e concede benefícios a toda a coletividade, independentemente de contraprestação, não se confundem e não podem ser comparadas com as entidades fechadas de previdência privada que, em decorrência da relação contratual firmada, apenas contempla uma categoria específica, ficando o gozo dos benefícios previstos em seu estatuto social dependente do recolhimento das contribuições avençadas, conditio sine qua non para a respectiva integração no sistema. Recurso extraordinário conhecido e provido.219
A nosso ver o Acórdão se baseia num equívoco essencial. Utiliza como
premissa o suposto fato de que, diferentemente das entidades assistenciais, as entidades
fechadas de previdência complementar receberiam “contraprestação” de seus
beneficiários.
Ora, são absolutamente incomparáveis as contribuições feitas pelos
participantes de um plano de previdência privada e as contraprestações pecuniárias
recebidas para a prestação de um serviço, por uma empresa com fins lucrativos.
As contribuições dos participantes aos planos de previdência privada
fechada se destinam a seu próprio benefício. Não visam remunerar a entidade, nem lhe
proporcionar lucros. Ao contrário, comporão, na maioria dos casos, em sua
integralidade, as reservas que lhes garantirão os benefícios futuros de aposentadoria, ou
cobrirão outros riscos sociais protegidos pelo plano, como morte e invalidez. Pode dar-
se que uma pequena parcela dessas contribuições sirva à cobertura de despesas
219 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 202.700-6/DF. Relator: Ministro Maurício Corrêa. Julgamento: 08 nov. 2001. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJ, 20 nov. 2001.
156
administrativas da entidade, porém ainda assim não se estará a falar em contraprestação
de serviços, uma vez que os gastos administrativos servem tão-somente a viabilizar a
cobertura dos riscos oferecida pela entidade, não caracterizando obrigação de fazer em
favor dos participantes, e os valores recebidos jamais poderão se converter em lucro
para a entidade. Ao contrário, nos termos da lei, eventual superávit será revertido em
favor dos participantes.
Alega-se também, a nosso ver equivocadamente, que faltaria às entidades
fechadas o atendimento ao princípio da generalidade, ou seja, a obrigatoriedade,
inerente à assistência social, de gerar benefícios para toda a coletividade. Ora, é claro
que não se pode interpretar esse comando ao pé da letra. Nenhuma entidade assistencial
pode se dedicar a toda a coletividade. Sempre haverá alguma circunscrição a certos
grupos, pois atuação assistencial universal é inviável. Isso não obstante, a entidade
assistencial, pela natureza de suas atividades, ao assistir um grupo, acaba por beneficiar
toda a coletividade.
Ademais, mesmo sendo inviável o atendimento de toda a sociedade por uma
única entidade de previdência fechada, a legislação exige a “generalidade possível”
nesse âmbito, consistente na obrigatoriedade, imposta pela Lei Complementar 109/01,
de as entidades fechadas oferecerem seus planos a todos os empregados dos
patrocinadores ou associados dos instituidores, inclusive gerentes, diretores,
conselheiros e dirigentes.220 Já assinalamos, atrás, ao tratar dos demais princípios da
previdência social aplicáveis às entidades fechadas, que a aplicação mitigada do
princípio da generalidade à previdência privada aconteceria dessa forma.
Com efeito, conforme estabelecido pela Lei Complementar no 109/01,
afastou-se a possibilidade de os benefícios previdenciários serem oferecidos,
arbitrariamente, apenas a um grupo de privilegiados. A partir do momento em que o
empregador ou entidade de classe opta por conceder o benefício, deverá franqueá-lo a
todo o grupo de possíveis interessados.
220 “Art. 16. Os planos de benefícios devem ser, obrigatoriamente, oferecidos a todos os empregados dos patrocinadores ou associados dos instituidores. § 1o Para os efeitos desta Lei Complementar, são equiparáveis aos empregados e associados a que se refere o caput os gerentes, diretores, conselheiros ocupantes de cargo eletivo e outros dirigentes de patrocinadores e instituidores”. (BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001).
157
Discordamos, portanto, de BUSCHMANN221, para quem
Ditas entidades, apesar de agirem em campo social relevante, tal como é o previdenciário, não estão acessíveis à população em geral e não atendem às camadas mais necessitadas da população. Assim sendo, essas entidades não podem ser enquadradas no conceito constitucional de assistência social retirado da Constituição Federal, conforme se depreende de todo o texto constitucional e, em especial, do art. 203 da CF/1988.
Nossa interpretação é diametralmente oposta. Quanto ao princípio da
generalidade, já nos manifestamos acima. Ressaltamos, mais uma vez, que a cobertura
dos riscos sociais da velhice, da enfermidade e da invalidez, respaldada pela previdência
privada, interessa a toda a sociedade, e não apenas a seus beneficiários individualmente
considerados. Assim, não é o fato de a previdência privada estar disponível a
determinados grupos que lhe retira a característica da generalidade. Ademais,
equivocado afirmar que não atende às camadas mais necessitadas da população. O
trabalhador, empregado de empresa ou associado a uma entidade de classe,
indubitavelmente necessita de amparo social na velhice e na invalidez, assim como
qualquer cidadão, e conceder-lhe tal amparo caracteriza a assistência social preconizada
na Constituição Federal.
Somente por essas razões, o entendimento do Supremo Tribunal Federal a
respeito dessa questão já mereceria revisão.
Deve-se ter presente que já transcorreu mais de uma década desde que foi
prolatado o acórdão do Caso CERES (RE 202-700-6/DF, julgado em 08/11/2001).
Desde então, vem-se observando progressiva precarização das condições de trabalho em
razão da globalização, dos avanços tecnológicos e da concorrência internacional. A
pirâmide demográfica, por sua vez, vem se invertendo, tornando cada vez mais difícil o
financiamento da previdência oficial através do princípio da solidariedade geracional. O
individualismo e o consumismo tornam-se, progressivamente, os valores dominantes na
sociedade, reduzindo iniciativas estritamente assistenciais. Sendo assim, cada vez mais
se justifica o estímulo à previdência privada fechada, a qual, conforme vem sendo
assinalado, não tem fins lucrativos, derivando exclusivamente do papel social da
221 BUSCHMANN, Marcos Vinicius. Imunidade das Entidades Fechadas de Previdência Privada. Revista Tributária de Finanças Públicas, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 53, 2003, p. 98.
158
empresa e de seu propósito de contribuir voluntariamente para a complementação da
aposentadoria de seus empregados.
Inegável, contudo, a complexidade da matéria e seu potencial para gerar
discussões acaloradas. Tanto é assim que o referido julgamento não foi unânime, mas
tomado por maioria de 6 votos a 4. O Ministro MARCO AURÉLIO MELLO foi um dos que
votaram em sentido contrário ao da distinção das entidades de previdência com base na
existência ou não de contribuições dos participantes. Vale transcrever trecho de seu voto
em que fundamenta este entendimento:
Frise-se que, diante da disposição constitucional, quer a pretérita, quer a ora em vigor, não cabe perquirir sobre a gratuidade dos serviços e benefícios prestados pelas instituições. Até mesmo no campo da previdência oficial tem-se a participação, no custeio, dos beneficiários, não havendo norma constitucional a excluir a imunidade em face da dupla contribuição – por parte dos empregadores e dos empregados.222
Concordamos, ipsis literis, com a posição do Ministro MARCO AURÉLIO
MELLO. Arguta sua observação de que até no campo da previdência oficial tem-se a
participação, no custeio, dos beneficiários. Quanto à exigência de gratuidade total já foi,
há muito, afastada pela jurisprudência do STF como requisito da caracterização da
assistência social. O que se exige, nos casos onde houver contraprestação, é que o
produto da arrecadação seja destinado às finalidades assistenciais da entidade. Não
poderia ser diferente com as entidades fechadas de previdência privada. Por outro lado,
conforme observamos antes, nem há falar, neste âmbito, de contraprestação em sentido
estrito, pois as contribuições dos participantes, quando existem, convertem-se,
majoritariamente, em reservas garantidoras de benefícios futuros e, em parcela mínima,
no custeio administrativo que, por sua vez, em hipótese alguma poderá gerar lucro para
a entidade.
Não se pode restringir o alcance de uma imunidade incluindo requisitos –
como o da ausência de contribuição – onde a Constituição não os exige. O que importa,
de fato, é que a pessoa jurídica não tenha fins lucrativos, o que no caso das entidades
fechadas é imposição legal. Recusar-lhes a imunidade é um contrassenso, em face do
222 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 202.700-6/DF. Relator: Ministro Maurício Corrêa. Julgamento: 08 nov. 2001. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação: DJ, 20 nov. 2001.
159
reconhecimento doutrinário e constitucional de seu papel na redução das desigualdades,
proteção à velhice e na garantia de uma existência digna.
Não obstante, desde 2001, diversos acórdãos foram proferidos pelo STF
nesse mesmo sentido, isto é, distinguindo o assistencialismo da previdência privada com
base no fato de serem ou não realizadas contribuições dos participantes aos planos. A
reiteração desse entendimento acabou ensejando a edição da Súmula 730:
A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, “c", da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários.223
Sobre esta súmula, opina WEINTRAUB:
Tal Súmula está pautada no caráter assistencial do fundo. O caráter assistencial só se manifestará para a imunidade tributária se o patrocinador arcar com toda a contribuição do participante, mostrando que a assistência é absoluta (o participante não desembolsa nada e recebe a proteção da Previdência Privada por conta do empregador, conferindo ao fundo de pensão caráter assistencial pleno).224
Reiteramos, contudo, que o recebimento de contribuições dos participantes
dos planos não é critério de discrimen adequado para se reconhecer ou negar a natureza
de entidades assistenciais e, portanto, a imunidade tributária, a entidades fechadas de
previdência complementar.
Alinhamo-nos, neste ponto, com o ponto de vista do Prof. IVES GANDRA DA
SILVA MARTINS, que questiona:
Ora, se a Suprema Corte já decidiu que a imunidade das entidades de assistência social independe de receber ou não pagamento por serviços prestados, bastando que sejam sem fins lucrativos e voltadas ao bem dos outros e não dos seus detentores, por que tributar entidades de “proteção à velhice”, que só existem porque empresas “não beneficiárias” contribuem, ao lado de “beneficiários”, para instituições sem fins lucrativos, objetivando a prover o futuro de determinada comunidade?225
223 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula 730. A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, "c", da constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários. Julgamento: 26 nov. 2003. Órgão Julgador: Plenária. Publicação: DJ, 9 dez. 2003.
224 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 128.
225 MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Imunidade das Entidades Fechadas de Previdência Privada. In: Torres, Heleno Taveira. (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 462.
160
Entendemos que o tratamento diverso dado pelo STF às entidades de
previdência fechadas contributivas e não contributivas ofende o Princípio da Isonomia,
pois trata diferentemente pessoas que estão na mesma situação jurídica. Tanto as
entidades fechadas de previdência quanto outras entidades assistenciais se dispõem a,
voluntariamente, contribuir com o Estado na prestação de assistência à velhice, sem
finalidade lucrativa. Isso as iguala no direito à imunidade. Contudo, com base no
inadequado fator diferencial da existência de contribuições dos participantes, tal
benefício é negado às entidades fechadas de previdência complementar.
O princípio da igualdade veda que se dê tratamento desigual a pessoas em
situação idêntica. Para que o tratamento desigual seja aceitável, é necessário identificar
um critério adequado de distinção. Esse critério deve ser geral, inerente à pessoa e
guardar correlação lógica com a disparidade estabelecida pelo tratamento jurídico. É o
que ensina CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELO, no clássico Conteúdo Jurídico do
Princípio da Igualdade 226:
Cabe, por isso mesmo, quanto a este aspecto, concluir: o critério especificador escolhido pela lei, a fim de circunscrever os atingidos por uma situação jurídica – a dizer: o fator de discriminação – pode ser qualquer elemento radicado neles; todavia, necessita, inarredavelmente, guardar relação de pertinência lógica com a diferenciação que dele resulta. Em outras palavras: a discriminação não pode ser gratuita ou fortuita. Impende que exista uma adequação racional entre o tratamento diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo. Segue-se que, se o fator diferencial não guardar conexão lógica com a disparidade de tratamentos jurídicos dispensados, a distinção estabelecida afronta o princípio da isonomia227.
Não se evidencia qualquer relação lógica entre a realização de contribuições
pelo participante ao plano administrado pela entidade e sua natureza assistencial. A
entidade, em si, continua existindo exclusivamente para dar proteção à velhice, sem
finalidade lucrativa. A distinção feita pelo STF em seus acórdãos, sobre a matéria e,
posteriormente, na Súmula 730, portanto, não utiliza critério de discriminação
logicamente correlacionado à caracterização de uma entidade como assistencial e,
consequentemente, ofende o Princípio da Isonomia, segundo o qual “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (artigo 5o da Constituição Federal).
226 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3. ed. atualizada, 3. tiragem. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 21.
227 Ibid., p. 38-39.
161
Por todas essas razões, entendemos que a matéria continua em aberto.
Concluiu IVES GANDRA DA SILVA MARTINS que a questão poderá voltar a ser
examinada, especialmente porque “com ‘contribuições’ ou ‘não’ de ‘beneficiários’,
nenhuma entidade de previdência privada, sem fins lucrativos, poderia subsistir sem a
contribuição das ‘entidades não beneficiárias’.”228
Em outras palavras, somente a iniciativa e as contribuições feitas pelos
empregadores, às entidades de previdência privada (que, conforme já realçado, com elas
não se confundem), viabilizam a concessão de aposentadoria complementar privada.
A exigência de contribuição do participante para compor a reserva que lhe
garantirá a aposentadoria é decisiva para sua formação, mas não retira ao ato da
empregadora o caráter de liberalidade, quando opta por conceder tal beneficio sem com
isso auferir nenhum lucro. A entidade de previdência, por sua vez, que é autônoma em
relação a suas patrocinadoras ou instituidoras, existe única e exclusivamente para
receber essas contribuições, geri-las e garantir benefícios de aposentadoria aos
participantes do plano, sem auferir lucro. Por essa razão, inegável sua natureza
puramente assistencial, independentemente de haver ou não contribuições dos
participantes aos planos, além das contribuições das patrocinadoras e instituidoras.
Acreditamos, portanto, que o entendimento do Supremo Tribunal Federal
merece ser revisto, após mais de uma década de sua formação.
Ainda que, atualmente, a legislação conceda isenção a tais entidades quanto
ao IRPJ, à CSLL e à COFINS, elas ainda sofrem o ônus da contribuição ao PIS e das
contribuições previdenciárias sobre a folha de salários, o que se mostra inadequado, em
face do sistema constitucional vigente e do relevo que a Constituição atribuiu à
previdência privada fechada.
Não obstante, passaremos a tratar, a seguir, das regras-matrizes de
incidência tributária atualmente aplicadas sobre as receitas e o superávit dessas
entidades, a fim de identificar sua adequação à respectiva natureza jurídica, uma vez
que a jurisprudência do STF acima analisada determinou o afastamento da imunidade a
que fazem jus.
228 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Imunidade das Entidades Fechadas de Previdência à Luz de Decisões da Suprema Corte. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 79, abr. 2002, p. 126.
162
5.2.2.2 PIS e COFINS e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária
Por tudo que foi exposto até aqui, no que diz respeito à importância e à
nobreza de propósitos das entidades fechadas de previdência complementar, bem como
seu alinhamento em relação aos princípios fundamentais da Constituição Federal, já se
chegaria à conclusão de que tais entidades, sem fins lucrativos, mereceriam ser
preservadas de incidências tributárias, de modo a permitir-lhes atingir suas finalidades
com maior eficiência.
Nesta linha foi a precisa observação de RAEFFRAY:
A previdência complementar fechada, ao desempenhar atividade institucional, atua nas áreas de saúde, previdência e assistências social, obrigações, que por sua vez não são cumpridas pelo Estado. Assim, a previdência privada fechada, por meio dos fundos de pensão, desonera em grande parte os órgãos do Estado, possibilitando-lhe atender os mais pobres, com os seus poucos recursos. Dentro desse contexto, o Estado que acaba sendo agraciado pela atuação das Entidades Fechadas de Previdência Privada, não deveria cobrar de suas colaboradoras, da forma como vem procedendo, as contribuições sociais, pois sendo estas uma extensão do sistema oficial, são geradoras de recursos que beneficiam, sobremaneira, esse sistema.229
Não obstante, a legislação em vigor impõe tal tributação, obrigando-nos a
analisar sua validade, mediante utilização de instrumental jurídico hábil.
Para tratarmos da incidência ou não incidência do PIS e da COFINS, sobre
os valores recebidos pelas entidades fechadas de previdência complementar,
utilizaremos algumas premissas estabelecidas nos tópicos iniciais deste trabalho.
Observa-se, para iniciar a análise, que as entidades fechadas de previdência
complementar, assim como as seguradoras, foram excluídas da sistemática não-
cumulativa de incidência do PIS e da COFINS, conforme previsão expressa do artigo 8o
das Leis nº 10.637/03 e 10.833/04. Nessas condições, permaneceram sujeitas, em
princípio, às regras-matrizes preexistentes e que continuam em vigor, veiculadas,
basicamente, pela Lei nº 9.718/98.
229 RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de. As Entidades de Previdência Privada e as Contribuições sobre o Faturamento. In: TORRES, Heleno Taveira. (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 554.
163
Essa legislação estabeleceu, originalmente, como base de cálculo do PIS e
da COFINS, o “faturamento” da pessoa jurídica, considerado como a soma de suas
receitas. Entretanto, essa equiparação, prevista no § 1º do artigo 3º, da referida lei, foi
declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, reiteradamente, o que
culminou por expulsá-la do sistema. No entender do STF, somente após a entrada em
vigor da Emenda Constitucional nº 20/98 o legislador ordinário passou a dispor de
competência para instituir contribuições sociais tendo como base de cálculo a “receita
bruta”. Até então tal competência era restrita à indicação do “faturamento” como base
de cálculo.
Já externamos nosso entendimento de que “faturamento” só pode ser
juridicamente definido como o conjunto dos ingressos decorrentes da comercialização
de mercadorias e da prestação de serviços, a despeito de interpretações mais
abrangentes, segundo as quais seria possível estender esse conceito à totalidade das
receitas decorrentes da atividade operacional da pessoa jurídica. Ampliar sua definição,
para fazê-la abarcar outras receitas, implica esvaziar a declaração de
inconstitucionalidade proferida pelo STF, intérprete último da Constituição, pondo em
risco a estabilidade e a confiabilidade de todo o sistema jurídico230.
230 A despeito disso, vêm sendo prolatados acórdãos no sentido de alargar o conceito de “faturamento” para abarcar outras receitas, inclusive receitas não decorrentes do objeto social da pessoa jurídica, o que nos parece uma aberração jurídica conducente à validação da inconstitucionalidade original da Lei nº 9.718/98, rechaçada pelo STF. Veja-se, nesse sentido, por exemplo, recente acórdão do STJ (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.432.952/PR. Relatora: Ministro Mauro Campbell Marques. Julgamento: 25 fev. 2004. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJe, 11 mar. 2014), em cuja ementa, primeiramente se afirma que a interpretação atual do STF, a respeito do conceito de faturamento, seria a de que o entendimento atual do STF seria o de que “a noção de faturamento deve ser compreendida no sentido estrito de receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, ou seja, a soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais”. Essa primeira afirmação já soa contraditória, pois ou bem o faturamento corresponde à receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, ou bem compreende a soma das receitas oriundas das atividades empresariais, já que é claro, para qualquer jurista, que as expressões em questão não são sinônimas, pois diversas atividades empresariais não configuram venda de mercadorias nem prestação de serviços. Ademais, ainda que não existisse tal incompatibilidade, contraditória seria a conclusão do tribunal no sentido de que “as receitas provenientes das atividades de construir, alienar, comprar, alugar, vender imóveis e intermediar negócios imobiliários integram o conceito de faturamento, para os fins de tributação a título de PIS e COFINS, incluindo-se aí as receitas provenientes da locação de imóveis próprios e integrantes do ativo imobilizado, ainda que este não seja o objeto social da empresa, pois o sentido de faturamento acolhido pela lei e pelo Supremo Tribunal Federal não foi o estritamente comercial” (grifamos). A nosso ver, esse acórdão do STJ conduz ao absurdo de concluir que toda e qualquer receita auferida pela pessoa jurídica, mesmo não decorrente de seu objeto social, pode ser entendida como faturamento, demonstrando que a matéria ainda se acha longe de estar pacificada e amadurecida nos Tribunais Superiores.
164
Fixadas essas premissas, é possível concluir, de plano, que as entidades
fechadas de previdência complementar não estão sujeitas à incidência do PIS e da
COFINS, considerando-se a legislação atualmente em vigor, pois não prestam serviços
nem comercializam mercadorias.
Com efeito, seus únicos ingressos consistem nas contribuições feitas pelas
patrocinadoras e pelos participantes dos planos, imediatamente convertidas em
obrigações em seu balanço, e alocadas a planos, cujos recursos são aplicados no
mercado financeiro, a fim de obterem-se rendimentos suficientes para o pagamento de
benefícios futuros (planos previdenciários) e ao plano de gestão administrativa, que tem
por objetivo o custeio das atividades gerenciais da entidade.
Nos termos do artigo 32, da Lei Complementar nº 109/01, as entidades
fechadas têm como objeto a administração e execução de planos de benefícios de
natureza previdenciária, sendo-lhes vedada, pelo parágrafo único desse dispositivo, a
prestação de quaisquer serviços fora do âmbito de seu objeto, ressalvados os serviços
assistenciais à saúde já prestados quando da edição da lei.
O objetivo das entidades fechadas de previdência complementar não é,
portanto, prestar serviços aos participantes ou aos segurados, mas sim atividade
específica, consistente na operação do regime de previdência privada, mediante a
instituição e a execução de planos de caráter previdenciário, baseados na constituição de
reservas que garantam o benefício231.
As contribuições ou aportes recebidos pelas entidades também contemplam,
usualmente, taxa de administração destinada à cobertura de suas despesas operacionais,
as quais são custeadas e contabilizadas no âmbito do Plano de Gestão Administrativa
(PGA). De todo modo, não se trata de receitas decorrentes da prestação de serviços aos
participantes ou à patrocinadora, uma vez que toda a gestão realizada pela entidade nada
mais é que atividade-meio, voltada para a sua finalidade última de conceder benefícios
231 BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001: “Art. 1º O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar. Art. 2º O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar.”
165
aos participantes dos planos, em hipótese alguma gerando lucro. Nesse sentido foi a
conclusão a que chegaram CARVALHO e MURGEL:
Assim sendo, não há que se falar no caso presente em pagamento de tributos incidentes sobre o faturamento. A uma, porque, conforme visto, inexiste expressão econômica nas atividades efetivadas pela entidade fechada de previdência complementar. A ocorrência do faturamento somente se dá quando a atividade exercida pela pessoa jurídica contenha expressão mercantil. Ou seja, para caracterização do fato gerador do PIS e da COFINS, a atividade deve ser praticada com o intuito de gerar retorno econômico – deve haver uma venda, efetivamente, de serviços. Por conseguinte, inexiste obrigação de recolher tais contribuições quando as atividades são efetivadas em proveito próprio (sistema de auto-gestão). Trata-se, com efeito, de uma hipótese de não-incidência de PIS e de COFINS nas atividades efetivadas pela entidade fechada de previdência complementar, porquanto não exprimem qualquer conotação econômica, sendo prestadas para proveito próprio. A duas, porque a legislação dos tributos em tela fala que sua base de cálculo é o faturamento auferido com a venda de serviços.232
Logo, como não prestam serviços nem vendem mercadorias, resta claro que
as entidades fechadas de previdência complementar não realizam o fato descrito na
hipótese de incidência das regras-matrizes veiculadas pela Lei nº 9.718/98, consistente
em obter “faturamento”. Consequentemente, forçoso concluir que não podem sujeitar-se
à contribuição ao PIS e à COFINS, tal como previstas pela legislação ordinária em
vigor.
5.2.2.2.1 Aplicabilidade da isenção do artigo 15 da Lei nº 9.532/96 às EFPC
Admitindo-se, contudo, que fosse possível concluir pela incidência da
contribuição ao PIS e da COFINS sobre os valores (aportes ou contribuições) recebidos
pelas entidades fechadas de previdência complementar, ainda assim tais entidades
restariam isentas de COFINS em relação às receitas decorrentes de suas atividades
próprias, e só poderiam se sujeitar à incidência da contribuição ao PIS calculada
mediante aplicação da alíquota de 1% (um por cento) sobre a folha de salários,
porquanto se lhes aplica o tratamento previsto nos seguintes dispositivos legais:
232 CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 202.
166
Art. 15. Consideram-se isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos. § 3º Às instituições isentas aplicam-se as disposições do art. 12, § 2°, alíneas "a" a "e" e § 3° e dos arts. 13 e 14. Medida Provisória nº 2.158-35/01 – Art. 13. A contribuição para o PIS/PASEP será determinada com base na folha de salários, à alíquota de um por cento, pelas seguintes entidades: […] IV - instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural, científico e as associações, a que se refere o art. 15 da Lei nº 9.532, de 1997; Art. 14. Em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de fevereiro de 1999, são isentas da COFINS as receitas: […] X - relativas às atividades próprias das entidades a que se refere o art. 13.233
Analisamos, linhas atrás, a natureza das entidades fechadas de previdência
complementar, concluindo que são fundações ou associações civis constituídas
exclusivamente para gerir planos de benefícios de caráter previdenciário em prol de
determinado grupo de pessoas (empregados das patrocinadoras ou associados a
entidades de classe), sendo-lhes vedado ter finalidade lucrativa.
Por conseguinte, não identificamos nenhum óbice à aplicação, a tais
entidades, da isenção de COFINS e do tratamento especial de PIS veiculados pela
legislação acima transcrita, caso se adote a premissa – da qual discordamos – de que
essas entidades têm “faturamento”.
Para tanto, contudo, as entidades em questão teriam de observar o disposto
no art. 12, § 2°, alíneas "a" a "e" e § 3° e dos arts. 13 e 14 da Lei nº 9.532/97, conforme
indicado no § 3º de seu artigo 15 acima transcrito. Ficariam, portanto, sujeitas às
seguintes obrigações, sob pena de suspensão da isenção:
a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais; c) manter escrituração completa de suas receitas e despesas em livros revestidos das formalidades que assegurem a respectiva exatidão; d) conservar em boa ordem, pelo prazo de cinco anos, contado da data da emissão, os documentos que comprovem a origem de suas receitas
233 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá outras providências. Brasília: DOU, 11 dez. 1997.
167
e a efetivação de suas despesas, bem assim a realização de quaisquer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial; e) apresentar, anualmente, Declaração de Rendimentos, em conformidade com o disposto em ato da Secretaria da Receita Federal; […]234
Note-se, contudo, que essa inteligência não costuma prevalecer perante os
tribunais administrativos. Ao analisar a matéria, o antigo 2º Conselho de Contribuintes
afastou a aplicação dessa isenção às entidades fechadas de previdência complementar,
por entender que elas “foram destacadas do grupo ou das demais entidades de sorte a
merecerem tratamento diferenciado, contido em legislação própria, devendo a ela,
portanto, se submeter”. No caso concreto analisado, manteve a isenção, sob o
argumento de que a entidade autuada era fundação mantida pelo poder público,
enquadrando-se, portanto, em outra hipótese do dispositivo legal235.
5.2.2.2.2. Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EFPC
A despeito de nosso entendimento no sentido da aplicabilidade, às entidades
fechadas de previdência complementar, da isenção prevista pelo artigo 15 da Lei nº
9.532/96, o tratamento dado pelo legislador a tais entidades considera que esta não lhes
é aplicável, e veicula diversas exclusões especiais na base de cálculo do PIS e da
COFINS, considerados como devidos. Com efeito, foi com fundamento na existência
234 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá outras providências. Brasília: DOU, 11 dez. 1997.
235 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Contribuintes. Acórdão n° 203-12.068. Processo nº 10166.007765/2001-21. Recurso n°119.726 Voluntário. Relator: Odassi Guerzoni Filho. Julgamento: 23 maio 2007. Órgão Julgador: Terceira Câmara / Segundo Conselho de Contribuintes. Matéria: Cofins - Auto de Infração. Publicação: DOU, 23 maio 2007. Neste particular, prevaleceu o entendimento exposto no voto vencido do Relator Odassi Guerzoni Filho: “A partir da Emenda Constitucional de Revisão n° 1, de 1° de março de 1994, e das Emendas Constitucionais n° 10, de 4 de março de 1996, e n° 17, de 22 de novembro de 1997, o legislador, ao exercer o poder constituinte derivado, estabeleceu que todas as pessoas jurídicas mencionadas no § 1° do art. 22 da Lei n° 8.212/1991, aí compreendidas as entidades de previdência privada abertas e fechadas, deveriam contribuir para a Cofins, com base no faturamento, definido como sendo a receita bit’ a das vendas de mercadorias. de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza, e a partir da vigência da Lei n° 9.718, de 1998, com base na receita bruta, entendida como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevante o tipo da atividade exercida ‘e a classificação contábil adotada para o seu registro. Dessa forma, as entidades de Previdência Privada foram destacadas do grupo ou das demais entidades de sorte a merecerem tratamento diferenciado, contido em legislação própria, devendo a ela, portanto, se submeter. Em face do exposto, afasto, também, o argumento de que a recorrente esteja isenta da Cofins sob o abrigo do referido artigo 14 da MP 2.158-35”.
168
desse conjunto de normas sobre a matéria que o Conselho de Contribuintes deixou de
aplicar a referida isenção, no acórdão acima referido.
A Lei nº 9.718/98 estabelece os seguintes dispositivos, no que concerne à
base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS supostamente devidos por
entidades fechadas de previdência complementar:
Art. 2º As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento, observadas a legislação vigente e as alterações introduzidas por esta Lei. Art. 3º O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. § 5º Na hipótese das pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, serão admitidas, para os efeitos da COFINS, as mesmas exclusões e deduções facultadas para fins de determinação da base de cálculo da contribuição para o PIS/PASEP. § 6º Na determinação da base de cálculo das contribuições para o PIS/PASEP e COFINS, as pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, além das exclusões e deduções mencionadas no §5, poderão excluir ou deduzir: […] III - no caso de entidades de previdência privada, abertas e fechadas, os rendimentos auferidos nas aplicações financeiras destinadas ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e de resgates; (Incluído pela Medida Provisória nº 2158-35, de 2001).236
As deduções mencionadas no § 5º, referentes à contribuição ao PIS e que
também se aplicam à COFINS, consistem na previsão, pelo artigo 1º, V da Lei nº
9.701/98, de que as entidades de previdência privada, abertas e fechadas, poderão
excluir, da receita bruta operacional auferida no mês, a parcela das contribuições
destinada à constituição de provisões ou reservas técnicas.
O inciso III do § 6º, acima transcrito, por sua vez, autoriza expressamente a
dedução, pelas entidades de previdência privada abertas e fechadas, dos rendimentos
auferidos nas aplicações financeiras destinadas ao pagamento de benefícios de
aposentadoria, pensão, pecúlio e de resgates.
Por fim, o art. 32, da Lei nº 10.637/2002, trata de exclusões específicas para
fim de apuração da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS,
exclusivamente para entidades fechadas de previdência complementar:
236 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Altera a Legislação Tributária Federal. Brasília: DOU, 28 nov. 1998.
169
Art. 32. As entidades fechadas de previdência complementar poderão excluir da base de cálculo da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, além dos valores já previstos na legislação vigente, os referentes a: I - rendimentos relativos a receitas de aluguel, destinados ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates; II - receita decorrente da venda de bens imóveis, destinada ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates; III - resultado positivo auferido na reavaliação da carteira de investimentos imobiliários referida nos incisos I e II.237
Conforme as regras acima transcritas, ficam excluídos da base de cálculo
das contribuições (que seriam os aportes ou contribuições recebidos de participantes e
patrocinadores): (i) a parcela das contribuições destinada à constituição de provisões ou
reservas técnicas, (ii) os rendimentos auferidos nas aplicações financeiras destinadas ao
pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e de resgates, (iii) as receitas
de aluguel, destinadas ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e
resgates; (iv) a receita decorrente da venda de bens imóveis, destinada ao pagamento de
benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates; e (v) o resultado positivo
auferido na reavaliação da carteira de investimentos imobiliários referida nos incisos.
Todas as exclusões previstas na legislação, da base de cálculo da
contribuição ao PIS e da COFINS das entidades fechadas de previdência complementar,
acabam por reduzi-la meramente aos valores recebidos pelas entidades para a cobertura
de seus custos, ou seja, às taxas de administração.
Contudo, a despeito da boa vontade do legislador, no sentido de proceder às
justas exclusões acima referidas, esta não é a forma correta de desonerar as entidades
fechadas da incidência de tais contribuições, uma vez que, como demonstrado, elas não
obtêm “faturamento” em sua atividade e, ainda que o obtivessem, estariam isentas da
COFINS e sujeitas apenas à incidência do PIS calculado à alíquota de 1% sobre a folha
de salários, por serem fundações ou associações civis sem fins lucrativos.
Indo além, ainda que fosse cabível dizer que a base de cálculo do PIS e da
COFINS não se restringe ao “faturamento”, podendo englobar as “receitas decorrentes
237 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.637 de 30 de dezembro de 2002. Dispõe sobre a não-cumulatividade na cobrança da contribuição para os Programas de Integração Social (PIS) e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), nos casos que especifica; sobre o pagamento e o parcelamento de débitos tributários federais, a compensação de créditos fiscais, a declaração de inaptidão de inscrição de pessoas jurídicas, a legislação aduaneira, e dá outras providências. Brasília: DOU, 31 dez. 2002 edição extra.
170
da atividade-fim da empresa”, e que não fosse aplicável a isenção prevista no artigo 15
da Lei nº 9.532/97, mesmo assim esbarraríamos na impossibilidade de considerar como
“receitas” os valores ingressados no patrimônio das entidades fechadas de previdência
privada, a título de aportes ou contribuições dos participantes e patrocinadoras, pelas
razões que passaremos a expor.
5.2.2.2.3 Contribuições recebidas por EFPC versus receita
A fim de afastar qualquer dúvida no que tange ao cabimento da incidência
da contribuição ao PIS e da COFINS sobre as contribuições realizadas, por
patrocinadoras e participantes, a planos previdenciários administrados por entidades
fechadas de previdência privada, e sobre os rendimentos decorrentes da aplicação
financeira dos respectivos recursos garantidores, importante fazer a distinção entre tais
ingressos e “receitas”.
A definição do conceito de “receita” já foi objeto de análise detida no
presente trabalho, a fim de apartá-lo da noção de “indenização”, bem como para
determinar se seria viável tratar, como tal, parte ou o total dos prêmios de seguro
recebidos por seguradoras e resseguradoras.
Até aqui, temos utilizado, com bons resultados, a definição construída pela
Doutrina, neste tópico representada por JOSÉ ANTONIO MINATEL, a qual exige, para sua
configuração, a presença certos requisitos238.
Passamos a investigar, agora, se as contribuições feitas a plano de
previdência privada por patrocinadores e participantes, transferidas, portanto, à
propriedade das entidades de previdência complementar, e os rendimentos de suas
aplicações financeiras, atendem aos requisitos exigidos pela Doutrina para a
configuração desse conceito:
(a) Ingresso de recursos financeiros no patrimônio da pessoa jurídica –
Sim, em termos.
238 MINATEL, José Antonio. Conteúdo Jurídico do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação. São Paulo: MP, 2005, p. 255.
171
As contribuições e rendimentos recebidos pelas entidades caracterizam
ingresso de recursos financeiros no patrimônio da entidade fechada de previdência
complementar, que assume a respectiva propriedade para realizar a sua gestão, dentro de
planos previdenciários e do plano de gestão administrativa. Contudo, a natureza desses
ingressos é sui generis e diversa de ingressos de receitas recebidos por pessoas jurídicas
com outras atividades, na medida em que a totalidade dos recursos recebidos é alocada
em contas de passivo (provisões técnicas) em favor dos próprios participantes, dentro
dos planos, destinadas ao pagamento de benefícios futuros. Apenas pequena parcela
desses recursos é alocada em contas administrativas, no plano de gestão administrativa,
destinadas à cobertura dos gastos operacionais da entidade, não podendo gerar lucro.
(b) Vinculada ao exercício da atividade empresarial – Não.
As entidades fechadas de previdência complementar não exercem atividade
empresarial, pois não têm, e são proibidas de ter, fim lucrativo, o que é essencial à sua
caracterização. Ademais, os valores recebidos não configuram remuneração pela sua
atividade, mas sim, predominantemente, a entrega de recursos para serem por ela
administrados – e o recebimento dos frutos desses recursos (rendimentos decorrentes de
sua aplicação no mercado financeiro) –, para futura devolução sob a forma de resgate ou
benefício. Por conseguinte, não se pode afirmar que os ingressos em questão sejam
vinculados ao exercício da atividade empresarial dessas entidades.
(c) Contraprestação em negócio jurídico que envolva a venda de
mercadorias ou prestação de serviços, assim como pela cessão
onerosa e temporária de direitos e pela remuneração de
investimentos – Não.
