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Pós-G raduação em mediação de conflitos com espec ialização em

mediação familia r 2011/2012

Reflexão sobre a abordagem te rapêutica na mediação familia r

Andre ia Baptista , Março 2012.

Uma definição simples, e ao mesmo tempo interessante, de mediação, apresenta-a

como (Haynes & Haynes, 1989, p. 1). Assumindo-se como uma

técnica não contenciosa de resolução de conflitos, esta auxilia as partes a procurarem os

seus verdadeiros interesses e preservarem-nos num acordo criativo (Vezzulla, 2005),

Subjacente a esta definição está a consideração do conflito, em que nos casos de

mediação familiar, muitas vezes o trabalho do mediador tem início numa fase em que

este já está solidificado e as partes se resguardam em posições estabelecidas, o que os

torna incapazes de concordar. No entanto, e apesar de frequentemente o conflito se

considerar negativo, uma das assunções básicas da mediação, é encará-lo, não apenas

como um perigo, mas também como uma oportunidade, isto porque representa um

momento de mudança que, não sendo invariavelmente positiva, se configura como

produtiva (Haynes & Heynes, 1989).

Uma das aplicações mais salientes da mediação de conflitos relacionados com a

família, refere-se à utilização desta em conflitos relacionados com situações de divórcio

e regulação das responsabilidades parentais (Taylor, 2002). Esta aplicação é

particularmente relevante se considerarmos que o divórcio afecta mais de um milhão de

management

responsável do conflito, pode fornecer uma oportunidade para facilitar esta transição do

divórcio e ultrapassar possíveis danos decorrentes do conflito parental. Este aspecto vê-

se reforçado pelas evidências na literatura que salientam o facto da mediação se associar

a reduções do distress psicológico tanto dos pais como das crianças que passaram por

um processo de divórcio (Walton, Oliver, & Griffin, 1999).

No entanto, apesar dos processos de divórcio constituírem uma das aplicações

centrais da mediação a disputas familiares, nem sempre os casos apresentados em

mediação correspondem àquilo que se pode considerar um processo de divórcio

es financeiras, de divisão de bens e de aspectos

relacionados com as responsabilidades parentais), podendo considerar-se a mediação

relativamente a apenas um, ou alguns, destes aspectos (Taylor, 2002). Deste modo,

tendo como quadro teórico fundamental uma perspectiva holística/ecológica que

salienta a interacção de diferentes elementos (e.g. estados psicológicos, padrões de

relação interpessoais, desenvolvimento das crianças e potenciais riscos à sua normal

progressão, factores demográficos, relações entre pares e recursos comunitários; Irving

& Benjamim, 1995), salienta-se acima de tudo a importância de, na mediação do

divórcio, se considerarem não só os aspectos legais inerentes a esta situação, mas

também os estados psicológicos e relacionais que o acompanham.

Neste sentido, e porque o objectivo deste trabalho é, no fundo, uma reflexão sobre

algum dos temas relacionados com o processo de mediação e/ou a prática profissional

nesta área, parece-me importante problematizar acerca dos modelos que nos podem

guiar e servir de referencial para a condução deste processo, reflectindo acerca das

nossas principais funções como mediadores.

Assim, e tendo em conta que ao longo da nossa formação este foi aquele que menos

atenção nos mereceu, parece-me oportuno referir-me e reflectir, exemplificando depois

através da apresentação de um caso hipotético, acerca do Modelo Terapêutico de

Mediação Familiar, seus pressupostos e etapas.

Segundo Irving e Benjamin (2002), existe algum acordo na literatura relativamente

aos objectivos principais da mediação familiar, sendo eles essencialmente: a criação de

um processo justo e cooperativo de divórcio para casais em conflito; a clarificação e

discussão dos assuntos que geram o desacordo; a possibilidade, caso faça sentido para o

casal, de reconciliação; o encorajamento dos pais no sentido de porem os interesses dos

seus filhos acima dos próprios interesses; a chegada a um acordo em que que ambas as

partes se sintam representadas e em que os seus interesses sejam garantidos.

