EXEMPLAR DISTRIBUÍDO NAS
AGÊNCIAS PERSONNALITÉ
REVISTA DO ITAÚ PERSONNALITÉ NO 30 | ANO 8
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MARIANA XIMENES“Ser ator é querer dizer alguma
coisa... Provocar, instigar”
LUCAS FONSECACLÓVIS DE BARROS FILHOMADELINE PUCKETTE
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EDITORIAL
ILUSTRAÇÃO DO MÓDULO PHILAE SAINDO DA SONDA ROSETTA
PARA POUSAR NO COMETA 67P/CHURYUMOV-GERASIMENKO. O
ENGENHEIRO LUCAS FONSECA, UM DOS PERFILADOS DA EDIÇÃO,
FOI O ÚNICO SUL-AMERICANO A PARTICIPAR DA MISSÃO
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E m 1969, seis dias depois da chegada do homem à Lua, o jornalista norte-americano E. B. White, um mestre do estilo nas páginas da
revista The New Yorker, escreveu uma pequena celebração. Anotou: “A lua, no fi m das contas, é um bom lugar para o homem. Um sexto da gravidade deve ser bastante divertido, e quando Armstrong e Aldrin se dedicaram a uma animada dancinha, feito duas criancinhas felizes, não foi apenas um momento de triunfo, mas também de alegria. A lua, em compensação, é um lugar ruim para as bandeiras. A nossa parecia dura e estranha ali, em sua tentativa de fl utuar numa brisa que não sopra. [...] À maneira de todos os grandes rios e mares, a Lua pertence a todos e a ninguém. Ainda traz o segredo da loucura, ainda controla as marés que banham as praias, ainda vigia os beijos daqueles que se amam em toda parte, debaixo de bandeira nenhuma, somente do céu”.
Esta edição que você tem em mãos, à sua maneira, reverbera o pequeno encômio escrito por White. Para festejar nossa trigésima edição decidimos levar o leitor para uma viagem pelas grandes e uni-versais experiências humanas.
Assim, para começar, no intuito de estampar nossa capa, visitamos o Rio de Janeiro e a estrela Mariana Ximenes, em um perfi l que cap-tura sua surpreendente adoração pelas artes plásticas. Em São Paulo, nossa jornada mergulhou nas questões internas que afetam todos nós. Para isso, conversamos com o fi lósofo Clóvis de Barros Filho, um pensador que, ao versar sobre a vida que vale a pena ser vivida, nos ensina que a felicidade está em perseguir aquilo que nos faz fe-liz. Uma caminhada que dura por toda a vida, um dia de cada vez. Simples assim. Fizemos também uma parada em Seattle, nos Estados Unidos. Lá, aprendemos com a sommelière Madeline Puckette como é possível rodar o mundo a partir de uma taça de vinho, em busca de uma recordação inesquecível.
A viagem desta trigésima e especial edição se encerra fora do pla-neta. Percorremos 500 milhões de quilômetros e desembarcamos na trajetória do cientista Lucas Fonseca, único brasileiro a participar da operação europeia que levou o módulo Philae a pousar, de forma pio-neira, em um cometa para investigar a origem do universo.
Em oito anos de vida, a Revista Personnalité vem cumprindo sua missão de garimpar experiências que merecem ser contadas. Investi-gar biografi as inspiradoras, visitar lugares especiais, resgatar perso-nagens adoráveis: nossa fórmula tem como meta levar aos seus olhos os sonhos que são construídos na realidade. Eis a receita que um dia levou o homem à Lua. Eis a receita que levou o paulista Lucas Fonse-ca rumo à origem de tudo. Pequenas e grandes viagens. Esteja convi-dado a embarcar conosco.
Um abraço e boa leitura,
André SapoznikItaú Personnalité
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Especializado em ciência, o jornalista paulistano
SALVADOR NOGUEIRA, 36 anos, tem oito
livros publicados. É autor do blog Mensageiro
sideral, da Folha de S. Paulo, jornal onde
começou sua carreira, e colunista do Jornal das
dez, da GloboNews. Nesta edição da Revista
Personnalité, Salvador assina o perfi l de Lucas
Fonseca, engenheiro brasileiro que participou
da missão da sonda espacial Rosetta.
O coletivo VAPOR324 é formado pelos
arquitetos paulistanos Fabio Riff,
Fabrizio Lenci, Rodrigo Oliveira e Thomas
Frenk. O quarteto se conheceu em 2009,
quando ainda estava na faculdade, abriu o
escritório em 2012, em São Paulo, e já teve
seu trabalho publicado em veículos como Trip,
Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Eles
ilustram a reportagem “O céu não é o limite”.
O jornalista RUY CASTRO, 67 anos, é autor de
biografi as de personalidades como Carmen
Miranda e Garrincha. Em sua quarta colaboração
consecutiva para a Revista Personnalité, ele assina
o perfi l de Zé Carioca. “Somos velhos camaradas.
Quando o li pela primeira vez no gibi, o presidente
da República ainda era o Getúlio Vargas, imagine!
Depois, lhe assisti no fi lme Você já foi à Bahia?, e
me empolguei vendo-o tapear o Pato Donald.”
O fotógrafo mineiro LEONARDO FINOTTI,
38 anos, é referência em publicações de arquitetura
no Brasil e fora dele: tem contato com 400 títulos
ao redor do mundo. Já trabalhou com grandes
nomes como Herzog & de Meuron e Isay Weinfeld.
Atualmente, está revisitando o modernismo da
América Latina, em um projeto com um grupo de
estudos da Universidade do Texas, que será exposto
em março no MoMA, em Nova York. São dele as
imagens da reportagem “Verde concreto”.
COLABORADORES
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COLABORADORES
A Trip Editora, cons ci en te das questões
am bi en tais e sociais, utiliza papéis Suzano
com certificado FSC
(Forest Stewardship Council) para
impressão deste material.
A Certificação FSC garante que uma
matéria-prima florestal provenha de um
manejo considerado social,
ambiental e economicamente adequado.
Impresso na Stilgraf – Certifi cada na Cadeia de Custódia – FSC
Editor Paulo Lima Diretor Superintendente Carlos Sarli Diretor
Editorial Fernando Luna Diretora de Criação Ciça Pinheiro Diretor
de Núcleo Tato Coutinho Diretor Financeiro Agenor S. Santos
Diretora de Publicidade e Circulação Isabel Borba Diretora de
Eventos e Projetos Especiais Proprietários Ana Paula Wehba
Diretor de Redação Décio Galina Editor Carlos Messias
Produtora Executiva Kika Pereira de Sousa Assistente
de Produção Flávia Ribeiro Projeto Gráfi co Beth Slamek
Departamento Comercial Assistente Comercial da Diretoria
Gabriela Trentin Assistente de Arte Marketing Publicitário
Fabiana Cordeiro Gerentes de Contas Flavia Marangoni, Roberta
Rodrigues e Juliana Ruiz Assistente de Tráfego Comercial Aline
Trida Assistente de Opec Cristiane Moraes
Para anunciar [email protected] Representantes AL/SE
Pedro Amarante BA Caio Silveira CE Ananias Gomes DF Alaor
Machado ES Dídimo Effgen GO Antonio Cordeiro MG Rodrigo Freitas
PE Wladmir Andrade PR Raphael Muller RJ X² Representação
RS/SC Ado Henrichs SP Antonio Carlos Bonfá Junior SP interior/
litoral Daniel Paladino SP Permutas Denis Oliveira USA Multimedia
[email protected] Pesquisa de Imagens Aldrin Ferraz
(coordenação) Bibliotecário Daniel de Andrade Estagiários Mayã
Maia e Arthur Fernandes Produção Gráfi ca Walmir S. Graciano
Produtor Gráfi co Cleber Trida Tratamento de Imagens Roberto
Longatto e Roberto Oliveira Revisão Ecila Cianni (coordenação),
Janaína Mello, Daniela Uemura e Marcos Visnadi Projetos Especiais
e Eventos Coordenação Regina Trama Editor de Arte Rafael Kendi
Analista Mariana Beulke Trade e Circulação Analista de Trade
Renata Vilar Coordenadora de Assinaturas Andrea Fernandes
Gerente de Circulação Adriano Birello Analista de Circulação
Vanessa Marchetti Projetos Digitais Editor Digital Thiago Araújo
Editores de Arte Débora Andreucci e Diego Maldonado Site Carla
Braga Gerente de Negócios Izabella Zuanazzi Núcleo de Vídeo
Coordenação Joana Cooper Produção Lorena Almeida Assistente
de Produção Juliana Carletti Assistente de Finalização Viviane
Gualhanone Montador Pitzan Oliveira Diretor de Fotografi a Pedro
Marques Relações Públicas Analista de RP Monalisa Oliveira
Assistentes de RP Julio Hercowitz Estagiária Luiza Nascimento
Colaboram nesta edição: Colaboram nesta edição: Vanina
Batista (direção de arte), Giovanni Tinti (edição de arte),
Edmundo Clairefont (edição de texto), Bruna Bopp, Carol
Nogueira, Carol Sganzerla, Daniel Benevides, Filipe Luna, Ines
Garçoni, Joselia Aguiar, Luciana Lancellotti, Luis Patriani, Mariana
Filgueiras, Ricky Hiraoka, Ruy Castro, Salvador Nogueira (texto),
Amanda Koster, Camila Fontana, Daryan Dornelles, Gabriel
Rinaldi, Leonardo Finotti, Paula Giollito, Pedro Loes (foto),
Mauricio Pierro, Vapor 324 (ilustração), Ana Hora (produção) Su
Tonani (fi gurino) Ricardo Tavares (Make)
Comitê Itaú responsável por esta edição Fernando Chacon,
André Sapoznik, Cristiane Portella, Danielle Sardenberg, Camila
Carneiro e Elisangela Bonamigo Colaboradores DPZ Propaganda
Marcello Barcelos e Elvio Tieppo
Capa e quarta capa Daryan Dornelles
Revista Personnalité é uma publicação trimestral da Trip Editora
e Propaganda em parceria com o Itaú Personnalité.
Endereço para correspondência: Rua Cônego Eugênio Leite, 767,
05414-012, São Paulo, SP.
E-mail: [email protected]
www.tripeditora.com.br
EXPEDIENTE
Reconhecido por suas fotos de grandes estrelas
da música brasileira, o carioca DARYAN
DORNELLES começou na profi ssão por acaso:
era nadador do Vasco e, em uma competição
no Chile, seu técnico precisou de um fotógrafo
– Daryan fi cou com a vaga. Para a capa desta
edição, ele enquadrou Mariana Ximenes na
Cidade das Artes, no Rio. “O ensaio foi tranquilo.
Ela fez tudo o que pedimos com carinho.”
A paulistana radicada no Rio de Janeiro
INES GARÇONI é autora do perfi l da atriz
Mariana Ximenes. A jornalista de 37 anos
começou sua carreira em 1999 na editoria de
política da revista IstoÉ. Desde então, escreveu
para o Jornal do Brasil, para a revista Poder,
revista da GOL, Marie Claire e Elle. É autora
de dois volumes do Guia carioca da comida
de rua. “A conversa com Mariana fl uiu
naturalmente. Ela não só responde às perguntas,
mas interage de fato com o repórter.”
Formado em fotografi a pelo Rochester Institute
of Technology, no estado de Nova York, o
catarinense GABRIEL RINALDI, 31 anos, já
teve suas imagens veiculadas em publicações
nacionais, como Trip, Playboy, Bravo!, Época e
Audi Magazine, e estrangeiras, como Bloomberg,
Surface e Fast Company. São dele os retratos que
ilustram o perfi l do fi lósofo Clóvis de Barros Filho.
Depois de ter passado por Veja e Folha de S.
Paulo, a jornalista paulistana CAROL NOGUEIRA,
25 anos, se mudou para Los Angeles em 2014,
de onde escreve sobre cinema e cultura pop
para diversos veículos. Para esta edição, ela foi
a Seattle entrevistar a sommelière Madeline
Puckette, do site Wine Folly. “Madeline é uma
mente brilhante. É interessante como seu
background em artes e música faz o seu trabalho
com vinhos ser tão diferente.”
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1610 Cá entre NósMúsica, gastronomia, esporte, viagem –
dicas de quem sabe viver bem
15 Prestígio
O BALÉ MAIS DANÇADO Para celebrar os 40 anos do Grupo Corpo, os irmãos Pederneiras
escolheram uma foto da peça Parabelo, apresentada 426 vezes
16 NAS TELASComo Mariana Ximenes elabora seus personagens para TV
e cinema e o prazer que ela tem em colecionar obras de arte.
Dois caminhos costuram a personalidade da atriz
26 REUNIÃO DE FAMÍLIANeta de Dorival, fi lha de Danilo e sobrinha de Nana, Alice Caymmi
abre seu baú de lembranças para buscar no legado familiar
os ingredientes da música que produz
34 O CÉU NÃO É O LIMITEO cientista Lucas Fonseca foi o único sul-americano a participar
da missão europeia que pousou uma sonda em um cometa
a 500 milhões de quilômetros da Terra em 2014
44 ATRÁS DA CORTINATão essenciais quanto os artistas, escolhemos sete profi ssionais
que trabalham nos bastidores para que os espetáculos apresentados
pela Osesp na Sala São Paulo sejam impecáveis
SUMÁRIO
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76 VINHO: QUER QUE EU DESENHE?A designer Madeline Puckette, criadora do portal Wine Folly, tornou-se
uma referência ao simplifi car o universo do vinho. “Ninguém sabe tudo
sobre a bebida. Você poderia passar a vida toda aprendendo”
84 VERDE CONCRETOPara dar outra cor às paredes dos edifícios paulistanos e melhorar
a vida de quem mora ali, jardins suspensos brotam em São Paulo
90 Primeira Pessoa
ESPÍRITO POÉTICOVera Holtz costuma comprar objetos sem saber exatamente o motivo.
“Um tempo depois, sempre acontece algo que ‘explica’ o porquê” de espírito poético, um momento desconhecido da minha experiência, como é a imensidão do mar.”
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54 “A FELICIDADE DISPENSA TEORIZAÇÃO...”Autor de 15 livros, o professor de fi losofi a Clóvis de Barro Filho faz
sucesso misturando Platão e Nietzsche a um jogo de futebol. Assim,
criou um jeito leve de investigar a existência
62 REAL E IMAGINÁRIOO melhor museu da Europa fi ca em uma pequena casa de Istambul.
Seu acervo, criado pelo escritor Orhan Pamuk, Prêmio Nobel de
Literatura, conta a história de um casal que nunca existiu
68 ZÉ CARIOCA EM PESSOAQuem inspirou Walt Disney a criar o papagaio era paulista e teve
uma vida que pode ser resumida à palavra que ele adorava:
“Demais!”. Com vocês, José do Patrocínio de Oliveira, o Zezinho
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CÁ ENTRE NÓSVIAGEM, GASTRONOMIA E CULTURA – CONVIDADOS ESPECIAIS ABREM SUAS PREFERÊNCIAS
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A fadista portuguesa, que emocionou Caetano e tem parcerias com Chico Buarque e Milton Nascimento, fala das canções marcantes de sua vidaPOR CARLOS MESSIAS
_ CARMINHO, cantora e compositoraTRILHA SONORA
people, de 1992] por causa dele.
Eu tinha 8 anos, e músicas
como ‘Man on the moon’ ou
‘Everybody hurts’ me tocaram
profundamente.”
3. “A KIND OF MAGIC”, QUEEN“O Queen é a minha banda
anglo-saxã favorita. Eles elevaram
o pop e o rock a outro patamar
com elementos de ópera e música
clássica, sem perder a verve
dançante. E ‘A kind of magic’
representa muito bem isso.”
4. “MEU CORPO”, BEATRIZ DA CONCEIÇÃO“Uma grande inspiração no fado,
tanto para mim quanto para a
minha mãe. Ela é tradicional e foi
importante na minha formação.
Cresci vendo-a tocar. Suas
interpretações são sempre muito
verdadeiras.”
5. “COM QUE VOZ”, AMÁLIA RODRIGUES“Outra fadista portuguesa
inspiradora. Em certo momento,
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ela começou uma parceria com
o compositor franco-português
Alain Oulman e sofreu preconceito
dos puristas. Mas ela sempre fez
o que o coração mandou – e isso
é uma grande lição.”
6. “O GRANDE CIRCO MÍSTICO”, CHICO BUARQUE E EDU LOBO“Não é fácil escolher uma música
do Chico. Vou fi car com uma das
primeiras que conheci, aos 15 anos.
E, graças às voltas que o mundo
dá, acabei gravando com ele uma
canção [“Carolina”] no meu disco.”
7. “A BARCA DOS AMANTES”, MILTON NASCIMENTO“Entrei no altar [em 2013] ouvindo
esta canção. O Milton é um
padrinho musical e um padrinho
de vida. Ninguém canta como ele.
Sua música não é MPB, não
é nada mais. É Milton.”
8. “PART I”, KEITH JARRETT“Abertura do concerto que ele
gravou na Casa de Ópera de
Colônia [Alemanha]. Em breve,
vou ter a oportunidade de pisar
no palco dessa sala tão
emblemática. Nem tudo me
toca em jazz, mas o Keith Jarrett
é fenomenal!”
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1. “PRAIA NUA”, TERESA SIQUEIRA“É difícil escolher uma canção da
minha mãe. Esta me traz muitas
lembranças. A partir dela, passei a
me relacionar com o fado. Foi uma
grande revelação quando vi que
esta canção era ouvida por gente
do mundo todo.”
2. “MAN ON THE MOON”, R.E.M.“Como sou a caçula, copiava tudo
que meu irmão fazia. Comecei a
ouvir este disco [Automatic for the
8
Ouça no tablet músicas da fadista Carminho
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SUDESTE ASIÁTICO, 2012
JORNADA INESQUECÍVEL
“Em minha primeira viagem ao Oriente, escolhi Vietnã, Camboja
e Laos. As cidades vietnamitas Hue e Hoi An são imperdíveis. A
primeira foi capital imperial e ainda é possível ver a Cidade Proibida
– o que restou depois da Guerra do Vietnã. Hoi An é famosa pelos
mais de 600 alfaiates que reproduzem qualquer roupa que você
queira. No Camboja, Angkor Wat é de uma beleza inesquecível. Em
Siem Reap, cidade que serve de base para visitar os mais de 50
templos de Angkor, sugiro um jantar no hotel Amansara. Construído
na década de 50 para ser uma guest house, o lugar hospedou John
F. Kennedy e Jacqueline Onassis. Terminei a viagem no Laos, em
Luang Prabang, uma cidade pequena, mas grandiosa pela fi losofi a
de vida presente no rosto de cada cidadão. Voltaria amanhã.”
MÉXICO
PRÓXIMA PARADA
“Em maio deste ano, no meu aniversário, viajo para o
México. Nunca planejei com tanta antecedência uma
viagem, mas conhecer melhor a América Latina sempre
foi um sonho. Dividi a viagem em dois destinos: Cidade
do México e Tulum. Na primeira, quero visitar museus, ver
os trabalhos de Frida Kahlo, Diego Rivera e algumas obras
do arquiteto Ricardo Legorreta, meu ídolo na época da
faculdade. Além de pesquisar a arte e o artesanato local.
Em Tulum, vou conhecer alguns cenotes [grutas repletas de
água]– quem sabe fi nalmente aprendo a usar um snorkel –
e as ruínas maias, as únicas construídas à beira-mar.”
