1
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL
UNIDADE EM ERECHIM
CURSO DE ADMINISTRAO - BACHARELADO
SRGIO LUIZ KOCZICESKI
SUCESSO NA AGRICULTURA FAMILIAR: PROBLEMTICA SOCIAL E DESAFIOS PARA A GESTO
PBLICA EM PAULO BENTO/RS.
ERECHIM
2007
2
SRGIO LUIZ KOCZICESKI
SUCESSO NA AGRICULTURA FAMILIAR: PROBLEMTICA SOCIAL E DESAFIOS PARA A GESTO
PBLICA EM PAULO BENTO/RS.
Trabalho de Concluso de Curso apresentado como requisito parcial para a obteno do ttulo de Bacharel em Administrao na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul. Prof.a Ms. Rosane Menna Barretto Peluso Orientadora.
ERECHIM
2007
3
SRGIO LUIZ KOCZICESKI
SUCESSO NA AGRICULTURA FAMILIAR: PROBLEMTICA SOCIAL E DESAFIOS PARA A GESTO
PBLICA EM PAULO BENTO/RS.
Trabalho de Concluso de Curso apresentado como requisito parcial para a obteno do ttulo de Bacharel em Administrao na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul.
Aprovado em......./........./.........
BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Prof.a Dra. Silvia Santin Bordin Universidade Estadual do Rio Grande do Sul Prof.a Ms. Rosane Menna Barretto Peluso Universidade Estadual do Rio Grande do Sul Prof.a Dra. Bernardete Maria Popoaski Universidade Estadual do Rio Grande do Sul
4
AGRADECIMENTOS
Aos agricultores familiares de Paulo Bento que contriburam com o estudo,
manifestando suas opinies.
A Prof. Ms. Rosane Menna Barreto Peluso, pela orientao e entusiasmo.
A Prof. Dra. Silvia Santin Bordin, pela compreenso.
A minha esposa Claudette, filhos Leonardo e Bruno, pela compreenso de
que o tempo reduzido de convvio se deve a uma boa causa.
A todos os professores que me ajudaram na construo de novos
conhecimentos e com isso alargaram os horizontes a serem vislumbrados.
A colega de trabalho Maricruz Salete Montemezzo pelo apoio na pesquisa.
A todos os colegas da EMATER/RS-ASCAR, que de uma ou outra forma,
apoiaram e incentivaram a iniciativa do estudo.
A todos os meus colegas de turma pela convivncia e incentivo.
5
RESUMO
O presente estudo teve por objetivo verificar a forma pela qual a sucesso hereditria na agricultura familiar no municpio de Paulo Bento/RS est ocorrendo, sua influncia e impactos na economia e sociedade. As famlias rurais foram estratificadas e classificadas de acordo com a renda e o tamanho das propriedades em descapitalizadas, em transio e consolidadas. Atravs de pesquisa de opinio, usando-se questionrios estruturados com questes de mltipla escolha, identificou-se o interesse profissional dos jovens nascidos no meio rural e suas correlaes, com conflitos entre geraes e relaes de gnero. Atravs de consulta a bibliografia especfica caracterizou-se a agricultura familiar e a forma pela qual se processa a sucesso hereditria e as formas de acesso a terra no Canad, Frana, Polnia, Tunsia e em diversas regies do Brasil. Buscou-se inserir informaes sobre a influncia das rendas no-agrcolas (pluriatividade) nestes pases. Fez-se, tambm, referncia a conceitos de gesto de unidades de produo agropecuria. Constatou-se que em Paulo Bento/RS a mdia de filhos por casal de agricultores varia de 2,0 a 2,5 e que, nas famlias em processo de transio esta mdia apresenta-se declinante, devido a preocupao destas em manter uma faixa patrimonial mnima para ser transferida aos filhos por herana. Da mesma forma, identificou-se que a populao rural, principalmente entre as famlias descapitalizadas, est em processo de envelhecimento, que os nascimentos masculinos superam os femininos e que, as filhas moas so preparadas desde a infncia para trabalhos urbanos. Ainda, constatou-se que, entre os rapazes das famlias descapitalizadas e em transio, o trabalho no-agrcola conjugado com o trabalho agrcola das propriedades, os tem mantido por mais tempo no meio rural. Entre os agricultores descapitalizadas a indisponibilidade de rea agricultvel para a instalao de toda a prole e o baixo nvel de escolaridade tem estimulado o processo de venda das propriedades, cujos moradores transferem-se para os centros urbanos prximos. Constatou-se, ainda, que para ser ungido como sucessor hereditrio nas unidades de produo, h preferncia por sucessores do sexo masculino com a menor escolaridade. Finalmente, prope-se polticas de gesto pblica para minimizar os efeitos contrrios a permanncia dos jovens no meio rural, como a introduo da policultura atuando como fonte geradora de renda e de remunerao mais justa a mo-de-obra rural; a introduo de atividades que valorizem social e economicamente o trabalho feminino, como o turismo rural; a valorizao do ensino formal entre os agricultores e programas de educao informal que, busquem a qualificao profissional do agricultor nas atividades produtivas e, principalmente, nas atividades de gesto das propriedades; melhores condies nos processos de financiamentos fundirios, com adequao do valor teto a regio e a possibilidade de contemplar a aquisio das
6
partes co-herdeiras; a criao do servio municipal de inspeo sanitria com a adeso ao sistema unificado nacional; a continuidade da pesquisa iniciada, aplicando-a a regio geogrfica estabelecida ao Norte do Rio Grande do Sul, como forma de potencializar o conhecimento regional nos assuntos relativos a sucesso hereditria na agricultura familiar, at este momento, pouco explorado e conhecido.
PALAVRAS CHAVE: Agricultura familiar, Sucesso hereditria, sucesso na agricultura familiar.
7
ABSTRACT
The present study it had for objective to verify the form for which the hereditary succession in familiar agriculture in the city of Pablo Bento/RS is occurring, its influence and impacts in the economy and society. The agricultural families had been estratificadas and classified in accordance with the income and the size of the descapitalizadas properties in, transistion and consolidated. Through opinion research, using itself questionnaires structuralized with questions of multiple choice, identified to the professional interest of the young born in the agricultural way and its correlations, as conflicts between generations and relations of sort. Through consultation the specific bibliography characterized it familiar agriculture and the form for which if it processes the hereditary succession and the forms of access the land in Canada, France, Poland, Tunisia and in diverse regions of Brazil. One searched to insert information on the influence of the incomes not-agriculturists (pluriatividade) in these countries. One became, also, reference the concepts of management of units of farming production. This average was evidenced that in Pablo Bento/RS the average of children for couple of agriculturists varies of 2,0 the 2,5 and that, in the families in transistion process presents declining, due the concern of these in keeping a minimum patrimonial band to be transferred to the children for inheritance. In the same way, it was identified that the agricultural population, mainly between the descapitalizadas families, is in aging process, that the masculine births surpass the feminine ones and that, the young children is prepared since infancy for urban works. Still, one evidenced that, it enters the youngsters of the descapitalizadas families and in transistion, the work not-agriculturist conjugated with the agricultural work of the properties, has kept them for more time in the agricultural way. The non-availability of agricultvel area for the installation of all enters the descapitalizadas agriculturists the offspring and the low level of escolaridade has stimulated the process of venda of the properties, whose inhabitants move to the next urban centers. One evidenced, still, that to be ungido as successive hereditary in the units of production, it has preference for successors of the masculine sex with the lesser escolaridade. Finally, one considers politics of public administration to minimize the contrary effect the permanence of the young in the agricultural way, as the introduction of the policultura acting as generating source of income and remuneration more joust the agricultural man power; the introduction of activities that value social and the feminine work economically, as the agricultural tourism; the valuation of formal education between the agriculturists and programs of informal education that, searchs the professional qualification of the agriculturist in productive activities e, mainly, in the activities of management of the properties; better conditions in the processes of agrarian financings, with adequacy of the value ceiling the e region the possibility to
8
contemplate the acquisition of the parts co-heiresses; the creation of the municipal service of sanitary inspection with the adhesion to the unified system national; the continuity of the initiated research, applying it it established geographic region to the North of the Rio Grande Do Sul, as form of potencializar the regional knowledge in the relative subjects the hereditary succession in familiar agriculture, until this moment, little explored and known.
WORDS KEY: Familiar agriculture, hereditary Succession, succession in familiar agriculture.
9
SUMRIO
1 INTRODUO........................................................................ 11
2 REFERENCIAL TERICO...................................................... 14
2.1 Agricultura Familiar................................................................. 14
2.2 Formas de acesso a terra na agricultura familiar.................... 15
2.3 A renda no-agrcola nas propriedades rurais familiares....... 19
2.4 As perspectivas dos jovens na agricultura familiar................. 20
2.5 Gesto das propriedades rurais familiares.............................. 22
3 METODOLOGIA...................................................................... 25
4 RESULTADOS E DISCUSSES............................................ 28
4.1 Caracterizao das famlias participantes da pesquisa.......... 28
4.2 Pensando a sucesso na agricultura em Paulo Bento........... 37
4.3 Proposies............................................................................. 40
4.3.1 Trabalhando a gerao de renda e a adequada
remunerao da mo-de-obra rural........................................
41
4.3.2 Trabalhando a questo de gnero.......................................... 42
4.3.3 Trabalhando a questo educacional....................................... 43
4.3.4 Trabalhando o acesso a terra................................................. 45
4.3.5 Trabalhando a agregao de valor a produo primria........ 47
4.3.6 Proposies para as entidades apoiadoras e
organizacionais: assistncia tcnica e extenso rural,
universidades, sindicatos e associaes................................
