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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE ARQUITETURA
PROGRAMA DE PESQUISA E PS-GRADUAO EM ARQUITETURA PROPAR
ARQ. RINALDO FERREIRA BARBOSA
Dissertao de mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em
Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - PROPAR - como
requisito parcial para obteno do grau de mestre em Arquitetura
ORIENTADOR: Prof. Cludio Calovi Pereira, Ph.D.
Junho 2005
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COM AMOR PARA
VERA &GUILHERME
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AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Cludio Calovi Pereira, por ser um dospoucos pesquisadores desta faculdade a valorizar a importncia da histria
da arquitetura como aprendizado para a prtica de projeto; pelo seu apoio
e suporte com a bibliografia para o desenvolvimento deste trabalho e pelo
incentivo constante para o desenvolvimento deste tema.
Aos professores e amigos do PROPAR, pelo enriquecimento
proveniente dos debates, discusses e divagaes arquitetnicas, em
especial aos professores: arq. Cludia Piant Costa Cabral, arq. Fernando
Freitas Fuo e arq. Rogrio de Castro Oliveira.
Aos amigos e colegas da disciplina de Projeto VI, na qual realizei o
estgio docente durante o ano de 2004: arq. Cludio Calovi Pereira, arq.
Glnio Vianna Bohrer, arq. Heitor da Costa Silva e arq. Srgio Moacir
Marques; pelo aprendizado didtico do atelier e o apoio e liberdade
disponibilizados durante esta experincia.Aos colegas que enriqueceram as discusses em sala de aula e
fora dela, em especial amiga de muitos cafezinhos, trabalhos, projetos e
divagaes: arq. Maribel del Carmen Aliaga Fuentes, pelo seu constante
incentivo e torcida pela finalizao deste trabalho.
Aos amigos que me incentivaram e ajudaram durante este
processo, particularmente ao arq. Miguel Antnio Farina, por compartilhar
os bons e maus momentos desta trajetria, pela troca de experincias
profissionais, revises e crticas construtivas deste trabalho, e o apoio
fundamental para a finalizao do mesmo.
Por ltimo, mas em primeiro lugar, a minha esposa e filho: Vera e
Guilherme, por sua compreenso pelas longas horas despendidas no
mestrado, aos quais dedico este trabalho.
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SUMRIO
SUMRIO........................................................................5
RESUMO..........................................................................9
ABSTRACT.....................................................................10
PREFCIO .....................................................................11
INTRODUO ...............................................................13Palladio Passado e presente atravs das villas palladianas... 14
As villas palladianas e o processo investigativo na metodologia
de projeto. .............................................................................. 21
O PROCESSO DE PROJETO NO RENASCIMENTO ..........29
Brunelleschi: Uma construo, uma tcnica, uma novaprofisso. ............................................................................. 32
Vitrvio: a base de pesquisa ............................................... 37Alberti: teoria e intelectualizao da arquitetura ou aformao terica do cliente. ................................................ 42Serlio: o tratado como formao e guia profissional. ......... 51O projeto como investigao e teoria.................................. 57Palladio: referncias e interferncias do mundorenascentista ....................................................................... 63
PALLADIO E OS QUATRO LIVROS DE ARQUITETURA...76O Livro I .................................................................................. 81
Agradecimentos e Prlogo ................................................... 81Firmitas, utilitas e venustassegundo Palladio..................... 83
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Os materiais, servios e as Ordens Arquitetnicas. ............. 85Formas e propores dos espaos ....................................... 87Os elementos finais na construo ...................................... 91
O Livro II ................................................................................ 93Condies e condicionantes para a moradia........................ 93
A casa na cidade .................................................................. 96A Casa no Campo ................................................................. 99
O Livro III ............................................................................. 101Infra-estrutura e cidade .................................................... 101
O Livro IV.............................................................................. 105O mundo clssico aos olhos de Palladio............................. 105Forma, Proporo e Convenincia nos templos. ................ 107
O repertrio e contedo normativo ..................................... 111
EXLORANDO AS VILLAS PALLADIANAS......................114A tipologia da Villa forma e ideologia no projeto.................. 116
Planilha 1 Villas e Palcios Palladianos .................................. 128As Villas Palladianas no Tratado ........................................... 129
Planilha 2 As villas Palladianas ............................................. 130Planilha 3 As villas no tratado esc. 1/2000. ........................... 133
Reconstruindo as Villas......................................................... 137O jogo da implantao.......................................................... 143
Planilha 4 A composio da implantao............................... 152Planilha 5 Implantao: a casa di villa e as alas de servio ..... 153
Desconstruindo a casa di villa ........................................... 154
Composio Planimtrica da casa di villa ....................... 155Configurao das Salas .......................................................... 155
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Loggias................................................................................. 158Grelhas................................................................................. 160reas.................................................................................... 163Variveis Compositivas da Composio Planimtrica. ................ 164
Composio Altimtrica da casa di villa......................... 165
Uma viso de Conjunto...................................................... 168Possveis Matrizes Compositivas .......................................... 172
A GARRA DO LEO......................................................177A Garra do Leo, um sistema arquitetnico Palladiano ........ 178
BIBLIOGRAFIA ...........................................................190
LISTA DE FIGURAS .....................................................195
LISTA DE GRFICOS...................................................199
ANEXOS ......................................................................200As villas no tratado Palladiano.............................................. 202
Villa Godi 1537................................................................ 202Villa Pisani Bagnolo 1542 ............................................... 206Villa Saraceno - 1545 ......................................................... 211Villa Thiene Quinto - 1546 ................................................. 215Villa Angarano - 1548 ........................................................ 219
Villa Poiana - 1549............................................................. 222Villa Pisani Montagnana - 1552 ......................................... 225Villa Cornaro - 1553 ........................................................... 229Villa Ragona - 1555 ........................................................... 233Villa Badoer - 1556 ............................................................ 237Villa Thiene Cicogna - 1556 ............................................... 241Villa Barbaro - 1557 ........................................................... 245Villa Repeta - 1557 ............................................................ 249
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Villa Foscari - 1559 ............................................................ 252Villa Mocenigo Marocco - 1559 .......................................... 256Villa Sarego Miega - 1562 .................................................. 260Villa Valmarana Lisiera - 1563 ........................................... 263Villa Emo - 1564................................................................. 267Villa Mocenigo Brenta - 1565............................................. 271Villa Zeno - 1565................................................................ 275Villa Capra - Rotonda - 1566.............................................. 279Villa Trissino - 1567 ........................................................... 283Villa Sarego Santa Sofia - 1569 ......................................... 287
Outras villas Palladianas....................................................... 291Villa Piovene ...................................................................... 291Villa Valmarana Vigardolo.................................................. 292Villa Forni........................................................................... 293Villa Gazotti ....................................................................... 294Villa Caldogno .................................................................... 295Villa Contarini .................................................................... 296Villa Chiericati .................................................................... 297Villa Porto .......................................................................... 298
LISTA DE LMINAS.....................................................299
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RESUMO
O Renascimento um perodo de mudana no pensamento da
civilizao ocidental, principalmente no campo das artes e da cincia. Apartir de Brunelleschi a arquitetura se estabelece como profisso tal como
hoje conhecida, dotada do status de cincia, isto , passvel de registro,
sistematizao, publicao e crtica. Para isto, o tratado de Vitrvio serve
de base de pesquisa para a fundamentao intelectual da arquitetura do
Renascimento e na elaborao dos tratados deste perodo, elaborados por
Alberti, Serlio e Palladio, entre outros. Palladio, atravs de seu tratado, I
Quattro Libri di Architettura, nos deixa seu legado terico e profissional,diferenciado dos demais na medida em que exemplificado atravs de
seus projetos. Neste legado, as villas palladianas constituem um
referencial tipolgico da arquitetura ocidental, que se difunde atravs dos
sculos seguintes e que revela princpios e mtodos de projeto que so
independentes da questo estilstica do Renascimento.
O presente trabalho aborda as questes de entendimento da
mudana do pensamento arquitetnico no Renascimento; suas referncias
na formao de Palladio; e a influncia deste processo na elaborao e
sistematizao de projeto atravs das villas. Os projetos das villas
palladianas so explorados atravs de sua reconstruo a partir da
computao grfica, apresentados no final deste trabalho. Sob esta tica a
dissertao estuda a presena destes modelos tipolgicos e explora as
operaes de projeto elaboradas por Palladio no conjunto das villasrepresentadas no tratado O manuseio destes projetos permitiu consolidar
a anlise do conjunto destas obras, permitindo o seu agrupamento
segundo operaes de projeto identificadas na anlise e apresentados a
seguir, interpretando as villas palladianas sob uma tica contempornea
de representao e anlise, extraindo seus valores como sistematizao
do conhecimento arquitetnico e referncia de metodologia projetual.
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ABSTRACT
The Renaissance represents a turning point in the thought of
western civilization, mainly in the field of the arts and sciences. Startingfrom Brunelleschi, architecture is established professionally in this
contemporary sense, endowed with the status of a science, that is,
susceptible to registration, systematization, publication and criticism.
Vitruvius treatise serves as a research base and intellectual foundation of
Renaissance architecture and also in the elaboration of other treatises of
this period, like the ones by Alberti, Serlio and Palladio. Palladio, through
his treatise, I Quattro Libri di Architettura, leaves us his theoretical andprofessional legacy. His work is singular because Palladios own projects
are used as examples. Palladios villas constitute a typological reference of
western architecture which was disseminated through the following
centuries and reveals principles and methods of design, that are
independent of stylistic matters of the Renaissance.