Laos, Camboja e Vietnã impressionaram bastante o viajante, que agora planeja comemorar seu aniversário no MéxicoPOR CAROL SGANZERLA
_ MAURÍCIO ARRUDA, arquiteto e designerSONHOS
CÁ ENTRE NÓS
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NO ALTO, MULHER VESTINDO ÁO DÀI (TRAJE TÍPICO VIETNAMITA) CAMINHA NO
PALÁCIO IMPERIAL, NA CIDADE DE HUE. ACIMA, TULUM, UM DOS DESTINOS NO
MÉXICO ONDE MAURÍCIO CELEBRARÁ SEU ANIVERSÁRIO ESTE ANO
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CÁ ENTRE NÓS
Ex-jogador de futebol do Lyon, ele não bebia até ir para França e provar os vinhos locais. Agora, no Rio, construiu adega própria para 80 garrafas POR LUCIANA LANCELLOTTI
_ JUNINHO PERNAMBUCANO, comentaristaA MENSAGEM DA GARRAFA
O NOMEUm dos mais respeitados vinhos de Bordeaux
recebeu este nome graças ao general britânico
Charles Palmer, que se aposentou e mudou
para Bordeaux em 1814, onde adquiriu a
propriedade, o então Château de Gascq.
O lugar já era intimamente ligado ao vinho –
um dos preferidos da corte de Luís XV.
A EMPRESAA Sociedade Civil Château Palmer se formou
em 1938 por um consórcio de quatro famílias
produtoras, que revitalizaram a propriedade.
As três bandeiras que hoje tremulam no
château correspondem à origem dessas
famílias: inglesa, francesa e holandesa.
Desde 2004, a empresa tem como CEO o
jovem produtor bordalês Thomas Duroux.
A PROPRIEDADEÉ considerada uma das mais bonitas e
acolhedoras da Apelação de Origem
Controlada de Margaux. Com 55
hectares de vinhedos, está localizada
em um platô no Cantenac. Dos jardins,
se avista o rio Gironde por meio das
vinhas velhas de Merlot. O solo é de
cascalho grosso, com 4 metros de
profundidade.
A SAFRAAs variedades são sempre as mesmas,
mas as proporções do corte variam a
cada ano. Em 2001, foram utilizados 51%
de Cabernet Sauvignon, 44% de Merlot
e 5% de Petit Verdot. Com potencial de
guarda estimado em até 2025, é uma
safra que recebeu 93 pontos do crítico
norte-americano Robert Parker.
“Em 2001, quando fui jogar no Lyon, já sabia que a França era o país do vinho, mas eu não bebia. Os jogadores abriam champanhe no vestiário para comemorar a vitória e eu nem provava. Com o passar do tempo, me apresentaram as regiões do Côte-Rôtie e Châteauneuf-du-Pape. Foi aí que comecei a beber com mais frequência. Me arrependo de não ter curtido naquela época, mas, hoje, celebro, abro uma garrafa, quero estar com as pessoas que amo. Quando a minha fi lha Giovana fez 18 anos, abrimos um vinho bom da adega para comemorar, não lembro qual, mas era especial [ao todo, Juninho tem três fi lhas]. Tenho aqui em casa um Château Palmer de 2001, ano em que a Maria Clara nasceu. Quem sabe a gente não guarda para o aniversário de 18 dela também?”
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Conheça outros vinhos franceses.
Acesse: itau.com.br/personnalite/experiencia
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CÁ ENTRE NÓS
Na Praia de Copacabana lotada, a ex-atleta não conteve a emoção e comemorou junto com a torcida o gol decisivo de Branco, em 1994 POR BRUNA BOPP
_ GLENDA KOZLOWSKI, jornalistaPASSE A PASSE
“A Copa do Mundo de 1994 foi a primeira que cobri como repórter.
No jogo das quartas de fi nal do Brasil contra a Holanda, fui para
a rua com a missão de gravar a reação dos torcedores. Me vi em
Copacabana com a pista tomada, telões espalhados, sem conseguir
andar. A partida estava difícil, o placar marcava 2 a 2 e Branco,
que era perseguido pela torcida, se preparou para bater uma
falta. Ele deu um chutaço. A bola saiu incandescente. Romário, na
malandragem típica dos campinhos de terra espalhados pelo Brasil,
tirou o corpo na hora exata e a bola entrou no cantinho da trave.
Comemorei junto, gritando com todos os torcedores. Tinha deixado
de competir havia um ano no bodyboarding, então, naquele
momento, ainda tinha o coração de competidora. Era uma atleta
brincando de ser jornalista.”
FICHA TÉCNICABRASIL 3 X 2 HOLANDA
9/7/1994, Cotton Bowl Stadium, Dallas, Estados Unidos. Quartas
de fi nal da Copa do Mundo. 63.500 pagantes.
BRASIL Taffarel, Jorginho, Aldair, Márcio Santos, Branco (Cafu),
Dunga, Mauro Silva, Mazinho (Raí), Zinho, Bebeto, Romário.
Técnico: Carlos Alberto Parreira.
HOLANDA De Goey, Koeman, Valck, Witschge, Winter, Jonk,
Rijkaard (De Boer), Wouters, Overmars, Bergkamp, Van Vossen
(Roy). Técnico: Dick Advocaat.
GOLS Romário aos 7, Bebeto aos 17, Bergkamp aos 18, Winter
aos 30 e Branco aos 35 minutos do segundo tempo.
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CÁ ENTRE NÓS
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No comando dos sete restaurantes do Grupo Rubaiyat, o espanhol ensina o passo a passo de um de seus pratos prediletos, o steak tartar POR BRUNA BOPP FOTO PEDRO LÓES
_ CARLOS VALENTÍ, chefÁGUA NA BOCA
1. UMA SAUDADELevar meus fi lhos, Hector e Carlota, que moram em
Madri, para a escola. E depois ir a um restaurante com
eles, de preferência japonês, culinária que adoram.
2. PRATO BRASILEIROMoqueca. Gosto muito de azeite de dendê. Quando
fui a Salvador, assistir ao jogo da Espanha na Copa,
fi z questão de experimentar a moqueca nordestina.
3. TEMPERO PREFERIDOAzeite de oliva. Ele tem, além de muitas notas
diferentes, a capacidade de transformar o prato.
4. VOCAÇÃONa minha casa sempre comemos muito bem.
Minha mãe adorava cozinhar e isso despertou em
mim a paixão pela culinária. Desde muito cedo já
sabia que seguiria pelo caminho da gastronomia.
5. HÁBITO NO TRABALHOTrabalhar em silêncio.
6. DESTINO GASTRONÔMICOQuando tiro férias, gosto de passar 15 dias em Cádiz,
no sul da Espanha, lugar com as melhores ortiguillas
(anêmonas) fritas que já comi.
7. INFLUÊNCIA NA COZINHAO tempo que tenho passado no Brasil deixou minha
mão mais pesada na hora de temperar. Tenho
caprichado, principalmente, quando uso limão.
A rotina de Carlos Valentí é assim: ele mal volta de Brasília e já tem que voar para o Chile, onde vai preparar o cardápio de mais uma unidade do Baby Beef Rubaiyat. Chef executivo do grupo há dois anos, o madrileno se divide entre os sete restaurantes da marca – além de Brasília, são três em São Paulo, um no Rio, um em Madri e um na Cidade do México. “É a chance de descobrir o que cada lugar tem a oferecer de melhor”, diz. Aos 38 anos, Carlos passa de dois a três meses em cada lugar, criando pratos e investindo na formação das equipes. Ao lado, ele ensina a receita de um dos pratos mais pedidos na unidade da avenida Faria Lima: o steak tartar.
Experimente
Baby Beef Rubaiyat
Av. Brigadeiro Faria Lima, 2954,
Itaim Bibi, São Paulo (SP).
Tel.: (11) 3165-8888
STEAK TARTAR
Ingredientes 150 g solomillo
1 colher de sobremesa da
emulsão (veja abaixo)
2 colheres de café de alcaparras
picadas
1 colher de café de pepino
em conserva picado
1 colher de café de cebola picada
1 colher de café de salsinha picada
1 colher de café de mostarda Dijon
Emulsão1 colher de sobremesa bem
cheia de mostarda Dijon
4 colheres de gema de
ovo pasteurizada
½ colher de sobremesa
de molho inglês Perrins
½ colher de sobremesa de
molho de pimenta Tabasco
1 colher de sobremesa
de conhaque
400 ml de azeite
extravirgem
Pimenta-do-reino
Sal
Modo de preparoMisture tudo e sirva gelado
(a carne deve estar bem gelada;
faça a mistura sobre um bowl
com gelo). Com um aro, monte
em um prato fundo o steak
tartar. Ao lado, coloque salada
de folhas verdes temperadas
com molho vinagrete de azeite
balsâmico e, por cima, três
batatas souffl eés.
Rendimento: 1 porção.
Tempo de preparo: de 20
a 30 minutos.
O Baby Beef Rubaiyat faz parte
do Menu Personnalité. Conheça os
pratos em: itau.com.br/personnalite/
experiencia
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PRESTÍGIO | GRUPO CORPO
Para celebrar os 40 anos do Grupo Corpo, os irmãos Pederneiras escolheram uma foto da peça Parabelo, que já foi apresentada 426 vezes
_ O BALÉ MAIS DANÇADO
O ano de 2015 é especial para o Grupo Corpo: a companhia de dança con-temporânea mais importante do país completa 40 anos. Não foi fácil chegar a um consenso da foto mais emblemá-tica da história do grupo mineiro, que tem os irmãos Pederneiras como miolo criativo. Enfi m, Paulo, diretor artísti-co, e Rodrigo, coreógrafo, fecharam a escolha em uma imagem da peça Pa-rabelo, criada em 1997. Explica-se: “O Parabelo é o nosso balé mais dançado. Até hoje foram 426 apresentações, das quais 137 só no Brasil. Ela é um mar-co de sucesso do Grupo Corpo”, diz
POR Luis Patriani
Paulo. Rodrigo, por sua vez, destaca a longevidade da montagem e o fato de ela ainda fazer parte do repertório da companhia, além de ser muito pedida no exterior. “A coreografi a de Parabelo é a mais brasileira e regional de todas as minhas criações. Ela é pujante e tem um brilho especial.”
O consenso, porém, não foi simples. Ao longo de quatro décadas, o grupo produziu peças muito marcantes, sendo que algumas com signifi cados subjeti-vos para cada um deles. “É muito pes-soal, mas a Missa do orfanato, de 1989, tem um signifi cado especial para mim.
Criei a coreografi a de uma vez só. Não parei para arrumá-la. Foi direto. Até hoje, quando assisto, sinto força e emo-ção”, revela Rodrigo. A pioneira Maria Maria, de 1976, que estreou com trilha musical de Milton Nascimento, um ano após a fundação da companhia, em Belo Horizonte, e o balé 21, cuja linguagem particular desenvolvida em 1992 ren-deu ao grupo sua assinatura até hoje, foram carinhosamente lembradas por Paulo. “O começo de tudo foi com Ma-ria Maria, que trouxe reconhecimento no Brasil. Com a peça 21, passamos a ser respeitados no exterior.”
O BALÉ PARABELO FOI O MAIS APRESENTADO PELO GRUPO
CORPO NOS 40 ANOS DE HISTÓRIA DA COMPANHIA MINEIRA
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Como Mariana Ximenes elabora seus personagens para TV e cinema e o prazer que ela tem em colecionar o trabalho de artistas plásticos, de quem acaba se tornando amiga. Dois registros (um em dourado; outro em preto) desvendam a personalidade da atriz em sua relação profunda com a arte
TELASNAS
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POR Ines Garçoni, do Rio de Janeiro FOTOS Daryan Dornelles
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PERSONNALITÉ
NO ALTO, MARIANA COMO A VEDETE AURORA
LINCOLN, NA NOVELA JOIA RARA (2013)
M ariana Ximenes entra no carro, põe delicadamente a mão no ombro do motorista, “como é seu nome?”,
pede mil desculpas pelo atraso de meia hora, “perdão, Roberto, eu tinha muitas coisas para fazer nesta manhã”, e bate o olho na televisão do painel. Vê uma imagem sem som do lutador Anderson Silva. O interesse é imediato: “Ah, olha ele! Vai lutar de novo. O que será que estão dizendo?”, pergunta. “Não, não é que eu goste de MMA. Eu curto histórias de superação. Adoro conhecer a trajetória das pessoas, saber quais caminhos escolhem na vida.” Às 9 da manhã, 29 graus do lado de fora, de cabelo preso e sem maquiagem, carregando “uma pasta, uma bolsinha e um bolsão” cheios de papéis e objetos de trabalho, Mariana já está absolutamente atenta a tudo ao redor. “Sou curiosa”, solta, quase sem querer.
Sempre foi assim, ela conta. A curiosidade impulsiona sua carreira há quase 20 anos: “Por que essa personagem age de tal maneira? Ah, então ela é feliz desse jeito? Eu aprendo com elas e amplio horizontes, me questiono”. Aos 34 anos, a paulistana Mariana Ximenes do Prado Nuzzi é
hoje uma das mais importantes atrizes de sua geração. No currículo extenso – sem contar os tempos de garota-pro-paganda na infância e na adolescência – não faltam elogios da crítica e prêmios. Da protagonista Aninha, de Chocolate com pimenta (2003), passando pela vilã Clara, de Passio-ne (2010), até a vedete sexy Aurora Lincoln, de Joia rara (2013), se tornou popular graças às novelas de televisão, mas transita por outras searas — teatro, cinema e até artes plásticas, como personagem de algumas obras: “Ser ator é querer dizer alguma coisa, se expressar. Podemos provocar, estimular, instigar, e sermos provocados também. A cada processo eu me transformo”, diz. “Busco sempre aprender e evoluir. Para me tornar um ser humano melhor.”
O carro vai chegando à Cidade das Artes, pavilhão que abriga um complexo cultural na Barra da Tijuca, zona oeste carioca, e em 40 minutos de viagem Mariana já falou com entusiasmo sobre a descoberta de uma “cultura superdiferente” na Índia, onde passou o réveillon, sobre como foi “incrível” escalar o Morro da Babilônia e ver o Pão de Açúcar por um ângulo diferente.
A ATRIZ
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19“O MEU RETRATO MAIS BONITO”, DIZ MARIANA SOBRE A FOTO
DA SÉRIE CONTRE JOUR, DO ARTISTA VICENTE DE MELLO
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M ariana Ximenes caminhava pelo vão da Cidade das Artes durante o ensaio fotográfi co quando deparou com uma
grande escultura de ferro. “Que lindo, de quem é?”, perguntou ao léu, caso alguém pudesse responder. Diante do silêncio, abordou uma funcionária da casa que perambulava por ali. Nada feito. Horas depois, ensaio quase terminado, a atriz cruza com um sujeito de crachá: “Por favor, o senhor sabe de quem é aquela obra de ferro?”. A dúvida se desfaz na hora; “a obra, sem título, é de José Bechara”. Ao que Mariana, feliz, emenda: “Ah, é do Bechara, claro! Ele também é meu amigo”.
A paixão pelas artes plásticas começou ainda adolescente, estimulada pelos pais, o advogado Pedro e a fonoaudióloga Fátima, eles próprios frequentadores assíduos de exposições. “Lembro até hoje da primeira vez que fui a uma edição do [projeto de intervenções urbanas em São Paulo] Arte Cidade, tinha uns 15 anos e estava com uma amiga”, conta a atriz. “A viagem começava já no vagão, na Estação da Luz, quando o trem entrava em movimento. Na janela, uma obra de arte ia se formando instantaneamente.” Hoje, 20 anos depois, além de algumas obras de arte em casa, Mariana também coleciona
amizades entre pintores, fotógrafos, escultores, grafi teiros. E as lembranças de museus, galerias e obras são tantas que ela quase se perde, entusiasmada, ao contar algumas das experi-ências. “Ai, espera! Esqueci de falar do Hermitage, em São Pe-tersburgo! Fiquei três dias chorando de emoção com aqueles Rembrandts maravilhosos.” Descontado o exagero, Mariana é, de fato, bastante sensível às artes.
Quem diz isso são os amigos. O artista carioca Ernesto Neto vê na atriz “uma forte sensibilidade para a coisa artística, muito aberta e curiosa. Como a arte é um mundo que beira o sobrenatural e transcende essa realidade brutal que a gente recebe hoje em dia, o interesse da Mariana faz com que ela tenha uma conexão, uma ponte de ordem espiritual, com esse universo oculto e simbólico”. Gustavo, um d’OSGÊMEOS, ou-tro amigo da atriz, acha “muito importante alguém como ela, com tanta sensibilidade, dividir o que tem dentro de si, fi ltrar o que enxerga, escuta e vivencia, e passar para outras pessoas. E ela faz isso de forma tão simples e direta”. Mariana tenta defi nir do que se trata a sua própria sensibilidade: “Não sei… Apenas adoro tudo o que mexe com os sentidos”.
A APRECIADORA DE ARTE
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PERSONNALITÉ
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Falou também sobre os aniversários que já comemorou em lugares inusitados – uma vez num barco nas Ilhas Cagarras e outra numa cachoeira no Horto, às 7 da manhã, levando um brunch e uma toalha na mochila. “Eu desfruto da cidade”, explica, “sou uma paulista apaixonada pelo Rio. Subo a Pedra da Gávea, vou à Floresta da Tijuca. Amo praia. Tenho até minha própria prancha de stand-up paddle”. Seu carro só sai da garagem para ir ao Projac; no resto do tempo, anda a pé e de bicicleta pela Gávea, bairro onde mora há dois anos. Antes, em Ipanema, “uma delícia de lugar”, viveu com o produtor de cinema Pedro Buarque de Hollanda, com quem foi casada dos 20 aos 28 anos, e com a mãe, depois da separação. Às vés-peras do Carnaval deste ano, Mariana foi à quadra da Portela e sambou ao lado do novo namorado, um empresário paulis-ta, como “pinto no lixo”, diziam os jornais no dia seguinte.
Flâneur, sim. No entanto, mais do que da rua, Mariana parece gostar de gente. Promove jantares com amigos em casa para debater ideias, arte, política etc. Quando pode, vai à casa do vizinho jornalista Jorge Bastos Moreno, comentarista político de O Globo, onde são famosos os encontros do mesmo gênero. Lá, num desses convescotes, conheceu o escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras Zuenir Ventura, 83 anos, autor de “1968 — O ano que não terminou”, obra que ha-via lido recentemente. “Mariana é interessadíssima, antenada, um papo superagradável”, diz Zuenir. “Está ligada em todos os movimentos. Conversamos horas sobre cinema, literatura… E é muito natural, sem arrogância ou preocupações com a própria imagem, algo que se esperaria de uma atriz tão famosa.”
“SER ATOR É QUERER DIZER
ALGUMA COISA... PROVOCAR, INSTIGAR”
1. MARIANA COM ZUENIR VENTURA 2. DANÇANDO NA QUADRA DA
PORTELA 3. INTERPRETANDO A VILÃ CLARA DA NOVELA PASSIONE
4. A PEQUENA MARIANA XIMENES NOS ANOS 80 5. OUTRA OBRA DE
VICENTE DE MELLO, DA SÉRIE O CINEMATÓGRAFO 6. SE PREPARANDO
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De alguns artistas, é ao mesmo tempo admiradora e musa. O fo-tógrafo carioca Vicente de Mello fez um dos seus retratos mais bonitos, na opinião da atriz, com uma Rolleifl ex. Os dois viajavam pelo Recôncavo Baiano, ao lado da artista Adriana Varejão, e um dia, caminhando, passaram por uma construção abandonada. “Ti-nha um patamar e umas árvores, e eu pedi para ela subir ali. Ela foi, fez um movimento que dá a sensação de que está se jogando ou caindo, e indicando uma rosa dos ventos. Foi tudo muito rápi-do, e ela desceu toda feliz. É alguém que se dispõe naturalmente, sem frivolidades, generosa. Tem uma liberdade própria”, explica Vicente. “Fala de arte com uma esperteza sensacional, pergunta o que você acha da questão, tem curiosidade pela opinião do ou-tro.” Com Varejão – hoje casada com o ex-da atriz, Pedro Buarque de Hollanda –, Mariana visitou Inhotim, em Brumadinho (MG), instituto que abriga uma das mais importantes coleções de arte contemporânea nacional, antes mesmo da inauguração. “Perdi a conta de quantas vezes já fui”, diz. “É um lugar mágico.”
