Til, de José de Alencar
Classificação da obra: romance regionalista do Romantismo brasileiro
2 volumes de 31 capítulos cada
Foco narrativo: 3.ª pessoa, narrador onisciente
Personagens principais: Berta, Jão Fera, Miguel, Brás, Ribeiro-Barroso
Personagens secundárias: Afonso, Luís Galvão, Ermelinda, Linda, Zana...
Tempo da narrativa: década de 40 do séc. XIX
Linguagem: adjetivada, cheia de metáforas, típica do autor.
Ela, pequena, esbelta, ligeira, buliçosa, saltitava sobre a relva, gárrula e
cintilante do prazer de pular e correr; saciando-se na delícia inefável de se difundir
pela criação e sentir-se flor no regaço daquela natureza luxuriante.
(cap. I, 1.º vol.)
Com o toque desse brando serpear sentiu Berta a doçura de uma carícia; a
boicininga titilava de volúpia ao tépido calor da cútis acetinada; e escondendo a
monstruosa cabeça na conchinha da mão que a menina recolhera ao seio, caiu no
letargo.
(cap. VIII, 2.º vol.)
Resumo:
Em um passeio pela fazenda, Berta, jovem pequena, esbelta, ligeira, buliçosa,
grandes olhos negros, boca mimosa. E Miguel que era alto, ágil, de talhe robusto e bem
conformado, encontram Jão Fera, homem de grande estatura e vigorosa compleição,
que tinha fama de bandido. Após um desentendimento entre Jão Fera e Miguel, o
primeiro vai embora a pedido de Berta.
Os dois amigos vão ao encontro de Linda e Afonso, irmãos gêmeos de cabelos
castanhos e olhos pardos, filhos de Luís Galvão que era um bonito homem, de
fisionomia inteligente e regular estatura, e de D. Ermelinda de 38 anos. Linda ama
Miguel. Berta e Miguel se amam. Mas para não fazer sofrer a amiga Linda, Berta faz de
tudo para que Miguel ame Linda. E consegue.
Ficam sabendo que Luís Galvão vai fazer uma viagem para Campinas e que a
mãe deles estava com mau pressentimento. Berta fica assustada, pois acha que Jão Fera
está por trás disso, e parte pela floresta para evitar a emboscada. Chegando lá discute
com ele, que lhe tem muito amor, e consegue evitar o assassinato. Havia sido contratado
por Barroso, homem de cinquenta anos, uma barba ruiva e áspera, de mediana estatura
e excessivamente magro. Este fica furioso ao saber que ele não cumprira o acordo. Jão
fica em débito com Barroso e precisa de cinquenta mil reis para saldar a dívida.
Todos gostavam muito de Berta, pois era alegre e de bom coração. Ela visitava
constantemente Zana, mulher com problemas mentais.
Brás de 15 anos era feio, e descomposto em seus gestos. Tinha um ar pasmado,
um olhar morno, com expressão indiferente e parva, ele também tem problemas
mentais. Ao sentir ciúme de Berta ele tenta matar Zana, é repreendido por Berta e se
arrepende. Brás era filho de uma irmã de Luís Galvão, que morrera viúva, e por isso ele
vivia na casa de seu tio. Ele dera a Berta o apelido de Til, pois quando ela lhe ensinava
o abc ele achava o til do alfabeto gracioso, então o associou a Berta, a quem queria
muito bem.
- Não sou mais Til! disse a menina lentamente.
Caiu-lhe então aos pés, outra vez humilde e cativo, rojando como um verme, o
mísero idiota, de cujo corpo rompia em arquejos e contorções o pranto, que não sabia
exprimir como os homens em lágrimas e lamentos.
Acalentou-o Berta, amimando-lhe as faces, e depois que o viu calmo, trouxe-o
de novo à reza e o fez recitar a prece interrompida.
“- Virgem Puríssima, Rainha do Céu, Bem-aventurança nossa, Mãe de Jesus e
dos aflitos, intercedei por meu tio, minha tia e meus primos; por mim, por Berta e
aqueles a quem ela quer bem, e fazei-nos a todos felizes.”