The present work intends to examine the change of the
architectural thought in the Renaissance; its references in the education of
Palladio; and the influence of this process in the systematics of
architectural design through the villas. The projects of the Palladios villas
are explored through your computer graphic reconstruction, presented at
the end of this work. The dissertation studies the presence of these
typological models and explores the design operations elaborated by
Palladio in the villas represented in the treatise. The study of theseprojects resulted in arranging the villas according to groups related to
allow to designs operations identified in the analysis. Such studies are
presented at the end as a contemporary interpretation of Palladios villas
extracting its values as systematization of the architectural knowledge and
references for designs strategies.
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PREFCIO
O primeiro projeto de pesquisa apresentado ao Programa de Ps
graduao em Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul(PROPAR) para ingresso no curso de mestrado enfatizava a abordagem
dos tratados de Vitrvio, Alberti, Serlio e Palladio atravs de suas
representaes e modelagens a partir da computao grfica.
A idia apresentada abordava dois campos que sempre me
fascinaram: a histria da arquitetura como conhecimento e pesquisa; e o
uso do computador e dos programas especficos de representao grfica
como ferramentas de trabalho e anlise na profisso do arquiteto. No
curso de graduao em Arquitetura, realizado nesta Universidade no
perodo de 1982 a 1987, as disciplinas da rea de histria da arquitetura
eram direcionadas e vinculadas ao ensino de histria da arte, cursadas
nos primeiros semestres do curso e distanciadas da prtica profissional da
arquitetura. No incio do curso, no se tinha o entendimento da
importncia deste assunto para a formao do arquiteto e a abordagem
das disciplinas no vinculava a histria prtica de projeto, ou seu estudo
como entendimento dos princpios de projeto de cada perodo e seus
reflexos na atualidade. A histria da arquitetura, inserida como parte da
histria da arte, se resumia ao acmulo de informaes de datas, estilos,
e autores que com o tempo se perdiam na memria.
O interesse pela computao grfica aplicada arquitetura surge
no momento em que j me encontrava fora do mbito acadmico, foiaprendida no dia a dia da profisso como ferramenta de representao e
agilidade no desenvolvimento dos projetos. Com o tempo, o
aperfeioamento de programas computacionais especficos para a
arquitetura e sua agilidade transformou o computador quase que no
substituto da prancheta dos estudantes e profissionais.
Aliar os dois campos citados em um projeto de pesquisa parecia
fascinante, mas ao me dedicar ao estudo dos tratados de arquitetura do
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Renascimento vi que estudar e representar graficamente os tratados de
Vitrvio, Alberti, Serlio e Palladio em dois anos seria uma tarefa quase
impossvel para uma anlise detalhada de cada um; correndo o risco do
trabalho se tornar uma simples representao grfica dos conceitoscontidos nestes textos. Em diversos momentos pensei em mudar o tema
do trabalho aqui apresentado, principalmente quando era questionado
sobre o tema da dissertao e ao responder, via olhares espantados, ou
at mesmo reprovadores, por estar abordando um tema to antigo. Mas
quanto mais eu lia e estudava os textos relativos ao assunto, mais
encontrava pontos de contato com o presente, o que me fez persistir na
abordagem dos textos renascentistas, centrando sua anlise nos projetosdas villas elaborados por Palladio.
Desta forma, assim como Palladio visita e estuda as runas da
antiguidade romana e o texto de Vitrvio a fim de compor seu tratado e
elaborar seus projetos, me dediquei a estudar suas obras, em especial
seus projetos de villas e seu tratado, a fim de elaborar o presente
trabalho.
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Captulo 1
INTRODUO
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Palladio
Passado e presente atravsdas villas palladianas
A teoria e o projeto de arquitetura, sua
metodologia de trabalho e composio em
ltima instncia o motivo e finalidade da
formao do arquiteto. O projeto a finalidade
principal do ensino de arquitetura e a edificao
sua finalidade prtica. Buscar suas razes e
princpios atravs de estudos das villas
palladianas e suas relaes com a prtica
contempornea revisar (no sentido de olhar
de novo) o passado no intuito de aprender com
um dos arquitetos mais importantes da histria
da arquitetura ocidental.
Ao falar dos projetos arquitetnicos no
Renascimento e dos tratados de arquitetura,
muitas vezes pensamos em algo muito distante
de nossa realidade. Para muitos soa como um
assunto de natureza histrica, para outros,
significa regras rgidas de controle absoluto daforma e do espao, vinculados ao estilo e a
incessante busca da beleza e harmonia da
antiguidade clssica. esquecida a importncia
destes projetos e tratados para o
desenvolvimento da arquitetura como campo
disciplinar e a sistematizao de seu
conhecimento e que, a partir deste momento, a
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arquitetura deixa de ser uma arte de ofcio
para tornar-se cincia. A arquitetura como
profisso reconhecida e o projeto como
elemento e resultado de uma elaborao eproduo intelectual, processo mental de
contnuo aperfeioamento e estudo, so
reconhecidos justamente neste momento da
histria.
A necessidade de uma fundamentao
terica leva vrios autores a buscar nos escritos
de Vitrvio, nico documento remanescente da
antiguidade sobre a produo arquitetnica, as
bases que dessem significado cultural
arquitetura. No entanto, estas interpretaes se
distanciam muitas vezes uma das outras, uma
vez que estes os livros no continham
ilustraes, ficando ao encargo do leitor
imaginar e tentar reproduzir graficamente a
construo clssica. Na falta das ilustraes de
Vitrvio o estudo das runas adquire
importncia no entendimento destas
construes. Os remanescentes de maior
interesse da antiguidade clssica esto em
Roma: o Pantheon, o Coliseu, as Termas de
Diocleciano e Caracala, e as runas do Frum
Romano. Em sua quase totalidade, as runas
eram de edifcios pblicos ou templos, quase
nada havendo a respeito da construo
domiciliar. No havendo indcios destas
construes os estudiosos e arquitetos tm de
se basear nas descries de Vitrvio para tentar
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entender a moradia antiga, por ser este o
anseio dos clientes do perodo renascentista.
Segundo Linda Pellecchia1, de Alberti a
Palladio, os arquitetos e tericos renascentistasdebatem-se por entender e interpretar a casa
romana descrita por Vitrvio em seu tratado,
De Architectura Libri Decem, e centram sua
discusso a partir da forma e funo do trio, o
compartimento principal da moradia, resultando
em uma diversidade de interpretaes e
configuraes deste espao. A casa e a maneira
de morar o centro da discusso e do interesse
neste momento, face o desconhecimento dos
exemplares descritos por Vitrvio e a
necessidade dos arquitetos de fornecerem a
seus clientes um modelo clssico de residncia.
A arquitetura ganha uma linguagem
prpria para a representao precisa das idias
no Renascimento, como cita Martinez: podra
decirse que hacia 1450 la arquitectura entro em
la poca de su lenguaje escrito, as como los
lenguajes naturales llegaron a la escritura
alfabtica hacia el 2000 antes de Cristo. 2
Ocorre uma sistematizao do processo deconhecimento e representao da arquitetura e
sua valorao como profisso e produo
intelectual. A arquitetura deixa de ser mera
prtica manual, de tentativa e erro do canteiro
1 PELLECCHIA, Linda (1992). Architects ReadVitruvius: Renaissance Interpretations of theatrium of the ancient house. Journal of the Society
of Architectural Historians. Vol. 51. Philadelphia.2MARTINEZ, Alfonso Corona (1998). Ensayo sobre elProyecto. Argentina: Kliczkowski Publisher P: 12.
Nesta poca, as runas dePompia e Herculano estavamsoterradas, assim como a cidade
porturia de stia.>
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de obras medieval e do repasse de
conhecimento atravs das corporaes de ofcio
para ser uma produo mental, pensada e
repensada, atravs do projeto, do desenho e damaquete. A partir deste momento, o projeto
fundamental para a verificao e
aperfeioamento constante das idias como
proclama Alberti no Livro Nove de seu tratado.3
Dentro deste contexto de
sistematizao do conhecimento, Palladio
escreve seu tratado, os Quatro Livros de
Arquitetura, que praticamente um catlogo
sistemtico de sua intensa produo
arquitetnica. Palladio divide seu tratado em
quatro livros: no Livro Um trata da teorizao
da arquitetura e seus componentes
construtivos, as ordens e as propores; no
Livro Dois trata da residncia, comeando pela
casa privada grega e romana para chegar a sua
produo de projetos residenciais privados para
palcios e villas; o Livro Trs dedicado aos
edifcios pblicos, ruas, estradas, pontes e
baslicas, utilizando exemplos antigos e seus
prprios projetos; no Livro Quatro, Palladio se
dedica arquitetura sagrada e os templos,
especialmente os templos romanos.
Uma das caractersticas singulares do
tratado palladiano a forma de representao
utilizada em seus desenhos. Os projetos so
3
ALBERTI, Leon Battista (1988). Traduo de RYKWERTJoseph; TAVERNOR, Robert . On The Art of Building inTen Books. Cambridge: MIT Press. P. 317.
3 But I can say this ofmyself: I have often conceived ofprojects in the mind that seemedquite commendable at the time; butwhen I translate them into drawings,I found several errors in the veryparts that delighted me most, andquite serious ones; again, when I
return to drawings, and measure thedimensions, I recognize and lamentmy carelessness; finally, when I passfrom the drawings to the model. Isometimes notice further mistakes inthe individual parts, ever one over thenumbers. >
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representados em escala e com medidas
referenciais, em forma de vistas ortogonais, de
planta baixa, cortes e fachadas, que permitem
sua fcil leitura e possvel reproduo. Esteselementos facilitam o entendimento da
totalidade do projeto e o controle de suas
diversas facetas e provavelmente um dos
maiores fatores da repercusso da obra de
Palladio e seus seguidores.