Além de arte, Inhotim tem também de sobra outra coisa que a atriz adora: árvores. Como na casa da arquiteta Lina Bo Bardi, em São Paulo, “onde há árvores plantadas por ela mesma há 50, 60 anos”. Lá Mariana visitou uma exposição, em 2013, com uma série de instalações. Uma delas, de Cildo Meirelles, ela considera inesquecível: “Ele deixou uma máquina de café ligada direto e o cheiro invadia o ambiente, enquanto uma gravação com a voz do marido dela, Pietro, dizia ‘Lina, va fare un caff è’. Muito legal, você se transportava para aquele tempo. E a casa, suspensa por pilotis, fi ca na altura das copas das árvores. Como ela é toda de vidro, você vê a paisagem. Quer mais arte que as copas das árvores?”.
“PERDI A CONTA DE QUANTAS
VEZES FUI PARA INHOTIM. É UM
LUGAR MÁGICO”
PARA VIVER A TRAPEZISTA MARGARETE NO FILME O GRANDE
CIRCO MÍSTICO, DE CACÁ DIEGUES 7. COM O ÍDOLO DE INFÂNCIA
JASON PRIESTLEY, COM QUEM ESTRELARÁ O FILME ZOOM
8. DESBRAVANDO A ÍNDIA NO RÉVEILLON DE 2015
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PERSONNALITÉ
“SOU UMA PAULISTA
APAIXONADA PELO RIO DE JANEIRO.
EU DESFRUTO A CIDADE”
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PERSONNALITÉ
_“No meu caos, eu me entendo”
Uma pasta de elásticos verde, simples,
guarda um caderno, canetinhas coloridas,
a imagem de uma escultura sacra impressa
e o roteiro do fi lme O grande circo místico,
onde se lê, com a letra de Mariana Ximenes,
“Margarete”. A personagem do fi lme de
Cacá Diegues é uma trapezista devota de
Santa Teresa D’Ávila, católica fervorosa, que
vê o sonho de casar virgem interrompido
por um estupro.
No caderninho, marcadores de página
indicam o lugar de temas como “Filmes” e
“Livros”, e há anotações esparsas, aparen-
temente sem ordem, de ideias que Mariana
tem para a construção da personagem. “No
meu caos, eu me entendo”, ela brinca. O
que a atriz faz é documentar, desde os pri-
meiros papéis que interpretou na vida, o seu
processo criativo. Para cada personagem,
uma pasta. Em outro caderninho, quando se
preparava para o fi lme Mãos de cavalo, com
estreia prevista para este ano, e precisou
aprender a escalar, deve ter anotado um
pensamento do instrutor que a marcou bas-
tante: “Ele perguntou: ‘você sabe qual é o
principal objetivo do escalador?’. A resposta
simples é ‘chegar no topo’. Mas ele disse:
‘Errado. É percorrer o caminho. Isso é o mais
importante’. Achei tão lindo isso”.
NO ALTO, A PASTA E O CADERNO COM O MATERIAL DE PREPA-
RAÇÃO DE MARIANA PARA O FILME O GRANDE CIRCO MÍSTICO
O amigo artista plástico Delson Uchôa defi ne Mariana em poucas palavras: “Uma diva contemporânea sem fricote”, brinca o pintor, que vive na Praia de Ipioca, a 20 quilôme-tros de Maceió. “Ela passou um réveillon aqui em casa, há uns dois anos, e fi quei impressionado com sua capacidade de fazer amizades.”
A atriz lembra dessa e de outras viagens com saudades. Quase sempre atraída pela natureza, já fez um safári na Tanzânia — e viu uma leoa e seis fi lhotes devorarem um búfalo — “sim, gosto de lugares exóticos” . No ano passa-do, foi a Alter do Chão, no Pará, e passou seis dias num barco, dormindo em rede. Fica “muito emocionada” a cada visita a Fernando de Noronha. Recomenda a qualquer um ir a Nova York no fi m de abril para ver o espetáculo das cerejeiras fl oridas no Jardim Botânico do Brooklyn. Na Ín-dia, dormiu em tendas, navegou rios, andou em elefantes e camelos. Mas também comeu e dançou com novos amigos indianos, “um casal que, se eu não tivesse conhecido, não teria me levado num dos castelos mais lindos que já vi”. Quinze dias não foram sufi cientes e a deixaram ainda mais curiosa sobre o país. “Recomendo mais tempo. Se eu pu-desse, fi cava por lá. Mas precisava voltar para trabalhar.”
Há cerca de um ano longe da TV, Mariana está se de-dicando ao cinema. Em 2015, estreia três fi lmes, entre eles Zoom, primeiro do diretor Pedro Morelli, ao lado de Gael García Bernal e Jason Priestley, o astro da série Barrados no baile, “meu ídolo de adolescência!”, se diverte.
A artista se diz disciplinada e dedicada: “Sem gostar de estudar, o ator não vai longe”. Desde 2004, a psiquiatra e coach de atores Katia Aschcar é sua parceira fundamental. “Nosso trabalho mais marcante foi a psicopata Clara, de Passione, uma difícil composição. Ela tinha três persona-lidades diferentes. Foram horas e horas de dedicação. Es-tudamos cena a cena, da interpretação e compreensão do texto, intenções e subjetividade”, lembra Katia, para quem Mariana, “com seu talento e confi ança, executa de manei-ra brilhante o trabalho diante das câmeras ou no palco”. Agora, a dupla está engajada na composição de Margarete, a trapezista de O grande circo místico, fi lme de Cacá Die-gues. A preparação inclui aulas de trapézio diárias: “Para compreender essa personagem, eu preciso fazer, entender a força, o cansaço, a disciplina dela”, comenta Mariana. “Tudo isso também é parte do meu próprio caminho, da minha trajetória.”
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A conjugação arte e natureza também já levou Mariana algumas vezes ao Storm King Art Center, parque de esculturas a 1 hora e meia de Manhattan, “onde tem um Richard Serra, gigantesco, Joseph Beuys… você anda pela natureza e de repente vê uma escultura enorme. É um passeio maravilhoso”.
Em Nova York, Mariana seguiu os passos da poeta e cantora americana Patti Smith, descritos por ela no livro Só garotos, no qual narra sua juventude nova-iorquina ao lado do fotógrafo Robert Mapplethorpe. “Anotei as referências que ela dá no livro, fui aos lugares que ela foi naquela época, e por fi m consegui ir a um show”, conta, orgulhosa. “É uma brincadeira de estímulos, de curiosidade, de inquietude. Se for algo que me mobiliza e me emociona, vou a fundo na pesquisa.” Foi assim também com a obra do artista irlandês Francis Bacon, de quem é admiradora: “Já gostava do Bacon e comecei a pesquisar toda a obra, fui atrás das fontes de inspiração dele”.
Uma das principais atrações para Mariana nas obras de arte são exatamente as fontes de inspiração dos artistas – e que aca-bam se tornando um pouco as suas também. “Me interesso pelo processo criativo. Como ele chegou nesse raciocínio, o que ele está lendo, quais são as referências, o que o motivou?” Em maté-ria de caminhos percorridos, tanto faz, para ela, se são certos ou
errados. O que importa é a trajetória em si. “Cada um faz a sua. Cada indivíduo tem uma identidade no seu dedão, cada um é único. Nem eu estou certa, nem o outro está errado. Aprendi, com o meu trabalho, a não julgar ninguém.”
Em casa, a atriz tem algumas peças, “muito menos do que gostaria, claro”, de estrelas como Vik Muniz, Ernesto Neto, Adriana Varejão, Ângelo Venosa, Delson Uchôa, Nel-son Leirner, Cildo Meirelles, Marcos Chaves, entre outros. São quase todos seus amigos. Inclusive Leirner, 82 anos, de quem fi cou próxima quando participou de um trabalho assi-nado por ele. “Convidei Mariana para ser fi gura principal na capa de um caderno feminino que fi z a convite do jornal O Globo. Imediatamente houve uma empatia muito grande e nos tornamos amigos”, conta Nelson. “Conversamos bastan-te sobre arte, cinema, teatro, televisão… Ela é muito culta. Tem alguns trabalhos meus, pequenos, e em datas signifi ca-tivas sempre mando algo feito por mim.” Mas Mariana recu-sa o rótulo de colecionadora. Rejeita ainda mais o carimbo de “entendida”. “Tenho medo de dizer que entendo de arte porque eles, os artistas, estudaram muito e eu não. Prefi ro dizer que sou apreciadora. Mas uma grande apreciadora”, diz, sorrindo.
A ATRIZ PAULISTANA POSA AO LADO DE UMA
ESCULTURA DE FERRO FEITA POR SEU AMIGO JOSÉ
BECHARA NA CIDADE DAS ARTES, NO RIO DE JANEIROBaixe a Revista Personnalité no tablet
e assista ao vídeo com Mariana Ximenes
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Neta de Dorival, fi lha de Danilo e sobrinha de Nana, Alice Caymmi esmiúça seu baú de lembranças para buscar no legado familiar
os ingredientes da música que produz
REUNIÃO
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POR Joselia Aguiar
A voz grave, parte do repertório e o sobrenome identifi cam Alice: é uma Caymmi. A cantora
nasceu envolta em música e teve lugar para levar adiante a vocação. Mas não é porque segue o cânone que a neta de Dorival (1914-2008), fi lha de Danilo e sobrinha de Nana tem sido apontada como um dos nomes mais interessantes da MPB. Ao contrário.
O jeito particular da artista de 25 anos se alicerça justamente na transgressão, uma combinação ousada de arranjos, interpretação, fi gurino e maquiagem. Logo nota quem escuta seu segundo disco, Rainha dos raios. Ela reúne de Gil e Caetano a Arto Lindsay, MC Marcinho e Michael Sullivan. A marca da perso-nalidade também nota quem a assiste em shows ou no DVD homônimo. Com cabelo descolorido e pier-cing, sua apresentação é dirigida por Paulo Borges, idealizador da São Paulo Fashion Week.
À música, Alice vem acrescentando o que apren-deu no teatro (é formada pela PUC-Rio), nas expo-sições que sua mãe, Simone, que foi cantora e atriz e
hoje exerce a psicologia, a ensinou a frequentar. Desde menina canta, compõe e toca violão. Hoje também desenha e pinta. Diz que tem quadros prontos, mas “experimentações”, nada que pensa em expor.
“Minha família foi muito importante na minha formação musical, sobretudo na artista que sou hoje”, explica. “Ela me deu liberdade para que pu-desse ser não só mais uma Caymmi, e sim Alice.” A cantora vive uma fase de agenda cheia e busca por experiências. “Estou sempre procurando outras referências, não somente brasileiras. É uma admi-nistração estética do trabalho, penso na plasticidade junto ao som, na desconstrução tanto da imagem quanto da música.” Tudo tem acontecido rápido. A estreia foi em 2012. Desde então amadureceu, como diz a crítica. A última, ela soube pela TV, quase por acaso: sua música “Como vês” virou tema da minis-série Felizes para sempre?, da Rede Globo. Pelas fotos retiradas do baú de Alice Caymmi, dá para dizer que nem foi tão rápido assim. Tem já 25 anos.
ALICE CAYMMI INTERPRETA CÁSSIA ELLER EM
EPISÓDIO DA SÉRIE CANTORAS DO BRASIL, EXIBIDO
PELO CANAL BRASIL, EM NOVEMBRO DE 2014
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“NA INFÂNCIA, O QUE ME DEIXAVA MAIS FELIZ ERA FICAR NO ESTÚDIO DO PAPAI”
“Das coisas que mais me deixavam feliz na infância, fi car no estúdio que o papai tinha em casa era especial. Dá para ver como estou feliz nesta foto, era o auge da minha vida. O neném fi ca louco com o teclado.
Ele me segurava e me botava para tocar dó-ré-mi-fá-sol-lá-si-dó. Fazemos apresentações juntos desde os meus 15 ou 16 anos. Temos uma química muito boa, e ele diz que minha presença o deixa mais calmo no palco.”
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“TOM JOBIM ME COLOCAVA NO COLO E ME DEIXAVA BRINCAR NO PIANO”
“A minha mãe quando estava grávida de mim fazia parte da Banda Nova, do Tom Jobim. E meu pai também. Então, meu contato com a sua música é anterior a tudo! Foi a primeira coisa que ouvi, até antes
do meu avô Caymmi. E havia outro motivo de proximidade também. Meu avô materno, pai da minha mãe, casou com a Helena Jobim, irmã do Tom, nesse que foi o segundo casamento dele. Tenho memória olfativa forte: do charuto, do chão de madeira da sala de ensaio. Lembro que me colocava no colo e me deixava mexer no piano, coisa que raramente deixava alguém fazer, porque era um piano valioso, caro.”
“NO MEU ANIVERSÁRIO DE 1 ANO, NO COLO DO MEU AVÔ”
“Lembro-me, entre as cenas que guardo desses primeiros anos, de ver o meu avô pegar no violão e cantar. Ouvir sua voz era de um impacto grande, aquela voz forte, grave como seria a de todo mundo da família.
A foto é do meu aniversário de 1 ano. Com 1 ano você nem sabe exatamente quem é, não consegue interagir direito, então eu não devia estar muito feliz com a festa. Mas certamente ele estava. Meu
avô adorava criança. A cantar a gente não sabe quando começa, mas a tocar violão foi com 10 anos. Já adolescente, mostrei o que fazia para ele, que dizia gostar, achava bonitinho. Por um tempo me distanciei
de sua música para me aproximar de novo, anos mais tarde. Foi quando parei para ouvir um box com toda sua obra. Fiquei muito impressionada e emocionada, um momento importante para mim. No show
Dorivália, ano passado, fi z uma releitura do meu avô, do meu jeito.”
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“TINHA 12 ANOS EM MINHA PRIMEIRA GRAVAÇÃO COM A TIA NANA”
“Minha tia Nana tem uma voz rara, assim como era a do meu avô. A foto registra a minha primeira gravação. Uma música chamada ‘Seus olhos’, da minha irmã Juliana Caymmi, que é compositora.
Eu tinha 12 anos, saí direto do colégio. Gravei o disco e depois cantei no Canecão com ela. A minha mãe me acompanhou nesse dia e está na outra foto. Começou como cantora e atriz, mas largou a trajetória artística para ser psicóloga. A minha relação com as artes plásticas se
deu muito por causa do seu estímulo – desde que eu era pequena, me levava para visitar exposições, cresci com essa curiosidade, essa inclinação.”
“VOVÓ TINHA UM GÊNIO FORTE E UM HUMOR MUITO INTERESSANTE”
“Vovó [Stella Maris] tinha uma voz maravilhosa, foi uma grande cantora de rádio, época em que conheceu meu avô. Cantava muito em casa fazendo as coisas. De gravação dela, a única que conheço é ‘Canção da noiva’, no disco Caymmi visita Tom. Não sei se existem outras. Tinha um gênio forte e um humor muito interessante. Uma verdadeira matriarca: estava sempre muito próxima de todo mundo, cuidava da família com muita força. Gostava que eu cantasse. Mas ninguém fi cou do lado de ninguém
dizendo ‘aprenda’, muito menos fi zeram isso comigo. Se via inclinação, deixava fl uir.”
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“ESTOU COM O MEU PAI, NO ENCERRAMENTO DO PAN-AMERICANO DE 2007”
“Estamos [com o pai Danilo] no Rio de Janeiro, durante o encerramento dos Jogos Pan-Americanos de 2007, pouco antes de eu fazer vestibular para Direito. Passei e um ano foi o sufi ciente para me desiludir
e entender que não nasci para aquela carreira. Então, passei para o teatro.”
“QUANDO A FAMÍLIA SE REÚNE, A GENTE BOTA A TIA-AVÓ DINAIR PARA CANTAR”
“Meu tio Dori é um grande maestro e arranjador. Lembro-me de vê-lo regendo, controlando tudo. A sua musicalidade se desenvolveu com um tipo de estudo diferente do que a família seguiu. Foi uma grande infl uência
para mim quando comecei a tocar violão e a compor. Quis entender a obra dele, conhecer as semelhanças e diferenças. Na foto, ele toca violão para minha tia-avó Dinair, que já passou dos 90, cantar. Muito lúcida, ela tem
a voz da família. Quando a gente consegue reunir a família, a gente bota a tia-avó para cantar.”
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O QUE MAIS MOTIVA VOCÊ NO TRABALHO?
MARIANA XIMENES PERGUNTA:
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LUCAS FONSECA RESPONDE: A ideia de trabalhar com espaço já é convidativa o sufi ciente para
gerar uma motivação diária. A minha real motivação deriva de um sonho de criança e assim segui até conseguir realizá-lo. Mas
minha maior motivação sempre foi o fato de poder acordar e saber que estava criando o incrível a cada dia. Tento aplicar a mesma
motivação do incrível para cada atividade que faço na vida. Não precisa ser necessariamente relacionada com o espaço.
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O CÉU NÃO É O LIMITE
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POR Salvador Nogueira ILUSTRAÇÕES Vapor 324
O cientista Lucas Fonseca foi o único sul-americano a participar da missão europeia que pousou uma sonda em um cometa a 500 milhões de quilômetros da Terra em 2014. Agora, pensa na próxima: “Quero mandar um satélite brasileiro para a Lua”
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PERSONNALITÉ
N as primeiras horas da tarde do dia 12 de novembro de 2014, uma quarta-feira, o engenheiro Lucas de Mendonça Fonseca, 30 anos, perdeu alguns de seus pou-
cos fi os de cabelo. Ele acompanhava, do Brasil, pela internet, o tenso desenrolar de acontecimentos durante a primeira tentativa de pouso de um artefato humano na superfície de um cometa. Junto ao pequeno módulo Philae, levado até o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko pela sonda europeia Rosetta, a uma distância de 500 mi-lhões de quilômetros da Terra, voavam os frutos de três anos de trabalho do brasileiro na Europa. Isso sem falar numa vida inteira de sonhos espaciais. “É difícil dizer quan-do começou. Sempre tive interesse por espaço”, conta Lucas. “Minha mãe e meu pai lembram que eu dizia, desde pequenininho, que não queria ser astronauta, que o que queria era construir uma nave.” Nascido em 1984, com fala mansa e expressão jovial, Lucas defi ne sua infância como a de um geek. “Com a diferença de que naquela época não se usava esse termo, era ‘nerd’ mesmo”, diz. Fã de fi cção científi ca, se apaixonou por Star wars, saga criada em 1977 pelo cineasta George Lucas que reúne duas das paixões de seu xará brasileiro: robôs e exploração espacial. “Gostava muito dos fi lmes, mas hoje não estou ansioso pela estreia do próximo [prevista para dezembro]. Aliás, não estou ansioso por fi lme algum.” O desinteresse pela fi cção talvez tenha uma expli-cação: a maioria de seus sonhos infantis, ele tornou realidade.
O JOVEM LUCAS NO CABO CANAVERAL, NA FLÓRIDA (EUA), EM 1994
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LUCAS FONSECA
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PRIMEIRO PASSO
Ao contrário do que está incrustrado na imaginação popular, nem só de Nasa vive a ciência que estuda o que está acima de nós. Existem projetos de sucesso banca-dos pela China e muitos países europeus. A própria missão Rosetta, ao custo de R$ 4,5 bilhões, conta com uma equipe multinacional, estabelecida em uma base em Darmstadt, na Alemanha.
