REDUÇÃO DA IDADE PENAL. ALTERAÇÃO INCONSTITUCIONAL E MALÉFICA PARA A SOCIEDADE BRASILEIRA
Guaraci de Campos ViannaJuiz Titular da Vara da Infância e da Juventude da Comarca da Capital do Rio de Janeiro - Presidente da
Abraminj - Expositor da EMERJ - Professor Universitário - Mestre em Ciências Penais pela UCAM
O presente trabalho tem por objetivo contribuir para o debate da questão
das propostas de redução da idade penal.
Pretende-se, na verdade, debater a questão da cláusula pétrea dos art. 227 e
228 da Constituição Federal e por conseqüência a impossibilidade de reforma ou
supressão dos referidos dispositivos, alem de, ad argumentandum tantum,
demostrar que se acolhida proposta contraria de reduzir os índices de
criminalidade juvenil e os níveis de violência não serão alcançados nem a curto,
nem a médio, nem a longo prazo. Ao contrário. Há um fundado receio e risco de
tais índices aumentarem significativamente.
Por outro lado, se acatadas as alterações tópicas no Estatuto da Criança e
do Adolescente (há muitas propostas), aumentando-se o limite da liberação
compulsória de 21 para 24 anos e o prazo máximo de internação de 03 (três) para
05 (cinco) anos, mantido o sistema sócio-educativo atual preconizado pela Lei
8069/90, não apenas serão ampliadas as possibilidades de recuperação dos jovens
infratores (em conflito com a lei), como também, consequentemente reduzirão os
níveis de criminalização dos jovens e violência social, sem falar que serão
atendidos, ainda que em parte, os anseios de uma parcela da sociedade civil no
sentido de aumentar a resposta, a pena, a medida retributiva pelo mal causado
pela prática do ilícito.
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INTRODUÇÃO
A violência praticada por jovens é um tema cada vez mais presente e assustador
na vida cotidiana e nos meios de comunicação de muitos países. No Brasil, o grave
momento de crise social alimenta ainda mais o temor que a população vivencia, em
meio a múltiplas formas de violência. Neste contexto, o crescente número de infratores
juvenis gera um movimento de solicitação de medidas repressivas por parte da
população, que desconhece as raízes do problema, as formas de atenção e de prevenção
necessárias para o enfretamento da questão.
Entanto isto, em alguns países desenvolvidos, esforços têm sido feitos no sentido
de prevenção, desde a primeira infância. Para tanto enfatizam a mobilização
comunitária, criando uma rede de suporte calçada na família, escola, treinamento para o
trabalho, atividades recreacionais e mudanças comunitárias.
A capacitação profissional para aqueles trabalhadores sociais que atuam
diretamente com os jovens em risco para a delinqüência é atividade prioritária, alem de
ênfase nas estratégias legais que visam a reforçar a segurança pública. A articulação de
todas essas atividades e o maior número de pessoas e instituições envolvidas são
responsáveis pelo sucesso ou fracasso das tentativas de solução para a delinqüência
juvenil.
A criminalidade e a violência tem se tornado uma tônica indesejável nos grandes
centros urbanos. Quando está envolvido uma criança ou um adolescente faz-se um
alarde muito grande. Surge, então, um universo de reflexões e uma variedade de temas
polêmicos. Propala-se que a criminalidade juvenil está em crescente aumento em
decorrência de um ambiente de impunidade, havendo muitos reclames postulando
inclusive a diminuição da maioridade penal.
Trata-se, entretanto, de uma reação equivocada. A equiparação de jovens e
adultos para fins penais é imprópria, pois o adolescente é ainda um ser em
desenvolvimento emocional e, contraproducente porque apenas ampliaria o potencial
ofensivo dos jovens infratores no momento em que deixassem o sistema.
O que fazer então? Durante anos pregou-se o antagonismo entre as idéias do
paternalismo ingênuo e do retributivismo hipócrita. Tratar os jovens como se não
houvesse violado direitos de outras pessoas é fomentar a trajetória de desrespeito a
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direitos alheios e negligenciá-los. Puni-los é uma solução paliativa para um problema
de causas muito mais enraizadas, tratando o adolescente como um ser irracional, uma
patologia social.
É preciso, então, criar no consciente e inconsciente coletivo uma idéia de que só
se constrói uma sociedade pacificada quando as pessoas respeitam o direito dos outros,
tendo como referencial a Lei, preservada em sua autoridade, quer por medo da coerção,
sob a ótica de Hobbes, quer sob a visão de Rousseau e Kaut, que sustentam que o
indivíduo respeita a Lei porque é responsável pela sua produção, por intermédio de sua
participação na formação da vontade social (eleição dos seus representantes no Poder
legislante).
O crime e a própria sociedade são vividos como uma ameaça. O delito é
concebido como um mal, a criminalidade como um enfermidade infecciosa e o
delinqüente como um ser daninho. Baseado nesses sentimentos é que são formuladas as
políticas públicas, na vã esperança de eliminar os delitos da face da terra.
Por isso, precisamos ter o Direito como um instrumento social funcional para a
solução do problema. Mas como? Primeiro , protegendo os bens jurídicos através do
efeito dissuasivo que as cominações legais - e a eventual aplicação delas - produz nos
infratores em potencial. É a ameaça do mal como retribuição a uma conduta anti-social;
segundo, produzindo um efeito psicológico que a proibição gera na mente dos
governantes e governados, um misto de satisfação e tranqüilidade, capaz de fazer com
que os indivíduos que se sintam inferiorizados saibam que eles são tão destinatários das
Leis quanto os demais e estes saibam não só que também estão sob a égide da Lei, mas
também que podem sofrer a ação dela, no caso de violação. Terceiro, é preciso
transformar as hoje simbólicas penas e as medidas sócio-educativas em instrumentos
reais de prevenção e recuperação. Marquês de Beccaria já defendia, há mais de 200
anos, que a pena não deve ser exageradamente curta nem exageradamente longa, mas
funcional, afastando a falsa idéia que se em no sistema atual quando se faz “Justiça”
retirando o indivíduo de circulação. Ao Estado fica a satisfação de haver “feito algo” e
ao povo a impressão de que os problemas estão “sob controle “.
Destarte, o sistema sócio-educativo precisa ser funcional, eficiente e capaz de
ressocializar. As medidas têm que ter um alto porcentual de eficiência, sendo
pedagogicamente impostas, executadas na forma dos arts. 99 e 100 da Lei 8069/90.
