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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
“SER BELA É SER MAIS MULHER”, POR ISSO, “ FAÇA-ME BONITA, PELO AMOR
DE DEUS”!
Linara Bessega Segalin1
Resumo: “Ser bela é ser mais mulher”, “Faça-me bonita, pelo amor de Deus”, “20, 30 ou 40
primaveras conquistando corações”. Essas são algumas frases encontradas nos anúncios
publicitários da Revista “Vida Doméstica”, no período de 1945-1962. As frases apresentadas
sugerem que ser bela era uma obrigação da mulher, um requisito para ser aceita na família e na
sociedade, um complemento para ser “mais mulher” e, principalmente, um fator de extrema
importância para conquistar e manter o amor de um pretendente. A publicidade encontrada nas
páginas da Revista “Vida Doméstica” não mede esforços para conscientizar (e às vezes aterrorizar)
as mulheres sobre a necessidade de preservar ou alcançar a beleza. Neste artigo, buscamos analisar
e compreender como os anúncios publicitários da Revista “Vida Doméstica” vão construindo
representações de gênero que associam a imagem da mulher à beleza, e a beleza à conquista
contínua do namorado, noivo ou marido. Analisaremos os anúncios do período conhecido como
“Anos Dourados”, período de grande crescimento da industrialização no Brasil e do aumento da
oferta de produtos de higiene e beleza, que se tornariam grandes aliados na “batalha” por ser bonita.
O discurso que aconselha e intimida revela os estereótipos de beleza a que as mulheres estavam
submetidas nos anos que antecedem as conquistas da segunda onda do movimento feminista.
Importantes reflexões em tempos em que persistem estereótipos de “Belas, Recatas e do Lar”.
Palavras-chave: Representações de gênero. Beleza. Matrimonio. Publicidade. Revistas Femininas.
“A beleza é o maior atrativo da mulher, por isso mesmo deve ser cuidadosamente
conservada”2, afirmava um anúncio do “Creme de Alface”, publicado na Revista Vida Doméstica,
em 19453.
As páginas da Revista Vida Doméstica concentravam um discurso exaustivo de como
alcançar a beleza para poder conquistar e manter o amor do noivo ou esposo. A maneira mais eficaz
de manter a felicidade conjugal, de acordo com a Revista, era manter-se sempre bela. Desta forma,
os anúncios afirmavam que “Ser bela é ser mais mulher”, por isso, as mulheres deveriam implorar
“Faça-me bonita, pelo amor de Deus”, como podemos evidenciar nas imagens abaixo.
1 Doutora em História Social Comparada pela Universidade de Murcia, Espanha. 2 A beleza atrai. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, março de 1945, p. 70. 3 O texto apresentado aqui é um recorte da minha tese de doutorado intitulada: “¿Bellas, Recatadas, Madres y
Hogareñas?” La construcción de las representaciones de género en la prensa femenina de Brasil y España. Una
perspectiva comparada: la revista “Vida Doméstica” y el “Almanaque de la Madre de Familia” (1945-1973), defendida
na Universidade de Murcia, Espanha.
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Figura 1: Ser Bela é ser mais mulher.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Novembro de 1945, p. 81.
Figura 2: Faça-me Bonita, Pelo Amor de Deus.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Agosto de 1953, p. 56.
Soihet afirma que a pressão sobre as mulheres era enorme, uma vez que as mulheres
consideradas feias não importavam muito na sociedade e eram associadas às mulheres que queriam
emancipar-se.
La fealdad era relacionada a las mujeres que querrían emanciparse. “solo las muy feas
querrán emanciparse…¡Pobres! La bonitas no” porque a ellas no les faltará un adorador. Y
sin tardanza: “¡Qué nos importan las feas! Que se salven las bellas, que la humanidad se
perfeccionará” (…) Es recurrente la preocupación por acentuar la belleza como carácter
imprescindible de las mujeres. La ausencia de ese atributo representa un gran peso, ya que
serán rechazadas por los hombres, lo cual imposibilitará la realización de la única
aspiración legítima de las mujeres, el casamiento (2006, p. 624).