(cap. XXIV, 1.º vol.)
Associando-se a lembrança original do idiota, disse-lhe a menina, ajudando a
palavra com mímica expressiva e apontando para a carta.
- Eu sou Til!
Esteve Brás um instante pasmo e boquiaberto, sem compreender, apesar da
ânsia com que afinal bateu palmas de contente e deitou a pular, regougando a sua
parva risada.
- Eh!... eh!... eh!... Berta, umh!... Berta, umh!...
Daí em diante aquele sinal, que para o idiota era símbolo de graça, da gentileza
e do prazer, tornou-se a imagem de Berta, e não se cansava Brás de o repetir, não por
palavras, mas por acenos com os meneios mais extravagantes.
Dias depois, chamando-a ele pelo nome, a menina respondeu-lhe:
- Não me chamo mais Berta; meu nome agora é Til.
(cap. XXVI, 1.º vol.)
Pelo assassinato de Aguiar, do Limoeiro, seu filho oferecera uma recompensa a
quem matar o assassino Jão Fera. Avisado do acontecido por Chico, Jão pede que este
vá até o filho de Aguiar do Limoeiro e peça cinquenta mil reis; em troca Jão Fera irá a
seu encontro.
Barroso e seu bando planejam provocar um incêndio na casa de Luís Galvão
para matá-lo e depois, apagando o incêndio, Barroso pretende oferecer seus serviços à
viúva e conquistá-la. Vingando assim a traição do passado, pois ficaria com a esposa
daquele que manchara a honra da esposa Besita.
Ribeiro trocara seu nome para Barroso, tinha agora uma irrupção no rosto. Jão
e Ribeiro tinham-se visto poucas vezes na época de Besita, por isso não se
reconheceram quando se encontraram.
Na noite São João, Gonçalo, o pajem Faustino e Monjolo, trancam a senzala e
ateiam fogo no canavial. Luís tenta apagar o fogo e é agredido pelas costas por Gonçalo,
Jão o salva e mata os três bandidos. Barroso foge.
Conforme o combinado, Jão se entrega ao filho de Aguiar, diz que irá pra onde
ele quiser desde que ninguém toque nele, pois se isso acontecer estará desfeito o acordo
e ele ficará livre novamente. Os capangas tentam amarrá-lo, ele espanca todos e vai
embora. Barroso volta para tentar matar Berta. Jão que estava solto novamente consegue
pegá-lo e o mata de forma violenta.
Quem o visse dilacerando a vítima com as mãos transformadas em garras,
pensaria que a fera de vulto humano ia devorar a presa e já palpitava com o prazer de
trincar as carnes vivas do inimigo.
(cap. XXVI, 2.º vol)
Brás que presenciara tudo e, como não gosta dele, leva Berta pra ver a cena. Ela
foge horrorizada. Jão tenta explicar o ocorrido, ela bate-lhe no rosto. Percebendo que ela
Agora lhe tem asco, Jão se entrega à polícia.
Luís resolve contar tudo à esposa, ela chora e decide que ele deve reconhecer
Berta como filha. Contam tudo a Berta, omitindo porém as circunstâncias
desagradáveis. Berta sente que estão escondendo algo.
Jão foge da prisão e procura Berta, ela o faz prometer que nunca mais matará
ninguém. Ele fala de Besita, mãe de Berta, e esta implora que lhe conte tudo. Ele conta.
Besita era a moça mais bonita da cidade, vivia com seu pai Guedes. Luís Galvão e Jão
Fera, que eram amigos, apaixonam-se por ela. Jão achando que ela nunca o amaria abre
mão desse amor para Luís, este só quer divertir-se não pretende casar-se. Ela conhece
Ribeiro e aceita casar-se com ele. Jão fica Furioso e se afasta de Luís. Besita casa-se
com Ribeiro que desaparece logo depois do casamento, após receber um bilhete
chamando-o com urgência a Itu. Alguns meses depois Besita é avisada por Zana que
seu marido chegara. Era noite, e no escuro ela se entrega às caricias do marido, depois
descobre que não era ele, e sim Luís Galvão. Jão pensa em matá-lo por isso mas ela o
impede. Meses depois Luís casa-se com D. Ermelinda e nasce Berta, filha de Besita.