Segundo o levantamento de Lionello
Puppi4, entre estudos e obras edificadas a
produo de Palladio chega a cento e quarenta
e trs projetos. Para a poca, um feito
excepcional, s possvel atravs de uma base
terica e compositiva, ou seja, um sistema
arquitetnico contido em seu tratado. Dentro
destas obras encontram-se trinta e seis
projetos residenciais de villas, entre rurais e
suburbanas. O nmero de projetos de um
mesmo gnero, elaborado por um arquiteto to
significativo para a histria e prtica da
arquitetura suscita a curiosidade e a
necessidade de um levantamento e anlise
mais acurada desta produo. Mais que a
soluo e organizao tripartite das plantas
palladianas, as villas podem ser agrupadas por
tipologias de volume isolado, volume com
arcadas laterais, tipos de soluo de acesso,
volumetria e outros mais. Estas classificaes
4 PUPPI, Lionello (1999). Andrea Palladio. Milo:Electa.
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revelam princpios de projeto que podem ser
abstrados da questo estilstica que
normalmente enfatizada nos estudos
elaborados sobre a arquitetura doRenascimento.
Vrios estudos j foram elaborados a
respeito da composio da obra de Palladio e
suas villas de uma forma menos sistemtica em
relao aos princpios compositivos, entre eles
os mais significativos para este trabalho so: os
textos de Wittkower5 e seus diagramas a
respeito das villas palladianas; as comparaes
elaboradas por Colin Rowe6 da obra de Le
Corbusier e Palladio; os estudos computacionais
de Hersey7e suas possveis villas palladianas.
Hoje o processo de representao e
anlise arquitetnica possui uma ferramenta
auxiliar importante: a computao grfica. Esta
ferramenta permite a visualizao e explorao
das possibilidades compositivas do projeto,
seus elementos geradores e reguladores, assim
como a explorao da forma e suas relaes
estruturais. Sob esta tica a dissertao
explora a presena destes modelos tipolgicospropostos no tratado palladiano a respeito da
arquitetura domstica e explora as operaes
5 WITTKOWER, Rudolf (1958). La arquitectura en laedad del humanismo. Buenos Aires: Nueva Visin.6 ROWE, Collins (1999). Manierismo y arquitecturamoderna y otros ensayos. Barcelona: Gustavo Gilli.7 HERSEY, George (1992). Possible palladian villas
(Plus a Few Instructively Impossible Ones).Cambridge: The Mit Press.
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de projeto elaboradas por Palladio no conjunto
das villas representadas no tratado. O trabalho
se d em quatro tpicos principais de estudo:
1. Estudo do processo de projeto noRenascimento italiano e as interferncias e
referncias de outros autores e arquitetos
na formao e conhecimento arquitetnico
de Palladio, principalmente em relao ao
tratado e ao projeto residencial das villas
italianas no sc. XVI.
2. Estudo do tratado Palladiano em relao
composio arquitetnica, seus elementos-
chave e a prtica de projeto residencial nas
villas italianas no sc. XVI, no contexto
arquitetnico do Renascimento.
3. Estudo das villas palladianas a partir da sua
reconstruo atravs da computaogrfica; extraindo seus valores como
referenciais de metodologia de projeto,
abstraindo-se a questo estilstica do
Renascimento;
4. Identificao dos princpios compositivos e
geomtricos das villas como referncia de
especulao projetual atravs dos dados
geomtricos extrados da reconstruo
grfica e anlise dos projetos originais de
Palladio, representados no tratado.
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As villas palladianas e o
processo investigativo na
metodologia de projeto.
Em tudo na verdade, o mximecertamente em arquitetura, essas duascoisas esto presentes: o que significado e o que significa. O que significado algo proposto do que se
fala; o que significa a demonstraoexplicada pelas regras da doutrina.(Vitrvio, 1999:50).
O objetivo deste trabalho interpretar
as villas Palladianas sob uma tica
contempornea de representao e anlise,
extraindo seus valores como sistematizao doconhecimento arquitetnico e referncia de
metodologia projetual. O projeto das villas de
palladio permite a aplicabilidade dos conceitos
preconizados no tratado, uma vez que as
limitaes encontradas na construo urbana
no existem nas propriedades rurais. A
inexistncia do limite fsico do lote e daestrutura de malha urbana possibilita a
liberdade de projeto dentro dos parmetros
ideais propostos por Palladio nos Quatro Livros
de Arquitetura.
Partindo desta premissa, a dissertao
identifica os esquemas compositivos utilizados
nos projetos das villas e os conjuga aos
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preceitos tericos propostos por Palladio em
seu tratado, identificando as linhas bsicas de
composio e organizao dos espaos e
volumetrias, revelando as operaes projetuaiscompositivas que geram um sistema
arquitetnico, que, segundo Burns
revalorizado recentemente atravs de outros
estudos:
Palladio provavelmente o maisinfluente e o mais conhecido entre osarquitetos que foram revistos no sculoque est por findar. A sua fama e a suareputao sobreviveram ao Barroco, aogosto neoclssico, ao invectivo queRuskin prega, ao movimento modernoque na sua ltima fase se reconciliaplenamente graas aos escritos deRudolf Wittkower e Collin Rowe com oarquiteto das villas racionais e deharmoniosas propores. A citaoecltica e freqentemente banal dos
elementos da linguagem de Palladio,como a galeria (peristilo) da VillaPoiana, tem mantido o seu nomefamiliar, e viva a fama de seu livro. Masao mesmo tempo ajudou aosobservadores mais atentos a entendera diferena do sistema arquitetnico dePalladio, no qual estrutura eornamento, forma e funo soperfeitamente integrados, do gesto de
confeiteiro que acrescenta uma outradecorao a sua torta. 8
Partindo do ponto de vista que o
programa do projeto habitacional apresenta
poucas variaes significativas ao longo dos
tempos, a anlise dos projetos ser direcionada
8
BURNS, Howard. La Creazione di unarchitteturasistematica e trasmissibile. Disponvel emwww.cisapalladio.org.
8 Palladio probabilmente ilpi influente ed il pi conosciuto tragli architetti che siano vissuti primadel secolo che sta per finire. La suafama e la sua reputazione
sopravvissero al Barocco, al gustoneo-gotico, alle invettive che Ruskingli rivolse, e al movimento moderno,che nella sua fase ultima si riconcilipienamente, grazie agli scritti diRudolf Wittkower e Colin Rowe, conl'architetto delle ville razionali edarmoniosamente proporzionate. Lacitazione eclettica e spesso pedestredegli elementi del linguaggio diPalladio, come la loggia di villaPoiana, ha mantenuto il suo nome
familiare e viva la fama del suo libro.Ma allo stesso tempo ha aiutato gliosservatori pi attenti a capire ladifferenza del sistema architettonicodi Palladio, in cui struttura edornamento, forma e funzione sonoperfettamente integrati, dal gesto delpasticcere che aggiunge un'altradecorazione alla sua torta. >
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nas possibilidades de composio geomtrica,
mtodos de composio e variaes possveis,
verificando o uso e relaes existentes nestas
villas em relao ao escrito no tratado. Asoperaes de projeto reveladas nos estudos das
villas palladianas nos indicam mais que simples
articulaes de espaos e propores, mas uma
srie de repeties e articulaes elaboradas
constantemente por Palladio, que se traduzem
numa metodologia projetual indita para o
Renascimento e que lhe permite desenvolverum grande nmero de obras sobre esta base
metodolgica, que se torna a marca do sucesso
palladiano ao longo dos tempos:
... tanto os exegetas do Iluminismocomo os atuais procuraram a chave daarquitetura palladiana na novidade dasplantas e dos esquemas distributivos,
na maneira como eles se articulam numespao interpretado sem preconceitosem sua realidade visual e viabilidadeconstrutiva, e, sobretudo na flunciametodolgica do projeto, que assumeas necessidades funcionais e prticasda construo como dados positivos eno como dificuldades ou obstculos aserem ultrapassados.9
A computao grfica nos permite
simular as regras de composio e proporo
preconizadas no tratado de Palladio e verificar
sua real aplicabilidade no projeto das villas,
alm de possibilitar a verificao de suas
potencialidades e possveis conexes com a
9
ARGAN, Giulio Carlo (1999). Clssico anticlssico, oRenascimento de Brunelleschi a Bruegel.So Paulo:Companhia das Letras. P: 413.
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condio presente da arquitetura e tambm
proporcionar estudos de variaes compositivas
tais como no estudo escrito por George
Hersey.10
A contribuio do computador
simplesmente a habilidade paracalcular um nmero enorme depossveis permutaes e combinaesbaseadas nas regras de Palladio. Porcausa da rapidez e perfeio com quepode aplicar estas regras e test-las emuma base mais ampla e segura quepoderia um ser humano sem ajuda.
Hersey prope em seu estudo um
esquema compositivo a partir da subdiviso de
retngulos, de maneira a chegar a solues
palladianas de organizao de planta e
esquemas de armao de fachadas a partir
destas subdivises. As subdivises aleatrias
propostas pelo programa de computao gera
solues muitas vezes distantes das solues
propostas por Palladio, requerendo mecanismos
de controles para limitar as subdivises em
esquemas proporcionais prximos aos utilizados
nas villas. O estudo de Hersey no foi usado
como referencial terico para a pesquisa, mascomo um referencial de estudos em relao ao
uso da computao grfica a fim de aproximar
o estudo das vilas renascentistas a possveis
situaes contemporneas de projeto medida
que se abstraia da construo da villa
10
HERSEY, George (1992). Possible palladian villas(Plus a Few Instructively Impossible Ones).Cambridge: The Mit Press. P: 10.
10 What the computercontributes is simply the ability tocalculate a huge number of possiblepermutations and combination basedon Palladios rules. Because of the
rapidity and completeness with whichit can apply these rules, it can testthem on a far wider and firmer basisthat could an unaided human being.
.
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propriamente dita para uma estrutura de
linhas organizatrias do projeto e do espao.