Existem numerosos modelos que procuram atingir estes objectivos utilizando as

mais variadas estratégias, técnicas e pressupostos. No caso do Modelo Terapêutico de

Mediação Familiar, objecto desta reflexão, a ênfase é dada aos processos relacionais. Os

objectivos principais dos profissionais que utilizam este modelo como referência são:

compreender o que está na base dos conflitos dos casais ainda que não seja apenas o

conflito manifesto; ajudar a transição dos papéis conjugais para os papéis parentais;

bloquear ou transformar padrões de conduta que interferem ou impedem a negociação;

encorajar as partes a trabalhar os sentimentos negativos relativamente ao cônjuge;

reenquadrar o divórcio de forma mais positiva, como uma reestruturação da família e

uma oportunidade de recomeço para todos os seus membros. Importa, talvez para

melhor compreender, referir que a lógica subjacente a este Modelo tem como base a

metateoria dos sistemas de Von Bertalanffy (1950). As principais assunções desta

teoria, e que importam à mediação familiar, são: a) as coisas ou entidades no mundo são

relacionais, ou seja, envolvem duas ou mais unidades em interacção; b) todos os

sistemas têm a mesma base estrutural sejam eles pessoas, díades, famílias ou

organizações; c) nenhum nível de complexidade deve ser visto como mais real, todos os

sistemas devem ser entendidos como abstracções organizacionais abstractas, são mais

ou menos úteis de acordo com o ponto de vista do observador; d) O todo é mais

complexo que a soma das suas partes; e) a causalidade dos sistemas é sempre circular, a

acção é recíproca e existe ao longo do tempo; f) as interacções entre os sistemas e

dentro de cada sistema acontecem em padrões que se repetem sequencialmente; g) em

sistemas sociais estes padrões envolvem negociação entre as partes; h) os sistemas e os

seus padrões de comunicação tendem para a homeostasia; i) cada sistema actua num

determinado contexto e a sua acção deve ser entendida com base no contexto em que

ocorre; j) os padrões transaccionais não só definem a relação entre os sistemas como

aquela entre os seus membros; k) uma mudança numa das partes do sistema vai operar

mudanças nas outras sendo que por isso se considera que os sistemas e os seus

elementos são interdependentes; l) os sistemas têm a capacidade de se auto-regular

(Irving e Benjamin, 2002).

Assim, é possível compreender as implicações que esta metateoria tem para o

Modelo Terapêutico de Mediação Familiar. Em primeiro lugar considera a família como

um sistema organizado de acordo com determinadas regras em que os seus membros

têm diferentes interesses. Esta perspectiva sugere, então, que é expectável que cada um

dos cônjuges desempenhe um papel diferente no momento em que está em reunião

individual, daquele que adopta quando em reunião com o outro, salientando a

importância da perspectiva da , como por exemplo, a família alargada.

O mediador pode servir muitas vezes como uma dessas s s que observa o

sistema como um todo e pode apreender aspectos mais funcionais e menos funcionais

do mesmo. Importa ainda referir que o interesse individual é muitas vezes díspar do

interesse do sistema como um todo. Ao longo do tempo é também possível observar que

os cônjuges, embora muitas vezes sem terem consciência disso, adoptam um tipo de

conduta e de padrões de comunicação resistentes à mudança. Se muitas vezes estes são

inofensivos para o processo, também é verdade que, creio eu, em outras ocasiões, não

podem ser ignorados. É crença comum, partilhada por vários modelos e autores, que

estes padrões devem ser alterados em mediação, quer bloqueando-os, quer modificando-

os no sentido da negociação mais produtiva. É neste sentido que o Modelo Terapêutico

surge como uma abordagem com uma identidade própria, talvez não única,

direccionando a sua acção no sentido da modificação destes padrões e não apenas do

bloqueio da sua emergência. Uma consequência deste trabalho é, muitas vezes, o

caminho da reconciliação ou até o encaminhamento para a terapia. É, pelo menos, sem

dúvida, o caminho através do qual se preparam os mediados para a adopção de novos

modelos comunicacionais, novas regras de conduta, prevenindo futuros litígios e

conflitos futuros (Irving e

Benjamin, 2002).