Os aportes recebidos pelas entidades fechadas de previdência privada não
correspondem a contraprestações ajustadas em negócios jurídicos. Embora seja
necessário, para a realização dos aportes, um contrato entre as partes – contrato
previdenciário –, prevendo direitos e obrigações da entidade, da patrocinadora e do
participante, o montante das contribuições não se define como prestação correspondente
à atuação da entidade, consistindo, majoritariamente, na entrega de recursos submetidos
à sua gestão, os quais serão restituídos ao participante na forma de resgate ou benefício
172
no futuro. Também não decorrem da venda de mercadorias, da prestação de serviços,
nem da cessão onerosa e temporária de direitos ou da remuneração de investimentos.
(d) Definitividade do ingresso – Não.
Os ingressos em questão – aportes recebidos por entidades fechadas de
previdência complementar – não integram, absolutamente, de forma definitiva o
patrimônio da entidade. Dada a sua natureza, logo que recebidos são contabilizados em
provisões técnicas, constituídas no passivo da entidade (isto é, como obrigações) e
destinadas ao pagamento de benefícios futuros. Fatalmente, portanto, retornarão aos
participantes sob a forma de resgate, benefício, ou serão transferidos por ele para outro
plano, no exercício da portabilidade.
(e) Mensuração instantânea a isolada em cada evento, abstraindo-se dos
custos e de periodicidade para sua apuração – Sim.
Esse requisito está presente nos aportes recebidos por entidades fechadas de
previdência complementar e nos rendimentos auferidos na aplicação de seus recursos,
uma vez que tais ingressos podem ser mensurados em cada evento, abstraindo-se dos
custos e de periodicidade para sua apuração.
Em conclusão, observamos que, de cinco requisitos essenciais para a
configuração do conceito de receita, os aportes recebidos por entidades fechadas de
previdência complementar, bem como seus rendimentos, atendem integralmente a
apenas um, a possibilidade de mensuração isolada, donde resta claro que não podem ser
entendidos como “receitas” para fins de incidência da contribuição ao PIS e da
COFINS.
Foi essa, também, a conclusão a que chegou, incensuravelmente, a
Conselheira KAREN JUREIDINI DIAS, em acórdão da Câmara Superior de Recursos
Fiscais que relatou, afastando a incidência da CSLL sobre o superávit apurado pelas
entidades fechadas de previdência complementar:
De mais a mais, a incidência da CSLL no presente caso se faz impossível tendo em vista que as EFPC's não possuem receita, mas apenas administram receitas de propriedade dos patrocinadores e dos participantes. Sobre o conceito de receita, José Antônio Minatel reconhece uma série de atributos imprescindíveis para sua configuração, sendo eles:
173
"a) conteúdo material: ingresso de recursos financeiros no patrimônio da pessoa jurídica; b) natureza do ingresso: vinculada ao exercício de atividade empresarial; c) causa do ingresso: contraprestação, em negócio jurídico que envolva a venda de mercadorias ou prestação de serviços, assim como pela cessão onerosa e temporária de bens e direitos pela remuneração de investimentos: d) disponibilidade: pela definitividade do ingresso: e) mensuração instantânea: isolada em cada evento, abstraindo-se dos custos e de periodicidade para a sua apuração." As entidades fechadas de previdência complementar, de modo geral, têm por escopo a administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária, exclusivamente, sendo-lhes vedada a prestação de quaisquer serviços que não estejam no âmbito do seu objeto social (artigo 2° da Lei Complementar n° 109/2001). Nesse sentido, recebem as contribuições de patrocinadores e participantes e administram tais recursos de maneira a possibilitar o melhor alcance dos objetivos da entidade, cujo fim será a manutenção da previdência privada dos participantes. Dessa maneira, não há que se falar em disponibilidade dos recursos. Ainda, o ingresso de recursos não se dá pelo desenvolvimento de uma atividade empresarial, mas sim pela vontade de participantes em poupar capital destinado à formação futura de previdência complementar. Por esses dois motivos nota-se que os recursos que ingressam na conta corrente das EFPC's e que por elas são administrados não se caracterizam como receita.239
Portanto, ainda que sobrevenha legislação futura, sob a égide da Emenda
Constitucional nº 20/98, estabelecendo a “totalidade das receitas” e não mais o
“faturamento” como base de cálculo do PIS e da COFINS devidos pelas entidades
fechadas de previdência complementar, e que não lhes seja aplicável a isenção do artigo
15, da Lei nº 9.532/97, os aportes recebidos por essas entidades não poderão ser
caracterizados como receitas e ficarão, inexoravalmente, fora do âmbito de incidência
dessas contribuições240.
239 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 01-06.016. Processo n° 10166.003496/2004-76, Recurso n° 105-145.995 Especial do Procurador. Matéria: CSLL. Relatora: Karem Jureidini Dias. Julgamento: 14 out. 2008. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DOU, 14 out. 2008, grifamos.
240 Não obstante estarmos seguros dos fundamentos jurídicos que sustentam nossa posição, cabe mencionar que a questão permanece em aberto perante o Poder Judiciário. Recentemente ficou clara a indefinição dos Tribunais Superiores, quando o STJ julgou recurso da BB Previdência – Fundo de Pensão do Banco do Brasil (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.390.261/DF. Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. Julgamento: 11 fev. 2014. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: 21 fev. 2014). No Recurso, a entidade pleiteava a dedução, da base de cálculo da COFINS, da rubrica denominada “transferência interprograma”, realizada com recursos do PGA para pagamento de terceiro contratado para gerir os respectivos recursos no mercado financeiro. O STJ denegou o pleito da Recorrente, sob o argumento de que tal exclusão não seria autorizada entre
174
5.2.2.3 IRPJ, CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária
5.2.2.3.1 Lucro versus superávit
A fim de adentrarmos a análise das normas tributárias relacionadas ao IRPJ
e à CSLL aplicáveis às entidades fechadas de previdência complementar, é imperativo
lógico verificar se tais entidades apuram lucro241, elemento básico conformador das
respectivas bases de cálculo. Para isso é necessário recapitular alguns aspectos da sua
natureza e das normas que as regulam.
Já pontuamos que o artigo 202 da Constituição Federal estabeleceu os
princípios básicos da previdência privada e foi regulamentado pela Lei Complementar
n° 109, de 29 de maio de 2001, que revogou a Lei n° 6.435/77 e tratou de todas as
questões relativas à formação, manutenção e fiscalização das entidades de previdência
complementar.
De acordo com as normas vigentes, as entidades de previdência
complementar podem ser abertas ou fechadas (artigo 4º da LC 109/01). As primeiras
oferecem planos de previdência privada a qualquer pessoa; as outras se circunscrevem a
empregados de determinada empresa ou grupo econômico ou a membros de entidades
de classe. Organizam-se sob a forma de fundações ou sociedades civis e são
obrigatoriamente sem fins lucrativos, nos termos do artigo 31, § 1º, da LC 109/01.
Ora, o simples impedimento legal de auferir lucros já deveria ser suficiente
para que se afastasse, em definitivo, qualquer cogitação quanto à sujeição passiva das
entidades fechadas de previdência complementar à incidência de IRPJ ou CSLL.
as hipóteses previstas na legislação. Ressalvou-se, contudo, no voto, que a questão da aplicabilidade ou não da Lei nº 9.718/98, às entidades de previdência privada, embora tenha sido decidida pelo TRF1 (tribunal de origem), não foi objeto do REsp. Quando da análise da matéria, contudo, o TRF1 “manteve a sentença que denegou segurança, ao fundamento de que: a) a declaração da inconstitucionalidade do art. 3º, § 1º, da Lei 9.718/98 pela Suprema Corte não beneficiou as entidades de previdência complementar, sujeitas à tratamento diverso pela lei; b) o recolhimento do PIS e da COFINS dessas entidades segue regramento próprio, conforme as Leis 9.701/98 e 9.718/98, que não alberga a “transferência interprograma” como parcela suscetível de exclusão ou dedução da base de cálculo”.
241 A rigor, a base de cálculo do IRPJ é o “lucro real”, consistente no lucro líquido do período, apurado de acordo com a lei comercial e ajustado pelas adições e exclusões estabelecidas pela legislação do imposto sobre a renda. Já a base de cálculo da CSLL é o lucro ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação específica dessa contribuição. As diferenças entre esses conceitos não são relevantes para os fins da presente análise, onde nos referiremos ao “lucro” como base de cálculo desses dois tributos.
175
Todavia, a despeito de estarem proibidas de auferir lucro, é comum encontrar-se, na
contabilidade dessas entidades, materialidade análoga, mas com marcantes diferenças: o
superávit. Daí decorre toda a controvérsia a respeito do cabimento de esse montante ser
tratado como base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
A distinção entre superávit e lucro é bem explicada por SACHA CALMON
NAVARRO COELHO:
Para as entidades fechadas de providência privada, a formação do resultado ocorre de forma bastante diferente, pois, apesar da contabilidade registrar as contribuições como receitas e os benefícios como despesas, esses valores são anulados no demonstrativo dos resultados pelos cálculos atuariais e incorporados diretamente nas rubricas do patrimônio líquido como benefícios concedidos, benefícios a conceder e reservas a amortizar. O superávit de um fundo de previdência, ou seja, a receita que excede a despesa, trata-se apenas da remuneração dos capitais aplicados, ou seja, o superávit é o resultado dos rendimentos econômicos e financeiros dos capitais aplicados no ativo, menos a amortização da dívida, que são reservas matemáticas. Poderíamos dizer, de um modo mais simples, que o balanço de um fundo de Previdência é constituído somente de contas ativa e passiva, não existindo, assim, resultados operacionais, receita líquida, lucro operacional, lucro líquido, lucro bruto, etc., pois os recursos do mês são canalizados para: pagamento dos benefícios já concedidos e aplicação em novos investimento, além de reinvestir os recursos já existentes.242
São esclarecedoras essas observações, quanto à contabilização dos recursos
das entidades de previdência privada. De fato, sua natureza reclama regramento contábil
próprio, previsto pela lei e pelo órgão regulador243, que determina a imediata
contabilização, nos balancetes dos planos previdenciários ou do PGA (Programa de
Gestão Administrativa), de todos os ingressos e saídas de recursos do plano. Em tais
condições, ou bem os recursos da entidade ingressam nos balancetes dos planos de
benefícios (ou assistenciais, se houver), para então servir exclusivamente às suas
finalidades, ou bem são contabilizados no seu programa de gestão administrativa,
conforme planos de contas formulados anualmente, para custeio de suas despesas de
gestão.
242 COELHO, Sacha Calmon Navarro. PIS/COFINS — Lei n° 9.718/98 — Entidades Fechadas de Previdência Privada. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 55, p. 128-146, abr. 2000.
243 BRASIL. Ministério da Previdência Social. Secretaria de Previdência Complementar. Instrução MPS/SPC nº 34, de 24 de setembro de 2009. Estabelece normas específicas para os procedimentos contábeis das entidades fechadas de previdência complementar, define a forma, o meio e a periodicidade de envio das demonstrações contábeis, e dá outras providências. Brasília: DOU, 28 set. 2009.
176
Daí se poderá ter superávit técnico, se ocorrer resultado positivo no âmbito
dos balancetes dos planos de benefícios. Nesse caso, conforme previsto na Lei
Complementar 109/01 e reproduzido pelo item 27 da referida instrução, “deve ser
contabilizado em ‘Reserva de Contingência’, até o limite de 25% (vinte e cinco por
cento) das ‘Provisões Matemáticas’, e o que exceder esse percentual em ‘Reserva
Especial para Revisão de Plano’". Quanto aos valores alocados no Plano de Gestão
Administrativa, na hipótese de não serem integralmente utilizados no período,
tampouco são distribuídos como ocorreria, se se tratasse de lucro, sendo mantidos em
conta para o exercício seguinte, reduzindo a necessidade de novos aportes.
A diferença entre superávit e lucro também foi muito bem explorada pela
Conselheira KAREN JUREIDINI DIAS, no seu voto magistral proferido no Acórdão 01-
06.016244, do qual foi Relatora na Câmara Superior de Recursos Fiscais:
Sinteticamente, lucro e superávit consistem em diferenças apuradas entre ingresso de receitas ou outra espécie e despesas. Contudo, o lucro, objetivo maior de qualquer atividade empresarial, é obtido com o objetivo de ser repassado aos sócios da pessoa jurídica e de ser repartido entre aqueles que possibilitam o desenvolvimento da atividade empresarial. O superávit, por sua vez, consiste em resultado positivo que, por ser auferido por pessoa jurídica sem fins lucrativos, não é repassado a ninguém, mas sim reinvestido na própria entidade, da maneira que determinar a legislação. O superávit não tem o caráter de disponibilidade, intrínseco ao lucro.
Embora lucro e superávit resultem igualmente do resultado positivo obtido
mediante cotejo entre ingressos e saídas de recursos na contabilidade de uma pessoa
jurídica, sua natureza exibe diferenças que não podem ser ignoradas.
Ora, o objetivo de uma pessoa jurídica empresária é auferir lucro para dele
dispor da forma que seus sócios entenderem conveniente, ou seja, distribuir ou
capitalizar, reinvestir, hipótese em que o patrimônio dos sócios é acrescido pela
valorização de sua participação na sociedade.
O superávit é obtido por pessoas jurídicas às quais é defeso ter fins
lucrativos. A própria lei determina a finalidade a dar-lhe, sempre distinta da distribuição
a sócios ou associados. No caso das entidades fechadas de previdência privada, a Lei
244 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 01-06.016. Processo n° 10166.003496/2004-76, Recurso n° 105-145.995 Especial do Procurador. Matéria: CSLL. Relatora: Karem Jureidini Dias. Julgamento: 14 out. 2008. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DOU, 14 out. 2008.
177
Complementar n° 109/01 determina, em seu artigo 20, que o superávit seja aplicado
numa reserva de contingência, possibilitando, assim, o cumprimento de obrigações
futuras245.
Nem se diga que os rendimentos auferidos pelas entidades fechadas, em
aplicações financeiras, isoladamente considerados, mereceriam tratamento diverso,
podendo ser tributados pelo IRPJ e pela CSLL. O objetivo desses rendimentos continua
sendo o mesmo das contribuições efetuadas aos planos: garantir recursos necessários ao
pagamento de benefícios futuros. Por essa razão, quando gerados, são automaticamente
transferidos às reservas constituídas no passivo dos planos administrados pela entidade,
para pagamento de benefícios. Nesse sentido é a explicação de CARVALHO e MURGEL:
Logo, os rendimentos decorrentes de aplicações financeiras de entidades fechadas de previdência complementar, bem como os valores recebidos do patrocinador e dos participantes de uma entidade fechada de previdência complementar, estão vinculados ao pagamento de benefícios ou à composição de reservas técnicas, permanecendo, sempre, voltados para a atividade fim dessas entidades. Tanto é assim que os rendimentos decorrentes de aplicações financeiras são considerados tais como os gastos na administração e pagamentos de benefícios, ou seja, como despesas, conforme planificação contábil aprovada pela Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência e Assistência Social. Verifica-se, desse modo, o equilíbrio financeiro, igualando direitos e obrigações.246
Como exposto, todos os recursos ingressados no patrimônio das entidades
fechadas de previdência complementar, inclusive os rendimentos obtidos nas aplicações
financeiras que realiza, são alocados a obrigações. Eventual excedente não
caracterizaria lucro, e tem destinação prevista em lei, consistente na contabilização em
245 “Art. 20. O resultado superavitário dos planos de benefícios das entidades fechadas, ao final do exercício, satisfeitas as exigências regulamentares relativas aos mencionados planos, será destinado à constituição de reserva de contingência, para garantia de benefícios, até o limite de vinte e cinco por cento do valor das reservas matemáticas.
§ 1o Constituída a reserva de contingência, com os valores excedentes será constituída reserva especial para revisão do plano de benefícios.
§ 2o A não utilização da reserva especial por três exercícios consecutivos determinará a revisão obrigatória do plano de benefícios da entidade.
§ 3o Se a revisão do plano de benefícios implicar redução de contribuições, deverá ser levada em consideração a proporção existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes, inclusive dos assistidos.” (BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001).
246 Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 95.
178
reserva para futura revisão do plano, jamais podendo ser destinado a distribuição,
convertendo-se assim em benefício para os participantes.
Consequentemente, superávit e lucro não podem, jamais, ser equiparados.
Daí porque estamos diante, ao tratar de IRPJ e CSLL, de verdadeiras hipóteses de não-
incidência tributária, em se tratando dos resultados (déficit ou superávit) apurados por
entidades fechadas de previdência privada.
Em 07/02/2014, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão
geral da matéria objeto do recurso da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de
Previdência Complementar – ABRAPP247, em que se arguia a inconstitucionalidade de
regras que pretendiam tributar o superávit das entidades fechadas de previdência
privada (MP nº 2.222/2001, revogada pela Lei nº 11.053/04 e Lei nº 6.465/77, revogada
pela Lei Complementar nº 109/01).
Ao julgar e prover os embargos que questionaram a admissibilidade do
Recurso Extraordinário, em 08/10/2013, o STF acabou por admiti-lo, por entender que a
questão fático-jurídica nele debatida já não era a imunidade tributária prevista no art.
150, VI, “c” da CF/88, relativa às entidades de assistência social, mas discussão sobre
as normas dos artigos 150, III e 195, I, “c”:
2. A controvérsia se subscreve à arguição de incompatibilidade entre a previsão constitucional de lucro e renda para a CSLL e o IRPJ, respectivamente, e a natureza jurídica não-lucrativa das entidades fechadas de previdência complementar, determinada pela lei federal que trata dessas pessoas jurídicas (Lei nº 6.435/77, revogada pela Lei complementar 109/01, atualmente em vigor), o que, segundo sustentado, afastaria a incidência das exações, vez que a configuração do fato gerador desses tributos decorre do exercício de atividade empresarial que tenha por objeto ou fim social a obtenção de lucro. 3. O argumento trazido no extraordinário refere-se à alegada inconstitucionalidade da regra do artigo 1º da MP nº 2.222, de 4 de setembro de 2001, ao estabelecer que partir de 1º de janeiro de 2002, os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de entidades abertas de previdência complementar e de sociedades seguradoras que operam planos de benefícios de caráter previdenciário, ficam sujeitos à incidência do imposto de renda de acordo com as normas de tributação aplicáveis às pessoas físicas e às pessoas jurídicas não-financeiras. 4. A impetração, desde a origem, se volta contra a retenção do IRPJ na fonte sobre os rendimentos auferidos nas aplicações de fundos de
247 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 612.686/SC. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgamento: 08 out. 2013. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe, 23 out. 2013.
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investimento das entidades fechadas, uma vez ausente a finalidade lucrativa dos fundos de pensão para configurar o fato gerador do tributo e as prévias constituições de reserva de contingência e reserva especial e revisão do plano atuarial, ao longo de pelo menos 3 (três) exercícios financeiros para aferir-se sobre a realização ou não do superávit, que, na seara contábil, não equivaleria a lucro. 5. Debate sobre a natureza da entidade de previdência complementar, a implicar a incidência dos tributos de IRPJ E CSLL, que pressupõe a ocorrência do fato gerador “lucro” ou “faturamento” pela pessoa jurídica, ante à previsão do artigo 195, I, a e c, da CF/88. 6. Embargos de declaração providos, com efeitos modificativos, para restabelecer o recurso extraordinário a fim de submeter o feito ao Plenário Virtual.248
Sendo julgado o RE 612.686 pelo STF, ter-se-á, finalmente, uma posição
definitiva quanto à distinção entre lucro e superávit, em especial no âmbito das
entidades fechadas de previdência complementar, e sobre a incidência ou não de IRPJ e
CSLL o superávit.
5.2.2.3.2 IRPJ e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária
A despeito da nossa posição, acima declarada, segundo a qual as entidades
fechadas de previdência privada estão fora do âmbito de incidência do IRPJ e da CSLL,
por não auferirem lucros em hipótese alguma, não podendo ser caracterizado como tal
eventual superávit, deve-se reconhecer que a sujeição das entidades de previdência
privada – inclusive fechadas – à incidência do imposto sobre a renda sempre foi um
tema controvertido.
Já tivemos oportunidade de analisar, neste trabalho, o julgamento que
culminou na fixação do entendimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de que as
entidades fechadas de previdência privada não são beneficiárias de imunidade
constitucional, por não serem assistenciais. Discordamos do afastamento de sua
natureza assistencial pelo simples fato de receberem contribuição dos participantes dos
planos e demonstramos, linhas atrás, os fundamentos da nossa dissidência. Todavia,
enquanto prevalecer essa orientação jurisprudencial e não se consolidar no âmbito dos
Tribunais a distinção entre lucro e superávit, sobreviverá o entendimento de que o
248 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 612.686/SC. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgamento: 08 out. 2013. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe, 23 out. 2013.
180
legislador da União tem competência para exigir imposto sobre a renda e contribuição
social sobre o lucro líquido de entidades de previdência privada.
Passamos a analisar, agora, o cenário jurídico que se descortinou após o
julgamento do STF afastando a imunidade das entidades fechadas de previdência
complementar.
Estabelecida, pelo Supremo Tribunal Federal, a jurisprudência acima
referida, o que havia no sistema eram as isenções, atribuídas pela legislação do imposto
sobre a renda, às entidades fechadas de previdência privada e às entidades abertas sem
fins lucrativos. Não estava pacificado, como ainda não está, o entendimento de que
estaríamos, no caso dos resultados das entidades fechadas, diante de verdadeiras
hipóteses de não incidência tributária. Com efeito, o Decreto-lei nº 2.065/1983
veiculava em seu artigo 6º, e ainda veicula, regra expressa no sentido da isenção das
entidades fechadas de previdência privada em relação ao imposto sobre a renda249.
Todavia, essa isenção não abrangia os juros, os rendimentos e os ganhos de
capital auferidos pelas entidades fechadas de previdência privada, tornando-se inócua,
pois o objetivo central de qualquer entidade de previdência privada é aplicar,
principalmente no mercado financeiro, os recursos garantidores dos planos que
administra, gerando reservas suficientes para fazer frente ao pagamento da
aposentadoria de seus participantes, na forma acordada. Assim, tributar os rendimentos
auferidos por essas entidades no mercado financeiro e seus ganhos de capital reduziria
consideravelmente os recursos disponíveis para capitalização durante o período de
acumulação, pouco valendo a manutenção de isenção genérica quanto ao imposto sobre
a renda auferido ao final do período de apuração.
249 “Art. 6º - As entidades de previdência privada referidas nas letras “a”do item I e “b”, do item II, do Art. 4, da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, estão isentas do Imposto sobre a Renda de que trata o Art. 24 do Decreto-Lei nº 1.967 de 23 de novembro de 1982.
§ 1º - A isenção de que trata este artigo não se aplica ao imposto incidente na fonte sobre dividendos, juros e demais rendimentos de capital recebidos pelas referidas entidades.
§ 2º - O imposto de que trata o parágrafo anterior será devido exclusivamente na fonte, não gerando direito à restituição.
§ 3º - Fica revogado o § 3, do Art. 39, da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977” (BRASIL. Presidência da República. Decreto-lei nº 2.065, de 26 de outubro de 1983. Altera a Legislação do Imposto sobre a Renda, Dispõe sobre o Reajustamento dos aluguéis Residenciais, sobre as Prestações dos Empréstimos do Sistema Financeiro da Habitação, sobre a Revisão do Valor dos Salários, e dá outras Providências. Brasília: DOU, 28 out. 1983).
181
Também seria aplicável, às entidades fechadas de previdência privada, a
isenção geral, cronologicamente posterior à específica, acima referida, prevista pelo
artigo 15, da Lei nº 9.532/97, para as associações civis que prestem os serviços para os
quais tiverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se
destinam, sem fins lucrativos250, conforme inclusive já tratado quando discorremos
sobre o tratamento de PIS e COFINS atribuível a essas entidades. Entretanto, essa
isenção também é restrita. De acordo com os parágrafos do artigo, aplica-se
exclusivamente em relação ao imposto sobre a renda da pessoa jurídica e à contribuição
social sobre o lucro líquido, não abrangendo os rendimentos e ganhos de capital
auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.
5.2.2.3.3 O tratamento atribuído pela MP nº 2.222/01 aos rendimentos das
entidades de previdência privada
Em face desse cenário, e na tentativa de atribuir tratamento tributário
adequado às entidades de previdência privada, logo após o julgamento da imunidade
pelo STF, editou-se a Medida Provisória nº 2.222, de 04 de setembro de 2001.
Foi estabelecido, em seu artigo 1º que, a partir de 1º de janeiro de 2002, os
rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas
técnicas e fundos de entidades abertas de previdência complementar e de sociedades
seguradoras, que operassem planos de benefícios de caráter previdenciário, ficariam
sujeitos à incidência do imposto de renda de acordo com as normas de tributação
aplicáveis às pessoas físicas e às pessoas jurídicas não-financeiras. O artigo 2º previa o
direito de opção, pelas entidades abertas e fechadas, por um regime tributário especial,
cabendo-lhes escolher a sistemática que considerassem mais vantajosa.
250 “Art. 15. Consideram-se isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos. (Vide Medida Provisória nº 2158-35, de 2001)
§ 1º A isenção a que se refere este artigo aplica-se, exclusivamente, em relação ao imposto de renda da pessoa jurídica e à contribuição social sobre o lucro líquido, observado o disposto no parágrafo subseqüente.
§ 2º Não estão abrangidos pela isenção do imposto de renda os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.
§ 3º Às instituições isentas aplicam-se as disposições do art. 12, § 2°, alíneas “a” a “e” e § 3° e dos arts. 13 e 14” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá outras providências. Brasília: DOU, 11 dez. 1997).
182
A regra geral do artigo 1º consistia na tributação normal dos ganhos com
compensação do imposto retido na fonte. O imposto incidia na fonte, à alíquota de 20%,
sobre todos rendimentos e ganhos proporcionados por recursos provenientes de aporte
de contribuições durante o período de acumulação e, ao final do período de apuração, a
entidade apuraria o IRPJ abatendo as retenções na fonte realizadas ao longo do ano.
Tratava-se de regra aplicável a toda e qualquer pessoa jurídica.
A regra do artigo 1º não era aplicável às entidades fechadas de previdência
privada, em razão da isenção prevista no artigo 6º, do Decreto-lei nº 2.065/1983. Assim,
as entidades fechadas não teriam seu superávit tributado ao final do período de
apuração. Contudo, como a isenção excepcionava os rendimentos auferidos em
aplicações financeiras, o regime especial previsto no artigo 2º se estendia às entidades
fechadas.
A regra especial e opcional era o chamado “Regime Especial de Tributação
- RET”, que também previa a incidência do imposto sobre os referidos rendimentos à
alíquota de 20% (vinte por cento) mas se utilizava de sistemática sui generis. Esta
consistia, primeiro, na aplicação da alíquota de 20% (vinte por cento) sobre os ganhos e
rendimentos das provisões, reservas técnicas e fundos e sobre os demais resultados
positivos das operações financeiras. O resultado era então limitado ao produto do valor
da contribuição da pessoa jurídica pelo percentual resultante da diferença entre: (i) a
soma das alíquotas do imposto de renda das pessoas jurídicas e da contribuição social
sobre o lucro líquido, inclusive adicionais; e (ii) oitenta por cento da alíquota máxima
da tabela progressiva do imposto de renda da pessoa física251.
251 “Art. 2º A entidade aberta ou fechada de previdência complementar, a sociedade seguradora e o administrador do Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI poderão optar por regime especial de tributação, no qual o resultado positivo, auferido em cada trimestre-calendário, dos rendimentos e ganhos das provisões, reservas técnicas e fundos será tributado pelo imposto de renda à alíquota de vinte por cento.
§ 1º O imposto de que trata este artigo: I - será limitado ao produto do valor da contribuição da pessoa jurídica pelo percentual resultante da
diferença entre: a) a soma das alíquotas do imposto de renda das pessoas jurídicas e da contribuição social sobre o
lucro líquido, inclusive adicionais; e b) oitenta por cento da alíquota máxima da tabela progressiva do imposto de renda da pessoa física; II - será apurado trimestralmente e pago até o último dia útil do mês subseqüente ao da apuração; III - não poderá ser compensado com qualquer imposto ou contribuição devido pelas pessoas jurídicas
referidas neste artigo ou pela pessoa física participante ou assistida”. (BRASIL. Presidência da República. Medida Provisória nº 2.222, de 4 de setembro de 2001. Dispõe sobre a tributação, pelo imposto de renda, dos planos de benefícios de caráter previdenciário. Brasília: DOU, 5 set. 2001 edição extra).
183
Segundo CARVALHO e MURGEL o RET “veio possibilitar a adesão a um
regime benéfico de tributação, criando uma espécie de diferimento tributário para a
poupança previdenciária, diminuindo a tributação na fase de contribuição, e tributando-
a na fase de acumulação”. Assim era porque a legislação da época já previa a
dedutibilidade das contribuições feitas pelas pessoas físicas (limitadas a 12% de seu
rendimento bruto no ano) e pelas pessoas jurídicas patrocinadoras ou instituidoras
(limitada a 20% do valor da folha de pagamento). Já no pagamento do resgate ou
benefício, esses valores seriam tributados pelo IRRF mediante aplicação da tabela
progressiva, com alíquota máxima de 27,5%. A incidência do IR sobre os rendimentos,
de acordo com o cálculo do RET, teria como objetivo, portanto, apenas recuperar a
diferença entre a dispensa do IRPJ e da CSLL (soma das alíquotas do IRPJ e da CSLL)
e a incidência do IRRF quando do pagamento do resgate ou benefício (80% da alíquota
máxima do IRPF).
Outro objetivo dessa legislação era pôr fim às discussões judiciárias sobre a
imunidade das entidades de previdência privada, e viabilizar o pagamento das vultosas
dívidas tributárias por elas acumuladas durante o tempo em que essas discussões
perduraram. Assim, a opção pelo RET estava condicionada à desistência expressa e
irrevogável de todas as ações judiciais que tivessem por objeto o imposto sobre a renda,
bem como à renúncia às alegações de direito sobre as quais se fundavam. Além disso,
foram também estabelecidas condições mais benéficas para o pagamento de tais débitos.
A incidência do imposto sobre a renda nos seus termos ou de acordo com a
regra geral da MP não afastava a incidência do IRRF no momento do pagamento do
resgate ao benefício às pessoas físicas252. Além disso, seguindo a então recente
jurisprudência do STF (que entendeu como assistenciais apenas as entidades que
recebiam contribuições exclusivamente das patrocinadoras), a MP estabelecia em seu
artigo 6º isenção de imposto de renda somente para os rendimentos e ganhos obtidos nas
aplicações de recursos de provisões, reservas técnicas e fundos referentes a planos de
benefícios e FAPI, constituídos exclusivamente com recursos de pessoa física ou destas
e de pessoa jurídica imune.
252 Seu artigo 7º estatuiu que ficavam mantidas todas as demais regras disciplinadoras da incidência do imposto de renda sobre planos de benefícios de caráter previdenciário ou FAPI, inclusive as relativas aos limites e às condições, para as deduções da base de cálculo do imposto, das contribuições feitas por pessoa física ou jurídica.
184
5.2.2.3.4 A isenção concedida pela Lei nº 11.053/04
Não obstante a louvável tentativa de agregar mais racionalidade à tributação
da previdência privada, as normas estabelecidas pela MP nº 2.222/01 não lograram
permitir a máxima acumulação de recursos em planos de previdência complementar,
viabilizando a otimização de seu objetivo de garantir a aposentadoria dos participantes
de seus planos e a manutenção de suas condições de vida na velhice e minimizando os
respectivos riscos sociais.
A tributação tem importante papel nesse objetivo, na medida em que pode
assumir a função destrutiva de reduzir as bases sobre as quais se acumularão os
rendimentos obtidos pelos planos. Tanto é verdade que a Lei Complementar nº 109/01,
a despeito de não tratar especificamente de matéria tributária, teve o cuidado de
estabelecer, em seu artigo 69, parágrafo primeiro, que, sobre as contribuições vertidas
para entidades de previdência complementar, destinadas ao custeio dos planos de
benefícios de natureza previdenciária, não incidiria tributação de qualquer natureza.
Ora, se o patrimônio das entidades de previdência privada é composto exclusivamente
por contribuições de participantes e Patrocinadores, e sobre os ganhos decorrentes da
aplicação financeira de seus recursos, seria absolutamente sustentável e lógico o
entendimento de que tampouco seus rendimentos poderiam ser tributados durante a fase
de acumulação dos recursos nos planos.
Aliás, é interessante observar que, por muito pouco, a própria Lei
Complementar 109/01 não trouxe em seu seio a correta indicação ao legislador
ordinário (norma de competência) do tratamento a dar a tais rendimentos. A única razão
para isso não ter acontecido foi o fato de, antes de sua promulgação, o artigo 70 ter sido
vetado.
Estabelecia expressamente, o dispositivo vetado, que os investimentos e
rendimentos provenientes das aplicações dos recursos das reservas técnicas, provisões e
fundos, constituídos com recursos das contribuições e que garantissem os benefícios,
poderiam ser incentivados, na forma da lei, e deveriam ter a tributação diferida em
relação ao imposto sobre a renda. Contudo, entendeu o Poder Executivo, naquele
185
momento, que o dispositivo poderia levar a interpretação dúbia, além do fato de,
tecnicamente, isenções tributárias não deverem ser tratadas por lei complementar253.
Malgrado a frustração dessa primeira tentativa, a Medida Provisória nº
2.222/01 acabou sendo revogada pelo artigo 9º, da Lei nº 11.053/2004 (resultado da
conversão da Medida Provisória nº 209/2004), juntamente com o art. 4º da Lei nº
10.426/2002, e a Lei nº 10.431/2002, jogando por terra as incidências tributárias e o
regime especial por ela veiculados.
O artigo 5º da Lei nº 11.053/04 (então novo marco legal de toda a tributação
da previdência privada) finalmente estabeleceu a isenção ampla devida às entidades de
previdência privada, ao determinar que, a partir de 1º de janeiro de 2005, ficariam
dispensados a retenção na fonte e o pagamento em separado do imposto de renda sobre
os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas
técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar,
sociedade seguradora e FAPI, bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura
por sobrevivência254.
A Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 209/04, convertida na Lei
nº 11.053/04 resumiu bem a necessidade de tal providência:
O artigo 5º determina que na fase de acumulação não haverá incidência de imposto de renda na fonte, no caso de rendimentos pagos por instituições financeiras, ou pago em separado, no caso de aplicações em bolsa e assemelhadas, o que resulta na não tributação dos rendimentos e ganhos auferidos na fase de acumulação. Trata-se de demanda histórica do sistema de previdência complementar e que torna a acumulação de recursos por meio destes produtos totalmente
253 Trecho da mensagem de veto: “Acreditamos que a proposição do diferimento do imposto de renda neste artigo poderá levar a interpretação dúbia, na medida em que se entenda que o referido diferimento aplique-se não apenas aos benefícios ou resgates recebidos, como também aos investimentos e aos rendimentos provenientes das aplicações dos recursos das reservas técnicas, provisões e fundos constituídos com recursos das contribuições.
Ademais, não há porque versar a matéria em questão no seio de lei complementar, mesmo porque a sanção presidencial, no particular, poderia ser interpretada como anuência do Poder Executivo a eventual – e desarrazoada – tese no sentido de que a matéria toca àquela espécie legislativa.
A lei complementar não é a norma própria para dispor sobre o tratamento a ser dispensado aos Fundos de Pensão, mormente quando fere questões que se inscrevem no domínio da legislação isencional.” (BRASIL. Presidência da República. Mensagem nº 494, de 29 de maio de 2001. Brasília, 29 maio 2001).
254 Por meio de alteração na Lei nº 11.053/2004, a Lei nº 11.196/2005 incluiu no aludido art. 5º o parágrafo único, que dispõe aplicar-se a dispensa referida acima aos fundos administrativos constituídos pelas entidades fechadas de previdência complementar e às provisões e reservas técnicas e fundos de planos assistenciais de que trata o art. 76 da Lei Complementar nº 109/2001. Essa disposição entrou em vigor em 4 de julho de 2005, pela Medida Provisória nº 255/2005, convertida na Lei 11.196/2005.
186
livre de impostos, a exemplo do que se verifica em outros países, sendo este mais um incentivo à formação de poupança previdenciária de longo prazo. Pelas mesmas razões propomos a revogação de dispositivos legais que tratam da tributação com base no regime especial previsto na MP nº 2.222, de 2001.255
Assim, a partir de 2005, as entidades mencionadas passaram a ser isentas de
imposto sobre a renda também relativamente aos ganhos obtidos com as aplicações dos
recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios e a incidência
do imposto sobre a renda passou a ocorrer apenas na fonte, no momento do resgate ou
do pagamento dos benefícios, com ônus da pessoa física.
Economicamente, trata-se de verdadeiro diferimento da tributação. Quando
é concedida isenção de IRPJ à entidade, proprietária dos recursos dos planos durante a
fase de acumulação, permite-se que estes sejam capitalizados sem as perdas decorrentes
de tributações sucessivas. Concluída a fase de acumulação e iniciada a de recebimento
dos benefícios pelo participante, passa a ocorrer a tributação destes, quando auferidos
pela pessoa física (IRRF e IRPF), observadas as regras aplicáveis quanto a alíquotas e
deduções, as quais serão comentadas adiante.
Juridicamente, trata-se de isenção de IRRF aplicável aos rendimentos das
entidades fechadas de previdência complementar em relação aos rendimentos havidos
pelos recursos garantidores dos planos que administram. Essa isenção se conjuga àquela
aplicável ao “lucro” (tecnicamente, superávit) das entidades fechadas de previdência
privada, prevista no artigo 6º do Decreto-lei nº 2.065/1983. Como consequência, as
entidades fechadas de previdência complementar não sofrem, hoje, nem a incidência do
IRRF sobre os rendimentos de aplicações financeiras, ao longo do período de apuração,
nem a incidência do IRPJ e da CSLL ao seu final.