48
5 CONSIDERAES FINAIS.................................................... 50
6 REFERNCIAS BIBBLIOGRFICAS..................................... 52
10
APNDICE A........................................................................... 55
APNDICE B........................................................................... 59
11
INTRODUO
Muito tem se falado sobre o envelhecimento da populao rural, das questes
de gnero e dos conflitos de geraes que influenciam as decises nos
empreendimentos agropecurios. Diz-se tambm, que est difcil convencer os
jovens, filhos de agricultores familiares, detentores de pequenas reas a darem
continuidade a atividade dos pais, em virtude da pouca disponibilidade de rea
agricultvel e da expectativa de retorno financeiro muito baixa. Neste estudo,
procurou-se levantar a discusso com os agricultores do tipo familiar no municpio de
Paulo Bento/RS e seus filhos, provveis sucessores na atividade, estes aspectos e,
atravs de pesquisa estratificada por renda bruta das propriedades, levantar
informaes sobre esta problemtica social. O conhecimento da realidade municipal
forneceu subsdios para discutir com maior propriedade os destinos que se
vislumbram para estes empreendimentos e, verificar, de acordo com o caso, as
possibilidades de interveno.
Estudos recentes tm demonstrado, pelo mundo afora, que herdar a
propriedade dos pais a forma mais usual entre as populaes camponesas para
garantir a reproduo social, cultural e econmica das famlias. No entanto, a forma
pela qual a sucesso acontece nas diferentes partes do mundo difere de acordo com
os componentes econmicos, polticos e culturais das Naes.
Lamarche (1993) coordenou estudos relacionados a estes aspectos da
agricultura familiar em cinco pases: Canad, Frana, Polnia, Brasil e Tunsia.
Evidenciou as particularidades destas Naes e demonstrou que de uma forma
geral, a transmisso de patrimnio na agricultura leva em considerao muito mais
os aspectos culturais, cuja tradio encontra-se enraizada nas famlias camponesas,
12
do que os meramente jurdicos e legais. Desta forma, dificilmente acontece a
sucesso igualitria.
No Brasil, por tratar-se de pas com vasta extenso territorial, formao tnica
diversificada e estratificada regionalmente, da mesma forma, a sucesso na
agricultura familiar tem tratamento diversificado e diretamente influenciado por estes
fatores. Brumer (1993) avalia que a transmisso do patrimnio por hereditariedade
muito comum na regio Sul, tem menor intensidade no Nordeste e no significativa
no Sudeste. Abramovay (2001) em pesquisa realizada no Oeste Catarinense
confirma as afirmaes de Brumer (1993) em relao a regio Sul e vai mais alm
afirmando que parcela importante dos empreendimentos rurais familiares de
pequeno porte sofrem com a falta de sucessores que queiram continuar a atividade
dos pais.
Procurou-se por trabalhos similares que contemplassem a regio do Alto
Uruguai, onde se encontra localizado o municpio de Paulo Bento/RS, objeto deste
estudo, mas no obteve-se xito nesta tarefa. Certamente, estudos desta natureza,
ainda no contemplaram esta regio. Este fator, antes de ser um empecilho para a
realizao deste trabalho de pesquisa, tornou-se fator de estmulo.
Para a realizao da pesquisa de campo estratificou-se as propriedades
rurais do municpio em trs categorias: descapitalizadas1, em transio2 e
consolidadas3. Foi determinado o nmero da amostragem a ser utilizada e os
entrevistados, previamente agrupados e caracterizados, foram selecionados atravs
de sorteio. A pesquisa de campo foi realizada no ms de junho de 2007.
Assim, o objetivo geral deste estudo verificar a forma pela qual a sucesso
na agricultura familiar no municpio de Paulo Bento est ocorrendo, sua influencia e
impactos na economia e sociedade. A sociedade precisa conhecer os mecanismos
que afetam, de alguma forma, positiva ou negativamente, o processo de
desenvolvimento local. A economia local, da mesma forma, est intimamente ligada
1 Quando a renda bruta anual inferior a dezesseis mil reais, a rea agricultvel disponvel pequena
e a viabilidade econmica do empreendimento comprometida. Geralmente so agricultores de poucos esclarecimentos, apresentam dificuldades relativas ao poder de anlise e discernimento e o nvel tecnolgico e de produtividade so deficientes (BLUM, 2001). 2 Quando a renda bruta anual superior a dezesseis mil reais e inferior a quarenta e cinco mil reais.
So pessoas de esclarecimentos, poder de anlise, discernimento e influencia comunitria de nvel mediano (BLUM, 2001). 3 Quando a renda bruta anual superior a quarenta e cinco mil reais. So agricultores que usam alta
tecnologia e apresentam demanda crescente por insumos e mquinas modernas. Geralmente so esclarecidos, com boa liderana nas comunidades e detentores de bom poder de anlise e discernimento (BLUM, 2001).
13
aos movimentos que se processam na sociedade e, por estes, so determinados
seus rumos, sendo desejvel que sejam favorveis no apenas aos ndices
econmicos e financeiros, mas, e, principalmente, aos ndices, muitas vezes, de
difcil mensurao, de crescimento e desenvolvimento social. Os objetivos
especficos consistem em conhecer a realidade das famlias rurais de acordo com a
renda e o tamanho das propriedades localizadas no municpio de Paulo Bento/RS;
identificar o interesse profissional dos jovens nascidos no meio rural e suas
correlaes, como conflitos entre geraes e relaes de gnero e, por ltimo,
propor aes de gesto pblica para facilitar o processo sucessrio. Durante o
estudo, foi dedicada ateno especial na identificao do interesse profissional dos
jovens descendentes de agricultores familiares, pois acredita-se que o fato de
nascerem no meio rural no determinante e condicionante para a sua continuidade
e, sim, a sua identificao e preferncia pelas atividades agropecurias. Dentro da
mesma linha de pensamento, as aes de gesto pblica propostas levam em
considerao a aptido profissional e o desejo de permanncia no meio rural, pois
como pas democrtico que, publicitariamente somos, seria desumano e
antidemocrtico condicionar o jovem a permanecer na propriedade rural, quando
esta no a sua opo pessoal.
O trabalho est dividido em captulos distintos: no primeiro capitulo apresenta-
se o estudo bibliogrfico que embasou o trabalho; no segundo apresenta-se a
metodologia da pesquisa; no terceiro captulo apresenta-se o resultado da pesquisa,
faz-se consideraes e ponderaes sobre o mesmo prope-se procedimentos de
gesto pblica consideradas pertinentes; o quarto captulo foi destinado as
consideraes finais do autor e, no quinto captulo apresentam-se as referencias
bibliogrficas consultadas no transcorrer do estudo. Ainda constam em apndice os
formulrios utilizados na pesquisa de campo.
14
2. REFERENCIAL TERICO
Este captulo destina-se a registrar, de maneira breve, as informaes
colhidas antes e durante o estudo, de autores diversos e que ajudaram a embasar a
pesquisa e as discusses dos resultados desta.
2.1 Agricultura familiar
Conceituar a agricultura familiar trabalho rduo, tendo em vista os diversos
entendimentos. Para Lamarche (1993) a agricultura familiar, ou agricultura enquanto
atividade familiar, a idia de uma identidade entre famlia e explorao. Na sua
avaliao corresponde a uma unidade de produo agrcola onde propriedade e
trabalho esto intimamente ligados a famlia. Relaciona ainda a interdependncia
dos fatores ligados a propriedade, trabalho e meios que propiciam noes abstratas
e complexas, como a transmisso do patrimnio e a reproduo da explorao. Para
Costabeber & Caporal (2003) a agricultura familiar , ao mesmo tempo, unidade de
produo, de consumo e de reproduo e, portanto, funciona mediante uma lgica
de produo combinada de valores de uso e de mercadorias, objetivando sua
reproduo. Evidenciam os autores que a lgica familiar diferente da lgica que
impulsiona a agricultura capitalista. A definio de Tedesco (2001) tambm
bastante abrangente: a famlia como proprietria dos meios de produo, o trabalho
na terra, modalidades de produo e manifestao de valores e tradies
(patrimnio sociocultural) em torno da e para a famlia. Ressalta ainda a
complexidade analtica, cujos processos envolvem as relaes de trabalho, o
sentido de agrupamento e sua multifuncionalidade em espaos de trabalhos
diferenciados.
15
Para Wanderley (2001) a conceituao de agricultura familiar assume ares de
novidade e renovao para designar conceitos j enraizados na sociedade brasileira
como o tradicional campons, agricultor de subsistncia e pequeno produtor rural e
incorpora conceitualmente os desafios da modernidade. Afirma a autora que a
agricultura familiar que se reproduz nas sociedades modernas deve adaptar-se a
um contexto socioeconmico prprio dessas sociedades, as quais obrigam a realizar
modificaes importantes em sua forma de produzir e em sua vida social
tradicionais. As transformaes a que se refere autora, no entanto, no produzem
uma ruptura total e definitiva com as formas anteriores e acrescenta ao agricultor
familiar moderno a capacidade de adaptar-se s novas exigncias da sociedade,
sem desvincular-se das tradies camponesas.
2.2 Formas de acesso a terra na agricultura familiar
Segundo Abramovay (2001) apenas nos ltimos anos o Brasil tem adotado
polticas pblicas, de interesse social e econmico, para a agricultura familiar,
estabelecendo mecanismos de acesso ao crdito e a terra. Este retardamento em
atender as necessidades das famlias do meio rural tem criado na grande maioria
dos jovens herdeiros de pequenas parcelas de terras, o desejo de abandonar a
atividade e buscar no meio urbano oportunidades mais promissoras de gerao de
renda. Da mesma forma, sendo o mercado de terras, um mercado imperfeito, cujo
valor venal est diretamente associado s possibilidades mecanicistas e
tecnolgicas, bem como aos resultados econmicos obtidos na produo
agropecuria, na grande maioria dos casos inviabiliza a expanso da agricultura
familiar, de modo geral fragilizada economicamente. Estes fatores tm levado a
conseqncias srias como o envelhecimento e a masculinizao celibatria da
mo-de-obra rural e deixadas parcelas importantes de pequenas propriedades sem
sucessores, segundo pesquisa realizada pelo autor no Oeste de Santa Catarina.