Elas vivem isoladas, mora com elas Zana, que amamenta o bebê, e Jão Fera, que cuida
delas como um cão fiel.
Um dia Besita pede a Jão que vá a Itu comprar algumas coisas para o bebê.
Durante sua ausência, aparece Ribeiro, que a acusa de traição e a estrangula. Jão chega e
consegue salvar Berta, mas Ribeiro foge.
Nhá Tudinha, mãe de Miguel, ouve choro vindo da casa de Besita e vai até lá.
Jão conta o acontecido e ela adota Berta como sua filha. Zana enlouquece e continua
morando na casa de Besita, e tendo alucinações com a morte dela. Jão torna-se capanga
e matador, tentando aplacar a furiosa sede de vingança que tem.
Berta o abraça e diz que ele cuidou dela, e que é seu pai. Jão passa a trabalhar na
terra. Luís quer que Berta vá morar com ele e sua família, ela se nega e pede que leve
Miguel, que ama Linda. Miguel tenta convencê-la a ir junto, mas ela recusa. “Não,
Miguel. Lá todos são felizes! Meu lugar é aqui, onde todos sofrem.” Eles partem para
São Paulo.
Como as flores que nascem nos despenhadeiros e algares, onde não penetram os
esplendores da natureza, a alma de Berta fora criada para perfumar os abismos da
miséria, que se cavam nas almas, subvertidas pela desgraça.
Era a flor da caridade, alma sóror.
(cap. XXXI, 2.º vol)
Características:
José de Alencar busca mostrar a vida do caipira do interior de São Paulo do
século XIX, vocabulário e costumes da região, as diferenças sociais da época (escravos,
capangas, pobres e ricos donos de terras).
O Romance é ambientalizado em Campinas, interior de SP, onde há o contraste
entre aspectos sociais, marginalização que sofrem personagens pobres, como Miguel
(que para casar-se com Linda teve de ir estudar na capital). Relata-se também um pouco
do namoro da época, e festas, como a de São João.
Mostra-se o ambiente dos escravos, senzala, e seus conflitos, como a rivalidade
entre duas cativas, além da marginalização consciente dos escravos como Faustino e
Monjolo, os quais conspiram para a morte de Galvão.
O romance segue o clima do folhetim, em que os capítulos são curtos e
terminam num momento de grande tensão. Além disso a temática do suspense e do
soturno são marcas registrados da obra, que é repleta de aventuras, momentos
de tensão, como quando Berta corre perigo fugindo de porcos selvagens furiosos.
No Livro, Berta é sempre comparada a flor. no capitulo inicial surge uma
imagem de flor bela, mas imatura; já no fim do livro (no poente do sol) a imagem da
flor se repete mostrando a “Flor Interior” cheia de caridade e abnegação. O autor cria
assim uma ideia nítida de desabrochar, pelos trechos:
− Manhã: "Eram dois, ele e ela, ambos na flor da beleza e mocidade"
− Poente: "Era a flor da caridade, alma soror"
Berta sacrifica-se para que todos vivem em paz e felizes, faz com que Miguel e
Linda fiquem juntos, e se resigna a cuidar dos que mais sofrem, como
Zana, Brás, Jão Fera (a quem ela reconhece como o seu verdadeiro pai), a galinha sem
pernas, e continua morando com nhá Tudinha.
Personagens do Romance
Berta, Inhá ou Til é a personagem central do livro, filha bastarda do fazendeiro
Luis Galvão com uma pobre moça da vila (Besita que foi morta por vingança) foi criada
por nhá Tudinha. Berta é uma adolescente muito bonita, graciosa, com
movimentos espontâneos e encantadores, atrai para si o amor e carinho de todos, é
caridosa e não se afasta das criaturas mais repulsivas e desprezadas
da região (como Jão Fera, o louco Brás, e Zana). É chamada de Inhá por Miguel, e de
Til por Brás durante uma aula que dava a ele; já no fim do livro ela própria se intitula
TIL.