Tem-se, portanto, um conjunto amplo de incentivos tributários à
acumulação de recursos em planos de previdência privada: (i) isenção das contribuições
feitas por patrocinadores/instituidores em favor de pessoas físicas, (ii) dedutibilidade
dessas contribuições, tanto para patrocinadores/instituidores quanto para as próprias
pessoas físicas, atendidas as limitações legais, e (iii) isenção dos rendimentos do plano
durante a fase de acumulação e, no caso das entidades fechadas, também de eventual
255 BRASIL. Presidência da República. Medida Provisória nº 209, de 26 de agosto de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 ago. 2004.
187
superávit (que a rigor, não configura isenção, mas sim verdadeira hipótese de não-
incidência tributária).
Foi bem observado por CARVALHO e MURGEL que
[…] a razão para a não-tributação das entidades fechadas de previdência complementar não se resumiria à regra da imunidade, rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal, sob o argumento de que estas seriam entidades assistenciais. Reside também na observância plena do princípio da igualdade, que ordena que a aplicação da norma tributária observe a natureza não lucrativa destas entidades e os benefícios sociais e econômicos trazidos com a alocação dos ativos econômicos nestas.256
Pode-se concluir, portanto, que, atualmente, a sistemática de não incidência
tributária, tanto na fase de contribuição, quanto na de acumulação dos recursos em
planos de previdência privada, bem como a não tributação das entidades fechadas sem
fins lucrativos, proporciona a geração de poupança de longo prazo, com o objetivo de
aposentadoria, incentivada e garantida pelos princípios constitucionais que norteiam as
atividades tributária e previdenciária privada, faltando apenas a confirmação, pelo
Supremo Tribunal Federal, de que o superávit não pode, em hipótese alguma, ser
confundido com lucro, pelas razões já expostas, jogando uma pá de cal sobre qualquer
discussão que se pretenda travar no futuro sobre o assunto.
5.2.2.3.5 CSLL e as EFPC – Hipótese de não-incidência tributária
O art. 5º, da Lei nº 10.426/2002, determinou que as entidades fechadas de
previdência complementar ficariam isentas da Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL), relativamente aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de
2002. Essa “isenção”, contudo, é redundante, pois já poderia ser deduzida do artigo 6º,
do Decreto-lei nº 2.065/1983 e do artigo 15, da Lei nº 9.532/96. Ademais, convém
reiterar que, a rigor, as entidades fechadas de previdência privada nunca realizam o fato
jurídico tributário descrito na hipótese de incidência da CSLL, pois jamais auferem
lucro. O que se verifica é, portanto, verdadeira hipótese de não-incidência tributária em
relação a essa contribuição.
256 Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 59.
188
A despeito de se nos afigurar cristalina, ainda não é universalmente aceita
nos tribunais a não incidência de CSLL sobre os resultados positivos havidos por
entidades fechadas de previdência privada, até mesmo pelo fato de a legislação
continuar a se referir a tais entidades como “isentas” de IRPJ e CSLL.
De fato, como já assinalado, visto que o Supremo Tribunal Federal entendeu
não terem, as entidades fechadas de previdência complementar, caráter assistencial (nas
hipóteses em que aceitam contribuições dos participantes), em princípio seriam
contribuintes da Seguridade Social como qualquer outra empresa, entidade ou
instituição, devendo, a teor do artigo 195, da Constituição Federal, financiar a
seguridade social em conjunto com toda a sociedade.
Com base na competência atribuída pelo artigo 195, o legislador federal
instituiu, entre outras, a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, veiculada pela Lei
n° 7.689/88 e destinada ao financiamento da seguridade social, tendo como base de
cálculo o “lucro” das pessoas jurídicas, previsto como materialidade possível na alínea
“e” do inciso I do Artigo 195 da Constituição Federal.
Entretanto, já demonstramos, no item 5.2.2.3.1, que as entidades fechadas
de previdência privada não apuram lucro, mas apenas superávit, conceito juridicamente
distinto. Sendo assim, estão fora do alcance da incidência da CSLL, a despeito de serem
equiparadas às instituições financeiras, pelo artigo 22, § 1°, da Lei n 8.212/91.
As entidades fechadas de previdência privada contribuem com a seguridade
social sempre que realizam os fatos jurídicos tributários previstos nas respectivas
normas. Assim, sujeitam-se à incidência das contribuições que têm como base de
cálculo a folha de salários, por exemplo, mas não à CSLL, que incide sobre o lucro,
justamente por que não o apuram, mas apenas superávit ou déficit.
Foi esse o entendimento da Câmara Superior de Recursos Fiscais a respeito
da matéria, em relação a fato gerador anterior à Lei 10.426/2002, quando ainda
pairavam dúvidas a respeito da aplicabilidade, a tais entidades, da isenção prevista pelo
artigo 15 da Lei nº 9.532/97:
ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LIQUIDO CSLL - Exercício: 2001, 2002
189
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO - ENTIDADES FECHADAS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR - O pressuposto básico para a incidência da Contribuição Social sobre o Lucro é a existência de lucro apurado segundo a legislação comercial. As Entidades Fechadas de Previdência Complementar obedecem a planificação e normas contábeis próprias, impostas pela Secretaria de Previdência Complementar, segundo as quais não são apurados lucros ou prejuízos, mas superávits ou déficits técnicos, que têm destinação específica prevista na lei de regência. O superávit técnico apurado por aquelas instituições, de acordo com as normas contábeis a elas aplicáveis, não se identifica com o lucro líquido do exercício apurado segundo a legislação comercial. Os ingressos de recurso nas Entidades Fechadas de Previdência Complementar não se configuram como receita, não havendo, assim, possibilidade de formação de lucro. O fato de as Entidades Fechadas de Previdência Complementar estarem incluídas entre as instituições financeiras arroladas no artigo 22, § 1°, da Lei n 8.212/91, não implica a tributação do superávit técnico apurado, mas a incidência de outras contribuições como forma das EFPC's contribuírem com a Seguridade Social.257
Não obstante a isenção prevista em lei e reconhecida pela Câmara Superior
de Recursos Fiscais, falta a pacificação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
no julgamento do RE 612.686, quanto à inviabilidade da incidência da CSLL (assim
como do IRPJ) sobre superávit apurado por entidade fechada de previdência privada,
uma vez que o referido excedente não pode, em hipótese alguma, ser confundido com
lucro, seja pela vedação de que seja obtido por tais entidades, seja pelo fato de sua
destinação nunca ser semelhante à do lucro, mas sim determinada por lei e por normas
emitidas pelo órgão regulador, sempre com o objetivo de retornar aos planos, gerando
benefícios futuros aos respectivos participantes.
257 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 01-06.016. Processo n° 10166.003496/2004-76, Recurso n° 105-145.995 Especial do Procurador. Matéria: CSLL. Relatora: Karem Jureidini Dias. Julgamento: 14 out. 2008. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DOU, 14 out. 2008.
190
5.2.3 Entidades Abertas de Previdência Complementar - EAPC
As entidades abertas de previdência privada, designadas pelo seu órgão
regulador como “EAPC”258, compõem o chamado terceiro pilar da Previdência Social
(embora no Brasil estejam sujeitas à regulação do Ministério da Fazenda, como as
seguradoras e as instituições financeiras). Elas propiciam que, independentemente da
iniciativa de seu empregador, os particulares constituam reservas para viabilizar sua
aposentadoria ou complementar a previdência social pública e a privada fechada,
conforme sublinha PÓVOAS:
No conceito de entidade aberta sobressai a sua característica de permitir e desejar a inscrição, em seus planos previdenciários, de qualquer pessoa que, encontrando-se dentro da exigência dos respectivos regulamentos, o queira fazer. Neste aspecto, a entidade aberta comporta-se como qualquer entidade de seguro de vida (mútua ou comercial).259.
WEINTRAUB também define com clareza essas entidades:
Entidade aberta de Previdência Privada é pessoa jurídica de direito privado que comercializa planos de previdência acessíveis, em princípio, a qualquer pessoa. Porém, pode haver certas limitações, pois os planos coletivos são acessíveis a pessoas físicas vinculadas, direta ou indiretamente, a uma pessoa jurídica contratante. Nos planos abertos individuais (oferecidos pelas entidades abertas), o participante não precisará possuir vínculo algum.260
Diferentemente das entidades fechadas, abordadas anteriormente, as abertas,
assim como as seguradoras, têm objetivo de lucro. Nos termos do artigo 36, da Lei
Complementar 109/2001, são constituídas unicamente sob a forma de sociedades
anônimas e seu objetivo é instituir e operar planos de benefícios de caráter
258 BRASIL. Ministério da Fazenda. Superintendência de Seguros Privados. Circular Susep n° 338, de 30 de janeiro de 2007. Altera e consolida regras e critérios complementares de funcionamento e de operação da cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta e dá outras providências. Brasília: DOU, 02 fev. 2007.
“Art. 1º Alterar e consolidar regras e critérios complementares de funcionamento e de operação da cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta.
Parágrafo único. Para fins de remissão nesta Circular, considera-se: I – EAPC: entidade aberta de previdência complementar ou sociedade seguradora autorizada a operar
planos de previdência complementar aberta; […]”. 259 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos,
Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007. 310-311. 260 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência.
São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 100.
191
previdenciário, concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único,
acessíveis universalmente.
Todos aqueles que o desejarem podem aderir a seus planos, daí a designação
de “abertas”. Não obstante serem pessoas jurídicas mercantis, portanto com finalidade
lucrativa, como esclarece RODRIGUES, “a finalidade do lucro não necessariamente gera
custeio mais elevado para os participantes, pois pode-se imaginar uma entidade não
lucrativa que tenha um custeio administrativo superior ao custo de um plano numa
entidade aberta (incluindo a margem de lucro)”261.
Sendo assim, não há falar, aqui, em natureza assistencial nem imunidade.
Não obstante, em face da sua natureza previdenciária e colaboração como terceiro pilar
da previdência social, as peculiaridades das entidades abertas também devem ser
levadas em consideração pelo Direito Tributário.
5.2.3.1 PIS e COFINS e as EAPC – Hipótese de Não-Incidência Tributária
Tratamos, no item 5.2.2.2, da não incidência do PIS e da COFINS sobre
entidades fechadas de previdência complementar. Cabe-nos avalia-la, neste passo, em
relação às entidades abertas, cuja atividade apresenta muitas semelhanças, mas também
algumas dessemelhanças, em comparação com a desenvolvida pelas entidades fechadas.
Assim como estas, objetivam gerir planos de previdência complementar, cujo escopo é
a concessão de benefícios de aposentadoria complementar aos seus participantes, bem
como benefícios de risco. Contudo, diferentemente das fechadas, as entidades abertas
têm fim lucrativo.
Consequentemente, algumas características identificadas nas entidades
fechadas também podem ser encontradas nas abertas, como o fato de não obterem
“faturamento”, dado não comercializarem mercadorias nem prestarem serviços, mas sim
administrarem os recursos que lhes são entregues, obrigando-se a devolvê-los,
acrescidos de remuneração, sob a forma de resgates ou benefícios. A gestão dos
recursos, assim como ocorre no âmbito das entidades fechadas, é atividade-meio e não o
261 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013.
192
objetivo final dessas entidades. Consequentemente, não há prestação de serviços
remunerados em favor de participantes (planos individuais) e eventuais instituidores
(planos coletivos), mas simplesmente a assunção da obrigação de gerar rendimentos
sobre os recursos que lhes são confiados, para garantia dos benefícios prometidos pelos
planos.
As entidades abertas de previdência privada, assim como as fechadas, foram
excluídas da sistemática não-cumulativa do PIS e da COFINS, pelo artigo 8º das Leis
10.637/03 e 10.833/04. Expuseram-se, portanto, em princípio, à incidência das regras-
matrizes veiculadas pela Lei nº 9.718/98. Entretanto, pelas mesmas razões dadas para
chegar a essa conclusão relativamente às entidades fechadas, as contribuições instituídas
por essa lei não podem incidir sobre os recursos ingressados nas entidades abertas, uma
vez que, atualmente, têm como base de cálculo exclusiva o “faturamento”, pelas razões
a seguir expostas.
5.2.3.1.1 Legislação de PIS e COFINS em vigor aplicável às EAPC
Não obstante nosso entendimento acima antecipado, as regras previstas na
legislação de PIS e COFINS para entidades abertas de previdência privada estabelecem
situação diversa. Ao editar a Lei nº 9.718/98, o legislador indicou como base de cálculo,
componente do critério quantitativo do PIS e da COFINS, o faturamento, entendido
como “receita bruta”, e portanto englobando a “totalidade das receitas da pessoa
jurídica”. Essa equiparação só veio a ser declarada inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal alguns anos depois da edição da lei, como já comentado. Contudo,
permaneceu na legislação tratamento especial às entidades abertas e fechadas de
previdência complementar, como se sujeitas estivessem a tal incidência. Assim, há,
ainda, que se definir, na jurisprudência, se são válidas essas disposições remanescentes,
e se os ingressos observados no patrimônio de tais entidades se caracterizam, ou não,
como “faturamento”. Dependendo da resposta a esses questionamentos, concluir-se-á se
as entidades abertas de previdência privada estão, ou não, sujeitas à incidência do PIS e
da COFINS nos moldes da Lei nº 9.718/98.
No que tange ao tratamento especial dispensado, observa-se que a Lei nº
9.718/98 estabelece, em seus artigos 2º, 3º, § 5º e 6º as deduções e exclusões que, além
193
das permitidas às pessoas jurídicas em geral, podem ser feitas pelas entidades abertas de
previdência complementar, quando da apuração do PIS e da COFINS supostamente
devidos262 (levando-se em conta que pode ocorrer sua incidência, o que aceitamos
apenas para fins de análise).
A referida legislação faz referência, no § 5º do artigo 3º, às deduções
referentes à contribuição ao PIS e que também se aplicam à COFINS, previstas, por sua
vez, no artigo 1º, V da Lei nº 9.701/98. Os dispositivos em questão prescrevem que as
entidades de previdência privada abertas e fechadas poderão excluir, da receita bruta
operacional auferida no mês, a parcela das contribuições destinada à constituição de
provisões ou reservas técnicas.
O inciso III do § 6º, por sua vez, autoriza a dedução, pelas referidas
entidades, dos rendimentos auferidos nas aplicações financeiras destinadas ao
pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e de resgates.
Percebe-se, portanto, o louvável propósito de excluir da incidência das
contribuições algumas parcelas dos ingressos obtidos por essas entidades, que
certamente não aderem definitivamente ao seu patrimônio, pois no momento em que
recebidas são automaticamente transferidas para contas de passivo destinadas ao
pagamento de benefícios (isto é, são contabilizadas nos planos previdenciários para
futura restituição aos participantes sob a forma de resgate ou benefício, ou transferência
para outra entidade, mediante exercício do direito à portabilidade).
262 “Art. 2º As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento, observadas a legislação vigente e as alterações introduzidas por esta Lei.
Art. 3º O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. § 5º Na hipótese das pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de
1991, serão admitidas, para os efeitos da COFINS, as mesmas exclusões e deduções facultadas para fins de determinação da base de cálculo da contribuição para o PIS/PASEP.
§ 6º Na determinação da base de cálculo das contribuições para o PIS/PASEP e COFINS, as pessoas jurídicas referidas no § 1º do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, além das exclusões e deduções mencionadas no §5, poderão excluir ou deduzir:
[…] III - no caso de entidades de previdência privada, abertas e fechadas, os rendimentos auferidos nas
aplicações financeiras destinadas ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e de resgates; (Incluído pela Medida Provisória nº 2158-35, de 2001)” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Altera a Legislação Tributária Federal. Brasília: DOU, 28 nov. 1998).
194
Contudo, essa lógica do legislador foi interrompida quando se deixou de
facultar, às entidades abertas, as deduções previstas no art. 32, da Lei nº 10.637/2002263.
Tais exclusões são específicas para fim de apuração da base de cálculo da contribuição
para o PIS/PASEP e da COFINS das entidades fechadas de previdência complementar,
não se aplicando, portanto, às entidades abertas. Entretanto, sua natureza é a mesma das
rubricas anteriormente mencionadas: valores que, recebidos pela entidade, são
imediatamente destinados à formação de provisões técnicas constituídas no passivo,
destinadas ao pagamento de benefícios previdenciários.
Com efeito, a própria indicação das rubricas na legislação evidencia essa
característica: (i) rendimentos relativos a receitas de aluguel, destinados ao pagamento
de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates; (ii) receita decorrente da
venda de bens imóveis, destinada ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão,
pecúlio e resgates; (iii) resultado positivo auferido na reavaliação da carteira de
investimentos imobiliários referida nos incisos I e II.
Ao observarmos as exclusões previstas na legislação, da base de cálculo do
PIS e da COFINS das entidades fechadas de previdência complementar, entendemos
que acabaram por reduzi-la aos valores recebidos pelas entidades para a cobertura de
seus custos, ou seja, às taxas de administração.
Todavia, no que respeita às entidades abertas, não é adequada a mesma
conclusão, uma vez que parte das deduções autorizadas para as fechadas (art. 32, da Lei
nº 10.637/2002) não lhe foi franqueada, restando como tributáveis valores que não se
agregam ao patrimônio, por serem destinados, conforme redação da própria lei, ao
pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates.
263 “Art. 32. As entidades fechadas de previdência complementar poderão excluir da base de cálculo da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, além dos valores já previstos na legislação vigente, os referentes a:
I - rendimentos relativos a receitas de aluguel, destinados ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates;
II - receita decorrente da venda de bens imóveis, destinada ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão, pecúlio e resgates;
III - resultado positivo auferido na reavaliação da carteira de investimentos imobiliários referida nos incisos I e II.” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.637 de 30 de dezembro de 2002. Dispõe sobre a não-cumulatividade na cobrança da contribuição para os Programas de Integração Social (PIS) e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), nos casos que especifica; sobre o pagamento e o parcelamento de débitos tributários federais, a compensação de créditos fiscais, a declaração de inaptidão de inscrição de pessoas jurídicas, a legislação aduaneira, e dá outras providências. Brasília: DOU, 31 dez. 2002 edição extra).
195
Reafirmamos, porém, que, a despeito das exclusões acima referidas -
insuficientes, pois há restrição anti-isonômica em relação às autorizadas para entidades
fechadas –, essa não é a forma correta de desonerar as entidades abertas da incidência de
tais contribuições, uma vez que, como demonstrado, elas não realizam “faturamento”
em sua atividade.
Considerando, contudo, que a jurisprudência ainda não é pacífica em
relação à extensão do conceito de “faturamento”, cabe-nos estudar a viabilidade de
tratar-se como “receitas” as contribuições recebidas por entidades abertas.
5.2.3.1.2 Contribuições a planos de previdência privada aberta versus receitas
A fim de determinar se os ingressos obtidos pelas entidades abertas de
previdência privada se qualificam como “receita”, procederemos ao mesmo teste
realizado quando da análise do assunto feita em relação às entidades fechadas, no item
5.2.2.2.3. Necessário verificar, portanto, se os aportes ou contribuições recebidos pelas
entidades abertas, bem como os rendimentos decorrentes da aplicação de seus recursos,
preenchem os requisitos exigidos pela Doutrina para sua caracterização como “receita”.
Antes de iniciar essa análise, todavia, e considerando que as entidades
abertas têm fins lucrativos, consideramos importante fazer breve exposição sobre a
forma de remuneração atualmente prevista na legislação para tais empresas.
Hoje existem duas verbas que remuneram a atividade das entidades abertas,
no que concerne à gestão de seus planos previdenciários: a taxa de carregamento e
aquela conhecida como taxa de performance.
A taxa de carregamento consiste na “importância destinada a atender às
despesas administrativas e de comercialização do plano”264 e corresponde a, no
máximo, 10% do montante das contribuições aportadas aos planos. As taxas usuais
praticadas no mercado consumam variar entre 1,5% e 5%, do montante das
contribuições, e podem ser cobradas quando do pagamento das contribuições ou do
exercício dos direitos de portabilidade e resgate.
264 Artigo 5º, V, da Resolução CNSP Nº 139, de 2005 (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Nacional de Seguros Privados. Resolução CNSP nº 139, de 2005. Altera e consolida as regras de funcionamento e os critérios para operação da cobertura por sobrevivência oferecida em plano de previdência complementar aberta e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 2005).
196
A legislação também faz referência às contraprestações denominadas
“percentual de gestão financeira”, incidentes sobre o patrimônio líquido do fundo no
qual está aplicada sua provisão, e “encargo de saída”, calculado sobre os resgates e
sobre o exercício da portabilidade, com o fim de cobrir o custo dessas operações. Isso
não obstante, a Resolução CNSP nº 139/95 vetou a cobrança do percentual de gestão
financeira265, e a Circular SUSEP 338, do mesmo ano, proibiu a cobrança de encargo de
saída266.
Além de receber a taxa de carregamento, a entidade aberta de previdência
privada também é remunerada quando obtém, na aplicação dos recursos garantidores
das reservas matemáticas dos participantes, remuneração superior à performance
estimada, gerando o chamado “excedente de rentabilidade”. Nesse caso, dependendo
das regras do plano, parte da rentabilidade excedente obtida é destinada à entidade
gestora dos recursos. Tal situação ocorrerá quando se estiver lidando com planos que
oferecem garantia de remuneração, atualização, ou ambas (Planos com Remuneração
Garantida e Performance (PRGP), com Atualização Garantida e Performance (PAGP),
Vida com Remuneração Garantida e Performance (VRGP) e Vida com Atualização
Garantida e Performance (VAGP)).
Quando os planos contratados com entidades abertas têm essa natureza, a
obtenção de rentabilidade superior à pactuada implica geração de “excedente de
rentabilidade”, o qual é rateado entre a entidade gestora e os participantes, conforme
definido em contrato (plano coletivo) ou regulamento (plano individual). Nos casos do
PGBL e do VGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres e Vida Gerador de Benefícios
265 “Art. 97. Os planos já aprovados pela SUSEP deverão ter o percentual de gestão financeira, nas comercializações efetuadas a partir de 1º de janeiro de 2006, reduzido a 0% (zero por cento)” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Nacional de Seguros Privados. Resolução CNSP nº 139, de 2005. Altera e consolida as regras de funcionamento e os critérios para operação da cobertura por sobrevivência oferecida em plano de previdência complementar aberta e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 2005).
266 “Art. 87. A partir do início de vigência desta Circular, a SUSEP não aprovará planos que prevejam a cobrança de encargo de saída.
§ 1º Para os certificados de participante que já prevejam a cobrança do encargo de saída, é fixado em 0,38% (trinta e oito centésimos por cento) o percentual máximo que poderá ser cobrado, exclusivamente, sobre valores resgatados pelo participante dos planos do tipo PGBL, PRGP, PAGP e PRSA.
§ 2º Fica vedada a cobrança de encargo de saída para as propostas subscritas a partir de 1º de julho de 2007” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Superintendência de Seguros Privados. Circular Susep n° 338, de 30 de janeiro de 2007. Altera e consolida regras e critérios complementares de funcionamento e de operação da cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta e dá outras providências. Brasília: DOU, 02 fev. 2007).
197
Livres), como não há garantia de remuneração, atualização ou benefício mínimo, a
integralidade dos rendimentos auferidos pelos recursos garantidores do plano é
repassada à reserva do Participante e não há falar em excedente de rentabilidade, nem,
consequentemente, em taxa de performance para a Entidade.
Esclarecido como se dá a remuneração das entidades abertas, passemos à
análise da natureza de seus ingressos, a fim de determinar se têm natureza de “receita”.
(a) Ingresso de recursos financeiros no patrimônio da pessoa jurídica –
Sim, em termos.
As contribuições de participantes e instituidoras, recebidas pelas entidades
abertas, caracterizam ingressos de recursos financeiros no seu patrimônio. O mesmo se
pode dizer em relação aos rendimentos auferidos pelas entidades na aplicação desses
recursos no mercado financeiro ou imobiliário.
Com efeito, a entidade assume a propriedade dos valores em questão para
realizar a sua gestão. Contudo, a natureza desses ingressos é sui generis, na medida em
que a maior parte dos recursos recebidos é alocada em contas de passivo (provisões
técnicas) em favor dos próprios participantes, dentro dos planos, para que sejam
oportunamente destinados ao pagamento de benefícios. Parcela menor (taxas de
carregamento e performance, se houver) é alocada de forma definitiva à entidade aberta,
como remuneração de sua atividade.
(b) Vinculada ao exercício da atividade empresarial – Sim, em termos.
As entidades abertas de previdência complementar, diferentemente das
fechadas, exercem atividade que se caracteriza como “empresarial”, pois tem objetivo
de lucro. Com efeito, a parcela dos valores recebidos, não alocada nas provisões
matemáticas dos participantes, ou seja, as taxas de carregamento e performance, são
vinculadas ao exercício da atividade empresarial dessas entidades.
(c) Contraprestação em negócio jurídico que envolva a venda de
mercadorias ou prestação de serviços, assim como pela cessão
onerosa e temporária de direitos e pela remuneração de investimentos
– Sim, em termos.
198
A taxa de carregamento (deduzida das contribuições dos participantes e
instituidores, no momento do aporte ou quando do exercício do direito ao resgate ou
portabilidade) e a taxa de performance (subtraída do excedente de rentabilidade dos
planos) correspondem à remuneração, no negócio jurídico firmado entre a entidade e as
demais partes (apenas o participante, no contrato individual, e o participante e a
instituidora, no contrato coletivo). Contudo, esse negócio jurídico não tem natureza de
venda de mercadorias, nem de prestação de serviços, tampouco decorrendo da cessão
onerosa e temporária de direitos. Apenas a taxa de performance se pode considerar
decorrente da remuneração de investimentos, já que a taxa de carregamento tem como
base de cálculo as contribuições realizadas no plano.
(d) Definitividade do ingresso – Sim, em termos.
É inadmissível dizer que a totalidade das contribuições recebidas por
entidades abertas de previdência complementar e dos rendimentos obtidos na aplicação
dos respectivos recursos passa a integrar definitivamente o patrimônio da entidade.
Dada a sua natureza, logo que recebidos são, em sua maior parte, contabilizados como
provisões técnicas (reservas matemáticas dos participantes), constituídas no passivo da
entidade (isto é, como obrigações) e destinadas ao pagamento de benefícios futuros.
Somente as taxas de carregamento e de performance são ingressos definitivos
patrimônio das entidades.
(e) Mensuração instantânea e isolada em cada evento, abstraindo-se dos
custos e de periodicidade para sua apuração – Sim.
Esse requisito está presente nos aportes recebidos por entidades abertas de
previdência complementar e nos rendimentos auferidos no mercado financeiro e
imobiliário, uma vez que tais ingressos podem ser mensurados em cada evento,
abstraindo-se dos custos e de periodicidade para sua apuração.
Observa-se que, ao responder às cinco questões correspondentes aos
requisitos para a configuração do conceito de receita, quatro foram respondidas com
“sim, em termos”, e apenas uma como “sim”. Em consequência, deve-se atentar para as
peculiaridades da atividade das entidades abertas, antes de qualificar, erroneamente,
como “receitas”, a totalidade dos valores recebidos por essas entidades.
199
Como visto, não cabe dizer que os aportes recebidos pelas entidades abertas
de previdência complementar e os rendimentos por elas obtidos se integram, total e
imediatamente, ao seu patrimônio, pois a própria lei e a regulação aplicável obrigam à
constituição – no passivo – de provisões matemáticas para garantir os benefícios
contratados, bem como os direitos a resgate e a portabilidade. Daí ser correto dizer, de
antemão, que apenas pequena parte dos aportes recebidos pode ser entendida como
receita (mais precisamente, as taxas de carregamento e performance), sendo cabível a
exclusão dos valores que, sabidamente, não deverão aderir ao patrimônio da entidade.
Não por outra razão, aliás, a legislação que rege, atualmente, a incidência do
PIS e da COFINS sobre as “receitas” (entre aspas, pois seus ingressos não se
caracterizam como tal) das entidades abertas faz uma série exclusões nas respectivas
bases de cálculo. Essas deduções (exclusão da parcela das contribuições destinada à
constituição de provisões ou reservas técnicas e dos rendimentos auferidos nas
aplicações financeiras destinadas ao pagamento de benefícios de aposentadoria, pensão,
pecúlio e de resgates), embora insuficientes (já que algumas outras foram autorizadas
apenas às entidades fechadas), espelham essa realidade.
Como sustentamos, as incidências da contribuição ao PIS e da COFINS,
previstas na Lei nº 9.718/98, são inaplicáveis, porquanto no seu âmbito somente o
“faturamento” pode servir como base de cálculo para o PIS e para a COFINS, e as
entidades abertas de previdência privada não comercializam mercadorias nem prestam
serviços. Contudo, caso a base de cálculo dessas contribuições venha a ser, com base
em futura legislação ou interpretação dos Tribunais, a totalidade de suas receitas, o
delineamento desse conceito deverá necessariamente levar em conta a peculiaridade de
suas atividades, como almejado pela legislação (repetimos, inaplicável) atualmente em
vigor. Do contrário, serão tributados como receita ingressos que, claramente, como já
demonstrado, não se caracterizam como tal.
5.2.3.2 RMIT do IRPJ e da CSLL devidos pelas EAPC
No que concerne ao Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas - IRPJ e à
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, o tratamento dado pela legislação,
em atenção à peculiaridade do negócio desenvolvido pelas entidades abertas de
200
previdência privada, é muito semelhante ao que recebem as seguradoras, já objeto de
análise no item 4.4. As entidades abertas, assim como as seguradoras, são pessoas
jurídicas que exercem atividade de natureza híbrida, ou seja, sujeita tanto a regime de
direito público, por ser regulada, quanto a regime de direito privado, por força de seu
caráter contratual. Por um lado, sua atividade é regulada minuciosamente pelo Estado,
visto serem elas gestoras de vultosa poupança popular de longo prazo. Por outro, são
particulares que se encontram nos polos da relação jurídica constituída pelo contrato
previdenciário.
Como entidades que têm finalidade lucrativa, as entidades abertas de
previdência privada são sujeitos passivos do IRPJ e da CSLL e, estando equiparadas a
instituições financeiras, pelo vultoso volume de recursos que administram, estão
obrigadas à apuração desses tributos pela sistemática do Lucro Real, não lhes sendo
dado optar pela sistemática simplificada do Lucro Presumido267.
Já foi assinalado, também, que as entidades abertas de previdência
complementar administram recursos de terceiros, os quais passam à sua propriedade
apenas para fim de gestão. Para espelhar essa realidade, sua contabilidade deve
constituir reservas técnicas que vão perdurar por todo o prazo de diferimento (período
de acumulação dos recursos) e de cobertura (período do pagamento de benefício sob a
forma de renda, se não for concedido mediante pagamento único).
Evidentemente, portanto, a legislação do IRPJ e da CSLL não poderia
ignorar essas peculiaridades, ao determinar as respectivas bases de cálculo, sob pena de
não observar a verdadeira capacidade contributiva dessas entidades. Daí ter o legislador
introduzido enunciado expresso no sistema, ajustando suas bases de cálculo para as
entidades abertas:
Art. 13. Para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, são vedadas as seguintes deduções, independentemente do disposto no art. 47 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964:
267 Lei nº 9.718/98 – “Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas: […] II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta; […]” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Altera a Legislação Tributária Federal. Brasília: DOU, 28 nov. 1998).
201
I - de qualquer provisão, exceto as constituídas para o pagamento de férias de empregados e de décimo terceiro salário, a de que trata o art. 43 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, com as alterações da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995, e as provisões técnicas das companhias de seguro e de capitalização, bem como das entidades de previdência privada, cuja constituição é exigida pela legislação especial a elas aplicável; […]268
Já assinalamos, ao tratar do IRPJ e da CSLL devidos pelas seguradoras, que
a legislação do imposto sobre a renda veda a dedução, como despesa, de qualquer
provisão, por entender que não configuram gastos definitivos da pessoa jurídica. No
caso das entidades abertas de previdência privada, as provisões técnicas são obrigatórias
e estabelecidas pela regulação aplicável a essas entidades. Sendo assim, impedir sua
dedução como despesa, para fim de determinação do lucro tributável do período,
equivaleria a tributar o patrimônio dessas pessoas jurídicas, e não verdadeiro acréscimo
patrimonial, desbordando dos limites de sua capacidade contributiva.
Consequentemente, as provisões técnicas das entidades abertas de
previdência são dedutíveis logo que constituídas no termo da regulação a elas aplicável.
Se e quando revertidas, total ou parcialmente, serão adicionadas às bases de cálculo do
IRPJ e da CSLL.
A regra-matriz de incidência tributária específica, do IRPJ e da CSLL269,
para as entidades abertas de previdência complementar pode, então, ser construída da
seguinte forma:
Hipótese: Critério material: Auferir renda Critério espacial: Território nacional Critério temporal: 31 de dezembro de cada ano (apuração anual) ou 30/03, 30/06, 30/09 e 31/12 (apuração trimestral) Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Entidades Abertas de Previdência Privada Critério quantitativo: base de cálculo: Lucro Real (em cujo cômputo são deduzidas, adicionalmente aos demais custos e despesas autorizados pela legislação, as provisões técnicas cuja constituição é exigida pela legislação especial aplicável),
268 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 1995.
269 Ressalvamos diferenças mínimas entre RMIT do IRPJ e a RMIT do CSLL, que não entendemos relevante adentrar neste trabalho.
202
alíquotas: IRPJ – 25% mais adicional de 10% sobre o montante da renda que ultrapassar R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais anuais).
CSLL – 15%.
203
6 TRIBUTAÇÃO DOS PLANOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
6.1 Definição do conceito de plano de previdência privada
A previdência privada, no Brasil, é operada através de “planos”,
denominação dada pela legislação aos contratos de previdência complementar privada.
Com efeito, a Lei Complementar no 109, de 29 de maio de 2001 estabelece, em seu
artigo 2o, que “o regime de previdência complementar é operado por entidades de
previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de
benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar”.
A administração da previdência através de diversos planos de benefícios foi
uma inovação da Lei Complementar no 109/01, que alterou o cenário anterior para
melhor estruturá-lo, uma vez que, até então, embora o mercado já utilizasse o conceito
de plano de previdência privada, este se confundia com a própria entidade. Destaca
RODRIGUES:
De início, as entidades fechadas de previdência complementar possuíam um único plano oferecido à integralidade dos empregados de uma única empresa ou grupo de empresas, confundindo-se o plano (sobretudo o seu patrimônio) com a própria entidade. Com o tempo, identificou-se que havia várias razões a apontar outro caminho possível e desejável. Verificou-se que a estrutura administrativa colocada à disposição de um plano poderia operar outros planos (com evidente diluição de custos), solução para viabilizar, sobretudo, os planos de empresas menores que não podem arcar integralmente com as despesas de uma entidade de previdência.270
PÓVOAS define os planos de previdência privada como
[…] elaboração intelectual que, considerando as necessidades de certo segmento da população ou de um conjunto definido de pessoas, se consubstancia num esquema de coberturas que as podem satisfazer, dentro das exigências dos organismos executivos e de controle da instituição; grande parte da elaboração intelectual recorre à ciência atuarial.271
270 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 17.
271 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 162.
204
Com efeito, os planos previdenciários estabelecem esquemas de cobertura
baseados na ciência atuarial. Contudo, é necessário ressaltar que, juridicamente, os
planos nada mais são que contratos, ou seja, instrumentos introdutores de normas
individuais e concretas, cujos termos são previamente aprovados pelo órgão regulador.
Sobre a matéria, opina MARTINEZ:
Plano de benefícios é uma modalidade ampla de instituição, expressa num conjunto complexo de normas derivadas de opções assumidas (uma espécie de Lei) e de atos, medidas e providências reais (práticas usuais) no âmbito organizacional, econômico, financeiro e atuarial com vistas à organização e à operação dos comandos de constituição da EPC [entidade de previdência complementar], filiação e admissão dos participantes (entidade abrangendo inclusive a patrocinadora ou a instituidora), contribuição obrigatória e definição das prestações postas à disposição dos beneficiários.272
O objetivo primordial dos planos de previdência é dar cobertura à velhice,
conceito que se baseia na idade avançada e é um dos mais relevantes riscos sociais.
Sobre a questão, assevera PÓVOAS:
O envelhecimento faz parte do processo biológico dos seres vivos. Dependendo da organização social em que vive o homem o envelhecimento, quase sempre, se traduz numa situação de carência, não apenas física, mas também de meios de subsistência. A noção de envelhecimento não tem, todavia, um significado definitivo, pois, não obstante haver um conceito geral de velhice ligado à aparência da pessoa, a verdade é que o conceito de velhice para efeito de aposentadoria tem um conteúdo inequívoco, independentemente do desgaste produzido pela idade, e que é determinado por lei. De qualquer forma, tal conceito assenta na idade, mais ou menos avançada.273
As partes do contrato previdenciário são a EFPC ou EAPC, a patrocinadora
ou instituidora e o participante. Caso se trate de previdência aberta e plano individual,
as partes serão exclusivamente a entidade e o participante.
O regulamento do plano é também instrumento introdutor de normas,
submetido à aprovação do órgão regulador, que estabelece minuciosamente os direitos e
obrigações das partes no contrato previdenciário (plano de previdência), tais como a
272 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários à Lei Básica da Previdência Complementar. São Paulo: LTr, 2003, p. 60-61 apud GAUDENZI, Patricia Bressan Linhares. Tributação dos investimentos em previdência complementar privada: fundos de pensão, PGBL, VGBL, FAPI e outros. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 77.