No entanto, anos atrás, ainda moleque, os sonhos de Lucas Fonseca coincidiam com o clichê da maioria das pessoas: qualquer interesse mais ousado pelo espaço era sinônimo de um trabalho na agência espacial americana. Com esse ideal em mente, o jovem iniciou sua jornada acadêmica. “Quando era estudante, não havia no Brasil cursos de engenharia espacial”, explica. “Então, o que fazia mais sentido era cursar mecatrônica.” Assim, em 2003, Fonseca deixou a cidade praiana de San-tos, onde nasceu, e se mudou para São Carlos, no interior paulista, onde se formaria em engenharia mecatrônica pela Universidade de São Paulo. No segundo ano de faculdade, já estava enviando currículos para a Nasa. A resposta vinha, polidamen-te, com uma negativa: as portas estavam fechadas.
No Brasil, o setor aeroespacial é ingrato – as oportunidades são poucas e, no ge-ral, resultam em mais frustração que resultados. “Eu já sabia um pouco sobre como as coisas funcionavam por aqui. Em 2006, sem chance nos Estados Unidos, acabei indo trabalhar na indústria farmacêutica.” Empregado na Johnson & Johnson, a vida melhorou. O salário era excelente, a carga horária, leve. O engenheiro encon-trava tempo para exercitar hobbies. Entre eles, tocar guitarra. “Mas aí olhava para a baia na minha frente e via um funcionário mais velho, um engenheiro de 40 anos, fazendo a mesma coisa que eu. E pensava: não quero passar o resto da vida aqui.”
O sonho da Nasa, claro, não estava morto.
ENCRUZILHADAS
A guinada transatlântica veio de súbito. No fi m de 2008, ao conversar com ami-gos e colegas, chegou à conclusão de que precisava investir numa complemen-tação à sua formação, feita no exterior e voltada para a engenharia espacial. Re-cebeu o apoio da então namorada, Lia, que conheceu nos tempos de faculdade e com quem está até hoje. “Ela disse: ‘Você tem esse sonho. Você tem que ir’.”
De início, a solução foi procurar uma bolsa europeia para estudantes de outros continentes – a Erasmus Mundus. Duas boas faculdades vinculadas ao programa de incentivo, na Alemanha e na Inglaterra, ofereciam mestrado em engenharia espacial naquele ano. Lucas foi aprovado nas duas. Mas não era exatamente lá que queria estudar. Seu desejo apontava para a tradicional Su-paero (Institut Supérieur de l’Aéronautique et de l’Espace), a melhor escola de engenharia aeronáutica francesa, localizada em Toulouse. “Em janeiro de 2009, escrevi um e-mail para eles, que responderam: ‘Temos o curso de mestrado, mas não estamos dando bolsa este ano. Você pode disputar uma vaga normalmente, mas terá de pagar’.” O brasileiro não levou muito tempo para decidir. “O preço do curso ia dar mais ou menos o valor do meu carro. Ele ia fi car pegando poeira na garagem enquanto eu estivesse por lá, então vendi o carro e paguei os estudos.” Não se arrependeu. “Tudo que me aconteceu depois, devo a esse curso. O método de ensino deles lá é fantástico. Nunca vivenciei nada parecido aqui no Brasil.”
Lucas Fonseca não é só um explorador
do espaço. Quando nos encontramos
para conversar, ele estava em meio aos
últimos preparativos para uma viagem à
Argentina. O objetivo: subir o Cerro Plata, a
cerca de 6 mil metros de altitude. É a mais
recente de uma longa série de aventuras de
montanhismo das quais ele já participou.
“Comecei muito cedo com história de
acampamentos e contato com a natureza”,
conta. “Passei por todas as fases do
movimento escoteiro. Fiz parte dos 6 aos
18 anos.” Ao subir montanhas, ele encontra
tranquilidade e paz. “Tem gente que se
incomoda com o isolamento. Eu gosto”, diz
o fã do explorador Amyr Klink.
A conquista do Cerro Plata, no fi m de
janeiro, foi o recorde de altitude de Lucas.
Mas ele vai além. Até o fi m de 2015,
quer fazer a Trilha Nacional de Israel (mil
quilômetros entre desertos e cidades
históricas) e o ponto mais alto no hemisfério
Sul, o Aconcágua (6.962 metros).
“Vamos ver se consigo.”
Em casa, Lucas não desgruda dos livros.
“Acostumado a ler muito e de tudo, sempre
carrega um livro e vive em busca de
atividades que lhe permitam criar. Sejam
a letra e a melodia de uma música, um
painel de controle eletrônico para nosso
sistema caseiro de irrigação ou um delicioso
jantar”, entrega a esposa, Lia. O engenheiro
também se arrisca como mestre-cuca. “Sua
especialidade é salmão ao forno com queijo
de cabra e vagem francesa.”
_Nas horas vagas, montanhismo
Baixe a Revista Personnalité no tablet
e veja a receita favorita do Lucas
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PERSONNALITÉ
O MESTRADO NA FRANÇA
Durante a estadia na França, de 2009 a 2010, Lucas decidiu buscar auxílio do astronau-ta brasileiro Marcos Pontes. “Não o conhecia pessoalmente, mas era alguém que estava na Nasa e podia me ajudar.” Depois de três meses do primeiro contato, Pontes escreveu a Lucas: “Acho uma ótima iniciativa essa sua de querer vir para a Nasa, mas quero te levar para o programa espacial brasileiro. Precisamos de jovens como você”. Pontes se recorda das tentativas do cientista. “O Lucas é um rapaz brilhante”, diz. “Seria uma excelente adição ao programa brasileiro e por isso apresentei o nome dele à Agência Espacial Brasileira [AEB], mas ainda é difícil desenvolver a carreira de engenheiro es-pacial no país. Muitas vezes, aos jovens resta buscar experiência e oportunidades fora.”
Algum tempo depois da conversa com o astronauta, Lucas recebeu uma ligação. Era Carlos Ganem, então presidente da AEB. Ele queria costurar os arranjos para repatriar Lucas. Ofereceu um estágio prévio de um ano na empresa aeroespacial europeia Astrium. Ficou também acertado que um órgão do governo brasileiro, o CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científi co e Tecnológico), iria reembolsar os gastos que o cientista havia tido com os estudos na França. Só que nada disso aconteceu. “Em defesa do Ganem, ele falou que ia ligar para o presidente da Astrium, e ele de fato fez isso. Mas, de resto, nada andou”, lembra.
Em 2011, o momento de apresentar a dissertação do mestrado se avizinhava, e Lu-cas precisava encontrar um lugar que o abrigasse. Na Supaero, o trabalho fi nal dos alu-nos é realizado dentro de alguma agência ou empresa espacial. Eis que surgiram duas opções. Em contato com a astrofísica brasileira Duília de Mello, radicada nos Estados Unidos, foi oferecida a Lucas a chance de realizar um pequeno projeto que emparcei-rava a Universidade Católica da América e... a Nasa. Depois de tanto orbitar seu destino dos sonhos, parecia hora de um pouso de sucesso dos Estados Unidos. Mas uma outra opção despontou: Lucas poderia ir à DLR, a agência espacial alemã, e trabalhar com um projeto então não muito conhecido, mas ousado e promissor, a missão Rosetta.
O COMETA NO MEIO DO CAMINHO
Diante do dilema, Lucas refl etiu: “Por um lado, era a chance de fi nalmente realizar o sonho e trabalhar na agência espacial americana. Mas era apenas uma ideia, uma vontade, algo que podia nem se materializar”, explica. “Por outro lado, a Rosetta era uma espaçonave que já estava no espaço, era uma missão concreta. Acabei optando pela DLR.” E assim o sonho americano começou a dar lugar à realidade alemã.
Quando Lucas chegou à Europa, os engenheiros estavam diante de um grande de-safi o. Como pousar num cometa uma espaçonave originalmente pensada para descer em outro, muito menor? A Rosetta fora projetada na década de 1990. Seu alvo era o cometa 46P/Wirtanen. Todos os componentes tinham sido desenvolvidos para esse objeto. Mas, quando houve um problema com o foguete que ia levá-la ao espaço, foi preciso adiar o lançamento. O sistema solar não costuma perdoar atrasos. Objetos ce-lestes mudam de lugar com o tempo e, uma vez perdida a janela de lançamento, torna--se impossível repetir a tentativa – pelo menos por um longo período.
A alternativa encontrada foi buscar outro cometa. O 67P/Churyumov-Gerasi-menko – astro dez vezes maior. Os desafi os gerados pela mudança seriam enfrentados durante a longa jornada de dez anos até a Rosetta chegar lá – entre 2004, momento do lançamento, e 2014, a esperada inserção orbital. Caberia aos engenheiros da DLR,
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A SONDA ROSETTA
Com 2,8 metros de altura por
2,1 de largura, a sonda pesa 3
toneladas e está acoplada a
painéis solares de 14 metros de
extensão. Foi aparelhada com
11 instrumentos de medição
que buscarão indícios de água
e carbono, fundamentais para
a origem da vida.
A TRAJETÓRIA
O pouso aconteceu a 500 milhões
de quilômetros da Terra. Desde
2004, a Rosetta percorreu mais
de 6 bilhões de quilômetros.
O MÓDULO PHILAE
Equipado com painéis solares,
pesa 100 quilos e se assemelha a
uma máquina de lavar roupa, com
1 metro de altura. Ele recolheu
nas primeiras 64 horas desde o
pouso dados gerados a partir de
amostras de solo e fotografi as,
enviados mais tarde para a sonda
em órbita e depois reenviados
para a Terra, a uma velocidade
de 28 kbps (a taxa é metade da
atingida por uma conexão de
internet discada).
O COMETA
67P/Churyumov-Gerasimenko
foi descoberto em 1969.
Por ser objeto ativo e com
pouca gravidade, difi cultou
os cálculos da trajetória de
ataque. A sonda passou
seis anos em órbita elíptica
ao redor do Sol e usou a
gravidade da Terra e de Marte
para tomar impulso para o 67P.
_A missãoA sonda Rosetta foi lançada no dia 2 de março de 2004 da base de Kou-
rou, na Guiana Francesa, a um custo de R$ 4,5 bilhões. Depois de dez
anos de viagem, a Agência Espacial Europeia conseguiu, pela primeira
vez na história, enviar um aparelho à superfície de um cometa. O pouso
do módulo Philae no astro aconteceu dia 11 de dezembro de 2014, às
13h35, 7 horas após descolar-se da nave-mãe, a Rosetta.
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PERSONNALITÉ
_Philae quicou antes do pousoO ataque histórico do módulo ao solo
do cometa foi bem-sucedido, embora
acidentado. O processo levou 30 minutos,
entre o primeiro contato e o repouso, a
1 quilômetro de distância do local
planejado. Nesse intervalo, o Philae quicou
e acabou se estabelecendo em posição
desconhecida, na face escura do 67P.
A bateria solar do módulo se esgotou após
64 horas de operação, como esperado
pelos cientistas. Nesse intervalo, enviou
dados para a Rosetta, retransmitidos ao
comando em Terra, o que confi gurou o
sucesso da operação. Em modo de hiber-
nação, o Philae deve ser reativado entre
maio e junho, quando receberá luz solar
novamente, por conta da posição
do cometa em relação ao Sol.
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LUCAS FONSECA
CÂMERA ACOPLADA À SONDA ROSETTA REGISTRA
O POUSO DO MÓDULO PHILAE NA SUPERFÍCIE DO
COMETA 67/CHURYUMOV-GERASIMENKO
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PERSONNALITÉ
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LUCAS FONSECA
responsáveis pelo módulo Philae, analisar as variáveis e preparar um protocolo automatizado de pouso de acordo com as análises e simulações realizadas na Terra. “O foco do Lucas era modelar a dinâmica do módulo de pouso durante a separação, a descida e a chegada ao solo”, explica Koen Geurts, coordenador da missão Rosetta na DLR. “Como foi visto no pouso real, esses aspectos foram fundamentais para o Philae.” Lucas era o único não europeu na equipe. “Uma coisa interessante é que, nas simulações, a gente não tinha a mínima ideia do formato do cometa. Tudo que a gente desenvolveu era com base em como imaginávamos que ele fosse.” O chute inicial apostava num astro com o formato de uma batata. Descobriram, mais tarde, que o cometa se assemelhava a um pato de borracha. “Foi um trabalho de três anos resumido em 7 horas. Vem muito forte a sensação de que participei de algo grande.”
Ao fi m de 2012, Lucas tinha oferta da DLR para continuar por lá. Mas sentiu que já havia cumprido sua parte. Precisava dar mais atenção a duas outras paixões da sua vida que fi caram relegadas a um segundo plano durante sua jornada espacial europeia – a esposa, Lia, e a vontade de empreender.
CERVEJA ARTESANAL
Apesar de jovem, Lucas já tem vivência no mundo dos negócios. Encorajado pelo espírito de uma geração que transformou o mundo (e fi cou rica no processo) sem sair da garagem de casa, ele não tem medo de arriscar. “Já montei uma porção de negócios. Quebrei umas quatro, cinco vezes. E, em umas duas vezes, podemos dizer que deu certo.”
Os ramos são os mais variados. Ele já se meteu com cervejas artesanais: “Ainda produzo as que bebo, mas estou longe de ser um mestre cervejeiro. Sou apenas um aprendiz que copia a receita dos outros”. Hoje tem negócios de estética: “Minha mulher mencionou uma pessoa que trabalhava com micropigmentação e precisava construir uma máquina, e eu fui lá ver o que era”. Segue, é claro, envolvido com a engenharia aeroespacial. Ao voltar da Europa com a Rosetta no currículo, criou em 2013 a Airvantis em São Paulo. “Em tese, é uma empresa de pesquisa e desenvol-vimento na área espacial”, conta Lucas. “Mas acaba que, pelo menos no momento, a gente só consegue participar de alguns editais do IAE [Instituto de Aeronáutica e Espaço] ou do INPE [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais]. Coisa técnica só. Difícil fazer pesquisa e desenvolvimento no Brasil.”
O diagnóstico de Lucas é que o mercado brasileiro tem a tendência de absorver bem apenas serviços, o que trava o progresso da indústria espacial. “Se você quer desenvolver satélites com aplicações em agricultura, ninguém quer saber. Mas se você oferecer o serviço de monitoramento agrícola, aí consegue vender. O compra-dor não está nem aí se você vai fazer com balão, com avião, com satélite. Ele quer o serviço, mas não se interessa pelos meios.”
É um problema maior do que parece, porque os spin-off s (produtos derivados) da pesquisa espacial costumam aparecer somente num segundo momento, depois que você já desenvolveu a tecnologia. Infelizmente, segundo Lucas, o Brasil ainda não entendeu isso. Mas ele não desanima. Ao perguntar ao engenheiro qual é sua grande ambição, ele não titubeia. “Mandar um satélite brasileiro para a Lua.” Os sonhos espaciais de Lucas Fonseca renasceram no Brasil.
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POR Ricky Hiraoka FOTOS Camila Fontana
Tão essenciais quanto os artistas, escolhemos sete profi ssionais que trabalham nos bastidores para que os espetáculos apresentados pela Osesp na
Sala São Paulo sejam sempre impecáveis
ATRÁS DA
CORTINA
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EM SENTIDO HORÁRIO, A PARTIR DA ESQUERDA: NIL CAMPOS,
ANTONIO CARLOS NEVES, IVONE PONTES, XISTO OSVALDO ALVES,
ERIK KLAUS, DANIELA MARCONDES, ANALÍA BELLI
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IVONE PONTES, camareira
“Comecei aqui junto com a Sala São Paulo em 1999, me lembro muito do dia da inauguração. Foi muito gla-moroso. Teve até maquiador para os funcionários. Gosto daqui por não ter rotina. Cuido da alimentação, do vestuário, da montagem dos ca-marins e ainda socorro os músicos nas emergências. Se uma calça rasga minutos antes do concerto, vou lá e costuro. Se o músico esquece a casaca em casa, dou um jeito de providenciar uma. Teve uma vez que emprestei meu uniforme para uma solista. Tinham avisado a moça que a roupa deveria ser branca, mas, na verdade, era preta. Aí, ela usou minha roupa de trabalho. Já até dei um jeito no vestido de dona Lu Alckmin, que descosturou durante um evento cheio de autoridades. Comigo não tem trabalho que não seja feito. No começo de tudo, o maestro Neschling obrigava a gente a ver os ensaios da orquestra. Isso me fez tomar gosto por esse tipo de música. Hoje, já não consigo ouvir mais samba. E olha que eu adorava! Por conta do contato que tenho com músicos, inscrevi minha fi lha para participar do Coral da Gente, de Heliópolis. Lá, ela aprendeu a tocar viola e canta no coro. Ela até já se apresentou aqui na Sala São Paulo. Um orgulho para mim!”
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ANALÍA BELLI, gerente de divisão operacional
“Sou pianista de formação, mas nunca fui boa musicista. Aí, dei-xei os palcos e fui trabalhar com produção de música erudita. Em 2009, estava pensando em voltar a morar na Argentina, país onde nasci, mas antes mandei um currículo para a Osesp. Deu certo. Fui chamada e comecei aqui em março daquele ano. Des-de então, acompanho a rotina dos músicos, alugo instrumentos, analiso a programação e vejo de que materiais eles vão precisar, planejo as viagens, contrato transporte, enfi m, dou todo o supor-te para a orquestra. Além disso, lido com os músicos estrangeiros que se apresentam aqui. Graças ao trabalho conheci ídolos como a Mitsuko Uchida, pianista japonesa que trouxe o próprio piano para a Sala São Paulo. Ela é para mim o que Justin Bieber é para uma adolescente! Mas há o outro lado também. Teve uma vez que um cantor não apareceu na hora combinada. Faltavam 2 ho-ras para o espetáculo e nada. Fomos até o hotel, ele não atendia, então, arrombamos a porta e o encontramos dormindo [risos]. Ele fi cou bravíssimo, mas fazer o quê?”
ERIK KLAUS, supervisor de acústica
“Quando entrei aqui, em 2003, eu torcia o nariz para a música clássica. Sempre fui do rock’n’ roll, sabe? Com o tempo, comecei a apreciar os concertos. Hoje, acompanho todos. Entrei para ser montador de orquestra e agora meu trabalho é operar as placas que fi cam em nosso teto acús-tico. São 15 placas, cada uma pesa 7 toneladas, e eu as mo-vimento para equalizar o som de acordo com o espetáculo. Nossa acústica é perfeita e as equipes técnicas das orques-tras estrangeiras que se apresentam na Sala São Paulo sempre fi cam impressionadas. Aqui, o menor dos barulhos reverbera. Na época do maestro John Neschling, ele pediu para a orquestra parar de ensaiar porque tinha ouvido um grilo e mandou a equipe técnica procurar o ruído. Depois de muito procurar, acharam um grilo no fosso. O que é interessante é que havia uma orquestra tocando, e ele per-cebeu que o grilo dava a entrada na hora errada. Qualquer barulho mínimo reverbera por toda a Sala São Paulo.”
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NIL CAMPOS, supervisor de iluminação
“Durante 12 anos fui bancário, mas larguei a carreira para tra-balhar em produções de teatro. Fiz de tudo: fui contrarregra, montei palco, trabalhei com iluminação. Antes de trabalhar aqui, nem sabia da existência da Sala São Paulo. E vim por acaso. Me falaram de uma vaga, fi z o processo seletivo e passei. Hoje, não me imagino longe dessa loucura que são os bastidores da Sala. Tem músico que nem sei o nome, mas sei como ele gosta da ilu-minação na hora do ensaio, da altura do banco e da posição da estante para ler a partitura. Quando saio de férias, sinto sauda-des da adrenalina e do desafi o de montar um palco em 2, 3 horas. O dia mais alucinante foi o réveillon de 2008 quando transmi-timos ao vivo um concerto para a Europa. Foi um sufoco, pois tivemos cinco dias para preparar tudo. Na hora, houve um efeito especial que simulava queima de fogos de artifício e o ambiente fi cou cheio de fumaça. Foi um desespero, pois a fumaça não saía. Corremos para abrir as portas dos camarotes, cortinas, movi-mentamos as placas do teto. No fi m, deu tudo certo.”