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Assim, ao invés da mera punição ou compaixão paternalista, que desumanizam
ainda mais o jovem infrator, negando-lhes acesso aos elementos constitutivos da
cidadania, o sistema de responsabilização deve favorecer a constituição de seres morais,
ou seja, de indivíduos capazes de compreender que o convívio em comunidade exige o
respeito das esferas de dignidade dos demais, e para isso sua esfera de dignidade deve
ser respeitada.
A responsabilização e ressocialização das crianças e dos adolescentes infratores
é, nesse sentido, não um direito dos adultos e do Estado, mas um dever. Um dever em
relação aos próprios infratores. Como dever, está limitado pelo direito da criança e do
adolescente ao pleno desenvolvimento da sua personalidade. Assim, a responsabilização
legal se torna um dever do Estado de buscar, por intermédio da aplicação da lei,
possibilitar à criança o desenvolvimento de um superego capaz de reprimir os impulsos
de destruição e inseri-la num convívio social pacífico. Portanto, não parece haver outra
forma conseqüente de controle da violência e do envolvimento de jovens com o crime,
que não o modelo de proteção integral, que agrega educação e responsabilidade,
conforme estabelecido pelo E.C.A.
I – LIMITE ETÁRIO PARA A IMPUTABILIDADE PENAL. POR QUÊ 18
ANOS?
Verifica-se, no ordenamento jurídico brasileiro, que o parâmetro de idade, para a
fixação da norma, varia de matéria para matéria, pois, enquanto que no Direito Civil de
1916 (Lei n. 3071 de 01/01/1916) era ele 21 (vinte e um) anos, só passando para 18
(dezoito) anos recentemente pelo Código Civil, instituído pela lei 10406 de 10/01/2002,
que entrou em vigência em 10/01/2003, e no Direito Penal é de 18 (dezoito) anos, o
Direito Trabalhista traz distinções normativas para as idades de 12 (doze), 14
(quatorze), 18 (dezoito) e 21 (vinte e um) anos. Já o Direito Comercial ressalva aos
menores e aos filhos-familias comerciantes o direito de obrigar, hipotecar e alhear
validamente seus bens de raiz. No Direito Político, a Constituição de 1988 rebaixou o
direito facultativo de alistamento e de voto aos maiores de 16 (dezesseis) anos.
Para a fixação de cada uma dessas normas, não é aleatória a distinção das
respectivas idades, cabendo, sempre, fundamentos e critérios valorativos que as
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justifiquem, aplicando-se, na maioria dos casos, o sistema biopsicológico, ou seja,
consideram-se as condições físicas e psicológicas do sujeito ativo ou passivo da norma.
Washington de Barros Monteiro comenta sobre a capacidade civil (à época aos
21 anos, conforme previa o CC/16). Embora esta já tenha sido alterada para 18 anos
pelo novo Código Civil, para ilustrar as diferenças em face de cada tipo de
responsabilidade, cabe citar os seus seguintes esclarecimentos:
(...) essa capacidade não deve ser confundida coma eleitoral, nem
com a idade limite para o serviço militar. As leis que às duas últimas
se referem cuidam de atividades, direitos e deveres específicos.
Assim, já se pronunciou o STF (arquivo judiciário, 113/283).
Mutatis mutantis, a idade em que tem inicio a responsabilidade penal
não exerce qualquer influencia na capacidade civil, que continua
regida por dispositivos próprio, consubstanciados no Código Civil.
(1958, p. 73).
Como se observa, a idade de uma pessoa influi diretamente tanto para o
exercício de direitos como para ter obrigações e responder juridicamente por seus atos
(comissivos e omissivos). Portanto, a pessoa, ao atingir as respectivas idades fixadas
legalmente para cada tipo de responsabilidade, adquire novas condições jurídicas na
sociedade. Assim, uma pessoa, ao completar 18 anos de idade, adquire a capacidade
para ter responsabilidade penal, para tirar carteira de motorista, ter como obrigatório o
exercício do seu direito político de voto, para o trabalho, inclusive o noturno, e, a partir
da vigência do NCC/02, adquire, também, a responsabilidade civil.
Alem do fator idade ser condição para a inimputabilidade, que há muitos anos
foi definida pelo Código Penal em 18 anos, o que se tornou norma constitucional pela
Carta de 05/10/88, o Estatuto da Criança e do Adolescente fez nova discriminação de
idade dentre os inimputáveis, distinguindo o adolescente (pessoa de 12 até 18 anos) e
criança (menores de 12 anos), estabelecendo medidas diferentes para cada uma dessas
categorias de menores, quando da prática de ato infracional.
Tanto a fixação da idade de 18 anos para a inimputabilidade penal, quanto a
discriminação de criança e adolescente para a aplicação das medidas de proteção ou
sócio-educativas têm sido alvo de inúmeras críticas e controvérsias doutrinarias.
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Existem segmentos importantes da camada culta da sociedade que apóiam a tese
de que se deve atribuir responsabilidade penal ao s cidadãos a partir de 16 anos de
idade.
Conforme se denota, há outra corrente, composta, também, por ilustres
doutrinadores e magistrados, que louva a inclusão, no texto constitucional de 1988, da
fixação da maioridade penal a partir de 18 anos, que até então só constava do Código
Penal. neste sentido, Maria Auxiliadorea Minahim, citada por Alyrio Cavallieri, faz as
seguintes observações:
“Quando lutamos pela conservação dessa idade, é comum ouvir-se,
até de pessoas cultas, a afirmação de que ela é absurda, porque,
mesmo com muito menos de 18 anos eles sabem o que fazem”.
É óbvio que a partir de tenra idade, eles sabem o que fazem. Mas em 1884,
Tobias Barreto já havia demonstrado que o discernimento pode ser encontrado, para os
atos de sua idade, numa criança de cinco anos. Toda esta dúvida tem sua origem na
Exposição de Motivos do Código Penal de 1940, quando o Ministro Francisco Campos
escreveu que os menores ficavam fora daquela lei, porque eram imaturos. No entanto,
no texto do Código, no art. 23, o Ministro escreveu que eles irresponsáveis. Ora, ter
responsabilidade penal é ser obrigado a arcar com as conseqüências do crime, sofrendo
uma pena. Imputabilidade é capacidade de culpa. Os menores têm capacidade de culpa.
Desde 1940, nossos professores botaram na nossa cabeça a idéia da imaturidade
dos menores, o que é um absurdo absoluto, formulado de maneira tão genérica pelo
Ministro Campos. Segundo ele, todos os menores de 18 anos no Brasil eram imaturos.
Absurdo completo. E nós contaminamos toda a nação com esta insólita concepção.