É ainda objectivo da Mediação Terapêutica e característica distintiva, o trabalho de

normalização dos sentimentos negativos e da ambiguidade sentidos no momento pós-

divórcio, ajudando os mediados a estabilizar as suas emoções e a aceitar de forma mais

produtiva as mudanças que advêm desta transição. A causalidade circular surge ainda

como forma de tornar mais reais e menos abstractas, do meu ponto de vista, as noções

que acompanham o processo de mediação, seja qual for o modelo ou modelos

adoptados, da necessidade de colaboração entre as partes, de voluntariedade, de

flexibilidade e da tão referida e importante imparcialidade do mediador. Poderá parecer

abusiva esta relação mas, no meu entender, apenas aceitando e integrando que o

comportamento de um elemento não é, por si só, explicativo do comportamento de

outro e que as relações entre eles devem ser contextualizadas e entendidas numa

dinâmica em que as acções de um afectam as acções do outro e o contrário (Alarcão,

2006) podemos garantir que os princípios acima citados serão respeitados e sobretudo

será explicitada a sua importância. Por outras palavras, apenas seremos flexíveis se

compreendermos que geraremos assim, mais facilmente, a flexibilidade no outro e

reciprocamente; só colaboraremos se integrarmos que a nossa acção afecta e modifica a

acção do outro; e só seremos verdadeiramente voluntários no processo quando nos

implicarmos e fizer sentido a partilha de responsabilidades. O mesmo se aplica, do meu

ponto de vista, ao mediador que além do referido é acrescido da importância da

imparcialidade que também penso ser garantida a partir, entre outros, deste pressuposto

no sentido em que, assumindo que cada um age em contexto e é interdependente da

acção do outro, a imparcialidade estará inevitavelmente presente, porque justificada.

No que concerne especificamente à questão da flexibilidade e considerando-a agora

noutra perspectiva, pondo o enfoque nas etapas do Modelo Terapêutico de Mediação

Familiar considero ainda importante notar que todo este Modelo é flexível, quer nas

suas diferentes fases e etapas quer na forma como cada profissional dirige e adapta o

modelo às evoluções e involuções dos mediados ao longo do processo (Irving e

Benjamin, 2002).

Importa por isso e como forma de melhor o compreender fazer uma breve descrição

das diferentes etapas propostas pelo Modelo Terapêutico de Mediação Familiar, são

Assessment - esta fase tem cerca de três sessões: uma individual com cada

uma das partes seguida de uma sessão conjunta. Nesta fase os mediadores classificam o

caso como sendo: a) inapropriado para mediação; b) preparado para entrar directamente

na fase de negociação ou; c) capaz de negociação após um período de pré-mediação; b)

a Pré-Mediação - e

aplicado aos mediados que se supõem num nível de conflitualidade que impede a

negociação. Tem como objectivo alterar os padrões relacionais de forma a serem

adequados à futura negociação; c) a Negociação - esta fase é definida como aquela em

que se desenrola o processo de discussão e acordo relativamente aos assuntos alvo da

Follow-up - esta fase envolve uma reunião conjunta passados cerca

de 6 meses da elaboração do acordo com o objectivo de monitorizar o progresso e a

adequabilidade do acordo feito anteriormente. É possível nesta fase que os mediados

possam regressar às fases de negociação ou mesmo de pré-mediação, confirmando-se,

como anteriormente referi, a flexibilidade inerente a este processo (Irving e Benjamin,

2002).

Antes de mais, referir-me ainda à dimensão pedagógica da mediação, que me parece

ser, em contraponto com as vias jurídicas de resolução de conflitos, a que mais importa

neste processo. Parece-me claro e fundamental notar que este Modelo tem em conta esta

dimensão quer de uma forma preventiva em relação a conflitos futuros, dotando os

mediados de padrões alternativos de comunicação e conduta, quer sobretudo, e talvez a

distinção em relação aos restantes modelos, para mim, seja fundamentalmente esta, na

resolução e normalização dos conflitos e sentimentos negativos passados e presentes.