273 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 67-68.
205
forma de realização de contribuições, e os benefícios a que o participante terá direito,
conforme explica REIS, ao discorrer sobre planos geridos por entidades fechadas:
Os benefícios previdenciários pagos pelas entidades fechadas de previdência complementar são aqueles pactuados no regulamento do plano de benefícios, onde constam também as regras de elegibilidade, como idade mínima, a forma de custeio, a base de cálculo, os critérios de correção dos benefícios e outros itens importantes para o disciplinamento da aposentadoria complementar. Para entrar em vigor, o regulamento (contrato) deve ser aprovado prévia e expressamente pelo órgão federal de supervisão, ou seja, pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), sucessora da Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social. Qualquer alteração nesse contrato também depende da chancela do próprio Estado, por meio de seu órgão competente.274
As entidades de previdência privada, abertas e fechadas, obedecendo a
regulação pertinente, segregam contabilmente o patrimônio e os investimentos de cada
plano de previdência, a fim de que sejam aplicados no mercado financeiro, e gerem,
separadamente, rendimentos a serem somados aos aportes, vindo a garantir o pagamento
dos benefícios e resgates contratados.
Ao tratarmos da tributação dos planos previdenciários estaremos nos
referindo, em especial, à incidência do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos
de capital gerados pela aplicação dos respectivos recursos garantidores. Esses recursos,
quando aportados ao plano pelos participantes e patrocinadoras/instituidoras, passam à
titularidade da entidade de previdência privada (pois os planos são contratos, não tendo
personalidade jurídica), mas são segregados contabilmente para fazer frente às
obrigações dos planos a que estão vinculados, retornando futuramente aos participantes
ou seus beneficiários sob a forma de resgate ou benefício.
O subsistema normativo que concerne às normas direta ou indiretamente
relacionadas com a tributação dos planos previdenciários inclui determinações
direcionadas às diversas etapas da formação da poupança na previdência privada e do
pagamento dos respectivos benefícios. São normas que se voltam desde à dedução de
despesas por patrocinadoras e instituidoras, até a tributação ou isenção dos rendimentos
correspondentes aos benefícios recebidos pelos participantes. Nos tópicos a seguir,
investigaremos o teor de cada uma delas.
274 REIS, Adacir. Aspectos Legais e Contratuais Fundamentais da Previdência Complementar Fechada. In: SEMINÁRIO “A Previdência Complementar Fechada no Brasil: Perspectivas e Aspectos Legais Fundamentais”. Foz do Iguaçu, 25-28 de outubro de 2010, Anais… Foz do Iguaçu, 2010, p. 29.
206
O quadro sinótico abaixo permite visualizar cada qual dessas etapas
separadamente, bem como o conjunto elaborado pelo legislador:
O primeiro ato de conteúdo econômico relacionado com a operacionalização
de um plano de previdência privada consiste na realização de um aporte, ou
contribuição, pelo participante ou pela patrocinadora. Este ato implicará na transferência
da propriedade de determinada quantia, do participante ou da patrocinadora, para a
EFPC ou EAPC responsável por sua gestão.
Nesse momento, caberá indagar quanto à dedutibilidade, da respectiva
despesa, tanto para o participante (da base de cálculo de seu IRPF), quanto para a
patrocinadora/instituidora (vide itens 1 e 2.1 no quadro acima).
Além disso, quando a patrocinadora efetua contribuição a plano
previdenciário, em benefício de seus empregados e dirigentes, é possível entender que
se trata do pagamento de um benefício indireto para esses últimos, o qual poderia
ensejar a incidência do IRRF e do IRPF. Essa incidência merece ser examinada, e está
indicada no item 2.2. do quadro acima.
Aportados os recursos ao plano (o que ocorrerá periodicamente), a EFPC ou
EAPC providenciará sua aplicação no mercado financeiro, a fim de capitalizá-los e
garantir os benefícios contratados. Os rendimentos gerados pela aplicação dos recursos
garantidores do plano são ganhos, acréscimos patrimoniais que, a rigor, pertencem à
entidade (pois os recursos aplicados lhe pertencem), porém são alocados contabilmente
em cada um dos planos, em contas individualizadas por participante. Resta verificar,
portanto, o tratamento tributário dado a esses acréscimos patrimoniais, em especial no
207
que respeita à incidência de IRRF, tributo que, por definição, incide sobre rendimentos
derivados de aplicações financeiras.
Durante o período de diferimento, em que participante e patrocinadora
realizam contribuições, até ser atingida a data para início do recebimento dos benefícios
de sobrevivência contratados, o participante pode fazer resgates dos planos. Os valores
serão resgatados de reservas compostas por contribuições próprias, da patrocinadora
(caso se trate de plano patrocinado ou instituído) e de rendimentos do plano. Ao receber
os recursos resgatados, o participante obterá acréscimo patrimonial. Necessário,
portanto, analisar o tratamento tributário aplicável a tal acréscimo (item 4 do quadro).
Atingido o objetivo do participante, de completar o período de diferimento e
iniciar o recebimento dos benefícios de aposentadoria contratados, receberá um
pagamento único ou renda mensal que lhe proporcionará acréscimo patrimonial, cujo
tratamento tributário merece ser estudado (item 4 do quadro).
Além do participante, seus beneficiários também podem vir a receber
recursos do plano previdenciário por ele contratado. Completado o período de
diferimento, em certos planos é facultado ao participante optar por renda, vitalícia ou
por prazo certo, que também pode ser convertida em pensão para o cônjuge ou filhos,
caso venha a falecer dentro de determinado período. Ademais, na hipótese de morte do
participante durante o período de diferimento (ou depois dele, se houver contratação
nesse sentido), existe também a possibilidade de destinação de seu saldo de conta para
os beneficiários indicados.
Em vista disso, cabe analisar, também, o tratamento tributário aplicável aos
benefícios e saldos de conta recebidos pelos beneficiários dos participantes (item 5 do
quadro).
Estudaremos, agora, cada uma dessas etapas de conteúdo econômico, que
abrangem a realização de aportes, capitalização de recursos, e recebimentos de resgates,
benefícios e saldos de conta de planos previdenciários, a fim de identificar as
respectivas consequências tributárias.
208
6.2 Tratamento tributário das contribuições efetuadas aos planos
6.2.1 Contribuições dos participantes
Como se pode verificar do quadro apresentado no item anterior, o
subsistema criado pelo legislador ordinário, para tributar os planos de benefício de
caráter previdenciário, contempla desde o tratamento das contribuições efetuadas ao
plano, seja pelos participantes, seja pelas patrocinadoras ou instituidoras, passando pela
isenção atualmente concedida aos rendimentos decorrentes da aplicação dos recursos
garantidores do plano, até a tributação dos benefícios, resgates e saldos de conta
recebidos pelos participantes e seus beneficiários.
O foco deste tópico são as normas tributárias voltadas à etapa consistente na
realização de contribuições, pelo participante, em benefício próprio ou de seus
dependentes, a planos de previdência privada.
Visando incentivar a adesão a planos de previdência privada, o legislador
federal autorizou a dedução, como despesa, da base de cálculo do IRRF e do IRPF, das
contribuições efetuadas pelo participante em benefício próprio ou de seus dependentes.
Essa dedução já era prevista na legislação ordinária desde 1995, ou seja,
desde antes da edição da Lei Complementar 109/01. Não obstante, mesmo anterior, a
legislação ordinária ajustou-se perfeitamente à determinação do seu artigo 69 da LC
109/01, segundo a qual “as contribuições vertidas para as entidades de previdência
complementar, destinadas ao custeio dos planos de benefícios de natureza
previdenciária, são dedutíveis para fins de incidência de imposto sobre a renda, nos
limites e nas condições fixadas em lei”.
Observa-se, portanto, que o já então garantido pela legislação ordinária
passou a ser determinado por norma de competência prevista em lei complementar,
ganhando maior relevância jurídica e menor flexibilidade.
209
6.2.1.1 Definição do conceito de contribuições
Antes de analisar a regra tributária acima referida, é necessário esclarecer a
natureza dos valores entregues pelo participante a um plano de previdência privada.
Esclarece PÓVOAS que “a prestação paga pelo participante à entidade chama-se
contribuição, e corresponde ao custo do serviço previdenciário que a entidade vai
prestar ao participante”. Salienta ainda que “esta contribuição é constituída de duas
partes: uma correspondente ao risco, a que chamamos por paralelismo à terminologia do
seguro, contribuição pura; outra correspondente ao carregamento”275. Embora o autor se
refira à contribuição como custo do “serviço” previdenciário, é importante ter presente,
como já tivemos a oportunidade de expor em tópicos precedentes, que a entidade de
previdência privada não presta serviços ao participante e, consequentemente, que a
contribuição por ele realizada não configura a respectiva contraprestação276.
A contribuição consiste, isto sim, na soma de recursos que o participante
transfere para a entidade de previdência, para que esta providencie sua aplicação no
mercado financeiro e lhe garanta benefícios previdenciários futuros, assim como as
prerrogativas do resgate ou da portabilidade. A obrigação da entidade não é de fazer,
mas sim de dar cobertura aos riscos sociais indicados no plano (velhice, invalidez ou
morte), mediante pagamento de benefícios ou devolução dos recursos geridos por
resgate ou transferência por portabilidade.
É bem verdade que, no momento em que o participante faz a contribuição
ao plano, o respectivo montante deixa de compor seu patrimônio e passa a integrar o da
entidade. Contudo, é também patente que a maior parcela da contribuição (exceção feita
às taxas de carregamento e performance, nas EAPC, e à taxa de administração, nas
EFPC, se houver) comporá as reservas que, por sua vez, servirão para o pagamento, ao
275 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 346.
276 Neste sentido, vale transcrever a análise precisa de CARVALHO e MURGEL, a respeito da inviabilidade de caracterização da atividade das entidades fechadas de previdência complementar como prestadoras de serviço: “Uma entidade fechada de previdência complementar visa administrar e executar planos de benefícios de natureza previdenciária aos seus associados sem qualquer finalidade lucrativa. Parcela da contribuição previdenciária de cada associado deverá cobrir as despesas de manutenção da entidade. Não há, nem mesmo esporadicamente, prestação de serviços a terceiros. As atividades de prestação de serviços exclusivamente aos seus participantes, mediante rateio proporcional dos custos decorrentes desta administração, não podem ser consideradas como serviços prestados a terceiros e, muito menos, de natureza mercantil”. (CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 214).
210
próprio participante, dos benefícios contratados. Esses valores também poderão vir a ser
resgatados pelo participante, nas condições e limites da lei e da regulação.
6.2.1.2 Dedução das contribuições na legislação ordinária
No momento do aporte, os respectivos recursos deixam, do ponto de vista
jurídico, ainda que momentaneamente, de pertencer ao participante, que incorre numa
despesa. A legislação do imposto sobre a renda, tanto na fonte (IRRF), quanto mensal
(IRPF – Carnê Leão), e apurado na Declaração de Ajuste Anual (IRPF – Anual),
enumera exaustivamente as despesas passíveis de dedução das respectivas bases de
cálculo277, podendo, portanto, dispor sobre a dedutibilidade das contribuições efetuadas
aos planos.
É consabido que “renda” significa “acréscimo patrimonial”. Para a
determinação do quantum do acréscimo patrimonial tributável é necessário,
inicialmente, estabelecer um período de apuração. Deve-se comparar o patrimônio
existente no início do período (por exemplo, 01.01.2014) com aquele existente ao
respectivo final (31.12.2014), considerando-se os ingressos e os gastos dedutíveis do
contribuinte. Contudo, nem todo gasto é aceito pela legislação tributária como
dedutível.
Na legislação do imposto sobre a renda da pessoa jurídica, têm-se como
dedutíveis as despesas consideradas “necessárias à atividade da empresa” (artigo 299 do
Regulamento do Imposto de Renda – RIR/99). É a regra geral aplicável sempre que não
houver dispositivo expresso dispondo sobre a dedutibilidade de determinada despesa.
De acordo com a regra geral, se a despesa for considerada necessária para a consecução
dos objetivos da empresa, usual e normal naquele ramo de atividades, será operacional
e, portanto, dedutível.
Já no âmbito do IRPF, a técnica utilizada é diferente. O legislador optou por
relacionar expressamente as despesas dedutíveis da base de cálculo do tributo, por ser
extremamente subjetiva a avaliação da necessidade e da razoabilidade das despesas
277 Eventuais vedações ficam sujeitas, naturalmente, ao controle de constitucionalidade do Judiciário, quanto à observância, ou não, ao conceito constitucional de renda e aos princípios aplicáveis a esse imposto.
211
incorridas pelas pessoas físicas. A lista de despesas dedutíveis é, portanto, numerus
clausus, sendo vedada a dedução de qualquer outra estranha a esse rol.
Seguindo a linha traçada na Lei Complementar no 109/01, de incentivar a
poupança de longo prazo e a cobertura do risco social da velhice, a legislação autoriza a
dedução, da base de cálculo do imposto sobre a renda das pessoas físicas, da despesa
correspondente às contribuições efetuadas a planos de previdência privada, no momento
em que é realizado o pagamento à entidade. A respeito da matéria, a Lei 9.250/95
estabeleceu, antes mesmo da edição da referida lei complementar:
Art. 4º Na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda poderão ser deduzidas: […] IV - as contribuições para a Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; V - as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social; VII - as contribuições para as entidades de previdência complementar de que trata a Lei no 12.618, de 30 de abril de 2012. […] Parágrafo único. A dedução permitida pelo inciso V aplica-se exclusivamente à base de cálculo relativa a rendimentos do trabalho com vínculo empregatício ou de administradores, assegurada, nos demais casos, a dedução dos valores pagos a esse título, por ocasião da apuração da base de cálculo do imposto devido no ano-calendário, conforme disposto na alínea e do inciso II do art. 8º desta Lei.278
Todavia, a dedução em análise está sujeita a algumas limitações impostas
pela Lei nº 9.532/97:
Art. 11. As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea e do inciso II do art. 8º da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da própria pessoa física, ficam condicionadas ao recolhimento, também, de contribuições para o regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observada a contribuição mínima, e limitadas a 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. (Redação dada pela Lei nº 10.887, de 2004)
278 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.250 de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 1995.
212
§ 5º Excetuam-se da condição de que trata o caput deste artigo os beneficiários de aposentadoria ou pensão concedidas por regime próprio de previdência ou pelo regime geral de previdência social. (Redação dada pela Lei nº 10.887, de 2004).279
A legislação condicionou a dedução ao recolhimento de contribuições para
o regime geral da previdência social (ou, quando for o caso, para o regime próprio de
previdência social dos servidores públicos). Ficaram dispensados dessa exigência os
aposentados e pensionistas do regime geral da previdência social ou do regime próprio
dos servidores públicos, que não podem ser forçados a contribuir para a previdência
oficial, pois já se encontram na fase de recebimento de benefícios. Além disso, no que
tange à dedução da base de cálculo do imposto sobre a renda apurado na Declaração de
Ajuste Anual, a lei a limitou a 12% (doze por cento) dos rendimentos brutos.
Trata-se de enunciados que compõem as regras-matrizes de incidência
tributária do imposto sobre a renda mensal das pessoas físicas (IRPF mensal, ou Carnê-
Leão), do Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF) exigido como antecipação do devido
na Declaração de Ajuste Anual, e do Imposto sobre a Renda Anual das pessoas físicas
(IRPF – anual)280. Nessas RMIT os enunciados em questão fazem parte do consequente,
participando de seu critério quantitativo e delineando as respectivas bases de cálculo
(i.e., a extensão do conceito de renda).
Interessante notar que não há limitação percentual para a dedução das
contribuições em relação às bases de cálculo do IRPF mensal e do IRRF. As
contribuições de ônus das pessoas físicas podem ser deduzidas integralmente na
apuração desses impostos, devidos mensalmente, desde que se considerem como base
de cálculo somente os rendimentos do trabalho com vínculo empregatício ou de
administradores. Aliás, as deduções mensais, nas bases de cálculo do IRPF mensal e do
IRRF – antecipação, só são permitidas em relação a essa modalidade de rendimentos
(do trabalho). Tratando-se de rendimentos tributáveis de outra natureza, a dedução só
poderá ser feita na base de cálculo do IRPF – anual, conforme determinado pelo
parágrafo único do artigo 4o da Lei no 9.250/95.
279 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá outras providências. Brasília: DOU, 11 dez. 1997.
280 Configuram regras-matrizes de incidência tributária autônomas, como sustentamos no nosso Imposto sobre a Renda na Fonte (São Paulo: Quartier Latin, 2007).
213
A previsão legal de dedutibilidade das contribuições do participante também
tem sido entendida pela jurisprudência como condição para a futura tributação dos
benefícios e resgates. Daí porque, depois de muita controvérsia, veio a prevalecer o
entendimento de que as contribuições de ônus dos participantes, efetuadas entre janeiro
de 1989 e dezembro de 1995, como não eram dedutíveis, nos termos da legislação
vigente à época, não poderiam ser tributadas quando pagos os respectivos benefícios ou
resgates281. Com efeito, ocorreria, economicamente, dupla tributação da mesma riqueza,
se a despesa não pudesse ser deduzida (de modo que a renda da pessoa física no período
da contribuição seria tributada sem a consideração dessa redução) e o benefício ou
resgate a ela correspondente viesse a ser tributado.
Como veremos mais adiante, após a fixação dessa diretriz pelo STJ, iniciou-
se o movimento jurisprudencial que veio a consagrar que, em nosso sistema, no âmbito
dos planos de previdência privada, ou bem há tributação na fase dos aportes e isenção
na fase dos benefícios (regime TTI ou TII282), ou bem há isenção na fase dos aportes e
tributação na fase dos benefícios (regime ITT ou IIT283), jamais podendo haver,
portanto, tributação na fase dos aportes e nova incidência no momento do recebimento
dos benefícios e resgates.
281 “TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. LEI 7.713/88 (ART. 6º, VII, B), LEI 9.250/95 (ART. 33).
1. Pacificou-se a jurisprudência da 1ª Seção do STJ no sentido de que, por força da isenção concedida pelo art. 6º, VII, b, da Lei 7.713/88, na redação anterior à que lhe foi dada pela Lei 9.250/95, é indevida a cobrança de imposto de renda sobre o valor da complementação de aposentadoria e o do resgate de contribuições correspondentes a recolhimentos para entidade de previdência privada ocorridos no período de 1º.01.1989 a 31.12.1995 (EREsp 643691/DF, DJ 20.03.2006; EREsp 662.414/SC, DJ 13.08.2007; (EREsp 500.148/SE, DJ 01.10.2007; EREsp 501.163/SC, DJe 07.04.2008).
2. Na repetição do indébito tributário, a correção monetária é calculada segundo os índices indicados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução 561/CJF, de 02.07.2007, do Conselho da Justiça Federal, a saber: (a) a ORTN de 1964 a fevereiro/86; (b) a OTN de março/86 a dezembro/88; (c) pelo IPC, nos períodos de janeiro e fevereiro/1989 e março/1990 a fevereiro/1991; (d) o INPC de março a novembro/1991; (e) o IPCA – série especial – em dezembro/1991; (f) a UFIR de janeiro/1992 a dezembro/1995; (g) a Taxa SELIC a partir de janeiro/1996 (ERESP 912.359/MG, 1ª Seção, DJ de 03.12.07).
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.012.903/RJ. Relator: Ministro Teori Albino Zavascki. Julgamento: 8 out. 2008. Órgão Julgador: Primeira Seção. Publicação: DJ, 13 out. 2008).
282 “TTI” referindo-se a tributação (T) no aporte, tributação (T) sobre os rendimentos do plano e (I) isenção do resgate ou benefício. Já “TII” referindo-se a tributação (T) no aporte, isenção (I) sobre os rendimentos do plano e (I) isenção do resgate ou benefício.
283 “ITT” referindo-se a isenção (I) no aporte, tributação (T) sobre os rendimentos do plano e (T) tributação do resgate ou benefício. Já “IIT” referindo-se a isenção (I) no aporte, isenção (I) sobre os rendimentos do plano e (T) tributação do resgate ou benefício.
214
6.2.1.3 Aspectos constitucionais da dedutibilidade das contribuições
Vimos que tanto a lei complementar quanto a legislação ordinária federal
autorizam, desde que observadas certas condições e limitações, a dedução dos aportes
efetuados a planos de previdência privada, da base de cálculo do imposto incidente
sobre a renda das pessoas físicas, em suas diversas modalidades.
Essa autorização surgiu em lei ordinária e, mais tarde, foi prevista
igualmente em enunciado de competência veiculado por lei complementar. O
mandamento dessa última dificulta eventual revogação do enunciado que autoriza a
dedução, pois em tais condições incorrer-se-ia em ilegalidade. De todo modo, em
princípio, não é impossível que, no futuro, venham a ser revogadas tanto a lei ordinária
quanto a lei complementar referidas, desde que observados os devidos processos
legislativos.
Pergunta-se, pois, se haveria inconstitucionalidade caso se viesse a vedar a
dedução, pelos participantes, de suas contribuições a planos de previdência privada.
A nosso ver, tal vedação seria flagrantemente inconstitucional, por várias
razões. Em primeiro lugar, porque a despesa em questão é necessária e plenamente
justificável para qualquer pessoa física, já que visa assegurar-lhe a obtenção de renda na
velhice, quando já não disporá de força de trabalho para angariá-la. Dessa forma, caso
negada a dedução em foco, acabar-se-ia por tributar o patrimônio da pessoa física (já
que sua diminuição justificada seria desconsiderada), desbordando-se do conceito
constitucional de renda e afrontando-se o princípio da capacidade contributiva.
Além disso, seria inconcebível permitir a dedução das contribuições
realizadas à previdência oficial e vedar a dedução das contribuições realizadas pelos
participantes à previdência privada aberta ou fechada, uma vez que configuram os três
pilares da Previdência Social reconhecidos pela própria Constituição Federal (artigo
202) como necessários à proteção da velhice, preservando a dignidade da pessoa
humana, princípio fundamental da República estatuído em seu artigo 1º, III.
A dedutibilidade das contribuições efetuadas pelos participantes de planos
previdenciários é, portanto, corolário tanto do conceito de renda e dos princípios
215
aplicáveis ao imposto sobre a renda, quanto da proteção à dignidade humana e da
institucionalização da previdência privada, previstos na Constituição Federal.
6.2.2 Contribuições da Patrocinadora ou Instituidora
6.2.2.1 Dedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e da CSLL
Além de favorecer a adesão das pessoas físicas a planos de previdência
privada, interessa ao Estado incentivar, também, que pessoas jurídicas contribuam para
esses planos, em favor de seus empregados e dirigentes.
As pessoas jurídicas podem fazer contribuições a planos previdenciários
administrados por entidades fechadas de previdência privada, constituídas por si ou pelo
grupo de empresas que integrarem, ou para planos coletivos administrados por
entidades abertas de previdência complementar. Em ambos os casos estarão, de um
lado, oferecendo um benefício para seus empregados, atraindo-os e retendo-os e, de
outro, colaborando com o Estado e com a sociedade para a redução dos riscos sociais da
velhice, da morte e da invalidez.
Com efeito, atualmente cabe à empresa não somente buscar o lucro, mas
também exercer papel social e moral, como adverte PÓVOAS:
Na concepção moderna, a empresa ganhou, também, uma fisionomia moral, podendo, neste sentido, falar-se até na sua humanização, na medida em que sofrendo com as críticas e os ataques que a filosofia tecnocrática recebia das facções socialistas, aceitou considerar que, sendo fonte continuada da riqueza nacional e esteio de empregos, lhe cabia, também, uma missão de preservação do ambiente social e do bem-estar de seus colaboradores. A consideração, no processo da vida da empresa, dos interesses das forças sociais, certamente, já vem da revolução industrial, só que na empresa moderna, tal consideração, resultando da mentalização do empresário acerca do papel da empresa no processo socioeconômico da nação, e da conscientização do elemento humano nos seus direitos e obrigações, face à empresa, conseguiu irmanar dirigentes e dirigidos na preocupação da sobrevivência da empresa, face às constantes oscilações conjunturais. A insegurança passou a dominar as preocupações dos empregados e dos empregadores. E porque o sistema de segurança social apenas atende ao essencial da subsistência do pessoal quando em inatividade, começaram a procurar esquemas suplementares previdenciários que,
216
muitas vezes, se sobrepuseram em dissídios coletivos, ao próprio problema do salário.284
As empresas que contribuem para planos de previdência privada em
benefício de seus empregados e dirigentes, ao assumirem tal obrigação, tornando-se
parte no contrato previdenciário, são denominadas “patrocinadoras”, nos planos geridos
por entidades fechadas, ou “instituidoras”, nos administrados por entidades abertas.
Existe, também, a figura do instituidor, nas entidades fechadas, mas nesses casos trata-
se de entidades de classe que criam e gerenciam tais planos, sem realizar
contribuições.285
O incentivo da lei às empresas que concedem tais benefícios consiste na
dedutibilidade desses gastos, como despesas operacionais, da base de cálculo do IRPJ e
da CSLL, tributos que incidem sobre o lucro.
Contudo, embora louvável o propósito de introduzir no sistema enunciado
específico para tal finalidade, assim como afirmado em relação à dedutibilidade das
contribuições dos participantes, da base de cálculo do IRPF, a referida dedução é
decorrência lógica do próprio conceito de “lucro”.
O resultado econômico da pessoa jurídica, de acordo com a legislação
comercial286, consiste no acréscimo patrimonial obtido após o cômputo de todas as suas
receitas, custos e despesas necessários à obtenção das respectivas receitas. Para apurar o
284 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 346.
285 “No âmbito das entidades fechadas, chamam-se de patrocinadoras a empresa, grupo de empresas, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, que instituírem um plano de previdência para seus empregados ou funcionários (art. 31). Esse mesmo dispositivo faz referência à figura do instituidor que também figura como parte na criação de um plano de previdência, porém cuida-se de pessoa jurídica de caráter profissional, classista ou setorial. O instituidor possibilita a criação de planos de previdência em entidades fechadas para aqueles trabalhadores cujos empregadores não instituam essa modalidade protetiva. Assim, os sindicatos, as associações, os órgãos classistas podem viabilizar esses planos. Essas pessoas jurídicas não serão, contudo, contribuintes para os planos, como são as patrocinadoras, mas agentes incumbidos de agregar pessoas para viabilizar os arranjos protetivos complementares fechados”. (RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 16).
286 Lei 6.404/76 com alterações posteriores: “Art. 183 […] § 1º Na determinação do resultado do exercício serão computados: a) as receitas e os rendimentos ganhos no período, independentemente da sua realização em moeda; e b) os custos, despesas, encargos e perdas, pagos ou incorridos, correspondentes a essas receitas e
rendimentos” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Brasília: DOU, 17 dez. 1976 suplemento).
217
seu lucro tributável (Lucro Real287), a legislação do imposto sobre a renda estabelece
que sejam feitos ajustes, de modo a adequar o resultado comercial às regras especiais
previstas na legislação tributária, como por exemplo aquelas que vedam ou limitam a
dedução de certas despesas.
Com efeito, a legislação tributária fixa o conceito de despesas
“operacionais”, estabelecendo serem somente aquelas necessárias à atividade da
empresa e à manutenção de sua fonte produtora de receitas. Noutras palavras, a empresa
só deve ter despesas cuja finalidade seja gerar receitas. Quando as despesas incorridas
tiverem essa característica, serão dedutíveis.
O artigo 299 e parágrafos, do Regulamento do Imposto sobre a Renda
(RIR/99 – Decreto no 3.000/99), fulcrado no artigo 47 da Lei no 4.506/64, explicita
claramente tal exigência:
Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora. § 1o São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa. § 2o As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa. § 3o O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.288
Feito esse introito, voltemos à questão da dedutibilidade das contribuições a
previdência privada, realizadas pelas pessoas jurídicas em favor de empregados e
dirigentes. Pergunta-se: por que as empresas remuneram e concedem benefícios a seus
empregados? A resposta é simples: a fim de que trabalhem mais e melhor, com maior
dedicação e motivação, o que conduz, logicamente, à maior geração de receitas. Sendo
assim, natural que qualquer benefício pago a empregados deva ser considerado despesa
dedutível, sendo supérflua, consequentemente, norma específica autorizando a dedução
de contribuições a planos de previdência privada em favor de empregados e dirigentes.
287 Não nos interessa, aqui, mencionar a possibilidade de opção pelo Lucro Presumido, pois neste caso as despesas da pessoa jurídica se tornam irrelevantes, e a discussão empreendida neste tópico não tem consequência alguma.
288 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999.
218
Essa conclusão é corroborada pelo disposto no parágrafo 3º do artigo 299
acima transcrito, segundo o qual “o disposto neste artigo aplica-se também às
gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem”. Esse
dispositivo evidencia que qualquer benefício pago a empregado constitui despesa
necessária, independentemente de sua denominação289. Tal regra, logicamente, seria
aplicável às contribuições efetuadas a plano de previdência privada, em favor dos
empregados da empresa.
Além disso, é patente que realizar contribuições a plano de previdência
privada, em favor de empregados e dirigentes, é importante para a atividade da empresa
(a lei não exige que seja imprescindível), além de, nos dias de hoje, configurar
dispêndio usual e normal em qualquer ramo de atividade. Assim, dispensável norma
especial para autorizar a respectiva dedução. Esta é decorrência natural do conceito de
“lucro” (renda da pessoa jurídica), o qual exige a exclusão de todas as despesas
necessárias.
Ainda assim, o legislador ordinário autorizou expressamente essa
dedução290, através do artigo 13, V da Lei no 9.249/95, vindo posteriormente a limitá-la
a 20% da folha de salário, com o objetivo de coibir abusos (Lei no 9.532, de 1997, art.
11, § 2o e 3o), uma vez que se tornara comum pagar vultosas contribuições a planos
previdenciários em lugar de bônus e remuneração variável, apenas como artifício para
valer-se de sua não caracterização como salário para fim de incidência de contribuições
sobre a folha.
Quanto à limitação da dedução a 20% da folha de salários (conforme o
caput do artigo 361 do RIR/99 citado na nota 254), a nosso ver é razoável, uma vez que
289 Desde que, naturalmente, sejam atendidos os requisitos da legislação para a dedução de qualquer despesa, como sua efetiva comprovação e registro contábil com identificação do beneficiário.
290 RIR/99 (Decreto no 3.000/99) – “Art. 361. São dedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica (Lei nº 9.249, de 1995, art. 13, inciso V).
§ 1º Para determinação do lucro real, a dedução deste artigo, somada às de que trata o art. 363, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a vinte por cento do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano (Lei nº 9.532, de 1997, art. 11, § 2º).
§ 2º O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o parágrafo anterior deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real (Lei nº 9.532, de 1997, art. 11, § 3º)” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999).
219
não se justificaria economicamente fazer contribuições a planos previdenciários acima
desse percentual, e assim o limitador efetivamente apenas coíbe excessos.
6.2.2.2 Semelhança dos benefícios aos da previdência social
Chama-nos a atenção, contudo, o requisito do caput do referido artigo de lei,
de que as contribuições sejam destinadas a custear “benefícios complementares
assemelhados aos da previdência social”. Ora, se levada às últimas consequências, tal
exigência é inviável, porque a natureza da previdência social e da previdência privada,
apesar de terem objetivos comuns, é distinta e, além disso, a própria normatização (Lei
Complementar no 109/01 e regulação aplicável às entidades abertas e fechadas) torna
essa analogia incabível.
Já vimos aqui, por exemplo, que, enquanto a previdência social é baseada no
princípio da solidariedade intergerações (a geração ativa contribui para a aposentadoria
da geração aposentada), a privada se baseia no regime de capitalização, em que cada
participante (e, se houver, sua patrocinadora ou instituidora) compõe uma reserva a ser
utilizada integralmente na aquisição de uma renda de aposentadoria futura.
Além disso, os benefícios pagos pela previdência social são do tipo BD
(benefício definido) e variam desde um valor mínimo para a subsistência (salário
mínimo) até o máximo correspondente ao salário de contribuição na ativa, limitado ao
teto estabelecido em lei. Já na previdência privada, estão em extinção os planos de
benefício definido. A maior parte dos planos vigentes é de contribuição definida ou
variável, sendo os benefícios futuros dependentes da rentabilidade das reservas, sem
valor mínimo ou máximo.
Quanto à legislação aplicável à previdência privada, também estabelece
regras inexistentes na previdência social, por força das dessemelhanças assinaladas. O
“resgate” e a “portabilidade”, por exemplo, são institutos não encontrados na
previdência social, pois nesta inexistem reservas individualizadas por participante, mas
obrigatórios na previdência privada, de acordo com a LC 109/01.
220
Sobre tal questão, é interessante a explicação de NEVES E ZAPPA.
Esclarecem que, ao estabelecer regra (a nosso ver supérflua) para autorizar a dedução
das contribuições das empresas a plano de previdência privada, o legislador tributário
[…] utilizou praticamente os mesmos termos empregados pela legislação previdenciária (Lei no 6.435/77) em vigor à época – “benefícios complementares assemelhados aos da previdência social” – expressão esta suprimida pela Lei Complementar no 109/01 e substituída pelo termo bem mais amplo – “benefícios de caráter previdenciário”291.
Ora, se interpretássemos literal e restritivamente esse requisito, anterior ao
atual arcabouço legislativo da previdência complementar, só poderiam ser considerados
benefícios semelhantes ou equivalentes aos da previdência social aqueles relacionados
no artigo 1o da Lei no 8.213/91 (Lei do Plano de Benefícios da Previdência Social), os
quais não existem na previdência privada. Tal interpretação teria por consequência
tornar todas as contribuições aos atuais planos previdenciários indedutíveis. Por isso é
que concordamos que “a expressão ‘benefícios complementares assemelhados aos da
previdência social’ deve ser interpretada à luz do novo arcabouço legislativo da
previdência complementar, de modo a extrair a interpretação mais completa possível de
acordo com o modelo proposto”292.
Outra interpretação sustentável, embora ainda restritiva, seria a de que, em
razão dessa expressão, só poderiam ser considerados “complementares” os benefícios
concedidos por entidades fechadas, já que apenas estes estavam condicionados, na
época, à concessão do benefício pela previdência social (a concessão de benefícios nos
planos administrados por entidades abertas nunca esteve condicionada à concessão do
benefício da previdência social).
Entretanto, tampouco essa interpretação se sustenta, pois inexiste distinção
quanto à necessidade, para a empresa, entre as contribuições a planos administrados por
entidades abertas ou fechadas. Em ambos os casos, o objetivo do empregador é
conceder um benefício ao empregado, incentivando-o a empenhar-se em sua atividade
laboral e a trabalhar mais e melhor. A pessoa jurídica também exerce seu papel social
291 NEVES, Andrea Nogueira; ZAPPA, Fabiana Ulson. Dedutibilidade das Contribuições Destinadas a Planos de Previdência Complementar. In: TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 518-519.
292 Ibid., p. 519.
221
igualmente em ambos os casos, contribuindo para a redução dos riscos sociais da
velhice e da invalidez, entre outros, pois, além da aposentadoria, muitas vezes os planos
previdenciários contemplam também benefícios de risco (seguro de vida para
dependentes e outros).
Logo, estamos com NEVES e ZAPPA quando concluem:
Da inter-relação entre a legislação previdenciária e fiscal, somos forçados a pensar que o benefício da dedutibilidade aplica-se aos planos de previdência complementar instituídos nos moldes da Lei Complementar nº 109/01 e nas normas expedidas pelos órgãos reguladores, ainda que não necessariamente ofereçam benefícios equivalentes aos da Previdência Social, mas enquanto planos que visam a cobrir os chamados “riscos sociais”, isto é, eventos decorrentes da velhice, morte e invalidez.293
Em vista de todo o exposto, portanto, parece-nos que as contribuições para
planos de previdência privada, administrados por entidades abertas ou fechadas,
efetuadas por pessoas jurídicas em favor de seus empregados e dirigentes, serão
dedutíveis sempre que destinadas a entidades regularmente constituídas, observada a
legislação e regulação aplicáveis, não sendo exigida similitude à previdência oficial.
6.2.2.3 Jurisprudência do CARF
Equivocado, portanto, o acórdão do antigo Conselho de Contribuintes, que
considerou indedutíveis as contribuições feitas pela pessoa jurídica a plano de
previdência privada que não estabelecia condições para o resgate, por entender que os
direitos concedidos pelo plano não eram assemelhados aos da previdência social:
IRPJ E CSLL — BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS - EMPREGADOS E DIRIGENTES — INDEDUTIBILIDADE: São indedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares não assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica. A previsão contratual de resgate independentemente da ocorrência de um estado de necessidade como o que ocorre na previdência social, descaracteriza a semelhança, tomando indedutíveis os pagamentos. (Lei n° 9.249/95 art. 13, inciso V c/c Lei 8.213/91 arts. 1°e 18).
293 NEVES, Andrea Nogueira; ZAPPA, Fabiana Ulson. Dedutibilidade das Contribuições Destinadas a Planos de Previdência Complementar. In: TORRES, Heleno Taveira (Coord.). Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais e na Previdência Privada. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 519.