DANIELA MARCONDES, gerente de obras
“Brinco que meu trabalho é ingrato, pois minha função é cui-dar da manutenção e dos reparos no prédio. Quanto menos os frequentadores notarem nossas ações, melhor. Cabe a minha equipe verifi car iluminação, ar-condicionado, arrumar cadei-ras etc. Promovo visitas guiadas com quem trabalha comigo para eles entenderem a importância do lugar e criarem uma identidade com a Sala. Assim, eles entendem que uma cadeira rangendo atrapalha o concerto. Nossa jornada de trabalho é de 7 por 24. Tem sempre alguém da equipe no prédio, o que gera casos curiosos. Não é raro quando um funcionário da madru-gada me procura para contar que viu fantasmas. Eles juram que já presenciaram uma menina andando com uma boneca e um velhinho que passa e dá boa-noite. Por conta disso, eles sempre andam em dupla. De manhã, também já aconteceram fatos engraçados. Uma vez, estávamos fazendo o restauro de um vitral e um urubu invadiu a Sala e fez um ninho. Só conse-guimos tirá-lo três dias depois com a ajuda de bombeiros.”
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ANTONIO CARLOS NEVES, coordenador do centro de documentação da Osesp
“Sou maestro e músico. Estudei piano, composição e regência. Há 44 anos vejo uma partitura na minha frente. Por cinco anos, fui coordenador dos programas educacionais da Osesp. Desde o fi m de 2012, gerencio o Centro de Documentação da orquestra, que é formado por 12 músicos. Basicamente, cuidamos da compra e do aluguel de partituras, direitos de execução das obras, direitos de gravação (CD ou DVD e transmissão pela TV, rádio ou live streaming). Tudo que toca na sala é da minha res-ponsabilidade. Cuido também da editora Criadores do Brasil, que disponibiliza no mercado aluguel e aquisição de obras brasileiras e revisa, edita e grava as sinfonias de Villa-Lobos. Esse trabalho me deu o prazer de conhecer e trabalhar diretamente com o maestro Isaac Karabtchevsky, uma grande referência para mim. Juntos, revisamos a obra de Villa-Lobos e consertamos os erros que encontra-mos nas partituras. Às vezes, fi camos 3, 4 horas no telefone discutindo trechos imprecisos da sinfo-nia. A gente criou uma grande amizade.”
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XISTO OSVALDO ALVES, inspetor de orquestra
“Vamos deixar uma coisa clara: não sou bedel dos músicos. Eu apenas fi scalizo para que tudo esteja dentro dos conformes: horário, uniforme, ordem de entrada no palco. Sou mi-litar reformado, então, disciplina é comigo! Cada integrante da orques-tra sabe de suas obrigações e não preciso fazê-los lembrar de nada. Vez ou outra, dou umas broncas, mas ninguém fi ca bravo comigo. Se eles passam por algum imprevisto que possa atrapalhar o andamento dos ensaios ou do próprio concerto, me acionam na hora. Uma vez, um músico me ligou da delegacia. Ele estava a caminho da Sala São Paulo para uma apresentação e, sem que-rer, atropelou um motoqueiro. Não tive dúvidas! Corri até lá, expliquei a situação para o delegado e me comprometi que levaria o músico de volta ao DP tão logo o concerto se encerrasse para que o boletim de ocorrência fosse concluído.”
“VEZ OU OUTRA,
DOU UMAS BRONCAS,
MAS NINGUÉM FICA BRAVO”
Baixe a Revista Personnalité no
tablet e assista ao vídeo da Osesp
Para acompanhar a programação da Osesp
Acesse: itau.com.br/personnalite/experiencia
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_Série Osesp Personnalité 2015Dentre os destaques da temporada, a pianista canadense Angela Hewitt, em abril, e o Quarteto Osesp sob regência de John Adams, em agosto
09 ABR QUI 21H Pau-Brasil
Sir Richard Armstrong regente
Angela Hewitt piano
HECTOR BERLIOZ
Beatriz e Benedito: Abertura
WOLFGANG A. MOZART
Concerto nº 25 para piano
em dó maior, KV 503
CESAR FRANCK
Sinfonia em ré menor,
Op. 48
*23 ABR QUI 21H00 Cedro
Marin Alsop regente
WOLFGANG A. MOZART
As bodas de fígaro, KV 492:
Abertura
Serenata nº 11 para orquestra
de sopros em mi bemol maior,
KV 375
SERGEI RACHMANINOV
Sinfonia nº 1 em ré menor, Op. 13
14 MAI QUI 21H Carnaúba
Stéphane Denève regente
JOHN WILLIAMS
Contatos imediatos: suíte
BERNARD HERRMANN
Um corpo que cai: suíte
JOHN WILLIAMS
A menina que roubava
livros: suíte
BERNARD HERRMANN
Psicose: suíte intriga
internacional: tema
HECTOR BERLIOZ
Sinfonia fantástica, Op. 14
28 MAI QUI 21H Cedro
Mark Wigglesworth regente
Measha Brueggergosman
soprano
Susa Bickler mezzo soprano
Stuart Skelton tenor
Peter Coleman Wright barítono
Marcos Thadeu regente
CORO ACADÊMICO DA OSESP
CORO DA OSESP
Seleção de Negro Spirituals
Michael Tippett
A Child of Out Time
26 JUN SEX 21H Pequiá
Thomas Dausgaard regente
Stig Andersen tenor
Gun-Brit Barkmin soprano
Denise de Freitas mezzo
soprano
CARL NIELSEN
Abertura Hélios, Op. 17
MAURICE RAVEL
Valsas nobres e sentimentais
RICHARD STRAUSS
Salomé, Op. 54: Parte 2
09 JUL QUI 21H Pau-Brasil
Marin Alsop regente
Matthias Goerne barítono
JOHANNES BRAHMS
Abertura trágica, Op. 81
MARC-ANDRÉ DALBAVIE
Stimme — Para barítono
e orquestra
GABRIEL FAURÉ
Pelléas et Mélisande,
Op. 80: Suíte
RICHARD STRAUSS
O Cavaleiro da rosa,
Op.59: suíte
14 AGO SEX 21H Sapucaia
John Adams regente
QUARTETO OSESP
JEAN SIBELIUS
Lendas Lemminkäinen,
Op. 22: O Retorno
JOHN ADAMS
Absolute Jest
LUDWIG VAN BEETHOVEN
Sinfonia nº 7 em lá maior, Op. 92
28 AGO SEX 21H Painera
Alondra De La Parra regente
Tambuco percussão
SILVESTRE REVUELTAS
Ventanas
EGBERTO GISMONTI
Adágio
JAN JÄRVLEPP
Garbage concerto
SILVESTRE REVUELTAS
La Noche de Los Mayas
*24 SET QUI 21H00 Jacarandá
Marin Alsop regente
JOHANNES BRAHMS
Sinfonia nº 1 em dó menor,
Op. 68
Sinfonia nº 2 em ré maior,
Op. 73
17 OUT SÁB 16H30 Jequitibá
Ragnar Bohlin regente
Marília Vargas soprano
Luisa Francesconi mezzo soprano
CORO DA OSESP
TOMASO ALBINONI
Adágio em sol menor
GIOVANNI BATISTA PERGOLESI
Stabat Mater
FRANCIS POULENC
Gloria
20 NOV SEX 21H Pequiá
Fabio Mechetti regente
David Müller-Schott violoncello
ROBERT SCHUMANN
Manfred, Op. 115: Abertura
Concerto para violoncelo em lá
menor, Op. 129
RICHARD STRAUSS
Uma vida de herói, Op. 40
[Strauss Essencial]
26 NOV QUI 21H Carnaúba
Isaac Karabtchevsky regente
Arnaldo Cohen piano
NIKOLAI TCHEREPNIN
O Reino encantado, Op. 39
FELIX MENDELSSOHN-
BARTHOLDY
Concerto nº 1 para piano em sol
Menor, Op. 25
HEITOR VILLA-LOBOS
Sinfonia nº 9
IGOR STRAVINSKY
O pássaro de fogo: suíte —
Versão 1919
05 DEZ SAB 16H30 Mogno
Celso Antunes regente
Bertrand Chamayou piano
CLAUDE DEBUSSY
Dois Prelúdios
[Orquestração de
Colin Matthews]
ALEXANDER SCRIABIN
Concerto para Piano em Fá
Sustenido Menor, Op. 20
TORU TAKEMITSU
A Flock Descends Into the
Pentagonal Garden
CLAUDE DEBUSSY
La Mer
12 DEZ SÁB 16H30 Imbuia
Marin Alsop regente
Tamara Wilson soprano
MAURICE RAVEL
Le Tombeau de Couperin
GUSTAV MAHLER
Sinfonia nº 4 em sol maior
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*CONCERTO COM TRANSMISSÃO AO VIVO PELA INTERNET
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SE HOUVER DA TERRA, IMPACTA A QUE TEMOS SOBRE NÓS?
LUCAS FONSECA PERGUNTA:
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VIDA FORA ISSO PERCEPÇÃO
CLÓVIS DE BARROS FILHO RESPONDE:Impactaria sobremaneira, porque toda construção da compreensão de si mesmo implica o tipo de entendimento que temos do outro. É a partir do outro que nos defi nimos a nós mesmos, pelas semelhanças,
pelas diferenças, enfi m, refl exivamente. Se houver vida inteligente fora do planeta, haverá uma redefi nição da alteridade, o que obrigará
necessariamente a uma redefi nição da ideia de si mesmo, e isso modifi cará completamente a nossa maneira de pensar, de entender o
mundo, o homem, a relação entre os homens, a ética, a estética. Tudo terá de se readequar a essa nova realidade.
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Por Daniel Benevides Fotos Gabriel Rinaldi
“a Felicidade disPensa
teorização. acredito
que momentos de
esPecial intensidade
são aqueles em que
você não busca
exPlicações racionais.
É a tristeza que vai
Patrocinar a reFlexão”
O filósofo Clóvis Barros Filho e as questões fundamentais da sua vida, como a felicidade
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PERSONNALITÉ
Professor de ética da comunicação na USP e sócio no Espaço Ética com a ex-mulher, de quem se separou há
cerca de um ano, Clóvis dá palestras que misturam impro-viso, humor, informalidade e carregam ideias que, de outra forma, talvez não fossem compreendidas. A expressão “atle-ta da comunicação” lhe cabe perfeitamente: só no ano pas-sado ele deu 349 palestras. Já é “íntimo” dos funcionários dos aeroportos de Congonhas e Viracopos.
Aos 49 anos, tem três fi lhos, dois deles adultos. Desco-briu sua vocação aos 13, quando precisou dar um seminário no Colégio São Luiz, em São Paulo. O menino que tinha o apelido de Delfi m Neto (por conta dos óculos de lentes garrafais e armação grossa) era “um CDF triste e que se arrastava pelo colégio”. Encontrou o “desabrochar da po-tência” ao ser convocado pelo professor de geografi a a falar por 50 minutos sobre petróleo. Em 15, desovou o que sabia
com energia e graça. Diante dos 35 minutos pela frente e do olhar animado dos colegas, seguiu. Enrolou as informações que tinha e não tinha. Fez a coisa com uma paixão tamanha que a atenção dos alunos e do professor tornou-se total, cativa (“Um professor, aliás, que não devia saber muito de petróleo, uma vez que falei ali, sem contestação, até da produção fóssil da região da Sildávia, lugar que tirei das Aventuras de Tintim”). Exultante com o sucesso, atinou: sua grande paixão era pensar livremente e traduzir isso a quem quisesse escutar. Filosofar, pois.
Graduou-se em direito, jornalismo e fi losofi a (fez mestrado na França, onde morou no fi nal dos anos 80, e doutorado na USP). Hoje, Clóvis não inventa fatos sobre o petróleo, mas cria minhocas, por assim dizer. Faz refl etir, problematiza. E fala de modo simples para exaltar a complexidade da vida. Assim, surrupia risadas do espectador enquanto o estimula a mergulhar em questões duras e essenciais. Do amor à morte, é capaz de misturar teorias de Kant e de Platão à imagem de um bumbum “apetecível”, tudo para tratar dos desejos que estão diante de nós. Cita Nietzsche e Sartre como quem relembra um jogo do São Paulo (o time para o qual torce). Destrincha a complexidade da ética espinosana enquanto relata uma ida ao Rancho da Pamonha como forma de teorizar sobre a felicidade (“O sujeito, com fome, diante da primeira pamonha é feliz. O sujeito diante da segunda pamonha, transformado pela primeira pamonha, é um pouco menos feliz. O sujeito depois de 20 pamonhas, ou depois de comer pamonha todo o dia, é triste”).
O teor de suas palestras, como faz questão de ressaltar, não é motivacional, ou seja, não ajuda a melhorar o desem-penho dos funcionários das empresas que o contratam; às vezes chega a acontecer o contrário: alguns (poucos) que o ouvem resolvem se demitir e mudar de vida. Isso porque ele defende “a vida que vale a pena ser vivida”, título de um de seus muitos livros (vários escritos em parceria), e esta não necessariamente passa pelo dia a dia de um escritório. Mas nunca recebeu queixas.
Os contratantes, que vão de universidades, grandes empresas públicas e privadas, a tribunais, ONGs e escolas, apostam em suas verdades e na forma como entretém o pú-blico. São cerca de 500 pedidos para cada 100 palestras que dá. Seu trabalho, como diz, é também sua fonte de diversão e felicidade. E talvez essa seja, subliminarmente, a maior contribuição que dá para seus ouvintes.
Ele é um dos palestrantes mais requisitados do país. Autor de 15 livros, o professor de fi losofi a faz sucesso misturando Platão e Nietzsche a um jogo de futebol. Assim, criou um jeito leve de investigar como lidamos com a existência
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clóvis de barros
O que as pessoas que te contratam querem saber?Eu não sei se elas querem saber, esse é o problema. Tenho a impressão de que hoje atendo a uma demanda complexa. Em primeiro lugar a minha palestra distrai, atende a uma demanda de entretenimento. Mas é claro que aí eu estaria numa vala co-mum com mágicos, contorcionistas, ilusionistas, cuspidores de fogo, humoristas etc. Então ela entretém e supostamente tam-bém tem algum conteúdo interessante, faz pensar em coisas que normalmente não se pensa. Definitivamente não é uma palestra motivacional, o que dificilmente poderia ser feito com a filosofia, seja ela qual for. Ou seja, não se volta para a obtenção de resul-tados, pro cara sair dali motivado a bater metas, e portanto, de certa maneira, atender aos interesses do dono do capital. Defin-itivamente a minha palestra faz um apelo à reflexão sobre a vida do colaborador e essa reflexão relativiza, digamos, o resultado profissional, como critério único de avaliação de uma vida boa.
_ A visão de Clóvis sobre seis temas
Amor é alegria sentida por quem ama.
Ganho de potência. De tesão pela vida. O
amado é a causa consciente desta alegria.
Quando o amante tem certeza daquilo
que lhe faz bem.
Felicidade é um estado afetivo muito
particular cujo principal sintoma é o desejo
– por parte daquele que a sente – de que o
instante feliz torne-se eternidade, ou pelo
menos dure um pouco mais.
Morte não se define por si. Apenas
negativamente. É o fim da existência.
O deixar de viver. Para muitos linha
imaginária ou passagem entre
uma e outra vida. O que raramente
consideramos é que a cada instante de
vida vamos deixando de ser e, portanto,
de certa forma, morrendo em vida.
Verdade é discurso. Algo que se diz. Que
se afirma. Um juízo sobre o mundo. Uma
ficção. Ilusão da correspondência entre o
discurso e o mundo. Entre a palavra e a
realidade que codifica. Entre significante
e significado.
Trabalho é atividade socialmente
significada. Indispensável para o
desenvolvimento econômico dos povos.
Confere ao trabalhador uma identidade,
uma definição de si mesmo, dando-lhe
a oportunidade de consagrar parte da
sua vida ao outro, ao mesmo tempo que
oferece condições materiais de sobrevida.
Dinheiro é sempre meio. Instrumento.
Nunca fim em si mesmo. A não ser para
tristes avarentos. Cujo valor depende dos
fins. Do que nos ocorre fazer com ele.
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Personnalité clóvis de barros
“não pretendo ser modelo
para ninguém. não faço escola.
não quero que me sigam”
E o amor nos tempos de hoje? A impressão que se tem é que as separações acontecem com mais facilidade...O amor é vivido em condições sociais específicas e numa sociedade que alguns chamam de líquida e que patrocinam um amor líquido. De certa maneira, há uma volatilidade mesmo, as relações entre pessoas se desinstitucionalizaram a tal ponto que, diante da menor tristeza, você tem a dis-solução do vínculo. Antes as pessoas tendiam, por cultura, ameaças ou outros fatores, a suportar muito mais tristezas em série em nome da preservação do status quo de uma relação. Submetidas a essa revolução do baixo ventre, ten-demos a de certa forma substituir relações em função das pequenas oscilações de afeto que elas nos proporcionam.
E isso é bom?Ah, isso é o que é, quer dizer, não tolerar tristezas ad eternum é positivo, por outro lado a descontinuidade das relações ante a menor queda de potência pode ser impedi-tiva de experiências vindouras, de maturidade na relação.
Sua separação teve algo a ver com a teoria da pamonha?Minha separação tem a ver com a preservação do afeto. A manutenção do estatuto institucional de casado... Minha
Então, se bobear, o que eu tô fazendo é um pouco o contrário do que meus colegas de palestras motivacionais fazem. Em vez de dizer “você tem que ganhar de qualquer jeito”, eu digo “será que esse troféu que você tá disputando é o bom troféu?”. Será que esse troféu vai ficar na sua mão, será que ele é o seu troféu?
Como surgiu sua persona de palestrante?Surgiu aos 13 anos, no seminário sobre o petróleo. O jeito de falar ali permaneceu o mesmo, a gesticulação, a energia, não teve nenhum trabalho em cima disso, tudo veio ao sabor do acaso, nunca fiz um curso sequer de apresentação oral, nem de didática, zero. Sei que tem curso de palestrante, para palestrante. Vieram me contar que há uma série de técnicas. Mas o que faço contraria rigorosamente todas... Não tem Powerpoint, não tem porra nenhuma, eu ponho a mão na frente, eu grito, eu esmurro, eu falo alto. Se tem dez manda-mentos eu desrespeito os dez. No Powerpoint só cabem ver-dades e o meu discurso é um discurso de desconstrução, que por definição não entra numa transparência.
Como você se diverte?Dando aula.
Mas você não tem nenhum hobby?Tenho. Dar aula. Ou como você quiser chamar. Até os alunos me perguntam: o senhor também trabalha ou só dá aula? Eu me divirto tanto dando aula, que, a julgar pelo entendimento comum do trabalho, eu não posso mesmo estar trabalhando. Pra mim trabalho, diversão e felicidade são sinônimos. Mas não pretendo ser modelo pra ninguém, não faço escola, não quero que me sigam.
Você é pessimista em relação à vida?Não. Pelo contrário. Acho que a vida intensa, nos instantes em que você vive uma espécie de excelência do próprio ser, de particular harmonia entre você e o entorno, são instantes fantásticos de serem vividos. Nesse sentido vale a pena a busca de uma vida onde as possibilidades de uma situação assim são grandes. Acredito que a vida reserva momentos de intensidade e de excelência vital que são profundamente incríveis.