Espero que a importância prática de uma conceituação adequada tenha sido
demonstrada. Os estatutistas merecem todos os encômios pela elevação à Lei Magna de
uma aspiração comum, mas poderiam ter aproveitado para destruir um mito prejudicial.
“Eles sabem o que fazem, mas não vão para a cadeia, pois temos solução melhor para
seus crimes” (1995, p. 55)
As ponderações apresentadas por Maira Auxiliadora Minahim, sobre a
impropriedade de ter o Código Penal considerado os menores de 18 anos
“inimputáveis”, o que pressupõe imaturidade, quando deveria tê-los considerado
“irresponsáveis”, têm como fundamento o fato de que não se pode negar que as pessoas
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de 18, 16, 14, 12, 10, até de menores de idade, sabem o que fazem, bem como quando
se trata de infração penal; portanto, não se trata de inimputabilidade, que pressupõe
imaturidade, mas, sim, de irresponsabilidade penal, por se entender que para o menor
infrator é mais eficaz a sua reeducação do que a cadeia junto do delinqüente adulto
onde, provavelmente, ele não seria reeducado, ao contrario, se aperfeiçoaria na prática
do crime. (Revista dos Magistrados do Brasil, junho/julho de 1996, os. 18/19)
Os episódios recentes envolvendo “crimes” (atos infracionais) praticados por
adolescentes, fizeram o Congresso desengavetar dezenas de propostas de alteração de
artigos do ECA, em especial o que trata da maioridade penal. tanto na Câmara quanto
no Senado, parlamentares trabalham a toque de caixa na tentativa de ganhar a
paternidade de mudanças na lei que sirvam, segundo eles, para reduzir a delinqüência
juvenil.
A violência praticada por jovens tem, gradativamente, se transformado em um
grave problema para a sociedade brasileira, especialmente nos seus centros urbanos,
acompanhando uma tendência mundial de crescimento deste fenômeno.
No Brasil, desde a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente –
ECA, utiliza-se o temo atos infracionais para designar os delitos cometidos por
adolescentes. O adolescente infrator passou a ser julgado pelas infrações previstas no
Código Penal, recebendo a medida sócio-educativa de acordo com a gravidade do ato e
com suas condições de cumpri-las, tendo amplo direito de defesa.
A implementação das medidas sócio-educativas previstas no ECA evidencia a
estratégia de ressocialização do adolescente – especial por sua condição de crescimento
e desenvolvimento. Além disso, reconhece a ineficácia da punição criminal.
Uma questão fundamental em diversos países e também no Brasil, especialmente
nos meios jurídicos, tem sido o debate m trono da responsabilidade que a criança e o
adolescente têm por seus atos, questão originada da escola clássica, fundada no século
XVIII por Beccaria e que teve continuidade com Bentham, influenciando,
sobremaneira, a elaboração do Código Penal Francês em 1791 (Schoemaker, 1996). De
acordo com os seguidores dessa escola, os atos humanos são frutos de uma escolha
racional, o que implica ter uma consciência nítida e clara das conseqüências positivas e
negativas de seus atos. Essa concepção indica que as pessoas optam voluntariamente
por praticar atos infracionais, assumindo que todos têm a mesma oportunidade de
efetuar escolhas em suas vidas. No Brasil, este debate se evidencia na pressão de certos
setores da sociedade para reduzir a idade pela qual os jovens podem assumir as próprias
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responsabilidades (Fonacriad et al., 1997). Em alguns países, mesmo crianças podem
ser julgadas porque a sociedade considera que são capazes de discernimento e escolhas
racionais.
A literatura especializada tem mostrado m enfoque diferenciado, dado pelos
profissionais da área da saúde (em conjunto com criminologistas), com inicio em
meados deste século e abordando o tema de maneira mais compreensiva. Esse novo
enfoque, originado da área da epidemiologia, busca identificar os fatores de risco para a
delinqüência e a possibilidade de se atuar preventivamente sobre tais fatores.
Os estudos epidemiológicos forneceram a sustentação teórica, contribuindo para
a seleção das variáveis abordadas empiricamente. As variáveis foram organizadas a
partir de um modelo teórico explicativo sobre a gênese da delinqüência juvenil,
apresentado por Schoemaker (1996: 251). Esse desenho está de acordo com as
principais teorias utilizadas aqui e listradas a seguir. Não consideramos o modelo
adotado completo, nem definitivo, mas útil na orientação, organização e direcionamento
do estudo.
Esse modelo de análise incorpora três níveis de conceitualização: estrutural, que
incorpora as condições sociais; sócio-psicológico, que se refere ao controle social da
família, escola e demais instituições responsáveis pelo adolescente, a auto-estima e a
influencia de grupos de jovens sobre o comportamento infrator; individual, incluindo
aspectos biológicos e psicológicos.
Nível estrutural:
Nesse nível a delinqüência foi inicialmente concebida, há algumas décadas,
como primaria e preponderantemente causada por fatores sociais em associação com
fatores situacionais e pessoais. A primeira teoria a tentar explicar a existência de crimes
praticados por grupos, organizados em gangues, foi a que se baseou na desorganização
social existente nas estruturas e instituições sociais, mais acentuada nas classes
populares (Shaw & Mckay, 1969).
A teoria da anomia (Merton, 1957) é outra corrente segundo a qual um grande
número de pessoas se acha em desvantagem em relação às atividades econômicas legais
e, portanto, se engajam em atividades ilegais e delinqüentes. Refere-se à distancia entre
a ideologia das oportunidades sociais e as reais condições de realização individual de
crescimento, sucesso e êxito na sociedade.
Essas e outras teorias foram muito criticadas desde então.
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É. Portanto, um erro transpor mecanicamente as condições estruturais ou a
pobreza como causas diretas de delinqüência. Incluímos, aqui, as condições estruturais,
representadas pela desigualdade social, de oportunidades, falta de expectativas sociais,
desestruturação das instituições públicas, facilidades oriundas do crime organizado e
outras instancias desse nível, como fatores que contribuem para a ocorrência de
delinqüência, atuando integradamente ou de forma combinada como uma rede de
fatores existentes nos outros níveis explicativos, mostrados a seguir.
Nível sócio-psicológico
A principal teoria explicativa nesse nível é a do controle social (Hirschi, 1969).
Mostra que a gênese da delinqüência juvenil está relacionada a problemas na vinculação
social do jovem a instituições como família, escola, igrejas, que teriam por função
formar ou adaptar o individuo às normas sociais. Chesnais (1996), importante
historiador francês que estuda a presença da violência nas sociedades ocidentais,
afirmou que, no Brasil, um dos fatores desencadeantes da delinqüência é o fraco
controle sobre os jovens exercido por instituições como família, igreja e escola.