A primeira abordagem da obra de
Palladio ser atravs da anlise e reproduodos projetos das villas apresentados no tratado,
onde os desenhos so acompanhados de
dimenses. Primeiramente elaborada uma
organizao cronolgica seguida de um exame
dimensional a fim de criar um paralelo em
escala de todas as villas representadas, uma
vez que em funo do meio de divulgao
impresso, as pranchas se encontram em
escalas diversas e a ordem de apresentao
das villas no tratado no est em seqncia de
datas de elaborao dos projetos de acordo
com as datas publicadas por Puppi.11
A partir das imagens em escala e de
suas dimenses foram remontadas as plantas e
volumetrias propostas pelos desenhos do
tratado e extrados destes novos desenhos as
possveis grelhas e elementos reguladores de
projeto utilizados por Palladio, facilitando a
anlise planimtrica, altimtrica e volumtrica
de cada villa. Desta forma, foi possvel extrairmatrizes de composio e classificaes
tipolgicas dentro da categoria villa e evidenciar
dentro deste conjunto de projetos quais os
elementos de projeto que Palladio manipulava
constantemente e que regravam seu mtodo de
composio.
11 PUPPI, Lionello (1999). Andrea Palladio. Milo:Electa.
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Grelhas, modulaes, propores,
jogos de eixos e volumes, composies
geomtricas, estabelecimento de elementos
estratgicos na composio do projeto,matrizes compositivas so elementos
encontrados na maneira de projetar de Palladio,
e que mudam muito pouco, conceitualmente,
quase quinhentos anos depois.
Programa, lugar e construo,
economia, preciso e universalidade so termos
utilizados por Helio Pion12como caractersticas
e qualidades no entendimento do projeto da
arquitetura moderna. Segundo Pion so os
elementos que asseguram sentido e
consistncia13 arquitetura modernista. Termos
semelhantes fazem parte do discurso de
Palladio em seu tratado, ao descrever os
princpios de convenincia, durabilidade e
beleza (commodit, perpetuit e
bellezza)14 das edificaes, e que so pontos
chaves do seu sucesso e de seus projetos j no
sculo XVI.
Abstraindo-se a questo figurativa e do
estilo, que fazem parte da questo do carterda arquitetura de cada poca, encontram-se
aproximaes na maneira de projetar entre
perodos historicamente to distantes. O uso de
sries tipolgicas como metodologia de projeto
12PION, Helio (1998). Curso bsico de proyectos,Barcelona: Ediciones UPC.13PION, Helio (2000 Entrevista a Prof. Ana Rosa
de Oliveira. Porto Alegre: Polgrafo PROPAR.14 PALLADIO, Andrea (1570). I Quattro libri dellarchitettura. Fax-smile (1990) Milo: U. Hoelpi. P:6.
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foi empregado por vrios arquitetos em
diversos perodos histricos aps Palladio ao
tratar de programas repetitivos ou similares. A
arquitetura tipolgica das igrejas de CristopherWren na reconstruo da Cityde Londres aps
o incndio, no sculo XVII; a construo das
barriresde Paris por Claude-Nicolas Ledoux no
sculo XVIII, a srie de residncias de Frank
Loyd Wright, no incio do sculo XX nos EUA,
conhecidas por praire houses, e Le Corbusier e
suas casas brancas na Europa modernista dasdcadas de 30 e 40 so somente alguns
exemplos de aproximaes da metodologia de
projeto utilizada por Palladio que evidenciam a
sua validade na prtica arquitetnica. 15
Outras aproximaes ainda so possveis
a partir da abstrao do aspecto figurativo e
programtico destas villas se centrada a
observao num conjunto abstrato de
esquemas compositivos e malhas abstratas de
organizao formal, entendendo-se a forma
como um sistema de relaes internas e
universais que geram e identificam o projeto e
que no tm escala. Desta maneira pode-se
buscar estas aproximaes tambm em outros
projetos com programas e funes distantes da
questo particular do programa domstico e
rural da villa, como os programas institucionais,
15
CASTEX, Jean. (1990). Renacimiento, Barroco yClassicismo Historia de la Arquitectura, 1420-1720.Madrid: Ediciones Akal. P: 154.
Castex cita comoprocedimento anlogo ao Palladiosomente Wren e Wright. >
16 Helio Pion em entrevista professora Ana rosa Oliveira emPorto Alegre, coloca que a forma notem escala, so estruturas derelaes, e que as estruturas queresolvem o programa domsticopodem gerenciar e organizar a formade uma cidade.
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comerciais ou at mesmo numa escala macro
da organizao da cidade.16
16PION, Helio (2000 Entrevista a Prof. Ana Rosade Oliveira. Porto Alegre: Polgrafo PROPAR. P: 13 .
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Captulo 2
O PROCESSO DE
PROJETO NO
RENASCIMENTO
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Entender a importncia do processo de
projeto nos dias de hoje nos faz voltar ao
princpio do Renascimento italiano, quando aprtica do projeto se consolida. Neste perodo,
a profisso do arquiteto surge como conhecida
nos tempos atuais, onde o projetista
responsvel pelo pensamento e organizao da
edificao como um todo, e o projeto
resultado de um processo intelectual, um
exerccio mental de soluo de um problema
que envolve a disposio das diversas partes.
As mudanas surgem atravs de
inovaes nas tcnicas construtivas e nas
relaes de trabalho na construo da cpula
de Santa Maria dei Fiore (1420-1436) em
Florena, e prosseguem rumo a uma
necessidade de teorizao e fundamentao
cultural da arquitetura, de maneira a equipar-
la s artes maiores, como a pintura e a
escultura e tambm torn-la cincia. Surge a
necessidade de encontrar bases que
explicassem esta nova arquitetura e lhe
atribussem significado cultural e lgico, comoramo de conhecimento e abordagem terica
prpria. Estas bases vo ser estabelecidas a
partir da redescoberta do texto de Vitrvio, De
Architectura libri decem, entre 1414 e 1416 por
Poggio Bracciolini em St. Gallens, que se torna
fonte de estudo e teorizao da arquitetura em
conjunto a anlise dos remanescentes dasconstrues antigas dos romanos.
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Vrios autores buscaro esta
fundamentao terica da arquitetura e
passaro a registrar sua viso e entendimento
da maneira de projetar e construir a exemplode Vitrvio. Os registros mais importantes so
os tratados de Alberti e Serlio, o livro de
Vignola a respeito das cinco ordens e
posteriormente o tratado palladiano, Os Quatro
Livros de Arquitetura.
Os tratados e as interpretaes do
texto vitruviano geram um novo debate a
respeito da arquitetura e da valorizao da
arquitetura clssica como modelo e base de um
novo sistema construtivo e representativo da
cultura humanista. Estes tratados so a
manifestao do desejo de estabelecer a
arquitetura como disciplina cientfica, algo que
se possa explicar, e que seja possvel a
transmisso deste conhecimento.
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Brunelleschi:
Uma construo, uma tcnica, uma nova
profisso.
Apesar de controvrsias histricas, a
cpula da Igreja de Santa Maria dei Fiore
(1420-1436 construo), em Florena,
projetada por Brunelleschi (1377-1446), objeto
de concurso, tida como marco do incio do
Renascimento17
, e a primeira obra modernaaps a Idade Mdia, sendo uma nova
concepo construtiva e espacial. Brunelleschi
ao estudar as construes e runas antigas em
suas viagens a Roma, busca o entendimento do
sistema construtivo romano a fim de realizar a
cobertura do grande vo da catedral de
Florena. A partir destas anlises, inventa umanova tcnica, possvel de executar a cpula a
partir de uma maquete, deixando de lado a
tradio das corporaes de ofcio baseados
nas experincias prticas dos mestres-de-obras.
Segundo Argan18, mais que uma
inovao tcnica e uma nova maneira de
construir, Brunelleschi inventa a distino ntida
entre o engenheiro e o mestre de obras, o
que uma revoluo em relao hierarquia
unitria da Idade Mdia.
17MURRAY, Peter (1986). The Architecture of ItalianRenaissance. London: Thames & Hudson. 3 ediorevisada. (1 edio:1963).18
ARGAN, Giulio Carlo (1999). Clssico anticlssico, oRenascimento de Brunelleschi a Bruegel. So Paulo:Companhia das Letras.
Figura 1 Brunelleschi - Fonte:www.weltchronik.de
Figura 2 - Santa Maria dei Fiore -Florena. Fonte: www.yesnet.yk.ca
O termo moderno naarquitetura do Renascimento utilizado por vrios autores, Murray,Lotz, Heinderich, como a novaarquitetura baseada nos princpioshumanistas e com bases naantiguidade clssica, sem vinculaoao que hoje denominamos arquiteturamoderna relacionada ao MovimentoModernista do incio do sculo XX. >
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Brunelleschi, com seu projeto e a
coordenao do canteiro de obras da cpula se
coloca acima das corporaes de ofcio e os
reduz a executores de um projeto. SegundoCastex, de maneira simblica pode-se
considerar a obra da cpula de Florena como o
lugar de nascimento da profisso de arquiteto e
da diviso de trabalho nas bases atuais.19
A histria da cpula amplamente
discutida e detalhada em quase todos os livros
que abordam a histria da arquitetura ocidental
no perodo do Renascimento. Giulio Carlo
Argan, Peter Murray, Jean Castex e Ludwig
Heydenreich, entre outros escritores do sculo
XX, relatam a importncia desta obra e a
conjuntura em que foi realizada, e todos
salientam a importncia da mudana de
pensamento e atitude que Brunelleschi
representa para a prtica da arquitetura.