Isso me faz pensar na expressão “eu era feliz e não sabia”.É uma ideia muito possível, porque os momentos de felicidade dispensam uma teorização e uma conjectura racional sobre o que está acontecendo. É justamente porque você não precisa parar pra pensar naquela situação concreta que ela é partic-
ularmente feliz. Acredito mesmo que esses momentos de es-pecial intensidade são momentos em que você não teoriza, não tem noção do tempo, não tem grandes dimensões espa-ciais, não estabelece nexos de causalidade, não busca expli-cações racionais, portanto são momentos que esgotam neles mesmos a sua magia. É normal que, quando você vá teorizar sobre o que aconteceu, aquele momento já não é tão bom. É a tristeza que vai patrocinar a reflexão sobre o momento de intensidade vivido.
Como você vê a internet nas relações humanas?Creio eu que não cabe a mim nem apologias nem saudosis-mos, cabe a mim deixar claro que, nos dias de hoje, se a vida tiver que ser boa, ela terá de ser boa também com a internet, porque a internet faz parte da vida. Em outras palavras, nessa ideia de reconciliação com o real que pressupõe uma vida intensa, o real com o qual temos que nos reconciliar é o real no qual a internet está absolutamente inscrita, inserida e con-solidada. E portanto, de certa maneira, qualquer reflexão que busque alguma felicidade longe da internet terá de amputar com a internet 1 milhão de outras experiências que lhe são correlatas, como a vida nas cidades, a vida em grandes es-paços de socialização e assim por diante.
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CLÓVIS DE BARROS
esposa, Karina, mora a 60 metros daqui... Morando e traba-lhando junto, estava erodindo um patrimônio afetivo que nós consideramos inalienável. Por isso, tentamos uma nova forma de relacionamento para proteger o enorme afeto que temos um pelo outro. Iniciativa bem-sucedida. Temos a Natália, que é uma criança, pra levar adiante, somos sócios no escritório e temos um pelo outro uma admiração e um carinho infi nito.
Estamos em uma época com a possibilidade de viver mais tempo. Como vê isso?É óbvio que os cuidados orgânicos com vistas à prolongação da vida podem ser positivos, desde que você não reduza a vida à sua extensão. Imagine você vivendo 110 anos tendo de comer linhaça, seria insuportável. A longevidade por si só não é uma variável relevante. Um momento vivido que você queira que perdure porque ele é bom, você lutará por sua eternidade, mas um momento de sofrimento, você lutará pela sua interrupção. Então, perceba, a extensão dos momentos, seja a adolescência ou a idade adulta, pode ser boa ou ruim, depende da intensidade de vida daquele instante. Calipso oferece a eternidade e a juventude a Ulisses e ele não aceita. E o que está por trás disso? Ele diz que prefere viver pouco uma vida boa e fi nita do que viver eternamente no lugar erra-do uma vida inadequada. É uma lição interessantíssima.
Tem um posicionamento político?A sociedade que queremos pra nós resultará das nossas esco-lhas, das nossas decisões e da nossa fi rmeza para construí-la. Não há que terceirizar nem os processos decisórios, nem a culpa por eventuais mazelas. Somos todos corresponsáveis pela sociedade em que vivemos, não somos turistas no lugar onde moramos. O Brasil somos nós, se ele não é o que nos convém, façamos acontecer o que queremos que aconteça.
Como você vê o futuro do homem?O futuro do homem nada mais é do que uma tentativa de an-tecipar a existência do homem no mundo em tempos ainda não vividos. Essa antecipação só poderá ser feita a partir de variáveis do presente ou já experienciadas. Portanto, quando falamos do futuro, falamos sempre com um material de co-nhecimento que não lhe pertence. Suponho que as condições de vida do homem no planeta sejam cada vez mais inóspitas, e suponho que isso seja gerador de afetos que nos tempos de hoje não são presentes. O homem tenderá a ter sensações cada vez mais diferentes, decorrentes de uma presença num mundo cada vez mais inóspito e tecnologizado.
E como se sentiria nesse mundo?No fi nal das contas tenho um sonho essencialmente cristão, no sentido de que a busca incessante da própria satisfação, do próprio acúmulo de recursos materiais, nos remete a estados afetivos pobres, porque uma alegria não dura sem convivên-cia – se você preferir, sem gente alegre do lado. Isso é uma certeza que tenho. Não há como fi car alegre num mar de tristeza. Em outras palavras, teríamos de ter uma nova escola, uma nova educação. Uma educação de afetos mesmo, de aná-lise das emoções. Isso enriqueceria demais a vida e permitiria a compreensão do quanto o sentido da vida está no outro.
Esse é o sentido da vida: o outro?A gente passa muito tempo pensando no bem-estar do outro, por que não admitir isso? Por que a gente tem de continuar repetindo que a única coisa que importa é a própria glória, se não somos assim? Então, eu vislumbraria um futuro em que houvesse uma verdadeira revolução pelos afetos e em que não só a educação, mas também o trabalho fossem re-gidos por uma espécie de bem-estar compartilhado e não por metas e resultados que de certa forma só fazem o enriqueci-mento do dono do capital sem nem mesmo garantir a ele uma vida feliz. Até porque, numa sociedade absolutamente dese-quilibrada como a nossa, a insegurança de ter o patrimônio dilapidado por conta desse desequilíbrio torna a vida ruim de ser vivida. Seria muito melhor se compartilhássemos mais.
E qual é, afi nal, a vida que vale a pena ser vivida?A do outro. O que quero dizer é que temos tendência a achar que, como não sentimos as tristezas que os outros sentem, a nossa vida é particularmente pesada e que a felicidade é uma experiência do outro. Quando, na verdade, deveríamos perce-ber que é ruim pra todo mundo, né. Tenho a nítida sensação de que a vida é uma espécie de reunião particular de paixões tristes, salpicada aqui e acolá de momentos de alegria. Então a alegria tem um valor especial por conta da sua raridade. O normal é que você oscile mesmo entre o enfado, a frustração, a angústia, o tédio, a dor, a melancolia, o medo... Agora, de vez em quando alguém sorri pra você, e aí já basta.
Com “já basta”, você quer dizer “compensa”?Ah, meu amigo, tenho a impressão de que deve compensar, porque, no fi nal das contas, todos temos a chave da abrevia-ção da existência, temos todos a possibilidade de interromper a vida a qualquer momento, e a grande maioria de nós conti-nua insistindo. É sinal de que deve compensar.
Baixe a Revista Personnalité no tablet e
veja o vídeo com Clóvis de Barros Filho
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POR Mariana Filgueiras, de Istambul
O melhor museu da Europa fi ca em uma pequena casa de Istambul. Seu acervo, criado pelo escritor Orhan Pamuk, Prêmio Nobel de Literatura, conta a história de um casal que nunca existiu
REAL E IMAGINÁRIO
ACIMA, A FACHADA DO MUSEU DA INOCÊNCIA, EM
ISTAMBUL. AO LADO, REPRODUÇÃO DO QUARTO DE KEMAL
(PROTAGONISTA DO LIVRO O MUSEU DA INOCÊNCIA), COM
DETALHES QUE REMETEM À SUA INFÂNCIA
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O taxista não sabe dizer onde fi ca, pes-soas que caminham pela rua Çukur-
cuma tampouco. A numeração não ajuda, e é preciso errar duas, três vezes, checar mais uma vez a memória, o guia turístico, o Google Maps. É ali mesmo, mas não se acha fácil: o Museu da Inocência fi ca num discreto sobrado cor de vinho em Beyoglu, um nobre distrito do lado euro-peu de Istambul, numa via conhecida por abrigar antiquários.
Eleito pelo conselho da União Euro-peia o melhor museu do continente em 2014, o Museu da Inocência passaria por uma casa otomana qualquer: o letreiro é
discreto, a bilheteria, quase disfarçada. O recato é proposital. Depois de pagar 25 liras turcas (o equivalente a R$ 28), a primeira peça que se vê no museu é um texto escrito pelo fundador da institui-ção, o romancista laureado com o Prê-mio Nobel Orhan Pamuk. O documento é um manifesto pela multiplicação dos “pequenos museus”, como este aqui, frente aos grandiosos e mais famosos. O escritor acredita que não faz mais sen-tido concentrar coleções pomposas em galerias nacionais, transformando em patrimônio estatal nacos da história de outros povos. E defende a existência dos
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64 VITRINE 28: NOS SURTOS DE SAUDADE QUE KEMAL TINHA DE FÜSUN,
ELE SE DISTRAÍA LEMBRANDO DE RECORDAÇÕES COMO O CROISSANT
DE NOZES, O ESPELHO DE MÃO QUE ELE FINGIA SER UM MICROFONE
NO BANHO OU O TREM DO ANKARA EXPRESS QUE ELA BRINCAVA
acervos modestos, aqueles que contam a história do indivíduo, não a de um povo.
Assim, já nos primeiros passos, o visitante depara com o seguinte trecho, escrito numa parede: “Os grandes museus apresentam a história de uma nação como sendo mais importante do que a história do indivíduo, mas as histórias dos indi-víduos são muito melhores para explicar as profundidades da nossa humanidade. O que eu quero com este lugar é recriar o mundo de homens simples”.
Foi por acreditar veementemente nessa assertiva que o escritor fundou a instituição em 2012 com uma coleção per-manente de objetos que conta a história de amor de um casal que nunca existiu, Kemal e Füsun. A trajetória da dupla é um recurso para que o autor – nessa lógica de que o indivíduo é a chave para contar a história de um país – narre os rumos da Turquia entre os anos 1970 e 2000. Assim, o casal, na verdade, é fruto de um projeto ainda maior de Pamuk. Ambos são protagonistas de O museu da inocência, romance lançado em 2008.
4.213 BITUCAS
Ao longo de nove anos, tempo que durou a escrita, o autor turco colecionou obje-tos garimpados em antiquários. A ideia era construir as personalidades de Kemal e Füsun com mais minúcia. Se via um pente de osso antigo, imagina-va que pudesse fazer parte da penteadei-ra de Füsun; se encontrava uma coleção de fotos envelhecidas, logo elas fariam parte da memória familiar de Kemal. Dessa forma, saleiros, vesti-dos, relógios, pequenos instrumentos musicais, brinquedos, cartas e outras centenas de itens foram sendo coletados, construindo o acervo do que se tornaria
Trechos do livro
O museu da inocência
“Era o momento mais
feliz da minha vida,
mas eu não sabia. [...]
Naquele momento, na
tarde de segunda-feira,
26 de maio de 1975, em
torno de quinze para
as três, assim como
nos sentíamos além
do pecado e da culpa,
o mundo todo parecia
ter sido liberado da
gravidade e do tempo.
[...] Quero contar minha
história de um modo
que faça justiça a seus
aspectos mais sérios
relacionados ao sexo
e ao desejo: a boca de
Füsun tinha o sabor de
açúcar de confeiteiro,
devido, acho, aos
chicletes Zambo de que
ela tanto gostava. [...]
Assim, toda vez que nos
beijávamos, primeiro
eu a beijava da maneira
como se encontrava à
minha frente, e depois
da maneira como existia
na minha memória.”
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65AO LADO, ESCRITOR TURCO ORHAN PAMUK
EM FRENTE AO MUSEU
o pequeno museu – ao mesmo tempo real e imaginário – de Pamuk.
Não é preciso ter lido o romance para entender a exposição, mas quem leu fi ca ainda mais tocado. Não à toa, há exemplares em todas as línguas espalha-dos pelos quatro andares da instituição. Há um esforço especial para botar o lei-tor turista dentro das linhas que Pamuk escreveu. Exemplo: a primeira instala-ção que o público vê é um imenso mural vertical com 4.213 bitucas de cigarro, como borboletas espetadas em caixas de vidro. Catadas ao acaso pelo autor nas ruas de Istambul, representam todos os cigarros fumados por Kemal enquanto esperava a amada, entre os anos de 1976 a 1984. É quase possível sentir o cheiro da fumaça que remete à ansiedade do personagem.
Divididos em 83 vitrinas, os objetos obedecem a uma separação por temas e assuntos. Há o setor dos vestuários, o dos objetos de cozinha e o de viagens. Há um mapa com todas as ruas que fa-ziam Kemal lembrar-se de Füsun, com os pontos de onde estiveram juntos marcados a tinta vermelha. Numa outra vitrine, apenas os artigos que usava para se distrair quando a saudade apertava: baralhos, horóscopo de jornal, um apa-relho de telefone, um copo de ayran, uma espécie de iogurte local.
Muitas surpresas esperam tanto quem leu quanto (e principalmente) quem não leu o romance. A parte fi nal da exposição se concentra no próprio livro: está lá, na íntegra, todo o manuscrito da obra. Pamuk conserva até hoje o hábito de escrever seus textos à mão. Estão lá também, expostas, as ca-pas de todas as versões do livro lançadas até hoje, em mais de 40 idiomas.
“Quando Füsun se atra-
sou dez minutos em
nosso encontro seguinte
no edifício Merhamet,
esqueci na mesma hora
minhas resoluções. Não
tirava o olho do relógio,
um presente de Sibel, e
do despertador marca
Nacar que Füsun adorava
sacudir até fazê-lo tilin-
tar, e olhava toda hora
através das cortinas para
a avenida Tesvikiye, an-
dando de um lado para o
outro pelo piso de tacos
que rangiam, incapaz de
desviar os pensamentos
de Turgay Bey. Logo
tranquei o apartamento
e saí para a rua. Olhava
cuidadosamente para os
dois lados, tentando me
certifi car de que não dei-
xaria de ver Füsun se ela
viesse na minha direção,
e caminhei até a boutique
Sanzelize. Mas Füsun
tampouco estava na loja.”
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67NA PÁGINA AO LADO, PERTENCES DO PAI DE KEMAL, COMO FOTOS ANTIGAS
DO EXÉRCITO, REMÉDIOS, JORNAIS E PALAVRAS CRUZADAS. KEMAL VÊ ESSES
OBJETOS APÓS DESPEDIR-SE DO PAI MORTO NA CAMA DO QUARTO. NESTA
PÁGINA, INSTALAÇÃO COM AS 4.213 BITUCAS DE CIGARRO FUMADAS POR KEMAL
Os leitores brasileiros fi carão felizes ao encontrar a edição em português em meio a tantos objetos.
Como o romance é contado a par-tir do presente, mas fala sobretudo da Turquia nos anos 70, período em que o país começou a viver de maneira mais explícita o confl ito entre a manutenção da tradição e o desejo de modernidade, e a narrativa faz tudo isso a partir de um recorte familiar, a mostra proporciona exatamente o que defende Pamuk à en-trada do museu: conta a história de uma nação a partir do indivíduo.
Ao cabo do passeio, o projeto Museu da Inocência surge, sobretudo, como um jogo intrincado de verdades. Sabe-se (pelo livro ou pela visita) que o próprio Kemal colecionava objetos de antiquá-rios para construir um museu que ele também batizaria de Museu da Ino-cência. Ou seja, o visitante passeia por um museu que é fruto da mente de um personagem; um personagem criado por um romancista; um romancista que fun-dou um museu de verdade; um museu de verdade que acolhe as lembranças de um personagem... É um jogo proposital e metalinguístico que concede à experi-ência uma atmosfera única de estranha-mento e encantamento. O melhor museu da Europa, quem diria, está lotado de quinquilharias, instalado numa casinha cor de vinho em Istambul.
_Um romance para celebrar o Nobel O museu da inocência é o primeiro ro-
mance que Orhan Pamuk publicou de-
pois de ter ganhado o Prêmio Nobel de
literatura, em 2006. No Brasil, foi edita-
do pela Companhia das Letras em 2011,
com tradução de Sergio Flaksman. Seu
enredo enfoca Kemal, descendente de
uma família rica e tradicional na Istam-
bul dos anos 70. Ele acaba de completar
30 anos e está prestes a se casar com a
bela Sibel. À época, representavam um
casal moderno, e o exemplo mais mar-
cante desse traço dos personagens são
as cenas de sexo descritas antes do ca-
samento. Certo dia, Kemal reencontra-se
com Füsun, uma jovem prima distante
que trabalha como vendedora em uma
pequena loja de roupas. Os dois passam
a se encontrar com frequência, embora
Kemal não considere romper o noiva-
do com Sibel – e esse confl ito é uma
metáfora para a própria ambiguidade
vivida pela Turquia no fi nal dos anos 70,
um embate entre a tradição oriental e
a modernidade de um país que quer se
aproximar do ocidente. É para provar
a si mesmo sua estreita ligação com
Füsun que Kemal começa a colecionar
objetos de época.
“Tendo me tornado —
com o passar do tempo
— o antropólogo da mi-
nha própria experiência,
não sinto o menor im-
pulso de depreciar essas
almas obsessivas que
recolhem cacos de cerâ-
mica, artefatos e utensí-
lios em terras distantes
e os organizam a fi m de
expô-los a nós, para po-
dermos entender melhor
as vidas dos outros e a
nossa própria. [...] Que
este conjunto de caneta
e tinteiro de cristal, per-
tencente à minha mãe,
com que Füsun brincou
naquela tarde depois de
tê-lo visto em cima da
mesa enquanto fumava
um cigarro, sirva como
relíquia do refi namento
e da frágil ternura que
sentimos um pelo outro.
Que este cinto, cuja fi ve-
la grande demais agarrei
e ajustei com uma arro-
gância masculina de que
mais tarde me arrepen-
deria tanto, sirva como
testemunho da melan-
colia que senti quando
cobrimos nossa nudez e
voltamos novamente os
olhos para a imundície
do mundo.”
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JOSÉ DO PATROCÍNIO DE OLIVEIRA, O ZEZINHO,
EM 1936, FOI A INSPIRAÇÃO DE WALT DISNEY
PARA O PERSONAGEM ZÉ CARIOCA
ZÉ CARIOCA
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POR Ruy Castro, do Rio de Janeiro
Quem inspirou Walt Disney a criar o papagaio era paulista, foi um músico de mão-cheia e teve uma vida que pode ser resumida à palavra que ele
adorava: “Demais!”. Com vocês, José do Patrocínio de Oliveira, o Zezinho
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S uzaninha, aqui é uma maravilha. É Hollywood. Vou te apresentar aos
artistas do cinema. Você vai nadar na piscina da Carmen Miranda. E vai co-nhecer o Zé Carioca!”
Esse era Vinicius de Moraes, em 1946, escrevendo da Califórnia para sua fi lha de 6 anos, Suzana, que fi cara no Rio com a mãe, Tati, e o irmãozinho Pedro – tentando cooptá-la para que os três fos-sem se juntar a ele nos Estados Unidos. Pouco antes de viajar para assumir o car-go de secretário do Consulado brasileiro em Los Angeles, Vinicius se separara de Tati por causa de Regina Pederneiras, uma arquivista do Itamaraty que ele aca-bara de conhecer. Surdo aos conselhos dos amigos, levara Regina com ele para o posto no exterior, mas não demorou a cair em si. Fora um erro – os dois não se entenderam. Então, Vinicius mandou Regina de volta para o Brasil e, agora, lutava para que Tati o perdoasse e fosse com as crianças para os States.
O que acabou acontecendo, e eles se-riam felizes para sempre nos quase cinco anos que passaram lá. E Suzana viu rea-lizado tudo que Vinicius lhe prometera. Era mesmo Hollywood. Ela ganhou um beijo de Orson Welles e de muitos outros artistas. Aprendeu a nadar na piscina de Carmen Miranda. E realmente conheceu o Zé Carioca. Mas qual Zé Carioca?