Duas teorias mostram a relevância da visão que o jovem tem de si mesmo e a
influência do meio (família, escola, comunidade) no processo da aquisição da auto-
imagem, fator importante a ser considerado na etimologia da delinqüência. Uma assume
que jovens com uma visão pobre de si mesmos se encaminham mais para o crime
(Reckless, 1961) e a outra considera que jovens rotulados de criminosos adquirem auto-
estima baixa (Lemert, 1951).
Nível individual
Essas teorias privilegiam mecanismos internos do individuo como os
determinantes fundamentais para a delinqüência. As que se baseiam nos aspectos
biológicos hereditários explicam esses fatores como importantes no que se refere ao
desenvolvimento cognitivo e aprendizado, podendo, assim, predispor um individuo à
criminalidade, mas jamais determinando esse comportamento.
Alguns dos atributos frequentemente relacionados aos delinqüentes são:
impulsividade, inabilidade em lidar com o outro e de aprender com a própria
experiência de vida, ausência de culpa ou remorso por seus atos, insensibilidade à dor
dos outros e transgressões. Pessoas com alguns desses atributos podem ser encaixadas
dentro de um diagnostico denominado personalidade anti-social.
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É contestável um continuo movimento que se produz em torno das pretensões de
redução da idade de maioridade penal. Assim, com o fito de que seja mantido integro o
teor do art. 228, da Constituição da Republica de 1988, congregam-se esforços para a
permanência constitucional da inimputabilidade penal das pessoas com idade inferior a
dezoito anos, que, por decorrência de opção política, constitui-se num direito individual,
de cunho fundamental, ínsito ao patrimônio personalíssimo das crianças e adolescentes
brasileiros. E, assim, não sendo possível, pois, a supressão, e, sequer, restrição, de um
direito individual, haja vista que a inimputabilidade penal deixa de ser considerado,
então, um instituto jurídico próprio da dogmática-jurídico penal até porque não se
operou um mero reenvio de tal instituto para o texto constitucional – para se constituir
numa adesão particularmente própria à autonomia do povo brasileiro, à diretriz
internacional dos Direitos Humanos, aqui, objetivada, em síntese, no art. 227, da
Constituição da Republica de 1988, como Doutrina da Proteção Integral.
Não há duvida que o adolescente de hoje está muito informado e melhor
preparado do que o adolescente dos anos 70, entretanto, a questão não é só de
informação, mas de formação; não é só de razão, mas de equilíbrio emocional; não
apenas de compreensão, mas de entendimento. Indaga-se: será que o adolescente de 15
ou 16 anos age relativamente? Será que pensa, antes de agir? Ou é, por excelência,
inconseqüente, por força mesmo de sua incompletude, de sua imaturidade? Somente o
tempo é capaz de edificar mecanismos que habilitem o homem a refletir, a ponderar, a
mensurar suas ações.
Essa condição de pessoa em desenvolvimento, que ainda está construindo a sua
estrutura psicológica, a sua inteligência emocional, é a base cientifica que levou o
legislador constituinte a erigir em presunção absoluta de inimputável o menor de 18
anos de idade, elevando-o à condição de garantia individual, nos termos do art. 228 da
CF, considerando que o rol de garantias individuais não se exaure no elenco do Ar.t 5º
da Carta Magna, ampliando-se para outros direitos inerentes à pessoa humana, nos
temos preconizados pelo § 2º do Ar. 5º, pelo que a garantia da inimputabilidade penal
para crianças e adolescentes – art. 228 da CF -, embora inseria no capitulo “Dos
Direitos Sociais”, é uma verdadeira garantia individual para crianças e adolescentes,
constituindo-se em cláusula pétrea, a qual não pode ser abolida nem por emenda
constitucional, a teor do que dispõe o Art. 60, §4º, IV da CF/88.
Não bastasse essa garantia individual inserida na lei suprema, a Convenção da
ONU sobre os Direitos da Criança, subscrita por mais de 180 países, incluindo o Brasil,
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estabeleceu como consenso mundial a imputabilidade penal aos 18 anos. Esse critério
vem sendo adotado pela maioria das legislações mundiais, como México, Republica
Dominicana, Porto rico, Uruguai, Equador, Venezuela, Espanha, dentro outros. É bem
verdade que outros países vêm adotando a imputabilidade penal aos menores de 18
anos, como Itália (14 anos), França (13 anos), Finlândia (15 anos), Suécia (15 anos),
Japão (14 anos), que normalmente exigem para o s menores de 18 anos comprovação,
em juízo, de que ao praticarem o crime não tinham completa capacidade de
discernimento, o que os leva a cumprir a pena em estabelecimentos especiais diversos
daqueles destinados aos adultos.
Impõe-se asseverar que nos países desenvolvidos do primeiro mundo, como
Itália, França, Suécia e Japão, os menores de 18 anos não se encontram na mesma
situação de vulnerabilidade do adolescente brasileiro, o qual sobrevive à margem da
sociedade consumista sem o direito de satisfazer suas necessidades básicas de
alimentação, educação, saúde, lazer, emprego, previdência etc., criando, por assim
dizer, o seu próprio mundo cultural, com sua própria linguagem, referencias e valores,
ficando numa posição de manifesta fragilidade diante de nosso sistema econômico
perverso e excludente. Nesse contexto, o adolescente brasileiro, em sua esmagadora
maioria, sem perspectivas ou horizontes, caminha em direção ao mundo da
criminalidade e das drogas.
O sistema penitenciário está falido, pois não vem cumprindo as finalidades de
prevenção geral e especial, nem tampouco a de ressocializar, o que transformaria as
cadeias públicas em depósitos de adolescentes, os quais sairiam especializados na
prática de crimes, em face do contacto nefasto com meliantes da mais alta
periculosidade, como traficantes, latrocidas e estupradores.
No se considera que essa seja a melhor solução para a nossa realidade, pois, sem
duvidas, só iria aumentar a violência em nosso meio com a reincidência maciça desses
jovens na prática delituosa. Entende-se que o ECA constitui uma das mais avançadas
legislações do mundo e a melhor solução será o seu aperfeiçoamento, identificando-se
as suas falhas e ajustando o seu normativo para a atual realidade social – em constante
mutação. Impõe-se, por exemplo, a ampliação do prazo máximo de internamento, que
poderia ser majorado para cinco anos e até ultrapassar os 21 anos, quando, em face das
circunstancias e da lata periculosidade do jovem, a medida se mostrar absolutamente
necessária. O período mínimo de avaliação poderia ser majorado para um ano e o juiz
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poderia decretar o internamento em casos graves, mesmo que praticados sem violência
ou grave ameaça.