Brunelleschi assume a responsabilidade
individual sobre a obra, sendo que a concepo
e as decises so baseadas em um trabalho
intelectual, o estudo e anlise do projeto
enquanto idia, no papel, e comprovada porseus clculos. O projeto idia, pensamento,
trabalho intelectual, separado do trabalho de
execuo. Nasce neste perodo a idia de
propriedade intelectual e responsabilidade
profissional perante a obra a ser executada. A
19
CASTEX, Jean (1990). Renacimiento, Barroco eClassicismo Historia de la Arquitectura, 1420-1720. Madrid: Ediciones Akal.
Figura 3 - Seo e Axonomtrica dacpula de Santa Maria dei Fiore.
Fonte: Castex, 1990.
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necessidade de compreender os detalhes
antecipadamente e verific-los como
representao de uma idia, em conjunto com
o interesse de Brunelleschi nas questes queenvolviam o campo visual e a mecnica da
viso o levam a estudar mais profundamente a
questo da teoria ptica da Idade Mdia.
A partir destes estudos e da experincia
dos retbulos para a visualizao do painel do
Batistrio, Brunelleschi desenvolve o que
conhecido como desenho em perspectiva, que
apesar do carter pictrico do painel do
batistrio, revela o seu interesse na
representao e uso da perspectiva para a
arquitetura, a fim de represent-la
graficamente tal como o olho humano a
percebe. A perspectiva se transforma em uma
ferramenta poderosa para o arquiteto a partir
deste momento, como instrumento que permite
testar uma representao tridimensional do que
ser construdo. Trata-se da visualizao
realista de uma idia, comparada ao uso da
computao grfica atualmente como
ferramenta de suporte ao projeto arquitetnico.
A perspectiva, segundo Castex, aparece junto
com o novo conceito de projeto:
Esta perspectiva se converte em
um prodigioso instrumento para
assegurar, ao inverso, como se ver,
uma vez construdo, o objeto que
projetado. Porque, como assegurar que
Figura 4 - O experimento dosretbulos. Fonte: Castex, 1990.
Brunelleschi pintou em doispequenos retbulos de madeira oBatistrio e a Praa della Signoria. O
primeiro tinha de ser olhado peloreflexo de um espelho posto na frentee paralelamente superfcie pintada,atravs de um furo aberto nele. Nolugar do cu havia uma superfcie deprata, que refletia o cu verdadeiro. Osegundo retbulo era recortado aolongo dos tetos dos edifciosrepresentados, e devia ser observadode maneira que o cu verdadeiroocupasse o fundo, completando apintura. >
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a construo corresponder ao projeto?
No esqueamos que a nova arquitetura
primeiramente projetada: desenhada,
e isto que faz sua especificidade.Projeto e perspectiva aparecem juntos
como as duas faces de uma mesma
realidade.20
As experincias de Brunelleschi so
posteriormente desenvolvidas por Alberti, em
seu tratado sobre a pintura, onde apresenta ateoria da perspectiva e da cmera escura.21
A importncia do entendimento deste
primeiro perodo de mudana do pensamento
em relao arquitetura se d no s pelo uso
da representao grfica como ferramenta de
exposio das idias, mas como mudana de
uma fase experimental e prtica de ofcio para
uma fase de processo mental do projeto. As
decises no so mais baseadas apenas na
prxis, no conhecimento transmitido atravs
das corporaes de ofcio, mas tomadas a partir
de um estudo e processo de projeto resultado
de uma produo intelectual.
A obra de Brunelleschi como marco de
uma nova postura profissional e o
estabelecimento de um processo de projeto
geram um olhar diferenciado sobre as
edificaes do sculo XV. Alm da tcnica
20 CASTEX, Jean (1990). Renacimiento, Barroco e
Classicismo Historia de la Arquitectura, 1420-1720. Madrid: Ediciones Akal. P. 36.21ALBERTI, Leon Batista (1435-1436). De Pictura.
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construtiva resgatada das observaes das
runas romanas, Brunelleschi busca o
entendimento de uma organizao e sistema de
propores adotados nas edificaes daantiguidade, buscando a harmonia e relao
das partes como um todo proporcional,
avanando ao sistema modular proveniente da
arquitetura gtica e que vo estar presentes em
suas obras posteriores, como o Hospital dos
Inocentes (1419), Igreja de San Lorenzo
(1421), Igreja de Santo Spirito (1436) e CapelaPazzi (1429), todos em Florena.
Este momento um perodo de
mudana e ruptura com a tradio medieval, e
como todo perodo de transio, conviver
ainda com obras e posturas culturais ligadas ao
passado gtico. Esta mudana na arquitetura
comea neste perodo na Itlia, e s
posteriormente atingir a Frana, Inglaterra e
outros pases da Europa.
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Vitrvio:
a base de pesquisa
No incio do sculo XV, em 1414 ou
141622, uma cpia manuscrita do tratado de
Vitrvio, De Architectura, redescoberta na
biblioteca do monastrio de St. Gallen, na
Sua, por Poggio Bracciolini. Esta redescoberta,
no momento em que novos rumos e
questionamentos a respeito da arquitetura solevantados, fundamental para a definitiva
mudana do pensamento arquitetnico nos
anos seguintes. O estudo deste manuscrito
serve de base terica nova posio a que a
arquitetura alada. O texto foi escrito
provavelmente entre os anos 20 e 30 a.C.,
dedicado ao Imperador Romano Augusto, apsa um longo perodo de guerras, o que
representa uma poca de renovao cultural e
arquitetnica.23
Como o primeiro tratado conhecido
escrito a respeito da arquitetura, o texto de
Vitrvio serve de base a toda teorizao sobre
as ordens e os princpios compositivos da
arquitetura clssica. Dividido em dez livros, o
tratado descreve as definies da arquitetura;
seus componentes; princpios de modulao,
simetria e proporo das construes, os
22 Mac Millan (1982). Encyclopedia of Architects.
Vol.4 New York. P: 341.23 ROWLAND, Ingrid D. (1999). Vitruvius, Ten Bookson Architecture. USA: Cambridge University Press
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templos, os edifcios pblicos e privados, a
residncia romana e tambm as ferramentas de
construo. O tratado mistura a teoria e a
prtica, o que Vitrvio j salienta no primeirolivro:
... O conhecimento nasce da
prtica e da teoria. Prtica o exerccio
constante e freqente do emprego das
mos pelas quais o trabalho realizado,
com qualquer material necessrio
consecuo de um projeto. Teoria,
entretanto, a habilidade para
demonstrar e explicar os princpios das
propores dos trabalhos executados,
hbil e sistematicamente.25
H uma grande dificuldade em
entender o tratado vitruviano no sculo XV. Osedifcios descritos por ele, em sua maioria so
runas, ou no existem mais. O livro no
contm ilustraes, o que determina que se
faam dedues a partir da sua descrio das
propores das construes. A dificuldade de
entender o texto escrito em latim e que utiliza
tambm termos gregos para designar partes daconstruo faz com que surjam comentrios
como o de Alberti, de que o texto pareceria
24
Texto em latim disponvel em:http://www.fhaugsburg.de25ROWLAND, Ingrid D. (1999). Op. cit. P: 21.
24 Architecti est scientia
pluribus disciplinis et variiseruditionibus ornata, cuius iudicioprobantur omnia quae ab ceterisartibus perficiuntur opera. Ea nasciturex fabrica et ratiocinatione. Fabricaest continuata ac trita usus meditatioad propositum deformationis, quaemanibus perficitur e materia,cuiuscumque generis opus est.Ratiocinatio autem est, quae resfabricatas sollertiae ac rationis proportione demonstrare atque explicare
potest.24
(Vitrvio, Livro I, cap.I.). >
25 The architects expertiseis enhanced by many disciplines andvarious sorts of specializedknowledge, all the works executedusing these other skills are evaluatedby his seasoned judgment. Thisexpertise is born both of practice andof reasoning. Practice is the constant,repeated exercise of the hands bywhich the work is brought to
completion in whatever medium isrequired for the proposed design.Reasoning, however, is what candemonstrate and explain theproportions of completed worksskillfully and systematically.
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latim para os gregos e grego para os
romanos.26
Um dos principais motivos da relevncia
do tratado vitruviano est principalmente pelofato de ter sido escrito por um arquiteto de
ofcio, descrevendo e teorizando sobre a
arquitetura clssica. Os arquitetos e intelectuais
do sculo XV buscam o entendimento sobre
toda a cultura clssica, em especial a
arquitetura. Desta forma o tratado o nico
documento conhecido como suporte a esta
busca em conjunto com o estudo das runas,
principalmente as localizadas em Roma, e serve
de base de pesquisa e de intelectualizao da
arquitetura.
Apesar de Vitrvio ser criticado por
Alberti, seu livro ser o suporte dos tratados e
teorias da arquitetura do Renascimento. Os
princpios de firmitas, utilitas e venustas
serviro de base para Palladio ao escrever seu
tratado, traduzindo os termos como:
commodit, perpetuit e belleza27. Mais que o
levantamento e compreenso dos edifcios
pblicos e os templos atravs do tratado, est acuriosidade e necessidade de tentar entender a
moradia da antiguidade romana, pois no
existem exemplares em condies de permitir
este estudo in loco. A necessidade de projetar
26ALBERTI, Leon Battista. Ten Books on architectura.Livro VI. Cap. I.27
PALLADIO, Andrea (1570). I Quattro libridellarchitettura. (fac similie) Milao:U. Hoepli.Editora,1990.
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residncias nos sculos XV e XVI inspiradas no
passado da antiguidade clssica romana faz
com que os arquitetos tentem imaginar as
construes descritas por Vitrvio. No seconheciam ainda as runas de Pompia e
Herculano, escavadas dois sculos depois.