Embora a mediação seja uma prática orientada para o futuro, em que se guiam as partes

-me importante

não descurar o passado e a história que os trouxe até nós. O conflito manifesto assenta

ou tem origem numa história conjunta, numa relação anterior, num conjunto de

situações e acontecimentos e, do meu ponto de vista, só acolhendo essa história e

trabalhando o que ela fez e faz sentir, impedindo a negociação, podemos realmente e, de

forma produtiva e eficaz, pensar e problematizar com eles, o futuro. No fundo, aquilo a

que me refiro é a uma dimensão que, do meu ponto de vista, para ser pedagógica tem

que ser, como supõe o Modelo, relacional. Ter como foco principal os padrões

relacionais, alterando-os e modificando-os de forma a poderem ser mais adaptativos é,

ao que me parece, a única forma de garantir a aprendizagem para o futuro de formas

alternativas de se relacionarem e consequentemente prevenir formas de resolução de

conflitos mais desajustadas que prejudicarão quer os membros do casal, quer a família

no seu todo. Relaciono ainda esta função com outro tema em constante debate e que

deve ser uma das principais funções do mediador, que é a garantia do superior interesse

da criança. Para além de garantir que os direitos das crianças são tidos em consideração

e atendidos em todas as suas valências, esta função pedagógica deve também ela servir

o interesse da criança capacitando os pais para interacções mais positivas que possam

abonar a favor de um desenvolvimento mais saudável e ajustado.

Correndo o risco de fazer confundir este Modelo com a terapia propriamente dita

parece-me relevante ainda explicitar aquelas que considero, de acordo com alguns dados

da literatura, serem as principais diferenças entre esta última e o Modelo que acima

referi. Se é certo que este modelo preconiza a utilização de métodos terapêuticos, é

importante notar que o faz com objectivos diferentes da psicoterapia. Esta última tem

como principal objectivo ajudar o cliente a fazer mudanças a longo-prazo na sua

conduta, construção de identidade, relacionamentos, etc. com vista à redução ou

eliminação dos problemas apresentados. A Mediação tem como principal objectivo

ajudar os clientes a resolver conflitos. No entanto, para esta resolução são necessárias

determinadas competências e a ausência de determinados padrões de conduta inimigos

da negociação. Assim, os métodos terapêuticos utilizados visam apenas providenciar

essa ajuda no sentido de adquirir as competências necessárias ao cumprimento deste

objectivo (Irving e Benjamin, 2002).

Aprese ntação de um caso

A apresentação de um caso serve, neste trabalho, a função de exemplificar a abordagem

acima referida pelo que não será uma apresentação exaustiva de todos os passos e

sessões do processo mas sim, uma apresentação geral com indicação, em cada etapa do

modelo, de um exemplo de intervenção.

Temos então o caso da Teresa e do Rui, casal recém-divorciado, que recorrem à

Mediação para a regulação das responsabilidades parentais das filhas, menores, Carolina

8 anos, e Mafalda 4 anos.

O Rui tem 42 anos, é médico e trabalha num hospital público, por turnos, sendo que

passa pouco tempo em casa.

A Teresa tem 38 anos, é jornalista e trabalha na redacção de um semanário, das 9h às

17h, pelo que até então era ela a responsável por assegurar as rotinas diárias das filhas

tais como: a deslocação escola-casa; os trabalhos de casa; as actividades extra-

curriculares, etc. A mãe da Teresa, Paula, 65 anos, sempre a ajudou nestas tarefas e

passa muito tempo com as netas estando muito envolvida na vida diária da família.