222
RECURSO NEGADO. (Grifos do original).294
O Conselheiro JOSÉ CLÓVIS ALVES, relator do voto vencedor, que está na
base desse acórdão, justificou sua conclusão:
Na realidade os benefícios previstos nos contratos juntados aos autos não se assemelham aos da previdência social, pois as cláusulas semelhantes são totalmente invalidadas, descaracterizadas, distanciadas dos da previdência social pelos motivos já elencados, mormente pela previsão de resgate independentemente da ocorrência de um evento que configure estado de necessidade, tomando-se na realidade verdadeira aplicação financeira em nome do funcionário, transferência de recursos da empresa aos seus colaboradores por pura liberalidade. A empresa pode por liberalidade transferir recursos para quem quiser, porém para efeito de redução da base de cálculo de tributos ou contribuições deve seguir a risca a previsão legal. No caso em tela como ficou demonstrado a empresa não cumpriu o requisito para dedutibilidade previsto pelo legislador.295
No caso que foi objeto deste julgamento, o plano previdenciário receptor
das contribuições permitia resgate pelos participantes a qualquer tempo, inclusive da
parcela da reserva constituída por contribuições da Instituidora (isto é, sem necessidade
de obediência a cláusula de vesting). Por esta razão, entendeu-se que a finalidade
previdenciária do plano estaria esvaziada.
Ocorre, contudo, que, como já verificado acima, o resgate é instituto típico
da previdência privada, sendo inclusive obrigatório, de acordo com a Lei Complementar
nº 109/01, tanto para planos administrados por entidades abertas (artigo 27) quanto
fechadas (artigo 14, III). As condições para sua realização são estipuladas pelos
respectivos órgãos reguladores, e as autoridades fiscais não podem estabelecer
requisitos adicionais para a dedutibilidade, sob pena de grave insegurança jurídica, na
medida em que um instituto obrigatório em face da legislação previdenciária
descaracteriza o plano quando visto sob a óptica tributária.
Ainda que assim não fosse, ou seja, ainda que possível descaracterizar os
aportes em questão como contribuições a plano de previdência privada, elas teriam,
necessariamente, de ser reclassificadas como salário ou gratificação pagos a
294 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão n° 107-07.355. Processo n° 16327.002712/2001-18. Recurso n° 135.495. Matéria: IRPJ - AF - lucro real. Relator: José Clóvis Alves. Julgamento: 15 out. 2003. Órgão Julgador: Sétima Câmara. Publicação: 15 out. 2003.
295 Ibid., grifamos.
223
empregados da pessoa jurídica, os quais, inexoravelmente, são dedutíveis para apuração
do IRPJ e da CSLL, conforme previsto no já comentado § 3º do artigo 299, do
Regulamento do Imposto sobre a Renda.
Nesse sentido, inclusive, a declaração de voto do Conselheiro NATANAEL
MARTINS que, embora concordando com a descaracterização das contribuições como
previdenciárias, a que nos opomos, votou pelo provimento do recurso do sujeito
passivo:
Na verdade, os benefícios pagos àquela determinada classe de pessoas via entidade de previdência privada, ao serem desqualificados como tais, à luz do direito aplicável, repito, somente podem ser catalogáveis como gratificações que, sendo habituais, na feliz expressão do julgador “a quo”, assumem a característica de rendimentos do trabalho e, como tais, dedutíveis na apuração do lucro real e na determinação da base de cálculo da CSL.296
Conclui-se, portanto, ser descabida a descaracterização de planos
previdenciários, pelo fato de preverem direito de resgate para os participantes,
inexistente na previdência oficial, tendo sido equivocado o acórdão do Conselho de
Contribuintes que adotou esse entendimento.
Com efeito, os requisitos para a realização de resgate, tanto das
contribuições realizadas pelo participante, quanto das contribuições da patrocinadora ou
instituidora, devem ser estabelecidos na legislação que dispõe sobre os planos das
entidades abertas e fechadas e na respectiva regulação. Quando não houver restrições
em tal legislação ou regulação, não caberá ao julgador tributário estabelecê-las.
6.2.2.4 Isenção de IRPF para os participantes
O financiamento dos planos previdenciários privados se dá através de
contribuições feitas por seus próprios participantes e pelas patrocinadoras e
instituidoras, se houver.
Tratamos, nos itens precedentes, da dedutibilidade das respectivas despesas,
tanto para os participantes, pessoas físicas, quanto para as pessoas jurídicas que as
296 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão n° 107-07.355. Processo n° 16327.002712/2001-18. Recurso n° 135.495. Matéria: IRPJ - AF - lucro real. Relator: José Clóvis Alves. Julgamento: 15 out. 2003. Órgão Julgador: Sétima Câmara. Publicação: 15 out. 2003.
224
realizam. Cabe agora analisar se as contribuições de pessoas jurídicas em favor de seus
empregados e dirigentes caracterizam benefícios indiretos para estes últimos,
proporcionando-lhes acréscimos patrimoniais passíveis, em tese, de tributação pelo
IRRF e pelo IRPF.
Como se sabe, as pessoas jurídicas podem remunerar seus empregados e
dirigentes direta ou indiretamente. A remuneração direta consiste, basicamente, em
salário e gratificações pagos em dinheiro. Contudo, há diversas formas de remunerá-los
indiretamente, que consistem na assunção de despesas suas pelo empregador.
Caracteriza benefício indireto297, por exemplo, a disponibilização de veículo para uso
pessoal do empregado e de sua família, bem como o pagamento de planos de saúde,
odontológico, academia de ginástica, clubes de lazer e desportivos, etc.
Nestes casos, ainda que não ocorra ganho perceptível para o beneficiário,
este deixa de incorrer em despesa que usualmente lhe caberia, podendo ser verificado,
então, por via transversa, acréscimo patrimonial tributável pelo imposto sobre a renda.
Os benefícios indiretos pagos pelos empregadores a seus empregados e
dirigentes são, portanto, remuneração e, em princípio, podem ser tributados pelo IRRF e
pelo IRPF. No caso do IRRF, como não há falar em pagamento de rendimentos pagos
diretamente pela pessoa jurídica à pessoa física, sobre os quais seria feita a retenção do
imposto; o que se dá é a inclusão desses rendimentos indiretos na base de cálculo do
IRRF, que se calcula sobre a soma dos rendimentos diretos e indiretos, de modo que a
retenção se dê sobre os demais rendimentos, pagos diretamente.
297 A Receita Federal tratou dos benefícios indiretos, ou “fringe benefits” no Parecer Normativo COSIT nº 11 de 30.09.1992. Neste parecer, conceituou-os como “despesas particulares dos administradores, diretores, gerentes e seus assessores, nelas incluídas despesas de supermercados e cartões de crédito, pagamento de anuidade de colégios, clubes, associações, etc.”. Tratou de seus beneficiários, das condições para sua dedutibilidade, pela pessoa jurídica pagadora e, no que tange à sua tributabilidade pelo Imposto sobre a Renda da Pessoa Física, concluiu:
“25. A tributação dos rendimentos percebidos pelas pessoas físicas independe da denominação, da localização da fonte, da origem dos bens produtores da renda e da forma de percepção das rendas ou proventos, bastando, para a incidência do imposto, que tenha havido um benefício ao contribuinte.
Assim, os salários indiretos pagos aos administradores, diretores, gerentes e seus assessores, quando acrescidos às suas respectivas remunerações, integram os rendimentos tributáveis da pessoa física, podendo o imposto de renda retido na fonte ser compensado com o devido na sua declaração de ajuste anual”. (BRASIL. Ministério da Fazenda. Coordenador-Geral do Sistema de Tributação. Parecer Normativo COSIT nº 11 de 30.09.1992. Os salários indiretos concedidos pelas empresas e pagos a administradores, diretores, gerentes e seus assessores como benefícios e vantagens adicionais, decorrentes de cargos, funções ou empregos, serão considerados como custos ou despesas operacionais, dedutíveis para efeito de apuração do lucro real, se atenderem as condições e limites previstos na legislação do imposto de renda. Brasília: DOU, 15 out. 1992).
225
A remuneração indireta, embora em princípio tributável, pode ser isentada
pelo legislador ordinário quando identificar valores, no sistema jurídico, que justifiquem
esse tratamento.
Daí porque o pagamento de planos de saúde em benefício dos empregados,
pelos empregadores, por exemplo, é isento de IRRF e IRRF. Entendeu o legislador que
a conduta dos empregadores, ao oferecer tal benefício, mereceria o incentivo da
desoneração tributária, por proporcionar melhores condições de vida aos empregados e
seus familiares, inclusive desonerando o sistema público de saúde.
A nosso ver, as contribuições dos empregadores, em benefício de seus
empregados, a planos de previdência privada, também caracterizam remuneração
indireta. Considerando o sistema atualmente em vigor, embora os respectivos recursos
passem à propriedade da entidade, que responderá por sua gestão, são segregados em
contas individualizadas que, por sua vez, retornarão ao participante sob a forma de
benefício ou resgate (exceção feita às taxas de carregamento e administração, quando
houver).
Sendo assim, embora os empregados e dirigentes não obtenham a
disponibilidade econômica desses rendimentos no momento em que as contribuições
são aportadas aos planos previdenciários, adquirem sua disponibilidade jurídica, pois os
rendimentos serão aplicados em seu favor e sua reserva lhe será devolvida ao final do
período de diferimento, sob a forma de benefício, ou até antes, sob a forma de resgate,
observadas as regras do plano e da legislação.
Em vista disso, entendemos que, a rigor, esses valores poderiam ser
somados à remuneração dos empregados e dirigentes, para fim de incidência do IRRF e
do IRPF, como ocorre com outros benefícios indiretos. Contudo, ao legislador ordinário
assim não pareceu, estabelecendo no artigo 6º, VIII da Lei nº 7.713/88, que ficariam
isentas do imposto de renda as contribuições pagas pelos empregadores relativas a
programas de previdência privada em favor de seus empregados e dirigentes. Preferiu o
legislador tributar esses valores quando efetivamente recebidos pelas pessoas físicas,
sob a forma de resgate ou benefício, conforme será analisado a seguir (regime IIT).
226
Optou, portanto, pelo diferimento dessa tributação (isenção concedida a uma
etapa da cadeia econômica, estabelecendo-se a tributação em etapa posterior298), que só
vai ocorrer quando do recebimento de benefícios ou resgate pelo participante ou seu
beneficiário.
O dispositivo que confere isenção compõe o critério quantitativo (base de
cálculo) das RMITs do IRRF (“rendimentos do trabalho assalariado pagos a
empregados ou remuneração paga a dirigentes”) e do IRPF (rendimentos do trabalho
assalariado ou decorrentes do exercício de cargo de direção), excluindo de seu âmbito a
remuneração indireta consistente nas contribuições efetuadas pela empresa ao
empregado ou dirigente. A incidência dessas RMITs só ocorrerá quando houver
pagamento de resgate ou benefícios aos participantes, pois tais valores encontram-se
englobados nas bases de cálculo do IRRF (em que constam como sujeitos passivos na
condição de responsáveis por substituição a EFPC ou EAPC) e do IRPF devido pelo
beneficiário ou participante que realizar resgate.
Essa sistemática, a nosso ver, se coaduna perfeitamente com os princípios
que regem a previdência privada e são prestigiados pela Constituição. Estimula a
contribuição, por parte das empresas, para planos de aposentadoria destinados a dar
cobertura ao risco social da velhice, contemplando também, usualmente, a hipótese de
invalidez permanente.
Além disso, a isenção concedida na fase da realização das contribuições
também se justifica por permitir que um maior volume de recursos seja aportado ao
plano (por não haver retenção de IRRF) e permaneça aplicado, gerando frutos durante o
período de diferimento, o que reforça o potencial do plano para obter o máximo de
recursos e maior renda para os participantes e beneficiários no futuro. Nesse sentido
também é o entendimento de WEINTRAUB, ao comentar os efeitos da isenção, quando
adotada em outros países299:
A isenção tributária em relação às contribuições para a Previdência Privada, que ocorreu nos países citados [EUA, Inglaterra, Holanda e Suíça] desde a Segunda Guerra Mundial, proporcionou um financiamento maciço dos fundos previdenciários privados. Isto
298 Segundo EDUARDO JARDIM, trata-se do “instituto pelo qual, em certas operações caracterizadas por sucessivas etapas de comercialização, o legislador elege uma dessas fases como o fato jurídico tributário (fato gerador)”. (Dicionário de Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2011, p. 112).
299 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 227.
227
possibilitou a majoração da poupança interna, fato que beneficiou patentemente todos esses países conhecidos pelo alto grau de desenvolvimento. A Previdência Complementar Privada deve, além de proporcionar benefícios diferidos, ser objeto de tributação diferida.
Cabe ressaltar, contudo, antes de concluir este tópico, que, no âmbito dos
planos geridos por entidades abertas, existe o instituto do vesting. Trata-se de cláusulas,
previstas nos contratos coletivos das entidades abertas, que condicionam o direito do
participante a receber, sob forma de benefício ou resgate, as contribuições realizadas
pelas instituidoras300.
Com a cláusula de vesting, as instituidoras de planos previdenciários
utilizam os planos previdenciários, também, como política de recursos humanos apta a
estimular a permanência dos empregados e dirigentes em seus quadros por maior tempo,
na medida em que há tal exigência para que façam jus aos recursos aportados em seu
favor.
Existindo cláusula de vesting, ou seja, previsão de condição futura e incerta
para que o participante faça jus às contribuições da Instituidora, entendemos que essas
jamais poderiam ser tributadas no momento do aporte, pois ainda não há, nesse
momento, disponibilidade jurídica e tampouco econômica da renda, mas mera
expectativa de direito.
Com efeito, quando não se cumprem as condições estabelecidas na cláusula
de vesting, as contribuições realizadas pela Instituidora são transferidas à conta coletiva
do plano, podendo vir a ser utilizadas para abater contribuições futuras da Instituidora
ao plano ou em benefício dos participantes remanescentes301. Nenhuma parcela das
contribuições antes efetuadas em seu benefício é creditada ao participante.
300 “Art. 5º Considera-se vesting o conjunto de cláusulas constantes do contrato entre a EAPC e a instituidora, a que o participante, tendo expresso e prévio conhecimento, está obrigado a cumprir para que lhe possam ser oferecidos e postos à sua disposição os recursos das provisões decorrentes das contribuições pagas pela instituidora, líquidos de carregamento, quando for o caso”. (BRASIL. Ministério da Fazenda. Superintendência de Seguros Privados. Circular Susep n° 338, de 30 de janeiro de 2007. Altera e consolida regras e critérios complementares de funcionamento e de operação da cobertura por sobrevivência oferecida em planos de previdência complementar aberta e dá outras providências. Brasília: DOU, 02 fev. 2007).
301 “Art. 16 […] § 2º Os valores relativos aos participantes que tenham descumprido as cláusulas de vesting poderão ser utilizados:
a) em favor dos participantes remanescentes; e/ou b) para quitação de contribuições futuras da instituidora referente ao benefício por sobrevivência”.
(Ibid.).
228
Neste caso, no momento do aporte não há disponibilidade econômica ou
jurídica da renda para o participante, que passa a ter mera expectativa de direito. Daí
porque, nessas hipóteses, a rigor, ainda não se configura o benefício indireto, de modo
que não se pode dizer que foi concedida isenção pelo legislador, pois este só pode
isentar aquilo que poderia tributar. O que se identifica, portanto, é verdadeira hipótese
de não-incidência tributária.
6.2.2.5 Isenção de contribuição previdenciária ao INSS
Além da isenção/não-incidência de IRRF e IRPF sobre contribuições
efetuadas por empregadores a planos de previdência privada, estas também fazem jus a
desoneração da contribuição previdenciária sobre a folha de salários302, destinada à
seguridade social, prevista pelo artigo 195, I, “a” da Carta e instituída pela Lei nº
8.212/91.
Externamos acima nosso entendimento de que, no mais das vezes (salva
aplicabilidade de cláusula de vesting), as contribuições em questão caracterizam
benefício indireto do empregador, em benefício do empregado. Sendo assim, a princípio
poderiam ser consideradas componentes do salário, também para fins de incidência de
contribuições previdenciárias.
O legislador ordinário, contudo, optou por excluí-las da base de cálculo das
contribuições previdenciárias sobre a folha de salários, desde que concedidas
regularmente. Trata-se de mais um incentivo da lei, concedido através de isenção, com
o objetivo de estimular que as empresas contratem planos de previdência privada e
contribuam para cobertura do risco social da velhice.
302 “Art.11. […] § 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: (Redação dada
pela Lei nº 9.528/97) […] p) o valor das contribuições efetivamente pago pela pessoa jurídica relativo a programa de previdência
complementar, aberto ou fechado, desde que disponível à totalidade de seus empregados e dirigentes, observados, no que couber, os arts. 9º e 468 da CLT; […])”. (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Brasília: DOU, 25 jul. 1991; 11 abr. 1996; 14 ago. 1998).
229
6.2.2.6 Contribuições em favor de beneficiário residente no exterior
Questão que suscita dúvidas é a do tratamento tributário aplicável na
hipótese de realização de contribuições, a plano de previdência privada, em favor de
participantes residentes no exterior. A matéria é relevante porquanto usual a
transferência de empregados e dirigentes de pessoa jurídica para trabalhar em outros
países, os chamados “expatriados”, e a manutenção das contribuições efetuadas pela
empregadora ao plano, a fim de que não sejam prejudicados pela ausência.
No que tange à dedutibilidade da despesa para a pessoa jurídica
empregadora, não há dúvida sobre sua manutenção, uma vez que a legislação aplicável
exige, como requisito, apenas que os beneficiários sejam empregados ou dirigentes da
pessoa jurídica303.
Assim, se mantido o vínculo de emprego ou diretivo durante o período de
expatriação do participante, a dedutibilidade das despesas se conserva (ainda que esses
vínculos sejam temporariamente suspensos). Por outro lado, se o contrato de trabalho
for rescindido, não estará mais presente o requisito legal exigido para a dedutibilidade, e
as respectivas despesas terão de ser adicionadas à base de cálculo do IRPJ e da CSLL,
por assumirem natureza de mera liberalidade.
Já no que tange à isenção de IRRF, há dúvida sobre sua aplicabilidade
quando se trata de contribuições a expatriados. De início, observa-se que o artigo 6º da
Lei nº 7.713/88, ao veicular a isenção em análise, não condiciona expressamente sua
aplicabilidade ao fato de as contribuições serem feitas a beneficiários residentes no País:
Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: […]
303 “Art. 361. São dedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica (Lei nº 9.249, de 1995, art. 13, inciso V).
§ 1º Para determinação do lucro real, a dedução deste artigo, somada às de que trata o art. 363, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a vinte por cento do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano (Lei nº 9.532, de 1997, art. 11, § 2º).
§ 2º O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o parágrafo anterior deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real (Lei nº 9.532, de 1997, art. 11, § 3º) (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999).
230
VIII - as contribuições pagas pelos empregadores relativas a programas de previdência privada em favor de seus empregados e dirigentes; […].304
Sendo assim, enquanto os expatriados se mantiverem como residentes
fiscais no Brasil, sendo sujeitos passivos do IRRF e do IRPF calculados mediante
aplicação da tabela progressiva, farão jus à isenção. Já quando se tornarem não-
residentes fiscais, os pagamentos efetuados em seu favor, a planos de previdência
privada, sofrerão a incidência do IRRF à alíquota de 25%, prevista para os rendimentos,
decorrentes da prestação de serviços profissionais, pagos a beneficiários domiciliados
no exterior305.
Vale notar, contudo, que esse tratamento pode implicar em sistemática na
qual as contribuições serão tributadas no aporte, e haverá tributação, novamente, no
momento da percepção dos benefícios ou resgates. Com efeito, se nesse momento o
beneficiário for residente no País, os benefícios e resgates, de acordo com a legislação
atual, serão tributados, seja pelo regime regressivo, seja pelo regime progressivo,
conforme opção feita quando da adesão do participante ao plano. Sendo residente no
exterior, também serão tributáveis, conforme se verá mais à frente, mediante aplicação
da alíquota de 15%, aplicável aos “demais rendimentos” pagos a beneficiários no
exterior, ou à alíquota de 25%, se tratados como rendimentos do trabalho, conforme
pretende a RFB.
A tributação na etapa das contribuições e na etapa do recebimento de
resgate ou benefício (TIT ou TTT) já foi rechaçada pelo STJ, definitivamente, quando
do julgamento da incidência de imposto de renda sobre benefícios e resgates originados
de contribuições efetuadas entre 1989 e 1985. A nosso ver, pode ser questionada, pelas
mesmas razões, se verificada na presente hipótese, sob o argumento da bitributação.
304 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988. Altera a legislação do imposto de renda e dá outras providências. Brasília: DOU, 23 dez. 1998.
305 “Art. 685. Os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente no exterior, estão sujeitos à incidência na fonte (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 100, Lei nº 3.470, de 1958, art. 77, Lei nº 9.249, de 1995, art. 23, e Lei nº 9.779, de 1999, arts. 7º e 8º):
[…] II - à alíquota de vinte e cinco por cento: a) os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços; […]” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999).
231
6.3 Isenção de IRRF sobre os rendimentos dos planos
Quando analisamos, em capítulo próprio, a incidência de imposto de renda
sobre o lucro e o superávit das entidades abertas e fechadas de previdência
complementar, verificamos que, por longo período, subsistiu obscuridade quanto à
tributação dos ganhos dessas entidades e dos ganhos obtidos na aplicação dos recursos
garantidores dos planos previdenciários que elas administram.
No âmbito das entidades abertas de previdência complementar, os
rendimentos auferidos pelos recursos garantidores dos planos eram tributados como se
pertencentes às entidades, sem qualquer distinção de tratamento. O IRRF incidia sobre
tais rendimentos como adiantamento do IRPJ calculado ao final do período de apuração.
Contudo, não se atentava para a peculiaridade de, mesmo pertencendo às entidades,
serem, como são, contabilizados em planos separados, nos quais se constituem as
provisões técnicas (passivos) obrigatórias para pagamento dos benefícios futuros aos
participantes. Portanto, essa forma de tributação simplesmente tratava os recursos como
pertencentes às entidades, o que se mostrava inadequado, em face dos objetivos da
previdência complementar privada.
Quanto às entidades fechadas, também tratamos, em tópico anterior, de sua
tentativa, por longos anos, de se qualificarem como assistenciais e, portanto, imunes à
incidência de impostos e contribuições previdenciárias. Contudo, o entendimento das
autoridades fiscais era contrário à sua qualificação como tal, de modo que, mesmo não
tendo fins lucrativos, os rendimentos das aplicações financeiras de seus planos eram
tributados pelo IRRF. Após o julgamento da matéria pelo STF, sobreveio a Medida
Provisória no 2.222/02 instituindo o “RET”, regime especial de tributação, que passou a
tributar de forma peculiar os rendimentos dos recursos dessas entidades, porém de modo
idêntico ao adotado nas entidades abertas.
Até então, portanto, não se havia chegado à situação ideal de não tributar os
rendimentos auferidos pelos recursos garantidores dos planos, durante o período de
acumulação, a fim de potencializar a poupança realizada e os frutos gerados pela sua
aplicação.
232
Somente a partir de 1º de janeiro de 2005, com a entrada em vigor da Lei
11.053/04, resultante da conversão da Medida Provisória nº 209/04, passou a vigorar tal
isenção:
Art. 5º A partir de 1º de janeiro de 2005, ficam dispensados a retenção na fonte e o pagamento em separado do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar, sociedade seguradora e FAPI, bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência. Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo aos fundos administrativos constituídos pelas entidades fechadas de previdência complementar e às provisões, reservas técnicas e fundos dos planos assistenciais de que trata o art. 76 da Lei Complementar no 109, de 29 de maio de 2001. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005).306
As relevantes razões que conduziram a tal isenção constaram da exposição
de motivos que justificou a edição da MP 209/04:
O artigo 5º determina que na fase de acumulação não haverá incidência de imposto de renda na fonte, no caso de rendimentos pagos por instituições financeiras, ou pago em separado, no caso de aplicações em bolsa e assemelhadas, o que resulta na não tributação dos rendimentos e ganhos auferidos na fase de acumulação. Trata-se de demanda histórica do sistema de previdência complementar e que torna a acumulação de recursos por meio destes produtos totalmente livre de impostos, a exemplo do que se verifica em outros países, sendo este mais um incentivo à formação de poupança previdenciária de longo prazo. Pelas mesmas razões propomos a revogação de dispositivos legais que tratam da tributação com base no regime especial previsto na MP nº 2.222, de 2001.307
Segundo CARVALHO e MURGEL, “dessa forma, as Entidades Fechadas de
Previdência Complementar, finalmente, passaram, a partir de janeiro de 2005, a ser
tributadas pelo regime IIT”. Acrescentamos que o mesmo regime passou a ser aplicável
aos planos administrados pelas entidades abertas. Até então, o sistema aplicável no País
era o ITT, em que só havia isenção/dedutibilidade na etapa das contribuições, sendo
tributados tanto os rendimentos do plano quanto os benefícios e resgates.
306 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 dez. 2004.
307 BRASIL. Presidência da República. Medida Provisória nº 209, de 26 de agosto de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 ago. 2004.
233
Denomina-se IIT o regime segundo o qual há isenção (I) e dedutibilidade no
momento da realização das contribuições, (I) isenção durante a fase de acumulação ou
diferimento, somente vindo a ocorrer a tributação (T) no momento do recebimento do
resgate ou benefício. Esse regime, assim como o TII (que prevê tributação na realização
das contribuições, e isenção nas etapas posteriores), privilegia a poupança em
detrimento do consumo, estimulando a contratação de previdência privada, pois
concede isenção em duas etapas da cadeia previdenciária privada, somente vindo a
tributá-la no momento futuro do recebimento dos benefícios previdenciários (ou no
resgate, se ocorrer). Diferentemente, os demais regimes utilizados (TTI e ITT), ao
tributar duas etapas da cadeia, tratam com igualdade o consumo e a poupança, não
incentivando a reserva de recursos no longo prazo, para fim de aposentadoria.
A nosso ver, o regime IIT, atualmente adotado, é o mais benéfico no
contexto do sistema jurídico, econômico e tributário brasileiro, por diversas razões. Em
primeiro lugar, porque interessa ao Estado, indubitavelmente, que os particulares
contribuam para a formação de poupança que vai gerar complementação de
aposentadoria futura, atenuando os ônus da velhice tanto para a previdência social
quanto para o sistema público de saúde. Em segundo lugar, deve-se ter em mente que,
num país com histórico de economia instável, é necessária a concessão de benefícios
tributários que incentivem a opção por poupança de longo prazo – sujeita às variáveis
econômicas – em substituição ao consumo de curto prazo.
Vale acrescentar, ainda, a colocação de CARVALHO e MURGEL sobre a
importância desse incentivo para o mercado de capitais:
O tratamento fiscal mais benéfico à poupança alocada em fundos de pensão justificar-se-ia pelo efeito positivo no mercado de capitais. Os fundos de pensão exercem papel importante para fins de assegurar a operação eficiente do mercado de capitais, aumentando sua liquidez e valorando adequadamente as respectivas garantias.308
Por todas as razões expostas, foi acertada a decisão do legislador de inserir
no sistema tributário a isenção de IRRF para os rendimentos auferidos na aplicação dos
recursos garantidores dos planos de benefício de caráter previdenciário, incentivando a
poupança de longo prazo e, consequentemente, desonerando a Previdência Social e os
demais sistemas estatais de apoio à velhice.
308 CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 70-71.
234
6.4 Tratamento tributário dos benefícios e resgates recebidos pelos participantes
Como vimos expondo, atualmente vigora, no subsistema de normas voltadas
à tributação da previdência privada, o regime denominado “IIT”, em que só incide
tributação na etapa final, ou seja, no momento em que os recursos aportados ao plano,
seja pelos participantes seja pelas patrocinadoras ou instituidoras, retornam ao
participante ou seus beneficiários, sob a forma de resgate ou benefício.
Antes de adentrarmos a análise das regras tributárias atinentes ao resgate e
ao benefício previdenciário, necessário definir os institutos.
Segundo PÓVOAS, “no contrato previdenciário, o benefício é a
contraprestação da entidade, isto é, a importância ou importâncias que a entidade
entrega ao participante ou aos seus beneficiários, uma vez verificado o evento
especificado no contrato previdenciário”309.
Já o “resgate” é um direito, garantido pela Lei Complementar nº 109/01 a
todos os participantes de planos de previdência privada (artigo 14, III para planos
geridos por EFPC e 27 para planos geridos por EAPC), que consiste na retirada de
recursos pelo participante, de sua reserva matemática constituída no plano
previdenciário, durante o prazo de diferimento, ou seja, antes de completado o período
contratado para o início do recebimento de benefício.
Importante deixar clara a diferença conceitual entre benefício e resgate.
Esclarece PÓVOAS:
Este direito [resgate] está correlacionado com o direito subjetivo do participante ao benefício, mas é diferente; é, sem dúvida, um novo direito subjetivo. O recebimento do resgate não corresponde ao exercício antecipado do direito ao benefício, porque não tem com ele qualquer ligação; mas está ligado à expressão atuarial da responsabilidade que a entidade deixou de ter em relação a ele, expressão essa que varia com as variáveis e parâmetros que a norma mande considerar no respectivo cálculo, o que explica que umas vezes essa expressão seja a totalidade ou uma parte da reserva matemática, ou seja, uma parte maior ou menor das contribuições pagas pelo participante.310
309 PÓVOAS, Manuel Sebastião Soares. Previdência Privada. Filosofia, Fundamentos Técnicos, Conceituação Jurídica. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 387.
310 Ibid., p. 409.
235
O resgate nos planos administrados por entidades fechadas só ocorre se e
quando acontece a extinção do vínculo do participante com a Patrocinadora ou
Instituidora. Já nos planos coletivos administrados por entidades abertas, não há essa
restrição, podendo ser realizado a qualquer momento, durante o período de diferimento,
no que tange à parcela da reserva constituídas por contribuições efetuadas pelo
participante. A parcela da reserva constituída por contribuições da Instituidora só pode
ser resgatada mediante atendimento às exigências da cláusula de vesting.
Nos planos individuais administrados por entidades abertas, o resgate pode
ser efetuado a qualquer tempo pelo participante, observada apenas a carência prevista na
legislação. Assinala RODRIGUES que “a possibilidade de resgate sem maiores requisitos
tem gerado a crítica de que esses planos acabam tendo um perfil de veículo de
planejamento fiscal e não de poupança previdenciária”311.
Justifica-se, então, que a legislação atribua tratamento tributário
diferenciado para resgate e benefício, porquanto, no caso do benefício, estamos
tratando, efetivamente, de complementação de aposentadoria, com sua característica de
cobertura do risco social da velhice. Já o resgate consiste em prerrogativa garantida pela
legislação previdenciária, a qual só pode ser exercida antes da data estipulada para
aposentadoria, nos moldes da regulação e do contrato previdenciário. Não tem, portanto,
característica previdenciária em sentido estrito.
Feitos esses esclarecimentos sobre a natureza do resgate e do benefício, e
observado que, no sistema atualmente em vigor, a tributação no âmbito da previdência
privada só ocorre quando do pagamento dos respectivos valores aos participantes e
beneficiários (regime IIT), passamos à análise dos dois diferentes regimes estabelecidos
na lei para tal tributação.
311 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 25.
236
6.4.1 Regime tradicional – Incidência do IR / tabela progressiva
Os resgates e benefícios recebidos pelos participantes de planos de
previdência privada há muito se sujeitam à incidência do imposto sobre a renda,
mediante aplicação da tabela progressiva mensal (IRRF) e anual (IRPF).
Dispõe a Lei nº 9.250/95:
Art. 33. Sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições.312
A nosso ver, esse método de tributação, segundo o qual, na ocasião do
pagamento, dá-se a incidência do IRRF mediante aplicação da tabela progressiva e, ao
final do período de apuração o sujeito passivo recalcula o IRPF devido sobre os mesmos
rendimentos em sua Declaração de Ajuste Anual, se ajusta à natureza dos benefícios
previdenciários, os quais visam, primordialmente, atender as despesas usuais da vida
cotidiana dos participantes assistidos, após a aposentadoria.
Tal regime é adequado a benefícios previdenciários, em primeiro lugar,
porque as alíquotas escalonadas da tabela, aplicáveis a cada uma das parcelas da renda
auferida, observam o princípio constitucional da progressividade, segundo o qual
quanto maior a renda, mais elevada deve ser a tributação. Nem se diga que o número de
alíquotas previsto na tabela é insuficiente para atingir de tal finalidade, pois há sempre
aplicação de mais de uma alíquota da tabela, considerando o valor específico da renda
auferida pelo contribuinte, o que, após a dedução de despesas, resulta numa infinidade
de alíquotas possíveis, variando de 0 a 27,5%.
Em segundo, porque tanto as regras referentes à incidência na fonte do
imposto, quanto os ajustes realizados anualmente, por ocasião da elaboração da
Declaração de Ajuste, permitem que sejam deduzidas as despesas imprescindíveis à
existência digna dos participantes assistidos, ainda que se possam fazer críticas em
relação à limitação das deduções autorizadas.
De qualquer modo, é fato que certas despesas, inegavelmente pesadas, em
especial para idosos (os usuais assistidos de planos previdenciários), como os gastos
312 BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.250 de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 1995.
237
médicos e com planos de saúde, podem ser integralmente deduzidas da base de cálculo
do imposto na Declaração de Ajuste Anual. Tudo isso vem ao encontro de outro
princípio constitucional fundamental, aplicável ao imposto sobre a renda, que é o da
capacidade contributiva.
No que concerne à relação entre esse princípio e o imposto sobre a renda,
arguta a observação de PAULO DE BARROS CARVALHO:
Aliás, diga-se de passagem, poucos são os tributos que se prestam à aferição da autêntica capacidade contributiva relativa como o imposto sobre a renda, dada sua forte índole de pessoalidade, sendo inteiramente possível ao legislador, por controlar a multiplicidade e a legitimidade dos ingressos e selecionando as quantias admitidas como dedutíveis, apurar o verdadeiro saldo identificador da renda tributável ou da renda líquida, segundo o regime jurídico da incidência. Aquilo que só de longe pode ser imaginado em impostos com o IPI e o ICMS, no IR se transforma em algo tangível e perfeitamente concretizável.313
Como bem apontado pelo Professor, o princípio da capacidade contributiva
encontra terreno fértil no imposto sobre a renda, pois a própria mensuração do
acréscimo patrimonial já o leva em consideração. O legislador deve ter em conta, no
mínimo, as despesas essenciais à subsistência, quando da quantificação da base de
cálculo do imposto, para harmonizá-lo com o referido princípio.
Há quem entenda que a progressividade deve necessariamente ser conjugada
à proporcionalidade para que o princípio da capacidade contributiva seja observado em
sua plenitude. Para ELIZABETH NAZAR CARRAZA, por exemplo, a proporcionalidade “só
atende ao princípio em análise – da capacidade contributiva – se atingida através da
progressividade do imposto”314.
No dizer de LUCIANO AMARO, “a progressividade não é uma decorrência
necessária da capacidade contributiva, mas sim um refinamento desse postulado”. Para
ele, “a proporcionalidade implica que riquezas maiores gerem impostos
proporcionalmente maiores (na razão direta do aumento da riqueza). Já a
progressividade faz com que a alíquota para as fatias mais altas da riqueza seja
maior”315.
313 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4. ed., revisada e ampliada. São Paulo: Noeses, 2011, p. 668.
314 CARRAZZA, Elizabeth Nazar. IPTU e Progressividade – Igualdade e Capacidade Contributiva. São Paulo: Juruá, 1998, p. 55.
315 AMARO, Luciano da Silva. Direito Tributário Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 139.
238
Além dos princípios da capacidade e da progressividade, também regem o
imposto sobre a renda os da universalidade e da generalidade. Já tivemos a
oportunidade de tratar, no item 3.3.1, do princípio da universalidade, segundo o qual
todas as rendas podem ser tributadas no País, independentemente da localização de suas
fontes de produção e de pagamento. Por seu turno, o princípio da generalidade, como
explica RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA,
[…] significa que o imposto deve tratar por igual todo e qualquer tipo de renda ou provento, melhor dizendo, todo acréscimo patrimonial deve receber o mesmo tratamento. Generalidade contrasta com seletividade, sabendo-se que em nossa Constituição há um imposto que obrigatoriamente deve ser seletivo […]. Já no caso do imposto de renda, a seletividade é vedada expressamente, por exclusão decorrente da adoção obrigatória do princípio da generalidade, que se contrapõe à seletividade.316
Ora, a tributação mensal (pelo Carnê Leão ou, como na presente hipótese,
pelo IRRF) e na Declaração de Ajuste Anual, conforme previsto no artigo 33, da Lei nº
9.250/95, para os resgates e benefícios de planos previdenciários, é a regra amplamente
aplicável a todos os rendimentos recebidos por pessoas físicas, salvo exceções expressas
(cuja validade, usualmente, é questionável, por contrariar os referidos princípios
constitucionais). Assim, colocar os benefícios previdenciários sob a égide dessas regras
matrizes implica também atender ao princípio da generalidade, segundo o qual todas as
rendas devem receber o mesmo tratamento tributário.
Cabe observar, aqui, a existência de regra especial para tributação dos
resgates, no âmbito do regime tributário tradicional ora analisado. Com efeito, a Lei nº
11.053/04 estabeleceu, em seu artigo 3º, a incidência do IRRF à alíquota de 15%
quando de sua realização, sendo tal tributação ajustada na Declaração de Ajuste Anual,
mediante aplicação da tabela progressiva317. O objetivo dessa regra foi coibir o
planejamento tributário que vinha sendo utilizado, consistente na realização de resgates
316 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 214.