O Estado deveria investir mais na estruturação dos Centros de Internamento
destinados a adolescentes infratores, dotando-os de melhor estrutura física e humana,
com equipe interdisciplinar que pudesse fazer acompanhamento psicossocial junto ao
adolescente e a sua família, como forma de reorientar o seu caminho e afasta-lo do
mundo da criminalidade e das drogas, fomentando o exercício de atividades
pedagógicas, esportivas, de lazer e profissionalizantes.
II – IMPOSSIBILIDADE DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL:
Não parece que a redução da maioridade penal seja a solução ideal, pois
simplesmente vai encher os presídios, já superlotados e sem qualquer programa eficaz
de readaptação do detento, de jovens em formação que poderiam se tornar cidadãos e
conviver, pacificamente, na sociedade. Abrir-se-á mão da prevenção para valorizar a
repressão.
Entende-se que a melhor solução está na modificação do ECA, ajustando-o às
novas exigências sociais,todavia não basta a mera alteração legislativa, é preciso que o
governo, principalmente, invista em políticas públicas de atendimento eficaz ao
adolescente em conflito com a Lei, extirpando as famigeradas FEBEM e criando um
verdadeiro sistema sócio-educativo de atendimento, redimensionando a situação do
adolescente em conflito com a Lei para vislumbra-lo como algo que transcende ao
aspecto meramente jurídico, revelando, assim, o seu caráter transdisciplinar a exigir a
concorrência de outras áreas do conhecimento humano, como a psicologia, psiquiatria,
pedagogia, sociologia, antropologia, dentre outras, no sentido de, conhecendo a história
do adolescente e fazendo acompanhamentos regulares, se poder perfurar a couraça do
adolescente em conflito com a Lei, tocando na sua auto-estima, fazendo-o descobrir,
com o auxílio indispensável dos trabalhadores sociais, que a vida é, de fato, uma grande
possibilidade, e que ele pode reescrever a sua própria história nesse mundo tão desigual.
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A inovação, na Constituição Federal de 05.10.88, de se conceder, em caráter
facultativo, o direito de voto ao menor de 18 (dezoito) e maior de 16 (dezesseis) anos de
idade, embora com 16 (dezesseis) anos não tenha o jovem responsabilidade civil nem
penal, provocou inúmera irresignações e denúncias daqueles que consideram uma
incoerência do ordenamento jurídico, ou melhor, a incoerência dos critérios adotados
pelo legislador quanto à idade inicial para o exercício de direitos e respectivas
responsabilidades jurídicas.
Sendo diferentes as conseqüências geradas pelos diversos tipos de
responsabilidades jurídica:civil, comercial,política e penal, etc., para cada preceito há
penas diferentes;assim, enquanto que para as responsabilidades civil e comercial
prevalecem as penas pecuniárias, para a responsabilidade penal são cominadas penas
pecuniários, para a responsabilidade penal são cominadas penas não só de caráter
pecuniário (as multas) e privativas de direito, mas, principalmente, as privativas de
liberdade. Isso quer dizer que se exigem capacidades diferentes para suporta-las. As
penas pecuniárias requerem condições materiais para assumi-las, enquanto que as
privativas de liberdade exigem condições, principalmente, psíquicas para suporta-las.
Uma política criminal orientada no sentido de proteger a sociedade terá de
restringir a pena privativa de liberdade aos casos de reconhecida necessidade, como
meio eficaz de impedir a ação criminógena, cada vez maior, do cárcere; portanto, há de
se pensar, repensar, analisar e estudar todas as conseqüências da redução da maioridade
penal, uma vez que esta implica admitir que, socialmente, é mais eficaz reprimir a
criminalidade das pessoas de 16 anos de idade, através de sua prisão em cárceres,
expostas ao convívio pernicioso do delinqüente adulto, e à contaminação da corrupção e
perda paulatina da aptidão para o trabalho e, consequentemente, declarar insuficientes
as medidas sócio-educativas, previstas nos arts. 112/125, do Estatuto da Criança e do
adolescente.
No Estado Democrático de Direito a lei – em especial a Constituição – tem uma
função transformadora. É da essência a instrumentalização da lei para que o vir-a-ser de
uma sociedade justa, solidária, onde a promoção da dignidade humana seja a razão da
própria existência do Estado, torne-se uma realidade.
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Sem que no ponto de partida do ordenamento jurídico no caso a Constituição –
encontre-se uma base de princípios – explícitos ou implícitos – que oriente a
interpretação do sistema, que lhe dê uma unidade de sentido, o Estado Democrático de
Direito não se realiza, pois o seu ordenamento transformar-se-á numa junção de
preceitos, desprovido de qualquer capacidade de coordenação do todo.
Ou seja, os princípios assumem proeminência no sistema jurídico.
(CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
p.1090:)
Uma ordem constitucional INSTITUIDORA DO Estado Democrático de
Direito, necessariamente, é um sistema normativo aberto, composto de regras e
princípios. (CANOTILHO, José Joaquim Gomes.,Op. cit., p. 1085).
Os princípios, ao ordenarem o texto constitucional no que diz respeito aos fins a
serem alcançados pelo Estado e sociedade no Estado Democrático de Direito, dão o
contorno ou a diretriz de conformação do ordenamento jurídico regulado pela
constituição. Por serem a base da Lei Maior, sem a qual não há um sistema organizado,
funcionam como vetores de interpretação de toda ordem jurídica.
A Constituição Federal consigna os princípios fundamentais nos artigos 1º a 4º,
no seu título I – Dos princípios fundamentais. A partir daí, mais o que contém o seu
preâmbulo, é permitido verificar quais são os princípios explícitos – isto é, expressos na
Lei Magna – são tidos como fundamentais para caracterização do núcleo essencial
(imodificável, pode-se dizer) da Constituição.
Além dos princípios fundamentais referidos nos artigos do título I, outros
princípios decorrentes daqueles, que funcionam como explicitação dos indicados como
fundamentais – emergem de distintos locais da Constituição e também integram o
núcleo essencial.
Como exemplo, podemos citar o princípio da prioridade absoluta, que a família, o
Estado e a sociedade devem conferir à criança e ao adolescente para que tenham um
desenvolvimento pleno e sadio – artigo 227.