Para muitas mulheres, não possuir os padrões de beleza desejados pela sociedade poderia
significar um enorme problema: o de não conseguir alcançar a “missão” pensada para elas: casar e
ter filhos/as.
De acordo com Strey, os corpos não dependem somente da natureza e são construídos
também culturalmente, sobretudo, o corpo da mulher.
Para muchas personas los cuerpos humanos son invenciones de la naturaleza y poco tienen
que ver con la cultura o la historia. Pero en realidad los cuerpos también son construidos
culturalmente, sobre todo el cuerpo de la mujer. Por eso es preciso acercar nuestra mirada
sobre las construcciones culturales sobre el cuerpo femenino (2004, p. 225, 226).
A discussão sobre a beleza sempre existiu. Ainda que os padrões de beleza considerados
ideais modificassem ao longo dos séculos nas distintas sociedades e, a pesar de não existir um
modelo de beleza universal, a beleza sempre esteve presente. Foi discutida por filósofos, artistas,
escritores, cientistas, etc. Existe algo de bom relacionado à beleza, mas também algo muito ruim. A
busca das medidas perfeitas, dos padrões estéticos considerados ideias em cada período histórico e
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em cada sociedade podem ser cruéis para aqueles/as que não se encaixam nos padrões de beleza
estabelecidos.
Nos últimos anos, as revistas também exaltam ideais para a beleza masculina e toda a sorte
de cuidados para que os homens possam alcançá-la e mantê-la. Porém, a beleza sempre foi e
continua sendo mais vinculada às mulheres. As mulheres sempre foram mais “vítimas” da beleza.
Um homem, de maneira geral, não necessita ser “bonito” para ser aceito na sociedade. Seu valor
social é quase sempre medido pelo seu caráter, pela sua honra, pelo seu trabalho, pelos bens
materiais que possui, pela beleza de sua esposa, por toda sorte de coisas, raramente por sua beleza.
Figura 3: Sempre em Forma! Usando no seu carro artigos de qualidade.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Julho de 1947, p. 151.
Para as mulheres, por outro lado, ser bela era una exigência social. Nos anos 1950 o mais
importante era a aparência. O rosto ainda era a parte do corpo mais valorizada pelos anúncios de
beleza, mas o resto do corpo já despertava o interesse das marcas de produtos e o cuidado das
mulheres. Os concursos de “Miss” apresentavam corpos femininos considerados ideais. As
mulheres se tornavam cada vez mais consumidoras de produtos que pudessem ajudá-las na busca
pela beleza.
En los años cincuenta, la imagen de la mujer adquiere un aire muy sofisticado. Está de
moda arreglarse mucho y presentar un aspecto muy cuidado. Las revistas femeninas, así
como el cine y la publicidad difunden un modelo de mujer que vigila su línea, aunque aún
no está de moda una excesiva delgadez, y se maquilla. Los cosméticos ahora son
patrimonio de todo tipo de mujeres, y ninguna – ya sea ama de casa o trabajadora, debe
renunciar a embellecerse (MELLADO, 2008, p. 49).
Se hoje as modelos são as referências de beleza, em grande parte do século XX foram as
atrizes de cinema de Hollywood as que serviam como referencial de beleza, protagonizando
anúncios de cosméticos e capas de revistas no mundo todo, como é possível observar no anúncio a
seguir, publicado na Revista em 1948.
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Figura 4: Para você...Uma pele macia...aveludada...como a das estrelas de Hollywood!
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Abril de 1948, p.75.
Para conquistar e convencer as leitoras da eficácia dos produtos, os anúncios utilizavam
um tom informal e de proximidade com as leitoras. Muitas vezes utilizavam histórias em
quadrinhos com diálogos simples e didáticos (uma conversa entre duas amigas ou entre mãe e filha,
por exemplo). Eram utilizadas também palavras e expressões que diminuíam a liberdade de escolha
das leitoras. Todo tipo de receita e conselhos eram repassados para que as mulheres se tornassem
mais belas e conquistadoras.