O acesso a terra no Brasil se d de formas diferenciadas de acordo com a
localizao geogrfica e com o componente cultural e formao tnica de suas
populaes. Estudos de Brumer (1993) apontam que na regio do Cariri (PB) 28 %
dos proprietrios rurais obtiveram suas terras por herana, enquanto que na regio
16
de Iju (RS) este percentual eleva-se a 70%. Por outro lado, na regio de Leme (SP)
praticamente inexistem casos de sucesso por herana, sendo as vendas de terras
uma constante, tendo em vista os incentivos do governo para a produo de lcool
combustvel e a conseqente expanso dos canaviais, geralmente pertencentes a
conglomerados agroindustriais de grande porte. Na opinio de Carneiro (2006), nas
questes relativas a herana patrimonial entre os agricultores familiares brasileiros
predominam as regras culturais sobre o regramento jurdico, quando modificam-se
as leis em favor dos interesses coletivos da famlia. Os cdigos costumeiros ou
usuais estabelecem o smbolo da unidade e da identidade familiar sobre o
patrimnio, que dever ser reproduzido no tempo atravs dos laos familiares e da
partilha desigual. Este regramento cultural no reconhece todos os filhos com
direitos iguais, selecionando um entre todos, normalmente homem, para dar
continuidade a manuteno do patrimnio familiar, cabendo aos irmos excludos da
partilha buscar sua sobrevivncia normalmente fora do meio agrcola. Como forma
de compensao aos excludos normalmente reduzido ao enxoval e alguns bens
para as moas que se casam com outro agricultor ou aos demais revertida em sua
manuteno na cidade enquanto estuda e se prepara para a insero no mercado
de trabalho urbano.
Quanto ao tamanho das propriedades familiares nas regies de Leme (SP) e
Iju (RS) predominam as propriedades com rea entre 20 e 50 hectares, enquanto
que no Cariri (PB) estas so menores, geralmente com menos de 20 hectares
(BRUMER, 1993). Segundo Costabeber & Caporal (2003) a agricultura familiar no
Rio Grande do Sul ocupa 32,90% da rea total das exploraes agropecurias e
representam 92,13% do nmero total de propriedades, ocupando 87,45% da mo-
de-obra agrcola.
Sendo esta obra uma discusso sobre os problemas sucessrios da
agricultura familiar em nvel de Brasil, aguou-se a curiosidade em conhecer esta
realidade em outras partes do mundo. No Canad, por exemplo, onde a mdia de
rea das propriedades bem superior as das regies coloniais brasileiras, a
transmisso da propriedade acontece, geralmente, de forma paulatina. So criadas
empresas familiares, aonde o pai vai vendendo aos filhos, partes do
empreendimento, em forma de aes. So propriedades com alto grau de
tecnificao e o tamanho mdio varia conforme a regio. Na regio do Baixo So
Loureno (Quebec), onde a produo leiteira predomina, cerca da metade das
17
propriedades tem, em mdia, 172 hectares, sendo consideradas pequenas as
propriedades com rea de 60 hectares. Na regio de Emerald a maioria das
propriedades rurais dedica-se a cultura cerealista extensiva e a rea mdia de 500
hectares, podendo contudo chegar a 2.500 hectares (STANEK, 1993).
Ocorre, muitas vezes, segundo Stanek (1993), que devido ao elevado ndice
de endividamento destas propriedades a transmisso de patrimnio do pai para os
filhos acelera ainda mais o processo de endividamento, pois os sucessores precisam
recorrer a financiamentos para poder adquirir a rea da famlia e que, segundo
Lamarche (1993), so constrangidos a comprar a explorao da gerao mais
velha.
Na Frana, as propriedades rurais so menores em extenso do que no
Canad e igualmente variam de acordo com a localizao geogrfica. Estudos de
Lamarche (1993) apontam que na regio da Bretanha as propriedades rurais tm
reas de superfcie entre 20 e 50 hectares e dedicam-se a um sistema de criao de
gado intensivo e especializado. Na regio de Marais variam entre 20 e 100 hectares
e a forma de explorao consiste em sistemas de policultura, de criao de gado e
grandes culturas. No Causse, as reas das propriedades so de 200 a 500 hectares
explorados em sistema de criao de gado ovino extensivo, podendo ser
encontradas algumas propriedades menores. A transmisso da posse das
propriedades pode acontecer, principalmente, de trs maneiras: a compra de terras
entre membros da famlia, a herana igualitria entre os descendentes ou a compra
por terceiros com vistas ampliao de rea das unidades de produo. A ordem
preferencial a apresentada.
Consta ainda que, apenas um quinto das propriedades rurais tem a garantia
de ter um sucessor e que dois teros esto em situao indefinida, no se sabendo
precisar de que forma ocorrer a sucesso. A quantidade de proprietrios de reas
rurais do sexo masculino solteiros e sem sucessores na descendncia
considervel, ou seja, cerca de 20%. Da mesma forma, identifica-se que a mo-de-
obra rural esta envelhecida e com perspectivas pouco provveis de haver sucesso
familiar nos negcios agrcolas, tendo em vista, a preferncia preponderante entre
os prprios agricultores de incitar seus filhos ao estudo e ao trabalho urbano
(LAMARCHE, 1993).
Na Polnia as reas das propriedades so sensivelmente menores que nos
outros pases, segundo estudos de Halamska (1993). Na regio de Drobin, 20,8%
18
das propriedades rurais tem rea inferior a 5 hectares, 50,2% tem uma superfcie de
explorao entre 5 e 10 hectares e 29% tem rea superior a 10 hectares. Na regio
de Steszew onde se encontram as maiores propriedades sendo que 44,1% tem
uma superfcie de explorao que conta com mais de 10 hectares, 16,5% tem uma
rea de 5 a 10 hectares e 39,4% tem rea inferior a 5 hectares. A concentrao de
propriedades menores se d na regio de Zator onde 93,4% das famlias possuem
reas inferiores a 5 hectares, 6% tem propriedades com rea entre 5 e 10 hectares
e, apenas, 0,6% contam com uma rea maior que 10 hectares. Quanto aos
sistemas de produo podem ser definidos como um sistema nico, onde se pratica
em todas as unidades de produo a policultura e a criao de animais.
O apego a terra pelos agricultores poloneses demonstrada atravs dos
nmeros. Em mais de 80% dos casos, os atuais proprietrios de exploraes
agrcolas as receberam por herana e apenas 3% dos agricultores venderam parte
da propriedade aps as ter herdado. Como so reas pequenas, para evitar a
disperso do patrimnio fundirio, a pratica corrente a poca da sucesso a
partilha desigual entre os descendentes, com a compra, pelo que assume a
explorao, das partes co-herdeiras (HALAMSKA, 1993).
Os agricultores poloneses tm boa formao profissional e esta condio
essencial para poder herdar a propriedade, segundo dados de Halamska (1993).
Geralmente, os jovens recebem qualificao para serem agricultores e aguardam a
oportunidade para tomar posse da explorao em trabalhos urbanos, formando uma
espcie de reserva a espera da oportunidade de assumir a propriedade rural. A
profisso de agricultor e o estatuto social da propriedade so uma tradio familiar.
A mobilidade social tambm muito baixa na Polnia. As famlias
camponesas moram h muitos anos no mesmo vilarejo. Identifica-se uma pequena
mobilidade atravs das geraes entre comunidades rurais compostas por vrias
aldeias ou dentro da mesma regio. Tambm inexistem problemas matrimoniais e
freqente encontrar mulheres frente das exploraes (Halamska, 1993).
Na Tunsia, a posse da terra tem carter de patrimnio e meio de prestigio
social mais solidificados do que como instrumento de produo. Estudos de Gana
(1993) apontam para um fraco dinamismo fundirio, onde as propriedades rurais so
transferidas quase que exclusivamente atravs de processos hereditrios. Por esta
razo a incerteza quanto sucesso bem fraca, representando apenas 5% dos
19
casos. No h apoio oficial para aquisio de terras, ou seja, inexistem formas de
financiamento ou qualquer outra forma de estimular o acesso a terra.
O porte das exploraes tambm bastante reduzido, sendo cerca de 88%
constitudas de propriedades com reas inferiores a 20 hectares. Mas, na regio de
Rs Djebel, o problema ainda mais critico apresentando 67% das propriedades
com rea inferior a 5 hectares. Nesta regio o sistema de cultivo predominante a
horticultura intensiva. Nas demais os sistemas predominantes so os das grandes
culturas associadas s criaes de gado extensivas, embora a horticultura semi-
intensiva esteja presente em 32% das exploraes (GANA, 1993).
2.3 A renda no-agrcola nas propriedades rurais familiares
A pluriatividade no Brasil, entendida como o exerccio de uma atividade
externa remunerada por algum membro da famlia que coabitam sobre o mesmo
teto, mais significativa na regio do Cariri (PB), onde 67% das unidades de
produo usam esta estratgia para a complementao da receita. Na regio de Iju
(RS) atividade igualmente importante, sendo praticada por 55% das famlias. J na
regio de Leme (SP) menos freqente e praticada por 22% das famlias de
agricultores (BRUMER, 1993). No Oeste de Santa Catarina a busca de renda fora
da propriedade praticada por 20% das famlias (ABROMOVAY, 2001). No
Assentamento Annoni (RS) 40% das famlias complementa a renda com trabalhos
remunerados realizados fora da propriedade (BAVARESCO, 2001). A pluriatividade
na maioria dos casos uma necessidade estrutural, ou seja, a renda obtida nesse
tipo de trabalho vem a ser indispensvel para a reproduo no s da famlia como
do prprio estabelecimento familiar (WANDERLEY, 2001). Contrariamente a esta
afirmao, Fialho (2000) afirma que a pluriatividade causa de desagregao da
agricultura familiar, porque os valores monetrios adquiridos sob forma de trabalho
no-agricola geralmente so destinados a melhoria da qualidade de vida, em
detrimento do aperfeioamento ou manuteno das atividades agrcolas do
estabelecimento. Segundo o autor, este procedimento leva ao processo de
sucateamento dos equipamentos e benfeitorias usadas na atividade agrcola e, por
conseqncia, a um crescente desinteresse pela incorporao de inovaes
20
tecnolgicas, causando a sada paulatina dos membros mais jovens da famlia e a
desarticulao da capacidade produtiva. Entretanto, avaliando a atividade pluriativa
sob o vis sob das condies sociais de gnero, Carneiro (2006) afirma que um
elemento importante para contribuir com a permanncia da mulher no meio rural e
para resolver crises de sucesso.
