7/30/2019 silncio, interdito e ideologia
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
IV SEAD - SEMINRIO DE ESTUDOS EM ANLISE DO DISCURSO1969-2009: Memria e histria na/da Anlise do Discurso
Porto Alegre, de 10 a 13 de novembro de 2009
A OPOSIO SILNCIO E INTERDITO NO FUNCIONAMENTO DA LINGUAGEM E
SUAS RELAES COM A IDEOLOGIA
Noeli Tejera Lisba (UFRGS)
A escritura de Clarice Lispector tem sido denominada, por diversos crticos, como a narrao do
indizvel, devido a forte insistncia da escritora em se aproximar daqueles espaos de silncio, prprios
de toda experincia humana, impossveis de serem simbolizados. No caminho oposto ao interdito, que
visa o apagamento de determinados sentidos, o silncio, enquanto real do discurso, tal como
trabalhado na obra de Clarice, abre os sentidos, mostrando que h modos de significao que a
linguagem no alcana e que, por permanecerem abertos, na obra da escritora, se prestam a mltiplas
interpretaes, deixando ao leitor a possibilidade de buscar seus prprios sentidos.
Este trabalho que Clarice desenvolve, em sua escritura, sobre/no silncio, aproximando-nos doreal, , no entender de Roland Barthes, a prpria essncia da literatura. pelo fato do real no ser
representvel e porque os homens querem constantemente represent-lo por palavras, diz ele, que h
uma histria da literatura (Barthes, Roland. O rumor da Lngua, 1989). A literatura seria assim, nesta
perspectiva, o resultado do inconformismo do homem com relao ao fato de que h uma distncia
intransponvel entre a experincia vivida e a linguagem.
A idia da literatura como representao do mundo, que teve em Jean-Paul Sartre um de seus mais
reconhecidos defensores, esbarra, portanto, na prpria natureza da lngua que incapaz de represent-
lo. Em vista disto, toda a aproximao do real, ou seja, daquilo que impossvel de ser simbolizado,passa por um trabalho sobre a lngua, flexibilizando-a. a que o escritor faz seu trabalho na/sobre a
Histria. Mudar a lngua, diz Barthes, mudar a Histria (Barthes, op.cit.,1989)
Na contramo do trabalho da ideologia dominante, que busca pela incessante repetio
parafrstica criar a evidncia do sentido, o silncio cria espaos de reflexo e de deslizamentos de
sentidos, mostrando que no h nem sentido nico, nem literal. Neste sentido, a escritura de Clarice
Lispector se revela um campus profcuo para a anlise das relaes entre silncio, linguagem e
ideologia, bem como da oposio existente entre silncio e interdito, ou silncio e silenciamento.
Na Anlise do Discurso, este funcionamento do silncio, como real do discurso, foi teorizado por
Eni Orlandi (As formas do silncio, 1997) e fundamento da prpria AD, tal como elaborada por
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Michel Pcheux, uma vez que o silncio rege a operacionalidade de todas as noes chaves com que a
teoria trabalha: sujeito, sentido, discurso, interdiscurso, gesto de interpretao, heterogeneidade, e
condies de produo, entre outras.
E , ao fazer uma crtica da linguagem, atravs do trabalho do silncio, que a escritura de Clarice
Lispector se aproxima dos pressupostos tericos da AD. Inerente a todo o funcionamento da
linguagem e por isto mesmo fundante, o real do discurso tem, na arte, de modo geral, e na literatura,
de modo especfico, um espao privilegiado para operar como uma crtica ideologia, demonstrando a
opacidade da linguagem e o modo como a sua suposta transparncia construda pelo silenciamento
de muitos sentidos. Desenvolvendo-se como uma crtica linguagem, a literatura de Clarice Lispector
espao privilegiado para a anlise do silncio enquanto real do discurso e mantm uma forte
interseo com a Anlise do Discurso, uma vez em que esta se prope a ser uma terica crtica da
linguagem.
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