Com a falta de exemplares construdos,
Vitrvio servir de suporte para os arquitetos
projetarem as residncias e palcios em Roma
e Florena de acordo com os novos anseios
desta sociedade. A restaurao da importncia
poltica de Roma no sculo XV com a
reunificao da Igreja e o retorno dos Papas
leva a uma poltica de obras pblicas e ao
incentivo da construo privada para recuperar
e restaurar a imagem da cidade, dilapidada e
com baixa populao por mais de um sculo. O
retorno dos papas a Roma, aps o fim da ciso
de Avignon, traz consigo toda a corte
eclesistica, cardeais e demais autoridades que
geram uma demanda de novas construes que
lhe fossem dignas, palcios pblicos e privados,
que congregavam um amplo programa e
definiam um edifcio monumental.28
O projeto destes palcios monumentais
e dos palcios menores29 revela a inteno de
muitos arquitetos de reconstruir a disposio
planimtrica da casa romana antiga (domus),
28 Ver PEREIRA, Cludio Calovi (2001). PrticaProfissional e o Projeto de Palcios menores no
Renascimento Italiano. Arquitextos 1. Porto Alegre:UFRGS PROPAR.29Idem.
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revelando um esforo intelectual em entender
as descries de Vitrvio sobre a moradia em
seu tempo, que da mesma maneira influenciar
Palladio no sculo XVI, na busca doentendimento da residncia romana da
antiguidade.30
30Ver RYKWERT, Joseph (1999). La casa de adn enel paraso. Barcelona: Gustavo Gilli.
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Alberti:
teoria e intelectualizao da arquitetura ou a
formao terica do cliente.
Por volta de 1450, Leon Batista Alberti
(1404-1472) escreve seu tratado sobre
arquitetura, De Re Aedificatoria.
Alberti um intelectual, formado desde
cedo nas bases humanistas, tratando-se de
uma personalidade de cultura ampla e querepresentar neste momento um papel especial
na consolidao de um novo statuspara com as
artes visuais. Alberti estuda direito civil e
cannico em Bolonha, ordenado em 1428 e
posteriormente dedica-se s disciplinas
filosficas, que incluam as cincias e as
matemticas.31 Esta formao salienta adiferena entre ele e seus antecessores na
formao e influncia na transformao do
status da arquitetura.
Em 1428, quando retorna a Florena,
conhece Brunelleschi e provavelmente a
Donatello, Ghiberti e Masaccio32. Em 1434,
retorna novamente a Florena e segundo
Argan, neste momento as obras destes autores
o teriam impressionado profundamente:
31 HEINDENREICH, Ludwig H. (1998). Arquitetura naItlia, 14500 1500. So Paulo: Cosac & NaifyEdies.32
MURRAY, Peter (1986). The Architecture of theItalian Renaissance. New York: Schocken Books. 3ed.
Figura 5 Plaqueta com suposto auto-retrato de Alberti.Fonte:www.centrostudiclassicismo.it.
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No promio do Tratado da
pintura dito com toda clareza que,
chegando a Florena em 1434, aps sua
primeira estada em Roma, Alberti ficouprofundamente impressionado com os
trs fatos mais notveis da renovao
que o pensamento humanista
determinara na arte: a grande estaturia
de Donatello, de Ghiberti, de Nanno di
Banco; a arquitetura de Brunelleschi,
com a cpula de Santa Maria dei Fiore; apintura de Masaccio. Percebeu que estes
fatos rompiam a articulao tradicional
entre momento doutrinrio e momento
operativo, ou manual, da arte; que no
havia mais continuidade, e sim, distino
e correlao de dois nveis: o da
inveno, ou teoria, e o da prxis.33
Depois de ter escritos os tratados sobre
a estaturia e a pintura, no qual desenvolve a
teoria da perspectiva, e ter percebido a
mudana de rumo na prtica profissional da
arquitetura deste momento, Alberti volta seu
interesse a uma nova conceituao a respeito
da arquitetura, aliado a seus interesses
pessoais34, quando nomeado consultor do
Papa Nicolau V a respeito das reformas
33ARGAN, Giulio Carlo (1999). Clssico anticlssico, oRenascimento de Brunelleschi a Bruegel. So Paulo:Companhia das Letras. P: 145.34 Ver Castex, Jean. (1990). Renacimiento, Barroco eClassicismo Historia de la Arquitectura, 1420-
1720. Madrid: Ediciones Akal. Captulo 4: Alberti (1404-1472): P. 49-61.
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urbansticas de Roma. Provavelmente em torno
de 1440, Alberti comea a escrever seu tratado
sobre arquitetura, De Re Aedificatoria, o qual
presenteia ao Papa Nicolau V em 1452 em umaprimeira verso, pois continua a trabalhar nele
at sua morte em 1472. A primeira publicao
impressa se dar em 1486, 14 anos aps sua
morte.
A importncia do entendimento deste
contexto que envolve a vida de Alberti, e o que
o leva a se interessar pela arquitetura,
essencial para o entendimento do seu tratado,
e para quem ele direcionado. O texto de
Alberti escrito em latim, idioma que s os
eruditos, estudiosos e a nobreza eclesistica do
sculo XV dominavam. O tratado dividido em
dez livros como o de Vitrvio, obviamente tem
por base o primeiro, mas as diferenas entre os
escritores so fundamentais. Alberti no
escreve para os construtores e arquitetos, e sim
para seus clientes, a quem quer convencer e
formar a opinio a respeito da arquitetura como
arte, e fruto de um pensamento lgico e
intelectual35.
Segundo Rykwert, 36 Vitrvio escrevia
seguindo uma tradio e confirmando sua
posio de custdia e guardio da arquitetura
que descrevia, enquanto Alberti estabelece a
35 KRAUTHEIMER, Richard (1969). Studies in EarlyChristian, Medieval, and ReaissanceArt. New York:NY University Press. Captulo 19.36
ALBERTI, Leon Battista (1988). Traduo de RYKWERTJoseph; TAVERNOR, Robert . On The Art of Building inTen Books. Cambridge: MIT Press.
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nova disciplina da arquitetura do Renascimento,
e a teoria a qual deveria seguir. O tratado de
Alberti, mais que uma descrio de obras e
tipologias da arquitetura clssica, e um manualsobre as tcnicas construtivas, aborda a
necessidade de entender a arquitetura como
processo intelectual, e atravs da arquitetura
clssica encontrar os princpios desta
arquitetura. A semelhana entre a estrutura dos
tratados de Alberti e Vitrvio amplamente
discutida no sculo XX, gerando algumascontrovrsias. Castex37coloca Vitrvio como um
trampolim para Alberti, Krautheimer38
argumenta que existem paralelos em relao
estrutura de seus contedos alm da diviso
em dez livros, e mais recentemente, Caroline
Van Eck escreve sobre a necessidade de
reconsiderar o estudo da estrutura do tratado,que estaria baseada nos textos de oratria e
salientando as diversas correntes de anlise dos
ltimos tempos.39
Alberti, no prlogo do tratado aborda a
arquitetura como arte maior, que satisfaz ao
mesmo tempo as exigncias dos trs nveis em
que opera: a necessidade (firmitas), a
comodidade (utilitas), e o prazer esttico
37Ver Castex, Jean. (1990). Renacimiento, Barroco eClassicismo Historia de la Arquitectura, 1420-1720. Madrid: Ediciones Akal. Captulo 4: Alberti (1404-1472): P. 49-61.38 KRAUTHEIMER, Richard (1969). Studies in EarlyChristian, Medieval, and Reaissance Art. New York:NY University Press. Captulo 1939
ECK, Caroline Van (1998). The Structure of De REAedificatoria Reconsidered. JSHA Journal of theSociety of Architectural Historians. Vol. 57. Nmero 3.
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(venustas). E define o estatuto do arquiteto
como aquele que pela fora da razo e do
mtodo saber corresponder s exigncias e
necessidades do homem nas construes, ouseja, utilidade, comodidade e prazer esttico.40
No mesmo prlogo ele ressalta a importncia
do projeto, na analogia prvia do edifcio como
um corpo, constitudo de contornos
(lineaments) e matria. O primeiro produto
do pensamento, que necessita da mente e
fora da razo e o segundo produto danatureza e dependente das corretas decises
de projeto para que o uso da matria seja
eficaz e consistente.41
Ao falar sobre os lineamentos, Alberti
coloca as primeiras definies do projeto
arquitetnico como hoje concebida. Trata-se da
possibilidade de projetar ou imaginar, sem
qualquer recurso material todas as formas na
mente, em um processo intelectual de soluo
de um problema, que dever ser testado e
revisado continuamente.
bastante possvel projetar
formas inteiras na mente sem qualquerrecurso material, pela designao e
determinao de uma orientao fixa e
conjuno de vrias linhas e ngulos.
40 Ver Choay Franoise (1980). A Regra e o Modelo.So Paulo: Editora Perspectiva.41ALBERTI, Leon Battista (1988). Traduo de RYKWERT
Joseph; TAVERNOR, Robert . On The Art of Building inTen Books. Cambridge: MIT Press.
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Considerando que isso o caso,
lineamentos devem ser o esboo preciso
e correto, concebido na mente,
composto de linhas e ngulos, eaperfeioado pela inteligncia e
imaginao.42 (Alberti, 1988. Livro I,
Cap. 1).
Mas eu posso dizer isto de mim:
eu concebi freqentemente projetos na
mente que pareciam bastante razoveis
na ocasio; mas, quando os traduzi em
desenhos, eu encontrei vrios erros nas
mesmas partes que me agradaram
muito, e erros bastante srios;
novamente, quando eu voltei aos
desenhos, e verifiquei as dimenses,
reconheci e lamentei meu descuido;
finalmente, quando passei dos desenhos
para a maquete, s vezes notei enganos
adicionais nas partes individuais, at
mesmo em cima dos nmeros.43
Estes trechos do tratado albertiano
revelam sua inteno em promover aarquitetura desde uma arte manual at o nvel
das artes liberais, como resultado do processo
intelectual em que o projeto comandar as
aes do canteiro de obra, levando adiante o
42ALBERTI, Leon Battista (1988). Traduo de RYKWERT
Joseph; TAVERNOR, Robert . On The Art of Building inTen Books. Cambridge: MIT Press.. Livro I, Cap. 1.43Idem, Livro IX, Cap. 10.