Se levarmos em considerao a situao dos agricultores familiares
franceses, veremos que as atividades pluriativas tambm naquele pas so uma
constante. Lamarche (1993) afirma que na Bretanha est consolidada, no Marais
encontrada de forma moderada e menor na regio do Causse. De qualquer forma,
a explorao agrcola no mais o lugar exclusivo do desenvolvimento das
atividades profissionais da famlia.
Entre os agricultores poloneses, a pluriatividade, atividade corrente. No
apenas os filhos que esto aguardando a posse da explorao moram na
propriedade e realizam atividades externas, mas tambm comum os chefes da
explorao e seus cnjuges possurem outra atividade. O mercado de emprego fora
da agricultura vasto e capaz de absorver toda a mo-de-obra excedente nas
exploraes agrcolas, segundo relatos de Halamska (1993).
A questo relacionada a pluriatividade para os agricultores tunisianos
praticamente no tem importncia, pois a grande maioria trabalha em turno integral
nas lides agrcolas. Ao mesmo tempo, estudos de Gana (1993), demonstram que
92% das exploraes declaram poder explorar uma rea maior da qual so
detentores, ficando evidenciado que h excedente de mo-de-obra. Diante desta
perspectiva o trabalho das mulheres nas atividades agrcolas tambm so
dispensadas e, estas participam mais ativamente nas produes animais.
2.4 As perspectivas dos jovens na agricultura familiar
Sob outro ngulo a pesquisa de Brumer (1993) avalia a possibilidade dos
filhos destas famlias continuarem nas atividades agrcolas e afirma que 54% dos
filhos homens na regio do Cariri (PB) so declarados como agricultores e apenas
18% das filhas mulheres. Na regio de Iju (RS) a agricultura ocupa a maior parte
dos filhos, sendo 54% dos filhos homens e 51% das filhas mulheres. Em Leme (SP)
21
a profisso de agricultor predomina entre os filhos homens, onde 72% continuaro
na atividade, em contrapartida, apenas 13% das filhas sero agricultoras. No Oeste
de Santa Catarina segundo Abramovay (2001) mais de dois teros dos filhos
homens desejam permanecer na agricultura e, em contrapartida, apenas 32% das
moas fazem esta opo. Da mesma forma, pesquisa realizada por Bavaresco
(2001) indica que no Assentamento Annoni no Rio Grande do Sul 64% dos filhos
homens permanecem na agricultura, enquanto que entre as mulheres este
percentual cai para 36%. Ainda informa o autor que a sada da propriedade dos pais
acontece com a mdia de idade de 21 anos.
No entanto, para Wanderley (2001) os agricultores brasileiros no se opem a
mobilidade espacial e, freqentemente, a migrao a soluo para resolver os
problemas fundirios das famlias, principalmente no sul do pas, entre os
descendentes masculinos.
Como se viu pelos dados apresentados mais freqente a busca pelo
trabalho no-agricola entre as mulheres jovens, fato atribudo por Weisheimer (2006)
pela diviso sexual do trabalho nas unidades de produo do tipo familiar, impondo
condies subalternas e de invisibilidade do trabalho feminino. Desta forma, elas
dificilmente tm possibilidades de acesso aos rendimentos financeiros advindos da
agricultura, nem vislumbram entre as suas possibilidades suceder aos pais na
gesto da unidade familiar e terem a propriedade da terra para o exerccio autnomo
da agricultura.
A questo educacional foi estudada por Abromovay (2001) no Oeste de Santa
Catarina e constatou que 74% dos filhos homens tem formao igual ou inferior a 8
srie do ensino fundamental e apenas 3% so formados como tcnicos agrcolas.
Para as filhas mulheres o nvel mais freqente de escolaridade encontrado foi o da
formao com o segundo grau com um ndice de 56%. Perguntados sobre o nvel
mnimo de instruo que consideram ideal para desenvolver bem a profisso de
agricultor apenas 9% consideraram a formao em tcnicas agrcolas como a ideal e
57% consideram que ter formao igual ou inferior a 8 srie do ensino fundamental
o suficiente. Por outro lado, o 1 Censo da Reforma Agrria, realizado pelo
INCRA/UNB, indica que entre os beneficirios o nvel de analfabetismo ou semi-
analfabetismo (aqueles que no concluram a 1a srie) de 11,1% no Rio Grande
do Sul e 42,6% no Brasil e que 78,8% possui escolaridade igual ou inferior a 8 srie
(RS), sendo que a nvel nacional este ndice cai para 49,6%. Ainda, o referido censo,
22
informa que apenas 3,8% dos beneficirios gachos possuem instruo superior ao
ensino fundamental e que a nvel nacional este ndice de 2,7% (BAVARESCO,
2001).
2.5 Gesto das propriedades rurais familiares
Blum (2001) afirma que o gerenciamento das unidades familiares de produo
deixa a desejar por ser espontneo e realizado com muita superficialidade. Este fato
ocasionado pela escassez e pobreza da terra, pela mo-de-obra de baixa
qualificao e pela conseqente descapitalizao dos agricultores que exploram
propriedades em regime de economia familiar. Como conseqncias so apontadas
as formas precrias de comercializao, baixa escala de produo, falta de
agregamento de valor a produo, diversificao excessiva, tecnologias
incompatveis, pouca disponibilidade de formao e informao, relaes de troca
desfavorveis e a inexistncia de poltica agrcola. Outra conseqncia apontada
pelo autor o associativismo, que muito pouco utilizado e quando o faz-se mau
uso desta prtica. Para Pinheiro (2001) as associaes de agricultores podem ser
um tipo de organizao ideal, quando combinam entre si participao democrtica
de todos os membros e capacidade de presso na busca por benefcios para o
grupo. No entanto, alerta que so alvos de prticas clientelistas de outras
organizaes como sindicatos, prefeituras, igrejas e at de polticos locais.
Uma das formas para buscar a equidade ou igualdade, dentre as maneiras
exgenas a de injetar no sistema rural financiamentos e subsdios, obedecendo
princpios participativos, sem distino, cooperativo, democrtico, de viso
sistmica e com superviso, orientao e treinamentos educativos informais. Outra
maneira de buscar o desenvolvimento das famlias e comunidades rurais e que
requer seja feita a mdio e longo prazo, a disponibilizao de ensino fundamental
e mdio e dar-se condies efetivas para que possam ser usufrudos pela populao
rural (BLUM, 2001). Tremea (2001) elenca um terceiro fator de desenvolvimento da
agricultura familiar : a agregao de valor sobre a produo, atravs da implantao
do processo de agroindustrializao, criando uma nova organizao social no
23
campo, de parceria associativa entre os produtores e seus familiares, de gerao de
emprego e renda....
Os problemas relacionados com a capacidade empresarial dos agricultores
familiares apontados por Blum (2001) so os seguintes: falta de administrao,
gerenciamento e viso empresarial; falta de anlise de custos, margens brutas,
lucratividade e anlise de investimentos; falta de associativismo e de viso
sistmica; desconhecimento das melhores formas de comercializao e agregao
de valor; uso de tecnologias inapropriadas para o tamanho do estabelecimento.
Estes problemas, para o autor, tm origem na assistncia tcnica, que os produtores
no recebem ou se a recebem no est preparada para atuar desta forma. Afinal,
fazendo-se a anlise econmica nas propriedades rurais, conhece-se a propriedade
como um todo e sistematicamente; determinam-se os pontos de estrangulamento, o
fluxo de caixa, os riscos e flexibilidades da propriedade,...e os objetivos do
agricultor. Este pensamento compartilhado por Lima et. al. (2001) ao afirmar que
diante da complexidade da agricultura moderna no pode mais se admitir que o
agricultor administre sozinho sua unidade de produo. H a necessidade, segundo
o autor, de a assistncia tcnica incorporar a assistncia gerencial, levando ao
agricultor uma viso empresarial da agricultura, para torn-los mais eficientes e
competitivos. E continua, ao afirmar que uma slida formao econmica e
gerencial condio bsica para a prtica de uma agricultura que a cada dia torna-
se mais complexa e em constante transformao.
Lacki (1995) apud Blum (2001) afirma que
necessrio introduzir inovaes tecnolgicas, gerenciais e organizacionais e, alm disso faze-lo em todos os elos da cadeia agroalimentar; isto no acesso aos insumos, na produo, na administrao da propriedade, na transformao dos produtos e na comercializao dos excedentes. (TEDESCO, 2001, p.74)
A temtica do gerenciamento ambiental nas unidades familiares de produo
levantada por Campos (2001) ao afirmar que necessrio buscar novas
metodologias de planejamento ambiental que atenuem os impactos dos processos
produtivos depredatrios do meio ambiente. Na avaliao do autor quanto menor e
mais fragilizadas economicamente forem as propriedades rurais maior ser a
24
presso sobre as terras marginais, definidas como ecologicamente sensveis que,
embora no sejam imprprias para o cultivo, so altamente suscetveis a
deteriorao ecolgica.
25
3. METODOLOGIA
Visando dar forma e contedo ao tema proposto e com a finalidade de obter
resposta aos objetivos especificados decidiu-se por fazer uma pesquisa de campo
no municpio de Paulo Bento/RS, por ser a localidade de maior facilidade de contato
deste autor com o publico alvo do estudo.
Inicialmente consultou-se o cadastro das famlias beneficirias do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PRONAF, onde se constatou
que 407 famlias esto inscritas no mesmo, acessando crditos e benefcios (MDA,
2005)4. Consultou-se ainda a agencia do SICREDI5 na cidade para obter-se a
informao do nmero de famlias tomadoras de financiamentos agropecurios e
que no esto cadastradas no PRONAF. Obteve-se a informao de que so 20
famlias.
De posse destas informaes, estratificou-se previamente as famlias em trs
categoriais a saber: consolidados, em transio e descapitalizados6. Levou-se em
considerao as argumentaes de Abramovay (2001), Blum (2001) e Garcia Filho
(1999), em contraponto ao declarado pelos prprios agricultores nos seus dados
cadastrais que geram os diversos enquadramentos nas linhas de crdito
disponveis7. H de se salientar que, devido seca ocorrida em 2004/2005, mesmo
4 Esta pgina de consulta na internet atualizada periodicamente pela Secretaria da Agricultura
Familiar SAF, rgo vinculado ao MDA. 5 O municpio conta com esta nica agencia bancria, no entanto, comum, pela proximidade, os
agricultores financiarem seus empreendimentos agropecurios em outros bancos nas cidades vizinhas de Erechim, Baro de Cotegipe, Jacutinga e Campinas do Sul. Mas, a parcela no abrigada sob o manto do PRONAF bastante fiel ao sistema cooperativo do SICREDI e, mantm, ao menos, um empreendimento vinculado a esta organizao pois, isto gera credibilidade na comunidade e respalda pleitos de ordem social e poltica. 6 Ver pginas 12 e 26 deste estudo. 7 No se acessou diretamente os dados cadastrais de cada agricultor e, sim, o resultado final destas
informaes que geram o posterior enquadramento.