Na primeira etapa, do , foram explorados os padrões relacionais entre os

membros do casal e com membros extra-familiares. É um casal com poucos recursos

comunicacionais, lidam com o conflito através do evitamento. O Rui tem muita

dificuldade em formular e articular os seus pensamentos de forma verbal, é pouco claro

e muito hesitante. A Teresa é muito verbal, tornando-se por vezes até caótica e

dramática mas claramente mais capaz de explicar por palavras os seus sentimentos e

pensamentos. Ambos são muito dedicados ao trabalho e partilham dos mesmos valores

no que concerne ao bem-estar e educação das suas filhas.

O Rui é filho único numa família onde os pais pouco falavam entre si e em que as

responsabilidades parentais eram apenas entregues à mãe. O Rui teve pouco contacto

com o pai, passava muito tempo sozinho com a mãe e sempre teve muito poucos

amigos. A Teresa vem de uma família numerosa e por isso está habituada a ter muitos

contactos sociais. Sempre teve muitos amigos e tem muita facilidade em estar e

comunicar com as pessoas.

O Rui lida mal com esta separação uma vez que o anúncio do divórcio foi feito pela

Teresa, há cerca de 1 mês, tendo sido, segundo o Rui,

admite que há quase um ano que a relação se tinha vindo a deteriorar. Para a Teresa a

decisão está tomada, levou quase 6 meses a pensar no assunto, está decidida e já tem um

novo relacionamento com o António, 44 anos, editor no semanário onde ela trabalha.

Para o Rui a vida sem a Teresa e as filhas é muito solitária uma vez que não tem

relacionamentos próximos com mais ninguém. Para a Teresa existe ainda a pressão da

família, com excepção da mãe que concorda e apoia a separação, e da igreja que

frequenta, afinal de contas,

Na etapa seguinte, a da pré-mediação, os objectivos foram então, essencialmente:

afirmar o Rui como pessoa individual e ajudá-lo a redefinir a sua relação com a Teresa,

aceitando o divórcio e investindo na relação com as suas filhas; encorajar a Teresa a

planear o futuro com as suas filhas continuando a relacionar-se com o Rui e olhando

para ele cad

filhas; melhorar a comunicação entre os dois por forma a permitir o envolvimento de

ambos na resolução de problemas futuros; reduzir a hostilidade e aumentar a confiança

por forma a permitir a negociação e garantir que a família da Teresa se mantém mais

afastada do processo deixando aos pais a tarefa de decidir o que é melhor para as suas

filhas.

Na fase seguinte, da negociação, apresento um dos problemas que surgiu, que teve que

ver com a rigidificação de ambos na posição da disputa pela residência com as filhas.

Ambos querem residir com as filhas e parecem irredutíveis nessa decisão.

A Teresa persiste nesta posição sobretudo por influência da mãe, que quer ver o genro

fora da vida da filha e das netas e que o considera um mau pai, e pela idealização que

faz da sua relação com o António, imaginando que este poderá substituir o Rui na vida

das filhas.

O Rui mantém também a sua posição sobretudo

sua relação extra-conjugal.

A Teresa utiliza como argumento o facto de o Rui ter sido sempre um pai ausente e

desinteressado o que a faz temer que se mantenha assim e que não tenha capacidade

para cuidar das filhas.

O Rui utiliza como argumento o facto de, embora atente que de facto foi, até ao

momento, um pai ausente e afastado da vida das filhas, considerar que este pode ser o

momento ideal para modificar essa situação, uma vez que vai ficar sozinho e que apenas

lhe resta o papel de pai, visto que o seu casamento fracassou e percebe agora que as

filhas precisam muito dele.