317 “Art. 3o A partir de 1o de janeiro de 2005, os resgates, parciais ou totais, de recursos acumulados relativos a participantes dos planos mencionados no art. 1o desta Lei que não tenham efetuado a opção nele mencionada sujeitam-se à incidência de imposto de renda na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento), como antecipação do devido na declaração de ajuste da pessoa física, calculado sobre:
I - os valores de resgate, no caso de planos de previdência, inclusive FAPI; II - os rendimentos, no caso de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de opção pelo regime de tributação
previsto nos arts. 1o e 2o desta Lei.” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 dez. 2004).
239
de baixo valor, de planos previdenciários tributados pela tabela progressiva, situados na
faixa de isenção da tabela, os quais não sofriam tributação. Considerando que o objetivo
dos planos previdenciários é gerar renda futura, após o período de diferimento, o
mecanismo em questão, que visa evitar realização de resgates como planejamento
tributário, se justifica e não onera o sujeito passivo indevidamente, na medida em que a
tributação em questão é objeto de acerto na Declaração de Ajuste Anual.
Em suma, conclui-se que o regime de tributação “tradicional”, veiculado
pelo artigo 33 da Lei nº 9.250/95, segundo o qual os resgates e benefícios recebidos de
plano de previdência privada são tributáveis na fonte e na Declaração de Ajuste Anual,
mediante aplicação da tabela progressiva, atende bem aos princípios constitucionais da
generalidade, da proporcionalidade e da progressividade, os quais devem,
necessariamente, ser observados pelo legislador ordinário, ao instituir as regras-matrizes
de incidência tributária do imposto sobre a renda.
6.4.2 Regime optativo – Incidência do IR / alíquotas regressivas
O regime de tributação “regressiva”, aplicável aos benefícios e resgates
realizados em planos previdenciários, foi instituído pelo artigo 1º, da Lei nº 11.053/04,
em que se converteu a Medida Provisória nº 209/04.
O referido dispositivo legal permitiu que os participantes de planos de
benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição
definida ou variável, optassem por tal sistemática, quando da adesão aos planos, ficando
excetuados dessa possibilidade os participantes de planos na modalidade benefício
definido.
De acordo com o regime de tributação regressiva, o imposto sobre a renda
na fonte incide, de forma definitiva, sobre os benefícios e resgates pagos aos próprios
participantes optantes ou seus beneficiários, de acordo com alíquotas que variam,
regressivamente, de 35% a 10% dependendo do prazo de acumulação dos recursos no
plano:
240
Alíquota Período de acumulação dos recursos 35% Até 2 (dois) anos 30% De 2 (dois) a 4 (quatro) anos 25% De 4 (quatro) a 6 (seis) anos 20% De 6 (seis) a 8 (oito) anos 15% De 8 (oito) a 10 (dez) anos 10% 10 (dez) anos ou mais
Conforme indicado na exposição de motivos da Medida Provisória nº
209/04, o regime de tributação baseado em alíquotas decrescentes objetiva incentivar a
manutenção dos recursos nos planos por períodos mais longos. Esse objetivo extrafiscal
da tributação regressiva foi ressaltado por WEINTRAUB:
Fica clara a extrafiscalidade no ponto da inibição de resgate de curto prazo e incentivo de postergação dos recursos no sistema previdenciário privado. Quanto mais tempo o participante mantiver recursos no sistema, menos eles serão tributados. Aliás, a alíquota de 10% para recursos com prazo de acumulação superior a dez anos é relativamente muito baixa, se considerarmos a carga tributária imensa que existe no Brasil.318
A instituição de normas tributárias com objetivo indutor de comportamentos
é instrumento utilizado pelo Estado com frequência. Nesse sentido, esclarecedor o
comentário de LUÍS EDUARDO SCHOUERI:
Dentre os mecanismos que se colocam à disposição do Estado para a intervenção no domínio econômico, não podem ser deixados de lado os de índole tributária. Por meio de normas tributárias indutoras, contribuintes se veem estimulados ou desencorajados a adotarem certos comportamentos desejados pelos formuladores de políticas econômicas. Tal assertiva, verdadeira na generalidade das economias, assume maior relevância em países cujas economias ainda dependam de impulsos estatais para seu desenvolvimento.319
O estimulo à poupança de longo prazo, por parte do legislador, em especial
no âmbito de planos previdenciários, é objetivo perfeitamente legítimo e louvável. Já
tivemos oportunidade de mencionar, em diversas passagens do presente trabalho, a
importância da previdência privada para garantir a efetividade do princípio da dignidade
318 WEINTRAUB, Arthur Bragança de Vasconcellos. Previdência Privada – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 221-222.
319 SCHOUERI, Luís Eduardo. Acordos de Bitributação e Incentivos Fiscais: o Papel das Cláusulas de Tax Sparing & Matching Credit. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; ELALI, André; PEIXOTO, Marcelo Magalhães (Coords.). Incentivos Fiscais – Questões Pontuais nas Esferas Federal, Estadual e Municipal, São Paulo: MP, 2007, p. 253.
241
da pessoa humana, protegendo-a das adversidades da velhice. Daí porque é bem-vinda,
em princípio, toda e qualquer legislação que venha favorecer e estimular a contratação,
manutenção e os melhores resultados dos planos previdenciários.
É princípio fundamental da dogmática jurídica o fato de as leis ordinárias
não poderem, sob pretexto algum, ofender princípios constitucionais. E a incidência
regressiva do imposto sobre a renda, tal como prevista pelo artigo 1º, da Lei nº
11.053/04, contrasta diversos deles.
Em primeiro lugar, ofende frontalmente o princípio da progressividade, uma
vez que o imposto em questão incide mediante aplicação de uma única alíquota sobre a
totalidade do benefício ou resgate recebido, levando em consideração apenas o período
de acumulação dos recursos no plano e ignorando o montante dos valores pagos.
A ofensa ao princípio da progressividade já seria suficiente para acoimar de
absoluta inconstitucionalidade a legislação em questão, a despeito da justiça dos
objetivos visados. Nesse sentido é a doutrina de EDUARDO JARDIM, para quem qualquer
tributo pode ser progressivo, independentemente de previsão expressa na Constituição.
Adverte, contudo:
Por outro lado, na hipótese de haver referência expressa na Carta Magna, como ocorre com o imposto sobre a renda e o imposto sobre a propriedade predial territorial urbana, ao contrário de autorização, trata-se de uma ordem, pela qual o legislador é obrigado a tornar o referido tributo progressivo, sob pena de descumprimento de comando constitucional.320
Além de afrontar a progressividade, a utilização da tabela regressiva em
foco também é potencialmente ofensiva ao princípio da isonomia. Com efeito, dois
contribuintes em igual situação econômica (ou seja, que comecem a receber, em 2014,
benefício previdenciário de R$ 2.000,00) poderão sofrer tributação diferenciada,
mediante aplicação de alíquotas tão díspares quanto 35% e 10%, a depender do período
de tempo em que tenham acumulado recursos no plano.
Tem-se ainda o fato de que, no âmbito da sistemática em questão,
diferentemente do que ocorre no regime “tradicional” de tributação dos planos
previdenciários, a incidência do imposto sobre a renda é definitiva, isto é, não permite
deduções de despesas na fonte, nem ajuste na Declaração Anual. Com isso, ofende-se o
320 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário de Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2011, p. 327.
242
conceito constitucional de renda (não se permitindo o cotejo entre receitas e despesas no
período de apuração) e, consequentemente, também o princípio da capacidade
contributiva. Resta contrariado, ainda, o princípio da generalidade da tributação, na
medida em que se atribui tratamento diferenciado a um determinado tipo de renda em
relação a outras.
O fato de essa tributação ser opcional, e potencialmente vantajosa para o
sujeito passivo não convalida as inconstitucionalidades perpetradas. Esclarece RICARDO
MARIZ DE OLIVEIRA:
Algumas vezes, quando se trata de uma incidência isolada e exclusiva, sem ajuste final, o regime beneficia o contribuinte, o qual, embora tributado antecipadamente, suporta ônus por alíquota inferior à devida sobre a sua renda universal do período. Neste caso, ele pode sair ganhando se o imposto progressivo incidente sobre a totalidade do seu acréscimo patrimonial, a este adicionado o valor tributado isoladamente, for maior do que a alíquota isolada. Em qualquer caso, contudo, há infringência do inciso I do parágrafo 2º do art. 153, primeiramente por não haver a observância do princípio da universalidade, em segundo lugar, por não haver o cumprimento do princípio da generalidade, eis que, nos casos do imposto devido na fonte, as alíquotas são diversas de uma hipótese para outra –, e, em terceiro lugar, por não ser atendido o princípio da progressividade.321
Deve-se observar, ainda, que a aparente vantagem da alíquota de 10% tende
a ser ilusória, pois é comum deixar-se de levar em conta, ao compará-la com a alíquota
de 27,5% encontrada no topo da tabela progressiva, que antes da aplicação desta última
ao rendimento serão deduzidas despesas (o que não ocorre no regime regressivo, já que
a tributação é definitiva), e que a tabela progressiva não indica uma única alíquota para
ser aplicada a determinada faixa de renda, mas submete-a a todas as alíquotas previstas
na tabela, chegando-se a alíquota efetiva intermediária, e muitas vezes inferior a 10%.
Além disso, a opção pela tributação progressiva ou regressiva é feita quando
da adesão do participante ao plano. Nesse momento, ele ainda não conhece os gastos
com que terá de arcar na sua velhice, dentre os quais avultam, em especial, as despesas
médicas, integralmente dedutíveis na apuração do IRPF tradicional. Da mesma forma
não sabe, ainda, o volume exato de recursos que conseguirá acumular no plano até a
idade em que iniciará o recebimento de benefícios, sendo que é o valor destes últimos
que determinará a alíquota incidente, de acordo com a tabela progressiva. Por esses
321 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 268-269.
243
motivos, no momento da opção o participante não tem condições de avaliar, com grau
razoável de segurança, os benefícios da sistemática regressiva em comparação com o
regime tradicional.
Parece-nos, portanto, ter andado mal o legislador ordinário quando se
utilizou do artifício das alíquotas regressivas do imposto sobre a renda na fonte para
estimular a adesão a planos de previdência privada e a manutenção dos recursos ali
aportados por longo prazo. Ao adotar tal procedimento, acabou por fazer tábula rasa de
todos os princípios que condicionam o legislador ordinário quando da instituição do
imposto sobre a renda.
PATRÍCIA GAUDENZI chegou a conclusões semelhantes ao analisar a
sistemática em questão:
O mesmo não se pode afirmar do Regime Regressivo de Tributação. Este referido regime baseia-se na instituição de alíquotas regressivas, não segundo a renda do contribuinte, mas segundo o prazo de acumulação dos recursos no plano. Assim, conforme o prazo de acumulação dos recursos, a alíquota do imposto de renda é a mesma, independentemente do montante de renda auferida pela pessoa física. Ademais, a sua base de cálculo não é variável de acordo com a situação econômica pessoal do contribuinte. Isto porque o imposto de renda, nesta sistemática, é definitivo, não sendo computado quando da apuração do imposto de renda efetivamente devido no ano pelo indivíduo (sobre a renda efetivamente recebida no período), nem os rendimentos por ele tributados, nem o seu montante retido na fonte. A única justificativa para este critério de incidência seria vislumbrar aplicação da extrafiscalidade – técnica usada para imputar à configuração dos tributos elementos que pudessem nortear seus comportamentos, de forma a estimular ou desestimular determinadas ações, julgadas de relevante interesse público, seja no âmbito social, político, monetário ou econômico. Neste caso, porém, conforme anteriormente exposto, em se tratando de imposto de renda, a extrafiscalidade somente poderá ser exercida se a hipótese de incidência atingida contemplar a capacidade contributiva e a progressividade.322
Com efeito, não se pode falar em extrafiscalidade, imposta por lei ordinária,
em afronta a princípios constitucionais. É bem verdade que a extrafiscalidade visa
atingir valores reputados como relevantes e merecedores de estímulo do legislador
ordinário. Contudo, os valores que devem ser perseguidos pela legislação tributária
foram expressamente eleitos e indicados na Constituição através dos princípios que
322 GAUDENZI, Patricia Bressan Linhares. Tributação dos investimentos em previdência complementar privada: fundos de pensão, PGBL, VGBL, FAPI e outros. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 234.
244
regem a tributação geral e certos tributos em especial. Esses valores, elevados ao nível
constitucional, em hipótese alguma podem ser afastados por norma legal de inferior
hierarquia.
6.4.3 RMIT do IRRF incidente sobre resgates e benefícios da previdência
privada
Obtidas as conclusões acima, vejamos como podem ser sistematizadas as
regras matrizes de incidência tributária do IRRF nas modalidades progressiva e
regressiva.
Comecemos pela RMIT do IRRF no regime progressivo.
Hipótese: Critério material: Pagar resgate ou benefício de plano de previdência privada a participante ou beneficiário não optante pelo regime regressivo Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do pagamento Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Entidade Aberta ou Fechada de Previdência Complementar Critério quantitativo: base de cálculo: montante total do benefício ou resgate, com as deduções previstas em lei. alíquotas: 15% para resgates, e 0 a 27,5% para benefícios, conforme o valor do rendimento.
Ressalte-se que, como a EFPC/EAPC ocupam o polo passivo da obrigação
tributária como responsável (substituta) tributária, além da RMIT extrai-se do texto
legal outra norma, que denominamos “norma de retenção”, a qual lhes atribui o direito
de reter, do valor do benefício ou resgate, o montante do IRRF, repassando seu ônus
econômico ao participante, que arca com ele por ser quem aufere renda na operação.
Observamos, ainda, que a incidência da RMIT do IRRF, no regime
progressivo, conjuga-se à incidência posterior da RMIT do IRPF apurado pelo
participante ou beneficiário em sua Declaração de Ajuste Anual. Quando da incidência
desta, cuja hipótese de incidência é “auferir renda”, os rendimentos em questão serão
novamente incluídos em sua base de cálculo, que levará em conta também todas as
despesas dedutíveis incorridas ao longo do ano.
245
Apurado o imposto devido, o IRRF pago antecipadamente poderá ser
utilizado como abatimento (em decorrência de “norma de crédito” prevista na
legislação) e eventuais valores pagos a mais serão restituídos ao sujeito passivo.
Com essa conjugação de normas, como já comentado anteriormente, são
obedecidos os princípios constitucionais da capacidade contributiva e da
progressividade.
Passemos, agora, à RMIT do IRRF no regime regressivo.
Hipótese: Critério material: Pagar resgate ou benefício de plano de previdência privada a participante ou beneficiário optante pelo regime regressivo Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do pagamento Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Entidade Aberta ou Fechada de Previdência Complementar Critério quantitativo: base de cálculo: montante total do benefício ou resgate, sem deduções. alíquotas: Conforme o prazo de acumulação dos recursos no plano 35% (até 2 anos), 30% (de 2 a 4 anos), 25% (de 4 a 6 anos), 20% (de 6 a 8 anos), 15% (de 8 a 10 anos) ou 10% (mais de 10 anos).
Também neste caso haverá “norma de retenção”, pois se trata de
substituição tributária.
No regime regressivo, diferentemente do que ocorre com a tributação na
sistemática progressiva, a incidência da RMIT é definitiva. Isso significa dizer que não
há conjugação com a RMIT do IRPF apurado pelo participante ou beneficiário em sua
Declaração de Ajuste Anual, com inclusão, em sua base de cálculo, dos rendimentos, e
norma de crédito permitindo a compensação do IRRF pago ao longo do ano.
Inexistindo essa possibilidade, não é possível o desconto das despesas
dedutíveis incorridas ao longo do ano, tampouco o ajuste da tributação segundo
alíquotas escalonadas conforme o valor da renda, ofendendo-se, como já exposto, os
princípios da capacidade contributiva e da progressividade.
246
6.5 Benefícios e saldos de conta recebidos pelos beneficiários
Mencionamos, anteriormente, que os beneficiários, além dos próprios
participantes, também podem receber valores de planos previdenciários. Isso pode
acontecer, basicamente, em três situações.
Ao contratar um plano de previdência privada, o participante pode adquirir,
conjuntamente, uma cobertura de risco para si (invalidez) e para seus beneficiários (para
o caso de sua morte), que nada mais é senão uma cobertura de seguro de pessoas, que
também pode ser oferecida por entidades de previdência privada (além de seguradoras).
Assim, vindo a falecer, os seus beneficiários receberão da entidade o “pagamento do
capital segurado”, também usualmente referido como “pecúlio”.
A segunda situação decorre da contratação de benefício de aposentadoria
pelo participante do plano, ao final do período de diferimento (ou seja, quando opta pelo
tipo de renda que deseja receber), destinado aos seus beneficiários, na hipótese de sua
morte com sobrevivência daqueles. Tais benefícios são adquiridos pelos participantes
das entidades de previdência com os recursos da reserva constituída durante o período
de diferimento.
Por fim, temos a terceira situação possível, que é a entrega, pela entidade
aos beneficiários dos participantes, do saldo de conta do participante, na hipótese de
falecimento deste durante o período de diferimento. Como a maior parte dos planos
atualmente oferecidos por EFPC e EAPC é de “contribuição definida” e, portanto,
baseada no regime de capitalização, se o participante morrer durante o período de
diferimento (ou seja, antes de sua aposentadoria na previdência privada), o saldo
existente em sua conta individualizada no plano deve ser destinado aos beneficiários
indicados quando de sua adesão. Nesse caso, não se está diante de cobertura de risco,
tampouco de benefício previdenciário especialmente contratado pelo participante em
favor de seus beneficiários, mas sim da mera transferência da poupança que acumulou
para sua aposentadoria, a seus beneficiários, quando o participante não sobrevive ao
período de diferimento.
Questiona-se, então, qual o tratamento a ser atribuído a tais rendimentos
(pagamento do capital segurado, benefícios e destinação do saldo de conta), quando
recebidos pelos beneficiários dos participantes, após sua morte.
247
A dúvida existe pois, como já mencionado quando tratamos da tributação
das indenizações de seguro, a Lei no 7.713/98, através de seu artigo 6o, VII, excluiu da
incidência do imposto sobre a renda das pessoas físicas os “seguros” recebidos de
entidades de previdência privada decorrentes de invalidez permanente ou morte do
participante (redação dada pela Lei nº 9.250, de 1995). Torna-se necessário, portanto,
determinar quando é possível aplicar tal isenção aos pagamentos de valores efetuados
por entidades de previdência privada aos beneficiários de participantes falecidos.
6.5.1 Tributação dos benefícios de pensão por morte
No que tange aos benefícios de pensão por morte, propriamente ditos,
recebidos usualmente sob a forma de renda (pagamentos periódicos) pelos beneficiários
dos participantes, contratados pelos participantes ao final do período de diferimento, a
nosso ver estão claramente contidos na regra do artigo 33 da Lei nº 9.250/95, segundo a
qual “sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste
anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as
importâncias correspondentes ao resgate de contribuições”.
A regra em questão refere-se aos “benefícios recebidos de entidade de
previdência privada”, sem fazer distinção de tratamento entre os recebidos por
participantes ou seus beneficiários. Se a tributação em questão será feita da forma
tradicional ou regressiva, isso dependerá da opção feita pelo participante na época da
adesão ao plano.
Esse tratamento tributário tem sentido lógico-sistemático, pois os benefícios
de pensão por morte, conforme acima afirmado, são adquiridos pelos participantes
quando da conversão de sua reserva em benefício. Não têm, portanto, natureza de
“seguro”, embora o valor da pensão seja calculado pela entidade mediante cálculos
atuariais.
Analisando-se a questão sob o ponto de vista tributário, verifica-se que esses
benefícios são adquiridos com os recursos da reserva do participante que, por sua vez,
foi constituída por contribuições dedutíveis do IRPF e isentas, quando pagas por
patrocinadoras e instituidoras. Daí poderem ser tributados quando recebido pelos
beneficiários dos participantes, em consonância com a sistemática IIT vigente.
248
6.5.2 Isenção do capital segurado pago por entidades de previdência privada
No que respeita ao pagamento do capital segurado aos beneficiários dos
participantes, decorrente da contratação de seguro de pessoas perante entidades de
previdência privada, parece-nos claro que não são tributáveis, por terem natureza de
“seguro” e por aplicação direta do artigo 6º, VII da Lei nº 7.713/88, que nada mais fez
senão equiparar o tratamento da indenização paga por entidades de previdência privada
àquele dado às indenizações pagas por seguradoras.
Já ressalvamos, e entendemos importante reiterar, que quando se referiu aos
“seguros” recebidos decorrentes de morte e invalidez, a referida legislação utilizou
expressões tecnicamente incorretas. A rigor, deveria ter sido feita referência ao
“pagamento do capital segurado” (denominação técnica da indenização de seguro de
pessoas) em razão da morte de titular de seguro de vida, ou contratante de benefício de
risco no âmbito de plano previdenciário.
Pois bem, em face da natureza indenizatória do “pagamento do capital
segurado”, este foi corretamente desonerado pelo legislador, seja quando pago por
seguradoras, seja quando pago por entidades de previdência privada, que também são
autorizadas a negociar com esse tipo de seguro. Assim é porque, como já salientado, as
indenizações estão fora do campo de incidência do imposto sobre a renda, tanto quando
recompõem o patrimônio material, quanto ao servir como reparação de dano moral ou
imaterial de qualquer natureza.
A nosso ver, a desoneração tributária, contudo, só é aplicável quando se está
diante de apólice de seguro de pessoas propriamente dita, a qual também pode ser
comercializada por entidades de previdência privada, porquanto a natureza jurídica
desses produtos é distinta da dos planos previdenciários, assim como o respectivo
tratamento tributário.
Os seguros de pessoas são custeados por prêmios cujo valor é determinado
mediante cálculos atuariais baseados em mutualismo (e não em mera capitalização
como ocorre com a previdência privada). Esses prêmios, diferentemente do que se dá
com as contribuições a planos previdenciários, quando pagos à seguradora ou entidade
de previdência privada não passam a compor a reserva individual do participante do
plano. Vão integrar normalmente o patrimônio da seguradora ou entidade que, por sua
249
vez, fica obrigada a constituir reservas técnicas suficientes para fazer frente às futuras
indenizações (pagamento do capital segurado) e benefícios (pensão por morte, por
exemplo), a que se obrigou.
Do ponto de vista tributário, os prêmios de seguro pagos para custear essa
cobertura de risco (seguro de pessoas) são indedutíveis para os participantes, da base de
cálculo do seu IRPF, diferentemente do que ocorre com as contribuições efetuadas a
plano de previdência privada323, e tributáveis como benefícios indiretos se pagos por
pessoas jurídicas em favor de seus empregados e dirigentes. Sendo assim, é lógico que
se isente o pagamento do capital segurado, observando-se, assim, sistemática TII, aceita
pela nossa jurisprudência por não importar em bitributação.
6.5.3 Tributação do saldo de conta pago a beneficiários
Considerando as diferentes naturezas jurídicas, princípios informadores e os
distintos regimes tributários a que estão sujeitos o seguro de pessoas (e as coberturas de
risco) e os planos de previdência privada, pensamos que a isenção acima referida,
prevista pelo artigo 6º, VII da Lei nº 7.713/88, não se aplica ao saldo de conta, pago
pelas entidades de previdência privada aos beneficiários do participante, na hipótese de
falecimento deste. O saldo de conta não tem natureza de indenização de risco contratada
para fazer face ao evento morte do segurado/participante. Trata-se de poupança por ele
constituída para de futuro recebimento de benefício, ao ser completado o período de
diferimento. Sua restituição aos beneficiários indicados acontece, portanto, apenas
circunstancialmente, uma vez que não fora contratada para essa finalidade.
Além disso, os recursos que compuseram essa reserva puderam ser
deduzidos do IR quando aportados (seja pelo participante, seja por patrocinadora ou
instituidora), e foram isentados de IR nessa última hipótese, tornando sua tributação,
quando restituídos aos beneficiários, razoável por conformar-se à sistemática IIT.
323 Ainda no que diz respeito ao tratamento tributário dos prêmios de seguro, tem-se que aqueles contratados para um grupo, custeados por empregadores, são considerados remuneração indireta dos respectivos empregados e dirigentes e tributados pelo IRRF e pelo IRPF, diferentemente, também, do que ocorre com as contribuições a previdência privada efetuadas em favor de empregados e dirigentes da pessoa jurídica, que como já vimos são isentas desses impostos.
250
6.5.4 Entendimento da RFB
Em vista do exposto nos itens precedentes, a nosso ver a desoneração do
artigo 6º, VII da Lei 7.713/88 só deve ser aplicada ao pagamento do capital segurado
feito por seguradoras ou entidades de previdência privada, em decorrência da
contratação específica de seguro de vida em favor de seus beneficiários, cujos prêmios
sejam indedutíveis e não componham a reserva individual do participante. Não é
aplicável, portanto, à restituição do saldo de conta do participante aos seus
beneficiários, por ocasião de sua morte, tampouco a benefícios de pensão por morte.
Não obstante, durante muito tempo as autoridades fiscais federais
equipararam a pecúlio (“pagamento do capital segurado”) o saldo de conta pago, por
entidades de previdência privada, por ocasião da morte dos participantes, aos seus
beneficiários, permitindo que lhe fosse aplicada a isenção do artigo 6º, VII da Lei nº
7.713/88.
Esse entendimento foi externado em respostas a diversas consultas
formuladas pelos contribuintes. Vigorava, à época, a compreensão de que
[…] a expressão ‘seguros’, utilizada no inciso VII do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, na redação dada pelo art. 32, da Lei nº 9.250, de 1995, teria o significado de pecúlio recebido de uma só vez, conforme definido no inciso XXII do art. 5º da Instrução Normativa SRF nº 15, de 2001.324
324 “Assunto: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte - IRRF. Ementa: PECÚLIO. PLANO DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. Pecúlio é o valor acumulado sob a forma de reserva específica, a ser pago de uma só vez, ao
participante ou beneficiário indicado, de plano de benefícios de caráter previdenciário que tenha cumprido os requisitos previstos no regulamento do plano, não sendo admitida outra forma de pagamento para fins tributários. A expressão “seguros” utilizada no inciso VII do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, em sua redação dada pelo art. 32 da Lei nº 9.250, de 1995, tem o significado de pecúlio recebido de uma só vez, conforme definido no inciso XXII do art. 5º da Instrução Normativa SRF nº 15, de 2001. Incide o imposto de renda na fonte sobre a importância paga, a título de pecúlio, pelas entidades de previdência complementar, nos termos do art. 33 da Lei nº 9.250, de 1995. Está isento de imposto de renda o pecúlio quando previsto no plano de benefício contratado e o pagamento em parcela única decorrer de falecimento ou invalidez permanente do participante, nos termos do inciso VII do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, na redação dada pelo art. 32 da Lei nº 9.250, de 1995.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei n 7.713, de 1988, art. 6º; Lei nº 9.250, de 1995, arts. 32 e 33; Medida Provisória nº 1.459, de 1996, art. 8º; Decreto nº 3.000, de 1999, arts. 39, 43 e 633; Decreto nº 81.402, de 1978, art. 22; IN SRF nº 15, de 2001, arts. 5º e 9º; IN RFB nº 740, de 2007, art. 12; Ato Declaratório Normativo nº 28, de 1996, e Perguntas e Respostas - IRPF - 2008, pergunta nº 212.
ANTÔNIO CLÁUDIO DE JESUS ABDALAH Chefe da Divisão
(BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 7ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 85, de 29 de agosto de 2008. Chefe: Eliana Polo Pereira. Julgamento: 29 ago. 2008. Publicação: 20 mar. 2009).
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A Receita Federal entendia que, para caracterizar pecúlio e, portanto, ser
isento de IRRF e IRPF, bastava que o pagamento efetuado pela entidade de previdência
privada decorresse de morte ou invalidez permanente e fosse realizado de uma única
vez, o que acabava abrangendo o saldo de conta restituído aos beneficiários dos
participantes por ocasião da sua morte. Baseava-se, exclusivamente, no artigo 5º, XXII,
da Instrução Normativa nº 15/2001, que estabelece estar isento, ou não se sujeitar ao
imposto de renda o “pecúlio recebido em prestação única de entidades de previdência
privada, quando em decorrência de morte ou invalidez permanente do participante”.
Contudo, mais recentemente, a RFB mudou seu entendimento, modificando
as respostas dadas anteriormente em manifestações como a Resposta a Consulta nº
83/11:
Assunto: Imposto de Renda Retido na Fonte - IRRF. Ementa: Entidade de Previdência Complementar - Importâncias Pagas aos Beneficiários de Participante de Planos Previdenciários. Revoga a Solução de Consulta SRRF/1ªRF/DISIT Nº 143, de 12 de novembro de 2007. São isentos do imposto de renda os seguros recebidos de entidade de previdência privada decorrentes de morte ou invalidez permanente do participante. A expressão "seguros" utilizada no inciso VII do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, em sua redação dada pelo art. 32 da Lei nº 9.250, de 1995, tem o significado de pecúlio recebido de uma só vez, conforme definido no inciso XXII do art. 5º da Instrução Normativa SRF nº 15, de 2001. As importâncias pagas por entidades de previdência privada a título de pecúlio não são dedutíveis para fins de apuração do imposto devido na declaração de ajuste anual da pessoa física. Entende-se por pecúlio, apenas, o benefício pago em parcela única por entidade de previdência privada, em virtude da morte ou invalidez permanente do participante de plano de previdência, assim entendido como benefício de risco, com característica de seguro, previsto expressamente no plano de benefício contratado. Portanto, o Benefício de Pensão por Morte e Aposentadoria por invalidez, quando pago exclusivamente em parcela única, no caso de fundo de pensão, só será enquadrado como pecúlio se, além de ser pago em parcela única, for entendido como contrato de risco, como característica de seguro, previsto expressamente no plano de benefício contratado. Pecúlio não se confunde com Reserva Individual de Poupança. A importância paga em prestação única, em razão de morte ou invalidez permanente do participante, denominada Reserva Individual de Poupança, correspondente a reversão das contribuições efetuadas ao plano, acrescida de rendimentos financeiros, não caracteriza pagamento de pecúlio (seguro) e portanto é tributável na fonte, como antecipação do imposto devido na declaração de ajuste anual da pessoa física ou tributação exclusiva no caso de haver opção pelo regime de tributação previsto no art. 1° da Lei nº 11.053, de 2004.
252
DISPOSITIVOS LEGAIS: Art. 6º, inciso VII da Lei nº 7.713, de 22.12.1988 (com a redação dada pelo art. 32 da Lei nº 9.250, de 26.12.1995); art. 39, XLIV do Decreto nº 3.000, de 26.03.1999; art. 5º, XXII da Instrução Normativa SRF nº 15, de 6.02.2001; e arts. 12 e 16 da Instrução Normativa SRF nº 588, de 21.12.2005. MIRZA MENDES REIS Chefe.325
Desde 2011, portanto, a Receita Federal do Brasil vem adotando
entendimento juridicamente mais preciso, o qual pode ser exemplificado pela resposta a
consulta acima recapitulada. De acordo com a nova orientação, para se beneficiar da
isenção do artigo 6º, XIII, da Lei nº 7.713/88, deve-se estar diante de “benefício de
risco, com característica de seguro, previsto expressamente no plano de benefício
contratado”. Quanto ao tratamento tributário, afirma a RFB que “as importâncias pagas
por entidades de previdência privada a título de pecúlio não são dedutíveis para fins de
apuração do imposto devido na declaração de ajuste anual da pessoa física”. O que a
Receita quer dizer é que o “pecúlio”, para ser isento, deve ser originário de prêmios
indedutíveis da base de cálculo do IRPF (isto é, conformando-se à sistemática TII).
Também é feita, nas respostas a consulta emitidas pela RFB (exemplificadas
pela acima transcrita) distinção expressa entre pecúlio e “reserva individual de
poupança”, e entre os respectivos regimes tributários. De acordo com o atual
entendimento da Receita Federal do Brasil no texto ora examinado e em diversas outros
no mesmo sentido:
[…] a importância paga em prestação única, em razão de morte ou invalidez permanente do participante, denominada Reserva Individual de Poupança, correspondente a reversão das contribuições efetuadas ao plano, acrescida de rendimentos financeiros, não caracteriza pagamento de pecúlio (seguro) e portanto é tributável na fonte, como antecipação do imposto devido na declaração de ajuste anual da pessoa física ou tributação exclusiva no caso de haver opção pelo regime de tributação previsto no art. 1° da Lei nº 11.053, de 2004.326
O tratamento dado à matéria, atualmente, pela Receita Federal do Brasil,
parte tanto da distinção conceitual entre benefício de risco (com natureza de seguro e
cálculo atuarial) e benefício previdenciário (com natureza de previdência e regime de
325 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 1ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 83, de 15 de dezembro de 2011. Chefe: Oriana Christina Zardo. Julgamento: 15 dez. 2011. Publicação: 24 jan. 2012, grifamos.
326 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 7ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 82, de 14 de dezembro de 2011. Chefe: Mirza Mendes Reis. Julgamento: 14 dez. 2011. Publicação: 24 jan. 2012.
253
capitalização), quanto da distinção entre os regimes jurídicos tributários dos dois
institutos (TII e IIT).
Com efeito, por um lado, o seguro de vida é remunerado por prêmio,
indedutível do IRPF para o segurado, e tributável como benefício indireto se pago por
seu empregador (regime tributário TII). Por outro, os planos previdenciários são
constituídos por contribuições dedutíveis do IRPF para os participantes, e isentas
quando pagas por seus empregadores (regime tributário IIT).
No seguro de vida, não há falar, exclusivamente, em constituição de
reservas individuais, pois o pagamento do capital segurado também é baseado em
mutualismo. Nos planos de previdência privada, contudo, são constituídas reservas
individualizadas por participante, fundadas tão somente em regime de capitalização, a
serem restituídas aos respectivos beneficiários, se o participante falecer durante o
período de diferimento.
Daí a correção do atual entendimento da Receita Federal sobre o assunto, no
sentido de que a “restituição do saldo de conta” de planos previdenciários, aos
beneficiários dos participantes, é tributável, segundo o regime eleito quando da
contratação. Esse entendimento está em linha com o nosso, tal como exposto no tópico
precedente, e espelha o regime “IIT” hoje adotado pelo nosso subsistema tributário
previdenciário.
6.5.5 Jurisprudência do STJ
Pouco tempo antes da mudança na orientação da RFB, também havia sido
pacificado o entendimento sobre a matéria no âmbito do Poder Judiciário, quando do
julgamento, pelo STJ, do Recurso Especial nº 1.086.492327 em sede de Recursos
Repetitivos.
327 “PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. IMPOSTO DE RENDA. CONTRIBUIÇÃO PARA A PREVIDÊNCIA PRIVADA. PENSÃO POR MORTE. COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO. ART. 6º, VII, “A” DA LEI Nº 7.713/1988 REVOGADO PELO ART. 32 DA LEI 9.250/1995. IMPRESCINDIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO QUANDO DAS CONTRIBUIÇÕES VERTIDAS PELO PARTICIPANTE AO FUNDO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA OU QUANDO DA PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
1. A complementação da pensão recebida de entidades de previdência privada, em decorrência da morte do participante ou contribuinte do fundo de assistência, quer a título de benefício quer de
254
seguro, não sofre a incidência do Imposto de Renda apenas sob a égide da Lei 7.713/88, art. 6º, VII, “a”, que restou revogado pela Lei 9.250/95, a qual, retornando ao regime anterior, previu a incidência do imposto de renda no momento da percepção do benefício.
2. Sob a égide da Lei 4.506/64, os valores recebidos a título de pensão eram classificados como rendimentos oriundos de trabalho assalariado, sobre eles incidindo o imposto de renda. Em contrapartida, as contribuições destinadas às entidades de previdência privada deveriam ser deduzidas da base de cálculo do imposto de renda.
“Art. 10. Os rendimentos de trabalho assalariado, a que se refere o artigo 16, a partir de 1º de janeiro de 1965, sofrerão desconto do impôsto de renda na fonte, observadas as seguintes normas:
[…]” “Art. 16. Serão classificados como rendimentos do trabalho assalariado tôdas as espécies de
remuneração por trabalho ou serviços prestados no exercício dos empregos, cargos ou funções referidos no artigo 5º do Decreto-lei número 5.844, de 27 de setembro de 1943, e no art. 16 da Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964, tais como:
[…] XI - Pensões, civis ou militares de qualquer natureza, meios-soldos, e quaisquer outros proventos
recebidos do antigo empregador de institutos, caixas de aposentadorias ou de entidades governamentais, em virtude de empregos, cargos ou funções exercidas no passado, excluídas as correspondentes aos mutilados de guerra ex-integrantes da Força Expedicionária Brasileira.” 3. A Lei 7.713/88, em sua redação original, dispunha que, verbis: “Art. 6º. Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: […]
VII - os benefícios recebidos de entidades de previdência privada: a) quando em decorrência de morte ou invalidez permanente do participante; b) relativamente ao valor correspondente às contribuições cujo ônus tenha sido do participante, desde
que os rendimentos e ganhos de capital produzidos pelo patrimônio da entidade tenham sido tributados na fonte;
4. A ratio essendi da não-incidência da exação (atecnicamente denominada pela lei 7.713/88 como isenção), no momento da percepção do benefício da pensão por morte ou da aposentadoria complementar, residia no fato de que as contribuições recolhidas sob o regime da Lei 7.713/88 (janeiro de 1989 a dezembro de 1995) já haviam sofrido a incidência do imposto de renda no momento do recolhimento, por isso que os benefícios e resgates daí decorrentes não são novamente tributados, sob pena de violação à regra proibitiva do bis in idem. (REsp 1.012.903/RJ, sujeito ao regime dos “recursos repetitivos”, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 08.10.2008, publicado no DJe de 13.10.2008).