26
aqueles agricultores que no costumam contrair financiamentos cadastraram-se no
PRONAF para poder acessar o programa denominado Bolsa Estiagem 20058
(MDA, 2005) fazendo com que todos os agricultores do municpio possuam um
cadastro oficial e esto devidamente registrados. Este fator gerou a confiana de
que o universo a ser pesquisado abrange a totalidade dos empreendimentos
agropecurios do municpio. Enfim, dos 427 estabelecimentos agropecurios sob
regime de economia familiar identificados chegou-se a concluso de que 10%
pertencem a categoria dos agricultores consolidados, 34% esto em processo de
transio e 56% esto descapitalizados.
Elaborou-se ento dois questionrios especficos para a realizao de
entrevista padronizada, com questes de mltipla escolha, que permitiu a opo por
uma ou mais alternativas, possibilitando captar as opinies divergentes entre o casal
ou a dualidade da opinio. A base do questionrio foi inspirada em Abramovay
(2001) e adaptada aos objetivos do estudo e a realidade do municpio. O primeiro
(Apndice A) foi aplicado aos proprietrios do empreendimento ou, como chamados
neste estudo, de pais. O segundo (Apndice B) foi aplicado aos filhos dos
proprietrios, rapazes ou moas, quando ainda residentes com os pais e solteiros. O
universo a ser pesquisado constitudo de 427 famlias foi estratificado e distribudo
em trs subgrupos. Dentro dos subgrupos a amostragem foi aleatria decidida em
sorteio prvio do qual participaram as famlias com filhos cuja idade, de pelo menos
um deles, estivesse na faixa de 13 a 30 anos, na condio de solteiro, vivendo ou
no na unidade de produo. A estratificao foi realizada da seguinte forma.
1. Agricultores consolidados considerou-se todos aqueles inscritos no
PRONAF, Grupo E, cuja renda bruta anual superior a quarenta e cinco mil reais e
os demais que no se enquadram nesta faixa por ter renda bruta anual superior a
oitenta mil reais (MDA, 2005). Neste sistema de produo os produtores usam alta
tecnologia. H uma demanda crescente por insumos9 e mquinas modernas, so
esclarecidos, com boa liderana nas comunidades, bom poder de anlise e
discernimento (BLUM, 2001). Foram identificadas 41 famlias e a amostragem
constitui-se de 2 famlias.
8 Auxlio emergencial financeiro para minimizar os prejuzos da seca ocorrida em 2004/2005,
disponibilizado pelo Governo Federal. 9 Fertilizantes, corretivos, sementes certificadas, inseticidas, fungicidas, herbicidas, raes
balanceadas, medicamentos, etc.
27
2. Agricultores em transio considerou-se todos os inscritos no PRONAF,
Grupo D, tendo renda bruta anual superior a dezesseis mil reais e inferior a quarenta
e cinco mil reais (MDA, 2005). Estes produtores usam tecnologias medianas, tendo
mquinas com maior tempo de uso10. A demanda por insumos menor que no
grupo anterior, so pessoas com menor esclarecimento que o grupo anterior e, em
conseqncia, a liderana nas comunidades mediana. Da mesma forma, o poder
de analise e discernimento tambm so medianos (BLUM, 2001). Nestas condies
foram identificadas 145 famlias e a amostragem constitui-se de 6 famlias.
3. Agricultores descapitalizados - considerou-se todos os inscritos no
PRONAF, Grupos A, B, C e A/C, cuja renda bruta anual inferior a dezesseis mil
reais (MDA, 2005). Este grupo de produtores trabalha em pequenas reas e a
viabilidade econmica do empreendimento comprometida, dificultando o acesso ao
crdito. So agricultores de poucos esclarecimentos e apresentam muitas
dificuldades relativas ao poder de anlise e discernimento e, portanto, o nvel
tecnolgico e de produtividade so deficientes (BLUM, 2001). Foram identificadas
241 famlias pertencentes a este grupo e a amostragem constitui-se em 9 famlias.
As entrevistas foram realizadas no perodo de 11 a 21 de junho de 2007.
O passo seguinte consistiu em tabular as informaes colhidas e fazer-se
anlise das mesmas conforme est descrito no capitulo seguinte.
10 Este grupo de produtores geralmente adquire mquinas e equipamentos usados, descartados pelos
agricultores consolidados por sua obsolencia.
28
4. RESULTADOS E DISCUSSO
4.1 Caracterizao das famlias participantes da pesquisa
Participaram da pesquisa 17 famlias das diversas localidades que compe o
municpio de Paulo Bento sendo que, destas, 9 so classificadas como
descapitalizadas, 6 em processo de transio e 2 consolidadas, todas
representativas em sua respectiva classificao. Percebeu-se que, entre os
agricultores descapitalizados a idade mdia dos proprietrios sensivelmente maior
que naquelas consideradas em transio ou consolidadas, conforme demonstrado
na tabela 1.
Tabela 1 Caracterizao das famlias de agricultores de Paulo Bento/RS quanto idade dos proprietrios, nmero e sexo dos filhos, em junho de 2007.
Classificao das famlias
Idade mdia dos pais (anos)
Idade mdia das
mes(anos)
Numero de filhos por
casal
Percentual de filhos homens
Percentual de filhas mulheres
Descapitalizadas
54,1 52,1 2,4 54,5 45,5
Em transio
51,5 47,3 2,0 66,7 33,3
Consolidadas 47,5 44,0 2,5 60,0 40,0 FONTE: Pesquisa de campo.
Informao importante contida nesta tabela o indicativo que a idade da
mulher em relao ao homem no casamento, na mdia, sempre inferior em todos
as faixas de classificao. Mesmo assim temerrio afirmar que isto seja uma
norma rgida e convencional, pois excees foram detectadas na pesquisa de
campo, embora no traduzam em nmeros como possvel tendncia de reverso.
29
Quanto ao nmero de filhos por casal a mdia muito semelhante nas famlias
consolidadas e descapitalizadas, ou seja, 2,5 e 2,4 respectivamente, apresentando
uma leve tendncia declinante nas famlias em processo de transio. A pesquisa
demonstrou que estas famlias (em transio) mostram-se mais preocupadas na
manuteno de uma faixa patrimonial mnima a ser transferida para os filhos.
Outro fator importante a ser destacado, ainda reportando-se a tabela 1 o
fato de os nascimentos masculinos superarem numrica e expressivamente os
nascimentos femininos, o que aliado conhecida tendncia das filhas mulheres
abandonarem as unidades de produo com maior freqncia que os homens, como
ser visto mais detalhadamente no decorrer do presente estudo, deixa o meio rural
do municpio de Paulo Bento bastante masculinizado. E a dvida que ocorre, neste
momento, a de saber se algumas retornaro ao meio rural atravs do casamento
ou se existem mulheres urbanas dispostas a enfrentar as agruras da roa. Diante
das circunstancias, pode-se conjecturar que ser mais fcil a elas atrarem os
homens para as cidades ou estabelecer-se a masculinizao celibatria nas
unidades de produo, conforme preconiza Abramovay (2001). Neste sentido, a
tabela 2 nos fornece elementos surpreendentes. A mdia de idade das filhas
mulheres nas propriedades consideradas em transio e consolidadas inferior a
idade a qual so consideradas aptas ao trabalho, ou seja, 14 anos. Da constatao
deste fato possvel formar raciocnio de que as mesmas saem em idade tenra da
propriedade para estudar e galgar sua posio social nos meios urbanos. Por outro
lado se, h uma idade mdia superior entre as filhas dos agricultores
descapitalizados, isto se deve ao fato de que, algumas ainda, aceitam o casamento
com um homem agricultor. Neste caso, em particular, a pesquisa apontou que 20%
das filhas de agricultores descapitalizados encontram-se casadas e permanecem no
meio rural.
dedutvel atravs desta tabela que a permanncia das moas no meio rural
superior nas famlias em processo de transio e naquelas que esto
consolidadas. No entanto, deve ressaltar-se que a metodologia da pesquisa,
antepe a condio da existncia de ao menos um possvel herdeiro na faixa etria
dos 13 aos 30 anos, solteiro, no importando o sexo, desta forma, limitando o
universo a ser pesquisado, o que levou a pesquisa de campo a estes dados,
levando-se em considerao que o enfoque do estudo no tinha este objetivo
especfico.
30
Tabela 2 Idade mdia, ndice de solteiros e de permanncia no meio rural dos jovens filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Agricultores descapitalizados
Agricultores em transio
Agricultores consolidados
Rapazes Moas Rapazes Moas Rapazes Moas Idade mdia (em anos de idade)
23,1
21,5
25,6
13,5
17,7
11,0
ndice de solteiros (%)
91,7
80,0
62,5
100,0
100,0
100,0
Permanecentes no meio rural (%)
78,6
60,0
87,5
75,0
100,0
100,0
FONTE: Pesquisa de campo.
Mas, em uma anlise mais aprofundada, percebe-se que a idade mdia
destas muito baixa e, pelos indicativos, tanto bibliogrficos, quanto de vivncia,
levam a crer que to logo se passem alguns poucos anos, considerados vitais na
formao de carter e retido, cuja valorizao as famlias consideram importantes,
seguiro os rumos da urbanizao. Por estes resultados, pretende-se que, num
futuro prximo, a pesquisa seja aprofundada com uma amostragem mais
representativa e delineada especificamente para estudar este fenmeno.
