1
Saber Militar e Marxismo [1]
Leatildeo Trotsky
8 de Maio de 1922
Primeira Ediccedilatildeo Fonte Problemas da Guerra Civil Antiacutedoto 1977 Traduccedilatildeo de Transcriccedilatildeo de Alexandre Linares HTML de Fernando Antocircnio de Souza Arauacutejo novembro 2005 Direitos de Reproduccedilatildeo Marxists Internet Archive (marxistsorg) 2005 A coacutepia ou distribuiccedilatildeo deste documento eacute livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License
I ndash Introduccedilatildeo
Permitam-me declarar aberta a reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar ndash a
518 segundo acabam de me dizer
O tema da nossa discussatildeo de hoje seraacute o lugar do saber e da habilidade
militares no sistema dos conhecimentos humanos em geral Reconheccedilo antes
de mais que a responsabilidade da iniciativa desta discussatildeo me cabe
pessoalmente em grande parte Natildeo porque considere que este problema
complexo abstrato teoacuterico e filosoacutefico ndash no melhor e ndash no pior sentido dos
termos ndash eacute o mais urgente e atual da nossa instruccedilatildeo militar mas tive a
impressatildeo de que estas questotildees se nos impunham a par com a evoluccedilatildeo
ideoloacutegica e com certa luta teoacuterica nas altas esferas do nosso exeacutercito
Numa das nossas publicaccedilotildees bastante proacutexima da nossa Associaccedilatildeo li
dois artigos [1] um dos quais demonstrava que a ciecircncia militar natildeo podia ser
edificada segundo os meacutetodos do marxismo que era impossiacutevel utilizaacute-los para
resolver os seus problemas particulares uma vez que a ciecircncia militar faz parte
das ciecircncias naturais Este artigo era acompanhado dum outro polecircmico-
criacutetico que exprimia sem duacutevida mais de perto o ponto de vista da redaccedilatildeo
2
Neste pelo contraacuterio tratava-se de tentar provar que os meacutetodos do marxismo
eram meacutetodos cientiacuteficos universais e que por conseguinte a sua competecircncia
se estendia igualmente agrave ciecircncia militar Peccedilo desculpa mais uma vez mas
pessoalmente creio que ambas as opiniotildees satildeo falsas a ciecircncia militar natildeo
pertence agrave categoria das ciecircncias naturais porque nem eacute natural nem eacute
ciecircncia Talvez a discussatildeo de hoje nos aproxime um pouco mais do fundo do
problema
Mas mesmo que admitamos que a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia natildeo
podemos de modo algum admitir que ela possa ser construiacuteda por meacutetodos
marxistas porque o materialismo histoacuterico natildeo eacute um meacutetodo universal paacutera
todas as ciecircncias Este eacute um enorme erro que me parece acarretar as mais
nocivas consequumlecircncias Podemos com ecircxito dedicar-nos durante toda a nossa
vida aos assuntos militares sem nunca refletir sobre os meacutetodos teoacutericos do
conhecimento dos assuntos militares ndash tal como podemos olhar todos os dias
para o reloacutegio ignorando o seu mecanismo interior e a disposiccedilatildeo das suas
molas e engrenagens Conhecendo os algarismos e o movimento dos ponteiros
sobre o mostrador natildeo corro o risco de me enganar Mas se natildeo me sentir
satisfeito com o movimento dos ponteiros sobre o mostrador e se quiser falar da
estrutura do reloacutegio devo conhececirc-la como deve ser e natildeo haacute qualquer lugar
para incluir coisas da minha lavra
Numa outra discussatildeo (a propoacutesito da doutrina militar unitaacuteria) jaacute me
referi a um episoacutedio da vida de Gueacuteorgui Valentinovitch Plekhanov [1N] ndash o
primeiro cruzado do marxismo na Ruacutessia homem de inteligecircncia rara e
altamente dotado Quando notava que algueacutem opunha os problemas do
materialismo filosoacutefico e histoacuterico ou pelo contraacuterio os confundia ndash Plekhanov
protestava violentamente O materialismo filosoacutefico eacute uma teoria que estaacute na
base das ciecircncias naturais ao passo que o materialismo histoacuterico explica a
histoacuteria da sociedade humana O materialismo histoacuterico eacute um meacutetodo que natildeo
explica todo o universo mas sim um grupo estritamente definido de fenocircmenos
que condicionam o desenvolvimento do homem histoacuterico O materialismo
filosoacutefico explica o movimento do universo enquanto mudanccedila e transformaccedilatildeo
da mateacuteria e leva o seu raciociacutenio ateacute agraves mais altas manifestaccedilotildees do espiacuterito
Ser politicamente marxista sem conhecer o materialismo histoacuterico eacute difiacutecil para
natildeo dizer impossiacutevel Ser politicamente marxista e natildeo conhecer o materialismo
filosoacutefico eacute possiacutevel ndash e haacute tantos exemplos destes quantos quiserem
3
E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)
divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto
Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem
Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na
clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo
sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que
um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute
preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela
causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da
filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando
na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido
veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios
No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa
tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de
questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se
acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem
comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas
esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos
militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-
se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista
constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber
militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes
destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem
duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos
Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e
obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se
impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo
direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda
a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo
atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais
diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser
num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute
saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria
numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma
conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia
4
acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas
estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos
Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente
uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo
contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais
claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo
consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim
dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas
confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente
da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com
uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas
altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem
conteuacutedo nem essecircncia
Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No
interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos
problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes
nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais
simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao
afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z
e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais
elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um
auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite
verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute
tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode
ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes
esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos
medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em
numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se
dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias
Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos
relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo
II ndash Encerramento
5
Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer
algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em
proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam
contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias
A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns
outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem
em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia
militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a
ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia
O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a
questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-
cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se
satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o
chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma
operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante
que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo
eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas
uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas
sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-
se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se
compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os
soldados ndash era a ciecircncia de vencer
Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares
com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte
praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo
Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que
em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash
mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma
importacircncia histoacuterica utilitaacuteria
Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies
no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode
natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente
teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de
ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
2
Neste pelo contraacuterio tratava-se de tentar provar que os meacutetodos do marxismo
eram meacutetodos cientiacuteficos universais e que por conseguinte a sua competecircncia
se estendia igualmente agrave ciecircncia militar Peccedilo desculpa mais uma vez mas
pessoalmente creio que ambas as opiniotildees satildeo falsas a ciecircncia militar natildeo
pertence agrave categoria das ciecircncias naturais porque nem eacute natural nem eacute
ciecircncia Talvez a discussatildeo de hoje nos aproxime um pouco mais do fundo do
problema
Mas mesmo que admitamos que a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia natildeo
podemos de modo algum admitir que ela possa ser construiacuteda por meacutetodos
marxistas porque o materialismo histoacuterico natildeo eacute um meacutetodo universal paacutera
todas as ciecircncias Este eacute um enorme erro que me parece acarretar as mais
nocivas consequumlecircncias Podemos com ecircxito dedicar-nos durante toda a nossa
vida aos assuntos militares sem nunca refletir sobre os meacutetodos teoacutericos do
conhecimento dos assuntos militares ndash tal como podemos olhar todos os dias
para o reloacutegio ignorando o seu mecanismo interior e a disposiccedilatildeo das suas
molas e engrenagens Conhecendo os algarismos e o movimento dos ponteiros
sobre o mostrador natildeo corro o risco de me enganar Mas se natildeo me sentir
satisfeito com o movimento dos ponteiros sobre o mostrador e se quiser falar da
estrutura do reloacutegio devo conhececirc-la como deve ser e natildeo haacute qualquer lugar
para incluir coisas da minha lavra
Numa outra discussatildeo (a propoacutesito da doutrina militar unitaacuteria) jaacute me
referi a um episoacutedio da vida de Gueacuteorgui Valentinovitch Plekhanov [1N] ndash o
primeiro cruzado do marxismo na Ruacutessia homem de inteligecircncia rara e
altamente dotado Quando notava que algueacutem opunha os problemas do
materialismo filosoacutefico e histoacuterico ou pelo contraacuterio os confundia ndash Plekhanov
protestava violentamente O materialismo filosoacutefico eacute uma teoria que estaacute na
base das ciecircncias naturais ao passo que o materialismo histoacuterico explica a
histoacuteria da sociedade humana O materialismo histoacuterico eacute um meacutetodo que natildeo
explica todo o universo mas sim um grupo estritamente definido de fenocircmenos
que condicionam o desenvolvimento do homem histoacuterico O materialismo
filosoacutefico explica o movimento do universo enquanto mudanccedila e transformaccedilatildeo
da mateacuteria e leva o seu raciociacutenio ateacute agraves mais altas manifestaccedilotildees do espiacuterito
Ser politicamente marxista sem conhecer o materialismo histoacuterico eacute difiacutecil para
natildeo dizer impossiacutevel Ser politicamente marxista e natildeo conhecer o materialismo
filosoacutefico eacute possiacutevel ndash e haacute tantos exemplos destes quantos quiserem
3
E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)
divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto
Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem
Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na
clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo
sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que
um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute
preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela
causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da
filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando
na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido
veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios
No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa
tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de
questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se
acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem
comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas
esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos
militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-
se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista
constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber
militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes
destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem
duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos
Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e
obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se
impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo
direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda
a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo
atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais
diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser
num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute
saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria
numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma
conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia
4
acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas
estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos
Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente
uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo
contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais
claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo
consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim
dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas
confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente
da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com
uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas
altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem
conteuacutedo nem essecircncia
Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No
interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos
problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes
nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais
simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao
afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z
e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais
elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um
auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite
verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute
tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode
ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes
esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos
medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em
numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se
dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias
Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos
relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo
II ndash Encerramento
5
Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer
algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em
proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam
contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias
A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns
outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem
em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia
militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a
ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia
O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a
questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-
cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se
satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o
chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma
operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante
que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo
eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas
uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas
sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-
se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se
compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os
soldados ndash era a ciecircncia de vencer
Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares
com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte
praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo
Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que
em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash
mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma
importacircncia histoacuterica utilitaacuteria
Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies
no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode
natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente
teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de
ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
3
E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)
divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto
Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem
Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na
clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo
sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que
um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute
preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela
causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da
filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando
na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido
veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios
No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa
tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de
questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se
acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem
comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas
esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos
militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-
se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista
constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber
militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes
destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem
duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos
Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e
obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se
impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo
direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda
a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo
atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais
diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser
num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute
saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria
numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma
conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia
4
acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas
estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos
Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente
uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo
contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais
claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo
consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim
dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas
confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente
da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com
uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas
altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem
conteuacutedo nem essecircncia
Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No
interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos
problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes
nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais
simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao
afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z
e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais
elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um
auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite
verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute
tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode
ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes
esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos
medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em
numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se
dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias
Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos
relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo
II ndash Encerramento
5
Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer
algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em
proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam
contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias
A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns
outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem
em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia
militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a
ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia
O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a
questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-
cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se
satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o
chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma
operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante
que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo
eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas
uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas
sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-
se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se
compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os
soldados ndash era a ciecircncia de vencer
Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares
com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte
praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo
Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que
em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash
mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma
importacircncia histoacuterica utilitaacuteria
Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies
no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode
natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente
teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de
ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
4
acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas
estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos
Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente
uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo
contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais
claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo
consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim
dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas
confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente
da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com
uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas
altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem
conteuacutedo nem essecircncia
Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No
interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos
problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes
nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais
simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao
afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z
e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais
elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um
auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite
verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute
tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode
ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes
esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos
medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em
numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se
dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias
Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos
relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo
II ndash Encerramento
5
Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer
algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em
proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam
contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias
A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns
outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem
em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia
militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a
ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia
O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a
questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-
cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se
satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o
chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma
operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante
que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo
eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas
uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas
sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-
se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se
compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os
soldados ndash era a ciecircncia de vencer
Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares
com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte
praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo
Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que
em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash
mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma
importacircncia histoacuterica utilitaacuteria
Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies
no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode
natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente
teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de
ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
5
Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer
algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em
proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam
contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias
A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns
outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem
em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia
militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a
ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia
O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a
questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-
cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se
satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o
chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma
operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante
que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo
eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas
uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas
sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-
se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se
compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os
soldados ndash era a ciecircncia de vencer
Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares
com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte
praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo
Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que
em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash
mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma
importacircncia histoacuterica utilitaacuteria
Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies
no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode
natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente
teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de
ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
6
dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com
finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro
criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]
conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao
propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida
[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo
proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu
autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo
tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo
arte
Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de
vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar
de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos
militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A
manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de
infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia
Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu
acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve
conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar
limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o
soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os
assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal
Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a
conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos
e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute
tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso
satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia
E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade
dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da
utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a
utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade
dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil
quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de
tudo natildeo devemos confundi-los
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
7
Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima
anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir
dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb
Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a
vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se
definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O
marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de
acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro
definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma
seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte
limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros
fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O
marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar
como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o
mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a
pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista
E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel
Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave
atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar
natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O
comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a
criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus
proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla
contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial
etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia
ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de
uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua
Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo
eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo
explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o
substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de
maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade
Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado
da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o
marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes
escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
8
domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras
palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a
contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie
de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-
marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo
sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo
histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um
certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos
tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento
humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo
marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do
materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como
o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo
eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir
meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem
de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um
maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem
que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo
Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel
da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente
justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia
eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas
noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas
para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees
fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de
vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo
substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade
militar
Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do
xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do
gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais
tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos
intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro
jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes
jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
9
oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o
desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de
xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro
maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel
aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas
leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de
Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados
do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra
franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de
posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves
manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as
condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do
jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo
disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste
fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender
a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a
surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno
A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas
regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos
regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de
ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum
artesanato ou duma arte
Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo
marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos
regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir
do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de
preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute
palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma
ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica
Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar
Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a
ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar
Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees
praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
10
A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte
os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas
do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da
sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da
guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum
podem ser eternos
No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos
elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da
cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou
mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de
origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar
elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se
guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees
militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais
elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado
seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute
de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas
muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou
duma arte
O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois
esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia
Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se
sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute
sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar
A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral
ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute
que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as
pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos
levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos
originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a
ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios
inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a
histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
11
do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de
verdades eternas
Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a
importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o
desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do
regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc
A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma
ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no
mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em
certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais
eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas
estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma
eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo
princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de
Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas
ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que
combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e
outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a
compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia
decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)
Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no
domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as
generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da
economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir
aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos
Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem
que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre
fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os
doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de
partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas
Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou
da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal
verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os
defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
12
das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no
meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da
quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu
valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de
outrora natildeo serem conhecidas
Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com
as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees
militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes
essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na
barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades
tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala
adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de
colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um
produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da
teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da
sociedade
Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do
senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo
legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da
economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio
Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes
dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa
correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e
baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de
accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre
o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral
estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que
considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que
devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos
Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados
numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia
transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os
princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
13
Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de
Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia
militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de
atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se
segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de
formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute
formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens
Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de
edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano
vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista
dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista
resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso
que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um
empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados
neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui
evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a
economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da
atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio
econocircmico
No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter
incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia
levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e
mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de
manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees
militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma
extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da
construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou
100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de
Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva
negaccedilatildeo
Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado
Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas
eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute
aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
14
que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de
automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o
niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa
industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os
meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos
etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos
mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos
meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito
evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a
economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da
sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa
Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas
tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em
interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem
pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria
A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes
exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel
para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo
modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de
caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma
ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos
regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar
Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no
plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as
leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da
nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]
Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a
guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente
todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da
arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos
inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas
proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de
vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista
um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
15
especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita
com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos
os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais
temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios
eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E
precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma
arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos
princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao
falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim
existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees
militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam
no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em
que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de
toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou
substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios
Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes
planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo
trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo
e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base
fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito
Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a
interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem
coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash
desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos
de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida
nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)
conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a
conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no
sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as
outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se
atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a
instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta
base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um
afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte
e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a
dominaccedilatildeo do grupo inimigo
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
16
Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E
evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro
lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de
instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem
sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo
esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em
que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a
pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo
podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de
dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro
por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no
sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio
reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do
momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras
se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na
economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente
estabelecidas
Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela
arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-
metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se
natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe
Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece
dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo
responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela
comporta os seguintes princiacutepios
ndash Princiacutepio da economia das forccedilas
ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas
ndash Princiacutepio da seguranccedila etc
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
17
Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas
citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios
absolutos satildeo poucos mas existem [11]
Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da
economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo
tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo
sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas
antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar
um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso
desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O
princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos
fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige
assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento
decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno
da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da
manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita
no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas
considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como
ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que
no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo
decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a
proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la
com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela
natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)
Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch
pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos
ulteriores
Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro
lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional
ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra
contrariamente agraves previsotildees de Foch
ndash a guerra durou quatro anos
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
18
ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se
estendeu agraves trincheiras
ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a
necessidade de se enterrar na terra
ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as
trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da
Alemanha
Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias
que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos
verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos
provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra
se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha
deduzido desses princiacutepios eternos
Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por
natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente
justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de
forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em
grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o
inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um
certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida
depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na
unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de
forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra
ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo
submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo
Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo
racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios
conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para
aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra
interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se
numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu
regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua
vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
19
contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o
conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o
princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)
da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso
particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de
elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a
situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das
soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo
soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou
economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo
Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente
uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha
Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo
dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade
militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei
matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado
dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e
posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio
da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal
mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos
e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de
forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais
mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais
distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-
maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem
um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada
Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo
por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de
preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de
mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo
isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo
geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o
xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e
finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
20
Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio
Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros
comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por
conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas
tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso
ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites
impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado
estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade
deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos
meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este
princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em
encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela
inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma
soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o
comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema
Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo
ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que
garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por
outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o
comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados
pelo alto comando
Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso
nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em
matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que
permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas
por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves
grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o
princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente
dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores
concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma
importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai
apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute
preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e
realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
21
forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana
em geral
Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta
desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos
e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de
numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as
experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si
proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais
convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de
experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue
sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos
princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-
nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas
loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no
plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa
etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e
praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas
de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos
mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo
isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo
determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo
satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo
instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra
eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo
para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais
estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma
aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante
Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma
arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a
carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional
Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios
napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash
que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras
napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem
moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
22
todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia
nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos
defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra
imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio
encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os
lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual
medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha
O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do
moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande
forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo
todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves
previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o
resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e
os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso
que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e
morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao
fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado
por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu
contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os
princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados
ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees
anglo-americanos
Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas
conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute
preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira
linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas
nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de
reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante
O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo
defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo
racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute
absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra
como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente
as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de
energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno
nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
23
utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum
menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave
espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa
hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao
princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta
do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma
tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra
napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo
Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de
forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente
nada tem de eterno
Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios
eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do
homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e
psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das
formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura
da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de
Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse
possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de
Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente
A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais
estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este
respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por
certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza
bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo
dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto
que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente
organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e
armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais
O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe
por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por
outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira
conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto
materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
24
histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave
mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si
mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo
coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode
extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia
Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um
bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que
leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode
dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na
experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas
espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos
Dito isto permitam que conclua
Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos
cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos
pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo
estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual
para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute
mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas
competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o
comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia
de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa
experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de
companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las
Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um
templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que
estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com
os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas
estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a
Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente
educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia
proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute
agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo
esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia
proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
25
pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o
chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no
interesse da classe operaacuteria
Notas
[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar
Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O
estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo
Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado
sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse
artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da
Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as
minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma
O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob
esta forma (voltar ao texto)
[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do
Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de
1922 (voltar ao texto)
[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor
de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra
Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)
[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do
Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por
incapacidade (voltar ao texto)
[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a
sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma
palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante
correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel
para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)
[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas
empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das
entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
26
como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de
conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)
[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov
Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos
imaginaacuterios (voltar ao texto)
[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem
treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e
Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o
venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)
[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor
das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi
imensa (voltar ao texto)
[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na
Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado
em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de
1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)
[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo
comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida
membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation
armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em
1877) (voltar ao texto)
[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda
Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim
mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no
momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a
experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees
(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para
chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader
Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e
pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse
posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
27
operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos
Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)
[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito
do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da
Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)
[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis
Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo
russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem
(voltar ao texto)
[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado
na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos
dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como
de uma Econocircmica (voltar ao texto)
[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio
de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que
jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do
pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica
Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)
[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio
introduziu o marxismo na Ruacutessia
[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de
novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em
literatura
[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho
Top Related