Sem a menor dúvida, pode-se afirmar que a proteção normativa outorgada à
infância e juventude é uma explicação do princípio da dignidade humana. Mas o
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Constituinte acrescentou um plus, tornou a consecução plena de tal princípio prioritária
em relação à criança e ao adolescente. E esse acréscimo – mesmo tendo ocorrido fora
das disposições do Título I –erige a total preferência estabelecida como um princípio
fundamental, integrativo do núcleo essencial da Constituição.
Ainda, importante salientar a possibilidade de princípios implícitos integrarem o
núcleo essencial da Constituição, conforme se extrai do art. 5º, § 2º, da lei Maior. A
ordem constitucional não se restringe à soma dos dispositivos descritos na Carta Magna.
Tratando-se de um sistema aberto, perfeitamente possível a localização – via
interpretação, a partir dos valores acolhidos pela Constituição e de seu sistema – de
princípios que não se encontrem enunciados formalmente. A ausência de referência
expressa, entretanto, não lhes retira o status de princípio constitucional.
Logicamente, tais princípios não podem ser “criados” ao talante de eventual
intérprete, surgindo do nada> A descoberta, necessariamente, passa por uma
interpretação ciosa, que leve em conta todo sistema constitucional, sendo de extrema
importância, na revelação dos princípios implícitos, o trabalho da doutrina e da
jurisprudência.
Identificado o princípio – e como exemplos, podemos citar: a supremacia do
interesse público, da proporcionalidade – há que se verificar se o mesmo tem natureza
fundamental, essencial para a preservação da Constituição. Presente tal caráter, sem a
menor dúvida que integra o núcleo essencial da Lei Magna. O entendimento adotado
como correto, em conformidade com a fundamentação que segue, é o de que os limites
materiais de reforma são imprescindíveis, não sendo possível tê-los como superáveis.
A existência de conteúdos imutáveis numa Constituição tem recebido críticas, sob
a alegação de que não é possível uma Constituição imodificável, pois acarretaria seu
imobilismo, gerando um descompasso normativo com a sociedade e, por conseqüência,
implicando um desprestígio do texto constitucional.
CANOTILHO, com a força de seu expressar, assim responde ao questionamento:
(...) Assegurar a continuidade da Constituição num processo
histórico em permanente fluxo implica, necessariamente, a proibição
não só de uma revisão total (...), mas também de alterações
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constitucionais aniquiladoras de uma ordem constitucional histórico-
concreta. Se isso acontecer é provável que se esteja perante uma nova
afirmação do poder constituinte mais não perante uma manifestação
do poder de revisão (CANOTILHO, José Joaquim, Gomes, Op. Cit.
P. 995)
O poder constituinte originário é de natureza política, existindo fora da
Constituição e acima dessa – pois o texto constitucional é a obra que realiza. É um
poder de natureza excepcional, manifestando-se somente em momentos de viragem
histórica de um povo. De outra banda, o poder reformador tem natureza eminentemente
jurídica. Inserido na Constituição, tem nessa o contorno de sua atuação, bem como de
sua limitação. É um poder de exercício normal, pois existe para funcionar nos períodos
de normalidade constitucional.
Logo, na condição de poder instituído ou constituído, o poder reformador sofre
limitações no seu pode de modificação da Constituição. Deve respeitar las limitações
quando indicadas no próprio texto (cláusulas pétreas) e, também, as limitações
implícitas, oriundas dos princípios que presidem a Constituição e que existem pela
necessidade de preservação da essência do núcleo político básico da carta
constitucional.
A atividade reformatória de uma Constituição é um meio de sua vivificação, pois
é pela reforma que se conserva renovando uma carta constitucional. A modificação de
um texto constitucional jamais poderá servir como caminho para o seu fenecimento.
Conforme assevera BONAVIDES.
O constituinte que transpuser os limites expressos e tácitos de seu
poder de reforma estaria usurpando competência ou praticando ato
de subversão e infidelidade aos mandamentos constitucionais,
desferindo, em suma, verdadeiro golpe de Estado contra a ordem
constitucional (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito
Constitucional, p. 178).
Pode-se dizer que as limitações expressas ao poder de reforma, insculpidas nos
textos constitucionais, visam à proteção dos princípios básicos e essenciais da
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Constituição, bem como as “implicações e desdobramentos” – na expressão da
STRECK – de tais princípios.
Em relação às vedações expressas, inviável, ao poder reformador, qualquer
possibilidade de alteração. Conforme STRECK:
O obstáculo do parágrafo 4º faz desses princípios – que lhe são
estruturais, básicos e fundamentais – rigidíssimos,
supraconstitucionais, no sentido de que não podem ser solapados,
reduzidos, diminuídos, mesmo pelos mais conspícuos poderes
constituídos: o Congresso, como órgão de reforma constitucional
(STRECK, Lenio Luiz. Constituição: limites e perspectivas de
revisão. P. 32-3)
Além dos limites formais /explícitos (...) há aqueles que decorrem
da sistematicidade da Carta política. Tais vedações - implícitas -
são limitações de reforma produzidas pela própria estrutura do
discurso pelo qual se expressa a Constituição. São aquelas que se
originam dos paradigmas adotados pelo próprio sistema jurídico e
que definem, com alguma clareza, quais as normas que a ele
pertençam ou posam pertencer. (STRECK, Lenio Luiz.
Constituição: limites e perspectivas de revisão. P. 32-3).
As vedações expressas (cláusulas pétreas), prevista no artigo 60, s 4ª, incisos I a
IV, da Constituição e, também, os limites implícitos conferem proteção contra a
atividade reformadora do texto constitucional.Funcionam como verdadeiras barreiras ás
intenções reformistas, salvaguardando os valores fundamentais da Constituição.
Não poderia deixa-se de anotar que, para fins de controle de
constitucionalidades, há uma equiparação entre emenda supressiva de dispositivo e
aquela que veicula uma tendência abolidora de preceito assegurado por cláusulas pétrea
explícita, isso porque ambas as hipóteses são proibidas expressamente pela
Constituição.
Comumente se diz que o grande marco de mudança paradigmática da questão da
infância no Brasil foi o advento do ECA. Entretanto, tal afirmação é equívoca. A Lei nº
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8.069/1990 nada mais é do que a integração legislativa do que estabelece a Constituição
Federal de 1988, no seu artigo 227, que introduziu em nosso país a doutrina da proteção
integral. Logo, possível afirmar que, desde a vigência da atual Carta Política, toda a
legislação menorista que contrariava os princípios constitucionais fixados para a
infância e juventude restou derrogada.