A pesquisa tambm avaliou o grau de escolaridade dos filhos dos agricultores
alvos da pesquisa podendo-se verificar, conforme a tabela 3, que tambm neste
detalhe h preferncia em dar-se melhor nvel escolar as filhas, principalmente entre
as famlias descapitalizadas e em transio. O fato se deve a condio de os pais
vislumbrarem para as mesmas o futuro no mundo urbanizado, onde as exigncias
educacionais formais, acreditam, sejam maiores que no meio rural.
Tabela 3 Nvel de escolaridade dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Agricultores descapitalizados
Agricultores em transio
Agricultores consolidados
Rapazes Moas Rapazes Moas Rapazes Moas At 4a Srie (Ensino Fundamental) - %
25,0
10,0
50,0
25,0
-
-
5a a 8a Srie (Ensino Fundamental) - %
58,3
60,0
12,5
25,0
66,7
100,0
Segundo Grau - %
16,7 30,0 25,0 50,0 - -
Nvel universitrio - % - - 12,5 - 33,3 - (-) No foram identificadas, na amostragem, pessoas com este nvel de escolaridade. FONTE: Pesquisa de campo.
31
Por outro lado, ao analisar-se a faixa etria dos rapazes (17 a 25 anos) que
permanecem com as famlias no meio rural (tabela 2) percebe-se que maior do
que a idade mdia das moas (11 a 21 anos). Da mesma forma, a taxa de
permanncia tambm superior (variando de 78 a 100% entre os rapazes e 60 a
100% entre as moas). Pelas informaes da tabela 3 percebe-se que a
escolaridade menor, especialmente entre as famlias descapitalizadas e em
transio. Levou-se, ento, em considerao as informaes da tabela 4 por onde
pode verificar-se que a exportao de mo-de-obra para as cidades ocorre com
maior freqncia nas famlias consideradas descapitalizadas.
Tabela 4 Ocupao da mo-de-obra dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Agricultores descapitalizados
Agricultores em transio
Agricultores consolidados
Rapazes Moas Rapazes Moas Rapazes Moas Trabalho agrcola na unidade de produo (%)
41,7
30,0
37.5
50,0
66,7
50,0
Pluriativos (%)
28,6 - 37,5 - - -
Empregados agrcolas (%)
-
10,0
-
-
-
-
Trabalho urbano (%)
33,3
40,0
12,5
25,0
-
-
Sem idade para o trabalho (%)
8,3
20,0
12,5
25,0
33,3
50,0
(-) No foram identificadas, na amostragem, pessoas exercendo estas atividades. FONTE: Pesquisa de campo
Considerou-se como trabalho agrcola na unidade de produo o trabalho
daqueles jovens agricultores que permanecem trabalhando exclusivamente na
unidade de produo familiar. Os pluriativos so aqueles que, alm de desenvolver
estas atividades, tambm possuem um servio externo a propriedade, geralmente na
indstria, comrcio ou servio pblico, funes tipicamente urbanas, mas realizadas
por estes jovens que permanecem morando na rea rural com seus pais. Os
empregados agrcolas so aqueles que prestam servios a outras unidades de
produo na rea agrcola, mas desvincularam-se da propriedade paterna. Como
trabalho urbano consideraram-se todos aqueles jovens que deixaram as unidades
32
de produo familiar para fixar residncia e gerar sua reproduo econmica e social
atravs do trabalho nas cidades. E, finalmente, considerou-se sem idade para o
trabalho as crianas e adolescentes com idade inferior a 14 anos.
Para saber-se qual a influncia dos pais em relao a permanncia dos
jovens no meio agrcola perguntou-se aos mesmos se eles, pais, estimulavam seus
filhos a serem agricultores, cujos resultados so apresentados na tabela 5.
Tabela 5 Respostas dos agricultores de Paulo Bento/RS, a questo: Voc estimula seus filhos a serem agricultores:?, em junho de 2007.
Agricultores descapitalizados
Agricultores em transio
Agricultores consolidados
Estimula todos os filhos a serem agricultores (%)
22,2
-
100,0
Estimula s um filho a ser a agricultor (%)
44,5
33,4
-
Desestimula os filhos a serem agricultores (%)
33,3
33,3
-
No influencia (%) - 33,3 - (-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
Percebe-se pelas respostas que entre os agricultores descapitalizados e os
que se encontram em transio, o maior percentual est com os que estimulam
apenas um filho a ser agricultor (33 a 44%) e um tero em cada uma das
classificaes desestimula todos os filhos a serem agricultores. Se levarmos em
considerao que o ndice de filhos por casal de 2,4 nos agricultores
descapitalizados e 2 nos agricultores em transio (Tabela 1) e que, em nmeros
absolutos so 241 e 145 famlias respectivamente, pode-se estimar que
aproximadamente 500 filhos de agricultores esto recebendo estmulo dos pais para
abandonarem a atividade. Ainda, pelas informaes fornecidas pela tabela 5, deduz-
se que uma parcela pequena dos agricultores descapitalizados (22,2%) estimula
todos os filhos a serem agricultores, enquanto que entre os agricultores
consolidados o desejo que todos permaneam na unidade de produo, mesmo
tendo maior ndice de escolaridade (Tabela 3).
As temticas at aqui relatadas tambm foram abordadas com os jovens,
para verificar-se a percepo que os mesmos tem sobre este foco da abordagem. A
33
tabela 6 reflete as informaes sobre a idade mdia e nvel de escolaridade dos
entrevistados.
Tabela 6 Mdia de idade e nvel de escolaridade dos filhos de agricultores entrevistados na pesquisa de campo em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Jovens oriundos das famlias
descapitalizadas
Jovens oriundos das famlias em
transio
Jovens oriundos das famlias consolidadas
Idade mdia em anos
20,5 21,5 20,5
At 4a Srie Ensino Fundamental (%)
22,2
16,7
-
5a a 8a Srie Ensino Fundamental (%)
55,6
16,7
50,0
Segundo Grau (%)
22,2 66,6
Nvel Universitrio (%) - - 50,0 (-) No foram identificadas, na amostragem, pessoas com este nvel de escolaridade. FONTE: Pesquisa de campo.
Tendo-se presente que a metodologia da pesquisa previu a entrevista de
filhos de agricultores com idade superior a treze anos e inferior a trinta, a idade
mdia dos entrevistados no poderia ser muito diferente da que est apresentada na
tabela 6. Da mesma forma, o nvel de escolaridade pretende reproduzir as
declaraes dos pais com relao a este aspecto. Devidamente qualificados os
entrevistados, procurou-se obter informaes referentes s aspiraes e a viso de
futuro deste pblico. As perguntas bsicas buscaram reproduzir as indagaes de
Abramovay (2001) no Oeste Catarinense. Em relao ao futuro desejvel e o futuro
provvel, segundo a viso dos entrevistados, os resultados so apresentados na
tabela 7. Para obter-se este resultado os entrevistados responderam a duas
perguntas bsicas: Qual o futuro que voc deseja? e, Qual o seu provvel futuro
profissional?.
Esta tabela reflete, sem sombra de dvida, que os jovens do meio rural esto
sendo empurrados para a urbanizao por conta de discursos sensacionalistas de
que ningum mais quer ficar na agricultura. A reflexo que o momento nos impe
se, como visto na tabela 7, os jovens desejam ser agricultores, proprietrios de
unidades produtivas, por que vislumbram um provvel futuro longe das lides
agropecurias as quais esto acostumados e preparados?
34
Tabela 7 Representao do futuro desejvel e provvel dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Jovens oriundos das famlias
descapitalizadas
Jovens oriundos das famlias em
transio
Jovens oriundos das famlias consolidadas
Desejvel Provvel Desejvel Provvel Desejvel Provvel
Permanecer na agricultura como proprietrios (%)
44,5
33,3
66,6
33,4
100,0
100,0
Morar no meio rural com atividades agrcolas e no-agrcolas (%)
22,2
11,1
16,7
33,3
-
-
Morar e trabalhar na cidade (%)
33,3
55,6
16,7
33,3
-
-
(-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
Vimos anteriormente (Tabela 5) que os pais, quer por conta da sua falta de
preparo, quer por conta das dificuldades impostas ao meio produtivo agropecurio,
vislumbram e impe, de certa forma at autoritariamente, que os filhos busquem no
meio urbano aquilo que eles, como profissionais, no conseguiram no meio rural.
Mal se do contas de que a competitividade urbana a cada limiar de novo dia impe
condies mais restritivas a quem, teve educao formal fragilizada e que, por
ordem de necessidades pessoais, precisa trabalhar para prover o seu sustento, em
detrimento da especializao profissional.
Com a finalidade de aprofundar-se a questo fez-se outra pergunta aos
jovens pesquisados, solicitando-se a opinio dos mesmos sobre a viso de futuro
como provveis agricultores, sucessores de seus pais na atividade. Os resultados
so apresentados na tabela 8.
Os resultados apresentados por esta tabela mostram dois fatores potenciais a
serem analisados: conforme a renda da unidade de produo vai subindo h maior
interesse em permanecer na mesma e, que a viso de dificuldades esto presentes
de forma marcante entre os jovens oriundos das famlias descapitalizadas e em
transio. Atribui-se o primeiro fato a melhor infraestrura produtiva e reas de terra
explorveis maiores, o que pode propiciar retorno financeiro imediato a quem a
explorar. O segundo fato, vem em contraponto ao primeiro, pois como so reas
pequenas e infraestrura fragilizada ou quando existente envelhecida e, muitas
35
vezes, sucateada faz com que a quem se dedicar a explora-las necessita de capital
externo para viabiliza-la e, desta forma, iniciar na atividade j com dvidas.
Tabela 8 Opinio dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, sobre o seu provvel destino, em junho de 2007.
Jovens oriundos das famlias
descapitalizadas
Jovens oriundos das famlias em
transio
Jovens oriundos das famlias consolidadas
Gostaria de ser e certo que ser agricultor (%)
11,1
28,6
100,0
Prefere outra profisso mas provavelmente ser agricultor (%)
11,1
-
-
Deseja ser agricultor, mas v dificuldades (%)
44,5
57,1
-
No quer ser agricultor (%) 33,3 14,3 - (-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo
Um terceiro ponto que chama a ateno e, de certa forma, surpreende o
fato de que se pode considerar baixo o ndice de rejeio pela agricultura,
confirmando as consideraes anteriores quando afirmou-se que os jovens saem do
meio agrcola mais por falta de condies e pelo estmulo familiar que recebem, do
que por interesse prprio.