Naquele ano, boa parte do mundo já assistira e se apaixonara pelo novo perso-nagem que Walt Disney apresentara em dois fi lmes, Alô, amigos (Saludos, amigos), de 1944, e Você já foi à Bahia? (The three caballeros), de 1945. Era o Zé Carioca, um papagaio brasileiro, safo e simpático, que contracenava com o Pato Donald e, para deleite geral, sempre levava vantagem. Originalmente, chamava-se José – ou Joe – Carioca. Para nós, desde o começo, ele foi Zé Carioca – obviamente verde, de olhos cor de mel, casaquinho amarelo
estilo peço a palavra, calças também ver-des, chapéu de palhinha, gravata borbole-ta, sempre carregando um guarda-chuva, e com um suingue jamais sonhado por qualquer personagem de Disney. Natural-mente, era esse o Zé Carioca que Suzana esperava conhecer.
Ao chegar à casa de Carmen Miranda em Beverly Hills e ser apresentada a ele por Vinicius, viu-se diante de um mulato simpático e sorridente, de bigodinho, calça comprida, camisa de malandro, ca-vaquinho na mão e chinelo. O verdadeiro Zé Carioca. Na intimidade, Zezinho.
Zezinho se chamava José do Patro-
cínio de Oliveira e – essa não! – nem era carioca. Era paulista (de Jundiaí), nasci-do em 1904 e, em boa parte da década de 30, um dos grandes nomes do rádio de São Paulo, por sua habilidade nos instru-mentos de corda, principalmente violão, cavaquinho e bandolim. Carmen Miranda o conhecera numa de suas excursões à Pauliceia e, como todo mundo, se encan-tara com ele. Zezinho era não só grande músico, mas exuberante e engraçado como pessoa. Falava uma gíria própria, às vezes enriquecida por uma experiência que tivera como funcionário do Instituto Butantã – aprendera o nome das cobras em latim e sempre dava um jeito de incluí-las na conversa, chamando-as da-quele jeito. Além disso, tinha uma ginga característica, elástica, malemolente.
Desde o Brasil, ele era amigo dos rapa-zes do Bando da Lua. Quando Carmen e o Bando foram para Nova York, em maio de 1939, já o encontraram lá. Zezinho che-gara havia alguns meses, com a orquestra de Romeu Silva, escalada para abrilhantar o pavilhão brasileiro na fabulosa Feira Mundial que estava se realizando na cida-de. E foi bom que o encontrassem porque, ainda no Rio, tinha havido um problema com o Bando da Lua: Ivo Astolfi , funda- D
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71ZEZINHO SEGURA ZÉ CARIOCA EM FRENTE A WALT
DISNEY COM O PATO DONALD, DURANTE A FESTA DE
ENCERRAMENTO DAS FILMAGENS DE ALÔ, AMIGOS (1944)
dor do grupo, desistira na última hora da aventura americana. E seu substituto, o já lendário violonista Garoto, não estava com os documentos em ordem para em-barcar imediatamente para a América. Com isso, Zezinho, à mão em Nova York, foi chamado para substituí-lo. Semanas depois, Garoto chegou e Zezinho voltou para a orquestra de Romeu Silva. Mas nunca fi cou longe deles. Em agosto de 1941, com o fi m dos contratos, Romeu regressou com a orquestra para o Brasil, mas dois de seus músicos “perderam” o navio e fi caram para trás: o pianista Va-
dico e... Zezinho. Não por coincidência, eles se juntaram de vez ao Bando da Lua, no lugar de Vadeco e Helio, dois outros membros que também preferiram voltar.
A essa altura, Carmen e o Bando já estavam radicados em Los Angeles, contratados pela Fox e fazendo um fi lme atrás do outro: Uma noite no Rio, Aconteceu em Havana, Minha secretária brasileira. Neste último, há a hilariante sequência em que Carmen os apresenta ao galã John Payne como seus irmãos que chegaram do Brasil, e eles vão entrando pelo apartamento – todos os
ZEZINHO USAVA
BIGODINHO, CAMISA DE MALANDRO E CHINELO
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seis, um a um, para desespero de Payne, e cantando “Chattanooga choo-choo” em português.
Foi então que o destino entrou em cena. Também naquele ano, 1941, Walt Disney, considerado o pior patrão de Hollywood, viu-se em apuros com os sindicatos americanos. Seus funcionários – desenhistas, animadores, coloristas e todos os envolvidos na produção dos de-senhos animados – o acusavam de redu-zir seus salários, negar-lhes crédito como autores dos personagens (alguém sabia, por exemplo, que o verdadeiro criador de Mickey era seu desenhista Ub Iwerks?), não reconhecer o direito de greve e ameaçá-los com demissões coletivas. Para eles, o maior rato do cinema não era Mickey, mas Walt Disney. Antes que Dis-ney perdesse o estúdio, Nelson Rocke-feller, em nome do governo americano, sugeriu-lhe que saísse de cena por uns tempos enquanto ele negociava com os funcionários. E propôs a Walt armar uma equipe (com quem ainda se sujeitasse a trabalhar com ele) para uma longa ex-pedição pela América Latina, fi nanciada pelo governo, a fi m de recolher material para um ou dois fi lmes que o ajudassem a consolidar a chamada Política da Boa Vizinhança – um importante programa do governo americano para evitar que o resto do continente simpatizasse demais com Hitler. Walt topou. E, assim, no se-gundo semestre de 1941, depois de passar por México, Chile e Argentina, Disney e seus rapazes desembarcaram no Rio.
ADMIRAÇÃO PELO PAPAGAIO
Uma das ideias era a de criar um persona-gem brasileiro que pudesse contracenar
NO ALTO, CENA DO FILME VOCÊ JÁ FOI À BAHIA?
(1945) EM QUE ZEZINHO ATUA COM ZÉ CARIOCA, PATO
DONALD E AURORA, IRMÃ DE CARMEN MIRANDA
com Donald. Em seu Q.G. no Copacabana Palace, visitado por brasileiros que iam levar-lhe sugestões, Disney achou curio-so que, ao contrário de seus vizinhos lati-nos para quem o símbolo nacional deve-ria ser uma ave nobre – uma águia, um condor, um falcão –, os brasileiros tinham grande admiração pelo papagaio. Pelo menos, era o herói de todas as anedotas que lhe contavam. E o que era o papa-gaio? Um bicho pobre, folgado e pregui-çoso, como os gringos imaginavam o bra-sileiro, mas inteligente, esperto e virador – enfi m, feliz. Dois grandes desenhistas cariocas, J. Carlos e Luiz Sá, levaram a Disney esboços de como o papagaio de-veria se vestir ou parecer. Mas foi só em Hollywood, meses depois, ao preparar as sequências em que Joe Carioca ( já com esse nome) contracenaria também com atores de carne e osso – Aurora (irmã de Carmen) Miranda e o Bando da Lua –, é que Zezinho entrou em cena.
Ele era perfeito para o papel. Sua ginga serviu de modelo para o andar do papagaio; suas gírias e expressões foram
adaptadas à fala do bicho; e, tanto em in-glês (com sotaque) como em português, só poderia ser Zezinho, claro, a dublar o personagem. E, assim, em dois fi lmes seguidos e de grande sucesso, lançados com pouco mais de um ano de intervalo, José do Patrocínio de Oliveira tornou-se – para sempre – Zé Carioca.
Quer saber como ele era? É fácil. Na principal sequência de Você já foi à Bahia?, em que Aurora e Donald cantam “Os quindins de Iaiá”, de Ary Barroso, e Zé Carioca (o papagaio) saracoteia ale-gremente entre eles, o próprio Zezinho pode ser visto com destaque. É o que toca lápis nos dentes.
Ele não fi cava longe disso na vida real: era sedutor, imaginativo, agregador, cheio de borogodó. Com pouco tempo de Hollywood, sua casa, em Laurel Canyon, tornou-se, juntamente com a de Carmen, o ponto mais importante de Los Angeles para brasileiros fi xos ou de visita. Se não estivesse fi lmando, Zezinho passava dia e noite recebendo uma quantidade de patrícios que, com o sucesso da estrela W
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NAS FESTAS DO ZEZINHO, AS ATRAÇÕES ERAM PINGA, FEIJÃO-PRETO
E PIADAS
nos Estados Unidos, resolvera tentar a sorte por lá: músicos, atores, jornalistas, vedetes e simples desocupados. Alguns habitués eram o próprio vice-cônsul Vinicius e família, os correspondentes Gilberto Souto e Alex Viany, o Bando da Lua em peso e suas mulheres, o ex-astro Raul Roulien, o guitarrista Laurindo de Almeida, o famoso Russo do Pandeiro, o escritor Erico Veríssimo (que morava em Los Angeles e aparecia quase todos os dias, mas não abria a boca) e até a can-tora Rosina Pagã, que não se sabia muito bem o que fazia por lá, além de namo-rar metade da Costa Oeste. A própria Carmen comparecia quando lhe davam sossego em sua casa. E quem marcou presença mais de uma vez? Walt Disney.
A grande atração das festas de Ze-zinho era a presença de brasileiros recém-chegados trazendo feijão-preto, carne-seca, pinga, discos com os últi-mos sucessos da terra e, claro, as piadas recém-inventadas. Em troca, ele os levava a visitar os estúdios de cinema e os impressionava ao passar por alguns astros e cumprimentá-los com a maior naturalidade: “Olá, Betty [Grable]!”; “Oi, Paulette [Goddard]!”; “Tudo bem, Linda [Darnell]?”. E os outros, de volta: “Hi, Joe!”. De onde vinha essa intimidade? Do seu trabalho naqueles estúdios.
FESTA NO APÊ
Zezinho não era popular apenas com os brasucas. Assim que ele se efetivou no Bando da Lua, Carmen apresentou-o a Darryl F. Zanuck, chefão da 20th Century Fox, e este o repassou a Alfred Newman, diretor de seu departamento musical. Resultado: sempre que precisavam de
um violão, guitarra ou mesmo banjo “latino”, era a Zezinho que recorriam na trilha sonora. O que fazia com que não lhe faltasse trabalho em Hollywood.
Os outros estúdios o descobriram e também se interessaram. Um deles, a Warner Bros., não se contentou em aproveitá-lo na trilha sonora – botou-o em cena, em carne e osso, junto a ou-tro respeitado violonista brasileiro em Hollywood, seu amigo Nestor Amaral. E ali os dois começaram a sua extensa fi lmografi a. No clássico Uma aventura na Martinica (To have and have not, 1944), de Howard Hawks, Zezinho e Nestor acompanham Hoagy Carmichael na sequência em que ele toca piano e canta “Am I blue?”. No mesmo fi lme, quando Lauren Bacall, escorrendo sensualida-de, tartamudeia “How little we know”, lá estão eles de novo – sem contar que, participando de toda a fi lmagem, assis-tiram de camarote a Humphrey Bogart se apaixonar alucinadamente por Bacall (foi o fi lme em que eles se conheceram). Em outra produção da Warner, Romance em alto-mar (Romance on the High Seas, 1948), de Michael Curtiz, que marcou a sensacional estreia de Doris Day no cinema, eles cantam com ela na sequên-cia em que o navio a caminho do Rio faz escala numa ilha.
E havia aquilo que, para Zezinho,
vinha em primeiro lugar: seu trabalho com Carmen. Apareceu em todos os fi l-mes que ela ainda viria a fazer até 1953; acompanhou-a em sua excursão a Lon-dres em 1948; e sua mulher, Odila, era a camareira ofi cial de Carmen em viagens, cuidando de seus vestidos, turbantes e sapatos – tarefa nada desprezível. O fi lho de ambos, também Zezinho e nascido lá, em 1947, era afi lhado de Carmen.
E o que dizer de sua carreira como Joe Carioca? Durante muitos anos, e usando o nome mágico, Zezinho foi uma sensação em palcos americanos – em tea-tros, boates, cassinos, bares, restaurantes e até estádios. Abrindo shows ou sendo a atração principal, ele era Joe Carioca, fazendo, inclusive, a voz do papagaio. E só então as plateias se davam conta de que ele era, na verdade, dois artistas: o humorista, que todos conheciam e reco-nheciam, e o instrumentista – este, sim, uma surpresa para quem o ouvia tocar.
Mas, como ocorreu com todos os músicos brasileiros ao redor de Carmen Miranda em Los Angeles, a morte dela, em agosto de 1955, foi um golpe insupor-tável. Alguns, como Aloysio de Oliveira, incapazes de se sustentar, voltaram para o Brasil. Zezinho não precisou fazer isso. Era querido e disputado, mas também estava cansado. Pelos anos seguintes, limitou-se a trabalhar para Walt Disney, apresentando-se no Clube do Mickey, uma programação do primeiro parque criado por Walt, a Disneylândia. Em 1979, aposentou-se. E, em 1987, aos 83 anos, pegou o boné. Deixou instruções para que, em sua lápide, fosse gravada uma palavra que ele adorava e que bem poderia defi nir sua vida: “Demais!”.
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CLÓVIS DE BARROS FILHO PERGUNTA:
UM VINHO PROVADO GOSTO?
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NUNCA TEM
MADELINE PUCKETTE RESPONDE: Não importa que o vinho tenha ou não tenha sabor. O que
interessa é a questão. É isso que nos torna humanos.
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VINHO: QUER QUE EU
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A designer Madeline Puckette, criadora do portal Wine Folly, tornou-se uma referência ao simplifi car o universo do vinho. “Ninguém sabe tudo sobre a bebida. Você poderia passar a vida toda aprendendo”
POR Carol Nogueira, de Seattle FOTO Amanda Koster
DESENHE?
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PERSONNALITÉ
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C inco anos atrás, Madeline Puckette, uma aspirante a cantora e designer gráfi ca de um jornal de Reno, em
Nevada, entrou num bar com o pior dos humores. Ela tinha acabado de perder o emprego, resultado da crise econômica que abatia os Estados Unidos desde 2008. O botequim, na verdade um wine bar chamado West Street, era o favorito de Madeline. Por conta da frequência, a jovem tornou-se amiga do proprietário, Rick Martinez. O rapaz ouviu a cantilena da cliente. Pensou e soltou uma proposta: “Olha, eu estou mesmo precisando de uma ajuda, não quer vir trabalhar aqui?”. “E eu fui, sem nunca ter trabalhado num bar”, conta Madeline.
Havia uma condição. Para assumir o cargo atrás do balcão, ela teria de se submeter a um teste de conhecimento de vinhos. “Fui para casa e estudei igual uma louca”, diz. Passou na prova, ganhou a vaga e apaixonou-se pelo tema. Decidiu prosseguir. Ingressou em um curso da mais prestigiada instituição do ramo, a Court of Master Sommeliers. Em pouco tempo, se tornaria uma referência no assunto. Mas de um jeito diferente.
Falar sobre vinhos pode ser um tema complicado para iniciantes. Eleger o rótulo ideal para harmonizar com a refeição, entender as sutis diferenças entre as castas de uvas ou mesmo explicar o que, afi nal de contas, as pessoas que cheiram uma taça recém-servida pelo garçom querem sentir.
Em seu rápido e intenso mergulho na enologia, Madeline percebeu que havia muita informação dispersa – e que o apreciador da bebida era, no fundo, alguém com sede de entendimento. Foi o estopim para criar em 2011 o Wine Folly: portal que uniria a experiência de designer com o que aprendeu servindo, bebendo e analisando tintos, rosés, brancos...
A cada mês, pelo menos 150 mil pessoas param por aí, superando a audiência de sites referenciais, como o do aclamado crítico Robert Parker, fundador do The Wine Advocate, o guia de classifi cação de vinhos mais prestigiado do mundo. Aos 31 anos, Madeline escreve artigos e publica trabalhos em jornais como Washington Post, revistas como a Reader’s Digest e portais como o Huffi ngton Post e o Business Insider. Ganhou por dois anos consecutivos (2013 e 2014) o prêmio de blog do ano da International Wine and Spirit Competition. Foi sommelière e tornou-se consultora de restaurantes em Seattle, onde vive. Recebe convites para visitar terroirs espalhados pelo mundo. Este ano, deve conhecer vinícolas chilenas e italianas.
A grande sacada que rendeu ao Wine Folly um lugar de destaque no mundo dos vinhos são os infográfi cos produzidos por Madeline. Elegantes e didáticos, surgem como manuais ilustrados a respeito de tudo aquilo que o enoconsumidor
gostaria de entender. Os temas vão desde dicas sobre harmonização até um glossário de sabores, além de testes para escolher a garrafa perfeita para cada ocasião. Ano passado, a designer largou o emprego de sommelière para se dedicar apenas ao Wine Folly. Sua equipe conta hoje com seis colaboradores. Fechou contrato para lançar um livro compilando alguns de seus principais trabalhos, intensifi cou a quantidade de posts sobre degustações e os textos de viagens. Começa a mesurar os frutos da investida por conta da atenção e dos elogios que recebe de autoridades da indústria.
“O que torna Madeline diferente é sua atitude muito divertida e refrescante”, diz Eric LeVine, criador do Cellar Tracker, site referência que conta com um público cativo de mais de 250 mil pessoas. “Adoro o tom dos textos dela. Há quem leve vinho muito a sério e há gente divertida, mas sem substância. Madeline balanceia os dois. Ela não leva muito a sério, mas sabe do que está falando. Não subestima o leitor”,
_O primeiro
vinho marcante: Vale do Rhône
“Já faz muito tempo, mas lembro que tomei
um vinho de lá que tinha gosto de azeitonas e
pimenta-do-reino! Era tão salgado. Foi a primeira
vez que senti gosto de outra coisa em um vinho.
Fiquei fascinada e, para falar a verdade,
um pouco perturbada. Me abriu para
o inesperado.”
ACIMA, ILUSTRAÇÃO DE MADELINE PUCKET COM RÓTULOS
DA REGIÃO DE BORDEAUX, NA FRANÇA. AO LADO, UM
EXEMPLO DE PÔSTER CRIADO PELA DESIGN QUE PODE SER
COMPRADO NO PORTAL WINE FOLLY
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MADELINE
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No país, Madeline visitou terroirs
na região sul e destaca o Vale
de Barossa, a 60 quilômetros de
Adelaide, como um dos pontos
altos da jornada. Na mesma
região, cujo forte calor estimula
a maturação das uvas da casta
Shiraz, também estão os vales de
Clare, McLaren e Adelaide Hills.
No Vêneto, a região de Valpolicella
produz o fantástico Amarone della
Valpolicella, um dos vinhos mais
premiados do país, tinto seco e de sabor
cheio de nuances cujas uvas passam por
processo de secagem de até cinco meses.
Boa parte dos produtores reservam as
garrafas por cinco anos. Na região do
Trento se destacam espumantes feitos
com Pinot Noir e Chardonnay.
Ela recomenda o Cabernet Sauvignon
como destaque da produção local.
“Há uma complexidade de sabores no
Cabernet sul-africano que faz com que ele
seja uma alternativa mais agradável do que
os cabernets frutados de Paso Robles ou
Sonoma, na Califórnia. Imagine pimenta-
negra e pimentão recheados com groselha,
amora e ameixa. O cabernet da África do
Sul é saboroso, mas sem os sedimentos
de um bordeaux francês superior.”
A sommelière desembarcou em dois
dos pedaços mais célebres do país.
Às margens do rio Loire, onde visitou
o famoso vale que dá nome à região,
Madeline provou os vinhos tintos de
Chinon, famosos por sua leveza. Na
quase vizinha Bourgueil, encontrou
versões mais aromáticas da bebida.
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_O mapa do vinhoMadeline Puckette percorreu quatro continentes e experimentou mais
de 7 mil rótulos. Aqui, mostramos com taças as cidades onde ela foi
beber e algumas experiências mundo afora
Em Navarra e na Catalunha, a
sommelière provou Cavas (espumante)
produzidas com a Viura (uva também
conhecida como Macabeu), de aroma
bastante fl oral. Na região de La Rioja,
provou tintos da casta Tempranillo, como
o Marqués de Murrieta, produzido desde
o século 19 por uma bodega familiar. O
país é o terceiro maior produtor de vinhos
do mundo (superado por França e Itália).