O século XX foi caracterizado pela dominação da publicidade. “O corpo feminino é
onipresente (...). Objeto do olhar e do desejo, fala-se dele. Mas ele se cala” (PERROT, 2003:13). De
acordo com a autora, o corpo feminino sempre foi um espetáculo para o homem, um capital
simbólico para ser disputado e conquistado.
No palco do teatro, nos muros da cidade, a mulher é o espetáculo do homem. A própria
beleza constitui um capital simbólico a ser barganhado no casamento ou no galanteio”
Ainda hoje, o corpo feminino, silencioso e dissecado, continua sendo o principal suporte da
publicidade” ( PERROT, 2003, p. 15).
As inúmeras propagandas anunciavam e conformavam os estereótipos de beleza
valorizados no período. Ao analisar as páginas da Revista Vida Doméstica, identificamos oito tipos
de anúncios que invocavam a beleza das mulheres. O primeiro afirmava que as mulheres que não
cuidassem da sua beleza estariam condenadas à solteirice. O segundo enfatizava que as mulheres
deveriam manter uma “eterna juventude e mocidade” para seguir sendo atrativas para os homens,
especialmente o noivo ou marido. O terceiro condenava a artificialidade da beleza provocada,
sobretudo, pelo excesso de maquiagem. A beleza natural era considerada a verdadeira beleza. O
quarto considerava que, quanto mais beleza tivesse uma mulher, mais ela ficaria na memoria dos
seus pretendentes, aumentando as possibilidades de conquista. O quinto destacava que a beleza era
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uma exigência social que deveria ser perseguida por todas as mulheres. O sexto afirmava que a falta
de beleza era um dos principais motivos do desinteresse dos maridos pelas esposas e pelo término
dos relacionamentos conjugais. O sétimo recordava as mulheres que, além da beleza do rosto, elas
também deveriam atentar para a beleza do corpo. Por último, a beleza da mulher trabalhadora
merecia especial atenção naquela sociedade em transformação.
Analisaremos alguns destes anúncios, verificando como, ao longo do século XX, se
construiu uma supervalorização da juventude e da beleza, sobretudo da mulher. A beleza feminina
esteve muitas vezes diretamente associada à conquista de um homem. O corpo feminino foi
organizado para o prazer da visão masculina (STREY, 2004, p. 234).
“Sempre sozinha…Porque?”, questionava o anúncio do “Creme dental Colgate”,
publicado na Revista em 1945. No diálogo entre tia e sobrinha, a sobrinha revelava que a tia estaria
sozinha por conta do seu mau hálito. No entanto, usando o creme dental do anúncio ela poderia
resolver o problema e, como um “milagre”, encontrar um pretendente, como aparece no último
quadro.
Figura 5: Sempre sozinha...por que?
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Novembro de 1945, p. 98.
Um anúncio de “Leite de Colônia”, em 1949, dizia: “Descubra um noivo para mim”. Na
conversa entre amigas, uma delas conta que procurou uma “vidente” para lhe ajudar a encontrar um
noivo. No entanto, sua amiga enfatizava que uma vidente não lhe ajudaria a encontrar um noivo se
ela não cuidasse da sua beleza. O excessivo uso de maquiagem somente escondia as imperfeições,
tornando a beleza artificial. Para resolver o problema, aconselhava o uso de “Leite de Colônia”. O
conselho parecia ser certeiro, já que na sequência da imagem, a jovem que buscava um noivo e que
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havia feito uso do produto indicado, recebia declarações de um rapaz: “Querida” Ontem nos
conhecemos…Hoje estou ansioso para revê-la. Roberto4”.
Figura 6: Descubra um noivo para mim.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Outubro de 1949, p.83.
A juventude era um dos aspectos mais importantes e valorizados numa mulher. “O cinema
inventou uma beleza reluzente e espetacular. (...) Hollywood propagou desde então um verdadeiro
culto à juventude. (...) Eles foram os grandes divulgadores das novas formas de cuidar do corpo
(SANT’ANA”, 2013). Muitos anúncios que apareciam na Revista traziam o tema da juventude e
prometiam uma beleza de adolescente, uma pele radiante e suave como as flores, um rosto fresco e
encantador que recordaria os 15, 20 anos.