O conteúdo do art. 227 da Constituição é reconhecido como veiculador da
síntese da doutrina da proteção integral, que restou plasmada na Convenção
Internacional dos Direitos da Criança, aprovada por unanimidade pela Assembléia Geral
da Organização das Nações Unidas (ONU), em 20/11/1989.
É dentro desse contexto de acolhimento da doutrina da proteção integral, que
assegura direitos à infância e juventude e, no campo da infração penal, estabelece a
apuração de eventual responsabilidade dentro de um sistema que oferece garantias
processuais, que a Constituição plasmou a idade da inimputabilidade em dezoito anos.
Os defensores da diminuição da idade da imputabilidade penal cometem um
grande equivoco, não reconhecendo que a sua fixação foi uma opção política do
Constituinte de 1987/1988. Logo, toda e qualquer discussão com base na teoria do
discernimento, como vem sendo travada, é desfocada. O critério para estabelecer a
idade penal mínima foi político, não tendo relação com a capacidade ou incapacidade de
entendimento.
Aceitar-se que a fixação constitucional da imputabilidade penal baseia-se na
falta de compreensão do caráter ilícito ou anti-social de uma conduta criminosa implica
equiparar adolescentes a insanos mentais, e isso, à evidência, é algo que padece de um
mínimo de coerência. Ninguém tem duvida de que o jovem e mesmo a criança têm
plena capacidade de entender que é reprovável furtar, danificar, matar etc.
Também não se pode falar na adoção, pelo Constituinte, de um critério
puramente biológico. A decisão foi no sentido de valorização da dignidade humana de
todas as pessoas menores de dezoito anos, de acordo com a tendência internacional de
reconhecimento jurídico da doutrina da proteção integral, que acabou consubstanciada
na Convenção Internacional dos Direitos da Criança.
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Em outras palavras, sendo o Estado Democrático de Direito presidido, entre outros, pelo
principio da dignidade da pessoa humana, a fixação da imputabilidade penal aos dezoito
anos representa o seu compromisso com a valorização da adolescência, por reconhecer
tratar-se de uma fase especial do desenvolvimento do ser humano.
Entende-se que o art. 228 da Constituição é um direito fundamental, razão pela
qual serão feitas algumas considerações gerais a respeito dessa espécie de direito.
Os direitos fundamentais exercem papel de capital importância no Estado
Democrático de Direito, pois são a principal garantia de que o Estado, por meio de seu
sistema jurídico é político, promoverá a proteção do cidadão como individualidade e,
também, a solidariedade social, visando a um pleno desenvolvimento da comunidade
como um todo.
Em outras palavras, os direitos fundamentais garantem o respeito dos direitos
individuais e a promoção social baseada na valorização da dignidade humana,
cumprindo a função de descortinar o horizonte emancipatório a alcançar no Estado
Democrático de Direito, o que decorre do seu compromisso antropológico.
Por força do papel que desempenham, os direitos fundamentais gozam, em nosso
ordenamento, de um reforço de efetividade, pois, de acordo com o § 1º do art. 5º da
CF, ?as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação
imediata?. Tal disposição implica uma ?juridicidade reforçada?, que é uma
característica comum e diferenciada dos direitos fundamentais. Além disso, são os
direitos fundamentais protegidos contra a possibilidade de extirpação da Constituição, já
que protegidos pela intangibilidade fixada no artigo 60, § 4º, inciso IV, da Lei Maior.
A Constituição Federal, conforme se vê do § 2º do artigo 5º, abriga o caráter
materialmente aberto dos direitos fundamentais, pois permite localizar tais direitos em
todo o seu texto, e não só aqueles que estão elencados no catalogo que apresenta (Titulo
II). Além disso, autoriza o reconhecimento de outros direitos fundamentais que não se
encontram no texto constitucional (direitos materialmente fundamentais), desde que
decorram do regime e princípios por ela adotados, bem como de tratados internacionais
dos quais o Brasil seja parte. Vale dizer, o rol de direitos fundamentais elencados na
Constituição é exaustivo, permitindo a localização de outros.
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A idade penal mínima é autentico direito fundamental localizada fora do
catalogo elencado pela Constituição no Titulo II, pois inequivocamente vinculado ao
principio fundamental da dignidade da pessoa humana.
Não só em sede doutrinaria há o reconhecimento de direitos fundamentais fora
do catalogo e com caráter de cláusula pétrea, pois o STF já deixou isso assentado, ao
apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 393/93, questionadora da
constitucionalidade da Emenda Constitucional nº 3, de 17/03/1993, que instituía a
arrecadação do Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras? IPMF? a partir e
agosto daquele ano, conforme estabeleceu a Lei Complementar nº 77, de 13/07/1993,
que também foi objeto da argüição de inconstitucionalidade.
Fazendo uma suma da posição majoritária adotada no julgamento da ADIn nº
93, pode-se assentar que a) restou inquestionável a possibilidade da existência de
direitos fundamentais fora do catalogo; b) a unidade sistêmica da Constituição deve ser
preservada, pois os princípios e direitos fundamentais apresentam intima ligação, não
podendo ocorrer uma visão da Constituição que não abranja o seu todo, devendo haver
respeito incondicional aos princípios que informam a Carta Magna; c) os limites
materiais de reforma não podem ser minimizados pela existência de exceções previstas
no próprio texto constitucional; d) todas as exceções feitas pelo Constituinte originário
são no exercício de uma competência incondicionada e que não se transfere ao Poder
Reformador, pois este é, por natureza, subordinado; e) a abrangência da cláusula de
intangibilidade do art. 60, § 4º, IV é ampla, pois vai além dos direitos e garantias
estritamente pessoais, açambarcando, pelo menos, os chamados direitos de primeira e
segunda gerações ou dimensões; f) a possibilidade de alteração do núcleo essencial de
direito fundamental que constitui cláusula pétrea tem de ser vista de forma restritiva,
sob pena de esvaziamento do direito por novas e sucessivas reformas; g) toda emenda
constitucional, por não emanar de poder originário, é suscetível de controle de
constitucionalidade.
Estabelece o artigo 5º da CF o rol de direitos e garantias individuais da pessoa
humana, sendo desnecessário discutir se são ou não amparados pelo § 4º do artigo 60,
pois está expressamente definido na carta. Entretanto, o § 2º do artigo 5º diz que são
direitos e garantias individuais as normas dispersas pelo texto constitucional, não
apenas as elencadas no dispositivo mencionado.
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Diz o parágrafo 2º do artigo 5º:
Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem
outros decorrentes do regime e dos principais por ela adotados, ou
dos tratados internacionais em que a República Federativa do
Brasil seja parte.