5. A Lei 9.250/95, retornando ao regime jurídico de direito público previsto na Lei 4.506/64, para impor a tributação no átimo da percepção do benefício da entidade de previdência privada, revogou o dispositivo legal supracitado, ao estabelecer que, litteris: “Art. 32. O inciso VII do art. 6º da Lei 7.713, de 22 de dezembro de 1988, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 6º.................................................................. ........................................................................ VII - os seguros recebidos de entidades de previdência privada decorrentes de morte ou invalidez
permanente do participante.” “Art. 33. Sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os
benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições . 6. Deveras, da leitura conjunta dos arts. 32 e 33 da Lei nº 9.250/95, sobressai, soberana, a mens legis de suprimir a “isenção” do imposto de renda, antes concedida, incidente sobre benefício decorrente de morte ou invalidez permanente do participante. Isso porque a dicção do art. 32 faz com que a “isenção” recaia tão-somente sobre os seguros percebidos do fundo em decorrência de morte ou invalidez do participante, enquanto o art. 33, corroborando o dispositivo anterior, prevê expressamente a incidência do imposto no momento da percepção do benefício ou resgate. Interpretar a expressão “seguro”, contida no art. 32, como inclusiva do benefício de pensão por morte, consubstancia grave equívoco, a ensejar não apenas afronta ao art. 33, como também a completa ausência de tributação, ante a ausência de previsão legal que institua a cobrança do imposto de renda quando do aporte ao fundo, o que beneficia tão-somente os dependentes daquele que falecer na vigência da Lei 9.250/95, em afronta ao princípio da isonomia.
7. Ademais, interpretação diversa geraria conflito entre os incisos VII e XV, da Lei 7.713/88, porquanto este último prevê a ausência de tributação até o valor estipulado a partir do mês em que o
255
Nesse julgamento, estava em debate a tributação de pensão por morte,
recebida por beneficiário de participante de plano de previdência privada.
contribuinte completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, com tributação do valor excedente. Ora, se acolhida a tese de que o inciso VII prevê a não-incidência total, o inciso XV ver-se-ia sem sentido nem utilidade, opondo-se à essência legislativa de que na lei não há espaço para palavras inúteis. Confira-se o referido dispositivo: “Art. 6º. Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:
[…] “XV - os rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão, de transferência para a reserva
remunerada ou de reforma pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por qualquer pessoa jurídica de direito público interno ou por entidade de previdência privada, a partir do mês em que o contribuinte completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, sem prejuízo da parcela isenta prevista na tabela de incidência mensal do imposto, até o valor de: (Redação dada pela Lei nº 11.482, de 2007)
a) R$ 1.313,69 (mil, trezentos e treze reais e sessenta e nove centavos), por mês, para o ano-calendário de 2007; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
b) R$ 1.372,81 (mil, trezentos e setenta e dois reais e oitenta e um centavos), por mês, para o ano-calendário de 2008; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
c) R$ 1.434,59 (mil, quatrocentos e trinta e quatro reais e cinqüenta e nove centavos), por mês, para o ano-calendário de 2009; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
d) R$ 1.499,15 (mil, quatrocentos e noventa e nove reais e quinze centavos), por mês, a partir do ano-calendário de 2010; (Incluído pela Lei nº 11.482, de 2007)
8. Em suma, revelam-se os seguintes regimes jurídicos de direito público a regerem os benefícios recebidos dos fundos de previdência privada:
(i) sob a égide da Lei 4.506/64, em que havia a incidência do imposto de renda no momento do recebimento da pensão ou aposentadoria complementar;
(ii) sob o pálio da Lei 7.713/88, a não-incidência da exação dava-se no momento do recebimento, em razão da tributação por ocasião do aporte;
(iii) após a vigência da Lei 9.250/95, em que, retornando à sistemática da Lei 4.506/64, há a não-incidência do tributo apenas sobre o valor do benefício de complementação de aposentadoria ou pensão e o do resgate de contribuições que, proporcionalmente, corresponderem às parcelas de contribuições efetuadas no período de 01.01.1989 a 31.12.1995, cujo ônus tenha sido exclusivamente do participante do plano de previdência privada.
9. É nesse sentido que devem ser interpretados os julgados deste Tribunal Superior, ao admitirem a “isenção” da complementação da pensão recebida de entidades de previdência privada tanto sob a égide da Lei 7.713/88, art. 6º, VII, “a”, quanto ao abrigo do art. 32 da Lei 9.250/95: REsp 1120206/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/06/2010, DJe 28/06/2010; REsp 1091057/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/02/2010, DJe 18/02/2010; AgRg no Ag 1210220/PR, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/12/2009, DJe 02/02/2010; AgRg no REsp 1099392/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/04/2009, DJe 15/05/2009; REsp 974.660/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/09/2007, DJ 11/10/2007; REsp 599.836/RN, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/11/2004, DJ 17/12/2004.
10. In casu, o contribuinte faleceu em 1987, ressoando inequívoca a ausência de contribuição ao fundo de previdência privada sob a égide da lei 7.713/88, por isso que não se cogita de não-incidência do imposto de renda sobre os valores recebidos a título de pensão por morte.
11. O art. 535 do CPC resta incólume se o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 12. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.
(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.086.492/PR. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgamento: 13 out. 2010. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe, 16 out. 2010).
256
Para decidir se esse benefício deveria ser considerado isento ou tributável, o
Tribunal analisou todo o histórico da tributação dos planos previdenciários, vindo a
concluir que a desoneração tributária dos benefícios previdenciários privados só se
justificava sob a égide da Lei nº 4.506/64, quando as contribuições aos planos eram
indedutíveis (ou seja, já haviam sofrido a incidência do imposto no momento do
recolhimento).
Nesse período, vigorava sistema TTI, ou seja, tributação no momento dos
aportes, tributação durante a fase de acumulação, e isenção no recebimento dos resgates
e benefícios.
A partir de 1995, com a edição da Lei 9.250, que alterou a Lei nº 7.713/88,
estabelecendo o sistema ITT (em que os aportes eram dedutíveis e isentos) e, também
com a edição da Lei nº 11.053/04, que estabeleceu regime IIT (isenção dos aportes e
rendimentos auferidos pelo plano na fase de acumulação), a isenção na última etapa
(benefícios e resgates) foi revogada, pois o contrário implicaria em jamais tributar os
rendimentos em questão.
Com efeito, a redação original do inciso VII do artigo 6º, da Lei nº 7.713/88
estabelecia serem isentos os “benefícios” recebidos de entidades de previdência privada,
tanto em caso de invalidez permanente ou morte do participante (alínea “a”), quanto
“relativamente ao valor correspondente às contribuições cujo ônus tenha sido do
participante, desde que os rendimentos e ganhos de capital produzidos pelo patrimônio
da entidade tenham sido tributados na fonte” (alínea “b”).
Com a edição da Lei nº 9.250/95, que passou a permitir, no seu artigo 4º, V,
a dedução das contribuições dos participantes a planos de previdência privada, e a
prever a tributação dos respectivos benefícios através de seu artigo 33, aquele
dispositivo foi revogado e substituído pela redação atual, que isenta apenas os “seguros
recebidos de entidades de previdência privada decorrentes de morte ou invalidez
permanente do participante”.
O Tribunal analisou toda a evolução histórica da tributação dos benefícios
previdenciários e reconheceu a existência de três regimes jurídicos:
Em suma, revelam-se os seguintes regimes jurídicos de direito público a regerem os benefícios recebidos dos fundos de previdência privada:
257
(i) sob a égide da Lei 4.506/64, em que havia a incidência do imposto de renda no momento do recebimento da pensão ou aposentadoria complementar; (ii) sob o pálio da Lei 7.713/88, a não-incidência da exação dava-se no momento do recebimento, em razão da tributação por ocasião do aporte; (iii) após a vigência da Lei 9.250/95, em que, retornando à sistemática da Lei 4.506/64, há a não-incidência do tributo apenas sobre o valor do benefício de complementação de aposentadoria ou pensão e o do resgate de contribuições que, proporcionalmente, corresponderem às parcelas de contribuições efetuadas no período de 01.01.1989 a 31.12.1995, cujo ônus tenha sido exclusivamente do participante do plano de previdência privada.328
De acordo com o entendimento do STJ, o que prevalece, no âmbito dos
benefícios pagos por entidades de previdência privada, é o regime tributário no qual as
respectivas contribuições estavam inseridas. Os benefícios pagos com reservas
constituídas por contribuições efetuadas entre 1989 até 1995, quando vigorava o regime
TTI, devem ser considerados isentos. Por seu turno, os benefícios pagos com
contribuições efetuadas após 1995 estão inseridos no regime tributário ITT ou IIT,
devendo ser tributados.
Concluiu o Tribunal, portanto, que os benefícios de pensão por morte então
analisados deveriam ser tributados pelo IRRF e pelo IRPF, pois haviam sido pagos com
reserva constituída antes de 1989, período em que as contribuições eram dedutíveis para
os participantes. Assim, do cotejo da jurisprudência administrativa com a judicial
atualmente vigentes sobre a matéria, tem-se que qualquer benefício pago por entidade
de previdência privada, inclusive restituição de saldo de conta individual, a beneficiário
de participante de previdência privada, é tributável segundo o regime escolhido no
momento da adesão, em razão da opção feita pelo legislador pelo regime IIT de
tributação dos planos previdenciários.
Será dado tratamento diferente somente no caso de reservas constituídas por
contribuições efetuadas entre 1989 e 1995, período em que as contribuições para os
planos eram indedutíveis para as pessoas físicas e tributáveis, se recebidas de pessoas
jurídicas.
Ressalvam-se ainda, por terem natureza distinta, isto é, securitária, os
pagamentos de capital segurado feitos por entidades de previdência privada aos
328 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.086.492/PR. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgamento: 13 out. 2010. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe, 16 out. 2010.
258
beneficiários de participantes. Nesse caso, trata-se de seguro de pessoas contratado pelo
participante, conjuntamente com seu plano de previdência privada, em favor de seus
beneficiários. Tais prêmios de seguro de pessoas são indedutíveis para a apuração do
IRPF dos participantes e tributáveis, se pagos por patrocinadoras ou instituidoras. Não é
constituída reserva individual em favor do participante, mas apenas provisão técnica no
patrimônio da entidade, sendo a indenização determinada mediante cálculo atuarial.
Neste caso, o regime a ser observado é o TII, com isenção no momento do pagamento
do pecúlio.
6.6 VGBL – Seguro de Vida com cláusula de cobertura por sobrevivência
Vimos analisando o subsistema tributário vigente para planos de previdência
privada e concluímos que atualmente se enquadra no modelo IIT, em que há isenção e
dedutibilidade das contribuições efetuadas ao plano, isenção dos rendimentos auferidos
durante o período de diferimento, e tributação dos benefícios e resgates pagos.
Contudo, importa mencionar que, paralelamente a esta sistemática, foi
criado um tipo específico de contrato, híbrido de plano previdenciário e seguro de vida,
denominado “Vida Gerador de Benefícios Livres” – VGBL, com o objetivo específico
de sujeitar-se a tratamento tributário distinto e semelhante ao do seguro de vida – o TII
–, amoldando-se às necessidades das pessoas que não têm interesse na dedutibilidade
das contribuições da base de cálculo do IRPF.
O VGBL, na regulação, é descrito como um “seguro de vida com cláusula
de cobertura por sobrevivência”. Foi tratado como seguro exatamente para poder se
sujeitar ao tratamento tributário que lhe é próprio, uma vez que, se caracterizado como
plano previdenciário, as contribuições efetuadas pelos participantes teriam de ser
dedutíveis, nos termos do artigo 69 da Lei Complementar 109/01.
Todavia, apesar da denominação atribuída pela lei, com a finalidade
indicada, suas características mais se assemelham a um plano de previdência privada,
seja pelo fato de prever benefício para a hipótese de sobrevivência do segurado a um
determinado período de diferimento estabelecido no contrato (o que não ocorre no
259
seguro de vida), seja por ser estruturado sob o regime financeiro de capitalização329.
Com efeito, o seguro de pessoas visa dar cobertura a risco de vida ou invalidez, e a
“sobrevivência” ao regime de diferimento não pode ser caracterizada como tal. Daí a
maior semelhança com planos previdenciários, que visam garantir renda na velhice.
Pois bem, ao tempo da criação do VGBL, foi estabelecido seu regime
tributário especial e distinto dos demais planos previdenciários vigentes.
A dedutibilidade das contribuições feitas por empregadores foi garantida
pelo artigo 4º, da Lei nº 11.053/04330, condicionada aos mesmos limites previstos para
contribuições feitas a planos de previdência privada. A nosso ver, assim como afirmado
em relação a estas últimas, a regra é supérflua, pois todo e qualquer benefício pago em
favor de empregados deve ser dedutível, por força do § 3º do artigo 299 do
Regulamento do Imposto sobre a Renda.
Contudo, diferentemente das contribuições efetuadas a planos de
previdência, os prêmios de VGBL pagos em favor de empregados e dirigentes não são
dedutíveis como despesa para os participantes e constituem rendimento tributável do
empregado ou do dirigente, se pagos por patrocinadora ou instituidora.
A indedutibilidade das contribuições para os participantes decorre de serem
despesas dedutíveis das bases de cálculo do IRRF e do IRPF, mensal e anual, apenas
aquelas expressamente enumeradas. Como não há previsão de dedução de prêmios de
seguro, estes tornam-se automaticamente indedutíveis331.
329 “Art. 2º A cobertura por sobrevivência de que trata esta Resolução é estruturada sob o regime financeiro de capitalização e tem por finalidade o pagamento do capital segurado, de uma única vez ou sob forma de renda, a pessoas físicas vinculadas ou não a um estipulante.
Parágrafo único. Ressalvado o caso de concessão de renda imediata, adquirida mediante pagamento único, o evento gerador do pagamento do capital segurado de que trata o caput será sempre a sobrevivência do segurado ao período de diferimento contratualmente previsto” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Nacional de Seguros Privados. Resolução CNSP nº 140, de 2005. Altera e consolida as regras de funcionamento e os critérios para operação da cobertura por sobrevivência oferecida em plano de seguro de pessoas e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 2005).
330 “Art. 4º A partir de 1º de janeiro de 2005, a dedução das contribuições da pessoa jurídica para seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência fica condicionada, cumulativamente:
I - ao limite de que trata o § 2º do art. 11 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, com a redação dada pela Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004; e
II - a que o seguro seja oferecido indistintamente aos empregados e dirigentes” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 dez. 2004).
331 A regra implícita na legislação foi explicitada pela Instrução Normativa nº 588/05: “Art. 6º - […]
260
Já a tributação dos prêmios de seguro de vida se dá pelo fato de esse
benefício caracterizar remuneração indireta e não haver isenção expressa, como há para
as contribuições a planos previdenciários332.
Quanto à isenção concedida para os rendimentos do plano, durante a fase de
acumulação, foi expressamente estendida ao seguro de vida com cláusula de cobertura
por sobrevivência, pelo artigo 5º da Lei nº 11.053/04333.
Por fim, na fase de recebimento de benefícios ou resgate, as regras de
tributação do VGBL estão previstas na Medida Provisória nº 2.158-35/01 (regime
tradicional)334 e pela Lei nº 11.053/04 (regime regressivo)335.
§ 3º Os prêmios de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência são indedutíveis para fins de determinação da base de cálculo do imposto devido na Declaração de Ajuste Anual” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Instrução Normativa SRF nº 588, de 21 de dezembro de 2005. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefício de caráter previdenciário, Fapi e seguros de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência e dá outras providências. Brasília: DOU, 26 dez. 2005).
332 A Instrução Normativa SRF nº 588/05 externou a regra que já estava implícita na legislação (vide nossos comentários a respeito de remuneração indireta, feitos no item 6.2.2.4 quando tratamos da isenção das contribuições feitas a planos previdenciários).
“Art. 9º Constitui rendimento tributável, sujeito à incidência do imposto de renda na fonte e na Declaração de Ajuste Anual, os prêmios de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência, contratado individual ou coletivamente, pagos pelo empregador em favor do empregado pessoa física” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Instrução Normativa SRF nº 588, de 21 de dezembro de 2005. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefício de caráter previdenciário, Fapi e seguros de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência e dá outras providências. Brasília: DOU, 26 dez. 2005).
333 “Art. 5o A partir de 1o de janeiro de 2005, ficam dispensados a retenção na fonte e o pagamento em separado do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar, sociedade seguradora e FAPI, bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência.” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 dez. 2004).
334 “Art. 63. Na determinação da base de cálculo do imposto de renda incidente sobre valores recebidos em decorrência de cobertura por sobrevivência em apólices de seguros de vida, poderão ser deduzidos os valores dos respectivos prêmios pagos, observada a legislação aplicável à matéria, em especial quanto à sujeição do referido rendimento às alíquotas previstas na tabela progressiva mensal e à declaração de ajuste anual da pessoa física beneficiária, bem assim a indedutibilidade do prêmio pago.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2002, os rendimentos auferidos no resgate de valores acumulados em provisões técnicas referentes a coberturas por sobrevivência de seguros de vida serão tributados de acordo com as alíquotas previstas na tabela progressiva mensal e incluídos na declaração de ajuste do beneficiário.
§ 2º A base de cálculo do imposto, nos termos do § 1º, será a diferença positiva entre o valor resgatado e o somatório dos respectivos prêmios pagos.
§ 3º No caso de recebimento parcelado, sob a forma de renda ou de resgate parcial, a dedução do prêmio será proporcional ao valor recebido” (BRASIL. Presidência da República. Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001. Altera a legislação das Contribuições para a Seguridade Social - COFINS, para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP e do Imposto sobre a Renda, e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 ago. 2001).
261
A legislação acima referida contempla enunciados que regulam tanto a base
de cálculo quanto a alíquota do IRRF e do IRPF, mensal e anual, incidentes sobre os
valores recebidos de VGBL.
Quanto à base de cálculo, corresponderá exclusivamente à diferença
positiva entre o valor resgatado e o somatório dos prêmios pagos. Tal tratamento
consiste em isentar os prêmios quando são resgatados ou recebidos sob a forma de
benefício, pelo fato de não terem sido deduzidos pelos participantes (e terem sido
tributados se pagos por empregadores). Somente os rendimentos produzidos no plano,
os quais também foram isentados durante o período de acumulação, serão tributados
quando recebidos na forma de benefício ou resgate.
O regime tributário aplicável poderá ser o tradicional (tabela progressiva do
IRRF e do IRPF mensal, com ajuste na Declaração Anual) ou o regressivo, conforme
opção do segurado no momento da contratação do VGBL.
Observa-se, portanto, ter sido instituído um regime do tipo TII para o
VGBL. Embora a sigla TII contenha “isenção” na última etapa, a desoneração dos
benefícios e resgates não é integral, pois há tributação da parcela correspondente aos
rendimentos auferidos pelo plano durante o período de acumulação, valendo a
desoneração exclusivamente para a parcela composta pelos prêmios pagos durante o
período de diferimento.
Como afirmam CARVALHO e MURGEL, citando estudo de FLÁVIO MARCÍLIO
RABELO, o resultado econômico do IIT e do TII é idêntico. Em ambos os casos é obtida
neutralidade tributária e benefícios correspondentes para os participantes. Concluíram
os autores:
335 Lei nº 11.053/04 - “Art. 1º É facultada aos participantes que ingressarem a partir de 1º de janeiro de 2005 em planos de benefícios de caráter previdenciário, estruturados nas modalidades de contribuição definida ou contribuição variável, das entidades de previdência complementar e das sociedades seguradoras, a opção por regime de tributação no qual os valores pagos aos próprios participantes ou aos assistidos, a título de benefícios ou resgates de valores acumulados, sujeitam-se à incidência de imposto de renda na fonte às seguintes alíquotas:
[…] § 1º O disposto neste artigo aplica-se: […] II - aos segurados que ingressarem a partir de 1º de janeiro de 2005 em planos de seguro de vida com
cláusula de cobertura por sobrevivência em relação aos rendimentos recebidos a qualquer título pelo beneficiário” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.053, de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre a tributação dos planos de benefícios de caráter previdenciário e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 dez. 2004).
262
Não há diferença entre o imposto ser cobrado na fase de contribuições ou quando do pagamento dos benefícios. Concluiu-se que o benefício auferido independe do diferimento tributário, sendo essa máxima aplicável a ambos os princípios de tributação apresentados. A diferença do benefício residirá, sim, na aplicação da neutralidade entre consumo e poupança (IIT e TII) ou da neutralidade entre consumo e poupança (ITT e TTI).336
Sendo assim, com os regimes tributários dos planos previdenciários em
geral (IIT) e do VGBL (TII), é possível ofertar produtos atrativos tanto para as pessoas
físicas que se interessam pela dedução das contribuições efetuadas a planos
previdenciários, quanto para aquelas que por qualquer motivo (por exemplo, por
apresentarem Declaração Simplificada), preferem abrir mão dessa prerrogativa para
usufruir do benefício fiscal no momento do recebimento do resgate ou do benefício.
Não há ofensa ao princípio da isonomia, pois ambos os regimes oferecem benefício
economicamente idêntico.
Observe-se que serão aplicáveis ao VGBL, por analogia, os mesmos
comentários feitos à tributação dos pagamentos efetuados a beneficiários, no que tange
à tributação progressiva ou regressiva.
Por terem natureza de benefícios previdenciários, serão tributados de forma
idêntica aos benefícios recebidos pelo participante, na hipótese de sua sobrevivência ao
período de diferimento, ou seja, observado o regime TII na forma acima exposta.
Havendo contratação, conjunta com o VGBL, de seguro de vida propriamente dito, o
pagamento do capital segurado será integralmente isento, também pelas razões já
expostas. Por fim, sendo efetuado o pagamento do saldo de conta aos beneficiários, em
razão do falecimento do participante no curso do período de diferimento, também será
isento por aplicação do regime TII, em razão do tratamento dado aos prêmios quando de
seu pagamento.
6.6.1 RMIT do IRRF incidente sobre benefícios e resgates de VGBL
Demonstraremos numa única sistematização as RMIT do IRRF progressivo
e regressivo incidentes sobre benefícios e resgates de VGBL.
336 CARVALHO, Fábio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. Tributação dos Fundos de Pensão. Belo Horizonte: Decálogo, 2007, p. 68-69.
263
Hipótese: Critério material: Pagar resgate ou benefício de VGBL optante ou não optante pelo regime regressivo Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do pagamento Consequente: Critério pessoal: ativo: União passivo: Entidade Aberta ou Fechada de Previdência Complementar Critério quantitativo: base de cálculo: parcela do benefício ou resgate constituída pelos rendimentos auferidos pelo plano durante a fase de acumulação. alíquotas: no regime progressivo - 15% para resgates, e 0 a 27,5% para benefícios, conforme o valor do rendimento. no regime regressivo - Conforme o prazo de acumulação dos recursos no plano: 35% (até 2 anos), 30% (de 2 a 4 anos), 25% (de 4 a 6 anos), 20% (de 6 a 8 anos), 15% (de 8 a 10 anos) ou 10% (mais de 10 anos).
Assim como nos planos previdenciários, a EAPC ocupa o polo passivo da
obrigação tributária na condição de responsável (substituta) tributária, o que exige a
coexistência de “norma de retenção” atribuindo-lhe o direito de reter, do valor do
benefício ou resgate, o montante do IRRF. Assim o participante assume o ônus
econômico do imposto, por ser quem aufere renda na operação337. Se o regime aplicável
for o progressivo, haverá futuro ajuste da tributação quando da incidência da RMIT do
IRPF – anual. Já se o regime aplicável for o regressivo, a incidência do IRRF será
definitiva.
6.7 Portabilidade
A portabilidade é direito garantido aos participantes de planos de
previdência privada pela Lei Complementar nº 109/2001. Com efeito, seu artigo 14
estabelece que os planos previdenciários deverão prever, entre outros, o direito à
portabilidade, evidenciando tratar-se de ponto em relação ao qual os contratantes não
podem dispor.
É clara a definição de portabilidade dada por KATIA FIRMINO:
337 Remetemo-nos ao item 6.4.3. no qual tecemos críticas ao fato de o regimes regressivo consistir em incidência definitiva, sem ajuste na Declaração Anual, ofendendo os princípios da generalidade, da capacidade contributiva e da progressividade. Os mesmos comentários são aplicáveis no âmbito do VGBL.
264
A portabilidade apresenta-se como meio técnico de transferência do capital acumulado durante certo tempo mínimo pelo participante de plano de previdência privada entre dois fundos de pensão ou planos, denominados cedente e cessionário, cujo exercício condiciona-se às exigências previstas em lei e resolve as obrigações e direitos assumidos pelo participante e pela entidade, estipulados no regulamento geral do plano contratado.338
Segundo RODRIGUES, “a portabilidade traz a faculdade para que o
participante, durante o período de acumulação, possa movimentar os seus recursos para
outro plano de previdência, tanto de entidade fechada como de entidade aberta”.
Continua o autor afirmando que, “há plena liberdade para a movimentação, sobretudo
em busca de menores taxas de administração e melhores resultados dos
investimentos”.339.
A própria Lei Complementar nº 109/2001, como não poderia deixar de ser,
garantiu a não-incidência de tributos nessa operação340. Com efeito, é requisito do
instituto que não haja disponibilização de recursos ao participante341. Sendo assim, essa
operação não gera nenhum ganho, não é “fato signo presuntivo de riqueza” que pudesse
ser colhido pelo legislador para fim de incidência tributária.
6.8 Benefícios e resgates pagos a domiciliados no exterior
Discorremos, no item 6.2.2.6, sobre o tratamento tributário aplicável às
contribuições a planos de previdência privada realizadas em favor de beneficiário
domiciliado no exterior. Concluímos que as contribuições das instituidoras ou
338 FIRMINO, Katia Cilene Balugar. Portabilidade na Previdência Complementar. 2005. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005. Disponível em: <http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1567>. Acesso em: 06 abr. 2014, p. 59.
339 RODRIGUES, Flávio Martins. Previdência Complementar: Conceitos e Elementos Jurídicos Fundamentais. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/previdencia-complementar-conceitos-elementos-juridicos-fundamentais/>. Acesso em: 05 ago. 2013, p. 24-25.
340 “Art. 69. […] § 2º Sobre a portabilidade de recursos de reservas técnicas, fundos e provisões entre planos de
benefícios de entidades de previdência complementar, titulados pelo mesmo participante, não incidem tributação e contribuições de qualquer natureza” (BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001. Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. Brasília: DOU, 30 maio 2001).
341 “Art. 15. Para efeito do disposto no inciso II do caput do artigo anterior, fica estabelecido que: I - a portabilidade não caracteriza resgate; e II - é vedado que os recursos financeiros correspondentes transitem pelos participantes dos planos de
benefícios, sob qualquer forma” (ibid.).
265
patrocinadoras serão dedutíveis, desde que mantido o vínculo empregatício ou diretivo
entre elas e o beneficiário. Quanto à incidência do IRRF, concluímos que os
pagamentos efetuados em seu favor, a planos de previdência privada, serão tributados à
alíquota de 25%, prevista para os rendimentos decorrentes da prestação de serviços
profissionais, pagos a beneficiários domiciliados no exterior, por configurarem
remuneração indireta e não haver norma expressa isentando-os.
Resta investigar, neste ponto, qual o tratamento aplicável aos resgates e
benefícios pagos por entidades de previdência privada a domiciliados no exterior.
Em primeiro lugar cabe esclarecer que a legislação atualmente em vigor,
que dispõe sobre a tributação aplicável aos benefícios e resgates pagos por entidades de
previdência complementar, é voltada à tributação dos rendimentos das pessoas físicas
domiciliadas no País.
Em suma, tais regras são veiculadas pela Lei nº 9.250/95, (regime
tradicional)342 e pela Lei nº 11.053/04, que institui regime regressivo opcional para
esses mesmos participantes. A Lei nº 9.250/05 anuncia, em seu artigo 1º, que “a partir
de 1º de janeiro de 1996 o imposto de renda das pessoas físicas será determinado
segundo as normas da legislação vigente, com as alterações desta Lei”. Refere-se,
portanto, ao imposto de renda das pessoas físicas, não contemplando o imposto de renda
incidente sobre rendimentos pagos a domiciliados no exterior. Por sua vez, a Lei nº
11.053/04 estabelece regime opcional em relação ao primeiro, o que conduz à
interpretação de que também se dirige à tributação das pessoas físicas residentes no
País.
Do exposto, pode-se inferir que os regimes acima referidos, segundo os
quais o IRRF incide mediante aplicação da tabela progressiva ou mediante alíquotas
regressivas conforme o prazo de acumulação dos recursos no plano, não se aplicam a
benefícios e resgates pagos a residentes no exterior. Qual seria, então, a tributação
aplicável nessas hipóteses? Essa dúvida também afligiu PIERRE MOREAU:
342 “Art. 33. Sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições” (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.250 de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e dá outras providências. Brasília: DOU, 27 dez. 1995).
266
Quanto à tributação de valores oriundos de pensões a serem remetidos ao exterior, a expatriados brasileiros, a legislação pátria de um modo específico, não apresenta dispositivos que tratem da possibilidade de portabilidade ao exterior de recursos provenientes de pensão a uma entidade previdenciária estrangeira. Na prática, os créditos de direitos são sempre efetuados em instituições nacionais e, portanto, tributados no Brasil. Nada obsta, no entanto, que o participante contrate uma entidade bancária para fazer a remessa. Desta forma, este rendimento a ser remetido ao residente no exterior, estará sujeito ao imposto de renda na fonte conforme assevera o artigo 685 do Regulamento do Imposto de Renda.343
Estamos com o Autor, quando menciona que os rendimentos em questão
devem sujeitar-se à incidência do IRRF, nos termos do artigo 685 do Regulamento do
Imposto sobre a Renda. Necessária, contudo, a definição sobre qual dos seus incisos
aplicar, uma vez que preveem alíquotas diferentes conforme a natureza dos rendimentos
pagos344.
O antigo Conselho de Contribuintes já decidiu, no passado, ser aplicável a
alíquota de 15% (quinze por cento), prevista no inciso I para os rendimentos que não
têm tributação específica prevista na lei.345
343 MOREAU, Pierre, Previdência Complementar – Tratamento dos Expatriados Brasileiros na União Europeia in Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais, coord. Torres, Heleno Taveira, p. 582.
344 “Art. 685. Os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente no exterior, estão sujeitos à incidência na fonte (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 100, Lei nº 3.470, de 1958, art. 77, Lei nº 9.249, de 1995, art. 23, e Lei nº 9.779, de 1999, arts. 7º e 8º):
I - à alíquota de quinze por cento, quando não tiverem tributação específica neste Capítulo, inclusive: a) os ganhos de capital relativos a investimentos em moeda estrangeira; b) os ganhos de capital auferidos na alienação de bens ou direitos; c) as pensões alimentícias e os pecúlios; d) os prêmios conquistados em concursos ou competições. II - à alíquota de vinte e cinco por cento: a) os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, e os da prestação de serviços; b) ressalvadas as hipóteses a que se referem os incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 691, os rendimentos
decorrentes de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 245” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. Decreto n º 3.000, de 26 de março de 1999. (Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99). Regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Brasília: DOU, 29 mar. 1999).
345 “RENDIMENTOS DE APOSENTADORIA - RESIDENTE NO EXTERIOR - TRIBUTAÇÃO - Os proventos de aposentadoria recebidos por pessoa física residente no exterior há mais de doze meses, sujeitam-se, a partir do 13°mês, à tributação exclusiva na fonte, à alíquota de 15% (quinze por cento).
Recurso parcialmente provido” (BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho de Contribuintes. Acórdão n° 104-20.403. Processo n° 10280.010948/99-13. Recurso n° 135.101. Matéria: IRPF - Ex(s): 1998 a 2000. Relator: Remis Almeida Estol. Julgamento: 03 dez. 2004. Órgão Julgador: Quarta Câmara / Primeiro Conselho de Contribuintes. Julgamento: 03 dez. 2004).
267
Contudo, em Solução de Consulta mais recente, de número 163/2013, a
Receita Federal do Brasil rechaçou esse entendimento, concluindo ser aplicável a
alíquota de 25%, prevista para rendimentos do trabalho:
Assunto: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte - IRRF. Ementa: RESIDENTE NO EXTERIOR - Benefícios ou Resgates de Contribuições da Previdência Privada. Os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior por Entidade de Previdência Privada, a título de benefício, bem como as importâncias correspondentes ao resgate de contribuições, devem ser tributados exclusivamente na fonte à alíquota de 25%, por se tratar de rendimento do trabalho. Se tais valores forem relativos a planos de Seguro de Vida com Cláusula de Cobertura por Sobrevivência (VGBL), devem ser tributados exclusivamente na fonte à alíquota de 15%, exceto no caso de tratar-se de país com tributação favorecida quando a alíquota será majorada para 25%. Dispositivos Legais: Art. 16 da Lei nº 4.506, de 31.11.1964; e arts. 43, XI e XIV, e 685 do Decreto nº 3.000, de 26.03.1999.346
A nosso ver, está correto o entendimento do Conselho de Contribuintes e
equivocado o adotado pela RFB, pois, embora os rendimentos previdenciários tenham
sua tributação equiparada aos rendimentos do trabalho para fim de tributação, tal fato
não autoriza a mesma equiparação quando se trata de apurar a incidência do IRRF sobre
rendimentos pagos a residentes no exterior. A natureza dos rendimentos é distinta, já
que, claramente, benefícios previdenciários não decorrem do trabalho, e o inciso I, do
artigo 685, estabelece expressamente aplicar-se a alíquota de 15% para os rendimentos
para os quais não houver tributação específica. Nessas condições, estamos convencidos
de que deve ser esta a alíquota aplicável aos benefícios e resgates pagos a beneficiários
não residentes.
Ressaltamos, por fim, que, mesmo aplicada a alíquota de 15%, a dupla
tributação – quando efetuadas as contribuições e quando pagos os benefícios ou resgates
– parece-nos questionável estar assentado pelo STJ, conforme já analisado, o
entendimento de que somente é aceitável haver tributação em uma dessas etapas.
346 BRASIL. Ministério da Fazenda. Receita Federal. 8ª Região Fiscal. Solução de Consulta nº 163, de 16 de julho de 2013. Chefe: Eduardo Newman de Mattera Gomes. Julgamento: 16 jul. 2013. Publicação: 28 ago. 2013.
268
CONCLUSÕES
Capítulo 1 - Premissas metodológicas
1. Embora as atividades securitária e de previdência privada sejam distintas e
exibam peculiaridades muito marcantes, sua característica comum de amenizar a lida
com os riscos, oferecendo cobertura a sinistros, permite-nos dar-lhes tratamento
razoavelmente homogêneo neste trabalho.
2. Para estudar o sistema jurídico e as normas que o compõem, adotamos a
premissa do “Construtivismo Lógico-Semântico” segundo a qual a realidade é
constituída pela linguagem. Os seguidores do Construtivismo Lógico-Semântico tomam
o Direito como linguagem, estudando-o sob essa perspectiva. Esta constatação permite
que o estudioso se valha do rico instrumental teórico desenvolvido pela Filosofia da
Linguagem e pela Semiótica, obtendo resultados teóricos e práticos surpreendentes.
3. Sendo o Ordenamento Jurídico um sistema comunicacional composto
exclusivamente por normas jurídicas, o método de aproximação do objeto utilizado
consiste na construção, mediante interpretação, das normas que se relacionam, direta ou
indiretamente, à tributação do seguro, do resseguro e da previdência privada.
Capítulo 2 - Princípios relacionados à atividade securitária
4. O Seguro e a Previdência Complementar foram eleitos como matérias de
relevância constitucional, por envolverem gestão de vultosa poupança popular e pelo
expressivo interesse social nessas atividades. Com efeito, interessa a toda a sociedade
que se possa lidar com os riscos inerentes à vida contemporânea da forma mais
organizada possível e, consequentemente, com mínima ocorrência de sobressaltos.
5. O tratamento constitucional dado aos seguros e à previdência privada
decorre da natureza “transindividual” desses direitos, para utilizar a precisa
conceituação adotada por J. J. Calmon de Passos. O estudo das normas jurídicas que
compõem os sistemas securitário e previdenciário privado, bem como do subsistema
tributário que onera os respectivos contratos e entidades operadoras, estará sempre
269
fundado no tratamento que lhes foi dado pelas normas de competência da Constituição
Federal.
6. O princípio do mutualismo ou solidariedade é determinante no âmbito dos
sistemas securitários, principalmente no seguro e na previdência social. Contudo, ainda
que em menor intensidade, também é indissociável do subsistema da previdência
privada. Esse princípio, dentro do sistema constitucional brasileiro, é corolário dos
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da justiça social, pois atua
como linha mestra para a operacionalização dos sistemas securitários que, por sua vez,
contribuem para a concretização daqueles valores.
7. Tanto o regime do mutualismo quanto o de capitalização visam acumular
recursos para fazer frente a infortúnios. São formas de obter poupança suficiente para o
pagamento de uma indenização de sinistro ou de uma aposentadoria, objetivos do
seguro e da previdência. Contudo, o regime de capitalização é estruturado de modo a
gerar reservas capazes, por si próprias e por seus rendimentos no mercado financeiro, de
garantir o pagamento de determinado benefício ou cobertura.