Quando analisou-se o nvel de escolaridade (Tabela 3) foi evidenciado que a
maior parte dos jovens rurais de Paulo Bento/RS possui como teto educacional o
Ensino Fundamental, muitas vezes incompleto. Alguns estudam at o segundo grau,
principalmente entre as moas e, poucos, possuem ou ambicionam o nvel
universitrio. Dentro deste cenrio formulou-se outra questo: considerando o seu
grau de instruo, onde voc acha que tem as melhores oportunidades? As
respostas esto graficamente dispostas na tabela 9.
Baseando-se nestas respostas pode-se afirmar que o jovem rural tem
convico de que o grau de instruo uma adversidade para as atividades urbanas
e que, por esta razo, tambm, ter melhores oportunidades na agricultura. No
entanto, no tem o mesmo nvel de exigncia educacional para o gerenciamento e
trabalho nas unidades de produo agrcolas, pecurias ou mistas (agropecuria).
36
Tabela 9 Opinio dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, sobre as melhores oportunidades que podem ter, considerando seu grau de instruo, em junho de 2007.
Jovens oriundos das famlias
descapitalizadas
Jovens oriundos das famlias em
transio
Jovens oriundos das famlias consolidadas
No meio rural e na agricultura (%)
44,5
50,0
100,0
No meio rural com atividades agrcola e no agrcolas (%)
33,3
33,3
-
Na cidade, em atividades urbanas (%)
22,2
16,7
-
(-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo
Perguntou-se a estes jovens Na sua opinio, qual o nvel mnimo de
instruo para desempenhar a funo de agricultor?. As respostas obtidas so
apresentadas na tabela 10.
Tabela 10 Opinio dos filhos de agricultores em Paulo Bento/RS, sobre o nvel mnimo de instruo para desempenhar a profisso de agricultor, em junho de 2007.
Jovens oriundos das famlias
descapitalizadas
Jovens oriundos das famlias em
transio
Jovens oriundos das famlias consolidadas
Saber ler e escrever (%)
10,0 - 25,0
At 4a Srie do Ensino Fundamental (%)
30,0
28,6
-
Ensino Fundamental completo (%)
40,0
-
-
Segundo grau (%)
10,0 14,3 -
Curso tcnico agrcola (segundo grau) (%)
10,0
42,8
50,0
Graduao universitria - 14,3 25,0 (-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
Observa-se que entre os filhos de agricultores descapitalizadas 80%
acreditam que o Ensino Fundamental, mesmo que no seja completo, seja suficiente
para viabilizar um empreendimento rural. Os jovens oriundos das famlias em
transio e consolidadas j so mais exigentes em relao ao grau de escolaridade
37
e aparece com maior freqncia a citao do curso tcnico agrcola a nvel de
segundo grau como exigncia preferencial. Verifica-se ainda, dentro destes grupos,
tambm a citao da graduao universitria como forma de viabilizar a unidade de
produo agrcola. Surpreende a informao de que alguns ainda consideram a
exigncia de saber ler e escrever como suficiente para formar-se um agricultor.
Houve tambm, principalmente entre os jovens das famlias em transio (50%) e
das famlias descapitalizadas (33,3%), a afirmao de que a participao em cursos
de preparao de mo-de-obra rural e outros afins, que tratem de transferncia de
tecnologias e processos, so importantes para viabilizar um agricultor.
4.2 Pensando a sucesso na agricultura familiar em Paulo Bento
Como a sucesso hereditria nos empreendimentos agrcolas de Paulo
Bento/RS a razo principal deste trabalho, procurou-se saber dos agricultores e
seus filhos quem ficar na propriedade, de que forma e quando isto vai acontecer e
colher a percepo que fazem do prprio processo sucessrio. Perguntou-se a pais
e filhos com quem ficar a propriedade. As respostas obtidas so apresentadas na
tabela 11.
Observando-se a tabela 11, de imediato percebe-se que entre pais e filhos
no h sintonia nas respostas. O que para os pais est definido, para os filhos j no
bem assim. Para os pais cresce a certeza na sucesso medida que cresce o
rendimento da unidade de produo. Para os filhos a escala de valores crescentes
a mesma, s que em menor intensidade. Percebe-se entre as famlias
descapitalizadas que h mais filhos (44,5%) interessados na venda da propriedade,
enquanto que entre as famlias em transio e consolidadas esta possibilidade no
nem cogitada, chegando-se apenas a admissibilidade do arrendamento. O grau de
incertezas semelhante entre pais e filhos das famlias descapitalizadas,
considerando-se que no saber quem ficar na propriedade, ou se algum ficar e
que os filhos so muito jovens para fazer a escolha so respostas que no fornecem
firmeza na afirmao, sugerindo a duvida. Este mesmo grau de incerteza menor
entre os pais das famlias em transio e maior nos filhos. Nas famlias consolidadas
a incerteza inexiste para os pais, mas, quanto aos filhos, estes esto divididos.
38
Tabela 11 Opinio dos agricultores e seus filhos sobre quem ficar na propriedade rural atualmente explorada pela famlia em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Famlias descapitalizadas
Famlias em transio
Famlias consolidadas
Pais Filhos Pais Filhos Pais Filhos
J est definido (%)
44,5 22,2 66,6 33,2 100,0 50,0
Algum ficar mas no sabem quem (%)
-
11,1
-
16,7
-
-
No sabem se algum ficar na propriedade (%)
22,2
11,1
16,7
16,7
-
-
Ningum ficar e no sabem o que fazer com a propriedade (%)
-
11,1
16,7
-
-
-
A propriedade ser vendida (%)
22,2
44,5
-
-
-
-
A propriedade ser arrendada (%)
-
-
-
16,7
-
-
Os filhos so muito jovens para fazer a escolha (%)
11,1
-
-
16,7
-
50,0
(-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
O estudo tambm buscou saber o que pensam os agricultores, tanto os pais
quanto os filhos, sobre quem dever ser o sucessor hereditrio na unidade de
produo e identificar as preferncias. As respostas obtidas so apresentadas na
tabela 12.
Percebe-se pelas respostas apresentadas na tabela 12 que no h critrio
predominante em se tratando de sucesso hereditria do patrimnio dos pais na
agricultura familiar de Paulo Bento/RS. As opinies entre pais e filhos so muito
parecidas no evidenciando sinais de conflito, apenas aparecem sinais de pequenas
divergncias quanto interpretao. Tem atrado a ateno o fato de uma pequena
parcela dos filhos mencionar o gosto pela agricultura como um fator de deciso,
enquanto que para os pais no parece ser relevante esta preocupao.
39
Tabela 12 Opinio dos agricultores e seus filhos sobre quem ser o sucessor na unidade de produo agrcola explorada pela famlia em Paulo Bento/RS, em junho de 2007.
Famlias descapitalizadas
Famlias em transio
Famlias consolidadas
Pais Filhos Pais Filhos Pais Filhos
O mais velho (%)
22,2 11,1 14,3 12,5 50,0 -
O mais novo (%)
22,2 11,1 14,3 12,5 - -
Haver mais de um sucessor (%)
22,2
22,3
28,5
25,0
50,0
50,0
O que tem mais afinidade com os pais (%)
11,2
22,2
14,3
12,5
-
50,0
O que mais gosta de agricultura (%)
-
11,1
-
12,5
-
-
No h outro herdeiro (%)
22,2 22,2 14,3 12,5 - -
Ainda no foi escolhido (%)
-
-
14,3
-
-
-
(-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
Como mencionou-se no referencial terico a afirmao de Weisheimer (2006)
de que as filhas de agricultores no vislumbram entre as suas possibilidades
suceder aos pais na gesto da unidade familiar, o que sugere que h discriminao
em relao a gnero, perguntou-se aos pais e as filhas qual a possibilidade destas
serem as sucessoras. A questo no foi formulada para filhas de agricultores
consolidados porque no esto representadas na pesquisa. As respostas so
apresentadas na tabela 13.
Se ao analisar-se a questo anterior no foram encontrados sinais claros de
conflitos e tendncias, a tabela 13 traduz em nmeros a evidencia do quanto s
filhas mulheres podem ser discriminadas na hora da partilha de bens. Os pais das
famlias em transio e consolidadas no escondem a preferncia pelos filhos
homens. J nas famlias descapitalizadas o processo praticamente o mesmo, no
entanto camuflado. Ao afirmar-se que as filhas receberiam terra se esta fosse
suficiente para atender a demanda de todos os filhos, coloca-se a condio feminina
na condicionante e, ento, ter-se- a justificativa para o ato de privilegiar os filhos
homens. Resta as filhas mulheres o conformismo por uma situao j consolidada
40
ou a esperana de conflito entre pais com os filhos homens para que possam ter o
seu direito de igualdade resguardado.
Tabela 13 Opinio dos agricultores de Paulo Bento/RS e suas filhas sobre a possibilidade destas virem a herdar a propriedade rural, em junho de 2007.
Famlias descapitalizadas
Famlias em transio
Famlias consolidadas
Pais Filhas Pais Filhas Pais Filhas
Quando existe terra para todos os filhos (%)
37,5
-
-
50,0
-
-
Tem as mesmas chances que os homens (%)
12,5
-
-
-
-
-
Nenhuma filha ser sucessora (%)
25,0
50,0
-
-
-
-
Prefere os filhos (%)
25,0 - 100,0 - 100,0 -
Quando h conflitos entre os pais e os filhos (%)
-
50,0
-
50,0
-
-
(-) No houve respostas positivas, nestes casos. FONTE: Pesquisa de campo.
4.3 Proposies
Sabe-se que qualquer interveno pblica sobre os fatos anteriormente
citados torna-se extremamente delicada. Antes de tudo, precisa-se trabalhar em
questes que esto enraizadas na sociedade rural e so transmitidas de gerao a
gerao desde que se estabeleceu a agropecuria na regio trazida pelos primeiros
imigrantes. Diante deste fato as proposies que se fazem a seguir precisaro de
ampla anlise antes da implantao, serem executadas por profissionais qualificados
e preparados para o trabalho junto s unidades de produo agrcola de economia
familiar e, acima de tudo, desprendimento poltico, social e econmico para que as
aes possam realmente beneficiar a toda a sociedade. No teria sentido investir-se
recursos pblicos em projetos que tenham como fim uma parcela ou casta social,
sem que isto represente ganhos para a sociedade como um todo.