Ninguém na casa se importava com essa galinha, a não ser para fazer-lhe mal.
Antes de perder os pés, por ser feia e arisca perseguiam-na a pedradas, quando
aparecia no quintal. Depois que a roeu a ratazana, esteve ameaçada da panela, donde
a salvou Berta, que desde esse dia a tomou a seu cuidado.
(cap. XVI, 1.º vol.)
Miguel é irmão de criação de Berta, filho de nhá Tudinha; é um jovem que se
mostra desde o principio apaixonado por Inhá. Esta porém faz de tudo para aproximá-lo
se da amiga Linda, que gosta de Miguel. Sendo pobre, Miguel não poderia casar-se com
Linda, mas por fim ele acaba estudando para ascender socialmente e poder unir-se a
Linda (o carinho que por ela “descobre” sentir foi pintado por Berta, que colocou seu
encanto na faces serenas da amiga).
Luis Galvão é o dono da Fazenda Palmas, muito jovial e alegre, que na
juventude foi homem de muitas aventuras amorosas e enrascadas – numa dessas
desonrou Besita, recém casada com Barroso a qual ficou grávida de Berta.
Linda é filha de Luís Galvão e D. Ermelinda, menina educada aos moldes da
corte, mas que junto ao irmão Afonso faz amizade com os jovens simples Berta e
Miguel.
Afonso, irmão de Linda, possui o mesmo espírito alegre e conquistador do pai
Luis, acaba gostando de Berta (sem saber ser esta sua irmã de sangue).
Jão Fera ou Bugre - terrível homem, de feições assustadoras e fama de matador
(que na verdade é); segundo uma interpretação do livro podemos considerar que a vida
o tornou assim (foi cheio de desilusões e sofrimentos). Era apaixonado por Besita,
porém apesar de seu desejo a tinha como “santa” e queria apenas sua felicidade, pois
sabia que ela não o amaria como ele. Assim quando Luís Galvão se recusou a casar com
ela, ele rompeu a “amizade” que os unia; protegia Besita de tudo, porém ela foi
assassinada e ele passou a cuidar de Berta, e prometeu vingança a sua amada.
Brás - um sobrinho de Luís Galvão; sofria de ataques epiléticos e era retardado
mental; na casa grande sua presença era desprezada. Ele apaixonou-se por Berta que
nunca o distratara e propôs-se a ensinar-lhe o abecedário e rezas. Numa das lições ele se
encantara pelo acento til, e só conseguia memorizá-lo; assim Berta teve
uma resolução: chamar-se-ia Til, e a partir daí foi ensinando as letras com associações a
coisas ou pessoas que o deficiente conhecia.
Zana – senhora de origem africana que trabalhava para Besita e presenciou toda
a história de Berta, e do assassinato de sua mãe; por isso enlouquecera e todos os dias
repetia suas ações no dia da morte de Besita (reproduzindo os fatos
daquele fatídico dia).
Barroso ou Ribeiro – casou-se com Besita, mas na noite de núpcias a
abandonou para resolver negócios relacionados a uma herança que recebera. Partiu e
ficou anos longe; quando voltou a sua casa viu a esposa com um bebê, planejou
sua vingança (que incluía a morte de Luís e Berta); matou a esposa, mas foi impedido
de matar o bebê por Jão Fera.
D. Ermelinda – esposa de Luís Galvão, muito elegante e educada,
mas não muito bela. Ao descobrir sobre o passado de seu marido se entristece, mas
quando ele confessa (no final do romance) ela o apoia a reconhecer Berta como filha.
Questões
1. Em Viagens na Minha Terra a personagem Carlos é volúvel em relação às mulheres
que lhe despertam paixão. Pode-se dizer o mesmo em relação a Berta, de Til? Justifique.
2. Identifique características típicas do Romantismo no texto que segue, o qual descreve
Berta, de Til.
Ela, pequena, esbelta, ligeira, buliçosa, saltitava sobre a relva, gárrula e
cintilante do prazer de pular e correr; saciando-se na delícia inefável de se difundir
pela criação e sentir-se flor no regaço daquela natureza luxuriante.
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