“Conheci o vinicultor Rob Mercer que
nos convidou a visitar sua produção em
Horse Heaven Hills. Ele nos levou por
vinhedos gigantes, com mais de 400
hectares. Foi ao ver uma fazenda tão
grande que entendi como essa bebida
pode ser um negócio. Bebemos muito
Shiraz assistindo a tempestades de raios
em Oregon, do outro lado do rio
Columbia. Jamais esquecerei disso.”
“Portugal é um dos tesouros perdidos
da Europa”, diz Madeline. Ela visitou
o Vale do Douro, as regiões de Minho,
Dão, Beiras e o Alentejo. “Mas dois dos
meus lugares favoritos de Portugal
são Alenquer, onde está a vinícola Quinto
do Pinto, e Colares, perto de Lisboa.
Colares virou um retiro para ricos, mas
sobraram quatro hectares de vinícolas – e
dois vinicultores lutam para preservá-los.
Sabe por quê? Não há vinhedo igual no
planeta. O solo fi ca 1 metro abaixo da
areia. As raízes, algumas com 100 anos,
pegam os nutrientes bem no fundo. Os
vinhos de lá são dourados e têm gosto de
mel com uma pitada de sal. Incríveis.”
A proximidade de casa fez com que
as vinícolas californianas fossem bem
exploradas por Madeline. Vale de Napa,
Clear Lake, El Dorado, Monterey e Santa
Lucia Highlands, San Luis Obispo e Paso
Robles, Santa Barbara, Santa Rita Hills e
Malibu constam como alguns dos locais
em que a especialista provou vinhos mar-
cantes. Para os amantes do enoturismo,
ela indica conhecer de carro as vinícolas
de Mendocino e do norte de Sonoma.
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PERSONNALITÉ
82 À ESQUERDA, DESENHO DE MADELINE RETRATA COMO PRODUTORES
TENTAM MINIMIZAR OS EFEITOS DE GRANIZO SOBRE A COLHEITA; NA
PÁGINA AO LADO, A DESIGNER EM SEATTLE, DURANTE A GRAVAÇÃO DE
UM DOS SEUS PRIMEIROS VÍDEOS PARA O SITE WINE FOLLY, EM 2012
afi rma Ryan O’Connell, da Naked Wines, empresa que fi nancia vinícolas independentes. “Ela não apenas entretém, mas educa – e faz isso da forma mais efi ciente”, explica Paul Mabray, criador do VinTank, empresa que monitora a popularidade de artigos relacionados a vinhos em redes sociais. “Madeline faz entender de vinho parecer fácil. Temas como moléculas, taninos e tipos de solo de repente surgem descomplicados e divertidos”, diz Nicholas Miller, vice-presidente de vendas da vinícola Bien Nacido Vineyards, da Califórnia.
A simplicidade de Madeline Puckette também se aplica em relação aos valores cobrados por uma garrafa. Ela acredita que não há necessidade de pagar uma fortuna por uma taça de um Pinot Noir sofi sticado para ter uma experiência signifi cativa. Diz que já gastou alguns milhares de dólares por uma garrafa (sem revelar a quantia), mas defende que rótulos mais em conta também são capazes de oferecer sabores marcantes. “Quando você experimenta vinhos caros e antigos, entende: é verdade, eles têm gosto melhor do que os baratos”, explica. “Mas, quando você sabe o que procurar, encontra algo tão bom quanto, ou tão adequado ao seu gosto, por bem menos. Tomei um, recentemente, da região do Lazio, na Itália, que custava uns US$ 40 a garrafa. Esse vinho poderia facilmente passar por um Bordeaux de US$ 900.”
As raízes do sucesso de Madeline – e da mistura de leveza e arte em sua profi ssão – estão nas experiências de juventude – incluídas aí uma faculdade de arte e uma carreira promissora na música. Ela é uma daquelas pessoas cujo cérebro funciona de uma maneira diferente, simples, brilhante e irrequieto. Em dezembro do ano passado, quando a encontrei para jantar em Seattle, a especialista me explicou a cidade desenhando um
mapa. Em cada bairro, rabiscava à caneta marquinhas e ícones, listava nomes dos locais de interesse e suas peculiaridades. Em um guardanapo e em poucos minutos, a designer é capaz de esboçar um guia divertido e surpreendente. Esse didatismo, mesmo diante das mais banais tarefas, é sua marca maior.
O entusiasmo com vinho também é pungente. Após o jantar, depois de passar horas falando sobre tintos e brancos, taninos e terroirs, Madeline me convidou a ir à casa de um amigo, chefe de uma grande vinícola da região, a quem ela queria mostrar um vinho que ganhou. Era um Cesanese del Piglio, rótulo que é fabricado desde a Idade Média e cujo gosto é diferente de tudo que já provei, com notas defumadas e especiarias.
Há mais um aspecto que explica muito do que Madeline é: sua infância. Quando criança, vivia cercada de música e arte na casa da família, na Califórnia, onde cresceu. O pai tocava violão e bandolim, enquanto a mãe, piano e cravo. Era natural que a garota se interessasse por algum instrumento. A irmã mais velha se interessou pela harpa, Madeline, aos 5 anos, fi cou alucinada após ver um músico tocando saxofone. A mãe achou que ela era pequena demais para o sax, e sugeriu uma fl auta. Mais tarde, estudou piano. No ensino médio, formou uma banda com as amigas. A música logo se tornaria uma grande parte de sua juventude. Tocou em bandas punk até que ingressou, em Los Angeles, na universidade CalArts, na qual se formou em tecnologia musical e arte em 2005. Ela, porém, odiou a experiência. “Eu queria ser artista, não fazer coisas comerciais”, diz. “Logo vi que não daria certo.”
Desiludida, girou seu foco para a musica eletrônica, gênero bem mais popular na Europa do que em seu país. “Eu sabia que queria fazer aquilo e que seria completamente inovador. Ninguém estava fazendo isso naquela época aqui.”
_Vinho para
celebrações: brancos“O período em que estávamos preparando
o Wine Folly foi marcado pelos tintos. Quanto
mais você entende de vinhos, tende a beber
mais brancos e champanhes. Amamos os
tintos, mas os brancos viram a nossa
cerveja: gelados, refrescantes, deliciosos,
e especialmente efetivos depois
de um dia longo.”
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MADELINE
Logo começou a frequentar a cena noturna de Los Angeles e ganhou alguma fama, lançando discos por gravadoras pequenas regionais. Além disso, colaborou com artistas de mais peso, como o DJ francês Joachim Garraud. Mesmo assim, não engrenou. “Quando eu tocava, não estava feliz.”
SAFRA CASEIRA
Ainda na faculdade, Madeline conheceu o namorado e co-fundador do Wine Folly, Justin Hammack, com quem está há mais de dez anos. “Ele é como o CEO do site, apesar de as pessoas conhecerem mais a mim”, diz. “Sou a cara do negócio, ele, o cérebro.” Justin, um web designer de formação, ajudou a moldar o formato do portal. É quem cuida do planejamento e analisa o retorno do público e do mercado para direcionar o futuro da empresa. Madeline conta que durante os primeiros meses do projeto, cansativos e incertos, a presença do parceiro serviu como um alicerce. À época, ela havia voltado a trabalhar como designer gráfi ca durante o dia, reservando as madrugadas para se dedicar aos textos e ilustrações do Wine Folly.
Hoje, com o site em expansão, Madeline tem recebido cada vez mais convites para conhecer vinícolas ao redor do mundo. Já percorreu quatro continentes e diz ter experimentado cerca
de 7 mil rótulos diferentes. “Mas não é tanto assim”, explica. “Considerando que um crítico profi ssional toma essa mesma quantidade por ano...” Mas é o sufi ciente para abastecer o endereço com notícias. Além disso, o Wine Folly começou a apostar em outros tipos de serviços e produtos mais sofi sticados. Recentemente, passou a vender pôsteres com os infográfi cos publicados. “Ainda é difícil ganhar dinheiro só com o site, mas estamos tentando”, diz.
Entre livros, pôsteres, viagens, infográfi cos e posts, Madeline Puckette estabeleceu seu nome como uma referência mundial. E com o saboroso diferencial de tornar uma carta de vinhos um documento acessível para todos os gostos e bolsos. É uma caminhada cheia de idealismo e difi culdades. Ela conta, com expressão frustrada, ter recusado ofertas comerciais e de anúncios porque julgou não combinarem com a proposta da empresa. “Não quero estragar o que construí”, explica, entre um sorriso e um gole de tinto. Ao mesmo tempo, expressa uma intensa empolgação ao passar horas e horas falando de suas viagens, recomendando rótulos especiais e lugares pouco conhecidos que merecem uma visita no verão. “Quanto mais você estuda e pesquisa o assunto, mais fi ca claro que ninguém pode saber de tudo”, diz. “Se quiser, você pode passar a vida toda aprendendo.”
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VERDE CONCRETOPara dar uma outra cor às paredes cinzas dos edifícios paulistanos e melhorar a vida de quem mora ali, jardins suspensos brotam em São Paulo
POR Filipe Luna FOTOS Leonardo Finotti
AO FUNDO, JARDIM VERTICAL DO HOTEL REGENT PARK, NA
PÁGINA AO LADO, O DO EDIFÍCIO TACOA; AMBOS ESTÃO EM
SÃO PAULO E FORAM INSTALADOS PELO MOVIMENTO 90°
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passou a mapear as paredes em que os jardins poderiam ser implantados. A tarefa durou mais de 1 ano e apresentou um resultado impressionante: cerca de 258 mil metros quadrados (área equivalente a 30 campos de futebol) de empenas cegas nas principais avenidas do centro expandido. O Movimento 90º começou com um objetivo defi nido: transformar o Minhocão num corredor verde. Era hora de formar uma equipe.
A portuguesa Inês Fernandes conhe-ceu o projeto de Blanche por meio de um amigo em comum e se juntou ao grupo
“OS JARDINS VERTICAIS
SÃO O FUTURO DA
CIDADE”, DIZ GUIL
BLANCHE
Em qualquer lugar no centro de São Paulo, um indivíduo se encontra cer-
cado por prédios. Não importa a direção em que a mira do observador aponta, imensas torres de concreto compõem a paisagem da cidade. Mas, aos olhos de Guil Blanche, criador do Movimento 90º, cada enorme parede vazia, numa ci-dade que não permite mais que a publi-cidade ocupe esse espaço, é um jardim. O objetivo do jovem paisagista é cobrir de natureza áreas que dão à capital pau-lista seu aspecto cinza pálido. “Morando no centro, próximo ao elevado Costa e Silva, o Minhocão, tive uma visão dessas empenas cegas [termo técnico para deno-minar as paredes sem janelas dos prédios], superfícies sem função alguma, cobertas de verde”, diz o goiano de 25 anos. “E, mais do que isso, entendi que era uma urgência da cidade.” Além do evidente benefício visual, um jardim vertical pro-voca impacto ambiental signifi cativo.
Guil aprendeu a técnica enquanto cursava a faculdade de arquitetura na Escola da Cidade, em São Paulo, através de um amigo que estudou com o criador dos jardins verticais, o botânico francês Patrick Blanc. “Fiquei encantado. Pensei: ‘Esse é o futuro da cidade. Você não tem espaço pra fazer jardim, então vai pra parede’.” Blanche voltou a Goiânia e pra-ticou durante seis meses numa fachada da fábrica de fundição de alumínio do pai. Chegou a um resultado similar ao de Blanc, mas com um custo mais barato. Decidiu espalhar a novidade pela capi-tal de Goiás. “Virou uma febre”, conta. “Hoje, qualquer casa de alto padrão lá tem um jardim vertical.”
De volta a São Paulo, Guil decidiu largar a arquitetura e completou o curso técnico em paisagismo. No fi nal de 2011,
ACIMA, A EQUIPE DO MOVIMENTO 90º: RODRIGO AMARAL
ROCHA (SENTAD0), GUIL BLANCHE E INÊS FERNANDES.
NA PÁGINA AO LADO, O JARDIM VERTICAL DO HOTEL
REGENT PARK, NO BAIRRO CERQUEIRA CÉSAR (SP)
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ARTE DE RUA
O primeiro grande jardim no Minhocão foi realizado no fi nal de 2013 no edifício Honduras, em parceria com a marca de bebidas Absolut. Guil desenhou o projeto como costuma iniciar seus jardins: pin-tando em aquarela. As espécies de plantas que dão as cores e compõem o desenho são escolhidas de acordo com a época do ano e a orientação da parede em relação ao sol. “É difícil chamar meu próprio tra-balho de obra de arte”, diz. “Agora, é pos-sível comparar, sim, com uma arte de rua, uma intervenção artística como o grafi te.”
O artista plástico Felipe Morozini, que mora na região e cujo trabalho está diretamente ligado ao Minhocão, exalta os aspectos positivos: “O impacto é gi-gantesco, seja visual ou ambiental. O jar-dim trouxe de volta pássaros que tinham ido para a Serra da Cantareira, ou outra fl oresta, e transformou um pequeno trecho da cidade numa outra paisagem, mais honesta e verdadeira”.
dim vertical é também um jardim versá-til em benefícios. Segundo os integran-tes do Movimento, a temperatura de uma parede cai cerca de 8 graus exter-namente e 4 graus na parte interna com um tapete verde aplicado sobre ela. As plantas absorvem o ruído da rua e ainda diminuem em 60% a concentração de micropartículas poluentes no ar, num raio de 30 a 40 metros do jardim. “Eles estão dando uma alternativa muito legal para você criar áreas verdes numa cida-de que tem pouco espaço”, explica Gil-berto Dimenstein. “É daquelas grandes invenções urbanas em que você mostra como pode embelezar e despoluir com baixo custo.” O jornalista e editor do site Catraca livre é um dos principais in-centivadores e convidou o grupo a criar um projeto para o galpão em que vai implantar o Armazém da Cidade – local onde o Movimento vai instalar seu novo escritório e dividir o espaço com outras empresas de impacto social.
em 2013. Aos 25 anos, a arquiteta, que fi zera parte de sua graduação na Uni-versidade de São Paulo, havia decidido deixar Lisboa para estabelecer carreira no Brasil. “Eu estava procurando empre-go, mas não estava satisfeita com o tipo de abordagem tradicional dos arquitetos, sem um impacto social ou na vida das pessoas”, afi rma. “Há muita coisa para ser feita em São Paulo, e é aqui onde me sinto mais útil.” O outro arquiteto da equipe, o também goiano Rodrigo Ama-ral Rocha, 28 anos, é amigo de infância de Guil. “Me interessei pela ideia de que esse projeto é acessível e de que pode transformar a cidade”, explica. “Tinha possibilidades de emprego mais rentá-veis, mas não é essa a função do trabalho para mim. Não adiantaria fazer algo que não transformasse a sociedade.”
O trio pinçou alguns dos problemas mais evidentes e essenciais da maior ci-dade da América do Sul e os atacou com um método simples e inspirador. Um jar-
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88 NA PÁGINA AO LADO, O JARDIM VERTICAL MONTADO
NO EDIFÍCIO HONDURAS DÁ OUTRAS CORES À
PAISAGEM QUE SE VISLUMBRA A PARTIR DO MINHOCÃO
O maior jardim vertical do mundo, segundo o livro Guinness dos recordes,
fi ca na região de Bukit Timah, em Cingapura. O condomínio Tree House traz
na sua fachada um jardim de 2.289 metros quadrados. São quatro torres de 24
andares e um total de 429 apartamentos. O metro quadrado lá vale mais ou me-
nos US$ 10 mil. Além de ser um dos aspectos marcantes do projeto, as plantas
proporcionam economia aos condôminos. A construtora estima uma economia
de 15% a 30% com gastos com ar-condicionado para os apartamentos que têm
quartos nessa fachada, graças à diminuição de temperatura interna causada pelo
jardim. Isso signifi ca de US$ 12 mil a US$ 24 mil a menos de custos com energia
elétrica por ano. O empreendimento tem ainda outras iniciativas de economia de
energia e água que irão diminuir os gastos anuais em até US$ 500 mil.
_Jardim vertical recordista
ra, e aqui temos insetos. Eu acho bom que tenha aranha na minha casa. Você está próximo da natureza, não isolado.”
O impacto do trabalho do Movimen-to 90o é sentido de fato quando o projeto tem mais escala. Por isso, o grupo quer aplacar a poluição gerada pelos cerca de 120 mil automóveis que passam por dia pelo Minhocão implantando mais 20 jar-dins verticais ao longo do elevado. Eles já conseguiram dez autorizações de con-domínios. “Acredito que daqui a 30 anos as cidades estarão cobertas de paredes verdes”, afi rma Guil. “Como ainda não existiu essa intervenção de impacto ur-bano, é isso que a gente quer fazer. Quer ver se realmente o impacto é sério.”
O objetivo está defi nido para 2015. Enquanto isso, seguem trabalhando para transformar São Paulo, e outras cidades do Brasil, em paisagens urbanas domina-das pelo verde. Nos cursos e workshops, o trio ensina toda a técnica que desen-volveu, sem se preocupar em guardar segredos industriais. “A gente torce para que as pessoas aprendam mesmo e que apareçam outros fazendo”, diz Guil. “E nenhum de nós é realmente de São Paulo, né? Todo mundo que vem parar aqui se identifi ca com a cidade porque ela te recebe de braços muito abertos”, completa Inês. “As coisas que as pessoas encaram como problemas, como mal resolvidas, para mim são possibilidades. Essa cidade está cheia delas. Sempre me identifi quei com a possibilidade de mudar o mundo com a minha atuação no lugar onde estou.” Guil Blanche encerra a conversa com um convite: “Precisamos de concorrência, de gente capaz de fazer. São 258 mil metros quadrados de pare-des lisas em São Paulo. Não tem como a gente dar conta sozinho.”
Rodrigo Rocha coordenou a equipe que instalou a parede verde no Hondu-ras. Uma estrutura com 5 centímetros de espessura separa as placas de material reciclado, feitas com embalagens Tetra Pak, da superfície do prédio. Uma cama-da de feltro cobre as placas com bolsos individuais para cada planta. O tecido ajuda a reter a água, que é distribuída por um sistema de canos. Em média, o custo do jardim é de R$ 890 por metro quadrado, mais cerca de R$ 200 de ma-nutenção por mês – que corresponde ao consumo de energia elétrica e água (o jardim aumenta apenas em 1,5% o con-sumo de água do condomínio).
DOMÍNIO DO VERDE
A instalação, no entanto, foi a parte simples. O maior desafi o acabou sendo convencer alguns moradores. “A grande maioria acha positivo e tem senhorinhas que amam e se orgulham de ter aquele jardim no prédio delas”, afi rma Rodrigo. “Mas tem outros que reclamam, que dá bicho. Tem épocas em São Paulo que você tem mais mosquitos. Agora, é natural, não é? Você está numa cidade, no planeta Ter-
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PRIMEIRA PESSOA | VERA HOLTZ
_ ESPÍRITO POÉTICOA atriz costuma comprar objetos sem saber exatamente o motivo. “Um tempo depois, sempre acontece algo que ‘explica’ o porquê.” Em 2014, após ter adquirido esta escultura, ela foi convidada para viver Timon de Atenas, que se lança em alto-mar a bordo de um veleiro, em uma peça de Shakespeare. “A escultura leva a um estado de espírito poético, um momento desconhecido da minha experiência, como é a imensidão do mar.”
A PEÇA É OBRA DO ARTISTA PARAENSE TONICO LEMOS AUAD
E SE CHAMA SERMÃO DOS PEIXES. ELA FEZ PARTE DA
COLEÇÃO BORDALLIANOS DO BRASIL E FOI ADQUIRIDA
PELA ATRIZ NA ARTRIO, EM SETEMBRO DO ANO PASSADO
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