41
4.3.1 Trabalhando a gerao de renda e a adequada remunerao da mo-de-obra rural
No h possibilidade de qualquer que seja o projeto dar certo se as pessoas
as quais so determinadas como beneficirias principais (a sociedade deve ser o
beneficirio fim) no forem adequadamente remuneradas vendo-se pelo prisma
econmico. Sob outro ngulo de viso, o lado social, fundamental que se tenha a
concepo enquanto indivduo de crescimento e aprimoramento social e a
sensibilidade do coletivo seja positiva para com os atos e os fatos e a sensao de
sucesso e progresso percebida e compartilhada por todos. H de se ter presente
ainda, que no se constri uma sociedade nova sem que sua cultura seja
respeitada, as tradies preservadas, gerando no indivduo a sensao de respeito
por sua condio de ser humano e, portanto, ser social. Ainda, considerar o meio em
que vive o homem, preservando-o e adequando-o a nova realidade, sem que haja
necessidade de destruio da natureza, mas ao contrrio, incluindo a sua
preservao como aliada ao projeto, atrai o sentimento pblico de incentivo.
Ao considerar-se importantes as reflexes acima expostas e julgar-se
importante que sejam observadas, sugere-se como atenuante ao problema social,
onde verificou-se que as reas produtivas esto ficando cada vez menores, tendo
em vista, as sucessivas partilhas, que projetos visando a elevao de renda por rea
sejam implementados pela gesto pblica. Sabe-se que, muitas at aqui foram s
tentativas e quase todas foram fadadas ao insucesso. Por isso, fez-se as
consideraes iniciais e que devem estar presentes na concepo dos projetos.
A proposta no de projetos acabados e prontos para serem executados. Ao
contrrio, o que prope-se que sejam identificados nichos de mercado, onde
possa-se trabalhar a cadeia produtiva como um todo, desde a fase pr-porteira at a
entrega do produto final acabado. Para tanto a gesto pblica deve enfrentar o
desafio de aglutinar as foras em torno de suas diferentes esferas, apoiar-se na
assistncia tcnica e extenso rural e nas organizaes sociais dos agricultores,
promovendo um debate amplo e respeitoso de onde podero surgir as idias
prticas para a execuo e monitoramento dos projetos. Sabe-se que em pequenas
reas pode-se obter altos rendimentos quando cultivadas com culturas ou criaes
no tradicionais, mas de alto valor econmico no mercado. Por serem no
42
tradicionais imperativo que tenham adequada assistncia tcnica na produo.
Mas de nada adiantar a produo se a forma de chegar ao consumidor final no
estar garantida. Neste sentido, recomenda-se detalhada anlise mercadolgica de
viabilidade dos empreendimentos, o que demandar profissionais capacitados em
administrao e marketing com experincia e viso das particularidades da
agropecuria e das famlias dos agricultores, tendo em vista, que trata-se de forma
de produo e pblico diferenciados, cuja lgica de reproduo no encontra
precedentes na administrao comercial ou industrial, entendidos como tal, os
processos produtivos tipicamente urbanos da produo e comercializao de bens
de consumo.
Diante do exposto, recomenda-se ento, a criao de associaes de
agricultores, pequenas e enxutas, com a finalidade de produzir e comercializar
produtos especficos. No quer-se aqui discutir a forma de organizao, mas sugere-
se que estas associaes ou pequenas cooperativas sejam assessoradas e
orientadas no sentido de optar pela inovao, produzir com qualidade e respeito ao
consumidor e, na medida do possvel, promover o intercambio entre as duas partes,
respeitando-se as opinies de cada segmento, procurando-se a equivalncia. Da
mesma forma, a gesto publica deve prover inicialmente meios de administrao e
gesto dos empreendimentos de forma que o xito possa transformar-se com o
transcorrer do tempo em independncia do projeto e das famlias envolvidas.
4.3.2 Trabalhando a questo de gnero
Na forma de trabalho proposta anteriormente muito pode ser feito para
minimizar-se os efeitos tradicionais da cultura machista que impera na agricultura
familiar que, como viu-se nos resultados da pesquisa cria o filho homem para a
agricultura e a filha mulher para as atividades urbanas. Ao incorporar-se as rotinas
da unidade de produo uma atividade nova e rentvel deve-se prever a
participao da mulher em igualdade de condies com o homem, seja nas
atividades de produo, gesto ou comercializao, sem descuidar-se das
diferenas fisiolgicas que fazem de cada indivduo um ser diferente, mas com
habilidades particulares. Assim como em qualquer processo produtivo prev-se a
43
aptido para o exerccio da tarefa, nas questes relativas a produo agropecuria,
o mesmo principio deve ser aplicado. Desta forma, dentro de uma famlia de
agricultores, encontram-se pessoas com habilidades diferenciadas e a quem couber
a tarefa de propor a introduo de uma atividade no tradicional deve ser capaz de
identificar o potencial e as habilidades pessoais.
A forma de valorizao do trabalho feminino nas unidades de produo
atribuir-se a ele valores que possam ser percebidos como importantes inclusive para
a reproduo econmica da famlia. Desta forma, propor trabalhos femininos que
liberem o lado artstico das pessoas como o artesanato e as prendas domsticas
devem ser apenas complementares e no a finalidade como costumeiramente se
faz. A incluso do trabalho feminino produtivo e a diviso das tarefas domsticas
entre homens e mulheres no eram considerados importantes at pouco tempo
atrs, inclusive nas cidades, onde hoje ganha espao e passa a ser considerado
forma imperiosa de desenvolvimento familiar. Por esta razo recomenda-se que
este debate tambm seja realizado com as famlias de agricultores, no como forma
da causa feminista, mas de sobrevivncia e aglutinao dos empreendimentos
agrcolas e familiares.
V-se, neste sentido, um potencial inexplorado e de possibilidades de xito no
municpio de Paulo Bento/RS, a cerca do desenvolvimento do turismo rural. Tendo
localizao regional privilegiada, cultura diversificada e a agricultura familiar
passando por crises econmicas e existenciais, o momento propcio a propostas
de largo alcance social. E, esta uma das atividades, onde a condio feminina
encontra valorizao plena e ganha importncia e reconhecimento social.
4.3.3 Trabalhando a questo educacional
Percebeu-se no desenrolar do presente estudo que a educao para os
agricultores familiares do municpio de Paulo Bento percebida em dois momentos
distintos: em menor grau para quem optar por ser agricultor e mais esmerada para
os que optarem pelos trabalhos urbanos. Embora encontre-se jovens com o
segundo grau completo e at, alguns cursando graduao universitria, nas
propriedades e dispostos a continuarem l, principalmente nos grupos das famlias
44
em transio e consolidadas, o normal para quem permanece na agricultura cursar
o ensino fundamental, habitualmente abandonado antes da concluso do mesmo.
Ao reportar-se ao nvel educacional de outros pases chama a ateno o fato
de que, segundo Halamska (1993), entre os agricultores poloneses, sabendo-se que
ficar apenas um herdeiro na propriedade paterna devido s reas das propriedades
serem muito pequenas, a necessidade imposta pelos pais e pela tradio agrcola
local de estudarem agricultura como elemento essencial de deciso na
hereditariedade da terra. Desta forma, escolhido o sucessor aquele que, melhor
tem se preparado para o exerccio da profisso de agricultor.
Neste sentido, este estudo prope a gesto pblica da agricultura familiar de
Paulo Bento/RS maiores cuidados com a educao daqueles filhos de agricultores
que querem permanecer na agricultura e sero os sucessores de seus pais nas
atividades agropecurias. Propem-se ento, maiores esforos do poder pblico
para que todos os filhos de agricultores concluam o ensino fundamental
obrigatoriamente e, no currculo, incluam-se disciplinas destinadas no s a tcnicas
agropecurias de produo, mas e, principalmente de gesto de propriedades,
mesmo que para isso, tenha-se que usar turno inverso ao do currculo programtico
formal.
Entretanto, considerando-se que grande parte dos atuais possveis
sucessores na agricultura familiar j esto fora da idade escolar, prope-se ainda, a
transformao do Centro Ambiental da Linha Quatro em Escola de Agricultores que
num primeiro momento dever atuar na educao informal dos jovens e agricultores,
promovendo cursos prticos nas reas sugeridas acima, sendo de fundamental
importncia que promova-se ao menos um curso, com durao mnima de um ano,
com aulas presenciais concentradas em um nico dia do ms, tendo como tema as
prticas de gesto de propriedades que, como demonstrou a pesquisa, so
totalmente ignoradas entre os agricultores descapitalizados, pouco conhecidas e
quando aplicadas nos outros dois grupos, totalmente inadequadas, muitas vezes
seguindo padres gerenciais e contbeis criados para as atividades tipicamente
urbanas, onde no leva-se em considerao a gesto de riscos inerentes as
peculiaridades da agricultura e da pecuria e, muito menos, do carter familiar da
produo.
Por outro lado, v-se como possibilidade real, buscar-se no ensino formal
uma oportunidade de formar gestores de propriedades rurais, aproveitando-se o
45
mesmo espao. Prope-se, ento, que num prazo um pouco mais longo, transforme-
se o local em uma escola tcnica de segundo grau, em cujo currculo estejam
previstas, alm dos contedos programticos oficiais, disciplinas voltadas gesto e
produo nas unidades agrcolas de produo de economia familiar. Acredita-se,
que para este fim, pela localizao do Centro Ambiental da Linha Quatro, possa
haver parcerias entre as Prefeituras Municipais de Paulo Bento, Ponte Preta,
Jacutinga e Quatro Irmos.
4.3.4 Trabalhando o acesso a terra
Quer-se, neste espao, registrar o apoio que o Programa Nacional de Crdito
Fundirio recebe por parte dos agricultores que foram pesquisados e, ao mesmo
tempo, fazer crticas e proposies concernentes a dois aspectos limi
Top Related