Figura 7: Um Rosto encantador que lhe recordará os 15 anos.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Setembro de 1947, p. 111. Figura 8: Conserve o frescor dos seus 20 anos.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Setembro de 1945, p. 106.
4 Descubra um noivo para mim. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Outubro
de 1949, p. 83.
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Alguns minutos de cuidado poderiam garantir anos de juventude, segundo os anúncios. Era
preciso fazer todos os esforços para evitar a “Idade Perigosa”.
Aos 18...aos 23...aos 25... a qualquer época pode começar a idade perigosa para sua beleza,
com as primeiras imperfeições de sua cútis. Cuide diariamente de sua pele com a famosa
Água de Junquillo, e estará de posse de uma beleza permanente5.
Enquanto os anúncios de maquiagens prometiam esconder as imperfeições, os anúncios de
limpadores de pele prometiam uma beleza natural, “sem máscara”.
“Pareça natural. Por favor”.... é mais elegante!” Os anúncios que defendiam uma beleza
natural justificavam a ideia de que “A conveniência ordena às mulheres da boa sociedade que sejam
discretas (...)” ( PERROT, 2003, p.15).
Figura 9: Pareça natural, por favor... É mais elegante.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Fevereiro de 1948, p. 117.
Figura 10: Sua cútis está diante desta ameaça: Beleza de máscara. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade
Gráfica Vida Doméstica, Novembro de 1945, p. 34.
Os anúncios de “Leite de Colônia” alertavam para o perigo de uma beleza de máscara. O
excesso de maquiagem fazia com as mulheres perdessem “a alma da beleza”6, uma vez que as
imperfeições eram somente escondidas. Por outro lado, as mulheres eram incentivadas a ser “A
favorita entre todas”7 e conquistar tudo o que os homens admiravam “Um rosto adorável, um colo
5 Idade Perigosa. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Agosto de 1946, p. 149. 6 Perdia, aos poucos, a alma da minha beleza... Beleza de máscara. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade
Gráfica Vida Doméstica, Março de 1950, p. 69. 7 Seja a favorita entre todas. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Março de
1949, p. 117.
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lindo e a sedução da juventude8”. Para tornar-se “inesquecível”, o uso de maquiagens era
incentivado. “Aquela de quem ele se lembra mais…brilha com o “efeito pétala” de “Tanger”. “Ele
quererá mais beijos dos seus lábios adoráveis”, usando o batom “Don Juan”. Os anúncios de
maquiagens enfatizam o poder de conquista que eles proporcionavam.
Figura 11: Aquela de quem ele se lembra mais.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Novembro de 1945, p. 106.
Figura 12: Ele quererá mais beijos dos seus lábios adoráveis.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Agosto de 1946, p. 90.
Era preciso ser admirável, encantadora. “Assim como as flores, as mulheres deviam
encantar. O encanto era uma palavra comumente utilizada pela propaganda da primeira metade do
século XX. Servia como uma luva para caracterizar a beleza feminina” (SANT’ANA, 2013). Este
estereótipo permaneceu presente até os anos 1960, quando os anúncios passaram a associar as
mulheres como “sempre livres” despojadas e arrojadas” (SANT’ANA, 2013).
Seguindo todos os conselhos de beleza, a tarefa de ser bela e manter o amor do noivo e/ou
esposo seria exitosa, de acordo com anúncios. “Meu marido não me larga”, exclamava a
publicidade do desodorante“Magic”.
8 Ela tem tudo o que eles admiram. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Julho
de 1949.
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Figura 13: Meu marido não me larga. Revista
Fonte: Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Junho de 1948, p. 125.
Ficar bonita era então uma exigência social. “Algumas já nascem belas...outras podem
alcançar a beleza” afirmava o anúncio de “Elizabeth Arden”. De acordo com Mellado, “La idea de
que hay una belleza latente en cada mujer, que esta puede sacar a flote si emplea los medios
apropiados, ha sido algo muy explotado por la publicidad de cosméticos y perfumes” (2008, p. 26).