8. Diversos outros princípios informam as atividades securitária e
previdenciária privada. No âmbito securitário, chama a atenção a atuação dos princípios
da pulverização dos riscos, e da função socioeconômica. No âmbito da Previdência
Privada, temos como exemplo de princípios aplicáveis o da distributividade, o da
universalidade da cobertura e do atendimento, e o do equilíbrio financeiro-atuarial.
Capítulo 3 - Tributação do Seguro e do Resseguro
9. O seguro é um contrato através do qual o segurado transfere à seguradora o
risco a que está exposto. Isso se dá mediante relação jurídica na qual o segurador se
obriga, perante o segurado, à garantia do risco objeto do contrato, consistente na
obrigação de pagar a indenização na hipótese de sinistro. Trata-se de contrato típico,
“contrato de seguro”, não se confundindo com outras figuras. Tanto que a Constituição
atribuiu aos Municípios a competência para instituir imposto sobre serviços de qualquer
natureza, e à União competência para tributar operações de crédito, câmbio e seguro.
10. É discreta a diferença conceitual entre seguro e resseguro. A peculiaridade
do resseguro é ter como “segurado” (ressegurado) a própria seguradora, que busca,
também ela, reduzir a sua profusa exposição a riscos. O contrato de resseguro tem como
270
partes, necessariamente, a seguradora e a resseguradora e, como objeto da relação
jurídica, assim como no seguro, a garantia oferecida pela última. O segurado original
não é parte nesse contrato, estando presente apenas na relação jurídica com a
seguradora, única responsável pelo pagamento da indenização.
11. O objeto dos contratos de seguro e resseguro é a garantia de interesse
legítimo do segurado ou ressegurado, obrigação esta que pode, ou não, se converter no
pagamento de uma indenização, se ocorrer o sinistro. O que pretende o segurado ou
ressegurado, ao contratar o seguro ou resseguro, é obter o direito a gozar de
tranquilidade, uma vez que seu interesse legítimo sobre pessoa ou coisa estará
resguardado contra os riscos predeterminados no momento da contratação. Essas
características estremam definitivamente os contratos de seguro e resseguro do contrato
de prestação de serviços, a despeito da obstinação da Receita Federal do Brasil em tê-
los como análogos para fins tributários.
12. Da análise das disposições constitucionais que atribuem à União
competência para instituir o IOF – Seguro, conclui-se que o contrato de seguro (e
resseguro), típico e com características próprias que o apartam definitivamente de
figuras como a da compra e venda e a da prestação de serviços, deve ser tributado
exclusivamente pela incidência desta RMIT, cuja competência foi atribuída à lei
ordinária federal e deve ser exercida com obediência a todos os princípios
constitucionais aplicáveis a tributos e impostos, como os da capacidade contributiva e
da proibição de confisco, excepcionada a observância do princípio da anterioridade e
mitigada a submissão ao princípio da legalidade, na medida em que, dentro dos
parâmetros estabelecidos por lei, sua alíquota pode ser alterada pelo Poder Executivo.
13. RMIT do IOF – Seguro:
Hipótese:
Critério material: Realizar operação de seguro (seguros de vida e congêneres, seguro de acidentes pessoais e do trabalho, seguros de bens, valores, coisas, resseguro e outros não especificados).
Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento do recebimento total ou parcial do prêmio Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Seguradora ou Resseguradora (na
hipótese de resseguro), na condição de responsável por substituição.
Critério quantitativo:
Base de cálculo: montante integral do prêmio.
Alíquota: atual geral de 7,38% (máxima de 25%)
271
14. Como a Seguradora/Resseguradora ocupam o polo passivo da obrigação
tributária como responsáveis (substitutas) tributárias, além da RMIT do IOF – Seguro
extrai-se do texto legal outra norma, que denominamos “norma de retenção”, que atribui
à Seguradora o direito de incluir no valor do prêmio o montante do IOF-Seguro,
repassando seu ônus econômico ao segurado/ressegurado, indicado pela legislação
como “contribuinte” do imposto.
15. O IOF – Seguro não incide sobre seguros e resseguros contratados com
seguradoras/resseguradoras no exterior, pois, de acordo com sua RMIT, são sujeitos
passivos do imposto na condição de substitutas, de modo que, sendo domiciliadas no
exterior, não estão sujeitas ao imposto brasileiro.
16. O IRRF incide sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro em favor
de residentes e domiciliados no exterior, pois o sujeito passivo do IRRF, na condição de
substituto, é a fonte pagadora do prêmio, domiciliada no País.
17. Os princípios da territorialidade e da universalidade regulam conjuntamente
a competência do legislador ordinário para o delineamento da base de cálculo do
imposto sobre a renda, orientando-o a fazê-la abranger todos os elementos
configuradores de riqueza nova, incluindo tanto os rendimentos auferidos por residente
fiscal no Brasil, ou provenientes de fontes pagadoras ou de produção domiciliadas no
País (decorrência da territorialidade), como aqueles auferidos por domiciliados no País,
mas originados de fontes pagadoras/de produção estrangeiras.
18. O legislador ordinário determinou a incidência do IRRF sobre rendimentos
pagos, creditados, entregues ou empregados em favor de residentes no exterior. Como
regra geral, tais operações, quando decorrentes de prestação de serviços, estão sujeitas à
incidência do imposto à alíquota de 25%. Já os rendimentos para os quais não houver
tributação específica prevista na lei sofrem a incidência do imposto à alíquota de 15%.
As autoridades fiscais vêm tentando aplicar às remessas de prêmio de seguro e
resseguro a alíquota de 25%, equiparando sua natureza à da prestação de serviços. Esse
entendimento é absolutamente equivocado. Tributar seguro como serviço configura
afronta direta à Constituição e ao Código Tributário Nacional. Não temos dúvida,
portanto, de que a alíquota a ser aplicada, nas remessas para o exterior de prêmios de
seguro e resseguro, é a de 15%, prevista na lei para todos os rendimentos não
expressamente indicados no texto legal.
272
19. É justificada e louvável a redução empreendida pelo legislador, da base de
cálculo do IRRF sobre prêmios de resseguro remetidos ao exterior, para 8% do valor do
prêmio. Contudo, é anti-isonômica a distinção de tratamento entre prêmios de resseguro
e prêmios de seguro, que não fazem jus à redução.
20. RMIT do IRRF sobre as remessas de prêmio de seguro e resseguro ao exterior
Hipótese:
Critério material: Creditar, entregar, empregar ou remeter prêmio de seguro ou resseguro a seguradora ou resseguradora domiciliada no exterior.
Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do crédito, entrega,
emprego ou remessa do prêmio. Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Segurado ou Seguradora (na
hipótese de resseguro)
Critério quantitativo:
Base de cálculo: montante total do prêmio, na hipótese de prêmio de seguro, ou 8% do prêmio, na hipótese de resseguro.
Alíquota: 15% * A norma de retenção acompanha a RMIT, por se identificar substituição tributária.
21. No âmbito dos tratados para evitar a dupla tributação, os rendimentos
decorrentes da prestação de serviços se enquadram no conceito de “lucro das empresas”,
constante do art. 7º do modelo de tratados da OCDE, só podendo ser tributados no país
de destino dos rendimentos, a menos que o destinatário tenha estabelecimento
permanente no País.
22. Depois de mais de uma década de adoção equivocada do entendimento
externado no Ato Declaratório COSIT nº 1/2000, que determinava a tributação, pelo
Brasil, dos rendimentos classificados como “lucros das empresas” nos tratados firmados
com outros países, a jurisprudência vem se encaminhando de forma incisiva no sentido
da aplicabilidade da isenção prevista no artigo 7º para os rendimentos decorrentes de
contratos de prestação de serviço. Essa nova orientação, agora corroborada inclusive
pela Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, é a
juridicamente mais consistente e resguarda o respeito do País aos tratados internacionais
a que se vinculou, o que lhe atribui confiabilidade nas relações externas.
23. Os prêmios de seguro e resseguro também merecem o tratamento de “lucro
das empresas”, previsto no artigo 7o dos Tratados, pois constituem apenas parcelas da
receita bruta das seguradoras e resseguradoras, as quais serão imediatamente
273
convertidas, em sua maior parte, em reservas e provisões técnicas obrigatórias, somente
vindo a tornar-se lucro ao final do prazo de vigência da apólice, com a dedução dos
demais custos e despesas incorridos.
24. Não há autorização constitucional para que a Lei nº 10.865/04 submeta os
prêmios de seguro e resseguro à incidência do PIS e da COFINS-Importação, pois o
segurado que contrata apólice no exterior não se enquadra, absolutamente, como
importador de serviços. Afiguram-se, portanto, inconstitucionais os parágrafos 1º e 2º
do artigo 7º, da Lei 10.865/2004. A matéria, contudo, deve ainda ser submetida à
apreciação do Supremo Tribunal Federal, intérprete definitivo da Constituição, apto a
excluir do sistema enunciados inconstitucionais.
25. Em regra, a indenização está fora do campo de incidência do imposto sobre
a renda. Trata-se de verdadeira hipótese de não-incidência tributária, uma vez que os
valores auferidos não caracterizam variação patrimonial positiva, mas mera
recomposição do patrimônio preexistente. Contudo, há situações em que a quantia da
indenização não corresponderá ao montante da diminuição patrimonial, por variadas
razões. Exemplo dessas situações são as indenizações por danos extrapatrimoniais, as
indenizações por lucros cessantes e as indenizações que ultrapassam o valor contábil
dos bens cobertos, pagas no âmbito de seguros de dano.
26. Não adotamos, neste trabalho, a distinção entre renda e transferências
patrimoniais preconizada por parte da Doutrina representada por RICARDO MARIZ DE
OLIVEIRA. Por conseguinte, entendemos que no cômputo das receitas que compõem a
renda não podem ser excluídas, a priori, as chamadas transferências patrimoniais. Estas
só podem ser desconsideradas quando houver norma expressa excluindo-as da base de
cálculo do imposto ou quando, por sua própria natureza, estiverem fora do âmbito de
incidência do imposto.
27. Está pacificado, na Doutrina e na jurisprudência civilista, que os bens
imateriais compõem o patrimônio intangível das pessoas físicas e jurídicas e podem ser
recompostos por pecúnia quando sofrem dano. A nosso ver, essa conclusão também
deve ser acatada pelo Direito Tributário. O mesmo conceito de patrimônio válido para o
Direito Privado deve valer para o Direito Tributário (artigo 109 do CTN). Por
conseguinte, entendemos que a reparação de dano imaterial está fora do campo de
incidência do imposto sobre a renda, por não representar acréscimo patrimonial.
274
28. A indenização dos seguros de pessoas (pagamento do capital segurado) só é
paga em face da ocorrência de acidente ou outro infortúnio, não desejado pelo segurado
ou por seus beneficiários. Assume, assim, a natureza de reparação do dano imaterial,
previamente quantificado pelo próprio segurado como condizente com o capital
segurado. Esta conclusão não gera distorções no sistema tributário, uma vez que os
prêmios pagos pelos segurados não são dedutíveis na apuração da base de cálculo do
imposto sobre a renda e, se pagos por empregadores, são tributáveis como remuneração
indireta aos empregados, de modo que a posterior isenção do pagamento do capital
segurado coíbe o bis in idem.
29. No caso das indenizações por lucros cessantes, o tratamento é habitualmente
diverso. Tanto a legislação, quanto a Doutrina e a Jurisprudência são pacíficas ao
indicar que há incidência do imposto sobre a renda. Faz sentido essa conclusão, uma
vez que, em tais hipóteses, o bem perecido é justamente o lucro. Substitui-se o lucro que
se deixou de auferir em razão do sinistro ocorrido por indenização, assumindo esta o
lugar e absorvendo sua natureza. Consequentemente, pode ser tributada.
30. O Direito criou a ficção jurídica segundo a qual o valor da indenização
corresponde ao valor do bem. Como consequência dessa ficção, o pagamento de
indenização (excetuada a hipótese de lucros cessantes), corresponderá sempre à estrita
recomposição patrimonial. Como, para fins securitários, a indenização não ultrapassa o
valor do bem sinistrado, para fins tributários essa mesma premissa deve valer, de modo
que eventual diferença entre o valor contábil do bem e o valor pecuniário da
indenização não pode ser considerada renda nem tributada.
31. O termo “receita” deve ser entendido, para fins de incidência tributária
autônoma, de forma a significar verdadeira manifestação de riqueza, devendo
caracterizar ingresso definitivo, positivo e real no patrimônio, decorrente do exercício
da atividade empresarial. Da adoção dessa definição decorre a impossibilidade de
caracterização das indenizações de seguro como tal, qualquer que seja a sua natureza.
Consequentemente, não caracterizam receita, e não se sujeitam à incidência da
contribuição ao PIS e da COFINS, as indenizações pagas em decorrência de seguro de
dano (material ou imaterial), por lucros cessantes, ou mesmo o pagamento de capital
segurado, quando se tratar de apólice de seguro de pessoas.
275
Capítulo 4- Tributação das Seguradoras e Resseguradoras
32. As seguradoras e resseguradoras precisam realizar complexos cálculos
atuariais e entesourar os recursos necessários para o pagamento das indenizações
calculadas até o fim dos contratos de seguro. Trata-se da chamada “constituição de
reservas técnicas”, necessárias não apenas por exigência ontológica da atividade, mas
também por obrigação legal e regulatória. Essa peculiaridade deve ser levada em conta
pelo Direito Tributário ao estabelecer incidências sobre sua atividade.
33. Analisada a legislação ordinária que estabelece a incidência de PIS e
COFINS sobre o faturamento das seguradoras, poder-se-ia concluir ser bastante
generosa, pois autoriza a dedução de todos os valores destinados à constituição de
provisões ou reservas técnicas, prêmios cancelados ou restituídos, cosseguro e resseguro
cedidos, assim como o valor das indenizações pagas, deduzidas dos valores recebidos
como cosseguro, resseguro, salvados e outros ressarcimentos. Todavia, essa conclusão
seria precipitada pois, de acordo com a redação atual dos artigos 2o e 3o, da Lei nº
9.718/98, a base de cálculo dessas contribuições é o faturamento, e os valores recebidos
pelas seguradoras, seja como prêmio, seja como rendimentos de aplicações financeiras,
não se qualificam como tal.
34. Após a declaração da inconstitucionalidade do § 1º do artigo 3º da Lei nº
9.718/98, a base de cálculo do PIS e da COFINS passou a se restringir ao faturamento,
entendido como as receitas decorrentes da venda de bens ou da prestação de serviços.
Consequentemente, como as seguradoras e resseguradoras não têm faturamento, pois
não vendem bens nem prestam serviços, ficaram excluídas do campo de incidência
dessas contribuições. Não obstante, a matéria específica relacionada à incidência de PIS
e COFINS sobre as receitas das seguradoras pende de julgamento, no STF, do RE
400.479, em que Seguros Brasil S.A. questiona a incidência das contribuições sobre o
faturamento, como um todo, das seguradoras.
35. A legislação do IRPJ veda a dedução, como despesa, de qualquer provisão,
por entender que não são dispêndios definitivos da pessoa jurídica. Entretanto, no caso
das seguradoras e resseguradoras (e também das entidades de previdência privada), as
provisões técnicas são obrigatórias e estabelecidas pela regulação aplicável a essas
entidades. Consequentemente, as provisões técnicas constituídas por companhias de
seguro e resseguro são dedutíveis logo que constituídas no termo da regulação a elas
276
aplicável. Se e quando forem parcial ou totalmente revertidas, serão adicionadas às
bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
36. RMIT do IRPJ e da CSLL, para seguradoras e resseguradoras:
Hipótese: Critério material: Auferir renda (lucro real). Critério espacial: Território nacional Critério temporal: 31 de dezembro de cada ano (apuração anual) ou
30/03, 30/06, 30/09 e 31/12 (apuração trimestral).
Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Seguradoras e Resseguradoras Critério
quantitativo: Base de cálculo: Lucro Real (em cujo cômputo são deduzidas, adicionalmente aos demais custos e despesas autorizados pela legislação, as provisões técnicas cuja constituição é exigida pela legislação especial aplicável).
Alíquota: IRPJ – 25% mais adicional de 10% sobre o montante da renda que ultrapassar R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais anuais). CSLL – 15%
Capítulo 5 - Tributação das Entidades de Previdência Complementar Privada
37. O único e exclusivo objetivo de uma entidade fechada de previdência
complementar (EFPC) é dar cobertura a riscos sociais, em especial à velhice, em
colaboração com o Estado que, através da assistência social que lhe incumbe prestar,
deve garantir proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice. O
fato de essas entidades não poderem ter fins lucrativos lhes confere natureza especial,
uma vez que só existem pelo fato de as empresas, em atenção ao seu papel social,
pretenderem contribuir, com ou sem a participação de seus empregados, para que estes
venham a auferir aposentadoria capaz de lhes propiciar padrão de vida correspondente
ao que desfrutavam quando na ativa.
38. As EFPC merecem o mesmo tratamento das entidades assistenciais, fazendo
jus a imunidade tributária, especialmente por não terem fins lucrativos e ser sua
finalidade essencial o amparo à velhice, um dos objetivos primordiais da assistência
social, nos termos ditados pelo artigo 202, inciso I da Constituição Federal. Contudo,
não foi esse o caminho trilhado pelo Supremo Tribunal Federal, no caso líder decidido
em 2001 (“Caso CERES” – RE 202-700-6/DF, julgado em 08/11/2001), que
posteriormente ensejou a edição de súmula no mesmo sentido.
277
39. A nosso ver, diferentemente do quanto concluído pelo STF, o fato de a
EFPC receber contribuições dos participantes aos planos por elas geridos não elide o
caráter assistencial de tais entidades. Também acreditamos que o fato de a previdência
privada estar disponível a determinados grupos não lhe retira a característica da
generalidade. Ademais, equivocado afirmar que não atendem às camadas mais
necessitadas da população. O trabalhador, empregado de empresa ou associado a uma
entidade de classe, indubitavelmente necessita de amparo social na velhice e na
invalidez assim como qualquer outro cidadão, e conceder-lhe tal amparo caracteriza a
assistência social preconizada na Constituição Federal. Sendo assim, acreditamos que o
entendimento do Supremo Tribunal Federal a respeito dessa questão merece revisão.
40. Como as EFPC não prestam serviços nem vendem mercadorias, resta claro
que não realizam o fato descrito na hipótese de incidência das regras-matrizes
veiculadas pela Lei nº 9.718/98, consistente em obter faturamento. Consequentemente,
forçoso concluir que não podem se sujeitar à contribuição ao PIS e à COFINS, tal como
previstas pela legislação ordinária em vigor.
41. Não obstante a boa vontade do legislador ordinário, no sentido de proceder
as justas exclusões na base de cálculo do PIS e da COFINS supostamente devidos por
EFPCs, esta não é a forma correta de desonerar as EFPCs dessas contribuições uma vez
que elas não obtêm faturamento em sua atividade e, ainda que o obtivessem, estariam
isentas da COFINS e sujeitas apenas à incidência do PIS calculado à alíquota de 1%
sobre a folha de salários, por serem fundações ou associações civis sem fins lucrativos.
42. Mesmo que se pudesse dizer que a base de cálculo do PIS e da COFINS não
se restringe ao faturamento, podendo englobar as “receitas decorrentes da atividade fim
da empresa”, e que não fosse aplicável a isenção prevista no artigo 15 da Lei nº
9.532/97, ainda assim permaneceria a impossibilidade de tributar as EFPCs por PIS e
COFINS, pois os valores ingressados em seu patrimônio, a título de aportes ou
contribuições dos participantes e patrocinadoras, não caracterizam receita.
43. Todos os recursos ingressados no patrimônio das EFPCs, inclusive os
rendimentos obtidos nas aplicações financeiras que realiza, são alocados a obrigações.
Eventual sobra de recursos (superávit) não caracteriza lucro e tem destinação prevista
em lei, jamais correspondendo à distribuição, e consistente na contabilização em reserva
para futura revisão do plano, convertendo-se em benefício para os participantes.
278
Consequentemente, superávit e lucro não podem ser equiparados, levando à constatação
de estarmos diante de hipóteses de não-incidência tributária de IRPJ e CSLL.
44. Após o julgamento do caso CERES, foi veiculada a Medida Provisória nº
2.222/01 criando regime especial de tributação – RET para tributar de forma mais
adequada o lucro dessas entidades. Essa medida acabou sendo revogada pelo artigo 9º
da Lei nº 11.053/2004. O artigo 5º, da Lei nº 11.053/04, finalmente estabeleceu a
isenção ampla devida às entidades de previdência privada, ao determinar que, a partir de
1º de janeiro de 2005, ficariam dispensados a retenção na fonte e o pagamento em
separado do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações
de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de
entidade de previdência complementar, sociedade seguradora e FAPI, bem como de
seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência.
45. Não obstante a isenção prevista em lei e reconhecida pela Câmara Superior
de Recursos Fiscais, espera-se ainda a pacificação da jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, no julgamento do RE 612.686, quanto à absoluta impossibilidade de
incidência da CSLL (assim como do IRPJ) sobre eventual superávit apurado por
entidade fechada de previdência privada, uma vez que este não pode, em hipótese
alguma, ser confundido com lucro, seja pela vedação de que seja obtido por tais
entidades, seja pelo fato de sua destinação nunca ser semelhante à do lucro, mas sim
determinada por lei e por normas emitidas pelo órgão regulador, sempre com o objetivo
de retornar aos planos, gerando benefícios futuros para seus participantes.
46. Diferentemente das EFPC, as entidades abertas de previdência
complementar (EAPC), assim como as seguradoras, têm objetivo de lucro. Nos termos
do artigo 36, da Lei Complementar 109/2001, são constituídas unicamente sob a forma
de sociedades anônimas e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de
caráter previdenciário, concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único,
acessíveis a quaisquer pessoas físicas.
47. No que pertine à sujeição das EAPC à incidência do PIS e da COFINS, as
normas da Lei nº 9.718/98 são inaplicáveis, pois no seu âmbito somente o faturamento
pode servir como base de cálculo para as contribuições em questão e as EAPC não
vendem mercadorias nem prestam serviços. Contudo, caso a base de cálculo dessas
contribuições venha a ser, com fundamento em futura legislação ou interpretação dos
Tribunais, a totalidade das receitas das entidades abertas de previdência complementar,
279
o delineamento desse conceito deverá necessariamente levar em conta a peculiaridade
de suas atividades, conforme pretendido pela legislação atualmente em vigor. Do
contrário, se estará tributando como receita ingressos que não se caracterizam como tal.
48. RMIT do IRPJ e da CSLL, para EAPCs
Hipótese: Critério material: Auferir renda (lucro real). Critério espacial: Território nacional Critério temporal: 31 de dezembro de cada ano (apuração anual) ou
30/03, 30/06, 30/09 e 31/12 (apuração trimestral). Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Entidades Abertas de Previdência
Complementar Critério
quantitativo: Base de cálculo: Lucro Real (em cujo cômputo são deduzidas, adicionalmente aos demais custos e despesas autorizados pela legislação, as provisões técnicas cuja constituição é exigida pela legislação especial aplicável).
Alíquota: IRPJ – 25% mais adicional de 10% sobre o montante da renda que ultrapassar R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais anuais). CSLL – 15%
Capítulo 6 - Tributação dos Planos de Previdência Privada
49. A previdência privada, no Brasil, é operada através de planos, denominação
dada pela legislação aos contratos de previdência complementar privada. Os planos
nada mais são que contratos, ou seja, instrumentos introdutores de normas individuais e
concretas, cujos termos são previamente aprovados pelo órgão regulador.
50. O subsistema normativo que contempla as normas direta ou indiretamente
relacionadas à tributação dos planos previdenciários abrange diversas etapas, tanto
relativas à dedução de despesas, quanto relacionadas à tributação ou isenção de
rendimentos. O quadro sinótico abaixo permite visualizar separadamente todas essas
etapas, bem como o conjunto elaborado pelo legislador:
280
51. A dedutibilidade das contribuições efetuadas pelos participantes de planos
previdenciários é corolário tanto do conceito de renda e dos princípios constitucionais
aplicáveis ao imposto sobre a renda, quando da proteção à dignidade humana e da
institucionalização da previdência privada, previstos na Constituição.
52. Quanto à dedução das contribuições efetuadas pelas pessoas jurídicas em
benefício de seus empregados e dirigentes, é decorrência lógica do próprio conceito de
lucro da pessoa jurídica, assim como a dedução de todo e qualquer benefício concedido
pelas pessoas jurídicas a tais pessoas.
53. As contribuições para planos de previdência privada, realizadas por pessoas
jurídicas em favor de seus empregados e dirigentes, serão dedutíveis sempre que
destinadas a entidades regularmente constituídas, observada a legislação e regulação
aplicáveis, não sendo exigida semelhança à previdência oficial. Equivocado, portanto, o
acórdão do antigo Conselho de Contribuintes, que considerou indedutíveis as
contribuições feitas pela pessoa jurídica a plano de previdência privada que não
estabelecia condições para o resgate, por entender que os direitos concedidos pelo plano
não eram assemelhados aos da previdência social.
54. As contribuições realizadas pelos empregadores caracterizam remuneração
indireta paga aos seus empregados e dirigentes. Em consequência, a rigor, esses valores
poderiam ser somados à respectiva remuneração, na determinação da base de cálculo do
IRRF e do IRPF, como ocorre com outros benefícios indiretos. Não obstante, o
legislador ordinário federal houve por bem desonerá-los, optando por tributar esses
valores quando efetivamente recebidos pelas pessoas físicas, sob a forma de resgate ou
benefício (regime IIT).
55. Existindo cláusula de vesting (previsão de condição futura e incerta para que
o participante faça jus às contribuições da Instituidora), as contribuições não poderiam
281
ser tributadas no momento do aporte, pois ainda não há, neste momento, disponibilidade
jurídica nem tampouco econômica, da renda, mas mera expectativa de direito.
56. Além da isenção de IRRF e IRPF para as contribuições efetuadas por
empregadores a planos de previdência privada, estas também fazem jus a desoneração
da contribuição previdenciária sobre a folha de salários, destinada à seguridade social,
prevista pelo artigo 195, I, “a”, da Carta, e instituída pela Lei nº 8.212/91. Trata-se de
mais um incentivo da lei a que as empresas contratem planos de previdência privada e
contribuam para a cobertura do risco social da velhice.
57. No que tange ao pagamento de contribuições a plano de previdência
privada, em favor de não residentes fiscais no Brasil, enquanto os expatriados se
mantiverem como residentes fiscais, farão jus à isenção. Quando se tornarem não
residentes fiscais, os pagamentos efetuados em seu favor sofrerão a incidência do IRRF
à alíquota de 25%, prevista para os rendimentos decorrentes da prestação de serviços
profissionais pagos a beneficiários domiciliados no exterior.
58. Denomina-se IIT o regime segundo o qual há isenção (I) e dedutibilidade no
momento da realização das contribuições, (I) isenção durante a fase de acumulação ou
diferimento, somente vindo a ocorrer a tributação (T) no momento do recebimento do
resgate ou benefício. Esse regime privilegia a poupança em detrimento do consumo,
estimulando a contratação de previdência privada, pois concede isenção em duas etapas
da cadeia previdenciária privada, somente vindo a tributá-la no momento futuro do
recebimento dos benefícios previdenciários (ou no resgate, se ocorrer).
59. O regime IIT, atualmente adotado, é o mais benéfico no contexto do sistema
jurídico, econômico e tributário brasileiro. Em primeiro lugar, pois interessa ao Estado,
indubitavelmente, que os particulares contribuam para a formação de poupança que vai
gerar complementação de aposentadoria futura, amenizando os ônus da velhice tanto para
a previdência social quanto para o sistema público de saúde. Em segundo lugar, deve-se
ter em mente que, num País com histórico de economia instável, é necessária a concessão
de benefícios tributários que incentivem a opção por poupança de longo prazo – sujeita a
variáveis econômicas – em substituição ao consumo de curto prazo. Foi acertada,
portanto, a decisão do legislador de inserir no sistema tributário a isenção de IRRF para os
rendimentos auferidos na aplicação dos recursos garantidores dos planos de benefício de
caráter previdenciário, incentivando a poupança de longo prazo e, consequentemente,
desonerando a Previdência Social e os demais sistemas estatais de apoio à velhice.
282
60. Justifica-se que a legislação tributária atribua tratamento tributário
diferenciado para resgate e benefício, porquanto, no caso do benefício, estamos
tratando, de fato, de complementação de aposentadoria, com sua característica de
cobertura do risco social da velhice. O resgate consiste em prerrogativa garantida pela
legislação previdenciária, que só pode ser exercida antes de alcançada a data estipulada
para aposentadoria, nos moldes da regulação e do contrato previdenciário.
61. O regime tributário “tradicional”, segundo o qual os resgates e benefícios
recebidos de plano de previdência privada são tributáveis na fonte e na Declaração de
Ajuste Anual, mediante aplicação da tabela progressiva, atende bem aos princípios
constitucionais da generalidade, da proporcionalidade e da progressividade, que devem,
necessariamente, ser observados pelo legislador ordinário, ao instituir as regras-matrizes
de incidência tributária do imposto sobre a renda.
62. Por outro lado, andou mal o legislador ordinário quando, ao estabelecer o
regime opcional regressivo, se utilizou do artifício das alíquotas regressivas do imposto
sobre a renda na fonte para estimular a adesão a planos de previdência privada e a
manutenção dos recursos ali aportados por longo prazo. Ao adotar tal procedimento,
acabou por fazer tábula rasa de todos os princípios que obrigam o legislador ordinário
quando da instituição do imposto sobre a renda.
63. Embora a extrafiscalidade tenha por objetivo atingir valores entendidos
como relevantes e merecedores de estímulo pelo legislador ordinário, não pode ignorar
que os valores a serem perseguidos pela legislação tributária foram expressamente
eleitos e indicados pela Constituição nos princípios constitucionais que regem a
tributação geral, e certos tributos em especial.
64. RMIT do regime tradicional (progressivo)
Hipótese:
Critério material: Pagar resgate ou benefício de plano de previdência privada a participante ou beneficiário não optante pelo regime regressivo.
Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do pagamento. Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Entidade Aberta ou Fechada de
Previdência Complementar Critério
quantitativo: Base de cálculo: montante total do benefício ou resgate, com as deduções previstas em lei.
Alíquota: 15% para resgates, e 0 a 27,5% para benefícios, conforme o valor do rendimento.
* A norma de retenção acompanha a RMIT, por se identificar substituição tributária.
283
65. A incidência da RMIT do IRRF, no regime tradicional (progressivo), se
conjuga à incidência posterior da RMIT do IRPF apurado pelo participante ou
beneficiário em sua Declaração de Ajuste Anual. Quando da incidência desta última
RMIT, cuja hipótese de incidência é “auferir renda”, os rendimentos auferidos ao longo
do ano serão novamente incluídos em sua base de cálculo, na qual vão ser consideradas
também todas as despesas dedutíveis incorridas no período. Apurado o imposto devido,
o IRRF pago antecipadamente poderá ser utilizado como abatimento (em decorrência de
“norma de crédito” prevista na legislação), e eventuais valores pagos a mais serão
restituídos ao sujeito passivo. Com essa conjugação de normas são observados os
princípios constitucionais da capacidade contributiva e da progressividade.
66. RMIT do regime opcional (regressivo)
Hipótese:
Critério material: Pagar resgate ou benefício de plano de previdência privada a participante ou beneficiário não optante pelo regime regressivo.
Critério espacial: Território nacional
Critério temporal: Momento da realização do pagamento.
Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Entidade Aberta ou Fechada de
Previdência Complementar Critério
quantitativo: Base de cálculo: montante total do benefício ou resgate, com as deduções previstas em lei.
Alíquota: Conforme o prazo de acumulação dos recursos no plano 35% (até 2 anos), 30% (de 2 a 4 anos), 25% (de 4 a 6 anos), 20% (de 6 a 8 anos), 15% (de 8 a 10 anos) ou 10% (mais de 10 anos).
* A norma de retenção acompanha a RMIT, por se identificar substituição tributária.
67. No regime opcional (regressivo), a incidência da RMIT é definitiva. Não há
conjugação com a RMIT do IRPF apurado pelo participante ou beneficiário em sua
Declaração de Ajuste Anual, com inclusão, em sua base de cálculo, dos rendimentos, e
norma de crédito permitindo a compensação do IRRF pago ao longo do ano.
Consequentemente, não é viável a dedução das despesas incorridas ao longo do ano,
tampouco o ajuste da tributação segundo alíquotas escalonadas conforme o valor da
renda, ofendendo-se os princípios da generalidade, da capacidade contributiva e da
progressividade.
68. Os benefícios de pensão por morte recebidos, usualmente sob a forma de
renda, pelos beneficiários dos participantes, são tributados segundo a mesma regra
284
aplicável aos participantes. Esse tratamento tributário tem sentido lógico-sistemático,
pois a cobertura em questão é adquirida pelos participantes quando da conversão de sua
reserva em benefício e não tem natureza de seguro. Sob o ponto de vista tributário,
verifica-se que são pagos com a reserva constituída por contribuições dedutíveis do
IRPF do participante e isentas, quando feitas por patrocinadoras e instituidoras. Daí
porque a tributação em questão estar em consonância com a sistemática IIT vigente.
69. No que diz respeito ao pagamento do capital segurado aos beneficiários dos
participantes, decorrente da contratação de seguro de pessoas junto a entidades de
previdência privada, parece-nos claro que não são tributáveis, por terem natureza de
“seguro” e por aplicação direta do artigo 6º, VII da Lei nº 7.713/88, que nada mais fez
senão equiparar o tratamento da indenização paga por entidades de previdência privada
àquele dado às indenizações pagas por seguradoras. Observa-se, também aqui, a
sistemática TII aplicável ao seguro de pessoas, aceita pela nossa jurisprudência por não
implicar em bitributação.
70. O saldo de conta, pago pelas entidades de previdência privada aos
beneficiários dos participantes, na hipótese de morte desse durante o período de
diferimento, não faz jus a isenção de IRRF e IRPF. Não tem natureza de seguro, pois
trata-se de poupança constituída para futuro recebimento de benefício, ao ser
completado o período de diferimento. Ademais, os recursos que compuseram essa
reserva puderam ser deduzidos do IR quando aportados seja pelo participante, seja por
patrocinadora ou instituidora, e foram isentados de IR nessa última hipótese, tornando
sua tributação, quando restituídos aos beneficiários, adequada por conformar-se à
sistemática IIT.
71. O VGBL é um tipo de plano previdenciário criado especialmente para
sujeitar-se a regime do tipo TII. Embora a sigla contenha “isenção” na última etapa, esta
não é integral, pois há tributação da parcela do benefício ou resgate composta pelos
rendimentos auferidos pelo plano durante o período de acumulação, valendo a
desoneração exclusivamente para a parcela composta pelos prêmios pagos durante o
período de diferimento.
72. Com os regimes tributários dos planos previdenciários em geral (IIT) e do
VGBL (TII), é possível ofertar produtos atrativos tanto para as pessoas físicas que se
interessam pela dedução das contribuições efetuadas a planos previdenciários, quanto
para aquelas que, por qualquer motivo (por exemplo, por apresentarem Declaração
285
Simplificada), preferem abrir mão dessa prerrogativa para usufruir do benefício fiscal
no momento do recebimento do resgate ou do benefício. Não há ofensa ao princípio da
isonomia, pois ambos os regimes oferecem benefício economicamente idêntico.
73. RMIT do IRRF incidente sobre VGBL
Hipótese:
Critério material: Pagar resgate ou benefício de VGBL a participante ou beneficiário optante ou não optante pelo regime regressivo.
Critério espacial: Território nacional Critério temporal: Momento da realização do pagamento. Consequente: Critério pessoal: Sujeito ativo: União Sujeito passivo: Entidade Aberta ou Fechada de
Previdência Complementar Critério
quantitativo: Base de cálculo: parcela do benefício ou resgate constituída pelos rendimentos auferidos pelo plano durante a fase de acumulação.
Alíquota: no regime progressivo - 15% para resgates, e 0 a 27,5% para benefícios, conforme o valor do rendimento no regime regressivo - Conforme o prazo de acumulação dos recursos no plano: 35% (até 2 anos), 30% (de 2 a 4 anos), 25% (de 4 a 6 anos), 20% (de 6 a 8 anos), 15% (de 8 a 10 anos) ou 10% (mais de 10 anos).
* A norma de retenção acompanha a RMIT, por se identificar substituição tributária.
74. Quanto à portabilidade, a própria Lei Complementar nº 109/2001 garantiu a
não-incidência de tributos nessa operação. Com efeito, nem poderia ocorrer, pois é
requisito do instituto que não haja disponibilização de recursos ao participante. Por
conseguinte, essa operação não implica em nenhum ganho, não caracterizando fato
signo presuntivo de riqueza apto a ser escolhido pelo legislador como hipótese de
incidência tributária.
75. Os regimes tradicional (progressivo) e opcional (regressivo) não são
aplicáveis a benefícios e resgates pagos a domiciliados no exterior. Os rendimentos em
questão devem sujeitar-se à incidência do IRRF, nos termos do artigo 685 do
Regulamento do Imposto sobre a Renda. A alíquota aplicável deve ser a de 15%,
prevista para rendimentos não expressamente indicados, e não a alíquota de 25%, que se
aplica a rendimentos decorrentes da prestação de serviços.
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