Esta questão foi reenquadrada positivamente mostrando que ambos partilhavam uma

enorme preocupação com o bem-estar das filhas e queriam estar envolvidos na sua

educação. Os avós foram chamados à mediação e foi valorizada a preocupação da avó

do- , como ela saberia de certeza

uma vez que é uma avó tão presente e consciente das necessidades das netas, era

importante que o pai se mantivesse presente nas suas vidas. A Teresa foi valorizada

como mãe, pela preocupação com o bem-estar das filhas e pela sua atitude colaborativa

com o Rui no sentido de tentarem chegar a acordo reconhecendo a importância do seu

papel na vida da Carolina e da Mafalda. No fundo a estratégia é a de permitir que a avó

isão aos pais e não pressione a filha no sentido do afastamento. É

importante que sejam os intervenientes a lho

do mediador o de facilitar este processo, utilizando as palavras deles e os acordos feitos

até então. Neste caso as meninas foram também ouvidas no sentido de se poder

confirmar a todos os intervenientes a vontade delas em manter contacto com ambos

os progenitores. Este é um exemplo, como poderia haver outros mais, sendo certo que,

depois do acordo final, passamos então à última fase, a do Follow-up. Foram

combinadas com o casal reuniões de follow-up de 3 em 3 meses no sentido de

monitorizar o acordo e reajustá-lo se necessário.

Conclusão e Re fle xão Final

Embora este trabalho não seja suficiente, nem seria esse o seu objectivo, para que me

seja possível reflectir acerca de todo o processo de mediação e das questões de

particular importância a ter em mente durante a prática profissional, parece-me que ao

problematizar acerca de um dos modelos que poderão servir de guia a essa prática, foi

possível aflorar alguns temas fundamentais e pensar, ainda que superficialmente, no

processo como um todo.

A apresentação do caso teve apenas o intuito de ilustrar, ainda que de forma muito

sucinta e rudimentar, as diferentes etapas do Modelo Terapêutico de Mediação Familiar.

Entendo que, apesar de discordar com a sua utilização, ou de outro qualquer modelo, de

forma purista em qualquer caso de mediação, permitiu-me reflectir acerca de alguns

pontos que considero fundamentais nesta prática. Relevo, nesse sentido, a necessidade

de - que considero essa sim fundamental, em qualquer caso sobretudo envolvendo a

regulação das responsabilidades parentais por supor uma relação que perdurará no

tempo - se trabalharem no sentido da maior funcionalidade, os padrões de conduta e

comunicação do casal divorciado pois só assim a Mediação poderá ser preventiva e

pedagógica e assegurar, da melhor forma, o superior interesse da criança. Chegarmos

a um acordo que, muito embora possa acautelar em termos formais o interesse das

crianças, não seja produto de uma verdadeira mudança de atitude e de uma maior

capacidade para a resolução de conflitos futuros, dificilmente poderá ser útil ou

produtivo ainda que seja cumprido.

Mais do que garantir as rotinas, as responsabilidades económicas, os convívios, etc. é

preciso acautelar a necessidade das crianças de crescerem num ambiente saudável, onde

a comunicação é adaptada e funcional e onde os pais, embora separados, podem em

conjunto, trabalhar e tomar decisões no sentido de garantir um desenvolvimento

saudável das crianças e das suas relações familiares.

Para que isto seja possível parece-me importante lembrar que estes pais são pessoas

comuns, homens e mulheres, com objectivos e identidades próprias, fracassos e

sucessos vários e que, fazem o melhor que sabem e podem no contexto e na situação em

que se encontram. Assim, parece-me importante não esquecer aquela que é,

independentemente do Modelo, das estratégias ou das etapas que o mediador entender

serem as mais adequadas, a característica que mais distingue, no meu entender, a

Mediação Familiar das vias jurídicas de resolução de conflitos, que é o facto de esta ser,

ou pretender ser, mais Humanizada. É feita com pessoas e para as pessoas, nos seus

contextos, nas suas realidades, com os seus mapas, com as suas possibilidades e com

todas as emoções e os sentimentos, bons e maus, que elas trazem e que compõem os

seus conflitos e litígios. Teremos assim que conseguir ir sempre além da lei, além da

regra, além do que fica escrito. Ir ao encontro daqueles pais e/ou daquelas crianças na

situação concreta, ir ao encontro do motivo, da necessidade que leva ao conflito, aquele

motivo que, por vezes, se não formos bem sucedidos poderá, na recta final, ainda não

ter sido discutido.

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