42 It is quite possible toproject whole forms in the mindwithout any recourse to the material,by designation and determining a
fixed orientation and conjunction forthe various lines and angles. Sincethat is the case, let lineaments be theprecise and correct outline, conceivedin the mind, made up of lines andangles, and perfect in the learnedintellect and imagination. (Alberti,1988. Livro I, Cap. 1).
43 But I can say this ofmyself: I have often conceived of
projects in the mind that seemedquite commendable at the time; butwhen I translate them into drawings,I found several errors in the veryparts that delighted me most, andquite serious ones; again, when Ireturn to drawings, and measure thedimensions, I recognize and lamentmy carelessness; finally, when I pasfrom the drawings to the model. Isometimes notice further mistakes inthe individual parts, even over the
numbers. (Alberti, 1988. Livro IX,cap. 10).
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que Brunelleschi, na prtica, j teria comeado
no incio do sculo XV e que Palladio ir
avanar no sculo XVI, aliando teoria e prtica
profissional. Para Alberti, no h arbitrariedadena definio do projeto. As regras do projeto
esto presentes em sua concepo dos
lineamentos, onde o todo est para as partes
assim como as partes para o todo, numa
relao lgica e proporcional, remetendo
sempre a analogia da construo e proporo
ao corpo humano.
A trade vitruviana (firmitas, utilitas e
venustas) elaborada ao longo de todo o
tratado quando discorre sobre os elementos da
construo, suas relaes e propores, as
tcnicas construtivas, tipo de edificaes, sem
necessariamente explicitar estes termos a cada
parte. A necessidade de estabelecer a
arquitetura como arte faz com que Alberti
submeta os aspectos tcnicos e construtivos
importncia suprema da beleza na arquitetura.
Segundo Choay, a argumentao lgica de todo
o tratado, em sua anlise como retrica, est
no encadeamento de toda a argumentao de
Alberti em professar a arquitetura como uma
arte superior e completa, em que a beleza e o
prazer esttico so a razo maior em direo ao
qual os fundamentos anteriores devem
concorrer.
O registro de comodidade,
porm, constitui apenas uma etapa no
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processo de edificao. Os espaos
construdos encontram seu verdadeiro
arremate somente no quadro do registro
superior. Em outras palavras, s regrasque permitem satisfazer a demanda de
comodidade, devem acrescentar-se as
regras que respondem ao desejo de
beleza: o prazer esttico e a beleza que
o proporciona so a finalidade e o
coroamento ao mesmo tempo da
edificao e do De Re Aedificatoria, cujaltima e mais longa parte lhes
dedicada. 44
Esta noo de beleza, que pode parecer
um conceito abstrato, definida de acordo com
a relao das partes e o conjunto da obra, onde
nada poderia ser acrescentado ou retirado sem
prejudicar o todo.
Beleza a sensata harmonia de
todas as partes dentro de um corpo, de
forma que nada pode ser adicionado,
subtrado, ou alterado, a no ser para
pior-lo.45
Desta maneira, ao longo do seu tratadoAlberti cria um sistema terico para definir a
arquitetura como cincia e arte liberal (ars
liberalis), conhecimento explicvel e com
44CHOAY, Franoise (1980). A Regra e o Modelo. SoPaulo: Editora Perspectiva. P:102.45ALBERTI, Leon Battista (1988). Traduo de RYKWERT
Joseph; TAVERNOR, Robert . On The Art of Building inTen Books. Cambridge: MIT Press. Livro VI, Cap. 2.
45 Beauty is that reasonedharmony of all the parts within abody, so that nothing may be added,taken away, or altered, but for theworse. (Alberti, 1988. Livro VI, Cap.2).>
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campo disciplinar prprio, explicitando as
regras e sistematiza seu processo de anlise e
entendimento. Os conceitos de lineamentos, as
formas e propores dos espaos, abordadosno livro I, servem de base para Palladio,
juntamente com o tratado vitruviano, ao
escrever o seu tratado, assim como a questo
urbana e das tipologias das villas e residncias
privadas abordadas no Livro V, do De Re
Aedificatoria.
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Serlio:
o tratado como formao e guia
profissional.
Sebastiano Serlio (1475-1555) nasceu
em Bolonha, filho do pintor Bartolomeo Serlio,
e, teve sua formao inicial como pintor, assim
como outros arquitetos da poca. Suas
primeiras atividades so em Pesaro, entre os
anos de 1511 e 1514. Aps este perodo se
transfere para Roma, onde trabalha nas obras
do Vaticano sob a superviso de Bramante,
Raphael e Baldassare Peruzzi, este ltimo seu
principal professor nos fundamentos da
arquitetura renascentista. Em 1527, aps o
saque de Roma, Serlio se transfere para Veneza
onde comea a trabalhar em seu tratado, TutteLOpere de LArquitettura et Prospetiva,
publicado integralmente somente aps a sua
morte.
A partir de 1538, a cidade de Vicenza
solicita a consultoria a vrios arquitetos, em
perodos distintos, para a renovao da baslica
da cidade, entre eles: Serlio, Giulio Romano,
Michele Sanmicheli e Palladio, sendo o projeto
de Palladio o escolhido pra execuo. Somente
em 1540 encontra finalmente seu tutor, o Rei
Francis I da Frana, que patrocina a publicao
de Della Antiquita, o terceiro livro de seu
tratado, iniciado em Veneza. Em 1545 publica
De metrie et De perspective, os dois primeiros
Figura 6 - Geometrias - Fonte: Serlio,1996
Figura 7 - Geometrias - Fonte: Serlio,1996
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livros do tratado, seguido do Quinto libro
drchitettura nel quale se trata de diverse
forme dei tempii em 1547. O sexto livro,
dedicado a arquitetura domstica, aparece em1551, mas nunca publicado, sobrevivendo
seus manuscritos e gravaes46. O stimo livro
sobre os acidentes arquitetnicos publicado
em 1575 aps sua morte.
Seu tratado o primeiro direcionado
especificamente ao problema da arquitetura
moderna47, apresentado com ilustraes e
informaes especficas sobre os mtodos
construtivos, assim como um guia geometria
euclidiana e aos princpios da construo
geomtrica em perspectiva. Escrito em
linguagem vernacular, em contraste ao tratado
de Alberti direcionado a nobreza e escrito em
latim, o texto e as ilustraes refletem sua
inteno de orientar sua publicao aos
arquitetos, como um guia prtico da
arquitetura.
O tratado organizado de maneira
seqencial, parte da base representativa da
expresso grfica e geometria para o desenhoem perspectiva, as antiguidades e as ordens,
apresentando a seguir exemplos de projetos,
partindo de solues simples para outras de
maior complexidade. O uso das ilustraes para
46 SERLIO, Sebastiano (1996). Sebastiano Serlio ondomestic architecture. New Hawen. Traduzido por
Vaughan Hart e Peter Hicks. Ver introduo, pgina xxv,The Architettura, a Treatise in Sevens Books.47Ver nota lateral P.32.
Figura 8 - Perspectivas - Fonte:Serlio, 1996.
Figura 9 - Perspectivas - Fonte:Serlio, 1996.
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expor seu pensamento revela o
desenvolvimento da racionalidade e
pensamento humanista, refletida no layout de
impresso de outros tratados cientficos damesma poca como, por exemplo, o trabalho
de anatomia De Humani corporis fabrica libri
septem, publicado por Andreas Vesalius em
1543 (Figura 10).
A seqncia de exposio apresentada
por ele no prefcio aos leitores indica a
inteno didtica de uma seqncia lgica de
leitura do trabalho como um todo,
independente da ordem inversa de sua
publicao. O primeiro livro tratando dos
princpios da geometria, para o entendimento
preciso do que o arquiteto produzir, o segundo
abordando os princpios da representao em
perspectiva, para revelar o conceito em uma
leitura tridimensional, o terceiro tratando da
representao grfica precisa, o desenho
tcnico, plantas e elevaes (Icnografia,
Ortografia) e vistas laterais (Sciografia). O
quarto livro trata das ordens, um dos
elementos chaves de entendimento e projeto
da arquitetura neste perodo. O quinto
discutindo as diferentes tipologias de templos,
com seus respectivos desenhos. O sexto livro
abordando a questo habitacional, desde as
mais simples at os palcios e o stimo e ultimo
livro do tratado concluindo com exemplos de
diversas situaes que o arquiteto se depararao longo da vida profissional, como formas
Figura 10 Desenhos de dissecao
de Vesalius, De humani corporisfabrica. Fonte: Tavernor, 1998.
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irregulares de terrenos, restauraes e
reconstrues de residncias.48 Esta seqncia
praticamente define o currculo de um curso de
arquitetura, abordando todas as questes queenvolviam o projeto neste momento, e uma
seqncia muita prxima da abordagem
acadmica atual do ensino de arquitetura.
A apresentao dos desenhos em vistas
ortogonais um precedente ao que Palladio
desenvolver posteriormente na publicao de
seu tratado com mais propriedade atravs do
uso das propores indicadas em planta em
suas representaes. Esta apresentao, de
qualquer maneira, forma uma ferramenta
didtica importante no contedo geral do
tratado de Serlio e ajudam a estabelecer um
padro para a representao arquitetnica no
Renascimento.
... As pranchas de Serlio
ajudaram a padronizar as projees de
desenho usadas no Renascimento e em
particular nos tratados arquitetnicos
subseqentes. 49
O Livro VI constitudo basicamente deilustraes com textos explicativos, mas
configura uma importante abordagem a
respeito da arquitetura residencial da poca, e
forma um catlogo consultivo de uma tipologia
normalmente construda sem a presena do
48SERLIO, Sebastiano (1996). Op. Cit. Pg. 253.49SERLIO, Sebastiano (1996). Op. Cit. Pg. xx.