Esse parágrafo nos traz duas certezas. A primeira, que a própria Constituição
Federal admite que encerra em seu corpo, direitos e garantias individuais, e que o rol do
artigo 5º não é exaustivo.
A segunda, que direitos e garantias concernentes com os princípios da própria
Constituição e de tratados internacionais firmados pelo Brasil, integram referido rol,
mesmo fora de sua lista.
As forças conservadoras da sociedade e a imprensa sensacionalista batem-se
insistentemente pela alteração do art. 228, apresentando o rebaixamento da maioridade
penal como a solução para o problema da violência urbana. A tese vem ganhando apoio
em ambos segmentos da sociedade, em decorrência, sobretudo, do sentimento de
insegurança da população ante a ineficácia dos poderes públicos no combate satisfatório
à criminalidade.
As distorções sobre tal questão são gigantescas e precisam ser corrigidas. A
primeira grande distorção consiste em pensar que os atos infracionais praticados por
adolescentes representam parcela significativa dos crimes ocorridos no país. Segundo
levantamento realizados em vários estados do Brasil, os crimes praticados por maiores
de 18 anos representam cerca de 90% do total. Assim, os adolescentes estariam
praticando apenas 10% das infrações.
Obviamente, o problema de segurança pública e sua solução não se resume, nem pode
ser centrado, em torno das particularidades de fração tão pequena deles, ou seja, aquelas
praticadas por adolescentes.
O segundo grande ponto que precisamos ter em mente é que essas forças
conservadoras insistem em confundir inimputabilidade penal dos menores de 18 anos
com ?impunidade?, ou total irresponsabilidade. É mentirosa a visão de que os
adolescentes autores de infrações penais não respondem pelo ato que praticam.
21
Respondem sim, e o faze, segundo as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei 8069/90), sendo submetidos a julgamento dentro do devido processo legal.
No Estatuto, para o jovem autor de infração penal estão previstas medidas
chamadas sócio-educativas.
A medida de internação, considerando apenas o aspecto da privação de
liberdade, é idêntica às penas criminais.
Na esteira da Constituição Federal e o ECA impõe a responsabilidade do
infrator, sujeitando-se à privação de liberdade. O período de internamento, no módulo
máximo de três anos, considera a condição de pessoa em desenvolvimento do
adolescente e o próprio período de metamorfose que caracteriza esta fase. Após esse
período, o adolescente estará apto, se adequadamente trabalhado, para a reinserção na
sociedade. Num paralelo com o sistema aplicável ao adulto, se ele praticou um roubo a
mão armada, a pena que receber como regra, deverá se situar ao redor de 5 anos e 4
meses de reclusão, observados os critérios do Código Penal. Desta pena, vai cumprir
preso apenas um terço dela, ou seja mais ou menos 2 anos, dada a sistemática da Lei de
Execuções Penais.
Outro grande equívoco nesta questão da redução da idade é o entendimento de
que ela se resume à discussão sobre capacidade de discernimento, ou seja, se o jovem
sabe ou não o que ele faz quando pratica uma infração penal. Pensando-se assim,
poderíamos chegar ao absurdo de dizer que uma criança de sete anos deve receber uma
pena criminal? Em um presídio? Porque ela sabe que matar alguém é errado ou porque
sabe que furtar o lápis do amiguinho na escola também é.
Não se trata de ter ou não discernimento. O enfoque correto do tema é buscar o
que é mais adequado e eficaz a reinserção do adolescente infrator na comunidade,
considerando a sua condição de pessoa humana em desenvolvimento, dentro da
realidade político-econômica da Nação, da própria falência do sistema penitenciário. A
fixação da idade m 18 anos vem se revelando com uma adequada solução de política
criminal. O que falta é a efetiva implementação das medidas sócio-educativas previstas
no Estatuto.
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CONCLUSÃO:
Voltemos ao pacto social de 1988 e os ideais de resgate da cidadania.
Houve algum motivo para a alteração dos ideais que fizeram com que resgatássemos a
cidadania, o amor próprio como cidadãos? Nesse particular, não houve qualquer fato
social que nos levasse a mudança.
Se não houve qualquer fato social que nos levo asse a mudança, por que, então
pensar em mudar? E mais: se o constituinte de 1988 preocupado já com a situação,
permitiu que o adolescente infrator fosse punido com a privação de sua liberdade
porque, então, alterar a sua responsabilização penal, se já há instrumento constitucional
para puni-lo, moldado pelo principio da educação e sociabilização?
Onde ocorreu inovação? Em que medida a inovação pretendida acresceria aos
ideais de 1988? Só vamos desenvolver mais cidadania na medida em que soubermos
louvar e entender o constituinte de 1988, especialmente quando pretendeu garantir um
exercício Mario de principio democrático, ausente no regime antecedente. A alteração
da maioridade penal em nada ira contribuir para o desenvolvimento da cidadania entre
nos. Se há ajustes a fazer, melhor fazê-los na lei ordinária, preservando os princípios
constitucionais. Não se deve alterar a Constituição Federal, diante a insuficiência de
políticas governamentais. Corrigir programas governamentais, fazer ajustes na
legislação ordinária não implica, necessariamente, alteração constitucional. Vamos
preservar a nossa memória institucional, vamos valorizar o nosso pacto de 1988, que
resgatou a cidadania, evitando? Mais uma vez? Alterar o texto, especialmente diante de
cláusula pétrea, especialmente diante da inexistência de qualquer mudança social e, por
fim, diante da existência de um sistema de punição do adolescente infrator? Que poderia
perfeitamente ser ajustado mediante mudanças de políticas governamentais e diante de
pequenas alterações legislativas ordinárias.
Não é aceitável confundir um direito de exercício de cidadania, votar aos 16
anos, com a reponsabilização por um ato infracional praticado.
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Inimputabilidade penal não rima com impunidade. Quem faz tal confusão, age
de má fé e sem base na legislação brasileira e nas normas internacionais, das quais o
Brasil é signatário.
Cabe assinalar que a redução da maioridade penal baixasse os altos índices de
violência/criminalidade presentes na sociedade brasileira, as pessoas com mais de 18
anos não poderiam/deveriam praticar a esmagadora maioria dos mesmos.
Reduzir a idade penal é romper também com os tratados internacionais, dos
quais o Brasil é signatário. As alternativas, portanto, não estão no endurecimento das
penas.
É mais do que urgente e necessária a correta e efetiva aplicação das medidas
sócio-educativas definidas no Estatuto da Criança e do Adolescente.
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