Figura 14: Onde uma cútis sem mácula é uma exigência social. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade
Gráfica Vida Doméstica, Julho de 1945, p. 27.
Figura 15: Algumas já nascem belas... Todas podem alcançar a beleza. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro:
Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Abril de 1951, p. 7.
A mulher casada não poderia jamais descuidar da sua beleza se quisesse manter o amor do
marido. Muitas vezes, o desinteresse dos maridos ou o término das relações amorosas era
justificado pela falta da beleza da esposa. As frases utilizadas nos anúncios para alertar as mulheres
desse perigo eram ameaçadoras, intimidadoras. “Poderei iludir meu marido amanhã?9” perguntava
a revista Vida Doméstica em 1947.
9 Poderei iludir meu marido amanhã? Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica,
Novembro de 1947, p. 87.
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Ouça, Helena! Aproxima-se o dia do meu casamento...e até agora, usei maquillage para
ocultar do meu noivo as imperfeições da pele. Depois de casada receio desiludi-lo com
minha beleza. De fato, Leda! Amanhã, você não poderá iludir seu marido com o excessivo
maquillage para encobrir as imperfeições da pele. Comece, agora, a corrigi-las usando,
diariamente, Leite de Colônia. Felizmente Leda lembrou-se a tempo. (Ela sabe que há
muitos maridos que se desiludem da beleza da esposa logo nos primeiros dias). E agora ela
se casa, na certeza de possuir beleza natural e jovem10.
Se descuidassem da beleza o destino poderia ser cruel. Muitas propagandas utilizavam
imagens de mulheres tristes, chorando, culpadas por terem descuidado da beleza e perdido o amor
do marido. “A publicidade embute, em relação a essas que não se encaixam nos padrões, uma
ideologia de fracasso, de impotência frente ao próprio corpo” (PRIORI: 2004, p. 255 264).
“Porque há maridos que esquecem o valor de um beijo”? Perguntava um anúncio do
“Creme Dental Colgate”. A resposta era direta: “Às vezes a culpa é da esposa, Irene. Porque não
consultas o dentista sobre o teu hálito?11”
As propagandas do desodorante íntimo “Lysoform” eram ainda mais cruéis. Nelas as
mulheres aparecem lamentando a frieza, o desinteresse e a perda do amor do esposo. “Eu era a mais
feliz das esposas...hoje ele me abandona”, “Que terei feito para perder o amor do meu marido?...
O inexorável destino das jovens esposas envelhecidas”.
Figura 18: Anuncio Lysoform. Eu era a mais feliz das esposas... hoje ele me abandona.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Setembro de 1945, p. 94.
Figura19: O destino inexorável das “jovens esposas envelhecidas”.
Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Maio de 1945, p. 115.
10Poderei iludir meu marido amanhã? Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica,
novembro de 1947, p. 87. 11 Porque há maridos que esquecem o valor de um beijo. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica
Vida Doméstica, Março de 1945, p. 16.
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O fim de um relacionamento parecia depender somente das más atitudes das mulheres,
sobretudo dos descuidos com a beleza. “Se você se esquece da sua beleza… seu marido esquece de
você”12, afirmava um anúncio “Leite de Colônia”.
As propagandas de “Horno Vivo” demonstram como a preocupação com a beleza deixava
de ser somente com a beleza do rosto, passando a ocupar-se também da beleza do restante do corpo.
“Beleza não é só rosto, é corpo também”! A medida do seu busto é a medida de sua beleza”. A
medicina também começava a aconselhar um corpo saudável, firme, bonito e jovem. (PRIORI:
2004, p. 255 261).
Figura 16: Beleza não é só rosto. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Julho de
1945, 27.
Figura 17: A medida do seu busto é a medida da sua beleza.
Fonte: Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, Outubro de 1946, p. 120.