A maior parte dos currculosde arquitetura atualmente, adota aseqncia de ensino atravs do
aprendizado da representaoarquitetnica e seus elementos. Aabordagem da tridimensionalidade darepresentao seja manual ouauxiliada por computador e oexerccio de projeto. Aliada a umarepertorizao atravs da histria daarquitetura e da pesquisa, e de umcrescente em complexidade nasquestes programticas do exercciode projeto.>
James Ackerman na
Introduo escrita por ele para atraduo do Livro VI, comenta oavano do uso das dimenses epropores utilizadas por Palladio emrelao a simplificao do uso demedidas e escalas adotadas porSerlio. Ver maiores detalhes emSERLIO, Sebastiano (1978). Ondomestic architecture. New York:Mit/Press, pgina 14.
49 Although Serlio tells us
that to assist the scaling off ofmeasurements from the drawings,perspective, or the foreshortening ofthe side face, is not to be used inBook III, side faces in perspectives incombination with true elevations arein fact a regular feature. Indeed, thereceding side serves to emphasise theprofile of the element underdiscussion. Serlios plates helped tostandardize the drawing projectionsused in the Renaissance and in
subsequence architectural treatises inparticular. (Serlio, 1996. Pg. xx.).
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arquiteto. Serlio antev uma nova clientela que
se forma neste perodo e populariza, pelo
menos na classe burguesa ascendente do
Renascimento, a profisso do arquiteto.Ento, como agora, a maioria
das residncias foi construda sem
arquitetos, e havia um grande mercado
em potencial para modelos padronizados
do novo estilo apresentado no Livro VI e
disponvel na verso impressa. Aps a
morte de Serlio, os construtores
seguramente continuaram a confiar
neste livro como inspirao, assim como
fizeram com a publicao de Palladio
vinte e cinco anos depois.50
Alm da importncia de prever esta
disseminao do trabalho do arquiteto noprojeto da arquitetura cotidiana, o manuscrito
do Livro VI contribui ao entendimento de uma
mudana social e poltica na histria ocidental,
o aumento de poder e influncia de uma nova
classe social, a burguesia. A ascenso e
mudana do carter desta nova sociedade se
refletem na mudana de relaes da cidade esuas necessidades. Novos espaos de
convivncia so necessrios, o carter de ruas
e praas se modifica, o que significa uma nova
ordenao do espao pblico das cidades.
50 SERLIO, Sebastiano (1978). On domestic
architecture. New York: Mit/Press. Introduo escritapor James Ackerman para a traduo do Livro VI,publicada em 1978. P: 11.
50 Then, as now, mosthousing was built without architects,
and there was a potential market forstandardized models in the latest stylesuch as Book VI would have providedhad it been available in print. Builderslong after Serlios death would surelyhave continued to rely on this bookfor inspiration as they did Palladiospublication of twenty-five years later.(Serlio, 1978. p.11).
Figura 11 - Planta baixa do Pantheon,segundo Serlio. Fonte: Serlio, 1996.
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Um novo pblico consumidor de
arquitetura surge nesta poca, mudando as
necessidades tipolgicas na construo do
sculo XVI, e criando uma nova relaoarquiteto-cliente, assim como uma nova
abordagem no processo de projeto, o processo
investigativo atravs da manipulao dos
elementos e das tipologias reinterpretadas da
arquitetura clssica.
James Ackerman escreve naintroduo da traduo do Livro VI, oartigo intitulado The UrbanRevolution, onde comenta estas novas
mudanas e a participao do textode Serlio neste contexto. Serlio, 1978.>
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O projeto como investigao e teoria
O sculo XVI representa um momento
de transformao na maneira de pensar e
projetar. A mudana das relaes de trabalho e
da sociedade nos sculos anteriores comea
esta transformao. Nos sculos XIV e XV, os
arquitetos eram apenas um dos participantes
do processo de construo e das decises
arquitetnicas. Sua influncia dependia dequem era o contratante da obra, quem eram as
comisses construtivas, que definiam muito do
que deveria ser feito.
As publicaes citadas anteriormente
so essenciais na mudana de pensamento,
uma vez que a arquitetura passa a figurar no
meio intelectual. Deixa de lado o sistemacorporativo das comisses construtivas sob a
superviso do mestre de obras (capomaestro)
para ser resultado da investigao atravs do
projeto autoral do arquiteto, fundamentado no
estudo do tratado de Vitrvio, e nos tratados da
atualidade renascentista.51Estes estudos geram
uma nova gama de parmetros para o projeto,
desde as propores at definies tipolgicas
dos edifcios.
51 Ver mais em: Pereira, Cludio Calovi. (1998).Architectural Pratice and the Planning of Minor
Palaces in Renaissance Italy: 1510-1570. Tese deDoutorado (Arquitetura)- Massachusetts Institute ofTechnology-. MIT.
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Em conjunto a esta mudana de
pensamento no entendimento da arquitetura
como cincia e arte liberal, surge a necessidade
de novos projetos no mbito da arquiteturadomstica. Os projetos destinados a arquitetos,
at ento vinculados a edifcios monumentais
ligados ao clero, a nobreza, ou a corte
eclesistica se expande para edifcios de
propores menores destinados a uma
nobreza menor no final do sculo XV, ligadas
normalmente corte papal em Roma, conformecita o Prof. Calovi:
Ao fim do sculo XV, a
restaurao poltica de Roma havia
criado uma nobreza menor na cidade,
composta principalmente por classes
profissionais ligadas administrao da
burocracia papal e proviso de servios
para a mesma. Tratava-se de
diplomatas, juristas, escrives,
economistas, secretrios, tradutores,
literatos, mdicos e artistas. Alguns
deles somavam sua ocupao secular
algum cargo ou funo eclesistica.52
O aumento do nmero destes projetos
residenciais em Roma (conhecidos como
palcios menores) levou a arquitetura a atuar
tambm na questo mais ampla da formao
da cidade e de uma relao arquiteto-cliente
52PEREIRA, Cludio C. (2001a). Prtica Profissional e
o projeto de Palcios Menores no RenascimentoItaliano. ARQTEXTO-, Porto Alegre, N 1. p. 38-47 1semestre 2001 PR0PAR/UFRGS.
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muito prxima atuao profissional atual. O
arquiteto passou a centrar sua atuao no
projeto do edifico, fornecendo ao cliente os
desenhos e maquetes para sua construo.53
O crescimento desta nova classe mdia
se expandia nas demais cidades italianas, assim
como em Roma. A mudana das relaes
comerciais e sociais dos sculos anteriores,
passando do sistema feudal medieval de trocas
para um sistema mercantil traz consigo a
necessidade de novos espaos para a cidade,
assim como moradias melhores para a classe
dominante em ascenso, que aspira por
residncias baseadas nos edifcios modernos
construdos para a nobreza e de acordo com a
nova ideologia humanista. Esta classe
composta por profissionais liberais, banqueiros
e mercadores, diferente da nobreza menor de
Roma, ligada Igreja, e com maiores vnculos
culturais em relao ao conhecimento da arte e
cultura humanista.
No incio do sculo XVI, Antnio da
Sangallo, o Jovem, projetou uma srie de
palcios menores em Roma, incluindo duasresidncias para ele. Nos projetos destas
residncias pode se verificar, atravs dos
desenhos remanescentes, o processo de
projeto atravs da investigao planimtrica.
53 Ver mais em PEREIRA, Cludio C. (2001). Prtica
Profissional e o projeto de Palcios Menores noRenascimento Italiano. ARQTEXTO-, Porto Alegre, N1. p. 38-47 1 semestre 2001 PR0PAR/UFRGS.
Figura 12 - Plantas Sangallo, o jovem.Ufizzi 984 Ar - Fonte: Pereira (1998).
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A partir de uma idia inicial desenhada
a rgua para a sua primeira residncia (1534),
localizada na Via Giulia em Roma, so feitas
investigaes e alteraes a mo livre, atsurgir a necessidade da elaborao de outra
planta contendo as novas informaes. As
alternativas variam em torno do ptio interno,
onde as variaes planimtricas se do na
localizao das partes. Na planta final os
principais espaos recebem denominaes com
base no tratado vitruviano, nomes como:vestibolo, atrio, peristilo e cavo aedio,
revelando a inteno de aproximar a moradia
do sculo XVI casa romana antiga.54
No projeto de sua segunda residncia
(1542) o conjunto de plantas remanescentes
revela uma srie de desenhos a mo-livre,
demonstrando um mtodo de especulao
projetual atravs de mltiplas alternativas,
avaliadas e desenvolvidas ao longo do
processo.55 Este processo de projeto, atravs
da investigao das alternativas planimtricas
dos palcios menores, identificado tambm
na obra de Baldassare Peruzzi e Palladio na
54 Ver mais em PEREIRA, Cludio C. (1998).Architectural Pratice and the Planning of MinorPalaces in Renaissance Italy: 1510-1570. Tese deDoutorado (Arquitetura)- Massachusetts Institute ofTechnology-. MIT.Tese
55PEREIRA, Cludio C. (2001a). Prtica Profissional e
o projeto de Palcios Menores no RenascimentoItaliano. ARQTEXTO-, Porto Alegre, N 1. p. 38-47 1semestre 2001 PR0PAR/UFRGS.
Figura 13 - Plantas Peruzzi para oPalazzo Ricci.Ufizzi 359 - Fonte: Pereira (1998).
Figura 14 Plantas de Palladio ,estudo para um palcio.RIBA XV/22v - Fonte: Pereira (1998).
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tese de doutorado do Prof. Cludio Calovi
Pereira.56
Peruzzi e Palladio esboam a planta de
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