Por último, a Revista Vida Doméstica também se preocupava com a beleza das mulheres
trabalhadoras. Segundo a Revista a falta de tempo das mulheres que trabalham não poderia impedir
os cuidados com a beleza. Para isso, a indústria deveria investir em produtos eficientes, de rápida e
fácil aplicação.
A beleza das mulheres que trabalham, pode dessa maneira ser tão convenientemente tratada
como a das mulheres que tem tempo para frequentar instituto de beleza ou passarem mais
tempo em seus cuidados. Bastando para isso, uma organização no tratamento e a escolha de
produtos simples mas eficientes, estudados para dentro da sua simplicidade de aplicação
darem o máximo de resultados13.
Com a análise das propagandas de produtos de higiene e beleza da Revista Doméstica foi
possível identificar como foram construídas na imprensa feminina, representações de gênero que
12 Será isto o fim do romance? Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida Doméstica, agosto de
1948. 13 A maquilagem das mulheres que trabalham. Revista Vida Doméstica, Rio de Janeiro: Sociedade Gráfica Vida
Doméstica, novembro de 1949 p. 77.
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associam a imagem da mulher à beleza, e a beleza à conquista contínua do namorado, noivo ou
marido. Uma análise necessária em tempos em que revistas recentes destacam como modelo ideal o
de “Bela, Recatada e do Lar”.
Referências:
MELLADO, María Paz Hinojosa. La persuasión en la prensa femenina: Análisis de las
modalidades de la Enunciación. Visión libros: Madrid: 2008.
PERROT, Michelle. Os silêncios do corpo da mulher. In: SOIHET, Rachel; MATOS, Maria Izilda
Santos. O corpo feminino em debate. São Paulo: Editora UNESP, 2003.
PRIORI, Mary del. Corpo a corpo com as mulheres: as transformações do corpo feminino no Brasil.
In: STREY, Marlene Neves. CABEDA, Sonia T. Lisboa. Corpos e Subjetividades em exercício
interdisciplinar. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.
SANT’ ANNA, Denise Bernuzzi de. Sempre Bela. In: PINSKY, Carla Bassanezi; PEDRO, Joana
Maria (Org.). Nova História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 2013. Ebook.
SOIHET, Rachel. Movimientos femininos y la lucha por el voto en Brasil. In: MORANT, Isabel.
Historia de las Mujeres en España y América Latina. Madrid: Cátedra: 2006.
STREY, Marlene Neves. A “criação” do corpo feminino ideal. In: STREY, Marlene Neves.
CABEDA, Sonia T. Lisboa. Corpos e Subjetividades em exercício interdisciplinar. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2004.
“Being beautiful is to be more woman”, therefore, “Make me beautiful, for God's sake!"
Astract: “Being beautiful is be more woman”, "Make me beautiful, for God's sake!", 20, 30 or 40
springs conquering hearts”. These are some phrases found in the advertisements of the magazine
“Vida Doméstica” (Domestic Life), in the period 1945-1962. The phrases presented suggest that
being beautiful was an obligation of the woman, it was a requirement to be accepted in the family
and society, a complement to be "more woman" and, principally, an extremely important factor to
conquer and keep maintain the Love of a suitor.
The advertisements found on the pages of the magazine “Vida Doméstica” (Domestic Life), does
not measure efforts to raise awareness (and sometimes terrify) the women about the necessity of
preserve or conquer the beauty. In this article, we seek to analyze and understand how the
advertisements of the magazine “Vida Doméstica” (Domestic Life) build gender representations
that associate the image of women with beauty, and the beauty to the continuing conquest of
boyfriend, fiancé or husband. We will analyze the announcements of the period known as “Anos
Dourados” (Golden Years), the period of great growth of industrialization in Brazil and the increase
in the supply of hygiene and beauty products, which would become great allies in the "battle" for
being beautiful. The discourse that counsels and intimidates reveals the stereotypes of beauty to
which women were subjected in the years preceding the conquests of the second wave of the
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feminist movement. Important reflections in times when stereotypes of “Bela, Recatada e do Lar”
(Beautiful, modest and housewife)
Keywords: Gender representations. Feminine magazines. Beauty standards.
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